república e democracia

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Page 1: República e Democracia

REPÚBLICAE

DEMOCRACIA

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TÍTULO República e Democracia

AUTORES Alfredo Carlos Barroco Esperança, Amadeu Carvalho Homem,

António Duarte Arnaut, Carlos Ferreira,

Fernando Mendonça Fava, Jaime Adalberto Simões Ramos,

Manuel Jorge de Magalhães e Silva, Fátima Ramos

CONCEPÇÃO GRÁFICA Edições MinervaCoimbra

IMPRESSÃO G.C. – Gráfi ca de Coimbra, Lda.

1.ª EDIÇÃO Setembro de 2011

EDIÇÃO

Município de Miranda do Corvo

Edições MinervaCoimbra

ISBN 978-972-?????-?-? • DEPÓSITO LEGAL ??????/11

© Copyright CMMC e Edições MinervaCoimbra

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor

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Page 3: República e Democracia

REPÚBLICAE

DEMOCRACIA

alfredo carlos barroco esperança

amadeu carvalho homem

antónio duarte arnaut

carlos ferreira

fernando mendonça fava

jaime adalberto simões ramos

manuel jorge de magalhães e silva

fátima ramos

Câmara Municipal de Miranda do Corvo

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Comissão Organizadora das Comemorações

do Centenário da República em Miranda do Corvo

Eng.º Carlos Jorge Rodrigues do Vale Ferreira

Dr.ª Anabela Nunes Monteiro

Dr. António da Torre Órfão

Sr. Victor Ferreira Gonçalves

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MOTIVAÇÃO

A República Portuguesa comemorou o seu centésimo aniversário em 2010.

Miranda do Corvo, berço de grandes republicanos, sentiu-se desde a 1.ª

hora motivada para comemorar esta efeméride com um conjunto de iniciati-

vas que tinha como principais objectivos dar a conhecer à população os valo-

res e ideais do republicanismo e homenagear todos aqueles que em tempos

mais remotos lutaram pela concretização desses ideais.

Na elaboração e implementação do programa das comemorações no nosso

Concelho, a autarquia foi apoiada por uma Comissão Organizadora sem a

qual não teria sido possível o desenvolvimento de um programa tão audacioso.

Agradeço a todos os membros da Comissão, bem como a todos os amigos

que se associaram, a motivação e empenho que imprimiram a este projecto.

Ao longo de 2010 e 2011 foram realizadas muitas e variadas iniciativas.

Editamos livros, realizamos tertúlias e palestras, homenageamos republicanos,

organizamos exposições, teatro, plantamos o bosque do centenário, constru-

ímos uma praça onde colocamos a cápsula do tempo… Graças ao Professor

Doutor Amadeu Carvalho Homem, que ofereceu a sua biblioteca ao Muni-

cípio, criamos uma importante biblioteca sobre República e Republicanismo.

Para as tertúlias e palestras convidamos especialistas de elevado curri culum,

o que proporcionou momentos muito agradáveis e enriquecedores, já com

evidências ao nível dos resultados.

Uma dessas evidências surgiu com a publicação do livro “Não basta mudar

as moscas…”, da autoria do Dr. Jaime Ramos. Trata-se de uma obra que pelo

seu conteúdo tem tido grandes elogios, sendo já uma referência face ao diag-

nóstico e propostas que apresenta para o nosso país.

Considerou a Comissão Organizadora e a Câmara Municipal que a qua-

lidade das várias intervenções realizadas nas tertúlias e palestras mereciam a

sua publicação em livro. Ao longo deste período foram feitas análises muito

profundas e interessantes. Constitui nossa obrigação publicá-las.

Ao lançar esta obra, espero que a mesma ajude a população presente e os

vindouros a compreender e defender os ideais do republicanismo e do Serviço

Público. Agradeço a todos os oradores o magnífi co trabalho de investigação

que realizaram.

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10 república e democracia

A Implantação da República tinha como objectivo a criação de uma socie-

dade livre e democrática, mais justa, com igualdade de oportunidades, mais

solidária e com menos diferenças entre ricos e pobres.

Durante estes 100 anos muito foi feito, mas muito ainda há para fazer.

Cabe-nos continuar a lutar para que os objectivos sejam defendidos e

alcançados.

Juntemos a nossa voz a todos aqueles que no passado e neste Concelho

lutaram por esses ideais, desde José Falcão, Belisário Pimenta, Baeta de Cam-

pos, Armando Alves Silva, entre muitos outros cidadãos anónimos, não esque-

cendo também Zulmiro Figueiredo que com a sua rebeldia sempre procurou

manter viva a chama das comemorações do 5 de Outubro.

Portugal é hoje um país com muito mais qualidade de vida mas onde ainda

subsistem muitas injustiças sociais. As assimetrias entre ricos e pobres e entre

o litoral e o interior têm-se acentuado.

Portugal continua a ser um país lindo, com um bom território e com um

bom clima. Os portugueses continuam a ter grande capacidade de trabalho.

Acredito por isso que será possível vencer!

Formulo votos para que o programa das Comemorações do Centenário da

República no nosso Concelho sirva para nos obrigar a uma profunda refl e-

xão sobre os ideais republicanos e nos ajude a construir um país mais justo e

solidário.

Muito Obrigada

fátima ramos

Presidente da Câmara Municipal de Miranda do Corvo

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NOTA EXPLICATIVA

Em 5 de Outubro de 2010 comemoraram-se os 100 anos da implantação

da República em Portugal.

Miranda do Corvo não foi apenas a terra onde nasceu José Falcão, um vul-

to impar e que foi um marco incontornável no advento da República, mas foi

também a terra onde nasceram, viveram e encontraram o seu refúgio alguns

outros nomes grandes do nosso republicanismo como Luís Baeta de Campos,

Belisário Pimenta e Armando Alves Silva, entre outros.

Estes homens deixaram o seu genoma ético no nosso concelho.

Miranda é um concelho alicerçado nos valores da liberdade, da igualdade

e da fraternidade.

Miranda é hoje um concelho marcado e referenciado pelos elevados valores

da solidariedade.

A autarquia mirandense não podia assim fi car indiferente a este centenário,

tendo decidido organizar um conjunto de eventos que, com a dignidade ade-

quada à dimensão do município, evocassem a efeméride e acima de tudo servis-

sem para divulgar os valores democráticos, éticos e morais do republicanismo.

Com esse intuito convidou um grupo de cidadãos para integrarem uma

comissão destinada a organizar as comemorações do centenário da República

no concelho.

O convite para coordenar esta comissão, constituída pela Dr.ª Anabela

Monteiro, pelo Dr. António Órfão e pelo Sr. Vítor Gonçalves, foi para mim

um prazer e uma honra. A entrega e dedicação de todos a este projecto foi

inexcedível.

Sabendo à partida das condicionantes resultantes dos constrangimentos

fi nanceiros dum concelho de pequena dimensão, o nosso objectivo foi con-

seguir um programa que conseguisse contornar este problema, mantendo no

entanto alguma coerência e a abrangência adequada para permitir uma refl e-

xão serena sobre as várias vertentes do republicanismo.

Não foi nosso objectivo desenvolver uma visão estática e saudosista da

história mas antes criar as condições para que a partir duma discussão aberta

sobre os valores da ética republicana se pudessem lançar as sementes para uma

refl exão e discussão sobre os caminhos passados, presentes e futuros da nossa

“Res Pública”.

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12 república e democracia

Pareceu-nos fundamental deixar aos vindouros um leve registo do que se

passou nestas comemorações daí a necessidade da publicação deste livro, à laia

de actas das comemorações do centenário.

Trata-se dum registo das intervenções mais relevantes, respeitando, tanto

quanto possível, a cronologia das realizações.

Com ele encerramos hoje, 5 de Outubro de 2011, o caminho iniciado na

evocação do 31 de Janeiro, quando em 2010 apresentámos o nosso projecto

de programa das comemorações.

Sentimos que do ideário que motivou os revolucionários de 1910 uma

parte se cumpriu mas muito está ainda por cumprir.

Sentimos que nem sempre os caminhos percorridos têm sido no sentido

certo para a sociedade livre, igual e fraterna pela qual os nossos antepassados

tanto lutaram.

Importa que saibamos trilhar os bons caminhos, que nos permitam atingir

rapidamente uma sociedade verdadeiramente livre da intransigência, da tira-

nia e do preconceito. Uma sociedade onde a igualdade, a justiça e a meritocra-

cia sejam uma constante. Uma sociedade fraterna, humana e caridosa, assente

no respeito pelo nosso semelhante.

Encerramos este ciclo comemorativo com a esperança de que estas come-

morações do centenário da implantação da República tenham servido, tal

como o moscardo de Sócrates, para espicaçar a consciência adormecida que

está dentro de cada um de nós.

Saúde e Felicidade.

Miranda do Corvo, 5 de Outubro de 2011

Carlos Jorge Rodrigues do Vale Ferreira

Presidente da Comissão das Comemorações do Centenário da República

em Miranda do Corvo

carlos ferreira

Presidente da Comissão Organizadora das Comemorações

do Centenário da República em Miranda do Corvo

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FAXSIMILE DO AUTO DE PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

EM MIR ANDA DO CORVO

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fax-simile do auto de proclamação da república em miranda do corvo 15

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16 república e democracia

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Page 15: República e Democracia

fax-simile do auto de proclamação da república em miranda do corvo 17

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Page 17: República e Democracia

AUTO DE PROCLAMAÇÃO DA REPUBLICA PORTUGUESA

NO CONCELHO DE MIRANDA DO CORVO

No dia seis de outubro de mil novecentos e dez nesta vila de Miranda

do Corvo e nos seus paços do concelho, foi solenemente proclamada a

Republica Portuguesa, pelos cidadãos abaixo assignados. E eu, João Henri-

ques Ferreira de Carvalho, secretario da Camara Municipal do concelho de

Miranda do Corvo, o escrevi e assigno.

Clemente Fernandes Falcão – Medico

Joaquim Gonçalves Paúl – Notário

Luis Maria da Conceição Pimenta – Coronel de Reserva

Lucas Pereira Falcão – Proprietario

Custódio José da Rocha – Proprietario

José d’Almeida – Medico

Joaquim Pereira Falcão – Proprietario

Luciano Fernandes Falcão – Professor

José Camilo da Silva Bastos – Segundo Aspirante da Fazenda

Francisco ?? – Secretario da Camara

Anibal Xavier Pereira – Amanuense

Jaime Augusto d’Almeida – Caixeiro

Albano S. Abreu – Inspector ?? da Camara

Jose Lopes – Distribuidor Postal

Alfredo Alves Esteves – Proprietario

João Henriques Ferreira de Carvalho – Secretario da Camara

José Ferreira de Carvalho – Ajudante de Pharmacia

Jose Maria Baptista – Negociante

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Page 18: República e Democracia

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Antonio da Silva Bastos – Pharmaceutico Vice-presidente da Comissão Municipal

Manuel Pereira Batalhão – Presidente da Comissão Municipal Republicana

Joaquim Rodrigues Costa – Vogal da Comissão

Abel Henriques – Vogal da Comissão

Alfredo Fernandes – Vogal da Comissão

José Firmino Ribeiro da Cunha – Pharmaceutico

Tiberio Rodrigues Fernandes – Amanuense

Manuel Correia Dias – Proprietario

José Corrêa Dias – Negociante

José Ferreira de Carvalho – Chefe da Estação Telegrafo Postal

Antonio Augusto da Silva – Sapateiro

Benjamin Baptista – Fabricante de Louça

Antonio Cardozo dos Santos – Ofi cial da Camara

Fernando Rodrigues – Proprietario

Manuel Cravo – Mestre de Pedreiros

Isaac Pereira Batalhão – Sapateiro

Camillo Caetano da Silva ??

Carlos Pereira Batalhão – Estudante

José Baptista Barreira – Regedor

Jose d’Abreu e Souza – 1.º Cabo de Infanteria

Camillo Caetano da Silva – Sapateiro

Francisco Fernandes da Paz – Proprietario

José Luis Moura de Figueiredo – Proprietario

Benjamin Arthur das Neves – 2.º Aspirante de Fazenda

Manoel Mathias da Cunha – Empregado de Fazenda

?? Lopes de Araújo – Serralheiro

Antonio Carlos d’Oliveira – Escrivão de Fazenda

Francisco Adelino Xavier Pereira – Secretario da Camara Aposentado

Joaquim Dias – Distribuidor Postal

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república e democracia 21

José Fernandes Lamas ??

Manoel Baptista – Vogal da Commição

Salvador Francisco Antunes – Negociante

Armando Fernandes Cosme

Jose Bento – Trabalhador

Arnaldo da Cruz – Trabalhador

Manuel Fernandes Cosme – Trabalhador

Alberto Pereira Martha – Pedreiro

Cesar Baeta de Campos – Comerciante

Antonio Pedro – Empregado Fiscal

Abilio dos Santos – Proprietario

Manoel Rodrigues Maria – Distribuidor Rural

Jose dos Santos – Guarda Fios

João Fernandes Conde

Alfredo Simões Serrano – Carteiro

Fernando Rodrigues

José Lourenço – Capitalista

João Baptista Leitão Pimenta – Aspirante a Medico do Ultramár

Francisco Augusto da Costa e Silva – ?? de Miranda ??

Manoel Fernandes Cosme – Escrivão do Juìz de Paz

?? ?? ?? – Chefe da Comissão d’Obras Publicas

Joaquim Fernandes dos Santos Junior – Estudante

Joo dos Santos Cardoso – Proprietario

José Camillo – Offi cial da Administração do Concelho

João Fernandes – Proprietario

Abilio Ferreira Gomes d’Abreu – Professor Aposentado

Adelino Correia – Cantoneiro

Pedro Baptista Barreira – Pedreiro

José Bernardino Mendes – Proprietario

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Page 20: República e Democracia

22 república e democracia

Joaquim Correia – Cantoneiro

Luiz Augusto Borges de Castro – Proprietario

Luiz Caetano de Castro – Proprietario

Antonio Corrêa Fernandes – Negociante

Manoel da Silva

Joaquim Correia – Proprietario

José Antonio Pereira – Proprietario

Accurcio Lopes – Proprietario

Manuel Baêta de Campos – Professor Ofi cial

José Francisco dos Santos – Proprietario

Joaquim Fernandes Ventura – Empregado da Fazenda

Agostinho Gomes – Fiscal dos Impostos

Antonio Pereira Batalhão – Pastor Rural

Victorino Luiz Marques – Proprietario

Abilio de Castro Marques – Proprietario

Joaquim Fernandes – Proprietario

João Henriques de Campos.

O Secretario da Camara

João Henriques Ferreira de Carvalho.

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Page 21: República e Democracia

Desfraldar da bandeira Carbonária na “ponte detrás do castelo” em Miranda do Corvo, provavel-mente ainda antes da revolução republicana ou então no próprio dia 5 ou 6 de Outubro de 1910

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Page 23: República e Democracia

INTERVENÇÃO DO ENG.º CARLOS FERREIRA,

NAS COMEMORAÇÕES DE 5 DE OUTUBRO DE 2010,

POR OCASIÃO DA INAUGURAÇÃO

DA PRAÇA DA REPÚBLICA

Senhora Presidente da Câmara Municipal de Miranda do Corvo

Senhor Presidente da Assembleia Municipal de Miranda do Corvo

Senhores Presidentes das Juntas de Freguesia

Demais Autarcas e Autoridades

Senhoras e Senhores

Há 100 anos foi proclamada a República na varanda da Câmara Munici-

pal de Lisboa.

Comemoramos hoje o primeiro Centenário da Implantação da República

em Portugal.

O Centenário da República fi cará, em Miranda, assinalado por uma série

de realizações e eventos que a Autarquia tem vindo a levar a cabo ao longo do

ano mas sem dúvida que a Praça da República e o monumento de homenagem

à República que hoje aqui inauguramos são a grande marca desta efeméride.

Comemorar a República é comemorar um regime politico mas é também

comemorar um conjunto de valores éticos que foram beber a sua inspira-

ção ao primado dos princípios da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade.

Não estamos hoje apenas a evocar um momento histórico... estático... do

passado... mas evocamos também o sonho de ver Portugal transformar-se

num país moderno e progressista, berço de valores e de princípios de conduta

ética e moral.

Sonho esse, que nós portugueses, até hoje ainda estamos longe de ter con-

seguido alcançar.

Importa que todos nós mantenhamos a bandeira da República levantada

bem alto e que nunca esqueçamos os valores que ela representa e incorpora.

Importa que todos nós lutemos diariamente, com os meios ao nosso

alcance, pela construção dessa sociedade melhor, pela qual os nossos antepas-

sados, há cem anos, tanto lutaram.

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Page 24: República e Democracia

26 república e democracia

Uma sociedade livre mas também uma sociedade mais justa e mais igual.

Uma sociedade que não permita que salários e reformas de miséria convi-

vam lado a lado com ordenados escandalosamente altos.

Uma sociedade que não se resigne a ser a que na Europa apresenta maiores

diferenças entre os mais ricos e os mais pobres e entre os salários mais baixos

e os mais altos.

Uma sociedade que não feche os olhos à injustiça e à mentira.

Uma sociedade cada vez com menos pobres e em que os ricos, em vez de

pensarem só em si, lutem pela elevação da própria sociedade.

Uma sociedade que aposte no homem e no seu valor, dando a todos iguais

oportunidades para que o valor de cada um se possa evidenciar.

Uma sociedade em que a justiça seja justa e independente e não um joguete

dos interesses e poderes político e fi nanceiro.

Uma sociedade progressista e instruída, que garanta o livre acesso de todos,

a uma educação e formação universais.

Uma sociedade humana, que garanta aos seus doentes um sistema de saúde

de qualidade, independentemente dos seus recursos fi nanceiros.

Uma sociedade solidária, que dê o devido apoio aos mais desfavorecidos e

seja inclusiva para com as vítimas de defi ciência e outros excluídos.

Uma sociedade boa que saiba dar a devida protecção às crianças e aos

idosos.

Foi este o sonho que há cem anos conduziu a bandeira verde e rubra à

varanda da Câmara de Lisboa e são estes princípios que devem nortear a vida

de todos nós, republicanos.

As duas colunas que no monumento agora inaugurado protegem a fi gura

da República estão aqui para isso mesmo, para nos recordar, com o seu porte

recto, a verticalidade dos valores do republicanismo.

Senhoras e Senhores

Estamos hoje aqui, em Miranda do Corvo, a comemorar o Centenário da

República e não poderíamos estar em melhor local.

Miranda e os mirandenses sempre souberam nortear a sua conduta pelos

ideais Republicanos.

Miranda é hoje uma terra livre e solidária.

É apontada por todos como uma referência regional e até mesmo nacional

na área da solidariedade, da inclusão e do investimento humano.

O caminho da solidariedade percorrido em Miranda desde que o Padre

Américo aqui fundou a primeira Casa do Gaiato, até ao trabalho hoje desen-

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Page 25: República e Democracia

introdução 27

volvido nesta Casa, na Fundação ADFP, na Misericórdia e na Caritas em

Semide e no Lar Dr. Clemente de Carvalho foi um caminho árduo mas segu-

ramente iluminado pelos valores Republicanos.

Não poderia ser de outra maneira.

Não podemos esquecer que Miranda viu nascer, na Pereira, José Falcão.

José Falcão, um dos mais ilustres mirandenses, foi um dos maiores repu-

blicanos portugueses a que a morte já não permitiu assistir ao 5 de Outubro

de 1910.

José Falcão foi de facto um dos grandes republicanos. Era um homem de

valores.

José Falcão era um democrata e um homem de bem.

Um homem verdadeiramente livre e de bons costumes.

Mas recordar José Falcão é também recordar, na sua fi gura, todos os repu-

blicanos mirandenses.

Desde logo recordamos aqui os Srs. Joaquim Pereira Falcão, António da

Silva Bastos, João Batista Leitão Pimenta, Manoel Pereira Batalhão e José

Maria Baptista, que constituíram as Comissões Municipais Republicanas de

Miranda do Corvo nos anos de 1906 / 1910.

Mas recordamos também os distintos republicanos que aqui nasceram ou

escolheram Miranda para viver: O Coronel Belizário Pimenta, o Dr. Rosa Fal-

cão, o Professor Armando Alves da Silva, o Dr. Luís Baeta de Campos, o Dr.

Joaquim Refoios, o José Maria Ferreira e o Dr. Henrique Brito de Carvalho,

entre outros.

Não podemos esquecer nas gerações mais recentes mas igualmente grandes

republicanos e merecedores também de justa evocação o Professor Doutor

Ferrer Correia, o Dr. Fausto Correia e o Prof. Lidio Alves Gomes.

Mas hoje importa especialmente homenagear todos os cidadãos miranden-

ses, anónimos, que ao longo deste século lutaram pelos ideais da República.

É também o testemunho da nossa memória, da nossa esperança, anseios e

medos, que daqui a pouco iremos encerrar na Cápsula do Tempo que fi cará

selada nesta praça.

Cerca de duzentos jovens alunos do Agrupamento de Escolas de Miranda

do Corvo, acompanhados por alguns dos cidadãos e cidadãs responsáveis do

nosso concelho, aqui irão depositar os seus testemunhos destinados aos seus

homólogos que daqui a cinquenta anos ocupem os mesmos lugares.

Esta Cápsula do Tempo destina-se a ser aberta no dia 5 de Outubro de 2060,

nas comemorações dos cento e cinquenta anos da República em Portugal.

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28 república e democracia

Senhoras e Senhores

A divulgação dos valores do republicanismo é hoje tão importante como o

era há cem anos.

Os ideais da República, cem anos depois, ainda não estão totalmente

cumpridos.

A nossa República necessita ainda de muito esforço de todos e de um per-

manente aperfeiçoamento.

Para nos recordar essa necessidade de conclusão da obra uma das colunas

deste monumento não está terminada.

Tal como os antigos arquitectos construtores das grandes catedrais não

descansavam enquanto, pedra após pedra, não concluíam a sua obra... Tam-

bém nós aqui estamos hoje a colocar mais uma pedra, na construção de mais

um arco de volta perfeita, nesta obra, iniciada à cem anos, que é a República

Portuguesa.

Tenhamos a coragem, todos juntos, de contribuir para o seu aperfeiçoamento.

Tal como há um século os nossos antepassados gritavam por vezes na calada

da noite...

Gritemos também nós... hoje... bem alto...

Viva a República!

Viva Miranda!

Viva Portugal!

carlos jorge rodrigues do vale ferreira

Presidente da Comissão Organizadora das Comemorações

do Centenário da República em Miranda do Corvo

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Page 29: República e Democracia

A REPÚBLICA E A CIDADANIA *

professor doutor amadeu carvalho homem

Aquilo que irei fazer aqui não vai ser tanto uma conferência em moldes

clássicos. Irei, isso sim, tentar travar uma conversa convosco, que pode-

remos prosseguir depois da exposição, através das perguntas que desejarem

colocar-me. Irei, sobretudo, esforçar-me por responder a interrogações que

todos nós temos. Hoje eu talvez tenha menos perplexidades sobre esta maté-

ria, uma vez que dediquei a este fenómeno da República uma boa parte da

minha vida. Mas no início deste processo de investigação, eu tinha muitas

dúvidas, no que respeitava à opção possível entre a república e a monarquia.

A monarquia assenta no facto de se deixar conduzir por um rei, que o é para

toda a vida. O rei transfere o seu poder para o fi lho varão mais velho, ou não

tendo fi lho varão mais velho transfere o seu poder para a fi lha mais velha, se

ela existe. Pelo contrário, o Presidente da República ocupa o seu lugar por um

determinado tempo, e no fi m dele cede a sua função a um outro Presidente

da República. E estava convencido que para além destas pequenas diferenças,

pouco mais havia que de alguma maneira separasse a identidade da república

e a identidade da monarquia. Existem outros espíritos de boa fé, ainda hoje,

que pensam sobre este assunto o seguinte: bom, afi nal de contas haver uma

república ou haver uma monarquia, desde que seja uma monarquia constitu-

cional, é quase a mesma coisa. E acrescentam: num caso temos lá o adorno

do rei, noutro caso temos um Presidente da República, que também pode ser

um adorno, em função do modo de exercício do cargo E dizem ainda mais:

temos aqui o exemplo da vizinha Espanha, temos o exemplo dos Países Nór-

dicos onde também há monarquias, e afi nal de contas essa gente, esses povos,

também estão desenvolvidos. Se as coisas são assim na aparência, a verdade

é que será muito bom debruçarmo-nos sobre certos antecedentes históricos

* O presente texto foi elaborado a partir da gravação da conferencia, que foi proferida sem

registo escrito.

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Page 30: República e Democracia

32 república e democracia

que lançam sobre este problema uma luz muito esclarecedora. Os povos e as

nações constroem-se no tempo, e no correr do tempo ocorrem várias situa-

ções de que podem resultar, efectivamente, uma maior afi nidade, uma maior

identifi cação de um povo relativamente a um regime e uma menor identifi -

cação desse mesmo povo relativamente a outro regime. E para além do mais,

eu ia aqui procurar esclarecer-vos ( e esclarecer-me também) sobre uns tantos

pontos que defi nem verdadeiramente o ser republicano, dando legitimidade à

preferência por um republicanismo assumido e convicto. Uma primeira tarefa

se nos impõe. Necessitamos de verifi car se a monarquia constitucional, aquela

monarquia que nós tivemos, foi uma democracia. Este é um ponto funda-

mental, porque realmente nós hoje sabemos o que é a democracia, e, apesar

de ser tantas vezes mal interpretada, a verdade é que gostamos de viver nela,

sendo ela para nós um valor importante. Um outro valor importante é, para

nós, a instrução, a educação, a cultura de um modo geral. Por isso, é bom que

possamos saber como é que , nestes domínios actuava a monarquia constitu-

cional. Uma outra noção que nos obrigará a esclarecimentos gerais é a noção

de laicismo ou de laicidade, uma vez que também esta noção foi interpretada

diversamente, em Portugal, pelos defensores da monarquia constitucional e

pelos militantes da República. O que é o laicismo, o que vem a ser a laicidade?

Teremos também de averiguar como é que foram verdadeiramente exercidos

os lugares públicos, as funções públicas, quer na monarquia constitucional,

quer na república. A questão está toda em saber se quem exerceu lugares públi-

cos, os exerceu com honradez, saber se foi honesto no exercício dessas funções.

Bom e fundamentalmente era sobre isto que eu queria começar a refl ectir.

Analisemos, desde já, o problema da democracia. Nós hoje sabemos bem o

que é uma democracia, pelo menos no seu aspecto mais evidente, no seu

aspecto formal. No seu aspecto mais formal, a democracia consiste no sufrá-

gio universal, ou seja, na possibilidade que é dada a cada cidadão para exercer

o seu direito de voto, deslocando-se às assembleias eleitorais quando há elei-

ções e fazendo lá descarregar o seu voto, que não é mais do que na expressão

da sua vontade livre. Hoje, neste regime republicano, todos nós benefi ciamos

deste aspecto da Democracia, estando a liberdade de voto consignada na lei

constitucional. Só não vamos votar, se não quisermos, e é por isso que pode-

mos dizer que esta democracia formal está verdadeiramente instalada. As coi-

sas não se passavam assim no período anterior à proclamação da República.

A monarquia constitucional, embora constitucional, não era uma monarquia

animada por valores democráticos. O diploma constitucional que então vigo-

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rava era a Carta Constitucional de 1826, outorgada por D. Pedro, que tinha

proclamado em 1822 a independência do Brasil e que desde aí tinha sido

reconhecido como Imperador dessa antiga colónia portuguesa chamada Bra-

sil. De acordo com essa Carta Constitucional de 1826, havia uma diferença

entre cidadãos activos e cidadãos passivos. O cidadão activo era aquele que

tinha efectivamente o direito e a prerrogativa de se dirigir à urna e de mani-

festar aí a sua vontade, podendo, em certas condições, não apenas votar, mas

também ser votado para determinados cargos. O cidadão passivo, era aquele

que pura e simplesmente não podia votar. Vamos reter, desde já, este ponto:

no decurso da monarquia constitucional havia concidadãos nossos, portugue-

ses como nós, que estavam impedidos de exercer o direito de voto. E provavel-

mente vão-me fazer uma pergunta evidente que é esta: mas então como é que

se distinguiam os cidadãos activos, aqueles que podiam votar, dos cidadãos

passivos, aqueles que estavam impedidos de votar? Esta diferenciação fazia-se

de acordo com o montante, de acordo com o teor quantitativo das quantias

pagas ao Estado a título de imposto. O imposto naquela altura era designado

tecnicamente como o censo. Hoje o censo é uma noção completamente dife-

rente, consistindo na contagem da população e na caracterização sociológica

da população. Mas naquela altura o censo identifi cava-se com o imposto a

pagar. Quando se dizia que se pagava o censo, o que estava a signifi car-se era

que se pagava o montante do imposto devido. Ora bem, o que as leis eleitorais

e o que a própria Carta Constitucional de 26 determinavam era que os cida-

dãos que atingissem ou ultrapassassem um determinado patamar de paga-

mento de imposto, esses poderiam votar; masse por acaso não atingissem esse

patamar de pagamento de imposto, não podiam votar, eram impedidos de

votar. Era tributada a riqueza. E, como sabem, naturalmente que o próprio

conceito e a noção de riqueza foi variando ao longo do tempo. No século XIX,

neste século a que me reporto e onde existiu a Carta Constitucional, quem era

rico era quem possuísse largas terras, enfi m, era o terratenente, o proprietário

de terras. Hoje, as pessoas que têm courelas, o que querem é desfazer-se delas,

porque realmente aquilo só dá prejuízo. Mas naquele tempo a detenção de

terra era indiscutivelmente sinal de riqueza, por dar rendimentos sufi cientes e

necessários para que se diferenciassem as situações patrimoniais e consequen-

temente se estabelecesse a fronteira entre as pessoas mais bem instaladas na

vida e as pessoas economicamente mais débeis. Ora bem, o que isto signifi -

cava, era que o direito de voto na monarquia constitucional estava por esta via

reservado exclusivamente àqueles que tinham bens materiais, àqueles que

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eram ricos, fi cando portanto a população mais humilde pura e simplesmente

retirada deste exercício de direito cívico, deste voto, e portanto, excluída da

democracia. Portanto, um primeiro argumento daqui emanado é este: que-

remo-nos e sabemo-nos republicanos, porque efectivamente prezamos a

democracia, mesmo aquela que apenas se expresse pelo seu aspecto formal,

aquela que garanta a cada um o seu direito de ir votar livremente, em quem

quiser. É fundamental que realmente, nós tenhamos este direito assegurado,

o direito de nos dirigirmos à assembleia de voto e depositarmos lá o nosso voto

como muito bem entendermos. Já agora, deixem-me dizer-vos também que

apesar desta exclusão de uma parte signifi cativa da população, nós podemos

dizer que as eleições no decurso da monarquia constitucional, como mais

tarde no decurso do Estado Novo, eram um logro, uma verdadeira mistifi ca-

ção, uma mentira de alto a baixo. No tempo da monarquia constitucional, as

votações em regra decorriam no interior das igrejas, habitualmente ao

domingo. Ao domingo é que se realizavam as eleições dentro das igrejas. Na

altura, a Igreja católica estava muito perto da perspectiva monárquica, por-

tanto defendia o mais que podia a monarquia, e de tal modo que os cidadãos

eleitores, antes de irem votar, ouviam habitualmente um sermão do pároco,

no qual ele fazia a apologia deste voto e não daquele, declarando coisas pare-

cidas com esta: - cuidado, vocês agora a seguir vão votar; votem bem, votem

no partido x , que é o bom, e não no partido y, que é o mau. Além disto, o

exercício do voto era condicionado por um conjunto de notáveis, que nós

podemos designar por infl uentes ou caciques locais, que tendo uma evidente

hegemonia sobre a população, a conduzia, a orientava, e a obrigava a votar

num determinado sentido e não no outro. Quem eram esses notáveis locais?

Basta ler o que a propósito dos diversos actos eleitorais sob a monarquia cons-

titucional escreveram nomes grandes da nossa Cultura e da nossa Literatura,

como Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Fialho de

Almeida, Aquilino Ribeiro e tantos outros. Estes caciques locais identifi ca-

vam-se, por exemplo, com o professor primário, fi gura extremamente respei-

tada, nomeadamente pelos serviços que prestava. Uma boa parte da população

rural portuguesa tinha emigrado, ou foi emigrando ao longo do século XIX.

Como por cá as condições de vida eram madrastas, como minguava o traba-

lho, como a miséria era uma constante ameaça, a população, sobretudo a

rural, pura e simplesmente saía, dirigindo-se habitualmente para o Brasil. Era

uma população analfabeta. Isto explica o grande respeito que habitualmente

era tido para com o professor primário ou para com o pároco. Isto resultava

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sobretudo da circunstância de serem pessoas que sabiam ler e escrever, e que

podiam, querendo, satisfazer as necessidades de comunicação dos que ainda

por cá fi cavam, escrevendo em nome deles cartas para os países de destino e

especialmente para o Brasil, que recebia o maior contingente desta emigração

portuguesa. E tal facto conferia imediatamente um ascendente destas pessoas

em relação às camadas iletradas, que lhes permitia impor as suas preferências

políticas e recomendar, em termos de verdadeira intimação, o voto nos candi-

datos deste partido e não daquele. Por outro lado, como os cuidados médicos

não estavam muito implantados nessas populações, também havia uma fi gura

extremamente infl uente, a qual se confundia com a do médico da aldeia, ou

seja, com o famoso João Semana, que Júlio Dinis tão bem soube tracejar.

Outro profi ssional muito respeitado era o boticário, o equivalente ao farma-

cêutico de agora, o qual, por vezes, arrancava dentes cariados e muito dolori-

dos quase a sangue frio, de forma perfeitamente primitiva, mas efi caz pelo

efeito de libertarem os sofredores das dores que os apoquentavam. E havia

também, como fi gura das mais importantes que teremos de incluir nesta gale-

ria de caciques, a fi gura do grande proprietário de um determinado lugar que

tinha a população na mão pelo facto de depender da sua vontade a oferta ou

a negação de trabalho braçal a este ou àquele, negando-o a quem bem lhe

apetecia. Ou seja: todas as individualidades que, em meios rurais, detinham

poderes económicos ou de prestação informal de serviços, estavam em condi-

ções de condicionar o sentido do voto das populações que delas dependiam.

Além do mais, naquela altura havia urnas de diversos materiais e feitios, sendo

algumas de vidro transparente, o que em nada favorecia o dignidade e a ver-

dade eleitorais. Tudo isto era ainda agravado pela circunstância de não estar

previsto na lei que as listas a introduzir nas urnas tivessem as mesmas dimen-

sões, fossem feitas com o mesmo tipo de papel, obedecessem, numa palavra, a

uma uniformidade de apresentação que pudesse ser garante de imparciali-

dade. Tudo isto foi exaustivamente satirizado por um dos maiores caricaturis-

tas portugueses, Rafael Bordalo Pinheiro, o qual fi gurava as eleições como os

momentos em que eram distribuídos aos eleitores rurais o “carneiro com bata-

tas do Senhor Fontes Pereira de Melo”. Era sabido que a imposição das prefe-

rências eleitorais destes caciques ou notáveis locais se fazia acompanhar de

refeições – habitualmente de carneiro – distribuídas gratuitamente aos sub-

missos e arregimentados votantes. Sendo portanto os actos eleitorais um ver-

dadeiro sofi sma, a consequência inapelável era esta: a “democracia monárquica”

não existia pura e simplesmente. A reclamação da democracia, equivalente ao

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sufrágio universal, foi uma reclamação trazida pelo republicanismo. Foram

homens como José Falcão, António José de Almeida, Afonso Costa, Alves da

Veiga, e tantos mais militantes do republicanismo que reivindicaram para

Portugal a adopção do sufrágio universal. Essa reivindicação não chegou a

materializar-se, nem sequer no momento em que os republicanos, a partir de

5 de Outubro de 1910, puderam erigir a sua Primeira República. O republi-

canismo, percorrido pelo temor de abrir o caminho à contra-revolução, aca-

bou por não conceder o direito de voto às mulheres. Esta ambição republicana

dos tempos da propaganda foi somente efectivada com o movimento revolu-

cionário de 25 de Abril de 1974. A concessão do direito de voto às mulheres,

sem nenhuma restrição ou condição, marca o momento da chegada de Portu-

gal à dignidade de uma Democracia formal plena. Efectivamente, foram os

capitães de Abril que realmente abriram o caminho para o exercício da plena

democracia em Portugal.

Passemos aos aspectos da instrução pública tão importante para a radicação

de uma democracia adulta. Se o republicanismo preza a Cidadania, isto supõe,

desde logo, que os concidadãos de um país republicano sejam esclarecidos por

uma instrução generalizada que lhes permita não apenas os actos elementares

da leitura, da escrita e do cálculo, mas também os actos mais sofi sticados da

refl exão sistemática, única forma de se conseguir que uma comunidade tenha

uma opinião pública adulta e interveniente. No decurso da monarquia cons-

titucional as pessoas não tinham, nem podiam ter este tipo de postura, não

tinham condições de poderem ser portadoras de um pensamento esclarecido.

Porquê? Pela razão simples de termos chegado ao 5 de Outubro de 1910, na

altura em que as instituições mudaram, fi nalmente, por via revolucionária com

uma taxa de analfabetismo da população portuguesa que superava os 75% da

população. Não há um argumento maior contra a monarquia, mesmo cons-

titucional, que supere este. Um regime como o da monarquia constitucional,

que, passados os tempos da guerra civil, se cimentou a partir de 1834, atingiu o

século XX com esta confrangedora e comprometedora taxa de analfabetismo!

É caso para perguntar: mas que políticas educativas foram postas em marcha (

se é que as houve) ? Mas que futuro de esperança podia divisar-se para os por-

tugueses? Negro futuro teria de ser – e foi – esse. Insista-se, portanto, nisto: a

monarquia teve o tempo que mediou entre 1834 e 1910 para melhorar o sistema

educativo e nada ou quase nada conseguiu fazer. Uma das grandes prioridades

da República e da propaganda republicana foi precisamente, a reclamação e a

reivindicação de um amplo sistema de educação popular.

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Passo já para o terceiro ponto e aqui vou ser relativamente breve porque

o meu amigo Carlos Esperança há-de vir falar-vos nisto. Esse ponto é o do

laicismo. Desejaria, acerca desta matéria, desfazer aqui determinado tipo de

perspectivas e determinado tipo de ditos, ou de preconceitos que esta palavra

desencadeia. Argumenta-se muitas vezes, em determinados sectores, que o

republicanismo envolveu sempre uma fi losofi a contrária à religião, nomeada-

mente à religião católica, apostólica-romana. Reconhecendo-se muito embora

a existência, no interior do movimento republicano e depois nas fi leiras do

Partido com o mesmo nome de uma sensibilidade ateísta – aliás minoritária

– deve enfatizar-se que o laicismo não é hoje mais do que a reivindicação de

que o Estado, que nos representa a todos, seja neutro em matéria religiosa,

isto é, que não tenha religião nenhuma. Um Estado organizado não tem nem

de servir, nem de perseguir movimentos religiosos, sejam eles quais forem.

E isto foi claramente percepcionado e praticado por republicanos dos mais

ilustres. Se houve fi guras, na panóplia do republicanismo português, que

assumiram uma atitude de grande energia para com os fenómenos exteriores

de religiosidade – e Afonso Costa é o máximo expoente desta orientação –

outros houve, como José Falcão, António José de Almeida ou o Abade Pais

Pinto, que sempre respeitaram as crenças religiosas tradicionais dos portu-

gueses, sendo o último até sacerdote. Por isso, que se quer dizer, para que

se aponta, quando se declara que o republicanismo deseja um estado laico?

Aponta-se para o seguinte: um estado que dê ao conjunto dos cidadãos a pos-

sibilidade de serem o que eles quiserem em matéria religiosa, mas que simulta-

neamente não escolha para si nenhuma religião, tratando-as imparcialmente a

todas. Dentro de um estado republicano ninguém proíbe o livre assumir das

crenças religiosas. Mas, por outro lado, todos os republicanos reivindicarão

que as diversas Igrejas ou crenças sejam vistas como fenómenos de consciência

individual e nunca como opções do próprio Estado. Aliás, dentro de zonas

territoriais, como o é a Europa, onde o fenómeno da pluralidade de confi s-

sões e de etnicidade é cada vez mais evidente, a emergência de um Estado

confessional só serviria para lançar a suspeita de que esse Estado estaria a

privilegiar os cidadãos de uma determinada crença em detrimento de outra

ou outras. O Estado, justamente porque nos representa a todos, tem que ser

neutral em matéria religiosa, devendo ser igualmente o primeiro garante de

que o ensino público ostente igualmente estas características de neutralidade.

Um Estado, sobretudo quando é confrontado com estes problemas da cha-

mada pluri-etnicidade, um Estado que por isso se torna diversifi cado nas suas

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fi nalidades em consequência das vagas migratórias ou emigratórias, não pode

ser um Estado confessional, não pode querer ter uma religião de Estado. Ora,

neste confronto entre monarquia e república, a diferença é muito grande, uma

vez que a monarquia constitucional, durante todo o período da sua vigência,

foi sempre uma monarquia com uma religião de Estado, e a religião de Estado

era a religião católica, apostólica, romana.

As acusações que alguns desferem contra a República de hoje, acusando-a

de corrupta, declarando o seu naufrágio, enfatizando que existe corrupção e

compadrio, cacicagem e falta de transparência administrativa, não podem ser

levianamente desmentidas. O velho programa do republicanismo histórico

não só não tem sido cumprido, mas tem sido mesmo claramente desvirtu-

ado. É uma acusação que republicanos podem fazer a republicanos, mas que

os monárquicos não terão o direito de sustentar. E isto porque o sudário de

misérias morais da monarquia constitucional, sobretudo a partir do Ultimato

inglês de Janeiro de 1890, é sufi ciente para – apesar dos desvios de hoje – não

consentir comparação de nenhuma índole. os meus livros e tal, vou tratar da

minha vida, porque esta vida, não é bem vida para mim, mas sou um republi-

cano, isso sou e nunca prescindi deste estatuto de republicano. A parte fi nal

da monarquia constitucional foi um sudário de misérias, de baixezas e de cor-

rupções. Houve o célebre caso Hilton, houve o escândalo de dinheiros mal-

parados do Crédito Predial, houve o caso dos “bonds” Hersent, que envolveu

a corrupção activa de deputados monárquicos por parte do primeiro respon-

sável da Companhia que se encontrava a fazer as obras do porto de Lisboa. E

houve essa espantosa revelação, feita em plena assembleia plenária da Câmara

dos Deputados por parte do ministro Oliveira Martins, provando à saciedade,

com documentos na mão, que um vulto político muito infl uente da política

monárquica, Mariano de Carvalho, havia cometido a baixeza de um desvio

de fundos públicos em proveito próprio. A mesma Câmara pasmou quando

o visado, longe de negar o crime, declarou que, em contrapartida, já tinha

salvo Portugal, por várias vezes, da bancarrota. Por outro lado, e fi nalmente,

a grande distinção entre a República e a Monarquia, é que efectivamente a

República preza e defende a “res publica”, a coisa pública. Sabem o que é a

coisa pública? A coisa pública é a casa comum dos portugueses, a coisa pública

é esta câmara municipal, a coisa pública é o hospital público, a coisa pública é

o conjunto das nossas instituições de ensino público, a coisa pública é a Uni-

versidade de Coimbra, a coisa pública são as ruas, ao cuidado desta autarquia

das outras autarquias do melhor maneira para que as pessoas não caiam no

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primeiro buraco que por lá haja, a coisa pública tudo isto. E sabem o que é

que o patriotismo republicano intransigentemente defende? Defende que esta

“res-publica”, esta casa comum dos portugueses, deva ser uma casa limpa,

deva ser uma casa bem arrumada, deva ser uma casa digna, deva ser uma

casa nossa. Afi nal de contas, o patriotismo não é mais do que isso, é a consci-

ência de que quem faz a Pátria somos nós, nós enquanto cidadãos. Portanto,

o grande apelo do Republicanismo é o apelo à cidadania, que naturalmente

depois se articula com outros apelos. Um desses apelos é que não exista uma

sociedade com grandes discrepâncias em matéria económica, embora se saiba

que é demagógico pedir uma sociedade radicalmente nivelada, uma socie-

dade onde prepondere uma “igualdade turca”. Isto não se reclama porque se

tem a certeza de que homens e mulheres não são iguais; não são iguais pelas

diferentes capacidades de trabalho, pelas diferentes devoções às missões que

cumprem, pelas diferenças de efi cácia na execução de tarefas, até mesmo pelas

diferenças caracteriais que separam um industrioso de um preguiçoso. Mas

o republicanismo bater-se-á para que não haja um abismo tão grande e tão

intransponível entre ricos e pobres, e para que não se instale uma forma tão

selvagem de cupidez e de perversão económica que permita que os ricos sejam

cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Os ricos são poucos e

poderosíssimos e os pobres que são cada vez mais, cada vez mais numerosos,

e que todos os dias cada vez estão sujeitos a mais constrangimentos económi-

cos. O republicanismo de hoje está convicto de que neste mundo que habita-

mos se torna cada vez mais necessária uma nova ordem económica mundial.

Nós já pusemos bem os olhos em África, onde meia dúzia de chefes tribais

acumulam riquezas verdadeiramente fabulosas, onde as senhoras desses ditos

chefes tribais tomam o avião para virem frisar os cabelos a Paris e regressam

novamente aos seus países, com toda a impunidade? E onde efectivamente há

milhões e milhões de pessoas a morrerem de podridão física, de doenças por

tratar e de miséria? Isto também é civismo republicano, porque o republicano

não tem apenas de cuidar da sua pequena casinha, o republicano tem também

que partir do principio de que habita um Mundo, e que quanto maior for a

justiça nesse vasto mundo, maior será a justiça social na sua pequena casa.

De modo que, fundamentalmente, eram estes os aspectos que eu hoje vos

queria desenvolver. Naturalmente que o faço com muito prazer, porque hoje

é um dia especial para os republicanos. Hoje é o 31 de Janeiro. Ora, a 31 de

Janeiro de 1891, no Porto, deu-se a 1.ª tentativa de demolição das institui-

ções monárquicas de armas na mão. E sabem que há aqui, inclusivamente,

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um aspecto que eu tenho que sublinhar, porque é muito apaixonante para

mim: é que quem efectivamente pegou nessas armas, quem efectivamente

quis derrubar as instituições em 31 de Janeiro de 1891, foram mais ou menos

as mesmas classes militares e profi ssionais que se movimentaram, quer no 31

de Janeiro de 1891, quer no 25 de Abril de 1974. Num e noutro caso, quem

se bateu foram os pequenos, foi o povo miúdo, foram as baixas patentes da

ofi cialidade. Em 31 de Janeiro de 1891 no Porto, quem saiu à rua, revolu-

cionariamente, com as armas na mão, foram cabos, foram soldados, foram

sargentos e da classe dos ofi ciais havia lá um alferes, um tenente e um capitão.

Em matéria de patentes, de altas patentes da ofi cialidade, o nosso 25 de Abril

de 1974 também foi assim. Num primeiro momento, quem deu o corpo às

balas foram os Capitães de Abril, de modo que, os republicanos partem do

principio de que o depósito mais fundamental das virtudes da nossa Pátria,

está efectivamente nessa arraia-miúda, nesse pequeno povo, que sofre todos

os dias e que resiste todos os dias. É, efectivamente, para ele e com ele que a

República tem de existir.

Muito obrigado pela vossa atenção.

Salão Nobre dos Paços do Concelho

Miranda do Corvo em 31-01-2011

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“SOCIEDADES SECRETAS, MAÇONARIA E CARBONÁRIA,

E A SUA INTERVENÇÃO NO ADVENTO DA REPÚBLICA”

dr. fernando fava

SOCIEDADES; SECRETAS; INICIÁTICAS; RITUALISTAS

ALGUMAS DEFINIÇÕES PREAMBULARES

Sociedades: são grupos de pessoas unidas em torno de uma fi nalidade

comum e que, por essa razão e nesse mesmo sentido, se obrigam, por con-

trato, a conjugar os seus esforços e os seus recursos. Para tanto, são criadas

regras e dinâmicas internas, visando atingir uma orgânica coerente com os

objectivos a que se devotam.

Secretas: as sociedades secretas são, na sua essência, uma realidade des-

conhecida do comum das pessoas. Os seus membros, os seus rituais, as suas

reuniões e temáticas, os seus objectivos, constituem matéria de um conheci-

mento esotérico, ou seja de um conhecimento próprio de um círculo restrito

de pessoas e a ele limitado. Assim sendo, estas sociedades aparecem aos olhos

do cidadão comum como que rodeadas de um halo de mistério.

Iniciáticas: regra geral, o acesso à condição e qualidade de membro de uma

sociedade secreta exige um acto cerimonial, a Iniciação. Através deste passo,

aquele que, até então, era profano passa a iniciado e, dessa forma, ascende das

«trevas à luz» e toma contacto com o conhecimento esotérico referido.

Ritualistas: porque nos seus actos importantes, nas suas cerimónias,

rodeiam-se de formalidades, de palavras e de atitudes institucionalizadas e

repetidas, em que é, notável a carga simbólica, tudo no sentido de causar

impressão funda, admiração, respeito.

Nota: não obstante serem muitas e diversas as organizações espalhadas

pelo mundo, que, grosso modo, preenchem estes requisitos e que, por conse-

guinte, podem ser apelidadas de sociedades secretas, em Portugal, neste ano

de Comemorações do Primeiro Centenário de Implantação do Regime Repu-

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blicano, interessa-nos, mormente, estudar a Maçonaria e a Carbonária, face

ao insubstituível papel histórico que estas duas instituições tiveram no pro-

cesso de afi rmação do republicanismo e de concretização da República.

A MAÇONARIA

Finalidades: criação de um mundo mais livre e mais igual; incentivar o

desenvolvimento espiritual homem; procura da fraternidade universal, par-

tindo do particular para o geral – amar a Pátria, mas também as outras nações.

No pensamento e palavras de Fernando Pessoa: “a Nação é a escola presente

para a Super-Nação futura”.

Origens : tradicionalmente, atribuem-se três Idades à Maçonaria: A Antiga,

a Medieval ou Operativa e a Moderna ou Especulativa.

Antiga: Há teses que pretendem situar a origem da Maçonaria na Antiga

Fenícia e mais insistentemente no Antigo Egipto e na construção do Tem-

plo de Salomão. De acordo com estas teses, os mestres maçons operavam

já nesses tempos bíblicos, eram muito exercitados na actividade do pen-

samento e detinham segredos importantes, que utilizavam justamente nas

suas construções. Eram iniciados numa espécie de “Geometria Sagrada”, a

que prestavam culto ao abrigo de ritos maçónicos. São, todavia, teses que

do ponto de vista científi co revelam fragilidades e cuja aceitação não pode

deixar de merecer reservas.

Medieval ou Operativa: a explicação mais bem aceite quanto às origens

da Maçonaria é a que resulta dos estudos de Paul Naudon, uma das maiores

autoridades mundiais nesta temática. Segundo este autor, as origens desta

sociedade secreta residem na antiga Roma Imperial, designadamente nos seus

Collegia Fabrorum, os quais eram corporações de construtores romanos. Após

as invasões bárbaras e a queda de Roma, os conhecimentos e valores destas

corporações passaram para as guildas dos construtores da Idade Média. São

estes construtores que edifi cam então a grande maioria dos templos e edifícios

religiosos por toda a Europa e que, dada a importância atribuída à sua acção,

benefi ciam de signifi cativos privilégios e encontram-se livres de servidões e

impostos. Daí a expressão francomaçonaria. Tal como na maçonaria de hoje,

nas guildas dos construtores existiam regras que impunham o secretismo, o

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fernando fava 43

espírito de corpo, a solidariedade entre os seus membros, o mutualismo, o

humanismo, justiça social, educação, fi lantropismo. Havia igualmente um

ritual de iniciação e os graus hierárquicos principais eram, também, o apren-

diz, o companheiro e o mestre. O conhecimento profundo das técnicas de

construção era segredo detido pelo mestre e só por ele transmitido.

Moderna ou Especulativa: o século XVI europeu foi atravessado por inten-

sas lutas religiosas; primeiramente a Reforma, depois a Contra-Reforma, cuja

guarda avançada era constituída pelo principais intérpretes do ultramonta-

nismo provindo das conclusões do Concílio de Trento (1545-1563). É neste

contexto que surge a Igreja Anglicana em Inglaterra, imposta por decreto de

Henrique VIII, mas que só posteriormente e de uma forma paulatina é aceite

e se fi rma como religião ofi cial. Desta forma a Inglaterra liberta-se do esparti-

lho apertado das normas e imposições do Papa de Roma. Porém a sociedade

inglesa sente ainda falta de uma organização laica que seja reguladora da moral,

mas que, ao mesmo tempo, possa constituir uma massa crítica e intelectual que

atravesse as classes sociais e promova o debate de ideias. Estava assim criado um

ambiente propício ao surgimento e afi rmação de uma maçonaria especulativa

que já não trabalhasse a pedra, mas o espírito. E é isso que vem, justamente, a

acontecer em 24/7/1717, dia de S. João Baptista, com a reunifi cação de 4 lojas

maçónicas londrinas, acto que deu origem à Grande Loja de Inglaterra, histo-

ricamente considerada o berço da maçonaria especulativa. Os seus membros,

maçons aceites, são fi lósofos que procuram respostas para as grandes interro-

gações do homem e da humanidade; a organização conserva os ritos, práti-

cas iniciáticas, secretismo, linguagem e simbologia das corporações medievais.

Espalha-se pela Europa e pelo mundo; adapta-se às correntes iluministas e com

elas se reforça; enfrenta as realidades diferentes das nações e adquire especifi ci-

dades em cada uma delas. Em 1723, um eclesiástico presbiteriano escocês, de

seu nome James Anderson, publicou as Constituições da Maçonaria, sendo estes

documentos, desde então até hoje, aceites com Leis Fundamentais da Maçona-

ria. Defi nem a organização como um sistema de ordem moral, com a elevada

missão de promover a união e a fraternidade entre os homens, sob auspícios de

uma entidade transcendente, o Grande Arquitecto do Universo.

Organização Interna: os irmãos maçónicos organizam-se livremente em

lojas independentes, mas ligadas a uma Grande Loja ou Grande Oriente,

organismo este que é soberano.

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Ligações Externas: A Maçonaria é universal; já na Idade Média tinha

dimensão cosmopolita; a condição de maçom implica ajuda a todos os irmãos;

são permanentes as relações internacionais através de representantes e embai-

xadores e ainda ao abrigo de acordos de Paz e Amizade entre as Obediências.

Exemplo é a UMM – União Maçónica Mediterrânica: a par de ordens maçó-

nicas internacionais, compreende Obediências de todos os países mediterrâ-

nicos, inclusive de Portugal.

Símbolos Maçónicos: Desempenham um lugar importante no Universo

Maçom; são emblemas do ideário, fi losofi a e valores maçónicos, reportando-

-se, por vezes, a saberes antigos transmitidos por determinados sinais.

Alguns exemplos de símbolos maçónicos:

Estrela de cinco pontas: símbolo do Homem Perfeito; o homem em seus

cinco aspectos: físico, emocional, mental, intuitivo e espiritual. É o homem

de braços abertos, mas sem virilidade, porque dominou as paixões e emoções.

Na Maçonaria e nos seus Templos, a abóbada celeste está adornada de estrelas:

É o emblema da paz, do bom acolhimento e da amizade fraternal.

Acácia: a planta símbolo por excelência da Maçonaria; representa a segurança,

a clareza, e também a inocência ou pureza. A Acácia é inicialmente um símbolo

da verdadeira Iniciação para uma nova vida, a ressurreição para uma vida futura.

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Avental: elemento principal das insígnias maçónicas, símbolo do trabalho

maçónico; branco, e de pele, para os Aprendizes e Companheiros; branco

orlado de vermelho, para os Mestres.

Compasso: símbolo do espírito, do pensamento nas diversas formas de racio-

cínio, e também do relativo (círculo) dependente do ponto inicial (absoluto).

Os círculos traçados com o compasso representam as lojas.

Colunas: símbolos dos limites do mundo criado, da vida e da morte, do ele-

mento masculino e do elemento feminino, do activo e do passivo.

Esquadro: Símbolo da rectidão e também da acção do Homem sobre a maté-

ria e da acção do Homem sobre si mesmo: Signifi ca que devemos regular a

nossa conduta e as nossas acções pela linha e pela régua maçónica. Emite a

ideia infl exível da imparcialidade e precisão de carácter.

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Templo: símbolo da construção maçónica por excelência, da paz profunda

para que tendem todos os maçons:

A Letra G: é a sétima letra do nosso alfabeto e apresenta diversos signifi cados:

Gravitação – É a força primordial que rege o movimento e o equilíbrio da

matéria.

Geometria ou a Quinta Ciência – É fundamento da ciência positiva, simboli-

zando a ciência dos cálculos.

Geração – Força Criadora que se acha no centro de todo ser e de todas as

coisas.

Génio – É a inteligência humana a brilhar com seu mais vivo fulgor;

Gnose – o impulso que leva o homem a aprender sempre mais e que é o prin-

cipal factor do progresso.

Grandeza – O homem, a maior e mais perfeita Obra da Criação;

Pedra Bruta: símbolo das imperfeições do espírito que o maçom deve procu-

rar corrigir.

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Três Pontos; triângulo: símbolo com várias interpretações: luz, trevas e tempo;

passado, presente e futuro; sabedoria, força e beleza; nascimento, vida e morte;

liberdade, igualdade e fraternidade.

O Delta: Símbolo do equilíbrio de forças (activas e passivas). O Olho é a

emanação da vida, o Princípio Criador, o Grande Arquitecto do Universo; o

Triângulo é a evocação da Trindade dos elementos.

Pavimento em Mosaico: chão em xadrez de quadrados pretos e brancos, com

que devem ser revestidos os templos; símbolo da diversidade do globo e das

raças, unidas pela Maçonaria; símbolo também da oposição dos contrários,

bem e mal, espirito e corpo, luz e trevas.

Malhete: pequeno martelo, emblema da vontade activa, do trabalho e da força

material; instrumento de direcção, poder e autoridade:.

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Estabelecimento da Maçonaria em Portugal: De acordo com Oliveira

Marques, em 1727 – 1728 terá sido fundada em Portugal a primeira loja

maçónica, sob a égide da Grande Loja de Inglaterra, por comerciantes ingleses

(vinhos e têxteis), que se fi xaram em Portugal ao abrigo das disposições do

Tratado de Methuen. Nos registos da Inquisição fi gurava com o nome de Loja

dos «Hereges Mercantes».

Periodização da História da Maçonaria em Portugal: É hábito os histo-

riadores apontarem três períodos. Um primeiro até 1834; um segundo, do

estabelecimento do regime liberal até meados do século; e um terceiro, da

Regeneração até à Proclamação da República. É um Fase Heróica de afi rma-

ção e postura revolucionária pelos ideais de liberdade, de justiça e dignifi ca-

ção da pessoa humana, de combate contra a opressão, contra o sectarismo,

contra a ignorância, pela perfectibilidade do ser humano, pela Nação, pelo

constitucionalismo.

1.º Período: desde o aparecimento da primeira loja, no reinado de D. João

V até ao fi m das guerras liberais, em 1834. No início é alvo de persegui-

ções inquisitoriais; depois prospera no reinado de D. José I, com o consulado

de Pombal, ele próprio um iluminado e um maçom, iniciado, ao que tudo

indica, na Grande Loja de Inglaterra; de seguida conhece, de novo, momen-

tos difíceis com D. Maria I, a política da Viradeira e a acção policial de Pina

Manique; as Invasões Francesas, portadoras dos ideais liberais e dos valores

iluministas constituíram um bom ambiente para a maçonaria, seguindo-se

tempos de lutas em que a organização e os seus membros estiveram perma-

nentemente envolvidos, designadamente a resistência ao domínio inglês, a

condenação e morte por enforcamento do Grão Mestre da Maçonaria Portu-

guesa, Gomes Freire de Andrade, a formação do Sinédrio (todos os elementos

eram maçons), a Revolução Portuense de 1820, as Guerras Liberais.

2.º Período: envolvimento no Setembrismo e na Revolução de Setembro;

na Constituição de 1838; nas lutas contra o cabralismo; na Patuleia.

3.º Período: é sobretudo marcado pela Luta pela República. O ascenso lento

do Republicanismo e a lenta aproximação dos maçons ao ideal republicano, face

às incapacidades e vícios do regime monárquico e ao progressismo do programa

e das ideias do republicanismo, alternativa única à Monarquia Constitucional.

A aproximação acentua-se com o Grão-Mestrado de Sebastião de Magalhães

Lima, em 1907, combatente antimonárquico com importantes contactos inter-

nacionais, grande admirador de Afonso Costa. Podemos dizer que com Maga-

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lhães Lima se faz a republicanização da Maçonaria. Entretanto engrossa a luta:

O Ultimato Inglês e o 31 de Janeiro, a Ditadura de João Franco, o 28 de Janeiro

de 1908 e o 5 de Outubro de 1910 têm a marca da acção conjunta do PRP,

da Maçonaria e da Carbonária. Com a República, os maçons estão no Parla-

mento, estão no Governo, estão nas chefi as do Exército e da Armada. As adesões

aumentam; as Lojas têm uma actividade intensa, há congressos maçónicos, dis-

cutem-se os grandes problemas: o ensino, a economia do país, o operariado, a

pobreza, a assistência médica, analfabetismo. Pouco a pouco, porém, as divisões

do espectro político refl ectem-se na Ordem Maçónica. Politizada, a Maçonaria,

a par de outras clivagens, divide-se em duas grandes Obediências: o GOL –

Grande Oriente Lusitano e o Grémio Luso Escocês, situação que permanece

até ao 28 de Maio de 1926. A Ditadura de Salazar empurra os maçons e a sua

organização para clandestinidade. O Vinte e Cinco de Abril de 1974, trazendo,

de novo, a ordem democrática, permite a reorganização e a afi rmação da Maço-

naria e dos seus projectos. Hoje existem em Portugal duas grandes Obediências:

O GOL e a GLRP – Grande Loja Regular de Portugal. Fala-se amiúde de uni-

fi cação, todavia face a alinhamentos partidários (GOL próximo do PS e GLRP,

próximo do PSD e do P.P.), tal desiderato afi gura-se assaz difícil de atingir.

A CARBONÁRIA

Finalidades: as mesmas da Maçonaria: aperfeiçoamento da pessoa humana,

procura de um projecto de sociedade mais justa e mais igual: concórdia e paz

universais.

Origens: Desconhecidas, mas a tese que colhe maioria de opinião é a de

uma evolução de sectores da Maçonaria para agrupamentos mais aguerridos,

mais actuantes e, aspecto importante, mais republicanos e mais anti-clericais.

Na França do pós 18 Brumário, com o avanço da igreja católica e a dita-

dura e repressão a empurrarem a Maçonaria para a clandestinidade, surgiram

agrupamentos que se integram nesta defi nição. Mas é em Itália, a partir de

1810 que a Carbonária se torna francamente visível, nas lutas nacionalistas,

primeiramente contra os ocupantes franceses e depois contra os austríacos,

pela independência e unifi cação do país; os carbonários estarão presentes no

movimento «Jovem Itália», liderado por Giusseppe Mazzini e com Cavour e

Garibaldi, no movimento político, social e paramilitar que veio a fi car histori-

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camente conhecido por Risorgimento. Os Carbonários faziam as suas reuniões

em fl orestas, nas cabanas dos carvoeiros; daí a designação carbonaro.

Quando comparada com a Maçonaria, a Carbonária apresenta alguma

semelhança organizativa e, frequentemente, os objectivos aproximam-se ou

coincidem, todavia tem uma dinâmica e uma prática substancialmente diversas.

É uma outra sociedade, com génese diferente, ritos diferentes, uma raiz socioló-

gica mais proletária, é profundamente anticlerical, possui um pendor revolucio-

nário mais acentuadamente libertário, visando a destruição de todas as estruturas

de poder ou, na sua própria terminologia, “limpar o bosque de lobos”.

Organização: De baixo para cima, a teia organizativa estende-se por Can-

teiros, Choças, Barracas, Vendas e Alta Venda, predominando o factor 5x. Os

graus hierárquicos são quatro: rachador, carvoeiro, mestre e mestre-sublime.

Chamavam-se entre si de «Bons Primos», tratavam-se por tu e obrigavam-se a

possuir armas de fogo e um punhal. Tinham palavras e sinais secretos para se

identifi carem e comunicarem.

Cerimónia de Iniciação: Sempre altas horas da noite, em fl orestas, em

casas desabitadas, armazéns, ruínas, cemitérios. Os Bons Primos ofi ciantes

vestiam balandraus negros, por vezes com tíbias e caveiras pintadas e tinham a

cabeça coberta por capuzes. O iniciado, vendado, era sujeito a um apertado e

insistente interrogatório, seguindo-se um juramento, dentro da seguinte fór-

mula, aproximadamente:

“Juro pela minha honra de cidadão livre guardar absoluto segredo dos fi ns e

existência desta sociedade, derramar o meu sangue pela regeneração da Pátria,

obedecer aos meus superiores e que os machados dos rachadores de cada canteiro

se ergam contra mim se eu faltar a este solene juramento”.

Depois de aceite, eram-lhe lidos os estatutos: acima de tudo, tinha de obe-

decer cegamente e guardar segredo tão absoluto que nem à sua própria família

poderia contar o que quer que fosse acerca da Carbonária e da sua condição

de carbonário. O ritual deste acto era intencionalmente grotesco no sentido de

ferir as imaginações. Era uma produção do romantismo, de resto a Carbonária,

nascida ou consolidada na fase romântica da ascensão e da consolidação dos

regimes liberais e constitucionais, está eivada de traços do romantismo: nacio-

nalismo, liberalismo, anticlericalismo, revolução, violência, a fi gura do herói.

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Símbolos Carbonários: A simbologia carbonária é vasta e assenta, em

grande parte, no reino vegetal: a fl oresta, o jardim e as ferramentas de traba-

lho. Os símbolos remetem sobretudo para valores e princípios como emanci-

pação política e luta contra todas as formas de opressão.

Estrela de 5 pontas representa a fi gura máscula de um «Bom Primo», de pé,

com as pernas afastadas e a cabeça erguida, como que a dizer: “pronto para a

luta contra todas as tiranias”.

A Choça é o símbolo da obediência à tradição

Bandeira da Carbonária: O fogo, o carvão, o céu.

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O emblema da Carbonária: a navalha de enxertia entre o compasso e o

esquadro. A navalha é a mais familiar das ferramentas de trabalho simbóli-

cas da Carbonária. Servindo para a selecção artifi cial das árvores de fruto, a

navalha fi ca assim ao serviço da Arte. No dia-a-dia, usava-se para cortar o pão.

À falta de melhor, servia de arma.

O machado: símbolo da autoridade e do poder, num avental de Mestre

Carbonário

Os Três pontinhos: dispostos de forma triangular, com o vértice para baixo.

Em Portugal: A Carbonária chegou a Portugal em 1822 pela mão de dois

militares italianos, o Coronel Pizza e o General Peppe, os quais vieram a Lis-

boa com esse propósito e a pedido do homens do Sinédrio, que haviam feito

a Revolução Liberal de 1820. A partir de Lisboa, expande-se pelo centro e

norte de Portugal, fi xando-se em localidades como Coimbra, Figueira da Foz,

Cantanhede, Pombal, Ílhavo e Braga. Manteve-se activa até 1864, ano a partir

do qual não se tem conhecimento de qualquer actividade. Esta é uma Car-

bonária inspirada no modelo italiano. Paralelamente, em 1844, o General

Joaquim Pereira Marinho, sob auspícios da Carbonária Francesa, fundou em

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Lisboa uma organização Carbonária. Por delegação do General Marinho, a

direcção desta organização foi assumida pelo padre António Maria da Costa

(Bom-Primo Ganganelli), pessoa que, nesse mesmo ano fundou em Coimbra

a Carbonária Lusitana. Apesar de conseguir cerca de quinhentos afi liados em

todo o Distrito de Coimbra, a Carbonária Lusitana dissolveu-se dois anos

depois, por força de graves e insanáveis dissensões internas. A reorganização

foi ainda tentada, anos mais tarde, por Abílio Roque de Sá Barreto, sem, toda-

via, tal tentativa obter êxito assinalável.

Posteriormente, depois do fi asco da Revolta Republicana 31 de Janeiro de

1891, reforça-se a ideia, junto dos meios republicanos, de que a luta teria de ser

conduzida e protagonizada por grupos secretos. É a partir desta pressuposição

e neste ambiente que aparece, em 1896, a Maçonaria Académica, dirigida por

Artur Duarte da Luz Almeida, um estudante do Curso Superior de Letras de

Lisboa. Aos membros da organização, na sua totalidade estudantes das Esco-

las Superiores de Lisboa é então ministrada preparação militar, com vistas à

formação de um Batalhão Académico. Sob a batuta de Luz Almeida as quatro

lojas que compunham esta Maçonaria Académica passaram a Choças, dando-se

assim origem à Carbonária Portuguesa, com a missão de precipitar a queda da

Monarquia e instituir a República. Com a decisão, então tomada, de admitir ele-

mentos populares (empregados de comércio, funcionários, operários, militares

de nível baixo e médio), em breve se formaram vinte choças e uma Alta Venda.

Em 1899, dá-se a formação da famosa Loja Montanha, da qual faziam

parte maçons que eram, simultaneamente, carbonários. Era assim como que a

Carbonária dentro da Maçonaria. É uma Loja Revolucionária, fora do GOL,

que vai ter uma importância acrescida na republicanização de maçons e na

eleição para Grão-Mestre da Maçonaria de Sebastião de Magalhães Lima.

Com o advento da ditadura de João Franco em 1906, endurece a luta e a

Carbonária cresce exponencialmente, infi ltrando-se massivamente na Mari-

nha de Guerra, na Guarda – Fiscal, no Exército. A organização rodeia-se de

um maior secretismo. Dão-se as iniciações de António José de Almeida, de

António Maria da Silva e de Machado Santos. Estes viriam a integrar a Alta

Venda, conjuntamente com Luz Almeida. A partir de então, a acção da Car-

bonária Portuguesa irá ser decisiva na luta pela República. Vejamos alguns

passos importantes dessa luta:

O 28 de Janeiro de 1908: Também chamado de Revolução da Biblioteca.

Nela tomaram parte a Carbonária, a Maçonaria, o Partido Republicano e ele-

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mentos do Partido Monárquico da Dissidência Progressista, de José Maria de

Alpoim. A tentativa falha porque feita descuidadamente, com as autoridades e

as polícias a seguirem todos os passos do processo. Na sequência do falhanço,

são presos, em Lisboa, os dirigentes carbonários Artur Duarte da Luz Almeida

e António José de Almeida. A Alta Venda mantém, todavia, a sua operaciona-

lidade, com Machado Santos e António Maria da Silva.

O Regicídio: Endurecendo a repressão, João Franco faz assinar pelo rei o

famoso Decreto da Deportação. Nos termos do diploma seriam deportados

(dizia-se que para Timor) todos os que houvessem atentado contras as institui-

ções e contra a segurança do Estado. A par de outras personalidades, designa-

damente Afonso Costa, os carbonários Luz Almeida e António José de Almeida

corriam então o sério risco de serem deportados. A organização não podia, pas-

sivamente, permitir que tal acontecesse. Fazem-se então reuniões nos Olivais e

em Xabregas, nelas tomando parte fi guras de proa da Dissidência Progressista.

Formam-se comandos de morte carbonários; o alvo inicial seria João Franco.

Falhado esse objectivo, apesar dos porfi ados esforços, as atenções, já no dia 1

de Fevereiro e no Terreiro do Paço, em Lisboa, voltam-se para o monarca, tam-

bém ele responsável pela ditadura e sobretudo pela promulgação do Decreto.

Como é sabido, o rei D. Carlos e o príncipe herdeiro, D. Luís Filipe, acabam

por ser as grandes vítimas de todo este conjunto de circunstâncias.

O 5 de Outubro: Entre 1908 e 1910, a Carbonária infi ltra-se, duplica os

efectivos. Fazem-se iniciados novos, alguns de grande importância, nome-

adamente o Almirante Cândido dos Reis e o dirigente republicano Antó-

nio Granjo. Prepara-se a Revolução e as forças aprestam-se para o combate.

Surgem, entretanto divergências entre o Directório do Partido Republicano

e a Alta Venda Carbonária. Reunida no Jardim do Forte de Almada, esta

decide assumir sozinha a liderança do processo. Concebe um Plano para o

qual o Directório do P.R. vem a dar o seu acordo. A Revolução está na Rua na

madrugada de 3 para 4 de Outubro. Falhou muita coisa: ligações não efectu-

adas, ordens que deveriam ser dadas e não o foram; posições estratégicas que

não foram tomadas, muitas deserções, mataram o chefe civil da Revolução,

Miguel Bombarda, suicidou-se o chefe militar da Revolução, Almirante Cân-

dido dos Reis.

Permaneceram nos seus postos e nas suas acções Machado Santos e os seus

sargentos, soldados e civis, barricados na Rotunda (na sua grande maioria

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carbonários); o mesmo aconteceu com os marinheiros e civis que assaltaram o

Quartel de Alcântara e as guarnições dos navios que se revoltaram e bombar-

dearam o Palácio Real e o Rossio, onde se encontravam as forças monárquicas

(a maior parte destes marinheiros e civis eram membros da carbonária).

Conclusão: A Carbonária ganhou a Revolução porque se manteve fi rme,

apesar dos sinais desmotivantes, dos boatos, das deserções de ofi ciais conju-

rados, da falta de armas, e apesar, também, de ter sido bombardeada seve-

ramente pela artilharia de Queluz sob o comando de Paiva Couceiro. A par

desta tenacidade, teve também infl uência na vitória republicana o muito

baixo moral das forças monárquicas.

O Governo Provisório e a Carbonária: O Governo Provisório simples-

mente aparece. Não houve uma entidade com legitimidade revolucionária

que desse posse a um tal governo, nem sequer houve, quanto ao assunto,

um entendimento com a Carbonária, afi nal a grande obreira da Revolução.

A verdade é que, quer o PRP, quer a Maçonaria sempre conviveram mal com

a Carbonária e logo após a vitória quiseram ver-se livres dela. Não aprovavam

os seus métodos e queriam-se demarcar do bombismo e do assassínio político.

O facto não deixou de se constituir numa perversão e numa debilidade para

a República: carbonários infl uentes, heróis do 5 de Outubro, não deixaram

de conspirar contra as governações que se seguiram, sobretudo contra Afonso

Costa. Em todo o caso, é justo referir que o Governo Provisório manteve-se

em funções desde 5/10/1910 até 4/9/1911 e durante esse período fez obra

revolucionária e administrativa de vulto.

Declínio da Carbonária: Durante a República, a Carbonária Portuguesa

fragmenta-se em bandos, servindo diversos interesses. Teve papel de relevo no

combate às invasões monárquicas de 1911 e 1912, nos combates aos sindica-

listas, na chamada «Formiga Branca», mas depois, refl ectindo as lutas intesti-

nas dos republicanos, acabou por se dilacerar irremediavelmente e desaparecer.

Não muito diferentemente, em toda a Europa as organizações carbonárias

salientaram-se enquanto lutaram pela liberdade e pela soberania e unidade das

Nações; apagaram-se quando se submeteram a partidos ou outros interesses.

Loja do Sr. Falcão, na Pereira

Miranda do Corvo, em 13 de Fevereiro de 2010

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LAICISMO E LAICIDADE DO ESTADO 03 ABRIL 2010

professor carlos esperança

Presidente da Associação Ateísta

Quero agradecer a amabilidade do convite para vir falar sobre Laicismo

e Laicidade. Pronuncio-me na qualidade de mero cidadão e não em

representação de qualquer associação, dado o tema que me proponho tratar –

Laicismo e Laicidade.

Chamo-me Carlos Esperança, não uso qualquer título académico, nobili-

árquico, eclesiástico ou castrense nem possuo qualquer venera. É, pois, como

mero cidadão que venho trocar impressões sobre Laicismo e Laicidade, duas

palavras que aparecem, nem sempre por boas razões, quase sempre deturpa-

das no seu signifi cado.

Começo por referir etimologicamente o que é o Laicismo. A palavra Lai-

cismo vem do termo grego, Laos, que quer dizer povo, população, mas no seu

signifi cado mais lato; Laos signifi ca população, mas toda, absolutamente toda

a população, tendo portanto carácter universal. É curioso que há um outro

termo grego que também signifi ca população, Ethnos, donde derivam etnia,

étnico e as palavras da mesma família. Ethnos também signifi ca população,

mas no sentido restrito de um grupo de famílias que vive com uma econo-

mia comum, com interesses comuns, com uma cultura comum, e normal-

mente com uma hierarquia muito defi nida. Tem um carácter, digamos, tribal.

Enquanto a primeira é de natureza cosmopolita, a segunda é de natureza

tribal, ou, eventualmente, nacionalista.

Então o que é o Laicismo? O laicismo é uma fi losofi a do séc. XVI que rei-

vindicava a administração dos bens eclesiásticos pelo clero. Hoje não signifi ca

isso, a semiótica explica como é que as palavras vão evoluindo e passam a ter

signifi cados diferentes. O laicismo é hoje a fi losofi a que reivindica o afasta-

mento do clero do aparelho de estado. Procura portanto afastar a infl uência

religiosa, da educação, da saúde e, naturalmente, do estado. O laicismo, à pri-

meira vista, pode parecer contra a religião mas sê-lo-á? – De modo nenhum,

aliás há uma associação em Portugal, a Associação República e Laicidade,

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com sócios católicos. Como calculam, uma religião minoritária defende sem-

pre a laicidade do estado. Quando é maioritária costuma refugiar-se nesta

desculpa: não se pode tratar da mesma forma aquilo que é diferente. E mani-

festa a tendência hegemónica, quiçá totalitária, daqueles que procuram a

exclusividade no mercado da fé.

O laicismo é uma conquista relativamente recente, digamos que a liber-

dade religiosa nasceu no fi m da Guerra dos 30 anos, em 1652, com a paz

de Vestfália. É a paz de Vestfália que reconhece pela primeira vez, depois de

uma guerra sangrenta, a liberdade religiosa. Até aí não havia liberdade reli-

giosa, convertia-se o rei, convertia-se o imperador e toda a gente se convertia

obrigatoriamente.

As religiões têm naturalmente a força que lhes deu o facto de serem elas a

moldar as fronteiras e as instituições dos vários países em que o mundo se foi

defi nindo. Foram frequentemente as religiões a marcar a fronteira que separou

os povos.

O Iluminismo veio pôr em causa essa infl uência predominante. Foi sobre-

tudo por causa da hegemonia que a Igreja assumiu, nas universidades, na polí-

tica e na assistência, no fi m da Idade Média, que começou a ser contestada.

Na Europa, a Igreja católica tomou o partido da aristocracia e, quando esta

foi vencida pela burguesia, naturalmente também saiu derrotada.

O Laicismo é, em meu entender, a única forma de se poder manter uma

paz social que não seja perturbada pelas religiões. Não há laicidade agres-

siva, como às vezes se diz, como não há uma laicidade moderada. A laicidade

é neutra e não há uma neutralidade maior ou menor. A laicidade agressiva

é uma absoluta impossibilidade conceptual porque, por defi nição, é neutra.

E é essa neutralidade que deve ser exigida aos estados, de tal modo que pos-

sam conviver no mesmo espaço civilizacional pessoas de quaisquer crenças,

descrenças e anti-crenças. E esse direito só a laicidade o garante.

O Laicismo é a fi losofi a e a laicidade é a forma de a pôr em prática. O lai-

cismo é a teoria e a laicidade a forma de a realizar.

Em Portugal, como sabem, a laicidade está assegurada na Constituição

mas na prática não é tão evidente. De qualquer modo, a Constituição da

República Portuguesa assegura a separação da Igreja e do Estado, separação

que está expressamente consagrada na Constituição e ainda na parte relativa

à sua revisão. Há alguns aspectos em que a Constituição não pode ser revista:

na defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, na fórmula repu-

blicana do estado e na separação da igreja do estado. A separação da igreja

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do estado, em Portugal, enquanto a Constituição da República Portuguesa

vigorar, não é possível ser alterada, porque ela própria impõe limites materiais

à alteração destes três princípios.

O que é que se passa nos diferentes países da Europa e até um pouco por

todo o mundo?

Há vários modelos cívicos que variam de país para país. Não é uniforme,

portanto, o conteúdo cívico da laicidade ou da confessionalidade. Come-

cemos pela Europa, podendo recorrer também aos EUA. Nos EUA, como

sabem, a constituição é laica. Os fundadores do país foram indivíduos fugi-

dos às guerras religiosas europeias e a Constituição é profundamente laica.

É verdade que o protestantismo evangélico tem vindo a infi ltrar-se com uma

força enorme, ao ponto de infl uenciar, inclusive, a politica americana, em

muitos aspectos. Recordam-se certamente que, antes da invasão do Iraque,

Bush falou com Deus – segundo afi rmou – que lhe disse para avançar com a

invasão. Infelizmente só temos o testemunho de uma das partes.

O termo fundamentalista, que se usa hoje para qualifi car o exagero de uma

posição cívica ou o radicalismo de um exaltado, esse termo foi cunhado no

princípio do século XX, nos EUA, para defi nir os protestantes evangélicos,

que foram apelidados de fundamentalistas porque consideram a leitura lite-

ral da bíblia como a fonte de todos os valores. Para eles o verdadeiro Deus

e a verdade única residem no Antigo Testamento, com um deus violento,

vingativo, misógino e xenófobo. Para os protestantes evangélicos o Antigo

Testamento é hoje a expressão cabal da vontade de Deus, o que justifi ca todas

as iniquidades contra as mulheres porque a mulher é considerada inferior.

O mesmo acontece com os judeus que rezam a oração em que todos os dias

agradecem a Deus por não os ter feito mulheres. Entre os muçulmanos, num

tribunal, o testemunho de uma mulher vale apenas metade do de um homem.

E mesmo aqui em Portugal, se nos lembrarmos do que acontecia antes do 25

de Abril, uma mulher não podia ser magistrada, presidir a uma câmara muni-

cipal, pertencer às Forças Armadas, salvo uma excepção tardia para enfermei-

ras da Força Aérea, ou integrar a carreira diplomática. Havia um sem número

de situações que à mulher eram vedadas. A matriz religiosa estava na origem

deste tipo de discriminação.

Actualmente qual é o estado da laicidade na Europa?

Aqui permitia-me dizer que a laicidade é demasiado importante, se se

lembrarem, por exemplo, que há três dias, na Bélgica, foi esta semana, uma

comissão especializada votou por unanimidade a interdição do niqab islâmico

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na via pública. Por duas razões, uma que me parece boa, e outra discutível: a

boa é esta: por questões de segurança, uma pessoa que se oculte, em Portugal

é proibido o uso de máscaras, tolerado no Carnaval, porque aumentariam a

impunidade dos crimes, porque torna impossível reconhecer as pessoas, e essa

foi uma das razões. A outra, que é mais discutível, por ser um símbolo reli-

gioso e, pior do que isso, um símbolo de subordinação da mulher ao homem;

esse motivo, dizendo eu que não será tão forte, é provavelmente, para a minha

sensibilidade, um motivo ainda mais justo do que o primeiro porque por cada

mulher que quer usar o véu há milhares que são obrigadas.

Permitam-me aqui um parêntesis: há tempos perguntavam-me numa

entrevista se eu era contra a poligamia. – Absolutamente contra, respondi.

– Mas é a favor de que haja penalizações, de que se seja condenado a prisão?

– Sou.

– Então qual é o seu conceito de liberdade? Não respeita as outras culturas?

A poligamia existe, os muçulmanos são polígamos, os mórmones são políga-

mos, até outros cristãos. Sob o ponto de vista legal, que é o que aqui conta,

aceita a criminalização?

– Aceito, estaria de acordo que não fosse criminalizada, à semelhança de

muitas coisas que eu considero más e que condeno a criminalização, e já lhes

dou alguns exemplos. Por que motivo deve ser criminalizada a poligamia?

Pela simples razão de que a poliandria não é permitida e, desde que haja dis-

criminação de género, há a obrigação de nos opormos. Se há superioridade

na nossa cultura, se há uma superioridade ética europeia, é a igualdade entre

o homem e a mulher que a defi nem e no dia em que a igualdade do homem

e da mulher forem postas em causa, está posta em causa a democracia, está

posta em causa a liberdade, estão postos em causa todos os valores de que nos

reclamamos como pessoas civilizadas e respeitadoras da ética republicana. Por

essa razão sou a favor da penalização da poligamia na lei.

Quanto aos exemplos de coisas más que não devem ser criminalizadas:

ninguém defenderá, penso eu, que o adultério é uma coisa boa, mas nin-

guém se permitiria hoje defender que alguém fosse para a cadeia por adultério.

Aquilo que é pecado no conceito das religiões, não é necessariamente um

ilícito no sentido jurídico. Porque há pecados horríveis, segundo as religiões,

eu ainda ontem cometi um, enorme, comendo lampreia, que é um animal do

mar sem escamas, o que é uma abominação, segundo a Bíblia, portanto passí-

vel da pena de morte. É evidente que hoje não se matará alguém por degustar

uma lampreia, ou por se debater com uns chocos mas é de facto esta a pena

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preconizada pela literatura comum aos três monoteísmos, assim como o hor-

ror ao toucinho. Nós evoluímos muito e a evolução é humana. Devo aqui

prestar homenagem a um dos 3 monoteísmos, o Cristianismo, quando refere

«dar a Deus o que é de Deus, e a César o que é de César». Está aqui a base da

laicidade, a separação entre Igreja e Estado. Se essa separação não se mantiver,

os problemas que está a viver a Bélgica, o que deu origem a um discurso notá-

vel de uma senhora que hoje é ateia, e já foi muçulmana, são problemas que

se agravam. A religião não é tanto aquilo que cada um refl ecte, é sobretudo

aquilo que cada um se habituou a praticar desde pequeno. Se assim não fosse

não haveria a geografi a das religiões, como há. Hoje, com a globalização, é

obvio que há tendência para haver todas as religiões e a sua ausência em todos

os países, menos onde as punições atingem a crueldade com que o Islão as

pratica. De facto, dos três monoteísmos, há dois que são profundamente pro-

sélitos. Um é o Cristianismo, e vê-se em várias seitas cristãs, na forma brutal

como esse proselitismo é exercido. Outro é o Islão, que tem uma gravidade

acrescida, porque no Islão foi a 1ª vez que Deus falou pela última, e onde o

último profeta é Maomé. Quando soube isto fi quei assustado, porque Deus

já não pode corrigir as barbaridades que disse entre Medina e Meca ao longo

de 20 anos através do arcanjo Gabriel. E imaginem o que é termos de lapidar

uma mulher por adultério ou amputar um membro a alguém por fazer mão

baixa de um castiçal de prata, algures numa mesquita. Penso que este aspecto

é sufi ciente grave para realmente nos interpelar.

Eu vim aqui para conversar, para levantar problemas, mas não tenho certe-

zas, são mais as dúvidas que me perseguem do que as certezas que me acom-

panham. Mas, de facto, vemos hoje um Islão político, militante e demente,

com jovens a imolarem-se para matarem infi éis. Dizem que o Islão é pacífi co,

depende da noção que cada um tenha de pacífi co mas não corresponde à

defi nição deste adjectivo pelos dicionários. Há crianças que se imolam porque

é fácil fanatizar uma criança, e penso que o mal não está nos crentes e que os

crentes devem ser respeitados. Não digo o mesmo das crenças porque quando

se fanatizam crianças nas madraças e nas mesquitas, é evidente que a religião

se torna um detonador do ódio e da guerra. Se queremos viver em paz, uma

conquista precária dos homens modernos e civilizados, temos de erradicar

as crenças violentas. Nós, hoje, somos incomparavelmente melhores do que

éramos há 6014 anos, quando os “criacionistas” acreditam que Deus criou

o mundo, embora as experiências que estão a decorrer num túnel da Suíça,

sob os auspícios da física, não confi rmem tal versão. De qualquer modo, nes-

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tes 6014 anos que o mundo leva, segundo os “criacionistas”, é óbvio que há

transformações brutais: nos costumes, na liberdade, no respeito pelos outros,

na igualdade de género. A grande difi culdade do Islão não é só o Corão, é a

propriedade das mulheres. E a propriedade das mulheres é uma coisa que para

eles é sagrada, são propriedade dos homens. Com esta gravidade acrescida,

no Islão pode-se casar a partir dos 9 anos, porque Maomé casou com uma

mulher dessa idade. Nem todas as suas mulheres eram viúvas e ricas como a

única que lhe permitiu ter uma carreira gloriosa no campo da religião. A refe-

rida mulher/criança casou com 6 anos e consumou o casamento com 9. Por

isso, ainda hoje o Islão permite o casamento a partir dos 9 anos. Certamente

repugna a todos os que aqui estamos, mas é assim. E não me venham dizer

que é da nossa parte, arrogância intelectual, considerarmos a superioridade

moral dos princípios que hoje perfi lhamos. Penso que podemos orgulhar-nos

dos passos que, de facto, demos ao longo, eu diria, do último século; que deve-

mos ser dignos do Iluminismo e da Revolução Francesa.

P – A mulher começou a votar em 1920 no mundo, não é isso Sr. Profes-

sor? Portanto, vamos lá ver, há passos de gigante, e ai de nós se permitirmos

um retrocesso. Ai de nós se permitirmos que as mulheres sejam enclausuradas

em burkas ou em niqabs.

R – Claro que estou de acordo e aproveitava para dizer qual é o estatuto

cívico das várias religiões, quais são os modelos europeus. A Europa tem 2

países que são católicos, que ofi cialmente são de confi ssão católica – Malta e

o Vaticano, embora o Vaticano mais parecido com uma teocracia do que pro-

priamente com um estado confessional. Há um país cuja laicidade não per-

mite dúvidas – a França. Temos 2 países, se incluirmos a Rússia, pelo menos

até aos Urais temos de a incluir na Europa, que são de religião ortodoxa.

A Rússia de religião ortodoxa russa e a Grécia de religião ortodoxa grega. Vale

a pena dizer que as três religiões monoteístas são criadas a partir do Antigo

Testamento. O judaísmo é o mais próximo. Depois temos o cristianismo

que, contrariamente ao judaísmo, dá um salto enorme, diria no marketing,

destinando-se a todo o mundo e que torna universal uma religião que era

apenas destinada às 12 tribos do povo escolhido. E há depois o Islão, que é

uma cópia, a meu ver, grosseira do Cristianismo. Foi ditado em árabe, entre

Medina e Meca, como já disse, ao longo de 20 anos, pelo arcanjo Gabriel, que

já devia estar demasiado velho, porque 6 séculos antes já tinha dito à virgem

Maria que estava grávida, coisa que uma mulher raramente descobre se não

vier um anjo dizer-lhe.

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Hoje é praticamente obrigatório aprender árabe na conversão ao Islão por-

que o Corão deve ser recitado na língua em que Deus o ditou. Bush também

estava convencido de que a Bíblia foi ditada em inglês, portanto também não

temos de nos surpreender, a não ser pelo número de pessoas que acreditam na

autoria divina dos livros sagrados.

Estas religiões sofrem a infl uência do direito. O Cristianismo, ou melhor,

o Catolicismo tem a infl uência do direito romano que é um direito civilista.

O Cristianismo ortodoxo medrou numa região onde o direito é essencial-

mente político e onde a religião e o estado têm uma ligação íntima. Não é por

acaso que a Grécia só em 2002 deixou de obrigar a menção da religião nos

bilhetes de identidade, e só perto do ano 2000 deixaram de ser obrigatórios

o baptismo e o casamento religioso. Mas perante uma enormidade destas, eu

também lhes quero lembrar que antes do 25 de Abril, pelo menos na Escola

Bissaia Barreto, em Coimbra, para se tirar o curso de enfermagem, além do

5.º ano dos liceus, havia habilitações literárias que eram obrigatórias: um ates-

tado de baptismo da igreja católica passado pelo padre da freguesia de nasci-

mento, e outra habilitação igualmente importante, e outro atestado, de bom

comportamento, passado pela mesma autoridade canónica. Portanto, vejamos

que a liberdade não é antiga, nem eterna ou irreversível, pelo que temos de ser

vigilantes os que amamos a República e a Democracia. E temos de ser vigilan-

tes para que não haja retrocessos, para não tornarmos a ser vigiados. Não há

conquistas defi nitivas, nunca houve.

Dei-lhes um panorama geral das religiões, das suas infl uências e idiossin-

crasias, características de cada uma delas.

Quanto às religiões do estado tinha apenas referido as dos países católicos.

Temos um país anglicano – o Reino Unido. É curioso que o facto de haver paí-

ses confessionais não signifi ca obrigatoriamente que sejam países com menos

liberdade religiosa do que outros que não são confessionais. A Espanha, por

exemplo, é um país laico, com uma concordata, como Portugal, e o ensino da

religião era obrigatório nos estabelecimentos de ensino ofi cial. Quando passou

a ser facultativo, já com o actual governo, presidido por Zapatero, os bispos

vieram abanar as mitras para a via pública e a brandir os báculos contra os

hereges, que queriam acabar com a religião. Apenas foi legalizado o carácter

voluntário do ensino da religião, isto é, passou a ser respeitada a liberdade

religiosa.

Além do país anglicano, dos países católicos e dos ortodoxos, há países pro-

testantes confessionais na Europa: a Dinamarca, a Finlândia e a Noruega, são

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países de confi ssão luterana. A Suécia deixou de ser um país confessional ape-

nas em 2002. Enfi m, a tendência é para deixar de haver países confessionais.

E há um aspecto importante que acaba sempre também por tornar mais bran-

das as próprias normas jurídicas que privilegiam as Igrejas – a secularização.

A secularização é um termo da fi losofi a inglesa, uma fi losofi a que se desin-

teressa totalmente da pretensa vida depois da morte, apenas se preocupando

com o bem-estar das pessoas enquanto vivem. E as sociedades, estão de facto,

na Europa, num processo de franca secularização. Ou estavam até há pouco.

Recordo que apareceu um fenómeno novo com a vitória do Ayatollah kho-

meini no Irão. Lembrem-se de que muitas daquelas cidades, eram cidades

cosmopolitas onde as mulheres não se distinguiam das que hoje se encontram

aqui, vestiam de mesma forma, praticavam ginástica, saíam à rua, nas grandes

cidades, e tinham uma vida ocidentalizada, ou seja, gozavam de liberdade.

A vitória do Ayatollah Khomeini reconduziu o Irão ao Islão político com a

brutalidade que o Corão preconiza. O vestuário feminino passou a ser vigiado,

foi exigido o niqab à mulher e as burkas não se multiplicaram por acaso. Os

países islâmicos, com a precária excepção turca, regem-se pelo Corão. Ou

seja, tudo o que vem no Corão serve como norma. Para a alimentação, ai de

quem for apanhado a comer sandes de presunto, a policia chega ao ponto de

cheirar o hálito das pessoas para ver se alguém transgrediu e bebeu álcool, e

naturalmente, em todas as restrições a mulher é a vitima maior.

A Turquia tem sido um país laico e foi longe ao proibir qualquer símbolo

religioso, até no vestuário, em edifícios públicos. O laicismo defende a liber-

dade religiosa e um país não deixa de ser laico porque a Igreja tem escolas

ou, inclusive, hospitais, A religião é vista como qualquer associação, portanto

se outra associação pode ter escolas e hospitais, não há razão para impedir o

mesmo direito a uma religião. O problema que aparece nos países islâmicos é

que ninguém pode ter outra religião. Vão para a Arábia Saudita, e vejam se é

possível, vão para qualquer país do médio Oriente e vejam se é permitido erigir

uma capela católica, um templo protestante, um pagode chinês, um templo

budista ou uma mesquita. Impensável, é absolutamente interdito. Penso que

devíamos exigir reciprocidade, que temos esse direito, mas deixo-vos isso para

pensar porque não há verdades únicas. Há duvidas quanto aos limites do que

deve ser permitido. Hoje, graças à liberdade de costumes, ninguém seria aqui

punido se aparecesse de bikini, ou com calçãozinho e tshirt. Mas, por exem-

plo, na Turquia uma mulher que saia à rua com niqab ou com burka, é detida,

melhor dito, o tempo verbal já não está muito correcto, era detida, porque

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Ataturk quis fazer da Turquia um país moderno e proibiu de forma violenta,

de uma forma absolutamente cruel, qualquer símbolo religioso nas ruas. Não

penso que tenha sido por ódio à religião, foi a necessidade de modernizar a

Turquia. E a Turquia tem tido dois grandes guardiães do laicismo, as forças

armadas e o poder judicial. Um acórdão de há 3 anos do tribunal supremo ou

da corte turca, não sei o nome exacto, equivalente ao nosso STJ, considerou

constitucionalmente correcta a proibição da entrada na universidade com o

niqab ou a burka; três desses juízes foram assassinados e o actual primeiro-

-ministro, em declarações à imprensa, disse que compreendia perfeitamente o

assassinato por chocar a sensibilidade dos turcos. Portanto, penso que é uma

refl exão a fazermos, quando a Europa e os EUA têm feito tudo para decapitar,

naturalmente, as forças armadas turcas, porque não há democracia sem juízes

nem democracia de juízes, nem democracia de militares. E a verdade é que os

muçulmanos ganham as eleições e lembrem-se da Frente Islâmica de Salvação,

na Argélia, que ia ganhar as eleições e tinha como programa impor a sharia.

Enquanto nalguns países se ganham eleições defendendo a liberdade, nou-

tros ganham-se eleições prometendo a proibição da liberdade e liquidando-a.

São estes aspectos que desta tertúlia podem fi car para refl exão, e uma refl e-

xão interessante.

Quanto à disputa religiosa, posso dizer-lhes que hoje, na América do Sul, há

grande competição entre o catolicismo e o protestantismo. Não é grave, porque

enfi m são formas diferentes de religião cristã. Mas há hoje uma luta brutal na

África. E essa luta é entre um protestantismo evangélico bastante agressivo

em vários países e o islamismo dos países do Sael (Senegal, Mauritânia, Mali,

Burkina Faso, Níger, a parte norte da Nigéria, Chade, Sudão, Etiópia, Eritreia,

o Djibouti e a Somália). A Nigéria é um país do qual têm ouvido falar por

péssimas razões, porque o norte é muçulmano, o sul é cristão e tem havido ver-

dadeiras chacinas no centro onde cristãos e muçulmanos se equivalem e digla-

diam. O proselitismo tem tido aí um papel assassino, matou milhares de pes-

soas recentemente, e tem provocado uma imensa tragédia humana. Aqui sim,

é a nossa arrogância intelectual e a falsa superioridade moral que se manifesta

quando são negros e pobres mostrando algum desinteresse perante a tragédia

porque milhões de negros pobres não têm a mesma a mesma mediatização de

uma criança loura que desapareceu no Algarve em circunstancias anómalas.

Desprezamos facilmente milhares de pessoas que cruelmente são assassinadas

com requintes de malvadez. A crueldade humana é algo que não tem, de facto,

limites, que raia o primitivismo mais grosseiro, mais torpe, mais violento, que

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era apanágio dos homens das cavernas que, para sobreviverem, tiverem de facto

de usar uma dureza que hoje seria intolerável. Essa guerra está a passar-se silen-

ciosamente em África. Doutras partes do mundo é evidente que nos chegam

notícias, mas temos hoje o Médio Oriente onde o constrangimento social e as

estruturas criadas pelo próprio poder, um poder clerical, tornam impossível ou

muito perigoso que alguém abandone o Islão e, paradoxalmente, os radicalis-

mos seduzem sempre algumas franjas sociais. É mais fácil ser radical do que ser

moderado, sobretudo em períodos de crise, seja na politica, na religião ou no

que quer que seja. Ser-se moderado em épocas difíceis é perigoso, os moderados

são normalmente as primeiras vítimas a tombarem porque se radicalizam, em

campos opostos, os ódios e, de facto, nesses países que têm o azar de pertencer

a uma civilização decadente, não me venham hoje recordar Avicena e Averróis,

que foram fi guras notáveis, que nos trouxeram a matemática, que até nos trou-

xeram a cultura grega. Hoje no Islão, não há um resquício que seja, da cultura

grega, nem do direito romano, para humanizar a violência com que o Corão

intoxica os povos que lhe estão submetidos.

Acabei por defender a laicidade com entusiasmo, gostaria de ser mais neu-

tro, mas provavelmente também por uma idiossincrasia pessoal, não consigo

ser tão neutro quanto gostaria.

As pessoas civilizadas distinguem o que é pecado para as religiões do que

é ou deve ser legal. Há bocado falava no adultério; quem defenderá honesta-

mente que seja um bem, claro que não é. Mas não se esqueçam, Camilo Cas-

telo Branco, ainda não foi há muitos anos, os nossos avós ainda viveram no

seu tempo, esteve preso numa enxovia por adultério. Mas há pior, quais são os

crimes mais violentos, crimes punidos com pena de morte em países que este-

jam vinculados aos preceitos religiosos. O mais grave de todos é o abandono

da religião – a apostasia. A apostasia é um crime imperdoável. Trocar um

Deus por outro ou desprezá-lo é de uma gravidade punível com a morte. Pois

bem, na nossa sociedade o direito de mudar de religião, de abandonar qual-

quer uma, de ser contra uma ou todas, é um direito inalienável, é um direito

de cidadania e o Estado não pode perguntar a ninguém qual é a sua religião,

e não pergunta. Em Portugal não se pergunta, é proibido perguntar a alguém,

sendo interrogado por agentes do Estado, qual é a religião que professa ou

que não professa. Ora, a apostasia, que atinge muita gente, pelo menos na

minha geração, era impossível nos meios rurais onde se era obrigatoriamente

educado sob os auspícios da igreja católica, apostólica, romana e onde aos 10

anos qualquer garoto já levava 4 sacramentos, era para ir aconchegado para a

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eternidade, no caso de lhes faltar a unção, porque, nesse caso, eram já 5. Eu

próprio livrei-me da extrema unção, com o sarampo, por ter o padre ido levar

o viático a um moribundo a uma terra próxima. Umas vizinhas já o queriam

levar lá a casa, para realmente me ungir com óleo santo, que era uma protec-

ção acrescida para a eternidade.

Todos os que foram e já não são crentes, é evidente que apostataram. Isto

hoje não causa qualquer transtorno, não pode haver uma autoridade que inco-

mode alguém por isso, mas não é assim no Islão, não é assim no Irão, não vai

ser assim no Iraque.

Penso que a invasão do Iraque foi uma grande tragédia, mas não entrarei

por aí porque foi uma decisão de natureza secular, embora venha a ter refl exos

no futuro ordenamento jurídico que difi cilmente será laico. Fundamental é o

problema da laicidade, porque entendo, entende muita gente, entendem mui-

tos crentes, que a laicidade é a pedra de toque de todas as democracias. Em

Coimbra, o Dr. Anselmo Borges, colega ali do Professor Amadeu Carvalho

Homem, na Faculdade de Letras, é um defensor tenaz da laicidade apesar de

ser padre católico. No Diário de Noticias defende a laicidade com entusiasmo,

diz que o Estado não tem rigorosamente nada que favorecer qualquer religião

e deve ser rigorosamente neutro, porque no dia em que não for neutro, fazem-

-se asneiras.

O que se exige, pois, da laicidade do Estado? O Estado não tem compe-

tência e tem de se declarar incompetente, por exemplo, a reconhecer milagres.

Qual é a competência de um Primeiro-ministro, do Presidente da Assembleia

da República ou do Presidente da República para reconhecer um milagre?

Não há olfacto que a posição politica aguce a ponto de sentir o odor a santi-

dade. Não obstante, o mais recente milagre, o da D. Guilhermina de Jesus,

obrado em Ourém, quando queimou o olho esquerdo com salpicos de óleo

fervente de fritar peixe e que lhe bastou beijar a imagem do D. Nuno para

imediatamente fi car curada, teve a presidir à comissão de honra da canoniza-

ção de D. Nuno o chefe de Estado. Eu não discuto o milagre, não nego que

D. Nuno se tenha transformado em colírio, depois de ter sido um brilhante

guerreiro na Idade Média, agora o que não posso aceitar é que o Presidente da

República presidisse à Comissão de Honra da canonização de santo Pereira,

porque passou de herói que era para o povo português, a santo de alguns cató-

licos. E talvez não merecesse semelhante enxovalho.

A neutralidade do estado não é apenas um dever é uma necessidade para

salvaguardar o pluralismo, e aqui terei que dizer, como republicano, que no

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dia em que não houver pluralismo, não teremos liberdade, nem democracia,

nem um país de que nos podemos orgulhar, apesar de todas as crises, pelo

menos nos valores que soubemos criar: fraternidade, justiça e emancipação.

Não há países livres onde um género não seja emancipado, não há países

livres onde de facto não gozem todos, perante a lei, daquilo que defi ne a ética

republicana a igualdade. No estado não pode haver lugares vitalícios nem

hereditários. E isso só se consegue, de facto, se o Estado for neutro em termos

religiosos e noutros, naturalmente, mas neste caso eu falo de laicidade, que é

muito importante. Reparem como se acelera a secularização: na Itália só em

1984 o catolicismo deixou de ser a religião ofi cial do Estado. Persiste ainda o

Pacto de Latrão assinado por Benito Mussolini, considerado um enviado da

providência porque permitiu elevar à categoria de Estado um bairro de 44

hectares onde está sediado o Vaticano.

Na Grécia a abolição que há pouco tinha referido, da obrigatoriedade do

baptismo e do casamento religioso, é de 1983, há apenas 27 anos. Na Irlanda

e na Grécia, mas a Grécia é um país ortodoxo e o cristianismo ortodoxo sofre

a infl uencia de um direito politico, ainda hoje se fazem juramentos para tomar

posse dos cargos públicos em nome da santíssima trindade. Na Grécia houve

deputados que recusaram, e foram deputados, mas por exemplo, para se ser

ministro, para fazer parte do governo continua a ser exigido o juramento reli-

gioso, bem como na Irlanda, país católico onde os actuais escândalos devem

provavelmente ter alguma infl uência para uma futura secularização. Aliás,

parece que a secularização está a ser extremamente acelerada.

Quero recordar que a liberdade religiosa só foi reconhecida pela Igreja cató-

lica já eu era homem. Foi no Concilio Vaticano II. Curiosamente, já foi posta

em causa neste pontifi cado, dizendo o Papa que não se pode esquecer que há

uma só religião verdadeira – a religião católica. Isto foi afi rmado de forma

absolutamente peremptória por Bento XVI, o que faz com que de algum

modo toda a gente seja ateia em relação aos deuses das religiões diferentes da

sua. Aqui todos somos ateus, pelo menos relativamente a Zeus, ou a Rá ou a

qualquer deus da mitologia. Os deuses actuais, mais tarde ou mais cedo, serão

estudados na mitologia em épocas vindouras.

Eu penso que seria mais interessante trocarmos impressões, termos uma

conversa. Era capaz de fi car por aqui, reiterando a afi rmação que há pouco

fi z: não há nenhum país democrático, não há nenhum país livre se, efectiva-

mente, o Estado não se comportar com neutralidade em relação às crenças, às

descrenças e às anti-crenças dos cidadãos que administra.

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A MAÇONARIA E A REPÚBLICA LIBERDADE

E DEMOCRACIA *

dr. antónio arnaut

Este tema não fui eu que o escolhi. Foi-me sugerido que falasse sobre

Maçonaria e República, mas eu acrescentei, justamente porque soube

que vinha o Dr. Magalhães e Silva, monárquico antigo e republicano actual,

liberdade e democracia, para dizer: só se pode ser verdadeiramente livre e

democrata em República.

Talvez seja um tema polémico, e é bom que haja aqui discordâncias para

suscitar o debate. Mas antes de entrar propriamente na minha exposição, não

vou demorar mais de meia hora, quero fazer uma homenagem a um grande

republicano, a todos os republicanos do concelho de Miranda, mas sobre-

tudo, àquele que mais se destacou na vida nacional, José Falcão. Trago o livro,

a Pátria, de Guerra Junqueiro. A Pátria foi, de facto, como o Dr. Magalhães

e Silva bem disse, um conceito de alguma maneira redimido pela República,

muito antes do 5 de Outubro. Porque sendo a maior parte dos republicanos

maçons e sendo uma grande parte deles agnósticos, eles tinham necessidade

de um sentido espiritual da vida. E a Pátria, como diziam alguns historiado-

res, tinha neles também, um sentido espiritual, mítico. De tal maneira que

Guerra Junqueiro disse: falar em República é falar em Pátria; falar em Repú-

blica é falar em Portugal. Mas trouxe então o livro do grande poeta Guerra

Junqueiro, Pátria, justamente para fazer uma homenagem a José Falcão. Diz

ele e cito: num postfácio a que chama “anotações”, vou só resumir aqui algu-

mas coisas, o seguinte; se houver alguma coincidência entre isto que Guerra

Junqueiro disse há mais de 100 anos e os tempos actuais é pura coincidência,

desculpem o pleonasmo, ou se houver alguma semelhança, melhor dito, é

pura coincidência. Diz ele: – um povo imbecilizado e resignado, humilde e

* O presente texto foi elaborado a partir da gravação da conferencia, que foi proferida sem

registo escrito.

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macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguen-

tando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um

mostrar de dentes, a energia de um coice, pois que nem já com as orelhas

é capaz de sacudir as moscas. Não, hoje felizmente o nosso povo já não é

assim. Mas depois diz: – um clero português desmoralizado e materialista,

liberal e ateu, cujo Vaticano é o ministério do reino, e cujos bispos e abades

não são mais que a tradução em eclesiástico do fura-vidas que governa o dis-

trito, o tal cacique que falou, ou do fura urnas que administra o concelho,

por ai adiante, uma burguesia cívica e politicamente corrupta, aqui é que já

vai havendo algumas coincidências, até à medula, não discriminando já o

bem do mal, sem palavra, sem vergonha, sem carácter; ele depois tem uma

anotação, dizendo que, há pessoas sérias, nem tudo é assim; sem palavra, sem

vergonha, sem carácter, havendo homens que honrados na vida intima, des-

cambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, etc, etc. Um exército

que importa em 6 mil contos não valendo 60 reis, como elemento de defesa

e garantia autonómica. Um poder legislativo e esfregão de cozinha do execu-

tivo, este criado de quarto do moderador, moderador era o Rei, e este fi nal-

mente tornado absoluto pela abdicação unânime do País, exercício ao acaso

da herança pelo primeiro que sai de um ventre, como da roda de uma lotaria.

O Dr. Magalhães Silva já disse, a Monarquia tem isto, o rei é o primeiro que

sai do ventre. A justiça é o arbítrio da política, torcendo-lhe a vara a ponto de

fazer dela um saca-rolhas, este Junqueiro sabia muito, era assim nesse tempo.

Hoje, enfi m, não digo nada, cada um tira as suas conclusões. Agora vejam:

dois partidos monárquicos, dois partidos, sem ideias, sem planos, sem convic-

ções, incapazes na hora do desastre de sacrifi carem à monarquia ou meia libra

ou uma gota de sangue. Era assim, dois partidos monárquicos, o progressista,

o regenerador, como já foi aqui falado, que se revezavam no poder, o Hintze

Ribeiro e o Luciano de Castro, mas que não eram capazes de fazer nada pela

defesa da Monarquia. Por isso, D. Carlos dizia, isto é uma monarquia sem

monárquicos. Por ai adiante, por ai adiante, eu vou resumir, por ai adiante,

não vale a pena …

Continuo a citar: um regime económico baseado na inscrição e no Brasil,

perda de gente e perda de capital, autofagia colectiva, organismo vivendo e

morrendo é o parasitismo de si próprio, liberdade absoluta neutralizada por

uma desigualdade revoltante, o direito garantido virtualmente na lei posto de

facto à mercê de um compadrio de batoteiros, sendo vedado, ainda aos mais

orgulhosos e mais fortes, abrir caminho nesta porcaria sem recorrer à infl u-

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ência tirânica e degradante de qualquer dos bandos partidários. A burguesia

liberal, merceeiros viscondes, parasitagem burocrática, bacharelice de piano,

advogalhada de S. Bento, etc, etc. Bem, passo à frente, para chegar onde eu

quero, que é a homenagem ao José Falcão. Era assim, era isto porque era preciso

sabermos também porque é que veio a República, porque é que caiu a Monar-

quia praticamente sem luta, só o Paiva Couceiro, à frente de umas dezenas,

poucas, de militares é que ainda esboçou uma resistência ao Machado Santos,

na Rotunda. Não caiu e depois a maior parte destes … quase todos passaram-

-se para o Partido Republicano, foi um dos males da República, oportunistas,

como sempre: os adesivos, eram justamente chamados os adesivos. Acontece

isto tudo e o País era assim, com 85% de analfabetos. Mas depois, diz Guerra

Junqueiro: – republicano e patriota tornaram-se sinónimos, quer dizer, nessas

circunstâncias, derrubar a Monarquia que já estava esgotada, fazer a Repú-

blica, era um acto de patriotismo. Por isso diz o Guerra Junqueiro: – republi-

cano e patriota tornaram-se sinónimos, hoje quem diz Pátria, diz República,

não uma República doutrinária, estupidamente jacobina, mas uma República

larga, franca, nacional, onde caibam todos. Não dum partido, da nação, Presi-

dente, o melhor. Foi por acaso miguelista? Embora. Uma revolução por selec-

ção de caracteres. Tal movimento cívico, espiritualizado e grande, requeria

pelo menos um homem. Quer dizer, este movimento de unifi cação da Pátria,

de redenção, merecia um homem. Existe? E Guerra Junqueiro, respondeu:

existiu, José Falcão.

José Falcão, alma tão nobre de patriota, não a conhecerei jamais, a ideia de

Pátria feita verbo, nela encarnara divinamente, hóstia sublime, trigo de comu-

nhão, deu luz a fé e … na hora da nossa morte, dá-nos ainda a esperança.

Esta é a homenagem que Guerra Junqueiro faz a José Falcão. Como eu não

podia ter palavras mais belas, resolvi ler este trecho para lhe prestar a minha

homenagem.

E agora vou dizer-vos alguma coisa sobre Maçonaria e República. Começo

por esclarecer o que é a Maçonaria, porque a maior parte não sabe, tem até

uma ideia errada, preconceituosa. A Maçonaria é das instituições mais anti-

gas e respeitáveis do mundo. Talvez mais antiga que a Igreja Católica, que é

outra instituição também respeitada. A Maçonaria, na sua forma moderna,

apareceu em 1717, como uma Ordem de carácter doutrinário, fi losófi co e

fi lantrópico. A Maçonaria é uma instituição que pretende contribuir para

o aperfeiçoamento do homem, do ponto de vista moral, ético e espiritual.

E para quê? Para que esse homem, ou agora acrescento, a mulher, pois há

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Maçonaria feminina, O Grande Oriente Lusitano foi durante 200 anos, fun-

dado em 1802, a única obediência, digamos assim, a única instituição maçó-

nica. Hoje há mais, felizmente que há mais, depois do 25 de Abril, e também

há uma Maçonaria feminina. A Maçonaria é única, é universal, é uma ordem

universal, mas há vários ramos. Há um ramo conservador que não admite as

mulheres, não dá às mulheres a dignidade de acederem à condição de maçon,

tal qual como a igreja conservadora também não admite as mulheres a acede-

rem aos mistérios. A Maçonaria e a Igreja têm algumas coincidências, nesse

aspecto. Passo à frente, para vos dizer o seguinte: – a maçonaria não faz revo-

luções; a maçonaria deve ser apolítica, e tolerante em matéria religiosa, por-

que tem obreiros, pessoas de todas as sensibilidades e convicções democráticas

e de todos os credos religiosos, ou sem credos religiosos. O que há de mais

belo numa loja maçónica, verdadeiramente comovedor, das coisas mais belas

a que uma pessoa pode assistir, é ver um católico sentado fraternalmente ao

lado de um judeu, de um muçulmano, de um ateu ou de um agnóstico,

como é o meu caso. E por exemplo ver uma pessoa, digamos, de um partido

centrista ou de um partido socialista, ou social-democrata ou sem partido,

sentados lado a lado, isso não os pode dividir. E é por isso que a maçonaria,

tenho que dar esta explicação prévia, não deve intrometer-se como instituição

na política, já o fez e fê-lo aqui, mas não deve, em principio, para não criar

divisões no seu seio, visto que tem todas as ideologias democráticas, não pode

ter ninguém de uma ideologia totalitária, e de todas as crenças ou sem crença

nenhuma, não pode envolver-se. Então qual é o papel da Maçonaria na pro-

clamação da República? A Maçonaria procura agir através dos seus membros.

Os seus membros é que na sociedade civil, onde trabalham, onde desenvol-

vem as suas actividades, é que têm que procurar, digamos assim, difundir os

valores, os ideais da Maçonaria. E quais são esses ideais fundamentalmente?

São sintetizados naquela trilogia muito bem conhecida: liberdade, igualdade,

fraternidade. Mas além disso há outros valores, a tolerância, eu tenho que

respeitar o outro, a diferença, a tolerância, o livre pensamento, a laicidade, a

cidadania. Ora bem é fácil compreender que estes valores são essencialmente

republicanos. A Maçonaria tinha em 1910, naturalmente, muitos monárqui-

cos, e ainda hoje tem monárquicos, mas ela é essencialmente republicana. …

Não tenho nenhum preconceito contra os monárquicos, e devo dizer que,

preferia viver numa monarquia democrática, do que numa República auto-

ritária, numa ditadura republicana, é evidente. E já agora adianto isto, eu

sou republicano, não sei porquê, não sei explicar, uma questão genética, cro-

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mossomática, não sei bem. Mas também porque aprendi desde muito jovem

com os republicanos, entre os quais cito aqui em homenagem à sua fi gura,

e até porque muitos o conhecem, o Dr. Fernando Vale, que me levou para o

Partido Socialista e para a Maçonaria. Faz hoje anos, 17 de Abril, estava eu

justamente na Alemanha, em Bad Munstereifel, perto de Bona, com outros,

com Fernando Vale e outros, para refundarmos o Partido Socialista, 17, 18 e

19. Eu presidi ao Congresso, com muito gosto, e por isso, a acta foi redigida,

e assinada por mim em primeiro lugar. E fala da Pátria…

Bom, 37 anos passaram, mas eu sou republicano não sei porquê, mas digo,

eu não tenho nada contra a Monarquia, compreendo perfeitamente que a

Monarquia possa ter virtualidades em países como a Espanha, porque sendo

a Espanha um conjunto de várias nações, eu admito que um rei que não é

eleito, que não é das “vascongadas”, nem é da Catalunha, nem é da Galiza,

possa, digamos, unifi car aquele conjunto de nações. Como no Reino Unido,

que são vários países, Gales, a Inglaterra, a Escócia. Vá lá dizer a um escocês

que é inglês, portanto, admito que eles transijam em ter uma Monarquia.

Como na Bélgica, por exemplo, com 2 línguas, etc. Portanto por circuns-

tâncias históricas, como disse o Dr. Magalhães Silva, admito isso perfeita-

mente. Simplesmente, antes de entrar propriamente na questão da Maçonaria

– República, já agora digo o seguinte: tá tudo certo, e até 1969, quando eu

também fui candidato a deputado aqui, o Sr. Dr. foi por Lisboa pela CEM,

comissão eleitoral monárquica, e eu fui aqui pela CDE, comissão democrática

eleitoral, aliás fi zemos aqui uma lista de unidade democrática, anti fascista.

Quem nos acolheu, para fazermos o comício distrital, foi o Henrique Bar-

rilaro Ruas, numa casa, em Soure, monárquico, na Gesteira. E o congresso

onde eu participei, que vem na minha biografi a, não sei onde é vocês a foram

buscar, que foi lido aqui, que apresentei de facto uma tese no 3º congresso,

chamou-se Congresso da Oposição Democrática, por solicitação, digamos,

eu digo imposição, dos monárquicos que também lá participaram, era para

se chamar Congresso Republicano. Mas, porque eles eram democratas, como

nós, portanto estiveram connosco muitos deles na luta anti fascista, eviden-

temente. Naquela carta que eu assinei, enfi m, e que nos valeu depois um

processo no plenário, estavam alguns monárquicos, como o Sousa Tavares, e

outros, que eram democratas. Portanto, ser democrata pode ser mais impor-

tante do que ser republicano, mas se for democrata e republicano, então é que

é verdadeiramente democrata, digo eu, sujeito a críticas. E agora vou dizer

porquê. Porque, realmente, a democracia pressupõe o sufrágio universal, os

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direitos iguais, tudo isso, mas, a chefatura do Estado tem que ser por escolha

directa do cidadão, não pode ser por herança. Portanto, o chefe de Estado

não pode ser o primeiro que nasce de um ventre privilegiado, nem exercer o

seu cargo de forma vitalícia. E é essa a grande diferença. Por isso é que só a

democracia é o governo do povo, do povo para o povo. Direitos iguais, não

pode haver uma família privilegiada, nem o cargo máximo do Estado, o Pre-

sidente da República, não pode aceder a esse alto lugar de representação por

herança e exercer o cargo de forma vitalícia. E é por isso que do meu entender,

e salvo o devido respeito por opinião contrária, eu acho que só a República

realiza verdadeiramente na sua essência a democracia. Mas ia a dizer, não

tenho nenhum preconceito contra a Monarquia, eu tenho relações pessoais

amistosas com o Sr. D. Duarte de Bragança. Porquê? Porque quando eu fui

Grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, recebi-o institucionalmente. Ele

manifestou o desejo de visitar o Palácio Maçónico e eu recebi-o institucio-

nalmente. A partir dai temos mantido relações, ainda há pouco estivemos em

Coimbra num encontro e falamos cordialmente, ele é uma pessoa estimável,

não está isso em causa. Mas esse encontro teve o signifi cado de mostrar que

não há nenhum contencioso entre a Maçonaria e a Monarquia, porque mui-

tos imputaram o Regicídio, primeiro à Carbonária e depois à Maçonaria. São

coisas ligadas como já vos vou dizer. E o Sr. Dr. tocou nesse aspecto. Não, a

Maçonaria não teve nada a ver com isso, nada. E a visita dele mostrou que

não tem nada a ver com isso, historicamente já está demonstrado, já não há

ninguém que sustente isso. E a Carbonária também não teve nada a ver com o

Regicídio, porque o Costa e o Buiça, não foram lá mandados pela Carbonária,

eram carbonários, mas não foi a Carbonária que os mandou, teria sido um

acto isolado, e segundo alguns historiadores, dignos de crédito, eles não iam

lá para assassinar o Rei, era porventura para um golpe de estado contra o João

Franco, que prudentemente não estava em casa onde foi procurado e vinha no

ultimo lugar do cortejo, à frente vinha o Rei, enfi m.

Então vamos agora falar de Maçonaria, e República.

A partir deste momento os nomes que vou referir são todos de maçons,

que é para mostrar o papel que eles tiveram. Simplesmente, houve muito mais

fi guras que não pertenceram à Maçonaria e que contribuíram para a Implan-

tação da República. A Maçonaria é uma associação de homens bons, mas

mal fora ao país se só houvesse homens bons na Maçonaria. Não, há muito

mais cá fora, não é preciso ser da Maçonaria para ser bom. Agora os nomes

que eu vou falar, foram todos da Maçonaria. Começo por dizer que a ideia

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republicana tem talvez em Portugal 200 anos, cerca de 200 anos, o Sr. Dr. já

falou um pouco isso também, quando falou na ida da corte para o Brasil. Ora

bem, havia um regime absoluto, a monarquia na sua essência era absoluta, o

Rei era o dono do País, e os habitantes eram os seus vassalos, não eram cida-

dãos. É outra diferença, eram súbditos, não eram cidadãos. Os reis portugue-

ses quando se casava uma princesa qualquer davam em dote à princesa, um

pedaço do território nacional, como aconteceu com Ceuta e Bombaim. Mas

portanto, havia uma necessidade, sobretudo depois de difundir essas ideias

liberais, de que, de facto, o Povo começasse a ter alguma coisa a ver com os

negócios públicos. A República é mesmo a coisa pública, Res publica. Ou

dito de outra maneira e melhor, a causa pública, Res publica não é só a coisa

pública é a causa pública.

Então a primeira tentativa, como todos sabem de derrubar a Monarquia

absoluta e instaurar um regime constitucional, com algumas liberdades, foi

com a revolução de 1820. Não, a primeira tentativa foi com revolução de

1817, chefi ada por Gomes Freire de Andrade. Fracassou, foram martirizados

todos os seus participantes, como sabem, e Gomes Freire de Andrade, Grão

Mestre do Grande Oriente Lusitano, todos os nomes que eu vou dizer são

maçons, mas este acrescento, Grão Mestre do Grande Oriente Lusitano, foi

enforcado, decapitado, queimado e as suas cinzas espalhadas pelo mar. Fra-

cassou, mas outros resolveram continuar essa utopia de instaurar um regime

constitucional em que o Rei também tivesse alguns deveres, e deu origem à

revolução liberal de 1820, de que foram principais mentores: Manuel Fer-

nandes Tomás, ali da Figueira, Ferreira Borges e Silva Carvalho. Este Silva

Carvalho havia de ser mais tarde Grão-mestre do Grande Oriente Lusitano e

ao mesmo tempo que exercia essas funções, Presidente do Supremo Tribunal

de Justiça. É curioso, hoje era impossível, o Presidente do Supremo Tribunal

de Justiça ser Grão Mestre ou ser maçon conhecido, era impossível. E o Libe-

ralismo teve isto, permitiu, de facto, que fosse ao mesmo tempo Grão Mestre

da Maçonaria e Presidente do Supremo Tribunal da Justiça. Ora a revolução

triunfou em 1820 e nós tivemos a primeira Constituição em 1822. Fomos

por ai adiante, e encurtando razões, houve várias vicissitudes, reformas que

o Mouzinho da Silveira, que o Sá da Bandeira, que o Joaquim António de

Aguiar foram introduzindo, no sentido de uma maior igualdade, maior dig-

nidade aos cidadãos. Depois em 1848, esta data talvez seja de reter, formou-

-se a chamada Comissão Revolucionaria de Lisboa, também conhecida por

Triunvirato Republicano, que era composto por António de Oliveira Marreca,

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Rodrigues Sampaio e José Estêvão. Entretanto, em 1871, Antero de Quental,

Eça de Queirós e outros, fi zeram as Conferências do Casino, onde se falava

também em liberdade, democracia, aliás chamadas Conferências Democráti-

cas do Casino. O Sr. Dr. disse há pouco, naqueles tempos do fascismo, dizer

Viva a República podia correr o risco de ir para a cadeia, e eu disse várias vezes

isto, Viva a República, que era um grito, que a gente andava o ano inteiro a

acumular sem poder dizer nada e chegava ao 5 de Outubro e despejava, dizia,

Viva a República, e nós fi cávamos aliviados. Dizer Viva a Democracia, era

mais perigoso, Viva a República, a PIDE apontava, fi cava lá na nossa fi cha.

Ora bem, é por isso que os historiadores coincidem em geral, em dizer que

nós estamos na 2ª República, porque o período ditatorial não foi verdadei-

ramente uma República. Portanto, hoje a partir do 25 de Abril nós estamos

na 2ª República. Mas entretanto, em 1875, Antero e José Fontana, fundam

o Partido Socialista E em 1876 é fundado o Partido Republicano Português,

depois o Sr. Dr. já falou da revolução de 31 de Janeiro, de que foram inspira-

dores Basílio Teles, Alves da Veiga e Sampaio Bruno.

Não quero repetir o que o Sr. Dr. disse, mas a questão do Ultimato Inglês

foi muito importante para o desencadear da ideia republicana, que vinha ama-

durecendo, mas porque se considerou de facto uma humilhação. O Rei foi

incapaz de desagravar, digamos assim, a humilhação do sentimento nacional

ferido. Tinha havido as comemorações do Centenário de Camões, em 1880,

depois, enfi m, houve o Ultimato Inglês, depois houve a tentativa revolucio-

nária de 1891 no Porto.

A propaganda republicana foi-se desenvolvendo, alguns republicanos

começaram a ser eleitos para a Câmara dos Deputados, e a propaganda repu-

blicana foi feita, entre muitos outros, todos os nomes que estou a referir, como

já informei, são maçons, no entanto vou só referir esses, Afonso Costa, Antó-

nio José de Almeida, havia de ser Grão Mestre, João Chagas, Elias Garcia,

Bernardino Machado, havia de ser Grão Mestre do Grande Oriente Lusitano.

Com o Bernardino Machado aconteceu uma coisa igual à que aconteceu com

o Sr. Dr. Magalhães Silva, também era monárquico e depois, enfi m, aderiu

aos ideais da República, e muitos outros, Teófi lo Braga, o José Relvas, Miguel

Bombarda, o Almirante Reis, por ai adiante.

Estávamos de facto, depois do Ultimato, com a perseguição que houve

aos revolucionários de 31 de Janeiro com a ditadura de João Franco, sobre-

tudo, com aquela monarquia sem monarca, estávamos numa situação que

era preciso redimir a Pátria. E a ideia de redimir a Pátria nessa altura, era a

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instauração da República. Só havia duas repúblicas na Europa, a França e a

Suiça, e não se sabia, como a nossa velha aliada, uma expressão muito antiga:

a nossa velha aliada, iria reagir à implantação da República. Como sabem, a

Portuguesa, o hino nacional, foi escrito na altura do Ultimato, por Alfredo

Keil e Henrique Lopes de Mendonça, também maçons, escrita e musicada, e

onde hoje diz: contra os canhões, marchar, marchar; dizia contra os bretões,

marchar, marchar.

Ora bem, entretanto estava iminente um golpe revolucionário, uma revolu-

ção. O Afonso Costa chegou aliás a dar uma entrevista em que dizia que, devia

preparar-se a revolução, falava-se assim. E devemos dar aqui algum tributo,

a D. Carlos, que segundo o historiador Rui Ramos, na História de Portugal,

coordenada pelo Mattoso, era maçon, aliás tivemos a D. Pedro IV, que foi

Grão Mestre da Maçonaria Brasileira. D. Carlos teria sido iniciado na Ingla-

terra.. A Maçonaria fez uma reunião plenária para decidir, formar uma comis-

são para a revolução da República, como já tinha feito na revolução de 1817,

em que se reuniram mais de 200 maçons na casa do General Gomes Freire de

Andrade para programarem uma revolução e para o convidarem a ser o chefe

dessa revolução. Portanto, a Maçonaria institucionalmente fez uma reunião,

e nessa reunião por proposta da loja Montanha, que se manteve sempre em

actividade mesmo durante o fascismo, à semelhança do que aconteceu tam-

bém com uma loja de Coimbra, A Revolta, ainda hoje existente, criada em

1909 e que fez já 100 anos. A loja Montanha que ainda hoje existe, propôs

a criação da chamada Comissão de Resistência, em 14/06/1910, quando foi

essa reunião, porque sabia-se que a revolução aconteceria mais dia, menos dia.

Fizeram parte dessa comissão, eleita especifi camente para preparar a revolução

e para acompanhar os acontecimentos. Magalhães Lima, que era Grão Mestre.

Magalhães Lima e outros partiram para a França e para a Inglaterra para saber

a reacção do governo inglês e do governo francês. Valeram-se das suas relações

maçónicas, para saber a opinião dos respectivos governos. E a opinião foi favo-

rável, a Inglaterra disse, as alianças são entre os povos e não são entre, os chefes

de Estado, nós temos uma aliança é com o povo português, portanto, não há

nenhum problema, e a França também disse que sim, apoiaria a República.

Ora essa comissão de resistência como eu disse, foi integrada por Magalhães

Lima, Grão Mestre, pelo Vice Grão Mestre, José de Castro, por Machado San-

tos, Miguel Bombarda, Cândido dos Reis e António Maria da Silva.

E agora aqui dou um salto para a Carbonária, para acabar a minha inter-

venção, porque depois certamente, não quero tomar muito tempo, certamente

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hão de querer fazer perguntas. Mas antes de dar o salto para a Carbonária,

porque a maior parte destes nomes foram carbonários, quero dizer o seguinte:

nestes nomes, todos maçons, não citei, por exemplo, o Cardeal Saraiva,

maçon, foi Grão Mestre, e Cardeal Patriarca de Lisboa e o Bispo de Viseu,

D. António Alves Martins, grande liberal, foi ministro, que se integraram

nesta corrente, digamos assim, renovadora. Para se saber que a Maçonaria,

sempre teve ao longo dos tempos e continua a ter, fi guras da igreja, e de outras

religiões, evidentemente.

Ora bem, deste conjunto de nomes que eu indiquei, Machado Santos e

António Maria da Silva, haviam de integrar mais tarde com Luz de Almeida

a direcção suprema da Carbonária chamada Alta Venda. A Carbonária, certa-

mente sabem, era uma organização armada. Teve origem na Itália, e veio para

Portugal, e destinava-se, justamente, a intervir pela força das armas quando se

tornasse necessário e em circunstâncias especiais, de defesa de certos valores.

Isto é discutível, mas também o 1640 também foi uma revolução armada, a

nossa restauração da independência, o 25 de Abril também foi uma revolução

armada, quer dizer, há circunstâncias em que se justifi ca a revolução armada.

Ora, a Carbonária, não é a Maçonaria, mas, esteve ligada, hoje não temos

Carbonária, esteve ligada à Maçonaria. Porquê? Porque eram maçons uma

grande parte dos seus dirigentes. Já falei de Luz de Almeida, Machado Santos

e António Maria da Silva. Machado Santos foi o grande herói da rotunda,

foi o fundador da República, verdadeiramente. Quem fazia a ligação entre a

Alta Venda e a Carbonária era o Almirante Reis e Miguel Bombarda. Miguel

Bombarda foi assassinado 2 dias antes do golpe programado por um doente

mental, há quem diga que foi um atentado, mas há quem diga que talvez não

fosse, um ofi cial do exército que era doente mental, porque Miguel Bombarda

era médico, na altura dizia-se alienista, hoje diz-se psiquiatra. O Almirante

Reis suicidou-se no dia 4 pressentindo o fracasso da revolução, porque houve

alguma hesitação da marinha em aderir à revolução, e ele num momento de

desespero suicidou-se. Era o chefe civil e o chefe militar dos conspiradores, e

a revolução pareceria que fracassava. Simplesmente, Machado Santos, maçon

e carbonário, resolveu cumprir o seu próprio programa e dirigiu-se para a

Rotunda e ai esteve, não vamos contar esses pormenores, mas foi ele que de

facto implantou a República. E há uma coisa curiosa, interessante. Foi talvez

um acaso, a República acabaria por vir, mas aconteceu um pouco no 5 de

Outubro o que aconteceu no 25 de Abril de 74, porque quem fez verdadei-

ramente essas revoluções foi o povo de Lisboa. Em 5 de Outubro Machado

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Santos, enfi m, eram ofi ciais subalternos, lá foi para a Rotunda. Alguns ofi ciais

com uma patente superior, receando o fracasso do golpe, desistiram, e ele

fi cou lá. E a determinada altura da madrugada do dia 5, um diplomata ale-

mão pede ao comandante da guarda municipal, ao chefe militar da capital,

um armistício umas horas para eles poderem, enfi m os estrangeiros, saírem

de Portugal. E o General que tinha o quartel no Rossio. disse que sim, e sai

um soldado com uma bandeira branca a caminho da Rotunda para dizer ao

Machado Santos se ele aceitava o armistício umas horas para que os estran-

geiros pudessem abandonar Lisboa. Quando esse sujeito saiu com a bandeira

branca, os milhares de civis que estavam ali, e certamente alguns milhares de

militares que estavam acampados, digamos assim, que estavam acampados no

Rossio, que pertenciam à guarda municipal e às forças monárquicas, mas que

se tinham recusado a disparar, só depois quando a marinha disparou, enfi m,

e bombardeou o Palácio das Necessidades, é que eles tomaram partido, mas

quando viram o sujeito com a bandeira branca a caminho da Rotunda, e

Machado Santos vem ao encontro das hostes, aquelas pessoas que estavam nas

ruas, aqueles milhares de pessoas, de populares, vieram para o Rossio confra-

ternizar com as tropas. E era impossível qualquer outra coisa, o povo tomou

conta das ruas de Lisboa, e a República foi proclamada assim. Um pouco

como aconteceu em 25 de Abril, quando os populares, vieram para o Largo

do Carmo e encheram as ruas de Lisboa e os cravos vermelhos, quer dizer, no

fundo foi o povo que fez a revolução, de 5 de Outubro e que fez a revolução

de 25 de Abril. Repito, foi o povo que fez a revolução de 25 de Abril, porque

sem o povo o 25 de Abril teria sido um golpe de Estado, não teria sido uma

revolução.

Ora bem, a República foi implantada, chefi ada pelo Machado Santos, que

nem era sequer ofi cial de combate, era um comissário naval, e acompanhado

por alguns soldados e sargentos e ofi ciais subalternos, como sabem, poucos.

Uns falam numa centena, ou cerca disto, e porventura 500 civis, todos car-

bonários, na Rotunda. Ora bem, havia nessa altura, segundo alguns historia-

dores, não sei se o número é exacto, 40 000 carbonários, nem todos armados,

em Lisboa. Como o Sr. Dr. disse e muito bem, não foi o povo rural, não, o

povo rural não tinha nada que ver com a República, foi aquilo a que os histo-

riadores haviam de chamar, a plebe urbana, nem sequer o povo de Lisboa, a

plebe urbana, operários, pequenos comerciantes, merceeiros, caixeiros, enfi m,

mas também a pequena burguesia, alguns aristocratas. E realmente com sen-

timento patriótico, de salvação do país e da Pátria, como eles diziam, foram

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esses homens, alguns descalços, andrajosos, que depois de arma na mão, no

dia 5 de Outubro e nos dias seguintes defenderam os bancos do assalto das

pessoas, eram carbonários e eram patriotas. Por isso eu fi quei incomodado

com umas declarações do Sr. D. Duarte de Bragança, que li hoje nos jornais,

Diário de Coimbra e As Beiras. Ele esteve na Figueira, num programa que lá

há, é o convidado, enfi m, e ele chama aos carbonários um bando de malfeito-

res, comparando-os à Eta e àquele movimento da Irlanda, o Ira e à Al Qaeda.

Isto para uma pessoa inteligente e culta, como disse há pouco conheço-o, é

um impropério, para não dizer outra coisa, um verdadeiro impropério. Por-

que é injusto chamar a estes patriotas, dos quais se pode discordar, mas que

agiram com sentido de salvação da Pátria e de redenção do povo português,

é injusto chamar-lhes terroristas, como são os da Al Qaeda, e porventura os

outros. É injusto, e ainda por cima, caso curioso, agora alguns vão-se admirar,

estando o Sr. Duarte de Bragança casado com uma bisneta do Visconde da

Ribeira Brava, maçon e carbonário.

Para terminar, este é o papel muito em resumo, que a Maçonaria teve na

implantação da República, mas para terminar, visto que também não tenho

o direito de abusar da vossa paciência. A 1ª República durou apenas 16 anos,

houve uma instabilidade política terrível, a média dos governos foi de 4

meses, com uma ditadura a de Pimenta de Castro, uma ditadura que durou

quase 2 anos, a do Sidónio Pais; com 3 incursões monárquicas, 1911, 1912 e

1919, que até instauraram a monarquia no Norte, que durou um mês, Paiva

Couceiro, com guerras civis, com golpes de Estado, com tudo isso. E até com

a noite sangrenta, 1921, em que assassinaram Machado Santos. e António

Granjo. Machado Santos foi o fundador da República, António Granjo que

era Presidente do ministério, e o Carlos da Maia. Foram 16 anos, de facto,

muito difíceis, e também tivemos, além das incursões monárquicas, tudo isto,

da instabilidade política, também tivemos a Grande Guerra, não se esqueça,

a Grande Guerra. Depauperou o País, não só de homens, mas também das

suas economias, dos seus fundos. Apesar de tudo, em 16 anos, a República

fez reformas profundas que ainda hoje se mantêm, é preciso dizer isso. Os tais

maçons, os que foram fi eis aos seus valores, às vezes com exageros, sobretudo

na questão clerical, mas é preciso dizer o seguinte: houve muito anti clerica-

lismo, muita perseguição injusta a clérigos, até nem tinham culpa no cartório

muitos deles, mas é preciso conhecer a História, a Igreja, o Papa,a hierarquia.

A Igreja só considerou que as ideias liberais não eram uma heresia em 1890,

porque até aí fulminava com a excomunhão quem aderisse às ideias liberais.

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Porque era uma heresia, o poder tinha que vir de Deus, era assim. Portanto,

quando se atacam os republicanos e os maçons de serem anti clericais, nem

todos foram, mas é preciso saber as circunstâncias em que isso aconteceu.

Porque a Igreja dominava o poder. O altar e o trono estiveram sempre uni-

dos; D. Afonso Henriques teve que pedir ao Papa autorização para se pro-

clamar independente, e prometeu pagar-lhe não sei quanto, acho que ainda

não pagámos, mas isso também não tem importância nenhuma. Mas não era

assim? As coisas eram assim, portanto, é preciso ver as circunstâncias em que

a Igreja, dominou o Estado e infl uenciou o Estado. Por isso, um dos valores

da República é a laicidade. A laicidade signifi ca a imparcialidade do Estado

em relação a qualquer religião, com a igual equidistância. O Estado tem que

respeitar todas as religiões por igual. Nós fomos um Estado confessional pra-

ticamente até à República, porque a religião católica era a religião do Estado.

A nossa primeira Constituição e mesmo a Carta Constitucional quando dá a

liberdade de pensamento e de religião, dizia, só havia a liberdade de religião

para os estrangeiros, porque os portugueses eram obrigados a ter a religião

católica, apostólica romana. Ora bem, é claro que as ideias Iluministas, Posi-

tivistas, tudo isso, colidiam com essa situação, e por isso, muitos republicanos

e maçons tornaram-se, uns a justo título, outros talvez nem tanto, anti cle-

ricais, mas é preciso ver isso. Eu também fui anti fascista, hoje não sou anti

fascista porque não há fascismo em Portugal, quer dizer, vamos lá ver, estou

vigilante.… .

Ora bem, a primeira grande lei, foi a lei da separação da Igreja do Estado,

que já tinha sido pensada, muito antes, por Mouzinho da Silveira que foi dos

nossos grandes reformadores. A lei da separação da Igreja do Estado, que aliás

é um benefício, a que a Igreja nessa altura reagiu, mas que hoje toda a gente

reconhece que é uma necessidade absoluta separar o poder temporal do poder

espiritual.

A lei do divórcio. O casamento até ai era um sacramento, passou a ser um

contrato civil ,mas quem quiser sacramento muito bem. A lei dos fi lhos legí-

timos e ilegítimos. Os fi lhos ilegítimos passaram a ser reconhecidos, que era

uma coisa importante, foram avanços civilizacionais.

O estabelecimento do dia de descanso semanal, de preferência ao Domingo.

Não havia descanso semanal por lei. A abolição do juramento religioso. A lei

da greve, embora condicionada. Depois, enfi m, na educação, o que António

José de Almeida fez na educação, as reformas, criou as universidades de Lisboa

e do Porto, a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, enfi m, trans-

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formou a Faculdade de Cânones na Faculdade de Direito, em Coimbra, por ai

adiante, grandes leis. Simplesmente os republicanos não tiveram coragem ou

não tiveram possibilidade de fazer aquilo que era essencial à República, que

foi o sufrágio universal. Uma das grandes falhas da República, não tiveram

tempo, ou não tiveram condições de fazer o sufrágio universal. Vigorava o

sufrágio censitário, só votavam os que estivessem inscritos, só estavam inscri-

tos aqueles que pagassem uma certa quantia, havia de se saber ler e escrever,

portanto, só uma pequena parte dos cidadãos portugueses é que estavam ins-

critos, é que podiam votar. E até se discutiu nessa altura, o Sr. Dr. Magalhães

Silva recorda-se, se as mulheres podiam votar, mas houve uma senhora, Caro-

lina Beatriz Ângelo, também maçon, que reclamou, porque a Constituição

era omissa, e o Supremo Tribunal de Justiça permitiu-lhe votar. E houve uma

colega nossa, penso que é Julieta Quintanilha, de Bragança, que foi a primeira

mulher que se inscreveu na Ordem dos Advogados. Nessa altura não era

admissível inscrever-se na Ordem dos Advogados, a mulher não tinha direi-

tos. Mas a mulher só adquiriu verdadeiramente direitos com a revolução do

25 de Abril, porque até aí também não tinha, é preciso lembrar isso. Houve

a questão religiosa, a República foi porventura pouco cautelosa nesse aspecto,

mas também não se pode dizer que Afonso Costa é o culpado, porque ainda

durante a República, essa lei da separação da Igreja, ah e a lei de extinção das

ordens religiosas, evidentemente; mas isso já se tinha feito na Monarquia, o

Marquês de Pombal já tinha expulsado os jesuítas, e o Joaquim António de

Aguiar, conhecido pelo Mata Frades, com quem eu me cruzo todos os dias

quando passo na Portagem, também já tinha extinguido as ordens religiosas,

portanto, isto também não é uma coisa da República. Mas houve um minis-

tro da República, chamado Moura Pinto, de Arganil, que alterou a lei de

separação da Igreja do Estado e a lei de extinção das ordens religiosas e que

tornou, de facto, as coisas bastante melhores. Até o António José de Almeida,

foi à imposição do barrete cardinalício ao núncio apostólico, que então repre-

sentava a Santa Sé na República. Quer dizer, tirando aqueles primeiros anos,

as relações entre o poder politico e a igreja tendiam a normalizar-se.

Terminei a minha exposição inicial, estou à vossa disposição para qualquer

esclarecimento. Deixo uma nota fi nal: talvez depois desta intervenção alguns

dos meus amigos que aqui estão tenham fi cado com uma ideia diferente da

Maçonaria, mas aqueles que não estando ainda esclarecidos não tenham dúvi-

das, eu sou maçon, com muita honra. Um maçon tem que ser, por defi ni-

ção um homem livre, de bons costumes e solidário. Porque, a liberdade, a

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igualdade e a fraternidade são valores importantes. É claro que há também

maçons que, excepcionalmente, não comungam destes valores, como tam-

bém na Igreja há elementos que não praticam os valores, mas não vamos agora

responsabilizar as instituições. O que eu quero dizer é que a Maçonaria teve

um papel importante na Proclamação da República, mas hoje a Maçonaria

continua a trabalhar discretamente para o bem comum. Não intervém na

política, e nos negócios. Os seus membros é que podem ter uma acção, cívica,

de esclarecimento, como eu estou hoje aqui a exercer. A cidadania é um dos

valores da República.

Muito obrigado.

Miranda do Corvo, em 17 de Abril de 2010

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DA MONARQUIA À REPUBLICA *

dr. manuel jorge magalhães e silva

Falar de Monarquia e República é singularmente bizarro para quem esteve

de um lado, e está do outro; e esteve de um lado, exactamente com a

mesma sinceridade com que esteve do outro, e portanto, disponível para olhar

para a perspectiva de cada lado e procurar perceber cada uma delas.

Aquilo que sempre me impressionou, seja na abordagem do lado em que

estive, seja na abordagem do lado em que estou, é alguma incompreensão

relativamente aos méritos e deméritos de cada uma das posições.

Normalmente, a questão da Monarquia é olhada pelos republicanos com

uma dose apreciável de preconceito, normalmente, a questão da República é

olhada pelos monárquicos com uma dose apreciável de preconceito. Sobretudo

porque se tem associado, normalmente, seja à Monarquia, seja à República,

alguma coisa que, sendo-lhe própria em determinados momentos históricos,

não lhe é, todavia, essencial.

Explicitando: – O que num primeiro momento distingue, essencialmente,

Monarquia da República é uma questão tão simples quanto a forma de desig-

nação do Chefe de Estado. O Chefe de Estado ou é designado por via heredi-

tária, ou é designado por via eleitoral, seja qual for a forma de sufrágio. O que

acontece é que, historicamente, estas formas de organização do Estado foram

acompanhadas de outras manifestações de carácter político. Sendo próprias

desse tempo e sendo próprias de cada um desse regime, todavia não lhe eram

essenciais.

Com isto retoma-se, obviamente, uma linguagem de S. Tomás de Aquino,

que é muito própria e muito adequada para este tipo de abordagem, que é

olhar para as coisas e perguntarmos, o que é que lhes é essencial, isto é, sem

* O presente texto foi elaborado a partir da gravação da conferencia, que foi proferida sem

registo escrito.

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isso não existem; e o que é que lhes é próprio, isto é, o que é que normalmente

acontece com elas.

Porque é que eu falo em preconceito na abordagem seja da Monarquia, seja

da República, exactamente nesta perspectiva? Porque quer uma, quer outra

se transformaram em momentos históricos determinados, em questões de

grande carga ideológica, e a partir do momento em que se transformaram em

questões de grande carga ideológica, transformaram-se, necessariamente, em

questões de enorme confrontação.

Os últimos oitenta anos, setenta, sessenta, cinquenta anos são particular-

mente ricos para que esse tipo de confusões pudesse, efectivamente, ocorrer.

O Estado Novo não encontrou melhor forma de legitimação do que eleger

como seu inimigo principal a República e buscar os seus pergaminhos e as

suas formas de brasonar, por oposição àquilo que devia fazer, do que a con-

traposição daquilo que entendia ter ocorrido na República. A República fun-

cionava, portanto, para o Estado Novo como uma diabolização da política:

tudo o que fosse República era o mau, tudo o que fosse Estado Novo era o

bom. Isso teve importância seja para análise da Monarquia, seja para a análise

da própria República.

Infelizmente tenho idade para ter sido homem quando o Estado Novo

estava ainda pujante, e portanto ter uma memória muito viva de como é que

as coisas funcionavam. E só se percebe o que é algum excesso de mística repu-

blicana, na abordagem republicana da realidade, se se perceber que no Estado

Novo, Viva a República, podia dar cadeia, pura e simplesmente. Não era pela

proclamação dos méritos da República, enquanto forma de organização do

Estado, mas porque aquele grito era a forma possível, em memória histórica,

de dizer: isso não, isso não pode ser, e o que queremos com os seus méritos e

deméritos é a República, não queremos isto.

Acontece que essa forma de reacção a um regime que era essencialmente

imoral é alguma coisa de que as gerações novas, hoje, não têm, não vão poder

ter, a experiência, e que é a de combater um regime, não porque se queira

qualquer coisa para si, mas pela mera circunstância do regime ser imoral.

Eu costumo lembrar sempre às gentes do meu tempo, e quando falo com

gente mais nova, aquilo que nós dizíamos uns para os outros antes de 74 (o Dr.

Arnaut lembra-se bem, e muitos dos presentes na sala, também). Nós dizíamos

assim: isto um dia há-de virar. E este, isto um dia há-de virar, apontava quase

para uma realidade mítica que iria acontecer, e em que nós nos iríamos salvar e

o país iria ser salvo daquela situação que era fundamentalmente imoral.

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Ora, quando as questões são colocadas nesta abordagem quase mítica, nin-

guém ambiciona nada. Quem estava nessa luta não queria ser ministro, não

queria ser deputado, não queria ser secretário de estado, não queria fi liar-se

em partido nenhum, não queria coisa o que quer que seja, porque não havia

nada para querer, não havia rigorosamente nada para ambicionar. Havia uma

única coisa: fazer, com os riscos próprios que isso comportava, o que fosse

necessário para derrubar aquele regime.

Ora bem, esta realidade que era o Estado Novo, santifi cou a República

tanto quanto o Estado Novo a tinha diabolizado, e impediu que houvesse,

relativamente a um determinado período histórico, o período que vai de 1910

a 1926, uma visão objectiva em que, com alguma tranquilidade, se pudesse,

fazer um inventário de méritos e deméritos, para se perceber em que é que

a República se tinha realizado, e em que é que ela tinha acontecido naquele

momento histórico, com as várias perversões que vão acompanhando os vários

regimes na sua forma de existirem historicamente. Isto porquê? Isto essencial-

mente porque a nossa República, como as modifi cações que lhe apareceram

associadas, tinha acontecido muito antes.

Há uma forma de organização da vida que começa o seu declínio, algures

por meados do século XVIII, isto é, há uma sociedade que se organiza na base

do comércio, e um comércio incipiente, e da propriedade da terra e sua pro-

dução, que vai fi car ferida de morte com a revolução industrial, que vai modi-

fi car, essencialmente, o modo como se estrutura e como funciona a economia

em cada país, como se ascende e se tem poder em cada país, e com as modi-

fi cações que isso, necessariamente, vai trazer para a organização do Estado e

para os regimes. E nessa altura acontece uma outra coisa que vai de par com

esta realidade, e que vai potenciar as modifi cações que vão ocorrer por todo o

século XIX e por todo o século XX: o surgimento de uma obra notável, pre-

monitória, duma clarividência insuspeitada, que é “A Riqueza das Nações”,

do Adam Smith, em que, pela 1ª vez, e isto é um factor da maior importância,

pela 1ª vez, se concebe, porque houve e começa a haver a revolução industrial,

se concebe o progresso e o crescimento económico. É uma coisa que, hoje,

a nós, nos faz a maior confusão, e todavia em meados do século XVIII, nas

nossas sociedades, como fora delas, não havia a ideia de crescimento econó-

mico e a ideia de progresso, são ideias completamente inexistentes e que são

conceptualizadas, que ocorrem e que são conceptualizadas e tratadas, a partir

de meados do século XVIII. E é por isso -, parêntesis, parêntesis de um agnós-

tico -, é por isso que é de uma enorme injustiça, de uma enorme injustiça,

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verberar as igrejas por fazerem até ao século XIX o discurso da pobreza: é que

não havia outro discurso possível. Onde não há a ideia de crescimento eco-

nómico e de progresso, não há distribuição possível; ou o discurso que não

seja o da pobreza, é sempre um discurso da revolta, é sempre um discurso da

insurreição. Quando surge a ideia de crescimento económico e de progresso,

passa a ser possível a distribuição, passa a ser possível organizar os bens e a sua

relação com eles de modo diverso. E porque isso é assim, não passou o século

XIX sem que a própria igreja católica tenha passado do discurso da pobreza

para o discurso da distribuição: E todos nós nos lembramos da “Rerum Nova-

rum”, no fi nal do século XIX, que é exactamente essa resposta, é dizer: alto

lá, até aqui era o discurso da pobreza, porque não havendo a ideia de cresci-

mento económico e de progresso não se podia fazer outro, agora, agora que

isso mudou, agora que é possível crescer, crescer, talvez até indefi nidamente,

e haver progresso, ai, então, o discurso já não é o da pobreza, é o discurso da

justiça distributiva, é o discurso da distribuição.

Isto para dizer o quê? Para dizer que a ideia de progresso, a ideia de cresci-

mento económico e a revolução industrial vão marcar de uma maneira deci-

siva a Europa, mas também vão marcar de uma maneira decisiva Portugal.

Com a lentidão com que as coisas chegam até nós, com os atrasos relativa-

mente à reconformação económica que foram os nossos, mas também chega-

ram necessariamente até nós.

Dizia que vale a pena retirar de Monarquia e República, para as pudermos

comparar e apreciar, aquilo que lhes é próprio, e se pensar apenas naquilo

que lhes é essencial. E uma das realidades que lhe era própria, e que vai desa-

parecendo, progressivamente, e de que fi ca só um resíduo do século XIX, é

exactamente a fi dalguia, fi dalguia com função política.

O século XIX assiste, progressivamente, à decadência da fi dalguia como

função política, de que fi cam apenas como resíduo os pares do reino e a

câmara dos pares, que desaparece como 2ª câmara em 1910. Mas é essa a

única função que ainda resiste sob o ponto de vista da organização do Estado,

na sua relação com a fi dalguia. E porquê? Porque a transformação económica,

o começo da indústria, o desenvolvimento do comércio ligado à agricultura

e da fi nança que com ela se correlacionava, progressivamente, determina a

criação, a eclosão de altas e médias burguesias que são, progressivamente, mais

numerosas do que as fi dalguias, e que, necessariamente, vão querer o poder.

E portanto, o século XIX assiste à ascensão dessas burguesias, e ao liberalismo

como instrumento de tomada de poder por parte das burguesias emergentes.

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O Liberalismo, com toda a generosidade que comportava, é um movi-

mento de conquista do poder pela burguesia, com o único e lamento da

fi dalguia. Simplesmente isso, que era próprio do regime monárquico, não lhe

era todavia essencial; e somos capazes de perceber que não lhe era, todavia,

essencial, quando, no século XXI, continuamos a ter, sobretudo no norte da

Europa e aqui ao lado na vizinha Espanha, ene sistemas que estão organizados

como Monarquia, e em que, enquanto realidade social, na linguagem que

nós hoje utilizaríamos, enquanto jet set, existem as aristocracias, existem as

fi dalguias, mas praticamente não têm, ou não têm mesmo, qualquer função

política ao nível da organização do Estado. A fi dalguia, no âmbito das monar-

quias existentes, não se traduz numa função. O que signifi ca que, consoante

as situações históricas, a Democracia e a Liberdade – a prova está feita – tanto

podem conviver com a Monarquia, como podem conviver com a República.

Tem que ver, essencialmente, com a História de cada país, com o modo como

nesse país se organiza o Estado, se organiza a liberdade e se organiza a demo-

cracia. Monarquia e República não as tenho como realidades que, necessaria-

mente, são as únicas para veicular a organização da liberdade, do progresso e

da democracia; depende, essencialmente, das circunstâncias históricas de cada

país e do momento que esse país está a viver.

Acontece que a ascensão das burguesias entre nós, século XIX, vive de par

com acontecimentos políticos dramáticos.

Temos, num primeiro momento, a ida da Corte para o Brasil e a deserti-

fi cação, entre aspas, estadual de Portugal, por contraposição à sua colónia de

além Atlântico. E na sequência do regresso da Corte e da independência do

Brasil, todas as confrontações que, na ascensão das burguesias, determinaram

que, enquanto a Europa pós industrial crescia algures entre 1810 e 1850, nós

vivemos na mais completa estagnação, à semelhança, aliás, do que aconteceu

em Espanha, embora por razões diversas, vivendo acontecimentos e realidades

do mesmo tipo.

E isso adensou alguma coisa com que nós nos confrontamos, hoje, que

muito nos penaliza e que é, efectivamente, a realidade aquém e além Pirinéus.

O gap, o fosso, que não é, efectivamente, nenhum mistério, não é, efectiva-

mente, nenhuma condenação periférica que tenha atingido Portugal e Espa-

nha; teve que ver, efectivamente, com circunstâncias históricas determinadas

e com o modo como, em cada um dos territórios, as coisas evoluem.

Acontece que, algum desenvolvimento agrícola, por um lado, algum

desenvolvimento do comércio ligado a essa realidade agrícola e de uma inci-

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piente banca, que começava a ter ligação aos terratenientes, procedeu-se, com

enormes confrontações, como estarão recordados, na sociedade portuguesa,

procedeu-se à dotação do país de alguma coisa que se percebeu que era essen-

cial para dar um salto para alguma modernidade: e que foi a revolução das

comunicações, na segunda metade do século XIX. Isso mudou tudo. A cir-

cunstância de ter sido possível, entre 1850 e 1890, ligar Lisboa e o Porto, um;

ter caminho-de-ferro entre Lisboa e o Porto, dois; e passar para qualquer coisa

como 10 000 km de estrada, três, alterou completamente o panorama global

do país, e a possibilidade, sendo nós efectivamente um país agrícola, com

um comércio vivendo da agricultura, ma industria extremamente incipiente e

algum crescimento da construção civil à volta destas realidades, da realidade

do comércio e da realidade da propriedade da terra, a possibilidade, dizia, de

se começar a modifi car a fi sionomia do país.

Simplesmente, isto teve consequências: as comunicações trazem às cidades

milhares e milhares de pessoas todos os anos. E trazem milhares e milhares de

pessoas, todos os anos, porque percebe-se que na nova relação entre comércio

e agricultura, não há espaço para o salário e não há espaço para a terra. Aca-

baram os baldios, toda a propriedade se transformou por via do Liberalismo

em propriedade individual, umas vezes pelas boas razões, muitas das vezes

pelas más. E isso signifi cou para hordas e hordas de pessoas que viviam, no

interior, da agricultura, que procurassem afl uir às cidades para novas condi-

ções de vida. Simplesmente a insipiência económica do país não chegava para

todos; e porque não chegava para todos, começa ai a saga da nossa emigração,

isto é, quando se percebe que não é possível dar resposta, nas nossas cidades,

a todo este êxodo rural, começa a emigração para o Brasil. Mas começa por

parte daqueles que a podiam fazer. Um dos fenómenos mais interessantes é

verifi car-se que é rara a emigração a partir do Algarve, que é rara a emigração

a partir do Alentejo, que é rara a emigração a partir do Ribatejo; a nossa emi-

gração é, sobretudo, uma emigração do Minho, da Beira Alta, da Beira Baixa

e da Beira Litoral. E porquê? Porque era efectivamente onde ainda havia, com

algum signifi cado, minifúndio, e onde era, portanto, possível empenhar-se,

ou vender o bocadinho de terra ou o que quer que fosse, para a viagem, para

poder ir para o Brasil, que era, ao tempo, o grande destino de emigração,

contrariamente ao que acontecia no Ribatejo, no Alentejo, no Algarve, onde

a miséria era tão sem esperança, que nem sequer havia dinheiro para se poder

ir para além mar na emigração.

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Ora, se o sistema de comunicações leva a este resultado global, a organiza-

ção política que lhe responde, traz, durante aqueles 50 anos do fi nal do século

XIX, alguma estabilidade, através, como estarão recordados, do partido rege-

nerador e do partido progressista, que se organizaram em termos de criar uma

estabilidade política feita daquilo que era comum na Europa, organizada em

democracias partidárias, e que era o rotativismo. E, portanto, ia governando

o partido regenerador ou o partido progressista, num sistema que compor-

tava, no nosso caso, alguma perversidade, porque se começava por indigitar

e nomear o primeiro-ministro, que depois organizava as eleições e depois as

ganhava, e portanto, o que se passava era um rotativismo combinado, passe

a expressão, em que a alternância se ia dando através deste processo relativa-

mente perverso, e mais perverso ainda porque a aparência de sufrágio directo

era, na realidade, a da existência de um claro sufrágio indirecto, porque todos

os círculos eleitorais, nas suas diversas dimensões, eram controlados pelo

senhor a, pelo senhor b e pelo senhor c. O país era a 80/85% analfabeto, e,

portanto, o resultado eleitoral era aquele que acabava por ser desenhado pelos

vários caciques, e tínhamos, assim, um sufrágio, passe a expressão, directo,

sob o ponto de vista formal, mas que era, realmente, exercido através de um

sufrágio indirecto, o sufrágio do colégio dos caciques que designavam efecti-

vamente as formas de governo.

Apesar de tudo, este tempo foi, também, acompanhado de alguma aproxi-

mação à Europa e de algum dourar, passe a expressão, da vida social.

Não foi sem consequências que se começou a estruturar uma média e uma

alta burguesia; não foi sem consequências que os que conseguiram algum

sucesso na cidade, vindos do campo, constituíram as suas pequenas burgue-

sias; e isso teve consequências ao nível da própria vida social e da própria

paisagem do país.

Não foram só os 10000 km de estradas que passaram a existir no fi nal

do século XX. Surpreendentemente, lá em cima, no norte, havia os palácios

hotel, as termas, é a nova realidade da burguesia ascendente e que leva a essas

formas de organização da vida, já douradas por uma certa qualidade, por uma

certa vontade de manifestação de luxo, de requinte, de cuidado. Aqui perto,

o Palácio Hotel do Buçaco, o Palácio Hotel da Cúria – reparem nas próprias

designações que eram dadas a estas unidades hoteleiras – eram palácios, por-

tanto, procurava-se criar para as burguesias nascentes realidades homólogas

daquelas que aconteciam ao nível da organização do Estado.

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Simplesmente, percebe-se que tudo isto, na paisagem política do século

XIX, não signifi cava poder efectivo para as burguesias nascentes, fosse a alta,

a média ou a pequena burguesia

O domínio da cena política e da cena económica continuava a não lhe

pertencer. Isso ia de par, como referi, com uma taxa de analfabetismo verda-

deiramente assustadora. E ia de par, também, com uma sensação de enorme

desconforto na classe dirigente, e que foi passando para estas burguesias, que

a sentiram como questão sua, com a perda do Brasil.

Nós hoje não temos ideia do que foi, em pleno século XIX, para as cama-

das superiores da organização do Estado e da sociedade em Portugal, a perda

do Brasil, o trauma que isso efectivamente representou, como se tivéssemos

sido amputados daquilo que nos era essencial, e por esse facto era essencial

para a nossa sobrevivência. No entanto, é interessante o modo como os corpos

sociais se defendem, e se defendem com uma enorme rapidez.

Reparem que temos a independência do Brasil, se a memória me não falha

em 22, e não demorou 14 anos – portanto acaba por ser um período relativa-

mente curto – em que na sequência da revolução de 70, não tivesse sido ela-

borado um detalhado relatório, em 1836, sobre o projecto de substituição do

Brasil pelas colónias de África. E começa aqui aquilo que é um dos elementos

essenciais na génese da queda da Monarquia e da implantação da República.

Começa aqui, e começou aqui para nós, o ultimo projecto de Império. Este é o

nosso último Império, e esse projecto foi assumido como um projecto nacional.

Era preciso realizar um Império, a partir do momento em que se tinha per-

dido o Brasil. Acontece que não fomos os únicos a acordar para esta realidade;

e, sobretudo, o Reino Unido, que tinha um poder político extremamente

estruturado e organizado, e que estava na primeira linha da Revolução Indus-

trial, percebeu ali – isto para a linguagem de hoje é mais comum, ao tempo

era menos -, percebeu que todos aqueles mercados e a dominação daqueles

mercados lhes era essencial. E para esse facto tinha que jogar com algumas das

realidades que eram próprias da forma de estruturar esses países.

A primeira foi, obviamente, a da escravatura, que era pedra de toque para a

politica inglesa, porque signifi caria, de forma defi nitiva, a maneira de garantir

a sua supremacia, porque tinha a supremacia tecnológica que lhe permitia

usar mão-de-obra muito barata, com máquinas, e não precisar dos escravos,

enquanto os outros, num estádio de desenvolvimento muito mais atrasado,

continuavam a ter de utilizar a mão-de-obra escrava como uma forma de

manutenção das suas economias.

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Com o poderio que tinham, conseguiram impor isso; e Portugal, perce-

bendo que a sobrevivência das suas colónias também estava dependente dessa

sua, passe a expressão, parceria com o Reino Unido, vai também na primeira

linha de proibição do tráfi co escravo.

Logo em 1836, com a proibição de tráfi co de escravos, de e para nas coló-

nias a sul do Equador, e como é sabido, em 1869, com a abolição em defi ni-

tivo da escravatura. Acontece é que a ambição inglesa era a ambição inglesa;

e a nossa penetração em África, na sequência do projecto de 1836, foi sendo

uma ocupação relativamente tímida, progressiva, mas relativamente tímida,

que a certa altura, isso é sabido também, atinge a zona do Congo. E tendo

atingido a zona do Congo, confl ituava com os interesses franceses, confl ituava

com os interesses belgas, que estavam a começar, queriam ter terreno para

além do seu exíguo território na Europa. E eclode, como também todos sabe-

mos, o confl ito a propósito do Zaire, que a Inglaterra medeia a nosso favor

através do Tratado de Ambriz, e em que nos dá a possibilidade de sermos nós

a controlar a situação.

Vitória e ganho de grande precariedade, porque tendo nós percebido que

era, efectivamente, importante fazer as coisas de modo diverso, e que não se

poderia estar em sucessivas alterações, com o que nenhuma politica colonial

se sustentava, emparceirámos com as várias potências europeias para tentar

resolver estas questões. E aparece, todos sabemos também, a conferência de

Berlim e o modo de organização da partilha de África à volta destas potências

– Alemanha, Bélgica, Holanda, Portugal e Reino Unido.

Acontece é que, duma forma relativamente obscura, mas efectiva, havia,

no âmbito das nossas convenções com a Alemanha, uma zona entre a Costa

de Angola e a Costa de Moçambique, sombreada a cor-de-rosa, e que nós

reivindicávamos como zona nossa. E reivindicávamos como zona nossa de

uma maneira, aliás, inteiramente razoável, porque no direito internacional

do tempo, o que dava direito a ter colónia, era efectivamente a primazia da

descoberta. E, portanto, nós, com base no título descoberta, continuávamos

a reivindicar aqueles territórios, que eram os adjacentes às terras que tinham

sido por nós descobertas, e nas quais, aliás, tínhamos efectivamente estado.

Há uma inércia inicial por parte do Reino Unido, que tinha o projecto,

como é sabido também, de ir desde o Cairo até à Boa Esperança, atraves-

sando a África inteira. Nós tivemos o projecto, e estávamos a realizá-lo, de ir

caminhando pelo interior de África, de Angola à contra costa, portanto, do

Atlântico para o Indico.

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Os ingleses sentem-se, e percebia-se porquê, feridos com esta política, que

lhes impossibilitaria a ligação Cairo – Cabo da Boa Esperança. E em 11 de

Janeiro de 1890, da parte da manhã, intimam o governo português a que, até à

tarde desse dia, retire de junto do Rio Chire as tropas que aí se encontravam já

do outro lado da costa africana. Com uma canhoneira fundeada no Tejo, para

alegadamente bombardear Lisboa, se o governo não cedesse ao ultimato inglês.

O governo cede, o rei cede.

Isso foi motivo de luto nacional, foi o choque, a humilhação, de, efecti-

vamente, ter o País que se defrontar com uma potência estrangeira a impor-

-nos um comportamento no âmbito daquilo que era um projecto nacional.

E nós argumentávamos, e argumentávamos, aliás, com alguma procedência,

aceitando a nova realidade do direito internacional de que o que valia era a

ocupação efectiva; e argumentávamos que por todo aquele território havia

fortalezas portuguesas, embora em ruínas, mas fortalezas portuguesas, ao

que, com alguma graça, reconheçamos, mas com enorme cinismo, os ingleses

respondiam: fortalezas em ruínas só provam soberanias arruinadas. Efectiva-

mente, perante a força do ultimato, não foi possível resistir; e no quadro exis-

tente ao tempo, fulanizou-se a responsabilidade. Como o rei cedeu, quem era

responsável pela cedência ao ultimato britânico era, realmente, a Monarquia,

era, efectivamente, o rei.

O sobressalto nacional foi tal que, composta para uma revista do tempo,

A Portuguesa se transformou numa canção popular, representando, como

representa, a forma possível de revolta, e de revolta popular, contra o ultimato

britânico e aquilo que ele signifi cava para nós.

Esta aparência de organização política que o rotativismo trazia consigo,

por um lado, o Ultimato Inglês, por outro, e a circunstância de as burguesias

quererem encontrar forma adequada de terem efectivamente o poder político

estimulam a criação do partido republicano e o movimento no sentido de

instaurar a República.

O movimento que, aliás, tinha contágio europeu. A questão não era nossa,

era uma questão europeia. A Espanha tinha tido o seu movimento republi-

cano em 68, a França tinha tido a sua República em 70, não se tratava de

uma coisa que estivesse a acontecer aqui assim, entre nós, como se fossemos

uma singularidade na Europa. Não. Na zona, este era o ar e o movimento do

tempo.

E depois. ao poder económico das novas burguesias sucedeu, necessaria-

mente, a formação universitária dos seus fi lhos. Donde, o que acontece é

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que nos anos 70, 80, 90 do século XIX, começam a surgir gerações, umas

atrás das outras, universitárias, provindas, grande parte delas, da burguesia,

muito pouco da aristocracia ou da fi dalguia, como se lhe quiser chamar, e

que estavam politicamente a beber as doutrinas do tempo, e politicamente

preparadas para exercer o poder. E o poder era, efectivamente, um poder que

não se compadecia já, na sua concepção, com a irracionalidade que resultava

de se ter uma organização do Estado em que o chefe de Estado, era chefe do

Estado por ser fi lho do seu pai. Isto era alguma coisa que chocava profunda-

mente a racionalidade positivista. E isto apesar da enorme lucidez de alguns

homens com grande importância no partido republicano, como é o caso de

um estrangeiro, mas um estrangeiro que estava entre nós, o José Fontana, que

diz esta coisa sobre a qual vale a pena meditar: o regime político não tem a

menor importância; o regime político não tem a menor importância, eu vivi

na Suíça, que tem uma República e a dominação é a mesma, o importante é

o regime económico. Isto é, também nesta altura, já havia a ideia de que não

é, necessariamente, pela forma de regime, se dá maior ou menor libertação,

maior ou menor democracia. Tem de se ter em conta as circunstâncias histó-

ricas de cada país, em cada momento. E explicitarei em devido tempo porque

é que me parece que é exactamente assim, e que é exactamente por isso que eu

hoje não sou monárquico, nem penso voltar a sê-lo. Mas é exactamente por

isso, não é por nenhuma mística, ou por pensar que as coisas não podem ser

de outra maneira É porque a História é o que é, e tem que se tirar as lições da

História, e perceber a sua relatividade.

Ligada, e esse era alguma coisa do tempo, ligada à ascensão das burguesias,

à ideia de império, à ideia de poder, aparecia de um modo muito forte, e só

podemos avaliar pelo que foi sendo escrito e pelo que foi sendo feito duma

forma muito sincera, uma disseminação de alguma coisa que até ai não havia,

sobretudo, não havia dessa maneira – o Patriotismo. Que é uma coisa essen-

cial, é essencial no último quartel do século XIX. Aparece com enorme força,

com enorme signifi cado, a ideia de que há uma Pátria, de que há uma Pátria

Portuguesa, e de que é preciso fazer alguma coisa pela Pátria Portuguesa, e

que o rei e a Monarquia não estavam a fazer. E essa é uma ideia fortíssima, e

é uma ideia fortíssima que vai buscar ao século XVI um herói – Camões. E é

por isso que no 3º Centenário da morte de Camões, há uma enorme explosão

urbana de patriotismo em todo o País, que culmina no célebre cortejo do

Centenário, em Lisboa, que é uma proclamação dos valores da burguesia, da

liberdade, da democracia e da Pátria. Mas muito claramente pelo elogio da

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agricultura, pelo elogio do comércio, pelo elogio do Império, é um projecto

da burguesia portuguesa que aposta fortemente em Camões, como símbolo

da ideia de Pátria, por um lado, e como mística coadjuvante de um projecto

político que estava em marcha. Isto dá uma enorme força a que se pudesse

passar ao acto; e passa-se. No Porto, em 31 de Janeiro de 1891, é o primeiro

acto cruento, digamos assim, de tentativa de implantação da República, que é

subjugada com … vítimas. As coisas acabam por ter algum interesse pessoal:

um tio-avô meu, entre 15 irmãos, que era etnólogo e etnógrafo, entra no 31

de Janeiro, e por esse facto exila-se no Brasil, onde faz, como arquitecto, a São

Paulo do princípio do século XX Tem, hoje, no Porto, a Rua Ricardo Severo,

como uma forma de homenagem à sua intervenção.

O 31 de Janeiro é isso, é uma grande revolta republicana, que é subjugada

de uma maneira crudelíssima, e que faz as primeiras vítimas, e as primeiras

vítimas motor de um movimento que haveria de ocorrer 19 anos mais tarde.

O rotativismo de que falei tinha-se esgotado, como era próprio de um

sistema tão formal, numa sociedade que queria mudar e em que vivia uma

dinâmica extremamente forte. O estertor fi nal é a ditadura de João Franco,

quando o rei, defrontado com a situação existente no âmbito da desorganiza-

ção do Estado, confere a João Franco o poder para formar governo e organi-

zar, num primeiro momento, eleições, num segundo momento, para governar

em ditadura. E como era próprio em face de vencedores e derrotados, são

os dissidentes do partido progressista, que tinham sido derrotados com esta

medida que o rei tinha tomado, que se vão juntar ao partido republicano para

procurar derrubar o regime.

Há um movimento conhecido, em 28 de Janeiro de 1908, que aborta, de

novo com uma repressão crudelíssima, e que só não tem consequências, todos

somos capazes de perceber, porque 4 dias depois, à revelia, tanto quanto se

pode perceber, à revelia relativa tanto quanto se pode perceber, do directório do

partido republicano, o rei e o príncipe real são assassinados no Terreiro do Paço.

Segue-se um período perturbadoramente angustiante, que são os 2 anos de

governo do rei D. Manuel, sob essa designação, que não é carne nem peixe,

de “a política ou o governo da acalmação”, percebendo-se que o país já não ia

por ai, já não podia ir por ai. Depois de tudo o que tinha acontecido o país já

não poderia ir por essa via, e alguma mudança iria ocorrer necessariamente; e

ocorreu, no curso desses 2 anos, em 5 de Outubro de 1910.

Não injurio nem Regime, nem História, se disser que se trata de uma

revolta de algum proletariado urbano, da pequena e média burguesia urbanas

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e de alguns sectores do exército. Todos sufi cientemente operativos para terem

podido implantar a República. Mas não é, na sua implantação, e enquanto

movimento, um movimento popular nacional. Não foi. Bem se percebe, por

isso, que a abordagem vanguardista que todos estes sectores tinham não lhes

fi zesse correr o risco de plebiscitar a República, o que os monárquicos sem-

pre reivindicaram. Em termos de realidade histórica, percebe-se que isso não

tenha sido feito: a República, se fosse plebiscitada, teria perdido, mas teria

perdido porque o País era controlado, globalmente, pelo que de mais de reac-

cionário havia no País inteiro. E, portanto, o movimento só tinha sido pos-

sível porque havia um movimento de vanguarda que ia na primeira linha da

modifi cação das condições globais.

Teria sido possível uma evolução diversa da Monarquia Portuguesa, em

termos tais que não tivesse sido inevitável a implantação da República? Não

faço a menor ideia; não se consegue perceber se as coisas podiam ter sido

assim, ou diferentemente. Essas formas de prognose para o passado são muito

mais, desculpem a expressão brejeira, são muito mais fezadas do que inter-

pretações com o mínimo de fundamento. Mas podem trazer-nos para hoje,

e essa é a sua pedagogia mais importante, podem trazer-nos para hoje uma

ideia extremamente operativa, e que foi exactamente a razão pela qual, com a

mesma sinceridade com que foi monárquico, deixei de o ser.

O que é que foi sempre entendido, entre monárquicos, como a suprema-

cia do regime monárquico sobre o regime republicano? Tal supremacia resi-

dia, essencialmente, no seguinte: a chefatura do Estado deve coincidir com a

chefatura da Nação, um; a chefatura do Estado e a chefatura da Nação não

deve ser ideológica e deve corresponder à vontade do todo nacional, dois.

A expressão democrática do voto e a organização democrática do Estado faz-

-se ao nível do Estado, imediatamente abaixo da chefatura do Estado, que

é uma representação da unidade nacional e da unidade do Estado. Aquele

que detenha poder apenas por ser fi lho de seu pai, e assim foi na História,

não tem o seu poder unitário dependente de quem quer que seja, e existe e é

aceite como quem respira, passe a expressão. Ninguém põe em causa se é ou

se deixa de ser; existe, é assim. Tem apenas o poder de representar a unidade

do Estado, de representar a Nação, de ter o cuidado de.

Isto representa uma enorme irracionalidade? Representa com certeza, isto

é, ter-se o poder pelo facto do nascimento, representa, efectivamente, uma

enorme irracionalidade, mas pode ser uma irracionalidade fecunda e opera-

tiva na História, depende do modo como nela vive. E eu dou um exemplo

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para se perceber exactamente o que quero dizer: eu sou de uma família muito

numerosa, tenho mais 8 irmãos, dezenas de sobrinhos e sobrinhos netos e

por ai fora; somos uma família muito numerosa, muito numerosa, e de tios

e de primos, são efectivamente algumas centenas, mesmo, de pessoas. E há

um tempo, refi ro-me há 25, 30 anos, mais ou menos, a pessoa mais velha da

família, que foi tendo 90, 91, 92, 93, 95, 96, 98, 99, morreu à boca de ter

100 anos. Ouvia muito mal, muito mal, via pessimamente, mantendo, toda-

via, uma grande lucidez: Era uma pessoa normalmente inteligente, com um

normal bom senso: Enquanto ela existiu não houve o menor confronto, nem

a menor dissensão no seio da família. Dissensões e confrontos começaram

um ano depois da senhora ter morrido. Como se houvesse um cimento, uma

forma de coesão, uma forma de agregação que não era reconduzível a nenhum

discurso racional, mas que funcionava efectivamente.

O que é que eu quero dizer com isto? Se um determinado povo vive e

convive com uma chefatura nacional e de estado, que tem estas característi-

cas de designação por nascimento, e não a põe em causa – , este é o ponto

essencial – e não a põe em causa, vive com ela como quem respira, isso pode,

efectivamente, signifi car um momento e uma forma exemplar de realização

da unidade do Estado e da Nação, se e enquanto for assim. E portanto, neste

quadro. o Rei e a Monarquia são, claramente, um produto da História, nas-

cem na História, vivem na História: E o que é que acontece – com isso eu me

defrontei em 1975 – , o que é que acontece, 65 anos depois? O que acontece

65 anos depois é que a questão Monarquia – República, deixou de poder

ser considerada, quer enquanto República, quer enquanto Monarquia, como

alguma coisa que toda a gente aceita como quem respira, e portanto, passou

a ser …, uma questão ideológica. E tendo-se transformado numa questão

ideológica, passou a ser, saudavelmente, mas passou a ser, um factor de con-

frontação. E portanto, aquilo que fundava a legitimidade histórica do Rei e

da Monarquia, que era a aceitação global, como quem respira, e portanto,

a natureza não ideológica do seu poder, transformou-se numa … questão

ideológica e em que o poder, se fosse reinstaurada nestas circunstancias uma

Monarquia, seria, necessariamente, ideológico, necessariamente de confron-

tação. Donde, destruía na base aquilo mesmo que justifi cava historicamente

a Monarquia. Permitindo então dizer: a Monarquia que nasceu na História,

morreu na História; e não tem importância nenhuma que tenha sido assim.

Nasceu na História, viveu na História, morreu na História, agora o tempo

é outro. Onde é que está o preconceito? O preconceito está em divinizar a

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República ou a Monarquia, ou em diabolizar a República ou diabolizar a

Monarquia. Elas corresponderam a aspirações, abordagens, formas de estar e

formas de organização diversas, de diversos tempos históricos, não são neces-

sariamente a verdade defi nitiva e absoluta até ao fi m dos tempos.

Eu não faço a menor ideia se a República será até ao fi m dos tempos a

forma de organização dos Estados. Não faço a menor ideia. É a deste tempo,

hoje; e essa é exactamente a historicidade da República, porque apelar contra

ela, hoje, é apelar contra os valores a que aparece associada: liberdade, demo-

cracia, ética, solidariedade, tudo aquilo que não lhe sendo essencial, porque

podia não ser assim – há ditaduras e as mais violentas que são repúblicas. – lhe

é próprio.

Aparecendo associada a ela todas estas realidades, vale a pena terem-se

conglomerado na história com essa designação unitária, República, a ética

republicana, que representar estas coisas todas, que lhe são próprias, mas não

lhe são essenciais, que lhe são próprias, e são historicamente próprias, para

poderem ser bandeira. E essa é a enorme importância, a enorme importância

deste Centenário, que não é diabolizar a Monarquia deposta em 1910, nem

divinizar a República que ocorreu entre 10 e 26. Só se nós fossemos completa-

mente tontos, tontos na abordagem serena da realidade, 800 anos de História,

que têm as mais diversas realizações consoante cada momento histórico: os

16 anos de 10 a 26 tiveram realizações magnífi cas, com as perversões mais

espantosas e com os crimes mais hediondos; e não tem importância nenhuma

que tenha sido assim. Essa é a realidade da História: não há santos e demó-

nios na História, temos que rever, de um modo defi nitivo, essa abordagem

religiosa da História, em termos de divinizarmos ou diabolizarmos situações.

E só quando formos capazes de olhar com alguma serenidade para a História,

na Monarquia, na República e no tempo de hoje, é que podemos neste Cen-

tenário, aproveitar de pleno as virtualidades, e aqui sem nenhuma hesitação,

do ideal republicano, ideal republicano concebido como este conglomerado

que liga a designação do chefe de Estado a toda uma organização da sociedade

e a toda uma fi losofi a de vida. Nisso vale a pena. Por isso eu, hoje, sou, sem

nenhuma traição, republicano. E +e por isso que não renego um milímetro

do meu passado monárquico e da forma sincera como o vivi, porque temos

as nossas evidências diversas em cada momento. Só em 75 se me tornou evi-

dente que era pelas razões porque eu era monárquico que eu tinha de deixar

de o ser. Porque aquilo porque eu era monárquico, a unidade do poder real,

e o poder real vivido como uma respiração, tinha deixado de existir na Histó-

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ria, e portanto, aquilo que era a sua voz, tinha desaparecido. Donde, eu não

podia ser por alguma coisa que não tinha suporte histórico para existir. Mas é

exactamente isso que hoje se pode, com uma enorme serenidade, sem ser, por

oposição ao Estado Novo, nem para diabolizar o que quer que seja, acarinhar

a República e pode dar, não como uma proclamação, mas como alguma coisa

que dizemos para dentro de nós próprios, quase em silêncio: Viva a Repu-

blica, para dentro, para dentro de nós próprios, que é para viver muito mais o

ideal do que para uma proclamação confrontativa.

Muito obrigado.

Miranda do Corvo, em 17 de Abril de 2010

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CAMINHOS ESQUECIDOS, DA IGUALDADE

À FRATERNIDADE

jaime ramos

Quando comemoramos os cem anos da República não podemos ignorar

o passado ou pintá-lo com as cores do nosso agrado.

Estamos na terceira república. Houve a primeira que falhou essencial-

mente por razões económicas e uma segunda, com o estado novo, assente

numa ditadura.

Esta terceira república também não é um bom exemplo. Basta pensar na

economia do país, na situação fi nanceira do Estado, nas desigualdades sociais

e na falência moral do regime para termos a noção de crise nacional.

A melhor forma de comemorar os cem anos de Republica será pensar

como a vamos reabilitar e renovar para que cumpra a sua missão de melhorar

a qualidade de vida dos portugueses.

Sou republicano. Nasci numa república.

Não me agradaria viver numa monarquia mas reconheço que há muitos

regimes monárquicos, em países com níveis de vida, valores éticos e práticas

de cidadania, muito melhores que o que temos conseguido em Portugal.

É evidente que entre uma monarquia democrática e uma ditadura repu-

blicana prefi ro a monarquia democrática. A liberdade e a democracia são os

valores fundamentais.

Um regime não se escolhe só pelo seu sucesso. Uma ditadura mesmo que

temporariamente próspera é sempre condenável. Acredito que uma democra-

cia, no mesmo país e nas mesmas circunstâncias fará sempre melhor que uma

ditadura.

É uma questão de fé. Nunca podemos comparar regimes. Não pode-

mos pôr uns a governar e depois rebobinar o tempo, voltar para trás, e fazer

experiencia com outros governos, para comparar resultados. Mas a verdade

história mostra que todos os grandes sucessos assentaram na liberdade e na

democracia. Todos os grandes desastres pertenceram às ditaduras, do nazismo

ao estalinismo.

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Sou um homem com fé, na democracia e nos homens. Por isso sou repu-

blicano.

Sou republicano por uma questão de legitimidade e igualdade de direitos.

Não considero que o fi lho de um professor universitário seja necessaria-

mente um bom professor. Por isso as cátedras não se herdam. Um professor

genial não pode deixar em testamento o seu lugar ao seu fi lho.

Todos percebemos que seria o fi m de uma Universidade e da sua capaci-

dade científi ca tolerar este princípio de passagem de uma cátedra de pais para

fi lhos.

É o mesmo principio que me impede de considerar que o fi lho de um esta-

dista seja necessariamente um bom estadista. Choca-me que se herde o direito

a chefi ar um povo só por ser fi lho do pai.

Desafi o-os a pensar noutras legitimidades semelhantes.

Um professor não pode deixar a cátedra ao fi lho, que conquistou ou cons-

truiu com saber e trabalho, mas se ele tivesse constituído uma fortuna ou uma

empresa já a poderá deixar aos descendentes.

Todos percebemos que os pais trabalham para deixar o património que

poupam aos seus descendentes. Todos sabemos que não levamos bem mate-

riais para a cova mas, mesmo assim, muitos de nós esforçam-se por poupar

muito mais do que precisam. Porquê? Porque ambicionamos deixar os des-

cendentes numa melhor situação económica.

Não queremos que um rei deixe o trono ao fi lho, que um presidente de

câmara deixe o cargo ao fi lho e impedimos o professor de deixar a cátedra.

Um juiz não deixa o “seu” tribunal ao primogénito.

Será legitimo que os fi lhos dos muitos ricos não precisem de trabalhar

bastando-lhes a herança?

Todos nós aceitamos que um descendente herde dos seus pais. Mas será legi-

timo que, a partir de certos valores a herança ou doação, não seja fortemente

sobrecarregada com taxa fi scal em vez de ser isenta ou com taxa reduzida?

Hoje em Portugal um indivíduo pode herdar a maior fortuna fi cando isento

de pagar imposto. Se herdar sem ser dos pais paga 10% de imposto de selo

independente mente do montante. Em percentagem tanto paga o rico como

o pobre. Nestes casos a igualdade gera injustiça e favorece os mais fortes.

Um chico-esperto desonesto pode construir uma imensa fortuna, mesmo

que assente em actividades criminosas. Pode deixar a fortuna assim amea-

lhada aos fi lhos sem que estes paguem qualquer imposto. Não precisa de fazer

qualquer branqueamento. Basta uma herança livre de impostos para que os

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herdeiros nada tenham que justifi car, nem de contribuir para a sociedade.

Basta-lhes viver dos rendimentos. Será legítimo? Será justo?

Quando se vai ao bolso dos pobres, obrigando-os a pagar imposto para

pagar o buraco do estado, agravado pelos subsídios à banca, será aceitável que

as heranças de grandes fortunas não paguem imposto?

É pena que hoje em Portugal não se discuta politica e ideologia mas só

casos de contabilidade ou pequena política.

Sou republicano porque quero que um povo possa escolher em liberdade

os seus líderes. Não aceito que seja uma corrida de espermatozóides a escolher

o chefe do estado.

Considero que é importante que todos os cidadãos tenham o direito a se

candidatar.

É uma questão de legitimidade e igualdade.

Pergunto-me: será a nossa democracia legítima e assente na igualdade?

Defendemos o principio de um homem um voto. Mas em Portugal não

respeitamos igualmente a vontade de todos.

A pessoa que decide votar branco ou nulo mostra uma clara opção. Não

quer nenhuma das opções em jogo. Qual a razão porque não respeitamos essa

vontade?

Nas diferentes eleições os votos brancos e nulos deveriam contar e ele-

ger/não eleger, lugares vagos no Municípios, nas Juntas, na Assembleia da

Republica.

De acordo com a vontade expressa pelos eleitores será exigível que o que-

rer dos eleitores tenha consequências, impedindo que sejam eleitos todos os

lugares disponíveis. De acordo com a proporcionalidade deviam fi car lugares/

cadeiras vagas, representando estes votos.

Igual representatividade deverá ser concedidas aos abstencionistas. Estes

também exprimem o seu desinteresse, a sua falta de vontade em se compro-

meterem. Os não votos dos abstencionistas também devem contar, obrigando

a fi car lugares vagos nas diferentes eleições. Esta solução, para além de garan-

tir igualdade aos eleitores, pune todos aqueles que burlam a realidade dos

cadernos eleitorais, aumentando representatividade fi ctícia, não anulando,

não dando baixa, por exemplo, dos eleitores mortos. Os eleitores falecidos

continuam escandalosamente a contar para que as câmara a e juntas elejam

mais autarcas e tenham maiores subsídios. São os mortos dos cadernos eleito-

rais que garantem melhores salários a alguns autarcas no país. É um escândalo

que será rapidamente corrigido se respeitarmos a vontade dos abstencionistas.

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O aperfeiçoar da democracia exige que todas as escolhas, todos os votos, e

não votos, devem contar.

Mas, se a democracia deve ser um objectivo sempre a aperfeiçoar, que

assente na igualdade, qual a razão porque hoje em Portugal, e na Europa,

continuamos a recusar o direito de voto a muitas pessoas?

Hoje rimo-nos, incrédulos, quando olhamos para trás e vemos que há

bem pouco tempo as mulheres não podiam votar. Hoje seria ridículo alguém

defender a recusa do voto  às mulheres, mas é verdade que, com o nosso silen-

cio, ainda há países no Mundo onde isso se passa e, até alguns, onde elas são

mutiladas para não terem prazer sexual.

Qual a razão porque impedimos jovens e crianças de votar e ter represen-

tatividade eleitoral? Porque não contam para a democracia? Porque violamos

a igualdade reduzindo a legitimidade democrática?

Um jovem de 16 anos pode fi liar-se num partido, fazer propaganda eleito-

ral, colar cartazes, assistir a comícios, vaiar ou aplaudir. Pode consumir álcool

mas não pode votar.

Um jovem de 16 anos pode legalmente decidir ter relações sexuais e casar,

constituir família e gerar descendentes, mas achamos que não tem discerni-

mento para votar. O que é mais importante votar ou fazer fi lhos?

Mas voltando ao voto das crianças. É evidente que acho que uma criança

ou um bebé não tem sabedoria, nem espírito crítico que lhe permita fazer

escolhas eleitorais e opções políticas.

Mas será legitimo que a democracia prescinda destas pessoas? Uma pessoa

não deixa de ser pessoa por ser criança.

Nas eleições escolhemos o futuro que queremos. Na actual democracia

a escolhas de futuro podem ser feitas por pessoas de muita idade, que mui-

tas vezes já não viverão para saber as consequências das suas escolhas… Mas

não damos o voto àqueles que, seguramente, vão sofrer as consequências das

escolhas.

Na nossa democracia um muito idoso tem o direito a escolher um futuro

que não viverá. A criança não tem o direito de se fazer ouvir para um amanhã

que, em princípio, será o seu.

Julgo que é legitimo conceder o direito de voto a todas as pessoas, incluindo

as crianças. Como elas não têm a tal sabedoria, que é necessário ter para fazer

escolhas, os seus pais deviam ter o direito a votar por elas. Se um pai tem o

direito afazer escolhas pelos fi lhos, escolher a escola, a residência, o médico,

etc., porque não fazer opções políticas por elas?

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No futuro todas as pessoas vão ter igual direito de votar. No futuro vamos

ter uma democracia diferente, mais jovem, mais preocupada com o futuro.

Uma democracia mais legítima.

É evidente que ser eleitor é diferente de ter o direito a ser eleito. Para Presidente

da República é preciso ter 35 anos mas todos os maiores de 18 já votam. Não

defendo a eleição de crianças, até porque já há demasiados garotos na política,

mas sim o direito a que os pais usem o seu voto para escolher o melhor para elas.

A democracia não tem de ser o que nos habituamos que seja. Podemos descobrir

formas para a aperfeiçoar, para lhe reforçar a legitimidade, para que toas as pes-

soas, novas ou velhas, sejam mais iguais nos direitos. Temos esta obrigação.

Temos que respeitar todos o votos mesmo aqueles que não se exprimem. Um

voto, uma pessoa deve incluir todas a s pessoas e não só algumas.

Sou republicano e cristão. Acredito que os valores da liberdade, igualdade

e fraternidade devem nortear todas as comunidades.

Não há dúvidas que vivemos em liberdade. É evidente que há sempre

pequenas restrições e constrangimentos, mas a liberdade é de facto uma con-

quista sedimentada na nossa vivência, garças á terceira república, instalada

depois do 25 de Abril.

Mas não temos a igualdade nomeadamente no que respeita ao direito de

voto e, infelizmente, em termos materiais somos cada vez mais desiguais.

Em Portugal tem crescido o fosso entre os mais ricos e os pobres. Hoje

somos o mais desigual ou pelo menos um dos mais desiguais dos países da

União Europeia.

Facto mais grave porque esta desigualdade tem sido agravada por gente que

se diz defender a igualdade.

Deste 95, há já 15 anos, somos governados pelo partido socialista, com

excepção do curto período Durão/Santana, um partido que afi rma promover

a igualdade. Esta diferença entre o que se promete e o que se pratica é um

dos maiores pecados da nossa democracia e mina a credibilidade da política.

Gente que se vende com o rótulo da igualdade promove a desigualdade e a

injustiça em vez da justiça social.

É um escândalo que alguns tenham salários e /ou rendimentos perfeita-

mente escandalosos.

Um qualquer fedelho, sem experiência de vida, sem ter especiais qualida-

des, só porque tem padrinhos certos, pode ser nomeado gestor de uma impor-

tante empresa onde passa a ganhar fortunas pornográfi cas, como se verifi cou

recentemente na PT.

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O que me choca é que em Portugal nós tenhamos perdido carácter. Tor-

namo-nos em gentinha que tudo aceita.

Um número crescente cala-se sempre que os políticos do partido com que

simpatiza estão no poder.

Fazem asneiras. Mas calam-se. Há suspeitas de corrupção e silenciam-se.

Há erros gravíssimos mas desculpam os seus camaradas ou companheiros.

Para justifi car este amorfi smo acrítico acabam por afi rmar que são todos

iguais.

É grave que digamos que “São todos iguais”. É falso que sejam todos iguais.

É evidente que fedelhos oportunistas existirão em todos os partidos. Gente

sem escrúpulos, corruptos e incompetentes há em todos os partidos e em

todas as profi ssões.

Mas temos que obrigar os políticos sérios a não se misturar com os

corruptos.

Se dizemos “são todos iguais” estamos a nivelar por baixo. Estamos a dizer

aos sérios que não vale a pena ser sérios porque nós os condenamos com o “são

todos iguais”. Com o “são todos iguais” estamos a promover a incompetência

e a corrupção.

Se um Deputado rouba gravadores a jornalistas temos de exigir que os

outros o punam e o marginalizem.

Se um politico em vez de estudar e trabalhar, comprar com compadrios

uma licenciatura ou um doutoramento, temos de o castigar e afastar.

Temos de ensinar que os jovens devem ser promovidos por mérito. Que a

escola deve incentivar o rigor e o trabalho. Não podemos tolerar políticos que

construíram a sua vida com “amiguismos” e facilitismos. O nacional porrei-

rismo, que tudo tolera, tem de acabar.

Se queremos mérito temos de condenar a cunha. Um chefe que fez a

carreira através da cunha nunca poderá dar o exemplo nem exigir trabalho

honesto, nem saberá reconhecer o mérito.

Hoje temos uma democracia de baixo nível mas nós somos culpados por-

que  prescindimos da nossa liberdade para criticar e não usamos o nosso voto

para afastar os piores.

SE nós queremos os melhores como Presidente da Republica e como Pri-

meiro-ministro como podemos aceitar que subalternos ganhem muito mais

que eles?

Como é que um gestor de uma pequena empresa pública pode ganhar

mais que aqueles que o nomeiam?

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Isto não acontece só no Governo. A nível das autarquias acontece o mesmo.

O gestor de uma empresa municipal ou intermunicipal ganha frequente-

mente mais que os autarcas que elegemos.

Como é isto possível?

Como é possível que tenhamos reformas muito baixas, insufi cientes para

uma vida digna e aceitemos que outros tenham reformas concedidas pelo

estado de valores obscenos.

Como é possível que sem nos indignarmos aceitemos que alguns tenham

varias reformas e subsídios vitalícios, com valores milionários, concedidos

pelo estado, enquanto outros se tem de contentar com valores insufi cientes

para uma vida digna?

Como é possível quer haja quem acumule várias pensões, reformas e sub-

sídios vitalícios, todos atribuídos pelo estado, enquanto outros são obrigados

a sobreviver com pouco mais de duzentos euros por mês.

Como é possível que tenhamos um salário mínimo baixíssimo e se con-

tinua a admitir que gestores do estado tenham salários de milhões de euros?

Como podemos votar em políticos que mantêm esta situação e são culpa-

dos por estas opções?

É preciso dizer que esta terceira republica viola os princípios da igualdade

e da fraternidade.

Não basta dizer que somos todos iguais. Não basta dizer que se é pela

igualdade.

Não é por ser maçom que um indivíduo defende a liberdade a igualdade e

a fraternidade. Tem de o mostrar no seu dia-a-dia.

Não é por uma pessoa se dizer católica que pode deixar de respeitar os

valores cristãos de amor aos outros. Tem de o mostrar.

Não basta dizer-se social-democrata ou afi rmar-se socialista. Tem de actuar

em conformidade.

Como é possível que as pessoas tenham votado num partido socialista e

sejamos hoje o mais desigual dos países europeus?

Ninguém é responsável? Vamos todos continuar a tolerar esta hipocrisia?

Uma coisa é sermos tolerantes, outra permitir poucas vergonhas. E a polí-

tica em Portugal, tal como a justiça, está ao nível da absoluta falta de vergonha.

Recentemente soubemos que uma fi gura pública recebeu milhões para almo-

çar com o Primeiro-ministro. OS que lhe ofereceram os milhões vão ser julga-

dos por corrupção. Ele que se vendeu não é arguido porque, coitadinho, não

sabia que estava a lidar com uma empresa de capitais públicos, dinheiro nosso.

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Recentemente vimos que um empresário corrupto, que comprovadamente

tentou comprar um vereador em Lisboa, foi ilibado com a desculpa que o

vereador era incompetente para lhe fazer o jeito.

Os julgamentos mediáticos arrastam-se anos sem uma qualquer conclusão.

Todos temos a sensação que há em Portugal pessoas acima da lei e da justiça.

Isto indicia uma justiça de fantochada.

Isto não é ética republicana nem moral cristã. Isto é um sistema de justiça

ao serviço de mafi osos, cujos magistrados não se dão ao respeito e se escon-

dem em formalismos jurídicos, claramente insensatos, que visam defender os

criminosos.

Isto acontece porque temos más leis e vivemos numa república de juízes

sem experiencia de vida. Os juízes não podem ser crianças recém licenciadas.

Um juiz devia ter um curriculum, com experiencia jurídica e de vida, em

profi ssões ligadas à justiça. Um juiz devia antes ter experiencia como pro-

fessor, advogado, notário, jurista, consultor, gestor, polícia, magistrado do

ministério público, entre outras profi ssões. Só depois devia poder concorrer à

função de juiz, com adequada formação complementar.

Os magistrados, juízes e do ministério público devem ter legitimidade

democrática. Não podemos ter Procuradores transformados em abafadores

e apagadores de escutas. O Procurador Geral da republica deve ser eleito por

maiorias qualifi cadas na Assembleia da Republica, com um mandato limi-

tado e os procuradores regionais ou distritais devem também ter legitimidade

democrática no mínimo com votação na Assembleia de Republica ou em

assembleias regionais.

Sem uma justiça efi caz, célere, que trate todos por igual Portugal não se

pode desenvolver.

Esta Republica tem de cuidar da justiça. A Republica tem de criar uma

Justiça com uma maior legitimidade democrática.

Caros amigos

Numa qualquer sociedade, o sistema de educação é o melhor veiculo para

permitir a igualdade de oportunidades. Num sistema de castas, de que é

exemplo mais gritante a índia, quem nasce nas elites vai ser sempre das elites,

quem nasce na pobreza vai sempre ser condenado às piores profi ssões.

Chocam-nos estes princípios a nós que somos cristãos. O sistema de ensino

deve ser uma prioridade vocacionada para permitir que qualquer pessoa possa

estudar e trabalhar para poder vir a ser tudo o que desejar e for capaz.

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É pela educação que se pode promover a mobilidade social e lutar contra

a estratifi cação social.

Infelizmente nos últimos nãos o ensino tem vindo a degradar-se a um nível

inaceitável. Uma escola deve ser o local onde se ensina disciplina e deve pro-

mover o gosto pelo rigor, pela seriedade, pelo trabalho.

Nada disso se verifi ca na nossa escola. A disciplina deu lugar ao abandalha-

mento. Cada vez se ensina e se exige menos. Num recente prova nacional de

aferição exigiu-se as crianças do sexto ano que soubessem calcular o quarto de

oito. Esta é uma exigência a fazer a uma criança de 6 ou 7 anos, não a um ado-

lescente de 12. Os políticos para terem bons resultados estatísticos aceleram o

desastre da escola. Não só criámos o 12ºano, sem escola e sem exames, como

temos um primeiro-ministro, que fez a licenciatura num fi m-de-semana.

A educação pública deve ter como primeiro objectivo detectar os melhores

de nós, as crianças mais dotadas, mais inteligentes, com maiores capacidades

de trabalho.

Devia ser como no desporto. Permite-se a todos que experimentem todas

as brincadeiras, todas as modalidades, mas, a seguir, vamos conseguir que

aqueles que são melhores na corrida compitam entre si, que aqueles que são

melhores no futebol joguem entre si.

Veja-se o processo de selecção no futebol. O Ronaldo nasceu na Madeira

num bairro de famílias pobres. Não o obrigaram a fi car na Madeira a jogar

com os vizinhos. Quando alguém, um professor/olheiro descobriu que ele

tinha jeito trouxe-o para Lisboa, para começar a jogar com outros, escolhidos

como ele.

É isto que nós temos de fazer no ensino: detectar os melhores a matemática

e pô-los a trabalhar com os melhores m matemática, os melhores na musica,

os melhores no desenho e na pintura, os melhores a falar e escrever.

Não podemos continuar a nivelar por baixo. Não podemos continuar a

manter os “Ronaldos” da matemática no seu bairro a jogar com outros que

não gostam de futebol, que não gostam de matemática, que nem gostam de

ir à escola. Não podemos desperdiçar os “ronaldos” da física, da musica, da

pintura, da fi losofi a…

Ao escolher os melhores, vamos ter futuro, porque aproveitaremos a criati-

vidade do nosso povo em vez de  estarmos a abafar as nossas melhores inteli-

gências, como agora acontece.

Com este sistema de educação, que não ensina nem incentiva e não forma

para os valores da cidadania, só os fi lhos de pais de classe média/alta, com

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educação ou com alguma capacidade fi nanceira, podem ter sucesso. Este sis-

tema está a estratifi car a nossa sociedade. Só serão médicos, juízes ou profes-

sores universitários fi lhos de famílias com algum nível, que puxam por eles,

que frequentam escolas privadas ou arranjam explicadores, que não os deixam

cair na mediania.

É curioso que neste aspecto o ensino regrediu em Portugal. Já tivemos um

sistema de ensino melhor, onde um fi lho de um agricultor, de um pequeno

comerciante ou de um operário podia ser medico, juiz ou professor univer-

sitário. Onde havia mobilidade social em vez da estratifi cação que estamos a

sedimentar.

Ao festejar-se os cem anos de república não podemos de deixar de conde-

nar a mediocridade instalada. Temos a obrigação de dizer que somos repu-

blicanos mas não somos estúpidos. Temos a obrigação de ter uma sociedade

mais fraterna e menos desigual. Mudar a balda na educação é uma prioridade.

Acredito que a educação possa fazer desenvolver um país. Mas não basta

estatística boas, com muitos 12 anos feitos à pressão, ou licenciaturas sem

conteúdo. Um ignorante não deixa de o ser por ter um canudo.

Quando vejo crianças de outros países irem para a escola vestidos de igual,

com o mesmo casaco, com a mesma camisola, com a mesma gravata e a

mesma camisa percebo que eles serão melhores que nós. Nesses países ensi-

nam às crianças que, independentemente do dinheiro dos pais, todos vestem

de igual. Que são iguais em princípio e que as diferenças serão feitos pelos

seus dotes naturais e pelos seus dotes de trabalho. Em Portugal as escolas são

mostruário das vaidades pessoais ou familiares, uns rotos de acordo com a

moda de momento, outros vestidos com as marcas mais caras, num misto de

exibicionismo e consumismo.

Lembram-se quando os estudantes de Coimbra usavam de facto capa e batina,

no dia-a-dia, e não como agora que é só um traje folclórico associado à festa e à

destemperança?

Nesta republica as desigualdades individuais cresceram tal como as desi-

gualdades regionais. Cada vez mais a riqueza se concentra em Lisboa. Cada

vez mais o interior se desertifi ca e se esvazia de oportunidades.

Nesta nossa terceira republica nada se tem feito de facto para contrariar

esta desigualdade. Este governo até decidiu roubar as regiões mais pobres

desviando para Lisboa dinheiros da União europeia destinados a reduzir as

diferenças regionais. Até justifi caram que a sede da judiciaria em Lisboa podia

ser paga com dinheiros destinados ao Centro e ao Porto porque essa sede da

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judiciaria iria melhorar os seus serviços e nós também benefi ciamos dessa

melhoria.

É o cumulo do desprezo pelo país. Nem uma monarquia absolutista seria

não defensora do terreiro do paço.

Não acredito que o país se possa desenvolver abandonando a maioria do

nosso território. É politicamente condenável que se continue a concentrar

pessoas e riquezas em Lisboa, empobrecendo Portugal.

Sem uma efectiva regionalização não se alterará esta situação. Todos pro-

meterão descentralizar e diminuir as assimetrias, como tem acontecido em

todas as eleições e governos, mas a verdade é que de facto nada farão.

Veja-se o caso da Madeira. Em 74 era uma das mais pobres regiões do país.

A pobreza era uma constante na Madeira. Crianças pedintes eram retrato

turístico que nos envergonhava.

Hoje graças à regionalização é a segunda região mais rica, com o maior PIB 

a seguir a Lisboa.

É evidente que Lisboa não quer que outras regiões, tal como fez a Madeira,

lhe exija um tratamento justo. Lisboa prefere ter uns boys do partido á frente

dos governos civis, dos serviços regionais da segurança social, educação, pla-

neamento, que estejam gratos por serem escolhidos, por ter algumas mordo-

mias e que se limitem a dizer yes aos ministros.

Hoje até os deputados são escolhidos por Lisboa. Eu sou do tempo em que

era o distrito que escolhia os candidatos. Hoje são as direcções nacionais que

indicam os seus féis. Não espantam que a Assembleia esteja repleta de gente

seguidista, sem nível, medíocre, que são deputados de “cu”. Levantam-se e

sentam-se em obediência à voz do dono e do chefe.

Só teremos desenvolvimento equilibrado e sustentável no país quando

tivermos regionalização. A regionalização não signifi ca mais gastos nem mais

pessoal político. Deve até  signifi car redução de políticos e redução de despesa.

O problema é que Lisboa não quer. Não quer a Lisboa politica dos parti-

dos, nem a Lisboa fumaceira que manda nos políticos actuais.

Uma das prioridades de descentralização é Lisboa deixar de ser a única

capital. Ela é a capital fi nanceira, a maior cidade, a mais populosa. A Presi-

dência da Republica, o Governo, a Assembleia da Republica e os Tribunais

Superiores não tem de estar todos na mesma cidade. Com as modernas auto-

-estradas e com as telecomunicações é possível que estas estruturas politicas

sejam distribuídos por mais que uma cidade.

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Coimbra pode ser umas das hipóteses para capital alternativa à actual con-

centração lisboeta.

Julgo que o Porto e Coimbra deverão ser sede de alguns órgãos de sobera-

nia que sairiam de Lisboa. Alguns ministérios deverão ir para outras cidades

capitais de distrito.

A ideia de todo o Poder num enorme Terreiro do Paço é um pensamento

antiquado que urge alterar.

Os políticos de fora de Lisboa devem lançar um movimento de redistribui-

ção do poder no país.

Sem regionalização, sem poder politico melhor distribuído, nem se criará

mais igualdade no desenvolvimento do nosso território nem os partidos

melhorarão. Os partidos continuarão a concentrar poder no aparelhismo lis-

boeta, nos carreiristas, no seguidismo acrítico.

É evidente que quando olho para a Madeira e Açores também vejo carreirismo

e aparelhismo, mas pelo menos o poder é melhor distribuído, menos concentrado.

A regionalização obrigará a um diálogo entre regiões, à partilha de poderes,

a uma melhor democracia.

Em vez de boys nomeados por Lisboa passamos a ter pessoas eleitas por

nós, pelos eleitores de da região. Será um poder mais legítimo e logo mais

democrático. Poderemos ser  um país mais igual com mais coesão social

Esta terceira república tem os dias contados. Temos que reinventar a

República.

Estamos metidos num buraco fi nanceiro.

Portugal não pode progredir sem conseguir quatro objectivos essenciais.

1. Investir em pessoas conseguindo que os portugueses das classes mais

baixas tenham melhores salários, reduzindo as desigualdades,

2. Melhorar a balança externa pondo Portugal a produzir mais na agri-

cultura, nas pescas, nas fl orestas, na indústria e no turismo. Temos de

produzir mais bens transaccionáveis.

3. Evitar a diminuição drástica da população incentivando a natalidade.

Portugal é o país da União Europeia onde a natalidade mais caiu na

ultima década. Entretanto o governo preocupa-se com os casamentos

de homossexuais demitindo-se de apoiar as famílias que fazem fi lhos.

4. Impedir a falência desta República construindo um estado forte, não

dependente de interesses económicos.

Infelizmente estes objectivos essenciais não estão na agenda dos nossos

políticos.

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Estamos em risco de destruir o Estado e a sua independência.

O estado é forte porque tem legitimidade, força, policia, exército, e capa-

cidade de fazer leis e das aplicar. O estado é forte porque tem dinheiro para

pagar estas despesas e tem património para, em situações de afl ição, pode

ceder algum a troco de serviços ou dinheiro.

O Estado somos nós, os portugueses, organizados para responder às nossas

necessidades de comunidade e individuais. Eu quero um estado forte e rico.

Não quero um estado fraco e pelintra como tem vindo a ser promovido em

Portugal por esta classe dirigente, política e fi nanceira.

Não aceito num Estado incapaz de viver com o que tem e que todos os

meses se endivida e empobrece. Não aceito que as nossas elites queiram um

estado dependente dos interesses económicos e que, para pagar as suas contas

correntes, tenha de negociar empréstimos com a banca.

Durante séculos, depois do feudalismo, criámos um Estado proprietário,

dono das escolas, dos hospitais das prisões, das estradas.

Hoje estas elites estão a criar um estado mendigo, dependente das ajudas e

dos empréstimos, inquilino em vez de ser proprietário.

O estado tem deixado de ter estradas para pagar a empresas privadas,

lucrativas, uma renda para gerirem as rodovias. O Estado está a deixar de ter

escolas, hospitais e prisões para pagar rendas aos grandes grupos fi nanceiros,

donos destas estruturas fundamentais à nossa vida em sociedade.

O estado já nem é responsável pela segurança dos seus edifícios. Paga estes

serviços a empresas de segurança privada, um pouco como acontecia na idade

média com os exércitos dos senhores feudais. Mas estes serviços de segurança

privados sustentados pelos nossos impostos, à mínima difi culdade gritam “ò

da guarda” e “chamem a policia” para que as forças do Estado resolvam as

coisas difíceis.

O Estado adjudica serviços às empresas de segurança, algumas multina-

cionais, que vivem á custa dos nossos impostos. Estas, quando a situação

se complica, passam o problema para as forças de autoridade directamente

dependentes do estado. É de loucos mas é o que acontece.

Estas adjudicações irracionais encontram-se noutras áreas como o refeitó-

rios das escolas, geridos por multinacionais, gestão de colégios do ministério

da justiça por uma organização espanhola, serviços sociais tradicionalmente a

cargo de instituições de solidariedade social que estão ser entregues, algumas

vez de forma ilegal, a capital privado que só tem como objectivo o lucro.

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O sector privado lucrativo deve ser prioritariamente dirigido para o sector

dos bens transaccionáveis, aqueles que passam fronteiras, e cujo defi cit em

Portugal é a causa primeira do nosso empobrecimento. O Governo vai mal, 

e põe em causa o interesse nacional, quando cria negócios protegidos para a

empresas que preferem lucrar sem risco, sem inovar nem competir.

É os Estado que paga as escolas, os hospitais, as estradas, as parcerias publico

privadas, mas são empresas privadas que são proprietárias e fi cam com os

lucros. Se derem prejuízo é o estado, como aconteceu recentemente com a

banca, que paga a conta. Os lucros são privados e os prejuízos nacionalizados.

Esta mudança de paradigma, de um estado proprietário para um estado

inquilino, vai ter consequências imprevisíveis, mas perigosas.

O poder assenta numa ideia, numa organização e no dinheiro/património.

O estado actual não tem ideias ou ideologia, que o legitimem. Os políticos

aprecem contabilistas. Começa a ter uma organização mínima que prescinde

de áreas fundamentais da soberania como as forças de segurança privada ou

as prisões para jovens geridas por privados espanhóis, e não é proprietário das

infra-estruturas básicas, como as estradas, as ferrovias, as redes de agua, as

escolas, prisões e hospitais.

Sem ideologia legitimadora, sem organização e sem património o estado

não tem poder. É uma entidade fraca, dependente dos poderosos, dos donos

do dinheiro.

Assusta-me a irresponsabilidade dos políticos actuais que transformam o

estado num inquilino dos poderosos.

No futuro não teremos Estado capaz de resolver uma crise fi nanceira como

a ultima que vivemos. Caminhamos para um desastre com consequências

sociais que podem ser trágicas no médio prazo.

Caros amigos

Temos 730.000 portugueses no desemprego, recorde absoluto na nossa

história. Temos de criar emprego sustentável, em vez de negócios para as

empresas do regime.

Peço que pensem que estas medidas anti-crise recentemente anunciadas

pelo governo visam só reduzir o defi cit do Estado para os 7% no fi nal de

2010.

Estes 7% vão somar-se a divida existente. Em 2011 teremos a divida actual

mais os 7% do défi cit deste 2010. Repito, em 2011 o Estado vai estar ainda

mais endividado.

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Não basta ir aos bolsos dos portugueses para pagar algumas contas. Pre-

cisamos de coragem para acabar com alguns desperdícios de que é um bom

exemplo a manutenção dos Governos Civis que hoje nãos servem para nada a

não ser empregar pessoal político.

É certo que, sem alteração das políticas, Portugal, dentro de 3 ou 4 anos,

estará ainda em pior situação fi nanceira.

Não basta uns acertos na contabilidade nacional. É precisa uma visão estra-

tégia assente em opções ideológicas que promovam a igualdade entre as pes-

soas e regiões.

Esta situação é ainda mais grave porque também as famílias, as empresas

e a banca estão endividados. A divida privada portuguesa é superior à divida

privada grega. Não surpreende que o Presidente do BPI tenha alertado para o

facto de a curto prazo Portugal poder ter de negociar com o FMI. Continuar

a lançar obras megalómanas é uma absoluta insensatez.

O aperto de cinto que vamos viver destina-se a pagar umas prestações da

nossa divida mas continuamos a endividar-nos. E, meus amigos, seremos nós

a pagar. Não vão ser os alemães, nem os ingleses, nem os franceses que virão

pagar a nossa conta. Vamos ser nós, mais os nossos fi lhos e os nossos netos.

Os alemães em 2009 introduziram uma emenda na Constituição a impedir

defi cits do Estado superiores a 0,35% do PIB e impedindo o endividamento

dos estados federados.

Recordo-me de nos anos oitenta, com o governo do Bloco central, eu ter

apresentado uma proposta de alteração à lei do orçamento que punia admi-

nistrativamente ministros que não respeitassem o orçamento. Quase 30 anos

depois, ninguém pôs fi m a irresponsabilidade dos ministérios e dos governos.

Tal como os Alemães temos que ser fi rmes e acabar com a balda orçamental.

Caros senhores e senhoras

As elites que nos governam ou são mentirosas ou ignorantes, mas em qual-

quer caso perigosas para o nosso futuro.

Se conheciam a situação fi nanceira do país não tinham o direito de nos

enganar e mentir, garantindo que não iriam aumentar os impostos. Se

foram ignorantes, e desconheciam as contas do país, então são irresponsáveis

perigosos.

Portugal vive hoje uma situação de pré bancarrota. Estes sacrifícios que vão

ser exigidos aos portugueses, são só uma moratória, um adiamento.

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116 república e democracia

Mas pior que a bancarrota fi nanceira é a bancarrota moral. As nossas elites

fi nanceiras mostraram recentemente ser gananciosas e adoptar comportamen-

tos criminosos para obter lucros excessivos.

Há vários gestores bancários indiciados por crimes. Muitos sabem que

enquanto dirigente da ADFP tive a sensação de ter sido burlado pela banca.

Pessoalmente senti-me vigarizado por um conto do vigário, mas praticado

pela banca, que deve ser auditada e inspeccionada pelo banco de Portugal.

Qualquer um de nós pode cair num conto do vigário. Basta sermos ambi-

ciosos, querer lucros fáceis para de um momento para o outro sermos enga-

nados por uma qualquer “dona Branca” ou um chico-esperto qualquer. Mas

nunca me passou pela cabeça que fosse burlado pela banca e que hoje seja

obrigado a desconfi ar da banca e dos seus contratos.

Falei há momentos das desigualdades no país. Deixem-me dar alguns

exemplos.

Os 166 administradores das empresas do PSI 20 receberam, em 2009,

136,5 milhões de euros ou seja 1/3 do que o Estado gasta com o Rendimento

Social de Inserção atribuído a 409.878 benefi ciários do rendimento mínimo.

O vencimento do Presidente da EDP foi de 3,1 milhões de euros ou seja

igual a 267 trabalhadores a ganhar o salário médio nacional de 894euros, ou

igual a cerca de 467 pessoas com o salário mínimo.

O vencimento dos sete administradores da EDP daria para fazer uma redu-

ção de 51,6 euros na factura de electricidade dos 341 mil portugueses que

tem o salário mínimo, segundo um estudo recentemente publicado na Visão.

Não podemos tolerar que se mantenha a promiscuidade entre a política

e os negócios. Não podemos aceitar que haja políticos que só fazem politica

para chegar ao governo e depois ter acesso a uma administração qualquer,

numa qualquer empresa, com permanentes negócios com o estado. Todos

nós conhecemos gente que fez fortuna à custa da política e tratamo-los como

pessoas dignas de respeito e admiração, em vez de exigirmos leis que punam

os corruptos.

É incrível que perante estes abusos assentes em salários pornográfi cos o

Governo tenha decidido, para fazer face à crise, lançar um imposto extraordi-

nário de 1% sobre todos os contribuintes de menores rendimentos. Acima de

2500 euros pagarão 1,5%. É justo que tenhamos impostos progressivos, em

que quem mais ganha mais paga. Mas é incrível que quem ganha 2500 euros

pague a mesma percentagem que aqueles que ganham 5.000. 10.000 ou cem

mil. Estes salários milionários só pagam mais 0,5% que os portugueses de

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baixos salários que, de forma injusta, já pagam o mesmo IVA. Estas não são

decisões justas.

Não é justo que, quando se obriga um trabalhador, que recebe um baixo

salário/salário minimo, a pagar este imposto extraordinário para a crise, se isen-

tem as empresas com lucros inferiores a dois milhões de euros de contribuir.

Em Portugal a economia paralela está calculada em mais de 20% do PIB.

Esta é uma economia que não paga impostos nem descontos para a segurança

social. É uma economia anti-socia,l que os governos têm permitido e incenti-

vado. Criar mecanismos para reduzir este espaço de negócio potencialmente

criminoso, não tem sido prioridade dos nossos políticos.

Não, estas não são medidas assentes numa ética que promova a igualdade

e a fraternidade.

Um Governo, que mantém os bancos apagar menos imposto que as outras

empresas, não é social-democrata.

Não basta um católico dizer-se católico. Tem de ter actos de acordo com

a religião. Não basta dizermo-nos defensores da igualdade e da fraternidade.

Não bastam as palavras. São precisos actos. Não basta festejar a república, é

preciso lutar para que ela seja melhor, renovada, mais legítima e mais justa.

Portugal enfrenta uma grave crise. E nós, que estamos nesta sala, também

somos culpados. Somos nós que elegemos os nossos políticos, que apoiamos os

nossos partidos, que não nos indignamos perante a ganância das nossas elites.

Somos nós que desculpamos a sua falta de carácter e de vergonha. Antes

das suas eleições dizem que não aumentam os impostos. Depois da eleição

fazem o contrário e nós comemos e calamos.

O estado a que chegamos só é possível porque nós temos tolerado estas

mentiras vindas de burlões profi ssionais.

Não nos indignamos. Quando alguém nos diz que as coisas nãos são fáceis,

que temos que mudar de rumo, nós fazemos de conta que não ouvimos e

preferimos escolher aqueles que nos prometem paraísos. Se nos falam com

seriedade e nos prometem trabalho nós optamos por quem nos promete

facilidades.

Sou pela República não pela mentira na política.

Defendo a República. Não suporto os seus coveiros nem aqueles que se

aproveitam dos seus valores para tratar da vidinha.

A mudança só poderá ser feita se nós, portugueses, formos exigentes.

Não esperem que sejam os alemães ou os nórdicos a virem resolver os nossos

problemas.

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O futuro depende de nós e das nossas instituições.

Acredito que a Igreja possa dar o seu contributo, criando níveis de exi-

gência ética, que não tolere a falta de vergonha de alguns políticos. A Igreja

tem o dever de se colocar ao lado de políticos com princípios, e condenar

políticos trafulhas. Acredito que a Igreja possa defender os pobres e condenar

com veemência os salários escandalosos destes pseudo gestores, ex-políticos

na maioria, que tratam da vidinha à nossa custa. Acredito que a Maçonaria

defende a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Mas é preciso que venha

a terreiro condenar estes excessos e pôr ordem na casa. Antonio Arnaut, ex

Grão-mestre, disse-nos, numa destas conferências, que a maçonaria não faz

politica mas que perante a degradação da monarquia os maçons sentiram

dever lutar para implantar a república. Perante a situação dramática do país e

a degradação da monarquia era um imperativo moral proclamar a república.

Perante a degradação desta republica é preciso que, gente de bem e homens

bons, dêem as mãos para salvar Portugal da bancarrota moral impedindo que

os portugueses tenham um futuro ainda pior que o presente.

Afastado da política activa não me demito de pensar como homem livre.

Em Portugal há caminhos esquecidos, da igualdade à fraternidade.

Procurei com esta intervenção apontar sugestões que permitam salvar a

Republica. Por mim não a condeno a cuidados terminais, do tipo paliativo.

Penso que a podemos revitalizar e renovar através deste conjunto de medi-

das, de que vos acabo de falar, e que vou enumerar numa breve síntese fi nal:

1. Todos os votos mesmo os brancos e nulos devem contar.

2. Temos de respeitar a voz dos eleitores que se abstêm.

3. Todas as pessoas devem ter direito de voto.

4. A regionalização é uma prioridade obrigando a que os serviços regio-

nalizados façam uma gestão com redução no mínimo de 2% nos

orçamentos.

5. Lisboa deve deixar de ser a capital política com distribuição de órgãos

de soberania por Coimbra e Porto, e ministérios por todas as capitais

de Distrito.

6. Deve haver legislação a impedir a irresponsabilidade na execução orça-

mental com punição dos responsáveis;

7. Defi cits do Estado superiores a 0,25% devem ser proibidos incluindo

nesta regra os serviços com autonomia e autarquias.

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8. Deve ser criado um imposto sobre as heranças e doações de médias e

grandes fortunas, favorecendo a igualdade de oportunidades.

9. Temos que dignifi car e democratizar a justiça.

10. A educação deve servir para descobrir os melhores talentos e promover

a mobilidade social,

11. No estado e nas suas empresas não pode haver salários ou aposenta-

ções superiores ao do Presidente da República.

12. Tem de se por fi m à acumulação de pensões, reformas e subsídios vita-

lícios de milhares de euros.

13. Salários, reformas ou subsídios vitalícios, pornográfi cos, no sector pri-

vado devem pagar impostos adequados, que reponham a justiça social

14. Devemos optar por políticas que aumentem os salários mais baixos,

que colocam as famílias dentro do limiar de pobreza.

15. Contra os contabilistas da política defendemos estratégias de cresci-

mento da nossa produtividade, visando resolver o nosso defi cit externo.

16. Devemos condenar aqueles que querem um Estado inquilino e pelintra.

17. É prioridade absoluta apolar as famílias no aumento da natalidade.

18. A Igreja deve agir na defesa dos valores cristãos na política, evitando a

bancarrota moral dos portugueses.

19. A Maçonaria deve assumir responsabilidades por acção política, não

partidária, na defesa da igualdade e fraternidade, combatendo a degra-

dação da política.

 

Meus amigos

Viva a República. Viva a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Viva Portugal

Salão Nobre dos Paços do Concelho

Miranda do Corvo, em 22 de Maio de 2010 

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APRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO FACSIMILADA

DA CARTILHA DO POVO DE JOSÉ FALCÃO

dr. fernando fava

Se nos situássemos num ponto de vista meramente formal, diríamos que

aquilo que hoje nos trás aqui seria o cumprimento de mais um ponto do

programa das Comemorações do Centenário da República, em Miranda do

Corvo. Mas há muito mais assunto para além do que acabo de anunciar. Em

boa verdade, este passo reveste-se de um signifi cado muito especial. Com

a plena realização do mesmo, prestamos uma justa e devida homenagem à

memória de um insigne português, simultaneamente um ilustre fi lho das ter-

ras de Miranda. Falamos, obviamente, de José Joaquim Pereira Falcão, nas-

cido justamente a 01 de Junho do ano de 1841, na freguesia de Pereira, deste

concelho de Miranda do Corvo.

Acontece, que a personalidade histórica que estamos agora a homenagear

foi também um notável e activo republicano, na verdade um dos maiores repu-

blicanos do seu tempo. E é por isso que ao prestarmos agora tão sentido preito

à memória desse iminente vulto que foi José Falcão e ao seu legado cultural,

estamos também, ipso facto, a reverenciar o republicanismo e a República.

Como entendeu então a Comissão Organizadora das Comemorações celebrar

esta efeméride que hoje se regista, não perdendo de vista o facto de a mesma

ocorrer num ano em que se festeja em Portugal o centenário da instituição

da República? Pois bem, nada menos que fazer uma edição, fac-símile, da

célebre Cartilha do Povo, obra-prima de José Falcão e uma das maiores peças

de propaganda politica de todos os tempos e de todos os países do mundo.

Trata-se de uma iniciativa extremamente feliz e que, pela sua inegável impor-

tância, foi, desde o seu início, assumida e apadrinhada pela Presidência desta

Câmara Municipal, suscitando, paralelamente e de uma forma espontânea e

desinteressada, as colaborações que se pediram e que se julgaram necessárias.

Postas estas breves palavras de intróito, quererei dizer, senhoras e senhores,

que é meu privilégio apresentar-vos, naturalmente em traços largos, o resul-

tado prático de todo este projecto e dar-vos nota do empenhamento e do

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conjunto de pessoas e vontades nele colocado. Abordando, numa primeira

fase, os aspectos de forma da obra agora produzida, dir-vos-ei que a opção

por um formato que, simplisticamente, consideraremos não muito grande,

parece-nos apropriada. E isto porque obedece a duas directrizes importantes

e signifi cativas, sendo a primeira delas as dimensões que a Cartilha original

manteve nas suas primeiras edições; e a segunda a de que este formato pos-

sibilita uma portabilidade e uma consulta fáceis, assumindo mesmo, neste

particular, as vantagens de um vade mecum. Quanto à capa, sempre uma parte

importante de um livro, procurou-se, tanto quanto vejo, que tivesse uma rela-

ção de semelhança com a primeira edição da Cartilha do Povo, com a subs-

tancial diferença de agora se colocar uma imagem de José Falcão, porventura

a imagem mais conhecida desta inesquecível fi gura de republicano. Por outro

lado, considero de extrema felicidade colocar-se em anexo todas as edições

da Cartilha do Povo, que se seguem à primeira, desde 1884 a 1909. Estão,

portanto, de parabéns a Comissão Organizadora das Comemorações do Cen-

tenário, a Câmara Municipal e a Editora Minerva por esta excelente obra que

agora nos é apresentada.

Para esta edição da Cartilha foram expressamente escritas algumas peças, as

quais têm um carácter preambular e destinam-se a justifi car o aparecimento

da obra, a dar informes acerca da mesma, a dar nota de questões processuais, a

registar agradecimentos, naturalmente devidos e justos, e também, como seria

curial, a abordar conteúdos mais directamente ligados ao autor José Falcão e

à sua obra-prima, A Cartilha do Povo.

Com isto entramos directamente na apreciação de questões de substância.

E assim é que a Sr.ª. Presidente da Câmara Municipal, Drª. Fátima Ramos,

numa peça a que chamou Motivação, nos dá nota das suas profundas convic-

ções republicanas e do grande apreço da autarquia, que superiormente dirige,

em celebrar os 100 anos da instauração da República em Portugal, designa-

damente através deste acto de homenagem à fi gura desse fi lho de Miranda

e grande republicano que foi José Falcão. Mas adverte, apesar de se terem

registado avanços civilizacionais e de se terem feito progressos sociais, há

ainda muitas injustiças e chagas a resolver, assimetrias profundas, por vezes

gritantes, interioridades negativas, desemprego, salários de miséria, que se

confrontam com remunerações sumptuosas dos chamados gestores públicos,

remunerações essas a que a Dr.ª. Fátima chama de obscenas. A terminar, diz-

-nos, a Digníssima Presidente da Câmara de Miranda do Corvo, que todos

estes males não são consentâneos com os ideais de uma República e faz votos

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para que estas Comemorações no Concelho de Miranda possam contribuir

para uma refl exão sobre a óptica e os valores republicanos, no sentido de que

possa Portugal vir a abrir-se para uma nova esperança.

Surge-nos depois uma Nota Explicativa de autoria do Eng.º Carlos Ferreira,

na sua qualidade de Presidente da Comissão Organizadora das Comemora-

ções. Utilizando hábil e sensatamente as palavras, fala-nos da importância da

republicação da Cartilha do Povo. Com efeito, no que respeita à Cartilha, é

preciso não só tornar a publicá-la, mas, não menos importante, republicá-la,

justamente com o sentido de a tornar um meio de acção útil à República e

aos seus fundamentos. De resto, vêem nesse sentido as palavras subsequentes

em que são prestadas homenagens a José Falcão e à sua Cartilha do Povo, e

também a outros republicanos, nomeadamente aos que entre 1906 e 1908,

integraram a comissão republicana de Miranda do Corvo, sob cuja alçada

tiveram lugar quatro edições desta tão importante obra de propaganda.

Termina com a formulação de votos para que a mensagem presente nesta

edição da Cartilha possa chegar às consciências dos portugueses, sobretudo à

consciência dos mais jovens, de modo a que o futuro possa trazer a Portugal

uma verdadeira República, efectivamente baseada em princípios que nos são

muito caros: liberdade, igualdade, fraternidade.

Da Dr.ª Anabela Monteiro, professora de História da Escola José Falcão, em

Miranda do Corvo, e pessoa que integra a Comissão para as Comemorações

do Centenário da República, chega-nos uma Nota de Apresentação. Fala-nos

esta peça da ligação histórica de Miranda do Corvo à Revolução Republicana

de 5 de Outubro de 1910, justamente através da invocação da fi gura do Prof.

José Falcão. Daí que, diz, esta edição fac-similada da Cartilha do Povo, se

impusesse neste ano de 2010, ano em que, justamente, se comemoram os

cem anos da implantação da República em Portugal, verifi cando-se, muito a

propósito, que todas as vontades convergiram no sentido de que a presente

edição fosse feita com base na 1ª edição da Cartilha. Dá-nos conta das extre-

mas difi culdades em obter um exemplar dessa 1ª edição, facto que somente se

tornou possível recorrendo ao espólio pessoal do Dr. Alberto Vilaça, no que

a família do distinto advogado e anti-fascista histórico gentilmente consen-

tiu. É ainda entendimento, da Dr.ª Anabela Monteiro que os outros apor-

tes dados a esta edição da Cartilha contribuíram para o seu enriquecimento.

E termina fazendo votos para que o pequeno livro que ora se publica encon-

tre repercussões junto dos nossos jovens, e isso porque, afi rma, a Cartilha do

Povo é, e cito: “uma preciosa herança que tem que ser perpetuada “.

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Com o título Perfi l de José Falcão e saído da pena douta do Prof. Dr. Ama-

deu Carvalho Homem, aparece-nos, a seguir, um apontamento que, como o

seu próprio título deixa antever, nos dá a conhecer aspectos mais substanciais

do percurso de vida de José Falcão. Do estudante, do homem de ciência, da

Universidade de Coimbra, do escritor, do político, do cidadão republicano

activo e atento. É um escrito de indiscutível valor historiográfi co e de apreci-

ável beleza estética ao nível da linguagem. De resto, é um dom conhecido no

Dr. Carvalho Homem este de conseguir casar o discurso historiográfi co com o

discurso literário, com vantagens para ambos. O autor transmite-nos conhe-

cimentos, não só acerca da individualidade de Falcão, mas também quanto

aos seus mais chegados condiscípulos e companheiros de luta, ou seja, aquela

plêiade de valorosos intelectuais que constituiu a brilhante e quase lendária,

ou mesmo lendária, geração de 70.

Com este escrito, fi camos a saber como era o ambiente da Universidade de

então, quais eram e como eram as lutas dos estudantes e o porquê dessas lutas,

mormente a revolta sentida contra métodos obsoletos de ensino, contra visões

de mundo ultrapassadas e contra a arrogância e a tirania das pessoas que pro-

tagonizavam ou defendiam tais posições ou valores. Por outro lado, é-nos dada

uma descrição e uma explicação muito apropriadas do que nos fi nais do século

XIX se passava nas arenas internacionais da política, com ênfase na chamada

Guerra Franco-Prussiana de 1870, no desfecho da mesma e nas suas consequên-

cias, particularmente a formação da célebre Comuna de Paris e as reacções e

posições da intelectualidade portuguesa, confrontada com os acontecimentos.

Tudo isso introduz o leitor desta edição da Cartilha, na compreensão do

que foi, quanto a esses sucessos históricos, a posição tida por José Falcão e

por ele exarada no seu opúsculo intitulado A Comuna de Paris e o Governo

de Versailles. A este propósito, e como se sabe, em José Falcão foi veemente

a defesa dos communard e a condenação do governo sanguinário e conserva-

dor de Versailles, encabeçado por Th iers. Isto valeu-lhe ser alvo de um pro-

cesso judicial, que o ministro do reino, António José de Ávila, então Marquês

de Ávila e Bolama, mandou instaurar contra a sua pessoa, com a alegação

de que as ideias desenvolvidas por Falcão atentavam contra a ordem social

estabelecida em Portugal e, por conseguinte, a passagem a escrito e publi-

cação dessas ideias confi guravam a existência de um crime público contra

a liberdade de imprensa. Na verdade não foi esse o entendimento do juiz

da Comarca de Coimbra, que considerou ser o escrito de Falcão uma aná-

lise meramente histórica de acontecimentos havidos, à data, em França.

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O procura dor régio recorreu ainda da sentença para o Tribunal da Relação do

Porto, porém este Tribunal acabou por confi rmar a sentença ditada anterior-

mente em Coimbra. As coisas estavam, desta forma, a correr tão mal para o

Governo e para a Coroa, que o ministro da justiça, Barjona de Freitas, man-

dou simplesmente arquivar o processo. Carvalho Homem fala-nos ainda de

outras questões importantes, nomeadamente do militantismo republicano de

José Falcão, expresso e disseminado por vários âmbitos, por várias frentes, por

várias presenças na organização de unidades internas do Partido Republicano,

na fundação, redacção e direcção de jornais republicanos e, matéria esta suma-

mente importante, na propaganda republicana. E é aqui que, justamente,

surge, com mais evidência, a nossa tão falada Cartilha do Povo, com referência

especial ao sucesso editorial alcançado por esse pequeno livrinho, o ambiente

vivo e pitoresco proporcionado pelo diálogo entre os protagonistas do mesmo

- José Povinho e João Portugal - e a razão porque se recorreu a esta forma de

diálogo, recurso a que Carvalho Homem chama de expediente expositivo. As

vicissitudes porque passava então o património colonial português em África,

mormente as confrontações com o Império Britânico, retratadas por aconte-

cimentos vexantes para Portugal, como o Tratado de Lourenço Marques e o

Ultimato Inglês, são aqui trazidas a lume com a intenção de, por um lado,

mostrar quanto o tema da manutenção das nossas colónias era então grato ao

movimento republicano e aos republicanos, e por lado, indicar que esse foi

um problema que preocupou José Falcão, ao ponto de escrever sobre o assunto

um folheto com o título A África portuguesa e a questão do Zaire. Nesse folheto

não são colocadas intenções de fazer propaganda republicana ou anti-monár-

quica, mas sim equacionar, com racionalidade, o problema das fragilidades

da nossa presença em África, procurando encontrar, para o mesmo, soluções

precisas e adequadas. A questão colonial, nunca resolvida, desembocará em

1890 no Ultimato Inglês e um ano depois na Revolução de 31 de Janeiro de

1891. Revolução que, por razões nesta peça perfeitamente explicadas, se salda

por um sério revés para as forças republicanas e para o Partido Republicano.

Por esta altura já José Falcão se encontra muito doente, mas é ele ainda

quem assume, superiormente a tarefa de reorganizar o partido a norte do país.

O seu falecimento, nos inícios do ano de 1893, causou uma consternação

geral, amplamente repercutida em jornais do norte a sul de Portugal. É pois

este extraordinário exemplo de dignidade, de verticalidade, de patriotismo,

para usar as próprias palavras de Carvalho Homem, que este escrito pertence

realçar e homenagear.

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Assinada por Fernando Fava, ou seja, eu próprio, aparece-nos uma Intro-

dução que no essencial aborda questões que têm mais a ver com a Cartilha,

propriamente dita, as suas várias edições, particularidades dessas diferentes

edições e os cidadãos e entidades que nelas estiveram envolvidos e as pro-

moveram. Esta peça faz considerações acerca do subtítulo da Cartilha: Parte

I – Para a gente do campo. Inalterado em todas as edições, com o seu enten-

dível signifi cado, é, todavia, um aspecto que gera algumas interrogações. Se

José Falcão escreve no frontispício da obra que se trata de uma primeira parte

para a gente do campo, é licito pensar que na sua mente haveria o propósito

de escrever uma segunda parte para o mesmo ou para qualquer outro estrato

social. Ora a verdade, é que tal segunda parte não apareceu, e porquê isso?

Porventura porque o êxito editorial e o impacto social alcançados com a cha-

mada primeira parte, foram tão grandes que Falcão preferiu não beliscar, nem

por um momento ou um pouco que fosse, tal situação de sucesso e de gran-

deza. Aborda-se também o facto de as edições feitas em vida do autor terem

vindo a público, todas elas, anonimamente, aproveitando-se este facto para

se fazer algumas observações quanto aos contornos do processo judicial a que

José Falcão foi sujeito pela publicação do seu opúsculo A Comuna de Paris e o

Governo de Versailles.

Por outro lado, descreve-se e aprecia-se o discurso ideológico de Falcão, as

suas referências políticas e culturais, desde a sua juventude como estudante até

aos seus dias fi nais como professor universitário, como cientista, como homem

político atento e actuante. No conteúdo da Cartilha são visíveis marcas des-

tes valores e princípios, sobretudo dos que se inserem na fase politicamente

mais amadurecida deste percurso de vida de José Falcão. Disso são exemplo

as palavras que nos surgem nas últimas páginas (nesta edição na página 45).

Diz assim João Portugal: “Acredita, meu José Povinho, o mundo está para ver

grandes coisas. Não tens visto à hora da madrugada, e à hora do anoitecer,

alumiar-se o céu com uma luz vermelha como as labaredas de um forno?

É a cor da nossa bandeira, meu irmão, é um sinal também. O Povo é forte e

valente, não tem medo à luta … quando eu voltar há-de ser para cantar nas

festas da nossa aldeia a vitória do Povo, e a aclamação da República.” Há aqui

um misticismo, uma crença, que nos remete para o universo das doutrinas de

Augusto Comte, no seio das quais o surgimento da República sociocrática, era

um facto escrito no destino, era uma inevitabilidade.

Num outro registo, José Falcão consegue descrever por meio das palavras

do Zé Povinho, o que era então a vida dos aldeãos, da gente do campo. Pessoas

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sem qualquer outro tempo que não fosse aquele de que dispunham para tirar

dos campos, e do suor do seu rosto, os meios necessários à sua precária sub-

sistência. Ainda assim eram sobrecarregados com impostos e outras servidões

injustas e cegas, como por exemplo, o serviço militar, na grande maioria dos

casos destinado aos fi lhos dos pobres, que com isso fi cavam ainda mais pobres

e mais desamparados. Consciente por fi m de que algo tem que ser feito contra

toda esta série … e insuportável de injustiças, o até então revoltado, porém

conformado, José Povinho, transfi gura-se e parte para a luta, predispondo-

-se a levar o evangelho republicano a todos os seus irmãos de infortúnio, nos

campos, nas feiras, nas romarias. E é a necessidade deste grito de revolta, desta

insubmissão que torna a Cartilha actual e a coloca no centro das atenções polí-

ticas de hoje, não contra o regime, porque esse é o nosso, mas contra os atrope-

los, contra as ofensas, contra a degradação a que o Estado e a Res Pública têm

vindo a sofrer, contra as injustiças de toda a ordem, as prepotências, os abusos

a que o irresponsável dirigismo político conduziu. Mas o povo tem as armas

necessárias para que esta prática seja banida para sempre. Para tanto, basta que

se consciencialize desse seu poder e se torne capaz de o exercer.

É essa a mensagem intemporal e inequívoca da Cartilha de José Falcão.

Tenho dito.

Salão Nobre dos Paços do Concelho

Miranda do Corvo, 1 de Junho de 2011

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JOSÉ FALCÃO *

professor doutor amadeu carvalho homem

Eu confronto-me aqui com uma grande difi culdade, e a grande difi cul-

dade é esta, é que já me secaram completamente o terreno. Já foram ditas

coisas, e coisas extremamente pertinentes, acerca do José Falcão. Já foram

ditas coisas, e coisas extremamente certas, acerca sobre a Cartilha do Povo. De

modo que eu interrogo-me, o que é que eu vou fazer?

Habitualmente quando estou numa situação mais constrangida conto his-

tórias, de modo que aquilo que eu vou fazer é contar, justamente, uma his-

tória. E a história passou-me mesmo hoje. É uma história que implica um

exercício de comparação que, naturalmente não trás consigo qualquer desva-

lorização para quem quer que seja, mas que é uma realidade.

Eu hoje consagrei todo o meu tempo até este momento à fi gura de José

Falcão, porque iniciei o meu trabalho cívico no próprio, eu gosto de o referir

pelo nome antigo, no Liceu José Falcão, onde falei para 4 turmas de jovens.

Bom, e naturalmente que depois com a amabilidade da Sr.ª Presidente da

Câmara e do Sr. Eng.º Carlos Ferreira, que me trouxeram aqui, para eu dizer

umas palavras acerca de José Falcão.

A história que eu queria contar era a seguinte: eu fui interpelado muito

vivamente, justamente no Liceu José Falcão, em Coimbra, por um jovem que

me perguntava: mas olhe, diga-me uma coisa, ainda faz sentido defender a

República, o regime republicano? quando nós, realmente estamos tão desilu-

didos, estamos tão distantes? E a resposta que eu lhe dei era esta: se daqui a

uns tempos tu estiveres exactamente a fazer a mesma pergunta, com o mesmo

desencanto, é natural que o sentido se comece a perder. Agora se efectiva-

mente tu deres o máximo numa coisa que se chama educação para a cidadania

e se souberes, exactamente, que o teu lugar é aqui, que não tens outra casa

* O presente texto foi elaborado a partir da gravação da intervenção, que foi proferida sem

registo escrito.

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para viver senão uma casa chamada Portugal, que Portugal tem de ser o mais

prestigiado possível, o mais bem servido possível, e que para isso deve contar

com o esforço, com a dádiva, de gente da vossa idade, naturalmente que então

faz todo o sentido, porque a grande lição que verdadeiramente, do meu ponto

de vista, nos trouxe a fi gura do José Falcão, é justamente a de nos dar conta de

que vale a pena servir a Pátria, vale a pena servir toda uma população, e vale a

pena fazer estas duas coisas de um modo tão desinteressado quanto possível.

É que a história de vida, para além da história da obra do José Falcão, não

é nem mais nem menos do que isto.

O José Falcão segundo rezam as memórias históricas, era um homem intro-

vertido, concentrado, um pouco bisonho, à primeira vista de tracto não muito

fácil, reservado e no entanto impôs-se de tal maneira a toda uma geração, a

uma juventude, que, quando nas vésperas do 31 de Janeiro de 1891, quando

uma academia se mobilizava para prolongar em Coimbra uma vitória que se

imaginava iria acontecer no Porto, e que não aconteceu, a primeira pessoa, e a

única pessoa, de quem se lembraram homens como António José de Almeida,

como Afonso Costa, como Malva do Vale e como tantos outros para irem

entregar o poder novo acabado de conquistar no Porto, e depois naturalmente,

a conquistar no resto do País, foi o José Falcão. E isto não aconteceu por acaso,

porque realmente, volto a sublinhá-lo, o José Falcão espontaneamente não reu-

nia condições de grande popularidade. Agora, o que ele apresentava era um

perfi l ético, cívico, de tal maneira intocável, de tal maneira impoluto que não

podia realmente ser outra pessoa, senão aquela, a receber nas suas mãos o patri-

mónio memorial, o património ético e o património valorativo da República.

É que ele tinha sido capaz de fazer uma coisa que poucos de nós, se calhar,

atrever-me-ia a dizer, seríamos capazes de fazer. Ele foi capaz de arriscar com-

pletamente, uma situação académica e profi ssional, uma estabilidade econó-

mica pessoal, e isso já foi aqui sublinhado, para fazer vingar um ponto de vista

de democraticidade.

Quando realmente houve esse grande embate entre os communard, os

homens da comuna de Paris que representavam o verdadeiro anseio popular,

e os homens do governo de Versailles, na altura chefi ados por Th iers, que

representavam uma divisão e uma versão elitista de governo, se quisermos até

que representavam verdadeiramente o privilégio dos ricos, o José Falcão em

Portugal foi a única voz, a única voz audível, que num folheto intitulado “

A Comuna de Paris e o Governo de Versailles”, foi capaz de dizer: eu estou

ao lado dos communard. Teve de o fazer naturalmente anonimamente, mas

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toda a gente sabia quem tinha escrito aquele folheto. E isto representava na

altura, um tão grande ataque aos valores instalados, que inclusivamente, com

base nisto lhe foi movido um processo e houve um desenho, um esboço de

perseguição.

Homens que são capazes disto, e que depois são capazes de escrever a Car-

tilha do Povo, que já foi aqui sufi cientemente caracterizada, e que depois

disto, quando realmente falhou a revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891,

são capazes de escrever uma série de artigos que apontavam claramente para

uma segunda tentativa revolucionária logo a seguir, são realmente homens de

uma estrutura interna, de uma verdade e de uma eternidade que convém reter.

Eu não queria cansar-vos, queria apenas deixar aqui uma última considera-

ção, que justamente também serviria para responder ao tal jovem: mas então

vale a pena?

Eu iria dizer-vos, caros amigos mirandenses, que o que realmente não vale

a pena é a falta de civismo, o que realmente não vale a pena é a perversão de

costumes políticos, o que realmente não vale a pena é a corrupção generalizada

e instalada, o que realmente não vale a pena é o principio do privilégio que

começa a ser altamente preocupante entre nós, isso é o que verdadeiramente

não vale a pena. Porque toda essa gente, e talvez esta pequena refl exão não

seja sufi cientemente tomada em linha de conta por essa gente, não merece a

designação de republicano.

Designar um homem ou uma mulher como republicano, é designar um

homem ou uma mulher como portador de uma verticalidade verdadeiramente

impoluta e intocável, portador de uma honorabilidade verdadeiramente

impoluta e intocável. Essa gente, a que não tem esta verticalidade impoluta

e intocável, está sujeita a uma coisa que é a lei da morte, e quando morrerem

dessa gente não restará uma única memória positiva.

Essa gente sumir-se-á completamente da nossa memória e quem verdadei-

ramente fi cará para lembrar, para recordar como paradigma e como exemplo,

são aqueles que dizem assim: queremos uma República, uma República de

valores para construirmos pedra a pedra, momento a momento, esforço a

esforço, suor a suor um Portugal melhor, maior para nós, para os nossos fi lhos

e para os vindouros.

Muito obrigada pela vossa paciência.

Salão Nobre dos Paços do Concelho

Miranda do Corvo, em 1 de Junho de 2010

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Casa onde nasceu e viveu José Falcão. Foto do início do século XX.

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CARTA DIRIGIDA AO PRESIDENTE DA CÂMARA

MUNICIPAL DE MIRANDA DO CORVO EM 2060,

DEPOSITADA NA CÁPSULA DO TEMPO PELA ACTUAL

PRESIDENTE DA CÂMARA, DR.ª FÁTIMA RAMOS

Caro/a Presidente do Município de Miranda do Corvo

Formulo Votos que ao ler esta carta seja uma pessoa feliz.

Espero que tenha a oportunidade de gerir um município com um bom

nível de população jovem, boa qualidade de vida e um índice de desenvolvi-

mento social ao nível dos melhores.

Espero que goste muito do que faz.

Acredito na capacidade empreendedora dos Mirandenses e no comporta-

mento solidário que sempre revelaram e estou certa que continuarão a revelar

no futuro.

Espero que os valores da Liberdade, Igualdade e Fraternidade estejam pre-

sentes no país.

Caro/a Presidente

Comemoramos hoje o centenário da implantação da República em Portugal.

Construímos uma pequena praça para assinalar o momento. Nesta praça

introduzimos uma cápsula do tempo, onde vamos guardar algumas cartas.

Temos esperança que essas cartas ajudem cada um de vós a entender melhor

os nossos sonhos e as nossas preocupações.

Miranda do Corvo, berço de um grande republicano, José Falcão, sentiu-

-se desde a primeira hora motivada para comemorar esta efeméride com um

conjunto de actividades que dessem a conhecer a toda a população mas espe-

cialmente aos mais jovens os valores e os ideais do republicanismo.

Na elaboração, preparação e implementação do Programa das Comemo-

rações no nosso concelho a autarquia foi apoiada por uma Comissão Orga-

nizadora, que apoiou o desenvolvimento e implementação de um programa

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de comemorações bastante abrangente. Aproveito para saudar o Eng.º Carlos

Ferreira, a Dr.ª Anabela Monteiro, o Dr. António Órfão e o Sr. Vítor Gonçal-

ves, a Comissão que tem apoiado a Câmara no programa das Comemorações

do Centenário da Republica.

Os ideais republicanos visavam a criação duma sociedade livre e democrá-

tica, mais justa, com igualdade de oportunidades, mais solidária, com menos

diferenças entre ricos e pobres.

Queremos que os ideais republicanos sejam defendidos e amados.

Só pode amar quem conhece!

Alguns dos ideais republicanos nunca foram até hoje alcançados.

Portugal é certamente hoje um país com muito mais qualidade de vida

do que em 5 de Outubro de 1910, mas em que continuam a existir muitas

injustiças sociais.

Felizmente vivemos em democracia. As pessoas têm total liberdade para esco-

lher os seus governantes. Todas as pessoas com mais de 18 anos podem votar.

Vivemos contudo, num país em que as assimetrias entre ricos e pobres

aumentam. Onde salários mínimos de miséria coexistem com salários obs-

cenos de alguns gestores públicos. Onde o desemprego atinge percentagens

elevadíssimas, especialmente para os mais jovens. Onde as pessoas do inte-

rior se vêem obrigadas a abandonar as suas terras e as suas casas à procura de

melhores condições de vida.

A taxa de desemprego no pais é actualmente de 10,6% O salário mínimo é

de 475 euros. O salário do Presidente da Republica é de 7630 euros. O presi-

dente da Republica recebe 2962 euros para despesas de representação.

Em contrapartida existem, gestores de empresas publicas com salários per-

feitamente obscenos, na ordem de varias dezenas de milhares de euros.

Estes gestores recebem salários de montante muito superior ao auferido

pelo Presidente da Republica.

A maioria destes gestores são pessoas com forte ligação aos partidos que

estão no governo.

Nas grandes empresas privadas e nos grupos fi nanceiros, também encon-

tramos ex-governantes.

Esta situação provoca um nível de promiscuidade que por vezes traz pro-

blemas e causa duvidas.

A taxa de natalidade no pais tem diminuído, o que a manter-se irá colocar

em causa a possibilidade de sucesso no futuro dos actuais sistemas sociais,

nomeadamente das reformas.

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Ao nível da produtividade e produção de riqueza somos dos países mais

atrasados da Europa.

O defi cit das contas públicas de Portugal é preocupante.

Recentemente, por causa deste problema, o governo apontou uma serie

de medidas de restrição. Algumas destas medidas podem passar por dimi-

nuição de salários e aumento da carga fi scal. A classe media será a principal

sacrifi cada.

Temo que estas medidas, tenham apenas um impacto de curto prazo, e que

a médio prazo sirvam para agravar ainda mais a actividade económica.

Portugueses com menor poder de compra serão piores consumidores. As

empresas vão sofrer e por conseguinte a actividade económica pode resfriar

ainda mais.

Espero que o governo aponte outras medidas com maior impacto na gestão

das contas publicas e menos devastadoras para a classe media.

Existem varias situações de desperdício no sector publico e também na

privada que podem ser reduzidas.

O governo tem continuado a lançar alguns investimentos de montante

muitíssimo elevado, cujo fi nanciamento será assegurado através de parcerias

público-privadas.

Receio que o impacto no aumento da produtividade seja muito diminuto

face ao impacto negativo nas contas publicas, que estamos a transferir para

as novas gerações.

Apesar de algumas medidas de combate a evasão fi scal que têm sido lança-

das, os níveis de evasão fi scal em alguns sectores ainda são signifi cativos.

Defendo uma maior transparência das contas bancárias.

O pais tem que produzir muito mais.

Urge diminuir as importações e aumentar as exportações.

A nossa competitividade tem que ter por base o aumento da produtividade

e efi ciência e não a baixa de salários.

Não é justo que o trabalho de um Finlandês, de um Alemão ou de um

espanhol, valha duas, três ou mesmo quatro vezes mais que o mesmo trabalho

realizado por um português em Portugal.

Não é justo que o mesmo português, com a mesma formação, tenha de

emigrar para a Alemanha ou para o Luxemburgo para ver reconhecido o valor

do seu trabalho hora.

Não é justo que no mesmo espaço económico trabalhos semelhantes

tenham pagamentos muito diferentes e desiguais.

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Espero que os europeus defi nam um pacto de estabilidade que atenue as

diferenças, aceitando que o crescimento dos salários em Portugal e a melhoria

do nível de vida é um imperativo de Justiça social e uma condição necessária

à melhoria dos nossos padrões de qualidade de vida.

Formulo votos para que estas comemorações realizadas no nosso concelho

e no país sirvam para nos obrigar a uma profunda refl exão sobre os ideais

republicanos e a sua actualidade no Portugal de hoje.

Tal como há cem anos Portugal precisa de uma nova esperança.

Caro/cara Presidente

Apesar da síntese de diagnostico que apresentei e que revela um quadro

de injustiça social e de grande preocupação em relação ao futuro, tenho espe-

rança que ainda seja possível inverter esta situação.

Os portugueses quando bem orientados, são óptimos trabalhadores. Mui-

tos têm emigrado para países do Norte da Europa e as suas capacidades de

trabalho são reconhecidas por todos.

Nos últimos anos o nosso sistema de saúde melhorou muito. Temos um

dos melhores sistemas de saúde do Mundo.

Temos um razoável sistema social. O meu receio no que toca a sustentabili-

dade futura deste sistema esta nos baixos níveis de natalidade actuais. Se a taxa

de natalidade aumentar, o sistema poderá manter-se e melhorar.

Urge que o governo tome medidas que fomentem o aumento de natalidade.

Alguns países da Europa já iniciaram este caminho, com sucesso.

O nível de escolaridade está a aumentar. Existe uma elevada percentagem

de jovens com formação superior. O numero de jovens com 12 anos de esco-

laridade ou mais, é bastante elevado.

As preocupações com o ambiente existem. As pessoas são bem formadas, o

nível de insegurança é pequeno.

O futuro de Portugal passa por uma valorização da nossa principal riqueza,

o capital humano.

Caro/Cara Presidente

Recentemente foi elaborado um Plano estratégico para o Concelho, que

após uma analise dos nossos pontos fortes e dos nossos pontos fracos, con-

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cluiu que a marca que melhor identifi cava o concelho era “ Comunidade

Saudável e Solidária”.

Sentimo-nos muito orgulhosos. Mas sentimos também uma enorme

responsabilidade.

Esta marca só foi conseguida graças ao trabalho de toda a comunidade.

Temos no concelho belíssimas instituições que prestam um óptimo trabalho

social e de apoio aos mais desfavorecidos. Temos procurado investir na melho-

ria da qualidade de vida, em respeito pela natureza.

Mas, esta marca só será mantida, se todos nos envolvermos e se todos tra-

balharmos para isso.

Quero salientar neste texto alguns exemplos que mostram que em Miranda

do Corvo as pessoas trabalham para isso. Exemplos simples, que devem ser

conhecidos, por todos os mirandenses no futuro.

Ao nível do trabalho realizado pelas instituições, temos no concelho varias

instituições que merecem o nosso orgulho.

Uma instituição que muito tem dado a Miranda e ao país é a Casa do

Gaiato.

Refi ro-me concretamente ao trabalho realizado ao longo de 70 anos pela

Casa do Gaiato em prol da educação de jovens rapazes.

Tenho muito orgulho no facto do Padre Américo ter escolhido Miranda

para sediar a primeira Casa do Gaiato do país.

Acredito que essa iniciativa para alem do bem que proporcionou a todos os

jovens rapazes que educou nestas sete décadas, foi também um factor motiva-

dor do surgimento de outras instituições no concelho.

Miranda é um concelho relativamente pequeno, com cerca de 14 mil

habitantes.

Temos no concelho três instituições sem fi ns lucrativos, com lares de apoio

a crianças e jovens provenientes de meios socialmente desfavorecidos.

A ADFP, A Caritas, e a casa do Gaiato. Não é uma situação normal.

Nenhum dos concelhos vizinhos, de dimensão similar, se pode orgulhar de ter

uma situação equivalente. É uma situação que nos orgulha a todos.

Comemoramos o feriado municipal no dia 1 de Junho. Data de nasci-

mento de José Falcão, mas também dia da Criança.

Termos no concelho instituições que de forma voluntaria apoiam e ajudam

crianças desfavorecidas constitui um grande orgulho para todos nós.

Em Semide temos também a funcionar a Santa Casa da Misericórdia, com

valências de apoio a idosos (centro de dia) e uma creche para crianças

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Na Pereira um benemérito ofereceu o seu património para criar um asilo

para idosos, o actual Lar Dr. Clemente de Carvalho. Mais recentemente, no

fi nal da década de 80, do século XX, Um grupo de pessoas liderado por Jaime

Ramos (médico), criou a Associação para o Desenvolvimento e Formação

Profi ssional, uma instituição exemplar onde as crianças e os idosos, os jovens,

os doentes crónicos e as pessoas defi cientes, convivem e trabalham em con-

junto, num exemplo prático de inclusão e integração social.

É uma instituição que tem revelado boas práticas de intervenção social,

inovando em muitos aspectos.

Vivem actualmente na instituição cerca de 300 pessoas, de todas as gerações.

Podemos afi rmar que esta instituição apoia todos os problemas sociais da

sociedade excepto a toxicodependência.

Na instituição recebem apoio crianças vitimas de maus tratos, mulheres

grávidas ou com fi lhos vitimas de violência domestica, defi cientes, idosos,

pessoas com carência económica, entre outras situações.

A instituição aposta também na área do turismo e no apoio as crianças,

gerindo algumas creches. Esta instituição é actualmente o maior empregador

do concelho.

Graças ao bom trabalho desenvolvido, tem alcançado vários prémios quer

em concursos nacionais quer internacionalmente.

Recentemente e face a dimensão da instituição, foi criada a Fundação

ADFP.

A instituição pretende dar continuidade ao trabalho desenvolvido, com a

implementação de novos projectos, nomeadamente novos lares para idosos e

para doentes mentais e a criação de um Hospital.

A criação de um Hospital constitui um projecto bastante ambicioso.

Miranda tinha um Centro de Saúde publico, dotado de serviço de urgên-

cias 24 horas por dia e internamento.

Recentemente, na sequencia de uma reestruturação dos serviços de saúde,

o Governo encerrou o internamento e o serviço nocturno.

Dada a experiencia e o bom trabalho que tem sido desenvolvido pela

ADFP, acreditamos que o projecto do novo Hospital, embora represente risco

como qualquer investimento, poderá ser um bom projecto. Acreditamos que

este projecto no futuro, vai dar maior qualidade de vida a população e gerar

postos de trabalho.

Acredito que em 2070, funcionara e será um motivo de orgulho para os

Mirandenses.

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fátima ramos 139

Esta instituição tem varias parcerias com os Hospitais da Universidade de

Coimbra e com a Câmara Municipal.

O seu trabalho estende-se a vários concelhos.

Neste momento está em fase de conclusão a construção de um Lar no

Senhor da Serra/ freguesia de Semide.

A ADFP, pretende também avançar com a construção de um Hotel na

Quinta da Paiva.

O Lar Dr. Clemente de Carvalho localizado na Pereira e a Misericórdia de

Semide pretendem avançar com dois lares de idosos.

Recentemente foi reactivada a Santa Casa da Misericórdia de Miranda,

através da aprovação de novos estatutos, desconhecendo-se ainda o trabalho

que irá ser desenvolvido.

Caro/cara Presidente

Miranda nunca foi um concelho com grande tradição industrial, nem com

grandes riquezas.

Como referi, o País vive uma crise económica grave. É importante lembrar

empresas que em tempos tão difíceis, trabalham para contrariar essa crise.

Temos no concelho alguns bons exemplos. Permitam-me que saliente a

empresa Isidoro Correia da Silva que recebeu o prémio PME Excelência e as

empresas Joalplás, Piclima, Contraforma e Tricana.

A empresa Isidoro Correia da Silva trabalha na construção civil , a Joalplás

na reciclagem de plásticos, a Piclima em sistemas de aquecimento e a Tricana

e um dos maiores importadores de carpetes persas.

Para alem destas existem varias outras empresas em vários sectores, mas de

pequena dimensão.

O sector industrial nunca foi preponderante no concelho em virtude dos

recursos fi nanceiros serem reduzidos e da carência de boas acessibilidades

rodoviárias.

Temos no concelho dois parques eólicos que produzem energia para mais

de 50.000 pessoas.

O concelho está bem dotado de superfícies comerciais.

Temos no concelho para alem dos lares da ADFP e Dr. Clemente de Car-

valho que são geridos por instituições sem fi ns lucrativos, um lar privado

localizado nas Chãs em Semide.

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Ao nível desportivo e de lazer, temos no concelho bons espaços desporti-

vos, atendendo a dimensão populacional.

Temos também boas instituições com bom trabalho desportivo.

Merecem destaque as piscinas municipais descobertas e a piscina muni-

cipal coberta, circuito de manutenção, ciclovia, campos de jogos, Pavilhões

desportivos, Centro Hípico, campos de Futebol, Ringues para a pratica des-

portiva, entre outras infra-estruturas.

Em conjunto com a secção de Judo da Casa do Povo, apoiada pelo atleta

Filipe Nuno Rosa e outros amigos, conseguimos realizar no concelho pelo

terceiro ano consecutivo o torneio internacional de judo, nível esperanças.

Este ano tivemos a participação de 13 países.

Trata-se de provas de grande nível que normalmente só são realizadas em

grandes cidades.

O clube Náutico também tem feito um bom trabalho na divulgação da

natação.

É importante que a nossa câmara cultive esta cultura de reconhecimento

do valor das pessoas e organizações, respeitando todos por igual, salientando

as suas diferenças.

Penso que todos sem antagonismos inúteis, devemos unir esforços para

trabalhar em conjunto, dando o máximo de todos nós, para bem servir e

melhorar a imagem do nosso concelho.

Caro Presidente/Cara Presidente

Ao longo do ano organizamos no concelho vários eventos, com carácter

lúdico e de promoção das nossas actividades.

Entre os eventos organizados pela Câmara merecem destaque a Expo

Miranda /mostra de actividades económicas e lazer, Festa das Vindimas em

Lamas, feira do Mel, feira da Arvore em Semide, Festival da juventude, Festi-

val do Bem Estar e alguns festivais gastronómicos nomeadamente “ Miranda

Capital da Chanfana” e “vivó Porco”.

Cerca de 80% das arvores produzidas no pais têm origem na nossa região.

Na freguesia de Semide temos uma enorme quantidade de viveiros de arvores.

Quer arvores de fruta quer arvores ornamentais, fundamentalmente camélias.

Por esta razão organizamos a feira da arvore.

Espero que no futuro esta produção evolua favoravelmente, acompanhada

de grande trabalho de investigação e melhoria de espécies.

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São realizados no concelho varias festividades religiosas, com particular

destaque para a Procissão do Senhor dos Passos e para a Via Sacra, que se

realizam na Quaresma e para a Romaria do Senhor da Serra que se realiza em

Agosto.

Na senhora da Piedade em Tábuas temos também uma romaria.

Caro Presidente/cara presidente

Quero aproveitar este dia e esta comunicação para lhe dar a conhecer algu-

mas das ultimas realizações e acontecimentos.

Ao nível da qualidade de serviços conseguimos um prémio importante.

Graças ao empenho de todos, a autarquia viu grande parte dos seus serviços

certifi cados no âmbito do sistema de qualidade.

Este processo representou muito trabalho e muito esforço.

Uma Câmara que consegue certifi car os seus serviços signifi ca uma Câmara

com capacidade para servir melhor.

Ultrapassado este grande desafi o, queremos contudo continuar a melhorar.

Ao nível desportivo e do lazer saliento o Pólo de Lazer da Quinta da Paiva.

Concluímos o restauro da Casa dos Reis em Vila Nova, que incluiu a constru-

ção de balneários de apoio a piscina e campo de jogos.

Trata-se de óptimos locais de lazer muito procurados pela população. No

Verão de 2010 só na piscina da Quinta da Paiva tivemos mais de 20 000 pes-

soas. O Parque Biológico contabiliza cerca de 30 000 visitantes.

Em termos de requalifi cação urbana temos procurado realizar vários inves-

timentos. Estes investimentos têm ocorrido por todo o Concelho.

Requalifi camos as ruas do Centro Histórico, o largo do mosteiro em

Semide, Construímos praças e Zonas Verdes, nomeadamente as praças do

Corvo, Cruz Branca, Quinta do Viso, Feira dos Bois; Fausto Correia, Mon-

toiro, entre outras.

Temos transformado algumas estradas em ruas, através da construção de

passeios com o objectivo de melhorar a acessibilidade das pessoas.

A nossa vila está cada vez mais bonita.

Miranda está cada vez mais acolhedora.

Temos vindo a requalifi car vários espaços do núcleo histórico.

Temos como objectivo dar continuidade a estas obras, melhorando a

envolvente da Igreja, a Zona da Torre e da cisterna e toda a área do Calvário.

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Em colaboração com vários municípios, apresentamos uma candidatura

aos fundos comunitários para tentar obter alguns apoios.

Miranda é um concelho com vários séculos de existência. Tivemos foral

em 1136. Essa candidatura tem como objectivo promover a competitividade

e o desenvolvimento cultural de vários municípios que faziam parte da Linha

defensiva do Mondego.

Esta candidatura foi recentemente aprovada, pelo que é nossa intenção dar

inicio a alguns investimentos de requalifi cação desta zona.

Temos muita pena de gerações anteriores não terem conseguido salvar o

Castelo.

Tudo iremos fazer para reactivar a sua memoria e a sua historia.

Queremos melhorar as acessibilidades das pessoas. Estamos a desenvolver

alguns projectos de melhoria de acessibilidades. Queremos ter um concelho e

uma vila onde caminhar a pé seja agradável e seguro.

Trata-se de um plano com concretização a Longo prazo, mas no fi nal

encher-nos-á certamente de orgulho.

Para o Senhor da Serra em colaboração com a Comissão do Santuário

estamos a projectar a criação de um espaço de lazer.

O Senhor da Serra era um local de culto muito importante na região. Nas

ultimas décadas tem perdido importância. Acreditamos que no futuro pode

ser um ponto de atracção importante do nosso concelho.

Em Semide temos o Mosteiro, classifi cado como monumento Nacional.

Trata-se de património do Estado.

Em 2003/2004 conseguimos que fossem realizadas algumas obras de con-

servação. Urge contudo que o Governo de continuidade as obras.

Temos continuado a pressionar o Governo para que avance com as obras

da segunda fase de recuperação do Mosteiro.

Sabemos que existem fundos comunitários que apoiam estas obras. Existe

já uma candidatura aprovada. Esperamos que o Governo não desperdice esta

oportunidade.

Temos esperança que as obras avancem.

Caro Presidente/Cara Presidente

Provavelmente não assistirei a leitura desta carta, mas .. Tenho pena...

Acredito... tenho esperança que quando esta carta for lida o Mosteiro

exista, com os seus claustros recuperados.

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Tenho esperança que seja um motivo de orgulho do concelho.

Da minha parte, tudo continuarei a fazer para espicaçar os governantes a

avançarem com as obras.

O Mosteiro de Semide para além do seu valor patrimonial é um mosteiro

com vida. Acolhe no seu interior o lar da Caritas e uma escola de formação

profi ssional.

Não tenho poder para dar a ordem do início das obras mas tudo vou con-

tinuar a fazer para que não se esqueçam do Mosteiro de Semide. Actualmente

temos em inicio de implementação um novo Quadro Comunitário. Temos

uma candidatura aprovada. Espero que o Governo aproveite as verbas dispo-

níveis para realizar as obras em falta.

Caro Presidente/Cara Presidente

Ao nível da educação temos feito uma autêntica revolução no concelho em

colaboração com a administração central.

Nos últimos oito anos foram construídas várias escolas no Concelho que

vieram substituir escolas antigas. Merecem realce as novas instalações da

escola José Falcão, a Pré Primaria da Feira dos Bois, a nova escola Ferrer Cor-

reia, e o actual Centro Educativo em fase fi nal de construção.

O novo Centro Educativo tem 12 salas e esta a ser construído Na Rua

Mota Pinto.

A construção da nova escola, representa um grande esforço fi nanceiro para

a autarquia mas é um esforço justo e necessário. As nossas crianças merecem

ainda melhores condições. Temos um concelho que já tem boas infraestruras

escolares. Onde as crianças têm inglês e desporto desde a Pré-primaria. Mas

queremos ainda mais para as nossas crianças. Queremos ser um bom exemplo

a nível nacional.

Caro/cara Presidente

Provavelmente ao ler esta carta, está a rir..

Todas estas instalações que hoje são modernas, em 2060 estão velhinhas.

Eventualmente as crianças já nem precisam de escolas para aprenderem..

Provavelmente a evolução tecnológica já transformou completamente o

actual modelo de aprendizagem..

Mas hoje, 5 de Outubro de 2010, isto é importante.

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144 república e democracia

Caro/cara Presidente

Como lhe referi no inicio desta carta, quase um testamento, um dos proble-

mas que o pais sente actualmente, prende-se com a baixa taxa de natalidade.

Os jovens que nascem hoje, só serão população activa capaz de gerar ren-

dimentos dentro de aproximadamente 30 anos.

Caro/cara Presidente... provavelmente será um destes jovens.

Se a natalidade continuar a diminuir e a população, dentro de alguns anos

sobrarão escolas, restaurantes, edifícios, etc, etc.

Urge por isso tomar medidas.

Devem ser tomadas medidas sérias e efi cazes pelo Governo. Estamos a

falar de medidas que extravasam a esfera municipal.

Mas o município de Miranda também quis dar o exemplo. Somos um con-

celho pequeno, com poucos recursos, que felizmente tem tido crescimento

populacional, mas que apesar disso quis mostrar que sente o problema e que

está preocupado.

Com este objectivo avançamos com um programa de incentivo a natali-

dade, no concelho.

Sabemos que o nosso programa não resolve o problema, mas serve certa-

mente para mostrar ao governo que estamos perante um problema que exige

refl exão seria e adopção de medidas.

Caro Presidente/Cara Presidente

Somos a favor da descentralização. Quer ao nível das escolas, quer ao nível

dos vários serviços.

Lutamos bastante contra o encerramento das urgências no concelho.

Lamento ainda hoje, o facto de termos tido pouco apoio.

A educação é um exemplo. Mas também constituem exemplos as piscinas

em algumas freguesias e os Centros Sociais.

A Delegação dos Bombeiros de Semide é outro exemplo. Semide é a

segunda maior freguesia do concelho.

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Em Semide construímos um pavilhão Multi-serviços.

Este espaço inclui estabelecimentos comerciais, a sede da junta de freguesia

e alguns espaços projectados para a realização de eventos e dinamização da

economia local.

Incorpora também alguns gabinetes para apoio ao empreendedorismo

jovem. Estes espaços estão reservados para acolherem jovens, de preferência

licenciados ou com formação profi ssional, que tenham projectos de negocio

capazes de dinamizar e criar riqueza.

Infelizmente tivemos que vencer vários obstáculos, a semelhança do que

aconteceu quando avançamos com o projecto do destacamento de bombeiros.

Infelizmente continuam a existir pessoas que defendem que este tipo de

investimentos devem ser construídos apenas na vila.

Criticamos o Governo quando assume uma postura centralista. Também

discordamos daqueles que pensam dessa maneira em relação ao concelho.

Acreditamos que com o esforço conjunto da Câmara, juntas de freguesia e

das varias instituições , a população do concelho será melhor servida.

Para melhor protegermos a fl oresta, temos procurado rectifi car várias

estradas fl orestais, construímos pontos de água e estamos a desenvolver várias

acções de silvicultura preventiva.

A fl oresta pode ser uma boa riqueza do Concelho. Necessita contudo de

ordenamento e maior protecção.

Felizmente temos no Concelho uma boa corporação de Bombeiros, a

AHBVMC.

O facto de termos um sistema de propriedade muito dividido, difi culta a

adopção de medidas mais efi cazes.

Apesar do bom Trabalho dos Bombeiros, todos os anos no Verão sofremos

com os incêndios.

Espero que ao ler esta carta este problema esteja resolvido e com uma

melhor solução.

O nosso ambiente e a nossa fl oresta merecem esse esforço.

Temos consciência que Miranda não tem uma grande tradição Industrial.

Fruto da crise económica, algumas das empresas sediadas no concelho têm

vindo a fechar.

Na sua maioria, são empresas trabalho-Intensivas que sofrem com a con-

corrência dos países de mão-de-obra barata. A crise económica do país tam-

bém agrava o problema.

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Para atenuar estas situações, a Câmara avançou com projectos de criação

de zonas industriais e com um projecto de ampliação e requalifi cação da exis-

tente. Trata-se de processos morosos ao nível de licenciamento.

Felizmente, algumas das instalações de antigas fábricas que tinham encer-

rado, também foram adquiridas por empresários do concelho com o objectivo

de proporcionarem a expansão dos seus negócios.

Avançamos com obras de requalifi cação da zona industrial de Miranda e

estamos a ultimar o processo para avançar com obras na zona Industrial de

Semide.

Para alem das acções referidas, a Câmara Municipal tem estado a desenvol-

ver contactos com a Universidade de Coimbra e com o CBE. Esses contactos

visam a criação no concelho de uma unidade de experimentação/incubadora

de negócios.

Pretendemos com este projecto apoiar o empreendedorismo de jovens com

ideias inovadoras.

Vamos avançar com um projecto de requalifi cação e ampliação do mercado.

Em alguns dos novos espaços, pretendemos apoiar jovens no lançamento

dos seus negócios.

Num espírito de união iremos criar condições para que jovens possam

desenvolver a sua ideia de negócio de forma facilitada, disponibilizando-lhes

instalações e apoio logístico.

Vivemos numa economia de mercado, onde a iniciativa empresarial per-

tence à iniciativa privada. Compete aos empresários e aos jovens empreende-

dores avançarem com os seus negócios.

A câmara municipal apenas pode colaborar criando condições propicias

e defendendo a realização de investimentos, nomeadamente ao nível das

acessibilidades.

Apesar das difi culdades é isso que procuramos fazer.

Ao nível turístico avançamos com alguns projectos.

No Gondramaz, realizámos vários investimentos. Transformámos o Gon-

dramaz numa aldeia turística.

O Gondramaz é hoje apelidada como uma aldeia “ mais que perfeita”.

Avançámos no Gondramaz, com um projecto intitulado “Gondramaz

Acessível”. Queremos que todas as pessoas, incluindo as portadoras de defi -

ciência,, se sintam bem no concelho. Este projecto transformou esta aldeia

num exemplo.

Criamos uma rede de caminhos pedestres.

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Fruto do bom exemplo, grande parte do Cadaval foi adquirida, para insta-

lação de um projecto turístico. O Cadaval esta completamente abandonado.

As casas estão todas em ruínas. Se este projecto se concretizar, poderá dar

origem a uma bonita aldeia recuperada.

Fazemos votos para que este projecto tenha sucesso.

Caro Presidente, Como está o Cadaval ? Existe ? foi recuperado?.

Espero que sim. O projecto é muito bonito.

Temo contudo que a actual crise económica difi culte a implementação.

Queremos que Miranda seja cada vez mais uma Comunidade Saudável e

Solidária.

Estão em curso vários projectos com objectivos turísticos.

Temos um concelho muito bonito, rodeado de serras.

Localizamo-nos próximo de Coimbra e relativamente próximos da Figueira

da Foz.

Ao nível das infra-estruturas fomos dos primeiros concelhos a ter electrici-

dade e água ao domicilio.

Ao nível das infra-estruturas de saneamento temos contudo algumas defi -

ciências, grande parte das quais já estão a ser corrigidas ou com projectos.

Pela empresa Águas do Mondego, da qual a Câmara de Miranda é accio-

nista, foram recentemente terminadas as obras de melhoria da captação da

Boa Vista, no rio Mondego, e de construção das condutas que permitiram

trazer a água do rio Mondego até Miranda, o que garantirá o abastecimento

de água em quantidade e com qualidade. Cerca de 80% da população era

servida a partir do rio Ceira. Com a redução dos níveis freáticos estávamos a

ter alguns problemas em verões de seca, como foi o caso de 2005.

Este abastecimento a partir do Mondego será mais efi caz.

Já foi lançado também o concurso, que ira permitir servir parte da popula-

ção de Vila Nova, substituindo o actual sistema de abastecimento.

Na vila construímos recentemente a Alameda das Moitas e esta em cons-

trução uma nova rua que fará a ligação da Rua 25 de Abril ao Corvo. Estamos

também a rectifi car a estrada real e vamos rectifi car a Rua do Porto Mourisco

e ligação a Mota Pinto.

Temos rectifi cado varias estradas no concelho.

Estas estradas localizam-se nas varias freguesias, nomeadamente: Lamas,

Miranda, Rio de Vide, Vila Nova, Semide e Miranda.

Constituem exemplos as estradas de Lobases/Urzelhe; Cerdeiras/Bubau;

Lamas/Pousafoles; Cadaixo/Gondramaz; Miranda/Moinhos/Vale do Açor;

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148 república e democracia

Senhor da Serra/Coenços ; Pomar de Braços /Segade, Rio de Vide /Pisão,

entre outras.

As acessibilidades vão manter-se sem dúvida como prioridade.

O Ramal da Lousã continuará também a ser uma grande prioridade.

Caro Presidente

A Refer, a CP e a Metro Mondego avançaram com as obras na linha e com

a construção dos interfaces. Toda a envolvente a estação está hoje requalifi -

cada. Decorrem as obras na linha no troço Serpins/Carvalhosas.

Os interfaces do Corvo e dos Moinhos estão em construção.

O inicio das obras constituiu uma alegria mas também uma preocupação.

O ramal da Lousã é uma linha centenária. Tínhamos um bom sistema de

transporte embora com necessidade de modernização.

No fi nal da década de 80, princípios da década de 90, do século passado

começou a ser projectado um novo sistema de transporte para a linha. Este

futuro sistema de transporte denominava-se Metro Mondego.

Previa a substituição da antiga linha ferroviário por um moderno sistema

de metro de superfície.

Contemplava também a criação de novas linhas, nomeadamente de acesso

aos HUC, em Coimbra.

Durante vários anos, só existiram promessas, continuando a linha a

funcionar.

Muitas pessoas, com receio da crise económica defenderam varias vezes

que o projecto não fosse tão ambicioso e que contemplasse apenas a moder-

nização e electrifi cação da linha e a compra de moderno material circulante.

Eu própria partilhava desta opinião, pois temia a falta de recursos para um

projecto tão ambicioso.

Os sucessivos governos informavam contudo que o sistema só teria sucesso

e só seria realizado se fosse implementado como estava formatado. Um sis-

tema de metro de superfície.

Após sucessivas promessas, o investimento entre Serpins e Carvalhosas

avançou no inicio deste ano. A linha foi arrancada.

O governo optou por dividir o investimento em troços, prometendo que

os concursos seriam lançados de forma sucessiva. O prazo para a concretiza-

ção do projecto no circuito Serpins/Coimbra era de dois anos.

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Essa promessa foi cumprida inicialmente.

Em Agosto deste ano surgiram contudo vários problemas. O governo man-

dou estudar cenários alternativos a concretização e faseamento do projecto.

Alegando a situação de crise, colocou-nos em pânico. Neste momento con-

tinuam a decorrer as obras adjudicadas, mas não foram entregues as obras

complementares, nomeadamente os troços Carvalhosas/Coimbra, nem foi

adjudicada a compra do material circulante.

Tínhamos um sistema de transporte ferroviário a necessitar de moderni-

zação mas que funcionava. Tínhamos vários comboios a fazer o trajecto para

Coimbra e Lousã. Já em pleno cenário de crise, o governo interrompeu o

sistema e arrancou a linha.

Caso o projecto não tenha continuidade ou seja interrompido, estamos

perante uma total irresponsabilidade dos governantes. Se não existiam os

recursos fi nanceiros não tinham iniciado as obras.

Trata-se de um projecto com apoio de fundos comunitários.

Espero que se trate apenas de um pequeno momento de instabilidade.

A paragem do processo agora signifi caria estragar todo o investimento já

realizado.

Seria mau de mais para ser verdade.

A concretização do projecto representaria uma boa acessibilidade ferroviá-

ria ara Coimbra.

No anterior sistema tínhamos Comboios de hora a hora para Coimbra.

Nas “horas de ponta” os intervalos eram menores. O tempo de viagem de

Miranda para Coimbra era de aproximadamente 30 minutos.

Com o novo sistema passaríamos a ter comboios com maior frequência e o

tempo de viagem passaria a ser um pouco menor.

Caro/cara presidente

Espero que este pesadelo esteja a acabar e que o projecto seja concluído

rapidamente.

A interrupção do sistema signifi caria uma total irresponsabilidade dos nos-

sos governantes.

Temos consciência que o pais vive uma situação de crise económica, mas é

obrigação dos governantes terminar os investimentos iniciados.

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Admitimos que possam existir atrasos relativamente ao lançamento e cons-

trução das novas linhas, mas não desculpamos interrupções no sistema e tro-

ços que ja funcionavam.

Caro/cara Presidente

Este é um dos problemas que mais nos preocupa actualmente.

Espero que ao ler esta carta, o sistema funcione e seja um sucesso.

Espero que a população de Miranda tenha óptimas ligações ferroviárias

para Coimbra.

Ao nível das acessibilidades rodoviárias esta em curso um belíssimo pro-

jecto para a nossa região.

O Governo lançou o IC3, tipo auto-estrada, de Tomar a Coimbra, com

variante a Lamas.

Esperamos que a obra seja iniciada rapidamente. Trata-se de uma parceria

público/privada.

Temos estado a reunir com a empresa que venceu o concurso e com a

empresa Estradas de Portugal.

As previsões apontam o inicio da obra para o primeiro trimestre de 2011.

Trata-se de uma via de crucial importância para vários concelhos do

interior.

Nos últimos anos, com a rectifi cação da EN17-1 de Miranda ao Espi-

nhal e com a conclusão da variante da EN342, melhorámos muito as nossas

acessibilidades.

No âmbito do distrito é fundamental a construção do novo traçado do

IC3.

A existência de um eixo rodoviário a Sul de Coimbra que unirá o IP3 ao

nó da auto-estrada em Cernache e que por Penela vá unir ao actual troço do

IC3 em Tomar deve ser uma prioridade.

Este anel à volta de Coimbra é uma grande prioridade que também ajudará

a resolver muitos problemas sentidos pelo trânsito da estrada da beira.

O IC3 terá quatro faixas, Será muito similar a uma auto-estrada.

Após a construção desta estrada fi caremos com óptimas ligações.

Caso se concretize este investimento tal como previsto, somos de opinião

que o concelho passara a reunir muito melhores condições de atracção de

empresas.

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Somos de opinião que deve surgir uma nova zona Industrial, na freguesia

de Lamas, próximo do IC3.

Caro Presidente/Cara Presidente

Acreditamos que as acções de requalifi cação no Gondramaz, em Semide e

no centro histórico da vila poderão contribuir para a valorização de Miranda

como ponto de interesse turístico.

Acreditamos que o projecto da Casa das Artes a instalar junto a Alameda das

Moitas, candidato a fundos comunitários e o projecto do Jardim da Paz, irão

enriquecer o Concelho e contribuir para o reforço da marca “ solidariedade”.

O projecto do Jardim da Paz, é um sonho que gostaria de concretizar.

Tenho consciência que estou perante um projecto ambicioso, mas espero

ter condições para o iniciar.

Um jardim/parque que terá no seu espaço monumentos de homenagem

aqueles que fi zeram bem ao Mundo.

Alguns dos Prémios Nobel da Paz fi gurarão nesse espaço.

Esse jardim ajudará a consolidar a marca da solidariedade do concelho,

mas constituirá também um local de ensino e formação para as crianças.

Neste âmbito não podemos esquecer as potencialidades do Senhor da Serra

e da Quinta da Paiva.

No caso da Quinta da Paiva a concretização do investimento tem sido

mais fácil porque temos duas entidades distintas a cooperar. Se todos os

investimentos fossem realizados apenas pela Câmara não seria possível a sua

concretização.

Acreditamos que no fi nal da realização dos vários projectos teremos na

Quinta da Paiva um pólo turístico com importância regional.

Todos estes investimentos, quer os da Câmara quer os da Associação, estão

a transformar a Quinta da Paiva num excelente parque de lazer capaz de servir

as pessoas de Miranda e de ser um excelente pólo de atracção turística.

Felizmente esta parceria tem merecido elogios.

Em 2007 a Câmara Municipal e A ADFP ganharam um importante pré-

mio internacional, na componente investimento humano. Esta parceria entre

a Câmara Municipal e a ADFP foi escolhida pelo governo para representar

Portugal na competição europeia.

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O projecto da Quinta da Paiva foi organizado a partir da elaboração de um

plano de pormenor que inseriu no território da quinta diferentes espaços com

diferentes usos.

Foram projectados vários equipamentos para cada um dos espaços.

Alguns dos lotes são da Câmara Municipal, outros lotes são da ADFP.

A ADFP, já tinha construído há vários anos um centro hípico muito voca-

cionado para a equitação adaptada. Recordo que o primeiro cavaleiro portu-

guês que esteve nos para-olímpicos foi Mirandense

Em 2009 a ADFP construiu o parque biológico e a quinta pedagógica.

No parque biológico temos representados todos os animais domésticos e

selvagens do pais.

A curto prazo esperamos ter também o urso. O urso habitou o nosso ter-

ritório ate ao Séc. XVIII.

O projecto esta a revelar-se um sucesso.

O grande objectivo deste investimento consiste em dar trabalho a pessoas

com defi ciência e vitimas de exclusão, e simultaneamente criar um projecto

sustentável com interesse turístico.

A ADFP, pretende construir no local um Hotel e um Museu.

Sempre com os mesmos objectivos, criar postos de trabalho, integrar pes-

soas e promover o concelho.

A Câmara Municipal avançou com a construção de uma piscina desco-

berta, que foi inaugurada em 2007. Posteriormente e dando cumprimento

ao previsto no plano de pormenor, projectamos e construímos um belíssimo

parque de lazer.

Este parque inclui, estacionamentos, zonas verdes, circuito de manuten-

ção, parques de jogos incluindo um mini-campo de relva sintética, caminhos

com calçada e iluminados, parque infantil, etc.

Temos ainda prevista a construção de um pequeno anfi teatro, embeleza-

mento do rio e recuperação do interior de um moinho.

Adjudicamos recentemente a construção de um bar de apoio.

O Projecto no seu conjunto tem sido um sucesso.

Desde que abriu o parque biológico, em Junho de 2009, até Setembro de

2010, o numero de visitantes com bilhetes pagos, ultrapassou os 30.000.

A acrescer a este numero temos mais de 20.000 pessoas nas piscinas no

verão de 2010 e muitas pessoas na zona verde.

Temos um numero elevado de frequentadores dos espaços verdes de uso

livre.

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Pessoas de todo o pais, amantes da natureza, interessados em conhecer a

nossa fauna e a nossa fl ora.

Urge por isso avançar com a construção do Hotel e do museu.

A câmara pretende adquirir mais terrenos na zona e ampliar o parque verde.

Queremos que todo este complexo funcione como uma verdadeira zona

Turístico/ ambiental capaz de aumentar a qualidade de vida dos mirandenses

e que funcione como um bom cartão de visita para os turistas.

Caro/Cara Presidente

Acredito que vamos conseguir concretizar estes investimentos.

Vale a pena lutar pelas nossas ideias,

Enfrentar adversidades, incompreensões.

Vale a pena o confronto democrático assente em diferentes programas e

convicções.

Há quem diga mal da politica. Há quem diga que são todos iguais.

Há quem esteja profundamente desiludido, com aqueles que prometem o

que sabem não poder cumprir.

Permitam-me que compreendendo esses estados de espírito, vos diga que

compete a todos nos demonstrar que a politica e uma missão nobre, seria,

digna, absolutamente necessária a melhoria do nosso dia-a-dia.

Há políticos desonestos, hipócritas e egoístas.

Cabe-nos mostrar que existe também uma maioria que é capaz de pensar

primeiro na comunidade e no interesse colectivo.

Neste dia 5 de Outubro , é isso que peço a todos os autarcas de Miranda.

Pessoalmente tenho imenso gosto em desempenhar estas funções.

São funções exigentes ao nível do trabalho e da dedicação.

Mas são funções muito gratifi cantes.

Pessoalmente dá-me uma enorme satisfação lutar pela concretização de

projectos úteis para a minha terra.

Em tempos de austeridade, com poucos recursos e varias necessidades,

sempre que conseguimos cumprir um projecto ou um compromisso, esta

satisfação é ainda maior.

O pluralismo deve ser factor de criatividade com mais e melhores ideias.

Para além da legitima afi rmação das diferenças partidárias, estamos obriga-

dos a gerar consensos que se traduzam em desenvolvimento e progresso.

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154 república e democracia

É por Miranda e pelos Mirandenses que espero continuar a trabalhar.

Face à lei da limitação de mandatos, já não vou ser presidente do municí-

pio muitos anos.

Espero contudo, poder continuar a trabalhar na defesa de Miranda e dos

interesses dos mirandenses, especialmente dos que mais precisam.

Caro Presidente ou Cara Presidente

Tenho uma grande satisfação. Fui eleita presidente de Câmara num conce-

lho que adoro. Tenho uma profunda admiração e carinho pelos Mirandenses.

São pessoas muito solidárias e com um elevado espírito democrático.

São pessoas inovadoras.

Fui eleita três vezes, apesar do partido que represento (PSD) não ser o par-

tido preferido da maioria dos Mirandenses actualmente.

Fui durante dois mandatos a única presidente de Câmara do Distrito.

Todos os outros presidentes eram Homens.

Acredito que no futuro esta situação vai ser alterada, para bem da democracia.

Infelizmente no momento actual ainda existem muito poucas mulheres na

politica.

Em Miranda as pessoas sempre souberam separar os interesses partidá-

rios dos interesses colectivos. No mesmo acto eleitoral a minha lista ganha as

eleições para a Câmara e outro partido ganha as eleições para a Assembleia

Municipal ou Juntas de Freguesia.

Mesmo quando as eleições para o Governo e para os Municípios ocorrem

quase em simultâneo as pessoas do meu concelho distinguem e votam de

formas muito diversas.

Esta situação actualmente não é comum nos concelhos vizinhos.

Por exemplo em Condeixa, Penela, Lousã, não têm esta tradição.

Nestes concelhos o normal e o partido que ganha as eleições legislativas

ganhar também as restantes eleições. Nestes concelhos o normal é o partido

que ganha nas eleições da Câmara ganhar também as outras eleições.

Somos por isso um concelho diferente, com grande maturidade democrática.

Sinto outro grande orgulho, as mesas de voto onde tive sempre a melhor

votação foram as mesas dos jovens e das pessoas que escolheram Miranda para

viver.

Espero que alguns desses jovens, tenham prazer ao ler esta carta.

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fátima ramos 155

Espero que riam das minhas preocupações. Espero que usufruam dos meus

sonhos e de todos os sonhos dos mirandenses que me seguirão nestas funções.

Formulo votos para que o seu espírito jovem se mantenha e que sejam

muito felizes.

Dentro de 50 anos terei 98 anos.

Bonita idade.

Espero poder comemorar convosco. Nessa idade chanfana não devo que-

rer. Estou disponível para beber uma caipirinha ou um vinho do Porto.

Pode ser na Quinta da Paiva, no Festival da Juventude ou noutro lugar

mais agradável e mais bonito que entretanto tenham descoberto.

Garanto-vos que estarei menos esquisita e menos chata.

Escreverei menos.

Beijinhos!!!

Até sempre...

Miranda do Corvo, em 5 de Outubro de 2010

fátima ramos

Presidente da Câmara Municipal

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A EDUCAÇÃO E A LUTA PELA CIDADANIA NA Iª REPÚBLICA

anabela nunes monteiro

A escolha do tema em questão assume-se como pertinente no ano em que se

assinala a efeméride da implantação da República Portuguesa, um marco

histórico no caminho da tríade ideal do Liberalismo, bem assim como da

luta, sempre recorrente, pelo permanente exercício da cidadania. Com efeito,

no mundo actual e com as difi culdades que Portugal atravessa, falar do ideá-

rio defendido por republicanos como José Falcão, Afonso Costa, Manuel de

Arriaga, Bernardino Machado, entre outros, é actual, necessário e até indispen-

sável para esta nossa sociedade que, progressivamente, se tem arredado da parti-

cipação cívica e da luta pelos seus direitos, nomeadamente o direito inalienável

de exercer o seu voto. Foi também contra este tipo de apatia e desinteresse que,

continuadamente, se vai apoderando dos portugueses – alheamento perigoso

que coloca em causa a Democracia – que o republicanismo português, dos

fi nais do século XIX e princípios do XX, se posicionou e lutou.

No dealbar da revolução republicana, Portugal “resumia-se” a duas cida-

des – as únicas tidas como verdadeiras urbes pelo historiador Oliveira Mar-

ques1 – pois todas as outras não se conseguiam livrar do seu cariz rural.

A maior parte do povo vivia espalhada pelos campos, labutando, arduamente,

numa agricultura pobre e defi citária. Os interesses dessa gente humilde, igno-

rante e sem grandes perspectivas de vida, convergiam, naturalmente, para os

aspectos mais prementes da sobrevivência do dia-a-dia. A educação, direitos e

até saúde, importantes para a melhoria de condições de vida, passavam para

um plano mais secundário, pois ainda estava pouco desperta uma consciência

cívica. Não quer isto dizer que não se havia percepcionado, ainda nos tempos

da monarquia, o obscurantismo educacional reinante. Os governos constitu-

cionais monárquicos, desde 1820, foram sensíveis a este problema, mas a sua

1 Marques, A.H. de Oliveira – A primeira República Portuguesa, 2.ª edição. Lisboa: Texto,

1970, p. 16.

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preocupação revelava-se, no terreno, mais direccionada para outras necessida-

des como os caminhos-de-ferro; o comércio ou as fi nanças. Portanto, a edu-

cação fi cava sempre num lugar bastante secundário no plano das intenções

governamentais. Desta forma, em 1910, sobressaía um país com uma alta

e triste percentagem de analfabetismo que rondava a taxa de 77,4%. Num

contexto destes, por um lado, havia perigos que poderiam colocar a revolução

republicana e os seus objectivos em causa, mas, por outro, havia que educar

um povo para dar o salto qualitativo na consciência da demanda da sua liber-

dade de escolha.

A tarefa revelou-se, logo de início, hercúlea, perante difi culdades e carên-

cias que brotavam de todos os lados. Os revolucionários, para alcançar os

desideratos a que se propunham, aperceberam-se da necessidade de quebrar

as amarras da ignorância que tornavam a população portuguesa tão permeável

às infl uências de uma mentalidade retrógrada e conservadora. Dentro dessas

infl uências sobressaía forte a do Clero/Igreja que, desde sempre, havia fun-

cionado como um apoio indiscutível aos olhos da maioria do crédulo povo

português, principalmente das mulheres. Estas, seres aparentemente frágeis,

viviam para o lar, marido, fi lhos e demais familiares, repartindo-se entre as

tarefas domésticas e o trabalho braçal dos campos. Mesmo as que viviam nas

cidades movimentavam-se no perímetro reduzido e, muitas vezes, aconche-

gante da casa familiar, sem grandes conhecimentos, oportunidades e mesmo

interesses para se envolverem em causas ou iniciativas, ainda que de limitada

projecção. Contudo, eram elas que educavam os fi lhos, orientando-os nos

primeiros anos das suas existências. Assim sendo, havia que ultrapassar os seus

condicionalismos, para abrir as portas do conhecimento aos seus descenden-

tes. Havia, assim, que educar para a cidadania.

O problema erguia-se a dois grandes níveis: primeiro, ter capacidade

humana, técnica e fi nanceira para o novo governo levar os projectos educati-

vos, como a escolaridade primária e obrigatória aos quatro cantos nacionais;

segundo, vencer as barreiras de resistência à inovação, junto da já referida

população portuguesa. Uma atitude era legislar, mas outra era fazer cumprir as

aspirações republicanas no terreno. Compreendeu-se que o projecto educativo

poderia resultar mais depressa, se as crianças, logo de tenra idade, fossem des-

locadas dos seus lares para escolas pré-primárias, os chamados jardins-escola.

Esta reforma pedagógica infantil havia tido os seus alicerces ainda no século

XIX, quando João de Deus (1820-1896) publicou um método revolucionário

de ensinar a ler, a que chamou Cartilha Maternal, método que tentava evitar

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a aprendizagem de cor, levando a compreensão do educando à decomposição

da palavra nos seus elementos componentes. A inovação, como todas as ino-

vações, gerou entusiasmos e críticas negativas, mas tornou-se uma referência

para as preocupações educativas republicanas, num primeiro patamar. O fi lho

de João de Deus, João de Deus Ramos (1878-1953) tentou levar a cabo este

projecto inovador, criando os referidos espaços educativos. Contudo, não foi

feliz no seu propósito, pois o país lutava com muitas difi culdades fi nanceiras

e os jardins-escola em causa não tiveram êxito, ainda que o primeiro tivesse

sido inaugurado logo em 1911, em Coimbra, cujos corpos discentes e docen-

tes comemoraram, este ano, o seu centenário de laboração. Outro exemplo

mostra a fraca adesão ao citado projecto: em 1927, o seu número ascendia a

cinco, a nível nacional.

Contudo, era imprescindível avançar na reforma do sistema de ensino,

introduzindo a obrigatoriedade de quatro anos de estudo, cujos conteúdos

programáticos continham, implicitamente, uma forte componente cívica.

O discurso político, nos fi nais dos séculos XIX e inícios do XX, onde ideias

como decadência, regeneração e progresso se entrecruzavam, encontrou ter-

reno propício para a mudança julgada necessária. Só pela educação seria

possível a regeneração do país2. Ou seja, a instrução, enquanto passagem

de conhecimentos técnico-científi cos, e a educação, enquanto orientação de

valores e comportamentos que levem ao bem da coisa pública, poderiam criar

uma sociedade nova, republicana e patriota. A educação cívica pretendia,

assim, para além de criar o homem novo, celebrar o culto da Pátria, da ban-

deira e dos grandes heróis.

Nesta perspectiva, um aspecto concreto da dita reforma do ensino republi-

cana, mas cuja existência já se verifi cava nos últimos anos da Monarquia3 (jus-

tamente por força da dinâmica republicana) era a Festa da Árvore, entendida

como símbolo da regeneração da vida. Igualmente, aos chamados Batalhões

Escolares, eram ministradas a disciplina e a ginástica que os jovens, pressu-

postamente, deveriam observar. A introdução, ainda que embrionária, destas

atitudes revolucionárias foi realizada em Portugal a partir de 1880, mas a sua

matriz tinha emergido, imediatamente, a seguir à Revolução Francesa de 1789.

2 Pintassilgo, Joaquim – República e formação de cidadãos. Lisboa: Edições Colibri, 1998, p. 56.

3 Proença, Maria Cândida (coord.) – O Sistema de Ensino em Portugal. Lisboa: Edições Colibri,

1998, p. 70.

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Focando a celebração da Árvore como um dos símbolos mais signifi cativos,

verifi ca-se que representava a verticalidade; a vida – na sua transformação

desde o nascimento até à morte; o sagrado; a fecundidade; o conhecimento;

a segurança e a protecção4. Tais aspectos prendiam-se à cultura do homem de

então, profundamente enraizada numa vida agrícola, pois desta dependia a

sua sobrevivência. Daí o simbolismo da árvore, simbolismo já intensamente

explorado aquando da Revolução Francesa, a mãe das revoluções humanistas

e liberais.

Na realidade estas festas cívicas tinham dois grandes objectivos: passar para

a população valores de natureza republicana e cativar a mesma para a esco-

larização dos seus fi lhos, levando-as a uma participação activa no processo

educativo. Por outras palavras, a escola tinha de ir ao encontro das famílias, da

comunidade social. A este desafi o, difícil pela necessidade de quebrar hábitos,

preconceitos e ignorância, os republicanos souberam dar uma resposta cria-

tiva, servindo-se da própria Natureza, tão próxima de um povo lavrador, para

divulgar a mensagem revolucionária da Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

A evolução dos festejos cívicos alcançou rapidamente uma grande dimen-

são, sobretudo no âmbito da escolaridade em causa. As ditas festas com peque-

nos espectáculos e acções simbólicas, como a plantação de árvores, discursos

de propaganda, inseridos num ambiente festivo, atraíam as massas humanas

aos valores republicanos.

A primeira Festa da Árvore em Portugal, realizou-se a 26 de Maio de 1907

no Seixal, promovida pela Liga Nacional de Instrução, que havia sido criada

para impulsionar e apoiar o ensino primário popular5. Ainda nesse ano, a 19

de Dezembro, também promovida pela referida instituição, realizou-se em

Lisboa, com o apoio da Câmara Municipal, outra Festa da Árvore que mobili-

zou os estudantes das principais escolas da capital. A imagem que segue e que

diz respeito à Festa da Árvore na Amadora mostra o aspecto lúdico do aconte-

cimento, envolvendo crianças e adultos. Mais se realça o signifi cado de existir

a preocupação de publicitar o evento através de cartazes.

4 Vieira, José Neiva – O Culto da Árvore e a 1.ª República. Em linha: http//wwwO-culto-da-

-arvore-a-1ª-republica_JNV_17Fev2010.pdf, consultado a 3 de Dezembro de 2010.

5 Pintassilgo, Joaquim, Educação e Festas Cívicas no Republicanismo. Texto policopiado,

XIII Jornadas Históricas “O Ideal Republicano e a Luta pela Cidadania”, 12/13 de Nov.

2010, Seia.

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Cartaz da 1.ª Festa da Árvore na Amadora, 1909

Para além dos objectivos que foram referidos, a Festa da Árvore continha

ainda a intenção de sensibilizar os portugueses e alertar as autoridades para

um panorama fl orestal preocupante do país, dada a desarborização constante

e desordenada e as necessidades crescentes em madeira. De salientar que ao

longo do século XIX tinha-se processado um signifi cativo abate de árvores,

nomeadamente carvalhos e castanheiros, sendo, por outro lado, necessário

secar pântanos e fi xar dunas através de arborização.

Ainda em 1908, numa já activa dinâmica republicana, a Direcção Geral de

Instrução chamou a si a responsabilidade de promover a generalização da Festa

da Árvore às escolas do país, tendo sido a Liga Nacional de Instrução, de que

era presidente Bernardino Machado, a grande dinamizadora dessas Festas até

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19126. Contudo, apesar do entusiasmo gerado em torno destas campanhas e

até justeza dos princípios propagandeados, a verdade é que as mesmas cedo

contaram com a hostilidade de opositores que vislumbravam nessas festas o

veículo ideal e fácil para a propaganda do ideário republicano, com aceita-

ção, também fácil, por parte das camadas mais populares. Daí que, da parte

desses interesses instalados, tivessem partido os boicotes, com campanhas

na imprensa e arranque de árvores, entretanto plantadas. Cita-se, a título de

exemplo, um pequeno excerto do jornal A Democracia, da Covilhã, em 1914.

Por isso mais uma vez lamentamos que certos católicos, enfi leirando ao lado

de pessoas reconhecida e notoriamente inimigas da Igreja levassem o seu zelo por

uma causa tão infeliz até ao ponto de subscreverem à carta circular que foi profu-

samente espalhada pela cidade.

No entanto, em outros periódicos como O Século Agrícola, datado de

Janeiro de 1913, fazia-se a publicação entusiástica do hino às árvores com

música de Aboim Foios e versos de Olavo Bilac:

6 Ver Vieira, José Neiva – O Culto da Árvore e a 1.ª República, p. 3.

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A partir de 1916, com a entrada de Portugal na Primeira Guerra Mundial,

agravando as fragilidades que o país atravessava, iniciou-se o declínio da Festa

da Árvore, registando-se ainda algumas iniciativas dispersas e uma tentativa

ofi cial fracassada, do Ministro da Instrução Pública, em 1923, de a ressuscitar.

Desde então e até 1970 a festa cívica perdeu o signifi cado, em grande parte

porque a ditadura salazarista se alheou de actividades desta natureza.

Para alcançar a tal educação para a cidadania associou-se a regeneração da

Natureza à regeneração de Portugal, envolvendo nisso a participação do povo.

Apesar da ideia da Festa da Árvore não ser portuguesa, nem algo apenas do

regime republicano, dado que a mesma entrou ainda durante a monarquia

como já foi referido, a mesma foi fomentada por republicanos. Os mesmos

conseguiram mostrar uma República como algo orgânico, dinâmico e exten-

sivo a todos os cidadãos.

Em 2010, ao comemorar o centenário da implantação da República e dos

seus valores houve também a preocupação de envolver as escolas, a comu-

nidade educativa e a população em geral. Antes de mais, pretendia-se uma

maior e melhor aquisição de valores republicanos. No concelho de Miranda

do Corvo, diversos eventos apelaram à participação activa dos jovens estu-

dantes residentes na área geográfi ca. Pela sua invulgaridade, destacamos dois:

O primeiro diz respeito à plantação de dez carvalhos na Quinta da Paiva,

um por cada decénio passado desde a Revolução Republicana. Simbolica-

mente, cem anos depois, voltamos à preservação de valores e ideias, através de

um espécime vegetal muito resistente e duradouro no tempo que irá “contem-

plar” – esperamos nós – os duzentos anos da República Portuguesa.

O segundo evento foi o encerramento da Cápsula do Tempo, depósito de

missivas e pequenos objectos que alunos e adultos da comunidade redigiram/

/guardaram para serem entregues no dia 5 de Outubro do ainda distante ano

de 2060 (cento e cinquenta anos da República Portuguesa) a um destinatário,

claramente identifi cado ou a um jovem que tivesse o mesmo número, ano e

turma no percurso académico. Mais de duzentas mensagens foram introduzi-

das num recipiente hermético que se encontra colocado no chão da Praça da

República, devidamente assinalado, em Miranda do Corvo. O que foi solici-

tado aos afoitos participantes é que se pronunciassem sobre dois assuntos, um

internacional e outro nacional que fossem matéria jornalística, e que falassem

sobre si próprios, quem eram, o que queriam para o seu futuro, difi culdades

vividas ou êxitos conseguidos. Pretendeu-se que as cartas constituíssem docu-

mentos vividos, na primeira pessoa, sobre um período conturbado, com crises

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económicas, guerras, instabilidade, entre outros. Ao projectar a nossa época,

em muito igual aos tempos da Iª República, os nossos alunos aprenderam

mais um pouco sobre a História de Portugal, esse património imenso, por

vezes, tão esquecido e apagado. Mas acima de tudo, aprenderam mais um

pouco sobre a importância da participação cívica e do valor da História, como

testemunha de uma época.

Os objectivos de tal projecto não diferiram muito do já explanado, relati-

vamente aos primeiros republicanos com as Festas da Árvore: assinalaram-se

a República e os seus valores; salvaguardou-se a memória histórica do nosso

tempo e incentivou-se o respeito pela História e pelas suas memórias. Mais

do que isso, deixaram uma mensagem clara para os seus descendentes que a

Democracia, através da tríade liberdade, igualdade e fraternidade, é para ser

preservada. E assim sendo, daqui a quarenta e nove anos, em 2060, outros

jovens e outros adultos ao abrirem a Cápsula do Tempo, receberão uma herança

cultural e cívica que os remete para a protecção futura da sua República e dos

seus valores cívicos.

REFERÊNCIAS

Marques, A.H. de Oliveira – A primeira República Portuguesa, 2ª edição. Lisboa:

Texto, 1970

Pintassilgo, Joaquim- República e formação de cidadãos. Lisboa: Edições Colibri,

1998.

Proença, Maria Cândida (coord.) – O Sistema de Ensino em Portugal. Lisboa: Edi-

ções Colibri, 1998.

Vieira, José Neiva – O Culto da Árvore e a 1.ª República. SITE: http//www: O-culto-

-da-arvore-a-1ª-republica_JNV_17Fev2010.pdf, consultado a 3 de Dezembro de

2010.

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5 DE OUTUBRO DE 1910 25 DE ABRIL DE 1974:

DUAS REVOLUÇÕES DISTINTAS POR CAUSAS COMUNS

augusto josé monteiro valente

INTRODUÇÃO

Analisando a história contemporânea de Portugal, facilmente se reconhece

o protagonismo dos militares nas grandes transformações operadas na

sociedade. Desde 1820 todas as mudanças de regime ou foram protagonizadas

por militares, ou tiveram uma participação militar mais ou menos relevante.

Assim aconteceu, nomeadamente, em 24 de Agosto de 1820, em 5 de Outubro

de 1910, em 28 de Maio de 1926 e em 25 de Abril de 1974.

Nesses momentos históricos, a intervenção militar quase nunca, ou nunca

mesmo, assumiu um carácter institucional ou generalizado, e os militares

desempenharam sobretudo um papel de precursores da acção política ou,

simplesmente, de seus principais apoiantes, porventura na ausência de

consciencialização cívica da maioria dos portugueses, de legitimação social do

novo regime, ou como garantes transitórios da nova ordem. Quando agiram

politicamente os militares foram também determinados por motivações

próprias da sua condição, mas o peso relativo destas, a dimensão do seu

envolvimento e as lógicas organizacionais foram signifi cativamente diferentes,

muito embora pareça poder conclui-se haver uma relativa analogia de factores

políticos estruturais e de motivações concretas, obviamente salvaguardando

o distanciamento temporal e, consequentemente, a natureza distinta das

conjunturas. Na realidade, se a água não passa duas vezes por debaixo da

mesma ponte, por vezes verifi cam-se semelhanças entre acontecimentos

históricos que fazem pensar o contrário.

Analisemos então comparativamente as revoluções de 5 de Outubro de

1910 e de 25 de Abril de 1974, colocando a enfâse nos aspectos militares.

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1.º O PROBLEMA COLONIAL E A CRISE DOS REGIMES

A revolução republicana de 5 de Outubro de 1910 e a revolução democrática

de 25 de Abril de 1974 aconteceram em momentos de fi m de regime, e,

em ambos as situações, a acção revolucionária teve sobretudo um papel de

acelerador do colapso fi nal.

A crise da Monarquia Constitucional

Após o Ultimato inglês de Janeiro de 1890 a Monarquia Constitucional

entrou em crise, isolada internacionalmente e contestada por sectores

sociais cada vez mais amplos. A política colonial de várias nações europeias

e a competição internacional pelo domínio do continente africano, criaram

a Portugal problemas graves, e, curiosamente, o maior deles aconteceu

precisamente com o seu principal aliado – a Inglaterra. Com o Ultimato

fi cou esgotado o projecto colonial da Monarquia, e, a partir dele, acentuou-se

irreversivelmente a decadência desta.

Nos anos anteriores o País havia-se transformado em quase todos os

sentidos, de tal modo que se tornara evidente a necessidade de dar um rumo

diferente à vida política nacional. Os primeiros clamores de dissentimento

despontaram sobretudo nas cidades, onde se concentrava uma população

mais evoluída.

O Ultimato deu ao republicanismo o pretexto para se transformar num

amplo movimento de renovação nacional, com particular incidência junto

da juventude estudantil e dos sectores intelectuais. A escalada de indignação

e exaltação precipitou um primeiro movimento revolucionário na cidade

do Porto, em 31 de Janeiro de 1891. Apoiado nos conselhos dos «Vencidos

da Vida», que defendiam o engrandecimento e fortalecimento do poder

real, D. Carlos rompeu a partir de então com a prática anterior do seu pai,

esquecendo a Carta Constitucional, começando a intervir na vida política e

dando cobertura a sucessivos governos em ditadura.

Procurando contrabalançar o fracasso do projecto do «mapa cor-de-rosa»,

os governos monárquicos envolveram-se nas chamadas «Campanhas de

Pacifi cação Africanas», com vista afi rmação do domínio português sobre os

territórios coloniais, fundamentais para a economia nacional. Mas o País vivia

em constante situação de crise fi nanceira. Em 1898, a Inglaterra e a Alemanha

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assinaram uma convenção secreta de partilha das colónias portuguesas de

Angola, Moçambique e S. Tomé, no caso de incumprimento por parte de

Portugal da sua dívida externa, confi rmando que o País nada contava na cena

internacional.

A agravar a situação, o rotativismo monárquico entrou em crise no alvorecer

do século XX, com cisões nos principais partidos, prenunciando a falência

do regime. Sucederam-se, em Abril de 1906, amotinações de marinheiros a

bordo dos cruzadores D. Carlos I e Vasco da Gama, as primeiras revoltas em

toda a história da Marinha. A situação agravou-se nos meses de Fevereiro

e Março do ano seguinte, com a eclosão de protestos e greves académicas.

O aumento da repressão por parte da ditadura de João Franco, em lugar de

restabelecer a ordem, fez explodir os ânimos e conduziu à segunda tentativa

de revolta republicana, a 28 de Janeiro de 1908, e ao regicídio três dias depois.

A Monarquia agonizava.

Apesar das tentativas de «acalmação», a Monarquia nunca mais recuperaria.

Seguiram-se dois anos de instabilidade política e social, com vários governos

que se sucederam de modo pouco pacífi co, num quotidiano aparentemente

tranquilo mas na realidade desconfi ado da «acalmação» que lhe fora

prometida. Imberbe, reservado, mal preparado, vacilante, com a sua vontade

aprisionada e tutelado por sua mãe, D. Manuel II contrastava em tudo com

a fortaleza de convicções de seu pai. Instalaram-se os dissídios, mesmo nos

próprios arraiais monárquicos, corroídos por recriminações e suspeições.

Teixeira de Sousa, último presidente do ministério, desagradou sobremaneira

à maioria dos monárquicos, devido às medidas que procurou implementar,

algumas inspiradas no programa republicano. O sector mais conservador do

regime, civil e militar, retirou-lhe defi nitivamente a confi ança, bem como ao

Rei, começando a advogar a intervenção do exército para sanear o regime e

varrer os republicanos, e procurando aliciar para a intentona o capitão Paiva

Couceiro, mentor do grupo dos «Africanistas», vistos por esta ala como os

genuínos representantes da Nação.

Era contudo já demasiado tarde para todos os grupos conspiradores,

e também para o liberal Teixeira de Sousa. O Partido Republicano, com

crescentes apoios populares, escudado sobretudo na sua vereação lisbonense,

dotado de um novo Directório apostado na acção directa, tendo garantido a

fi delidade maçónica e a operacionalidade dos carbonários, recebera entretanto

o aval para pôr em marcha a revolução. E a 5 de Outubro a República triunfou

fi nalmente na Rotunda, culminando uma luta de trinta e quatro anos.

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168 república e democracia

O colapso do Estado Novo

A questão colonial foi igualmente a causa remota do fi m do Estado Novo.

A contestação internacional à política colonial de Salazar, a eclosão, no

início dos anos sessenta, da guerra colonial e o isolamento de Portugal perante

a comunidade internacional marcaram o início irreversível do declínio do

regime. Logo em Abril de 196 foi dado o primeiro sinal, com tentativa de

golpe de Estado dirigida pelo general Botelho Moniz. Seguiu-se, na viragem

do ano, a tentativa insurreccional a partir de Beja.

Apesar de não haver conduzido de imediato a uma situação de crise do

regime, tendo até provocado um surto de desenvolvimento económico

nos primeiros anos, a guerra colonial motivou grandes transformações na

sociedade portuguesa, e o colonialismo transformou-se na verdadeira base

material de sustentação do regime. Mas, ao mesmo tempo, o colonialismo e

a guerra foram gerando contradições políticas, económicas e sociais, fazendo

aumentar as tensões e confl itos a níveis sem precedentes na história do regime,

com expressões mais signifi cativas primeiramente no sector operário e no

meio académico. Também o surto de desenvolvimento económico acabou

por ser bloqueado pela lei do condicionamento industrial, pelo isolamento

internacional, pelos crescentes encargos fi nanceiros com a guerra, e pela falta

de mão-de-obra em consequência da vaga de emigração clandestina e das

crescentes mobilizações de jovens para as frentes de combate.

Coincidindo com a morte de Salazar e a ascensão de Marcelo Caetano,

o ano de 1969 marcou o início a crise fi nal do Estado Novo. Agravou-se a

confl itualidade entre as várias facções do bloco no poder e intensifi cou-se a

contestação social nos sectores laborais e académicos, pondo em causa a forma

organizativa do Estado Novo.

As eleições de 1969 e de 1973 desfi zeram todos os equívocos. Incapaz

de ultrapassar as divergências políticas, Marcelo Caetano recuou nas tímidas

medidas de abertura que ensaiara, fi cando prisioneiro dos sectores mais

radicais. Temendo a destruição dos interesses instalados e, sobretudo, a

alteração da política ofi cial em relação às colónias, os ultras exigiram-lhe o

regresso à matriz central e original do Salazarismo, originando uma crise de

hegemonia que acentuou a crise de legitimação do regime.

A percepção do colapso criou as condições para o aumento das exigências

por parte dos sectores da oposição democrática, centradas sobretudo na

reivindicação das liberdades cívicas e políticas, na institucionalização da

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democracia, no regresso de Portugal ao seio da comunidade internacional e

de uma relação política diferente com as colónias.

A contestação ao regime acabou por contagiar as próprias Forças Armadas,

que eram o mais forte sustentáculo do regime. E foram estas que, vencida a

facção militar mais conservadora, fi zeram precipitar o fi m do Estado Novo,

em 25 de Abril de 1974.

Em suma. A questão colonial foi a causa próxima comum dos colapsos da

Monarquia Constitucional e do Estado Novo. Os percursos fi nais dos dois

regimes foram em quase tudo muito idênticos, salvaguardando a excepção

da guerra colonial, que não teve paralelo com as «Campanhas de Pacifi cação

Africanas». O início do declínio foi, em ambos, acompanhado do aumento

da contestação social, de revoltas militares e do reforço do autoritarismo e da

repressão. E as tentativas de moderação ensaiadas, em lugar de atenuarem a

confl itualidade interna e de conduzirem à desejada liberalização, acabaram

por surtir efeitos contrários, aprofundando as contradições e os dissídios no

poder político, alargando o campo da luta política por parte das oposições e

precipitando as revoluções que lhes puseram termo, que tiveram nos militares

o seu elemento iniciador.

2.º A PROBLEMÁTICA MILITAR E AS MOTIVAÇÕES PROFISSIONAIS

É relativamente consensual a afi rmação de que a Revolução de 25 de Abril

de 1974 começou por um golpe militar conduzido pelo Movimento das Forças

Armadas, a que se seguiu uma revolução popular. Na realidade, a componente

militar foi dominante na primeira fase dos acontecimentos, se não mesmo

exclusiva. O Exército foi o ramo mais comprometido nos acontecimentos,

e os capitães a componente maioritária – daí o nome de «Movimento dos

Capitães» por que fi cou conhecido.

Em contrapartida, a participação militar na Revolução de 5 de Outubro de

1910 foi reduzida, a Marinha foi o ramo decisivo e os subalternos e sargentos

foram os principais elementos envolvidos. Factores de ordem profi ssional

contribuíram para esta diferença de comportamentos dos militares nas duas

revoluções.

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Os militares e a crise da Monarquia

No fi nal do século XIX, o Exército encontrava-se em acentuada deca-

dência, envelhecido, pouco instruído, desleixado, tecnicamente atrasado,

mal remunerado e socialmente desprestigiado. A sua principal função era

o policiamento da província, a vigilância de feiras, romarias e procissões.

A preparação propriamente militar era muito reduzida, as promoções eram

demoradas, e os ofi ciais em regra idosos eximiam-se a qualquer iniciativa ou

responsabilidade. Ao posto de capitão só se chegava à volta dos quarenta e

cinco anos de idade, e ao generalato quase aos setenta anos.

No Exército, a maioria dos ofi ciais permanecia alheada da política,

aceitando passivamente a ordem estabelecida. Os altos escalões hierárquicos,

comprometidos com o rotativismo, nem por absurdo concebiam a hipótese de

uma alteração do regime. Mas nos postos inferiores um número signifi cativo

de ofi ciais mostrava abertura às ideias republicanas, e, com maior extensão,

o mesmo acontecia entre os sargentos. Por seu turno, os cabos e soldados, na

sua generalidade, eram pouco sensíveis a um discurso essencialmente urbano,

mas na Revolução de 5 de Outubro de 1910 alguns deles desempenhariam

um papel importante na tomada das unidades e na resistência na Rotunda.

Na Marinha, em contrapartida, com melhor espírito de corpo, mais contactos

com o exterior, quase total concentração em Lisboa e maior proximidade com

o activismo revolucionário, a propaganda republicana recolhia simpatias mais

fortes em todas as classes.

A infl uência republicana fazia-se sentir sobretudo na capital, onde se

localizavam os altos comandos, os serviços de administração, os estabelecimentos

de ensino, os arsenais militares, e em cujo porto se encontravam os principais

navios de guerra, o que facilitava as acções de propaganda. A iniciação dos

militares ao republicanismo acontecia também durante a frequência dos cursos

preparatórios nas escolas superiores, condição obrigatória para o ingresso na

Escola do Exército.

Na viragem do século, havia uma forte corrente favorável a uma remo-

delação absoluta e completa das instituições militares, por forma a que se

tornassem mais proveitosas para o País, quer assegurando a paz no interior,

quer mostrando-se capazes de reagir efi cazmente contra qualquer agressão

estrangeira. As principais reivindicações centravam-se na implementação do

recrutamento obrigatório, geral e pessoal, na reestruturação dos exércitos

metropolitano e colonial, na alteração do sistema de promoções, na moder-

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nização tecnológica e na transformação da organização militar numa

instituição autónoma e prestigiada, subordinada ao poder civil e ao serviço

na Nação. Mas, até ao fi nal da Monarquia, perante o imobilismo rotativista

e as pressões da hierarquia conservadora, fracassaram todas as tentativas de

reformas de fundo. As consequências foram o alastramento da frustração e

do descontentamento, sobretudo entre os graduados dos escalões inferiores,

intelectualmente e tecnicamente melhor preparados. E a convicção de que as

mudanças ansiadas jamais lograriam êxito na vigência do regime monárquico

fez evoluir vários destes quadros para o campo republicano.

Após o Regicídio, a política de «acalmação» não conseguiu travar nem o

descontentamento, nem o crescimento do movimento republicano. A situação

começou a semear a dúvida quanto à efi cácia das medidas de transigência

adoptadas pelo regime. Reunidos no «Bloco de Defesa Monárquico», os sectores

civis e militares mais conservadores começaram a conspirar abertamente.

Alguns procuraram aliciar primeiramente o general Vasconcelos Porto, antigo

ministro da Guerra de João Franco. Perante a sua recusa, voltaram-se então

para Paiva Couceiro. Mas o seu grupo de apoiantes militares não representava

na realidade mais do que uma pequena minoria de ofi ciais, e este foi o seu

grande equívoco.

Conhecedores desta situação, os republicanos reforçaram a organização,

uniram esforços com a Maçonaria e a Carbonária, criaram uma Junta

Revolucionária e uma Comissão Militar. E na madrugada do dia 4 de

Outubro, militares, marinheiros e civis armados iniciaram a revolta e com o

povo proclamaram a República na manhã seguinte.

A participação dos militares na Revolução continua a suscitar controvérsia

entre os investigadores: uns defendem que ela foi essencialmente militar;

outros enfatizam o papel dos civis organizados em torno da Carbonária. Em

que fi car?

O movimento revolucionário apoiou-se inicialmente num plano militar

que previa o envolvimento activo de dezenas de ofi ciais e sargentos, de sete

das dez unidades do Exército aquarteladas em Lisboa, dos principais navios

de guerra e de cerca de um milhar de marinheiros. Mas apenas alguns ofi ciais

isolados e cerca de duas dezenas de sargentos reagiram activamente à hora

fi xada; e somente o Regimento de Infantaria N º 16 e o Regimento de

Artilharia N º 1 foram lançados na revolução. Por seu turno, na Marinha,

o Quartel dos Marinheiros sublevou-se à hora prevista, mas a força que dele

partiu não logrou alcançar o seu objectivo; e os cruzadores S. Rafael, Adamastor

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172 república e democracia

e D. Carlos somente pela madrugada e tarde do dia 4 foram controlados pelos

revoltosos. Que acontecera?

O inesperado assassinato de Miguel Bombarda levara o Governo a

determinar a prevenção geral das unidades de Lisboa, e vários graduados

comprometidos com a revolução fi caram sem condições, ou coragem, para

levarem a cabo as acções que lhes haviam sido atribuídas. Falhou também

a carbonária, faltou o apoio dos líderes políticos, fraquejou inicialmente a

mobilização popular. E as primeiras horas foram de confusão, angústia e

desânimo.

Mas, apesar da fraca adesão militar, o potencial de fogo dos revolucionários

na Rotunda era bastante superior ao das forças monárquicas, e, com a entrada

em acção da artilharia dos cruzadores da Marinha, a situação começou a

inverter-se. A ameaça do desembarque de centenas de marinheiros acabou por

fazer passar à defensiva as forças monárquicas, apesar de serem numericamente

bastante superiores. E com os civis armados e o povo que tomou conta das

ruas, a Revolução saiu vencedora na madrugada do dia 5 de Outubro. Apesar

da derrota militar bilateral e do papel decisivo do povo de Lisboa, os militares

foram fundamentais para o triunfo da República.

São redutoras, pois, qualquer das duas hipóteses acima referidas.

Os militares e o colapso do Estado Novo.

A eclosão da guerra colonial provocou efeitos de variada ordem no seio das

Forças Armadas, que se revelariam decisivos para a queda do regime. Logo em

Abril de 1961 ocorreu a tentativa de golpe de Estado liderada pelo ministro

da Defesa Nacional, general Botelho Moniz.

No plano estritamente militar, a intensifi cação da guerrilha em Angola

e o seu alargamento à Guiné e a Moçambique provocaram uma crescente

mobilização de efectivos militares e de quadros, sobretudo no Exército, que

no ano de 1974 atingiram uma totalidade de quase 150.000 homens, só

conseguidos pela crescente milicianização e africanização das forças armadas.

As maiores necessidades de graduados verifi cavam-se nos postos de furriel/2°

sargento, alferes e capitão, uma vez que as operações de contraguerrilha eram

conduzidas principalmente por pequenas unidades. Os primeiros eram na sua

quase totalidade milicianos. Nos quadros permanentes, o principal problema

residia na demorada formação e progressão na carreira, incompatíveis com

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as exigências da guerra. Os critérios para ingresso na Academia Militar

tornaram-se por isso mais permissivos, e a duração dos cursos e dos períodos

de permanência em subalterno foram encurtados. Mas as expectativas

goraram-se a partir de 1963, com a inversão da tendência de crescimento do

recrutamento de candidatos.

O Governo procurou ultrapassar o problema através de medidas casuísticas

com vista ao aliciamento de ofi ciais milicianos para a carreira militar. As

consequências foram, entre outras, a perda do controlo político e ideológico

sobre os escalões inferiores da ofi cialidade, a desvalorização da carreira militar

e o agravamento das tensões corporativas entre os ofi ciais com formação

normal na Academia Militar e os restantes.

A guerra colonial produziu ao mesmo tempo efeitos signifi cativos na

motivação geral dos militares, e dos quadros permanentes em particular.

O contacto com uma realidade muito diferente daquela que era divulgada

pela propaganda do regime, o desgaste provocado por sucessivas comissões, o

acumular de dúvidas quanto à legitimidade da guerra e à sua solução militar,

favoreceram uma progressiva tomada de consciência política crítica quanto ao

regime que lhes incumbia defender.

Entretanto, nos três teatros de operações a situação agravava-se conti-

nuamente, com a abertura de novas frentes e a utilização de melhor armamento

pela guerrilha. Entre os militares do quadro permanente foi-se fortalecendo a

convicção de que o regime mais facilmente aceitaria uma derrota militar que

a abertura de negociações com movimentos de libertação. Instalou-se então,

sobretudo entre os ofi ciais, o receio de as Forças Armadas serem de novo

transformados no bode expiatório do insucesso político do Governo, como

acontecera em 1961 com a Índia.

Estavam criadas as condições para os militares passarem à acção política.

A primeira tomada de posição contra a política colonial ocorreu em Abril

de 1973, quando cerca de 400 ofi ciais contestaram a iniciativa do regime de

organização do I Congresso dos Combatentes do Ultramar. Mas o detonador

do «Movimento dos Capitães» seria, contudo, de natureza profi ssional,

provocado pela publicação de legislação que inverteu as normas vigentes sobre

a antiguidade relativa e os critérios de promoção entre ofi cias de diferentes

origens.

As novas disposições foram consideradas inaceitáveis pelos ofi ciais oriundos

de cadetes da Academia Militar. Seguiu-se uma onda de protestos com uma

dimensão nunca antes vista. Alarmado, o Governo corrigiu precipitadamente

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o decreto, mas apenas parcialmente, salvaguardando os interesses dos ofi ciais

superiores mas deixando de lado os capitães e subalternos. E em 9 de Setembro

de 1973, cerca de uma centena e meia de ofi ciais dos quadros permanentes

reuniram-se numa herdade alentejana perto de Évora, para discutir uma

tomada de posição conjunta. Nascia o «Movimento dos Capitães».

O Governo recuou. Mas era já tarde. Tomando consciência de que a resolução

dos problemas da carreira militar era indissociável da recuperação do prestígio

da instituição, e que tal só seria possível com uma clara demarcação das Forças

Armadas relativamente à política colonial e ao próprio regime, a contestação

evoluiu rapidamente para a conspiração política. E só tardiamente o Governo,

e os sectores a ele ligados, se aperceberam desta alteração qualitativa.

Desavindos com Marcelo Caetano, os integracionistas do regime,

encabeçados pelo general Kaúlza de Arriaga, tentaram ainda um golpe de

Estado para afastar aquele do poder e liquidar a contestação militar. Mas

acabaram por fracassar. A organização do movimento militar decidiu então

acelerar os preparativos. Alargou-se aos três ramos das Forças Armadas,

dotou-se de um programa político e aproximou-se dos generais que lhe

mereciam maior confi ança – Costa Gomes e Spínola. Mas o segundo jogava

num projecto próprio e autónomo, só coincidente com o do Movimento no

objectivo de derrubar o Governo, e iria tentar pô-lo em prática. A publicação

do seu livro “Portugal e o Futuro” foi o primeiro passo nesse sentido.

Pressionado pelo Presidente da República, Marcelo Caetano tentou reagir,

encenando uma manifestação de apoio à política colonial por parte das mais

elevadas chefi as militares, exonerando depois aqueles dois generais. E, em

desespero de causa, enveredou pela repressão dos principais ofi ciais da direcção

do Movimento. Deixou de ser possível recuar ou adiar por muito mais tempo

a acção militar. Spínola tentou ainda reverter a seu favor a situação, com o

falhado «Golpe das Caldas da Rainha». Mas, em lugar de o conseguir, acabou

por favorecer os planos do Movimento ao pôr em evidência as fragilidades das

defesas do regime.

A comissão militar do Movimento das Forças Armadas, chefi ada pelo

major Otelo Saraiva de Carvalho, ultimou entretanto o plano operacional,

distribuiu-o às unidades e realizou as últimas coordenações. E na madrugada

do dia 25 de Abril de 1974 desencadeou uma ampla e bem conduzida operação

militar que em poucas horas neutralizou as poucas, fracas e desconexas

resistências. Surpreendido com dimensão e força do movimento militar e com

o amplo apoio popular, o regime colapsou em poucas horas.

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Em síntese. Tanto na Revolução de 5 de Outubro de 1910, como na

Revolução de 25 de Abril de 1974 as motivações mobilizadores dos militares

envolvidos começaram por ser de natureza corporativa. A progressiva tomada

de consciência politica fê-las evoluir para o campo ideológico republicano e

democrático, respectivamente.

Em 25 de Abril de 1974 os militares assumiram total protagonismo

na primeira fase da acção libertadora, numa ampla movimentação militar

envolvendo cerca de 700 ofi ciais, sendo 367 capitães, 201 majores e os restantes

distribuídos pelos outros postos, de alferes a general, um quantitativo que

elimina à partida qualquer propósito de comparação com o dos graduados

envolvidos no 5 de Outubro de 1910. Só a partir do momento em que

os acontecimentos se tornaram públicos é que a população despertou do

pesadelo de quarenta e oito anos de ditadura, e numa explosão de cidadania

transformou o movimento militar em Revolução. O 5 de Outubro teve

desenvolvimentos bastante diferentes, sendo entre todas as revoluções aquela

em que a colaboração militar-civil foi mais dominante.

No plano estritamente militar, a diferença de atitudes nas duas revoluções

teve sobretudo a ver com a longa guerra colonial e os seus efeitos no seio das

Forças Armadas, arrastando-as para uma situação de deslegitimação perante

a opinião pública e de quase colapso militar, situação que não teve qualquer

paralelo com a que se viveu nos últimos anos da Monarquia.

Outro aspecto que, no plano militar, diferencia e, simultaneamente,

aproxima as duas revoluções, diz respeito à graduação dos protagonistas

mais implicados na génese dos movimentos e na execução das operações –

tenentes e sargentos no 5 de Outubro, capitães e majores no 25 de Abril

–, se bem que em ambos os acontecimentos se tivesse verifi cado também o

envolvimento de outros quadros de mais elevada graduação, mas em número

limitado, e não contando com os numerosos cabos e soldados. Ou seja, em

ambas as revoluções a força militar proveio dos quadros mais novos, daqueles

que estavam mais directamente em contacto com as realidades, que mais

sofriam as suas consequências e que mais descomprometidos se encontravam

relativamente aos regimes políticos que lhes incumbia defender.

Um último ponto importante a registar, e que distingue muito claramente

as duas revoluções, tem a ver com lógica organizacional dos militares. Em 5

de Outubro de 1910 a lógica organizacional foi exterior às Forças Armadas,

assumida sobretudo pelo Partido Republicano, pela Maçonaria e pela

Carbonária. Os principais ofi ciais do Exército que integraram a Comissão

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Militar – capitão Sá Cardoso, capitão Afonso Pala e tenente Hélder Ribeiro –

eram membros activos da Maçonaria. Da Marinha eram igualmente maçons

o chefe militar da Revolução, almirante Cândido dos Reis, também elemento

importante da Carbonária, e os tenentes Mendes Cabeçadas e Carlos da Maia que

tomaram o comando do cruzadores Adamastor e D. Carlos. Em contrapartida,

no 25 de Abril de 1910, a lógica organizacional foi exclusivamente militar;

“Tudo se passou em «família», entre militares sobretudo”, como conclui Eduardo

Lourenço.

3.º CAUSAS COMUNS NAS DUAS REVOLUÇÕES

O 5 de Outubro de 1910

Como atrás se referiu, o republicanismo assumiu progressivamente um

carácter de movimento de renovação nacional, sobretudo entre os sectores

intelectuais e urbanos. Por impulso, sobretudo, do movimento da «Geração

de 70» e da agitação intelectual das «Conferências do Casino», as novas ideias

haviam inundado o País. Portugal, a sua história e o seu destino foram então

vivamente discutidos e problematizados, despertando uma nova atitude sobre

a realidade nacional. O Partido Republicano, fundado em 1876, bebeu muita

da sua inspiração ideológica original nesse movimento cultural, muito embora

a aspiração republicana fosse sobretudo herdeira da corrente esquerdista do

vintismo, do autêntico espírito constitucional, da ideologia setembrista e das

motivações das rebeliões da Maria da Fonte e da Patuleia, tendo começado

a concretizar-se mediante a oposição à feição conservadora do liberalismo.

O ideário republicano caracterizava-se por um leque aberto de tendências

que se inseriam num mesmo horizonte iluminista, e que se foi conformando

e consolidando ao longo dos anos. Doutrinar, educar e fazer evoluir a maior

parte da população foram as suas principais linhas programáticas, que

imprimiram ao republicanismo nos primeiros tempos uma atitude sobretudo

pedagógica e doutrinadora de novos valores sociais, sob o impulso de insignes

fi guras como Elias Garcia e José Falcão.

Reportando-se ao sistema político vigente, os republicanos contrapunham

à Carta Constitucional de 1826 adoptada pela Monarquia, o modelo da

Constituição de 1822, assente na supremacia do poder legislativo; ao poder

divino, vitalício e hereditário do rei, a soberania nacional e o carácter electivo

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e temporário dos cargos políticos; à dependência e às afrontas externas,

nomeadamente da Inglaterra, o patriotismo; ao regime de privilégios indi-

viduais, de sangue e de classe, a prevalência do interesse público sobre o

particular e a igualdade de todos os cidadãos perante a lei; à ideia liberal

individualista, a superioridade da comunidade, a cidadania participativa e

os direitos sociais; ao voto censitário, o sufrágio universal; ao clericalismo,

a laicidade, traduzida na separação das Igrejas do Estado, no registo civil,

nas leis da família e na educação pública obrigatória. Ou seja, o ideário

republicano, muito para além do objectivo político de operar uma mudança

de regime, consubstanciava ainda, fundamentalmente, um vasto conjunto de

novos valores que pretendiam dar corpo ao sonho de um país moderno e a

uma autêntica ética republicana de bem público, utilidade comum, interesse

público e vontade geral, colocando a tónica na fi nalidade com que o poder

era exercido.

A dimensão comunitária foi uma das principais marcas do republicanismo

português. O indivíduo era identifi cado como cidadão que só existia

enquanto membro da comunidade, donde resultaram os traços fundamentais

da ética republicana: a superioridade do interesse público sobre os privilégios

individuais; a devoção ao serviço à comunidade; a exigência de honradez

e austeridade no exercício dos cargos; o zelo pelo bom uso dos recursos

nacionais; a moral da solidariedade e da fraternidade; a igualdade no direito

à educação e ao ensino, como condição para o exercício pleno da cidadania,

entre outros.

Infelizmente a República nasceu num período de grande complexidade

interna e externa, e a sua vida seria de uns curtos dezasseis anos. Herdou um

país com um persistente défi ce fi nanceiro, atravessado por confl itos políticos,

sociais e religiosos, num contexto de crise europeia que prenunciava a guerra

mundial que explodiria quatro anos depois. A República, por sua vez, gerou

novos confl itos e agravou alguns dos anteriores.

Têm existido distorções interpretativas sobre a I República, porventura por

resquícios da propaganda do Estado Novo. Mas a verdade é que, apesar das

difi culdades e do curto tempo de vigência, a I República levou a efeito reformas

importantes para fazer entrar Portugal na modernidade, designadamente nos

domínios do direitos civis, da laicização do Estado (a reforma institucional

mais importante), das leis da família, do registo civil, da educação e do ensino,

da assistência, do serviço militar, lançando também as bases para a retoma do

desenvolvimento económico do país.

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Com o Salazarismo foi o atabafar das reformas e do espírito da I República,

sobrevivendo desta apenas uma memória progressivamente mais ténue e a

semântica republicana no texto constitucional.

Mas a Revolução de 25 de Abril de 1974 refundou a República, restaurou

e aprofundou a liberdade e a democracia, pôs termo à guerra colonial, lançou

as bases para uma nova relação com as antigas colónias e mudou o rumo de

Portugal do Atlântico para a Europa.

O 25 de Abril de 1974

Aprendendo com os erros e omissões da primeira, a II República realizou

fi nalmente as promessas do 5 de Outubro de 1910: institucionalizou o

sufrágio directo universal, tanto masculino como feminino; integrou os

direitos económicos, sociais e culturais no alargado conjunto dos direitos

fundamentais dos cidadãos; consagrou a participação cívica como um dos

pilares Estado de direito democrático; promoveu um melhor equilíbrio

dos poderes dos órgãos de soberania; e instaurou o poder local e as regiões

autónomas.

Em abono da verdade, terá de reconhecer-se que os avanços conseguidos

com a Revolução de 25 de Abril de 1974 foram enormes, quer em termos dos

direitos dos cidadãos, quer em termos da justiça social e do desenvolvimento,

designadamente nos domínios da democratização do ensino, da saúde,

socorro e assistência, da habitação e da segurança social, do nível geral de vida

da população, das infra-estruturas básicas e de comunicação, e sobretudo, na

emancipação dos cidadãos.

4.º CONCLUSÃO

Procurou-se evidenciar as analogias entre as transições da Monarquia para

a I República e do Estado Novo para o II República, bem como as causas

comuns que foram bandeiras dos novos regimes.

Deu-se especial relevo às questões militares, designadamente à análise dos

problemas que explicarão os comportamentos dos militares nas Revoluções de

5 de Outubro de 1910 e de 25 de Abril de 1974.

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O 25 de Abril de 1974 retomou os grandes ideais do 5 de Outubro de

1910, e refundou e aprofundou a República. Foram duas revoluções distintas,

mas movidas por causas comuns.

Portugal está hoje, novamente, a braços com uma crise grave. Os sectores

mais atingidos são os ligados ao emprego e aos direitos económicos e sociais

– ao Estado social, a grande conquista do 25 de Abril.

É fundamental perceber que não existem solução para a crise fora do

regime democrático – a História no-lo ensina.

A I República falhou porque os republicanos, em nome da democratização,

não democratizaram a República. E a II República está a falhar pelas mesmas

razões.

A solução para a crise da II República só pode ser encontrada com mais

democratização na vida nacional, ou seja, com maior participação dos

cidadãos na vida política, maior exigência na moralização da República, enfi m

com maior cidadania. Porque, afi nal, ao cabo de trinta e sete anos, o que

continua por realizar é a autêntica republicanização da República, ou, por

outras palavras, a efectiva democratização da Democracia.

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INTERVENÇÃO DO ENG.º CARLOS FERREIRA

NAS COMEMORAÇÕES DE 25 DE ABRIL DE 2011

carlos jorge rodrigues do vale ferreira

Presidente da Comissão Organizadora das Comemorações

do Centenário da República em Miranda do Corvo

Exm.ª Senhora Presidente da Câmara Municipal de Miranda do Corvo

Exm.º Senhor Presidente da Assembleia Municipal de Miranda do Corvo

Exm.ºs Senhores Presidentes das Juntas de Freguesia

Exm.ª Senhora e Exm.ºs Senhores Membros da Comissão Organizadora das

Comemorações do Centenário da República em Miranda do Corvo

Exm.º Senhor Presidente do Agrupamento de Escolas de Miranda do Corvo

Exm.º Senhor General Monteiro Valente

Demais Autarcas, Autoridades e Convidados

Senhoras e Senhores

Evocamos hoje a Revolução de Abril.

Há 37 anos os Capitães saíram à rua e com o povo português fi zeram

uma revolução.

Há 37 anos Salgueiro Maia invadiu Lisboa e ocupou o Terreiro do Paço e

o Largo do Carmo.

Há 37 anos o então Capitão Monteiro Valente saiu à rua, assumindo o

comando do Regimento de Infantaria N.º 12, na cidade da Guarda, e com as

suas tropas ocupou a fronteira de Vilar Formoso.

Nunca esqueceremos esse grupo de jovens, na fl or da idade, tocados por

um sonho de liberdade, pelo qual se arriscaram em nome de todos nós, em

nome de Portugal, e nos trouxeram a esperança de Abril.

A si o meu muito obrigado, Sr. General, mas também na sua pessoa gosta-

ria de evocar e homenagear Salgueiro Maia e todos os Capitães de Abril.

Como manifestação de agradecimento e apreço pela paz e pela liberdade

que generosamente nos ofereceram peço a todos os presentes que se levantem

e que em pé façamos ecoar uma calorosa salva de palmas.

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Senhoras e Senhores

As comemorações do Centenário da República vão trilhando o seu cami-

nho em Miranda através duma série de realizações e eventos que a Autarquia

tem vindo a levar a cabo, ao longo de 2010 e 2011, prevendo-se o encerra-

mento deste ciclo de comemorações no próximo dia 5 de Outubro.

Em 2011 tivemos já o workshop Mix-República e a exposição Viva a Repú-

blica em Digressão. Estão ainda previstos, para além da realização de algumas

tertúlias e conferências, mais dois momentos altos.

No dia 1 de Junho, evocando o nascimento de José Falcão, teremos a assi-

natura dum protocolo, com o Senhor Professor Doutor Amadeu Carvalho

Homem, que irá permitir a criação dum Centro de Estudos Republicanos

na Biblioteca Municipal Miguel Torga, teremos também o lançamento dum

livro sobre a vida privada dos Presidentes da Primeira República e teremos

ainda a inauguração, nos Paços do Concelho, duma galeria com os retratos

dos Presidentes da nossa Câmara Municipal após a implantação da República.

Pretende-se que seja uma galeria viva e continuada no tempo com os retratos

dos futuros presidentes.

No dia 5 de Outubro teremos o encerramento das Comemorações com

uma exposição evocativa do republicanismo, teremos a inauguração do Cen-

tro de Estudos Republicanos Amadeu Carvalho Homem e teremos ainda

o lançamento dum livro com as actas das comemorações do Centenário da

República em Miranda.

Não posso esconder o orgulho que sentimos quando o Sr. Professor Dou-

tor Carvalho Homem decidiu, duma forma generosa e altruísta, oferecer a sua

biblioteca pessoal à biblioteca Miguel Torga e justifi cou publicamente a sua

decisão com o modo como Miranda soube dignifi car as Comemorações do

Centenário da República.

Senhoras e Senhores

A construção de infraestruturas que permitissem a democratização do

ensino do 1.º ciclo, à data denominado ensino primário, e a sua disseminação

foi uma das prioridades da Primeira República.

Não poderíamos terminar este ciclo de comemorações sem a inauguração

duma nova e moderna escola em Miranda.

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Daí que desde o início tivéssemos incluído esta inauguração no nosso

programa.

Inaugurar hoje este Centro Educativo é uma forma de homenagearmos

os valores de Abril mas é também uma forma de honrarmos a República e os

seus ideais.

Senhoras e Senhores

Mas hoje, dia 25 de Abril, importa evocarmos a revolução dos cravos que

há 37 anos nos trouxe a liberdade.

É indiscutível que Portugal é hoje um país livre e, do ponto de vista das

liberdades, uma democracia sem mácula.

O nosso concelho é aliás um exemplo da vivacidade da nossa democracia.

Em Miranda a alternância democrática é uma constante.

Em Miranda todos os órgãos autárquicos, Câmara Municipal, Assembleia

Municipal e todas as Juntas e Assembleias de Freguesia, já foram presididos

por mais do que um partido.

Já por várias vezes a Câmara e a Assembleia Municipais foram em eleições

simultâneas, ganhas por partidos diferentes e sempre soubemos conviver bem

com isso.

Praticamente todas as eleições legislativas e europeias foram ganhas pelo

Partido Socialista mas a maioria das vezes as eleições autárquicas têm sido

ganhas pelo Partido Social Democrata.

Ainda nas últimas eleições, há cerca de ano e meio, os mirandenses deram

uma vitória esmagadora ao Partido Socialista nas eleições legislativas e apenas

um mês depois deram a vitória ao PSD nas eleições autárquicas.

Os mirandenses sempre deram mostra duma grande maturidade demo-

crática, rejeitando o voto seguidista e acrítico por indicação das bandeiras

partidárias.

Não poderia ser de outra maneira. Honramos a nossa história.

Somos um povo que tem a herança genética de José Falcão e de muitos

outros grandes republicanos e democratas que enriquecem a história do nosso

concelho.

Sendo eu republicano e democrata, este elevado sentido democrático dos

mirandenses é para mim uma honra e motivo de grande orgulho.

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184 república e democracia

Mas Abril não foi apenas um sonho de liberdade, foi também motivado

por um conjunto de valores e princípios éticos.

Tal como o republicanismo também a revolução de Abril teve a sua génese

no pensamento iluminista do Século XVIII.

O espírito de Abril está associado a um conjunto de valores éticos que

foram beber a sua inspiração no primado dos princípios da Liberdade, da

Igualdade e da Fraternidade.

Minhas Senhoras e Meus Senhores

37 anos depois impõe-se uma pergunta... teremos nós sabido cumprir

Abril?

Hoje é indiscutível que Portugal é um país muito mais moderno e progres-

sista do que era em 74 mas também é uma realidade que Portugal é hoje o

país que na Europa apresenta maiores diferenças entre os mais ricos e os mais

pobres e uma maior assimetria entre os salários mais baixos e os mais altos.

Hoje permitimos que salários e reformas de miséria convivam lado a lado

com ordenados escandalosamente altos, muitos deles pagos com dinheiro

público.

Nos últimos anos temos assistido a uma degradação acelerada dos valores

de Abril.

Hoje a maioria de nós tem a opinião que a nossa justiça não é justa nem

independente, sendo antes um joguete dos interesses e poderes político e

fi nanceiro.

Hoje o nosso sistema educativo está cada vez menos democrático e mais

elitista. Cada vez é mais difícil o fi lho dum pobre conseguir ser médico ou

juiz, independentemente do seu mérito e da sua inteligência.

Hoje o Sistema Nacional de Saúde está a ser alvo de constantes amputa-

ções e atropelos. Fecharam extensões de saúde, fecharam urgências, fecharam

serviços nocturnos, fecharam maternidades, faltam médicos nos Centros de

Saúde e faltam meios.

Hoje a fuga ao fi sco e a economia paralela representam quase 30% da eco-

nomia nacional, prevendo-se que este valor esteja a aumentar.

Hoje já temos mais de setecentos mil desempregados, com uma forte inci-

dência nos mais jovens e com mais elevadas habilitações, o que está a provocar

um surto de emigração, sem paralelo desde meados do século passado.

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Estamos a expulsar as nossas futuras elites enriquecendo o capital humano

qualifi cado de outros países.

Hoje temos um uma segurança social falida porque passivamente deixá-

mos envelhecer o país, transformando-o no mais envelhecido da Europa.

Hoje muitas das conquistas que julgávamos intocáveis estão a ser postas

diariamente em causa

Hoje muitos portugueses alheiam-se da política e fartos de promessas

incumpridas e de demagogia, deixaram de se rever e acreditar na maioria dos

nossos políticos.

A abstenção sobe de acto eleitoral para acto eleitoral, pervertendo comple-

tamente o sentido da democracia.

Hoje a corrupção corrói a saúde da nossa democracia. Os portugueses

começam a não querer separar o trigo do joio. Começa a fazer escola o prin-

cipio do “são todos iguais”. Este é... o principio do fi m.

Hoje muitas nas nossas elites esqueceram o signifi cado de palavras como

pátria, honra, ética, dever e serviço público.

Hoje muitas das nossa elites fecham sistematicamente os olhos à injustiça

e à mentira.

Hoje muitas das nossas elites esqueceram a chama de Abril, deixando

esmorecer o sonho duma sociedade mais justa e mais igual.

Uma sociedade cada vez com menos pobres e em que os ricos, em vez de

pensarem só em si, lutem pela elevação da própria sociedade.

Uma sociedade que aposte no homem e no seu valor, dando a todos iguais

oportunidades para que o valor de cada um se possa evidenciar.

Senhoras e Senhores

Fruto de muitos desvarios, irresponsabilidade e incompetência de alguns

governantes, Portugal está hoje numa situação fi nanceira complicadíssima, à

beira da bancarrota.

A nossa crise é uma crise fi nanceira grave mas é também e sobretudo uma

crise de valores.

É nos momentos difíceis que se avalia a têmpera dum povo.

Nós somos o povo que sulcou os mares descobrindo terras e trazendo novos

mundos ao mundo.

Nós somos o povo que globalizou o comércio e que fundou a grande aldeia

global.

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186 república e democracia

Nós somos o povo que há 200 anos fez frente às tropas de Napoleão.

Nós somos o povo que fez a revolução republicana.

Nós somos o povo que fez Abril.

Estou certo que nós somos um povo capaz de cumprir Abril.

Nunca devemos esquecer que uma democracia enfraquecida pode propi-

ciar o aparecimento dum ditador por via eleitoral. A história está cheia de

exemplos.

Hitler servindo-se duma crise fi nanceira e ética profunda na democracia

alemã chegou ao poder pela via eleitoral. Matou milhões de pessoas, de uma

forma bárbara, com o silêncio e conivência de grande parte das elites alemãs.

Foi apenas há 70 anos. Alguns dos presentes já eram nascidos nessa altura.

Importa que não deixemos aos outros a possibilidade de escolher por nós e

que usemos dignamente a nossa arma... o voto... a arma do povo.

Importa que saibamos sempre separar o trigo do joio e que não aceitemos

nunca a corrupção, banindo e punindo de imediato os seus autores.

Importa que abramos o dicionário e que todos nós voltemos a dar sentido

a palavras como pátria, honra, ética, dever e serviço público.

Importa que saibamos exigir o respeito por estes valores às nossas elites e

políticos.

Importa que saibamos colocar o interesse público muito acima dos inte-

resses individuais.

Importa que todos nós saibamos agir independentes dos interesses instala-

dos, sabendo resistir aos lóbis, mesmo que com isso prejudiquemos interesses

dos nossos amigos ou familiares.

Importa que todos nós saibamos dar o exemplo na nossa actuação diária.

Importa que todos nós lutemos diariamente, com os meios ao nosso

alcance, pela construção duma sociedade melhor, transformando Portugal

num país mais moderno e progressista, alicerçado em profundos princípios

de conduta ética e moral.

Importa que saibamos construir um Portugal mais livre. Um Portugal mais

igual. Um Portugal mais fraterno e solidário.

Importa que todos nós arregacemos as mangas e deitemos mãos à obra.

Tenhamos a coragem, todos juntos, de darmos as nossas mãos para, em

conjunto, cumprirmos Abril.

Viva o 25 de Abril... Sempre!

Viva Miranda!

Viva Portugal!

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REPUBLICANISMO E REPÚBLICA

dr. fernando fava

O ROTATIVISMO

Nos tempos que se seguiram ao Ultimato e à Revolta do 31 de Janeiro de

1891, a chamada intelligentsia portuguesa encontrava-se em dissídio,

cada vez mais alargado, com o regime monárquico-constitucional, conside-

rando-o corrompido, esgotado, sem projectos sérios de governabilidade e sem

soluções para os pesados problemas nacionais. Na mente de um número cada

vez maior destes e de outros portugueses, a República começava a ser ideali-

zada como o regime que poderia salvar e revivifi car a nação. Assim, por mérito

próprio, mas também por demérito dos seus adversários, o Partido Republi-

cano começava a emergir da crise em que mergulhara após a tentativa revolu-

cionária de 31 de Janeiro de 1891 e, de uma forma paulatina, ia-se afi rmando

como uma alternativa, no palco da política nacional.

Este palco era marcado por uma prática que procurava assegurar um «rota-

tivismo» entre os Partidos Regenerador e Progressista, respectivamente chefi a-

dos por Hintze Ribeiro e por José Luciano de Castro. Os dois chefes políticos,

revezando-se na governação, permaneceram, durante muito tempo, tacita-

mente concertados na intenção de impedir o acesso ao poder por parte de cor-

rentes políticas mais radicais. Os seus partidos organizavam-se em torno de

clientelas partidárias sob esquemas em que o político infl uente tinha de pagar

ao cacique que para ele arregimentava votos e, por sua vez, o cacique tinha

de pagar a fi delidade do seu eleitor, podendo esta cadeia ser, pontualmente,

mais complicada. Era assim como que um arremedo de sistema feudal com

os suseranos a terem de pagar a fi delidade dos seus vassalos. Esses pagamentos

sob a forma de concessão de cargos políticos, de empregos ou de quaisquer

outras dádivas ou concessão de privilégios determinavam uma praxis política

que, privilegiando a sustentação das necessárias clientelas, subalternizava a

resolução dos gravíssimos problemas económicos e sociais com que o País se

debatia. Por outro lado, as eleições faziam-se não para escolher um governo,

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188 república e democracia

mas para legitimar executivos já empossados e dar-lhes maioria parlamentar.

Ademais seria tarefa bem árdua, fazer, à boca das urnas, uma escolha criteriosa

quanto a um ou outro governo, posto que, quer na teoria quer na prática,

eram assaz discretas as diferenças entre os dois partidos. Regra geral, o partido

no governo ganhava sempre e folgadamente as eleições.

Agora, porém, o edifício rotativista começava a ser minado a partir do

interior dos próprios partidos componentes do sistema. No seio dos regene-

radores, João Franco, inconformado com o seu estatuto de segunda fi gura,

entrara em confronto aberto com o seu chefe-de-fi la, Hintze Ribeiro. Em

Maio de 1901 abandonara o Partido Regenerador, arrastando consigo a sua

roda de amigos, entre os quais se encontravam 25 deputados. Com eles iria

João Franco constituir, em 1903, o Partido Regenerador Liberal, novo grémio

político que, muito embora se reclamasse do campo monárquico, se esfor-

çava por aparecer aos olhos da opinião pública como isento dos erros e vícios

políticos dos partidos tradicionais e se propunha, no dizer do seu próprio

caudilho, «caçar no terreno dos republicanos». Aconteceu no entanto que,

em Junho de 1901, Hintze Ribeiro obteve do rei a dissolução da Câmara de

Deputados e, especialmente contra a ânsia de poder de Franco, o governo

regenerador fez aprovar nova legislação eleitoral que reduzia drasticamente as

hipóteses electivas das minorias. Franco baptizou este pacote legislativo com a

designação de «ignóbil porcaria», expressão que veio a popularizar-se. Assim,

com apenas um deputado eleito pelo Partido Franquista na pugna eleitoral de

1901, João Franco iria fazer a «travessia do deserto» até 1906.

AS DISSIDÊNCIAS MONÁRQUICAS E A ESTRATÉGIA

DO PARTIDO REPUBLICANO PORTUGUÊS

No ano de 1905 seria a vez do dirigente progressista, José de Alpoim,

desafi ar a autoridade do velho e alquebrado chefe do Partido, José Luciano de

Castro. As desinteligências vinham de trás e prendiam-se com a contestação

feita por Alpoim e pelos seus seguidores à orientação conservadora impri-

mida pela direcção de José Luciano. Este estado de coisas agravou-se sobre-

maneira quando, em Abril, Alpoim viu ser-lhe negado por José Luciano a

Pasta do Reino, ministério que Alpoim tanto ambicionava para consolidar o

seu poder e chegar à chefi a do Partido. Naturalmente que José Luciano, velha

raposa, tudo fazia para travar ou contrariar esses tiques de poder de Alpoim,

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fernando fava 189

tanto mais que desconfi ava das chegadas relações que este mantinha com os

regeneradores de Hintze Ribeiro. Não sendo a paciência uma das virtudes

de Alpoim, este cansou-se de esperar pela morte, sempre anunciada, de José

Luciano, e, declarando guerra à direcção do seu partido e ao seu próprio

governo, abriu uma cisão que veio a dar origem ao aparecimento de um novo

clube político (mais um), a Dissidência Progressista.

Aproveitando a polémica Questão dos Tabaco, ele e os restantes dissidentes,

seus apaniguados, elaboraram e apresentaram na Comissão de Fazenda da

Câmara uma proposta que desvirtuava por completo as intenções contidas

na decisão governamental de atribuir o monopólio à Companhia dos Taba-

cos de Portugal, à testa da qual estava o Conde de Burnay, velho inimigo

de Alpoim. Marcada a sessão parlamentar para 10 de Maio, a mesma trans-

formou-se numa contenda pessoal entre Alpoim e José Luciano e em que,

perdendo a noção das conveniências, os contendores se cobriram de ridículo,

descendo à mais baixa chicana política, com José Luciano afi rmando que

Alpoim aprovara em Conselho de Ministros a proposta que agora recusava

e Alpoim, exaltadamente, a garantir à Câmara que aquele estava a mentir.

Somente à voz autorizada e respeitada do idoso ministro do Reino, Augusto

Pereira de Miranda, os dois homens fi zeram cessar a sua incontinência ver-

bal. Estas lutas intestinas começavam a ferir de morte o rotativismo tanto

mais que os líderes históricos dos dois principais partidos monárquicos não

souberam lidar com as situações entretanto criadas e acabaram por se deixar

enredar em tricas e em alianças espúrias, com isso fazendo afi nal o jogo dos

seus inimigos e contribuindo, porventura decisivamente, para o fi m do rota-

tivismo e da monarquia.

Entretanto o Partido Republicano Português que, na pura conjuntura

rotativista, desempenhara um papel político secundário, ou secundarizado,

ia aproveitando das difi culdades e convulsões dos seus adversários para se ir

afi rmando e ganhando estatura. As eleições de 1904, 1905 e 1906 foram disso

um afi nado barómetro, com os republicanos a arrecadarem, neste último ano,

54,1% dos votos expressos na cidade de Lisboa. Era então republicana a pri-

meira cidade do reino, facto que, todavia, não ofuscava a visão política de

uma nova geração de republicanos que tomara em suas mãos os destinos do

partido. Esses novos dirigentes sabiam que somente a desorientação que rei-

nava pela banda dos monárquicos e as divergências entre as chefi as dos prin-

cipais partidos permitiam que tal situação acontecesse e que não seria pela

via eleitoral que se chegaria à República. Tanto mais que no resto do país as

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votações arrecadadas pelos republicanos continuavam exíguas, sendo que no

Porto, a segunda cidade do reino, os votos nunca foram além de 618.

Cônscios desta realidade, homens como António José de Almeida, Afonso

Costa, Malva do Vale, João de Meneses e outros, que haviam participado, em

1896, do Grupo Republicano de Estudos Sociais (projecto de alternativa ao pro-

grama do Directório do Partido Republicano) declaravam-se publicamente

a favor da revolução e da tomada do poder por meio das armas como forma

(única em seu entender) de implantar o regime republicano em Portugal.

Esta estratégia estava e esteve sempre longe de ser consensual, mantendo-se

no interior do partido, em contraponto e actuante e infl uente, uma ala mode-

rada que apostava na pedagogia e na educação e esclarecimento das massas

populares e da pequena burguesia para, com o seu voto nas urnas, chegar ao

poder. Desta forma, persistiram, no combate à monarquia e até à alvorada da

Revolução de Outubro, uma estratégia conspirativa e outra eleitoral. O que,

essencialmente, convém reter é que o Partido Republicano já não era mais

aquele agrupamento político que, pacientemente e pela via da pedagogia e da

atitude cívica, pensava conquistar os votos que lhe dariam o poder ou que,

com base em credos positivistas, considerava tal acesso uma inevitabilidade

histórica, sem que fosse necessário recorrer a meios violentos.

Para o conservadorismo monárquico e especialmente para os poderes insti-

tuídos (sempre receosos de uma revolução) esta mudança no seio dos republi-

canos era mais uma «dor de cabeça». Não deixa de ser curioso notar que neste

contexto, sem haver qualquer espécie de concertação, as circunstâncias pare-

ciam, no entanto, encaminhar os negócios da política no mesmo sentido da

perdição da monarquia, com os monárquicos a dilacerarem-se num processo

autofágico e o Partido Republicano a encetar uma viragem na sua estratégia,

que o tornava uma ameaça séria ao regime vigente. O futuro iria confi rmar e

agravar este estado de coisas e acentuar esse caminho tendencial que a Monar-

quia parecia então condenada a percorrer.

AVANÇOS REPUBLICANOS NO PAIS DE JOÃO FRANCO

Como vimos anteriormente, João Franco, enredado nas suas próprias

ambições, caíra entretanto numa situação de proscrição política. Todavia,

em 1907, aparece-nos o mesmo João Franco investido das mais altas funções

governativas e exercendo-as em ditadura? A verdade é que ele chegara de novo

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ao poder e, desta feita, na qualidade de Chefe de Governo. Aparentemente, o

impossível acontecera! Um olhar mais atento permite, no entanto, considerar

que tal situação não era, de todo, impossível. O próprio Franco entrevira essa

possibilidade e já em 1897, após a queda do ministério regenerador liderado

pela dupla Hintze Ribeiro -João Franco, houvera feito ao então seu correli-

gionário, José de Azevedo Castelo Branco, a confi dência seguinte: “Agora só

me tornas a ver subir estas escadas como Presidente do Conselho”. Bravata

inteira ou meia bravata, o facto é que o futuro viria a dar plena consistência

àquelas palavras, conduzindo efectivamente João Franco ao cargo que, decla-

radamente, ambicionava.

Detenhamo-nos um pouco nas circunstâncias que permitiram que tal

acontecesse, lembrando que deixámos João Franco a braços com a sua hercú-

lea tarefa de deitar abaixo o rotativismo e as personalidades e grupos políticos

que o sustentavam. Diga-se, em abono da verdade, que não se saiu muito mal

dessa empreitada, se bem que, para tanto, tivesse nos próprios rotativistas e

nos seus erros os seus maiores aliados. Na base de uma retórica de oposição

promoveu uma intensa e bem conseguida campanha de propaganda, a qual

gerou um notável movimento de opinião que o colocava a ele, João Franco,

como alternativa válida e única, dentro do campo monárquico, aos partidos

tradicionais e, nesse sentido, como político sério, capaz de levar a efeito as

reformas de que o país tanto carecia. E sendo estas reformas vitais para o

país, eram-no também para a monarquia, visto que a sua ausência ou demora

aproximava ainda mais o perigo de uma revolução republicana. Constituindo

tal facto uma constante preocupação para a Coroa, não é de estranhar que em

1906, D. Carlos, a braços com mais uma crise governamental, tivesse encar-

regado Franco de constituir governo. E isso porque, na sequência do debate

e discussões na Câmara sobre a já referida Questão dos Tabacos, o Parlamento

encerrou para reabrir em Fevereiro de 1906, de novo com sessões assanhadas

e tumultuosas. Sentindo-se sem condições para levar por diante uma gover-

nação, José Luciano de Castro pediu ao rei a dissolução das Cortes, no que,

foi atendido. Formou-se então um governo regenerador sob a presidência

de Hintze Ribeiro. Realizadas, a 29 de Abril, eleições para sustentação deste

ministério, delas resultou um parlamento com uma composição curiosa, quer

em número, quer em diversidade: 107 deputados regeneradores, 17 progres-

sistas, nove dissidentes, sete franquistas, seis nacionalistas, dois independentes,

um miguelista e um republicano. Um primeiro olhar logo trazia à evidência

uma desproporcionada aproximação entre dissidentes progressistas e progres-

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sistas lucianistas, nisso se adivinhando o dedo manipulador de Hintze, facto

que, no clima de encarniçamento político vivido pelos dois chefes rotativistas,

iria, necessariamente, provocar retaliações da parte de José Luciano.

Um outro aspecto ressaltava ainda dos resultados destas eleições. É que,

se bem que maioritário na capital, o Partido Republicano, tendo em conta

a sua fraca penetração no meio rural e os condicionalismos das leis eleitorais

(ignóbil porcaria), não teria, em boa verdade, votos sufi cientes para eleger um

deputado. Aconteceu porém que Hintze, tentando comprar a boa vontade

ou a quietude dos republicanos, mandou «chapelar» as eleições na Azambuja

a favor do candidato republicano Bernardino Machado. Tal revelou-se um

tremendo erro, dado que, fazendo um hábil aproveitamento da fraqueza de

Hintze, as hostes republicanas rejeitaram, com grande alarido, tal “favor”,

vindo Bernardino a público recusar a sua própria eleição. À sua chegada a Lis-

boa, na noite de quatro de Maio, esperavam-no, na estação do Rossio, Afonso

Costa e outros correligionários, bem assim como grosso número de populares.

Aí se gerou então uma ruidosa manifestação que provocou violenta e desme-

surada intervenção das forças policiais. Dias depois, durante uma tourada no

Campo Pequeno, os espectadores aplaudiam estrepitosamente Afonso Costa,

ignorando, em simultâneo, a presença da família real.

FRANCO AO PODER OU O PRINCÍPIO DO FIM

Os acontecimentos anteriormente narrados, a par das revoltas de marinhei-

ros republicanos, ocorridas a 8 e a 13 de Abril de 1906, a bordo do cruzador

D. Carlos I e do couraçado Vasco da Gama, foram devidamente aproveita-

dos pela imprensa republicana e contribuíram defi nitivamente para o pro-

fundo desgaste da imagem do ministério regenerador de Hintze Ribeiro, quer

junto da opinião pública quer junto da Coroa. Atemorizado com o estado

da situação política e prevendo eventuais sessões tumultuosas no parlamento

recém-eleito, o chefe regenerador tentou ganhar tempo sufi ciente para que

os ânimos esfriassem. Nesse sentido, predispôs-se a governar em ditadura,

pedindo ao rei o adiamento sine die da abertura das cortes. Na sua célebre

carta de 16 de Maio de 1906, D. Carlos negou-lhe o adiamento das sessões

parlamentares. De imediato, Hintze pediu a demissão do gabinete ministerial

e o rei concedeu-lha. No seguimento, o monarca chamou João Franco ao Paço

e encarregou-o de formar gabinete ministerial. Assim é que, pela mão do pró-

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prio soberano, estava colocado um ponto fi nal ao rotativismo. Na verdade, D.

Carlos estava de posse de informações que lhe permitiam e até encorajavam

esta medida, visto que, por intermédio da pessoa do próprio José Luciano

de Castro, acompanhara as negociações iniciadas em Março de 1906 entre o

Partido Progressista e o Partido Regenerador-Liberal de Franco, na sequência

das quais fora fi rmado, nos primeiros dias de Maio, um acordo político a que

fora dado o nome de Concentração Liberal. Em conformidade, José Luciano

dera garantias de que apoiaria a formação de um ministério composto por

regeneradores-liberais e presidido por João Franco, muito embora não qui-

sesse para si ou para o seu partido, de acordo com as suas próprias palavras,

“pastas nem postas”.

Considerando que os progressistas haviam sido apeados da governação

havia apenas dois meses e que o governo dos regeneradores empossado há 58

dias chegara tão depressa e tão desastradamente ao seu fi m, concluir-se-á que,

na circunstância, D. Carlos foi, praticamente, empurrado para esta solução,

dado já não lhe restar margem de manobra para operar mais uma tradicional

rotação. Sendo isto verdade, também facto é que da decisão do soberano de

entregar o poder executivo a João Franco, não estava arredada uma intenção

pessoal de romper com o rotativismo e com os dois partidos que lhe davam

corpo. É que, desgastadíssimos estes com o uso, tantas vezes aviltante e estéril,

do poder, a sua manutenção, como principais intérpretes da política nacional,

contribuiria apenas para dar continuação a um estado de coisas que não só

não solucionava os graves problemas nacionais, como, pior ainda, era propi-

ciador de um contínuo deslizar do país para a república. Atento, D. Carlos

há muito tinha intuído esta realidade e, na ocasião, julgou ver, nos propósi-

tos reformadores do franquismo (intensamente propagandeados) a oportuni-

dade para corrigir os «erros que de longe vêm» (palavras suas na aludida carta

a Hintze Ribeiro) e para travar os ímpetos republicanos. Nos contornos da

decisão então tomada era também notória uma apetência para um reforço dos

poderes e da infl uência do rei, porque, desta forma, a sua pessoa teria, neces-

sariamente, um maior ascendente sobre um governo assim formado. De facto,

o futuro breve viria a confi rmar uma maior presença e intervenção do rei nos

negócios políticos, o que não deixava de ser do agrado de D. Carlos, sensível

que era às teorias do engrandecimento do poder real, tecidas e propugnadas

por Carlos Lobo d’Ávila e por Oliveira Martins, membros proeminentes do

grupo de diletantes autodenominado “Vencidos da Vida”. De notar que as

teorias apoiadas por esse grupo, tinham, ao tempo e entre a intelectualidade,

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muitos seguidores. Um testemunho insuspeito desta propensão de mando por

parte do monarca D. Carlos é-nos dado por António Cabral, fi gura muito

próxima de José Luciano de Castro e escrevinhador de crónicas em O Correio

da Noite, órgão do Partido Progressista. Produziu ele a afi rmação seguinte:

“No ânimo imperioso de El-Rei, havia, a par da sua natural delicadeza e do

respeito à lei, o desejo e a vontade de mandar”. Tal vocação de mando por

parte do rei, em manifesto atentado à Carta Constitucional, haveria de o levar

a apadrinhar medidas e situações que, em muito, contribuíram para o fi m

da monarquia e, antes disso, para o seu próprio e funesto fi m. Desta forma,

pela mão do monarca e com a ajuda dos rotativistas do Partido Progressista,

chegou João Franco ao poder. Os seus inimigos de ontem eram amigos ou

aliados de hoje; por sua parte estavam convenientemente esquecidas as razões

que a eles o haviam oposto e a verrinosa e continuada retórica que sobre eles

exercera. Não se fi cariam por aqui as contradições que distinguiriam, pela

negativa, a governação de Franco.

A DESGOVERNAÇÃO DE FRANCO E A OPOSIÇÃO REPUBLICANA

Em Maio de 1906, foi constituído o gabinete ministerial presidido por João

Franco, fruto do conchavo entre o Partido Progressista e o Partido Regenera-

dor-Liberal, com o apadrinhamento pelo monarca, D. Carlos. Logo o novel

Presidente do Conselho de Ministros fez declarações públicas, afi rmando-se

liberal e disposto a governar à inglesa, querendo com isso dizer que respeita-

ria o Parlamento e as suas decisões. Ao mesmo tempo, mostrava-se contrito

por, conjuntamente com Hintze Ribeiro, ter governado em ditadura entre

1893 e 1897. Na verdade e, pelo menos, de início, João Franco conseguiu

transmitir de si próprio a imagem do político combativo e honesto, um novo

“messias” (mais um nos nevoentos horizontes portugueses), capaz de levar a

efeito redentoras reformas e assim resgatar o regime monárquico da desgraça

e da desonra a que havia chegado. No entanto, o controverso João Franco

permanecia igual a si próprio, notavelmente ao afi rmar que, em termos eleito-

rais pretendia «caçar no mesmo terreno dos republicanos» e que o ministério

governaria com «main douce et ferme» para, pouco depois, na inauguração

duma sede do seu partido em Alcântara, face às vaias que da rua lhe eram

endereçadas por operários e outros populares, dizer: «os republicanos estão

precisando de sabre da polícia como de pão para a boca».

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Não revogou Franco a contestada «ignóbil porcaria», antes se serviu dela

e, nas eleições realizadas a 19 de Agosto desse ano de 1906, a Concentração

Liberal, sua base de apoio, obteve confortável maioria. Foram então eleitos

pelo círculo de Lisboa, quatro republicanos: Afonso Costa, António José de

Almeida, Alexandre Braga e João de Meneses. A abertura das cortes foi convo-

cada para 29 de Setembro. O governo de João Franco, não obstante os apoios

de que dispunha, não teve a acção facilitada. Dentro da arena parlamentar,

as oposições, em especial os aguerridos republicanos, criaram impasses à obs-

trução à actividade legislativa, levando a discussão a centrar-se em torno de

questões de forma ou de substância por si levantadas ou aproveitadas. Fora

do Parlamento, nos mentideros da política, nos jornais e em comícios, a opi-

nião pública incendiava-se contra o governo e contra o regime. Duas grandes

questões – Questão dos Adiantamentos e Questão Académica – pela emoção e

impacto que causaram nos meios políticos, pela discussão rubra que geraram,

pelas difi culdades governativas que originaram e pelo efeito negativo que tive-

ram na coesão ministerial e nos apoios progressistas ao governo, levaram a

que Franco se decidisse pelo encerramento das Câmaras, em Abril de 1907.

Pretendia com isso criar um compasso de espera que lhe permitisse, de acordo

com intenções suas, e somente suas, reforçar o seu gabinete ministerial com

mais elementos da hoste progressista.

Sem dúvida que esta actuação de João Franco era politicamente perspicaz,

uma vez que visava, não só criar condições de governabilidade, como ainda

estabelecer um elo mais apertado com o Partido Progressista. Daí poderia,

quiçá, resultar uma fusão dos dois partidos (o progressista e o regenerador

liberal) e, dessa forma, tornar-se ele, Franco, chefe de um grande partido

como sempre fora sua ambição. Só que, os progressistas e nomeadamente José

Luciano sentiram esse perigo e, naturalmente, colocaram-se em defesa. Nessa

atitude, os notáveis do Partido Progressista, convidados ou requeridos por

Franco para fazerem parte do seu executivo – Conde de Penha Garcia, Antó-

nio Cabral e Moreira Júnior – recusaram defi nitivamente tal “honra”, nada

os demovendo dessa decisão, nem mesmo os bons ofícios de D. Carlos, feitos

chegar através da estreita amizade que o unia a José Luciano.

Para ser coerente com declarações e promessas tão recentemente por si

feitas, João Franco deveria agora renunciar ao cargo de primeiro-ministro.

Todavia, sob instigação do soberano, não o fez e, com o seu patrocínio, entrou

a governar em ditadura após a dissolução das Câmaras por decreto de 10 de

Maio de 1907. E com isso, prosseguiriam as incongruências de um “messias”

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português, chamado Franco (por acinte, «mexias» posto que o «Xuão», para

grande gáudio dos lisboetas, profusamente reproduzido no seu anedotário,

falava «achim»).

O DUETO D. CARLOS/JOÃO FRANCO I

Vimos anteriormente que sob a égide e apadrinhamento do monarca

D. Carlos, João Franco entrara abertamente a governar em ditadura. Nesta

trama, as duas personagens cimeiras da mesma, estranhamente desatentas aos

sinais dos tempos e dos factos, seguiam lado a lado, na feitura e acumulação

de erros, mais parecendo, com isso, apostadas em antecipar o momento da

sua desdita

O rei, fazendo transbordar a sua acção para além da órbita dos poderes

moderadores que a Carta Constitucional lhe conferia, descera à arena da con-

tenda partidária e colocara-se ao lado de um dos contendores, constituindo-

-se assim adversário de todos os outros. Ao abandonar o seu papel de árbitro

da pugna política, D. Carlos deixara de pairar acima da algazarra partidária

e passara a ser o alvo principal das críticas e diatribes da grande maioria da

imprensa escrita e das manifestações de rua. Por seu lado, Franco, logo numa

primeira fase, cometeu o grave erro de apressar-se a, por decreto governa-

mental, dar uma qualquer solução à candente questão dos adiantamentos de

quantias à Casa Real, feitos por conta da dotação ofi cial, a chamada Lista

Civil, solução essa que não passava de uma forma habilidosa de perdoar as

dívidas da Casa Real e de lhe aumentar as dotações.

Pela polémica assanhada e o aproveitamento político já havidos em torno

do assunto, fácil era ver que uma tal decisão seria mais uma enormidade polí-

tica; tanto assim que até o próprio D. Carlos (principal e grande benefi ci-

ário da medida governamental) começou por recusar, parecendo-lhe que o

conteúdo da resolução e o tempo de aplicação da mesma não seriam os mais

apropriados. E no entanto, perante as insistências de Franco, o soberano calou

as suas razões e assinou o decreto. Acto incompreensível em quem, por carta

escrita a João Franco, datada de 23 de Junho de 1907, com clarividência,

tinha afi rmado:

“Estamos diante de uma fogueira que desejamos apagar e não se apaga

lançando-lhe lenha, e é o que agora sucederia”.

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Que motivações impeliram D. Carlos a sancionar o politicamente desas-

troso decreto, após proferir aquelas sensatas palavras? Talvez que, no caso, e à

semelhança de outros casos, o exercício desmesurado do poder tenha cegado

os seus protagonistas e lhes tenha dado uma virtual sensação de impunidade.

Mas também era verdade que os quantitativos da Lista Civil não eram aumen-

tados desde o tempo do trisavô de D. Carlos, o rei D. João VI, e que alguns

edifícios pertencentes à Casa de Bragança eram utilizados pelo Estado sem

quaisquer contrapartidas. O monarca poderá ter cedido perante esses argu-

mentos, porventura julgando-os sufi cientemente pesados para abafar a ino-

portunidade da aplicação do referido decreto.

A verdade, porém, é que a reacção a uma tal medida não se fez esperar.

Logo a rua republicana de Lisboa entrou em efervescência e toda a imprensa

oposicionista desencadeou uma enorme e ruidosa campanha contra a dita-

dura e contra a Coroa. Nessa campanha, tomaram parte activa os dois chefes

rotativos – José Luciano e Hintze Ribeiro – curiosamente esquecidos do facto

de os famosos adiantamentos somente terem sido possíveis com as suas assina-

turas. Então, a braços com uma enormíssima e anormalíssima agitação social,

o ditador Franco entendeu adoptar medidas de excepção, designadamente o

endurecimento da censura à imprensa, apreensão e fecho de jornais, intensa

repressão policial, prisões e perseguições políticas. Nesta senda de violências, o

braço direito do chefe do governo era o poderoso juiz Veiga (Francisco Maria

da Veiga), amigo particular do rei e magistrado infl uente, que dominava as

polícias e dirigia o Juízo de Instrução Criminal, instituição que se tornara céle-

bre pela efi cácia com que reprimia os inimigos do regime monárquico. Toda-

via, dado a ceder aos seus ataques de mau génio, Franco incompatibilizou-se

com Veiga e exonerou-o das suas funções, privando-se assim desse valioso

auxiliar. A somar a tudo isto, a deserção ou o «cruzar de braços» de outros

funcionários era uma espécie de gangrena que ia atingindo e paralisando o

aparelho de Estado.

O DUETO D. CARLOS/JOÃO FRANCO II

Os ecos da tempestuosa situação política provocada pela ditadura de João

Franco repercutiam-se na imprensa estrangeira, por vezes de forma bem

pouco lisonjeira para Portugal e para os portugueses. Alguns jornalistas dessa

imprensa vieram a Lisboa, entre eles Joseph Galtier do periódico francês Le

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Temps, que após um encontro com o Chefe de Governo português, conseguiu

que o Rei o recebesse na cidadela de Cascais. Na entrevista concedida, D. Car-

los fez coro com Franco nas catilinárias proferidas por este contra os políticos,

contra os partidos e contra o Parlamento.

Desatinadamente, disse que, contra o que outros já anteriormente lhe

tinham pedido, concedera a ditadura a João Franco por ele lhe ter dado «des

garanties de caractère». Sendo a expressão um pouco dúbia, mormente na sua

tradução para português, o certo é que os políticos dos diversos quadrantes,

alguns deles antigos servidores do regime, a entenderam como uma afronta,

um insulto intolerável. Pois não seriam eles próprios pessoas de carácter?

Na sequência do incidente, Augusto José da Cunha, par do Reino, antigo

ministro da Coroa e ex-preceptor de D. Carlos, veio a público declarar a

sua adesão formal ao Partido Republicano. Outras defecções de não menor

importância se seguiram. Os dados estavam lançados e de tal forma que já

nada podia deter a marcha descendente que, no plano perigosamente incli-

nado da ditadura e do regime, os seus próprios mentores haviam empreen-

dido. Fortíssima em jornais de grande tiragem como O Século, A Luta ou

O Mundo, a propaganda republicana aprofundava a derrocada. Sobre o país

pairava, eminente, a ameaça da revolução.

A 28 de Janeiro de 1908, fracassou uma tentativa revolucionária empre-

endida em Lisboa por republicanos e por dissidentes progressistas. José de

Alpoim, chefe do Partido da Dissidência Progressista, conseguiu fugir para

Espanha; em Lisboa fi cavam presos Afonso Costa, Álvaro Pope, Pinto dos

Santos, Egas Moniz e o Visconde da Ribeira Brava. Dias antes tinham sido

feitas outras prisões entre as quais as de António José de Almeida, João Chagas

e França Borges.

Perante os factos, João Franco, em quem a prudência nunca fora uma vir-

tude, ensaiou mais uma «fuga para a frente», forjando de imediato um decreto

que conferia ao governo poderes para desterrar para as colónias todos os que

em tribunal fossem declarados culpados de atentar contra a «segurança do

Estado, a tranquilidade pública e os interesses gerais da Nação». Pelo mesmo

decreto eram retiradas as imunidades parlamentares aos que «contra a segu-

rança do próprio Estado se manifestem ou que como inimigos da sociedade

se apresentem». Compreende-se o quanto as intenções de Franco não se fi ca-

vam por um simples e imediato alcance da medida, mas, outrossim, visa-

vam, a médio ou longo prazo, o aniquilamento das oposições, mormente a

do Partido Republicano. Com efeito, sem as cabeças que Franco se propunha

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banir para bem longe (dizia-se que para Timor), os partidos fi cariam drastica-

mente mutilados e, estimada ambição do ditador, por vasto tempo incapazes

de desenvolverem qualquer acção hostil, afastando-se assim da cena política

nacional, o espectro da revolução.

A 31 de Janeiro, em Vila Viçosa, o rei apunha a sua referenda no decreto.

Contra tudo e contra todos, abandonando necessárias precauções, D. Carlos

decidira ir até ao fi m no caminho escolhido, porventura considerando que já

não havia espaço nem tempo para recuar. E, valha a verdade, o fi m chegou

depressa: no dia seguinte, o primeiro de Fevereiro de 1908, junto às arcadas

do Terreiro do Paço, o soberano e o seu primogénito, regressados de Vila

Viçosa, sucumbiam aos tiros disparados por atiradores que se haviam mistu-

rado com a multidão.

Na opinião de muitos portugueses, estes algozes, Alfredo da Costa e Manuel

Buiça, eram somente os intérpretes da ira e da justiça populares e, como tal,

heróis do povo. Veja-se a propósito o comentário feito por um vulto da litera-

tura, como o foi o poeta Guerra Junqueiro: «Não mataram o rei: suicidou-se

[…] as balas da morte partiram da alma da nação.»

A ACALMAÇÃO

As mortes do rei, D. Carlos e do príncipe-real, D. Luís Filipe, ocorridas a 1

de Fevereiro de 1908, ditaram o fi m imediato da ditadura franquista e soaram

como um «toque a fi nados» para a monarquia em Portugal.

Sentado no trono por força das circunstâncias, D. Manuel, fi lho segundo

de D. Carlos, após a demissão e expatriação de João Franco, ensaiava a forma-

ção de um governo com apoio parlamentar, ao estilo de governos da monar-

quia constitucional anteriores à ditadura. Nesse passo, a solução encontrada

foi a criação de um gabinete (dito de «acalmação») de composição heteróclita,

composto por regeneradores, progressistas e independentes e presidido pelo

almirante Ferreira do Amaral. Abriram-se então as prisões que encerravam

presos políticos e revogaram-se os decretos mais opressivos da ditadura, mor-

mente quanto a Leis de Imprensa e quanto ao julgamento de crimes de natu-

reza política por Tribunais Criminais.

Não obstante estas tentativas de pacifi cação da sociedade portuguesa, o

período histórico compreendido entre Fevereiro de 1908 e Outubro de 1910,

foi sobretudo marcado pelo progressivo apagamento dos agrupamentos parti-

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dários da área monárquica e pelo fortalecimento do Partido Republicano Por-

tuguês (PRP), traduzido pelo número e importância das adesões entretanto

registadas e pelos resultados obtidos em eleições para Câmaras Municipais e

para o Parlamento.

Em Maio de 1908, na sequência do Congresso de Coimbra, o PRP pela

mão da sua ala reformista, propôs à monarquia de D. Manuel a celebração de

um entendimento, a que foi dado o nome de Pacto Liberal. Um documento

elaborado por Afonso Costa consubstanciava um conjunto de reivindicações,

em que, sobretudo, se exigia o restabelecimento das liberdades de imprensa,

de reunião e de associação e a revisão da Carta Constitucional. Em troca, o

PRP prometia relegar para um plano secundário as suas aspirações à governa-

ção. A proposta terá sido bem recebida pelos progressistas e pelo próprio rei,

todavia acabou por ser inviabilizada pelo Partido Regenerador e, de acordo

com as palavras de José Relvas (um dos moderados do PRP) em Memórias

Políticas, inviabilizado também pela «impenitente acção da Rainha».

A partir de então alcançou preponderância decisiva, no seio do PRP, a

acção revolucionária, preponderância que veio a ser confi rmada e ratifi cada

pelo congresso de Setúbal de 1909, ainda que por vitória minguada.

Paralelamente, corria a acção da Carbonária, visível sobretudo no ali-

ciamento de militares de baixa patente para a causa da revolução. E, num

misto de conspirata e de luta legal, os republicanos promoviam activíssima

propaganda, graças à colaboração prestimosa de uma imprensa própria ou

simpatizante, moldando assim a opinião pública no sentido profundo da

ideia de que as mais lídimas aspirações dos portugueses teriam completa

realização com o «inevitável» advento da República. Por outro lado, organi-

zações afi liadas do PRP (centros, clubes, ligas, grémios) espalhadas pelo país

promoviam espectáculos musicais e teatrais, criavam gabinetes de leitura

e de informação eleitoral, organizavam excursões e abriam cantinas, tudo

sob o impulso de uma forte acção doutrinária orientada para as camadas

populares e para a pequena burguesia. Perante este fogo de barragem do

armamento republicano, a coroa e os sucessivos governos a que deu posse

– seis que foram – nunca estiveram senhores da situação. Como disse Raul

Brandão nas suas Memórias:

“[…] o que resta de pé não passa de fi cção. Quem manda, quem governa,

mesmo na oposição, são os republicanos […] Sucedem-se os governos, mas a

força é outra, que se sente por trás do cenário”.

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O 5 DE OUTUBRO DE 1910

Os anos de 1909 e 1910 viram agigantar-se a campanha de agitação repu-

blicana. Neste campo de acção, a imprensa desempenhou um papel decisivo.

Para além dos jornais com vínculo ao Partido Republicano, havia jornais de

grande tiragem que insistentemente advogavam a necessidade da mudança de

regime como solução única para o momentoso problema político então vivido

em Portugal. Estavam no caso jornais como o Século, dirigido por Magalhães

Lima, e a Luta de Brito Camacho. Nas vésperas da República entraram neste

combate outros diários como A Capital, dirigida por Manuel Guimarães;

A República de Artur Leitão; e O Radical dirigido por Marinha de Campos.

Não há memória de, entre nós, se fazer, como então se fez, obra jornalística e

panfl etária de tamanha envergadura.

Na opinião pública fundara-se a convicção de que a Monarquia tinha os

seus dias contados. A Revolução estava eminente. Existiam, todavia, algumas

divergências entre o Directório do Partido Republicano e a Alta Venda Car-

bonária, liderada então por Machado Santos. Tudo isso ia atrasando a aplica-

ção prática do Plano, já então gizado, para tomar conta do País.

Depois de sucessivos adiamentos – Abril, Julho, Agosto – a Revolução

começou a tomar forma na madrugada de 3 para 4 de Outubro de 1910,

com tropas a sair de Campo de Ourique e de Campolide para a Rotunda

e com as guarnições amotinadas dos cruzadores Adamastor e São Rafael a

prepararem-se para bombardear o Palácio das Necessidades. Ao raiar do dia

«contadas as espingardas», constatou-se que o número de insurrectos acanto-

nados era muito escasso para levar com êxito o empreendimento; dispunham,

no entanto, de 8 peças de artilharia. Tinha havido uma imensa descoorde-

nação e daí faltas de comparecimento de dirigentes comprometidos com o

projecto, deserção de ofi ciais, falhas de informação e de ligação. Notícias de

que a revolução havia fracassado e que “estava tudo perdido, levaram a que o

vice-almirante Cândido dos Reis, chefe militar da Revolução, pusesse termo à

vida com um tiro de pistola, numa viela esconsa de Lisboa.

O Conselho de Ofi ciais, reunido na Rotunda sob o comando do capitão

Sá Cardoso pronuncia-se pelo abandonar das armas. Não é essa, porém, a dis-

posição de Machado Santos que, conjuntamente com civis, soldados, cabos e

alguns sargentos decide permanecer nas barricadas da Rotunda e resistir. Dos

que aí fi cam, a maioria dos civis e muitos militar de baixa patente são mem-

bros da Carbonária; conseguem estabelecer ligações com outros núcleos car-

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bonários activos em Lisboa e, em conjunto obter a neutralização de algumas

unidades monárquicas. Durante o dia vão afl uindo à Rotunda mais militares

e civis. O acampamento acaba por resistir bem aos ataques da artilharia de

Paiva Couceiro. A meio da tarde o Adamastor e o S. Rafael bombardeiam o

Palácio das Necessidades. O rei foge para a Ericeira. O conhecimento desta

fuga tem um impacto muito negativo nos comandos das forças monárquicas.

Chega-se ao dia 5, são 8 horas da manhã. Dá-se então um episódio curioso:

o encarregado de negócios da Alemanha em Lisboa sobe a Avenida da Liber-

dade em direcção à Rotunda e pede para falar com Machado Santos. Alegando

que havia falado com o General Gorjão, pretendia então uma trégua de uma

hora para evacuar a salvo os súbditos alemães residentes em Lisboa. Machado

Santos começa por recusar, pensando haver ali uma manobra de dilação com o

sentido de as forças do Rossio ganharem tempo, mas depois, pensando melhor,

disse ao diplomata para fi car tranquilo que ele iria resolver o assunto.

Enverga então a melhor farda, monta a cavalo e desce a Avenida da Liber-

dade. Ora o povo, que aquela hora era já muito, quer no Rossio, quer na Av.

da Liberdade, que tinha visto uma bandeira branca subindo à Rotunda e via

agora Machado Santos a descer em direcção ao Rossio, convenceu-se de que

os monárquicos tinham capitulado e então foi um mar de gente caminhando

ao lado do cavalo de Machado Santos, aos gritos de “Viva a República”. Gente

que invadiu literalmente o Rossio e se pôs a confraternizar com os soldados

das forças monárquicas, os quais se iam passando aos magotes para o lado dos

revoltosos.

Machado Santos entra na tenda de Gorjão e convida-o a render-se. Este

hesita, mas acaba por aceder, colocando apenas como condição que fossem

poupadas as vidas da família real, o que, lhe foi, de imediato, garantido.

Estava implantada a República em Portugal. Poucas horas depois, às jane-

las da Câmara Municipal e perante uma massa enorme de gente, Eusébio

Leão lia a respectiva Proclamação.

Caíra a Monarquia da Carta! Nascera a República, herdeira do liberalismo

vintista!

PRIMEIROS PASSOS DE UMA JOVEM REPÚBLICA

A seguir à Proclamação, acto solene e formal da inauguração do novo

regime, foi constituído um Governo Provisório presidido por Teófi lo Braga,

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professor catedrático de literaturas modernas e um dos principais apóstolos do

positivismo em Portugal. No entanto, os homens que, nesta fase inicial, mais

efectivamente conduziram os negócios políticos do país foram os ministros da

Justiça, Afonso Costa; do Interior, António José de Almeida; e do Fomento,

Brito Camacho. Todos eles dirigentes do Partido Republicano Português e,

nessa qualidade, líderes de diferentes correntes de pensamento que já clara-

mente se desenhavam no seio do Partido Republicano e que, constituindo

factores de crise, haveriam de conduzir a cisões e à formação, no campo repu-

blicano, de três partidos distintos. O pecado original deste primeiro governo

da República era o de que ele simplesmente aparecera, isto é, não fora inves-

tido nas suas funções por qualquer corpo ou entidade com legitimidade revo-

lucionária, facto que não deixou de constituir para o próprio governo, para a

revolução e para o país, uma permanente fragilidade.

No plano das realizações políticas, de imediato se colocava a necessidade

de promover a existência de uma Constituição adaptada às novas realidades

da nação portuguesa. Preparou-se então nova legislação eleitoral que veio a

ser aprovada e consagrada em Abril de 1911. De acordo com esta disposição

legal, o direito de voto foi concedido a todos os cidadãos maiores de 21 anos,

alfabetizados ou chefes de família. Não era ainda o sufrágio universal, julgado

então prematuro num país com uma percentagem de analfabetos a rondar os

80% e onde o fenómeno do caciquismo era uma realidade que permanecia

forte. Perante tais condicionalismos, entendeu o governo provisório que do

sufrágio universal adviria uma votação maioritariamente inconsciente, facto

que se traduziria numa perversão da liberdade de escolha e num desvirtu-

amento dos fi ns e objectivos a alcançar. O acto eleitoral para a Assembleia

Nacional Constituinte (ANC) decorreu a 28 de Maio desse ano de 1911,

num sufrágio em que só houve eleições em cerca de metade dos círculos elei-

torais, dado que, em muitas circunscrições, os candidatos foram declarados

eleitos por o seu número não ser superior ao dos deputados a eleger. Reunida,

pela primeira vez, a 19 de Junho, a Assembleia Nacional Constituinte (ANC),

na sua qualidade e legitimidade de órgão de soberania eleito, formalizou e

ofi cializou os actos de abolição da Monarquia e de instituição da República,

confi rmando ainda os poderes do Governo Provisório. A Nova Constituição

foi aprovada e promulgada a 21 de Agosto de 1911 e contemplava, como

traços mais salientes, a consagração da República como regime e forma única

de governo; a assunção do sistema bicameralista; a tripartição dos poderes; e

o reconhecimento dos direitos, liberdades e garantias individuais. No dia 24

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de Agosto, o Congresso da República (reunião das duas câmaras – Deputados

e Senado) elegeu para o cargo de Presidente da República o Dr. Manuel de

Arriaga, advogado e professor de liceu e velha e estimada fi gura de dirigente

republicano. Em torno desta eleição agudizaram-se as clivagens existentes no

seio do P.R.P., no contexto de uma luta que opôs dois candidatos: Bernar-

dino Machado pelos afonsistas e Manuel de Arriaga por um então formado

«bloco» de almeidistas e camachistas. Na eleição presidencial, Arriaga obteve

121 votos contra 86 de Bernardino. Esta correlação de forças foi transportada

para a Câmara de Deputados e para o Senado, daí resultando que os parla-

mentares afonsistas, organizados sob a denominação de «Grupo Parlamentar

Democrático», quer numa câmara quer na outra, fi cassem em minoria. Mas o

«bloco» era uma construção de circunstância, destinada a impedir a eleição de

Bernardino Machado e, como tal, a breve trecho se desfaria.

Eleito um presidente da República, o Governo Provisório apresentou a sua

demissão, a qual, de imediato, foi aceite. Para trás fi cava uma obra legislativa

e governativa com altos e baixos, mas que, numa apreciação de conjunto,

se afi rmaria como positiva, com destaque para pontos como a reforma da

instrução pública (com especial incidência no ensino primário e no ensino

superior) e a reforma religiosa – Separação da Igreja do Estado –, mau grado a

insanável polémica que esta última levantou e ainda levanta. Neste contexto

da governação exercida pelo Governo Provisório, dever-se-á realçar ainda o

excelente trabalho feito pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Ber-

nardino Machado, que com inexcedível habilidade e tacto diplomático foi

tranquilizando as nações estrangeiras quanto à natureza e intenções do regime

saído da Revolução da Rotunda. Para além do indiscutível alcance social e polí-

tico da obra legislativa e da actuação deste governo é visível, nesse esforço,

uma intenção de apagar, tanto quanto possível, vestígios do regime deposto

a 5 de Outubro de 1910 e de obter o reconhecimento do regime republicano

português no contexto de uma Europa monárquica e conservadora, onde ape-

nas dois países, a França e a Suíça, eram repúblicas.

INSTITUCIONALIZAÇÃO DOS PARTIDOS REPUBLICANOS

O primeiro Governo Constitucional da República Portuguesa tomou

posse a 4 de Setembro de 1911. Era presidido por João Chagas, homem de

letras e jornalista e, à data, Ministro Plenipotenciário de Portugal, em Paris.

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Com um passado longo de luta contra a monarquia, a sua indigitação para

a chefi a do Executivo era, em grande parte, devida ao prestígio que gozava

junto das camadas populares republicanas. Mas, neste passo de constituição

de Governo, Chagas apenas pôde contar com personalidades bloquistas, posto

que os democráticos se mostraram, para tal, indisponíveis. Não obstante, no

Parlamento declararam o seu apoio ao gabinete ministerial de Chagas, se fosse

feita «obra de efi cácia e oportunidade política». Portugal entrava assim numa

fase de normalidade constitucional, facto que favorecia o reconhecimento do

regime por parte das nações estrangeiras.

No primeiro aniversário da República, a 5 de Outubro de 1911, Paiva

Couceiro, um outro herói da Rotunda, neste caso por banda dos monárqui-

cos, fez a sua primeira incursão contra-revolucionária, entrando por Bragança

à frente de uma coluna de cerca de 1000 homens, mal armados e equipados.

Apoderou-se da vila de Vinhais onde proclamou a monarquia e hasteou a ban-

deira azul e branca. A resposta do Governo da República foi tardia. Somente

a 9 de Outubro enviou uma força de cerca de 400 marinheiros para comba-

ter os guerrilheiros de Couceiro. O confronto armado limitou-se a algumas

escaramuças, após o que, desgastados, os invasores retiraram para Espanha.

A responsabilidade pela frouxa resposta dada pelo Governo à ofensiva monár-

quica foi imputada ao Ministro da Guerra, general Pimenta de Castro que,

no contexto dos acontecimentos, teve um comportamento dúbio e vacilante,

de tal forma que criou junto dos meios republicanos a ideia de que pactuava

com o inimigo, sendo, por isso, exonerado das suas funções e substituído por

outro militar, o tenente-coronel Alberto da Silveira.

Um Congresso do Partido Republicano Português, realizado em Lisboa,

de 27 a 30 de Outubro de 1911, teve o dom de aprofundar ainda mais as

já muito cavadas divisões entre os republicanos. Nesse campo de acção, os

democráticos conseguiram eleger um novo Directório cujos membros lhes

eram, maioritariamente, afectos. Logo Brito Camacho veio a público no seu

jornal, A Luta, para dizer que estava defi nitivamente desfeita a unidade do

Partido, enquanto que, contrariamente, Bernardino Machado em O Mundo

fazia um apelo à unidade de todos os republicanos. Todavia, as desinteligên-

cias, obedecendo sobretudo a diferenças de práxis política, confi guravam já a

existência de partidos no seio da família republicana. Uma tal situação levou

João Chagas a considerar que não existiam mais os pressupostos de unidade

republicana que tinham presidido à formação do seu Ministério e assim

sendo, o mesmo já não era representativo das forças em presença. A sete de

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Novembro, o Executivo demitia-se em bloco. Seguiu-se o Governo do profes-

sor Augusto de Vasconcelos que, para além da fi gura do presidente, integrava,

como ministros, três democráticos e quatro bloquistas. Feita a sua apresenta-

ção no Parlamento a 16 de Novembro foi ali bem recebido e apoiado.

Com este novo governo reacendeu-se a chamada Questão Religiosa, posto

que na Justiça estava agora António Macieira, advogado que durante a fase

do Governo Provisório tinha sido o mais precioso auxiliar de Afonso Costa

na feitura das leis do Registo Civil e da Separação da Igreja do Estado. Sendo

então estas leis da República desrespeitadas por alguns hierarcas da igreja, o

Ministro mandou instaurar processos judiciais aos Bispos da Guarda e do

Algarve e ao próprio Cardeal Patriarca de Lisboa, D. António Mendes Belo.

Em Janeiro de 1912, foram aqueles dignitários da igreja católica condenados

à pena de desterro, fi cando interditos de entrarem nos seus distritos e dioceses

por um período de dois anos.

Sinais de crise governamental começaram entretanto a desenhar-se em

torno do chamado «Caso Ambaca» (Companhia de Caminhos de Ferro de

Angola), com os ministros bloquistas a divergirem da actuação do seu colega

democrático, Freitas Ribeiro, que detinha a pasta das Colónias. Por outro

lado, um incidente parlamentar levava, em Março, a Câmara de Deputados

ao rubro: António José de Almeida, numa intervenção em que anunciava a

fundação do Partido Evolucionista (o seu partido), fez, concomitantemente,

uma proposta para concessão de uma amnistia aos conspiradores implicados

na intentona monárquica de 5 de Outubro de 1911. Aos múltiplos protestos

vindos de todas as bancadas, juntaram-se os gritos do público que nas galerias

se manifestava. A proposta foi recusada, com nítido prejuízo para o prestígio

de António José e para a credibilidade do seu anunciado partido.

Em todo o caso, a 24 e 26 de Fevereiro de 1912 tiveram fundação ofi cial os

Partidos Evolucionista e Unionista, respectivamente. Foram somente actos de

ofi cialização de uma situação já de facto vivida. O espectro político-partidário

passou assim a apresentar, à esquerda, o Partido Democrático, herdeiro das

estruturas e das tradições do velho Partido Republicano Português; à direita

deste fi cavam o Partido Evolucionista, liderado por António José de Almeida

e que se colocava num centro-direita de cariz ruralista e o Partido da União

Republicana ou Partido Unionista, grémio de intelectuais conservadores lide-

rado por Brito Camacho. Entrementes, o Partido Democrático reunido de

novo em Congresso em Braga, a 26 de Abril desse ano de 1912, confi rmou

a liderança de Afonso Costa, no acto de reeleição do Directório. Nesse Con-

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gresso foi decidido manter a denominação de Partido Republicano Português,

símbolo, só por si, representativo da tão almejada mas para sempre perdida

unidade republicana. Facto notável é o de não se ter gerado, nestes primeiros

anos da República, nem, diferentemente, nos seguintes, uma bipolarização

partidária que conduzisse a um rotativismo. Isso deveu-se, em primeiro lugar,

à posição hegemónica do Partido Democrático, continuadamente demons-

trada nas urnas e, em segundo lugar, às divergências profundas existentes

entre Almeida e Camacho, factor que sempre se revelou impeditivo de coliga-

ções ou acordos eleitorais.

A SUPREMACIA ELEITORAL DO PARTIDO REPUBLICANO PORTUGUÊS

E A AFIRMAÇÃO DE AFONSO COSTA COMO GOVERNANTE E ESTADISTA

No quadro político gerado pela institucionalização dos três partidos Repu-

blicanos – Democrático, Evolucionista e Unionista – o Partido Democrático

(ofi cialmente Partido Republicano Português), com grande peso representa-

tivo dentro e fora do Parlamento, condicionava governações e governantes.

Em Junho de 1912, os democráticos provocaram a queda do governo do

professor Augusto de Vasconcelos, por manifesta desconfi ança em relação à

fi gura do Ministro do Interior, o unionista Silvestre Falcão. O encargo de

formar novo governo foi cometido ao professor da Politécnica do Porto,

Duarte Leite, pessoa que, após uma primeira desistência, conseguiu formar

um ministério de concentração partidária, que integrava democráticos, unio-

nistas e evolucionistas.

Sendo a tomada de posse a 16 de Junho, logo a 6 de Julho seguinte teve o

novo executivo de se defrontar com uma segunda incursão monárquica, de

novo capitaneada por Paiva Couceiro. De imediato, o governo mandou seguir

tropas para o norte a fi m de reforçar as guarnições locais. Entrados mais uma

vez pela Galiza, os assaltantes, desta feita em maior número e melhor arma-

dos, vinham com a intenção fi rme de restaurar a monarquia. Em três colunas

dirigiram-se, separadamente, a Valença, a Vila Verde da Raia e a Chaves. Em

todos estes locais, os seus ataques acabaram por ser repelidos pelas forças da

República. Após três dias de combates, com baixas de pequena monta, de

parte a parte, terminaram os monarquistas por se retirarem, cruzando de novo

a fronteira a caminho de Espanha. Os julgamentos dos implicados na conjura

decorreram por todo o resto do ano de 1912 e esse foi o assunto que, por

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igual tempo, animou e acalorou as sessões das Câmaras, com os parlamentares

divididos entre os indultos e as condenações.

Esta segunda derrota monárquica desfez as ilusões dos que, à data, ainda

esperavam uma mudança de regime. Nessa ambiência, os infl uentes polí-

ticos locais, de norte a sul do país, sempre arrivistas e desejosos de manter

os seus poderes, começaram a aderir ao Partido Democrático, pela simples

razão de ser este o partido que mais garantias lhes dava de vir a dominar a

vida política da Nação e, nesse sentido, de vir também a contemplar a suas

expectativas de manutenção dos seus estatutos de pessoas infl uentes. Ora se

o partido de Afonso Costa era já forte, mais forte fi cou com essas adesões,

de tal forma assim que passou a ser entendimento dos seus dirigentes que

deveriam assumir o poder executivo e governar sem parcerias. Ademais, a

conjuntura era-lhes propícia, uma vez que o bicéfalo «bloco», composto

por evolucionistas e unionistas, só ocasionalmente conseguia entender-se

e dar apoio parlamentar ao Governo de Duarte Leite e este, naturalmente,

vinha-se ressentindo de uma tal situação. E, muito embora António José

de Almeida viesse afi rmando que estava pronto a assumir responsabilidades

governativas, a verdade é que para tal não reunia quaisquer hipóteses, posto

que o seu partido, comparado que fosse o poderoso Partido Democrático

não passaria de mera patrulha política, sendo também certo que num lance

de natureza governativa não poderia contar com o apoio incondicional e

permanente dos unionistas. Não é pois de estranhar que, em Janeiro de

1913, na sequência da demissão do governo de Duarte Leite, o presidente

Manuel de Arriaga se visse compelido a chamar Afonso Costa para consti-

tuir ministério.

Chegado ao poder, à frente do primeiro governo monopartidário da Repú-

blica, a grande preocupação de Afonso Costa foi a de pôr ordem na caótica e

sempre defi citária situação fi nanceira do país. Por essa razão acumulou a Pre-

sidência do Conselho de Ministros com a pasta das Finanças, encetando uma

política de rigorosa contenção orçamental. Para o efeito, criou mecanismos

legais adequados, designadamente a famosa Lei-Travão, lei esta que impedia

quaisquer gastos fora das condições e especifi cações de um quadro de despesas

previamente defi nidas e tidas como indispensáveis. Por outro lado, aumentou

a receita, instituindo o princípio do imposto progressivo, com isso fazendo

os ricos pagarem mais que os pobres. Nos dois exercícios orçamentais que se

seguiram à sua tomada de posse como chefe de governo, as Contas do Estado

saldaram-se – situações únicas na República – com superavit.

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A 27 de Abril de 1913, eclodiu uma revolta contra o governo, logo pron-

tamente sufocada. Conluiados estavam monárquicos, sindicalistas e republi-

canos radicais. Pela primeira vez, facto inquietante a indiciar autodilaceração,

assistia-se a uma revolta de republicanos contra republicanos. Por detrás do

golpe, agindo na sombra, estava o republicano Machado Santos, o herói da

Rotunda, declaradamente inimigo público de Afonso Costa. Por todo o mês

de Abril se registaram manifestações e atentados bombistas. Afonso Costa

prosseguiu, com fi rmeza, a sua obra governativa, enfrentando greves e aten-

tados à bomba e praticando reformas, com produção de nova legislação em

áreas como a instrução pública, fi nanças, fi scalidade e direito administrativo.

Em 20 de Outubro o governo neutralizou mais uma tentativa de revolta,

desta vez monárquica e que fi cou historicamente conhecida por Primeira

Outubrada. A 16 de Novembro realizaram-se eleições suplementares para pre-

enchimento de lugares vagos na Câmara de Deputados. Arrecadando maior

número de votos, os democráticos reforçaram a sua representação parlamen-

tar, passando a dispor de maioria absoluta na Câmara de Deputados. Até

então, tinham governado em concertação com os unionistas, ao abrigo de um

entendimento táctico entre Afonso Costa e Brito Camacho. Pouco depois, a

30 de Novembro, o Partido Democrático coleccionava outra vitória eleitoral,

a das eleições municipais. A partir daí, os unionistas passaram a fazer uma

oposição cerrada ao Governo, o que, de resto, favorecia Afonso Costa, posto

que, desta forma, fi cavam tranquilizados alguns sectores do seu partido que

não viam com bons olhos o entendimento com Camacho.

A 4 de Fevereiro de 1914, de novo sob impulso de Machado Santos e de

sectores radicais que o apoiavam, grupos de populares (sobretudo operários

desagradados com a política anti-sindical do governo) marcharam do Largo

de Camões em direcção ao Palácio de Belém, exigindo ao presidente da Repú-

blica a demissão do governo de Afonso Costa. Ouvidos os líderes partidários

(note-se que tanto Almeida como Camacho haviam recusado participar na

manifestação), Manuel de Arriaga defendeu publicamente uma amnistia para

presos e proscritos políticos, a revisão da Lei de Separação da Igreja do Estado

e a cessação das hostilidades entre os republicanos. Face à complexa e deli-

cada situação, Afonso Costa apresentou o pedido de demissão colectiva do

seu governo. Foi então chamado a formar ministério o Professor Bernardino

Machado, político independente, próximo do Partido Democrático, entre-

tanto regressado do Brasil onde exercera o cargo de Ministro de Portugal no

Rio de Janeiro. O seu Governo, constituído por três democráticos e cinco

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independentes, tomou posse a 9 de Fevereiro, dando início a uma política de

apaziguamento (pedida pelo presidente da República) que conseguiu atenuar

o clima de exacerbadas paixões políticas em que o país mergulhara: concedeu

amnistias, autorizou o regresso de prelados às suas dioceses e prometeu rever

a Lei da Separação da Igreja do Estado.

Desta forma, chegou o Portugal Republicano às vésperas do primeiro con-

fl ito armado à escala mundial, a Grande Guerra. Há muito adivinhada, por

questões de mercados e de partilhas coloniais, o rastilho que incendiou o

barril de pólvora foi a morte do grão-duque Francisco Fernando, herdeiro do

Império Austro-Húngaro, assassinado a tiro por um independentista sérvio,

em Sarajevo, a 28 de Junho de 1914. Uma guerra que os participantes de um

lado e de outro supunham estar resolvida pelo Natal e que acabou, afi nal, por

tomar proporções inimagináveis e prolongar-se por quatro longos anos, com

um saldo assustador em feridos, mortos e estropiados.

Uma comoção de tal envergadura teria, necessariamente, de condicionar

a política e a economia dos países, directa ou indirectamente envolvidos nas

hostilidades. Em Portugal, país de facto beligerante, primeiro em África e

depois também na Europa, os efeitos da formidável contenda foram trans-

versais, atingindo, a todos os níveis, o funcionamento das instituições e a

vida dos portugueses, com consequências de monta. A história da República

passou a confundir-se com a história da guerra e nisso se projectaram também

as distintas posições dos grandes chefes políticos: Afonso Costa de resolu-

ção pronta pela entrada de Portugal ao lado da Inglaterra; António José de

Almeida a pender para aí, inicialmente porém, hesitante; Brito Camacho,

tenazmente contra.

O pomo da discórdia era, ao momento, a nossa participação nos campos

de batalha na Europa, visto que em África a luta armada pela defesa dos ter-

ritórios de Angola e de Moçambique, face aos ataques alemães, era uma reali-

dade que vinha desde o início do confl ito. Enquanto uns pensavam que para

a defesa do património colonial seria sufi ciente o esforço militar em África,

outros, porventura mais atinadamente, julgavam que, para tanto, era neces-

sária a participação directa no teatro de guerra europeu, posto que somente

com uma reconhecida qualidade de país beligerante, Portugal poderia vir a

sentar-se à mesa das negociações de paz. Este divisionismo cresceu com o

surgimento, à escala nacional, de facções guerristas e facções antiguerristas,

epifenómeno de uma teia complexa que ligava sentimentos germanófi los ou

anglófi los a motivações políticas, a comodismos e a interesses económicos.

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OS ANOS DE GUERRA

A defl agração da Primeira Guerra Mundial e o assassinato do fi lósofo e

político francês pacifi sta, Jean Jaurès, acontecimentos coincidentes no tempo,

foram profundamente sentidos em Portugal. Escrevendo para O Comércio da

Póvoa de Varzim de 2 de Agosto e para O Norte, diário democrático da tarde, de

4 de Agosto do ano de 1914, o Professor Leonardo Coimbra, fi lósofo, peda-

gogo e político republicano do Partido Democrático, dá uma nota comovida

da morte absurda do grande fi lósofo francês e faz algumas refl exões explica-

tivas do seu pensamento. Em simultâneo, expressa o seu alinhamento pela

causa dos aliados e verbera o pangermanismo, manifestando a sua crença no

espírito francês, ao qual atribui um papel libertador e civilizacional.

O tema da guerra e a própria guerra passaram, a partir desta altura,

a marcar o andamento da vida política e social do país. Uma primeira e

grande questão se colocava a Portugal, a de saber da posição ofi cial a assumir

perante o gigantesco confl ito. Entre os chefes republicanos, o que maiori-

tariamente se mostrava mais conveniente para a defesa do nosso patrimó-

nio colonial, era a participação directa dos portugueses no teatro de guerra

da Europa, ao lado dos aliados e sob o enquadramento da velha aliança

anglo-lusa. Esta orientação era defendida tanto por democráticos como por

evolucionistas. A 1 de Agosto de 1914, dia do começo ofi cial da guerra, a

questão da nossa muito singular posição foi colocada, por via diplomática,

à Inglaterra. Respondeu a velha aliada que, por ora, nos abstivéssemos de

quaisquer declarações ofi ciais, fossem elas de beligerância ou de neutrali-

dade. Era uma resposta que nos deixava numa situação ambígua e descon-

fortável, tanto mais que se adivinhava como certa e para breve uma guerra

que teríamos de travar em África contra os apetites, já sobejamente exibidos

pela Alemanha, pelos nossos territórios coloniais. De todo o modo, havia

que reconhecer que sem o apoio logístico da Inglaterra em transportes e

equipamentos, não dispúnhamos de um mínimo de condições que nos per-

mitissem avançar para a frente europeia.

Colocado o país perante um tal leque de indefi nições, o Congresso da Repú-

blica, reunido a 7 de Agosto, aprovou um documento que dava forma escrita

a um conjunto de intenções sobre política externa portuguesa. O documen-

to previa, de forma implícita, a entrada da nação portuguesa no teatro de

guerra europeu em função dos seus compromissos internacionais, mormente

a aliança com a Inglaterra.

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A confi rmar as suspeitas quanto às intenções alemãs em África, logo a 25

desse mês de Agosto se registavam escaramuças entre tropas portuguesas e ger-

mânicas na fronteira norte de Moçambique e pouco depois, a 19 de Outubro,

na fronteira sul de Angola. Estávamos assim iniciando uma guerra que era,

afi nal, a mesma que se travava na Europa, com a diferença de as nossas frentes

de batalha se situarem em outro continente. A forçada neutralidade não ofi cial

para que fôramos remetidos era fomentadora de grande animosidade contra

os ingleses mas também de quezílias entre os portugueses. A este respeito, o

líder unionista, Brito Camacho, defendia teses, nas quais, para os nossos inte-

resses coloniais e outros, seria melhor a nossa obediência aos desígnios e visão

estratégica da Inglaterra e respeito pelo que no Tratado da Aliança se encon-

trava estipulado. Não pensavam assim, porém, os outros chefes políticos que

não confi avam nas intenções da Pérfi da Albion quanto a um efectivo auxílio

na defesa das colónias portuguesas, e suspeitavam até que ela quisesse utilizar

as nossas possessões africanas como moeda de troca, no contexto de um even-

tual acordo entre as duas principais potências bélicas, tendente a acabar com

o confl ito. Neste mesmo sentido, entendia a forte corrente intervencionista

e os seus principais mentores que somente a participação directa de Portugal

no front garantiria os nossos históricos direitos aos territórios ultramarinos, e,

por outro lado, nos traria a legitimidade de nos sentarmos, de pleno direito,

à mesa dos vencedores, reclamando devidas indemnizações ou compensações

de guerra.

Entre o fogo cruzado de guerristas e não-guerristas, o governo, sob a

batuta conciliadora de Bernardino Machado, tentava gerir a difícil situação,

procurando não criar qualquer desaguisado com a Inglaterra. Prevendo-se

para o país um estado permanente de confl itualidade, foram adiadas, sine

die, as eleições legislativas. A 20 de Outubro houve que sufocar uma rebe-

lião monárquica com epicentros em Bragança e em Mafra; presos os rebel-

des, estes afi rmaram-se contra a entrada de Portugal na guerra, sendo esse o

motivo da sua revolta. Entretanto, por nota escrita, enviada ao Ministro de

Portugal em Londres, Manuel Teixeira Gomes, com data de 10 de Outubro,

o governo inglês convidava Portugal a sair da sua situação de neutralidade

ofi ciosa e a alinhar de forma activa ao lado da Inglaterra e dos aliados, não

signifi cando isso, contudo, que pudesse, a partir daí, adoptar ou invocar o

estatuto de país beligerante; se tal quisesse, teria de invocar razões próprias e

não obrigações advindas da aliança. Feito nestes termos, o convite contrariava

as propostas dos intervencionistas portugueses e parecia oferecer argumentos

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aos que advogavam a não entrada do país na cena de guerra europeia, tendo

assim o efeito de complicar ainda mais a conturbada situação política por-

tuguesa. Em todo o caso, sob prévia aprovação do Congresso da República,

começaram os preparativos para a formação da Divisão Auxiliar, ou seja, um

corpo de tropas português com destino à frente de guerra na Europa, se bem

que houvesse totais indefi nições quando a destinos e datas de partida. Em

Dezembro, o governo, alvo de hostilidades provindas de todos os quadrantes

políticos e sociais, pediu a demissão. O presidente da Câmara de Deputados,

Vítor Hugo de Azevedo Coutinho, formou novo executivo que logo a veia

anedotística portuguesa apodou de «os miseráveis», em clara alusão ao nome

do seu chefe. De imediato, os unionistas renunciaram aos seus mandatos no

Parlamento em sinal de protesto contra um governo que consideravam de

forte infl uência do Partido Democrático e, no seu jornal partidário, A Luta,

reputavam de «maior perigo para a República». Foram então marcadas elei-

ções legislativas para 7 de Março de 1915.

Entretanto, de 20 a 25 de Janeiro de 1915, acontecimentos de acentuada

gravidade desenrolaram-se na cena política nacional, dando lugar e confi -

guração ao facto histórico que veio a fi car conhecido por «Movimento das

Espadas». Em sinal de protesto contra a prisão e transferência de alguns cama-

radas de armas, reputadamente monárquicos, grande número de ofi ciais das

guarnições de Lisboa e de outras praças militares no país, fez a entrega das

suas espadas aos seus superiores hierárquicos. Machado Santos acompanhou

o gesto, entregando a sua espada (a mesma que usara na Rotunda) ao presi-

dente da República, Manuel de Arriaga. Também a oposição unionista apoiou

o movimento, fazendo coro com estes descontentes. Arriaga forçou então a

demissão do governo de Vítor Hugo Coutinho e encarregou um seu particu-

lar amigo, o general Pimenta de Castro, de formar novo ministério e governar

em ditadura. O governo saído deste golpe semi-militar, semi-palaciano, era,

na sua maior parte, composto por militares de confi ança do velho general.

As eleições legislativas, marcadas para 7 de Março, foram adiadas sine die.

Depois, a 4 de Março de 1915, forças policiais a mando do Governo impedi-

ram a entrada dos deputados democráticos no Parlamento. Estes, conjunta-

mente com os seus colegas senadores, reuniram então no Palácio da Mitra, em

Loures, aprovando aí uma moção, na qual o ministério presidido por Pimenta

de Castro era qualifi cado como fora-da-lei.

O governo da ditadura deu então início a uma política de perseguição aos

republicanos, sobretudo democráticos, e de acolhimento a católicos e monár-

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quicos. Lançou uma amnistia geral para presos e exilados políticos, logrando

com isso a presença provocatória de Paiva Couceiro em Lisboa. Entretanto,

procedeu à dissolução da Câmara Municipal de Lisboa e de várias outras pelo

país, substituindo as edilidades por comissões administrativas. Quanto ao

problema da guerra, Pimenta de Castro era claramente um germanófi lo e um

inimigo declarado dos intervencionistas e daí o boicote aos trabalhos de pre-

paração da Divisão Auxiliar, com desmobilizações ou concessões de licenças

aos militares já convocados para essa missão especial. Com todas essas medi-

das e arranjos conseguiu Pimenta a proeza de unir de novo os republicanos,

porém contra si próprio. Em Maio, protestos de rua anti-monárquicos ocor-

reram em Lisboa, em Coimbra e em outras cidades. Logo o Governo proibiu

todas as manifestações susceptíveis de «alterar a ordem pública e o bom-nome

das instituições». A situação tornou-se tão complicada que até o próprio pre-

sidente Arriaga, grande mentor da ditadura, começou a ter dúvidas quanto

à conveniência para a República e para o país, da governação exercida por

Pimenta de Castro.

Por fi m, uma madrugada libertadora veio pôr termo à incongruência: na

antemanhã do dia 14 de Maio de 1915, cerca das quatro horas, os holofotes

dos couraçados Vasco da Gama e Almirante Reis, fundeados no Tejo, ilumina-

ram a cidade. Era o sinal para o começo de uma revolta preparada por ofi ciais

da Marinha e do Exército, muitos deles maçons e politicamente próximos de

Afonso Costa. Pouco tempo depois, marinheiros secundados por numerosos

civis, controlavam não só os navios de guerra no Tejo como ainda o Quartel de

Marinheiros em Alcântara e os Arsenais da Marinha e do Exército. Tal como

no 5 de Outubro, também agora o poder de fogo dos vasos de guerra se revelou

decisivo para a vitória dos revoltosos, só que nesta refrega o derramamento de

sangue foi muito superior. Tal como no 5 de Outubro, também agora a Repú-

blica foi proclamada das janelas dos Paços do Concelho, acto simbólico repleto

de signifi cado e estrondosamente aplaudido pelo povo de Lisboa.

Reposta, pois, a normalidade constitucional, foi chamado a formar governo

João Chagas, Embaixador de Portugal em Paris e que à data do 14 de Maio de

1915 se encontrava em Lisboa. Mas, alvejado a tiro pelo professor e membro

do Senado, João de Freitas, na estação do Entroncamento, Chagas fi cou cego

de um olho e desfi gurado, sendo-lhe assim roubada a oportunidade de exercer

o honroso cargo, nesse momento de assinalável importância histórica. Assu-

miu então a chefi a do governo, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, advo-

gado e escritor e pai do então «jovem turco» Álvaro de Castro, licenciado em

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direito e ofi cial de infantaria. Na sequência dos acontecimentos, Manuel de

Arriaga renunciou ao seu mandato de Presidente da República, sendo eleito

para o cargo Teófi lo Braga, que, constitucionalmente, desempenharia essas

funções até 5 de Outubro de 1915. A governação de José de Castro retomou

e intensifi cou os trabalhos de constituição da Divisão Auxiliar, procurando

recuperar o atraso causado pelas atribulações provocadas pela ditadura de

Pimenta de Castro. Nas eleições legislativas, realizadas a 13 de Junho, o Par-

tido Democrático obteve maioria absoluta nas duas câmaras do Parlamento.

Os democráticos voltavam assim ao poder, porém, a 3 de Julho, Afonso Costa

precipitou-se de um eléctrico numa tentativa de escapar ao que julgou ser um

atentado contra a sua pessoa. A aparatosa queda causou-lhe um traumatismo

craniano que o reteve em casa, em convalescença prolongada. Recuperado

ao fi m de alguns meses, um governo composto só por democráticos e por si

chefi ado, iniciou funções em 29 de Novembro desse ano de 1915. A posse

foi-lhe conferida por Bernardino Machado, entretanto eleito presidente da

República para o quadriénio 1915-1919, nos termos da Constituição, e a

exercer, efectivamente, esse mandato desde 5 de Outubro.

PORTUGAL EM GUERRA E O ASCENSO DA CONTRAREVOLUÇÃO

Em Fevereiro de 1916, Portugal logrou fi nalmente sair da situação de beli-

gerância encoberta em que se encontrara perante o confl ito mundial chamado

Grande Guerra. Necessitada que estava de navios mercantes, face às baixas

infl igidas à sua frota pela guerra submarina alemã, a Inglaterra solicitou ao

governo português que procedesse à requisição de todos os navios inimigos

que se encontrassem em portos portugueses. O governo de Afonso Costa

dispôs-se a aceder ao pedido da Inglaterra, pondo, no entanto, a condição de

o mesmo ser ofi cialmente formulado ao abrigo da aliança anglo-portuguesa,

no que, os ingleses concordaram, não sem alguma surpresa por parte dos

governantes portugueses. A 24 de Fevereiro foi publicado o decreto de con-

fi sco dos barcos e, alguns dias depois, a 9 de Março, a Alemanha declarou

guerra a Portugal. Por seu turno, a Grã-Bretanha manifestou publicamente a

intenção de assumir todas as obrigações da aliança, dando a Portugal todo o

auxílio possível ou considerado necessário, quer na Europa, quer em África.

Os dados estavam lançados e Portugal adquiria assim, jure et facto, o estatuto

de país beligerante.

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O Congresso da República, reunido a 10 de Março proclamou o estado

de guerra e pronunciou-se pela necessidade da constituição de um ministério

mais amplamente representativo da realidade política nacional. Desta posição

do Congresso, nasceu a formação do Governo, chamado de União Sagrada

(decalque de L’Union Sacrée, francesa). União que, todavia, se restringiu a

democráticos e evolucionistas, dado que, apesar dos esforços feitos pelo presi-

dente Bernardino Machado, tanto Brito Camacho como Machado Santos se

recusaram a participar em tal projecto. O Partido Socialista Português negou

também a sua participação e os monárquicos não foram sequer convidados.

Sendo o divisionismo no campo republicano um facto insofi smável, espe-

rava-se, no entanto, que em torno de um empreendimento desta dimensão e

importância se pudessem estabelecer consensos. Tal não aconteceu e isso não

deixaria de ter refl exos negativos.

António José de Almeida foi o nome escolhido para chefi ar o novo

governo, fi cando Afonso Costa com a pasta das Finanças. Sob o impulso

forte e empreendedor do Ministro da Guerra, major Norton de Matos, foi

realizado, em cerca de três meses, o chamado Milagre de Tancos, ou seja,

a constituição do Corpo Expedicionário Português (CEP), composto por

trinta mil homens, razoavelmente preparados e equipados. Enfrentando difi -

culdades políticas e económicas de monta e uma tentativa de revolta em

Tomar, encabeçada por Machado Santos, o governo conseguiu levar a efeito

a participação das tropas portuguesas nas frentes de batalha europeias e ainda

aumentar o esforço de guerra nas colónias. O primeiro contingente do CEP

largou do Tejo a 30 de Janeiro de 1917, a bordo de três navios britânicos e

chegou à Flandres a 8 de Fevereiro. O segundo contingente embarcaria a 23

desse mês de Fevereiro.

Entretanto, intensifi cavam-se os ataques internos das oposições, com des-

taque para os monárquicos germanófi los que, com apoio dos alemães, cons-

piravam contra a República e envenenavam a opinião pública, voltando-a

contra os poderes instituídos. Aproveitando o ambiente de descontentamento

provocado pela grande escassez de géneros de primeira necessidade, as suas

atoardas acabavam, acolá e além, por produzir os efeitos desejados. A isto

se somavam as incoerências políticas de um Brito Camacho e os comporta-

mentos inconsequentes de um Machado Santos. Por motivações ideológicas,

também os sectores sindicais, dominados pelo anarco-sindicalismo, se pro-

nunciavam contra a política guerrista do Governo da União Sagrada. Por estas

razões, foi-se instalando, pouco a pouco, na sociedade portuguesa, um clima

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de mal-estar que acabou texto do chegar ao próprio governo e por afectar

negativamente alguns dos seus membros. Apesar da fi rmeza de propósitos dos

principais chefes – António José de Almeida e Afonso Costa – em levar por

diante o programa da União Sagrada, o Governo veio a cair, face à defecção

de alguns evolucionistas.

Constituiu-se então novo Ministério, presidido por Afonso Costa, o seu

terceiro governo constitucional. Eram inúmeras as difi culdades com que a

acção governativa se defrontava, podendo afi rmar-se que existiam duas fren-

tes: a externa, compreendendo a questão da guerra e todos os problemas dela

decorrentes e a interna em que a complicação maior era a das subsistências,

aí se fi liando um cortejo extenso de males – falta de géneros alimentícios e

energéticos, alta de preços, contrabando, açambarcamentos, mercado negro,

novo-riquismo. Mas também não faltavam adversidades de outra natureza,

tais como a existência de elementos activos no interior das forças armadas a

provocar estados latentes de insurreição e minorias politicamente organizadas

a desenvolver acções de propaganda anti-governamentais. Assacando todas as

culpas ao Governo, visavam contabilizar a seu favor todo o natural descon-

tentamento das populações, face às condições de vida extremamente penosas,

impostas pela economia de guerra. As misérias experimentadas pelos solda-

dos na linha da frente e o elevado número de mortos, feridos e estropiados

concorriam também para que as famílias portuguesas passassem a odiar uma

guerra cuja razão de ser nunca fora, de resto, sufi cientemente entendida pelo

povo, sobretudo o povo da província. Tudo isto constituía um caldeirão de

ingredientes perigosos, fervendo num lume brando que a propaganda germa-

nófi la e anti-guerrista se esforçava por atear.

Entre Maio e Setembro de 1917, o país viveu um ambiente continuado

de greves e tumultos e assaltos a padarias, mercearias e armazéns. A repres-

são, por parte das polícias, a esses actos de pilhagem, causava, invariavel-

mente, mortos. Degradava-se a imagem do Governo e a de Afonso Costa e

eram constantes os rumores de golpe de estado. O jornal A Montanha, órgão

democrático do Porto, abandonava o Partido e tornava-se independente. Em

outro importante jornal democrático, O Mundo, um grupo de redactores,

com Mayer Garção à frente, retirava-se para fundar A Manhã, diário indepen-

dente. Nas eleições municipais de 4 de Novembro de 1917, os democráticos

conquistaram apenas 92 dos 300 municípios conquistados em 1913. A nação

portuguesa afundava-se e com ela o Partido Democrático, em cujo interior se

começavam a instalar desinteligências graves.

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Em Novembro, Afonso Costa ausentou-se para Paris para aí participar

numa conferência promovida pelos aliados. Aproveitando a sua ausência, a

insurreição militar pôs-se em marcha. À sua frente aparecia uma personagem

politicamente desconhecida, de seu nome Sidónio Bernardino Cardoso da

Silva Pais. Militar de artilharia e lente de matemática, exercera até Março de

1916 as funções de ministro plenipotenciário de Portugal em Berlim. Desde

o seu regresso, conspirara activamente contra a União Sagrada e contra a polí-

tica intervencionista, tentando assumir o papel de chefe e guia de todos os

descontentes. No trabalho desenvolvido ao longo de todo esse tempo, logrou

obter o apoio de grandes proprietários agrícolas e da alta burguesia que se dis-

puseram a fi nanciar a causa. O próprio Sidónio Pais, discursando em Évora,

referir-se-á a António Miguel Fernandes, lavrador rico de Beja (depois guin-

dado ao cargo de Governador Civil de Lisboa), como «o homem que mais

ajudou a revolução». O projecto envolvia unionistas, centristas, machadistas,

monárquicos, católicos e, no sector militar, ofi ciais de baixa patente, cadetes

da Escola de Guerra e alguns sargentos que se opunham com mais deter-

minação à participação no front. Os próprios sindicalistas, ideologicamente

antiguerristas e cansados que estavam de deterioradas condições de vida e de

repressão, concediam a Sidónio senão apoio, pelo menos benefício da dúvida.

Assim, todos esses empenhos conseguiram insurreccionar algumas unidades

militares da guarnição de Lisboa – artilharia, cavalaria e infantaria – que con-

juntamente com os referidos cadetes e alguns populares (poucos) saíram à rua,

ao anoitecer do dia 5 de Dezembro de 1917, e assentaram arraiais no alto do

Parque Eduardo VII.

A resposta do governo foi frouxa, própria de um executivo que se encon-

trava num estado de grande debilidade. No entanto, a luta tornou-se acesa

durante o dia 7, com duelos de artilharia e combates no Largo do Rato e na

Avenida da Liberdade. Numa atitude timorata que contrastava com a fi r-

meza que anteriormente demonstrara possuir, o Ministro da Guerra, Norton

de Matos, apresentou o seu pedido de demissão ao Presidente Bernardino

Machado. O desânimo e a desorientação instalados no Governo, estando

Afonso Costa ausente, acabaram por oferecer a vitória aos revoltosos. A pos-

tura, eternamente conciliadora, de Bernardino Machado levou-o a considerar a

possibilidade de fazer um entendimento com os mentores da revolução. Nesse

sentido, pediu a comparência junto de si do chefe unionista, Brito Camacho,

o qual, pura e simplesmente, ignorou o pedido. Bernardino Machado osten-

tava assim um desconhecimento ingénuo quanto ao que realmente se estava a

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passar, não se apercebendo do que representava a revolta e das intenções que a

mesma comportava, facto tanto mais indesculpável quanto era verdade que a

insurreição havia sido tramada quase às claras. As declarações e proclamações

iniciais dos vencedores, feitas a 8 de Dezembro, em nome da Liberdade e da

República e defensoras da presença de Portugal na guerra, ao lado dos alia-

dos, não escondiam o cariz germanófi lo, conservador e revanchista do movi-

mento. Contavam, no entanto, com o apoio do antiguerrista Brito Camacho

e do eterno conspirador Machado Santos, campeão do ódio a Afonso Costa.

E tinham também o assentimento do médico e cientista Egas Moniz que,

entretanto, desenvolvia esforços para formar um novo clube político, o Par-

tido Centrista Republicano.

Regressando de Paris, sem ter noção exacta do que se estava passando em

Portugal, Afonso Costa foi preso no Porto. Por seu turno, o Presidente da

República, Bernardino Machado, instado a renunciar ao cargo, recusou fazê-

-lo, sendo por isso demitido por decreto e forçado a exilar-se. Após quatro

meses de prisão, também Afonso Costa partirá para o exílio em Paris, cidade

onde virá a fi xar residência permanente. O movimento dezembrista, assim

chamado por ocorrer em Dezembro, dará lugar a uma ditadura personifi -

cada pela fi gura de Sidónio Pais, regime que rapidamente desaparecerá após a

morte do ditador, na noite de 14 de Dezembro de 1918, data do seu assassi-

nato na Estação do Rossio, em Lisboa.

DEZEMBRISMO/SIDONISMO/REPÚBLICA NOVA

Os nomes citados no título têm servido para classifi car um período curto,

mas controverso da nossa história, e, todavia, são palavras que encerram con-

teúdos diversos e até contraditórios: Dezembrismo, o movimento revolucio-

nário em si e os seus valores, diametralmente opostos aos da União Sagrada;

Sidonismo, a dinâmica política que se gerou, fortemente centrada na fi gura

do chefe e abrangendo o culto a ele prestado; República Nova, a expressão tão

cara a Sidónio Pais e que servia para nominar as suas intenções de destruir o

regime anterior, ao qual chamava, por antonímia pejorativa, República Velha.

Reclamando-se sempre republicano, Sidónio queria, afi nal, uma República

afeiçoada à sua pessoa e ao seu projecto pessoal de poder. Daí que, no governo

saído da Junta Revolucionária, o “Chefe” abocanhasse uma grossa fatia de

poderes, acumulando a chefi a do mesmo com as pastas da Guerra e dos Negó-

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cios Estrangeiros. Neste primeiro executivo, Machado dos Santos, o herói

aplaudido e consagrado do 5 de Outubro de 1910, foi Ministro do Interior.

Pouco tempo volvido, o Presidente do Ministério acumulou as suas fun-

ções com as de Presidente da República, isso até à eleição de um Chefe de

Estado, tudo nos termos de um decreto governamental com data de 27 de

Dezembro desse ano de 1917. Estavam assim dados os primeiros passos para

a instauração de um presidencialismo que viria a ser uma das marcas fortes

do regime sidonista e que mereceria a Sidónio o apodo de Presidente-Rei,

concedido pelo génio de Fernando Pessoa. Faltaria então institucionalizar o

sistema, o que seria tentado, porém de forma incipiente e atabalhoada, atra-

vés de decretos, sem que uma nova constituição viesse a consagrar toda essa

idealizada construção política.

À revolução dezembrista ou, melhor, ao sidonismo, colaram-se os católicos

e os monárquicos. A primeira motivação de uma tal atitude, era, inequivoca-

mente, o profundo ódio que ambos votavam à República e, acima de tudo, ao

afonsismo. Mas, naturalmente, havia segundas intenções: por parte dos católi-

cos havia a simples expectativa, entretanto criada, de recuperarem importân-

cia ofi cial e antigos privilégios; por banda dos monárquicos, governava-os o

entendimento de que, no âmbito da nova situação política, o plano da luta

pela restauração da monarquia, passaria, numa primeira fase, pela solidarie-

dade com o regime de Sidónio Pais; depois, fragilizado este, estariam criadas

as necessárias condições para um assalto ao poder. Sendo esta uma estratégia

que obedecia às ordens do rei no exílio, D. Manuel II, não era a mesma, no

entanto, consensual entre os monárquicos.

O facto é que a governação de Sidónio dava pleno abrigo a estas presun-

ções e esperanças monárquicas. Na verdade, enquanto as cadeias se enchiam

de republicanos, os altos cargos da administração pública e das instituições

militares eram preenchidos com personalidades afectas à Monarquia. Com um

tal aparelho administrativo e dada a natureza anti-parlamentar do sidonismo,

a administração do país foi sendo feita sem programa político, com recurso a

medidas avulsas ditadas por necessidades pontuais. Daí que se tivesse caído no

vício de produção de uma imensa legislação de quase 2000 decretos governa-

mentais em um ano. Era, em todo o caso, uma acção político-administrativa

que estava muito longe das «facilidades» que a fraqueza dos adversários e os

consensos estabelecidos na fase conspiratória e nos inícios da revolução pare-

ciam prometer. Por outro lado, é bom não esquecer que o movimento dezem-

brista e o sidonismo estavam hipotecados, desde o princípio, a alguns desses

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consensos. Na verdade, não fora em troca de nada que os proprietários e a alta

burguesia se tinham decidido a apoiar Sidónio Pais e o seu projecto revolu-

cionário. Assim sendo, quando este chegou ao poder, logo se assistiu à libera-

lização dos preços dos produtos agrícolas e de outros bens e a uma repressão

generalizada dos trabalhadores e das suas organizações, como forma de impe-

dir lutas e reivindicações. Logo, logo, os sindicalistas chegaram à conclusão

amarga de que nada tinham ganho com a troca do afonsismo pelo sidonismo.

Agravava-se entretanto a já calamitosa situação económica do país, com

especial incidência no problema, sempre candente, dos abastecimentos dos

bens essenciais e dos combustíveis. A fome grassava pelas casas e pelas ruas:

era o tempo da «sopa do Sidónio», rejeitada dignamente por muitos que recla-

mavam, não esmolas, mas condições de existência com um mínimo de dig-

nidade. Sobretudo nas principais cidades, um povo esfomeado continuava a

assaltar as tulhas dos armazéns e dos estabelecimentos comerciais.

E quanto ao problema do confl ito mundial, parecia que a palavra de ordem

de «abaixo a guerra», gritada no decorrer da revolução, havia tido pleno cabi-

mento e aceitação junto do Executivo de Sidónio, visivelmente na redução

drástica dos contingentes militares de rendição das tropas no front. Sucediam-

-se as desmobilizações, os prolongamentos de licenças, as deserções, tudo isso

explicado com base em alegadas difi culdades de transportes, face à falta de

navios…, dos navios que Portugal não tinha e de que a Inglaterra não dis-

punha. Escusas que não foram, nem nunca serão, sufi cientes para eximir a

ditadura de Sidónio Pais da responsabilidade moral pelo desastre português

de La Lys, a 9 de Abril de 1918, acontecimento infausto convenientemente

ocultado pela imprensa sidonista e censurado em outros jornais. Aliás, o ano

de 1918 mostrou-se funesto para o sidonismo e para Portugal, confi gurando

uma situação de um país em estado de guerra interna: revoltas militares; gre-

ves e confrontos com sindicalistas; sabotagens; assaltos a jornais e a sedes de

organizações políticas; tumultos de toda a ordem; estados de sítio; repressão

feroz da parte das polícias; as cadeias a abarrotarem de presos políticos; uma

epidemia, a pneumónica, que matou mais de cem mil portugueses. O regime

desintegrava-se no meio das suas próprias contradições e dos acontecimentos

que já não dominava. Uma situação que, em editorial, o jornal O Século clas-

sifi cava de «anarquia mansa», dizendo que «[…] não faltando quem mande,

só não manda quem pode» (O Século de 24/8/18, 1.ª página).

Abandonado pelos republicanos e pressionado e condicionado por monár-

quicos, particularmente por monárquicos militares, o ditador voltava-se para

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uma engalanada vida pública, sempre envergando a sua vistosa farda, reca-

mada de estrelas. Daí a sua presença constante em paradas militares, recep-

ções de soldados vindos da frente de guerra, visitas a centros de assistência e

hospitais e cerimónias religiosas em que o irmão Carlyle (nome maçónico de

Sidónio) ajoelhado nas igrejas, adoptava uma postura mística que tanto fas-

cinava as senhoras. Não desprezando uma oportunidade para promover a sua

imagem, o populista Sidónio cultivava a sua relação com o povo, tentando,

também por essa via, manter-se no poder.

Mas também entre o povo ele tinha inimigos e eram afi nal do povo os

homens que se dispuseram a pôr termo à sua vida e à ditadura. Uma primeira

materialização desses intentos ocorreu, a 5 de Dezembro de 1918, durante

uma daquelas acções de rua em que se pretendia mostrar, sendo então alvo de

um primeiro atentado de que saiu ileso. Passados poucos dias não teve, porém,

tanta sorte e, teimando, contra todos os avisos e conselhos, em viajar de com-

boio para o Porto, marcou encontro com a “Morte”, à entrada da Estação do

Rossio. Esta apareceu-lhe sob a forma de uma pistola empunhada pelo ex-com-

batente das campanhas de África, alentejano de Garvão, José Júlio da Costa.

Desta maneira, foi colocado um ponto fi nal ao cidadão Sidónio Pais e à sua

torrentosa irrupção na vida política portuguesa. Uma passagem que, apesar de

breve, deixou marcas, e que, de alguma forma, pode considerar-se como um

ponto charneira entre duas fases da história da Primeira República: o afonsismo

e o pós-afonsismo.

Em jeito de síntese, diríamos que o sidonismo aparece, no contexto da

República, como uma manifestação estranha de poder pessoal misturada com

o exercício de uma governação confusa, imediatista, com governantes de oca-

sião e ao sabor das necessidades. Sem um suporte ideológico consistente, sem

um programa, a sua única directriz era uma reacção à política de guerra e os

seus grandes objectivos resumiam-se, afi nal, ao combate a essa política e à

busca de soluções para uma sequente e generalizada situação de crise, para isso

deitando mão ao uso de medidas de excepção e, por natureza, anti-democráti-

cas. O projecto vago de construção de uma nova ordem institucional e social,

denominado República Nova ou Ideia Nova, baseado no carisma do chefe e

pretensamente legitimado pela ligação deste ao povo, não teve oportunidade

de vingar em tempo de Sidónio. Teve, porém, contornos que anteciparam as

linhas mestras dos regimes fascistas que após os anos vinte proliferaram por

alguma Europa e por outros lugares do mundo. E, na sua essência e na sua

forma, foi uma prefi guração da conjuntura política que se instalou em Por-

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tugal após 1933 e que veio a fi car conhecida por Estado Novo. Uma retórica

de cariz nacionalista, o culto do chefe, um populismo demagógico, levado ao

extremo, e a presença suscitada do messianismo português, fenómeno sempre

exacerbado em tempo de crise, foram ingredientes que, devidamente mis-

turados, produziram ou ajudaram a produzir a irracionalidade colectiva e a

crença e atracção pela fi gura do «salvador milagrosamente aparecido para sal-

var a Pátria das garras dos seus inimigos». Uma recorrência sebastianista que

chegou a afectar cabeças bem pensantes como, por exemplo, a de Fernando

Pessoa, ainda que, no caso, por pouco tempo. Em outro registo temporal, mas

dando provas da sua arguta percepção da realidade e da sua fi níssima e certeira

ironia, Guerra Junqueiro, em entrevista ao jornal A Pátria de 1 de Julho de

1920, qualifi caria Sidónio Pais de «fabricante de tragédias».

Mais à frente, veremos que, para maior desgraça de Portugal e dos portu-

gueses, os momentos mais patéticos desta «tragédia», tiveram lugar, não em

tempo de vida do «fabricante», mas após a trágica morte deste.

O PÓSSIDONISMO E A CONJURA MONÁRQUICA

Morto Sidónio Pais, o sidonismo começou de imediato a morrer. A assun-

ção, por parte do Governo, do pleno exercício dos poderes executivos e a elei-

ção de um novo presidente da República foram actos realizados nos termos da

Constituição de 1911, então reposta em vigor. Com isso se fazia letra morta

dos rudimentos constitucionais sidonistas, ao abrigo dos quais fora consti-

tuído o Congresso da República (reunião da duas câmaras do Parlamento –

deputados e senadores), ao qual, todavia, não tinham sido atribuídos poderes

electivos. E no entanto foi este órgão que, a 16 de Dezembro de 1918, elegeu

para a presidência da República o vice-almirante João do Canto e Castro Silva

Antunes, um monárquico que desempenhava o cargo de Secretário de Estado

da Marinha, desde Outubro desse ano.

O novo Chefe de Estado encarregou o anterior Secretário de Estado

das Finanças, tenente-coronel João Tamagnini da Silva Barbosa, de formar

governo. Este assim o fez, recorrendo, em boa parte, a elementos do anterior

ministério. De acordo com disposições governamentais então tomadas, fi ca-

vam também repostas as fi guras institucionais do presidente de ministério,

bem assim como dos ministros (recorde-se que em tempo de Sidónio Pais os

ministros haviam passado a secretários de Estado).

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Neste ínterim, agitavam-se, porém, os militares, organizados primeira-

mente nos chamados Núcleos de Guarnição e depois nas proclamadas Juntas

Militares. Os Núcleos tinham surgido, ainda em tempo de Sidónio Pais, como

mais uma consequência da sua desatinada política de se rodear de monár-

quicos, provendo com estes as chefi as e os mais altos e estratégicos cargos

do sector militar. O resultado foi o aparecimento dum exército fortemente

politizado e extremado em duas facções principais: de um lado uma ofi ciali-

dade monarcófi la que se havia mostrado fortemente antiguerrista e que temia

o avanço dos democráticos (a quem apelidavam de «seita demagógica») e o

retorno a uma situação política igual ou parecida com a que se vivera antes da

revolução dezembrista; do outro lado, ofi ciais de fundadas convicções repu-

blicanas e que viam, com razão, nas acções e movimentações dos primeiros, o

perigo de uma tentativa de restauração monárquica.

Na verdade, em articulação com alguns dirigentes monárquicos, mais liga-

dos a Paiva Couceiro, o verdadeiro e superior objectivo das Juntas Militares

era a restauração da monarquia em Portugal. Ao momento mostravam ape-

nas os seus intentos de infl uir na situação política, intervindo nas compo-

sições governamentais ou promovendo a formação de um governo militar

que «jugulasse de vez a fúria revolucionária» (“Proclamação da Junta Militar

do Norte”, datada de 18/12/18, in Diário de Notícias de 21/12/18). Num

primeiro ensaio de força e sob o pretexto de desconfi ança política quanto

a algumas personalidades governamentais como o médico Egas Moniz e o

magistrado Afonso de Melo, os militares monárquicos fi zeram sair de quar-

téis, na madrugada de 24 de Dezembro de 1918, os regimentos de cavalaria

de Lisboa, acompanhados por elementos das baterias de Queluz e por alunos

da Escola de Guerra. Sob o comando do general Jaime de Castro foram acam-

par no Parque Eduardo VII, de onde enviaram delegados seus a Belém para

conferenciar com o Presidente Canto e Castro e com o Chefe de Governo,

Tamagnini Barbosa. Da conferência resultou que continuaria em funções o

Ministério de Tamagnini, tal como estava constituído, aguardando-se melhor

oportunidade para introduzir alterações que, de alguma forma, satisfi zessem

as pretensões das Juntas Militares. Após estas conversações, os sublevados, sob

uma chuva contínua que se fazia sentir, levantaram arraiais e retiraram para

Queluz.

Para Canto e Castro e Tamagnini Barbosa que, a todo o transe, queriam

evitar derramamentos de sangue, a retirada dos militares constituía uma

pequena vitória, uma vez que não só não houvera confrontos, como ainda no

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difícil plano negocial haviam ganho tempo, não se obrigando, pelo menos no

imediato, a dar resposta a qualquer das reivindicações das Juntas. De resto, o

movimento golpista era condenado publicamente por muitos sectores e mem-

bros das Forças Armadas e pela quase totalidade da imprensa. De notar que

junto da opinião pública, mormente da opinião pública lisboeta, as Juntas

não gozavam de apoios, bem pelo contrário, eram vigorosamente verberadas.

Todavia, ainda nessa manhã de 24 de Dezembro, os insurrectos fi zeram che-

gar a Tamagnini Barbosa uma comunicação na qual colocavam uma série de

condições para uma retirada defi nitiva para quartéis. Designadamente, pre-

tendiam a queda do Ministério e a constituição de outro, integrando pessoas

por si indicadas, e reclamavam a prerrogativa de serem eles, militares, a esco-

lher os comandos para os corpos de tropas no país. Tamagnini de imediato

taxou as reivindicações de inaceitáveis.

Desta forma, a guerra civil, opondo realistas a republicanos, avizinhava-se,

perigosamente. Porém, na sequência de esforços mediados por Canto e Cas-

tro, o Governo e as Juntas chegaram, aparentemente, a um entendimento, à

luz do qual se procedeu a uma recomposição ministerial que afeiçoava o Exe-

cutivo um pouco mais às exigências dos monarquistas. Apresentado no Par-

lamento a 9 de Janeiro, o novo Governo mereceu críticas da parte dos vários

grupos parlamentares, com excepção da minoria católica, sendo Tamagnini

acusado de andar às ordens das Juntas. No Senado, também Machado San-

tos não se eximiu a proferir opiniões cáusticas quanto à actuação do Chefe

do Executivo, chamando-lhe «comerciante de secos e molhados» (O Século

de 10/1/19). Em todo o caso, o remodelado Governo não foi inviabilizado.

Contudo, as cedências feitas aos monárquicos das Juntas Militares tive-

ram o efeito de exaltar os ânimos dos republicanos. Não tardou muito para

que essa exaltação desse lugar a uma revolta republicana com epicentro em

Santarém e com focos de rebelião em Lisboa e na Covilhã. As tropas envia-

das pelo Governo dominaram as insurreições em pouco tempo e sem difi -

culdades de maior, excepção feita para Santarém que continuava a resistir.

Da cidade, o comandante das forças amotinadas, coronel Jaime de Figuei-

redo, enviou ao Presidente da República um telegrama, reconhecendo a sua

autoridade de Chefe de Estado e justifi cando a revolta como um meio para

libertar o país e os órgãos de soberania da coacção das Juntas Militares. No

documento, propõe a organização de um governo «retintamente republi-

cano» (O Século de 12/1/19). Decidido a não contemporizar, o Governo fez

deslocar tropas de Lisboa e do Alentejo e de Coimbra, pondo cerco a Santa-

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rém. A estas tropas juntaram-se outras, vindas do norte, enviadas pela Junta

Militar e comandadas pelo coronel Silva Ramos, acto que, decerto, obede-

ceu à dúplice intenção de, por um lado, combater os republicanos (inimigos

de sempre) e, por outro lado, afi rmar a existência da Junta como centro

de poder, alternativo ao Governo. Também a famosa Coluna Negra (grupo

armado com peças de artilharia e composto por guardas-fi scais, guardas-

-republicanos e soldados de uma companhia de obuses, arregimentados por

Teófi lo Duarte em Castelo Branco e na Guarda e que, sob o seu comando,

dominaram os revoltosos da Covilhã. Agindo por conta própria, deambu-

larão depois pelas Beiras, numa táctica de movimento nunca antes ensaiada

em Portugal por tropas sublevadas) comandada por Teófi lo Duarte, um dos

cadetes de Sidónio, se pôs a caminho da cidade ribatejana. Cercados por

efectivos poderosos e sujeitados a aturado fogo de artilharia, os sitiados, ao

meio-dia de 15 de Janeiro de 1919, mostraram sinais de quererem negociar

uma rendição e acabaram por depor as armas ao fi m da tarde, não perante

o comandante geral das forças militares atacantes, general Tamagnini de

Abreu, mas ante a fi gura de Teófi lo Duarte, que era apenas tenente. Na sua

declaração de rendição, os revoltosos justifi caram tão insólita atitude com

o reconhecimento na pessoa de Teófi lo Duarte da sua dignidade de Gover-

nador de Cabo-Verde (investido nesse cargo por Sidónio Pais), facto que

o transformava no interlocutor mais importante. Não é difícil adivinhar-

-se outras motivações por parte dos revoltosos, designadamente a intenção

de apoucarem o Governo, uma vez que em todo aquele contexto, Teófi lo

Duarte agira sempre por conta própria, não estando mandatado para quais-

quer dos actos que cometera.

Esta aventura republicana, em si própria, e a benignidade com que os seus

autores foram julgados pôs de sobreaviso os próceres das Juntas Militares.

Suspeitavam, aliás com fundamento, de cumplicidades entre insurrectos e

membros do Governo para a criação de um facto (a revolta) que se mostrasse

como uma contraposição forte às actividades das Juntas Militares, com isso

se visando a subvalorização do peso e infl uência destas no xadrez da política

nacional. Certas afi rmações produzidas mais tarde pelo deputado dezembrista,

Cunha Leal, implicado no movimento, dão alguma consistência à suspei-

ção das Juntas. Com efeito, Cunha Leal declarará na Câmara de Deputados

que por amigos do Presidente do Ministério lhes foi dito, a eles, revoltosos,

o seguinte: “Nós não temos forças para combater as Juntas Militares, mas

revoltem-se vocês provando ao Governo que essa força existe, pois assim o

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Governo em lugar de os combater dar-lhes-á as mãos” (Diário da Câmara de

Deputados de 11/02/1919 – grafi a actualizada).

Adiante veremos que de toda esta complexa e turbulenta conjuntura resul-

tarão consequências graves e dramáticas que não deixarão de pesar dos desti-

nos da República e de Portugal.

CONTRAREVOLUÇÃO MONÁRQUICA E CONTRADIÇÕES REPUBLICANAS

No âmbito da conturbada situação política que se seguiu à chamada

Revolta de Santarém, o conhecimento de uma mencionada cumplicidade

existente entre o Governo de Tamagnini Barbosa e os vultos republicanos

envolvidos na dita revolta terá levado os próceres das Juntas Militares a con-

cretizar os seus, até então inconfessados, desígnios de restauração da realeza

em Portugal. Em consequência, a 19 de Janeiro, na cidade do Porto, reunida

toda a guarnição militar no Largo do Monte Pedral, deu-se o acto formal

de restauração da Monarquia. As «cerimónias» decorreram sob a presidência

de Henrique Mitchell de Paiva Couceiro (o já referido cabecilha das Incur-

sões Monárquicas), personalidade que, a partir de então, passou a intitular-se

Regente do Reino de Portugal, em nome de D. Manuel II. No seguimento,

várias outras cidades do norte hastearam a bandeira azul e branca, fi cando a

nação portuguesa dividida em dois regimes, com uma linha divisória sensivel-

mente marcada pelo curso do rio Vouga. Estava assim implantada a chamada

«Monarquia do Norte». Em Trás-os-Montes, a cidade de Chaves permanecia,

porém, como um importante e signifi cativo baluarte republicano.

Perante tão graves acontecimentos, o Presidente Canto e Castro decretou

o estado de sítio, para vigorar em todo o país por trinta dias. Por seu turno,

o Chefe do Governo, a 21 de Janeiro, diante de uma enorme manifestação

republicana que se concentrava junto às portas do Ministério do Interior, fez

um apelo para que o povo republicano de Lisboa pegasse em armas e comba-

tesse os monárquicos, inimigos da República. Este mesmo povo, fi el aos ideais

da República, respondeu pronta e maciçamente. Viva expressão dessa entrega

generosa é o episódio seguinte:

“[…] O Sr. Alferes Sá avisa um popular que vem descalço de que não lhe

será dado calçado e não poderá combater assim, mas ele replica com energia:

− Não faz mal; arranjarei umas botas. O que eu quero é defender a República!

(O Século de 23/1/19, 1.ª página).

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Vendo assim uma hoste grossa e animosa de civis a ser armada, e disso

tomando fundados receios, a Junta do Sul e os dirigentes monárquicos de

Lisboa, até aí expectantes, decidiram que era chegado o momento de agir. No

âmbito dessa decisão, várias unidades do Exército, acompanhadas de alguns

civis, na tarde de 22 de Janeiro subiram ao Monsanto e daí fi zeram fogo sobre

a cidade. Sob o comando do conselheiro Aires de Ornelas (primeiro repre-

sentante em Portugal da pessoa do rei exilado, D. Manuel II) e do tenente-

-coronel Álvaro César de Mendonça (Ministro da Guerra do último Governo

de Sidónio Pais) as forças realistas declararam-se então em estado de pronun-

ciamento pela monarquia.

No início, a situação por banda dos republicanos mostrou-se muito difícil,

dado que, persistindo as mais importantes unidades militares de Lisboa em

manterem-se neutrais, o Governo não sabia de que armas ou forças poderia

dispor para dar combate aos insurrectos. Neste impasse, o Parque Eduardo

VII foi designado como local de concentração de todos os que quisessem

lutar contra a sedição monárquica. Afortunadamente para a República, para

ali foram afl uindo civis e militares, fazendo-se estes acompanhar de algum

armamento. No dia 23, não sendo ainda as forças republicanas em número

sufi ciente para se tentar um assalto, o comandante das operações, tenente-

-coronel Vieira da Rocha, decidiu pôr cerco a toda a serra do Monsanto,

cortando todas as estradas e caminhos que possibilitassem uma saída dos

revoltosos. Travou-se então um feroz duelo de artilharia que se saldou por

alguma vantagem para o lado dos monárquicos, vantagem essa que, pouco a

pouco, se foi estreitando, sobretudo em função dos constantes reforços que

chegavam às hostes republicanas. Durante o dia de 24 de Janeiro, sitiantes e

sitiados combateram-se ainda encarniçadamente, até que, ao fi m da tarde, os

republicanos reuniram forças e encetaram um ataque geral, que em pouco

tempo levou ao desbaratamento e consequente rendição dos monárquicos,

constatando-se então que estes se encontravam esvaídos pelo longo esforço

dispendido e já sem munições para as peças de artilharia.

Esta importante vitória sobre a monarquia em armas teve, como não pode-

ria deixar de ter, repercussões fundas no plano político. E porque entre os

republicanos, que tão grande feito haviam cometido, estavam, maioritaria-

mente, partidários da República Velha, o acontecimento representava mais

um fi rme passo na morte, já anunciada, do dezembrismo e do sidonismo,

enquanto forças e ideologias actuantes. Portugal enfrentava então uma nova e

diferente situação política, a qual exigia um governo representativo dos inte-

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resses dos partidos históricos da República, facto bem entendido pelo pró-

prio elenco governativo chefi ado por Tamagnini Barbosa e que, bem depressa,

levou à demissão irremissível do mesmo.

O Presidente da República incumbiu então o republicano histórico e

conservador, José Relvas, de formar governo. Este, movimentando-se com

rapidez, apresentou, logo a 28 de Janeiro, um ministério de concentração

republicana, composto por quatro republicanos independentes, dois sidonis-

tas, dois democráticos, dois unionistas, um evolucionista e um socialista. De

notar que, pela primeira vez, um socialista entrava num governo da Repú-

blica, circunstância que não podia deixar de estar relacionada com um ascenso

social do operariado em função da sua participação, porventura decisiva, na

vitória obtida contra os monárquicos, em Monsanto.

Assim formado, o Governo foi tido como representante de todas as corren-

tes republicanas ainda em presença na cena política e teve nas Câmaras uma

recepção muito favorável, colhendo aí intenções de um incondicional apoio.

No entanto, persistia uma difi culdade de monta, a qual era a necessária,

porém difi cultosa, senão mesmo impossível, convivência com um Parlamento

que datava do tempo de Sidónio e que, extinta a conjuntura que possibilitara

a sua criação, já não tinha, ao momento, qualquer razão de existir. Ora este

era um problema que afectava também o Presidente da República, uma vez

que o monárquico Canto e Castro devia a sua eleição a esse Parlamento, agora

desadequado à nova realidade política.

Entrementes, na luta travada contra a Traulitânia, as tropas da República,

ultrapassando a linha do Vouga, progrediam em direcção a Viseu e a Lamego,

tomando esta cidade a 10 de Fevereiro. Numa outra frente mais a oeste, tam-

bém Estarreja, e a seguir Ovar, caíam em poder dos republicanos. Atacadas

pelo mar, Viana do Castelo, Vila Praia de Âncora e Caminha resistiam mal

às arremetidas que lhe eram lançadas. Por força de todas estas ofensivas enco-

lhiam drasticamente as fronteiras da Monarquia do Norte. A derrocada fi nal

chegou no dia 13 de Fevereiro, vinda de dentro da própria cidade do Porto,

numa acção conjunta de elementos da Guarda Republicana (à data, Guarda

Real, posto que os monárquicos lhe haviam mudado o nome) e da artilha-

ria da Serra do Pilar. Esta conjugação de esforços logrou uma fácil e rápida

dominação das tropas realistas que restavam na cidade. Abriram-se as portas

das prisões, a bandeira azul e branca foi arriada e o regime republicano foi ofi -

cialmente reposto. Na semana que se seguiu, caíram praças importantes como

Vila Real e Mirandela, sendo ainda debelados focos de resistência que per-

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duravam em outras localidades. Chegava assim ao fi m a aventura da efémera

Monarquia do Norte ou Reino da Traulitânia, assim também chamado pelo

facto de alguns dos seus sequazes, armados de cacetes (traulitos), exercerem

pelas ruas perseguições e sevícias sobre os seus adversários políticos. Havia

sido um reino de 25 dias, eivado de sentimentos realistas que apenas haviam

tocado um sector bastante restrito das populações portuenses e do norte do

País.

Esta completa derrota dos monárquicos, desfazendo por inteiro quaisquer

ilusões acerca da sua almejada restauração, veio reforçar a posição dos partidos

históricos da República. Daí que começassem a soar, mais insistentemente e

com mais força, as vozes que pediam a extinção das Câmaras Parlamentares.

O Presidente Canto e Castro via-se cada vez mais perto da desconfortável

contingência de ter de ser ele a promulgar o decreto de exoneração de um Par-

lamento que o havia elegido para o alto cargo que ocupava. Seria subtrair a si

próprio a legitimidade que lhe fora conferida para o exercício do seu mandato

presidencial. A herança de Sidónio continuava ainda a gerar incongruências.

Consciente da delicadeza do problema, José Relvas convidou o Parlamento,

na pessoa do presidente do Congresso, Zeferino Falcão, a ponderar a hipótese

de ser o órgão de soberania a votar a sua própria dissolução. Todavia e como

escreveu o próprio José Relvas “ […] foram tão desencontradas as opiniões

que foi de todo impossível chegar a um acordo” (Relvas, José, Memórias Polí-

ticas, Lisboa, Terra Livre, 1978, vol. 2, p. 98). No entanto, na nova realidade

política, as câmaras, tais como se encontravam constituídas, eram uma excres-

cência anormal que não poderia durar muito mais tempo. Relvas acabou por

se convencer da inevitabilidade de pôr termo à situação por decreto e nesse

sentido promoveu a elaboração de um projecto-lei que, para além de dissolver

as Câmaras, marcava eleições legislativas para 13 de Abril de 1919. A apre-

sentação desse diploma na Câmara de Deputados gerou uma tão forte discus-

são e uma tal desordem que obrigou ao encerramento compulsivo da sessão.

José Relvas foi então a Belém conferenciar com o Presidente da República,

fi cando decidida a promulgação do decreto de exoneração. No seguimento,

logo Canto e Castro fez notar a sua vontade de abandonar a Presidência da

República. Signifi cava isto que o remédio para a solução de uma crise era, em

si próprio e potencialmente, fautor de uma outra crise, porventura de não

menor gravidade.

Verifi cada a dissolução do Parlamento, de imediato os ministros sidonis-

tas se declararam demissionários, facto que não constituiu qualquer surpresa.

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O Governo e o próprio Relvas estavam agora na incómoda situação de, por

um lado, serem acusados de ainda albergar sidonistas no seu seio e, por outro

lado, terem de se defrontar com a deserção e até com os ataques políticos destes

mesmos sidonistas. A par deste tipo de difi culdades, o Governo tinha ainda de

suportar as arremetidas de uma opinião pública republicana que classifi cava

como timorata e comprometida a acção do Ministério quanto à questão de

um exigido saneamento político do exército e do funcionalismo público. Em

defesa do gabinete ministerial e do seu chefe, só se faziam sentir as vozes de

alguns jornais como A Manhã, A Capital ou O Século. Os partidos não inter-

vinham directamente, esperando poder tirar do imbróglio alguns dividendos

políticos. Em Março, Relvas, já desiludido do seu acalentado sonho de formar

à direita um grande partido conservador que contrabalançasse o poder do

Partido Democrático, afi rmava sentir que estava «num ponto morto da acção

do Governo» (Cf. Relvas, José – Memórias Políticas, Apresentação e Notas de

Carlos Ferrão, Lisboa, Terra Livre, 1978.p. 127).

Na verdade, desgastado pelo ambiente hostil que se gerara e pelas demissões

verifi cadas que, entretanto, já não se restringiam aos sidonistas, o Governo já

mal cumpria as suas funções. A 27 de Março, Relvas apresentou a Canto e

Castro o pedido de demissão colectiva do seu gabinete. A sua passagem pelo

poder durara apenas dois meses, facto que os bons auspícios dos seus primei-

ros dias não haviam vaticinado. Tal circunstância, não sendo inédita, e justa-

mente por o não ser, transporta-nos para a conclusão de que a história do país

que era então Portugal, ditada pelo jogo de forças das paixões políticas, corria

vertiginosamente. Comentando a queda do ministério Relvas, dizia um jor-

nal: “Enquanto os governos em Portugal, não tiverem senão missões políticas

a realizar e não viverem senão de efémeros apoios políticos e partidários, a sua

instabilidade será constante” (O Século de 27 de Março de 1919, 1.ª página).

Algo de profético estas palavras continham, mas não deixa de causar alguma

estranheza que, numa altura em que com facilidade se encarava o recurso à

violência como um meio legítimo para fazer vingar ideais e até como meio

de assalto ao poder, se viesse à praça pública falar de estabilidade. A afi rmação

feita, sendo justa e moralmente defensável, abordava porém o problema pela

rama. É que não se ia ao fundo da questão, reconhecendo que, para haver a

tão ansiada estabilidade era necessário que ela passasse pelo Partido Demo-

crático. Sem ele ou contra ele, o país não era governável. A sua preponderân-

cia era tão grande que mesmo quando não estava no governo era ele, afi nal,

que governava. O seu monopólio eleitoral e político residia no facto de ter

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herdado toda a rede clientelar e caciqueira do PRP e até parte da dos velhos

partidos monárquicos. À luz desses condicionamentos não pode afi rmar-se,

com segurança, que fossem, de todo, ilegítimas as aspirações de exercício do

poder por parte dos outros partidos republicanos, justo num país em que os

votos eram decididos pelos cabos eleitorais. E sendo esse o verdadeiro «pomo

da discórdia», note-se que, todavia, a dinâmica destes outros partidos em nada

contrariava ou procurava remediar um tal estado de coisas.

Acresce que, paradoxalmente, o fenómeno da hegemonia eleitoral de um

partido acabou por ser para a República um presente envenenado porque,

enquanto poder, o Partido Democrático, arrostando com essa luta encarni-

çada dos seus adversários republicanos e com as arremetidas dos monárquicos

e de outros conspiradores, teve, na maior parte do tempo, de se limitar a gerir

situações de crise, dispondo de poucas ocasiões para promover uma efectiva

governação. E, na verdade, sozinho na governação, nunca reuniu condições

para executar com efi cácia as reformas que poderiam dar consistência e esta-

bilidade ao regime. Não houve estratégia a longo prazo que resistisse a um tal

contexto político de dúvidas, de suspeições, de recusas, de fraccionamento

partidário, de ameaças, de quedas de governo, de revoltas. Face a este perma-

nente cenário, as soluções de fundo foram sempre adiadas.

O problema, tal e qual assim colocado, terá sido bem compreendido e

avaliado pelos dirigentes partidários republicanos, os quais, no entanto, enle-

ados em sectarismos e antagonismos nunca resolvidos, jamais se empenharam

na construção de soluções alternativas, duradouras e efi cazes, nem mesmo

quando a elas foram directamente chamados. Esta foi uma insanável contra-

dição que permaneceu, com pequenas nuances, por todo o tempo da Repú-

blica, vindo a ser uma das causas principais, senão a principal, da sua queda,

podendo quanto a isso afi rmar-se que os grandes inimigos da República não

foram, afi nal, os monárquicos, mas sim, os republicanos.

O INÍCIO DOS ANOS 20 DA REPÚBLICA

Após a queda do Governo Relvas assistiu-se à formação de um outro minis-

tério, igualmente de concentração republicana, mas agora completamente

liberto de resquícios sidonistas. À frente do novo elenco ministerial estava o

democrático Domingos Pereira. Advogado, professor e jornalista, havia siso

Ministro da Instrução no ministério anterior. Num tempo em que o Partido

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Democrático de novo se afi rmava como o grande partido político do regime,

amiúde se expendia a opinião de que Portugal estava de regresso aos anos

primeiros da República. Mas esta propalada afi rmação de regresso ao passado

pouco tinha a ver com a realidade do presente. Muito embora no entendi-

mento de muitos e infl uentes republicanos fl orescesse a ideia de regenerar

o regime, devolvendo-lhe a pureza inicial do 5 de Outubro, a verdade é que,

em tempos tão mudados, tais expectativas não passavam de meras conjectu-

ras procedentes de bem-intencionadas vontades. Um retorno ao passado não

seria viável num tempo em que a experiência da guerra, agente acelerador de

mudanças, havia operado transformações nas pessoas, atingindo-as no seu

modo de pensar e ver o mundo e nos seus comportamentos sociais. E se, no

plano das instituições político-partidárias, se assistia ao regresso do domínio

eleitoral do Partido Democrático, havia que registar, porém, a circunstância

de este partido já não ser exactamente o mesmo que Afonso Costa liderara.

Nele se delineavam agora sensibilidades e clivagens ideológicas, encabeçadas

por líderes espontâneos e não historicamente consagrados, clivagens essas que

iriam dar origem a cisões, com formação à direita e à esquerda de outros

agrupamentos partidários. Um outro indício de mudança, com incidência

importante na sociedade portuguesa, residia no facto de a Guarda Nacio-

nal Republicana (GNR) ter substituído a Armada no papel de força militar

defensora do regime. Sob auspícios do Partido Democrático e pela mão de um

dos seus proeminentes membros, o tenente-coronel Liberato Pinto, a GNR

foi sendo reestruturada no sentido de poder cumprir estas novas atribuições,

vindo os seus efectivos e o seu armamento a aumentarem de forma exponen-

cial. Daí resultaria o efeito perverso de, ao invés de a Guarda se submeter às

ordens e decisões governamentais, ser afi nal, ela própria, porque detentora do

poder das armas, a ter uma palavra de peso na constituição ou destituição de

governos ou a infl uenciar a acção destes. Natural era, pelo menos segundo a

lógica e a ética políticas de então, que o Partido Democrático, como promo-

tor desta nova realidade, detivesse algum poder dentro daquela corporação

militar, podendo nela determinar atitudes ou movimentações. Não era esse

um poder muito claro e objectivo, mas em todo o caso, a sua pressuposta

existência constituía um factor adicional de instabilidade política, pelas reac-

ções que desencadeava da parte dos outros partidos. Também os protagonistas

da acção política já não eram os mesmos: Brito Camacho, remetido para o

cargo de Alto-Comissário da República, em Moçambique, durante os anos

de 1921 e 1922, desinteressar-se-á pouco a pouco da política, acabando por

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se devotar às literaturas; António José de Almeida, que tinha andado a monte

durante o sidonismo, viu-se, pouco tempo depois, eleito para a Presidência da

República; Afonso Costa, exilado em Paris e chefe da Delegação Portuguesa

à Conferência de Paz e à Sociedade das Nações, jamais regressará do seu dou-

rado exílio, adquirindo a auréola de um «encoberto» no panorama nevoento

da política e da sociedade portuguesas.

Tudo, ou quase tudo, mudara! E quase tudo porque algo havia que tei-

mava em persistir, porventura diferentemente em alguns aspectos, mas igual

na sua essência e nas suas consequências. Referimo-nos ao sectarismo político

e à intransigência que regia as relações entre partidos e pessoas, tantas vezes a

descambar para o ataque baixo e gratuito, mais ou menos violento. Num tal

ambiente, os governos foram-se sucedendo a uma cadência indesejável, não dis-

pondo de condições políticas ou tempo sufi ciente para cumprir os seus progra-

mas e vendo a sua obra não continuada ou destruída por executivos posteriores.

Em raros momentos, como o que imediatamente se seguiu à vitória sobre a

Monarquia do Norte, afl oravam boas intenções no sentido de um entendi-

mento entre os republicanos, não logrando, porém, passar de isso mesmo, de

boas intenções. A tentativa mais séria de construir, à direita do espectro político,

um grande partido republicano conservador, que nas urnas, fi zesse páreo com o

Partido Democrático, surge com a fusão dos Partidos Unionista e Evolucionista

num só agrupamento político-partidário, o Partido Liberal. No entanto, e mau

grado as cisões havidas no seu seio e as quebras registadas nas suas votações

urbanas, o Partido Democrático só por uma vez, em 1921, perdeu eleições a

favor dos liberais. As baixas percentagens dos eleitores que participavam nos

actos eleitorais eram um inequívoco indício de uma democracia com insu-

fi ciências graves e com elites dirigentes demasiado distanciadas do país real.

Por outro lado, assistiu-se, até 1922, a um crescendo da actividade sindical,

marcado por vagas sucessivas de greves que afectaram os mais importantes

sectores da indústria e do comércio bem como o funcionalismo público e

empresas de serviços. Foram os anos da «ameaça vermelha» (expressão usada

pelos patrões) que viram nascer a Confederação Geral do Trabalho (C.G.T.) e

o seu órgão, A Batalha, um diário que passou a ser o terceiro maior do país,

com uma tiragem de cerca de 20 mil exemplares. O operariado e as classes tra-

balhadoras, que tinham conquistado prestígio político pela sua participação

no combate à tentativa de restauração monárquica de 1919, lutavam agora

por uma melhoria das suas condições de vida, no difícil quadro económico

do país, entretanto agravado pelas sequelas da guerra. A existência de um

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Ministério do Trabalho, a vigorar já desde o Governo Relvas, era um sinal

da importância política que os sindicatos e o mundo do trabalho tinham,

entretanto, adquirido. Em presença das acções dos grevistas, tantas vezes

acompanhadas de tumultos, agressões, sabotagens, destruições, os governos

tendiam a atribuir às classes trabalhadoras as responsabilidades pelos confl i-

tos laborais e pelas suas consequências e a exercer uma forte repressão pela

força das armas e por meio de legislação anti-laboral. Não eram, no entanto,

menos radicais as posições e as respostas do patronato, circunstâncias havendo

em que eram os próprios governos a intervir como elemento mediador nos

diferendos que opunham empregados a empregadores. É certo que, na mente

e nos planos de uma nova geração de sindicalistas, que se ia distanciando

do ideário anarquista, a luta sindical fundava-se em objectivos que estavam

muito para além da imediata satisfação das reivindicações salariais ou outras.

Com efeito, as suas acções e os seus escritos continham, de forma implícita,

a intenção de subverter a ordem vigente e criar condições para a eclosão da

revolução social em modelo inspirado pela Revolução Soviética de Outubro

de 1917. Surgiram então duas correntes sindicais – anarquistas e bolchevistas

ou maximalistas – que se defrontavam. Dessa confrontação resultaram cisões

no seio da C.G.T. e um enfraquecimento do movimento sindical, factos que,

necessariamente, levaram ao abrandamento dos confl itos laborais e dos surtos

grevistas, a partir de 1922.

Foi num contexto de uma onda de greves, nos fi nais de Março de 1919,

que o Governo de Domingos Pereira iniciou as suas funções. O surto grevista,

iniciado nas fábricas da CUF, no Barreiro, depressa ganhou maior ampli-

tude com a adesão de operários corticeiros, metalúrgicos, cesteiros, alfaiates,

pessoal camarário e da Carris e pessoal da Companhia das Águas. A greve

destes últimos, envolvendo acções de sabotagem, provocou a intervenção do

Ministério da Guerra, sendo presos alguns grevistas, circunstância que, no

imediato, gerou uma crise ministerial, com o Ministro do Trabalho, o socia-

lista Augusto Dias da Silva, também conhecido por «Camarada Augusto», a

demitir-se, como forma de protesto pelas acções de repressão levadas a cabo

pelo Governo. Noutros sectores, as competentes instâncias governamentais,

mostrando grande moderação e abertura, escutaram os trabalhadores e pro-

curaram instituir medidas tendentes à satisfação das suas reivindicações, con-

seguindo-o, em grande parte. Sendo a manutenção da ordem pública um

questão importante a exigir especial atenção, foi elaborada legislação que

punia as acções dos bombistas com penas de degredo para o Ultramar.

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Em Maio, na sequência do acto eleitoral havido a 11 desse mês, o Exe-

cutivo de Domingos Pereira declarou-se demissionário, em obediência aos

preceitos constitucionais. Nessas eleições, em que votaram apenas 7% dos

eleitores inscritos, o Partido Democrático arrecadou 53% dos votos expressos.

Na sessão de abertura do Parlamento, a 2 de Junho, foi pedido ao Governo

cessante que se mantivesse em funções, evitando-se assim que novos surtos

grevistas, que se adivinhavam, eclodissem em momento de crise governamen-

tal. A 29 de Junho, como expressão dos resultados eleitorais, tomou posse um

novo Gabinete Ministerial, inteiramente do Partido Democrático e presidido

pelo Coronel Sá Cardoso. O extenso programa do novo Governo, apresen-

tado na Câmara, era um plano vasto para introdução de melhorias e solu-

ções em todas as áreas da governação, com especial incidência na Economia

e nas Finanças. Entretanto, paralisaram os Caminhos-de-Ferro (CP), numa

das maiores greves até então feitas por ferroviários em Portugal, reivindicando

aumentos de salários. Era uma primeira «prova de fogo» para a novel gover-

nação. O confl ito arrastou-se por dois meses, durante os quais se registaram

sabotagens em linhas e estações, descarrilamentos em Santa Apolónia, tiroteio

no Entroncamento e bombas na estação do Rossio. Decidido o encerramento

do Sindicato dos Ferroviários, o Governo colocou-se, com a aprovação do

Parlamento, como mediador das negociações entre trabalhadores e entidades

patronais. Com persistência e poder de persuasão, conseguiu que os grevistas

regressassem ao trabalho.

A 6 de Agosto de 1919, o Congresso elegeu para presidência da República

o cidadão António José de Almeida. Avizinhava-se o fi m do mandato con-

ferido a Canto e Castro em conhecidas circunstâncias dramáticas. Durante

todo esse tempo do seu mandato (Dezembro de 1918 a Outubro de 1919), o

confesso monárquico, honrando o compromisso assumido, defendeu intran-

sigentemente a República e com isso ganhou o respeito e admiração de todos

os republicanos. Já em Maio, aquando da eleição do novo Parlamento, Canto

e Castro manifestara ao então Chefe de Governo, Domingos Pereira, a sua

vontade de renunciar, posto o facto de ter passado a haver normais condições

para ser eleito um novo presidente. Por moção apresentada na Câmara pelo

democrático António Maria da Silva, unanimemente aprovada e aplaudida,

foi-lhe pedido que se mantivesse em funções até ao dia 5 de Outubro, data

em que tomaria posse o novo presidente a eleger. Em Fevereiro, Bernardino

Machado, Presidente da República de direito (a sua magistratura fora violen-

tamente interrompida pela Revolução Dezembrista), renunciara formalmente

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ao cargo, facilitando assim o encontro de uma solução para o problema, com

a permanência de Canto e Castro nas suas funções até 5 de Outubro de 1919.

Pouco tempo antes, convidado ofi cialmente a visitar o Brasil pelo Presidente

Epitácio Pessoa, Canto e Castro respondeu que talvez o seu sucessor tivesse

essa felicidade, ele não, porque dentro de meses deixaria vaga a cadeira presi-

dencial. Assim seria, António José de Almeida iria ao Brasil em viagem ofi cial.

Uma revisão constitucional, havida em Setembro desse ano de 1919, con-

cedeu ao Presidente da República poderes para dissolver o Parlamento. Pen-

sava-se que esse instrumento legal, deposto nas mãos do Presidente, pudesse

ser um contributo no sentido de morigerar a actuação dos governos e das

câmaras, tendo em conta que sobre esses órgãos se sobrepunha agora uma

autoridade que os poderia destituir. Todavia, a faculdade de dissolver as câma-

ras fi cava dependente da aprovação de um Conselho Parlamentar, composto

por representantes dos partidos com assento nas câmaras: Signifi cava isto que,

em termos reais era afi nal o Parlamento que se dissolvia a si próprio. O resul-

tado prático e mais visível deste novo ordenamento constitucional foi o de

passar a haver mais pressões sobre a Presidência da República. Em Outubro

assistiu-se à fusão dos evolucionistas e dos unionistas num novo agrupamento

partidário, o Partido Liberal Republicano. Foi um arranjo entre dois parti-

dos históricos da República, cada um dos quais se encontrava desqualifi cado,

desunido e sem chefi as activas. Um arranjo que não frutifi cou na cena política

portuguesa. Poucos dias depois surgia outro grémio político, o Partido Popu-

lar, formado por ex-sidonistas e por franjas evolucionistas. Capitaneado por

Júlio Martins (ex-evolucionista) e por Cunha Leal (ex-sidonista), o novo par-

tido dizia-se republicano radical e pretendia-se à esquerda dos democráticos,

decerto com a presunção de que essa seria a melhor forma de os combater.

O trabalho difícil de busca de soluções para os problemas que afl igiam a

sociedade portuguesa de então e sobretudo a incompreensão e contestação

tidas pelo Parlamento quanto a algumas dessas soluções começavam a trazer

algum desgaste ao Executivo de Sá Cardoso. Este Governo tinha desenvol-

vido esforços sérios no sentido de dirimir greves, de manter a tranquilidade

e ordem públicas e de resolver, tanto quanto possível, o sempre bicudo pro-

blema das subsistências. No fi nal do ano de 1919, a discussão na Câmara

de um pacote legislativo, que contemplava importantes alterações na política

cambial e na importação de bens não essenciais, levou a uma crise ministerial

que somente fi cou resolvida em Janeiro de 1920, por meio de uma remode-

lação governamental. Na apresentação do seu reconstituído Ministério, Sá

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Cardoso classifi cou a situação do país de «melindrosa, mesmo grave, mas não

desesperada». Porém, sob as acusações de ser despesista, o Ministério con-

frontou-se na Câmara com três moções: uma de confi ança apresentada pela

maioria democrática e duas de desconfi ança apresentadas, cada uma de per

si, pelas minorias socialista e popular. Se bem que só a primeira das três fosse

aprovada, a decisão do Executivo foi a demissão em bloco por, no seu enten-

dimento, haver grande número de parlamentares a opor-se à sua política.

A resolução da crise passava agora para as mãos do presidente António José de

Almeida. Este, face aos poderes de que então dispunha, poderia ter seguido

o caminho da dissolução e da formação de um governo de convergência par-

tidária, contudo, fi el ao seu declarado princípio de «alheio ás lutas políticas,

só nelas intervirei com o fi m de as acalmar», convidou a minoria parlamentar

mais numerosa, o Partido Liberal, a formar governo. Francisco Fernandes

Costa, antigo evolucionista, foi a personalidade encarregada de formar novo

gabinete, desempenhando-se do encargo com rapidez. Mas, desfeiteado por

uma manifestação de rua, o gabinete liberal nem chegou a tomar posse. Em

declarações posteriores, Fernandes Costa adiantou como verdadeiro motivo

da sua desistência a cumplicidade que notou entre elementos da GNR e os

manifestantes, disso extraindo a leitura de que um governo por si chefi ado

teria de se confrontar, futuramente, com aquela força militar. Nova crise,

entretanto solucionada com o aparecimento de um governo de concentração

partidária, chefi ado pelo democrático Domingos Pereira (pela segunda vez na

chefi a de um ministério). Tomou posse a 21 de Janeiro de 1920 e veio encon-

trar um país paralisado por um surto grevista e com os gravíssimos problemas

das subsistências e das fi nanças públicas sem solução à vista. Quanto a estes

dois aspectos, as medidas gizadas no sentido de os resolver ou de os minorar

nos seus efeitos negativos não chegaram a ter qualquer efi cácia, porquanto,

logo em Março, o Ministério caiu, na sequência da rejeição na Câmara das

suas propostas de lei que visavam conter ou condicionar uma greve então

encetada pelo funcionalismo público. No acto de votação, uma facção do

Partido Democrático, liderada por Álvaro de Castro, juntou-se às minorias.

Essa facção separar-se-ia do partido, poucos dias depois, para formar o Núcleo

de Acção de Reconstituição Nacional (depois, Partido Republicano de Recons-

tituição Nacional). O novo clube partidário estava representado no Parla-

mento por oito senadores e dezanove deputados e afi rmava-se ao centro, entre

democráticos e liberais. Face à queda do Governo de Domingos Pereira, que

havia durado cerca de 15 dias, colocava-se, mais uma vez, a necessidade de

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formar governo. A 8 de Março, o coronel António Maria Baptista, ofi cial do

Exército e membro do Partido Democrático, conseguia apresentar um Exe-

cutivo constituído por nove democráticos e um liberal, sendo este último, o

Ministro da Marinha, Júdice Biker, amigo particular do coronel Baptista. Este

singular arranjo retirava ao Ministério uma feição partidária, sem prejuízo de

uma dinâmica concertada. Em manifesto dirigido à Nação e no discurso de

apresentação na Câmara, o Governo traçou, em termos dramáticos, a situa-

ção do país, apelando ao patriotismo dos grevistas para que regressassem ao

trabalho, sob pena de o país entrar irremediavelmente na falência. Na sua

exposição, António Maria Baptista deu ainda particular ênfase ao problema

da ordem pública, repetindo a expressão várias vezes e declarando-se decidido

a utilizar as medidas enérgicas e urgentes que a situação requeria, para o que

pedia a compreensão e o apoio de deputados e senadores. Neste sentido, pro-

pôs um adiamento da abertura dos trabalhos parlamentares, de forma a dar ao

Governo tempo e pulso livre para empreender os seus planos. No imediato,

esse apoio foi garantido pelos democráticos, quedando-se as outras forma-

ções partidárias por uma atitude expectante. Votada em reunião conjunta das

duas Câmaras, a proposta do Executivo foi aprovada por 72 votos a favor e

43 contra, fi cando a abertura da sessão legislativa aprazada para 11 de Abril.

Com persistência e com dureza, o Governo de Baptista interveio nas gre-

ves em curso (funcionalismo público, metalúrgicos, operários da construção

civil, funcionários dos serviços telégrafos-postais), neutralizando as acções e

posições dos grevistas com arregimentação de pessoas e meios, conseguindo

acordos, publicando nova legislação anti-greve e encerrando sindicatos. Em

resultado de todo esse porfi ado trabalho, o movimento grevista foi declinando.

Voltando-se para o momentoso problema da manutenção da ordem pública,

o executivo actuou também com mão-de-ferro, publicando um diploma que

previa penas de deportação até 10 anos para bombistas e fabricantes de bom-

bas, bem assim como para os autores e incitadores de actos de perturbação da

ordem e da tranquilidade públicas. Os julgamentos destes crimes passaram a

ser feitos em processos sumários, sendo, para o efeito, criado o Tribunal de

Defesa Social. Medidas também enérgicas e inovadoras foram tomadas pelo

Ministério de Baptista no tocante às questões das subsistências e das fi nan-

ças públicas. Avultaram quanto ao primeiro aspecto, as expropriações de ter-

ras para serem agricultadas, a exploração de baldios, a fi xação dos preços de

géneros alimentícios e a publicação de leis contra as especulações do trust

das moagens e panifi cações. Quanto ao segundo aspecto, a par de medidas

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de redução de despesas e de aumentos de receitas e de criação de impostos

sobre operações de Bolsa, saiu do Ministério das Finanças uma lei que fi cou

conhecida por Lucros de Guerra e que tributava certos lucros do comércio e

da indústria, ocorridos antes e depois de 1914. Quando tudo indicava que

o Governo estava à altura da situação, dando resposta adequada aos proble-

mas do país e sendo, por isso mesmo, respeitado e apoiado por políticos e

pelas chamadas forças vivas, António Maria Baptista morre subitamente a 6

de Junho de 1920, em pleno Conselho de Ministros, vítima de apoplexia,

após receber uma carta insultuosa. Desta tão infeliz forma se cortou cerce

um rumo governativo que parecia estar conseguindo colocar os superiores

interesses da Nação e do regime acima das paixões político-partidárias e dos

interesses particulares. Acerca morte do coronel Batista, disse então o conhe-

cido fi lósofo Leonardo Coimbra:

“Morreu lutando, oferecendo os restos duma saúde precária às importuni-

dades dos amigos, à calúnia e à maldade dos inimigos e sobretudo à grande

estupidez moral desta época”.

OS LOUCOS ANOS 20

Na sequência da crise política gerada com morte do coronel António Maria

Baptista, formou-se um gabinete ministerial presidido pelo líder do Partido

Democrático, o Engenheiro António Maria da Silva. A inconsequência dos

políticos levou a que esse gabinete passasse na Câmara de Deputados, mas

no Senado acabasse por ver aprovada, contra si, uma moção de desconfi ança.

Note-se que António Maria da Silva formara um gabinete com 2 democrá-

ticos, 2 populares, 1 socialista e 4 independentes. Um governo assim cons-

tituído tinha como certa a oposição dos liberais e dos reconstituintes. Na

Câmara passou pela escassa maioria de 44 contra 39 votos, mas no Senado,

dada a diferente composição, as coisas correram pior, sendo aí aprovada uma

moção de desconfi ança por 25 contra 23 votos. Se bem que nos termos cons-

titucionais, prevalecesse a posição da Câmara dos Deputados, António Maria

da Silva não podia deixar de se sentir apreensivo quanto à sua débil posição

perante o Parlamento. Colocado o assunto à consideração do Presidente da

República, foi este de opinião que se buscasse uma solução numa futura reu-

nião do Congresso. Reunido a 2 de Julho, este órgão aprovou, por escassa

margem de votos, uma moção que recomendava a suspensão por dez dias, dos

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trabalhos parlamentares. Durante esse período de tempo, refl ectindo sobre a

sua própria situação, o Executivo chegou à conclusão de que não tinha condi-

ções sufi cientes para governar. Face a uma tal constatação, renunciou ao poder

a 8 de Julho de 1920.

De novo estava nas mãos do Presidente António José de Almeida a espi-

nhosa missão de encontrar quem, nesse confuso mar da política portuguesa,

se colocasse ao leme da nau. Falhadas algumas tentativas feitas por persona-

lidades afectas ao Partido Democrático, o líder dos liberais, António Granjo,

em aliança com os reconstituintes de Álvaro de Castro, logrou concertar um

ministério. À apresentação no Parlamento, em 20 de Julho, o Governo che-

fi ado por Granjo colheu o apoio dos partidos ali representados, com excepção

do Partido Popular, que logo declarou ir fazer uma oposição séria e respon-

sável. No descrever dos grandes problemas nacionais a pedir intervenção

urgente, as soluções apresentadas não eram muito diferentes das de anteriores

governos, ou seja, o mesmo acento tónico colocado nas sempre preocupantes

questões das fi nanças públicas, das subsistências, da ordem pública, do apro-

veitamento dos recursos do país. Encerrado em Agosto, o Parlamento deixou

autorização ao Executivo para este tomar as medidas económicas e outras,

que entendesse por necessárias. Quando reabriu em Outubro, logo os demo-

cráticos pela voz de António Maria da Silva manifestaram a sua discordância

em relação à actuação havida na área da economia, particularmente quanto

aos contratos de fornecimentos de trigo e carvão negociados no estrangeiro.

Todavia, a Câmara aprovou por grande maioria, um documento expressando

apoio às decisões governamentais tomadas em matérias de economia e de

fi nanças. Mas, em Novembro, reapreciada a política económica, as discussões

e os condicionamentos colocados, bem assim a rejeição de uma moção de

confi ança, provocaram a demissão do Ministério de António Granjo.

Álvaro de Castro, líder do Partido Reconstituinte, foi incumbido de cons-

tituir ministério. A decisão dos democráticos em não participar levou a que

Domingos Pereira e os seus amigos, em desacordo com a decisão tomada, saís-

sem do partido. Desses dissidentes, três entraram para o gabinete que Álvaro

de Castro conseguiu formar a 19 de Novembro. Para além dos reconstituin-

tes, dele faziam parte também os dois vultos cimeiros do Partido Popular,

Júlio Martins e Cunha Leal. Na Câmara dos deputados, o Governo assim

formado teve de defrontar a oposição dos democráticos e dos liberais. A dis-

cussão do programa e o surgimento duma proposta de aumento do montante

da circulação fi duciária, feita pelo Ministro das Finanças, Cunha Leal, tive-

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ram como resposta a apresentação de uma moção de desconfi ança, que foi

maioritariamente votada por democráticos e liberais. E assim caía um governo

que nem sequer chegara a governar. Em fi ns de Novembro, o tenente-coronel

Liberato Pinto, membro do Partido Democrático e chefe de Estado-Maior da

Guarda Nacional Republicana, formou um Ministério em cuja composição

entravam democráticos, dissidentes democráticos, reconstituintes, populares

e um independente. Com tal arranjo partidário, apenas os liberais de Antó-

nio Granjo se constituíram como oposição. Mais uma vez, a especial atenção

do Executivo se fi xou no problema das fi nanças e do défi ce orçamental. No

entanto e apesar da urgência, o irregular funcionamento das sessões e a inter-

rupção de Natal remeteram a discussão da matéria para ano seguinte. Em

Fevereiro de 1921, retomado o assunto, a discussão em torno do mesmo foi

tão violenta que o Ministro das Finanças, Cunha Leal, depois de assanhada

altercação com um deputado da oposição, abandonou ostensivamente a sala,

no que foi secundado por outros ministros. E, desta forma, caía mais um

ministério, na senda de tantos outros.

A gravidade dos acontecimentos parecia não se fazer sentir entre os parla-

mentares, surdos e cegos que se mostravam a outras conveniências que não

fossem as suas e as dos seus partidos. Neste clima de insensibilidade para

com os interesses do regime e da nação, os derrubes dos ministérios, de tanto

repetidos, eram algo que se estava a tornar uma banalidade. O Presidente da

República, face à desistência do liberal Barros Queiroz e à recusa do demo-

crático Augusto Soares, convidou Bernardino Machado a formar ministério.

No difícil contexto, a experiência, o trato fácil e a maleabilidade daquele emi-

nente político operaram a formação de um governo, do qual faziam parte

as fi guras cimeiras dos partidos que haviam composto a governação ante-

rior, designadamente, António Maria da Silva pelos democráticos, Domingos

Pereira pela dissidência democrática, Álvaro de Castro pelos reconstituintes e

Júlio Martins e Cunha Leal, pelos populares.

Mas, no bas-fond da política, estavam a preparar-se acontecimentos de

excepcional gravidade. Entre uma parte signifi cativa da baixa ofi cialidade da

GNR começava a tomar vulto a ideia de que a anterior destituição de Liberato

Pinto do cargo de chefe de governo e a sua substituição por um civil, faziam

parte de um plano para retirar poder e prestígio à corporação. E a circunstân-

cia de, entretanto, terem sido levantados àquele ofi cial superior dois processos

disciplinares, um por indisciplina nas relações com o comando e outro por

suspeita de peculato, mais convenceram aquela baixa ofi cialidade de que eram

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acertadas as suas presunções. Assim, no dia 21 de Maio desse ano de 1921,

algumas importantes unidades da GNR, em que se incluía o grupo de metra-

lhadoras pesadas, saíram de quartéis e ocuparam posições no Parque Eduardo

VII, lugar mítico das revoluções. Os revoltosos justifi cavam a sua acção como

um gesto de solidariedade militar e também como forma de protesto contra

um possível desarmamento que, dizia-se, iria acontecer na Guarda Republi-

cana. Exigiam a queda do Ministério de Bernardino Machado, a dissolução

do Parlamento e a constituição de um ministério sob auspícios e critérios do

Presidente da República. Se bem que de um eventual confronto militar, se

adivinhasse a vitória das forças fi éis ao Governo, a instâncias de Bernardino

Machado no sentido de serem evitados derramamentos de sangue, o Gabinete

demitiu-se a 23 de Maio, sendo então encetado um protocolo de negociações

com os revoltosos, facto que possibilitou a sua retirada pacífi ca. O Presidente

da República, movido também ele por intuitos de apaziguamento, convidou

a oposição ao governo cessante, os liberais, a formar governo, tarefa pronta-

mente executada por Tomé de Barros Queirós. Às solicitações que lhe eram

feitas para que dissolvesse o Parlamento, António José de Almeida mostrava-

-se reticente, apesar dos liberais nisso muito insistirem. Em todo o caso, o

Presidente decidiu reunir o Conselho Parlamentar, o qual acabou por se pro-

nunciar pela dissolução das câmaras.

As eleições, realizadas a 10 de Julho, foram muito participadas e surpreen-

deram pelo facto de, à escala nacional, serem os liberais a vencer por maioria,

fi cando os democráticos como segunda força política mais votada. Na cidade

de Lisboa, o Partido Democrático arrecadou a maioria dos votos, sendo aí

exígua a votação dos liberais, inferior mesmo à dos monárquicos. Com base

nesse dado é possível e lícito considerar que os resultados, a nível nacional,

terão sido meramente conjunturais. De facto, sendo a primeira vez que o Par-

tido Democrático perdia umas eleições, a explicação residirá na circunstância

de, desta feita, ter sido um governo liberal a preparar o processo eleitoral

e a apoiar com todos os meios o esforço de campanha do seu próprio par-

tido. Este novo quadro terá criado algumas expectativas de mudança junto

do eleitorado, propiciando uma dinâmica de participação que, todavia, não

faria carreira, quedando-se por esta experiência única. Nestas eleições, quem

não conseguiu fazer passar a sua mensagem de partido radical à esquerda dos

democráticos, foram os populares cujos votos permitiram eleger apenas um

deputado. O pequeno Partido Católico obteve quatro deputados, um dos

quais, eleito pelo círculo de Guimarães, era, de seu nome, António de Oliveira

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Salazar. O futuro ditador assistiu apenas à sessão de abertura das câmaras, não

voltando mais ao Parlamento.

A distribuição dos lugares nas Câmaras, a reacção não desfavorável dos par-

tidos aquando da apresentação do Gabinete Ministerial e do seu programa e

a própria fi gura do chefe do executivo, Tomé de Barros Queiroz, autodidacta

tido como um especialista em assuntos de fi nanças e economia, auguravam

à governação dos liberais confortáveis condições políticas para desempenhar

com efi ciência e tranquilidade a sua missão. Todavia, a viabilidade do seu

programa económico, tal como ele estava traçado, dependia, em grande parte,

da concretização de um vultuoso empréstimo externo, negociado na praça de

Nova Iorque. Ora, não só esse empréstimo não se concretizou, como o apura-

mento da realidade mostrou uma situação algo rocambolesca, em que o fi nan-

ciador norte-americano era, afi nal, um vigarista internacional e a proposta de

fi nanciamento não mais que uma tentativa de burla. Por outro lado e a par

deste descrédito, revelou-se inefi caz a acção governativa para a revitalização da

economia portuguesa, tudo isso conduzindo a perplexidades e divergências

no seio do Executivo. Desanimado, Barros Queiroz cedeu a governação ao

seu correligionário António Granjo. O segundo Governo liberal, em grande

parte com os mesmos ministros e o mesmo programa económico do pri-

meiro, aparece aos olhos da opinião pública ainda manchado pelo desaire que

havia sido a questão do empréstimo internacional. A par disso, revelou este

executivo alguma falta de tacto político para lidar com problemas muito sen-

síveis para a sociedade portuguesa quanto o eram o problema religioso e, na

área económica, as subsistências, sobretudo a questão do pão. Na imprensa,

Granjo era acusado (nem sempre com inteira verdade) de propiciar a dis-

tribuição de uma «mixórdia de pão» (pão único) e de admitir a possibili-

dade de o catolicismo vir a ser reconhecido como religião única em Portugal.

A estas acusações, juntavam-se outras, tais como a das suas políticas penaliza-

rem principalmente a classe média, a de não dar cumprimento à amnistia con-

cedida ao assassino de Sidónio Pais e a de mostrar profunda aversão pela GNR

e pela Armada. E, num outro registo, o desfecho do chamado processo Libe-

rato Pinto, condenando aquele ofi cial superior à pena de um ano de detenção

no Forte de Elvas, veio fazer recrudescer a já violenta campanha de imprensa

encetada contra António Granjo e a sua governação, com a maioria dos peri-

ódicos da capital a considerarem injusta e desproporcionada a pena atribuída

ao militar e político que já fora chefe de governo. A suspensão dos trabalhos

parlamentares e a concentração de tropas em Mafra, no âmbito das habitu-

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ais manobras de Outono, forneceram aos inimigos de Granjo mais pretextos

para a sua ofensiva. Deste particular se fez eco especial A Imprensa da Manhã,

que acusou o Governo de, sob a capa daquelas manobras, dar execução a um

plano pré-estabelecido de disposição estratégica de forças militares em redor

da capital, prevenindo assim a eclosão duma revolta ou providenciando a sua

jugulação. Este tipo de invectivas eram, em si mesmas, denunciadoras de que

algo de grave se estava preparando. De facto, estava em marcha a conspiração

que haveria de desaguar no Outubrismo e nos sinistros acontecimentos da

tristemente célebre Noite Sangrenta que, para sempre, passou a constituir uma

efeméride de horror na história da Primeira República.

Após uma primeira tentativa em 30 de Setembro, prontamente dominada

pelo governo, a revolta chega efectivamente na noite de 18 de Outubro de

1921, com o Governo previamente sabedor de que a mesma iria eclodir e a

ordenar o estado de prevenção militar rigorosa. Mas o Executivo de António

Granjo, dando mostras duma inabilidade e duma tibieza incompreensíveis,

havia-se deixado isolar, não colocando homens a si afectos nos comandos

militares de Lisboa e por isso não tinha esses comandos por seu lado ou des-

conhecia a postura que, na possível contenda, eles iriam tomar. O Ministério

refugiou-se então no campo de aviação da Amadora, onde fi cou aguardando

notícias que nunca chegaram. Na manhã de 19, Granjo regressou a Lisboa

e dirigiu-se ao quartel da GNR, no Carmo, constatando que os revoltosos

haviam tomado conta da situação. Uma Junta Revolucionária, sediada, como

de costume e de conveniência, no Parque Eduardo VII, controlava já as princi-

pais unidades navais e terrestres e proclamara como grande objectivo a forma-

ção de um «governo de salvação pública com um programa de ressurgimento

nacional» e de regresso ao «espírito republicano do 5 de Outubro de 1910».

Granjo escreveu então uma carta ao Presidente da República, solicitando a

sua demissão, a qual foi imediatamente aceite. Depois, receando pela vida

dos seus e pela sua própria, colocou a família a recato e refugiou-se em casa

de Cunha Leal, seu adversário político, que, no entanto, o recebeu com con-

sideração e afecto. Pelas 21 horas aí o foi buscar o guarda-marinha Benjamim

Pereira, conhecido de Cunha Leal, sob o pretexto de o conduzir em segurança

a bordo do Vasco da Gama, navio da Armada surto no Tejo. Granjo e Cunha

Leal entraram então para uma camioneta cheia de marinheiros armados que

os conduziu ao Arsenal de Alcântara onde, em horríveis circunstâncias de bes-

tialidade, António Granjo foi alvejado e trespassado por baionetas, à vista de

Cunha Leal, entretanto manietado e ferido a tiro. De seguida, a «camioneta

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da morte» rodou em busca de nova vítima, recaindo a escolha sobre a pessoa

do comandante Carlos da Maia, um dos combatentes do 5 de Outubro, que

levado da sua residência igualmente para o Arsenal, foi aí brutalmente assas-

sinado. Depois, os sanguinários carrascos puseram-se de novo em marcha,

buscando o Ministro da Marinha e não o encontrando, trouxeram para o

mesmo lugar de chacina o seu chefe de gabinete, comandante Freitas da Silva,

a quem deram fi m idêntico ao dos anteriores passageiros transportados. Em

mais uma viagem, os tripulantes do veículo fatal dispararam na rua sobre o

tenente-coronel Botelho de Vasconcelos, antigo ministro sidonista, ferindo-o

de morte. Por fi m, dirigiram-se para o Largo do Intendente, até à residência

de um herói da República, Machado Santos, que, preso e arrastado, acabou

varado a tiro na Avenida Almirante Reis, por a «camioneta da morte» aí se ter

avariado.

Sobre o porquê destas mortes bastante tinta tem corrido em abundantes

teses que vão desde uma intrincada conspiração monárquica até sequelas do

golpe da GNR de 21 de Maio de 1921, passando por maquinações da Igreja

ou de elementos da direita republicana, ligados às forças vivas, nome então

dado aos patrões do comércio e da indústria. No decorrer das revoluções,

sempre ódios antigos ou recentes se desatam e, qual «Caixa de Pandora» des-

tapada, todos os males se espalham sem qualquer controlo possível. Três dos

assassinados, José Carlos da Maia, Machado Santos e Botelho de Vasconcelos,

tinham em comum o facto de todos terem sido ministros do sidonismo e

sabe-se quanto esse regime foi gerador de ódios. António Granjo terá sido a

vítima de toda a conspirata geral, dos políticos, dos jornais, do povo (pelas

duras condições de vida) e da Armada e da GNR (por decisões de governo que

desagradaram àquelas corporações). Finalmente, quanto à morte do coman-

dante Freitas da Silva, sem se poder afastar a possibilidade de algum ou alguns

elementos da turbamulta de assassinos terem algum agravo da parte daquele

ofi cial e aproveitarem para exercer vinganças pessoais, o que avulta como

mais visível e provável é, na sua sanha assassina, os executores não quererem

fi car defraudados e verem no chefe de gabinete um substituto apropriado do

ministro. Esta leitura dos acontecimentos é, de alguma forma, corroborada

pelo teor das orações fúnebres proferidas durante as cerimónias do funeral de

António Granjo. Mas é também contrariada pelas declarações feitas a Berta da

Maia, viúva do malogrado Carlos da Maia, por um dos principais assassinos,

o cabo artilheiro Abel Olímpio, conhecido pela alcunha de «Dente de Ouro».

No seu livro As Minhas Entrevistas com Abel Olímpio, O Dente de Ouro, Berta

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da Maia fornece indícios palpáveis da existência de uma conspiração monár-

quica, com ramifi cações internacionais (designadamente a Espanha e ao rei

Afonso XIII), para desacreditar defi nitivamente a República e, por essa via,

se tornar possível a restauração da monarquia. O facto é que as autoridades

de então, e sobretudo as que se seguiram, mostraram-se incapazes de levar a

efeito as investigações que o caso, necessariamente, merecia e exigia. Depois,

a ditadura salazarista mandou arquivar defi nitivamente o assunto. Decerto,

restarão sempre dúvidas quanto às verdadeiras motivações dos assassinos.

Seja como for, os actos cometidos, impróprios de um regime democrático e

expressão de uma sociedade doente ou defeituosa, abalaram profundamente

a estrutura moral da República e, sem dúvida, apressaram a sua queda. As

repercussões nacionais e internacionais de todos estes acontecimentos eram de

extrema desonra para o país, um enxovalho, uma ignomínia. Portugal como

nação e como República, parecia ingovernável.

A respeito de governos e de partidos, é interessante referir o conteúdo

de uma curiosa entrevista dada pelo Grão-Mestre da Maçonaria, Sebastião

Magalhães de Lima, ao Século de 5 de Outubro de 1921. O velho Grão-

-Mestre veicula então a ideia de solucionar a crise política em Portugal (sem-

pre permanente, ora em estado latente ora em estado declarado), refreando as

paixões políticas por meio de um amplo movimento pacifi cador que actuasse

fora da esfera de acção dos partidos e fosse independente destes. O próprio

Magalhães de Lima propunha-se ser o organizador desse amplo movimento

e mencionava um conjunto de personalidades que iria contactar para o aju-

darem na construção dessa enorme e, reputadamente, patriótica tarefa. Um

primeiro aspecto interessante a reter é o de que, ontem, tal como hoje, havia e

há mentes, pressupostamente esclarecidas, que se deixavam e deixam seduzir

pela hipotética possibilidade de a democracia poder funcionar sem partidos

políticos. Um outro aspecto, não menos interessante, é o de que a posição

de Magalhães Lima decorre sobretudo de preconceitos de rejeição de um

quadro governativo político-partidário. E, todavia, uma tal dinâmica encerra

contradições insanáveis. Na verdade se, supostamente, houvesse alguém em

Portugal com autoridade e capacidade sufi cientes para fundar qualquer coisa

como, por exemplo, “A Coligação Moral dos Portugueses”, e que, por essa via,

conseguisse convencer todos os outros que antes de se ser militante ou sim-

patizante deste ou daquele partido é-se essencialmente homem e português,

então, sem dúvida que muitos dos problemas de natureza política, e sobre-

tudo de contenda política, do país seriam resolvidos. Porém, construir um

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tal organismo social, à custa do desaparecimento dos partidos políticos é, de

todo, uma impossibilidade porque a unidade constrói-se sempre pela concita-

ção das vontades que são diversas e nunca a partir da imposição dos desejos ou

intenções de alguém ou de um grupo. Nesse hipotético contexto apartidário,

o mais provável é que a referida “Coligação Moral dos Portugueses” depressa

se tornasse num partido e num partido único, com todos os conhecidos peri-

gos e perversões que daí resultam. Não obstante, ainda nos dias de hoje somos

surpreendidos pelo surgimento amiúde, na sociedade portuguesa, de opiniões

que, semelhantemente, advogam soluções extra-partidárias para o exercício da

governação, mormente quando as coisas da administração e da política parti-

dárias não caminham tão bem quanto seria, minimamente, desejável.

O DERRADEIRO TEMPO DA REPÚBLICA

No rescaldo da Revolução Outubrista e dos acontecimentos da Noite San-

grenta, o Presidente António José de Almeida, bem contra a sua vontade,

cedendo apenas à preocupação de não permitir que o poder caísse na rua e

também ao desejo de pôr fi m aos desmandos, que já eram tantos e tão gra-

ves, sancionou um Governo chefi ado pelo Coronel Manuel Maria Coelho

(o tenente Coelho do 31 de Janeiro de 1891). O Coronel Coelho, enfren-

tando difi culdades de monta na atribuição de pastas ministeriais, constituiu

um gabinete composto por personalidades outubristas e por alguns (pou-

cos) independentes, militares e civis, todos sem grande nome no mundo da

política. Foi um Governo de uns breves quinze dias, no decorrer dos quais

esteve quase sempre em crise e em sucessivas substituições, até que, a 4 de

Novembro, se declarou demissionário. Um dia antes, o Partido Democrático

anunciara a intenção de expulsar das suas fi leiras o militante Manuel Maria

Coelho. Como causa próxima da queda deste ministério estará, para além

das difi culdades apontadas, o opróbrio e a consternação causados em todo o

país pela notícia dos crimes do Arsenal da Marinha. É certo que os mentores

do Outubrismo se apressaram a condenar os eventos da Noite Sangrenta e que

nada há de concreto que autorize o estabelecimento de qualquer ligação entre

as intenções dos revolucionários e os tristes sucessos da madrugada de 19 de

Outubro. Aliás, no Tribunal Militar Extraordinário, constituído para julgar

os criminosos, foram ilibados de quaisquer culpas ou cumplicidades os ofi -

ciais que dirigiram o movimento revolucionário. Não obstante essas certezas,

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a opinião pública, reagindo emocionalmente, não dissociou uma realidade

da outra, facto que, como já se disse, terá decisivamente contribuído para o

fracasso experimentado pelos outubristas nas suas tentativas de constituição

de governos. Decerto, ninguém se queria comprometer com um movimento

que, aos olhos do grande público, aparecia conotado com os nefandos crimes

do Arsenal.

Imensamente desgostoso com toda a situação que se gerara, em verdadeira

condição de desgaste emocional e alquebrado pela doença (gota), o Presidente

António José de Almeida anunciava então a sua intenção de se demitir do

seu alto cargo. Reconsiderou, porém, face às muitas cartas que recebeu de

personalidades do mundo da cultura e da política, rogando-lhe que permane-

cesse, rogos secundados por uma estrondosa manifestação de homenagem à

sua pessoa, organizada pela Câmara Municipal de Lisboa em 30 de Outubro

1921. Da janela da sua residência, António José proferiu então um discurso

que fi cou memorável. O seu sofrimento estóico pela causa cívica do regime,

haveria de lhe valer o epíteto de «apóstolo da República».

A 5 de Novembro o poder governativo era assumido por um segundo exe-

cutivo outubrista, chefi ado pelo coronel Maia Pinto, anterior Ministro do

Comércio. Numa tentativa de alijar ou aligeirar a carga negativa do Outu-

brismo, houve da parte de Maia Pinto o cuidado de se fazer rodear de per-

sonalidades não comprometidas com tal movimento e nisso contou com a

colaboração do Partido Popular e com a de alguns dissidentes democráticos.

No entanto, dada a necessidade, sentida e manifestada, de se imprimir um

novo rumo à política e à governação, o Presidente da República utilizou, pela

segunda vez no seu mandato, a prerrogativa da dissolução. O Parlamento que

havia sido eleito em Julho e em que o Partido Liberal dispunha de maioria

foi dissolvido, sendo marcadas eleições para 11 de Dezembro, depois adiadas

para oito de Janeiro do ano seguinte. A pretensão governamental de favorecer

candidatos seus a estas eleições entrou em choque com os interesses e a dinâ-

mica de uma maioria pré-eleitoral, resultante de um acordo fi rmado pelos três

maiores partidos: o Democrático, o Liberal e o Reconstituinte. O gabinete de

Maia Pinto, que vinha já registando alguma falta de coesão, entrou em crise

ofi cial, apresentando pedido de demissão a 13 de Dezembro de 1921.

Entretanto, dera-se uma reviravolta no pensamento político de Cunha

Leal. Dando mais uma vez nota de ser um malabarista político, o ex-sido-

nista abandonou o seu recente radicalismo e remeteu-se de novo para sua

primitiva condição de republicano conservador. Com esse renovado estatuto

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assumiu a chefi a do Partido Liberal, em substituição do malogrado António

Granjo. A abjuração de Cunha Leal pode ter obedecido a motivações que se

incluem em uma das duas leituras seguintes, ou nas duas. Assim: na primeira

hipótese, horrorizado com os acontecimentos da Noite Sangrenta, em que

também ele quase foi assassinado, renunciou a uma linha política potencial-

mente fomentadora de extremismos; em segundo lugar, terá visto ou entre-

visto, na circunstância da morte de Granjo, a sua oportunidade de se tornar

chefe de um grande partido conservador, como de resto estaria mais perto

do seu pensamento e ambições; por fi m, poderá ter agido com fundamento

nessas duas vertentes, uma a do sentimento, outra a da conveniência. A ver-

dade mais imediata é que guindado, desta forma, à chefi a do Partido Liberal

e, decerto atendendo a essa sua novel condição, António José de Almeida

a ele recorreu para formar um governo que fosse representativo de todas as

forças republicanas e se empenhasse na preparação das eleições que se avizi-

nhavam já para 8 de Janeiro, mas que, entretanto, voltaram a ser adiadas para

29 do mesmo mês. Desfeito o acordo celebrado anteriormente entre os três

principais partidos, os democráticos apresentaram-se sozinhos, enquanto que

reconstituintes, liberais, socialistas e independentes se reuniram contra aque-

les, num acordo a que deram o nome de Conjunção, esperando dessa forma

disputar-lhes a maioria. Quanto a isso, quaisquer veleidades havidas foram

desfeitas pela retumbante triunfo eleitoral dos democráticos, que nessa pugna

obtiveram maiorias absolutas nas duas câmaras do Parlamento. Reforçava-se

assim o Partido Democrático, sendo incontestável o seu domínio na cena

política nacional, apesar das suas recentes convulsões internas.

Após esta vitória dos democráticos pensou-se que era hora do regresso de

Afonso Costa. O líder histórico do Partido Republicano foi de facto convi-

dado e mesmo instado a voltar ao país e a formar gabinete ministerial. No

entanto, recusou o convite e as instâncias, em face do que, se seguiu a for-

mação e a tomada de posse, a 6 de Fevereiro, de um gabinete inteiramente

democrático, presidido por António Maria da Silva. Em início de funções, o

novo Governo dominou sem difi culdade maior uma conspiração orquestrada

por sectores outubristas não conformados com os resultados das eleições.

Depois, entregou-se à tarefa de reorganizar a Guarda Nacional Republicana,

reduzindo-a nos seus efectivos e armamento e despolitizando-a. Para tanto,

e sob a intenção de desfazer dinâmicas já concertadas, recorreu ao envio de

unidades e de elementos da Corporação para as zonas rurais, com a missão

de as patrulhar. O problema número um da Nação continuava a ser o das

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fi nanças públicas e quanto a soluções buscadas para o resolver elas teriam

de, forçosamente, assentar em dois pontos: reduzir as despesas e aumentar as

receitas. Não passaram na Câmara as propostas do Governo e este insucesso

acarretou-lhe fragilidades internas que obrigaram à sua demissão, em 30 de

Novembro. A crise foi ultrapassada no mesmo dia com a formação de um

segundo gabinete democrático ou, mais propriamente, com a remodelação

do gabinete já existente.

Enquanto isso, por banda da oposição registavam-se reorganizações par-

tidárias, designadamente a fusão dos Partidos Liberal e Reconstituinte, daí

resultando o aparecimento do Partido Republicano Nacionalista, pressuposta-

mente uma força capaz de disputar o poder aos democráticos. Por transfor-

mações orgânicas passava igualmente o Partido Popular, acolhendo nas suas

fi leiras algumas fi guras outubristas que, apesar dos revezes políticos sofridos,

teimavam em continuar com o seu projecto de regresso aos «ideais puros» da

Revolução de Outubro de 1910. Estas movimentações produziram arranjos e

alinhamentos que teceram uma arrumação mais nítida do espectro partidário,

mas, face a uma continuação da hegemonia eleitoral do Partido Democrático,

não deram lugar a uma situação de alternância de exercício do poder executivo.

Continuando as suas tentativas de promover um programa de saneamento

das fi nanças públicas, o governo de António Maria da Silva por intermédio

do seu Ministro das Finanças, Vitorino Guimarães, foi apresentando no Par-

lamento diversas propostas de aumento de receitas, nem sempre bem acei-

tes ou atempadamente discutidas, permanecendo os problemas sem solução

à vista. Chegou-se assim ao dia cinco de Agosto de 1923, dia de fecho do

Parlamento, sem que, quanto ao assunto, estivesse decidido ou aprovado o

que quer que fosse. No dia seguinte, o Congresso reuniria ainda, mas ape-

nas com uma agenda fi xa e exclusiva, a da eleição de um novo presidente da

República. Decidido a não contemporizar com um tal estado de coisas, o

Ministro das Finanças, no seguimento de advertências já anteriormente por

si feitas, apresentou a sua defi nitiva demissão. Entrementes, celebrado o acto

da eleição presidencial, o candidato patrocinado pelo Partido Democrático,

o diplomata Manuel Teixeira Gomes, foi eleito à terceira votação por 121

votos contra apenas 5 de Bernardino Machado, seu mais directo concorrente.

Dizia-se então que o apoio dado pelos democráticos à candidatura de Teixeira

Gomes, fazia parte de um plano para conseguir o regresso de Afonso Costa.

Feita, entretanto, mais uma remodelação governamental, por força da

demissão de Vitorino Guimarães, tomou conta das Finanças, o democrático

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Velhinho Correia, o qual, em acto imediato ao da tomada de posse, apresen-

tou ao Parlamento um pedido de autorização para a aplicação dum conjunto

variado de medidas tendentes à redução do defi cit orçamental. Tal pedido

levantou viva celeuma e, criticado pela Comissão Parlamentar de Finanças,

teve com resposta algumas contrapropostas cujo teor foi considerado inacei-

tável pelo Ministro. Este, face à intransigência dos parlamentares, terminou

por pedir a sua demissão do cargo. Assim é que, de remodelação em remo-

delação, o Governo de António Maria da Silva foi gerindo a crise mas não

fazendo as reformas de que o país carecia, porque tal não lhe era permitido

por um Parlamento em cujas câmaras dispunha, no entanto, de maiorias

numéricas. Situação estranha e anómala que somente as fracturas existentes

entre os democráticos possibilitavam e que veio a refl ectir-se na votação de

uma moção de confi ança ao Governo, apresentada no princípio de Novembro

desse ano de 1923. O documento foi aprovado apenas por um voto (43 con-

tra 42). Fazendo desses resultados a adequada leitura, o Ministério demitiu-se.

Apesar das sucessivas recomposições, fora o governo de mais longa duração na

história da República, mantendo-se no poder quase dois anos, de Janeiro de

1922 a Novembro de 1923.

Perante uma nova crise política e governamental, o Presidente da Repú-

blica, Manuel Teixeira Gomes, convidou Afonso Costa a vir a Portugal e

a formar governo. Desta vez, o infl uente político aceitou a incumbência e

regressou à pátria com a disposição de formar um governo em que estivessem

representados todos os partidos. Não sem discussão e dissensões internas, os

marechais do recém-formado Partido Republicano Nacionalista decidiram não

entrar num tal projecto e declararam-se aptos a assumirem sozinhos respon-

sabilidades governativas. A resposta constituía uma recusa, quer quanto às

propostas de Afonso Costa, quer quanto às intenções e esforços do Presi-

dente Teixeira Gomes, para se encontrar uma situação politicamente estável,

no quadro das instituições parlamentares da República. De alguma forma,

na decisão dos nacionalistas, e no teor da sua comunicação, encontrava-se

implícita uma forte pressão no sentido da dissolução do Parlamento e da con-

vocação de novas eleições legislativas, acto em que, pensavam, iriam obter os

resultados que projectaria o seu partido para o primeiro plano da vida política

nacional. A situação mostrava inequivocamente que a família republicana não

conseguia unir-se, nem mesmo à voz de um «desejado» como o era, ao tempo,

Afonso Costa, cuja fi gura e projectos de governação poderiam representar a

salvação do próprio regime, face aos perigos que já no horizonte se divisavam.

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Com efeito, nos quadrantes políticos de direita e em ambientes castrenses

engrossavam as vozes que advogavam a intervenção enérgica da instituição

militar, para pôr fi m a um sistema político que, afi nal e opiniosamente, não

correspondera, nem corresponderia, às expectativas de riqueza e de justiça e

harmonia sociais nele depositadas, sendo antes um fautor de desavenças entre

portugueses e de pobreza e entristecimento da nação.

Perante a escusa dos nacionalistas, Afonso Costa regressou a Paris. Por cá,

após uma tentativa gorada de constituição de um ministério democrático,

com participação de independentes, surgiu o Governo Nacionalista de Gines-

tal Machado. Prediziam-lhe vida curta duas grandes fragilidades: a falta de

apoio parlamentar e a desunião que grassava no Partido Nacionalista. Ainda

assim, conseguiu fazer aprovar no Parlamento o seu programa, embora com

alterações signifi cativas. Entrementes, a discussão parlamentar foi interrom-

pida por uma tentativa de sedição movida por um ex-ministro outubrista, o

capitão-de-fragata João Manuel de Carvalho, que, na noite de 10 de Dezem-

bro, colocou em revolta contra o Governo a tripulação do contratorpedeiro

Douro. O motim, porque disso não passou, foi dominado sem quaisquer

difi culdades, mas logo os nacionalistas aproveitaram a maré favorável trazida

por essa pequena vitória para exigirem a dissolução do Parlamento, onde esta-

vam em minoria. O grande argumento era o de que, diziam, o Gabinete

precisava de ter pulso livre ou espaço de manobra sufi ciente para empreender

uma governação capaz de manter a ordem pública e reavivar a economia do

país. Face a uma terminante recusa do Presidente da República, o governo

nacionalista demitiu-se e tudo veio a descambar para uma bizarra situação em

que a maioria democrática, podendo governar sozinha, não o queria fazer, e

a minoria nacionalista, querendo-o, não dispunha de apoios sufi cientes. Tei-

xeira Gomes, decidido a não ceder a pressões, convidou uma fi gura de proa

dos nacionalistas, Álvaro de Castro, a constituir ministério. Este, em ruptura

plena com o Directório do seu Partido, propôs-se formar um gabinete de con-

centração partidária, conseguindo-o com partidários seus, com democráticos

e com independentes e ainda com dois membros do grupo Seara Nova, sendo

eles António Sérgio e Mário de Azevedo Gomes. O governo assim constituído

tomou posse a 18 de Dezembro de 1923. Nesse gabinete, António Sérgio era

Ministro da Instrução.

No entender dos seareiros, a República, se quisesse sobreviver como regime

democrático, teria de mudar o seu sistema de governação. Nesse sentido, pre-

conizavam o aparecimento de partidos políticos fortes e de elites intelectuais

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interventivas, estas com a função de esclarecerem e orientarem a vida em socie-

dade. Objectivos atingíveis a médio ou a longo prazo, após um amoldamento

dos espíritos a essa retratada realidade. Daí que uma das suas prioridades,

senão a grande prioridade, se centrasse na educação e na reforma do ensino.

No curto prazo defendiam a substituição do Senado por um órgão consultivo

composto por tecnocratas, e a criação de uma administração pública essen-

cialmente técnica e independente dos governos e da classe política. Algumas

das suas propostas patrocinavam a instituição da fi gura do Governo Excepcio-

nal, que em período de crise governaria na estrita observação de um conjunto,

previamente defi nido, de medidas e regras, consideradas fundamentais para

defesa da República. Para a formação de um tal governo imprescindível seria

o empenho presidencial e o prévio consentimento do Parlamento. A estas

ideias da Seara era sensível Álvaro de Castro, que, entretanto, se desligara dos

nacionalistas e formara, com cerca trinta deputados que lhe eram afectos, o

Grupo Parlamentar de Acção Republicana, vulgarmente conhecido por grupo

dos alvaristas. Era mais uma infl exão à esquerda no percurso ziguezagueante

deste político. As suas anunciadas intenções de promover uma governação

diferente encaixavam-se nas recomendações dos seareiros e ao abrigo de uma

perspectiva francamente reformadora. No Parlamento, o novo Executivo e o

seu programa passaram com confortável margem de apoios. Segundo a opi-

nião de Álvaro de Castro, o único grande problema, de difícil solução, era

o fi nanceiro e por isso o Governo se lançou, com a aquiescência das outras

representações parlamentares, numa reforma da administração pública e

numa rigorosa contenção de despesas. Todavia, o funcionamento vagaroso

e negligente do Parlamento depressa entrou em confronto com a celeridade

e o rigor que os ministros seareiros queriam dar à sua acção governativa, daí

resultando as suas demissões a vinte e sete de Fevereiro de 1924, coincidentes,

no tempo, com a do Ministro da Guerra, este por discordar da aprovação de

uma lei referente à promoção de sargentos.

Prontamente colmatadas as brechas abertas no executivo com as saídas

destes ministros, as propostas governamentais foram entretanto passando no

Parlamento, com maior ou menor difi culdade. Isso, não sem desgaste interno

do elenco governamental, verifi cando-se, por outro lado, sensíveis modifi ca-

ções na inicial atitude de permissão parlamentar havida por parte dos outros

partidos. Vendo estreitar-se, cada vez mais, a sua base de apoio, ou, melhor

dizendo, a base dos que haviam prometido uma postura de não obstrução, os

alvaristas apostaram tudo numa só jogada, apresentando a 26 de Junho uma

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moção de confi ança, que acabou por ser derrotada por 33 votos contra 31.

Era mais um ministério que caía, sem poder concretizar minimamente a obra

que planeara.

O Portugal de então, país ingovernável, de novo voltou as atenções, como

que numa súplica, para Afonso Costa. Desta feita, foram Álvaro de Castro e o

próprio Presidente Teixeira Gomes que lhe rogaram que voltasse e constituísse

um governo. Inúteis esforços! O fi lho da República que mais genuinamente

encarnara o seu espírito jacobinista e anti-clerical, voltava as costas ao palco

onde o futuro se jogava, parecendo querer alhear-se de destinos que já então

se adivinhavam trágicos. Na verdade, Afonso Costa fazia depender a sua vinda

e assunção do poder de um total consenso republicano em torno da sua pes-

soa, enquanto chefe de um governo. Mas isso era pedir demais a uma Repú-

blica cujos fi lhos se encontravam irremediavelmente desavindos. Goradas

estas diligências, Teixeira Gomes insistiu então com os democráticos para que

assumissem as suas responsabilidades de partido maioritário. Estes acataram

o aviso e daí resultou a formação de um governo composto por democráti-

cos e alvaristas, sob a chefi a de Rodrigues Gaspar. Tomou posse a 6 de Julho

de 1924 e na Câmara só os nacionalistas se afi rmaram como oposição. Era

mais um governo da República que, declaradamente, encetava esforços para

curar as doentes fi nanças públicas, utilizando remédios não muito diferentes

dos empregues ou propostos por outros governos, seus antecessores. Apli-

cou alguns desses remédios com resultados aparentemente positivos; porém,

contendas no interior do Partido Democrático viriam a estar na origem da

queda deste Executivo, a 19 de Novembro de 1924. É que, após algumas

depreciações feitas à actuação do Governo, a ala esquerda dos democráticos,

chefi ada por José Domingues dos Santos, votou, conjuntamente com a opo-

sição nacionalista, uma moção de confi ança apresentada pelo chefe da ala

direita, António Maria da Silva. Desta forma, o documento foi rejeitado por

uma diferença de três votos, todavia o sufi ciente para o Ministério cair. Nada

mudava neste torrão democrático e republicano, sem dúvida recheado de boas

intenções, mas com uma intransigência de princípios e de posições que dei-

tava tudo a perder.

A divisão do Partido Republicano Português em uma facção radical (os

canhotos) e uma outra mais conservadora (os bonzos) era um facto que

remontava a 1919, mas que somente a partir de fi nais de 1923 ameaçava

tornar-se cisão partidária. Com efeito, sob a batuta de António Maria da Silva

o partido encaminhara-se para um conservadorismo que negava as suas ori-

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gens, fenómeno que provocou um movimento de sinal contrário por parte de

um grupo mais radical de militantes e que levou a que estes se organizassem

internamente em uma tendência com opções e posições próprias. Sendo

uma situação que, à partida, poderia qualifi car-se pela existência de duas sen-

sibilidades no seio do mesmo partido político, a mesmo veio, por força da

confl itualidade parlamentar e da abundância de incidentes na vida política, a

confi gurar a existência de dois partidos sob a mesma envolvência e denomi-

nação. O tempo político, provocando a agudização das diferenças existentes

e o surgimento de insanáveis litígios, trouxera a tomada de posições públicas

diversas, muitas vezes, antagónicas.

Neste estado de coisas, após a queda do executivo de Rodrigues Gaspar,

os canhotos ainda conseguiram que o Directório do Partido aprovasse o nome

de José Domingues dos Santos para chefi ar o próximo ministério a constituir,

afi rmando então o órgão ofi cial, O Mundo, que só um governo de esquerda

teria viabilidade parlamentar. O novo Ministério, formado por democráticos

de esquerda, alvaristas e republicanos independentes, era, nas declarações do

seu chefe, para governar à esquerda e na defesa do povo e das instituições

republicanas. E na verdade, a sua política fi scal fez incidir maior carga de

impostos sobre a indústria e sobre o alto comércio e a banca, o que, natu-

ralmente, provocou a reacção das associações patronais e dos patrões desses

sectores da economia. Na sequência desta contenda, o Governo mandou

encerrar a Associação Comercial de Lisboa e, enquanto isso, José Domingues

dos Santos tecia palavras de agradecimento e de desagravo a uma manifestação

popular de apoio à política governamental, em que houvera confrontos entre

manifestantes e a GNR. Estas medidas e actuações dos governantes foram

asperamente criticadas no Parlamento e deram origem a uma moção de des-

confi ança que, aprovada com os votos da ala direita do Partido Democrático,

a 11 de Fevereiro de 1925, causou a demissão do Ministério. Dois dias depois,

às portas de Belém, uma outra manifestação popular, integrando comunistas

e socialistas, pedia ao Presidente Teixeira Gomes para reconduzir o Governo,

o que foi terminantemente recusado.

A nova crise ministerial veio a ser resolvida com a formação do Governo

de Vitorino Guimarães, personalidade democrática de uma zona cinzenta do

Partido, a meio caminho entre esquerda e direita. O Ministério que consti-

tuiu obedeceu à fórmula de composição dos anteriores, ou seja, democráticos,

alvaristas e independentes. As semelhanças não se fi cavam só por aí, posto

que o seu programa era, na sua essência, igual ao do governo antecessor e, nas

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declarações feitas, Vitorino Guimarães mostrava uma visão política e governa-

tiva coincidente com a de José Domingues dos Santos. Em sinal de protesto

contra uma praxis política e uma retórica radicais, em tudo semelhantes às do

anterior executivo, os nacionalistas, com Cunha Leal à frente, abandonaram

os trabalhos parlamentares. A verdade porém é que, contra as expectativas,

a actuação do governo foi de extrema prudência, procurando eliminar, ou

amenizar, na legislação e de disposições anteriores, aspectos mais polémicos e

susceptíveis de causar maiores protestos.

Mas a sociedade portuguesa permanecia agitada e avolumavam-se os

rumores de golpe militar. Após o desarme da Guarda Republicana, o Exército

agigantara-se como instituição com poderes e prestígio para intervir na cena

política. A encorajar uma tal experiência havia os exemplos que vinham de

fora, designadamente do país vizinho, onde desde 1923 se instalara uma dita-

dura militar de extrema-direita dirigida pelo general Primo de Rivera. Acima

de tudo, os militares portugueses mais graduados admiravam nesse regime a

autoridade e o estabelecimento rigoroso da ordem e da disciplina. De resto,

as ditaduras militares e fascistas estavam então em moda pela Europa, facto

que não deixava de infl uenciar muita gente, nos meios político e castrense

nacionais, avivando a ideia de que era hora de a instituição militar tomar o

poder pela via da força e impor a ordem pública e a estabilidade governa-

tiva. Animando esta predisposição estavam altas patentes militares, políticos

conservadores monárquicos e republicanos, a alta burguesia, as associações

patronais, a hierarquia da igreja, os chamados integralistas lusitanos e mesmo

alguma intelligentsia que, entretanto, se deixara deslumbrar pelos fascismos.

Uma primeira materialização deste alargado quadro de intenções ocorreu a

18 de Abril de 1925, sob a forma de uma tentativa de revolta de algumas uni-

dades da guarnição de Lisboa, comandada por ofi ciais generais. Os revoltosos,

estacionados na Rotunda, não resistiram por muito tempo ao fogo de artilha-

ria de forças fi éis à República e, enquanto isso, um dos chefes da intentona, o

general Sínel de Cordes, era feito prisioneiro no Quartel do Carmo da GNR,

para onde se dirigira com o intuito de conferenciar com o Presidente Teixeira

Gomes. Restabelecida a normalidade, seria forçoso tirar a ilação de que os

acontecimentos constituíam um prelúdio do que se estava preparando e um

sério aviso para que se tomassem drásticas medidas de prevenção. Todavia,

alguns meses mais tarde, a benevolente (ou desautorizada) República permitia

que um tribunal militar devolvesse os golpistas à liberdade. Fortalecida e não

desarmada, fi cava, sem dúvida, a intentona anti-republicana.

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Nos fi nais de Junho, os democráticos de António Maria da Silva retiraram

o seu apoio à política orçamental do Governo, o qual, vendo as suas pro-

postas nessa área serem reprovadas, pediu a demissão colectiva ao Presidente

da República, que a aceitou. Quatro dias depois era empossado um governo

de bonzos, chefi ado pelo próprio António Maria da Silva. Tinha à esquerda,

a oposição dos canhotos do seu próprio partido e a dos alvaristas da Acção

Republicana, e à direita, a dos nacionalistas. Na Câmara de Deputados, votada

uma moção de desconfi ança, a mesma foi rejeitada por um voto. O Governo

passava, à tangente, uma primeira prova de fogo, mas não se lhe augurava

longa vida. Com efeito, uma semana depois, a 15 de Julho, era apresentada,

em sessão nocturna do Parlamento, nova moção de desconfi ança, cuja vota-

ção o Governo protelou, colocando o deputado João Camoesas a cometer a

notável proeza de discursar durante mais de oito horas seguidas, sendo depois

substituído, às nove horas da manhã de 16 de Julho, pelo deputado Agatão

Lança. Todo esse prolongamento artifi cial dos trabalhos parlamentares para

permitir a chegada e o voto de deputados democráticos, entretanto ausentes

no Porto. De nada valeu o expediente e a extensa maratona, pois que, o docu-

mento acabou por ser aprovado por uma diferença de nove votos. O ardiloso

António Maria da Silva conseguiu entretanto fazer aprovar no Senado uma

moção de confi ança e, embora esta deliberação não anulasse a moção de des-

confi ança aprovada na Câmara, esgrimiu esse argumento perante o presidente

da República, solicitando deste a dissolução do Parlamento. Depois, convo-

cou uma reunião do Directório do Partido, na qual foi decidida a expulsão

de José Domingues dos Santos e dos seus partidários, que com a sua votação

tinham ajudado o Ministério a cair. Expulsos assim por meio de mera medida

administrativa, os canhotos constituíram-se ofi cialmente no Partido Republi-

cano da Esquerda Democrática.

Ao leme do Partido Democrático, sem oposição interna, António Maria

da Silva instou com o Presidente da República para que o Parlamento fosse

dissolvido, o que lhe foi categoricamente recusado. Logo a seguir, a 19 de

Julho de 1925, tudo foi interrompido por outra insurreição militar, no decor-

rer da qual foi bombardeado o Palácio de Belém pelo cruzador Vasco da Gama.

À testa desta conjura estava um homem do 5 de Outubro, o comandante

Mendes Cabeçadas, republicano conservador mas indefectível, facto que fazia

pressupor que o golpe tinha, não uma intenção de atentar contra a República,

mas de alterar os rumos que esta tomara. De qualquer modo, ainda desta vez

o governo conseguiu dominar a situação e prender os revoltosos. Ultrapassado

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o incidente e consumada a queda do Governo de António Maria da Silva, o

democrático Domingos Pereira constituiu novo Ministério a 1 de Agosto desse

ano de 1925. Estava-se então no fi m de um período legislativo e havia pela

frente a tarefa de preparar eleições. Em Setembro, foram a julgamento os impli-

cados no golpe de 18 de Abril. Num tribunal constituído por ofi ciais generais

– alguns deles suspeitos de comprometimento com o acto que estavam a julgar

–, as audiências foram uma farsa, com os réus e testemunhas a considerarem

os governos da República como verdadeiros culpados dos acontecimentos. O

inevitável desfecho foi o de as acusações serem dadas como não provadas e os

réus mandados em paz e de volta a quartéis. A vilipendiada República não

conseguiu ir para além de um elevado coro de protestos e da retirada de algu-

mas funções e dignidades aos generais membros do júri, não evitando com

isso um descrédito que era, afi nal, mais um passo no caminho que a levava ao

abismo. Nas eleições realizadas a 8 de Novembro de 1925, o aguerrido partido

dos canhotos viria a ser esmagado pela poderosa máquina eleitoral dos bonzos.

Verdade era que o tempo da democracia estava a chegar ao fi m.

Por esta altura, o país foi confrontado com o pedido de renúncia de fun-

ções do Presidente Teixeira Gomes, cujos desejos neste mesmo sentido de

há muito vinham sendo manifestados, cedendo sempre aos rogos feitos para

adiar a decisão. Agora, invocando razões de saúde, mostrava-se decididamente

indisponível para continuar a exercer o cargo para que fora eleito. A 17 de

Dezembro de 1925, o Tejo viu-o partir no cargueiro Zeus, com destino ao

norte de África. Viajaria depois intensamente pela Itália, Grécia e Ásia Menor,

fi xando residência em Bougie, na Argélia, a partir de 1927, e não mais vol-

tando, em vida, a Portugal.

O Congresso elegeu então para a Presidência da República, o cidadão

Bernardino Luís Machado Guimarães. Como cumpria, tendo em conta a

recente realização de eleições, o Governo de Domingos Pereira apresentou

o seu pedido de demissão. Como líder do partido mais votado, dispondo de

maioria em ambas as câmaras do Parlamento, António Maria da Silva recebeu

a incumbência de constituir ministério. A 17 de Dezembro apresentou-se

no Parlamento com um gabinete inteiramente composto por correligionários

seus, registando-se como votos contra apenas os dos nacionalistas e os da

Esquerda Democrática que agora detinha, como refl exo dos resultados eleito-

rais, uma fraquíssima representação parlamentar.

Vivia-se então em Portugal, e mormente em Lisboa, o chamado Escân-

dalo Alves dos Reis, caso do falsário português que conseguira emissões em

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duplicado de notas de 500 escudos, fabricadas na mesma fi rma em Londres

onde o Banco de Portugal mandava executar as suas encomendas. O assunto,

profusamente comentado na imprensa e com fundas repercussões sociais,

apaixonara a opinião pública e fi zera rolar cabeças políticas, inclusive a do

Ministro do Comércio do Governo anterior, Nuno Simões. Conveniente-

mente aproveitado e comentado pelos animadores da contra-revolução em

marcha, constituiu mais uma achega na preparação das mentes dos cidadãos

para a aceitação da intervenção militar, que já se adivinhava, imparável.

A 1 de Fevereiro de 1926 ocorreu uma revolta de cariz esquerdista, animada

por outubristas e elementos do Partido Radical e empreendida por forças da

Escola Prática de Artilharia de Vendas Novas, comandadas por sargentos. Os

revoltosos vieram postar-se no alto de Almada e daí alvejaram Lisboa. Foi

uma aventura isolada que acabou ao amanhecer do dia 3 de Fevereiro, com

os revoltosos a renderem-se às tropas da capital. No entanto, era um aconte-

cimento portador de avisos de que na esquerda também se conspirava, não

havendo somente a ameaça pairante duma ofensiva militar direitista e auto-

ritária. Uma outro assunto que se transformou numa «dor de cabeça» para

este Governo, foi mais uma edição da sempre polémica Questão dos Tabacos,

nisso se vendo uma curiosa similitude com os factores de crise que vinte anos

antes tinham concorrido para a queda da monarquia. A este propósito, cau-

saram enorme turbulência política (tal como vinte anos atrás) as propostas do

Executivo para que a exploração desta indústria passasse a ser por conta do

Estado, ou seja, a chamada régie. E isso, porque a tese da liberdade de explora-

ção tinha muitos adeptos, sobretudo junto da oposição. Pelos meses de Abril

e Maio, a discussão do assunto prolongou-se por várias sessões parlamentares

em que não faltaram insultos e cadeiras partidas, ao mesmo tempo que nas

galerias, o público, constituído por operários tabaqueiros, vaiava e injuriava

os deputados oposicionistas. E o confl ito, extravasando os muros de S. Bento,

passava-se para o chamado Largo das Cortes, em ruidosas manifestações que,

por mais de uma vez, requereram a intervenção da GNR.

As coisas atingiram proporções insustentáveis, de tal forma que o Governo

decidiu suspender a sua representação na Câmara de Deputados, decisão

tomada a 25 do mês de Maio, justamente a data em que Gomes da Costa se

preparava para ir a Braga chefi ar o movimento de tropas que a partir daquela

cidade minhota marchou sobre Lisboa. O país assistiu ao passeio militar ini-

ciado em Braga ao romper do dia 28 de Maio e acabado em Lisboa a 6 de

Junho, com as tropas a viajar de comboio, a pé, a cavalo – rios de gente a

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desaguar na capital, em grande parada militar, com o general Gomes da Costa

à frente, sobre o dorso de um cavalo, espada em continência. Pela primeira

vez em Portugal, uma revolta militar fazia-se em movimento. A tradição era

a saída de quartéis e o acantonamento em zona propícia, habitualmente a

Rotunda. Desta feita, os chefes militares ter-se-ão inspirado na célebre Mar-

cha Sobre Roma, organizada por Mussolini e pelas suas milícias fascistas.

A disposição mais ou menos generalizada de aceitação de uma «Nova Ordem»,

e designadamente da tomada do poder por parte dos militares, confi gurava

mais uma recorrência sebastianista, nascida, como sempre, de uma situação

de crise política e de identidade nacional.

Pereceu a Primeira República, não por falta ou falência de ideais e valo-

res, mas porque no plano prático não soube ou não teve condições para os

cultivar e fazer frutifi car. A democracia que foi capaz de construir fi cou res-

tringida a um sistema parlamentar não baseado na universalidade do voto.

E neste quadro a tónica dominante foi a invencível supremacia de um par-

tido, assente na fi delidade de um eleitorado urbano e numa vasta rede de

notáveis de província com capacidade para assegurar vitórias nas zonas rurais.

É claro que não deixava de ter peso o argumento da inadequação do sufrágio

universal a um país cujos habitantes eram, na sua maioria analfabetos, de tal

decorrendo os perigos de inconsciência no acto de votar e de permeabilização

ao caciquismo, sabendo-se o quanto as populações rurais eram presa fácil da

acção do clero. A questão esteve sempre em aberto, havendo quem, como

Sampaio Bruno, afi rmasse que “O povo existe. O que é preciso é educá-

-lo. Porém aqui urge não nos iludir com o lema, porque a educação de um

povo faz-se conferindo os direitos públicos a esse mesmo povo. Ele aprende

usando e só assim”. Não foi esse, porém, o entendimento dos responsáveis

republicanos, iluminados pelas teorias positivistas e pelo paradigma do cien-

tismo. A essa luz, a crua realidade que era o estado cultural da sociedade

portuguesa constituiu um factor francamente determinante da implantação

de uma democracia mitigada.

Liberdade na República…, decerto que a houve; consignadas na lei fun-

damental estavam as liberdades de imprensa, de opinião, de associação e os

direitos à greve e à manifestação. Se não tivesse sido um regime de liberdade,

não teria a República sido atravessada e por fi m embargada, por ditaduras,

como o foi. Mas, bastas vezes essa liberdade, porventura mal usada ou ao ser-

viço de outros interesses, se voltou em excesso contra o próprio regime, com

sucessivas desvalias de homens, de instituições e de governos.

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Um esforço bem intencionado no sentido de dignifi car e libertar a pessoa

humana portuguesa surgiu com a publicação da chamada Lei da Separação

da Igreja do Estado, através da qual se visava subtrair a sociedade portuguesa à

infl uência do clero, considerada a religião uma superstição nefasta e fomenta-

dora de atraso e de obscurantismo. As disposições draconianas da lei atacavam

frontalmente a Igreja Católica que detinha em Portugal um poder verdadeira-

mente incoercível, na medida em que este mergulhava as suas raízes nos senti-

mentos primários e profundos de uma população rural, inculta e encharcada

em séculos de catolicismo. A criação e a aplicação da Lei da Separação foi,

como nos diz Fernando Catroga, uma tentativa radical de laicização da socie-

dade em que se procurou legislar em sete meses tanto quanto a França o tinha

feito em 30 anos. No imediato, tudo o que se conseguiu foi a ruptura das

relações com a Santa Sé e o aparecimento de maiores rasgões no tecido social,

com instalação de antagonismos entre as cidades e os campos, o sul e o norte

e a hierarquia da Igreja e o Estado. Mais a prazo, verifi cou-se fl agrante insu-

cesso na aplicação desta política religiosa, com os governos e as autoridades a

terem de fechar os olhos às infracções (que muitas eram) à Lei da Separação

ou a concederem amnistias aos infractores. Mais tarde, já em fase preparatória

de ajuste de contas, a feição anticlerical da República foi convenientemente

aproveitada na manipulação das consciências, sobretudo as campesinas, para

uma aceitação fácil da «Nova Ordem» que chegava.

Paralelamente à aplicação das leis religiosas, e no âmbito do mesmo

objectivo de promover o homem do povo de súbdito inconsciente a cidadão

conhecedor dos seus direitos e deveres, procurou-se atribuir à escola laica e

ao professor a alta missão de preparar os futuros cidadãos republicanos. Na

República, a escola e o professor deveriam substituir-se à igreja e ao padre e

tomarem sobre si a missão de instruir e formar o povo para o exercício da cida-

dania. Daí que, em um ano de governo provisório, fossem construídas cerca

de mil escolas primárias. Nos programas de ensino estavam bem expressas as

intenções de ensinar as crianças a ler, escrever e contar, mas, mais que isso,

ensiná-las a amar a sua pátria, as suas gentes, a sua história, as suas tradições.

Neste sentido, o contacto directo com as realidades nacionais – monumentos,

museus, fábricas – e a participação em festas cívicas estavam amplamente

acarinhados. Também surgiram teorizações e importantes reformas do ensino

como a que foi preceituada pela Lei de 11 de Março de 1911, assinada por

António José de Almeida, e, mormente, a que foi estabelecida em 1919 pelo

Ministro Leonardo Coimbra. Todavia, sempre estes conjuntos de boas-inten-

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ções encalharam no «faz /desfaz» ou no «não faz» inerentes às tensões políticas

e às instabilidades governamentais. Daí que a República não tenha conse-

guido a redução do analfabetismo para índices louváveis e tampouco tenha

conseguido a criação de uma cultura política e cívica republicana, com isso

comprometendo a sua identidade e a sua própria sobrevivência.

Estas insufi ciências e inefi cácias não seriam, contudo, razão sufi ciente para

a queda do regime. Porém, recorde-se que a elas estiveram aliadas o descalabro

fi nanceiro, a violência da guerrilha político-partidária e a consequente inca-

pacidade para rever e aperfeiçoar o sistema de governação e para desenvolver

outros factores de equilíbrio. A diabólica e dramática Noite Sangrenta e os

escândalos fi nanceiros como o do suposto empréstimo do escroque ameri-

cano e o Caso Alves dos Reis não podiam ter acontecido; acontecendo, feriram

gravemente a República. Tudo isso e um contexto internacional de desenvol-

vimento de ideias contrárias à manutenção de sistemas parlamentares deter-

minou irreversivelmente a marcha das coisas. Não deixa de ser curioso notar

que o fi m chega quando a situação parecia já tomar um rumo muito mais

favorável, quer do ponto de vista da estabilidade política (maioria democrá-

tica), quer do ponto de vista fi nanceiro (equilíbrio do orçamento, decréscimo

da dívida pública, estabilização da moeda).

Tarde demais! Desperdiçou muito tempo a República e quando quis come-

çar a fazer obra já não lhe foi dada oportunidade para tal.

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ADVENTO DA REPÚBLICA EM DATAS

eng. carlos ferreira*

1780

12 de Julho 1780 – Nasce Mouzinho da Silveira.

1802

8 de Setembro 1802 – Nasce Simão José da Luz Soriano, escritor e jornalista.

1805

26 de Março 1805 – Nasce em Santarém o eminente chefe republicano António de Oliveira

Marreca.

1810

28 de Março 1810 – Nasce em Lisboa o grande historiador e homem fundamental do libe-

ralismo português Alexandre Herculano.

1817

8 de Outubro 1817 – No Campo de Santana (hoje Campo dos Mártires da Pátria) foram

enforcados os liberais portugueses por ordem de Beresford, com a concordância dos respon-

sáveis pela regência do reino.

18 de Outubro 1817 – É enforcado em S. Julião da Barra, o nobre patriota general Gomes

Freire de Andrade.

1818

11 de Maio 1818 – Nasce Francisco Maria de Sousa Brandão, militar, precursor das ideias

republicanas e defensor do movimento associativo.

1820

24 de Agosto 1820 – Desencadeia-se no Porto, a revolta que vai conduzir à Revolução Libe-

ral e à queda do Absolutismo no nosso país.

* Trabalho elaborado tendo por base investigações do autor e o recurso a várias fontes, com particular des-

taque para as seguintes publicações: “Almanaque Republicano”, por Artur B. Mendonça e José M. Martins;

“Anuário do Centro de Estudos do Pensamento Politico” e “Respublica”, por José Adelino Maltez; “História

de Portugal em Datas”, por António Simões Rodrigues; “O Século XIX em Portugal. Cronologia e Qua-

dro de Gerações”, por António Machado Pires; ”Cronologia Geral da História de Portugal”, por Joel Serrão;

“Cronologia Política de Coimbra”, por Lia Ribeiro; “No Advento da República, 1907”, por Manuela Rego.

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266 república e democracia

1829

14 de Março 1829 – Nasce no Porto, o advogado e conhecido anticlerical, Alexandre Braga

(Pai).

1830

7 de Março 1830 – Nasce, em S. Bartolomeu de Messines (Silves), o poeta e pedagogo João

de Deus, autor da Cartilha Maternal, que criou um método simples de aprendizagem da

leitura e da escrita que os republicanos divulgaram por todo o país nos seus centros políticos

e nas escolas que a eles estavam ligadas.

1832

16 de Maio 1832 – Mouzinho da Silveira decreta a obrigatoriedade do Registo Civil.

17 de Maio 1832 – Mouzinho da Silveira ordena a supressão dos conventos de religiosas e

religiosos nos Açores.

1833

4 de Julho 1833 – Morre Borges Carneiro, um dos paladinos da Revolução de 1820, preso

no forte de S. Julião da Barra.

1834

1 de Abril 1834 – Nasce em Lisboa o professor Augusto José da Cunha, que em 1907 aderiu

ao Partido Republicano.

27 de Maio 1834 – Joaquim António de Aguiar publica o decreto a extinguir as ordens

religiosas em Portugal.

13 de Junho 1834 – Nasce em Faro, o professor José Veríssimo de Almeida, lente do Insti-

tuto de Agronomia e um dos vereadores republicanos eleitos para o município de Lisboa em

1 de Novembro de 1908.

1837

20 de Fevereiro 1837 – Nasce em Coimbra o Dr. Bernardino Pinheiro.

1838

6 de Janeiro 1838 – Nasce em Bragança o Dr. Manuel Emídio Garcia.

7 de Março 1838 – Nasce em Alcobaça o antigo e dedicado republicano Bernardino dos

Santos Carneiro.

17 de Abril 1838 – Nasce João Bonança, autor da História da Lusitânia e da Ibéria e um dos

primeiros propagandistas republicanos em Portugal.

1840

24 de Janeiro 1840 – Nasce no Porto o professor e publicista republicano Rodrigues de

Freitas.

8 de Julho 1840 – Nasce o Manuel de Arriaga na Horta (Açores).

28 de Outubro 1840 – Morre José Fontana, um dos obreiros do socialismo em Portugal.

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advento da república em datas 267

22 de Novembro 1840 – Nasce em Albarraques, perto de Coimbra, o jornalista e livre-

-pensador Cecílio de Sousa, director do “O Trinta” e da “A Folha do Povo”.

1841

1 de Junho 1841 – Nasce em Miranda do Corvo o republicano José Falcão, autor da “Car-

tilha do Povo” e de “A Comuna de Paris e o Governo de Versalhes”.

1842

18 de Abril 1842 – Nasce na Ilha de S. Miguel (Açores), Antero Tarquínio de Quental,

poeta e um dos fundadores do Partido Socialista Português.

1843

24 de Fevereiro 1843 – Nasce em Ponta Delgada o escritor e historiador da literatura por-

tuguesa Joaquim Teófi lo Braga.

1844

10 de Outubro 1844 – Morre, em S. Miguel, Manuel António de Vasconcelos, deputado às

cortes constituintes de 1837, onde se destacou pelas suas convicções democráticas.

1846

1 de Janeiro 1846 – Nasce em Sesimbra o Dr. Leão de Oliveira, um dos grandes organiza-

dores do Partido Republicano em Portugal.

9 de Outubro 1846 – Revolta no Porto onde se nomeia uma Junta Provisória do Governo

do Reino, sendo esta a primeira manifestação de protesto ao golpe de estado de 6 de Outu-

bro desse mesmo ano. Na sequência destes acontecimentos foi preso o Duque da Terceira.

1848

8 de Janeiro 1848 – Nasce em Lisboa o dedicado republicano Guilherme Henrique de

Sousa.

8 de Março 1848 – Nasce na cidade da Horta (Açores), José de Arriaga, escritor e jornalista

republicano.

7 de Abril 1848 – Nasce em Valhelhas, distrito da Guarda, José de Castro.

14 de Abril 1848 – Nasce Silva Pinto.

16 de Abril 1848 – Sai em Lisboa o primeiro número do jornal de inspiração republicana

“O Regenerador”.

18 de Abril 1848 – Nasce José da Cunha Castelo Branco Saraiva, apóstolo incansável dos

princípios associativos.

25 de Abril 1848 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “A

Republica”.

1 de Junho 1848 – Nasce em Miranda do Corvo um dos primeiros líderes do Partido Repu-

blicano, José Falcão, lente da Universidade de Coimbra.

6 de Junho 1848 – Nasce o poeta Gomes Leal.

15 de Agosto 1848 – Nasce António José Ennes, escritor, jornalista e autor da peça “Os

Lazaristas”.

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268 república e democracia

22 de Setembro 1848 – José Estevão de Magalhães, António Rodrigues Sampaio e António

de Oliveira Marreca, assinaram um documento que existiu em poder de Joaquim Martins de

Carvalho, em que se autorizava a comissão revolucionária de Coimbra a promover o triunfo

dos princípios democráticos, empregando “todos os meios conducentes para o mesmo fi m”.

1849

1 de Fevereiro 1849 – Nasce, em Lisboa, o escritor e Par do Reino, vereador municipal em

Lisboa e adepto das ideias republicanas Anselmo Braamcamp Freire.

11 de Junho 1849 – Nasce Eudóxio César Azedo Gneco, propagandista das ideias socialistas

e membro do Partido Socialista Português.

1850

28 de Abril 1850 – Sai em Lisboa o primeiro número da revista semanal “O Eco dos

Operários”.

10 de Junho 1850 – Nasce no Rio de Janeiro o professor e jornalista Guilherme de Sousa,

redactor entre outros jornais, de “A Vanguarda”.

18 de Setembro 1850 – Nasce em Freixo de Espada-à-Cinta o poeta Guerra Junqueiro,

autor de “A Velhice do Padre Eterno”, “Pátria” e outras obras importantes.

28 de Setembro 1850 – Nasce em Izeda (Bragança), Augusto Manuel Alves da Veiga, jorna-

lista, escritor e revolucionário do 31 de Janeiro de 1891.

25 de Outubro 1850 – Nasce, em Vila Real, o professor do Instituto de Agronomia e Vete-

rinária Alves Torgo, fundador do Centro Escolar Afonso Costa.

5 de Novembro 1850 – Nasce na Covilhã o jornalista e político republicano José Maria de

Moura Barata Feio Terenas, que foi deputado republicano em 1908.

1851

28 de Março 1851 – Nasce Bernardino Machado.

30 de Maio 1851 – Nasce no Rio de Janeiro, Sebastião de Magalhães Lima.

1852

10 de Março 1852 – Nasce em Lisboa o ilustre republicano Zófi mo Consiglieri Pedroso.

1853

14 de Outubro 1853 – Nasce o propagandista José Maria de Sousa.

1854

22 de Outubro 1854 – Nasce no Porto o professor Santos Pousada.

1 de Dezembro 1854 – Publica-se pela primeira vez, em Lisboa, o periódico “A Tribuna do

Operário”.

1855

19 de Janeiro 1855 – José Maria Latino Coelho toma pela primeira vez lugar como depu-

tado no Parlamento.

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1856

2 de Fevereiro 1856 – Nasce Henrique Lopes de Mendonça, dramaturgo e autor da letra do

Hino Nacional, “A Portuguesa”.

14 de Fevereiro 1856 – Nasce no Porto, Basílio Teles, economista, escritor e propagandista

do Partido Republicano.

6 de Março 1856 – Nasce em Chaves Manuel Maria Coelho, um dos principais envolvidos

nos acontecimentos de 31 de Janeiro de 1891.

23 de Março 1856 – Nasce em Cuba, no Alentejo, Ernesto Cabrita.

1857

21 de Março 1857 – Nasce em Tomar o republicano fundador do semanário “A Emancipa-

ção”, Carlos Campeão dos Santos.

5 de Setembro 1857 – Morre o fi lósofo e mentor do sistema positivista, Augusto Comte,

que tanto impacto teve na formação do movimento republicano em Portugal.

1858

23 de Janeiro 1858 – Morre em Lisboa, José Félix Henriques Nogueira.

28 de Março 1858 – Inicia a publicação, em Lisboa, o diário de cariz democrático “O Futuro”.

1 de Outubro 1858 – Funda-se em Alcântara (Lisboa), a Associação Fraternal dos Fabrican-

tes de Tecidos e Artes Correlativas.

1860

1 de Março 1860 – Publica-se, em Lisboa, o primeiro número do jornal republicano “A

Discussão”.

2 de Maio 1860 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do jornal de cariz democrático

“A Política Liberal”, nome que resultou da fusão de dois jornais anteriormente existentes “A

Discussão” e “O Futuro”.

1861

20 de Maio 1861 – Nasce em Vila Real o ilustre jornalista republicano Alves Correia.

25 de Dezembro 1861 – São proibidas despoticamente as reuniões da Sociedade Patriótica

de Lisboa, sob o pretexto de falta de estudo.

1862

11 de Janeiro 1862 – Nasce em Barrancos Higino de Sousa.

14 de Janeiro 1862 – Nasce Manuel Borges Grainha, jornalista e publicista republicano.

11 de Março 1862 – Expulsão de Portugal das Irmãs da Caridade e dos padres que a dirigiam.

20 de Abril 1862 – Nasce na Amareleja Aresta Branco.

24 de Junho 1862 – Inauguração do Asilo de S. João, fundado pelo Grão-Mestre da Maço-

naria, José Estêvão de Magalhães.

1864

8 de Outubro 1864 – Nasce em Ílhavo o engenheiro Xavier Esteves, deputado pelo Porto

na legislatura de 1900.

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270 república e democracia

31 de Outubro 1864 – Nasce em Almeirim Guilherme Godinho, que em 1908 seria presi-

dente da Câmara Municipal.

1865

29 de Janeiro 1865 – Nasce em Lisboa, João Pereira Bastos, ofi cial do exército, fundador da

Escola de Ofi ciais Milicianos, ministro da Guerra num governo de Afonso Costa (1913-14)

e maçon.

9 de Outubro 1865 – Realiza-se o Congresso Social no Centro Promotor de Lisboa, com a

presença de representantes de 71 associações de todo o País.

20 de Outubro 1865 – Nasce em Moura Afonso de Lemos, vereador da Câmara Municipal

de Lisboa.

1867

25 de Janeiro 1867 – Nasce em Elvas, Adelaide de Jesus Damas Brasão Cabete, médica,

republicana e fi gura de relevo no incipiente movimento feminista português.

1 de Julho 1867 – Decreta-se o “Código Civil”. Este código foi elaborado por Barjona de

Freitas e pelo Visconde da Ribeira Grande.

1 de Julho 1867 – É abolida a pena de morte e de trabalhos públicos em Portugal. Estabe-

lece-se a pena de prisão celular e a reforma do júri.

1868

1 de Janeiro 1868 – Revolta popular no Porto conhecida pela Janeirinha.

8 de Abril 1868 – Nasce em Viseu o dedicado democrata Ferreira Chaves, um dos fundado-

res da Associação do Registo Civil.

Setembro 1868 – Foi proclamada a República em Espanha. “Quando chegou a Coimbra

a primeira notícia, os estudantes, com uma fi larmónica à frente, encheram o largo da Feira,

aclamando a República com entusiasmo.”

1869

3 de Fevereiro 1869 – Instalou-se em Coimbra a loja maçónica Democracia, cujo venerável

era Joaquim de Almeida Cunha, composta por oito estudantes. Durou até Setembro de

1871.

25 de Fevereiro 1869 – É abolida completamente a escravidão em território português,

fi cando os escravos existentes ao serviço dos patrões até ao dia 29 de Abril de 1878.

14 de Março 1869 – Nasce em Viseu o jornalista republicano, José Perdigão, redactor do

jornal “Beira”.

30 de Setembro 1869 – Decreto do Conde de Paraty, Grão Mestre do Grande Oriente

Lusitano, declarando aprovada pela Grande Loja a junção proposta pelo Grande Oriente

Português sob o título de Grande Oriente Lusitano Unido: Supremo Conselho da Maço-

naria Portuguesa, fi cando em vigor a Constituição do Grande Oriente Português de 23 de

Fevereiro de 1867 alterada e modifi cada pelo acto adicional de 17 de Agosto de 1869.

26 de Outubro 1869 – Nasce em Mourão o professor Agostinho Fortes que foi vereador da

Câmara Municipal de Lisboa.

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10 de Novembro 1869 – Nasce no Porto o ilustre parlamentar e advogado Dr. Alexandre

Braga.

1870

19 de Janeiro 1870 – Nasce na cidade do Porto o ex-alferes Augusto da Costa Malheiro,

também ele um dos implicados no movimento revolucionário de 31 de Janeiro de 1891.

7 de Março 1870 – Publica-se, na cidade do Porto, o primeiro número do bissemanário

“Gazeta Democrática”.

17 de Março 1870 – Saiu nesta data O Trabalho, semanário de estudantes, primeiro perió-

dico republicano a ser publicado em Coimbra.

11 de Maio 1870 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do jornal democrático “A

República”, redigido por Antero de Quental, Eça de Queirós, Batalha Reis, Joaquim Pedro

de Oliveira Martins e António Ennes.

1 de Julho 1870 – Sai no Porto o primeiro número do semanário republicano “O Combate”.

15 de Outubro 1870 – Magalhães Lima realiza a sua primeira matrícula na Universidade

de Coimbra.

24 de Outubro 1870 – Nasce no Ameal, nas proximidades de Coimbra, Malva do Vale.

1871

10 de Janeiro 1871 – Nasce em Sobral de Monte Agraço, António França Borges, jornalista

republicano, fundador do diário matutino “O Mundo”.

13 de Fevereiro 1871 – Realiza-se em Lisboa o primeiro casamento civil entre Alexandre

António Alves e Andreza Maria da Conceição.

16 de Fevereiro 1871 – Publicou-se o primeiro número do periódico A Federação, criado

pela loja maçónica Federação, dirigido por Feio Terenas.

21 de Fevereiro 1871 – Nasce em Viseu, José Antunes de Castro, fundador de vários jornais

republicanos.

27 de Maio 1871 – Inauguração, em Lisboa, das Conferências do Casino.

Maio 1871 – Numa primeira intervenção cívica de grande dimensão, José Falcão publicou

anonimamente, em Coimbra, o opúsculo A Comuna de Paris e o Governo de Versailles, em

que reiterava a defesa da Comuna. Esta publicação valeu ao autor um processo em que era

acusado de um crime público de abuso de imprensa. Foi ilibado de todas as acusações.

6 de Junho 1871 – Augusto Soromenho profere a IIIª Conferência no Casino Lisbonense

sobre “A Literatura Portuguesa”.

16 de Junho 1871 – São aprovados os estatutos do Centro Promotor das Classes Laboriosas.

25 de Junho 1871 – São proibidas as Conferências do Casino.

21 de Agosto 1871 – Costa Godolfi m, José Maria Chaves e outros fundam o Centro

Democrático.

21 de Setembro 1871 – Promulgação da Constituição Maçónica em que se defi nem clara-

mente as atribuições, direitos e regalias do Supremo Conselho do Grau 33 Antigo e Aceite

para Portugal e seus domínios e jurisdição, e as do Grande Oriente Lusitano Unido, na

junção da família maçónica portuguesa realizada em 30 de Setembro. Nesta mesma data

o Conde de Paraty, Soberano Grande Comendador e Grão-Mestre, em nome do Supremo

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Conselho do Inspectores Gerais do Grau 33º e no da Grande Loja como corpo superior do

Rito Francês moderno, declarou a referida Constituição aprovada por aqueles altos corpos e

mandou que fosse jurada em todas as ofi cinas e posta em vigor.

27 de Setembro 1871 – Regularização da Loja maçónica Ave Labor, em Lisboa.

1 de Outubro 1871 – Fundação, em Lisboa, do Ateneu, Sociedade de Estudo e Ensino

Livre, de cariz republicano.

Outubro 1871 – Começou a funcionar a loja maçónica Perseverança, fundada por obreiros

saídos da loja A Federação. A sua regularização teve lugar apenas a 11-2-1873 e o seu pri-

meiro venerável foi Abílio Roque de Sá Barreto.

7 de Novembro 1871 – Nasce, na Baía, José Bessa de Carvalho.

1872

1 de Janeiro 1872 – Iniciou a sua publicação o jornal Correspondência de Coimbra, que até

1874 refl ectiu, por acção de Emídio Garcia, alguma infl uência republicana.

14 de Janeiro 1872 – José Fontana funda, em Lisboa, a Associação Fraternidade Operária.

2 de Fevereiro 1872 – Nasce em Quintãs, Tomé de Barros Queirós, político republicano.

10 de Março 1872 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do jornal socialista “Pensa-

mento Social”.

12 de Abril 1872 – Nasce em Lagos o conhecido comerciante e republicano Gonçalves de

Azevedo.

15 de Abril 1872 – É regularizada no Grande Oriente Lusitano Unido a Loja Regeneração

Irlandesa, de que era venerável Guilherme Augusto Ferreira Gomes, sendo encarregado pelo

Supremo Conselho do 33º Grau dessa regularização Pedro de Alcântara Cristiano.

16 de Junho 1872 – Realização de um comício anti-jesuítico no Porto, no Salão da Porta do

Sol, para protestar contra a reacção religiosa e a introdução dos jesuítas em Portugal.

5 de Outubro 1872 – Morre, em Luanda, José Vieira de Castro, político e escritor que ali

viveu desterrado durante alguns anos. Era um dos grandes amigos de Camilo Castelo Branco

e autor de uma obra intitulada “A Republica”.

11 de Outubro 1872 – Publica-se, em Lisboa, o primeiro número do diário “A Democracia”.

13 de Outubro 1872 – É instalada no Barreiro uma secção do Partido Socialista.

1873

13 de Janeiro 1873 – Nasce em Lisboa, Joshua Benoiel, pioneiro do fotojornalismo em

Portugal.

17 de Fevereiro 1873 – Declaram-se em greve os charuteiros das fábricas do Porto, exigindo

aumento de salários.

1 de Maio 1873 – Começa a publicar-se em Coimbra o semanário republicano “Republica

Portuguesa”, fundado por Alves da Veiga.

28 de Maio 1873 – Nasce em Paranhos, João José de Freitas, advogado, professor no Liceu

de Braga e membro substituto do Directório.

15 de Julho 1873 – Bernardino Machado toma o grau de bacharel pela Universidade de

Coimbra.

27 de Julho 1873 – Os socialistas portugueses protestam pública e solenemente contra as

calúnias da imprensa que deturpa os acontecimentos de Alcoy.

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9 de Agosto 1873 – Publica-se no Porto o periódico socialista “O Bom Senso”.

4 de Outubro 1873 – Publica-se o último número do jornal “Pensamento Social”, onde

colaborou assiduamente Antero de Quental.

12 de Outubro 1873 – Funda-se no Porto a Fraternidade Operária.

17 de Dezembro 1873 – É realizada uma manifestação republicana, em Lisboa, no teatro

do Príncipe Real, promovida pelos redactores do “Rebate”.

1874

6 de Abril 1874 – Sai, em Lisboa, o primeiro número do semanário anti-jesuítico “A Semana

de Loyola”. Era seu director J. J. Silva Graça.

26 de Maio 1874 – Morre Joaquim António de Aguiar, conhecido como “O Mata-Frades”.

Foi o ministro que decretou a extinção de todas as ordens religiosas em Portugal.

26 de Julho 1874 – Morre no Porto o poeta e escritor Guilherme Braga, autor de “Os Falsos

Apóstolos” e de “O Bispo”. O seu funeral realizou-se civilmente.

1875

10 de Janeiro 1875 – Nasce em Lisboa, António Machado Santos, ofi cial da marinha e

organizador do 5 de Outubro.

10 de Janeiro 1875 – Fundação do Partido Socialista por proposta de Azedo Gneco, apoiada

por José Fontana.

16 de Abril 1875 – Representa-se pela primeira vez o drama anti-clerical “Os Lazaristas”, da

autoria de António José Enes.

23 de Maio 1875 – Morre o Duque de Loulé, Nuno José Severo de Mendonça Rolim de

Moura Barreto, antigo combatente das tropas liberais e Presidente da Câmara dos Pares.

7 de Agosto 1875 – Publica-se o primeiro número do semanário socialista “O Protesto”.

1876

14 de Fevereiro 1876 – Nasce João Maria Ferreira do Amaral, ofi cial do exército e reorgani-

zador da polícia durante a República.

7 de Março 1876 – Realiza-se em Mogofores (Anadia) o enterro civil do escritor Albano

Afonso de Almeida Coutinho, pai de Albano Coutinho, futuro governador civil de Aveiro.

19 de Março 1876 – Comício no Casino Lisbonense em que o Partido Republicano reclama

junto das oposições monárquicas a necessidade de instaurar o sufrágio universal, a responsa-

bilidade ministerial e o registo civil obrigatório.

25 de Março 1876 – Realiza-se um jantar de cerca de 150 pessoas em Lisboa para comemo-

rar as vitórias eleitorais alcançadas pelos republicanos franceses.

3 de Abril 1876 – É eleito o Directório do Partido Republicano Democrático, composto

por 34 membros.

6 de Abril 1876 – Funda-se em Faro o jornal “O Distrito de Faro”, que durante alguns anos

foi o defensor dos ideais republicanos na região. Porém, mais tarde, este jornal torna-se órgão

do Partido Regenerador.

20 de Abril 1876 – Funda-se em Alcântara o Centro Eleitoral Republicano Democrático.

27 de Abril 1876 – Inaugura-se em Tavira uma associação democrática denominada

Clube Democrático Progressista, cujos fundadores eram na sua maioria adeptos das ideias

republicanas.

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9 de Junho 1876 – Bernardino Machado apresenta a sua tese de doutoramento na Univer-

sidade de Coimbra subordinada ao tema “Teses da Filosofi a Natural”.

26 de Junho 1876 – Assinala-se o primeiro registo civil em Lisboa. Foi o de falecimento de

Ayres Maia.

5 de Julho 1876 – Nasce em Borba o Dr. Caldeira Queiróz.

5 de Julho 1876 – Morre Francisco José Nunes.

9 de Agosto 1876 – Publica-se em Angra de Heroísmo o primeiro número da “Ideia Nova”,

folha liberal, que realizou campanha anticlerical.

2 de Setembro 1876 – Suicida-se o livreiro, socialista, livre-pensador e um dos fundadores

da Associação Internacional dos Trabalhadores em Portugal e da Fraternidade Operária, José

Fontana. O seu funeral realizou-se civilmente. Tinha nascido em Cabbis, na Suíça, a 28 de

Outubro de 1848.

3 de Dezembro 1876 – É fundado em Lisboa o Clube Mundo Novo.

1877

3 de Abril 1877 – Nasce em Lisboa o veterinário José Miranda do Vale, que foi vereador da

Câmara Municipal de Lisboa.

4 de Junho 1877 – Antero de Quental adere ao Partido Socialista.

20 de Junho 1877 – Realiza-se em Lisboa, no Teatro da rua do Condes, um comício popu-

lar, para protestar contra as prepotências praticadas pela polícia civil e guarda municipal na

noite de 17 do mesmo mês.

13 de Setembro 1877 – Morre, em Vale de Lobos, o conhecido historiador português Ale-

xandre Herculano.

1878

1 de Fevereiro 1878 – Sai em Coimbra o primeiro número do jornal republicano “A Justiça”.

1 de Fevereiro 1878 – Realiza-se o Congresso Nacional Socialista, na cidade do Porto.

8 de Fevereiro 1878 – Sai em Coimbra o número programa do semanário republicano “O

Partido do Povo”.

8 de Março 1878 – Nasceu o Centro Eleitoral Republicano Democrático de Coimbra, diri-

gido por Abílio Roque de Sá Barreto.

2 de Abril 1878 – Funda-se em Vila Verde, na Figueira da Foz, a Sociedade Democrática

Republicana.

31 de Maio 1878 – Os republicanos federais portugueses celebram o centenário de Voltaire.

3 de Junho 1878 – É absolvido Carrilho Videira, acusado de se recusar, em plena audiência

a prestar juramento sobre os Evangelhos.

13 de Julho 1878 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “A

Bandeira Republicana Democrática”.

14 de Julho 1878 – Realiza-se um comício republicano no Porto, em que Rodrigues de

Freitas apresenta o seu programa como candidato republicano.

31 de Julho 1878 – Emídio Garcia, numa atitude que provocou polémica e teve eco nacio-

nal, baptizou “civilmente” um dos seus fi lhos. Primeiro no Centro Republicano, consa-

grando-o à Humanidade, e só depois o fez religiosamente.

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advento da república em datas 275

4 de Agosto 1878 – Foi absolvido Carrilho Videira, escritor democrata e livre pensador,

acusado de não querer prestar juramento católico. Foi seu defensor o Manuel de Arriaga. No

fi nal da audiência houve manifestações à porta do tribunal.

4 de Agosto 1878 – O partido republicano alcança em Coimbra 513 votos nas eleições

municipais.

11 de Agosto 1878 – Começa a publicar-se em Lisboa o semanário republicano Amigo do

Povo.

7 de Outubro 1878 – Comício eleitoral realizado em Lisboa, no Teatro da Rua do Condes,

para apresentação do candidato a deputado republicano, Manuel de Arriaga. Nesta ocasião o

candidato expôs o seu programa político. Presidiu a este comício Ramalho Ortigão.

10 de Outubro 1878 – Nas eleições para deputados o Centro Eleitoral Republicano Demo-

crático de Coimbra apresentou como candidato Abílio Roque de Sá Barreto.

13 de Outubro 1878 – Eleições gerais para deputados, em que se apresentaram três candi-

datos pelo Partido Republicano que obtiveram as seguintes votações: Teófi lo Braga, círculo

nº 94 (Lisboa; 1º Bairro) – 434 votos; Manuel de Arriaga, círculo nº 96 (Lisboa; 3º Bairro)

– 465 votos; Abílio Roque de Sá Barreto, círculo nº 54 (Coimbra) – 622 votos.

14 de Outubro 1878 – Foi iniciado na Maçonaria portuguesa o capitão de engenharia Luís

Augusto Ferreira de Castro, que depois foi Soberano Grande Comendador e Grão-Mestre.

28 de Novembro 1878 – Publica-se a Lei do Registo Civil por iniciativa de Fontes Pereira

de Melo, Rodrigues Sampaio, Tomás Ribeiro, Serpa Pimentel, Andrade Corvo e Lourenço

António da Luz de Carvalho.

28 de Novembro 1878 – Funda-se em Lisboa a Federação Académica.

1879

4 de Janeiro 1879 – Constitui-se em Lisboa, na sala da Associação das Classes Laboriosas,

o Clube Republicano de Lisboa, sob a presidência de Oliveira Marreca, secretariado por

Latino Coelho e Bernardino Pinheiro.

18 de Janeiro 1879 – Nasce no Funchal, António Aurélio da Costa Ferreira, médico, psicó-

logo e professor. Foi ministro do Fomento no governo de Duarte Leite, vereador da Câmara

Municipal de Lisboa e maçon.

4 de Fevereiro 1879 – Realiza-se o primeiro Registo Civil de nascimento no 1º bairro do

Porto, de um fi lho de José Vianna Quintella e Maria Silva Lopes, que recebeu o nome de

Trajano.

2 de Março 1879 – Começa a publicar-se em Lisboa o jornal “A Discussão”.

2 de Março 1879 – Publica-se, em Lisboa, o primeiro número do semanário republicano

Tribuna do Povo, onde colaboravam Bartolomeu Salazar Moscoso, Horácio Hesk Ferrari e

João Monteiro.

3 de Março 1879 – Em reunião do Centro Republicano de Lisboa, resolveu-se lançar na

acta da reunião um protesto contra o procedimento do Governo português que consentiu,

sem qualquer protesto, que fosse executado em Espanha o português José da Costa Leitão.

23 de Março 1879 – Realiza-se a sessão de abertura do III Congresso do Partido Socialista

Português.

25 de Maio 1879 – Publica-se, no Porto, o primeiro número do semanário socialista “O

Operário”.

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276 república e democracia

29 de Maio 1879 – Comício realizado em Lisboa, no Teatro do Príncipe Real, a fi m de

requerer acerca da falta de trabalho dos manipuladores de tabaco.

12 de Junho 1879 – Publica-se em Lisboa o 1º número do jornal António Maria, que viria

a desempenhar um importante papel de desgaste dos poderes instituídos, graças ao génio

satírico de Rafael Bordalo Pinheiro.

21 de Junho 1879 – Publica-se em Angra de Heroísmo o primeiro número do semanário

democrático “A Época”.

25 de Julho 1879 – Realiza-se o primeiro registo civil de casamento em Vila Real.

30 de Setembro 1879 – Foi inaugurado em Lisboa, no Largo do Contador, o Comité

Central do Partido Republicano Federal, que depois tomou o título de Centro Republicano

Federal.

1 de Outubro 1879 – Sai em Lisboa o 1º número do diário republicano “O Suplemento”.

3 de Outubro 1879 – Nasce em Coimbra Belisário Pimenta.

11 de Outubro 1879 – Inicia publicação, em Lisboa, o semanário “Voz do Operário”, órgão

dos manipuladores do tabaco, fundado por Custódio Brás Pacheco.

19 de Outubro 1879 – Rodrigues de Freitas é eleito deputado pelo Porto. Nestas eleições a

lista republicana obtém 746 votos em 15 assembleias de Lisboa.

21 de Dezembro 1879 – É realizado um comício no teatro Baquet, do Porto, convocado

pelo deputado eleito pelo Partido Republicano, Rodrigues de Freitas, para dar contas do acto

eleitoral.

1880

11 de Fevereiro 1880 – Nasce, em Peso da Régua, Augusto Tito de Morais, ofi cial de Mari-

nha e político republicano.

18 de Fevereiro 1880 – Morre em Tomar, Carlos Campeão dos Santos, iniciador do movi-

mento republicano e livre-pensador naquela cidade.

7 de Março 1880 – Realiza-se um comício organizado por republicanos, no Teatro dos

Recreios em Lisboa, contra as medidas fi nanceiras.

15 de Março 1880 – Morre na Guarda o livre-pensador César Augusto Proença. O seu

funeral, foi o primeiro naquela cidade a realizar-se civilmente.

29 de Março 1880 – Organiza-se em Ponta Delgada o Centro Republicano Federal.

17 de Abril 1880 – Sai em Ponta Delgada o primeiro do semanário “A Republica Federal”.

25 de Abril 1880 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “O Vulcão”.

6 de Maio 1880 – Comício operário realizado em Lisboa, onde se aprova uma representação

que defendia as ideias proteccionistas. No seguimento desta moção, Rodrigues de Freitas,

apresenta no Parlamento um discurso em que defendia o proteccionismo.

12 de Maio 1880 – Publica-se o primeiro número do semanário republicano “A Vanguarda”.

2 de Junho 1880 – Vítor Hugo associa-se à homenagem a Camões, enviando um telegrama

a Carrilho Videira.

10 de Junho 1880 – Os republicanos assumem a organização das comemorações do Tricen-

tenário da morte de Camões, com a realização de um sarau no Palácio de Cristal do Porto.

Em Coimbra, após a tomada de conhecimento da decisão do Parlamento em considerar festa

nacional o dia l0 de Junho, reuniu o corpo docente da Universidade e a Academia, delibe-

rando associar-se à celebração do tricentenário de Camões

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advento da república em datas 277

21 de Junho 1880 – Publica-se no Porto, o 1º número do semanário republicano “Revista

do Norte”.

4 de Julho 1880 – Inicia publicação no Porto o semanário republicano “O Estado do Norte”.

4 de Julho 1880 – Banquete no Bairro Camões, presidido por Manuel de Arriaga e ofere-

cido à Câmara Municipal e Comissão Executiva das Festas Camoneanas.

7 de Julho 1880 – Nasce no Funchal Carlos Olavo.

12 de Julho 1880 – Inicia publicação no Porto o semanário “O Republicano”.

30 de Julho 1880 – Sai em Lisboa o primeiro número da revista mensal, cientifi ca e literária

“Era Nova”.

2 de Agosto 1880 – Sai no Porto o primeiro número do jornal “A Justiça Portuguesa”.

27 de Agosto 1880 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do semanário satírico “Bar-

rete Frígio”.

3 de Setembro 1880 – Começa a publicar-se em Lisboa o semanário republicano “A

Liberdade”.

5 de Setembro 1880 – Realizam-se eleições suplementares para deputados tendo os candi-

datos apresentados pelo Partido Republicano em Lisboa obtido 2857 votos.

23 de Setembro 1880 – É fundado em Lisboa o Centro Republicano Federal Círculo nº 97.

26 de Setembro 1880 – Alguns republicanos fazem uma manifestação à esquadra francesa

ancorada ao largo de Lisboa.

23 de Outubro 1880 – Greve dos corticeiros de Lisboa.

23 de Outubro 1880 – Em Bruxelas surge o primeiro número do semanário comunista –

anarquista, “A Liberdade”.

15 de Dezembro 1880 – Publica-se, em Lisboa, o número programa do diário republicano

“O Século”.

1881

22 de Janeiro 1881 – Funda-se em Lisboa o Clube Republicano Henriques Nogueira.

4 de Fevereiro 1881 – Nasce João de Barros, na Figueira da Foz, poeta, jornalista e ministro

da Educação durante a República.

5 de Fevereiro 1881 – Manifestação de livres pensadores em Grândola, acompanhando ao

cemitério Felisbella das Dores Logrifa, que foi enterrada civilmente.

17 de Fevereiro 1881 – Recebe-se a notícia em Lisboa do falecimento, no Rio de Janeiro, de

José Augusto Martins, um dos fundadores do movimento republicano nos Açores e respon-

sável pelo jornal “A Republica Federal”, de Ponta Delgada.

19 de Fevereiro 1881 – Reunião da imprensa de Lisboa a convite do Grande Oriente Lusi-

tano Unido, para se resolver a forma de comemorar o Centenário do Marquês de Pombal.

20 de Fevereiro 1881 – Em consequência da propaganda feita pelo “Trinta” começa a agi-

tar-se a opinião pública, por constar que estava próxima a discussão do Tratado de Lourenço

Marques, e o Século, declarando tomar parte activa no protesto contra a aprovação do tra-

tado, anuncia a realização de um comício.

21 de Fevereiro 1881 – Resolve-se num comício efectuado na Covilhã, sob a presidência de

Tomás António Ribeiro, fundar uma associação anti-jesuítica.

3 de Março 1881 – Realiza-se uma reunião na redacção do jornal “O Século” em que se

deliberou realizar um comício contra o Tratado de Lourenço Marques.

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278 república e democracia

6 de Março 1881 – Inicia a publicação o semanário republicano “O Futuro de Portugal”.

6 de Março 1881 – Realiza-se o primeiro comício promovido pelo jornal “O Século”, no

Teatro D. Fernando, contra o Tratado de Lourenço Marques.

6 de Março 1881 – Realiza-se em Coimbra, promovido pela Associação Liberal de Coim-

bra, um comício que teve lugar na sala da Associação dos Artistas, também contra o Tratado

de Lourenço Marques.

8 de Março 1881 – A Câmara dos Deputados aprova em sessão secreta o Tratado de Lou-

renço Marques, o que redobra a agitação no país. Aproveitando o facto o jornal “O Século”

anuncia novo comício contra o Tratado a realizar no dia 13.

13 de Março 1881 – Comício republicano, promovido pelo jornal “O Século”, contra o Tra-

tado de Lourenço Marques, realizado na Rua de S. Bento em Lisboa. Os jornais republicanos

assinalam esta data como uma das mais importantes, devido à participação de cerca de 6000

pessoas que se manifestavam contra a assinatura do Tratado de Lourenço Marques.

13 de Março 1881 – Na mesma data realizaram-se também comícios em simultâneo em

Almada e no Teatro de S. Carlos, onde discursaram as principais fi guras do movimento

republicano e socialista da época.

14 de Março 1881 – Publica-se, no Porto, o número programa do jornal “O Norte

Republicano”.

20 de Março 1881 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “A Justiça”.

20 de Março 1881 – Assinala-se o primeiro registo civil de nascimento no Seixal.

27 de Março 1881 – Realiza-se um comício republicano, no Porto, de protesto contra o

Tratado de Lourenço Marques.

30 de Março 1881 – Assinala-se o primeiro registo civil de casamento em Odemira.

3 de Abril 1881 – Realiza-se um comício republicano em Setúbal, contra a assinatura do

Tratado de Lourenço Marques.

17 de Abril 1881 – Importante comício anti-jesuítico no Teatro de S. João, no Porto.

18 de Abril 1881 – Morre em Lisboa o livre pensador Joaquim Augusto Queiroz, fundador

de vários jornais e agremiações políticas. Foi um dos fundadores da Associação Promotora

do Registo Civil.

8 de Maio 1881 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “A

Marselhesa”.

8 de Maio 1881 – Inaugura-se na rua da Bela Vista, freguesia da Graça, o Centro Republi-

cano Club Borges Carneiro.

15 de Maio 1881 – Tentativa de inauguração do Centro Almadense Eleitoral Republicano,

em Cacilhas. Porém, a autoridade administrativa do concelho intimou para a dissolução

da assembleia o que provocou a publicação de um protesto que foi reproduzido por vários

jornais republicanos da época.

22 de Maio 1881 – Reunião na Póvoa de Varzim, em casa de João Ferreira Baptista, resol-

vendo-se fundar naquela vila (à época) o Centro Republicano Federal Povoense, e nome-

ando-se uma comissão para tratar da respectiva instalação.

23 de Maio 1881 – Publica-se no Porto o primeiro número do diário republicano “A Folha

Nova”, um dos jornais mais combativo na defesa do ideal de democracia, redigido por Emí-

dio de Oliveira.

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31 de Maio 1881 – É instalada em Lisboa a Suprema Câmara do Rito Simbólico, que se

havia formado a 27 de Maio.

19 de Junho 1881 – É inaugurado em Lisboa, no Largo de Santa Marinha, o Clube Passos

Manuel.

26 de Junho 1881 – É inaugurado no beco de S. Vicente, em Lisboa, o Clube Federal Vieira

da Silva.

28 de Junho 1881 – Constitui-se na Horta (ilha do Faial) o Centro Republicano Federal.

2 de Julho 1881 – Sai no Funchal o primeiro número do semanário republicano “O

Independente”.

3 de Julho 1881 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “A Scentelha”.

3 de Julho 1881 – É preso na cadeia do Limoeiro o poeta Gomes Leal, autor do “Hereje” e

do “Anti-Cristo”, por ter escrito a “Traição”.

3 de Julho 1881 – É inaugurado em Alcântara o Clube Razão e Justiça, sob a presidência de

Sebastião de Magalhães Lima.

5 de Julho 1881 -Reúnem-se vários centros republicanos para protestarem contra a prisão

do poeta Gomes Leal.

10 de Julho 1881 – Manifestações republicanas em Carrazeda de Ansiães, por ocasião da

feira mensal.

23 de Julho 1881 – Funda-se na cidade da Guarda o Centro Republicano Democrático.

31 de Julho 1881 – Inauguração do Centro Eleitoral Republicano Mouzinho da Silveira.

5 de Agosto 1881 – É instalado em Lisboa, na Rua das Farinhas, o Centro Eleitoral Repu-

blicano Gomes Leal.

7 de Agosto 1881 – Realizam-se comícios eleitorais republicanos nos seguintes pontos: em

Lisboa, onde se apresentava como candidato Manuel de Arriaga; no Porto, onde se apresen-

tava Alves da Veiga; em Setúbal, onde se apresentava Jacinto como candidato a deputado.

7 de Agosto 1881 – Funda-se em Aveiro o Clube Eleitoral Republicano Aveirense.

10 de Agosto 1881 – É julgado, por suposta falta de habilitações, o proprietário da Tipogra-

fi a onde era impresso “O Trinta”, sendo condenado a prisão remível e às custas, bem como

aos selos do processo. Nessa mesma data começava a ser apregoado pelas ruas de Lisboa o

novo periódico republicano “A Folha do Povo”, sucessora de “O Trinta”.

14 de Agosto 1881 – É inaugurado em Alhos Vedros um Centro Republicano.

16 de Agosto 1881 – Foi dissolvida por ordem administrativa a reunião eleitoral dos quatro

centros republicanos do círculo nº 94, que promoviam a candidatura de Teófi lo Braga, sendo

preso Augusto de Figueiredo que presidia à reunião.

18 de Agosto 1881 – Começa a publicar-se em Lisboa o jornal “O Sufrágio”, semanário

republicano.

18 de Agosto 1881 – Comício eleitoral realizado em Arroios (Lisboa) a fi m do candidato a

deputado republicano pelo círculo nº 95, Elias Garcia, apresentar o seu programa político.

20 de Agosto 1881 – Eleições gerais para deputados, obtendo as candidaturas republicanas

cerca de 8000 votos.

21 de Agosto 1881 – É eleito deputado republicano por Lisboa Elias Garcia.

27 de Agosto 1881 – Ernesto Fernandes Tomás e outros republicanos da Figueira da Foz

fundam um centro republicano com o título Fernandes Tomás, em homenagem ao seu

parente e conterrâneo, Manuel Fernandes Tomás.

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3 de Setembro 1881 – Manifestação democrática no cemitério dos Prazeres, em Lisboa, por

ocasião da trasladação dos restos mortais de Francisco Vieira da Silva.

8 de Setembro 1881 – No Terreiro do Trigo (Lisboa) funda-se uma associação republicana

com a denominação de Teófi lo Braga, mais tarde passa a denominar-se Associação Escolar e

Eleitoral Pinto Ribeiro, porque Teófi lo Braga não aceitou esta homenagem que os republi-

canos pretendiam fazer.

8 de Setembro 1881 – Comício republicano em Miragaia, No Porto, onde Manuel Emídio

Garcia apresenta o seu programa político, como candidato a deputado pelo círculo nº 40.

11 de Setembro 1881 – Realizam-se as eleições de desempate, em que os quatro candidatos

a deputados pelo Partido Republicano obtiveram a seguinte votação: Círculo nº 39 – Alves

da Veiga – 995 votos; Círculo nº 40 – Emídio Garcia – 870 votos; Círculo nº 90 – Teófi lo

Braga – 1105 votos; Círculo nº 98 – Magalhães Lima – 940 votos.

2 de Outubro 1881 – Começa a publicar-se em Lisboa o semanário republicano “O Noventa

e Três”, dirigido por Augusto de Figueiredo.

3 de Outubro 1881 – Publica-se em Ponta Delgada o primeiro número do jornal “Ventosa

Sarjada”.

13 de Outubro 1881 – Imponente manifestação de republicanos e livres-pensadores durante

o funeral do comerciante José Alves Bebiano, conhecido republicano federal.

22 de Outubro 1881 – Morre em Viseu o jornalista João da Silva Mendes.

23 de Outubro 1881 – Inaugura-se em Alhandra o Centro Eleitoral Alhandrense.

24 de Outubro 1881 – Morre em Coimbra o general José Maria de Pina, que tomou parte,

desde 1833 a 1847, nas campanhas pela implantação e consolidação do liberalismo em

Portugal.

24 de Outubro 1881 – Inaugura-se, em Lisboa, o Clube Anselmo Xavier, na Rua do

Recolhimento.

26 de Outubro 1881 – Inaugurou-se em Grândola o Centro Eleitoral Republicano.

9 de Novembro 1881 – Pede a exoneração de Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano

Unido o Conde de Paraty, que exercia o cargo desde Outubro de 1869, assumindo como

Grão-Mestre o general Miguel Baptista Maciel.

22 de Dezembro 1881 – Publica-se, na Póvoa de Varzim, o primeiro número do semanário

republicano “A Independência”.

1882

13 de Janeiro 1882 – Morre o poeta operário Xavier de Paiva, cujo enterro se realizou

civilmente.

2 de Fevereiro 1882 – Publica-se em Tomar o primeiro número do semanário republicano

“A Emancipação”.

3 de Fevereiro 1882 – A Academia de Coimbra resolve, para comemorar o Centenário do

Marquês de Pombal, pedir o estabelecimento da liberdade de ensino, a substituição da facul-

dade de Teologia por uma de Letras, e a celebração das festas religiosas, independentemente,

do corpo docente que manda dizer missas.

9 de Fevereiro 1882 – Realiza-se o primeiro Registo Civil em Lagos.

16 de Fevereiro 1882 – Morre o operário João da Cruz, um dos fundadores do Clube Razão

e Justiça, de Alcântara (Lisboa).

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23 de Fevereiro 1882 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “O

Estandarte Republicano”.

27 de Fevereiro 1882 – Comemorações do 80º aniversário de Victor Hugo no Clube Hen-

riques Nogueira e no Centro Eleitoral Republicano Federal.

4 de Março 1882 – Realiza-se o 1º enterro civil em Luanda (Angola), quando faleceu o

tenente-coronel José Cândido Laforte, comandante do Batalhão nº 3 do exército da África

Ocidental.

5 de Março 1882 – Publica-se, em Lisboa, o primeiro número do jornal socialista “Protesto

Operário”.

12 de Março 1882 – Comício promovido pelo jornal “O Século” e realizado no Teatro Cha-

let, contra as medidas fi nanceiras.

12 de Março 1882 – Consiglieri Pedroso realiza uma conferência na Sociedade de Geogra-

fi a, a propósito do Centenário do Marquês de Pombal, por iniciativa da comissão académica.

15 de Março 1882 – A comissão eleita durante o comício realizado no dia 12 desse mês,

entregou no Parlamento uma representação escrita por Jacinto Nunes e publicada pelos jor-

nais republicanos no dia 16.

19 de Março 1882 – Inaugura-se, na freguesia de Santa Isabel em Lisboa, o Clube Gomes

Freire de Andrade.

25 de Março 1882 – Inaugura-se em Lordelo do Ouro (Porto) o Clube Democrático de

Instrução Guilherme Braga.

27 de Março 1882 – Funda-se em Aldeia Galega (Montijo), um Centro Republicano.

31 de Março 1882 – Inicia-se a subscrição para criar o Instituto de Ensino Livre Marquês

de Pombal.

7 de Abril 1882 – Morre em Paris o ilustre publicista Guilherme de Azevedo, cujo funeral

se realiza civilmente.

27 de Abril 1882 – A Maçonaria Portuguesa consegue fazer publicar a lei, aprovada no

Parlamento, que mandava erigir um monumento ao Marquês de Pombal, com a concessão

do bronze necessário.

7 e 8 de Maio 1882 – A iniciativa de homenagear o Marquês de Pombal no 1.º centenário

da sua morte terá partido de um grupo de estudantes de Lisboa à qual se associaram anti-

clericais, republicanos e mações. A base de apoio destas festividades foi menor que a do tri-

centenário camoniano, tendo as celebrações seguido o mesmo modelo. Em Coimbra a ideia

partiu de um docente positivista, Correia Barata.

7 de Maio 1882 – Realiza-se no Porto uma manifestação de homenagem ao Marquês de

Pombal. Em Coimbra realizou-se um comício anti-jesuítico no Teatro Académico, onde se

pedia aos poderes públicos o cumprimento severo da lei de 3 de Setembro de 1759 (decreto

de expulsão dos Jesuítas de Portugal) e do decreto de 28 de Maio de 1834 (decreto que

declara a extinção de todas as ordens religiosas).

8 de Maio 1882 – Realiza-se um grande cortejo cívico em Lisboa, por ocasião do Centená-

rio da Morte do Marquês de Pombal. No Porto realizam-se manifestações contra o jornal “A

Palavra”, provocadas pelo suplemento que muitos consideraram agressivo para a memória

do estadista português. Ainda em Coimbra, António Cândido, elemento de destaque da

Igreja, realiza na Sala dos Capelos da Universidade de Coimbra, o elogio da mesma perso-

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282 república e democracia

nalidade. Por seu lado, em Lisboa, lançava-se a primeira pedra para a construção do monu-

mento a Sebastião José de Carvalho e Melo, ao cimo da Avenida da Liberdade.

8 de Maio 1882 – Funda-se em Lagos o Centro Eleitoral Democrático Lacobrigense, presi-

dido por José António Bourquin Brak-Lamy.

8 de Maio 1882 – Começa a publicar-se em Lisboa o semanário democrático “A Época”.

18 de Maio 1882 – Fundação das Escolas Móveis pelo Método João de Deus, organização

muito acarinhada pelo Partido Republicano.

28 de Maio 1882 – Realiza-se um comício académico em Lisboa, para protestar contra o

procedimento do governador civil. Este protesto foi posteriormente enviado, sob a forma de

requerimento, ao Parlamento.

10 de Junho 1882 – Manuel de Arriaga redige o Projecto de Organização Defi nitiva do

Partido Republicano.

20 de Junho 1882 – São julgados e condenados em 10 dias de prisão, custas e selos José

da Cunha Castelo Branco Saraiva, João Rodrigues dos Santos, Eduardo Nunes da Mota e

Vitorino Proença, acusados de exercerem cargos na Associação Escolar Fernandes Tomás.

25 de Junho 1882 – Comício contra o sindicato Salamanca.

2 de Julho 1882 – Realizam-se comícios em Lisboa, Almada e Coimbra contra o Sindicato

da Salamancada.

2 de Julho 1882 – Realiza-se no Hotel Tejo, em Lisboa, um banquete republicano com 120

talheres, em homenagem aos quatro membros do Clube Fernandes Tomás que tinham sido

condenados a prisão por fazerem parte dos corpos gerentes daquela agremiação.

9 de Julho 1882 – Realiza-se um comício em Aveiro contra o Sindicato da Salamancada.

19 de Agosto 1882 – Sai em Viseu o primeiro número do semanário republicano “Ideia Nova”.

24 de Agosto 1882 – É inaugurado no porto, por iniciativa de F. M. de Sousa Brandão, o

Clube Comercial Democrático.

25 de Agosto 1882 – Reunião dos eleitores republicanos do círculo nº 98, em uma das salas

da redacção do Século, para resolverem a apresentação da candidatura de Magalhães Lima

nas eleições suplementares.

1 de Setembro 1882 – Publica-se em Lisboa o primeiro número do semanário republicano

“O Raio”.

13 de Outubro 1882 – Cria-se a Associação de Jornalistas e Homens de Letras do Porto.

28 de Novembro 1882 – Inicia publicação, em Lisboa, o semanário republicano “Trinta

Diabos e Cª”.

28 de Novembro 1882 – Publica-se na Guarda o primeiro número do semanário republi-

cano “O Povo Português”.

3 de Dezembro 1882 – É realizado um comício republicano em Lisboa, num recinto da

Rua de S. Bento, onde compareceram cerca de 7000 cidadãos (números da imprensa repu-

blicana), para tratar das questões do Congo e da Nunciatura, sendo intimada a mesa pelas

autoridades para não se realizar o comício, que se dissolveu em boa ordem.

3 de Dezembro 1882 – Publica-se na Horta (ilha do Faial) o número um do semanário

republicano “O Raio”.

24 de Dezembro 1882 – É realizado um banquete republicano presidido por Oliveira Mar-

reca, para comemorar a eleição do deputado Manuel de Arriaga e aí é resolvida a organização

defi nitiva do Partido Republicano, sendo aclamada uma comissão para o efeito.

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26 de Dezembro 1882 – É realizada a primeira reunião no Clube Henriques Nogueira, da

comissão aclamada no jantar do dia 24, para tratar da organização do Partido Republicano.

1883

1883 – Um grupo de republicanos liderados por José Falcão e Augusto Rocha, por divergên-

cias internas, entrou em dissidência com o Centro Republicano no Democrático de Coim-

bra e fundou o Centro Eleitoral Republicano Leonel Tavares.

1 de Janeiro 1883 – Saiu o 1.º n.º do jornal “A Ofi cina”, dirigido por Pedro Cardoso,

extinguindo-se após os acontecimentos do 31 de Janeiro no Porto.

9 de Janeiro 1883 – Morre em Lisboa, Augusto César de Oliveira, um dos fundadores do

Clube Gomes Freire de Andrade.

10 de Janeiro 1883 – Manuel de Arriaga toma assento no Parlamento como deputado eleito

pelo Partido Republicano.

9 de Fevereiro 1883 – É publicado em Luanda o primeiro número do semanário republi-

cano “O Farol do Povo”.

12 de Fevereiro 1883 – Instala-se em Évora, em casa de Bernardo de Matos, o Centro Elei-

toral Democrático Eborense.

1 de Março 1883 – Começa a publicar-se, em Vila Nova de Ourém, o jornal republicano

“O Ouriense”.

18 de Março 1883 – Sai na Régua o primeiro número do semanário republicano “O Grito

do Douro”.

22 de Abril 1883 – Sai em Lisboa o primeiro número do semanário republicano “O Man-

darim Júnior”.

23 de Abril 1883 – Sai em Lisboa o número programa do semanário republicano “O Defen-

sor do Povo”.

15 de Maio 1883 – Começa a publicar-se em Aveiro o tri-semanário republicano “A

Locomotiva”.

7 de Julho 1883 – Morre em Lisboa, Canuto Félix António Moreira, um dos fundadores da

Associação Escolar Fernandes Tomás e, ainda que anonimamente, um dos homens a quem

o Partido Republicano deve a realização de importantes serviços.

2 de Setembro 1883 – Inaugura-se, na Rua dos Cardais de Jesus, o Clube José Estêvão.

10 de Setembro 1883 – Sai em Ponta Delgada o primeiro número do semanário republi-

cano “O Raio”.

24 de Outubro 1883 – Inicia publicação no Funchal o semanário “República”.

28 de Outubro 1883 – Comício republicano para apresentação da lista dos candidatos aos

cargos municipais, realizado no Chalet do Rato (Lisboa).

4 de Novembro 1883 – Morre em Lisboa João José Baptista, editor de várias obras de pro-

paganda democrática.

1 de Dezembro 1883 – É inaugurado em Barcelos o Clube Democrático Barcelense.

3 de Dezembro 1883 – Inaugura-se, no Porto, na freguesia de Santo Ildefonso, o Clube

Eleitoral Republicano Soberania Popular.

4 de Dezembro 1883 – Publica-se no Porto, o primeiro número do semanário socialista “O

Combatente”.

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284 república e democracia

1884

23 de Janeiro 1884 – O Centro Eleitoral Republicano Leonel Tavares reintegrou o Centro

Republicano de Coimbra.

16 de Março 1884 – Inauguração do Centro Escolar e Eleitoral Democrático de Cacilhas.

30 de Março 1884 – Manifestação em Lisboa por ocasião da trasladação dos restos mortais

de José Fontana para o monumento que a Associação dos Trabalhadores, por subscrição

pública, mandou erigir.

8 de Abril 1884 – Sai em Celorico de Basto o primeiro número do semanário republicano

“O Minho Democrático”.

13 de Abril 1884 – Realiza-se um comício republicano no Chalet do Rato, para protestar

contra o projecto da Reforma Penal, a denominada “Lei das Rolhas”.

17 de Abril 1884 – Realiza-se o primeiro registo civil de nascimento em Castelo Branco.

11 de Maio 1884 – Realiza-se no Chalet do Rato, em Lisboa, um comício contra a assina-

tura do Tratado do Zaire.

12 de Maio 1884 – A Associação Liberal Portuense protesta contra o pedido da Associação

Católica de Lisboa, em que esta pedia o restabelecimento das ordens religiosas.

22 de Maio 1884 – Funda-se o Centro Republicano Federal Povoense.

Maio 1884 – José Falcão publicou em Coimbra a 1.ª edição da Cartilha do Povo.

29 de Junho 1884 – Eleições para deputados sendo eleitos por Lisboa e pela minoria Elias

Garcia e Consiglieri Pedroso.

29 de Junho 1884 – Na Madeira é fuzilado o povo para conseguirem derrotar os candidatos

republicanos. Os partidos monárquicos combinados praticam as maiores infâmias em todas

as assembleias eleitorais.

22 de Agosto 1884 – Realizam-se manifestações de protesto contra a proibição do cortejo

de homenagem a Manuel Fernandes Tomás.

24 de Agosto 1884 – Imponente manifestação realizada no cemitério ocidental de Lis-

boa para homenagear a memória do patriota e lutador pela liberdade Manuel Fernandes

Tomás. Esta manifestação representava também um protesto importante contra a realeza e o

Governo que tinham proibido o cortejo cívico que estava previsto.

24 de Outubro 1884 – Pede a exoneração de Grão-Mestre pró-interino o general Miguel

Batista Maciel.

26 de Outubro 1884 – Morre no Porto o poeta e livre-pensador Ernesto Pires.

7 de Novembro 1884 – É eleito Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano Unido o repu-

blicano e democrata José Elias Garcia.

1885

31 de Maio 1885 – Realiza-se, no Porto, um cortejo cívico em honra de Victor Hugo.

2 de Julho 1885 – Fundação, em Lisboa, da Associação do Livre Pensamento.

11 de Julho 1885 – Augusto Fuschini apresenta no Parlamento um projecto de lei sobre o

trabalho dos menores.

15 de Julho 1885 – É criada em Lisboa a Associação Propagadora do Livre Pensamento.

Esta associação publicou a revista mensal “Livre Exame”.

27 de Agosto 1885 – Morre o liberal Francisco de Mello Baracho, que se bateu na ilha Ter-

ceira e no Porto pela implantação do regime liberal.

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advento da república em datas 285

1 de Setembro 1885 – Inaugura-se em Tavira um Centro Republicano de que foi presidente

o médico Francisco Emiliano Parreira.

1 de Setembro 1885 – Teixeira Bastos, escritor e jornalista, dirige uma carta à Associação do

Livre Pensamento agradecendo as felicitações pelo seu casamento civil.

28 de Outubro 1885 – Morre o propagandista Francisco Ferreira da Costa.

1886

30 de Janeiro 1886 – Publica-se na cidade do Porto o primeiro número do semanário “O

Estandarte Vermelho”.

1 de Fevereiro 1886 – A Associação Anti-Jesuítica resolve convidar o jornal “A Ideia Nova”,

de Barcelos, a realizar um comício para exigir às Cortes a execução das leis do país acerca das

congregações religiosas.

11 de Fevereiro 1886 – Morre em Lisboa e é enterrado civilmente o poeta operário Dionísio

Sampaio.

13 de Abril 1886 – Realiza-se o primeiro registo civil em Montemor-o-Novo.

3 de Maio 1886 – É colocada à venda a primeira edição do poema de Gomes Leal, “O

Anti-Cristo”.

3 de Maio 1886 – Pelo Grande Oriente Lusitano Unido são decretados uma nova Consti-

tuição e um novo Regulamento Geral da Ordem.

7 de Junho 1886 – Manuel de Arriaga, então vereador da Câmara Municipal de Lisboa,

propõe a supressão da Guarda Municipal.

20 de Setembro 1886 – Morre o general Gilberto Rola, um dos mais antigos republicanos

portugueses. O seu funeral decorreu civilmente.

1 de Outubro 1886 – Começa a publicar-se em Lisboa o primeiro volume da Biblioteca de

Propaganda Democrática, da qual saíram quatro volumes, dirigida por Zófi mo Consiglieri

Pedroso.

5 de Novembro 1886 – Funda-se em Lisboa o Clube Republicano Gilberto Rola, em home-

nagem ao militar, republicano e livre-pensador do mesmo nome.

7 de Novembro 1886 – Realiza-se no Clube Republicano do Calvário um sarau anti-jesuítico.

13 de Novembro 1886 – “O Século” publica uma lista de todas propriedades dos Jesuítas,

em Lisboa, que eram conhecidas.

21 de Novembro 1886 – Realiza-se uma conferência anti-jesuítica, por Gomes da Silva, no

Club Borges Carneiro.

1887

1 de Janeiro 1887 – Saiu o 1.º n.º do jornal republicano “Gazeta de Coimbra”.

Janeiro 1887 – António Augusto Gonçalves e Abílio Roque de Sá Barreto foram eleitos

vereadores da câmara de Coimbra pela minoria republicana.

18 de Março 1887 – Morre a menina Maria da Graça Braga, fi lha de Teófi lo Braga, cujo

funeral decorreu civilmente.

5 de Abril 1887 – Começa a publicar-se na cidade de Tavira o semanário “O Combate”,

dirigido por Roque Féria.

18 de Junho 1887 – Reúne-se nas salas do Clube Henriques Nogueira o Congresso Repu-

blicano Português, elegendo-se o Directório do partido.

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22 de Agosto 1887 – Morre o paladino da democracia João Rodrigues Vieira.

4 de Setembro 1887 – Morre António Augusto de Aguiar.

5 de Outubro 1887 – Morre o livre-pensador José Narciso Barbosa.

30 de Outubro 1887 – Morre, em Sacavém, José Joaquim Miranda, tesoureiro da Associa-

ção Escolar 24 de Agosto de 1820.

1888

11 de Fevereiro 1888 – Sai o jornal republicano “A Lucta”, publicado no Funchal, órgão do

Partido Republicano da Madeira.

16 de Abril 1888 – Morre em Lisboa, vitima da tuberculose o jornalista João Monteiro.

22 de Abril 1888 – Morre o Trigueiros de Martel, um dos fundadores do jornal “O Século”,

cujo funeral se realizou civilmente.

21 de Maio 1888 – Morre o incansável propagandista João Baptista Correia.

22 de Maio 1888 – Morre em Lisboa Trigueiros de Martel, um dos sócios fundadores do

jornal republicano “O Século” e antigo membro do Directório.

10 de Setembro 1888 – Morre na ilha da Madeira o maçon Manuel Joaquim Nunes. O seu

funeral realiza-se civilmente.

26 de Setembro 1888 – Morre o ilustre republicano Filipe João Salgado.

14 de Outubro 1888 – A Sociedade Voz do Operário inaugura a sua biblioteca.

20 de Outubro 1888 – Morre Júlio Cardoso, tesoureiro do Clube Vieira da Silva, de Lisboa.

29 de Outubro 1888 – Morre, em Lisboa, vitimado pela tuberculose Carlos Augusto Rami-

res, sócio fundador do Clube Vieira da Silva.

1889

11 de Fevereiro 1889 – Regista-se no Porto uma pequena tentativa de revolta republicana.

20 de Março 1889 – Morre em Lisboa o venerando chefe republicano António de Oliveira

Marreca.

20 de Abril 1889 – Morre em Olhão um dos grandes combatentes do Partido Republicano

no Algarve. Roque Féria. Espanhol, estabelecido na região de Tavira e mais tarde Olhão,

fundou e colaborou em diversos jornais republicanos, tanto regionais como nacionais.

24 de Junho 1889 – A Maçonaria celebra solenemente o aniversário do Asilo de S. João.

14 de Julho 1889 – Terminam, no Páteo do Salema (Lisboa), as festas comemorativas do 1º

Centenário da Tomada da Bastilha.

15 de Julho 1889 – Realiza-se em Paris o Congresso Internacional Socialista onde os socia-

listas portugueses estão representados por Viterbo de Campos e Luís de Figueiredo.

26 de Julho 1889 – No Centro Fraternidade Republicana, no Pátio do Salema, Elias Garcia

realiza uma conferência sobre a Revolução Francesa, cujo centenário aquele centro comemo-

rara com grandiosas festas que duraram desde 5 de Maio até 14 de Julho.

11 de Agosto 1889 – Festas maçónicas em Aveiro. Descobre-se a lápide comemorativa na

casa onde nasceu o Grão-Mestre José Estevão Coelho de Magalhães. Realizam-se banquetes,

saraus e cortejo cívico.

12 de Agosto 1889 – É inaugurada a estátua de homenagem ao grande orador parlamentar

José Estevão Coelho de Magalhães, Grão-Mestre da Maçonaria Portuguesa e fundador do

Asilo de S. João.

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15 de Agosto 1889 – A maçonaria promove, com auxílio das agremiações republicanas, um

cortejo cívico ao Largo das Cortes, onde deposita uma coroa de bronze na estátua de José

Estevão Coelho de Magalhães.

8 de Setembro 1889 – Encerra-se a exposição da Caixa Económica Operária de Lisboa.

11 de Outubro 1889 – Morre em Viseu o poeta, livre-pensador e engenheiro civil Alexan-

dre da Conceição. O seu funeral realiza-se civilmente. Era natural de Ílhavo.

10 de Novembro 1889 – Funda-se a Associação dos Carpinteiros Civis, de Lisboa.

13 de Novembro 1889 – Enterro civil de António Teixeira Penha, livreiro. A Banda Filar-

mónica 24 de Agosto acompanha-o ao cemitério dos Prazeres tocando A Portuguesa, por

esse ser o desejo do fi nado.

18 e 19 de Novembro 1889 – Reuniu o 8.º Congresso do Partido Republicano Português

em Coimbra tendo-se procedido à eleição do novo Directório.

1890

11 de Janeiro 1890 – Ultimato do governo britânico, exigindo a retirada das forças militares

existentes no território compreendido entre as colónias de Moçambique e Angola, no actual

Zimbabwe, com o pretexto dum incidente provocado entre os portugueses e os Macololos.

14 de Janeiro 1890 – Nomeação de novo governo, após o Ultimato britânico presidido por

António Serpa Pimentel. Este governo dissolve a câmara municipal de Lisboa, presidida pelo

progressista Fernando Palha.

26 de Janeiro 1890 – Organização da Liga Patriótica do Norte, reunindo estudantes das esco-

las superiores do Porto, jornalistas republicamos e alguns elementos do Partido Progressista.

6 de Fevereiro 1890 – Antero de Quental chega ao Porto para assumir a presidência da Liga

Patriótica do Norte.

11 de Fevereiro 1890 – Comício republicano na Rua da Palma, em Lisboa, no Largo de

Martim Moniz. A manifestação é dissolvida pela Guarda Municipal.

11 de Fevereiro 1890 – Por levantarem vivas à liberdade e à Pátria são presos no Rossio,

e pouco depois metidos no porão do navio Vasco da Gama, Manuel de Arriaga e Jacinto

Nunes.

24 de Fevereiro 1890 – A autoridade afi xa editais proibindo a realização do cortejo cívico

promovido pela Maçonaria em honra de Camões e de Vasco da Gama.

2 de Março 1890 – O governo proíbe um cortejo cívico aos Jerónimos, promovido por

Higino de Sousa e por outros elementos ligados ao jornal “Pátria”, para deporem ramos

sobre as urnas de Camões e de Vasco da Gama.

23 de Março 1890 – António José de Almeida, estudante universitário em Coimbra, publica

o artigo “Bragança, o último”, que será considerado calunioso para o rei e o levará à prisão.

23 de Março 1890 – Publica-se em Coimbra o primeiro número do jornal “Ultimatum”,

órgão dos estudantes revolucionários.

29 de Março 1890 – Promulgação do decreto sobre o direito de associação.

30 de Março 1890 – Eleições legislativas, com ocorrência de violentos recontros que provo-

caram 10 mortos e mais de 40 feridos. São eleitos 3 deputados republicanos (Elias Garcia,

Latino Coelho e Manuel de Arriaga), todos por Lisboa.

7 de Abril 1890 – Nova Lei de Imprensa, conhecida pela «Lei das rolhas», promovida pelo

ministro da justiça Lopo Vaz.

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288 república e democracia

10 de Abril 1890 – António de Serpa Pimentel, então presidente do Conselho, dissolve os

centros republicanos.

10 de Abril 1890 – É colocado à venda o livro “Finis Patriae” de Guerra Junqueiro, onde a

fi gura do rei é ridicularizada.

21 de Abril 1890 – Os republicanos de Tete protestam energicamente contra a afronta do

ultimatum, obrigando o governador militar a decretar o estado de sítio e o cônsul inglês a

refugiar-se em casa de um súbdito italiano.

26 de Abril 1890 – Morre o socialista António Lúcio Fazenda.

27 de Abril 1890 – Os jornais noticiam a transferência dos corpos da guarnição de Lisboa,

conhecidos pelas suas ideias contrárias à política governamental.

1 de Maio 1890 – Assinalam-se pela primeira vez em Portugal as comemorações do 1º de

Maio.

4 de Maio 1890 – Realiza-se em Lisboa um comício operário na Rua Nova da Piedade, onde

se fala de Karl Marx.

6 de Maio 1890 – Realiza-se o primeiro casamento civil em Tomar.

28 de Maio 1890 – Em Coimbra, realiza-se uma manifestação anti-clerical em homenagem

a Joaquim António de Aguiar.

28 de Maio 1890 – Por iniciativa de Martins de Carvalho realizou-se, junto ao tumulo de

Joaquim António de Aguiar, uma manifestação em honra deste estadista e da sua legislação

anticlerical.

8 de Junho 1890 – Comícios em Lisboa e Setúbal com o fi m de protestar contra o aumento

de impostos.

26 de Junho 1890 – O deputado republicano Bernardino Pereira Pinheiro, apresenta um

projecto de lei para a criação de escolas móveis distritais pelo método de João de Deus.

30 de Agosto 1890 – Publicação do Tratado de Londres no “Diário do Governo”, assinado

entre Portugal e a Grã-Bretanha e que defi nia os limites territoriais de Angola e Moçambique.

20 de Agosto 1890 – O Tratado de Londres é assinado entre Portugal e a Grã-Bretanha,

defi nindo os limites territoriais de Angola e Moçambique.

15 de Setembro 1890 – Funda-se a Associação de Classe dos Chapeleiros, de Lisboa.

20, 21, 22, 23 e 24 Setembro 1890 – Manifestações em Lisboa reprimidas por ordem do

governador civil Paço d’Arcos. As sessões das Câmaras são suspensas por falta de quórum.

25 de Setembro 1890 – Realiza-se, em Coimbra, uma manifestação a António José de

Almeida por ocasião da sua saída da prisão, após cumprir três meses de clausura por ter

publicado no jornal “Ultimatum” um artigo intitulado “D. Carlos, o último”

28 de Setembro 1890 – Publica-se em Lamego, o primeiro número de “A Revolução”.

14 de Outubro 1890 – Um governo extra-partidário presidido por João Crisóstomo é

nomeado após 28 dias de crise governamental. O governo será apoiado pela Liga Liberal.

19 de Outubro 1890 – Funeral do propagandista e fundador do Centro Democrático, José

Maria Chaves.

1891

5, 6 e 7 de Janeiro 1891 – Congresso do Partido Republicano Português, no Porto. É apro-

vado um novo programa para o partido.

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11 de Janeiro 1891 – Publicação de um Manifesto – Programa do Partido Republicano

Português.

26 de Janeiro 1891 – João Chagas é condenado a 10 dias de prisão pelos seus artigos publi-

cados na imprensa sobre o Ultimato.

31 de Janeiro 1891 – Revolta republicana na cidade do Porto, que instaura o regime repu-

blicano por breves horas.

31 de Janeiro 1891 – Nasce em S. Vicente de Cabo Verde, Luís de Montalvor, poeta e

editor.

4 de Fevereiro 1891 – Entra na cadeia da relação do Porto o capitão Leitão, um dos princi-

pais implicados no movimento do 31 de Janeiro.

5 de Fevereiro 1891 – As Câmaras reabrem para votarem as bases do monopólio do tabaco e

um empréstimo de 10 milhões de libras. O Conde de Burnay emprestará 3 milhões de libras,

com a condição de lhe ser concedido o monopólio do tabaco.

8 de Fevereiro 1891 – Sai da cadeia da relação do Porto, Gonçalves Cruz, redactor do jornal

“O 31 de Janeiro”, que tinha sido condenado a seis meses de prisão por suposto abuso de

liberdade de imprensa.

20 de Fevereiro 1891 – Realiza-se o julgamento dos jornalistas republicanos Heliodoro

Salgado e Alves Correia. Foram condenados a seis meses de prisão, 500$000 réis de multa e

ao pagamento das custas do processo.

20 de Fevereiro 1891 – Promulgação de uma Portaria que restringiu a liberdade de reunião

e associação, em nome da manutenção da paz social.

21 de Março 1891 – O Abade João Pais Pinto, João Chagas e Francisco Homem Cristo, que

se encontravam presos a bordo do navio Moçambique, por terem sido implicados na revolta

do Porto, protestam contra o facto de estarem depois de julgados, muitos dias esperando que

o tribunal leia a sentença.

1 de Abril 1891 – Adiamento da reunião do parlamento. O governo anuncia que passará a

governar em ditadura.

15 de Abril 1891 – O Tribunal da Relação confi rma a pena de 6 meses de prisão, por delito

de imprensa, em que foi condenado Heliodoro Salgado.

21 de Abril 1891 – Morre em Lisboa, sendo sepultado civilmente, José Elias Garcia.

23 de Abril 1891 – São condenados cinco soldados da guarda fi scal do Porto, acusados de

tomarem parte activa na revolta militar daqueles ano.

24 de Abril 1891 – Partida para o degredo dos principais envolvidos na revolta de 31 de

Janeiro.

28 de Abril 1891 – Julgamento de 20 presos implicados na revolta de 31 de Janeiro, que

haviam recolhido aos hospitais.

7 de Maio 1891 – Bancarrota do Estado português. É suspensa por 90 dias a convertibi-

lidade das notas de banco, o que provoca uma desvalorização do papel-moeda em cerca de

10%

7 de Maio 1891 – O exército é colocado em estado de prevenção.

9 de Maio 1891 – As associações operárias são autorizadas, desde que os seus fi ns fossem

exclusivamente profi ssionais.

4 de Junho 1891 – Iniciava a sua publicação o jornal “O Alarme”, bissemanário republicano

da classe operária.

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290 república e democracia

10 de Junho 1891 – Congresso do Partido Socialista Português, em Coimbra.

15 de Junho 1891 – Aparece o Manifesto dos Emigrados da revolução de 31 de Janeiro,

redigido por Sampaio Bruno.

18 de Junho 1891 – O Grémio Lusitano celebra as exéquias solenes pela morte do Grão-

-Mestre da Maçonaria, José Elias Garcia.

23 e 25 de Junho 1891 – Aires de Gouveia, na Câmara dos Pares, critica a perseguição aos

republicanos, considerando-os uma pequena minoria.

2 de Agosto 1891 – O relatório dos médicos que examinaram Sara de Matos, confi rma

que a jovem noviça do Convento das Trinas, fora violada e envenenada, facto que foi muito

difundido pela imprensa republicana e pelos grupos anticlericais.

4 de Agosto 1891 – Começa a cumprir a sentença de cadeia a que tinha sido condenado, o

jornalista republicano Heliodoro Salgado. Tinha sido condenado a seis meses de prisão por

delito de liberdade de imprensa.

20 de Agosto 1891 – É suprimido o jornal “A Revolução de Janeiro”.

29 de Agosto 1891 – Morre em Sintra o general e líder republicano José Maria Latino Coe-

lho, um dos importantes escritores portugueses do século XIX.

5 de Setembro 1891 – Realiza-se na Caixa Económica Operária, de Lisboa, o Congresso

Sindical Cooperativista, com doze sessões.

6 de Setembro 1891 – A Sociedade Voz do Operário instala-se na Calçada de S. Vicente,

em Lisboa.

11 de Setembro 1891 – Suicídio de Antero de Quental, poeta, membro da Sociedade do

Raio (Coimbra), dirigente da Liga Patriótica do Norte e fundador do Partido Socialista

Português.

1 de Outubro 1891 – Começa a publicar-se em Lisboa o jornal “Ideia Nova”, de cariz

republicano.

11 de Outubro 1891 – Inauguração, em Lisboa, da primeira escola fundada pela Sociedade

Voz do Operário.

Outubro 1891 – Domitilia Hormizinda Miranda de Carvalho torna-se a primeira mulher

a inscrever-se na Universidade de Coimbra. Médica e professora do Liceu Maria Amélia Vaz

de Carvalho será eleita em 1935 e em 1938 deputada à Assembleia Nacional nas listas da

União Nacional.

2 de Novembro 1891 – É processado um artigo publicado pelo livre-pensador, socialista e

mais tarde republicano Heliodoro Salgado.

Dezembro 1891 – Publicou-se em Coimbra o 1.º fascículo da revista Azagaia, assinada por

estudantes republicanos.

1892

15 de Janeiro 1892 – O presidente do conselho João Crisóstomo confi rma que o ministro

da fazenda Mariano de Carvalho fez adiantamentos à Companhia Real dos Caminhos de

Ferro sem conhecimento do governo.

29 de Janeiro 1892 – D. Carlos cede 20% da sua dotação para diminuir o défi ce.

4 de Fevereiro 1892 – Sai do Limoeiro, onde cumpriu a pena de seis meses de prisão, o jor-

nalista, escritor e propagandista do livre pensamento, Heliodoro Salgado, autor de diversas

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advento da república em datas 291

obras, entre elas o “Culto da Imaculada Conceição” e a tradução da obra de Malvert, “Ciência

e Religião”.

7 de Fevereiro 1892 – Sai da cadeia do Limoeiro, depois de ter cumprido três meses de

prisão, por suposto crime de liberdade de imprensa, João de Menezes.

5 de Abril 1892 – Morre em Lisboa o livre pensador António Augusto de Macedo.

8 de Maio 1892 – Trasladação dos restos mortais do poeta Xavier de Paiva.

26 de Maio 1892 – Morre o propagandista Francisco Maria de Sousa Brandão.

27 de Junho 1892 – Heliodoro Salgado é condenado no Porto por abuso de liberdade de

imprensa, a três meses de cadeia e a 250$000 réis de multa.

29 de Junho 1892 – Imponente manifestação ao poeta livre-pensador Xavier de Paiva, por

ocasião da trasladação dos seus restos mortais do cemitério oriental para o ocidental.

26 de Julho 1892 – Morre o major Adelino da Cruz, colaborador dos jornais republicanos

“Batalha” e “Voz Pública” do Porto.

21 de Julho 1892 – Começou a sua publicação o bissemanário republicano O Defensor do

Povo.

22 de Julho 1892 – D. Carlos visita Coimbra ofi cialmente.

11 de Setembro 1892 – Morre em Lisboa o benemérito médico Castelo Branco Saraiva,

propagador do Movimento Mutualista. O seu funeral realizou-se civilmente.

13 de Setembro 1892 – O jornalista e dirigente republicano João Chagas é preso.

18 de Setembro 1892 – Começa a publicar-se em Lisboa o jornal anarquista A Revolta.

23 de Outubro 1892 – Eleições legislativas. O presidente do conselho Dias Ferreira não

consegue ser eleito por Aveiro, sendo eleito por Penacova no último momento.

19 de Dezembro 1892 – Detonação de uma bomba em Lisboa, despoletada por anarquistas.

1893

14 de Janeiro 1893 – Morre em Coimbra José Falcão.

24 de Janeiro 1893 – Reunião de republicanos portugueses e espanhóis em Badajoz.

23 de Fevereiro 1893 – Governo de Hintze Ribeiro. Regresso ao rotativismo, com a nome-

ação de um governo de um governo do Partido Regenerador.

15 de Abril 1893 – João Chagas, deportado desde 12 de Outubro de 1890, parte de Luanda

para Portugal.

1 de Maio 1893 – Manifestação socialista. Romagem ao túmulo de José Fontana. Comício

no teatro da Praça da Alegria.

Junho 1893 – Conferência em Badajoz dos republicanos ibéricos.

1 de Julho 1893 – Julgamento dos estudantes Carlos Amaro, Emílio Costa, Carlos Marques

e José Barroso, por serem autores de um artigo publicado no semanário “Barricada” intitu-

lado “Ao Rei”. Foram condenados a vinte dias de prisão e a 100$000 réis de multa.

Julho 1893 – Lei que restringe o direito de reunião.

18 de Agosto 1893 – Azedo Gneco, chega a Lisboa vindo de Londres.

22 de Outubro 1893 – Grande homenagem prestada pelo Partido Republicano ao jorna-

lista Alves Correia.

22 de Outubro 1893 – Realiza-se um grandioso comício operário no Teatro Alegria, em

Lisboa.

23 de Outubro 1893 – Eleições para as Câmaras. Os republicanos elegem três deputados.

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292 república e democracia

9 de Dezembro 1893 – As Cortes são dissolvidas, sendo marcadas eleições para 7 de Março

de 1894.

9 de Dezembro 1893 – Nasce em Miranda do Corvo Luís Baeta de Campos.

1894

29 de Janeiro 1894 – A cidade de Coimbra viveu a sua primeira greve.

Janeiro 1894 – Realização do Congresso Cooperativista.

14 de Fevereiro 1894 – Morre, no Rio de Janeiro, o jornalista Crispiano da Fonseca, com-

panheiro de Higino de Sousa na “Pátria”.

Fevereiro 1894 – Fim do Centro Republicano Democrático de Coimbra.

5 de Março 1894 – As eleições são adiadas para dia 15 de Abril, e a abertura das Cortes

marcada para 3 de Maio.

15 de Abril 1894 – Eleições. Os progressistas são derrotados em Lisboa. Os regeneradores

obtêm uma vitória esmagadora, reduzindo os progressistas a 11 deputados e os republicanos

a dois deputados eleitos por Lisboa.

27 de Maio 1894 – O jornal Correio da Tarde ataca violentamente a situação política

acusan do o rei de tomar medidas anticonstitucionais.

2 de Julho 1894 – Constitui-se uma União Liberal entre progressistas e republicanos.

24 de Agosto 1894 – Morre o historiador Oliveira Martins, autor de diversas obras, com-

panheiro de Antero e impulsionador das célebres Conferências do Casino. Por sua expressa

vontade é sepultado catolicamente e morre confortado com os sacramentos da Igreja.

12 de Outubro 1894 – Morre, em Vila Real (Trás-os-Montes), o jornalista democrata e

livre-pensador Augusto César, director do jornal “O Transmontano”.

Outubro 1894 – Foi publicado em Coimbra o n.º único do jornal republicano O Raio. Era

dirigido por António José de Almeida.

13 de Novembro 1894 – Ernesto Silva realiza uma conferência na Associação dos Pedreiros

Portuenses.

28 de Novembro 1894 – Governo entra em ditadura. São encerradas as Cortes e deixa de

haver parlamento até Janeiro de 1895. Situação semelhante apenas ocorrera em 1847.

3 de Dezembro 1894 – A oposição reúne-se na redacção do Correio da Noite, formando-se

a Coligação Liberal, juntando progressistas e republicanos.

9 de Dezembro 1894 – Grande comício no Campo Pequeno, juntando republicanos e pro-

gressistas. José Maria de Alpoim proclama que a pátria está em perigo. No Porto, o conde de

Samodães também preside a comício de protesto no teatro do Príncipe Real.

1895

17 de Janeiro 1895 – Afonso Costa faz exame para obter a licenciatura em Direito.

20 de Janeiro 1895 – Eleita a comissão municipal republicana do Porto. O secretário da

Universidade de Coimbra, Cerqueira Coimbra, depois de aderir aos republicanos, é imedia-

tamente demitido.

4 de Fevereiro 1895 – No Barreiro, nasce Henrique Galvão, ofi cial de Marinha e escritor,

que se destacou na oposição ao Estado Novo.

21 de Fevereiro 1895 – Saiu o 1.º n.º do bissemanário Resistência, órgão do partido Repu-

blicano de Coimbra.

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advento da república em datas 293

2 de Março 1895 – Sexto Congresso do Partido Republicano, em Lisboa. A polícia impede

a reunião.

2 de Março 1895 – Joaquim Martins de Carvalho, director de O Conimbricense, adere ao

Partido Republicano.

8 de Março 1895 – Grande homenagem a João de Deus.

28 de Março 1895 – Publicada nova lei eleitoral, que revoga a de 1884. Os círculos eleitorais

correspondem aos distritos, e as minorias não são representadas. A quota censitária é dimi-

nuída, mas os chefes de família deixam de ter direito a voto automaticamente o que afasta os

eleitores mais pobres, prejudicando em príncipio sobretudo os republicanos.

8 de Abril 1895 – Morte de Manuel Pinheiro Chagas.

4 de Maio 1895 – Começa a publicar-se em Bragança o semanário republicano “A Voz da

Pátria”.

6 de Maio 1895 – Começa a publicar-se em Coimbra o jornal republicano “O Defensor do

Povo”.

10 de Maio 1895 – Morre Alexandre Braga (Pai), ilustre advogado, irmão do poeta e livre

pensador Guilherme Braga e autor de algumas obras anti-clericais como “O Bispo” e “Os

Falsos Apóstolos”.

Maio 1895 – Polícia começa a circular armada com revólveres.

9 de Junho 1895 – Afonso Costa acaba a sua formatura na Faculdade de Direito da Uni-

versidade de Coimbra.

25 de Junho 1895 – Congresso Socialista Anti-Clerical.

28 de Junho 1895 – Encerra o Congresso Católico em Lisboa.

30 de Junho 1895 – Os reaccionários festejam o 7º centenário de Santo António com uma

procissão. Os liberais vão em romaria ao túmulo de Sara de Matos.

1 de Julho 1895 – Realiza-se um sarau anti-jesuítico no Salão Terpsichore, à Praça das Flo-

res, em Lisboa.

5 de Agosto 1895 – Funda-se em Lisboa a Associação Propagadora da Lei do Registo Civil.

Foram seus fundadores: Ferreira Chaves, Eduardo Pinto, José da Costa Lemos, Lomelino de

Freitas, Vasco Gamito, Raul Joaquim Gil e Carlos Cruz, entre outros.

13 de Setembro 1895 – Funda-se, em Lisboa, a Cooperativa A Libertadora.

25 de Setembro 1895 – Reforma da Carta Constitucional por decreto ditatorial.

13 de Outubro 1895 – Celebra-se em Tomar o Congresso Socialista.

Outubro 1895 – Congresso do Partido Socialista em Tomar.

16 de Novembro 1895 – D. Carlos visita a França, a Alemanha e a Inglaterra.

17 de Novembro 1895 – Eleições com vitória do Partido Regenerador, sendo que a oposi-

ção não concorreu em muitos círculos, o que permite a continuação do Governo de Hintze

Ribeiro. A legislatura será conhecida pelo Solar dos Barrigas.

1896

11 de Janeiro 1896 – Morre João de Deus, pedagogo português, poeta e autor da “Cartilha

Maternal”.

17 de Janeiro 1896 – São libertados da cadeia do Limoeiro, os redactores responsáveis do

jornal “Barricada”, José Soares e Carlos Marques.

5 de Fevereiro 1896 – É publicado o notável livro do poeta Guerra Junqueiro, “A Pátria”.

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294 república e democracia

28 de Fevereiro 1896 – Morre no Porto o general Correia da Silva, que tomou parte activa

nos acontecimentos revolucionários de 31 de Janeiro.

13 de Fevereiro 1896 – Lei de João Franco, que procurava reprimir as acções violentas que

iam acontecendo em protesto contra a ditadura de Hintze Ribeiro. A lei ameaçava com a

deportação para Timor a quem perturbasse a ordem social, fi cando conhecida como “Lei dos

Anarquistas”. O Conimbricense promoveu um abaixo-assinado contra esta lei.

13 de Fevereiro 1896 – Lei contra os anarquistas, que ameaçava reprimir as acções violentas

com a deportação para as colónias.

29 de Fevereiro 1896 – Pedradas contra a carruagem real atiradas por um anarquista

13 de Março 1896 – Gungunhana chega a Lisboa, fi cando preso no Forte de Monsanto.

3 de Abril 1896 – Novo Acto Adicional à Carta Constitucional

14 de Abril 1896 – Publicação do 1.º n.º do semanário Portugal, órgão dos estudantes

republicanos.

1 de Maio 1896 – Realiza-se a eleição para a Comissão Municipal Republicana de Ourique.

10 de Maio 1896 – Funda-se no Porto a Associação Propagadora da Lei do Registo Civil.

5 de Junho 1896 – A polícia ocupa as ofi cinas do jornal “País”, impedindo a sua circulação.

7 de Junho 1896 – A polícia impede a circulação de “O País”.

8 de Junho 1896 – É apreendido o jornal de caricaturas “O Berro”.

8 de Junho 1896 – Estabelece-se a censura prévia para o jornal “O País”.

10 de Junho 1896 – A censura impede a publicação de vários artigos de “O País”.

10 de Junho 1896 – São suprimidos os jornais: “Correio da Manhã”, “Jornal do Comércio”,

“Tempo” e “Dia”.

27 de Junho 1896 – É suprimido o jornal “O Portugal”, dos estudantes republicanos de

Coimbra.

24 de Julho 1896 – É proibida pela polícia uma manifestação liberal à memória de Sara de

Matos.

26 de Julho 1896 – Trasladação, no cemitério dos Prazeres, de Sara de Matos, da sepultura

onde estava enterrada para o jazigo mandado fazer por subscrição pública.

27 de Julho 1896 – Morre no Porto o republicano Rodrigues de Freitas.

28 de Julho 1896 – Realiza-se o funeral civil de Rodrigues de Freitas.

18 de Agosto 1896 – Sexta feira negra, corrida aos bancos em geral e suspensão de

pagamentos.

16 de Setembro 1896 – A direcção da Associação de Benefi cência 31 de Janeiro resolve

adjudicar a construção do monumento a Bernardo Marques da Silva.

19 de Setembro 1896 – O “Intransigente”, jornal republicano de Viana do Castelo, anuncia

a publicação de um número especial com a Cartilha do Povo de José Falcão.

23 de Outubro 1896 – Os cocheiros de Lisboa fundam a Associação A Lusitana.

31 de Outubro 1896 – O professor Diogo Rosa Machado, realiza um eloquente discurso

na Loja Liberdade de Lisboa.

1897

31 de Janeiro 1897 – Inauguração no cemitério do Repouso, no Porto, de um monumento

para receber as ossadas de quantos morreram na revolta republicana de 31 de Janeiro de

1891.

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advento da república em datas 295

3 de Fevereiro 1897 – Reúnem-se os estudantes republicanos de Lisboa para organizarem

um Grémio Académico Democrático.

3 de Fevereiro 1897 – Morre o médico Eduardo Maia, que é enterrado civilmente.

6 de Fevereiro 1897 – D. Carlos não sancionou a proposta de nomeação de novos pares do

reino, levando o governo de Hintze Ribeiro a pedir a demissão.

7 de Fevereiro 1897 – Governo de Luciano de Castro com regresso dos Progressistas ao

governo.

8 de Fevereiro 1897 – Morre no Sabugal, o ex-sargento da revolta republicana do Porto de

1891, José Maria Diniz.

8 de Fevereiro 1897 – Reúne o Directório do Partido Republicano , resolvendo a continu-

ação da abstenção eleitoral.

11 de Fevereiro 1897 – Alvarás aprovam os estatutos das Associação Comercial de Lisboa,

da Associação dos Lojistas de Lisboa e da Associação Industrial Portuguesa. Estavam à espera

da aprovação do governo desde Março de 1894.

17 de Fevereiro 1897 – As autoridades proíbem a reunião das Comissões Paroquiais Repu-

blicanas de Lisboa, sob a presidência de Eduardo de Abreu.

18 de Fevereiro 1897 – Reúne a assembleia geral o Centro Fraternidade Republicana.

25 de Fevereiro 1897 – É eleita a comissão municipal republicana de Lisboa.

26 de Fevereiro 1897 – Criação do Grande Oriente de Portugal, provocado por uma cisão

do Grande Oriente Lusitano Unido.

2 de Março 1897 – Morre em Lisboa, o director da “ A Folha do Povo”, Ceclio de Sousa,

director de vários jornais republicanos como “O Trinta” e “A Folha do Povo”. Como livre-

-pensador, e por sua indicação, o funeral realizou-se civilmente.

4 de Março 1897 – Reúne o Centro Fraternidade Republicana, presidido por João Chagas.

4 de Março 1897 – Reúne a comissão municipal republicana de Famalicão.

6 de Março 1897 – O jornal “O País” publica um manifesto dos estudantes republicanos

de Lisboa.

9 de Março 1897 – Publica-se o primeiro número do semanário republicano “A Voz do

Porvir”.

11 de Março 1897 – O Directório do Partido Republicano envia à Comissão Municipal

Republicana de Lisboa cópia da acta da sessão em que as comissões paroquiais resolvem a

convocação do congresso do partido para a eleição do novo Directório.

18 de Março 1897 – Lei criando as Escolas Normais para os professores da instrução

primária.

23 de Março 1897 – Instala-se a Comissão Municipal Republicana de Lisboa, sendo a posse

dada pelo Sr. Gomes da Silva e fi cando constituída pelos seguintes elementos: Teófi lo Braga,

João Viegas Paula Nogueira, Andrade Neves, Teixeira de Magalhães e Coelho da Silva.

25 de Março 1897 – Reúnem, sob a presidência de João Chagas, os corpos gerentes do

Centro Fraternidade Republicana, sendo lidas e aprovadas as bases para a federação das

agremiações republicanas.

25 de Março 1897 – Realiza-se uma reunião preparatória para a reorganização do Centro

Republicano Borges Carneiro.

1 de Abril 1897 – Sai o primeiro número do semanário republicano académico “A Rua”,

que teve curta duração devido às sucessivas acusações e apreensões.

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296 república e democracia

2 de Abril 1897 – Reúne o Centro Fraternidade Republicana na redacção da Marselhesa.

5 de Abril 1897 – É publicado o primeiro número do panfl eto “A Praça Pública”.

11 de Abril 1897 – Reúnem-se os republicanos da freguesia de Santa Isabel, em Lisboa, para

tratarem da reorganização do Clube Gomes Freire de Andrade.

12 de Abril 1897 – É inaugurada na Escola Politécnica a Exposição Oceanográfi ca de D.

Carlos.

13 de Abril 1897 – Reúne no Porto o Grupo Republicano de Estudos Sociais.

13 de Abril 1897 – Reúne a Comissão Municipal Republicana de Lisboa.

15 de Abril 1897 – Reunião em Lisboa do Congresso Pedagógico dos professores do ensino

primário.

3 de Maio 1897 – Eleições com a vitória do Partido Progressista, no governo.

6 de Maio 1897 – Reúne a Comissão Municipal Republicana de Lisboa, tomando conhe-

cimento das adesões das comissões da província aos trabalhos, para realização do congresso

geral do partido. Reúne também a assembleia geral do Centro Fraternidade Republicana.

9 de Maio 1897 – Reúne o Clube Republicano Gomes Freire de Andrade.

14 de Maio 1897 – Publica-se o acórdão da Comissão de Justiça da Grande Loja do Grande

Oriente Lusitano Unido, condenando 3 três maçons das lojas Tolerância 1ª e Regeneradora

nº3, absolvendo-se os restantes acusados.

14 de Maio 1897 – Reúne a Comissão Municipal Republicana encarregada da reorganiza-

ção das comissões paroquiais republicanas de Lisboa.

20 de Maio 1897 – A Comissão Municipal Republicana de Lisboa envia às Comissões Paro-

quiais e à imprensa um manifesto.

23 de Maio 1897 – Comício republicano na Praça da Alegria, contra a alienação de parcelas

do Ultramar.

1 de Junho 1897 – Instala-se no Porto o Centro Republicano do Porto.

9 de Junho 1897 – São notifi cadas seis acusações contra o jornal “O País”.

10 de Junho 1897 – É processado “A Folha do Povo”.

12 de Junho 1897 – É apreendida “A Marselheza”.

13 de Junho 1897 – Comício republicano no Porto sobre a situação fi nanceira.

13 de Junho 1897- Realiza-se um importante comício no Porto contra os planos do

Governo.

26 de Junho 1897 – Realiza-se o Congresso Operário, promovido pela Confederação

Metalúrgica.

27 de Junho 1897 – Greve dos manipuladores de pão, em Setúbal.

27 de Junho 1897 – Realiza-se em Lisboa um comício republicano.

1 de Julho 1897 – É processado “A Marselheza”.

4 de Julho 1897 – É publicado por Eduardo Augusto Pinto, o “Guia do Registo Civil”.

5 de Julho 1897 – É processado “A Marselheza”.

7 de Julho 1897 – Morre em Viseu o republicano António Correia de Lemos.

8 de Julho 1897 – Começam as comemorações de Vasco da Gama na Sociedade de Geografi a

de Lisboa. Em 7 de Março, o governo decidiu não apoiar fi nanceiramente as comemorações.

12 de Julho 1897 – São apreendidos os jornais “País” e “Marselheza”.

17 de Julho 1897 – Brito Camacho é intimado pelo Ministro da Guerra a partir para Lou-

renço Marques.

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23 de Julho 1897 – São apreendidas “A Marselheza” e “A Folha do Povo”.

23 de Julho 1897 – É eleita a Comissão Municipal Republicana do distrito de Coimbra.

24 de Julho 1897 – Proíbe-se um comício republicano em Gaia.

25 de Julho 1897 – A polícia cerca a tipografi a onde se imprimia “O País”, impedindo a

circulação deste periódico, de “A Marselheza” e de “A Folha do Povo”.

30 de Julho 1897 – É proibida a circulação da “Marselheza” e da “Voz Pública”.

12 de Setembro 1897 – Funda-se em Lisboa o Círio Civil do Castelo.

5 de Setembro 1897 -Realização do 7.º congresso do Partido Republicano, em Coimbra.

20 de Setembro 1897 – É decretada uma nova Constituição Maçónica para o Grande

Oriente Lusitano Unido.

25 e 26 de Setembro 1897 – Realização do 7.º Congresso Republicano em Coimbra, no

Salão da Trindade.

9 de Outubro 1897 – É apreendido o jornal “Marselhesa”.

14 de Outubro 1897 – Nasce em Elvas, David Ferreira, investigador e historiador da 1ª

República.

18 de Outubro 1897 – O Directório Republicano, eleito dias antes, elege Manuel de Arriaga

para seu presidente.

23 de Outubro 1897 – Morre em Lisboa o propagandista António Pacheco Moreira Lobo,

que durante mais de 20 anos prestou relevantes serviços ao Partido Republicano.

15 de Dezembro 1897 – Mouzinho de Albuquerque regressa a Lisboa.

1898

5 de Janeiro 1898 – Reunião do Partido Progressista.

12 de Janeiro 1898 – Alves Correia deixa a direcção política do “País”, que passa a ser diri-

gido por João Chagas.

25 de Janeiro 1898 – Afonso Costa é nomeado lente catedrático e titular da cadeira de

Organização Judiciária.

7 de Março 1898 – Comício republicano presidido por Bernardino Machado.

15 de Abril 1898 – Decreto maçónico autorizando a formação de um triângulo em Torres

Novas.

22 de Abril 1898 – Decreto maçónico autorizando a instalação da Loja Capitular Perseve-

rança, em Coimbra.

1 de Maio 1898 – Foi celebrado pela primeira vez o 1.º de Maio em Coimbra.

17, 18 e 19 de Maio 1898 – Celebração do 4.º Centenário do Descobrimento do Caminho

Marítimo para a Índia.

29 de Maio 1898 – Morre em Condeixa, o venerando apóstolo do movimento associativo,

Abílio Roque de Sá Barreto.

18 de Junho 1898 – Suicida-se no Porto, António Henrique Verdial. Em Lisboa, os mani-

puladores do pão declaram-se em greve.

29 de Junho 1898 – Morre em Lisboa Leão de Oliveira, organizador activo e inteligente do

partido.

3 de Agosto 1898 – São notifi cadas duas acusações ao jornal “Lanterna”.

5 de Agosto 1898 – Chaga a Lisboa Campos Salles, ex-presidente da República do Brasil.

18 de Agosto 1898 – Remodelação governamental.

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298 república e democracia

1 de Outubro 1898 – Bernardino Machado é eleito Grão-Mestre honorário da Maçonaria

brasileira.

7 de Outubro 1898 – O Grande Oriente de Portugal (dissidência do Grande Oriente Lusi-

tano Unido) decreta a Constituição que o deve reger.

15 de Outubro 1898 – O Grande Oriente Lusitano Unido autoriza a constituição de um

triângulo ou Loja em Ovar.

17 de Outubro 1898 – Rosa Machado realiza, na Loja Liberdade de Lisboa uma conferência

sobre Gomes Freire de Andrade, comemorando o aniversário da morte do 3º Grão-Mestre

da Maçonaria Portuguesa.

17 de Outubro 1898 – O jornalista Baptista Machado foi condenado a 20 dias de prisão

por delito de imprensa.

17 de Outubro 1898 – Morre em Coimbra o director de “O Conimbricense”, Joaquim

Martins de Carvalho.

18 de Outubro 1898 – A Loja União Independente realiza na Associação Comercial dos

Lojistas de Lisboa, uma sessão comemorativa da morte afrontosa do general Gomes Freire

de Andrade, sendo conferente Alfredo Augusto César da Silva.

22 de Outubro 1898 – A Loja Liberdade de Lisboa, realiza uma sessão magna para assinalar

a morte de Gomes Freire de Andrade no novo templo Gomes Freire, do Grande Oriente

Lusitano Unido.

28 de Outubro 1898 – França Borges é preso como responsável pela publicação de um

artigo intitulado “Actualidade”, no jornal “A Lanterna”, de que era director.

31 de Outubro 1898 – Entra na cadeia, a fi m de cumprir uma pena, o editor de “O País”,

Paulo da Fonseca.

2 de Novembro 1898 – Entra na cadeia do Limoeiro o editor do “O País” Júlio César Eus-

táquio dos Santos.

3 de Novembro 1898 – É notifi cada uma acusação à “Folha do Povo”.

6 de Novembro 1898 – Entra na cadeia do Limoeiro António José Martins, editor do jornal

“A Lanterna”.

1 de Dezembro 1898 – Saiu o n.º único do periódico O Revoltado, impresso clandestina-

mente na tipografi a do Tribuno Popular, tendo por lema a defesa da Pátria e da República.

1899

13 de Janeiro 1899 – O Tribunal da Relação de Lisboa manda despronunciar António

França Borges que tinha sido acusado com base na lei de 13 de Fevereiro.

1 de Março 1899 – Publica-se, em Lisboa, o primeiro número do jornal “A Pátria”, dirigido

por José Benevides.

6 de Março 1899 – Parte para S. Tomé João de Freitas.

23 de Março 1899 – Promulgação do decreto sobre mendicidade

13 de Abril 1899 – Reúne a Assembleia Geral do Clube Republicano José Falcão.

1 de Maio 1899 – Grande homenagem a José Fontana, dirigente do Partido Socialista.

1 de Maio 1899 – No Porto começa a publicar-se o jornal republicano “Folha Nova”, diri-

gido pelo ex-tenente Manuel Maria Coelho.

27 de Maio 1899 – Apresenta-se às autoridades o jornalista João Chagas, afi m de prestar

fi ança por 15 processos contra ele instaurados por abuso de liberdade de expressão.

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advento da república em datas 299

29 de Maio 1899 – Assinala-se o primeiro aniversário do falecimento do ilustre republicano

Leão de Oliveira.

4 de Junho 1899 – É processado “A Pátria”.

29 de Junho 1899 – O Directório do Partido Republicano depõe uma coroa no túmulo de

Leão de Oliveira.

26 de Julho 1899 – Nova lei eleitoral. São dados poderes constituintes às próximas Cortes.

30 de Julho 1899 – o Dr. Teófi lo Braga realiza uma conferência na Associação de Lojistas.

2 de Agosto 1899 – Toma posse o novo bispo do Porto, D. António Barroso.

8 de Agosto 1899 – O jornal francês “La Vague” publica uma entrevista com Guerra Jun-

queiro sobre a questão Dreyfus.

27 de Setembro 1899 – Grande excursão de Círios Civis a Setúbal. Participam nesta activi-

dade os Círios Aurora do Futuro, da Bica, Calhariz de Benfi ca, Estrela, Heliodoro Salgado e

Amoreiras. O bispo fez com que o Governo evitasse uma nova excursão a Évora.

1 de Outubro 1899 – São notifi cadas onze acusações ao jornal republicano “A Lanterna”.

4 de Outubro 1899 – Funda-se no Porto a Associação de Classe dos Revendedores de Jornais.

16 de Outubro 1899 – Morre em Viseu o notável poeta e escritor Alexandre da Conceição.

12 de Novembro 1899 – Reúne a Comissão Municipal Republicana de Vila Nova de Gaia,

resolvendo apresentar como candidato republicano o Dr. João de Menezes.

18 de Novembro 1899 – Realiza-se a sessão inaugural do Congresso Republicano Português

presidido por Florido Toscano, em Coimbra.

19 de Novembro 1899 – Realiza-se a 2ª sessão do Congresso Republicano em Coimbra,

onde são eleitos o Directório e a Câmara Consultiva.

26 de Novembro 1899 – Eleições, com vitória dos republicanos no Porto, elegendo Afonso

Costa, Paulo Falcão e Xavier Esteves. O conde Burnay vence em Setúbal. As eleições foram

anuladas em 5 de Janeiro de 1900.

1900

2 de Janeiro 1900 – Discurso da Coroa.

5 de Janeiro 1900 – As eleições no Porto são anuladas, alegando-se irregularidades.

5 de Janeiro 1900 – Morre, em Lisboa, o jornalista republicano António Narciso Rebelo da

Silva Alves Correia, fundador de “O País”.

8 de Janeiro 1900 – O jornal “A Pátria” abre uma subscrição pública para se erguer um

mausoléu no cemitério oriental em homenagem aos altos serviços prestados ao partido por

Alves Correia.

11 de Janeiro 1900 – França Borges assume a direcção do jornal “A Pátria”, de Lisboa.

14 de Janeiro 1900 – O Tribunal de Verifi cação de Poderes anula a eleição dos deputados

pelo Porto: Afonso Costa, Xavier Esteves e Paulo Falcão.

18 de Janeiro 1900 – Confl ito entre João Franco e o ministro dos negócios estrangeiros

Veiga Beirão sobre a guerra dos Boers na África do Sul.

22 de Janeiro 1900 – Começa a publicar-se na cidade do Porto, o jornal “O Norte”, de

inspiração republicana.

2 de Fevereiro 1900 – Realiza-se, no Porto, um comício presidido por Nunes da Ponte,

de protesto contra a exclusão do Parlamento, pelo Tribunal de Verifi cação de Poderes, dos

deputados republicanos do Porto.

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300 república e democracia

14 de Fevereiro 1900 – Higino de Sousa, após concurso público, é nomeado lente da Escola

Médica de Lisboa.

15 de Fevereiro 1900 – O jornal “O Mundo” publica um manifesto da Academia de Coim-

bra ao povo.

17 de Fevereiro 1900 – Realiza-se no Palácio de Cristal, no Porto, um comício republicano

presidido por Nunes da Ponte.

18 de Fevereiro 1900 – São novamente eleitos pelo Porto os deputados republicanos Afonso

Costa, Paulo Falcão e Xavier Esteves.

19 de Fevereiro 1900 – Organiza-se em Lisboa a Liga Académica Republicana, constituída

por estudantes das escolas superiores de Lisboa. Esta organização republicana teve entre os

seus fundadores Luís Derouet, Carlos Olavo, Arnaldo Mendo, Francisco António Vicente e

Júlio Martins, entre outros.

3 de Março 1900 – Realiza-se em Coimbra uma grande manifestação em homenagem a

Afonso Costa.

8 de Março 1900 – O Tribunal de Verifi cação de Poderes confi rma a eleição dos deputados

republicanos pelo círculo eleitoral do Porto: Afonso Costa, Xavier Esteves e Paulo Falcão.

11 de Março 1900 – Realiza-se na agremiação socialista Karl Marx, uma sessão de propa-

ganda democrática.

12 de Março 1900 – Chegam a Lisboa os deputados eleitos pelo círculo do Porto.

13 de Março 1900 – Prestam juramento na Câmara dos Deputados os representantes repu-

blicanos eleitos pelo círculo eleitoral do Porto.

14 de Março 1900 – Estreia parlamentar do deputado republicano Xavier Esteves.

15 de Março 1900 – Estreia parlamentar dos deputados republicanos Afonso Costa e Paulo

Falcão.

18 de Março 1900 – Heliodoro Salgado realiza uma conferência na Associação de Instrução

A Obra, sobre A Revolução Comunalista de 1871.

21 de Março 1900 – Realiza-se no Porto a eleição da Comissão Municipal dessa cidade.

25 de Março 1900 – Realiza-se nas salas da Associação dos Lojistas a sessão solene promo-

vida pelo Clube José Falcão em honra dos deputados pelo Porto.

28 de Março 1900 – Responde na Figueira da Foz, por abuso de liberdade de imprensa, o

jornalista Amadeu de Sanches Barreto.

31 de Março 1900 – Realiza-se nas salas do Ateneu Comercial a primeira conferência duma

série promovida pela Liga Académica Republicana.

3 de Abril 1900 – Reúne o Clube Republicano José Falcão.

5 de Abril 1900 – Reúne o Grémio Republicano Concentração Democrática.

6 de Abril 1900 – O deputado republicano Afonso Costa manda para a mesa da Câmara de

Deputados um aviso prévio, pedindo a comparência do Ministro dos Negócios Estrangeiros,

para conhecer a atitude de Portugal perante a Guerra Anglo-Boer.

6 de Abril 1900 – Reúne a Liga Académica Republicana.

7 de Abril 1900 – É proibido um comício popular de protesto contra as medidas da fazenda.

7 de Abril 1900 – Reúne o Centro Fraternidade Republicana.

8 de Abril 1900 – Reúne a Comissão Municipal Republicana do Porto.

11 de Abril 1900 – Reúne o Directório do Partido Republicano.

19 de Abril 1900 – Grande comício de protesto no Porto contra a aliança inglesa.

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advento da república em datas 301

13 de Maio 1900 – Inaugura-se o Grémio Republicano Concentração Liberal.

14 de Maio 1900 – O jornal republicano “A Pátria” é processado.

24 de Maio 1900 – É apreendido pela autoridade o jornal “Pátria”.

1 de Junho 1900 – É processado “A Vanguarda”.

2 de Junho 1900 – É preso Heliodoro Salgado por ter publicado um artigo no “A Pátria”.

4 de Junho 1900 – É apreendida “A Pátria”.

11 de Junho 1900 – Chega a Lisboa, vindo de África, o tenente Manuel Maria Coelho.

19 de Junho 1900 – Afonso Costa apresenta na Câmara dos Deputados uma moção em que

diz que o povo quer instituições republicanas e não outras que constituem um privilégio de

classes e castas.

20 de Junho 1900 – São apreendidos os jornais republicanos “A Pátria” e “A Vanguarda”.

25 de Junho 1900 – Nomeação de um novo governo dirigido por Hintze Ribeiro.

29 de Junho 1900 – Reúne em Lisboa o Congresso do Partido Republicano, resolvendo

mandar imprimir a moção que Afonso Costa apresentou ao Parlamento em 18 de Junho de

1900.

3 de Julho 1900 – Nova acusação sobre o jornal “Pátria”.

12 de Julho 1900 – Ernesto da Silva inicia a sua colaboração com o jornal “Pátria”.

19 de Julho 1900 – Reúne a direcção da Associação Propagadora de Instrucção e Benefi -

cência José Elias Garcia.

29 de Julho 1900 – Realiza-se no Porto um banquete para comemorar a concentração

democrática.

30 de Julho 1900 – Promovido pela Federação dos Círios Civis inaugura-se em Lisboa um

congresso anti-clerical.

Julho 1900 – Realização de um Congresso anticlerical, organizado pelos Círios Civis,

socialistas.

9 de Agosto 1900 – Reúnem-se as comissões paroquiais de Lisboa, resolvendo dirigir uma

mensagem aos deputados republicanos pelo Porto. É eleita a Comissão Municipal Republi-

cana de Lisboa.

17 de Agosto 1900 – Morre o escritor e jornalista Eça de Queiroz.

29 de Agosto 1900 – Parte para Paris Manuel de Arriaga.

31 de Agosto 1900 – É notifi cada uma acusação ao jornal “Reacção”, jornal republicano do

Porto.

2 de Setembro 1900 – É apreendida “A Pátria”.

4 de Setembro 1900 – É suprimida “A Pátria”.

7 de Setembro 1900 – Sai o primeiro número de “O País”, em substituição do “A Pátria”,

sob a direcção política de França Borges, mas foi impedido de circular.

9 de Setembro 1900 – Realiza-se, em Lisboa, um comício anticlerical, presidido por Brito

Camacho.

10 de Setembro 1900 – Sai o primeiro número de “A Lanterna”, que vem substituir “A

Pátria”, sob a direcção de França Borges.

11 de Setembro 1900 – Reúne a Associação de Jornalistas no Porto, para discutir a supres-

são do “A Pátria”.

12 de Setembro 1900 – É apreendida “A Lanterna”, e impedido pela polícia de circular o

segundo número deste jornal republicano.

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16 de Setembro 1900 – Sai o primeiro número de “O Mundo”, sob a direcção de França

Borges, substituindo assim o jornal “A Pátria”.

17 de Setembro 1900 – Reúne a Comissão Municipal Republicana de Lisboa.

18 de Setembro 1900 – É entregue ao director de “O País” o material apreendido nas salas

da redacção daquele jornal.

29 de Setembro 1900 – Em Évora os republicanos promovem a candidatura de Brito

Camacho por aquele círculo.

2 de Outubro 1900 – “O Mundo” promove uma acusação contra o juiz Veiga.

8 de Outubro 1900 – Morre em Lisboa o prestimoso jornalista republicano Sabino de

Sousa.

10 de Outubro 1900 – É apreendido o jornal “O Mundo”.

13 de Outubro 1900 – Augusto de Vasconcelos realiza uma conferência na Associação

União dos Trabalhadores, Serventes de Pedreiros e Estucadores.

27 de Outubro 1900 – Dissolução da Câmara dos Deputados.

30 de Outubro 1900 – O “Jornal de Abrantes” entrega a França Borges a pena de ouro

adquirida por subscrição pública aberta nas colunas daquele jornal, em homenagem à luta

travada na Pátria contra o jesuitismo.

4 de Novembro 1900 – No teatro D. Afonso, do Porto, realizou-se um banquete de home-

nagem aos deputados republicanos, presidindo Azevedo e Albuquerque.

6 de Novembro 1900 – Morre em Camarate, e é sepultado civilmente, o democrata e livre-

-pensador Eduardo Augusto Pinto, fundador e secretário da Associação do Registo Civil.

7 de Novembro 1900 – São proclamados pelas Comissões Paroquiais Republicanas do

Porto, candidatos a deputados Afonso Costa, Xavier Esteves e Paulo Falcão.

12 de Novembro 1900 – Reúne o Partido Republicano, resolvendo apresentar como candi-

datos por Lisboa Bettencourt Raposo, José Estevão de Vasconcelos, Manuel de Brito Cama-

cho, Alexandre Braga e João Viegas Paula Nogueira.

15 de Novembro 1900 – O Governador-Civil do Porto proíbe a realização de um comício

republicano que se devia realizar no Teatro D. Afonso.

17 de Novembro 1900 – Realiza-se no Porto um comício de propaganda eleitoral, presidido

por Azevedo e Albuquerque.

19 de Novembro 1900 – O Governador Civil de Lisboa proíbe uma sessão de propaganda

eleitoral no Grémio Concentração Democrática.

20 de Novembro 1900 – As Comissões Paroquiais de Coimbra resolvem por unanimidade

propor candidato por aquela cidade António José de Almeida.

21 de Novembro 1900 – Estevão de Vasconcelos realiza uma conferência na Liga Acadé-

mica Republicana.

23 de Novembro 1900 – Alexandre Braga realiza uma conferência no Clube Republicano

Paulo Falcão.

25 de Novembro 1900 – 39.ª eleições gerais, com nova vitória do partido no governo. As

listas monárquicas vencem em Lisboa e no Porto, não sendo eleitos deputados republicanos,

mesmo que a sua votação tenha aumentado.

29 de Novembro 1900 – Fundação do Centro Escolar Dr. Afonso Costa.

30 de Novembro 1900 – Remodelação governamental.

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Dezembro 1900 – Visita ao Tejo da Frota britânica do Canal, reafi rmando a aliança entre

os dois países.

1901

19 de Janeiro 1901 – Nasce em Lisboa, Luís Ernani Dias Amado, médico, anti-fascista e

maçon.

12 de Fevereiro 1901 – Ruptura entre Hintze Ribeiro e João Franco,

13 de Fevereiro 1901 – Regresso de D. Carlos do funeral da Rainha Vitória em Londres.

3 de Março 1901 – Conferência de Alexandre Braga na Associação dos Lojistas, promovida

pela Associação do Registo Civil.

3 de Março 1901 – É apreendido no Porto o jornal “O Norte”, diário republicano daquela

cidade, chegando o edifício sede a estar cercado pela polícia.

12 de Março 1901 – Decreto anticongreganista, o governo emite um decreto sobre ordens

religiosas, mantendo assim, com o apoio do Rei D. Carlos, a tradição anticlerical do Partido

Regenerador.

16 de Março 1901 – É apreendida mais uma edição do jornal “O Mundo”.

18 de Março 1901 – Na sequência da campanha anticlerical e anticongreganista, fundou-se

o Centro Nacional Académico.

18 de Março 1901 – Criação do Centro Nacional Académico, por Francisco José de Sousa

Gomes, transformado no ano seguinte em Centro Académico de Democracia Cristã.

19 de Março 1901 – A autoridade proíbe a realização de um comício republicano no Porto.

24 de Março 1901 – O Governador Civil do Porto proíbe um comício popular.

24 de Março 1901 – Manuel de Brito Camacho realiza em Évora uma conferência

republicana.

25 de Março 1901 – Grande agitação anti-jesuítica em Setúbal motivada pela questão Cal-

mon. Rosa Calmon, fi lha do cônsul brasileiro no Porto, foi infl uenciada a ponto de querer à

viva força abandonar a família e internar-se num convento. O movimento de protesto surgiu

de imediato e um pouco pelo País. Em Setúbal foram mortos dois populares, pelos militares,

na Avenida Luísa Todi.

28 de Março 1901 – O jornal católico A Palavra é apreendido.

1 de Abril 1901 – Reúnem a Comissão Municipal Republicana do Porto e os presidentes

das Comissões Paroquiais.

5 de Abril 1901 – É apreendido “O Mundo”.

18 de Abril 1901 – Decreto que legalizou de forma hábil a existência de ordens religiosas.

Reunião da academia contra o jesuitismo. Os estudantes decidiram criar a Liga Académica

Liberal de propaganda antijesuítica.

14 de Abril 1901 – D. Carlos é saudado como rei liberal na praça de touros do Campo

Pequeno, devido ao seu reconhecido anti-clericalismo.

20 de Abril 1901 – São encerradas várias casas religiosas.

25 de Abril 1901 – Criação de uma Comissão Liberal, isto é, anticlerical, presidida por José

Dias Ferreira.

28 de Abril 1901 – Inaugura-se em Lisboa o Centro Dr. Afonso Costa.

30 de Abril 1901 – Criação de uma Junta Liberal republicana, presidida por Miguel

Bombarda.

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304 república e democracia

5 de Maio 1901 – Realiza-se uma manifestação cívica no cemitério de Camarate em home-

nagem ao livre pensador Eduardo Augusto Pinto, secretário da Associação do Registo Civil

e autor do Guia do Registo Civil.

8 de Maio 1901 – O Partido Republicano reúne para tratar da questão religiosa.

11 de Maio 1901 – É apreendido o jornal “A Liberdade”.

14 de Maio 1901 – Chega a Lisboa o Alferes Malheiro, um dos chefes militares da revolução

de 31 de Janeiro.

16 de Maio 1901 – Criado o Centro Regenerador-Liberal em Lisboa.

24 de Maio 1901 – Morre o escritor e publicista Teixeira Bastos, discípulo de Teófi lo Braga.

Publicou entre outras obras “O Jesuíta e o Progresso do Espírito Humano”.

28 de Maio 1901 – É suprimido “A Liberdade”, onde colaboravam Carlos Olavo, Máximo

Brou e Carlos Amaro.

30 de Maio 1901 – Reaparece “A Liberdade”, órgão dos estudantes republicanos da capital,

com o título “A Marselhesa”.

30 de Maio 1901 – 25 deputados regeneradores acompanham João Franco no abandono do

partido, dando origem aos regeneradores-liberais.

1 de Junho 1901 – Duelo entre João Franco e Pinto dos Santos.

4 de Junho 1901 – É apreendida “A Marselheza”.

7 de Junho 1901 – É suprimida “A Marselheza”.

8 de Junho 1901 – A polícia proíbe a realização de um comício republicano no Porto.

23 de Junho 1901 – Eduardo Abreu publica um manifesto ao Partido Republicano.

1 de Julho 1901 – Dissolução da Câmara dos Deputados, devido à perda pelo governo do

apoio da facção João Arroio do Partido Regenerador, já enfraquecido pela saída do grupo de

João Franco.

14 de Julho 1901 – Realiza-se em Lisboa, no Restaurante Paris, um banquete organizado

pelos revolucionários portugueses.

21 de Julho 1901 – É notifi cada uma acusação a “O Mundo”.

28 de Julho 1901 – Realiza-se em Lisboa uma manifestação anti-jesuítica.

4 de Agosto 1901 – Chega a Lisboa o capitão Amaral Leitão, um dos chefes da revolta mili-

tar de 31 de Janeiro, vindo do Brasil.

6 de Agosto 1901 – Morre em Lisboa o jornalista, comerciante, bibliotecário-mór da Biblio-

teca Nacional, maçon, e autor teatral António José Ennes. Fundou e dirigiu ainda “O País”

e “O Progresso” e fundou “O Dia”.

8 de Agosto 1901 – Aprovação da última lei eleitoral da Monarquia, apelidada de Ignóbil

Porcaria por João Franco, que dividindo os círculos eleitorais de Lisboa e Porto, conseguia

impedir a representação dos pequenos grupos políticos, como os republicanos, mas também

como os regeneradores-liberais, na câmara dos deputados.

30 de Agosto 1901 – Regressa do Pará o alferes Augusto Malheiro, um dos chefes militares

da Revolta de 31 de Janeiro de 1891, no Porto.

1 de Setembro 1901 – Realiza-se um passeio promovido pelo Clube Republicano José Fal-

cão a Benavente, com fi ns políticos.

4 de Setembro 1901 – Reúnem-se as comissões municipais e paroquiais de Lisboa.

9 de Setembro 1901 – Reúnem o Directório e as Comissão Municipal Republicana de

Lisboa.

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advento da república em datas 305

25 de Setembro 1901 – “O Mundo” publica uma carta de Afonso Costa em editorial.

26 de Setembro 1901 – Reúne a Comissão Municipal Republicana conjuntamente com o

Directório.

27 de Setembro 1901 – Sob a presidência de Aristides Coelho Basto reúne o Grémio Con-

centração Democrática.

28 de Setembro 1901 – É apresentada às comissões paroquiais da capital a lista dos candi-

datos republicanos a deputados pelos círculos de Lisboa.

6 de Outubro 1901 – Eleições. Não são eleitos membros do partido Republicano em Por-

tugal, tendo os franquistas eleito um único deputado. O dirigente republicano Afonso Costa

conseguirá ser eleito por Angola no escrutínio de 15 de Dezembro.

31 de Outubro 1901 – No Centro Escolar Dr. Afonso Costa realiza uma conferência anti-

-clerical Augusto José Vieira.

31 de Outubro 1901 – Realiza-se, no Porto, o I Congresso da Indústria Têxtil.

1 de Novembro 1901 – O Governo proíbe um comício popular de protesto contra as con-

gregações religiosas.

3 de Novembro 1901 – O Dr. Alexandre Braga realiza no Clube Republicano José Falcão

uma conferência de pendor anti-jesuítico.

24 de Novembro 1901 – Os republicanos ganham as eleições paroquiais nas freguesias de

Alcântra, Almada, Santos, Santa Justa, Santa Isabel e S. Paulo.

5 de Dezembro 1901 – Dias Ferreira realiza uma conferência anticlerical.

24 de Dezembro 1901 – Reforma do ensino primário, passando a ser gratuito e obrigatório.

1902

5, 6 e 7 de Janeiro 1902 – Congresso Republicano em Coimbra no edifício dos Grilos.

6 de Janeiro 1902 – São eleitos para o Directório do Partido Republicano Teófi lo Braga,

Eduardo Abreu, Jacinto Nunes, António José de Almeida , Estevão de Vasconcelos e Celes-

tino de Almeida.

8 de Janeiro 1902 – Suicídio de Joaquim Mouzinho de Albuquerque, herói das campanhas

de Moçambique. Era na altura da morte aio do príncipe real D. Luís Filipe.

13 de Janeiro 1902 – Sai o 1.º n.º do bissemanário republicano O Liberal. O ultimo n.º

saiu a 9 de Novembro.

17 de Janeiro 1902 – O jornal “O Mundo” é condenado, por suposto abuso de imprensa,

em 12 meses de prisão, remíveis a 100 réis diários, e nas custas e selos do processo.

26 de Janeiro 1902 – Comício republicano em Vila Franca de Xira onde discursaram Ale-

xandre Braga, João Chagas e Feio Terenas.

21 de Fevereiro 1902 – As autoridades impedem a circulação do jornal “O Mundo”.

22 de Fevereiro 1902 – É proibida pela polícia a circulação do jornal “O Mundo”.

25 de Fevereiro 1902 – O deputado Augusto Fuschini interpela o Governo na Câmara

dos Deputados sobre as violências e arbitrariedades exercidas sobre o jornal republicano O

Mundo.

10 de Março 1902 – Reúne a comissão paroquial republicana dos Mártires, em Lisboa.

12 de Março 1902 – É apreendido o jornal “O Norte”.

16 de Março 1902 – Assinala-se o quinto aniversário do Centro Republicano José Falcão.

20 de Março 1902 – Reúne a Comissão Paroquial de Santa Engrácia, em Lisboa.

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306 república e democracia

21 de Março 1902 – Parte para Luanda o ex-tenente Manuel Maria Coelho, um dos ofi ciais

que tomaram parte na revolta de 31 de Janeiro de 1891, no Porto.

21 de Março 1902 – Motins estudantis nas Universidades do Porto e de Coimbra, assim

como na Escola Politécnica de Lisboa, que se estenderão até Abril.

22 de Março 1902 – Bernardino Machado realiza uma conferência na cidade do Porto.

25 de Março 1902 – Reúne o Grémio Republicano.

25 de Março 1902 – Pereira Carrilho consegue negociar em Paris um acordo dos credores

estrangeiros quanto à dívida externa portuguesa. Na altura, D. Luís Filipe assiste em Londres

à coroação de Eduardo VII.

30 de Março 1902 – França Borges realiza uma conferência no Grémio Excursionista

Liberal.

6 de Abril 1902 – A autoridade proíbe a circulação do “Mundo”.

11 de Abril 1902 – O juiz Francisco Maria da Veiga, juiz de instrução criminal, acusa o

director do jornal “O Mundo”.

14 de Junho 1902 – É distribuída a Lei Orgânica do Partido Republicano, aprovada no

Congresso do mesmo.

19 de Junho 1902 – É apreendido o jornal “O Mundo”.

2 de Julho 1902 – Morre no Porto Joaquim Bessa de Carvalho.

6 de Julho 1902 – É instituído o prémio Luís Derouet na Escola 31 de Janeiro.

12 de Julho 1902 – O ministro Teixeira de Sousa estabelece o Registo Civil para os estados

da Índia mas mandando-os efectuar respectivamente por párocos, regedores e chefes dos

comandos militares.

30 de Julho 1902 – É processado “O Mundo”.

12 de Agosto 1902 – Grandioso comício republicano em Lisboa. Heliodoro Salgado realiza

uma conferência no Centro Rodrigues de Freitas. Realiza-se ainda um comício de propa-

ganda eleitoral em Samora Correia.

17 de Agosto 1902 – Realiza-se na Associação dos Lojistas uma sessão solene dos Centros

Democráticos em Lisboa em honra de “O Mundo”.

4 de Setembro 1902 – Morre em Livorno (Itália) o capitão-de-mar-e-guerra José Bento Fer-

reira de Almeida, natural de Faro. Antigo governador colonial, militar da armada, deputado,

par do reino, ministro da marinha, maçon e fi gura polémica da política portuguesa dos fi nais

do século XIX. Por sua determinação o cadáver foi cremado. Quando as cinzas do seu corpo

chegaram a Lisboa não lhe foram prestadas honras militares.

4 de Setembro 1902 – Angelina Vidal assume a regência da cadeira de francês, no curso

nocturno, na Sociedade Voz do Operário.

14 de Setembro 1902 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Miragaia.

19 de Setembro 1902 – Reúnem no Clube Republicano José Falcão, os eleitores republica-

nos da freguesia de Santo André.

25 de Setembro 1902 – Reúne o Grémio Comercial Democrático.

5 de Outubro 1902 – Morre Miguel Baptista Fernandes, fundador do Clube João Pinto

Ribeiro.

6 de Novembro 1902 – A polícia impede a circulação de “O Norte”.

2 de Novembro 1902 – O Governo-Civil do Porto proíbe a circulação de um suplemento

do “O Norte” e manda apreender “A Voz Pública”.

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advento da república em datas 307

2 de Novembro 1902 – Eleições municipais, com vitória dos regeneradores no Porto.

3 de Novembro 1902 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Lisboa.

8 de Novembro 1902 – Morre José Isidoro Viana, republicano que prestou importantes

serviços à propaganda do partido.

15 de Dezembro 1902 – Sai o 1.º n.º do semanário de propaganda republicana A Justiça.

16 de Dezembro 1902 – Depois de sucessivas viagens a Paris e Londres, D. Carlos regressa

a Portugal.

1903

3 de Janeiro 1903 – Morre em Portimão o livre pensador Frederico Moreira, que deixa

testamento para ser enterrado civilmente, mas a quem o padre e as autoridades locais não

respeitam a vontade.

11 de Janeiro 1903 – Morre em Linda – a – Pastora, o jornalista republicano Luis Serra, um

dos redactores do jornal “Pátria”, em 1890.

15 de Janeiro 1903 – Julgamento do director do jornal “Lucta”, José de Macedo, acusado de

ter publicado um artigo de aplauso sobre o assassinato do rei Humberto.

3 de Fevereiro 1903 – Reúne-se a comissão eleitoral republicana da freguesia das Mercês

(Lisboa).

13 de Fevereiro 1903 – Morre o jornalista portuense João César Pinto Guimarães.

20 de Fevereiro 1903 – Reúnem os corpos gerentes do Grémio Comercial Democrático.

27 de Fevereiro 1903 – Demissão do governo de Hintze Ribeiro, que continua como Presi-

dente do Conselho à frente de novo governo Regenerador.

12 de Março 1903 – Graves acontecimentos em Coimbra, havendo manifestações

republicanas.

30 de Março 1903 – Inaugura-se o Centro Escolar e Eleitoral Rodrigues de Freitas.

30 de Março 1903 – Começa a publicar-se em Lisboa “O Debate”, jornal republicano da

tarde.

Março 1903 – «Greve geral» em Coimbra contra a carestia de vida, conhecida pela Revolta

do Grelo. Oliveira Matos e Dias Ferreira interpelam o governo sobre a matéria.

2 de Abril 1903 – Insubordinam-se 118 soldados no Regimento de Infantaria N.º 18,

havendo manifestações republicanas.

5 de Abril 1903 – É preso Alexandre Braga por não se descobrir à passagem duma procissão.

25 de Abril 1903 – Morre em Lisboa o socialista Ernesto da Silva, jornalista, orador, drama-

turgo e propagandista dos mais dedicados.

1 de Maio 1903 – Dissidência progressista, com a saída de seis deputados.

2 de Maio 1903 – João de Meneses realiza uma conferência no Grémio Democrático Elei-

toral, em Arroios.

14 de Maio 1903 – Reúnem no Centro Democrático Português os cidadãos republicanos,

da freguesia de Santa Catarina.

14 de Maio 1903 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana da Freguesia de S. Miguel.

18 de Maio 1903 – Reúnem no Centro Democrático Português, os cidadãos republicanos

da freguesia de S. Paulo (Lisboa), afi m de elegerem a Comissão Municipal Republicana.

24 de Maio 1903 – Manuel de Arriaga realiza uma conferência, a convite da Academia de

Estudos Livres, na Associação dos Lojistas de Lisboa.

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308 república e democracia

25 de Maio 1903 – Reúne a Comissão Municipal Republicana de Lisboa, sob a presidência

de João Gonçalves.

25 de Maio 1903 – Foi eleita a Comissão Municipal Republicana do Carvalhido.

1 de Junho 1903 – Uma comissão de estudantes portugueses entrega em Madrid uma men-

sagem a Salmeron.

4 de Junho 1903 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de S. Mamede.

29 de Junho 1903 – Nos dias 28 e 29 realiza-se em Coimbra um Congresso da Maçonaria

Portuguesa em que são apresentados por algumas Lojas de Lisboa diversos trabalhos tais

como: “Exército permanente”, pela Loja Pureza; “Paz e Arbitragem”, pela Loja Simpatia e

União; “Demagogia Reaccionária”, pela Loja Cavaleiros da Paz e da Concórdia; “Separação da

Igreja do Estado”, pela Loja Elias Garcia; “Vintém das Escolas”, pela Loja Comércio e Indústria;

“Vagabundagem de Menores”, pela Loja Liberdade; “Boletim Ofi cial”, pela Loja José Estêvão;

“Capital, Trabalho e Greves”, pela Loja Livre Exame; “Ritos”, pela Loja Luís de Camões;

“Escravatura em África”, pela Loja Justiça. Ainda foram apresentadas por outras Lojas as

seguintes teses: “Acção da Maçonaria”, pela Loja Perseverança, de Coimbra; “Socorro Mútuo

e Protecção Maçónica”, pela Loja Liberdade e Progresso, do Porto; “Escolas Profi ssionais de

Enfermeiros”, pela Loja Luz do Norte, do Porto; “Preço do Trabalho”, pela Loja Fraternidade,

de Viana do Castelo; “Analfabetismo e Educação”, pela Loja Fernandes Tomás, da Figueira

da Foz; “Centralização de Poderes”, pela Loja Viriato, de Viseu; “Registo Civil Obrigatório”,

pela Loja Portugal, de Coimbra; “Instrução do Povo”, pela Loja União, do Porto; “Sufrágio

Universal”, pela Loja Pátria, de Coimbra; “Trabalho das Mulheres e dos Menores nas Fábricas”,

pela Loja Soberania Académica, de Coimbra.

28 de Julho 1903 – Greves operárias no Porto, começadas pelos tecelões, mas que se alastram

a outras categorias de assalariados.

8 de Agosto 1903 – Os estudantes da Academia Politécnica do Porto felicitam Emile Com-

bes, primeiro-ministro francês, numa mensagem enviada a propósito da promulgação da lei

de separação do Estado e da Igreja naquele país.

17 de Outubro 1903 – Funda-se, em Lisboa, a Associação dos Compositores.

25 de Outubro 1903 – Sessão de homenagem a Ernesto Silva.

1 de Novembro 1903 – Eleições municipais em Lisboa.

4 de Novembro 1903 – Morre em Lisboa o dedicado republicano José Sebastião Teixeira

Júnior.

7 de Dezembro 1903 – Greve dos metalúrgicos, começada na Empresa Industrial Portuguesa.

1904

4 e 5 de Fevereiro 1904 – Adesão de trabalhadores portuários e de metalúrgicos de outras

empresas à greve dos metalúrgicos da Empresa Industrial Portuguesa.

26 de Fevereiro 1904 – Morre em Belém (Lisboa), vítima de tuberculose, o estudioso do

movimento libertário, Tiago Ferreira, que foi sepultado civilmente.

29 de Março 1904 – Morre em Viseu o operário gráfi co Alberto Sampaio, fundador e direc-

tor do jornal republicano, socialista e anti-clerical, “A Voz da Ofi cina”. Por sua determinação

expressa foi enterrado civilmente.

18 de Abril 1904 – Greve nas empresas jornalísticas de Lisboa.

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27 de Abril 1904 – Foram presos, sendo posteriormente libertados sob caução, Carlos Cruz

e António Marques Nogueira, membros da direcção e do conselho fi scal da Associação do

Registo Civil. Nessa mesma ocasião foi também detido João Gonçalves, editor do jornal diá-

rio republicano “Vanguarda”. A causa para estas detenções foi a publicação de uma circular

do jornal anti-religioso do Porto, “O Clarão”, no referido jornal de Lisboa. No dia seguinte

foram pagas as fi anças aos cidadãos João Gonçalves, Jácome da Silva e José da Costa Lemos,

todos directores da referida associação.

29 de Abril 1904 – Morre em Lagos o prestimoso chefe republicano daquela cidade, o

cidadão João Marreiros Neto.

1 de Maio 1904 – O 1.º de Maio foi festejado em Coimbra.

7 de Maio 1904 – Instalação do Centro Eleitoral Republicano José Falcão em Coimbra.

13 de Maio 1904 – Morre no Porto o militante socialista Viterbo de Campos, propagan-

dista do movimento operário. Foi enterrado civilmente.

13 de Maio 1904 – Magalhães Lima realiza uma conferência em Lisboa subordinada ao

tema “A República e o Socialismo”.

18 de Maio 1904 – Inauguração, em Lisboa, na Rua Alexandre Herculano, da nova sina-

goga israelita.

2 de Junho 1904 – Morre em Lisboa o livre pensador Joaquim Rodrigues Rocha.

13 de Junho 1904 – Morre em Gouveia o redactor da “Voz Publica”, do Porto, Artur Pinto

Ribeiro.

23 de Junho 1904 – Realiza-se, no Porto, uma manifestação de apoio a Guerra Junqueiro.

26 de Junho 1904 – Eleições gerais com vitória do partido regenerador, no governo, com

acordos eleitorais com os progressistas

10 de Agosto 1904 – Morre o jornalista Ribeiro de Azevedo, redactor de “A Lucta” e de “A

Folha do Povo”. Foi enterrado civilmente.

31 de Agosto 1904 – Morre na Figueira da Foz o benemérito propagandista e amigo da

instrução popular, João Jacinto Fernandes.

20 de Setembro 1904 – Inauguração do Congresso Internacional do Livre Pensamento em

Roma. Portugal fez-se representar por Magalhães Lima e Fernão Botto Machado.

15 de Outubro 1904 – Morre em Lisboa Manuel Emídio Garcia, notável escritor, jornalista

e professor universitário. Autor do drama “Entre Dois Fogos”, onde defendia o divórcio e

combatia os dogmas impostos pelos Jesuítas.

18, 19 e 20 de Outubro 1904 – Queda do governo Hintze Ribeiro devido à discussão par-

lamentar sobre os novos contratos do tabaco e dos fósforos. O Partido Progressista volta ao

governo, onde permanecerá até 1 de Fevereiro de 1906. Será o último governo presidido por

Luciano de Castro, apelidado o ministério das mil e uma maravilhas.

13 de Novembro 1904 – Morre Florinda Bela, propagandista das reivindicações feministas.

14 de Novembro 1904 – Alfredo Augusto César da Silva realiza uma conferência na Asso-

ciação Comercial dos Lojistas de Lisboa sobre o Marquês de Pombal.

8 de Dezembro 1904 – Sessão Solene no Teatro Príncipe Real em homenagem a Bernar-

dino Machado, que havia aderido ao Partido Republicano, organizada pela Associação de

Livre-Pensamento.

12 de Dezembro 1904 – D. Carlos vista a Grã-Bretanha.

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1905

12 de Janeiro 1905 – Morre em Paredes José Vieira Pinto dos Reis, fundador dos jornais

“O Povo” e “O Alarme”.

4 de Fevereiro 1905 – Registam-se tumultos em Lisboa, por ocasião da chegada de Bernar-

dino Machado.

12 de Fevereiro 1905 – Eleições gerais com vitória do Partido Progressista, no governo.

9 de Março 1905 – Por decreto do Governo, foi criada uma comissão para erguer o monu-

mento ao Marquês de Pombal.

19 de Março 1905 – Morre, em Lisboa, o médico João Rodrigues dos Santos.

2 de Abril 1905 – Saíram dois números da revista Livre-Pensamento, o último em Maio

desse ano.

5 de Abril 1905 – Congresso do Livre Pensamento, em Lisboa.

2 de Maio 1905 – Dissidência progressista de José Maria de Alpoim por causa do contrato

dos tabacos, levando consigo seis deputados progressistas, dando origem à chamada Dissi-

dência Progressista.

8 de Maio 1905 – Realizam-se, em Lisboa, as comemorações do segundo centenário do

nascimento do poeta António José da Silva, o Judeu. Estas comemorações foram promovidas

pela Associação do Registo Civil e constaram, entre outras realizações, de uma conferência

realizada por Teófi lo Braga no Ateneu Comercial.

20 de Junho 1905 – Comício em Coimbra contra a questão dos tabacos organizado por

associações de operários. Decorreu próximo do Largo da Fornalhinha.

21 de Junho 1905 – Congresso Inter-Peninsular da Maçonaria.

22 de Junho 1905 – Congresso Inter-Peninsular da Maçonaria.

23 de Junho 1905 – Encerramento do Congresso Inter-Peninsular de Maçonaria, em Lisboa.

24 de Junho 1905 – Morre no Porto o jornalista Felizardo de Lima, fundador da Associa-

ção do Livre Pensamento, Propagadora do Registo Civil. Escreveu o livro “Judeus, Cristãos

e Maometanos perante a ciência” e traduziu a “História da Religião ao Alcance de Todos”, de

Iborreta. Foi enterrado civilmente.

16 de Julho 1905 – Augusto José Vieira realiza uma conferência no Clube 8 de Maio.

19 de Agosto 1905 – Nas eleições para deputados republicanos por Lisboa obtêm maior

votação no círculo oriental Afonso Costa e António José de Almeida, e no círculo ocidental

Alexandre Braga e João de Meneses.

25 de Agosto 1905 – Morre em Marvão o democrata e livre-pensador José Carrilho Videira,

fundador da Biblioteca das Ideias Modernas.

1 de Setembro 1905 – Cenas de pugilato na Câmara dos Pares entre Dantas Baracho e

Pereira Dias.

27 de Outubro 1905 – Uma delegação maçónica constituída por Luís Augusto Ferreira de

Castro, Luís Filipe da Mata e José Maria de Moura Barata Feio Terenas vão receber o presi-

dente francês Loubet e entregam-lhe uma mensagem. A Instituição “O Vintem das Escolas”

organiza em honra do Presidente Loubet um canto coral com 1500 crianças das suas escolas,

que entoam entre outros cânticos a Marselheza e vão decorados com a medalha comemora-

tiva da visita de Loubet a Portugal e os rapazes com os seus vistosos fardamentos.

27 de Outubro 1905 – Emile Loubet, presidente da República Francesa, visitou Lisboa.

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27 de Outubro 1905 – O presidente da França Émile Loubet visita Lisboa. Os republicanos

realizam manifestações de regozijo.

8 de Novembro 1905 – Realiza-se um sarau literário na Caixa Operária de Lisboa a favor

de Angelina Vidal.

20 de Novembro 1905 – D. Carlos parte para Paris

10 de Dezembro 1905 – Comício dos republicanos, na Estefânia. Discursos de Afonso

Costa, António José de Almeida e Brito Camacho.

28 de Dezembro 1905 – Nova remodelação governamental.

1906

1 de Janeiro 1906 – Inicia publicação o jornal diário republicano de Lisboa “A Lucta”, diri-

gido por Manuel de Brito Camacho.

7 de Janeiro 1906 – Afonso Costa realiza no Centro Democrático do Porto uma notável

conferência sobre formas de governo.

16 de Janeiro 1906 – Morre o ex-capitão Amaral Leitão, um dos implicados na revolta de

31 de Janeiro de 1891.

17 de Janeiro 1906 – Morre na cidade do Porto o médico republicano José Joaquim Dias

Júnior.

21 de Janeiro 1906 – Grande comício na cidade do Porto onde discursaram Afonso Costa,

Duarte Leite e Nunes da Ponte, entre outros.

24 de Janeiro 1906 – O jornal “O Mundo” é novamente condenado, por suposto abuso de

imprensa, em 40 dias de prisão e nas custas e selos do processo.

26 de Janeiro 1906 – Morre em Setúbal o antigo republicano Joaquim Arocha Júnior.

27 de Janeiro 1906 – Os estudantes de Coimbra recebem em festa os representantes do

Partido Republicano que iriam inaugurar o Centro Académico Republicano. O grande mentor

desta iniciativa foi Carlos Olavo.

28 de Janeiro 1906 – Fundação do Centro Académico Republicano, sito nas escadas do

Quebra-Costas.

4 de Fevereiro 1906 – Parte de Coimbra o Dr. Bernardino Machado, vindo a Lisboa para

presidir à sessão solene do 6º aniversário da Escola 31 de Janeiro.

5 de Fevereiro 1906 – Encerra a Câmara dos Pares entre grandes protestos a propósito do

escândalo dos Tabacos.

7 de Fevereiro 1906 – Reúne a comissão republicana do Beato (Lisboa).

7 de Fevereiro, 1906 – Sessão agitada na Câmara dos Deputados quando José Luciano

apresenta os novos ministros.

9 de Fevereiro 1906 – Os estudantes republicanos de Coimbra protestam contra a prepo-

tência de que foi vítima o secretário da Universidade, Cerqueira Coimbra.

9 de Fevereiro 1906 – Reúnem os Centro Rodrigues de Freitas, Grémio Comercial Demo-

crático e Comissão Paroquial Republicana de Santo André e S. Vicente.

11 de Fevereiro 1906 – Reúnem a Comissão Organizadora do Centro Republicano Botto

Machado e a Comissão Paroquial Republicana da Freguesia do Sacramento.

12 de Fevereiro 1906 – O empresário do Teatro do Príncipe Real é intimado a substituir

o guarda-roupa do quadro da revista do ano ali em cena, intitulada “O Tribunal do Santo

Ofício”.

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17 de Fevereiro 1906 – Reúnem no Centro Republicano de S. Carlos, a Comissão Muni-

cipal Republicana de Lisboa e a Junta Directora do Sul, os antigos membros do Directório,

antigos deputados republicanos e vereadores, e os directores dos jornais republicanos.

19 de Fevereiro 1906 – Manifesto dos estudantes de Coimbra contra a degradação da acti-

vidade governamental.

20 de Fevereiro 1906 – Morre, em Tomar, Joaquim Cândido, antigo médico do município

e ex-vogal da Junta Geral do Distrito de Santarém.

20 de Fevereiro 1906 – Estudantes do Liceu do Carmo em Lisboa queimam um grande

charuto de cartão, onde podia ler-se Abaixo o Governo.

21 de Fevereiro 1906 – As empresas jornalísticas de Lisboa publicam um manifesto contra

a censura prévia à imprensa.

22 de Fevereiro 1906 – Reúnem no Centro Republicano do Largo de S. Carlos, sob a pre-

sidência de Manuel de Arriaga, as comissões paroquiais republicanas de Lisboa.

22 de Fevereiro 1906 – É processado Bernardino Machado por um artigo publicado no

“Mundo” de 13 de Fevereiro desse ano, intitulado “França e Portugal”.

22 de Fevereiro 1906 – Manifesto das empresas jornalísticas de Lisboa contra a apreensão de

jornais. Subscrevem-nos França Borges, por O Mundo, Moreira de Almeida, O Dia, Maga-

lhães Lima, Vanguarda, Alfredo Cunha, Diário de Notícias, Zeferino Cândido, A Época.

23 de Fevereiro 1906 – Morre em Lisboa o livre-pensador Miguel José Mendes, fundador

e director da “Voz do Operário”.

26 de Fevereiro 1906 – É proibida a circulação no Porto do jornal “O Norte”.

1 de Março 1906 – Reúnem-se, na sede da comissão municipal republicana e a convite

desta, os presidentes das comissões paroquiais republicanas.

2 de Março 1906 – Reúne a comissão eleitoral republicana da freguesia das Mercês (Lisboa).

3 de Março 1906 – O jornal “El País”, de Madrid, publica traduzido em castelhano, o artigo

de Bernardino Machado,”França e Portugal” que tinha sido originalmente publicado pelo

diário republicano “O Mundo”.

3 de Março 1906 – Morre, com 87 anos, Luís de Almeida e Albuquerque, director da Escola

Politécnica, que publicou no “Mundo” alguns artigos de pendor republicano.

4 de Março 1906 – Reúne a comissão paroquial republicana do Sacramento (Lisboa).

4 de Março 1906 – Instala-se o Centro Eleitoral Democrático, de Lisboa, sob a presidência

de Bernardino Machado, tomando parte como oradores Manuel de Arriaga, João de Mene-

ses e António José de Almeida.

6 de Março 1906 – “O Mundo” publica o agravo da apreensão do mesmo jornal, pelo artigo

de Bernardino Machado intitulado “França e Portugal”.

7 de Março 1906 – Morre o cidadão republicano José Pereira da Cunha.

9 de Março 1906 – Reúne a comissão instaladora do Centro Escolar Fernão Botto Machado.

10 de Março 1906 – Reúne, na Liga da Paz, a comissão promotora da homenagem a Teófi lo

Braga.

11 de Março 1906 – António José de Almeida realiza uma conferência em Cuba.

11 de Março 1906 – Realiza-se, em Beja, o julgamento do semanário republicano “Nove de

Junho”.

11 de Março 1906 – D. Carlos parte para Espanha em vista ofi cial. Regressará no dia 16.

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12 de Março 1906 – Realiza-se uma cerimónia de homenagem ao saudoso republicano

Bernardino Pinheiro, no cemitério dos Prazeres em Lisboa.

13 de Março 1906 – Reúnem-se as comissões municipais republicanas do 1º Bairro em

Lisboa.

15 de Março 1906 – Reúne-se a comissão republicana da Porcalhota (actualmente concelho

da Amadora).

16 de Março 1906 – Dá entrada na cadeia do Limoeiro, Carlos Cruz, secretário da Associa-

ção Propagadora do Registo Civil de Lisboa, para cumprir a pena de vinte meses de prisão

por ofensas ao dogma da Imaculada Conceição, publicadas no jornal Vanguarda. Carlos

Cruz acabou por cumprir somente setenta e oito dias de prisão, porque foi indultado pelo

governo de João Franco.

18 de Março 1906 – Heliodoro Salgado realiza nova conferência no Grémio Federal Repu-

blicano, subordinada ao tema: República e Comuna.

19 de Março 1906 – Publica-se o primeiro número do jornal “Pátria”, órgão do Centro

Académico Republicano de Coimbra.

19 de Março 1906 – Reúne a Comissão Paroquial Republicana de Dois Portos (Torres

Vedras).

19 de Março 1906 – O governo de José Luciano de Castro demite-se.

21 de Março 1906 – Último governo de Hintze Ribeiro.

1 de Abril 1906 – Torna-se pública a lista dos candidatos republicanos a deputados pelos

círculos de Lisboa.

1 de Abril 1906 – Na Póvoa de Santa Iria, António José de Almeida realiza uma sessão de

propaganda eleitoral.

7 de Abril 1906 – O Tribunal da Relação absolve “O Mundo”, condenado no Tribunal da

Boa Hora.

8 de Abril 1906 – Realizam-se comícios de propaganda republicana em Alhandra, Sacavém

e Arruda dos Vinhos e conferências no Centro Rodrigues de Freitas e no Grémio Federal

Republicano.

12 de Abril 1906 – Realiza-se o comício republicano em Dois Portos.

13 de Abril 1906 – Comício de propaganda eleitoral republicana em Alcântara (Lisboa).

14 de Abril 1906 – É apreendido “O Mundo”.

15 de Abril 1906 – Grandes comícios republicanos em Torres Vedras, Labrugeira, Merce-

ana, Atalaia, Alenquer, Lourinhã, Setúbal, Almeirim e Gondomar.

16 de Abril 1906 – Grande comício em Vila Franca de Xira.

22 de Abril 1906 – Comícios republicanos na Estefânia e nos Olivais.

22 de Abril 1906 – Grandioso comício em Lisboa para apresentação dos candidatos a depu-

tados pelos dois círculos eleitorais da capital.

24 de Abril 1906 – “O Mundo” intenta uma acção comercial por perdas e danos contra

Hintze Ribeiro e o ex-Juiz Veiga.

24 de Abril 1906 – São apreendidos os jornais Vanguarda e Mundo por publicarem os dis-

cursos dos comícios.

25 de Abril 1906 – O Tribunal da Relação de Lisboa anula o despacho da primeira instân-

cia, que tinha confi rmado a apreensão do jornal “O Mundo” pela inserção do artigo “França

e Portugal”, devido à pena de Bernardino Machado.

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29 de Abril 1906 – Eleições gerais de deputados, saindo eleitos por Lisboa: Afonso Costa,

Alexandre Braga, António José de Almeida e João de Menezes.

29 de Abril 1906 – Nas eleições gerais não são eleitos deputados republicanos, mas à última

hora, Bernardino Machado, graças ao uma chapelada governamental, aparece eleito pela

assembleia do Peral, com três vezes mais votos do que o número de eleitores.

1 de Maio 1906 – Brito Camacho funda o Jornal “A Lucta”.

3 de Maio 1906 – Reúne a Comissão Paroquial Republicana dos Anjos (Lisboa), onde se

resolve oferecer um bodo a 100 pobres, para assinalar a votação alcançada pelos deputados

do povo na última eleição.

4 de Maio 1906 – Chega a Lisboa Bernardino Machado. A polícia agride a população de

forma brutal junto à estação de comboio.

4 de Maio 1906 – Incidentes, no Rossio, quando republicanos esperam a chegada de Ber-

nardino Machado

6 de Maio 1906 – Incidentes na praça de touros do Campo Pequeno: espectadores voltam

as costas à família real e ovacionam Afonso Costa.

7 de Maio 1906 – O jornal “O Mundo” é apreendido.

12 de Maio 1906 – António José de Almeida é intimado a comparecer no Juízo de Instru-

ção Criminal, tornando-o responsável por quaisquer motins populares. É eleita a Comissão

Paroquial Republicana de Coimbra.

16 de Maio 1906 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Santa Cruz, em Coimbra.

19 de Maio 1906 – Em Gouveia, realiza-se uma reunião preparatória para organização do

Partido Republicano local.

19 de Maio 1906 – São eleitas, no Porto, as Comissões Paroquiais Republicanas de Cam-

panhã, Foz do Douro, Bonfi m, Miragaia, Lordelo do Ouro, Santo Ildefonso, Paranhos e

Victória.

19 de Maio 1906 – Governo de João Franco. O rotativismo partidário entre regeneradores e

progressistas, inaugurado em 1893, termina a sua fase. Pensa-se que João Franco irá concre-

tizar o programa de Vida Nova, proposto por Oliveira Martins e António Cândido.

24 de Maio 1906 – São eleitas as Comissões Paroquiais Republicanas de Massarelos, Aldoar

e Arcozelo.

27 de Maio 1906 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Lamego.

28 de Maio 1906 – Conselho de Estado vota amnistia para os crimes de imprensa.

29 de Maio 1906 – O professor Carlos Cruz, secretário da Associação do Registo Civil sai da

cadeia, indultado pelo governo de João Franco. Este cidadão encontrava-se preso por ofensas

à religião e tinha sido condenado a vinte meses de cadeia.

29 de Maio 1906 – Reunião de republicanos sobre o caso Schroeter.

1 de Junho 1906 – Imponente manifestação de protesto contra a existência nos conselhos

da Coroa de um estrangeiro naturalizado (Ernesto Driesel Schroeter, Ministro da Fazenda,

nomeado em Maio de 1906).

1 de Junho 1906 – Manifestação de republicanos contra Schroeter, com discurso de Ber-

nardino Machado.

1 de Junho 1906 – Chegam a Lisboa os deputados republicanos espanhóis D. Lúcio Cata-

lina Bachiller e D. Emílio Mendes Pallares.

5 de Junho 1906 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Arroios.

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8 de Junho 1906 – Inauguração em Benfi ca da creche das Fábricas Grandela.

9 de Junho 1906 – É eleita a Comissão Municipal Republicana do Porto.

10 de Junho 1906 – Há em Lisboa grandes manifestações republicanas à chegada do Clube

Fenianos do Porto.

20 de Junho 1906 – Publica-se novo livro de João Chagas, “Bom Humor”.

22 de Junho 1906 – Bernardino Machado realiza uma conferência no Centro Eleitoral

Democrático.

23 de Junho 1906 – É feita uma grande manifestação de apoio a Afonso Costa na gare de

S. Bento.

25 de Junho 1906 – António José de Almeida realiza uma conferência no Centro Republi-

cano do Largo de S. Carlos.

26 de Junho 1906 – Morre no Porto o republicano António Dias Pinto.

28 de Junho 1906 – Partem para o Porto os delegados ao Congresso Republicano, havendo

manifestações da Gare do Oriente.

1 de Julho 1906 – José Benevides, antigo membro do Directório do Partido Republicano

parte para S. Tomé e Príncipe.

1 de Julho 1906 – É eleito no Porto o Directório do Partido Republicano, fi cando assim

constituído: Dr. Bernardino Machado, Afonso Costa, António José de Almeida, António

Luís Gomes, Celestino de Almeida; como suplentes: Albano Coutinho, Francisco Fernandes

Costa, João José de Freitas e Inácio de Magalhães Basto.

4 de Julho 1906 – O Directório do Partido Republicano envia um telegrama de saudação

ao Presidente da República Francesa.

7 de Julho 1906 – No Porto, à chegada do chefe de governo há manifestações republicanas.

7 de Julho 1906 – Reúne a direcção do Grémio Federal Republicano.

7 de Julho 1906 – Reúne a Comissão Municipal Republicana do Porto.

7 de Julho 1906 – O Directório do Partido Republicano convida o povo do Porto para um

comício público, no dia 15 de Julho.

8 de Julho 1906 – Reúne-se em Guimarães o Congresso Regionalista do P.S.P.

8 de Julho 1906 – Bernardino Machado realiza uma conferência em Aviz, a convite dum

infl uente local.

9 de Julho 1906 – Chega a Lisboa o abade Paes Pinto que é recebido com grandes manifes-

tações republicanas.

9 de Julho 1906 – Sá Pereira realiza uma conferência no Centro Republicano Rodrigues de

Freitas.

10 de Julho 1906 – Fica defi nitivamente instalado na sua sede o Centro Eleitoral Republi-

cano Democrático Elias Garcia, na Cova da Piedade.

11 de Julho 1906 – Assinala-se o aniversário da morte do valioso republicano Sebastião

Correia Saraiva Lima.

12 de Julho 1906 – Chega a Lisboa D. José de Salmeron, fi lho do patriarca republicano

espanhol D. Nicolau de Salmeron.

12 de Julho 1906 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de S. José.

13 de Julho 1906 – Parte para Cabanas (Carregal do Sal) o abade Paes Pinto, um dos revo-

lucionários do 31 de Janeiro.

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316 república e democracia

15 de Julho 1906 – Realiza-se no Porto um grande comício republicano presidido por

Nunes da Ponte, proferindo discursos na ocasião Eduardo d’ Abreu, Afonso Costa e António

José de Almeida.

15 de Julho 1906 – Em Lamego realiza-se uma conferência republicana com Antão de

Carvalho.

15 de Julho 1906 – Augusto José Vieira realiza uma conferência no Centro Rodrigues de

Freitas.

17 de Julho 1906 – “O Mundo” publica na íntegra o discurso de Eduardo Abreu, no comí-

cio do Porto.

18 de Julho 1906 – É entregue a António José de Almeida uma mensagem coberta de assi-

naturas republicanas comemorando o dia do seu aniversário.

20 de Julho 1906 – Inauguração do Centro Fernão Boto Machado.

21 de Julho 1906 – Reúne a Comissão Municipal Republicana do Porto para tratar de

assuntos eleitorais.

22 de Julho 1906 – É eleita a Comissão Distrital Republicana de Coimbra.

22 de Julho 1906 – Realiza-se em Beja um banquete em honra de Aresta Branco.

1 de Agosto 1906 – Na sede da Associação dos Lojistas realiza-se a sessão solene para inau-

guração do Centro António José de Almeida.

3 de Agosto 1906 – João de Meneses realiza uma conferência na sede da Academia de Ins-

trução Popular.

4 de Agosto 1906 – Bernardino Machado realiza uma conferência no Centro Eleitoral

Republicano.

5 de Agosto 1906 – Realizam-se comícios de propaganda eleitoral republicana no Porto,

Merceana, Atalaia, Vila Verde, Labrugeira, Alenquer e Almeirim.

6 de Agosto 1906 – João de Meneses realiza uma conferência de propaganda eleitoral em

Belém e António José de Almeida realiza outra conferência em Benfi ca.

6 de Agosto 1906 – É proibida a reunião do Partido Republicano em Alcântara para a rea-

lização da eleição da comissão paroquial.

7 de Agosto 1906 – Inaugura-se o Centro Republicano das Mercês.

9 de Agosto 1906 – Realizam-se sessões de propaganda eleitoral no Centro Rodrigues de

Freitas e Grémio Federal Republicano e na Quinta da Laranjeira, em Benfi ca.

10 de Agosto 1906 – Realizam-se sessões de propaganda eleitoral no Centro Rodrigues de

Freitas, Escola de Ensino Liberal, em S. Paulo (Benfi ca) e em Alcântara.

11 de Agosto 1906 – Em S. Paulo (Benfi ca), e no Centro Republicano de Alcântara, reali-

zam-se sessões de propaganda eleitoral.

13 de Agosto 1906 – Realizam-se sessões de propaganda eleitoral republicana no Centro

Rodrigues de Freitas, Academia de Instrução Popular, Grémio Federal Republicano, na fre-

guesia da Lapa e em Sintra.

14 de Agosto 1906 – Realizam-se sessões de propaganda no Centro Escolar Afonso Costa

e Academia de Instrução Popular. É julgado no Porto o jornal republicano “Voz Pública”,

sendo advogado de defesa Germano Martins.

15 de Agosto 1906 – Realizam-se comícios de propaganda em Alcântara, Setúbal, Porto e

Foz.

17 de Agosto 1906 – Realiza-se um comício republicano em Alhandra.

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advento da república em datas 317

22 de Agosto 1906 – “O Mundo” publica uma saudação, em nome de Afonso Costa, e a

pedido deste por telegrama de Cauterets, ao povo republicano de Lisboa, pela grande afi r-

mação que representa o acto eleitoral de dia 19 do corrente.

23 de Agosto 1906 – Funda-se no Porto o Centro Democrático Duarte Leite.

26 de Agosto 1906 – Reúne o Grémio Federal Republicano.

27 de Agosto 1906 – Reúnem as Comissões Paroquiais de Santa Catarina e S. José e o Cen-

tro Escolar Botto Machado.

28 de Agosto 1906 – Recebe-se em Lisboa um telegrama de Alves da Veiga saudando o povo

republicano e os seus deputados.

29 de Agosto 1906 – Comício anti-clerical, em Beja, presidido por Miguel Bombarda.

29 de Agosto 1906 – Reúne extraordinariamente a Comissão Paroquial Republicana de

Benfi ca.

30 de Agosto 1906 – Reúnem na Câmara Municipal de Lisboa as assembleias de apura-

mento dos dois círculos eleitorais, apurando-se com respeito aos candidatos republicanos

por Lisboa a seguinte votação pelo círculo oriental: António José de Almeida, 6467 votos;

Afonso Costa, 6351 votos; Bernardino Luiz Machado Guimarães, 6284 votos; Augusto de

Vasconcelos, 6062 votos; Pedro António Betencourt Raposo, 6168 votos. Pelo círculo oci-

dental: João de Meneses, 5117 votos; Alexandre Braga, 5037 votos; Francisco José Fernandes

Costa, 4930 votos; João José de Freitas, 4929 votos; José Correia Nobre França, 4438 votos.

31 de Agosto 1906 – Grande reunião partidária no Centro Eleitoral Democrático para

tratar da eleição da Comissão Municipal Republicana.

2 de Setembro 1906 – Realiza-se em Alenquer uma grande reunião republicana para eleger

a sua comissão municipal.

6 de Setembro 1906 – Reúne o Grémio Federal Republicano, que aprova uma mensagem

a Afonso Costa.

16 de Setembro 1906 – António José de Almeida percorre várias freguesias dos concelhos

de Alenquer e Vila Franca de Xira em propaganda política.

20 de Setembro 1906 – Elege-se a comissão organizadora do Centro Republicano de Pro-

paganda de Santa Isabel.

27 de Setembro 1906 – Por Jacinto Nunes e Aresta Branco foi instalada a Comissão Paro-

quial Republicana de Sines.

21 de Setembro 1906 – Duelo entre Abel de Andrade e Aníbal Soares, jornalista franquista

do Diário Ilustrado

2 de Outubro 1906 – Faz a sua estreia parlamentar António José de Almeida.

3 de Outubro 1906 – Alexandre Braga estreia-se a discursar no parlamento.

5 de Outubro 1906 – É adiado o julgamento do juiz Veiga no processo que “O Mundo”

lhe move.

7 de Outubro 1906 – É inaugurada em Sobral, concelho de Vila Franca de Xira, uma escola

gratuita a expensas do prestimoso republicano Manuel Fernandes Pereira.

12 de Outubro 1906 – Morre em Lisboa Heliodoro Salgado, activo propagandista repu-

blicano e livre-pensador. Autor de várias obras como “Culto da Imaculada Conceição” e tra-

dução de outras obras como “Ciência e Religião”, de Malvert. O seu corpo foi venerado nas

instalações do Centro Republicano do Largo de S. Carlos.

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318 república e democracia

14 de Outubro 1906 – Realiza-se civilmente o funeral de Heliodoro Salgado, sendo acom-

panhado de grande manifestação de pesar entre a imensa multidão.

18 de Outubro 1906 – António José de Almeida discursa na Câmara dos Deputados contra

João Franco.

20 de Outubro 1906 – Afonso Costa discursa na Câmara dos Deputados, afi rmando que «à

frente do governo está um rábula».

21 de Outubro 1906 – Inauguração em Lisboa, em Benfi ca, a Escola Dr. Afonso Costa,

mandada construir pelo industrial e comerciante Francisco de Almeida Grandela.

28 de Outubro 1906 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Lisboa.

28 de Outubro 1906 – Bernardino Machado procede à entrega dos prémios aos alunos da

Academia de Instrução Popular.

30 de Outubro 1906 – Regressa a Portugal Alves da Veiga.

1 de Novembro 1906 – É dada posse à Comissão Municipal Republicana de Lisboa.

4 de Novembro 1906 – Realiza-se a eleição camarária do Porto, sendo eleitos vários

republicanos.

4 de Novembro 1906 – Eleições municipais do Porto, com vitória dos republicanos.

5 de Novembro 1906 – É conhecido o resultado defi nitivo das eleições camarárias do Porto,

vencendo por grande maioria a lista apoiada pelo Partido Republicano, o qual fi ca com os

seguintes representantes: Duarte Leite, Nunes da Ponte, Germano Martins, António da Silva

e Cunha, Xavier Esteves, Napoleão da Mata, Henrique de Oliveira e Machado Pereira.

16 de Novembro 1906 – Suspende temporariamente a sua publicação o jornal republicano

do Porto “O Norte”.

20 de Novembro 1906 – São expulsos do Parlamento, no meio de força armada, os deputa-

dos republicanos Afonso Costa e Alexandre Braga.

20 de Novembro 1906 – Questão dos adiantamentos no Parlamento em Novembro. Na

sessão de dia 20, Afonso Costa disse: «Por menos do que fez o Sr. D. Carlos, rolou no cada-

falso a cabeça de Luís XIV.» Os deputados republicanos são suspensos durante um mês dos

trabalhos parlamentares.

22 de Novembro 1906 – Manifestação de apoio a Afonso Costa, sendo presas 63 pessoas.

24 de Novembro 1906 – Em Viseu realiza-se um comício de protesto contra a expulsão da

Câmara dos Deputados dos representantes do Partido Republicano.

25 de Novembro 1906 – Realiza-se a eleição da Comissão Municipal Republicana de

Santarém.

25 de Novembro 1906 – Realiza-se em Aldeia Galega do Ribatejo uma conferência com

Agostinho Fortes.

27 de Novembro 1906 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Belém.

28 de Novembro 1906 – Comício republicano no Porto

29 de Novembro 1906 – Protestos contra o governo da Associação dos Lojistas

2 Dezembro 1906 – Comício republicano no Porto mobiliza cerca de 12 000 pessoas

8 de Dezembro 1906 – Comício republicano em Leiria

23 de Dezembro 1906 – Banquete de homenagem aos deputados republicanos na rua da

Junqueira em Lisboa.

29 de Dezembro 1906 – Regresso do rei a Lisboa, vindo de Vila Viçosa. Há uma manifes-

tação de homenagem.

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advento da república em datas 319

1907

3 de Janeiro 1907 – Morre o médico Ferraz de Macedo.

7 de Janeiro 1907 – Morre, em Lisboa, Oliveira Miguens, valioso elemento do Partido

Republicano na freguesia de Alcântara.

7 de Janeiro 1907 – Publica-se o primeiro número de “O Impressor”, em Lisboa.

10 de Janeiro 1907 – Publica-se o primeiro número da revista quinzenal “A Academia”.

20 de Janeiro 1907 – Morre em Lisboa o cidadão João Gonçalves, fundador da Associação

do Registo Civil.

20 de Janeiro 1907 – Os viticultores do Sul protestam contra a politica vinícola do Governo.

22 de Janeiro 1907 – Estreia “A Severa” de Júlio Dantas, no Teatro do Príncipe Real, em

Lisboa.

31 de Janeiro 1907 – Saiu o 1.º n.º do semanário A Verdade, órgão republicano académico.

1 de Fevereiro 1907 – Partem de Lisboa António José de Almeida e Bernardino Machado

para tomarem parte em comícios em Constância, Vila Nova da Barquinha e Abrantes.

2 de Fevereiro 1907 – Morre no Porto, o democrata e antigo companheiro de José Fontana,

Conceição Fernandes.

2 de Fevereiro 1907 – Realizam-se Barquinha e Constância importantes comícios republi-

canos onde discursam Bernardino Machado, António José de Almeida, Ramiro Guedes e

Anselmo Xavier, entre outros.

2 de Fevereiro 1907 – Publica-se no Porto o primeiro número de “Nova Silva”, dirigida por

Leonardo Coimbra, Jaime Cortesão, Cláudio Basto e Álvaro Pinto.

6 de Fevereiro 1907 – Afonso Costa profere um importante discurso na Câmara dos Depu-

tados sobre a questão do descanso semanal.

14 de Fevereiro 1907 – É aprovada uma lei que reconhece a liberdade de associação sem

autorização prévia.

14 de Fevereiro 1907 – Lei sobre a liberdade de associação.

17 de Fevereiro 1907 – Realiza-se em Évora, um comício republicano.

17 de Fevereiro 1907 – Inaugura-se o Centro João Chagas, no Poço do Bispo.

21 de Fevereiro 1907 – Inaugura-se o Centro Alexandre Braga.

24 de Fevereiro 1907 – Realiza-se em Lisboa um imponente comício de protesto contra a

lei de imprensa, ao qual assistem os principais vultos do Partido Republicano.

24 de Fevereiro 1907 – No Centro Republicano Rodrigues de Freitas realiza-se uma sessão

solene em homenagem a Teófi lo Braga.

24 de Fevereiro 1907 – É eleita a comissão municipal republicana da freguesia de S. Victor

(Braga).

24 de Fevereiro 1907 – Inauguram-se em Lisboa os Centros Republicanos Latino Coelho

e Castelo Branco Saraiva.

26 de Fevereiro 1907 – O Presidente da Associação de Agricultura renuncia ao mandato de

deputado, em protesto pela forma como o governo procedeu na questão vinícula.

27 de Fevereiro 1907 – Reúne extraordinariamente a comissão paroquial republicana de S.

Nicolau.

28 de Fevereiro 1907 – “O Mundo” publica a carta dos republicanos de Benguela (Angola) aos

deputados republicanos de Lisboa, em que protestam contra a sua expulsão do Parlamento.

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320 república e democracia

28 de Fevereiro 1907 – Teve início a greve académica de 1907, conhecida como Greve dos

Intransigentes.

1 de Março 1907 – Início da greve académica em Coimbra, originada pela reprovação do

candidato a doutor José Eugénio Dias Ferreira e que se insere numa contestação geral ao

governo de João Franco. O movimento alarga-se a outras escolas do país.

3 de Março 1907 – Inaugura-se, em Lisboa, o Centro Republicano Heliodoro Salgado.

3 de Março 1907 – Inaugura-se em Aldeia Galega (Montijo), o Centro Republicano Dr.

Celestino de Almeida.

4 de Março 1907- Quatrocentos estudantes de Coimbra vêm a Lisboa entregar uma petição

ao parlamento.

6 de Março 1907 – Afonso Costa leva ao parlamento a questão dos adiantamentos à Casa

Real.

7 de Março 1907 – A direcção da Associação Propagadora do Registo Civil de Lisboa,

informa Teófi lo Braga de que foi eleito sócio honorário da Associação, pedindo-lhe o seu

consentimento para realizar a inscrição.

7 de Março 1907 – Frederico Augusto III, rei de Saxe, visita Lisboa.

11 de Março 1907 – Inauguração, em Lisboa, do Centro Republicano Dr. Bernardino

Machado.

15 de Março 1907 – Artur Leitão realiza uma conferência no Centro Republicano da Ajuda.

16 de Março 1907 – Manuel de Brito Camacho realiza uma conferência política no Centro

Republicano da Pena.

17 de Março 1907 – Realiza-se a inauguração do posto de vacina gratuito no Centro Repu-

blicano da Pena.

17 de Março 1907 – Inaugura-se o Centro Republicano Pátria Nova, em Carnaxide.

17 de Março 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana do Porto .

18 de Março 1907 – É aprovada nova lei de imprensa.

19 de Março 1907 – Inaugura-se nas Caldas da Rainha um centro republicano.

19 de Março 1907 – Teófi lo Braga realizou uma conferência na Associação dos Lojistas para

marcar a inauguração da Escola Maternal.

23 de Março 1907 – Realiza-se em Chaves, um conferência republicana com Eugénio

Ferreira.

24 de Março 1907 – Inauguração do Centro Republicano Heliodoro Salgado, em Benfi ca

(Lisboa).

24 de Março 1907 – No Centro Republicano de Santa Isabel (Lisboa), realiza-se uma con-

ferência política com Manuel de Arriaga.

24 de Março 1907 – Realiza-se uma sessão solene no Centro Republicano Escolar de Lor-

delo do Ouro (Porto) para distribuição de prémios.

24 de Março 1907 – Sessão comemorativa do aniversário da Escola Liberal, em Setúbal.

24 de Março 1907 – Realiza-se um banquete em Chaves, de homenagem a Eugénio Ferreira.

24 de Março 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Anadia e a Comissão

Paroquial Republicana de Sangalhos.

25 de Março 1907 – Inaugura-se o Centro Eleitoral Republicano de Belém. Na sessão

solene, Bernardino Machado declarou-se solidário com a Academia de Coimbra, assumindo

o compromisso de abandonar a cadeira de lente no caso de algum académico ser expulso.

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25 de Março 1907 – Realiza-se um comício republicano em Sarilhos Grandes (Montijo),

para eleição da Comissão Paroquial Republicana.

25 de Março 1907 – D. Amélia e os príncipes partem para Sevilha onde vão assistir à

Semana Santa.

29 de Março 1907 – Sessão de homenagem a Heliodoro Salgado na sede da Associação dos

Corticeiros, em Almada.

29 de Março 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Vila Nova de Ourém.

1 de Abril 1907 – São expulsos da Universidade de Coimbra por dois anos os estudantes

republicanos Carlos Olavo, Ramada Curto e Campos Lima, e por um ano os estudantes

Alberto Xavier, Pinto Quartin e Gonçalves Preto.

1 de Abril 1907 – Bernardino Machado recebe uma intimação da reitoria da Universidade,

à qual responde com altiva dignidade.

2 de Abril 1907 – Suicida-se em Tomar, Cristóvão da Costa Gonçalves, um dos sócios

fundadores da Associação do Registo Civil de Lisboa, e membro, durante muitos anos, do

conselho fi scal e da direcção.

4 de Abril 1907 – “O Mundo” publica uma entrevista com alguns dos estudantes da Uni-

versidade de Coimbra em greve.

7 de Abril 1907 – Publicam-se os primeiros números de “A Conquista do Pão” e de “O

Garoto: Semanário Piadista”, ambos em Lisboa.

7 de Abril 1907 – Inauguração das novas instalações dos Armazéns Grandela.

9 de Abril 1907 – Parte para o Porto o ilustre advogado Afonso Costa, que vai defender

Guerra Junqueiro num processo de imprensa.

10 de Abril 1907 -Realiza-se, no Porto, o julgamento do poeta Guerra Junqueiro, sendo

condenado por abuso de imprensa em 50 dias de multa a 1$ooo réis e nas custas e selos do

processo, por ter injuriado o Rei no jornal “A Voz Pública”.

11 de Abril 1907 – João Franco fez aprovar uma lei de imprensa mas que fi cou conhecida

como lei contra a imprensa.

11 de Abril 1907 – Lei de imprensa de 11 de Abril de 1907 é considerada pela oposição

como lei contra a imprensa. Dela resulta o chamado gabinete negro.

12 de Abril 1907 – Início da ditadura de João Franco, que encerra a sessão legislativa sem

marcação de novas eleições.

13 de Abril 1907 – Artur Leitão realiza uma conferência no Centro Escolar da freguesia de

Santa Isabel.

14 de Abril 1907 – Realiza-se a eleição da Comissão Distrital Republicana de Lisboa.

14 de Abril 1907 – É eleita a Comissão Paroquial de Santana da Serra (Ourique).

14 de Abril 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Torres Vedras.

15 de Abril 1907 – Inauguram-se no Porto o Centro Guerra Junqueiro e o Centro Afonso

Costa.

16 de Abril 1907 – Bernardino Machado pede a sua exoneração de lente da Faculdade de

Filosofi a da Universidade de Coimbra.

17 de Abril 1907 – Bernardino Machado demite-se de professor da Universidade de

Coimbra.

21 de Abril 1907 – Imponentes comícios republicanos em Torres Vedras e Lourinhã.

28 de Abril 1907 – Início do Congresso do Partido Republicano em Lisboa.

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322 república e democracia

30 de Abril 1907 – O célebre “gabinete negro”, de invenção franquista, processa “O Mundo”

por oito artigos.

1 de Maio 1907 – Rebenta um surto de greves no sector fabril, principalmente em Setúbal,

Covilhã e Porto.

1 de Maio 1907 – É criada a Federação Geral do Trabalho.

1 de Maio 1907 – Realiza-se um comício comemorativo do 1.º de Maio, na Av. D. Amélia.

1 de Maio 1907 – Inicia-se a publicação no Porto de “A Voz do Povo”, órgão do Partido

Socialista do Norte.

1 de Maio 1907 – Publica-se em Lisboa o primeiro número de “A Humanidade”, folha

mensal cooperativista, dirigida por Fernão Botto Machado.

1 de Maio 1907 – Surge o jornal “A Luta” de Brito Camacho.

2 de Maio 1907 – Remodelação do Governo de João Franco.

4 de Maio 1907 – O governo proíbe a inauguração do Centro João Chagas no Porto.

5 de Maio 1907 – O jornal “O Mundo” inicia uma subscrição pública a favor da libertação

dos presos na noite de dia 4 de Maio. Bernardino Machado, realiza na sala do Centro Elei-

toral Republicano, uma manifestação de protesto contra a eleição do Peral.

6 de Maio 1907 – É julgado, sendo absolvido, o redactor da “Voz Publica”, Lopes Teixeira.

6 de Maio 1907 – Publica-se o primeiro número de “A Seta”, órgão dos empregados do

comércio da Guarda.

7 de Maio 1907 – O Gabinete Negro processa dezassete artigos de “O Mundo”.

7 de Maio 1907 – Funda-se a Sociedade das Escolas Liberais. No Porto, são acusados de

delito de imprensa Alfredo de Magalhães, Duarte Leite e Henrique Cardoso.

8 de Maio 1907 – É emitido o primeiro decreto ditatorial.

8 de Maio 1907 – A oposição desencadeia uma vaga de ataques a João Franco e a D. Carlos.

A oposição dos dissidentes progressistas entende-se com os republicanos e chega mesmo a

instituir-se um comité revolucionário com Ribeira Brava e Alpoim, pelos dissidentes, Afonso

Costa e Alexandre Braga, pelos republicanos.

10 de Maio 1907 – O governo de João Franco começa a governar em ditadura, dissolvendo

as Cortes.

11 de Maio 1907 – Manuel de Arriaga realiza uma conferência para inaugurar as Escolas

Maternais, que decorre na Associação dos Lojistas, em Lisboa.

12 de Maio 1907 – Realiza-se no Cartaxo um importante comício republicano. São eleitas

as Comissões Municipais Republicanas de Beja e da Mealhada.

14 de Maio 1907 – Publica-se o primeiro número de “O Proletário”, em Aveiro.

14 de Maio 1907 – “O País” é julgado na Boa-Hora e absolvido.

15 de Maio 1907 – As comissões executivas do Partido Progressista e do Partido Regenera-

dor reúnem-se para protestar contra a ditadura de João Franco.

15 de Maio 1907 – O jornal “A Vanguarda” é julgado.

16 de Maio 1907 – Realiza-se uma importante reunião republicana no Teatro S. Carlos para

proceder à análise da situação política da ditadura de João Franco.

17 de Maio 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Aveiro.

17 de Maio 1907 – Publica-se o primeiro número do semanário independente “O Fundão”.

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advento da república em datas 323

18 de Maio 1907 – Realiza-se no Tribunal da Boa-Hora o julgamento de França Borges e

Artur Leitão, do diário “O Mundo”, tendo patrocinado a defesa deste jornal o ilustre advo-

gado republicano Alexandre Braga.

19 de Maio 1907 – No Centro Eleitoral Republicano realiza-se uma importante reunião,

composta na sua maioria de caixeiros viajantes.

19 de Maio 1907 – Inaugura-se em Coimbrões (Gaia), o Centro Republicano Latino

Coelho.

19 de Maio 1907 – Solene investidura de Sebastião de Magalhães Lima como Grão-Mestre

do Grande Oriente Lusitano Unido.

19 de Maio 1907 – Realiza-se um comício em Lisboa, contra a ditadura de João Franco.

22 de Maio 1907 – Começa a funcionar os denominados “gabinetes negros” contra a

imprensa.

23 de Maio 1907 – A Associação do Registo Civil reforma os seus estatutos. Colaboraram

na elaboração do novo estatuto os cidadãos: Macedo de Bragança, Silva Fernandes, Manuel

Mendes de Almeida, Júlio Martins Pires, José Hemitério de Sousa Jordão, José Alvaro de

Oliveira e Alfredo Carvalho dos Santos.

23 de Maio 1907 – Bernardino Machado realiza uma conferência no Centro Republicano

de que é patrono.

23 de Maio 1907 – É publicado um decreto que manda encerrar as inscrições na Universi-

dade de Coimbra, considerando admitidos a exame apenas os naturais de Coimbra.

26 de Maio 1907 – Realiza-se em Lisboa um grande comício, contra a política do Governo.

26 de Maio 1907 – As Comissões Municipal e Paroquiais do Porto, sob a presidência de

Pedro Osório, aprovam uma moção de simpatia a Afonso Costa.

27 de Maio 1907 – Realiza-se no Seixal a Festa da Árvore.

30 de Maio 1907 – Em Alcobaça realiza-se uma grande manifestação de apoio a Bernardino

Machado.

1 de Junho 1907 – Realiza-se o julgamento Brito Camacho e de “A Lucta”.

1 de Junho 1907 – Manuel de Arriaga realiza uma conferência no Centro Escolar Republi-

cano Dr. Alexandre Braga.

1 de Junho 1907 – Ferreira Manso realiza uma conferência no Centro Republicano Dr. Ber-

nardino Machado.

1 de Junho 1907 – Publica-se o primeiro número do semanário republicano “Alvorada”, em

Guimarães, de que se publicaram apenas quatro números.

2 de Junho 1907 – Brito Camacho realiza uma conferência na Sociedade Promotora de

Educação Popular.

2 de Junho 1907 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Fanhões.

3 de Junho 1907 – Realiza-se o julgamento de Magalhães Lima e José do Vale e do jornal

“A Vanguarda”.

3 de Junho 1907 – Procede-se à eleição dos corpos gerentes no Centro Escolar Dr. Alexan-

dre Braga.

5 de Junho 1907 – Realiza-se o julgamento do “País”.

5 de Junho 1907 – É entregue pelo “Mundo” ao Directório do Partido Republicano a quan-

tia de 1265$430 réis, resto da subscrição aberta por aquele jornal para as vítimas de 4 de

Maio.

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324 república e democracia

5 de Junho 1907 – Publica-se no Porto o número um de “Azorrague”, auto-intitulado sema-

nário dos estudantes intransigentes.

6 de Junho 1907 – “O Mundo” publica uma entrevista a Bernardino Machado.

6 de Junho 1907 – É publicado o decreto que dissolve a Câmara Municipal de Lisboa.

9 de Junho 1907 – Realiza-se no Porto um imponente comício republicano.

10 de Junho 1907 – Sai o primeiro número de “O Mundo” nas novas instalações na Rua de

S. Roque.

10 de Junho 1907 – É julgado “O Mundo” por incurso na lei de imprensa, sendo condenado

França Borges (director) em 150 dias de prisão remíveis a 1$000 réis por dia e nas custas e

selos do processo, e Artur Leitão (redactor) em 80$000 de multa.

10 de Junho 1907 – No Centro Republicano da Ajuda realiza-se uma sessão de homenagem

a José Falcão.

13 de Junho 1907 – Realizam-se importantes comícios em Alpiarça, Almeirim e Santarém

onde participam José Relvas, Bernardino Machado, João Chagas e António José de Almeida,

entre outros.

14 de Junho 1907 – Realiza-se em Gouveia o julgamento do jornal “A Solidariedade” que

veio a ser absolvido do crime de delito de imprensa.

14 de Junho 1907 – Realiza-se um julgamento de Magalhães Lima e José do Vale do jornal

“Vanguarda”.

15 de Junho 1907 – Realiza-se em Lisboa o julgamento de “O País”. Meira e Sousa responde

neste processo pelos seus artigos “Preparemos a Revolução”, “Avante pela Revolução”, “Venha

a Revolução”, “Em face da Revolução” e “Processos Novos”.

15 de Junho 1907 – Em Setúbal é julgado Martins dos Santos, secretario de “O Germinal”.

15 de Junho 1907 – Imponente comício em Portalegre no qual discursam Bernardino

Machado e António José de Almeida.

15 de Junho 1907 – Inaugura-se em Almada o Centro Republicano Capitão Leitão.

15 de Junho 1907 – Inicia-se o julgamento do professor Bettencourt e do caldeireiro Rebor-

dão, acusados de na noite de 6 de Agosto estarem, na loja nº 17 da R. de Santo António à

Estrela, a fabricar maquinismos tendentes a determinar a explosão para destruição de pessoas

ou edifícios.

16 de Junho 1907 – Realiza-se um imponente comício de propaganda republicana em

Portalegre.

16 de Junho 1907 – Inaugura-se em Almada o Centro Republicano Capitão Leitão.

17 de Junho 1907 – O povo de Angra do Heroísmo protesta públicamente contra os jesuí-

tas e as irmãs da caridade no Hospital da cidade, registando-se distúrbios e sendo necessária

a intervenção da força militar.

17 de Junho 1907 – “O Mundo” é julgado e unanimemente absolvido pelo júri. No Porto,

o chefe do governo é recebido com desagrado pela população. São presos vários jornalistas e

vultos do Partido Republicano.

17 de Junho 1907 – João Franco passou na estação velha, onde foi recebido por uma mani-

festação de apoiantes e outra de críticos republicanos. Alguns estudantes foram espancados

e outros presos.

18 de Junho 1907 – À chegada de João Franco a Lisboa há manifestações populares, sendo

o povo atacado nas praças públicas, registando-se diversos feridos e mortos.

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advento da república em datas 325

19 de Junho 1907 – Repetem-se as manifestações populares em Lisboa, realizando-se mui-

tas prisões.

20 de Junho 1907 – São levados para o forte do Alto do Duque, escoltados por uma força

da guarda municipal, atravessando a cidade, os presos das noites de 18 e 19 de Junho.

20 de Junho 1907 – É publicada uma nova lei de imprensa que agrava ainda mais a de 11 de

Abril, proibindo escritos desenhos ou impressos atentatórios da ordem pública. Ficam refor-

çados os poderes dos governadores civis relativamente à decisão sobre novas publicações.

21 de Junho 1907 – É publicado no Diário do Governo o decreto autorizando os governa-

dores civis a suspenderem os jornais.

21 de Junho 1907 – A polícia invade o Liceu de S. Domingos e maltrata os estudantes,

disparando tiros.

22 de Junho 1907 – É julgado e absolvido “O Primeiro de Janeiro”.

23 de Junho 1907 – Os jornais “O Mundo” e “O País” são suspensos por trinta dias.

27 de Junho 1907 – “O Primeiro de Janeiro” e “A Voz Pública” são suspensos por oito dias.

1 de Julho 1907 – O príncipe Luís Filipe parte para uma visita a S. Tomé, Angola e

Moçambique.

2 de Julho 1907 – Sai no Porto o primeiro número do matutino “Diário Nacional”.

10 de Julho 1907 – João Chagas e o Visconde da Ribeira Brava encontram-se desencade-

ando o movimento que conduzirá ao golpe de 28 de Janeiro de 1908.

10 de Julho 1907 – Realiza-se um julgamento do jornal “O País”.

12 de Julho 1907 – Brito Camacho e o jornal “A Luta” são julgados e multados em 75$000

réis.

17 de Julho 1907 – São julgados António José de Almeida, Artur Leitão e França Borges por

artigos publicados em “O Mundo”.

18 de Julho 1907 – É julgado o jornal “A Voz Pública”, no Porto.

22 de Julho 1907 – Agostinho Fortes realiza uma conferência na Academia de Estudos

Livres.

22 de Julho 1907 – O jornal “O País” reaparece depois de ter estado suspenso.

23 de Julho 1907 – É retomada a publicação de “O Mundo” após a suspensão a que esteve

condenado.

27 de Julho 1907 – “O Mundo” publica as declarações feitas por Bernardino Machado a um

redactor do “Matin” sobre a crise política em Portugal.

27 de Julho 1907 – Os jornais “O Primeiro de Janeiro” e “Voz Publica” são suspensos por

oito dias.

28 de Julho 1907 – Realiza-se uma grande manifestação de apoio popular a Bernardino

Machado, na sua casa da Travessa do Pinheiro, recebendo a visita de muitos correligionários

e adesões de todo o país.

29 de Julho 1907 – “O Mundo” publica uma carta do antigo ministro da fazenda Augusto

Fuschini.

29 de Julho 1907 – Sai no Porto o primeiro e único número do semanário ilustrado repu-

blicano “A Revolta”.

30 de Julho 1907 – “O Mundo” publica, traduzida em português, uma entrevista do redac-

tor do “Heraldo”, de Madrid, D. Luís Morote com Bernardino Machado.

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326 república e democracia

30 de Julho 1907 – No Grémio Comércio e Indústria realizou-se uma sessão de homena-

gem a Magalhães Lima.

31 de Julho 1907 – “O Mundo” anuncia a colaboração diária do escritor e jornalista repu-

blicano João Chagas.

1 de Agosto 1907 – João Chagas começa a colaborar no “O Mundo”, na secção “Diário Livre”.

1 de Agosto 1907 – Morre Hintze Ribeiro, chefe do Partido Regenerador.

2 de Agosto 1907 – Realiza-se o julgamento de “O Mundo” no tribunal da Boa-Hora, sendo

António Maceira o advogado de defesa. O jornal republicano é absolvido.

5 de Agosto 1907 – É julgado e condenado Barbosa Colen, director do jornal “Novidades”.

6 de Agosto 1907 – Dá-se uma explosão na Rua de Santo António à Estrela, em Lisboa,

devido ao fabrico de bombas.

12 de Agosto 1907 – Nasce o futuro médico e escritor Adolfo Rocha, que fi cou consagrado

como Miguel Torga.

16 de Agosto 1907 – Realiza-se um comício de propaganda eleitoral em Campo de Ourique.

16 de Agosto 1907 – São suspensos por 30 dias “A Vanguarda” e “O Popular”.

18 de Agosto 1907 – Foi preso José Bento Gonçalves, que durante vários anos pertenceu aos

corpos dirigentes da Associação de Registo Civil. Após alguns dias de reclusão e incomunica-

bilidade, foi libertado a 6 de Setembro.

24 de Agosto 1907 – No Centro Eleitoral Democrático realiza-se uma sessão política para

apreciar os actos do Governo.

25 de Agosto 1907 – Reúnem as Comissões Municipal e Paroquial de Constância para

protestar contra a ditadura.

26 de Agosto 1907 – D. Carlos preside a uma reunião do Conselho de Estado.

30 de Agosto 1907 – É promulgado o decreto que liquida os adiantamentos à Casa Real.

1 de Setembro 1907 – Realiza-se no Centro Escolar Democrático uma festa democrática.

9 de Setembro 1907 – Morre José Dias Ferreira, em Vidago.

11 de Setembro 1907 – Reúne a comissão administrativa da Comissão Humanitária 27 de

Outubro de 1905.

13 de Setembro 1907 – Reúne a Comissão Paroquial de Cedofeita (Porto), aprovando um

voto de louvor à imprensa republicana pela forma digna como tem pugnado pelos interesses

do país.

14 de Setembro 1907 – O jornal “Vanguarda” retoma a publicação depois de 30 dias de

suspensão.

14 de Setembro 1907 – Sai no Funchal o primeiro número do semanário de caricaturas “A

Garra”.

15 de Setembro 1907 – Reúne o Grupo dos Nove Republicanos.

20 de Setembro 1907 – O jornal “O País” é suspenso de novo, por 30 dias.

22 de Setembro 1907 – Lançamento da primeira pedra para a construção do monumento

a Manuel Fernandes Tomás, na Figueira da Foz.

25 de Setembro 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana da Figueira da Foz.

27 de Setembro 1907 – Celebra-se a assinatura de um Tratado de aliança entre o Grande

Oriente do Brasil e o Grande Oriente Lusitano Unido.

28 de Setembro 1907 – O príncipe Luís Filipe regressa a Portugal depois da sua viagem a

África.

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advento da república em datas 327

30 de Setembro 1907 – Reúne a comissão paroquial de S. Cristovão e S. Lourenço.

4 de Outubro 1907 – Morre, em Hamburgo, Alfredo Keil, autor da música a “Portuguesa”,

escrita em 1890 após o Ultimato inglês e que se tornou o Hino Nacional com a implantação

da República.

4 de Outubro 1907 – “O Mundo” publica o agravo de Afonso Costa no célebre processo

dos 21.

6 de Outubro 1907 – Realiza-se uma sessão para distribuição de prémios na Missão Elias

Garcia do Vintém das Escolas.

12 de Outubro 1907 – Júlio de Vilhena é eleito chefe do Partido Regenerador.

13 de Outubro 1907 – É eleita a Comissão Municipal Republicana de Tavarede.

13 de Outubro 1907 – Realiza-se, por iniciativa da Associação do Registo Civil, uma roma-

gem ao túmulo de Heliodoro Salgado.

13 de Outubro 1907 – Agostinho Fortes realiza uma conferência no Centro Alexandre

Braga.

20 de Outubro 1907 – Inauguração em Aveiras de Cima da Escola Dr. Francisco Maria de

Almeida Grandela.

20 de Outubro 1907 – O professor Agostinho Fortes realiza uma conferência na Associação

do Registo Civil.

20 de Outubro 1907 – Realiza-se a festa do terceiro aniversário da Sociedade das Escolas

Liberais a que preside Bernardino Machado.

22 de Outubro 1907 – Realiza-se uma cerimónia de homenagem, nas Caldas da Rainha, a

Afonso Costa e a Francisco Grandela.

22 de Outubro 1907 – O corpo de Alfredo Keil chega a Lisboa.

24 de Outubro 1907 – Realiza-se a eleição da Comissão Paroquial Republicana de S. Brás

de Alportel.

27 de Outubro 1907 – Inauguração da Escola do Centro Capitão Leitão, em Almada.

27 de Outubro 1907 – Realiza-se um comício republicano em Almada.

1 de Novembro 1907 – É eleita a Comissão Paroquial Republicana de Cacia, em Aveiro.

Nesta ocasião foi também decidido fundar um centro democrático com aulas nocturnas para

adultos, uma biblioteca e gabinete de leitura.

1 de Novembro 1907 – Reorganizou-se em Vila Nova de Ourém a Comissão Municipal

Republicana.

3 de Novembro 1907 – Sob a presidência de Bernardino Machado realiza-se a distribuição

dos prémios da Escola Democrática.

3 de Novembro 1907 – Inauguração, no Porto, do Centro Democrático Dr. Afonso Costa.

3 de Novembro 1907 – O professor Borges Grainha realizou uma conferência no Ateneu

Comercial de Lisboa, subordinada ao tema “Educação Cívica”.

3 de Novembro 1907 – Morre o professor e politico José Vicente Barbosa du Bocage.

4 de Novembro 1907 – Afonso Costa é recebido com grandes manifestações de simpatia

em Mogofores e Anadia.

9 de Novembro 1907 – Realiza-se a cerimónia de casamento civil de Julião Quintinha, em

Silves. Foram testemunhas do acto Gregório Nunes Mascarenhas e Manuel Guerreiro da

Costa.

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328 república e democracia

10 de Novembro 1907 – Realiza-se no Centro Pátria Nova, em Carnaxide, a inauguração

da missão pelo Método João de Deus.

10 de Novembro 1907 – No Centro Republicano Liberdade (Évora), inaugura-se solene-

mente o retrato de Bernardino Machado.

13 de Novembro 1907 – Morre o velho e saudoso republicano Xavier da Silva.

14 de Novembro 1907 – Toma posse a Comissão Paroquial da Pena (Lisboa).

15 de Novembro 1907 – No Grémio Republicano Federal realiza uma conferência de Ber-

nardino Machado.

16 de Novembro 1907 – A Escola Democrática, onde se ensinava pelo Método de João de

Deus, prestou homenagem a Bernardino Machado, na sua nova residência na capital situada

na Rua de S. Bernardo à Estrela. A homenagem realizada constava da entrega de uma foto-

grafi a do grupo de crianças que frequentava essa mesma escola, bem como de um bouquet

de fl ores naturais. Há um século atrás frequentavam aquela escola 32 crianças, sendo 22

raparigas e 10 rapazes.

16 de Novembro 1907 – A rainha D. Amélia assiste em Londres ao casamento de sua irmã

Louise.

16 de Novembro 1907 – Numa casa da Rua do Carrião à Estrela, em Lisboa, o médico

Gonçalves Lopes e o comerciante Belmonte de Lemos morreram numa explosão quando

manipulavam bombas. Aquilino Ribeiro que vivia nessa casa escapa com vida e é preso.

17 de Novembro 1907 – Festa Republicana no Centro Dr. Castelo Branco Saraiva com a

realização de exames e a distribuição de prémios aos alunos da escola do centro. Presidiu à

cerimónia da entrega de prémios o professor Agostinho Fortes.

17 de Novembro 1907 – Fernão Botto Machado realiza um conferência em Sacavém sobre

a “Emancipação Progressiva da Mulher”.

17 de Novembro 1907 – Realiza-se uma conferência no Centro Republicano do Cartaxo

por Francisco José Pereira, inaugurando-se de seguida um curso para analfabetos adultos.

Anunciava-se também para breve a realização de um outro curso, neste caso de desenho para

operários.

17 de Novembro 1907 – Eleição da Comissão Paroquial Republicana em Manique do

Intendente, concelho da Azambuja.

17 de Novembro 1907 – Eleição da Comissão Paroquial Republicana de Quiaios (Figueira

da Foz), onde foram eleitos, como efectivos: Albano Sousa, António Gil Nogueira e Joaquim

Gil Netto. Substitutos: António Ribeiro, Joaquim Custódio Russo e José Gil Netto. Presidiu

à sessão o Dr. Cerqueira da Rocha por proposta do incansável republicano da Figueira da

Foz, José da Luz.

18 de Novembro 1907 – Inauguração do Centro Democrático Escolar de Aljustrel com a

presença dos ilustres líderes republicanos Aresta Branco, Augusto Barreto e Brito Camacho.

O jornal “A Lucta” calculava que assistiram a esta inauguração cerca de 3000 pessoas.

18 de Novembro 1907 – Os jornais “A Época” e “Correio da Noite” são suspensos até 19 de

Dezembro.

19 de Novembro 1907 – Por iniciativa e a expensas do Centro Republicano da freguesia

de S. Paio, em Gouveia, inaugurava-se um curso nocturno para ensino das primeiras letras,

através do Método de João de Deus.

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advento da república em datas 329

19 de Novembro 1907 – Aderem ao Partido Republicano o Luís Ferreira dos Santos, presi-

dente da Câmara Municipal de Loures e Marques da Costa, médico em Cacia.

19 de Novembro 1907 – Nasce Gustavo Soromenho, que viria a ser advogado e politico.

20 de Novembro 1907 – São suspensos os jornais “O Popular”, “O Dia” e “Jornal do

Comércio”.

21 de Novembro 1907 – O jornal “O Liberal” foi suspenso até 23 de Dezembro no segui-

mento da publicação duma nota dizendo: “enquanto não for suspenso este jornal estão as

suas colunas ao dispor dos colegas cujos jornais foram suspensos pelo ditador”.

22 de Novembro 1907 – O diário católico do Porto “A Palavra” foi suspenso por oito dias.

24 de Novembro 1907 – Adere ao Partido Republicano Faustino de Sá Nogueira, represen-

tante da família Sá da Bandeira.

25 de Novembro 1907 – No curso nocturno para adultos criado pelo Centro Escolar Repu-

blicano do Cartaxo estavam matriculados 136 alunos.

1 de Dezembro 1907 – Augusto José da Cunha e Anselmo Braamcamp Freire fi liam-se no

Centro Republicano.

4 de Dezembro 1907 – Sai no Porto o primeiro número do “Diário Popular” sucessor de

“O Popular”.

8 de Dezembro 1907 – É inaugurado em Lisboa o animatógrafo.

12 de Dezembro 1907 – Alves Roçadas é recebido pelo rei, no Arsenal, e os expedicionários

são aclamados em Lisboa.

19 de Dezembro 1907 – O jornal “O País” retoma a publicação depois de ter estado sus-

penso trinta dias.

23 de Dezembro 1907 – Reforma da Carta Constitucional.

1908

4 de Janeiro 1908 – É posto à venda o “Almanach do Mundo”, que no seu primeiro ano de

publicação consegue tornar-se um sucesso de vendas.

4 de Janeiro 1908 – Em Vila Nova de Ourém, realizou-se o registo civil de baptismo de

uma fi lha de Artur de Oliveira Santos que recebeu o nome de Democracia. Foram testemu-

nhas do acto Álvaro Mendes e Joaquim Fernandes Cordeiro. Era o segundo registo civil de

nascimento em Ourém.

8 de Janeiro 1908 – O jornal “Independência de Águeda”, que se publicava naquele concelho

desde 1903, declarou-se republicano. Colaboravam nesse periódico aguedense, entre outros:

António José de Almeida e Albano Coutinho. Tornou-se o órgão da Comissão Municipal

Republicana de Águeda.

11 de Janeiro 1908 – Termina o julgamento em Beja do antigo director do semanário repu-

blicano “Nove de Julho”, o cidadão Filipe Fernandes. Foi seu advogado de defesa o João de

Meneses, que conseguiu a absolvição do crime de liberdade de imprensa, por ter publicado

artigos considerados passíveis de crime sobre a questão dos adiantamentos à Casa Real.

18 de Janeiro 1908 – O Governador Civil de Coimbra proíbe a realização de uma conferên-

cia de carácter eleitoral que se iria realizar no Centro José Falcão, na Figueira da Foz.

19 de Janeiro 1908 – Realiza-se a inauguração da escola do Centro João Chagas, em Braço

de Prata, onde discursaram Bernardino Machado e João Chagas.

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330 república e democracia

20 de Janeiro 1908 – Em Lagos, adere ao Partido Republicano, o advogado Jerónimo

Cabrita Vieira Rato.

20 de Janeiro 1908 – Morre, em Lisboa, o médico António de Vasconcelos, presidente do

Centro Latino Coelho.

21 de Janeiro 1908 – Sai o n.º único do diário da tarde republicano “O Futuro”.

22 de Janeiro 1908 – São presos e acusados de conspiração contra o regime monárquico:

João Chagas, António José de Almeida e França Borges.

25 de Janeiro 1908 – O governo de João Franco impede a realização da reunião eleitoral

marcada para o Centro S. Carlos.

28 de Janeiro 1908 – Manifesta publicamente a sua adesão ao Partido Republicano Henri-

que Jardim de Vilhena, médico e professor na Escola Médica de Lisboa.

28 de Janeiro 1908 – São presos por suspeita de conspiração contra o regime monárquico:

Afonso Costa, o visconde de Ribeira Brava, Egas Moniz e o tenente Álvaro Poppe.

28 de Janeiro 1908 – Frustrou-se uma intentona de revolta republicana, na qual participa-

ram vários ofi ciais da armada e do exército.

29 de Janeiro 1908 – O governo de João Franco dava indicações ofi ciosas de que estavam

a ser preparados para deportação os republicanos e dissidentes presos nos dias antecedentes.

31 de Janeiro 1908 – Decreto prevendo a deportação dos que atentassem contra a segurança

do Estado. O decreto foi assinado por D. Carlos em Vila Viçosa.

1 de Fevereiro 1908 – Regicídio. No regresso de Vila Viçosa é morto a tiro no Terreiro do

Paço o rei D. Carlos, que na véspera assinara o decreto contra os que procuravam defender a

Pátria e a liberdade. Na mesma ocasião é morto seu fi lho D. Luís Filipe, herdeiro do trono.

Caiem, abatidos pelas balas da polícia os dois regicidas, Manuel Buiça e Alfredo Luís da

Costa, e um popular que nada tinha a ver com os acontecimentos, de nome João Sabino da

Costa.

5 de Fevereiro 1908 – Governo dito da «acalmação». São revogados alguns dos diplomas

franquistas, como a lei de imprensa e o decerto de 31 de Janeiro.

6 de Fevereiro 1908 – Reaparecem os jornais suspensos: Diário Popular, Liberal, O Dia, O

País, Correio da Noite.

6 de Fevereiro 1908 – “O Mundo” publica a primeira lista de subscrição para apoiar os fi lhos

do professor Buíça, abatido pela polícia aquando do regicídio.

6 de Fevereiro 1908 – São postos em liberdade Afonso Costa, João Chagas, António José

de Almeida, Alfredo Leal, Visconde de Ribeira Brava, França Borges, Egas Moniz e outros

presos políticos que foram mantidos incomunicáveis durante vários dias na cadeia de Caxias.

8 de Fevereiro 1908 – Funerais de D. Carlos e D. Luís Filipe.

11 de Fevereiro 1908 – De madrugada, são sepultados no cemitério do Alto de S. João, os

cadáveres do professor Buíça e de Alfredo Luís da Costa, mortos pela Polícia na tarde de 1 de

Fevereiro. Ao enterramento, realizado no maior secretismo, assistem apenas dois represen-

tantes do “Mundo” e guardas da polícia.

12 de Fevereiro 1908 – Amnistia para os marinheiros implicados nas revoltas de 8 e 13 de

Abril de 1906.

12 de Fevereiro 1908 – Chega a Lisboa, o visconde de Pedralva, preso em Espanha à ordem

de João Franco.

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advento da república em datas 331

15 de Fevereiro 1908 – São pronunciados o professor Brito Betencourt e o caldeireiro

Manuel Rebordão por fabrico de explosivos.

16 de Fevereiro 1908 – Grande comício republicano em Aldeia Galega (Montijo).

17 de Fevereiro 1908 – A direcção da Associação Propagadora da Lei do Registo Civil

promove uma romaria ao cemitério do Alto de S. João, às sepulturas dos seus consócios,

o professor Manuel Buiça e Alfredo Costa, empregado de comércio. Os jornais, mesmo os

mais conservadores e de grande circulação calcularam a assistência em 80 000 pessoas.

17 de Fevereiro 1908 – É colocado na disponibilidade o tenente de cavalaria Álvaro Poppe,

preso em 28 de Janeiro, no elevador da Biblioteca.

23 de Fevereiro 1908 – Inaugura-se no Beato (Lisboa), a Escola Heliodoro Salgado.

26 de Fevereiro 1908 – Afonso Costa retoma o seu lugar de professor na Universidade de

Coimbra, sendo aclamado entusiasticamente pelos estudantes republicanos.

29 de Fevereiro 1908 – Dissolução da Câmara dos Deputados.

8 de Março 1908 – Na cidade de Viseu realiza-se um grande comício republicano, no qual

tomam parte José Relvas, António José de Almeida e Fernandes Costa.

13 de Março 1908 – Regressa a Portugal Alberto Costa, que viveu quatro meses de exílio no

estrangeiro por razões políticas.

13 de Março 1908 – O jornal “O Mundo” anuncia os candidatos a deputados pelo Partido

Republicano, no círculo de Lisboa, a apresentar nas eleições gerais que iriam decorrer a 5

de Abril: Afonso Costa, António José de Almeida, José Relvas, Augusto Vasconcelos, Beten-

court Raposo, Teófi lo Braga, Teixeira de Queiróz, Alexandre Braga, João de Menezes e Aresta

Branco.

14 de Março 1908 – O jornal “O Mundo” anuncia os candidatos a deputados pelo círculo

eleitoral do Porto: Guerra Junqueiro, Antão de Carvalho , António Luís Gomes, Padua Cor-

reia, Basílio Teles, Alfredo Magalhães, José Caldas , Paulo Falcão e Nunes da Ponte.

15 de Março 1908 – Grande comício de propaganda republicana em Barcarena.

15 de Março 1908 – Em Braga foram escolhidos para candidatos a deputados por aquele

círculo eleitoral os seguintes republicanos: João de Freitas, Manuel Monteiro, João Caetano

Fonseca Júnior, Joaquim Sousa Fernandes, José Summaville Soares, António Martins de

Sousa Lima.

15 de Março 1908 – Realiza-se uma festa no Centro Republicano Alexandre Braga, onde

participam, para além do patrono do centro, Manuel de Arriaga, Alberto Costa, Fernão

Botto Machado e João de Meneses.

17 de Março 1908 – Adere ao Partido Republicano Carlos Bello de Moraes, lente na Escola

Médica de Lisboa.

19 de Março 1908 – Adere ao Partido Republicano Pinto de Magalhães, professor da Escola

Médica de Lisboa.

20 de Março 1908 – Adere ao Partido Republicano José de Pádua, conhecido médico em

Lisboa.

10 de Março 1908 – Fundação do Grupo Académico Democrático, constituído unicamente

por estudantes.

1 de Abril 1908 – Adere ao Partido Republicano Matos Cardoso, conhecido advogado em

Portalegre.

2 de Abril 1908 – Realizam-se grandes comícios republicanos em Mafra e Queluz.

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332 república e democracia

3 de Abril 1908 – Realizam-se comícios republicanos em Faro e Tavira, com participação

de Estevão de Vasconcelos, Agostinho Fortes, Fernandes Costa e António José de Almeida.

4 de Abril 1908 – São julgados no Porto e condenados os redactores da “Voz Pública”, Lopes

Teixeira, Pádua Correia e Bartolomeu Severino, acusados de injuriarem os juízes de Paredes

e Penafi el, que condenaram o tenente Djalme.

5 de Abril 1908 – Realizam-se as eleições gerais onde são eleitos deputados republicanos:

Afonso Costa, António José de Almeida, Alexandre Braga, João de Menezes, por Lisboa;

Estevão de Vasconcelos e Feio Terenas por Setúbal; Brito Camacho por Beja. Registam-se

alguns episódios sangrentos nas assembleias eleitorais de Alcântara, Santos e S. Domingos,

de que resultam 14 mortos e mais de uma centena de feridos.

17 de Abril 1908 – Funda-se em Lisboa a Junta Federal de Livre Pensamento.

19 de Abril 1908 – Inaugura-se em Lisboa o Primeiro Congresso Nacional do Livre Pensa-

mento. Presidiu à abertura Teófi lo Braga e à sessão de encerramento Magalhães Lima. Neste

congresso, o delegado Jorge dos Reis Boaventura apresenta um plano de Almanaque Leigo.

20 de Abril 1908 – Os jornais republicanos “Vanguarda” e “Republica” são processados por

vários artigos políticos.

20 de Abril 1908 – “O Mundo” publica uma carta do grande poeta Guerra Junqueiro, na

qual este pede aos portugueses do Congo que tomaram a deliberação de lhe oferecer uma

pena de ouro, que dêem aos pobres o produto da subscrição aberta com aquele fi m.

21 de Abril 1908 – Inaugura-se na Sociedade de Geografi a de Lisboa o Congresso de Ins-

trução Primária e Popular promovido pela Liga Nacional de Instrução.

23 de Abril 1908 – Os sete deputados eleitos reúnem no Centro de S. Carlos, a fi m de

concertarem a sua atitude parlamentar na sessão legislativa próxima.

24 de Abril 1908 – O Tribunal de Verifi cação de Poderes aprova a eleição do círculo orien-

tal de Lisboa, não reconhecendo a inelegibilidade dos candidatos Matias Nunes e Manuel

Francisco Vargas.

25 de Abril 1908 – Inaugura-se em Coimbra o Congresso do Partido Republicano.

25 de Abril 1908 – Em Lisboa, no Congresso de Instrução Primária, os professores Tito

Lopes, Carlos de Melo e Ladislau Piçarra propõem a abolição do ensino religioso na escola

primária.

26 de Abril 1908 – No salão da Caixa Económica Operária realiza-se, sob a presidência de

Magalhães Lima, a sessão de encerramento do Congresso do Livre Pensamento, promovido

pela Associação do Registo Civil, em comemoração do morticínio dos cristãos novos em

Lisboa.

26 de Abril 1908 – Realizam-se as duas últimas sessões do Congresso Republicano, que

decide por maioria, não aceitar a demissão do Directório.

29 de Abril 1908 – Abrem as primeiras cortes do reino do novo reinado, prometendo D.

Manuel “reinar como manda a lei”.

29 de Abril 1908 – São presos Macedo de Bragança e o comerciante Manuel Mendes de

Almeida, respectivamente, presidente da direcção e tesoureiro da Associação Propagadora do

Registo Civil.

30 de Abril 1908 – Morre em Espinho o hábil artista Carlos Evaristo Félix da Costa.

25 e 26 de Abril 1908 – Congresso do Partido Republicano Português em Coimbra presi-

dido por José Relvas.

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advento da república em datas 333

6 de Maio 1908 – Aclamação de D. Manuel II.

9 de Maio 1908 – O médico Estêvão de Vasconcelos apresenta no Parlamento o projecto de

lei sobre acidentes de trabalho.

13 de Maio 1908 – Afonso Costa discursa no Parlamento, reclamando a revogação da

legislação sobre as ordens religiosas, como o decreto de 18 de Abril de 1901, da autoria de

Hintze Ribeiro; a lei de 21 de Julho de 1899, da autoria de José Maria d’ Alpoim; a revoga-

ção dos artigos 130 e 135 do Código Penal (vigente na época) sobre supostos delitos contra

a religião.

19 de Maio 1908 – O General Dantas Baracho, na Câmara dos Pares, apresenta uma pro-

posta de abolição do decreto de 18 de Abril de 1901, procurando retomar a legislação ante-

riormente em vigor sobre a abolição das ordens religiosas, estabelecendo novamente o registo

civil obrigatório e defendendo a separação da Igreja e do Estado, a supressão do subsídio aos

padres do Espírito Santo, dispensando-os também da actividade de missionação nas provín-

cias ultramarinas.

21 de Maio 1908 – Sai o n.º único do periódico Republicano “O Dever”.

27 de Maio 1908 – Uma delegação da Universidade de Coimbra, acompanhada pelo reitor,

Alexandre Cabral, e pelo secretário da Universidade, Manuel da Silva Gaio, foi a Lisboa sau-

dar o novo rei. A embaixada coimbrã foi hostilizada pelos colegas da capital.

27 de Maio 1908 – Vem a Lisboa uma delegação da Universidade de Coimbra, saudar o

novo rei, acompanhada pelo reitor, Alexandre Cabral, e pelo secretário da Universidade,

Manuel da Silva Gaio.

28 de Maio 1908 – O Grupo de Propaganda Liberal, de Setúbal, promove uma sessão de

homenagem a Nakens, jornalista espanhol, que tinha saído da cadeia.

30 de Maio 1908 – A Junta Federal do Livre Pensamento festeja o aniversário de Voltaire.

31 de Maio 1908 – O Grupo Republicano França Borges promove uma manifestação em

honra de Magalhães Lima.

31 de Maio 1908 – A assembleia geral da Associação das Escolas Móveis elege Casimiro

Freire seu presidente honorário.

2 de Junho 1908 – A Junta Federal do Livre Pensamento comemora a morte de Garibaldi,

o grande caudilho da Liberdade que fundou a Itália moderna.

3 de Junho 1908 – António José de Almeida pronuncia um discurso sensacional na Câmara

dos Deputados, dirigindo palavras muito duras para os ditadores vis e cobardes que arras-

taram D. Carlos à morte. Defende ainda no mesmo discurso que a bomba de dinamite em

revolução, e em certos casos, pode ser legitima.

4 de Junho 1908 – Anunciam-se terem sido presos, por suspeitas de estarem implicados

no regicídio, os operários António José de Ávila, Adão Duarte, Augusto Machado, Miguel

Córdoba e Constantino Mendes.

6 de Junho 1908 – O vereador Tomás Cabreira realiza uma brilhante conferência na Asso-

ciação dos Lojistas, solenizando assim a inauguração dos trabalhos da Universidade Popular.

7 de Junho 1908 – Inauguração do retrato de Sabino de Sousa no Centro Republicano

Latino Coelho.

8 de Junho 1908 – O deputado Feio Terenas faz a sua estreia parlamentar na resposta ao

discurso da coroa.

10 de Junho 1908 – Iniciava a sua publicação o bissemanário republicano “Defesa”.

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334 república e democracia

14 de Junho 1908 – Começa a discutir-se na Câmara dos Deputados as questões dos adian-

tamentos à Casa Real e da Lista Civil.

28 de Junho 1908 – O administrador do Seixal proíbe uma sessão de propaganda, promo-

vida pelos liberais da terra, a favor do Registo Civil obrigatório.

28 de Junho 1908 – Na sessão de propaganda da Junta do Livre Pensamento efectuada

em Sacavém, foi enviado um telegrama ao secretário-geral do Congresso Nacional de Livre

Pensamento reunido em Bruxelas (Bélgica), cidadão Raphael Rens.

3 de Julho 1908 – Miguel Bombarda refere-se na Câmara dos Deputados à necessidade

do estabelecimento do Registo Civil obrigatório, dissertando sobre as religiões, protestando

contra a intervenção do clericalismo na governação pública e declarando-se anti-clerical.

5 de Julho 1908 – Realiza-se um comício no Porto contra os adiantamentos à Casa Real,

havendo tumultos, cargas de cavalaria e várias prisões.

7 de Julho 1908 – A Associação do Registo Civil resolve , em nome do povo de Lisboa,

entregar uma petição reclamando o Registo Civil obrigatório.

11 de Julho 1908 – João Chagas realiza em Lisboa uma conferência sobre os adiantamentos.

13 de Julho 1908 – Afonso Costa realiza um notável discurso sobre a questão dos adianta-

mentos na Câmara dos Deputados.

14 de Julho 1908 – Miguel Bombarda entrega na Câmara dos Deputados a petição da Asso-

ciação do Registo Civil, pedindo a obrigatoriedade do registo civil. A comissão era composta

por Teófi lo Braga, Magalhães Lima e Botto Machado.

14 de Julho 1908 – Afonso Costa bate-se em duelo com o Conde de Penha Garcia, devido

às acusações de Afonso Costa de cumplicidade no escândalo dos adiantamentos por parte

do segundo.

14 de Julho 1908 – Constitui-se em Lisboa o Grupo Anti-Clerical 14 de Julho de 1908.

26 de Julho 1908 – Morre no Porto o livre-pensador Adolfo Leite de Magalhães, que publi-

cou a poesia “Cristo no Vaticano”, atribuída a Vitor Hugo.

5 de Agosto 1908 – Publica-se na Covilhã o número único de “A Verdade”, folha liberal para

combater os jesuítas e as irmãs da Caridade do Hospital D. Amélia. É seu director e proprie-

tário José Pereira Barata, médico do mesmo hospital e sub-inspector escolar.

9 de Agosto 1908 – Suicida-se Trindade Coelho, autor do “Manual Político do Cidadão Por-

tuguês”. O Cardeal Patriarca censurou o padre que acompanhou o funeral até ao cemitério.

9 de Agosto 1908 – Assinalando o 13º aniversário, a Associação do Registo Civil veste vinte

e quatro crianças pobres de ambos os sexos, registadas civilmente, servindo também nessa

ocasião uma pequena refeição a todas as crianças e senhoras presentes.

16 de Agosto 1908 – A Junta Federal do Livre Pensamento efectuou a primeira sessão de

propaganda em Oeiras.

18 de Agosto 1908 – É preso Heitor Ferreira, armeiro, acusado de ter vendido a carabina

com que Buiça assassinou o rei D. Carlos.

26 de Agosto 1908 – Foi libertado Heitor Ferreira, que tinha sido acusado de ser o vendedor

da carabina utilizada para o regicídio.

30 de Agosto 1908 – A Junta Federal do Livre Pensamento e a Associação do Registo Civil

efectuam a sua primeira sessão de propaganda em Linda-a-Velha, para se organizar ali a Junta

Local do Livre Pensamento.

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Page 333: República e Democracia

advento da república em datas 335

2 de Setembro 1908 – Na Câmara dos Pares, Pedro de Araújo pede para entrar em discus-

são o parecer relativo à concessão do bronze para a estátua de Joaquim António de Aguiar, o

Mata Frades. Fizeram o elogio do antigo homem de Estado, Teixeira de Sousa e Dias Costa.

Os membros do clero que tinham representantes nesta câmara optaram por não comparecer

à sessão.

5 de Setembro 1908 – Altercação pública entre um popular e o conhecido poeta, jornalista

e escritor Guerra Junqueiro, em frente à redacção do jornal republicano do Porto “O Norte”,

quando decorria uma procissão religiosa, devido ao facto de o poeta se recusar a descobrir-se

perante a passagem da procissão.

6 de Setembro 1908 – Forma-se na Vila de Canha a União dos Propagandistas do Livre

Pensamento e do Registo Civil.

8 de Setembro 1908 – A Comissão Municipal Republicana do Porto trata do desacato ocor-

rido no dia 5, entre Guerra Junqueiro e outro cidadão. Deliberaram então atribuir o nome

do poeta a uma rua e fazer, pelas escolas, uma distribuição de livros do mesmo.

24 de Setembro 1908 – Bernardino Machado parte para Madrid para representar o Partido

Republicano no funeral de Salmeron.

27 de Setembro 1908 – Alberto Costa (Pad Zé), realiza uma conferência no Centro Repu-

blicano de Carnaxide.

3 de Outubro 1908 – Na Covilhã registam-se altercações, devido à realização de um con-

gresso de Jesuítas, que provocaram reacções aos mais liberais e livres-pensadores, levando à

intervenção da força armada.

4 de Outubro 1908 – Inauguração na Figueira da Foz do Centro António José de Almeida.

14 de Outubro 1908 – Alberto Costa (Pad Zé) inicia no “O Mundo” um secção intitulada

“Fogo Vivo”.

15 de Outubro 1908 – Alberto Costa (Pad Zé) realiza uma conferência no Centro Republi-

cano da Ajuda, subordinada ao tema Reacção e Revolução.

16 de Outubro 1908 – Bernardino Machado inicia a série de conferências de propaganda

municipalista organizada pela Comissão Municipal de Lisboa.

18 de Outubro 1908 – Realiza-se um comício no Samouco onde discursa Alberto Costa.

18 de Outubro 1908 – Grande manifestação junto ao túmulo de Heliodoro Salgado.

19 de Outubro 1908 – Morre repentinamente em Lisboa o democrata Candido Nicolau

Artur Braga.

22 de Outubro 1908 – “O Mundo” entrevista o Ministro da Guerra Brasileiro, o marechal

Hermes da Fonseca, de passagem em Lisboa.

24 de Outubro 1908 – O administrador de Vila Franca de Xira proíbe João Chagas de ali

realizar uma conferência de carácter político.

25 de Outubro 1908 – Grandes comícios de propaganda em Lisboa e Sobral de Monte

Agraço. No primeiro discursaram Teófi lo Braga, Manuel de Arriaga, Cunha e Costa, Tomás

Cabreira, Miranda do Vale e José de Abreu, e no segundo Bernardino Machado, França

Borges, Alberto Costa e António Bernardo.

25 de Outubro 1908 – A Associação do Registo Civil procede à distribuição no Campo

Grande, em Lisboa, de um bodo a 100 pobres.

25 de Outubro 1908 – Realizam-se grandes comícios de propaganda em Palmela, Caparica,

Samouco, Olivais, Barreiro, Oeiras, Caneças e Seixal.

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336 república e democracia

29 de Outubro 1908 – O Mundo recebe a comunicação de ter sido inaugurado em 14 de

Julho no Pará o Centro Republicano Português, cujos primeiros corpos dirigentes são eleitos

e tomam posse em 15 de Outubro.

31 de Outubro 1908 – O Mundo anuncia a prisão por seis meses, no forte da Graça em

Elvas, do militar e professor Tomás Cabreira.

1 de Novembro 1908 – Eleições municipais em todo o País, com excepção do Porto, obtendo

os republicanos vitória completa em 12 municípios, incluindo Lisboa, e parcial em 21.

1 de Novembro 1908 – No Centro do Largo de S. Carlos reuniram-se os deputados repu-

blicanos para deliberarem qual o caminho a seguir devido à perseguição que consideravam

afrontosa ao vereador da Câmara Municipal de Lisboa, Tomás Cabreira.

3 de Novembro 1908 – Suicida-se na redacção do jornal “O Mundo”, de que era redactor,

o advogado Alberto Costa, vulgarmente conhecido como Pad-Zé. O seu funeral realizou-se

civilmente por sua expressa determinação.

5 de Novembro 1908 – Teófi lo Braga inicia as conferências de protesto contra a perseguição

de que foi vítima Tomás Cabreira.

11 de Novembro 1908 – Uma comissão de democratas, presidida por Teófi lo Braga, entrega

a Magalhães Lima uma mensagem de reconhecimento pelos seus serviços prestados a favor

de Portugal no estrangeiro.

22 de Novembro 1908 – Fundam-se as Juntas Locais do Livre Pensamento, em Benavente

e Samora Correia.

29 de Novembro 1908 – Representa-se pela primeira vez, no Teatro D. Maria, o drama

anti-clerical “Beijos por Lágrimas”, da autoria do escritor e jornalista Faustino da Fonseca.

8 de Novembro 1908 – O rei D. Manuel visita o Porto em 8 de Novembro e Coimbra no

dia 20 do mesmo mês. Regressa a Lisboa no dia 4 de Dezembro, mas atravessa a cidade em

carruagem fechada que circulou a alta velocidade.

5 de Dezembro 1908 – Saiu o 1.º n.º do semanário republicano de estudantes A Revolta.

1909

24 de Janeiro 1909 – Inauguração do Centro Republicano de Santa Clara.

31 de Janeiro 1909 – Inauguração do Centro Mocidade Republicana Dr. Malva do Vale.

5 de Fevereiro 1909 – Inauguração do Centro Republicano Dr. Fernandes Costa.

7 de Abril 1909 – Morre em Cabanas, o abade João Pais Pinto, padre, licenciado em Direito,

republicano, revolucionário do 31 de Janeiro e colaborador em vários órgãos da imprensa

republicana.

11 de Abril 1909 – Governo de Sebastião Teles.

24 e 25 de Abril 1909 – Congresso do Partido Republicano em Setúbal.

25 de Abril 1909 – O governo cai por causa de uma questão estranha à governação.

5 de Maio 1909 – Inauguração do Centro Democrático Ramada Curto, no Centro Fernan-

des Costa.

14 de Maio 1909 – Governo de Wenceslau de Lima.

29 de Junho 1909 – Saiu o 1.º n.º do periódico republicano O Povo de Santa Clara.

21 de Julho 1909 – Congresso Nacional Operário em Julho. No mesmo mês Consiglieri

Pedroso vence as eleições para a presidência da Sociedade de Geografi a, derrotando a lista

monárquica de Carlos Roma du Bocage.

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advento da república em datas 337

21 de Julho 1909 – Partido Republicano organiza uma Comissão Militar para organizar a

revolução.

21 de Julho 1909 – José Luciano de Castro defende, em carta a D. Manuel, que o partido

republicano avança a passos rápidos, e prepara-se para uma aventura revolucionário.

2 de Agosto 1909 – Organiza-se uma manifestação anticlerical em Lisboa que terá reunido

cerca de 100.000 pessoas.

29 de Novembro 1909 – Republicanos vencem as eleições para 122 juntas de paróquia.

Novembro 1909 – É lançado o mensário Folhas Novas, um dos exemplos do esforço de

propaganda laicista especifi camente orientado para “a gente do campo”.

22 de Dezembro 1909 – Governo de Veiga Beirão (até 26 de Junho de 1910). Todos os

ministros são do partido progressista e todos com experiência governativa.

23 de Dezembro 1909 – Manifestação da Junta Liberal, chefi ada por Miguel Bombarda,

António Aurélio da Costa Ferreira, Egas Moniz e Cândido dos Reis, junta cerca de uma

centena de milhar de pessoas.

1910

2 de Janeiro 1910 – Abertura das Cortes.

9 de Fevereiro 1910 – Início da publicação da “Alma Nacional”, semanário republicano

dirigido por António José de Almeida.

6 de Fevereiro 1910 – Saiu em Coimbra o 1.º n.º do jornal “O Intransigente!.

6 de Abril 1910 – Saiu em Coimbra o 1.º n.º do semanário “A Tribuna”, órgão do Partido

Republicano Português.

29 e 30 de Abril 1910 – Congresso do Partido Republicano no Porto.

27 de Junho 1910 – Dissolução das Cortes.

22 de Julho 1910 – José Relvas, Magalhães Lima e Alves da Veiga são enviados pelo partido

republicano para contactos diplomáticos em Paris e Londres.

7 de Agosto 1910 – Grande comício republicano em Lisboa.

19 de Agosto 1910 – Governo, dizendo temer movimento revolucionário das oposições

monárquicas, põe as tropas de prevenção.

28 de Agosto 1910 – Eleições.

3 de Setembro 1910 – Morte de Consiglieri Pedroso.

17 de Setembro 1910 – Amnistia para os crimes de liberdade de imprensa.

23 de Setembro 1910 – Abre o parlamento. Logo no dia seguinte as cortes são adiadas.

27 de Setembro 1910 – Comemorações do centenário da batalha do Buçaco.

29 de Setembro 1910 – Greves de corticeiros, tanoeiros e garrafeiros.

1 de Outubro 1910 – Visita Lisboa o presidente do Brasil, Hermes da Fonseca.

2 de Outubro 1910 – Reunião de emergência na sede do Partido Republicano Português.

O Almirante Cândido dos Reis, chefe militar da revolução, marca as operações para a noite

seguinte.

3 de Outubro 1910 – Assassinato Miguel Bombarda, cerca das 11 horas. O acto foi exe-

cutado por um antigo doente, ofi cial do Exército. Mal a notícia circulou, tiveram lugar

manifestações espontâneas.

Madrugada de 4 de Outubro 1910 – Os 15 dirigentes máximos da revolução concentram-

-se nos Banhos de S. Paulo.

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338 república e democracia

Estava previsto que vários quartéis de Lisboa aderissem á revolução republicana, mas só se

sublevam três: Quartel de Marinheiros, Infantaria 16 e Artilharia 1.

Os navios cruzadores Adamastor e S. Rafael, ancorados no Tejo em frente de Lisboa, aderem

à revolução, mas o navio almirante D. Carlos permanece nas mãos dos monárquicos. Colu-

nas de militares que aderiram à revolução saem dos quartéis para se dirigirem aos pontos-

-chave que deviam tomar.

Avançam por Campo de Ourique em Lisboa. Desencadeia-se uma troca de tiros com uma

patrulha da Guarda Municipal fi el à monarquia. Os revolucionários juntam-se no largo do

Rato e dali tentam avançar para o quartel do Carmo, mas defrontam-se e trocam tiros com

uma barreira de guardas na Av. Alexandre Herculano. Os revolucionários verifi cam que não

têm forças sufi cientes para prosseguir o plano e decidem concentrar-se na Rotunda onde se

barricam.

O Almirante Cândido dos Reis dirige-se aos Banhos de S. Paulo para conferenciar com os

15 companheiros que aí se encontravam. Concluíram que o golpe tinha falhado e decidem

fugir. Cândido dos Reis toma o caminho de Arroios e desesperado com o fracasso suicida-se.

A notícia do suicídio espalha-se lançando a maior consternação entre os republicanos.

José Relvas e outros companheiros decidem ir para a redacção do jornal A Luta e redigem

notícias a negar o suicídio, mas a consternação continua e muitos soldados e civis republica-

nos decidem abandonar a Rotunda.

Por volta das 5 horas da manhã permanecem na Rotunda apenas 100 soldados e 50 civis com

5 canhões e algumas espingardas, comandados por Machado dos Santos.

Manhã de 4 de Outubro 1910 – Tropas monárquicas concentram-se no Rossio.

Pelas 11 horas os navios que aderiram à revolução bombardeiam o palácio das Necessidades

onde o rei D. Manuel II se encontrava.

O rei foge de Lisboa e dirige-se para o palácio de Mafra.

Tarde de 4 de Outubro 1910 – Tropas monárquicas comandadas por Paiva Couceiro diri-

gem-se para uma colina acima da Rotunda, o alto da Penitenciária, e daí abrem fogo sobre os

republicanos. São alvejados pelos republicanos a partir do quartel de Artilharia 1.

Grupos de elementos da Carbonária dinamitam pontes, estradas e a linha-férrea para isolar

Lisboa.

A mãe de D. Manuel II, rainha D. Amélia e a avó, rainha D. Maria Pia, que se encontravam

no palácio da Pena, em Sintra, decidem ir para Mafra juntar-se ao rei.

Muitos republicanos, civis e militares decidem juntar-se ao grupo barricado na Rotunda,

levando consigo armas e munições. Ao fi m da tarde, já eram cerca de 1500 resistentes.

As tropas de Paiva Couceiro dirigem-se para o Alto do Torel para daí continuarem a abrir

fogo sobre os republicanos barricados na Rotunda.

Noite de 4 de Outubro 1910 – O quartel-general monárquico tenta chamar reforços a

Lisboa, vindos dos regimentos da província. As colunas militares não conseguem entrar em

Lisboa, pois todos os acessos à cidade tinham sido destruídos pelos grupos da Carbonária.

Durante toda a noite há tiroteio cruzado, à distância, e ninguém sabia como a luta ia acabar.

O navio cruzador D. Carlos é tomado pelos republicanos.

Manhã de 5 de Outubro 1910 – O embaixador da Alemanha sai à rua com uma bandeira

branca a pedir tréguas para que os cidadãos estrangeiros residentes em Lisboa pudessem sair

da cidade.

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advento da república em datas 339

Grupos de soldados monárquicos julgam que a bandeira branca signifi ca que os ofi ciais se

tinham rendido e decidem largar armas e confraternizar com os republicanos.

Os ofi ciais da Marinha ameaçam bombardear a cidade de Lisboa com as baterias dos navios

ancorados no Tejo.

Às 9 horas Eusébio Leão, José Relvas e vários outros dirigentes republicanos entram na

Câmara Municipal de Lisboa, assomam à varanda e dali proclamam a República com dis-

cursos infl amados.

A multidão enche a praça do Município e aplaude a vitória republicana.

6 de Outubro 1910 – A família real, acompanhada por alguns nobres e alguns criados,

embarca no iate Amélia, na praia da Ericeira e o navio zarpa em direcção a Gibraltar. Aí

permanecem uma semana. À excepção de D. Maria Pia, que era italiana e preferiu dirigir-se

à sua terra natal, seguem todos para Londres.

6 de Outubro 1910 – Chega a Coimbra a noticia da Proclamação da República em Lisboa

no dia anterior. Começam os festejos com os “viva a República”. A primeira bandeira a ser

hasteada foi a do Centro Republicano de Santa Clara e foi-o entre aclamações e palmas. É

feito o Auto de Proclamação da República.

6 de Outubro 1910 – Em Miranda do Corvo é feito um Auto de proclamação da República,

assinado por 94 cidadãos.

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PRESIDENTES DA CÂMARA MUNICIPAL DE MIRANDA

DO CORVO (1910/2010)

(Presidentes das Comissões administrativas ou executivas):

1910

JOSÉ D’ALMEIDA

1910-1912

JOAQUIM PEREIRA FALCÃO

1912-1913

ANTONIO SILVA BASTOS

1914-1918

MÁRIO AUGUSTO D’ALMEIDA

1918-1919

MANUEL FERREIRA MATEUS

1919

MANUEL MARQUES DOS SANTOS FERRER

1919-1923

AURELIO AUGUSTO D’ALMEIDA

1923-1926

MANUEL MARQUES DOS SANTOS FERRER

1926-1927

CARLOS PEREIRA BATALHÃO

1927-1928

CESAR AUGUSTO DA CUNHA SANTOS

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Page 340: República e Democracia

342 república e democracia

1928-1930

JOÃO LOPES ROMÃOZINHO

1930-1931

JOAQUIM PEREIRA DA SILVA PORTO

1931-1934

MANUEL ALVES GOMES JUNIOR

1934-1936

JOSÉ FIRMINO RIBEIRO DA CUNHA

1936-1938

JOAQUIM JÚLIO

1938-1946

FERNANDO SILVA

1946-1959

JOSÉ CAMILO DA SILVA BASTOS

1959-1972

FRANCISCO RODRIGUES MARTINS

1972-1974

AFONSO BANDEIRA DE MELO GARCÊS

Presidentes eleitos:

1974-1980

JOSÉ LOURENÇO SIMÕES PEREIRA

1980-1990

JAIME ADALBERTO SIMÕES RAMOS

1980-1986

LÍDIO ALVES GOMES

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presidentes da câmara municipal de miranda do corvo (1910/2010) 343

1986-1989

QUIRINO DIAS SÃO MIGUEL

1990-1992

JOSÉ RODRIGUES LOPES

1992

FAUSTO JORGE RODRIGUES LUIS

1993-2001

JORGE MANUEL FERNANDES COSME

2001-

MARIA DE FATIMA SIMOES RAMOS DO VALE FERREIRA

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RESENHA BIOGRÁFICA DOS AUTORES

ALFREDO CARLOS BARROCO ESPERANÇA

Nasceu em 1 de Janeiro de 1943.

Encontra-se actualmente reformado (professor do Ensino primário, Delegado

Escolar, Agente Comercial, Delegado de Propaganda Médica, Chefe de Secção de

Informação Médica).

Em 1960 foi Presidente da Associação Cultural da EMPG.

Em 1962 foi professor na Covilhã, tendo sido denunciado à PIDE por um padre.

Em 1964 foi activista da campanha pro-rotativa do jornal «República». Foi

indeferido pelo ministro da Educação Nacional o pedido para colaborar no jornal

República.

Em 1965 foi delegado de Francisco Salgado Zenha nas frustradas eleições

legislativas, no concelho da Lourinhã

Em 1966 foi SMO de 11 de Janeiro/66 até 15 de Janeiro de 1970, 26 meses em

Moçambique.

Entre 1970 e 1974 foi activista da CDE e sócio da Cooperativa DEVIR, até ao

encerramento pela polícia de choque, e da Cooperativa Esteiros até ao 25 de Abril.

É sócio fundador da Associação República e Laicidade.

É sócio da Associação 25 de Abril.

É Vice-Presidente da Direcção da Delegação Centro da Associação 25 de Abril.

É blogger do Diário Ateísta, Ponte Europa, Sorumbático e Avenida da Liberdade.

É colaborador do Jornal do Fundão.

É colunista do mensário de Almeida «Praça Alta».

Foi colunista do semanário «O Despertar», de Coimbra.

É autor do livro «Pedras Soltas» e de diversos textos em jornais, revistas, brochuras

e catálogos.

É o sócio N.º 1177 da Associação Portuguesa de Escritores (2007)

É o primeiro e actual Presidente da Direcção da Associação Ateísta Portuguesa,

desde 2008.

É membro da Comissão Cívica de Coimbra para as comemorações do centenário

da República (2010).

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AMADEU CARVALHO HOMEM

Professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

A sua investigação tem privilegiado a teorização política do liberalismo, da

democracia e do socialismo em Portugal, no decurso do período contemporâneo.

Dedicou-se especialmente ao aprofundamento da história do nosso republicanismo,

procurando sobretudo salientar os contributos fi losófi cos em que essa proposta

assentou.

Pelo seu labor de clarifi cação do fenómeno republicano em Portugal, recebeu das

mãos do então Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, a comenda da Ordem

do Infante D. Henrique.

Como historiador da Cultura, dedicou muito do seu estudo à caracterização

intelectual de alguns dos vultos cimeiros da “Geração de 70”.

É o coordenador científi co de um curso de 2º Ciclo (nível de mestrado) e de um

curso de 3º Ciclo (nível de doutoramento), ministrados pela Faculdade de Letras da

sua Universidade, no âmbito das ideologias e das utopias contemporâneas.

Além de exercer o seu trabalho junto de estudantes de História, tem colaborado

também com outras áreas de formação, como a área de Comunicação Social e

Jornalismo e a dos Estudos Europeus.

Deu início muito recentemente a uma nova frente de investigação, de natureza

multidisciplinar, aplicada ao estudo da imagem e da iconografi a históricas.

É autor de inúmeros livros e publicações sobre as suas áreas de investigação.

ANABELA NUNES MONTEIRO

Professora de História no Agrupamento de Escolas de Miranda do Corvo,

concelho de Coimbra, licenciou-se na Universidade de Coimbra em 1981, cidade

onde reside. Por motivos profi ssionais viveu em Macau de 1993 a 2000, onde

defendeu, na Universidade de Ásia-Macau, a tese de Mestrado subordinada ao

tema “Macau no tempo de Bento Pereira de Faria- século XVII”. Presentemente,

encontra-se a aguardar a defesa da tese de Doutoramento, apresentada à Faculdade

de Letras de Coimbra, cujo tema é sobre os interesses e estratégias de sobrevivência

da presença portuguesa no Mar da China, durante o século XVII. No âmbito da

História Moderna, tem participado em vários seminários e congressos nacionais e

internacionais com comunicações, bem como com artigos para revistas e obras de

especialidade, nomeadamente, o Dicionário da História de Macau. Para além dessa

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resenha biográfica dos autores 347

vertente de interesse, dedica-se ao estudo de assuntos relativos à Iª República, tendo

feito parte da Comissão Cívica para as Comemorações do Centenário da República

em Coimbra e da Comissão Organizadora das Comemorações do Centenário da

República Portuguesa, em Miranda do Corvo.

ANTÓNIO DUARTE ARNAUT

Nasceu em Cumieira, concelho de Penela, a 28 de Janeiro de 1936 e licenciou-se em

Direito pela Universidade de Coimbra, tendo exercido em Penela, Ansião e Coimbra.

Ainda estudante, começou a participar nos movimentos oposicionistas ao Estado

Novo.

Em 1959, depois da campanha presidencial do general Humberto Delgado, em que

participara activamente, assinou, com mais quatro dezenas de católicos, um pedido de

inquérito à actividade da PIDE, em carta dirigida ao presidente do Conselho.

Aderiu à Acção Socialista Portuguesa, organização que daria origem ao Partido

Socialista, a cujo congresso fundador, realizado em 1973 na então capital da

República Federal da Alemanha, Bona, presidiu.

Também em 1973, apresentou ao III Congresso da Oposição Democrática,

realizado em Aveiro, um trabalho intitulado ”Breve Comunicação sobre a Estratégia

Política da Oposição Democrática nas Próximas Eleições Legislativas”.

Depois do 25 de Abril, foi presidente da comissão administrativa da Câmara

Municipal de Penela, deputado e secretário da mesa da Assembleia Constituinte e

deputado à I e II legislaturas da Assembleia da República (1976-1983), de que seria

vice-presidente na I legislatura e na I sessão da II legislatura.

No II Governo Constitucional (1978), foi ministro dos Assuntos Sociais, tendo

então criado o Serviço Nacional de Saúde.

Foi membro do Conselho Superior da Magistratura, Vice-Presidente e Presidente

da Liga Portuguesa dos Direitos do Homem e Presidente do Conselho Distrital de

Coimbra da Ordem dos Advogados.

Foi também fundador e presidente da Associação Portuguesa dos Escritores Juristas.

É o militante número 4 do Partido Socialista, embora se tenha afastado da vida

política activa em 1983.

Entre 2002 e 2005, foi grão-mestre do Grande Oriente Lusitano da Maçonaria,

iniciando uma política de abertura à sociedade civil e de relacionamento com as

instituições do Estado.

Poeta, fi ccionista, ensaísta e conferencista, é autor de uma vintena de obras.

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348 república e democracia

AUGUSTO JOSÉ MONTEIRO VALENTE

Major-General do Exército, na situação de reforma.

Nasceu em Coimbra, em 16 de Abril de 1944, e reside nesta mesma cidade desde

1980.

Concluiu a licenciatura em Ciências Militares – ramo Infantaria, na Academia

Militar, em 1966.

Cumpriu duas comissões na guerra colonial: em Angola, como alferes (1967), e

na Guiné, como capitão e comandante de Companhia de Caçadores Independente

(1970 – 1972).

Habilitado com vários cursos profi ssionais, entre os quais de Operações Especiais,

Comando e Estado-Maior e Comando e Direcção, possui ainda o curso de Auditor

da Defesa Nacional.

Licenciado em História, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra,

possui a pós-graduação em Estudos Europeus, pela Faculdade de Direito da mesma

Universidade.

Desempenhou, entre outros, os cargos de Comandante do Centro de Instrução de

Operações Especiais, Comandante da Brigada Territorial N º 5 da GNR, Inspector-

Geral e 2 º Comandante-Geral da GNR.

«Capitão de Abril», assumiu em 25 de Abril de 1974 o comando do Regimento

de Infantaria N º 12, na cidade da Guarda, e ocupou a fronteira de Vilar Formoso.

Agraciado com a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, foram-lhe também

concedidos vários louvores e condecorações.

Sócio fundador da A25A, é actualmente Presidente da Direcção da Delegação do

Centro, em Coimbra.

Investigador associado do Centro de Documentação 25 de Abril, tem publicado

artigos sobre história militar, geopolítica e geoestratégia

CARLOS JORGE RODRIGUES DO VALE FERREIRA

Nasceu em Coimbra em 1961 e é licenciado em Engenharia Civil.

É técnico superior do quadro da Câmara Municipal de Miranda do Corvo desde

1987, encontrando-se actualmente a desempenhar funções de Chefe de Gabinete da

Presidência na mesma autarquia.

De 2003 a 2005 desempenhou as funções de Delegado Regional da Delegação de

Coimbra do Instituto Português da Juventude.

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resenha biográfica dos autores 349

É membro do Conselho Local de Acção Social de Miranda do Corvo.

É o Presidente do grupo coordenador e do fórum participativo da implementação

da Agenda 21 Local no concelho de Miranda do Corvo.

É desde 2002 administrador não-executivo da Metro Mondego SA.

É membro do Conselho Geral do Agrupamento de Escolas de Miranda do Corvo.

Foi fundador da Associação para o Desenvolvimento e Formação Profi ssional de

Miranda do Corvo (IPSS) e é Presidente do seu Conselho de Fundadores.

Foi fundador da Fundação ADFP (IPSS) e é Vice-Presidente do seu Conselho

Geral.

É Presidente da Direcção da Cooperativa Mirante – Cooperativa de Informação

e Cultura CRL.

É Director do jornal regional “Mirante”.

É membro do movimento cívico de refl exão Fórum Centro de Portugal.

É colaborador regular do jornal Diário de Coimbra.

É Presidente da Comissão para as Comemorações do Centenário da República

em Miranda do Corvo.

É membro da Comissão Organizadora da Expo-Miranda (feira de actividades

económicas).

Foi membro da Comissão Mista de Coordenação do Plano Regional de

Ordenamento do Território do Centro (PROTC).

Foi fundador e Presidente da Direcção do Centro Hípico de Miranda do Corvo

e actualmente preside à Mesa da Assembleia Geral.

Foi fundador do Clube de Golfe do Centro, actualmente sedeado na Curia.

Como profi ssional liberal desenvolveu várias consultorias na área do planeamento

e do urbanismo.

Foi sócio-gerente e gestor da fi rma Mirangesp – Gabinete de Projectos Lda.

Foi consultor da empresa de construções António Margarido & Filhos, Lda,

tendo também desempenhado as funções de director técnico da mesma.

Foi gerente da fi rma Quinta da Paiva – Empreendimentos Turísticos e de

Habitação Lda.

Foi formador em vários cursos do Fundo Social Europeu desenvolvidos pela

Direcção Regional de Educação do Centro.

Foi fundador e é membro do Conselho Fiscal da Real Confraria da Cabra Velha.

Foi fundador e é membro do Conselho Fiscal da Real Confraria da Matança do

Porco.

Foi candidato a Deputado da Assembleia da República, pelo círculo de Coimbra,

nas eleições legislativas de 2005, de 2009 e 2011.

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350 república e democracia

FERNANDO MENDONÇA FAVA

É Mestre em História Contemporânea pela Faculdade de Letras da Universidade

de Coimbra.

É membro da Comissão Directiva da Alternativa, Associação Cultural para o

Desenvolvimento do Ser Humano.

É membro da Comissão Cívica de Coimbra para as Comemorações do Centenário

da República.

É investigador do Centro de Estudos Interdisciplinares do século XX (CEIS-20)

da Universidade de Coimbra.

Tem obra publicada na área a que dedica os seus estudos, sendo especialista na

História da 1ª República.

De momento, encontra-se a desenvolver investigação ao nível de doutoramento,

no âmbito da História das Ideias Políticas e Sociais, na transição do século XIX para

o século XX.

JAIME ADALBERTO SIMÕES RAMOS

É médico especialista em Clínica Geral e Familiar e em  Medicina do Trabalho.

É Director Clínico da Cruz Branca, Lda – Segurança, Higiene e Saúde no

Trabalho e da Unidade de Cuidados Continuados de Miranda do Corvo.

Foi Deputado à Assembleia da República de 79 a 85 e em 1995, tendo sido autor

de vários projectos lei na área da Saúde, Ambiente e Comunicação Social: Prevenção

do Tabagismo, Interrupção Voluntária de Gravidez, Planeamento Familiar e

Educação Sexual, Criação das Rádios Locais; criação da Escola de Medicina Dentária

em Coimbra; Protecção da Camada de Ozono, proibição dos CFM nos aerossóis;

Protecção da Mata da Margaraça,  etc.

Foi Vice-Presidente do Grupo Parlamentar do PSD em duas eleições.

Foi Governador Civil do Distrito de Coimbra de 05/02/90 a 18/12/91.

Foi Presidente da Câmara Municipal de Miranda do Corvo de 1979 a 1990 com

quatro eleições.

Foi o primeiro Presidente da Administração Regional da Saúde de Coimbra em

1983.

Foi Presidente da Administração Regional de Saúde do Centro em 1994 a 1995.

Foi Presidente do Conselho Geral do Hospital Sobral Cid de 1992 a 1995.

Foi Delegado Regional do Centro do SPTT em 1994.

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resenha biográfica dos autores 351

Foi membro da Assembleia de Representantes da Faculdade de Medicina 76/77.

Foi trabalhador rural no Canadá em 1975 e na hotelaria, na Holanda, em 1976.

Foi Director- fundador do Jornal Regional “Mirante”.

Foi fundador da “Rádio Dueça” e da “Associação Rádio Livre”.

Foi autor de artigos de Intervenção em diversos jornais nacionais (Expresso,

Jornal, Diário de Notícias, etc) e regionais (Jornal de Coimbra, As Beiras, Diário de

Coimbra, Campeão das Províncias).

É fundador e Presidente da Associação para o Desenvolvimento e Formação

Profi ssional de Miranda do Corvo (Instituição Privada de Solidariedade Social/

Instituição de Utilidade Pública) desde a sua fundação em 1988.

Foi fundador e Presidente do Conselho de Administração da Mirandinvest, SA

Investimentos Imobiliários e Turísticos, 89/90.

Foi Presidente da Mesa da Assembleia-geral da Associação de Futebol de Coimbra

85/86.

Foi Presidente de diversas colectividades locais: Bombeiros Voluntários, Atlético

Mirandense, Associação Rádio Livre, etc.

Foi membro da Direcção da Escola Profi ssional de Agricultura de Semide, do

Conselho de Administração da Federação de Municípios do Distrito de Leiria e do

Conselho Pedagógico da Escala C+S de Miranda do Corvo.

Foi membro do Conselho Consultivo do Centro Regional de Segurança Social

de Coimbra de 1986 a 1989.

Foi professor de Saúde na Escola Secundária e C+S de Tábua e Miranda do Corvo

em 1978/79 e 1985/86.

Foi fundador da AJA, Associação de Jovens Amigos da ADFP e Presidente da

Direcção –1996.

Foi fundador e dinamizador do Movimento Pró 5 Regiões As Beiras no Referendo

Nacional.

Foi fundador e dinamizador do Movimento de Cidadãos da Lousã e Miranda de

2000 a 2004.

É Confrade da Real Confraria da Cabra Velha e Presidente da Assembleia-Geral,

desde 2003.

Foi fundador e é Presidente da Direcção da Real Confraria da Matança do Porco,

desde 2009.

Foi fundador e é Presidente do Conselho de Administração da Fundação ADFP

– Assistência, Desenvolvimento e Formação Profi ssional, desde 2008.

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MANUEL JORGE DE MAGALHÃES E SILVA

Nasceu no Porto em 28 de Dezembro de 1944.

Licenciou-se em Direito na Universidade de Lisboa, onde era fi nalista do seu

curso quando se apresentou como candidato a deputado pela oposição.

Foi vice-presidente da Comissão de Juventude da Causa Monárquica, em 1966-

-1967, e seu presidente interino no ano seguinte, até Abril.

Foi um dos fundadores da Renovação Portuguesa.

Em 1973, abriu escritório de advogado na comarca de Lisboa.

Na Assembleia Constituinte do PPM, votou contra a fundação do partido.

De 1988 a 1990, foi Secretário Adjunto para os Assuntos de Justiça de Macau.

No triénio de 1996 a 1998, desempenhou as funções de vogal do Conselho

Superior da Ordem dos Advogados.

Fez parte da Comissão Revisora do Código de Processo Penal em 1998.

Fez parte do Conselho Superior de Justiça de Macau entre 1995 e 1996.

Entre 1996 e 2006, foi Consultor para os Assuntos Políticos e de Justiça do

Presidente da República, Jorge Sampaio.

De 1996 a 1999, fez parte da delegação portuguesa no Grupo de Ligação

Conjunto Luso-Chinês, para a negociação dos termos de transferência do exercício

de soberania sobre Macau.

Em 2007, candidatou-se a bastonário da Ordem dos Advogados mas não foi

eleito.

É sócio sénior de uma Sociedade de Advogados.

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