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Resenha: Princípios de Economia Política e Tributação – David Ricardo
Micael Frederico Aguiar
O livro Princípios de Economia Política e Tributação, juntamente com outras
obras, constitui o alicerce do pensamento econômico contemporâneo. Publicado em
1817, seu autor é o economista político britânico David Ricardo (1772 – 1823).
O objetivo central de seu trabalho é, conforme indicado ao longo do prefácio,
suprir o déficit informacional identificado por ele na literatura, principalmente no que
diz respeito à abordagem das dinâmicas da renda, do lucro e do salário. Ao buscar
atingir tal objetivo, Ricardo discute suas reflexões sobre diferentes pontos da
economia política à luz das ideias e contribuições de nomes declaradamente
admirados por ele, como Adam Smith, Jean-Baptiste Say, Thomas Malthus e outros.
Os 32 capítulos, sendo o primeiro deles dividido em sete seções, exibem um
distinto estilo de escrita, caracterizado por uma linearidade lógica bem demarcada
no encadeamento de seus argumentos, bem como pelo uso de um linguajar
notadamente formal.
Iniciando o primeiro capítulo, intitulado Sobre o Valor, Ricardo discorre sobre
o conceito de valor segundo as reflexões de Smith, apresentando explicitamente
algumas de suas objeções em relação ao tema. Durante o capítulo de abertura, suas
reflexões são praticamente em totalidade direcionadas aos bens cujo valor de troca
é dependente da quantidade de trabalho necessária para produzi-lo (custo de
produção), afim construir futuras elaborações visando o objetivo por ele proposto.
Um dos pontos mais notórios da contribuição de David Ricardo ao
pensamento econômico, a chamada teoria das vantagens comparativas, é expressa
no sétimo capítulo. Em síntese, sua análise do comércio exterior considera um
sistema perfeitamente livre, este permite que cada país dedique-se à produção de
bens cuja respectiva dotação para tal é a melhor possível. Por essa razão, o fluxo de
troca dos bens produzidos por esses países impactariam diretamente nas dinâmicas
econômicas e levariam ao benefício mútuo, definindo assim quais bens seriam
produzidos em cada um deles.
A tributação, termo presente no próprio título da obra, é discutida em uma
considerável parte do livro, principalmente entre os capítulos IX e XVII. A discussão
volta-se para tributações sobre diferentes variáveis econômicas, onde são expostas
reflexões acerca dos seus possíveis efeitos, sejam eles benéficos ou maléficos, e
em diferentes graus. Por sua vez, Ricardo dedica-se às taxas tributárias, deixando
em segundo plano o método de tributação, a ponto que possa abordar os impactos
destas taxas sobre a produtividade e, consequentemente, sobre as dinâmicas
mantidas por ele em consideração.
Já em um dos últimos capítulos, intitulado Sobre a Maquinaria, David Ricardo
discute a influência exercida pela automação nas relações de interesse das
diferentes classes sociais. Em consonância com o tom de discurso adotado desde o
prefácio, Ricardo admite ter reconsiderado sua posição diante do tema. Tal
reconsideração se deu após o abandono de um otimismo precedente ao próprio
livro, quando considerara a automação um fenômeno benéfico para proprietários de
terras, capitalistas e trabalhadores. A mudança acontece em virtude da relação entre
automação e classe trabalhadora, sendo que a última poderia vir a ser prejudicada
caso o aumento de produtividade não refletisse em uma queda nos preços dos bens
habitualmente por ela consumidos.
Em Princípios de Economia Política e Tributação podemos encontrar um
conjunto de reflexões acerca de algumas das principais dinâmicas no campo da
economia política durante o século XIX. Mesmo precedendo a formalização
matemática da ciência econômica, o método indutivo empregado por David Ricardo
tem como característica marcante uma rigorosa linearidade lógica, proporcionando
ao leitor um vislumbre do posterior desenvolvimento teórico baseado em suas ideias,
indo de Karl Marx à escola de Chicago, por exemplo. Obviamente, seu trabalho não
foi imune às desconstruções teóricas, tal como o próprio David Ricardo almejava
realizar através do livro, porém é necessário considerar o escopo do arcabouço
ricardiano para que uma compreensão satisfatória de sua obra seja possível.
Recomenda-se então a leitura para aqueles já experimentados no debate econômico
e que anseiam por uma melhor compreensão das questões contemporâneas através
da exploração das raízes do pensamento econômico.