resenha verossimilhansa indice

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DA VEROSSIMILHAN˙A AO ˝NDICE* Pequena retrospectiva histórica sobre a questªo do realismo na fotografia Philippe Dubois, O Ato FotogrÆfico. Campinas, Papirus, 1994. Tudo o que eu disse deriva finalmente dessa particularidade fundamental do meio fotogrÆfi- co: os próprios objetos físicos imprimem sua imagem por intermØdio da açªo ótica e química da luz. Esse fato foi sempre reconhecido, mas tratado de muitas maneiras diferentes por aqueles que escreveram sobre o assunto. Rudolf Arnheim, 1981(1) * Esse capítulo foi escrito em colaboraçªo com GeneviLve Van Cauwenberge. Toda reflexªo sobre um meio qualquer de expressªo deve se colocar a questªo fundamental da relaçªo específica existente entre o referente externo e a mensagem produzida por esse meio. Trata-se da questªo dos modos de representaçªo do real ou, se quisermos, da questªo do realismo. Ora, caso jÆ se dirija a qualquer produçªo com pretensªo documental - textos escritos (reportagem jornalística, diÆrio de bordo etc.), representaçıes grÆficas, cartogrÆficas, picturais etc. -, essa questªo de fundo muito geral coloca-se com uma acuidade ainda mais nítida quando essas produçıes procedem da fotografia (ou do cinema). Existe uma espØcie de consenso de princípio que pretende que o verdadeiro documento fotogrÆfico presta contas do mundo com fidelidade. Foi-lhe atribuída uma credibilidade, um peso de real bem singular. E essa virtude irredutível de testemunho baseia-se principalmente na consciŒncia que se tem do processo mecânico de produçªo da imagem fotogrÆfica, em seu modo específico de constituiçªo e existŒncia: o que se chamou de automatismo de sua gŒnese tØcnica. Se admitimos muitas vezes com bastante facilidade que o explorador pode relativa- mente fabular quando volta de suas viagens e elaborar, portanto, por exemplo para impressi- onar seu ouvinte, narrativas mais ou menos hiperbólicas, em que a parcela de fantasia e de imaginÆrio estÆ longe de ser negligenciÆvel, ao contrÆrio, a fotografia, pelo menos aos olhos da doxa e do senso comum, nªo pode mentir. Nela a necessidade de ver para crer Ø satis- feita. A foto Ø percebida como uma espØcie de prova, ao mesmo tempo necessÆria e suficien- te, que atesta indubitavelmente a existŒncia daquilo que mostra. Proponho-me a retraçar no presente capítulo um percurso histórico das diversas posiçıes defendidas no decorrer da história pelos críticos e teóricos da fotografia quanto a esse princí- pio de realidade próprio à relaçªo da imagem fotoquímica com seu referente. É claro que sei que o problema Ø antigo, pelo menos tªo velho quanto a própria fotografia; mas, a meu ver, hoje o debate adquire um aspecto novo e importante no plano teórico. A fim de apreender bem essa nova atitude, convØm pelo menos colocÆ-la em perspectiva atravØs justamente de uma retrospectiva dos pontos de vista sobre essa questªo muito antiga tantas vezes debatida. Em linhas gerais, esse percurso vai se articular em trŒs tempos: 1) a fotografia como espelho do real (o discurso da mimese). O efeito de realidade ligado à imagem fotogrÆfica foi a princípio atribuído à semelhança existente entre a foto e seu refe- rente. De início, a fotografia só Ø percebida pelo olhar ingŒnuo como um analogon objetivo do real. Parece mimØtica por essŒncia. 2) a fotografia como transformaçªo do real (o discurso do código e da desconstruçªo). Logo se manifestou uma reaçªo contra esse ilusionismo do espelho fotogrÆfico. O princípio de realidade foi entªo designado como pura impressªo, um simples efeito. Com esforço

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Resenha do capítulo I do livro O Ato Fotográfico.

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  • DA VEROSSIMILHANA AO NDICE*

    Pequena retrospectiva histrica sobre a questo do realismo na fotografia

    Philippe Dubois, O Ato Fotogrfico. Campinas, Papirus, 1994.

    Tudo o que eu disse deriva finalmente dessa particularidade fundamental do meio fotogrfi-co: os prprios objetos fsicos imprimem sua imagem por intermdio da ao tica e qumicada luz. Esse fato foi sempre reconhecido, mas tratado de muitas maneiras diferentes poraqueles que escreveram sobre o assunto.

    Rudolf Arnheim, 1981(1)

    * Esse captulo foi escrito em colaborao com Genevive Van Cauwenberge.

    Toda reflexo sobre um meio qualquer de expresso deve se colocar a questo fundamentalda relao especfica existente entre o referente externo e a mensagem produzida por essemeio. Trata-se da questo dos modos de representao do real ou, se quisermos, da questodo realismo. Ora, caso j se dirija a qualquer produo com pretenso documental - textosescritos (reportagem jornalstica, dirio de bordo etc.), representaes grficas,cartogrficas, picturais etc. -, essa questo de fundo muito geral coloca-se com uma acuidadeainda mais ntida quando essas produes procedem da fotografia (ou do cinema). Existeuma espcie de consenso de princpio que pretende que o verdadeiro documento fotogrficopresta contas do mundo com fidelidade. Foi-lhe atribuda uma credibilidade, um peso dereal bem singular. E essa virtude irredutvel de testemunho baseia-se principalmente naconscincia que se tem do processo mecnico de produo da imagem fotogrfica, em seumodo especfico de constituio e existncia: o que se chamou de automatismo de sua gnesetcnica. Se admitimos muitas vezes com bastante facilidade que o explorador pode relativa-mente fabular quando volta de suas viagens e elaborar, portanto, por exemplo para impressi-onar seu ouvinte, narrativas mais ou menos hiperblicas, em que a parcela de fantasia e deimaginrio est longe de ser negligencivel, ao contrrio, a fotografia, pelo menos aos olhosda doxa e do senso comum, no pode mentir. Nela a necessidade de ver para crer satis-feita. A foto percebida como uma espcie de prova, ao mesmo tempo necessria e suficien-te, que atesta indubitavelmente a existncia daquilo que mostra.

    Proponho-me a retraar no presente captulo um percurso histrico das diversas posiesdefendidas no decorrer da histria pelos crticos e tericos da fotografia quanto a esse princ-pio de realidade prprio relao da imagem fotoqumica com seu referente. claro que seique o problema antigo, pelo menos to velho quanto a prpria fotografia; mas, a meu ver,hoje o debate adquire um aspecto novo e importante no plano terico. A fim de apreenderbem essa nova atitude, convm pelo menos coloc-la em perspectiva atravs justamente deuma retrospectiva dos pontos de vista sobre essa questo muito antiga tantas vezes debatida.Em linhas gerais, esse percurso vai se articular em trs tempos:

    1) a fotografia como espelho do real (o discurso da mimese). O efeito de realidade ligado imagem fotogrfica foi a princpio atribudo semelhana existente entre a foto e seu refe-rente. De incio, a fotografia s percebida pelo olhar ingnuo como um analogon objetivodo real. Parece mimtica por essncia.

    2) a fotografia como transformao do real (o discurso do cdigo e da desconstruo). Logose manifestou uma reao contra esse ilusionismo do espelho fotogrfico. O princpio derealidade foi ento designado como pura impresso, um simples efeito. Com esforo

  • tentou-se demonstrar que a imagem fotogrfica no um espelho neutro, mas um instrumen-to de transposio, de anlise, de interpretao e at de transformao do real, como alngua, por exemplo, e assim, tambm, culturalmente codificada.

    3) a fotografia como trao de um real (o discurso do ndice e da referncia). Por mais til enecessrio que tenha sido, esse movimento de desconstruo (semiolgica) e de denncia(ideolgica) da impresso de realidade deixa-nos contudo um tanto insatisfeitos. Algo desingular, que a diferencia dos outros modos de representao, subsiste apesar de tudo naimagem fotogrfica: um sentimento de realidade incontornvel do qual no conseguimos noslivrar, apesar da conscincia de todos os cdigos que esto em jogo nela e que se combina-ram para a sua elaborao. Na foto, diz R. Barthes em La chambre claire(2) [A cmaraclara], o referente adere em direo a tudo e contra tudo. Diante da imagem fotogrfica,no se pode evitar o que J. Derrida qualifica em La verit en peinture(3) [A verdade empintura] de processo de atribuio, por meio do qual se remete inevitavelmente a imagema seu referente. Deve-se, portanto, prosseguir a anlise, ir alm da simples denncia doefeito de real: deve-se interrogar segundo outros termos a ontologia da imagem fotogrfi-ca.

    nesse estgio que se situam algumas pesquisas atuais ps-estruturalistas (entre as quais apresente), que encontraram apoio, por exemplo, em certos conceitos das teorias de Ch. S.Peirce, em particular na noo de ndice (por oposio a cone e a smbolo)(4), que algunsvem como que uma lgica, seno uma epistemologia da qual a imagem fotogrfica fornece-ria um modelo exemplar.

    esse percurso, da verossimilhana ao ndice, que pretendo restituir nessas linhas gerais.

    A fotografia como espelho do real

    Trata-se aqui do primeiro discurso (e primrio) sobre a fotografia. Esse discurso j estcolocado por inteiro desde o incio do sculo XIX (sabe-se que o nascimento da prticafotogrfica foi acompanhado de imediato por um nmero impressionante de discursos deescolta). Embora comportasse declaraes muitas vezes contraditrias e at polmicas - orade um pessimismo obscuro, ora francamente entusiastas - o conjunto de todas essas discus-ses, de toda essa metalinguagem nem por isso deixava de compartilhar uma concepo geralbastante comum: quer se seja contra, quer a favor, a fotografia nelas considerada como aimitao mais perfeita da realidade. E, de acordo com os discursos da poca, essa capacida-de mimtica procede de sua prpria natureza tcnica, de seu procedimento mecnico, quepermite fazer aparecer uma imagem de maneira automtica, objetiva, quase natural(segundo to-somente as leis da tica e da qumica), sem que a mo do artista intervenhadiretamente. Nisso, essa imagem aqueiropoieta (sine manu facta, como o vu deVernica)(5) se ope obra de arte, produto do trabalho, do gnio e do talento manual doartista.

    A partir dessa clivagem (foto versus obra de arte) e dessa concepo mimtica, todo o discur-so sobre a foto da poca comea a funcionar e a se resolver, ora na denncia, ora no elogio.Em sua famosssima diatribe, Baudelaire lidera os que denunciam:

    Em matria de pintura e estaturia, o Credo atual das pessoas de sociedade, principalmentena Frana (e no acredito que algum ouse afirmar o contrrio) o seguinte: Acredito na

    natureza e s acredito na natureza (h boas razes para isso). Acho que a arte e s pode sera reproduo exata da natureza(...). Assim, a indstria que nos desse um resultado idntico natureza seria a arte absoluta. Um Deus vingador acolheu favoravelmente os desejos dessa

  • multido. Daguerre foi seu Messias. E ento ela disse para si: Como a fotografia nos pro-porciona todas as garantias desejveis de exatido (eles acreditam nisso, os insensatos!), aarte a fotografia. A partir desse momento, a sociedade imunda precipitou-se, como umnico Narciso, para contemplar sua imagem trivial no metal. Uma loucura, um fanatismo

    extraordinrio apoderou-se de todos esses novos adoradores do sol.(6)

    intil comentar longamente esse texto conhecido. Vamos apenas assinalar, principalmenteprolongando o interessante comentrio fornecido a esse respeito por Jean Franois Chvrier(em sua entrevista com Gilles Delavaud, publicada em Education 2000, n 17, Lexprience

    photographique, 1980, pp. 18-19), at que ponto ele tem valor de sintoma do verdadeirotrauma que o surgimento da fotografia provocou entre os artistas e em toda a sociedade do

    sculo XIX. A mutao tcnica enorme. Desperta todo um fundo mitolgico formado simul-taneamente de medo e atrao ( a ambivalncia caracterstica de Baudelaire que, ao mesmotempo em que denuncia com virulncia o gosto da multido pela foto, nem por isso deixoude pedir que Nadar e Carjat fizessem seu retrato vrias vezes, com o sucesso que conhece-

    mos, e nem por isso deixou de testemunhar o desejo - muito edipiano - de ter o retrato foto-grfico de sua me)(7). Nessa oscilao, a atitude de Baudelaire exemplar: o novo soladorado pela multido idlatra com certeza a luz que entra na caixa escura, imprime a

    imagem, sem que o fotgrafo tenha algo a ver com isso: ele contenta-se em assistir cena,no passa do assistente da mquina. Uma parte da criao - sua parte essencial, nodal,

    constitutiva - escapou-lhe. Todo o sculo XIX, na esteira do romantismo, trabalhado dessemodo pelas reaes dos artistas contra o domnio crescente da indstria tcnica na arte,

    contra o afastamento da criao e do criador, contra a fixao no sinistro visvel em detri-mento das realidades interiores e das riquezas do imaginrio, e isso justamente no

    momento em que a perfeio imitativa aumentou e objetivou-se.

    Menos virulentos decerto, mas inspirados pela mesma lgica, esses discursos claramentediscriminadores de um grande contemporneo de Baudelaire, Hippolyte Taine:

    ...a fotografia a arte que, numa superfcie plana, com linhas e tons, imita com perfeio esem qualquer possibilidade de erro a forma do objeto que deve reproduzir. Sem qualquerdvida a fotografia um instrumento til arte pictural. manejada muitas vezes comgosto por gente culta e inteligente, mas, afinal, nem se cogita compar-la com a pintura.

    (Philosophie de lart, 1865, t.I, p. 25.)

    Em tal ideologia, aparece de imediato a necessidade de clivar as coisas, assinalar bem asdiferenas, denunciar as confuses, reservando a cada prtica seu campo prprio: a arte aqui

    (a pintura), a indstria ali(a foto). Baudelaire ainda o mais explcito(8):

    Esse trecho tambm esclarece as circunstncias de surgimento de uma tcnica(9). O que importante apontar aqui a clivagem que Baudelaire estabelece com vigor entre a fotografiacomo simples instrumento de uma memria documental do real e a arte como pura criaoimaginria. O papel da fotografia conservar o trao do passado ou auxiliar as cincias em

    seu esforo para uma melhor apreenso da realidade do mundo. Em outras palavras, naideologia esttica de sua poca, Baudelaire recoloca com clareza a fotografia em seu lugar:

    ela um auxiliar (um servidor) da memria, uma simples testemunha do que foi. No deveprincipalmente pretender invadir o campo reservado da criao artstica. O que sustenta

    tal afirmao evidentemente uma concepo elitista e idealista da arte como finalidade semfim, livre de qualquer funo social e de qualquer arraigamento na realidade. Para

    Baudelaire, uma obra no pode ser ao mesmo tempo artstica e documental, pois a arte

  • definida como aquilo mesmo que permite escapar do real.

    A averso de Baudelaire corrente realista e naturalista e ideologia cientificista ascendenteguia, evidente, seu ponto de vista. Sua reao fotografia est ligada ao fato de ele reco-nhecer na maioria das produes fotogrficas de sua poca a forte influncia da ideologianaturalista (basta reler o final de sua carta me, citada na nota 7). No jogo complexo desua ambivalncia, parece portanto que no tanto o meio em si mesmo quanto suas utiliza-es que Baudelaire estigmatiza em primeiro lugar.

    Ao contrrio das posies de um Baudelaire, ou seja, no outro extremo do espectro dessesdiscursos do sculo XIX sobre a fotografia, existem todos os tipos de discursos e declara-es, dessa feita resolutamente otimistas e at entusiasmados, que proclamam a libertao daarte pela fotografia. Esses discursos positivos de fato baseiam-se exatamente na mesmaconcepo de uma separao radical entre a arte, criao imaginria que abriga sua prpriafinalidade, e a tcnica fotogrfica, instrumento fiel de reproduo do real. A conotao dosvalores mudou, mas a lgica permanece a mesma: porque uma tcnica muito mais bemadaptada do que a pintura para a reproduo mimtica do mundo, a fotografia v-se rapida-mente designada como aquilo que dever a partir de ento se encarregar de todas as funessociais e utilitrias at aqui exercidas pela arte pictural. Desse modo, assistiremos transfor-mao dos antigos retratistas oficiais em fotgrafos profissionais. Num ensaio premonitrioao qual voltarei adiante, Walter Benjamin observava por exemplo:

    Desde o instante em que Daguerre teve a sorte de conseguir fixar as figuras no quartoescuro, os pintores, nesse ponto, foram despedidos pelo tcnico. A verdadeira vtima da

    fotografia no foi a pintura de paisagem, foi o retrato em miniatura. As coisas andaram todepressa que, a partir de 1840, a maioria dos inmeros miniaturistas se tornaram fotgrafosprofissionais, a princpio acessoriamente, depois de maneira exclusiva.(10)

    No mesmo esprito, veremos florescer ao longo de todo o sculo XIX uma argumentao quepretende que, graas fotografia, a prtica pictural poder doravante adequar-se quilo que

    constitui sua prpria essncia: a criao imaginria isolada de qualquer contingnciaemprica. Eis a pintura de certa forma libertada do concreto, do real, do utilitrio e do soci-al. Poderamos citar muitssimas declaraes nesse sentido. Vamos contentar-nos com duas,uma de Picasso, a outra de Andr Bazin, que mostram que tal concepo perdurou de fato

    bem alm do sculo XIX. Em 1939, num dilogo com Brassai, Picasso afirma:

    Quando voc v tudo o que possvel exprimir atravs da fotografia, descobre tudo o queno pode ficar por mais tempo no horizonte da representao pictural. Por que o artista

    continuaria a tratar de sujeitos que podem ser obtidos com tanta preciso pela objetiva deum aparelho de fotografia? Seria absurdo, no ? A fotografia chegou no momento certo

    pata libertar a pintura de qualquer anedota, de qualquer literatura e at do sujeito. Em todocaso, um certo aspecto do sujeito hoje depende do campo da fotografia

    Quanto citao de Andr Bazin, tirada de seu texto (alis importante) sobre a ontologiada imagem fotogrfica (1945), que tambm parece prolongar esse tipo de discurso

    liberador - mas, como veremos adiante, que abre igualmente a problemtica para outrosdados bem mais atuais:

    Rematando o barroco, a fotografia libertou as artes plsticas de sua obsesso da semelhan-a. Pois a pintura esforava-se, no fundo em vo, em nos iludir, e essa iluso bastava arte,enquanto a fotografia e o cinema so descobertas que satisfazem definitivamente e em sua

    prpria essncia a obsesso do realismo (...). Libertado do complexo da semelhana, o pintor

  • moderno - cujo mito hoje Picasso - abandona-o ao povo que o identifica a partir de entopor um lado fotografia e, por outro, apenas pintura que se aplica a isso.(11)

    A distribuio portanto clara: fotografia, a funo documental, a referncia, o concreto, ocontedo; pintura, a busca formal, a arte, o imaginrio.

    Essa bipartio recobre claramente uma oposio entre a tcnica, por um lado, e a atividadehumana, por outro. Nessa perspectiva, a fotografia seria o resultado objetivo da neutralidadede um aparelho, enquanto a pintura seria o produto subjetivo da sensibilidade de um artistae de sua habilidade. Quer o pintor queira, quer no, a pintura transita inevitavelmente pormeio de uma individualidade. Por isso, por mais objetivo ou realista que se pretenda, osujeito pintor faz a imagem passar por uma viso, uma interpretao, uma maneira, umaestruturao, em suma, por uma presena humana que sempre marcar o quadro. Ao contr-rio, a foto, naquilo que faz o prprio surgimento de sua imagem, opera na ausncia do sujei-to. Disso se deduziu que a foto no interpreta, no seleciona, no hierarquiza. Como mqui-na regida apenas pelas leis da tica e da qumica, s pode retransmitir com preciso e exati-do o espetculo da natureza. Eis pelo menos o que fundamenta o ponto de vista comum, adoxa, o saber trivial sobre a foto.

    Uma srie de dados histricos poderia ser mencionada para confirmar todas essas considera-es. Por exemplo, viu-se com muita rapidez a fotografia ser investida de tarefas de cartercientfico ou documental: Niepce s descobriu a fotografia por acaso: procurava um meio decopiar gravuras. Desde 1839, com seus famosos photogenic drawings, William Henry FoxTalbot comea a fotografar plantas e flores para os botnicos. A tradio das reportagens fossem documentos histricos (sobre a campanha da Crimia, a guerra da Secesso etc.),fossem lbuns de viagem de pases mais ou menos distantes ou exticos - desenvolve-se numavelocidade e com uma amplitude prodigiosas. Trata-se quase sempre de estender ao mximoas possibilidades do olhar humano. Logo os homens se pem a explorar o espao (Nadar eseu balo...) rumo ao infinitamente pequeno, ou rumo ao cosmos (1840: primeirosdaguerretipos com microscpio solar de Donn. 1845: imagem do sol de Fizeau. 1851:magnfico daguerretipo da lua de John Adams Whipple com o telescpio do Observatriodo Harvard College).

    Diversas pesquisas voltam-se para o prprio dispositivo fotogrfico para melhorar seusdesempenhos. Essas pesquisas sempre iro no sentido de um melhoramento das capacida-des de mimetismo do meio. Trata-se de tornar cada vez mais verdadeiro, de estar cada vezmais prximo da viso real que temos do mundo. Em 1862: primeiras pesquisas sobre a corcom os trabalhos de Charles Cros e Ducos Du Hauron. Nessa corrida rumo verossimilhan-a, as pesquisas de uma fotografia binocular, que visasse restituir da melhor maneira possvelnossa percepo do relevo, desenvolveram-se tambm muito depressa e com intensidade.Isso comprovado, por exemplo, pelas seguintes linhas de Olivier Wendell Holmes, de 1859,que dizem respeito inveno do Estereoscpio por Ch. Wheatstone:

    O primeiro efeito que se sente ao se olhar uma boa fotografia atravs de um estereoscpio uma tamanha surpresa que nenhuma pintura jamais conseguiu provocar. O esprito avanano prprio interior da profundidade da imagem. Os galhos nus de uma rvore no primeiro

    plano sobressaem em nossa direo como se quisessem arrancar-nos os olhos. O cotovelo deuma figura avana tanto que nos incomoda. H tambm uma quantidade incrvel de deta-

    lhes, a ponto de sentirmos o mesma sensao de complexidade infinita que experimentamosdiante da Natureza. Um pintor mostra-nos apenas massas; j a figura estereoscpica nadanos poupa - tudo deve estar ali, cada basto, cada palhinha, arranho, to autntico e realquanto o domo de So Pedro ou o pico do Mont Blanc, ou ainda a tranqilidade sempre

  • movedia do Nigara. O sol no poupa pessoas ou coisas.(12)

    intil prolongar infinitamente essa lista de exemplos. Para encerrar esta primeira parte dotrabalho sobre o discurso da mimese fotogrfica, vamos simplesmente nos contentar em

    evocar uma espcie de prova a contrrio: quando, no final do sculo XIX, alguns fotgrafosquiseram ir contra toda a tradio que acabamos de evocar, ou seja, quando pretenderam,

    apesar de tudo, tornar a fotografia uma arte, disso decorreu, como por acaso, o que foichamado de pictorialismo. Pretendendo reagir contra o culto dominante da foto como

    simples tcnica de registro objetivo e fiel da realidade, os pictorialistas no conseguem pro-por algo alm de uma simples inverso: tratar a foto exatamente como uma pintura, manipu-

    lando a imagem de todas as maneiras: efeitos sistemticos de flou como um desenho,encenao e composio do sujeito, e sobretudo: inmeras intervenes posteriores sobre oprprio negativo e sobre as provas, com pincis, lpis, instrumentos e vrios produtos. O

    pictorialismo no faz outra coisa, finalmente, alm de demonstrar pela negativa a onipotnciada verossimilhana nas concepes da fotografia no sculo XIX.

    Antes de chegar segunda parte desse panorama (a fotografia como transformao do real),eu gostaria de abrir um parntese. Embora caracterize maciamente as estticas do sculoXIX, o discurso da mimese, tal como acabamos de evocar em linhas (muito) gerais, nem porisso se detm bruscamente em 1901. Ter muitos prolongamentos no sculo XX, como jassinalamos. Exemplos escolhidos ao acaso: Roger Munier, em 1964 em Contre limage[Contra a imagem]: A fotografia apagamento total diante do real com o qual coincide. omundo tal como , em sua verdade imediata, seja ela reproduzida no papel ou na tela. E, naEncyclopdie Franaise: Toda obra de arte reflete a personalidade de seu autor. A placafotogrfica, ela prpria, no interpreta. Registra. Sua exatido e sua fidelidade no podemser recolocadas em questo. Etc. Gostaria de apresentar, bem rapidamente, dois casosparticulares, porque tiveram grande importncia terica e sobretudo porque, ao mesmotempo que pareciam inscrever a imagem fotogrfica na perspectiva da semelhana, podemser tambm considerados como primeiras balizas - ainda implcitas, ambguas e um poucoconfusas - do que constituir nossa terceira parte: um discurso da referncia, alm do discur-so do cdigo e da desconstruo.

    Esses dois textos, que vm portanto deslocar levemente a questo do realismo, so os, cle-bres, de Andr Bazin, por um lado (Ontologia da imagem fotogrfica, 1945)(13), e deRoland Barthes, por outro (A mensagem fotogrfica, 1961)(14).

    Quando acredita estar apresentando o que considera como essncia da fotografia, Bazin,como j dissemos, parece inscrever-se na linha das concepes que acabamos de passar emrevista:

    A originalidade da fotografia com relao pintura reside em sua objetividade essencial.Tambm, o grupo de lentes que constitui o olho fotogrfico que substitui o olho humano

    chama-se precisamente objetiva. Pela primeira vez, entre o objeto inicial e sua representa-o, nada se interpe alm de um outro objeto. Pela primeira vez, uma imagem do mundoexterior forma-se automaticamente sem interveno criadora do homem de acordo com um

    determinismo rigoroso(...). Todas as artes baseiam-se na presena do homem; apenas nafotografia usufrumos sua ausncia. Ela age sobre ns como fenmeno natural, como uma

    flor ou um cristal de neve cuja beleza inseparvel das origens vegetais ou telricas.

    Insistncia das mais ntidas sobre a naturalidade e objetividade da imagem fotogrfica. Mas- e isso novo - esse automatismo na constituio da imagem no designado como necessa-

    riamente produtor de semelhana. Com certeza Bazin no disse que no existe mimese na

  • foto, longe disso. Porm, no isso realmente que importa. A semelhana para Bazin nopassa de um resultado, de uma caracterstica do produto fotogrfico. Ora, o que interessa aele no a imagem feita, mais o prprio fazer, suas modalidades de constituio. E esse

    fato que importante, e ele o diz com todas as letras: A soluo no est no resultado, masna gnese. Essa gnese automtica. A ontologia da foto est, em primeiro lugar, nisso. Nono efeito de mimetismo, mas na relao de contigidade momentnea entre a imagem e seu

    referente, no princpio de uma transferncia das aparncias do real para a pelcula sensvel. Aidia do trao, da marca, est implicitamente presente nesse tipo de discurso. Para falar nos

    termos de Ch. S. Peirce, existe, no final das concepes de Bazin, a idia de que a foto antes de mais nada ndice antes de ser cone. O realismo no negado de forma alguma,

    deslocado.

    Essa gnese automtica provocou uma reviravolta radical na psicologia da imagem. A objeti-vidade da fotografia confere-lhe um poder de credibilidade ausente de qualquer obra

    pictural. Quaisquer que sejam as objees de nosso esprito crtico, somos obrigados aacreditar na existncia do objeto representado, ou seja, tornado presente no tempo e no

    espao. A fotografia beneficia-se de uma transferncia de realidade da coisa para sua repro-duo.

    Por sua gnese automtica, a fotografia testemunha irredutivelmente a existncia do referen-te, mas isso no implica a priori que ela se parea com ele. O peso do real que a caracteriza

    vem do fato de ela ser um trao, no de ser mimese.

    Quanto ao texto de R. Barthes, parece tambm primeira vista, e mais ainda que o prece-dente, inscrever-se no prolongamento das concepes sobre a essncia mimtica da foto:

    Qual o contedo da mensagem fotogrfica? O que a fotografia transmite? Por definio, aprpria cena, o real literal. Do objeto sua imagem, existe decerto reduo: de proporo,

    de perspectiva e de cor. Mas essa reduo no em momento algum uma transformao (nosentido matemtico do termo). Para passar do real sua fotografia, no absolutamente

    necessrio recortar esse real em unidades e constituir essas unidades em signos substancial-mente diferentes do objeto que do para ler; entre esse objeto e sua imagem, no em abso-luto necessrio dispor uma etapa, ou seja, um cdigo; decerto a imagem no o real; mas ela pelo menos seu analogon perfeito, e precisamente essa perfeio analgica que, diante dosenso comum, define a fotografia. Assim aparece a condio particular da imagem fotogrfi-ca: uma mensagem sem cdigo.

    Essa passagem famosa fez correr muita tinta, principalmente em pleno perodo semitico-estruturalista. Tal como , o texto com certeza muito ambguo, e sua formulao decerto

    no muito bem-sucedida (em particular a palavra analogon e a prpria noo de analo-gia, que no cessa de ser flutuante e indefinida). Todavia, se considerarmos esse texto luzdas consideraes ulteriores de Barthes sobre a fotografia (em particular em La chambreclaire), percebe-se que, por trs das ambigidades de formulao, uma concepo menos

    mimtica do que parece nele trabalha subterraneamente. Aqui, o importante no a idia daperfeio analgica, mas a de mensagem sem cdigo, que corresponde de fato bastante

    bem noo de gnese automtica em Bazin. O problema em Barthes que eleabsolutizou essa noo. Mas desenvolverei tudo isso adiante, na terceira parte deste estudo,sobre o discurso da referncia. Antes disso, devo apresentar o que chamei de discursos do

    cdigo e da desconstruo.

    A fotografia como transformao do real

  • Se, de maneira geral, o discurso do sculo XIX sobre a imagem fotogrfica o da semelhan-a, seria possvel dizer, sempre globalmente, que j o sculo XX insiste mais na idia datransformao do real pela foto. Provavelmente a grande onda estruturalista constitui umaespcie de ponto culminante de todo esse vasto movimento crtico de denncia do efeito dereal (ver, por exemplo, as anlises semiolgicas de um Christian Metz sobre o que chama deimpresso de realidade no cinema)(15). Quase no insistirei aqui sobre tais discursossemiticos padro, muitas vezes bastante conhecidos e cujos efeitos analticos desempenha-ram bem o seu papel (ver, alm de Metz, os trabalhos de Umberto Eco, Roland Barthes,Ren Lindekens, Grupo m etc.)(16). Evocarei principalmente, para mostrar o quanto essenovo ponto de vista desconstrutor sobre a imagem foi divulgado, a pregnncia desse discursoem trs outros setores do saber: em primeiro lugar, em textos de teoria da imagem inspiradosna psicologia da percepo e que so bem anteriores ao estruturalismo francs ps-1965(Arnheim, Kracauer); em seguida nos estudos posteriores a este, ou contemporneos, e quetm um carter explicitamente ideolgico (Damisch, Bourdieu, Baudry e os Cahiers duCinma); finalmente, nos discursos que dizem respeito aos usos antropolgicos da foto. Emtodos esses casos, vai se tratar de textos que se insurgem contra o discurso da mimese e datransparncia, e sublinham que a foto eminentemente codificada (sob todos os tipos deponto de vista: tcnico, cultural, sociolgico, esttico etc.). Para terminar veremos que essacodificao desloca a noo de realismo de sua fixao emprica para o que se poderia cha-mar de princpio de uma verdade interior (Diane Arbus).

    Em primeiro lugar, convm assinalar que essa posio terica que insiste na parcela de trans-formao do real necessariamente operada pelo meio fotogrfico j apresenta vestgios desdeo sculo XIX, num modo decerto menor e muitas vezes apagado, mas assim mesmo explcito.Como, por exemplo, esse texto de Lady Elizabeth Eastlake, publicado em 1857:

    Conseqentemente, evidente que, qualquer que seja o sucesso que a fotografia possa terquanto a uma estrita imitao dos jogos de sombra e de luz, nem por isso deixa de falhar na

    restituio de um verdadeiro chiaroscuro, ou na verdadeira imitao da luz e da obscuridade.E, mesmo se o mundo no qual nos encontramnos, em vez de se exibir diante de nossos olhoscom todas as variedades de uma paleta colorida, s fosse constitudo de duas cores - o preto

    e o branco com todos os seus graus intermedirios - e se qualquer figura fosse vista emmonocromo, como as observadas por Berlin Nicolai com seus problemas de viso mesmo

    ento a fotografia ainda no poderia copi-las corretamente. Devemos nos lembrar de que aNatureza no apenas feita de sombras e luzes verdadeiras, diretas; por trs dessas massasmuito elementares, possui inmeras luzes e meios-tons refletidos que brincam ao redor de

    cada objeto, arredondam as arestas mais cortantes, iluminam as zonas mais escuras, clareiamos lugares cobertos de sombras, o que o pintor experiente se deleita em restituir.(17)

    O que esse texto indica, muito fragmentariamente, portanto a inaptido da fotografia paraexibir toda a sutileza das nuanas luminosas e no apenas reduzindo o espectro de cores a

    simples jogos de dgrads do preto ao branco.

    De fato, como se sabe, se observarmos concretamente a imagem fotogrfica, ela apresentamuitas outras falhas na sua representao pretensamente perfeita do mundo real. Obser-varemos, alis, para terminar nossas observaes sobre o sculo XIX, que nas polmicasmuito vivas sobre a questo da fotografia como arte, os defensores de sua vocao artsticae em particular os pictorialistas, j evocados, evidentemente no cessaram de colocar emevidncia essas lacunas, essas carncias, essas fraquezas do espelho fotogrfico, paraatacar e invalidar a idia segundo a qual a essncia da fotografia estaria em ser unicamenteuma reproduo mecnica fiel e objetiva da realidade(18).

  • No sculo XX, toda essa argumentao ser retomada com vigor, sistematizada e amplificadaem vrios sentidos. Como anunciei, vou comear evocando esse discurso por meio de estudosque se inspiram em teorias da percepo e, em particular, na perspectiva dos escritos deRudolf Arnheim em sua obra Film as art(19). Nesse livro, Arnheim prope uma enumeraosinttica das diferenas aparentes que a imagem apresenta com relao ao real: em primeirolugar, a fotografia oferece ao mundo uma imagem determinada ao mesmo tempo pelo ngulode viso escolhido, por sua distncia do objeto e pelo enquadramento; em seguida, reduz,por um lado, a tridimensionalidade do objeto a uma imagem bidimensional e, por outro,todo o campo das variaes cromticas a um contraste branco e preto; finalmente, isola umponto preciso do espao-tempo e puramente visual (s vezes sonora no caso do cinemafalado), excluindo qualquer outra sensao olfativa ou ttil. Como se v, tal desconstruodo realismo fotogrfico baseia-se por inteiro numa observao da tcnica fotogrfica e deseus efeitos perceptivos. Nesse sentido, seria possvel ver nesse tipo de consideraes umaespcie de prefigurao do ponto de vista que guiou Andr Bazin em seu texto j citado(lembremos: para Bazin, no o resultado que conta - a imagem feita - mas a gnese, o modode constituio desta). Contudo, a diferena que separa essas duas posies - ela importan-te e sintomtica - que Arnheim, nesse texto, prende-se a uma atitude puramente negativado processo (trata-se para ele de reagir contra o discurso do mimetismo, ainda predominantena poca), enquanto Bazin, como j sugeri, testemunha ento uma atitude mais positivaquanto s conseqncias tericas desses dados tcnicos, que anuncia os atuais discursos dareferncia, que evocarei adiante e que finalmente esto livres da obsesso do mimetismo, doefeito do real a ser desconstrudo. O prprio Arnheim, num de seus textos mais recentes(1981), voltou questo e declara explicitamente a propsito de suas concepes no livro de1932:

    Nesse livro j antigo, eu tentava refutar a acusao segundo a qual a fotografia nada maisera do que uma cpia mecnica da natureza. Tal abordagem era colocada em reao contra

    essa concepo estreita que prevalecera desde Baudelaire (...). Num sentido, tratava-se l deuma abordagem negativa(...). Eu s estava ento secundariamente interessado pelas virtudespositivas que derivavam da qualidade mecnica de suas imagens.(20)

    Mais engajadas e radicais na via dessa denncia do realismo fotogrfico, vm em seguida asanlises de carter mais ou menos francamente ideolgico, que contestaro a pretensa neu-tralidade da cmera escura e a pseudo-objetividade da imagem fotogrfica. Um dos textos

    tericos mais famosos a esse respeito provavelmente o artigo de Jean-Louis Baudry, produ-zido na esteira do ps-maio de 1968 e intitulado: Cinema: efeitos ideolgicos produzidospelo aparelho de base(21). No insistirei nesse texto conhecido demais. Indicarei apenas

    que outros trabalhos o precederam mais ou menos nesse ponto, em particular os de HubertDamisch (em 1963) e de Pierre Bourdieu (em 1965) que, em perspectivas diferentes, insistem

    ambos no fato de que a cmara escura no neutra e inocente, mas que a concepo deespao que ela implica convencional e guiada pelos princpios da perspectiva renascentista.

    Hubert Damisch:

    A aventura da fotografia comea com as primeiras tentativas de o homem reter uma imagemque aprendera a formar de longa data (provavelmente os astrnomos rabes utilizavam a

    cmera obscura desde o sculo XI para observar os eclipses do sol). Essa longa familiaridadecom a imagem assim obtida e o aspecto bem objetivo e, por assim dizer, automtico, em todoo caso estritamente mecnico, do processo de registro explica que a representao fotogrfi-ca em geral parea caminhar por conta prpria e que no se preste ateno em seu carter

    arbitrrio, altamente elaborado (...). Esquece-se de que a imagem da qual os primeirosfotgrafos pretenderam apoderar-se, e a prpria imagem latente que souberam revelar e

  • desenvolver, essas imagens nada tm de um dado natural: pois os princpios que presidem construo de um aparelho fotogrfico - e a princpio da cmara escura - esto vinculadosa uma noo convencional do espao e da objetividade que foi elaborada antes da invenofotogrfica e qual os fotgrafos, em sua imensa maioria, s fizeram se adequar. O prprioobjetivo do qual se corrigiu com cuidado as aberraes e se reparou os erros, esse obje-

    tivo no o tanto quanto parece: digamos que satisfaz, por sua estrutura e pela imagemorganizada do mundo que permite obter, a um sistema de construo do espao particular-mente familiar, mas j bem antigo e carcomido, ao qual a fotografia ter conferido tardia-

    mente uma recuperao inesperada de atualidade.(22)

    Em Un art moyen [Uma arte mdia], Pierre Bourdieu vai no mesmo sentido:

    Normalmente todos concordam em ver na fotografia o modelo da veracidade e da objetivida-de (...). E fcil demais mostrar que essa representao social tem a falsa evidncia das pr-

    noes; de fato a fotografia fixa um aspecto do real que sempre o resultado de uma seleoarbitrria e, por a, de uma transcrio: de todas as qualidades do objeto, so retidas apenasas qualidades visuais que se do no momento e a partir de um nico ponto de vista; estas sotranscritas em preto e branco, geralmente reduzidas e projetadas no plano. Em outras pala-vras, a fotografia um sistema convencional que exprime o espao de acordo com as leis daperspectiva (seria necessrio dizer, de uma perspectiva) e os volumes e as cores por interm-

    dio de dgrads do preto e do branco. Se a fotografia considerada um registro perfeitamen-te realista e objetivo do mundo visvel porque lhe foram designados (desde a origem) usos

    sociais considerados realistas e objetivos. E, se ela se props de imediato com as aparn-cias de uma linguagem sem cdigo nem sintaxe, em suma de uma linguagem natural,

    antes de mais nada porque a seleo que ela opera no mundo visvel completamente confor-me, em sua lgica, representao do mundo que se imps na Europa desde o Quattrocento.(Paris, Minuit, 1965, pp. 108-109.)

    Eis a concepo da naturalidade da imagem fotogrfica claramente desnaturalizada. Acaixa preta fotogrfica no um agente reprodutor neutro, mas uma mquina de efeitos

    deliberados. Ao mesmo modo que a lngua, um problema de conveno e instrumento deanlise e interpretao do real.

    Outro exemplo, mais marcado e mais virulento no plano ideolgico, desses discursosdesconstrutores do efeito de real: todo o trabalho da equipe dos Cahiers du Cinma nos anos70. Em particular, o famoso nmero especial Imagens de marca (n 268-269, 1976), quecomporta um item sobre a fotografia, essencialmente sobre a fotografia de imprensa: a foto-scoop, histrica, espetacular, que se tornou smbolo dos grandes acontecimentos mundiais. justamente esse tipo de foto, considerada como um cmulo de real captado ao vivo em suaintensidade bruta e natural, que os autores se esforam por desmontar e denunciar. Assim,Alain Bergala, em seu texto Le pendule, ataca as fotos histricas estereotipadas dasquais diz que so de fato fotos inteiramente dominadas, controladas - qualquer que seja seulocal de origem - engodo de um consenso universal factcio, simulacro de uma memriacoletiva, na qual elas imprimem uma imagem de marca do acontecimento histrico, a dopoder que as selecionou para fazer calar todas as outras. Segue-se ento uma anlise defotos conhecidas, como a de Robert Capa (o republicano espanhol que morre em plena aoem 1938), a do pequeno judeu de bon erguendo os braos no gueto de Varsvia, a do mongebudista que se imola pelo fogo em 1963, a do vietnamita que chora sob seu guarda-chuvaarrastando num saco o corpo de seu filho morto etc. Bergala denuncia toda a parcela deencenao dessas imagens, toda a dimenso ideolgica de seus dispositivos de enunciaosempre ocultados: insiste nos modos de integrao do fotgrafo na ao, no efeito de parada

  • na imagem, no papel da grande angular etc.:

    Antes de mais nada, o espao da representao fotogrfica no deve deixar que dele sesuspeite como espao de enunciao. Constri-se pela grande angular como um espao

    envolvente no qual nos encontramos capturados brutalmente, mas sempre como por acaso,por acidente (...). A grande angular trabalha maciamente em benefcio do humanismo

    choramingo; isola o personagem, a vtima, em suma solido e sua dor...(23)

    Finalmente, quarta e ltima categoria de exemplos desses discursos sobre a codificao daimagem fotogrfica: depois das anlises semiticas, as consideraes tcnicas vinculadas

    percepo e s desconstrues ideolgicas, eis os propsitos determinados pelos usos antro-polgicos da foto, que mostram que a significao das mensagens fotogrficas de fato

    determinada culturalmente, que ela no se impe como uma evidncia para qualquer recep-tor, que sua recepo necessita de um aprendizado dos cdigos de leitura. Todos os homens

    no so iguais diante da fotografia, eis o que nos diz sua maneira a seguinte anedota relata-da por Alan Sekulla em seu artigo On the invention of photographic meaning:

    O antroplogo Melville Herskvits mostrou um dia a uma aborgene uma foto de seu filho.Ela foi incapaz de reconhecer a imagem at o antroplogo atrair sua ateno para os detalhes

    da foto (...). A fotografia no comunica qualquer mensagem para aquela mulher at que oantroplogo a descreva para ela. Uma proposta, como isto uma mensagem e isto est nolugar de seu filho, necessria leitura da foto. Uma transposio para a lngua que torneexplcitos os cdigos que procedem composio da foto necessria para sua compreenso

    pelo aborgene. O dispositivo fotogrfico , portanto, de fato um dispositivo codificadoculturalmente.(24)

    A partir de ento, o valor de espelho, de documento exato, de semelhana infalvel reconheci-da para a fotografia recolocado em questo. A fotografia deixa de aparecer como transpa-rente, inocente e realista por essncia. No mais o veculo incontestvel de uma verdadeemprica. A questo particularmente pertinente com relao ao campo antropolgico ou

    cientfico: possvel elaborar uma anlise cientfica com base em documentos fotogrficos(ou flmicos)? Estes no constituiriam antes a ilustrao de um conceito estabelecido pelo

    cientista? Etc.

    Antes de abordar a ltima parte deste primeiro captulo (o discurso do trao e da referncia,gostaria de terminar esta segunda parte destacando o que, a meu ver, uma conseqnciaimportante desses discursos de desconstruo dos cdigos da imagem fotogrfica e que vainos mostrar como eles deslocaram, de modo notvel, a questo do realismo.

    De fato, como se denega ento qualquer possibilidade de a fotografia ser simplesmente umespelho transparente do mundo, como ela no pode mais, por essncia, revelar a verdadeemprica, vamos assistir ao desenvolvimento de diversas atitudes que vo todas no sentido deum deslocamento desse poder de verdade, de sua ancoragem na realidade rumo a uma anco-ragem na prpria mensagem: pelo trabalho (a codificao) que ela implica, sobretudo noplano artstico, a foto vai se tornar reveladora da verdade interior (no emprica). noprprio artifcio que a foto vai se tornar verdadeira e alcanar sua prpria realidade interna.A fico alcana, e at mesmo ultrapassa, a realidade.

    Sintomtico de tal atitude, de tal deslocamento, o trabalho fotogrfico de Diane Arbus, porexemplo, que, de acordo com a anlise proposta por Susan Sontag, ao fazer seus modelosposarem deliberadamente, os leva de fato, pelo cdigo e nele, a revelar sua verdade autntica. por meio do artefato, assumido como tal, da pose, que os sujeitos alcanam sua realidade

  • intrnseca, mais verdadeira que ao natural:

    Como Brassai, Arbus queria que seus modelos estivessem, na medida do possvel, avisadose conscientes da ao qual eram convidados a participar. Em vez de tentar faz-los assumiruma posio natural ou tpica, ela os incitava a parecer embaraados - em outras palavras,a posar. (A expresso reveladora da personalidade vai assim se confundir com o que estra-nho, bizarro, deformado.) Sentadas ou de p, o ar afetado, essas personagens nos aparecem

    desse modo como a prpria imagem do que so.(25)

    Eis a anttese da foto-ao-vivo, da foto pedao-de-vida, da foto feita de improviso ou sem queo modelo saiba. Contra a imagem capturada, Arbus joga a imagem convocada e construda.Contra a espontaneidade, a pose. por meio da imagem plstica que querem dar de simesmas e que a artista as leva a produzir que se revela a verdade, a autenticidade das

    personagens de Arbus. Eis o deslocamento: a interiorizao do realismo pela transcendnciado prprio cdigo.

    Esse tipo de posio terica, sob formas muito variveis, conheceu um nmero muito grandede defensores em todas as pocas e um pouco em todos os campos, mas sobretudo, claro,entre os retratistas. De certo modo, a prpria aposta da prtica do retrato fotogrficobasear-se nesse princpio de uma realidade ou de uma verdade interior revelada pela foto.Vamos encontrar propostas nesse sentido em quase todos os fotgrafos de retratos (e at emdeclaraes dos modelos que contemplam sua imagem). Assim, por exemplo, o grande retra-tista Richard Avedon, que chega a praticamente derrubar a relao da imagem com o real:Para mim as fotos tm uma realidade que as pessoas no tm. S por intermdio das fotos que conheo essas pessoas.(26)

    Na mesma perspectiva, mas exatamente ao contrrio de Avedon, e vista com o pessimismo ea negatividade que sempre o caracterizaram, essa conversa de Franz Kafka com Janouch,que pressupe tambm uma realidade-verdade interior, alm das aparncias e dos cdigos darepresentao, mas colocada aqui justamente como inacessvel ao olho fotogrfico:

    Mostrei uma srie dessas fotos a Kafka e disse-lhe brincando: Por mais ou menos duascoroas, possvel fazer com que algum o fotografe sob todos os ngulos. o conhece a ti

    mesmo automtico! Voc quer dizer o engane a ti mesmo automtico, replicou Kafka comum leve sorriso. Protestei: Por que diz isso? O aparelho no consegue mentir! Kafka

    inclinou a cabea sobre seu ombro: De onde voc tirou isso? A fotografia concentra seuolhar sobre o superficial. Desse modo obscurece a vida secreta que brilha atravs dos contor-nos das coisas num jogo de luz e sombra. No se pode captar isso, nem mesmo com o auxliodas lentes mais poderosas. Devemos nos aproximar dessa vida interior p ante p...(27)

    Poderamos dar inmeros exemplos desse tipo de discurso. Em todos os casos, trata-se deassinalar a desconfiana quanto objetividade, neutralidade e naturalidade do meio

    fotogrfico na sua reproduo da realidade emprica. Essa desconfiana baseia-se em (ougera) uma crena numa verdade propriamente interna, interiorizada, que no se confundecom as aparncias do prprio real. O caso de Diane Arbus continua sendo com certeza omais exemplar, na medida em que inverte de certa forma essa concepo de uma verdade

    interior no prprio meio, fazendo-lhe alcanar um alm do verdadeiro na prpriaartificialidade da representao.

    Em suma, o que expresso nesses textos a concepo de uma forte dicotomia entre realida-de aparente e realidade interna, ou verdade, concepo que remonta, devemos nos lembrar,ao mito platnico da caverna. Essa posio ideolgica adquiriu uma amplitude bem particu-

  • lar nesses ltimos anos. a conseqncia lgica de todo esse vasto movimento crtico dedenncia do efeito de real na fotografia. Desembocou numa volta com fora do artefato,numa interveno deliberada e exibida do artista nos processos mediticos (tanto em foto-grafia quanto no cinema). Vejam todo o movimento de reintroduo da fico nodocumentrio. Vejam sobretudo a obra de um Jean-Luc Godard, que no fundo jamais ces-sou de proceder desse modo.

    A fotografia como trao de um real

    De fato, os dois grandes tipos de concepo que passamos em revista at aqui - a foto comoespelho do mundo e a foto como operao de codificao das aparncias - tm como denomi-nador comum a considerao da imagem fotogrfica como portadora de um valor absoluto,ou pelo menos geral, seja por semelhana, seja por conveno. Antecipando um pouco algu-mas noes que evocarei logo adiante, poderia dizer que at aqui as teorias da fotografiacolocaram sucessivamente seu objeto naquilo que Ch. S. Peirce chamaria em primeiro lugara ordem do cone (representao por semelhana) e em seguida a ordem do smbolo (repre-sentao por conveno geral). Ora, o tema desta ltima parte do trabalho justamenteteorias que consideram a foto como procedente da ordem do ndice (representao porcontigidade fsica do signo com seu referente). E tal concepo distingue-se claramente dasduas precedentes principalmente pelo fato de ela implicar que a imagem indiciria dotadade um valor todo singular ou particular, pois determinado unicamente por seu referente e spor este: trao de um real.

    Tal discurso, que s vezes apresenta certos perigos, encontrou nesses ltimos anos um vigorcompletamente novo e caracterizado tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, em parti-cular redescobrindo Peirce e suas teorizaes do ndice justamente, ou baseando-se nosltimos escritos de Roland Barthes (sobretudo La chambre claire). De fato, tal impulso nasreflexes atuais pode ser compreendido principalmente pela evoluo das concepes, talcomo se retraou seu percurso at aqui: seria necessrio passar pela fase negativa dedesconstruo do efeito do real e da mimese para poder recolocar finalmente, positivamente,mas de outra forma, a questo da pregnncia do real na fotografia. Nesse sentido, os discur-sos denunciadores das iluses da foto-espelho, tanto pela moda semitica-estruturalistaquanto pela onda das crticas ideolgicas, tero permitido, por terem eles completado entoseu tempo e sua obra, voltar questo do realismo referencial sem a obsesso de se cair noardil do analogismo mimtico, livre da angstia do ilusionismo.

    Quando digo que esses discursos do trao, do ndice e da referencializao caracterizam asreflexes mais recentes, falo mais uma vez tendenciosamente. evidente que se podem en-contrar exemplos dessa atitude nas reflexes anteriores. Desse modo, j evoquei o texto deAndr Bazin sobre a Ontologia da imagem fotogrfica (1945), que se encontra de certaforma no cruzamento do discurso da mimese e do trao (ver acima). Antes dele, e de maneirabem mais ntida, deve-se citar igualmente os trabalhos muito premonitrios de Walter Benja-min, em particular, em 1931, sua Pequena histria da fotografia, na qual j insiste, comoBarthes far meio sculo depois, no fato de que na foto ( a diferena da pintura e do dese-nho), quer se queira, quer no, alm de todos os cdigos e de todos os artifcios da represen-tao, o modelo, o objeto referencial captado, irresistivelmente, retorna:

    Mas com a fotografia, assiste-se a algo de novo e singular: nessa pescadora de New Haven,cujos olhos baixos tm um pudor to descontrado e sedutor, resta algo que no se reduz aum testemunho a favor da arte do fotgrafo [trata-se de David Octavius Hill], algo que

    impossvel reduzir ao silncio e que reivindica com insistncia o nome daquela que viveu ali,que ali est ainda real e que jamais passar inteiramente para a arte (...). A tcnica mais

  • exata pode conferir a seus produtos um valor mgico que nenhuma imagem pintada poderiater para ns. Apesar do domnio tcnico do fotgrafo, apesar do carter combinado da

    atitude imposta ao modelo, o espectador, contra a sua vontade, obrigado a buscar em talimagem a pequena fasca de acaso, de aqui e agora, graas qual o real, por assim dizer,

    queimou o carter de imagem; e deve encontrar o lugar imperceptvel em que, na maneira deser singular desse minuto, h muito tempo passado, o futuro se aninha ainda hoje e to

    eloqente que, por meio de um olhar retrospectivo, podemos encontr-lo.

    Esse trecho, surpreendentemente barthesiano, tanto em seu tom quanto em seu contedo (jprefigura literalmente o isso foi e a metonmia do punctun) anuncia portanto todo um

    leque de reflexes atuais sobre o realismo fotogrfico. Para resumir, diremos que, se a fasede desconstruo dos cdigos se estruturou, grosso modo, em dois eixos - um mais semitico

    (Metz, Eco etc.), o outro mais ideolgico (Baudry, os Cahiers du Cinma etc.) -,da mesmamaneira nesses dois campos que vai se manifestar com maior nitidez o retorno da referncia

    singular na foto.

    Vou comear pelo campo ideolgico. Algum tempo depois do famoso nmero especialImagens de marca dos Cahiers du Cinma, j mencionado acima, assistiu-se ao incio,dentro da prpria redao da revista, de uma polmica, ou pelo menos de uma discussosobre a questo do peso do real, alm dos cdigos, na fotografia. Desse modo, no n 270(setembro-outubro de 1976), Pascal Bonitzer, num artigo intitulado A sobre-imagem voltas anlises de Alain Bergala. De certo reconhece o fundamento da conduta do ltimo, dizcompreender bem a necessidade e a importncia das desconstrues do efeito do real,sustenta os jogos ideolgicos que levam a desmontar os dispositivos de enunciao dasmensagens visuais (no -toa que se faz parte da redao dos Cahiers!), mas ao mesmotempo - e isso muito sintomtico - diz no conseguir evitar, ao ver essas fotos-documentos,um incmodo, um mal-estar persistente, que se esfora por analisar:

    H portanto essa foto do vietnamita chorando sob um guarda-chuva(...). E verdade quea grande angular trabalha aqui em benefcio do humanismo choramingo: isola o persona-

    gem, a vtima, em sua solido e sua dor [Bergala]... No entanto, nessa foto, algo resta,resiste anlise, indefectivelmente. que ao lado, acima das palavras humanismo

    choramingo, existe mesmo assim o fato de que o vietnamita est chorando: apesar daencenao, do enquadramento, da enunciao fotogrfica e jornalstica (lixo de jornalista!),h o enunciado das lgrimas(...). Indefectivelmnente, o enunciado mudo da foto volta, enig-

    mtico; o acontecimento obscuro dessa dor captada por uma objetiva; mercantil, a singulari-dade das lgrimas voltam sem rudo a se propor meditao. Ento um outro texto pe-se abrotar da mesma imagem(...) nisso, mesmo se saiu dos mesmos cdigos de representao(cmara escura etc.), que a fotografia nada tem a ver com a pintura: a maneira como o obje-to capturado completamente diferente. O objeto no grita da mesma maneira numa tela e

    numa fotografia (...). [A fotografia] , em primeiro lugar, um adiantamento de real que aqumica faz aparecer. Isso muda tudo...(29)

    Esse gnero de considerao, que afirma a transcendncia da referncia - nica, singular,literalmente inesquecvel - alm dos cdigos e aqum de qualquer efeito simplista de mimese,v-se bem que aqui ainda procede, quase intuitivamente, das reaes imediatas do especta-

    dor diante da foto. Nesse sentido, antes de ver como esse retorno da referncia pde serteorizado pelas anlises semiolgicas, eu gostaria de evocar pela ltima vez a obra essencialde R. Barthes que, como se sabe, assume e afirma em La chambre claire(30) esse ponto devista subjetivo da reao imediata do espectador diante de uma foto. Ao longo de todo esselivro, de fato, o observador Barthes no cessa de se espantar com a pregnncia e a presena

  • do referente dentro da foto e por meio dela:

    Tal foto jamais se distingue de seu referente (p. 16).

    Diramos que a foto sempre continua carregando seu referente com ela (p. 17).

    Pois eu s via o referente, o objeto desejado, o corpo querido (p. 19).

  • A fotografia literalmente uma emanao do referente (p.126).

    Eu ainda no sabia que dessa obstinao do referente de estar sempre ali ia surgir a essn-

    cia que eu procurava (p. 18).

    E, quando Barthes, esforando-se por conceitualizar um pouco esse sentimento de extremareferencializao prprio imagem fotogrfica, prope sua famosa definio ontolgica, s

  • pode repetir a mesma coisa:

    A princpio preciso conceber bem e portanto, se possvel, bem dizer no que o referente dafotografia no o mesmo que o dos outros sistemas de representao. Chamo de referentefotogrfico no a coisa facultativamente real a que uma imagem ou um signo remete, mas acoisa necessariamente real que foi colocada diante da objetiva, na falta do que no haveriafotografia. J a pintura pode fingir a realidade sem t-la visto(...). Ao contrrio, na fotogra-fia, jamais posso negar que a coisa esteve ali. H dupla posio conjunta: realidade e passa-do. E como essa coero s parece existir por si mesma, deve-se consider-la, por reduo, aprpria essncia, a noema da fotografia(...). O nome da noema da fotografia ser portanto:

    isso foi (p. 119).

    Com o seu passado semitico, Barthes decerto o primeiro a saber que a imagem fotogrfica atravessada por todos os tipos de cdigos (j dizia isso em seu primeiro artigo de 1961

    sobre a mensagem fotogrfica, quando assinalava os seis cdigos principais de conotao -trucagem, pose, objeto, fotogenia, esttica e sintaxe). E ainda repetir em La chambre claire: evidente que cdigos vm influenciar a leitura da foto(p. 138). Durante toda a sua vida,alis, Barthes no cessou de perseguir os clichs, os esteretipos, os modelos culturais (cf.

    Mitologias, Sistema da moda, o prprio [Fragmentos de um discurso amoroso]). Mas justamente porque passou por esse saber dos cdigos que Barthes pode insistir assim no

    realismo. Pois em sua essncia, ou seja, alm de todos esses cdigos, ou aqum, que a foto para ele marcada como inscrio referencial: na pureza de sua denotao, por sua

    gnese automtica, que ele a declara mensagem sem cdigo.

    Evidentemente, ao apresentar as coisas dessa maneira, Barthes pego na armadilha, nomais da mimese, mas do referencialismo. Pois aqui est o perigo que espreita esse tipo deconcepo: generalizar, ou melhor, absolutizar, o princpio da transferncia de realidade,quando se adota uma atitude exclusivamente subjetiva de pretenso ontolgica. Barthes estlonge de ter escapado a esse culto - a essa loucura - da referncia pela referncia.

    Para evitar ser prisioneiro desse crculo perigoso, deve-se decerto relativizar mais o campo eo domnio da referncia, por mais incontornvel e nodal (noemtica) que esta seja. A esserespeito, os que elaboraram nessa via as anlises que me parecem atualmente as mais sutis eas mais srias, so provavelmente os tericos que se inspiram nos conceitos semiticos deCh. S. Peirce e mais particularmente em sua famosa noo de ndice. Terminarei esse estudoevocando brevemente os trabalhos de alguns desses tericos(31).

    Em primeiro lugar lembremos que o prprio Peirce, entre as vrias anotaes que deixoupara ilustrar suas inmeras classificaes dos signos, j assinalara em 1895 (!) a condioindicial da fotografia:

    As fotografias, e em particular as fotografias instantneas, so muito instrutivas porquesabemos que, sob certos aspectos, elas se parecem exatamente com os objetos que represen-

    tam. Porm, essa semelhana deve-se na realidade ao fato de que essas fotografias foramproduzidas em tais circunstncias que eram fisicamente foradas a corresponder detalhe por

    detalhe natureza. Desse ponto de vista, portanto, pertencem nossa segunda classe designos: os signos por conexo fsica [ndice].(32)

    Peirce lana aqui as primeiras balizas de uma abordagem terica do realismo fotogrfico queultrapassa o obstculo epistemolgico que a questo da mimese. V-se que, para funda-

    mentar sua definio, ele leva em considerao no o produto icnico concludo, mas oprocesso de produo do mesmo, anunciando dessa maneira Bazin e sua gnese automti-

  • ca. Todavia, de forma diferente do ltimo, no insistir tanto nas conseqncias tico-estticas dessa gnese (a neutralidade, a naturalidade, a objetividade etc.) quanto em suas

    conseqncias lgico-semiticas, que correspondem s implicaes gerais da noo de ndice.Mais do que se fixar apenas na referncia, apenas no fato de que para que haja foto,

    necessrio que o objeto mostrado tenha estado ali num determinado momento do tempo) (cf.Barthes), Peirce vai abrir o caminho, por meio de suas consideraes sobre o ndice, a uma

    verdadeira anlise da condio da imagem fotogrfica, que ser consideravelmente desenvol-vida e especificada pelas pesquisas atuais que caminham nesse sentido, quando elas prprias

    no continuam se referindo explicitamente terminologia de Peirce.

    O ponto de partida portanto a natureza tcnica do processo fotogrfico, o princpio ele-mentar da impresso luminosa regida pelas leis da fsica e da qumica. Em primeiro lugar otrao, a marca, o depsito (um depsito de saber & de tcnica, segundo a expresso deDenis Roche)(33). Em termos tipolgicos, isso significa que a fotografia aparenta-se com acategoria de signos, em que encontramos igualmente a fumaa (indcio de fogo), a sombra(indcio de uma presena), a cicatriz (marca de um ferimento), a runa (trao do que haviaali), o sintoma (de uma doena), a marca de passos etc. Todos esses sinais tm em comum ofato de serem realmente afetados por seu objeto (Peirce, 2.248), de manter com ele umarelao de conexo fsica (3.361). Nisso, diferenciam-se radicalmente dos cones (que sedefinem apenas por uma relao de semelhana) e dos smbolos (que, como as palavras dalngua, definem seu objeto por uma conveno geral).

    Notaremos que essa definio minimal da foto, em primeiro lugar como simples impressoluminosa, no implica a priori nem que se passe por um aparelho de fotografia, nem que aimagem obtida se parea com o objeto do qual o trao. A mimese e a codificao perceptualda cmara escura no so seu princpio. Claro que podem intervir, mas de certa forma se-cundariamente. Nesse sentido, foi possvel considerar, por exemplo, que aquilo que se chamaem foto, desde Moholy-Nagy, o fotograma (que nada tem a ver com o fotograma do cine-ma) constitui de certa maneira uma ilustrao histrica dessa definio minimal: o fotograma uma imagem fotoqumica obtida sem cmera, por simples depsito de objetos opacos outranslcidos diretamente no papel sensvel que se expe luz e depois se revela normalmen-te. Resultado: uma composio de sombra e de luz puramente plstica, quase sem semelhan-a (muitas vezes complicado identificar os objetos utilizados), onde conta apenas o princ-pio do depsito, do trao, da matria luminosa.

    Por outro lado, observaremos tambm que o princpio do trao, por mais essencial que seja,marca apenas um momento no conjunto do processo fotogrfico. De fato, a jusante e a mon-tante desse momento da inscrio natural do mundo sobre a superfcie sensvel, existe, deambos os lados, gestos completamente culturais, codificados, que dependem inteiramentede escolhas e de decises humanas (Antes: escolha do sujeito, do tipo de aparelho, da pelcu-la, do tempo de exposio, do ngulo de viso etc. - tudo o que prepara e culmina na decisoderradeira do disparo; depois: todas as escolhas repetem-se quando da revelao e da tira-gem, em seguida a foto entra nos circuitos de difuso, sempre codificados e culturais - im-prensa, arte, moda, pornografia, cincia, justia, famlia...). Portanto, somente entre essasduas sries de cdigos, apenas no instante da exposio propriamente dita, que a foto podeser considerada como um puro ato-trao (uma mensagem sem cdigo). Aqui, mas somenteaqui, o homem no intervm e no pode intervir sob a pena de mudar o carter fundamentalda fotografia. Existe a uma falha, um instante de esquecimento dos cdigos, um ndicequase puro. Decerto esse instante dura apenas uma frao de segundo e de imediato sertomado e retomado pelos cdigos que no mais o abandonaro (isso serve para relativizar odomnio da Referncia em fotografia), mas ao mesmo tempo, esse instante de pura

  • indicialidade, porque construtivo, no deixar de ter conseqncias tericas.

    Para terminar gostaria de evocar muito rapidamente algumas dessas conseqncias gerais(elas sero retomadas em detalhe e sistematizadas no captulo seguinte). A condio de ndiceda imagem fotogrfica implica, caso quisermos sintetizar nesse ponto as aquisies de Peirce,que a relao que os signos indiciais mantm com seu objeto referencial seja sempre marcadapor um princpio qudruplo, de conexo fsica, de singularidade, de designao e de atesta-o.

    J se evocou suficientemente o princpio de base da conexo fsica entre a imagem foto e oreferente que ela denota: tudo o que faz dela uma impresso. A conseqncia de tal estadode fato que a imagem indicial remete sempre apenas a um nico referente determinado: omesmo que a causou, do qual ela resulta fsica e quimicamente. Da o singularidade extremadessa relao. Ao mesmo tempo, pelo fato de ser uma foto dinamicamente vinculada a umobjeto nico e apenas a ele, essa foto adquire um poder de designao muito caracterizado(cf. Barthes: Uma fotografia sempre se encontra na ponta desse gesto; ela diz: isso isso, aquilo!, mas no diz nada alm do que disse (...). A fotografia no passa nunca de um campoalternado de Veja, Olhe, Aqui est; ela aponta.(34) ndice igualmente nesse sentidodigital). Finalmente, em virtude desse mesmo princpio, a foto tambm levada a funcionarcomo testemunho: atesta a existncia (mas no o sentido) de uma realidade (cf. todo o debatejurdico sobre seu estatuto de testemunha, legal ou no, em matria judiciria).

    Por essas qualidades da imagem indicial, o que se destaca finalmente a dimenso essencial-mente pragmtica da fotografia (por oposio semntica): est na lgica dessas concepesconsiderar que as fotografias propriamente ditas quase no tm significao nelas mesmas:seu sentido lhes exterior, essencialmente determinado por sua relao efetiva com o seuobjeto e com sua situao de enunciao (cf. os diticos e shifters em lingstica). Alis,no por esse motivo que Barthes no nos mostra a foto de sua me ainda criana no Jar-dim de Inverno, foto que motiva toda La chambre claire, mas que, para nossos olhos deleitores annimos, no teria literalmente qualquer sentido?

    Essa observao faz com que compreendamos que a lgica do ndice que hoje assinalamos nocentro da mensagem fotogrfica utiliza plenamente a distino entre sentido e existncia: afoto-ndice afirma a nossos olhos a existncia do que ela representa (o isso foi de Barthes),mas nada nos diz sobre o sentido dessa representao; ela no nos diz isso que dizer aqui-lo. O referente colocado pela foto como uma realidade emprica, mas branca, se forpossvel se expressar assim: sua significao continua enigmtica para ns, a no ser quesejamos participantes da situao de enunciao de onde a imagem provm. Como ndice, aimagem fotogrfica no teria outra semntica que sua prpria pragmtica. exatamentedisso que se trata. Vemos que estamos muito longe, apesar do que certas ms lnguas queremnos fazer acreditar, que estamos quase nos antpodas hoje dos discursos da mimese.

    Concluso

    Esse panorama das teorias sobre a foto permitiu-nos portanto assinalar, em linhas gerais,trs posies epistemolgicas quanto questo do realismo e do valor documental da ima-gem fotogrfica.

    1) A primeira dessas posies v na foto uma reproduo mimtica do real. Verossimilhana:as noes de similaridade e de realidade, de verdade e de autenticidade recobrem-se e sobre-pem-se bem exatamente segundo essa perspectiva: a foto concebida como espelho domundo, um cone no sentido de Ch. S. Peirce.

  • 2) A segunda atitude consiste em denunciar essa faculdade da imagem de se fazer cpia exatado real. Qualquer imagem analisada como uma interpretao-transformao do real, comouma formao arbitrria, cultural, ideolgica e perceptualmente codificada. Segundo essaconcepo, a imagem no pode representar o real emprico (cuja existncia , alis,recolocada em questo pelo pressuposto sustentado por tal concepo): no haveria realida-de fora dos discursos que falam dela), mas apenas uma espcie de realidade interna trans-cendente. A foto aqui um conjunto de cdigos, um smbolo nos termos peircianos.

    3) Finalmente, a terceira maneira de abordar a questo do realismo em foto marca um certoretorno ao referente, mas livre da obsesso do ilusionismo mimtico. Essa referencializaoda fotografia inscreve o meio no campo de uma pragmtica irredutvel: a imagem foto torna-se inseparvel de sua experincia referencial, do ato que a funda. Sua realidade primordialnada diz alm de uma afirmao de existncia. A foto em primeiro lugar ndice. S depoisela pode tornar-se parecida (cone) e adquirir sentido (smbolo).

    NOTAS

    1. Rudolf Arnheim, On the nature of photography (texto ingls com traduo italiana), emRivista di Storia e Critica della Fotografia, II, 2, 1981, p. 12. Traduo Francesa de e emPhilippe Dubois, De la photographie, Anthologie, Lige, seo Information et Arts dediffusion, 1982, 280 pginas, pp. 107-125.

    2. Roland Barthes, La chambre claire. Note sur photographie, Paris, co-edio Cahiers duCinma - Gallimard - Seuil, 1980, p. 18.

    3. Jacques Derrida, La vrit en peinture, Paris, Flammarion, col. Champs, 1978.

    4. Charles Sanders Peirce, crits sur le signe (coletados, traduzidos e apresentados porGrard Deledalle), Paris, Seuil, col. Lordre philosophique, 1978, sobretudo pp. 138-165.Tudo isso ser desenvolvido adiante.

    5. Lembremos que o Vu de Vernica (ou, caso se prefira para ser mais histrico, o SantoSudrio de Turim) pode ser considerado, com sua impresso em negativo, com seu efeitoimpressionante de realismo, com seu valor de relquia e de fetiche, como uma espcie deprottipo da fotografia: uma imagem obtida por impregnao direta do modelo no suporte,sem qualquer interveno da mo no surgimento da representao. possvel ler uma elabo-rao literria sobre esse tema na novela de Michel Tournier, Les suaires de Vronique (emLe coq de bruyre, Paris, Gallimard, col. Folio, 1982, pp. 153-172).

    6. Charles Baudelaire, Le public moderne et la fotografia, em Salon de 1859. Retomadoem Ch. B., Curiosits esthtiques, Paris, Garnier, col. Classiques Garnier, 1973.

    7. Vale a pena citar a belssima carta que Baudelaire escreve em 1865 sua me: Eu gosta-ria muito de ter teu retrato. uma idia que se apoderou de mim. Existe um fotgrafo exce-lente no Havre. Mas temo que isso no seja possvel nesse momento. Eu teria de estar pre-sente. Tu no entendes disso, e todos os fotgrafos, mesmo excelentes, tm manias ridculas:consideram uma boa imagem a imagem em que todas as verrugas, todas as rugas, todos osdefeitos, todas as trivialidades do rosto tornam-se muito visveis, muito exageradas: quantomais a imagem for dura, mais ficam satisfeitos. Ademais, gostaria que o rosto tivesse pelomenos a dimenso de uma ou duas polegadas. S em Paris h quem saiba fazer o que desejo,ou seja, um retrato exato, mas com o flou de um desenho. Enfim, vamos pensar nisso, no?

  • 8. Charles Baudelaire, Le public moderne et la fotografia, art. cit.

    9. Assim, no decerto insignificante que seja no prprio momento em que a corrente realis-ta e depois naturalista comea a se impor que a tcnica fotogrfica tende a se generalizar. Aemergncia de uma tcnica nova sempre se inscreve num contexto scio-histrico determina-do, que corresponde a apostas ideolgicas relativamente precisas. Sobre esse assunto ver, porexemplo, de maneira geral, a srie de artigos de Jean-Louis Comolli, intitulada Techniqueet idologie, publicada em Cahiers du Cinma, ns 229 (maio de 1971), 231 (agosto-setem-bro de 1971), 233 (novembro de 1971, 234-235) (dezembro de 1971, janeiro-fevereiro de1972) e 241 (setembro-outubro de 1972). Para consideraes mais precisas sobre a emergn-cia e a extraordinria expanso da fotografia no sculo XIX, ver Andr Rouille, Lempire dela photographie. Photographie et pouvoir bourgeois, 1839-1870, Paris, Le Sycomore, 1982.

    10. Walter Benjamin, Petite histoire de la photographie(1931), trad. francesa em W. B., L.homme, le langage et la culture, Paris, Denol/Gonthier, col. Mdiations, 1971, p. 65.

    11. Andr Bazin, Ontologie de limage photographique (1945), em Quest-ce que lcinma?, tomo I, Paris, Ed. du Cerf, 1975, pp. 11-19 (cit. p.14).

    12. Olivier Wendell Holmes: The stereoscope and the stereograph, em The AtlanticMontly, n3, junho de 1859, pp. 738-748. Retomado na antologia de Beaumont Newhall,Photography: Essays and images. Illustrated readings in the history of photography, Lon-dres, Secher and Warburg, 1981, pp. 53-61. Traduzido por mim.

    13. Texto j citado na nota 11.

    14. Roland Barthes, Le message photographique, em Communications, n 1, Paris, Seuil,1961.

    15. Christian Metz, Essais sur la signification au cinma (sobretudo tomo I), Paris,Klincksieck, col. Esthtique, 1968 (tomo II, 1972).

    16. Umberto Eco, Smiologie des messages visuels, em Communications, n 15 (Lanalysedes images), Paris, Seuil, 1970 (retomada, com correes, de um captulo de La strutturaassenta, Milo, Bompiani, 1968); Pour une reformulation du concept de signe iconique,em Communications, n 29(lmage(s) et culture(s)), Paris, Seuil, 1978. Roland Barthes,Rhtorique de limage, em Communications, n 4, Paris, Seuil, 1964. Ren Lindekens,Elments pour une smiotique de la photographie, Paris, Didier, 1971, e Essai de smiotiquevisuelle, Paris, Klincksieck, col. Semiosis, 1976. Grupo M(Jacques Dubois, Philippe Dubois,Francis Edeline, Jean-Marie Klinkenberg, Philippe Minguet), La chafetire est sur latable...Elments pour une rhtorique de limage, em Communications, n 29, 1976, pp. 37-50); Trois fragments dune rhtorique de limage, pr-publicao n 82-83 do Centro Inter-nacional de Semitica e Lingstica da Universidade de Urbino, 1979; Iconique etplastique: un fondement de la rhtorique visuelle, em Revue desthtique(especialRhtoriques, smiotiques), n 1-2, Paris, 10/18, 1979, pp. 173-192; Plan dune rhtoriquede limage, em Kodikas/code, n 3, Tbingen, Narr Verlag, 1980, pp.249-268.

    17. Lady Elizabeth Eastlake, Photography, em Quaterly Review, n 101, Londres,abril de1857, pp. 442-468. Retomado na antologia de Beaumont Newhall, Photography: essays andimages..., op. cit. (cf. nota 12), p. 90. Traduzido por mim.

    18. Ver, por exemplo, a obra de Charles H. Caffin, Photography as a fine art, Nova York,Doubleday, 1901.

  • 19. o captulo Film and reality - que figura na coletnea Film as art, publicada em 1957por R. Arnheim (University of California Press)-que me interessa particularmente aqui. Essetexto de fato bem antigo, pois j fora publicado em 1932 em Berlim em sua obra Film alsKunst. Encontraremos uma traduo francesa (de Georges Dupouy) de Film et ralit nonmero especial da Revue dEsthtique(composto por Dominique Noguez): Cinma:thories, lectures, Paris, Klincksieck, 1973, pp. 27-45. Num caminho comparvel, mas relati-vamente inverso ao de Arnheim, poderamos evocar igualmente as teorias sobre o realismo deSiegfried Kracauer em Theory of film, Nova York, Oxford University Press, 1968.

    20. Rudolph Arnheim, On the nature of photography, art. cit. (cf. nota 1), p. 12. Traduzi-do por mim.

    21. Jean-Louis Baudry, Cinma: effets idologiques produits par lappareil de base, emCintique, n 7-8, Paris, s.d., pp. 1-8. Ver igualmenie do mesmo autor, L dispositif:approches mtapsychologiques de limpression de ralit, em Communications, n 23,(Psychanalyse et cinma), Paris, Seuil, 1975, pp. 56-72. Esses artigos so retomados em J.-L.II., Leffet-cinma, Paris, Ed. Albatros, col. a-cinma, 1978.

    22 Hubert Damisch, Cinq notes pour une phnomnologie de limage photographique emLArc, n 21 (La photographie), Aix-en-Provence, primavera de 1963, pp. 34-37. Traduoinglesa por Rosalind Krauss em October, n 5 (Photography: a special issue), Nova York,MIT Press, 1978.

    23. Alain Bergala, Le pendule (La photo historique strotype), em Cahiers du Cinma,n 268-269(Especial lmages de marque, Paris, julho-agosto de 1976, pp. 40-46.

    24. Alan Sekulla, On the invention of photographic meaning, em Photography in Print,antologia editada por Vicki Goldberg, Nova York, Simon and Schuster, 1981, p. 454.

    25. Susan Sontag, De lAmrique, travers ses photographies, sombrement, em Laphotographie, Paris, Seuil, col. Fiction & Cie, 1979, pp. 48-49. (Traduzido do ingls por G.H. e G. Durand).

    26. Citado por Jean-Franois Chevrier em Richard Baltauss: une ressemblanceexemplaire, em obra coletiva, Anthologie de la critique: 15 critiques, 15 photographes,Paris, Ed. Cratis, 1982, p. 72.

    27. Extrado da Conversation avec Kafka de Gustav Janouch, citado por Susan Sontag, Laphotographie, op. cit. (cf. nota 25), p. 220.

    28. Walter Benjamin, Petite histoire de la photographie, art. cit. (cf. nota 10), pp. 60-61.

    29. Pascal Bonitzer, La surimage, em Cahiers du Cinma, n 270, setembro-outubro de1976, pp. 30-31.

    30. Roland Barthes, La chambre claire. Note sur la photographie, op. cit. (cf. nota 2).

    31. Ver, por exemplo, os trabalhos de Rosalind Krauss, Notes on the index: seventies art inAmerica, em October, n 3 (parte I) e n 4 (parte II), Nova York, MIT Press, 1977 (tradu-o francesa em Macula, n 5-6, Paris, 1979), assim como Marcel Duchamp, ou le champ delimaginaire, em Degrs, n 26-27 (Langage et ex-communication), Bruxelas, primavera-vero de 1981. Ver por outro lado, mas com reservas importantes, o trabalho de Henri VanLier, Philosophie de la photographie, pr-publicao de Jeunesses et Arts Plastiques, Bruxe-las, 1981. Finalmente ver aqui mesmo o captulo 2, consagrado por inteiro a esse problema.

  • 32. Charles Sanders Peirce, The art of reasoning, cap. II, em Collected papers, vol. 2, 281,Harvard University Press. Traduo francesa de Grard Deledalle em crits sur le signe, op.cit. (cf. nota 4), p. 151.

    33. Ver Denis Roche, Dpts de savoir & de technique, Paris, Seuil, col. Fiction & Cie, 1981.

    34. Roland Barthes, La chambre claire, op. cit.(cf. nota 2), p. 16.