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Resumo
Introdução:
A pancreatite aguda é um processo inflamatório agudo do pâncreas que envolve os
tecidos peri-pancreáticos e/ou sistemas de órgãos remotos, com incidência de 4.9-80/100.000
por ano e mortalidade de 5%. Classifica-se em ligeira e severa, de acordo com o Score de
Ranson na admissão. A etiologia deve ser sempre esclarecida, representando a litíase e o
álcool as duas principais causas. O diagnóstico baseia-se na dor abdominal, doseamento de
amilasémia/lipasémia ou resultado da TC, sendo o seu prognóstico avaliável pelos Critérios
de Severidade de Atlanta. O tratamento da pancreatite é sintomático, sem terapêutica
específica.
Objectivo:
Caracterizar uma série hospitalar de doentes admitidos por pancreatite aguda.
Metodologia:
Foram analisados 89 doentes admitidos por pancreatite aguda em 2006, quanto a
parâmetros de âmbito geral, clínico, laboratorial, imagiológico, prognóstico e terapêutico.
Resultados:
Dos 89 doentes, 44 pertenciam ao sexo feminino e 45 ao masculino, com idade média
de 61.88 anos. O tempo decorrido para a admissão foi de 44.68 horas. A pancreatite severa
correspondeu a 31% e a ligeira a 69%. O 1º episódio, verificado em 78% dos doentes,
associou-se a um valor mais elevado de PCR na admissão/72 horas, e o recorrente a 22%. As
etiologias idiopática, litiásica e alcoólica representaram 33.7%, 30.3% e 22.5%,
respectivamente. A etiologia relacionou-se com a idade, sexo do doente e com o tempo de
2
admissão. A Ecografia foi realizada em 92.1% dos doentes e a TC em 34.8%. O Score de
Ranson na admissão relacionou-se com a idade do doente, falência de órgão, 1º episódio, PCR
na admissão/72 horas, bilirrubinémia total na admissão e recurso a antibioterapia. Não se
verificou relação entre o Score de Ranson na admissão e o sexo do doente, o desenvolvimento
de complicações locais, sistémicas ou infecciosas. O Score de Ranson às 48 horas associou-se
ao desenvolvimento de complicações locais, sistémicas, infecciosas e falência órgão. O Grau
Balthazar não evidenciou relação com o desenvolvimento de complicações sistémicas ou
infecciosas.
Conclusão:
A idade é factor de risco no desenrolar da pancreatite aguda, ao contrário do sexo do
doente. A etiologia litiásica é mais frequente no sexo feminino e a alcoólica no masculino,
revelando a etiologia idiopática um excessivo predomínio. O Score de Ranson na admissão
prevê a falência de órgão e o Score de Ranson às 48 horas o desenrolar de complicações
locais, sistémicas e infecciosas. A Ecografia é o exame mais utilizado no diagnóstico de PA.
A um Grau Blathazar mais elevado não se associa um maior número de complicações
sistémicas ou infecciosas.
3
Abstract
Introduction:
Acute pancreatitis is an acute inflammatory process of the pancreas which involves the
peri-pancreatic tissues and/or remote organ systems, with an incidence of 4.9-80/100.000 per
year and mortality of 5%. It can be classified in mild and severe, according to the Ranson’s
Score at admission. The etiology should always be informed, representing the lithiasis and
alcohol the two main causes. The diagnosis is based on abdominal pain, determination of
serum amylase/lipase or results of CT, and the prognosis assessed by the Severity Criteria of
Atlanta. Treatment is symptomatic, without a specific therapy.
Objective:
Characterize a hospital group of patients admitted by acute pancreatitis.
Methodology:
We reviewed 89 patients admitted by acute pancreatitis in 2006 and analyzed them
according to parameters of general, clinical, laboratory, imaging, prognosis and therapy
ambit.
Results:
Of the 89 patients reviewed, 44 were females and 45 males, with a mean age of 61.88
years. The time for admission was 44.68 hours. Severe acute pancreatitis was 31% and mild
69%. The first episode was 78%, and we could associate it to a higher value of PCR at
admission/72 hours, and the recurrent was 22%. The idiopathic, lithiasic and alcoholic
etiologies accounted for 33.7%, 30.3% and 22.5% respectively. The etiology was related to
4
age, sex of the patient and the time for admission. The Ultrasonography was performed in
92.1% of patients and CT in 34.8%. The Ranson’s Score at admission was related to the
patient's age, organ failure, first episode, PCR at admission/72 hours, total bilirubinemia at
admission and use of antibiotics. There was no relationship between the Ranson´s Score at
admission and patient’s sex, the development of local, systemic or infectious complications.
The 48 hours Ranson’s score was associated with the development of local, systemic and
infectious complications and organ failure. Balthazar CT didn´t stress importance with the
development of systemic or infectious complications.
Conclusion:
Age is a risk factor in the course of the acute pancreatitis, unlike the patient’s gender.
The lithiasic etiology is more frequent in females and the alcoholic in men, revealing the
idiopathic etiology excessive dominance. Ranson’s Score at admission provides information
about the organ failure and the 48 hours Ranson’s Score about the development of local,
systemic and infectious complications. The Ultrasonography is the more used exam in the
diagnosis of acute pancreatitis. To a higher degree of Blathazar CT, we can not associate
whether systemic or infectious complications.
Palavras-chave
- Pancreatite aguda, pancreatite aguda recorrente, etiologia, PCR, prognóstico.
5
Introdução
A pancreatite aguda (PA) é um processo inflamatório agudo do pâncreas que envolve
frequentemente os tecidos peripancreáticos e/ou os sistemas de órgãos remotos1. É uma das
patologias pancreáticas mais comuns, com uma taxa de incidência que ronda 4.9-80/100.000
por ano, tendo-se verificado, nas duas últimas décadas, um progressivo incremento desta2. O
internamento hospitalar é obrigatório em todos os casos de PA, sobretudo se considerarmos o
1º episódio, onde há necessidade de determinar a causa específica3. Esta patologia está ainda
associada a uma elevada mortalidade, cerca de 5% 4, com dois principais picos de
mortalidade, um na primeira semana, devido à falência multi-orgânica, e o outro, durante as 3ª
e 4ª semanas, resultado de infecção pancreática, sépsis ou falência multi-orgânica5.
Classificamo-la como ligeira (85% dos casos), que se associa a falência de órgão
mínima e a uma recuperação quase na sua totalidade, e severa (15%), que está associada a
falência de órgão ou complicações locais, incluindo necrose, infecção ou formação de
pseudoquisto6.
A etiologia da PA é mencionável em ¾ dos doentes, representando as causas litiasica e
alcoólica cerca de 80% dos casos. Os restantes 20% estão associados a variantes anatómicas,
obstruções ampulares e ductais, alterações metabólicas, drogas, toxinas, traumatismos,
fenómenos de isquémia, hipotermia, infecções, auto-imunidade e genética7. É muito
importante identificar a etiologia, pois o conhecimento desta pode, muitas vezes, influenciar o
tratamento específico.8
É importante que distingamos uma outra entidade, a pancreatite aguda recorrente que
se define como a presença de, pelo menos, dois episódios documentados de pancreatite, num
doente sem evidência imagiológica de pancreatite crónica9. Esta verifica-se em 27% dos
6
doentes com etiologia alcoólica e 25% dos doentes com litiásica, sendo a mortalidade da PA
recorrente inferior à do 1º episódio5.
O diagnóstico final da patologia, que deverá realizar-se até às 48 horas após a
admissão10
, é feito com base em dois dos três seguintes critérios: dor abdominal característica,
amilasémia/lipasémia superior ou igual a três vezes o limite normal superior e/ou achados
característicos na TC (Tomografia computorizada)3.
Poderemos prever o curso clínico de uma PA se atendermos aos Critérios de
Severidade, segundo Atlanta, que consideram: sinais de prognóstico precoce (critérios de
Ranson ≥3 e Score APACHE II ≥8), falência de órgão (choque – PAsistólica ˂90 mmHg), PaO2
≤ 60 mmHg, creatinina> 2.0 mg/L após rehidratação e hemorragia GI ˃ 500 cc/24 h) e
complicações locais (necrose, abcesso e pseudoquisto).
A evolução de uma PA oscilará entre um curto período de hospitalização, com
terapêutica médica de suporte (fluidoterapia, analgesia e terapêutica nutricional)5, e uma
hospitalização mais prolongada, quando surge infecção e se tenta limitar a inflamação,
necrose ou uma reposta inflamatória sistémica. É, em ambos os casos, um tratamento
sintomático, sem qualquer terapêutica específica.11
O objectivo deste estudo será caracterizar uma série hospitalar de doentes, admitidos
por PA, submetendo a análise, entre outros, aos seguintes parâmetros: etiologia da doença,
classificação, clínica, diagnóstico, tratamento, evolução e prognóstico.
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Material e Métodos
Este trabalho visa o estudo retrospectivo de uma série hospitalar de doentes
internados, com o diagnóstico principal de Pancreatite Aguda, na Enfermaria e Unidade de
Cuidados Intensivos de Gastroenterologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC),
durante o ano de 2006.
A análise da série hospitalar incluiu parâmetros da seguinte tipologia:
- De âmbito geral: sexo, idade, Índice de massa corporal (IMC), local e número de dias
de internamento, antecedente relevante ou patologia associada, classificação, tipo de episódio,
etiologia;
- De âmbito clínico: tempo de evolução da doença até à admissão hospitalar,
sintomatologia, exame físico torácico e abdominal e sinais vitais na admissão do doente;
- De âmbito laboratorial: hematócrito, amilasémia, amilasúria, lipasémia,
bilirrubinémia total e trigliceridémia na admissão, data de normalização da amilasémia e
bilirrubinémia e PCR na admissão, às 24, 48 e 72 horas;
- De âmbito imagiológico: Radiografia abdominal sem preparação, Radiografia do
tórax e suas alterações, Ecografia (ECO) abdominal e suas alterações e TC, incluindo data de
realização e grau (Critérios de Balthazar) da mesma;
- Critérios de Ranson (admissão e às 48 horas), Critérios de Glasgow Modificados e
Critérios de Severidade de Atlanta;
- Complicações: locais, incluindo data de aparecimento e regressão de pseudoquisto,
sistémicas e infecciosas (data, agente e local da colheita);
- Tratamento Médico: reequilíbrio hidro-electrolítico (RHE), analgesia, inibidor da
bomba de protões (IBP), sonda naso-gástrica (SNG) e antibioterapia; Tratamento
8
endoscópico: Colangiopancreatografia retrógrada por via endoscópica (CPRE), data de
realização e suas complicações;
- Suporte Nutricional: entérico e parentérico;
- Cirurgia: data e motivo;
- Evolução: readmissão e óbito.
Os dados obtidos foram tratados através do recurso ao Statistical Package for the
Social Sciences (SPSS, versão 14.0). O estudo estatístico foi realizado com o recurso aos
testes estatísticos, para correlação de variáveis: t Student (contínua/discreta), Chi-square
(discreta/discreta) e Pearson (contínua/contínua).
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Resultados
Estudámos, tal como já referido anteriormente, 89 doentes, internados no Serviço de
Gastroenterologia dos HUC, durante o ano de 2006. Quarenta e quatro pertenciam ao sexo
feminino e os restantes 45 ao masculino, o que concretiza um ratio H/M de 1:1. A idade
média dos nossos doentes foi de 61.88.
Foi feita a pesquisa do IMC, bem como dos antecedentes pessoais relevantes ou de
patologia associada; porém, o registo destes não consta na maioria dos processos, daí não os
termos utilizado no nosso estudo. A média do número de dias de internamento foi de 12.20
dias. Oitenta por cento dos doentes foram internados na Enfermaria de Gastroenterologia, 9%
na UCIGE, enquanto os restantes 11% passaram por ambos os locais.
Na figura 1 e 2, respectivamente, retratamos a distribuição da nossa série
relativamente à classificação e tipo de episódio.
Figura 1 – Classificação Figura 2 – Tipo de Episódio
A figura 3 representa as várias etiologias que encontrámos para a PA. Optámos por
inserir, na categoria Outras, a hipertrigliceridémia (2.2%), a disfunção do esfíncter de Oddi
(1.1%), o Pâncreas divisum (1.1%) e a Pancreatite Crónica (1.1%), dado que apresentavam
percentagens bastante baixas.
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Figura 3 – Etiologia
O tempo decorrido entre a admissão hospitalar e o aparecimento dos primeiros
sintomas foi de 44.68 horas.
Fizemos o levantamento da clínica de acordo com sinais e sintomas, exame físico
torácico e abdominal. No que diz respeito aos sinais e sintomas e exame físico abdominal,
verificou-se uma constante, com todos os doentes a manifestarem dor abdominal
acompanhada de náuseas e vómitos, com dor à palpação superficial e/ou profunda nas regiões
do epigastro e hipocôndrio direito, sem registo de sinais de ventre agudo.
Relativamente ao exame físico do tórax, 11 (12.4%) dos nossos doentes apresentaram
diminuição dos sons pulmonares à auscultação ou outra alteração, não tendo os restantes
quaisquer alterações (87.6%).
O registo dos parâmetros vitais incluía: temperatura, frequência cardíaca, tensão
arterial e frequência respiratória. Não foi possível o registo do último parâmetro pela ausência
de dados. Uma temperatura axilar, superior a 37ºC, foi registada em 41.6% dos doentes na
admissão. Dezassete por cento foram admitidos em taquicardia (˃100 bpm), 36%
11
apresentavam hipertensão, 10.1% hipotensão e os restantes 53.9% encontravam-se
normotensos.
Na tabela I observamos os resultados laboratoriais que obtivemos, relativamente ao
hematócrito (Ht), amilasémia, amilasúria, bilirrubinémia total (BT) na admissão (adm). A
PCR foi registada na admissão, às 24, 48 e 72 horas. A amilasémia retomou o seu valor
normal, em média, 2.67 dias após o internamento, e a bilirrubinémia 4 dias. Procedemos ao
levantamento da lipasémia, porém como o número de doentes, a quem conseguimos apurar
este doseamento, foi quase insignificante, optámos por não referi-lo.
Tabela I – Dados Laboratoriais
Incluímos também, no nosso estudo, o levantamento do doseamento da
trigliceridémia; porém, este não constava na grande maioria dos processos; daí que não o
tenhamos incluído.
Cerca de 52.8% dos doentes realizaram Radiografia do Tórax dos quais 6.44
revelaram alterações, estando o derrame pleural em destaque com 5.91% dos doentes a
manifestarem-no. A Radiografia do abdómen foi concretizada em 38.2% dos doentes e a Eco
abdominal em 92.1%; destes, apenas 19.1 % revelaram alterações a nível pancreático que não
especificamos. A TC foi realizada em 34.8% dos doentes; a data média da sua realização foi
Ht
adm (%)
Amilasémia
adm (U/L)
Amilasúria
adm (U/L)
PCR adm
(mg/L)
PCR 24hrs
(mg/L)
PCR 48hrs
(mg/L)
PCR 72hrs
(mg/L)
BT adm
(mg/dl)
MÉDIA 39.7 1 277 9 502 7.1 15.9 12.2 14.6 2.9
MÍNIMO 19.2 38 532 0.01 0.8 0.1 0.6 0.2
MÁXIMO 53.3 9 960 45 525 47 45.4 43.4 39.8 37.2
12
de 5.55 dias de internamento. Da observação do relatório das TC, fizemos corresponder a
cada doente um Grau de Balthazar, que corresponde à distribuição indicada na figura 4.
Figura 4 – Grau de Balthazar
Obtivemos informação de 88 doentes, no que diz respeito ao Critérios de Ranson na
admissão; porém, relativamente aos mesmos às 48 horas, apenas nos foi possível recolher
informação de 35 doentes. Quanto aos Critérios de Glasgow Modificados, os dados dizem
respeito a 69 doentes. Nas figuras 5, 6 e 7 podemos observar os resultados.
Figura 5 – Score de Ranson na admissão Figura 6 – Score de Ranson às 48 horas
13
Figura 7 – Critérios de Glasgow modificados
Relativamente às complicações durante o internamento, registámos que 11.2% dos
doentes desenvolveu complicações locais, das quais a colecção fluida foi a mais frequente
(6.7%), enquanto 24.7% desenvolveu uma ou várias complicações sistémicas, sendo o
derrame pleural a predominante (6,7%).
Quanto aos Critérios de Severidade de Atlanta, verificámos que 31% dos doentes
tiveram um Score de Ranson superior ou igual a 3; 16.9% tiveram falência de órgão durante o
internamento, com 35.7% a registar falência respiratória, 28.6% renal e 35.7% falência de
mais do que um órgão. Quanto às complicações locais, apenas 1 doente teve necrose, 2
pseudoquisto e 1 ambas as complicações. Destes 3 doentes que desenvolveram pseudoquisto,
1 deles regrediu durante o internamento ao 39º dia, enquanto os outros dois permaneceram,
tendo sido os doentes seguidos em consulta externa a posteriori.
No que diz respeito às complicações infecciosas, 9% dos doentes desenvolveu este
tipo de complicações.
Relativamente ao tratamento médico de suporte, todos os doentes, durante o
internamento, receberam reequilíbrio hidro-electrolítico, analgesia em SOS, com recurso ao
14
Paracetamol ou Metamizol e Inibidores da Bomba de Protões (IBP). O recurso à Sonda
Nasogástrica ocorreu em 34.8% dos doentes, numa média de 1.97 dias.
Figura 8 – Antibioterapia Tabela II – Tipo de Antibiótico
A duração média do Antibiótico foi de cerca de 9.28 dias.
Dos 85 doentes de que obtivemos informação, apenas 2 necessitaram de alimentação
através de SNG. A reintrodução da dieta ocorreu, em média, 3.99 dias, após o internamento.
Por vezes, verificou-se uma rejeição alimentar, daí que se tenha tentado, por mais do que uma
vez, a reintrodução da dieta.
A CPRE, como forma de tratamento por via endoscópica foi realizada em 17.6% dos
doentes, em média, 6.67 dias pós-internamento; 26.7% sofreram complicações pós-CPRE.
A cirurgia foi necessária em 3 doentes, com o objectivo de corrigir complicações
locais que surgiram no internamento, passados, em média, 59 dias, após o internamento.
Três doentes (3,4%) acabaram por falecer, passado um período, em média de 17 horas,
após o internamento.
Imipenem+Cilastatina 54,5%
Ciprofloxacina 16,4%
Piperacilina+Tazobactan 12,7%
Mais do que um 12,2%
Outro 3,6%
15
Após a descrição estatística que realizámos, vamos agora proceder à apresentação da
correlação de variáveis através do recurso ao SPSS, já referido na metodologia. Relembro
que, da panóplia de correlações realizadas, salientamos, de seguida, aquelas que nos parecem
ter maior interesse.
Relativamente à variável sexo, verificámos que esta se relaciona com a idade,
apresentando os homens idade inferiores à das mulheres (p˂0.05) (58.6 vs 64.2). A etiologia
litiásica (p˂0.05) foi mais comum em mulheres (72%) e a alcoólica em homens (100%). bem
como o uso de SNG (p˂0.05) que predomina no sexo masculino, numa proporção de 1:2, não
tendo porém qualquer influência na classificação da PA.
Ao estudarmos a variável idade, concluímos que a idades mais avançadas está
associada uma maior severidade da doença (p˂0.01) e um predomínio da etiologia litiásica
(p˂0.01), já que a média de idades da etiologia alcoólica foi de 42.2 anos e a da litiásica de
63.2. Em idades mais jovens encontramos, mais frequentemente, a etiologia alcoólica
(p˂0.01) associada a menor severidade (p˂0.01). Não estabelecemos qualquer relação entre a
idade e a BT na admissão, as complicações locais, sistémicas e pós-CPRE, o uso de SNG ou o
óbito.
No que toca à Classificação da PA, que dividimos em ligeira e severa, constatámos
que valores mais elevados de temperatura, PCR na admissão (p˂0.05) e às 72 horas (p˂0.01)
e BT na admissão (p˂0.05) estão associados a uma classificação mais severa da PA. A
ocorrência de falência de órgão (p˂0.01), tal como o uso de antibiótico (p˂0.01) é mais
frequente na PA severa. Já o número de dias de internamento, o tempo decorrido para a
admissão, o Ht e a amilasémia na admissão, a PCR às 48 horas, as complicações locais e
infecciosas, o uso de SNG e o óbito não são influenciados pela classificação.
No primeiro episódio de PA encontrámos valores mais elevados de PCR na admissão
(p˂0.05), às 72 horas (p˂0.01) e um Score de Ranson na admissão (p˂0.05) e de Glasgow
16
(p˂0.05) mais elevados, se comparados com os valores de episódios recorrentes. Porém, o
valor da amilasémia na admissão, de PCR às 24 e 48 horas e de Score de Ranson às 48 horas,
tal como o desenvolvimento de complicações locais e sistémicas não variam, quer estejamos
perante o primeiro episódio de PA, ou não.
Na etiologia litiásica encontrámos valores médios de amilasémia (1651.4 vs 522.4) e
BT na admissão (5.27 vs 0.99) francamente superiores (p˂0.05), relativamente aos da
etiologia alcoólica. O tempo decorrido para a admissão foi, em média, menor no caso da
etiologia alcoólica se comparado com o da litiásica (28 hrs vs 137 hrs; p˂0.05). No nosso
estudo, não estabelecemos qualquer relação entre a etiologia e o número de dias de
internamento, a classificação, a PCR na admissão, o Score de Ranson na admissão, o
desenvolvimento de complicações locais ou sistémicas, o uso de SNG ou o óbito.
O valor de amilasémia que o doente apresenta na admissão não influencia o
desenvolvimento de complicações locais ou a colocação da SNG. Relaciona-se, porém, com a
realização de CPRE (p˂0.01), já que verificamos que os doentes submetidos a CPRE
apresentaram um valor médio de amilasémia, significativamente superior. Um valor mais
elevado de PCR na admissão deixa adivinhar complicações locais (p˂0.01) e um maior
número de dias com SNG (coeficiente de Pearson: 0.846; p˂0.05), não influenciando, porém,
o número de dias de internamento, as complicações infecciosas ou o óbito. A PCR às 24
horas, das variáveis atrás descritas, parece relacionar-se, apenas, com as complicações locais
(p˂0.05). Um valor mais elevado, quer de PCR às 48, quer às 72 horas, condiciona um maior
número de dias de internamento (coeficiente de Pearson: 0.640; p˂0.05 / coeficiente de
Pearson: 0.497; p˂0.05) e uma probabilidade mais alta de complicações locais (p˂0.01) e
infecciosas (p˂0.05). Nenhuma delas influencia o número de dias com SNG.
17
O grau de Balthazar de C, D ou E, obtido com base na TC, não se associou a mais
complicações sistémicas ou infecciosas do que o Grau A ou B, mas foram os doentes daquele
grupo que, mais frequentemente, foram submetidos a cirurgia (p˂0.01).
Um Score de Ranson na admissão mais elevado influencia a realização de TC (p˂0.01)
e o desenvolvimento de falência de órgão, não revelando qualquer valor preditivo quanto às
complicações locais, sistémicas, infecciosas ou necessidade de cirurgia. Já um Score de
Ranson às 48 horas mais elevado influi na realização de TC (p˂0.01), aumenta a
probabilidade de ocorrência de complicações locais (p˂0.01), sistémicas (p˂0.01), infecciosas
(p˂0.05) ou falência de órgão (p˂0.01), bem como a necessidade de cirurgia (p˂0.01). Nem o
Score de Ranson na admissão, nem às 48 horas se relaciona com a mortalidade.
O desenvolvimento de complicações locais influencia a manifestação de complicações
sistémicas (p˂0.01) e a necessidade de cirurgia (p˂0.01), não demonstrando qualquer relação
com a antibioterapia ou com a data de reintrodução da dieta. Esta última revelou no presente
estudo ser tão mais tardia, quanto mais tempo tiver passado até a normalização da amilasémia
(coeficiente de Pearson: 0.382; p˂0.05), mais elevado for o valor de PCR às 48 horas
(coeficiente de Pearson: 0.473; p˂0.05), o número de dias com SNG (coeficiente de Pearson:
0.509; p˂0.05) e com antibiótico (coeficiente de Pearson: 0.525; p˂0.05).
Por último, revelamos três resultados, que nos pareceram ter alguma pertinência. As
complicações sistémicas influenciam a duração da toma de antibiótico (coeficiente de
Pearson: 0.568; p˂0.05). A SNG, utilizada mais frequentemente no sexo masculino (p˂0.05),
numa proporção de 1:2, foi utilizada indiferenciadamente, quer estivéssemos perante uma PA
ligeira ou severa. Os doentes submetidos a um tempo superior de drenagem gástrica
permaneceram por um período mais prolongado no internamento (coeficiente de Pearson:
0.527; p˂0.05).
18
Discussão
Temos assistido, nos últimos anos, a um aumento de incidência da PA, devido a três
factores essências: aumento da esperança média de vida, doseamento de amilasémia/lipasémia
pedido mais regularmente e introdução da CPRE nas duas últimas décadas e meia.
No presente estudo, obtivemos um ratio H/M de 1:1, com uma média de idades
ligeiramente superior a 60 anos (61.88), valor que vai ao encontro de outros estudos já
realizados, que apontam a década de 60 como a predominante para o surgimento de PA, com
uma forte tendência de aumento, graças ao envelhecimento da população5,12
. Verifica-se uma
forte correlação entre género e idade, com a idade média dos homens a ser bastante inferior à
das mulheres. Relativamente à etiologia, podemos associar a predominância da etiologia
alcoólica ao género masculino e a da litiásica ao feminino14
. O uso de SNG foi preferencial
nos homens, não podendo, porém, generalizar-se e afirmar-se que este uso se relaciona com a
etiologia alcoólica, pois não ficou demonstrada essa associação. Não se estabeleceu qualquer
relação entre o género e a classificação da PA que, relembro, foi obtida considerando para PA
ligeira um Score de Ranson na admissão <3 e para severa um Score de Ranson na admissão
≥3, ou seja, a severidade da PA é independente do género do doente.
A idade do doente parece ter alguma associação com a etiologia, pois há, de facto, um
predomínio da etiologia alcoólica em idades mais jovens, enquanto a litiásica surge em idades
mais avançadas. Verifica-se, igualmente, que a idade se relaciona com a classificação da PA,
ou seja, a idade funciona como factor de risco para severidade na admissão4. Esta, porém, não
tem correlação directa com o desenvolvimento de complicações locais ou sistémicas, ou
mesmo com o óbito do doente.
Pensamos que a pesquisa e registo do IMC possa ser um dado bastante importante,
dado que ficou já provado que um IMC> 30 é, também, um factor de risco na PA, no sentido
19
do desenvolvimento de severidade4, complicações e aumento da mortalidade, não sendo,
porém, factor de risco da necrose pancreática12
.
Relativamente ao tipo de episódio de PA, 1º episódio ou recorrente, 22% dos doentes
estudados já tinham tido pelo menos um episódio de PA anteriormente, enquanto nos
restantes 78%, este seria o episódio inaugural. Estes valores contrastam com o intervalo de
4,2%-14,4%, sugeridos por DiMagno12
, para a frequência actual de PA recorrente; porém, não
descartamos a hipótese de podermos ter considerado alguns doentes com Pancreatite Crónica,
que não deveriam ter entrado na contagem. Tínhamos referido, na Introdução, que ao 1º
episódio estava inerente um risco bastante mais elevado7, facto que comprovámos, ao obter,
no nosso estudo, um valor de PCR na admissão e às 72 horas, bem como de Score de Ranson
na admissão, mais elevados.
Cerca de 1/3 dos doentes evoluiu para uma PA severa, valores um pouco mais
elevados do que os estudos, normalmente, sugerem: 15-20%4,7
. Constatámos que o valor de
PCR na admissão e às 72 horas e a BT na admissão são valores fortemente prognósticos de
severidade da PA, e que o desenvolvimento de falência de órgão é mais provável aquando da
presença de PA severa; a toma de antibiótico é também mais frequente entre portadores de PA
severa. A ideia de que a PCR na admissão possa funcionar como factor de prognóstico de
severidade vai contra, por exemplo, a ideia traduzida por Banks, quando afirma que, como o
pico de PCR é entre as 36-72 horas após admissão, o teste não será útil na admissão. Há
autores que defendem, inclusivamente, que a PCR continua a ser o melhor parâmetro
bioquímico, para o mais rápido e realístico diagnóstico de PA severa3,13,14
. Também a
Temperatura do doente na admissão parece relacionar-se com a severidade da doença.
Relativamente às complicações locais, sistémicas e infecciosas, estas já não se relacionam
com a severidade da doença. Também a mortalidade, parece não ser influenciada pela maior
ou menor gravidade da doença.
20
A litíase e o álcool foram responsáveis pelo surgimento de 53% das PA apresentadas,
percentagem que ficou aquém dos habituais 80%, que se registam na maioria da literatura
revista por nós. Não nos foi possível identificar a causa em 33,7% dos doentes, o que não é
plausível, dado que esta só não deverá ser identificada em 20% do total10
. Podemos ter
considerado, erradamente, algumas PA como idiopática, quando de facto não o seriam.
Apelamos, portanto ao esclarecimento da etiologia, sempre que possível. A etiologia da PA
faz oscilar o tempo decorrido para a admissão, bem como o valor de amilasémia e BT na
admissão. Se o doente apresenta PA de causa alcoólica, verificamos que a sua chegada ao
Hospital é mais rápida do que no caso da litiásica. Os valores de amilasémia e BT são
superiores, no caso de etiologia litiásica.
Verificámos que não é pedido o doseamento da lipasémia, apesar de sabermos que a
lipase nos fornece informação mais fiável, dado que é mais específica que a amilase4,10
. A
amilasémia retomou os valores normais passados cerca de 2.67 dias, valor que vai ao encontro
das normativas internacionais que preconizam que os níveis de enzimas, aumentam na fase
aguda da doença, com declínio passado 3/4 dias10
. O valor da amilasémia não influi na
colocação de SNG ou no desenvolvimento de complicações locais. Parece ter, porém, relação
com a necessidade de realizar CPRE, algo que é compreensível se pensarmos que valores
mais elevados estão em relação com etiologias litiásicas. O valor de PCR, a partir das 48
horas, parece fornecer uma previsão da evolução do doente, dado que foi possível estabelecer
associação entre o número de dias de internamento e o desenvolvimento de complicações
infecciosas. Já um doseamento mais precoce da PCR, parece ter importância na previsão do
aparecimento de complicações locais.
Relativamente aos exames complementares de diagnóstico, cerca de 92% dos doentes
realizaram Ecografia abdominal, enquanto 35% realizaram TC. De facto, a Ecografia tem-se
revelado mais sensível que a TC, na detecção de litíase biliar, bem como um instrumento
21
valioso na detecção de dilatação da árvore biliar, triagem para CPRE e monitorização de
colecções pancreáticas, para além de aliar um baixo custo, ser móvel e oferecer uma grande
disponibilidade15
. Já a TC, é o melhor exame para diagnosticar a severidade da PA e
identificar as suas complicações4. Não verificámos relação entre Grau de Balthazar e
desenvolvimento de complicações, ou seja, os Graus C, D e E não revelaram uma taxa de
complicações sistémicas ou infecciosas, superior aos A e B, ao contrário do que alguns
estudos revelam16
.
Constatámos que o Score de Ranson às 48 horas é um instrumento valioso na
perspectiva de evolução do doente, no que toca ao desenvolvimento de complicações locais
com necessidade de cirurgia, sistémicas, infecciosas e falência de órgão, ao contrário do Score
de Ranson na admissão, que não nos dá essa perspectiva futura. Salientamos, portanto, o facto
de só nos ter sido possível registar o Score de Ranson às 48 horas de 35 doentes, o que nos
parece insuficiente pelas razões já apresentadas.
O desenvolvimento de complicações infecciosas ocorreu em 9% dos doentes, e da
observação dos resultados, podemos afirmar que estas são dependentes das complicações
locais, bem como das sistémicas.
Tal como podemos observar dos resultados, os doentes foram sujeitos a um tratamento
base homogéneo que consistiu em reequilíbrio hidro-electrolítico e Inibidor da Bomba de
Protões (IBP). A reposição de fluidos é de extrema importância, como forma de colmatar a
hipovolémia, causada pelas perdas para o terceiro espaço, vómitos, diaforese e aumento de
permeabilidade vascular, graças aos mediadores inflamatórios libertados4. Não procedemos ao
registo da percentagem de doentes a quem foi administrado oxigénio, mas não podemos
deixar de sublinhar o facto de que é aconselhado que este seja administrado durante as
primeiras 24/48 horas, dado estar provado que uma correcta ressuscitação com fluidos e
fornecimento de O2 previnem o desenvolvimento de necrose pancreática e aumentam a
22
sobrevivência4. Quanto ao IBP, este foi utilizado em todos os doentes, sem excepção, prática
que não vai ao encontro das recomendações internacionais5.
O uso da SNG, em cerca de 35% dos doentes, relacionou-se com um maior tempo de
permanência hospitalar e uma reintrodução da dieta mais tardia, ideia sublinhada por alguns
estudos realizados que afirmam que a SNG não confere qualquer benefício na diminuição da
estimulação pancreática e distensão gástrica, e que o seu uso deve ser reservado para os
doentes com íleus severo, distensão abdominal severa ou emeses persistentes3.
Quanto ao recurso à Antibioterapia, a 62% dos doentes foi administrado antibiótico,
com preferência para o Imipenem e a Ciprofloxacina, cujo tempo médio de utilização foi de
9.28 dias. Sabemos que é aconselhável um tempo máximo de utilização de 14 dias10
, pois o
uso prolongado levará a um aumento de infecções fúngicas. Os carbapenemes,
fluorquinolonas e cefalosporinas são eleitos, pela sua excelente acção bactericida e penetração
pancreática17
. Verificámos que o uso de antibiótico não depende do desenvolvimento de
complicações locais, mas está dependente da maior, ou menor severidade da doença, ou seja,
o seu uso é mais frequente, em doentes com Ranson ≥3 na admissão. Uma toma de antibiótico
mais prolongada condiciona, também, uma reintrodução da dieta mais tardia. A toma de
antibiótico, por rotina, não está indicada na PA ligeira e na severa não há indicação
profiláctica. Se em PA severas, os doentes apresentarem sinais infecciosos, é apropriado o uso
de Antibiótico, enquanto a fonte infecciosa é estudada; se esta não for encontrada e as culturas
forem negativas, devemos pará-lo4.
Todos os doentes realizaram uma pausa alimentar logo após o internamento. A
reintrodução da dieta ocorreu, em média, após 3.99 dias, valor dentro do intervalo
recomendado por uns, 3-7 dias4, enquanto outros sugerem que esta deverá ser iniciada no
prazo máximo de 48 horas após a admissão, não devendo prolongar-se até aos 4/5 dias18
.
Constou de uma introdução progressiva de água chalada, líquida, pastosa e hipolipídica,
23
apesar de ainda não haver certezas se os doentes deverão receber inicialmente uma dieta
pobre em gorduras ou, primariamente, uma dieta com totalidade de líquidos4. Esta deverá
ocorrer quando a dor tiver terminado e já não forem necessários analgésicos, as náuseas e os
vómitos tiverem cessado, os ruídos hidro-aéreos estiverem presentes e a sensibilidade
abdominal tiver diminuído marcadamente4. A reintrodução da dieta é tão mais tardia, quanto
mais tempo a amilasémia demorar a normalizar e quanto maior for o valor de PCR às 48
horas, bem como o tempo de Antibioterapia e o número de dias com SNG.
Observámos que à etiologia litiásica se encontrava associado um doseamento de
amilasémia na admissão bastante mais elevado do que o encontrado na PA quer alcoólica,
quer de outra etiologia, facto que é descrito na literatura revista19,20
. Os 17,6% dos doentes
que realizaram CPRE, realizaram-na passados 6.67 dias do internamento e apresentavam
valores de amilasémia na admissão bastante superiores, se comparados com os dos doentes
que não a realizaram. A literatura publicada até 2005 refere que a CPRE deverá ser realizada
até às 72 horas após o internamento; porém, hoje sabe-se que a CPRE precoce não
demonstrou qualquer efeito benéfico na PA biliar ligeira/severa, e que apenas os doentes com
uma obstrução prolongada ou colangite aguda associada poderão beneficiar da CPRE
precoce21
.
A cirurgia foi preconizada em 3 doentes, passados, em média, cerca de 59 dias do
internamento, para correcção de complicações locais que surgiram, necrose. Todos
apresentaram um Grau de Balthazar elevado e um Score de Ranson elevado às 48 horas,
apesar de não o ser na admissão. A cirurgia precoce, necrosectomia, durante os primeiros 14
dias da doença não é recomendada, a não ser em casos específicos22
. Lembramos que a
necrose estéril per si não tem indicação cirúrgica23
, é melhor tratada, medicamente durante as
primeiras 2-3 semanas e, só após este período, o desbridamento deverá ser ponderado. Quanto
à necrose infectada, esta deverá ser abordada cirurgicamente, através do desbridamento4.
24
Registámos uma taxa de mortalidade de 3.37%, que está dentro dos valores
normalmente encontrados, 2-9%17
. Constatámos que a idade do doente e a etiologia da PA
não influem na mortalidade e, por outro lado, que o Score de Ranson na admissão e às 48
horas, bem como o valor de PCR, qualquer que seja a altura do doseamento, não são úteis
para prever a mortalidade do doente.
25
Conclusão
Com a caracterização desta série hospitalar concluímos que a idade do doente é factor
de risco, dado que se associa a uma maior severidade da doença, mas não influencia o
desenrolar de complicações locais ou sistémicas. O sexo do doente não é factor de risco, mas
verificamos que a etiologia litiásica predomina no sexo feminino e a alcoólica no masculino,
correspondendo esta a idades mais jovens e a um menor tempo decorrido até à admissão
hospitalar. As etiologias litiásica e alcoólica foram as mais prevalentes, verificando-se uma
elevada percentagem de PA idiopática.
O primeiro episódio de PA associa-se a um Score de Ranson e a um doseamento de
PCR na admissão mais elevados.
Se a um elevado Score de Ranson na admissão podemos associar um valor mais
elevado de PCR na admissão/72 horas, BT na admissão e uma previsão de falência de órgão,
a um Score de Ranson às 48 horas associamos uma maior probabilidade de desenvolver
complicações locais, sistémicas, infecciosas ou falência de órgão.
Dos exames complementares que se realizam, a Ecografia é o exame mais utilizado,
sendo a TC para adequada à averiguação de severidade ou complicações. O Grau de Balthazar
não se relaciona com o desenrolar de complicações sistémicas ou infecciosas.
A antibioterapia é preferencialmente utilizada na PA severa, porém as complicações
que se possam desenvolver, não são influenciadas pelo seu uso.
A dieta é tão mais tardiamente reintroduzida quanto mais elevado for o valor de PCR
às 48 horas, o tempo de normalização da amilasémia, de antibioterapia ou de drenagem
gástrica.
A idade do doente, a etiologia da PA, o Score de Ranson na admissão ou às 48 horas
não consegue predizer a mortalidade do doente.
26
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