resumo farmacologia

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ECM FARMACOLOGIA CLÍNICA Página 1 ECM FARMACOLOGIA CLÍNICA O PROCESSO DA PRESCRIÇÃO RACIONAL DE MEDICAMENTOS (os seis passos) Passo 1 - DEFINIR O PROBLEMA DO PACIENTE. Passo 2 - ESPECIFICAR O OBJETIVO TERAPÊUTICO. Definir qual será o objetivo terapêutico (vai tratar para quê?). Passo 3 - VERIFICAR SE O SEU TRATAMENTO É ADEQUADO PARA O PACIENTE EM QUESTÃO. Inventário das estratégias terapêuticas (não medicamentosas X medicamentosas); seleção de grupos de medicamentos mais utilizados no tratamento específico; conhecer os medicamentos mais escolhidos e efeitos colaterais mais freqüentes de cada medicamento. Os critérios devem ser EFICÁCIA, SEGURANÇA, CONVENIÊNCIA / APLICABILIDADE, CUSTO. Passo 4 - FAZER A PRESCRIÇÃO. Deve constar nome do medicamento escolhido (da sua escolha; dê preferência a um medicamento genérico); nome genérico; forma farmacêutica; via de administração; esquema de administração. A PRESCRIÇÃO DEVE SER CLARA, LEGÍVEL E INDICANDO COM PRECISÃO O QUE DEVE SER FORNECIDO AO PACIENTE. Passo 5 - FORNECER INFORMAÇÕES, INSTRUÇÕES E RECOMENDAÇÕES. Você deverá fornecer informações e recomendações ao paciente. Para melhorar a adesão ao tratamento você deverá: prescrever um tratamento adequado; criar uma boa relação médico-paciente; gastar um tempo da consulta para fornecer informações, instruções e recomendações. Os seis pontos abaixo deveriam orientar a informação a ser fornecida aos seus pacientes: Efeitos do medicamento. Por que o medicamento é necessário; quais sintomas desaparecerão; qual a importância de tomar o medicamento, o que acontece se não o tomar; Efeitos colaterais: Quais efeitos colaterais podem ocorrer; como reconhecê-los; por quanto tempo durarão; o que fazer se eles ocorrerem; qual a seriedade deles; Instruções: Quando e como tomar; como guardar; por quanto tempo o tratamento deve continuar; o que fazer em caso de problemas; Avisos: O que não fazer (dirigir, operar máquinas, se for o caso); dose máxima (intoxicação); Próxima consulta: Quando voltar (ou não); o que fazer com as sobras de medicamento; Tudo claro? Tudo foi compreendido; repetir informação; alguma outra pergunta. Passo 6 - MONITORIZAR (INTERROMPER?) O TRATAMENTO.

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Page 1: RESUMO FARMACOLOGIA

ECM FARMACOLOGIA CLÍNICA

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FARMACOLOGIA CLÍNICA

O PROCESSO DA PRESCRIÇÃO RACIONAL DE MEDICAMENTOS (os seis passos)

Passo 1 - DEFINIR O PROBLEMA DO PACIENTE. Passo 2 - ESPECIFICAR O OBJETIVO TERAPÊUTICO. Definir qual será o objetivo terapêutico (vai tratar para quê?). Passo 3 - VERIFICAR SE O SEU TRATAMENTO É ADEQUADO PARA O PACIENTE EM QUESTÃO. Inventário das estratégias terapêuticas (não medicamentosas X medicamentosas); seleção de grupos de medicamentos mais utilizados no tratamento específico; conhecer os medicamentos mais escolhidos e efeitos colaterais mais freqüentes de cada medicamento. Os critérios devem ser EFICÁCIA, SEGURANÇA, CONVENIÊNCIA / APLICABILIDADE, CUSTO. Passo 4 - FAZER A PRESCRIÇÃO. Deve constar nome do medicamento escolhido (da sua escolha; dê preferência a um medicamento genérico); nome genérico; forma farmacêutica; via de administração; esquema de administração. A PRESCRIÇÃO DEVE SER CLARA, LEGÍVEL E INDICANDO COM PRECISÃO O QUE DEVE SER FORNECIDO AO PACIENTE. Passo 5 - FORNECER INFORMAÇÕES, INSTRUÇÕES E RECOMENDAÇÕES. Você deverá fornecer informações e recomendações ao paciente. Para melhorar a adesão ao tratamento você deverá: prescrever um tratamento adequado; criar uma boa relação médico-paciente; gastar um tempo da consulta para fornecer informações, instruções e recomendações.

Os seis pontos abaixo deveriam orientar a informação a ser fornecida aos seus pacientes: Efeitos do medicamento. Por que o medicamento é necessário; quais sintomas desaparecerão; qual a

importância de tomar o medicamento, o que acontece se não o tomar; Efeitos colaterais: Quais efeitos colaterais podem ocorrer; como reconhecê-los; por quanto tempo durarão; o

que fazer se eles ocorrerem; qual a seriedade deles; Instruções: Quando e como tomar; como guardar; por quanto tempo o tratamento deve continuar; o que fazer

em caso de problemas; Avisos: O que não fazer (dirigir, operar máquinas, se for o caso); dose máxima (intoxicação); Próxima consulta: Quando voltar (ou não); o que fazer com as sobras de medicamento; Tudo claro? Tudo foi compreendido; repetir informação; alguma outra pergunta. Passo 6 - MONITORIZAR (INTERROMPER?) O TRATAMENTO.

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I. HIPOGLICEMIANTES ORAIS E TERAPIA DO DIABETES MELLITUS TIPO 2:

1. Fisiopatologia e Introdução ao Tratamento do

Diabetes Mellitus Tipo 2:

PASSO 1 - DEFINIR O PROBLEMA DO PACIENTE

O Diabetes Mellitus Tipo 2 (DM2) é caracterizado por um hipoinsulinismo relativo, ou seja, presença de níveis séricos de insulina significativos, algumas vezes elevados, porém menores que o necessário para um adequado controle glicêmico.

É uma doença geralmente diagnosticada em indivíduos com mais de 40 anos, sendo 80% deles obesos. A fisiopatologia da doença é marcada por graus variados e sobrepostos de dois fatores:

o Resistência periférica à insulina; o Disfunção das células β pancreáticas.

Os níveis de insulina podem estar até elevados,

no entanto, são menores que os esperados para o grau de resistência insulínica e hiperglicemia. Postula-se que a doença seja marcada por uma disfunção lenta e progressiva das células β. A fisiopatologia da doença resume-se pela figura 1, e progride segundo a figura 2.

Figura 1 – Fisiopatologia do DM2

Figura 2 – Progressão do DM2

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A progressão da doença (figura 2) é fisiopatologicamente marcada pela constante resistência insulínica com progressiva redução da secreção de insulina pelo pâncreas, sendo este fator o responsável pelo agravo do quadro (demonstrado pela diminuição da função da célula β).

A própria hiperglicemia acentuada pode inibir a capacidade de secretar insulina da célula β (efeito glicotóxico), assim como o aumento dos ácidos graxos livres (efeito lipotóxico). A reversão destes distúrbios, portanto, pode retardar a progressão da doença em sua fase inicial.

Definido o problema do paciente, podemos proceder ao passo 2.

PASSO 2 - ESPECIFICAR O OBJETIVO TERAPÊUTICO

Os objetivos terapêuticos são: o Tratar precocemente. Para isto o diagnóstico

também precisa ser precoce. o Estimular desde o início as mudanças de estilo

de vida para reduzir a resistência insulínica. o Poupar a função da célula β na fase de

intolerância à glicose. o Prevenir a aterogênese reduzindo a glicemia

pós-prandial. o Corrigir outras anormalidades metabólicas que

favorecem complicações.

Figura 3 – Alvo Terapêutico *HbA1c<7%

O paciente com DM2 apresenta um grupo de

fatores de risco para doença cardiovascular aterosclerótica, como: hipertensão arterial, dislipidemia e obesidade; o que configura a chamada síndrome metabólica. Portanto, a estratégia terapêutica destes pacientes visa justamente o

controle destes fatores de risco. Os alvos terapêuticos seguem na figura 3.

Estabelecidos nossos objetivos terapêuticos, seguiremos para o próximo passo.

PASSO 3 - VERIFICAR SE O SEU TRATAMENTO É ADEQUADO PARA O PACIENTE EM QUESTÃO

A adequação do tratamento passa,

primeiramente, pelo conhecimento do inventário de estratégias terapêuticas farmacológicas e não-farmacológicas, e, a seguir, a determinação de qual estratégia trará maior benefício para o paciente, estando ciente dos riscos de cada tipo de tratamento. Vale destacar que a estratégia terapêutica deve variar também segundo a gravidade do quadro e o estágio de progressão da doença, como apresentado na figura 4.

Figura 4 – Intensificação do tratamento em resposta à progressão natural do DM2

As mudanças no estilo de vida, como mostrado

na figura 4, devem ser incentivadas ao longo de todo o tratamento e podem ser a única estratégia terapêutica no início do quadro.

O uso de hipoglicemiantes orais estaria indicado, portanto, para pacientes que não atingiram seu alvo glicêmico com dieta e exercício físico regular após 2-3 meses. Alguns autores preconizam a prescrição dessas drogas já na primeira consulta em pacientes com glicemia de jejum superior a 160-180 mg/dl, e principalmente para indivíduos obesos.

Vale lembrar que o médico tem total autonomia na prescrição e, independente das diretrizes, pode tentar adequar seu tratamento ao perfil do paciente.

PASSOS 4 E 5 - FAZER A PRESCRIÇÃO E FORNECER INFORMAÇÕES, INSTRUÇÕES E RECOMENDAÇÕES

Para proceder à prescrição e ao aconselhamento

do paciente quanto ao tratamento a ser empregado, seus riscos e benefícios, mecanismos de ação, efeitos colaterais e orientações de administração, o médico deve conhecer as classes farmacológicas a serem

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empregadas, bem como suas indicações e características. Seguimos, portanto, com o estudo das classes farmacológicas de hipoglicemiantes orais.

Veja na figura 5 as principais classes farmacológicas de hipoglicemiantes orais e seus mecanismos de ação, a serem estudados detalhadamente a seguir.

Figura 5 – Hipoglicemiantes Orais e Mecanismos de Ação

2. Sulfoniluréias: Mecanismo de Ação: Aumentam a secreção basal de insulina pela célula β pancreática (Efeito Secretagogo). Atuam bloqueando os canais de K+ dependentes de ATP, o que promove o influxo de Ca+2 e, consequentemente, maior liberação de insulina. Análogos de 1ª geração:

o Tolbutamida; o Clorpropamida;

Análogos de 2ª geração: o Glibenclamida: Mais barata e mais usada,

porém com menor tempo de meia-vida e, portanto, menor comodidade posológica;

o Glimepirida: Ação prolongada, apresentando maior tempo de meia-vida e maior comodidade posológica, porém é mais cara;

o Gliclazida: Também apresenta ação prolongada; o Glipizida.

Farmacocinética:

o Absorção: Boa absorção por via oral; o Distribuição: 90% de ligação a proteínas

plasmáticas; o Metabolismo: Metabolismo hepático, com

meia-vida rápida (3-5 h), mas efeito prolongado;

o Excreção: Urinária. Efeitos adversos:

o HIPOGLICEMIA* (EFEITO DE CLASSE) (risco aumenta com omissão ou menor ingesta de alimentos, uso de álcool, desnutrição; transtornos hepáticos ou renais e por interação com outras drogas que também se ligam a proteínas plasmáticas);

o GANHO DE PESO (EFEITO DE CLASSE); o Hipersensibilidade: Alergia, fotossensibilidade e

rash cutâneo; o Manifestações gastrintestinais: gosto metálico,

náuseas, vômitos, diarréia; o Intolerância alcoólica (pp. clorpropamida):

podendo precipitar hipoglicemia; o Distúrbios hematológicos: depressão da medula

óssea com leucopenia, anemia e trombocitopenia, e anemia hemolítica;

o Distúrbios hepáticos: anormalidade da função hepática, hepatite alérgica e icterícia;

o Distúrbios hidroeletrolíticos: Hiponatremia e intoxicação hídrica (pp. clorpropamida).

*Obs.: É aconselhável o uso das sulfoniluréias próximo a uma grande refeição, para diminuir o risco de hipoglicemia.

Redução da

Hiperglicemia

secreção

de insulinaSulfoniluréias

Repaglinida

Nateglinida

absorção de

carboidratos

Acarbose

produção

de glicose

Metformina

resistência

periférica à

insulina

Tiazolidinedionas

Secreção

de glucagon

GLP1

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Contra-indicações:

o Gravidez e lactação; o Hipersensibilidade prévia a uma sulfonamida ou

a uma sulfoniluréia; o Insuficiência renal; o Insuficiência hepática; o Contra-indicações relativas: cirurgias e

intercorrências clínicas de maior gravidade (substituir por insulina).

Eficácia terapêutica:

o DM2 (em monoterapia ou em associação): São as drogas preferidas em pacientes DM2 não-obesos com glicemia de jejum entre 160-270 mg/dl (aqueles em que predomina a disfunção de célula β em relação à resistência periférica à insulina);

o São (junto com a metformina) os antidiabéticos orais de maior eficácia, reduzindo em 1-2% a HbA1c e em 60-70 mg/dl a glicemia de jejum (reduzem em até 20% o valor de base);

o Reduzem significativamente a incidência de complicações microvasculares (retinopatia, nefropatia e neuropatia), porém não reduzem significativamente a incidência de complicações macrovasculares (IAM, AVE).

3. Glinidas: Medicamentos:

o Repaglinida; o Nateglinida.

Mecanismo de Ação: Aumentam a secreção basal de insulina pela célula β pancreática (Efeito Secretagogo). Também diminuem a condutância ao K+, atuando em outro receptor diferente da sulfoniluréia, o que promove o influxo de Ca+2 e, consequentemente, maior liberação de insulina. Obs.: Apresentam ação mais rápida porém menos sustentada que as sulfoniluréias (ótimo efeito sobre a glicemia pós-prandial), devendo ser administradas 10 minutos antes das refeições. Devido a sua ação menos sustentada, apresenta menor risco de hipoglicemia. Farmacocinética:

o Absorção: Rápida pelo TGI; o Metabolismo: Hepático (maior parte) e renal.

Apresenta meia-vida curta (1 h). Efeitos adversos (semelhantes a sulfoniluréias):

o HIPOGLICEMIA (EFEITO DE CLASSE); o GANHO DE PESO (EFEITO DE CLASSE).

Eficácia terapêutica:

o São muito eficazes no controle da glicemia pós-prandial;

o Podem ser utilizadas como alternativa a sulfoniluréias em pacientes alérgicos e idosos. No entanto são de maior custo;

o Podem ser utilizados como profilaxia para DM2. 4. Biguanidas (Metformina):

A metformina é a única biguanida liberada para uso clínico. Seu mecanismo bioquímico de ação é ainda desconhecido. Mecanismo de Ação:

o Diminui a resistência periférica à insulina, aumentando a sensibilidade a esta nos tecidos muscular e adiposo;

o Diminui a gliconeogênese hepática; o Estimula a glicólise anaeróbica (↑lactato).

Obs.: Por não aumentar a secreção de insulina (não apresentar efeito secretagogo), a metformina não apresenta ação hipoglicemiante, na verdade apresenta ação anti-hiperglicemiante. Farmacocinética:

o Absorção: Boa absorção por via oral, sendo absorvida no intestino delgado;

o Distribuição: Não se liga a proteínas plasmáticas, apresentando tempo de meia-vida curto;

o Metabolismo: Não é metabolizada no organismo;

o Excreção: Urinária, sem alteração metabólica. Obs.: A metformina deve ser administrada 2-3x/dia, junto com as refeições. Efeitos adversos:

o ACIDOSE LÁCTICA: Raro (uso inadequado), mas com alta taxa de mortalidade (35-50%);

o Distúrbios gastrintestinais (5 a 20%): Náuseas, vômitos, diarréia, anorexia e gosto metálico. Podem ser minimizados com administração. durante ou após as refeições, ou reduzindo a dose, tornando a aumentá-la conforme a necessidade. Menor tolerância do que as sulfoniluréias;

o Prejuízo da absorção intestinal da vitamina B12 e folato: Pode ser revertida com a administração suplementos de cálcio;

o Anorexia e perda ponderal; o NÃO CAUSA HIPOGLICEMIA.

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Contra-indicações (risco de acidose láctica): o Insuficiência renal ou em uso de medicamentos

que possam causar IRA; o Doença cardíaca grave (ICC); o Doença respiratória crônica (DPOC) e estados de

hipóxia; o Insuficiência hepática e alcoolismo; o Gravidez.

Eficácia terapêutica:

o DM2 (em monoterapia ou em associação): São as drogas preferidas em pacientes DM2 obesos com glicemia de jejum entre 110-270 mg/dl (aqueles em que predomina a resistência periférica à insulina em relação à disfunção de célula β);

o São (junto com as sulfoniluréias) os antidiabéticos orais de maior eficácia, reduzindo em 1-2% a HbA1c e em 60-70 mg/dl a glicemia de jejum;

o Única medicação que reduz significativamente a incidência de complicações macrovasculares (IAM, AVE) em obesos;

o Efeito cardioprotetor: Redução dos triglicerídeos em 15-20% e em menor grau do LDL;

o Diminui peso corporal. 5. Glitazonas (Tiazolidinedionas): Medicamentos:

o Pioglitazona; o Rosiglitazona.

Mecanismo de Ação: As glitazonas são potentes sensibilizadores periféricos da insulina, exibindo ação análoga à metformina. Porém com ação muito maior na diminuição da resistência periferia à insulina do que na diminuição da produção hepática de glicose.

Atuam ativando o receptor PPAR-γ (receptor nuclear do fator ativado de proliferação de peroxissomos gama), o que aumenta a expressão de canais periféricos de glicose sensíveis à insulina (GLUT4).

No tecido adiposo, a ativação do PPAR-γ leva a um aumento da produção de adiponectina, o que diminui a resistência periférica à glicose e diminui a gliconeogênese hepática. A ativação do PPAR-γ ainda promove a transformação de pré-adipócitos em adipócitos menores (mais sensíveis à insulina), reduzindo os níveis de ácidos graxos livres e triglicerídeos (efeito cardioprotetor).

Assim como a metformina, sua ação é classificada como anti-hiperglicemiante, não havendo risco de hipoglicemia quando em monoterapia ou em associação com metformina.

Efeitos Adversos:

o Ganho de peso, cerca de 3,5 a 4kg nas doses máximas, mas atenuado em 50% com uso prévio de metformina;

o Anemia dilucional, com pequena redução da hemoglobina e hematócrito (especialmente nas 4 a 8 semanas iniciais de tratamento, permanecendo estável a seguir);

o Edema (retenção de sódio) mais comum na associação com Insulina;

o Hepatopatia (poucos relatos); o Risco de fraturas apendiculares espontâneas

(rosiglitazona); o Insuficiência Cardíaca Congestiva

(rosiglitazona), decorrente da retenção hídrica; o Cefaléia.

Contra-indicações:

o Gravidez e lactação; o Insuficiência renal; o Insuficiência hepática; o Insuficiência cardíaca.

6. Inibidores da α-glicosidase: Medicamentos:

o Acarbose; o Miglitol.

Mecanismo de Ação: Inibem as enzimas α-glicosidases intestinais, responsáveis pela quebra de polissacarídeos complexos (amido) em monossacarídeos (glicose), retardando, assim, a absorção intestinal de glicose, o que diminui a hiperglicemia pós-prandial. Apresenta também efeito cardioprotetor por diminuir a relação LDL/HDL. Como apenas retarda a absorção (não a diminui), não altera o peso corporal. Efeitos adversos:

o DISTÚRBIOS GASTRINTESTINAIS: meteorismo, flatulência, distensão abdominal; diarréia;

o Elevação das enzimas hepáticas em doses superiores a 600mg/dia;

o Anemia. Contra-indicações:

o Gravidez e lactação; o Pacientes com transtornos crônicos da digestão

e absorção intestinal, úlceras de intestino grosso e doença inflamatória intestinal.

Eficácia terapêutica:

o Muito eficaz no controle da glicemia pós-prandial em pacientes DM2.

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7. Incretinomiméticos:

As incretinas são hormônios produzidos no intestino após ingestão alimentar, cuja principal função é estimular produção de insulina pelas células β de forma glicose-dependente e suprimir a produção de glucagon pelas células α pancreáticas.

As incretinas fisiológicas envolvidas na homeostase da glicose são:

o GLP-1 (glucagon-like peptide 1): produzida pelo íleo;

o GIP (glucose-dependent insulinotropic peptide): produzida pelo jejuno.

As ações das incretinas nos diversos tecidos

periféricos estão relacionadas na figura 6. Os incretinomiméticos são fármacos que

simulam os efeitos das incretinas fisiológicas. Existem duas classes de incretinomiméticos:

o Análogos da GLP-1: São agonistas de GLP-1, ligando-se a seus receptores e determinando os

mesmos efeitos que a GLP-1 fisiológica. Ex.: Exenatida (injetável – SC);

o Inibidores da DPP-IV: Inibem a enzima responsável pela degradação das incretinas (GLP-1 e GIP), aumentando o tempo de ação desses hormônios. Ex.: Sitagliptina e Vildagliptina.

Farmacocinética:

o Absorção: Rápida e sem alterações com a alimentação e o jejum;

o Metabolismo: Metabolizados por hidrólise plasmática e seus metabólitos são inativos;

o Excreção: Renal (contra-indicados em insuficiência renal).

Efeitos adversos:

o Nasofaringite e outras infecções; o Cefaléia; o Hipoglicemia; o Náuseas (análogo GLP-1).

Figura 6 – Ação periférica das incretinas

8. Conclusão:

A escolha do fármaco deve levar em conta: o Os valores das glicemias de jejum e pós-prandial

e da HbA1c; o O peso e a idade do paciente; o A presença de complicações, outros transtornos

metabólicos e doenças associadas; o As possíveis interações com outros

medicamentos, reações adversas e as contra-indicações.

Segue, na figura 7, tabela comparativa dos antidiabéticos orais, e, na figura 8, uma correlação entre o estágio do DM2 e os medicamentos mais adequados para o tratamento.

PASSO 6 - MONITORIZAR (INTERROMPER?) O TRATAMENTO

O médico prescritor deve estar atento quanto ao sucesso do tratamento empregado em seus pacientes, e deve ter em mente alternativas terapêuticas em casos de insucesso ou insatisfação do paciente quanto aos efeitos adversos.

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Figura 7 – Tabela comparativa de antidiabéticos orais

Figura 8 – Algoritmo terapêutico para manejo do DM2 segundo a fase de evolução da doença

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II. INSULINOTERAPIA: 1. Princípios da Insulinoterapia:

A insulina é a base do tratamento do DM1, não havendo outro medicamento capaz de reduzir a glicemia nesses pacientes. É importante, também, no tratamento do DM2 avançado, em que a função da célula β já se encontra bastante diminuída. Neste último caso, a insulinoterapia pode ser acompanhada pelo uso de um sensibilizador de insulina, como a metformina ou as glitazonas.

Os princípios posológicos da insulinoterapia tentam seguir a secreção fisiológica diária de insulina, exibida na figura 9. Observe que os picos de insulina acompanham os picos de glicemia e correspondem justamente aos períodos pós-prandiais diários. Portanto, uma terapia que simule a secreção fisiológica de insulina deve apresentar picos pós-prandiais de insulinemia com manutenção de níveis basais entre os picos. Para obter tal efeito é utilizado uma combinação de insulinas exógenas, que diferem entre si apenas quanto a farmacocinética, vide figura 10.

Figura 9 – Secreção fisiológica de insulina

Preparação Início (h)

Pico (h) Duração (h)

Ação Rápida o Regular 0,5 – 1 2 - 4 6 - 8 o Lispro 0,25 1 3 - 4

o Aspart 0,25 1 3 - 4

o Glulisina 0,25 1 3 - 4

Ação Intermediária

o NPH 1-3 6-8 12-16

Ação Prolongada

o Detemir 1 3-9 6-23 o Glargina 1 Não 24

Figura 10 – Tipos de insulina exógena

Figura 11 – Perfis de ação das insulinas

Início da Insulinoterapia no DM1: O início da terapia em pacientes recém diagnosticados com DM1 deve ser feito com doses menores que as usuais (em torno de 0,2-0,4 U/Kg/dia), pois o pâncreas ainda mantém certa secreção de insulina, não sendo necessária a dose plena de insulina diária (0,5-1,0 U/kg/dia). Esse pequeno intervalo entre o diagnóstico e a adoção de doses plenas de insulinoterapia é conhecido como “período de lua-de-mel”, e corresponde ao período final de destruição das ilhotas pancreáticas no DM1. Início da Insulinoterapia no DM2: Como já discutido na história natural do DM2, a disfunção da célula β chega a tal ponto em que é necessária a introdução de insulina no tratamento. Quando se introduz insulina no tratamento do DM2 (em geral NPH ao deitar), é melhor conservar os hipoglicemiantes orais ao invés de simplesmente trocá-los por insulina. Pois, comparada à monoterapia com insulina, a associação com medicação oral:

o melhora o perfil glicêmico; o reduz a incidência de hipoglicemias e o ganho

de peso; o diminui as necessidades de insulina e serve de

transição para a insulinoterapia intensiva. 2. Insulinoterapia Intensiva:

A insulinoterapia intensiva corresponde à reposição plena da secreção endógena de insulina por reposição exógena. Como já discutido, o esquema de insulinoterapia intensiva deve simular o mais próximo possível a secreção basal de insulina, e, para tal, são utilizados vários tipos diferentes de insulina com diferentes farmacocinéticas, segundo esquemas específicos.

A simulação da secreção fisiológica de insulina é feita com uma insulina de ação prolongada ou intermediária, substituindo a liberação basal, e uma

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insulina de ação rápida ou ultrarápida, simulando o pico pós-prandial, vide figura 10. Apresentaremos, a seguir, os esquemas mais utilizados na prática clínica. Esquema em duas aplicações (figura 12): Neste esquema, recomenda-se fazer 2/3 da dose pela manhã (antes do café) e 1/3 da dose pela noite (antes do jantar). A proporção de insulina NPH (basal) /regular (rápida) deve ser de 70%/30% pela manhã e 50%/50% pela noite.

A adoção deste esquema apresenta algumas desvantagens:

o Período matinal antes da aplicação da insulina relativamente “desprotegido”: Este período corresponde ao pico circadiano de GH, um hormônio hiperglicemiante, portanto, a hipoinsulinemia neste período (visto que o nível de NPH já se encontra bastante diminuído) somada ao efeito do GH podem causar hiperglicemia matinal (“Fenômeno do alvorecer”);

o Altas doses de NPH antes do jantar podem causar hipoglicemia de madrugada e, consequentemente, hiperglicemia reativa pela manhã (pelo pico de hormônios contrarreguladores), sendo este fenômeno conhecido como “Efeito Somogyi”;

o A NPH administrada pela manhã pode ser insuficiente para controlar o pico glicêmico pós-almoço;

o O paciente não pode variar o tempo de suas refeições ou exercício físico.

Obs.: A insulina regular exige uma aplicação 30-45 minutos antes da refeição, a troca por insulina ultrarápida (Lispro ou Aspart) permite que aplicação na hora da refeição, o que é muito mais cômodo para o paciente. Esquema em três aplicações (figura 13): Este esquema visa diminuir os efeitos da hiperinsulinemia noturna e hiperglicemia matinal, referentes à administração de NPH antes do jantar. Para tal, administra-se a insulina regular normalmente (antes do jantar) e administra-se a NPH antes de dormir (seguindo a mesma proporção de 50%/50%). Esquema em quatro aplicações (figura 14): É o esquema mais fisiológico, mas de maior custo pois exige o uso de insulinas de ação prolongada (Glargina ou Detemir). É realizado com a administração matinal de insulina de ação prolongada e a administração de insula regular ou ultrarápida (Lispro ou Aspart) antes de cada refeição (café, almoço e jantar). Este esquema apresenta ainda a vantagem da possibilidade de ajuste

da dose de insulina rápida baseada na glicemia capilar 1 hora antes da refeição.

Figura 12 – Esquema em duas aplicações

Figura 13 – Esquema em três aplicações

Figura 14 – Esquema em quatro aplicações

Infusão Contínua: Segundo esse esquema, a insulina basal (60% da dose diária) é bombeada continuamente através de uma agulha instalada no subcutâneo. E os 40% restantes são administrados com insulina rápida antes de cada refeição.

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Efeitos Adversos:

o Hipoglicemia: por dosagem errada, ausência de alimentação ou exercício prolongado;

o Reações alérgicas; o Lipodistrofia; o Resistência à insulina.

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III. HIPOLIPEMIANTES: 1. Fisiopatologia e Introdução ao Tratamento das

Dislipidemias:

PASSO 1 - DEFINIR O PROBLEMA DO PACIENTE Dislipidemias: Designam-se dislipidemias as alterações metabólicas lipídicas decorrentes de distúrbios em qualquer fase do metabolismo lipídico, que ocasionem repercussão nos níveis séricos das lipoproteínas. Metabolismo das Lipoproteínas:

Seguem, na figura 15, as vias metabólicas exógena e endógena das lipoproteínas, e, na figura 16, o metabolismo do HDL e o transporte reverso de colesterol, dos tecidos para o fígado.

Figura 15 – Vias metabólicas exógena e endógena das lipoproteínas

Figura 16 – Metabolismo das HDL e transporte reverso de colesterol

Classificação Fenotípica das Dislipidemias:

o Hipercolesterolemia isolada: Aumento do colesterol total (CT) e/ou LDL-C;

o Hipertrigliceridemia isolada: Aumento dos triglicerídeos (TGL);

o Hiperlipidemia Mista: Aumento do CT e dos TGL;

o Diminuição isolada do HDL-colesterol (HDL-C) ou associada a aumento dos TGL ou LDL-C. Os valores de referência para diagnóstico em

adultos, segue na figura 17.

Figura 17 – Valores de referência para dislipidemia

Classificação Etiológica:

o Dislipidemias Primárias: Origem genética: hipercolesterolemia familiar (HF), dislipidemia familiar combinada (DFC), hipercolesterolemia poligênica, hipertrigliceridemia familiar e síndrome da quilomicronemia;

o Dislipidemias Secundárias: Causadas por outras doenças ou uso de medicamentos: - Hipotireoidismo; - Diabetes mellitus; - Síndrome nefrótica; - Insuficiência renal crônica; - Obesidade; - Alcoolismo; - Icterícia obstrutiva; - LES; - Medicamentos: anticoncepcionais; diuréticos; corticóides; anabolizantes; betabloqueadores.

Avaliação Laboratorial das Dislipidemias:

o O perfil lipídico é definido pelas determinações do CT, HDL-C, TGL e, quando possível, do LDL-C* após jejum de 12 horas.

* Fórmula de Friedewald: LDL-C = CT – HDL-C – TG/5 (válida se TG < 400 mg/dL).

PASSO 2 - ESPECIFICAR O OBJETIVO TERAPÊUTICO

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Para especificar o objetivo terapêutico do tratamento da dislipidemia, procede-se à estratificação do risco de aterosclerose.

O LDL-C é considerado fator causal e independente de aterosclerose e sobre o qual devemos agir para diminuir a morbimortalidade. O poder preditor de risco e a meta lipídica adotada para prevenção irão variar dependendo da associação com outros fatores de risco. Os principais fatores de risco para aterosclerose são:

o Fumo o Hipertensão arterial sistêmica (PA ≥ 140 /

90mmHg); o HDL-C* < 40mg/dL; o Diabetes mellitus (são considerados como

portadores de aterosclerose); o Idade (≥45 anos homens e ≥55 anos mulheres); o História familiar precoce de aterosclerose

(parentes de 1º grau <55 anos homens e <65 anos mulheres);

o *HDL-C >60mg/dL são considerados um fator protetor devendo ser descontado um fator de risco da soma.

AS RECOMENDAÇÕES PROPOSTAS SÃO AS SEGUINTES: Baixo risco:

o Risco absoluto de eventos menor que 10% em dez anos. Geralmente são indivíduos com 1 FR (excetuando DM) além do colesterol (LDL-C > 160 mg/dL).

o Prevenção Primária Meta: LDL-C < 130 mg/dL, entretanto, tolera-se LDL-C até 160 mg/dL;

o Perfil desejado: CT <200 mg/dL, HDL-C > 40 mg/dL e TG< 150 mg/dL.

Médio risco:

o Risco de evento maior que 10%, porém menor do que 20% em 10 anos. Geralmente indivíduos com 2 FR (excetuando DM), além do colesterol (LDL-C > 160 mg/dL).

o Prevenção Primária Meta: LDL-C < 130 mg/dL; o Perfil desejado: CT <200 mg/dL, HDL-C > 40

mg/dL e TG< 150 mg/dL. Alto risco:

o Risco de evento maior ou igual a 20% em 10 anos ou acima de 20% extrapolando-se a idade para os 60 anos de vida. Geralmente mais de 2 FR (excetuando DM) além do colesterol (LDL-C > 160 mg/dL), principalmente homens com idade acima dos 55 anos e outros FR associados. Nessa categoria também se incluem diabéticos e portadores de doença aterosclerótica coronária ou não.

o Prevenção Primária de Alto Risco ou Prevenção Secundária Meta: LDL < 100 mg/dL;

o Perfil desejado: CT <200 mg/dL, HDL-C > 40 mg/dL (HDL-C > 45 mg/dL em diabéticos) e TG < 150 mg/dL.

Note que, independente da estratificação do

risco, o perfil lipídico desejado é sempre o mesmo: CT <200 mg/dL, HDL-C > 40 mg/dL e TG< 150 mg/dL. O que varia na meta terapêutica é o controle no LDL-C, que deve ser tão menor quanto mais grave for o risco cardiovascular: Baixo risco (LDL-C < 130-160 mg/dL); médio risco (LDL-C < 130 mg/dL); alto risco (LDL-C < 100 mg/dL).

PASSO 3 - VERIFICAR SE O SEU TRATAMENTO É ADEQUADO PARA O PACIENTE EM QUESTÃO

A adequação do tratamento passa,

primeiramente, pelo conhecimento do inventário de estratégias terapêuticas farmacológicas e não-farmacológicas, e, a seguir, a determinação de qual estratégia trará maior benefício para o paciente, estando ciente dos riscos de cada tipo de tratamento.

A diretriz recomenda para todos os níveis de risco modificações no estilo de vida (MEV). A instituição do tratamento farmacológico dependerá do nível de risco, dos níveis do LDL-C, e da eficácia ou não das MEV em controlar o LDL-C. Mais uma vez, a diretriz determina que quanto maior o risco mais rigoroso deve ser o controle e mais “pesada” deve ser a terapêutica. Vide figura 18.

PASSOS 4 E 5 - FAZER A PRESCRIÇÃO E FORNECER INFORMAÇÕES, INSTRUÇÕES E RECOMENDAÇÕES

Para proceder à prescrição e ao aconselhamento

do paciente quanto ao tratamento a ser empregado, seus riscos e benefícios, mecanismos de ação, efeitos colaterais e orientações de administração, o médico deve conhecer as classes farmacológicas a serem empregadas, bem como suas indicações e características. Classes de agentes hipolipemiantes:

o AÇÃO NO METABOLISMO ENDÓGENO: - Estatinas;

o AÇÃO NO METABOLISMO EXÓGENO: - Resinas sequestrantes de ácidos biliares; - Inibidores de absorção intestinal: Orlistat; Fitosteróis e Fitostanóis; Ezetimiba;

o REDUTORES DE TRIGLICERÍDEOS: - Derivados do ácido fíbrico; - Niacina ou ácido nicotínico; - Ácidos graxos Ω-3.

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Seguimos, portanto, com o estudo dessas classes farmacológicas de hipolipemiantes.

Figura 18 – Meta terapêutica de prevenção de aterosclerose e estratégias de intervenção segundo risco

2. Estatinas: Mecanismo de Ação: Inibem a enzima HMG-Coa Redutase, inibindo, portanto, a síntese de colesterol endógeno. Por diminuírem a concentração de colesterol livre, aumentam a síntese de receptores de LDL no fígado, diminuindo o LDL circulante. Medicamentos:

o Sinvastatina: Não é alterada pela alimentação; o Atorvastatina: Apresenta maior tempo de meia-

vida; o Rosuvastatina: Maior eficácia na diminuição do

LDL (38-58%); o Lovastatina; o Pravastatina: Eliminação predominantemente

renal e menor ligação a proteínas plasmáticas. Farmacocinética:

o Absorção: Boa absorção por via oral. Alimentação pode variar a biodisponibilidade aumentando ou diminuindo a mesma dependendo da estatina em questão; apenas a sinvastatina não é alterada pela alimentação;

o Distribuição: Ampla ligação com proteínas plasmáticas, com exceção da pravastatina;

o Metabolismo: Em geral são metabolizadas pelo fígado, apresentando meia-vida de 1-3 horas, dependendo da estatina, exceto atorvastatina que apresenta meia-vida de 14 horas;

o Eliminação: Em geral, eliminação hepática maior que a renal, exceto para a pravastatina.

Obs.: O uso das estatinas deve ser contínuo e preferencialmente à noite, devido à maior síntese de colesterol neste período. Cuidados no tratamento com estatinas (PASSO 6 – MONITORIZAR TRATAMENTO):

o ATENÇÂO PARA DORES MUSCULARES: As estatinas devem ser suspensas em todos os pacientes que tiverem dor muscular de causa desconhecida (principalmente em panturrilhas), observa-se aumento progressivo da CK nesses casos; - Risco de rabdomiólise em interações medicamentosas: Estatina + Genfibrozila / Sinvastatina + Amiodarona.

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o ATENÇÂO PARA FUNÇÃO HEPÁTICA: As estatinas devem ser suspensas em pacientes com alteração de TGO/TGP maior que 3x o normal, ou manifestações como: icterícia e hepatomegalia.

Eficácia terapêutica:

o As estatinas são a principal estratégia farmacológica de diminuição do LDL-C. Sendo que seu efeito varia quanto o tipo de estatina e dose empregada (vide figura 19);

o Duplicar a dose de estatina diminui em aproximadamente 6% o LDL-C;

o Em pacientes em que se necessita redução agressiva do LDL-C, pode-se associar o uso de estatinas com outros medicamentos hipolipemiantes, como: ezetimiba, resinas, ácido nicotínico e fibratos; havendo potencialização de efeitos sobre o LDL-C.

Figura 19 – Efeito das estatinas sobre o LDL-C

3. Fármacos com Ação no Metabolismo Exógeno:

Os fármacos com ação no metabolismo exógeno dos lipídeos atuam na luz intestinal, inibindo a absorção de lipídeos (↓absorção de colesterol exógeno) ou inibindo a reabsorção de ácidos biliares (↑eliminação de colesterol endógeno). Seus efeitos adversos, em geral, estão ligados a manifestações gastrintestinais e hipovitaminose ADEK (vitaminas que dependem da absorção de lipídeos para serem absorvidas). Resinas sequestrantes de ácidos biliares (Colestiramina):

o Mecanismo de Ação: Atuam no intestino, retendo os sais biliares e promovendo sua eliminação nas fezes, logo, aumentam a eliminação fecal de colesterol, e, indiretamente, aumentam a remoção de LDL circulante pelo fígado;

o Vantagens: Segurança hepática e muscular, com possibilidade de uso em crianças e gestantes;

o Desvantagens (Efeitos adversos): Manifestações gastrintestinais (constipação, plenitude gástrica,

náuseas e meteorismo, agrava hemorróidas); hipovitaminose ADEK e deficiência na absorção de folato; diminui a absorção de outras drogas.

Orlistat:

o Mecanismo de ação: Inibe as lipases no intestino, especialmente a lipase pancreática, diminuindo, assim, a absorção intestinal de gorduras;

o Desvantagem: Pode causar hipovitaminose ADEK.

Fitosteróis e Fitostanóis:

o Mecanismo de ação: Inibem competitivamente a absorção de colesterol exógeno pelo intestino, reduzindo os níveis circulantes de colesterol;

o Desvantagem: Pode causar hipovitaminose ADEK.

Ezetimiba:

o Mecanismo de ação: Inibidor de absorção do colesterol que atua na borda em escova das células intestinais inibindo a ação da proteína transportadora do colesterol;

o Eficácia terapêutica: Usada isoladamente, reduz cerca de 20 % o LDL-C; aumenta em 20% a redução do LDL-C quando em associação com estatinas;

o Vantagens: NÃO APRESENTA RISCO DE HIPOVITAMINOSE ADEK; sem ações sistêmicas importantes.

4. Fármacos Redutores de Triglicerídeos: Ácidos graxos Ω-3: Derivados do óleo de peixes de águas frias e profundas;

o Mecanismo de ação: Reduzem a síntese hepática dos triglicerídeos (↓TGL e ↑HDL). Podem, entretanto, aumentar o LDL;

o Em portadores de doença arterial coronária, a suplementação de 1g /dia, em cápsulas, diminui em 10% os eventos cardiovasculares (morte súbita, IAM, AVC);

o Conclusão: São terapias adjuvantes na hipertrigliceridemia ou em substituição a fibratos, niacina ou estatinas em pacientes intolerantes.

Ácido Nicotínico (Niacina):

o Mecanismo de ação: O ácido nicotínico reduz a ação da lipase tecidual nos adipócitos, levando a menor liberação de ácidos graxos livres para a corrente sangüínea, consequentemente, reduz-se a síntese de TG pelos hepatócitos, diminuindo LDL e aumentando HDL;

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o Eficácia terapêutica: Reduz o LDL-C em 5% a 25%, aumenta o HDL-C em 15 a 35% e diminui os triglicerídeos em 20 a 50%;

o Efeitos colaterais: prurido; rubor; hiperglicemia; disfunção hepática; hiperuricemia; manifestações gastrintestinais; miopatias.

Fibratos (derivados do ácido fíbrico):

o Mecanismo de ação: Estimula os receptores nucleares denominados “receptores alfa ativados de proliferação dos peroxissomos” (PPAR-α). Esse estímulo leva a um aumento da produção e ação da lipase lipoprotéica (LPL), responsável pela hidrólise intravascular dos TG, e redução da Apo CIII, responsável pela inibição da LPL. O estímulo do PPAR- α pelos fibratos também leva a maior síntese da Apo AI, e conseqüentemente, de HDL. O menor influxo de ácidos graxos livres para o fígado acaba por diminuir a síntese de VLDL;

o Farmacocinética: - Absorção: Boa absorção pelo TGI; - Distribuição: Alto grau de ligação à albumina; - Metabolismo: Hepático, via citocromo P450, interagindo com outras drogas que utilizam essa mesma via metabólica; - Excreção: Renal, após conjugação hepática com glicuronato;

o Efeitos adversos (incomuns): distúrbios gastrintestinais; mialgia; astenia; litíase biliar (mais comum com clofibrato); Diminuição de libido; erupção cutânea e prurido; cefaléia; perturbação do sono; raramente, ↑de TGO/TGP e/ou CPK (reversível); teratogenicidade (proscrito em gestantes);

o Interações medicamentosas: CUIDADO! Genfibrozila + estatinas; ajuste de dose em pacientes em uso de anticoagulante oral;

o Eficácia terapêutica: Reduzem os níveis de triglicerídeos de 30 a 60%. No entanto, a redução será mais pronunciada quanto maior o valor basal da trigliceridemia. Aumentam o HDL-C de 7 a 11%. Sua ação sobre o LDL-C é variável, podendo diminuí-lo, não modificá-lo ou até aumentá-lo. Vide figura 20.

Figura 20 - Efeito dos fibratos sobre o HDL e os TGL

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IV. ANTIINFLAMATÓRIOS NÃO-ESTERÓIDES (AINE):

Os AINE são antiinflamatórios de amplo uso na

prática clínica no tratamento de queixas músculo-esqueléticas e articulares, e comumente tomados sem prescrição para dores de menor importância. No estudo dos AINE, primeiramente discutiremos seu mecanismo de ação, propriedades terapêuticas e efeitos adversos, e, a seguir, especificaremos os principais tipos de AINE utilizados na prática clínica. 1. Mecanismo de Ação e Propriedades Terapêuticas

dos AINE: Mecanismo de ação: Inibem a enzima araquidonato ciclooxigenase (COX). A COX é uma enzima bifuncional que exibe uma ação principal de ciclooxigenase, produzindo prostaglandinas (e tromboxanos) a partir do ácido araquidônico, e uma ação secundária de peroxidase, na conversão de prostaglandinas (PGG2 em PGH2).

O mecanismo molecular de inibição ainda está sendo elucidado, mas, com exceção do AAS que é inibidor irreversível da enzima, os demais AINE não inibem irreversivelmente a enzima. Vide figura 21.

Figura 21 – Mecanismo de ação dos AINE

Ações farmacológicas:

Os AINE, em geral, apresentam três ações terapêuticas diferentes, todas determinadas, direta ou indiretamente, pela inibição de produção de prostaglandinas:

o Efeito antipirético: inibe a elevação da temperatura;

o Efeito analgésico: reduz certos tipos de dor; o Efeito antiinflamatório: modula a resposta

inflamatória.

Existem dois tipos de COX: COX-1, que é uma enzima constitutiva presente na maioria dos tecidos; e COX-2, cuja síntese é induzida por células inflamatórias ativadas. Portanto, a ação farmacológica antiinflamatória dos AINE é proporcionada pela inibição de COX-2, enquanto seus efeitos adversos são, principalmente, decorrentes da inibição de COX-1. Logo, fármacos mais seletivos para COX-2 costumam apresentar menores efeitos colaterais que os fármacos não-seletivos ou seletivos para COX-1. Efeito antipirético:

O efeito antipirético dos AINE está relacionado à inibição da COX hipotalâmica produtora de PGE2 em resposta a pirógenos (IL-1 e TNF-α). Portanto, não diminui a temperatura em pacientes com temperatura normal, apenas previne o aumento de temperatura ou reverte este aumento provocado pela produção de PGE2 no termostato hipotalâmico. Efeito analgésico:

São úteis no alívio da dor associada à inflamação ou à lesão tecidual, visto que diminuem a produção de prostaglandinas e mediadores inflamatórios que sensibilizam os nociceptores. São, portanto, eficazes em artrites, bursites, dismenorréia, miosites, vasculites e dor de dente; no entanto, não alteram a progressão da lesão patológica.

Em combinação com opióides, os AINE podem ser úteis no manejo dar dor no pós-operatório, reduzindo a necessidade de opióides.

O alívio da cefaléia parece estar relacionado com a abolição do efeito vasodilatador proporcionado pelas prostaglandinas sobre a vasculatura cerebral. Efeito antiinflamatório:

Os AINE diminuem os componentes da resposta inflamatória e imune dependentes da ação da COX-2, ou seja, diminuem: vasodilatação; edema e dor. No entanto, não alteram o aporte de células inflamatórias para o sítio de inflamação e não modificam a história natural da lesão.

“SÃO MEDICAMENTOS SINTOMÁTICOS, INESPECÍFICOS, NÃO INTERFERINDO NA

HISTÓRIA NATURAL DAS DOENÇAS INFLAMATÓRIAS.”

(Farmacologia Clínica. Fuchs e col. 2004) 2. Efeitos Adversos do uso de AINE:

Como já discutido anteriormente, o uso dos AINE, principalmente em altas doses e continuamente, promove o aparecimento de efeitos indesejáveis, principalmente relacionados à inibição da enzima

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constitutiva COX-1. Os efeitos adversos do uso de AINE podem ser classificados em:

o Distúrbios gastrintestinais; o Lesões cutâneas; o Distúrbios renais; o Outros.

Distúrbios gastrintestinais:

Os distúrbios gastrintestinais são os efeitos indesejáveis mais comuns da terapia com AINE. São causados pela inibição da enzima constitutiva COX-1, que, no estômago, promove inibição da secreção ácida, ação protetora sobre a mucosa e modula o fluxo sanguíneo local. As manifetações mais comuns são: dispepsia; diarréia ou constipação; náuseas e vômitos. O uso crônico ainda pode levar à lesão gástrica com hemorragias e perfuração. Lesões cutâneas:

As lesões cutâneas correspondem ao segundo efeito indesejável mais comum. São caracterizadas por: erupções leves; urticária; reações de fotossensibilidade.

AINE mais associados: ácido mefenâmico; sulindaco. Distúrbios renais:

Em indivíduos sem doença renal, a administração de AINE pouco ameaça a função renal.

No entanto, pacientes suscetíveis (idosos e diabéticos) podem apresentar insuficiência renal aguda, decorrente da inibição de PGE2 e PGI2 envolvidos na manutenção da dinâmica sanguínea renal.

O uso crônico de AINE, principalmente o paracetamol, está associado a nefrite crônica e necrose papilar renal, configurando o quadro de nefropatia por analgésicos. Outros efeitos indesejáveis:

o Distúrbios hepáticos; o Depressão de medula óssea (principalmente

dipirona); o Equilíbrio hidroeletrolítico: Retenção de sódio e

água, reduzindo ação de antihipertensivos; hipercalemia;

o Broncoespasmo em asmáticos (sensíveis ao AAS).

3. Propriedades dos principais AINE:

Existe pouca diferença na eficácia dos AINE na população geral, de maneira que a principal diferença entre eles é a presença de efeitos indesejáveis. Para minimizar os efeitos indesejáveis do uso de AINE, pode-se adotar fármacos mais seletivos para a COX-2, como: Nimesulida; celecoxib; rofecoxib (vide figura 22).

Figura 22 – Seletividade dos COX2/COX1 dos AINE

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Ácido acetilsalicílico (AAS): o Inibidor irreversível não-seletivo da COX; o Utilizado também por sua ação antiagregante

plaquetária em baixas doses; o Dose analgésica: 500 mg até de 6 em 6 horas; o Dose antiinflamatória muito elevada (> 4 g/dia):

Acima da dose máxima segura, havendo alto risco de toxicidade;

o Efeitos adversos: - Distúrbios gastrintestinais (inclusive hemorragia): Mesmo em dose terapêutica; - Broncoespasmo em asmáticos sensíveis; - Erupções cutâneas; - ↑ Tempo de Sangramento (2x em até 7 dias): Em doses ≥ 650 mg/dia; - ↓ Ferro sérico e sobrevida da hemácia; - Doses Altas: Salicilismo*1; - Doses Tóxicas: Distúrbios ácido-básicos*2; - Síndrome de Reye*3; - Interação com varfarina (potencializa efeito anticoagulante, o que aumenta risco de sangramento).

*1Salicilismo: Síndrome que consiste em zumbido, vertigem, perda auditiva, náuseas e vômitos; decorrente da ingestão de altas doses de AAS. *2Distúrbios ácido-básicos: Os salicilatos em doses tóxicas desacoplam a fosforilação oxidativa (principalmente nos músculos), aumentando o consumo de O2 e a produção de CO2, causando hiperventilação. A hiperventilação, tanto por acúmulo de CO2 quanto por ação direta dos salicilatos no centro respiratório, provoca alcalose respiratória, que, devido aos mecanismos de compensação renal, torna-se alcalose respiratória compensada. Doses ainda maiores podem causar depressão do centro respiratório, verificando-se acidose respiratória, que pode se complicar com acidose metabólica (devido ao acúmulo ácido de piruvato, lactato, acetoacetato e do próprio salicilato). O distúrbio mais comum em adultos é a alcalose respiratória, enquanto que nas crianças é a acidose metabólica (por provável imaturidade hepática). *3 Síndrome de Reye: Distúrbio hepático e encefalopatia observados em crianças com gripe ou varicela em uso de salicilatos. Paracetamol (Acetaminofeno):

o Excelente efeito analgésico e antipirético. No entanto, apresenta baixo efeito antiinflamatório;

o Doses: 500 e 750mg. Dose máxima: 4 g/dia; o Metabolismo: Hepático, conjugação com sulfato

e glicuronídio;

o Efeitos adversos: - Dose terapêutica (raros): reações cutâneas alérgicas; - Dose alta: Em uso regular, aumenta risco de lesão renal (nefropatia por analgésicos); - Dose tóxica*4 (2-3x dose terapêutica): distúrbios gastrintestinais iniciais (náuseas, vômitos, anorexia e dor abdominal); Hepatotoxicidade e nefrotoxicidade (efeitos tardios do acúmulo de metabólito tóxico).

*4 Intoxicação por paracetamol: A intoxicação ocorre quando as enzimas hepáticas responsáveis pela conjugação do paracetamol estão saturadas, fazendo com que o excesso de fármaco seja metabolizado pelas oxidases de função mista, cujo metabólito resultante (n-acetil-p-benzoquinona imina) é tóxico e deve ser inativado por conjugação com glutation. Na deficiência de glutation, o metabólito tóxico se acumula e causa necrose no fígado e nos túbulos renais.

o Tratamento: Reposição dos estoques de glutation com n-acetilcisteína; lavagem gástrica com carvão ativado.

Figura 23 – Metabolismo hepático do paracetamol

Dipirona:

o Excelente efeito analgésico e antipirético. No entanto, apresenta baixo efeito antiinflamatório;

o Grupo: Derivado de Pirazolona; o Doses: 500 mg até de 6 em 6 horas; o Reações adversas: Alergia; depressão da

medula óssea (leucopenia isolada ou associada a plaquetopenia).

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Ibuprofeno: o Potente antiinflamatório pouco seletivo para

COX-1; o Doses: 200 a 400 mg a cada 4 ou 6 horas. Dose

máxima: 1200 mg/dia; o Metabolismo: Hepático; o Reações adversas: Inerentes a todos os AINE,

mas principalmente distúrbios gastrintestinais (náuseas, dor epigástrica, pirose, cólica abdominal, vômitos) e lesões cutâneas (rash cutâneo e prurido).

Perguntas frequentes:

o São os AINE mais eficazes analgésicos que paracetamol? R: Não há evidência de que AINE sejam mais eficazes que paracetamol em síndromes dolorosas agudas músculo-esqueléticas.

o Há diferenças de eficácia antiinflamatória entre AINE? R: Não há diferença de eficácia entre AINE.

o Uso de altas doses determina aumento de eficácia antiinflamatória? R: Altas doses não determinam maior resposta terapêutica, pois há efeito teto para a eficácia.

o Uso de dois AINE aumenta o efeito antiinflamatório? R: Interações entre AINE não determinam maior eficácia.

o AINE tópicos têm eficácias similares a dos AINE sistêmicos? R: O real benefício da administração tópica permanece incerto.

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V. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DA GOTA:

1. Fisiopatologia e Introdução ao Tratamento da Gota:

PASSO 1 - DEFINIR O PROBLEMA DO PACIENTE

A gota é uma doença metabólica caracterizada por um distúrbio no metabolismo das purinas, havendo acúmulo de ácido úrico no organismo. Manifesta-se clinicamente por crises intermitentes de artrite aguda, provocadas pela deposição de cristais de urato de sódio no tecido sinovial das articulações, o que desencadeia inflamação local.

Locais mais frequentemente acometidos: o Sinóvia; o Cartilagem das articulações periféricas; o Bursa olecraneana;

o Hélice da orelha. Hiperuricemia: Presença de altos níveis de ácido úrico

no sangue (homens 6,8 mg/dL – mulheres > 6 mg/dL).

o Praticamente todos os pacientes com gota têm hiperuricemia, mas nem todos os pacientes com hiperuricemia têm gota, o que evidencia a necessidade de outros fatores na gênese da doença.

Ácido Úrico: Produto de degradação de compostos de purina. Apresenta solubilidade de aproximadamente 7 mg/dL a 37ºC.

o Excreção: Renal; principal forma de eliminação (cerca de 2/3) – 250 a 750 mg/24 h;

o Tem sua produção associada à alimentação.

Figura 24 – Metabolismo das Purinas

Formas Clínicas:

o Hiperuricemia assintomática (fator de risco para gota);

o Artrite aguda: Geralmente em uma articulação dos membros inferiores. Costuma se resolver em alguns dias mesmo sem tratamento;

o Gota crônica: Envolvimento poliarticular destrutivo e deformante, e com formação de tofos.

Fatores de risco:

o Hiperuricemia; o Drogas;

o Obesidade; o Hipertensão arterial sistêmica; o Hipertrigliceridemia; o Hiperglicemia; o Consumo de álcool; o Polimorfismos em genes familiares.

Causas:

o Primária; o Secundárias:

- Uso de medicamentos; - Intoxicação por chumbo;

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- Excreção renal diminuída (doença renal crônica, hipotireoidismo, hipertensão, hiperparatireoidismo); - Erros inatos do metabolismo; - Neoplasias mieloproliferativas e linfoproliferativas.

PASSOS 2 E 3 - ESPECIFICAR O OBJETIVO

TERAPÊUTICO E VERIFICAR SE O SEU TRATAMENTO É ADEQUADO PARA O PACIENTE EM QUESTÃO

O objetivo terapêutico depende da forma clínica

apresentada pelo paciente. Para todos os pacientes, no entanto, devem ser incentivadas mudanças no estilo de vida (com dieta e exercícios físicos moderados). Na gota de causa secundária, quando possível, deve ser feito também o tratamento da causa de base. Hiperuricemia assintomática: Não deve ser tratada, exceto:

o Pacientes em tratamento por malignidade; o Pacientes com hiperuricemia > 13 mg/dL com

altas taxas de excreção de urato (risco de nefrolitíase).

Artrite aguda: O tratamento da artrite aguda é sintomático, e não altera a história natural da doença:

o Medidas gerais (repouso relativo; elevação do membro afetado; aplicação de gelo local);

o AINE; o Colchicina; o Corticoterapia.

Gota crônica: O tratamento da gota crônica visa a prevenção de recorrências, a partir de uma terapia que objetiva reduzir a concentração sérica de urato para

um nível abaixo do ponto de saturação (7 mg/dL 300 µmol/L – ideal seria < 6 mg/dL). O tratamento farmacológico estará indicado em caso de:

o Doença recorrente (>2 crises por ano); o Artropatia crônica; o Gota tofácea; o Cálculos de ácido úrico ou doença renal.

Os fármacos utilizados para o tratamento crônico são:

o Alopurinol; o Agentes uricosúricos (probenecida;

sulfimpirazona; benzobromarona). o SALICILATOS NÃO DEVEM SER UTILIZADOS

(suas doses uricosúricas são muito elevadas e pouco seguras).

*Obs.: A profilaxia secundária (e tratamento da gota crônica) deve ser iniciada 1 a 2 semanas após a resolução da crise aguda. O tratamento com AINE ou colchicina deve permanercer por 3 a 6 meses após a

resolução da crise aguda para evitar novas crises. Eventuais crises durante o tratamento crônico devem ser normalmente tratadas sem a descontinuação da medicação redutora de urato. 2. Fármacos utilizados no tratamento da artrite aguda:

PASSOS 4 E 5 - FAZER A PRESCRIÇÃO E FORNECER INFORMAÇÕES, INSTRUÇÕES E RECOMENDAÇÕES

Para proceder à prescrição e ao aconselhamento

do paciente quanto ao tratamento a ser empregado, seus riscos e benefícios, mecanismos de ação, efeitos colaterais e orientações de administração, o médico deve conhecer as classes farmacológicas a serem empregadas, bem como suas indicações e características. Antiinflamatórios não-esteroidais (AINE): Os AINE são altamente eficazes no tratamento da crise aguda por suas propriedades analgésicas e antiinflamatórias.

o O tratamento deve ser iniciado imediatamente; o Os AINE mais indicados são: indometacina;

naproxeno; sulindaco; celecoxibe e etoricoxibe (sendo este dois últimos seletivos para COX-2);

o OS SALICILATOS EM BAIXA DOSE CAUSAM RETENÇÃO DE URATO, E NÃO DEVEM SER UTILIZADOS.

Colchicina: Apresenta efeito específico na artrite gotosa, por inibir a migração dos neutrófilos para a articulação. Também pode ter aplicação em profilaxia secundária, no entanto, seu uso contínuo deve ser evitado devido a sua toxicidade.

o Mecanismo de ação: Liga-se à tubulina, resultando na despolimerização de microtúbulos e interferindo na motilidade celular de neutrófilos, que passam a assumir “andar de bêbado”;

o Farmacocinética: É bem absorvida por via oral. É excretada predominantemente por via biliar, e em parte pela urina (10-20%);

o Efeitos adversos: distúrbios gastrintestinais (náuseas, vômitos, dor abdominal e diarréia); redução da temperatura corporal; depressão do centro respiratório; estimulação vasomotora central (induz hipertensão).

Corticoterapia:

o Apresenta eficácia semelhante aos AINE, no entanto são necessárias altas doses. Os corticóides de escolha são a prednisona e a metilprednisolona;

o A injeção intra-articular de corticóides tem melhor efeito na crise monoarticular de grandes

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articulações quando comparada com indometacina.

3. Fármacos utilizados no tratamento crônico:

Os fármacos utilizados no tratamento crônico da gota atuam diretamente diminuindo a hiperuricemia:

o Inibindo a síntese de ácido úrico (alopurinol); o Aumentando a excreção de ácido úrico (agentes

uricosúricos: probenecida, sulfimpirazona, benzobromarona).

Alopurinol:

o Mecanismo de Ação: Inibidor competitivo da enzima Xantina oxidase (XO) em baixas doses, e não competitivo em altas doses, inibindo a síntese de ácido úrico, e promovendo acúmulo de xantina e hipoxantina, produtos mais solúveis e mais excretados na urina. Vide fig. 24. Seu metabólito, oxipurinol, também apresenta atividade inibitória;

o Farmacocinética: Apresenta boa absorção por via oral; não se liga a proteínas plasmáticas e apresenta meia-vida curta, mas seus efeitos são prolongados por seu metabólito ativo (oxipurinol) de meia-vida mais longa, o que permite prescrição com dose única diária; apresenta excreção pela urina com reabsorção tubular sensível à probenecida;

o Efeitos adversos: distúrbios gastrintestinais; reações alérgicas; pequeno risco de cálculos por xantina;

o Interações medicamentosas: Inibe a ativação da mercaptopurina e azatioprina pela XO; inibe o metabolismo hepático da varfarina, aumentando seu efeito anticoagulante;

o É o tratamento de primeira linha contra hiperuricemia!! A dose deve ser aumentada progressivamente.

Agentes Uricosúricos: Os agentes uricosúricos são fármacos que aumentam a excreção de ácido úrico através da inibição da reabsorção tubular de urato.

o Indicação: Estão indicados para pacientes com uricosúria < 700 mg/24h;

o Benefícios: Regressão no tamanho dos tofos, e prevenção da formação de novos tofos; Os três exemplos clássicos são: Probenecida;

sulfimpirazona; e benzobromarona: o Probenecida: Droga relativamente bem

tolerada, podendo causar leve irritação gastrintestinal, sendo necessária certa cautela em pacientes com úlcera péptica. É ineficaz no tratamento em pacientes com insuficiência renal (clearance de creztinina < 50 ml/min);

o Sulfimpirazona: Também ineficaz em pacientes com insuficiência renal, e ainda mais irritativo da mucosa gastrintestinal; interfere no metabolismo das sulfoniluréias e varfarina; inibe função plaquetária; liga-se à albumina e desloca outros fármacos;

o Benzobromarona: Isoladamente é o mais eficaz (inclusive em comparação com o alopurinol); apresenta eliminação biliar, sendo o mais seguro em pacientes com insuficiência renal, no entanto, pode apresentar hepatotoxicidade. Apresenta melhor comodidade posológica, podendo ser prescrito com dose diária única (os demais são prescritos em 2 doses diárias).

Dieta na Hiperuricemia (SBR, 2009): Há muitos mitos a respeito de dieta e gota. Eis os fatos: 1. A obesidade pode estar ligada a altos níveis

de ácido úrico no sangue. Se você estiver acima do peso, estabeleça com seu médico um programa de perda de peso. Não permaneça em jejum, nem tente fazer dieta muito restritiva, pois isso pode aumentar seus níveis de ácido úrico e piorar a gota. Se não estiver acima do peso, monitore cuidadosamente sua dieta a fim de evitar ganho de peso.

2. Em geral você pode comer o que quiser com moderação. Se tiver cálculos renais devido ao ácido úrico, pode ser necessário evitar ou limitar alimentos que aumentem os níveis de ácido úrico, como os enumerados abaixo. Converse com seu médico ou com o nutricionista a respeito dos alimentos a serem evitados.

3. Você pode tomar café e chá, mas deve limitar a quantidade de álcool que ingere. O álcool em excesso, especialmente a cerveja, o vinho e outros podem aumentar seus níveis de ácido úrico e desencadear um episódio de gota, por isso, caso você beba, não deixe de comunicar ao seu médico.

4. Tome pelo menos 10 a 12 copos de 250 mililitros de líquido não-alcoólico por dia, especialmente se tiver cálculos renais. Isso vai ajudar a eliminar os cristais de ácido úrico do seu organismo.

Certos alimentos podem aumentar os níveis de

ácido úrico. Para balancear sua dieta, consulte o nutricionista. Pode ser necessário reduzir as quantidades ingeridas dos seguintes alimentos:

• Sardinhas, anchovas e frutos do mar • Aves domésticas e carnes • Miúdos (rim, fígado) • Legumes (feijão, soja, ervilha)

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VI. CORTICOTERAPIA: 1. Fisiologia do Córtex Adrenal e Ação dos

Glicocorticóides:

Para melhor compreensão de suas propriedades terapêuticas e de seus efeitos indesejáveis, deve-se conhecer a fisiologia normal de regulação da síntese, transporte e ação dos glicocorticóides. Síntese e liberação de glicocorticóides pela adrenal:

Os glicocorticóides são hormônios endógenos sintetizados e liberados continuamente (sem armazenamento), principalmente, em resposta ao hormônio corticotrópico hipofisário (ACTH). A secreção de ACTH, por sua vez, é regulada, em parte, pelo fator de liberação de corticotropina hipotalâmico (CRF), e em parte, pelo nível de glicocorticóides no sangue (feedback negativo).

Figura 25 – Eixo Hipotálamo-hipófise-adrenal

A concentração sanguínea de glicocorticóides

endógenos apresenta um ritmo circadiano, com maiores níveis pela manhã (por volta de 8 horas) e menores níveis pela noite (por volta de meia-noite), seguindo também o ritmo de liberação hipofisário de ACTH.

Figura 26 – Ritmo circadiano de secreção de ACTH e glicocorticóides

Vale destacar que outros fatores também regulam a secreção de glicocorticóides, e estimulam sua liberação, como: emoções, excesso de calor e frio, lesões e infecções; que, em conjunto, podem ser traduzidos como estresse fisiológico. Transporte:

Os glicocorticóides endógenos são transportados no plasma ligados reversivelmente à CBG (transcortina) e à albumina. A CBG possui alta afinidade de ligação para os glicocorticóides endógenos, porém exibe baixa capacidade de ligação total, e não se liga aos corticóides sintéticos. Já a albumina liga-se tanto a corticóides endógenos quanto exógenos, apresenta menor afinidade de ligação, porém maior capacidade total de ligação (por sua alta concentração plasmática).

Vale destacar que os corticóides ligados a proteínas plasmáticas, embora estejam em equilíbrio químico com a fração livre, não apresentam atividade biológica. Mecanismo de Ação:

Para determinar seus efeitos, os glicocorticóides precisam atingir seus receptores no citoplasma celular. Por serem pequenas moléculas lipofílicas, apresentam alta capacidade de difusão passiva pela membrana celular. No citoplasma, interagem com receptores citoplasmáticos, formando o complexo esteróide-receptor que segue em direção ao núcleo em pares (dímero) para alterar a expressão gênica, induzindo a síntese de determinadas proteínas e inibindo a síntese de outras. Os principais efeitos dos glicocorticóides são explicados pela alteração na síntese protéica. Ações dos glicocorticóides:

o Efeitos metabólicos e sistêmicos; o Efeitos antiinflamatórios e imunossupressores; o Efeito de retroalimentação negativa.

Efeitos metabólicos e sistêmicos:

Os efeitos metabólicos são produzidos por estímulo gênico a síntese de proteínas diversas, a maioria relacionada com a quinase de AMPc (PKA), determinando ações, principalmente, no metabolismo intermediário:

o Metabolismo dos carboidratos: Diminui a captação e utilização de glicose e estimula a gliconeogênese, levando à hiperglicemia. Estimula ainda a glicogênese hepática (efeito mediado pela insulina secretada em resposta à hiperglicemia);

o Metabolismo das proteínas: Reduz a síntese protéica e estimula sua degradação, principalmente muscular, fornecendo aminoácidos para a gliconeogênese;

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o Metabolismo dos lipídios: Apresenta ação permissiva sobre o efeito lipolítico das catecolaminas e GH, havendo lipólise com liberação de ácidos graxos (AG) e glicerol, substrato para a gliconeogênese. Os adipócitos de cada região reagem de forma diferente aos glicocorticóides e à insulina, sendo que os periféricos são mais sensíveis aos glicocorticóides e os do tronco são mais sensíveis à insulina. Altas doses por tempo prolongado, portanto, promovem redistribuição da gordura, caracterizando a obesidade central e gibosidade;

o Ação mineralocorticóide (EHE): Em níveis supra-fisiológicos, ocupam também os receptores mineralocorticóides, promovendo retenção de Na+ e perda de K+;

o Metabolismo Ósseo: Diminui a absorção intestinal de Ca+2 (antagoniza a ação da vitamina D3) e aumenta sua excreção renal (favorecendo a osteoporose);

o Outros: - Estimula a produção gástrica de ácido e pepsina; - Aumenta o número de hemácias e plaquetas; - Estimula a síntese de surfactante pulmonar, estimulando a maturação pulmonar fetal.

Efeitos antiinflamatórios e imunossupressores:

Os efeitos antiinflamatórios e imunossupressores dos glicocorticóides decorrem de sua ação inibitória sobre a síntese de proteínas inflamatórias, como: COX-2; citocinas inflamatórias; moléculas de adesão celular; sintetase do óxido nítrico. Importante ação antiinflamatória também é creditada à produção de lipocortina-1, estimulada pelos corticóides, que inibe a fosfolipase A2, responsável pela síntese de ácido araquidônico (precursor de prostaglandinas e leucotrienos inflamatórios). Suas ações resumem-se a:

o Vasoconstrição e redução da permeabilidade vascular;

o Diminuição do aporte de células inflamatórias para sítios de inflamação;

o Diminuição da ação e proliferação de células T; o Diminuição da função de fibroblastos na

cicatrização e reparo tecidual; o Produção diminuída de prostanóides (inibição da

síntese de COX-2 e inibição da fosfolipase A2, via lipocortina-1);

o Redução na síntese de citocinas inflamatórias; o Redução na concentração plasmática de

componentes do sistema complemento; o Redução na síntese de óxido nítrico induzido; o Redução na liberação de histamina por basófilos; o Produção diminuída de IgG.

Fisiologicamente, essas ações apresentam importância nas respostas agudas a infecções, traumas e inflamação sistêmica, limitando as respostas de defesa do organismo que poderiam ameaçar a homeostasia.

A poderosa ação dos glicocorticóides como antiinflamatórios e imunossupressores corresponde a sua principal importância farmacológica a ser estudada posteriormente. Efeitos de retroalimentação negativa:

Os glicocorticóides, tanto endógenos quanto exógenos, exercem efeito inibitório sobre a secreção de CRF e ACTH, correspondendo, respectivamente, às alças longa e curta de feedback negativo, que limitam sua secreção. Este efeito inibitório apresenta grande importância farmacológica, pois a supressão do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, provocado por longas terapias com altas doses, pode necessitar de meses pós-terapia para a recuperação da capacidade de síntese endógena de glicocorticóides. 2. Farmacologia dos Glicocorticóides:

Os glicocorticóides apresentam importância clínica notavelmente por suas propriedades antiinflamatórias e imunossupressoras, e na terapia de reposição hormonal, em pacientes com deficiência de cortisol, como na insuficiência adrenal e hiperplasia adrenal congênita. Vias de administração:

Os glicocorticóides podem ser administrados através de diversas vias:

o Via oral; o Via parenteral (IV ou IM); o Via tópica: Associada a efeitos adversos

ausentes ou muito menores (exceto a atrofia cutânea em uso contínuo de corticóide tópico).

Corticoterapia sistêmica:

O alvo de estudo, a partir de agora será a corticoterapia sistêmica (por VO ou parenteral), devido a importância clínica do conhecimento de seus princípios farmacológicos. Critérios para o início da terapia sistêmica crônica com glicocorticóide:

o Iniciar somente se existem evidências clínicas estabelecidas na literatura do seu benefício terapêutico (vide lista abaixo);

o Utilizar somente frente à falência de outras terapias específicas;

o Identificar um objetivo terapêutico específico; o Utilizar critérios de resposta objetivos;

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o Administrar as menores doses possíveis no menor tempo possível para obter a resposta desejada.

Indicações do uso de corticoterapia sistêmica segundo nível de evidência: - Benefício definido:

o Meningite bacteriana inespecífica (redução da perda auditiva);

o Lesão medular aguda (redução de sequelas neurológicas);

o Asma aguda (diminuição de hospitalização e de exacerbações agudas);

o Extubação de recém-nascidos (menor necessidade de reintubações);

o Tratamento agudo do crupe (melhora nos escores de gravidade);

o Pneumonia por P. jirovecii (menor gravidade); o Curso único de corticóide em doença da

membrana hialina (redução de morte, síndrome da angústia respiratória, hemorragia intraventricular, enterocolite necrosante, hiperbilirrubinemia neonatal);

o Síndrome nefrótica com lesões mínimas em crianças (menor número de recaídas);

- Benefício provável: o Polimialgia reumática e arterite temporal; o Hepatite auto-imune; o Púrpura trombocitopênica auto-imune; o Paralisia de Bell; o Exacerbação aguda de doença pulmonar

obstrutiva crônica; o Hepatite crônica ativa; o Nefropatia IgA; o Anafilaxia e reações alérgicas graves; o Transplante de fígado;

o Artrite gotosa aguda; - Benefício desconhecido:

o Traumatismo craniano e edema cerebral; - Avaliação risco/benefício:

o Artrite reumatóide; o Sarcoidose pulmonar; o Meningite tuberculosa; o Doença da membrana hialina (múltiplas doses

de corticóide); o Ruptura prematura de placenta; o Doença de Crohn; o Dermatite atópica;

- Sugerida ineficácia (maior risco que benefício): o Síndrome da angústia respiratória do adulto; o Otite média com perda de audição; o Nefropatia membranosa idiopática; o Síndrome da fadiga crônica; o Piodermite gangrenosa.

Considerações a serem feitas antes do início da corticoterapia sistêmica:

o Qual a gravidade da doença de base? o Para quanto tempo está previsto o tratamento? o Qual a preparação do glicocorticóide a ser

empregada? o Qual a dose terapêutica mínima efetiva? o Existe predisposição para efeitos adversos? o Há como associar outras drogas, visando reduzir

a dose do glicocorticóide e, consequentemente, seus efeitos indesejáveis?

o O esquema pode ser usado em dias alternados*1?

*1. A terapia em dias alternados reduz os efeitos indesejáveis da corticoterapia sistêmica.

Escolha do corticóide sistêmico:

Fármaco Potência Antiinflamatória

Potência Mineralocorticóide

Meia-vida biológica (horas)

Duração da ação

terapêutica

Dose Equivalente

Cortisol (HC) 1 1 8 – 12 Curta 20

Cortisona 0,8 0,8 8 – 12 Curta 25

Prednisona 4 0,8 12 - 36 Intermediária 5

Prednisolona 4 0,8 12 – 36 Intermediária 5

Metilprednisolona 5 Mínima 12 – 36 Intermediária 4

Triamcinolona 5 Nenhuma 12 – 36 Intermediária 4

Betametasona 20-30 Desprezível 24 – 72 Prolongada 0,75

Dexametasona 20-30 Mínima 24 – 72 Prolongada 0,75 Tabela – Principais corticóides sistêmicos de uso clínico

Efeitos adversos:

Quando utilizados como antiinflamatórios e imunossupressores, todos os seus efeitos metabólicos

passam a ser tratados como efeitos adversos, visto que o objetivo terapêutico é exclusivamente a inibição da resposta inflamatória, e não existem glicocorticóides

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seletivos para tal ação. Segue abaixo extensa lista de efeitos adversos, muitos destes já foram discutidos a cerca da ação fisiológica dos glicocorticóides. Os mais frequentes e importantes serão discutidos com maiores detalhes: - Cardiovasculares e renais (decorrentes da ação mineralocorticóide):

o Hipertensão arterial; o Insuficiência cardíaca congestiva;

- Gastrintestinais: o Esofagite, gastrite, dispepsia, úlcera péptica; o Hemorragia gástrica; o Perfuração intestinal; o Pancreatite;

- Neuropsiquiátricos: o Alterações psiquiátricas; o Pseudotumor cerebral; o Hipertensão intracraniana;

- Oculares: o Glaucoma; o Catarata subcapsular posterior; o Infecções;

- Músculoesqueléticos: o Osteoporose e fraturas; o Necrose óssea asséptica (cabeça do fêmur); o Miopatias e cãibras;

- Endocrinometabólicos: o Indução de diabetes; o Hiperlipidemia; o Coma cetônico hiperosmolar; o Retenção de sódio e hipocalemia; o Alcalose; o Balanço negativo de cálcio e nitrogênio; o Hirsutismo; o Inibição do crescimento; o Alterações menstruais, amenorréia secundária,

menopausa precoce; o Impotência; o Inibição do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal; o Insuficiência adrenal secundária; o Síndrome de Cushing iatrogênica; o Obesidade central;

- Alterações imunológicas: o Supressão ou diminuição da resposta

inflamatória da hipersensibilidade tardia; o Neutrofilia, linfocitopenia e monocitopenia; o Maior suscetibilidade às infecções; o Recidivar tuberculose e estrongiloidíase graves;

- Cutâneos: o Retardo na cicatrização; o Atrofia do subcutâneo; o Estrias; o Púrpura; o Equimoses; o Petéquias; o Paniculites;

o Acne; o Pletora;

- Vasculares: o Vasculites; o Tromboembolismo; o Aceleração da aterosclerose;

- Pseudo-reumatismo cortisônico. Síndrome de Cushing Iatrogênica:

O excesso prolongado de glicocorticóides pode levar ao quadro de síndrome de Cushing, caracterizado pela exacerbação dos efeitos fisiológicos do hormônio. Vide figura 27.

Figura 27 – Síndrome de Cushing

Osteoporose:

Os glicocorticóides inibem a indução dos genes induzidos pela vitamina D3, diminuindo a absorção intestinal de Ca+2 e aumentando sua excreção renal. Além disso, inibe a ativação dos osteoblastos como sintetizadores da matriz óssea e sua síntese de colágeno, e estimulam, indiretamente, a atividade dos osteoclastos (por aumento da secreção de paratormônio em resposta a hipocalcemia). O efeito final é o estímulo a um processo de degradação da matriz óssea (osteoporose), podendo ser causa de fraturas, principalmente em idosos.

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Insuficiência adrenal aguda e supressão do eixo: A suspensão abrupta de uma corticoterapia

pode levar a insuficiência adrenal aguda, devido à supressão do eixo durante o tratamento prolongado, o que determina pouca ou nenhuma resposta da adrenal após a suspensão da droga. A resposta adrenal é especialmente importante em situações de estresse, e, portanto, o paciente pode precisar de suplementação de glicocorticóides nessas situações.

A crise aguda de insuficiência suprarenal manifesta-se por:

o Hipotensão e choque; o Hipertermia; o Desidratação; o Taquicardia; o Náuseas e vômitos; o Anorexia; o Fraqueza e apatia; o Hipoglicemia; o Confusão mental; o Desorientação.

O tratamento desta condição deve ser a reposição de corticóide e medidas gerais de tratamento sintomático. Para evitar a ocorrência do quadro, é aconselhável a retirada gradual do medicamento (desmame). Fatores que influenciam na supressão do eixo*1:

o Dose total a ser usada: Baixa x Alta; o Tempo de tratamento: Curto x Prolongado; o Fracionamento da dose: Única x Múltipla; o Horário da administração: Manhã x Noite; o Frequência: Dias Alternados x Diária; o Duração da ação: Curta x Intermediária x Longa.

*1. Os valores sublinhados correspondem ao ideal terapêutico para prevenção da supressão do eixo.

Considerações gerais quanto ao manuseio dos Corticosteróides: - Tomando como base a Prednisona:

o Doses equivalentes a 40 mg/dia (8x o nível fisiológico), por mais de uma semana, resultam em supressão do eixo HHA;

o Doses < 20 mg/dia promovem supressão do eixo somente após 30 dias de uso;

- Sobre o tempo de recuperação do eixo HHA: o Pode variar de 2 meses a 1 ano, se usadas doses

≥ 40 mg/dia, por períodos > 3 meses; o Não está bem estabelecido, se usadas doses <

20 mg/dia, por períodos de 2 a 4 semanas.