revista cirurgia 04

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Corpo Editorial Editor Chefe – José Manuel Schiappa, Editores – José Crespo Mendes de Almeida (Editor Científico), José Augusto Gonçalves (Editor Técnico), Jorge Penedo (Editor de Supervisão), Amadeu Pimenta, Eduardo Xavier da Cunha (Editores Associados) Conselho Científico A. Silva Leal, António Marques da Costa, A. Araújo Teixeira, C. Alves Pereira, Eduardo Barroso, F. Castro e Sousa, Fernando José Oliveira (Presidente), Francisco Oliveira Martins (Secretário Geral), Jaime Celestino da Costa, João Gíria, João Patrício, Jorge Girão, Jorge Santos Bessa, José Guimarães dos Santos, José Luís Ramos Dias, José M. Mendes de Almeida, Rodrigo Costa e Silva, Vítor Passos de Almeida Edição e Propriedade Sociedade Portuguesa de Cirurgia – Rua Xavier Cordeiro, 30 – 1000-296 Lisboa, Telefs.: 218 479 225/6, Fax: 218 479 227, E-mail [email protected] Redacção e Publicidade SPOT Depósito Legal 255701/07 Composição, impressão e acabamento G.C. – Gráfica de Coimbra, Lda. Página dos Editores/Editors Page . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 Página da Sociedade Portuguesa de Cirurgia/Portuguese Society of Surgery Page . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 HISTÓRIA E CARREIRAS PROFISSIONAIS/HISTORY AND PROFESSIONAL CAREERS João Cid dos Santos – Evocação da vida, pensamento e obra, na celebração do seu centenário /João Cid dos Santos – Remembering his life thoughts and work, at the celebration of his centenary . . . . . . . . 7 A. Dinis da Gama ARTIGOS ORIGINAIS /ORIGINAL PAPERS Citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica no tratamento da doença peritoneal maligna: Estudo de fase II com reduzida toxidade e morbilidade /Citoreduction followed by intraperitoneal hyperthermic chemoperfusion, treating malignant peritoneal disease: Phase II study with reduced toxicity and morbidity . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes Agenda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Hiperparatireoidismo – um diagnóstico não pensado/Hyperaparathyroidism – a non thought diagnosis . . . . 23 João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira GRANDES TEMAS: OBESIDADE / GRAND ROUNDS: OBESITY Globesity, diabesity and surgery . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 Nicola Basso Obesidade: causas e distribuição da epidemia / Obesity: causes and distribution of the epidemy . . . . . . . . 35 Henrique Barros, Elisabete Ramos Revista Portuguesa de Cirurgia II Série n.° 4 Março 2008 1 II Série Número 4 Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia Índice

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Page 1: Revista Cirurgia 04

Corpo Editorial Editor Chefe – José Manuel Schiappa, Editores – José Crespo Mendes de Almeida (Editor Científico), José Augusto

Gonçalves (Editor Técnico), Jorge Penedo (Editor de Supervisão), Amadeu Pimenta, Eduardo Xavier da Cunha (Editores

Associados) • Conselho Científico A. Silva Leal, António Marques da Costa, A. Araújo Teixeira, C. Alves Pereira, Eduardo

Barroso, F. Castro e Sousa, Fernando José Oliveira (Presidente), Francisco Oliveira Martins (Secretário Geral), Jaime Celestino da

Costa, João Gíria, João Patrício, Jorge Girão, Jorge Santos Bessa, José Guimarães dos Santos, José Luís Ramos Dias, José M.

Mendes de Almeida, Rodrigo Costa e Silva, Vítor Passos de Almeida • Edição e Propriedade Sociedade Portuguesa de Cirurgia

– Rua Xavier Cordeiro, 30 – 1000-296 Lisboa, Telefs.: 218 479 225/6, Fax: 218 479 227, E-mail [email protected] • Redacção

e Publicidade SPOT Depósito Legal 255701/07 • Composição, impressão e acabamento G.C. – Gráfica de Coimbra, Lda.

Página dos Editores/Editors Page . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

Página da Sociedade Portuguesa de Cirurgia/Portuguese Society of Surgery Page . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

HISTÓRIA E CARREIRAS PROFISSIONAIS/HISTORY AND PROFESSIONAL CAREERS

João Cid dos Santos – Evocação da vida, pensamento e obra, na celebração do seu centenário/João Cid dos Santos – Remembering his life thoughts and work, at the celebration of his centenary . . . . . . . . 7

A. Dinis da Gama

ARTIGOS ORIGINAIS /ORIGINAL PAPERS

Citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica no tratamento da doença peritoneal maligna: Estudo de fase II com reduzida toxidade e morbilidade/Citoreduction followed by intraperitoneal hyperthermic chemoperfusion, treating malignant peritoneal disease: Phase II study with reduced toxicity and morbidity . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15

J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes

Agenda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

Hiperparatireoidismo – um diagnóstico não pensado/Hyperaparathyroidism – a non thought diagnosis . . . . 23João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira

GRANDES TEMAS: OBESIDADE / GRAND ROUNDS: OBESITY

Globesity, diabesity and surgery . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31Nicola Basso

Obesidade: causas e distribuição da epidemia / Obesity: causes and distribution of the epidemy . . . . . . . . 35Henrique Barros, Elisabete Ramos

Revista Portuguesa de Cirurgia II Série • n.° 4 • Março 2008

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

Índice

Page 2: Revista Cirurgia 04

Cirurgia bariática / Bariatic surgery . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43Isabel do Carmo, Maria João Fagundes, José Camolas

A obesidade do ponto de vista do gastrenterologista / Obesity from the gastroenterologist’s perspective . . . . . . 51M. Bispo, P. Barreiro, T. Bana, L. Matos

Tratamento da obesidade mórbida com banda gástrica / Treament of morbid obesity with gastric band . . . . 59António Sérgio

Bypass gástrico / Gastric bypass . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69Rui Ribeiro

Gastrectomia vertical calibrada “Sleeve”/Vertical calibrated Sleeve Gastrectomy . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79Edgar Jesus da Rosa

Derivação biliopancreática com duodenal switch / Biliopancreatic bypass with duodenal switch . . . . . . . . . . 81Pedro Gomes

Physiologie de l’absorption alimentaire: diversion bilio-pancréatique. Mise à jour à propos de 3000 interventions . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85

N. Scopinaro

CASO CLÍNICO / CLINICAL CASE

Síndrome de Boerhaave . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101Sousa, L., Garrido, R. & Santos, L.

Instruções para autores – versão sumarisada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103

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Revista Portuguesa de Cirurgia

Page 3: Revista Cirurgia 04

Página dos editoresJosé Manuel Schiappa

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

UM ANO DE “REVISTA PORTUGUESA DE CIRURGIA”

Passou um ano e conseguimos publicar 5 números da nossa “Revista Portuguesa de Cirurgia”: o número “Zero” e os4 números que estabelecemos como “produção” anual.

Estamos satisfeitos? Estamos de parabéns? É verdade que estamos satisfeitos por termos cumprido o prometido. Procurámos obter uma uniformidade editorial

e tentámos criar um estilo. Sob o nosso ponto de vista, estes pressupostos foram atingidos e esperamos poder continuar namesma linha, mantendo o que seja positivo (segundo a visão de todos e com as vossas opiniões) e tentando melhorar tudoaquilo que saiu “menos bom”. Fizemos a publicação atempada dos vários números também como previsto.

Sabemos que tivemos melhores e piores números e sabemos também que houve textos e tipos de artigos publicadosque poderão ter agradado mais ou menos a diversos tipos de leitores.

No entanto, temos também que reconhecer que, ainda que os números publicados nos tenham dado satisfação, ficá-mos com a sensação de que houve uma falha na tarefa a que nos propuséramos de “chegar ao leitor”; ou melhor de “fazero leitor chegar à Revista”.

De facto, não tem havido a esperada resposta do lado dos leitores nem a interactividade que desejávamos que pudessevir a ser uma das linhas mestras da vida da Revista. Como acontece sempre, tivemos felicitações pelo trabalho bem comoas esperadas palavras críticas – ainda que muito poucos fossem reparos “construtivos”. Também estamos a isso habituadose o esperávamos, pelo que não houve surpresas.

É em relação à falta de interactividade que pomos a questão e é em relação a isto que gostaríamos de saber onde falhá-mos e o que pode ser feito para obtermos a vida científica pretendida; tudo sem baixar a qualidade de textos que quere-mos que se mantenha no nível que achamos ser o que a nossa Cirurgia merece e que também entendemos que é bem capazde atingir e manter.

Afinal, uma “não resposta” e a falta de contactos pode ser uma resposta, demonstrativa de que o que fizemos não é oque os leitores pretendem; de que a Revista não traduz a nossa realidade, e não vai ao encontro do que os leitores querem.Gostaríamos que nos façam saber, com a frontalidade que deve existir, quais as alterações que são pretendidas ou quais aspossíveis razões desta situação. Também entendemos que sucessivas revistas científicas dedicadas à cirurgia têm soçobradoe que não está criada uma cultura de publicação e participação generalizada e continuada.

Passando do majestático ao pessoal, como Editor-Chefe, tenho que agradecer à equipa editorial pelo trabalho e peloentusiasmo e apoio dado; sem eles seria absolutamente impossível ter sido feito o que se fez, não só em termos da quali-dade – de que nos orgulhamos – mas também em termos mais simples daquele trabalho básico, difícil de explicar mas queé crucial.

O trabalho foi feito com gosto, entusiasmo e prazer, e foi o melhor que conseguimos com as condições existentes. Estascondições, que foram de início difíceis e não permitindo algumas formas de trabalho que entendíamos como fundamen-tais, estão agora a caminho de resolução com o apoio da direcção da SPC e pensamos que a nossa resposta e facilidade decontacto com os autores e revisores fique francamente melhorada em breve com muito melhor articulação, entendimento,rapidez e resultados.

As reuniões de Editores são sempre sede de franca e muito aberta discussão com participação interessada e extrema-mente construtiva; também aí temos procurado ultrapassar a inércia dos potenciais autores fazendo convites para a elabo-ração de artigos a cirurgiões portugueses conhecidos pelos seus interesses e trabalhos em determinadas áreas. Todos têm sidoaceites e temos tido, graças a esses trabalhos, textos de elevado nível científico nos nossos números. No entanto, apesar detodos os convites terem sido aceites, nem todos foram finalizados com um texto.

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Revista Portuguesa de Cirurgia

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Por essa razão, o trabalho dos editores viu-se sobrecarregado uma vez que nos vimos, por vezes, forçados nós própriosa elaborar textos para que uma coerência possa ser mantida e para manter os prazos e as linhas editoriais.

Agradeço também aos Revisores o trabalho efectuado e o apoio à linha editorial que estamos a seguir.Houve alguma confusão, por deficiente comunicação, em relação aos trabalhos apresentados a concurso no nosso Con-

gresso de 2007, todos supostamente originais, e que deveriam ter sido apresentados de acordo com determinadas regras edi-toriais para depois serem – eventualmente – publicados na Revista; a ideia transmitida aos autores foi diferente da origi-nal mas a situação foi ultrapassada com a sua publicação, que termina neste número. No entanto, para este ano e para ofuturo, a situação fica clarificada com as condições dos Editores da Revista Portuguesa de Cirurgia publicadas em carta quejá foi enviada pela Direcção da Sociedade a todos os sócios.

Apenas um dos trabalhos não foi publicado uma vez que os seus autores decidiram retirá-lo desse propósito.Todas estas situações levantaram, contudo, um outro problema; enquanto não existir uma “velocidade de cruzeiro”

com um envio regular, atempado e em número suficiente, de trabalhos originais para eventual publicação, não entende-mos que estejam reunidas as condições para fazermos o pedido oficial para a New York Library of Medicine para que aRevista Portuguesa de Cirurgia seja aceite para ali ser indexada.

O cumprimento das regras e condições exigidas, e a sua manutenção, não é fácil e implica uma responsabilidade con-tinuada que, a falhar, leva a um descrédito que não queremos arriscar e que tememos poder acontecer no actual panorama.Assim que verificarmos haver um fluxo de artigos originais em volume que nos permita ultrapassar estas dúvidas, faremoso pedido com o envio de todos os números até agora publicados.

Como exemplo demonstrativo do rigor e dos problemas que rodeiam estes processos podemos reportar-nos ao querecentemente é citado no número de Dezembro da HBP, a revista da Associação Internacional de Cirurgia Hepato-Bilio-Pancreática, onde o Editorial mostra bem as preocupações com o nível da Revista, que tenta a sua aceitação na lista de Jor-nais científicos indexados na Medline. A Revista não foi aceite quando avaliada no fim de 2006! Ainda que positivamenteavaliada quanto à qualidade dos manuscritos, do Corpo editorial, da regularidade e prontidão de publicação e do conteúdocientífico dos trabalhos originais e de revisão, falhou em outras áreas como política de saúde e educação. Creio que estaenumeração dos pontos que são considerados mostra bem o rigor e a minúcia dos processos. O que a HPB pede é seme-lhante, ainda que a diferente nível, ao que nós pedimos: que os membros da Sociedade considerem a apresentação dos seustrabalhos à nossa Revista e que o façam transformando em manuscritos, por exemplo, os trabalhos que considerem maisimportantes e que tenham sido apresentados no nosso Congresso como Free Papers ou Palestras. O interesse deste pontoé mutuo, com maior volume de trabalhos para publicação, por um lado, e com maior divulgação, nacional e internacio-nal do trabalho produzido pelos nossos diversos Departamentos e Serviços de Cirurgia.

Mas o panorama pode e deve mudar; para este número tivemos trabalhos em quantidade suficiente e alguns tiveramde ver a sua publicação adiada. Mesmo algumas secções já habituais tiveram que ser excluídas deste número para quepudesse ter um número não excessivo de páginas. O Caderno Especial é volumoso em conteúdo e em número de páginase levou a esta situação; no entanto, considerando o seu interesse e a sua qualidade, pensamos que foi a melhor opção.

Temos notícias de interesse geral, respeitantes a novidades introduzidas na nossa Revista, algumas das quais para o pró-ximo número e que anunciaremos nessa altura.

Estabelecemos um acordo com o “Journal de Coelio-Chirurgie” para a troca de artigos de especial interesse, o pri-meiro dos quais é publicado neste número, incluído no Caderno especial; do mesmo modo certos dos nossos textos focandoLaparoscopia poderão ter a oportunidade de serem publicados naquela prestigiada Revista francesa.

Duas alterações relativas a informações e serviços a autores: as instruções para autores passarão a ser apresentadas naRevista apenas na sua versão sumária, para poupança de espaço; a versão completa poderá ser consultada on-line. As sepa-ratas passarão a ser enviadas aos autores sob a forma de um ficheiro PDF com a versão completa do trabalho, absolutamenteigual ao publicado.

Por último, estamos a tentar também modificar o “site” da Revista de forma a poder responder de forma simples às– possíveis – necessidades dos utilizadores; mais uma vez, e porque não sabemos quais são, necessitamos do vosso apoio,das vossas opiniões e da interactividade tão desejada.

Termino com um voto de confiança no futuro da Revista, considerando o nível que temos conseguido, fruto da qua-lidade dos trabalhos que têm sido enviados e selecionados e com um pedido renovado: Sejam pro-activos! Contactem-nose escrevam-nos! Transmitam-nos as vossas ideias e os vossos trabalhos! Sejam críticos em relação ao publicado; no geral eno particular, em relação à forma e ao conteúdo!

Só desse modo a Revista será de todos e poderá traduzir o que todos queremos.

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As transformações que ocorreram na medicina, nas últimas duas ou três décadas, foram tão intensas e abran-gentes, que é previsível que a cirurgia convencional possa sofrer um declínio nos próximos anos.

Um melhor conhecimento das causas e dos mecanismos de diversas doenças em conjugação com notáveis inves-tigações farmacológicas, permitiram tratar muitas delas através de soluções não cirúrgicas. Os programas de preven-ção, rastreio e diagnóstico precoce reduziram, em muitas circunstâncias, as indicações para a cirurgia. A consagra-ção da cirurgia minimamente invasiva e a expansão de novas técnicas de intervenção tornaram mais simples, commenor morbilidade e menos onerosa a abordagem terapêutica de muitos doentes, outrora submetidos a procedi-mentos mais complexos e agressivos.

Estes exemplos, entre muitos outros que se poderiam citar, reflectem, apenas, o processo de evolução e trans-formação que ocorre continuamente no seio da medicina, mas são, suficientemente, elucidativos para se compreen-der algum declínio da cirurgia geral.

Concomitantemente com esta situação, que poderá afectar a essência da própria especialidade, tem-se assistidoà progressiva desertificação da cirurgia geral.

Na realidade, após um período áureo em que a cirurgia geral foi uma das opções preferenciais no acesso aointernato de especialidade, passou-se para uma fase intermédia, mas tendencialmente decrescente, registando-se nosúltimos tempos um decréscimo significativo nas escolhas dos internos, com repercussões não só na qualidade dos can-didatos como, facto que já se verifica nalguns países, no número daqueles que optam pela cirurgia geral.

Mas, porque é que estão a diminuir os candidatos para a especialidade de cirurgia geral?Será que um certo declínio da cirurgia geral, a que aludimos, justifica, só por si, o escasso impacto desta espe-

cialidade nas novas gerações?Pensamos que não, sendo possível identificar outros factores tais como, a progressiva redução do peso das dis-

ciplinas cirúrgicas na formação pré-graduada, a forma de recrutamento dos internos, o número de horas de traba-lho semanal, a crescente fragmentação da cirurgia geral, a superespecialização e, “the last but not the least”, a quali-dade de vida.

Esta crise, que não se circunscreve ao nosso país, não parece ser uma crise de vocações, mas reflecte, sobretudo,a incapacidade de uma especialidade em seduzir, apenas, porque deixou de ser apelativa.

É necessário inverter esta tendência que, a curto prazo, pode tornar-se preocupante.Os cirurgiões através das suas associações científicas e profissionais, nomeadamente a Sociedade Portuguesa de

Cirurgia e o Colégio de Especialidade de Cirurgia Geral, deverão ser capazes de formatar propostas que requalifiquema cirurgia geral tornando-a, novamente, uma especialidade apelativa, sedutora e desejada pelas novas gerações.

É que a Cirurgia Geral continua a ser uma especialidade essencial com uma esfera de intervenção específica ecom um previsível recrudescimento do número de doentes que dela necessitam, em consequência do aumento daesperança de vida das populações e, também, do acréscimo das indicações para cirurgia profiláctica.

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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Página da S.P.C.Fernando José de Oliveira

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Revista Portuguesa de Cirurgia

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ERRATA

Ao N.°3 da Revista Portuguesa de CirurgiaPágina 52 – Caso Clínico – Rotura isolada da vesícula biliar por traumatismo abdominal fechado por M.Mendes, J. Penedo, J. Guedes da Silva, do Centro Hospitalar de Lisboa Central – E.P.E: Hospital de Santo Antó-nio dos Capuchos – Serviço 6

Faltou na impressão da Revista, um parágrafo que tira grande parte do sentido do Caso Clínico, por a suaausência omitir o tratamento cirúrgico efectuado:Imediatamente a seguir ao parágrafo que termina com:... outras lesões potenciais.Deveria ter sido impresso o seguinte parágrafo:

Após exploração cirúrgica da via biliar principal, arco duodenal, e espaço retroperitoneal através de manobrade Kocher ampla, não foi detectada qualquer outra solução de continuidade. O aspecto isquémico da parededa vesícula condicionou a opção por colecistectomia anterógrada, com drenagem passiva da loca de Morrisson.O pós-operatório decorreu sem complicações com alta ao 6º dia.

Do facto, pedimos desculpa aos autores.

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João Cid dos Santos ocupa um lugar destacado nahistória da Angiologia e Cirurgia Vascular devido àssuas grandes descobertas, a flebografia em 1937 e aendarteriectomia em 1947. Elas resultaram natural-mente do seu génio criativo e do ambiente e doshomens que o rodearam e o influenciaram, nesseriquíssimo e fértil período histórico que mediou entrea 1ª e a 2ª Guerra Mundial.

A concretização da flebografia como método semio-lógico exigiu uma apreciação e revisão profunda sobrea circulação venosa, sobretudo dos membros inferiores,da qual emergiram novos conceitos e interpretaçõesanátomo-fisiológicas relativamente a um sector quetradicionalmente se encontrava votado ao abandono eesquecimento; por sua vez a flebografia permitiu alar-gar a capacidade de estudo e compreensão da essênciade muitos quadros patológicos, de natureza orgânicaou funcional, que podem atingir a circulação venosados membros.

Durante décadas, a flebografia assumiu-se como ométodo de excelência para o estudo da circulaçãovenosa dos membros; o seu campo de acção foi,porém, fortemente condicionado pela introdução dosultra-sons na área do diagnóstico, nos finais dos anos60 e o seu subsequente aperfeiçoamento e sofisticaçãoaté à actualidade. A utilização da flebografia na prá-tica clínica quotidiana está hoje restringida a casos clí-nicos singulares e muito bem seleccionados, mas reco-nhece-se que é ainda o método mais completo e pro-

fundo que existe para o estudo da circulação venosados membros e por isso continua a ser consideradocomo o “gold standard”, através do qual se comparamo valor e a eficiência das novas tecnologias que vãosendo introduzidas. É por outro lado um instrumentoindispensável na investigação clínica, devido ao rigor,precisão e objectividade das informações que propor-ciona.

A endarteriectomia ou desobstrução arterial consti-tuiu a primeira tentativa de restabelecer a circulaçãoem artérias afectadas por oclusões crónicas, através daremoção do processo oclusivo e restauração da sua per-meabilidade.

Numa época em que o tratamento das arteriopatiasoclusivas se encontrava dependente de concepçõesfisiopatológicas de natureza funcional, que legitima-vam a utilização da simpaticectomia como arma tera-pêutica, de que Rene Leriche fora o grande mentor, aproposta de Cid dos Santos surge simultaneamentecomo uma heresia e uma esperança.

Com efeito, de acordo com os princípios então esta-belecidos, a actuação no interior de uma artéria eraseguida invariavelmente pela oclusão da mesma, o quetornava proibitiva a exposição, manipulação ou o con-tacto da sua intima. Cid dos Santos demonstrou coma endarteriectomia que tal principio não era ver-dadeiro e a sua técnica veio a consagrar-se como ummétodo terapêutico de eleição para o tratamento daslesões arteriais oclusivas segmentares de praticamente

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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HISTÓRIA E CARREIRAS PROFISSIONAIS

João Cid dos SantosEvocação da vida, pensamento e obra,

na celebração do seu centenárioA. Dinis da Gama

Clínica Universitária de Cirurgia Vascular da Faculdade de Medicina de Lisboa

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A. Dinis da Gama

Em Estrasburgo trabalhou Cid dos Santos directa-mente com Fontaine e travou conhecimento com JeanKunlin, Michael DeBakey e Georges Arnulf, entreoutros, estabelecendo amizades que se prolongarampela vida fora. Esse período de um ano marcou Ciddos Santos de forma definitiva e imperecível: “... Porisso, o nosso estágio junto de Leriche marca ummomento capital da nossa vida. O embate dentro denós entre as personalidades e as respectivas orientaçõesdos nosso dois Mestres foi o facto determinante na for-mação da mentalidade que - boa ou má - ainda hojeconservamos...”confessou ele num momento de refle-xão.

Regressado a Lisboa retomou as suas funções comointerno de cirurgia do Hospital de Arroios e em 1939ingressa nos quadros da Faculdade de Medicina comoassistente de Urologia.

Em 1942 obtém, mediante concurso, o titulo deCirurgião dos Hospitais e em 1944 parte para os Aço-res, mobilizado para chefiar uma equipa cirúrgica mili-tar que deu apoio na rectaguarda, às tropas aliadasenvolvidas na II Guerra Mundial.

Nesse mesmo ano, presta provas de doutoramentona Faculdade Medicina de Lisboa com uma tese inti-tulada “Patologia Geral das Isquémias dos Membros”,em 1945 é aprovado como Professor Extraordinário eem 1949 chega ao lugar de Professor Catedrático deCirurgia da Faculdade de Medicina de Lisboa, entãolocalizada no Hospital de Santa Marta.

Em 1953 ocorre a inauguração do novo HospitalEscolar de Santa Maria no qual Cid dos Santos foiencarregue da Direcção do Serviço de Clínica Cirúr-gica. Conseguia, aos 46 anos de idade, ascender a umlugar destacado e uma posição de liderança na cirurgiae nos meios académicos nacionais. Organiza, com umdedicado grupo de colaboradores, um serviço modelar,o que lhe permite concretizar, aprofundar e expandiruma parte significativa da sua obra científica, que nas-cera em Arroios e Santa Marta. Nesta fase da sua vida,consegue notoriedade e projecção internacional. Sãocrescentes os contactos e solicitações provenientes detodo o mundo em que a par das motivações científicasse revela um emérito conferencista, requisitado pelos

todas as artérias cirurgicamente acessiveis do orga-nismo.

Foi na sequência da divulgação da endarteriectomiaque surgiram outras técnicas e métodos de revascula-rização, utilizando enxertos venosos ou sintéticos, quederam corpo e expansão à cirurgia arterial directa daactualidade. Este desenvolvimento só se concretizouapós a demonstração, por Cid dos Santos, que o pre-tenso papel desempenhado pela endartéria era ummito, que tinha impedido o desenvolvimento da cirur-gia arterial directa e que o destronar desse mito enco-rajara outras fórmulas de tratamento para as doençasarteriais obstrutivas.

Por isso se pode considerar, justamente, que a endar-teriectomia está na origem da cirurgia arterial recons-trutiva do nosso tempo.

CRONOLOGIA

João Cid dos Santos nasceu em Lisboa em 5 deAgosto de 1907 e desde muito novo, certamenteinfluenciado pela figura do seu pai, Reynaldo dos San-tos, mostrou interesse e vocação para a Medicina. EmSetembro de 1927 matriculou-se na Faculdade deMedicina de Lisboa e concluiu a licenciatura em 1933,começando, desde logo, a trabalhar com seu pai, noHospital de Arroios, em Lisboa. As bases da sua for-mação cirúrgica e pedagógica datam dessa época: rea-lizou as primeiras intervenções cirúrgicas e anestésicas(a anestesia nessa época era feita pelos cirurgiões maisnovos) e deu as primeiras aulas a estudantes e inter-nos. Ao mesmo tempo, ensaiou os primeiros passos nacirurgia experimental, estudando no animal técnicasvárias de cirurgia arterial, desde suturas simples a anas-tomoses e enxertos venosos.

Em 1936, com um inicio de experiência pessoal nocampo clínico, cirúrgico e experimental foi trabalhar,durante um ano, com René Leriche, em Estrasburgo.O peso e o prestigio de Leriche e da sua escola projec-tavam-se pela Europa e pelo Mundo fora e atraíamcirurgiões nacionais e estrangeiros, ávidos de conheci-mentos e experiências novas.

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Fig. 1 – Primeira flebografiarealizada no homem por JoãoCid dos Santos em 8 de Agostode 1933

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João Cid dos Santos. Evocação da vida, pensamento e obra, na celebração do seu centenário

FLEBOGRAFIA E FISIOPATOLOGIA VENOSA

Em 1930 a patologia venosa constituía uma área doconhecimento extremamente pobre e desinteressante,recheada de conceitos simplistas ou empíricos e nãoexistia um único método para estudar objectivamenteas doenças das veias. Uma das grandes dificuldades deavaliação residia na direcção centrípeta do fluxo san-guíneo e a presença de válvulas no sistema venoso. Ins-pirado nos trabalhos de Egas Moniz e Reynaldo dosSantos, conseguiu Cid dos Santos obter a visualizaçãodos troncos venosos profundos principais, após injec-ção de uma substância de contraste opaca aos Rx nacirculação venosa superficial dos membros.

Pela primeira vez tornou-se possível obter umavisualização completa dos colectores venosos profun-dos dos membros e da pélvis, método que designoupor “Flebografia directa em circulação livre” (Fig. 1).Foram inúmeras as técnicas flebográficas que se desen-

mais diversos auditórios, atraídos pelos seus notáveisdotes de oratória, vigor e brilho intelectual. Foi umverdadeiro embaixador da ciência e cultura portugue-sas do seu tempo.

Faleceu em 4 de Novembro de 1975, de ataque car-díaco, amargurado com os acontecimentos que seregistavam num dos períodos mais críticos por quepassava a sociedade portuguesa após a revolução de 25de Abril de 1974.

Para a história ficam os contributos maiores do seugénio criador, a flebografia e a endarteriectomia, mastambém permanece inesquecível a sua formação cul-tural e humana, a sua sensibilidade e inteligência, quefizeram dele um autêntico “cidadão do mundo” - esti-mado e admirado por todos os que o conheceram ecom ele conviveram.

OBRA CIENTIFICA

Tal como seu pai Reynaldo dos Santos, a obra cien-tifica de João Cid dos Santos estendeu-se à CirurgiaGeral, à Urologia e à Angiologia e Cirurgia Vascular,desde sempre apoiada numa fértil imaginação criativae com contributos originais dedicados ao diagnósticoou ao tratamento das afecções mais diversas. No domí-nio da Cirurgia Geral, Cid dos Santos descreveu aderivação dos falsos quistos do pâncreas para o estô-mago (cistogastrostomia) e criou uma técnica de liber-tação intrapancreática do colédoco, seguida de esfinc-terectomia externa, para as lesões obstrutivas do esfínc-ter de Oddi. No campo da Urologia foi um pioneirona criação da neobexiga ileal e da prostatectomia trans-peritoneal, mas foi sobretudo no âmbito da patologiavascular que as suas descobertas tiveram mais resso-nância e projecção. Para além de contribuições maismodestas, como é o caso de uma via de acesso (ante-rior) para a simpaticectomia lombar ou de ter efec-tuado pela primeira vez uma trombectomia venosanum caso de flebotrombose aguda profunda, foi a des-coberta da flebografia e da endarteriectomia que lheconferiram os créditos e o mérito de grande investiga-dor e pioneiro da cirurgia vascular contemporânea.

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verdades esquecidas ou minimizadas da anatomo-fisio-logia normal e patológica do sistema venoso. Sua apli-cação à patologia e terapeutica”. A essência desse tra-balho foi apresentada às Jornadas Cardiológicas Inter-nacionais de Paris, em 1947 e é considerada uma dasmais lúcidas, completas e profundas análises dedica-das ao tema.

“Eu não podia ainda acreditar que em 1947 estavaescrevendo sobre uma matéria praticamente nova, aodescrever as bases fundamentais dos problemas veno-sos dos membros inferiores. Ainda hoje me é difícilentender inteiramente esse período da minha vida. Oconhecimento estava presente e, todavia, não estava.Verdades tinham sido emitidas para logo serem esque-cidas ou desprezadas. A flebografia representou o ter-reno sólido sobre o qual a revisão dos problemas tevelugar”.

O apogeu da flebografia como método semiológicoocorreu com a apresentação do relatório ao IX Con-gresso da Sociedade Europeia de Cirurgia Cardiovas-cular, em 1960, intitulado “Introdução à flebografiados membros inferiores”. Pouco tempo depois, o apa-recimento dos ultra-sons prenunciava o inicio do seudeclínio, que se vem acentuando até aos dias de hoje,persistindo, todavia, ainda como o mais completo erigoroso método de apreciação da anatomo-fisiologiae patologia da circulação venosa dos membros.

ENDARTERIECTOMIA

Existia entre os cirurgiões da época, a convicção quea manipulação da intima de uma artéria era seguidapor um fenómeno de trombose local imediata, con-ceito que foi sustentado por grandes personalidades,entre as quais se destacam Matas (1909), Guthrie(1912) e Moure (1923). Paralelamente, no campo dasembolias, assistia-se com frequência à formação deuma trombose secundária após a remoção de umêmbolo, sobretudo se se tratava de uma embolia deevolução prolongada. Tal facto, ficava a dever-se à lesãodo endotélio resultante do impacto do embolo naparede arterial. Eynar Key considerava que toda a

volveram na sequência desta descoberta, até se obteruma desejável e ambicionada estandardização dométodo. Uma vez consagrada a técnica da flebografia,pode dizer-se que todos os estudos no campo dasdoenças venosas dos membros dependeram directa ouindirectamente da sua utilização. O diagnóstico pre-coce das tromboses venosas, a localização inicial dostrombos, as condições de aderência dos trombos àparede venosa e a sua extensão, a origem anatómicadas varizes, os processos de recanalização das veias pre-viamente obliteradas, o diagnóstico diferencial dasafecções venosas entre si e com factores extrínsecos,representam os aspectos culminantes demonstrados deforma clara pela flebografia.

Desde o inicio da utilização clínica da flebografiaque se levantaram dúvidas e incertezas relativamente àsbases fundamentais da fisiopatologia venosa, que setentaram esclarecer com a utilização do própriométodo. “... A investigação sobre flebografia foi ini-ciada na mais completa escuridão. As perguntas queeu fazia a mim próprio eram de natureza elementar:para quê as válvulas e por que existiam elas sómente nosistema venoso? Por que se localizavam as lesões trófi-cas das afecções venosas sómente na pele e tecido celu-lar subcutâneo? Por que é que o pé está aparentementeprotegido das lesões tróficas? Como se estabelece a cir-culação venosa colateral? Qual a influencia da força degravidade no retorno venoso? O que é a estase?... Todasestas perguntas tinham forçosamente de obter umaresposta, sobretudo porque o desenvolvimento da fle-bografia e sua interpretação dependiam do conheci-mento das bases fundamentais anátomo-fisiopatológi-cas do sistema venoso dos membros”, interrogava-seCid dos Santos num momento de reflexão profundasobre o rumo a imprimir às suas investigações.

Utilizando a flebografia como instrumento, procu-rava Cid dos Santos responder àquelas questões,apoiando-se igualmente em dados da experimentaçãoanimal. À medida que a experiência ia progredindo,muitas das respostas tornaram-se claras, simples e lógi-cas. Tal circunstância estimulou-o a registar, para aposteridade, o produto das suas conclusões, sob aforma de um trabalho que intitulou “Sobre algumas

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João Cid dos Santos. Evocação da vida, pensamento e obra, na celebração do seu centenário

Concebeu então que a acção da heparina poderiaservir de protecção à regeneração da intima após aremoção de um trombo antigo, formado em conse-quência de um processo de endarterite. Era urgentedemonstrar-se na prática clínica essa possibilidade.

Em doentes graves, sofrendo de processos terminais,realizou Cid dos Santos algumas desobstruções arte-riais periféricas, sob protecção da heparina, podendocomprovar, dias depois e após o falecimento dessesdoentes, que as artérias se mantinham permeáveis.Enviou para estudo histopatológico os fragmentosresultantes da desobstrução e constatou que eles eramcompostos por um trombo central organizado, toda aendartéria doente e parte da camada muscular. Esteachado deixou-o perplexo: tinha em mente a remoçãodo trombo apenas e os exames histológicos demons-travam que a remoção se estendia sempre à túnicamédia da parede arterial! A constatação destes factoslevou-o de imediato a duas conclusões que se revela-ram fundamentais para o prosseguimento e sucesso daexperimentação: a descoberta da existência de umplano de clivagem em plena túnica média da paredearterial que facilitava a remoção do processo oclusivo;e que naquelas condições e sob protecção da heparina,o sangue podia fluir na artéria, em contacto com umaparede muscular, sem ocorrer trombose secundária, oque parecia inacreditável.

Animado com estas revelações, decidiu de imediatooperar alguns doentes, apoiado naqueles conceitos.Em 27 de Agosto de 1946 realizou pela primeira vezuma desobstrução de um segmento ilio-femoral, numhomem de 66 anos de idade, restabelecendo a per-meabilidade arterial, o que foi comprovado por arte-riografia intra-operatória, constatando que o métodopermitia ainda restabelecer a permeabilidade de cola-terais ocluídas.

Em 12 de Dezembro do mesmo ano realizou igualprocedimento numa mulher de 35 anos de idade, comuma obstrução das artérias subclávia e axilar do mem-bro superior direito. Um excelente e prolongado resul-tado deu-lhe a certeza que o método reunia todas ascondições para o sucesso e designou-o por “desoblite-ração arterial”. Bazy chamou-lhe depois, mais apro-

embolia que ultrapassasse as 10 horas de evoluçãodeveria ser desencorajada de ser tratada por embolec-tomia, por ser sistematicamente seguida de trombosesecundária, um conceito que era igualmente compar-tilhado por Leriche.

O carácter “intocável” da intima arterial desmoti-vava e impedia mesmo as tentativas de desobstruçãoarterial e os cirurgiões voltavam-se para a cirurgia dosistema nervoso simpático, de natureza funcional,visando a resolução do “magno” problema do vasos-pasmo - a que Leriche deu tanta importância e queconsiderava como uma componente essencial da fisio-patologia das isquemias dos membros.

O desenvolvimento e progressiva utilização clínicada aorto e arteriografia pôde trazer, aos olhos dos cirur-giões, um “mundo” totalmente novo, sobretudo a reve-lação de uma nova patologia macroscópica, queassumia, com relativa frequência, um carácter seg-mentar nos diversos territórios da árvore arterial.

Desde logo experimentou Cid dos Santos a tentaçãode abordar e tratar directamente essas lesões, no quefoi estimulado por Reynaldo dos Santos. Voltou aolaboratório com esse propósito, ensaiando e reprodu-zindo as clássicas experiências de Carrel e Guthrie,com o objectivo de aperfeiçoar a sua execução técnica.

E é então que, em 1943, surge um facto que vem adesempenhar um papel relevante no desenrolar dosacontecimentos: a possibilidade de utilização da hepa-rina na prática clínica quotidiana. ...” I was in the posi-tion which is clearly defined through the words of theold fisherman to the young boy in one of ErnestHemingways’ books: the hooks were at the right place;then one had only to wait for the fish. In this case, thefish was heparin”... escreveu um dia, a esse propósito,Cid dos Santos.

Desde logo ocorreu-lhe a ideia de utilizar a hepa-rina na prevenção da trombose secundária após aembolectomia, no que foi bem sucedido; de seguida,empregou-a nas embolectomias tardias, igualmentecom resultados satisfatórios; finalmente utilizou-acomo prevenção da trombose pos cirurgia reconstru-tiva dos aneurismas (endoaneurismorrafia) igualmentecom bons resultados.

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priadamente, “endarteriectomia” e em circunstanciasde oclusão completa, recebia a designação de “trom-boendarteriectomia”.

Cid dos Santos tomou a decisão de apresentar osresultados da sua investigação e da consequente pro-posta terapêutica à Academia Francesa de Cirurgia, soba forma de uma comunicação que constituiu ummarco histórico da cirurgia vascular contemporanea eque se intitulava “Sur la désobstruction des thrombo-ses artérielles anciennes”. Foi seu relator René Lericheque termina a sua análise felicitando o autor e afirmacom visão prospectiva: “For 25 years I tried, after arte-rectomy, to find favourable conditions for the reesta-blishment of arterial continuity through grafting. I wasnever able to accomplish my program. I hope that thenew method will enable us to reestablish a lost func-tion. And this will be an immense progress”.

Os anos seguintes foram dedicados à difusão dométodo, bem como ao seu aperfeiçoamento. EdwinWilie foi o seu introdutor nos Estados Unidos daAmérica. Cedo se descobriu que a endarteriectomiapodia ser efectuada sem a protecção da heparina e quea manutenção da permeabilidade da artéria operadadependia mais da qualidade do débito sanguíneo doque da coagulação. A introdução do “over-pass”, dospontos de Kunlin a fixar a endartéria seccionada e aangioplastia em patch proposta por DeBakey consti-tuiram contributos significativos que visaram o seuaperfeiçoamento e aumentaram a sua eficácia.

O conjunto destes pormenores técnicos, bem comoa criação e o desenvolvimento de instrumentos cirúr-gicos destinados à sua realização, as indicações clíni-cas e os resultados obtidos com a endarteriectomia nosdiferentes territórios arteriais foram amplamente ana-lisados em Roma em 1963 no decurso do Congressoda International Cardiovascular Society, estabele-cendo-se as regras fundamentais do procedimento aque Cid dos Santos designou por “principios deRoma”. Era a consagração internacional do método deque fora pioneiro (Fig. 2).

Constituiu sempre a sua maior aspiração deixarescrito um livro dedicado à técnica da endarteriecto-mia. Todavia, foram certamente as múltiplas solicita-

ções de que era alvo e a dispersão de actividades a quefora obrigado, que o impediram de ver concretizadoesse seu desejo muito íntimo.

Em Setembro de 1975, como presidente da Inter-national Cardiovascular Society proferiu Cid dos San-tos em Edinburgh a Leriche Memorial Lecture intitu-lada “From embolectomy to endarterectomy or the fallof a myth” em que descreve, de forma simples, pro-funda e brilhante, a história da endarteriectomia e asincidencias que gravitaram em torno da ideia e da suarealização.

A terminar a conferência, em jeito de balanço finalde uma vida intensa e atribulada que fora a sua e decerto modo melancólico, afirma Cid dos Santos: “Theconsequence of all this (dispersion of activities) wasthat my work was practised mainly on units ratherthan on series of cases. Furthermore and paradoxically,having worked hard all my life, with little sleep andwithout the benefit of real hollidays, I confess to be, bynature, extremely lazy, indeed. In fact, I have wastedmuch time. If it were not for all these evils, endarte-rectomy could have its birth some years before. But,that is that”...

Dois meses depois, sobreveio, brutalmente, o ata-que cardíaco. Já na cama do hospital, abriu os olhos,cumprimentou-me com a saudação habitual “Olámenino!” e disse-me: “Desta vez é a sério”...

Morria na madrugada seguinte.

A. Dinis da Gama

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Fig. 2 – A tromboendarteriectomia, operação de João Cid dos Santos

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PROFESSOR UNIVERSITÁRIO E CIDADÃO

DO MUNDO

Era Cid dos Santos uma figura imponente, queimpressionava logo à primeira vista (Fig. 3). Alto, fei-ções anguladas e nariz procidente, olhar vivo e pene-trante, protegido por umas enormes sobrancelhas, commãos largas e expressivas, dele irradiava naturalmenteum sentimento misto de respeito e simpatia. Era cor-tês e afável nas relações pessoais, mas sabia como nin-guém ser ríspido e severo, sem nunca atingir porém aviolência ou a má criação. Dedicava especial atenção eafecto aos estudantes e médicos jovens a quem escu-tava com paciência as suas ideias e inquietações e mos-trava-se sempre disposto a ajudar e a aconselhar quemdele se socorresse.

Exprimia-se numa linguagem fluente e elegante,tradutora da sua vasta erudição e formação cultural.Na primeira lição como Professor Catedrático dedi-cada aos estudantes de Patologia Cirúrgica, em 1949,confessara que três homens de excepção haviam exer-cido notável influência na formação do seu espírito:Reynaldo dos Santos, René Leriche e o poeta ehomem de letras Afonso Lopes Vieira. Terá sido

Afonso Lopes Vieira quem mais o motivou para omundo da literatura e das artes. Era, porém, a litera-tura a sua paixão, mas não ignorava a pintura e amúsica, na qual se revelava um exímio interprete,como pianista. Num documento inédito que deixouno seu espólio literário, registou alguns autores eobras de que nunca desejaria separar-se: Platão,Demóstenes, Séneca, Cícero, Montaigne, Montes-quieu, Pascal, Anatole, Plutarco, Hume, Wellington,Churchill, de Gaulle, Camus e Oscar Wilde... Eranestes autores e suas obras que se refugiava nosmomentos críticos por que era obrigado a passar eganhava então alento e redobradas energias para pros-seguir a caminhada ...

Gostava do convívio social, sempre rodeado de ami-gos e colaboradores e recebia as visitas com discrição eelegância na sua mansão, situada na Rua da Rosa emAlfama, com uma esplendorosa vista sobre a cidade deLisboa.

Apreciava as coisas boas da vida e era um exigente“gourmet”, cultivava alguns dotes de culinária queainda hoje são lembrados em alguns dos velhos res-taurantes de Lisboa, os quais registam nas suas emen-tas um prato designado por “ovos mexidos à Profes-sor”, da sua autoria.

Dominando várias línguas estrangeiras, que falavaperfeitamente, foi um professor e um conferencistanotável, quer no país, quer no estrangeiro, ficandocélebres algumas das suas palestras como é o caso de“Medicina, última profissão romântica do mundo”,“Garfos, facas e colheres, ou a adaptação do espírito àinvestigação clínica”, “As oliveiras de Sócrates e os plá-tanos de Hipócrates”, “Como gastar tempo” ou “Oproblema das lesões vasculares na guerra, vistos por umcirurgião na paz” ...

Foi também um biógrafo de personalidades emi-nentes da Medicina como Reynaldo dos Santos, Frie-derich Wholwil, Jean Kunlin, René Fontaine e EdwinWylie e ainda de homens das artes como Francisco deLacerda ou Raul Lino.

Ficaram célebres algumas das frases que criou e queconstituem hoje inscrições lapidares transcritas emhomenagem à sua memória, tais como “Não há horá-

João Cid dos Santos. Evocação da vida, pensamento e obra, na celebração do seu centenário

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Fig. 3 – João Cid dos Santos

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rios para o pensamento” ou “Não basta dizer-se que avida de médico é dura, é necessário que o seja”.

Dedicou muito do seu tempo e preocupações parti-cularmente nos últimos anos da vida, a temas sociais ea projectos de reforma dos hospitais e da Universidade,em prol dos quais decidiu enveredar, transitoriamente-mente, por uma carreira politica, como deputado àAssembleia Nacional, que não durou mais do que trêsanos e que terminou em estado de desencanto e frus-tração. O respeito pelos princípios e rigor que eram tim-bre da sua formação cientifica rapidamente o incompa-tibilizaram com os homens e o volúvel mundo da poli-tica. Era um constante e irreverente critico face aopoder, a qualquer poder. De facto, muito apreciava sub-meter as razões do poder ao poder da razão ...

Desde muito novo que se rodeou de um pequenogrupo de colaboradores, que se foi alargando com odecorrer do tempo e que lhe dedicavam particular afei-ção e a maior admiração. “Não esqueço os meus ami-gos e colaboradores. Não se pode viver sem eles”, escre-veu ele um dia, em jeito de retribuição.

Como chefe de escola podia orgulhar-se de ter for-mado sete professores universitários e ter influenciadoa educação de um incontável número de cirurgiõesnacionais e alguns estrangeiros.

Foi membro activo e dirigente de numerosas agre-miações e sociedades científicas ou sócio-profissionais,nacionais e internacionais, contando-se entre elas avice-presidência do Capitulo Europeu e a presidênciada Sociedade Internacional de Cirurgia Cardiovascu-lar.

Tal como acontecera com o seu pai, João Cid dosSantos teve o privilégio de ver reconhecido em vida ovalor e o mérito da sua obra criadora, dedicada ao pro-gresso e desenvolvimento da angiologia e cirurgia vas-cular. São inúmeros os testemunhos desse reconheci-mento, sob a forma de doutoramento “honoris causa”por diversas universidades estrangeiras, membro hono-rário de cerca de vinte sociedades cientificas repartidaspelo mundo, professor visitante de outras tantas e ofi-cial da Legião de Honra, entre muitas outras conde-corações e prémios.

Partiu da vida num momento de apogeu e glória dasua carreira, com um prestígio e um nome mundial-mente conhecido, respeitado e admirado. No fundo,tal resultou da conjugação do seu génio com a forma-ção humana e o sentido universalista com que olhouo mundo e soube conduzir o seu destino. Por isso,creio que a designação de “cidadão do mundo” lheassenta com propriedade e justiça.

A. Dinis da Gama

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BIBLIOGRAFIA

– J. Cid dos Santos. Curriculum Vitae, 1ª Parte. Edição do Autor, 1944– J. Cid dos Santos. Curriculum Vitae, 2ª Parte. Edição do Autor, 1948– J. Cid dos Santos. Lição de Abertura do Curso de Patologia Cirurgica. Edição do Autor, 1949– J. Cid dos Santos. “Sur la desóbstruction des thromboses artérielles anciennes”. Bull Mem Académie de Chirurgie, 4 juin 1947: 409– J. Cid dos Santos. “Sur quelques véritées premières oubliées ou méconnues de l’anatomo-physiologie normale et pathologique du systéme vei-

neux. Leur application à la pathologie et à la thérapeutique”. Amatus Lusitannus, nº 1, 148– João Cid dos Santos. “Três homens de qualidade”. Edição do Autor, 1965– J. Cid dos Santos, “As oliveiras de Sócrates e os plátanos de Hipócrates”. Edição do Autor, Lisboa, 1966– J. Cid dos Santos. “Outro modo”. Edição do Autor, Lisboa, 1968– J. Cid dos Santos. “Reynaldo, Fontaine, Kunlin, Wylie”. Edição do Autor, Lisboa, 1968– J. Cid dos Santos. “Adaptação do espirito à investigação clínica”. J Médico 1969; LXIV: 880-5– Livro de Homenagem ao Prof. Cid dos Santos. Edição “O Médico”, Lisboa, 1976– Sessão de Homenagem ao Prof. João Cid dos Santos. Jornal da Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa, Janeiro-Março de 1976– J. Cid dos Santos. “Leriche Memorial Lecture. From embolectomy to endarterectomy or the fall of a myth”. J Cardiovasc Surg 1976; 17: 113-128

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Citorredução seguida de quimioperfusãointraperitoneal hipertérmica no

tratamento da doença peritoneal maligna:Estudo de fase II com reduzida toxidade e morbilidade

J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes

Serviço de Oncologia Cirúrgica – IPO PORTO FG EPE

ARTIGO ORIGINAL

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

RESUMO

Introdução: A cirurgia de citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica (HIPEC) é umaterapêutica multimodal de doentes seleccionados com doença peritoneal maligna primária ou secundária. Aindaque promissora, esta técnica tem sido associada a taxas de morbilidade significativas, internamentos prolonga-dos e a um risco moderado de mortalidade pós-operatória. Efectuamos um estudo prospectivo de fase II para ava-liar a toxicidade e morbilidade da cirurgia de citorredução seguida de HIPEC.

Métodos: Entre 2001 e 2006, 25 doentes com doença peritoneal maligna primária ou secundária, foram sub-metidos a citorredução seguida de HIPEC. A citorredução com ressecção do peritoneu visceral e parietal envol-vido por doença, teve como objectivo eliminar toda a doença macroscópica. Depois da citorredução procedeu-se à quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica durante 90 minutos, a uma temperatura de 42oC, com Mito-micina C (15 mg/m2/2L) para tumores primários de origem digestiva ou Cisplatina (50mg/m2/2L) para tumo-res primários do ovário e do peritoneu.

Resultados: Uma citorredução completa foi obtida em 88% dos doentes. A duração da intervenção variou entre5 e 9.30 horas. Registaram-se 3 casos com complicações pós-operatórias major (12%), não se tendo registado mor-talidade pós-operatória ou toxicidade relacionada com a quimioterapia. A mediana do tempo de internamentofoi de 11 dias. A taxa de sobrevivência global foi de 88% e 76% aos 1 e 2 anos, respectivamente.

Conclusões: A citorredução seguida de HIPEC pode proporcionar taxas de sobrevivência inesperadas, com bai-xas taxas de morbilidade e mortalidade. A selecção de doentes criteriosa e uma equipa treinada no suporte per-operatório podem contribuir para reduzir a morbilidade potencial desta terapêutica.

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J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes

de HIPEC. Todos os doentes foram incluídos numestudo prospectivo não randomizado de fase II e tra-tados segundo o mesmo protocolo.

Foram incluídos no estudo doentes com carcino-matose peritoneal comprovada por biópsia por lapa-rotomia ou laparoscopia, com ausência de sinais demetástases á distancia na TAC abdominal e torácica ecom tumor primário ou recidivante potencialmenteressecável, com idade menor ou igual a 80 anos eECOG performance status de 0, 1 ou 2.

Os critérios de exclusão do estudo foram a existên-cia de metástases á distância; sinais de envolvimentodo mesentério detectado na TAC ou na laparotomiaexploradora; a existência de co-morbilidades que con-tra-indiquem uma cirurgia major; ou alteração dasfunções hematológica, hepática ou renal.

Os doentes foram completamente informados sobreas potenciais vantagens e inconvenientes do procedi-mento, devendo autorizar por escrito a sua participa-ção no estudo.

Tratamento

Cirurgia de CitorreduçãoO objectivo da citorredução é a ressecção completa

da doença macroscópica. Na impossibilidade da res-secção completa, o objectivo é não deixar depósitosperitoneais com uma espessura superior a 2,5 mm,uma vez que esta é a máxima penetração tecidular damitomicina C. Para obter a máxima exposição é reali-zada uma incisão mediana desde o apêndice xifóideaté à sínfise púbica, com viscerólise e exploração com-pleta da cavidade abdominal. A extensão tumoral nacavidade peritoneal deve ser cuidadosamente registada.O Índice de Carcinomatose Peritoneal (PCI) descritopor Jacquet e Sugarbaker19 é um sistema de classifica-ção quantitativo da carcinomatose peritoneal, tendoem conta o envolvimento das diferentes regiões abdo-minais e o tamanho dos implantes peritoneais noabdómen e na pelve. A cavidade abdomino-pélvica foidividida em 13 regiões e as lesões peritoneais classifi-cadas de 0-3 tendo em conta o maior diâmetro dosimplantes em cada região anatómica (Fig.1).

INTRODUÇÂO

A cirurgia citorredutora combinada com a quimio-perfusão intraperitoneal hipertérmica (HIPEC) temsido descrita num número crescente de artigos publi-cados na literatura, para o tratamento da dissemina-ção peritoneal de neoplasias de várias origens, baseadana evidência do sinergismo entre a hipertermia e váriasdrogas antineoplásicas.1-4

Vários estudos de fase II e um de fase III demonstra-ram que esta terapêutica multimodal pode melhorar asobrevivência média em dois anos e proporcionar sobre-vivências superiores a 5 anos em cerca de 20% dosdoentes 5-11. Esta melhoria da sobrevivência deve serbalanceada com a potencial morbilidade desta terapêu-tica. Este procedimento é habitualmente prolongado etecnicamente complexo, pelo que não é surpreendenteuma morbilidade significativa, como resultado das res-secções múltiplas combinadas com a citotoxicidade daquimioterapia. Têm sido descritas taxas de morbilidadede 27% a 56% e taxas de mortalidade de 0% a 11%, amaioria relacionadas com complicações cirúrgicas 12-18.

Actualmente, existe uma grande variabilidade datécnica de citorredução combinada com HIPEC. Nãoexiste consenso relativamente ao tempo e temperaturade perfusão, ao uso da técnica aberta ou fechada e aoesquema e dosagem de citostáticos.

No Instituto Português de Oncologia do Porto efec-tuamos a cirurgia de citorredução com peritonectomiae ressecção de todas as áreas envolvidas por tumor,seguida da quimioperfusão intraperitoneal hipertér-mica com técnica aberta.

O objectivo deste estudo foi a avaliação da morbili-dade e toxicidade da citorredução seguida de HIPEC,em doentes com carcinomatose peritoneal de tumoresprimários de origem digestiva e do ovário e em doen-tes com mesotelioma peritoneal.

MÉTODOS

Entre Janeiro de 2001 e Dezembro de 2006, 25doentes com doença peritoneal maligna primária ousecundária, foram submetidos a citorredução seguida

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Fig. 1: Índice de Carcinomatose Peritoneal (PCI)

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Citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica no tratamento da doença peritoneal maligna

fragmático direito com a cápsula de Glisson na área deconfluência dos vasos suprahepáticos.

No final do procedimento de citorredução a quan-tidade de tumor residual nas 13 regiões abdomino-pélvicas deve ser registado. O score de citorredução(CC) é um factor de prognóstico quantitativo, queavalia a quantidade de tumor residual depois da citor-redução e deve ser classificado como: CC0: Ausênciade tumor residual; CC1: Persistência de implantestumorais <2,5mm; CC2: Persistência de implantestumorais > 2,5mm; CC3: Persistência de implantestumorais >2,5 cm.

Quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica Depois do procedimento de citorredução são colo-

cados um catéter de Tenckhoff centralmente no abdó-men e três drenos de Jackson-Pratt nas áreas sub-hepá-tica, sub-diafragmática esquerda e pélvis. As sondas detemperatura são colocadas no catéter de Tenckhoff, naárea sub-diafragmática esquerda e na pélvis. A paredeabdominal é suspensa pelo aro do afastador de Book-walter. A laparostomia é coberta com uma película deplástico, para evitar o extravasamento do líquido deperfusão e para diminuir a perda de calor. Durante aperfusão são manipuladas as ansas intestinais, para evi-tar as adesões das superfícies peritoneais e asseguraruma completa distribuição dos citostáticos nas áreasde risco. O equipamento de perfusão está constituídopor uma bomba de perfusão, um permutador de calore um reservatório com filtro. A solução usada para aperfusão é a solução de diálise peritoneal com dextrosea 1,5%. A temperatura da perfusão é monitorizada deforma contínua no permutador de calor, no tubo deentrada, na bacia e nas regiões sub-diafragmáticas.Com um fluxo de perfusão de 1L/minuto, o permu-tador de calor é programado para assegurar uma tem-peratura de perfusão de 420 C.

O esquema de quimioterapia intraperitoneal usadodurante a perfusão foi: Mitomicina C 15 mg/m2/2Lpara a carcinomatose de origem apendicular, colo-rec-tal e gástrica; Cisplatino 50 mg/m2/2L para a carcino-matose de origem ovárica, sarcomatose peritoneal emesotelioma. Foram colhidas amostras de liquido de

O PCI é obtido através do somatório do tamanhodas lesões em cada uma das 13 regiões anatómicas epode variar entre 0-39.

A técnica de peritonectomia é efectuada tal comodescrita por Sugarbaker20. A dissecção do peritoneu,espessado pela infiltração tumoral, é muito facilitadapelo uso da electrocirurgia em corte puro em alta vol-tagem, com eléctrodo de ponta esférica de 5mm. Éessencial manter o campo operatório absolutamenteseco ao longo da operação, já que a área exposta é habi-tualmente muito extensa, e mesmo uma hemorragiamoderada pode, no fim de uma cirurgia tão prolon-gada, resultar numa perda hemática excessiva.

A técnica de citorredução consta de um ou mais dosseguintes procedimentos, dependendo da extensão dadoença: 1. Omentectomia, peritonectomia parietaldireita ± hemicolectomia direita; 2. Peritonectomiapélvica ± ressecção do sigmóide ± histerectomia e ane-xectomia bilateral; 3. Omentectomia (pequeno epi-plon) e dissecção do ligamento hepato-duodenal ±antrectomia ± colecistectomia; 4. Peritonectomia doquadrante superior direito ± dissecção da cápsula deGlisson; 5. Peritonectomia do quadrante superioresquerdo ± esplenectomia; 6. Outras ressecções intes-tinais ou ressecções de massas tumorais.

As únicas razões para não proceder á citorreduçãocompleta foram o envolvimento extenso do delgadoou do mesentério, a infiltração tumoral da porta hepa-tis ou do pâncreas, e em alguns casos devido à existên-cia de infiltração tumoral na reflexão do peritoneu dia-

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perfusão, sangue e urina para determinação das con-centrações de citostáticos, aos 30 minutos, 1 hora e 24horas depois de terminada a perfusão. Ao cabo de 90minutos de perfusão o fluido é eliminado através dosdrenos. O Tenckhoff e os sensores de temperatura sãoremovidos, deixando-se os drenos que são conectadosa sistemas de drenagem por gravidade.

A continuidade gastrointestinal é restabelecida umavez terminada a perfusão. Realizamos ostomas deriva-tivos apenas em doentes de elevado risco. As anasto-moses são habitualmente realizadas com dispositivosde sutura automática e os topos das ressecções iniciaissão ressecados com uma margem de 0,5 cm, para asse-gurar que células tumorais viáveis não sejam incluídasnas linhas de sutura.

Periodo pós-operatórioTodos os doentes permaneceram na UCI até á esta-

bilização completa das suas funções vitais. A alimen-tação parentérica (APT) total foi iniciada precoce-mente. A alimentação entérica pela jejunostomia foiiniciada no 1º dia de pós-operatório em quantidadescrescentes, até superar as 2000 Kcal/ dia, altura em quea APT é suspensa e removido o catéter central. A ali-mentação oral foi iniciada em função da actividadeperistáltica. Os drenos foram removidos quando a dre-nagem foi inferior a 50 cc/dia.

Registo da morbilidade e toxicidadeDurante o período pós-operatório todos os parâ-

metros de morbilidade e toxicidade foram registados,nomeadamente complicações cirúrgicas e não cirúrgi-cas, o tempo entre a operação e a alimentação oralcompleta, o tempo de internamento e a quimio-toxi-cidade, segundo a escala de toxicidade da OMS.

Avaliação da respostaA avaliação da resposta ao tratamento é particular-

mente difícil nos doentes com carcinomatose perito-neal. Foi considerada resposta completa a ausênciacompleta de alterações na TAC, com normalização dosníveis de CEA no carcinoma colo-rectal; ausência dedoença comprovada por laparotomia ou laparoscopia.

Considerou-se resposta parcial a redução do volumedo tumor superior a 50% avaliado por TAC; reduçãodo nível de CEA pré-operatório superior a 50% emdoentes sem doença detectável com outros meios dediagnóstico; redução do volume de tumor superior a50% na laparotomia ou laparoscopia. Classificou-secomo doença progressiva o aumento do volume tumo-ral de 25% ou mais demonstrado pela TAC; aumentodo nível de CEA de 25 % sobre o nível mínimoobtido; aparecimento de novos nódulos em localiza-ções que previamente não tinham lesão; ascite positivapara células malignas. As situações em que não existi-ram critérios de resposta parcial, mas também nãoexistiram critérios de doença progressiva classificou--se como doença estável.

Follow-upApós a alta hospitalar, foi realizado exame físico,

hemograma, função hepática e renal, doseamento demarcadores tumorais (CEA, Ca 125 e Ca 19.9) e Rxde tórax com periodicidade trimestral, TAC abdo-mino-pélvico semestral e endoscopia anual (quandoindicado.

Análise da sobrevivênciaO tempo até à progressão da doença foi considerado

o tempo transcorrido entre a data da cirurgia e omomento em que a progressão da doença foi pela pri-meira vez documentada. A sobrevivência global e livrede doença foi calculada desde a data da cirurgia. Acausa de morte foi registada como consequência derecidiva tumoral, como complicação do tratamento oudevida a causa não relacionada.

A análise estatística foi efectuada com SPSS forWindows versão 11.0 e a sobrevivência foi calculadapelo método de Kaplan-Meier.

RESULTADOS

Foram analisados os 25 casos efectuados. Vinte eum doentes eram do sexo feminino (84%) e 4 (16%)do sexo masculino. A mediana da idade foi de 66 anos

J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes

18

Page 19: Revista Cirurgia 04

(mínimo 34 – máximo 79 anos); 56% dos doentesapresentava ECOG 0 e 40% ECOG 1.

Todos os doentes foram operados previamente, tendoefectuado cirurgias com carácter paliativo ou ressecçõescom intenção curativa. Com o objectivo de estratificaradequadamente a extensão da cirurgia efectuada pre-viamente, os doentes foram classificados segundo oscore cirúrgico pré-operatório (PSS), dependendo donúmero de regiões abdominais dissecadas na interven-ção anterior: PSS 1 (1 região abdominal dissecada): 5doentes (20%); PSS 2 (2 a 4 regiões abdominais disse-cadas): 17 doentes (68%); PSS 3 (5 ou mais regiõesabdominais dissecadas): 3 doentes (12%). A ressecçãopaliativa foi o tipo de cirurgia efectuada em 14 doentes(56%), em 7 (28%) foi realizada ressecção curativa e em4 (16%) apenas laparotomia exploradora.

A localização do tumor primário foi o apêndice em16 doentes (64%); o ovário em 4 doentes (16%); omesotelioma peritoneal em 2 doentes (8%); o estô-mago num doente (4%); delgado num doente (4%) ecolo-rectal num doente (4%).

Efectuaram quimioterapia com carácter adjuvanteou paliativo antes da cirurgia 8 doentes (32%).

Mais de 50% dos doentes apresentavam intra-ope-ratoriamente mais de 8 regiões abdominais envolvidaspor doença (Fig.2). A mediana do PCI foi de 18, comum mínimo de 6 e um máximo de 39. Verificou-se em5 doentes (20%) um PCI entre 1 e 9; em 11 doentes(44%) um PCI entre 10 e 19; em 7 doentes (2%) umPCI entre 20 e 29 e em 2 doentes (8%) um PCI entre31 e 39.

Fig. 2: Nº de regiões abdominais envolvidas

Em função da extensão da doença foram realizados5 ou menos procedimentos de citorredução em 8doentes (32%); entre 6 e 10 procedimentos de citor-redução em 15 doentes (60%) e mais de 10 procedi-mentos de citorredução em 2 doentes (8%) (Fig.3).

Fig. 3: Nº de procedimentos de citorredução

Foi obtida uma citorredução completa em 88% dosdoentes. Em 7 doentes (28%) não se verificou tumorresidual no final da citorredução e em 15 doentes(60%), apesar da realização de citorreduções extensas,consideramos poder existir focalmente doença residualcom espessura inferior a 2,5 mm; em apenas 3 doen-tes (12%) não foi possível a ressecção completa de todaa doença macroscópica.

A duração das intervenções variou entre 5 horas e 9horas e 30 minutos. A mediana do tempo de inter-venção foi de 7 horas e 30 minutos. Durante a cirur-gia foram utilizadas, em média, 2 unidades de con-centrado de eritrócitos e 40 gramas de albumina.

O tempo mediano de permanência na Unidade deCuidados Intensivos foi de 2 dias (mín. 1 - máx. 7dias). O tempo mediano de internamento foi de 11dias (mín. 7 - máx .21 dias). O tempo mediano parao início de alimentação oral completa foi de 7 dias(mín. 5 – máx. 11 dias).

Não foi registada toxicidade relacionada com a qui-mioterapia intraperitoneal nem mortalidade aos 30dias de pós-operatório. Foram registadas complicaçõespós-operatórias major em 3 casos (12%) (Tabela 1).

Todas as complicações major se registaram emdoentes com uma carcinomatose peritoneal de adeno-carcinoma mucinoso do apêndice com PCI superior a

Citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica no tratamento da doença peritoneal maligna

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20

J. Abreu, M. Serralva, M. Fernandes, L. Santos, P. Guerra, D. Gomes

livre de doença foi de 63% e 49% aos 1 e 2 anos (Fig.5), respectivamente.

Fig. 5

CONCLUSÕES

A morbilidade observada nos doentes com doençaperitoneal maligna primária ou secundária, submetidosa citorredução seguida de HIPEC está relacionada sobre-tudo com as complicações cirúrgicas e estas estão direc-tamente dependentes da extensão da cirurgia. Nos casosem que se registaram complicações major, estas ocorre-ram em doentes com PCI elevado, submetidos a inter-venções prolongadas, nos quais foram efectuados múlti-plos procedimentos de citorredução. A carga tumoral éo principal factor de risco para a existência de complica-ções, sendo necessário continuar a investigar outros fac-tores de risco para as complicações desta terapêutica.

A baixa taxa de morbilidade, a ausência de mortali-dade pós-operatória e as inesperadas taxas de sobrevi-vência observadas na nossa série, sugerem que a téc-nica é segura. Por outro lado, ainda que o estudo tenhasido realizado num pequeno número de doentes pen-sámos que a citorredução seguida de HIPEC deveráser considerada uma alternativa terapêutica válida eeficaz nos doentes com doença peritoneal maligna.

19. Uma doente com um PCI de 24, submetida a peri-tonectomia diafragmática direita, antrectomia, perito-nectomia diafragmática esquerda com esplenectomia epancreatectomia caudal, peritonectomia pélvica comressecção do sigmoide, peritonectomia do quadranteinferior direito com hemicolectomia direita, sofreuuma hemorragia no pós-operatório imediato que obri-gou a re-intervenção com laqueação de vaso sangranteda cauda do pâncreas. Noutro caso verificou-se umaevisceração ao 7º dia de pós-operatório após ter sidosubmetida a peritonectomia pélvica parcial, histerec-tomia e anexectomia bilateral, ressecção do sigmoide,ressecção do pequeno e grande epiplon, dissecção doligamento hepatoduodenal e colecistectomia. Porúltimo registámos também um abcesso sub-frénicotratado com drenagem percutânea, numa doente comPCI de 25, submetida a peritonectomia diafragmáticadireita com dissecção do ligamento hepatoduodenal,colecistectomia, ressecção do pequeno epiplon, gas-trectomia sub-total, peritonectomia diafragmáticaesquerda com esplenectomia, peritonectomia pélvicae dos quadrantes inferiores direito e esquerdo.

Foram registadas 4 (16%) complicações classifica-das como não cirúrgicas: 2 (8%) infecções do CVC, 1(4%) infecção respiratória e 1 (4%) lesão femoral comparésia do MID.

Após um tempo mediano de seguimento de 26meses (min. 1 – máx. 73 meses) 7 (28%) dos doentesfaleceram com doença; 15 doentes (60%) estão vivossem doença; e 3 (12%) estão vivos com progressão dadoença. A taxa de sobrevivência global foi de 88% e76% aos 1 e 2 anos (Fig. 4) e a taxa de sobrevivência

Page 21: Revista Cirurgia 04

Citorredução seguida de quimioperfusão intraperitoneal hipertérmica no tratamento da doença peritoneal maligna

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BIBLIOGRAFIA

Page 22: Revista Cirurgia 04

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Agenda

AgendaMARÇO

61st Annual cancer symposium of the Society of Surgical Oncology (SSO)13 a 16 de MarçoChicago, Illinois, USAwww.surgonc.org

ICS Pacific Regional Meeting21 a 23 de Março Quensland, Australiahttp://www.icsglobal.org

AHPBA 2008 Scientific Meeting (American Hepato-Pancreato--Biliary Association)27 a 30 de Março Fort Lauderdale, Florida, EUAwww.ahpba.org

XXVI Jornadas Portuguesas de Cirurgia31 de Março a 2 de Abril Porto

ABRIL

11ª Reunião Anual da Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado4 a 5 de Abril Cascais, Portugalwww. apef.com.pt

SAGES9 a 12 de Abril Filadélfia, EUAwww.sages.org

Charing Cross 30th International Symposium12 a 15 de Abril Londres, Inglaterrawww.cxsymposium.com

Advances in Colorectal Surgery - 3rd Annual Update for the Practicing Surgeon17 e 18 de Abril Boston, Massachusets, EUAwww.cme.hms.harvard.edu/courses/generalsurgery

International Forum on Quality and Safety in Health Care 200822 a 25 de Abril Paris, Françawww.quality.bmjpg.com

1st Central European Congress of Surgery23 a 26 de Abril Praga, República Checawww.central-european-surgery.com.

3rd Congress of the European Society of Endocrine Surgeons24 a 26 de Abril Barcelona, Espanhawww.eses.cc

MAIO

30th Congress of European Hernia Society – GREPA7 a 10 de Maio Sevilha, Espanhahernia2008.unicongress.org/

VI Reunião Internacional de actualização em cirurgia do esófago e do estômago12 a 13 de MaioPorto, PortugalCirurgia-b.med.up.pt

EVC: European Vascular Course15 a 17 Maio Amsterdão, Holandawww.european-vascular-course.org

48th Annual Meeting at Digestive Disease Week 2008 17 a 22 de MaioSan Diego, California, USAwww.ssat.com/

Association of Surgeons of Great Britain and Ireland InternationalSurgical Congress21 a 23 de Maio Harrogate, Inglaterrabournemouth.asgbi.org.uk/

9th European Congress of Trauma and Emergency Surgery24 a 27 de Maio Budapeste, Hungriawww.eurotrauma.2008.org

JUNHO

XXVIII Congresso nacional de Gastrenterologia e EndoscopiaDigestiva4 a 7 de JunhoVilamouraAmerican Society of Colon and Rectal Surgeons – Tripartite meeting7 a 11 de Junho Boston, Massachusetts, USAascrs.affiniscape.com

16th International Congress of the European Association for Endoscopic Surgery (EAES)11 a 14 de JunhoEstocolmo, Suéciawww.eaes-eur.org

18th World Conference on Disaster Management (WCDM)15 a 18 de Junho de 2007Toronto, Canadáwww.wcdm.org

2nd International Experts Meeting on Advanced Laparoscopic Surgery20 a 22 de Junho Atenas, Gréciawww.congressexcel.gr

XXIII World Congress of the International Union of Angiology21 a 25 de Junho Atenas, Gréciawww.iua2008-athens.com

Association of Coloproctology of Great Britain and Ireland 2008Annual Meeting30 a 3 de JulhoBirmingham, Inglaterrawww.acpgbi.org.uk/

Page 23: Revista Cirurgia 04

RESUMO

O hiperparatireoidismo primário (HPT1) tem uma prevalência entre 1:300 e 1:2000 na população. No entanto mais de90 % dos casos não são diagnosticados. A definição de HPT1 assintomático é controversa uma vez que os doentes na suamaioria apresentam algum tipo de sintomatologia. Os doseamentos de cálcio são muito importantes na detecção de doen-tes pouco sintomáticos, particularmente entre as mulheres pós-menopáusicas. Os autores apresentam um estudo prospec-tivo referente aos 64 doentes operados por HPT1, numa Unidade de Cirurgia Endócrina, entre Fevereiro de 2002 e Dezem-bro de 2006. A idade média foi de 56 anos, com predomínio do sexo feminino (56/8). Da forma de apresentação salien-tam-se 26 achados (14 laboratoriais, 9 imagiológicos e 3 operatórios, embora quase todos os doentes apresentassem sinto-mas). Cinquenta e dois doentes tinham queixas ósteo-articulares, 35 HTA, 30 sintomas psiquiátricos e 28 litíase renal. O diagnóstico foi efectuado 18 vezes pelo endocrinologista, 16 pelo cirurgião, 9 pelo nefrologista, 9 pelo reumatologista,8 pelo internista, 3 pelo clínico geral e 1 pelo dermatologista. A mediana do cálcio sérico foi de 11,0 mg/dl e a da PTHifoi de 172,4 pg/dl. As paratireóides removidas mediam 19 mm e pesavam 2,23 g, em média. Nesta série verificamos umgrande número de achados como forma de apresentação e de lesões avançadas na altura do diagnóstico. A maior sensibili-zação de todos os clínicos para este tipo de patologia e a determinação de rotina do cálcio sérico, será com certeza a melhorforma de se efectuar o diagnóstico precoce do HPT1 e diminuir consequentemente a incidência observada de lesões dosorgãos-alvo.

INTRODUÇÃO

O hiperparatireoidismo primário (HPT1) pode serdefinido como a hipercalcemia resultante da secreçãoanómala de paratormona (PTH) pela glândula parati-reoideia. É uma das endocrinopatias mais frequentes etem uma prevalência entre 1:300 e 1:2000 na popula-ção [1-10]. No entanto mais de 90 % dos casos não sãodiagnosticados e a frequência ainda é subestimada emmuitos países, continuando a verificar-se uma predo-minância franca de casos sintomáticos na altura dodiagnóstico [3, 11]. Muitos doentes ainda são diagnos-

Hiperparatireoidismo– um diagnóstico não pensado

João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira

Unidade de Cirurgia Endócrina e Mama. Serviço de Cirurgia Geral. Hospital de São João

ARTIGO ORIGINAL

23

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

ticados tardiamente e chegam ao cirurgião após váriosanos de tratamentos sintomáticos, apesar de terem pas-sado por vários médicos, de diferentes especialidades.

Os doseamentos de cálcio são fundamentais para adetecção de doentes pouco sintomáticos, particular-mente entre as mulheres pós-menopáusicas. O seudiagnóstico e tratamento precoce permitem a cura dadoença numa percentagem alta de casos, evitando aslesões crónicas e incapacitantes dos orgãos-alvo [1, 2, 11,

12]. A definição de HPT1 assintomático é controversauma vez que mesmo estes doentes na sua maioria apre-sentam algum tipo de sintomatologia [1, 3, 6, 7, 10, 13].

Page 24: Revista Cirurgia 04

única patologia existente, embora apenas 2 destes 26doentes não apresentassem realmente qualquer sin-toma (tabela 2). Referiam artralgias 13 dos doentesdiagnosticados por hipercalcemia (93%), assim comotodos os achados imagiologicamente. Aproximada-mente 2/ 3 dos hiperparatireoidismos achados apre-sentavam sintomatologia neuro-psiquiátrica: 9 doslaboratoriais, 6 dos imagiológicos e 2 dos operatórios.O estudo de uma família com síndrome de MEN 2apermitiu o diagnóstico dos outros 2 casos assintomá-ticos. Entre os 64 doentes, as queixas osteo-articularesforam o principal sinal de alarme para o clínico pen-sar no diagnóstico (n = 19). Tivemos um caso que seapresentou sob a forma de hiperparatireoidismo agudocom hipercalcemia grave, afundamento do estado deconsciência e pancreatite.

Quando foram admitidos na nossa consulta, agrande maioria dos doentes (81 %) tinha sintomato-logia e/ ou antecedentes de doença osteo-articular equase metade tinham clínica ou imagiologia de nefro-litíase (tabelas 3 e 4). Os sintomas neuro-psiquiátri-cos, a fadiga proximal, a HTA e a obstipação tambémforam referidos por quase 50 % dos doentes. A pato-logia tireoideia associada, 4 carcinomas papilares, 19bócios nodulares e 3 doentes com síndrome de MEN2a, foi o motivo para a realização de 26 tireoidecto-mias concomitantes. Uma outra doente era portadorade uma agenesia tireoideia congénita.

Cerca de 1/4 dos doentes apresentavam alteraçõesno ECG e/ ou no ecocardiograma.

Na data do internamento a mediana do cálcio séricofoi de 11,0 mg/dl e a da PTHi foi de 172,4 pg/dl.

MATERIAL E MÉTODOS

Nos Serviços de Cirurgia 3 e 4 (cuja junção resultouna Cirurgia B), Cirurgia B e Geral (resultante da fusãodos Serviços A e B) do Hospital de São João, opera-ram-se 96 doentes com HPT1 entre 1990 e Dezembrode 2006 (tabela 1).

Na Unidade de Cirurgia Endócrina de Cirurgia B,a partir de Fevereiro de 2002, foi criada uma baseinformatizada com os dados referentes aos doentesoperados por hiperparatireoidismo. As observações sãocompletadas com os registos efectuados na consultaexterna.

Os autores apresentam um estudo prospectivo refe-rente aos 64 doentes operados por HPT1, na Unidadede Cirurgia Endócrina de Cirurgia B, entre Fevereirode 2002 e Maio de 2006 e de Cirurgia Geral entreMaio e Dezembro de 2006.

A idade média foi de 56 anos, com predomínio dosexo feminino (56/8).

Foi identificada a especialidade médica que efectuouo diagnóstico e estudada a forma de apresentação, asintomatologia e a patologia associada ao hiperparati-reoidismo, os exames subsidiários, o tratamento efec-tuado e os seus resultados e os exames anatomo-pato-lógicos.

RESULTADOS

O diagnóstico de HPT1 foi efectuado 18 vezes peloendocrinologista, 9 pelo nefrologista, 9 pelo reumato-logista, 8 pelo internista, 3 pelo clínico geral e 1 pelodermatologista. Nos outros 16 casos foi o cirurgiãoquem diagnosticou o hiperparatireoidismo, 4 dosquais por sintomas sugestivos, 3 vezes no decurso doestudo de hipercalcemia, 2 em familiares de síndromede MEN 2a, 4 ao realizar o exame ecográfico de umsuposto nódulo da tireóide e por 3 vezes no decurso decirurgia tireoideia.

Da forma de apresentação salientam-se os 26 acha-dos: 14 laboratoriais, 9 imagiológicos e 3 operatórios,sendo num destes casos 1 adenoma paratireoideu a

24

João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira

Doentes (n) HPT 1º

1990 – 1996 12

1996 – Fev. 2002 20

Fev. 2002 – Dez 2006 64

Total 96

Tabela 1

Page 25: Revista Cirurgia 04

Realizaram-se 51 paratireoidectomias uniglandulares(80 %), das quais 48 por adenoma e 3 por neoplasia, 4biglandulares por adenoma duplo (6 %) e 4 subtotais e 1total com implante paratireoideu por hiperplasia (8 %).Nos outros 2 casos procedeu-se à exérese de recidiva decarcinoma da paratireóide, tireoidectomia e esvaziamentodo compartimente central em bloco. Em 2 doentes não seencontrou a glândula anómala.

Efectuou-se cirurgia mini-invasiva 26 vezes (41 %das intervenções), das quais 14 por minicervicotomiae 12 videoassistidas. A localização e orientação glan-dular per-operatória foi eco e radioguiada em 19pacientes, tendo sido necessário a conversão para umaincisão clássica numa intervenção. Nos 7 doentes res-tantes utilizou-se unicamente o apoio ultrassonográ-fico.

A PTH intra-operatória foi determinada nas últi-mas 51 paratireoidectomias.

Apenas num caso foi necessário esternotomia porparatireóide mediastínica, num total de 9 glândulasectópicas encontradas (14 %): 5 tímicas e 4 mediastí-nicas extra-tímicas.

A morbilidade resumiu-se a 2 paresias da cordavocal, a 2 hematomas que não necessitaram de drena-gem, a 1 caso de desorientação psicomotora e a umhemotórax na doente submetida a esternotomia.Registou-se um caso de hipoparatireoidismo defini-tivo.

As paratireóides removidas em média pesavam 2,23g e mediam 19 mm, com mínimos de 120 mg e 6 mmem casos de hiperplasia familiar e máximos de 26 g e55 mm num caso de neoplasia. As paratireóides hiper-plásticas eram mais pequenas e mais leves do que as

Estes valores baixaram para 8,6 mg/dl e 24,4 pg/dl,respectivamente, no pós-operatório. Os níveis maiselevados foram encontrados entre os doentes comforma de apresentação renal ou neuro-psiquiátrica. Noextremo oposto encontraram-se os casos encontradosimagiologicamente ou no decurso de estudo familiar(tabela 5). Em 10 dos nossos doentes os níveis de PTHnão excediam em 30 % o limite superior da normali-dade verificando-se em 6 deles oscilação dos valores aolongo do tempo com períodos em que se encontravamdentro dos limites normais. Encontramos também 7casos sintomáticos de hipercalcemia intermitente.Nesta série tivemos uma doente internada de urgênciapor hiperparatireoidismo agudo com cálcio sérico de14,4 mg/dl e PTHi de 1540 pg/dl e 2 casos de carci-noma com calcemias de 12,8 mg/dl e 14,2 mg/dl ePTHi de 855 pg/dl e 1900 pg/dl, respectivamente.

Para a localização glandular, segundo o protocolodo Serviço, foi efectuada pelo cirurgião uma avaliaçãoecográfica no dia ou na véspera da paratireoidectomia.Foram localizadas correctamente 50 glândulas (78 %de eficácia, com sensibilidade de 83 % e um valor pre-ditivo positivo de 93 %) com 4 falsos positivos (Figura1). Através deste método imagiológico pudemos con-firmar as duas recidivas de carcinoma paratireoideu. Aincapacidade na localização ecográfica da glândulaanómala aconteceu em 3 bócios multinodulares, em 3casos de ectopia mediastínica e em 3 doentes comhiperplasia das paratireóides. Em 51 ocasiões recorreu-se ao cintilograma que evidenciou 35 paratireóides (69% de eficácia, com sensibilidade de 74 % e um valorpreditivo positivo de 94 %) com 4 falsos positivos(Figura 2).

25

Hiperparatireoidismo primário – um diagnóstico não pensado

Figura 1 Figura 2

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adenomatosas, enquanto que as mais volumosas cor-respondiam às neoplasias, duas das quais de localizaçãomediastínica.

Foi detectada uma mutação no gene HRPT2 res-ponsável pela síndrome hiperparatireoidismo e tumo-res nos maxilares hereditários (HPT-JT) numa doentecom carcinoma e uma mutação do gene RET nos 3doentes portadores de síndrome MEN 2a.

Registaram-se 4 persistências (2 mediastínicas járeoperadas) e 2 recidivas por carcinoma, uma das quaisfaleceu por hipercalcemia. Nos 2 casos de insucessocirúrgico, em que as doentes mantiveram o hiperpara-tireoidismo, a investigação diagnóstica pós-operatórianão revelou a localização da glândula anómala.

DISCUSSÃO

O hiperparatireoidismo primário (HPT1) é umadas endocrinopatias mais frequentes. Este facto foiverificado após a inclusão dos valores de calcemia nosexames de rotina nos Estados Unidos, no Japão e emalguns países europeus, permitindo o diagnóstico decasos assintomáticos ou vagamente sintomáticos [1-9,

14]. Atinge mais frequentemente mulheres na 6ªdécada da vida e é uma doença cujas incidência e pre-valência aumentam claramente com a idade [1, 3, 5, 6, 10,

12, 14, 15]. A frequência do HPT1 ainda é subestimadana maioria dos países. Em Portugal a realidade é a deuma predominância franca de casos sintomáticos naaltura do diagnóstico [11]. Muitos doentes ainda che-gam ao cirurgião tardiamente, após vários anos de tra-tamentos sintomáticos, apesar de terem passado porvários médicos, de diferentes especialidades e inclusi-vamente estarem medicados com suplementos de cál-cio. Na maioria são mulheres pós-menopáusicas, poli-medicadas e portadoras de várias patologias. O factodos doentes numa fase inicial do HPT1 apresentaremapenas sintomas neuro-psiquiátricos inespecíficos,muitas vezes atribuídos à idade, assim como a elevadafrequência de patologia ósteo-articular, de HTA e delitíase renal na população em geral e no idoso em par-ticular serão, provavelmente, os motivos para o defi-

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João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira

Forma de apresentação n %

Ósteo-articular 19 30

Hipercalcemia 14 22

Renal 9 14

Achado imagiológico 9 14

HTA 4 6

Achado operatório 3 5

Estudo familiar 2 3

Neuro-psiquiátrica 2 3

Dermatológica 2 3

Tabela 2

Patologia associada n %

Ósteo-articular 52 81

HTA 35 55

Nefrolitíase 28 44

Cardíaca 16 25

Péptica 16 25

Litíase vesicular 9 14

Fracturas 8 13

Gota 4 6

Dermatológica 2 3

Pancreatite 1 2

Tabela 4

Sintomatologia n %

Ósteo-articular 52 81

Neuro-psiquiátrica 32 50

Fadiga 30 47

Cólica renal 28 44

Obstipação 26 41

Polidipsia 21 33

Assintomáticos 4 6

Tabela 3

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mg/ 24h, densidade mineral óssea da coluna lombar,do colo do fémur ou do rádio distal, abaixo de 2,5 des-vios padrão em relação ao pico de massa óssea (T score<-2.5) e impossibilidade de se efectuar um seguimentocorrecto dos doentes não operados. Estes critérios nãoforam aplicados nos nossos doentes uma vez que sótivemos 4 casos verdadeiramente assintomáticos, 2 dosquais portadores de síndrome de MEN 2a e os outros2 achados operatórios. Quando foram admitidos nanossa consulta, a grande maioria dos doentes apresen-tava-se francamente sintomática, com queixas osteo-articulares, renais, neuro-psiquiátricas, obstipação eHTA. A alta percentagem de patologia tireoideia asso-ciada dificultou a localização paratireoideia e colocou-nos problemas na abordagem cirúrgica, nomeada-mente ao limitar a realização de cirurgia mini-invasivae ao nível dos cuidados necessários para a preservaçãodas glândulas normais.

O HPT1 pode ser definido como a hipercalcemiaresultante da secreção anómala de paratormona (PTH)pela glândula paratireoideia e é a causa mais comum dehipercalcemia em pacientes ambulatórios. O controlefisiológico da homeostase do cálcio é extremamentesensível e qualquer alteração dos seus níveis séricosdeve ser valorizada. A regulação desta homeostaseenvolve a interacção da PTH, da vitamina D activa,do cálcio e do fósforo, de modo que a avaliação destesparâmetros é fundamental na suspeita desta patologia[6, 11, 18, 19]. O diagnóstico de HPT1 estabelece-se napresença de hipercalcemia e de uma PTH elevada ouinapropriadamente “normal”, o que se verifica entre10% a 15% dos doentes [11, 15]. O aumento destesvalores é insidioso na maioria dos casos e encontram-se significativamente mais elevados nos pacientes comdoença severa [3]. Na rara situação de carcinoma daparatireóide, a hipercalcemia instala-se mais rapida-mente e os níveis de cálcio e de PTHi geralmente sãomuito elevados, como pudemos verificar nos 2 casosque tratamos [20-23]. Na nossa série verificamos valo-res mais elevados nos doentes em que a queixa quealertou para o diagnóstico foi do foro renal, ao con-trário do descrito noutras séries [17]. Os valores menosalterados encontraram-se entre os achados imagioló-

ciente diagnóstico precoce [4, 12]. Também a poucasensibilização dos clínicos para este tipo de patologiaimpede, muitas vezes, a correcta valorização dos níveisalterados de calcemia.

Da forma de apresentação dos casos que apresenta-mos, salienta-se o elevado número de achados: 26,embora apenas 2 destes doentes não apresentassemrealmente qualquer sintoma. Quando inquiridos, agrande maioria destes pacientes referia artralgias e sin-tomas neuro-psiquiátricos inespecíficos. Num quartodos doentes que operamos, foi o cirurgião quem fez odiagnóstico, situação esta pouco admissível uma vezque estes hiperparatireoidismos passaram despercebi-dos aos clínicos assistentes, aos imagiologistas querotularam os nódulos como tireoideus e, em 2 casos, acitologistas que classificaram a lesão como tumoral deprovável origem folicular. Também em 3 casos o pró-prio cirurgião foi confrontado com o achado de umaparatireóide anómala durante uma tireoidectomia,sendo num destes casos o adenoma paratireoideu aúnica patologia existente. Este facto confirma a neces-sidade de se incluir o doseamento da calcemia noestudo pré-operatório de patologia tireoideia [16].

Na maioria dos relatos da literatura recente, o hiper-paratireoidismo primário apresenta-se na forma assin-tomática, no entanto, esta é uma definição controversauma vez que mesmo estes doentes na sua maioria,quando pesquisada, apresentam algum tipo de sinto-matologia [1, 3, 6, 7, 10, 13]. Com o aumento do númerode casos diagnosticados, o perfil da apresentação clí-nica, imagiológica e laboratorial sofreu mudanças gra-duais nas últimas décadas, passando do hiperparati-reoidismo grave com doença óssea e renal típica, paracasos cada vez menos sintomáticos, até o estado actualonde mais de 80 % dos casos são rotulados como “nãoapresentando sintomatologia” [1, 3, 4, 9, 14, 17]. Este factolevou à elaboração de guidelines de diagnóstico e tera-pêutica do HPT1 assintomático, actualizadas poste-riormente em 2002 [8, 9]. As indicações actuais paracirurgia são: idade inferior a 50 anos, calcemia 1,0mg/dl acima do limite superior do normal, clearancede creatinina diminuído em mais de 30% comparadocom pessoas da mesma idade, calciúria superior a 400

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Hiperparatireoidismo primário – um diagnóstico não pensado

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Forma de apresentaçãoPTH

(pg/ ml)Ca

(mg/ dl)Peso(g)

T(mm)

Ósteo-articular 170 11,0 1,0 16

Hipercalcemia 174 10,8 1,5 21

Renal 296 11,6 1,2 22

Achado imagiológico 110 10,2 0,5 20

HTA 164 11,3 1,0 16

Achado operatório – – 1,0 20

Estudo familiar 135 9,4 0,5 14

Neuro-psiquiátrica 883 12,1 9,8 29

Dermatológica 161 10,3 3,5 23

Tabela 5

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gicos ou de estudo familiar. É raro o diagnóstico deHPT1 na presença de normocalcemia, que pode sercausada pela presença associada de níveis muito bai-xos de vitamina D ou por estarmos perante a variantenormocalcémica do HPT1 [10, 14, 15, 24, 25]. Encontra-mos 7 casos sintomáticos de hipercalcemia intermi-tente, o que poderia ser explicado pela presença deoutros factores responsáveis pela sintomatologia. [3, 24].

Embora o diagnóstico do hiperparatireoidismo sejaclínico e bioquímico, a avaliação glandular imagioló-gica tem sido utilizada com frequência crescente [6, 11,

26, 27]. Esta avaliação pré-operatória facilita o sucessoterapêutico da cirurgia por determinar o envolvimentouni ou multiglandular, o tamanho e a localização dasparatireóides e ao possibilitar programar cirurgiamenos invasiva ou radical (na suspeita de carcinomada paratireóide) e ainda por permitir o diagnóstico depatologia tireoideia associada. A eficácia do cirurgiãona localização pré-operatória das paratireóides por eco-grafia pode ser superior à do radiologista em algumasinstituições. A ecografia efectuada pelo cirurgião, com-plementada por cintigrafia nos casos de falha daquelemeio imagiológico ou para realização de cirurgia radio-guiada, tem sido, na nossa experiência, uma mais valia

para o tratamento do HPT1, com resultados compa-ráveis aos descritos na literatura [6, 27-29]. A falha nalocalização ecográfica da glândula anómala aconteceuem casos associados a bócio multinodular, em ectopiasmediastínicas e em hiperplasia das paratireóides, situa-ção em que os meios imagiológicos frequentemente sódetectam as paratireóides maiores e não reconhecem adoença multiglandular.

A eficácia da paratireoidectomia na cura desta pato-logia varia entre 70 e mais de 95% em função dotreino do cirurgião [1, 2, 6, 10, 12, 30, 31]. A eficácia datratamento cirúrgico do HPT1 no nosso serviço ron-dou os 97%, embora 2 doentes com ectopia medias-tínica tivessem sido operados em 2 tempos no mesmointernamento, após o insucesso da abordagem inicial.Nos 2 casos de insucesso cirúrgico, em que as doentesmantiveram o hiperparatireoidismo, a investigaçãodiagnóstica pós-operatória ainda não revelou a locali-zação da glândula anómala. Duas doentes com carci-noma tiveram recidiva aos 2 e 3 anos de seguimento.

A cirurgia mini-invasiva, em doentes seleccionados,tem múltiplas vantagens, nomeadamente ao nível domenor tempo operatório, de internamento e de recu-peração, da menor morbilidade, dor, incisão e fibroseque condiciona [6, 32, 33]. Optou-se por paratireoidec-tomia mini-invasiva sempre que pré-operatoriamenteforam localizadas 1 glândula ou 2 homolaterais, naausência de patologia cirúrgica tireoideia ou de histó-ria familiar de hiperparatireoidismo ou ainda de sus-peita de carcinoma paratireoideu. A localização glan-dular per-operatória foi eco e radioguiada com eficá-cia semelhante ao referido na literatura [34]. O dosea-mento intra-operatório de PTH foi fundamental paraa comprovação da eficácia da paratireoidectomia,sobretudo nos casos em que se optou por uma abor-dagem selectiva da glândula afectada.

A paratireoidectomia em centros com experiência éuma intervenção segura e com uma baixa taxa de com-plicações [1, 7, 12]. Toda a morbilidade da presente sériefoi temporária e pode ser resolvida facilmente.

O tipo histológico responsável pelo HPT1 mais fre-quente é o adenoma único (80 – 90%), seguido dahiperplasia (10 - 20%), do adenoma duplo (5%) e do

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BIBLIOGRAFIA

Hiperparatireoidismo primário – um diagnóstico não pensado

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carcinoma em último lugar ( < 1%). O HPT1 apre-senta-se normalmente de forma isolada e raramente,pode estar presente na forma familiar ou ser um doscomponentes das neoplasias endócrinas múltiplas(MEN) do tipo 1 e do tipo 2a ou do hiperparatireoi-dismo e tumores nos maxilares hereditários (HPT-JT)[1, 2, 6, 14, 35]. Na nossa experiência estes números sãoalgo diferentes uma vez que 83 % dos nossos doentestinham doença uniglandular, 6% adenomas duplos,apenas 8% tinham hiperplasia e operamos 2 carcino-mas. A diversidade dos resultados histológicos relati-vamente à literatura, nomeadamente no que concerneao número reduzido de hiperplasias observado, poderáser explicado pelo pequeno tamanho da série e poruma possível falha no diagnóstico da doença multi-glandular, normalmente mais difícil de efectuar do quenos casos de adenoma. Em relação às característicashistológicas das paratireóides removidas é de referirque na nossa série eram, em média, bastante volumo-sas e correspondiam a situações de hiperparatireoi-

dismo grave com doença óssea e renal muito sintomá-tica.

CONCLUSÕES

Nesta série verificamos um grande número de“achados” como forma de apresentação e de lesõesavançadas na altura do diagnóstico. A maior sensibili-zação de todos os clínicos, cirurgiões incluídos, paraeste tipo de patologia e a determinação do cálcio sériconos exames laboratoriais de rotina, será com certeza amelhor forma de se efectuar o diagnóstico precoce doHPT1 dito “assintomático” e diminuir consequente-mente a frequência observada de lesões dos orgãos-alvo.

A paratireoidectomia é a forma de tratamento eficaze definitivo e tem uma taxa reduzida de complicaçõesse for efectuada em centros vocacionados para a cirur-gia endócrina.

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João Capela Costa, Pedro Sá Couto, Filomena Valente, Susy Costa, Tiago Pimenta, Matos Lima, Cardoso de Oliveira

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The obesity problem is a global epidemic of ever increas-ing proportions. Because of a number of different reasonsmany nations, in developed and developing countries, dealwith this problem. While the U.S.A. stand in “pole posi-tion”, in Europe the uncontrolled diffusion of sweet snacksis responsible for children obesity, in China the diminishednumbers of bikers in favour of car drivers, in Oceania thesuccess of “fast food” instead of the traditional fruit con-sumption are considered as causes of this phenomenon.

All in all, according to reliable statistics, 1.5 billion peo-ple all over the globe are obese: globesity.

Taking care of all these people accounts for 2-8% of allthe national medical expenses, as much as it takes for alltumours, with the added difference that expenses for obe-sity grow by 25 % every three years.

Further, mortality for obesity is three times the com-pounded mortality of colon and breast cancers.

Obese individuals have a life expectancy approximatelyshortened by 10-15 %, because of diabetes, cardiovascular dis-eases, hypertension, cancer etc. One important and under-valued problem is the augmented frequency of many differentmalignant tumours found in the USA and Canadian obesepopulation as reported in the “New England Journal of Med-icine” and found by us in the Italian obese population

Surgery in obese patients may reduce sanitary costs by45% after 5 years. U.S.A. statistics show that, three yearsand a half after surgery, operated patients cost less than nonoperated patients.

At the same time mini invasive laparoscopic surgery,during the last 20 years, has had a tremendous diffusionworld wide.

The combination of these two factors, obesity and lapa-roscopy, determined a “critical mass” which resulted in theexplosion of bariatric surgery, with an exponential growthin the last 10 years. The advantages of laparoscopic surgerywere greatly stressed in bariatric surgery.

Early mobilization and early recovery of G-E functions,

peculiar to laparoscopic surgery, are advantageous to allpatients but, even more so, in morbidly obese patients whichare high risk patients.

The great compliance of patients to bariatric laparoscopicsurgery caused in the U.S.A. a jump from 10.000 proceduresper year from the seventies to the nineties in the last cen-tury, to 250.000 procedures during the last year.

Standardization of surgical techniques was an added rea-son for the success of laparoscopy. The EAES ConsensusConference in 2004 and the Consensus Statement of ACSin 2005 indicated 4 types of standard surgical procedures:adjustable gastric banding, vertical banded gastroplasty, gas-tric by-pass, bilio-pancreatic diversion.

Indications to surgery must be based on reasonable expec-tations from the surgeon and from the patient. On this regardthe psychiatric/psychological interview is of the outmostimportance to avoid vain hopes and bitter disappointment.At present internationally accepted and established precise cri-teria must be considered to indicate bariatric surgery.

Once surgery is indicated, which kind of operationshould be chosen? Over the years, many different proce-dures, with a variety of rational basis, have been proposed.

The first significant contribution of surgery to the solu-tion of the obesity problem was the intestinal bypass pro-posed and performed by Linner, Kremer and Nelson in1954. In 1963 Payne standardized the jejunal-ileal by pass.The procedure determines a very effective and indiscrimi-nate malabsorption by reducing to 30 cm the functioning(digestion and absorption) small intestine.

However the early and unquestionable effect of surgery wasdue to very significant physio-pathological changes with severeside effects, in particular severe liver sequalae, even cirrhosis.All major surgical societies consider this procedure banned.

At present there are three groups of standard surgical pro-cedures, internationally accepted:

– restrictive procedures, laparoscopic adjustable siliconegastric banding (LASGB) and vertical banded gastroplasty

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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Globesity, diabesity and surgeryNicola Basso

Dipartimento Malattie Mediche e Chirurgiche Apparato Digerente, del Fegato ed Endoscopia Digestiva Policlinico Umberto IUniversity of Rome “La Sapienza”

GRANDES TEMAS: OBESIDADE

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Complications of GBP include haemorrhage (0.8-3.8%),fistulization (0.8-3.6%) and strictures (1.6-5.8%), mainlyinvolving the gastro-jejunal anastomosis in the immediatepostoperative period.

In the long run internal hernias occur with an incidencebetween 0.6 and 6% in different literature reports. Thepathogenesis is due to the incarceration of small bowel inthe surgery induced mesenteric defects, which become morehazardous when visceral fat diminishes significantly.

The mechanism of action of this procedure involves gastricrestriction during the first post-operative period. However thetwo main patho-genetic factors are: decreased appetite andincreased satiety which are tied to the hormones ghrelin pro-duced by the stomach and PYY, stimulated by early arrival ofnon processed food to the ileum. The alimentary exclusion ofthe gastric body and fundus determines low levels of ghrelin,hormone of appetite, and flattens its circadian rhythm: hungerand daily meals frequency are reduced.

During the last few years great attention has been given tothe anti-diabetic effect of GBP. This effect has a very rapidonset and is independent from weight loss suggesting thepresence of a hormonal mechanism.

Two mechanisms have been hypothesized: the Foreguthypothesis and the Hindgut hypothesis.

In 1998 Paries foresaw a role for the duodenum-jejunumin the pathogenesis of diabetes mellitus (2 D.M.).

In 2004 Rubino and Gagner pinpointed a number ofearly hormonal effects of GBP.

In 2006 again Rubino elucidated, experimentally, the roleof duodenal exclusion in controlling 2 D.M. hypothesisingthe presence of an anti-incretin substance secretion.

According to the hindgut hypothesis unmodified foodreaching the terminal ileum stimulates ileum L-cells tosecrete GLP – 1.

Finally the two main types of malabsorptive proceduresare: BPD and BPD – DS.

BPD was conceived in 1972 and performed in man in1976 by Scopinaro.

In extreme synthesis Scopinaro obtained a high malab-sorptive effect with minimal malnutrition consequences.

Patho-physiology of BPD is related to two factors: - a 50cm common channel where mixing of food with the bilio-pancreatic secretion occurs with diminished fat absorptionand diminished caloric intake; - a 200-250 cm alimentarychannel in which proteins, calcium and glicids are absorbedlessening malnutrition problems.

(VGB); – malabsorptive procedures, bilio-pancreatic diversion(BPD and its modification with the so-called “duodenalswitch” (BPD-DS); - metabolic procedures, gastric by pass(GBP).

VBG, once the procedure of choice, is almost completelyabandoned in the U.S.A., and is in declining popularity inEurope.

LASGB was the first bariatric procedure to be performedby laparoscopy and it is now the most frequently used inEurope, with over 150.000 cases.

The reasons for LASGB popularity are: - it is a simpleprocedure with very few operative and post operative com-plications; - it is easily reversible, in most cases bylaparoscopy; - it is effective in 70% of cases and even morewhen selection of patients is very accurate.

L.A.S.G.B. on one hand presents the lowest incidence ofoperative and post-operative complications, but it has thehighest incidence of late complications requiring a surgicalprocedure.

Major complications are: band migration into the stomachdue to erosion of the gastric wall; pouch dilatation due toslippage or technical faults. However these complicationsalmost always do not represent emergency situations and aredealt electively.

The treatment for the gastric pouch dilatation is the com-plete band desufflation (conservative treatment), followedby a progressive insufflation. The failure of the conservativetreatment makes it necessary to reposition or to remove theprosthesis. To prevent this kind of complication it is betterto create a virtual pouch above the “bursa omentalis” and tofix the prosthesis using gastro-gastric sutures.

The incidence rate of the gastric erosion is between 1,6%and 6,3%, considering several clinical experiences. Solutionin most cases is mini invasive surgery: laparoscopic, endo-scopic or combined laparoscopic-endoscopic.

Clinical results, after LASGB, are considered satisfactory(BMI below 35) in 70-80 % of cases. The best results areobtained in non super obese young women without ali-mentary disorders like BED or sweet eating.

GBP represents 70% of all bariatric procedures in theU.S.A.

GBP determines a EWL of 60% in the long period (over14 years), cures co-morbidities like diabetes, hypertensionetc. in 80-90% of cases and has a low re- intervention rate.For all these reasons GBP in the USA is considered the goldstandard in the treatment of morbid obesity.

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Nicola Basso

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and psychological profile of alimentary behaviour. Unfortu-nately, at present, precise and very reliable criteria do not exist.The last word is always to the patient and to his satisfaction.

In conclusion bariatric surgery determines an effectiveand long term EWL with a beneficial effect on co-morbidi-ties. As a consequence life expectancy is lengthened andquality of life is ameliorated. The social-economic impact isvery effective.

Key points are: correct selection of patients, adequate sur-gical technique, and exhaustive follow-up.

The laparoscopic approach is, by no means, the gold stan-dard as it fulfils all criteria to be considered so: safety, efficacy,reproducibility, cost effectiveness. The efficacy at the 10 yearsfollow-up will, we are certain, confirm the present results.

However there are a number of controversial “hot topics”related to:

- age, both for the adolescent and for the elderly; weightlimits (class 1 obesity) for indication to surgery; - criteria forselection of the type of surgery in the individual patient; -diabesity; - sleeve gastrectomy.

In the last few years age limits both on the upper and onthe lower range are under debate. Obesity is extending tosurprising new categories of individuals. Particularly worri-some is the phenomenon in the paediatric age with per-centages that go as up as 20-25% between 9 and 12 years ofage. Italy holds first place in Europe, together with Greece.Fifteen per cent of these children eventually will be morbidlyobese adults.

Debate exists also for weight limits (class 1 obesity), sincethe ever increasing demand for surgery.

Among the “hot topics”, diabetes and its relationship withobesity is, at present, the hottest. In the world there are 190million diabetes mellitus patients, 90% of which are obese.“Diabesity” is the XXI century epidemic

GBP and BPD seem to exert an anti-diabetic effect, inde-pendently from the weight loss, determined by an endocrinemechanism in part clarified, but still needing further inves-tigation.

The anti-diabetic effect of GBP and BPD is so relevantthat Dixon, in a momentous editorial strongly suggested arole for surgery in the therapy of DM 2.

The goal of a surgical therapy for diabetes is pursued bymany surgeons around the world. Trials are ongoing inEurope, U.S.A. and South America. In the “Diabetes SurgerySummit (DSS)”, that took place in Rome in March 2007, thetop medical and surgical authorities from all over the world

In 1988 Scopinaro procedure was modified by Hess toreduce the occurrence of possible troublesome diarrhoeasymptoms. Main differences are: sleeve gastrectomy withpylorus maintenance, 100 cm common channel: BPD-DS.

Further Gagner proposed a two steps procedure: first thesleeve gastrectomy. After an interval of 6-12 months and asignificant EWL, the second step is performed. The twosteps procedure significantly reduces morbidity and mortal-ity when compared to the one step procedure.

BPD determines a 50-75 % EWL at long (>10 years) fol-low up, being the most effective procedure on excess weight.Similarly this procedure is very effective on the metabolicsyndrome (diabetes mellitus 2: 90/100 % resolution, hyper-cholesterolemia 100 % resolution, etc.

Complications of BPD are: bleeding (6 %), fistulization(2 %), pulmonary embolism (0.5 %) and respiratory prob-lems. In most instances the treatment is conservative. Anas-tomotic ulcers occurrence has been greatly reduced by pro-ton pomp inhibitors therapy.

Specific side effects of BPD include: tiredness, gas bloatsyndrome, peripheral oedema and, most undesirable, diar-rhoea (15-20 %) with foul smelling stools.

According to Hess and to Gagner BPD-DS seems todecrease the incidence of these side effects due to the longercommon channel (100 vs 50 cm) and to the maintenance ofthe pylorus.

Before closing on surgical procedures, only few words onan old technique with novel interest. In the last few years theintra-gastric balloon (BIB) has had an ever increasing popu-larity among patients and surgeons due to the ease of appli-cation (endoscopy in sedation), and to encouraging results.

BIB has been used primarily in the treatment of border-line cases and as a preoperative procedure to decrease ope-rative risks.

A randomized study showed that the BIB induced weight-loss is not a placebo effect but is dependent on a specific mech-anism. BIB induced in 80% of cases a significant improve-ment of respiratory function and sleep apnoea episodes.

One problem we are confronted with is the indication ofthe type of surgery in the individual patient. In the Nice 2000EAES consensus conference suggestions have been given. Thecriteria adopted take into account well established data.Although all the three main surgical procedure, more com-monly executed, determine a significant EWL, this effectincreases from LASGB, to GBP, to BPD. Two additional fac-tors taken into consideration are: existence of co-morbidities

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Globesity, diabesity and surgery

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defining sleeve gastrectomy a suitable “option” in the treat-ment of morbid obesity “in particular in patients at highpreoperative risk or in super-super obese patients”. In theseinstances sleeve gastrectomy can be considered a “risk reduc-tion strategy”.

As far as indication for a “tailored” type of operation inthe individual patient, in 2007 we are still in the stone age.We need criteria that should take into account: behaviouralindex, metabolic index, genetic codex and, possibly, allowus to indicate more correctly and properly what is the bestsurgical treatment in the specific patient.

On the other hand therapeutic trials are difficult for anumber of reasons: different social environments determinedifferent economic conditions, different alimentary habitsand different surgical experiences. Further different geneticfactors and the validation criteria necessitating a long fol-low-up period make the goal even harder to achieve.

Obesity, appropriately defined “globesity” is, to allaccounts, a social problem. All components of society musttake the burden: - the teaching institutions with an adequatenutritional education; the National Health System, with effec-tive preventive campaign, as it has been done for smoking,and with specific outpatient structures for pre and post-surgery care; - the media with a correct information avoidingmisleading stories on the so called “malpractice”; - finallypoliticians who should not behave like the proverbial threemonkeys: I do not listen, I do not see, I do not talk.

Where are we going and where is the future?In the last two decades surgeons have been constantly

pursuing the “mini-invasiveness”. On this path another pres-tigious enterprise has started: Natural Orifice TransluminalEndoscopic Surgery (N.O.T.E.S.). Trans vaginal, trans gas-tric cholecystectomies and appendectomies have been per-formed, intra gastric per-endoscope procedures have beenrealized by means of endoscopic suturing devices. In bariatricsurgery the first experimental models of restrictive proce-dures have been realized. The road is open for exploration.

Will surgery be the ultimate weapon against obesity? Prob-ably it will not. We are already trespassing from the geneticengineering (building with genes) to the genetic factory (build-ing the genes). May be, sometimes in the future we will go fromthe laparoscopic mini-invasiveness to the non invasiveness.

In prehistory of man, obesity was a defensive factor, help-ing the individual to survive through cold winters and famine.Today obesity has become a global dramatic risk for man. Sur-gery seems to confront effectively with the problem.

joined to put the basis for future investigational and clinicalstudies. The impact of the summit was such that the Ameri-can Society of Bariatric Surgery (ASBS) has decided to changethe name to ASM(etabolic)BS. A similar decision was takenby the Italian and other obesity surgery societies.

Diabetes surgery is nowadays a developing reality.We retrospectively reviewed the results of 110 obese dia-

betic patients, who underwent laparoscopic gastric bandingor gastric by-pass or sleeve gastrectomy with a mean followup of 24 months. Regardless of the type of surgical proce-dure, bariatric surgery cured diabetes in 76, 3% of these“diabesity” patients. In April 2007 Cohen et al. reported thepreliminary data on two diabetic patients with BMI of 22and 34 Kg/m², surgically treated with a duodenal-jejunalby-pass. Patients had normal blood glucose levels 5 weeksafter surgery and were off anti diabetic drugs.

An endo luminal technique has been proposed recently: aprosthesis (60 cm in length) is anchored to the duodenal bulb,so preventing contact of ingested food to the duodenal-jeju-nal mucosa. The ingested food is separate from bilio-pancreaticjuices for all the length of the prosthesis, mimicking a surgicalduodenal-jejunal by-pass. Preliminary results on the resolutionof glucose metabolism alterations are highly promising.

The enthusiasm is great and, may be, a word of cautionmay seem appropriate.

In the last few years sleeve gastrectomy (or vertical gas-trectomy) performed as first step in DS, stimulated a novelapproach to obesity surgery, being proposed by a number ofsurgeons as a “solo” procedure.

In a recent summit, in New York City, the results of sleevegastrectomy on excess weight and on co-morbidities after afollow-up of 3 years, have been reported. In collect reviews(775 patients) the results in terms of EWL (between 33-83%), morbidity (14%), mortality 0.4 % and the reductionof co-morbidities were very promising. Disadvantages ofsleeve gastrectomy are: irreversible procedure, postoperativecomplications at a very low frequency but, when present, athigh risk. The advantage is that in patients with non satis-factory results, a second step procedure may be performedwith diminished operative risks. The second procedure maybe multidirectional: D.S. or gastric by pass have been equallyadopted, with relative technical ease.

At present, clinical results of sleeve gastrectomy, as a “pri-mary solo” procedure, in the treatment of morbid obesity,encourage to pursue on this path. The American Society forMetabolic Bariatric Surgery (ASMBS) gave out a statement

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Obesidade: causase distribuição da epidemia

Henrique Barros, Elisabete Ramos

Serviço de Higiene e Epidemiologia da Faculdade de Medicina do Porto

GRANDES TEMAS: OBESIDADE

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

e obesidade, de âmbito intersectorial, nomeadamente,entre os sectores da saúde, social, alimentar, educa-cional e cultural, como também preparar medidascompreensivas de prevenção e gestão contra a obesi-dade”. Igualmente, lembra que dado a obesidade seencontrar intimamente ligada a outras doenças, comoa diabetes, as doenças cardiovasculares e as osteoarti-culares, “é necessário não apenas uma abordagem pre-ventiva, mas também uma intervenção curativa e degestão da doença e da obesidade, através de um pro-grama específico para o efeito. Afirmava que seria“criado em parceria com as sociedades científicas, noâmbito da Direcção-Geral da Saúde, um grupo deperitos com a missão de elaborar uma proposta deprograma nacional, com linhas estratégicas de com-bate à obesidade”. Existe actualmente a PlataformaNacional Contra a Obesidade [5].

Alguns aspectos anedóticos revelam a importânciasocial da obesidade: foi preciso alargar os carros paratransportar bebés porque uma proporção de crianças éobesa desde muito cedo e as suas medidas estavam paralá dos padrões comuns fornecidos pelo mercado; acirurgia estética, nomeadamente a lipoaspiração, cres-ceu 118% entre 1997 e 2005, nos Estados Unidos daAmérica; também na América foram aumentados ostamanhos das cadeiras dos estádios de basebol, dema-siado estreitos e incómodos para uma proporção cres-cente dos espectadores; em 2000, o excesso de pesodos passageiros custou às companhias aéreas america-nas 1325 mil milhões de litros de combustível adicio-nal e o peso que em si puseram esses passageiros cus-

Nas sociedades ocidentais, a obesidade, com o taba-gismo e o consumo de bebidas alcoólicas, constitui umconjunto de problemas de saúde com mais marcadoefeito na morbilidade, na mortalidade e consequente-mente nos custos em saúde [1]. Estima-se que naUnião Europeia a obesidade seja responsável por cercade 7% dos custos em cuidados de saúde, percentagemque irá aumentar dada a tendência crescente na suaprevalência [2, 3].

Há mais de uma década que as diferentes organiza-ções internacionais com relevo na investigação e nadefinição de políticas de saúde reconhecem que a ali-mentação tem um papel determinante na saúde, sendoconhecidas relações directas particularmente com aocorrência de doenças cardiovasculares e de cancro.

Em Portugal, o Plano Nacional de Saúde 2004-2010 [4], reconhece que a obesidade “é um enormeproblema de saúde pública, pela elevada prevalência,natureza crónica do seu curso, morbilidade e morta-lidade de que se acompanha, assim como pela difi-culdade e complexidade do tratamento.” Já então oPlano descrevia a obesidade como “um problema emcrescente aumento” estimado entre os 10% e 15%, eque a sua prevalência se “situava entre os 10% e 25%nos países europeus, prevendo-se que, em Portugal, aprevalência se situe nos 15% para o sexo masculino enos 16% para o sexo feminino”. Em consequência, oPlano explicita a necessidade de melhorar a informa-ção e a acção sobre a obesidade e para isso, nele seescreve que “...deverá ser adoptada uma abordagemde promoção da saúde e preventiva do excesso de peso

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no sul dos Estados Unidos da América [7]. Os índiosPima que vivem nos Estados Unidos começaram pro-gressivamente a apresentar maior peso desde o fim dasegunda guerra mundial e actualmente a prevalênciade obesidade é superior a 70%, sendo dos gruposhumanos com a mais elevada frequência de diabetesdo tipo 2. Como a herança genética não mudou noespaço de duas ou três gerações o que mudou foi oambiente e a obesidade é a expressão da incapacidadede uma determinada estrutura genética se adaptar efi-cientemente a um novo ambiente, em curto períodode tempo. É que um indio Pima mexicano pesa emmédia cerca de vinte quilos menos que os seus paren-tes do norte. Estaria deste modo apoiada, de formadramática, uma das teorias mais populares para expli-car a obesidade e que ficou conhecida como a teoria do“gene da fome”: uma selecção para sobreviver a perío-dos prolongados de fome ou penúria alimentar. Assim,a obesidade seria a resposta a uma etapa da evoluçãohumana confrontada com a abundância estável.

Foi possível identificar o efeito de alguns tipos deadenovirus na ocorrência de obesidade, tanto em estu-dos experimentais em animais como em observaçõesem humanos [8-11]. Foram identificados pelo menoscinco vírus animais obesogénicos, quatro actuandosobre o sistema nervoso central e um quinto, oSMAM-1, um adenovirus das aves, descrito na Índia,que actua directamente sobre os adipócitos e é o únicovírus animal que está associado com a obesidadehumana [11].

Entre os seis adenovírus humanos investigados, oadenovirus (Ad) 36, Ad-37 e Ad-5, que estão relacio-nados com a obesidade, também afectam directamenteos adipócitos [11]. Estes vírus estimulam enzimas e fac-tores de transcrição que causam acumulação de trigli-cerídeos e a diferenciação dos pré-adipócitos em adi-pócitos maduros. Demonstrou-se que os Ad-5 e Ad-37e o Ad-9 causavam obesidade em animais de labora-tório e o Ad-36, o mais estudado, foi o único que secomprovou estar associado à obesidade em sereshumanos. Ad-36 causa obesidade em galinhas, rati-nhos, ratos e macacos, e estava presente em 30% deum conjunto de pessoas obesas por oposição a apenas

tou a libertação para a atmosfera de mais quase quatrotoneladas evitáveis de dióxido de carbono [6].

O tratamento cirúrgico da obesidade era inicial-mente reservado a pessoas com a chamada obesidademórbida (índice de massa corporal superior a 40kg/m2) ou perante complicações resolúveis com aperda de peso, como o são a insuficiência cardíaca oua apneia de sono. A decisão cirúrgica pode ser tão radi-cal quanto um “by-pass” gastro-intestinal, retirandogrande parte do aparelho digestivo do circuito de pas-sagem dos alimentos, ou tão simples quanto a coloca-ção de uma banda gástrica que deixa reduzido o espaçoque o estômago oferece para acomodar alimentos eestimula a sensação de saciedade, e com o que se podeem 12 a 18 meses obter reduções de 60 a 80% doexcesso de peso. No entanto, é sempre consideradacomo um recurso limite (pelas complicações, queembora raras são bem conhecidas, pelo compromissocom mudanças radicais no estilo de vida, e natural-mente pelos custos) que pressupõe terem sido esgota-das as opções com base na manipulação da dieta e doexercício.

OBESIDADE: ASPECTOS ETIOLÓGICOS

E DETERMINANTES DO RISCO

A pobreza, a insegurança alimentar e a mal-nutri-ção estão ligadas à obesidade, ou seja, a um estado desobre-nutrição. Esta situação paradoxal resulta de aingestão alimentar de muitas das pessoas vivendo napobreza ser adequada ou exceder as quantidades ener-géticas para responder às necessidades calóricas masfalta-lhe a qualidade nutricional que promova a saúdee previna as doenças crónicas. Assim, o constructomal-nutrição, tradicionalmente definido pela insufi-ciência tem que incluir também a dimensão do excessoe ambas as situações podem emergir da pobreza.

Mas para lá dos determinantes sociais há outros fac-tores ambientais e genéticos implicados. Existe umainteracção entre o repertório genético e o meioambiente. A mostrá-lo está o caso extremo dos índiosPima, uma tribo separada entre o México e Arizona,

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Obesidade: causas e distribuição da epidemia

mente do conteúdo do bolo alimentar) será com-preender como é que o cérebro percebe como sufi-ciente a quantidade ingerida de glicose ou lipídeos,especificamente.

A gordura corporal constitui um verdadeiro tecido,com enorme actividade metabólica, e não um sistemapassivo de armazenamento. A obesidade promove umprocesso inflamatório e induz respostas endócrinasmuito variadas [14]. Por exemplo, os adipócitos da gor-dura em torno das vísceras abdominais produzeminterleucina 6, que no fígado oestimula a produção deproteina C reactiva, por sua vez capaz de lesar as arté-rias ou, pelo menos, contribuir para o fenómeno delesão aterosclerótica, que desperta também uma res-posta inflamatória e assim se perpetua uma cascata deacontecimentos patológicos.

Nos últimos anos, depois da descrição por Reaven[15] de uma nova entidade clínica caracterizada pelaagregação de obesidade, resistência à acção da insulina,aumento da glicemia, da pressão arterial e alteraçõesdos lipídeos, designada síndrome metabólica, a obesi-dade deixou de ser vista como uma patologia isolada.Todas os componentes da síndrome metabólica eramjá bem conhecidas enquanto factores de risco para odesenvolvimento de aterosclerose e das suas complica-ções. Não é ainda claro se o conjunto dessas compo-nentes resulta em consequências que mais do que asoma dos seus efeitos individuais sejam o produtosinérgico das suas acções.

Na verdade, a obesidade é um dos factores maisimportantes e modificáveis de risco cardiovascular eaté de cancro, as duas principais causas de doença emorte nas sociedades desenvolvidas [1]. Mas nãoinfluencia apenas esses acontecimentos finais: a obesi-dade aumenta a probabilidade de aparecimento devalores anormalmente altos de colesterol, de pressãoarterial e de diabetes do tipo 2, por si factores de riscoimportantes para as doenças do coração e dos vasos [16,

17]. Uma grande quantidade de informação científicapermitiu concluir que uma pessoa com um índice demassa corporal maior que 27 kg/m2, comparada comoutra de corpulência inferior, independentemente deoutras características, terá um risco cerca de três vezes

11% de indivíduos não obesos. O que é também inte-ressante notar é que em gémeos discordantes para ainfecção com o Ad-36 o gémeo infectado era o maispesado e o que apresentava maior proporção de massagorda. Voluntários obesos e não obesos foram avalia-dos quanto à presença de anticorpos para os Ad-37,Ad-31 e Ad-2 não se tendo encontrado qualquer asso-ciação com o índice de massa corporal ou a concen-tração sérica de lipídeos.

Por outro lado, e através de vias distintas de actua-ção, foi-se perseguindo a ideia de a obesidade poderser uma situação em que outros agentes microbianos,agora bactérias intestinais, teriam um papel de relevo[12, 13]. As bactérias intestinais poderiam ainda servircomo biomarcadores e até potenciais alvos terapêuti-cos. Observou-se, quer em ratos quer em humanosobesos, que a quantidade relativa de dois dos grupos debactérias intestinais mais frequentes se encontrava alte-rada. Em experiências com animais de laboratório,após sequenciar os genes dos agentes microbianos pre-sentes em ratos obesos e ratos magros e transplantandoos diferentes agentes para ratos com aparelho digestivoamicrobiano, pôde verificar-se que os agentes de ratosobesos tendiam a obter maior número de calorias dosalimentos, pois os seus genes tinham maior capacidadede digerir polissacarídeos e propiciavam uma quanti-dade significativamente maior de gorduras aos recep-tores celulares. Assim, para além da ingestão alimentare do exercício a flora microbiana do aparelho digestivopoderá contribuir para determinar o risco de obesi-dade.

Sem o apetite e a saciedade não ocorreriam as acçõesque através da alimentação asseguram a estabilidadedas reservas plásticas. Apenas nas últimas décadas foipossível desvendar o intrincado fluxo de informaçãoque se estabelece entre o cérebro e o aparelho diges-tivo, nos seus diversos segmentos, seja através de trans-missores neuronais seja por intermédio de estímuloshormonais. O estômago, por exemplo, produz a gre-lina, que estimula a fome, enquanto o duodeno induza secreção de um mediador para a saciedade. Mas maisinteressante que estas respostas monótonas a estímulosde volume (a distensão das vísceras independente-

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Importa salientar que o índice de massa corporalpode ser uma medida enganadora perante situaçõesem que há uma massa muscular muito desenvolvida(responsável pelo aumento de peso) bem como emmulheres grávidas ou a amamentar, situações em quesobrestima a gordura corporal. Pelo contrário, podesubestimar a gordura corporal em idosos que, comoparte do processo de envelhecimento, perderam massamuscular.

Em todos os casos, parece haver uma diferença bemmarcada na classificação individual quando o cálculodo índice de massa corporal é feito com base em medi-ções objectivas ou através da informação auto-decla-rada. Verifica-se em ambos os sexos uma tendênciageral para indicar pesos menores que os reais e estatu-ras mais elevadas, o que resulta em índices de massacorporal mais baixos. Deste modo, não só a caracteri-zação individual como o cálculo da prevalência da obe-sidade, devem ter como base medições objectivas epadronizadas. De outro modo são sistematicamentesubestimadas as frequências de obesidade.

Em crianças e adolescentes o índice de massa cor-poral é classificado de forma diferente dos adultos.Porque os rapazes e as raparigas têm um ritmo dife-rente de crescimento o índice de massa corporal é clas-sificado de forma específica para o sexo e a idade. Ospontos de corte para a classificação definem-se peladistribuição percentual com base nas características deuma amostra com a qual é comparado o valor indivi-dual de cada criança [21].

Assim, e acordo com essas normas, uma criança éconsiderada:

– com baixo peso, se o índice de massa corporal esti-ver abaixo do percentil 5

– com peso normal, se o índice de massa corporal sesituar do percentil 5 até abaixo do percentil 85

– em risco de excesso de peso, se índice de massacorporal se situar entre o percentil 85 e o percen-til 95

– com excesso de peso, se o índice de massa corpo-ral for igual ou superior ao percentil 95.

Além desta classificação da Organização Mundial daSaúde (OMS)[21], há a considerar a definida pela Inter-

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superior de desenvolver hipertensão, diabetes nãodependente da insulina ou acidentes vasculares cere-brais; um risco duas vezes superior de gota, litíase vesi-cular, artroses, angina de peito ou enfarte agudo domiocárdio; e um risco cerca de 50% mais alto de ocor-rência de cancro colo-rectal ou da mama [18].

Algumas avaliações recentes permitiram calcular quea obesidade diminui a esperança de vida em quatro anove meses. Cálculos similares, nos Estados Unidos daAmérica, quando aplicados às crianças e perante o con-tinuado aumento da obesidade nessa idade, permitemestimar diminuições médias de dois a cinco anos devida [19]. A manter-se esta situação, as presentes gera-ções de crianças dos países desenvolvidos tornar-se-iamas primeiras da nossa história mais recente a viver vidasmais curtas que as dos pais.

DEFINIÇÃO ANTROPOMÉTRICA DE OBESIDADE

A obesidade pode ser definida utilizando diferentesmedidas, sendo o índice de massa corporal, pela suaaplicabilidade prática, o mais utilizado, nomeada-mente em estudos populacionais de larga dimensão[20].

Para os adultos, o índice de massa corporal obtêm-se dividindo o peso em quilogramas pelo quadrado daaltura, em metros. Embora seja uma variável contínua,o índice de massa corporal costuma ser consideradoem categorias, cujos limites e designações forammudando, e as pessoas classificadas de acordo com elas.

Assim, um adulto é considerado:– com baixo peso, se o índice de massa corporal for

inferior a 18,5 kg/m2

– com peso normal, se o índice de massa corporal seencontrar entre 18,5 e 24,9 kg/m2

– com excesso de peso, se o índice de massa corpo-ral estiver compreendido entre 25,0 e 29,9 kg/m2

– com obesidade, se o índice de massa corporal forigual ou superior a 30,0 kg/m2

Adicionalmente, algumas classificações ainda subdi-videm a categoria obesidade de acordo com classes de 5kg/m2, reflectindo formas crescentemente mais graves.

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marcador mais sensível do risco cardiovascular – porexemplo, o risco de sofrer um enfarte agudo do mio-cárdio – do que o índice de massa corporal.

Em 2000 as Nações Unidas fizeram a Declaraçãodo Milénio, na qual se estabeleceram oito objectivospara o desenvolvimento e um conjunto de indicadoresa atingir até 2015. O primeiro objectivo é a erradica-ção da pobreza extrema e da fome. Para o conseguirpretende-se reduzir em 50% a proporção das pessoasque vivem com menos de um dólar por dia e reduzirtambém para metade a proporção das pessoas que pas-sam fome. Algumas regiões do globo fizeram progres-sos no sentido destas metas mas a fome e a insegurançaalimentar (inexistência de acesso físico, social ou eco-nómico adequado a alimentos suficientes, seguros enutritivos capazes de garantir as necessidades dietéticase as preferências alimentares indispensáveis para umavida activa e saudável) continuam excessivamente pre-sentes e ambas contribuem para a má-nutrição.

A OBESIDADE EM PORTUGAL

Em Portugal, o Inquérito Nacional de Saúde permitedescrever e acompanhar as tendências de alguns aspec-tos relacionados com a saúde, nomeadamente o excessode peso e a obesidade. A comparação entre os resultadosdo inquérito realizado em 1995/96 e os dados de1998/99 permite observar a nível nacional um aumentoda prevalência. Nos homens, a prevalência de excessode peso foi de 39,9% em 1995/96 e de 42,5% em1998/99. Nas mulheres estes valores foram 32,2% e32,3%, respectivamente. A prevalência de obesidadeaumentou em ambos os sexos, de 10,3% para 11,5%,nos homens e de 12,7% para 14,2%, nas mulheres [25].Estes resultados provavelmente subestimam a real fre-quência do excesso de peso uma vez que se baseiam eminformações referidas pelo inquirido e não em mediçõespor observador independente. Ao longo dos anos, e até2005, esses valores sempre cresceram.

Utilizando dados de uma amostra representativa dacidade do Porto, seleccionada por aleatorização de dígi-tos telefónicos (Estudo EPIPorto), observou-se que a pre-

national Obesity Task Force (IOTF)[22]. A Internatio-nal Obesity Task Force utiliza como referência os dadosde Cole e colaboradores que estimaram para cada idadee sexo qual o índice de massa corporal que correspondiaa 25,0 Kg/m2 e 30,0 Kg/m2 nos adultos – valores consi-derados, como já vimos, para a definição, respectiva-mente, de excesso de peso e obesidade nos adultos – assu-mindo que, para cada idade e sexo, o valor correspon-dente aos pontos de corte no adulto definem as respec-tivas categorias nas crianças e adolescentes.

A Organização Mundial de Saúde propôs que seconsiderassem obesos os indivíduos que têm índice demassa corporal superior ao percentil 95 para o sexo eidade, e com excesso de peso aqueles cujo índice demassa corporal se encontra entre o percentil 85 e 95para o sexo e a idade. Alguns países, ou estudos, fazemas suas próprias curvas de distribuição com base emamostras consideradas representativas, para definir oponto de corte, enquanto outros adoptam curvas deoutros países, dificultando ainda mais a comparabili-dade dos dados. Em Portugal, a Direcção-Geral daSaúde optou pela definição da Organização Mundialde Saúde e como referência considera as curvas publi-cadas pelo National Centre for Health and Statisticsdos Estados Unidos da América [23] (Circular Nor-mativa: Nº: 05/DSMIA de 21/02/2006).

Para classificar as crianças utiliza-se frequentemente“excesso de peso” e “risco de excesso de peso” e nãoobesidade, para contrariar a discriminação associadacom a obesidade, vista socialmente como uma des-vantagem, bem como o estigma que também crescen-temente a acompanha.

Deve-se acentuar que o índice de massa corporal éum instrumento valioso para quantificar modificaçõesao longo do tempo e monitorar o resultado de inter-venções. Mas há outros parâmetros antropometricos ecom eles podem-se obter formas alternativas de ava-liar a gordura corporal e classificar individualmente aspessoas. Um desses parâmetros é o perímetro da cinta,considerando-se anormal um valor superior a 88 cen-tímetros nas mulheres e 102 centímetros nos homens[24]. Aliás, o perímetro da cinta, bem como a razãoentre o perímetro da cinta e o perímetro da anca, é um

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valência de obesidade, definida como o índice de massacorporal ≥30 kg.m-2, era 25,8% nas mulheres e 15,9%nos homens, e que 36,6% das mulheres e 47,2% doshomens apesar de não serem obesos apresentavamexcesso ponderal (Tabela 1) [26]. Se utilizarmos o perí-metro da cintura para definir obesidade abdominal, e deacordo com os pontos de corte definidos pelo AdultTreatment Panel III, 40,4% das mulheres e 16,8% doshomens apresentam uma acumulação de gordura a nívelabdominal, considerada de elevado risco cardiovascular.Estas proporções sobem se utilizarmos pontos de cortemais recentemente estabelecidos pelo European Groupfor the Study of Insulin Resistance (EGIR) e pela Inter-national Diabetes Federation (IDF), em 2005, de acordocom cujos critérios 64,3% das mulheres e 44,9% doshomens na cidade do Porto apresentam obesidade cen-tral. Pelo parâmetro razão perímetro cintura - anca(Organização Mundial de Saúde, 1995) quase todos osindivíduos do Porto apresentam valores acima dos reco-mendados [27].

Pela primeira vez foi possível estimar a prevalênciada síndrome metabólica numa amostra representativade adultos de um grande centro urbano português. Asíndrome metabólica foi definida de acordo com oAdult Treatment Panel III, pela presença de três oumais dos seguintes indicadores: perímetro da cintura>102 cm nos homens e > 88 cm nas mulheres, trigli-cerídeos >150 mg/dl, colesterol HDL < 40 mg/dl noshomens e < 50 mg/dl nas mulheres, pressão arterialsistólica superior a 130 e diastólica acima de 85 mmgHg, glicemia em jejum 110 mg/dl. A prevalência brutada síndrome metabólica foi de 23,9 %, (27,0% nosexo feminino e de 19,1 % no sexo masculino), sendoo seu valor após padronização para a população euro-peia de 14,5%. A prevalência da síndrome aumentacom a idade em ambos os sexos, atingindo o valormáximo na faixa etária dos 60-69 anos (35,0% nasmulheres e 32,9% nos homens). Verificámos uma ele-vada prevalência de pressão arterial igual ou superior a130/85 mm Hg em ambos os sexos (68,0 % nasmulheres e 73,5% nos homens), sendo o factor menosprevalente a glicemia em jejum maior que 110 mg/dL(6,0% nas mulheres e 8,2% nos homens) [28]. Assim,

nesta população do Porto, a síndrome metabólica émuito frequente e está caracteristicamente associada avalores elevados de pressão arterial, em consonânciacom a elevada morbilidade e mortalidade cardiovas-cular Portuguesa (Tabela 2).

Numa amostra de 2040 adolescentes portuguesesnascidos em 1990, estudantes nas escolas da cidade doPorto, e avaliados aos 13 anos, verificou-se que tendoem conta a definição da Organização Mundial deSaúde e utilizando as curvas do National Centre forHealth and Statistics, a prevalência de excesso de pesofoi 15,9% nas raparigas, e 16,8% nos rapazes. A pro-porção de obesos foi 9,2% nas raparigas e 11,1% nosrapazes. Neste estudo os adolescentes foram pesados emedidos por inquiridores treinados. Quando se estu-daram os factores que o determinavam verificou-se queeram o facto de os pais serem obesos e, claro, a inten-sidade das actividades físicas no lazer [29].

Do mesmo modo que para os adultos também nosadolescentes, e em idades relativamente precoces,como são os 13 anos das crianças na amostra do Porto,a presença de excesso de peso se associa com aumentoda prevalência de valores mais elevados de pressão arte-rial, duplicando a frequência da hipertensão em ambos

Henrique Barros, Elisabete Ramos

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Tabela 1: Prevalência de obesidade, avaliada por intermédio do índicede massa corporal e dos perímetros da cintura e da anca

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os sexos quando comparamos adolescen-tes normo ponderais com adolescentes coexcesso de peso [30]. Também são fre-quentes entre adolescentes valores altera-dos dos critérios que definem a síndromemetabólica e a própria índrome definidapela presença de pelo menos três dessescritérios (Tabela 3).

A utilização do índice de massa corpo-ral como marcador de obesidade acarretaproblemas uma vez que a relaçãopeso/estatura no adolescente é diferenteda do adulto, acrescido ainda de quemuitas das varições dependem mais daidade biológia (maturação) do que daidade cronológica. Utilizando novamenteos dados do estudo EPITeen para ilustraresta dificuldade, podemos observar que,qualquer que seja o critério considerado,a prevalência de excesso de peso e obesi-dade é maior nos adolescentes do sexomasculino. Este resultado é concordantecom outros dados nacionais e internacio-nais que usam o índice de massa corporalpara a classificação [21, 31]. No entanto,quando avaliada a proporção de massagorda (estimada utilizando o equipa-mento Tanita®) para o total do peso cor-poral verificou-se que são as adolescentesque apresentam média (± desvio padrão)superior (26,3±7,79 versus 14,9 ± 7,36,em %). No entanto, a utilização doíndice de massa corporal é consideradaapropriada uma vez que é um métodonão invasivo, barato e o equipamentonecessário para o estimar (balança e esta-diometro) é fácil de transportar, estascaracterísticas tornam o índice de massacorporal particulatmente útil para a ava-liação de grandes grupos. E permite com-parações simples ao longo do tempo eentre áreas geográficas, como mostra atabela 4.

Obesidade: causas e distribuição da epidemia

41

Tabela 2: Prevalência (e respectivos intervalos de confiança a 95 %) da síndrome meta-bólica em homens e mulheres adultos, residentes na cidade do Porto, por classes de idade.

Tabela 3· Prevalência (intervalo de confiança 95%) de síndrome metabólico e seus com-ponentes individuais em adolescentes com 13 anos.

Tabela 4: Estimativas de prevalência de excesso de peso (excesso de peso e obesidade), con-siderando o método de avaliação do peso e estatura e o critério utilizado na classificação.

Page 42: Revista Cirurgia 04

Henrique Barros, Elisabete Ramos

42

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Para algum observador externo poderá parecer para-doxal, ou mesmo bizarro, que em metade do mundocerca 700 milhões padeçam de fome e que na outrametade do mundo se tenha que “ afunilar” o estômagopara que não entrem mais alimentos. E no entanto, nãoé assim tão estranho. Segundo a Organização Mundialde Saúde , na metade do mundo que vive em estadode insuficiência proteíco-calórica, à medida que houverdisponibilidade de alimentos, os indivíduos entrarãodirectamente ( alguns já estão a entrar) na obesidade edentro desta uma parte terá obesidade grave ou mór-bida. As razões para esta mudança directa de um estadopara o outro são a selecção genética da resistência àfome, os baixos custos da disponibilidade alimentarhipercalórica e os custos altos da alimentação menoscalórica e com maior valor nutricional. Como exem-plo pode-se observar o que se passa na India, onde naregião de Nova Deli no Norte da India, as mulheres dazona urbana tem 16,4 % de obesidade( um poucosuperior à nossa) e as da zona rural têm 2,2 % (1). Asdeterminantes sociais são bem patentes nos EUA ondena avaliação do NHANES de 2003-2004 (2) a obesi-dade grau III tem uma prevalência de 2,8% entre osbrancos não-hispânicos na população dos 18 aos 64anos e de 6,9 nas mulheres do mesmo grupo, sendo de5,4% entre os homens afro-americanos. Quanto a nós,temos 0,6% de obesidade grau III (0,8 nas mulheres e0,2 nos homens), num conjunto de 14,2% de obesi-dade, a qual se agrava sucessivamente à medida que sedesce na escala social (3,4). E apesar da nossa prevalên-cia ser pequena comparada com a de outros países,

como os EUA, é suficientemente grande para se calcu-larem cerca de 32.000 grandes obesos em Portugal emidade adulta. Deverá ainda ser adicionada a populaçãocom obesidade grau II com doenças associadas.

Esta população de grandes obesos tem provavel-mente um forte factor genético. Esta afirmação pode-se basear em três razões:1. Estando inseridos num con-junto populacional sujeito às mesmas condições demudanças alimentares e sedentarismo, destacam-se nodesenvolvimento duma obesidade grave, enquanto queos restantes se distribuem por graus mais moderados 2.Na anamnese é quase constante o relato duma obesi-dade que vem desde a pequena infância 3. São fre-quentes os casos de familias de grandes obesos. Pensa-se hoje que são poucos os casos de defeitos genéticosque se reduzem a uma determinante, como é o caso daleptina, mas que há uma situação (ou terreno) poligé-nico que determina a gravidade dos casos, após a expo-sição aos factores alimentares e ao sedentarismo (5).

PATOLOGIA ASSOCIADA

Na obesidade mórbida, ou grave ou grau III, acen-tuam-se todos os riscos que se apontam para a obesi-dade em geral. Ou seja: riscos cardiovasculares, pro-babilidade de ocorrência de diabetes tipo 2, probabi-lidade acrescida de certos cancros, doenças osteoarti-culares, pertubação do sono e problemas psicológicose psico-sociais. O risco relativo de morte calculado aos50 anos para homens e mulheres com IMC≥40 nãofumadores é respectivamente de 3,82 e 3,79 (6) e para

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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GRANDES TEMAS: OBESIDADE

Cirurgia bariátrica

Isabel do Carmo1, Maria João Fagundes2, José Camolas3

1 Endocrinologista, Professora da Faculdade de Medicina,Directora do Serviço de Endocrinologia do Hospital de Santa Maria (HSM)

2 Psicóloga clínica, responsável de avaliação psicológica na consulta de obesidade do HSM3 Nutricionista, Técnico Superior da Consulta de Obesidade no HSM

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Isabel do Carmo, Maria João Fagundes, José Camolas

quilos depois. Têm toda a razão pois não há segui-mento de intervenção que resista a este enorme peso,mas o doente vê-se num bêco sem saída. Todo o acon-selhamento estereotipado que possamos fazer de “dietasaudável e exercicio” é desadequado, senão ridículo.

2. A pertubação do sono. Por circunstâncias tam-bém mecânicas estes doentes têm roncopatia e sono per-turbado, com apneias. Esta situação tem sérios riscos depertubação da conjugalidade e tem aumento dos riscosde mortalidade, como é sabido. A consequente sono-lência diurna, que ocorre subitamente, muitas vezes semanúncio, é causa de acidentes graves, alguns mortais. Éfrequente que o grande obeso que é motorista de pro-fissão, com grandes refeições e sedentarismo, acabe porvir parar ao serviço de urgência dos hospitais, politrau-matizado por acidente que ocorreu em consequência doadormecimento súbito ao volante.

3. A pertubação psicológica e social. Uma pessoaque arrasta desde a infância uma condição de pêsograve tem necessáriamente pertubações emocionais dereacção a essa circunstância. A existência tão cêdo destamarca física trás também pertubações da personalidadeque passam a integrar o indivíduo definitivamente. Demodo que parece mais lógico considerarmos as pertu-bações psicológicas como uma consequência do quecomo uma causa das grandes obesidades. Quanto aocomportamento alimentar ter-se-à que considerar quea marca genética também funciona ao nível do com-plexo sistema de apetite/saciedade, que um corpo volu-moso tem necessidades alimentares superiores às dumcorpo de pêso recomendável para a mesma idade esexo e que estas pessoas têm muitas vezes uma históriade vida com sucessivas tentativas de restrição alimen-tar que provocam uma consequente compulsão ali-mentar que não é patológica, mas sim lógica, como seexplica à frente na avaliação psicologica ( pseudo binge-eating) Socialmente também sabemos quanto estasituação é marginalisante.

INDICAÇÕES PARA A CIRURGIA BARIÁTRICA

Perante o que atrás fica dito, é necessária uma inter-venção da natureza da cirurgia bariátrica nos indivi-

os jovens grandes obesos o risco é 12 vezes superior aosde pêso normal(7,8). E, numa época em que se dis-cute muito os custos dos Sistema de Saúde e em quetudo se avalia, ao que parece, mais em números de des-pesa do que em sofrimento humano, vale então a penadizer que os custos anuais em saúde dos obesos comIMC≥35 são três vezes superiores aos dos individuosde pêso normal(9). Este ponto de corte no IMC de 35e não no de 40, a partir do qual se considera obesidadegrau III justifica-se pelo facto de, a partir do IMC de35( grau II) se estabelecerem doenças associadas – dia-betes, HTA, doenças arteriais cardíacas e cerebrais,doenças osteoarticulares, doenças venosas dos mem-bros inferiores – em relação às quais se torna imperiosoutilizar os instrumentos medicamentosos existentes nomercado, de modo a minorar o sofrimento e o risco. Orecurso ao médico, às urgências hospitalares e a inter-namentos é muito grande. A partir do IMC de 35 comdoenças associadas é tambem a situação individual apartir da qual o absentismo ao trabalho ou o desem-prego implicam custos sociais e pessoais. Importa, por-tanto, salientar toda esta morbilidade e risco de mor-tabilidade. No entanto, pela experiência clínica e aoencontro dos dados que surgem nas nossas séries e emoutras, gostariamos de destacar aspectos particularesdestes doentes:

1. A patologia osteo-articular. Estes doentes sãoportadores de sintomas de dor, dificuldade de mobili-dade e mesmo de incapacidade, sobretudo relaciona-dos com a coluna vertebral, os joelhos e os pés. Asrazões mecânicas são óbvias, mas a verdade é que tam-bém estão afectadas as pequenas articulações das mãos.A existência de outras causas, para além das mecânicas,parece derivar da insulino-resistência e dos factorespró-inflamatórios associados.

A verdade é que estamos perante doentes que semobilizam com dificuldade, em relação aos quais arecomendação de exercicio tem que ser muito caute-losa, para além da mandatada pela sua fraca capaci-dade cardio-respiratória.

Muitas vezes estes doentes têm a “porta fechada”pelo colega de ortopedia em relação a prótese da ancaou dos joelhos que esperam por eles menos 30 ou 40

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Cirurgia bariátrica

ção tiroideia e supra-renal, análises de pesquisa deeventual síndroma do ovário poliquístico nas mulhe-res e análises relativas ao estado nutricional( ferro, tran-ferrina, ferritina, ac.fólico, vitB12, zinco,cálcio, fós-foro, magnésio e proteinograma). Os doentes fazemtambém avaliação cardiológica, com ecg, ecocardio-grama e outras provas se necessário. Na nossa consultafazem sistemáticamente estudo do sono e provas defunção respiratória. No período mais próximo daintervenção fazem endoscopia alta. A avaliação médicadeve conresponder a pelo menos 5 consultas.

Os doentes com IMC superior a 50Kg/m2 são acon-selhados a colocar balão intra-gástrico previamente,para haver uma perda de pêso que facilite a interven-ção cirurgica.

No espaço de 360 dias após a intervenção deveráhaver pelo menos 7 consultas aos 15, 30, 90, 150, 210,270 e 360 dias, com avaliação do estado de saúdegeral, das co-morbilidades e do estado nutricional. Acarência pós-cirurgica mais comum que temos encon-trado e tratado tem sido a carência de zinco, patentenas análises e nos sintomas.

No entanto, o acompanhamento do doente que fazcirurgia bariátrica não pára aos 360 dias. O seguimentodos doentes intervencionados, apesar das melhoriasenormes do seu estado de saúde, é para a vida. Nos quetêm complicações pós-cirurgia ou simplesmente adap-tações o seguimento é ainda mais exigente.

INTERVENÇÃO PSICOLÓGICA NA CIRURGIA

BARIÁTRICA.

(A experiência na Consulta de Obesidade Mórbidado Serviço de Endocrinologia Diabetes e MetabolismoHospital de Santa Maria, Lisboa)

Como ficou exposto atrás, a intervenção na obesi-dade mórbida e consequentes doenças metabólicaspassa, cada vez mais, por uma solução cirúrgica. Paraos próprios doentes, a saúde e/ou a melhoria de qua-lidade de vida são a razão principal para a procura ouaceitação desta cirurgia 10 . Aos psicólogos clínicos quetrabalham em contexto de Saúde, a avaliação e acom-panhamento dos obesos candidatos a cirurgia bariá-

duos que obedeçam aos critérios que estão estabeleci-das pelas guidelines europeias: doentes entre os 18 e os60 anos; IMC ≥40 Kg/m2; IMC≥35 Kg/m2 comdoenças associadas, em relação às quais se esperamelhorias pela perda de pêso induzida pela cirurgia;estes doentes terão que ter uma história de tentativasfrustadas de perda de pêso através de tratamentomédico ou perda de pêso seguida de recuperação.

Os doentes com menos de 18 anos ou com mais de60 têm que ser considerados individual e excepcional-mente(8). Além dos critérios de exclusão que maisadiante serão descritos na avaliação psicológica, há cri-térios de exclusão clínica gerais: doentes sem condiçãoanestésica cirurgica; portadores de doença que reduz sig-nificativamente a esperança de vida ( neoplasias, doençacoronária sitomática, insuficiência renal crónica, cirrosehepática); doenças gastro-esofágicas não tratadas.

AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA

O doente que vai ser sujeito à cirurgia bariàtricadeve ser avaliado por endocrinologia/medicina, psi-cologia/psiquiatria e nutrição/dietética.

Esta avaliação demora alguns meses. Este tempo énecessário para os vários exames e sobretudo para a ava-liação psicológica detalhada, mas também é necessáriopara optimizar o tratamento das co-morbilidades e per-mite que o doente mostre que é capaz de ser assíduo nasconsultas. Este seguimento pré- operatório mostrarátambém que o doente assume o tratamento e o projectocirurgico como um acto da sua opção, que é capaz demodificar hábitos alimentares e que está motivado.

Com o número de grandes obesos existente em Por-tugal, o doente teve um tempo de espera importantepara integrar a consulta de obesidade, que nos várioscentros estamos a tentar reduzir. No entanto, tambémnão podemos dar a ideia de que quando é chamado oestá a ser para a cirurgia. É necessário explicar que a inte-gração na consulta é o inicio dum novo processo quelevará alguns meses, pelo menos seis, e explicar-lhe tam-bém os riscos, limitações e benefícios da cirurgia.

A avaliação médica inclui Rx torax, análises dehematologia e bioquimica de rotina, avaliação da fun-

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trica pressupõe um conjunto de práticas que, infeliz-mente, não estão, ainda, organizadas num protocolonacional e/ou internacional11

Cada grupo de trabalho constitui a sua bateria detestes, critérios de exclusão, periodicidade e tipo deintervenção psicoterapêutica.

Para colmatar o que se considera ser uma lacunaimportante, o Núcleo de Psicologia da Sociedade Por-tuguesa de Cirurgia Bariátrica e o Grupo de Trabalho dePsicologia e Comportamento da Sociedade Portuguesapara o Estudo da Obesidade estão a produzir, em con-junto, um protocolo que, pretendemos, sirva de orien-tação para os profissionais portugueses bem como seconstitua a proposta nacional para o protocolo europeu.

Neste artigo, descrevemos a prática do grupo mul-tidisciplinar da Consulta de Obesidade Mórbida doHospital de Santa Maria em Lisboa.

Na nossa consulta o encaminhamento para a CirurgiaBariátrica é feito, por equipa multidisciplinar, com baseem critérios médicos e psicológicos. Para tal, foi criadoum protocolo de intervenção psicológica, com base naliteratura internacional e dados empíricos de centros hos-pitalares que realizam esta avaliação há várias décadas.

A intervenção do psicólogo pode esquematizar-sedo seguinte modo: Pré-operatório: Avaliação Psicoló-gica (A.P.) e acompanhamento visando a adesão ao tra-tamento (v.g. mudanças comportamentais, estratégiade coping alternativa à “alimentação emocional”, incre-mento da actividade física). Pós-operatório: despiste e

intervenção nas possíveis complicações psicológicas edo âmbito psicossocial (v.g. perturbações do compor-tamento alimentar, depressão, ansiedade ou agrava-mento da sintomatologia psicológica prévia à inter-venção). Em síntese, pretende excluir-se candidatoscujo risco supere o benefício; seleccionar os que apre-sentam melhor prognóstico12. Quanto aos restantesintervir quando os critérios são “limite” de modo a queestes candidatos possam, a seu tempo, ser submetidosà cirurgia. A actualização científica deve ser constante,já que a experiência de outros grupos, com outras téc-nicas, grandes séries e acompanhamento longitudinalse revela de enorme interesse13,14 .

OBESIDADE MÓRBIDA, AVALIAÇÃO

PSICOLÓGICA, CIRURGIA BARIÁTRICA

A consulta de Obesidade Mórbida tem uma estru-tura multidisciplinar que inclui consultas de endocri-nologia, cirurgia, psicologia e nutrição.

Todos os candidatos são avaliados na consulta depsicologia. O Protocolo consiste numa Avaliação Psi-cológica (A.P.), em cinco sessões, onde é aplicada umaEntrevista semi-estruturada e uma bateria de testes psi-cométricos e projectivos conforme Tabela 1.

A Entrevista é o primeiro instrumento de avaliação.Com base nesta se fará, logo na primeira fase, o diag-nóstico diferencial das Perturbações do Comporta-mento Alimentar e do padrão alimentar do obeso:

Isabel do Carmo, Maria João Fagundes, José Camolas

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Tabela1: Instrumentos utilizados na avaliação psicológica

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Petisco contínuo, Hiperfagia prandial; e o que chamamosPseudo Binge Eating (Crise de Voracidade Alimentar) quecessa após o poli fraccionamento, e ainda o diagnósticode Psicopatologia que se completará com os testes.

O processo dura 6 meses podendo chegar ao ano.O tempo é o necessário para A.P. e intervenção prepa-ratória22 para a cirurgia. Os candidatos são mantidosem acompanhamento no sentido de promover a modi-ficação comportamental que se operacionaliza, entreoutras medidas, por uma perda de peso de 10% e ade-são às consultas. O critério é a evolução do doente.

Para esta intervenção estão estabelecidos Critérios deExclusão23 que, no nosso protocolo, são os da imagemseguinte 24.

Cada vez mais os Critérios de Exclusão se prefiguramno que, no nosso entender, deveria classificar-se comoCritérios de Intervenção Obrigatória. Conforme pode-mos verificar apenas dois destes são considerados Cri-térios de Exclusão absolutos: o uso/abuso de substân-cias25 e a Perturbação de Personalidade (Eixo II) ouPsiquiátrica não compensadas. Considerando-se, por-tanto, que o doente recusa o acompanhamento psi-quiátrico ou não adere ao tratamento.

Se, e quando, compensado é reintegrado na con-sulta e é estabelecido uma intervenção psicoterapêu-tica,26 individual, segundo o parecer do psicólogo queacompanha o caso.

Após esta avaliação e se os valores forem considera-dos normativos, são programadas quatro consultasmensais, nas quais se pretendem elaborar estratégiasde modificação comportamental, adequação ao novoshábitos de exercício físico, alimentares (v.g comer de 3em 3 horas, introdução de hábitos na família, e a ade-são às consultas) 27. É, ainda, assinado um “Consenti-mento Informado” documento que, entre outras infor-mações, sintetiza as possíveis complicações da cirur-gia. Na consulta de psicologia, é com a assinatura destedocumento, feita obrigatoriamente com cônjuge,familiar ou amigo próximo, que se afere o suportesocial e se discutem, em família, muitas das adapta-ções a realizar no futuro. Após a 7ª consulta, o caso éapresentado em reunião multidisciplinar e discutida aintervenção adequada.

PÓS-OPERATÓRIO

O follow-up pós-operatório consiste em 6 consultascalendarizadas do seguinte modo: Dia da alta e após 2,4, 12, 24 e 52 semanas desta. No segundo ano, 6 e 12meses após a última consulta. A todos os doentes éfacultada a marcação de consulta, em qualquer data,sempre que o solicitem.

O procedimento consiste numa entrevista semi-estruturada, protocolar, onde são investigados o com-portamento alimentar, alterações de humor, vida ins-tintiva (sono, apetite e líbido). A escuta atenta é, comosempre, uma “ferramenta” imprescindível. A melho-ria, objectiva, da qualidade de vida não deve compro-meter o despiste de eventual sintomatologia depres-siva27 ou emergência de comportamento alimentarperturbado29 (crises de voracidade alimentar, nighteating syndrome, bulimia nervosa v.g.) Post-SurgicalEating Avoidance Disorder (PSEAD)30 ou dificuldadesde ordem psicossocial31 . A experiência de grandes per-das de peso, que podem ser da ordem dos 30% a 40%do peso inicial, são vivenciadas por cada sujeito deforma particular, estando descritos na literatura des-compensações psiquícas graves32.

Fizemos referência à intervenção individual. Oacompanhamento em grupo é uma possibilidade van-tajosa, quer em termos logísticos quer promovendobenefício terapêutico específico.

Em síntese, podemos dizer que a obesidade é umadoença crónica e a Cirurgia Bariátrica não é uma cura.

Cirurgia bariátrica

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Mas, neste importante processo, a avaliação e acompa-nhamento psicológico devem ser realizados por profis-sionais experientes, munidos de um protocolo testado ecom uma calendarização que sirva o doente. O acom-panhamento não tem um fim previsível. A estabilidadeemocional e a modificação de hábitos de vida terão dese conquistar e manter diariamente. As memórias, físi-cas e psicológicas, da obesidade mórbida, não se apa-gam num só momento. Para isso, teremos de estar dis-poníveis, pessoal e institucionalmente, para o resto, doque desejamos, seja uma boa e longa vida.

Avaliação/Seguimento Nutricional Pré-Balão/Cirurgia Bariátrica

O protocolo que se segue é o resultado dum traba-lho comum dos especialistas de nutrição/dietética doHospital de Santa Maria e do Hospital Pulido Valente:Patrícia Nunes, Silvia Neves, Anabela Santos, JoséCamolas, João Vieira e Maria Guiomar Ferreira.

1. Número, periodicidade e duração das consultas:• O candidato a Balão/Cirurgia Bariátrica deve fre-

quentar um mínimo de três consultas de avaliação//segui mento nutricional antes da cirurgia;

• A periodicidade será aproximadamente mensal;• A duração será de aproximadamente 30 a 40

minutos, no caso de serem primeiras consultas, e de20 minutos, nas consultas de seguimento;

2. Tem como objectivos:• Proceder à História Clínica e Avaliação Nutricio-

nal, visando avaliar:– Altura, peso (actual, habitual e adequado, bem

como a sua evolução), perímetro da cintura e perí-metro da anca

– Patologias associadas (Diabetes, DCV, HTA,entre outras)

– Antecedentes familiares de obesidade e/ou outraspatologias associadas

– Alterações do Comportamento Alimentar (NightEating Syndrome, Binge Eating Syndrome, SweetCraving, entre outras)

– Esquema alimentar do doente– Apetite e níveis de saciedade– Presença de sintomatologia gastrointestinal (náu-

seas, vómitos e alterações do trânsito intestinal)– Alterações do paladar e olfacto– Preferências alimentares e aversões (incluindo

questões éticas e culturais)– Presença de alergias ou intolerâncias alimentares – Consumo de bebidas alcoólicas– Capacidade de aquisição e intervenção na prepa-

ração de alimentos – Grau de actividade física– Fármacos e Suplementos Nutricionais• Iniciar o processo de Reeducação Nutricional;• Esclarecer o doente sobre as fases da Dieta Pós-

-Operatória

SEGUIMENTO NUTRICIONAL PÓS-BALÃO/

/CIRURGIA BARIÁTRICA

1. Periodicidade e duração das consultas:• A data da alta o doente receberá orientação ali-

mentar do técnico de nutrição que dá apoio ao Ser-viço de Cirurgia e é orientado para, aproximadamenteuma semana depois, se dirigir à consulta de ambula-tório para receber novas orientações;

• As consultas seguintes de ambulatório terão umaperiodicidade aproximadamente quinzenal, nos pri-meiros dois meses, mensal, até aos seis meses, bimes-tral, até ao ano, trimestral, após os 12 meses, e bianual,aos dois anos após a intervenção;

• A duração será de aproximadamente 20 minutos.2. Características da DietaConteúdo EnergéticoAs técnicas restritivas ou mistas permitem a existência

de uma sensação de saciedade precoce, devida à reduzidadimensão do primeiro reservatório. Durante os três pri-meiros meses após a cirurgia a restrição calórica é maisintensa, sobretudo devido à redução espontânea daingestão de alimentos, à diminuição do apetite e à sacie-dade precoce. Nos primeiros 6-12 meses a ingestão caló-rica rondará as 800 Kcal/dia. Posteriormente, com a dila-tação do reservatório e com a consolidação dos hábitosalimentares, a ingestão rondará as 1000-1200 Kcal/dia.

ConsistênciaAinda no internamento o doente deve ser estimu-

Isabel do Carmo, Maria João Fagundes, José Camolas

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Page 49: Revista Cirurgia 04

lado a começar por ingerir água e/ou infusões, naquantidade de 20-30 ml cada 5 a 10 minutos. Poste-riormente, deve existir uma evolução progressiva daconsistência da dieta, distinguindo-se 4 fases quedevem ser respeitadas:

1ª FASE – Dieta LíquidaDeve ser seguida durante o 1º mês após a cirurgia,

visa permitir a adequada recuperação. É essencial queforneça quantidades adequadas de proteínas, que é asse-gurada pela ingestão de leite e iogurte líquido (aproxi-madamente 1 litro/dia) e eventualmente um suple-mento proteico, também na forma líquida, que forne-cerá cerca de 20g de proteínas. Também se recomendao consumo de sumos de frutas e/ou de legumes, e cal-dos de carne e peixe, com ou sem legumes, coados.

2ª FASE – Dieta PastosaA ser seguida durante o 2º mês após a cirurgia. Uti-

lizam-se papas, que incluem carne ou peixe trituradose misturados com os fornecedores de amidos e gordu-ras. Podem comer-se frutas cozidas ou assadas. Trata-se de uma fase que, habitualmente, é de difícil aceita-ção por parte dos pacientes, porque se fartam facil-mente deste tipo de alimentação. Assim, o período,sempre que o doente demonstre boa evolução, podeser reduzido para apenas 15 dias.

3ª FASE – Dieta MoleInicia-se cerca do 3º mês após a cirurgia, na qual o

doente pode comer quase tudo, excepção feita a ali-mentos muito elaborados ou condimentados.

4ª FASE – Dieta LivreÉ iniciada a partir do 3º mês após a cirurgia. Nesta

fase o doente tem uma grande liberdade para escolheros seus alimentos, ainda que alguns possam continuara ser difíceis de digerir, como é o caso habitual das car-nes vermelhas.Volume

É essencial garantir a adequada ingestão de nutrien-tes, em particular de proteínas e de energia com volu-mes pequenos.

Nas Técnicas Restritivas, o volume ingerido deve terem conta a dimensão do primeiro reservatório, uma vezque a comida, depois de chegar ao mesmo, passa comlentidão através do estoma para o restante estômago.

Nas Técnicas Malabsorptivas, normalmente não sãonecessárias restrições significativas à quantidade. Noentanto, são frequentes os problemas com a absorçãoda gordura, o que implica a existência de esteatorreia,que é directamente proporcional à presença de gor-dura na alimentação.

Na primeira semana após a alta estão indicadosvolumes de aproximadamente 50ml, nos quinze dias atrês semanas seguintes os volumes evoluirão para os100 a 150 ml, de acordo com o grau de tolerância dosdoentes. Seguidamente, ainda que variando conside-ravelmente entre os indivíduos, os volumes rondam os200 a 250 ml. Consideração a propósito das consequências nutricionais

É essencial um follow-up estreito nos primeiros 3meses após a intervenção, uma vez que neste períodoexiste um défice proteico, que habitualmente é resta-belecido por volta dos 18 meses.

Nas técnicas restritivas, existe o risco de vómitosrecorrentes com possível défice proteico e vitamínico.Assim, é essencial incentivar o doente a comer devagar,mastigando bem os alimentos. Considera-se indispen-sável a suplementação com multivitamínicos/mineraisnos primeiros dois a três meses após a intervenção.

No Bypass Gástrico (Y de Roux) os alimentos inge-ridos não passam pelo fundus, corpo e antrum gástri-cos, nem pelo duodeno e por uma porção variável dojejuno. Desta forma, podem ocorrer carências de Ferro(por ausência da conversão do Fe ferroso => Fe fér-rico), de Vitamina B12 (por falta do factor intrínseco)e de Vitamina D e Cálcio (porque o duodeno e ojejuno são zonas de absorção preferenciais). Assim, énecessária a suplementação com multivitamínicos//minerais com Vitamina B12, Ferro e Cálcio para oresto da vida.

Nas Diversões Bílio-Pancreáticas com ou semSwitch Duodenal, a associação da malabsorção com aredução da capacidade gástrica implicam a necessidadede suplementação, também para o resto da vida.

Pode ser considerada a suplementação alimentar,com recurso a produtos modulares, nomeadamenteproteínas e hidratos de carbono, visando a satisfaçãodas necessidades individuais mínimas.

Cirurgia bariátrica

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Isabel do Carmo, Maria João Fagundes, José Camolas

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A obesidade do ponto de vistado gastrenterologista

Obesity from the gastroenterologist’s perspectiveM. Bispo1, P. Barreiro1, T. Bana1, L. Matos2

1 Interno do Internato Complementar de Gastrenterologia2 Director do Serviço de Gastrenterologia

Serviço de Gastrenterologia – Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, E.P.E. – Hospital de Egas Moniz

GRANDES TEMAS: OBESIDADE

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

RESUMOIntrodução: A crescente epidemia da obesidade conduziu à procura de novas opções terapêuticas, tendencialmente menos invasivas,associadas a menor morbilidade e a menores custos económicos. O papel da Gastrenterologia nesta área, com o aparecimento recentede novas terapêuticas endoluminais e a perspectiva futura de procedimentos bariátricos transgástricos, é promissor.Métodos: Revisão da literatura actual, seleccionada em bases de dados médicas informatizadas (MEDSCAPE, MEDLINE), sobre ostratamentos endoscópicos da obesidade, já disponíveis e em investigação.Resultados: A terapêutica endoluminal da obesidade com o balão intra-gástrico revelou já um bom perfil de segurança e tolerabilidade,com eficácia a curto e longo-prazo demonstrada em vários estudos europeus prospectivos. Possibilita uma redução ponderal compara-tivamente inferior à cirurgia bariátrica, mas suficiente para atingir os objectivos definidos pela OMS no tratamento da obesidade, commelhoria das principais comorbilidades associadas. Encontram-se em fase investigacional novas terapêuticas endoluminais e transgás-tricas, que combinam as vantagens da endoscopia flexível com procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos, na perspectiva de virema ter um papel relevante na abordagem multidisciplinar da obesidade.Conclusões: O balão intra-gástrico associa-se a sucesso técnico e clínico, permitindo melhoria das principais complicações médicas daobesidade. A crescente evolução de novos procedimentos endoluminais e transgástricos surgem como mais-valias promissoras no com-bate a este problema mundial de saúde pública.Palavras-chave: obesidade; endoscopia terapêutica; balão intra-gástrico; bariátrica.

ABSTRACTBackground: Along with obesity’s epidemic growth, came the need for new therapeutic options, tendencially less invasive, associatedwith lower morbidity and lower cost. Gastroenterolgy plays a promissing role in this field, with emerging new endoluminal procedu-res and the future perspective for transgastric bariatric treatments.Methods: A literature review was done, selected from computerized medical data bases (MEDSCAPE, MEDLINE), on currently avai-lable and investigational bariatric endoscopic procedures.Results: Several prospective european studies have shown that endoluminal obesity’s treatment with intra-gastric balloon is safe andwell tolerated, with satisfactory short and long-term success rates. It allows shorter weight loss when compared to bariatric surgery, butenough to accomplish WHO’s main goals for obesity treatment, with improvement in major medical comorbidities. New endolumi-nal and transgastric procedures combining the skills and techniques of flexible endoscopy with minimally invasive surgery are underinvestigation, with the perspective of a future relevant part in obesity’s multidisciplinary management.Conclusions: Intra-gastric balloon shows high technical and clinical success rates, with prompt improvement in associated medical com-plications. Evolving endoluminal and transgastric procedures come as valuable therapeutical options in this worldwide health problem.Key Words: obesity; therapeutic endoscopy; intragastric balloon; bariatric.

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Miguel Côrte-Real da S. Bispo, Pedro Miguel B. Fernandes Barreiro, Tiago dos Santos N. Bana e Costa, Leopoldo Maria L.s Cunha Matos

luminal) surge agora como um novo conceito, quecombina as vantagens da endoscopia flexível com téc-nicas cirúrgicas laparoscópicas, procurando um lugarnas áreas da Gastrenterologia e da Cirurgia Geral.

Neste artigo faz-se uma revisão crítica do desenvol-vimento técnico dos procedimentos endoscópicos uti-lizados no tratamento da obesidade, salientando-se asua eficácia, segurança e tolerabilidade. O BIG é dis-cutido em maior detalhe, por constituir a terapêuticaendoscópica actualmente utilizada na prática clínica, epara a qual já existe informação resultante de estudosprospectivos. São ainda descritas novas técnicas decirurgia bariátrica endoluminal e transgástrica, que seencontram em fase investigacional.

MATERIAL E MÉTODOS

Foi efectuada uma pesquisa informática das basesde dados MEDSCAPE e MEDLINE, identificandoos artigos publicados até 2007, abordando o tema“procedimentos bariátricos endoscópicos”, e tendosido utilizadas para a pesquisa as palavras-chave “intra-gastric balloon”, “bioenterics”, “endoscopic bariatricprocedures”, “endoluminal/transgastric bariatric sur-gery”. Foram adicionalmente pesquisados artigospublicados entre 1990 e 2007, referentes à eficácia ecomplicações da cirurgia bariátrica, utilizando para oefeito as palavras-chave “bariatric surgery”, “gastricbypass”, “gastric band(ing)”. Também foram analisa-dos livros de referência e listas de referências de artigosseleccionados.

RESULTADOS

Desde a descoberta da correlação entre bezoars eperda de peso, na primeira metade do século XX, acomunidade médica perspectivou a utilização de“bezoars iatrogénicos” aplicados endoscopicamente,como uma alternativa minimamente invasiva no tra-tamento da obesidade (10). Assim, a terapêutica endos-cópica da obesidade, baseou-se inicialmente na ideia

INTRODUÇÃO

Para além da Gastrenterologia, com a multiplici-dade de órgãos da sua área de preocupação, ter quelidar com várias complicações médicas associadas àobesidade (como a esteatose hepática, a esteatohepatitee a litíase biliar), tem sido chamada a intervir endos-copicamente com métodos terapêuticos bariátricosadjuvantes. O progresso da Medicina tem como objec-tivo primordial atingir o melhor resultado terapêutico,com a menor taxa possível de complicações ou efeitosadversos. Apesar da evolução da cirurgia bariátrica nosentido de se tornar cada vez menos invasiva, e darápida expansão europeia desta cirurgia utilizando abanda gástrica de silicone, estes procedimentos conti-nuam a estar associados a uma taxa considerável decomplicações (1, 2, 3, 4) e ao estigma que envolve qual-quer procedimento cirúrgico. O receio da cirurgiabariátrica poderá explicar em parte, porque é que ape-nas cerca de 1% dos doentes nos EUA, que preenchemos critérios do National Institutes of Health (NIH) paracirurgia bariátrica, são submetidos a este procedimento(5). A terapêutica endoscópica da obesidade foi ini-cialmente concebida de forma a minimizar estas preo-cupações, e a constituir uma alternativa não cirúrgica,que possibilitasse o regresso rápido às actividades davida diária. O interesse crescente no tratamento endos-cópico da obesidade associou-se também à evidênciade que a maioria dos doentes obesos não necessitava daredução ponderal substancial alcançada com a cirur-gia bariátrica convencional (banda gástrica e bypass)(6). Na verdade, as recomendações actuais da OMS (7)

e do NIH (8) no tratamento da obesidade contrariamalguns conceitos do passado, definindo como objec-tivo primordial terapêutico uma redução ponderalmantida de 10 a 15%, de forma a reduzir as compli-cações associadas e o risco cardiovascular global.

Após mais de uma década da introdução do balãointra-gástrico (BIG) no tratamento da obesidade, pers-pectiva-se a convergência da tecnologia endoscópicacom procedimentos cirúrgicos minimamente invasi-vos, na criação de novas alternativas terapêuticas (9). Acirurgia bariátrica endoluminal e transgástrica (trans-

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A obesidade do ponto de vista do gastrenterologista

se, posteriormente, as novas tecnologias endoluminaise transgástricas que estão na origem do novo conceitode cirurgia bariátrica endoscópica.

I. Balão intra-gástrico (BIG)Como já referido, o BIG foi concebido de modo a

diminuir a capacidade de reserva do estômago e a pro-duzir uma sensação de saciedade precoce, contri-buindo para a aquisição de novos hábitos alimentares.São considerados elegíveis para este tratamento ape-nas os doentes motivados, em que a terapêutica con-servadora (dieta, terapêutica comportamental e far-macoterapia) mantida durante pelo menos 6 meses foiineficaz (14). O BIG constitui uma opção terapêuticaparticularmente atractiva no grupo de doentes resis-tentes ao tratamento conservador, que não preenchemos critérios do NIH para cirurgia bariátrica (15). Doldiet al (16), considera que os grupos de doentes que maisbeneficiam deste tratamento são:

1. Obesos mórbidos (IMC>40 Kg/m2) e super-obe-sos (IMC>50 Kg/m2) na preparação para cirurgiabariátrica;

2. Obesos com IMC 35-40 Kg/m2 (classe II), napresença de pelo menos uma doença associada àobesidade;

3. Obesos com IMC 30-35 Kg/m2 (classe I), na pre-sença de comorbilidade grave associada (ex:doença médica não controlada, doença coroná-ria, ou pelo menos duas doenças associadas à obe-sidade).

A colocação do BIG é habitualmente realizada sobsedação profunda, com monitorização cardíaca e oxi-metria de pulso. O balão deve ser colocado no fundogástrico, sob controlo endoscópico, e preenchido comuma solução de 400-800ml de soro fisiológico (ajus-tado à cavidade gástrica de cada doente) e 10ml de azulde metileno (Figura 1). Após o procedimento, deve serinstituída terapêutica com inibidor da secreção ácidagástrica, anti-emético e anti-espasmódico, com neces-sidade de um período de vigilância hospitalar de ape-nas duas horas (17). A extracção do BIG é igualmenterealizada sob sedação e controlo endoscópico (Figuras2 A, B e C), em regime de ambulatório (17).

de reduzir a capacidade de reserva do estômago, deforma a produzir uma sensação de saciedade precoce.Este conceito levou ao desenvolvimento do primeiroBIG (balão de Garren-Edwards), em 1986, mais tarderetirado do mercado devido ao elevado número decomplicações associadas (nomeadamente, casos dedesinsuflação espontânea e oclusão intestinal) (11). Onovo BIG (BioEnterics Corp., Carpinteria, Calif.),produzido pouco tempo mais tarde, revelou, por suavez, um bom perfil de segurança e tolerabilidade (12),sendo constituído por um material inerte de silicone,não tóxico, não irritativo, com indicação para perma-nência na cavidade gástrica de 4 a 6 meses. O Serviçode Gastrenterologia do Hospital de Egas Moniz foipioneiro em Portugal no tratamento da obesidade como BIG. Desde o primeiro tratamento realizado emOutubro de 2000, o número destes procedimentoscontinua a aumentar. Actualmente, o BIG continua aconstituir a única terapêutica endoscópica da obesi-dade disponível na nossa prática clínica diária.

Só mais recentemente, a dimensão da terapêuticaendoscópica da obesidade foi alargada, surgindo o con-ceito de cirurgia bariátrica endoluminal e transgástrica(9). Por um lado, a cirurgia endoluminal é definida pelarealização de procedimentos cirúrgicos inteiramenteno lúmen gastrointestinal, usando a endoscopia flexí-vel. Por outro lado, a cirurgia transluminal (ou trans-gástrica), engloba procedimentos dentro da cavidadeperitoneal, com acesso a partir da cavidade gástrica. Acirurgia bariátrica transgástrica integra-se colectiva-mente na “Natural Orifice Transluminal EndoscopicSurgery” (NOTES) (13). A utilidade de novos equipa-mentos cirúrgicos endoluminais está actualmente a seranalisada em estudos pré-clínicos e clínicos, incluindoa revisão de cirurgias bariátricas prévias, e como poten-ciais procedimentos primários para a redução de peso.Se a segurança e eficácia destes novos procedimentosbariátricos for comprovada, surgirá na prática clínicauma nova dimensão de cirurgia minimamente inva-siva.

De seguida, é feita uma breve revisão da terapêuticaendoscópica endoluminal da obesidade mais difundidana prática clínica: o balão intra-gástrico, apresentando-

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Figura 1. Fotografia endoscópica: colocação do BIG (endoscópio eminversão). Balão intra-gástrico adequadamente colocado no fundo gás-trico (preenchido com soro fisiológico e azul-de-metileno).

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Miguel Côrte-Real da S. Bispo, Pedro Miguel B. Fernandes Barreiro, Tiago dos Santos N. Bana e Costa, Leopoldo Maria L.s Cunha Matos

3 dos estudos publicados mais relevantes. Nas referidasséries, o objectivo definido pela OMS em termos deredução ponderal e melhoria das principais comorbi-lidades (7) foi atingido na maioria dos doentes. Gencoet al (18), descrevem a resolução completa das princi-pais comorbilidades encontradas (diabetes e hiperten-são) em 44,3% dos doentes tratados.

A eficácia a longo-prazo (após a remoção do BIG) émais polémica, tendo sido demonstrada por umnúmero limitado de estudos prospectivos em centrosexperientes (14, 20) e sendo questionada por algunsautores (24). Os resultados a longo-prazo (ao fim de 2anos do inicio do tratamento) indicam que 55% dosdoentes conseguem manter pelo menos 10% da redu-ção do peso inicial (14), cumprindo assim o endpoint dotratamento definido pela OMS (7). Falta analisar pros-pectivamente quais os grupos de doentes que maisbeneficiam a longo-prazo deste tratamento, de formaa predefinir critérios de selecção.

II. Cirurgia bariátrica endoluminal e transgástricaDe um ponto de vista técnico, podemos então divi-

dir a endoterapia bariátrica em 2 grandes grupos: acirurgia endoluminal e a transluminal (transgástrica),esta última ainda em fase experimental em animais. Acirurgia bariátrica endoluminal baseia-se em diferentesmétodos com o objectivo comum de reduzir o aportecalórico através do tracto gastrointestinal. As inter-venções endoscópicas nesta área são divididas em 4grupos: 1. técnicas de sutura endoscópica; 2. colocaçãode próteses endoluminais; 3. técnicas de ablação teci-dual; 4. técnicas de estimulação eléctrica (9).

1. Técnicas de sutura endoscópicaSwain et al (25), iniciaram em 1986 trabalhos pio-

neiros no desenvolvimento de aparelhos de sutura quepudessem ser aplicados por via endoscópica. O pri-meiro equipamento de sutura endoscópica disponívelno mercado, o Endo-Cinch®, foi inicialmente conce-bido para o tratamento da doença de refluxo gastro-esofágico (DRGE). Para além do Endo-Cinch®, foramrecentemente disponibilizados no mercado dois dis-positivos adicionais, o Plicator® e o aparelho de sutura

O bom perfil de segurança e tolerabilidade do BIGsugerido nos estudos clínicos iniciais (12) foi confir-mado posteriormente em diversos estudos retrospecti-vos de grande dimensão (16, 18, 19) e em estudos pros-pectivos (14, 20). A taxa de sucesso técnico descrita nosprocedimentos de colocação/extracção do BIG é >99,0% (16, 18, 19). Na maior série retrospectiva descritana literatura (18), Genco et al descrevem uma taxa glo-bal de complicações do tratamento < 3,0%, sendo acomplicação mais frequente a esofagite de refluxo (em1,3% dos casos). As duas complicações descritas maistemíveis do tratamento, a perfuração gástrica e a obs-trução gastrointestinal são descritas em 0,2 e 0,8% doscasos, respectivamente, sendo a taxa de mortalidadeinferior a 0,1% (18). As queixas de náuseas e vómitossão frequentes durante a primeira semana de trata-mento, ocorrendo em 66 a 90% dos casos (20, 21). Noentanto, os casos de intolerância ao tratamento exi-gindo a sua interrupção precoce são pouco frequentes,afectando apenas 4,3 a 8,5% dos doentes (16, 19, 20, 21).

A eficácia a curto-prazo deste tratamento (duranteo período de permanência do BIG) foi já demonstradaem vários estudos europeus retrospectivos (16, 18, 19, 22)

e prospectivos (14, 20, 23). O quadro 1 resume as prin-cipais características demográficas e os resultados obti-dos durante o tratamento com BIG (a curto-prazo) em

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Figura 2 – A, B e C. Fotografias endoscópicas: remoção do BIG.Punção guiada por endoscopia e aspiração do conteúdo do balão intra-gástrico (Figuras 2A e 2B), até desinsuflação completa. O balão járemovido (com o auxílio de uma pinça) é observado na Figura 2C.

A

B

C

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A obesidade do ponto de vista do gastrenterologista

da Wilson-CookTM. Os resultados promissores destetipo de tratamento na DRGE (26), criam boas expec-tativas e a iniciativa em expandir este procedimento aoutras situações clínicas, nomeadamente na correcçãode perfurações viscerais e na terapêutica bariátrica.

À imagem dos aparelhos de sutura, estão também aser criados e aperfeiçoados agrafadores endoscópicos,actualmente representados pelo SurgASSIST®.

Fogel et al (27), relataram o único estudo clínico desutura endoluminal como tratamento primário daobesidade. Neste estudo, 10 doentes com IMC médiode 39Kg/m2, foram submetidos a gastroplastia endos-cópica, utilizando o sistema de sutura Endo-Cinch®.Foram colocadas aplicações ao longo da pequena cur-vatura gástrica, com sucesso técnico na totalidade doscasos. O tempo médio da intervenção foi de 60 a 90minutos, sem registo de complicações. Registou-seuma perda ponderal rápida, variando entre 15 e 45Kg, num período total de 9 meses. Este estudo pers-pectiva o desenvolvimento da gastroplastia endoscó-pica como uma alternativa no tratamento primário daobesidade a curto-prazo.

2. Colocação de próteses endoluminaisVárias têm sido as próteses desenvolvidas na tera-

pêutica bariátrica, com diferentes características e for-mas de actuação. Existem 2 grandes grupos: os dispo-sitivos intragástricos, que têm por objectivo ocuparespaço no lúmen gástrico; e os dispositivos que dimi-nuem a absorção intestinal (6).

Para além do já conhecido BIG, novos dispositivostêm sido desenvolvidos nesta área. Actualmente, já emestudos clínicos, encontra-se o Butterfly (28). Este dis-positivo de polietileno foi concebido para colocaçãoendoscópica no lúmen gástrico, sem necessitar de serinsuflado ou moldado. A sua eficácia na terapêutica daobesidade ainda é desconhecida.

Encontram-se também em investigação prótesesendoentéricas (consistindo em tubos ou stents coloca-dos por via endoscópica no duodeno e jejuno proxi-mal), com o objectivo de criar um bypass à absorçãointestinal. A companhia GIDinamicsTM está a desen-volver um tubo ultrafino de polietileno, impermeável,

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Quadro 1. Caracterização demográfica e principais resultados obtidos durante o tratamento com BIG em 3 estudospublicados (resultados a curto-prazo).

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Miguel Côrte-Real da S. Bispo, Pedro Miguel B. Fernandes Barreiro, Tiago dos Santos N. Bana e Costa, Leopoldo Maria L.s Cunha Matos

ção do seu real valor. O dispositivo eléctrico mundial-mente mais conhecido é o sistema Transcend®. Estesistema, primariamente colocado por laparotomia oulaparoscopia, poderá vir a ser colocado endoscopica-mente, funcionando como um pace-maker gástrico.O mecanismo de acção passa por colocar eléctrodosendoluminais que promovem um atraso no esvazia-mento gástrico.

CIRURGIA BARIÁTRICA TRANSLUMINAL

(TRANSGÁSTRICA)

O entusiasmo em redor das emergentes técnicastransluminais tem sido grande. Vários são os trabalhospublicados nesta área, descrevendo inovadores dispo-sitivos, multifacetados, e novas técnicas cirúrgicas rea-lizadas em animais.

Dois estudos recentes independentes apresentarammétodos para a realização de anastomoses gastrojeju-nais, mediante técnicas transluminais. Kantsenvoy et al(32) e Park et al (33), relataram a criação de gastrojeju-nostomias em porcos, acedendo à cavidade peritonealpor via transgástrica.

DISCUSSÃO

O excelente perfil de segurança e tolerabilidadedemonstrado com o BIG, foi determinante para arápida expansão europeia da terapêutica endoscópicada obesidade que se registou na última década. Apesar

ligado a uma prótese metálica auto-expansível, colo-cado no lúmen intestinal numa extensão variável de180 a 360cm (29). Numa série recente com 10 doen-tes (6), registou-se após 3 meses de uso da prótese, umaredução de aproximadamente 20% do peso inicial,não se tendo objectivado complicações técnicas nacolocação e remoção do dispositivo.

3. Técnicas de ablação tecidualAs técnicas de ablação, nomeadamente a radiofre-

quência, têm sido usadas no tratamento endoscópicoda DRGE, induzindo lesão tecidual com consequenteretracção das fibras de colagénio, o que leva aoaumento do tónus da transição esófago-gástrica.Actualmente encontra-se disponível no mercado o sis-tema de radiofrequência Stretta®. Esta tecnologia estáa ser testada como terapêutica ablativa aplicada aoantro e piloro, com o objectivo de atrasar o esvazia-mento gástrico, condicionando saciedade precoce (30).

A ablação tecidual com escleroterapia, foi tambémdescrita por Spauling no tratamento (revisão) de dila-tações de estomas gastrojejunais, como complicaçãopós-bypass gástrico em Y-de-Roux (31). Nesta série de20 doentes, 15 retomaram a redução ponderal poste-riormente a esta terapêutica.

4. Técnicas de estimulação eléctricaTem havido bastante entusiasmo em relação à esti-

mulação eléctrica e dispositivos de enervação do estô-mago para fins bariátricos, aguardando-se a confirma-

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A obesidade do ponto de vista do gastrenterologista

vez menos invasivos, perspectivam a rápida emergênciada cirurgia bariátrica endoscópica (9). Os resultados deensaios clínicos actualmente a decorrer irão conduzir aevolução destas tecnologias e responder a questõescomo a eficácia relativa, durabilidade e segurança des-tes procedimentos. Perspectiva-se que as primeiras indi-cações a surgir serão na utilização de técnicas endolu-minais como ponte para a cirurgia bariátrica conven-cional e na reparação de complicações pós-cirúrgicas,sendo os dados preliminares encorajadores (27).

A expectativa do papel que as técnicas cirúrgicasendoluminais possam vir a ocupar na medicina bariá-trica é muito grande. Espera-se que estes procedimen-tos reduzam ou eliminem muitos dos riscos associadosà cirurgia bariátrica convencional, criando o conceitode cirurgia bariátrica de ambulatório (38). Pensa-seainda que possam vir a alargar o grupo de potenciaiscandidatos cirúrgicos, englobando graus de obesidademenos severos (9).

Coloca-se a importante questão de quem irá realizaros procedimentos bariátricos endoluminais. Apesar des-tes procedimentos serem actualmente realizados prima-riamente por gastrenterologistas, o papel dos cirurgiõesneste campo tem sido encorajado (38). Esse papel seráparticularmente relevante com o desenvolvimento dacirurgia transgástrica (NOTES). Dada a especificidadedestes procedimentos e as exigências técnicas destesequipamentos, poderá mesmo vir a surgir uma especia-lidade híbrida única (9). É fundamental um trabalhoconjunto da Gastrenterologia e da Cirurgia Geral, den-tro de uma estrutura multidisciplinar, para uma har-moniosa evolução da endoterapia bariátrica.

da perda ponderal atingida com este tratamento sersubstancialmente inferior à documentada com a cirur-gia bariátrica (1, 24, 34), cumpre os objectivos terapêuti-cos definidos pela OMS (7) na maioria dos doentes, oque se traduz pela melhoria das principais comorbili-dades registadas (14, 16, 17, 18, 19, 20, 21). A longo-prazo,a eficácia do BIG não é consensual, pelo que não éincluído nas recomendações internacionais do trata-mento da obesidade (1). Dois importantes estudos pros-pectivos recentes (14, 20), sugeriram que uma proporçãoda perda ponderal atingida durante a permanência doBIG é durável até aos 24 meses, considerando que osucesso clínico do BIG é extensível a longo-prazo. Aeficácia clínica comprovada da cirurgia bariátrica, queé actualmente considerada a terapêutica gold-standardda obesidade mórbida (15), é, por sua vez, contrabalan-çada pelo receio dos doentes dum procedimento maisinvasivo, e pela evidência do número não desprezívelde complicações precoces e tardias já documentadas (1,

2, 3, 4, 35). Alguns autores (36, 37) consideram que o BIG“pré-cirúrgico” (como “ponte” para a cirurgia bariá-trica), para além de possibilitar uma redução do riscoanestésico e de complicações intra e pós-operatórias,permite seleccionar os doentes que mais beneficiamcom um procedimento cirúrgico restritivo (como abanda ou o bypass), devendo os doentes “resistentes” aoBIG ser submetidos a um procedimento que induzamal-absorção.

A realidade actual da terapêutica endoscópica daobesidade ultrapassa o BIG e entra num novo estadiode desenvolvimento. A evolução da tecnologia endos-cópica e a exigência de procedimentos cirúrgicos cada

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Correspondência:LEOPOLDO MATOSServiço de GastrenterologiaCentro Hospitalar de Lisboa Ocidental, E.P.E. – Hospital de Egas MonizRua da Junqueira, 126 – 1349-019 LisboaTelefone: 917 222 [email protected]

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Miguel Côrte-Real da S. Bispo, Pedro Miguel B. Fernandes Barreiro, Tiago dos Santos N. Bana e Costa, Leopoldo Maria L.s Cunha Matos

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Tratamento da obesidade mórbidacom banda gástrica

António Sérgio

Hospital do Carmo, Porto

GRANDES TEMAS: OBESIDADE

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

incluindo emprego, mobilidade e actividades familia-res (2)

A aplicação na última década das técnicas laparoscó-picas a todas as áreas da cirurgia geral tem-se intensifi-cado e a cirurgia bariátrica não é excepção, aliás citandoHenry Buchwald “ provavelmente a maior inovação nacirurgia bariátrica é a revolução laparoscópica” (3). Écada vez mais aceite que a cirurgia laparoscópica, naobesidade, deve ser o método de eleição (4) para realizarcirurgias que levem a perda de peso, desde que os prin-cípios da cirurgia bariátrica sejam mantidos e sejam rea-lizadas com toda a segurança; beneficiando o pacientedas conhecidas vantagens da cirurgia laparoscópica:recuperação e mobilização precoce com menos dor, con-sequente melhoria da função respiratória e cicatricial ediminuição do risco de infecção.

Introduzidas em 1978 por Lawrence H. Wilkinson,utilizando uma rede de Marlex à volta da parte alta doestômago, realizando bolsas gástricas com volume entre25 e 50 mls sem secção do estômago e desde entãoamplamente utilizadas, em particular na décadaseguinte por Molina que, embora nunca tivesse publi-cado o seu trabalho, foi o grupo que mais bandas nãoajustáveis por via clássica realizou em todo o Mundocomo nos explica Oria que teve a oportunidade de tra-balhar com Molina, na revisão por si feita (5). Foi noentanto, com o aparecimento das bandas de volumeajustável no fim da década de 80 e inicio de 90 desen-volvidas por Kuzmak e Peter Forsel (6, 7) que estas se tor-naram o método preferencial no tratamento desta pato-logia, em particular na Europa, Austrália, alguns Países

INTRODUÇÃO

A obesidade é um verdadeiro problema de saúdepública, já considerada a epidemia do século XXI, cujaprevalência tem vindo a aumentar em todos os gruposetários, duplicando em cada década; a grande respon-sável pelo crescimento da prevalência da diabetes tipoII e associada a muitas outras patologias, actualmentea maior forma de má-nutrição, razão pela qual nãodeve nunca deixar de ser tratada.

O grau de obesidade mede-se através do Índice deMassa Corporal (IMC), obtendo-se assim a gradaçãoda mesma consoante os seus índices de gravidade

IMC > 18 < 25 Kgs/m2 NormalIMC > 25 < 30 Kgs/m2 Excesso de pesoIMC > 30 < 35 Kgs/m2 Obesidade moderada (grau I)IMC < 35 < 40 Kgs/m2 Obesidade grave (grau II)IMC > 40 Kgs/m2 Obesidade mórbida (grau III)

A cirurgia bariátrica é actualmente o único trata-mento efectivo para doentes que sofram de obesidademórbida, diminuindo os custos e aumentando inclu-sive a sobrevida destes doentes (1).

O tratamento cirúrgico da obesidade está indicadoem doentes que possuam 45 kgs acima do peso ideal,ou um IMC igual ou superior a 40 kg/m2, um IMCentre 35 e 40 kg/m2 desde que possuam pelo menosduas comorbilidades de alto risco (apneia sono, dia-betes, hipertensão, etc.) ou problemas fisicos majorque afectem adversamente o seu estilo de vida,

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60

António Sérgio

equipe de suporte com o intuito de trabalhar esta ver-tente da doença, tornando o doente o mais participativopossível, corresponsabilizando-o nos resultados, atravésdo conhecimento completo da cirurgia e uma partici-pação activa no processo de emagrecimento, únicaforma de obter um bom resultado a longo prazo, poiscomo Van Houf et al (11) comenta, “a cirurgia bariátricaé uma modificação comportamental forçada”.

PREPARAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA

Devido à complexidade da doença na sua génese eevolução, que assume características de doença crónica,o tratamento cirúrgico deve ser encarado de uma formaglobal, não como curativo da doença, mas como amelhor ferramenta disponivel para ajudar a controlá-la em particular este tipo de cirurgia restritiva. Assim, atodos os doentes eleitos para cirurgia e, atenção devemser considerados somente aqueles que possuam riscooperatório aceitável sem contraindicações, como abusode álcool e drogas, psicose intratável ou falência majorde qualquer órgão ou sistema, deve ser proporcionadoum conhecimento completo do acto cirúrgico e pro-cesso terapêutico a que vão submeter-se. É fundamen-tal que o paciente tome conhecimento do mecanismode funcionamento da cirurgia. A cirurgia pode falhar eesta possibilidade será tanto maior quanto menor for acooperação constante entre ambas as partes, paciente eequipe multidisciplinar. É fundamental que o pacientetenha consciência que os seus hábitos alimentares irãoimperiosamente modificar-se e que o seu comporta-mento é peça fundamental para os resultados que pro-cura. Desde 1999 que funcionamos com grupos desuporte realizando reuniões mensais para os pré opera-tórios e semanais para os pós-operatórios.

Verificamos que após institucionalização destesactos na sequência do início de uma equipe multidis-ciplinar no tratamento da doença os nossos resultadosmelhoraram, não só periodo no pré-operatório (Qua-dro 1) mas também pós-operatóriamente (Quadro 2).

Durante a preparação, além do esclarecimento dosriscos que o acto cirúrgico por si só comporta, são

da América Latina e a partir de Junho 2001 nos EstadosUnidos da América com aprovação da Lap-band pelaFDA. A simplicidade do processo, a baixa morbimor-talidade, a inexistência de invasão de um órgão oco(estômago) e, particularmente a sua completa reversibi-lidade, fizeram da banda gástrica a técnica cirurgica maisinóqua para o controle da obesidade severa.

Na última reunião de consenso na ASBS em 2004sobre as indicações para a utilização de banda gástricaficou definido (8):

• Apropriação dos critérios de NIH• Há evidência clara para suportar a segurança e efi-

cácia da utilização da banda gástrica ajustável emse tornar uma intervenção primária para doentesbariátricos em centros apropriados, com follow upa longo prazo

• Neste momento há pouca evidência que qualquergrupo de doentes específico responda melhor aoutro tipo de cirurgia de obesidade

• Necessidade de cuidados a longo prazo pela cro-nicidade da doença

AVALIAÇÃO E PREPARAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA

Nos últimos anos a cirurgia emergiu como o trata-mento mais eficaz dos doentes com obesidade mórbida(9). No entanto, com o aumento do número de doentesoperados, constatou-se que a cirurgia só por si, emboraocupasse o papel fundamental no tratamento destapatologia, pelas características muito próprias dadoença, não era suficiente para a sua resolução, atri-buindo-se cada vez mais importância à multidisciplina-ridade da equipa de cirurgia bariatrica, no sentido demelhorar os resultados obtidos através do esclareci-mento e co-responsabilização do paciente no processoterapêutico (10). Se este facto é importante em todas ascirurgias, na cirurgia com colocação de banda gástricatorna-se um instrumento fundamental para o sucesso,porque ao contrário das outras cirurgias só tem umacaracterística – restrição e, a maior parte dos pacientesapresentam maus hábitos alimentares que a cirurgia porsi só não resolve. É necessário o apoio de uma óptima

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Quadro 1 – Evolução IMC com e sem reuniões

Quadro 2 – Evolução do peso com e sem reuniões

Fig. 1 Fig. 2 Fig. 3

61

Tratamento da obesidade mórbida com banda gástrica

• Tromboembolismo pulmonar (12,13)

• Hiperglicemia pós operatória• Infecção

TÉCNICA CIRÚRGICA

Houve desde o inicio uma grande variabilidade nastécnicas cirúrgicas utilizadas.

A 1ª inserção de banda gástrica via laparoscópica éatribuída a Cadiére (14) no ano de 1993. Várias modi-ficações se deram na técnica durante estes anos e váriastécnicas descritas como R. Weiner (15), Fielding (16) eBelachew (17). O maior impacto obteve-se quando sepassou da técnica de inserção perigástrica para a técnicavia pars flácida. Com este tipo de colocação o númerode complicações diminuiu (18). Segundo a nossa expe-riência os casos colocados por via perigástrica possuemum maior número de dilatações e slippages (16,6%para2,2% e 10% para 2 % respectivamente).

Actualmente a técnica base instituida para se con-seguir uma correcta colocação de uma banda gástricaincide em três princípios fundamentais:

1. Criação de uma abertura junto ao ângulo de Hisminimizando o trauma gástrico (Fig. 1)

2. Criação de um túnel retrogástrico logo abaixo dajunção esofagogástrica e assegurando-se que estefica acima da “bursa omentalis” (Fig. 2)

3. Confecção de um túnel anterior livre de tensão,sem apertar o estômago sobre qualquer área dabanda, minimizando assim o aparecimento deerosão gástrica (Fig. 3)

valorizadas e esclarecidas a forma de prevenir pelomenos três situações que podem por em perigo a vidado paciente, não só no acto operatório, mas tambémpós operatorio:

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Fig. 5: 1 – trocar subxifoideu afastador fígado; 2 – trocarmediano - óptica; 3 – trocar linha mamilar esqdª; 4 – tro-car mão esqdª cirurgião; 5 – trocar do ajudante (+ esqdª)

62

António Sérgio

particular osteoarticulares, no entanto é fundamentalque o paciente se envolva em algum programa de acti-vidade fisica regular, pois ajuda não só a manter amassa magra mas também um balanço proteico posi-tivo (21).

Um dos problemas que pode ocorrer neste períodoé a obstipação assim, no sentido de minimizar estaocorrência os doentes são instruídos a ingerirem omaior volume de líquidos e quantidade de fibras pos-sível e, se mesmo assim não se consegue obter ummovimento cólico diário adequado, iniciamos a admi-nistração de lactulose e por vezes macrogol associado(movicol).

Como a restrição é o ponto chave desta cirurgia epara evitar que hajam falhas de macro e micronu-trientes, temos notado que os nossos doentes apresen-tam um défice (22) por vezes de ferro, vit B1 e B12,zinco e vit. C, são instruídos nesse sentido e são admi-nistrados suplementos vitamínicos em particular sob aforma de líquidos e com as quantidades adequadasdestes nutrientes ao consumo diário. O ferro merece-nos uma atenção especial, em particular nas mulheresem idade fértil porque de facto a ingestão é muitobaixa e podem ter perdas aumentadas.

Às 4 semanas de pós-operatório os doentes recor-rem à consulta para se fazer a primeira injecção de sorofisiológico na banda (a quantidade depende do tipo debanda introduzida), e alterar o tipo de alimentação,iniciando agora dieta mole por um período de 4-5dias. Posteriormente a alimentação será a mais variadapossível, reforçando as orientações préviamente forne-cidas relativamente à forma de ingestão/mastigação,pois o sucesso da cirurgia pode ser conseguido e mui-tas das complicações podem ser evitadas se as duasprincipais regras forem obedecidas: mastigar bem osalimentos e engolir devagar. A não ocorrência de vómi-tos permite uma maior diversidade nos alimentos quepoderão ingerir, aumenta a confiança e permite umaperda de peso mais eficaz.

Durante o primeiro ano normalmente serão neces-sários em média 3 a 4 ajustes por paciente, após o queé muito raro haver necessidade de novos ajustes,embora em alguns doentes a banda sofra uma perda

A mortalidade desta cirurgia é muito baixa, variaentre 0 e 0,5% (19,20) nas grandes séries. Em 1300doentes operados temos a registar um óbito (0.08%)em doente que fez uma aspiração de vómito no pós-operatório e veio a falecer 31 dias mais tarde.

CUIDADOS E ORIENTAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS

Sempre que um paciente é operado vários são osproblemas que posteriormente se levantam, mas odoente deve já ser portador de informação suficienteproveniente de toda a preparação fornecida previa-mente.

Os doentes têm alta nas primeiras 24 horas pós-ope-ratórias, cuidados de higiene e vigilância visando a pre-venção e despiste percoce de infecção, em particulardo port, que está mais na dependência do paciente.Orientação para a ingestão de alimentos liquidos nasprimeiras 4 semanas, que não deve ser hipercalórica,caso contrário o paciente tem mais dificuldade em per-der peso. Normalmente ao 4º-5º dia, o paciente podeiniciar a sua actividade profissional sem qualquer limi-tação (desde que esta não envolva esforços fisicos vio-lentos) e é aconselhado a iniciar exercício numa baseregular ao fim de 3 semanas. A actividade fisica nuncadeve ser violenta, podendo acarretar graves mazelas em

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Tratamento da obesidade mórbida com banda gástrica

remover a banda, o terceiro por opção do doente ficouinternado com fluidoterapia e ao fim do 8º dia os sin-tomas desapareceram.

O problema major no pós-operatório imediato é ainfecção (25).

COMPLICAÇÕES A MÉDIO E LONGO PRAZO

As queixas mais comuns nos doentes submetidos acolocação de banda gástrica ajustável são as náusea,vómitos e refluxo gastroesofágico. Se as náuseas e osvómitos normalmente aparecem após as primeirasinsuflações do balão da banda gástrica, havendo porvezes necessidade de desinsuflar um pouco a banda, orefluxo gastroesofágico aparece por norma tardiamenteà cirurgia, normalmente após o primeiro ano e, édevido à dificuldade de esvaziamento esofágico que abanda à volta do estômago promove.

Fig. 7

De notar que este refluxo (regurgitação) é predomi-nantemente nocturno, acordando o doente por vezespela tosse que provoca, sendo causa frequente de pneu-monias. Revela-se infrutifero nestes casos combater orefluxo com inibidores da bomba de protões ou pro-pulsores esofagogástricos pois não resolvem o pro-blema, dado que o mecanismo esfincteriano esofágico

ligeira de liquido, em torno de 10% ano e haja neces-sidade de repicar 1 a 2 vezes para manter o peso.

COMPLICAÇÕES E RESULTADOS

As complicações devemos dividi-las em 2 tipos dife-rentes:

• Pós-operatórias imediatas e a curto prazo (30 dias)• Tardias

COMPLICAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS IMEDIATAS E A

CURTO PRAZO:

As complicações imediatas incorporam as intraope-ratórias que podem, como em todas as cirurgias doandar superior do abdómen englobar lesões esplénicasque podem obrigar a esplenectomia, lacerações hepá-ticas, lesões da veia cava e da aorta abdominal. As maisfrequentes são as lesões de perfuração de víscera oca(19), que podem ser quer do esófago, quer do estô-mago, obrigando à sua reparação imediata ou de outromodo coloca em risco a vida do doente. Nos 1298doentes operados entre 15/11/1996 e 15/11/2006documentamos 3 perfurações gástricas.

A disfagia e os vómitos são intercorrências quepodem verificar-se no pós operatorio imediato. Se osvómitos se resolvem a maior parte das vezes com anti-eméticos (embora muito raramente possa provocar umdeslizamento por rotura dos pontos gastro-gástricos dotúnel anterior) a disfagia não (23,24) porque pode serprovocada por interposição de tecido, ou por edemapós-operatório pelo facto de o diâmetro da banda serpequeno para a quantidade de tecido que envolve. Estacomplicação é mais frequente após a utilização da via“pars flácida”. Quando esta situação acontece poderesolver-se de duas formas: aguardando em média 8 a10 dias (resolução do edema), reoperando para des-truição da gordura do “fat pad” interposta. A nossaexperiência envolve três casos (0,23%) com disfagiaimediatamente a seguir à cirurgia, dois deles foramreoperados e destruída a gordura do “fat pad”, sem se

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Fig. 8 Fig. 9

Fig. 10 Fig. 11 Fig. 12

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António Sérgio

cada novamente, mais superiormente, ou optar poroutra atitude cirúrgica.

Outra complicação que pode desenvolver-se e quepode estar directamente relacionada com crises hemé-ticas graves é o deslizamento do estômago através dabanda ou slippage (27), provocando sintomas de obs-trução e dor epigástrica, que pode ser provocadasomente pela distensão gástrica ou por necrose daparede. Na nossa experiência, ocorreu em 1,5% dos1298 doentes. É uma verdadeira urgência cirúrgica,pelo risco de necrose do estômago e consequências quedaí possam advir (Figs.10, 11).

A complicação provavelmente mais grave é a erosãoprovocada pela banda através da parede para o lúmengastrico (29,30,31). Pensa-se que as duas principaisrazões para que tal aconteça são a banda se encontrardemasiado apertada ou infecções que possam aconte-

inferior é destruído, ocorrendo dilatação esofágica,sendo necessário aliviar a pressão exercida pela bandasobre a parede gástrica, permitindo assim um melhoresvaziamento gástrico (Fig. 7).

Por vezes esta sintomatologia de regurgitação noc-turna não é mais do que um sinal de inadaptação dodoente à banda gástrica, que insiste em comer e beberinusitadamente, ocasionando vómitos e forçando abolsa de forma repetida, provocando consequente-mente a dilatação da bolsa gástrica (26) que obriga mui-tas vezes a reintervenção cirúrgica (27,28) para recolo-cação da banda (Figs. 8, 9).

A percentagem de dilatação de bolsa gastrica comnecessidade de recurso a cirurgia para recolocação dabanda é de 2,2% nos 1298 doentes operados. É de terem conta que sempre que exista dilatação da bolsa gas-trica, a banda deve ser removida do seu leito e recolo-

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Fig. 13 Fig. 14

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Tratamento da obesidade mórbida com banda gástrica

trico, ao contrário de outros autores (30) somos daopinião que a remoção da banda e a execução de novatécnica cirurgica devem ser realizados em tempos dis-tintos.

Outro dos problemas major verificado, está tambémrelacionado com a estabilidade do material protésico(32,33) utilizado e a sua longevidade, a banda aparece aofinal de algum tempo danificada (rompe-se), tendovárias sido já removidas devido a este problema (Fig.13,14).

Este acontecimento, que se verificou em 2,37% dosdoentes, provoca um extravasamento do líquido con-tido no balão da banda, diminuindo a sensação desaciedade e consequente aumento de peso, sem outrasqueixas. Como acontece com a migração também arotura da banda é mais frequente em tipos de bandaespecíficos (A. Sérgio – comunicação Tóquio X Con-gresso Mundial IFSO).

cer e passar despercebidas, provocando a erosão(Fig.12).

Normalmente esta complicação não se manifestapor peritonite ou abcesso intraabdominal, podendo semanifestar por um abcesso da parede abdominal(infecção do port), aumento de peso e por hemorra-gia digestiva alta por erosão de um vaso sanguíneo.Nos primeiros 1298 doentes operados verificamos 20migrações (1,5%), estas migrações apareceram na suamaioria entre os 12 e os 24 meses de pós-operatório,no entanto, as 4 últimas migrações sucederam emdoentes portadores de banda gástrica há 8 anos, semmanifestação clinica prévia.

O tratamento passa pela remoção da banda e pos-terior realização de outra cirurgia ou colocação de novabanda. Das 20 migrações intra-gastricas referidas, 4dos pacientes colocaram nova banda, optando osoutros por outra técnica cirurgica como bypass gas-

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António Sérgio

aumenta de peso, isto é justificado pela possibilidadeque o sistema tem, de com o tempo perder umapequena percentagem de liquido contido no balão(purosidade) diminuindo a sensação de saciedade, apósa sua reposição desaparece a sensação de fome e o pesomantém-se estável.

Os bons resultados não se medem somente pelaperda de peso, isto seria o menos importante se, estaperda de peso não estivesse associada à melhoria dascomorbilidades (37,38) e, é esta melhoria e por vezesmesmo a resolução de parte das doenças associadascom esta doença que inferem de um bom resultado,tabela 1. Na mesma população de 1298 doentes estu-dada 660 (60%) tinham patologia associada e, partedeles mais do que uma doença:

• 60% Dos doentes tinham osteoartropatia• 40% Hipertensão arterial• 24% Diabetes tipo II• 30% Roncopatia• 14% Apneia de sono• 6% Hérnia hiato• 8% Refluxo gastroesofágico com hérnia hiato• 6% Litiase vesicular

DISCUSSÃO

Na evolução dos processos cirúrgicos desde a décadade 50, a banda gástrica ajustável foi indiscutivelmenteo último processo com carácter restritivo e eficácia notratamento da obesidade a fazer parte do armamentá-rio nesta luta constante contra a epidemia deste século.O manter a inviolabilidade gástrica, a ajustabilidadedo estoma criado, a sua reconversão fácil sempre quenecessário, pareciam tornar este acto cirúrgico a cirur-

A perda de peso pode ser expressa em percentagemdo excesso de peso perdido (% EPP), ou em percenta-gem da perda de Índice de Massa Corporal, noentanto neste capítulo optamos por exprimir a perdade peso em % EPP (34,35,36).

A % de EPP varia muito de acordo com os autorese, na cirurgia com banda gástrica há uma dificuldademuito grande, ao contrário da derivação biliopancreá-tica ou mesmo bypass gástrico, em obtermos resulta-dos em séries longas e com muitos anos de evolução.

O perfil da perda de peso nos doentes com bandagástrica é um pouco diferente do que acontece com obypass gástrico. Normalmente o doente perde peso deuma forma mais lenta, em média 45 a 50% do excessode peso no primeiro ano, para se tornar ainda maislento posteriormente. O emagrecimento implica ajus-tes regulares da banda, de forma a promover umasaciedade precoce. A perda de peso máxima estabelece-se por volta do 3º, 4º ano (quadro 3), para se mantera partir de então.

O gráfico corrobora estes dados e caracteriza umapopulação obesa estudada de 1298 doentes, operada

entre Novembro de 1996 e Novembro de 2006, comum IMC médio de 47 kg/m2, para um mínimo de 33kg/m2 e máximo de 77,3 kg/m2, um peso médio de121 kgs para um mínimo de 86 kgs e máximo de 242kgs.

A estabilidade do peso é conseguida pelo facto deexistir sempre a possibilidade de reajustar a banda compequenas quantidades de liquido, quando o paciente

Quadro 3 – Evolução peso, % EPP e IMC - 10 anos(A. Sérgio comunicação)

Comorbilidades Nº de doentes Sem doença Melhorados Sem alteração

Osteoartropatia 360 210 150

Hipertensão 240 138 102

Diabetes tipo I 144 95 49

Apneia sono 84 50 34

Roncopatia 180 110 70

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Tratamento da obesidade mórbida com banda gástrica

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A qualidade de vida melhora francamente, comaumento da autoestima, diminuição dos sintomasdepressivos, fumentada não só pela melhoria da ima-gem corporal bem como pelo recuperar de actividadespor vezes hà muito perdidas.

CONCLUSÃO

A cirurgia é a única forma de tratamento da obesi-dade mórbida que oferece uma solução a longo prazodo problema, promovendo não só a perda de peso,mas também a melhoria das doenças que lhe estão rela-cionadas. O tratamento da obesidade mórbida combanda gástrica ajustável é uma forma de cirurgia bariá-trica aceitável pela sua segurança, eficácia e reversibi-lidade. No entanto, a sua aplicação deve ser confinadaa centros que promovam um follow up compreensivopara toda a vida, fazendo o doente entender que éparte integrante do tratamento, a cirurgia por si só nãotraz resultados, é necessario o desenvolvimento deesforços por parte da equipa, de forma a trabalhar emconjunto com o paciente com o intuito de modificarcomportamentos.

A cirurgia não cura a obesidade, mas é uma armamuito potente no seu combate.

gia de eleição para o tratamento da obesidade mas, acolocação de material protésico cuja longevidade eestabilidade é desconhecida, o tratarmos com doentesque têm características muito próprias (11), a necessi-dade de grupos de suporte e a falta de trabalhos comfollow up mais longo, embora não inviabilizem ométodo, desencadeiam ainda alguma desconfiança nomeio médico.

No entanto, uma técnica cirúrgica bem conduzida,a possibilidade da sua realização em regime ambulato-rio (40), um follow up adequado (39) com um suportefranco ao doente (grupos de suporte), tornam a bandagástrica ajustável, como uma solução segura e eficazno tratamento da obesidade mórbida.

Segurança – a mortalidade pós-operatória é baixa,apontada entre 0 e 0,5%, é a mais baixa de todas as téc-nicas cirúrgicas, assim pode-se dizer que é 1/10 da mor-talidade do bypass gástrico e Derivação biliopancreática

Eficácia – Como referido anteriormente, a perda depeso é progressiva e ocorre normalmente nos primei-ros 3 ou mesmo 4 anos, em particular nos superobe-sos, com uma variabilidade grande 50-60% de perdado excesso de peso, verificamos na nossa experiencia64% EPP aos 8 anos.

Uma franca redução das comorbilidades, por vezescom cura completa das doenças associadas acompanhaesta perda de peso, com melhorias significativas nascondições componentes do síndrome metabólico, commelhoria ou mesmo remissão numa percentagemgrande de diabetes tipo II (41,42,43), minorando assimas suas consequências. Melhoria significativa da hiper-

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António Sérgio

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Bypass gástrico

Rui Ribeiro

Cirurgião Geral – Centro Hospitalar de Lisboa Central – E.P.E.Hospital de S. José – Serviço de Cirurgia 1

GRANDES TEMAS: OBESIDADE

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

res centraram-se na tentativa de reduzir o peso pormeio da amputação da capacidade de absorção intes-tinal criando o bypass intestinal. Mais tarde, com oadvento do bypass gástrico percebeu-se o interesse docomponente restritivo, de tal forma que, nas décadasde 80 e 90, receberam a preferência da maioria doscirurgiões. Hoje, com o bypass gástrico assumindo opapel de operação “gold standard” e a gastroplastiatubular calibrada (“sleeve”) em ascensão, começa-se areforçar o conceito da cirurgia endócrina.

De inovação em inovação, várias concepções foramtestadas, sempre com o intuito de encontrar a opera-ção ideal que levasse ao máximo de perda de peso como mínimo risco e desconforto. Seguramente, o pro-cesso continua e ainda estamos, algures, num pontodo percurso...

Na cirurgia bariátrica o êxito do tratamento avalia-se, normalmente, pelo emagrecimento obtido. O parâ-metro que melhor transmite essa medida é a Percenta-gem de Excesso de Peso Perdido (%EWL, abreviaturado inglês % Excess Weight Loss). Mas, o parâmetro real-mente importante, e a ter sempre em linha de conta, éa taxa de cura ou controle das comorbilidades.

Noutra vertente, a avaliação do êxito da cirurgia deveser feita também por estudos de qualidade de vida eestes demonstram, de forma homogénea, grande melho-ria das pontuações. Temos pois um tratamento que con-trola (quando não cura) doenças e dá qualidade de vida,duas contribuições importantes para o bem-estar e,pode-se dizer, para a felicidade dos cidadãos.

No início dos anos 90, a implementação generalizadada abordagem laparoscópica, aplicada à cirurgia bariá-trica, permitiu reduzir substancialmente o desconforto

A obesidade mórbida é uma doença multifactorial,crónica, com consequências físicas, psicológicas esocioeconómicas devastadoras que diminuem, deforma hoje comprovada, a expectativa e a qualidadede vida.

Os efeitos negativos das doenças que provoca, detodos conhecidas, têm um efeito lento mas devastadorsobre o organismo. Para alguns epidemiologistas a pre-valência crescente da obesidade e suas comorbilidadesfaz com que esta tivesse ultrapassado já o tabagismocomo causa principal de mortalidade (1).

Nos E.U.A., 40% da população é obesa. Em Portugaltemos 14% de obesos (3) e a tendência é para aumentar,a avaliar pelos múltiplos trabalhos que documentam oagravamento da incidência da obesidade infantil.

Por ser uma doença multifactorial, o tratamento daobesidade mórbida deve ter um tratamento multidis-ciplinar. As especialidades nucleares envolvidas, alémda cirurgia, são a psicologia e a nutrição. Acessoria-mente devem estar disponíveis cuidados de fisiatria,pneumologia, cardiologia, endocrinologia, radiologia,gastroenterologia e cirurgia plástica e reconstrutiva.

O objectivo do tratamento é a reeducação alimentare comportamental e, para tal, o papel da equipa é indis-pensável. A intervenção da cirurgia consiste despoletaro processo de mudança ao mesmo tempo que facilita aobtenção e manutenção dos resultados ambicionados.

A EVOLUÇÃO DA CIRURGIA BARIÁTRICA

O tratamento cirúrgico da obesidade começou a serconhecido na década de 50. De início os investigado-

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e, sobretudo, o risco operatório. Esta mudança foi agrande responsável pela vaga de entusiasmo que se gerouem redor desta nova “subespecialidade”.

No início de 2008, a cirurgia assume-se e é reconhe-cida como profundamente eficaz no controle da obesi-dade e comorbilidades associadas. A abordagem lapa-roscópica é largamente dominante mas a laparotomiaclássica terá de ser sempre uma reserva “estratégica” paracasos de maior dificuldade ou complicados. As técnicasmais populares entre os cirurgiões da actualidade são,por ordem de complexidade de execução técnica, abanda gástrica, a gastroplastia tubular calibrada vulgo“sleeve”, o bypass gástrico e a derivação bilio-pancreáticacom desvio duodenal, vulgo “duodenal switch”.

Segundo o resultado de um censo realizado pelaIFSO e apresentado no Congresso Mundial de Cirur-gia da Obesidade, em Salamanca em 2006, o bypassgástrico era utilizado em 66% dos casos de cirurgiabariátrica a nível mundial.

Na Europa , a banda gástrica teve uma implementa-ção notável na década de noventa. Nos últimos anosverificou-se já neste Século XXI uma tendência, noscentros mais notados, para a sua substituição pelobypass gástrico. Nos Estados Unidos da América pas-sou-se um pouco o contrário. Sendo o bypass uma téc-nica já dominante (70%) face a relatos iniciais de mausresultados da banda gástrica nos anos noventa, verifica-se actualmente uma tendência para o aumento do usoda banda, sobretudo depois da aprovação pela FDA detodas as bandas produzidas no mercado americano.

O BYPASS GÁSTRICO

Se a cirurgia bariátrica nasceu em 1954 com umaoperação denominada “bypass intestinal”, entretantoabandonada por elevada taxa de complicações metabó-licas, o seu crescimento deu-se nos anos sessenta com odesenvolvimento do conceito do “bypass gástrico”.

Esta técnica foi introduzida, em 1967, por Masone Ito, na Universidade de Iowa (5) a partir da observa-ção de que os doentes submetidos a gastrectomia sub-total por doença péptica tinham dificuldade em recu-perar peso perdido no decurso da sua doença. Após

estudos experimentais em cães, Mason demonstrouque o “bypass gástrico” tinha resultados sobreponíveisao seu antecessor intestinal. Algumas fragilidadescomo o facto de fazer uma montagem em ansa provo-cando gastrite e esofagite alcalina, ou a tendência ulce-rogénica do bypass de Mason, foram corrigidos maistarde com a montagem em y de Roux e a redução docalibre da bolsa e, como tal, da secreção ácida (6).

Outros autores tentaram modificações capazes deaumentar a eficácia e segurança da técnica. Em 1977,Alden foi o primeiro a tentar a partição gástrica comagrafadores mecânicos, sem secção da parede gástrica,para construir a bolsa gástrica (7). Passou ainda a usaruma ansa de delgado antecólica. A cirurgia resultavamais simples e segura e os resultados eram semelhan-tes, com menos casos de fístulas anastomóticas (8).Mas, mais tarde, foi registada uma taxa de 2 a 15% decasos de repermeabilização da partição gástrica (9,10,11)

e a ideia foi precocemente abandonada prevalecendo oconceito da transsecção gástrica.

Griffen, ainda em 1977, teve o mérito de introdu-zir a montagem em “Y de Roux” (12). Com isso,modernizou o bypass ao conseguir a redução dorefluxo bilio-pancreático. Também o facto de, na bolsa,existir apenas saliva, diminui a gravidade de uma even-tual fístula. Conseguiu também, provavelmente sem ocalcular, abrir mais uma frente de variação da técnicade bypass gástrico: a determinação do comprimentoóptimo a dar à ansa alimentar. Se nos primeiros anos,o comprimento de 75 cm foi considerado padrão, essevalor viria a ser questionado com os trabalhos de Bro-lin (13) e depois Murr (14) que demonstraram que oscasos com ansa alimentar alongada (Bypass Gástricocom Ansa de Roux Longa) produzem maior perda depeso embora à custa de uma maior taxa de complica-ções ligadas à absorção das proteínas e das vitaminaslipossolúveis.

Verificou-se mais tarde que , na história natural dagastrojejunostomia, esta sofria uma dilatação possivel-mente responsável alguns casos de recuperação parcialdo peso perdido. Tentando evitar esse fenómeno, Fobi(1986) e Capella (1990) propuseram a incorporaçãode um anel de “silastic” proximal ao estoma (15,16).

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Fobi junta ainda uma gastrostomia circundada poruma placa radiopaca para permitir um eventual acessoendoscópico ao estômago, em caso de necessidadediagnóstica. Menos preocupado com esse aspecto,Capella desenha uma operação em que o delgado éusado como um “patch” sobre parte da linha verticalde agrafagem da bolsa gástrica, reduzindo o risco defistulização gastro-gástrica e conseguindo, tambémalgum efeito anti-refluxo. Numa ou noutra modali-dade, o bypass anelado, como também é conhecido,ficou popular entre muitos grupos como, por exem-plo, entre os cirurgiões bariátricos brasileiros. De qual-quer forma, continua por demonstrar a superioridadedos resultados deste tipo de variante.

Em 1994, Wittgrove and Clark (17) fizeram, pela pri-meira vez, o bypass gástrico por abordagem laparoscó-pica conseguindo minimizar alguns dos problemas datécnica aberta. Na sua versão, usavam uma bolsa de 15a 30 ml, uma anastomose mecânica com calibre 21 mme uma ansa alimentar de 75 cm. As grandes séries pro-duzidas por Wittgrove mas também por Schauer (18),Nguyen (19) e Higa (20) viriam a demonstrar claramentea equivalência de resultados face à abordagem clássicaaberta, bem como uma significativa diminuição dotempo de internamento, do tempo de regresso a activi-dades sociais e ainda uma importante redução da mor-bilidade sobretudo no tocante a infecções da paredeabdominal, pneumonias e hérnias incisionais.

Em 1996, Lonröth (21) descreve uma montagem emque é feita primeiro a gastrojejunostomia com umaansa em ómega e só depois a jejunojejunostomia(ambas com agrafador linear e encerramento manualdo orifício resultante). Mais tarde, faz-se a secção daansa aferente para criar um Y de Roux. Este tipo demontagem, com a qual iniciámos a prática do bypasspor laparoscopia em 2002, viria a ser fortemente divul-gado em Portugal com base na colaboração e apoio doexcelente grupo Paulista dos Drs. Almino Ramos eManuel Galvão Neto. À sua versão chamaram bypasssimplificado e esta é, seguramente, a variante mais pra-ticada em Portugal.

Rutledge, em 1997, retoma a ideia do inicial bypassem ansa. Começa por construir uma bolsa gástrica mais

comprida e à custa da pequena curvatura (menos dis-tensível e mais próxima do Treitz). Depois faz uma anas-tomose da bolsa ao jejuno, a 200cm do ângulo de Treitz.Esta versão assume-se como uma variante de bypass demais fácil execução e que, embora com alguns proble-mas de reprodutibilidade, cumpre os objectivos do tra-tamento. Segundo este autor, numa série de 2410 casosoperados (22), os resultados são sobreponíveis aos dobypass com montagem em Y de Roux (80% EWL) e otempo operatório médio foi de 37,5 minutos o que dizbem do potencial interesse desta variante, pelo menosnalgumas situações de maior dificuldade técnica ounuma fase inicial de prática do bypass.

AVALIAÇÃO PRÉ-OPERATÓRIA E SELECÇÃO

DA TÉCNICA

A selecção criteriosa dos doentes é a chave para oêxito da cirurgia. A avaliação pré-operatória do candi-dato a bypass faz-se de acordo com critérios disponí-veis em “guide-lines” definidos por conferências deconsenso das principais Sociedades ligadas ao tema. As“guide-lines” da European Association of EndoscopicSurgery (EAES) e da American Society of BariatricSurgeons (ASBS) são excelentes referências mas asrecomendações do National Institute of Health (23),definidas em 1991, são ainda as mais seguidas (Qua-dro 1).

Estão contra-indicados para cirurgia bariátrica casosde doentes com diagnósticos de doença endócrina des-compensada (Hipotiroidismo e Cushing), doença psi-quiátrica (excepto depressões reactivas ligeiras), doen-ças infecciosas crónicas (Hepatite B, HIV+), doençasdigestivas inflamatórias crónicas (D. Crohn, Coliteulcerosa), gravidez e casos em que não haja garantiade o doente poder voltar regularmente ao seio daequipa no acompanhamento do pós-operatório

Estão ainda contra-indicados, segundo os critériosN.I.H., os doentes menores de 18 e maiores de 65anos. No entanto entende-se, hoje em dia, que esteslimites podem ser ultrapassados em casos selecciona-dos e em que a relação risco versus benefício seja favo-rável.

Bypass gástrico

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ESTUDO PRÉ-OPERATÓRIO

O estudo pré-operatório dos candidatos à técnicaenvolve uma completa avaliação clínica e laboratorial.Por ser uma doença de causa multifactorial, o seu tra-tamento deve ser, desde cedo, multidisciplinar. A coor-denação da equipa e a avaliação dos casos especiaiscompete ao cirurgião bariátrico. Considera-se cirur-gião bariátrico o que tem mais de 200 casos operados,faz mais de 50 cirurgias/ano e tem a capacidade de exe-cutar diversas técnicas de cirurgia bariátrica.

A avaliação complementar deve incluir observaçõespelos especialistas envolvidos sendo recomendável umaavaliação endocrinológica nos casos em se suspeite, clí-nica ou laboratorialmente, de doença desse foro.

O envolvimento do nutricionista, do psicólogo clí-nico e do fisiatra é sempre recomendado. O internista, o cardiologista ou o pneumologista sê-lo-ão em casode patologia da sua área. O cirurgião plástico avalia odoente mais tarde, pelo menos 6 meses depois da esta-bilização ponderal, se houver lugar a correcções pararemodelação corporal.

Na avaliação do cirurgião, deve ser feita uma históriaclínica exaustiva focando em particular aspectos da evo-lução ponderal, hábitos alimentares, patologia associada,avaliação da situação social e da motivação para a cura.

Os protocolos de estudo devem incluir sempre aendoscopia digestiva alta, a ecografia abdominal, a ava-liação da composição corporal, provas de função tireói-deia (T3f, T4f e TSH) e supra-renal (cortisol) paraalém das rotinas habituais (ECG, Rx tórax, hemo-

grama e provas de coagulação, bioquímica e urina tipoII). Nos casos de superobesidade e em doentes compatologia cardíaca o ecocardiograma pode ser necessá-rio bem como a prova de esforço ou a cintigrafia mio-cárdica na suspeita de cardiopatia isquémica.

As provas de função respiratória devem ser semprefeitas nos maiores de 30 anos e em qualquer idade sehá associação de patologia respiratória ou tabagismo.

Nos casos com IMC > 50 ou em qualquer um emque existam sintomas sugestivos de apneia do sono deveser feito estudo do sono (polissonografia) e, eventual-mente, avaliação por pneumologista. Este pode reco-mendar o uso de aparelhos de suporte ventilatório noc-turno (CIPAP). O uso destes aparelhos, só por si, podeinduzir a perda de 10% do excesso de peso, o que podeser precioso no período de preparação pré-operatória.

Num doente superobeso, ou com apneia do sonograve, é sempre recomendável reservar uma vaga decuidados intensivos para o pós-operatório imediato.

O envolvimento activo do pessoal de enfermagem emtodo o processo é tido como essencial nos centros comgrande experiência. O envolvimento precoce do doentenas actividades de um grupo de suporte ligado à equipamultidisciplinar amplifica muito o impacto da cirurgiano período peri-operatório e maximiza os resultadosdiminuindo as complicações no pós-operatório.

QUANDO OPTAR PELO BYPASS GÁSTRICO ?

Se existem ainda cirurgiões ou grupos que utilizampredominantemente uma técnica, a tendência actualé para a adopção de uma abordagem personalizada emque a técnica escolhida o é, tendencialmente, em fun-ção de critérios orientadores, muitas vezes registadosna forma de fluxogramas de decisão como o que usa-mos actualmente (Figura 1).

Nunca é demais dizer, até pela frequência com quetende a ser esquecido, que a avaliação por equipa mul-tidisciplinar é fundamental, não só na avaliação doperfil do doente, importante para a selecção persona-lizada da técnica operatória, como no acompanha-mento e aconselhamento pós-operatório.

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O paciente adulto deve:

1 – Ter IMC acima de 40 Kg/m2

2 – Ter IMC entre 35 e 40 Kg/m2 com morbilidades associadas3 – Ter uma baixa taxa de sucesso com medidas não operatórias4 – Estar bem informado sobre os riscos e benefícios a curto e a longo prazo 5 – Estar fortemente motivado para perder peso pela cirurgia6 – Ter um risco peri-operatório aceitável7 – Estar disposto a manter vigilância médica a longo prazo

Quadro 1 – Sumário dos critérios de selecção de doentes(1991 NIH Consensus Statement)

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Normalmente, o IMC é o primeiro critério a con-siderar. Obesos de grau III ou superobesos serão oscandidatos preferenciais para bypass, pois nestes casosas técnicas restritivas são, demasiadas vezes, insufi-cientes do ponto de vista da perda ponderal, ou docontrole das comorbilidades.

O perfil psicológico e o perfil alimentar devem entrar,a seguir, em linha de conta. Em doentes com distúrbiospsicológicos mais graves, ou em casos de comedorescompulsivos de doces (“sweet eaters”), ou os típicosbeliscadores (“binge-eaters”), ou ainda em doentes comproblemas psiquiátricos devidamente controlados, aoperação mínima deverá ser o bypass gástrico.

Os exames complementares de diagnóstico são tam-bém muito importantes. Por exemplo, assume particu-lar importância a endoscopia digestiva alta (EDA) pois,em casos de gastrite crónica atrófica, o bypass deverá serevitado dado o risco acrescido de desenvolvimento decancro gástrico cujo diagnóstico pode ser atrasado nocaso de localização no estômago remanescente.

Também a presença de infecção com HelicobacterPilori no estômago do doente deve ser avaliada, sejacom a biopsia da mucosa gástrica seja com a serologia.Verificada a presença da infecção deve ser obrigatoria-mente realizada terapêutica de erradicação bem comodocumentada a eficácia da mesma.

A EDA diagnóstica com frequência detecta casos deesofagite de refluxo, com ou sem hérnia do hiato, atéentão insuspeitos. Neste caso, a opção pelo bypass fica

reforçada pois a taxa de cura do refluxo é tendencial-mente de 100%.

Outro aspecto importante é a avaliação da funçãohepática. O bypass aumenta, de facto, o stress meta-bólico hepático e é frequente verem-se aumentos dis-cretos das transaminases nos exames pós bypass gás-trico. A existência prévia de uma insuficiência hepá-tica ou mesmo de evidência de hipertensão portaldevem ser considerados factores desfavoráveis à opçãopelo bypass. Alguns autores recomendam a realizaçãode biopsia hepática intra-operatória para avaliação debase da histologia hepática.

Pelo contrário, a presença de doenças auto-imunesé um factor, muitas vezes esquecido, que desaconselhaa colocação de próteses de silicone e aí o bypass é nor-malmente a primeira opção terapêutica, hoje me diacom a concorrência do ”sleeve”.

MECANISMOS DE ACÇÃO

O bypass gástrico é uma operação dita de tipo mistoque reúne três componentes responsáveis pelos seusefeitos fisiológicos.

1 – O componente restritivo, determinado pelapequena dimensão da bolsa (15 a 30 cc) e pelo calibreda gastrojejunostomia, que deve ter cerca de 20 mm.

2 – O componente, dito mal-absortivo, ocorre por-que os alimentos são dirigidos precocemente para odelgado, não passando no duodeno nem no jejunoproximal. Porque essa zona é precisamente aquelaonde são preferencialmente absorvidos o cálcio, ferro,Vit. B12, ácido fólico, zinco e vitaminas lipossolúveis(A,D,E e K), a carência destes elementos é o aspectoque merece maior atenção pelas eventuais repercussõesno organismo e que determina a necessidade de daraos doentes doses suplementares desses nutrientes evigiar regularmente os seus níveis séricos.

Para além disto, existe hoje evidência científica cres-cente de que esta operação actua nos eixos hormonaisresponsáveis pela presença da fome e da saciedade. Aexclusão da maior parte do estômago e do duodeno docircuito alimentar parece levar à alteração da produçãode hormonas, resultando em ausência de fome e numa

Bypass gástrico

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Figura 1

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saciedade precoce, apesar das pequenas quantidades dealimentos ingeridas. A diminuição da produção da Gre-lina no fundo gástrico e a produção precoce no períodopós-prandial do Glucagon Like Peptid 1 (GLP-1) e doPéptido Y3-36 (PPY), são as alterações mais comenta-das, mas outras deverão ocorrer (31). Em condições nor-mais, e por via destas alterações, um doente com bypassgástrico não terá fome durante cerca de um ano, períodoem que o emagrecimento se mantém. Trata-se, assim,de uma verdadeira operação endócrina e aí reside osegredo do seu êxito.

Um aspecto importante no bypass é a possibilidadeda ocorrência de fenómenos de “dumping”, precoce outardio. Se por um lado é incómodo e pode perturbar bas-tante o doente, evita-se com medidas do foro dietético e,de alguma forma, obriga o doente a cumprir o plano ali-mentar estabelecido. Sendo o consumo de açucaradosuma das causas frequentes do “dumping” podemos con-cluir que o bypass protege os doentes com maior ten-dência para a ingestão desses tipo de alimentos.

Ao contrário do que por vezes é dito, o bypass gás-trico não é uma operação irreversível mas sim de rever-sibilidade mais trabalhosa. Na literatura encontramosvários casos publicados e nós próprios tivemos a neces-sidade de reverter um mini-bypass numa operação deMason.

TÉCNICA CIRÚRGICA

O bypass gástrico é uma operação de tipo misto,mais complexa que a banda ou o “sleeve”, com umaexigência de capacidade técnica por vezes difícil decontornar e que obriga a que seja executada apenas porequipas cirúrgicas particularmente dedicados ao trata-mento da obesidade. Só dessa forma se pode obter aexperiência e a rotina indispensáveis à sua realização,dentro de estreitos limites de segurança.

Apesar de ser considerada a técnica “gold standard”,o bypass continua a ter uma limitação importante queé existência de um número indeterminado de varia-ções da técnica. Alguma variabilidade dos resultadosé induzida pelas diversas “personalizações” que, assim,podem retirar homogeneidade e credibilidade cientí-fica à técnica. Sendo altamente dependente da padro-nização de mecanismos, equipa, material e gestos, oconceito do bypass só teria a ganhar se fosse feito umesforço para reduzir drasticamente o número devariantes. Concretizando a ideia, interessa saber hojeem dia, com elevado grau de evidência, ou seja comestudos prospectivos envolvendo apenas algumasvariantes, se o comprimento da ansa alimentar sereflecte realmente na perda de excesso de peso, se acolocação de anel pré-anastomótico mantém a com-ponente restritiva mais tempo que as versões sem anel,ou ainda, qual a real taxa de complicações do mini-bypass gástrico.

Focando sobretudo as abordagens laparoscópicas,ocorrem variações técnicas na construção da gastroje-junostomia, na posição e no comprimento da ansa ali-mentar (de Roux), bem como na construção da jeju-nojejunostomia (figura 2).

A gastrojejunostomia pode ser construída comsutura intracorporal, com agrafadores circulares oucom técnica mista (agrafador linear e sutura intra-cor-poral).

No primeiro caso, protagonizado por Higa (20), aanastomose é construída exclusivamente com suturaintracorporal. Os seus defensores reclamam como prin-cipais vantagens uma menor taxa de fistulização, aausência de manipulação esofágica e um custo reduzido.

No segundo caso, está descrito o uso de agrafado-res circulares de calibre 21 ou 25 mm (15,16,17,24,26).

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O uso do calibre 21 provoca um maior número deestenoses mas que respondem bem à dilatação pneu-mática endoscópica. O uso do calibre 25 provocamenor número de estenoses mas diminui o efeito res-tritivo e pode comprometer a perda ponderal. A his-tória natural da anastomose mostra-nos que, a partirdo primeiro ano de pós-operatório, o calibre da anas-tomose é igual em ambos os casos.

Do ponto de vista técnico, o batente da máquinapode ser introduzido pela boca, solidarizado numasonda nasogástrica que é recolhida num orifício feitona bolsa gástrica, para onde o batente vai ser orientado– técnica de Gagner (24).

Noutros casos o batente é introduzido no abdómene depois na bolsa gástrica. Para isso, Himpens descre-veu uma variante que consistia em colocar o batenteno interior do estômago, deslocá-lo para o cárdia,recortar a bolsa e fazer o espigão furar a bolsa,entrando depois a máquina num orifício de trocarte ena ansa que irá ser a alimentar (25). Feito o disparo damáquina e verificada a integridade dos anéis circularese a ausência de pontos de fraqueza na bolsa gástrica(teste com azul de metileno), o coto da ansa onde amáquina entrou é encerrado com um disparo de agra-fador linear.

Outros, como “de la Torre” e “Carrasquillo” recor-tam a bolsa abrindo-a depois para introduzir o batente,suturando então o orifício em redor da haste para fazer,como descrito atrás, o disparo e o teste de estanquici-dade (26).

Os autores que usam agrafadores lineares (18,21,22)

abrem um orifício na bolsa gástrica e outro na ansajejunal, introduzem uma mandíbula da máquina emcada um dos dois orifícios e fazem o disparo sendo,depois disso, encerrado o orifício comum com suturacontínua intra-corporal sobre tubo calibrador e reali-zado teste com azul de metileno.

Em relação à ansa alimentar existem autores queoptam por comprimentos fixos mas a maioria adaptao comprimento ao IMC pré-operatório do doenteexistindo mesmo protocolos diversos para o efeito (27).Nuns casos a ansa fica retrocólica (28) e noutros ante-cólica (21). Esta última opção tem ganho adeptos por

parecer provocar menos casos de hérnia interna e oclu-são intestinal. Também por este motivo todas as “bre-chas” mesentéricas criadas na remontagem intestinaldevem ser suturadas com material de sutura não absor-vível para evitar o aparecimento de hérnias internas dofuturo.

Apesar das diferenças, alguns aspectos são consen-suais e dão alguma uniformidade à técnica do bypassgástrico. São eles a reduzida capacidade da bolsa gás-trica (15-30cm), uma gastrojejunostomia restritivacom cerca de 20mm de diâmetro e a construção deuma ansa alimentar de comprimento variável entre 75e 200cm. Tanto a calibração da gastrojejunostomiacomo o encerramento das brechas não suscitam polé-mica hoje em dia.

RESULTADOS

Os resultados do bypass gástrico realizado por vialaparoscópica são sobreponíveis aos realizados por viaaberta, como já vimos, com vantagem no capítulo daduração do internamento, nas complicações precocese mesmo nas tardias.

Vários estudos demonstram que, à distância, osresultados do bypass são duradouros, pese embora umatendência para recuperar, a partir dos 2 ou 3 anos deoperados, uma pequena parte do peso perdido masmantendo um bom controlo da morbilidade (29).

No bypass gástrico, a ingestão alimentar não é tãolimitada como nas técnicas restritivas e os estudos dequalidade de vida indicam melhor resultado do quecom as técnicas restritivas puras.

Em relação à Percentagem de Perda de Excesso dePeso (%EWL) o valor médio cifra-se entre os 68 e os80%. Este valor e a taxa de resolução das principaiscomorbilidades podem ser verificado no quadro 2numa recolha da autoria do grupo de Schauer (30).

Quanto à resolução das comorbilidades, o efeitomais importante, sem dúvida, é sobre a diabetes mel-litus tipo II. Pories, com uma “cohort” de 608 doen-tes com 16 anos de follow-up entre 1980 a 1996,obteve um estado euglicémico em 83% dos diabéticose em 99% dos doentes com diminuição da tolerância

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à glicose (31). Este efeito, profundo e imediato, sobreo metabolismo dos hidratos de carbono desencadeouuma onda de investigação em curso sobre a possibili-dade de resolver a diabetes, mesmo no doente nãoobeso, por via cirúrgica.

Na hipertensão, o resultado é também muito signi-ficativo mas parece, ao contrário da diabetes, correla-cionar-se melhor com a perda de peso ao longo do pri-meiro ano. Em muitos casos não se consegue a “cura”da doença mas consegue-se, quase sempre, uma redu-ção da medicação.

Quanto ao refluxo gastro-esofágico, embora nalgunsgrupos a taxa de resolução na literatura não seja 100%,verificamos essa cifra nos nossos operados. Eventual-mente tal diferença pode ficar a dever-se ao facto de ocomprimento que usamos na ansa alimentar variarentre 75 e 200 cm, a maior parte das vezes 150 cm.

COMPLICAÇÕES

Por ser uma cirurgia com anastomoses e de duraçãomais longa implica um risco de complicações peri-ope-ratórias superior às outras técnicas (cerca de 10%) etem também um risco de mortalidade de 1-2% prin-cipalmente devido ao tromboembolismo pulmonar eà ocorrência de fístulas anastomóticas na gastrojeju-nostomia. A dilatação gástrica aguda com rotura doestômago remanescente por obstrução da jejunojeju-

nostomia ou da ansa bilio-pancreática é um eventotemível e que exige elevada suspeição diagnóstica.

Existem também complicações a médio e longoprazo como sejam as hérnias internas, as úlceras daboca anastomótica ou duodenais, a estenose da gas-trojejunostomia, a recuperação de peso por dilataçãoda bolsa gástrica e/ou alargamento da gastrojejunosto-mia, o “dumping” e as complicações ligadas à máabsorção do Cálcio (osteopénia) Fe e Vit. B12 (ane-mia), Complexo B (Síndroma Wernicke Korsakoff ),cálcio (osteoporose e fracturas) ou zinco (alopécia).Para prevenir estes eventos os doentes devem fazersuplementação crónica polivitamínico e cálcio, even-tualmente com ferro, ácido fólico, Vit. B12 ou outros.

As úlceras marginais normalmente cicatrizam bemcom esquemas terapêuticos envolvendo a erradicaçãodo Helicobacter Pilori e uma protecção da bolsa gás-trica com inibidores da bomba de protões. Quandocrónicas podem levar às estenoses da gastrojejunosto-mia mas, mesmo assim, estas quase sempre podem serresolvidas com dilatação pneumática endoscópica.Raramente a cirurgia pode ter de intervir.

O dumping, já comentado atrás, resolve-se com cui-dados dietéticos, normalmente eficazes. Se necessário,podemos restabelecer cirurgicamente o efeito restritivocom a colocação de um anel pré-anastomótico que vaievitar a “inundação” do intestino pelos alimentos hipe-rosmolares.

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Perda do excesso de peso 68-80%

Estadia Hospitalar 2 a 4 dias

Resolução / melhoria de comorbilidadesDiabetes tipo II (do obeso)Hipertensão arterialHipercolesterolemiaDoença de refluxo gastro-esofágicoSindroma da apneia do sonoDoenças degenerativas articularesIncontinência urináriaDepressõesInfertilidadeRoncopatia (ressonar)

82-98%52-92%

63%72-98%74-100%41-76%44-88%

60%70%95%

Figura 2

Quadro 2 – Benefícios

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Vejamos a distribuição das complicações aindasegundo a recolha de Schauer (30):

Um aspecto muito discutido é a possibilidade deaparecimento de cancro gástrico no estômago rema-nescente. Para além de não existir evidência científicade que esse seja um problema significativo, pois sãoraros os relatos de tal circunstância, existe evidênciaexperimental (trabalhos de F.Rubino) que apontam nosentido de o cancro ser um fenómeno raro no estô-mago em “repouso”.

Medidas como a erradicação pré-operatória e depoisanual do H.Pilori e a exclusão das propostas parabypass dos casos de gastrite crónica atrófica, deverãodiminuir esse risco.

Para mais, em caso de suspeição forte, existe sem-pre a possibilidade de explorar o estômago residualcom uma endoscopia por gastrotomia laparoscópicaou, mais recentemente divulgada a sua exequibilidade,com enteroscopia de duplo balão. Isto para além dosmétodos imagiológicos modernos como o TAC heli-coidal ou a Endoscopia virtual.

EXPERIÊNCIA PESSOAL

Até à presente data usámos o bypass gástrico em 180casos, dos quais 11 por via aberta, no início da expe-riência em 2002. Numa avaliação recente dos primei-

ros 74 casos com follow-up superior a 2 anos verificá-mos 81,17 % de perda de excesso de peso (%EWL)com uma morbilidade de 15,5% (< 30 dias: 7% e >30 dias: 8,3%).

A taxa de resolução das comorbilidades foi de 83%para os diabéticos, 68% para os hipertensos, 88% paraa dislipidemia, 52% para as depressões, 83,5% para aapneia do sono e 62% de melhoria de queixas articu-lares.

No total dos 180 doentes operados ocorreu um casode mortalidade em 2004 (0,56%) por tromboembo-lismo na sequência de internamento prolongado por 3meses em UCI, devido a perfuração tardia do esófagotorácico.

No grupo de doentes com menos de 2 anos de fol-low-up (106) não ocorreu mortalidade e verificou-seuma redução marcada dos casos de morbilidade noque parece ser uma evolução normal na curva deaprendizagem que é longa (superior a 100 casossegundo a maioria dos autores) e difícil de vencer.

REINTERVENÇÕES

O bypass é ainda uma boa solução para casos decomplicações de outras técnicas bariátricas, sobretudoas restritivas puras. Em particular no caso de bandascomplicadas com prolapso gástrico (slippage) ou apósestenoses da gastroplastia vertical anelada (Operaçãode Mason), a construção do bypass permite uma saídamuito interessante para o doente: não só permite resol-ver a complicação como oferece a manutenção de umfactor restritivo associado aos outros efeitos do bypass.Como consequência, e em condições normais, estesdoentes ficam ainda com a possibilidade de perderalgum peso melhorando a qualidade de vida em gerale de ingestão alimentar em particular.

CONCLUSÕES

O bypass gástrico é a operação mais praticada (“goldstandard”) em cirurgia bariátrica porque é efectivaquanto à perda de peso (80%EWL) e à redução das

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Quadro 3 – Riscos e complicações

Conversão para cirurgia aberta 0 a 8%

Complicações pós-operatórias (major + minor)HemorragiaFístula anastomóticaInfecções feridas operatóriasTromboembolismo venoso/Embolia pulmonar

4,2 a 30%0,4 a 4%0 a 4,4%0 a 8,7%

0 a 1,3% / 0 a 1,1%

Complicações tardias (major + minor)Estenose da anastomoseÚlcera marginalOclusão intestinalTaxa de reoperaçõesDeficiência de ferroDeficiência de Vit B12Taxa de mortalidade

8,1 a 47%2 a 16%

0,7 a 5,1%1,1 a 10,5%0 a 13,8%6 a 52%3 a 37%0 a 2%

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doenças associadas, permitindo longevidade acrescidae melhor qualidade de vida aos doentes operados.

É uma técnica cirúrgica que deve ser usada em con-texto de equipa especializada e multidisciplinar. Deveser feita por laparoscopia para reduzir as complicaçõesmas a via aberta pode ser útil sobretudo nos casos dereintervenções.

Tem um efeito de controlo altamente benéfico sobreas comorbilidades, com particular destaque para a dia-betes do adulto.

A curva de aprendizagem é longa e ultrapassa, nomínimo, a centena de casos.

A morbimortalidade a 30 dias é de cerca de 10% eas sequelas metabólicas podem ser evitadas pela tomaregular de suplementos vitamínicos e minerais. O con-trolo analítico deve ser pendular em períodos entre 6meses a 1 ano.

É uma técnica que permite resolver, sem perda dacapacidade de emagrecimento, as complicações dasoperações restritivas.

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Page 79: Revista Cirurgia 04

Procedimento de cirurgia restritiva gástrica que con-tráriamente á banda gástrica, não implica o uso dematerial estranho. Neste tipo de procedimento ofundo gástrico é removido enquanto o estômago rema-nescente é constituído pelo antrum intacto e parte docorpo.

A preservação da pequena curvatura tem como fun-ção a manutenção da função secretora do estômago.

O uso desta técnica, definido como gastrectomiaparcial com remoção de aproximadamente 70% a80% do estômago em doentes super-obesos, tem dadoexcelentes resultados em termos de perda de peso talcomo acontece com outras técnicas, porém commenor morbilidade.

Embora não seja uma técnica recente (1º tempo dacirurgia em dois tempos – “Duodenal Switch”), o seuuso como técnica isolada no tratamento da obesidade“per si”, não está totalmente estudada. No entanto, nosúltimos anos tem havido algum esforço de publicaçãode artigos com informação sobre os benefícios da gas-trectomia vertical em doentes obesos e diabéticos tipo II.

As publicações mais recentes, nomeadamente Dr.Lee and colleagues [1] comparando o resultados de 216doentes submetidos a esta técnica entre Novembro de2002 e Agosto de 2005, demonstraram que os resul-tados comparativos a técnicas como o “Bypass Gás-trico” e o “Switch Duodenal“ são sobreponíveis.

A porção do estômago calibrado serve inicialmentepara restringir o volume de alimentos ingeridos con-duzindo assim a perda de peso. Existem no entantoalgumas teorias que tentam explicar um fenómenobioquímico decorrente da remoção do estômago,nomeadamente factores relacionados com a produção

de Grelina, chamada de “Hormona da Saciedade”,cujo foco principal de produção se situa no fundo gás-trico, embora possam existir focos ectópicos de pro-dução desta hormona, mais frequentemente no intes-tino delgado proximal.

PRINCÍPIOS GERAIS DA TÉCNICA

…..Cirurgia puramente restritiva e sem qualquercomponente de malabsorção….

• Criação de tubo gástrico calibrado (sonda / tubode calibração de 32 Fr) com remoção de 70 a 80%

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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GRANDES TEMAS: OBESIDADE

Gastrectomia vertical calibrada “Sleeve”

Edgar Jesus da Rosa

Cirurgião Geral – Serviço de Cirurgia Hospital São Francisco Xavier, CHLO, Lisboa

Page 80: Revista Cirurgia 04

de estômago com redução significativa do tempocirúrgico e 0% de mortalidade nos grupos depacientes de alto risco, iniciando a cerca de 6 cmdo piloro.

• Teste final do tubo gástrico com azul-de-me ti leno.

INDICAÇÕES

• Alternativa técnica à “ Banda Gástrica” (IMC 35 -60), no entanto não está recomendada como trata-mento de escolha após gastroplastia com banda.

• Primeiro passo de um potencial procedimento defi-

nitivo realizado em dois tempos (Duodenal Switch)nos doentes com IMC superior a 55.

• Procedimento definitivo em doentes com IMCbaixo sem padrão alimentar “Sweet”.

• Perda de peso semelhante a Derivação Bilio-Pan-creática e “Duodenal Switch”

• Procedimento seguro como 1º passo da cirurgiadefinitiva em doentes super-obesos e/ou de altorisco.

• Aparentemente boa eficácia em doentes com Índicede Massa Corporal (IMC) baixo com padrão ali-mentar essencialmente de “volume” e sem grandesco-morbilidades.

Embora ainda pouco divulgada como alternativaterapêutica para a cura da obesidade mórbida, já exis-tem centros com resultados bastante animadores.

Edgar Jesus da Rosa

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1. Dr Lee and Collegues, Lap Vertical Sleeve gastrectomy Alone Touted for Super-obese, GENERAL SURGERY NEWS/ JUNE 20062. Philippe Mognol; Denis Chosidow; Jean-Pierre Marmuse, , Laparoscopic Sleeve Gastrectomy as an initial Bariatric Operation for High-Risk

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Multi-purpose Bariatric Operation, Clinica San Jorge and Alcony Hospital ; Alcony, Spain

BIBLIOGRAFIA

Page 81: Revista Cirurgia 04

INTRODUÇÃO

A Cirurgia Bariátrica, tem ao longo da sua evoluçãopassado por várias fases correspondentes a diferentesconcepções sobre o tratamento cirúrgico da obesidade.

No século passado, em meados da década de 50,vários cirurgiões norte americanos iniciaram a práticaconsistente de cirurgias especificamente dirigidas parao tratamento dos grandes obesos.

À data, o conceito em moda era o BYPASS INTES-TINAL com a finalidade de estabelecer má absorçãodigestiva, à custa da exclusão do circuito digestivo deextensos segmentos de intestino delgado e grosso.

Estávamos em plena Era da CIRURGIA de MÁABSORÇÃO.

Kremen da Universidade do Minnesota com oBypass Jejunoileal em 1954 e Payne com o Bypass Jeju-noCólico em 1956, foram pioneiros nessa nova con-cepção cirúrgica.

Muitas outras variações do mesmo conceito forampropostas por outros cirurgiões mas todas associadas amorbilidade e mortalidade muito elevadas, decorren-tes em grande parte das inevitáveis diarreias e conse-quente expoliação hidroelectrolitica.

As complicações mais frequentes eram a LitíaseRenal e a Insuficiência Hepática que muitas vezes pro-gredia para uma grave e fatal Falência Hepática termi-nal

Esta estigmatização de maus resultados colocadasobre a cirurgia para o tratamento dos grandes obesos,na forma do Bypass Intestinal, impôs de alguma forma

à cirurgia bariátrica um período de travessia dodeserto, que chegou ao fim quando se avançou parauma outra concepção no tratamento cirúrgico da obe-sidade.

O novo conceito foi o da compartimentação gástrica,possível a partir do aparecimento e desenvolvimentodos instrumentos de sutura por agrafagem de vísceras(stapplers ).

Deste modo foi iniciada a Era da CIRURGIA RES-TRITIVA com o cirurgião norte americano EdwardMason da Universidade de Iowa.

Baseando-se nos dados do seguimento dos doentescom úlcera péptica submetidos a Gastrectomia subtotal, em que se verificava com frequência, perda con-sistente de peso, concebeu uma compartimentaçãototal da parte superior do estômago com agrafagemsem ressecção e execução de uma gastrojejunostomiaem ansa (1967 ).

Estava lançada a ideia de BYPASS GÁSTRICO.Várias modificações foram idealizadas e postas em

prática por muitos outros grupos cirúrgicos, mas sem-pre respeitando o princípio de uma bolsa receptoragástrica (reservatório) de pequenas dimensões, de loca-lização justa cárdia, separada do estômago restante ecom um reduzido estoma de saída para uma ansa dedelgado.

As deiscências da anastomose gastroentérica, o dum-ping, a úlcera da boca anastomótica, o síndrome deansa eferente eram as complicações frequentes e demuito difícil resolução com os meios terapêuticos exis-tentes na época.

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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GRANDES TEMAS: OBESIDADE

Derivação biliopancreáticacom duodenal switch

Pedro Gomes

Assistente Graduado de Cirurgia Geral – Hospital dos Covões – Centro Hospitalar de Coimbra

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Em 1982 Mason propôs uma operação de puracompartimentação gástrica, sem anastomose ao intes-tino, utilizando stapplers circular (EEA) e linear (TA)na construção de um reservatório gástrico, com umaboca de saída, estreitado à custa de um anel de redesintética.

Era a Gastroplastia Vertical Anelada de Mason (GVA),que rapidamente se tornou numa das mais praticadasoperações na história da cirurgia bariátrica.

Foi a primeira concepção de uma operação total-mente restritiva.

O desenvolvimento da cirurgia bariátrica, envolviaum cada vez maior número de cirurgiões e centroscirúrgicos com grande actividade clínica e de investi-gação, o que originou o lançamento de novas ideiasdentro dos conceitos em voga.

Assim, em1983 foi proposta por Torres, a Gastro-plastia Vertical com Bypass Gástrico, impondo uma gas-troenterostomia, mas salvaguardando o conceito depequena bolsa por compartimentação gástrica pro-posta na GVA de Mason.

Iniciava-se um período em que aparecia uma outraconcepção que consistia na associação de um compo-nente restritivo, representado pela bolsa gástrica cadavez de menores dimensões e uma ansa de jejuno emmontagem de Y de Roux, com maior ou menor com-primento de ansa, deste modo introduzindo um com-ponente de má absorção.

A Era da CIRURGIA MISTA tinha começado.Já em 1976, Nicola Scopinaro de Génova efectuara

uma Derivação Biliopancreática (DBP). Fig 1AEra uma operação verdadeiramente do tipo misto.

Consistia num componente restritivo, representadopor uma gastrectomia parcial e um componente de máabsorção, constituído pela divisão do intestino delgadoa 250 cm da válvula ileocecal, seguindo-se uma anas-tomose da ansa distal ao estômago sob a forma de umamontagem em Y de Roux para transporte dos alimen-tos, formando a ansa digestiva. O restante segmentode delgado, formado pelo duodeno, jejuno e íleon pro-ximal transporta o conteúdo de sucos biliares e pan-creáticos, formando a ansa enzimática, que era anas-tomosada a 50 cm da válvula ileocecal, ponto a partir

do qual se misturam alimentos e enzimas digesivas,constituindo o denominado canal comum da absorção.

Esta operação tinha associada uma percentagem sig-nificativa de dumping e úlcera marginal o que paramuitos cirurgiões a limitava na sua escolha como alter-nativa cirúrgica.

A DERIVAÇÃO BILIOPANCREÁTICA

COM DUODENAL SWITCH

Em 1988, Douglas Hess um cirurgião norte-ameri-cano e Picard Marceau, um cirurgião canadiano, modi-ficaram a operação proposta por Scopinaro e propuse-ram um novo procedimento denominado DerivaçãoBiliopancreática com Duodenal Switch (DBP DS) Fig 1B

Transformaram a gastrectomia sub total numa gas-trectomia vertical (linear), à custa da ressecção dagrande curvatura e fundo gástrico, construindo umtubo de estômago denominando-o de sleeve gastrectomy(gastrectomia em manga). Preservando a inervação gás-trica pelos nervos vagos, e mantendo o antro na suaquase totalidade e o piloro intactos resulta daí a manu-tenção do funcionamento da bomba antral.

O estômago residual comporta-se pois, como umverdadeiro tubo gástrico funcionante mas com proprie-dades restritivas devido à redução volumétrica sofrida.

Pedro Gomes

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Figura 1 – (A) Scopinaro, (B) Derivação bibliopancreática com duo-denal switch

A B

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Introduziram também o conceito de “duodenalswitch” proposto por DeMeester para o tratamento dorefluxo duodeno gástrico.

O duodeno é seccionado num ponto situado 3 a 4cm distal ao piloro, seguindo-se uma anastomose doduodeno proximal á ansa distal do ileon seccionado a250 cm da válvula ileo-cecal (duodenoileostomia)constituindo-se a via alimentar. Por sua vez o topoproximal irá ser anastomosado ao ileon terminal cons-tituindo a via enzimática . Esta anastomose distaráentre os 65 cm e os 100 cm da válvula ileo cecal, sem-pre superior aos 50 cm propostos por Scopinaro noseu procedimento.

Este segmento de ileon terminal, mais ou menoslongo segundo as opções de cada cirurgião, constitui odenominado canal comum da absorção.

As alterações estabelecidas na DBP DS em relação àDBP de Scopinaro revelaram-se muito importantes.

A gastrectomia linear quando correctamente efec-tuada, ao ressecar a totalidade do fundo gástrico temcomo consequência originar uma acentuada queda naprodução de ácido e eliminar ou diminuir drastica-mente a produção de grelina com efeitos marcados noapetite. Por outro lado a preservação do antro e dopiloro inervados pelos vagos permite manter o con-trole do esvaziamento gástrico.

Estes factores são responsáveis pela inexistência dasconhecidas complicações, úlceras marginais e dum-ping, nos doentes operados de DBP DS em relação aossubmetidos à técnica de Scopinaro.

BASES FUNCIONAIS DO PROCEDIMENTO

A DBP DS é um procedimento bariátrico do tipomisto.

O componente restritivo é representado pela gastrec-tomia linear, verdadeiro tubo gástrico funcional quesofreu uma redução volumétrica em relação ao órgãooriginal de cerca de 70 a 75 %.

O estômago residual suporta um volume de 100 a150 cc.

Nos primeiros meses pós cirurgia nos doentes sub-metidos a DBP DS, verifica-se uma diminuição acen-

tuada do apetite e ao contrário do que acontece nosprocedimentos puramente restritivos, raramente exis-tem vómitos embora os doentes refiram com frequên-cia, sensação de saciedade precoce pós prandial.

Figura 2

Constatou-se nos estudos cintigráficos efectuadospelo grupo de Melissas (4) incidindo numa refeiçãosólida enriquecida com radioisótopo, a existência deum esvaziamento gástrico rápido no sleeve. Este factoassociado à distensão do antro por acumulação dos ali-mentos nesta área após a ressecção do fundo produtorde grelina, hormona digestiva associada ao apetite,pode ser o mecanismo tornado dominante no que serefere á justificação da diminuição do apetite e ao esta-belecimento da sensação de saciedade precoce.

Esta parece ser a principal causa da acentuada perdaponderal nos primeiros 9 a 12 meses pós cirurgia.

O componente de má absorção da DBP DS, rela-ciona-se principalmente com a má absorção de lipidose está directamente dependente da extensão do canalcomum da absorção no ileon terminal. A bílis e as enzi-mas pancreáticas ao serem desviadas para este curtosegmento distal da ansa alimentar criam as condiçõesnecessárias para a absorção lipídica. A dimensão docanal comum é pois um importante factor no êxito dacirurgia. Se for excessivamente longo não se verificaráuma suficiente diminuição da absorção das gordurase como tal não haverá a adequada perda de peso. Sepelo contrário o canal comum for demasiado curtoterá como consequência uma baixa acentuada daabsorção lipídica, com esteatorreia abundante e mar-cada perda de peso que poderá impor cirurgia de revi-são. Autores experientes e com responsabilidades acres-cidas neste tipo de cirurgia, como é o caso de PicardMarceau (3), utilizam um canal comum com dimen-sões fixas de 100 cm. Existe um certo consenso em que

Derivação biliopancreática com duodenal switch

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Page 84: Revista Cirurgia 04

utilizando a mesma extensão de canal comum paratodos os doentes, o valor mais adequado será de 75cm. Outros autores como Douglas Hess propõemextensões variáveis para o canal comum, 50, 75 e 100cm, entrando na decisão factores diversos como aidade, sexo, peso e morbilidades associadas. Outra pro-posta para a extensão do canal comum é ter comovalor 10% do comprimento total do intestino delgado,medido do Treitz à válvula ileocecal (1).

A extensão da ansa alimentar tem consequênciasdirectas na absorção das proteínas e em menor escalana absorção dos hidratos de carbono.

Existirá deficiente absorção proteica se as ansasforem demasiado curtas. Um dos principais objectivosna DBP DS é a construção de uma ansa alimentar comextensão suficiente para que proporcione adequadaabsorção proteica.. Se a ansa alimentar fôr demasiadolonga, impedirá uma perda ponderal aceitável.

No que respeita aos hidratos de carbono uma ansaalimentar excessivamente curta afecta de algum modoa sua absorção, mas de modo nenhum com a mesmaintensidade que afecta a aborção proteica. A razãodisto situa-se no facto fisiológico que uma parte subs-tancial da amilase (cerca de 40%) é produzida nasglandulas salivares, parótida e sub maxilares, tendocomo consequência que a digestão dos hidratos de car-bono é iniciada na boca, daqui resultando que existauma mais do que suficiente absorção de hidratos decarbono mantida ainda que na presença de uma ansaalimentar demasiado curta.

Picard Marceau (3), em relação à extensão da ansaalimentar preconiza um valor total fixo, na ordem dos250 cm, incluindo os 100 cm do canal comum. Tam-bém aqui existem autores como Douglas Hess, comresponsabilidades neste tipo de cirurgia, que preconi-zam um cálculo variável para o valor da extensão daansa alimentar. Este valor obtem-se calculando 40%da extensão total do intestino delgado (1).

Genèricamente poder-se-à afirmar que a decisãoquanto à extensão da ansa alimentar deverá resultar deuma equilibrada ponderação entre uma extensão deansa suficientemente longa para que seja prevenida adeficiência proteica e uma extensão tão longa quanto

aconselha a manutenção da perda de peso a longoprazo.

A fórmula dos 40% do comprimento total do del-gado aplicada como cálculo para a extensão da ansaalimentar parece ser apropriada em virtualmente todosos casos (1).

PROCEDIMENTOS ASSOCIADOS

Na DBP DS é procedimento standart efectuar-se aColecistectomia devido ao elevado risco de apareci-mento de litiase vesicular nos anos seguintes. O estudoecográfico sistemático pré operatório para despiste decolelitiase é fundamental. História anterior de episó-dios de colecistite ou pancreatite aconselham estudomais completo e especifico, nomeadamente umaColangiopancreatografia Endoscópica Retrógrada(CPRE) que permitirá o diagnóstico de litiase do colé-doco e consequente tratamento endoscópico, comextracção de cálculos e Esfincterotomia Endoscópica.

Aconselha-se também que no decurso de uma DBPDS seja efectuada uma Biópsia Hepática.

Nos doentes obesos, nomeadamente nos grandesobesos é quase uma inevitabilidade a existência de umfigado gordo, a esteatose hepática, a cada vez maiscitada na literatura, Doença Hepática Gorda NãoAlcoólica que apresenta um espectro variado de lesõeshepáticas desde a simples esteatose com ou sem infla-mação inespecifica, podendo evoluir para a cada vezmais reconhecida Esteatohepatite Não Alcoólica(NASH) e desta para uma etapa mais gravosa, a Cir-rose (6;7).

O seguimento dos parâmetros hepáticos é impor-tante nos doentes operados de DBP DS. Cirurgia cominfluência marcada na absorção proteica e dos hidra-tos de carbono, poderá ter reprecurssões na funçãohepática. Isto explica a importância dos dados forne-cidos pela Biópsia intra operatória e no caso de insu-ficiência hepática evolutiva nos meses ou anos póscirurgia podermos confrontar esses dados com os deuma nova Biópsia efectuada desta feita por controleecográfico e decidir qual a melhor atitude terapêutica.

Pedro Gomes

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Page 85: Revista Cirurgia 04

Finalmente o terceiro procedimento aconselhadocomo rotina no decurso de uma DBP DS é a Apendi-cectomia.

Invoca-se como razão justificativa, o evitar de umafutura apendicite impondo intervenção cirúrgica e poroutro lado obstar a que qualquer eventual dor abdo-minal no futuro possa ser confundida com apendiciteaguda conduzindo a dificuldades diagnósticas de umasempre possivel complicação da DBP DS ou de qual-quer outra causa de dor abdominal.

EVOLUÇÃO DA PERDA DE PESO

No tratamento cirúrgico do grande obeso, o princi-pal objectivo é não apenas a perda de peso mas tam-bém a manutenção dessa perda ao longo dos anos, emconjugação com a melhoria ou cura das morbilidadeseventualmente associadas e com a consequentemelhoria da qualidade de vida.

Globalmente a DBP DS é de todos os procedimen-tos bariátricos o que melhor alcança estes objectivos.

Em relação à perda de peso, é sem a menor dúvidaa operação que consegue maiores perdas ponderais e alongo prazo atinge as melhores percentagens de excessode peso perdido (% EPP) para todos os niveis de IMC.

Hess (1) refere uma série seguida de 182 doentesoperados conseguindo um follow up de 92% aos 10anos (167 doentes).Verifica um máximo da perda pon-deral aos 4 anos com uma %EPP de 80%, a partirdaqui caindo ligeiramente. Aos 5 anos para 78%,aos10 anos 75% e aos 12 anos 72%.

Por sua vez Picard Marceau (3) numa muito recentepublicação de 2007, apresenta um estudo de 1423doentes submetidos a DBP DS num período com-preendido entre 1992 e 2005. É evidente a manuten-ção da perda ponderal ao longo dos anos. Para doen-tes com < 5 anos a %EPP média é de 77%; para doen-tes entre os 5 anos e os 10 anos a %EPP média é de69.4%; para os doentes com > 10 anos, a %EPP médiaé de 68.9%

Aniceto Baltasar (8) numa revisão em 2005, publi-cada em 2006 analisou resultados aos 5 anos de doen-

tes operados de DBP DS, aberta (n=525) desde Marçode 1994 e laparoscópica (n=240) desde Outubro de2000.A análise incidiu sobre 90% dos doentes com 5anos de recuo.

A perda máxima verificou-se aos 30 meses. Aos 5anos o IMC baixou para 29.82; a %EPP foi de70.59% e a % Excesso de IMC Perdido (%EIMCP)foi de 78.76%.

O nosso grupo cirúrgico de (Pedro Gomes;L SimõesReis;J Conceição;A Firmo), operou 81 doentes deDBP DS por laparotomia, desde Outubro 2001 aDezembro de 2007. Nesta série, 15 doentes têm umrecuo de 5 anos e todos se mantêm em follow up. OIMC médio destes 15 doentes antes da cirurgia era de51.3. Aos 5 anos a %EPP média é de 74.7% e o IMCmédio baixou para 30.4.O pico da perda ponderal(nadir) foi verificado ao 4º ano com uma %EPP médiade 76.5%. Aos 6 anos, os 6 doentes que actualmenteatingiram este recuo apresentam uma %EPP média de71.3% e um IMC médio de 31.6.

Um certo grau de recuperação do peso a longo prazoé inevitável. A perda máxima do peso (nadir) ocorreregra geral entre o 2º e o 4º ano. Nos doentes com boaevolução pós cirurgia, verifica-se seguidamente umacerta recuperação ponderal e finalmente estabilização.

Esta evolução do peso pós cirurgia está relacionadanuma primeira fase com o funcionamento da compo-nente de restrição representada pela GastrectomiaLinear (Sleeve).

O reconhecimento deste facto originou a propostado grupo de M. Gagner (9) sobre a utilização num pri-meiro tempo cirúrgico do Sleeve laparoscópico nosSuper Obesos (IMC ≥ 50) e fundamentalmente nosSuper Super Obesos (IMC ≥ 60), seguido numsegundo tempo, entre os 6 meses e os doze meses, deuma DBP DS.

A manutenção ao longo dos anos da perda ponde-ral obtida com a DBP DS é atributo da modificaçãodas condições fisiológicas da absorção digestiva comreprecurssão directa na aborção proteica e em menorgrau na aborção dos hidratos de carbono. Desta formaficam reunidas as condições de base para a desejadamanutenção da perda ponderal.

Derivação biliopancreática com duodenal switch

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Page 86: Revista Cirurgia 04

SEGUIMENTO PÓS CIRÚRGICO (FOLLOW UP)

Em cirurgia bariátrica esta é uma etapa absoluta-mente fundamental. Sem um seguimento programadoa longo prazo, durante anos, não é possível uma ava-liação dos resultados obtidos nem controle dos poten-ciais riscos e complicações que podem aparecer se osdoentes não cumprirem algumas regras alimentares eterapêuticas.

1. Défices em Vitaminas e Oligoelementos

No caso especifico dos procedimentos mistos, nosquais se engloba a DBP DS, as alterações já referen-ciadas da absorção proteica e dos hidratos de carbono,associadas a défices da absorção de vitaminas e saisminerais consequentes às modificações produzidas nocircuito digestivo (Fig 3) impõem um rigoroso segui-mento sob pena de aparecerem patologias iatrogénicas

É fundamental que o doente submetido a uma DBPDS fique perfeitamente ciente da sua nova fisiologiaatravés de uma explicação médica adequada e com-preensível para o seu entendimento antes da cirurgiaser efectuada.

Deve compreender o porquê da necessidade de umseguimento calendarizado e com recurso a exames ana-liticos.

O doente deve entender a necessidade absoluta desuplementação diária e para toda a vida em polivita-minas e cálcio.

A tendência para Anemia não é uma inevitabilidade,mas a sua prevalência está aumentada e como talimpõe vigilância da hemoglobina que poderá apontarpara uma suplementação circunstancial com ferro eácido fólico oral.

O doseamento da albuminemia é muito impor-tante. Constitui por si só um marcador nutricional. Aexistência de má nutrição pós DBP DS constitui umpotencial risco mas não é frequente e sobretudo é emgrande parte evitável através de ajustes dietéticos. Sese verificar uma baixa acentuada e permanente daalbumina sérica será necessário o recurso a outrasmedidas terapêuticas. Para além do reforço proteicoda dieta impõe-se o tratamento com Albumina iv eenzimas pancreáticas por via oral. Se a baixa da albu-mina persistir e se agravar, associada a alterações dastransaminases e GT será necessária a introdução deAlimentação Parenteral Total. Por vezes esta necessi-dade obriga a repetidos internamentos.

Uma nova baixa da albumina após a reposição dosníveis séricos aconselha a execução de uma BiopsiaHepática com agulha sob controle de ecografia. Oconfronto dos resultados entre a primeira biopsia efec-tuada durante a cirurgia e a actual servirá para despistede um eventual agravamento da doença hepáticaincluindo evolução para cirrose.

Perda de peso excessiva, hipoalbuminemia acen-tuada e persistente, anemia e hipocalcemia são emconjunto indicadores de má nutrição.

O diagnóstico fundamentado de Má Nutrição nãocontrolável associada com frequência a diarreia sãoindicação formal para Cirurgia de Revisão.

A Revisão Cirúrgica consiste fundamentalmentenum alongamento da ansa alimentar à custa do avançoproximal desta sobre a ansa biliopancreática o que con-diciona um aumento conjunto das dimensões da ansaalimentar e do canal comum com efeitos seguros namelhoria da absorção proteica.

Hess (1) na revisão dos 1243 doentes submetidos aDBP DS encontrou uma taxa de 1.53% (n=19) de

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Figura 3

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Revisões Cirúrgicas com alongamento conjunto daansa alimentar e canal comum. Marceau (3) num totalde 1423 doentes operados refere uma taxa de 0.7%(n=9) com o mesmo tipo de revisão.

Na nossa série de 81 doentes operados foi necessá-ria uma Revisão Cirúrgica para alongamento da ansaalimentar e canal comum numa doente com má nutri-ção não controlável com %EPP de 108% aos 2.5 anospós cirurgia, correspondendo a uma percentagem de1.23% (n=1).

Se apesar da Revisão se mantiver uma situação pro-gressiva de má nutrição não controlável a soluçãoextrema será uma Reconversão Cirúrgica.

A Reconversão consegue-se à custa de uma anasto-mose latero-lateral entre a ansa de jejuno no segui-mento do Treitz e um segmento proximal da ansa ali-mentar. O restabelecimento deste circuito entre a ansabiliopancreática e a alimentar anula o efeito de máabsorção.

A Reconversão da DBP DS é uma situação deexcepção em todas as séries publicadas com taxa deincidência < 1%.

Outros problemas podem e devem ser diagnostica-dos no seguimento dos doentes, visto que impondoterapêutica especifica em tempo adequado são tratá-veis e não evoluem para complicações mais graves.

Uma das queixas mais frequentes, muitas vezes incó-moda e comprometedora para o doente é o mau cheirodas fezes e gazes intestinais (70%) associada a circuns-tancial distensão abdominal (48%). Uma parte signi-ficativa do circuito alimentar sem a presença das enzi-mas biliopancreáticas é a causa desses sintomas. Algunsajustes nas regras dietéticas e a introdução de enzimaspancreáticas ( Kreon®) associado a curtos ciclos de 2a 3 dias de Metronidazol (Flagyl®) resolvem frequen-temente a situação.

A DBP DS ao ter efeitos significativos na absorçãodas gorduras, consequentemente diminui a absorçãodas vitaminas lipossolúveis e ácidos gordos essenciais.

Os défices de vitaminas hidrosolúveis são menosfrequentes.

Genericamente os défices de vitaminas após umaDBP DS, são normalmente evitáveis por uma suple-

mentação oral diária e prolongada por toda a vida àcusta de um polivitaminico equilibrado.

Deve ser referida, por ser uma situação patológicade estabelecimento mais ou menos agudo e que sereveste de grande aparato clínico, o denominado Sin-drome de Wernicke-Korsakoff, complicação de qual-quer procedimento bariátrico que tenha como conse-quência uma rápida perda de peso sobretudo se asso-ciada a vómito.

Ao atingir o Sistema Nervoso Central, caracteriza-se por uma clínica exuberante com nistagmus, oftal-moplegia, ataxia e confusão mental, originando adenominada Encefalopatia de Wernick. É uma situa-ção que pode surgir após qualquer cirurgia que con-duza a uma rápida perda de peso. Por este facto poderáestar também relacionada com uma DBP DS.

Qualquer cirurgião que pratique cirurgia bariátricadeve ter presente esta complicação para que atempa-damente a possa reconhecer e tratar. Um quadro neu-rológico deste tipo que sobrevém num doente comvómitos sujeito a uma operação bariátrica num pas-sado mais ou menos recente deve levar à suspeição deum défice de Tiamina ( vitamina B1 ). Esta vitaminaé crucial no metabolismo dos hidratos de carbono e aadministração destas substâncias pela via oral ouparenteral, são um factor desencadeante dos défices deTiamina. O tratamento consiste na administração deTiamina na dose de 100mg iv / dia durante 7 dias,seguido de suplementação oral (12).

A queda de cabelo é outro sintoma muito comumnos doentes submetidos a cirurgia bariátrica. Está asso-ciado a uma deficiência de Zinco que se pode prolon-gar até cerca de um ano pós cirurgia sobretudo na fasede maior perda ponderal. A suplementação com Zincodeve estar incluída no complexo vitamínico utilizado.

Existe um potencial risco de Doença Óssea Meta-bólica como complicação a longo prazo de toda acirurgia bariátrica mas especialmente na DBP DS quetem uma componente de má absorção evidente.

Na base deste problema está a baixa da absorção deCálcio após esta cirurgia. O Cálcio é principalmenteabsorvido por transporte activo no duodeno e jejunoproximal num processo intimamente ligado ao que

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acontece à forma activa da Vitamina D. A produção daforma activa é fisiologicamente regulada pelo cálcioextra celular e pela concentração da parathormona.

A absorção oral de Vitamina D ocorre através dequilomicrons e é prejudicada por condições geradorasde esteatorreia.

Tendo presente as alterações da fisiologia produzidaspela DBP DS, entende-se a importância da monitori-zação e suplementação em Cálcio e Vitamina D nofollow up destes doentes, ao longo de toda a vida.

As doses de suplementação em cálcio serão de 1200 a1500 mg diários e para a vitamina D de 800 UI/diária.

2. Outras Complicações a Longo Prazo

Para além das complicações anteriormente referidasconsequentes às alterações fisiológicas estabelecidaspela DBP DS, outras existem que poderão ser impu-táveis a um qualquer procedimento de cirurgia major.

A Oclusão Intestinal, complicação sempre possívele das mais frequentes após uma cirurgia abdominalseja por laparotomia seja por laparoscopia é particu-larmente importante no seguimento da cirurgia debypass e nomeadamente na DBP DS. A razão destaimportância acrescida, tem a ver com a eventual difi-culdade no diagnóstico. Se a ansa comprometida nomecanismo de oclusão é a ansa alimentar, o diagnós-tico é relativamente acessível, pois será baseado numclássico quadro clínico e imagiológico de oclusão intes-tinal alta. Se pelo contrário é a ansa biliopancreáticaque está implicada na causa da oclusão, o diagnósticopoderá então rodear-se de maior dificuldade. Excluídado trajecto alimentar a ansa intestinal implicada não épassível de estudo por exame radiológico contrastado.

Perante uma dor abdominal persistente e de inten-sidade crescente deve ser colocada a suspeição diag-nóstica de oclusão da ansa biliopancreática. Deve serefectuada uma TAC Abdominal com contraste diges-tivo e perante a imagem de ansa(s) dilatadas fora docircuito do contraste, o diagnóstico passará a ter umacerta consistência. Para complemento poderá serpedido um estudo cintigráfico com HIDA, que reve-lará a acumulação de bílis marcada nas ansas a mon-tante da oclusão.

No estudo de Marceau (3) no seguimento de 15 anospós DBP DS a oclusão intestinal impondo tratamentocirúrgico ocorreu em 6% de casos (83/1356), emmédia 3.2 anos após a cirurgia inicial.

As oclusões intestinais por hérnias internas, bemcomo má rotações do intestino são mais frequentesapós cirurgia por laparoscopia (8).

As hérnias Incisionais são relativamente frequentespós laparotomia e raras em cirurgia laparoscópica.

3. Tipo de Dieta

A Dieta pós DBP DS não se diferencia da estabele-cida para outros procedimentos bariátricos no que serefere às primeiras semanas de pós operatório.

Nas 2 a 3 primeiras semanas pós cirurgia a dietadeve ser liquida e rica em proteínas. Seguir-se-à pro-gressivamente uma dieta mole (duas semanas) e final-mente uma dieta sólida normal, mas sempre rica emproteínas e com restrições em hidratos de carbono egorduras.

A DBP DS tem a vantagem de ser o único procedi-mento de cirurgia bariátrica que permite o recurso a umadieta normal. Mais de 90% dos operados ingere todo otipo de alimentos. O vómito é pouco frequente, ocor-rendo apenas em menos de 5% dos casos, contraria-mente ao que se verifica nos procedimentos restritivos.

A vantagem desta conjugação de factos é permitir apossibilidade de grande parte da suplementação ali-mentar exigida ser efectuada através de uma dieta nor-mal.

A desvantagem é devida à grande tolerância ali-mentar induzindo a que por vezes não sejam cumpri-das as regras de dieta que assegurem uma perda pon-deral adequada e mantida ao longo dos anos nos níveisdesejados.

Esta é uma razão suficiente para que se verifiqueuma vigilância dietética ao longo do follow up destesdoentes.

EFEITO SOBRE AS MORBILIDADES ASSOCIADAS

As doenças associadas à obesidade atingem todos ossistemas orgânicos.

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A melhoria ou cura dessas doenças é outro dosobjectivos que se pretende atingir com a cirurgia asso-ciada à perda de peso.

No topo da lista das doenças melhoradas ou curadasestão a Diabetes e as Dislipidemias.

A eventual cura ou melhoria de outras patologiasassociadas está directamente relacionada com a quan-tidade de peso perdido.

Também neste aspecto a DBP DS tem seguramentea longo prazo os melhores resultados.

Na série já referida de 81 doentes operados de DBPDS pelo nosso grupo, em 61 doentes (75.3%) verifi-cou-se a associação com outras patologias.

As seis patologias mais frequentes que foram regis-tadas:

Hipertensão arterial 47 (58.0%) Sindrome de Apneia do Sono 41 (50.6%)Diabetes tipo 2 16 (19.7%)Dislipidemia 10 (12.3%)Patologia degenerativa articular 6 (7.4%)Ulcera varicosa 3 (3.7%)

Registamos seguidamente os resultados recolhidosdo seguimento dos 53 doentes com 3 anos de recuosobre a cirurgia.

Verificou-se a cura da diabetes em 100% dos 9doentes diabéticos, 2 dos quais eram medicados cominsulina.

Dos 28 doentes com hipertensão arterial, 21 (75%)passaram a ter valores normais de TA, enquanto 6(21.4%) tiveram ajustes da terapêutica por diminui-ção dos valores da TA e apenas 1 doente (3.5%) man-teve valores inalterados.

Em relação à apneia do sono, que despistamos antesda cirurgia em todos os doentes super obesos através deregisto poligráfico durante o sono, dos 25 doentes quesofriam de apneia, 17 (68%) registaram cura comabandono do ventilador. Nos restantes 8 (32%) regis-tou-se melhoria motivando alterações nas pressões doCiPAP.

Relativamente aos valores da dislipidemia, dos 4doentes com recuo de 3 anos, 3 normalizaram os valo-

res e 1 registou apenas diminuição dos valores docolesterol e normalização dos triglicerideos. De notarque os 3 doentes que normalizaram os valores da dis-lipidemia, esta enquadrava-se num quadro de Sin-drome Metabólica que se resolveu na globalidade.

Os 2 doentes com ulcera varicosa registaram cica-trização total em tempo variável mas apenas quando a%EPP atingiu os 50%.

Os doentes com recuo de 3 anos (n=2), com pato-logia degenerativa articular registaram com a perda depeso melhoria dos sintomas consequente à menorsobrecarga, mobilizando-se com maior facilidade.Contudo mantiveram clinica e sinais imagiológicos deartroses (anca e joelho) com indicação para artroplas-tias.

Os resultados revistos por A.Baltasar (8) apontampara uma resolução em 100% dos doentes diabéticose 76% de cura da HA.

Marceau (3) na revisão de 1356 doentes, registou27.8% (n=377) diabéticos. Destes, 301 eram medica-dos, enquanto 76 apenas cumpriam dieta. O efeitoterapêutico da perda de peso pós cirurgia foi notável,já que numa primeira fase 97% (292/301) diminuí-ram a medicação e com o passar do tempo 92% dei-xaram mesmo os antidiabéticos orais. Nos doentes quefaziam terapêutica associada de insulina com antidia-béticos orais, 98% deixaram a insulina enquanto61.3% suspenderam também a medicação oral. Dosdoentes que utilizavam no pré operatório CiPAP , ape-nas 7% (n=14) o mantém.

CIRURGIA ABERTA / CIRURGIA LAPAROSCÓPICA

A Cirurgia Minimamente Invasiva é cada vez maise em todos os ramos da Cirurgia uma abordagem deeleição.

A Cirurgia Bariátrica não é excepção. A abordagempor laparoscopia é actualmente não só possível comodesejável em todos os procedimentos cirúrgicos paratratamento da obesidade, devido às inúmeras e conhe-cidas vantagens que a cirurgia minimamente invasivaapresenta.

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Apesar disto a cirurgia aberta não está de modonenhum proscrita. A cirurgia aberta pode e deve sersempre considerada uma alternativa praticável face auma impossibilidade da via laparoscópica.

Na Conferência de Consenso da American Societyof Bariatric Surgery (ASBS) realizada em Washingtonem Maio de 2004 um dos itens finais estabelecidos foique a cirurgia efectuada por via aberta ou por via lapa-roscópica, são válidas e complementares.

A DBPC DS é um procedimento de grande cirur-gia que implica uma linha de secção e de agrafagemda grande curvatura gástrica (sleeve), a tecnicamenteexigente secção duodenal cerca de 3 cm pós pilóricacom o consequente encerramento do coto duodenaldistal e finalmente duas anastomoses (duodeno/ileos-tomia e jejunoileostomia).

Este é um procedimento que pela eficácia dos resul-tados a longo prazo está cada vez mais reconhecidocomo a cirurgia indicada nos Super Obesos (IMC>50)e nos Super Super Obesos (IMC>60). Em doentescom este grau de obesidade a hepatomegália pela estea-tose é factor condicionando dificuldades técnicasacrescidas. Existem propostas para abordagem destesdoentes por etapas. Balão intra gástrico (BIB) duranteo máximo 6 meses seguido de cirurgia. Outra pro-posta, feita em primeira mão por M.Gagner, é a exe-cução de um Sleeve num primeiro tempo, seguido deDuodenal Switch seis a doze meses depois. Contudoapesar das opções aconselhadas continua a ser umaconjugação problemática, a morfologia anatómica dosgrandes obesos e uma DBP DS por laparoscopia comcurva de aprendizagem difícil e prolongada, superior àdo bypass gástrico mesmo em experientes cirurgiõeslaparoscopistas.

O nosso grupo (Pedro Gomes;L Simões Reis;JConceição A.Firmo), preconiza actualmente a DBPDS como primeira opção cirúrgica para obesos comIMC>60. Dos 81 doentes operados, todos por viaaberta, 55 (67.9%) tinham IMC>50 e destes, 25(30.8%) são Super Super Obesos (IMC>60), sendoque 8 (9.8%) têm IMC>70.

Dos últimos 35 doentes operados apenas 6 tinhamIMC <55 e em 18 deles o IMC >60 o que demonstra

a estabilização da indicação para DBP DS no nossogrupo.

O IMC médio de toda a série (n=81) é 54.6 commínimo de 39.1 e máximo 79.4 Kg/m².

Utilizamos segundo o aconselhado por Aniceto Bal-tasar (5) na via aberta, uma Incisão transversal supraumbilical que sendo motivadora de menos dor, favo-rece a dinâmica respiratória, condiciona menos even-trações e finalmente numa futura cirurgia moduladoracorporal, poderá ser esta cicatriz excisada ao ser efec-tuada a abdominoplastia com óptimo resultado esté-tico.

Consideramos indispensável a utilização de um apa-relho de dissecção ultrasónico para a laqueação/secçãodos vasos gastro epiploicos e vasos curtos para liberta-ção de toda a grande curvatura gástrica e adequadamobilização do fundo. A gastrectomia linear (sleeve) sóserá verdadeiramente eficaz na sua função de restriçãose fôr tubular, baseada a ressecção numa calibraçãocom sonda de Foucher 40 e se fôr removido todo ofundo gástrico.

A linha de agrafagem da secção do corte com as GIAé finalmente reforçada com uma sutura continuaserosa a serosa com fio absorvível.

A anastomose entre o duodeno (seccionado ± 3 cmpós piloro) e o ileon que foi trazido para posição supramesocólica é por nós efectuada invariavelmenteunindo as duas estruturas término/lateral com umasutura continua num só plano com Prolene ® 3/0.

A intervenção termina com a introdução de sorosalino misturado com azul de metileno através dasonda de Foucher com a extremidade distal posicio-nada na junção esofagogástrica, permitindo testar aintegridade das linhas de sutura do sleeve e a permea-bilidade da duodenoileostomia.

Nos 81 doentes operados, utilizando sempre as téc-nicas referidas conforme inicialmente aconselhado porAniceto Baltasar (5), não se registou nenhum leak doSleeve, registando-se duas fistulas de pequena dimen-são, avaliadas por imagem de Rx com gastrografina (6ºe 13º doentes operados) que com tratamento conser-vador cicatrizaram entre o 16º e 24º dias sem compli-cações nem sequelas posteriores.

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A Baltasar (8) para a DBP CD aberta tem uma taxade mortalidade de 0.95% e para a via laparoscópica éde 0.85%.

Na nossa série de 81 doentes registaram-se 2 óbitos.A mortalidade operatória foi de 1.2% correspondenteao falecimento de um doente nas primeiras 24 h porembolia pulmonar. Registou-se outra morte ao 4º mêspor pneumonia pulmonar bilateral contributo paraque a mortalidade global da série seja de 2.4%.

CONCLUSÃO

• A Derivação Biliopancreática com Duodenal Switch(DBP DS) é o procedimento bariátrico que registaos melhores resultados na perda de peso e na manu-tenção dessa perda a longo prazo.

• Cura ou promove significativamente a melhoria dasmorbilidades associadas.

• Sendo uma cirurgia do tipo misto em que associaum componente restritivo (Sleeve) com o compo-nente indutor da má absorção (Duodenal Switch)cria uma nova fisiologia que obriga a um segui-mento criterioso e prolongado de modo a seremdetectados e corrigidos eventuais défices vitamino//minerais e as consequentes patologias que lhe estãoassociadas.

• É o único procedimento bariátrico que cria as con-dições para que seja possível a prática de uma ali-mentação quase normal em que o sintoma vómito équase inexistente.

• A DBP DS é do ponto de vista técnico uma opera-ção de alguma complexidade sobretudo se efectuadapela via laparoscópica. Apesar disto e desde quesejam respeitados os timings de uma curva de apren-dizagem exigente, a morbilidade e mortalidadesituam-se em níveis perfeitamente aceitáveis sobre-tudo tendo em conta os doentes Super Obesos(IMC>50) que constituem a indicação preferencialdeste procedimento.

Registaram-se em dois doentes hemorragias intraabdominais intensas nas primeiras 24 horas de pósoperatório que impuseram laparotomias de revisão.Em ambos os casos foram encontrados volumososhematomas supra mesocólicos, estendendo-se emintima relação com o novo tubo gástrico e que apóscuidadosa aspiração e revisão não foi percebida a ver-dadeira causa da hemorragia. Passámos, após estes doisepisódios a ter maior atenção à manipulação do grandeepiplone desinserido da grande curvatura gástrica apósa laqueação de vasos com o aparelho ultra sónico.

A complicação minor mais frequente foram os Sero-mas (n=12 – 14.8%) da parede apesar da drenagemsistemática com drenos de vácuo.

Foram até ao momento diagnosticadas três HérniasIncisionais (3.7%) não estando nenhuma delas rela-cionada com seromas prévios, mas uma delas foi numdos doentes que teve hemorragia pós operatóriaimpondo uma segunda laparotomia.

No estudo de Marceau (3) são descritas hérnias inci-sionais em 13% dos doentes operados (176/1356).

MORTALIDADE

A DBP DS apesar de ser um procedimento tecni-camente exigente, seja qual fôr a via de abordagemescolhida, apresenta taxas de mortalidade que seenquadram no que é aceitável em cirurgia bariátrica.

É facto conhecido que o IMC > 50 KG/m² funcionacomo elemento agravante da mortalidade operatória.

Marceau (3) registou uma mortalidade operatória(nos primeiros 30 dias) de 1.1% (16/1423) .Quandoregista os dados referentes a 90 dias a mortalidadesobe ligeiramente para 1.3%.

Estes dados são sobreponíveis aos verificados emdoentes submetidos a Bypass Gastrico.

Hess (1) apresenta valores de mortalidade global paraa DBP DS de 0.57%. Contudo quando se refere adoentes com IMC > 50 a taxa é de 1.16%.

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BIBLIOGRAFIA

Pedro Gomes

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II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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GRANDES TEMAS: OBESIDADE

Physiologie de l’absorption alimentaire:diversion biliopancréatique.

Mise à jour à propos de 3000 interventions

N. Scopinaro

Gênes – Italie

RÉSUMÉL'auteur à propos d'une série de 3 000 interventions, dont 162 réalisées par voie coelioscopique, présente les avantages et les inconvé-nients de la diversion bilio-pancréatique (DBP). La DBP assure une réduction de plus de 70% de l'excès pondéral initial, tant chez lesobèses que chez les superobèses ; cette perte de poids est constante et surtout se maintient à très long terme (25 ans). La DBP a un effettrès favorable sur le métabolisme du glucose, avec 98% de guérison du diabète à 10 ans ; elle réduit à long terme le cholestérol sériqueavec augmentation du HDL cholestérol. Elle normalise la tension artérielle dans 80% des cas à 10 ans. Elle constituerait ainsi le traite-ment le plus puissant de l'hyperlipidémie et du diabète sucré type II. L'anémie, la déminéralisation osseuse, l'ulcère gastrique et la neu-ropathie périphérique peuvent être contrôlés aisément ; le problème le plus important est celui de la malnutrition protéique (MP), qu'ils'agisse de la forme épisodique précoce ou de la forme récurrente. L'auteur, en adaptant aux caractéristiques du patient dans la "DBP adhoc" le volume gastrique d'une part, et la longueur de l'anse alimentaire d'autre part, obtient à 10 ans chez les 300 derniers opérés, 1%de MP récurrente entraînant 1% de réinterventions, avec une réduction permanente de 71% de l'excès de poids initial.(MOTS CLÉS: Obésité, Dérivation bilio-pancréatique (DBP), Syndrome métabolique, Diabète type II, Hyperlipidémie)

SUMMARYA propos of a series of 3,000 procedures, 162 of which were performed laparoscopically, the author presents the advantages and draw-backs of biliopancreatic bypass (DBP). DBP allows an over 70% initial excess weight loss, both in obese and superobese patients ; theweight loss remains constant and above all it is long lasting (25 years). In fact, DBP has a favourable effect on glucose metabolism, with98% of cases of diabetes cured at 10 years ; it lowers serum cholesterol lastingly and increases HDL cholesterol. DBP also regulates bloodpressure in 80% of cases at 10 years. DBP could represent the most powerful treatment against hyperlipidemia and type II diabetesmellitus. Anaemia, bone demineralisation, gastric ulcer and peripheral neuropathy are easily controlled ; the major problem is that ofprotein malnutrition (MP) both in its early episodic form and recurring form. In "ad hoc DBP " the author tailors the procedure topatient characteristics, namely gastric volume and length of feeding loop. In his last 300 operated patients, his results at 10 years are1% of recurring MP leading to 1% reoperations, with a 71% permanent loss of initial excess weight.(KEY WORDS: Obesity, Biliopancreatic bypass (DBP), Metabolic syndrome, Type II diabetes, Hyperlipidemia)

RIASSUNTOL'autore presenta i vantaggi e gli svantaggi della diversione bilio-pancreatica (DBP) su una serie di 3000 interventi, di cui 162 eseguitiin laparoscopia. La DBP assicura la riduzione di oltre il 70% dell'eccesso ponderale iniziale, tanto nei soggetti obesi quanto nei super-obesi ; questa perdita di peso è costante e soprattutto si mantiene a lungo termine (25 anni). La DBP ha un effetto molto favorevolesul metabolismo del glucosio, con 98% di guarigione del diabete a 10 anni ; riduce a lungo termine il colesterolo sierico con aumentodel L colesterolo. Normalizza la pressione arteriosa nel 80% dei casi a 10 anni. Essa costituirebbe inoltre il trattamento più potentedell'iperlipidemia e del diabete mellito di tipo II. L'anemia, la demineralizzazione ossea, l'ulcera gastrica e la neuropatia periferica pos-sono essere controllate facilmente ; il problema più importante è la malnutrizione proteica (MP), sia nella forma sporadica precoce chenella forma ricorrente. L'autore, adattando alle caratteristiche del paziente nella "DBP ad hoc" il volume gastrico da una parte e la lun-ghezza dell'ansa alimentare dall'altra, ottiene a 10 anni, negli ultimi 300 operati, 1% di MP ricorrente che impone 1% di reinterventi,con una riduzione permanente del 71% dell'eccesso di peso iniziale.(PAROLE CHIAVE : Obesità, Diversione bilio-pancreatica (DBP), Sindrome metabolica, Diabete tipo II, Iperlipidemia)

“Reproduzido com autorização do “Journal de Coelio Chirurgie”, Copyright SREC diffusion”Se este artigo fôr citado em qualquer futura publicação e/ou apresentação, deve ser usada como citação a publicação original:

Journal de Coelio Chirurgie n.° 64 – Dezembro 2007, 10-15

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PATIENTS ET MÉTHODE

La diversion bilio-pancréatique (DBP) a été conçueet expérimentée sur le chien il y a plus de trente ans [1]

et pratiquée pour la première fois chez l'homme en1976 [2], en gardant à l'esprit que la réduction de poidsest sans intérêt si elle n'est pas suivie par une stabilisa-tion définitive du poids.

L'opération consiste en une gastrectomie distaleavec une reconstruction par anse à la Roux, l'entéro-entérostomie étant placée à un niveau iléal distal. Cetteopération de chirurgie générale, que tout bon chirur-gien général peut réaliser, comporte un détail tech-nique important qui est la mesure de l'intestin grêle,tant en chirurgie open qu'en coelioscopie [3], qui doitêtre complètement tendu afin d'obtenir des mesuresreproductibles.

L'opération peut être considérée comme une pro-cédure combinée avec un mécanisme temporaire pourla perte de poids et un mécanisme permanent pour lemaintien pondéral.

Le premier mécanisme est basé sur la réduction duvolume gastrique qui, à travers une large gastro-enté-rostomie, se vide rapidement dans un segment intes-tinal relativement distal. Cela provoque une baissetemporaire de l'appétit et la survenue d'un syndromepostcibal et, ainsi, une diminution des apports ali-mentaires responsable de la perte de poids initial.Comme ces effets sont d'autant plus importants etdurent d'autant plus longtemps que le volume gas-trique est plus petit, depuis 1984 le volume gastriqueest adapté aux caractéristiques individuelles despatients, incluant l'excèdent initial de poids corporel etd'autres variables. Le mécanisme essentiel de l'actionde la DBP est le retard du mélange entre le bol ali-mentaire et les sucs biliopancréatiques avec pourconséquence une digestion raccourcie de façon per-manente et donc une diminution de l'absorption desgraisses et des féculents [4].

Les avantages de la DBP sont très importants Notre série dépasse maintenant les 3 000 interven-

tions dont 162 réalisées par voie coelioscopique. Il y a

trois caractéristiques de perte de poids qui font de laDBP la plus efficace des procédures jamais proposées:

– la première est son amplitude qui excède 70% del'excédent pondéral initial à la fois chez les obèses etchez les superobèses;

– la seconde caractéristique est la constance de cetteperte de poids;

– la troisième, et de loin la plus importante caracté-ristique de la perte de poids dans la DBP, est son trèsstrict maintien à long terme, les 70% de perte de l'ex-cès de poids initial se maintenant jusqu'à 25 ans dansun groupe de patients subissant l'intervention dans saforme originale.

Une étude sur l'absorption intestinale des graisses,d'énergie et d'azote [5], nous donne l'explication de cepresque incroyable maintien illimité du poids, démon-trant que le mécanisme digestif d'absorption dans laDBP a une capacité maximale de transport pour lesgraisses et les féculents, et donc pour l'énergie qui cor-respond à environ 1250 calories par jour et que, enconséquence, tous les apports énergétiques qui dépas-sent le seuil maximum de transport ne sont pas absor-bés. Pour cette raison, puisque l'apport énergétique despatients opérés est largement plus élevé que le seuil detransport susmentionné, l'absorption quotidienned'énergie est constante pour chaque sujet ; c'est aussipourquoi le poids va rester constant de façon perma-nente. Ce phénomène a été confirmé par une expé-rience de suralimentation dans laquelle 10 sujets, por-teurs d'une DBP à long terme, ont maintenu un poidscorporel absolument constant alors qu'ils étaient nour-ris pendant 15 jours avec un supplément de 2000 calo-ries en graisses et féculents.

À côté du bénéfice évident dû à la perte de poids,quelques actions spécifiques de la DBP expliquent lanormalisation permanente du cholestérol et du glu-cose sérique chez 100% des sujets avec des taux préo-pératoires anormalement hauts, ce qui, avec plus de90% et 80% de normalisation des triglycérides et de lapression artérielle, signifie un effet extraordinaire sur lesyndrome métabolique [6].

• L'effet sur le métabolisme du glucose dans les opé-rations de chirurgie restrictive est lié uniquement à la

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perte de poids de sorte que s'il y a reprise de poids,l'effet favorable disparaît. Pour comprendre ce qu'iladvient après bypass gastrique ou DBP rappelons-nousque, selon l'hypothèse de Randle [7, 8], le diabète dansl'obésité serait dû à l'augmentation de l'oxydation desFFA (free fatty acid) qui, à son tour, inhibe l'oxyda-tion glucidique, causant ainsi une résistance à l'insu-line. Plus récemment l'école suédoise [9] a suggéré quel'hyperinsulinémie serait due à une diminution de laclearence hépatique à l'insuline, secondaire à l'aug-mentation de la concentration portale en FFA et de lacompétition qui s'en suit avec les récepteurs insuli-niques.

Si nous considérons qu'indépendamment de cespathogénies le diabète sucré de type 2 est caractérisépar le cercle vicieux dans lequel l'hyperinsulinémiecause la résistance à l'insuline et vice versa, il est clairque tout facteur influençant ce cercle vicieux aura unerépercussion sur le diabète. C'est le cas de l'annulationvirtuelle de l'axe entéro-insulaire due au bypass duduodénum et du jéjunum proximal qui cause uneréduction de la production d'insuline et ainsi aug-mente la sensibilité à l'insuline. La DBP ajoute à celaau moins une autre action spécifique consistant enl'extrême réduction de l'absorption lipidique avec unediminution conséquente de la graisse intramyocellu-laire et renversement de la résistance à l'insuline [10] etnaturellement réduction ou annulation de la toxicitéaux graisses des cellules béta [11].

La presque annulation de l'axe entéro-insulaire estprouvée par l'extrême réduction du GIP (Gastric Inhi-bitory Polypeptide) qui est considéré comme la plusimportante incrétine qui après DBP a des niveaux debase fortement réduits, une courbe plate en réponse àun repas, et une réponse intégrée très réduite [12]. L'ab-sorption graisseuse minime est attestée [5] montrantune absorption quotidienne moyenne d'environ 40 grde lipides après DBP.

Différemment du bypass gastrique la DBP a aussideux actions spécifiques sur le métabolisme du cho-lestérol, représentées par l'interruption calibrée de lacirculation entérohépatique des sels biliaires avec l'aug-mentation consécutive de la synthèse d'acides biliaires

au détriment du pool cholestérolique, et par l'absorp-tion fortement réduite du cholestérol endogène due àl'absorption minimale de graisses. Ces actions sontégalement prouvées par une étude qui montre uneexcrétion quotidienne de sels biliaires d'environ 750mg, versus une valeur normale de 400 mg, et de nou-veau une absorption de graisses extrêmement limitée[5] qui certainement autorise l'absorption d'une partminime de cholestérol endogène.

Sur les 2 266 patients avec "DBP ad hoc", avec unsuivi minimum d'un an, 317 d'entre eux (14%)avaient une simple hyperglycémie préopératoire, 140(6,2%) avaient un diabète sucré type 2 traité avec deshypoglycémiants oraux, et 39 (1,7%) patients avaientun diabète sucré de type 2 nécessitant un traitement àl'insuline. Parmi ces patients tous, exceptés deux,avaient un an après DBP et de façon permanente uneglycémie normale sans traitement et avec un régimeentièrement libre.

Il y a eu 4 autres cas de rechute tardive, mais aucunde ces patients à long terme n'a eu besoin d'un traite-ment quelconque. Significativement cela s'est accom-pagné d'une normalisation des niveaux sériques d'in-suline, comme cela a été démontré par une analyselongitudinale [4], et par une analyse transversale mon-trant des niveaux sériques de base postopératoires nor-maux ainsi que la réponse au repas test, et la surfaceau-dessous de la courbe, et par la normalisation de lasensibilité à l'insuline qui fut explorée dans une autreétude au moyen d'une restriction isoglycémiquehyperinsulinémique [4].

De façon intéressante les patients avec un diabèteinsulinodépendant préopératoire avaient déjà un niveausérique moyen de glucose normalisé un mois après laDBP, alors que l'excès de poids était encore autour de80% ce qui prouve à nouveau un effet spécifique indé-pendant du changement de poids. De la même façon lesvaleurs HOMA, et donc la sensibilité à l'insuline, étaientnormales un à deux mois après l'intervention [13].

Il est intéressant de comparer les effets bénéfiques àlong terme de la DBP sur le métabolisme du glucoseavec ceux de l'autre opération qui, à côté de très bonsrésultats à long terme sur le poids, a aussi une action

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spécifique sur le métabolisme glucidique : le bypassgastrique qui, avec seulement une des actions spéci-fique du DBP, a un impact inférieur sur la cure du dia-bète. Le groupe Greenville, et précisément WalterPories et al [1]. et Kennet MacDonald et al [15], a pré-senté les résultats à dix ans du GBP dans le traitementdu diabète sucré de type 2 concernant environ 150patients diabétiques.

Pour cette raison nous avons pris en compte les 1 576 "DBP ad hoc" qui avaient un minimum de 10ans de suivi fin 2003, dont 312 avaient un diabète préo-pératoire défini par une glycémie à jeun supérieure à125 mg/ dl : dix ans après l'opération 42 des patientsopérés (13%) étaient perdus de vue; sur les 270 restants33 (12%) étaient décédés de sorte que 237 étaient éli-gibles pour évaluation. Les patients avec GBP avaientune réduction moyenne de la glycémie à jeun de 187 àmoins de 140, stabilisée jusqu'à 10 ans. Les valeurs cor-respondantes pour les patients avec DBP étaient de 178à moins de 90. Le pourcentage de patients guéris, c'est-à-dire normoglycémiques en régime libre et sans médi-cations, est de 83% dans la série de Pories, alors quedans notre série il varie de 99 à 100%, avec 98% à 10ans. Dans les deux séries les résultats peuvent se voirquelques jours après l'opération confirmant ainsi l'ac-tion spécifique de ces opérations.

Dans le groupe de Mac Donald le nombre depatients traités à l'insuline ou aux hypoglycémiantsoraux tombe de 32% avant chirurgie à 9% au derniercontrôle après GBP, alors qu'aucun de nos opérés, nimême le très petit nombre avec guérison incomplèteou légère rechute, n'a jamais pris aucune médicationdans les deux ans de suivi. Enfin la mortalité dans legroupe contrôle de Mac Donald était de 28% versus9% au total dans le groupe chirurgical. Nous n'avonspas de groupe de contrôle jusqu'à présent et notre tauxglobal de mortalité est de 12%, avec 4 cas de dénutri-tion protéique, que l'on aurait pas aujourd'hui, maisqui représentaient probablement à cette époque le plushaut prix à payer pour une opération avec possibilitéde complications tardives à vie. Il y a eu seulement 4décès d'origine cardio-vasculaire, c'est un peu moinsde 1%, à comparer aux 15% des groupes contrôle.

Concernant les effets de la DBP sur le cholestérolsérique, il n'y a pas de comparaison possible; le GBP,comme toutes les opérations gastriques purement res-trictives, n'a pas d'effets autres que ceux liés à la perte depoids. Dans notre série la réduction moyenne du cho-lestérol sérique après DBP est d'environ 30% chez lespatients qui avaient des valeurs préopératoires normales,et d'environ 45% chez les patients hypercholestérolé-miques en préopératoire. En particulier sur les 2 800patients opérés (série totale) avec un suivi minimumd'un mois, 1 486 avaient un cholestérol sérique à untaux supérieur à 200 mg/ dl, 609 à plus de 240 et 102à plus de 300 mg/ dl. Tous avaient un cholestérol infé-rieur à 200 déjà à un mois postopératoire et aucunevaleur supérieure à 200 n'a été enregistrée durant les 30ans de suivi. Si nous ne prenons en compte que lespatients dont le taux de HDL cholestérol était disponi-ble ces résultats se maintenaient à moyen terme chez 51patients appariés, tandis que le HDL cholestérol mon-trait une augmentation légère mais significative, et à trèslong terme, chez les 10 patients opérés par le modèleoriginal de "half-half" DBP et pour lesquels les valeursétaient disponibles à 15 à 20 ans.

• Les effets de la DBP sur l'hypertension artérielle sontmoins impressionnants mais encore manifestementtrès bons. Si l'on considère comme normale une pres-sion systolique inférieure à 140 et une diastolique au-dessous de 85, en tenant compte seulement des 73opérés dont la T.A. est disponible sur 10 ans, la nor-malisation de la pression artérielle augmente durantles dix ans de suivi, atteignant 80% à 10 ans en dépitdu vieillissement et de la stabilité de poids corporel, cequi est exactement le contraire de ce que l'étude SOSdémontrait après les procédures restrictives [16].

Des considérations très importantes peuvent êtrefaites à ce stade: comme nous l'avons vu les effetsmétaboliques de la DBP sont totalement indépendantsdu changement de poids, et cela est démontré par leschangements obtenus, à un mois déjà après l'inter-vention, sur la glycémie, la sensibilité à l'insuline, lesgraisses intramyocellulaires, et également par la nor-malisation de la pression sanguine, qui continuent às'améliorer à long terme en dépit de la stabilisation du

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poids corporel. Aussi, pourquoi ne pas utiliser la DBPchez les patients non-obèses morbides et même non-obèses mais présentant un syndrome métabolique ?Certainement pas par peur d'une perte de poids nondésirée. En fait imaginons un patient avec un seuild'absorption énergétique intestinal correspondant àun poids de 80 kg. Nous savons que c'est le poids qu'ilatteindra nécessairement quel qu'élevé que soit sonpoids de départ. Que va-t-il se produire si, aucontraire, son poids de départ est de 70 kg? La réponseévidente est qu'il ne va pas perdre de poids. Ainsi pourne prendre aucun risque plaçons le seuil à un niveauplus élevé. Nous avons besoin maintenant de considé-rer que dans la DBP, seule l'absorption des graisses estlimitée à l'anse commune, alors que les protéines et lesféculents sont absorbés 'à la fois dans l'anse communeet dans l'anse alimentaire (voir ci-dessous). C'est pour-quoi le seuil d'absorption énergétique intestinal peutêtre considérablement relevé en allongeant l'anse ali-mentaire, ce qui n'affecte en rien les autres effets spé-cifiques de l'opération. Ce n'est pas seulement unehypothèse puisque cela a pu être vérifié chez deuxjeunes filles maigres présentant une chilomicronémiafamiliale qui n'ont perdu aucun poids après avoir subiune DBP avec une anse alimentaire plus longue [17].

La conclusion évidente est que la DBP est actuelle-ment le traitement disponible le plus puissant pourl'hyperlipidémie et le diabète sucré de type 2, et qu'ellepourrait être sûrement et efficacement utilisée dans letraitement des syndromes métaboliques sévères chez lesobèses mais aussi chez les sujets non-obèses.

Evidemment cela a un prix, comme toutes chosesdans la vie, en particulier les bonnes. La pratique etl'expérience nous ont conduits, hors learning curve, àune mortalité opératoire fermement réduite au-des-sous de 0, 5% avec progressivement une quasi-dispa-rition des complications générales et des complicationschirurgicales majeures.

La DBP a des complications tardives spécifiques.• L'anémie, qui ne survient que chez les patients

avec un saignement chronique, peut être réduite au-dessous de 5% avec une supplémentation adéquate.

• La déminéralisation osseuse requiert aussi une sup-plémentation calcique à titre préventif et curatif. Defaçon intéressante un pourcentage significatif depatients obèses a déjà une maladie osseuse modérée àsévère qui apparemment tend à s'améliorer du fait dela perte de poids. Ce qui se produit probablement c'estque, durant la première année, l'effet défavorable dela réduction d'absorption de Ca prévaut, provoquantune augmentation du pourcentage de troubles osseux,alors que secondairement c'est l'effet bénéfique de laperte de poids. Ce phénomène général est particuliè-rement évident dans les populations présentant lesaltérations préopératoires les plus importantes, c'est-à-dire les patients plus âgés et plus lourds [18, 19, 20].

• L'incidence de l'ulcère d'estomac essentiellementlimitée à la première année postopératoire est forte-ment influencée en particulier chez la femme par l'al-cool et surtout par la cigarette. Bien que l'ulcère soitaisément curable par les médicaments antisécrétoires,chez les fumeurs il peut rechuter indéfiniment jusqu'àl'arrêt du tabac [4].

• La neuropathie périphérique, autre complicationprécoce, est très aisément prévenue par la supplémen-tation à la thiamine [21].

• La malnutrition protéique (MP) avec ses symp-tômes classiques est la complication la plus sérieuse dela DBP. Généralement épisode précoce unique, elle estdue au nonrespect des règles alimentaires qui doiventêtre observées en début de période postopératoire. Plusrarement cet épisode peut être récurrent en raisond'apport de protéines inférieur à celui requis : une cor-rection chirurgicale est alors nécessaire avec allonge-ment de l'anse commune [22, 23]. La lutte contre cettecomplication a été la plus importante dans le déve-loppement de la DBP.

Pour comprendre comment la technique, les indi-cations et le management postopératoire ont évoluéjusqu'à ce que nous obtenions éventuellement lecontrôle de cette complication, nous devons reveniren arrière sur quelques principes de base de la physio-logie des complications nutritionnelles de la DBP. Levolume gastrique influence grandement l'absorptionénergétique et protéique, à la fois dans la période post-

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opératoire précoce en provoquant une baisse d'appétitet la survenue d'un syndrome postprandial, et à longterme en influençant le temps de transit intestinal. Ceseffets sont d'autant plus intenses que le volume gas-trique est plus petit et que l'anastomose gastro-intes-tinale est plus distale. De plus il est très important decomprendre que très peu, voire pas du tout, d'enzymespancréatiques atteignent l'anse commune, de tellesorte qu'il n'y a pas de digestion pancréatique à ceniveau. La seule capacité digestive disponible est celledes enzymes de la bordure en brosse intestinale. Enconséquence les protéines et les féculents sont digéréset absorbés dans la totalité du segment intestinal entrela gastroentérostomie et la valve iléo-coecale, tandisque, du fait de la nécessité des sels biliaires, seule l'ab-sorption des graisses est strictement confinée à l'ansecommune [24]. Comme nous le savons la DBPentraîne un seuil maximum d'absorption pour lesgraisses et les féculents et donc l'énergie qui, avec leslongueurs standards dans nos populations, correspondà une moyenne d'environ 40 gr / jour pour les graisseset 225 gr / jour pour les féculents, ce qui explique à lafois la constance et le maintien à long terme de laréduction pondérale après la DBP. La longueur del'anse commune est également importante car elle doitpermettre une absorption de sels biliaires suffisante etne pas provoquer de perte excessive de sels biliairesdans le côlon et donc de diarrhée avec sa réductiond'absorption colique de protéines consécutive. Defaçon intéressante, et heureusement, contrairement àl'absorption des graisses et des féculents, l'absorptiondes protéines après DBP dépend de l'apport alimen-taire et avec nos longueurs standards correspond àenviron 70%. Par conséquent plus l'apport alimentairesera important et plus l'anse alimentaire sera longue,plus l'absorption protéique sera importante mais, dufait de la plus grande absorption concomitante desféculents, la perte de poids sera aussi moindre. Enfinune quintuple augmentation de la perte d'azote endo-gène a été démontrée après DBP. Tout calcul fait celaporte les quantités moyennes requises de protéines àenviron 90 grammes par jour et cela explique le risquede malnutrition protéique après DBP.

Dans la période postopératoire précoce, du fait de laréduction obligatoire des apports alimentaires, la pré-valence de protéines dans le faible apport de nourri-ture consommée favorise le développement de la forme"marasmatique" de malnutrition en protéines et éner-gie, ce qui est exactement le but de l'opération.

Au contraire quand la préférence est donnée auxhydrates de carbone la forme "hypo-albuminique" peutse développer et elle représente la vraie complication,nécessitant réhospitalisation et nutrition parentérale.

Etant donné que l'opération fonctionne pour la vieentière la malnutrition protéique sporadique peut sur-venir à n'importe quelle distance de l'intervention etest généralement due à une diarrhée infectieuse viraleprolongée ou à une réduction des apports alimentairesquelle qu'en soit la cause.

La forme récurrente de malnutrition protéique estd'une importance beaucoup plus grande. Un certainnombre de facteurs, isolés ou combinés, peuvent abou-tir à cette forme. Des facteurs sujet-dépendants telsqu'apports protéiques insuffisants, absorption pro-téique insuffisante par unité de surface intestinale, ouperte excessive d'azote endogène, et des facteurs opé-ration-dépendants tels qu'estomac trop petit entraî-nant une vidange et de ce fait un transit intestinal troprapide avec une absorption réduite de façon perma-nente, ou encore une anse intestinale trop courte pro-voquant une absorption protéique insuffisante. Un ouplusieurs de ces facteurs peuvent être responsables decette complication. Le concept est que cette opérationspécifique chez tel ou tel patient, est incompatible avecun bon statut nutritionnel protéique. Après deux outrois épisodes de malnutrition protéique on doit déci-der une reprise chirurgicale avec allongement de l'ansecommune. Etant donné, comme on l'a déjà dit, quel'absorption protéique dépend de la longueur d'intes-tin entre la GEA et la VIC (valve iléo-coecale) l'allon-gement ne doit pas être réalisé au niveau de l'anse ali-mentaire mais au niveau de l'anse bilio-pancréatique.Le standard qui, entre nos mains, garantit la solutionde tous les problèmes nutritionnels protéiques estd'ajouter 150 cm pour obtenir une longueur finale de4 mètres. Cela évidemment entraîne la restabilisation

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du poids du corps à un niveau moyen qui correspondà un regain d'environ 25% de l'excès de poids.

Pour mieux comprendre comment nous avonsmodifié l'opération dans le but de minimiser le risque demalnutrition protéique (MP) résumons les causes de MPaprès DBP. D'un côté la DBP elle-même qui en dimi-nuant l'absorption protéique et en augmentant la perted'azote endogène augmente la demande protéique qui,à son tour, influence à la fois la MP épisodique et récur-rente. D'un autre coté la diminution du volume gas-trique qui, par une diminution temporaire des entréesalimentaires, influence la MP précoce épisodique et,par une diminution permanente du temps de transitintestinal et ainsi une réduction de l'absorption pro-téique, influence à la fois la MP précoce épisodique etla MP tardive récurrente. Nous avons été initialementtrès fortement attirés par l'extraordinaire perte de poidsobtenue en réduisant le volume gastrique et à une phaseancienne de développement de la DBP nous avonsdrastiquement réduit le volume moyen à 150 cc obte-nant de ce fait une spectaculaire réduction de 90% del'excès de poids initial, mais une incidence catastro-phique de 30% de MP avec un taux de 10% de récur-rence. L'importance du volume gastrique est prouvéepar le fait que l'estomac des sujets avec MP était signi-ficativement plus petit que celui des patients sans MP.Dans le but de diminuer l'incidence de MP sans perdreles avantages du petit estomac, nous avons adapté levolume gastrique aux caractéristiques de chaquepatient. La philosophie originale de la DBP avec "esto-mac ad hoc" était de confiner le risque de MP auxpatients qui requéraient la plus grande perte de poidsen adaptant le volume gastrique seulement à l'excès depoids initial. Le volume gastrique moyen fut réduit àenviron 300 cc avec une incidence totale de MP de15% et avec encore une très bonne perte d'excès depoids de 79%. Naturellement les patients avec unvolume gastrique inférieur à 300 cc avaient encore uneincidence de MP significativement plus importante.

Nous avons décidé alors d'adapter le volume gas-trique aux autres caractéristiques des patients, en par-ticulier l'âge, le sexe, les habitudes alimentaires et ledegré de compliance escompté. Le résultat fut une inci-

dence globale de 11% de MP avec un taux de récur-rence de 4,3% et une perte d'excès de poids corporelinitial de 75%. A ce point l'absence de différence signi-ficative entre le volume gastrique des patients avec MPet sans MP démontrait qu'il n'avait plus d'influencesur l'incidence de MP.

C'est pourquoi afin de diminuer ultérieurement letaux de cette complication, depuis 1992 nous avonségalement commencé à adapter la longueur de l'ansealimentaire aux caractéristiques individuelles despatients, la principale caractéristique socio-comporte-mentale corrélée avec le risque de MP étant le contenuprotéique de l'alimentation habituelle, la capacité demodifier les habitudes alimentaires en fonction debesoins et le statut financier.

L'intervention "DBP avec estomac ad hoc et ansealimentaire ad hoc" qui résulte de ces modifications,analysée chez les 300 derniers patients ayant un fol-low up moyen de 10 ans, entraîne une incidencepresque négligeable de seulement 1% de MP récur-rente ce qui signifie seulement 1% de réinterventionspour des complications tardives spécifiques associéesencore à une très bonne réduction permanente de71% de l'excès de poids initial.

Le fait que cette dernière politique procure le meil-leur compromis entre efficacité et sécurité est confirmépar une évaluation BAROS récente de plus de 800patients qui montrait chez les patients opérés après1992 un taux d'échecs de seulement 2% et plus de90% de résultats bons et excellents.

En conclusion, une bonne connaissance de la phy-siologie de la DBP permet l'adaptation à la fois duvolume gastrique et de la longueur de l'anse alimen-taire aux caractéristiques individuelles du patient. Letaux qui en résulte de 1% de reprise pour complica-tions tardives spécifiques fait de la DBP entre nosmains l'intervention la plus efficace mais aussi la plussûre utilisable dans le traitement de l'obésité.

Par ailleurs la learning curve a aussi influencé favo-rablement notre taux de complications tardives spéci-fiques la MP chutant de 15 à moins de 3%, l'ulcèregastrique de 9 à 4%, cependant que les complicationsneurologiques disparaissaient totalement.

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Comme conclusion générale nous pouvons direque la DBP est une arme puissante et que de ce faitelle peut être très dangereuse si elle est utiliséeimproprement. C'est pourquoi elle ne devrait pasêtre faite de façon sporadique. Son usage devraitêtre confiné entre les mains de chirurgiens qui, en

garantissant un certain nombre d'opérations par anet un suivi à vie très soigneux, peuvent acquérir l'ex-périence nécessaire pour adapter l'intervention àleur population de patients et ainsi obtenir les meil-leurs résultats possibles avec le moins de complica-tions.

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Université de Médecine de GênesGênes – [email protected]

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INTRODUÇÃO

A síndrome de Boerhaave foi descrita em 1724 pelo médico ebotânico holandês Hermann Boerhaave. É uma entidade raracom elevada mortalidade que continua a desafiar a nossa capaci-dade clínica de inverter um prognóstico tão sombrio.

CASO CLÍNICO

Homem de 22 anos, sem antecedentes pessoais relevantes, quena sequência de vómito, após refeição copiosa acompanhada debebidas alcoólicas, refere toracalgia esquerda súbita, intensa, comirradiação escapular esquerda. Recorreu ao Serviço de Urgência(S.U.) de outro hospital onde fez Radiografia do tórax que mostroudiscreto apagamento do seio costo-frénico esquerdo. O doente tevealta medicado com analgésico. Cerca de 5 horas depois é admitidono S.U. do nosso hospital por agravamento da dor torácica, acom-panhada de febre e dispneia. Repetiu a Radiografia de tórax querevelou um derrame pleural esquerdo e foi internado.

Durante as horas seguintes houve um agravamento progressivodo quadro e foi nessa altura solicitada a nossa colaboração, já apósum novo radiograma que revelou hidropneumotórax esquerdocom colapso total do pulmão e desvio do mediastino(Fig.1).

No exame objectivo, o doente apresentava dispneia sem cia-nose, febre (38,5ºC), taquicardia e hipotensão (90/60 mm Hg).Palpava-se discreta crepitação subcutânea ao nível da fúrcula ester-nal. Na auscultação pulmonar o murmúrio vesicular estava abo-lido no hemitórax esquerdo. O abdómen apresentava-se plano,indolor e sem organomegálias.

Face ao quadro clínico foi admitida a hipótese de rotura doesófago após vómito (síndrome de Boerhaave).

Realizou de imediato TAC torácico com ingestão oral de gas-trografina, que confirmou a existência de uma perfuração ao níveldo terço inferior do esófago, com passagem do contraste para acavidade pleural esquerda e pneumomediastino, além de volu-moso hidropneumotórax homolateral (Fig. 2).

Foi operado com cerca de 14 horas de evolução. Submetido atoracotomia póstero-lateral esquerda, constatou-se importantecontaminação da cavidade pleural com restos alimentares, mas

ainda sem mediastinite purulenta. Foi detectada uma perfuraçãode 2 cm no esófago distal, cerca de 1 cm acima do diafragma. Após“toilette“ da cavidade pleural optou-se por esofagorrafia numplano, reforçada por “patch” pleural (Fig. 3). Associou-se trata-mento intensivo na UCI, com ventilação mecânica, correcção dochoque, antibioticoterapia de largo espectro e alimentação paren-térica total.

Como complicações há apenas a mencionar atelectasia lobar infe-rior esquerda com pneumonia associada. A situação foi debelada.

Ao 9º dia do pós-operatório fez exame contrastado do esófagoque não mostrou deiscência da esofagorrafia. Ao 16º dia repetiuTAC torácico que apenas revelou um pequeno derrame pleuralseptado. O doente teve alta com indicação de manter cinesitera-pia em ambulatório e encontra-se bem passados dois meses.

DISCUSSÃO

A síndrome de Boerhaave, ou rotura expontânea do esófago écaracterizada pela tríade de Mackler: vómitos, dor torácica e enfi-sema subcutâneo. É uma entidade rara, ocorre predominante-mente no sexo masculino (80 % dos casos) entre os 40 e 60 anose tem mortalidade entre os 28 e os 85 %. [3] Este prognósticosombrio e variável depende, primordialmente, da rapidez diag-

II Série • Número 4 • Março 2008 Revista Portuguesa de Cirurgia

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CASO CLÍNICO

Síndrome de BoerhaaveSousa, L., Garrido, R. & Santos, L.

Serviço de Cirurgia II – H.N.S.R., E.P.E. – Barreiro

Director de Serviço: Dr. José Pereira

Fig.1– Rx do tórax PA - hidropneumotórax esquerdo

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nóstica e terapêutica e, secundariamente, do estado geral, patolo-gia associada e idade do doente.

A tríade patognomónica nem sempre está presente, sendo fun-damental uma elevada suspeição diagnóstica. A história de umvómito violento nem sempre existe. Nalguns doentes nem é possí-vel colher dados anamnésticos, porque estão em choque ou conec-tados a um ventilador. A atitude é sempre a de excluir a perfuraçãodo esófago através de um radiograma contrastado (meio de con-traste hidrossolúvel) e se necessário com recurso a TAC torácica.

A esofagoscopia de princípio está contraindicada.

A rotura do esófago é consequência de um aumento súbito dapressão intraesofágica, acima dos 200 mm Hg (5 vezes a pressãodesencadeada no esforço habitual de um vómito) e localiza-se,maioritariamente, no terço distal e no bordo pósterolateralesquerdo, por duas razões anatómicas: o maior calibre do esófagono 1/3 distal que determina a maior pressão nesse segmento e ararefacção da camada muscular oblíqua que gera nesta zona umlocus de minor resistência. [5]

Quase sempre a perfuração faz-se para a cavidade pleuralesquerda.

A passagem de saliva com a flora anaeróbia, associada aorefluxo de secreções cloridropépticas e biliares, criam as condi-ções para uma agressão química do mediastino, seguida de medias-tinite purulenta e necrótica frequentemente com piotórax.

O tratamento é cirúrgico salvo raras excepções (colocação deprótese esofágico e drenagem pleural) [2] e as técnicas dependemdas condições locais e do tempo de rotura. A maioria dos autoresactualmente defende que se os bordos da brecha esofágica nãoapresentam grande edema ou necrose e se ainda não existe umamediastinite purulenta o procedimento ideal consiste na esofa-gorrafia que pode ser apoiada por “patch” pleural muscular oucom fundoplicatura, independentemente do tempo de rotura, sebem que, estas condições ocorram habitualmente nos casos commenos de 24 horas. [4] Em casos de maior conspurcação outempo de evolução a rafia da rotura deve ser protegida pela exclu-são bipolar do esófago, com sutura automática associada a esofa-gostomia cervical lateral, gastrostomia e jejunostomia de alimen-tação. Neste caso se não ocorrer deiscência da esofagorrafia é pos-sível manter o órgão, pois ocorre a repermeabilização do lumenesofágico ao fim de cerca de 4 semanas ( a qual pode ser ajudadapor endoscopia ). Alguns autores preconizam uma fistulizaçãodirigida com tubo de Kehr(Abbot). [1] Parece-nos uma opção des-necessária nos diagnósticos precoces e pouco segura nos casos tar-dios, deixando sempre o problema de uma fístula dirigida porencerrar. Finalmente nalguns casos mais arrastados, com intensanecrose mediastínica, pesa a decisão de uma intervenção maisagressiva, num doente geralmente muito afectado pela disfunçãomultiorgânica e que consiste na esofagectomia com derivação edrenagem do mediastino, gastrostomia e jenunostomia de ali-mentação, com a consequente esofagoplastia diferida, após o con-trolo da sépsis e recuperação das condições gerais do doente.

Sousa, L., Garrigo, R. & Santos, L.

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Fig. 2 – Fístula esofágica observada em TC Torácico

Fig. 3 – Rotura observada no esófago

REFERÊNCIAS

[1] D. Mutter , S. Evrard .Le syndrome de Boerhaave ou rupture spontanée de l’oesophage. J. Chir. (Paris) 1993; 130: nº5 p.231-236.[2] P.K. Agarwal ,SEP Miller. Spontaneous rupture of the oesophagus:case report of a delayed diagnosis and subsequent management. J R Soc Med

1995; 88 : 149-150.[3] C. Dayen, H. Mishellany.La rupture spontanée de l’oesophage ou syndrome de Boerhaave. Rev Mal Respir. 2001; 18: 537-540.[4] Jacques Jougon. Primary esophageal repair for Boerhaave’s syndrome whatever the free interval between perforation and treatment. European

Journal of Cardio-Thoracic Surgery 2004; 25: 475-479.[5] Owen Korn, René López. Anatomy of the Boerhaave syndrome.Surgery Feb 2007;141 nº2:222-228.

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Revista Portuguesa de Cirurgia

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