revista de políticas públicas e gestão governamental

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ISSN 1678-4057 - Vol. Jan/Jun 2010 9, No. 1 - Vol. 9 - No. 1 Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental ORIGENS E FUNDAMENTOS DA CARREIRA DE GESTOR GOVERNAMENTAL Aldino Graef AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO: INSTITUCIONALIZAÇÃO NA GESTÃO DASPOLÍTICAS PÚBLICAS DO GOVERNO FEDERAL Pedro Cavalcante e Ronaldo Nogueira IMPACTOS ECONÔMICOS DA REGRA DE PORTABILIDADE DE CARÊNCIA EM PLANOS DE SAÚDE Thompson da Gama Moret Santos A APLICAÇÃO DOS DADOS DEMOGRÁFICOS NA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DA AMAZÔNIA LEGAL: DESAFIOS E PERSPECTIVAS Pedro Assumpção Alves e Thiago Batista Marra PARTICIPAÇÃO DOS DEPUTADOS NA COMISSÃO MISTA DE ORÇAMENTO E REELEIÇÃO Marco Lemgruber

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Origens e fundamentos da carreira de Gestor GovernamentalAldino GraefAvaliação e Monitoramento: institucionalização na gestão daspolíticas públicas do Governo FederalPedro Cavalcante e Ronaldo NogueiraImpactos Econômicos da Regra de Portabilidade deCarência em Planos de SaúdeThompson da Gama Moret SantosA aplicação dos Dados Demográficos na Regularização Fundiáriada Amazônia Legal: desafios e perspectivasPedro Assumpção Alves e Thiago Batista MarraParticipação dos Deputados na Comissão Mista de Orçamento eReeleição

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ISSN 1678-4057 - Vol. Jan/Jun 2010 9, No. 1 -

Vol.

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o. 1

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ORIGENS E FUNDAMENTOS DA CARREIRA DE GESTOR GOVERNAMENTALAldino Graef

AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO: INSTITUCIONALIZAÇÃO NA GESTÃO DASPOLÍTICAS PÚBLICAS DO GOVERNO FEDERALPedro Cavalcante e Ronaldo Nogueira

IMPACTOS ECONÔMICOS DA REGRA DE PORTABILIDADE DE CARÊNCIA EM PLANOS DE SAÚDEThompson da Gama Moret Santos

A APLICAÇÃO DOS DADOS DEMOGRÁFICOS NA REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DA AMAZÔNIA LEGAL: DESAFIOS E PERSPECTIVASPedro Assumpção Alves e Thiago Batista Marra

PARTICIPAÇÃO DOS DEPUTADOS NA COMISSÃO MISTA DE ORÇAMENTO E REELEIÇÃOMarco Lemgruber

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Revista de Políticas Públicas

e Gestão Governamental

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Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental -uma carreira a serviço da cidadania

Diretor Presidente: Roberto Seara Machado Pojo Rego

Diretor Vice-Presidente: Rodrigo Zerbone Loureiro

Diretor Administrativo-Financeiro: Rodrigo Ribeiro Novaes

Diretor de Assuntos Jurídicos: João Guilherme Lima Granja Xavier da Silva

Diretor de Comunicação e Divulgação: Trajano Augustus Tavares Quilhões

Diretora Sócio-Cultural: Helenilka Pereira Barboza da Luz

Diretor de Assuntos Profissionais: Arthur Phillipe Pinto e Silva

Diretor de Assuntos Parlamentares: Lauseani Santoni

Diretor de Estudos e Pesquisas: Jean Paraíso Alves

CONSELHO FISCAL: Amarildo Baesso, Pedro Antônio Bertone Ataide, Lígia Aparecida de Arruda Camargo Lacerda

CONSELHO DE ÉTICA: Alessandro Ferreira dos Passos e Igor da Costa Arsky

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS ESPECIALISTAS EM POLÍTICASPÚBLICAS E GESTÃO GOVERNAMENTAL

Editor: Jean Paraiso Alves - Comissão Editorial: Carolina Gabas Stuchi, Eduardo Granha, ElisabethSousa Cagliari Hernandes, Kenys Menezes Machado, Gisele Gomes da Silva, Lamartine Braga, JulianaA. N. Suzuki, Leila Giandoni Ollaik, Márcia Muchagata, Roberto Domingos Taufick, Trajano AugustusTavares Quinhões - Projeto Gráfico: Wagner Alves /Anagraphia BR - Foto capa: Patrick GrosnerDiagramação e Produção: Acqua Design - Revisão: Eveline de Assis

Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental.Endereço: SBN, Quadra 2, Bloco F, Ed. Via Capital, Sala 309/310 - CEP: 70.040-911 - Brasília/DF.FONES: (61) 3323 2397 / 3321 3898 / FAX: (61) 3322 4049.E-mail: [email protected] / Site: www.anesp.org.br1.000 exemplares - circulação dirigida

RES PVBLICA é uma publicação semestral da Associação Nacional dos Especialistas em PolíticasPúblicas e Gestão Governamental - ANESP. O conteúdo dos artigos publicados não necessaria-mente expressa a opinião da ANESP.

Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental : Res Pvblica / Associação

Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas e Gestão Governamental.

– Ano 1, n.1 (set. 2002)- . – Brasília : ANESP, 2002- .

Semestral

ISSN 1678-4057

1. Administração Pública – Periódicos. 2. Gestão Governamental – Periódicos. 3.

Politica Pública – Periódicos. I. Associação Nacional dos Especialistas em Políticas Públicas

e Gestão Governamental. II. Título: ResPvblica.

CDD 350.005

CDU 35 (05)

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Página 3

Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

5 Editorial

7 Origens e fundamentos da carreira de Gestor GovernamentalAldino Graef

25 Avaliação e Monitoramento: institucionalização na gestão daspolíticas públicas do Governo FederalPedro Cavalcante e Ronaldo Nogueira

43 Impactos Econômicos da Regra de Portabilidade deCarência em Planos de SaúdeThompson da Gama Moret Santos

67 A aplicação dos Dados Demográficos na Regularização Fundiáriada Amazônia Legal: desafios e perspectivasPedro Assumpção Alves e Thiago Batista Marra

87 Participação dos Deputados na Comissão Mista de Orçamento eReeleiçãoMarco Lemgruber

Sumário

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

EditorialOs cinco artigos selecionados para esta edição tratam

de temas fundamentais para a gestão de políticas públicas.

O texto de Aldino Graef, “Origens e Fundamentos da

Carreira de Gestor Governamental”, é uma atualização de

um documento apresentado pelo autor em seminário da

carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão

Governamental realizado no ano de 1998, no contexto da

retomada do recrutamento e seleção, mediante concurso

público, para a carreira e a presença de novas turmas de

gestores, após oito anos de interrupção. O texto teve

como objetivo oferecer aos novos gestores uma visão

histórica das origens da carreira no contexto da

redemocratização do País na década de 1980, bem como

dos fundamentos legais sobre os quais se assentaram a

sua criação.

Em “Avaliação e Monitoramento: institucionalização na

gestão das políticas públicas do governo federal”, Pedro

Cavalcante e Ronaldo Nogueira argumentam que o

processo de institucionalização da avaliação e

monitoramento de políticas públicas (A&M) está avançado

na administração pública brasileira, principalmente em

função da criação de sistemas avaliativos sofisticados e

integrantes do ciclo de políticas públicas. Após a discussão

teórica sobre a importância e o desenvolvimento da A&M

no Brasil, os autores analisam duas experiências

inovadoras de formulação e implementação de sistemas

de avaliação e monitoramento (SAM) no governo federal. A

primeira, desenvolvida no âmbito do Plano Plurianual

(PPA), envolve todos os programas do governo federal,

enquanto a segunda, do Ministério do Desenvolvimento

Social e Combate à Fome (MDS), consiste em uma

estrutura voltada exclusivamente às políticas públicas

dessa pasta.

No artigo “Impactos Econômicos da Regra de

Portabilidade de Carência em Planos de Saúde”,

Thompson da Gama Moret Santos procurou avaliar a

eficácia da regra de portabilidade de carência estabelecida

pela ANS e seu respectivo impacto no bem-estar social.

Apesar do avanço nessa matéria proporcionado pela

elaboração da RN nº 186/2009, esta regra prevê diversos

requisitos no momento do exercício do direito ao exercício

da portabilidade da carência que, sob a ótica da dinâmica

da eficiência na produção (OPS) e da eficiência nas trocas

(beneficiário), interferem nas decisões alocativas desses

agentes econômicos. Conforme demonstrado no

trabalho, verifica-se que, em diversos casos, a atual regra é

inócua e em outros produziria um problema de seleção

adversa intra faixa de preço.

O artigo de Pedro Alves e Tiago Marra, intitulado “A

Aplicação dos Dados Demográficos na Regularização

Fundiária da Amazônia Legal: desafios e perspectivas”,

apresenta as diferentes dimensões do problema fundiário

na Amazônia Legal, destacando os desafios que se

apresentam ao Programa Terra Legal e as soluções

propostas para superá-los. Ponto importante é avaliar qual

será a governabilidade do programa para levar a cabo a

tarefa ao qual ele se propõe: regularizar ocupações rurais

em terras públicas federais, legítimas segundo os pré-

requisitos da Lei nº 11.952/09; além de garantir o

cumprimento das cláusulas resolutivas previstas para as

ocupações regularizadas, ou seja, que elas cumpram com

a função social prevista na Constituição Brasileira.

Marco Lemgruber, no artigo “Participação dos

Deputados na Comissão Mista de Orçamento e Reeleição”,

investiga se o padrão de sucesso eleitoral dos deputados

federais que participam da Comissão Mista de Planos,

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Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO), do Congresso

Nacional, é diferente do padrão dos demais parlamentares.

Para tanto, o autor analisa a participação dos deputados

federais na CMO nas 50ª, 51ª e 52ª legislaturas, e os

padrões de sucesso eleitoral dos mesmos nas eleições de

1998, 2002 e 2006.

Boa leitura!

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Origens e fundamentos da

carreira de Gestor

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Por Aldino Graef

O presente artigo é uma atualização de um documento apresentado pelo autor em seminário

da carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental realizado no ano de 1998,

no contexto da retomada do recrutamento e seleção mediante concurso público para a carreira e a

presença de novas turmas de gestores, após oito anos de interrupção. O texto teve como objetivo

oferecer aos novos gestores uma visão histórica das origens da carreira no contexto da

redemocratização do País na década de 1980, bem como dos fundamentos legais sobre os quais

se assentaram a sua criação.

O artigo aborda também as contradições surgidas no período pós-constituinte com a

interrupção do processo de modernização e profissionalização da administração pública (iniciado no

governo da Nova República e cujas principais diretrizes foram incorporadas no texto da Constituição

de 1988). O autor aborda os problemas surgidos com a não regulamentação do texto constitucional

relativamente ao novo sistema de carreiras e a sobrevivência da estrutura arcaica e ultrapassada do

Plano de Classificação de Cargos da Lei nº 5.645, de 1970, bem como seus impactos sobre a

carreira de gestores governamentais.

O autor reafirma no texto sua convicção na retomada do processo de profissionalização da

administração pública em futuro próximo e o papel da carreira nesse contexto. Por fim, é abordada

a necessidade da elaboração de um novo regulamento para a carreira, bem como, a necessidade

da retomada da formação dos integrantes da carreira nos moldes originais, isto é, de um mestrado

profissional de altos estudos em gestão governamental.

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Origens e fundamentos da carreira de Gestor

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.INTRODUÇÃO

A incompreensão em torno das missões e dasatribuições dos cargos da carreira de Especialista emPolíticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) ébastante grande, quase generalizada. Existem razões paratal. A principal é o desconhecimento dos fundamentos doprojeto da reforma que lhe deu origem. Mas, além daincompreensão de muitos, temos também a oposiçãoconsciente de alguns segmentos corporativos da própriaadministração, que veem na carreira uma ameaça, real oufictícia, a seus espaços de poder burocrático, ou de gruposprivados específicos interessados na ocupação deespaços no gerenciamento da máquina administrativa dogoverno.

Para os grupos corporativos contrários a uma carreirade gestores governamentais, a profissionalização é vistacomo a soma de estruturas controladas por corporaçõesespecíficas de Estado sem uma visão integrada da gestãogovernamental. Por seu turno, os segmentos privadosveem na profissionalização da administração pública, emespecial na existência de uma carreira de executivospúblicos e da Escola Nacional de Administração Pública(ENAP), como escola de governo, uma ameaça séria paraseus objetivos e interesses específicos.

Em razão da grande permeabilidade da administraçãopública, resultante da ampla estrutura de cargos deconfiança atual, esses grupos conseguem ocupar espaçosde poder e, dada sua perspectiva própria, ignoram overdadeiro papel da carreira e a missão da ENAP comoescola de governo e formadora dos gestoresgovernamentais. Enquanto isto, os gestores, cuja carreirafoi criada como instrumento de modernização daadministração e da implantação do novo sistema decarreiras, têm estado alijados dos postos de maiorresponsabilidade no Sistema de Pessoal Civil da União(SIPEC). O caos atualmente existente na organização dosquadros e dos cargos na administração pública federal,com aproximadamente 130 planos de cargos e carreiras –crescentes conflitos de atribuições e intensas lutas porespaços de poder burocrático, refletidas nas “reservas demercado de cargos e funções” já existentes em váriosórgãos e entidades – certamente teria sido evitado poruma gestão menos corporativa e alicerçada em uma visãoestratégica da administração.

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O caso da ENAP é igualmente significativo nestaavaliação. A política de congelamento da carreira degestores governamentais, durante os governos Collor eItamar Franco, refletiu-se também na tentativa de reduçãodo papel estratégico da ENAP, como escola de governoformadora dos altos executivos públicos. O desmonte doEstado no governo Collor, extremamente duro na área derecursos humanos em geral, impactou a ENAP com aredução de seu papel ao de um “centro de treinamento”em atividades de natureza técnico-operacional.

O decreto que transformou a ENAP em fundaçãopública, com a extinção da antiga Fundação Centro deFormação do Servidor Público (FUNCEP) (que abrigou emsua estrutura a ENAP em seus primórdios), não deixadúvidas sobre a política desestruturadora e reducionistado papel da escola, implícito no ato. O perfil dos dirigentesda ENAP durante todo esse período também tornou issoevidente. Enquanto o parágrafo único do art. 4º doDecreto de criação da ENAP1, muito corretamenteestabelecia que os seus dirigentes fossem escolhidos“dentre profissionais de notória competência ereconhecida experiência no setor público”, o que se viu foiuma sucessão de dirigentes de perfil próprios de gerentesde centros de treinamento e sem a necessária efundamental experiência de gestão estratégica no governofederal, sem a qual a condução do processo de formaçãode quadros superiores da administração ficacomprometida.

No período do ministro Bresser Pereira, apesar daretomada do recrutamento para a carreira, também foinegado à ENAP o seu papel estratégico de Escola deGoverno, isto é, de altos estudos e formadora dosrecursos humanos estratégicos da administração. Apolítica bresseriana era contrária ao texto constitucionalnão somente no caso do regime jurídico único (quetentou eliminar por meio de Emenda à Constituição), mastambém, em relação ao sistema de carreiras. BresserPereira defendia a ideia do “mercado de DAS” que é, narealidade, a antítese do sistema de mérito. Nessaperspectiva, não cabe uma Escola de Governo e, por issomesmo, propôs a extinção da ENAP. Uma associação civil,constituída por iniciativa dos dirigentes da ENAP da época,por coincidência ou não, originários de uma instituiçãoprivada de ensino superior, composta por duas dezenasde pessoas próximas, seria qualificada como organizaçãosocial e viria a substituir a ENAP. Uma nova forma, mais

radical que a estratégia do governo Collor, de extinção daENAP e de golpear a carreira, pois, sem escola de governonão há formação de gestores governamentais para osaltos escalões da administração. Esses profissionais nãosão formados nas universidades e institutos deadministração. Por essa razão a ENAP foi criada.

Contudo, o Congresso Nacional teve o bom-senso derejeitar a proposta do ministro Bresser Pereira. Aliás, oCongresso foi além e não só rejeitou o Projeto de Lei deextinção da ENAP como aprovou uma Emenda àConstituição que estabelece a obrigação para a União, osEstados e o Distrito Federal de manter escolas de governopara a formação e o aperfeiçoamento dos servidorespúblicos “constituindo-se a participação nos cursos umdos requisitos para a promoção na carreira”.2 A rejeiçãodesse PL de extinção da ENAP e a aprovação da Emendatornando obrigatórias as escolas de governo foi uma dasmaiores vitórias da carreira e de todos aqueles quedefendem a profissionalização da administração pública.

Uma administração pública profissional, apoiada emuma carreira de executivos de alto nível, será certamentemenos vulnerável diante da ação de grupos de interessesprivados e corporativos específicos. A existência da carreirade gestores, hoje com quase mil integrantes e largaexperiência adquirida de parte da maioria de seus quadros,e da ENAP constituem uma base fundamental para a

Para os grupos corporativos

contrários a uma carreira de

gestores governamentais, aprofissionalização é vista

como a soma de estruturas

controladas por corporaçõesespecíficas de Estado sem

uma visão integrada da

gestão governamental

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retomada do projeto de profissionalização daadministração pública congelada pelos dirigentes da áreade administração dos governos apoiados na filosofianeoliberal.

Por essas razões é de fundamental importânciaresgatar a história da carreira, recuperar a memória doprojeto que lhe deu origem. Por outro lado, oconhecimento das bases do projeto que deu origem àcarreira permitirá compreender melhor as resistênciascorporativas e de grupos privados que enfrentamos aolongo dos anos que precisamos vencer para superar osentraves para uma reforma que modernize aadministração pública para que possa cumprir sua missãode suporte efetivo à governabilidade no contexto doregime democrático e de alternância de partidos no poderpolítico e de melhoria da prestação dos serviços públicos atoda a população.3

UM PROJETO INOVADOR

A carreira de gestores governamentais tem origem noprocesso de redemocratização do País, como parte doprojeto de reforma administrativa do governo da NovaRepública, o primeiro governo civil depois de mais de duasdécadas de regime militar. A reforma administrativa daNova República orientou-se na perspectiva deimplantação de uma administração profissional que dessesustentação e assegurasse a continuidade administrativano contexto do novo regime de alternância democráticade partidos no poder.4 Assim, a reforma propugnava aprofissionalização da administração pública e aimplantação do sistema de mérito, em oposição aos víciosdo clientelismo, do nepotismo e do patrimonialismoprofundamente arraigados na administração públicabrasileira.

Importante observar que, embora o governo da épocase preocupasse com a racionalização da estruturaorganizacional do serviço público, o centro da reformaadministrativa era a política de recursos humanos. Emparticular, houve uma preocupação especial com aformação de um corpo de executivos públicos de carreiraque seria a vanguarda da reforma do Estado e a cabeçada nova estrutura de recursos humanos da administraçãopública federal.

Pode-se constatar, pois, que aquela proposta dereforma, ao colocar os recursos humanos no centro e,

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mais especialmente, a formação de um corpo deexecutivos públicos de carreira como questão prioritária,tinha como objetivo uma transformação profunda eduradoura. Era uma proposta avançada com eixo naquestão gerencial concretizada na criação da Carreira deGestores Governamentais e da Escola Nacional deAdministração Pública (ENAP).

Por mais que a reforma tenha sido, em grande parte,abortada, ainda durante o próprio governo que a propôs,especialmente a partir do surgimento e fortalecimento dochamado “Centrão” (movimento político conservador noprocesso da Assembléia Constituinte), a carreira degestores governamentais foi aprovada pelo CongressoNacional, com apoio de amplos setores, desde os liberais,passando pelos partidos de centro-esquerda e da FrenteParlamentarista. Independentemente do retrocesso com amudança da composição do governo e, a seguir, pela nãorecepção no novo ordenamento jurídico pós-constituintedo Decreto-Lei nº 2.403, de 1987, que definia as diretrizesdo novo sistema de carreiras, a presença dos gestores naadministração pública é hoje um elemento que ninguémpode desconsiderar. Como a fênix ela renasceu das cinzasda destruição da política conservadora da segunda fasedo governo Sarney e do governo Collor e é atualmenteum instrumento importante na gestão governamental.Nem mesmo os feiticeiros vendedores de fórmulasmágicas que pretendem revolucionar as organizações, dodia para a noite (mas que se evaporam sem deixarvestígios de sua passagem, exceto as contas a pagar aosconsultores), podem negar a importância da carreira.

A profissionalização da administração pública,elemento fundamental para a governabilidadedemocrática, continua sendo, entretanto, um objetivo aser alcançado e uma tarefa a cumprir.

O SISTEMA DE CARREIRAS DO DECRETO-LEI 2.403 EOS GESTORES

A política de recursos humanos da reformaadministrativa democrática da Nova República baseava-seem um tripé composto de:

1.implantação de um novo sistema de carreiras, emsubstituição ao Plano de Classificação de Cargos da Leinº 5.645, de 1970, cujas diretrizes foram aprovadaspelo Decreto-Lei nº 2.403, de 1987, com vinculação

dos cargos comissionados de “provimento restrito” àsclasses das carreiras, observada a hierarquia deresponsabilidades, e acesso a essas funções a partir deum sistema de habilitações baseadas em processos deformação gerencial em escola de governo e naexperiência adquirida ao longo da vida profissional,expressa no desenvolvimento da carreira;

2.implantação de um Subsistema de Capacitação eTreinamento do Servidor Público5, integrado pelaENAP, criado com a finalidade de formar os quadrosdirigentes do novo sistema de carreiras e o CEDAM,responsável pela formação gerencial e técnico-operacional, integrantes da estrutura da antigaFUNCEP, sob a coordenação da Secretaria de RecursosHumanos, órgão central do Sistema de Pessoal Civil daUnião (SIPEC);

3. criação da carreira de gestores governamentais,um corpo de executivos públicos profissionais, comatribuições voltadas para a formulação, implementaçãoe avaliação de políticas públicas e o exercício deatividades de direção e assessoramento nos escalõessuperiores da administração pública federal direta,autárquica e fundacional.

As diretrizes do Sistema de Carreiras, no qual seinseriam os cargos de Especialista em Políticas Públicas eGestão Governamental, com criação proposta por meiodo Projeto de Lei enviado ao Congresso Nacional emoutubro de 1987, foram fixadas no Decreto-Lei nº 2.403,de 21 de dezembro de 1987.

As diretrizes e principais projetos da reformaadministrativa do governo da Nova República delinearamum novo modelo profissionalizado de administraçãopública, destinado a substituir o modelo de administraçãodo regime militar, atendendo às exigências do processo dedemocratização em curso na sociedade e no Estado. Opapel da carreira de gestores governamentais foi, portanto,definido objetiva e concretamente por essa reformaadministrativa que visava à profissionalização daadministração e à valorização do servidor público. AConstituição de 1988 viria a estabelecer os princípiosfundamentais da administração já preconizados pelareforma não concluída nos anos anteriores. Princípiosesses que, aliás, nada têm a ver com as farras deefetivações dos milhares de servidores celetistas nãoconcursados, por meio de dispositivo da Lei do Regime

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Jurídico Único e outras efetuadas nos anos posteriorescujas repercussões negativas se estendem até os dias dehoje.

Cumpre ressaltar que as diretrizes do Sistema deCarreiras do Serviço Civil da União, fixadas no Decreto-Leinº 2.403, de 21 de dezembro de 19876, previa asubstituição do antigo Plano de Classificação de Cargos daLei n° 5.645, de 1970, bem como, a extinção das formasde provimento em comissão por critérios de confiançavigentes no PCC de 1970.

Por esse diploma legal, os cargos em comissão eramclassificados em duas categorias: de provimento amplo, delivre nomeação e exoneração, ou de provimento restrito,vinculados às carreiras. Já o art. 6° do referido diplomalegal estabelecia:

Art. 6° As carreiras serão organizadas em classes,integradas por cargos de provimento efetivo.

Parágrafo Único. Serão estabelecidos, para cadaclasse, as atribuições, os requisitos de formação,capacitação e experiência, bem como, quando foro caso, os cargos em comissão a ela vinculados(grifo nosso).

O art. 9°, por sua vez, determinava:

Art. 9° Cada Ministério e Território Federal teráquadro de pessoal estruturado e administrado deacordo com as diretrizes do Sistema de Carreira, emque serão especificados:

I - os cargos de direção e os de assessoramentoreferentes a cada unidade da respectiva estruturaorganizacional;

II - as carreiras necessárias ao desempenho dasrespectivas atividades;

III - as classes de cada carreira, devendo a classemais elevada corresponder aos cargos comissionadosde maior nível, a que esteja vinculada;

IV - o número máximo de cargos de cada carreira,fixado com base nas necessidades de serviço;

§ 1° os quadros de pessoal de que trata o caputdeste artigo incorporarão os servidores dosrespectivos Órgãos Autônomos;

§ 2º No que se refere aos cargos em comissão, dedireção ou de assessoramento, deverão ser

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discriminados os de recrutamento amplo e os derecrutamento restrito (grifos nossos)

Na parte relativa à capacitação do servidor, o Decreto-Lei nº 2.403, de 1987, mantinha total coerência com omodelo geral do sistema de carreiras e os princípios dareforma voltados para a profissionalização e valorizaçãodo servidor, conforme podemos depreender do dispostono art. 18:

“Art. 18. As atividades de capacitação, como parteintegrante do Sistema de Recursos Humanos, serãoplanejadas, organizadas e executadas de formaintegrada e sistêmica, segundo diretrizes fixadas pelaSecretaria de Administração Pública da Presidência daRepública – SEDAP, destinando-se a proporcionar aosfuncionários:

I - aperfeiçoamento, especialização e atualizaçãode conhecimentos, nas áreas de atividadescorrespondentes às respectivas carreiras;

II - conhecimentos, habilidades, técnicas degerência geral e aplicada ás áreas de atividadesfinalísticas e instrumentais.

§ 1° Os programas de capacitação, relacionados acada carreira, deverão ter em vista, precipuamente ahabilitação do funcionário para o eficaz desempenhodas atribuições inerentes à respectiva classe e à classeimediatamente superior, incluídas as dos cargos emcomissão a ela vinculados. (...) (grifos nossos)

Seguindo essa mesma linha, o art. 29, do mesmoDecreto-Lei estabelece: “Art. 29. O ingresso do servidor emqualquer classe da carreira somente o habilitará aoexercício dos cargos em comissão a ela vinculados após aconclusão, com aproveitamento do programa decapacitação respectivo.”

O artigo 26 considera em extinção os cargos e tabelaspermanentes instituídos de acordo com as Leis n° 5.645,de 1970, e n° 6.550, de 1978. E o artigo 30 estabeleceque: “Art. 30. A implantação do Sistema de Carreiraimplicará na extinção gradativa das atuais formas deprovimento em comissão e pelos critérios de confiança,bem como a designação para encargos de direção eassistência intermediárias.”

A criação dos “cargos de natureza especial deEspecialista em Políticas Públicas e Gestão

Governamental”7 atendia à necessidade de um corpoprofissional de alto nível de suporte ao comando políticodo Estado, responsável pela ligação entre o governo e ascarreiras técnicas integrantes do Sistema de Carreiras, comas atribuições de formulação, implementação e avaliaçãodas políticas públicas, bem assim de direção eassessoramento nos escalões superiores da administração.Ou seja, constituiriam um corpo de suporte ao comandopolítico do Estado e de sustentação superior do sistema aser implantado e, por essa razão, o curso de formação foiprojetado para uma duração de 20 meses. Esse curso teriao formato de um mestrado profissional e seria pré-requisito e habilitação para o exercício dos cargoscomissionados mais elevados da hierarquia.

Aliás, as atribuições da carreira de Especialista emPolíticas Públicas e Gestão Governamental sãoabsolutamente coerentes com o nível de responsabilidadeque lhes seria atribuído:

“Art. 1º É criada a Carreira de Especialista emPolíticas Públicas e Gestão Governamental enovecentos e sessenta cargos respectivos deprovimento efetivo, para execução de atividades deformulação, implementação e avaliação de políticaspúblicas, bem assim de direção e assessoramento em

A profissionalização da

administração pública,

elemento fundamental para a

governabilidade democrática,

continua sendo, entretanto,

um objetivo a ser alcançado

e uma tarefa a cumprir.

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Origens e fundamentos da carreira de Gestor

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escalões superiores da Administração Direta eAutárquica.”8

Entre as atividades de formulação, implementação eavaliação de políticas públicas e as de direção eassessoramento nos escalões superiores da AdministraçãoDireta e Autárquica há estreita correlação, pois estas sãoatividades próprias dos escalões superiores daadministração, subordinados diretamente aos membrosdo governo, isto é, ao comando político do Estado.

A perspectiva evidenciada nas declarações públicasdos dirigentes da Secretaria de Administração daPresidência da República (SEDAP) e formuladores dosprojetos da reforma, bem como nas diretrizes do Sistemade Carreiras, era a de manter como cargos comissionadosde livre provimento apenas os cargos de chefe deGabinete de Ministro e de um grupo restrito de assessores.Os demais cargos da estrutura, inclusive os de secretáriosNacionais, diretores de Departamentos e demais cargos deassessoramento desses níveis, seriam profissionalizados econsiderados de provimento restrito, vinculados às classesdas carreiras. A carreira de Especialista em PolíticasPúblicas e Gestão Governamental destinava-se aosuprimento das necessidades de quadros profissionais dealto nível e de formação generalista para os escalõessuperiores da administração.

A Constituição de 1988 incorporou as teses gerais dareforma profissionalizante da administração estabelecendono inciso V, do art. 37, que as atividades de direção, chefiae assessoramento, seriam desenvolvidas por meio de duasestruturas distintas: os cargos em comissão, de livreprovimento, mas com um percentual destinado aservidores de carreira e, as funções de confiança, restritasa ocupantes de cargos efetivos. Ficou para a legislaçãoordinária de organização administrativa a definição dosespaços estruturais dos cargos em comissão e dasfunções e à legislação das carreiras a vinculação dasfunções às classes das mesmas, por correlação deatribuições.

AS CONTRADIÇÕES DO PERÍODO PÓS-CONSTITUINTE E A REALIDADE ATUAL

A Constituição de 1988 incorporou as tesesfundamentais da reforma da Nova República no tocanteao sistema de carreiras e à unificação do regime jurídico

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em toda a administração pública. Cabia, portanto, aoPoder Executivo a proposição dos regulamentos exigidospelo texto constitucional. O primeiro grande problemasurgiu com a obsolescência do Decreto-Lei nº 2.403, de1987, não recepcionado no novo ordenamento jurídicopor Ato Declaratório do Presidente do Senado Federal, emrazão da não aprovação do decreto-lei no prazo de 180dias da proclamação da nova Constituição. É óbvio,entretanto, que o Decreto-Lei não teve tramitação porclara opção dos novos dirigentes do Poder Executivo daárea de administração, em especial de recursos humanos,claramente contrários à carreira de gestoresgovernamentais e ao modelo do Decreto-Lei.

Convém lembrar que a SEDAP foi extinta e suascompetências incorporadas à Secretaria de Planejamento,ainda durante o governo Sarney, no início de 1989. Emconsequência, foram enormes as dificuldades de manter aENAP, o que só foi alcançado em função da campanhapública de grande alcance desenvolvida pelos alunos daEscola (a primeira turma)9. Da mesma forma, a aprovaçãodo Projeto de Lei de criação da carreira esteve ameaçada,inclusive com um veto presidencial à lei aprovada peloCongresso Nacional, proposto pela Procuradoria daFazenda Nacional, evidenciando a pressão contrária desetores burocráticos do Poder Executivo. Novamente acapacidade de articulação dos alunos da ENAP, futurosgestores, foi fundamental para que o presidente daRepública enviasse novamente o projeto ao CongressoNacional, agora sob a forma de Medida Provisória,rapidamente aprovada pelo Poder Legislativo esancionada pelo presidente, em outubro de 1989.

Nesse processo, os segmentos mais atuantes contra osistema do Decreto-Lei nº 2.403 e a criação da carreira degestores eram grupos de servidores não concursados,contratados durante o período da ditadura militar peloregime da CLT, originalmente em órgãos da administraçãoindireta e incorporados, ao longo do tempo, a órgãos daadministração direta, os quais se sentiam diretamenteameaçados com a criação da carreira de altos executivos.Com a reviravolta política na segunda fase do governoSarney, que culminou com a saída de todo o núcleo dareforma (os ministros Aluízio Alves, da Administração, JoãoSayad, do Planejamento, e Dílson Funaro, da Fazenda,todos da ala de Ulisses Guimarães, do PMDB) eincorporação da SEDAP à Secretaria de Planejamentoesses grupos burocráticos ocuparam a direção do

processo, em especial na Secretaria de RecursosHumanos, responsável pela elaboração dos regulamentosda Constituição. Um dos fatos que melhor simbolizam areação à carreira foi da própria Secretaria de RecursosHumanos que se negou a receber gestores interessadosem desenvolver seu estágio naquela Secretaria durante operíodo em que novo projeto de diretrizes de carreira seriaelaborado.

Dessa forma, deslocados os gestores do processo,novo Projeto de Lei de Diretrizes do Sistema de Carreiraselaborado pela Secretaria de Recursos Humanos daSEPLAN, com uma fisionomia distinta do Decreto-Lei nº2.403/87, foi enviado ao Congresso Nacional, ainda em1989, em conjunto com o novo Regime Jurídico Único dosservidores. Em relação aos gestores, o novo PL implicavaem claro enclausuramento nas atividades auxiliares emdetrimento das áreas de políticas públicas. Contudo, aresistência dos sindicatos de servidores, defensores daidéia de carreira única por órgão, impediu a aprovação doreferido projeto. A resultante foi que o PL do regimejurídico foi aprovado, o mesmo não acontecendo com asdiretrizes de carreiras.

Não sendo recepcionado o Decreto-Lei n° 2.403/87,nem aprovado o novo PL encaminhado em 1989, ficouum vácuo entre o texto constitucional, que estabeleceu oRegime Jurídico Único e um sistema de carreiras, e aestrutura de cargos vigente, ou seja, o PCC de 1970. Damesma forma, a carreira de gestores ficou sem asustentação das diretrizes do sistema de carreira que aengendrou e em conflito com a estrutura de pessoalvigente.

As diretrizes do Decreto-Lei n° 2.403/87, assim comoo texto da Constituição, conflitam com a estrutura doPlano de Classificação de Cargos da Lei n° 5.645/70 emdois pontos chaves:

1.um sistema de carreiras constitui umaestruturação completamente distinta dos cargos e dosquadros de pessoal da estrutura e critérios declassificação adotados no Plano de Classificação deCargos da Lei nº 5.645, de 1970, baseada emCategorias Funcionais;

2.no caso dos cargos comissionados, o PCC osclassifica como um grupo de cargos distintos ehomogêneos, de livre provimento, não vinculados àscategorias funcionais de cargos ou empregos, ao passo

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que no texto constitucional e nas diretrizes doDecreto-Lei nº 2.403/87, as atividades de direção,

chefia e assessoramento seriam segmentadas emcargos em comissão de livre provimento, portanto deconfiança política (com um percentual mínimodestinado a servidores), e os de “provimento restrito”(ou funções como dispõe o inciso V do art. 39 da CF),vinculados hierarquicamente às classes das carreiras,observada a habilitação específica relacionada com aformação gerencial em Escola de Governo.

Estamos, portanto, diante de uma situação anômala ecaótica na gestão de recursos humanos na administraçãopública. A não regulamentação da Constituição quanto àestruturação do sistema de carreiras, incluída aestruturação dos cargos em comissão e funções noâmbito desse novo sistema, deu uma sobrevida ao PCC daLei nº 5.645, de 1970, provocando, por um lado, umprocesso caótico de constituição de carreiras sem umavisão integrada da administração e, por outro, amanutenção da antiga estrutura de cargos de confiança,causando um enorme atraso na profissionalização daadministração pública brasileira. Assim, as carreiras queforam criadas ao longo do período pós-constituinte, nãosão realmente verdadeiras carreiras porque nãoincorporam à sua estrutura de classes as atividades dedireção e assessoramento não diretamente vinculadas aocomando político do Estado.

Nesse contexto caótico e contraditório, os gestoressão hoje legalmente habilitados, em razão das atribuiçõesda carreira, bem como das características de rigor doprocesso de seleção e do curso de formação da ENAP,para o exercício de cargos comissionados dos escalõessuperiores da administração. No entanto, em função dasobrevivência do PCC e sua estrutura de cargoscomissionados, exclusivamente de livre provimento, ahabilitação legal dos gestores10 não é respeitada, apesar deestabelecida em Lei e ter sustentação no texto daConstituição. É uma típica situação em que as velhas eanacrônicas estruturas resistem à implantação das novasestabelecendo-se entre elas um conflito.

Muitos colegas interpretam essa situação de formapessimista, no sentido da perda de eficácia da lei decriação da carreira. Isso se constitui, entretanto, em umgrande equívoco, porque não é um processo concluído.Ao contrário, apesar do retrocesso dos anos recentes, a

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profissionalização da administração pública continuasendo uma questão fundamental e, mais dia, menos dia,terá de ser enfrentada. Além disto, uma habilitação ésempre uma habilitação e ela é, de fato, um direitoadquirido e, como tal, não pode ser extinta simplesmente.Da mesma forma que não se pode retirar de um médico,ou de um engenheiro, a habilitação que adquiriu(observadas as exceções regulares). Do ponto de vistalegal, os gestores têm o direito ao exercício das atividadesde direção e assessoramento nos escalões superiores daadministração pública federal. No entanto, a questão éfundamentalmente de natureza política e necessita sertratada nesse âmbito. O caos atual na estrutura derecursos humanos necessita ser enfrentado e umaracionalização das estruturas de carreiras é urgente. Aomesmo tempo, terá de ser enfrentada a questão davinculação, por correlação de atribuições com os cargosefetivos, das funções de confiança às classes das carreiras.

A habilitação dos gestores tem outros aspectosimportantes que não devem ser esquecidos:

a)a habilitação para o exercício das atividades dedireção e assessoramento nos escalões superiores daadministração mantém relação direta com asatribuições dos cargos voltados para a formulação,implementação e avaliação de políticas públicas,competências próprias dos cargos de direção nosescalões superiores e, consequentemente, constituium elemento identificador do campo de atuação dosintegrantes da carreira, fundamental para evitar odesvio de função;

b)o processo de profissionalização do serviçopúblico federal pode ser retomado a qualquermomento e, nesse momento, a existência de umacarreira de executivos públicos devidamentehabilitados, com vasta experiência acumulada, será defundamental importância, e seus integrantes estarãorespaldados, não só do ponto de vista do mérito, mas,também, do ponto de vista legal, para reclamar o seulugar no processo em razão desta habilitação;

c)por fim, o aspecto moral da questão não éirrelevante, pois os integrantes da carreira são osúnicos detentores dessa habilitação, adquirida combase em puro e exclusivo mérito, desde o rigorosoprocesso de seleção, curso de formação profissionalem escola de governo, além da experiência adquirida

no exercício das atribuições próprias da carreira.Entramos no serviço público pela porta da frente,diferentemente de tantos e tantos que só ocupamfunções dirigentes por razões que nada têm a ver comcritérios de mérito, incluídas as “reservas de mercado”corporativas, alcançadas pela via sindical ou política(excetuados, evidentemente, os cargos cujas funçõessão essencialmente políticas e devem ser ocupadaspor agentes políticos).

SISTEMA DE MÉRITO X “RESERVA DE MERCADO DEDAS”

Fiéis ao princípio ético, que nos orientou desde oprimeiro curso de formação em 1988, da legitimidade daação corporativa em defesa do projeto original da carreirade gestores, diante das constantes ameaças de parte deagentes contrários à carreira, também nos opusemossempre à idéia do “mercado de DAS” (tese do ministroBresser Pereira), assim como, à criação de “reservas demercado” de cargos de direção e assessoramento, muitasvezes presentes nas reivindicações de diversos sindicatosde servidores.

A “reserva de mercado de DAS” é parte de uma visãoconservadora11, pois defende a manutenção do status

Estamos diante de umasituação anômala e caóticana gestão de recursoshumanos na administraçãopública. A nãoregulamentação daConstituição quanto àestruturação do sistema decarreiras, incluída aestruturação dos cargos emcomissão e funções ...

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quo, isto é, a manutenção da estrutura anacrônica eultrapassada do PCC de 1970, bem como do sistema debutim. Além disso, o seu fundamento é a busca deprivilégios burocráticos visando apenas e tão somente amaiores espaços de poder burocrático para categoriasespecíficas de servidores. Outra coisa, muito distinta, é aimplantação do sistema de mérito como critério paraacesso aos cargos e função de direção e assessoramento,baseado em habilitações, no contexto de um sistema decarreiras com vinculação dessas funções às classes dascarreiras, com base na correlação de atribuições com oscargos efetivos.

Para boa parte dos servidores não existe diferençaentre os dois processos, uma visão amplamente difundidapor segmentos importantes de organizações sindicais,para as quais o exercício de atividades de direção eassessoramento é uma questão política, sem qualquerrelação com uma perspectiva de modernização dogerenciamento na administração pública. Desse modo, aexigência de habilitações específicas para o exercício dagerência em seus diferentes níveis não faz parte de suaspreocupações, ao contrário, é vista como um empecilho. Amaneira de raciocinar desses segmentos tem sua base nafilosofia da estrutura do PCC, onde as funções de direção eassessoramento são separadas das atividades dos cargosde provimento efetivo. A politização da estrutura decargos do PCC, pela via da criação do Grupo DAS de livreprovimento, transladou para a mente dos servidores aideia de que o acesso aos cargos comissionados énecessariamente uma questão política e, como tal, sóconsegue vislumbrar esse acesso para os servidores pelavia de uma reserva de mercado politicamenteconquistada. Esse tipo de visão desconsidera a relevânciada questão gerencial, mesmo após a grande revoluçãogerencial que transformou profundamente a gestãoempresarial em todo o mundo. É uma perspectivaamadorística de administração que leva em seu bojo aincompetência e conduz inexoravelmente à ineficiênciaadministrativa.

Por outro lado, existe também um aspecto táticoimportante a considerar. A criação de “reservas demercado” para grupos específicos constitui-se em umempecilho para a estruturação de um sistema racional decarreiras e de profissionalização da administração pública.A transformação de cargos comissionados de livreprovimento (não vinculados diretamente ao comando

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político) em cargos de “provimento restrito vinculados àsclasses das carreiras” deve basear-se em umacompreensão global da divisão de trabalho no seio dosórgãos integrantes da administração pública. Se esseprocesso for substituído pela política de concessões àspressões de sindicatos de servidores e gruposcorporativos específicos, não chegaremos senão ao caosadministrativo, permeado por conflitos corporativosirreconciliáveis que, certamente, se constituirão em forteempecilho à efetividade na ação governamental.

Um aspecto extremamente relevante nessa discussãosão as características diferenciadas dos diversos níveisgerenciais. As funções relativas à chefia imediata e parte dagerência intermediária mantêm correlação, desde que nocontexto de um sistema estruturado de habilitações comformação específica em Escola de Governo, com asatribuições genéricas das carreiras técnicas existentes,embora, em sua maioria, não tenham desdobramento emníveis de responsabilidade distintos, isto é, em atribuiçõesdiferenciadas das classes que as integram. Mas, o mesmonão ocorre com as funções da alta administração, isto é,dos escalões superiores da administração, de carátergeneralista, cujas competências envolvem os processos deformulação, implementação e avaliação de políticaspúblicas e a coordenação governamental. O“esquartejamento” dessas atribuições da altaadministração entre diversos segmentos corporativos, queeventualmente possam vir a ter êxito na sua pretensãonos pleitos de “reserva de mercado de DAS”, engendrariaum sistema profundamente corporativizado, com ênfaseno enfoque setorial, com sérias consequências para acoordenação governamental e para uma visão integrada esistêmica da administração pública.

Por essas razões, de natureza ética e de racionalidadeadministrativa, é fundamental que saibamos diferenciarmuito precisamente o processo de profissionalização daadministração pública com ênfase no princípio do mérito ea criação de “reservas de mercado de DAS”, uma forma deprivilégio engendrado por pressões corporativistasestreitas e conservadoras.

NOVO REGULAMENTO DA CARREIRA

Pelas razões até aqui expostas, as dificuldades parauma adequada regulamentação da carreira são facilmentecompreensíveis. O regulamento vigente deixa de abordar

questões elementares de uma verdadeira carreira, como odesdobramento das atribuições genéricas em atribuiçõesespecíficas das classes que a compõe. Questão elementarem termos de estrutura de carreira, mas de fundamentalimportância para os seus integrantes, tendo em vista queas atribuições das classes é que lhes asseguram o exercíciode atividades próprias de cada nível estrutural, incluídas asatividades de direção e assessoramento respectivas.

A especificação de perfis profissionais e a análise eclassificação de cargos são técnicas essenciais àadministração de pessoal, mas com as quais os dirigentespouco se preocupam. A transitoriedade nas funções degoverno, perspectiva muito presente para os dirigentespolíticos, os faz menosprezar as questões de naturezatécnico-administrativa, o que quase sempre conduz adecisões que, em razão da fragilidade do órgão central dosistema de pessoal civil, levam ao aumento dos problemasem lugar de soluções. Dessa forma, a vulgarização dosconceitos relacionados às atribuições da carreira podelevar a generalizações inadequadas ou a interpretaçõesprofundamente restritivas, dependendo do enfoque oudos interesses corporativos em jogo. Mas, também ébastante provável que mesmo entre nós gestores existamuita confusão a respeito do assunto. E necessário, pois,descer ao nível da descrição das atividades a seremdesenvolvidas pelos gestores, em cada uma das classes,para que seu papel se torne claro para a administraçãopública em sua totalidade, inclusive para os dirigentespolíticos aos quais estão subordinados.

No caso das atividades de direção e assessoramento,previstas como atribuições dos cargos efetivos deEspecialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental,o Decreto nº 98.895/1990 estabelecia em seu art. 2°, deforma totalmente contrária ao espírito da lei de criação dacarreira, que “a nomeação para cargos e funções dedireção e assessoramento superiores, previsto no artigo 1ºda Lei n° 7.834, de 6 de outubro de 1989, far-se-á emconformidade com a legislação pertinente.”12 Estadefinição foi uma forma que o governo à época utilizoupara driblar o verdadeiro sentido da lei da carreira, nocontexto da sobrevivência da estrutura do antigo PCC. Defato, esse texto não anula o disposto na lei, pois umapossível regulamentação dos dispositivos constitucionaisrelativos ao sistema de carreiras pode solucionar oanacronismo do antigo Plano de Classificação de Cargos e

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vincular às classes da carreira as funções de direção eassessoramento correlatas.

No contexto da sobrevivência do PCC, para o exercíciode atividades de direção e assessoramento, é necessária anomeação para os cargos em comissão da estruturavigente. Mas, existem muitas funções de coordenação egerência de programas e projetos, bem como deassessoramento em diversos níveis, e até mesmo deadjuntos, que podem ser exercidas por simples designaçãodo dirigente do órgão, sem necessidade de nomeaçãopara cargo comissionado. Essas são funções próprias dosintegrantes da carreira de gestores nas áreas de políticaspúblicas e gestão governamental. Mesmo com ascontradições entre os fundamentos da carreira e alegislação vigente do PCC, é perfeitamente possível umaregulamentação que englobe essas atividades comoatribuições das classes que a compõem. Aliás, taisatividades são características da carreira e, de modoalgum, podem deixar de constar do detalhamento dasatribuições das classes. Desse modo, independentementeda reforma da gestão de recursos humanos daadministração, os gestores podem ser designados paraatividades de responsabilidade gerencial, especialmente noreferente à gestão de programas e ações governamentais,ou atividades de coordenação, sem necessidade denomeação para cargos ou funções específicas.

Seria necessária, entretanto, uma boa dose de boavontade e de compreensão do papel da carreira, para queum regulamento minimamente coerente com suasmissões possa ser adotado. Contudo, é uma possibilidadeimediata de dar passos à frente.

Um novo regulamento é importante não só pelasrazões anteriormente apontadas. Ele é extremamenteimportante também para uma correta definição doprograma de formação dos gestores, em razão doabandono pela ENAP do modelo do curso de formaçãooriginal de um mestrado profissional com duração deaproximadamente dois anos. Independentemente dosargumentos utilizados, na gestão do ministro BresserPereira para a implantação de um curso de curta duração,é fato incontestável que esse tipo de curso não atende àsnecessidades de formação inicial de altos executivospúblicos.

A característica de generalista do gestorgovernamental exige uma formação transdisciplinarabrangendo não somente conhecimentos

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multidisciplinares aplicados ao ciclo das políticas públicas(da filosofia, da sociologia, das ciências políticas, demetodologias de pesquisa, etc.) como também,conhecimentos relacionados à administração pública(direito constitucional e administrativo, estrutura efuncionamento da administração pública, finançaspúblicas, etc.), além de conhecimentos relativos aosinstrumentos de gestão próprios do setor público. Nãobastam, entretanto, os conhecimentos teóricos.Enquanto curso de formação profissional, necessita servoltado para a prática e a experimentação. Apesar degrande parte das habilidades específicas do gestorgovernamental ser adquirida na sua prática profissionalao longo dos anos, a formação inicial deve dar ao futurogestor conhecimentos mínimos sobre os processos reaisde formulação, implementação e avaliação de políticaspúblicas e de gestão governamental. Afinal, será noambiente da administração pública que sua prática serádesenvolvida e, por essa razão, o gestor das classesiniciais da carreira necessita de conhecimentos práticossobre os processos de gestão das políticasgovernamentais, incluindo o funcionamento dosPoderes Legislativo e Judiciário.

No contexto atual, um programa de formaçãoconsistente com as missões da carreira e as atribuiçõesdos cargos que a integram só será alcançado por meio deum novo Decreto regulamentador.

LÓCUS INSTITUCIONAL DE ATUAÇÃO

Políticas públicas referem-se a tudo o que o governofaz, ou seja, um conceito relacionado às ações próprias dogoverno e, portanto, ao plano de governo. Por essa razão,a Lei nº 7.834, de 1989, estabeleceu a possibilidade deexercício dos gestores em todos os órgãos daadministração direta, autárquica e fundacional. Isso nãoimplica, entretanto, exclusividade para os gestores emtodas as áreas da administração. Existem áreas deatividades de naturezas bastante diversas da gestãogovernamental propriamente dita em que as atividades dedireção e assessoramento requerem conhecimentosespecializados e habilidades específicas próprias de outrascarreiras. Entre outras podemos citar as seguintes:

• de polícia, de administração penitenciária e deagências de informação;

• de diplomacia e serviço exterior;• de arrecadação e fiscalização diversas (receita

federal, fiscalização do trabalho, fiscalizaçãoagropecuária, fiscalização fitossanitária, fiscalizaçãoambiental);

• de instituições de ensino e pesquisa(universidades e outras instituições de ensino epesquisa), de instituições de pesquisa altamenteespecializadas, administração escolar;

• de hospitais e outras instituições especializadasde saúde;

• do Banco Central;• de advocacia e consultoria jurídica.

Assim sendo, considerando as missões e as atribuiçõesdos cargos da carreira, o lócus central de atuação dosseus integrantes é constituído pelos segmentosrelacionados às políticas públicas e aos órgãos centraisdos sistemas de atividades auxiliares responsáveis pelasnormas administrativas e sua coordenação. No campo daspolíticas públicas podemos destacar as áreas sociais(previdência e assistência social, emprego e renda, saúde,educação, cultura e esportes, direitos humanos e políticaurbana), meio ambiente, ciência e tecnologia e inovação,

A Lei nº 7.834, de 1989,estabeleceu a possibilidadede exercício dos gestores emtodos os órgãos daadministração direta,autárquica e fundacional.Isso não implica, entretanto,exclusividade para osgestores em todas as áreasda administração.

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infraestrutura e desenvolvimento econômico. O campo dagestão governamental, por sua vez, abrange ogerenciamento de programas e ações, as atividades deprogramação, a coordenação setorial e intersetorial da suaexecução e a gestão estratégica dos meios necessários àexecução do plano de governo.

Importante frisar que o exercício dos gestores emtodos os órgãos da administração direta, autárquica efundacional, autorizado em lei, está sempre referenciadonas atribuições dos cargos que, como já vimos,concentram-se na gestão estratégica das políticasgovernamentais. Consequentemente, o gerenciamento deatividades técnico-operacionais das áreas de atividadesauxiliares (gerências intermediárias e de chefia imediata)deve ser atribuído a integrantes das carreiras de suportetécnico-operacionais especializadas dessas áreas. Aatuação dos gestores nas áreas administrativas auxiliaresdeve se restringir, portanto, aos órgãos centraisnormativos, à supervisão a partir das secretarias executivase às subsecretarias ou diretorias responsáveis pelasupervisão e coordenação estratégica dessas atividadesnos órgãos setoriais e seccionais.

A ENAP, enquanto Escola de Governo formadora dosaltos executivos públicos, deve ser incluída como lócusprivilegiado de atuação da carreira, visando assegurar oalinhamento estratégico da Escola em torno de sua missãofundamental e, também, com o intuito de fortalecer suacapacidade, tanto em termos de formação como depesquisa, com o aproveitamento das experiências dosintegrantes da carreira.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SANTOS, L. A. A organização de planos de carreira no Serviço Público Federal – Evolução, conceitos, limite epossibilidades. (Dissertação Mestrado em Estudos Sociais Aplicados)–Brasília: Universidade de Brasília, 1996.

NOTAS

1 Decreto nº 93.277, de 1986,

2 Atual redação do § 2º do art. 39 da CF.

3 Carreiras de executivos públicos semelhantes a que estava sendo criada já existiam em países como França,Estados Unidos, Austrália e Argentina ou foram criadas posteriormente, como na Espanha, Itália, México e Peru.

4 Ver discursos do presidente José Sarney e do ministro Aluizio Alves na aula inaugural do Primeiro Curso dePolíticas Públicas e Gestão Governamental, em 11 de agosto de 1988, publicados na Revista do Serviço Público de jul./out., 1988.

5 Instituído pelo Decreto nº 95.088, de 1987.

6 O Decreto-Lei nº 2.403, de 1987, foi declarado revogado pelo Ato Declaratório do presidente do Senado, de 14de junho de 1989, por não ter sido apreciado pelo Congresso Nacional no prazo de 180 dias da promulgação da novaConstituição, nos termos do inciso II, do § 1º do art. 25, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

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Aldino Graef, graduado em História e pós-graduado em Políticas Públicas e Gestão Governamental (ENAP),Pertence à carreira de Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG) desde 1990. Tem26 anos de experiência no Serviço Público Federal brasileiro, tendo ocupado cargos de direção eassessoramento superiores no Ministério do Trabalho, Ministério do Trabalho e Previdência Social e Ministériodo Trabalho e Administração (1990 a 1993), de diretor de Administração de Pessoal da Secretaria deRecursos Humanos da Secretaria de Administração Federal (SAF) (1993), de assessor do Secretário Executivodo Ministério do Trabalho (MTE) (1994), de diretor de Carreiras e Remuneração e Secretário Interino deRecursos Humanos do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (MARE) (1995), naCoordenação de Acompanhamento do Plano de Ação na Secretaria Executiva do Ministério da Educação(MEC) (1995 a 1999), de subsecretário de Assuntos Administrativos (MEC) (1999 a 2001), de diretor deProgramas da Secretaria Executiva do MEC (2001 a 2002), de gestor de Administração do Centro de Gestão eEstudos Estratégicos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) (2002 a 2008), e de diretor de Articulação eInovação Institucional da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2008 a2010). Atualmente exerce a função de assessor especial da SAG/Casa Civil da Presidência da República.Possui diversos trabalhos e artigos publicados, especialmente nas áreas de reforma administrativa e gestãogovernamental.

7 O Projeto de Lei propunha a criação de cargos de natureza especial a serem incorporados aos planos de carreiraa serem criados no bojo da reforma. Foi do senador Maurício Corrêa, relator do Projeto no Senado, a proposição dacriação da carreira em razão da revogação do Decreto-Lei nº 2.403/87 em junho de 1989, por Ato Declaratório dopresidente do Senado Federal.

8 Lei nº 7.834, de 1989.

9 Ver Correio Braziliense de 2 de abril de 1989, p. 34.

10 Art. 9º da Lei nº 7.834, de 1989.

11 As reservas de mercado ocorrem com a vinculação de cargos em comissão aos servidores de um Quadro dePessoal, sem consideração de correlação com as atribuições dos cargos das carreiras. A substituição dos cargos emcomissão por funções igualmente vinculadas aos servidores de um Quadro, e não às classes de carreiras porcorrelação de atribuições com os cargos efetivos, não envolve qualquer diferença em relação à vinculação de cargos,sendo apenas uma diferença de nomenclatura. Nos dois casos não há qualquer vinculação com o sistema de méritoprofissional, além de se constituir em um elemento desagregador da estrutura de carreiras.

12 O atual marco regulamentador da carreira, Decreto de nº 5.176, de 10 de agosto de 2004, é extremamentegenérico sobre esse tema.

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Avaliação e monitoramento:

institucionalização na gestão

das políticas públicas no

governo federal

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Por Pedro Cavalcante e Ronaldo Nogueira

A literatura sobre o tema defende que as ferramentas de avaliação e monitoramento (A&M)

formalmente estão inseridas na gestão dos programas do governo federal, mas na prática são

pouco úteis para o apoio à tomada de decisão e a correção de rumo das políticas. Em

contraposição, o presente artigo argumenta que o processo de institucionalização da A&M está

avançado na administração pública brasileira, principalmente, em função da criação de sistemas

avaliativos sofisticados e integrantes do ciclo de políticas públicas. Assim, o trabalho apresenta

inicialmente uma discussão teórica sobre a importância e o desenvolvimento da A&M no Brasil e,

em seguida, são discernidas duas experiências inovadoras de formulação e implementação de

sistemas de avaliação e monitoramento (SAM) no governo federal. A primeira, desenvolvida no

âmbito do Plano Plurianual (PPA), envolve todos os programas do governo federal, enquanto a

segunda, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), consiste em uma

estrutura voltada exclusivamente às políticas públicas dessa pasta. Como conclusão, o artigo

defende que, apesar de persistirem obstáculos, a administração pública federal caminha para um

processo de integração da A&M à gestão, refletido no investimento orçamentário nessa área, na

produção e disseminação de conhecimento e no treinamento especializado.

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Avaliação e monitoramento: institucionalização na

gestão das políticas públicas do governo federal

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INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, a administração pública vempassando por um processo de profundas transformaçõesde modo a ajustar-se às exigências da nova realidadepolítica, econômica e social. No Brasil, os efeitos da crisefiscal do Estado e da democratização criaram umambiente de contenção de gastos públicos e, ao mesmotempo, de intensificação da demanda por políticaspúblicas, em especial de cunho social, que amenizassemproblemas estruturais históricos. Por conseguinte, a partirda década de90 o aparelho administrativo estatalatravessou uma fase de redefinição de suas atribuições ede alteração nas estratégias de gestão.

As reformas denominadas gerenciais estabeleceram-sena agenda do governo e, de modo geral, preconizavam aadoção de estratégias da iniciativa privada nasorganizações do setor público com vistas a alterar o focopredominante no controle para uma maior atenção nosresultados. No esboço desse movimento reformista, asferramentas de avaliação e monitoramento (A&M) passama ser consideradas peças-chave na gestão das políticaspúblicas na qual a medição de resultados e indicadores dedesempenho são pressupostos essenciais.

A introdução efetiva desses instrumentos naadministração pública brasileira esbarrou nas dificuldadesde se superar a incipiente cultura de avaliação vigente atéentão, haja vista a prevalência de resistências naturais,sejam individuais ou organizacionais, em relação aosprocessos avaliativos. Nesse sentido, o grande desafio é ainstitucionalização do monitoramento e da avaliação nagestão dos programas governamentais. Boa parte daliteratura defende que formalmente elas já estão inseridasno governo federal, mas na prática são pouco úteis noapoio à tomada de decisão e à retroalimentação(feedback) das políticas públicas (COTTA, 2001; FARIA,2005; GARCIA, 2000; MOKATE, 2002; RUA, 2004). Emcontraposição, o presente trabalho diverge dessaperspectiva ao afirmar que o processo deinstitucionalização da A&M está bem avançado naadministração pública brasileira, principalmente, em funçãoda criação de sistemas avaliativos sofisticados eintegrantes do ciclo de políticas públicas.

Portanto, o trabalho se propõe a debater ainstitucionalização da avaliação e monitoramento nagestão das políticas públicas no Brasil contribuindo com

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uma posição distinta da visão predominante. Para tanto, éapresentada uma discussão teórica sobre a importância eo desenvolvimento da A&M no Brasil e, em seguida, sãodescritas duas experiências de formulação eimplementação de sistema de avaliação e monitoramento(SAM) no governo federal.

A primeira, no âmbito dos Planos Plurianuais (PPA)2004-2007 e do seguinte, 2008-2011, estabeleceu umabrangente sistema avaliativo, incluindo todos osprogramas do governo federal, sob a coordenação doMinistério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP). Asegunda consiste na iniciativa formulada e implantada em2004 pela Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação(SAGI), do Ministério do Desenvolvimento Social e Combateà Fome (MDS), que institui um SAM voltado exclusivamenteàs políticas públicas dessa pasta. Por fim, traça-se umaanálise comparativa dos sistemas, ressaltando os recursosdespendidos, as deficiências e os principais resultadosalcançados no sentido de corroborar a hipótese deinstitucionalização dessas ferramentas na administraçãopública federal.

AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO NA GESTÃOPÚBLICA BRASILEIRA

É notório que as políticas públicas são compostas poretapas ou fases, no entanto, não há consenso na literaturaacerca de quais são e de que modo elas operam. Acomposição mais aceita pressupõe que as políticaspúblicas incluem a formação da agenda na qual umademanda ou problema passa a ser alvo da açãogovernamental; formulação das alternativas de políticas;implementação ou execução; e por fim; avaliação emonitoramento (SABATIER, 1999; SARAVIA, 2006).

Entretanto, não há concordância nas análises daspolíticas públicas no que tange à sua forma defuncionamento. Em outras palavras, existe umordenamento predefinido no qual essas fases ou etapasocorrem? A leitura mais atual analisa as políticas públicascomo um processo de fluxos não necessariamente emordem e nem como uma sequência linear de etapas(CARVALHO, 2003). Nessa perspectiva, a avaliação e omonitoramento ganham mais relevância na medida emque podem fazer parte de todo o processo, ou seja,constituem-se como uma atividade permanente e nãosomente como etapas finais.

No Brasil, os estudos de políticas públicas ainda sãorecentes se comparados aos dos Estados Unidos e depaíses da Europa. Enquanto nesses países, esse campo depesquisa se intensificou a partir dos anos 60, por aqui,apenas na década de 90 as pesquisas começaram a seconsolidar de fato (FREY, 2000).

Embora os estudos nessa área venham se proliferando,a atenção maior é dada aos processos de formação daagenda e formulação das políticas, em detrimento daimplementação e da avaliação e monitoramento, comoexposto por Costa e Castanhar (2003, p. 972):

Historicamente, na administração pública brasileiranão há a preocupação de avaliar programas públicos,em geral, e programas sociais, em particular. Duranteanos, a produção de conhecimento técnico na buscada melhoria dos padrões de gerenciamento do setorpúblico sempre esteve muito mais voltada para osprocessos de formulação de programas do que paraos relacionados a sua implementação e avaliação.

Entretanto, esse domínio vem perdendo fôlego nosúltimos anos não apenas no âmbito das pesquisas comotambém na prática governamental. Cada vez mais aavaliação e o monitoramento são partes obrigatórias dosprogramas do Estado e ganham mais espaço nas

Nessa perspectiva, a

avaliação e o monitoramento

ganham mais relevância namedida em que podem fazer

parte de todo o processo, ou

seja, constituem-se comouma atividade permanente e

não somente como etapas

finais.

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pesquisas acadêmicas. Mas a que se deve essa mudançade foco no campo das políticas públicas?

Nas últimas três décadas, profundas transformaçõesimpactaram as relações entre sociedade e Estado em todomundo e, particularmente, no Brasil. Entre elas,definitivamente, a crise fiscal iniciada ainda nos anos 70 e ademocratização nas décadas seguintes culminaram emuma situação paradoxal, na qual o Estado volta suasatenções a um intenso processo de contenção de gastos,ao passo que a sociedade começa a demandar mais porações efetivas na solução de problemas históricos dentrode um cenário de liberdade política. Em outras palavras, oEstado brasileiro passa a redefinir sua área de atuaçãodiante das restrições fiscais e ao mesmo tempo sofre umapressão até então inédita pela ampliação de políticaspúblicas mais universais, de qualidade e eficientes.

Nesse contexto, inicia-se um abrangente movimentode reformas de Estado e de seu aparelho administrativonos países desenvolvidos, que rapidamente se proliferaaos demais. O movimento se fundamenta na abordagemda Nova Gestão Pública ou New Public Management que,em termos gerais, preconizava uma redefinição do papeldo Estado bem como a implantação de mecanismos degestão oriundos da iniciativa privada na administraçãopública. De acordo com Caiden e Caiden (2001), asreformas tinham como propósito implantar umaperspectiva de contenção dos gastos públicos, de buscade melhoria da eficiência e da produtividade, de ampliaçãoda flexibilidade gerencial e da capacidade de resposta dosgovernos, bem como de maximização da transparência dagestão pública e de responsabilização dos gestores, emum processo no qual o “consumidor” dos bens e serviçospúblicos estaria, supostamente, em primeiro lugar. Osegundo objetivo é que essas reformas pudessem trazer àtona a necessidade de uma redefinição do papel doEstado e de suas atribuições precípuas.

Não é objeto deste artigo discutir o mérito ou a eficáciadas reformas, todavia, é inegável que a avaliação e omonitoramento ganharam mais destaque comoferramentas estratégicas dentro da lógica da gestãopública voltada para o desempenho ou resultados.

Dessa forma, os conceitos de avaliação emonitoramento tornam-se amplamente utilizados pordiferentes áreas de estudos, embora não haja clareza nadefinição exata desses termos (WORTHEN et al, 2004). No

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mesmo sentido, Trevisan e Van Bellen (2008, p. 535)argumentam:

Não existe consenso quanto ao que seja avaliaçãode políticas públicas, pois o conceito admite múltiplasdefinições, algumas delas contraditórias. Esse fato seexplica justamente porque a área de políticas públicasé perpassada por uma variedade de disciplinas,instituições e executores, abrangendo diversasquestões, necessidades e pessoas.

Todavia, nessa miríade de conceitos, a avaliaçãosempre alude à ideia de julgamento e nesse sentido,Worthen et al (2004, p. 35), coloca em termos simples:“avaliação é a determinação do valor ou mérito de umobjeto de avaliação”, ou em uma definição mais ampla,“avaliação é identificação, esclarecimento e aplicação decritérios defensáveis para determinar o valor, a qualidade, autilidade, a eficácia ou a importância do objeto avaliadoem relação a esses critérios”. Enquanto o monitoramentoalude a ideias de acompanhamento contínuo e cotidiano,por parte de gestores e gerentes e/ou por agentesexternos, do desenvolvimento dos programas e políticasem relação a seus objetivos e metas (VAITSMAN et al,2006).

Em ambos os instrumentos, é latente a função deprovisão de informações sobre um determinado programaou política governamental em todo o seu ciclo, até mesmoa partir do momento inicial de identificação do problema.Em uma conceituação compreensiva abrangente, a A&Mde programas consiste na verificação da adequação dodesenho do programa à sua finalidade e aos objetivospretendidos, da correlação entre os serviços prestados eas metas definidas no planejamento estratégico, dosefeitos (resultados e/ou impactos) mensuráveis e, por fim,da lógica de eficiência subjacente, ou seja, os benefícios dapolítica são válidos para compensar os seus custos?

Contudo, as funções de avaliação vão além da simplesdisponibilização de informações aos tomadores dedecisão ou dirigentes. Carol Weiss (1998) classifica quatrotipos: instrumental, voltada ao tomador de decisão;conceitual, mais restrita aos técnicos locais do programa eque podem vir a alterar a percepção desses atores e,consequentemente, a natureza, o modo de operação e oimpacto da implementação; persuasão, utilizada paramobilizar apoio e dar legitimidade à política; e, finalmente,

esclarecimento, forma de influenciar as redes deprofissionais e coalizões de defesa e, assim, pode causarmudanças na agenda governamental.

Cabe ressaltar ainda que, assim como asconceituações e as percepções das suas funções, aavaliação também possui uma diversidade demetodologias, modalidades e tipologias, tais comoavaliações de processo, de desempenho, jurídica, entreoutras. No entanto, este trabalho não tem comopropósito se aprofundar nesses aspectos, mas simdebater o processo de institucionalização da A&M nagestão pública brasileira, o que converge com apercepção de Pisco (2006, p. 567):

A questão central hoje em dia não é tanto aquestão técnica de como é que se fazem atividades deavaliação e melhoria, mas de como se estabelecem e semantêm de forma sustentada estas atividades comoparte do trabalho de uma organização, ou seja, comoé que se estabelece um plano estruturado parainstitucionalizar estas atividades, como é que se criacom sucesso um sistema de forma coerente eintegrada.

Primeiro é fundamental discutirmos o que se entendepor um processo de institucionalização nas políticaspúblicas. Em análise da política de saúde, Felisberto (2006,p. 554) afirma que

a institucionalização é entendida como umaestratégia presente em diversas ações/atividades,projetos e políticas, com o objetivo explícito deincorporar a avaliação no cotidiano de gestores eprofissionais, partindo de uma visão abrangente dosprocessos avaliativos.

A plena institucionalização da avaliação consiste natotal aceitação e no uso contínuo da avaliação (WORTHENet al, 2004), culminando, assim, em um abrangenteprocesso de aprendizado individual e coletivo.

A institucionalização fundamenta-se, portanto, nãoapenas na inserção de instrumentos de avaliação emonitoramento na rotina do planejamento e da gestãodos programas governamentais. De acordo com Travassos(1999), institucionalizar a avaliação requer, além demelhorar a interação entre avaliar e tomar decisões,

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estratégias e recursos com vistas à produção deconhecimento e o treinamento de pessoal especializado.

Dessa forma, a implantação de sistemas de avaliação emonitoramento (SAM) vai ao encontro dessa perspectivana medida em que supera essa prática esporádica ouisolada no processo de políticas públicas, configurando-oscomo parte integrante de toda a gestão. A ideia de sistemaremete a princípios de conectividade, integração etotalidade, ou seja, o todo apresenta propriedades ecaracterísticas próprias que não são encontradas emnenhum dos elementos dispersos. Além disso, pressupõe aintrodução de estratégias e recursos humanos efinanceiros na produção e disseminação dos resultadosdesses processos e ainda atua no sentido de capacitarcada vez mais pessoal para atuar nessas áreas. Nessadireção, Costa e Castanhar (2003, p. 971) argumentam:

A avaliação sistemática, contínua e eficaz dessesprogramas pode ser um instrumento fundamentalpara se alcançar melhores resultados e proporcionaruma melhor utilização e controle dos recursos nelesaplicados, além de fornecer aos formuladores depolíticas sociais e aos gestores de programas dadosimportantes para o desenho de políticas maisconsistentes e para a gestão pública mais eficaz.

Todavia, a questão central é se a adoção dessasestratégias de institucionalização culmina no efetivofomento da cultura avaliativa no setor público. Diversosautores afirmam que, embora seja reconhecido que aavaliação e o monitoramento são relevantes, na prática,estas ainda não compõem efetivamente os processos degestão dos programas governamentais no Brasil (COTTA,2001; GARCIA, 2000; MOKATE, 2002; FARIA, 2005). Domesmo modo, Rua (2004, p. 2) afirma que:

No Brasil, a importância da avaliação das políticaspúblicas é reconhecida em documentos oficiais ecientíficos, mas esse reconhecimento formal ainda nãose traduz em processos de avaliação sistemáticos econsistentes que subsidiem a gestão pública... Esseconsenso no plano do discurso, não produzautomaticamente a apropriação dos processos deavaliação como ferramentas de gestão, poisfrequentemente a tendência é percebê-los como umdever, ou até mesmo como uma ameaça, impostos

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pelo governo federal ou por organismos financiadoresinternacionais.

Um aspecto comum e notório nesse debate é aexistência de obstáculos inerentes ao processo deinstitucionalização da avaliação na administração pública,tais como a incerteza quanto aos benefícios, o receio emrelação a eventuais resultados negativos, a possibilidadede aumento de custos sem a devida mensuração dosbenefícios, bem como a precariedade de recursoshumanos para realizar avaliações e monitoramento.

Essas resistências não podem ser desconsideradas,tendo em vista sua permanente presença no setorpúblico, em especial no caso brasileiro. Entretanto, asvantagens da consolidação de um SAM nas políticaspúblicas indicam que a institucionalização vemgradualmente superando tais obstáculos.

Portanto, como forma de corroborar com a afirmaçãode que a administração pública federal está em umprocesso evolutivo de institucionalização da avaliação emonitoramento, na parte seguinte da pesquisa sãodetalhados dois importantes sistemas que introduziraminovações e impactaram na integração dessas ferramentasà gestão das políticas públicas do País.

SISTEMAS DE AVALIAÇÃO E MONITORAMENTO DEPROGRAMAS DO GOVERNO FEDERAL

Sistema de monitoramento e avaliação do PlanoPlurianual

Não é tão recente a disposição formal do governofederal em inserir o mecanismo de A&M na administraçãopública. Desde fevereiro de 1994, a legislação1 do governobrasileiro, mais especificamente no tocante ao Sistema dePlanejamento e de Orçamento Federal, explicitaclaramente que entre as competências das unidadesresponsáveis pelas atividades de planejamento estão:avaliar os planos e programas, avaliar os investimentosestratégicos do governo e realizar análises de políticaspúblicas.

No entanto, a implantação dessas atribuições requeriauma metodologia sustentável e complexa de trabalho quesó foi efetivamente adotada dez anos depois. Oinstrumento encontrado para desenvolver essasatividades foi o Plano Plurianual. Cabe aqui uma breve

descrição acerca do Plano que é o conjunto deprogramas e ações que se consubstancia em uma lei deiniciativa do Poder Executivo, que é encaminhada até o dia31 de agosto do primeiro ano de mandato presidencial epossui vigência de quatro anos. A Constituição de 1988estabelece ainda que o PPA defina de forma regionalizada,as diretrizes, os objetivos e as metas da AdministraçãoPública Federal para o período de quatro anos.

Embora os PPA de 1996-1999 e 2000-2003 jápossuíssem instrumentos de avaliação e monitoramento,os modelos apresentavam diversas falhas (GARCIA, 2000),o que suscitou a necessidade de incrementar essesaspectos no Plano. Nesse sentido, o PPA 2004-2007trouxe uma inovação em relação aos anos anteriores: oSistema de Avaliação do Plano Plurianual2. O objetivo eraassegurar que a avaliação fosse parte integrante da gestãodos programas, subsidiando a tomada de decisão,disseminando a cultura de avaliação e ainda garantindo asua presença na formulação e implementação daspolíticas e programas de governo. De acordo com Pares eValle (2006), a criação desse Sistema contribuiu para queos processos, ao longo do ciclo de gestão dos programas,pudessem ser reforçados e integrados, com base noempoderamento das equipes descentralizadas nos órgãosda administração federal.

Nos dois sistemas são

latentes as preocupaçõescom a contínua formação de

pessoal para atuar em

avaliação e monitoramento etambém com a divulgação do

conhecimento e dos

resultados dos processos.

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A estrutura principal desse Sistema é a Comissão deMonitoramento e Avaliação (CMA), assessorada pelaCâmara Técnica de Monitoramento e Avaliação (CTMA).Essa Comissão é constituída pelos Ministérios doPlanejamento, da Fazenda e do Meio Ambiente, além daCasa Civil, com a finalidade de deliberar sobre propostas denormas e procedimentos gerais relativos à A&M dosprogramas do Poder Executivo. Além disso, ofereceelementos técnicos que orientam o processo de alocaçãode recursos orçamentários e financeiros e a revisão dosprogramas, com vistas ao alcance dos resultados. Odiagrama da estrutura desse sistema, mostrado na Figura1, ilustra bem as relações entre cada ator relevante dosistema.

As estruturas descentralizadas do Sistema são asUnidades de Monitoramento e Avaliação (UMA) dos órgãossetoriais, responsáveis por dar suporte ao comitê decoordenação dos programas, apoiar os gerentes deprograma e coordenadores de ação e atuar como

Figura 1 – Fluxo da informação no Sistema de Monitoramento e Avaliação do PPA3

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consultores internos nos processos de monitoramento eavaliação. Além disso, elas possuem atribuições típicas deassessoramento nos ministérios, respondem comounidades setoriais de acompanhamento físico do Plano,são responsáveis pela elaboração da avaliação setorial dapasta, bem como elaboram relatórios institucionais, asaber: Mensagem Presidencial e Balanço Geral da União(BGU).

Quanto ao monitoramento, o principal instrumento doPPA é a Portaria MP nº 198, de 18 de julho de 2005, que“estabelece os procedimentos e a periodicidade pararegistro de informações relacionadas com o desempenhodas ações do Plano Plurianual, no Sistema de InformaçõesGerenciais e de Planejamento (SIGPlan)”. A norma obriga oregistro de informações do desempenho físico das açõesno sistema pelos coordenadores de ação, como tambémo registro de restrições à execução e providênciasadotadas para superação.

No que tange à avaliação, o PPA possui o RelatórioAnual de Avaliação, obrigatório por lei e encaminhado aoCongresso Nacional com as propostas de revisão do Planoe da Lei Orçamentária Anual. O Relatório é constituído detrês avaliações: dos programas, realizada pelos gerentes;Avaliação Setorial, elaborada no âmbito da SecretariaExecutiva dos ministérios; e a Avaliação do Plano, umaavaliação geral realizada pelo MP. O diagrama da Figura 2demonstra as etapas, instâncias e objetivos de cada parteque compõe o Relatório Anual de Avaliação.

A etapa de avaliação do programa é, de fato, umaauto-avaliação na qual os gerentes destacam os avançose resultados do programa e apresentam as restrições derecursos orçamentários, humanos, entre outros, quedificultaram a obtenção de melhores desempenhos.

A avaliação subdivide-se em três partesinterdependentes: quanto à concepção do programa;quanto à implementação e; quanto aos resultados. Todasas etapas são importantes para o alcance dos objetivos daavaliação. Contudo, a terceira (resultados do programa)valoriza a elaboração, o acompanhamento e a apuraçãodos indicadores como forma de propiciar objetividade ecredibilidade ao processo. A metodologia de avaliação deprogramas do PPA aproxima-se da defendida por Costa eCastanhar (2003), isto é, envolve a escolha de umconjunto de critérios e o uso de indicadores, possibilitandoum julgamento continuado e eficaz acerca dodesempenho de um programa ou conjunto de programas,por meio da comparação com padrões de desempenhopredefinidos.

A Avaliação Setorial fica a cargo da Unidade deMonitoramento e Avaliação (UMA), composta porservidores das Subsecretarias de Planejamento,Orçamento e Administração. As duas avaliações sãorealizadas por intermédio de um roteiro com questõesdisponibilizadas para acesso online no SIGPlan,normalmente em março, e que devem ser encaminhadasao MP até o mês de abril. No caso da setorial, ela é

Figura 2 – Fluxo do processo de Avaliação do PPA4

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baseada em questões mais abrangentes que visamidentificar os resultados alcançados de acordo com osobjetivos de cada pasta. O Ministério do Planejamentoadiciona essas avaliações a uma análise das variáveismacroeconômicas, do cenário que integra a Lei deDiretrizes Orçamentárias e da conjuntura, para consolidaro Relatório Anual de Avaliação.

O sistema de avaliação e monitoramento depolíticas e programas sociais

O sistema foi desenvolvido no âmbito da Secretaria deAvaliação e Gestão da Informação (SAGI) do MDS e temcomo competência principal desenvolver e implementarinstrumentos de avaliação e monitoramento das políticase programas referentes às ações da pasta. Além dessaresponsabilidade, a Secretaria ainda responde pelacapacitação de gestores de políticas sociais, pelapromoção da gestão do conhecimento e pela publicaçãode estudos e pesquisas, sejam contratadas ou realizadasinternamente.

A SAGI substituiu a estrutura da Secretaria deAvaliação dos Programas Sociais do extinto Ministério daAssistência e Promoção Social (MAS) e constitui um órgãoespecífico e singular com a finalidade exclusiva deavaliação e gestão da informação, algo até então inéditono governo federal (VAITSMAN et al, 2006). Na prática, aSAGI tem um funcionamento do tipo matricial, na medidaem que executa e contrata pesquisas, cursos epublicações, atendendo a necessidades das secretariasresponsáveis pelas políticas nacionais de segurançaalimentar e nutricional, de assistência social e de renda decidadania. O diagrama da Figura 3 demonstra a estruturado Sistema de Monitoramento e Avaliação proposto pelaSAGI e suas inter-relações com as secretarias gestoras deprogramas sociais e com demais organizações quesubsidiam a secretaria com o fornecimento dados.

De acordo com o regimento interno do ministério6, asinformações produzidas pela SAGI têm como objetivosubsidiar gestores e formuladores das políticas sociais natomada de decisões de modo a aperfeiçoar os programasda pasta e racionalizar o uso dos recursos financeiros.Ademais, a disseminação do conhecimento ao público emgeral, seja do meio acadêmico ou não, mediante adistribuição de publicações técnicas e a realização deseminários, contribuem para a ampliação do controle

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social e para o fortalecimento da transparênciagovernamental.

É importante esclarecer que a SAGI não possui umaexclusividade na avaliação dessas políticas sociais no País.Conforme publicação do Banco Mundial (2007, p. 17)7, “aresponsabilidade institucional para avaliação éprimeiramente da SAGI, embora outras agências, tantointernas (como o IPEA e o IBGE) e externas (universidades,fundações privadas e think tanks) também estãoenvolvidas em atividades avaliativas”. Desse modo, a SAGIutiliza os estudos de avaliação realizados por outrosatores para projetar e contratar suas pesquisas.

No subsistema de avaliação da SAGI, foi desenvolvidoum modelo institucional próprio que inclui uma rotina deprocedimentos englobando desde a definição doproblema à elaboração dos termos de referência depesquisas, contratação, acompanhamento, divulgação epublicação regular dos resultados. Primeiro define-se qualo programa a ser avaliado; em seguida, determinadasquestões relacionadas à dimensão do programa (processoou resultados) que será alvo da pesquisa. Os parâmetrosmetodológicos são debatidos com os técnicos das áreasfinalísticas, para assim definir o termo de referência para acontratação das instituições avaliadoras (VAISTMAN et al,2006). A Secretaria também atua no acompanhamento detodas as fases das pesquisas, inclusive enviando servidores

para o trabalho de campo, promovendo assimaprendizado organizacional.

Em relação às atividades de monitoramento, o principalinstrumento elaborado pela SAGI é a Matriz de InformaçãoSocial (MI Social), uma ferramenta de informaçõesgeoreferenciadas sobre os programas do MDS, na qual sãodepositadas informações migradas de outros sistemas eagregadas tabelas específicas de informações nãosistematizadas. Tais informações podem ser visualizadasem vários níveis de desagregação, sejam por unidades daFederação, microrregiões, municípios ou territóriosespeciais. Além dos indicadores e informações básicas dosprogramas sociais do MDS, estão disponíveis para consultana ferramenta informações demográficas esocioeconômicas que podem ser obtidas em váriosformatos: planilhas eletrônicas, relatórios, gráficos, mapasestatísticos e etc. Aliado aos quatro dicionários (deindicadores, de programas, de fontes e de variáveis), a MISocial constitui-se no subsistema de monitoramento daSAGI.

Resultados e diferenças dos sistemas

Após a descrição das duas experiências implementadasno âmbito do governo federal, cabe compará-los emtermos de recursos humanos e orçamentáriosdespendidos e, especialmente, resultados alcançados. Para

Figura 3 – Estrutura matricial do Sistema de Monitoramento e Avaliação do MDS5

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tanto, é importante ter em mente que, no primeiro caso, oSAM do PPA, trata-se de uma estrutura de órgão central, oMP, que por intermédio da Secretaria de Planejamento eInvestimentos Estratégicos (SPI) implantou e gerencia umsistema audacioso que se propõe a monitorar e avaliarregularmente a totalidade dos programas da União. Comoexemplo da magnitude do sistema, em 2008, foramavaliados 306 programas nos três Poderes. Por outro lado,no MDS, existe um sistema setorial de avaliação emonitoramento, restrito a seis programas, mas quetambém conta com a colaboração de outras instituiçõesde pesquisa que apoiam as atividades da SAGI ou ascomplementam por meio de contratação de pesquisa.Portanto, enquanto o primeiro tem um caráter holísticodo governo, o segundo caracteriza-se como umaestrutura de avaliação e monitoramento específica da áreade desenvolvimento social.

Quanto à questão de recursos humanos, a SAGI possuium contingente menor, se comparado ao pessoalenvolvido no órgão central de Planejamento. No período2004-2008, a Secretaria possuiu um quadro de pessoalque não ultrapassou 50 técnicos, enquanto que no MP, aSPI possui uma equipe de aproximadamente 105funcionários, boa parte servidores da carreira de analistade Planejamento e Orçamento. Esse sistema ainda contacom a participação de todo o conjunto de coordenadoresde ações e gerentes que realizam as avaliações anuais e omonitoramento das metas físicas dos programas, bemcomo das equipes que compõem as UMAs em todos osórgãos setoriais.

Vale salientar que nos dois sistemas são latentes aspreocupações com a contínua formação de pessoal paraatuar em avaliação e monitoramento e também com adivulgação do conhecimento e dos resultados dosprocessos. A SAGI, inclusive, possui uma diretoria específicapara Capacitação e Gestão da Informação, enquanto o MPatua durante todo o ano promovendo ações de formaçãode equipes para aprimorar as avaliações do PPA, além depriorizar as publicações do Relatório Anual de Avaliaçãodo PPA. Com efeito, essas atividades se refletem naelevação do aprendizado e da accountability no âmbitoda administração pública federal.

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Com relação ao Orçamento, a rubrica que financiapredominantemente o sistema da SAGI teve, em média,desde sua criação em 2004, R$ 8,3 milhões por ano paraarcar com as despesas de avaliação e monitoramento daspolíticas e programas do MDS. Enquanto que no SAM doPPA, as suas duas rubricas orçamentárias despenderam, emmédia no mesmo período, cerca de R$ 1,8 milhão. Observa-se, portanto, que apesar de o PPA compreender um sistemaavaliativo responsável por mais de 300 programasgovernamentais, o seu gasto é quatro vezes menor que odo MDS. Logo, é natural que essa diferença tenha impactodireto na qualidade dos processos. Os valores liquidadosano a ano estão relacionados na Tabela 1.

Desse modo, os resultados alcançados pelo SAM daSAGI, em termos de avaliações realizadas, possuemsentido crescente. Ao longo dos últimos quatro anos,constituiu-se um acervo de 78 pesquisas e estudos, alémde ter criado a Matriz de Informação Social. O quantitativoé bastante expressivo, levando-se em consideração que acompetência da Secretaria é restrita ao pequeno conjuntode programas do MDS e ainda que, na sua maioria, setratam de avaliações de impacto, ou seja, pesquisas commetodologias e procedimentos mais sofisticados querequerem maiores recursos financeiros e humanos na suaelaboração.

Esse desempenho vem sendo reconhecido,principalmente, pelos organismos multilaterais como aUNESCO e o Banco Interamericano de Desenvolvimento,além do meio acadêmico. Como exemplo, o modelo doMDS foi vencedor do Prêmio de Inovação da EscolaNacional de Administração Pública (ENAP) que premiaexperiências de sucesso na administração pública comoforma de estimular a disseminação de soluções inovadoras

em organizações públicas. Na mesma direção, Abrucio(2007, p. 79) reconhece os bons resultados desse modeloao relatar: “o trabalho do Ministério do DesenvolvimentoSocial está ancorado num conjunto competente detécnicos e em uma estratégia de monitoramento bemformulada.”

No caso do SAM do PPA, é inegável que a proposta dese introduzir um processo avaliativo anual em todos osprogramas do governo já se configura uma posturainovadora. Nos últimos cinco anos, desde que foireformulado o sistema, em 2004, o PPA induz os gestoresdos programas a refletirem, ao menos uma vez por ano,sobre a concepção, o processo de implementação e odesempenho dos programas sob sua responsabilidade.Além disso, o Relatório Anual do PPA também édisponibilizado à sociedade e aos demais Poderes,contribuindo, assim, para a ampliação da transparência edo accountability. Por outro lado, o processo avaliativoapresenta algumas deficiências que indicam a fragilidadeda sua metodologia, são elas: baixa qualidade dosindicadores, que na sua maioria não mensuram impacto enem custos; apuração de indicadores bastanteinsatisfatória – por exemplo, em 2008, mais de 70% nãoforam medidos; prevalência de autoavaliações altamentesubjetivas e; ausência de discussão intra eextragovernamental acerca dos resultados das avaliações.Com efeito, a avaliação do PPA consiste em um processoavaliativo com metodologia estruturada dentro de umsistema estável e institucionalizado. Porém, os problemassupracitados culminam em certo grau de desperdíciodesse esforço.

Finalmente, no que tange ao monitoramento, no PPAvem ocorrendo um incremento anual no preenchimento

Tabela 1 – Evolução dos recursos despendidos para avaliação e monitoramento

Fonte: SIAFI.

*MDS: ação 4923 – Avaliação de Políticas de Desenvolvimento Social e Combate à Fome;

** MP: ações 4505 – Monitoramento, Avaliação e Revisão do Plano Plurianual e 4254 - Sistema de Informações Gerenciais

e de Planejamento do Plano Plurianual (SIGPlan).

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do SIGPlan, conforme a Tabela 2. Contudo, deve-seconsiderar que o nível de preenchimento não reflete, namesma medida, a qualidade da informação preenchida.

Já na Matriz de Informações Sociais, assim como noSIGPlan, a sua maior crítica é a deficiência na atualizaçãodas informações. Como não há sanção aos gestores deprogramas responsáveis pela alimentação das bases dedados, prepondera a carência de informações atualizadas,

debilitando-os como sistemas de gestão capazes de,efetivamente, subsidiar a decisão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate acerca da institucionalização da avaliação emonitoramento na gestão pública brasileira constitui-seum terreno fértil no campo de estudos das políticaspúblicas. Nas últimas duas décadas, presenciamos oconsiderável avanço das pesquisas sobre o tema, o queem si já demonstra a importância da questão.

No caso brasileiro, não é possível afirmar que a culturade avaliação se encontra disseminada no aparelho doEstado, a despeito das dificuldades metodológicas de semensurar esse fenômeno. Todavia, nos anos recentes, aprática cotidiana de avaliação e monitoramento naadministração pública evoluiu de forma célere, não serestringindo a um determinado campo das políticaspúblicas como, por exemplo, a saúde (FELISBERTO, 2006;CONTANDRIOPOULOS, 1999 e 2006).

Nesse sentido, o artigo conclui que o processo deinstitucionalização é de fato uma realidade, exemplificada

Tabela 2 – Evolução do preenchimento noSIGPlan

Fonte: Balanço Geral da União, 2007.

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pelas experiências do PPA e do MDS. O argumentoconverge, portanto, para a conclusão de Worthen et al(2004) de que a prática da avaliação tende a se tornarcada vez mais institucionalizada na medida em que asiniciativas de avaliação de políticas públicas são valorizadase aperfeiçoadas como, por exemplo, a partir daconstrução de sistemas de monitoramento e avaliação.

Os sistemas apresentados demonstram que aintegração da A&M à gestão, a produção e disseminaçãode conhecimento e o treinamento especializado sãopartes inerentes dos programas do governo federal.Apesar das dificuldades naturais de qualquer inovação naadministração pública e das diferenças de abrangência emetodologia desses modelos, a análise comparativaindicou que eles têm apresentado resultados positivos,principalmente, se comparados ao passado recente. Osefeitos da implantação dos SAM do PPA e do MDSevidenciam a trajetória de fortalecimento da accountabilitye de construção de uma estrutura informacional essencialpara a melhoria da tomada de decisões e a correção derumo das políticas.

Contudo, é importante ressaltar que tais resultadosestão em fase de constantes aperfeiçoamentos e nãoprontos e acabados. Sendo esta a razão central que levaparte dos estudiosos a questionarem o processo deinstitucionalização da avaliação e do monitoramento daspolíticas públicas no País. Os desafios para a eficazutilização dos resultados pelos gestores não sãoirrelevantes, inclusive em países desenvolvidos que jáintroduziram a A&M na administração pública há maistempo. Os problemas relativos à qualidade dasinformações, em especial de desempenho, as resistênciasda burocracia em ser avaliada, a devida qualificação dosavaliadores e a responsabilização dos gestores sãoobstáculos que impactam no alcance da eficiência e daqualidade na gestão das políticas públicas. A superaçãodesses desafios é o objetivo da nova fase da administraçãopública que ultrapassa a questão da institucionalizaçãodessas ferramentas, direcionando os esforços no seuaprimoramento contínuo.

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NOTAS

1 A Lei nº 10.180/2001 foi uma conversão da Medida Provisória nº 2.112-88, de 2001, cuja versão Originária foi a

Medida Provisória nº 480, de 27 de abril de 1994, após passar pelas diversas edições.

2 Lei nº 10.933, de 11 de agosto de 2004, art. 9º, § 1º; com redação dada pela Lei nº 11.318, de 2006.

3Extraída do Manual de Avaliação do PPA 2008-2011 ano base 2008, disponível em www.sigplan.gov.br.

4Idem.

5 Extraída de Vaitsman, Rodrigues e Paes-Sousa, 2006.

6 Portaria GM/MDS nº 330, de 11 de outubro de 2006.

7 BIRD. Social Protection Discussion Paper , n. 709, de maio 2007.

Pedro Cavalcante, EPPGG, atualmente licenciado para cursar doutorado em Ciência Política na Universidade de Brasília.

Ronaldo Nogueira, AFC, Assessor Especial de Controle Interno do Ministério da Justiça e mestre em Administração

Pública pelo Instituto Universitário de Lisboa.

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Impactos Econômicos da

Regra de Portabilidade de

Carência em Planos de

Saúde1

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Por Thompson da Gama Moret Santos

No caso do mercado de plano médico individual/familiar, além da facilidade de acesso da

operadora de plano de saúde ao prestador de serviço, nota-se que outra condição necessária para

a efetiva rivalidade (ex-post) é a eliminação/redução do custo de transferência –, uma vez que a

regra de carência engendra este custo para o beneficiário. A RN nº 186/2009 estabelece diversos

requisitos para que os beneficiários possam exercer os seus direitos à portabilidade de carência.

Todavia, esses requisitos podem interferir nas decisões alocativas dos agentes econômicos

presentes nesse mercado.

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INTRODUÇÃO

O setor de saúde suplementar é caracterizado pordeterminadas falhas de mercado que produzem umequilíbrio ineficiente do ponto de vista econômico.Portanto, podem existir perdas de bem-estar para osagentes econômicos que atuam nesse setor. Ademais, opadrão de competição desse setor apresenta certasparticularidades que o diferem de padrões apresentadosem outros mercados.

Em grande medida, as principais falhas de mercadopresentes nesse setor são: assimetria de informação – soba ótica da operadora de plano de saúde; assimetria deinformação – sob a ótica do beneficiário; e externalidadesdifusas.

Entre outras características, destacam-se também trêsfatores que tendem a dificultar a entrada de umconcorrente potencial: tamanho mínimo da massa debeneficiários da carteira que uma nova operadora deplano de saúde precisa possuir; regulação governamentalque, apesar de ser necessária sob diversas óticas, tende atornar o processo de entrada (e de permanência no setor)mais seletivo; e uma tendência recente de integraçãovertical, entre algumas modalidades de operadoras deplanos de saúde (OPS) e determinados tipos deprestadores de serviços de cuidado com a saúde.

No caso do mercado de plano médico individual/familiar, além da facilidade de acesso da OPS ao prestadorde serviço, nota-se que outra condição necessária para aefetiva rivalidade (ex-post) é a eliminação/redução docusto de transferência –, uma vez que a regra de carênciaproduz esse custo para o beneficiário. Nesse mercado,existe uma regra que permite ao beneficiário substituir, sobcertas condições, o seu plano de origem por outro (dedestino).

Tendo em mente as principais características dessesetor e a recente regulamentação, o objetivo destetrabalho é analisar o impacto da norma sobre o bem-estarsocial e avaliar se ela contribui para reduzir e/ou eliminar ocusto de transferência, considerando os problemas demaximização do segurado e da OPS.

METODOLOGIA DO PRESENTE TRABALHO

Esta análise está dividida da seguinte forma:inicialmente será apresentada, na seção “Das Regras de

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Portabilidade de Carência Estabelecidas pela RN nº 186/2009”, a nova regra estabelecida pela Agência Nacional deSaúde Suplementar, ANS; na seção “ExperiênciaInternacional na Portabilidade de Carência”, seráapresentado um breve resumo das regras sobre esse temaestabelecidas em outros países; a seção seguinte, “ModeloTeórico”, apresentará o modelo teórico utilizado nestetrabalho; e as seções seguintes apresentam o impactoeconômico da regra sobre o bem-estar social e suaeficácia na eliminação e/ou redução do custo detransferência, a conclusão do trabalho e algumassugestões.

DAS REGRAS DE PORTABILIDADE DE CARÊNCIAESTABELECIDAS PELA RN Nº 186/2009

No caso do mercado de planos de saúde individual/familiar, nota-se que uma das condições necessárias paraa existência de efetiva rivalidade (ex-post) é a existência daportabilidade de carência – ou seja, a eliminação/reduçãodo custo de transferência –, uma vez que a regra decarência produz este custo para o beneficiário2.

Nesse sentido, a Agência Nacional de SaúdeSuplementar (ANS) publicou recentemente a ResoluçãoNormativa (RN) nº 186, de 14 de janeiro de 2009, queestabelece requisitos para que os beneficiários possamexercer os seus direitos à portabilidade de carência, nomercado de planos privados de assistência à saúde. Emresumo, tais requisitos dizem respeito à elegibilidade dobeneficiário e à incidência sobre os produtos (planos), deacordo com artigos 2º e 3º desta norma.

Quanto à elegibilidade, destaca-se o artigo 2º, inciso VI,que estabelece, in verbis:

... Art. 2º Para efeito desta Resolução, consideram-se: ... VI – tipo compatível: é o tipo que permite aobeneficiário o exercício da portabilidade para um outrotipo por preencher os requisitos de abrangênciageográfica, segmentação assistencial, tipo decontratação e faixa de preço, nos termos destaResolução...

Ainda quanto à elegibilidade, destaca-se o caput doartigo 3º, que estabelece, in verbis:

... Art. 3º O beneficiário de plano de contrataçãoindividual ou familiar, contratado após 1º de janeiro de1999 ou adaptado à Lei n.º 9.656, de 1998, ficadispensado do cumprimento de novos períodos decarência e de cobertura parcial temporária...3

Quanto à incidência desta regra sobre os produtos(planos de saúde), mesmo que o beneficiário atenda aosdemais requisitos estabelecidos nesta norma, aportabilidade de carência recairá sobre os produtos queatendam simultaneamente aos seguintes casos, segundoos incisos III e IV do artigo 3º, in verbis:

...III – o plano de destino estar em tipo compatívelcom o do plano de origem, conforme disposto noAnexo desta Resolução; IV – a faixa de preço do planode destino ser igual ou inferior à que se enquadra oseu plano de origem, considerada a data da assinaturada proposta de adesão; ...

O parágrafo 5, nos incisos de I a IX, define os planostipos-compatíveis, cuja regra pode ser resumida daseguinte forma: “quem pode mais pode menos, mas quempode menos não pode mais”, seja do ponto de vista dadimensão do produto (segmentação assistencial), seja doponto de vista da dimensão geográfica4. De fato, tal

O setor de saúdesuplementar é caracterizadopor determinadas falhas demercado que produzem umequilíbrio ineficiente do pontode vista econômico. Portanto,podem existir perdas debem-estar para os agenteseconômicos que atuamnesse setor.

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definição é coerente com aquela estabelecida no incisoIV, do artigo 3º da RN nº 186, porém, ela cria umaassimetria no processo concorrêncial pelo lado dademanda.

Sob a ótica da dimensão do produto, caso obeneficiário possua um plano de origem comsegmentação assistencial superior – contrato que possuiuma cobertura maior, relativamente aos serviços decuidado com a saúde oferecidos –, ele poderá substituí-lopor outro (plano de destino) com segmentaçãoassistencial inferior ou idêntica, mas o oposto não éverdadeiro. Por exemplo, caso o beneficiário possua umplano de origem com segmentação assistencial do tipo“internação com obstetrícia nacional”, a substituiçãopoderá ocorrer para um plano de destino classificado emum dos seguintes tipos: “para os tipos sem internaçãomunicipal, sem internação estadual, sem internaçãonacional, internação sem obstetrícia municipal, internaçãosem obstetrícia estadual, internação sem obstetrícianacional, internação com obstetrícia municipal, internaçãocom obstetrícia estadual e internação com obstetrícianacional” – pergunta 1: “poderá essa situação representaruma escolha ótima para o consumidor e um equilíbrio demercado?”

Porém, a possibilidade de substituição inversa não épermitida. Por exemplo: caso o beneficiário possua umplano de origem com segmentação assistencial do tipo“internação com obstetrícia municipal”, a substituiçãopoderá ocorrer para um plano de destino classificado emum dos seguintes tipos: “para os tipos sem internaçãomunicipal, sem internação estadual, sem internaçãonacional, internação sem obstetrícia municipal,internação sem obstetrícia estadual, internação semobstetrícia nacional e internação com obstetríciamunicipal” – pergunta 2: “poderá essa situaçãorepresentar uma escolha ótima para o consumidor?”

Sob a ótica da dimensão geográfica, caso obeneficiário possua um plano de origem com a coberturanacional, ele poderá substituí-lo por outro (plano dedestino) de abrangência geográfica inferior ou idêntica,mas o oposto não é verdadeiro. Por exemplo: caso obeneficiário possua um plano de origem do tipo “seminternação nacional”, a substituição poderá ocorrer paraum plano de destino classificado em um dos seguintestipos: “para os tipos sem internação municipal, seminternação estadual e sem internação nacional” –

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“pergunta 3: poderá essa situação representar umaescolha ótima para o consumidor?”

Porém, a possibilidade de substituição inversa não épermitida, por exemplo: caso o beneficiário possua umplano de origem com abrangência geográfica do tipo “seminternação municipal”, a substituição poderá ocorrer paraum plano de destino classificado em um dos seguintestipos: “para o tipo sem internação municipal” – pergunta 4:“poderá essa situação representar uma escolha ótima parao consumidor?”

Com efeito, relativamente aos serviços cobertos emdeterminada região (localidade) pelo plano de origem, talregra não permite que o beneficiário tenha o direito àportabilidade da carência desses serviços em diversoscasos. Assim, essa norma não permite que o beneficiáriomelhore de situação, se avaliada sob a ótica do equilíbriode mercado entre a OPS e o segurado no mercadorelevante5 analisado, sendo a única exceção a soluçãotrivial p

ojd = p

osd*.

Ademais, dada a amplitude de uma determinada faixa depreço6, na qual, pelo inciso IV do art. 3º da RN nº 186/2009, é permitida a portabilidade de carência, se foremrespeitados os demais requisitos, essa regra poderá produzirincentivos para o comportamento de arbitragem e deaumento do problema de seleção adversa emdeterminados mercados relevantes. Em decorrência, tal fatopode provocar um desequilíbrio nesse mercado e umapossível perda de bem-estar social – seja no mercado deprodução (OPS) seja no mercado de trocas (beneficiário).

Por último, cabe observar que o objetivo da regra deportabilidade de carências é reduzir e/ou eliminar o custode transferência do beneficiário, produzindo umacondição necessária para que, sob certas condições, sejapossível a efetiva rivalidade no mercado de planosprivados de assistência à saúde individual/familiar –pergunta 5: “esse objetivo é atingido pelas regrasimplementadas pela ANS?”

EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL NAPORTABILIDADE DE CARÊNCIA

A portabilidade de carência é contemplada, sob certascondições, no marco regulatório do setor de planos desaúde em alguns países. Nesse trabalho, serãocomentadas brevemente as regras dos seguintes países:Austrália; Canadá; e Estados Unidos da América (EUA).

Austrália7

O sistema de seguro-saúde na Austrália é misto, isto é,coexistem o sistema público e o sistema privado. Apesarde o primeiro possuir uma cobertura universal, o segundocobre aproximadamente 44% da população, umpercentual significativo quando comparado aos demaispaíses-membros da Organização para a Cooperação e oDesenvolvimento Econômico (OCDE).

A portabilidade de carência é permitida nos planos desaúde individuais, desde que a transferência ocorra paraoutro plano (de destino) com um nível de benefício igualou inferior ao anterior (de origem). Todavia, segundoColombo (2003), apesar da existência de 44 OPS e regrasque garantem a completa portabilidade de cobertura, asubstituição entre planos não ocorreu de formasignificativa, uma vez que os segurados preferempermanecer nos contratos já firmados (planos de origem).

Segundo aquele estudo, tal situação pode ser causadapor custos transacionais e de informação suportadospelos beneficiários que vislumbram a troca de plano desaúde. Embora a escolha seja melhorada peladisponibilidade de diferentes tipos de planos de saúde, aexistência de um grande número de produtos podeconfundir o consumidor, restringindo sua escolha.

Canadá8

Diferentemente do caso anterior, o sistema de seguro-saúde no Canada é prioritariamente público. Segundo oCanadian Health Care Act, Section 8, os planos de saúdedevem ser administrados e operados por instituiçõespúblicas (non-for-profit), as quais estão sob aresponsabilidade dos governos das províncias e dosterritórios.

Nesse sistema, os seguros-saúde são compreensivos,no sentido de que devem cobrir all insured health servicesprovided by hospitals, medical practitioners or dentists(Section 9). Esses contratos são também universais, isto é,all insured persons must be covered for insured healthservices provided for by the plan on uniform terms andconditions (Section 10). Da definição de insured personssão excluídas aquelas pessoas cobertas por outros planosfederais ou das províncias.

A portabilidade de carência é permitida no sistemacanadense, uma vez que os contratos são firmados, em

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geral, com a província na qual o segurado reside. Assim,caso ocorra uma alteração momentânea – no máximo trêsmeses – da residência do segurado, a província (do plano)de origem deve cobrir todos os gastos do seguradorealizados na outra província (de destino). Após esseperíodo de três meses, a província (do plano) de destinoassume os gastos do segurado.

Todavia, a portabilidade de carência é condicionada aacordos entre as respectivas províncias, ocorrendo umavariação no entendimento – nesses acordos – do que sãoconsiderados serviços emergenciais, os quais sãocontemplados pela portabilidade, e serviços eletivos, quenão são cobertos por essa regra.

EUA9

Como no caso da Austrália, o sistema de seguro-saúdeamericano é misto, porém os planos de saúde privados(for-profit e not-for-profit) respondem por uma parcelasignificativa do total de cobertura. De acordo com oUnited States Census Bureau, 85% da população possuemplano de saúde, sendo que desses, aproximadamente,60% são obtidos por meio de empregadores (planocoletivo), enquanto que 9% adquirem o contratodiretamente (plano individual/familar).

A maioria dos seguros-saúde mais compreensivoscobre os custos de rotina, preventivos e procedimentosemergencais, além de quase todos os medicamentos devenda com prescrição. Em geral, os tipos de coberturasentre os planos coletivos (grandes e pequenas/médiasempresas) são semelhantes. Todavia, os planos individuaismais adquiridos são aqueles com coberturas maiscompreensivas (major medical plan), isto é, que ofertamseguros para sinistros mais onerosos.

A portabilidade de carência no sistema americano éregulada, principalmente, por intermédio de duas leisfederais: Consolidated Omnibus Budget Reconciliation Actde 1985 (COBRA); e Health Insurance Portability andAccountability Act de 1996 (HIPAA).

As normas da COBRA garantem aos indivíduos quepossuem planos coletivos, em uma eventual troca/perdade emprego, a opção de extensão da cobertura do planode origem, sob certas condições, durante determinadoperíodo de tempo – no máximo 18 meses. Nesse caso, oempregador (do plano de origem) deve custear osbenefícios ao longo desse período. Segundo Madrian

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(1998)10, in verbis: COBRA is a good example of how the federal government’s idiosyncratic approach to health insurance reform creats new problems even as it attempts to solve others.

Quanto ao HIPAA, esta norma permite, sob certas condições, a portabilidade de carência em dois casos gerais: na troca entre planos coletivos; ou b) na substituição de um plano coletivo por um plano individual. O primeiro caso é mais comum na troca de emprego, porém esta regulamentação não garante o mesmo nível de cobertura anterior. O segundo caso restringe-se à saída/perda do emprego. Assim, caso algum indivíduo saia ou perca o seu emprego, o HIPAA garante, em alguns casos, que tenha acesso a um plano individual.

MODELO TEÓRICO Neste trabalho, optou-se pelo modelo de equilíbrio

parcial no mercado de seguro-saúde, com base nas decisões ótimas na produção e no consumo, cujas funções custo total e utilidade, e suas respectivas hipóteses, estão apresentadas nas próximas seções.

Nesse mercado, o produto ofertado e demandado é o seguro-saúde, cujo “ativo-objeto” é a “saúde do indivíduo”. Assim, caso ocorra um sinistro, em determinado momento, com uma dada probabilidade, que produza alguma perda do nível de saúde do segurado, este poderá exercer o seu direito à utilização da cobertura oferecida pela operadora de plano de saúde, a fim de reestabelecer parte ou totalmente o seu nível de saúde original. Como a variável “nível de saúde” não é facilmente observável, esta análise será feita adotando-se a variável “valor segurado”.

Da produção de plano de saúde Supondo-se que, em determinada região

(localidade) R, existam os conjuntos/espaços que podem representar os principais atributos/coberturas (insumos) de um contrato de seguro-saúde (plano privado de assistência à saúde)11, de acordo com as definições das variáveis apresentadas abaixo, tem-se

que: iose

(η x 1) = o

∙ ios = (mose, dos

e, kose) representa a

quantidade esperada de cada um dos η insumos; mosji(A# x 1) = (αosji1, αosji2, ..., αosjia#, ..., αosjiA#)’ ≥ 0 representa

o vetor linha das quantidades de coberturas ofertadas para o i-ésimo consumidor (indivíduo/família) dos A# tipos de serviços de cuidado com a saúde factíveis, ajustados pelos índices de segurança dos serviços prestados pela j-ésima pessoa jurídica, que estão

cobertos pela segmentação assistencial definida na s-ésima modalidade possível dos contratos ofertados pela o-ésima OPS; e dos

e e kose representam,

respectivamente, os demais atributos dos planos e os demais fatores produtivos supostos fixos; αosjia = bλμj . aosjia ≥ 0 representa a quantidade de cobertura ajustada pelo índice de segurança do a-ésimo tipo de serviço ofertado para o i-ésimo consumidor, pelo j-ésimo prestado de serviços, que está coberto pela s-ésima modalidade ofertada pela o-ésima OPS, tal que:

bb

> 0 e aa

> 0. (1)

Assim, o problema de maximização de lucro da o-ésima OPS, no curto prazo, para a s-ésima modalidade, pode ser estabelecido da seguinte forma alternativa12: (problema1): min po(-p#) ∙ ios

e em ios

e E2(co); s. r. fos(ios

e) = cos

e onde:

iif

e

e

osos

ie

fi

> 0. (2)

A condição necessária e suficiente para a solução do problema 1 – para um dado nível de produção cos

e – é estabelecida pelas seguintes condições (condição1):de primeira ordem: po(-p#) = λ ∙ f(ios

e*) e fos(iose*) = cos

e; e de segunda ordem: h’ ∙ D2 f(ios

e*) ∙ h ≤ 0, h E2(co) : po(-p#) ∙ h = 0;

Page 51: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

A solução do problema de minimização com restrição no problema 1 estabelece as seguintes funções, dada a quantidade produzida da s-ésima modalidade, cos

e = cose:

a) função demanda compensada pelo η-ésimo

insumo (iηe): iηe = iηe(po(-p#), cose)

onde:

p

cpie

ospo

e

poi pi ,

)#( < 0; po(-p#)

vetor de preços (cons. dados) dos η insumos (3) b) função custo total esperado (CTos

e): CTose =

CTose (po(-p#), cos

e) (4) onde: E3(co) = {ios

e E(co) : po(-p#) ∙ iose =

CTose} é a isocusto, tal que, no ponto ótimo (ios

e*), sua inclinação, dada pelos preços reltativos dos insumos, iguala-se à taxa marginal de substituição técnica entre esses insumos. No caso de somente dois insumos, 1 e 2, isto significaria que: Pos1/Pos2 = [d fos(ios

e*)/ d i1e)]/ [d fos(ios

e*)/ d i2e)]. c) função custo marginal (Cmgos) ou a função

oferta inversa de curto prazo da s-ésima modalidade

(foss)13: Cmgos

e =

ccpCT

e

os

e

ospo

e

os

ce

o

C p,

)#( > 0

onde: Cmgose ≡ pos

s = foss(po(-p#), cos

e) ∙ (5) Assim, verifica-se uma relação positiva entre o

prêmio do contrato (poss) e o nível de segurança

coberto (valor segurado esperado) pela s-ésima modalidade de contrato ofertado pela o-ésima OPS. Substituindo a restrição do problema 1 em (5), tem-se a função oferta de curto prazo da s-ésima modalidade em relação aos po(-p#) preços e às quantidades demandadas dos η insumos dada por:

pos

s = foss(po(-p#), fos(ios

e)) ou poss = fos

si(po(-p#), iose) (6)

onde: a) e

e

ospo

si

os

ipfi

fp

ii,)#(

> 0 e b)

oospo

si

ospf ,, i)#(

> 0.

Do mesmo modo, verifica-se uma relação positiva entre o prêmio do contrato (pos

s), a quantidade esperada demandada, pela OPS, e a probabilidade de ocorrência14 de cada um dos η insumos, dados os seus preços. Por hipótese, assume-se aqui que as (D#+K#) quantidades dos insumos, relativos aos demais atributos e aos demais fatores produtivos da s-ésima modalidade, são consideradas constantes, isto é:

ios

e = (mos

e, dose, kos

e) : poss = fos

si(po(-p#), mose, dos

e, kose). (7)

Considerando os preços dos insumos como dados

e a existência da função demanda inversa, fosd-1(xos, po(-s-

p)d, y), a receita total esperada e o custo total esperado,

proporcionados pelo valor segurado na s-ésima modalidade ofertada pela o-ésima OPS, são dados por: RTos

e = πop.fosd-1(xos,po(-s-p)

d,y).xos+(1-πop).fosd-1(xos,po(-s-p)

d,y).xos= fos

d-1(xos, po(-s-p)d, y).xos; CTos

e = πop . cos + (1 - πop ) . 0 = πop . cos

= cose; y = y é a renda do consumidor considerada

constante; e p G2. Logo, considerando dados os demais preços, po(-s-p)

d, e a renda do consumidor, a OPS estará maximizando seu lucro esperado em xos*, pos

d*, tal que xos = xos* ≡ cos = cos*, se, e somente se:

Rmgose =

cpcRT

os

d

psoos

e

osy

co

R cccc ps,,

)(

*

=

ccpCT

os

ospo

e

os

co

C p

*

)#(,

= Cmgose

Da condição de equilíbrio acima, tem-se que:

cpcfos

d

psoos

d

osy

co

f cccc ps,,

)(

*1

. cos* + fosd-1(cos*,

po(-s-p)d, y) = πop (8)

Com base na equação de equilíbrio em (8) e na lei da demanda compensada, pode sugir um dos cenários abaixo, a partir do pressuposto de que o consumidor não consegue interferir na probabilidade.

a) mercado competitivo: ε + fos

d(cos*) = πop , ε = 0 posd = πop; e

b) mercado não competitivo: ε + fos

d(cos*) = πop , ε < 0 posd > πop;

Page 52: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

onde: ε = cpcfos

d

psoos

d

osy

co

f cccc ps,,

)(

*1

. cos*.

As questões da etapa de produção, tratadas até o

momento, referem-se à atividade da o-ésima OPS, o J. Para que seja obtida a produção de cada modalidade de contrato produzida por todas as J# - j# OPS em atividade com beneficiários na região R, deve-se realizar o processo de agregação dos planos de produção.

Da demanda por plano de saúde No mercado de planos de saúde, as escolhas são

realizadas sob alternativas de resultados incertos, cuja estrutura pode restringir as decisões do consumidor “racional”, uma vez que elas representam alternativas associadas a risco chamadas de loterias. Suponha que os resultados dessas loterias possam ser representados em unidades monetárias que representam valores segurados, cujas ocorrências estão associadas a probabilidades objetivamente conhecidas πosi dos A#+D# sinistros cobertos pelo contrato de seguro.

Considera-se que existe uma função de densidade de probabilidade15 objetivamente conhecida, definida sobre esse mercado, com base em eventos ocorridos ao longo de um período de tempo no passado (eventos/gastos realizados).

Em que pese, nesse mercado, o fato de as escolhas dos consumidores poderem ocorrer de forma discreta, isto é, a decisão do indivíduo poderia também ser representada da seguinte forma: ou adquirir o seguro (cosi ≡ єosi = 1) ou não adquirir o seguro (cosi ≡ єosi = 0). Tal fato, impõe algumas condições na formulação da função que representa as preferências nesse mercado. A fim de tornar a presente análise mais simples, será adotada a hipótese simplificadora de que a escolha do consumidor pode ser representada por uma variável contínua, o valor segurado.

Conforme as hipóteses e o processo de escolha ótica do consumidor representativo e de (15) no problema 5, o problema de maximização do consumidor no problema 4 pode ser reescrito da seguinte forma (problema 2):

Max U(Xx, q) em Xx , q; s. r. Px

. Xx + pqd . q = y; Xx =

ue(x), e(pd) = Px . po; onde q é o índice de quantum dos demais bens e serviços.

A condição necessária e suficiente para a solução do problema 2 – dados nível de renda y e a hipótese de não saciedade local – é estabelecida pelas seguintes condições (condição 2): de primeira ordem: pd = λ U(Xx*, q*) e Px

. Xx* + pqd . q* = y; e de segunda ordem:

h’ ∙ D2 U(Xx*, q*) ∙ h ≤ 0, h V : pd ∙ h = 0. Aplicando no problema 2 as condições

estabelecidas na condição 2, obtem-se a cesta de consumo ótima (Xx*, q*), dados os preços e a renda do consumidor. Assim, conforme destacado no processo de escolha do consumidor representativo, pode-se imaginar que a decisão do consumidor ocorre em dois estágios: no primeiro, dada a sua restrição orçamentária, ele decide quanto (o montante) de valor segurado será demandado como função do índice de preços; e no segundo estágio, dados os preços dos valores segurados e o montante do valor segurado (função dispêndio) ótimo, ele decide de qual OPS/modalidade ele demandará o valor segurado ótimo (xos*) determinado no problema 4.

A partir da solução do problema de maximização do consumidor (problema 2), dada a sua restrição orçamentária, pode-se estabelecer a função demanda marshaliana, que é homogênea de grau zero nos preços e na renda: xos = fos

d(p o(-s-p)d, y).

Portanto, substituindo o valor segurado de equilíbrio de mercado, (xos*), determinado em (8), na função demanda inversa, fos

d-1(xos, po(-s-p)d, y), obtem-se o

prêmio por unidade do valor segurado de equilíbrio, pos

d* = fosd-1(xos*, po(-s-p)

d, y). Como observado acima, no mercado de planos de

saúde, as escolhas são realizadas sob alternativas de resultados incertos, que representam alternativas associadas a risco, chamadas de loterias. Suponha que, independentemente da restrição orçamentária do consumidor, essas loterias representem os valores segurados líquidos que podem ser recebidos pelo beneficiário, cujas ocorrências, em cada estado da natureza, estão associadas a probabilidades objetivamente conhecidas (πosi = π) dos (A#+D#) sinistros cobertos pelo contrato de seguro.

Supondo hipóteses semelhantes àquelas estabelecidas acerca de suas preferências e supondo uma função utilidade estado-dependente16, a escolha ótima do consumidor pode ser representada pelo problema 3:

Max z

zzzu(xz) Xx : Xx X e (x 1, x2) Ω ; s. r. π1 .

h1 + π2 . h2 = 0; onde: a) πz (0, 1] e z

zzz = 1; b)

Page 53: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

existe a fUe(π2, π”2) que é a função utilidade esperada do beneficiário avaliada segundo o seu tipo verdadeiro (π2) e o seu tipo revelado, pelo segurado, para a OPS (π”2); c) a fim de que sejam válidas as compatibilidades de incentivos, requer-se que π2 arg max fUe (π2, π”2), isto é, que o segurado obtenha a máxima utilidade esperada anunciando o seu verdadeiro tipo, isto é, π”2 = π2; d) h1= - Px

. Xx; h2=Xx - Px . Xx; e e) x1 = w + h1; x2 =

w - L + h2. Dado que: o segurado é estritamente avesso ao

risco; π2 arg max fUe(π2, π”2); e que π >> 0, a condição necessária e suficiente para a solução do problema 3 é estabelecida pelas seguintes condições (condição 3): de primeira ordem: π = λ ∙ u(xz

#); π1 . h1

# + π2 . h2# = 0; e de segunda ordem: h’∙D2 u(xz

#) ∙ h ≤ 0, h V : π ∙ h = 0.

Das condições necessárias e suficientes em (cond.3), encontra-se o valor segurado ótimo, Xx

#, e obtém-se o ponto ótimo, a# = (x1

#, x2

#), conforme o

Gráfico 1, onde: 1

2

xx

1x2x

é a inclinação da reta π1 . x1 + π2 .

x2 = we. Portanto, de Xx# em (15), encontra-se o nível

de utilidade esperada ótima: Xx# = ue(x) = ue#.

Resolvendo o problema 5 para ue#, obtém-se o contrato de seguro ótimo (x#), cujo resultado é equivalente àquele estabelecido no problema 4, o que determinará a modalidade e a OPS ótima, xos

#.

ANÁLISE DO IMPACTO ECONÔMICO DA RN

Nº 186/2009 Comparando as escolhas ótimas obtidas no

problema 2, Xx*, e no problema 3, Xx

#, verifica-se que os seguintes cenários são possíveis de ocorrer17: A) Xx

* < Xx

# < (y / Px); B) Xx* = Xx

#; e C) 0 < Xx# < Xx

*. No cenário B (Xx

* = Xx#), tudo mais constante,

verifica-se que a escolha do contrato de seguro-saúde ótimo não é alterada qualquer que seja a forma de maximização definida pelo consumidor representativo (beneficiário). Este caso está representado no ponto “a” do Gráfico 2.

O ponto “e” não carece de comentários inicialmente. Todavia, nos cenários A e C, representados pelos pontos “c” e “b”, respectivamente, o consumidor encontra-se em desequilíbrio, considerando sua restrição orçamentária, bem como os estados da natureza.

Considere agora que a posição inicial é de desequilíbrio18, indicada em um dos cenários A e C. Nestes casos, dados os problemas de maximização do problema 1 e problema 2, relativamente ao problema 3, tanto o segurado como a OPS possuem incentivos para alterar seus contratos.

Assim, tudo mais constante, o beneficiário poderá melhorar de situação substituindo o contrato de plano de saúde que lhe proporciona um valor segurado Xx

#

Page 54: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

por outro que lhe forneça o valor segurado Xx*, ou seja,

movendo-se para o ponto “a” que representado pelo cenário B onde Xx

* = Xx#.

O movimento até o ponto “a”, entretanto, não provocará uma alteração nos preços relativos desde que as substituições promovidas pelo consumidor ocorram dentro das regras de mercado vigentes, em particular, respeitando as regras de carência. Essa condição é importante porque reduz a probabilidade de ocorrência de elevação dos gastos realizados em decorrência do problema de seleção adversa por meio da imposição, para o segurado, de um período de espera (carência) na utilização dos benefícios contratados, o que produz um custo de transferência19 para o segurado. Como a OPS busca maximizar o seu lucro esperado, logo, tais substituições não provocam uma alteração nos gastos esperados pelas OPS e, por consequência, os preços relativos não são alterados.

No ponto “a” não há incentivos para que ocorra algum desvio; tanto o segurado como a OPS estão nos seus pontos ótimos: o beneficiário está maximizando sua utilidade considerando sua restrição orçamentária, bem como seus estados da natureza; e a OPS está maximizando seu lucro esperado, dada sua tecnologia, os demais preços e os estados da natureza; logo, dado (8), há uma posição de equilíbrio em cos

* = xos*.

Portanto, substituindo o valor segurado de equilíbrio de mercado, (xos*), determinado em (8), na função demanda inversa, fos

d-1(xos, po(-s-p)d, y), obtém-se o

prêmio por unidade do valor segurado de equilíbrio, pos

d* = fosd-1(xos*, po(-s-p)

d, y). Considere agora uma perturbação no ponto de

equilíbrio “a”, produzida por uma alteração nos preços relativos (Px

/ pqd), a qual é causada pelo aumento de

Px. Essa situação está descrita no Gráfico 3. Como o prêmio por unidade do valor segurado

aumentou, tudo mais constante, o beneficiário encontrará uma nova cesta ótima (um novo ponto de equilíbrio) que lhe proporcionará um nível de utilidade inferior (Ub’) àquele verificado anteriormente (Ua’), com um valor segurado inferior, por exemplo, o ponto “b”20. Assim, a diferença entre os níveis de utilidade determina a variação do bem-estar do consumidor, ∆Wc. Como a variável utilidade é uma medida ordinal, para que seja mensurada essa variação, pode-se utilizar a função utilidade monetária métrica indireta, dada por: μ(P*; Po , y) ≡ e(P*, ve(Po, y)), onde: Po = (Pxo, pq

d), P* = (Px*, pq

d) e ve(Po, y) é a função de utilidade indireta esperada.

Essa função define o novo nível de dispêndio do consumidor, dados os novos preços relativos e o nível de renda inicial, supondo que seja concedida, ao segurado, uma compensação na sua renda nominal tal que ele retorne ao nível de utilidade anterior (Ua’), isto é: μ(Pb’; Pa’ , y) ≡ e(P b’, ve(P a’, y)). Assim, a variação de bem-estar do segurado pode ser mensurada por: ∆Wc = μ(Pb’; Pb’ , y) - μ(Pb’; Pa’ , y) = y - μ(Pb’; Pa’ , y).

Como a função utilidade monetária métrica indireta é uma transformação monótona da função utilidade

Page 55: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

indireta e como, para um dado nível de renda nominal,

P

Pve

Pv

e

< 0, então, P b’ > P a’ e(P b’, ve(P b’, y)) <

e(P b’, ve(P a’, y)), logo: ∆Wc = y - μ(Pb’; Pa’ , y) < 0. De forma análoga, pode-se verificar a variação no

nível de produção produzido por uma variação nos custos (preços) esperados relativos dos insumos. Como os demais atributos do contrato (dos) e os demais fatores produtivos (kos) são considerados constantes no curto prazo, e como ios

e (η x 1) = (mos

e, dose, kos

e), considere a simplificação do problema de maximização da OPS no problema 1, em relação ao vetor de insumos esperados ie”os(η x 1) = (mos

e, k”ose

(D#+K# x 1)), somente para o caso de dois tipos de insumos, conforme Gráfico 4.

Até o momento, o beneficiário era o suposto “consumidor representativo” desse mercado, sem levar em consideração a possibilidade de tipos de beneficiários distintos, onde o tipo reflete o seu nível de risco. Considere agora o exercício anterior de perturbação do ponto de ótimo, por meio de uma alteração exógena provocada em Px*, nesse mercado de seguro-saúde, no qual pode existir mais de um tipo de beneficiário e onde existe uma assimetria de informação21 entre as OPS (Principal) e os segurados (Agente).

Observe que, como os beneficiários estão sujeitos à sua restrição orçamentária, as OPS seriam incapazes também de separar perfeitamente os segurados de acordo com o seu risco, uma vez que contratos com

Page 56: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

maior valor segurado esperado (coberturas) e prêmios mais elevados podem não pertencer ao conjunto de escolhas factíveis dos segurados.

Este é o caso retratado, por exemplo, pelo ponto “d” do Gráfico 2. Assim, segurados sujeitos a situções de riscos mais elevados e com menor poder aquisitivo teriam de escolher à revelia contratos com coberturas menores22, ou seja: “Dados seus estados da natureza, sua restrição orçamentária, os prêmios dos contratos e suas preferências, os beneficiários podem não estar fazendo suas escolhas ótimas.” (9)

Considere, assim, que existam I# beneficiários que podem ser diferenciados pela probabilidade exógena de ocorrência de determinado estado da natureza (πz), cujas informações são observáveis somente pelo segurado (Agente) e não pelas OPS (Principal).

Suponha que o consumidor, a priori, possa ter uma apólice de seguro-saúde já contratada. Assim, ele deve optar entre: ou permanecer no contrato atual (plano de origem); ou substituir o plano de origem por outro (plano de destino); ou cancelar o plano de origem e não contratar outro plano. Por definição dos problemas de maxização (problema 2 e problema 3), a última opcão será descartada, uma vez que o segurado não estaria maximizando sua função utilidade esperada.

Sem perda de generalidade, suponha que esses I# segurados possam ser distribuídos com probabilidade πz da seguinte forma: π1 representa o baixo risco; e π2 representa o alto risco. Adicionalmente, suponha que esses beneficiários sejam distribuídos nas carteiras de todas as OPS em atividade na região R da seguinte forma:

π1 possui uma participação no total das

carteiras (da região R) de δ1, δ1 > 0; π2 possui uma participação no total das

carteiras (da região R) de δ2, δ2 > 0;

π1 = (1 – π2), π2 (0, 1],z

zzz = 1; e δ1 =

(1 – δ 2), δ 2 (0, 1),z

zzz = 1.

Logo, para fins de avaliação da alteração do bem-

estar de todos os tipos de beneficiários residentes em determinada localidade (∆Wc), o consumidor representativo poderia ser visto como sendo o “tipo médio – πm” de consumidor nas carteiras das OPS em atividade com beneficiários, na região R, definido da seguinte forma: πm = δ1. π1 + δ2. π2 > 0. (10)

Seja a variação agregada do bem-estar do consumidor representada pela soma das variações

individuais, ou seja: ∆Wc = i

ii W , ∆Wi = μi (Pb’;

Pb’ , yi) - μi (Pb’; Pa’ , yi) e t = i

it , para i = 1, 2.

Suponha que o segurado de baixo risco (i = 1) possua uma probabilidade de ocorrência de sinistro muito baixa, π1 ≈ 0. Logo, a carência acarreta, para esse tipo de segurado, um custo de transferência muito baixo, t1 ≈ 0. Assim, a substituição do plano de origem pelo plano de destino possui uma baixa probabilidade de aumento da freqüência de utilização (f1) dos benefícios por esse usuário. De (6), isso significa que, para a OPS do plano de destino, Pb’ ≈ Pa’, implica em ∆W1 ≈ 0.

Suponha que o segurado de alto risco (i = 2) possua uma probabilidade de ocorrência de sinistro elevada, π2 > π1 ≈ 0. Logo, a carência acarreta, para esse tipo de segurado, um custo de transferência não desprezível, t2 > t1 ≈ 0. Assim, a substituição do plano de origem pelo plano de destino possui uma probabilidade elevada de aumento da frequência de utilização (f2) dos benefícios por esse usuário, que pode ser mensurado por: ∆ f2

e = π2.∆ f2 + (1 - π2).0 = π2.∆ f2 > 0. Suponha que Px = g(f2

e, t2). Assim:

tPx

tP

2

= t

tfge

tg ffff

2

22,

> 0 e ex

fPfP

2

= e

e

ftfg

fg ffff

2

22,

> 0

Como o objetivo da portabilidade de carência é

eliminar/reduzir o custo de transferência, dt2 < 0; como o aumento da frequência esperada possui um impacto positivo no prêmio, então, se

dtttfg

e

22

22,

dfffft 2

g <

e

e

e

dff

tfg2

2

22,

dfffff

g Pb’ > Pa’ ∆W2 < 0.

(10.1)

Page 57: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Como δi > 0, a variação agregada do bem-estar (esperado) do consumidor será negativa, ou seja: ∆Wc = δ1. ∆W1 + δ2. ∆W2 < 0.

Portanto, para fins de avaliação da alteração do bem-estar (esperado) dos consumidores residentes em determinada região R, o exercício realizado no Gráfico 3 poderia ser representado por uma das seguintes formas: avaliar as variações individuais para cada tipo de segurado e, em seguida, agregá-las, ponderando-as pelo peso de cada tipo de segurado na carteria da OPS em determinada região; ou considerar a função utilidade do “tipo médio” de segurado.

Caso o efeito líquido das variações da frenquência esperada e do custo de transferência, sobre o prêmio do seguro (Px), seja positivo, Pb’> Pa’, ocorrerá uma redução no bem-estar do consumidor, ∆Wc < 0, conforme destacado acima. Por outro lado, caso esse efeito seja negativo, Pb’< Pa’, haverá um aumento no bem-estar, ∆Wc > 0, conforme a mudança da cesta “a” para “b” no Gráfico 5.

Quanto aos incentivos, relacionados aos beneficiários bem como à OPS, que tendem produzir uma dessas situações, estes podem ser explicados conforme abaixo.

Suponha agora que a perturbação no ponto de equilíbrio “a`”, do Gráfico 3, tenha sido produzida pela regra de portabilidade de carência, cujo efeito líquido seja representado pelo ponto “b” do gráfico, e mensurado de acordo com a forma que se segue:

a) conforme destacado acima, o custo de transferência recai tanto para o baixo risco como para o alto risco, as análises sobre os incentivos de desviar do ponto de equilíbrio e do impacto do deslocamento do ponto “a`” para o ponto “b”, do Gráfico 3, serão realizadas com base no “tipo médio – πm” de beneficiário;

b) como a regra de precificação dos planos de saúde, no País, segue o método do mutualismo e como a carência imputa um custo de transferência para o beneficiário médio, então, esse custo deve ser considerado, pelo segurado, no processo de substituição entre dois planos de saúde quaisquer;

c) com base no modelo de cidade linear de diferenciação do produto23, e adaptando-o para o caso de custo de transferência no mercado de seguro-saúde, o custo total de uma unidade do valor segurado (cobertura) pode ser representado por: pos

d = posd” + tm,

(11) onde: tm > 0 representa o custo de transferência, por unidade de valor segurado, do beneficiário médio, definido em (10); pos

d” representa o prêmio, por unidade do valor segurado, líquido de tm, onde pos

d” = h(f2e); pos

d é definido conforme o problema 4; e por hipótese, o benefício extraído, pelo segurado, de uma unidade de valor segurado é superior ao custo de produção e ao custo de transferência24.

d) com base no exposto em (9), em conjunto com as regras de portabilidade de carência, e dada a diferenciação na qualidade dos prestadores de serviço, presentes na região R, pode-se imaginar que o

Page 58: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

beneficiário médio poderia melhorar de situação, uma vez que a nova regra, em casos particulares, pode garantir ao segurado, um benefício adicional (ba) na substituição desses contratos, entretando, essa situação poderá causar uma distorção nos preços relativos, conforme demonstrado abaixo;

e) como o beneficiário pode estar em desequilíbrio, de acordo com (9), e como ue(x) >> 0, então, o segurado poderia melhorar de situação substituindo o plano de origem (de menor valor segurado esperado e de menor prêmio, p1) por outro (de maior valor segurado esperado e maior prêmio, p2), em determinados casos, respeitados os requisitos de tipo compatível e faixa de preço;

f) porém, essa ação do beneficiário poderá aumentar a frequência de utilização de eventos mais onerosos, provocando um aumento do gasto realizado para um nível superior àquele esperado anteriormente pela OPS25, conforme Gráfico 4, pelos seguintes motivos:

1) em primeiro lugar, no cálculo do

prêmio a ser pago pelo segurado, no plano de destino, estava implícita a existência do custo de transferência, tm > 0, isto é, a eficácia da regra da carência; de (11), a eliminação desse custo – dentro da mesma faixa de preço –, dada pela regra de portabilidade, poderia ser vista como equivalente à redução arbitrária do preço do plano de destino, o que pode produzir um aumento da frequência de utilização de serviços mais onerosos; de (6.b), esse aumento da probabilidade engendraria, para a OPS do plano de destino, um “novo prêmio” (p2n) superior a p2, isto é, p2n > p2, o que certamente acontecerá para os “futuros beneficiários”, aqueles que ainda não contrataram esse plano;

2) em segundo lugar, pelo ótica da OPS, nada garante que o valor presente do prêmio, p2, recebido pela OPS, na contratação do plano de destino – ao longo do período máximo de três anos previstos na RN nº 186/09 – seja superior ao valor presente do aumento do gasto realizado por esta OPS; com efeito, existem diversos serviços cujos custos de utilização, para a OPS, podem ser muito superiores a essa “receita adicional”;

3) em terceiro lugar, pela ótica do beneficiário, nada garante que, ao longo do período máximo de carência, o valor presente da diferença entre os prêmios p2 e p1, custo adicional (ca), seja superior ao benefício adicional (ba) para o segurado, o qual pode ser definido como: ba = tm + bL, (12)

onde tm é definido conforme (11) e bL representa o valor presente do benefício líquido esperado pelo segurado, o qual é definido pela diferença entre os valores presentes dos benefícios auferidos na utilização dos prestadores de serviço de melhor qualidade (plano de destino) e de menor qualidade (plano de origem); neste caso, haveria o incentivo para que o beneficiário substituísse o plano de origem pelo de destino e, com probabilidade πm, utilizasse os serviços mais onerosos; porém, isto pode significar, conforme a inequação (10.1), que a OPS do plano de destino estaria incorrendo em lucro líquido esperado (receita adicional - gastos adicionais esperados) negativo, o que produziria uma ação de racionamento, por parte da OPS, por meio do aumento dos prêmios para os novos contratos e/ou da redução dos valores segurados esperados conforme explicação dada no ponto “b`”, que representa uma posição final de equilíbrio inferior àquela dada no ponto “a” do Gráfico 3. Assim, caso houvesse uma alteração dos custos

unitários esperados dos insumos, produzida por uma elevação da probabilidade de ocorrência de determinados eventos, a OPS estaria incorrendo, no ponto (b’’), em gastos esperados mais elevados desses serviços, relativamente aos demais fatores produtivos, conforme o deslocamento do ponto (a’’) para o ponto (b’’) no Gráfico 4. Esse fato pode ser explicado, por exemplo, devido à maior frequência na utilização de prestadores de serviço de maior qualidade e custos mais elevados26. Tal situação provocaria uma oferta ótima do valor segurado inferior àquela da situação inicial.

Como verificado acima, somente no ponto “a” do Gráfico 2 há um equilíbrio de mercado sustentável no sentido de que a OPS e o segurado estariam fazendo suas escolhas ótimas dadas suas restrições, os estados da natureza e a regra de carência. Ademais, alguns fatores podem interferir no (des)equilíbrio, seja na produção, seja na demanda. A seguir será analisado o impacto econômico da RN nº 186/2009, em particular, se essa regra contribui para eliminar e/ou reduzir o problema de custo de transferência do segurado e como ela pode afetar o bem-estar social.

Verifica-se que, em diversos casos, a atual regra é inócua. Observa-se também que ela pode não ser eficaz em eliminar e/ou reduzir o custo de transferência sem afetar negativamente o equilíbrio de mercado, exceto no caso da solução trivial. Ademais, caso o consumidor tenha um aumento na sua renda (nominal/real), a aplicação simultânea dos requisitos de

Page 59: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

tipo compatível e de faixa de preço não permitiria que ocorresse uma melhoria de pareto, isto é, que o segurado melhorasse de situação sem que fosse reduzida a produção ótima da OPS, deslocando-se para um nível de utilidade superior, o que corresponderia, no Gráfico 2, na mudança do ponto “a” para o ponto “d”.

Diante do exposto, dada a racionalidade do consumidor e dada a existência de assimetrias de informação presentes nesse mercado, verifica-se que a regra atual de portabilidade de carência, além de ter a possibilidade de produzir uma distorção nas decisões alocativas dos agentes econômicos, causando uma perda de bem-estar para o segurado, pode não ser eficaz para a redução/eliminação do custo de transferência – exceto no caso da solução trivial.

Assim, a resposta às perguntas de 1 a 5 – formuladas anteriormente na seção “Das Regras de Portabilidade de Carência Estabelecidas pela RN nº 186/2009” – pode ser assim resumida: Não. Considerando a racionalidade do consumidor e a ausência de assimetria de informação e verifica-se que a única solução é a trivial pjs

d = posd*, dado Xx

* = Xx#;

assim, tal regra pouco ou nada contribuirá para a redução do custo de transferência.

Portanto, verifica-se que a iniciativa da ANS é extremamente importante, relativamente à intenção de estabelecer de normas que visem à melhoria do bem-estar social no setor de planos de saúde. Porém, faz-se necessário o aprimoramento da regra de portabilidade de carência, atualmente em vigor no País, a fim de que seu objetivo principal – reduzir e/ou eliminar o custo de transferência – seja alcançado de forma eficaz, sem promover distorções nas decisões alocativas dos agentes econômicos, produzindo um efeito líquido negativo sobre o bem-estar social.

CONCLUSÃO E SUGESTÕES DE APRIMORAMENTO DA RN Nº 186/2009

Este trabalho procurou avaliar a eficácia da regra de

portabilidade de carência estabelecida pela ANS e seu respectivo impacto no bem-estar social. Apesar do avanço nessa matéria proporcionado pela elaboração da RN nº 186/2009, esta regra prevê diversos requisitos no momento do exercício do direito ao exercício da portabilidade da carência que, sob a ótica da dinâmica da eficiência na produção (OPS) e da eficiência nas trocas (beneficiário), interferem nas decisões alocativas desses agentes econômicos.

Conforme demonstrado no presente trabalho, verifica-se que, em diversos casos, a atual regra é

inócua; em outros, produz um problema de seleção adversa intra faixa de preço. Observa-se também que essa regra de carência, em diversos casos, não é eficaz para eliminar e/ou reduzir o custo de transferência sem afetar negativamente o bem-estar do consumidor, exceto no caso da solução trivial27. Ademais, caso o indivíduo tenha um aumento na sua renda (nominal/real), a aplicação simultânea dos requisitos de tipo compatível e de faixa de preço não permitiria que ocorresse uma melhoria de pareto, isto é, que o segurado melhorasse de situação sem que fosse reduzida a produção ótima da OPS.

Antes da apresentação das sugestões, alguns esclarecimentos precisam ser feitos. Primeiro, apesar de algumas dessas propostas estarem baseadas na experiência internacional e na presente análise, deve-se considerá-las como de caráter preliminar, necessitando uma análise mais precisa. Segundo, essas regras visam eliminar e/ou reduzir o problema de assimetria na substituição entre planos de saúde sem causar problemas de seleção adversa, bem como o problema de job-lock28.

Sem prejuízo das demais regras estabelecidas na RN nº 186/2009, essas propostas podem ser divididas da seguinte forma:

1) institutir a portabilidade de carência somente

para aqueles grupos de benefícios do plano de origem, caso este possua as dimensões “tipo compatível” e/ou “faixa de preço” inferiores àqueles do plano de destino;

2) caso o plano de origem seja classificado como “tipo compatível” e/ou “faixa de preço” inferiores àqueles do plano de destino, relativamente à sua rede credenciada/referenciada (própria ou não), e a critério da OPS do plano de destino, pode-se admitir duas possibilidades para a portabilidade de carência:

2.1) utilização imediata da rede da OPS do plano

de destino; nesse caso, os beneficiários deveriam apresentar alguns dados: a) rede de prestadores de serviço do plano de origem; b) histórico de utilização; etc;

2.2) relativamente aos prestadores de serviço do plano de destino que não estão compreendidos na rede de prestadores do plano de origem, estabelecer uma carência reduzida na sua utilização; nesse caso, a OPS do plano de destino compromete-se a cobrir a utilização naqueles prestadores constantes da rede prevista no plano de origem até o término desse período;

Page 60: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Principais Vantagens: a) reduzir o problemade job-lock; e b) assegurar que o beneficiário titular/dependentes possam continuar cobertos caso o

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NOTAS

1 Este trabalho expressa unicamente as opiniões do autor.2 Santos (2008, p. 16).3 De acordo com o Caderno de Informação da Saúde Suplementar de dezembro de 2008, aproximadamente 24%

dos 8,5 milhões de beneficiários de planos de saúde de assistência médica individual/familiar, existentes em dezembro

de 2008, possuíam contratos antigos, isto é, pelo menos, 2 milhões de beneficiários não são elegíveis por esta regra.4 Neste aspecto, faz-se necessária a diferenciação entre duas importantes definições: abrangência geográfica de

cobertura – vista sob a ótica do regulador desse setor (ANS), principalmente na questão da segurança, para o

titular do plano de origem (plano coletivo) cesse seuvínculo empregatício por algum motivo (dispensa,troca de emprego, morte, invalidez, etc.).

Page 61: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

beneficiário, em relação à existência em determinada região da prestação do serviço especificado no contrato; e

dimensão geográfica – vista sob a ótica de definição do mercado relevante, conforme especificada em Santos (2008) e

pelo Guia de Análise Econômica de Atos de Concentração Horizontal, principalmente no seu parágrafo 30.5 De acordo com a metodologia definida em Santos (2008).6 Vide Instrução Normativa IN 19, de 3 de abril de 2009, para maiores detalhes sobre essa amplitude.7 Colombo e Tapay (2003).8 Canada Health Act, 1984.9 Health care in the United States, disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/

Health_care_in_the_United_States>. Acesso em: 12/8/2008.10 Madrian (1998, p.27).11 Esta análise será restrita ao mercado de planos privados de assistência à saúde individual/familiar. Todavia, a

mesma pode ser generalizada para que seja compreendido também o mercado de planos privados coletivos de

assistência à saúde.12 Dado o objetivo desta análise, sem perda de generalidade, supõe-se que o consumidor não tem a possibilidade

de influenciar a probabilidade de ocorrência dos sinistros, isto é, a OPS não incorre no problema Principal-Agente (risco

moral) e pode oferecer uma cobertura total do risco envolvido. Ademais, supõe-se a não existência do problema de

seleção adversa.13 Neste caso, considerando somente a parte crescente da curva de custo marginal, isto é, d2CT(.)/dCe2 > 0.14 Neste caso, considerando-se os preços e a quantidade dos insumos, a variação da probabilidade implica em um

deslocamento da curva de custo marginal “para cima e para a esquerda”. Mas por que (como) a probabilidade poderia

ser alterada? Apesar de a maioria dos problemas de escolha do consumidor, em um ambiente de incerteza, depender

de probabilidades subjetivas, segundo a Lei de Bayes, o consumidor racional deveria atualizar suas probabilidades à luz

das evidências. Assim, tanto a função utilidade como as probabilidade subjetivas podem ser derivadas a partir do

comportamento observado do indivíduo, desde que esse processo de escolha siga determinados axiomas. Como a

probabilidade objetiva é calculada a partir das frequências observadas, uma alteração na tendência dessa última variável

provocará uma mudança na primeira. Vide Varian (1992, p. 190-192).15 De forma geral, pode-se definí-la como uma função de distribuição cumulativa , a fim de não excluir a

priori a possibilidade de existência de um conjunto de alternativas discretas.16 O consumidor representativo (segurado) preocupa-se não somente com os valores líquidos recebidos da

seguradora (payoffs), mas também com os prováveis estados da natureza que podem engendrar alguma perda na sua

saúde.17 Esses cenários se aplicam mesmo se for levado em consideração o problema Principal-Agente (risco moral) e/ou

o problema de seleção adversa. No caso de risco moral, a seguradora estaria disposta a ofertar uma cobertura parcial,

ou seja: Xx## < Xx

#. Assim, bastaria substituir Xx# por Xx

## nos cenários A, B e C. No caso de seleção adversa, a

seguradora estaria disposta a ofertar dois tipos de contratos (supondo somente dois tipos de beneficiários): o primeiro

com cobertura total, Xx### = Xx

#, porém com um prêmio maior por unidade monetária segurada; o segundo com

cobertura parcial, Xx#### < Xx

#, e com um prêmio menor. Como no caso do risco moral, bastaria substituir Xx# por

Xx### ou por Xx

#### nos cenários A, B e C.18 De fato, esta situação não é difícil de acontecer, uma vez que a hipótese inicial de que não há assimetria de

informação pela ótica do beneficiário (hip9) é raramente verificada na prática. Ademais, dada a restrição orçamentária do

beneficiário, Xx# pode ser maior do que Xx

*, o que implicaria que a escolha ótima dele no ponto “a” do Gráfico 2 não

fosse ótima quando levados em consideração seus estados da natureza.19 O custo de transferência pode ser representado monetariamente como sendo o valor presente do fluxo de

pagamento mensal dos prêmios do plano de origem ao longo do período máximo de carência do novo plano –

normalmente dois anos –, contados a partir da aquisição desse plano (de destino).

Page 62: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

20 Esta situação pode ser observada nos seguintes cenários: a) para os beneficiários que já possuem a s-ésima

modalidade contratada, a OPS poderá realizar algumas ações que podem engendrar um valor segurado esperado

menor, por exemplo: a.1) substituir prestadores de serviço de melhor qualidade e custos maiores por outros de

qualidade/custos inferiores; a.2) fixar maiores controles de acesso; etc; b) para os planos que ainda não foram

contratados, a OPS poderá: b.1) aumentar seus prêmios em decorrência do aumento do gasto realizado; e b.2)

realocar prestadores de serviço de melhor qualidade para contratos com prêmios superiores àqueles relativos aos

planos nos quais esses prestadores faziam parte da rede credenciada/referenciada (própria ou não).21 Este problema pode ser descrito da seguinte forma: como determinado agente econômico (Principal) pode agir

para que o outro (Agente) haja da forma desejada pelo primeiro, a qual engendra um custo para o Agente? Este

problema surge, normalmente, nas relações entre o Agente e o Principal, nas quais este contrata o primeiro, porém o

Principal não possui total controle sobre as ações do Agente, isto é, o Principal não consegue observar o conjunto de

informações sobre os custos e/ou as ações do Agente. Em geral, o problema de o Principal não conseguir observar o

conjunto de informações sobre as funções custo/utilidade do Agente, antes da assinatura do contrato, é chamado de

Hidden Information e o problema de o Principal não conseguir observar diretamente as ações do Agente, durante o

período do contrato, é chamado de Hidden Action.

Para uma leitura sobre estes temas, vide: Perloff (2005, p. 414), Stiglitz (2000, p. 202) e Varian (1992, p. 440-469).22 Por exemplo, o cenário A. Ver Ledo (2005).23 Ver Mas-Colell et al. (1995, p. 395-397).24 Esta hipótese é necesssária para excluir a possibilidade de o beneficiário não desejar nenhum dos planos.25 Repare que, relativamente à OPS do plano de destino, a recepção de um novo beneficiário neste caso

(substituindo o plano de origem) possui condições distintas daquelas verificadas quando o segurado faz sua primeira

contratação: em nenhuma das duas situações a OPS tem a possibilidade de observar o conjunto de informações sobre

o seu “futuro beneficiário”, o que suscita o problema de seleção adversa. Porém, no primeiro caso, a OPS não pode

utilizar a regra da carência como um mecanismo de screening na sua carteira, enquanto que no segundo, a OPS

consegue utilizá-la.26 Essa situação, para a operadora, é semelhante ao problema de seleção adversa, porém, neste caso, por força da

regra de portabilidade de carência, ela não poderá impedir a utilização de determinado serviço.27 De acordo com as declarações do atual presidende da ANS, em artigo publicado no jornal Valor Econômico, de

11 de junho de 2010, p. B1, houve um fracasso no primeiro ano da portabilidade, período no qual apenas 1,2 mil

pessoas trocaram de operadora.28 Falta de incentivos para que determinado empregado mude de emprego devido à possibilidade da perda (total

ou parcial) de seus benefícios.

Thompson da Gama Moret Santos, mestre em Economia pela EPGE/FGV/RJ, integra a carreira de Especialista em

Políticas Públicas e Gestão Governamental.

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A aplicação dos dados

demográficos na

regularização fundiária da

Amazônia Legal: desafios e

perspectivas

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Por Pedro Assumpção Alves e Thiago Batista Marra

Qual a importância do trabalho de regularização fundiária, em curso no Ministério do Desenvolvimento

Agrário, para a prevenção e solução dos principais conflitos ambientais e sociais da região Amazônica?

Até que ponto a realidade amazônida está expressa nos bancos de dados das instituições que tratam

da gestão de terras no Brasil? Qual a utilidade das informações demográficas para captar o dinamismo

das ocupações em terras públicas? Até que ponto os dados dos Censos Agropecuários podem ser

comparados aos demais dados oficiais para compor a realidade amazônida? Esses e outros

questionamentos dão o Norte do presente artigo, que busca demonstrar a estratégia e a metodologia

do Ministério do Desenvolvimento Agrário ao utilizar a Contagem Populacional e o Censo Agropecuário

de 2006 no trabalho de regularização fundiária da Amazônia Legal.

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A aplicação dos dados demográficos na

regularização fundiária da Amazônia Legal:

desafios e perspectivas

INTRODUÇÃO

Um dos principais desafios para a construção de umaestratégia de desenvolvimento para a região amazônica éo ‘anacronismo de sua estrutura fundiária’1. Pode-se dizerque esse é um problema que permeia todo o territórioamazônico, não obstante a enorme diversidade regionalque caracteriza essa porção do território brasileiro2.

Um sintoma de tal anacronismo pode ser apontadocomo o desencontro das bases de dados disponíveis nosdiferentes órgãos e instituições que tratam da gestão deterras nesta região. Dessa forma, é possível afirmar queexiste um quadro do panorama fundiário presente emcada um dos órgãos que tratam do tema, que raras vezescoincide com os demais.

O Censo Agropecuário de 2006 trouxe importanteselementos para uma melhor compreensão dessaproblemática. Este texto busca apresentar um quadrogeral das principais dimensões da questão fundiária naAmazônia Legal, com o objetivo de apresentar a estratégiado Ministério do Desenvolvimento Agrário na utilizaçãodos dados do Censo Agropecuário de 2006 como um dosprincipais subsídios para planejar o início do hercúleoempreendimento da regularização fundiária de ocupaçõesem terras públicas.

Por essa razão, é importante destacar que o objetivodo presente trabalho é contribuir para a agenda depesquisa que trata do tema fundiário, a partir da exposiçãodas presentes estratégias do governo federal paraenfrentar o problema, ressaltando a importância dautilização dos dados coletados no Censo Agropecuário de2006 para o planejamento desse processo.

Sendo assim, busca-se expor a forma como tais dadosforam assimilados pelo programa de regularizaçãofundiária, com o intuito de que, no decorrer do debateacadêmico, novas contribuições possam ser apreendidase incorporadas a essa metodologia.

Para alcançar esse objetivo este trabalho foi divididoem cinco seções, sendo esta pequena introdução aprimeira. A segunda parte trata de uma breve exposiçãosobre a dimensão social do desafio da regularizaçãofundiária Amazônica, a partir do histórico da ocupaçãoantrópica na Amazônia Legal.

A terceira parte aborda o ambiente institucional da gestãofundiária na Amazônia. Essa seção é enfocada naorganização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma

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Agrária (INCRA), abordando o funcionamento do SistemaNacional de Cadastro Rural e sua atual base de dados.

A quarta parte trata especificamente da contribuiçãoda base de dados coletados pela Fundação InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística (FIBGE), no decorrer doCenso Agropecuário de 2006, para a estruturação doinicio dos trabalhos de regularização fundiária naAmazônia Legal. Vale destacar que esta seção do textoreserva um espaço dedicado à descrição da metodologiaempregada pelo MDA, especialmente na compatibilizaçãodos dados disponibilizados pelo IBGE com as demaisfontes de dados que tratam do tema fundiário naAmazônia.

Por fim, a última parte deste trabalho aborda o atualprograma de regularização fundiária (Programa TerraLegal) como importante ferramenta para buscar amitigação e solução de parte dos conflitos sociaisexistentes nessa região.

DIMENSÃO SOCIAL

A dimensão social do desafio de executar umprograma de regularização fundiária na Amazônia Legalpode ser classificada como a mais aguda e de difícilsolução. É importante ressaltar que a Amazônia seconstitui em um mosaico de situações, com enormediferenciação regional (e local). Não obstante, é possívelentender grandes padrões de ocupação e exploração naregião, que estabelecem, em linhas gerais, as principaisquestões a serem enfrentadas.

Na dinâmica de ocupação da Região Amazônica nasegunda metade do século XX, ocorrem dois processosdistintos (CARDOSO, 2002; BECKER, 2005; AB’SABER,2005). A primeira fase pode ser caracterizada por umaexpansão da ocupação da Amazônia capitaneada porgrandes investimentos federais, por meio da criação deestrada, incentivos fiscais, e grandes projetos deexploração mineral, agrícola3 e hidroelétrico.

Nessa fase, predominaram migrações provenientes dediferentes partes do Brasil em direção à Amazônia. Dentrode um contexto em que as frentes de expansão selocalizavam principalmente nas três grandes artériasrodoviárias (Belém-Brasília, Brasília-Cuiabá eTransamazônica) a tradicional conectividade entre osnúcleos populacionais, a partir da rede de transportefluvial, alterou-se para uma conectividade rodoviária.

Nessa fase, a ocupação populacional foi planejada apartir de um paradigma de criação de uma hierarquiaentre os assentamentos populacionais. Deveriam sercriados novos pólos a partir das cidades existentes,contando que, a partir da nova conectividade portransporte rodoviário, essas cidades comandariam as vilascriadas ao longo das novas rodovias, que, por sua vez,dinamizariam comunidades rurais mais afastadas4

(CARDOSO, 2002).A segunda fase de ocupação da Amazônia delineia-se

a partir da crise fiscal pela qual passou o Estado brasileirono decorrer dos anos de 1980. Nessa fase, os grandesplanos de investimento federal vão sendo paulatinamenteabandonados e a expansão das frentes de ocupaçãopassa a ser comandada por “madeireiras, pecuaristas esojeiros já instalados na região, que a promovem comrecursos próprios” (BECKER, 2005, p. 81). Por essa razão,entende-se que a dinâmica recente de expansãopopulacional e de aumento da complexidade da redeurbana da região apresenta impulso endógeno. Dessaforma, os movimentos migratórios predominantes, a partirde 1980, passam a ser intrarregionais, entre os Estados daregião, e com uma grande dimensão de movimentos nosentido rural-urbano.

Vale ressaltar que a característica de ‘agriculturaitinerante’, observada por Celso Furtado, ainda é válida,

A dimensão social do desafiode executar um programa deregularização fundiária naAmazônia Legal pode serclassificada como a maisaguda e de difícil solução. Éimportante ressaltar que aAmazônia se constitui emum mosaico de situações,com enorme diferenciaçãoregional (e local).

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A aplicação dos dados demográficos na

regularização fundiária da Amazônia Legal:

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mas a dinâmica geral do movimento de ocupação foialterada.

O aumento das migrações do tipo rural-urbano foifruto da contraposição entre dois modelos de uso da terrae dos recursos florestais (BECKER, 2005; CARDOSO, 2002).De um lado, o modelo que caracteriza a agricultura familiardo tipo minifundista e o modo de vida das populaçõestradicionais; de outro, o modelo capitaneado pelaexpansão da agroindústria da soja, dos grandespecuaristas e das madeireiras, cuja posse da terra pode sercaracterizada como de tipo latifúndio5. A principalconsequência deste quadro é a importante evasãopopulacional6 de comunidades rurais e de pequenas vilasem direção a cidades e vilas de maior porte, que acabaramadquirindo status de município. Como demonstra oGráfico 1.

Outro ponto importante a ser destacado é que aforma de uso do solo se alterou no decorrer desteperíodo, mudando a correlação entre a dinâmica deocupação humana e a pressão sobre os recursosflorestais. No Gráfico 2, pode-se observar que no decorrerdo período de 1988 a 2008, a pressão sobre os recursosnaturais, expressa na taxa anual de desmatamento,apresenta um movimento senoidal, com pouquíssimarelação com os dados apresentados no Gráfico 1, quetrata do crescimento da população. Sendo assim,corrobora-se a afirmação de que o dinamismo dodesmatamento na região (uma das principais agendas do

Gráfico 1 – População Urbana e Rural Residente nas Unidades da Federação que formam aAmazônia Legal

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governo federal na Amazônia) não é mais ditado pelocrescimento demográfico (HOGAN; D’ANTONA; CARMO, 2007).

Pode-se dizer que essa mudança acirrou os conflitosque giram sobre o direito ao uso e ocupação da terra,colocando em foco a multiplicidade de atores/agentessociais na região (indígenas; populações tradicionais;ocupantes fruto de colonização induzida; assentados dereforma agrária; grileiros; madeireiros; produtores de soja;pecuaristas; etc., De qualquer forma, o exercício a serrealizado na análise da dimensão social dos desafios àregularização fundiária deve ser centrado nas formas deinserção econômica desses agentes, bem como a formade reprodução social destes grupos.

Dentro do novo foco dado aos atores sociais naregião, Carlos Guedes7 chama a atenção para apossibilidade de visualizar a ascensão de um grupoformado pelos agricultores ‘médios’, ou seja, aqueles quenão se constituem nem como latifundiários, nem comoagricultores minifundistas. São agricultores e pecuaristasque ocupam uma porção de terra maior do que aquelacaracterística do minifúndio, contudo compartilham decarências de assistência técnica e extensão rural, logística,acesso ao crédito e comercialização, agenda essa quetambém é da agricultura familiar. A recente discussãosobre o reconhecimento dos direitos de ocupações emterras públicas deve levar este ponto em consideração.

Por outro lado, no que se refere à dinâmica deocupação do solo, é importante ressaltar o papelprogressivo da ‘especulação imobiliária’ nesse processo.Em um artigo publicado em 1991 (p.1), Fearnside jáchamava a atenção para este ponto, quando afirmava que“a pecuária bovina toma a maior parte das terrasdesmatadas na Amazônia”, no entanto, “a produção decarne bovina é baixa, mas o papel das pastagens naespeculação fundiária acelera o processo dodesmatamento”.

Essa exposição reflete o imbróglio institucional queincide sobre a Gestão de Terras na Amazônia, cujoresultado mais aparente é a falsa ideia cultivada na região,em que a degradação florestal se constituiu como umadas principais ferramentas para a comprovação da possee exploração da terra.

DIMENSÃO INTERINSTITUCIONAL

A dimensão interinstitucional é estreitamente ligada àfalta de coordenação do aparato burocrático do Estadobrasileiro, sendo a principal causa da insegurança jurídicanessa região. Pode-se dizer que ela também é resultado deuma atuação insuficiente (ou ineficiente) do Estado naAmazônia. De qualquer forma, a principal questãorelacionada a essa problemática é a multiplicidade de

Gráfico 2 – Desmatamento na Amazônia, acumulado anual, período 1988–2008, km²

Fonte: INPE, PRODES, www.inpe.br, acesso em 15/10/09.

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A aplicação dos dados demográficos na

regularização fundiária da Amazônia Legal:

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ações, que vislumbraram cumprir diferentes objetivos,muitas vezes antagônicos.

É correto afirmar que até os anos 1960, a maior partedas terras da Amazônia pertencia à União e aos Estados. Aforma de ocupação e uso do solo, majoritariamente,estava caracterizada por terras públicas não tituladas,ocupadas por posseiros.

A partir de meados da década de 1960, a ocupaçãoantrópica da Amazônia passa a integrar a agenda dosgovernos militares. Nesse contexto, a Lei nº 4.504/1964cria o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA) e oInstituto Nacional de Desenvolvimento Agrícola (INDA).

Em 9 de julho de 1970, o Decreto nº 1.110 criou oInstituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária(INCRA), resultado da fusão do IBRA com o INDA. A partirde então, essa autarquia passa a ser a principal entidaderesponsável pela gestão de Terras no Brasil e, portanto, naAmazônia. É importante destacar que a regularizaçãofundiária não era o principal foco da atuação dessaautarquia, que foi marcada por uma sequência dereformas e interrupções, tanto em sua estrutura funcional,quanto em suas prioridades de atuação8.

No início da década de 1980, o acirramento dosconflitos pela posse de terra, na Região Norte do País,aliado a uma crescente organização dos movimentossociais, levou a criação do Ministério Extraordinário paraAssuntos Fundiários e dos Grupos Executivos de Terras doAraguaia/Tocantins (GETAT), e do Baixo Amazonas(GEBAM). Pode-se dizer que essa foi a primeira tentativa defocalizar a atuação do INCRA na regularização fundiária.

Contudo, a vida destes Grupos Executivos foi curta,visto que o INCRA acaba sendo extinto em 1987, pelogoverno José Sarney, que passa suas atribuições para oMinistério da Agricultura, após a extinção do Ministério deReforma Agrária e Desenvolvimento (MIRAD). Vale ressaltar,que neste momento a regularização fundiária passa para osegundo plano, e o enfoque da atuação dos órgãos degestão de terras volta-se para o esforço de ampliar osprogramas de ‘reforma agrária’.

Em 1989 o INCRA é recriado pelo Congresso Nacionale vinculado à Presidência da República. Posteriormente,em 1996, passa a vincular-se ao Ministério Extraordináriode Política Fundiária. Este Ministério, por sua vez, acabousendo extinto, resultando na criação do Ministério doDesenvolvimento Agrário, ao qual o INCRA está vinculado,a partir da edição do Decreto nº 3.338 de 2000. Os

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primeiros nove anos da atuação do INCRA, vinculado aoMinistério do Desenvolvimento Agrário também forammarcados pelo maior enfoque na reforma agrária,deixando a regularização fundiária em segundo plano.

A edição da Medida Provisória nº 458, de fevereiro de2009, e sua converção na Lei nº 11.952, de junho de2009, marcam a iniciativa de tentar focalizar o trabalho deregularização fundiária como uma das ações prioritáriasdo INCRA. Para alcançar tal objetivo, foi criada umaengenharia de gestão, em que o Programa Terra Legal écoordenado diretamente pelo Ministério doDesenvolvimento Agrário9 e executado pelaSupertintendência Nacional de Regularização Fundiária naAmazônia Legal. A organização proposta para a execuçãodos trabalhos de regularização fundiária difere datradicional estrutura do INCRA. Isso pelo fato de seconstituir por uma estrutura de comando centralizada, emque os servidores lotados nas diferentes Unidades daFederação estão subordinados a escritórios regionais, e,não a superintendências regionais10. Resta saber se essanova configuração da estrutura executiva será dotada derecursos físicos e humanos para levar a cabo o trabalhoque se propõe.

Este breve quadro lança luz sobre a descontinuidadedo processo histórico de regularização fundiária, emespecial, o da regularização fundiária na Amazônia. Aliadoa esse panorama histórico, é importante ressaltar que naatual estrutura organizacional do Estado brasileiro, a Uniãoe os Estados apresentam uma série de órgãos que tratamda gestão de terras nessa região, dentre as quais:Fundação Nacional do Índio (FUNAI); Instituto ChicoMendes de Conservação da Biodeversidade (ICMBio);institutos de terras estaduais; cartórios e tabelionatos deRegistro Civil; entre outros.

Entre essas instituições, vale destacar a situaçãoespecífica dos cartórios e tabelionatos de Registro Civil,que, apesar de instituições do Direito Privado, exercemfunção de utilidade pública. Não são raros os casos decartórios que apresentam registro de imóveis quesuperam em muito a área de sua comarca. Outra questãoque também envolve os cartórios é a falta de um sistemaque interligue as bases de informações das diferentescomarcas, permitindo o registro de um mesmo imóvel emdiferentes cartórios, levando a duplicidade de informações.Por fim, vale ressaltar o fato de que os cartórios etabelionatos de Registro de Imóveis são órgãos regulados

pelo Poder Judiciário, o que, via de regra, torna inviável acorreção de registros cartoriais que não condizem com osdados registrados no Sistema Nacional de Cadastro Rural(SNCR) pela via administrativa11.

O principal ponto a ser ressaltado do atual arranjoinstitucional concertado sobre o tema da gestão de terrasno Brasil é o de que não existe uma base de dadosunificada para consulta de tais órgãos, fato que culmina nasobreposição espacial de informações e destinações.

A consequência mais aparente desse problema é aincerteza sobre os números que envolvem a Amazônia:não se sabe qual o volume de terras já titulado em nomede particulares; não se sabe com exatidão qual o volumede unidades de conservação na região, nem sua posiçãogeográfica; em menor grau, tem-se o mesmo problemacom as terras indígenas; grande parte dos projetos deassentamento não tem sua posição geográfica bemdefinida. Sendo assim, não é certo o montante (área) deterras públicas que será objeto do Programa deRegularização Fundiária (grifo do autor).

Dessa forma, é mister ressaltar a necessidade derepensar e redesenhar o fluxo de informações entre asinstituições afetadas e envolvidas na gestão de terras12.Iniciativas como o Plano Amazônia Sustentável (PAS) e oMacrozoneamento Ecológico Econômico da AmazôniaLegal (MacroZee) devem ser acompanhadas de perto pelo

A consequência mais

aparente desse problema é a

incerteza sobre os númerosque envolvem a Amazônia

(...) Sendo assim, não écerto o montante de terraspúblicas que será objeto doPrograma de RegularizaçãoFundiária

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A aplicação dos dados demográficos na

regularização fundiária da Amazônia Legal:

desafios e perspectivas

núcleo de decisão dos governos, para que existacoerência nas iniciativas empreendidas pelos diferentesórgãos na estratégia de desenvolvimento da Amazônia.

O Sistema Nacional de Cadastro Rural

Pode-se dizer que o Sistema Nacional de CadastroRural (SNCR) foi uma das principais iniciativas do governofederal no sentido de alcançar uma base de dadosconfiáveis para a gestão de terras no Brasil.

O Cadastro de Imóveis Rurais foi criado, pelodenominado Estatuto da Terra em 1964, pela Lei nº4.504/1964, com o foco de dar maior capacidadeexecutiva para as ações de Zoneamento Agrário, Políticasde Reforma Agrária, de Desenvolvimento Agrário e deTributação da Terra.

No ano de 1972, buscando aprimorar a capacidade detributação do Estado, é criado o SNCR, com apromulgação da Lei nº 5.868/1972. A partir da criação doSNCR foram efetuados quatro esforços derecadastramento de imóveis rurais, nos anos de 1972,1978 e 1992 e 2008.

Em 2001, o foco de atuação do SNCR ganha maiorescopo, e a gestão das terras passa a se configurar comoum de seus principais objetivos, a partir da promulgaçãoda Lei nº 10.267/2001. Assim sendo, o SNCR passa abuscar maior interface com as informações contidas nosServiços de Registro Imobiliário. É criado o Sistema Públicode Registro de Terras, estabelecendo um vínculo entre oSNCR (INCRA) e o registro imobiliário (sistema cartórios).Além disso, passam a ser exigidas as plantasgeorreferenciadas do imóvel rural para a efetivação dequalquer transação imobiliária no sistema cartorário.

Dessa forma, o atual SNCR apresenta uma estruturaque tenta cumprir quatro objetivos principais13:

• Caracterização do domínio e uso da terra(incluindo títulos de domínio, natureza da posse,localização geográfica, área com descrição das linhasde divisas e nome dos respectivos confrontantes,dentre outras);

• Identificação e o grupamento dos váriosimóveis rurais que pertençam a um único proprietário;

• Certificado de Cadastro de Imóveis Rurais(documento expedido pelo INCRA e que não faz provade propriedade ou de direitos a ela relativos);

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• Classificação fundiária – imóveis passíveis deintervenção para correção do regime de uso e posseda terra.

Contudo, é importante ressaltar que a implementaçãodas alterações legais efetuadas pela Lei nº 10.267/01esbarraram em problemas estruturais e institucionais doSNCR. Em primeiro lugar, toda a base de cadastrosconstantes no SNCR antes de 2001 não apresentavadados da localização espacial dos imóveis, impossibilitandoo posicionamento geográfico de tais imóveis, bem como adefinição de seus limites.

Via de regra, o recadastramento de imóveis ruraisrealizado pelo INCRA na Região Norte, apresentou baixaadesão, fato que impossibilitou a correção dos dados jápresentes na base.

As Superintendências Regionais do INCRAapresentaram baixa capacidade de execução no que serefere à certificação de plantas e memoriais descritivos,provenientes de serviços de georreferenciamentoexecutado por particulares, inviabilizando a emissãosistemática de Certificados de Cadastro de Imóvel Rural(CCIR). Por sua vez, os CCIRs são peça-chave para avinculação do SNCR com o registro de imóveis, fato quelevou à continuidade da prática de registros que nãoatendiam à legislação.

O panorama dos registros contidos no SNCR é umbom exemplo da baixa qualidade dos dados disponíveispara o início do programa de regularização fundiária.Segundo a tabulação realizada em 2003, pelaCoordenação de Obtenção, da Diretoria de OrdenamentoFundiário do INCRA, apenas 35% da área territorial daAmazônia Legal estava cadastrada no SNCR. Dessa forma,se essa base de dados fosse tomada como um reflexo darealidade amazônida, ela poderia expressar apenas umterço de sua situação fundiária.

Quando os dados da base do SNCR são agregados emnível municipal é possível observar maiores fragilidadesnesta fonte de registros:

Na Tabela 1 é possível observar a enorme lacunaexistente nos dados cadastrados no SNCR. Por um lado,15% dos municípios dessa região apresentam uma áreacadastrada que excede sua dimensão territorial. Por outrolado, mais de 50% dos municípios apresentam menos de50% de sua extensão territorial cadastrada no SNCR.

Esses dados são um exemplo da fragilidade dasinformações constantes na base de dados do INCRA parao início do trabalho de regularização fundiária naAmazônia Legal, indicando a necessidade de buscaroutras fontes de informação para o início desse esforço,dentre as quais os dados coletados no CensoAgropecuário de 2006, do IBGE.

Tabela 1 – Informações cadastradas no SNCR, agrupadas por municípios, Amazônia Legal, 2003

Fonte: Coordenação de Obtenção, Diretoria de Ordenamento Fundiário, INCRA.

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OS DADOS DO CENSO AGROPECUÁRIO DE 2006 E OTRABALHO DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

Os dados do Censo Agropecuário de 2006 foramimportantes para o planejamento do início das operaçõesdo Programa Terra Legal em diferentes aspectos. Oprimeiro motivo foi o de permitir uma crítica aos dadospresentes nos registros do SNCR, a partir daquelescoletados em uma pesquisa que teoricamente representao universo de atuação do programa.

Deve-se destacar que existem diferenças no conceitode imóvel rural14, dos dados presentes no SNCR, daquelescoletados no Censo Agropecuário de 2006, quandotratam de estabelecimentos agropecuários15.

No que se refere ao trabalho de regularização fundiáriada Amazônia Legal16, regido pela Lei nº 11.952/2009, operfil dos beneficiários do Programa Terra Legal pode serapreendido quando é utilizado o conceito deestabelecimento agropecuário. Esta informação secorrobora pelo fato de que o beneficiário deve comprovaro exercício da ocupação e exploração de forma ‘direta,mansa e pacífica’, enquanto o Censo Agropecuárioreconhece que ‘todo estabelecimento agropecuário ésubordinado a uma única administração’. Ou seja, paraestimar o número de ocupações é importante atentarque, por um lado, o conceito do IBGE leva emconsideração as áreas efetivamente ocupadas eexploradas, para definir o estabelecimento agropecuário.Por outro lado, o conceito de imóvel rural, antes dapromulgação da Lei nº 10.267/01, levava em

Tabela 2 – Condição legal das terras, Amazônia Legal, 2006

Fonte: FIBGE, Censo Agropecuário de 2006.

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consideração a área que o ocupante declarava ocupar,independente de exercer exploração e ocupação direta daárea. Sendo assim, podemos observar que há uma maiorsimilaridade com o conceito utilizado pelo IBGE.

Os dados da Tabela 2 demonstram que 7,1% (62.503),de todos os estabelecimentos agropecuários recenseadosnas Unidades da Federação da Amazônia Legal,declararam que não tinham titulação definitiva, enquantooutros 9,8% (85.445) declararam que aqueleestabelecimento era fruto de uma ocupação. Dessa forma,a partir de uma leitura simplificada, seria possível estimarque o público do ‘Programa Terra Legal’ circula em tornode 150 mil potenciais beneficiários, que ocupam uma áreade cerca de 6,2 milhões de hectares.

Por outro lado, é importante lançar algunsquestionamentos sobre esses números. Em primeiro lugar,é preciso lembrar que as informações do Censo sãodeclaratórias. Dentro de um ambiente de grandeinsegurança jurídica, é preciso refletir sobre a grandepropensão dos entrevistados em afirmar sua titularidadesobre a terra (mesmo que isso não corresponda àrealidade), levando a uma subnumeração dos dadosapresentados na Tabela 2. Outro ponto importante nestadiscussão faz referência aos projetos de assentamentoimplantados na Região Norte, cujo montante deassentados já titulados é baixo. Dessa forma, parte dosdados apresentados na Tabela 2 faz referência a essepúblico, que não é beneficiário do “Programa Terra Legal”.

Por essa razão, é preciso assumir a limitação dosdados agregados fornecidos pelo Censo Agropecuário,ressaltando sua importância como instrumento norteadorpara as políticas, mas tomando as devidas precauçõespara não incorrer em conclusões simplificadas.

Dessa forma, os dados do Censo Agropecuário de2006 foram uma fonte de informação de extremaimportância para uma preliminar delimitação do universode beneficiários do Programa Terra Legal. Contudo, osubstancial ganho trazido pelo Censo Agropecuário 2006foi a espacialização dos dados, ou seja, a associação dainformação coletada a uma coordenada georreferenciada.

Até então, as informações coletadas pelo IBGE estavamespacialmente associadas a unidades territoriaispredefinidas, geralmente divisões administrativas, e, nomáximo, setores censitários. Porém, dentro de ummunicípio, ou mesmo de um setor censitário, pode havergrandes variações de fenômenos estudados.

Do ponto de vista espacial, isso se torna muito limitadopensando no caso amazônico, onde os municípiospossuem vastas áreas. Para exemplificar as grandezas emquestão, seria possível percorrer uma distância de mais de700 km em linha reta sem sair do município de Altamira-PA, que possui quase 160 mil km² de área. Espacialmente,ter dados referentes ao município de Altamira significamuito pouco para localização desses fenômenos em suavasta área, ou seja, é um dado homogêneo para uma áreade mais de um milhão de hectares, que não conseguerepresentar suas variações internas.

Com a obtenção da coordenada georreferenciadaagregada à informação17, tornou-se possível a correlaçãodesses dados com níveis muito mais refinados delocalização. Isso quer dizer que, com um grau considerávelde precisão, estaríamos aptos a contar quantosestabelecimentos agropecuários foram identificados emum determinado projeto de assentamento, ou mesmo emtodos eles. O mesmo raciocínio é válido para domicílios, talcomo para outros temas fundiários, como unidades deconservação, terras indígenas e glebas públicas federais.

Deve-se ressaltar que tais dados não foram tomadoscomo reflexos diretos da realidade local, visto que o IBGEalertou para o elevado número de entrevistas em que acoordenada espacial não pode ser coletada porproblemas técnicos. Contudo, este foi o princípio doprocesso aplicado para avaliar quantitativa equalitativamente diferentes porções do territórioamazônico em termos de ‘domicílios’ e‘estabelecimentos’, nos diferentes tipos de domínio eocupação na Amazônia Legal.

Estes diferentes tipos de ocupação e dominialidadesforam representados pelas camadas de dadosgeoespaciais. Estas camadas contêm polígonos querepresentam, no espaço, a circunscrição de áreas sobdomínio de cada órgão que cuida de questões fundiárias.Como exemplo, a FUNAI disponibiliza em sua página naInternet uma camada indicando os limites das terrasindígenas no Brasil18. De forma análoga, foram colhidas,diversas fontes, as informações geoespaciais maisatualizadas e confiáveis disponíveis.

Cabe aqui um importante parêntese sobre aconfiabilidade/qualidade dos dados geoespaciaisfundiários disponíveis hoje no País. A informaçãogeográfica/geoespacial está diretamente associada aosmétodos de levantamento e processamento utilizados

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para originá-la e representá-la. Como as informaçõesfundiárias comumente derivam da interpretação dedocumentos antigos, produzidos a partir de técnicas delevantamento primitivas, estão sujeitas a severos desvios eimprecisões. Também é comum o uso de fontessecundárias para originar informações fundiárias, como aprática de extração de feições a partir de cartastopográficas, geralmente em escalas muito pequenas.Quando se trata da Amazônia, boa parte do territórioencontra-se mapeado apenas na escala 1:250.000,absolutamente inadequada para se trabalhar cominformações dessa natureza.

No intuito de superar essa situação, foi promulgada,em 2001, a Lei Federal nº 10.267, que institui o Certificadode Cadastro de Imóveis Rurais (CCIR), já comentadaanteriormente neste artigo. Além dos aspectos cadastrais eregistrais já abordados, o CCIR trouxe consigo umasistemática para o levantamento de imóveis rurais,especificada na Norma Técnica para Georreferenciamentode Imóveis Rurais, editada em 2003 e reeditada em 2010(Portaria INCRA nº 69, de 22/2/2010). A referida normabuscou modernizar e principalmente padronizar a formacom que a informação geoespacial representa os imóveisrurais.

A adoção desses padrões exige a utilização deequipamentos específicos e de custo considerável, etambém da aplicação de técnicas dominadas por técnicosqualificados. É importante ressaltar que foram necessáriosalguns anos até que o padrão de qualidade propostofosse efetivamente assimilado pelo mercado deprestadores de serviço, por proprietários de imóveis e pelopróprio governo. Este tem apresentado, recentemente,

Figura 1 - Esquema do Processamento de Informações Geográficas

Fonte: ESRI, 2010.

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ações no sentido de adequar a situação cadastral eregistral das terras sob seu domínio, o que pode serexemplificado pela abertura de pregões para execução deserviços de georreferenciamento de unidades deconservação sob responsabilidade do ICMBio.

Metodologia para unificação das bases de dados esobreposição aos pontos georreferenciadosfornecidos pelo IBGE

Preparação e cruzamento de dados fundiários

As informações são obtidas nas fontes oficiais (IBGE,INCRA, FUNAI, ICMBio) e inseridas em um banco de dadosque avalia a geometria das feições. Os frequentes erros degeometria são corrigidos.

As diferentes feições que representam os limitesfundiários são processadas umas em relação às outras,retornando um produto como o esquematizado abaixo:

Dessa forma, as identidades primitivas são preservadas,de forma que são somados todos os dados fundiários emuma única fonte, permitindo a identificação oagrupamento de área por município e UF e ainda aidentificação de sobreposição entre todos os temasfundiários considerados. No exemplo acima, asobreposição entre as feições G1, UC1 e UC2 passa a seridentificável e quantificável – é possível extrair ainformação de cada uma separadamente e da relaçãoentre elas. Torna-se possível responder à pergunta: qual aárea da UC1 que está na G1?

Devido à precária descrição de limites e a feiçõesextraídas de cartas topográficas com escalas pequenas,entre outros fatores, a ocorrência de sobreposições ésignificativa. Também deve ser considerada limitada ainformação de área por município/UF, já que a camada delimites municipais fornecida pelo IBGE possui uma escalamuito pequena, o que reflete diretamente nos resultados.

Preparação dos dados do Censo Agropecuário (FIBGE, 2007)

Os dados coletados no Censo Agropecuário 2007 peloIBGE, cedidos em formato shapefile, com o tipo de feiçãoponto, foram filtrados em cinco níveis:

I. Excluídos os estabelecimentos que nãofossem os agropecuários;

II. Excluídos os pontos incidentes em áreasurbanas (fonte: polígonos de localidades IBGE/SISCOMIBAMA);

III. Excluídos os tipos de logradouros queremetiam a áreas urbanizadas (Agrovila, Alameda,Aldeia, Arraial, Avenida, Bairro, Edifício, Praça,Residencial, Rotatória, Rótula, Rua, Ruela);

IV. Os domicílios foram estratificados por tipo(1= Domicílio Particular Permanente Ocupado, 2=Domicílio Particular Permanente Fechado, 3= DomicílioParticular Permanente de Uso Ocasional, 4= DomicílioParticular Permanente Vago, 5= Domicílio ParticularImprovisado Ocupado, 6= Domicílio Coletivo comMorador, 7= Domicílio Coletivo sem Morador);

V. Foi realizada uma subseleção dos dados emque havia coincidência de posição entreestabelecimentos agropecuários e domicílios,identificando os domicílios (por tipo) dentro deestabelecimentos agropecuários e os estabelecimentosagropecuários sem domicílio.

Segmentados os dados, estes são cruzados com ospolígonos processados no item 1. Dessa forma é possívelquantificar para cada parcela territorial identificada daAmazônia Legal, quantos e quais pontos do censoagropecuário incidem sobre a mesma.

A tabela de dados alfanuméricos do produtogeoespacial resultante é exportada para o formato xls,permitindo consultas fora do ambiente do Sistema deInformações Geográficas (SIG).

Aplicações

Com os dados exportados e organizados (em filtros outabela dinâmica), tornou-se possível responder,considerando as limitações das fontes dos dados, aperguntas como: Quantos estabelecimentosagropecuários existem na unidade de conservação X?Quantos domicílios incidentes em estabelecimentosagropecuários estão em glebas públicas federais nomunicípio Y? Quais glebas são essas? Qual a área delas?Qual a quantidade de área destinada de cada uma? Qual aárea não destinada?

Ou seja, o planejamento das operações e a delimitaçãodas áreas prioritárias para atuação no programa sofreramuma melhora substancial depois da agregação da base de

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pontos coletados pelo Censo Agropecuário de 2006 epela Contagem Populacional de 2007, realizados peloIBGE.

Nesse sentido, devemos ressaltar que existe grandeproximidade entre os dados apresentados na Tabela 2 e onúmero de pontos coletados no Censo Agropecuário2006, situados em glebas públicas federais não destinadas(159.040 pontos). No entanto, esses pontos só indicam ospossíveis estabelecimentos agropecuários com problemasde dominialidade que estão situados em terras públicasfederais. Ou seja, aqueles estabelecimentos agropecuáriosque apresentam problemas fundiários, e estão localizadosem terras estaduais, não estão contemplados dentro dabase de dados elaborada pelo MDA, e provavelmenterepresentam um elevado montante de estabelecimentosque declararam problemas fundiários no decorrer daaplicação do Censo Agropecuário 2006. Dessa forma,corrobora-se a afirmação de que os dados agregados,fruto dos questionários declaratórios aplicados pelo IBGE,devem sempre ser observados a partir de um olhar crítico.

De qualquer forma, o ponto paradoxal nesta discussãoé o fato de que as informações que serão resultantes dotrabalho de regularização fundiária, ou seja, (entre outrascoisas) uma base de dados fundiários consistente(unificada e confiável), seria requisito básico para oplanejamento das ações que irão levá-la a cabo.

PROGRAMA ‘TERRA LEGAL’ – NOVA ESTRATÉGIAPARA EXECUTAR A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIANA AMAZÔNIA?

Pode-se dizer que 2008 e 2009 foram dois anos deintensos debates na arena governamental (principalmenteno âmbito do Poder Executivo Federal) acerca de novasestratégias para a execução da regularização fundiária naAmazônia Legal. Nesse sentido, a conversão da MedidaProvisória nº 458 na Lei nº 11.952, de junho de 2009,pode ser encarada como a proposta vencedora nestedebate.

Tendo em vista que o Programa Terra Legal trabalhacom três passos para a regularização (o cadastramento, ogeorreferenciamento e a destinação/ regularização dasposses,) pode-se afirmar que as principais inovações doprocesso de regularização fundiária na Amazônia Legalestão na celeridade do rito e no arranjo institucionalprevisto para a implementação das ações. Até o advento

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da MP nº 458/2009, as exigências para a regularizaçãofundiária na Amazônia Legal eram similares às exigênciasde regularização no Centro-Sul do Brasil. Com a mudançano marco legal, o rito de titulação foi simplificado,tornando mais expedita a titulação de ocupações com atéquatro módulos fiscais (limite da área considerada comode agricultura familiar, Lei nº 11.326/06), cuja vistoriaprévia tornou-se facultativa, além da aplicação de valoresdiferenciados abaixo do valor de mercado, compagamento em até 20 anos.

Buscando garantir a regularização de cidadãosbrasileiros e evitar a intensificação do processo deconcentração de terras no Brasil, os termos da Lei nº11.952/09 dizem que o ocupante e seu cônjuge oucompanheiro deverão atender aos seguintes requisitos:ser brasileiro nato ou naturalizado; não ser proprietário deimóvel rural em qualquer parte do território nacional; nãoter sido beneficiado por programa de reforma agrária oude regularização fundiária de área rural (ressalvadas assituações admitidas pelo INCRA); ter sua principal atividadeeconômica advinda da exploração do imóvel; e nãoexercer cargo ou emprego público no INCRA, no Ministériodo Desenvolvimento Agrário, na Secretaria do Patrimônioda União do Ministério do Planejamento, Orçamento eGestão ou nos órgãos estaduais de terras. Não será objetode regularização a área rural ocupada por pessoa jurídica.

Para ser passível de regularização a ocupação tem deser comprovadamente anterior a dezembro de 2004. Oatual ocupante pode ter chegado depois dessa data erequerer a regularização se ele conseguir provar que aocupação já existia na data limite, antes de ele chegar.

Os imóveis situados em áreas até quatro módulosfiscais não poderão ser vendidos dentro de um prazo dedez anos, mas poderão ser utilizados como garantia nasoperações de crédito rural nas instituições financeiras. Osque se encontram em posses acima de quatro módulosfiscais poderão ser vendidos a partir de três anos,mantidas as cláusulas resolutivas para os novosproprietários.

No que se refere à capacidade da regularizaçãofundiária, proposta no Programa Terra Legal, de atuarcomo ferramenta de mitigação e prevenção dos principaisconflitos sociais da Amazônia, pode-se apontar osseguintes pontos previstos na legislação:

Com o intuito de evitar ocupações que incidam emáreas ocupadas por populações tradicionais, ou de

interesse especial da Administração Federal, em seu art. 4º,a legislação faz uma ressalva e elimina a possibilidade deregularização de terras que sejam “tradicionalmenteocupadas por indígenas”; “reservadas à administraçãomilitar”; “de floresta pública, [...] unidades de conservação”;que “contenham acessões ou benfeitorias federais”; alémde instituir regimes especiais para a regularização de áreasocupadas por comunidades quilombolas e porpopulações cujas ocupações são incidentes em áreas daMarinha.

Buscando reduzir ainda mais a potencialidade deconflitos, o art. 8º deixa claro que em caso de conflitos aUnião priorizará “a regularização em benefício dascomunidades locais, [...] se o conflito for entre essascomunidades e particular, pessoa natural ou jurídica”.

Por fim, vale ressaltar a parceria entre o Ministério doDesenvolvimento Agrário e o Centro Gestor do Sistema deProteção da Amazônia (CENSIPAM), para operacionalizar omonitoramento via satélite das áreas tituladas, buscandogarantir o comprimento das cláusulas ambientais.

A equipe do CENSIPAM disponibiliza, na forma derelatórios trimestrais, os quadros do desmatamento apartir do “momento zero” da titulação nas glebas peloPrograma Terra Legal. O relatório inicial contém a evoluçãodo desmatamento desde o ano de 2003 até o momentoque antecede a titulação. Os relatórios subsequentesutilizam diferentes fontes de dados para monitorar aocorrência de desflorestamento nas áreas tituladas.

Volta-se a ressaltar que o objetivo é garantir omonitoramento sistemático das áreas tituladas peloPrograma Terra Legal, com a responsabilização pelo uso eocupação dessas áreas, com base nas cláusulascontratuais dos títulos expedidos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este texto buscou apresentar as diferentes dimensõesdo problema fundiário na Amazônia Legal, destacando osdesafios que se apresentam ao Programa Terra Legal e assoluções propostas para superar tais desafios. Pontoimportante é avaliar qual será a governabilidade doprograma para levar a cabo a tarefa ao qual ele se propõe:regularizar ocupações rurais em terras públicas federais,legítimas segundo os pré-requisitos da Lei nº 11.952/09;além de garantir o cumprimento das cláusulas resolutivasprevistas para as ocupações regularizadas, ou seja, que

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elas cumpram com a função social prevista naConstituição Brasileira.

Buscou explorar os principais desafios presentes noinício do trabalho de regularização fundiária, bem como asestratégias utilizadas pelo MDA para superar tais desafios.Na opinião do autor, as principais lacunas para aelaboração de um mínimo planejamento operacionalforam cumpridas, contudo, estratégias de identificaçãoocupacional dos potenciais beneficiários deveriam serempregadas nas áreas mais críticas da atuação do

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programa, a fim de contornar as limitações expostas notexto.

De uma maneira geral, espera-se que este textocontribua para o fomento das discussões acadêmicassobre o tema, e mais, que tais debates possam criaraportes que levem ao aperfeiçoamento de metodologiasde levantamento e cadastro fundiário, que tragam apossibilidade de, por meio do cruzamento de dados dediferentes instituições, auxiliar na complexa tarefa deregularizar as ocupações em terras públicas da região.

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SINGER, P. Economia Política da Urbanização. São Paulo: CEBRAP/Brasiliense. 1973.

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NOTAS

1 Termo utilizado no Macrozoneamento Ecológico Econômico da Amazônia Legal.

2 Amazônia Legal: A atual área de abrangência da Amazônia Legal corresponde à totalidade dos Estadosdo Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso,Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins e parte do Estado doMaranhão (a oeste do meridiano de 44º de longitude oeste), perfazendo uma superfície de aproximadamente5.217.423 km², correspondente a 61% do território brasileiro.

3 Dentre os quais vale ressaltar o Plano de Integração Nacional (PIN – 1970), o Programa deRedistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste (o Programa de PólosAgropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZÔNIA – 1974).

4 Contudo, é importante ressaltar que a grande maioria dos projetos de colonização induzida foiabandonada antes de sua conclusão. Por um lado, as novas cidades apresentam grandes lacunas em relaçãoà infraestrutura urbana, e, por outro, os processos de fixação do homem na terra, a partir da concessão detítulos de domínio definitivo, acumulam-se nos arquivos das superintendências regionais do INCRA semconclusão.

5 O uso sustentável dos recursos florestais, dos quais o projeto Reflorestamento Econômico ConsorciadoAdensado (RECA) seria o exemplo mais bem-sucedido, tem maior possibilidade de se tornar efetivo a partir domodelo de uso do solo da agricultura familiar, onde existe maior aproveitamento da cultura ‘amazônida’, emque a biodiversidade se compõe como uma vantagem comparativa. Em contraposição, o modelo de uso dosolo historicamente preponderante nos latifúndios: caracterizado pela busca de homogeneização danatureza (monocultura), via de regra, sem levar em conta as características particulares do solo amazônico eda relação estabelecida entre os mais antigos ocupantes da Amazônia com o ambiente, fato que pode serapontado como uma das principais causas do rápido empobrecimento do solo em diferentes áreas defronteira dessa região (AB’SABER, 2005).

6 Na segunda fase de ocupação da região amazônica, transparece uma progressiva desvinculação entrefixação populacional e dinâmica de desmatamento de áreas florestais. “[...] onde as migrações rural-urbanaestão se tornando majoritárias e pequenos agricultores têm deixado o campo, pesquisas têm demonstradoque as florestas não estão aumentando. Mais precisamente, muitos pequenos proprietários são substituídospor fazendeiros de maior escala ou por novos migrantes que simplesmente substituem aqueles que saíram.”Padoch et al, 2008 (tradução livre).

7 Secretário executivo adjunto extraordinário de Regularização Fundiária da Amazônia Legal.

8 Pode-se dizer que o INCRA, na época de sua criação, tinha como principal objetivo de atuação naRegião Norte a execução das políticas de colonização induzida, representadas pelo jargão “ocupar para nãoentregar”. Este tipo de política difere de forma importante do atual conceito de regularização fundiária, quefaz referência ao esforço de reconhecer a dominialidade de ocupações já existentes, no caso da regularizaçãofundiária da Amazônia Legal, segundo o regramento da Lei nº 11.952/09.

9 Na figura do secretário executivo adjunto extraordinário de Regularização Fundiária da Amazônia Legal,do Departamento de Planejamento, Monitoramento e Avaliação da Regularização Fundiária da AmazôniaLegal e das Coordenações Estaduais Extraordinárias de Regularização Fundiária na Amazônia Legal.

10 A ideia que norteou essa engenharia de gestão é a de que a subordinação a um comando centralizadolevaria a uma maior capacidade de orientar e monitorar o trabalho executado pelos escritórios regionais. Essa

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opção foi tomada, tendo em vista a baixa capacidade da sede do INCRA em Brasília de direcionar e monitoraras ações de suas superintendências regionais. Outro ponto importante para tornar o monitoramento daregularização fundiária mais efetivo é o fato de que todos os escritórios regionais estão subordinados a umaúnica unidade gestora, ou seja, todos os gastos são autorizados e monitorados a partir de Brasília.

11 Entre as ações em curso para tornar mais efetiva a relação entre os dados constantes nos cartórios etabelionatos Civis daqueles constantes no SNCR destacam-se o Acordo de Cooperação Técnica firmadoentre o Conselho Nacional de Justiça e o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Dentro os objetos desseacordo estão previstas ações das corregedorias das Unidades da Federação sobre os cartórios,queapresentam maior problema em suas bases cadastrais.

Além disso, também se tentou assegurar a correção das bases cartoriais a partir do trabalho deregularização fundiária. Ou seja, tendo em vista que todos os imóveis regularizados segundo o regramento daLei nº 11.952/09 terão sua posição geográfica definida a partir do serviço topográfico que segue a NormaTécnica de Georreferenciamento de Imóveis Rurais para a Regularização Fundiária da Amazônia Legal, todosos registros particulares que incidirem nessas áreas serão corrigidos segundo as informações espaciaisdisponibilizadas por este trabalho. Contudo, esta correição fica restringida pela execução do acordo firmadocom o Poder Judiciário.

12 Deve-se apontar para o atual esforço de construção da Infraestrutura Nacional de Dados Espaciais(INDE), na qual se prevê a disponibilização das informações e dados Georreferenciados de todos os órgãospúblicos, por serviços oferecidos por meio da Internet, por intermédio de protocolos internacionais públicos,de ampla aceitação. Quando essa estrutura estiver em funcionamento, será possível a um órgão acessar deforma mais simples, ágil, completa e integrada, e sem necessidade de conhecimento especializado, tanto osdados e as informações de suas próprias bases, quanto dados e informações existentes nas bases de outrosórgãos do governo federal.

13 Informações coletadas a partir de uma exposição realizada em 2006 pela Coordenação de CadastroRural, da Diretoria de Ordenamento Fundiário do INCRA. Disponível em: <https://portalsncr.serpro.gov.br/forum>. Acesso em 23/3/2010.

14 Lei n. 4.504, de 1964: “o prédio rústico de área contínua qualquer que seja sua localização que sedestine à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos devalorização, quer através de iniciativa privada.”

15 Estabelecimento agropecuário: “É toda unidade de produção dedicada, total ou parcialmente, aatividades agropecuárias, florestais e/ou aquícolas. Todo estabelecimento agropecuário é subordinado a umaúnica exploração: a do produtor ou a do administrador. Independente de seu tamanho, de sua formajurídica, ou de sua localização em área urbana ou rural, todo estabelecimento agropecuário tem comoobjetivo a produção para subsistência e/ou para venda, constituindo-se assim numa unidade recenseável”(FIBGE, 2007, p. 18.).

16 Segundo os critérios estabelecidos nos artigos 2º, 3º, 4º e 5º da Lei nº 11.952, bem como deinformações coletadas no decorrer da 5ª Reunião do Grupo Executivo Intergovernamental do ProgramaTerra Legal, ocorrido no dia 25/3/2010, no Centro Regional do Sistema de Proteção da Amazônia (SIPAM),em Porto Velho-RO.

17 É importante ressaltar que não foram disponibilizadas as informações presentes no questionário doCenso Agropecuário, apenas a tipologia de classificação do ponto geográfico capitado no decorrer daentrevista (‘estabelecimento agropecuário’, ‘domicílio’, etc.)

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18 Deve-se alertar novamente para o fato de que existe um grande número de áreas indígenas que nãoestão georreferenciadas de acordo com as normas vigentes, assim como de unidades de conservação,assentamentos de reforma agrária, etc.

Pedro Assumpção Alves, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério doPlanejamento, lotado no Ministério do Desenvolvimento Agrário. Economista pela UFSC e mestre emDemografia pela UNICAMP. E-mail: [email protected]

Thiago Batista Marra, servidor do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. E-mail:[email protected]

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Participação dos deputados

na Comissão Mista de

Orçamento e reeleição

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Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

Por Marco Lemgruber

O objetivo deste trabalho é verificar se o padrão de sucesso eleitoral dos deputados federais que

participam da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO), do Congresso

Nacional, é diferente do padrão dos demais parlamentares. Para tanto, serão analisados a participação

dos deputados federais na CMO nas 50ª, 51ª e 52ª legislaturas, e os padrões de sucesso eleitoral dos

mesmos nas eleições de 1998, 2002 e 2006.

A análise mostra que os deputados que participaram da CMO nas legislaturas pesquisadas alcançaram

índices de reeleição bastante superiores ao padrão daqueles parlamentares que não participaram. E

mais, indica que, quanto mais tempo o parlamentar participou da CMO, maiores foram suas chances

de reeleição. Diante dos achados da presente pesquisa, podemos supor que uma teoria sobre reeleição

em nosso país se pauta no acesso dos parlamentares a recursos (orçamentários ou não) que se

transformam em apoios financeiros e não na distribuição de benefícios para os seus redutos eleitorais.

Este tipo de vínculo entre as arenas legislativa e eleitoral que os parlamentares estabelecem pode ser

a base fundamental da conexão eleitoral no Brasil.

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INTRODUÇÃO

Uma das discussões teóricas mais interessantes naCiência Política brasileira diz respeito à influência que asemendas parlamentares teriam para o sucesso eleitoraldos deputados federais. As emendas individuais (AMES,1995, 2003) seriam a moeda de troca que o Executivoteria para conseguir o apoio dos parlamentares para aimplementação de suas políticas públicas, tendo em vista aimportância das mesmas para o sucesso eleitoral dosdeputados e senadores (PEREIRA; MUELLER, 2002, 2003;RENNÓ; PEREIRA, 2003, 2007). Ao angariar recursos parasuas bases, os parlamentares teriam o reconhecimento dapopulação que retribuiria com votos reconduzindo esseparlamentar ao Congresso Nacional. Ou seja, a conexãoeleitoral1 brasileira estaria alicerçada no fato de oparlamentar conseguir levar esse tipo de benefício(emendas) para determinada localidade, os habitanteslocais o identificarem como provedor dessa demanda e,consequentemente, decidirem retribuir essa gratidão oureconhecimento em voto. Por outro lado, ao regular oacesso a esse tipo de recurso, o Executivo conseguiriaincrementar, aprovando os projetos de seu interesse noCongresso Nacional.

Estudos recentes (podemos citar os trabalhos deLIMONGI; FIGUEIREDO, 2005, 2008; MESQUITA, 2008)pretendem demonstrar que essa relação, do ponto devista da arena eleitoral, não se sustenta, porque nãohaveria diferença significativa de padrão de sucessoeleitoral entre aqueles parlamentares que tiveram suasemendas executadas e os outros que não apresentaramemendas. Ou seja, a conexão eleitoral brasileira, posta daforma tradicional pela literatura ao analisar o caso brasileironão encontraria lastro na realidade.

Pensamos, então, em uma abordagem alternativa.Sabendo da importância do acesso a recursos,especialmente os advindos da participação no processoorçamentário para os membros do Poder Legislativo,iniciamos uma pesquisa que pudesse verificar se existerelação entre a participação na Comissão Mista deOrçamento (CMO)2 e o sucesso eleitoral dos deputadosque dela participam. Nesse sentido, o objetivo destetrabalho é verificar se o padrão de reeleição dosdeputados que participam da CMO é diferente dos demaisdeputados. Nossa hipótese é que a taxa de reeleiçãodesses parlamentares é superior à dos demais deputados.

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Isso nos sugere que a participação no processoorçamentário é um fator primordial nas chances eleitoraisdos deputados federais que pretendem se reeleger. Naverdade, acreditamos que o acesso ampliado a recursos,advindos da participação na CMO, se traduz em maioresauxílios financeiros a serem utilizados em campanhaspolíticas. E, confirmando-se essa hipótese, quais são asimplicações políticas desse fenômeno?

A resposta a essas questões podem ser umaferramenta importante para compreendermos como searticulam a arena eleitoral e a legislativa em nosso país.Para tanto, iniciamos este trabalho discutindo osfundamentos sobre os quais tem se alicerçado o debatesobre o tema, especialmente a discussão imposta sobre autilização da teoria da “conexão eleitoral” para a realidadepolítico-eleitoral brasileira.

A seguir, verificamos o desempenho eleitoral naseleições de 1998, 2002 e 2006 dos deputados queparticiparam da CMO nas 50ª, 51ª e 52ª legislaturas. Apartir daí, comparamos a taxa de reeleição dessesparlamentares com os índices de reeleição dos demaisdeputados. O objetivo é verificar se existe assimetria nosucesso eleitoral de ambos os grupos. Se existir, faz-senecessário compreender que variáveis podem explicar talfenômeno.

DISCUSSÃO TEÓRICA

O cientista político norte-americano David Mayhew(1974) inovou ao estabelecer que, no caso americano, aarena eleitoral condicionaria o comportamento dospolíticos na arena legislativa. Os parlamentares, semprecom o objetivo de se reeleger, determinam o seucomportamento no parlamento na tentativa de alcançaresse objetivo. Como Mayhew (1974, p. 37) afirma:

The ultimate concern here is not how probable it isthat legislators will lose their seats but whether there isa connection between what they do in office and theirneed to be reelected. It is possible to conceive of anassembly in which no member ever comes close tolosing a seat but in which the need to be reelected iswhat inspires members’ behavior. It would be anassembly with no saints or fools in it, an assemblypacked with skilled politicians going about theirbusiness.

Pereira (2003) salientou o vínculo entre as duasarenas:

a atuação dos partidos políticos na arena legislativaseria, assim, basicamente, uma consequência funcionalda necessidade de se vencer eleições. A inferênciadireta deste argumento, portanto, é que as regraseleitorais incentivam os candidatos a desenvolverrelações personalísticas e individuais com suas baseseleitorais, em vez de mediá-las via partidos políticos, eque isso necessariamente acarreta a diminuição doimpacto dos partidos políticos na arena legislativa.

Esse modelo3 explicaria os altos índices de reeleiçãoalcançados pelos parlamentares norte-americanos. Abusca pela reeleição os levaria a legislar no sentido deangariar a maior quantidade possível de recursos paraseus redutos eleitorais. Na outra ponta, os eleitores,reconhecendo os benefícios obtidos pela atuação doparlamentar, votariam nesse político, levando-onovamente ao Parlamento. Como observaram Cain,Ferejohn e Fiorina (1987):

...como as ações dos parlamentares são orientadaspara benefícios eleitorais e visam garantir a sua

Isso nos sugere que a

participação no processo

orçamentário é um fatorprimordial nas chances

eleitorais dos deputados

federais que pretendem sereeleger.(...)quais são as

implicações políticas desse

fenômeno?

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sobrevivência política, o parlamentar tenderá a darmais atenção a seus redutos eleitorais, independentedos interesses coletivos do partido a que pertença oudas limitações institucionais.

As repercussões para a democracia são claras. Oincentivo a ações personalísticas baseadas no simplesinteresse da reeleição leva o parlamentar a estabeleceruma relação direta com o seu eleitorado e a cultivar umaestratégia de independência no exercício do mandato. Issoenfraquece os partidos políticos e corrói os alicerces sobreos quais as estruturas políticas tradicionais sefundamentam. A perda de funcionalidade do partido noCongresso diminui os benefícios do parlamentar emmanter-se fiel às orientações de seu partido. Se o objetivoprimordial de todo político é se reeleger, ele orienta toda asua atividade legislativa na busca deste seu objetivo maior.A arena legislativa perde sua importância tornando-seassessória, basicamente uma arena auxiliar diante dabusca do objetivo maior. Com isso, o debate sobreassuntos de interesse mais gerais perdem importância equando são travados o são de maneira equivocada, já queo parlamentar terá a sua conduta balizada pelo interessede seu reduto eleitoral. Dessa forma, estava estabelecida aconexão eleitoral nos EUA.

Diante de certas similaridades com o modelo norte-americano, esse debate chegou ao Brasil. Aqui, oCongresso Nacional seria marcado pela indisciplina dosparlamentares que privilegiariam políticas do tipo porkbarreL4 em detrimento das políticas nacionais. A presençade partidos políticos fracos e indisciplinados, que seriamlevados a atender aos anseios individualistas de cadaparlamentar, completariam o cenário. Alia-se a isso o fatode termos um presidencialismo de coalizão, ou seja, paraque o presidente consiga governar ele precisa estabeleceruma extensa gama de apoios no Congresso. Se temospartidos fracos e parlamentares com comportamentoindividualista5, como o Executivo conseguiria obter apoiono Congresso para impor sua agenda e implementar aspolíticas públicas de seu interesse? Para alguns estudiososa cooperação surge por intermédio do processoorçamentário. Provavelmente Barry Ames (1995, 2003)tenha sido o primeiro a estabelecer essa relação. Para ele,as emendas ao Orçamento seriam uma excelente moedade troca do Executivo para angariar apoio a sua agendano Congresso. Tendo como premissa que o motivador

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principal do parlamentar é a maximização eleitoral/reeleição e o espaço eleitoral é o geográfico, ocomportamento padrão de todos os membros doCongresso, diante da periodicidade das eleições, seria o deprocurar atender aos interesses específicos dos eleitoresde sua região, principalmente daquela região em que foimais votado. Sendo assim, a execução das emendasindividuais passa a ser fundamental para o sucessoeleitoral de deputados e senadores. Como o Executivo temo poder de liberar ou não esses recursos, já que oOrçamento é apenas autorizativo, uma boa relação comele se torna primordial para o bom desempenho eleitoraldos parlamentares. Diante desse poder, o Executivo passaa utilizá-lo para conseguir aprovar seus projetos noLegislativo.

Como afirma Mesquita (2008):

De um lado se encontram os que têm porpressuposto que o modelo brasileiro depresidencialismo de coalizão, associado aos incentivosdo sistema eleitoral brasileiro (proporcional de listaaberta), acarretaria em um sistema instável, baseadono atendimento de interesses individuais dos políticos,para funcionar. Seria necessário oferecer aosparlamentares benefícios tangíveis, fazer concessõesaos interesses locais destes, para obter a cooperaçãocom o Executivo. Esses benefícios seriam as execuçõesde emendas orçamentárias, uma vez que implicariamna adoção de uma política distributivista, fundamentalpara pôr em marcha e assegurar os vínculos diretosentre políticos e eleitores. A existência desses vínculosseria condição sine qua non para o triunfo dascarreiras políticas dos parlamentares brasileiros.

Na mesma direção estão os trabalhos de Pereira eMueller (2002, 2003) e Pereira e Rennó (2007), entreoutros. Segundo Pereira e Mueller (2002), a execução dasemendas individuais é “um dos mecanismos maisimportantes de que o Executivo dispõe para negociar suaspreferências com sua coalizão no Congresso”. A conexãoeleitoral no Brasil estaria desvendada. Segundo Pereira eMueller (2003):

A variável explicativa-chave desse teste é aquantidade de pork barrel de fato executada, na formade emendas individuais dos parlamentares aos

orçamentos de 1995 a 1998, orientadas parabeneficiar o município onde o parlamentar recebeumaior número de votos na eleição de 1994. O modeloprevê uma correlação positiva entre reeleição e porkbarrel. Em outras palavras, quanto maior a quantidadede emendas executadas pelo presidente, maiores aschances de o parlamentar ser reeleito.

Ou seja, para eles, quanto maior o montante deemendas individuais do legislador executadas maioresserão as probabilidades de conseguir a reeleição. Namesma direção, encontramos outro trabalho, de Pereira eRennó (2007):

Foi demonstrado nas eleições de 1998 que osistema político brasileiro gera vários incentivos paraque os eleitores se preocupem mais com os benefícioslocais do que com o desempenho nacional dos seusrepresentantes. Isto faz com que a participação dosparlamentares no espaço nacional, principalmente nasatividades dentro da Câmara dos Deputados, sejaorientada pela busca de benefícios que possam serutilizados no espaço local, como forma de alcançaremmaiores retornos eleitorais. A distribuição de benefícioslocais, assim, proporciona muito mais retornoseleitorais do que as atividades legislativas dentro daCâmara ou as posições de voto assumidas em relaçãoa uma determinada política. É importante enfatizar quea participação do deputado no processo legislativobem como seu perfil de voto no plenário da Câmarados Deputados não influiu diretamente nas suaschances de ser reeleito. Na realidade, os interesseslocais prevalecem na arena eleitoral porque asdemandas locais parecem ter impacto mais forte nosucesso eleitoral. Mesmo o comportamento partidário,quando este acontece dentro da Câmara, segue estalógica, pois são os líderes dos partidos e o Executivoque controlam a distribuição de benefícios.

A execução das emendas individuais seria a moeda detroca para selar acordos que envolveriam eleitores,legisladores e o Executivo. E ela tem sido vista como o “eloperdido” que permitiria reunir em um único corpo analíticoa arena eleitoral e a arena legislativa. No entanto, nemtodos os pesquisadores compartilham desta visão.Samuels (2003), por exemplo, afirma:

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The results for both years are consistent, and fullysubstantiate my argument: pork does not help adeputy win reelection. Even when we control for“likelihood of benefiting from pork,” pork neverdemonstrates a positive and significant relationshipwith reelection success...

E conclui:

These findings contradict the view that budgetarypork helps Brazilian deputies win reelection. Instead,they confirm my first hypothesis, that pork-barrelingprovides little direct political payoff for reelection-minded deputies. The analysis here improves uponprevious research by using a more direct indicator ofpork – executed amendments – and byoperationalizing the dependent variable to test forwhether pork actually helps win reelection. Theconsistent, non significant results on the pork variablessuggest that the findings are robust.

Os críticos mais consistentes a esta tradução da teoriada conexão eleitoral à realidade brasileira têm sidoFigueiredo e Limongi (1999, 2002, 2005, 2008). Para eles,por exemplo, a premissa de que deputados visamprimeiramente à sua reeleição leva à suposição de quetodos os parlamentares usarão sua prerrogativa deemendar o Orçamento de forma similar. Para Figueiredo eLimongi (2005):

Todos usariam as emendas de acordo com o queprevê a “cartilha” da ciência política norte-americana,isto é, promovendo políticas distributivistas parareceber em troca votos cruciais que assegurariam areeleição.

Se todos adotassem esta estratégia, seguiria que osparlamentares já não poderiam ser distinguidos porsuas filiações partidárias. Interesses e políticas comuns,distributivas, os uniriam e os colocariam em campooposto ao do Executivo. Este, em razão da suaconexão com o eleitorado nacional e da necessidadede prestar atenção aos efeitos macroeconômicos dosgastos públicos, seria forçado a levar em conta ointeresse geral.

Portanto, nos termos desse argumento, aexecução das emendas individuais em nada

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contribuiria para a implementação do programa dogoverno. Toda e qualquer emenda individualexecutada implicaria a subtração de dotações deaplicações preferidas pelo Executivo. Ao executar aemenda de um parlamentar, o Executivo transfeririarecursos de suas prioridades para atender aosinteresses necessariamente parciais e locais dosparlamentares. Não haveria, assim, ganhos a auferir,apenas perdas a computar. Tornando esse ponto maisclaro, ainda com o risco de nos tornarmos repetitivos:o Executivo só executaria emendas individuais seforçado a fazê-lo, ou seja, como um meio para obter osvotos necessários à aprovação da sua agendalegislativa. O Executivo e o Legislativo teriam prioridadesmutuamente excludentes.

Outro ponto mencionado por Limongi e Figueiredo dizrespeito à importância relativa dada pelos parlamentaresàs emendas individuais. Para eles, se a definição dosvolumes de recursos a serem distribuídos para asemendas individuais é uma decisão interna do Legislativo,por que esse volume é tão baixo em comparação com asoutras emendas? Seria a constatação de que o processoorçamentário não é orientado exclusivamente paraatender aos interesses individuais dos parlamentares.Apesar de concordar que a participação do Legislativonão se dá exclusivamente para atender aos interessesindividuais dos parlamentares, não acredito que isso possaser verificado pela razão exposta por Limongi. Na verdade,apesar de os limites para as emendas individuais seremdecididos pela CMO, sua definição sofre todo tipo depressão do Executivo. Diante dos limites orçamentáriosimpostos, principalmente pela equipe econômica dogoverno, da pressão dos governadores e das grandesempreiteiras, a CMO tem uma estreita margem de manobrapara definir valores elevados para as emendas individuais.Além disso, o Executivo pode, e o faz constantemente,contingenciar grande parte desses recursos. Portanto,acreditar que os parlamentares não dão importância àsemendas individuais, tendo em vista sua parcela noOrçamento geral, nos parece um argumento que nãoencontra respaldo na realidade.

Já Lara Mesquita (2008)6 demonstra que a taxa dereeleição dos deputados que executam emendasindividuais é semelhante à dos parlamentares que nãoapresentam emendas. Ela conclui:

A conexão eleitoral que se supõe existir mediadapelas emendas não foi confirmada por estadissertação. Ao fim desta empreitada não é possívelafirmar que seja a execução orçamentária o eloperdido entre eleitores e eleitos. Os resultados destaanálise não apontam para uma relação entre o valorexecutado das emendas de cada parlamentar e osucesso eleitoral. Ao contrário, indicam que a execuçãoimpacta negativamente no aumento de votos entreuma disputa e outra. As questões que se mostrarammais relevantes para explicar o sucesso na busca pelareeleição não são questões locais, e sim de cunhopolítico mais amplo.

Algumas ressalvas a este estudo merecem ser feitas. Aprimeira refere-se à rastreabilidade7 das emendasindividuais. Muitas vezes não é possível saber exatamentese determinada emenda foi ou não executada e para quallocalidade ela foi distribuída. Nesse sentido, os achadosrevelados nessa pesquisa devem ser relativizados. Porexemplo, a autora argumenta que não há como explicar ofato de que quase 40% dos deputados não apresentaramemendas individuais para os municípios em que forammais votados. Acreditamos que, para responder a essaquestão, é necessário conhecer o funcionamento do

Muitas vezes não é possívelsaber exatamente sedeterminada emenda foi ounão executada e para quallocalidade ela foi distribuída.(...) é necessário conhecer ofuncionamento doParlamento brasileiro e sabercomo se lubrificam asengrenagens que movem osatores na arena político-eleitoral.

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Parlamento brasileiro e saber como se lubrificam asengrenagens que movem os atores na arena político-eleitoral. Aos políticos, tão ou mais importante do que levarbenefícios aos eleitores é ter acesso a recursos quepoderão ser utilizados nas futuras campanhas políticas. Seconseguirem aliar o acesso a esses recursos aoencaminhamento de benefícios ao seu reduto eleitoral,melhor ainda. Mas, se for preciso escolher entre essas duasopções, muitas vezes a escolha é feita pela busca demaximização de suas chances eleitorais. Outra crítica queacredito que merece ser feita é a de que Mesquita, aotentar desconstruir o argumento principal de Ames, deque existe uma estratégia dominante (pork) e mais eficientepara os deputados conseguirem sucesso eleitoral, ou seja,concentrar votos em poucos municípios e dominá-los,não consegue apresentar uma resposta satisfatória para aimportância dada pelos parlamentares às emendasorçamentárias. Afinal, se elas não são importantes para osucesso eleitoral, por que elas são tão desejadas?Seguindo a lógica de Lara, a única explicação possível seriao interesse dos políticos em abocanhar parte dessesrecursos para interesses próprios e não políticos. O que,em parte, acredito poder ser verdadeiro.

Outros pesquisadores acreditam que existem variáveistão importantes quanto à execução de emendas paraexplicar o sucesso eleitoral. Para Rennó e Pereira (2007),por exemplo, apesar de encontrarem dados que reforçama hipótese de que a execução das emendas parlamentarestem impacto na reeleição, o envolvimento do presidenteda República no apoio aos seus aliados no Parlamento éuma variável fundamental para explicar o sucesso eleitoraldos deputados.

Outra vertente de pesquisadores (entre outros,SAMUELS, 2001a) caminha na direção de ressaltar aimportância do dinheiro para o sucesso eleitoral doscandidatos no Brasil. Como afirma Samuels (2001c, p,851):

The reason for this is very simple: money is a farmore fungible and exclusive political resource thanpork. A candidate can attempt to target public worksprojects to his or her electoral bases, but not to theextent that he or she can target where, when, and howto spend campaign funds. Money can also beemployed to win over voters left unaided by publicworks projects. In addition, a politician spending

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campaign funds on personnel and advertising materialsdoes not have to share the benefits with otherpoliticians as he or she might have to with a pork-barrel project. Because it is fungible and exclusive,politicians have strong incentives to accumulatemoney to help their political campaigns.

How do politicians acquire this needed resource inBrazil? Some candidates are already rich, but this istrue in any country. In Brazil, for candidates who lackmoney (or who simply want more), pork barrelingbrings them into close and repeated contact with the(owners of) private firms that stand to profit directlyfrom obtaining public works contracts (Bezerra, 1999 eTendler, 1999). Over 90% of all budget amendmentsare for building roads, bridges, dams, and the like, or formunicipal or regional development programs like ruralelectrification (the remaining 10% are for hospitalinternments, child welfare programs, etc.).8 Theseprojects may ultimately benefit voters, but in a diffuseway. However, pork-barrel projects may very directlyand immediately benefit the owners of constructionfirms or local businesses or the landowners and otherlocal notables who stand to profit from thegovernment contracts that pork-barrel projects fund.

E é esse tipo de interpretação que acredito melhorexplicar a realidade da interseção das arenas eleitorais elegislativas em nosso país. Minha hipótese é de que,quanto mais exposto a recursos, orçamentários ou não, oparlamentar tem maiores chances de reeleição. Nessesentido, a participação na CMO pode nos ajudar acompreender melhor a relação entre a participação dosparlamentares no processo orçamentário e o sucessoeleitoral, nos casos de reeleição, tendo em vista este ser olocal onde se encontram maximizadas as ofertas derecursos no âmbito do Legislativo. Ou seja, a participaçãona CMO permite ao parlamentar obter mais dinheiro para acampanha devido ao seu maior contato com empresasprivadas que são grandes financiadoras de campanhaspolíticas. Permite, ainda, ampliar o rol de contatos com asburocracias federal, estadual e municipal. E amplia efortalece as lealdades com outros agentes políticos (líderespartidários, governadores, senadores, ministros de Estado,secretários estaduais, entre outros).

Importante ressaltar a importância de outras variáveisexternas à CMO, além das citadas acima, para o sucesso

eleitoral nos casos de reeleição. Diversos estudos indicamque variáveis que traduzam aspectos da carreira política(cargos que ocupou no Executivo ou Legislativo);características pessoais (carisma, recursos próprios, etc.);relações com o Executivo (execução de emendas, apoiodo presidente e/ou governador, etc.); desempenho nopartido (cargos ocupados, etc.); desempenho na Câmarados Deputados (posições hierárquicas importantesocupadas, etc.) e outras variáveis eleitorais (concentraçãoeleitoral, média de candidatos no reduto eleitoral, gastosde campanha, etc.) são extremamente importantes para atentativa de reeleição. Além disso, os membros da CMOpoderiam possuir características próprias que osdiferenciasse da média dos demais deputados. Poderiam,por exemplo, possuir maior experiência política ourecursos próprios. Não acreditamos, contudo, que ogrupo de deputados pesquisado seja muito diferente deuma amostra significativa de toda Câmara dos Deputados.Porém, estudos mais extensos e profundos precisam serrealizados para que possamos ultrapassar os limitesmetodológicos impostos pela presente pesquisa.

PARTICIPAÇÃO NA CMO E REELEIÇÃO

A Comissão Mista de Orçamento é o local onde oPoder Legislativo intervém no processo orçamentário.Amparada no art. 166 da Constituição Federal, a CMO tempor competência8 emitir parecer e deliberar, entre outrasatribuições, sobre:

I - projetos de lei relativos ao plano plurianual, diretrizesorçamentárias, Orçamento anual e créditos adicionais,assim como sobre as contas apresentadas nos termosdo art. 56, caput e § 2º, da Lei Complementar nº 101,de 4 de maio de 2000;II - planos e programas nacionais, regionais e setoriais,nos termos do art. 166, § 1º, II, da Constituição;III - documentos pertinentes ao acompanhamento efiscalização da execução orçamentária e financeira eda gestão fiscal, nos termos dos arts. 70 a 72 e art.166, § 1º, II, da Constituição, e da Lei Complementar nº101, de 2000.

Para o objetivo desta pesquisa o importante é saberque os integrantes da CMO estabelecem um canal deacesso ao Orçamento e aos interessados no processo

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orçamentário. Interessa, nesse sentido, saber se essaposição privilegiada se transforma em vantagem paraaqueles que desejam concorrer à reeleição. Primeiramente,pretendemos verificar a taxa de reeleição dos deputadosfederais que participaram da CMO nas 50ª, 51º e 52ªlegislaturas e compará-la com a taxa de reeleição dosdemais deputados. Depois, verificaremos se a quantidadede anos na CMO altera a possibilidade de sucesso eleitoral.Ou seja, será que quanto mais exposto a esse conjunto deelementos que cerca o processo orçamentário, maioresserão as chances de o deputado se reeleger?

A Tabela 1 nos mostra quantos deputados9

participaram da CMO na 50ª legislatura, tomando-se onúmero de anos que o parlamentar participou daComissão. Podemos observar que, ao longo dos quatroanos, 173 deputados participaram da CMO, sendo que129 só participaram por um ano e apenas 4 participaramem todos os quatro anos daquela legislatura.

Já na Tabela 2, que retrata a participação dosdeputados da 51ª legislatura na CMO, os dados refletemuma mudança considerável no padrão de preenchimentodas vagas da CMO por deputados. Podemos notar quediminui consideravelmente o número de deputados queparticiparam da CMO por apenas um ano, 47 deputados,ao longo desta legislatura (1999/2002). Essa“profissionalização” pode ser verificada, também, naelevação considerável de deputados que participaram detodos os anos ao longo desta legislatura. Foram 15deputados que ficaram durante os quatro anos, ao invésde apenas 4 na legislatura anterior. Podemos tambémsupor que, diante da crise pela qual passou a CMO noinício dos anos 90, com o escândalo dos anões doOrçamento, a participação dos membros usuais sofreu

Tabela 1 – Quantidade de participações de deputados na CMO no período de 1995 a 1998

Fonte: CMO

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uma considerável descontinuidade, acarretando umaalternância significativa em sua composição. Com os anos,seria de se esperar o retorno a especialização de seusmembros, o que parece ter ocorrido.

A Tabela 3, com a participação dos deputados da 52ªlegislatura na CMO, nos indica um padrão diferente ao daslegislaturas anteriores. Foram 131 deputados queparticiparam nos quatro anos, sendo que 68 participaramda CMO em apenas um ano e 15 participaram em todosos anos. Podemos observar que houve uma quedaimportante no número total de deputados queparticiparam da CMO em comparação com a 50ª

legislatura, mas um incremento em relação à legislaturaanterior. A distribuição deixou de ser tão homogênea aolongo das quatro faixas de participação como nalegislatura anterior, contudo, sem chegar aos níveis tãoextremados como na primeira legislatura analisada.

A Tabela 4 nos revela o percentual de frequência dedeputados, por legislatura, em função do número de anosque participou da CMO. Ela nos mostra a evolução dessaparticipação ao longo das três legislaturas analisadas.

Diante dos dados levantados, passamos, então, averificar a taxa de reeleição dos deputados participantesda CMO, os dados estão na Tabela 5. A taxa de reeleiçãodos deputados que participaram a CMO nas três

Tabela 2 – Quantidade de participações de deputados na CMO no período de 1999 a 2002

Fonte: CMO.

Tabela 3 – Quantidade de participações de deputados na CMO no período de 2003 a 2006

Fonte: CMO.

Tabela 4 – Frequência de participação dos deputados na CMO por legislatura (em %)

Fonte: CMO.

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legislaturas analisadas é bastante elevada. Sendo que ataxa média do período analisado nesta pesquisa foi de65,96%. Diante desses dados, passamos a compará-loscom os dados disponíveis para a taxa de reeleição dosdeputados federais na Câmara dos Deputados.

A Tabela 6 nos mostra a taxa de reeleição dosdeputados federais ao longo dos últimos 60 anos.Verificamos que os pleitos eleitorais no períodocompreendido entre 1945 e 2006 tiveram taxa média dereeleição de 46,16%, ou seja, quase 20 pontos percentuaisabaixo daquela encontrada para os deputados queparticiparam da CMO nas três últimas legislaturas. No quese refere especificamente ao período analisado, a médiageral foi de 50,94%. Já a taxa média de reeleição dosdeputados participantes da CMO no período analisado foide 65,96%.

Se compararmos as taxas médias de reeleiçãoencontradas nos períodos analisados nesta pesquisa,encontraremos uma diferença um pouco menor, mas nãomenos significativa. Para o período de 1995 a 1998, adiferença foi de 12,36 pontos percentuais. Para o períodode 1999 a 2002 de 12,92 e para o período de 2003 a2006 foi de 19,76. Ou seja, tomando-se como referênciaos resultados encontrados nas últimas três legislaturas, aschances de um deputado que participou da CMO sereeleger foi, no período de 1995 a 1998, 23,66% maior doque a de um parlamentar que não participou da referidaCMO. Nos períodos seguintes, as chances aumentaramainda mais, passando para 25,79% no período de 1999 a2002 e chegando a 39,14% no período de 2003 a 2006.Os dados são muito consistentes e sugerem que participarda CMO fez uma diferença significativa nas chanceseleitorais dos deputados nas últimas três eleições.

Diante dos dados encontrados, decidimos verificar ataxa de reeleição dos participantes da CMO por

Tabela 5 – Taxa de reeleição dos deputados participantes da CMO, por legislatura

Fontes: TSE e CMO.

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quantidade de anos em que ele participou da Comissão.Interessava-nos saber se o fato de o parlamentarpermanecer por mais tempo na Comissão influía para seusucesso eleitoral. Mais uma vez, os dados encontrados sãobastante contundentes. A taxa de reeleição dosdeputados que participaram por apenas um ano da CMOfoi, no período, de 58,06%. Ou seja, significativamenteinferior à média encontrada para todos os deputados queparticiparam da CMO no período. Já a taxa de reeleição dosparlamentares que participaram da CMO nos quatro anosde uma mesma legislatura foi de 79,41% (34parlamentares e 27 reeleitos). Um padrão de reeleiçãobastante elevado. Ou seja, existe uma diferença de quase30 pontos percentuais (28,47) entre as médias daquelesdeputados que não participaram da CMO e daqueles queparticiparam ao longo de todos os anos de uma mesmalegislatura, no mesmo período analisado. As chances dereeleição de um deputado que participou da CMO duranteos quatro anos em uma mesma legislatura foram 55,89%maior do que as daquele que não participou da CMO.

O que explica, então, o padrão de sucesso eleitoral dosmembros da CMO? Embora precisemos aprofundar aspesquisas, dentre as oportunidades abertas pela atuaçãona CMO, acredito que o retorno financeiro seja a variável

mais impactante para o sucesso eleitoral dosparlamentares. Os contatos com empresas executoras deobras públicas, maiores financiadoras oficiais e não oficiaisde campanha, pode ser uma boa pista para começarmosa decifrar essa relação. Ter uma parcela deresponsabilidade na construção da dotação orçamentáriade grandes obras públicas pode ser muito importante nacomposição de apoios, recursos, contatos e outraspremissas essenciais para a construção de uma campanhaeleitoral vitoriosa. Faz parte da atual realidade político-eleitoral a participação11 em parte das obras executadaspor emendas parlamentares, individuais ou coletivas. Aarticulação com outros agentes políticos, servidorespúblicos e lobistas fornece ao parlamentar oportunidadede fazer parte da distribuição de dinheiro para aaprovação, execução e liberação de recursosorçamentários. E a ampliação das contribuições, oficiais ounão, para financiamento das campanhas políticas tem sidoum fator decisivo para as altas taxas de reeleição dosparlamentares que participaram da CMO nas últimas trêslegislaturas. Mais do que levar obras para a localidade emque foi mais votado, o importante parece ser o acesso arecursos que possam ser utilizados nas campanhas.Importante também se torna a participação do

Tabela 6 – Taxa de reeleição para a Câmara dos Deputados (em %)

Fontes: TSE, TREs.Elaboração: LEEX-IUPERJ.

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parlamentar na construção e manutenção dos apoiospara o seu partido. Longe de ser uma decisão estritamenteindividual, a participação na CMO é uma decisão dospartidos e de suas lideranças que a condicionam adeterminados tipos de deveres, compromissos e lealdades.O pretenso individualismo de nossos parlamentares aquinão se manifesta em sua plenitude diante do acúmulo deinterseções de interesses próprios, de seu partido, doslíderes e dos demais interesses representados nessa arena.

Não podemos, contudo, menosprezar a importânciada participação na construção de relações com asestruturas políticas dos estados e do governo federal. Opoder dessas relações também é fundamental para osucesso eleitoral dessa estratégia e, de certa maneira,contribui para retroalimentar o esquema acima citado.

Mas, afinal, qual a importância deste debate? Osprejuízos para o fortalecimento do Legislativo e,consequentemente, para a democracia são claros. Asfunções primordiais do Parlamento, quais sejam, legislar efiscalizar o Executivo, estariam seriamente comprometidas.No caso do Brasil, o que poderemos esperar dosparlamentares se verificássemos que a conexão eleitoralpassaria pelos ganhos obtidos por eles em suaintervenção no processo legislativo? O que poderíamosesperar em termos de fiscalização do Executivo se osparlamentares necessitam dele para liberar suas emendasindividuais? Da mesma forma, como esperar que osdeputados votem com independência se eles são tãodependentes de outro poder para alcançar seu objetivoprincipal? O que esperar de parlamentares tãodependentes de toda sorte de interesses que estão portrás da briga pela distribuição de recursos que seconcentra na CMO? Qual a independência que possuempara legislar em assuntos de interesse de grandescorporações? Qual a moral que possuem em discutirqualquer assunto, se parte significativa de recursosutilizados em sua campanha são fruto de caixa dois?

Mas outra questão merece ser tratada. Será quepodemos acreditar que os parlamentares se comportamde maneira diferente quando apresentam, relatam ouvotam os demais projetos? Será que a atuação dosparlamentares nas comissões e no Plenário não estásubmetida a essa mesma lógica? Não seria esse tipo decomportamento que podemos esperar diante doscrescentes custos das campanhas políticas e dodecrescente reconhecimento sobre a importância do

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trabalho dos parlamentares? Maximizar a possibilidade deretorno, especialmente financeiro, para reinvestir em seusucesso eleitoral não seria a regra de comportamentolegislativo?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa propôs-se a colocar foco em umdeterminado tipo de relação que, a nosso ver, merece sermais bem estudada. Não nos parece condizente com arealidade menosprezar os benefícios do acesso a recursos(orçamentários ou não) para o sucesso eleitoral dosparlamentares que tentam a reeleição. Os dadosencontrados na presente pesquisa nos sugerem quepertencer à CMO causou impacto positivo no sucessoeleitoral nos casos de reeleição dos deputados das 50ª,51ª e 52ª legislaturas. A taxa média de reeleição dosdeputados que pertenceram a CMO nas legislaturasanalisadas foi de 65,96%, bastante superior à taxa dosdemais deputados que foi de 50,94%. Assim como estataxa foi tão maior quanto maior foi a presença doparlamentar na CMO. Os deputados que participaram porquatro anos da CMO tiveram taxa média de reeleição de79,41%.

Se a conexão eleitoral no Brasil não está alicerçada nasbenesses paroquiais advindas da execução de emendasindividuais, ela talvez esteja calçada nas oportunidadesabertas com a possibilidade de os parlamentares terem

acesso a recursos mediante sua atuação no processolegislativo, o que se faz mais palpável pela atuação dessesna CMO, local onde os acessos estão ampliados pelaprópria natureza da Comissão. Dessa forma, acreditamosque menosprezar as possibilidades de inter-relaçõesexistentes entre a arena legislativa e a eleitoral é, nomínimo, desconhecer sobre que bases se sustentam asrelações político-eleitorais em nosso país. Da mesmamaneira, não nos parece plausível pensar que osparlamentares não façam um cálculo político-eleitoral nomomento de estruturar o seu comportamento legislativo,principalmente nos momentos em que sua atuaçãoindividual pode ser observada. Nesse sentido, acreditamosque a intencionalidade de participar da CMO faz parte deuma estratégia previamente definida de maximização daatuação legislativa, tendo em vista o esperado retornoeleitoral. Políticos perseguem diversas estratégias para sereeleger e a participação mais incisiva no processoorçamentário é uma das mais importantes.

Longe de encerrar o debate, esta pesquisa reforça anecessidade de aprofundarmos os estudos sobre arelação entre o acesso a recursos, especialmente osorçamentários, e o sucesso eleitoral no Brasil. Importante,também, seria extrapolar essa metodologia para verificar seesse tipo de conexão é encontrado nas atividades dosparlamentares em outras esferas da arena legislativa. Aconstrução de uma teoria sobre reeleição no Brasil passa,necessariamente por esse tipo de relação.

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Page 100: Revista de Políticas Públicas e Gestão Governamental

NOTAS

1 Conexão eleitoral: termo utilizado primeiramente por MAYHEW, David. Congress: the electoral connection. New

Haven and London: Yale University Press, 1974.

2 A participação do parlamentar na CMO não se dá, apenas, a partir de decisão pessoal. No entanto, os

parlamentares sabem que essa participação trará benefícios que implicarão aumento significativo de suas chances de

sucesso eleitoral.

3 Uma discussão interessante sobre os modelos de conexão eleitoral nos Estados Unidos e no Brasil está em

CERVI, Emerson. Produção legislativa e conexão eleitoral na Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Revista de

Sociologia Política, v. 17, n. 32, p. 189-193, fev. 2009.

4 Entende-se por pork barrel políticas públicas que oferecem benefícios particulares para localidades específicas.

5 No caso brasileiro, esse comportamento individualista seria agravado por diversos fatores, principalmente pelas

regras eleitorais, entre elas o fato de a eleição ser proporcional de lista aberta.

6 Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, sob o

título Emendas ao Orçamento e conexão eleitoral na Câmara dos Deputados brasileira, 2008, orientada por Fernando

Limongi.

7 A autora, inúmeras vezes, toma como investimento nos Estados a emendas individuais que têm, a princípio,

dotação não definida a determinado município. Esse é um erro metodológico grave. Essa estratégia é muito utilizada

entre os parlamentares quando querem ter mais liberdade para definir o destino daquele recurso em um momento

posterior à aprovação do Orçamento. São, em geral, duas situações a serem evitadas. A primeira refere-se à

possibilidade de definir uma emenda a um município que poderá não estar apto a receber os recursos no momento

em que ele for disponibilizado. Ou seja, entre o lapso temporal da aprovação do Orçamento e o empenho do recurso

pelo Executivo, o município pode ter ficado inadimplente, portanto, sem condições legais de receber novos recursos.

Em segundo lugar, diante da dinâmica política, o prefeito pode ter deixado de apoiar o parlamentar e este não deseja

mais que aqueles recursos tomem esse destino. Se a definição de município for feita no Orçamento não há como

alterar a destinação dos recursos. Contudo, se for definido de forma genérica, por exemplo, “canalização de córregos

em municípios do Estado X“, um simples ofício do parlamentar ao órgão responsável especifica a destinação dos

recursos. Além disso, algumas vezes os parlamentares são atendidos em outras rubricas orçamentárias, as chamadas

“genéricas”, que são definidas pelos próprios órgãos. Esse erro metodológico, no entanto, não desqualifica outros

resultados encontrados na pesquisa, já que a taxa de reeleição dos candidatos que não apresentaram emendas foi

comparada à dos que apresentaram independentemente da destinação específica dos recursos ou de sua execução.

8 A Resolução nº 1, de 2006, alterada pela Resolução nº 3, de 2008, estabelece as normas de funcionamento da

CMO.

9 No período analisado, a CMO era composta por 63 deputados e 21 senadores. Após a Resolução nº 1, de 2006,

passaram a formar a CMO 30 deputados e 10 senadores.

10 A taxa de reeleição utilizada para montagem desta tabela levou em conta o seguinte critério: a taxa de reeleição

no pleito t é igual ao número de parlamentares reeleitos, dividido pelo número de cadeiras em disputa em t - 1.

11 Participação refere-se ao montante de recursos financeiros não contabilizados que são distribuídos aos diversos

atores envolvidos na alocação e liberação de recursos orçamentários, como podemos observar em diversas

reportagens na mídia e nas conversas e entrevistas com atores políticos.

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Marco Lemgruber, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental (EPPGG); cientista político (UNB) e

economista (CEUB); pós-graduado em Inteligência e Administração Pública; mestre em Ciência Política (UNB).

Atualmente, assessor da liderança do Partido Popular Socialista (PPS) na Câmara dos Deputados.

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VII. As notas devem figurar no final do texto, numeradas em ordem crescente e indicadas no corpo do texto emalgarismos arábicos, nos padrões da ABNT. A citação bibliográfica deve ser completa quando o autor e a obraforem indicados pela primeira vez. Ex.: REZEK, Francisco. Direito Internacional Público. 10 ed. São Paulo: Saraiva,p. 14, 2005.

VIII. Nos casos de repetição, utilizar: REZEK, Francisco, op. Cit., p. 21.

IX.. A bibliografia é indispensável, devendo constar ao final do trabalho, em ordem alfabética, nos padrões ABNT,conforme exemplos listados abaixo:

Livro: WIEACKER, Franz. História do direito privado moderno. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,2004.

Coletânea: MOTA, Lourenço Dantas (org.). Introdução ao Brasil. Um banquete no trópico 1. 3ª ed. SãoPaulo: Editora SENAC São Paulo, 2001.

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Artigo em coletânea: ALENCASTRO, Luiz Felipe de. Joaquim Nabuco. Um estadista no império. In:Introdução ao Brasil. Um banquete no trópico 1. 3ª ed. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2001.

Artigo em periódico: BARROSO, Luis Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direitoconstitucional brasileiro. Revista Diálogo Jurídico. Salvador: ano I, vol. I, nº 6, set. 2001.

Tese acadêmica: SOUZA, Telma de. A tradição autoritária brasileira e a esquerda. Tese (Doutoramentoem Ciência Política), Universidade de São Paulo, São Paulo.

X. O autor do texto publicado terá direito a dez exemplares da revista.

XI. Informações adicionais sobre a revista bem como os números publicados estão disponíveis na paginawww.anesp.org.br.