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 Estudos em Educação eLinguagem

Revista Eletrônica do

Centro de Estudosem Educação

e Linguagem

Vol 1. Nº 1

Recie, 2011

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Copyright 2011 © Centro de Estudos em Educação e Linguagem

Reservados todos os direitos desta revista. Reprodução proibida, mesmo parcialmente,sem autorização expressa dos autores. Para solicitar autorização de uso entre em

contato com o editores através do e-mail: [email protected]

Estudos em Educação e Linguagem: revista eletrônica do Centro de Estudos emEducação e Linguagem. v. 1, n. 1, jul./dez. 2011 - . Recie: Universidade Federalde Pernambuco / Centro de Estudos de Educação e Linguagem – CEEL: UFPE,

2011.

Publicação on line.Semestral.ISSN 2237-5880

1. Linguagem e educação - Periódicos. I. Universidade Federal de Pernambuco.Centro de Educação. Centro de Estudos em Educação e Linguagem 

UFPE

CDD (22. ed.) 370 CE 2011-073

Dados de catalogação na publicação.

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 Expediente Universidade Federal de Pernambuco

Centro de Educação

Coordenação do Centro de Estudos em Educação e LinguagemAna Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa – CEEL/UFPE

Andréa Tereza Brito Ferreira – CEEL/UFPEEliana Borges Albuquerque – CEEL/UFPETelma Ferraz Leal – CEEL/UFPE

Edição deste VolumeCarmi Ferraz Santos – CEEL/UFRPE

Maria Lúcia Ferreira de Figueiredo Barbosa – CEEL/UFPE

Pareceristas Ad HocAlexsandro da Silva – UFPE

Maria Helena Dubeaux – UFPE

Projeto Gráfico e DiagramaçãoAugusto Noronha e Karla Vidal – Pipa Comunicação

Conselho EditorialAna Cláudia Rodrigues Gonçalves Pessoa – UFPE

Ana Lúcia Guedes Pinto – UNICAMPAna Teberosky – Universidade de Barcelona

Andréa Tereza Ferreira Brito – UFRPEAngela Del Carmen Bustos Romero de Kleiman – UNICAMP

Anne-Marie Chartier – INRP

Antônio Augusto Gomes Batista – UFMGArtur Gomes de Morais – UFPE

Clecio dos Santos Bunzen - UNIFESPCosme Batista dos Santos - UNEB

Eliana Borges Correia de Albuquerque – UFPEMaria Auxiliadora Bezerra – UFPB

Maria Lourdes Dionísio – Universidade do MinhoTelma Ferraz Leal – UFPE

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Política Editorial Estudos em Educação e Linguagem: revista eletrônica do Centro de

Estudos em Educação e Linguagem é uma publicação semestral do

Centro de Estudos em Educação e Linguagem da UniversidadeFederal de Pernambuco (CEEL/UFPE), com volumes publicadosem junho e dezembro. Tendo por objetivo promover a discussão detemáticas que dizem respeito à relação entre educação e linguagem,mais especificamente ao ensino – aprendizagem de língua materna,a revista publica trabalhos tanto de caráter teórico quanto aplicado.

 Além desses, serão publicadas resenhas ou notas de leitura de obras

que versem sobre as temáticas propostas pela revista.Serão aceitos trabalhos de autores nacionais ou estrangeiros,dando-se preferência a textos inéditos. No entanto, trabalhospublicados em anais de eventos científicos ou em publicações dedifícil acesso, ou esgotadas, também serão publicados.

Os textos serão analisados anonimamente por dois pareceristas,que tomarão como critérios básicos a adequação à linha editorialda revista, a consistência teórico-metodológica do trabalho e

o cumprimento das normas de publicação. Os critérios para aavaliação dos artigos são:

1. coerência com a proposta da revista;3. consistência teórico-metodológica;4. relevância para a área;5. pertinência da bibliografia;

6. qualidade da escrita; e7. normatização.

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Sumário13 Editorial

17 Leitura e tempo: aspectos temporais e as condições deprodução da leitura em um curso de graduaçãoIvete Janice de Oliveira Brotto (UNIOESTE)Flávia Anastácio de Paula (UNIOESTE)

35 O texto literário e o trabalho com a compreensão em

livros didáticos de portuguêsThaís Ludmila da Silva Ranieri (FSM/UFPE)

57 O ensino de literatura e a formação de leitoresliterários: o que dizem os PCN e as orientaçõescurriculares para o ensino médioRosivaldo Gomes (UNIFAP)

Josenir Sousa da Silva (UNIFAP)

73 Do texto ao texto: as refrações do texto lidomaterializadas no reconto produzido pelos alunosCláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto (UNIMEP)Rita de Cássia Cristofoleti (FACECAP)

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91 “Ensino de análise linguística – reflexão e construçãode conhecimentos ou memorização e reconhecimentode estruturas?”Marcela Thaís Monteiro da Silva (UFPE)Lívia Suassuna (UFPE)

109 Avaliação em larga escala e produção textual: reflexõessobre o ENEMEwerton Ávila dos Anjos Luna (UFRPE)

125 Gêneros digitais: navegando rumo aos desafios da educação a distância Ivanda Maria Martins Silva (UFRPE)

147 Normas

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 Editorial 

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 13

Editorial

Caro leitor,

Neste número inaugural da Estudos em Educação e Linguagem:

revista eletrônica do Centro de Estudos em Educação e Linguagem múltiplosobjetos de estudo e discussão se entrecruzam pautados por umeixo estruturador que é a linguagem e o seu ensino. A leitura, porexemplo, é alvo de discussões em que se enfatizam suas condições deprodução, particularmente, as condições afetas ao tempo que leitoresutilizam para leitura de textos acadêmicos. Ainda na esteira da leiturae seu ensino, o foco do debate se volta para a compreensão do texto

literário em atividades do livro didático (LD), a fim de mostrar outra via de escolarização da leitura, sob o olhar crítico para o LD e suaspossibilidades de contribuir com a formação do leitor literário. Essaformação é discutida, mais amiúde, à luz de documentos oficiais comoos Parâmetros Curriculares Nacionais e as Orientações Curricularespara o Ensino Médio, enquanto estreita-se a relação entre discussõessobre literatura no ensino médio e o processo de formação do leitorliterário na escola. Outro aspecto da leitura em discussão é sua interfacecom a produção de texto, mais especificamente com a escrita do recontode história literária e os modos de mediar essa escrita pela docente.Resguardando o eixo estruturador dos trabalhos publicados, a noção detexto é o centro desse eixo, quer quando se discute sobre leitura, querquando se discute sobre produção de texto. É nesse entrecruzamentoque a reflexão sobre análise linguística dialoga com as demais propostasaqui presentes com vistas a confrontar novas perspectivas de abordagem

do texto, na dimensão da leitura e da escrita, com formas tradicionais

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 14

de ensinar a língua na escola. Outras questões que emergem no cenáriodo ensino de língua como, por exemplo, a avaliação em larga escalae a educação a distância são também objeto de discussão do presentenúmero. Com esse perfil, o conjunto de trabalhos ora publicados buscacontribuir para divulgar estudos e reflexões no âmbito da pesquisa emeducação e linguagem.

Boa leitura! As Editoras

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 Artigos 

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 17

Leitura e Tempo:

aspectos temporais e ascondições de produção da leitura

em um curso de graduação

Ivete Janice de Oliveira Brotto

UNIOESTE – [email protected]ávia Anastácio de Paula UNIOESTE – [email protected]

RESUMO: Este artigo apresenta o modo como se produzem leiturase leitores no tempo que os estudantes destinam a suas leituras emcurso de graduação. A especicidade do tema recai sobre as leiturasdos estudantes na disciplina de Alabetização, do curso de Pedagogia

da UNIOESTE. Objetiva-se analisar e reetir sobre como os estudantesorganizam as leituras indicadas e justiicam as não leituras para aparticipação nas aulas. Na análise, adotam-se alguns preceitos teóricosbakhtinianos e as dimensões de tempo elaboradas por Heller para aabordagem do tema.

PALAVRASCHAVE: ormação de leitores; enunciação; tempo.

ABSTRACT: This article presents the way readings and readers areproduced in the time devoted by students to their readings in anundergraduate course. Specically, it addresses the students’ readingsor the subject o Literacy in the course o Education at UNIOESTE. It aimsat analyzing and making some reections on how students organizethe readings assigned or the classes and how they justiy the undonereadings. In the analysis, some Bakhtin’s theoretical principles and theconceptions o time in Heller are used to approach the subject.

KEY WORDS: reader education; enunciation; time.

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Introdução

 A discussão sobre leitura de estudantes, desenvolvida neste artigo,foi mobilizada por contradições vividas nos cursos de formação deprofessores. Atualmente, tornou-se corriqueira, nesses cursos, a leituranão integral, ou mesmo, a ausência da leitura dos textos científicos1 

indicados para estudo. Em uma espécie de rito inicial, em aulas cujoobjetivo é a discussão de uma leitura prévia indicada pelo professor, apergunta: ‘quem leu o texto para a aula?’, encontra, via de regra, comoresposta outras perguntas - ‘que texto?’ ‘Quem era mesmo o autor?’ - queindiciam a não-realização da leitura ou uma leitura feita às pressas.

Essa situação indica que as práticas de leitura entre estudantesuniversitários efetivamente se modificaram nas últimas décadas.Mesmo nas carreiras das humanidades, em que a fronteira entre aleitura fruição e a leitura de trabalho é mais difusa, convertendo-seesta, para a maioria dos estudantes, em prática obrigatória passívelde ser contornada, mais do que efetivamente realizada. Decorredesse fato, muitas vezes, o despreparo desses jovens estudantes paraatuarem profissionalmente na escola básica, que tem como uma desuas principais tarefas a de assegurar o acesso de crianças, jovens eadultos à cultura escrita e suas práticas.

 A formação inicial de professores não é apenas mediadora do acessoaos conhecimentos relativos ao ensino, à organização da escola e àspráticas profissionais. É ela, igualmente, uma prática constitutiva daidentidade como leitor e como professor, mediada pelos gestos de

1. Estamos nos reerindo aqui a texto cientíco como um dos tipos mais ou menos estáveis deenunciados, componente dos gêneros discursivos que circulam em eseras de segunda ordem, ouseja, extrapolam a esera da cotidianidade, justamente pela sua orma mais elaborada (BAKHTIN,2003).

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leitura do formador. Aceitar essas considerações é aceder ao fato de quenovas contradições se evidenciam e colocam em questão as condiçõesde leitura possibilitadas nas relações sociais de ensino produzidas nocontexto escolarizado.

 Assumindo a centralidade da atividade discursiva, como princípiode pesquisa, propusemo-nos a compreender como os estudantes, com

quem atuamos, realizam suas leituras e como justificam suas não-leituras no processo em que se formam professores de leitura e deescrita. Para tanto, pautamo-nos nas enunciações desses estudantes,produzidas no cotidiano de nossas relações de ensino, entendendo-ascomo modos de significar e compreender a leitura.

Esse modo de focalizar a linguagem em funcionamento nas relaçõessociais é tributário das contribuições de Bakhtin. Segundo esse autor,aquilo que se enuncia e a compreensão do que se enuncia produzem-se em condições sociais específicas, na relação com outros discursos,na dinâmica da produção histórico-cultural. Dessa perspectiva, asenunciações são sempre dialógicas, isto é, são relações de sentido entreenunciados, constituídas nas relações dos sujeitos com o Outro, dalinguagem, da cultura, da tradição, da interação, da interlocução, enfim,o Outro das e nas relações humanas (BAKHTIN, 1988; 2004).

1. Os tempos para a leitura no curso universitário

Nas relações cotidianas de sala de aula, na disciplina de Fundamentosda Alfabetização do curso de Pedagogia de uma universidade estadualno sul do país, apreendemos três enunciações recorrentes, apresentadascomo justificativa pelos acadêmicos, para a não-leitura dos textospropostos por nós, suas professoras: falta de tempo, em face dasexigências do mundo do trabalho no qual estão inscritos (muitos

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alunos trabalham oito horas por dia); falta de tempo em face doscompromissos acadêmicos derivados do curso, em especial as provas ouos trabalhos avaliativos e falta de tempo em face do número excessivo detextos indicados para leitura pelo conjunto de professores do curso.

Essas justificativas mobilizaram nossas primeiras análises econsiderações. A ‘falta de tempo’ para a leitura e seus desdobramentos,

em nossa ótica, referem-se a argumentos de superfície, no sentidopragmático. Há algo mais profundo subjacente a esses enunciados quetem implicações no processo de formação de cada sujeito como leitor.

O tempo para ler não é uma questão de ordem estritamenteindividual. Essa categoria abstrata, ‘em nós entranhada’, éhistoricamente construída e culturalmente apropriada e elaborada nasrelações sociais vividas. Nesse sentido, discutir o tempo, na sociedadedo capital, exige focalizá-lo nas condições históricas de sua produção,tanto em sua relação intrínseca com a economia, na qual ele é vividocomo um tempo externo, que submete os indivíduos às formasaligeiradas, aceleradas e controladas de vivência das atividades, quantoem sua relação com a subjetividade, como tempo interiorizado, comsentidos distintos, como momentos de atividade, de repouso ou aindade reconstituição, como forma de auto-organização, como astúcias,como irreversibilidade e limite.

Significado, o tempo se faz visível nos modos como os sujeitosreferem-se a ele em seus enunciados, como possibilidades, comoirreversibilidade, como limite. Fala-se em perder tempo, ganhar tempo,economizar tempo, não ter tempo, viver o tempo... E, nesse sentido,merecem atenção, nas enunciações sobre o tempo, as categorias comque ele aparece articulado. Elas nos ajudam a pensar a formação e aleitura na formação na medida em que indiciam os modos como ossujeitos organizam-se e lidam com o tempo da sua formação, com o

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tempo do trabalho e da vida, como dialogam com seus conhecimentosprévios, com sua formação leitora, anterior à entrada no curso superior,e com os sentidos que permeiam a interpretação e a compreensão desuas leituras e o estabelecimento da articulação entre as diferentesdisciplinas que estão cursando.

Mas os sentidos do tempo também se fazem visíveis como

aproveitamento de momentos oportunos. Trata-se não necessariamentede criar, mas de aproveitar uma ocasião, aproveitar a oportunidade.Este é o tempo kairológico, da figura alada de Kairós, que se contrapõeà cronologia representada na figura do titã Cronos2. Considerar otempo nessas duas dimensões distintas é entendê-lo como mais doque uma grandeza matemática ou uma cronometria com a divisão esucessão das atividades durante um período, mas, também, é entendê-lo como laços, como tempo qualitativo e taticamente aproveitado nosmomentos oportunos.

Nos trabalhos de Agnes Heller (1991), sobre a teoria da vidacotidiana, encontramos contribuições significativas para a discussão daquestão do tempo. Segundo ela, o ritmo temporal não ‘caminha’ nem

 veloz, nem lento. Ele é intensidade e uma relação com a cotidianidadedo tempo histórico.

Cotidiano e história são, segundo Heller, dois grandes âmbitos da

atividade social em que se divide a vida humana. A vida cotidiana é

2. Cronos gura na mitologia como titã que tanto semeia quanto mata suas criaturas e seus lhosno transcurso do tempo. Alegoricamente Cronos é o semear, a agricultura, o tempo quanticado,medido, colocado em um contínuo onde toda criatura é substituída e substituída com pressa,tornando o tempo do uir, da velocidade, da exigência de um novo contínuo. Kairós gura namitologia como pessoa alada que se equilibra na corda e pinça ou echa a caça e colhe; ou comodeusa da ortuna. Alegoricamente Kairós é o laçar, o caçar, o espreitar o momento oportuno. É otempo da sagacidade e da astúcia, o tempo da intensidade, das dobras, do bordar. São os laços, asamarras kairológicas que dão intensidade e encadeiam os signicados no uir cronológico.

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Ivete Janice de Oliveira Brotto & Flávia Anastácio de Paula

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constituída a partir de três tipos de objetivações do gênero humanoque constituem a matéria-prima para a formação elementar dosindivíduos (objetivações genéricas em-si): a linguagem, os objetos(utensílios e instrumentos) e os usos. A vida não-cotidiana constitui-sepor objetivações humanas superiores (objetivações para-si): ciências,filosofia, arte, moral e política. O segundo âmbito tem sua gênese

histórica no primeiro. No entanto, “a linguagem é a única objetivaçãogenérica em si, na qual, junto com o sistema de signos primários,produziu também um sistema de signos secundários: a escrita”(HELLER, 1991, p. 289, tradução nossa).

O contato cotidiano entre os sujeitos constitui-se como base dasrelações sociais. Nele elaboram-se algumas categorias da formaçãohumana: a ação verbal, o jogo, os afetos, o espaço e o tempo cotidiano,as disputas e as satisfações. A formação dos indivíduos começa semprenas esferas da vida cotidiana. Esse processo de formação inicia nomomento de seu nascimento e inserção no universo cultural humanoe se estende por toda a vida (HELLER, 1991).

O indivíduo, na cotidianidade, aprende a manipular os objetos, osinstrumentos e utensílios de sua cultura, dos significados e sentidosdas categorias que ordenam as relações sociais, tais como o tempoe o espaço, da linguagem como forma básica de interação entre os

indivíduos de um determinado grupo. Essa apropriação é sempremediada, direta ou indiretamente, por um outro indivíduo, em relaçõessociais que também são apropriadas e elaboradas no processo mesmode seu acontecimento. A linguagem é mediada e instrumento deoutras mediações, seja ela oral ou escrita. Uma das relações mediadasno cotidiano são as relações temporais.

O sistema de referência do tempo cotidiano é o agora. A vidacotidiana, e não só ela, mas também a política, é repleta de presentes.

 Estudos em Educação e Linguagem

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O tempo cotidiano, assim como o espaço, caracteriza-se por serantropocêntrico.

Segundo Heller (1991), as experiências espaciais e as experiênciastemporais cotidianas só são influenciadas pelo desenvolvimento daciência quando esta produz possibilidades de ação. Assim, por exemplo,mesmo quem conhece bem a teoria da relatividade e os conceitos

científicos de tempo opera na vida cotidiana com conceitos temporaiscotidianos e estes não perdem o sentido de verdade, no sentido dosaber cotidiano. Os conceitos científicos de tempo servem aos sujeitospara irem em direção oposta às atividades não-cotidianas. Heller nãotraz o conceito científico de relatividade para a vida cotidiana, masfaz o inverso, eleva, em nível científico, um aspecto peculiar da vidacotidiana que é muito importante para ela: a experiência interiortemporal, isto é, o sentido da duração.

 As relações entre o âmbito da vida cotidiana e do não-cotidianoaportam elementos metodológicos interessantes para compreendermosa formação e a mediação através da leitura e a dialética das relaçõesentre teoria e prática como atividades constituidoras de um indivíduopelo Outro.

Como refere o psicólogo soviético Leontiev (1978), a constituiçãosocial da individualidade é, necessariamente, um processo mediado,

direta ou indiretamente, por outros indivíduos. O psiquismohumano estrutura-se a partir da atividade social e histórica de outrosindivíduos, ou seja, pela apropriação da cultura humana material esimbólica, produzida e acumulada objetivamente ao longo da históriada humanidade. Os objetos desse processo de apropriação, a saber,as objetivações produzidas pelo gênero humano, condensam em si,isto é, materializam trabalho humano, faculdades e aptidões humanasdesenvolvidas durante toda a história humana e se constituem em uma

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síntese dessa própria história. No caso de um estudante do curso dePedagogia, que vai se tornar professor alfabetizador e influenciar aformação do leitor, sua formação é tanto mediada por conhecimentose modos de leitura por ele vividos no decorrer de sua experiência,escolar e não-escolar, anterior ao seu ingresso no ensino superior,bem como pelos conhecimentos e modos de leitura possibilitados e

 vividos na graduação.Dessa perspectiva, os enunciados dos estudantes, coletados em

turmas de Pedagogia de dois campi diferentes, relativos à falta de tempo,indiciam os modos como os sujeitos organizam-se e lidam com o tempoda sua formação. Como valoram a formação, como lidam com o tempodo trabalho e da vida, como compreendem o ato de ler e sua formaçãocomo leitores, como significam suas experiências de leitura, anterioresao seu ingresso no curso superior, e com que sentidos elaboram essaprática cultural no curso das relações de ensino vividas na graduação. Taisenunciados não só carregam a espessura das experiências vividas por essessujeitos em relação à leitura, como também remetem a uma avaliação dopróprio processo de formação de professores que estão vivendo.

 Ao nos voltarmos para as enunciações-justificativas da falta deleitura, com essa visão ampliada pela compreensão mais aprofundadada noção de tempo, reconhecemos que elas deixam à mostra a ausência,

ao longo da vida escolar, de práticas leitoras condizentes com umtrabalho de/com leitura como princípio educativo, isto é, para a vidahumana. Quando dizemos isso, estamos nos referindo à leitura comointerlocução, relação com o Outro mediada pelo texto escrito, comoprática de compreensão.

Um trabalho educativo com leitura passa pelo conhecimentoprofundo a respeito do texto com que o professor universitário vaitrabalhar, o estabelecimento das relações daquele texto com a disciplina

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que ministra, com os outros textos já trabalhados na própria disciplinae com as outras disciplinas ministradas por outros professores. Ora,poder-se-ia pensar que isso é quase impossível, no entanto, comoprofessor universitário, pressupõe-se que o seu estar na academia foiprecedido de algumas etapas formativas que o tornaram (e tornam)um leitor mais profícuo. E, por isso, qualificado para estabelecer as

relações intertextuais necessárias, tentando minimizar a fragmentaçãodo conhecimento, que nem sempre foi didaticamente distribuído,ritmado e encadeado no currículo.

Diante dos enunciados literais dos estudantes, tais como - ‘dei umarápida passada de olhos’, ou ‘li apenas a introdução’, ou ‘li, mas, nãoconsegui entender nada’ - ou da atitude de alguns estudantes que,apesar de não lerem os textos indicados, procuram dar mostras deque o leram, recorrendo a suposições que lhes são sugeridas por seustítulos e subtítulos, cabe questionar o que se lê, como se lê, que Outrosemergem dessas e nessas leituras, constituindo o processo de formaçãoleitora e profissional do aluno.

Tais enunciações evidenciam que se leem fragmentos e que seconsideram, no âmbito das relações de formação, esses fragmentoscomo suficientes para fazer inferências sobre a temática discutida emum texto. A despeito da falta de propriedade desse pressuposto, a

leitura é significada, nesse tipo de relação, não como uma interlocuçãocom o texto, mas como uma resposta ao professor de que a tarefaescolar obrigatória foi feita, mesmo que parcialmente, ou contornadaatravés da simulação. O que se tem em vista, nesse movimento, sãoas regras avaliativas do processo escolar, que ainda prescindem decritérios bem definidos e concepções coerentes, primando mais peloreconhecimento do domínio (ou não) das formas utilizadas, do quepela compreensão do que foi lido de fato.

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 As escolhas do estudante entre o que precisa ler e as necessidadesmais emergenciais, resolver uma avaliação, por exemplo, levam-noa ler algo sem relacioná-lo com as demais leituras já realizadas e arealizar. A avaliação parece, ainda que equivocadamente, induzir aoentendimento de que a compreensão dos textos anteriormente lidospode ou precisa ser ‘excluída’, para que um outro saber ‘instale-se’,

até que outra necessidade emergencial apareça e se processe umaoutra ‘substituição’. Por exemplo, parece muito estranho aos alunosque na avaliação da terceira unidade da disciplina de Fundamentosda Alfabetização sobre diagnóstico da aprendizagem das criançastambém se ‘cobre’ a compreensão dos conceitos de primeira unidadesobre língua materna e da segunda unidade sobre as concepções dealfabetização.

Embora temas distintos, a leitura e a avaliação entrelaçam-se naescolarização, mediatizando a constituição de um tipo de formaçãoleitora em que não se realizam leituras conjugadas, compartilhadas,dialogadas intertextualmente.

Se não se produzem essas leituras, o processo de interação em sala deaula pode ficar prejudicado. O texto deixa de ser um ponto de encontroentre as experiências de leitura do estudante, seus conhecimentos, eos pontos de vista do autor, sob a mediação do professor. O saber do

autor do texto, o conhecimento ali sistematizado fica à mercê do modode apropriação e compreensão do professor universitário, quando estese expressa.

No entanto, a leitura do professor, ainda que autorizada socialmentepelo lugar que ocupa na relação de ensino, não é a única possível. Naausência da interlocução com e sobre o texto, a leitura do professortende a ser tomada pelo aluno como padrão único de leitura aceitável.

 Aliás, a situação ‘ler para ser avaliado’ contribui para que o aluno

 Estudos em Educação e Linguagem

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busque no professor os indicadores da leitura necessária à aprovaçãona disciplina cursada, reduzindo a compreensão da própria ciência edas teorias a que tem acesso a fragmentos formais, desconectados doreal e sua complexidade.

Esse modo de entendimento não é gratuito e revela uma compreensãodialógica já formulada em anos anteriores de escolarização, mediada

por uma grande tradição: teorias e práticas pedagógicas, metodologiasde ensino e de aprendizagem. Considerado o tempo de escolarizaçãoque compõe a experiência de um estudante de graduação, cumprelembrar que a redução da leitura à avaliação foi cronologicamenteaprendida e longamente consolidada, e que para romper tais sentidos,não basta que a intencionalidade dos formadores seja expressa apenasem seus planos de ensino, através das opções pelos conteúdos e pelabibliografia. O redimensionamento dos sentidos da leitura precisa sercompartilhado diuturnamente, ‘laçado’, com os alunos.

O estudante, no processo de formação em que se encontra, temque ser incitado constantemente a reconhecer e fazer as articulaçõesentre os diferentes objetos das disciplinas. Ou seja, entendemos queas articulações sejam algo a ser ensinado, orientado; não ficar apenasno subentendido, ou à espera daquilo que supostamente o estudantejá tenha desenvolvido, por exemplo, em um terceiro ano de curso de

graduação. De algum modo, trata-se de retomar o contexto dialógico,os discursos dos outros, as vozes outras, que constituem a compreensãoampliada de um tema. Este, conforme prenunciado por Bakhtin (2003),é entendido como muito mais do que a organização sintática daspalavras em orações, mas as circunstâncias sociais, o contexto histórico-cultural, as intencionalidades e os sentidos produzidos. É a retomadadesses elementos, mobilizada pelo professor universitário, que podeacionar uma atitude responsiva ativa pelo aluno – a compreensão

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temática. Em outras palavras, o restabelecimento da dialogia, das ‘vozes’já pronunciadas por Outros, podem possibilitar a melhor apropriaçãodo conhecimento em questão.

O ensino de um outro modo de ler não se limita às orientações paraque os alunos busquem a tese defendida pelo autor, os objetivos de suaescrita, seus argumentos, o caminho teórico-metodológico percorrido

e as conclusões a que chega o autor. Dificilmente as orientações em simesmas são identificadas e provocam reflexão na leitura do estudante.Carece antes da participação dos seus interlocutores imediatos, oprofessor universitário e os colegas de sala de aula. Especialmenteporque é na interação discursiva, na interlocução, que os sentidossão produzidos, e nessa relação, estes podem ser revistos, corrigidos,ampliados, refutados. Esse processo ideal de leitura tem sua realização,sua materialização assegurada, principalmente no contexto de umcurso de formação de professores, na medida em que se colocam parao debate os processos históricos, culturais, linguísticos e discursivos deconstituição de um tema. Estes que, por sua vez, constituem os índices

  valorativos dos sujeitos que analisam, avaliam, ponderam, enfim,produzem sentidos sobre esse mesmo tema/conhecimento.

Mais necessário torna-se esse encaminhamento se compreendemose aceitamos que a palavra sempre parte de alguém e se dirige a

alguém, e este, numa atitude responsiva, demonstra o que sabe,compreende, critica, reage; o que não pode ocorrer se o estudantenão cumpre com seu papel na relação de ensino. E, no que tange àtemática aqui abordada, significa que o aluno tem o compromisso dedesenvolver o seu trabalho de leitura com os textos definidos. Casocontrário, há equívocos de ambos, professor e aluno, na compreensãodo funcionamento da linguagem enquanto espaço de constituiçãohumana, logo, de interação social.

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 A leitura é prática, é exercício, é atividade necessária que o alunotem que realizar tanto para que o professor conheça o tipo de leiturarealizada, a compreensão responsiva que seu outro-aluno elabora, comotambém para assumir diante da compreensão explicitada, a retomadade elementos elucidativos e concernentes ao objeto em foco no textoe envidar novas investidas, ‘superiores’, para o trabalho de produção

de conhecimento de seu aluno.Nessas condições, considerar a “falta de tempo” para ler merece,

além da análise cuidadosa, encaminhamentos práticos no âmbitodas próprias relações de ensino produzidas na formação em nívelde graduação. Trata-se de reelaborar e aproveitar os ‘momentosoportunos’, conforme explicitam Certeau (1994) e Heller (1991),para produzir modos de leitura que possibilitem um tempo deconstrução de relações entre pessoas, formas e conteúdos. Reelaborar os‘momentos oportunos’ exige de qualquer professor uma compreensãotanto do seu objeto de ensino quanto do sujeito para e com quemmedia. Os ‘momentos oportunos’ dão-se a ver na conhecibilidade, namaleabilidade de retomar temáticas e situações e novamente encadeá-las. Na metáfora kairológica do uso do tempo, rebordando o tecido,repuxando a trama e a urdidura. Como fazê-lo?

  A essa pergunta, contrapomos outras: que tempos temos para

ouvir, conhecer, reconhecer e elaborar alternativas para os estudantescom quem convivemos? Que tempo temos para conhecer as escolhasdos estudantes? Nesses tempos, o que sabemos sobre as formas emque se produz a leitura dos nossos estudantes? O que sabemos sobreas ‘artimanhas’ de que lançam mão para ler e para não-ler? Comolidamos com elas?

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2. Um episódio singular e seus aprendizados

 Analisamos a seguir um episódio vivido por uma de nós.

No corredor das salas de aula uma aluna inquire: “Professora, qual

o texto para próxima aula?” Respondo pelo título do capítulo e nome

do autor. E em seguida completo: “Você vai tirar cópia?” “Nãoprofessora, eu não tiro mais cópias dos textos.” Perguntei: “Você vai

ler na biblioteca?” “Não! Eu descobri que se eu tiro cópia, o texto

acaba ficando para depois, depois, e eu não leio, assim, agora eu

peço a cópia emprestada de uma amiga. Como a amiga também

precisa ler para o dia da aula, eu tenho que ler, anotar e devolver 

a tempo dela ler. (abril de 2008)

No momento mesmo em que aconteceu o relato, o estranhamentopor ele suscitado foi tal que levou a professora a registrá-lo. Além disso,provocou a observação cuidadosa dos modos de ler daquela aluna eo acompanhamento sistemático de seu desempenho no decorrer dadisciplina, que é anual.

 Ao longo dos encontros, a estudante indiciava em sua participaçãooral que lera os textos programados para as aulas.

  Ao final da disciplina, como um dos elementos avaliativos, osestudantes deveriam entregar um relatório/caderno/diário dasanotações das aulas, das leituras realizadas e de observações que elesrealizaram, seja com crianças, nos estágios, ou em outras situaçõescorriqueiras de leitura e escrita na vida cotidiana que se tornaram

 visíveis e comentadas em aula. De maneira geral, os cadernos/diáriosdos estudantes eram muito parecidos. Entretanto, o caderno/diárioda estudante do relato acima destoava do conjunto. Em primeiro

lugar pelo volume. Era um destes cadernos bem grossos, quase todo

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preenchido, e nele constava o fichamento de quase todos os textos deleitura ‘obrigatória’ e outros complementares. Fichamentos elaboradosora com a redação da própria aluna, demonstrando que tivera, alémdo tempo para ler, o tempo para escrever sobre aquilo que lera, eoutros elaborados no formato de cópias de parágrafos ou itens dotexto original.

 A análise do material produzido no caderno/diário permitiu váriasobservações, análises e indagações. Uma condição que se destacou foia utilização, pela aluna, de uma forma de leitura antiga ou em desusoe em declínio na universidade: ler um texto de empréstimo e fazeranotações à mão sobre ele. Talvez este fosse um modo de ler maistípico antes do advento das fotocópias em que o comum era dirigir-seà biblioteca da universidade para tomar o livro público de empréstimo,fazendo-se apontamentos sobre ele e sobre a própria leitura. Essa práticadeu lugar às anotações, rápidas, feitas nas margens ou no verso dostextos fotocopiados.

Outra característica significativa do modo de ler dessa estudantefoi sua organização no tempo. De modo a devolver o texto tomado deempréstimo, antes do prazo da aula, ela necessitava ‘autodeterminar’ otempo (ELIAS, 1994). De certa forma, pela ausência do suporte físicodo texto, o modo de ler (ler e anotar) a quantidade (tentar ler todo o

texto) e o tempo/prazo de ler diferenciavam-na dos companheiros. A ausência da materialidade do suporte do texto movia a estudante paraque lesse e registrasse o lido ou sobre o lido com muito mais critériojá que os demais alunos munidos do suporte da fotocópia poderiamretornar a ela em caso de dúvida, para uma releitura, ou para terminara leitura em outro momento.

O principal questionamento a que esse episódio instiga-nos é:o que os modos de ler dos estudantes podem nos ensinar sobre as

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formas de conduzir a leitura nos processos de formação de professoresem um curso de graduação?

 A experiência temporal cotidiana, conforme nos lembra Heller,envolve indissociavelmente os aspectos temporais do limite, dairreversibilidade, do tempo vivido, que são tempos longos. Assimcomo a distribuição, o ritmo, a sincronicidade e a simultaneidade

e o aproveitar os momentos oportunos envolve aspectos temporaiscurtos. Para pensarmos o ensino-aprendizado na graduaçãopriorizamos, neste trabalho, o aspecto limite da experiência temporalcotidiana. O limite é, em outros termos, a duração limite ou amorte, o envelhecimento e a convivência com outra geração, isto é,um dos aspectos mais significativos da temporalidade humana. Foio que nos mostrou os gestos/atos de leitura da aluna do episódioreferido: seus modos de ler marcam a dialogicidade com outros:colegas, professores, autores, contexto imediato e mediato. Inclusiveestabelece o diálogo entre os modos de ler da tradição de grandetemporalidade e os da geração atual. Limites de longa temporalidadee limites de curto prazo precisam ser sincronizados, encadeados,cadenciados e auto-regulados. O aprendizado do uso destas relaçõestemporais coordenadas com o modo de ler distinguiu a estudante. Éo que nos permite ler Heller, quando afirma existir uma intrínseca

relação entre os limites da vida do indivíduo e os pontos-limiteshistóricos. Estes últimos periodizam o destino de uma interpretação,fixam o marco do seu desenvolvimento. No entanto, a densidadedesses pontos não é indiferente à conduta da vida cotidiana. “A nãoresignação à irreversibilidade por parte dos homens é um modo dereagir ao feito irreversível da finitude da vida, sua limitação [morte egeração], e isso se faz por projetos históricos que extrapolam a própria

 vida biológica.” (HELLER, 1991, p. 388).

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Uma relação com o limite é a consciência da falta de tempo, ou“o temor de perder para sempre o que não conseguiu obter hoje”(HELLER, 1991, p. 387-9). Assim, refletir sobre a formação deprofessores pode ser também uma oportunidade de pensar sobre otempo: a irreversibilidade, o tempo vivido, o limite. Como pode ser,também, o inverso, isto é, observar como a experiência do tempo

na totalidade das práticas pedagógicas é fundante no processode formação humana e profissional. Os aspectos temporais dassituações vividas no cotidiano ajudam a fazer, desfazer e refazer asexperiências, bem como ajudam a analisar as práticas educacionaise outros processos de formação de professores.

Referências bibliográficas:

BAKHTIN, Mikhail. Questões de estética e literatura: a teoria doromance. São Paulo: Hucitec, 1988.______. A estética da criação verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes,2003.______. (VOLOCHINOV). Marxismo e Filosofia da Linguagem. 11.ed. São Paulo: Hucitec, 2004.

CERTEAU, Michel.   A Invenção do Cotidiano: artes do fazer.Petrópolis: Vozes, 1994.ELIAS, Nobert. Sobre o tempo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.HELLER, Agnes. Sociología de la vida cotidiana . Barcelona: EdicionesPenínsula, 1991.LEONTIEV, Alexei. N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa:Livros Horizonte, 1978.

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O texto literário e o trabalho

com a compreensão em livrosdidáticos de português

Thaís Ludmila da Silva RanieriFSM – PPGL/UFPE – [email protected]

RESUMO: Acreditando que há ainda muito que se investigar no campoda compreensão e que os textos literários ainda carecem de umamaior atenção no espaço didático, a presente investigação tem porobjetivo azer uma análise das questões de compreensão propostaspara o trabalho com o texto literário em livros didáticos do EnsinoFundamental 2. Para tal, recorremos à tipologia proposta por Marcuschi(2004) e as discussões sobre a escolarização do texto literário em Soares(2006) e Chiappini (2005).

PALAVRAS-CHAVE: compreensão, texto literário, livro didático.

ABSTRACT: Believing that there is still much to investigate in the eldo understanding and literary texts that stil require more attentionin the educational space, this research aims to analyze the issueso understanding proposed to work with the literary text in booksteaching o Ensino Fundamental 2. We rely on the typology proposedby Marcuschi (2004) and discussions on the education o the literarytext in Soares (2006) and Chiappini (2005).

KEYWORDS: comprehension, literary text, textbook.

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 Apresentação

Há certo tempo, contamos com uma diversidade de pesquisasque visam às questões de compreensão em livros didáticos de línguaportuguesa (LDP). Procurando contribuir com as discussões jáexistentes, o presente trabalho propõe-se a investigar o tratamento dado

aos textos literários nos manuais didáticos. Em nosso caso, focamosespecificamente às atividades de compreensão que envolvem taistextos. Para tanto, partimos do pressuposto de que o texto literário,como qualquer outro texto ao chegar à instância pedagógica, assumecaracterísticas distintas de seu domínio discursivo. Por sua vez, asatividades em que estão envolvidos são previamente planejadas pelosautores das coleções (MARCUSCHI, B; 2007), que levam em contaesse processo de didatização. Tendo em vista esses pontos, buscamosinvestigar se as questões de compreensão elaboradas para seremtrabalhadas com esses textos exploram os aspectos literários e estilísticosque são intrínsecos a eles. Posto assim, para a composição do corpus,selecionamos os volumes 2 e 3 da coleção didática Tudo é linguagem.

Na coleção, selecionamos uma sequência didática de cada volume quetrabalha um gênero textual específico da literatura, em nosso caso oconto e o poema. Para isso, tomamos como parâmetro a tipologia

proposta por Marcuschi (2004), além das discussões que envolvemo trabalho com o texto literário em sala de aula (CHIAPPINI, 2005;SOARES, 2006). Sendo assim, pretendemos investigar, também, seexiste uma diferença entre o tratamento dado ao texto literário emrelação aos textos de domínios discursivos distintos, ao que tange àsquestões de compreensão.

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1. Referencial teórico

Como pressuposto para todo trabalho em Linguística, faz-senecessário uma discussão acerca da concepção de língua e, em nossocaso também, de texto que subjaz a pesquisa. Posto assim, as discussõesque serão apresentadas tomam por base as concepções de língua e de

texto tal como propostas pela perspectiva sóciocognitiva de estudosda linguagem.

 Ao tomar os posicionamentos teóricos expostos por essa área, a visão de língua adotada considera a sua perspectiva funcionalista, nãonegando, no entanto, a sua organização sistêmica. “Esse ponto de vista

implica uma noção de língua que não se esgota no código, nem em um sistema

de comunicação que privilegia o aspecto informacional ou ideacional. A língua

não é um simples instrumento de transmissão ou de informação” (KOCH,MARCUSCHI, 2006, p. 382). Assim, uma vez que a noção de línguanão será tomada apenas como um sistema, destacamos também asquestões referentes aos contextos de uso e de produção bem como ossujeitos envolvidos no processo interacional. Portanto, abraçamos aconcepção de língua tal como concebida por Marcuschi (2004b, p. 29),que a vê como conjunto de práticas sociais e cognitivas historicamentesituadas. Buscamos, também, a visão de Koch (2003) que tem a

língua como uma atividade sociocomunicativa. Essas concepções sãoreforçadas com a visão defendida por Silva (2002, p. 182), quandoafirma que “a língua é uma forma de ação de um para com outro, uma ação

entre aquele que produz e aquele que recebe e vice-versa”.Por conseguinte, uma vez exposta a concepção de língua que orienta

as reflexões que serão feitas, faz-se necessário apresentar a concepçãode texto assumida no presente trabalho.

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Distante das antigas concepções em que a unidade textual semostrava como um produto acabado, a perspectiva sociocognitivaadota um enfoque em que o texto é visto como produto da ação verbal.Sob essas condições, “os textos são entidades comunicativas verbalmente

realizadas e não entidades lingüísticas que adicionalmente possuem um caráter 

comunicativo” (SCHIMDT apud JUBRAN, 2006). Visto sob essa ótica,

o texto ao ser trabalhado congrega princípios teóricos de áreas como aPragmática, a Linguística Textual e a Análise de Conversação.

Essa posição nos conduz a olhar para a unidade textual dentro desituações concretas de uso da língua, uma vez que somente sob essascondições conseguimos arcar com as especificidades das interações

 verbais, tais como o contexto de produção e de recepção (no casodos textos escritos), os sujeitos participantes e os elementos de ordemoutras ordem semióticas, isto é, todas as questões pertinentes aoprocesso da interação verbal. Koch (2003, p. 17), afirma que “há lugar,

no texto, para toda uma gama de implícitos, dos mais variados tipos, somente

detectáveis quando se tem, como pano de fundo, o contexto sociocognitivo dos

participantes da interação”.

O caso do texto literário

Sem precisar fazer uma investigação mais aprofundada, percebemosque os textos literários têm um lugar cativo nos livros didáticos delíngua portuguesa. Até certo tempo atrás, era praticamente o único tipode texto que circulava nas aulas de língua, visto que o texto literário,em vários momentos, foi visto e associado com a ideia do bem fazere com a estética do belo, tal como aconteceu no fim do século XIX aqui no Brasil. (CHIAPPINI, 2005). No entanto, desde a década de 90com a criação do PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) de Língua

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Portuguesa e com as contribuições teóricas vindas das discussões sobreGêneros Textuais, o texto literário passou a disputar espaço com textosde outras instâncias discursivas, sem, contudo, perder o seu status. Valeressaltar a afirmação que se encontra no PCN de Língua Portuguesa,quando defendo o trabalho com os textos literários, acompanhe:

  A questão do ensino da literatura ou da leitura literáriaenvolve, portanto, esse exercício de reconhecimento dassingularidades e das propriedades compositivas que matizamum tipo particular de escrita. Com isso, é possível afastaruma série de equívocos que costumam estar presentes naescola em relação aos textos literários, ou seja, tratá-loscomo expedientes para servir ao ensino das boas maneiras,dos hábitos de higiene, dos deveres do cidadão, dos tópicos

gramaticais, das receitas desgastadas do “prazer do texto”,etc (1998, p. 30).

Como afirma Chiappini (2005) hoje precisamos rever o conceito deliteratura, uma vez que não pode ser adotado o mesmo do século XIX.Desse modo, para superá-lo e ampliá-lo, é preciso passar por dentrodele, passar pelo próprio texto. Posto assim, veremos como a escolarecebe o texto literário e trabalha com ele.

 Ao assumirmos uma concepção de língua e de texto pautada numaperspectiva interacional e sociocognitiva, caminhamos para umadiscussão que nos faça ver o texto como produto social e dialógico.No caso do texto literário, mais uma vez Chiapini (2005, p. 245) nosmostra que, dentro da Teoria da Literatura, “há teorias que enfatizam

o texto, outras que enfatizam sua relação com o social, umas que acentuam

a relação da obra com seu processo de produção e com seu autor, outras, com

sua recepção, seus leitores”. Essas perspectivas nos apontam que não

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há uma única forma de lidar com o texto literário, ou melhor, que épossível lidar de maneiras diversificadas com ele. Consequentemente,o trabalho em sala de aula ganha uma gama de possibilidades queultrapassa uma perspectiva meramente formal, como se tem visto emgrande número em propostas de atividades dos livros didáticos dePortuguês para então, adotar uma posição de base interacional que

privilegia os espaços de circulação, como também a relação autor-leitor.Para isso, o texto literário sofre algumas adaptações até chegar à salade aula, conforme veremos abaixo.

É inegável que o saber que chega à escola passa por um processode transformação para atender as necessidades desse espaço. Nodecorrer desse processo, o conhecimento científico é modelado esistematizado, visando uma organização bem própria do espaço escolar.O conhecimento precisa ser ajustado ao tempo escolar, à divisão emséries e à unidades. Não sendo diferente, percebemos que o textoliterário também recebe uma nova roupagem, isto é, também sofrealterações para se adequar ao domínio da escola. Nesse processo deescolarização do texto literário, Soares (2006) aponta quatro aspectosimportantes:

• a questão da seleção de textos: gêneros, autores e obras;

• a questão da seleção do fragmento que constituirá o texto aser lido e estudado;

• a questão da transferência do seu suporte literário para umsuporte didático, a página do livro didático;

• a questão das intenções e dos objetivos de leitura e estudodo texto.

 Em nosso caso, chama-nos a atenção o primeiro e último ponto,

a seleção de textos e as intenções e os objetivos da leitura. No caso

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do primeiro aspecto, de modo geral, há uma grande recorrência aosgêneros literários da narrativa (conto, novela e romance) e poema. Aindase mostra pouco presente a presença de outros gêneros literários comoa epístola, a biografia e a peça teatral. Paralelamente, a escola aindaprioriza uma coletânea de obras e autores que são considerados modelospara o bem escrever, colocando de lado autores contemporâneos ou

de matizes regionais. Já ao que se refere ao quarto aspecto, a questão parece ser ainda

mais deficitária. Não há uma proposta clara do trabalho com os textosliterários, principalmente nas turmas do ensino fundamental. No casodo trabalho com a leitura, observamos que não há um espaço paraa leitura do texto em sala de aula e, muito menos, uma orientaçãoadequada do professor para se fazer esse trabalho.

Os LDP’s ficam longe de um trabalho que vise à percepção daliterariedade do texto e de seus recursos expressivos e estéticos. ParaSoares (idem), os manuais didáticos se preocupam mais com asinformações veiculadas do que o modo como são veiculadas, uma vezessa parece ser uma das principais características entre textos literáriose não-literários.

Discutindo compreensão

  Já está bem discutida a ideia de que ler é decodificar. Estudosrecentes vêm mostrando que a noção de leitura se associa à noçãode compreensão, assim, pode ser dizer que, ler é compreender. Vistasob essas condições, a leitura deixa de ser uma atividade isolada, paraentão ser vista como uma atividade social e interacional, vinculada acontextos sociais e culturais. Para Marcuschi (2004, p. 143),

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a compreensão não é uma atividade natural e nem umaherança genética nem uma ação individual isolada do meioe da sociedade em que vive. Compreender exige habilidade,interação e trabalho. Compreender não é uma ação apenaslingüística, mas é muito mais uma forma de inserção e um modode agir sobre o mundo na relação com o outro.

Podemos afirmar que “a compreensão é também um exercício de

convivência sócio-cultural” (MARCUSCHI, 2004, p. 144). Paralelamente,Kleiman (2004), considera o processo de compreensão uma atividadeinterativa em que o leitor ativará seus conhecimentos com os do texto,gerando, por sua vez, um novo texto. A compreensão de um texto não seesgota somente no lingüístico. Ela é fruto de uma atividade social, uma

 vez que, para a sua realização, faz-se necessária a participação de fatores

socioculturais e cognitivos. Sob essas condições, a leitura passa a ser vistacomo uma ação solidária e coletiva no seio da sociedade. Para Koch(2002, p. 46), durante o processamento textual “os usuários da língua

realizam passos interpretativos finalisticamente orientados, efetivos, eficientes,

 flexíveis, em vários níveis simultaneamente”, para processar a informação.Trazendo a discussão para o espaço didático, percebemos que

os livros ainda desenvolvem questões de compreensão que pouco

exploram os aspectos discursivo-cognitivos dos textos. Ainda há umapredominância de questões tipo “a cor do cavalo branco de Napoleão”,em que as perguntas são autorrespondidas ou de perguntas quefocalizam a localização de informações no texto, sem ter um objetivoexplícito com essa busca de informação (MARCUSCHI, 2004). Aofazer uma categorização das perguntas, Marcuschi nos apresenta aindaoutros tipos de questão de compreensão em sua pesquisa: questões tipocópias, objetivas, inferenciais, globais, subjetivas, vale-tudo, impossíveis,

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metalingüísticas. De modo geral, o nome dado às questões já anunciamas suas intenções.

No caso do trabalho com o texto literário, a situação parece ser maisgritante. Ainda que esse tipo de texto apresente características distintas,podemos afirmar que, de modo geral, o tipo de questão apresentadaacima é a mesma utilizada para se trabalhar com os textos da literatura.

Não há distinção entre um e outro tipo de texto. Ainda que algunsautores anunciem as suas especificidades, tal como Soares (2006, p. 43),

os objetivos de leitura e estudo de um texto literário sãoespecíficos a este tipo de texto, devem privilegiar aquelesconhecimentos, habilidades e atitudes necessários aformação de um bom leitor de literatura: a análise dogênero do texto, dos recursos de expressão e de recriação

da realidade, das figuras autor-narrador, personagem,ponto de vista (no caso da narrativa), a interpretação deanalogias, comparações, metáforas, identificação de recursosestilísticos, poéticos, enfim o estudo daquilo que é textual edaquilo que é literário.

Posto assim, passaremos para a análise em que confrontaremos asreflexões teóricas com os dados coletados.

2. Metodologia e análise dos dados

O corpus foi construído a partir de uma seleção das unidades de umacoleção didática. A coleção selecionada foi Tudo é linguagem aprovadapelo PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) de Língua Portuguesaem 2008. Para compor o corpus, foram selecionados os volumes 2 e 3

da coleção e de cada um foi escolhida uma unidade programática. No

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caso do volume 2, escolhemos a unidade 1 que trabalha com o gêneroconto. E no volume 3, selecionamos a unidade 7 que apresenta umtrabalho com o gênero poema. Para a análise, apresentaremos uma

 visão geral de cada unidade e, em seguida, os comentários críticos.

 Análise das unidades

O momento da compreensão na coleção Tudo é linguagem

  A primeira atividade de trabalho proposta pela unidade é aatividade de compreensão. O livro apresenta como Interpretação do

texto – Compreensão inicial. Nessa atividade, o aluno se depara comoutro subtítulo  Atividade escrita, anunciando que as respostas devemser escritas no caderno. Geralmente os autores propõem uma média

de 7 a 10 perguntas referentes ao texto que abre a unidade. Em algunsmomentos, também é proposta uma atividade de compreensão paraser respondida oralmente –  Atividade oral. Nesse caso, não se tratade questões de compreensão a serem respondidas oralmente, mas deoralização do texto escrito.

 V olume 2 – unidade 1 – o gênero conto

Nessa unidade, o livro traz para os alunos o conto  A aranha deOrígenes Lessa. O conto é apresentado completo seguido da referênciabibliográfica e de um breve quadro com informações sobre o autorno fim da página. È interessante notar a presença, perto do títulodo texto, da capa do livro onde o texto foi publicado. Há tambémilustrações feitas exclusivamente para o conto ao longo da narrativa.De modo geral, as ilustrações apresentam as personagens, imagens do

elevador e de uma aranha.

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 45

Em seguida, é aberta a atividade de compreensão (Compreensão

inicial – Atividade escrita) e inicia-se a sequência de perguntas. No total,são 9 perguntas de compreensão. Algumas têm mais de uma perguntapor quesito, tal como as questões 1 e 2.

 A questão 1 e 2 buscam obter informações sobre o narrador e ospersonagens. Para isso, os autores constroem 5 questões para o primeiro

quesito e 6 questões para o segundo. As questões de modo geral buscamobter informações sobre o enredo do conto, o papel de cada elementoda narrativa, o espaço e as características das personagens. São feitasperguntas que levam o aluno a localizar as informações pontuaisno texto. De modo geral, as perguntas parecem querer confirmar serealmente o aluno leu o conto, visto que muitas perguntas de localizaçãoapenas pedem que se busquem um ou outro elemento no texto. Muitas

 vezes sem ser necessário, para que se responda, fazer a leitura do texto.Nesse caso, parece haver uma preocupação dos autores da coleção emgarantir que o texto tenha sido lido. Paralelamente, indica tambémuma preocupação em ajudar o aluno a organizar as informações dotexto. Há, em algumas perguntas, a preocupação em identificar algunselementos da narrativa: personagens, narrador, espaço e tempo.

 Veja:

1. Numa história, uma personagem quer convencer o narrador,que também é personagem, a escrever um conto sobre um casoacontecido.a. Quem é a personagem que quer convencer o narrador a

escrever o conto?b. Onde acontece a conversa entre eles?c. Que motivo o narrador alega para não ouvir o caso?d. O que acontece que possibilita a personagem contar sua

história?e. Qual é a história que a personagem insiste em contar para virar

um conto?

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2. A outra história dentro do conto é aquela que Enéias sugere quese transorme em conto.a. Quem são as personagens principais dessa outra história?b. Quais as características do Melo apontadas pelo contador?c. Onde se passa essa história?d. Como é caracterizado o lugar?e. Quando se passam as ações nessa outra história?. O que acontece nessa história?

  Ainda que, à primeira vista, esse tipo de pergunta parece serdescartável no trabalho de compreensão, é interessante salientar a suaimportância, quando bem conduzida, como se dá acima. Não se trata desó localizar onde e o quê no texto, mas de sistematizar as informaçõesdo texto. Muitas vezes os alunos não conseguem autonomamentereconstruir o enredo do texto e acabam por confundir a sequência de

fatos nas narrativas. No caso do conto A aranha

, a atividade se mostranecessária, pois o conto também aborda o processo de criação de umconto, isto é, apresenta uma temática metalingüística.

 Além desse tipo, encontramos também questões de cópias. Nessecaso, não há um trabalho que explore a compreensão do texto em si,mas, chama a atenção, para se tentar trabalhar o adjetivo como recursode construção das personagens. A questão se perde, quando só orientao aluno a copiar e não propõe uma reflexão a mais sobre como essas

características. Observe:

“3. A aranha é vista na história de duas maneiras: como um bichoameaçador e como um bicho companheiro, com comportamento quasehumano. Copie do texto palavras que caracterizam cada um dessesmodos de ver a personagem”.

 Já a questão 4, O que fez com que a aranha, a principio considerada monstruosa, passasse a ser distração e a companheira de Melo?,

pode ser classificada como inferencial, uma vez que o aluno necessita

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recorrer ao seu conhecimento de mundo para entender a mudançasofrida pela aranha. Da mesma forma, como acontece com a 6 No finaldo conto, sob o ponto de vista de Melo, a aranha é “uma velha amiga”.E do ponto de vista do visitante, o que a aranha representa?

Nessas duas, o livro pouco explora a construção estilística do contoou o processo de construção do conto que é uma das temáticas do

enredo do texto trabalhado. As questões mostram outras preocupaçõesque não são impertinentes, mas que deixam em segundo plano asespecificidades do texto literário.

 A questão 5 pode ser classificada como uma questão metalingüística, visto que objetiva analisar os recursos de coesão construídos com o usodo pronome ela. No entanto, a questão também busca olhar para osefeitos expressivos da forma como o pronome se apresenta. Observe:

À medida que o Melo e a aranha vão icando companheiros, apersonagem Enéias vai mudando a orma de se reerir a ela. Compare ouso do pronome ela nas rases do texto:

I. “Para ver se ela voltava. E voltou.” (linha 102)II. “Queria saber se ‘ela’ voltava”. (linha 128)III. “Era Ela, com E grande ...” (linha 152)

No exemplo 1, o uso de ela é comum: o pronome está empregado para

substituir “a bicha”. Explique o uso das aspas no exemplo II e o empregoda palavra Ela, com inicial maiúscula, no exemplo III.

Tal como propõe Soares (2006), a questão busca explorarestilisticamente o uso do pronome Ela , uma vez que, seu uso nessecontexto, não está sendo evidenciado somente como um elemento dearticulação textual. O uso do pronome, nesse trecho do conto, retomaa palavra aranha, ao mesmo tempo em que reconstrói discursivamente

a palavra aranha que no texto apresenta valores bem particulares.

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Da mesma forma, busca-se trabalhar na questão 7. O autor nessaquestão explora os adjetivos, os verbos e o grau aumentativo, comorecursos expressivos na construção do gênero conto. Fica evidente ouso das classes de palavras como elemento importante na construçãoda narrativa. Acompanhe:

Observe com atenção os adjetivos, os verbos e o aumentativo usadosnesta rase:

“E num salto violento, (...) caiu sobre a aranha, esmagando-a com osapatão cheio de lama.”

Agora, copie em seu caderno a rase seguinte completando-a com aalternativa que achar mais adequada;

Do modo como é narrada essa passagem do texto, o que se pretendemostrar é:

a. a situação de ragilidade da aranha.b. a situação de perigo vivida pelo visitante.

Salienta-se, no entanto, que a questão, ainda que busque exploraros recursos literários do conto, se perde por não levar o aluno a observaras características da aranha. O aluno é levado a responder, de acordo

com, a visão do autor do livro que se limita a duas opções. Ou uma ououtra está certa. Além disso, o uso estilístico das classes trabalhadas sóé brevemente comentado. A atividade não conduz o aluno a percebero uso das flexões como algo que particulariza e singulariza o uso daforma lingüística nos textos literários.

Por fim, as questões 8 e 9 voltam a explorar outros pontos do texto,deixando, mais uma vez de lado, os aspectos literários. Assim, seguindo

a tipologia proposta por Marcuschi (2004), podem ser classificadas

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como subjetivas, uma vez que não há como confrontar o que será tidocomo resposta com as informações do texto. A resposta fica a critériodo aluno, sem que se precise voltar ou se basear no texto, para obtê-la.

 Acompanhe:

8. Releia:

“E vocês não imaginam o desapontamento, a humilhação com que eleouviu toda essa história que eu contei agora...”Por que o visitante cou desapontado e humilhado ao ouvir a históriada aranha?

9. O texto começou com uma pergunta: “Quer assunto para umconto?”Depois de ter lido a história da aranha que apreciava música, quala sua opinião? Esse oi um bom assunto para um conto? Por quê?

 V olume 3 – unidade 7 – o gênero poema  

Nessa unidade, o gênero poema é o grande destaque. O próprionome da unidade  Agora... poemas revela a quase que exclusividadede textos poéticos presentes por toda a unidade. Logo de cara, osautores apresentam dois textos para as atividades de compreensãotextual, mas cada um com questões próprias. Em seguida, há umtrabalho de comparação entre os dois poemas. Para a análise em

questão, no entanto, selecionamos o segundo O tempo é um fio deHenriqueta Lisboa.

 Ao que se refere ao trabalho com a poesia, Soares (2006) apontapara a exploração da metáfora como recurso da construção do texto. Eé exatamente com essa proposta que os autores iniciam as atividades decompreensão que pode ser vista nas atividades 1 e 2. Nessas atividades,os autores exploram a relação tempo e fio e a ideia do verbo tecer quepossibilita uma diversidade de sentidos.

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1. No poema o tempo é denido por meio de uma metáora, isto é,uma comparação implícita. Recorde a dierença entre metáora ecomparação.

O tempo é um o. → O tempo é como um o.↓  ↓

metáora comparação

a. Observe o esquema a seguir:

Tempo Fio

Qual é idéia que pode ser comum a tempo e a o?

b. Copie do texto outras palavras ou expressões que reorçam a idéiaapontada por você no item a.

2. Tecer siginica entrelaçar os para ormar tecidos, redes, esteiras,cestos; o mesmo que trançar. O eu poético az um apelo: “Tecei! Tecei!”,provavelmente para que se aproveite o o do tempo. Indica comoaproveitar o tempo por meio de metáoras. Observe o esquema:

O que, provavelmente, essas metáoras indicam em relação aoaproveitamento do tempo? Transcreva em seu caderno as alternativas

que podem traduzir essa idéia:

Tecei

rendas de bilro com gentileza

ranças espessas com mais empenho→ carregam rutos

malhas e redes com mais astúcia → apanham peixes

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a. Aproveitar o tempo produzindo algo útil, delicado.b. Aproveitar o tempo azendo algo que gosta.c. Aproveitar o tempo com trabalhos que dêem dinheiro.d. Aproveitar o tempo com ações que dêem bons resultados.

No entanto, as questões seguintes se detêm a simplesmente exploraros recursos gramaticais da poesia, com pouca reflexão sobre esses

recursos na construção do texto poético. Veja:

3. Releia o esquema da atividade anterior e copie os adjuntos adverbiaisde modo que estão conerindo atributos ou qualidade às ações para seaproveitar melhor o tempo. Explique-os.

Ou tratam de questões subjetivas ou de localização de informação:

4. Na sua opinião, por que haveria necessidade dessas qualidades para

melhor aproveitar o tempo?5. O tempo perdido é comparado com o quê?

 Agora, observamos mais uma vez a exploração da construção dotexto poético, como acontece na questão 6:

6. O verso “Mas ainda é tempo!” está bastante destacado, pois ele sozinhoorma uma estroe. Qual seria a razão desse destaque?

Nessa atividade, os autores chamam a atenção do aluno para aconstrução da estrofe. Todo o poema apresenta estrofes com mais deum verso, no entanto, ao se chegar ao fim da poesia é apresentadouma estrofe construída com um verso só.

 Já o último quesito, se distancia da proposta das primeiras questões.Percebemos que as questões não podem ser tidas como questõesde compreensão. Estão mais para questões de análise lingüística. A 

preocupação delas é com a reflexão sobre o uso do sistema lingüístico.

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Observe:

7. Releia a última estroe:“Soltai os potrosaos quatro ventos,mandai os servosde um pólo a outro,

vencei escarpas,dormi nas moitas,voltai com o tempoque já se oi!...”

a. Por meio de que palavras percebemos que a última estroe tambémé um apelo?

b. Qual é o sujeito a que se reerem os verbos dessa estroe?c. Nessa estroe o eu poético parece azer um apelo nal convocando o

sujeito a ações mais intensas, mais ortes, mais contundentes. Dessasações, transcreva a que indica:

• sacriício;• desao.• orça.• usar todos os recursos.

d. No primeiro apelo eito ao sujeito (segunda estroe), a ênase é dadaà ação de tecer, para prender o tempo.

E para aproveitar o tempo que ainda resta, o que deve ser eito?e. Na segunda estroe o eu poético az um apelo para que se aproveite o

tempo, usando o verbo tecer no presente. Já nos dois últimos versoso apelo é dierente, pois há um verbo no pretérito:

“voltai com o tempoque já se oi!...”

Na sua opinião, o que pode signicar esse verbo nal do poema?

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Conclusão

 Ainda que o texto literário tenha um espaço privilegiado na sala deaula, percebemos que, muitas vezes, o trabalho que se é proposto deixaa desejar. No caso da compreensão, que foi o objeto de investigação dotrabalho, pudemos ver que os textos literários são tratados com poucas

diferenças em relação aos textos de outros domínios discursivos. Nãoestamos aqui panfletando uma supervalorização do texto literárioem detrimento aos demais tipos de textos, mas buscamos trazer aimportância de sua presença no espaço escolar. Enfatizamos que épapel da escola fazer uso e tomar para si a obrigação de oferecer acessoaos textos da literatura, bem como de apresentar propostas de trabalhocondizentes com o processo de produção deles. Isso nos levar a pensarem um dos aspectos apresentados por Soares (2006) que trata dosobjetivos do estudo desse tipo de texto na escola. Assim, quais sãoas intenções e os objetivos que se têm em mente ao recorrer ao textoliterário como objeto de estudo nas aulas de Língua Portuguesa? Essaparece ser a grande pergunta.

Nas atividades analisadas, vimos propostas que buscam atenderas especificidades do texto literário. Vimos questões que buscavamexplorar os aspectos estilísticos presentes nesse tipo de texto. Explorar

a estrutura dos gêneros da literatura trabalhados, analisar os elementosda narrativa. No entanto, temos, na mesma coleção, questões queusam o texto literário como pretexto para se fazer análise lingüística.O interessante é que essas atividades foram encontradas no espaçodestinado ao trabalho com a compreensão textual. Aqui surge outrapergunta: está claro para os autores dos livros didáticos e para nósprofessores, o que é o trabalho com a compreensão?

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 A resposta parece ser não. Na análise, pudemos acompanhar umaproposta de trabalho com o gênero poema. As últimas perguntas nem sequer foram classificadas de acordo com a tipologia de Marcuschi (2004),uma vez que não se tratavam de questões de compreensão. Não eramboas ou ruins, não eram, no entanto, questões de compreensão.

  As questões aqui levantadas não pretendem pôr em cheque a

autoria da coleção ou coisa parecida. Buscamos ver os pontos positivose os que precisam ser revistos, no intuito de levantar reflexões quecaminhem para auxiliar o trabalho do professor em sala de aula.

 Assim, longe de ser um trabalho conclusivo, pretendemos com estainvestigação chamar a atenção para o trabalho com a compreensãoe, em especial, para o texto literário, mostrando que há ainda muitacoisa a ser investigada.

Referências bibliográficas

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l  55

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O TEXTO LITERÁRIO E O TRABALHO COM A COMPREENSÃO EMLIVROS DIDÁTICOS DE PORTUGUÊS

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O ensino de literatura e

a formação de leitores literários:o que dizem os PCN e as

orientações curriculares para

o ensino médio

Rosivaldo GomesUNIFAP – [email protected]

 Josenir Sousa da Silva UNIFAP – [email protected]

RESUMO: Neste texto apresentamos algumas reexões a respeito decomo é apresentada a noção de texto literário em dois documentos

ociais, mais especicadamente, nos Parâmetros Curriculares Nacionais(1998) e nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006).Expomos também discussões de teorias que discutem as práticas deensino/aprendizagem de literatura no ensino médio e a questão daormação de leitores literários na escola.

PALAVRAS-CHAVE: ensino, práticas de leitura, texto literário.

RESUMÉ: Dans cet article nous présentons quelques réexions sur la açondont est présentée la notion de texte littéraire dans deux documentsofciels, notamment les Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) et lesOrientações Curriculares para Ensino Médio (2006). Nous présentonségalement des discussions théoriques en discutant des pratiquesd’enseignement/apprentissage de littérature dans l’enseignementsecondaire bien que la question de la ormation de lecteurs littérairesà l’école.

MOTS-CLÉS: enseignement, pratique de la lecture, textes littéraires.

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Introdução

Ler implica troca de sentido não só entre o escritor e o leitor,mas também com a sociedade onde ambos estão localizados,pois os sentidos são resultado de compartilhamentos de visões de mundo entre os homens no tempo e no espaço

(COSSON, 2006, p.27).

 Atualmente é possível documentar uma série de transformaçõese mudanças que as instituições governamentais de ensino têmempreendido a favor de uma escola mais formadora e eficiente emrelação a seus objetos de ensino. Tais ações, apesar de todos os limites,estão acontecendo tanto na área de formação e capacitação dosprofessores como em outra, não menos significativa, a das avaliações

(ANTUNES, 2003, p. 21).De acordo com Barros-Mendes (2005), reconhece-se que tais

mudanças não ocorreram de uma hora para outra, mas graças, aosgrandes avanços das ciências da aprendizagem e das ciências dalinguagem, bem como a (re)configuração que está ocorrendo comos currículos de formação de professores desde a década de 60, eas próprias exigências sociais que impõem a revisão de paradigmas

(BATISTA, 2003).Essas mudanças que têm caráter interdisciplinar fizeram com queas investigações sobre leitura passassem a discutir com maior ênfasea interação que existe entre autor-texto-leitor (KOCH & ELIAS,2009), ou seja, nesse processo, o sentido de um texto é construído nainteração texto-sujeitos. Assim, partindo-se desse viés, a concepção deleitura vigente concebe esse processo como “uma atividade interativaaltamente complexa de produção de sentidos” (KOCH & ELIAS,

2009, p. 11).

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l  59

Para Koch (2005), nessa perspectiva interacional - dialógica, o leitorpassa a exercer papel de grande importância, deixando de ser pacientepara tornar-se agente desse processo de construção de sentidos. Dessemodo, o ato de ler passa a ser compreendido como um processamentocognitivo complexo de informações que são produzidas pelo leitor-produtor na sua interação com o autor-produtor, mediada pelo texto.

No que diz respeito à questão do ensino de literatura e a prática daleitura, incluindo-se nessa a literária, tem-se apresentado nas últimasdécadas diversas discussões por teóricos da área, cf. Soares (2002),Lajolo (2008), Nascimento (2001), propondo outras formas de trabalhocom o texto literário dentro da sala de aula no que se refere ao processode escolarização da leitura literária.

Embora existam vários avanços no que se refere ao processo deensino-aprendizagem de literatura e da leitura literária como prática aser exercida dentro e fora da sala de aula, tem-se constatado ainda quequando se sai da esfera acadêmica e entra-se na sala de aula da maioriadas escolas brasileiras de ensino fundamental e médio, encontramosuma prática pedagógica de trabalho com o texto literário que revelapouca ou quase nenhuma influência de todas essas novas perspectivasde abordagem e dos documentos oficiais, os quais foram criados com afinalidade de propor parâmetros didáticos para a efetivação do ensino

de literatura e da leitura literária, ou seja, a escolarização da literaturaacaba deixando de lado outros sentidos/significados que o texto possui(SOARES, 2001).

Nesse sentido, objetivamos com este artigo estabelecermos algumasreflexões a respeito de como é apresentada a noção de texto literárionos documentos oficiais criados pelo Ministério da Educação (MEC),mais especificamente, nos Parâmetros Currículos Nacionais (1997/8)e nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006). Para isso,

O ENSINO DE LITERATURA E A FORMAÇÃO DE LEITORES LITERÁRIOS:O QUE DIZEM OS PCN E AS ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO MÉDIO

  Rosivaldo Gomes & Josenir Sousa da Silva

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expomos algumas discussões de teóricos sobre as práticas de ensino/aprendizagem da literatura no ensino médio, abordando a questão daformação de leitores literários na escola, posteriormente apresentamosdiscussões sobre o discurso do texto literário presente nos PCN enas Orientações Curriculares para o Ensino Médio, mostrando qualpostura esses documentos adotam em relação a esse tema.

Desse modo, este trabalho caracteriza-se como um artigo de revisãoteórica, através do qual buscamos apresentar algumas contribuiçõespara as discussões já existentes em relação ao ensino de literatura e daleitura literária, tanto no ensino fundamental quanto no médio.

1. A literatura no ensino médio: que leitores literários a escola tem formado?

 Vivemos o momento dos questionamentos sobre o queestá “congelado” na “tradição da homogeneidade” que porlongos tempos foi “aceito” /imposto; a ordem agora é ummundo globalizante que “exige razões” e abre possibilidadesde se libertar dos constrangimentos do passado, isso significareconhecer que é a face positiva da globalização que nos levaa experimentar a heterogeneidade da vida humana de frente(MOITA-LOPES, 2006, p. 17).

Segundo Moita Lopes (2006) as mudanças culturais, sociais,econômicas, políticas e tecnológicas que estão se efetivando atualmenteno mundo têm gerado um foco bastante incisivo na temática dasidentidades, tanto na mídia como nas academias. Segundo este autor,nas práticas cotidianas está havendo um questionamento constantedos modos de viver a vida social. Esse questionamento tem afetado a

“compreensão da classe social, do gênero, da sexualidade, da idade, da

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raça e da nacionalidade”; em síntese, a compreensão de quem somosna vida social contemporânea (MOITA LOPES, 2006, p. 19-20). Comefeito, a escola não escapa dessas transformações e se vê obrigada atomar decisões e a alterar suas estratégias e objetos de ensino pararesponder às necessidades da sociedade.

Durante a realização de observações de estágio supervisionado na

disciplina Literatura Brasileira em turmas do ensino médio, em umaescola da Rede Estadual de Macapá, duas questões nos chamaram aatenção. A primeira diz respeito à atitude de agentes passivos que osalunos assumiam diante dos textos literários dentro de sala de aulaapresentados pela professora, ou seja, raramente questionavam sobreo que liam ou apresentavam outra visão além daquela proposta porela ou pelo livro didático.

 A segunda refere-se ao convencionalismo do ensino de literaturapautado em suas características estruturais e de estilo literário dedeterminada época, em detrimento de um verdadeiro ensino deliteratura e de leitura literária nas práticas escolares.

No que se refere à primeira questão, o processo errôneo einadequado de escolarização atribuído ao texto literário, possivelmenteseja uma das causas desse estado de “inércia” que instaurou-se, eem alguns casos ainda persiste, como percebido por nós nas quatro

turmas de ensino médio, nas quais foram realizadas as observações.Segundo Magda Soares (2001), a literatura infantil – e nesse contextoinsere-se também a geral – passa por três instâncias de escolarização:(i) a biblioteca escolar, (ii) a leitura e o estudo de livros de literaturae (iii) a leitura e o estudo de textos literários nas aulas de Português.

 A primeira instância, conforme a autora, escolariza, ao especificarum lugar para guardar os livros, sendo que neste lugar a criança deve teratitudes distintas das que têm cotidianamente. A biblioteca escolar seria

então uma espécie de “templo”; escolariza também quando estabelece

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tempos para permanência em seu interior e de leitura dos livros sobsua guarda; quando seleciona os livros que oferecerá à leitura; quandosocializa a leitura, definindo quem indica e com que critérios indicadeterminado livro e, por fim, quando estabelece rituais de leitura.

Nesse sentido, ao observarmos a realidade da maioria de nossasescolas, verificamos que praticamente as salas de leitura não exercem

seu real papel, e na melhor das hipóteses, quando exercem sãoespaços não tão apropriados à leitura, ou então a visita a esse espaçode interação é limitado a um determinado dia e horário, é comose o “templo” – a escola – fosse o único lugar possível para que o“culto” – o ato de ler – fosse concretizado, excluindo-se desse modo osrituais pagãos – outras leituras feitas pelos alunos fora da escola. Essaexclusão pode ser explicada por meio do processo de escolarização daliteratura, pois como esclarece (NASCIMENTO, 2001, p. 38):

Essa imprópria escolarização contribui para a deturpação,falsificação, distorção da literatura, uma vez que esvazia otexto literário de seu potencial, congelando-o, por exemplo,em definições e classificações que concorrem para afastar oaluno das práticas de leitura literária, desenvolvendo neleresistência ou aversão.

  A segunda instância escolariza a literatura quando, nas aulasde Português, a leitura de livros literários assume a configuração(inevitável) de tarefa escolar e passa a ser avaliada por meio deinstrumentos diversos, com objetivos também variados e que irãoservir posteriormente como critério avaliativo, despertando assim noaluno, o não interesse pela leitura – principalmente a literária - ou seja,“o problema é que os rituais de iniciação propostos os neófitos não

parecem agradar: o texto literário, objeto de um nem sempre discreto,

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mas sempre incômodo desinteresse enfado dos fiéis – infidelíssimos,aliás – que não pediram para ali estar” (LAJOLO, 2008, p.12).

Finalmente, a terceira instância que diz respeito ao uso de fragmentosde textos literários para serem lidos, compreendidos e interpretados.Tais fragmentos encontram-se, em sua maioria, em livros didáticos,livros esses que às vezes constituem-se como o único material de leitura

dos alunos (e até mesmo de muitos professores) e suporte (e norte) dotrabalho do professor.

Em relação à segunda questão, como bem explica Lajolo (2008) ouso do texto literário em sala de aula funda-se, ou deveria fundar-se emuma concepção de literatura muitas vezes deixada de lado em discussõespedagógicas, isto é, em que a escola, por não saber exatamente comoexplorar o texto literário, acaba atribuindo a esse um lugar secundário,passando então a literatura a ser tratada como pretexto e estratégiapara o estudo de outros objetos.

Nesse sentido, o texto literário passa a ser o protagonista do ensinoda escrita, da estrutura da língua e de uma leitura quase semprereduzida a uma leitura não literária, que ao invés de permitir ao alunoliberdade de compreensão e possibilidades de inferências de sentidos,acaba se transformado em uma leitura que não permite a produçãode mais de um sentido se não o ditado pelo professor ou pelo livro

didático.Isso pode ser constatado em muitas práticas escolares como a do

tipo: o que o autor que dizer com isso? Presentes ainda na cobrançade interpretações de um texto que é literário, esquecendo-se que estepossui sua singularidade com relação aos demais textos, se assim é,porque ainda continuamos propondo tais questões aos alunos? Já quede qualquer forma e em qualquer contexto, o autor ainda que queira,não pode influir na leitura que se faz de seu texto depois de pronto.

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Sabemos que a escola pode ensinar a ler, e também desenvolver umensino de literatura que priorize o desenvolvimento de competênciase habilidades relacionadas com o letramento literário, mas para queisso ocorra é necessário que ela se atualize, dando espaço para práticasculturais contemporâneas que são muito mais dinâmicas.

É necessário, portanto, refletirmos sobre quais leitores literários a

escola está formando, quais práticas de letramentos literários têm-sepriorizado em sala de aula, pois:

[...] devemos compreender que o letramento literário éuma prática social e, como tal, responsabilidade da escola. A questão a ser enfrentada não é se a escola deve ou nãoescolarizar a literatura, como bem nos alerta Magda Soares,mas sim como fazer essa escolarização sem descaracterizá-

la, sem transformá-la em um simulacro de si mesma quemais nega do que confirma seu poder de humanização”(COSSON, 2006, p. 23).

Desse modo, no letramento literário não podemos simplesmenteexigir que o aluno leia a obra e ao final faça uma prova ou ficha. Énecessário e permissível que se possa ir além dos sentido/significadosestabelecidos pelo discurso do professor ou do livro didático para que

a inércia seja quebrada e se possam desenvolver capacidades leitorasproficientes, tanto para o ensino de literatura quanto para a práticada leitura literária.

2. O discurso sobre o texto literário nos Parâmetros Curriculares Nacionais e nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio.

 Amplamente divulgados desde o momento de sua publicação, em

1997 os Parâmetros Curriculares Nacionais do ensino fundamental

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(doravante PCN), foram elaborados com o objetivo de propiciar aossistemas de ensino e particularmente aos professores subsídios àelaboração e/ou (re)elaboração dos currículos escolares, servindo aindacomo eixo norteador para construção e consolidação de um projetopedagógico que buscasse a efetivação da cidadania do aluno.

Esses documentos são resultado de um longo trabalho que foi

inicialmente elaborado em versões preliminares para serem analisadose debatidos por professores que atuavam em diferentes áreas e níveisde ensino brasileiro.

Nesse sentido, os PCN de maneira significativa influenciaram eainda influenciam fortemente o processo de ensino-aprendizagem nasescolas brasileiras, tanto nas atitudes pedagógicas dos professores, sejameles contrários ou não às propostas oferecidas por esse documentoquanto na maneira de olhar/ensinar determinados objetos de ensino.É sabido que em seu primeiro estágio, esses parâmetros sacudirambastante a cabeça dos professores mais interessados e provocarammudanças significativas na elaboração, na escolha dos livros didáticose no próprio ensino de língua e literatura na sala de aula.

No contexto atual do ensino brasileiro é possível percebermosno discurso de muitos professores marcas, às vezes profundamentealicerçadas, outras apenas superficiais, do discurso dos parâmetros

curriculares, ou seja, alguns tomaram para si os PCN como sendoa “bíblia escolar”, ou o fio condutor de todo o processo de ensino-aprendizagem, outros, no entanto, conseguem olhá-los apenas pelo

 viés de uma invenção educacional. Assim, cabe aqui traçarmos umadiscussão sobre como o texto literário é visto/compreendido por estedocumento.

De acordo com os PCN (1997), sugere-se que o texto literário deveser aliado às demais práticas cotidianas da sala de aula, pois se trata

de uma forma de conhecimento especifico, já que, em seu estudo,

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devem ser mostradas suas propriedades, bem como debatidas eanalisadas quando se trata de ler as diferentes manifestações assentadassobe a rubrica geral de texto literário. Porém, Cosson (2006, p.21)esclarece que “a literatura tem um sentido muito extenso, o queinevitavelmente tem ocasionado o englobamento de qualquer textoescrito, que aparentado parentesco com a poesia e ficção passam a

serem rotulados com literários”.  Ainda conforme os PCN, a literatura – e consequentemente o

texto literário – não devem ser vistos como a cópia do real, nem comopuro exercício de linguagem, muito menos como mera fantasia quese asilou dos sentidos do mundo, de modo que o texto literário deveser compreendido como um texto construído/constituído em práticassócio-históricas e culturais.

No discurso do referido documento, a questão do ensino daliteratura e da leitura literária envolve, além de elementos estruturais,um exercício de reconhecimento das singularidades e das propriedadescompositivas que matizam um tipo particular de escrita, negando-sedessa forma o uso do texto literário com a finalidade de servir aoensino das boas maneiras, dos hábitos de higiene, dos deveres decidadão e dos tópicos gramaticais.

Desse modo, tais procedimentos postos de forma descontextualizada,

pouco ou nada ajudam para a formação de leitores capazes dereconhecer as peculiaridades que o texto literário possui e os diversossentidos que dele podem surgir, isto é, os sentidos não estão no texto,à disposição do leitor, nem nas possíveis intenções do autor ao escrevê-lo, antes sim, este sentido é construído pelo leitor ao longo do ato daleitura, dentro dos limites de sua enciclopédia e do próprio objetoescrito, ou seja, “o sentido não está no texto, mas se constrói a partirdele, no curso de uma interação” (KOCH, 2005, p. 25).

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No que se refere às Orientações Curriculares para o EnsinoMédio (2006), esses documentos igualmente aos PCN estabelecemque a literatura não deve ser trabalhada em sala de aula de formadescontextualizada, com a intenção apenas de explorar as característicasque o texto literário apresenta, sobre um determinado estilo literário,já que este difere-se dos demais que estão presentes na sala de aula,

como destaca o referido documento

Decorre, diferentemente dos outros, de um modo deconstrução que vai além das elaborações linguísticas usuais,porque de todos os discursos é o menos pragmáticos, o quemenos visa à aplicação práticas. Uma de suas marcas é suacondição limítrofe, que outros denominam transgressão,que garante ao participante do jogo da leitura literária o

exercício da liberdade, e que pode levar a limites extremosas possibilidades da língua. (OCEM, 2006, p. 49)

  Ao longo de outras passagens, o referido documento discutecomo o ensino da Literatura pode ser encaminhado no ensinomédio, partindo-se das especificidades e da inserção da literatura noscurrículos do ensino médio (p.49). Discute-se ainda que o ensino deliteratura (e de outras disciplinas) tenha como objeto principal, comoestabelece a LDB, “ao aprimoramento do educando como pessoahumana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomiaintelectual e do pensamento crítica”. (LDBEN, 1996).

  As OCEM (2006) defendem também que para se chegar aodesenvolvimento desse objetivo – leitura literária - não se devesobrecarregar o aluno com informações sobre épocas, estilos,características descontextualizadas de escolas literárias. Tal questão já

era discutida desde os PCN, principalmente nos (PCN+) que afirmam

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que essas informações devem ter caráter secundário no ensino deliteratura, pois, “trata-se, prioritariamente, de forma leitores literários,em outras palavras, de “letrar” literariamente o aluno, fazendo-oapropriar-se daquilo a que tem direito” (PCN+, 2002, p.55).

Todavia, apesar desse documento chamar atenção para essa questão,(COSSON, 2006, p. 21), em seus trabalhos a respeito do papel da

literatura na escola, nos esclarece que “no ensino médio, o ensino daliteratura limita-se à literatura brasileira, ou na melhor das hipóteses, àhistória da literatura brasileira, usualmente na forma mais indigente”,ou seja, as aulas de literatura estão servindo muito mais ao ensino dahistoricidade da literatura do que propriamente da literatura, o queimplica evidentemente dizer que a leitura literária fica em segundoplano, uma vez que os textos literários, quando comparecem na salade aula, são fragmentados e servem prioritariamente para comprovaras características dos períodos literários.

Com base nas colocações de Soares (2002,) sobre a noção deletramento, as orientações curriculares estabelecem que o LetramentoLiterário seria visto, então, como estado ou condição de quemnão apenas é capaz de ler poesia ou drama, mas dele se apropriarefetivamente por meio da experiência estética. Entretanto, a trajetóriade formação do leitor de Literatura na escola, sempre privilegiou os

fragmentos literários, pois como destaca Pinheiro (2006, p.24) “oleitor que se pretende formar nas práticas de leitura deve ler o queé permitido, seguindo os valores transmitidos por essa importanteformadora da comunidade de leitores”, ou seja, esses valores são

 veiculados, principalmente, na escola e através do livro didático, quecostuma guiar as práticas de leitura realizadas na sala de aula.

 A partir do exposto, compreende-se então que o letramento literáriose dá através das práticas sociais de uso da escrita literária, sobretudo

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todas as práticas sociais de uso da escrita ficcional com a finalidade dese obter prazer, despertar sentidos e gosto por aquilo que se ler.

 Algumas considerações

Podemos perceber diante das reflexões e análises apresentadas que

o trabalho com o ensino de literatura e de leitura literárias tem-seapresentado com uma tarefa complexa, já que em se tratando da leiturado texto literário, é importante refletirmos, como defende Paulino(2005), sobre as especificidades que esse possui, sem deixarmos delevar em conta o que há de comum (as semelhanças) entre essa leiturae a de textos não-literários, pois na perspectiva contemporânea, “todosos domínios discursivos, sem exceção, passaram a exigir e desenvolverhabilidades complexas e competências sociais de seus leitores”(PAULINO, 2005, p. 61). Habilidades e competências essas que aospouco estão sendo desenvolvidas pela escola, e é nessa direção que osdocumentos oficiais têm empreendidos esforços para que o ensino deliteratura e da leitura literária possa se concretizar em sala de aula demaneira mais eficaz.

Portanto, possivelmente a certeza acerca de como o professor poderádesenvolver a prática da leitura, em especial da leitura literária, de

modo que esta se apresente significativa para os alunos, sem levar emconta apenas aspectos de estilo e características literárias, demandaráuma mudança que deverá englobar além de materiais didáticos e outrasmetodologias, o modo como a escola está vendo/trabalhando esseobjeto de ensino – o texto literário – e a concepção que o professortem sobre ele.

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Do texto ao texto:

as refrações do texto lidomaterializadas no reconto

 produzido pelos alunos

Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto

PPGE – UNIMEP – [email protected] de Cássia CristofoletiFACECAP – [email protected] 

RESUMO: Este estudo procurou compreender os modos de mediaçãoda proessora nos processos de elaboração da escrita pela criança,considerando a leitura e a reescrita como instauradora da atividade,no entanto, não se considerava a possibilidade de reração do texto

pela criança, o que se evidenciou na prática do reconto e na produçãodela decorrente.

PALAVRASCHAVE: produção de texto, autoria e mediação

ABSTRACT: This study sought to understand the ways o the teachersmediation on the processes o writing elaboration by the child,considering the reading and the rewritten as an establisher o theactivity, however, didn’t considered the possibility o reraction o thetext by the child, evidenced in the practice o the retelling and in theproduction resulted by it.

KEYWORDS: text production, authorship e mediation

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Introdução

Este trabalho é parte de uma pesquisa já concluída, cujo objetivofoi entender os modos de mediação da professora e os processos deelaboração e re-elaboração da escrita pela criança, tendo em vista odesenvolvimento da dimensão reflexiva do ato de escrever.

O referencial teórico no qual nos ancoramos para a realizaçãodeste trabalho foi a abordagem histórico-cultural do desenvolvimentohumano de Vygotsky e a perspectiva enunciativo-discursiva de Bakhtin,bem como no trabalho de autores igualmente fundamentados nessasperspectivas.

Tanto Vygotsky (1989) quanto Bakhtin (2002), em suas proposições,destacam a centralidade da linguagem e do outro na constituição de nossa

subjetividade e de nossa possibilidade de consciência e reflexividade.Segundo ambos, vamos nos tornando quem somos no processo deapropriação e de elaboração das formas culturais já consolidadas nogrupo social a que pertencemos, pela mediação do outro, através dalinguagem.

Em nossas relações com o outro, que são relações sociais determinadaspelos lugares e papéis sociais nelas em jogo, apreendemos o outro,ao mesmo tempo em que a ele nos expomos. Nessa relação, porque

consideramos, compreendemos e avaliamos os atos dos outros e porqueos outros emitem compreensões e juízos acerca de nossos atos, tornamo-nos capazes de compreender e avaliar a nós mesmos.

Em função do referencial teórico assumido, para focalizar areflexividade não basta voltar-se para o sujeito e sim para a dinâmicainterativa em que ele vai se constituindo. Como nosso interesse eraapreender o desenvolvimento da reflexividade nas atividades escritas

produzidas na escola, voltamo-nos para a dinâmica interativa produzida

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entre professora-alunos, alunos-alunos, professora-alunos-textos, alunos-alunos-textos.

Para tanto focalizamos as interlocuções produzidas em suas condiçõessociais imediatas e mais amplas de produção, as palavras que eram ditas eescritas e a linguagem não verbal que permeava a produção enunciativa,considerando cada enunciado como um ato de fala singular e ao mesmo

tempo histórico, em função de sua vinculação à cadeia da comunicação verbal.

 Assim, a dinâmica interativa instaurada pela produção e circulação detextos em sala de aula foi descrita em suas condições sociais de produçãoe registrada nos distintos enunciados compartilhados entre os sujeitosque dela participaram.

No trabalho que ora apresentamos nos voltamos para alguns dadosda pesquisa e os analisamos sob um outro ângulo: o da refração do textopela criança. Refração essa mediada pela história singular de suas relaçõessociais e pelo lugar por ela ocupado nessas relações. Para essa análise,destacamos episódios produzidos na prática do reconto e na produçãodela decorrente. O que nos conta o reconto?

Para descrever o processo vivido e o modo como os dados foramproduzidos, apresentamos a seguir uma síntese do trabalho desenvolvidoem sala de aula.

1. A mediação da professora 

O processo de ensino da língua estava centrado em três práticas – aleitura de textos, a produção textual e a análise linguística – de acordocom a proposta desenvolvida por Geraldi no livro “O texto na sala deaula” (1997). Segundo o autor, a proposta assenta-se em uma concepçãoque “situa a linguagem como o lugar de constituição de relações sociais,

onde os falantes se tornam sujeitos” (p. 41).

DO TEXTO AO TEXTO: AS REFRAÇÕES DO TEXTO LIDO MATERIALIZADASNO RECONTO PRODUZIDO PELOS ALUNOS

  Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto & Rita de Cássia Cristofoleti

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Nessa perspectiva, a leitura de textos é entendida como um “processode interlocução entre leitor/texto/autor. O aluno-leitor não é passivo,mas o agente que busca significações” (GERALDI e FONSECA, 1997,p.107). A produção textual, por sua vez, considera os alunos comoprodutores de textos, e não como produtores de redação, porque nãoé apenas uma pessoa na função “professor-escola” que os lê e também

porque um texto não é apenas sobre alguma coisa, mas também umaprodução verbal de alguém dirigida sempre a outrem. (p.106).

  A análise linguística refere-se aos aspectos estruturais da línguaescrita que devem ser apropriados pela criança, aspectos que cabemao professor trabalhar durante o ano letivo com seus alunos. Comoassinala Geraldi (1997), o essencial nessa prática é “a substituição dotrabalho com metalinguagem pelo trabalho produtivo de correção eautocorreção de textos produzidos pelos próprios alunos” (p.79). Nessecontexto, considerando que a linguagem é uma atividade constitutivae o trabalho linguístico não é nem um eterno recomeçar nem umeterno repetir (GERALDI, 1996), recorreu-se ao reconto como umadas principais estratégias para a produção textual que as criançasrealizariam logo no início do ano.

 Além da familiaridade das crianças com essa prática – pois já ahaviam vivenciado no ano anterior –, foram importantes para sua

escolha, o argumento de Geraldi (1997), segundo o qual ao propormoso reconto evitamos o acúmulo de dificuldades que se colocam para acriança frente às exigências de criar e de escrever. E o argumento deLajolo (1988), segundo o qual, “é o processo de significação atualizadono texto escrito, tomado como ponto de partida, que pode deflagraro processo de significação do texto a ser criado” (p.59-60). Ou seja, oprocesso de significação que deflagra um novo texto nasce do encontrocom outras produções escritas e da própria leitura que a criança faz

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da vida, ou seja, ao produzir um novo texto a criança coloca-se comoautor, um autor que não está diante só do enunciado do texto lido, masdiante também de todos os outros enunciados que foram compondo asua história de leitor e de leitura. São essas experiências que alimentamo conjunto de idéias e de possibilidades temáticas para ela. É nessainterlocução que ela amplia as possibilidades do que tem a dizer e dos

modos de fazê-lo.Dessa perspectiva, é possível afirmar que um texto não existe sozinho,

ele faz parte de uma cadeia de enunciados. Como um enunciado estásempre em relação com outros enunciados, todo enunciado é plenode vozes, é polifônico. São os vários enunciados que falam em nós.

 Acreditando que é nesse encontro com outras obras e na aproximaçãocom elas que os sujeitos vão se nutrindo de possibilidades e dediferentes formas de dizer o que tem a dizer, apostou-se na interlocuçãoestabelecida na sala de aula, nas discussões das experiências de vida ena leitura da obra “Guilherme Augusto Araújo Fernandes” (1995), deMem Fox, para que o processo de produção textual fosse instauradopautado na proposta do reconto.

Guilherme Augusto Araújo Fernandes era um menino pequeno,que morava ao lado de um asilo de idosos, todos seus amigos. Masa pessoa de quem ele mais gostava era Dona Antônia, porque tinha

quatro nomes como ele. Certo dia, ao ouvir seus pais conversando,soube que ela perdera a memória. O menino quis saber o que issosignificava e perguntou ao pai. Não satisfeito, foi perguntar aos outrosdo asilo. Ouve diferentes respostas, pois cada idoso atribuía um sentidodiferente ao conceito. Nesse jogo de significados e sentidos que seproduzem o menino escolhe objetos relacionados aos sentidos queele produz sobre o que vem a ser memória, monta uma cesta e vailevá-la a Antônia. Ao receber cada um dos presentes ‘maravilhosos’, a

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idosa vai tendo uma lembrança de seu passado. Assim, Dona Antôniarecupera a memória ajudada por um menino “que nem era tão velhoassim”. (FOX, 1995).

Essa história foi escolhida porque, no decorrer do ano letivo, algumasmarcas linguísticas específicas da narrativa deveriam ser trabalhadas, taiscomo: um verbo no imperfeito introduzindo a abertura da história; o

uso de expressões como “daí, então, depois, um belo dia”, introduzindoa ação propriamente dita, seção essencialmente narrativa; e fórmulasde fechamento da história (PERRONI, 1992) e os recursos linguísticospara a criação da expectativa, do conflito e do encadeamento de ações,em um jogo de causa/efeito. (SIQUEIRA, 1992).

Da mesma forma que os significados das palavras vão sendoelaborados ativamente pelos sujeitos nas muitas relações em queeles se confrontam com palavras novas e com situações em queos sentidos dessas palavras são explicitados, também uma série deconvenções relativas à escrita vão sendo elaboradas pelas criançasem suas relações com elas. Nós, professoras, destacamos as marcaslinguísticas específicas, informamo-las acerca das formas de utilizaçãoe de sua função na organização textual, sugerimos que elas se utilizemdesses marcadores, utilizando-os, mediadas por nossas intervenções,as crianças ativamente elaboram esses usos.

Concordando com Lajolo (Idem), acreditamos que é nessa condiçãoque a leitura propicia o escrever bem. Pois como afirma ela, não é ofato de ler um bom texto o que habilita o aluno a produzir um bomtexto. “A relação entre o ler e escrever talvez seja mais forte do queo julgam os adeptos da teoria da criatividade e mais tênue do que oacreditavam os discípulos da formação do estilo pela imitação dos bonsautores” (Destaque das autoras).

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Nesta mesma perspectiva, Bakhtin (2003, p.279), afirma que:

as obras [...] dos diferentes gêneros [...] a despeito de todaa diferença entre elas e as réplicas do diálogo, também são,pela própria natureza, unidades da comunicação discursiva:também estão nitidamente delimitadas pela alternância dossujeitos do discurso, cabendo observar que essas fronteiras,ao conservarem a sua precisão externa, adquirem um caráterinterno graças ao fato de que o sujeito do discurso – nestecaso o autor de uma obra – ai revela a sua individualidadeno estilo, na visão de mundo, em todos os elementos daidéia de sua obra. Essa marca da individualidade, jacentena obra, é o que cria princípios interiores específicos quea separam de outras obras a ela vinculadas no processo decomunicação discursiva de um dado campo cultural: dasobras dos predecessores nas quais o autor se baseia, deoutras obras da mesma corrente, das obras das correnteshostis combatidas pelo autor, etc.

O argumento de Lajolo no que diz respeito à intertextualidadecontribuiu também para a escolha do reconto, na medida queinteressava à professora, mediar a apreensão das relações de significaçãoentre textos.

Considerou-se, naquele momento, que a leitura, vivida emdiferentes condições de produção, poderia ser o eixo condutor dasmediações junto às crianças.

Em um primeiro momento, ao lerem a obra escolhida para iniciar oprocesso de produção textual, as crianças estariam, no papel de leitoras,construindo, com o autor, a significação do texto por ele escrito. Emseguida, ao recontarem esse mesmo texto, estariam vivenciando com

ele uma outra dimensão da leitura, em que o processo de significação

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atualizado no texto escrito estaria mediando o processo de significaçãodo texto a ser criado.

Posteriormente, ao ser lido por outros alunos e pela professora, otexto criado tornar-se-ia, ele próprio, objeto de leitura e de produçãoativa de sua significação. A leitura dessa versão seria mediada, por sua

 vez, pela leitura do original, que deflagrou sua produção. Nesse jogo,

não só o encontro entre textos estaria sendo possibilitado aos alunos,como também a explicitação de relações entre eles, que poderiampautar os comentários e as sugestões de possíveis revisões.

Nessa condição de leitura, diferentemente do autor da obra lida,que estava distante – não era conhecido por seus leitores e já eraportador de toda uma legitimidade conferida pela publicação – osalunos estariam em contato com um texto produzido por alguémpróximo, inclusive em termos das posições sociais ocupadas, a quempoderiam se manifestar de modo mais direto e informal, com acerteza de que seus comentários chegariam, de fato, até o autor.

  Ao voltar para as mãos de seus autores, os textos comentadosinstaurariam uma outra condição de leitura. Os autores estariam re-encontrando seus próprios textos na condição de leitores e essa leituraestaria sendo mediada pelo original lido, pelos comentários e sugestõesregistrados por seus colegas na condição de seus leitores e por suas

intenções discursivas.No encontro com os comentários dos próprios colegas, as criançasestariam experimentando o sentimento de autoria, uma vez que nocomentário do leitor sobre o texto produzido, a relação entre aqueleque escreve e aquele que lê se materializa, instaurando o sujeito deautoria. Nesse sentido, estamos de acordo com Vygotsky (2003) ecom Bakhtin (2003), quando dizem que o outro instaura o lugar deautoria na medida em que propicia àquele que escreve a experiência

de se reconhecer como autor.

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Como autores, os alunos também seriam convidados a revisarseus textos, tendo em conta as muitas referências de leitura acimadestacadas. Mais do que solicitar que a criança olhasse para o própriotexto na intenção de melhorá-lo, a intenção era a de caracterizar omomento da revisão como um espaço de interlocução entre o autor e oleitor de seu texto, em que se explicitassem as diferentes compreensões,

sempre possíveis, de um mesmo enunciado, pois “o ser, refletido nosigno, não apenas nele se reflete, mas também se refrata” (BAKHTIN,2002, p.46).

 Assim, no decorrer da produção textual, cada criança experimentariaa dimensão comunicativa da linguagem através do desdobramento desuas relações com os textos – leitor, autor, comentarista e autor –revisando o próprio texto.

Parece simples dizer que no processo de produção de textos foitrabalhada a leitura, a produção e a análise da produção textual dascrianças, o que implicou leitura e produção novamente. Isso tudo defato aconteceu, porém, somente no percurso fomos percebendo todaa complexidade das relações envolvidas no processo de construçãode textos, entendendo, com Lajolo (1988), que o texto apenas existequando há o encontro entre dois sujeitos: o que escreve e o que lê.

Em nosso encontro com as produções escritas, procuramos tomar

os textos das crianças como espaço de produção de sentidos, muitomais do que como espaço de trabalho sobre a linguagem (GERALDI,2001, p.52).

Na tentativa de compreender melhor as diferentes significaçõesde enunciados presentes nos textos produzidos pelos alunos, agorano lugar de autores, recorremos a Bakhtin (2003) em “O autor e apersonagem”, ensaio incluído no volume Estética da criação verbal. Paraele nenhuma significação é isolável, ou seja, o autor é parte integrante

do objeto estético. É esse autor-criador quem dá forma ao conteúdo,

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porém, não é passivo a ele, o autor responde axiologicamente aosenunciados daqueles que o rodeiam.

Fomos percebendo que na proposta do reconto, apesar de a história“já estar contada” e do fato de que os alunos não precisariam criar,bastaria escrever –, o lugar de autoria ocupado pelas crianças instauravaum complexo processo de transposições da vida para a arte. O reconto

nunca é um mero reflexo do texto lido, uma vez que há sempre umacompreensão ativa-responsiva daquele que lê. Ao recontar o textolido anteriormente, a criança, do lugar de autor, “que é aquele quetem o dom da fala refratada” (FARACO, 2005, p.40), traz os signosdo enunciado lido para junto dos significados e sentidos que já têmelaborados recortando e reorganizando tanto aspectos formais, comode conteúdo.

“O autor acentua cada particularidade da sua personagem,cada traço seu, cada acontecimento e cada ato de sua vida, os seuspensamentos e sentimentos, da mesma forma como na vida nósrespondemos axiologicamente a cada manifestação daqueles que nosrodeiam” (BAKHTIN, 2003, p.03).

2. A singularidade de nossos pequenos autores...

Mais do que estarmos atentas às palavras escritas, foi importanteestarmos atentas também às palavras ditas pelos alunos, palavrasestas que mediavam a produção escrita. Ao iniciar o processo deprodução textual, Ale dirigiu-se à professora e disse: “Tia, como euposso começar?” A professora argumentou que ele poderia começar daforma como estava escrito no livro: “Era uma vez um menino chamadoGuilherme Augusto Araújo Fernandes e ele nem era tão velho assim.Sua casa era ao lado de um asilo de velhos e ele conhecia todo mundo

que vivia lá” (FOX, 1995, p.05).

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 Ao se deparar com a resposta, Ale se posicionou: “Ah não, era uma vez é muito infantil, eu quero começar de outro jeito”. Após trocaremalgumas ideias ele se dirigiu para sua carteira e começou a escrever:“Havia um garoto chamado Guilherme Augusto Araújo Fernandesque morava do lado de um pequeno asilo de velhos onde ele conheciatodos os senhores e senhoras”. No caso de Ale é interessante ressaltar

que para ele, se Guilherme Augusto conhecia todos os idosos quemoravam no asilo, este asilo só poderia ser pequeno.

Fer, ao escrever seu texto, percebendo que ao final o meninoconsegue ajudar a idosa a recuperar a memória, explicita, já de início,sua esperteza: “Era uma vez um menino chamado Guilherme Augusto

 Araújo Fernandes, esse menino era muito esperto, Guilherme Augusto morava do lado de um asilo cheio de velinhos, os que ele maisconversava, que ele era bem amigo, eram só seis [...]” (sic).

Bia assume a condição de ser criança e enuncia: “Existe um meninoque se chamava Guilherme Augusto Araújo Fernandes, ele brincava,corria, pulava, fazia de tudo que podia . Morava do lado de um asilo,e conhecia muita gente de lá” (sic).

 Ainda, com relação ao início do texto, devido ao fato de que aescola havia realizado uma campanha de produtos de higiene paraum lar de idosos na cidade de Piracicaba (interior do Estado de São

Paulo), as crianças compreendiam que neste tipo de instituição vivem vários idosos. Nesse sentido Ja se coloca frente ao texto da seguintemaneira: “Havia um menino que se chamava Guilherme Augusto

 Araújo Fernandes, ele morava perto de um asilo de velhinhos compessoas muito queridas por ele. Tinham muitos velinhos. Ele gostava em especial de 6” (sic). Ao explicitar que ele gostava especialmente deseis idosos, a aluna dá a ver os seis interlocutores com os quais ele serelaciona na busca da elaboração do sentido da palavra memória.

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Le, uma aluna que tinha o hábito de ler diariamente escreveu:“Havia um menino que morava em uma casa au lado de um asilo de

 vários idosos. À propósito este menino chama Guilherme Augusto Araújo Fernandes” (sic). Neste caso, o que se evidencia é o uso de ummarcador linguístico que a aluna, provavelmente, apreendeu em outrasleituras realizadas, ou seja, os enunciados estão sempre se colocando

em relação a outros enunciados.Cabe destacar que a grande maioria dos textos das crianças

apresentou contrapalavras exatamente no momento da narrativa emque o pai conversa com a mãe sobre o fato de Dona Antônia ter perdidoa memória. É a partir deste momento que Guilherme Augusto iniciaa busca pelo significado da palavra memória.

“Um dia, Guilherme Augusto escutou sua mãe e seu pai conversandosobre Dona Antônia.

– Coitada da velhinha – disse sua mãe.– Por que ela é coitada? – perguntou Guilherme Augusto.– Porque ela perdeu a memória – respondeu o pai.– Também, não é para menos – disse sua mãe. – Afinal, ela játem noventa e seis anos.– O que é uma memória? – perguntou Guilherme Augusto. Ele

 vivia fazendo perguntas.– É algo de que você se lembre – respondeu o pai.

Mas Guilherme Augusto queria saber mais; então ele procurou[todos os outros idosos do asilo para perguntar: ‘O que é memória?’]”.(FOX, 1995, p.08-09).

Neste momento do diálogo a mãe tece um comentário sobre ofato de Dona Antônia já estar bem velha, talvez esse enunciado tenha

sugerido aos alunos que ao reescreverem o texto, na condição de

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autores, pudessem, também eles, tecerem comentários a respeito dosignificado da velhice que cada um deles vem elaborando nas muitasrelações que estabelecem dentro e fora da escola.

Chamou-nos também a atenção o fato de que muitas dessascontrapalavras estavam relacionadas a um momento que retrata ocotidiano de uma criança: a conversa familiar, talvez na sala ou no

quarto; a entrada da criança no diálogo dos pais e os objetos que temguardados em seu quarto, entre outros.

Com relação a essa passagem do texto, encontramos no texto de Thi,o sentido que ele elabora quanto à condição de Dona Antônia, paraele, não há porque ter pena de uma velha que perde a memória: “Umdia seus pais, ou melhor, os pais de Guilherme Augusto A. Fernandes,ele estavam na sala conversando que dona Antonia era uma coitadaporque ela perdeu a memória e seu pai respondia Que coitada nada uma velha dessas. So que Guilherme ouviu a conversa. E Guilhermequeria saber o que era memória e seu pai respondeu assim que nemquando tem que lembra alguma coisa e não se lembra” (sic).

Diferentemente de Thi, Ama solidariza-se com a condição da idosae procura, de imediato, ajudá-la: “Um dia ouviu seus pais comentandoque Dona Antônia tinha perdido sua memória, mas pensou, pensou oque podia fazer para a memória de Dona Antônia voltar a funcionar.

E foi lá perguntar para o seus amigos o que era memória” (sic). Ale apresenta uma explicação para o fato de Dona Antônia ter perdidoa memória: “Pobre senhora ela já está justa na idade de quando essascoisas começam – respondeu a mãe – ela já ta na 3ª idade” (sic), ouseja, para ele, o velho já está na idade de perder a memória.

No caso de Hel, é importante ressaltar que a aluna aproximou-seda professora e enunciou: “Tia, eu me lembro da história, mas voucontar com as minhas palavras, vou contar do meu jeito, tá ?”:

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“Um dia Guilherme chegou em casa e seus pais estavam falandosobre a dona Antônia.

– Coitadinha da dona Antonia – disse seu Pai.– Mais ela já tem 96 amos, já era de se esperar que...– Coitada porquê? – perguntou Guilherme, cortando sua mãe.

– Porque ela perdeu a memória” (sic).

 A forma como Hel introduziu Guilherme Augusto no diálogodos pais mostrou-se bastante significativa, visto que era desta formaque a aluna portava-se em sala de aula, raramente aguardava sua vezde falar.

Na história lida, depois de ouvir as respostas dos idosos sobre o queera memória para cada um deles, o menino seleciona alguns objetos

para levar para Dona Antônia.“Então, Guilherme Augusto voltou para casa, para procurar

memórias para Dona Antônia, já que ela havia perdido as suas. Eleprocurou uma antiga caixa de sapato cheia de conchas, guardadas hámuito tempo, e colocou-as com cuidado numa cesta.

Ele achou a marionete, que sempre fizera todo mundo rir, ecolocou-a na cesta também.

Ele lembrou-se, com tristeza, da medalha que seu avô lhe tinhadado e colocou-a delicadamente ao lado das conchas.Depois achou sua bola de futebol, que para ele valia ouro; por

fim, entrou no galinheiro e pegou um ovo fresquinho, ainda quente,debaixo da galinha”. (FOX, 1995, p.16-21).

Nessa passagem a autora do livro não explicita os locais nos quaisestão guardados os objetos que Guilherme Augusto pega para compora cesta que levará para Dona Antônia, exceto o local de onde ele pega

o ovo.

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Esli se coloca frente ao texto da seguinte maneira: “Guilhermeencontrou um ovo de galinha e lembrou do que a Sra Silvano tinhadito. Em seu quarto encontrou uma marionete antiga e lembrou doque a Sra Mandala tinha falado. Achou também uma bola de futebolque para ele valia ouro e lembrou do que o Sr. Possante tinha falado.Estava cheretando seu armário e achou uma caixa de sapatos antiga

cheia de conchas e lembrou o que o Sr Cervantes tinha dito” (sic).Talvez Esli não tenha explicitado o local onde Guilherme Augusto

pegou o ovo devido ao fato de a autora já tê-lo feito. Agora, no lugarde autoria, a criança explicita aos seus leitores os locais em que omenino encontrou os outros objetos, pois, talvez, como leitora, elatenha sentido a ausência dessas informações no texto. Normalmenteas crianças guardam seus brinquedos e objetos pessoais em seusquartos, em seus armários. Especificamente na passagem em que omenino encontra a caixa de conchas, Esli sugere que, talvez, por estarguardada ali há muito tempo, o menino a tivesse esquecido e só atenha encontrado por estar xeretando no armário. Considerações finais

Certamente, muitos outros indícios de refração poderiam ser

encontrados nestas e em outras produções. Ao olhar para os textosproduzidos fomos percebendo que as crianças reproduziram passagensda narrativa, porém, combinaram alguns de seus elementos comoutros sentidos que produziram a partir dela. A palavra, comosigno ideológico, não se colocou neutra, ela penetrou nas relaçõesdos sujeitos refletindo e refratando a realidade em transformação(BAKHTIN, 2002). Nesse sentido, as crianças transformaram, emparte, personagens, cenário e ações.

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 A atenção ao que os alunos querem nos dizer com/em seus textos,às palavras que nos são ditas por eles e que mediam suas produçõesescritas, permitem-nos perceber que as escolhas e a direção impressaspela professora às atividades de leitura e de escrita, marcadas porintenções relativas ao processo de ensino, ressignificam-se durantea atividade de leitura e produção de texto, mediadas pela dinâmica

intersubjetiva em que se materializam, evidenciando que:

[...] toda enunciação, mesmo na forma imobilizada da escrita,é uma resposta a alguma coisa e é construída como tal. Nãopassa de um elo da cadeia dos atos de fala. Toda inscriçãoprolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmicacom elas, conta com as reações ativas da compreensão.(BAKHTIN, 2002, p.98).

No movimento da comunicação verbal, professora e alunospraticaram a leitura e a escrita nos seus contextos de utilização,elaborando significados e sentidos do/no texto, fazendo-se leitorese escrevinhadores, pois estes, como assinala Nilma Lacerda (2003,p.228), “não nascem feitos [...] mas se formam com trabalho edeterminação”.

Referências bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. Martins Fontes,2003.BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo,Hucitec, 2002.

FARACO, Carlos Alberto. “Autor e autoria”. In: BRAIT, Beth (Org).

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Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005.FOX, Mem. Guilherme Augusto Araújo Fernandes. Ed. Brinque-Book, 1995.GERALDI, João Wanderley. “O professor como leitor do texto doaluno”. In: MARTINS, Maria Helena (Org) Questões de Linguagem.6.ed. São Paulo: Contexto, 2001.

______. (Org). O Texto na Sala de Aula . São Paulo: Ática, 1997.______. Portos de Passagem. 4.ed. São Paulo: Martins Fontes,1997.______ e FONSECA, Maria Nilma G. “O circuito do livro e a escola”.In: GERALDI, João Wanderley, (Org). O Texto na Sala de Aula . SãoPaulo: Ática, 1997.______. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação.Campinas, SP: Mercado das Letras – ALB, 1996.LACERDA, Nilma G. “Os Peixes de Schopenhauer: Leitura e ClassePensante”. In: VIELLA, Maria dos Anjos L. (Org) Tempo e espaçosde formação. Chapecó: Argos, 2003.LAJOLO, Marisa. O texto não é pretexto. In: Zilberman, R. (Org.)Leitura em crise na escola : as alternativas do professor. Porto Alegre,Mercado Aberto, 1988, p. 51-62.PERRONI, Maria Cecília. Desenvolvimento do discurso narrativo.

São Paulo: Martins Fontes, 1992.SIQUEIRA, João Sayeg. Organização textual da narrativa . São Paulo:Selinunte, 1992.

 VIGOTSKI, Lev Semenovitch. Pensamento e Linguagem. São Paulo:Martins Fontes, 2003.

 VYGOTSKY, Lev Semenovitch. A formação social da mente. SãoPaulo: Martins Fontes, 1989.

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“Ensino de análise

linguística – reflexão e construçãode conhecimentos ou memorização e

reconhecimento de estruturas?”

Marcela Thaís Monteiro da Silva PIBIC/FACEPE/CNPq/UFPE – [email protected]

Lívia Suassuna UFPE – [email protected]

RESUMO: Nesse estudo, investigamos como o trabalho com a Análiselinguística (AL) se dá no ensino undamental II. Assim, problematizamosos processos de ensino-aprendizagem de AL observados em duas escolasbuscando compreender se estes avoreciam a compreensão dos processoslinguísticos e discursivos presentes nos textos ou constituíam-se comoum exercício marcado pela ênase em nomenclaturas e reconhecimentode estruturas.

PALAVRAS-CHAVE: ensino de português; análise linguística; gramática-ensino

RESUMEN: En este estudio, examinamos como el trabajo con el Análisislinguístico (AL) ocurre en la enseñanza básica. Así, problematizamos

los procesos de ensenãnza-aprendizaje de AL vistos en dos escuelasbuscando comprender si éstos auxiliaban la comprensión de los procesoslinguístico-discursivos presentes en los textos o se caracterizaban comoun ejercicio enmarcado por el énasis en terminologías y reconocimientode estructuras.

PALABRAS-CLAVE : enseñanza de portugués; análisis lingüístico;gramática-enseñanza

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Introdução

Este estudo integra um projeto mais amplo, intitulado Ensino de

análise linguística – representações e práticas, por meio do qual pretendemosinvestigar o ensino de análise linguística (AL) e algumas de suas múltiplasdimensões. O termo análise linguística, cunhado por João Wanderley 

Geraldi em 1981, designa uma das práticas estruturadoras do ensino deportuguês, ao lado da leitura e da produção textual. Especificamente, a

 AL consistiria num trabalho de reflexão sobre os recursos expressivosda língua e das operações discursivas realizadas no uso da linguagem.

É importante destacar que a AL, tal como proposta pelo autorcitado, coaduna-se com uma concepção de linguagem como interação,no quadro de um ensino de base sociointeracionista. Essa concepçãode linguagem como interação ganhou força no contexto histórico-epistemológico que se convencionou chamar de “virada linguística”(transição entre as décadas de 1970 e 1980), cuja principal marca seriauma visão ampliada da linguagem, a partir das teorias da enunciação.

  Assim, além do enunciado propriamente dito, estariam em jogo ascircunstâncias de sua produção.

Do ponto de vista do ensino da língua materna, os impactos daproposta de Geraldi foram muitos, se não em termos de modificações

significativas nas práticas vigentes, ao menos em termos da geração dequestionamentos sobre o que se costumava fazer nas aulas de português.Disse o autor, em um de seus estudos, que uma diferente concepção delinguagem haveria de engendrar não apenas diferentes metodologias deensino, mas, sobretudo, novos conteúdos. Afirmou ele também que AL não era apenas um novo rótulo para o ensino tradicional de gramáticae que seria importante decidir sobre o lugar da metalinguagem noensino de língua.

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Entre os muitos questionamentos, dúvidas e tensões derivados deuma proposta que trazia para o interior da sala de aula o texto, emlugar do rol de palavras e frases prontas e modelares, o uso da línguaem lugar da mera descrição, o funcionamento dos discursos em lugarda prescrição gramatical, podemos citar:

(a) a ideia de que bastaria retirar do texto o elemento gramaticala ser estudado, permanecendo os mesmos os procedimentos deanálise e prescrição que já se praticavam na escola;(b) a ideia de que não se deveria mais ensinar gramática, masapenas leitura e produção de textos;(c) a ideia de que a AL seria uma atividade de correção do textodo aluno, uma vez que foi sugerido que um dos momentosprivilegiados do estudo da língua seria justamente a reescrita;(d) a ideia de que a AL seria a substituição de aulas de gramáticanormativa da língua padrão por modelos de análise da linguísticateórica e aplicada;(e) a crença de que, sob o rótulo de AL se deveriam ensinar,ainda que por metodologias diferenciadas, os mesmos conteúdoselencados nas gramáticas normativas conhecidas.

Os inúmeros processos de formação (inicial e continuada) deprofessores que se seguiram à proposta da AL, bem como os diferentesdocumentos curriculares e livros didáticos produzidos dos anos 1980até hoje também têm gerado questionamentos e dúvidas que se vemprocurando tematizar e investigar no contexto da pesquisa acadêmica. Asdemandas por sugestões de trabalho didático são muitas e são tambémmuitas as indagações sobre os saberes dos professores e suas imagens ecrenças acerca do que seja ensinar português, gramática e AL.

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Do quadro acima descrito derivam questões que julgamos relevantepesquisar e que vão desde as concepções dos professores sobre línguae ensino de língua, até as práticas de sala de aula, passando pordefinições e documentos curriculares, livro didático de portuguêse formação de professores. No caso do presente trabalho, a questãoque nos ativemos é: as aulas de gramática/AL (dependendo de como

os professores concebam e pratiquem o ensino de língua portuguesa)são aulas caracterizadas:

1. pela memorização, pelo reconhecimento de estruturas,pelo investimento na nomenclatura e na prescrição, pelaênfase nos conceitos e exemplos, por exercícios mecânicos edescontextualizados de correção de frases, típicos da perspectivagramatical tradicional; ou2. pelo cotejo de construções, pelo raciocínio indutivo, pelaconsideração das variedades linguísticas, pela análise das ereflexão sobre as construções discursivas e seus efeitos de sentido,típicos da perspectiva sociointeracionista?

Com vistas a equacionar as indagações acima, traçamos comoobjetivo geral para esse estudo a análise e discussão do ensino de AL 

no ensino fundamental e como objetivos específicos: (1) analisar see em que medida o ensino de AL se constitui efetivamente comouma prática reflexiva; (2) Identificar as estratégias utilizadas pelosprofessores para promover a reflexão a respeito da língua e de seususos; (3) Identificar se predomina, nas aulas de AL, a indução ou adedução enquanto formas de raciocínio, pensamento e descobertacientífica; (4) Verificar se a aula de AL favorece o reconhecimento das

 variedades linguísticas e de seus efeitos de sentido; (5) Investigar que

papel é atribuído à nomenclatura na aula de português.

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1. Fundamentação teórica 

Redimensionando a aula de português e de gramática 

Na perspectiva tradicional do ensino, a língua ainda é concebida,de modo predominante, como um sistema homogêneo, constituído

de signos definíveis pelos contrastes que se pode estabelecer entre eles,como um código abstrato, transparente e descolado de suas condiçõessócio-históricas de produção (MARCUSCHI; VIANA, 1997).

 As propostas alternativas para o ensino de língua tomam como baseoutra concepção de linguagem, agora vista como processo, discurso,forma de interação social. Tal concepção colocou o desafio de definirnovos conteúdos de ensino, novas metodologias e procedimentosdidáticos, assim como novos modos de avaliar a aprendizagem.

Levando em conta pressupostos dessa ordem, é preciso decidirsobre o que ensinar e avaliar, dando destaque a certos conhecimentos ecapacidades em relação a outros. Atualmente, existe uma preocupaçãode tentar contemplar o uso social da língua, numa perspectivadiscursiva. Desse modo, as atividades e perguntas propostas, namedida do possível, não estarão submetidas ao conhecimento abstratoda língua, ao domínio da nomenclatura e à concepção de correção

propostos pela gramática; antes, trata-se de verificar se o aluno saberelacionar os conhecimentos metalinguísticos ao uso da língua.Também importa termos em mente que o fim último do ensino

de português é formar cidadãos leitores e produtores de textos, emsuas mais diversas configurações, através de três práticas articuladas,de acordo com a sugestão de Geraldi (1996, 1997b): leitura, produçãode textos e AL. A leitura seria entendida como possibilidade deinterlocução com o autor/texto, compreendendo, avaliando e

criticando sua visão de mundo. A escrita diz respeito à capacidade de

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colocar-se como alguém que registra sua visão de mundo para ser lidopor outros. Já a atividade de AL teria como ponto de partida o uso dalíngua, enfocando aspectos linguísticos e discursivos desse uso, para, emseguida, permitir o retorno, com conhecimentos ampliados, às práticaslinguísticas de leitura e escrita. Nessa situação de reflexão sobre os usosda língua, devem ser priorizados os níveis pragmático e discursivo de

análise, funcionando os outros níveis (ortográfico e gramatical, p. ex.)como suportes da compreensão dos fenômenos estudados.

Destaque-se que a prática de AL se aplica simultaneamente à leiturae à produção de textos, quaisquer que sejam estes (dos alunos ou dosautores trazidos para a sala de aula). Quanto à leitura, a AL ajudaria naapreciação e compreensão dos muitos efeitos de sentido presentes notexto. Quanto à produção de textos, a análise possibilita a expressão dasubjetividade do autor e dos sentidos que ele propõe ao seu leitor (oque também demanda apreciação e compreensão de efeitos de sentido).

 Assim sendo, a avaliação ganha muito em qualidade – diante de textos,lendo e escrevendo com nossos alunos, podemos superar a dicotomiacerto x errado. Caso o aluno cometa erros – e é certo que os cometeráno processo de aprendizagem –, devemos encará-los como resultantesdo nível de entendimento que ele possui da língua, de suas relaçõescom as diferentes situações de enunciação com que se depara. Avaliar

esses erros passa a ser promover um trabalho de reflexão sobre a línguae suas peculiaridades, uma atividade de construção/apreensão de suasregras de funcionamento.

No que tange à AL propriamente dita, vimos que, conforme atradição, o ensino de gramática, ainda hoje, consiste em levar os alunosa dominar uma nomenclatura específica, com a qual se descreve e regulaa modalidade padrão escrita da língua, predominando, nesse processo,o enfoque normativo sobre o descritivo. Desse modo, o ensino

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tradicional pauta-se na metaliguagem gramatical (NGB), além de ater-se ao ensino da modalidade escrita da língua padrão, com a aplicaçãode exercícios de completar lacunas com a forma adequada, flexão determos, correção de frases erradas e reconhecimento de estruturaslingüísticas, em detrimento da indução ao conhecimento sobre a línguamaterna. Na opinião de Geraldi (1996), todo falante realiza, em sua

prática linguística, atividades epilinguísticas por meio das quais avaliaos recursos expressivos que utiliza. No entanto, as atividades de ensinode gramática não constituem, na prática escolar, a continuidade (queseria desejável) dessas reflexões epilinguísticas. A gramática normativatradicional é tida como a verdadeira e única reflexão sobre os recursosexpressivos de uma língua. Diz o autor que as análises resultantesdas teorias gramaticais adotadas e ensinadas na escola são respostaselaboradas para perguntas que os alunos não formularam. É por issoque muitos conteúdos gramaticais, regras e classificações pouco ounada lhes dizem e, não obstante isso, constituem-se em matéria deensino-aprendizagem; são conteúdos nem sempre epistemologicamenteconsistentes e de relevância sociocultural duvidosa.

O enfoque no uso, entretanto, como ressalta Pisciotta (2001), aocontrário do que muitos imaginam, não significa que os aspectosgramaticais da língua tenham perdido espaço ou importância. Os

fenômenos gramaticais, na verdade, estão presentes como objetos deobservação, descrição e categorização, e são essenciais para o estudodo discurso.

Não parece haver dúvidas sobre a importância do conhecimentogramatical para a leitura e a produção de textos, fim último do processoensino-aprendizagem da língua portuguesa. O que convém rever são asbases desse ensino. Marcuschi (1999) considera que o conhecimentometalinguístico emerge no âmbito das atividades de leitura e produção

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de textos, não se confundindo, portanto, com um mero exercícioanalítico de palavras ou frases isoladas. Para a autora, gramática ediscurso são interdependentes: o texto necessita de uma ordenaçãoformal representada pela gramática, mas com características funcionaisque permitam a produção de efeitos de sentido praticada no uso efetivoda língua. Saber gramática, então, envolve a competência para interligar

e articular fenômenos, seguir regras e ordenar estruturas que favoreçama compreensão e a produção de significados discursivos.

Pisciotta (2001) ainda salienta que, embora pareça simples, constituigrande desafio para o professor aliar a AL a situações de uso efetivoda linguagem, construindo explicações e descrições a partir dasregularidades observadas em textos significativos para os alunos. A autora propõe um conceito ampliado de AL, que incorpora, além dequestões gramaticais e fonéticas, aspectos semânticos e pragmáticosrelacionados à produção e à recepção dos discursos. Por isso não setrata apenas de mudança de rótulo, mas de concepção de língua e deobjetivo de ensino, o que traz implicações também para a metodologiaa ser utilizada e para os conteúdos a serem ensinados. Um dos aspectosque nos interessam em nossa investigação é justamente a formacomo os professores vêm lidando com esse desafio: pretendemos ver,além das concepções de língua que informam o ensino de AL, os

conteúdos definidos em cada aula e as metodologias adotadas com vistas à articulação entre o linguístico e o discursivo, entre linguageme sociedade.

2. Metodologia 

  A pesquisa realizada foi do tipo qualitativo-indiciário, por isso,

nela utilizamos poucos dados numéricos. Tratou-se, portanto, de uma

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investigação se que se baseou na observação do dado no ambientenatural em que ele se manifesta, no nosso caso, na sala de aula. Alémdisso, dados singulares foram considerados importantes para estapesquisa, assim, trabalhamos com indícios, pequenos dados, queforam passíveis de comparações, reflexões e levantamento de hipótesesexplicativas.

Para desenvolvermos a investigação, analisamos a prática de ensinode duas docentes de duas escolas públicas da cidade do Recife/PE.Em cada escola foram observadas 10 horas/aula. Na primeira unidadeescolar, pertence à rede estadual de ensino de PE, foram examinadasaulas numa 7ª série do ensino fundamental. A sala de aula onde sedeu a observação dispunha de boa infraestrutura, era arejada e bemiluminada, além disso, era composta por um corpo discente de trinta esete alunos, cuja faixa etária era entre doze e dezessete anos. A docente,cuja prática de ensino foi observada, tem formação em Letras, possuimais de dez anos de experiência em ensino de língua portuguesa eparticipa de cursos de formação continuada.

Na segunda instituição, que é do âmbito federal de ensino,observamos aulas de uma turma de 9ª série, a qual era composta portrinta e três alunos, que tinham entre doze e treze anos. A professoraque participou da pesquisa é formada em Letras e atua a mais de uma

década no ensino de língua portuguesa, além de integrar um grupo depesquisa sobre ensino de língua portuguesa. Além disso, o ambienteonde as aulas aconteceram era iluminado e arejado.

Registramos os dados coletados na pesquisa em gravador de vozMP4 e em diários de campo. Entretanto, antes de empreendermosa investigação sobre a prática de ensino de AL em cada instituição,entramos em contato com a diretoria e com os professores das referidasescolas, a fim de obtermos a autorização para a realização da pesquisa.

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 Assim, os professores bem como a diretoria das escolas assinaram umTermo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual assegura, entreoutros aspectos, o anonimato das escolas que participaram deste estudo.

 A coleta de dados se deu no período de março a maio de 2010.

3. Resultados e discussão

 A partir da coleta dos dados foram constatadas várias situaçõesdidáticas que serão aqui discutidas. Dessa forma, trataremos dequatro situações referentes às práticas de ensino de AL observadasnas duas escolas participantes da pesquisa, sendo as duas primeirasreferentes à Escola Estadual, enquanto as outras duas tangem à práticadocente vista na escola experimental. Tais situações foram escolhidaspor representarem bem as práticas das docentes no que se refere aoensino de AL, durante o período da nossa investigação. Na análise ediscussão que se seguirão, chamaremos a professora da Escola Estadualde “professora A” e referida escola se denominará “escola 1”; a docenteda escola experimental será aqui nomeada de “professora B”, e unidadede ensino será identificada como “escola 2”. Passemos à análise:

Exemplos da  prática de ensino de AL da professora A:

Situação 1: a transmissão de conceitos acabados

 Ao iniciar o assunto tipos de frases, a professora A parte do modotradicional de ensino de gramática. Inicia o ensino de tal conteúdoprogramático pela conceituação (do que são frases imperativas edeclarativas, por exemplo), apresentando as nomenclaturas presentesna gramática tradicional sobre o conteúdo curricular trabalhado.

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Em seguida, exemplifica os tipos de frases usando enunciadosdescontextualizados, ou seja, os enunciados apresentados pelaprofessora não estavam inseridos em um texto, portanto, não pertenciaa um processo discursivo real; por fim, como exercício, a docente pedeaos alunos que construam alguns exemplos das frases ensinadas.

Nota-se que, ao iniciar a explicitação do assunto valendo-se das

definições dadas pela gramática tradicional (GT), a professora não viabiliza o pensamento, a reflexão e a descoberta do porquê de taisfrases receberem determinadas nomenclaturas e a sua correlatafuncionalidade em contextos reais de interação.

Consideramos que exercícios que estimulam a reflexão dos alunossão de grande relevância para a construção do conhecimento linguísticoe discursivo do aprendiz. No caso da referida situação, notamosque a participação do aluno na construção do conhecimento foi,praticamente, nula visto que a ele coube o papel de receptor de umconceito acabado e reprodutor de estruturas linguísticas deslocadas doseu contexto real de uso, uma vez que apenas afirmamos, negamos ouperguntamos algo a alguém em um espaço de interação. Além disso,

 verificamos na aula o amplo uso da dedução como modo organizaro pensamento, já que inicialmente definições são apresentadas para,posteriormente, se deduzir as possíveis aplicações.

 Ainda sobre a metodologia empregada no desenvolvimento da aula,acreditamos que a utilização de textos, em vez de enunciados isolados,facilitaria a compreensão do alunado acerca da metalinguagem. Dessemodo, observar no interior do texto, o uso das referidas estruturaslinguísticas permitiria ao aluno fazer a conexão entre a nomenclaturae a função que as sobreditas estruturas exercem.

Também destaca Ignácio (1993) a importância da existência de uma“adequação programática” entre os assuntos ensinados, por meio da

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qual os exercícios de análise sintática se façam de maneira sistemática,integrados com a produção de textos e a leitura de textos variados. Essaprática visaria ao entendimento, assimilação e uso da escrita, e o melhormétodo de ensino seria o indutivo, no qual se parte da observação dosfatos para se chegar a definições e classificações.

Situação 2: o texto a serviço do reconhecimento de estruturas

Outra situação observada na prática de ensino da professora A serefere à leitura. Ao trabalhar a compreensão textual, a docente indica aleitura de um texto jornalístico. Tal atividade foi realizada em equipesde cinco alunos, e cabia a estes ler e discutir sobre o texto, a fimresponder oralmente as perguntas elaboradas pela docente. Depois daleitura e da discussão do texto por parte dos aprendizes, a professoraos questionou sobre o tema da matéria que tinham lido, perguntouem que região tinha ocorrido o terremoto mencionado na notícia,entre outras questões concernentes à compreensão textual. Por fim,como atividade para casa, pediu que os alunos encontrassem no texto5 palavras sinônimas, 2 palavras parônimas, 5 verbos e 10 substantivos.Dessa forma, não presenciamos a discussão prévia sobre a finalidadeatribuída aos verbos presentes no texto ou sobre o valor semântico

dos sinônimos ali verificados, por exemplo.Percebe-se, a partir da situação descrita, que a professora procura

articular a leitura aos conteúdos de AL, entretanto, o faz de modo quenão promove a reflexão dos alunos sobre a língua, uma vez que não secriam meios de observação sobre a função das estruturas lingüísticaspresentes na produção textual. Assim, após fazer indagações básicassobre o texto, a docente pede que nele sejam coletados substantivos,

 verbos, palavras sinônimas, etc. O exercício proposto trata-se, pois,

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de um exercício de reconhecimento de estruturas, no qual o texto étomado como um “depósito” de classes de palavras, as quais o alunodeve identificar.

Sobre o conhecimento metalinguístico, Marcuschi (1999) entendeque seu surgimento deve emergir no âmbito das atividades de leiturae produção de textos, não se confundindo, portanto, com um mero

exercício analítico de palavras e frases. As discussões e sugestões para o trabalho reflexivo em sala de aula

são inúmeras. Concordamos com Hengemuhle (2007), quando esteadvoga ser a situação-problema um meio que gera interesse e instigaa busca pela solução de uma problemática. Desse modo, convémque o profissional docente priorize uma metodologia que vise àproblematização dos conteúdos ensinados aos aprendizes, com vistas àressignificação do conhecimento adquirido por eles. Em oposição a umprocesso de ensinar e aprender que valorize a memorização de dados ea sua reprodução, as teorias contemporâneas valorizam e aproveitamos conhecimentos prévios dos alunos, incentivam e desenvolvem seusenso e sua capacidade crítico-argumentativa, a fim de proporcionar-lhes a construção de novos saberes.

Exemplos da prática de ensino de AL da professora B:

Situação 3: a participação do aluno na construção de orações

adverbiais

 Ao tratar o conteúdo curricular “orações subordinadas adverbiais”,a mestra pede que os alunos elejam um sujeito para realizar uma açãoe, posteriormente, pede aos aprendizes para eles relacionarem a açãorealizada pelo sujeito à ideia de tempo. Os alunos escolhem o sujeito

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“João” e atribuem a ele a ação de “correr”, por fim, atrelam tal ação àideia de tempo “amanhecer”. Do raciocínio dos alunos surge a oração“João corre quando amanhece”. Após a elaboração do enunciadorealizado pelos aprendizes, a docente solicita que os mesmos tentemnomear a oração adverbial construída por eles, procurando designá-la como faz a gramática tradicional. A docente segue a mesma

estratégia para trabalhar os outros tipos de orações adverbiais e, aofinal da aula, expõe textos publicitários aos alunos, para que elesem coletividade, na sala de aula, criem hipóteses explicativas para oemprego das orações adverbiais encontradas naquele gênero textual.Na aula, observamos que os alunos são sujeitos que constroem o sabersobre a língua, visto que refletem sobre ela ao construir enunciadose tentar nomeá-los.

Sobre as tentativas de construção de conhecimentos, Geraldi(1996) julga que estas importam e ensinam mais do que o estudodos produtos de reflexão gerados pelos gramáticos, sem que delessaibamos os critérios e as razões.

Situação 4: as orações adjetivas e a língua em uso

  A professora B, em outra aula, trata das “orações adjetivas”.

Logo no princípio de uma das aulas observadas, os aprendizes sãoindagados sobre a função do adjetivo. Após a resposta dos alunos, aprofessora, a fim de sondar se eles conseguiriam cambiar um adjetivopara uma oração adjetiva, pediu que os alunos transformassem oadjetivo da frase “Conheço um menino falador.” em uma oraçãoadjetiva. Os alunos, obtendo sucesso, construíram o seguinteenunciado: “Conheço um menino que fala muito.”.

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 Após verificar que os alunos compreendiam a função do adjetivo,além de saberem construir uma oração adjetiva, a docente ofereceexplicações sobre os dois tipos existentes de orações adjetivas(explicativas e restritivas) e recomenda aos alunos que atentem aosentido dessas orações e não apenas para a presença ou ausênciade vírgulas. Ao final da aula, além de mostrar anúncios através dos

quais os alunos puderam perceber o emprego das orações adjetivas,a professora solicitou, como atividade para casa, que eles buscassemoutros anúncios através dos quais pudessem ser encontradas oraçõesadjetivas, observando, sobretudo, as intenções do autor do texto aoempregá-las.

Nesse trabalho, observou-se que, além de desenvolver a reflexãodos alunos sobre as orações adjetivas e apresentar-lhes os seus doistipos, a docente procurou destacar os usos dessas orações no gênerotextual anúncio publicitário, destacando que o discurso publicitáriotambém se vale de adjetivos para qualificar os produtos que desejapromover. Dessa forma, como considera Pisciotta (2001), as atividadesde AL, partindo de discursos concretos, mobilizam o conhecimentoque o aluno já traz e desenvolvem novas habilidades e saberes.

Também constatamos que os processos de dedução e induçãoforam utilizados pela docente com vistas à organização do saber

linguístico e discursivo por parte do alunado. Ora a professora instigaos alunos a utilizarem os conhecimentos linguísticos e epilinguísticosde que dispunham, ora ela insere a explicação dos tipos de oraçõesadjetivas que existem na língua e conceitua os supracitados tipos.

  Acreditamos que a aula de português deve ser um momento deprodução simbólica e construção de subjetividades, dessa forma, oestudo da língua formal estaria a serviço do dizer.

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Conclusão

Mediante a pesquisa empreendida verificamos duas situações deensino de AL distintas. Na escola A, percebeu-se um ensino de AL muito próximo do ensino tradicional de gramática; assim, as aulasobservadas pouco fomentaram a reflexão sobre os aspectos linguísticos

e discursivos; deu-se ênfase à memorização e ao reconhecimento deestruturas, e a dedução foi amplamente utilizada durante as aulas. Asatividades com texto enquanto totalidade semântica e o reconhecimentodas variedades linguísticas, praticamente, não foram observados.

Na escola B, por sua vez, verificou-se o estímulo à reflexão dosalunos sobre os aspectos linguísticos e discursivos da linguagem. Alémdisso, observou-se que o discurso do aprendiz foi relevante e tomadocomo parte da aula. Dessa forma, por ter havido, na maior parte das

 vezes, atividades desenvolvidas com a língua em uso, percebeu-se queas variedades linguísticas são valorizadas e utilizadas no processo deensino-aprendizagem. Por fim, importa dizer que a nomenclaturaemergiu, durante as aulas, após a reflexão sobre as funções de cadaelemento da língua, não se caracterizando, portanto, como o objetopropriamente dito de ensino da língua.

  A partir dos resultados obtidos, acreditamos ser relevante o

desenvolvimento de trabalhos e políticas de formação docenteque apresentem estratégias de promoção da AL e que destaquema importância da reflexão sobre a língua nas práticas de ensino doprofessor de português.

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 Avaliação em larga escala

e produção textual:reflexões sobre o Enem

Ewerton Ávila dos Anjos Luna UFRPE – [email protected]

RESUMO: Este estudo objetiva investigar o que pensam avaliadores daprova de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). O ocoé reetir sobre diculdades encontradas no processo de avaliação emlarga escala. O corpus é composto por entrevistas realizadas com os cor-retores; e o reerencial teórico é ormado por contribuições de estudiososda Linguística e Educação.

PALAVRAS-CHAVE: avaliação em larga escala; produção textual;ENEM.

ABSTRACT: This study aims to investigate what think evaluators o writ-ing test rom Brazilian High School Examination (ENEM). The ocus is onthe reection about difculties during a large-scale evaluation process.The data is composed by interviews realized with some evaluators; andthe theoretical reerence is ormed by contribution o scholars romLinguistics and Education.

KEYWORDS: large-scale evaluation; writing; ENEM.

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Introdução

O processo de avaliação em larga escala é bastante complexo.Dentre suas finalidades, podemos destacar: (1) a seleção, como é feitonos vestibulares e concursos, (2) e a identificação da real situaçãodos sistemas de ensino. Em relação à primeira, pode-se afirmar que a

proposta é classificar os candidatos, e assim hierarquizá-los. A segundaé uma tendência que vêm sendo desenvolvida em vários países, e serelaciona à avaliação dos sistemas de ensino, no geral, e das escolas, dasIES, dos professores, dos recursos teórico-metodológicos que guiam oensino, em particular.

No Brasil, pode-se citar, por exemplo, a partir da década de 1990,a criação do SAEB, Sistema de Avaliação da Educação Básica; doENEM, Exame Nacional do Ensino Médio; do ENC, Exame Nacional

de Cursos, conhecido por Provão – hoje ENADE – Exame Nacionalde Desempenho de Estudantes, avaliando o Ensino Superior. Além deexames criados mais recentemente como a Prova Brasil, que avalia apenasestudantes de ensino fundamental de 4ª e 8ª séries e o Encceja, ExameNacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos.

  Vianna (2003, apud KELLANGHAN, 2001) afirma que asrazões para estes tipos de avaliações são inúmeras: “destacando-se,

inicialmente, como uma de suas prioridades, a identificação deproblemas de aprendizagem, com o fito evidente de imediata superaçãodo quadro apresentado” (p.45). Entretanto, isso nem sempre ocorre.Será, por exemplo, que após os resultados são sempre criadas políticaspara redirecionamento de práticas? Será que os relatórios produzidossão acessíveis aos professores? Será que as IES privadas não desvirtuamsuas práticas para se preparar para uma avaliação e depois usar oresultado como estratégia de marketing? Até que ponto os resultados

indicam a real situação da educação no país?

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 Além de todas essas questões relacionadas ao tratamento dosresultados, ainda há as referentes ao próprio processo de avaliação.Esses dois tópicos são frutos desse estudo a partir especificamenteda reflexão sobre a avaliação da produção de textos, que configurao referencial teórico (1.0) e do que pensam alguns avaliadores daredação no ENEM, no tópico 3.0, que apresenta e discute os dados

da pesquisa; antes disso, porém, são traçados comentários sobre ospercursos metodológicos (2.0).

O objetivo desse estudo, logo, é investigar como os profissionaisque participam do processo enquanto avaliadores da prova de redaçãodo ENEM se posicionam diante do trabalho por eles realizado comênfase nas dificuldades apresentadas. Considera-se relevante estainvestigação uma vez que aborda o tratamento dado à avaliação daprodução textual por uma esfera importante no âmbito do ensino delíngua: Ministério da Educação; e, ainda, por refletir acerca de umExame que vem se popularizando a cada ano. No ano de sua criação,por exemplo, o ENEM teve cerca de 150 mil participantes. Em 2010, onúmero de concluintes e egressos do Ensino Médio que participaram,

 voluntariamente, aumentou para cerca de 4,6 milhões.

1. Avaliação da produção textual

Devido à natureza processual da escrita, trabalhos no campoda produção textual (FERREIRO, 1996; ABAURRE et al., 1997;ROCHA, 2003; entre outros) enfatizam um ponto de vista da avaliaçãoque leva em consideração não apenas o produto final do texto, mastambém todo o processo de escritura como a revisão e a refacção.Rocha (2003), por exemplo, entende a revisão:

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Como um procedimento que permite não apenas ver melhormas, também, ver de outra perspectiva, na medida em que,durante a produção da primeira versão do texto, o aprendiztem sua atividade reflexiva centrada em aspectos como: o

que dizer, como dizer, que palavras usar... Durante o processode revisão, a aluno tem possibilidade de centrar esforços

em questões pertinentes ao plano textual-discursivo, comodizer mais, dizer de outro jeito, analisar e/ou corrigir o que foi

dito... (p.73).

Em relação ao trabalho de reescrita, Ruiz (2001) destaca aimportância de que, mesmo que esta etapa ocorra após a leitura eas sugestões do professor, o aluno seja o responsável para encontraros recursos que melhorarão seu texto. Segundo a autora, “o grande

proveito possível que o aluno pode tirar, em função de uma intervençãodo professor em seu texto, é aquele que advém também de um esforçopessoal seu...” (p.78). Para Ruiz, a avaliação resolutiva incita o alunoa apenas realizar atividade de cópia enquanto reescrita, impedindoassim a oportunidade de reflexão.

Nessa perspectiva o erro é concebido como fundamental para aaprendizagem. Ferreiro (1996), em estudo sobre crianças, afirma quenão se pode esperar que elas saibam fazer perfeitamente aquilo queainda estão aprendendo, por isso não se pode aplicar os juízos advindosda norma adulta (absoluta). Abaurre, Fiad e Mayrink-Sabinson (1997),afirmam que:

Durante um longo período, os estudos e práticas pedagógicasignoraram o fato de que os “erros” cometidos pelos aprendizesde escrita/leitura eram, na verdade, preciosos indícios de

um processo em curso de aquisição da representação escrita

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da linguagem, registrando os momentos em que a criançatorna evidente a manipulação que faz da própria linguagem,história da relação que com ela (re)constroí ao começar aescrever/ler (p. 16-17).

Esses posicionamentos em relação ao erro, à forma como o texto

é concebido, aos aspectos contextuais, etc. podem ser observados apartir dos ganhos advindos das teorias do discurso. A concepção delinguagem como trabalho social “mostra que não se trata de aprenderuma língua para dela se apropriar para, posteriormente, usá-la; trata-se,antes de usá-la em processos interativos...” (SUASSUNA, 2004, p.133).Mas nem sempre, como pôde ser observado anteriormente, essa visãofoi preponderante às demais. O que é avaliado nas produções textuaisdos alunos está diretamente relacionado à concepção de língua que

subjaz a prática do docente. Segundo Marcuschi (2004),

Os critérios selecionados e atualizados pelo professor de línguamaterna nos procedimentos avaliativos podem ser vistoscomo fortes indicadores dos valores lingüísticos e culturaisque vigoram em ambiente escolar (e mesmo na sociedade demodo mais amplo) a respeito da linguagem (p.4)

Geraldi  (2002),  ao questionar como as produções de alunossão avaliadas, destaca que muitas vezes a escola prepara para a vida“encarando-se o hoje como não vida”. Existe, então, um aluno-funçãoque escreve para a função-professor, ou seja, há uma descaracterizaçãodos sujeitos. Segundo o autor, nós, professores, “precisamos nos tornarinterlocutores para, respeitando-lhe a palavra, agirmos como reaisparceiros: concordando, discordando, acrescentando, questionando

perguntando, etc.” (p.128-129).

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 A dificuldade de alunos não se dá pela ausência de interlocutor, esim pela forte presença da imagem da escola como “grande interlocutor”(BRITTO,1983). Em consonância, Leal (2003) afirma que a lógicaescolar elimina “a atitude responsiva ativa, pois o aluno sabe deantemão que nada ou muito pouco pode esperar como resposta efetivado que produz” (p.55). Destaca, ainda, que propósitos indefinidos ou

objetivos obscuros também trazem sequelas para o processo de ensinoe aprendizagem. Portanto, critérios devem ser claramente estabelecidos.Como destaca Geraldi (1995), o produtor de texto toma decisões

 variadas que comportam os âmbitos gramatical, estilístico, semântico,pragmático, etc. O professor, por sua vez, ao avaliar, deve estar cientedisso e conceber que estes âmbitos estão imbricados na produção deefeitos de sentido.

Por outro lado, o ensino de produção escrita por parte daquelesque concebem a língua como forma heterogênea de interação sócio-historicamente situada está voltado para condições efetivas de uso. Naavaliação, são considerados como critérios importantes não apenasestruturas gramaticais, mas o uso de recursos expressivos que a línguaoferece em prol da construção de sentidos.

2. Percursos metodológicos

 A fim de discutir sobre as dificuldades encontradas pelos avaliadoresno processo de avaliação da redação do ENEM, foi coletado o corpus dapesquisa composto por dados provenientes da realização de entrevistassemi-estruturadas.

Foram escolhidos, aleatoriamente, 09 sujeitos participantes, seguindoo único critério de terem vivenciado o processo de correção do ENEMenquanto avaliadores dos textos. Considera-se que esse número

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permita “uma certa reincidência das informações, porém não desprezainformações ímpares cujo potencial explicativo tem que ser levado emconta” (MINAYO, 1999, p. 102).

Todos possuem graduação em letras e cursos de pós-graduaçãolato ou stricto sensu em Linguística (maioria), Teoria da Literatura eEducação. A maior parte era, no período de coleta (2008), de recém

mestres e estudantes de doutorado, e trabalhavam nas variadas esferasda educação: rede pública e/ou privada; Ensino Fundamental II,Ensino Médio e/ou Ensino Superior.

 As observações analíticas a serem tecidas sobre os dados destapesquisa são realizadas através de ponto de vista baseado em referencialteórico-metodológico desenvolvido ao longo do estudo, que possuicaráter interdisciplinar, estando baseada em pressupostos da Linguísticae da Educação. Destaca-se, ainda, o fato deste trabalho ser um recortede pesquisa mais ampla, intitulada “Avaliação da produção escrita noENEM: como se faz e o que pensam os avaliadores”, dissertação demestrado defendida em 2009 no Programa de Pós-graduação em Letrasda Universidade Federal de Pernambuco.

3. O que dizem avaliadores sobre o processo de correção da redação do ENEM

Dentre as questões apontadas pelos entrevistados, pode-semencionar a dificuldade de trabalhar com mais de um foco de avaliaçãoem uma única competência. Por exemplo, a competência II, da Planilhade Correção da Redação do ENEM, avalia o domínio estrutural dotipo textual solicitado pela proposta, além da compreensão do temaproposto e o desenvolvimento temático apresentado pelo participantea partir da aplicação de conceitos de várias áreas de conhecimento.

Sobre isso, afirma Avaliador 7 (Av7):

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‘desenvolve tangencialmente o tema e/ou apresentaembrionariamente o tipo de texto dissertativo-argumentativoou desenvolve tangencialmente o tema e dominarazoavelmente ou bem o tipo de texto dissertativo-argumentativo ou desenvolve razoavelmente o tema eapresenta embrionária ou precariamente o tipo de texto

dissertativo-argumentativo (lendo a planilha)’eu nunca entendia bem porque as três coisas estavam nomesmo tópico

eu ficava confusa

 Vale ressaltar que o ENEM tem o objetivo de oferecer um retornoao participante para que ele possa refletir sobre sua prática deescrita. Entretanto, se o avaliador que possui domínio teórico-prático

relacionado à produção textual tem dificuldades com a planilha decritérios no momento da avaliação, pode-se, então, inferir como deveficar o participante.

Se não houver um trabalho interpretativo das competências, oparticipante receberá seus resultados e se voltará essencialmente paraa nota, sem ao menos refletir sobre a mesma. De acordo com Av1, estetrabalho com os critérios deve acontecer na escola uma vez que o alunopode não saber, por exemplo, o que significa “desvios gramaticais deescolha de registro e de convenções da escrita pouco aceitáveis nessaetapa de escolaridade”.

Av1: pra mim também é muito complexo corrigir um texto que

não vai ter um leitor da correção

isso me incomoda muito porque eu dialogo

eu digo “aça isso... melhore isso”

 

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Entrevistador: mas embora o candidato não leia sua observação “aça assim”

nesse determinado aspecto ele vai receber uma carta com sua

marcação em eu digo “aça isso... melhore isso”

Av1: é... o ENEM tem isso que vai além dos vestibulares

agora pergunto... ele consegue ler isso aqui?

com as minhas as observações

para ele é muito mais ácil quando ele pega isso aqui [segurao texto avaliado]

ele diz “ah:: ta... tirei sete”

ele não pára e os colégios/

aí há uma questão para reetir também

o colégio não pára

“traz todo mundo... vamos reletir... você tirou tanto na

competência tal... por quê?

altou isso altou aquilo”

talvez seja isso que a equipe organizadora do ENEM esperamas não é o que as escolas estão azendo

ele pega... vê quanto tirou em cada competência

eles não conseguem ler

e les não conseguem. . quer d izer . . . eu a lo bem

hipoteticamente

eu não trabalho com o ensino médio

mas eu acredito que eles não consigam...

‘demonstra domínio da norma culta’

“eu tirei dois... então o que eu preciso azer para tirar a

quatro?quais oram os meus problemas?”

não há o trabalho com os resultados

o trabalho/

ele pára nos resultados quando na verdade ele deveria iniciar

um novo trabalho

Questão similar que também pode ser discutida se relaciona a

avaliação da própria avaliação. Alguns avaliadores questionaram no

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momento da entrevista quando iniciaria o processo de 2008 e comosaberiam se iriam fazer parte da equipe novamente. Pode-se perceber,através do depoimento seguinte, que é sentida a falta da meta-avaliaçãojunto ao avaliador. Assim como o participante recebe a carta sobresua prova, com a finalidade de desenvolver competências até entãopassíveis de melhoramento, cada avaliador precisa também de um

 feedback para a confirmação ou redirecionamento de sua prática. Nofragmento abaixo Av1 expõe sua angústia:

Av1: como é que a gente sabe se vai corrigir esse ano de novo ou não?

porque eu acho que é outra coisa/

deveria ter um retorno para o corretor

“você oi bem... você oi mal”

/.../

isso acontece em outros processos também

a gente trabalha trabalha trabalhadiscute discute discute

mas no nal não recebe um retorno

a gente só sabe se nossa correção oi boa um ano depois quando

eles ligam

me chamou para corrigir novamente...

então eu penso “gostaram da minha correção”

/.../

mas nem sobre isso [cotas] eu recebi um retorno

“olhe... você não bateu as cotas... mas tudo bem”então... “você não bateu as cotas... tem que bater”

eu queria alguma resposta

nem que osse uma bronca porque eu não estava batendo as

cotas

Sobre o último trecho transcrito, tem-se uma referência à quantidadede textos a serem avaliados. Muitos dos avaliadores entrevistadosargumentaram como fator a ser repensado uma vez que o excesso de

material poderia trazer consequências para a qualidade da avaliação.

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Os avaliadores receberam, no ano de 2007, 102 textos por dia duranteum mês.

Av1: no início eu voltava muitomas depois eu parei porque se não eu não terminava nuncaeu acho que se não osse a grande quantidade dessas cotasde cento e tantasa qualidade melhorava

Av5: você ca desesperadovocê tem que corrigir muitas redaçõesum envelope com mais de cem redações

Av7:  /.../ então... assim... eu trabalhei pouco tempo com produçãotextual

inclusive todas as vezes que eu era chamada para trabalharcom correçãoeu sempre dizia “não quero não”por quê... porque eu tenho... não seimeu limite de cansaço mental ele/chegou a trinta quarenta redações eu já/aí eu acho que minha criticidade vai pra as cucuiaseu já não consigo... sabe?

Uma outra observação identificada a partir do discurso dosavaliadores é o fato de alguns criarem uma certa imagem sobre oENEM. É como se o grau de exigência no Exame fosse inferior,por exemplo, à sala de aula ou a outras comissões organizadoras deconcursos. O que foi observado é que alguns avaliadores realizama leitura texto do participante com este pré-conceito, refletindo,portanto, na avaliação feita.

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Av3: aqui a gente/até... eu acho que tem uma certa condescendênciadiante da variedade de estudantes que vem da escolapúblicaque vem com muita deciência... de escola rural...

 /.../a avaliação é virtual

então a gente não pontua questões menoresa avaliação é eita no âmbito maiorque ali engloba muita coisa e muita coisa também passadespercebido né?

Av9: eu vejo que no ENEM você acaba pesando menos em algunscritérios

Entrevistador: isso por quê?por conta da planilha?

Av9: também da planilha... mas eu acho que pesa um outro critérioaí que é o do público que você tá corrigindo

Não há como evitar a reflexão dos avaliadores em relação aoprocesso; ter opiniões particulares em relação à rigidez, por exemplo;mas uma coisa é achar que no ENEM as notas devem ser mais altasporque o Exame é ‘leve’ (Av3 e Av9), porque há participantes declasses economicamente desfavorecidas, e outra é deixar essas visõessubjetivas interferirem no processo. Essa é a ótica apresentada por

 Av6 que, apesar de se posicionar criticamente perante o que lhe é

oferecido, ele procura seguir as instruções recebidas. Para exemplificar,

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 Av6 cita uma comissão de vestibular para qual trabalha em que tinhaque contabilizar os erros do candidato e descontar na nota (sendo ainfração relacionada ao mesmo conhecimento), mesmo discordandode tal postura.

Av6: eu acho que independente das nossas concepções

a gente tem que cumprir o acordadoa gente pode discutir concepções antes de começar a corrigir...entendesse?depois que a gente começa a corrigira gente tem que entrar dentro daquelas concepções queoram ali acordadasvestir a camisa

Considerações finais

Não se pretende aqui afirmar que a avaliação da produção textualno ENEM não seja importante e válida para a busca de melhoriaseducacionais, mas refletir sobre algumas dificuldades vividas emprocesso em larga escala.

 Vale destacar que o mesmo possui certas limitações que não sepode deixar de levar em consideração. Em relação à aprendizagem, por

exemplo, não é possível realizar uma avaliação conclusiva da situaçãode um aluno sem a observação e acompanhamento de seus avanços. Apesar de todas as limitações discutidas sobre a avaliação em larga

escala da produção escrita no ENEM, reforça-se sua importância, naspalavras de Vianna, para os sistemas educacionais: 

No sentido de (1) elevar os padrões de ensino muitas vezesbastante comprometidos em algumas instituições; (2)

ajustar os processos de ensino à aprendizagem com o uso de

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metodologias adequadas e que devem ser de domínio dosprofessores, o que nem sempre ocorre; (3) contribuir para aformação de cidadãos que possam desafiar a complexidadede uma sociedade tecnológica; e, ainda, (4) proporcionaraos responsáveis pela tomada de decisões educacionais o feedback necessário para que prevaleça o bom senso que, na

prática, conduz ao acerto das ações. (2003, p.74)

É sabido que o ENEM não apenas oferece dados sobre a situaçãoeducacional no país, mas também contribui para as reflexões sobrepráticas de ensino. Entretanto, sabemos que na busca da melhoriana educação, a avaliação em larga escala não é a solução, e sim oprimeiro passo.

Referências bibliográficas

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São Paulo: Ática, 1996.GERALDI, João Wanderley. Portos de Passagem. São Paulo: MartinsFontes, 1995.

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Gêneros digitais:

navegando rumo aos desafiosda educação a distância

Ivanda Maria Martins Silva UFRPE – [email protected]

RESUMO: Os novos suportes de comunicação e os ambientes virtuaisde aprendizagem estão re-dimensionando as práticas de linguagem nacibercultura. Os gêneros digitais ou e-gêneros orientam a comunicaçãoonline e inuenciam as interações síncronas e assíncronas no contexto daeducação a distância. Pretende-se discutir os gêneros digitais recorrentesna educação a distância, considerando as características do ambientevirtual moodle.

PALAVRAS-CHAVE: gêneros digitais, educação a distância, ambientesvirtuais.

ABSTRACT: The new media o communication and virtual learningenvironments are changing the language practices in cyberculture. Thedigital genres or e-genres guide to online communication and inu-ence the synchronous and asynchronous interactions in the context o distance education. This paper intends to discuss about digital genres

applicants in distance education, considering the characteristics o thevirtual environment moodle.

KEYWORDS: genres digital; distance education, virtual environments.

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Introdução

 A educação a distância explora certas técnicas de ensino, incluindo ashipermídias, as redes de comunicação interativas e todas as tecnologiasintelectuais da cibercultura. (LÉVY, 1999). Na era da cibercultura,em que a interatividade ganha destaque, novas competências são

requeridas, devido à superabundância de informações e à mobilidadedo ciberespaço, o qual funciona como uma imensa rede de conexões,promovendo a ampliação da “inteligência coletiva”. (LÉVY,1999).

 As práticas de linguagem começam a sofrer transformações dianteda rapidez das trocas comunicativas e dos e-gêneros ou gêneros digitais.E-mails, chats, blogs, microblogs, fóruns de discussão, entre outros,tornam-se gêneros cada vez mais conhecidos dos internautas. Osusuários da Internet se adaptam às convenções desses novos modelose buscam aperfeiçoar estratégias comunicativas, visando à eficácia dasinterações no ciberespaço. Segundo Crystal (2001), pode-se considerarque o impacto da Internet é menor como revolução tecnológica do quea mudança nos modos sociais de interagir linguisticamente.

Com as mudanças e os avanços tecnológicos, a educação a distância vem re-dimensionando as práticas comunicativas nos ambientes virtuaisde aprendizagem (AVA). Os cursos a distância são desenvolvidos em

ambientes virtuais de aprendizagem, como, por exemplo, o Moodle(modular object oriented distance learning ), ou seja, um sistema aberto paragerenciamento de cursos, destinado a auxiliar educadores na produçãode cursos online. O ambiente virtual de aprendizagem assume o papelde uma espécie de hipergênero, promovendo o diálogo entre váriosgêneros digitais usados para apoiar a aprendizagem dos alunos naeducação online.

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Neste trabalho, alguns gêneros digitais serão priorizados, tais como:fórum, chat, blog, glossário, quiz, no sentido de ampliar o debatesobre os gêneros no ambiente virtual Moodle amplamente usado naeducação a distância.

1. Os gêneros digitais nos ambientes virtuais de aprendizagem

Na educação a distância, os fluxos de interação ocorrem nosambientes virtuais de aprendizagem. Esses ambientes são formadospor um conjunto de ferramentas para a construção, disponibilizaçãoe manipulação de material instrucional. Este conjunto de ferramentas,além de conter recursos para a manipulação de textos e gráficos,contém dispositivos para organizar dados, gerenciar informaçõesadministrativas e conteúdos sobre acompanhamento da aprendizagemdo aluno, considerando a participação dos educandos em testes,avaliações, processos de comunicação síncrona e assíncrona.

Pode-se dizer que:

Os AVA consistem em mídias que utilizam o ciberespaçopara veicular conteúdos e permitir interação entre osatores do processo educativo. [...] Ambiente Virtual de

  Aprendizagem (AVA) consiste em uma opção de mídiaque está sendo utilizada para mediar o processo ensino-aprendizagem a distância. (PEREIRA, SCHMITT, DIAS,In: PEREIRA, 2007, p.05).

Nos ambientes virtuais, os indivíduos tornam-se capazes de interagir,utilizando as ferramentas tecnológicas para elaborar e socializar suasproduções. Desse modo, a construção da aprendizagem revela-se

colaborativa, na medida em que os sujeitos produzem, (re)avaliam,

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socializam, constroem e reconstroem os diversos percursos que levamà construção do conhecimento.

Os ambientes virtuais podem ser utilizados como suportes parasistemas de educação a distância, realizados exclusivamente online,bem como para apoio às atividades presenciais. Nesses ambientes, acomunicação mediada por computador (e-comunicação) é efetivada nos

espaços virtuais e pode ser realizada de três maneiras: comunicação deum para um, comunicação de um para muitos e comunicação de muitos

para muitos.Na comunicação de um para um, o processo de transmissão da

informação limita-se ao envio e ao recebimento da mensagem. Comoexemplo, podemos colocar o caso das mensagens individuais queos professores usam constantemente nos ambientes virtuais, comopequenos avisos, recados, informes, publicados. O envio de mensagensassume a função do e-mail, podendo-se estabelecer a comunicação entreum determinado participante que envia a sua mensagem para outro.

 A comunicação de um para muitos é caracterizada pela existênciade um mediador, o qual estabelecerá regras de conduta, fazendoas intervenções necessárias. Podemos citar como ferramenta parautilização desta forma de comunicação os fóruns de discussão.Na comunicação de muitos para muitos ou comunicação estrelar , os

integrantes destes ambientes agem de forma colaborativa, ou seja,todos participam da criação e desenvolvimento das comunidades erespectivas produções.

  As tecnologias da informação e comunicação permitem criarambientes ricos em possibilidades de aprendizagem, nos quais as pessoaspodem aprender qualquer coisa sem precisar fazer uso do processo deensino formal. As pessoas podem fazer uso de ambientes que venham aconstruir o conhecimento de forma colaborativa e cooperativa.

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Como se pode notar, os ambientes virtuais de aprendizagem sãoespaços de interação, encontros virtuais entre docentes e discentes,locais em que os percursos de aprendizagem vão sendo construídosde forma colaborativa.

Batista (2000) define o AVA como lugar, onde estudantes eprofessores podem interagir psicologicamente com relação a certos

conteúdos, por meio de métodos e técnicas previamente estabelecidos,  visando à construção de conhecimentos. Ainda conforme Batista(2000), o AVA revela-se como espaço propício para que os estudantesobtenham recursos informacionais e meios didáticos para interagir erealizar as atividades de acordo com as metas e propósitos educativosestabelecidos. Batista (2000) também aborda dois elementosfundamentais na concepção de um AVA: a) o desenho instrucional, ouseja, a forma como se planeja o ato educativo; b) o desenho da interface, ou seja, a expressão visual e formal do AVA.

Dentre os ambientes virtuais de aprendizagem, o Moodle vemconquistando papel de destaque no campo da educação a distância.Uma das principais vantagens do Moodle sobre outras plataformasaponta para aprendizagem construída paulatinamente na interaçãoentre os sujeitos participantes dos fluxos educacionais. Nesse sentido,os alunos são estimulados à construção de aprendizagens significativas,

de modo colaborativo, a partir dos processos de mediação tecnológicae pedagógica.

No Moodle, o acompanhamento dos alunos é realizado a partir derelatórios de acesso, os quais permitem a visualização das atividadesrealizadas e o registro do parecer descritivo da avaliação. Podem-se

  visualizar as mensagens postadas por determinado aluno de formaisolada ou ainda apresentar uma lista de enunciados, citações e acessosde forma agrupada. O Moodle apresenta diversas ferramentas que

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podem facilitar as interações entre docentes e discentes, apoiandoa formação de comunidades virtuais de aprendizagem, bem como aconstrução de aprendizagens significativas na educação online.

Os ambientes virtuais de aprendizagem são espaços para leitura,escrita e processamento textual, considerando a integração entrediversos gêneros digitais. Conforme Marcuschi (2003, p. 30), os

gêneros textuais precisam ser compreendidos como “artefatos culturaisconstruídos historicamente pelo ser humano”. Sob esse aspecto, diantedo contexto dinâmico da cultura digital, o debate sobre os gêneros sãore-dimensionados para os novos suportes de comunicação, percebendo-se o ciberespaço e os ambientes virtuais de aprendizagem como novosdomínios para as relações sociais entre os sujeitos, bem como paranovas estratégias comunicativas usadas nos gêneros digitais.

Nos ambientes virtuais, podemos notar a intertextualidadeintergêneros (MARCUSCHI, 2003), se considerarmos o AVA comoespécie de hipergênero (BONINI, 2004, SOUZA, 2009), espaço deconvergência entre diferentes gêneros que promovem interaçõessíncronas e assíncronas entre docentes e discentes no contextoda educação a distância. Os ambientes virtuais funcionam como“constelações de gêneros digitais”, termo sugerido por Araújo (2005).Sob esse aspecto a confluência de diferentes gêneros, linguagens e

ferramentas midiáticas transformam o AVA em um espaço dinâmico,onde som, imagem, textos verbais e não-verbais, hipertextos, e-books,

 vídeoaulas e outros recursos motivam a aprendizagem dos alunos.Neste trabalho, será priorizado o ambiente virtual Moodle usado

no contexto da educação a distância para apoiar a aprendizagem dosalunos. Nas interações virtuais do Moodle, alunos e professores podemutilizar diversos gêneros digitais, no sentido de manter fluxos contínuosde comunicação nos processos de ensino-aprendizagem. Dentre os

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gêneros digitais mais utilizados no ambiente virtual, destacam-se: perfildo usuário, chat, fórum de discussão, quiz, blog, wiki, como veremosa seguir:

Perfil do usuário

 Ao acessar o ambiente Moodle, o usuário pode criar o seu próprioperfil, colocando dados pessoais, como conta do e-mail, informaçõesprofissionais, dados acadêmicos e outros comentários. Ainda nacomposição do perfil, pode-se colocar uma foto do usuário para facilitara interação no AVA. Em síntese, o perfil é um espaço para a apresentaçãogeral do usuário, no sentido de estreitar as relações interpessoaismediadas pelas tecnologias da informação e comunicação. A construçãodo perfil envolve características multimodais, aproximando imagem,textos verbais e não-verbais no mesmo espaço virtual.

Chat

O gênero chat é uma sessão de bate-papo que tem muita relevânciana educação online. O chat permite a realização de uma discussão

 virtual via web em modalidade síncrona, ou seja, os participantes da

sessão de chat precisam estar conectados de forma simultânea. O chat é importante para minimizar a sensação da distância física (espacial-temporal), permitindo que a interação entre professores e alunos revele-se mais estreita e intensa. Na educação a distância, é importante queo chat seja utilizado não apenas para tirar dúvidas, mas também paraampliar discussões e debates temáticos. Por isso, investir em sessõestemáticas de chat com participantes convidados poderá dinamizar aaprendizagem dos alunos.

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Os chats assemelham-se às conversações orais espontâneas,revelando traços de oralidade na tentativa de representar, ou melhor,simular as interações face a face. Nesse sentido, os chats podem sercompreendidos como transmutações de conversas espontâneas,muito frequentes na oralidade e agora representadas nas mídiasdigitais. Bakhtin (1992) já abordava o diálogo entre gêneros e a

sua transmutação para ampliar as reflexões sobre o surgimento e aformação de novos gêneros. Desse modo, podemos perceber como ochat, usado nos ambientes virtuais, apresenta aproximações com asconversas espontâneas da oralidade nas interações face a face.

Nos chats, o diálogo centraliza-se entre duas ou mais pessoas,revelando a interatividade como recurso primordial na rápida troca deturnos conversacionais. É interessante observar que, no ciberespaço,por meio dos chats abertos, os internautas podem esconder suasidentidades, criando apelidos virtuais (nicknames). Esse fato estádiretamente relacionado com a intersubjetividade nas práticascomunicativas, permitindo que os indivíduos assumam identidadesdiferentes, com propósitos distintos, configurando, também, o chat

como gênero polifônico (BAKHTIN, 1992), no qual o entrecruzamentode várias vozes direciona os papéis dos interlocutores.

No entanto, nos ambientes virtuais de aprendizagem dos cursos

a distância, a identidade dos participantes é mantida nas sessões dechat. Nos AVA da EAD, o chat é um gênero de natureza educacional,portanto, os participantes mantêm um fluxo e interação de acordo como contexto acadêmico de troca de informações, visando à construçãode conhecimentos. Nesse sentido, até o padrão de formalidade ouinformalidade é diferente dos chats usados abertamente no ciberespaço,em função das relações entre os participantes do processo.

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Na Internet, as relações entre os sujeitos são mais abertas, cadaum pode colocar um nickname, a fim de simular comportamentos eaté assumir outras personalidades, já que o chat é usado mais comuma função lúdica de interação social. Se, por um lado, as sessões dechat no ciberespaço são mais flexíveis e abertas, por outro lado, nosambientes virtuais da EAD, as sessões de chat são privadas, já que os

participantes precisam estar inscritos no curso a distância. No Moodleusado na EAD, as sessões de chat precisam ter um número limitado departicipantes para o mediador acompanhar os fluxos de interação, tiraras dúvidas, promover uma comunicação eficaz, de natureza pedagógicano espaço acadêmico da instituição que está promovendo o curso.

Marcuschi (2004, p.28) elenca vários tipos de chats, dentre os quaisdestacamos:

a) Chats em aberto: “inúmeras pessoas interagindo simultaneamente

em relação síncrona e no mesmo ambiente”.

b) Chat reservado: variante dos room-chats, mas com as falas pessoais

acessíveis apenas aos dois interlocutores mutuamente selecionados,

embora possam continuar vendo todos os demais em aberto.

c) Chat agendado: oferece possibilidade de diversos recursos

tecnológicos na recepção e envio de arquivos.

d) Chat privado: “são os bate-papos em sala privada com apenas osdois parceiros de diálogo presentes”. (MARCUSCHI, 2004, p.28).

  A linguagem utilizada nos chats transforma as relações entrefala e escrita, na medida em que há a necessidade de estabelecer acomunicação de modo bastante rápido e dinâmico, simulando astrocas comunicativas na interação face a face. Desse modo, expressões

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surgem abreviadas ao máximo, devido à economia verbal que tendea estreitar as relações entre fala e escrita, contribuindo para acentuar,também, o grau de informalidade nesse tipo de interação.

Marcuschi (2004, p. 47) também aponta para os traços característicosdo gênero chat, dentre os quais destacamos:

a) Produções escritas no formato de diálogob) Produções síncronas apesar de escritasc) Contribuições geralmente curtas

Na EAD, os professores tutores têm papel fundamental noprocesso de mediação dos turnos de interação entre os participantesda sessão de chat. Em geral, vários alunos entram na sessão de chat

e cabe ao professor coordenar a interação de modo eficaz, tentando

responder a todos satisfatoriamente. Também é importante queo professor se coloque como o facilitador da interação dialógica,convidando também os alunos a assumirem o papel de sujeitos doprocesso comunicativo e não apenas de receptores passivos.

Na construção coletiva de várias vozes, espécie de orquestraçãopolifônica (BAKHTIN, 1992), o chat pode se transformar em umgrande espaço de encontros virtuais, nos quais a afetividade, a

interação e o diálogo revelam-se como eixos essenciais. Dar respostasindividualizadas, atentando para os nomes dos alunos, consideraras perguntas e questionamentos como fundamentais no processo deaprendizagem, manter a linguagem rápida, dinâmica são premissasimportantes para o sucesso do chat como gênero pedagógico usadona educação a distância.

Conforme Cabral e Cavalcante (2010, p. 67), para que o chat sejabem utilizado nas práticas educativas, é fundamental que o professor

tenha consciência das habilidades que pode priorizar, tais como:

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• Socialização: o chat permite a criação de redes derelacionamento, motivando o processo de interação socialmediado pelas tecnologias da informação e comunicação.• Cooperação: o professor pode utilizar o chat para auxiliaras atividades a serem realizadas em grupo. A organização deseminários virtuais, produções coletivas, painéis de socialização

podem ser atividades realizadas por meio do chat.• Estudo: o chat pode ser usado para apoiar estudos e pesquisasdos alunos. O professor pode disponibilizar um horário específicopara orientar os educandos em relação às duvidas que poderãosurgir durante o processo de ensino-aprendizagem.

 Assim como o chat, o fórum também tem importância capital paramotivar a interação nos ambientes virtuais de aprendizagem nos cursosa distância, como veremos a seguir.

Fórum de discussão

Os fóruns revelam diversos tipos de estruturas e podem incluir aavaliação recíproca de cada mensagem. As mensagens são visualizadas emdiversos formatos e podem incluir anexos. Os fóruns são ferramentas de

comunicação assíncrona, permitindo que os participantes estabeleçama interação sem estarem conectados em tempo real.

Segundo Santos (In: SILVA, 2006, p.229), os fóruns permitemo registro e a comunicação coletiva por meio da tecnologia. Aindaconforme Santos (In: SILVA, 2006, p.229), nos fóruns, “emissão erecepção se imbricam e se confundem permitindo que a mensagemcirculada seja comentada por todos os sujeitos do processo decomunicação”.

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Uma vantagem dos fóruns é que eles organizam as mensagens deacordo com o assunto. O fórum tem uma função pedagógica bemimportante no processo de interação e trocas de experiências entre osseus participantes. Por meio do fórum, pode-se visualizar a construçãoda aprendizagem em rede, considerando as contribuições de cada atordo processo de comunicação assíncrona.

De acordo com Cabral e Cavalcante (2010, p. 72), “o fórumconstitui um recurso coletivo de aprendizagem que exige a presençaconstante de um mediador para redirecionar e orientar comentários e/ou situações que não estejam de acordo com os objetivos do trabalhoa ser desenvolvido”.

Na educação a distância, o fórum pode ser utilizado para debatessobre temas propostos, esclarecimentos de dúvidas, desenvolvimentode pesquisas, sistematização de leituras, troca de experiências,práticas contínuas de avaliação e autoavaliação, envio de materiaiscomplementares para estudo, além de diversas outras utilidades.

No ambiente virtual Moodle, o professor pode criar tópicos dediscussão nos fóruns e solicitar que os alunos alimentem tais tópicospor meio de respostas interativas. Assim, os alunos têm a oportunidadede responder a mensagem proposta no tópico criado pelo professore os professores tutores podem fazer a mediação dos fluxos de

interação nesse processo de aprendizagem em rede, como propôs Lévy (1999). Desse modo, forma-se uma rede de colaboração por meio dascontribuições dos alunos, mediadores, professores tutores, todos juntosno processo de construção coletiva nos fóruns de discussão online.

Lévy (1999) já comentava que a função do professor é atuar como“animador da inteligência coletiva” na era da cibercultura, dinamizandoos processos de ensino-aprendizagem nos ambientes virtuais. Os fórunsde discussão são gêneros digitais que propiciam esse papel do professor

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“animando” as aprendizagens que são (re)construídas nos ambientes virtuais da educação a distância.

Uma estratégia pedagógica importante é deixar que, nos fóruns,os alunos criem seus próprios tópicos de discussão, no sentido depropiciar oportunidades para que os educandos se manifestemde forma mais dinâmica e consigam estabelecer a interação com

mediadores, professores tutores e demais colegas. Nesse sentido,os alunos podem colocar suas temáticas preferidas, compartilharsuas pesquisas, fornecer dicas de leituras, sugerir filmes e sites paraoutros colegas, enfim, os alunos assumem a posição de mediadores eincentivadores do processo de comunicação, tornam-se sujeitos de seuspercursos de aprendizagem e atuam lado a lado com os professorescomo “animadores da inteligência coletiva” (LÉVY, 1999).

Ressaltamos ainda que os fóruns criados no ambiente Moodletambém permitem que os participantes anexem arquivos, nos formatos

  Word, PowerPoint, jpg, Excel, entre outros, o que certamentepode facilitar a troca de experiências e a interação entre os seusparticipantes. Além da possibilidade de anexar arquivos e sugerirleituras complementares, os usuários ainda podem inserir imagens,cores e textos verbais na organização do corpo da mensagem, mesclandouma diversidade de códigos e linguagens na composição das produções

textuais que são publicadas.

Blogs

Os blogs funcionam como diários virtuais, de cunho público,com várias informações autobiográficas que são disponibilizadas. A contribuição dos leitores é muito colaborativa, por meio de recados,avisos, bilhetes, notícias, poemas, ratificando-se a relação dialógica

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entre leitura e escrita. A autoria compartilhada parece ser umacaracterística fundamental na constituição dos blogs, os quais se revelamcomo “vitrines eletrônicas”, mostrando a privacidade dos indivíduos,por meio de dados que fazem parte do cotidiano das pessoas.

Na educação a distância, o blog  pode ser usado para que osusuários coloquem suas experiências pessoais, profissionais, no

sentido de ampliarem a rede social de interação no ambiente virtualde aprendizagem. Pedagogicamente, o blog pode também ser usado,na EAD, como recurso importante para as práticas autoavaliativasdos educandos, visto que os alunos podem registrar continuamenteseus percursos de aprendizagem, suas pesquisas, suas descobertas,o que favorece a reflexão crítica e a construção da autonomia dosdiscentes.

Quiz

O quiz consiste em um instrumento de composição de questõese de configuração de questionários. As questões são arquivadas porcategorias em uma base de dados e podem ser (re)utilizadas em outrosquestionários e/ou em outros cursos. A configuração dos questionárioscompreende a definição do período de disponibilidade, a apresentação

de feedback automático, diversos sistemas de avaliação, a possibilidadede diversas tentativas. Alguns tipos de questões podem ser priorizados,tais como: múltipla escolha, verdadeiro ou falso, resposta breve, etc.

O quiz funciona como espécie de jogo de perguntas e respostas, o qualestimula diversas habilidades dos participantes. Pode ser construídopara ser utilizado individualmente ou de forma colaborativa, gerando-se, neste caso, uma competição entre os participantes que podem sesentir estimulados ao desafio de aprender na interação com os outros.

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O quiz permite a organização de um grupo de perguntas e respostas,com base em diversos recursos que promovem a integração entreimagem, som, textos verbais e não-verbais, animações, movimento,além de várias outras estratégias que proporcionam a interatividade,premissa fundamental nos cursos a distância. O professor podeutilizar diferentes tipos de perguntas para o desenvolvimento de

um quiz, considerando os diferentes estilos de aprendizagem dosalunos.

O quiz pode ser útil para instrumentos avaliativos e autoavaliativosonline por meio de perguntas e respostas, propiciando um  feedback imediato aos alunos. Nesse sentido, o quiz pode fornecer informaçõesimportantes para educadores e educandos sobre os desempenhos epercursos de aprendizagem em construção.

 Wiki

 A wiki proporciona a construção de textos de forma colaborativa,permitindo que os participantes trabalhem juntos, adicionandonovas páginas web ou completando e alterando o conteúdo daspáginas publicadas. A wiki é importante para a escrita colaborativano ambiente virtual, promovendo maior interação entre os autores

que podem compartilhar suas experiências de produção textual,considerando os mecanismos de textualidade e as orientações domediador no processamento textual. Pode-se utilizar a wiki paraestimular a produção textual coletiva de toda a turma ou aindamotivar a escrita colaborativa em pequenos grupos de trabalho. Osalunos podem usar os recursos do ambiente virtual para trocar ideias,construir projetos em grupo, organizar portfólios colaborativos, criarredes interativas de comunicação.

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Diversos outros gêneros digitais vêm assumindo destaque nacomunicação mediada por computador. Poderíamos elencar umaenorme lista, discriminando gêneros que já fazem parte da rotina dosinternautas. No entanto, priorizamos apenas alguns e-gêneros, a fim derefletir sobre essas novas modalidades de comunicação. Na verdade,alguns autores (MARCUSCHI, 2004) já defendem que os gêneros

digitais encontram contraparte nos gêneros tradicionais.Com a revolução tecnológica, o que se observa é a mudança

significativa nos suportes de comunicação e interação, considerandoa tela do computador como novo canal, a fusão de mídias, a criaçãode ambientes virtuais, etc. Conforme afirma Soares (2002), as práticasde leitura e escrita em novos suportes de comunicação inauguramum novo tipo de letramento, ou seja, o letramento digital como certoestado ou condição dos que se apropriam da nova tecnologia digital eexercem práticas de leitura e de escrita na tela. Ainda segundo Soares(2002), não é apenas a tela do computador que gera um novo tipode letramento, mas todos os mecanismos de produção, reprodução edifusão da escrita e da leitura no mundo digital.

Considerações finais

Na educação a distância, os ambientes virtuais de aprendizagem têmpapel especial nas mediações pedagógica e tecnológica entre alunose professores que se encontram separados espacial e temporalmente,mas unidos por meio dos recursos tecnológicos. Os ambientes virtuaisprecisam ser re-dimensionados para o contexto dinâmico da EAD,

 visando garantir a interatividade, minimizando o sentimento aparentede solidão dos alunos que estudam “sozinhos”, mas que participam

 virtualmente das redes de conexões da inteligência coletiva.

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Os ambientes virtuais podem estimular os processos síncronos eassíncronos de comunicação entre os aprendizes, além de motivar otrabalho cooperativo, a autoria compartilhada, a pesquisa baseada nosmateriais e recursos didáticos disponíveis, visando que os educandosconquistem a autonomia em seus percursos de aprendizagem.

Os ambientes virtuais funcionam como hipergêneros, promovendo

o diálogo entre diferentes gêneros em um mesmo espaço de leitura eprodução textual. Blogs, fóruns, chats, quiz, perfil do usuário, wikis e

 vários outros gêneros digitais podem ser utilizados para os processosde comunicação mediada por computador (e-comunicação). Éfundamental que os participantes da e-comunicação estabeleçam novoscontratos comunicativos, reconhecendo as características dos gênerosdigitais e aprimorando o grau de letramento digital no contexto daeducação a distância. 

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Edições Loyola.2006.SOARES, Magda. Novas práticas de leitura e escrita: letramento nacibercultura. Educação e Sociedade. Campinas, v.23, n.81, p.143-160,dez. 2002.SOUZA, Valeska. Ambientes virtuais de aprendizagem: sistemascomplexos compostos por gêneros digitais. Revista Texto Line. Nº 2

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TORI, Romero. Educação sem distância: as tecnologias interativas naredução de distâncias em ensino e aprendizagem. São Paulo: EditoraSenac SP, 2010.ZUIN, Antônio. Educação a Distância ou Educação Distante: o programa

Universidade Aberta do Brasil, o tutor e o professor virtual. In: Educaçãoe Sociedade, Campinas: CEDES, vol.27, número especial, 2006.Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v27n96/a14v2796.pdf.

 Acesso em: 20 jun, 2010.

GÊNEROS DIGITAIS: NAVEGANDO RUMO AOS DESAFIOS DAEDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

  Ivanda Maria Martins Silva

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 Normas 

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 147

Normas

Gêneros:Editorial; Artigos/ensaios; Resenhas..

 Normas de publicação:

1. Os trabalhos deverão ser enviados para o e-mail [email protected].

br, em programa Word for Windows, em dois arquivos, um com textocompleto com identificação do(s) autor(es), e indicação do tipo de trabalho(artigo/ensaio, resenha). Em outro arquivo deve constar apenas o texto semidentificação de autor(es).

2. Tipo de letra: Arial, corpo 10.

3. Espaçamento: espaço 1,5 entre linhas e parágrafos; espaço duplo entrepartes e entre textos e exemplos, citações, tabelas, ilustrações, etc.

4. As citações com mais de três linhas devem aparecer em parágrafo distinto,iniciando-se a 4 cm da margem esquerda, com letra tamanho 8, comespaçamento simples entre as linhas e sem as aspas.

5. As tabelas, as ilustrações (fotografias, desenhos, gráficos, etc) e anexossão contados no limite total de páginas. Para anexos que constituem textosoriginais já publicados, incluir referência bibliográfica completa, bem comopermissão dos editores para publicação.

6. O texto deve ser apresentado na seguinte seqüência:

•Título:centralizado,emmaiúsculas,emnegrito.

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 148 

•Subtítulos:semadentramento,numeradosemnúmerosarábicos

(Introdução não tem recebe numeração); apenas a primeira letra de cadasub-título em maiúscula.

•Nome(s)do(s)autor(es):duaslinhasabaixodotítulo,àdireita;letras

maiúsculas apenas para as iniciais.

a) Sigla da instituição de filiação do(s) autor(es): entre parênteses,abaixo do(s) nome(s) do(s) autor(es).b) Indicação de e-mail abaixo do nome do(s) autor(es).

•Resumo:apalavraRESUMO,seguidadedoispontos,emmaiúsculas,

duas linhas abaixo do nome do autor e de sua instituição, sem adentramento.Na mesma linha, o início do texto do resumo, que deverá ter entre 40 e 60palavras em itálico.

- O primeiro resumo deverá ser redigido em língua portuguesa; osegundo, em língua diferente daquela em que estiver redigido oartigo: se em português, o segundo resumo deverá ser em espanholou em inglês ou em francês (Resumen ou Abstract ou Resumé). Se oartigo estiver redigido em espanhol, o segundo resumo deverá estarem língua inglesa ou francesa; se em francês, o segundo resumo deveser em língua espanhola ou inglesa; se em inglês, em língua francesaou espanhola. Após cada um dos resumos, deverão constar trêspalavras-chave em negrito, na língua em que estiver escrito (Keywords,Mots-clés ou Palabras-llave).

7. A Revista publicará os seguintes textos: artigos, resenhas e ensaios.

•Artigos/ensaios - Textos dedimensão variável, entre seis e dez

páginas

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Vol. 1 Nº 1 Janeiro a Junho de 2011  l 149

•Resenhas-Textoscomdimensãovariável,entreduasetrêspáginas,

contendo o registro e a crítica de obras, livros, teses, monografias, etc,publicadas recentemente;

8. Referências: as referências bibliográficas, redigidas segundo a norma NBR 6023/2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

9. Imagens: As imagens utilizadas no texto precisam ser enviadas em arquivosseparados do arquivo .doc, com resolução mínima de 300 dpi e dimensõesmínimas de 1024x768 pixels. Capturas da internet devem utilizar softwaresadequados (ex: Picasa, Pohotoshop etc.) e finalizadas em formato .jpg, .pngou .tiff. As capturas de internet precisam trazer a url completa da capturanas referências do artigo ou em sua legenda. Todas as imagens precisam sercreditadas e suas fontes mencionadas.

10. Notas: As notas de rodapé devem ser exclusivamente explicativas.Todas as notas deverão ser numeradas e aparecer no pé de página (usarcomando automático Inserir/Notas). Não incluir referências bibliográficasnas notas.

11. A correção gramatical e ortográfica é de responsabilidade de cadaautor.

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