revista 46 andes-cotas e ações afirmativas

Upload: lua-kramer-de-oliveira

Post on 09-Jul-2015

851 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Ano XX - nmero 46Junho 2010

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE publicada pelo Sindicato nacional doS docenteS daS inStituieS de enSino Superior - andeS-Sn

Braslia univ. Soc. Braslia ano XX n 46 p. 8-174

Semestral jun. 2010

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 1

UNIVERSIDADE E SOCIEDADEUNIVERSIDADE E SOCIEDADE uma publicao semestral do AnDeS-Sn: Sindicato nacional dos Docentes das Instituies de ensino Superior. Os artigos assinados so de total responsabilidade de seus autores. Todo o material escrito pode ser reproduzido para atividades sem fins lucrativos, mediante citao da fonte. ConTrIBuIeS para publicao na prxima edio: veja instrues na pgina 4. ASSInATurAS e pedidos de nmeros avulsos: utilize o cupom da pgina final.

EditorialTemos em mos uma edio diferenciada, o presente nmero 46 de nossa revista, a Universidade e Sociedade. Diferenciada, em primeiro lugar, porque o tema foi determinado por deciso congressual, ao invs de ter sido, simplesmente, delegado a uma deciso por parte da diretoria do Sindicato, o ANDES-SN. J por este fato pode-se depreender a importncia que a discusso sobre as cotas no acesso ao Ensino Superior assumiu, nos ltimos anos, no mbito do movimento docente. Confirmando este fato, a temtica foi agraciada por 12 textos, cada um lanando-lhe um olhar complementar, embora todos, no caso, advoguem aes na mesma direo: a oportunidade e, mais, a necessidade da introduo de uma poltica de discriminao positiva para um segmento que ainda sofre excluso. Embora as Polticas de Ao Afirmativa possam atingir e, na prtica, j instituda em vrias universidades, assim o fazem segmentos considerados pobres, de modo geral, identificados como egressos da escola pblica, todos os textos se concentram na excluso por motivos tnicos, em particular da parcela negra de nossa populao. Esta circunstncia demonstra, adicionalmente, quo intenso est o debate e quo envolvidos esto os principais atores nesta disputa, oportuna, por coraes e mentes. A comear, o tema foi abordado por dois autores que, ao se colocarem na perspectiva marxista - e criticarem a verso eurocntrica e um pouco mope, que, por vezes, relega a disputa exclusivamente ao embate econmico -, conseguem trazer baila aspectos complementares em relao questo tnica, de extremo interesse. Vem, a seguir, uma srie de artigos que deslindam esta questo de modo cabal, aportando argumentos imprescindveis a um debate srio: dados, numricos ou qualitativos, sobre a presena decrescente de representantes negros nas esferas sociais de maior relevncia; e a possibilidade da desconstruo de boa parte dos argumentos utilizados contra a poltica de cotas, em especial quanto a dificuldade em se discernir o negro, sob o aspecto da raa. O professor Kabengele Munanga nos brinda com um brilhante ensaio sobre o papel do multiculturalismo, com relao diversidade tnica. Uma grande questo, que emerge de parte significativa dos textos, contradizendo temores que freqentemente afloram, a convico de que a efetivao de cotas raciais para o ingresso no Ensino Superior faria aumentar a coeso social, no Brasil, ao incrementar o conhecimento do outro, de sua histria e cultura, e ao revitalizar a auto-estima dos prprios negros(as). Os quatro artigos finais da seo temtica, que se debruam sobre as novas realidades, em construo, nas universidades que j adotaram e/ou esto em processo de discusso quanto s cotas raciais, proporcionam temtica um fecho condigno. Quanto tradicional seo Debates Contemporneos, esta nos traz, desta vez, um artigo que no deixa de ter relao com o tema principal, e acaba por nos remeter a um estgio anterior da subordinao tnica, ao apresentar o problema da violncia, explcita e crua, contra os indgenas, em particular a relacionada ao direito terra. Um outro texto nos lembra que, provavelmente, no sejamos to civilizados assim, ao passo que o terceiro desta seo disseca, competentemente, os meandros das ltimas gestes na esfera federal e o transformismo poltico que reveste suas aes. Uma resenha de livro nos remete a questes da atualidade na Colmbia, considerada pelo autor a ditadura perfeita, apesar de sujeita a eleies peridicas. E, como fecho temtico, agradecemos Biblioteca Brasiliana/USP a oportunidade de reproduzir, a partir de verses originais, datadas da dcada de 80 do sculo XIX, oriundas da coleo Mindlin, duas poesias de Castro Alves, que nos do a oportunidade de participar, um pouco, do clima reinante, nesta poca, entre a frao abolicionista da sociedade brasileira. Os EditoresUNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Conselho Editorial Antnio Candido; Antnio Ponciano Bezerra; Carlos eduardo malhado Baldijo; Dcio Garcia munhoz; Luiz henrique Schuch; Luiz Carlos Gonalves Lucas; Luiz Pinguelli rosa; mrcio Antnio de oliveira; maria Cristina de moraes; maria Jos Feres ribeiro; marina Barbosa Pinto; newton Lima neto; osvaldo de oliveira maciel (in memoriam); Paulo marcos Borges rizzo; renato de oliveira; roberto Leher; Sadi Dal rosso. Encarregatura de Imprensa e Divulgao manoel Lus martins da Cruz

Coordenao GTCA edmir Terra, Francisco Carlos Duarte Vitria, Laudenir Antnio Gonalves, marcone Antnio Dutra. Editoria Executiva deste nmero Bartira C. Silveira Grandi, Cristiano Lima Ferraz, Joel moiss Silva Pinho, Lighia Brigitta horodynski matsuhigue (Coordenadora), maria Ceclia de Paula Silva, Zuleide Fernandes de Queiroz Reviso metodolgica e Assessoria de produo editorial Iara Yamamoto

Edio de Arte e Editorao Dmag Comunicao (11) 5542.6745 Capa e Ilustraes Doriana madeira (11) 9515.3530 Tiragem: 1400 exemplares Impresso: hr Grfica e editora Redao e Assinaturas AnDeS-Sn/eSCrITrIo reGIonAL So PAuLo rua Amlia de noronha, 308, Pinheiros So PAuLo - SP, 05410-010 Fone (11) 3061-3442 Fone/Fax: (11) 3061-0940 e-mail: [email protected]

Sindicato nacional dos Docentes das Instituies de ensino Superior - AnDeS-Sn Setor Comercial Sul (SCS), Quadra 2, edifcio Cedro II, 5 andar, Bloco C CeP 70302-914 - Braslia-DF - Fone: (61) 3962-8400 e Fax: (61) 3224-9716 e-mail: [email protected] www.andes.org.br

universidade e Sociedade / Sindicato nacional dos Docentes das Instituies de ensino Superior - Ano 1, n 1 (fev. 1991) Braslia: Sindicato nacional dos Docentes das Instituies de ensino Superior. 1991 v. ilust. 22cm Ttulos anteriores: o Sindicato, 1991 Semestral ISSn 1517 - 1779 1. ensino Superior - Peridicos. 2. Poltica da educao - Peridicos. 3. ensino Pblico - Peridicos. I. Sindicato nacional dos Docentes das Instituies de ensino Superior CDu 378 (05)

2 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 3

OBJETIVOS E NORMAS DA REVISTA UNIVERSIDADE E SOCIEDADEUNIVERSIDADE E SOCIEDADE est aberta colaborao de docentes e profissionais interessados(as) na rea e que desejam compartilhar seus estudos e pesquisas com os(as) demais. Objetivos Constituir-se em frum de debates de questes que dizem respeito educao superior brasileira tais como: estrutura da universidade, sistemas de ensino, relao entre universidade e sociedade, poltica universitria, poltica educacional, condies de trabalho etc.; Oferecer espao para apresentao de propostas e sua implementao, visando instituio plena da educao pblica e gratuita como direito do cidado e condio bsica para a realizao de uma sociedade humana e democrtica; Divulgar trabalhos, pesquisas e comunicaes de carter acadmico que abordem ou reflitam questes de ensino, cultura, artes, cincia e tecnologia; Divulgar as lutas, os esforos de organizao e realizaes do ANDES-SN; Permitir a troca de experincias, o espao de reflexo e a discusso crtica, favorecendo a integrao dos docentes; Oferecer espao para a apresentao de experincias de organizao sindical de outros pases, especialmente da Amrica Latina, visando integrao e conjugao de esforos em prol de uma educao libertadora. Instrues gerais para o envio de textos Os artigos e resenhas enviados a Universidade e Sociedade sero submetidos Editoria Executiva e a conselheiros ad hoc. Universidade e Sociedade reserva-se o direito de proceder a modificaes de forma e sugerir mudanas para adequar os artigos e resenhas s dimenses da revista e ao seu padro editorial. 1- Os textos devem ser inditos, observadas as seguintes condies: 1.1 Os artigos devem ter uma extenso mxima de 15 pginas (cerca de 40 mil caracteres), digitados em Word, fonte Times New Roman, tamanho 12, em espao 1,5, sem campos de cabealhos ou rodaps, com margens fixadas em 1,5 cm em todos os lados; as resenhas devem conter no mximo 2 pginas, contendo um breve ttulo e a referncia completa da obra resenhada ttulo, autor(es), edio, local, editora, ano da publicao e nmero de pginas; 1.2 - O ttulo deve ser curto, seguido do nome, titulao principal do(a) autor(a), bem como da instituio a que est vinculado(a) e de seu e-mail para contato; 1.3 - Aps o ttulo e a identificao do(a) autor(a), deve ser apresentado um resumo de, aproximadamente, 10 linhas (mximo 1.000 caracteres), indicando os aspectos mais significativos contidos no texto, bem como o destaque de palavras-chave; 1.4 - As referncias bibliogrficas e digitais devem ser apresentadas, segundo as normas da ABNT (NBR6023 de ago. de 2002), no fim do texto. Devero constar apenas as obras, stios e demais fontes mencionadas no texto. As citaes, em lngua portuguesa, tambm devem seguir as normas da ABNT (NBR 10520 de ago.de 2002); 1.5 - As notas se houver, devem ser apresentadas, no final do texto, numeradas em algarismos arbicos. Evitar notas extensas e numerosas; 2 - Os conceitos e afirmaes, contidos no texto, bem como a respectiva reviso vernacular so de responsabilidade do(a) autor(a); 3 - O(a) autor(a) dever apresentar seu mini-currculo (cerca de 10 linhas), no final do texto e informar endereo completo, telefones e endereo eletrnico (e-mail), para contatos dos editores; 4 O prazo final de envio dos textos antecede, em aproximadamente trs meses, as datas de lanamento do respectivo nmero da Revista, que sempre ocorre durante o Congresso ou o CONAD, em cada ano. A Secretaria Nacional do ANDES-SN envia, por circular, as datas do perodo em que sero aceitas as contribuies, bem como o tema escolhido para a edio daquele nmero; 5 - Todos os arquivos de textos devero ser encaminhados como anexos de e-mail, utilizando-se o endereo eletrnico: [email protected]; 6 - Os artigos que tenham sido enviados em disquete (acompanhados ou no da respectiva cpia impressa) e que no forem aceitos para publicao no sero devolvidos; 7 Artigos publicados do direito ao recebimento de cinco exemplares e as resenhas a dois exemplares.

Sumrio3 8 18 28 35 45 51 61 67 78EDIToRIAl PolTICA DE CoTAs nA unIvERsIDADE: ACEsso, PERmAnnCIA E DEmoCRATIzAo Teoria marxista e ideologia da negritude: encontros e desencontros hertz da Conceio Dias Aes Afirmativas em perspectiva marxista rosenverck estrela Santos Cotas para a populao negra nas universidades brasileiras henrique Cunha Junior Consideraes sobre o debate nacional a respeito do multiculturalismo na escola e das cotas no Ensino superior Kabengele munanga Cotas, movimento docente e democratizao do Ensino superior no Brasil: uma discusso necessria Luciano mendona de Lima mas, quem negro no Brasil?: uma contribuio para o debate acerca das cotas raciais nas universidades brasileiras Alex ratts e Diogo maral Cirqueira nem para todos a educao: cotas e aes afirmativas Francisco Carlos Cardoso da Silva As Polticas Educacionais e a questo do negro: anlise do problema racial brasileiro Claudica Alves Durans As Aes Afirmativas e a universidade do Estado da Bahia: uma cultura universitria inovadora Claudia rocha da Silva; Ivanilde Guedes de mattos; otto Vinicius Agra Figueiredo Patricia Carla Alves Pena; Wilson roberto de mattos. Polticas de Aes Afirmativas na unEB (memrias de um acontecimento histrico) Valdlio Santos Silva um olhar sobre a luta por Polticas Afirmativas no mbito da universidade Federal de Campina Grande Antnio Berto machado Aes Afirmativas no Ensino superior: visibilidade e incluso Cristiane maria ribeiro DEBATEs ConTEmPoRnEos melhor impossvel: a nova etapa da hegemonia neoliberal sob o Governo lula David maciel Agora chama a polcia, se tiver! o papel da polcia na manuteno da ordem social: um breve ensaio Simone Kelly Cetolin; Sirlei Fvero Cetolin; Clarete Trzinsk. Roraima: a luta pela homologao da Raposa serra do sol e a violncia gerada contra os ndios entre 1970 e 2009 Jaci Guilherme Vieira; Paulo Srgio rodrigues da Silva; Carla onofre ramalho. REsEnHA: Colmbia: um Estado Terrorista? Waldir Jos rampinelli PoEsIAs Castro Alves - Tragdia no Lar Castro Alves Sangue de Africano

92 99 111 120 134 142 154 162 173UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

4 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 5

Diretoria do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituies de Ensino Superior - ANDES-SNGesto 2008 - 2010EXECUTIVA NACIONAL Presidente: Ciro Teixeira Correia (ADuSP) 1 Vice-Presidente: Antnio Lisboa Leito de Souza (ADurn) 2 Vice-Presidente: rodrigo de S. Dantas m. Pinto (ADunB) 3 Vice-Presidente: marco Antnio Sperl de Faria (ADunImeP) Secretria Geral: Solange Bretas (ADuFu) 1 Secretrio: manoel Lus martins da Cruz (maneca) (AProFurG) 2 Secretrio: evson malaquias de moraes Santos (ADuFePe) 3 Secretria: Cludia Alves Durans (APrumA) 1 Tesoureiro: Jos Vitrio Zago (ADunICAmP) 2 Tesoureiro: Alberto elvino Franke (APuFSC) 3 Tesoureiro: hlio Cabral Lima (ADuFerPe) Regional Norte I 1 Vice-Presidente: Adilson Siqueira de Andrade (ADunIr) 2 Vice-Presidente: Leandro roberto neves (SeSDuF-rr) 1 Secretria: roseanie de Lyra Santiago (SeSDuF-rr) 2 Secretria: maria do Socorro C. de Albuquerque (ADuFAC) 1 Tesoureiro: Jos Alcimar de oliveira (ADuA) 2 Tesoureiro: Antonio Jos V. da Costa (TonZ) (ADuA) Regional Norte II 1 Vice-Presidente: maria Socorro dos S. Aguiar (ADuFPA) 2 Vice-Presidente: Andr rodrigues Guimares (SInDuFAP) 1 Secretrio: Jos Augusto C. Arajo (SInDuePA) 2 Secretrio: marcelo Luiz Bezerra da Silva (SInDuePA) 1 Tesoureira: maria Isabel Duarte rodrigues (ADuFPA) 2 Tesoureira: Adlia Benedita Coelho dos Santos (ADFCAP) Regional Nordeste I 1 Vice-Presidente: Antnio Srgio Luz e Silva (ADuFC) 2 Vice-Presidente: marcone Antnio Dutra (APrumA) 1 Secretria: Zuleide Fernandes de Queiroz (SInDurCA) 2 Secretrio: Ayrton Vasconcelos Lima (SInDCeFeT-PI) 1 Tesoureiro: Cristiano matias neto (ADuFPI) 2 Tesoureiro: Franquiberto dos Santos Pessoa (ADuFC) Regional Nordeste II 1 Vice-Presidente: Joo Wanderley rodrigues Pereira (ADurn) 2 Vice-Presidente: evenildo Bezerra de melo (ADuFePe) 1 Secretrio: marcos Aurlio montenegro Batista (ADuFPB) 2 Secretrio: Luciano mendona de Lima (ADuFCG) 1 Tesoureiro: Levy Paes Barreto (ADuFerPe) 2 Tesoureiro: Zacarias marinho (ADuern) Regional Nordeste III 1 Vice-Presidente: maria Ceclia de Paula Silva (APuB) 2 Vice-Presidente: Cristiano Lima Ferraz (ADuSB) 1 Secretria: maslowa Islanowa Cavalcante Freitas (ADuFS-Ba) 2 Secretrio: Joo Jos P. Walpole henriques (SInDeSP-extremo Sul-BA) 1 Tesoureira: oneize Amoras de Arajo (ADuFS) 2 Tesoureiro: menandro Celso de Castro ramos (APuB) Regional Leste 1 Vice-Presidente: hlcio Queiroz Braga (SInDCeFeT-mG) 2 Vice-Presidente: Jos Antonio da rocha Pinto (ADuFeS) 1 Secretrio: roberto Alves Braga Junior (ADuFLA) 2 Secretria: Viviana mnica Vermes (ADuFeS) 1 Tesoureiro: Joaquim Batista de Toledo (ADuFoP) 2 Tesoureiro: elton Jos de Lourdes (ADunImonTeS) Regional Rio de Janeiro 1 Vice-Presidente: Luis mauro Sampaio magalhes (ADur-rJ) 2 Vice-Presidente: Waldyr Lins de Castro (ADuFF) 1 Secretria: Cludia march Frota de Souza (ADuFF) 2 Secretria: Janete Luzia Leite (ADuFrJ) 1 Tesoureiro: Andr elias Fidelis Feitosa (ADuFF) 2 Tesoureira: Susana moreira Padro (ASDuerJ) Regional Pantanal 1 Vice-Presidente: Laudenir Antnio Gonalves (ADuFmAT-roo) 2 Vice-Presidente edmir ribeiro Terra (ADuFDourADoS) 1 Secretrio: Carlos roberto Sanches (ADuFmAT) 2 Secretrio: hajime Takeuchi nozaki (ADLeste) 1 Tesoureiro: Pedro de Assis e S. Filho (ADuFmAT) 2 Tesoureiro: Wilson Brum Trindade Junior (ADuemS) Regional Planalto 1 Vice-Presidente: Joel moiss Silva Pinho (APuG) 2 Vice-Presidente: Simone Perecmanis (ADunB) 1 Secretrio: Cludio Lopes maia (ADCAC) 2 Secretria: Suely dos Santos Silva (ADCAJ) 1 Tesoureiro: Wilson mozena Leandro (ADuFG) 2 Tesoureiro: Adriano Sandri (ADuCB) Regional So Paulo 1 Vice-Presidente: milton Vieira do Prado Junior (ADuneSP) 2 Vice-Presidente: Lighia Brigitta horodynski matsushigue (ADuSP) 1 Secretria: raquel de Aguiar Furuie (ADunIFeSP) 2 Secretrio: marco Aurlio de C. ribeiro (ADunImeP) 1 Tesoureiro: Carlos Alberto Anaruma (ADuneSP) 2 Tesoureiro: Paulo Jorge moraes Figueiredo (ADunImeP) Regional Sul 1 Vice-Presidente: Bartira C. Silveira Grandi (APuFSC) 2 Vice-Presidente: hlvio Alexandre mariano (ADunICenTro) 1 Secretria: magaly mendona (APuFSC) 2 Secretria: milena maria C. martinez (APuFPr) 1 Tesoureiro: Denny Willian da Silva (ADunICenTro) 2 Tesoureiro: Sirley Laurindo ramalho (SInDuTF-Pr) Regional Rio Grande do Sul 1 Vice-Presidente: Fernando molinos Pires Filho (ADuFrGS) 2 Vice-Presidente: Francisco Carlos Duarte Vitria (ADuFPeL) 1 Secretria: elaine da Silva neves (ADuFPeL) 2 Secretria: maristela da Silva Souza (SeDuFSm) 1 Tesoureira: Laura Souza Fonseca (ADuFrGS) 2 Tesoureiro: henrique Andrade Furtado mendona (ADuFPeL) EnDEREo DA sEDE E DAs sECRETARIAs REGIonAIs sede nacional Setor Comercial Sul (SCS), Quadra 2, edifcio Cedro II, 5 andar, Bloco C, 70302-914, Braslia - DF. Telefones: (61) 3962-8400 e Fax: (61) 3224-9716 e-mails: Secretaria - [email protected] Tesouraria - [email protected] Imprensa - [email protected] Escritrios Regionais AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl noRTE I rua 7, casa 79, conj., 31 de maro, bairro Japiim I, manaus Am, 69077-080 Fone: (92) 3237-5189 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl noRTE II Av. Augusto Correia, n 1 Guam, Campus universitrio da uFPA Setor de recreaes Altos, Caixa Postal 8603, Belm PA, 66075-110 Fone/fax (91) 3259-8631 Fones: (91) 3082-0500 / 3269-2836 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl noRDEsTE I rua Tereza Cristina, n 2266, salas 105 e 106, Benfica, Fortaleza Ce, 60015-141 Fone/Fax: (85) 3283-8751 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl noRDEsTE II rua Dr. Jos Luiz da Silveira Barros, 125 ap. 02, espinheiro - recife- Pe, 52020-160 Fone/fax: (81) 3421-1636 /Fone: (81) 3222-9507 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl noRDEsTE III Av. Presidente Vargas, 60, Sala 101/Barra Center - Salvador - BA, 40140-130 Fone/fax: (71) 3264-2955 /(71) 3264-3063 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl lEsTE Av. Afonso Pena, 867 - salas 1012 a 1014, Belo horizonte mG, 30130-002 Fone: (31) 3224-8446 /Fax: (31) 3224-8982 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl PlAnAlTo Alameda Botafogo, 68, qd. A, lt. 05, casa 03 Centro- Goinia - Go, 74030-020 Fone: (62) 3213-3880 /Fax: (62) 3213-1445 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl PAnTAnAl Av. Alziro Zarur, 338, sala 03- Cuiab - mT, 78068-365 Fone/fax: (65) 3627-7304 e 3627-6777 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl so PAulo rua Amlia de noronha, 308, Pinheiros - So Paulo - SP, 05410-010 Fone (11) 3061-3442 - Fone/Fax: (11) 3061-0940 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl RIo DE JAnEIRo Av. rio Branco, 277, sala 1306 Centro- rio de Janeiro - rJ, 20040-904 Fone: (21) 2510-4242 Fax: (21) 2510-3113 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl sul rua emiliano Perneta, 424, conj. 31, edifcio Top Center executive Centro Curitiba - Pr, 80420-080 Fone/Fax: (41) 3324-3719 e Fone (41) 3324-6164 e (41) 9941-9658 e-mail: [email protected] AnDEs-sn/EsCRITRIo REGIonAl RIo GRAnDE Do sul Av. Protsio Alves, 2657 Sala 303 - Bairro Petrpolis - Porto Alegre - rS, 90410-002 Fone: (51) 3061-5111 e-mail: [email protected]

Poltica de Cotas na Universidade

6 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 7

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

1. Introduo omo articular o debate do problema racial e classe no Brasil? possvel fazer esse debate do ponto de vista marxista? Como os marxistas brasileiros e a esquerda trataram essa temtica? Quais os desafios postos na contemporaneidade para a superao do racismo e da explorao, no contexto das lutas sociais no Brasil? Esses so alguns questionamentos que nos propomos a discutir neste artigo. Em se tratando de analisar as origens do pensamento marxista brasileiro e situ-lo no debate sobre a problemtica racial, deparamos-nos, logo, com um fato inusitado: as primeiras aluses sobre os escritos de Marx e Engels no Brasil coincidem justamente com o perodo de emergncia da crise do regime escravista ou do Escravismo Tardio1.

C

ro no perodo ps-abolio como, tambm, foram reduzidos os estudos na posteridade que focalizaram o carter racialmente excludente que se deu na fase de transio do Brasil escravista para o de capitalismo dependente. Segundo Moura (1983), ao divorciar o negro contemporneo do seu passado histrico, ou o seu passado histrico de sua contemporaneidade, diversos es-tudiosos, dentre os quais muitos marxistas, acabam transformando o afro-descente em um ser a-histrico.A sociedade de modelo de capitalismo dependente que substituiu a de escravismo colonial, consegue apresentar o problema do Negro no Brasil sem lig-lo, ou lig-lo insuficientemente, s suas razes histricas, pois tal ligao diacrnica remeteria o estudioso ou interessado ao nosso passado escravista. O sistema competitivo inerente ao modelo de capitalismo dependente, ao tempo em que remanipula os smbolos escravistas contra o negro, procura apagar a sua memria histrica e tnica, a fim que ele fique como homem flutuante, a-histrico (MOURA, 1988, p.125).

Quando o Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels foi publicado, ns, aqui, estvamos nos primeiros anos do Segundo Imprio, dirigido pelo imperador Pedro II, que estava ento com vinte e poucos anos. Havia poucos intelectuais republicanos e eles eram influenciados pelos ideais democrticos europeus (KONDER, 2003, p.27).

Teoria marxista e ideologia da negritude: encontros e desencontrosHertz da Conceio Dias mestre em educao/uFmA, militante do GT de negros e negras da Conlutas e do Quilombo urbano mA E-mail: [email protected]

Resumo: Recorrendo teoria social de Marx e Engels e de autores brasileiros, buscamos entender, a partir da construo histrica da sociedade brasileira, a condio da populao negra, posta em grande desvantagem social, econmica e poltica, em decorrncia do escravismo estabelecido no pas e dos modelos adotados aps o fim da escravido legal. Em especial, a discusso gira em torno da possibilidade de estabelecer uma articulao entre o problema racial e as questes de classe, no Brasil. Procuramos estabelecer os nexos entre a materialidade e as representaes construdas, destacando os desafios contemporneos da luta contra a opresso racial e a explorao econmica em nosso pas. Palavras-chave: Marxismo; Racismo; Escravismo; Lutas de classes.UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Para esses intelectuais, o Brasil s poderia ter um proletariado significativo, influente, se a industrializao avanasse. E a industrializao s avanaria com o fim do sistema baseado na explorao do trabalho escravo dos negros. (KONDER 2003, p. 33). Nota-se, j nos proto-marxistas2 brasileiros um dos elementos que entendemos como determinante para a invisibilidade do negro no pensamento das esquerdas brasileiras, ou seja, o economicismo. Nessa perspectiva, a realidade que precisa ser modificada (no caso, a industrializao) para a operacionalizao da teoria e no a teoria que deve ser pensada com e na realidade, no sentido de compreend-la para modific-la. No s foram poucas as vozes daquele perodo preocupadas com a questo da insero social do negro brasileiUNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Enquanto em pases, como a Frana psrevolucionria, a burguesia organiza, no mbito da superestrutura, uma nova ordem de valores (individualismo liberal, defesa da propriedade privada, igualdade formal, racionalismo etc.), que dar combate permanente aos resqucios ideolgicos das antigas classes ou estamentos sociais, no Brasil ps-abolio a nascente burguesia cafeeira e industrial, descendente, em grande monta, da classe escravocrata, conseguiu reelaborar e ressignificar os signos e smbolos escravistas para esse novo contexto histrico.

Para este autor a questo em tela est para alm de identificar a luta de classe existente no Brasil colonial, mas de compreender como essa luta, que se deu numa sociedade que perdurou por quase quatrocentos anos e cujos principais plos opostos eram a classe dos senhores e dos escravos, foi definitiva [...] na plasmao do ethos do nosso pas (MOURA, 1983). E continua:Penetrando todas as partes da sociedade, injetando em todos os nveis os seus valores e contra-valores, o escravismo ainda hoje um perodo de nossa histria social mais importante e dramaticamente necessrio de se conhecer para o estabelecimento de uma prxis social coerente (p. 124).

2. Classes na conformao da realidade No Brasil, a transio do escravismo colonial para o capitalismo dependente, deu-se sem a substituio de uma classe social por outra, mas uma metamorfoseDF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 9

8 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

no interior da mesma classe. Considerando as cincias ou as No Brasil, No caso da Europa, Engels (2007, produes cientficas como parte das diferentemente dos p.262) explica que a crtica dos econosuperestruturas polticas e ideolgicas, Estados Unidos, onde mistas burgueses tinha como alvo a notamos que grande parte da produo [sociedade] anterior, especialmente a marxista brasileira no s silenciou soos negros representam feudal, com a qual ainda tinha que lutar bre essas questes, como seus autores apenas 12% da diretamente, [e] se assemelhou a crtica caram prisioneiros e, em muitos capopulao, no foi que o cristianismo fez do paganismo, ou sos, foram defensores da ideologia do possvel impor uma o protestantismo do catolicismo. branqueamento e da idia de demolegislao separatista, Esse, certamente, dever ser um dicracia racial3, ambas gestadas neste com uma linha racial novo contexto histrico (do Brasil de ferencial fundamental, que muitos esbem definida, ou seja, capitalismo dependente do imperialistudiosos da realidade brasileira no o racismo brasileiro no mo britnico) pelos grupos sociais que levaram em considerao. Enquanto se institucionalizou como detinham a hegemonia econmica, polem pases, como a Frana ps-revolunos Estados Unidos. A tica e social na antiga formao social cionria, a burguesia organiza, no mbito (no Brasil escravocrata). da superestrutura, uma nova ordem de superioridade numrica Fiabani (2005) mostra que o intevalores (individualismo liberal, defesa da de afro-brasileiros e a lectual marxista Clvis Moura, um dos propriedade privada, igualdade formal, repercusso mundial primeiros estudiosos a se interessar em racionalismo etc.), que dar combate perda revoluo negra analisar a situao do negro em termos manente aos resqucios ideolgicos das de 1814, no Haiti, histricos, teve que enfrentar resistnantigas classes ou estamentos sociais, no desaconselhava tal cias da intelectualidade de esquerda Brasil ps-abolio a nascente burguesia iniciativa. dentro do seu prprio partido (Partido cafeeira e industrial, descendente, em Comunista Brasileiro - PCB) para pugrande monta, da classe escravocrata, conseguiu reelaborar e ressignificar os signos e smbolos blicar produes com essa finalidade. Mesmo sendo militante do PCB, o jovem socilogo teve a edio escravistas para esse novo contexto histrico. Com efeito, ao desconsiderar as contradies his- de seu trabalho rejeitada por Caio Prado Jnior e no tricas dessa realidade brasileira, ou por pens-las a incentivada por dison Carneiro, seus companheiros partir de modelos fechados e europeizados, a maioria de partido. (FIABANI, 2005, p. 85). Ainda sobre a persistncia de Clvis Moura e a desses estudiosos no conseguiu compreender a imensa complexidade da transio abolicionista, especialmente resistncia tenaz do PCB em admitir a existncia da problemtica racial no Brasil, Freire (2000) relata que: nas relaes inter-tnicas.Da por que o problema da revoluo burguesa no Brasil um problema polmico, especialmente por que muitos estudiosos tomam como paradigma as revolues burguesas europias como se tivssemos de repeti-las aqui, na poca do imperialismo e no contexto de uma sociedade que tinha at cem anos atrs como forma fundamental de trabalho a escravido e as instituies correspondentes. (MOURA, 1988, p.103). Para ilustrar as dificuldades dos PCs frente questo, o autor de Rebelies da Senzala conta que, durante o processo constituinte ps-Estado Novo, o deputado Hamilton Nogueira (UDN) apresentou projeto contra o racismo a ser includo na nova Constituio. No entanto, a bancada do PCB vota contra o projeto, sob o argumento de que no Brasil no existe luta de raas, mas de classes (!). (p. 12-13)

Por outro lado, diversos relatos so tambm feitos por Abdias do Nascimento, em seu livro Quilombismo (1980), sobre a negrofobia da poltica das esquerdas marxistas dos Estados Unidos e do Brasil. Dentre todos os casos, merece destaque a saga do Comit AfroBrasileiro, que foi fundado em 1945 pelo referido autor e outros colegas dentro da Unio Nacional dos Estudantes - UNE. Alm da luta anti-racista, o Comit Afro-Brasileiro incorporou em seus propsitos a luta pela anistia de presos polticos daquele perodo. Passada essa fase, segundo Nascimento (1980), inicia-se um intenso processo de perseguio poltica, engendrado por parcela dos militantes do PCB, que atuavam na UNE e no referido Comit. Novamente a questo do suposto anacronismo da problemtica racial no Brasil estava em pauta.

com uma linha racial bem definida, ou seja, o racismo brasileiro no se institucionalizou como nos Estados Unidos. A superioridade numrica de afro-brasileiros e a repercusso mundial da revoluo negra de 1814, no Haiti, desaconselhava tal iniciativa. Nesse sentido, enquanto nos Estados Unidos prevaleceu a idia da supremacia racial branca, com cdigos e leis como os de Jim Crow4, no Brasil a estratgia de dominao racial adotada foi a da superioridade racial de cunho mais ideolgico5. Dentro dessa filosofia, o Brasil aparece como paraso racial do negro dcil e do branco benevolente. Percorrendo o caminho inverso dos demais pases multirraciais, aqui, as raas teriam se misturado harmonicamente, criando a maior democracia racial do mundo. Foi ento que os radicais, negros e brancos, revelaram Diversos intelectuais do incio do sculo XX se a verdadeira razo de sua presena no seio do Comit: apressaram em afirmar que, quanto mais mestio fosse tratar de questo especfica do negro era fascismo, que o pas (leia-se mais branco e menos negro), mais deia resultar a diviso das classes oprimidas. O grupo senvolvido ele se tornaria; neste sentido a ideologia da fundador do comit insistiu na necessidade de o Comit democracia racial e a do branqueamento atuam como cumprir seu objetivo fundamental: a defesa das massas foras conjuntas. Essa filosofia que tinha (e ainda afro-brasileiras em todos os aspectos da realidade do tem) como pano de fundo a idia de mestiagem e pas. E aqui chegamos ao momento culminante: usando de democracia racial, ao pintar o Brasil com as cores mscaras negras dos radicais negros, os radicais harmnicas de um arco-ris multirracial (mestio), conbrancos, como maioria, expulsaram do Comit os seus seguiu nele diluir tambm o interesse pela categoria trs membros fundadores: Abdias do racial, como bem nos mostra Skidmore A ideologia da Nascimento, Agnaldo de Oliveira Ca(1971, apud FIOLA, 1991):margo e Sebastio Rodrigues Alves. O motivo justificador da expulso: ramos negros racistas! (NASCIMENTO, 1980, p.173).

Feitas essas observaes, necessrio compreender que o Brasil arcaico preservou os seus instrumentos de dominao, prestgio e explorao e o moderno foi absorvido pelas foras dinmicas do imperialismo que tambm antecederam abolio na sua estratgia de dominao (MOURA, 1988, p.103).10 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

Em relao imprensa negra de So Paulo, que desempenhou um importante papel social e ideolgico junto comunidade negra, no perodo de 1915 a 1963, Moura (1988, p. 204) lembra que a prpria Histria da Imprensa no Brasil, de Nelson Werneck Sodr, no a registra.UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Como vemos, a idia de que no existe racismo no Brasil ou de que vivemos numa democracia racial contribuiu sobremaneira para tornar invisvel a problemtica racial para as reflexes de nossa intelligentsia. Afinal de contas, as cincias sociais e, especialmente, o marxismo, no se propem a resolver questes que no esto colocadas como fundamentais para a humanidade. No Brasil, diferentemente dos Estados Unidos, onde os negros representam apenas 12% da populao, no foi possvel impor uma legislao separatista,UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

mestiagem, o mito da democracia racial e seu elo mais prximo que a idia de superioridade racial branca, todos imbricados num projeto de consolidao da identidade nacional, perpassaram e, at certo ponto, determinaram, o debate poltico e cultural iniciado no final do sculo XIX. E, nesse projeto, o negro visto ora como raa inferior, ora como ser invisvel.

Na prtica, o pressuposto assimilacionista levou o governo a tomar uma medida reveladora, omitir a raa do senso. Embora a raa tivesse includa no primeiro senso, de 1872, e no de 1890, foi omitida em 1900 e 1920 (no houve senso em 1910 e 1930) s reaparecendo no de 1940. Entre 1880 e 1940, pois, a principal coleta de dados ignorou as categorias raciais no pas do Novo Mundo que mais recebeu escravos africanos ( p. 8).

Mas, o prprio Skidmore ressalta que a falta de dados oficiais no justifica tanta omisso cientfica num pas marcado por tantos contrastes e conflitos raciais. bom que se diga que o silncio tem muito a dizer. Acreditamos que nos espaos em branco das interpretaes existentes que devemos mergulhar paraDF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 11

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

que possamos construir novas interpretaes6. Contudo, com o surgimento da chamada Escola de So Paulo, em meados do sculo passado, que ter frente Florestan Fernandes, Fernando Henrique Cardoso e, posteriormente, Otvio Ianni, que o estudo sobre as desigualdades raciais assume uma importncia bem mais significativa no mundo acadmico. Entretanto,enquanto,nopensamento das elites, o negro desapareceria medida que o pas se tornasse mais mestio, para esses estudiosos da Escola de So Paulo, o problema do negro seria resolvido com o desenvolvimento do capitalismo e com justia social.Os que sustentavam essa viso no acreditavam no mito de Paulo Freyre, mas eram devotos de uma viso economicista de mundo. Como as injustias econmicas dominam o mundo

Todos os nveis institucionais exercem um tipo de controle sobre a sua vida na academia, do Presidente da Repblica ao aluno. O professor reage a esse supercontrole, isolando-se, reproduzindo o modelo autoritrio, inserindo-se na corrida pela titulao e publicao, competindo com os pares, enfim, criticando algumas dimenses, mas lutando, dirigindo suas energias na busca da sua insero no modelo proposto.

capitalista, atac-las resolveria todos os problemas de qualquer cor. Na verdade, esses intelectuais podem ter sido mais influenciados pelo mito da democracia racial do que gostariam de admitir (SKIDMORE, 1991, p.11).

O historiador Gorender (2000), que tambm reconhece a importncia que teve Florestan Fernandes no combate ao mito da democracia racial brasileira, destaca que na produo deste autor existe certa carga de exclusivismo econmico. O racismo, para Florestan, analisa Gorender, seria uma das chagas da sociedade escravista que ainda persistia no capitalismo, mas que, com a industrializao, tenderia a desaparecer gradualmente. Florestan expressou a perspectiva de que a industrializao e a urbanizao, em curso no processo de formao capitalista, viessem a propiciar a extino da discriminao no Brasil, configurando uma segunda abolio (GORENDER, 2000, p. 69). A ideologia do branqueamento, acreditamos, cumpriu com maestria, no Brasil, a funo de justificar no s a imobilidade social do setor majoritrio da populao, no caso dos negros, como tambm de limitar ou bloquear as reflexes de parte de nossa inteligncia sobre a problemtica racial. A equao simples: se o12 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

problema no existe no h por que investig-lo. A ideologia da mestiagem, o mito da democracia racial e seu elo mais prximo que a idia de superioridade racial branca, todos imbricados num projeto de consolidao da identidade nacional, perpassaram e, at certo ponto, determinaram, o debate poltico e cultural iniciado no final do sculo XIX. E, nesse projeto, o negro visto ora como raa inferior, ora como ser invisvel. Se levarmos em considerao todos os signos e smbolos escravistas remanipulados pelas elites brasileiras para justificar a marginalizao do negro na transio do escravismo para o de capitalismo dependente, faz-se necessrio empreender uma ao (ou crtica) cultural, ou seja, no mbito da superestrutura. somente por meio da crtica dialtica interpretao mecnica e linear da relao entre estrutura e superestrutura, decorrente, por sua vez, da insuficiente ligao entre teoria e prtica (a prxis humana entendida como motor histrico) que poderemos encontrar os vazios ou as pginas em branco destas mesmas interpretaes sobre o negro brasileiro. No se trata, evidentemente, como nos ensina Grner (2007), de restituir o objeto histrico em sua essncia, mas de retirar-lhe o vu ou desvelar os smbolos que determinada base material (scio-histrica) lhes atribuiu. Por trs dessas simbologias, como por exemplo, a de ver o proletariado brasileiro como uno e a-histrico, encontraremos outros smbolos, como a ideologia do branqueamento ou a idia de democracia racial, que foram construdas para explicar ou justificar determinadas formas de relaes sociais, como a excluso estrutural do negro no perodo ps-abolio e a imigrao do trabalhador europeu. Ao tratar o proletariado brasileiro somente como conceito terico, portanto universal e abstrato, os nossos marxistas no conseguiram identificar a sua diversidade e, nela, a histria de cada grupo social que o constituiu.UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Para Grner (2007), h uma diferena fundamental entre o proletariado como categoria terica e o proletariado como realidade sociolgica.No primeiro caso, define-se (define-o Marx classicamente) como aquelaclasse de homens e mulheres des-

blicano, tornaram-se hegemnicos no pensamento intelectual brasileiro, chegando inclusive a afetar tambm o marxismo brasileiro, de vis economicista.

3. Em busca de uma interseo entre a teoria possudos de todo meio de produo, e to somente marxista e movimento da negritude proprietrios de sua fora de trabalho, essa mercadoria Em nosso entendimento, os preconceitos raciais que esto obrigados a vender ao capitalista, e em con- que estimulam o desprezo do trabalhador branco seqncia produzir uma cota de mais valia para o dito para com o negro, no interior do prprio proletariado capitalista etc. No segundo, trata-se de uma realidade brasileiro, esto umbilicalmente ligados unidade neemprica extraordinariamente complexa e mutvel, cessria entre estrutura e superestrutura articulada pecom um alto grau de determinaes concretas que va- los intelectuais orgnicos da burguesia para garantir a riam de sociedade para sociedade, articulando-se com hegemonia da sua classe, como bloco histrico. Nunca igualmente variveis condies socioeconmica, po- ser demais lembrar que a origem tnica de nossas lticas e ainda psicolgicas. A diferena elites branco-europia. Para melhor explicitar entre ambos os registros homloga Dessa forma, fica claro que o racismo nosso pensamento, entre a que faz o prprio Marx entre garante, ao mesmo tempo, e em sua reretomaremos o debate um modo de produo e uma formao ciprocidade, a dominao vertical (de socioeconmica (p. 111). classe) e a diviso horizontal (na classe). sobre a transio do Sem rosto, particularidades e, acima Visto sob o prisma da concepo trabalho escravo para de tudo, sem histria, o que temos em gramsciana de hegemonia, o racismo o trabalho livre, a nossos registros histricos um conceito serve tanto para garantir a dominao poltica imigracionista arbitrrio, uno e universalizante de prona estrutura social como a direo cule a ideologia do letariado. Nesse contexto, a raa, como catural e ideolgica na superestrutura. branqueamento no tegoria especfica e contraditria, diluiuespelho e reflexo para a dominao. Brasil. O que tentaremos se, mecnica e magicamente, no conceito Para melhor explicitar nosso pensamostrar como o vnculo fechado, europeizado e trans-histrico de mento, retomaremos o debate sobre entre infra-estrutura proletariado e na mxima de classe contra a transio do trabalho escravo para o e superestrutura to classe ou de luta de classes. trabalho livre, a poltica imigracionista No podemos ver, por isto, como certos e a ideologia do branqueamento no indissocivel como a marxistas de ctedras, o problema do Brasil. O que tentaremos mostrar relao entre raa e negro brasileiro como simples problema como o vnculo entre infra-estrutura e classe no Brasil. de luta de classes, embora esteja includo superestrutura to indissocivel conele e seja um dos seus aspectos mais importantes e mo a relao entre raa e classe no Brasil. pouco estudado. simplificar - dentro de categorias Para as classes dominantes, de qualquer parte do muito gerais - um problema bastante complexo. Partindo mundo, o que interessa em primeiro plano o lucro, a esses estudiosos da idia de um proletariado abstrato, de acumulao de riqueza, a manuteno ou ampliao de acordo com o existente na Europa Ocidental no meio do suas vantagens econmicas. No Brasil no foi diferente; sculo XIX, so incapazes de um mnimo de imaginao por trs da idia de que o trabalhador negro era inferior sociolgica ao tratarem do problema atual do Negro no ao branco europeu estavam as vantagens econmicas Brasil. (MOURA, 1983, p.125-126). da poltica imigracionista e no necessariamente a crenEm uma palavra, o proletariado, como conceito a pura e simples de nossas elites na superioridade da sociolgico, construindo um contexto particular, con- raa branca, pelo menos a priori, o que nos mostra creto e histrico, no foi a partir deste desenvolvido vi- Moura (1988): No houve aquele automatismo de aceitao decorrente sando abarcar a realidade sociolgica do pas porque da superioridade obvia do imigrante. O que pretendia os smbolos escravistas, remanipulados no Brasil repuUNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 13

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

essa substituio do trabalhador nacional pelo aliengena era satisfazer uma teia de interesses que se conjugavam dentro de uma viso capitalista dessa transao, com capitais em jogo e interesses ideolgicos e polticos que se completam. O governo imperial investe no imigrante por que ele no era mais um simples trabalhador, mas uma pea importante nos mecanismos que dinamizavam- via interesse de uma burguesia mercantil ativa e vida de lucros- essa substituio (p. 88).

inferior, incapaz de se adaptar ao processo civilizatrio que se desenvolveu a partir do fim do escravismo. Em 1882, ao se falar na vinda de negros para So Paulo, o deputado Raphael Correia exclamaria indignado que era necessrio arredar de ns essa peste, que vem aumentando a peste que aqui j existe. Adicionava a condio de praga ociosidade inevitvel dos negros (MOURA, 1988, p. 94).

Como se explica, por exemplo, que, ainda em 1850, No queremos com isso afirmar, e nem o caso de trabalhadores livres de uma tipografia de So Paulo, ao Moura, que no existia seletividade racial ou branquitu- entrarem em greve, reivindicarem tambm a libertao de antes da poltica imigracionista, pois como o prprio de um trabalhador escravo que fazia parte do quadro autor nos mostra, interesses econmicos, polticos e de empregados daquela mesma empresa7 , sendo que 70 ideolgicos coadunavam-se nessa fase de transio do anos depois, ou seja, em plena dcada de 1920, diversos jornais anarquistas, ao contrrio, exibiam escravismo tardio de capitalismo deTomar as relaes manifestaes explcitas de preconceitos pendente. e desprezo para com a populao negra, O que queremos acentuar que econmicas e a conforme relata Moura (1988) a seguir: tal ideologia no simplesmente filha materialidade como Em pesquisas parciais que realizamos em jornais in natura da suposta mentalidade fundamento do anarquistas e em trabalho sistemtico feito escravista de nossas elites. Em nosso mtodo dialtico no pelo professor Sidney Srgio Fernandes Slis, entendimento, essa viso , antes de quer dizer, de modo tanto no Rio de Janeiro como em So Paulo, tudo, histrica e se traveste, de acordo algum, que os homens, a imprensa anarquista que ento circulava no com as circunstncias histricas. os povos, as naes refletia nenhuma simpatia ou desejo de unio Moura (1988, p. 90) lembra-nos que: e os agrupamentos com os negros, mas, pelo contrrio, chegava As grandes firmas imigracionista, tnicos sejam meros mesmo a estampar artigos nos quais era visvel grupos interessados nesse processo o preconceito racial [...] e esse racismo larvar e especuladores em geral no viam reflexos deformados passou a exercer um papel selecionador dentro evidentemente o imigrante como suda economia ou do do prprio proletariado (p. 65). perior, mas o viam como um invesdesenvolvimento Os trechos supracitados demonstram timento que daria lucros a quem admiinfra-estrutural. a insuficincia tanto do marxismo econistrasse os mecanismos imigracionomicista ou materialista vulgar, que apregoava que nistas. Em vista disso, seria necessrio ento justificar a o racismo diminuiria medida que a sociedade se opo pelo imigrante europeu e a no utilizao do desenvolvesse, como a viso etnicista, que desconsidera trabalhador nacional negro. em meio a esse dilema a questo de classe no interior do agrupamento racial que toda carga de preconceitos raciais recair sobre o ou a solidariedade de classe entre etnias diferentes. Nossas concluses apontam: 1- que o racismo negro, ancorada na ideologia do branqueamento. Acompanhando esses mesmos mecanismos que dina- brasileiro sofisticou-se, medida que as foras promizavam a estratgia da importao de imigrantes e dutivas, outrora travadas pelo escravismo, foram se suas compensaes monetrias, projeta-se a ideologia desenvolvendo; 2- as ideologias so incuas sem sua de rejeio do negro. Em So Paulo, onde o processo base material; procurar suas origens fora da histria e das migratrio subsidiado foi considerado a soluo para a relaes sociais como procurar sistemas anatmicos substituio do trabalho representativos dos escravos, em fantasmas; 3- a ideologia do branqueamento no os polticos representativos dos fazendeiros de caf de- brota da composio gentica do branco, como nos senvolveram um pensamento contra o negro, no mais querem fazer pensar os etnicistas, mas das necessidades como ex-escravo, mas como negro membro da raa concretas da classe/etnia dominante; 4- e que, portanto,14 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

a ideologia do branqueamento tem uma origem e vtima seja produto da explorao capitalista, no deiuma existncia histrica, sendo portanto, gentico- xa de ser uma verdade. Porm, acreditar que basta lutar pela superao do modo de produo capitalista para dinmica. Desse modo, fica claro que no na idia de supe- que as opresses desapaream, como fazem muitos rioridade branca que devemos buscar as causas da imi- marxistas economicistas, tem sido uma viso esgrao europia, ela na verdade o seu pretexto e a jus- tritamente fechada. Pensando com Marx, a opresso tificativa para no utilizao do trabalhador nacional. do negro deve ser tratada como uma questo geral O que estava em jogo, na verdade, era a possibilidade [de classe] dentro de uma esfera especial [de raa]. A postura mecnica e economicista, que sobrepe de acumulao de capitais, com a instituio de um searbitrariamente o conceito de classe ao de raa, o unigundo trfico de fora de trabalho. Em razo disso, essa mesma ideologia ser fora versal ao concreto, a totalidade s partes, sem qualquer viva para a manuteno das relaes sociais no Brasil, articulao entre as mesmas, no se d conta de que o at os dias de hoje, isso porque nossa intelligentsia no capitalismo, em determinadas formaes sociais, no s produz, como se alimenta permanentemente do raconseguiu elaborar uma contra-ideologia racial. Tomar as relaes econmicas e a materialidade cismo, o que, por si, s exigiria a construo de uma como fundamento do mtodo dialtico no quer dizer, anttese, o anti-racismo, conforme nos mostra Gorende modo algum, que os homens, os povos, as naes der (2000): Sabemos que a discriminao racial no indispensvel e os agrupamentos tnicos sejam meros reflexos ao capitalismo, o qual capaz de se reproduzir, dia a deformados da economia ou do desenvolvimento dia, sem ela. Contudo, no deixa de ser verinfra-estrutural. Pelo contrrio, a ecoSe entendermos dade que em determinadas condies histnomia no trata das coisas, mas das ricas, o capitalismo no se inibe de herdar relaes entre as pessoas e, em ltima a ideologia do preconceitos e prticas racistas de formaes instncia, entre as classes, apesar de branqueamento como anteriores. Dessa maneira, conserva e adapta essas relaes estarem sempre unidas uma necessidade tais preconceitos e prticas ao prprio funciona coisas e aparecerem sempre como histrica para o bloco amento socioeconmico intrnseco e consegue coisas (ENGELS, 2008, p.282). ideolgico dominante aumentar as possibilidades de explorao da Portanto, tratar das relaes entre brasileiro garantir a fora de trabalho [...] a eliminao efetiva do as pessoas, significa considerar seus direo cultural, no racismo no pode ocorrer, por isso, como sentimentos, representaes, subjetis em relao ao conseqncia de processos espontneos ou da vidades e necessidades. trabalhador negro, mas evoluo permanente objetiva do ordenamento Em nosso apangio, a luta contra as em relao ao conjunto social, porm como resultante da luta anti-raopresses deve ser entendida no contexto cista consciente, tenaz e prolongada (p.70). das lutas pela emancipao coletiva do prodo nosso proletariado, No temos dvidas de que na base letariado. Marx, em artigo publicado na o que temos, aqui, material ou na economia que devemos Gazeta Renana, faz uma bela anlise sobre justamente o buscar as determinaes, em ltima a indissociabilidade entre o particular e o inverso. A ideologia anlise, da vida social. Porm, necesgeral, na luta por liberdade, na sociedade do branqueamento, srio identificar que elementos desemcapitalista, explicando que: A falta de associada ao penham as funes principais para que liberdade a regra e a liberdade execonomicismo, fez do tais relaes sociais de produo se ceo da sorte e do capricho. Portanto, negro brasileiro uma mantenham. nada mais perverso que pensar que o cobaia sociolgica da Engels (2008) explica que quando caso de um ser particular de liberdade seja intelligentsia brasileira, Marx migrou da filosofia para a econouma questo particular. Trata-se de uma mia, no foi por ser determinista, mas questo geral dentro de uma esfera espesegundo nossas para dar combate ao idealismo hegeliano, cial (MARX, 2006, p. 87). reflexes. que era o pensamento hegemnico, no Que o racismo do qual o negro UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 15

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

somente na Alemanha, mas em quase Brasil, para com a problemtica racial Se o economicismo toda a Europa, no sculo XIX. decorrem, conforme nos mostrou o socego para as opresses, No se tratava de parania econocilogo e historiador Clvis Moura, da o etnicismo tambm micista, mas de tato dialtico e sensibiausncia de criatividade sociolgica da fechado e antidialtico, lidade intelectual para ver a primazia maioria desses intelectuais e do peso do no avana para alm ontolgica do econmico. Marx comeconomicismo nestas mesmas produes. bate Hegel por dentro e por fora. Acrescenta-se a isso a virada stalinista no das aparncias, no Por dentro, com a dialtica; e por marxismo mundial, que no foi possvel consegue, por isso, dar fora, quando restitui ao pensamento analisar neste artigo. conta das contradies dialtico a sua base material. Do mesPor outro lado, qualquer anlise sono seu prprio interior. mo modo o faz, em sentido contrrio, bre as questes tnicas deve ser estabeEnfim, no cremos que claro, com o materialismo vulgar. lecida em conexo permanente com a o racismo persista no Se levarmos em considerao essa questo das classes sociais, dentro de Brasil porque seja uma trajetria de Marx e entendermos a uma prxis total, pois, como vimos, a entidade autnoma, ideologia do branqueamento como negritude fechada e epidrmica s serviu vitalcia e deslocada uma necessidade histrica para o bloaos interesses das classes dominantes. A das relaes sociais do co ideolgico dominante brasileiro negritude etnicista, ou seja, aquela que garantir a direo cultural, no s em no dialoga com outros setores opricapitalismo dependente. relao ao trabalhador negro, mas em midos e explorados da sociedade, deixa relao ao conjunto do nosso proletariado, o que de ser movimento e passa a ser ideologia morta ou temos, aqui, justamente o inverso. A ideologia do teoria sem prxis. branqueamento, associada ao economicismo, fez do Se o economicismo cego para as opresses, o negro brasileiro uma cobaia sociolgica da intel- etnicismo tambm fechado e antidialtico, no avana ligentsia brasileira, segundo nossas reflexes. para alm das aparncias, no consegue, por isso, dar Por encarar o racismo meramente como uma chaga conta das contradies no seu prprio interior. Enfim, do passado escravista, esses pensadores, sobretudo os no cremos que o racismo persista no Brasil porque economicistas, anunciaram que a sua extino seria seja uma entidade autnoma, vitalcia e deslocada inevitvel com o natural desenvolvimento das foras das relaes sociais do capitalismo dependente. Pelo produtivas, especialmente com a futura construo da contrrio, ele s persiste, ressignificadamente, porque sociedade socialista. serve aos interesses das classes sociais dominantes e de De modo que o presente fica, como elo perdido seu bloco ideolgico, aquele que pensa e atua com os e silenciado, entre a herana maldita do passado es- ps no cho do mundo em que vivem. cravista e o paraso racial do futuro socialista. Sem Notas interpretao e ao transformadora, para os negros ento restaria acreditar em um utpico socialismo aos 1. Para Moura (1994), o escravismo no Brasil se divide em duas fases: moldes daquele proposto por Simon, Fourier e Owen, a do escravismo pleno que vai de aproximadamente 1550 a 1850 e a do escravismo tardio, de 1851 a 1888. Na primeira fase, segundo que Marx e Engels tanto criticaram, justamente por ser o autor, estrutura-se, em toda a sua plenitude, a escravido (modo incapaz de apresentar uma prxis transformadora. de produo escravista), a qual ir configurar o comportamento das Essa desqualificao ou subsuno das lutas espe- classes fundamentais dessa sociedade: os senhores e os escravos. cficas em relao s lutas de classes tem tambm suas O escravismo tardio por sua vez, representa a fase da modernizao sem mudana, ou seja, fase em que o Brasil entra na nova ordem razes nas distores que o stalinismo empreendeu na mundial imperialista como uma nao dependente que mesclar, em literatura marxista, cuja influncia se expandiu pelos toda a fase do segundo imprio, relaes capitalistas com trabalho quatro cantos do mundo, inclusive entre as esquerdas escravo e em que as antigas classes senhoriais se transformaro em latifundirios e industriais capitalistas. brasileiras. Desta forma, se, de um lado, a sociedade acumula, assimila e 4. Consideraes finais dinamiza aquilo que o desenvolvimento industrial, cientifico e As lacunas existentes na produo marxista, no tecnolgico criou e aperfeioou, do outro lado, as relaes entre16 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

os homens, no processo de trabalho, continuaram atrasadas e correspondentes a um estgio anterior e inferior ao da estrutura que avanou. Todo o suporte fundamental da sociedade fica, desta forma, em desarmonia com o desenvolvimento da outra parte, que se modernizou. 2. Entre esses primeiros socialistas (KONDER, 2003. p. 28-29) destacam-se o negro (chamado por Konder de mulato) Antnio Pedro de Figueiro (1814-1859) e Jos Incio de Abreu e Lima (17941869), ambos influenciados pelo franceses Benoit-Jules e LouisLger Vauthier, que vieram discursar sobre as idias socialistas no Brasil. Antnio Figueiro, inclusive, chegou a ser apelidado de Cousin fusco que significava Cousin Pardo, pelo fato deste ter simpatizado com o livro do intelectual francs Victor Cousin. Jos Incio, que era filho do Padre Roma um revolucionrio que participou da Insurreio pernambucana, chegou a escrever um livro intitulado O socialismo. 3. Na sociedade de capitalismo dependente, que se estabeleceu no Brasil aps a abolio, necessitou-se de uma filosofia que desse cobertura ideolgica a uma situao de antagonismo permanente, mascarando-a como sendo uma situao no-competitiva (Moura, 1988, p.55). 4. As leis de Jim Crow foram leis estaduais e locais, decretadas nos estados sulistas e limtrofes, nos Estados Unidos da Amrica, em vigor entre 1876 e 1965, que afetaram afro-americanos, asiticos e outras raas. A poca de Jim Crow ou a era de Jim Crow se refere ao tempo em que esta prtica ocorria. As leis mais importantes exigiam que as escolas pblicas e a maioria dos locais pblicos (incluindo trens e nibus) tivessem instalaes separadas para brancos e negros. Estas Leis de Jim Crow eram distintas dos Black Codes (1800-1866), que restringiam as liberdades e direitos civis dos afro-americanos. A segregao escolar patrocinada pelo Estado foi declarada inconstitucional pela Suprema Corte em 1954 no caso Brown v. Board of Education. Todas as outras leis de Jim Crow foram revogadas pelo Civil Rights Act, de 1964 . 5. Contudo, cabe ressaltar que essa estratgia ideolgica no descarta ou ameniza, de forma alguma, o confronto racial e as manifestaes explcitas de separatismo racial no Brasil. Santos (2001) mostra que a populao negra era excluda de participar de associaes de cunho cultural e de lazer, como o Palestra Itlia, o Clube Paulistano, os clubes Homes, Tiet etc. Foram tambm impedidos de participar dos movimentos operrios, majoritariamente formados por imigrantes, em defesa da repblica ou, mesmo, do corpo de oficiais do movimento tenentista e dos partidos das oligarquias. 6. Sobre a crtica de Marx aos economistas burgueses, Grner (2007, p. 120) afirma que o que faz Marx comear a aceitar o texto da economia burguesa como verdade parcial e logo interrogar seus silncios ou as suas inconsistncias [...]. Construindo sobre esses vazios da economia clssica Marx produz sua prpria teoria, sua interpretao crtica do capitalismo, baseada no descobrimento de, entre outras coisas, a mais valia. Para o referido autor no existe interpretao da realidade histrico-concreta, mas as interpretaes das interpretaes da realidade. 7. Moura (1988, p. 247) levanta a hiptese [...] de possvel conexo de lutas operrias como as dos escravos [...].

RefeRNciasENGELS, Friedrich. Psfcio: IN: MARX, KARL. Contribuio crtica da economia poltica. Trad. Florestan Fernandes. 2. ed. So Paulo: Expresso Popular, 2008. FREIRE, Alipio. Prefcio. IN: MOURA, Clvis. Sociologia poltica da guerra camponesa de Canudos: da destruio do Belo Monte ao aparecimento do MST. So Paulo: Expresso popular, 2000, p. 12-13) FIABANI, Adelmir. Mato, palhoa e pilo: o quilombismo, da escravido s comunidades remanescentes. So Paulo: Expresso Popular, 2005. GORENDER, Jacob. Brasil em branco e preto: o passado escravista que no passou. So Paulo: Editora SENAC, 2000. GRNER, Eduardo. Leitura culpadas: marx(ismos) e a prxis do conhecimento. In: Teoria marxista hoje: problemas e perspectivas. BORON, Atlio; AMADEO, Javier; GONZLES, Sabrina. (Organizadores). 1. ed. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Cincias Sociales- CLACSO, So Paulo: Expresso Popular, 2007. KONDER, Leandro. Histria das idias socialistas no Brasil. So Paulo: Expresso Popular, 2003. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia Alem. (Teses sobre Feuerbach). 9. ed. So Paulo: Hucitec, 1984. MARX, KARL. Contribuio crtica da economia poltica. Trad. Florestan Ferenandes. 2. ed. So Paulo: Expresso Popular, 2008. MOURA, Clvis. Dialtica radical do Brasil negro. So Paulo: Editora Anita, 1994. _____. Sociologia do negro brasileiro. So Paulo: Ed. tica, 1988. _____. Escravismo, colonialismo, imperialismo e racismo. In: Centro de Estudos Afro- Orientais. Bahia: Afro- sia, n.141983. _____. Rebelies e senzalas. 4. ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988. NASCIMENTO, Abdias. O quilombismo. So Paulo: Vozes, 1980. SANTOS, Ivair Augusto Alves dos. O movimento negro e o estado (1983- 1987): o caso do Conselho de participao e desenvolvimento da comunidade negra no governo de So Paulo. 2002. 183 f. Dissertao (Mestrado em Cincias Polticas) Departamento de Cincia Poltica do Instituto de Filosofia e Cincias Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas- SP, 2001. SKIDMORE, Thomas E. Fato e mito: descobrindo um problema racial no Brasil, 1971. In: FIOLA, 1991. Cadernos de pesquisa. So Paulo, n. 79, p. 5-16, nov. 1991. VSQUEZ, Adolfo Sanches. tica e marxismo. In: Teoria marxista hoje: problemas e perspectivas. BORON, Atlio; AMADEO, Javier; GONZLES, Sabrina. (Organizadores). 1. ed. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Cincias Sociales- CLACSO, So Paulo: Expresso Popular, 2007. _____. Filosofia da Prxis. 1. ed: Buenos Aires. Consejo Latinoamericano de Cincias Sociales- CLACSO. Trad. Maria Encarnacin Moya. So Paulo: Expresso Popular, 2007.

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 17

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Aes Afirmativas em perspectiva marxistaRosenverck Estrela Santos Professor da uFmA e militante do GT negro Cosme/Conlutas-mA E-mail: [email protected]

Os socilogos preferem ser imparciais e dizem ser financeiro o nosso problema. Mas, ser branco e negro na periferia se parecem, entretanto, no so iguais(Racionais MCs/ msica Racistas Otrios).

Resumo: O texto busca discutir a questo das Aes Afirmativas, particularmente a poltica de cotas nas universidades, em perspectiva marxista. Tenta demonstrar, a partir do materialismo histrico dialtico, enfatizando as categorias totalidade, historicidade e contradio, o racismo no Brasil como construo estruturante das relaes sociais neste pas. Para desmistificar a falsa polarizao entre raa e classe, questiona: raa e classe se excluem no Brasil? O fenmeno do racismo e da explorao de classe so plos antagnicos no sistema capitalista?. Por fim, aponta a necessidade das Aes Afirmativas, como poltica transitria que no apenas desnuda o projeto educacional universalizante burgus, que exclui os condicionantes de classe e raa, como tambm oferece possibilidades para o enfraquecimento das estruturas pautadas nesses condicionantes que sustentam uma sociedade excludente, exploradora e discriminatria, no Brasil. Ao mesmo tempo aponta as Aes Afirmativas como uma conquista dos trabalhadores e da juventude afro-descendente, por melhores condies de vida e, por conseqncia, a perda de espao dos exploradores e opressores. No a chave mestra que vai solucionar o problema, mas um passo fundamental. a dialtica da luta social. Palavras-chave: Aes Afirmativas; Cotas; Educao; Racismo; Marxismo; Totalidade; Contradio; Historicidade; Lutas de Classes.18 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

necessariamente raa e classe se excluem no Brasil? O 1. Introduo tualmente tem-se discutido bastante sobre temas fenmeno do racismo e da explorao de classe so como diversidade tnica e pluralidade cultural. A plos antagnicos no sistema capitalista? chamada globalizao, os constantes fluxos migratrios, a intensidade cada vez maior dos contatos en- 2. Nem economicismo, nem culturalismo: a tre diversos povos, o aumento do desemprego e do perspectiva do debate O pensamento, na tomada de conscincia, conforracismo tornaram esses temas eixos centrais das polme nos diz Lefebvre (1979), atua, num primeiro moticas pblicas sociais de diversos pases. Convivendo contemporaneamente com dois fe- mento, em aspectos da realidade, pontos de vista uninmenos contraditrios, mas interligados - a globa- laterais. Mas, ao partirmos do materialismo dialtico, lizao (pessoas, capital, cultura) e os localismos deve-se perceber a interao das partes, no processo (por um lado com suas reinvidicaes do direito de compreenso do real. Nesse sentido, preciso capdiferena e por outro, com o aumento da xenofo- tar o movimento, as relaes e contradies entre as mesmas. A matria aparece inerte ao bia) - os governos nacionais tm enSer que senso comum, mas apenas aparncia, campado polticas pblicas, includo a necessariamente raa pois est em movimento, como a vida o campo educacional, centradas no ree classe se excluem no humana. Nesse movimento, interagem conhecimento da diversidade tnicoBrasil? O fenmeno do as contradies, na formao do todo. cultural, como resultado das presses racismo e da explorao Os opostos simplesmente no se negam, dos movimentos sociais. mas convivem em unidade contraditria No Brasil, as polticas de Aes de classe so plos como, por exemplo, a vida e a morte que Afirmativas obtiveram destaque, na antagnicos no sistema no se excluem, pelo contrrio, se co-rerea da educao, por meio das cotas capitalista? lacionam. e da lei 10.639, que obriga as escolas a Acreditamos que a Na condio de no parar, de no estancar ministrarem o ensino de Histria da dualidade posta na teimosamente numa das propriedades descofrica e bem como a dos descendentes atualidade em torno bertas, ele reencontra o contedo, o movide africanos no Brasil. Partindo do das Aes Afirmativas, mento, a unidade (completa, concreta) dos pressuposto que preciso respeitar e no Brasil, falsa, pois pontos de vista unilaterais assumidos pelo valorizar a diversidade, essas diretrizes preciso perceber entendimento. O pensamento supera e nega o institucionais tm o intuito de possias singularidades da que h de negativo, de destrutivo na anlise; e o bilitar, via educao, a solidariedade e faz, precisamente, ao coloc-lo em seu devido as condies para o desenvolvimento formao populacional lugar, em sua verdade relativa (LEFEBVRE, intelectual e scio-econmico dos grudo Brasil e das relaes 1979, p.181). pos tnicos discriminados. tnico-sociais presentes. Baseados nessa premissa, acreditamos No obstante, est estabelecida a polmica quanto validade e necessidade das Aes que a dualidade posta na atualidade em torno das Afirmativas, principalmente no que diz respeito s Aes Afirmativas, no Brasil, falsa, pois preciso cotas. As opinies, geralmente, esto polarizadas em perceber as singularidades da formao populacional torno de duas teses: 1) a que acredita que o problema do Brasil e das relaes tnico-sociais presentes. As exclusivamente social, necessitando apenas de uma pesquisas recentes sobre o recorte tnico-racial e a melhoria das condies sociais da populao negra e a anlise de Portela (1997), por exemplo, apontam que conseqente ampliao e melhoria do ensino bsico e os problemas da populao negra nas escolas no da escola pblica; 2) a que se concentra na importncia esto relacionados apenas baixa renda ou desesda questo racial, desconsiderando sensivelmente as truturao econmica familiar, evidente na maior questes materiais de classe, priorizando, nesse sen- parte da populao negra brasileira, mas existem contido, a implementao de polticas educacionais que dicionantes raciais que causam multirrepetncias, favoream o respeito diversidade. Mas, ser que violncia, auto-negao, evaso escolar, baixo rendi-

A

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 19

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

mento entre os alunos(as) negros(as). Ao mesmo tempo preciso perceber que firmar a tese no respeito diferena, sem levar em considerao os fatores histricos e materiais causadores da excluso de muitos e incluso de poucos, como assim procedem as vrias polticas empreendidas nos pases europeus e nos EUA, por exemplo, tratar o problema das desigualdades raciais de forma superficial. Concordamos que [...] o melhor mtodo ser comear pelo real e pelo concreto. [...] O concreto concreto por ser sntese de mltiplas determinaes, logo unidade na diversidade (MARX, 1983, p. 218). Alguns intelectuais do movimento negro, por exemplo, tem tratado esta questo sob o ponto de vista exclusivamente racial1. Transformam o racismo numa mera categoria explicativa de um fato existente, a histrica, deslocada do real, das vrias determinantes das relaes sociais no Brasil. No percebem,[...] que o mundo sensvel que o envolve no algo dado imediatamente por toda a eternidade, uma coisa sempre igual a si mesma, mas sim o produto da indstria e do estado da sociedade; isto, na verdade, no sentido de que um produto histrico, resultado da atividade e de toda uma srie de geraes, cada uma das quais se alando aos ombros da precedente, [...], modificando a ordem social de acordo com as necessidades alteradas (MARX; ENGELS, 1977).

tanto, fundamental a compreenso do processo de formao histrica do Brasil, centrada na escravido e no capitalismo dependente. Como princpio metodolgico de investigao dialtica da realidade, o conceito de totalidade adquire fundamental importncia. O conceito de totalidade concreta, na viso de Kosik (1976) possibilita a compreenso da interao e co-penetrao das partes. Elucida o todo e o entendimento deste perpassa o conhecimento da dinmica e especificidade das partes que com ele interagem. Nesse sentido, cada fenmeno pode ser compreendido como um momento do todo. O real no visto pela dialtica do concreto como uma soma das partes, fatos, representaes atomsticas, mas como um conjunto desses elementos, considerando sua criao, estrutura e gnese. O todo e a parte encontram-se em contnua interao e ordenao em sua concreticidade. Nessa direo, o homem como sujeito deve ser reconhecido para a compreenso da realidade social, tomada em sua totalidade.O conhecimento da realidade histrica um processo de apropriao terica isto , de crtica, interpretao e avaliao de fatos processo em que a atividade do homem, do cientista condio necessria ao conhecimento objetivo dos fatos (KOSIK, 1976, p.45).

Como nos alerta Pereira (1978), a histria eurocntrica quer nos fazer crer que o racismo um fenmeno atemporal que vitima os seres humanos de cor desde os primrdios da humanidade. Seria, ento, aceitar que, se sempre existiu, sempre existir. Senghor (apud Pereira, 1978, p.22) afirma que o racismo etnocentrismo carregado de diferenas raciais, reais ou imaginrias no tem mais de quatro sculos. Nasce com a expanso europia, portanto, coincidindo com o fortalecimento da sociedade capitalista. So faces de um mesmo desenvolvimento histrico. Diante do exposto, para uma anlise do papel da escola e da educao, no contexto das relaes tnicoraciais, so fundamentais duas questes, em interao recproca. A primeira, deve pautar-se numa anlise histrica da formao social brasileira e, a outra, na constituio, tambm histrica, do sistema de ensino e da funo da educao e da escola na sociedade capitalista, em nosso caso especfico, brasileira. Por20 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010

A educao brasileira, nesse sentido, no pode ser entendida sem levar em conta as relaes entre os diversos grupos tnicos que formaram sua sociedade, pois os [...] quatrocentos anos de escravismo foram definitivos na plasmao do ethos do nosso pas (MOURA, 1983, p. 124). O Brasil, aps a invaso europia, nasceu sob a gide da explorao e da dependncia. Inserido no quadro do antigo sistema colonial, fruto da expanso martima e do desenvolvimento capitalista naquele continente, a partir do sculo XV, a colnia brasileira, segundo Prado Jnior (1998, p.55), deveria ser [...] uma simples produtora e fornecedora de gneros teis ao comrcio metropolitano e que se pudessem vender com grandes lucros nos mercados europeus. O objetivo de Portugal, portanto, com a colonizao do Brasil era explorar o mximo possvel de suas riquezas, em proveito prprio (PRADO JNIOR, 1965). Nesse sentido, o advento da atividade aucareira veio substituir os tipos iniciais de explorao da colnia, baseados no sistema extrativista de produtos, comoUNIVERSIDADE E SOCIEDADE

o pau-brasil (FERLINI, 1994). Com a produo do especfico, mas marcou profundamente a dinmica acar inaugurava-se o sistema produtivo de explora- do desenvolvimento scio-econmico e cultural do o, sendo o latifndio, a monocultura e o trabalho Brasil ps-escravido. O fim desta e o incio do sisescravo, elementos essenciais para a diminuio dos tema capitalista de produo no representaram para gastos e aumento dos lucros (NOVAIS, 2001). A a populao negra brasileira uma melhoria das suas grande extenso territorial evitava gastos com fertili- condies de vida, que permaneceram extremamente zao e cuidados tcnicos. A monocultura impedia o precrias. Os ex-escravos e seus descendentes concrescimento da pequena propriedade, que no interes- tinuaram a ser tratados como inferiores e discrimisava metrpole; e, o trabalho escravo se impunha por nados pela cor da pele, relegados misria e falta de algumas razes. Dentre elas, a existncia de um trfico perspectivas. A sociedade de modelo de capitalismo depenultramarino de escravos era o fator que As riquezas que a dente que substituiu a de escravismo colonial mais o justificava, pois, conforme nos coroa portuguesa e conseguiu apresentar o problema do negro sem mostra Novais (2001), possibilitava os comerciantes de lig-lo, ou lig-lo insuficientemente, s suas enormes lucros metrpole e isso deterrazes histricas, pois [...] ao tempo em que minou a substituio do trabalho escravo escravos angariavam re-manipula os smbolos escravistas contra o indgena pelo trabalho escravo africano. com o trfico tornavam negro procura apagar a sua memria histrica As riquezas que a coroa portuguesa e esta atividade e, e tnica, a fim de que ele fique como homem os comerciantes de escravos angariavam por conseqncia, flutuante, a - histrico (MOURA, 1983, p.125). com o trfico tornavam esta atividade o trabalho escravo preciso destacar que a formao e, por conseqncia, o trabalho escravo africano indispensveis do Brasil, pautado no trabalho escravo africano indispensveis dinmica das dinmica das relaes e na explorao de suas riquezas, teve relaes entre metrpole e colnia. entre metrpole e como uma de suas resultantes o apaComo nos mostra Sousa Filho (2004, colnia. O negro passou recimento de prticas [...] racistas que p.136), o trfico negreiro e a escravido, a ser definido como no s produziram conseqncias no como tributrios do movimento de momento histrico em que foram geexpanso colonial europeu esto reinferior, brbaro, radas, mas tambm para os sculos que cheados de justificativas utilizadas para selvagem, assemelhado se sucederam (SOUSA FILHO, 2004, caracterizar o africano como escravo e a um animal, p.151). estabelecer como legtimo a caa husimples instrumento A explorao econmica, portanto, mana que produziu na frica durante de produo, lhe teve reflexos fundamentais na maneira vrios sculos. foi retirada sua de pensar da sociedade brasileira. Isso Os europeus, portanto, utilizaramverticalizao e no significa, tendo em vista o matese de variados argumentos (biolgicos, humanizao por meio rialismo dialtico, uma relao determireligiosos, econmicos etc.) para legida violncia fsica e nista entre explorao econmica e timar a explorao do africano em formas de pensamento. O princpio da terras brasileiras. Seguindo o mesmo psicolgica. causalidade, nos informa Kosik (1979), raciocnio, Carneiro (1997) e Moura (1983) ressaltaram que o negro passou a ser definido encarado de forma rgida, determinista, recai no como inferior, brbaro, selvagem, assemelhado a um mecanicismo, excluindo o acaso e, portanto, numa animal, simples instrumento de produo, lhe foi re- doutrina absoluta, que acaba sendo de natureza teotirada sua verticalizao e humanizao, por meio da lgica. O determinismo confunde duas coisas: a deviolncia fsica e psicolgica. Essas conceitualizaes terminao e o encadeamento mecnico. Todo ser e prticas eram o pretexto necessrio para a utilizao determinado, mas em seu movimento, em seu devir. O que no significa que nesse caminho no exista uma da fora de trabalho africana como escrava. A escravido no s atingiu a cultura, a psicologia, dinmica nova, o acaso, uma especificidade. A lei do a economia e a sociedade do seu contexto histrico devir existe, determinada, porm no determinista,UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 21

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

dados outros elementos que se somam ao movimento. Um pas desenvolvido, no entanto, no poderia ser Tudo tem um fim. Esse pressuposto do princpio marcado por uma populao de maioria negra e mesda finalidade, que, tomado pela metafsica, considera tia ou com conflitos raciais que prejudicassem o a natureza como tendo finalidades, metas. Porm, seu desenvolvimento. Nessa direo, duas ideologias em sentido dialtico leva-se em considerao a reci- surgem, inicialmente, para solucionar o problema: a procidade da ao. Portanto, o todo determina a parte ideologia do branqueamento e o mito da democracia e vice-versa. A causa tambm o fim, ou seja, o fim racial. tambm um comeo. Silva (1995, p. 25) refletindo acerca dessas formas Para compreenso de um determinado ser, coisa, de pensamento afirma: Como no possvel estabelecer relaes recprocas de fato, dado histrico etc., no podemos nos contentar direitos e respeito em um sistema baseado na explorao com o conhecimento imediato, a primeira impresso, do outro, desenvolveu-se toda uma ideologia justificadora a aparncia. Mas, temos que aprofundar o ato de coda opresso e inferiorizao, objetivando a nhecer e chegar at a essncia do ser. O Brasil, depois da destruio da identidade, da auto-estima e do No obstante, um ser determinado escravido, deveria reconhecimento dos valores e potencialidades aparece em seu movimento, em sua ser repensado e do oprimido. negao e transformao. O movimento reorganizado a A ideologia do branqueamento, do conhecimento, ao buscar essa transfim de inseri-lo no posta em prtica com o incentivo dado formao, esse momento inicial em quadro do capitalismo aos imigrantes europeus e a busca, a que o ser se nega, descobre a primeira internacional. Um partir deles, de tornar o Brasil um pas manifestao da essncia, que a apabranco nada mais do que uma ttica rncia. pas desenvolvido, no para desarticular ideologicamente e Assim, a aparncia, a manifestao, entanto, no poderia existencialmente o segmento negro a o fenmeno, so um reflexo da essncia, ser marcado por uma partir de sua auto-anlise (MOURA, da realidade concreta, com tudo o que populao de maioria 1983, p.126). implica a palavra reflexo: algo fugaz, negra e mestia ou com A diviso racial do trabalho durante transitrio, rapidamente negado e supeconflitos raciais que a escravido seria substituda pela rado pela essncia mais profunda prejudicassem o seu competio democrtica da sociedade (KOSIK, 1979, p.217). Refletir sobre o desenvolvimento. Nessa capitalista. Tal pensamento escamoteava que est aparente buscar a essncia, direo, duas ideologias a construo histrica do pas e virava as entender de maneira mais profunda o surgem, inicialmente, costas condio da populao negra, aparente manifestado. A essncia, em durante essa formao. Essa competio sua relao com as demais coisas, tornapara solucionar o democrtica, consubstanciada no mito se aparncia e demonstra apenas um dos problema: a ideologia do da democracia racial, desarticula seus aspectos. apenas uma abstrao, branqueamento e o mito a conscincia do negro brasileiro um aspecto menos importante da esda democracia racial. (MOURA, 1983, p.127), pois o mesmo sncia. Em relao aparncia, a essncia negao, contradio, diferena. Por outro lado, a se v como incapaz frente ao sucesso profissional e aparncia faz parte da essncia, pois esta se manifesta educacional do branco. Ao negro foram suprimidas as oportunidades de em relao s coisas, totalidade das aparncias. A essncia que se forma nessa manifestao, tambm se trabalho, que foram reservadas aos europeus, disto esgota e tem fim. Trata-se de uma oposio dialtica, resultando uma diviso de funes na sociedade brasileira, restando ao segmento negro posies de unidade concreta. Feita, essa ressalva, continuemos na configurao trabalho inferiores ou rejeitadas pelos brancos. Essa reconstituio histrica tornou-se necessria, histrica brasileira. Com efeito, o Brasil, depois da escravido, deveria ser repensado e reorganizado a fim pois assim poderemos perceber melhor de que forma de inseri-lo no quadro do capitalismo internacional. as instituies educacionais, polticas, culturais etc., re22 - DF, ano XX , n 46, junho de 2010UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

produziram e reproduzem os valores e padres de uma Essa violncia simblica afeta a existncia escolar das elite dominante. No caso da educao, que interessa ao crianas submetidas e tem reflexos na permanncia nosso estudo, Silva (1995, p.31), analisando 82 livros das mesmas na escola. de comunicao e expresso do ensino fundamental, Bem como o currculo, o livro didtico tambm aponta que raramente a criana negra retratada na tornou-se um importante instrumento de carter ideoescola, o seu nome quase nunca mencionado, lgico, servindo a interesses de grupos hege-mnicos chamada por apelidos ou de negrinho e se percebe, na sociedade. Tourinho Jnior (2002), comentando o claramente, uma falta de atributos humanos. livro didtico, nos informa que os discursos textual e Levando em considerao essa anlise, importante imagtico so utilizados, levando-se em considerao refletirmos sobre a funo social da escola como uma a simplificao conceitual implcita, para reificar importante instituio responsvel pela sociabilidade algumas noes essenciais para a padronizao de dos seres humanos. Nela ocorre a possibilidade da um determinado tipo de conhecimento necessrio construo de identidades, da formao dos valores para a manuteno da ordem social (TOURINHO ticos e morais. Entretanto, a escola, fruto do pensa- JNIOR, 2002, p. 91). mento liberal e do individualismo, decorrentes da Nesse sentido, o livro didtico no levado s esRevoluo Francesa de 1792, assume um carter uni- colas de forma descomprometida, como nos alerta versalizante e homogeneizador que exclui a referncia Silva (1995). Pelo contrrio, ele controlado pelo negra africana da formao da sociedade brasileira. A Estado a partir de muitos decretos e instituies garantia do acesso gratuito para todos os que queiram ligadas ao Ministrio da Educao. E apesar dos entrar na escola, no esconde, contraditoriamente, o avanos na anlise crtica dos livros didticos, ainseu papel de reproduo das idias e valores da classe da percebemos que existe uma ausncia grande dos dominante. referenciais tnicos africanos ou que estes so traConforme nos mostra Gramsci (1991), a apreenso tados de maneira depreciativa. O livro didtico codas vises de mundo da classe dominante pelos grupos loca de forma explcita a inteno de inferiorizar e excludos do aparato de poder se torna qualificada e desumanizar o negro, que descrito e ilustrado de eficiente com a interferncia da escola, instituio or- forma caricaturada, deformada, associado a seres desganizada e sistematizada internacionalmente para a trutivos e sujos (SILVA, 1995, p.51). formao humana. sobre esses alicerces que as instituies educaEssa reproduo pode ser melhor entendida se ob- cionais, polticas e culturais reproduzem valores e paservarmos dois elementos fundamentais na prtica dres discriminatrios de uma elite dominante. Como educativa: o currculo e o livro didtico. Quando o afirma Machado (1989, p.107) O projeto burgus negro tratado, os currculos se resumem a situ-lo de escola unificada pretende realizar a unificao no perodo da escravido, como subescolar pela supresso das barreiras importante refletirmos alterno ou inferior. O currculo oficial, econmicas, polticas, religiosas, raciais sobre a funo social portanto, no um elemento neutro, e sexuais existentes, ao acesso escola, da escola como uma mas ao contrrio constitudo por condicionando-os apenas a critrios disputas, relaes de poder e controle psicopedaggicos. importante instituio social sobre o conhecimento produzido. O Direito, a Justia e a Educao responsvel pela Para alm do currculo oficial, existe burguesas pretendem-se universais, sociabilidade dos ainda o currculo oculto que permeia as com direitos iguais, mas baseiam-se seres humanos. Nela relaes escolares no Brasil. Por meio na desigualdade ocultada. O que a ocorre a possibilidade do currculo oculto incluem-se valores proposta liberal universalizante faz da construo de que so explicitados nos gestos, nos transpor os princpios do Direito para identidades, da olhares, nas repreenses e nas atitudes o campo educacional. Nesse sentido, a formao dos valores de professores e alunos brancos no igualdade no direito liberal-burgus ticos e morais. dia-a-dia frente aos alunos negros(as). desigualdade de fato.UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

DF, ano XX, n 46, junho de 2010 - 23

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

Poltica de Cotas na universidade: Acesso, Permanncia e Democratizao

do como objetivos a destruio do Isso nos faz refletir sobre a relao O Direito, a Justia e capitalismo e a construo do comuentre as demandas da sociedade civil e a Educao burguesas nismo, Marx e Engels no esqueceram suas relaes com a sociedade poltica, pretendem-se universais, as mediaes importantes para intensiconsubstanciada no Estado. Muitos dos com direitos iguais, ficar a mudana. Os dois contrapunhamque proferem crticas s polticas de Aes mas baseiam-se na se aos que acreditavam em mudanas Afirmativas e se consideram marxistas, as desigualdade ocultada. substanciais no Estado burgus, mas, fazem por acreditarem que tais polticas O que a proposta liberal por outro lado, tambm eram contrrios no apenas excluem o fator classe, mas universalizante faz aos que pensavam que as mudanas s reforam a dominao do Estado burpoderiam iniciar-se aps a tomada de gus. Pensar dessa maneira ter uma transpor os princpios do poder pelo proletariado. Fizeram uma concepo funcional-estruturalista do Direito para crtica forte aos que simplesmente neEstado, segundo a qual o mesmo visto o campo educacional. gavam o Estado, sem perceber suas apenas como instrumento de dominao Nesse sentido, a contradies, o que gerava imobilismo do capital. Neste caso, as reivindicaes igualdade no direito poltico. Por outro lado, tambm, cridos movimentos sociais face ao Estado liberal-burgus ticavam os que superestimavam as conseriam reformistas e apenas reforariam o desigualdade de fato. quistas democrticas, gerando desartipoder estatal e, por conseguinte, o sistema culao das massas (MACHADO, 1989). e a classe hegemnica qual serve. Marx e Engels tinham a preocupao de unificar O que tais marxistas desconsideram que uma anlise marxista deve perceber Estado e capital como a luta poltica com a econmica, visando elevao [...] fenmenos situados na estrutura complexa do da conscincia dos trabalhadores e destruio do ser social [...] (FARIAS, 2000, p.14), que devem ser capitalismo. Elaboram, ento, uma concepo diaabordados segundo o mtodo dialtico e materialista. ltica da transformao. Nesta concepo, a relao O Estado capitalista deve ser situado no tempo e no entre teoria e prtica no se constitui mecanicamente. espao, numa totalidade complexa e contraditria, Assim como a prtica fundamento da teoria, a teoria rica em determinaes, onde exista uma relao con- possui condies de interferir no curso da prtica traditria entre as classes. No meramente um gestor que ainda no existe. O que demonstra que a relao entre teoria e prtica no pode se formar de modo dos interesses do capital, da bur-guesia. Segundo Lnin (1978, p.226), O Estado o pro- mecnico, unilateral como se toda a teoria fosse apenas duto e a manifestao do carter inconcilivel das um resultado da atividade prtica. Teoria e prtica so contradies de classe. O Estado surge precisamente abstraes da histria da vida humana. Dividir em onde, quando e na medida em que as contradies dois plos, onde apenas um dos lados contribui para de classe objetivamente no podem ser conciliadas. existncia do outro uma prova de mecanicismo. Por Representa, contudo, os interesses da classe dominante. isso, torna-se claro que teoria e prtica