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REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ® A tutela jurisdicional do direito a alimentos grav?cos: An?se ?t?icas processuais diferenciadas institu?s pela Lei n.º 11.804/08 Resumo: O presente trabalho se presta ao exame das particularidades da Lei n.º 11.804/2008, que regulou o direito a alimentos devidos à gestante e ao próprio nascituro, bem assim disciplinou a forma pela qual a tutela deste mesmo direito se efetivará. Abstract: The present work relates to the particularly exam Law nº 11.804/2008, what regulate the right to appropriate food supply to pregnant women and their newborn babes, this discipline is the way which this tutorship right will take effect. Sumário: 1. Introdução. 2. A pertinência do tema tutela dos direitos no âmbito do direito processual civil. 3. A tutela jurisdicional e a tutela jurisdicional dos direitos. 4. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos. 5. O direito material a alimentos e as suas necessidades. 6. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos a alimentos. 7. A Lei n.º 11.804/08 e as técnicas processuais diferenciadas à tutela de direitos a alimentos gravídicos. 7.1. Considerações iniciais. 7.2. O conceito e a extensão dos alimentos gravídicos. 7.3. A especial situação do nascituro. 7.4. Visão geral do procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008. 7.5. A legitimidade ativa e passiva. 7.6. A competência. 7.7. A cognição. 7.8. A tutela antecipada. 7.9. A coisa julgada e seus limites. 7.9.1. Considerações iniciais. 7.9.2. Os limites objetivos da coisa julgada. 7.9.3. Os limites subjetivos da coisa julgada. 7.10. Apontamentos finais. 8. Conclusões. 1. Introdução Pretende-se neste ensaio enfrentar questões essenciais atinentes às técnicas processuais diferenciadas (lato sensu), instituídas com a publicação da Lei n.º 11.804/2008, que disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma de sua tutela jurisdicional. É o que se propõe.[1] 2. A pertinência do tema tutela dos direitos no âmbito do direito processual civil Conquanto a tutela dos direitos não seja exclusividade da jurisdição,[2] representa seu principal escopo. E se assim é, sentido nenhum há em se trabalhar o direito processual civil alheio às necessidades do direito material, às especificidades do caso concreto e à realidade da vida, numa busca estéril e ilimitada pela neutralidade da ciência processual. Foi realmente importante a empreitada assumida pela escola processual italiana do início do século XX, sobretudo porque reconstruiu o processo sob bases publicistas, consoante leciona Luiz Guilherme Marinoni. Contudo, ali teve início a história que permitiu ao processo afastar-se perigosamente dos seus compromissos com o direito material.[3] Afinal, trabalhava-se com a ilusão de que o processo poderia ser neutro em relação ao direito material e à realidade da vida, uma lógica fria que alienava as formas processuais do seu próprio fim. Nas palavras do mestre paranaense, “houve uma lamentável confusão entre autonomia científica, instrumentalidade e neutralidade do processo em relação ao direito material.”[4] Contudo, diante da conscientização de que o direito processual possui finalidades que lhe são exteriores, percebeu-se que as formas processuais devem ajustar-se ao direito material com o qual operam.[5] A ciência processual civil deve ser pensada, construída e apreendida sempre à luz do direito material e em função dele, sendo inúteis as construções processuais que não proporcionem real contribuição para o objeto mesmo do processo – prega-se o comprometimento com os resultados do processo mediante a necessária compatibilização entre a técnica processual e o seu escopo.[6] Trabalhar a tutela dos direitos no âmbito jurisdicional é, enfim, atentar-se à intimidade entre o direito material e o direito processual.[7] É encarar que a ciência processual civil deve ser elaborada e compreendida sempre à luz do direito material e em função dele. É, afinal, admitir uma sadia contaminação da ciência processual com elementos oriundos do direito material. É aceitar que o direito processual civil não é neutro, mas antes impuro e necessariamente corrompido pelo direito material. 3. A tutela jurisdicional e a tutela jurisdicional dos direitos Pensar em tutela de direitos é referir-se automaticamente a alguma atividade (pública ou particular) e a técnicas voltadas à proteção ou satisfação de direitos. Isso não quer significar, contudo, que a atividade e as técnicas sejam propriamente a tutela de direitos, não obstante condutos indispensáveis à sua consecução. Logo, sempre que um direito (material) é protegido, é amparado ou salvaguardado, é efetivado ou usufruído, não importando em que plano (legislativo, administrativo, jurisdicional ou privado), ou mediante quais técnicas, é legítimo afirmar que houve tutela de direito. Ao direito processual civil, interessa, mais especialmente, a tutela jurisdicional do direito e os meios predispostos à sua obtenção. Interessa ao estudioso da ciência processual e ao operador do processo, a tutela do direito decorrente da atividade jurisdicional, vale dizer, o resultado prático da jurisdição e as técnicas processuais utilizadas a sua concretização.[8] Tenha-se em mente que é a pretensão a uma tutela jurisdicional de direito – a vontade de conquistar, de usufruir, de sentir esse mesmo direito – que instiga a ignição da máquina judiciária pelo demandante. Quando se pensa no pedido, um dos requisitos essenciais à valia da petição inicial (CPC, art. 282, IV), estar-se-á a refletir também na própria tutela jurisdicional do direito, pois ela o integra – é o que a doutrina chama de pedido mediato, isto é, o bem da vida que se pretende ver tutelado com instigação da atividade jurisdicional. Numa realidade oposta, é a pretensão de obter uma tutela jurisdicional reversa (declaratória negativa) – nesse caso apenas tutela jurisdicional e não tutela jurisdicional “de direito” – que igualmente estimula àquele, em face de quem foi instaurada a demanda (demandado), a se defender em juízo e dele intentar resposta que o beneficie.[9] Mas a importância de a ciência processual se dedicar ao estudo das tutelas jurisdicionais vai além. Ora, se a tutela jurisdicional revela o resultado que se almeja por intermédio da atividade jurisdicional no plano do direito material, pensá-la, nesta perspectiva, é comprometer-se com o escopo mais importante da jurisdição, e assim pensar o direito processual civil na perspectiva das necessidades do próprio direito material.[10] É fundamental a consciência de que, por trás da tutela, há sempre um direito, e é com base nas peculiaridades deste último que aquela deve ser prestada.[11] 4. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos A tutela jurisdicional de direito há de ser compreendida à luz do direito material. Afinal, indica esse mesmo direito material em exercício, vale dizer, é a concretização da pretensão mediata postulada através do processo. Quando se afirma, destarte, que a tutela jurisdicional de direito foi entregue pelo Estado-juiz, quer-se com isso dizer que o demandante percebeu (sentiu, usufruiu, auferiu) a resposta da atividade jurisdicional ao seu pedido. Tutela jurisdicional de direito é sinônimo de satisfação, de entrega do bem da vida perseguido àquele que o postulou via judicial. Mas os direitos são tutelados pelo Estado-juiz mediante técnicas processuais (lato sensu) as mais diversas, criadas e, muitas vezes, adaptáveis segundo as necessidades do direito material e as particularidades do caso concreto. A elaboração e a compreensão dessas técnicas processuais, enfim, levam em conta essencialmente as necessidades dos diversos direitos materiais às quais elas mesmas se prestam a efetivar. Não há, por outro lado, que se confundir decisões interlocutórias, sentenças ou acórdãos com a própria tutela jurisdicional de direito.[12] Não se traduz a sentença (e nem as decisões interlocutórias e acórdãos) em tutela de direito, mas em técnica processual destinada a colaborar com a tutela do direito. Às vezes, é bem verdade, a tutela jurisdicional do direito intrinca-se – mas não se confunde – com a técnica processual que medeia seu trânsito do plano processual à realidade da vida. Outras, contudo, a técnica processual se apresenta absolutamente distinta à tutela jurisdicional de direito, uma vez que apenas certifica o direito e autoriza a realização de atos práticos à sua real concretização.[13] Ressalte-se, nesse turno, que as técnicas processuais são inúmeras e não se restringem às decisões judiciais (lato sensu). Na medida em que são predisposições ordenadas de meios destinados à obtenção de certos resultados preestabelecidos,[14] abarcam todas as formas elaboradas pelo

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REVISTA ÂMBITO JURÍDICO ®

A tutela jurisdicional do direito a alimentos grav?cos: An?se ?t?icas processuais diferenciadas institu?s pela Lei n.º 11.804/08

Resumo: O presente trabalho se presta ao exame das particularidades da Lei n.º 11.804/2008, que regulou o direito a alimentos devidos à gestante eao próprio nascituro, bem assim disciplinou a forma pela qual a tutela deste mesmo direito se efetivará.

Abstract: The present work relates to the particularly exam Law nº 11.804/2008, what regulate the right to appropriate food supply to pregnant womenand their newborn babes, this discipline is the way which this tutorship right will take effect.

Sumário: 1. Introdução. 2. A pertinência do tema tutela dos direitos no âmbito do direito processual civil. 3. A tutela jurisdicional e a tutela jurisdicionaldos direitos. 4. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos. 5. O direito material a alimentos e as suas necessidades. 6. Técnicasprocessuais e a tutela jurisdicional de direitos a alimentos. 7. A Lei n.º 11.804/08 e as técnicas processuais diferenciadas à tutela de direitos aalimentos gravídicos. 7.1. Considerações iniciais. 7.2. O conceito e a extensão dos alimentos gravídicos. 7.3. A especial situação do nascituro. 7.4.Visão geral do procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008. 7.5. A legitimidade ativa e passiva. 7.6. A competência. 7.7. A cognição. 7.8. A tutelaantecipada. 7.9. A coisa julgada e seus limites. 7.9.1. Considerações iniciais. 7.9.2. Os limites objetivos da coisa julgada. 7.9.3. Os limites subjetivosda coisa julgada. 7.10. Apontamentos finais. 8. Conclusões.

1. Introdução

Pretende-se neste ensaio enfrentar questões essenciais atinentes às técnicas processuais diferenciadas (lato sensu), instituídas com a publicação daLei n.º 11.804/2008, que disciplina o direito a alimentos gravídicos e a forma de sua tutela jurisdicional.

É o que se propõe.[1]

2. A pertinência do tema tutela dos direitos no âmbito do direito processual civil

Conquanto a tutela dos direitos não seja exclusividade da jurisdição,[2] representa seu principal escopo. E se assim é, sentido nenhum há em setrabalhar o direito processual civil alheio às necessidades do direito material, às especificidades do caso concreto e à realidade da vida, numa buscaestéril e ilimitada pela neutralidade da ciência processual.

Foi realmente importante a empreitada assumida pela escola processual italiana do início do século XX, sobretudo porque reconstruiu o processo sobbases publicistas, consoante leciona Luiz Guilherme Marinoni. Contudo, ali teve início a história que permitiu ao processo afastar-se perigosamentedos seus compromissos com o direito material.[3] Afinal, trabalhava-se com a ilusão de que o processo poderia ser neutro em relação ao direitomaterial e à realidade da vida, uma lógica fria que alienava as formas processuais do seu próprio fim. Nas palavras do mestre paranaense, “houveuma lamentável confusão entre autonomia científica, instrumentalidade e neutralidade do processo em relação ao direito material.”[4]

Contudo, diante da conscientização de que o direito processual possui finalidades que lhe são exteriores, percebeu-se que as formas processuaisdevem ajustar-se ao direito material com o qual operam.[5] A ciência processual civil deve ser pensada, construída e apreendida sempre à luz dodireito material e em função dele, sendo inúteis as construções processuais que não proporcionem real contribuição para o objeto mesmo doprocesso – prega-se o comprometimento com os resultados do processo mediante a necessária compatibilização entre a técnica processual e o seuescopo.[6]

Trabalhar a tutela dos direitos no âmbito jurisdicional é, enfim, atentar-se à intimidade entre o direito material e o direito processual.[7] É encarar quea ciência processual civil deve ser elaborada e compreendida sempre à luz do direito material e em função dele. É, afinal, admitir uma sadiacontaminação da ciência processual com elementos oriundos do direito material. É aceitar que o direito processual civil não é neutro, mas antesimpuro e necessariamente corrompido pelo direito material.

3. A tutela jurisdicional e a tutela jurisdicional dos direitos

Pensar em tutela de direitos é referir-se automaticamente a alguma atividade (pública ou particular) e a técnicas voltadas à proteção ou satisfação dedireitos. Isso não quer significar, contudo, que a atividade e as técnicas sejam propriamente a tutela de direitos, não obstante condutosindispensáveis à sua consecução. Logo, sempre que um direito (material) é protegido, é amparado ou salvaguardado, é efetivado ou usufruído, nãoimportando em que plano (legislativo, administrativo, jurisdicional ou privado), ou mediante quais técnicas, é legítimo afirmar que houve tutela dedireito.

Ao direito processual civil, interessa, mais especialmente, a tutela jurisdicional do direito e os meios predispostos à sua obtenção. Interessa aoestudioso da ciência processual e ao operador do processo, a tutela do direito decorrente da atividade jurisdicional, vale dizer, o resultado prático dajurisdição e as técnicas processuais utilizadas a sua concretização.[8]

Tenha-se em mente que é a pretensão a uma tutela jurisdicional de direito – a vontade de conquistar, de usufruir, de sentir esse mesmo direito – queinstiga a ignição da máquina judiciária pelo demandante. Quando se pensa no pedido, um dos requisitos essenciais à valia da petição inicial (CPC,art. 282, IV), estar-se-á a refletir também na própria tutela jurisdicional do direito, pois ela o integra – é o que a doutrina chama de pedido mediato,isto é, o bem da vida que se pretende ver tutelado com instigação da atividade jurisdicional. Numa realidade oposta, é a pretensão de obter umatutela jurisdicional reversa (declaratória negativa) – nesse caso apenas tutela jurisdicional e não tutela jurisdicional “de direito” – que igualmenteestimula àquele, em face de quem foi instaurada a demanda (demandado), a se defender em juízo e dele intentar resposta que o beneficie.[9]

Mas a importância de a ciência processual se dedicar ao estudo das tutelas jurisdicionais vai além. Ora, se a tutela jurisdicional revela o resultadoque se almeja por intermédio da atividade jurisdicional no plano do direito material, pensá-la, nesta perspectiva, é comprometer-se com o escopomais importante da jurisdição, e assim pensar o direito processual civil na perspectiva das necessidades do próprio direito material.[10] Éfundamental a consciência de que, por trás da tutela, há sempre um direito, e é com base nas peculiaridades deste último que aquela deve serprestada.[11]

4. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos

A tutela jurisdicional de direito há de ser compreendida à luz do direito material. Afinal, indica esse mesmo direito material em exercício, vale dizer, éa concretização da pretensão mediata postulada através do processo. Quando se afirma, destarte, que a tutela jurisdicional de direito foi entreguepelo Estado-juiz, quer-se com isso dizer que o demandante percebeu (sentiu, usufruiu, auferiu) a resposta da atividade jurisdicional ao seu pedido.Tutela jurisdicional de direito é sinônimo de satisfação, de entrega do bem da vida perseguido àquele que o postulou via judicial.

Mas os direitos são tutelados pelo Estado-juiz mediante técnicas processuais (lato sensu) as mais diversas, criadas e, muitas vezes, adaptáveissegundo as necessidades do direito material e as particularidades do caso concreto. A elaboração e a compreensão dessas técnicas processuais,enfim, levam em conta essencialmente as necessidades dos diversos direitos materiais às quais elas mesmas se prestam a efetivar.

Não há, por outro lado, que se confundir decisões interlocutórias, sentenças ou acórdãos com a própria tutela jurisdicional de direito.[12] Não setraduz a sentença (e nem as decisões interlocutórias e acórdãos) em tutela de direito, mas em técnica processual destinada a colaborar com a tutelado direito. Às vezes, é bem verdade, a tutela jurisdicional do direito intrinca-se – mas não se confunde – com a técnica processual que medeia seutrânsito do plano processual à realidade da vida. Outras, contudo, a técnica processual se apresenta absolutamente distinta à tutela jurisdicional dedireito, uma vez que apenas certifica o direito e autoriza a realização de atos práticos à sua real concretização.[13]

Ressalte-se, nesse turno, que as técnicas processuais são inúmeras e não se restringem às decisões judiciais (lato sensu). Na medida em que sãopredisposições ordenadas de meios destinados à obtenção de certos resultados preestabelecidos,[14] abarcam todas as formas elaboradas pelo

legislador com o propósito de efetivar a tutela de direitos na seara jurisdicional.[15] Por isso o rol que identifica as técnicas processuais engrossa-sedemasiadamente, conforme, aliás, demonstra José Roberto dos Santos Bedaque:

“Nesta linha, as especificidades procedimentais constituem aspecto da técnica, pois se pretende que o processo se desenvolva de forma a permitir aadequada solução da controvérsia. Como esta também apresenta peculiaridades, deve haver compatibilidade entre meio e objeto. (...) também sãoopções relacionadas com a técnica processual a predominância da palavra oral sobre a escrita (oralidade), a maior ou menor profundidade dacognição, a restrição ou ampliação da iniciativa probatória do juiz, a liberdade ou legalidade das formas, a fungibilidade de meios, o regime dapreclusão, a recorribilidade ou não das decisões, a regulamentação dos requisitos de admissibilidade do julgamento do mérito.”[16]

Em conclusão, as técnicas processuais traduzem-se, assim, em meios variados através dos quais o fim da jurisdição (tutela de direitos) é alcançado.[17] Não têm valor em si mesmas, pois sua elaboração e compreensão apenas se mostram aceitáveis se consideradas as necessidades do direitomaterial[18]e as especificidades do caso concreto.[19] Por serem instrumentos, não devem se constituir em empecilhos à consecução do resultadoperseguido pela atividade jurisdicional, como se a técnica se legitimasse mesmo alienada ao objeto para o qual serve e se justifica. A tutelajurisdicional e as técnicas processuais destinadas à sua concretização representam, enfim, os pontos de confluência entre os dois planos (processuale material) do ordenamento jurídico.[20]

5. O direito material a alimentos e as suas necessidades

Alimentos correspondem a tudo aquilo indispensável à conservação das necessidades vitais e à manutenção da dignidade daquele que, sozinho, éincapaz de fazê-lo – os motivos são diversos: incapacidade, idade avançada, desemprego, enfermidade, necessidade financeira. Especificamente,equivalem a prestações, em dinheiro ou in natura, destinadas à garantia de uma vida digna, às quais, além do sustento, se prestam igualmente asuprir necessidades elementares à própria qualidade de vida do ser humano. Dentre outras, são despesas alimentares as vinculadas ao vestuário, àhabitação, à educação, ao lazer, à cultura e à saúde.

Para facilitar a sua compreensão, a doutrina os divide em naturais e civis. Os primeiros, também denominados necessários, prestam-se a prover asnecessidades básicas do alimentando; os últimos, por sua vez, também chamados côngruos, destinam-se a manter, dentro de determinadospadrões, sua qualidade de vida, até mesmo igualá-la ao patamar que se reputa desejável à recuperação e à conservação de seu status social.[21]

Pela sua importância, os alimentos encontram-se inseridos num contexto constitucional. Afinal, é a Constituição que impõe ser dever da família, dasociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer,à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda formade negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (CF/88, art. 227).[22] Não bastasse, é inegável o vínculo entre osalimentos e alguns dos fundamentos e objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, vale dizer, a dignidade da pessoa humana (CF/88,art. 1.º) e a construção de uma sociedade solidária (CF/88, art. 3.º, I).[23]

Mais importante para atingir os objetivos que se pretende neste ensaio, entretanto, é identificar as necessidades do direito material a alimentos.Afinal, é pressuposto lógico perquirir sobre essas necessidades para, só em seguida, averiguar se determinada técnica processual (lato sensu) seapresenta a elas afinada.[24] Há, enfim, que se desvelar o porquê de técnicas processuais diferenciadas[25] na busca da efetivação do direito aalimentos.

Sublinhe-se, de início, que o crédito alimentar realmente recebe do ordenamento jurídico tratamento especial. E assim ocorre justamente em razãoda sua finalidade, cuja essência é compreendida por uma de suas características essenciais: a imprescindibilidade dos alimentos.[26] A ratio destaproteção especial reconhecida a esse direito repousa, afinal, na própria finalidade do crédito alimentar: a garantia da subsistência e a manutenção davida do alimentando.[27] O direito a alimentos é exigência que, no mais das vezes, “se impõe como decorrência do próprio direito fundamental à vida,pois traz em si o fornecimento daquilo que é essencial para a subsistência de determinada pessoa.”[28]

E a própria Constituição dá notícia desta especialidade conferida ao crédito alimentar, pois o excepciona da obediência à ordem cronológica deapresentação dos precatórios, quando devedora a Fazenda Pública, priorizando a satisfação dos alimentos em face de crédito de natureza diversa(CF/88, art. 100).[29] No âmbito processual infraconstitucional, por sua vez, faculta-se ao alimentando a utilização de meios executivos bastanteenérgicos – a ameaça de prisão, por exemplo –, sempre em prol da célere e efetiva tutela da qual depende a sua subsistência.

É, portanto, a finalidade do crédito alimentar, motivada, sobretudo, por sua imprescindibilidade, que avaliza, em especial, a criação de técnicasprocessuais diferenciadas, destinadas à sua tutela de maneira rápida e eficaz,[30] ainda que eventualmente em sacrifício da segurança jurídica e dedireitos patrimoniais do alimentante.[31] Também o direito fundamental à igualdade justifica a construção dessas técnicas processuais diferenciadasem prol da efetividade dos alimentos, afinal, naquilo que diz respeito à vida, apesar de ambos, alimentante e alimentando, terem direito a ela, é óbviaa fragilidade do último neste particular. Acaso a tutela de direito a alimentos não se concretize da forma que se espera e como haveria de ser natural,a alternativa é a instigação do Estado-juiz para dele postular a satisfação pretendida. Configuraria imperdoável inconstitucionalidade por omissão aausência de técnicas processuais diferenciadas asseguradoras de uma tutela jurisdicional do direito a alimentos segundo os valores celeridade eefetividade.[32]

6. Técnicas processuais e a tutela jurisdicional de direitos a alimentos

As principais necessidades a serem consideradas pelo legislador em termos de tutela de direito a alimentos situam-se nos ideais de celeridade eefetividade. Afinal, estar-se-á tratando de um direito cuja finalidade é a garantia da subsistência e a conservação da própria vida do alimentando.Noutras palavras, a sobrevivência do credor e o atendimento de suas demais necessidades básicas dependem do adimplemento pontual a serrealizado pelo alimentante. A celeridade e a efetividade na prestação do direito alimentar, enfim, traduz-se em condição indispensável à vida digna esadia do alimentando.[33]Até intuitiva, portanto, a imprescindibilidade de o legislador elaborar procedimentos e técnicas processuais (stricto sensu)diferenciados, que se mostrem ajustados a tutelar o direito a alimentos urgentemente, em prol da satisfação dos anseios humanos mais elementares.[34]

E no que diz respeito ao tema “alimentos”, a legislação processual é realmente pródiga em procedimentos e técnicas processuais (stricto sensu)diferenciados, elaborados sobretudo com vistas às necessidades do direito material alimentar.

A Lei n.º 5.478/68, de início, criou um rito especial para se postular tutela jurisdicional a alimentos, cujas particularidades são as mais diversas.Também o Código de Processo Civil prevê um pseudoprocedimento cautelar para a satisfação alimentar em circunstâncias específicas (CPC, art.852 e segs.),[35] além de estabelecer rito especial para a execução de prestação alimentícia, mais contundente e agressivo se comparado àquelesvoltados à satisfação de créditos comuns. Mais recentemente, adveio Lei n.º 11.804/2008, a qual disciplina o direito a alimentos gravídicos, regulandoum procedimento próprio para a sua salvaguarda. Não se olvide, ademais, a possibilidade de se cobrar alimentos através do rito ordinário, tambémdisciplinado pelo CPC e hoje perfeitamente acomodado aos valores efetividade e celeridade, haja vista a instituição de dispositivo expresso no CPCprevendo a utilização generalizada da tutela antecipada (CPC, art. 273).[36]

São inúmeras, ademais, as técnicas processuais (stricto sensu) inerentes a esses procedimentos, construídas tendo por base justamente as jáaludidas necessidades do direito material a alimentos: a sumariedade da cognição, a concentração de atos processuais, o segredo de justiça (CPC,art. 155, II), a possibilidade de concessão liminar de alimentos (tutela antecipada), o processamento durante as férias (CPC, art. 174, II), a dispensade caução na execução provisória (CPC, art. 475-O, §2.º, I), a competência favorável ao alimentando (CPC, art. 100, II), a fixação dos alimentos combase no salário mínimo (CPC, art. 475-Q, §4.º), a dispensa de produção de prova documental em alguns casos (Lei n.º 5.869/68, art. 2.º, §2.º, I e II),o desconto em folha de pagamento (CPC, art. 734), cobrança mediante alugueres de prédios ou de quaisquer outros rendimentos do devedor (Lei n.º5.869/68, art. 17); a possibilidade de penhora (e arresto) de bens absolutamente impenhoráveis (CPC, art. 649, §2.º), a possibilidade de penhora (earresto) de bem de família do devedor, a constituição de capital (CPC, art. 475)), o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo (CPC, art.520, II), a ameaça de prisão.

7. A Lei n.º 11.804/08 e as técnicas processuais diferenciadas à tutela de direitos a alimentos gravídicos

7.1. Considerações iniciais

Publicada e em vigor desde 06/11/2008, a Lei n.º 11.804/2008 disciplina o direito a alimentos gravídicos e institui procedimento e técnicasprocessuais (strico sensu) diferenciados,tudo no propósito de conferir proteção à mulher grávida e ao nascituro.

Por meio dela, busca-se, afinal, regular o direito material a alimentos gravídicos e a forma pela qual a sua tutela deve se materializar. Apesar desintética – é composta por apenas seis artigos –, é inegável que incita uma série respeitável de questões de ordem material e processual.[37] Aseguir, apontar-se-ão algumas delas, bem assim respostas que se acredita mais acertadas a elucidá-las

7.2. O conceito e a extensão dos alimentos gravídicos

A expressão “alimentos gravídicos” indica prestações devidas à gestante e àquele que é gestado, indispensáveis à conservação de suasnecessidades vitais. Sem embargo de o art. 1.º da Lei n.º 11.804/2008 afirmar que o seu propósito é disciplinar “o direito de alimentos da mulhergestante”, não há como negar que rege igualmente o direito de alimentos da pessoa concebida e cujo nascimento se espera,[38] isto é, aquele queainda se encontra em estado de maturação no ventre materno (nascituro).

Segundo a própria Lei, esses alimentos compreendem os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejamdela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive às referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares,internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juizconsidere pertinentes (art. 2º).

O rol é meramente exemplificativo, sendo lícito ao juiz, a pedido da parte, considerar outras, que não aquelas descritas alhures, desde quepertinentes e de alguma forma vinculadas às necessidades da gravidez e do nascituro.

7.3. A especial situação do nascituro

Divergem, doutrina e jurisprudência, quanto à condição jurídica do nascituro.[39]

São três as correntes: a natalista, a teoria da personalidade condicional e a concepcionista. A primeira defende a tese de que o nascituro só adquirepersonalidade após o nascimento com vida; a segunda assegura-lhe direitos subordinados a uma condição suspensiva (o seu nascimento com vida);e a última, por fim, advoga que a personalidade do nascituro começa desde a concepção da vida no útero materno.

Os natalistas são ainda predominantes. Escoram-se basicamente no sentido literal do art. 2.º do atual Código Civil, o qual estabelece, como marcoinicial da personalidade, o nascimento com vida, não obstante o dispositivo também assegurar, já a partir da concepção, os direitos do nascituro.[40]

Acredita-se, entretanto, que a razão está com os concepcionistas. A capacidade de direito, conforme aponta a própria Lei Civil, é a aptidão de terdireitos e deveres na ordem civil (CC/2002, art. 1.º).[41] É capaz todo aquele, pessoa ou ente, a que a lei confere poder para ser titular de direitos edeveres. No que toca ao nascituro, a lei, ao assegurar, desde a sua concepção, os seus direitos (CC/2002, art. 2.º, segunda parte), está a encampara tese concepcionista, afinal, direitos subjetivos só detêm aqueles qualificados como pessoas. Ao impor que o marco inicial da personalidade é onascimento com vida (CC/2002, art. 2.º), o legislador apenas diferençou personalidadesfísica e jurídica: a primeira, iniciada a partir do nascimentocom vida, retroativa à data da concepção nesta mesma hipótese; a derradeira, principiada desde a concepção.[42]

Nascituro, destarte, é a pessoa embrionária, isto é, aquelaque ainda não nasceu, pois mantém vida intra-interina. Pelo simples fato de ser pessoa e,portanto, sujeito de direitos e deveres na ordem civil, detém capacidade de direito, e, por conseguinte, personalidade jurídica. É, aliás, em face dessacapacidade que o nascituro tem direito a curador (CC/2002, art. 462), pode ser reconhecido (CC/2002, art. 1.609, parágrafo único), e receberdoações (CC/2002, art. 542) ou deixas testamentárias (CC/2002, art. 1.798). São, pois, portadores de direitos da personalidade, dentre os quais seinsere a própria vida, direito fundamental cuja efetividade, além de assegurada constitucionalmente, também o é por intermédio de legislaçõesinfraconstitucionais, a exemplo da recente Lei n.º 11.804/2008.[43]

A Lei n.º 11.804/2008, ao disciplinar o direito material e a forma de tutela jurisdicional a alimentos gravídicos, não só demonstrou preocupação àsnecessidades do direito alimentar, como também reconheceu a especial situação de fragilidade à qual se encontram gestante e concepto. E apesarde alguma timidez, o legislador, uma vez mais, reforçou entendimento doutrinário e jurisprudencial adotado por aqueles que conferem ao nasciturocapacidade de direito.[44]

7.4. Visão geral do procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008

Consoante afirmado anteriormente, a Lei n.º 11.804/2008, além de disciplinar o direito a alimentos gravídicos, regulou a forma pela qual esse mesmodireito deve ser efetivado. Instituiu, portanto, procedimento e técnicas processuais (stricto sensu) diferenciados voltados à tutela alimentar dagestante e do nascituro.

De início, afirme-se que se aplicam, supletivamente, ao procedimento em exame, as disposições das Leis n.º 5.478/1968 (Lei de Alimentos) e5.869/1973 (Código de Processo Civil) (art. 11).[45]

Tem legitimidade e interesse de agir tanto o nascituro como a própria gestante, em litisconsórcio ou não. Concluída a gravidez, desaparece apossibilidade de utilização do rito especial, cumprindo ao interessado valer-se das vias adequadas para postular a competente pensão alimentícia, oumesmo cobrar eventuais despesas expendidas no período gestacional. Não se deve olvidar que o rito especial apenas tem valia no curso dagravidez, tanto assim que o art. 6.º impõe que o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança.[46] O Ministério Público,por sua vez, não tem legitimidade para propor, como substituto processual, “ação de alimentos” em benefício da gestante e do nascituro, apesar denecessariamente ter que acompanhar o processo na qualidade de custos legis (art. 9.º da Lei n.º 5.478/68 e art. 82, II, do CPC).

Consigne-se, ademais, que a petição inicial haverá necessariamente de vir acompanhada com prescrições ou declarações assinadas por médicos,dando ciência da indispensabilidade dos alimentos para cobrir despesas adicionais da concepção ao parto.[47] É que o art. 2.º da Lei n.º 11.804/2008estabelece não apenas um rol exemplificativo daquilo que se enquadra no conceito de alimentos gravídicos, mas também impõe que os alimentosque nela são tratados compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam deladecorrentes, da concepção ao parto, a juízo do médico.[48] Diante da urgência que qualifica o procedimento especial, é prudente que a demandanteassim o faça já ao promover sua demanda, permitindo ao juiz, inclusive, munir-se de elementos probatórios mínimos que lhe possibilitem deferirpedido de tutela antecipada antes mesmo de apresentada a resposta pelo demandado.

O procedimento é bastante enxuto,[49] não obstante baseado preponderantemente na técnica da cognição exauriente. Conquanto sumária a técnicaprocedimental (procedimento sumário), não há sumariedade no que diz respeito à técnica de cognição (no plano vertical). Sem embargo de o juizestar autorizado a proferir sentença exclusivamente com base em prova indiciária (art. 6.º), não lhe é lícito resolver o mérito mediante cogniçãosumária. De regra, as decisões tomadas no curso do procedimento, em especial a sentença, resultar-se-ão de profunda análise e valoração dos fatose fundamentos apresentados aos autos pelas partes e eventuais terceiros, sempre abalizadas num juízo de certeza.

A exceção diz respeito às decisões tomadas a título de tutela antecipada. A despeito da omissão legislativa, aplica-se supletivamente a regra geral(CPC, art. 273), admitindo-se formulação de pedido e deferimento de decisão antecipada também no bojo do procedimento instituído pela Lei n.º11.804/2008, sendo suficiente, nesse caso, valer-se o juiz de mero juízo de probabilidade (cognição sumária). Aliás, raciocínio diverso não seriaaceitável, uma vez que a urgência é ínsita ao direito material em questão, seja pela sua finalidade especialíssima (salvaguarda do próprio direitofundamental à vida), seja pela situação de fragilidade na qual se encontram gestante e nascituro, seja porque a demora aqui, quando menos,implicará o nascimento do infante e a inutilidade do próprio direito aos alimentos gravídicos.

Havendo pedido de tutela antecipada, cumpre à demandante demonstrar os requisitos genéricos necessários ao seu deferimento (CPC, art. 273, I e

II), ocasião em que o juiz, até oficiosamente, poderá designar audiência de justificação prévia para formar seu convencimento. Demonstrados taisrequisitos, a decisão antecipada deverá ser concedida mesmo antes de apresentada a contestação.

Embora o art. 221, do CPC, exclua a citação pelo correio nas ações de estado, a “ação de alimentos” (gravídicos ou não) segue regramento especial,vale dizer, comunica-se o demandado mediante registro postal isento de taxas e com aviso de recebimento (Lei 5.478/68, art. 5º e § 2º), poucoimportando que resida em outra comarca (CPC, art. 222). Frustrada a citação pelo correio, far-se-á por mandado. Se frustrada também essa última, acitação deverá ser feita por edital, em consonância com o disposto no art. 5.º, §4.º, da Lei n.º 5.478/68.

Citado o demandado, antes ou depois de concedida a liminar, terá a faculdade de apresentar defesa no prazo de 5 (cinco) dias, a contar da juntadado mandado de citação aos autos do processo. É prudente, ademais, sobretudo pelo caráter emergencial que caracteriza o direito material aalimentos gravídicos, que o juiz, valendo-se da técnica de concentração dos atos processuais, designe uma única audiência – audiência deconciliação e julgamento –, e isso já ao despachar a inicial, também determinando, em ato contínuo, a comunicação do dia e hora de sua realizaçãoao demandado. Consignar-se-á no mandado de citação que a contestação haverá de ser apresentada na aludida audiência.

Revel o demandado, deve o juiz nomear-lhe curador especial (CPC, art. 9.º, II). Ainda que se reconheça a revelia, a sua decretação, contudo, nãoimporta confissão a respeito da matéria fática, pois se está a tratar de direito indisponível – a prova, mesmo em tal caso, não haverá de serdispensada (CPC, art. 320, II). Acaso conteste, poderá suscitar, em primeiro plano, questões preliminares e prejudiciais, e no mérito, arguir e provar –também mediante prova indiciária – a ausência da paternidade que lhe é impingida, bem assim a sua impossibilidade financeira de honrar alimentoseventualmente fixados (cognição limitada no plano horizontal).

Em audiência de conciliação e julgamento, demandante e demandado devem comparecer acompanhados de, no máximo, 3 (três) testemunhas (Lei5.478/68, art. 8º). Ausente a demandante, os autos serão apenas arquivados, com cessação da eficácia da decisão antecipada acaso já concedida,circunstância que possibilita o prosseguimento do feito através de simples manifestação futura da parte.[50] A falta do demandado, de outra parte,importa em revelia, mas não em confissão quanto à matéria fática (CPC, art. 320, II), de modo que a confirmação da decisão antecipada, ou mesmoa concessão de alimentos definitivos condicionam-se a produção probatória. Não é exigida a prévia apresentação do rol de testemunhas e sequersua prévia intimação se apresenta necessária. Como não poderia ser diferente, a presença do representante do Ministério Público é indispensável.

Aberta a audiência, lida a petição inicial e a resposta, se houver, ou dispensada a leitura, o juiz ouvirá os litigantes e o representante do MinistérioPúblico, propondo conciliação (art. 9.º da Lei n.º 5.478/68). Havendo acordo, lavrar-se-á o respectivo termo, que será assinado pelo juiz, escrivão,partes e representante do Ministério Público (Lei 5.478/68, art. 9.º, §1.º). Caso contrário, o juiz tomará o depoimento pessoal das partes e ouvirá astestemunhas, podendo julgar o feito sem a mencionada produção de provas, se as partes assim concordarem (Lei 5.478/68, art. 9.º, §2.º). Concluídaa instrução, poderão as partes e o representante do Ministério Público aduzir alegações finais, em prazo não excedente de 10 (dez) minutos paracada um (Lei 5.478/68, art. 11). Em seguida, o juiz renovará a proposta de conciliação e, não sendo aceita, ditará sua sentença, contendo sucintorelatório do ocorrido na audiência (Lei n.º 5.478/68, art. 12). Convencido, enfim, da existência de indícios da paternidade, bem assim da necessidadealimentar e do poder de contribuição do suposto pai (possibilidade), julgará procedente o pedido e arbitrará os alimentos gravídicos mediantesentença fundada em cognição exauriente, os quais perdurarão até o nascimento da criança. É bom lembrar que o demandado haverá de sercondenado apenas à fração das despesas que deve custear, uma vez que também a mulher grávida é obrigada a contribuir financeiramente para obem estar do nascituro – o juiz se valerá do critério da proporcionalidade e, assim, sopesará os recursos e condições de contribuição de amboslitigantes. A sentença pode ser impugnada mediante recurso de apelação, o qual, neste caso, será recebido apenas no seu efeito devolutivo (Lei5.478/68, art. 14).

Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor, até que uma das partes solicitesua revisão.

7.5. A legitimidade ativa e passiva

Interessante questão diz respeito à legitimidade ativa para promover a “ação de alimentos gravídicos”.

Se o critério cingir-se a uma interpretação literal, tal titularidade caberia apenas à gestante. Afinal, o art. 1.º da Lei n.º 11.804/2008 estabelece que eladisciplina o direito de alimentos da mulher gestante. Também a mesma impressão se colhe ao se ler o art. 6.º, parágrafo único: “Após o nascimentocom vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.” Àgestante caberia a legitimidade de ajuizar demanda para a tutela de alimentos gravídicos; ao nascituro cumpriria o papel meramente passivo deaguardar eventual tutela jurisdicional que o beneficie.

Não é esta, todavia, a melhor interpretação. Admiti-la é ulcerar o direito fundamental à tutela jurisdicional adequada (CF/88, art. 5.º, XXXV). Afinal,não há porque vedar ao nascituro o uso de via procedimental instituída também para protegê-lo. É bem verdade que tal raciocínio apresenta-sebastante coerente àqueles que adotam a corrente concepcionista, não obstante também válido aos natalistas. Ora, se a lei põe a salvo o direito dosnascituros (CC/2002, art. 2.º), parece lógico afirmar que eles detêm legitimidade para postular judicialmente a tutela dos direitos que lhe sãoassegurados, mesmo que alguns insistam em negar-lhes capacidade de direito – é o que se costuma denominar de personalidade judiciária.[51]Nesta linha, aliás, a melhor orientação jurisprudencial.[52]

O que fez a Lei n.º 11.804/2008 foi mesmo ampliar a legitimidade ativa para a postulação da tutela jurisdicional de alimentos gravídicos.[53] Ajurisprudência já reconhecia tal legitimidade ao nascituro. Agora, também a gestante – em litisconsórcio ou não com o nascituro – a detém, de modoque é plenamente lícito que ela, sozinha, promova demanda postulando tais alimentos, de resto voltados igualmente a sua salvaguarda.[54]

No que toca a legitimidade passiva, o escopo da Lei, que é o de proteger a genitora e sua prole, sugere a aplicação do art. 1.698 do CC/2002. Assim,se o suposto pai, que em primeiro lugar deve os alimentos, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorreros de grau imediato. Sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e,intentada demanda em face de uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a relação processual. Obviamente, tal interpretação nãoexpurga a necessidade de se provar a relação de parentesco, questão prejudicial à própria condenação e fixação dos alimentos gravídicos.

7.6. A competência

Segundo disporia o art. 3.º da Lei n.º 11.804/2008, para a aferição do foro competente das ações judiciais voltadas à tutela de alimentos gravídicos,aplicar-se-ia o art. 94 do Código de Processo Civil. Assim, a referida ação haveria de ser proposta no foro do domicílio do demandado, segundo aregra geral do Código de Processo Civil.

Tal dispositivo foi, contudo, vetado. Sua incoerência, afinal, era abissal, se confrontada à sistemática processual em matéria de competênciaenvolvendo demandas cujo propósito é a tutela jurisdicional de direito a alimentos.

O artigo em questão, por outro lado, destoava-se da finalidade do direito a alimentos, isto é, ia de encontro ao escopo protecionista da Lei n.º11.804/2008. Era, enfim, contrário às necessidades do próprio direito material a alimentos gravídicos.

Ademais, até avesso aos contornos contemporâneos do direito fundamental à tutela jurisdicional adequada (CF/88, art. 5.º) atribuir-se à demandanteo ônus de ajuizar “ação de alimentos gravídicos” na sede do domicílio do demandado, e assim impingir despesas e dificuldades justamente àquelesque haveriam de ser protegidos pela situação de fragilidade em que se encontram.

Portanto, a competência para o ajuizamento de demandas em que se postulam a tutela de alimentos gravídicos é a do foro do domicilio dademandante.

7.7. A cognição

A cognição é técnica processual que permite a construção de procedimentos ajustados às reais necessidades de tutela dos direitos.[55] Representaatos de inteligência, consistentes em considerar, analisar e valorar as alegações e as provas deduzidas e produzidas pelas partes no processo e cujoresultado é o alicerce das decisões judiciais.[56]

Mediante interpretação apressada, poder-se-ia afirmar que a cognição realizada no procedimento instaurado pela Lei n.º 11.804/2008 é sumária.[57]Seria dizer que no plano vertical (profundidade ou intensidade) a cognição, voltada à emissão de decisões judiciais, é baseada em juízo deprobabilidade. É que o art. 6.º da referida Lei impõe ser suficiente para o deferimento de alimentos gravídicos que o juiz se convença dos indícios depaternidade.

Cognição sumária, contudo, há apenas quando o juiz examina o pedido de antecipação de tutela de alimentos gravídicos. Bem diferente é o que sedá na atividade cognitiva realizada pelo juiz ao proferir a sentença, pois, ao prolatá-la e julgar procedente ou não o pedido, cumpre-lhe basear-se numjuízo de certeza, não obstante conduzir seu raciocínio com alicerce em indícios da paternidade. Trata-se, então, de cognição exauriente, e nãosumária.

Não há, enfim, que se vincular “cognição realizada em indícios da paternidade” e “cognição sumária”. Julgar com base em indícios não quer significarjuízo de mera probabilidade. A chamada prova indiciária, aliás, sempre foi admitida, em todo e qualquer processo, especialmente naquelascircunstâncias em que a demonstração direta de um determinado fato se apresenta dificílima ou mesmo impossível, obrigando o juiz a deduzir a suaexistência a partir de outro fato já provado.[58] Nas demandas de alimentos e de investigação de paternidade, antes da existência do popularmenteconhecido “Exame de DNA”, as presunções (ou indícios) eram sobejamente utilizadas pelas partes e juízes, naturalmente pela dificuldade derealização da prova direta do parentesco.[59]

Sobre as presunções – ou provas indiciárias – leciona Humberto Theodoro Júnior:

“As presunções correspondem mais a um tipo de raciocínio do que propriamente a um meio de prova. Com elas pode-se chegar a uma noção acercade determinado fato sem que este seja diretamente demonstrado. Usa-se na operação a denominada prova indireta (circunstancial ou indiciária).Presunção, nessa ordem de idéias, é a consequência ou ilação que se tira de um fato conhecido (provado) para deduzir a existência de outro, nãoconhecido, mas que se quer provar. O fato realmente provado não é o objeto da indagação, é um caminho lógico, para alcançar-se o que em verdadese deseja demonstrar. De tal sorte, as presunções são consequências que resultam dos constantes efeitos de um fato (...).[60]

De tal sorte, o procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008 é mesmo sumário, mas a cognição (no plano vertical) nele realizada para se chegar asentença é exauriente.[61] Não é porque o juiz julga mediante raciocínio indiciário que seu exame é perfunctório. Muito pelo contrário, para se chegara uma conclusão mediante a técnica de prova indiciária, ainda mais intensa e exauriente haverá de ser a cognição empreendida.

Infelizmente o legislador não foi feliz ao afirmar que o juiz fixará alimentos quando convencido da existência de indícios da paternidade. Não havianecessidade de assim se pronunciar, pois a especial condição a qual se encontram nascituro e gestante é suficiente para tornar descabida exigênciade prova direta acerca da paternidade. Por isso, aliás, o veto ao artigo 8.º da Lei, o qual condicionava a procedência do pedido de alimentosgravídicos à realização do exame pericial, sempre que houvesse oposição à paternidade por parte do demandado. Não bastassem as dificuldadeseconômicas que impunha, tal dispositivo colocava em risco de morte o próprio nascituro.[62]As palavras utilizadas pelo legislador, enfim, podem levara falsa compreensão de que pretendeu instituir procedimento cuja cognição também é sumária, e, portanto, infensa à própria coisa julgada material.

No plano horizontal, por outro lado, a cognição é limitada. A exemplo do que ocorre na “ação de alimentos”, cujo rito também é especial e sumário,por se estar diante de um procedimento destinado a atender às necessidades do direito material a alimentos gravídicos, é inviável a cumulação depedidos de natureza diversa (CPC, art. 292, §1.º, III). Logo, não sendo apropriado o procedimento às várias postulações, o litígio não podeultrapassar os limites ínsitos à questão alimentar para que o procedimento especial se mostre adequado.[63]

Em resumo, a cognição exercitada no rito especial instituído pela Lei n.º 11.804/2008 é limitada (no plano horizontal) e exauriente (no plano vertical).Sofre, portanto, limitações quanto à amplitude do debate das partes, afetando, na mesma medida, o conhecimento do juiz, sem que exista, contudo,qualquer restrição quanto à profundidade do objeto cognoscível.[64]

7.8. A tutela antecipada

Nada há na Lei n.º 11.804/2008 que discipline o uso da tutela antecipada.

Havia, contudo, dispositivo (art. 5.º) que impunha ao juiz, recebida a petição inicial, designasse audiência de justificação prévia, momento em queouviria a demandante e apreciaria as provas de paternidade em cognição sumária, podendo tomar depoimento do demandado e de testemunhas erequisitar documentos. Tal dispositivo, embora vetado, demonstra a intenção do legislador de instituir previsão expressa acerca da tutela de urgênciana Lei n.º 11.804/2008. O veto do qual foi alvo não poderia significar jamais obstáculo a pedidos antecipatórios, sob pena de também se vulnerar odireito fundamental à tutela jurisdicional adequada.

Aplica-se supletivamente a regra geral, atinente à tutela antecipada, (CPC, art. 273), ao procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008. E tal sejustifica pela mera urgência que caracteriza o direito postulado, uma vez que o não deferimento imediato da tutela alimentar poderá importar onascimento daquele a quem os alimentos deveriam servir à subsistência, quando não menos atuar em prejuízo à sua própria vida. Por tal razão, nemde longe é exagerado assinalar que a tutela antecipada é técnica inerente ao novel procedimento, sem a qual sua utilidade, por certo, sedesvanecerá.

Então, o caráter emergencial que destaca os alimentos gravídicos leva à possibilidade de o juiz concedê-los antecipadamente, através de cogniçãosumária, mesmo antes de instaurado o contraditório, desde que presentes indícios da paternidade e da possibilidade de dano irreparável ou de difícilreparação para assim atuar (CPC, art. 273).[65] Não estando o juiz suficientemente convencido da necessidade de deferir a tutela antecipada, deverádesignar audiência de justificação prévia com o intento de formar seu convencimento. A decisão que defere ou não o pedido de tutela antecipadapode ser desafiada por agravo de instrumento, o qual, como se sabe, é recebido, de regra, sem efeito suspensivo.

7.9. A coisa julgada e seus limites

7.9.1. Considerações iniciais

A coisa julgada atrela-se intimamente ao direito fundamental à segurança jurídica. Representa a garantia de que aquela discussão, já passada emjulgado, não mais surgirá, pois indiscutível ou imutável o resultado da atividade jurisdicional empreendida para tal finalidade.[66]

Não há dúvidas de que o procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008 produz decisão (sentença ou acórdão) com autoridade de coisa julgada.Afinal, a cognição nele realizada é exauriente, produzida mediante juízo de certeza, não obstante escorada em provas indiciárias.

É por isso que se mostra importante traçar breve análise acerca dos limites objetivos e subjetivos da coisa julgada produzida neste novoprocedimento, a qual, aliás, apresenta algumas peculiaridades, de resto devidamente ajustadas às necessidades do direito material a alimentosgravídicos.

7.9.2. Os limites objetivos da coisa julgada

Objeta-se pelo estudo dos seus limites objetivos definir a parte da sentença que se reveste da imutabilidade. Busca-se, enfim, identificar, entre asdiversas questões decididas, aquelas protegidas pelo manto da coisa julgada material.

E no direito brasileiro a coisa julgada envolve apenas a parte dispositiva da sentença, de modo que, nesta ordem de idéias, ficam de fora: a) osmotivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; b) a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento

da sentença; e c) a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo. (CPC, art. 469).

Apesar de sumário o procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008, a cognição ali realizada pelo juiz é exauriente, embora baseada em provasindiciárias. E é justamente porque o juiz julga mediante provas indiretas (indiciárias) que se reforça a necessidade de delineamento preciso daquiloque na sentença é protegido pela coisa julgada. Afinal, julgamentos escorados em tais provas apresentam margem maior de insegurança, ainda quese esteja diante de juízo de certeza. É importante, enfim, definir exatamente qual a fração da sentença se reveste de imutabilidade, bem assim atéem que ponto o litigante prejudicado estará autorizado a ajuizar nova demanda para acudir eventual injustiça em face dele cometida.

Especificamente, deve-se responder se a coisa julgada, oriunda de demanda promovida e processada segundo o rito da Lei n.º 11.804/2008,compreende, em seus limites objetivos, a relação de paternidade. Basta pensar que o juiz, antes de proferir sentença definitiva concedendo direito aalimentos gravídicos, deverá enfrentar questão relativa à paternidade. Julgada por sentença a demanda e concedidos os alimentos gravídicos, acoisa julgada alcança a relação de paternidade, definida pelo juiz mediante cognição exauriente, mas com base, no mais das vezes, em provasindiciárias? A resposta é negativa.

É que a coisa julgada não abarca em seus limites decisão sobre questão prejudicial, salvo se postulada mediante “ação declaratória incidental” (CPC,art. 469, III). Segundo o rito estabelecido pela Lei n.º 11.804/2008, a relação de paternidade é subordinante (questão prejudicial) à obrigaçãoalimentar, pois para que a última exista, indispensável que a primeira seja reconhecida. O direito à tutela alimentar depende da relação deparentesco. Cumpre ao juiz, então, examiná-la previamente, mas isso não significa que o dispositivo da sentença deve abrangê-la. Afinal, o art. 469,III, do CPC é clarividente ao indicar que as questões prejudiciais não são alcançadas pela coisa julgada quando decididas incidentalmente noprocesso.[67]

É de se sublinhar, por fim, que há um pedido implícito sob condição em toda demanda cujo rito é o estabelecido pela Lei n.º 11.804/2008. É que oseu art. 6.º, parágrafo único, impõe que os alimentos gravídicos convertem-se em pensão alimentícia em favor do menor, até que uma das partessolicite a sua revisão. Assim, se inicialmente os alimentos prestam-se a suprir despesas adicionais do período de gravidez e dela decorrentes, numsegundo momento sua finalidade automaticamente transmuda-se, e a tutela alimentar assume a finalidade de prover necessidades exclusivas domenor. Portanto, também envolvida pela coisa julgada condenação à pensão alimentícia, destinada à subsistência exclusiva do infante, desde quenasça com vida (condição).[68] Dito de outro modo, já sabe previamente o alimentante que condenação que eventualmente vir a sofrer não selimitará ao período correspondente à gravidez (da concepção ao parto), mas, muito ao contrário, estender-se-á para além dela, prestando-se a supriras necessidades do alimentando também em vida. Trata-se de condenação ex lege a respeito da qual o pedido expresso se mostra despiciendo.

7.9.3. Os limites subjetivos da coisa julgada

Já os limites subjetivos da coisa julgada se prestam a determinar os sujeitos a quem a decisão prejudica ou beneficia.[69] Ao examiná-los o que sepretende é justamente definir aqueles que se encontram submetidos ao comando inserido na sentença. É o que leciona Luiz Eduardo RibeiroMourão:

“Estudar os limites subjetivos da coisa julgada significa identificar quais os sujeitos que serão alcançados pela autoridade da coisa julgada e,portanto, estarão impedidos de rediscutir o conteúdo de uma determinada decisão judicial, em processo futuro.”[70]

Segundo o CPC, a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, de modo que não beneficia nem prejudica terceiros (art. 472). Nãoquer isso dizer que a sentença passada em julgado prevalece ou somente vale entre as partes, mas simplesmente que a sua imutabilidade eindiscutibilidade não podem prejudicar, nem beneficiar, estranhos ao processo em que foi proferida.[71]

O tema ganha especial relevo diante da Lei n.º 11.804/2008, também em face do que dispõe o seu art. 6.º, parágrafo único: “Após o nascimento comvida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.”

Constata-se pela redação do dispositivo aludido que, mesmo a demanda sendo promovida exclusivamente pela gestante, a autoridade da coisajulgada atuará sobre o infante, não só ainda quando nascituro, mas também depois do seu nascimento com vida. Afinal, a partir de então, osalimentos, cujo propósito inicial era o de apenas cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e dela decorrentes, converter-se-ão em pensãoalimentícia em seu exclusivo favor.

O que se vê é a criação de um novo regime de eficácia subjetiva da coisa julgada, diversamente do que se passa nas ações individuais reguladaspelo CPC. A legislação especial, enfim, instituiu que, em ações judiciais cujo rito é o estabelecido pela Lei n.º 11.804/2008, a sentença faz coisajulgada também em relação ao infante, mesmo que inicialmente não integre a relação jurídica processual. Certamente o legislador se apegou aquiaos valores constitucionais efetividade e celeridade, de resto norteadores de grande parte das reformas pontuais que se assiste hodiernamente nocenário jurídico processual. É mais um exemplo vivo de definição e compreensão dos contornos de um instituto processual segundo as necessidadesdo direito material perseguido.

7.10. Apontamentos finais

Algumas observações finais merecem breve transcrição.

A primeira delas diz respeito à controvérsia acerca do termo inicial dos alimentos gravídicos. Ressalte-se que o projeto fazia referência à citaçãocomo marco a partir da qual os alimentos seriam devidos, a exemplo do que reza a Lei n.º 5.478/1968 (art. 13, §2.º). Mas tal dispositivo (art. 9.º) foivetado, o que, a rigor, não afasta idêntica conclusão. Melhor, contudo, é adotar interpretação sistemática para admitir o reembolso das despesasrealizadas também antes da citação, sem descurar, por óbvio, do necessário respeito ao critério da proporcionalidade no tocante à disponibilidadefinanceira de cada uma das partes, além da fixação de um valor mensal até o fim da gestação que, após o nascimento com vida, será convertido empensão alimentícia ao menor. É essa a solução conferida por Douglas Phillips Freitas, valendo-se do art. 398 do CC/2002, o qual estabelece que, nasobrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora desde a sua prática. Na ótica acertada do jurista, não é despropositadoenquadrar o desamparo alimentar pelo pai em relação à mãe e o nascituro como ato ilícito e, assim, aplicar analogicamente o dispositivo (CC/2002,art. 398) para a solução de questões que também envolvam a Lei n.º 11.804/2008.[72]

Outro aspecto interessante diz respeito ao ônus probatório. Excetuados os casos de presunção de paternidade, tal ônus pertence à demandante, quedeverá provar a presença de indícios da relação de paternidade entre o nascituro e o demandado, bem assim a necessidade e a possibilidade de seconceder a tutela a alimentos gravídicos.[73] Por ser a cognição limitada no plano horizontal – a discussão encontra-se limitada à relação depaternidade e ao binômio necessidade/possibilidade –, e ausente a possibilidade de o demandado postular “Exame de DNA”, poderá defender-seprovando, por exemplo, a realização de vasectomia, que sofre de impotência sexual, que a genitora contraiu novas núpcias, entre outros previstosnos arts. 1.597 a 1.602 do CC/2002.[74]

A Lei n.º 11.804/2008, ademais, refere-se à revisão apenas depois de nascido o infante e convertidos os alimentos em pensão alimentícia. Todavia, éplenamente possível a postulação judicial de tal revisão alimentar ainda no período da gravidez, obviamente em demanda própria voltada a essafinalidade, conquanto pouco provável que tal hipótese ocorra na praxe.

É absolutamente majoritário, em doutrina e jurisprudência, o entendimento de que não há se falar em ressarcimento dos valores pagos a título dealimentos gravídicos, dada a sua natureza peculiar. Portanto, ainda que demonstrada a ausência de vínculo de paternidade, não seria lícito aodemandado, em demanda diversa, postular ressarcimento do prejuízo sofrido. A primeira versão deste artigo, aliás, seguiu este rumo, com a ressalvade que, demonstrada a má-fé da gestante, a responsabilização civil haveria de ser admitida.[75] Mas o argumento de Francisco José Cahali, situadoem ensaio que apenas tomamos conhecimento posteriormente, obrigou-nos, até por honestidade intelectual, a alterar a posição antes firmada.Crê-se, enfim, mais ajustada a uma visão constitucional defender-se a responsabilidade civil da gestante pelo prejuízo causado ao demandado, a serpostulada em demanda própria, e desde que provada a ausência de paternidade. E assim haverá de ser ainda que ausente dolo ou mesmo má-fé porparte da gestante. Trata-se de entendimento mais consentâneo ao direito fundamental à tutela jurisdicional adequada (CF/88, art. 5.º, XXXV).[76]

Superada a gravidez em decorrência de aborto, perde a ação alimentar o seu objeto, devendo ser extinta sem resolução de mérito, ante a falta deinteresse de agir. Trata-se de hipótese em que a carência da ação surge no curso do procedimento, justamente em face da ocorrência de causasuperveniente – o aborto, sem dúvida um fato processual. Por outro lado, já encerrado o processo, com sentença condenatória passada em julgado,mas sobrevindo um aborto, a melhor orientação sugere a necessidade de ajuizamento de nova ação judicial (“ação de exoneração de alimentos”) porparte do alimentante, cujo propósito, agora, norteia-se à obtenção de tutela jurisdicional que o exonere do pagamento de alimentos gravídicosarbitrados na demanda anterior, sendo insuficiente, portanto, a mera comunicação no feito já extinto – é, pois, vedada a exoneração automática doalimentante ao pagamento de pensão alimentícia. Trata-se, neste último caso, de interpretação consentânea à súmula 358 do Superior Tribunal deJustiça.

É interessante também indagar se ao juiz seria permitido proferir sentença condenatória cujas prestações fossem definidas em valores diferentes,considerando o período da gravidez (da concepção ao parto) e aquele após o nascimento com vida do nascituro (prestações em valor “X” daconcepção ao parto; prestações em valor “Y” devidos a título de pensão alimentar ao infante). Por outras palavras, seria lícito ao juiz arbitraralimentos em valores diversos, devidos em períodos temporais também diversos e conforme as particularidades de cada qual das fases (período degravidez e período pós-parto) pelas quais passa gestante e nascituro? Não parece, entretanto, ser possível a adoção de tal caminho. É clara a lei aoimpor que, após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos converter-se-ão em pensão alimentícia em favor do menor, até que uma das partessolicite a sua revisão. Admitir-se ao juiz condenações em valores diversos poderia levar a ampliação da cognição (limitada, no plano horizontal), emprejuízo à própria celeridade que caracteriza o procedimento diferenciado.

No que diz respeito à prescrição, é certo que o direito de alimentos é imprescritível. E assim é também com o direito a alimentos gravídicos.Unicamente os alimentos devidos prescrevem no prazo de dois anos, que inicia no vencimento de cada prestação.[77] Essa prescrição de dois anosrefere-se tão-somente à prestação periódica que está fixada em sentença ou convencionada em acordo, de maneira que incide em cada prestaçãoque se encontra vencida, mantendo-se, entretanto, o direito de exigir as demais.[78]

Por fim, na execução do direito a alimentos gravídicos (concedidos através da técnica da tutela antecipada ou definitivos) é possível a utilização detodos os meios executivos e técnicas diferenciados instituídos pelo legislador para conferir efetividade à cobrança do crédito alimentar (desconto emfolha de pagamento, penhora de bens absolutamente impenhoráveis e de família, constituição de capital, ameaça de prisão, dentre outros). OSuperior Tribunal de Justiça vem entendendo ser cabível a prisão civil, por certo a mais grave das medidas executivas, quer se trate de execução dealimentos definitivos, quer de alimentos provisórios ou provisionais.[79] Não há porque afastar esse entendimento às questões atinentes aoprocedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008.

8. Conclusão

Há primado constitucional a impor que se dispense tratamento diferenciado aos desiguais em prol da igualdade. E o legislador infraconstitucional temsido fiel ao cumprir esse comando, na medida em que institui regularmente legislações protecionistas a determinadas categorias de pessoas,conferindo-lhes prerrogativas materiais e processuais.

Assim ocorre com as crianças e adolescentes e também com os idosos. Os deficientes igualmente encontram proteção na legislação pátria.Categorias vulneráveis como os consumidores também dispõem de legislação própria que lhes assegurem proteção e igualdade.

Já era tempo de o legislador estender esse raciocínio especificamente à pessoa embrionária, à qual, segundo a doutrina concepcionista, também ésujeito de direitos e deveres na ordem civil.[80] Se a especial condição da criança e do adolescente instigou a edição de legislação que lhes éprotecionista, por que não esperar que se torne igualmente alvo de proteção estatal, compatível à sua natureza humana, também o nascituro, demodo que se reconheça a dignidade que lhe é inerente e o respeito aos seus direitos fundamentais?[81] Afinal, não se deve olvidar ser impossívelfalar em dignidade quando a pessoa é rebaixada a mero objeto, tratada como coisa e, por assim dizer, descaracterizada como sujeito de direitos.[82]

É bem-vinda, portanto, a Lei n.º 11.804/2008. Mas não apenas porque reforça a possibilidade de se deferir judicialmente alimentos ao nascituro e àmulher grávida, além de instituir técnicas processuais (lato sensu) ajustadas às particularidades desse mesmo direito material. De maneira especial,sua importância está em incutir na mente social a necessidade premente de se dedicar esforços estatais (administrativos, legislativos e judiciais)protecionistas àqueles cujas vozes sequer podem ser ouvidas, tamanha é a vulnerabilidade que particulariza a sua própria essência.

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Notas: [1] Agradeço prontamente aos preciosos amigos, Claudiovir Delfino, João Delfino, André Menezes Delfino e JoãoD’Amico, pela leitura dos originais que deram origem a este ensaio, bem assim às críticas que ofertaram, todas importantes e devidamenteconsideradas, de um modo ou de outro, no corpo do artigo. [2] A tutela jurisdicional – fruto da atividade jurisdicional – é só uma das maneiras de setutelar direitos. Também o legislador tutela direitos quando legisla (tutela normativa de direitos). Por igual, o administrador tutela direitos, quando, porexemplo, determina, mediante processo administrativo, o cumprimento de uma norma de proteção (instalação de equipamento antipoluente,paralisação na construção de obra, etc.) (tutela administrativa de direitos). Sugere-se, para aprofundamento no tema, a leitura de: MARINONI, LuizGuilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 241-246. [3] MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral doProcesso. 3ª. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 240. [4] MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª. ed. São Paulo :Revista dos Tribunais, 2008. p. 240. [5] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo. Influência do direito material sobre o processo. 4ª.ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2006. p. 20. [6] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo. Influência do direito material sobre oprocesso. 4ª. ed. São Paulo : Malheiros Editores, 2006. p. 20. [7] É esta também a visão de Robson Renault Godinho ao afirmar que o direitoprocessual e o direito material possuem uma “dependência recíproca”, e assim é impossível estudar o processo sem mirar os direitos cuja tutela sepretende. Esclarece, ademais, que direito material e processo correspondem a dimensões indissociáveis da garantia de tutela de direitos consagradaconstitucionalmente. A aproximação do processo com o direito material, portanto, não traduziria nenhum risco para a autonomia do direito processual.Reputa, aliás, excessivo pudor e incompreensível resistência rechaçar a tutela dos direitos dos objetivos do processo. (GODINHO, Robson Renault.Tutela jurisdicional diferenciada e técnica processual. Temas atuais das tutelas diferenciadas. Estudos em Homenagem ao Professor DonaldoArmelin. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 736). [8] Não é nenhuma novidade a diversidade de amplitude a que a doutrina atribui ao termo “tutelajurisdicional”. Há aqueles, na esteira de Flávio Luiz Yarshell, para quem a “tutela jurisdicional é locução apta a designar não apenas o resultado doprocesso, mas igualmente os meios predispostos para a obtenção desse resultado. Nessa medida, portanto, o exercício da jurisdição, por meio doprocesso, é forma de tutela para o autor e para o réu, embora de formas distintas”. (YARSHELL, Flávio Luiz. Tutela jurisdicional. São Paulo : Atlas,1999. p 189). Entretanto, crê-se que tal concepção é demasiada ampla por encampar duas realidades num só conceito. Afinal, para os que assimpensam, integram a idéia de tutela jurisdicional não apenas o resultado do processo, senão ainda as técnicas processuais à obtenção desse mesmoresultado. Prefere-se, assim, encarar a tutela jurisdicional apenas sob o prisma do resultado oriundo da atividade jurisdicional. [9] Fala-se em tutelajurisdicional “de direito” quando o demandante obtém, provisória ou definitivamente, o bem da vida objetivado, seja no curso, seja ao final doprocedimento. Se a jurisdição se presta a tutelar o direito material controvertido, a tutela jurisdicional “de direito” deve ser compreendida justamentecomo essa tutela do direito ameaçado ou lesado. Tutela jurisdicional “de direito” é, pois, espécie de tutela de direitos, e surge quando o demandante,diante da resposta concedida pela atividade jurisdicional, sente seus efeitos no plano do direito material. Obtém tutela jurisdicional “de direito”, enfim,apenas o demandante, quando o Estado-juiz conforma a realidade da vida à sua pretensão. Por outro lado, fala-se também, pura e simplesmente, emtutela jurisdicional (stricto sensu), isto é, sem o designativo “de direito”. É que casos há em que o resultado (provisório ou definitivo) da jurisdição nãoconforma a realidade a direito algum. Nessas situações, a tutela jurisdicional não se relaciona com o direito material. Exemplos: a) quando o juizdeclara não existir o direito afirmado pelo demandante (julgamento de improcedência); b) quando é constatada a ausência de condições da ação e oprocesso é extinto sem resolução de mérito (CPC, art. 267, VI); c) quando se verifica a ausência de pressupostos processuais e o processo étambém extinto sem resolução de mérito (CPC, art. 267, IV); d) quando o demandante desistir da ação (CPC, art. 267, VIII). Casos ainda existem emque, não obstante procedente o pedido (julgamento de procedência), a tutela do direito não se concretiza, circunstância que se pode atribuir, vezes àprópria depreciação (ou desaparecimento) do bem da vida perseguido, vezes à indisposição do próprio devedor em satisfazer a obrigação, vezesoutras a sua insubsistência patrimonial. Pense-se, como ilustração, nas execuções específicas direcionadas a satisfação de obrigações infungíveis àsquais o devedor se recusa a adimplir, ou nas execuções promovidas em face de pessoa insolvente. Em tais casos, não há realmente tutelajurisdicional de direito, mas mera tutela jurisdicional (stricto sensu), a despeito da procedência dos pedidos postulados em juízo. Em resumo: “tutelajurisdicional lato sensu” é gênero, da qual são espécies: a) a “tutela jurisdicional de direito” e a “tutela jurisdicional stricto sensu”. Fala-se, portanto,em “tutela jurisdicional de direito” quando o demandante obtém, provisória ou definitivamente, o bem da vida perseguido, seja no curso, seja ao finaldo procedimento. Já a “tutela jurisdicional stricto sensu” traduz-se também no resultado oriundo da atividade jurisdicional, sem, contudo, tutelardireito, pois não conforma a realidade a direito algum. [10] Há de se compreender a seguinte lição: “Muito embora hoje seja “costume” falar em tutelajurisdicional dos direitos, é preciso que se deixe claro que o jurista que estuda o processo civil na perspectiva da tutela jurisdicional tem sériocompromisso em pensar em um processo que possa responder, com efetividade, às diversas necessidades de tutela do direito material. (...) Não setrata, portanto, de utilizar a expressão “tutela” apenas por amor conceitual – ou, o que é pior, por simples preferência terminológica –, mas de tentarelaborar uma construção dogmática capaz de dar conta das diferentes necessidades de tutela dos direitos, tomando em consideração suaspeculiaridades e características e principalmente o papel que pretendem cumprir na sociedade. (...) é preciso delinear as tutelas capazes deresponder às diferentes necessidades do direito substancial.” (MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento. 5ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 431). [11] BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria doAdvogado, 2007. p. 15. [12] Há de se deixar claro que as tutelas dos direitos situam-se no plano do direito material, ao passo que as sentenças e osmeios executivos, assim como todas as demais técnicas processuais para a adequada tutela dos direitos, estão no plano do direito processual.(MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento. 5ª. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 433). Não é lícito, nestaperspectiva, nivelar sentenças e tutelas jurisdicionais, tratá-las como se identificassem o mesmo fenômeno, pois, como já mencionado, sentençassão técnicas voltadas a concretizar a tutela de direito que se pretende pela via jurisdicional. Enfim, a classificação das tutelas de direito há de semanter fiel ao plano do direito material; aquela, relativa às sentenças, deve guardar relação com o direito processual. [13] No que toca às sentençascondenatórias, a tutela de direito, para se realizar, ou é prestada voluntariamente pelo demandado, ou se concretizará jurisdicionalmente, mediante

meios executivos que o ordenamento jurídico oferece para esse fim, isto para não falar no procedimento e na jurisdição, de resto tambémfundamentais para se atingir a tutela jurisdicional adequada. (MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento. 5ª. ed. São Paulo :Revista dos Tribunais, 2006. p. 432). Obviamente que esses meios executivos (penhora, astreintes, expropriação) também se caracterizam como

técnicas processuais hábeis a mediar a realidade certificada no processo à realidade da vida. [14] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições deDireito Processual Civil. 6ª. Ed. Vol. I. São Paulo : Malheiros Editores, 2009. p. 60. [15] Leciona o insigne processualista Cândido Rangel Dinamarco,em aclamada passagem doutrinária, que “técnica é a predisposição ordenada de meios destinados a obter certos resultados preestabelecidos. Todatécnica será cega e até perigosa se não houver a consciência dos objetivos a realizar, mas também seria estéril e de nada valeria a definição deobjetivos sem a predisposição de meios técnicos capazes de promover sua realização. A técnica do processo visa em primeiro lugar à pacificação deindivíduos e grupos de indivíduos, eliminando conflitos mediante a realização da justiça. Na adequada aplicação da técnica processual cumpre ao juizbuscar soluções legitimamente descobertas no direito substancial bem interpretado, o que significa que, num plano imediato, essa técnica éinstrumento a serviço da realização do direito substancial – embora, numa visão mais ampla, ambos se filiem ao escopo social de pacificar. A técnicaprocessual é descrita de maneira mais visível nas leis e tem, portanto, indisfarçável tendência às conotações preponderantemente dogmáticas: cadaordem jurídico-processual difere, no tempo e no espaço, da ordem jurídico-processual de outros períodos históricos ou de outros países.”(DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6ª. Ed. Vol. I. São Paulo : Malheiros Editores, 2009. p. 60). [16] BEDAQUE,José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. São Paulo : Malheiros Editores, 2006. p. 33. [17] Hoje se concebe o direitofundamental à ação (CF/88, art. 5.º, XXXV) numa nova roupagem. Fala-se, assim, em direito fundamental à tutela jurisdicional adequada, cujosignificado engloba também o direito a técnicas processuais capacitadas a assegurar as tutelas jurisdicionais prometidas pelo direito material. Em suaperspectiva objetiva, os direitos fundamentais estabelecem valores cuja serventia é a de orientar toda a interpretação do ordenamento jurídico,norteando a postura dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A compreensão (ideal) mesma do ordenamento jurídico se legitima quandorealizada com alicerce nos valores emanados pelos direitos fundamentais. Esses mesmos valores se propagam, irradiam-se sobre o direito positivo,fundindo-se a ele, moldando seus contornos de significação. É como o ar, que a todos invade e cuja necessidade não se pode prescindir. E se os

direitos fundamentais são portadores dessa perspectiva objetiva, é mesmo ajustado atribuir ao direito fundamental à tutela jurisdicional adequada osentido de direito a técnicas processuaiscapacitadas a assegurar tutelas jurisdicionais prometidas pelo direito material. Trata-se de uma interpretaçãovoltada a obrigar o próprio legislador a criar técnicas processuais aptas a garantir tutelas jurisdicionais segundo as necessidades devidamenteanunciadas pelo direito material. Esse significado é, pois, resultado de uma análise hermenêutica focada na perspectiva objetiva do direito à tutelajurisdicional adequada, numa ótica dirigida ao legislador, mas, também, ao próprio juiz, caso haja omissão legislativa, ou mesmo inaptidão da técnicaquando confrontada às necessidades do direito material e às particularidades do caso concreto. [18] MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica processuale tutela dos direitos. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 34. [19] Robson Renault Godinho é categórico ao informar que não bastadisponibilizar técnicas processuais, pois seu adequado manejo é indispensável à prestação adequada da tutela jurisdicional. Estas as suas palavras:

“A preocupação com a técnica processual se dá ao menos em dois planos: a) técnicas disponíveis para a tutela de direitos; 2) correto manejo dasregras do processo pelos sujeitos que nele atuam. Ou seja: é necessária a existência de técnicas aptas para a realização do direito material;entretanto, apenas a previsão abstrata de técnicas é insuficiente se não há um manejo correto dos instrumentos postos à disposição dos sujeitos doprocesso.” (GODINHO, Robson Renault. Tutela jurisdicional diferenciada e técnica processual. Temas atuais das tutelas diferenciadas. Estudos emHomenagem ao Professor Donaldo Armelin. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 746). [20] MAFFINI, Rafael da Cás. Tutela Jurisdicional: um ponto deconvergência entre o direito e o processo. Revista AJURIS, Porto Alegre, n.º 76, dezembro de 1999. p. 263-288. [21] NERY JUNIOR, Nelson; NERY,Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 9ª. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2006. p. 962.Numa visão ainda mais aprofundada, há quem classifique a obrigação alimentar segundo as seguintes espécies: a) alimentos legais (ou legítimos); b)alimentos voluntários (contratuais e testamentários); e c) alimentos indenizatórios ou originados de ato ilícito. Cada qual tem por fonte,respectivamente: a) a relação familiar; b) o negócio jurídico; c) o ato ilícito causador do dano. Conferir críticas a essa classificação em: BOECKEL,Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 26. [22] Quando impõe cumprir àfamília, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar às criança e aos adolescentes todo aquele elenco de direitos (vida, saúde, alimentação,educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade), quer mesmo o constituinte, num conceito mais simples, apenas lhesgarantir a tutela ao direito de alimentos. Afinal, vida, saúde, alimentação, educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito e liberdadesão todos designativos de um conceito maior, isto é, conferem sentido à idéia de alimentos. Pertinente, assim, a observação doutrinária de que osalimentos “legais” apresentam significado mais amplo se comparados à expressão comum e não-jurídica “alimentos”. [23] Segundo Rolf HanssenMadaleno, o dever de prestar alimentos funda-se “na solidariedade humana reinante nas relações familiares e que têm como inspiração fundamentala preservação da dignidade da pessoa humana, de modo a garantir a subsistência de quem não consegue sobreviver por seus próprios meios, emvirtude de doença, falta de trabalho, idade avançada ou qualquer incapacidade que a impeça de produzir os meios materiais necessários à diáriasobrevida.” (MADALENO, Rolf Hanssen. Renúncia a Alimentos. Revista Brasileira de Direito de Família, São Paulo, v. 6, n.º 27, dezembro de 2004 –janeiro de 2005, p. 147). [24] Na esteira de Luiz Guilherme Marinoni, “para analisar a efetividade do processo no plano do direito material e, assim,sua concordância com o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, é imprescindível tomar consciência das necessidades que vêm do direitomaterial, as quais traduzem diferentes desejos de tutela.” (MARINONI, Luiz Guilherme. Técnica Processual e Tutela dos Direitos. São Paulo : Revistados Tribunais, 2004. p. 147-148). [25] É manifesta a divergência doutrinária acerca do conceito de tutela diferenciada, de resto influenciada pelaprópria divergência também existente quanto ao próprio conceito de tutela jurisdicional. Acredita-se inadequado falar-se em tutela diferenciada, poisnão é propriamente a tutela jurisdicional que se apresenta “diferenciada”, mas, sim, as técnicas processuais adotadas para salvaguardá-la. A tutelajurisdicional (lato sensu) é apenas o resultado logrado pela atividade jurisdicional mediante técnicas processuais, diferenciadas ou não. [26] Existemoutras características da obrigação alimentar, também responsáveis, em alguma medida, pela diferenciação das técnicas processuais instituídas paraa sua tutela. Essas características geram, assim, algum tipo de repercussão no processo. São elas: a) imprescindibilidade dos alimentos, b)irrepetibilidade dos alimentos prestados, c) retroatividade limitada, e d) periodicidade. Para uma compreensão adequada de todas essascaracterísticas, bem assim da influência que exercem na elaboração e compreensão das técnicas processuais destinadas à tutela do direito aalimentos, recomenda-se a leitura de: BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria doAdvogado, 2007. [27] GUERRA, Marcelo Lima. Execução Indireta. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1998. p. 227-228. [28] BOECKEL, FabrícioDani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 39. Belmiro Pedro Welter leciona, na mesmasenda, que esse tratamento especial conferido pelo legislador ao crédito alimentar justifica-se porque representa a preservação da vida, a qual tempreferência sobre qualquer outro direito, além de ser o primeiro direito posto a disposição do ser humano, até porque de nada adiantariam outrosdireitos sem ela. (WELTER, Belmiro Pedro. Alimentos no Código Civil. 2ª. Ed. São Paulo : IOB-Thompson, 2004, p. 355). [29] No mesmo sentido aSúmula 100 do Superior Tribunal de Justiça: “Os créditos de natureza alimentícia gozam de preferência, desvinculados os precatórios da ordemcronológica dos créditos de natureza diversa.” [30] Conforme leciona Donaldo Armelin “presentes diferenciados objetivos a serem alcançados poruma prestação jurisdicional efetiva, não há porque se manter um tipo unitário desta ou dos instrumentos indispensáveis a sua corporificação. Avinculação do tipo da prestação à sua finalidade específica, espelha a atendibilidade desta; a adequação do instrumento ao seu escopo potencia oseu tônus de efetividade.” (ARMELIN, Donaldo. Tutela jurisdicional diferenciada. Revista de Processo, 65. Jan./Mar. São Paulo : Revista dosTribunais, 1992. p. 45). [31] Transcreva-se importante observação de Robson Renault Godinho: “(...) verifica-se que o procedimento pode consistirna diferenciação da tutela, desde que haja modificação do resultado obtenível no procedimento que pode ser designado como sendo o comum,tornando efetiva a tutela jurisdicional. Advirta-se que a diferenciação da tutela pode significar sacrifício de direitos do réu, motivo pelo qual osinteresses em jogo devem ser ponderados para que não haja nenhum excesso constitucionalmente vedado na consagração de instrumentosdiferenciados.” E conclui, citando passagem doutrinária da autoria de Luiz Guilherme Marinoni: “A importância da tutela jurisdicional diferenciada estáno reconhecimento da necessidade de o processo adaptar-se a diferentes situações decorrentes do direito material, que, exatamente por seremvariadas, não são adequadamente tuteladas por um único procedimento comum ou ordinário. Vale lembrar que “o fato de o processo civil serautônomo em relação ao direito material não significa que ele possa ser neutro ou indiferente às variadas situações de direito substancial.”(GODINHO, Robson Renault. Tutela jurisdicional diferenciada e técnica processual. Temas atuais das tutelas diferenciadas. Estudos em Homenagemao Professor Donaldo Armelin. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 743-744). [32] Bem evidencia a imprescindibilidade dos alimentos a lição de FabrícioDani de Boeckel: “Quanto aos alimentos (...) não pode haver dúvida de que a proteção jurisdicional deve ser prestada antes que se consume o dano.Conforme dito anteriormente, os alimentos consistem em prestação indispensável ao atendimento de necessidades atuais e prementes do respectivocredor, sendo imprescindíveis à sua sobrevivência. Nessa medida, o cumprimento tardio da obrigação compromete os direitos fundamentais à vida eà dignidade do alimentando, caracterizando-se como algo inconcebível diante da proteção constitucional a todos assegurada.” (BOECKEL, FabrícioDani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 89). [33] BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutelajurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 84. [34] As técnicas processuais (lato sensu) abrangem nãoapenas os procedimentos, senão ainda as técnicas processuais (stricto sensu) que os compõem. Técnica processual (lato sensu) é gênero, do qualsão espécies procedimento e demais técnicas processuais (stricto sensu), as quais caracterizam os contornos desse mesmo procedimento. [35] Nãohá como se atribuir natureza cautelar ao procedimento instituído nos arts. 852 a 854 (alimentos provisionais). Afinal, antes de apenas acautelar com opropósito de assegurar futura execução, proporciona efetividade ao direito perseguido. A tutela jurisdicional que se origina de tal procedimento não épropriamente cautelar, mas, sim, satisfativo. Seu propósito é efetivamente entregar ao demandante, mesmo que em caráter provisório, a tutelajurisdicional de direito a alimentos. [36] Hoje, o procedimento ordinário realmente se mostra adequado à tutela do direito alimentar, especialmentepela inserção do instituto da antecipação de tutela pela Lei n.º 8.952/1994 (CPC, art. 273), o qual permite, em todo e qualquer caso, a aceleraçãoprovisória da tutela jurisdicional de direito, desde que presentes alguns requisitos. É de se dizer, ademais, que, diante dos novos contornosconferidos ao rito ordinário, o pseudoprocedimento cautelar de alimentos provisionais, também regulado pelo CPC (art. 852 a 854), perdeu totalmentea sua utilidade. Confira-se, nesse sentido, a lição de Fabrício Dani de Boeckel: “Seguindo essa linha, percebe-se que as razões justificadoras daexistência e mesmo a utilidade de tal procedimento [cautelar de alimentos provisionais] não mais se fazem presentes: nos dias atuais não mais sequestiona a possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela satisfativa; admite-se de forma pacífica que a efetividade da jurisdição, em muitoscasos, só pode ser assegurada através de medidas urgentes, fundadas apenas na verossimilhança das alegações e no perigo de dano irreparável oude difícil reparação; a própria disciplina legal da técnica antecipatória foi objeto de significativo avanço, reduzindo bastante seus inconvenientes. Comisso, em suma, o rito destinado a fixação de ‘alimentos provisionais’ tornou-se despiciendo e até mesmo inadequado. Os fins a que servia podemhoje ser alcançados por caminhos menos tortuosos, privilegiando a economia processual, sem causar maior comprometimento à segurança jurídica einclusive sem dar ensejo à desnaturação da prestação alimentar (pois ‘cautelar’ obviamente ela não é).” E conclui: “Registre-se, por oportuno, que oprocedimento estabelecido para a fixação de ‘alimentos provisionais’ foi arquitetado com o objetivo de proporcionar uma célere decisão quanto aopensionamento devido ao alimentando, tudo com base numa cognição sumária sob o prisma vertical, exercida noutro processo que não o principal(‘definitivo’), uma vez que, neste último, os provimentos antecipatórios não eram aceitos por falta de expressa previsão legal e por supostamenteatentarem contra a segurança jurídica. Atualmente, contudo, o processo ‘cautelar de alimentos provisionais’ não deveria ser visto como meroacessório do feito principal, exigindo a propositura dessa outra demanda paralela, visando a uma decisão definitiva. Afinal, a tornar como acertadasas conclusões da corrente que defende a acessoriedade dos ‘alimentos provisionais’, esse processo dito ‘cautelar’ seria complemente inócuo, porexigir a propositura de mais uma demanda sobre o mesmo objeto: para que hoje tivesse alguma utilidade, deveria ser ampliada a cognição(tornando-se exauriente), a fim de não duplicar o trabalho a ser desenvolvido pelo Judiciário.” (BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional dodireito a alimentos. Porto Alegre : Livraria dos Advogados Editora, 2007. p. 122-123) [37] Francisco José Cahali justifica a Lei n.º 11.804/2008principalmente em vista à filiação havida fora do casamento, pois, consoante afirma, em casos tais a tendência doutrinária e jurisprudencial semprefoi pela rejeição da pretensão alimentar em favor do nascituro, mais em razão da incerteza jurídica provocada pela inexistência de vínculo entre osgenitores. Muitos sustentavam seus argumentos em barreiras processuais (inexistência de prova pré-constituída da obrigação alimentar), emboraoutros, poucos, defendiam a inexistência de previsão legal como empecilho ao deferimento da pretensão material. Conclui o festejado jurista: “Nestecenário, de pouca relevância a inovação legislativa em benefício do nascituro havido no casamento, porém, pertinente a previsão, como, aliás, secontém no art. 6.º nos casos de “mãe solteira”, não no sentido pejorativo, mas no seu significado real (genitora sem núpcias com o genitor, ainda queexistente união estável). Para estes casos – mães solteiras – se rompe uma barreira de preconceito lastreado em alguns julgados e doutrina queencontravam restrições processuais e materiais para garantir ao nascituro as condições saudáveis durante a gestação.” (CAHALI, Francisco José.

Alimentos Gravídicos. Direito das Famílias. Contributo do IBDFAM em homenagem a Rodrigo da Cunha Pereira. Organização Maria Berenice Dias.São Paulo : Revista dos Tribunais, 2009. p. 579-580). [38] Adiante se verá que se optou pela teoria concepcionista, a qual atribui ao nascituro

capacidade de direito e o trata, portanto, como verdadeira pessoa, sujeito de direitos e deveres na ordem civil. [39] No presente ensaio asexpressões nascituro, pessoa embrionária, concepto e feto, serão todas utilizadas como sinônimas, apesar das diferenças conceituais entre elasexistentes. [40] É interessante ressaltar a existência de um procedimento próprio para assegurar os direitos sucessórios do nascituro. Trata-se da

ação de posse em nome do nascituro, disciplinada pelos arts. 877 e 878 do CPC. Por meio dela se busca investir a grávida, ou eventual curador, naposse dos direitos do nascituro (CPC, art. 878). [41] Em defesa à tese concepcionista, Zoraide Sabaini dos Santos Amaro é contundente: “(...) Aodissertar sobre a matéria parte-se da premissa de que a proteção inicia-se desde a concepção ou fecundação do embrião, e não somente após onascimento com vida, objetivando-se uma ampla proteção do nascituro, tendo em vista que a vida precisa ser protegida, principalmente diante dosavanços científicos atuais experimentados na Biociência. Uma conciliação entre o progresso científico e um Direito que salvaguarde, em especial, adignidade humana, é necessária que seja encontrada, vez que nem tudo que é cientificamente possível deve ser permitido.” E conclui: “Tem-se,portanto, que por mais entendimentos conservadores e seus defensores queiram se esconder por detrás de algumas doutrinas bem construídas oucrenças bem enraizadas, convém não olvidar que tendo essencial direito à vida, o nascituro tem dignidade humana, que deve do mesmo modo serreconhecida, respeitada e protegida. Além desses direitos humanos que hão de ser-lhe juridicamente reconhecidos, outros direitos podem ser-lheoutorgados e garantidos.” (AMARO, Zoraide Sabaini dos Santos. O reconhecimento da personalidade jurídica do nascituro desde a concepção nosistema jurídico nacional como forma de solidificar a exigente atuação integral do fenômeno humano nas relações jurídicas. Disponível em:<www.conpedi.org>). [42] VIANNA, G.C. O nascituro como sujeito de direitos – início da personalidade civil: proteção penal e civil. In.:BUSTAMENTE, Ricardo, SODRÉ, Paulo César (coord.). Ensaios Jurídicos. V. 1. Rio de Janeiro : Instituto Brasileiro de Atualização Jurídica, 1996. p.292-295). [43] Confiram-se as seguintes passagens doutrinárias em defesa da personalidade jurídica do nascituro: “(...) percebe-se que a doutrinavem firmado posição de reconhecimento dos direitos da personalidade jurídica no nascituro. Inúmeros são os casos em que o legislador direciona anorma jurídica para aqueles que apenas foram concebidos, não importando, ao que parece averiguar se a concepção foi intra-ulterina ouextra-ulterina. É relevante destacar que a Constituição Federal de 1988, no art. 5.º, incisos V, X e XXVIII, dispõe serem invioláveis a intimidade, avida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito de indenização pelo dano material decorrente de sua violação, todos direitos dapersonalidade compatíveis com a condição do nascituro, de pessoa por nascer (...). ”( AMARO, Zoraide Sabaini dos Santos. O reconhecimento dapersonalidade jurídica do nascituro desde a concepção no sistema jurídico nacional como forma de solidificar a exigente atuação integral dofenômeno humano nas relações jurídicas. Disponível em: <www.conpedi.org>). “(...) O nascituro é pessoa porque traz em si o germe de todas ascaracterísticas do ser racional. A sua imaturidade não é essencialmente diversa da dos recém-nascidos, que nada sabem da vida e, também não sãocapazes de se conduzir. O embrião está para a criança como a criança está para o adulto. Pertencem aos vários estágios de desenvolvimento de ummesmo e único ser: o homem, a pessoa.” (FRANÇA, Rubens Limongi. Instituições de direito civil. 3ª. ed. São Paulo : Saraiva, 1988. p. 50). “(...)juridicamente, entram em perplexidade total aqueles que tentam afirmar a impossibilidade de atribuir capacidade ao nascituro, ‘por este não serpessoa’. A legislação de todos os povos civilizados é a primeira a desmenti-lo. Não há nação que se preze (até a China) onde não se reconheça anecessidade de proteger os direitos do nascituro (Código Chinês, art. 1.º). Ora, quem diz direito, afirma capacidade. Quem afirma capacidade,reconhece personalidade.” (ALMEIDA, Silmara J. A. Chinelato e. Tutela Civil do Nascituro. São Paulo : Saraiva, 2000. p. 160). [44] A jurisprudênciajá reconhecia capacidade para ser parte ao nascituro, devidamente representado, para demandar em juízo, mesmo antes da edição da Lei n.º11.804/2008. A seguinte emenda prova esse fato: “Investigação de paternidade. Nascituro. Capacidade para ser parte. Ao nascituro assiste, no planodo direito processual, capacidade para ser parte, como autor ou como réu. Representando o nascituro, pode a mãe propor a ação investigatória, e onascimento com vida investe o infante na titularidade da pretensão de direito material, até então apenas uma expectativa resguardada. Açãopersonalíssima, a investigatória somente pode ser proposta pelo próprio investigante, representado ou assistido, se for o caso; mas, uma veziniciada, falecendo o autor, seus sucessores tem direito de, habilitando-se, prosseguir na demanda. Inaplicabilidade da regra do art. 1.621 do CódigoCivil.” (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 583052204, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: AthosGusmão Carneiro, Julgado em 24/04/1984). [45] Então, naquilo que não contrastar com a Lei n.º 11.804/2008, o procedimento por ela regido há deseguir especialmente as formas estabelecidas pela Lei n.º 5.478/1968, sobretudo em face das necessidades emergenciaisque caracterizam o direitomaterial perseguido. Dito de outro modo, a preferência de se aplicar supletivamente, e em primeiro lugar, a Lei de Alimentos (Lei n.º 5.478/68), e nãoo CPC, justifica-se porque a primeira institui procedimento e técnicas processuais mais consentâneos às necessidades do direito material aalimentos, o qual, em razão do caráter emergencial que quase sempre o acompanha, deve estar ajustado aos valores efetividade e celeridade. [46]Há, contudo, quem pense diferentemente. Defendem a possibilidade de utilização do procedimento instituído pela Lei n.º 11.804/2008 para a simplescobrança de valores que cubram as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela provenientes. Advogam, pois, a utilização doprocedimento diferenciado com o mero objetivo de cobrar essas despesas, mesmo ausente a urgência, que é – acredita-se – essencial à utilizaçãodas formas dispostas pela Lei especial. [47] Nessa linha, a lição de Douglas Phillips Freitas: “A leitura do texto legal informa claramente que osvalores dos alimentos gravídicos compreendem aqueles ‘adicionais do período de gravidez’, ‘a juízo do médico’. Ou seja, salvo se a genitora nãopossuir condições de autossustento, o que poderá prejudicar o desenvolvimento fetal, há que se instruir a exordial com documento médico quedetermine ‘alimentação especial’ ou ‘demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis’ (como nos casos de gravidez de risco, diabetesgestacional, entre outros). Já no tocante à possibilidade de despesas ‘outras que o juiz’ considerar pertinentes, deverão estas ser discriminadas, paraque não haja julgamento extra ou ultra petita.” (FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos e a Lei n.º 11.804/08, Revista Jurídica Consulex.Ano XIII. N.º 298. 15 de junho de 2009. p. 36-37). [48] Consoante leciona Francisco José Cahali: “Observe-se, por oportuno, ser indispensável ademonstração de serem as despesas em função da gravidez, não aquelas pessoais da gestante. À gestante, por mais que tenha necessidade,caberá buscar seus alimentos em face do genitor apenas e tão-somente se pela legislação civil for merecedora (como cônjuge ou companheira).”(CAHALI, Francisco José. Alimentos Gravídicos. Direito das Famílias. Contributo do IBDFAM em homenagem a Rodrigo da Cunha Pereira.Organização Maria Berenice Dias. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2009. p. 583). [49] Justamente por se tratar de um procedimento diferenciado,compromissado com os valores constitucionais da efetividade e da celeridade, é que não se admite cumulação de pedidos. É essa também a visãode Francisco José Cahali: “E considerando o rito especial eleito pelo legislador aos alimentos gravídicos, restará vedada a cumulação de pedidos, oque, ademais, não se faria proveitosa, pois ensejaria inadequada confusão de fundamentos (fáticos e jurídicos) para uma e outra pretensão.” Enfim,conclui, em nota de rodapé: “Caso, porém, pretendidos alimentos ao nascituro sem ser com fundamento na lei, mas seguindo a então jurisprudênciae doutrina, especialmente nos casos de filiação havida no casamento, daí sim caberá a cumulação dos pedidos, em ação de alimentos pelo ritoespecial, ou cautelar, seguida de principal com o pedido de tutela definitiva a respeito, cumulado ou não com outras pretensões (por exemplo,separação, reconhecimento e dissolução de união estável etc.).” CAHALI, Francisco José. Alimentos Gravídicos. Direito das Famílias. Contributo doIBDFAM em homenagem a Rodrigo da Cunha Pereira. Organização Maria Berenice Dias. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2009. p. 583-584). [50]

“Apelação cível. Ação de alimentos. Não comparecimento do autor à audiência de conciliação e julgamento. Aplicação do disposto no art. 7.º da Lei5.478/68. Arquivamento do pedido. Situação que não pode ser interpretada como desistência da ação. Impossibilidade de extinção do feito semjulgamento do mérito. Medida que não se confunde com o arquivamento previsto na Lei de Alimentos. Inteligência dos §§ 1.º e 4.º do art. 267 doCPC. Do próprio art. 267, § 1º, do CPC extrai-se que arquivamento do pedido e extinção do processo não ocorrem em concomitância, além de seremconceitos que não se confundem. Ou seja, ainda que tramite o processo sob o rito da Lei de Alimentos, não se pode conferir a seu art. 7º ainterpretação observada na sentença, que extinguiu o feito sem julgamento de mérito a partir do arquivamento previsto no dispositivo acima citado. Aausência prevista na Lei de Alimentos não pode ser interpretada como desistência da ação.” (Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apelação cível n.º1.0702.04.167320-4/001(1), Sétima Câmara Cível, Relator Desembargador Wander Marotta, julgado em 08/05/2007, disponível em:<www.tjmg.jus.br>). [51] A jurisprudência avaliza capacidade para ser parte a determinados órgãos destituídos de personalidade jurídica. Ashipóteses são sempre excepcionais. É o caso das prefeituras municipais e câmaras de vereadores, às quais, não obstante despersonalizadas,também possuem o personalidade judiciária, isto é, podem figurar em juízo em seu próprio nome, mas apenas na defesa de suas prerrogativasinstitucionais. Mesmo que algum desses entes ou órgãos não tenha, enfim, capacidade de direito no plano material, no que toca ao direito processualé aceitável que atuem como partes (demandante e demandado) ou mesmo intervenientes. [52] Adota-se, aqui, a teoria concepcionista. Acredita-se,assim, que o nascituro detém capacidade de direito e, por conseguinte, capacidade para ser parte (pressuposto processual) e legitimidade para agir(condição da ação) em demandas cuja tutela jurisdicional direciona-se à satisfação de seus direitos. Sem embargo, mesmo que se adote posiçãocontrária, não é possível negar que o Judiciário tem admitido que o próprio nascituro, devidamente representado pela mãe gestante, promovademandas judiciais. Nessa linha, a lição de William Artur Pussi: “A regra é a capacidade de ser parte acompanhar a personalidade. Entretanto, casosexistem em que a capacidade de ser parte aparece, mesmo sem personalidade. (...) Assim, parte da doutrina bem como a jurisprudência reconhecemao nascituro a capacidade de ser parte ativa. E nem poderia ser diferente, visto que, se a lei civil garante-lhe direitos, nada mais óbvio e até mesmonecessário que lhe conceda meios para a defesa destes direitos através de sua capacitação para demandar no pólo ativo. Todavia, o nascituro nãopode agir por si mesmo, quer do ponto de vista jurídico (por lhe faltar capacidade de agir), quer do ponto de vista físico (por viver comprimido aoventre materno sem possibilidade de atuação), fato que impõe a representação quer pela mãe, quer pelo pai ou até mesmo, pelo curador.” (PUSSI,William Artur. Personalidade jurídica do nascituro. Curitiba : Editora Juruá, 2008. p. 162). [53] Outra, entretanto, é a posição do insigne Yussef SaidCahali: “Aqui, às expressas (a lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante), a titular da pretensão é a mulher, com direito próprio paraexigir a coparticipação do autor de sua gravidez nas despesas que se lhe fizerem necessárias no transcorrer da gestação, exclusivamente em funçãodo estado gravídico. O nascituro, em inteira consonância com o disposto no art. 2.º do CC/2002, somente terá direito a pensão alimentícia, porconversão dos alimentos gravídicos, quando nascer com vida (art. 6.º, parágrafo único, da Lei 11.804/2008).” E continua: “Em outros termos, a Lei11.804/2008 procura proporcionar à mulher grávida um autêntico auxílio-maternidade, sob a denominação lato sensu de alimentos, representado poruma contribuição proporcional a ser imposta ao suposto pai, sob forma de participação nas despesas adicionais do período de gravidez e que sejamdela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares,internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juizconsidere pertinentes.” (CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 6ª. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2009. p. 353). [54] Esta também a posiçãode Denis Donoso, em interessante ensaio sobre o tema: “Não me parece, contudo, sem razão a formação de um litisconsórcio (mãe e nascituro) ou opedido feito direta e exclusivamente pelo nascituro, na medida em que a edição da nova lei não é suficiente para afastar as conclusões a que chegueilogo acima, quando tratei dos direitos do nascituro e sua proteção judicial.” (DANOSO, Denis. Alimentos gravídicos. Aspectos materiais e processuaisda Lei n.º 11.804/2008. Disponível em: <www.jus.com.br>). [55] MARINONI, Luiz Guilherme. A efetividade do processo e tutela de urgência. PortoAlegre : SAFe, 1994. P. 15. [56] WATANABE, Kazuo. Da cognição no processo civil. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1987. P. 41. [57] AlexandreFreitas Câmara, munindo-se das lições de Kazuo Watanabe, identifica a cognição nos seus planos vertical e horizontal. Esclarece o jurista: “Assim éque, horizontalmente considerada (plano de extensão), a cognição é plena ou limitada. Será plena quando todos os elementos do trinômio queconstitui o objeto da cognição estejam submetidos à atividade cognitiva do juiz. É o que se dá no processo de conhecimento. Pense-se, por exemplo,numa “ação de alimentos”, demanda de natureza condenatória (e pertencente, portanto, às “ações de conhecimento”). O juiz ali analisará questõespreliminares (como, e.g., as referentes à regularidade do processo), questões prejudiciais (como a relação de parentesco entre demandante edemandado) e, por fim, a pretensão condenatória manifestada pelo autor em face do réu. De outro lado, a cognição será limitada, quando algunsdestes elementos (de ordinário o mérito da causa) for subtraído da atividade cognitiva, como ocorre no processo de execução, no qual o juiz, como jáafirmado, não julga o meritum causae”. E continua: “No plano vertical (profundidade ou intensidade), a cognição pode ser exauriente, sumária ousuperficial. Tem-se cognição exauriente quando ao juiz só é lícito emitir seu provimento baseado num juízo e certeza. É o que normalmente ocorre noprocesso de conhecimento. A cognição é sumária quando o provimento jurisdicional deve ser prolatado com base num juízo de probabilidade (comono caso da tutela antecipatória – art. 273 CPC). Por fim, tem-se cognição superficial (ou sumaríssima) em casos – de resto não muito freqüentes –em que o juiz deve se limitar a uma análise perfunctória das alegações, sendo a atividade cognitiva ainda mais sumária do que a exercida na espécieque leva este nome. Tal espécie de cognição é exercida, e.g., no momento de se verificar se deve ou não ser concedida medida liminar no processocautelar. Se nesta espécie de processo (utilizando-se aqui da classificação tradicional dos processos quanto ao provimento jurisdicional pleiteado) aatividade cognitiva final é sumária (uma vez que o juiz não verifica se existe o direito substancial alegado pelo demandante, mas tão só aprobabilidade dele existir – fumus boni iuris), é óbvio que para verificar se deve ou não ser antecipada a concessão de tal medida através de liminarnão se pode permitir que o juiz exerça, também aqui, cognição sumária, sob pena de se obrigar o juiz a invadir de forma indevida o objeto doprocesso cautelar. Deverá o julgador, portanto, exercer cognição superficial. Ao invés de buscar o requisito do fumus boni iuris, deverá verificar o juiza probabilidade de que tal requisito se faça presente (algo como um fumus boni iuris de fumus boni iuris)”. Finalmente conclui: “Visto isso, podemoschegar à seguinte conclusão: há processos de cognição PLENA E EXAURIENTE (como os processos de conhecimento que seguem o procedimentocomum – ordinário ou sumário), PLENA E SUMÁRIA (como no processo cautelar), LIMITADA E EXAURIENTE (como no processo de execução, emque o julgador não pode examinar o mérito – cognição limitada – mas profere juízo de certeza sobre as questões preliminares – cognição exauriente),LIMITADA E SUMÁRIA (como na “ação de separação de corpos”, em que a impossibilidade de se discutir a presença de alguma causa para que sedissolva o vínculo matrimonial limita a cognição, e a urgência com que se necessita do provimento implica na sumariedade da atividade cognitiva).”(CÂMARA, Alexandre Feitas. O objeto da cognição no processo civil. Escritos de direito processual. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2001. p. 85-86). [58]Deve ficar claro que a permissão de se realizar prova indiciária nada mais é do que uma exigência das próprias necessidades do direito material aalimentos gravídicos. Basta perceber que eventual exame técnico para demonstrar a paternidade, a ser empreendido na mulher grávida, além deeconomicamente inviável para grande parcela da população nacional, coloca em risco o próprio desenvolvimento do nascituro. Portanto, a Lei n.º11804/2008 encontra-se ajustada ao direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. Aliás, a respeito da correlação entre direito a prova e direito aoacesso à justiça, pertinente a lição de Luiz Guilherme Marinoni: “Se o juiz deve se convencer de algo que está no plano do direito mateiral,obviamente não há como dele exigir uma convicção uniforme. Em alguns casos, como os de lesões pré-natais, de seguro e relativos a atividadesperigosas, a redução das exigências de prova ou de convicção de certeza é mera decorrência da própria natureza do direito material. Diante deles éadmitida a convicção de verossimilhança, pois tais situações têm particularidades específicas, suficienbtes para demonstrar que a exigência de provaplena seria contrária ao desejo do direito material. (...)” (MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. Teoria Geral do Processo. Vol. 1.º. 3ª.ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2008. p. 328). [59] Sobre o popular “Exame de DNA”, aponte-se, apenas como registro, o teor da Súmula 301do STJ: “Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.” Ajurisprudência, portanto, adota a prova indiciária como forma de se atingir conclusão sobre a relação de paternidade. Pauta-se o juiz em um fatoconhecido e evidenciado (negativa do suposto pai de se submeter ao exame de DNA) para deduzir sobre a existência de outro fato não propriamenteconhecido (a relação de paternidade). Recentemente, aliás, foi publicada a Lei n.º 12.004/2009, destinada justamente a estabelecer a presunção depaternidade no caso de recusa do suposto pai em submeter-se ao exame de código genético (DNA). Impõe a aludida legislação que a recusa do réuem se submeter ao “Exame de DNA” gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório. [60] JUNIOR,Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I. 47ª. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. p. 482. Na mesma esteira, Cassio ScarpinellaBueno leciona que as presunções não são meios de prova, mas métodos de raciocínio ou de convencimento que a lei pode assumir com maior oumenor intensidade em alguns casos para dispensar a produção da prova. Pelas presunções – continua o festejado processualista –,independentemente de sua fonte, autoriza-se que o juiz construa o seu pensamento a partir de atos e fatos auxiliares, isto é, que não guardam diretapertinência com o seu objeto de conhecimento – são os usualmente chamados indícios –, mas que permitem a formulação de uma conclusão sobre oque ocorreu ou sobre as consequências daquilo que ocorreu. (BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil.Procedimento comum ordinário e sumário. Vol. 2. Tomo I. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 239). [61] É importante, outrossim, não vincular

procedimento sumário à cognição sumária. A lição de Fabrício Dani de Boeckel, escorada nos ensinamentos de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, éprecisa a respeito disso, e bem serve também para as demandas voltadas a tutela de alimentos gravídicos, conquanto elaborada para ilustrar acognição na ação de alimentos: “(...) Isso porque a ‘sumarização’ do procedimento não se dá às custas da redução da certeza, da segurança jurídica.Decorre, isto sim, de mera simplificação formal do rito, com a supressão de atos cuja falta não compromete a finalidade e as garantias do processo,além do encurtamento de prazos e da concentração dos atos processuais em audiência, tudo visando à aceleração do julgamento, mas sem diminuirde modo significativo o grau de certeza que o juízo pode atingir.” (BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. PortoAlegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 122). [62] Confira-se a crítica contundente de Maria Berenice Dias ao disposto no art. 8.º (vetado): “Éconcedido o réu o prazo de resposta de 5 dias. Caso ele se oponha à paternidade a concessão dos alimentos vai depender de exame pericial. Este,às claras é o pior pecado da lei. Não há como impor a realização de exame por meio da coleta de líquido amniótico, o que pode colocar em risco avida da criança. Isso tudo sem contar com o custo do exame, que pelo jeito terá que ser suportado pela gestante. Não há justificativa para atribuir aoEstado este ônus. E, se depender do Sistema Único de Saúde, certamente o filho nascerá antes do resultado do exame.” (DIAS, Maria Berenice.

Alimentos gravídicos? Disponível em: <www.mariaberenicedias.com.br>. Acessado em 20/08/2009). [63] BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutelajurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 122. [64] MARCATO, Antonio Carlos. Considerações sobrea tutela jurisdicional diferenciada. Disponível em: <www.mundojuridico.adv.br> Acessado em 20/08/2009. [65] Interessante notar que em se tratandode direito a alimentos – leciona Fabrício Dani de Boeckel – sempre que a tutela for antecipada, o será com o intuito de permitir a adoção de medidacom caráter preventivo em favor do alimentando. Afinal, em causas de tal natureza, o dano é essencialmente irreparável, somente sendo efetiva atutela quando concedida previamente, vale dizer, antes que o alimentando sofra as consequências da falta de recursos para sua mantença.(BOECKEL, Fabrício Dani de. Tutela jurisdicional do direito a alimentos. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2007. p. 90). [66] É de LuizEduardo Ribeiro Mourão a seguinte definição de coisa julgada: “(...) a res iudicata é uma situação jurídica que se caracteriza pela proibição derepetição do exercício da mesma atividade jurisdicional, sobre o mesmo objeto, pelas mesmas partes (e, excepcionalmente, por terceiros), emprocessos futuros. Para alcançar esse desiderato, vale-se o legislador de duas técnicas processuais: a) veda a repetição da demanda e b) imutabilizaas decisões judiciais transitadas em julgado.” (MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Coisa Julgada. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 29). [67] Segundoleciona Humberto Theodoro Junior, prejudicial “é aquela questão relativa a outra relação ou estado que se apresenta como mero antecedente lógicoda relação controvertida (à qual não diz diretamente respeito, mas sobre a qual vai influir), mas que poderia, por si só, ser objeto de um processoseparado. São exemplos de questões prejudiciais as que se relacionam com o domínio da coisa numa ação de indenização de danos; à sanidademental do devedor ao tempo da constituição da dívida numa ação de cobrança; à relação de paternidade numa ação de alimentos etc. Por nãodizerem respeito diretamente à lide, situam-se as questões prejudiciais como antecedentes lógicos da conclusão da sentença. Não se integram,portanto, no seu dispositivo, que é a única parte do julgado que atinge a culminância de res iudicata.” (JUNIOR, Humberto Theodoro. Curso de DireitoProcessual Civil. Vol. I. 47ª. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. p. 608). [68] Segundo o art. 293 do CPC, os pedidos são interpretadosrestritivamente. Porém, o mesmo dispositivo, em sua segunda parte, abre uma exceção à regra da interpretação restritiva, de sorte a admitir pedidoimplícito de juros legais. Tratando-se, enfim, de demanda cuja postulação traduz-se em obrigação de pagar quantia, eventual condenação doprincipal, independentemente de requerimento expresso, atinge também os juros legais (moratórios). Outros pedidos que sempre devem serconsiderados pelo juiz, ainda que implícitos: a) correção monetária (Lei n.º 6.899/81; b) despesas processuais; c) honorários advocatícios (CPC, art.20); d) pedido de prestações periódicas vincendas (CPC, art. 290). O que fez a Lei n.º 11.840/2008 foi criar nova hipótese de pedido implícito,condicionando sua eficácia ao nascimento com vida do nascituro. Mesmo ausente requerimento expresso, já se sabe de antemão que, o julgamentode procedência importa também conversão da condenação de alimentos gravídicos em pensão alimentícia ao infante, a parir do seu nascimento comvida. [69] COUTURE, Eduardo J. Fundamentos Del derecho procesal civil. Depalma. 3ª. Edición. Buenos Aires. 1.985, p. 422. [70] MOURÃO, LuizEduardo Ribeiro. Coisa Julgada. Belo Horizonte: Fórum, 2008. p. 229. [71] JUNIOR, Humberto Theodoro. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I.47ª. ed. Rio de Janeiro : Forense, 2007. P. 616. [72] FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos e a Lei n.º 11.804/08, Revista JurídicaConsulex. Ano XIII. N.º 298. 15 de junho de 2009. p. 36-37. [73] FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos e a Lei n.º 11.804/08, RevistaJurídica Consulex. Ano XIII. N.º 298. 15 de junho de 2009. p. 36-37 [74] FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos e a Lei n.º 11.804/08,

Revista Jurídica Consulex. Ano XIII. N.º 298. 15 de junho de 2009. p. 36-37 [75] Refere-se a versão publicada na Revista Brasileira de DireitoProcessual n.º 68, publicada pela Editora Fórum, em dezembro/2009. Este o trecho que se encontra registrado no aludido periódico: “Não há se falar,por outro lado, em ressarcimento dos valores pagos a título de alimentos gravídicos, dada a sua natureza peculiar. É bem verdade que o projetoprevia originariamente a responsabilidade objetiva da demandante, pelos danos materiais e morais causados ao demandado, em caso de resultadonegativo do exame pericial de paternidade. Tal dispositivo acabou, todavia, sendo alvo de veto. Portanto, apenas se restar provado que ademandante valeu-se do procedimento para lograr auxílio financeiro de terceiro que sabia não se tratar do suposto pai, é que eventual indenizaçãopoderá ser concedida, mas em demanda ajuizada para este propósito específico. (FREITAS, Douglas Phillips. Alimentos gravídicos e a Lei n.º11.804/08, Revista Jurídica Consulex. Ano XIII. N.º 298. 15 de junho de 2009. p. 36-37).” [76] Confira-se a lição de Francisco José Cahali: “Oreconhecimento da paternidade nesta ação de alimentos gravídicos se faz incidenter tantum, como requisito à imposição da obrigação ao réu. Pode,porém, acontecer que a paternidade venha a ser afastada, após a instrução do feito. Para esta hipótese, a lei, em sua versão aprovada peloCongresso, estabelecia a responsabilidade objetiva do autor, por danos morais e materiais, a ser liquidada nos próprios autos. Tal artigo, comooutros, foi vetado, veto este prestigiado por alguns comentaristas do Projeto de Lei (...). Diversamente, porém, entendemos que o veto não retira aresponsabilidade civil decorrente da iniciativa impropriamente direcionada a quem não é pai. Mesmo sem previsão na lei (que aliás é mesmodesnecessária, salvo para prever a apuração nos próprios autos como então proposto), a responsabilidade existe, pelo direito comum (direito civil), esendo a autora a gestante, em face dela deverá ser direcionada a ação (não contra o menor), pelo prejuízo causado, ainda que ausente dolo, oumesmo má-fé. Lembre-se, ainda, ser da mãe a responsabilidade civil perante terceiros quando ainda menor o filho (CC,a rts. 932, I, e 933) e assim,mesmo que até o final do processo tenha havido a substituição processual, ainda é da genitora a responsabilidade. E esta obrigação de indenizar,antes de ferir o direito de acesso à justiça, em nosso sentir, confere a este maior seriedade e responsabilidade. Aliás, o próprio princípio dasucumbência consagrado em nossa e diversas legislações, representa, em certa medida, exatamente impor ao vencido uma responsabilidade emindenizar o vencedor em um dano com valor presumido, e jamais se cogitou em considerar a sucumbência como ofensiva ao acesso à justiça. Poroutro lado, seria totalmente despropositado, e aí sim agressivo ao direito de acesso à justiça, impor-se ao réu, e sem lei para tanto, um prejuízo doqual não se deu causa, sem garantir a ele o direito de pretender no Judiciário a respectiva recomposição diante da lesão sofrida.” (CAHALI, FranciscoJosé. Alimentos Gravídicos. Direito das Famílias. Contributo do IBDFAM em homenagem a Rodrigo da Cunha Pereira. Organização Maria BereniceDias. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2009. p. 587-588). [77] RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família: Lei n.º 10.406, de 10.01.2002. 2ª. ed. Riode Janeiro : Forense, 2004, p. 733. [78] RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família: Lei n.º 10.406, de 10.01.2002. 2ª. ed. Rio de Janeiro : Forense,2004, p. 733. [79] “Habeas Corpus. Alimentos. Pressupostos ensejadores da prisão civil não configurados. 1. A aplicação da penalidade contida noart. 733, § 1º, do CPC se dá quando, em sede de execução de sentença ou de decisão que fixa os alimentos provisionais, o executado não efetua ointegral pagamento das três últimas parcelas anteriores ao ajuizamento da execução, acrescidas das vincendas, nem apresenta escusas legítimaspara não fazê-lo. Súmula 309/STJ. 2. Na espécie, ausentes os pressupostos ensejadores do decreto prisional. 3. Ordem concedida.” (SuperiorTribunal de Justiça, HC 114327/PI, Quarta Turma, Relator Ministro Fernando Gonçalves, julgado em 11/11/2008, disponível em: <www.stj.jus.br>). [80] Evidenciando a proteção ao nascituro conferida pela Constituição Federal, Zoraide Sabaini dos Santos Amaro leciona: “A legislação brasileiragarante os direitos do nascituro desde a concepção, principiando pela Constituição Federal, art. 5.º, através do qual estabelece a inviolabilidade dodireito à vida. Nesse contexto, a não observância dos direitos de personalidade do nascituro feriria esse princípio e, por via reflexa, todo o mundojurídico. De importância também nesse contexto, ainda na Lei Maior, é o inciso XXXVIII do mesmo art. 5.º, que reconhece a instituição do júri comcompetência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida, entre os quais se inclui o aborto. Assegura, ainda, a proteção à maternidade,especialmente à gestante (art. 201, II e art. 203, I) (...).” (AMARO, Zoraide Sabaini dos Santos. O reconhecimento da personalidade jurídica donascituro desde a concepção no sistema jurídico nacional como forma de solidificar a exigente atuação integral do fenômeno humano nas relaçõesjurídicas. Disponível em: <www.conpedi.org>). [81] GODINHO, Adriano Marteleto. O estatuto jurídico do nascituro no direito brasileiro. RevistaJuristas, João Pessoa. a. III, n. 92, 19/09/2006. Disponível em: <www.juristas.com.br>. [82] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitosfundamentais. 4ª. ed. Porto Alegre : Editora Livraria do Advogado, 2004. p. 177.