restauração completa casa friedel jaraguá do sul - sc...a casa está situada em jaraguá do sul,...

Casas EnxaimelCasas EnxaimelCasas EnxaimelCasas Enxaimel - Paulo Volles

Rua Gustavo Zimmermann 1051, Blumenau, SC 89062-100

47 3339-3872 www.casasenxaimel.com.br [email protected]

Restauração Completa

Casa Friedel

Jaraguá do Sul - SC

Paulo Volles

Março / 2012




Apresentação

Este relatório tem como objetivo divulgar nosso trabalho de “Restauração Completa” em casas enxaimel. Nosso trabalho é baseado em exemplos e métodos recentes da Alemanha onde desde o ano de 2000 estão mudando o conceito de restauro Kaputt Sanierung (restauro do quebrado) para Komplett Sanierung (restauração completa) onde é feito desde o fundamento ao telhado, trocando e renovando inclusive, conforme aspectos técnicos antes de históricos. Nada mais correto, porque é preciso em primeiro lugar garantir a segurança e a saúde dos moradores e com isso obter os meios para a preservação de seu conteúdo histórico por outro século. Afinal, sem o cuidado e interesse dos proprietários já foi comprovado que não funciona. E isto também deve ser realizado dentro da realidade econômica e destino do imóvel.

Não é um trabalho simples. Requer pessoal dedicado e altamente qualificado. Com este trabalho de Restauro Completo é possível normalizar a forma de restauro para casas enxaimel. Especificando os meios que devem ser usados e seu procedimento. Isso evita o uso de materiais inadequados e técnicas “alternativas”. Também possibilita de forma clara o registro da enorme quantidade de informações encontradas durante os trabalhos.

Outro ponto interessante surgiu na análise da técnica aplicada. Pela nossa prática e evidências encontradas, é possível elaborar um perfil bem próximo deste carpinteiro e dos meios disponíveis em sua época.




A casa...

A casa está situada em Jaraguá do Sul, à rua Roberto Zieman,1749 e de acordo com o proprietário, Darlei Friedel esta casa, datada de 1924, foi construída por seu bisavô Albert Friedel. De acordo com Friedel, consta em registro oficial como profissão de Carpinteiro até o ano de 1950. Há outras 2 casas nas proximidades, nas ruas Pref. Jose Bauer (1913) e Waldemar Rau (1935), semelhantes em bitolas, numeração e cortes, que possivelmente tem relação com seu trabalho. Apesar de aparentar um bom estado externo. A casa estava em colapso. Havia muitas madeiras danificadas por cupins e umidade. Dentro, as paredes soltavam o reboco. Em certas partes do sótão, já não era mais seguro de andar. Na parede do lado Sul da casa, o meio estava arqueado para baixo. Nos fundos e no lado oeste, as paredes estava arqueadas para fora em até 5 cm. Isso já dava sinais que as madeiras e encaixes estavam danificados e não estavam mais suportando a carga. Também havia alguns pontos de descaracterização como “remendos” de concreto, madeiras pregadas e cimentadas na estrutura. Uma construção convencional nos fundos prejudicava as madeiras da parede dos fundos. O Baldrame ali estava totalmente apodrecido. No lado Norte, as madeiras estavam melhor conservadas por maior incidência de sol. Mas incrivelmente, a radiação da região é tão forte que chegou a “queimar” até 5mm da madeira em sua largura neste período de 87 anos. Essa observação inclusive nos leva a considerar este fator na determinação da bitolas existentes em próximas restaurações. De forma geral, a falta de Baldrame, fundamentos inadequados, alastramento de cupins e apodrecimentos em vários pontos já são argumentos de peso para se realizar uma restauração completa. Nossos trabalhos iniciaram em Agosto de 2011 com a Desmontagem e logo em seguida com o Restauro e Pré montagem (interna) em Setembro e Outubro. Em Novembro, as madeiras permaneceram curando dos tratamentos e em Dezembro a casa foi remontada.




Partes do telhado reforçadas com cimento Baldrame totalmente apodrecido junto à construção convencional/fundos.

No sótão não era mais seguro de se andar. As paredes do lado Sul, sem o baldrame, úmidas e soltando o reboco.

Detalhe das madeiras “queimadas” pelo sol forte da região. A parte ressaltada é da moldura da janela. A parte com a numeração na coluna permaneceu intacta porque estava coberta pela “pingadeira” de tijolos.

Observamos que a parede lado sul foi pintada de vermelho, numa tentativa de vedar contra a umidade. Nesta mesma parede já não existia mais o baldrame de madeira. Este foi substituído por tijolos e a umidade passou a deteriorar as colunas. Em muitas casas já constatamos este tipo de conserto, feito por pedreiros, mas totalmente ineficiente.




Detalhe da parede Sul pintada em vermelho, a falta do baldrame em toda a base. No centro, a viga estava apodrecida e arcando toda a estrutura para baixo.

Dentro da casa, uma divisória de tábuas no meio da casa separava a sala/quarto. Este inclusive ocultava um problema grave. A casa utilizava nos frechais, madeiras curtas e com emendas. Para isso, o correto seria uma parede enxaimel no meio para manter a rigidez das paredes. Na outra casa, na Rua Pref. José Bauer havia uma “mão francesa” como meio de corrigir a falta da parede do meio. Coincidentemente esta também possui o mesmo problema da falta do Baldrame e no mesmo lado, indicando que o clima de Jaraguá é realmente um problema crônico para estas casas.

Os tijolos eram os tradicionais maciços, assentados com o barro e suas fugas preenchidas com massa à base de Cal. Os preenchimentos eram fixados por pequenas ripas de madeira 2x2x20cm, pregados nas faces internas das colunas, na parte superior.

Detalhe do assentamento do tijolo. Sarrafinhos usados para fixar os enchimentos “Mão Francesa” em outra casa .




A Desmontagem A desmontagem da casa é sempre um momento triste. Constatarmos as perdas devido ao estado de algumas peças. É praticamente rotina para nós, considerar uma perda de no mínimo 30% em cada casa. Em geral são peças do telhado e do baldrame, afetadas por cupins e umidade. Felizmente neste caso, muitas partes ainda foram depois reutilizadas de forma bem satisfatória. Mas o estado das madeiras era deplorável. A desmontagem foi relativamente fácil. Como o proprietário já havia retirado os tijolos e telhas levou apenas 3 dias para ser desmontada. Pouquíssimos pinos deram trabalho para serem retirados e alguns saiam até na mão. O fato destes serem quadrados, cônicos e aliado com infiltração de chuva fez com que perdessem efeito de travamento. Já tínhamos experiência de outra casa restaurada (Casa Fisher/Vila Itoupava), que os pinos quadrados são ineficientes com nossas madeiras e clima.

Detalhe dos frechais apodrecidos e da coluna arqueada (esquerda). Pinos quadrados e encaixes apodrecidos.

Toda a casa foi devidamente documentada. Cada peça foi medida e marcada num

lado interno para posterior identificação. Na montagem, cada peça deve voltar para seu local de origem, do contrário a estrutura não ficará rígida. Inclusive, onde existiam as emendas foram recolocadas em suas mesmas posições. Utilizamos a nossa marcação tradicional, para não haver equívocos. A marcação existente tinha certos pontos confusos e não seria considerada. Algumas também não estavam seqüenciais. Isto não deixa de ser estranho. Sabemos que isso pode ocorrer durante a montagem ou numa reforma posterior, caso alguém decida mudar a posição de uma porta ou janela. No entanto, nenhuma peça ou encaixe para adaptação foi encontrado. Todos os encaixes eram convencionais. Ou seja, foi modificado ainda na montagem.




Ao lado, uma peça cujo encaixe não funcionou devidamente e quebrou durante o aperto. O Carpinteiro não teve outra opção, a não ser colocar um prego metálico (único em toda a estrutura da casa). Este detalhe evidencia que ele não era um carpinteiro formado na Alemanha. Mas era aprendiz de um, já estabelecido no Brasil e seu conhecimento vinha do dia a dia do seu trabalho junto à oficina com seu mestre. Uma hipótese é que nunca teve necessidade para aprender a realizar tais emendas. As madeiras eram sempre longas e disponíveis. Mas depois de se tornar carpinteiro e

devido à alguma crise de madeira, e ou na falta de serrarias grandes, teve de recorrer a este recurso. Na falta de livros ou outros profissionais para consultar, decidiu experimentar alguma forma de emenda. Fazer um encaixe para esta função não é simples. Este tipo de encaixe estava sendo aplicado de forma incorreta. Atendia sua função somente após ser travado com enormes pinos de 40mm, o que não é padrão no enxaimel. Havia 4 encaixes destes na casa. No trabalho de restauro da parede nos fundos em nosso galpão, aplicamos um tipo de encaixe mais adequado para essa aplicação. Durante a retirada das peças pudemos ainda constatar a terrível umidade local. Em pedras usadas no fundamento a água visivelmente condensava nas laterais internas. Nos fundos onde estava apoiado sobre o solo e parte de um anexo, metade inferior do baldrame já não existia mais devido ao apodrecimento. Não foi constatado nenhum produto ou meio de isolar a madeira no fundamento. Outra constante era um tipo de fungo cor verde esmeralda em várias madeiras junto ao fundamento. Foi tomado o devido cuidado de evitar contato e em certos casos até o descarte imediato. Nas madeiras externas constatamos que usaram Betume como proteção.

Detalhe de fungo cor verde esmeralda se alastrando nas vigas do assoalho.




Estado das madeiras da casa Pedras do fundamento com umidade condensada

As madeiras empregadas nesta casa eram de maioria Canela Preta e Pindabuna. No

telhado, foi usado mais o Araçá e este ainda estava “verde” quando colocaram. Por conseqüência disto, acabou arqueando todo o telhado para dentro. Também foi bastante danificado pelo cupim. Somente uma peça foi reutilizada como caibro na fachada.

A madeira da estrutura foi toda transportada para Blumenau em uma viagem de caminhão apenas. O assoalho, escadas e vigas do assoalho inferior, foram guardadas numa garagem no local.




Os Trabalhos internos.

O primeiro trabalho foi a limpeza das peças. Foi utilizado uma lavadora de pressão. Este é o melhor meio. Remove inclusive pinturas à cal, incrustações e higieniza as peças para posterior manuseio e habitação. Há de se ter em mente o acúmulo de sujeiras e microorganismos perigosos ao longo do tempo. Há partes da casa e frestas na madeira, que são impossíveis de se realizar a limpeza diária. Detalhe de um baldrame sendo limpo com lavadora de pressão.

Após a secagem, as peças passaram por uma triagem, onde os pregos, parafusos e outros elementos eram removidos e separados dependendo quais seriam ser feitos enxertos, quais estavam em bom estado e usados como reutilização. As peças descartadas para reutilização eram logo anotadas para serem produzidas. Os trabalhos de enxerto são bem padronizados. A parte danificada é cortada até que se alcance madeira em boas condições para suportar a colocação de pinos de madeira. E neste deve-se utilizar um encaixe especial, que evite a entrada de água de chuva, usando madeiras de propriedades semelhantes ou superiores e que atenda as respectivas características mecânicas (pressão, flambagem e tração). É preciso ter em mente que um enxerto terá de suportar a mesma condição de um encaixe normal. Em alguns casos este enxerto deve suportar tração superior a 500 kg. A Fundação Cultural de Jaraguá do Sul enfatizou a importância de usarmos ao máximo a alternativa de enxertos devido ao conteúdo histórico da casa. Em vista disso, dedicamos especial atenção e qualidade ao trabalho. Também seria uma oportunidade de avaliar a resistência de paredes com múltiplos enxertos. É nosso crer que no futuro alguém um dia poderá refazer este trabalho de restauro e avaliará nosso trabalho.




Detalhe dos 2 tipos de enxertos mais utilizados neste restauro. “Plano com cortes inclinados” e o “Dente falso”

Em um restauro completo não são usados meios metálicos em enxertos. Estes são nocivos à durabilidade da madeira. Mesmo sendo em materiais inoxidáveis, geram umidade dentro das madeiras. Um prego, ao longo do tempo ou irá enferrujar ou apodrecer a madeira. Todos os enxertos são fixados por meio de pinos de madeira e com as peças estão sob pressão. Em todos os enxertos também aplicamos cola à prova dágua p vedação. A cola aplicada é a Kleberit PU da empresa alemã Henkel. Apesar desta cola ter excelentes propriedades mecânicas, nós a utilizamos por sua característica expansiva e assim vedar completamente os espaços na madeira.

Coluna/escora tendo seu apodrecido cortado. E depois com o enxerto montado. Os pinos que o fixam não ficam aparentes por fora.

As paredes da casa foram montadas conforme a técnica tradicional, deitados no chão e controlando sua geometria (dimensões, perpendicularidade e paralelismo). Tradicionalmente, as casas são montadas numa seqüência: fachada entrada, fachada fundos, e fachada “puxado” (fundos). Posteriormente laterais direita e esquerda. Também constatamos que esta e outras casas deste carpinteiro foram concebidas já com o “puxado”. Na Alemanha quase não se vê anexos feitos desta forma. E em outras casas mais antigas, em Blumenau e região é comum observar que o “puxado” foi incrementado posteriormente.




Aqui, outro enxerto e sendo fixo por pinos inclinados.

As madeiras desta casa foram todas cortadas mecanicamente. Notamos nesta ao lado a uniformidade dos cortes. Se tivessem sido desdobradas à mão, as linhas não seriam paralelas. Não havia nenhuma peça cortada à machado.

As partes que estavam afetadas por

fungos foram totalmente removidas.




A Pré Montagem.

Toda a casa foi bem detalhada nos desenhos, incluindo até milímetros nas medidas (as cotas são visíveis com zoom)

Um detalhe importante no processo de restauração completa, é também garantir que

a casa seja habitável novamente. Algumas divisórias são fundamentais tanto para a estabilidade da casa, como para seu uso atual como moradia. Foram analisadas várias alternativas junto ao cliente, com a arquiteta responsável e a fundação cultural. E no final foi alcançado uma forma simples, mas bem funcional e sem alterar muito a estrutura antiga. Na parte dos fundos foram inseridas 3 paredes em enxaimel (panos), formando área de serviço, banho e quarto de solteiro. Onde antes no centro da casa havia uma divisória de tábuas, esta passou a ser em enxaimel. Uma das alterações inclusive foi retornar a porta dos fundos à sua posição original. Na casa esta estava fechada com tijolos.

O processo de montagem foi sem

problemas em toda a remontagem. Apenas havia a dificuldade de localizar furos antigos em peças novas. Para isso desenvolvemos uma bucha para localizar a posição ideal/centro e uma broca especial, que possuía uma guia na ponta e abria o furo no ajuste desejado. Se não fosse assim, o furo ficaria folgado e a peça sem o devido aperto. Quase a metade das furações da casa foi feita assim. Os furos são tradicionalmente feitos com brocas tipo “Serpentina”. Detalhe das brocas de 18 e 22 contra a de 14mm




Ao todo, 7 paredes da casa foram remontadas e 5 novas (3 menores) acrescentadas

Fachada da entrada sendo remontada. O processo garante a geometria perfeita da estrutura na hora da montagem final.

Parede dos fundos sendo montada e gabaritada. Os esticadores são usados para dar o aperto necessário nas peças.




A peça antiga é sobreposta na uma nova, a bucha localiza o centro do furo e uma broca especial abre na medida do pino.

Nas peças novas para paredes antigas, utilizamos os mesmos padrões que existiam. Inclusive estes padrões de medidas de encaixes e bitolas de madeira se mantiveram constantes durante o período de 1857 e 1924. As únicas diferenças, eram no comprimento dos dentes, que por regra deveria ser 6 mas fizeram com 5cm e nas furações que ao invés do tradicional 14 a 16mm usaram 18 e 22mm. Estas inclusive, tivemos de adquirir especialmente para o restauro.

O detalhe destes furos maiores reflete uma crise de época influenciada pela 1ª Guerra Mundial. De acordo com dados obtidos no IBGE, logo no início da guerra em 1914, as importações brasileiras de equipamentos industriais caíram 75% . E no pós guerra, a situação permaneceu crítica pois todos os paises envolvidos passavam por crises financeiras. Não havia como importar máquinas e ferramentas e nem para substituir as que quebravam. Esta situação inclusive levou o Brasil a criar sua primeira usina siderúrgica, a Belgo Mineira em 1924. Como o Carpinteiro já não tinha mais brocas de tamanho normal, (na casa da Rua Pref. Jose Bauer, de 1913, usou brocas de 14mm) passou a utilizar uma de 18mm. No entanto, esta quebrou logo na metade da segunda parede. Nestas brocas, há um parafuso na ponta que guia a broca dentro da madeira e este é comum quebrar. Sem esse, ela não simplesmente não funciona. Desesperado e sem outra opção, passou a usar uma de 22mm. Isso até explicaria o fato de não ter madeiras longas disponíveis. Possivelmente faltavam serras, rolamentos e peças de reposição nas serrarias também.

O fato dos dentes serem menores e os

furos maiores gerou um sério problema. Muitos dentes estavam quebrados. Tivemos de substituir, enxertando o dente em muitas peças. Felizmente graças à madeira ser de qualidade muito boa, e em sua maioria Canela Preta, suportou bem esta condição. Em alguns pontos mais críticos utilizamos nosso padrão, 14mm por segurança.

Furo de 14mm e um de 22mm.




Durante a pré montagem da parede

dos fundos, constatamos vários furos de 40mm em algumas colunas. Não tinham relação com a casa ou a estrutura, mas pela altura e posição que estavam, serviam para fixar uma bancada de trabalho. Usava a parede da casa para ficar mais estável ao serrar e poder trabalhar com peças mais pesadas.

“Aqui é preciso cuidar, o ressalto deve ter cerca de 25cm (por causa do cizalhamento), e o mesmo princípio para o inserto”.

O encaixe acima foi utilizado na parede dos fundos para emendar o baldrame. Este utiliza cunhas em ambos os lados para “puxar” o conjunto. Os 4 pinos de madeira colocados posteriormente quase não tem efeito. Mas devem ser colocados por garantia. O que o carpinteiro usou tinha somente uma cunha. E ao ser martelada, vergava o conjunto ao invés de puxar as peças. Mas no final aplicando os pinos de 40mm o resultado que obteve foi satisfatório.

Ao refazer as partes do telhado, constatamos que as antigas estavam com um erro de apenas 0,5 ° nos cortes das peças (ex: 45,5°). Esta medida foi mantida assim nas novas.

Fachadas do telhado sendo montadas no galpão.




Esta, assim como todas as outras casas enxaimel, possuem uma antiga e simples forma de telhado chamado de “Sparrendach”. Em telhados de até 7m de largura, possui somente os Caibros e Barrote. Itens como Cumeeiras, escoras e tirantes são isentos e em certas situações nota-se o telhado balançar em dias de trovoadas fortes. Uma parece central já evita que isso ocorra. Foi adicionado então, no centro do sótão, uma parede enxaimel, com uma abertura para porta. Mais por segurança do que conforto e com esta divisão, o espaço pode ser melhor utilizado como sala de estar e um dormitório.

“Sparrendach” Telhado de Caibros. Isento de outros elementos.

Ao final de cada montagem das paredes, utilizamos nossa marcação tradicional na

laterais da peças, em áreas que não ficarão visíveis quando a casa estiver pronta. A seqüência de numeração é padronizada em romanos, crescente, da esquerda para direita.

Após o número em romano é colocada uma Runa identificando a respectiva parede. As runas são um aspecto mais pessoal do que técnico. Em geral utiliza-se um desenho que seja fácil de interpretar e marcar. Nossa runas são / , // , /// ... para fachadas. Para identificar as laterais usamos traços _ , = ... A ausência de Runas pode representar o “zero” ou o lado da rua.

Nesta casa havia algumas particularidades em sua numeração.

-O Número V (5) estava de cabeça para baixo. -As Runas estavam antes do numero da peça e identificadas por X para a fachada da entrada e XX para os fundos. -Nas Laterais nem todas possuíam Runas. Algumas peças tinham uma marca horizontal (-) igual como a que utilizamos.

Identificação da peça ao lado:

Lado X = Parede frente/varanda Posição = VII (7)




Nossa numeração aplicada na lateral de cada peça. Note também 4 enxertos nesta foto

A numeração que existia foi reproduzida nos enxertos e peças novas. Um detalhe interessante, é que já tínhamos visto uma numeração parecia assim, mas aplicada em outra colônia muito distante. Em Dois Irmãos, no Rio Grande do Sul.

É descrita no livro Arquitetura Popular de Imigração Alemã de Günter Weimer . Isso

pode dar no futuro alguma pista à respeito da origem da técnica do Carpinteiro. Infelizmente em algumas pesquisas que fazemos, algumas respostas surgem somente depois de muito tempo. O fato, é que o número 5 invertido e as runas usando X e XX causaram inicialmente uma certa confusão. Se não tivéssemos marcado as peças no início dos trabalhos teríamos dificuldade para remontar.

Detalhe do livro com a numeração utilizando o Nr V invertido nos travessões.




Aproveitando a ocasião do Restauro Completo, todas a madeiras da casa passaram por tratamento com banhos. Algumas mais longas e pesadas preferimos várias aplicações com broxas e derramando o produto em furos e rachaduras. O produto é uma mistura à base de betume com solventes e tem grande poder de penetração na madeira. Como um dos fatores de deterioração da casa foi o cupim, consideramos fundamental tal prevenção. Depois da cura, a madeira ganha um aspecto escurecido e mais uniforme. A madeira do lado interno pode ser pintada com verniz posteriormente. Madeiras logo após os banhos, indo em seguida para a cura/secagem




Conclusões.

Em uma análise preliminar das informações levantadas, é possível para nós descrever um pouco deste Carpinteiro Albert Friedel, da sua época e a relação às 3 casas, a de 1913, 1924 e 1935 na região e que possivelmente trabalhou nelas.

Pelas madeiras encontradas nas 3 casas, de bitolas 12x12, 16x16 e 18x18 nas mesmas funções e sendo utilizando os mesmos cortes e identificações, é possível afirmar que foram feitas pela mesma pessoa ou “escola”. Apesar de existir décadas de diferença, nota-se particularidades entre as casas. Quando citamos “escola” trata-se da oficina do Carpinteiro. Como na época não havia mais o fluxo de imigrantes da Alemanha, as carpintarias acabavam se tornando “formadores de profissionais”. Nestas, jovens a partir dos 12 e 13 anos aprendiam conforme os ensinamentos do mestre. Alguns conteúdos básicos do ofício, como matemática, química e história, que o mestre havia recebido na Alemanha, eram praticamente deixados de lado. Ensinava-se pela prática diária e essa seria sua única referencia. Nisto pode-se considerar, os desenhos, os gabaritos, as numerações e os cortes aplicados. Na casa de 1913, Albert Friedel era solteiro e tinha 17 anos então. Não poderia ser um carpinteiro nesta época. Mas sendo aprendiz e em plena atividade seria uma hipótese bem plausível (há algumas tarefas os aprendizes não devem fazer). Já a sua de 1924, ele estaria casado, com 29, seria um profissional capacitado e independente do seu antigo mestre. Com relação à de 1935, pudemos somente observar superficialmente. Pelas bitolas da madeiras empregadas, e alguns acabamentos pode-se afirmar que seja da mesma escola e carpinteiro. Porém, seria necessário avaliar mais profundamente isso num futuro restauro. É importante ressaltar, que um Mestre carpinteiro pode ter tido vários aprendizes, que seguiram seus padrões, mesmo décadas depois de encerrar a oficina. Só um deles, sendo seu favorito ou seu último, podia receber um livro didático ou as ferramentas, que eram poucas e caríssimas na época. Ou seja, algumas casas podem ter sido construídas com mesmos métodos, porém carpinteiros distintos vindos desta mesma “escola”. Isso ocorreu também na Alemanha. Há casas lá, exatamente iguais em características construtivas. O que torna uma diferente da outra, são pequenas “assinaturas” destes carpinteiros. Detalhes como marcas das ferramentas usadas (largura do formão), as medidas de certas partes, a marcação por Runas, encaixes especiais, etc.

A casa de 1913, idêntica em encaixes, bitolas de madeira e numeração empregada. Inclusive com o V invertido.

Numeração na casa de 1913 similar à de 1924. A Runa X está depois do Nr.




Avaliando o trabalho de Albert Friedel, pelo uso de peças com emendas indica que

na época trabalhava boa parte do processo sozinho ou com somente um auxiliar. Isto também foi constatado depois na montagem, Era tão fácil, que poderia ser feito tranquilamente por duas pessoas. Há também a possibilidade que na região não havia engenhos de serrar com capacidade para peças grandes ou como já mencionamos anteriormente, pela falta de importações de peças e máquinas para serrar. Mas é mais provável que usado este artífice devido a sua pequena estrutura como empresa. Notamos também a boa qualidade dos corte feitos e da escolhas das madeiras. Apesar de não ter os melhores recursos, o carpinteiro era bastante habilidoso e fazia um trabalho bem preciso. Este provavelmente tinha uma estrutura simples. Na questão de qualidade de trabalho, era um carpinteiro muito hábil e cuidadoso com os cortes. Foi uma das melhores casas que encontramos em relação a ângulos aplicados e alguns encaixes estavam com ajuste muito bom, as peças deslizava perfeitamente. Já em outros aspectos havia algumas emendas que não funcionaram adequadamente e foram reforçados com pinos gigantes. Não havia numeração secundária em algumas peças e alguns encaixes estavam fora de medida. É até irônico, porque quando observamos o trabalho feito por nossos próprios aprendizes, ocorrem exatamente os mesmos erros. E boa parte acontece quando o mestre não está olhando. Mas neste caso, considerando que a casa era para ele próprio, pela pressa em terminar, dificuldades e falta de recursos, há de se compreender e apreciar seu desempenho.




Montagem

A montagem da casa ocorreu na primeira semana de Dezembro. Contamos com um excelente tempo, sem chuvas e apenas um calor excessivo.

O fundamento tinha recebido diversas melhorias e agora estava bem nivelado e cosntruído. Foram colocados novos pilares, maiores em tamanho e quantidade. Os anteriores não eram bem dimensionados e outros eram improvisados da remoção do Baldrame no lado Sul. O trabalho de fundamento foi realizado pelo proprietário Darlei Friedel.

Nossa primeira providencia foi isolar os pilares com asfalto em pasta (ISOL2-Otto Baumgarten) antes de colocar as madeiras. Após alguns minutos de secagem as madeiras do baldrame já podiam ser colocadas sobre os pilares.

Aplicando o isolante nos pilares antes de colocar as peças. Baldrames colocados

Uma medida de prevenção contra a umidade, foi

de se fazer vários furos de 6mm para drenagem da água que acumula nos encaixes, principalmente nas laterais.

A montagem de uma casa Enxaimel revela sua grande vantagem prática. Ao longos

dos séculos sempre se destacou por sua velocidade de montagem. E nesta oportunidade é possível refazer exatamente este procedimento. Não há necessidade de medições, ajustes ou retrabalhos. As peças são selecionadas conforme a sua numeração, colocadas em seus respectivos locais e logo recebem um pino de madeira para fixar. No grupo, um fica responsável por martelar os pinos e outros localizam e colocam as peças em seus devidos lugares. É um processo rápido e infalível. Desnecessário até de se tentar otimizar. O único recurso que adotamos é de utilizar um guindaste para colocar as peças do telhado. E este é mais por questões de segurança.




Alguns sarrafos foram colocados por segurança. Como os encaixes eram curtos, não tinham muita estabilidade.




As escoras desta casa, tinham cortes precisos e bem feitos. Os travessões se encaixavam com um ajuste deslizante, sem fazer pressão ou folgado demais. Em qualquer casa enxaimel é o principal ponto a observar ao se avaliar a qualidade do trabalho.

Atentos na numeração, um busca o travessão, outro a coluna e o terceiro aplica os pinos.




Após todas as paredes terem sido colocadas, vão sendo montados os frechais. Com estes pinados a casa já ganha sua rigidez e alinhamento. O uso de peças curtas facilitou bastante a montagem. Demonstrou praticidade e segurança.




Tendo condições de usar o guindaste, as partes do telhado são previamente montadas e posicionadas em seus respectivos lugares na casa. Este método, não só poupa tempo como a necessidade de estaleiros exclusivos para colocar as peças mais pesadas sobre a casa. Além de eliminar o risco de acidentes graves por estar fazendo força em locais perigosos.




Detalhe dos furos e encaixe “rabo de andorinha” sob a viga.




Na colocação dos caibros dos “puxados” fundos e varandas surgiu a dúvida de se devíamos manter o uso de pregos como existia ou utilizaríamos pinos de madeira. No final optou-se por pregos por ter sido o método usado originalmente na casa. Não encontramos até hoje alguma casa com puxados que possua algum tipo de encaixe específico nesta aplicação. Em nossos próprios projetos, nestes casos, utilizamos 1 a 2 pinos de madeira, além de um ressalto para assentar a peça.

Todo o processo de montagem levou 4 dias.Terminada a parte da estrutura, a cobertura de telhas e o preenchimento com tijolos já podia ser feito. Essa parte ficou sob responsabilidade do proprietário. Alguns acabamentos e reaplicação do tratamento em algumas partes foram feitos algumas semanas depois, já com o telhado.




Agradecimentos Nossos sinceros agradecimentos à Família Friedel e a Fundação Cultural de Jaraguá

do Sul pela oportunidade de realizarmos este trabalho. Esperamos que nosso trabalho tenha sido satisfatório e que dure por muito tempo.

Participantes do Restauro Casas Enxaimel

Paulo Volles Gisele Diel Max Diel Volles Arno Diel Divo Pazzeto Fundação Cultural de Jaraguá do Sul

Arq. Carlos Baratto Proprietários

Darlei Friedel Lili Zickhur Friedel Este relatório irá passar por uma revisão até o mês de Maio. Quando será

gravada sua versão definitiva e esperamos inserir ainda algumas informações que ficaram

de ser comprovadas... Sinta-se à vontade de incluir comentários e informações.

restauração completa casa friedel jaraguá do sul - sc...a casa está situada em jaraguá do sul,...

Documents