representaÇÃo social da pessoa com deficiÊncia … · carvalho, sandra maria cordeiro rocha....

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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO SANDRA MARIA CORDEIRO ROCHA DE CARVALHO REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA FRENTE À EXCLUSÃO / INCLUSÃO JOÃO PESSOA/PB 2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO

SANDRA MARIA CORDEIRO ROCHA DE CARVALHO

REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM

DEFICIÊNCIA FRENTE À EXCLUSÃO / INCLUSÃO

JOÃO PESSOA/PB 2007

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SANDRA MARIA CORDEIRO ROCHA DE CARVALHO

REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

FRENTE À EXCLUSÃO/ INCLUSÃO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Programa de Pós - Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba, como um requisito final para obtenção do título de mestre em Educação.

Orientadora: Profa. Dra. Edineide Jezine Mesquita

JOÃO PESSOA/PB 2007

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SANDRA MARIA CORDEIRO ROCHA DE CARVALHO

REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

FRENTE À EXCLUSÃO / INCLUSÃO

Dissertação aprovada em 08 de novembro de 2008

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________________ Profa. Dra. Edineide Jezine Mesquita PPGE / UFPB

(orientadora)

________________________________________________________ Profa. Dra. Ana Doziat Barbosa de Melo PPGE / UFPB

(examinadora)

_______________________________________________________ Profa. Dra. Janine Marta Coelho Rodrigues PPGE / UFPB

(examinadora)

________________________________________________________ Profa. Dra. Maria Aparecida Ramos de Meneses - PPGSS / UFPB

(examinadora)

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DEDICO

A DEUS, pela constante proteção, força e coragem na minha humilde existência e a Nossa Senhora da Graças, pelas incontáveis bênçãos e graças derramadas em minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus queridos pais, Alódio Onofre Rocha (in memória) e Marly Cordeiro Rocha pelo amor, exemplo e presença firme em toda minha vida.

Ao meu tio, Professor Dr. Airton Cordeiro (in memória), quando, em julho de 2000, ainda no seu leito de morte, ter me incentivado a procurar outras possibilidades na minha vida profissional, estimulando-me a seguir o caminho da docência. E hoje o tenho como grande referência na minha vida.

Aos meus queridos sogros, Elba Coelho Rodrigues de Carvalho e Manoel Carvalho, por compartilharem comigo o filho amado e me fazerem sentir amada também.

Ao meu bem amado Elmano, companheiro em tudo, pelo amor incondicional, por relevar minhas ausências, por entender e aceitar minha essência, por partilhar comigo meus sonhos.

As minhas filhas amadas, Brenda Cássia e Bruna Carla, por serem o motivo maior de tudo o que faço, penso e sou. Por elas não existe luta vã.

Aos meus irmãos Rita de Cássia, Joaquim Cordeiro e Marcone Cordeiro, pelo aconchego da família, pelos sobrinhos (as) amados (as), por me fazerem sentir feliz quando estamos juntos.

A minha orientadora muito estimada, Profa. Dra. Edineide Jezine Mesquita, pela forma generosa com que me acolheu em sua vida e pelo esmero e afinco na orientação de meus passos nessa dissertação, fazendo-me sentir totalmente amparada em sua competência e sabedoria.

As professoras Dra. Janine Marta Coelho Rodrigues e Dra. Ana Doziart B. Melo, pela tão nobre acolhida e significativa contribuição à minha pesquisa, com competência e oportunas intervenções.

À professora Dra. Maria Aparecida Ramos de Meneses, quando no tempo de graduação nesta universidade, testemunhei suas mobilizações, empenho e participação nas atividades políticas e sociais nos primórdios dos anos 80/90 até os dias atuais. Agradeço de coração e sinto-me honrada com a vossa presença nesse grande momento que a academia me proporciona.

Ao professor Dr. Roberto Jarry Richardson, nome forte da metodologia cientifica , agradeço de coração, os questionamentos oportunos, as provocações angustiantes e pertinentes, que me levaram às inquietações e enfrentamentos na busca de um maior aprofundamento teórico - metodológico que respaldasse e alicerçasse a pesquisa ora apresentada.

À professora Maria Deusa, pela valiosa e generosa contribuição na elaboração deste aporte teórico, reconhecendo-a como uma grande estudiosa na área das representações sociais.

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À coordenação do PPGE/UFPB, representada pela professora Dra. Adelaide e o professor Dr. Antonio Carlos, a todos os professores e professoras do mestrado e aos funcionários na pessoa Sra. Roselene.

À FUNAD, onde dos meus 42 anos de existência, 15 foram dedicados a ela com amor à causa das pessoas com deficiência. Onde tive a honra de implantar serviços em prol dessa grande causa.

As colegas do mestrado Isabelle, Cristiane, Cris Olinda, Valeria, entre outros, por ter estado no lugar exato nas horas em que mais precisei, fazendo-me sentir mais tranqüila e confiante. E a todos da 26ª. Turma do PPGE/UFPB, pelos bons e emocionantes momentos que ficamos juntos.

Aos usuários que tão gentilmente contribuíram para minha dissertação, através das suas falas, resgatando e compartilhando seus sentimentos, momentos de angustias e de esperanças por dias melhores ou vendo nos seus olhos a ingenuidade do que nada podia ser feito para que esses dias melhores pudessem vir.

Á Coordenadora da CODAFI, representada por Dra. Leila Mônica Gonçalves, os meus mais sinceros agradecimentos pela paciência, amizade e confiança depositada durante os anos que convivemos na FUNAD.

A caríssima e muito estimada amiga, a fisioterapeuta Maria Filomena Spinelle, incentivando-me e estimulando-me a vencer os desafios e por sempre se fazer presente às minhas solicitações.

Aos colegas docentes da Clínica Escola de Fisioterapia do UNIPÊ, Profa. Carla Fechine, Aldeide Rocha, Socorro Gadelha, que respaldaram minhas ausências de maneira tão carinhosa.

À coordenação do Curso de Fisioterapia do UNIPÊ, professoras Mariana Brito Barbosa e Ana Margarida Trigueiro do Vale, pela confiança, respeito e disponibilidade em ajudar-me nessa importante fase da minha vida.

À Comunidade Católica Nossa Senhora Menina, que participo e convivo há oito anos, e que tem como membros: Maria Eulina Aguiar, Alice Ângelo, Moema Maia, Graça Baptista, Vera e todos os abençoados de caminhada cristã.

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CARVALHO, Sandra Maria Cordeiro Rocha. Representação Social da Pessoa com Deficiência frente à exclusão / inclusão. João Pessoa, 2007, p. 127. Dissertação do Curso de Mestrado em Educação do Programa de Pós

Graduação em Educação - PPGE, da

Universidade Federal da Paraíba UFPB.

RESUMO

A presente pesquisa reservou-se a investigar as representações sociais das pessoas com deficiência frente à exclusão / inclusão que participam das atividades da Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência - FUNAD, localizada no município de João Pessoa, PB. Parte dos aspectos sobre a pessoa com deficiência, no contexto da exclusão e inclusão, na busca da cidadania. Têm o objetivo de dar voz as pessoas com deficiência, para que, através de suas falas, pudessem explicitar os sentimentos, significados e as representações que emergem no seu cotidiano. Compreendendo suas atitudes podem-se desvelar as contradições existentes que permeiam as propostas de inclusão e cidadania. Para a análise desse estudo, optou-se pela Teoria da Representação Social de Moscovici, como aporte teórico

metodológico de uma pesquisa do tipo qualitativa, a partir do procedimento de entrevista com pessoas com deficiência, que freqüentam a referida instituição. Para análise dos dados foi selecionada a técnica da Análise de Conteúdo proposta por Bardin, a partir da seleção das categorias teóricas exclusão, inclusão e cidadania, em que buscamos identificar as representações sociais que essas pessoas têm a respeito do processo de exclusão / inclusão e cidadania. As análises das entrevistas com os sujeitos envolvidos na pesquisa revelaram que estes se sentem acolhidos no contexto institucional que freqüentam, mas a maioria dos sujeitos da pesquisa não compreende o significado da proposta inclusiva, da cidadania e dos seus direitos enquanto cidadãos no contexto social em que estão inseridos. O estudo aponta ainda que as pessoas com deficiência trazem consigo o senso comum acerca de sentimentos diversos, dentre os quais se destacam: estigmatização, a acomodação e a resignação, sentimentos que, por sua vez remetem, ao meu entender, uma postura de subordinação, alienação e desconhecimento acerca dos seus direitos como cidadão e cidadã dentro da perspectiva de inclusão que a sociedade do capital, produtora da exclusão social, lhes oferece.

Palavras-chave: representação social; pessoa com deficiência; cidadania; inclusão.

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CARVALHO, Sandra Maria Cordeiro Rocha. Handicapped Person Social Representation Facing Inclusion/Exclusion. João Pessoa, 2007, p.127. Education Mastership Course Dissertation in Education Post Graduation Program

EPGP

Universidade Federal da

Paraíba - UFPB

ABSTRACT

The actual research had been reserved to investigate handicapped social representations facing exclusion / inclusion who participate in Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência

FUNAD activities, located in João Pessoa, PB. It comes from aspects about handicapped person exclusion/inclusion context, searching for citizenship. The aim of this study was to give voice to these persons in order to, through their words; they could turn explicit the feelings, meanings and representations that rise out of the quotidian. Understanding one can attitudes and unveil the existing contradictions in inclusion and citizenship proposal. Form study analyses we chose Moscovici Social Representation Theory as theoretical- methodological as a support of a qualitative research. Seven persons were interviewed, who attended the institution previously referred, between the months of September and October of the current year. For data analysis it was selected the content analysis proposed by Bardin, from the theoretical categories exclusion, inclusion and citizenship, where they search to identify the social representations that these persons have about the exclusion/inclusion process and citizenship. The interviews analysis with the subjects involved in the research showed that those feel welcome in the institutional context that attend to, but the majority of the research subjects doesn t understand the inclusion, citizenship and rights proposal meaning, while citizens in the social context that are inserted. The study indicates that handicapped persons still bring with them the common sense about various feelings, among them we detach: the stigmatization and accommodation feelings that, in turn, remit, to my understanding, to a subordination alienation and ignorance attitude, about their rights as citizens in this inclusion perspective that the capital society, promoter of social exclusion, gives to them.

Key-words: social representation, handicapped person, inclusion.

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SUMÁRIO

vi RESUMO ......................................................................................................................

ABSTRACT .................................................................................................................. vii

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18

INTRODUÇÃO..............................................................................................................

CAPITULO 1: A REPRESENTAÇÃO SOCIAL COMO APORTE TEÓRICO

METODOLÓGICO DA PESQUISA ............................................................................

1.1 O Caminho metodológico e aspectos éticos da pesquisa ................................ 18

1.2 A teoria da representação Social ....................................................................... 22

36 1.3 O significado das Representações Sociais no campo da deficiência ...............

CAPITULO 2: CONTEXTUALIZAÇÃO DA DEFICIÊNCIA E CIDADANIA

42

2.1 Aspectos histórico-conceituais da deficiência e da pessoa com deficiência .... 43

2.2 A cidadania e os movimentos sociais na perspectiva de inclusão ................... 55

CAPITULO 3: CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS PROCESSOS DE

EXCLUSÃO .................................................................................................................... 68

3.1 Aspectos históricos da produção da exclusão e inclusão ................................. 69

3.2 Histórico das campanhas institucionais e um breve resgate das políticas

inclusivas .............................................................................................................. 80

3.3 Processos de inclusão no município de João Pessoa ........................................ 83

3.4 À FUNAD como lócus da pesquisa .................................................................... 89

CAPÍTULO 4: PERFIL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA FRENTE AO LÓCUS

DA PESQUISA E SUAS REPRESENTAÇÕES FRENTE À EXCLUSÃO,

INCLUSÃO E CIDADANIA .......................................................................................... 93

4.1 Perfil da pessoa com deficiência frente ao lócus da pesquisa........................... 95

4.2 A representação Social da Pessoa com deficiência frente à exclusão/ inclusão

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................

REFERÊNCIAS........................................................................................................... 110

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APÊNDICE...................................................................................................................

ANEXO...........................................................................................................................

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INTRODUÇÃO

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A expansão das desigualdades sociais e a exclusão marcam o período histórico

vivenciado no capitalismo do século XX e nos tempos atuais de globalização, em que as

pessoas são reduzidas à condição de objeto, consideradas parte do processo apenas quando se

encontram em perfeitas condições físicas e psicológicas. No contexto dos processos de

produção capitalista produzem-se discriminações e preconceitos que marcam a sociedade do

capital em que vivemos, uma vez que separam as pessoas produtivas das improdutivas.

Nesse processo de exclusão, incluem-se na categoria improdutiva, as chamadas

pessoas com deficiência, que, pelas dificuldades na condição de autonomia, tornam-se

absolutamente dependentes e subordinados ao contexto familiar e social.

A temática em estudo merece ser considerada no sentido de analisar o processo que se

destina a incluir a pessoa com deficiência em contextos educacionais e sociais fortemente

excludentes. Observamos, a partir da vivência profissional, que as dificuldades para a inclusão

se intensificam junto aos mais carentes, pois a falta de recursos econômicos diminui as

chances de um atendimento de qualidade, ante ao agravante de que o potencial e as

habilidades dessas pessoas são pouco valorizados nas suas comunidades de origem, supomos,

também, em virtude do pouco esclarecimento a respeito do potencial da pessoa com

deficiência, em que se sobrepõe os estigmas que são criados pela própria sociedade, quando

rotula ou ignora o que, segundo seus padrões de normalização, diferem dos ditos normais

pelos mesmos.

No contexto social da exclusão, torna-se, então, evidente a necessidade de se estudar e

discutir as Representações Sociais que mediatizam as relações interpessoais e possibilitam a

construção do vínculo, como estrutura dinâmica da sociedade que engloba tanto os sujeitos

quanto os fenômenos da inclusão e seus contextos, pois entendemos que a forma como estes

são concebidos neste momento histórico possibilitará conhecer as representações sociais, que

são pensamentos compartilhados, construídos e desenvolvidos na vida cotidiana. Defrontam-

se, então, dois grandes desafios à pesquisa: compreender o ser a partir de suas reflexão

envoltas de significados e sentidos elaborados na sua história, desvelando as manifestações e

ocorrências com foco no fenômeno de deficiência, exclusão e inclusão, no processo de

desenvolvimento educacional e social.

A escolha do tema foi motivada, inicialmente, pela necessidade pessoal de

aproximação e apropriação de facetas de uma realidade que tem nos envolvido em

questionamentos e que a formação em fisioterapia não nos habilitou a responder. Por que não

se tem lugar para todos em nossa sociedade? O que separa as pessoas em espaços distintos as

quais, por princípio, têm o mesmo direito de ocupar todos os espaços? Onde e quando essas

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diferenças se estabeleceram? Como o cidadão ou a cidadã com deficiência se vê nesse

processo? Questionamentos tantos, de natureza tão diversas, mas que aos poucos fomos

percebendo não estarem dentro somente das nossas inquietações; então presentes também

entre outros profissionais que, direta ou indiretamente, interagem com esses cidadãos que

estão inseridos nesse segmento social.

A prática profissional, há quinze anos no lócus desta pesquisa, impulsionou e

estimulou a buscar um olhar interdisciplinar sobre a problemática da deficiência, como

possibilidade de superação das dificuldades que ora se apresentavam no cotidiano

profissional.

No espaço aberto pela oportunidade dada a nós, como profissional da saúde, de

ingressar num programa de Mestrado em Educação, optamos por tentar encontrar respostas

que diminuíssem as lacunas existentes dos profissionais de formação na área da Saúde, que

têm como rotina profissional o convívio com pessoas com deficiências e a constante

observação dos processos de exclusão por que passam essas pessoas, na defesa dos seus

direitos sociais.

Em 1992, iniciaram-se minhas atividades na Fundação Centro Integrado de Apoio ao

Portador de Deficiência - FUNAD, como fisioterapeuta. Nesse mesmo ano, participava de

encontros ligados à área da educação especial, nos quais, a expressão inclusão se fazia

presente nas discussões em grupo, instigando-nos à curiosidade e a necessidade de nos

interarmos sobre o referido tema no nosso serviço e cotidiano institucional.

Mas a inclusão que se discutia na época não mencionava os tais espaços vazios,

apenas referia-se a necessidades de se colocar mais alguma coisa, ou alguém, em espaços

muitas vezes já cheios, como se a mágica da dilatação de todos os espaços, os físicos e os

mentais, pudesse ser feita facilmente. Famílias iam em busca de uma escola para todos, na

qual a proposta pedagógica fosse concebida à luz das diferenças de todos e os professores

fossem formados para ensinar e aprender com a diversidade. Ideais inspiradores, mas ainda

distantes da realidade brasileira, e, em particular, do nosso estado. Como atingí-los?

Perguntávamos-nos de certa forma indignados e esperançosos.

A opção por este objeto de pesquisa é advindo da indignação brotada e aguçada, a

partir das observações das freqüentes indagações das pessoas com deficiência e, até mesmo,

da postura de subserviência e anulação frente aos seus direitos enquanto cidadãos. Esta teve

início durante a nossa vivência na prática terapêutica com esse segmento da sociedade,

quando, na rotina do dia-a-dia, fomos ouvintes de suas angústias, relatos de discriminação,

subserviência, acomodação, aceitação e neutralização diante do que lhes oferecem.

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Observamos, de uma maneira geral, nas suas queixas diárias o desinteresse, a despolitização e

a falta de perspectivas diante da causa da pessoa com deficiência.

Sem querer negar a importância dessas questões, sentíamos o interesse por outro

aspecto que a nosso ver se fazia mais urgente conhecer: o que imaginavam esses cidadãos

sobre o contexto da exclusão/inclusão em que estavam envolvidos. Dento dessa compreensão

Bicudo e Espósito (1997, p. 76) enfatizam que o pesquisador em educação defronta a tarefa de

desvelar e tornar explicita a constituição dos acontecimentos da vida diária. Para tanto,

procura situar-se diante dos fenômenos de forma que estes possam mostrar-se na sua própria

linguagem, ou seja, nas várias formas pelas quais eles podem aparecer tipicamente.

Assim, partindo dos próprios questionamentos e diante das indagações já elencadas,

buscamos um método que fosse capaz de revelar não apenas possíveis respostas, mas indícios

do contexto da construção destas. Uns métodos que nos possibilitasse entender como as

pessoas com deficiência se situam nessa sociedade de histórico excludente e sob perspectivas

inclusivistas, em que se parte do princípio geral que essas pessoas são sujeitos historicamente

contextualizados, mesmo com rótulos e estigmas agregados por esta sociedade, possuem

potencialidades, têm seus direitos e deveres enquanto pessoa, cidadão pela sua própria

condição de ser humano.

Historicamente, essas pessoas têm sido relegadas aos mais esdrúxulos processos de

exclusão, desde os manicômios até prisões domiciliares, por se acreditar serem incapazes de

processos socializadores. Essa situação, embora venha sendo revista desde o final do século

passado, através de significativos avanços legais de promoção da inclusão, ainda é grave,

perdurando a um senso comum da discriminação arraigado há séculos. Neste sentido,

investigar a concepção das pessoas com deficiência acerca das práticas inclusivistas,

vivenciadas no contexto social e educacional em que estão inseridos, poderá possibilitar um

novo olhar sobre sua condição de existência na sociedade e as potencialidades de organização

e de lutas em busca da sua cidadania no contexto social que estão envolvidos.

A Cidadania se revela na concretização de seus direitos civis, sociais e políticos,

representando tais leis o referencial necessário para a realização das ações dessa natureza.

Assim, garantir a sua acessibilidade, o trabalho, o acesso à saúde são exemplos básicos de

cidadania que envolve não só a pessoa com deficiência, mas todos os cidadãos que têm seus

direitos renegados por uma sociedade eminentemente excludente, uma vez que estereótipos e

discriminações impedem que essas pessoas excluídas do contexto social sejam aceitas. Nesse

processo de exclusão e inclusão tem-se observado que uma das principais fontes de

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preconceitos é a desinformação existente acerca das potencialidades, anseios e dificuldades

dessas pessoas.

O objetivo deste estudo é dar voz às pessoas com deficiência, para que, por meio de

suas falas, possam explicitar os sentimentos, significados e as representações que emergem no

seu cotidiano, buscando compreender as atitudes e desvelar as contradições existentes nos

conceitos de inclusão que influenciam e expressam as ações do seu cotidiano. Assim,

pretendemos investigar como a pessoa com deficiência se vê nesse processo de

exclusão/inclusão e qual é a sua representação social acerca da inclusão.

Portanto, sensíveis a esta questão, tomamos aqui como objeto de investigação a

Representação Social da pessoa com deficiência frente à exclusão / inclusão, no sentido de

analisar as representações sociais do referido grupo, acerca da suas percepções, opiniões, do

contexto em que estão inseridos, dito inclusivista pela sociedade. De forma mais especifica,

buscaremos: identificar a caracterização do contexto inclusivista em que está inserido,

analisar a percepção do grupo acerca deste contexto, as representações que fazem das inter-

relações, das relações com os atores externos implicados (o social) e da instituição que os

acolhe (educacional e reabilitacional) e a atitude frente ao exercício da cidadania.

A Teoria das Representações Sociais configura-se em um referencial teórico

metodológico que apresenta possibilidades concretas de alcançar o objetivo proposto nesta

pesquisa, qual seja analisar as representações sociais da pessoa com deficiência.

Estudos que se fundamentam na Teoria das Representações Sociais apresentam um

grau de importância relevante neste país. Na educação, podemos encontrar uma diversidade

de estudos sob o enfoque de representações sociais. Teóricos e pesquisadores como Souto

(1995), Rangel (1999), Madeira (2000), Costa e Almeida (2000), Oliveira e Siqueria (2000),

dentre outros. Também em outras áreas como saúde, encontram-se pesquisas relevantes

envolvendo a Teoria das Representações Sociais, dentre as quais destacamos as desenvolvidas

por Oliveira (2000), Trindade (2003), Souza Filho (1992), e Reigota (2002). No percurso de

nossa busca de literatura para esta pesquisa, foi possível perceber a preocupação desses

pesquisadores, em encontrar, analisar e discutir as representações sociais que envolvem a área

educacional, preocupação essa decorrente da necessidade de conhecer melhor o contexto

social que envolve os sujeitos da pesquisa.

Em busca de uma exploração minuciosa do nosso tema de pesquisa, percorremos um

caminho metodológico investigativo que inicialmente se deu a partir do levantamento

bibliográfico em livros, revistas especializadas, dissertações e teses envolvendo o assunto, o

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que nos encaminham para a escolha dos sujeitos e do local da pesquisa, na busca de

documentos oficiais.

Foi apresentado o Termo de Consentimento livre e esclarecido aos sete entrevistados,

que freqüentam a Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência FUNAD,

entre os meses de setembro e outubro do corrente ano. Conforme solicitação prévia junto ao

Comitê de Ética do Centro de Ciência da Saúde (CCS), no que rege os aspectos éticos

referentes à pesquisa em seres humanos, preconizados pela Resolução Nº. 196 de 10 de

outubro 1996 do Conselho Nacional de Saúde, do Ministério da Saúde capítulo II, sendo

asseguradas aos participantes do estudo, informações sobre os objetivos da mesma, a

privacidade, o livre consentimento, após terem sido convenientemente esclarecidos, bem

como a liberdade de desistir da participação em qualquer momento sem prejuízo para a sua

assistência.

A pesquisa teve um caráter qualitativo, visto que este tipo de pesquisa, por se tratar da

necessidade de compreensão do pensamento, é entendido por Richardson (1999, p. 90) como

a tentativa de uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais

apresentadas pelos entrevistados, em lugar da produção de medidas quantitativas de

características ou comportamentos.

O instrumento utilizado para a coleta de dados foi à entrevista individual, captada por

um gravador digital e depois transcrita e digitalizada. A entrevista é uma técnica importante

que permite o desenvolvimento de uma estreita relação entre as pessoas. [...] o termo

entrevista é construído a partir de duas palavras, entre e vista. Vista refere-se ao ato de ver, ter

preocupação de algo. Entre indica a relação de lugar ou estado no espaço que separa duas

pessoas ou coisas. Portanto o termo entrevista refere-se ao ato de perceber realizado entre

duas pessoas (RICHARDSON, 1999, p. 207).

A técnica metodológica que foi utilizada para a interpretação dos dados das entrevistas

foi o da Análise de Conteúdo proposta por Bardin. A referida autora a define como [...] um

conjunto de técnicas de análises das comunicações visando obter, por procedimentos,

sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos

ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção

/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1988, p. 42).

Pautamos-nos pelo estudo com a Teoria da Representação Social, pelo fato de

acreditarmos que através dela poderemos entender as mais significativas expectativas e ou

anseios destes sujeitos, na perspectiva de que os resultados e as conclusões contribuam para a

própria organização e reorganização desse segmento social. Além de, é claro, poder contribuir

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também como referência para a elaboração do processo desses sujeitos, diante da trajetória de

inclusão desse segmento e dos movimentos sociais de que os mesmos fazem parte.

Com base nas argumentações até agora elencadas para a construção dessa pesquisa, a

dissertação foi estruturada em quatro capítulos distintos, que foram de grande relevância para

o entendimento e suporte teórico do fenômeno pesquisado. No primeiro capítulo desta

pesquisa, encontra-se a Representação Social como aporte teórico-metodológico da pesquisa,

seguido pelo caminho metodológico e aspectos éticos da pesquisa. Encontramos na Teoria da

Representação Social de Serge Moscovici, que norte para o processo de compreensão deste

estudo, e finalizamos este capítulo, com o significado das representações Sociais no campo da

deficiência. O segundo capítulo tratou da contextualização da questão da deficiência e

cidadania, demonstrou os aspectos históricos e conceituais da deficiência e da pessoa com

deficiência e a cidadania e os movimentos sociais na perspectiva da inclusão.

O terceiro capítulo delineia o contexto histórico dos processos de exclusão e inclusão,

abordando aspectos históricos da produção da exclusão e inclusão, e um breve histórico das

campanhas institucionais e políticas inclusivas, além do processo de inclusão no município de

João Pessoa e a FUNAD como lócus da pesquisa. O quarto capítulo, intitulado Perfil da

pessoa com deficiência frente ao lócus da pesquisa e sua representação social frente á inclusão

/exclusão e cidadania, tem como subtítulos O perfil da pessoa com deficiência frente à

FUNAD e A representação da pessoa com deficiência frente à exclusão/inclusão e cidadania.

Tais análises têm como base teórica autores como Serge Moscovici e colaboradores como

Denise Jodelet, Marcos Reigota, Laurence Bardin, dentre outros já citados. E no campo

temático da exclusão / inclusão da pessoa com deficiência, autores como Mittler (2003),

Sassaki (2006), Mazzotta (1996), Rodrigues (2006), Santos e Paulino, Freire (1980) dentre

outros.

E, por último, são apresentadas as considerações finais levantadas ao longo das

análises, na perspectiva não se esgotar s reflexões sobre o tema, mas, ao contrário, de

possibilitar aos leitores, a partir destas, o levantamento de outras hipóteses relacionadas com a

temática abordada.

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CAPÍTULO 1

A REPRESENTAÇÃO SOCIAL COMO APORTE TEÓRICO-

METODOLÓGICO DA PESQUISA

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Neste capítulo, abordaremos o caminho metodológico e os aspectos éticos da pesquisa,

sobre a Teoria da Representação Social de Serge Moscovici, como aporte teórico-

metodológico da pesquisa. Abordar-se-á também o significado das Representações Sociais no

campo da deficiência. Consideradas essas imprescindíveis e elementares para a construção e

direcionamento da pesquisa em foco.

Concordamos com o pensamento de Moysés e Collares (1997, p. 17) no sentido de que

a pesquisa é o caminho de procura do conhecer, de acesso à apreensão, decomposição e

reconstrução dialética da totalidade de um objeto de estudo, processo possível pela superação

do aparente, que por vezes é enganoso; pelo enfrentamento de enigmas a serem decifrados, e

de jogos de aparências e sombras, que ocultam o próprio objeto que se procura conhecer .

1.1 Caminho metodológico e aspectos éticos da pesquisa

De acordo com Martins e Bicudo (1989, p. 76), a pesquisa na abordagem

fenomenológica que se inicia com uma interrogação. Inicialmente, esta interrogação não está

muito bem delineada para o pesquisador. Ela corresponde a uma insatisfação do pesquisador

em relação aquilo que ele pensa saber sobre algo. Sente-se pouco à vontade em relação a isto.

Algo o incomoda. Cria-se uma tensão que acompanha e alimenta o pesquisador na busca

da intuição da essência do fenômeno interrogado.

Os procedimentos metodológicos desta pesquisa partem da necessidade de articulação

entre o processo e o produto da mesma como sendo elementos indissociáveis, o que não nos

permite estabelecer uma falsa dicotomia entre o processo de elaboração das representações,

tanto na sua elaboração e estruturação quanto no pensamento constituído. Nesses termos, as

intenções foram de estabelecer uma metodologia de caráter dinâmico durante o processo de

construção da referida pesquisa.

Dessa forma, é imprescindível entender a escolha do caminho a trilhar, que, a priori,

dependendo do enfoque estabelecido, já determina a postura do pesquisador, dito de outra

maneira leva-se em consideração a perspectiva teórico-metodológica escolhida para observar

e ser observado pelos sujeitos históricos que estão inclusos neste trajeto. Sendo assim, [...] a

metodologia utilizada no estudo de um objeto é determinada pela forma como ele é abordado.

A abordagem de um objeto é por sua vez determinada pela forma como apreendemos a

sociedade (ANDRADE, 2000, p. 36).

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Dentro de um largo espectro de possibilidades de investigação do nosso fenômeno,

optou-se por uma linha teórico-metodológica que nos permita ver a essência dos fatos, na

verdade, os fatos, os dados, não se revelam gratuito e diretamente aos olhos do pesquisador

(LUDKE; ANDRE, 1986, p. 04).

Sendo assim, o propósito deste estudo foi o de procurar adotar uma perspectiva

metodológica que melhor respondesse aos questionamentos e que estivesse articulada com a

teoria. Então, assumindo uma metodologia que contemplasse essas aspirações, no trato com o

objeto em estudo, enveredou-se por um caminho que tivesse relação com o campo das

representações sociais, que devem ser construídas e posteriormente reveladas pelas pessoas

com deficiência frente ao processo de exclusão e inclusão.

Em síntese, podemos dizer que as partes dessa metodologia estão entrelaçadas ao

referencial teórico-metodológico, portanto em nível do simbólico. O campo das

representações socias está articulado, neste caso em particular, com a realidade das pessoas

com deficiência que freqüentam a Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de

Deficiência localizado no município de João Pessoa, Paraíba.

Seguindo esta abordagem, a pesquisa foi conduzida desenvolvendo-se um estudo

qualitativo, uma vez que o estudo das representações está voltado para o conteúdo das

comunicações. De acordo com Lakatos e Marconi (1982, p. 18) as metodologias qualitativas

são capazes de incorporar a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos

atos, às relações e às estruturas sociais. Sendo estas últimas construções humanas

significativas, tendo como foco de atenção o específico e o particular, como parte da

compreensão do fenômeno estudado .

Segundo Spink (1995, p. 28) as representações sociais se definem por um conteúdo,

composto de atitudes, imagens, opiniões e informações. Elas têm um caráter icônico

(imagem) e simbólico (significado). Tais aspectos não podem ser separados, pois toda

imagem está associada a um sentido e vice-versa. Este conteúdo se refere a algo (o objeto) e

foi elaborado por alguém (o sujeito) .

Os sujeitos da pesquisa foram sete pessoas, seis com deficiência motora e uma com

deficiência visual. Justifica-se a exclusão das pessoas com deficiência mental e auditiva,

tendo em vista a escolha do instrumento para obtenção dos dados serem necessário uma

compreensão verbalizada e uma coerência de entendimento cognitivo expressado pelo sujeito

a ser submetido às entrevistas elaboradas de acordo com os objetivos propostos neste estudo.

A escolha da FUNAD se deu em virtude da mesma ser considerada um local de

referência no Estado da Paraíba onde se concentra um atendimento amplo as várias condições

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e especificidade de que são portadoras as pessoas com deficiência. A referida instituição está

localizada no município de João Pessoa/PB, atende em média, segundo estatística fornecida

pela diretoria técnica.

Os usuários1

escolhidos para a entrevista foram determinados conforme marcação de

visitas às coordenadorias e disponibilidades de horário. Portanto foram visitadas na Fundação

Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência

FUNAD, as coordenadorias de

atendimento ao deficiente físico e de atendimento ao deficiente visual, entre os meses de

setembro e meados de outubro do corrente ano.

As entrevistas foram individuais, em que a pesquisadora apresentou-se ao

entrevistado (a), munida de uma pasta com as entrevistas, termo de consentimento e um

gravador digital para armazenamento das falas dos respondentes. Primeiramente, foi

apresentado aos mesmos o propósito da pesquisa e indagado sobre a disponibilidade de sua

contribuição na referida pesquisa. Com o consentimento dos participantes, procedeu-se à

gravação das entrevistas, que foram transcritas posteriormente, respeitando-se com exatidão a

maneira como cada um se expressou.

De acordo com os aspectos éticos referentes à pesquisa em seres humanos,

preconizados na Resolução no. 196 de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde

do Ministério da Saúde capítulo II, foram assegurados aos participantes deste estudo,

informações sobre os objetivos do mesmo, a privacidade, o livre consentimento, após terem

sido convenientemente esclarecido, bem como a liberdade de desistir da participação em

qualquer momento sem prejuízo para a sua assistência. Estes aspectos serão observados

através do termo de Consentimento Livre e Esclarecidos elaborado pela pesquisadora e

adotado nesta pesquisa.

Como técnica de coleta dos dados desta pesquisa, recorreu-se à técnica de entrevista

semi

estruturada, com o intuito de favorecer a livre expressão dos sujeitos e estimular a

abordagem da temática em estudo uma vez que, esta nos permite apreender o significado dado

pelos respondentes. Para tanto, utilizou-se um roteiro abrangendo os seguintes eixos: sobre a

identificação dos usuários, os serviços da FUNAD e sobre o tema objeto da pesquisa a

inclusão, exclusão e a cidadania.

Os itens contidos no roteiro das entrevistas seguiram uma seqüência levando em

consideração os seus objetivos, com o cuidado de não induzir às respostas. Ou seja, foram

divididos em partes distintas. De início, colhemos algumas informações visando

1 Conforme estatuto da Instituição FUNAD/1989, designação dada a todas as pessoas que se submetem a um ou mais serviços oferecidos na Instituição.

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caracterização dos sujeitos entrevistados quanto a sua idade, grau de instrução, tipo de escola

que estudou profissão e dificuldades escolares. Em seguida, colhemos dados sobre a FUNAD

e, por último, enfocamos o objeto do estudo propriamente dito, que são as categorias inclusão,

exclusão e cidadania, conforme o roteiro de entrevista contido no apêndice dessa pesquisa.

O método para análise dos dados e para a caracterização dos sujeitos foi o de análise

de conteúdo, comumente utilizado em pesquisas qualitativas, cujos dados foram planilhados e

analisados. O conjunto destas informações veio compor o perfil dos entrevistados, bem como

o cenário em que foram construídas as suas representações. O material obtido nas entrevistas

foi analisado, segundo a técnica elencada pelo referido método.

De acordo com Bardin (1988, p. 109) a análise de conteúdo é aplicável a qualquer

comunicação e é definida como um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando

obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,

indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às

condições de produção e percepção (variáveis inferidas) destas mensagens .

Entre as diversas técnicas de análise de conteúdo, optamos pela análise por categoria

visto que a mesma se baseia na decodificação de um texto em diversos elementos, os quais

são classificados e formam agrupamentos analógicos. Entre as possibilidades de

categorização, a mais utilizada, mais rápida e eficaz, sempre que se aplica aos conteúdos

diretos (manifestos) e simples, é a análise por temas ou análise temática; uma vez que é

habitualmente empregada nos estudos sobre motivações de opiniões, atitudes, valores, crenças

(BARDIN, 1988; FRANCO, 1986; RICHARDSON, 1999).

Para análise dos conteúdos das entrevistas, partiu-se para a classificação que

denominamos categorização. De acordo com Bardin (1988, p.118), a etapa de categorização

não é obrigatória na análise de conteúdo, mas a maioria dos procedimentos inclui a

categorização, pois facilita a análise da informação .

1.1 A Teoria da Representação Social.

Como referencial teórico-metodológico desta pesquisa de investigação, adotou-se a

Teoria das Representações Sociais, proposta por Moscovici, uma vez que ela nos permite

compreender e analisar que concepção a pessoa com deficiência tem nesse contexto

inclusivista de histórico exclusivista, que está inserido.

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Conforme a definição oferecida por Jodelet (2001), as representações sociais

"constituem modalidades de pensamento prático, orientadas em direção à comunicação,

compreensão e domínio do meio social, material e ideal (imaginário) . Isto é, as

representações têm como propósito transformar algo estranho em familiar.

Partiu-se da compreensão de que as representações humanas configuram-se como os

meios através dos quais os sujeitos sociais expressam as apreensões que fazem dos

acontecimentos do cotidiano, das características do ambiente, das informações que circulam,

das relações sociais. Constituem ainda um tipo de saber elaborado a partir do senso comum,

das idéias, das imagens, das concepções e das visões de mundo que os atores sociais possuem

da realidade.

É a realidade introjetada, manifestada concretamente. Neste sentido, as representações

sociais são abordadas concomitantemente como produto e processo de uma atividade de

apropriação da realidade exterior ao pensamento e de elaboração psicológica e social dessa

realidade. Em outras palavras, uma representação social corresponde a uma forma de

expressão social do conhecimento, que concorre para uma vivência prática. Ou seja, [...] uma

forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que

contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social (JODELET, 2001

p.22).

A representação social está diretamente relacionada com o senso comum, com as

ideologias, com os preconceitos, com a realidade cotidiana. Dessa maneira, Uma

representação social é o senso comum que se tem sobre determinado tema, onde se incluem

também os preconceitos, ideologias e características específicas das atividades cotidianas

sociais e profissionais (sociais e profissionais) das pessoas (MOSCOVICI, 2003, p. 12).

As expressões representacionais estão relacionadas com percepção, crenças e imagens

dos atores sociais em relação a um contexto ou a um fenômeno cotidiano. São meios de se

construir aquilo que se imagina. São formas através das quais os indivíduos exteriorizam

pensamentos, sentimentos e aspirações sobre si mesmos, sobre outros indivíduos, sobre

relações, sobre objetos, sobre o meio mais imediato e também sobre o mundo.

As representações sociais são construções resultantes das interações sociais, mediadas

pela comunicação, na perspectiva de compreensão de uma realidade e, nessa direção, Reigota

(2002, p. 70) destaca: As representações sociais equivalem a um conjunto de princípios

construídos interativamente e compartilhados por diferentes grupos que através delas

compreendem e transformam a realidade .

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É a interação social, sustentada na comunicação, no meio que possibilita a circulação

do conhecimento, seja este proveniente do senso comum ou da ciência, servindo de cerne para

a elaboração das representações sociais. As representações são produtos da interação e

comunicação, e elas tornam sua forma e configuração específica a qualquer momento, como

uma conseqüência do equilíbrio específico desses processos de influência social

(MOSCOVICI, 1991, p.21).

Portanto, surge uma nova possibilidade de análise no contexto das Ciências Sociais,

centrada na perspectiva de percepção e compreensão dos fenômenos. Observa-se a

emergência de um novo campo epistemológico para interpretação e conseqüente explicação

da realidade, pleiteando a construção de um conceito, observada pelas ciências

contemporâneas como ainda inacabado, que confere dinamicidade aos processos imersos aos

contextos, em que o sujeito interfere no objeto, e vice-versa, ao mesmo tempo em que ambos

são produtos de uma totalidade.

É exatamente nesse contexto hitórico e complexo que vem se consolidando a teoria

das representações sociais como um conceito dinâmico e explicativo, tanto da realidade

social, como física e cultural, que possui uma dimensão histórica e transformadora;

juntamente aos aspectos culturais, cognitivo e valorativo, isto é, ideológicos, que estão

presentes nos meios e nas mentes, isto é, ele se constitui numa realidade presente no objeto e

nos sujeitos; é um conceito sempre relacional, e por isso mesmo social.

No entanto, conforme Moscovici (1991) a teoria da representação social representa um

sistema de valores, de noções, e de práticas tendo uma dupla tendência: antes de tudo,

instaurar uma ordem que permite aos indivíduos a possibilidade de se orientar no meio

ambiente social, material e de dominá-lo. Em seguida, de assegurar a comunicação entre os

membros de uma comunidade propondo-lhes um código para suas trocas e um código para

nomear e classificar de maneira unívoca as partes de seu mundo, de sua história individual ou

coletiva.

O conceito de representação remonta ao século passado e tem sua origem na

Sociologia de Émile Durkheim (1858

1917), que buscou discutir a importância das

representações dentro de uma coletividade e como elas interferem nas decisões individuais

dos seres humanos. Tomou como fenômeno de análise o suicídio , que ao menos

aparentemente se processa em nível individual. Depois de estudos e análises rigorosas,

Durkheim apresenta uma explicação geral para o problema, descrevendo: O suicídio é um

fenômeno individual, mas que tem por causas forças que emanam da coletividade. Ele aponta

para a existência de correntes suicidógenas (ou representações - que perpassam as

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sociedades modernas e seriam as causas fundamentais do fenômeno) (REIGOTA, 2002,

p.66).

Seguindo essa linha de raciocínio, mesmo havendo uma predisposição psicológica

para o fenômeno (suicídio), em última instância, este é originado das representações. Nesse

sentido, respaldado em Durkheim, Reigota acrescenta: [...] nada ou quase nada escapa das

configurações sociais, ou seja, as sociedades agem sobre seus indivíduos independentemente

da vontade destes (REIGOTA, 2002, p.66). Continuando, o ator citado (p. 67), destaca que

Durkhaim trata ainda de uma diferenciação entre representações e conceitos científicos.

De acordo com este entendimento, ele coloca que os conceitos científicos tendem a

generalizações e ao rigor, enquanto que as representações coletivas se associam a um tipo de

conhecimento que, podemos eventualmente possuir um aspecto de cientificidade, se pauta

pela compreensão descompromissada do real, situando-se fora de um padrão inflexível de

formulação do saber. Entretanto, isto não diminui o valor e a pertinência social do

conhecimento gerado a partir das representações:

[...] como saber de senso comum ou ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento é diferenciada, entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida como um objeto de estudo tão legítimo quanto este devido a sua importância na vida social e à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais (JODELET, 1990, p. 22).

Subseqüentemente a Durkheim, surge outra corrente sociológica que influencia a

teoria das representações sociais, precisamente na década de 20 e 30, chamada Sociologia do

Conhecimento (Mannhein).

Tomando como base a tese da sociologia do conhecimento, diríamos que, na realidade somente o indivíduo é capaz de pensar. Porém, seria falso pensar que todas as idéias e sentimentos que motivam o indivíduo tenham origem apenas nele, e que possam ser adequadamente explicados tomando-se unicamente por base sua experiência de vida (REIGOTA, 2002, p.68).

Sabendo-se que a tarefa primordial a que propõe Mannhein é buscar as origens sociais

do conhecimento e, apesar de o mesmo não usar o termo representações, há uma forte

coincidência entre seu pensamento e o pensamento Durkheiminiano. Nesse sentido, toda

forma de pensamento está inserida numa situação histórico-social concreta e precisa ser

compreendida sempre se tomando por base sua configuração coletiva específica.

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A Sociologia do Conhecimento se situa dentro do paradigma da contradição, marcado pelo materialismo histórico, enquanto o pensamento de Durkheim se origina para o consenso, uma busca de equilíbrio que se processa também através de representações (REIGOTA, 2002, p.68).

Todavia, o conceito de representação tem em Durkheim o seu fundamento original

enquanto fenômeno de expressão dos sujeitos a partir de forças que emanam da sociedade,

opondo-se, com isso, a posição de que as representações têm origem apenas no indivíduo.

Portanto segundo Moscovici, (1978, p.47), o verdadeiro inventor do conceito é

Durkheim, na medida em que fixa os contornos e lhe reconhece o direito de explicar os

fenômenos mais variados na sociedade. Ele define por uma dupla separação. Primeiramente,

as representações coletivas se separam das representações individuais, como conceito das

percepções ou das imagens. Estas últimas, próprias a cada indivíduo, são variáveis e trazidas

numa ordem ininterrupta. Em seguida, as representações individuais têm por substrato a

consciência de cada um; as representações coletivas, a sociedade em sua totalidade. Assim,

estas não são o denominador comum daquele, mas antes sua origem, correspondendo à

maneira pelo qual esse ser especial, que é a sociedade, pensa as coisas de sua própria

experiência.

Para Durkheim, as representações resultam de forças que emanam das instituições

sociais, de forma coercitiva e homogenizadora sobre os indivíduos ou grupos de indivíduos,

que passam a representar valores, noções, conhecimentos e condutas. Estas servem ainda

para:

[...] preservar o vínculo entre eles, prepará-los para pensar e agir de modo uniforme. Ela é coercitiva por isso e também porque perdura pelas gerações e exerce uma coerção sobre os indivíduos, traço comum a todos os fatos sociais (MOSCOVICI, 1978, p.47).

Para Andrade (2000, p. 148), na visão de Moscovici, a perspectiva européia,

especificamente a francesa, a psicologia social vem questionar a dissociação do indivíduo e

do coletivo no cotidiano humano, desde então, vive-se a expectativa de que estes elementos,

necessariamente, não se contradizem, mas ao contrário, acham-se próximos.

Levando-se em consideração esta linha de raciocínio, poderia se dizer que existe na

realidade um entrelaçamento entre a psique e o social, numa dimensão relacional que não

concebe a cisão indivíduo e coletividade, conferindo-lhes uma dialeticidade, atendendo assim

às expectativas da dinamicidade da realidade contemporânea, na mesma dimensão temporal

em que encontra nos sujeitos a sua complementaridade. Se vê na psicologia social em meio

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de se preencher uma falta: de uma parte, preencher o sujeito social de um mundo interior; de

outra parte restituir o sujeito individual ao mundo exterior, isto é, social (MOSCOVICI,

1991, p.9).

No entanto, Andrade (2000, p.78) esclarece que Moscovici parte do princípio de

Durkheim que explica a irredutibilidade do pensamento coletivo e dos princípios que regem o

pensamento individual, como também, a ligação dos conteúdos e da estrutura do pensamento

coletivo às formas de organização social . Contudo, detecta-se que Durkheim não aprofunda

nem explica a pluridade dos modos de organização do pensamento, em suas reflexões, as

representações configuram um tipo bem geral de fenômenos psíquicos e sociais que

incorporam a ciência, a ideologia, o mito dentre outros.

Ao empreender a tarefa de distinguir todos os fenômenos como o mito, a ideologia e

as lendas. Moscovici, com o conceito de representações sociais, dá um passo à frente, em

relação à noção de representação social , mais ligada à análise das sociedades tradicionais. O

autor considera o conceito de representações sociais mais adequados à análise das

sociedades modernas (ANDRADE, 2000).

Para Jodelet (2001, p. 22) diz que Moscovici renovou a análise, quando insiste sobre a

especificidade dos fenômenos representativos nas sociedades contemporâneas, caracterizada

por: intensidade e fluidez das trocas e comunicações; desenvolvimento da ciência; pluralidade

e mobilidade sociais.

Esse pensamento vem, num sentido mais amplo, justificar a mudança adjetiva de

coletiva a social, empreendida por Moscovici, na compreensão da concepção de

representação. Em outras palavras, o caráter social das representações transparece, segundo

Moscovici, na função específica que elas desempenham na sociedade, qual seja, a de

contribuir para os processos de formação de condutas e de orientação das comunicações

sociais (REIGOTA, 2002, p.69).

O trabalho de Moscovici surgiu com sua tese de doutoramento, La Psychanalise, Son

Image Public , transfigurando-se como um marco referencial no campo de pesquisas e

representação social. O estudo tratou das representações sociais da psicanálise, pesquisadas

por meio de questionários e de escalas, com os parisienses, no período que vai de meados para

fins dos anos 50, centralizando o enfoque das atitudes, através de manifestações das opiniões.

Segundo Moscovici (2001), as respostas aos questionários expressavam opiniões que

constituem uma primeira fase da formação das atitudes. E a partir de então, ele lança uma

hipótese, posteriormente comprovada, de que cada um desses universos de opinião

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apresentaria três dimensões possíveis: a atitude, a informação e o campo de representação

(ANDRADE, 2000, p.83). .

Tendo-se como base a leitura das três dimensões tem-se um panorama geral do

conteúdo e do sentido do objeto representado pelo sujeito ou pelo grupo. Porém, segundo

Moscovici (1978, p.73), essa tridimensionalidade pode não se manifestar plenamente num

universo representado. Numa pesquisa de opinião, por exemplo, em virtude do acesso ao

conhecimento que não contempla a todos, como acontece nas sociedades desiguais, podemos

encontrar bem a dimensão conhecimento em uma parte da população e não em outra. Assim

como, nesta ultima, a dimensão atitude pode ser mais contundente do que naquela em que o

conhecimento foi mais evidente. Isto nos permite refletir que, dependendo do objeto

representado e de seus representantes, em relação a este objeto, podemos encontrar atitudes

determinadas, porém, em parte, representações sociais completas. Pois quase sempre,

[...] a atitude é mais freqüente das três dimensões e, talvez, geneticamente primordial. Por conseguinte, é razoável concluir que uma pessoa se informa e se representa alguma coisa unicamente depois de ter adotado uma posição, e em função da posição tomada (MOSCOVICI, 1978, p.74) ·.

Baseando-se na sua pesquisa, Moscovici pôde concluir que os parisienses

evidenciavam através de suas atitudes, valores tanto positivos como negativos em relação ao

objeto estudado, mesmo sem ter antes conhecimento daquilo que poderia ser psicanálise,

evidenciando claramente que indivíduos constroem suas representações sobre os objetos,

mesmo antes de conhecê-los.

Em suma, talvez possamos situar a história evolutiva da compreensão da noção de

representações sociais a partir das seguintes contribuições: Durkheim, pondo o caráter

coletivo das representações em contraposição ao seu caráter meramente individual; e

Moscovici que, com o adjetivo social , busca imprimir a dinamicidade e diversidade das

formas representacionais em contextos societários dinâmicos, estruturados a partir de muitos

centros, marcados pela difusão das mais diversas formas de conhecimentos em tempos de

comunicação, em contraposição à noção estática das representações coletivas de Durkheim.

O que lhes dá esse caráter não é o fato de elas serem autônomas, ou que elas sejam comuns, mas sim o fato de seus elementos terem sido construídos através da comunicação e estarem relacionados pela comunicação. As coações que tal fato exerce suas regras de interação e influencias determinam a estrutura especifica de conhecimento e linguagem daí resultante (MOSCOVICI, 1978, p. 29).

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Pelo fato de tratar-se de um tipo de saber, as representações sociais são possuidoras de

modos de elaboração e funções específicas. Isto não implica em absoluto uma negação do

saber científico ou de qualquer outra forma de saber, mas tão somente, o reconhecimento da

especificidade de saberes que têm métodos e funções próprias, que foram historicamente

construídos e que necessariamente não estão superpostos.

Para caracterização, estrutura e função, segundo Jodelet (1990, p. 360 -5), destacam-se

cinco caracteres fundamentais ao fato de representar: ela é sempre representação de um

objeto; têm um caráter imaginante e a propriedade de tornar intercambiável o sensível e a

idéia, o percebido e o conceito; tem um caráter simbólico e significante; tem um caráter

construtivo e tem um caráter autônomo criativo.

Evidencia-se ainda que:

[...], representar ou se representar corresponde a um ato do pensamento pelo qual um sujeito se reporta a um objeto. Não há representação sem objeto. [...], conteúdo concreto do ato de pensamento, a representação mental traz a marca do sujeito e de sua atividade. Este último aspecto remete às características de construção, criatividade e autonomia da representação, que comportam uma parte de reconstrução, de interpretação do objeto e de expressão do sujeito (JODELET, 2001, p.22-23).

Entendendo ainda que as representações sociais possam ser como entidades vivas , a

partir da compreensão de que se caracterizam como tais, pois se movimentam, circulam e se

cristalizam no universo cotidiano através de uma fala, de um encontro e de um gesto nas

comunicações que se estabelecem; ao mesmo tempo em que são capazes de propor e provocar

transformações em todos os elementos envolvidos: os sujeitos, os objetos representados e as

relações. E mais, [...] as representações sociais correspondem, por um lado, a substancia

simbólica que entra na elaboração e, por outro, à prática que produz a dita substância . [...]

(MOSCOVICI, 1978, p.41).

Enquanto fenômeno da dimensão psicossocial, Moscovici nos fala da complexidade,

não de apreensão das representações sociais em si, mas, sobretudo, da sua conceituação. E

nessa perspectiva complementa: [...] se a realidade das representações sociais é fácil de

apreender, não o é o conceito (MOSCOVICI, 1978, p.41).

Por conseguinte, em geral, as preocupações de Moscovici acerca desse campo de

estudo se fundamentaram na direção de re-significar ou reconceitualizar a Psicologia Social, e

nesse sentido, coloca-se: [...] uma das tarefas da Psicologia Social deveria ser então a de

coletar tais representações e descrevê-las sistematicamente

em outras palavras, estabelecer

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um corpus semelhante aos que a antropologia, a história, a etnologia e a psicologia da criança

têm à sua disposição. Somente com a ajuda de tal acumulação de fatos e interpretações pode

uma ciência progredir e formular uma teoria geral (MOSOCVICI, 2003, p.43).

Dentre os elementos constitutivos, o sujeito e sua objetivação, descrevem-se os

elementos constitutivos da representação social da seguinte forma: atitudes, opinião, crenças,

imagens, noções, estereótipos, percepções, práticas, história, meio ambiente, comunicação

entre outros. Tendo como referencia às formulações conceituais de Moscovici, define-se as

noções como sendo a forma em que cada sujeito dá nome aos objetos sociais, ou melhor, é a

atribuição significativa aos objetos sociais; a comunicação apresenta-se como um fenômeno

onde os indivíduos articulam e veiculam valores, constituindo uma rede de múltiplas e mutuas

interações propiciando ao individuo a aquisição do caráter de social e o social subverte-se em

individual, repercutindo nos processos de mudanças sociais, ao mesmo tempo em que

participa na construção das representações sociais.

Quais são as formas de apreensão do espaço, das condições físicas e sociais, das

vinculações, das relações e das interações que o sujeito faz na construção das representações

sociais, como por exemplo, a classe social a que pertence? A noção de ambiente, entendido

como elemento constitutivo do processo, traduzido no contexto das representações sociais,

emprega sentido aos comportamentos e incorpora-os em um complexo de caracteres móveis e

socialmente estabelecidos.

As imagens são resultantes dos processos de internalização dos fenômenos dados, dos

acontecimentos cotidianos e das relações que se estabelecem. A imagem é a reprodução do

objeto à maneira em que foi concebida, não necessariamente à maneira de cópia, tal qual o

objeto se apresenta. Ou ainda,

[...], esta é concebida como reflexo interno de uma realidade externa. Por conseguinte, é a reprodução passiva de um dado imediato. O indivíduo

foi escrito

carrega em sua memória uma coleção de imagens do mundo sob seus diferentes aspectos . Essas imagens são construções combinatórias, análogas às experiências visuais. São independentes, em grupos diversos (MOSCOVICI, 1978, p.47).

Supõe-se ainda que as imagens sejam sensações mentais resultantes das impressões

deixadas pelos objetos ou pelas pessoas em nosso cérebro. Em seu processo de elaboração se

dá uma espécie de seleção, de acordo com o que lhe apraz ou ainda de acordo com a coerência

que lhe é necessária. E o mais fascinante é que: Elas efetuam sempre uma filtragem e

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resultam de uma filtragem de informações possuídas ou recebidas pelo sujeito a respeito do

prazer que ele busca ou da coerência que lhe é necessária (MOSCOVICI, 1978, p.47-48).

Desta forma, a imagem exerce uma função de duplo sentido: seleciona o que vem do

interior, sobretudo, o que vem do exterior; porém se faz oportuno entender que, ao se falar de

representações sociais, esses corte dado entre o universo exterior e o universo interior do

individuo ou do grupo, não deve existir.

Na realidade, é preciso considerar a capacidade e o poder criativo das atividades

representativas. Na fascinante qualidade de representar, o ser humano se mostra capaz de

relacionar novas imagens às já existentes

combiná-las e separá-las, e ao mesmo tempo

recombiná-las, engendrá-las

diversificando assim, tanto em qualidade quanto em qualidade

o seu universo ou reservatório de imagens e a sua capacidade.

De uma forma ampla, o que imprime peso, autenticidade, valor e importância às

representações sociais é o fato de se tratar de uma forma de conhecimento produzido ou

elaborado, sobretudo no seio das relações sociais e interações entre pessoas, fenômenos e

mobilidade, mutabilidade, dinamicidade e, sobretudo, o seu caráter criador e re-criador;

porém o mesmo não se observa particularmente aos conceitos de imagem, atitude, opinião.

Nesse sentido, Moscovici (1978) destaca:

Os conceitos de imagem, de opinião e de atitude não levam em conta esses vínculos, a abertura que os acompanha. Os grupos são encarados a posteriori de maneira estática, não na medida em que criam e se comunicam, mas enquanto utilizam e selecionam uma informação que circula na sociedade (MOSCOVICI, 1991, p.50).

Para Moscovici (1978, p. 50), as representações sociais são conjuntos dinâmicos, seu

status é o de uma produção de comportamentos e de relações com o meio ambiente, de

uma ação que modifica aqueles e estas, e não de uma reprodução desses comportamentos ou

dessas relações, de uma ação a um dado estímulo exterior.

De acordo com a exposição, podemos concluir que as representações sociais não

podem ser resumidas a opiniões sobre ou imagens de , mas como um corpo teórico, uma

ciência coletiva sui generes , que objetiva interpretar, elaborar e reelaborar a realidade. Não

se pretende, com isso, rebaixar ou obscurecer a valia ou significância dos conceitos de

imagem, de opinião e de atitude. Pelo contrário, deve-se reconhecer a pertinência destes como

elementos constitutivos das representações sociais.

O que se pretende dizer é que são conceitos que não tem preocupação com as relações

que direta ou indiretamente os produzem, não deve ser confundido com o conceito de

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representação social em si, pois que a centralidade deste conceito último são as relações

sociais e interações que os produzem. Daí que os primeiros devem ser reconhecidos pela sua

importância, mas como elementos constitutivos deste último, ou seja, as atitudes, as imagens

e as opiniões como elementos constitutivos das representações sociais.

O sujeito é sua representação nesse universo, sendo que o sujeito apresenta-se distante

do objeto. É ele que torna o objeto ausente, determina o caráter estranho do objeto

é o

indivíduo ou o grupo. Se há de se estranhar à ciência, a filosofia ou a política é porque, como

se sabe, estas foram forjadas, desenvolvendo grandes esforços para nos excluir, para não

permitir um reconhecimento nelas. Nesse sentido, Moscovici reforça:

Um povo, uma instituição, uma descoberta, etc. parecem-nos distantes, bizarros, porque não estamos neles, porque se formaram e evoluíram como se não existíssemos , sem relação alguma conosco. Representa-los conduz a repensar-lhos, a reexperimentá-los, a refazê-los à nossa maneira, em nosso contexto, como se aí estivéssemos ; em suma, introduzir-nos numa região do pensamento ou do real de que fomos eliminados e, de fato, a intervir-nos nela e a torná-la como própria (MOSCOVICI, 1978, p.64).

A representação não surge do vazio, do nada. Ela é sempre representação de alguma

coisa (objeto) e de alguém (sujeito). As características do sujeito e do objeto nela se

manifestam Também se origina aí a tensão no âmago de cada representação entre o pólo

passivo da estampagem do objeto

a figura

e pólo ativo da escolha do sujeito - a

significação que lhe dá e de que ele está investido (MOSCOVICI, 1978; JODELET, 2001).

Trata-se de figura e não de imagem pelo fato de que o segundo nos traz muito a idéia

de reflexo, de reprodução, enquanto que o primeiro termo

figura

dá-nos a impressão de

mais liberdade no sentido mais de produção do sujeito, o que é próprio da representação.

Na estrutura de cada representação tem-se o desdobramento de duas faces

indissociáveis, ou que não devem ser jamais interpretadas separadas, pois que se

complementa no universo do sujeito que a construiu: a face figurativa e a face simbólica .

Neste sentido, apresenta-se, em síntese, Moscovici (2003, p.46) diz: a representação iguala

toda imagem a uma idéia e toda idéia a uma imagem .

Nessa direção, Jodelet (2001, p.27) ainda expressa que a representação social tem com

seu objeto uma relação de simbolização (substituindo-o) e de interpretação (conferindo-lhe

significações). Estas significações resultam de uma atividade que faz da representação uma

construção e uma expressão do sujeito.

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Em âmbito psíquico, apreende-se do exterior, cercado de conotações políticas,

religiosas, ideológicas etc., reelabora-se e representa-se em uma figura carregada de sentido

próprio, inscrevendo o objeto em nosso universo, ou seja, naturalizando-o e, ao mesmo

tempo, fornecendo um contexto inteligível.

Ao penetrar no universo do indivíduo ou do grupo, o objeto entra numa série de

relacionamentos, interações e articulações com outros objetos aí presentes, onde se dá o

intercâmbio de propriedades em sentido duplo, ou seja, o objeto novo toma propriedades do

existente e a este acrescenta as dele. Sendo assim, o objeto ao tornar-se próprio e familiar, é

transformado e transforma também. Daí se depreende que a tarefa de representar não se limita

a simples reprodução fiel do lado dado, pelo contrário, destina-se a redefini-lo de acordo com

a sua adaptação ao contexto pretendido.

Ao ser representado, o objeto adquire um novo status, um novo perfil a partir das

relações e da adaptação de acordo com o significado que adquire e exerce no contexto

representado. Nesse sentido, resumidamente, [...] representar um objeto é, ao mesmo tempo,

conferir-lhe o status de um signo, é conhecê-lo, tornando-o significante (MOSCOVICI,

1978, p. 63).

A objetivação, amarração ou ancoragem são os dois processos fundamentais inerentes

à elaboração das representações sociais. A ancoragem está diretamente relacionada ao

investimento do objeto da representação pelo corpo social, como também a influência dos

valores de referência sobre sua evolução. Ao passo que a objetivação se faz na perspectiva de

tornar real um esquema conceptual, ou ainda, de dar uma imagem, uma contrapartida

material.

A objetivação corresponde ao trabalho onde o dado (de uma ciência, por exemplo) é

tomado, não necessariamente em incorporação do objeto. Pode-se dizer ainda, que

corresponde à naturalização autônoma das idéias ou dos objetos no seio do senso comum.

Isso é possível de acontecer, segundo Moscovici (1991), primeiramente, pela

flexibilidade cognitiva:

O estoque de indícios e de significantes que uma pessoa recebe, emite e movimenta, no ciclo das infracomunicações pode tornar-se superambulante. Para reduzir a defasagem entre a massa de palavras que circulam e os objetos que os acompanham, e como não se poderia falar de nada , os signos lingüísticos estão ligados a estruturas materiais (tenta-se acoplar a palavra a coisa). Essa diligencia é tanto mais indispensável porquanto a linguagem

notadamente a linguagem científica

pressupõe uma serie de convenção que fixam a sua adequação ao real. (MOSCOVICI, 1991, p.111).

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Segundo Moscovici (2003, p. 71), objetivar é reabsorver um excesso de significações

materializando-as (e adotando assim certa distância a seu respeito). É também transplantar

para o nível da observação o que era apenas inferência ou símbolo. Noutras palavras,

Objetivando une a idéia de não familiaridade com a de realidade, torna-se a verdadeira

essência da realidade. [...] objetivar é descobrir a qualidade icônica de uma idéia, ou ser

impreciso; é reproduzir um conceito em uma imagem.

O fato de objetivar incide sob três eixos: a naturalização, a classificação e a

esquematização estruturante. O primeiro consiste nas possibilidades do fluxo dos elementos

objetivos para o meio cognitivo, preparando-os para uma mudança essencial de status e

funcionalidade. Uma vez naturalizado, compreendendo que o objeto reproduz a fisionomia de

uma realidade quase física. Assim como o seu caráter intelectual perde importância. E, em

relação ao segundo

a classificação tem-se que: [...] coloca e organiza as partes do meio e,

mediante certos cortes, introduz uma ordem que se adapta à ordem preexistente, atenuando

assim o choque de toda e qualquer nova concepção (MOSCOVICI, 1978, p.113).

A tarefa classificatória cumpre a função de situar e fixar os comportamentos

individuais e organizá-los em sintonia com o núcleo do objeto naturalizado em representação.

Complementando, Ela completa o quadro das instâncias principais do psiquismo, indica

quais as que estão presentes, as que deveriam ou não figurar no lugar em que figuram

(MOSCOVICI, 1978, p. 130).

No que se refere à esquematização estruturante, o modelo figurativo resultante daí

acaba por preencher algumas importantes funções:

[...] é um ponto comumente a teoria cientifica e sua representação; [...]; a mudança do indireto em direto encontra-se aí realizada; [...], o que na teoria é expressão geral, abstrata, de uma série de fenômenos, converte-se, na representação, em tradução imediata do real; o modelo associa os elementos indicados numa seqüência autônoma, dotada de uma dinâmica própria (MOSCOVICI, 1978, p. 126-127).

Pode-se dizer ainda que objetivar é tornar o conceptual prático, concreto, vivenciável

materializá-lo, torná-lo natural, ao corrente. É fazê-lo circulante nas relações sociais,

influenciando-as e sofrendo influências destas.

A amarração ou ancoragem, processo através do qual a sociedade e/ou o grupo opera a

conversão do objeto social em instrumento de que ela e/ou ele pode fazer uso. Através desse

processo, o objeto passa a situar numa escala de preferência nas relações sociais correntes. Ou

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ainda, [...] designa a firme inserção de uma ciência na hierarquia de valores e entre as

operações realizadas pela sociedade (MOSCOVICI, 1978, p. 13).

É através da ancoragem que um saber torna-se útil a todas. Diz-se que tal nível foi

atingido quando a maioria na coletividade toma para si o conhecimento a ponto de vivenciá-

lo, e, por conseguinte, mobiliza as relações sociais, noutras palavras Jodelet (2001) reforça:

[...], a ancoragem enraíza a representação e seu objeto numa rede de significações que permite situá-los em relação aos valores sociais e dar-lhes coerência, nesse nível, a ancoragem desempenha um papel decisivo, essencialmente no que se refere à realização de sua inscrição num sistema de acolhimento, um já pensado. Por um trabalho de memória, o pensamento constituinte apóia-se sobre o pensamento constituído para enquadrar-se a novidade a esquemas antigos, ao já conhecido (JODELET, 2001, p.38-39).

O sentido do social na representação, dentre as várias interrogações a respeito da

dimensão do social na representação, ou seja, o fato de que a representação ser ou não social,

Moscovici (1978, p75) coloca-nos: Que representação não seria social? .

Em toda representação implícita ou explicitamente, existe um vínculo com algo, seja

este pré-existente ou presente, seja vivenciado ou até mesmo imaginado, até porque mesmo a

imaginação está relacionada a algo de real. Este vínculo materializa-se na e pela comunicação,

principalmente através da linguagem, possibilitando a emergência e ao mesmo tempo a

circulação das representações.

Jodelet (2001) ressalta que elas circulam nos discursos, são trazidas pelas palavras e

veiculadas em mensagens e imagens midiáticas, cristalizadas em condutas e em organizações

materiais e espaciais. Complementando Moscovici, diz:

Foi fundamental, desde o inicio, estabelecer a relação entre comunicação e representações sociais. Uma condiciona a outra, porque nós não podemos comunicar, sem que partilhemos determinadas representações e uma representação é compartilhada e entra na nossa herança social, quando ela se torna um objeto de interesse e de comunicação (MOSCOVICI, 1991, p.17-18).

Contudo, qualificar uma representação de social equivale partir da compreensão de

que toda representação é uma representação de algo, e que esse algo, objeto representado, está

presente nos sujeitos e nos meios, ou seja, está circunscrito na cultura e, portanto, circulante

através das comunicações que se estabelecem nas relações sociais, propiciando sua apreensão,

avaliação, apropriação e conseqüente reapresentação, ou nova representação. Ela é social

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ainda pela sua propensão à expansividade pelo corpo social. A representação surge no corpo

social e a ele se reverte, mediada ou engendrada pela comunicação. Sendo assim, pode se

encontrar a dimensão social das representações.

Em outras palavras,

[...] a representação é social por três aspectos correlatos, isolados e postos à prova por Moscovici (1961)

o primeiro critério, quantitativo, define sua extensão numa coletividade; os outros dois são qualitativos, a partir do momento em que se trata de considerá-la expressão (ou produção) de uma formação social, ou de analisar sua própria contribuição (ou função) no processo de formação e de orientação das condutas e das comunicações sociais (JODELET, 2001, p. 80).

Para Moscovici (1978 p. 76-77) qualificar uma representação de social não basta para

definir o agente que a produz. Saber quem produz esses sistemas é menos instrutivos do que

saber por que se produz. Para se poder apreender o sentido do qualitativo social é preferível

enfatizar a função a que ele corresponde do que as circunstancias e as entidades que reflete.

Esta lhe é própria, na medida em que a representação contribui exclusivamente para os

processos de formação de condutas e de orientação das comunicações sociais.

Enquanto as representações sociais cumprem a função de formação de condutas e

orientação das comunicações sociais, Moscovici, a respeito das funções da ciência e da

ideologia, nos diz: A primeira visa o controle da natureza e tem por finalidade contar a

verdade sobre ela; a segunda esforça-se antes por fornecer um sistema geral de metas ou em

justificar os atos de um grupo humano (MOSCOVICI, 1978, p. 77).

1.2. O significado das Representações Sociais no campo da deficiência

Como já abordado e embasado a Teoria da Representação Social originou-se no

trabalho de Moscovici, com uma abordagem sociológica da Psicologia Social, no qual

pontuam as relações dialéticas entre o homem e a sociedade, capazes de explicitar a

pluralidade dos modos de pensar e de se comunicar.

Jodelet (2001) comenta que os sujeitos exprimem em suas representações o sentido

que dão à sua experiência no mundo social, servindo-se dos sistemas de códigos e

interpretações fornecidos pela sociedade e que, na realidade, projetam valores e aspirações

sociais.

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Nesta pesquisa, a deficiência como representação social foi estudada no referencial de

Moscovici e Jodelet, que entendem a questão como modalidade de conhecimento particular

que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre os indivíduos:

Toda representação é composta de figuras e de expressões socializadas. Conjuntamente, uma

representação social é a organização de imagens e linguagens, porque ela realça e simboliza

atos e situações que nos tornam comuns (MOSCOVICI, 1978, p.25).

De forma semelhante, Jodelet (l989) entende: Representações sociais são uma forma

de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, tendo uma visão prática e concorrendo

para a construção de uma realidade comum a um conjunto social (apud SPINK, l995, p. 32).

Para Moscovici, trata-se de uma fala retirada à substância simbólica longamente

elaborada por uma coletividade que, ao modificar seu modo de ver, tende a influenciar - se e a

modelar-se reciprocamente. Nesse sentido, os preconceitos sociais jamais são manifestados

isoladamente, eles se assentam no fundo de sistemas de raciocínio e linguagem no tocante a

natureza biológica e social do homem e suas relações com o mundo. Moscovici busca, dessa

forma, articular processos psicológicos, simbólicos, conceituais e condutas engendradas às

interações e relações sociais.

Esses sistemas são constantemente interligados, comunicados entre gerações, grupos, e

as pessoas que são alvo desses preconceitos são naturalmente coagidas a entrar no molde

elaborado, adotando, muitas vezes, uma atitude de complacência e conformismo. As

experiências concretas determinam à subjetividade, a representação e o pensamento; são, pois,

ações processadas, elaboradas e interiorizadas na prática. Afirma Moscovici, que não existe

atividade psíquica desvinculada da prática e que não existem processos e conteúdos psíquicos

que não estejam determinados pelas condições concretas da existência.

Tendo-se como foco as representações sociais da pessoa com deficiência, entende-se

que sua análise se compõe de duas faces complementares: a história individual, subjetiva, que

abarca o interior, os vínculos, os sentimentos e as imagens que emergem nas tramas das

relações que aí são significadas; a outra, a realidade objetiva, exteriorizada nas condições

materiais concretas de existência que se manifestam nas formas de relação, interação e

satisfação dos desejos e necessidades humanas das pessoas com deficiência.

Entendendo-se que estas duas faces se interligam e se integram em uma totalidade

dialética do ser, é preciso compreender o contexto em que se situa esses sujeitos, suas

realidades. Sob essa perspectiva, Newton Duarte (2000), apresenta o conceito de alienação

como sendo o distanciamento e conflito entre as forças essenciais humanas que vão sendo

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objetivadas em níveis cada vez mais elevados, e às condições concretas da existência na

maioria dos indivíduos humanos.

A palavra alienação, para o autor supracitado, tem várias definições como, cessão de

bens, transferência de domínio de algo, perturbação mental, na qual se registra uma anulação

da personalidade individual, loucura dentre outros. A partir desses significados traçam-se

algumas diretrizes para melhor analisar o que é a alienação, e assim buscar alguns motivos

pelas quais as pessoas se alienam. Ainda assim, os processos alienantes da vida humana se

tratam de maneira atemporal, defraudada, abstraída de processos sócio-econômicos concreto.

A alienação trata-se do mistério de ser ou não ser, pois uma pessoa alienada carece de si

mesmo, se tornando sua própria negação.

A alienação, na Sociologia, tem seu significado atrelado às teorias de Karl Marx, que

vai escrever sobre como o sistema capitalista gera uma forte estratificação na sociedade em

capitalista versus proletariado. Desta maneira, se explica a condição do proletariado no

mundo capitalista e relata sobre as condições de trabalho no período de industrialização, onde

quem detém o modo de produção é o capitalista, e a produção é dividida em etapas, de forma

que um trabalhador não tinha conhecimento ou posse do resultado final do trabalho (o

produto). É alienada também por se submeter às condições tão miseráveis, a ponto de nunca

poder ser um consumidor do próprio produto que o trabalhador produz, sendo essa, portanto,

a dimensão que a alienação toma nessa teoria.

Partindo-se desse contexto, concebe-se a consciência, na ótica dialética, como origem

e produto da necessidade da ação humana em relação aos outros homens e mulheres, dentro

de determinadas condições de produção, concluindo-se, dessa maneira, que a significação

humana é impossível de ser compreendida fora da estrutura social.

Nesse sentido, a compreensão da representação social da pessoa com deficiência

requer articulação desses dois conceitos, formando-se a idéia que nós temos da realidade, pois

são eles que governam nossas percepções e inferências construídas a partir do conjunto de

nossas relações sociais e apontam dois níveis de representações sociais distintos: um, de

responsabilidade individual, compreendendo a energia pessoal; e outro, de responsabilidade

social, corroborando com as idéias preconcebidas e defendidas por MOSCOVICI (2003).

Moscovici (2003) também assume, no prefácio do livro: Textos em Representações

Sociais, que sente repulsa diante do dualismo do mundo individual e social, do reducionismo

social às relações interpessoais ou intersubjetivas ou à redução inversa, negando a

especificidade do indivíduo e fazendo do consenso o resultado de uma interação que faz

desaparecer as distinções entre os indivíduos. .

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Percebe-se o surgimento, então, da noção do conflito entre o individual e o coletivo,

essencial para a teoria das representações, pois o conflito não está apenas no domínio da

experiência de cada um, mas é igualmente realidade fundamentada na vida social. Sem essa

noção de representações partilhadas que assegurem uma coexistência possível, não se pode

compreender o dinamismo da sociedade, as mudanças e as transformações das partes que a

compõem.

Jodelet (2001) compreende que as representações traduzem o ser social dos grupos

concretos e têm uma função de preservação da identidade coletiva e grupal. Na perspectiva

social e cultural, equaciona-se que o humano é o social, pois as representações são construídas

na atividade prática dos grupos, mediatizada pela cultura no trio atividade-linguagem-

representação. Necessita, portanto, para seu estudo, de aportes teóricos e metodológicos

plurais.

Então, compreender o significado da deficiência, entender o que significa ser e sentir-

se diferente ou pessoa com deficiente, conhecer a experiência de conviver com a pessoa com

deficiência, são questões humanas complexas que necessitam de um olhar mais abrangente,

para além da dimensão física e intelectual, contemplando múltiplos aspectos: emocional, ético

e sociocultural.

Através dessa forma de perspectiva de valorização da essência humana provenientes

das situações concretas de vida, é que se buscou, pela atitude de escuta e acolhida,

compreender e interpretar os sentimentos, as imagens e representações que expressam os

conceitos e atitudes construídas e partilhadas socialmente.

Por conseguinte, as representações sociais da pessoa com deficiência foram estudadas

como processo intra e interpsíquico, enfatizado por Spink, (l995, p.121) quando diz que: as

representações sociais devem ser estudadas articulando elementos afetivos, mentais, sociais,

integrando a cognição, a linguagem e a comunicação às relações sociais que afetam as

representações sociais e a realidade material, social e ideativa sobre as quais elas intervêm .

Na gênese das representações, o indivíduo não é apenas um ser genérico, mas é um

sujeito histórico, com uma história pessoal e social, que expressa sentimentos e afetos, com

poder de criar e transformar a realidade, existindo suas representações socias.

Conhecer a pessoa com deficiência dentro do contexto que está inserido implica dirigir

o olhar para partes sem perder de vista à estrutura global para aclarar as relações, os

comportamentos e as atitudes. Há necessidade, portanto, de desvelar a essência,

transcendendo o objeto material, investigar a subjetividade de como as pessoas elaboram essa

consciência. Ao mesmo tempo, é um movimento em transformação, em contradição, pois sem

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perder a especificidade como parte da totalidade, apresenta as crenças e as representações

constituídas na totalidade mais ampla ( ELZIRIK, 1999).

Nesse campo conceitual, observa-se que o fenômeno deficiência restringe-se não só ao

específico, mas à limitação, que ao mesmo tempo se revela e se oculta. Cabe, então, a reflexão

sobre o que se revela e se oculta à deficiência. A dificuldade de se olhar ou de se aproximar

de pessoas que geralmente são rotuladas e estigmatizadas no contexto social em que estão

inseridas. Como também, a dificuldade em lidar com as suas próprias limitações e

sentimentos e a rejeição de seus perfis humanos diferentes. Compreende-se dessa forma, que a

nossa matriz cultural de normalidade permite divergência e contradições quando nos

referimos a própria formação do individuo no contexto sociocultural que está inserido.

Esses são conflitos existenciais humanos vivenciados por nós como autores sociais

participativos e que na atualidade tem uma visão e fazem uma leitura reflexiva e crítica das

questões ideológicas e políticas que permeiam o imaginário social em nosso meio.

Moscovici (1978) reconhece que a essência desses conceitos simbólicos tem caráter

complexo e contraditório, difícil de apreender, pois as Representações Sociais são entidades

quase tangíveis na medida em que povoam nosso cotidiano.

Jodelet (2001) afirma que as pessoas têm necessidade de estar bem informadas sobre o

mundo que as cerca e precisa se ajustar a ele, e assim obtém formas e níveis de

comportamento, a fim de, identificar e resolver os problemas que a sociedade lhes apresenta.

Estes seriam os motivos pelos quais as representações são criadas. O mundo de objetos,

pessoas, acontecimentos ou idéias é compartilhado entre pessoas, por isso, as representações

são sociais é de fundamental importância na vida cotidiana. Segundo a autora, as

representações guiam as pessoas no modo de nomear e definir conjuntamente os diferentes

aspectos da realidade, no modo de interpretar esses aspectos e tomar decisões ante eles.

As representações sociais, enquanto sistema de interpretação que regem as relações

das pessoas com o mundo e com os outros, orientam e organizam as condutas e comunicações

sociais. Elas também interferem em processos variados, tais como a difusão e assimilação dos

conhecimentos, o desenvolvimento individual e coletivo, a definição das identidades pessoais

e sociais, a expressão dos grupos e as transformações sociais.

Assim, define-se a relevância teórica e histórica, social e política, dos estudos no

campo da educação e nas áreas das ciências humanas e sociais como um todo que fazem uso

da representação. È a busca de explicações, conhecimentos para superar as certezas. È a

afirmação da educabilidade como condição do ser homem, que se efetiva atualizando sentidos

de diferentes ordens no espaço que cada um ocupa no mundo.

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Pretende-se então, neste trabalho, ouvir a pessoa com deficiência, buscando

compreender os conceitos sociais, as construções simbólicas e as relações ideológicas,

desvelando os conflitos e as contradições existentes na realidade social, na vida prática, ou

seja, no cotidiano em que estão imersos.

Nesse intuito, a teoria das Representações Sociais é o fio condutor deste debate, o

palco das interações sociais no contexto da exclusão, inclusão e cidadania, como já

referendado anteriormente. A compreensão dessas relações é relevante no espaço social como

um todo, em que as pessoas se encontram e expressam seus sentimentos, desejos,

expectativas, necessidades e sonhos de transformação. Por essa teia e rede de significados, o

cotidiano e a prática social foram revelados, desnudados e discutidos através de ação

compartilhada.

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CAPÍTULO 2

CONTEXTUALIZAÇÃO DA QUESTÃO DA

DEFICIÊNCIA E CIDADANIA

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O termo cidadania vem ganhando cada vez mais importância, embora, ainda, boa parte

da população desconheça o seu real significado e as suas implicações no processo de

emancipação dos homens e mulheres na compreensão dos seus direitos e deveres na sociedade

em que estão inseridos. Ao transformar-se, esta mesma sociedade repercute e atualiza de

forma significativa elementos que contribuem para a evolução conceitual do termo cidadania,

abrangendo nos dias atuais, uma concepção bem mais ampla e de complexidade tal, que as

concebidas e formuladas em outras épocas. Entende-se que à medida que a sociedade se

transforma se conscientiza e se torna mais humanizada. Nesse ínterim amplia-se também, o

conceito de cidadania no sentido do seu real significado, para outros segmentos da

comunidade que, muitas vezes, eram esquecidos ou ignorados em seus direitos fundamentais.

Nesse sentido, se faz necessário entender suas inter-relações e implicações relacionadas às

pessoas com deficiência no contexto da exclusão e perspectivas de inclusão, principalmente

quando se busca refletir sobre questões que são consideradas básicas para a prática diária do

direito e o exercício do que vem a ser cidadania na coletividade e da cidadania da pessoa com

deficiência nesse contexto de inserção.

2.1 Aspectos históricos e conceituais do termo deficiência e da pessoa com deficiência.

Ao se trabalhar qualquer tema, é imprescindível escolher conceitos que possam

funcionar como bússola, na condução das idéias que serão desenvolvidas. Porém conceituar

pode mascarar ou aprisionar o pensamento. Por isso, optou-se por apresentar definições

existentes, tomando o cuidado para não cair na armadilha de tratar conceitos com fins em si

mesmos, mas usá-los para ampliar, cada vez mais, a discussão sobre o perigo de quando se

podem limitar os atos de pensar, pelo fato de as pessoas prenderem-se a termos que, em geral,

não conseguem revelar todas as nuanças envolvidas em um tema tão complexo como

deficiência (FERREIRA e GUIMARAES, 2003, p. 23).

O termo deficiência é um substantivo feminino, derivado do latim deficientia, que

segundo Aurélio (2005, p. 38) significa falta, falha, carência, defeito, imperfeição. Do ponto

de vista social, o termo deficiente é atribuído aos membros de uma sociedade que

apresentam alguma forma de anormalidade ou de diferenciação perante os demais, quer

no domínio cognitivo, afetivo ou motor e tem sido objeto de críticas e discussões entre os

profissionais que lidam com os indivíduos assim designados. O debate em torno desta

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denominação tem como preocupação fundamental evitar a rotulação do ser humano ou a

estigmatização que advém dos desqualificativos, como: anormal e incapaz.

No senso comum , por exemplo, os conceitos de normalidade e anormalidade

são freqüentemente utilizados, no entanto, poucas pessoas conseguem indicar claramente os

limites do que é normal ou anormal, em uma mesma cultura ou em culturas diferentes

(CARMO, 1994).

Nesta perspectiva, Carmo (1994, p.25) apresenta um sumário de termos para designar

uma pessoa que se afasta do padrão de normalidade ; tentando assim demonstrar a carga de

preconceito que o termo apresenta.

[...] inválido, menosválido, deficiente, anormal, discapacitado, indivíduo de capacidade reduzida, indivíduo de capacidade limitada, incapacitado, impedido ou minorado. O que apresenta anomalia, deficiência, déficit, invalidez, retardo e transtorno, etc. (UNESCO, 1993, p.69

apud CARMO, 1994, p. 25).

Essas especificidades podem se referir às profissões, crenças, grupos sociais à que

pertençam ou ainda a características físicas ou mentais que as definam. Normal, anormal,

deficiente, eficiente, capaz, incapaz, são polarizações, de alguns dos rótulos/estigmas

utilizados para que, uma vez identificadas, pessoas sejam enquadradas socialmente de acordo

com sua capacidade de responder às expectativas que a sociedade tem sobre seus cidadãos.

Nesse ponto, poder-se-ia pensar que o que está em questão quando se mantêm

excluídos os diferentes é o risco da ruptura com o conceito estático de homem, de mundo, de

conhecimento; é a necessidade de cruzar experiências, de compartilhar caminhos, de

compreender a complexidade e a diversidade pela abertura de canais para o diferente. O que é

certo é que esse caminho provoca ferimentos pela insegurança, pela quebra das certezas e de

normas estáveis.

Quando se discute os significados dos conceitos, à luz do contexto social, não é

indicador de secundarização ou superficialidade do problema, mas, pelo contrário, indica que

se atribui à atenção necessária aos mecanismos da linguagem que atuam como forma de

violência simbólica , que significa que todo poder pode chegar a impor significações e a

impô-las como legítimas, dissimulando as relações de força que estão na base de sua força,

isto é, propriamente simbólica, a essas relações de força.

De acordo com Ferreira e Guimarães (2003) a maior parte dos termos e expressões

adotados em educação especial é extraída de documentos de organismos internacionais,

geralmente escritos em inglês ou espanhol. E, a tradução para o português nem sempre

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mantém o sentido com que estão originalmente empregados tais termos, o que, comumente,

tem gerado inúmeras ambigüidades e distorções no entendimento e na aplicação de seus

significados.

Entendemos que o critério e o cuidado no emprego dos referidos termos e expressões

não configuram preciosismo lingüístico, mas uma necessidade que se impõe para a remoção

de barreiras atitudinais, decorrentes de juízos equivocados sobre a capacidade e as aptidões

das pessoas com deficiência. Entre esses destacamos deficiência , incapacidade e

desvantagem ou impedimento . Portanto, o conceito utilizado para deficiência e sua

definição passam por dimensões descritivas e valorativas, tendo sempre um caráter histórico

concreto, de acordo com um determinado momento, num contexto sócio-econômico e cultural

específico.

Segundo o Programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência, publicado em

1997, pela Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, a

Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe os seguintes conceitos:

Deficiência é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica; Incapacidade é toda restrição ou falta (devido a uma deficiência) da capacidade de realizar atividades, na forma ou na medida que se considera normal para o ser humano e Impedimento é situação desvantajosa para um determinado indivíduo, em conseqüência de uma deficiência ou de uma incapacidade que lhe limite ou impeça o desempenho de um papel que é normal em seu caso, em função de idade, sexo, fatores sociais e culturais. (OMS, 1997 apud FERREIRA E GUIMAREAS, 2003, p. 25)

Desta forma, a tendência entre os profissionais que trabalham com pessoas que

apresentam algum tipo de deficiência é a utilização de uma nomenclatura próxima à OMS, em

que permanece explicita a concepção de casualidade mecânica, isto é, o impedimento leva à

deficiência e esta, por sua vez, à incapacidade .

No sentido amplo da questão, outro aspecto que envolve a deficiência não é inerente

apenas à pessoa que possui: ele engloba não apenas o que o indivíduo traz de desvantagens,

como o que a sociedade traz em si mesma de incompetência. Sendo assim, o sentido da

deficiência, na vida de uma pessoa, é resultado do entrelaçamento de sua história pessoal com

o meio social onde vive. Sobre o indivíduo considerado deficiente incidirá o estigma da

incapacidade , do impedimento, da invalidez . Recaindo sobre o mesmo o fardo da

opressão e da impotência tão visivelmente expressada pela sociedade que vivemos.

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Cabe-nos então uma importante reflexão em torno do significado político, econômico

e social das incapacidades impostas pela deficiência, mas que, a rigor, não devem representar

impedimento ao exercício da plena cidadania. São as inúmeras exigências familiares e sociais

que colocam alguns cidadãos em condições de desvantagens, e não, suas características físicas

ou diferenciadas.

A noção de deficiência

é uma questão contingencial e decorre de normas e

expectativas da sociedade. É uma situação que surge como produto da interação daqueles que

são portadores de determinados atributos com o meio social, que interpreta e consideram tais

aspectos como desvantagens.

Os efeitos causados pela visão equivocada sobre pessoas com deficiência levam ao

desconhecimento de suas potencialidades, o que acaba por continuar reforçando a crença

sobre sua suposta incapacidade. Esse quadro somente poderá ser alterado a partir do momento

em que a condição de deficiência seja modificada, tomando em consideração também as

potencialidades e possibilidades, e não apenas as limitações dessas pessoas (FERREIRA E

GUIMARÃES, 2003).

Os autores supracitados, também chamam a atenção para o sentido e o significado do

termo deficiência, quando faz referência ao ponto de vista ou à concepção da pessoa que

atribui de quem recebe o atributo. Constituindo no movimento histórico das relações entre os

homens, o conceito deficiência só pode ser analisado por duas vertentes, ou seja, o que é

deficiência para uns não o é para outros, tudo vai depender de a que homem, sociedade e

mundo estão referindo.

Observa-se dentro desses aspectos, um direcionamento maior ora no aspecto social,

ora no aspecto psicológico, ora no aspecto médico ou no aspecto educacional. Destacamos

também, as contradições que cercam a tradicional e comum expressão pessoa portadora de

deficiência , que foram substituídas por outras, como pessoa portadora de necessidades

especiais ou portadoras de necessidades especiais , quando relacionados à escolarização.

Essas expressões tentam minimizar ou descaracteriza as deficiências em si mesmas, pois nem

sempre aqueles que apresentam necessidades educacionais especiais são, necessariamente,

alunos com deficiência .

Segundo Sassaki (2006), o termo necessidades especiais é utilizado com um

significado mais amplo, do que estamos habituados a supor. Para o referido autor:

O uso das expressões pessoas portadoras de necessidades especiais, pessoas com necessidades especiais e portadores de necessidades especiais,

como

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sendo melhor do que usar as expressões pessoas portadoras de deficiência, pessoas com deficiência e portadores de deficiência, no sentido de que, assim, seria evitado o uso da palavra deficiência , supostamente desagradável ou pejorativa (SASSAKI, 2006, p. 36).

O autor citado acima acrescenta que é aceitável que se diga ou escreva pessoas

deficientes . O que não se aceita mais é o uso dos vocábulos deficientes como um

substantivo. As pessoas deficientes podem apresentar condições atípicas, tais como:

deficiências, mental, física, auditiva, visual e múltipla; autismo; a dificuldade de

aprendizagem; insuficiências orgânicas; superlotação; problemas de conduta; distúrbios de

déficit de atenção com hiperatividade, obsessivo compulsivo, síndromes; distúrbios

emocionais e transtornos mentais.

Algumas condições atípicas são agravadas por resultantes de situações sociais

marginalizantes ou excludentes como: trabalho infantil, prostituição e privação cultural, assim

como a pobreza, desnutrição, saneamento precário e abuso persistente e severo contra

crianças, e falta de estímulo do ambiente e de escolaridade (UNICEF, 1995 apud SASSAKI,

2006, p. 29).

Sassaki (2006) faz referência a dois modelos de deficiência, caracterizando-os como

médico e social. O modelo médico de deficiência atribui os problemas encontrados pela

pessoa com deficiência à sua própria condição, ou seja, condição de possível incapacidade de

preencher as condições necessárias para a participação social. No modelo social de

deficiência, os problemas não estão na pessoa com deficiência, estão nas condições históricas

impostas pela sociedade que a rotula e estigmatiza. Assim, a sociedade é chamada a ver que

ela cria problemas para as referidas pessoas causando-lhes incapacidade ou desvantagem no

desempenho de papéis sociais.

Nos âmbitos político e social, atualmente é possível distinguir-se duas linhas de

discurso sobre as pessoas com deficiência. Em termos gerais, a linha vinculada à medicina, à

educação especial e à assistência social é adotada pelas instituições que trabalham na ótica do

atendimento (linha do assistencialismo). Aqui o discurso parte sempre de um sujeito que fala

a respeito da pessoa com deficiência.

Contudo, o que não pode ser mais aceitável é o uso de expressões que estigmatizem a

pessoa com deficiência, porque esses cidadãos e cidadãs, assim rotulados no contexto social e

cultural em que vivem, possuem identidade, se relacionam e estão situados geograficamente e

historicamente. Como respalda o grande educador Paulo Freire, ao se referir as relações.

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[...] as relações, da esfera puramente humana, guarda em si, como veremos, conotações de pluralidade, de transcendência, de criticidade, de conseqüência de temporalidade. As relações que o homem trava no mundo com o mundo (pessoais, impessoais, corpóreas e incorpóreas) apresentam uma ordem tal de características que as distinguem totalmente dos puros contatos, típicos da outra esfera animal. [...] Estar com o mundo resulta de sua abertura à realidade, que o faz o ente de relações que é. (FREIRE, 2001, p. 47).

De fato, cada nomenclatura ou denominação revela um aspecto, projeta uma face,

deforma de um jeito. Mesmo quando a intenção não é desqualificar, o que enrijece o uso é o

sistemático descuido em tomar a parte pelo todo, supondo que termos são sinônimos, quando

na realidade, apenas se cruzam, entrelaçam-se, mas não se recobrem perfeitamente. Preferir

uma nomenclatura a outra não é questão aleatória. O nome insinua crenças, delineia pontos de

vista, revela intenções. Como também, camufla encobre e esconde as intenções.

O uso de termos corretos tem a ver com a evolução alcançada mundialmente quanto

aos valores e conceitos em torno da pessoa com deficiência. Portanto, sem descartar a

importância maior que têm as ações em comparação com a importância do discurso, devemos

atualizar a terminologia utilizada para se referir as pessoas com deficiência, tanto oralmente

em conversas ou palestras, ou por escrito, em textos legislativos, livros, jornais, revistas,

dentre outros.

Algumas pessoas alegam que tanto faz o nome utilizado, desde que as ações corretas

sejam concretizadas em benefício das pessoas com deficiência. Como dito anteriormente, as

ações são mais importantes que os discursos, mas os valores das pessoas com deficiências que

se deseja transmitir à sociedade devem ser expressos por meio de nomenclaturas coerentes a

eles.

Portanto, é imprescindível esclarecer que jamais houve ou haverá um único termo

correto, válido definitivamente em todos os tempos e espaços, ou seja, latitudinal e

longitudinalmente. A razão disso está no fato de que a cada época são utilizados termos cujo

significado seja compatível com as necessidades e valores vigentes em cada grupo social

organizado, que estabelece regras que alteram denominações com os segmentos que possuem

este ou aquele tipo de deficiência.

Sassaki (2003, p 16) interpreta, mesmo que superficialmente, a trajetória dos termos

utilizados ao longo da história da atenção às pessoas com deficiência, no Brasil. Os

inválidos

termo utilizado no começo da história, durante séculos. Romances, nomes de

instituições, leis, mídia e outros meios mencionavam "os inválidos". O termo significava

"indivíduos sem valor". Em pleno século 20, ainda se utilizava este termo, embora se

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suponha, já sem nenhum sentido pejorativo. Aquele que tinha deficiência era tido como

socialmente inútil, um peso morto para a sociedade, um fardo para a família, alguém sem

valor profissional.

A expressão denominada, incapacitado , divulgada no século vinte até por volta de

196. O termo significava, de início, "indivíduos sem capacidade" e, mais tarde, evoluíram e

passaram a significar "indivíduos com capacidade residual". Durante várias décadas, era

comum o uso deste termo para designar pessoas com deficiência de qualquer idade. Uma

variação foi o termo "os incapazes", que significava indivíduos que não são capazes" de

fazer algumas coisas por causa da deficiência que tinham. Foi um avanço de a sociedade

reconhecer que a pessoa com deficiência poderia ter capacidade residual. Mas, ao mesmo

tempo, considerava-se que a deficiência, qualquer que fosse o tipo, eliminava ou reduzia a

capacidade da pessoa em todos os aspectos: físico, psicológico, social e profissional.

Os defeituosos, os deficientes, os excepcionais, por volta de 1960 até cerca de 1980.

"Os defeituosos" significavam "indivíduos com deformidade , principalmente física. "Os

deficientes", "indivíduos com deficiência" física, intelectual, auditiva, visual ou múltipla, que

os levava a executar as funções básicas de vida como andar, sentar, correr, escrever, tomar

banho etc. De uma forma diferente daquela como as pessoas sem deficiência faziam. E isto

começou a ser aceito pela sociedade. "Os excepcionais" significavam "indivíduos com

deficiência intelectual". A sociedade passou a utilizar estes três termos, que focalizam as

deficiências em si sem reforçarem o que as pessoas não conseguiam fazer como a maioria.

Simultaneamente, difundia-se o movimento em defesa dos direitos das pessoas superdotadas2.

O movimento mostrou que o termo "os excepcionais" não poderia referir-se

exclusivamente aos que tinham deficiência intelectual, pois as pessoas com superdotação

também são excepcionais por estarem na outra ponta da curva da inteligência humana.

As pessoas deficientes, de 1981 até o ano de 1987. Pela primeira vez em todo o

mundo, o substantivo deficiente (como em os deficientes) passou a ser utilizado como

adjetivo, sendo-lhe acrescentado o substantivo pessoas. A partir de 1981, nunca mais se

utilizou a palavra "indivíduos" para se referir às pessoas com deficiência. Foram atribuídas

pessoas àqueles que tinham deficiência, igualando-os em direitos e dignidade à maioria dos

membros de qualquer sociedade ou país. A Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou em

1980 a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, mostrando

que estas três dimensões existem simultaneamente em cada pessoa com deficiência.

2 Expressão substituída por "pessoas com altas habilidades" ou "pessoas com indícios de altas habilidades"

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Exemplos: Por pressão das organizações de pessoas com deficiência, a ONU deu o nome de

"Ano Internacional das Pessoas Deficientes" ao ano de 1981. E o mundo achou difícil

começar a dizer ou escrever "pessoas deficientes". O impacto desta terminologia foi profundo

e ajudou a melhorar a imagem destas pessoas.

As pessoas portadoras de deficiência, por volta de 1988 até o ano de 1993. Alguns

líderes de organizações de pessoas com deficiência contestaram o termo "pessoa deficiente"

alegando que ele sinaliza que a pessoa inteira é deficiente, o que era inaceitável para eles,

termo que, utilizado somente em países de língua portuguesa, foi proposto para substituir o

termo "pessoas deficientes". Pela lei do menor esforço, logo reduziram este termo para

"portadores de deficiência". O "portar uma deficiência" passou a ser um valor agregado à

pessoa. A deficiência passou a ser um detalhe da pessoa. O termo foi adotado nas

Constituições federal e estadual e em todas as leis e políticas pertinentes ao campo das

deficiências. Conselhos, coordenadorias e associações passaram a incluir o termo em seus

nomes oficiais.

As pessoas com necessidades especiais, pessoas portadoras de necessidades especiais,

por volta de 1990 até hoje. O termo surgiu primeiramente para substituir "deficiência" por

"necessidades especiais". Daí a expressão portadores de necessidades especiais". Depois,

esse termo passou a ter significado próprio sem substituir o nome "pessoas com

deficiência". O art. 5º da Resolução CNE/CEB nº. 2, de 11/9/01, explica que as necessidades

especiais decorrem de três situações, uma das quais envolvendo dificuldades vinculadas a

deficiências e dificuldades não-vinculadas a uma causa orgânica. Valor da pessoa: De início,

"necessidades especiais" representava apenas um novo termo. Depois, com a vigência da

Resolução nº 2, "necessidades especiais" passou a ser um valor agregado tanto à pessoa com

deficiência quanto a outras pessoas.

As pessoas especiais, por volta de 1990 até hoje, o termo apareceu como uma forma

reduzida da expressão "pessoas com necessidades especiais", constituindo um eufemismo

dificilmente aceitável para designar um segmento populacional. O adjetivo especial

permanece como uma simples palavra, sem agregar valor diferenciado às pessoas com

deficiência. O especial não é qualificativo exclusivo das pessoas que têm deficiência, pois ele

se aplica a qualquer pessoa. Surgiram expressões como crianças especiais , alunos

especiais , pacientes especiais e assim por diante numa tentativa de amenizar a

contundência da palavra deficiente.

Em maio de 2002, surgiu à expressão, Portador de Direitos Especiais, o referido termo

e a sigla apresentam problemas que inviabilizam a sua adoção em substituição a qualquer

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outro termo para designar pessoas que têm deficiência. O termo "portadores" já vem sendo

questionado por sua alusão a "carregadores", pessoas que "portam" uma deficiência. O termo

"direitos especiais" é contraditório porque as pessoas com deficiência exigem equiparação de

direitos e não direitos especiais. E mesmo que defendessem direitos especiais, o nome

"portadores de direitos especiais" não poderia ser exclusivo das pessoas com deficiência, pois

qualquer outro grupo vulnerável pode reivindicar direitos especiais.

A tendência é no sentido de parar de dizer ou escrever a palavra "portadora" (como

substantivo e como adjetivo). A condição de ter uma deficiência faz parte da pessoa e esta

pessoa não porta sua deficiência. Ela tem uma deficiência. Tanto o verbo portar como o

substantivo ou o adjetivo portador não se aplicam a uma condição inata ou adquirida que faz

parte da pessoa. Por exemplo, não dizemos e nem escrevemos que certa pessoa porta olhos

verdes ou pele morena. Uma pessoa só porta algo que ela possa não portar, deliberada ou

casualmente. Por exemplo, uma pessoa pode portar um guarda-chuva se houver necessidade e

deixá-lo em algum lugar por esquecimento ou por assim decidir. Não se pode fazer isto com

uma deficiência, é claro.

Para Sassaki (2006, p.27), os valores agregados às pessoas com deficiência são: o do

empoderamento - uso do poder pessoal para fazer escolhas, tomar decisões e assumir o

controle da situação de cada um; o da responsabilidade de contribuir com seus talentos para

mudar a sociedade rumo à inclusão de todas as pessoas, com ou sem deficiência.

Na década de 90 até os dias de hoje, as pessoas com deficiência e pessoas sem

deficiência, quando tiverem necessidades educacionais especiais e se encontrarem segregadas,

têm o direito de fazer parte das escolas inclusivas e da sociedade inclusiva. O valor agregado

às pessoas é o de elas fazerem parte do grande segmento dos excluídos que, com o seu poder

pessoal, exigem sua inclusão em todos os aspectos da vida da sociedade. Trata-se do

empoderamento. Exemplificamos com a Declaração de Salamanca/Espanha que preconiza a

educação inclusiva para todos, tenham ou não uma deficiência.

O terceiro milênio está sendo marcado por eventos mundiais, liderados por

organizações de pessoas com deficiência. Nesses eventos foram elaborados documentos de

grande importância para esse segmento social. Com a confirmação da terminologia pessoas

com deficiência, que passa a ser o termo preferido por um número cada vez maior de adeptos.

No maior evento das organizações de pessoas com deficiência, realizado no Recife

PE

conclamaram o público a adotar este termo. Elas esclareceram que não são "portadoras de

deficiência" e que não querem ser chamadas com tal nome (SASSAKI, 2006, p.25).

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Os movimentos mundiais de pessoas com deficiência, incluindo os do Brasil, estão

debatendo o nome pelo qual elas desejam ser chamadas. Mundialmente, já fecharam a questão

e querem ser chamadas de "pessoas com deficiência3" em todos os idiomas.

E esse termo faz parte,

[...] do texto da Convenção Internacional para Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência, a ser aprovada pela Assembléia Geral da ONU em 2003 e a ser promulgada posteriormente através de lei nacional de todos os Países-Membros ( ONU apud SASSAKI, 2006, p. 28).

A outra linha, surgida mais recentemente, ganhando força a partir da segunda metade

da década de 80, centra o discurso no campo da cidadania e dos direitos humanos. Passa a

ocorrer uma nova discussão no interior dos movimentos sociais, e as pessoas com deficiência

buscam um espaço de tomada da palavra para si , colocando-se como sujeitos do seu próprio

discurso.

A quase totalidade dos documentos, a seguir mencionados, foi escrita e aprovada por

organizações de pessoas com deficiência que, no atual debate sobre a Convenção da ONU a

ser aprovada em 2003, estão chegando ao consenso quanto a adotar a expressão "pessoas com

deficiência" em todas as suas manifestações orais ou escritas.

Citaremos aqui importantes documentos da ONU, que nos respalda dessas

informações:

1990 - Declaração Mundial sobre Educação para Todos / Unesco. 1993 - Normas sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência / ONU. 1993 - Inclusão Plena e Positiva de Pessoas com Deficiência em Todos os Aspectos da Sociedade / ONU. 1994 - Declaração de Salamanca e Linhas de Ação sobre Educação para Necessidades Especiais / Unesco. 1999 - Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência (Convenção da Guatemala) / OEA. 2001 - Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde (CIF) / OMS, que substituiu a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades / OMS, de 1980. 2003 - Convenções Internacionais para Proteção e Promoção dos Direitos e Dignidade das Pessoas com Deficiência / ONU (SASSAKI, 2006, 41).

3 Grifo nosso

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Baseado em Sassaki (2006), elencamos aqui, importantes eventos4 que geraram declarações

de outros organismos mundiais.

1992 - Declaração de Vancouver 1993 - Declaração de Santiago 1993 - Declaração de Maastricht 1993 - Declaração de Manágua 1999 - Cartas para o Terceiro Milênio 1999 - Declaração de Washington 2000 - Declaração de Pequim 2000 - Declaração de Manchester sobre Educação Inclusiva. 2002 - Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão. 2002 - Declaração de Madri 2002 - Declaração de Sapporo 2002 - Declaração de Caracas 2003 - Declaração de Kochi 2003 - Declaração de Quito 2004 - Declarações Mundiais Sobre Deficiência Intelectual (p. 32).

Por conseguinte, nesse estudo pretende-se adotar o termo pessoa com deficiência5,

baseado nas determinações da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU),

do dia 13 de dezembro de 2003 que aprovou a Convenção Internacional de Direitos da Pessoa

com Deficiência, primeiro documento de direitos humanos do Século XXI e oitavo da ONU.

Trata-se de importantíssimo instrumento de aprimoramento dos direitos humanos, não apenas

porque atende ás necessidades específicas desse grupo, que conta com cerca de 650 milhões

de pessoas em todo o mundo segundo a organização Mundial de Saúde (OMS), mas, acima de

tudo, porque fortalece os direitos humanos.

O conceito de pessoa com deficiência que se contempla no art. 2º. Da Convenção

sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência implica grande reversão paradigmática na

concepção jurídica do sujeito a quem se destina o referido instrumento internacional. É que

além de aspecto clínico comumente utilizado para definição em apreço, concernente a

limitação física, intelectual ou sensorial, inclui-se a questão social, para estabelecer-se o

alcance da maior ou menor possibilidade de participação dessas pessoas em sociedade e

consequentemente, reivindicarem seus direitos enquanto cidadão ou cidadã.

Embora para esta pesquisa não sejam relevantes dados que remetam a quantificação da

pessoa com deficiência, faz-se necessário algumas colocações acerca dos referidos

levantamentos estatísticos realizados por órgão oficiais. Por conseguinte, se confrontarmos

4 Não nos aprofundamos nos documentos e eventos aqui elencados, porque no momento, o foco da minha pesquisa não são as políticas publicas para este seguimento.

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dados do CENSO (2000), que pela primeira vez no Brasil propôs uma radiografia da

população desse segmento em particular, pois o país usava os dados de estimativas da

Organização Mundial da Saúde (OMS) e baseado neles, os governantes executavam as suas

plataformas administrativas e econômicas. Visto por esse ângulo, poderíamos justificar, em

parte, os parcos recursos disponibilizados nessa área social.

A Pessoa Portadora de Deficiência , nomenclatura utilizada na legislação e

documentos é segundo o Decreto Federal No. 914/93, "aquela pessoa que apresenta, em

caráter permanente, perdas ou anomalias de sua estrutura ou função psicológica, fisiológica

ou anatômica, que gerem incapacidade para o desempenho de atividades, dentro do padrão

considerado normal para o ser humano". Com base nestas definições o IBGE buscou

radiografar a realidade sócio-econômica dessas pessoas.

Segundo a OMS (2000), a deficiência estava dividida em: deficiência física

(tetraplégica, paraplegia e outros), deficiência mental (leve, moderada, severa e profunda),

deficiência auditiva (total ou parcial), deficiência visual (cegueira total e visão reduzida) e

deficiência múltipla (duas ou mais deficiências associadas).

Sassaki (2006, p.29) sugere que há uma discrepância enorme entre os dados da OMS e

a realidade fática do Brasil. Isso já foi tema de debate em muitos congressos onde dizia que os

dados eram muito maiores do que aqueles que nos apresentavam. No quadro abaixo é

demonstrado um comparativo entre os números que vinham sendo apresentados e os números

do IBGE (2000).

TIPO DE DEFICIÊNCIA

DADOS / OMS DADOS / IBGE Nº / HABITANTES

(EM MILHÕES)

Mental 5% 1,24% 2,09 Física 2% 0,59% 0,99

Auditiva 1,5% 2,42% 4,08 Visual 0,5% 6,97% 11,77

Múltiplos 1% - - Motora - 3,32% 5,6 Total 10% 14,5% 24,5

Dados: OMS e IBGE censo 2000 apud HECK6, (2002).

6 HECH, Ari. O Brasil é um País de deficientes. Artigo do leitor, Jornal O Estado de São Paulo, em 10.07.2002. In: www.nppd.ms.gov.br/artigo.asp?art_id=38 - 16k.

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Segundo a pesquisa citada, encontrou-se uma população de mais de 24,5 milhões de

brasileiros com algum tipo de deficiência. Os dados do Censo mostram, ainda, que os homens

predominam no caso de deficiência mental, física ("especialmente no caso de falta de membro

ou parte dele") e auditiva. O resultado é compatível com o tipo de atividade desenvolvida

pelos homens e mostra que os acidentes de trabalho vêm contribuindo no aumento desse

índice. Já as mulheres predominam no índice dificuldades motoras ("incapacidade de

caminhar ou subir escadas") ou visuais, o que até certo ponto é coerente porque elas dominam

na composição por sexo da população e idade acima de 60 anos. Também, ao somarmos o

número de pessoas com deficiência física e motora, temos um total de 3,91% de pessoas com

dificuldades físicas, ou seja, 6,59 milhões.

Durante os últimos trinta anos, acostumamo-nos a utilizar o índice estimativo mundial,

segundo o qual 10% da população de qualquer país em tempos de paz seriam pessoas com

algum tipo de deficiência. Por isso, muitos de nós, participantes do movimento da inclusão

social, profissionais de reabilitação, ativistas das organizações de pessoas com deficiência e

demais envolvidos neste campo, ficamos surpresos e preocupados com os resultados do

Censo 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2000).

A surpresa e a preocupação pouco têm a ver com a diferença entre o percentual

estatístico (14,5%) encontrado no Censo do IBGE e o índice estimativo (10%). A diferença de

4,5%, para mais ou para menos em relação a 10%, já era esperada, a exemplo do que se

verificou nos censos realizados em outros países ao longo de três décadas. São outros os

motivos que nos levam a sentir insegurança e, de certo modo, resistência na hora de utilizar os

dados do Censo 2000.

2,2 A cidadania e os movimentos sociais na perspectiva de inclusão

A palavra cidadania é derivada de cidadão, que vem do latim civitas. Na Roma antiga,

o conjunto de cidadãos que constituíam uma cidade era chamado de civitate. A cidade era a

comunidade organizada politicamente. Era considerado cidadão aquele que estava integrado

na vida política da cidade. Naquela época, e durante muito tempo, a noção de cidadania

esteve ligada à idéia de privilégio, pois os direitos de cidadania eram explicitamente restritos a

determinadas classes e grupos. A palavra cidadania foi usada na Roma antiga para indicar a

situação política de uma pessoa e os direitos que essa pessoa tinha ou podia exercer

(AURÉLIO, 2004, p.18).

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De acordo com Valle (2000, p.25), ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à

propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar do

destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não

asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do

indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a

uma velhice tranqüila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais.

A expressão cidadania está por toda parte, apropriada por todo mundo, evidentemente

com sentidos e intenções diferentes. Isso de certa forma é positivo porque indica que a

expressão vem ganhando espaço na sociedade, por outro lado, tendo em vista a velocidade e

voracidade das várias apropriações dessa noção, faz-se necessário à delimitação do seu

significado.

Para Dagnino (1994, p. 103-14), torna-se evidente que as apropriações e a crescente

banalização desse termo não só abrigam projetos diferentes no interior da sociedade, mas

também tentativas de esvaziamento do seu sentido original e inovador. Há uma disputa

histórica pela fixação do seu significado e, portanto, dos seus limites.

Na evolução histórica da busca pela cidadania, na concepção atual diz que ela é um

fenômeno único, de modo que não se há de falar em uma continuidade do mundo antigo. A

cidadania do passado não guarda relação muito estreita com a concepção atual. Porém, a

análise histórica do que se entende por cidadania dá sentido à compreensão desse processo de

entendimento conceitual e facilita a análise do seu significado moderno.

Portanto o conceito de cidadania teve diferentes significados de acordo com a

sociedade e a época em vigor, segundo as relações de poder, conquistas, lutas, dominações,

entre outras situações históricas e foi sofrendo alterações ao longo do tempo, seja pelas

alterações dos modelos econômicos, políticos e sociais ou como conquistas, resultantes das

pressões exercidas pelos excluídos dos direitos e garantias aos poucos preservados, num rico

processo histórico ora demonstrado.

A conceituação de cidadania é extremamente complexa, uma vez que não se trata de

um conceito estanque, mas histórico, o que significa que seu sentido varia no tempo e no

espaço. Ser cidadão na época do Brasil - colônia, durante o período da escravatura ou dos

regimes militares, em comparação com a situação de hoje, era completamente diferente. Da

mesma forma, é diferente a concepção de cidadania que se tem na Alemanha, Estados Unidos

ou no continente europeu em relação a que se tem no Brasil. Isso ocorre não apenas pelas

regras que define quem é ou não titular da cidadania, mas também pelos direitos e deveres

distintos que caracterizam o cidadão em cada um dos Estados nacionais contemporâneos.

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A evolução histórica do conceito de cidadania revela muitas situações que,

consideradas absurdas anteriormente, se incorporaram ao conceito de cidadão, com o passar

do tempo. Exemplos dessas questões referem-se à situação da mulher, da criança e do

adolescente, da pessoa com deficiência e dos marginalizados ou excluídos sociais. Sendo

assim, podemos conceituar cidadania diante de uma situação contextualizada, mas não de

forma perene e definitiva, pois esse conceito também se liga, intrinsecamente, às lutas e

reivindicações de cada povo e ao pleno exercício da democracia.

Por conseguinte, para se ter uma compreensão do que vem a ser cidadania, faz-se

necessário, rever historicamente, o processo de formação da sociedade. De acordo com

Rodrigues (2006, p. 34), os homens travavam relações com a natureza e consigo mesmo. Ao

transformarem a natureza para atender as suas necessidades, aparece o trabalho, a principio

manual, mas que utiliza simultaneamente a reflexão intelectual. Na melhoria da confecção,

facilitação, organização e administração da produção, o homem desenvolveu instrumentos de

trabalho e domesticou animais, visando o aumento da produtividade social. Para desenvolver

as forças produtivas, organizou a produção junto aos seus semelhantes, distribuindo tarefas

entre si, surgindo, então daí, a divisão social do trabalho, primeiro genericamente entre os

homens e mulheres, depois entre a agricultura e a pecuária, entre os artesões e

administradores e assim por diante.

Esses modos específicos de divisão e de organização do trabalho, aliados ás relações

de propriedade, denominados por Marx e Engels de relações sociais de produção, deram

início à dominação de alguns homens sobre outros, sustentando a base das desigualdades

sociais no sistema capitalista. A dominação histórica de alguns grupos humanos sobre outros

produziu uma distorção na compreensão e valorização das atividades manual e intelectual,

promovendo em detrimento da mão

de

obra, a exaltação da atividade cognitiva como

estereótipo (RODRIGUES, 2006, p. 29).

As relações de dominação são processualmente construídas, histórica e socialmente

aceita de acordo com a consciência coletiva vigente. No modo de produção escravista antigo

como na Grécia e Roma antiga, o trabalho era feito pelos escravos. No feudal, os servos

trabalhavam para os senhores feudais. Os modos de produções citadas, o dominado percebia

claramente o seu explorador, ou seja, seu dominador. No capitalismo atual, a oposição entre

capitalistas e trabalhadores constitui a base desse processo. Na venda da força de trabalho, o

operariado não percebe o trabalho não pago que constitui a mais

valia fundamento de

sustentabilidade do processo de exploração dos sistemas capitalista, pois muitas vezes,

considera natural um salário pelo fruto de seu trabalho (RODRIGUES, 2006, p. 41).

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Esse processo de feuticização é denominado por Marx de falsa consciência ou

consciência invertida, em que, por estarem alienados, os trabalhadores não conseguem

perceber as relações de submissão pelas quais estão envolvidos.

Por conseguinte,

[...] a sociedade mostra-se alienada quanto ao modo de produção capitalista, além de condicionada pela mídia, tornando-se consumista de uma forma extrema, quando a idéia de que o homem e a mulher só se sentem incluída se consumir e excluída se não consegue beneficiar-se deste consumo (RODRIGUES, 2006, p. 42).

No que se refere ao processo de formação da sociedade, faz-se necessários uma

reflexão acerca da tomada de consciência dessa dominação e alienação, cada vez mais

acentuada nos dias atuais com a constante invasão da mídia em nossas vidas, com o avanço

tecnológico da informação, gerando economia de mão-de-obra, conseqüentemente, o

desemprego e o aumento da estratificação social.

O termo alienação tem várias definições como, cessão de bens, transferência de

domínio de algo, perturbação mental, na qual se registra uma anulação da personalidade

individual, loucura. A partir desses significados elaboram-se algumas diretrizes para melhor

analisar o que é a alienação, e assim buscar alguns motivos pelos quais as pessoas se alienam.

Ainda assim, os processos alienantes da vida humana foram tratados de maneira atemporal,

defraudada, abstraído de processos sócio-econômicos concreto. A alienação trata-se do

mistério de ser ou não ser, pois uma pessoa alienada carece de si mesmo, se tornando sua

própria negação.

Alienação tem seu significado atrelado às teorias de Karl Marx, que vai escrever sobre

como o sistema capitalista gera uma forte estratificação na sociedade em capitalistas e

proletariados. Desta maneira, quando explica a condição do proletariado no mundo capitalista

e relata sobre as condições de trabalho no período de industrialização, mostra que quem detém

o modo de produção é o capitalista, e a produção é dividida em etapas, de forma que um

trabalhador não tinha conhecimento ou posse do resultado final do trabalho (o produto).

Através desse recorte histórico, podemos analisar que o povo retratado somente pode

recuperar direitos perdidos e melhorar sua organização através de reivindicações, lutas e

participação política. Para época, era natural que houvesse a distinção do povo entre cidadão e

não cidadãos, já que essa conquista se dava, a principio, a partir de uma hegemonia ou

hereditariedade. A cidadania estava relacionada à questão da forma de pertencimento comum

a todos.

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Retomando a historicidade da cidadania, alguns períodos representam marcos

significativos para a análise do processo conceptual. Pode-se ter como referência que os

alicerces da cidadania formaram-se pelas Revoluções: Inglesa (1640-1688), Americana

(1776) e Francesa (1789). Posteriormente, o conceito de cidadania continuou se

desenvolvendo de acordo com a evolução da sociedade (direitos sociais, luta das mulheres e

das minorias, meio ambiente, etc.), até chegar ao estágio conhecido nos dias de hoje

(DAGNINO, 1994, p. 93).

Dentre as revoluções citadas, a Revolução Francesa constitui, dentro do conceito de

cidadania, um marco de extrema importância, em razão de princípios adotados: liberdade,

igualdade e fraternidade. É a fundadora dos direitos civis e tem como marco significativo a

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão7. Essa declaração teve a característica de

universalidade, não se restringindo apenas aos cidadãos franceses. Ela é considerada como

uma declaração dos direitos civis dos homens, não importa o país, o povo e que etnia. É uma

declaração que pretendeu alcançar a humanidade como um todo.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, nesse contexto, ganhou

relevância, já que significou o início do processo de transformação do homem comum em

cidadão, cujos direitos civis são garantidos por lei. Basta que analisemos alguns artigos dessa

declaração para constatar tal assertiva.

Art. 1 - Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. Art. 2 - O fim de toda associação política é a preservação dos naturais e irrenunciáveis direitos humanos. Estes direitos são: a liberdade, a propriedade, a segurança, a resistência contra a opressão. Art. 3 - A origem de toda soberania está essencialmente no povo. Art. 4 - A liberdade consiste em tudo poder fazer que não prejudique um outro.

No entanto, na Inglaterra, como lembra Marshal, tais direitos consolidaram-se de

maneira escalonada, ou seja, os direitos civis no século XVIII, os políticos no século XIX e os

sociais no século XX.

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão significou o início do processo de

transformação do homem comum em cidadão, cujos direitos civis são garantidos por lei. No

Brasil, a afirmação de tais direitos ocorreu tardiamente, a partir do século XIX e de modo

diverso, ou seja, estabeleceram-se direitos políticos, alguns direitos sociais (principalmente na

era Vargas) e os direitos civis, enfrentando dificuldades naturais, por motivo de mudança da

7 Proclamada em 26 de agosto de 1789, contendo 17 artigos e um preâmbulo.

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forma de governo e das políticas desenvolvidas. Essa situação demonstra uma evolução na

questão da cidadania do povo brasileiro, marcada por fatos históricos e pela exclusão de

parcela da comunidade (mulheres, escravos, negros, crianças e adolescentes, portadores de

deficiência) de seus direitos fundamentais.

Dagnino (1994, p. 101) afirma que a história relaciona a questão da cidadania à

conquista de direitos. E todo esse movimento histórico proporcionou, no aspecto legal, uma

evolução dos direitos. Nesse sentido, pensadores contemporâneos, como T. H. Marshal e

Norberto Bobbio, revelam que, na evolução dos direitos dos homens, se encontram três

grupos distintos.

Os Direitos civis correspondem ao conjunto das liberdades individuais estabelecidas

por meio da igualdade jurídica. Compreende-se o direito de liberdade, como o direito que

tende a limitar o poder do Estado e a reservar para o indivíduo, ou para os grupos particulares,

uma esfera de liberdade em relação ao Estado. Podemos considerá-los os mais elementares,

são os direitos políticos primários, sendo os que menos satisfazem aqueles que deles

precisam, agravando ainda mais sua exclusão, pois só quem tem recurso pode fazê-los valer.

Os Direitos políticos, referentes ao exercício do poder, são estabelecidos por

mecanismos de participação social e política. Os direitos políticos, segundo Dagnino (1994),

são aqueles os quais

concebendo a liberdade não apenas negativamente, como não

impedimento, mas positivamente, como autonomia

tem como conseqüência a participação

cada vez mais ampla, generalizada e freqüente dos membros de uma comunidade no poder

político (ou liberdade no Estado). Dentro do que observamos, na maioria das vezes, é a

restrição natural ao direito social e civil que seria direcionado ao assistencialismo.

Os Direitos sociais que apresentam como o conjunto das garantias mínimas do bem-

estar econômico, de acordo com os padrões culturais aceitos por uma sociedade. São regidos

pelo signo da igualdade e visam ao bem-estar social. Expressam o amadurecimento de novas

exigências, podemos mesmo dizer, de novos valores

como os do bem-estar e da igualdade

não apenas formal, e que poderíamos chamar de liberdade através ou por meio do Estado. Em

outras palavras, na prática, não passam de meras concessões, que, na maioria das vezes, nem

sequer são usufruídos.

Os direitos que temos não nos foram conferidos, mas conquistados. Muitas vezes

compreendemos os direitos como uma concessão, um favor de quem está em cima para os que

estão em baixo. Contudo, a cidadania não nos é dada, ela é construída e conquistada a partir

da nossa capacidade de organização, participação e intervenção social.

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Portanto, no Brasil, estamos gestando a nossa cidadania, os primeiros passos foram

dados através do processo de redemocratização e a Constituição de 1988 aborda no seu texto

tais direitos expressos e legitimados. A afirmação dos direitos civis, políticos e sociais está

bem caracterizada na também denominada de Constituição Cidadã, e nas leis ordinárias que

se seguiram.

No texto da nossa Constituição, percebemos que a cidadania é o reconhecimento do

cidadão, de seus direitos, deveres e participação, bem como pelo Estado. Sendo assim, a

cidadania está vinculada à posse de direitos conquistados unido a idéia de igualdade de

direitos. Portanto, não existe cidadania sem direitos. Nesse caso, cidadão é aquele indivíduo

que participa de uma mesma comunidade política, na qual todos têm os mesmos direitos

legalmente reconhecidos.

De maneira geral, podemos afirmar que ser cidadão implica o reconhecimento e a

concretização de seus direitos civis, políticos e sociais e a cidadania resulta na efetivação de

tais direitos e na luta incessante para alcançá-los, independentemente da condição pessoal ou

social do indivíduo em que implica o cumprimento dos deveres. Contudo, o elemento da

reivindicação é preponderante para garantir exercício da cidadania.

Compreendemos que a existência da cidadania está atrelada, na maioria das vezes, a

uma prática de reivindicação, de apropriação de espaços, da lei para fazer valer os direitos do

cidadão, nesse sentido, a prática da cidadania pode ser a estratégia, por excelência, para a

construção de uma sociedade melhor. Mas o primeiro pressuposto dessa prática é que esteja

assegurado o direito de reivindicar os direitos, e que o conhecimento deste se estenda, cada

vez mais, a toda a população.

A concepção de cidadania envolve a idéia de igualdade e de subjetividade, pois ela é

respectivamente coletiva e individual. Portanto, construir cidadania é também construir novas

relações e consciências. A cidadania é algo que não se aprende com os livros, mas com a

convivência, na vida social e pública. É no convívio do dia-a-dia que exercitamos a nossa

cidadania, através das relações que estabelecemos com os outros, com a coisa pública e o

próprio meio ambiente. Ela deve ser perpassada por temáticas como a solidariedade, a

democracia, os direitos humanos, a ecologia, a ética dentre outros.

A pessoa com deficiência é um cidadão como toda e qualquer outra pessoa. Este

direito deve ser respeitado por todos e em todas as situações, como, por exemplo, na saúde, na

educação, no transporte, no acesso à justiça, dentre outros. O que ocorre, na verdade, é que,

embora garantidos pela Constituição Federal e pelas leis, o que se verifica, na prática, é uma

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reiterada e ostensiva inobservância desses direitos de cidadania contra a maioria da população

excluída dos bens e serviços desfrutados pelas elites.

O grande desafio é, portanto, além de incorporar novos direitos aos já existentes,

integrar cada vez um número maior de indivíduos ao gozo dos direitos reconhecidos. Na visão

de Covre (1991, p.13), para qual cidadania significa o acesso permanente aos direitos

políticos, civis e sociais, sendo: os direitos políticos relacionados ao ato de votar e ser votado;

os direitos civis relacionados à liberdade de expressão do pensamento, á locomoção e, ainda,

ao exercício profissional; e à questão dos direitos sociais, às condições de vida como um

todo . Não podemos nos esquecer que o caminho para se alcançar esses direitos requer

mobilizações de grupos e atores sociais que fizeram e ainda fazem história. Mesmo aqueles

que são agregados à dinâmica estatal perdendo, de certa forma, sua altivez e independência,

em troca da viabilidade econômica injetada pelo Estado neoliberal vigente.

As lutas dos movimentos sociais têm sido consideradas, por vários analistas e

consultores de organizações internacionais, como elementos e fontes de inovações e

mudanças sociais. Existe também um reconhecimento de que eles detêm um saber,

decorrentes de suas práticas cotidianas, passíveis de serem apropriados e transformados em

força produtiva. Os movimentos são elementos fundamentais na sociedade moderna, agentes

construtores de uma nova ordem social e não agentes de perturbação da ordem, como as

antigas análises conservadoras escritas nos manuais antigos, ou como ainda são tratados na

atualidade por políticos tradicionais.

Para Gohn (2001, p. 29), a presença dos movimentos sociais é uma constante na

história política do país, mas ela é cheia de ciclos, com fluxos ascendentes e refluxos. Alguns

estratégicos, de resistência ou rearticulação em face de nova conjuntura e as novas forças

sociopolíticas em ação; compreendendo que o importante a destacar é esse campo de força

sócio-político e o reconhecimento de que suas ações impulsionam mudanças sociais diversas.

O repertório de lutas que eles constroem e demarcam interesses, identidades, subjetividades e

projetos de grupos sociais.

Mesmo com a idéia da década de 80 como a década perdida , com sensível aumento

dos índices de pobreza e exclusão social, pode-se dizer que o saldo positivo deste longo e

complexo processo de organização popular foi ampliar as possibilidades de equacionamento

político das demandas sociais, diante da disponibilidade de recursos públicos (DOIMO, 1995

p. 219).

Com as possibilidades de parcerias em andamento, a partir de 1990, os movimentos

sociais deram origem a outras formas de organizações populares, mais institucionalizadas,

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como os fóruns nacionais de luta pela moradia popular. No caso da habitação e reforma

urbana, por exemplo, o próprio Estatuto da Cidade, é resultado dessas lutas. O Fórum da

Participação Popular e tantos outros fóruns e experiências organizativas locais, regionais,

nacionais e até transnacionais, estabeleceram práticas, fizeram diagnósticos e criaram

agendas, para si próprios, para a sociedade e para o poder público. O Orçamento Participativo

e vários programas surgiram como fruto desta trajetória.

A maioria dos movimentos identitários e culturais atua em conjunto com ONGs e eles

têm sido bastante evidenciados e valorizados nos meios de comunicação de uma forma geral.

Os movimentos identitários são reportados como ações coletivas, frutos de projetos

focalizados, coordenados por indivíduos empreendedores, agrupados segundo categorias de

gênero, faixa etária, origem étnica, religião dentre outros.

Há também, os movimentos populares propriamente ditos, aqueles que nos anos 70/80

foram estimulados pela teologia da libertação. Eles não desapareceram, apenas alteraram suas

práticas e perderam visibilidade política e da mídia, porque suas ações passaram a ser mais

propositivas do que reivindicativas. Alguns fatores conjunturais explicam essas mudanças.

Eles sempre foram heterogêneos em termos de temáticas e demandas. O que unifica o

universo das suas demandas são as carências socioeconômicas.

Eles criaram e desenvolveram, nos anos 90, redes com outros sujeitos sociais, assim

como redes dentro do próprio movimento popular propriamente dito. Nas redes com outros

sujeitos destacam-se as do campo sindical, institucional de outras entidades sociais, o campo

político partidário, o campo religioso, o campo das ONGs. Quer dizer, os movimentos

populares criaram, ou ampliaram, ou fortaleceram a construção de redes sociais.

Ocorreram, entretanto, alterações profundas no cotidiano da dinâmica interna dos

movimentos populares. De um lado eles, perderam visibilidade (porque ao longo dos anos 90

os movimentos populares urbanos diminuíram as formas de protestos nas ruas e diminuíram

sua visibilidade na mídia), e houve um deslocamento dessa visibilidade para as ONGs.

Embora os eixos das demandas fossem os mesmos, eles incorporaram novas práticas;

alguns de seus líderes ou assessores passaram a incorporar diferentes escalões da

administração pública, nos locais em que a oposição ascendeu ao poder. Seus discursos se

alteraram em função da mudança da conjuntura. As matrizes que estruturaram esses discursos

e as práticas também se alteraram. Não se tratava mais de se ficar de costas para o Estado,

mas de participar das políticas, das parcerias, dentre outros. Eles ajudaram a construir outros

canais de participação, principalmente os fóruns; e contribuíram para a institucionalização de

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espaços públicos importantes tais como os diferentes conselhos criados nas esferas

municipais, estadual e nacional.

A noção do novo sujeito histórico, povo, um dos eixos estruturante do movimento

popular, reformulou-se, assim como deu novos sentidos e significados às suas práticas.

Resulta desse processo uma identidade diferente, construída a partir da relação com o outro, e

não centrada exclusivamente no campo dos atores populares. Esse outro estava presente nos

relacionamentos desenvolvidos com novas formas de associativismo emergentes, interações

compartilhadas com ONGs e a participação nas políticas públicas.

Isso tudo alterou o projeto político dos movimentos populares urbanos no sentido de

um projeto político policlassista, um novo projeto político dos movimentos populares, que vai

contemplar outras questões além de demandas específicas do campo das carências

socioeconômicas, indo das questões do modelo de desenvolvimento do país às questões do

meio ambiente e do desenvolvimento humano. Na maioria dos casos, não há uma ênfase

exclusiva nas questões apenas locais, inclui-se outras dimensões. Em parte, essas mudanças se

explicam pelos efeitos do próprio modelo organizacional adotado: de se atuar em redes. O

outro, o diferente, acaba alterando o movimento local.

Com isso, outros temas entraram para a agenda dos movimentos populares urbanos,

tais como o de uma cidadania planetária, antes circunscritos aos movimentos sociais

organizados e assessorados por outras camadas sociais, como os ambientalistas, as mulheres,

direitos humanos, antiglobalização, movimento popular de saúde, movimentos populares de

bairro, movimentos populares que não tinham tanta presença nos anos 80, como a própria

questão dos idosos e os aposentados da previdência pública, das pessoas com deficiência,

movimentos dos homossexuais, dentre outros.

No campo dos movimentos sociais rurais, a organização popular cresceu bastante nos

anos 90. Dentre dos inúmeros movimentos de sem-terra, o mais expressivo foi o Movimento

dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST. Ele se destaca em termos nacional como no

plano internacional via um eficiente trabalho de mídia e marketing político de suas demandas

pela Reforma Agrária, bandeiras e místicas e o movimento social a partir dos anos 90,

denominado movimento antiglobalização.

Com certa preocupação, Gohn (2001, p. 31) denomina de cenário contraditório, pois as

entidades que buscam a mera integração dos excluídos, por meio da participação comunitária,

em políticas sociais disputam os mesmos espaços com entidades e movimentos críticos, com

projetos de emancipação para a sociedade e para a democratização do Estado. Complementa a

autora: Acho que é preciso avançar, efetivamente, na direção de projetos inspirados em um

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novo modelo civilizatório, onde a cidadania, a ética, a justiça e a igualdade social, sejam

imperativas, prioritários e inegociáveis .

Portanto, não bastam princípios estratégicos, avaliações de resultados baseadas na

lógica do custo e benefício, se o projeto político de uma entidade para a sociedade civil como

um todo, incluindo sua relação à sociedade política, com os organismos estatais, não contiver

propósitos bem explícitos. Subjacente a esse projeto há um questionamento acerca de que

modelo de Estado e de sociedade almejamos para nossas futuras gerações.

Nesse contexto dos movimentos sociais, a análise da concepção atual de cidadania

contempla um processo de inclusão e não de exclusão. E quando se analisa, de maneira

específica, a questão envolvendo o segmento social pessoas com deficiência e as leis

brasileiras para garantia dos direitos civis, políticos e sociais constata-se que esse processo de

inclusão e reconhecimento da cidadania foi lento. Embora, atualmente, apresente-se como

tema relevante na sociedade moderna, os direitos dos que vivem à margem dos contextos

sociais e que são discriminados como os negros, os índios, os homossexuais, os idosos, os

pobres, as crianças e as pessoas com deficiência ainda são desconsideradas, sendo esses

segmentos tratados com indiferença ou como objetos e não como sujeitos de direitos e

deveres um cidadão.

A Constituição Federal de 1988 começou a estabelecer, logo no artigo 1.o , que, entre

os fundamentos da República Federativa do Brasil, encontram-se a cidadania e a dignidade da

pessoa humana. Para a efetividade desses fundamentos, tratou o legislador constituinte de

consignar capítulo específico referente aos direitos e garantias fundamentais da pessoa

humana.

Assim, a garantia da cidadania a todos os cidadãos brasileiros deve se consolidar

mediante ações que venham a concretizar o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,

ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária. Em síntese, a cidadania tem por objetivo garantir os

direitos sociais, civis e políticos.

Somente com a Emenda No. 01 à Constituição de 1967 é que surgiu uma vaga

referência à pessoa com deficiência, quando tratou da educação dos excepcionais . Até

então, era como se não existissem pessoas com deficiências e, por isso, não havia necessidade

de nenhuma proteção legal para garantia e satisfação de seus direitos fundamentais e

posteriormente, com a Emenda No. 12, de 17 de outubro de 1978, à Constituição de 1967,

houve, dessa forma, significativos avanço em relação aos direitos da pessoa com deficiência,

quando se estabeleceu:

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Artigo único: É assegurada aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica especialmente mediante: I - educação especial e gratuita; II - assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País; III - proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e a salários; IV - possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.

A partir daí, a inovação mais significativa ocorreu com a atual Constituição de 1988.

Ela foi pródiga ao tratar da pessoa com deficiência, estabelecendo não somente a regra geral

relativa à questão da cidadania (Art. 1. º) e do princípio da igualdade (Art. 5. º, caput ), mas

também:

a) A competência comum da União, Estado, Distrito Federal e Município para cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência (art. 23, II). b) A competência concorrente para legislar visando à proteção e integração do portador de deficiência (art. 24, XIV). c) A proteção ao trabalho, proibindo qualquer discriminação no tocante ao salário e admissão da pessoa com deficiência (art. 7.º, XXXI) e a reserva de vagas para cargos públicos (art. 37, VIII). d) A assistência social

habilitação, reabilitação e benefício previdenciário (art. 203, IV e V). e) A educação

atendimento especializado, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 208, III). f) A eliminação das barreiras arquitetônicas, adaptação de logradouros públicos, edifícios, veículos de transportes coletivos (art. 227, II, parágrafo 2.º). g) Preocupação com a criança e adolescente portadores de deficiência, com criação de programas de prevenção e atendimento especializado, além de treinamento para o trabalho (art. 227, II).

Nesse mesmo intuito, foram editadas outras leis que buscaram regulamentar os direitos desses cidadãos, tais como:

a) A Lei n.º.853, de 24 de outubro de 1989, estabeleceu o apoio à pessoa com deficiência, sua integração social, a tutela jurisdicional de interesses coletivos e difusos dessas pessoas, disciplinou a atuação do Ministério Público e definiu crimes; b) O Decreto n.º.298, de 20 de dezembro de 1999, regulamentou a lei supracitada, pormenorizando as ações e diretrizes referentes ao portador de deficiência, especificamente em relação à saúde, ao acesso à educação, habilitação e reabilitação profissional, acesso ao trabalho, cultura, desporto, turismo e lazer; c) A Lei n.º 0.098, de 19 de dezembro de 2000, tratou da eliminação das barreiras arquitetônicas para a inclusão do portador de deficiência. Regulamentou questões em torno dos elementos de urbanização, como os mobiliários urbanos, estacionamentos públicos, da acessibilidade aos edifícios públicos e aos de uso privado, do transporte coletivo e da acessibilidade aos sistemas de comunicação.

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A cidadania das pessoas com deficiência revela-se na concretização de seus direitos

civis, sociais e políticos, representando tais leis o referencial necessário para a realização das

ações dessa natureza. Assim, a acessibilidade aos ambientes, o trabalho, à saúde e a educação

são exemplos básicos de cidadania, envolvendo esses cidadãos.

Em síntese, a exclusão e a cidadania são conceitos muito presentes e interligados à

nossa vida e de difícil compreensão, devido à sua complexidade, por envolverem diferentes

concepções e visões de homem e de mundo no contexto da sociedade do capital. Portanto,

torna-se imprescindível retomar neste estudo a relação contraditória que permeia os processos

de exclusão de uma forma mais direcionada.

Diante dessa dinâmica da exclusão, que está arraigada e impregnada há séculos em

tudo que fazemos, cabe-nos provocar inquietações diante do produto de estratificação social

dessa dinâmica devastadora da sociedade do capital. Poderíamos dizer que infelizmente o

terreno é fértil para novas pesquisas e estudos nesta área, tendo em vista o crescente aumento

na produção da exclusão social e praticamente sendo impossível sua erradicação.

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CAPÍTULO 3

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DOS PROCESSOS DE

EXCLUSÃO E INCLUSÃO

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A exclusão tornou-se uma espécie de epidemia do início do século XX. Ela é

assustadora como a peste, altamente contagiosa e de cura pouco provável. Esta epidemia

social demonstra uma grande vitalidade e dinamismo e, devido ao seu rápido alastramento,

tem sido tratada como uma das ameaças mais sérias ao desenvolvimento das sociedades. De

acordo com esse contexto, para um melhor embasamento teórico desta pesquisa, o capitulo

em questão abordará os aspectos históricos da exclusão à inclusão, como também fará um

breve resgate das políticas voltadas para a inclusão. Trataremos ainda da relação entre as

instituições e o processo de inclusão no município de João Pessoa. Ao término deste capítulo,

caracterizaremos a FUNAD como lócus da pesquisa.

3.1 Aspectos históricos da produção da exclusão/inclusão.

As terminologias exclusão/inclusão denotam complexidade abrangendo diversas

concepções de, de acordo com variadas visões de homem e de mundo desenvolvidas em cada

grupo ou sociedade. Para tais conceitos existem critérios, vínculo e relatividade entre os dois

termos que não podem estar pressupostos na expressão do conceito. Ou seja, discutir a

concepção de exclusão significa pensar em discutir a inclusão. Portanto, são dois conceitos

que caminham simultaneamente, mas que em certos momentos, um apóia o outro.

Sendo assim, devemos nos preocupar com os critérios e dimensões em que a exclusão

se processa e não com a definição do termo em si. Ao aparecer como um fato, a exclusão é

retirada do seu conteúdo processual, sendo entendida na pessoa excluída, na conseqüência, e

não na causa.

Para Santos (2006, p. 153), o processo de exclusão é questionável, pois devemos levar

em consideração o contexto sócio-político e econômico no qual está inserido. Ou seja, vemos

no nosso dia a-dia que existem situações que levam à exclusão, como: desempregados de

longa duração, crianças de rua, desabrigados, além daqueles considerados pelas sociedades

predominantemente exclusivas como alguém desprovido de reconhecimento social, como

portadores de hanseníase, os doente mentais, as pessoas com deficiência, entre outras

situações similares.

Diante do exposto o importante é saber que processo os levou a essa condição de vida,

buscar a raiz, ou seja, estudar as condições que desencadearam a exclusão na sociedade do

capital. Portanto, focalizando o contexto da exclusão evita-se uma série de erros políticos, que

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têm se tornado permanentes, não acabando com a exclusão, e sim aumentando o produto dela,

os excluídos, conforme enfatiza Goffman (1988), quando diz:

[...] o pior dessa situação é que com um histórico significativo de fracasso das políticas públicas, tal panorama torna-se natural diante dos olhos da sociedade, desenvolvendo um imaginário socialmente distorcido no que diz respeito a atribuir estereótipos, rótulos e estigmas, formando julgamentos que condenam os desafortunados como se fossem responsáveis pelo próprio infortúnio (p.31).

No entanto, para sabermos quais as causas da exclusão se faz necessário nos reportar

à história que, de acordo com Santos (2006, p. 153), explica que o capitalismo, nos últimos

200 anos, foi desenvolvendo e se ampliando com o reconhecimento de direitos. Esse modo de

produção é um processo de avanço que, ao mesmo tempo, desperta um processo de

retrocesso. Marx afirmou que a inclusão de todos no trabalho, tentando desenvolver-se a

igualdade, conseguiu aumentá-la, transformando os donos do capital em indivíduos cada vez

mais poderosos, ricos, concentradores de riquezas e, simultaneamente, aumentando a pobreza.

Entender a exclusão social em que algumas pessoas se encontram só é possível, ao se

propor olhar o homem contextualizado historicamente, observando sua representação social.

Para isso deve-se referir ao sujeito psicológico, que processa a informação sem analisar sua

origem, valorizando apenas o produto final da informação recebida ( PAIXÃO, 1997).

Refletindo sobre o fenômeno social de exclusão, em que se acham envolvidas as

pessoas com deficiência no Brasil, um primeiro questionamento interessa aqui, ao se articular

possíveis retomadas inclusivas às quais se determina averiguar nesta dissertação: qual a

crença comum desse segmento social, e mais especificamente das pessoas com deficiência,

sobre a inclusão?

Ao partir da normalização como aporte de pertinência social, buscaremos exemplificar

algumas idéias que norteiam a concepção acerca da pessoa com deficiência, em cada período

histórico, para que se possa compreender melhor o lugar desse indivíduo com deficiência na

sociedade contemporânea.

Durante a Antigüidade, os nascidos deficientes eram abandonados ao relento. Na

cidade de Esparta as crianças com deficiências física ou mental eram consideradas

subumanas, o que legitimava sua eliminação ou abandono, muito provavelmente em favor dos

ideais morais da sociedade clássica e classista da época, na qual a eugenia e a perfeição do

indivíduo eram extremamente valorizadas (PESSOTI, 1984; ARANHA, 1995;

SCHWARTZMAN, 1999).

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Na Idade Média, numa visão influenciada pela Igreja, a deficiência era concebida

como um fenômeno metafísico e espiritual, sendo a ela atribuído um caráter "divino" ou

"demoníaco . Essa concepção, de certa forma, ao longo da história da humanidade, conduziu

o modo de tratamento das pessoas deficientes. Com a influência da doutrina cristã, as pessoas

com deficiência começaram a ser vistos como possuindo uma alma e, portanto, eram filhos de

Deus. Dessa forma, não eram mais abandonados, mas, sim, acolhidos por instituições de

caridade. Ao mesmo tempo em que imperava esse ideal cristão, as pessoas com deficiência

eram consideradas como produtos da união entre a mulher e o demônio, o que justificava a

queima de ambos, mãe e criança (SCHWARTZMAN, 1999).

Além dessa prática, usavam-se também outras mais "amenas" como punições, torturas

e diversos tipos de maus-tratos no lidar com essas pessoas Essa era a postura da sociedade

daquela época, em que a ambivalência caridade-castigo constituía a marca definitiva da

atitude medieval diante da pessoa com deficiência (ARANHA, 1995).

No final do séc. XV, com a revolução burguesa e a racionalidade cientifica, houve

mudanças na concepção de homem e de sociedade, o que proporcionou também uma

mudança na concepção de deficiência, que passou a ter uma conotação mais direta com o

sistema econômico que se propunha, sendo considerada atributo dos indivíduos não

produtivos economicamente. Além disso, com o avanço da medicina, houve uma prevalência

da visão organicista sobre a deficiência, sendo vista como um problema médico e não mais

apenas como uma questão espiritual. Nos séculos XVII e XVIII, se ampliou às concepções a

respeito da deficiência em todas as áreas do conhecimento, favorecendo diferentes atitudes

frente ao problema, dentre elas a institucionalização do ensino especial.

De acordo com Bueno (1993), a educação especial surgiu nas sociedades industriais

no séc. XVIII, como parte pouco significativa de um conjunto de reivindicações de acesso à

riqueza produzida (material e cultural) e que desembocou na construção da democracia

republicana representativa, cujo modelo expressivo foi implantado na França, pela revolução

de 1789, sob as bandeiras da igualdade, liberdade e fraternidade. Dessa forma, o acesso à

escola para pessoas com deficiência por meio da existência de uma escola especial nasceu

como necessidade de oferta de escolarização às crianças cujas anormalidades eram

consideradas prejudiciais ou impeditivas do convívio com os outros alunos normais . E esta

não é uma mera diferença de ênfase na análise do percurso histórico da educação especial,

mas uma diferença de fundo, demonstrativa do caráter de segregação do indivíduo anormal e

dos processos exigidos pelas novas formas de organização social (BUENO, 1993, p. 37).

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No séc. XX houve uma multiplicação das visões a respeito da deficiência, com a

prevalência de vários modelos explicativos: o metafísico, o médico, o educacional, o da

determinação social e, mais recentemente, o sócio construtivista ou sócio-histórico que apesar

da existência desses modelos, a deficiência tanto física como mental, ainda continua sendo

considerada como um fenômeno que ocorre no sujeito; portanto, ele é o portador da

deficiência (FERREIRA, 1993; ARANHA, 1991).

A análise histórica e crítica do conceito de deficiência proposta por Aranha (1995)

rompem com as visões tradicionais e mecanicistas. A autora ressalta a importância dos ideais

e pressupostos que o sistema socioeconômico capitalista possui na construção da deficiência,

uma vez que esta é tratada como sendo sinônimo de improdutividade e desvio. No sistema

capitalista, a produção é exigida igualmente para todos os indivíduos e aqueles que não

conseguem atingir as expectativas dos detentores da produção são vistos como desviantes,

estando à condição de deficiência incluída nessa categoria. Para ela, a deficiência é

multideterminada por fatores que, aliados aos valores do sistema vigente na sociedade, levam

à segregação e à estigmatização das pessoas com deficiência. Estes, por sua vez, são

considerados incapazes e fracos, pois não se enquadram nos moldes produtivos do sistema

capitalista. Portanto, a deficiência é vista como uma condição desvalorizada no contexto

social da produção.

Segundo Omote (1995, p. 59), o deficiente tanto físico é uma pessoa que possui

algumas limitações em suas capacidades e desempenhos; porém, há outras pessoas na

sociedade que também são limitadas e que não são consideradas deficientes. Esse autor afirma

que o nome deficiente refere-se a um status adquirido por essas pessoas. Então, sua

preferência em utilizar o termo pessoa deficiente a utilizar o termo pessoa portadora de

deficiência , pois dessa forma a deficiência torna-se uma variável estabelecida por quem está

na audiência, de acordo com seus próprios padrões de normalidade.

Estigma, para os gregos, eram os sinais corporais8 com os quais se procurava

evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os

apresentava (GOFFMAN, 1988, p.11).

Quando se tem alguém que não se conhece à frente, um determinado atributo que ele

apresente e que permita categorizá-lo em uma espécie menos desejável, é um estigma. Um

estigma aumenta a distância entre a identidade social virtual e a identidade social real de um

indivíduo. Entendem-se como identidade social virtual uma identidade imputada ao indivíduo

8 Esses sinais eram feitos com cortes ou fogo, e o seu portador era um escravo ou criminoso ou traidor.

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de acordo com o que se espera dele, com os requisitos pré-definidos que ele preencha para o

convívio social. Já sua identidade social real corresponde aos atributos que o indivíduo prova

possuir.

Nem todos os atributos indesejáveis são estigmatizantes, refere ainda Goffman (1988),

mas apenas aqueles que são incongruentes com o estereótipo que se cria para um determinado

tipo de indivíduo. Um atributo que estigmatiza alguém pode confirmar a normalidade de outro

alguém. Um defeito físico pode ser escondido quando um indivíduo quer ser aceito em

determinada função ou utilizado quando o indivíduo quer ser poupado de determinada função.

Um estigma é, portanto, uma relação especial entre atributo e estereótipo.

Há três tipos de estigma: as abominações do corpo, as várias deformidades físicas; as

culpas de caráter individual, fraquezas, homossexualismo, vícios, desemprego, alcoolismo,

tentativas de suicídio, entre outros; estigmas tribais de raça, nação e religião: os transmitidos

de pai para filho (GOFFMAN, 1988).

Em todos os casos, o indivíduo possui um traço que chama atenção e, por isso, outros

atributos seus passam despercebidos. Ao se utilizar os termos como aleijado, retardado,

bastardo, na verdade são metáforas para se dirigir a esse traço mais aparente. Na escola,

freqüentemente assistimos a esse recurso metafórico para se distinguirem indivíduos normais

daqueles com deficiências físicas e mentais, tratando-se estes últimos, como débeis mentais.

Nessas situações, a vergonha pode surgir no indivíduo que se percebe diferente das

expectativas, e a presença dos normais reforçarão a sua auto-exigência e ego, podendo surgir

a autodepreciação e o auto-ódio.

Assim, refere Goffman (1988), o estigmatizado pode tentar corrigir a característica

que origina o estigma, por meio de cirurgias, reabilitação física, dentre outras formas. No

âmbito escolar, as salas de reforço ou salas de recursos, as atividades de reabilitação física, as

inúmeras tentativas empreendidas por esses alunos com deficiência em adequarem-se a sua

turma são exemplos dessas atitudes. Pode também tentar superar o estigma com o esforço

para ressaltar outra característica sua, tornando-se exemplo de auto-superação.

Afirma então o autor que o estigmatizado pode romper com a realidade e (re)

significar sua identidade social, encarando a deficiência como uma bênção secreta e os

normais como diminuídos.

A rejeição da sociedade às pessoas com deficiência reflete a própria fragilidade social,

pois tudo que é diferente e anormal chama atenção e pode causar variadas reações. A

diferença é parte inerente ao conceito de deficiência e traz em si mesma a possibilidade do

preconceito, uma vez que este se caracteriza pela aversão ao diferente (CROCHIK, 1997).

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Contudo, essa diferença poderia não traduzir essa forma de preconceito se ela, a

diferença, fosse reconhecida como fazendo parte da essência humana. O preconceito vem

sendo abordado como questão psicológica desde a década de 1920, quando começou a ser

pesquisado. Apesar de se constituir como fenômeno psicológico, o que leva o indivíduo a ser

preconceituoso pode ser encontrado em seu processo de socialização, o qual só pode ser

entendido, novamente, ao se olhar esse indivíduo histórica e culturalmente. Os preconceitos

surgem como resposta aos conflitos pela sobrevivência. Portanto, apesar de um fenômeno que

se manifesta no indivíduo, a sociedade que o contém pode inibi-lo ou suscitá-lo, devendo ser

observadas as duas naturezas distintas dessa realidade: a social e a individual (CROCHIK,

1997).

Entender os estigmas, preconceitos e discriminações advindas de uma sociedade

eminentemente excludente, remete-nos a procurar as causas da exclusão e até tentar justificá-

la através da história. Mas o fato é que, as causas serão certamente múltiplas. No entanto esse

desenvolvimento tenaz da exclusão como um todo incentivou os responsáveis políticos Mas

poderíamos condensar resumir tal situação em ter momentos distintos: no primeiro as que têm

tradições democráticas mais antigas.

Diante do contexto abordado acerca da exclusão, faz-se necessário a partir de agora

abordar O contrário, quando se O termo inclusão instiga artigos e debates em torno do seu

significado social. A palavra inclusão deriva do verbo incluir, originado do latim incluire,

correspondendo a inserir, introduzir, acrescentar ou abranger. Seria equivalente ao verbo

incluir a frase "colocar também..

Acredita-se que o termo inclusão seja sugestivo a compreensões ou análises

direcionadas a pessoa com deficiência por questões ideológicas. De acordo com Backhtin,

(1992).

É preciso fazer uma análise profunda e aguda da palavra como signo social para compreender seu funcionamento como instrumento da consciência. É devido a esse papel excepcional de instrumento da consciência que a palavra funciona como elemento essencial que acompanha toda criação ideológica, seja ela qual for. É no fluxo da interação verbal que a palavra difunde significados. É através dela que se evidenciam ideologias e se consolidam interpretações, até mesmo as mais contraditórias ou precipitadas (p. 37).

A maneira de pensar de cada um é levada adiante através do convívio. O profissional

mantém sua postura ideológica muitas vezes fundamentada numa premissa empírica. Tudo o

que sabemos acerca do mundo dos fatos deve, pois, ser suscetível de expressão sob a forma de

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enunciados acerca de nossas experiências. Só podemos chegar à conclusão de que esta mesa é

azul ou verde consultando nossa experiência sensorial. Pelo imediato sentimento de convicção

que ela nos transmite, podemos distinguir o enunciado verdadeiro, aquele cujos termos estão

em concordância com a experiência, do enunciado falso, aquele cujos termos não concordam

com a experiência (POPPER, 2000, p. 100).

Em muitas situações há grande preocupação em incluir os "diferentes" no sistema

regular de ensino, enquanto aqueles que são vistos como "normais" não são compreendidos

em suas particularidades, podendo gerar um sentimento de exclusão, ocasionando, dentre

outras conseqüências.

Inclusão, palavra empregada nacional e internacional; porém, se entendida como plena

participação de todo o processo educacional, laboral, de lazer, dentre, torna-se cada vez mais

difícil de ser vivida por muitos, dadas às rápidas transformações que afetam todas as áreas,

dentro de organização social cada vez mais excludente (AURÉLIO, 2004).

O termo se refere à conduta de inserir alguém ou alguma coisa em algum lugar, que

tem conotações diferentes quando adjetivado, se no social ou no educacional. Entendendo que

o social abranje tudo que se relaciona ao espaço social. Os defensores da inclusão se baseiam

no modelo social da deficiência. Pelo modelo social da deficiência, os problemas da pessoa

com necessidades especiais não estão nela tanto quanto estão na sociedade. Assim, a

sociedade é chamada a ver que ela cria problemas para as pessoas portadoras de necessidades

especiais, causando-lhes incapacidade ou desvantagem no desempenho de papéis sociais em

virtude de: seus ambientes restritivos; suas políticas discriminatórias e suas atitudes

preconceituosas que rejeitam a minoria e todas as formas de diferenças; seus discutíveis

padrões de normalidade; seus objetos e outros bens inacessíveis do ponto de vista físico; seus

pré-requisitos atingíveis apenas pela maioria aparentemente homogênea; sua quase total

desinformação sobre necessidades especiais e sobre direitos das pessoas que têm essas

necessidades; suas práticas discriminatórias em muitos setores da atividade humana.

Cabe, portanto, à sociedade eliminar todas as barreiras físicas, programáticas e

atitudinais para que as pessoas com necessidades especiais possam ter acesso aos serviços,

lugares, informações e bens necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e

profissional.

Fischinger (2000) explica que o modelo social da deficiência focaliza os ambientes e

barreiras incapacitantes da sociedade e não as pessoas deficientes . O modelo social foi

formulado por pessoas com deficiência e agora vem sendo aceito também por profissionais

não-deficientes. Ele enfatiza os direitos humanos e a equiparação de oportunidades.

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O modelo social da deficiência diz que são as atitudes da sociedade e o nosso

ambiente que necessitam mudar . E, em meados da década de 80, já se afirmava que a

comunidade como um todo deveria aprender a ajustar-se às necessidades especiais de seus

cidadãos com deficiência (WESTMACOTT, 1985, p. 21-22).

Para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada a partir do

entendimento de que ela é que precisa ser capaz de atender às necessidades de seus membros.

O desenvolvimento por meio da educação, reabilitação e qualificação profissional das pessoas

com deficiência deve ocorrer dentro do processo de inclusão e não como uns pré-requisitos

para estas pessoas poderem fazer parte da sociedade, como se elas precisassem pagar

"ingressos" para integrar a comunidade."

A prática da inclusão social repousa em princípios até então considerados incomuns,

tais como: a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência

dentro da diversidade humana, a aprendizagem através da cooperação. A diversidade humana

é representada, principalmente, por origem nacional, opção sexual, religião, gênero, cor,

idade, raça e deficiência que é acometido.

A inclusão social é um processo que contribui para a construção de um novo tipo de

sociedade através de transformações, pequenas e grandes, nos ambientes físicos como espaços

internos e externos, equipamentos, aparelhos e utensílios, mobiliários e meios de transporte,

nos procedimentos técnicos e na mentalidade de todas as pessoas, portanto também na da

pessoa com deficiência.

Os sistemas sociais comuns em várias partes do mundo já é realidade. A prática da

inclusão começou, há cerca de 10 anos. O processo de inclusão vem sendo aplicado em cada

sistema social. Quanto mais sistemas comuns da sociedade adotar a inclusão, mais cedo se

completará a construção de uma sociedade que realmente seja para todos, dita por sociedade

inclusiva.

Para Werneck (1997, p. 21), "a sociedade para todos conscientes da diversidade da

raça humana, estaria estruturada para atender às necessidades de cada cidadão, das maiorias às

minorias, dos privilegiados aos marginalizados".

Assim, existe a inclusão no mercado de trabalho, na educação, no lazer e recreação,

nos esportes, nos transportes etc. Quando isso acontece, podemos falar em empresa inclusiva,

educação inclusiva, no lazer e recreação inclusivos, no esporte inclusivo, no transporte

inclusivo e assim por diante. Uma outra forma de referência consiste em dizermos, por

exemplo, educação, lazer e recreação, esportes, mercado de trabalho e transportes para todos.

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Segundo Werneck (1997), a menção do conceito sociedade inclusiva é de certa forma

recente nos meios especializados em assuntos de deficiência. Ele vem sendo mencionado a

partir de 1995 em traduções e textos originais em português, assim como em palestras e

reuniões que tratem de estudar o desafio da implementação das vinte e duas normas de

equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência propostas pelas Nações Unidas

em 1996. Ele é mais recente do que os conceitos de educação inclusiva, lazer inclusivo e

empresa inclusiva, os quais começaram a ser aplicados já na década de 80 nos EUA, na

Europa e em alguns outros países.

No âmbito internacional, a ONU - Organização das Nações Unidas foi provavelmente

a primeira entidade a cunhar explicitamente a expressão uma sociedade para todos , pois ela

está registrada na resolução 45/91 da Assembléia Geral das Nações Unidas, ocorrida em 1990.

Desde então os documentos da ONU vêm relembrando constantemente a meta de uma

sociedade para todos. Para tanto, foi dado ao processo de consecução da meta de uma

sociedade inclusiva o prazo de cerca de 20 anos (1991-2010). E, para apoiar ações concretas

desse porte existe o Fundo Voluntário das Nações Unidas sobre Deficiência, aprovado pela

Assembléia Geral através da resolução 40/31 (United Nations, 1997, p. 5 apud SASSAKI,

2006 p. 43).

A inclusão no sentido educacional transparece uma interpretação dúbia. Na prática, a

maioria dos educadores quando convocados a falarem sobre o termo, designam suas

explicações à inserção no sistema regular de ensino, aquelas crianças ditas "diferentes" que

apresentam impedimentos nos órgãos sensoriais ou no sistema nervoso central. Esta

interpretação baseada nas dificuldades, impedimentos e impossibilidades são vista como parte

da consciência de quase todos que trabalham em educação (MITTLER, 2003 p.63).

Corresponde á nossa cultura, a nossa experiência, acreditar que educação inclusiva se

direciona apenas a crianças portadoras de alguma síndrome ou debilitadas físicas, as crianças

ditas diferentes da maioria padronizada e homogeneizada superficialmente, sem

considerações à subjetividade. Nossa prática está alicerçada numa educação para crianças

"normais", enquanto que a própria interpretação de normalidade pode ser contraditória porque

é subjetiva.

Para Mantoan (2001, p. 107) a inclusão passa por uma mudança no modo de vermos o

outro, de agirmos para que todos tenham seus direitos respeitados. Seguindo este viés,

compreende-se que quando falamos sobre educação inclusiva não especificamos a quem, mas,

apregoamos uma educação de qualidade, comprometida com cada sujeito, de modo que não o

segregue sob nenhum pretexto ou razão. Há diversidade sim, mas precisamos olhá-la sob

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outro prisma. É a diversidade que conduz o processo ensino-aprendizagem e são as opiniões e

as divergências que impulsionam as reflexões que nos fazem crescer e amadurecer como

pessoa.

Cada educando aprende e se relaciona com os demais de maneira singular, pois traz

consigo uma história, uma ideologia. Nossas crenças e valores não se desvinculam de nós em

nenhum instante. Direcionar nossa atenção apenas a pessoas com deficiência não vai mudar o

atual sistema de ensino onde muitas crianças ainda reprovam porque não "compreenderam"

algumas equações ou não escrevem em letras cursivas.

Só podemos cultivar a inclusão numa experiência inclusiva. Só podemos cultivar uma

prática pedagógica inclusiva e para todos se assim for vivenciado, mas, para vivenciar,

precisamos buscar ou refletir sobre nossas ações, sobre nossas experiências. Cada um de nós é

responsável por compreender as regras ou princípios que conduzem sua forma de pensar. "A

rua de acesso à inclusão não tem um fim porque ela é em sua essência, mais um processo do

que um destino (MITTLER, 2003, p. 36).

O conceito de inclusão ganhou grande importância nas últimas décadas, e pode-se

dizer que, no início do século XXI, ele está na moda . Em relação à educação formal, a idéia

é que as crianças com necessidades especiais sejam incluídas em processos de educação

regular, em escolas para crianças normais . Isso significa, na prática, o fim dos espaços de

educação especial que se tornaram norma para o trabalho com crianças diferentes ao longo

de todo o século XX e ainda persistindo nesse novo século (BRASIL, 2000).

A inclusão, como movimento social, iniciou na segunda metade da década de 80, nos

países desenvolvidos. No Brasil, tomou impulso na década de 90, com a difusão das idéias da

Declaração de Salamanca (1994) e com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional (LDB) n.º 9394, em 20 de dezembro de 1996, que define Educação

Especial, no capítulo V: Da educação especial; artigo 58, como: a modalidade de educação

escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de

necessidades especiais . É este artigo que define educação especial em termos da lei e

regulamenta a prática da educação inclusiva (BRASIL, 2000).

A inclusão social constitui a mais recente prática de que se tem noticiado no campo

das deficiências, não apenas no contexto do território brasileiro como também em muitos

outros países. È um processo que paulatinamente vem substituindo a prática da integração

social, que, por sua vez, havia ocupado o lugar da segregação e da exclusão de pessoas com

deficiência. Essa ação que se tornou visível em todos os lugares e setores da vida social,

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constituindo-se o início uma mudança paradigmática, que descolou os portadores de

necessidades educativas especiais da idéia de integração rumo à inclusão social. Inclusão que

requer pertencimento, que reclama respeito, que exige direito e cobra deveres.

Para Sassaki (2006, p.41) a inclusão social é um processo pelo qual a sociedade se

adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais comuns, pessoas com necessidades

especiais e, simultaneamente, estas as preparam para assumir papéis na sociedade. A inclusão

social constitui, então, um processo bilateral no quais as pessoas, ainda excluídas, e a

sociedade busca, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a

equiparação de oportunidades.

Segundo Mantoan (2001, p. 47), inclusão é um conceito novo surgido na Europa para

definir uma sociedade que considera todos os seus membros como cidadão legítimo. É uma

sociedade em que existe justiça social, em que cada membro tem seus direitos garantidos e em

que sejam aceitas as diferenças entre as pessoas como algo normal. É um novo paradigma que

considera a diferença como algo inerente na relação entre seres humanos (MANTOAN, 2001,

p 47).

Uma perspectiva social que contempla o uno e múltiplo no processo de

desenvolvimento humano rompendo com a idéia de homogeneidade e uniformização

adotando práticas sociais e políticas em que as diferenças sejam entendidas como inerentes a

vivencia humana e não como algo exótico e nem como desvio ou desvantagem.

Como afirma Mantoan, quando diz:

[...] inclusão significa afiliação, combinação, compreensão, envolvimento, continência, circunvizinhança. Significa com inclusão quer dizer estar com o outro e cuidar uns dos outros. Inclusão significa convidar aqueles que de alguma forma têm esperado entrar e pedir-lhes para ajudar a desenhar novos sistemas que encorajem todas as pessoas a participar da completude de suas capacidades como companheiras e como membros (MANTOAN, 2001, p. 137).

A diversidade cultural apresenta diferentes recortes (negros, mulheres, homossexuais,

portadores de deficiência, índios, dentre outros) e a luta desses grupos em prol do respeito à

diferença. O desafio, no entanto, é considerem a historia e a diferença de cada grupo social e

cultural, respeitando-os nas suas especificidades sem perder de vista o diálogo a troca de

experiências e a garantia dos direitos sociais. Ou seja, o reconhecimento das diferenças não

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pode se dar de forma separada e isolada e nem resultar em práticas culturais e políticas

solitárias e excludentes.

A inclusão social implica, segundo Mantoan (2001, p. 168), na conquista do espaço

social mediante as interações que se estabelecem no interior dos grupos sociais através de

uma participação real das pessoas como membros ativos e produtivos da sociedade, o que

significa uma participação real na escola, no lazer e no trabalho.

Os defensores dessa idéia de inclusão se baseiam não no modelo médico da

deficiência, e sim, no modelo social, por meio do quais os problemas da pessoa com

deficiência não estão nela, mas na sociedade.

A inclusão social, portanto, é um processo que contribui para a construção de um novo

tipo de sociedade através de transformações, a partir do entendimento de que ela precisa ser

capaz de atender as necessidades de seus membros.

No âmbito da educação, Mantoan (2001, p.8) afirma que a inclusão institui a inserção

de uma forma mais radical, completa e sistemática de um aluno ou grupos de alunos que

foram anteriormente excluídos. A meta da inclusão é, desde o inicio, não deixar ninguém fora

do sistema escolar, que terá de se adaptar às particularidades de todos os alunos.

De acordo com a autora supracitada, inclusão não é somente uma palavra nova na área

da Educação Especial, mas sim, a mudança na compreensão do que sejam as diferenças entre

as pessoas e de como nós podemos encará-las sem medo e sem preconceito.

2.2

Histórico das campanhas institucionais e um breve resgate das políticas inclusivas

De acordo com as experiências, Sassaki (2006, p.112) identifica quatro práticas sociais

relacionadas à sociabilidade das Pessoas com Deficiência. A primeira refere-se à fase em que

a pessoa com deficiência é totalmente encarada, sem direitos e aniquilada pela sociedade,

ocorrendo à prática da exclusão. A sociedade simplesmente ignorava, rejeitava, perseguia e

explorava estas pessoas, então consideradas possuídas por maus espíritos ou vítimas da sina

diabólica e feitiçaria.

Na segunda fase, chamada prática de segregação, as pessoas com deficiência foram

tiradas da sociedade e colocadas em instituições com o objetivo de escondê-las dentro de

muros institucionais. Em relação à fase anterior, houve uma considerável evolução, pois as

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pessoas com deficiência passaram a ser vistas como capazes de produzir, surgindo assim às

escolas especiais, os centros de reabilitação e as oficinas protegidas de trabalhos profissionais.

Conforme expressa Sassaki, quando diz que:

[...] foi neste contexto que emergiu, em muitos países em desenvolvimento, a educação especial para crianças deficientes, administrada por instituições

voluntárias em sua maioria religiosas, com consentimento governamental, mas sem nenhum outro tipo de envolvimento por parte do governo. Algumas dessas crianças passaram à vida inteira dentro das instituições (SASSAKI, 2006, p. 112).

A prática de integração refere-se à terceira fase e se dá na década de 80. Neste período,

é proposta a saída da pessoa com deficiência das instituições, para que os mesmos passassem

a viver em sociedade. Isso dependia do seu esforço individual. Foram criadas as classes

especiais dentro das escolas comuns, com o intuito de não interferir no ensino das crianças

tidas como normais . Segundo Sassaki (2006, p. 34)

[...] a integração tinha e tem o mérito

de inserir o portador de deficiência na sociedade, sim, mas desde que ele esteja de alguma

forma capacitado a superar as barreiras físicas, programáticas e atitudinais nela existentes.

Na fase atual, iniciada nos primórdios da década de 90, emerge a prática da inclusão, a

partir de experiências elaboradas nos países desenvolvidos como, os EUA, o Canadá, a Itália e

a Espanha. Nesta prática é a sociedade que deve mudar para se adequar à pessoa com

deficiência, capacitando professores, adaptando escolas, prédios e transportes. Essa idéia é

proclamada em 1994 na Espanha na Declaração de Salamanca, e tem como princípios à

aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência dentro da

diversidade humana, a aprendizagem através da cooperação (SASSAKI, 2006 p. 41 -42).

O percurso histórico da fase de exclusão à inclusão indica processos de movimentos

da sociedade civil através dos pais, das comunidades e das instituições. Porém, pode-se

perceber o desprezo do estado com a pessoa com deficiência, uma vez que as primeiras

ajudas

foram advindas da igreja e das instituições filantrópicas que tinham um caráter

assistencialista e caritativo.

No século XIX, no Brasil, foram criadas algumas organizações de serviços que

atendiam a cegos, surdos, deficientes mentais e físicos. No período de 1854 a 1956, criam-se

instituições de apoio as Pessoas com Deficiência, como: Imperial Instituto dos Meninos

Cegos (RJ) em 1854; Imperial Instituto dos surdos-mudos (RJ), em 1857; Instituto Benjamim

Constant 1854; Instituto Pestalozzi de Canoas (Porto Alegra/RS), em 1926; Lar-Escola para

portadores de deficiência física São Francisco (SP), em 1943; Associação de Assistência às

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Crianças Defeituosas

AACD (SP), em 1950 e a Associação de Pais e Amigos Excepcionais

APAE (RJ), em 1954.

A implementação da primeira campanha para o atendimento a Pessoa com deficiência

a nível nacional, pelo Governo Federal, foi a Campanha para a Educação do Surdo

Brasileiro (CEBS) em 1957, instalada no Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Rio

de Janeiro, que tinha por finalidade, segundo Mazzotta (2005, p. 49-50), promover, por todos

os meios a seu alcance, as medidas necessárias à educação e assistência, no mais amplo

sentido, em todo o Território Nacional.

A segunda campanha, criada em 1958, foi a Campanha Nacional de Educação e

Reabilitação de Deficientes da Visão, junto com a direção do instituto Benjamim Constant no

Rio de janeiro. E em 1960 tem uma nova denominação, Campanha Nacional de Educação de

Cegos (CNEC), que passou a ser vinculada ao Gabinete do Ministro da Educação e Cultura, e

desenvolveu atividades como:

[...] treinamento e especialização de professores e técnicos no campo da educação e reabilitação de deficientes visuais, incentivo, produção e manutenção de facilidades educacionais, incluindo equipamentos, livros, auxílios ópticos e materiais para leitura e escrita, além da assistência técnica e financeira aos serviços de educação especial e reabilitação (MAZZOTTA, 2005 p. 51).

A terceira campanha, criada em 1960, foi a Campanha Nacional de Educação e

reabilitação de Deficientes Mentais (CADAME), influenciada pela Sociedade Pestalozzi e

Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais e apoiadas pelo Ministro da Educação e

Cultura, que tem por finalidade, conforme Mazzotta (2005, p.52), promover, em todo o

território nacional, a educação, treinamento, reabilitação e assistência educacional das

crianças retardadas e outros deficientes mentais de qualquer idade ou sexo.

O ano de 1981 foi considerado o Ano Internacional da Pessoa com Deficiência, pela

ONU, com significativa repercussão para novas articulações e mudanças de paradigmas. Em

1986, foi criada a CORDE, Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de

Deficiência, sendo um órgão autônomo, administrativo e financeiro, vinculado ao Gabinete

Civil da Presidência da República. E ainda neste mesmo ano o CENESP é substituído pelo

SESP, Secretaria de Educação Especial.

Em 1988, a promulgação da nova Constituição Brasileira vem dar a todas as pessoas

direito à Seguridade Social, à educação, entre outros, especialmente à pessoa com deficiência,

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através do Capítulo VIII, Inciso IV da CF a habilitação e reabilitação das pessoas

portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária .

No dia 13 de Julho de 1990, foi criada o ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente,

com a intenção de garantir a todos os direitos a eles assistidos, inclusive aos portadores de

deficiência, colocando em seu Artigo 54, que é dever do Estado assegurar à criança e ao

adolescente, atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,

preferencialmente na rede de ensino .

Contudo, ainda percebemos as dificuldades que as pessoas com deficiência têm para

serem inseridas numa sociedade tão contraditória e excludente com castração dos seus direitos

que são garantidos e assegurados por leis. Mas contrariando esse senso comum, existem

correntes que se formaram ao longo dos tempos em defesa desses direitos, que são reforçadas

através das entidades afins, instituições, centros e a própria academia com serviços

especializados. No texto a seguir faremos um breve resgate acerca de importantes instituições

e serviços existentes no município de João Pessoa, que prestam serviços de relevância para

esse segmento social.

3.3 Processos de inclusão no município de João Pessoa

Neste tema apresentaremos um breve resgate sobre a crescente expansão das

instituições e dos serviços que envolvem a educação especial em nosso município, partindo da

década de 80 até os dias atuais. Levando em consideração a ordem cronológica do surgimento

dos serviços, instituições e fundações que ora são citadas, como: a Educação Especial na

UFPB (1980, 1990, 2003); Biblioteca Braile (1980); Sistema Universal Verbonal de Audição

Guberina SUVAG (1983); Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiente

FUNAD (1989); Núcleo de Educação Especial

NEDESP/UFPB (1990); Comitê de Apoio

aos Estudantes Portador de Necessidades Especiais

COMPORTA ESPECIAL (2003);

Centro de Atividades Especiais Helena Holanda

CAEHH (2005); APAE/PB,

PESTALOZZI, Centro de Referência e Inclusão para Pessoas Deficientes

CRIPD (2006)

(HOLANDA, 2007, p. 68-89).

Data de 1945 as atividades pioneiras da Fundação para o Livro do Cego no Brasil,

para suprir as necessidades de livros para estudantes e pessoas cegas9. Na mesma década foi

9 FUNDAÇÃO DORINA NOWILL PARA CEGOS, ANTIGA Fundação para o Livro do Cego no Brasil, foi oficialmente fundada em 11 de março de 1946, pela iniciativa da professora Dorina de Gouvêa Nowill e da Sra.

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inaugurada oficialmente em 29 de abril de 1947, a biblioteca do Centro Cultural São Paulo10

que conta com cerca de 140 usuários em todo o país - é composta por aproximadamente 6.500

títulos. É a maior do gênero no Brasil. O acervo de livros abrange obras de referência, ficção,

literatura brasileira e portuguesa, literatura infantil, além de periódicos nacionais e

estrangeiros.

Esta biblioteca foi criada por Dorina Nowill, com intuito de suprimir a necessidade de

se transcrever, para o sistema, os livros que compunham o acervo da Biblioteca Infanto

juvenil Monteiro Lobato. Possibilitou pela primeira vez no país, que crianças com deficiência

visual tivessem um acervo especializado destinado a elas. Na UFPB, o acervo que se

encontra na biblioteca central, foi a primeira iniciativa da educação especial para alunos

cegos. Construída em 1980, contemplou através de um setor de braile alunos cegos,

permitindo assim uma maior interação com os livros e o saber (HOLANDA, 2007 p. 87).

As entidades de cunho não governamental ganharam força, aliados e espaços públicos

para se expandirem. Nos anos 1980, no Brasil, as pessoas surdas também são priorizadas, com

instituições voltadas para elas, por força de um movimento que teve início ainda na década de

1950. E João Pessoa não ficou fora deste contexto, aderiu o que se considera um trabalho de

grande credibilidade direcionado as pessoas com deficiência auditiva

o Sistema Universal

Verbonal de Audição Guberina / SUVAG.

O SUVAG foi divulgado em 1954 pelo professor de línguas estrangeiras, lingüista e

foneticista o iugoslavo Peter Guberina. A partir daí, a Metodologia Verbotonal11 vem sendo

utilizada em mais de 3000 centros espalhados por diversos paises, filiados ao centro SUVAG

Internacional, com sede em Zagrev, Croácia. No Brasil, o Centro SUVAG é uma respeitada

instituição de caráter cientifico e integrador dos quinze centros com a mesma denominação

registrados no nosso país. Em nosso município, este centro teve seus primeiros passos na

década de 80, por iniciativa de um grupo de pais de crianças surdas. Funcionou na Avenida

Santa Catarina, Bairro dos Estados, onde começou o trabalho para a criação, que se deu em 02

de março de 1983, sob o registro no. 42.746, tendo sido, porém fundada em 1984.

O SUVAG nasceu com fins de desenvolver programas de recuperação e reeducação

auditiva, estudo de foniatria, de logopedia e de pesquisas da educação de pessoas com

Adelaide Reis Magalhães, com a colaboração de um grupo de voluntários. Disponível em http://www.fundacaodorina.org.br. Acesso em out/2007. 10 [email protected]. In 2004, agenda da Revista dos Sentidos, Ed. 40, p.200. 11 Um método de educação da audição e linguagem que a partir da estimulação da motricidade, da afetividade e de todos os canais sensoriais, inclusive, e, principalmente, o auditivo, objetiva criar condições para que a expressão oral aconteça através de uma fala o mais natural possível. Disponível em http://www.arpef.org.br/htms/metodo_verbo.htm#metodo. Acesso em Out. 2007.

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deficiência auditiva e da fala. O referido serviço tem sua sede no Campus I da UFPB

Universidade Federal da Paraíba. Esta aquisição se deu no ano de 1984, por conta de um

convênio entre estas instituições, ainda na gestão do reitor Berilo Borba que também era

integrante do Lions Clube de João Pessoa. De acordo com a Profa. Benedita Dutra, diretora

do serviço. [...] foi realmente registrada em 1984. Foi instalado na Universidade, inclusive o

prédio já foi construído com este objetivo. Foi justamente por força do convênio SUVAG e

UFPB que funciona na UFPB.

O Núcleo de Educação Especial da UFPB foi fruto do trabalho desenvolvido no Setor

de Educação Especial do Centro de Educação, pela necessidade de atendimento apresentado

por alunos universitários deficientes visuais, no campus I, a partir de 1977. Segundo consta no

Manual do NEDESP (1997), a disciplina Educação de Excepcional é ministrada no curso de

Pedagogia desde 1976, por professores especialistas na área de visão. A repercussão deste

trabalho levou o Departamento de Fundamentação Pedagógica (atual Centro de Educação) a

reestruturar-se e apoiar novos investimentos no setor de educação especial (HOLANDA,

2007, p. 85).

A criação do NEDESP deu-se em conseqüência das ações de atenção e defesa dos

direitos, em prol das pessoas com deficiência. Sua criação se deve ao empenho da equipe de

professores responsáveis pela área de Educação Especial do Centro de Educação e às

professoras: Helena Ferreira e Maria da Piedade Resende da Costa, que elaboraram projetos

com seus subprojetos de atendimento psicopedagógico, nas áreas visual e mental e de

problemas de aprendizagem. Além disso: Elaborou o regimento interno do Núcleo de

Educação Especial que foi aprovado pelo Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão

CONSEPE em 17.05.1990, através da resolução no. 09/90, no Reitorado do Professor José

Jacson Carneiro de Carvalho (HOLANDA, 2007, p. 85).

Na dissertação de Holanda (2007) a atual coordenadora do NEDESP, Profa. Dra.

Janine Marta Coelho Rodrigues e outros, fizeram um relato de que apesar da resolução para

aprovação do referido núcleo ter acontecido em 1990, desde 1988, o núcleo vem

desempenhando ações concretas à comunidade. Segue seu relato, fazendo referência a

estrutura e o inicio do seu funcionamento. Segue o transcrito da entrevista:

[...] o NEDESP começou como uma parte do departamento de educação. Em 1988 foi construído esse prédio inteiro, essa frente do lado direito para escola de música e a frente do lado esquerdo para essa mata tão bonita, para funcionar o Núcleo de Educação Especial. A princípio, o núcleo foi ligado ao centro de educação e pertencia ao centro de habilitação pedagógica através da disciplina de Educação Especial. Nos anos de 1988

1989, houve

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um empréstimo dessa parte final do NEDESP ao SUVAG, o tempo foi passando e o SUVAG ficou aí. Nós ficamos com uma parte e meia do NEDESP funcionando e o SUVAG com aparte restante, mas o SUVAG não tem nada a ver com o NEDESP (HOLANDA, 2007, p. 85).

O NEDESP, assim como todo o departamento da universidade, oferece ensino,

pesquisa e extensão, mas o que oferece de mais peculiar é o aprofundamento na educação

especial para o curso de Pedagogia e para os diversos cursos da universidade que realizam

pesquisas e se utilizam de sua biblioteca especializada. O referido núcleo não tem fins

lucrativos, oferece à comunidade atendimentos em grupo ou individualizado. Também conta

com um trabalho especializado para os alunos cegos, projetos voltados para alunos surdos,

mercado de trabalho e assessoria educacional. Reforçado pela coordenadora quando diz que

[...] o NEDESP vai alem das ações da educação especializada. Com um leque de projetos se

estende também ao Hospital Universitário Lauro Wanderley e às alunas mães do turno da

noite.

Portanto, qualquer seguimento educacional que queira ser inclusivo necessita de sua

própria política de inclusão, para que ela se concretize. O NEDESP se apresenta como um

núcleo da UFPB comprometido com a educação especial e a inclusão social. Trabalha na

perspectiva direta de atender às necessidades especificas dos alunos universitários com

deficiência, capacitar a geração atual docente para atuar na educação especial, na formação

para professores da rede comum e especializada de ensino, entre outros desafios que torne o

aluno mais inclusivo.

Com iniciativa da professora Iguatemi Lucena, que era pró-reitora da UFPB, surgiu

em 28 de novembro de 2003, o COMPORTA através da portaria R/GR/No. 069/2003. É mais

um organismo que se soma às iniciativas existentes na instituição, no âmbito da educação

especial. Assim a profa. Benedita Marta coordenadora do COMPORTA, discorre quando

aborda sua criação:

[...] a idéia surgiu com intuito de juntar, fazer um trabalho onde se verificasse o setor de educação especial que já existia dentro da universidade e trabalhava isoladamente. Então o objetivo primeiro era juntar esses setores formando o COMPORTA ESPECIAL para que pudéssemos trabalhar juntos e melhor, em prol dos estudantes portadores de necessidades especiais da graduação (HOLANDA, 2007, p. 82).

Analisando o cenário da educação especial, Rodrigues (2006, p. 48) afirma que a

omissão do poder público em relação à Educação Especial resultou no fortalecimento da

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abertura de serviços de iniciativa privada, para absorver o contingente de pessoas com

deficiência que não conseguem atendimentos nos serviços oferecidos pelo estado. O Centro

de Atividades Especiais Helena Holanda - CAEHH, atualmente sem fins lucrativos, foi uma

dessas iniciativas na grande João Pessoa. Sua criação foi fruto do trabalho de mais de 30 anos

da educadora física e atual presidente Helena Maria Duarte de Holanda. Que também,

desenvolveu trabalhos relevantes, na APAE/PB, Pestalozzi/PB e FUNAD. Por ocasião da sua

aposentadoria, dedicou-se mais ainda a causa da pessoa com deficiência, abrindo inicialmente

uma academia com fins lucrativos, direcionada para esse segmento social na perspectiva da

inclusão social. Desde 2000 até os dias atuais o CAEHH transforma-se em uma Organização

Não Governamental sem fins lucrativos.

O Movimento das APAEs é o maior movimento filantrópico do Brasil e o segundo

maior do mundo. Este movimento deu origem às diversas APAEs do Brasil, como também

em João Pessoa, quando: Aos vinte e nove dias do mês de março do ano de 1957, ás vinte

horas e trinta minutos, na residência do senhor José Régis [...] teve lugar a reunião de

instalação provisória da associação de Pais e Amigos dos Excepcionais da Paraíba [...] Os

sócios fundadores efetuam depósito inicial para despesas de impressão dos Estatutos, ficha de

sócio e talões de recibo, e é a professora Olívia Pereira que recebe o título honorário. Assim

começou a APAE (HOLANDA, 2007, p.38).

Atualmente a APAE é dirigida pelo Sr. Ivaldo Araújo e a instituição conta com um

quantitativo de pouco mais de quatrocentos alunos. Seus serviços têm como base três tipos de

atendimento: clínico, escolar e educação profissional. O clínico está diretamente ligado à

reabilitação; o escolar é reconhecido pelo conselho de educação, em condição de escola

regular de ensino e a educação profissional é oferecida através de oficinas de informática,

tecelagem, jardinagem, horta e artes que também se amplia á comunidade desde que apresente

algum déficit de algum aprendizado.

A criação da escola na APAE-JP se confunde com a fundação12 dessa instituição,

porque o propósito inicial do grupo de pais fundadores foi criar um espaço que possibilitasse

a escolarização de seus filhos, deficientes mentais. Isto aconteceu no ano de 1957. Mais tarde

a escola teve sua primeira autorização de funcionamento em Educação Infantil e Ensino

Fundamental, na modalidade educação especial, expedida em 17 de outubro de 2002 como

Escola de Educação Especial.

12 ARAUJO, Rosália Maria Lins, 2006 - http://www.apaejp.org

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A sociedade também tem um papel relevante nesses benefícios efetivados em relação

às pessoas com deficiência. O surgimento de escolas especializadas governamentais é uma

resposta a esses atos da sociedade, transformadas em leis, ainda que de modo tímido, vêm a

garantir o direito fundamental de educação, minimizando, assim, a exclusão educacional.

Durante o governo de Ernani Sátyro (1971-1975), cumpre-se a Lei Federal 72.425 de

03 de julho de 1973 que determinava que a educação especial no Brasil fosse implantada,

ficando a cargo do CENESP - Centro de Educação Especial, a estruturação nas unidades

federais, inclusive na Paraíba.

Dois meses após este ato, criou-se em três de setembro de 1973 a primeira escola de

Educação Especial do Estado, ligada á Secretaria de Educação e Cultura do governo, na

gestão do então secretário Carlos de Freitas, a quem coube autorizar a criação da referida

escola de Educação Especial. A escola foi criada com o objetivo de dar assistência às crianças

portadoras de deficiência mental (HOLANDA, 2007, p. 51).

A primeira Sociedade PESTALOZZI do Brasil foi fundada na cidade de Belo

Horizonte, Minas Gerais, em novembro de 1932, iniciando assim o movimento

PESTALOZZI brasileiro. Este movimento totaliza atualmente cerca de 100 instituições

espalhadas por todo o país, cuja missão é contribuir para a melhoria da qualidade de vida,

através de ações que valorizem o ser humano, tendo como objetivo criar o maior número

possível de escolas para as crianças excepcionais.

A responsável por esse movimento no Brasil foi a grande pesquisadora e educadora, a

professora Helena Antipoff, que implantou, no país, uma política de educação e assistência á

criança portadora de deficiência mental. A PESTALOZZI em João Pessoa, também integrante

do movimento PESTALOZZIANO, foi fundada no ano de 1977, no governo do Sr. Ivan

Bichara Sobreira, e teve como primeira presidente a senhora Josete Campos.

Como providencia para funcionamento da Sociedade Pestalozzi da Paraíba, a Senhora

Myrtes Bichara conseguiu o prédio da antiga Escola de Formação de Oficiais da Policia

Militar do Estado, onde se manteve em funcionamento somente até 1986. No ano de 1986,

voltou a funcionar com a ajuda do governo Burity. A primeira dama do Estado, D. Glauce

Burity empenhou-se na sua reabertura, passando a funcionar no Bairro do Cristo, onde ainda

funciona nos dias atuais (HOLANDA, 2007, P. 52

54).

A Prefeitura Municipal de João Pessoa criou o Centro de Referência Municipal e

Inclusão para Pessoas com Deficiência

CRMIPD, antiga instalações do Centro de Educação

da Paraíba LTDA. Sendo dado continuidade parte das atividades de reabilitação, lúdicas e

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educacionais voltadas para pessoas com deficiência nas áreas motora, mental visual e

audiocomunicação.

3.4 À FUNAD como lócus da pesquisa

No que se refere às práticas institucionais a Fundação Centro Integrado de Apoio ao

Portador de Deficiência

FUNAD é uma instituição de referência no Estado da Paraíba.

Segundo os documentos, de possível acesso na instituição, de inicio a Fundação recebeu o

nome de Centro Integrado de Apoio ao Deficiente da Paraíba

CIAD/PB. Depois passou a

ser chamada de Fundação Centro Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência. A referida

instituição teve a contribuição do Governo Estadual, através do Governador Tarcisio Burity,

na época, das próprias pessoas com deficiência e de algumas associações e representações da

pessoa com deficiência.

Holanda (2007, p. 71) faz referência que inicialmente esta instituição foi registrada

com a denominação de Centro Integrado de Apoio ao Deficiente - CIAD. Na época, sob a

gestão da Profa. Benedita Freire, presidente, e da Profa. Dra. Janine Marta Coelho Rodrigues,

vice-presidente da referida instituição, por um período de aproximadamente quatro anos. Por

questões políticas acrescentaram o termo Fundação, sem alterar sua proposta inicial de

criação. Assim continua sendo um órgão estadual representativo da educação especial no

estado da Paraíba. Compete a FUNAD, para o atendimento desta Resolução, gerenciar,

planejar, coordenar e promover o desenvolvimento da Educação Especial em todo o território

estadual, em consonância com a SEESP / MEC, (PARAIBA. Secretaria da Educação e

Cultura /Conselho Estadual de Educação, Resolução No. 285 / 2003 e Parecer No. 343 / 2003.

João Pessoa, 2004).

A atual presidente da FUNAD é a assistente social Sra. Maria de Fátima Ribeiro Lira,

por três gestões, todas no governo da família Cunha Lima. A criação da FUNAD significou

uma resposta do estado ao incansável processo de lutas e reivindicações emanadas das

pessoas com deficiência, ao longo dos anos, fortalecidas pelos movimentos associativistas.

(HOLANDA, 2007, p. 72).

A FUNAD é um órgão disseminador da política de educação especial do Ministério da

Educação na Paraíba e tem o compromisso de apoiar todas as instituições de educação

especial, escolas de um modo geral (privada ou pública). Cabe a mesma um papel

preponderante, na luta pela inclusão social das pessoas com deficiência e no assessoramento

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para a educação inclusiva nas escolas. Porém, muitos não atentam para a sua finalidade e não

a buscam ou solicitam seus serviços. Desconhecem que todas as escolas do estado, privadas,

organizações não governamentais, tem direito esse direito (Diretora da Escola Ana Paula,

2006 apud HOLANDA, 2007, p. 72).

Segundo textos exposto no Folder (2003), a FUNAD foi criada pela Lei no. 5.208 de

18/12/1989, tendo como atribuição básica: habilitar, reabilitar, ações profissionalizantes e

inserir no mercado de trabalho, portadores de deficiência, bem como desenvolver programas

de prevenção e capacitação de recursos humanos. Gerencia, ainda, as ações de educação

especial em todo o estado. Atende os portadores de deficiência mental, visual, auditiva,

múltipla, acidentado de transito, de trabalho, seqüelados de hanseníase e portadores de

necessidades educativas especiais.

Possui uma área de 33.678,00 m2, sendo 13.028,00 m2 de área de construção, com

8.891,00 m2 de área de cobertura, dividida em dois pavimentos. O térreo possui: auditório

para duzentas pessoas, biblioteca, oficinas, cozinha/refeitório, ambulatório médico-

odontológico, praça de recreação, área administrativa. No pavimento superior (área

administrativa, coordenadorias de atendimento a pessoa com deficiência visual, mental, física,

auditiva, Escola Ana Paula e duas piscinas térmicas).

A FUNAD é uma organização de natureza governamental, de âmbito estadual, cujo

objetivo é integrar o portador de deficiência (visual, mental, auditivo, físico e múltiplo) na

sociedade e no mercado de trabalho, assim como proporcionar aos mesmos todo e qualquer

tipo de apoio: saúde, educação, lazer, cursos profissionalizantes, ou seja, tudo que o a pessoa

com deficiência necessita para a sua reabilitação e para a sua inclusão no mercado de

trabalho, como também na sociedade como um todo.

A referida fundação recebe recursos financeiros do Governo Estadual e Federal, via

SUS. O apoio do Estado se dá através das Secretarias da Saúde, da Educação, do Trabalho e

Serviço Social, da Justiça e Cidadania. Recebe o apoio também da Prefeitura e de

Organizações Nacionais, como a CORDE (Coordenadoria Nacional para a Integração da

Pessoa Portadora de Deficiência) e o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento

Educacional).

Como visto, a FUNAD representa um órgão de grande porte em termos de estrutura

física e no que se refere ao atendimento das pessoas com deficiência na grande João Pessoa e

no Estado como um todo. Justificada pela diversidade de atribuições e serviços que a mesma

presta a esse segmento social da população.

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91

A Fundação, ao lado do seu corpo técnico-administrativo e de apoio, vem

desenvolvendo um trabalho de habilitação, reabilitação e capacitação profissional junto às

pessoas com deficiências, como também, vem desenvolvendo programas de prevenção da

deficiência através de vários serviços.

A Coordenadoria de Triagem e Diagnóstico - CORDI, é a porta de entrada da

instituição, onde é realizada a triagem diagnóstica através da equipe sistêmica do serviço

(enfermagem, serviço social, psicologia, pedagogia, clinica médica, neurologia, pediatra,

fisioterapia e fonoaudióloga e outros especialistas conveniados). Com finalidade de

esclarecimento da hipótese diagnóstica nos comprometimentos motor (física), mental, visual,

auditiva e múltipla. A seguir apresentaremos aqui a disponibilidade deste serviço dentro de

uma rotina comum de atendimento.

Os usuários, como assim são denominados, chegam à instituição por

encaminhamentos de especialistas. Inicialmente onde inicialmente se dirigem à CORDI, com

xérox dos documentos de identificação para triagem com equipe de multiprofissionais.

Dependendo do que o usuário necessita, é feita uma marcação de consulta com os

profissionais que contemple as suas necessidades. Dentro do protocolo da instituição, o

prontuário, é considerado o documento de base para a identificação deste usuário. Após

consultas com os profissionais da equipe, promove-se um estudo de caso, que geralmente tem

um dia determinado da semana. Nele, são analisados os prontuários pela equipe responsável

pelo estudo de caso. Dependendo das análises dessa equipe, os usuários são encaminhados

para uma ou mais coordenadorias correspondentes às suas necessidades educacionais, de

reabilitação ou aquisição de documentos.

Quando chegam às coordenadorias fins, passam por um processo de avaliação e

programação terapêutica especializada com equipe multiprofissional, e ficam no serviço

geralmente por um tempo prolongado, numa média de seis meses, até que a equipe que o

acompanha, através das reavaliações e evoluções específicas, definia sua alta.

A FUNAD tem uma diversidade de serviços, e, segundo as estatísticas da diretoria

técnica, os atendimentos mensais chegam a uma média de 22.000 (vinte e dois mil) por mês

(HOLANDA, 2007, p. 72).

As coordenadorias que podem receber esses usuários são citadas a seguir e no anexo

dessa dissertação (um Folder da FUNAD, com as denominações, especificidades e finalidades

dos serviços prestados por cada coordenadoria e núcleos). Portanto, temos as coordenadorias:

a Coordenadoria de Atendimento a Portador de Deficiência Mental - CODAM; a

Coordenadoria de Atendimento ao Portador de Deficiência de Áudio-Comunicação -

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CODAPA; a Coordenadoria de Atendimento ao Portador de Deficiência Visual - CODAVI; a

Coordenadoria de Atendimento ao Portador de Deficiência Mental - CODAM; a

Coordenadoria de Atendimento ao Portador de Deficiência Física - CODAFI; a

Coordenadoria de Treinamento, Produção e Apoio Profissionalizante - CORPU; a

Coordenadoria de Educação Integrada - CODEI; a Comissão Permanente de Prevenção das

Deficiências - COPRED.

Além das coordenadorias já citadas, a FUNAD dispõe de assessorias e núcleos que

dão suporte e complementam os outros serviços, tais como: a AEE

Assessoria de Educação

Especial; a ADPD

Assessoria de Defesa dos Direitos dos Portadores de Deficiência; o NED

Núcleo de Educação Física e Desportos; o NVA

Núcleo de Vivência e Artes e a Escola

Estadual Ana Paula, destinada à Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental de

alunos com deficiência mental e alunos surdos.

Por fim, em termos de estrutura física, de recursos humanos e serviços oferecidos, é

uma referência no Estado no sentido da prestação de serviços não só no processo da cura e

reabilitação. A FUNAD dentro do seu planejamento e programações tem a finalidade de

atender nos níveis de atenção à saúde de acordo com o que preconiza as políticas de Saúde

Federal via Sistema Único de Saúde - SUS.

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CAPÍTULO 4

PERFIL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA FRENTE AO LÓCUS DA

PESQUISA E SUAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS NO CONTEXTO

EXCLUSÃO/INCLUSÃO E CIDADANIA

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Tendo como foco de análise as representações sociais das pessoas com deficiência,

buscamos apreender as suas manifestações a partir de suas falas e ações, no contexto da

vivência no interior da instituição FUNAD, sobretudo as condições subjetivas que essa

vivencia desperta. Nosso objetivo foi de, através da análise de conteúdo com a técnica de

categorização, percebermos de que forma se expressa a representação social da pessoa com

deficiência frente à exclusão/inclusão.

De acordo com Jodelet (2001, p. 120) conhecer as representações dos sujeitos que

vivem uma determinada situação nos possibilita ainda compreender as manipulações do

cotidiano programado nesta situação. É no cotidiano que as representações imperam e é

através delas que identificamos o papel estipulado para cada coisa.

O processo de estabelecer categorias diz respeito ao ato de classificar elementos que

constituem um conjunto, diferenciação e depois por reagrupamento segundo o gênero, com os

critérios definidos previamente. As categorias configuram-se em classes que reúnem um

grupo de elementos sob um título genérico, sendo esses agrupamentos organizados em razão

dos seus caracteres comuns. Categorizar é um processo que implica duas etapas: o inventário,

que corresponde ao isolamento dos elementos, e a classificação, que implica repartir os

elementos, buscando organizar as mensagens (BARDIN, 1988, p. 117).

O objetivo primeiro da categorização é apresentar, por condensação, uma

representação simplificada dos dados brutos. Esse processo pode se dar de duas maneiras,

uma em que o sistema de categorias é estabelecido previamente e os elementos são repartidos

à medida que vão sendo encontrados; outra maneira ocorre quando o sistema de categorias

não existe previamente, resulta da classificação analógica e progressiva dos elementos.

Considerando o objeto de estudo, os objetivos, bem como os encaminhamentos

metodológicos utilizados e, em especial os dados obtidos, foi necessário, segundo a proposta

de análise de Bardin, procedermos com o isolamento dos dados alcançados em agrupamentos

genéricos, para efetuar a posterior categorização.

Distribuiremos aqui, as categorias selecionadas a partir dos dados que obtivemos por

meio das entrevistas, que foram classificados e agrupados em elementos de análise, a partir de

dois eixos temáticos: o primeiro relativo à participação da pessoa com deficiência frente à

FUNAD, com os seguintes tópicos: dificuldades escolares; razões de buscar a FUNAD e

serviços oferecidos pela FUNAD. O segundo eixo temático trata de questões direcionadas ao

objeto do conhecimento da pesquisa que é a representação social da pessoa com deficiência

frente à exclusão/inclusão, sob a investigação nos seguintes tópicos: conceito de inclusão;

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conceito de cidadania; relação cidadania e pessoa com deficiência; participação cidadã da

pessoa com deficiência na sociedade; sentimento enquanto cidadão e direitos de cidadania.

A nominação e categorização dos fenômenos obtidos foram feitas através dos dados

pela observação minuciosa. Linha por linha, parágrafo por parágrafo, se compararam

constantemente os fenômenos que se foram apresentando na fala dos entrevistados, evitando-

se que aqueles fenômenos semelhantes fossem codificados com o mesmo nome. Os números

que se apresentam à frente de cada trecho selecionado correspondem ao número atribuído a

cada entrevista, ou seja, a cada pessoa com deficiência que foi entrevistado na FUNAD.

Mantivemos integralmente a linguagem utilizada pelos participantes, e, em alguns

casos, os esclarecimentos pertinentes antes da entrevista que pudessem esclarecer as dúvidas

sobre os itens do roteiro da entrevista. Foram atribuídos em todos os entrevistados números

por ordem das entrevistas.

4.1 Perfil da pessoa com deficiência frente ao lócus da pesquisa

Com relação ao primeiro eixo da entrevista, foi estabelecido um perfil das pessoas

com deficiência, estipulando-se para cada uma, numeração de um (01) a sete (07) pela ordem

cronológica das entrevistas, conforme ilustração abaixo.

De acordo com o perfil dos sete entrevistados, observamos que a faixa etária foi entre

24 a 64 anos; O sexo e as deficiências que foram acometidos distribuíram-se da seguinte

forma: um do sexo masculino com deficiência visual e seis do sexo feminino com deficiência

motora.

De acordo com as respostas dos entrevistados no que se refere à instituição,

destacamos duas categorias: razões de buscar a FUNAD e os serviços oferecidos por essa

instituição. Essas categorias surgiram pela importância dessa instituição no contexto da

pesquisa, tendo em vista que os usuários que participaram deste estudo encontram-se na

instituição há um tempo considerável podendo apreciar ou não os serviços realizados na

mesma. Foram direcionadas aos entrevistados as seguintes indagações: O que levou você a

procurar esta instituição? Quanto tempo está na mesma? Você conhece todos os serviços

disponíveis na instituição? O referido serviço atende às suas necessidades? Os serviços

oferecidos melhoraram em algum aspecto a sua vida? Qual (is)? O que você poderia sugerir

para melhorar o atendimento nesta instituição?

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QUADRO 1 - Distribuição dos usuários entrevistados na FUNAD.

IDADE

SEXO/ IDADE

PESSOA COM DEFICIENCIA

GRAU DE INSTRUÇÃO

ESCOLA QUE FREQUENTOU

PROFISSÃO

No. 01 F/35 D. Motora SUPERIOR PÚBLICA

ASSISTENTE SOCIAL

No. 02 45 F/45 D. Motora

ENSINO BÁSICO

INCOMPLETO PÚBLICA

APOSENTADORIA (BENEFÍCIO)

No. 03

64 F/64 D. Motora

ENSINO MÉDIO COMPLETO PÚBLICA APOSENTADORIA

(BENEFÍCIO)

No. 04

49 F/49 D. Motora NÃO ESTUDOU - APOSENTADORIA

(BENEFÍCIO)

No. 05

49 F/48 D. Motora

ENSINO MÉDIO COMPLETO PÚBLICA

APOSENTADORIA (TEMPO DE SERVIÇO)

No. 06

49 M/49 D.Visual SUPERIOR PRIVADA E

PÚBLICA FISIOTERAPEUTA

No. 07 24 F/24 D. Motora

ENSINO MÉDIO COMPLETO

PÚBLICA TÉCNICA DE ENFERMAGEM

Fonte: Dados da Pesquisa coletados a partir das entrevistas.

De acordo com o demonstrado no quadro acima, no que se refere ao tipo de escola que

freqüentou, ao grau de instrução, profissão e as dificuldades escolares na época que estudou,

foi observado ser a escola pública o local onde houve uma maior concentração dessa

população, pois todos estudaram em escolas públicas e o entrevistado número seis estudou

também em escola particular. Quanto ao grau de instrução, o respondente número quatro não

estudou e segundo seu relato Não, nunca estudei, pois tinha dor de cabeça e desmaiava e

meu pai não deixou eu estudar;

e recebe o beneficio13; o número dois possui ensino básico14

incompleto e também recebe beneficio. Têm ensino médio completo os entrevistados de

numero seis e cinco que recebem aposentadoria, e o numero sete que tem o curso técnico de

enfermagem, mas ainda não trabalha. Concluíram o ensino superior os números um e seis, os

quais exercem, respectivamente, a profissão de serviço social e fisioterapia.

Quando questionados se haviam tido dificuldades na época em que estudavam os

números dois, três e cinco responderam que não. Ressaltamos que, de acordo com sua fala

transcrita, os citados três e cinco não apresentavam a deficiência motora na época, sendo

adquirida posteriormente.

13 O benefício de prestação continuada é um benefício no valor de um salário mínimo

garantido pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 203, inciso V para a pessoa portadora de deficiência sem limite de idade e ao idoso com mais de 67 anos, que comprovem não ter condições econômicas de se manter e nem de ter sua subsistência mantida por sua família. www.entreamigos.com.br/textos/direitos/bepreco.htm. 14 Antigo ensino primário

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No que se refere às dificuldades elencadas, observamos na fala transcrita do número

um: Sim, com certeza. A questão da tão famosa inclusão falada hoje né... é que na época de

[...] de escola nem toda a escola me aceitava pela minha deficiência . Percebemos uma ênfase

na sua afirmação, a valorização da inclusão nos dias atuais que comparada com a época (final

dos anos 80 e anos 90) em que se encontrava inserida nas etapas do ensino formal até a

conclusão do ensino superior. Demonstrou a dificuldade de ser inserida na escola por ser uma

pessoa com deficiência.

Portanto, a exclusão e a discriminação apresentam-se de forma clara numa época em

que a inclusão começava a se pronunciar à luz das prerrogativas da Constituição de 1988. Isso

foi observado também na fala do respondente número seis, quando diz:

[...] Primeiro e segundo grau tinha visão boa, é entrei na faculdade de engenharia tive um problema de vista que foi se agravando, tive que trocar para o curso de fisioterapia, onde fiz o curso com metade tendo a visão e a outra metade quando perdi a visão. Tendo muita dificuldade depois da perda da visão. Como por exemplo: fazer as provas que não tava preparada pra perda da visão, locomoção para ir para faculdade, é aquisição de material, tinha que gravar fitas, fazer provas orais, tive muitas dificuldades (entrevistado no. 06).

Observamos já a falta de preparo da própria academia, no que se refere à inclusão e as

adaptações pedagógicas necessárias para a adaptação em sala de aula. Por fim, a usuária de

número sete apresentou a seguinte situação:

[...] Em termos de deficiência, não. Mas tinha alguns colegas de sala que às vezes criticavam, ficavam dizendo uma coisa e outra. Mas que também, e esse fato não me prejudicou, não me levou a ter problema, não a me dificultar na escola, não. Eu sempre levei como todo mundo leva e nunca dei importância pra isso não (entrevistado no. 07).

Verificamos na fala acima citada que a condição de ter a deficiência, não seria o

motivo do problema que dificultava suas atividades escolares, quando diz que sempre faz-

nos supor que havia um processo contínuo da postura da usuária diante do que lhe ocorria.

Na sociedade existe um difícil acesso da pessoa com deficiência à educação. A

estrutura física das escolas não contribui para que isso aconteça, onde é necessário que a

pessoa com deficiência venha a se adequar às estruturas que a sociedade em geral impõe. Isto

vai de encontro às diretrizes da Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de

deficiência, que preconiza a inclusão da Pessoa com Deficiência, respeitada as suas

peculiaridades, em todas as iniciativas governamentais relacionadas à educação, saúde,

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trabalho, à educação publica seguridade social, transporte, habilitação, cultura, esporte e lazer

(BRASIL, 2000, p. 40).

Ressaltamos que o acesso à educação é um mecanismo imprescindível à sobrevivência

e à cidadania, tendo em vista que a educação é um importante recurso na luta por melhores

oportunidades. Além do mais, conhecer a si mesmo e as condições que o cercam é um direito

do ser humano, reforçado pelo educador Freire (2001, p. 14), quando diz que a educação faz

parte da liberdade e, portanto, da cidadania.

As análises das falas nos aproximaram da realidade vivenciada pelos sujeitos, não

apenas no interior da instituição FUNAD, mas na manifestação de suas ações quando falam

de que forma essa convivência representa para eles. De acordo com Jodelet (1990, p. 120)

conhecer as representações dos sujeitos que vivem uma determinada situação nos possibilita

ainda compreender as manipulações do cotidiano programado nesta situação. É no cotidiano

que as representações imperam e é através delas que identificamos o papel estipulado para

cada coisa.

Nosso objetivo é de que através dessa análise das representações da pessoa com

deficiência frente à exclusão e inclusão, possamos distribuir as categorias encontradas,

percebendo de que forma se expressa esse processo de exclusão e de como o mesmo se vê

dentro de uma possibilidade inclusivista e de cidadania.

Podemos através das suas falas transcritas, confirmarmos que as razões mais elencadas

para procurar a instituição foram pela necessidade de se submeterem ao processo de

reabilitação, de acordo os entrevistados de número dois, três, quatro, cinco e seis. Os que

procuram à instituição, visando o enquadramento no mercado de trabalho, correspondem aos

de números um e sete. Vejamos o que disseram esses usuários a esse a respeito:

[...] bem, de início eu como deficiente eu gostaria de participar de alguma atividade né, na época de escola e eu fiquei sabendo que a FUNAD tinha cursos profissionalizantes, que a minha maior intensão era a questão da profissionalização. E eu vim para cá porque eu queria justamente arrumar um trabalho, então me disseram que a instituição tinha a CORPU, mas conhecida como setor de profissionalização e eu vim por causa disso (entrevistado no. 01).

Devido eu ter esse problema, e hoje em dia o governo ta criando condições, é pra você conseguir um emprego ta muito difícil, como eu já tinha esse problema, e como a FUNAD é uma instituição de dá apoio a este tipo de problema. Alias, em ajudar, você tem mais direito em concurso, junto às empresas, foi isso que me fez procurar a FUNAD (entrevistado no. 07).

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No que se referem às razões e ao tempo que estão na FUNAD, o que chamou a

atenção foi à necessidade de se inserirem no mercado de trabalho e obterem o serviço de

reabilitação oferecida pela instituição. Com um tempo de permanência variando de alguns

meses até 14 anos na instituição, os usuários de certa forma buscaram a instituição com um

propósito e, pela sua permanência ate hoje, se mostram de certa forma à vontade e satisfeitos

na mesma.

Em relação aos serviços oferecidos pela instituição, a maioria dos usuários respondeu

que conheciam os serviços existentes, e quando questionados, as respostas foram mais

direcionadas à reabilitação, ou seja, aos serviços que estavam vinculados. Percebe-se, nesse

contexto, que os usuários entrevistados via a instituição como um local para tratamento de

suas necessidades físicas e motoras.

Quanto ao grau de satisfação em relação aos serviços e se havia alguma sugestão para

os mesmo, todos foram unânimes no que se refere a serem suficientes em relação as suas

perspectivas e mostraram-se gratos por fazerem parte da mesma. Os entrevistados de número

um, dois, cinco, seis e sete, além da afirmativa, expressaram sua falas, enfatizando que a

participação na mesma chegou a mudar sua vida em vários aspectos, no atendimento

psicológico, fazendo-o sentir-se como cidadão (a) e no sentido de ter melhorado a relação

familiar. Podemos observar tal afirmação nas falas dos seguintes entrevistados:

Com certeza, atende as minhas necessidades [...] com certeza, a minha vida particular melhorou bastante [...]. (No. 01); Sim, atende [...] Cem por cento, em tudo. Como falei ficava sem perspectiva, aqui foi aberta uma porta muito grande, cheguei aqui com depressão, é cabisbaixa [...] (No. 02); Atende e muito bem, pois desde que cheguei aqui, tenho melhorando bastante [...], melhoraram em todos os aspectos que você possa imaginar, na relação com a minha família, na aceitação da minha condição de deficiente, de entender que mesmo com minhas limitações físicas eu posso ser feliz. - [...]. (No. 05); [...] com certeza, fui muito bem recebida, o pessoal muito educado, muito simpático, souberam me informar da melhor forma possível [...]. E graças a DEUS eu consegui tudo que eu queria e até alem da conta, [...] por exemplo a carteirinha interestadual, que eu já vou ter uma prioridade no ônibus, a carteirinha interestadual e também posso fazer concurso fica mais fácil entrar [...] (No. 07).

As observações empíricas realizadas no período da pesquisa mostraram que, as

expressões utilizadas pelos usuários envolvidos na pesquisa costumam de certa forma, serem

usual, principalmente naqueles que estão a longo tempo na instituição, como é o caso da

maioria dos entrevistados.

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Constatando através da pesquisa que a reabilitação em si é o que mais está em

evidência, nos discursos dos entrevistados, avalia-se que,como os meses e anos na instituição,

o estreitamento na relação usuário e equipe sistemática do serviço do qual faz parte favorece

uma acomodação que gera uma intimidade que dificulta a resolutividade do programa

terapêutico estabelecido no processo de avaliação inicial do programa de tratamento, tendo

em vista o(a) usuário(a) desse serviço, tornar-se parte do processo da rotina institucional. De

um lado, existe a idéia de que o usuário não tem condições de viver sem a instituição e, do

outro, o profissional habitua-se a rotina terapêutica estabelecida, achando que o usuário

depende dos seus préstimos.

Podemos inferir que ocorre na relação pessoa com deficiência e instituição uma prática

assistencialista. A impressão, durante a análise das respostas, é que a prática do

assistencialismo alimenta a idéia de que a pessoa com deficiência está subordinada à

reabilitação. A equipe que o assiste e a instituição passa a ser parte da sua vida, criando uma

alienação e uma dificuldade ou até uma impossibilidade do corte dessa relação, justificada

pelo longo tempo institucional pontuado pelos respondentes.

Deixamos bem claro que a relação e o respeito terapeuta/paciente são

importantíssimos e elementares, para o processo de reabilitação como um todo. Mas, a partir

do momento que os vínculos criam laços de dependência, subestima-se a capacidade do outro

de ser livre e criar sua própria identidade e autonomia. E, por conseguinte, a não

conscientização dos seus direitos e deveres como cidadão pertencente a um meio sem precisar

tornar-se parte dele suas possibilidades de reivindicações e o senso crítico pelo fato de sempre

terem justificativas, quando seus direitos como cidadão (ã) são desrespeitados e subestimados

pela instituição como um todo.

Dentro do consensual, as instituições deveriam garantir àqueles em situação de

exclusão social, como ainda é o caso dos nossos entrevistados dentro da conjuntura social

vigente, às condições para que alcancem os seus direitos, partindo do princípio que esses

segmentos são igualmente titulares de direitos, que, por sua vez, lhes têm sido sonegados.

Para tanto, ao longo das suas lutas e enfrentamentos,por meio dos grupos sociais que

os representam, observamos a construção de políticas públicas voltadas à recuperação de sua

dignidade e auto-estima, que consideramos ponto fundamental nesse processo é a própria

construção das relações entre o poder público e as comunidades assistidas.

A assistência estabelecida por instituições que diz representar a pessoa com

deficiência, deveria se dar entre dois sujeitos autônomos e não entre um sujeito, o poder

público e um objeto, a comunidade carente. Diante disso, o que se vislumbra é a possibilidade

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dos assistidos nesse contexto institucional se organizarem de forma independente, elaborar

suas demandas de forma coletiva e passarem a crer mais em si próprio do que na intervenção

de qualquer liderança, autoridade ou instituição, que lhe apareça superior.

A assistência oferecida por instituições fins, que tenha como princípios essenciais o

reconhecimento dos direitos e deveres das pessoas com deficiência, deveria ter como objetivo,

através das suas atividades institucionais, despertarem uma consciência individual e coletiva,

para que as pessoas com deficiência que participam das atividades de reabilitação tornem-se

agentes críticos e conscientes dos seus direitos sociais e políticos, não só no meio em que

realiza sua reabilitação, mas em qualquer ambiente que se encontrem e, assim, possam

promover uma prática de emancipação social e política. Se na prática essas atitudes fossem

empregadas, provavelmente produziriam sujeitos mais livres, críticos e autônomos capazes de

construir e exercitar sua cidadania.

A assistência institucional que visa apenas o assistencialismo, ao se praticar a atenção

às populações excluídas, oferece a própria atenção como uma "ajuda", vale dizer: insinuam,

em uma relação pública, os parâmetros de retribuição de favor que caracterizam as relações na

esfera privada. É pelo valor da "gratidão" que os assistidos se vinculam ao titular das ações de

caráter assistencialista . O que se perde aqui é a noção elementar de que tais populações

possam usufruir dos direitos e deveres sociais, e que, portanto, toda iniciativa pública, voltada

ao tema da assistência caracteriza dever do Estado.

O que se vislumbra, é que o assistencialismo

propriamente dito desenvolvido por

instituições do estado tende a promover a submissão e a dependência, dificultando a

organização de forma autônoma, mais ainda como expressão de demandas políticas. O

assistencialismo

observado sob essa vertente, transforma-se numa prática de dominação. Se

bem sucedido, esse senso comum produz pessoas dóceis e manipuláveis.

4.2 A Representação Social da pessoa com deficiência frente à exclusão e

inclusão

As ações pautadas no assistencialismo e na dependência das pessoas com deficiência è

perceptível através das representações que fazem acerca da importância da instituição em suas

vidas. A partir deste prisma, buscou-se o processo de compreensão dessas pessoas acerca da

promoção de sua autonomia, a partir dos tópicos trabalhados na entrevista, como o conceito

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de inclusão, conceito de cidadania, relação cidadania e pessoa com deficiência, participação

cidadã da pessoa com deficiência na sociedade, sentimento enquanto cidadão e direitos de

cidadania. Acreditamos que, por meio de suas falas, pudessem explicitar os sentimentos,

significados e as representações que emergem no seu cotidiano, buscaram-se compreender

neste estudo as atitudes e desvelar as contradições existentes nos conceitos de inclusão que

influenciam e expressam as ações do seu cotidiano. Assim, investigou-se como a pessoa com

deficiência se viu nesse processo de exclusão/inclusão? Qual foi a sua representação social

acerca da inclusão? Nesta etapa os dados foram divididos, conceitualizados e relacionados.

No que se refere ao conceito de inclusão, o

dicionário Aurélio (2005), o verbo incluir

apresenta vários significados, todos eles com o sentido de algo ou alguém inserido entre

outras coisas ou pessoas. Em nenhum momento essa definição pressupõe que o ser incluído

precisa ser igual ou semelhante aos demais aos quais se agregou. Quando falamos de uma

sociedade inclusiva, pensamos naquela que valoriza a diversidade humana e fortalece a

aceitação das diferenças individuais. É dentro dela que aprendemos a conviver, contribuir e

construir juntos um mundo de oportunidades reais, não obrigatoriamente iguais para todos.

Isso implica numa sociedade onde cada um é responsável pela qualidade de vida do outro.

Quando indagados sobre o que seria inclusão, os entrevistados de número um, dois e

três, responderam, respectivamente: é a aceitação do deficiente na sociedade ; está inserido

no meio da sociedade e é fazer parte da sociedade . De acordo com as respostas, observa-se

a idéia da inclusão. Nesse mesmo contexto, o respondente número um, dá uma condição [...]

mas para que o deficiente seja aceito na sociedade ele primeiro tem que se aceitar como

deficiente e quem tem grande peso nisso aí é a questão da família . E o entrevistado número

quatro, diz não entender o que significa inclusão.

A resignação, ou ainda aceitação, na espiritualidade, na conscientização e na

psicologia humana, geralmente se refere a experienciar uma situação sem a intenção de mudá-

la. A aceitação não exige que a mudança seja possível ou mesmo concebível, nem necessita

que a situação seja desejada ou aprovada por aqueles que a aceitam. De fato, a resignação é

freqüentemente aconselhada quando uma situação é tanto ruim quanto imutável, ou quando a

mudança só é possível a um grande preço ou risco. Aceitação pode implicar apenas em uma

falta de tentativas comportamentais visíveis para mudar, mas a palavra também é utilizada

mais especificamente para um sentimento ou um estado emocional ou cognitivo teórico.

Então, alguém pode decidir não agir contra uma situação e ainda assim não ter de aceitá-la.

A aceitação é contrastada com a resistência, mas esse termo tem fortes conotações

políticas e psicoanalítica que não são aplicáveis em muitos contextos. Às vezes, a aceitação é

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usada com noções de espontaneidade, como diz Duarte (1996) que "[...] mesmo se uma

situação indesejável da qual não poderei escapar ocorrer comigo, eu ainda posso

espontaneamente escolher aceitá-la."

Por grupos ou por indivíduos, a aceitação pode ser de vários eventos e condições no

mundo; as pessoas também podem aceitar elementos de seus próprios pensamentos,

sentimentos ou passados. Por exemplo, o tratamento psicoterapêutico de uma pessoa com

depressão ou ansiedade poderia envolver a aceitação das circunstâncias pessoais que geraram

aqueles sentimentos, sejam elas quais forem, ou pelos sentimentos em si.

Minorias na sociedade freqüentemente descrevem seu objetivo como "aceitação", onde

a maioria não contestará a participação efetiva da minoria na sociedade. Diz-se que uma

maioria é (na melhor das hipóteses) "tolerante" com as minorias quando ela restringe sua

participação a certos aspectos da sociedade.

A atribuição do papel da familia no contexto da inclusão, pode ser considerada o

primeiro meio propício ao tema , visto a importância dessa instituição secular no contexto da

formação da identidade do indivíduo.

Compreendemos que o papel da família estável é oferecer um campo de treinamento

seguro, onde as crianças possam aprender a ser mais humanas, a amar, a formar sua

personalidade única, a desenvolver sua auto-imagem e a relacionar-se com a sociedade mais

ampla e imutável, da qual e para a qual nascem.

Esse pensamento reflete a grande importância que a família adquiriu neste século,

como a primeira célula social da qual fazemos parte e que será responsável por nossa

formação individual e social. Podemos considerar a família como um sistema bastante

complexo, uma vez que, cada família é única, diferindo em tamanho, elementos que a

compõem e valores. É um sistema altamente interativo, pois o que ocorre com um de seus

elementos repercute em todo ele.

A família exerce suas funções em cinco áreas básicas, a saber: na econômica - cabe

aos pais a manutenção de sua prole; na doméstica e de cuidados com a saúde - oferecer

abrigo, alimentação, cuidados com a higiene e saúde; na recreação - propiciar aos filhos

momentos de lazer, socialização - desenvolver nos filhos a capacidade de se relacionar em

outros grupos; na auto-identidade - oferecer aos filhos noção de realidade e consciência dos

limites: Quem sou? Qual o meu valor? E na afeição - oferecer afeto, possibilitando aos filhos

desenvolver a capacidade de amar a si e aos outros, de expressar emoções.

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[...] Bom, pra mim, inclusão fica bastante claro que é o seguinte: que é a aceitação do deficiente na sociedade. Mas para que o deficiente seja aceito na sociedade ele primeiro tem que se aceitar como deficiente e quem tem grande peso nisso aí é a questão da família. A família é um dado essencial porque se você não tiver um apoio de casa, da família e de quem cria, seja quem for pai, mãe, tia ou avó. Você não chegará a canto nenhum, simplesmente você vai parar no tempo, e vai ficar se achando como coitadinho. E não é isso que eu penso, eu penso bem diferente (No. 01).

Discriminar significa "fazer uma distinção". Existem diversos significados para a

palavra, incluindo a discriminação estatística ou a atividade de um circuito chamado

discriminador. O significado mais comum, no entanto, tem a ver com a discriminação

sociológica: a discriminação social, racial, religiosa, sexual ou étnica. A discriminação é

considerada eticamente uma violência à pessoa frente a sua representação enquanto sujeito

pertencente ao meio. Freire (2001, p. 133)considera que a violencia contra os discriminados,

não importa a razão da discriminação, nos leva a um processo de luta profundamente

ancorado na ética. Isto significa, na visão de Dussel (2000 a p. 11), que lutar contra a

exclusão social é lutar pela vida , pela humanização de homens e mulheres . Podemos

observar na fala transcrita do respondente abaixo a atenção que o mesmo faz com o termo

discriminação.

[...] Bem, essa palavra não me é estranha, mas acredito que seja no sentido de nós deficiente, algo que venha para nos ajudar no sentido de que todas as pessoas normais possam aceitar a nossa presença de forma natural, sem ficar discriminando e apontando pra gente (No. 05).

Os entrevistados de número seis e sete atribuíram o termo a participação nos locais

públicos, referindo uma troca. De um lado não há necessidade a imposição da pessoa com

deficiência e, do outro lado, o respondente também faz uma imposição de que tem que haver

preparo para recebê-los.

A prática de integração referida na década de 80 tem como proposta à saída da pessoa

com deficiência das instituições e que os mesmos passassem a viver em sociedade,

dependendo do seu esforço individual. Na interpretação de Sassaki (2006, p. 34) [...] a

integração tinha e tem o mérito de inserir o portador de deficiência na sociedade, sim, mas

desde que ele esteja de alguma forma capacitado a superar as barreiras físicas, programáticas

e atitudinais nela existentes .

Já o termo inclusão social é o processo pelo qual a sociedade se adapta para poder

incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com deficiência e, simultaneamente, estas se

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preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um

processo bilateral no quais as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade busca em parceria,

equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para

todos (SASSAKI, 2006, p. 3).

[...] Bem, como eu sou uma pessoa do meio eu sei que inclusão é a participação do deficiente é nas instituições, no meio publico e em todos os setores numa troca ele não vai ter que se integrar como antigamente, ele sozinho teria que se adaptar, mas vai ter que ter gente preparada para também dar um retorno(No. 06)..

[...] Inclusão? È uma palavra que vem a incluir as pessoas especiais, no meio das outras pessoas para que fique uma sociedade só. Cada um com seu desenvolvimento e [...] (No. 07).

Com relação à exclusão e discriminação, representando dessa forma a categoria

exclusão, todas as pessoas entrevistadas, em algum momento da sua vida passaram por

situações que denotassem um preconceito caracterizado por condutas discriminatórias. Mas,

mesmo diante das situações discriminatórias, não optaram por medidas ditas legais, sendo,

portanto unânimes as respostas da ausência de tais medidas. Podemos citar algumas falas dos

entrevistados como, por exemplo:

[...] bem, é passei sim com certeza. Pois, todo deficiente passa por questão de discriminação [...] então isso me constrangeu muito, mas aí eu deixei para - lá (No. 01); [...] de mim mesmo eu já senti muito, me senti revoltada com muita revolta e minha reação foi chorar, chorei muito nesse dia (No. 04); [...] sim, uma vez. No próprio setor de trabalho uma mãe de uma usuária, que tinha deficiência mental (No. 06); [...] já...já... no momento agora não me vem a lembrança...eu lembro que já houve (No. 07).

Nas reflexões sobre a exclusão social, consideramos como Sawaia (1999), que há um

sofrimento ético político gerado pela situação social de ser o indivíduo tratado como inferior

e sem valor, assim como pelo seu impedimento de desenvolver , mesmo em uma pequena

parte, o seu potencial humano. E, ainda, que deve existir a luta contra a exclusão social, a luta

contra o desrespeito a vida, contra qualquer tipo de violência.

[...] Não, só algumas vezes com gente bestinha que passa na rua, dizendo alguma coisa, mas eu tiro de letra. Não usei nenhum direito legal. Não porque com algumas palavras eu sei colocar as pessoas no seu lugar. Não foi necessário, como por exemplo, na época que eu estudava, fui bem aceita,

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também trabalhei em escritório e fui muito bem aceita. Onde quer que eu vá, eu não vejo nenhum olhar de discriminação. Se houver Dra. Sandra, eu sei me sair muito bem ( No. 02). [...] Às vezes quando tenho que ir ao médico, ficar em fila esperando o médico chegar ir atrás de remédio do governo, entre outras coisas. Não, porque não gosto de confusão. Como já falei, evito ao máximo ter que fazer confusão, pois as coisas são assim mesmo, temos que ter paciência (No. 03)

[...] De mim mesmo eu já senti muito. Fora daqui, a muitas coisas. Como ver pessoas apontando para elas na rua. Me senti revoltada, com muita revolta e minha reação foi chorar, chorei muito nesse dia. Não, não usei de nenhum direito desses, deixei para lá, e entreguei a Deus. (No. 04)

Compreendemos a exclusão social na perspectiva dialética de Martins (2007, p16),

como processo de exclusão integrativa ou modos de marginalização, ou seja, exclusão que se

processa por uma inclusão precária, diferenciada, descriminada e marginal. Para Sawaia

(1999, p. 9); que concebe a exclusão como um processo complexo e multifacetado, uma

configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas, que se relacionam

com a inclusão, como parte constitutiva dela, e envolve o ser humano por inteiro e suas

relações com os outros.

Em relação ao conceito de cidadania, ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à

propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar do

destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não

asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do

indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a

uma velhice tranqüila, ou seja, exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e

sociais.

Quando indagados acerca do termo cidadania, as respostas das pessoas com

deficiência a essa questão, de certa forma, não surpreendeu muito, no sentido do modismo até

então com o termo, sem que se saiba o real significado da mesma na prática dos nossos

direitos e deveres como cidadãos. Portanto, os entrevistados de número dois, três, quatro e

sete correlacionaram o termo cidadania à posse de bens e grau de instrução das pessoas. A

resposta do entrevistado de número seis foi de que [...] ser cidadão é você ter seus direitos

políticos, seus direitos sociais, e deveres. É a pessoa que participa, do contexto da sociedade

(entrevistado No. 06).

Como também as respostas dos números um e cinco foram as que

mais se aproximaram as definições encontradas na literatura de uma forma geral,

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demonstrando um conhecimento acerca do tema, conforme suas palavras transcritas logo a

seguir:

[...] Pra mim, o que é ser cidadão, é nada mais nada menos do que o exercer os meus direitos, certo? De igual para igual sem discriminação, entendeu? [...] entender que o deficiente também, tem seus direitos também tem suas obrigações como qualquer cidadão comum que paga seus imposto, entendeu? E é isso que eu acho da questão de ser cidadão. É igualdade para todos (No. 01).

[...] penso que ser uma cidadã, seja algo como agente ter sabedoria para entender que as pessoas tem que respeitar agente de uma forma ou de outra, mesmo agente sendo deficiente, agente ter direito a possuir um trabalho, ter uma residência para morar, poder comprar alimento para nossa família...não sei se é isso mas ouvi muito dessas coisas nos programas dos políticos ...na época das eleições....aí fiquei pensando que pode ser isso (No. 05).

Quando perguntados sobre se é possível à pessoa com deficiência exercer sua

cidadania propriamente dita, os respondentes de número três, quatro e sete atribuíram à

possibilidade de exercer sua cidadania se tivesse uma condição social elevada no sentido

financeiro. Os de número dois e cinco se expressaram, respectivamente, assim: [...] claro que

sim, porque é um ser humano como um outro qualquer (No. 02) ; [...] bem, mesmo sem

entender direito o que essa palavra significa, acho que deve ser alguma coisa que agente

deficiente devia possuir também e que as pessoas normais já tem (No.05) :

O entrevistado de número um disse: [...] com certeza, eu acho possível sim desde que

o próprio deficiente vá atrás, lutar, na questão dos seus direitos e mostre a sociedade que ele é

igual dentro das suas limitações a qualquer cidadão (No. 01) , e o de número seis enfatizou

que [...] sendo tratado como uma pessoa normal, o deficiente precisa ser tratado como um

ser humano igual aos outros. Na constituição ta dizendo isso. Na constituição diz que: todo o

cidadão brasileiro é igual perante a lei

(No.06).

[...] eu poderia exercer melhor como é o que é o que tenho tentado fazer, e a questão de lutar pelos espaços dos deficientes, ter exercido né? Convocar a sociedade esclarecer, abrir a mente das pessoas pra que elas entendam que o deficiente também é gente, igual como outro qualquer. [...] a questão da acessibilidade é um fator importante para toda a sociedade, certo? [...] existe pouco acesso para pessoas deficientes, para idoso, para o cidadão que tem uma necessidade especial, né? Para um cidadão que tem uma deficiência mais é complicada. [...] acesso as grandes instituições, prédios, ao shopping, a ainda deixe muito a desejar, né? Para que a cidade fique completamente acessível para toda a sociedade, inclusive o portador de deficiência (No. 01).

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Em relação à participação e aos direitos de cidadania, os entrevistados: dois, três,

quatro e cinco atribuíram ao direito à acessibilidade; o de número sete relacionou o direito ao

trabalho, e os de número um

e seis, conforme citação abaixo, foram os que relacionaram essa

participação mais ampla no contexto social em que estão inseridos.

[...] sendo tratado como uma pessoa normal, o deficiente precisa ser tratado como um ser humano igual aos outros. Na constituição ta dizendo isso. [...] todo o cidadão brasileiro é igual perante a lei. [...] fora as fundações, a reabilitação, o deficiente pode ter acesso ao esporte, muitos têm, aos clubes, muitos vão para o forrock, à praia, aos shoppings, não deveria ser, ou melhor, não deve ser discriminado (No.06).

Com relação ao sentimento enquanto cidadão e em relação aos seus direitos de

cidadania, todos os entrevistados fizeram uma ênfase na condição de ser uma pessoa com

deficiência, ter suas dificuldades, mas que se sentem dentro do contexto de inserção

atribuindo a aceitação da família, da comunidade e das atividades realizadas dentro do

contexto social no qual estão relacionados. Destacamos algumas falas que fundamentam

nossa argumentação.

[...] Bom olhe enquanto cidadã, eu digo a você que não foi fácil não, é difícil para um deficiente. Mas agente tendo o apoio da família, então agente consegue chegar a algum lugar, agente consegue estudar, agente consegue participar das atividades né, que a sociedade nos promove [...] a questão do cidadão inserido na sociedade tem que ser dessa forma. [...] a família é um ponto crucial para que o deficiente um dia venha a ser reconhecido tanto como deficiente como profissional (No. 01).

A pessoa com deficiência é um cidadão como toda e qualquer outra pessoa. Este

direito deve ser respeitado por todos e em todas as situações, como, por exemplo, na saúde, na

educação, no transporte, no acesso à justiça, dentre outros. O que ocorre, na verdade, é que,

embora garantidos pela Constituição Federal e pelas leis, o que se verifica, na prática, é uma

reiterada e ostensiva inobservância desses direitos de cidadania contra a maioria da população

excluída dos bens e serviços desfrutados pelas elites.

[...] como cidadão não tenho do que reclamar, eu tenho meus direitos, conheço os direitos de deficiente, e conheço o direito do cidadão, sou formado, pago o conselho de fisioterapia, tenho trabalho, participo de todas as atividades da minha profissão, no que se refere ao trabalho de atendimento. Eu não sou muito discriminado devido à posição e ao status (No.06).

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De maneira geral, podemos afirmar que ser cidadão implica o reconhecimento e a

concretização de seus direitos civis, políticos e sociais e a cidadania resulta na efetivação de

tais direitos e na luta incessante para alcançá-los, independentemente da condição pessoal ou

social do indivíduo em que implica o cumprimento dos deveres. Contudo, o elemento da

reivindicação é preponderante para garantir exercício da cidadania.

[...] já estou com 24 anos de idade [...] já fiz cursos, e já me comuniquei com vários tipos de pessoas, de assim que já estagiei em locais que tem comunicações com o publico, com vários, com gente de todo pensamento assim. Hoje eu me considero uma pessoa normal, hoje eu me considero como qualquer um. Não como qualquer um, me considera uma pessoa que a cada dia estou crescendo mais (No. 07).

Se compreendermos que a existência da cidadania está atrelada na maioria das vezes a

uma prática de reivindicação, de apropriação de espaços, da lei para fazer valer os direitos do

cidadão, nesse sentido, a prática da cidadania pode ser a estratégia, por excelência, para a

construção de uma sociedade melhor. Mas o primeiro pressuposto dessa prática é que esteja

assegurado o direito de reivindicar os direitos, e que o conhecimento deste se estenda, cada

vez mais, a toda a população.

A concepção de cidadania envolve a idéia de igualdade e de subjetividade, pois ela é

respectivamente coletiva e individual. Portanto, construir cidadania é também construir novas

relações e consciências. A cidadania é algo que não se aprende com os livros, mas com a

convivência, na vida social e pública. É no convívio do dia-a-dia que exercitamos a nossa

cidadania, através das relações que estabelecemos com os outros, com a coisa pública e o

próprio meio ambiente. Ela deve ser perpassada por temáticas como a solidariedade, a

democracia, os direitos humanos, a ecologia, a ética, dentre outros.

A cidadania é tarefa que não termina, não é como um dever de casa, onde faço a

minha parte, apresento e pronto, acabou. Enquanto seres inacabados que somos, sempre

estaremos buscando, descobrindo, criando e tomando consciência mais ampla dos direitos.

Nunca poderemos chegar e entregar a tarefa pronta, pois novos desafios na vida social

surgirão, demandando novas conquistas e, portanto, a exigência do exercício da vida social.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como propósito estudar as representações sociais da pessoa com

deficiência frente à inclusão e exclusão que freqüentam a Fundação Centro Integrado de

Apoio ao Portador de Deficiência FUNAD, localizado nesse município.

A princípio, temos a compreensão de que este estudo sobre as representações sociais

não se dá por acabado, aqui, por considerarmos que a realidade é um fator cíclico. Portanto, as

respostas que foram obtidas nesta pesquisa têm um caráter de provisoriedade, uma vez que a

vida possui o caráter dinâmico e as perspectivas no processo de inclusão é uma construção

constante e permanente, realizada através dos enfrentamentos das pessoas enquanto atores e

sujeitos do seu destino e dos movimentos sociais em que fazem parte, numa sociedade de

caráter eminentemente capitalista que se diz organizada.

As respostas foram analisadas e construídas, a partir de algumas constatações, as quais

vão ao encontro desta pesquisa empírica, possibilitando a indicação de caminhos possíveis

sobre as representações sociais da pessoa com deficiência frente à inclusão e exclusão.

Consideramos que as inferências, neste estudo, deixam lacunas que, na percepção e

construção do todo, fazem parte deste arcabouço teórico, com características próprias deste

conjunto de elaborações e de uma concepção de ciência na qual o saber é inesgotável.

Compreendendo, desta forma, que aqui ficarão perguntas sem respostas, mas é, a meu

ver e entendimento, que outras pesquisas poderão suscitar respostas futuras às lacunas, aqui

evidenciadas. A exemplo disto, a de que futuramente, se possa estudar quais as representações

que os dirigentes institucionais têm sobre as pessoas com deficiência, dados que na minha

concepção podem ser captados não apenas pelas entrevistas, mas ao se analisar seus

planejamentos anuais, aplicabilidade e resolutividade dos mesmos junto a esse segmento

social.

O caminho trilhado por este estudo levou em consideração aspectos teóricos e práticos

sobre os dados analisados. Portanto serão retomados alguns destes aspectos numa perspectiva

conclusiva. Nas representações sociais das pessoas com deficiências entrevistadas, tivemos

acesso a concepções que ora confirmaram ora discordavam de algumas premissas que

serviram como ponto de partida para esta pesquisa.

A finalidade deste estudo foi o de dar voz às pessoas com deficiência, para que, por

meio de suas falas, os mesmos possam explicitar os seus sentimentos, significados e as

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representações que emergem no seu cotidiano, buscando compreender as suas atitudes e

desvelar as contradições existentes nos conceitos de inclusão que influenciam e expressam as

ações do cotidiano da pessoa com deficiência. Assim, investigaram-se como os atores que

fazem parte deste segmento social se vê nesse processo de exclusão, inclusão e a sua

representação social acerca deste conjunto.

Tomaremos a partir das respostas obtidas através das entrevistas realizadas com as

pessoas com deficiência e as categorias obtidas, o nosso ponto de partida, na tentativa de fazer

uma síntese de todo o caminho percorrido nessa pesquisa.

As interpretações que podemos fazer com relação aos dois eixos da pesquisa: o perfil

dos entrevistados em relação à instituição FUNAD e a representação da pessoa com

deficiência frente à inclusão e exclusão, é que evidentemente esta caracterização mais geral

vai necessariamente produzir um sentido mais amplo ao conjunto das representações, de

forma a explicá-las dentro de cada campo de representação.

No tocante a representação frente à instituição, os entrevistados possuem uma relação

que expressa positividade, tendo como ancoragem, a aceitação quando se reconhecem fazendo

parte da mesma, numa perspectiva e concepção de acolhimento gerador da sua felicidade

pessoal, na família e na comunidade.

Contextualizando sua análise às representações construídas pelos indivíduos

estigmatizados, entendemos que a estrutura social existente é anterior ao nascimento do

indivíduo: a criança já nasce no bojo de uma concepção de mundo reforçada socialmente, ou

seja, a família já possui suas próprias representações sobre a deficiência e o deficiente. Tais

valores se constituirão em referenciais que serão elaborados pelos sujeitos no convívio com a

pluralidade dos grupos sociais.

Refletindo sobre a difusão dos discursos que envolvem preconceito e discriminação de

indivíduos estigmatizados pela deficiência em nossa sociedade, acreditamos que se deve

avançar o raciocínio no sentido de colher todos os elementos possíveis que constroem e

configuram a identidade estigmatizada. Tal perspectiva, ao nosso entender, possibilitará, não

apenas a identificação desses aspectos, porém, também, o modo como essa identidade é

utilizada tanto pelos estigmatizados como pelos profissionais que lidam com essas pessoas.

No entendimento do fenômeno da representação social da pessoa com deficiência, há

que considerar alguns pontos fundamentais, tais como: os valores manifestos pela sociedade

sobre a deficiência e pelas próprias pessoas com deficientes; os valores considerados pelas

instituições que atendem pessoas deficientes, ou seja, a visão dessas instituições sobre o

deficiente e a deficiência e os valores que as pessoas com deficiência atribuem a sua

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condição. Portanto, a análise das relações e das articulações entre sociedade, instituições

especializadas e pessoas deficientes é o ponto central à compreensão da identidade social dos

deficientes, problemática, ao nosso entender, ainda pouco aprofundada pelos estudiosos.

A percepção da identidade da pessoa com deficiência nas sociedades complexas

atuais, não se perde no vazio. Mas, evidentemente, que, como construção coletiva, se articula

à construção da identidade particular, configurando representações sociais acerca da

concepção de um determinado grupo ou segmento social que se inter-relacionam e criam suas

próprias imagens e concepções nesse contexto.

Referindo-se às instituições de reabilitação, o referido autor chama atenção para o fato

de que essas instituições focalizam aspectos considerados importantes às relações sociais de

produção e vínculos, no que se refere à reabilitação. Consideramos para este estudo na

medida em que, ao analisar os valores que norteiam as instituições de reabilitação, acaba

descortinando, num aspecto geral, alguns valores que norteiam o real papel dessas

instituições. Em consonância com a concepção das instituições de reabilitação, pode-se

afirmar que há um trabalho institucional no sentido de promover a aproximação da imagem da

pessoa com deficiente, e não de sua vida concreta e de suas potencialidades.

A propósito da construção da identidade da pessoa com deficiência, o fato de que,

embora os discursos sociais e institucionais propugnem pela inserção do indivíduo

estigmatizado na sociedade, estamos cônscios de que há uma grande distância entre discurso e

prática: a sociedade tende a excluir os que fogem aos modelos de normalidade, quer do ponto

de vista das relações de produção, quer do ponto de vista das relações sociais; e as instituições

especializadas, em função desse fato, não conseguem atender essa expectativa, ou seja,

promover uma relação efetiva.

Nessa reflexão, ressaltamos, com base nos pressupostos desenvolvidos nesse trabalho,

que as representações sociais se constituem na atualidade, em uma linha de pesquisa que, sob

a perspectiva da racionalidade científica, clarifica os estudos voltados a questões pertinentes à

identidade social, estereótipos, preconceitos, concepções, dentre outros, desvelando o que está

subjacente nas relações e articulações dos grupos estigmatizados, possibilitando, assim, maior

compreensão do objeto pesquisado.

O que se esconde através da deficiência não é o patológico, mas, o reino da

desigualdade; desigualdade que remete à deficiência de uma constituição ou desigualdade de

quem lida na luta pela vida concebida como concurso/percurso de obstáculos. Remete sempre

a uma inferioridade. A deficiência naturaliza ao mesmo tempo a história da pessoa, fazendo

de sua falta um deficit e a história social, assimilando as performances requisitadas em um

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certo momento histórico a uma normalidade natural. Por isto, é que é impossível distinguir, a

rigor, os deficientes de certas formas de falta de adaptação social.

Ao examinarmos as circunstâncias que cercam a vida das pessoas com deficiência,

identificamos mecanismos de segregação, marginalização e exclusão, fomentados por

políticas assistencialistas e filantrópicas. Não raro, estas pessoas são tratadas como inferiores,

subalternas e infantis, estando sujeitas ao sentimentalismo de uma concepção autoritária. Para

retirar as pessoas com deficiência da posição de apêndice da sociedade e reconhecer sua

cidadania e identidade de sujeitos desejantes, será necessário reexaminar as concepções

acerca da deficiência e seus corolários. Somente assim será possível redefinir políticas de

reabilitação, compreendida em todos os sentidos de independência e de autonomia como

dinâmica de recomposição da vida.

Assim optamos por compreender as representações sociais das pessoas com

deficiência, a partir da existência concreta dos mesmos, no local a sociedade tem como

referencia e que são incorporadas por eles como parte deles e não pertencentes ao meio, como

cidadãos críticos e conscientes da realidade que os cerca. E não, no entendimento de uma

realidade ambígua, de resignação e aceitação, onde os discursos românticos e de gratidão

mesclam-se, mas ao mesmo tempo, possuem contornos distintos em nível de suas

representações sociais.

Dentro dessas considerações não poderíamos deixar de pensar que a Instituição

FUNAD seria diferente para as pessoas com deficiência que foram entrevistadas, em termos

de superação de alguns conflitos e carências. A instituição está incorporada à vida dos

entrevistados numa relação de poder e dominação através da docilidade e do assistencialismo,

já incorporado ao senso comum da gratidão. Uma exclusão e dominação produzida não pela

instituição, mas histórica e socialmente.

A condição da pessoa com deficiente é apontada, em algumas situações das

entrevistas, como algo anormal

e fora do comum, dos padrões postos pela sociedade, uma

variedade de comportamentos que revelam atitudes de negação da deficiência,

marginalização, super proteção e outros sentimentos confusos e contraditórios, geralmente,

mesclados de ambivalência, decepção, culpa e rejeição.

O sentido da deficiência na vida de uma pessoa é produto do entrelaçamento de sua

história pessoal com o meio social no qual vive. Sobre a pessoa com deficiência incide o

estigma da incapacidade e da invalidez. Sobre ela recai o peso da menos valia e da opressão.

Mas existem aquelas que ousam desafiar as leis, ignoram supostas inaptidões e mobilizam

recursos no sentido de pleitear e tomar posse dos espaços conquistados, alguns destes

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encontraram seus espaços em movimentos sociais e fizeram e fazem sua história acontecer.

Mas uma grande maioria são as pessoas com deficiência que se tornam dependentes do seu

meio social, e não conseguem seus espaços porque estão subordinados a eles, mesmo que não

percebam.

Não foi diferente com os nossos sete entrevistados, que de uma maneira geral, tiveram

sua representação ancorada na idéia de direitos e deveres, acessibilidade, aceitação e

resignação na pretensão de ser aceito na sociedade. Em todas as falas o significado do que é

ser cidadão e os significados dos mesmos, com algumas exceções, estavam entrelaçados a

uma idéia fragmentada e de repetição de discursos reproduzidos pela mídia e jornais que

reforçam o senso comum da própria condição da deficiência que é portador, dos estigmas,

preconceitos e, retomo o termo que ficou de certa forma evidente nas entrelinhas das

entrevistas que foi, resignação e aceitação. Ficou menos relevante nas suas falas a autonomia

como ser pensante, tendo seu próprio status social, sem dependência.

De fato, promover mudanças nesse consenso, podemos dizer que seria uma utopia,

visto que, nessa condição de dependência e subordinação, estamos todos nós, envolvidos num

senso comum do ter, poder, possuir e consumir. E porque, também, não dizer rotular e

estigmatizar não só a pessoa com deficiência, mas todos que não se submetem a esse status

social. Cabe a nós dentro de uma visão solidária e reivindicatória, promover e proporcionar

mudanças que minimizem o quadro atual, promovendo mudanças de atitudes em prol de

emancipação, autonomia e consciência do outro nesse contexto de mundialização que

fazemos parte e de certa forma compactuamos.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICE

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APENDICE I

Pesquisa: REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM DEFICIENCIA FRENTE À INCLUSÃO

Local: Fundação Cento Integrado de Apoio ao Portador de Deficiência Data: ____/____/___ Horas: __________

Mestranda: Sandra Maria Cordeiro Rocha de Carvalho. Orientadora: Profa. Edineide Jesine Mesquita

ROTEIRO DE ENTREVISTA

1. IDENTIFICAÇÃO DO RESPONDENTE:

1.1 NOME: __________________________________________________________SEXO: _______

D/N: ___/____/_____ PROFISSÃO: _______________________ ESTADO CIVIL:_____________

1.2 ENDEREÇO: _______________________________________________NO.______-__________

COMPLEMENTO: _________________________________________________________________

2. INSTRUÇÃO:

2.1 GRAU DE ESCOLARIDADE: ______________________________________________

2.1 ESCOLA QUE ESTUDOU /A?

PUBLICA

PARTICULAR

2.1 TEVE/TÊM DIFICULDADES? SIM NÃO

CASO SIM, QUAIS? ________________________________________________________

3. DADOS ESPECÍFICOS DA INSTITUIÇÃO - FUNAD:

3.1 DEFICIÊNCIA QUE É PORTADOR (A):

MENTAL

AUDIOCOMUNICAÇÃO

MÚLTIPLA

FISICO

VISUAL OBS. ___________________________________________________________________________

3.2 O QUE LEVOU VOCÊ A PROCURAR ESTA INSTITUIÇÃO? ___________________________________________________________________________

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

CURSO DE MESTRADO

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3.3 QUANTO TEMPO ESTA NA MESMA? __________________________________________________________________________ 3.4 VOCÊ CONHECE TODOS OS SERVIÇOS DISPONÍVEIS NA INSTITUIÇÃO?

SIM NÃO

3.5 QUAIS OS SERVIÇOS QUE VOCÊ ESTÁ INSERIDO (A)?

CODAFI

CODAVI

CODAM

CODEI

CODAVI

NVA

NED

AEE

CODAPA

OUTRAS

OBS. _____________________________________________________________________

3.6 O REFERIDO SERVIÇO ATENDE AS SUAS NECESSIDADES? ___________________________________________________________________________

3.7 OS SERVIÇOS OFERECIDOS MELHORARAM EM ALGUM ASPECTO A SUA VIDA? QUAL (IS) ___________________________________________________________________________

3.8 VOCÊ PARTICIPA DA ASSOCIAÇÃO DE PAIS EXISTENTE NA INSTITUIÇÃO?

SIM - HÁ QUANTO TEMPO ? _________________________________________ NÃO - PORQUÊ? _____________________________________________________

3.9 O QUE VOCÊ PODERIA SUGERIR PARA MELHORAR O ATENDIMENTO NESTA INSTITUIÇÃO? ___________________________________________________________________________

4.DADOS GERAIS:

4.1 QUE VOCÊ ENTENDE POR INCLUSÃO? ___________________________________________________________________________

4.2 VOCÊ SE SENTE INCLUIDO (A) FUNAD?

SIM Porquê? ___________________________________________ NÃO Porquê? _________________________________________

4.3 VOCÊ SE SENTE INCLUIDO (A) NA SUA COMUNIDADE?

SIM Porquê? _________________________________________ NÃO Porquê? _________________________________________

4.4 VOCÊ SE SENTE INCLUIDO (A) NAS ATIVIDADES ESCOLARES?

SIM Porquê? _________________________________________ NÃO Porquê? _________________________________________

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4.5 VOCÊ SE SENTE INCLUIDO (A) NAS ATIVIDADES DE LAZER (SHOPPING, PRAIAS, CAMPO DE FUTEBOL, ETC)?

SIM Porquê? _________________________________________ NÃO Porquê? _________________________________________

4.6 COM RELAÇÃO À EXCLUSÃO E DISCRIMINAÇÃO, VOCÊ JÁ PASSOU POR ALGUMA SITUAÇAO SEMELHANTE?

SIM NÃO

a) Quais? __________________________________________________ b) Como você se sentiu? _______________________________________________________ c) Nesse contexto de discriminação você usou de algum direito legal? d) Quais os outros direitos sociais ou legais que você conhece e á utilizou? e) Em que circunstâncias?

5. COM RELAÇÃO AO TERMO CIDADANIA:

5.1 PARA VOCÊ O QUE É SER CIDADAO (Ã)?

5.2 NESTA SOCIEDADE EM QUE VIVEMOS VOCÊ ACHA POSSÍVEL O EXERCÍCIO DA CIDADANIA DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA?

_________________________________________________________________________

5.3 COMO, NESTA SOCIEDADE VOCÊ PODERIA EXERCER MELHOR O SEU ESPAÇO DE CIDADANIA?

___________________________________________________________________________

5.4 DENTRO DO SEU ENTENDIMENTO, QUAIS OUTROS SERVIÇOS OU ESPAÇOS SOCIAS A PESSOA COM DEFICIÊNCIA PODERIA UTILIZAR?

__________________________________________________________________________

5.5 COMO VOCÊ SE SENTE ENQUANTO CIDADÃO (Ã) DENTRO DO CONTEXTO QUE ESTÁ INSERIDO (A)? ___________________________________________________________________________

5.6 VOCÊ CONHECE SEUS DIREITOS ENQUANTO CIDADÃO OU CIDADÃ? SIM

a) Através de que/quem? _______________________________________________________ b) Quais são? ________________________________________________________________

NÃO - Porquê ? __________________________________________ Obrigada por sua colaboração em responder a esta entrevista. Comprometo-me a manter em sigilo as informações aqui prestadas.

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APENDICE II

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Prezado (a) Senhor (a)_________________________________________________

Esta pesquisa é sobre REPRESENTAÇÃO SOCIAL DA PESSOA COM

DEFICIÊNCIA FRENTE À EXCLUSÃO X INCLUSÃO

e está sendo desenvolvida por

Sandra Maria Cordeiro Rocha de Carvalho, mestranda da 26ª. Turma do Curso de Mestrado

em Educação / PPGE da Universidade Federal da Paraíba, sob a orientação da Profa. Dra.

Edineide Jezine Mesquita.

O objetivo deste estudo é dar voz às pessoas com deficiência (visual e motora), para

que, por meio de suas falas, possam explicitar os sentimentos, significados e as representações

que emergem no seu cotidiano, buscando compreender as atitudes e desvelar as contradições

existentes nos conceitos de inclusão que influenciam e expressam as ações dentro do contexto

que estão inseridos.

A finalidade deste trabalho é contribuir para um maior esclarecimento acerca da

necessidade de fazer com que as pessoas com deficiência se apercebam da necessidade de se

interarem dos seus direitos enquanto cidadão (ã) no contexto que estão inseridas. Trazendo-as

direta ou indiretamente a refletir criticamente sobre a sua participação e contribuição na

temática inclusivista atual.

Solicitamos a sua colaboração para responder a entrevista, como também sua

autorização para apresentar os resultados deste estudo em eventos da área de saúde e publicar

em revista científica. Por ocasião da publicação dos resultados, seu nome será mantido em

sigilo. Informamos que essa pesquisa não oferece riscos, previsíveis, para a sua saúde.

Esclarecemos que sua participação no estudo é voluntária e, portanto, o (a) senhor (a)

não é obrigado (a) a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas pela

Pesquisadora. Caso decida não participar do estudo, ou resolver a qualquer momento desistir

do mesmo, não sofrerá nenhum dano, nem haverá modificação na assistência que vem

recebendo na Instituição.

Os pesquisadores estarão a sua disposição para qualquer esclarecimento que considere

necessário em qualquer etapa da pesquisa.

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Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido (a) e dou o meu

consentimento para participar da pesquisa e para publicação dos resultados. Estou ciente que

receberei uma cópia desse documento.

______________________________________ Assinatura do Participante da Pesquisa ou Responsável Legal

OBERVAÇÃO: (em caso de analfabeto - acrescentar)

Espaço para impressão dactiloscópica ______________________________________ Assinatura da Testemunha

Contato com o Pesquisador (a) Responsável:

Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para o (a) pesquisador (a)

Sandra Maria Cordeiro Rocha de Carvalho

Endereço: Centro de Educação / Mestrado em Educação/ PPGE - UFPB Telefone: (83) 32552001 (83) 99794788

Atenciosamente,

___________________________________________ Assinatura do Pesquisador Responsável

___________________________________________ Assinatura do Pesquisador Participante

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ANEXOS

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