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RENADE Rede Nacional de Defensores dos Adolescentes em Conflito com a Lei Relatório Final 1 É preciso estar atento e forte... O presente Relatório tem o objetivo de apresentar o trabalho realizado pela Consultoria junto à RENADE no período de um ano compreendido entre abril de 2012 e março de 2013, bem como propor ações de incidência política junto ao Parlamento e o Executivo federais. Nesse período, diversas atividades foram executadas, como a elaboração de pareceres que subsidiem parlamentares atuantes na tramitação dos projetos de lei e propostas de emenda constitucional que afetem os direitos socioeducativos de crianças, adolescentes e jovens adultos; realização de encontros da rede de entidades componentes da RENADE e de adolescentes; articulação entre entidades e movimentos sociais potencialmente parceiros na consecução de ações de campanha e de elaboração dos pareceres; disseminação de informações e documentos normativos na rede eletrônica da RENADE; realização de reuniões com parlamentares federais etc. Em suma, atividades que contemplam diretamente a finalidade dessa atuação consultora, em prol das ações da Rede Nacional. Apresentam-se as principais propostas de alteração legislativa atuais (Câmara dos Deputados e Senado Federal); análise das propostas em andamento e as ações de articulação parlamentar e incidência política por meio do assessoramento técnico e parcerias. A seguir, o Relatório desenvolve-se nas seguintes partes: I. Propostas de Emenda Constitucional. II. Projetos de Lei. III. Leitura política sobre as propostas normativas Tendências IV. Estratégias utilizadas durante a Consultoria feita à RENADE V. Plano de Incidência experiência 2012/2013 e propostas para a RENADE. 1 Autoria: Daniel Adolpho Daltin Assis

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RENADE

Rede Nacional de Defensores dos Adolescentes em Conflito com a Lei

Relatório Final1

“É preciso estar atento e forte...”

O presente Relatório tem o objetivo de apresentar o trabalho realizado pela

Consultoria junto à RENADE no período de um ano compreendido entre abril de 2012 e

março de 2013, bem como propor ações de incidência política junto ao Parlamento e o

Executivo federais. Nesse período, diversas atividades foram executadas, como a

elaboração de pareceres que subsidiem parlamentares atuantes na tramitação dos

projetos de lei e propostas de emenda constitucional que afetem os direitos

socioeducativos de crianças, adolescentes e jovens adultos; realização de encontros da

rede de entidades componentes da RENADE e de adolescentes; articulação entre

entidades e movimentos sociais potencialmente parceiros na consecução de ações de

campanha e de elaboração dos pareceres; disseminação de informações e documentos

normativos na rede eletrônica da RENADE; realização de reuniões com parlamentares

federais etc. Em suma, atividades que contemplam diretamente a finalidade dessa

atuação consultora, em prol das ações da Rede Nacional. Apresentam-se as principais

propostas de alteração legislativa atuais (Câmara dos Deputados e Senado Federal);

análise das propostas em andamento e as ações de articulação parlamentar e incidência

política por meio do assessoramento técnico e parcerias.

A seguir, o Relatório desenvolve-se nas seguintes partes:

I. Propostas de Emenda Constitucional.

II. Projetos de Lei.

III. Leitura política sobre as propostas normativas – Tendências

IV. Estratégias utilizadas durante a Consultoria feita à RENADE

V. Plano de Incidência – experiência 2012/2013 e propostas para a RENADE.

1 Autoria: Daniel Adolpho Daltin Assis

O processo de investigação adotou como estratégia a busca por palavras-chave,

uma vez que o universo de proposições não está previamente divido em categorias que

nos contemplem, senão, apenas, por espécies de normas propostas. A busca se deu nos

portais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e resultou em 100 proposições.

Realizou-se por meio das seguintes palavras-chave: “socioeducativo”, “medida

socioeducativa”, “conflito com a lei”, “adolescente e ato infracional”. Diante disso,

encontramos as proposições a seguir sistematizadas.

Nas tabelas, dividimos em cores que sinalizam os documentos que se

apresentam, ao ver do autor deste Relatório, com o objetivo de:

a) promover retrocessos no marco histórico das conquistas sociais dos adolescentes e

que estejam:

i. em andamento regular cor vermelha.

ii. em andamento irregular (distintos arquivamentos) cor amarela.

b) promover avanços, estratégicos ou finalísticos2, no marco histórico das conquistas

sociais dos adolescentes cor verde.

Com isso, pretendemos que o leitor assimile, de forma didática e sintetizada, o

universo de documentos normativos propostos no Congresso Nacional – instância

legítima para alterar a Carta Magna e as leis ordinárias infra-constitucionais - por meio

da numeração, autoria, ementa (ou explicação da ementa) e etapas do complexo

processo legislativo. Para maior detalhamento de cada documento, sugere-se entrar nos

portais das instituições mencionadas3 e utilizar os recursos presentes.

Pontuaremos, ao final, estratégias utilizadas e a serem aproveitadas para os

próximos passos desta Rede Nacional de Defensores do Adolescente em Conflito com a

Lei e de outras tantas entidades, redes, coletivos, movimentos e órgãos (estatais e não-

estatais) que se coloquem rumo ao objetivo de defesa de direitos humanos de

adolescentes e jovens por meio da incidência política.

2 Adotamos a nomenclatura “avanço estratégico” como sinal de ações legislativas que, apesar de não

gerarem efeitos concretos de significativa conquista, produzem elementos de mobilização dos setores

progressistas e convencimento setores moderados e conservadores. Já “avanço finalístico” é nomenclatura

informalmente adotada para significar o resultado de ações legislativas que assumem um claro

posicionamento de radicalização da democracia e de suas instituições de garantia de direitos.

3 Câmara dos Deputados: www.camara.gov.br; Senado Federal: www.senado.gov.br.

Glossário

Câmara dos Deputados

CCJC – Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.

CCJR – Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (extinta).

CSSF – Comissão de Seguridade Social e Família.

CSPCCO – Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado.

CECD – Comissão de Educação, Cultura e Desporto.

CREDN - Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional.

CEC – Comissão de Educação e Cultura.

CDHM – Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

CMADS - Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

Senado Federal

CCJ - Comissão de Constituição e Justiça.

CDH/LP - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa.

CAS – Comissão de Assuntos Sociais.

CCJSSP - Subcomissão Permanente de Segurança Pública.

CAE – Comissão de Assuntos Econômicos.

I. Propostas de Emenda Constitucional (PEC).

a) Câmara dos Deputados

O processo de busca no portal da Câmara dos Deputados deu origem à

identificação de 31 Propostas de Emenda Constitucional (PEC). São elas:

PEC Autoria Ementa / Explicação

da ementa

Tramitação e status

171/93 Dep. Benedito

Domingos (PP/DF)

Altera a redação do art.

228 da Constituição

Federal (imputabilidade

penal do maior de

dezesseis anos).

De 1993 a 2012: apensamento de

28 PECs: 14/89, 37/95, 91/95,

531/97, 633/99, 68/99, 133/99,

150/99, 167/99, 169/99, 260/00,

321/01, 377/01, 582/02, 64/03,

179/03, 272/04, 302/04, 489/05,

48/07, 73/07, 85/07, 87/07,

125/07, 399/09, 57/11, 223/12,

228/12.

1995: encaminhado à CCJC.

2009: parecer Dep. Rel. Marcelo

Itagiba (PSDB/RJ).

37/95 Dep. Telmo Kirst

(PPR/RS)

Dispõe que são penalmente

inimputáveis os menores

de dezesseis anos, sujeitos

às normas da legislação

especial.

1995: apensamento à PEC

171/93.

91/95 Dep. Aracely de

Paula (PFL/MG)

Declara inimputáveis os

menores de dezesseis anos.

1995: apensamento à PEC

171/93.

1996: Apensadas a esta as PEC

386/96 e 426/96.

301/96 Dep. Jair Bolsonaro

(PPB/RJ) Estabelece que os menores

de 16 (dezesseis) anos são

inimputáveis, sujeitando-se

as normas da legislação

especial.

1996: apensamento à PEC

171/93.

386/96 Dep. Pedrinho Abrão

(PTB/GO) Excetua a inimputabilidade

penal os maiores de

dezesseis e menores de

dezoito anos no caso de

crimes contra a pessoa, o

1996: apensamento à PEC 91/95.

patrimônio e dos crimes

hediondos.

426/96 Dep. Nair Xavier

Lobo (PMDB/GO) Declara inimputáveis os

menores de dezesseis anos.

1996: apensamento à PEC 91/95.

531/97 Dep. Feu Rosa

(PSDB/ES)

Determina a

imputabilidade penal do

maior de dezesseis anos.

1997: apensamento à PEC

171/93.

68/99 Dep. Luiz Antonio

Fleury (PTB/SP) Estabelecendo a

imputabilidade penal do

maior de dezesseis anos.

1999: apensamento à PEC

171/93.

133/99 Dep. Ricardo Izar

(PMDB/SP) Declara inimputáveis os

menores de dezesseis anos,

sujeitos às normas da

legislação especial.

1999: apensamento à PEC

171/93.

150/99 Marçal Filho

(PMDB/RS) Dispõe sobre a

imputabilidade penal do

maior de dezesseis anos.

1999: apensamento à PEC

171/93.

167/99 Dep. Ronaldo

Vasconcellos

(PFL/MG)

Altera o limite de idade da

responsabilidade penal

para dezesseis anos. Altera

a Constituição Federal de

1988.

2000: apensamento à PEC

171/93.

169/99 Dep. Nelo Rodolfo

(PPB/SP) Altera o limite de idade da

responsabilidade penal

para quatorze anos.

2000: apensamento à PEC

171/93.

2004: Apensada a esta a PEC

242/04.

260/00 Dep. Pompeo de

Mattos (PDT/RS) Dispõe que são penalmente

inimputáveis os menores

de dezessete anos, sujeitos

às normas da legislação

2000: apensamento à PEC

171/93.

especial.

633/99 Dep. Osório Adriano

(PFL/DF)

Estabelece que o menor

entre 16 (dezesseis) e 18

(dezoito) anos de idade,

sendo ou não emancipado,

poderá responder a

processo judicial.

1999: apensamento à PEC

171/93.

321/01 Dep. Alberto Fraga

(PMDB/DF) Estabelece que a

maioridade penal será

fixada em lei, devendo ser

observados os aspectos

psicossociais do agente,

aferido em laudo emitido

por junta de saúde que

avaliará a capacidade de se

autodeterminar e de

discernimento do fato

delituoso.

2001: apensamento à PEC

171/93.

377/01 Dep. Jorge Tadeu

Mudalen (PMDB/SP) Reduz para 16 (dezesseis)

anos a imputabilidade

penal.

2001: apensamento à PEC

171/93.

582/02 Dep. Odelmo Leão

(PPB/MG) Estabelece que serão

penalmente inimputáveis

os menores de 16

(dezesseis) anos.

2002: apensamento à PEC

171/93.

64/03 Dep. André Luiz

(PMDB/RJ) Estabelece que lei federal

disporá sobre os casos

excepcionais de

imputabilidade para

menores de dezoito anos e

maiores de dezesseis.

2003: apensamento à PEC

171/93.

179/03 Dep. Wladimir Costa

(PMDB/PA) Estabelece que serão

penalmente inimputáveis

os menores de 16

(dezesseis) anos.

2003: apensamento à PEC

171/93.

272/04 Dep. Pedro Corrêa Reduz para 16 (dezesseis)

2004: apensamento à PEC

(PP/PE) anos a idade para que o

menor seja penalmente

inimputável; altera a

Constituição Federal de

1988

171/93.

302/04 Dep. Almir Moura

(PL/RJ) Dá nova redação ao art.

228, da Constituição

Federal, tornando relativa

a imputabilidade penal dos

dezesseis aos dezoito anos.

2004: apensamento à PEC

171/93.

489/05 Dep. Medeiros

(PL/SP) Submete o menor de 18

(dezoito) anos acusado da

prática de delito penal à

prévia avaliação

psicológica para que o juiz

conclua sobre sua

inimputabilidade; altera a

Constituição Federal de

1988.

2005: apensamento à PEC

171/93.

2005: regime de tramitação –

especial.

48/07 Dep. Rogério Lisboa

(PFL/RJ)

Reduz a idade penal para

16 (dezesseis) anos,

considerando os maiores

de dezesseis anos

imputáveis penalmente.

Altera a Constituição

Federal de 1988.

2007: apensamento à PEC

171/93.

2007: regime de tramitação –

especial.

2007: recebimento pela CCJC.

73/07 Dep. Alfredo Kaefer

(PSDB/PR)

Estabelece que a

autoridade judiciária

decidirá sobre a

imputabilidade penal do

menor de 18 (dezoito)

anos. Altera a Constituição

Federal de 1988.

2007: apensamento à PEC

171/93.

2007: regime de tramitação –

especial.

2007: recebimento pela CCJC.

85/07 Dep. Onyx Lorenzoni

(DEM/RS)

Torna imputável o agente

com idade entre 16

(dezesseis) e 18 (dezoito)

anos que tenha cometido

crime doloso contra a vida,

nos casos em que for

2007: apensamento à PEC

171/93.

2007: regime de tramitação –

especial.

constatado em laudo

técnico que ao tempo do

ato infracional o mesmo

tinha perfeita consciência

da ilicitude do fato. Altera

a Constituição Federal de

1988.

2007: recebimento pela CCJC.

87/07 Dep. Rodrigo de

Castro (PSDB/MG)

Considera penalmente

imputáveis os menores de

dezoito anos nos casos que

especifica.

2007: apensamento à PEC

171/93.

2007: regime de tramitação –

especial.

2007: recebimento pela CCJC.

125/07 Fernando de Fabinho

(DEM/BA)

Torna penalmente

imputável o adolescente;

estabelece que a

imputabilidade será

determinada por decisão

judicial, baseada em

fatores psicossociais e

culturais do agente, e nas

circunstâncias em que foi

praticada a infração penal.

Altera a Constituição

Federal de 1988.

2007: apensamento à PEC

171/93.

2007: regime de tramitação –

especial.

2007: recebimento pela CCJC.

399/09 Dep. Paulo Roberto

Pereira (PTB/RS)

Dá nova redação ao art.

228 da Constituição

Federal, tornando relativa

a imputabilidade penal dos

14 aos 18 anos para crimes

praticados com violência

ou grave ameaça à

integridade das pessoas.

2009: apensamento à PEC

171/93.

2009: regime de tramitação –

especial.

2009: recebimento pela CCJC.

57/11 Dep. André Moura

(PSC/SE)

Estabelece que os maiores

de 16 (dezesseis) anos de

idade são penalmente

imputáveis.

2011: apensamento à PEC

171/93.

2011: regime de tramitação –

especial.

2011: recebimento pela CCJC.

223/12 Onofre Santo

Agostini (PSD/SC)

Dispõe sobre alteração do

art. 228 da Constituição

Federal, propondo a

redução da maioridade

penal.

2012: apensamento à PEC

171/93.

2012: regime de tramitação –

especial.

2012: recebimento pela CCJC.

228/12 Keiko Ota (PSB/SP) Altera o art. 228 da

Constituição Federal, para

reduzir a idade prevista

para imputabilidade penal,

nas condições que

estabelece.

2012: apensamento à PEC

171/93.

2012: regime de tramitação –

especial.

2012: recebimento pela CCJC.

b) Senado Federal

Em busca no portal do Senado Federal, a partir das mesmas palavras-chave,

encontramos 09 Propostas de Emenda Constitucional.

PEC Autoria Ementa / Explicação

da ementa

Tramitação e status

18/99 Romero Jucá

(PSDB/RR)

Altera a redação do art.

228 da Constituição

Federal.

1999: encaminhado à CCJ.

1999: tramitação conjunta com a PEC

20/99.

2001: tramitação conjunta com a PEC

03/01.

2004: tramitação conjunta com as PEC

26/02, 90/03 e 09/04.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE)

2009: desapensação das demais PEC e

arquivo.

20/99 Sen. José Roberto

Arruda

(PSDB/DF)

Altera o art. 228 da

Constituição Federal,

reduzindo para dezesseis

anos a idade para

imputabilidade penal.

1999: Recebido pela CCJ.

1999: tramitação conjunta com a PEC

18/99.

2001: tramitação conjunta com a PEC

03/01.

2004: tramitação conjunta com as PEC

26/02, 90/03 e 09/04.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE)

16.04.2012: Aguarda inclusão em Ordem

do Dia.

03/01 Sen. José Roberto

Arruda

(PSDB/DF)

Altera o art. 228 da

Constituição Federal,

reduzindo para dezesseis

anos a idade para

imputabilidade penal.

2001: Recebido pela CCJ.

2001: tramitação conjunta com as PEC

18/99 e 20/99.

2004: tramitação conjunta com as PEC

26/02, 90/03 e 09/04.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE)

2011: Arquivado.

26/02 Sen. Íris Resende

(PMDB/GO)

Altera o art. 228 da

Constituição Federal, para

reduzir a idade prevista

para a imputabilidade

penal, nas condições que

estabelece.

2002: Recebido pela CCJ.

2004: tramitação conjunta com as PEC

18/99, 20/99, 03/01, 90/03 e 09/04.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE)

2011: Arquivado.

90/03 Sen. Magno Malta

(PL/ES)

Inclui parágrafo único no

art. 228, da Constituição

Federal, para considerar

penalmente imputáveis os

maiores de treze anos que

tenham praticados crimes

definidos como hediondos.

2004: Recebido pela CCJ.

2004: tramitação conjunta com as PEC

18/99, 20/99, 03/01, 26/02 e 09/04.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE).

04/2012: aguardando novo Relator

(CCJ).

09/04 Sen. Papaléo Paes

(PSDB/AP)

Acrescenta parágrafo no

art. 228 da Constituição

Federal, para determinar a

imputabilidade penal

quando o menor apresentar

idade psicológica igual ou

superior a dezoito anos.

2004: Recebido pela CCJ.

2004: tramitação conjunta com as PEC

18/99, 20/99, 03/01, 26/02 e 90/03.

2007: Aprovação favorável à PEC 20/99,

com rejeição às PEC 18/99, 03/01,

26/02, 90/03 e 09/04 (Rel. Sen.

Demóstenes Torres – DEM/GO). Voto

em separado, pela rejeição, dos Sen.

Aloizio Mercadante (PT/SP) e Patricia

Saboya (PDT/CE).

2011: Arquivado.

74/11 Sen. Acir Gurgacz

(PDT/RO)

Redução da idade penal

para 15 anos para atos

infracionais equivalentes a

homicídio doloso e roubo

seguido de morte, tentado

ou consumado.

08/2011: remetido à CCJ.

12/12: envio do Requerimento n. 1.175,

do Senador Benedito de Lira (PP/AL),

para tramitação conjunta com as PEC

83/11 e 33/12.

01/2013: Requerimento aprovado na

Mesa do Senado.

83/11 Sen. Clesio

Andrade

(PMDB/MG)

Estabelece a maioridade

civil e penal aos dezesseis

anos, tornando obrigatório

o exercício do voto nesta

idade.

09/2011: remetido à CCJ.

09/2012: designado Relator Sen.

Benedito de Lira (PP/AL)

12/12: envio do Requerimento n. 1.175,

do Senador Benedito de Lira (PP/AL),

para tramitação conjunta com as PEC

74/11 e 33/12.

01/2013: Requerimento aprovado na

Mesa do Senado.

33/12 Sen. Aloysio

Nunes (PSDB/SP)

Altera a redação dos arts.

129 e 228 da Constituição Federal, acrescentando um

parágrafo único para

prever a possibilidade de

desconsideração da

inimputabilidade penal de

maiores de dezesseis anos

e menores de dezoito anos

07/2012: Recebido na CCJ.

10/2012: Designado Relator Sen. Ricardo Ferraço (PMDB/ES).

12/12: envio do Requerimento n. 1.175,

do Senador Benedito de Lira (PP/AL),

para tramitação conjunta com as PEC

74/11 e 83/11.

por lei complementar.

II. Projetos de Lei.

a) Câmara dos Deputados

Durante a pesquisa no portal citado, encontramos 44 Projetos de Lei.

Projetos

de lei

Autoria Ementa / Explicação da

ementa

Tramitação e status

398/99 Dep. Enio

Bacci

(PDT/RS)

Proibe a divulgação das iniciais

do nome e prenome do menor

infrator.

1999: apensado ao PL 4412/98.

2002: desapensado do PL 4412/98 e

apensado ao PL 397/99.

2002: Recebido pela CSSF.

2003: Arquivado junto ao PL

397/99.

2007: Arquivado na mesa diretora.

1938/99 Dep. Enio

Bacci

(PDT/RS)

Dispõe que a partir da idade de 18

(dezoito) anos, o adolescente

deverá ser liberado, colocado em

regime de semiliberdade ou de

liberdade assistida; ou ainda

transferido para casas de

transição.

1999: Recebido pela CSSF.

2000: Apensa-se a este o PL

2511/00.

2000: Aprovação pela CSSF.

2001: Recebido pela CCJR.

2011: Aguardo de Relatoria na

CCJC.

2847/00 Dep. Darcísio

Perondi

(PMDB/RS)

Estabelece que para as pessoas

entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e

um) anos a pena sócio-educativa

poderá estender-se até 23 (vinte e

três) anos nos casos de crime

violento, ameaça grave a pessoas

e tráfico ilícito de drogas, pode a

mesma ser cumprida em

penitenciária destinada a adultos.

2000: Recebido pela CSSF.

Apensamento dos PLs: 3362/00,

3700/00, 5035/01, 5036/01,

5037/01, 6923/02, 852/03, 904/03,

2523/034, 2588/03, 2628/03,

109/07, 114/07, 157/07.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2007: Aprovação pela CSPCCO.

Apensamento dos PLs: 165/07,

102/07, 120/07, 179/07, 241/07,

4 Os PLs em negrito e itálico referem-se a projetos discriminados ao longo da tabela, aleatoriamente

escolhidos como forma de transmitir ao leitor a tendência do conteúdo desses documentos apensados ao

PL n. 2847/2000 (principal).

173/07, 177/07, 184/07, 322/07,

395/07, 565/07, 719/07, 820/07,

934/07, 941/07, 978/07, 2215/07,

2754/08, 3967/08, 4617/09,

4753/09, 4808/09,

2511/00 Dep. Alberto

Fraga

(PMDB/DF)

Dispõe que o período de

internação do menor infrator

poderá exceder três anos, quando

o ato infracional for considerado

como crime hediondo; e quando o

adolescente infrator completar

dezoito anos de idade será

transferido para a penitenciária.

2003: Recebido pela CCJR.

2003: Apensado ao PL 1938/99.

3362/00 Dep. Eunício

Oliveira

(PMDB/CE)

Possibilita à autoridade judicial

determinar, ouvido o Ministério

Público, o recolhimento, aos

abrigos, de menores que estejam

em desamparo, pelas ruas, e em

condições desfavoráveis de

sobrevivência; possibilita a

prorrogação do prazo de

internação; extingue a liberação

compulsória aos vinte e um anos e

inclui a prática do tráfico de

drogas passível de medida de

internação de menores.

2000: Apensado ao PL 2847/00.

2004: Apensa-se a este o PL

3444/04.

2009: Apensam-se a este os PLs

5212/09 e 5670/09.

2009: Arquivado.

5546/01 Dep. Nilmário

Miranda

PT/MG) e

Nelson

Pellegrino

(PT/BA)

Estabelece medidas de prevenção

e regras para a persecução penal

das práticas delituosas previstas

na Lei nº 9.455, de 07 de abril de

1997, e dá outras providências.

2002: Recebido pela CECD.

2003: Aprovação pela CECD.

2003: Recebido pela CREDN

(excluída).

2004: Recebido pela CSPCCO.

2004: Aprovação pela CSPCCO.

2004: Recebido pela CCJC.

2005: Apensa-se a este o PL

5233/05.

2006: Aprovação pela CCJC.

2011: Apensa-se a este o PL

958/11. Regime de Prioridade.

6577/02 Dep. José

Carlos

Coutinho

(PFL/RJ)

Caracterizando como crime a

permissão, por omissão ou

abandono, por parte dos pais ou

responsáveis pelo pátrio poder do

menor de 18 (dezoito) anos que

2002: Apensado ao PL 5699/01.

2002: Recebido pela CCJR.

2003: Arquivado.

comete ato infracional.

7318/02 Comissão de

Segurança

Pública e

Combate ao

Crime

Organizado,

Violência e

Narcotráfico

Altera dispositivos sobre adoção

internacional e medidas

sócioeducativas de internação do

menor infrator em

estabelecimentos de recuperação e

ressocialização; aumenta para 16

anos a idade de início da atividade

laboral do menor; agravando a

pena para o crime de pedofilia

pela Internet e para as pessoas que

usam menores como "escudo

humano" em movimento de

manifestação coletiva.

[aumenta, em casos excepcionais,

em um ano o tempo da medida

socioeducativa de internação]

2002: Recebido pela CSSF.

2004: Arquivo.

1754/03 Dep. Carlos

Nader

(PFL/RJ)

Caracteriza como crime a

permissão, por omissão ou

abandono, por parte dos pais ou

responsáveis pelo pátrio poder do

menor de 18 (dezoito) anos que

comete ato infracional.

2003: Recebido pela CEC.

2003: Aprovado o parecer de

rejeição da Dep. Rel. Professora

Raquel Teixeira.

2004: Recebido pela CSSF.

2004: Aprovado o parecer de

rejeição do Dep. Rel. Geraldo

Resende.

2005: Recebido pela CCJC.

2008: Arquivo.

2523/03 Dep. Moroni

Torgan

(PFL/CE)

Aumenta para seis anos o limite

máximo de internação do menor

infrator e para nove anos caso o

ato infracional descrito como

homicídio tenha sido praticado

após a imposição de medida

sócio-educativa pela prática

anterior do mesmo ato, não se

aplicando a liberdade compulsória

aos 21 (vinte e um) anos.

2003: Apensado ao PL 2847/00

(arquivado)

2588/03 Dep. Vicente

Cascione

(PTB/SP)

Altera os arts. 103, 108, 121, 122

e 123, da Lei n° 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente,

dispondo sobre medidas de

repressão aos atos infracionais

2003: Apensado ao PL 2847/00

(arquivado)

graves e aos correspondentes aos

crimes hediondos.

2628/03 Dep. Jutahy

Junior

(PSDB/BA)

Estabelece a transferência para

prisão comum de infrator quando

completar dezoito anos;

aumentando o período de

internação para oito anos.

2003: Apensado ao PL 2847/00

(arquivado)

1871/03 Dep. Antonio

Carlos Biscaia

(PT/RJ)

Acrescenta parágrafos ao art. 120

da Lei nº 8.069, de 13 de julho de

1990, que dispõe sobre o Estatuto

da Criança e do Adolescente, e dá

outras providências.

[Propõe a divisão de lucros,

resultantes da atividade de

profissionalização, entre

adolescente, familiares e despesa

de custeio]

Projetos apensados: PLs n.

1.894/03, 2.382/03, 2.705/03,

2.799/03, 3.022/04.

Parecer de aprovação, com

emendas e voto separado (Dep. Rita

Camata (PMDB/ES), da CSSF;

Parecer de aprovação do parecer da

CSSF, da CCJ, e pela rejeição dos

PLs apensados.

2008: Desapensação dos PLs.

2008: Remessa ao Senado Federal.

2575/03 Dep. Ronaldo

Vasconcellos

(PTB/MG)

Altera dispositivos da Lei nº

8.069, de 13 de julho de 1990,

que dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente.

[Propõe o aumento excepcional, a

critério do juiz, de um ano no

tempo limite de três anos de

internação; aplicação automática

de internação em caso de tráfico

de entorpecentes.5]

2005: Parecer da CSSF com

substitutivo.

2005: Aprovação do parecer da

CSSF.

2005: Recebimento pela CCJC.

2007: Parecer do Relator favorável.

2008: Arquivo.

2799/03 Dep.

Alexandre

Santos

(PMDB/RJ)

Altera o Estatuto da Criança e do

Adolescente.

[Propõe a divisão de lucros,

resultantes da atividade de

profissionalização, entre

adolescente, familiares e despesa

de custeio.]

2004: Apensado ao PL n.

1871/2003.

2007: Rejeitado em pareceres da

CSSF e CCJ, no bojo do PL

1871/2003.

2008: desapensação automática do

PL 1871/03.

2008: Arquivado na Mesa Diretora

da Câmara dos Deputados.

5 Neste caso, destacamos apenas a parte do PL referente ao assunto em pauta, eis que o documento traz

inovações de outras áreas infanto-adolescentes, como o aliciamento de crianças e adolescentes, adoção

internacional e trabalho em aprendizagem.

3444/04 Dep. Jefferson

Campos

(PMDB/SP)

Acrescenta dispositivo à Lei nº

8.069, de 13 de Julho de 1990 -

Estatuto da Criança e do

Adolescente, para dispor sobre a

internação do adolescente que

praticar ato infracional de tráfico

ilícito de entorpecentes

2004: Apensado ao PL 3362/00

(apensado ao PL 2847/00 –

arquivado)

4487/04 Dep. Enio

Bacci

(PDT/RS)

Proíbe qualquer imagem de

crianças envolvidas em ato

infracional e dá outras

providências.

2004: Recebido pela CSSF.

2011: Aprovado parecer favorável.

2011: Recebido pela CCJC.

3022/2004 Dep. Carlos

Nader (PL/RJ)

Acrescenta dispositivos ao art.

120 da Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990, que ‘dispõe sobre o

Estatuto da Criança e do

Adolescente, e dá outras

providências’.

[Propõe a divisão de lucros,

resultantes da atividade de

profissionalização, entre

adolescente, familiares e despesa

de custeio.]

2004: Apensado ao PL n.

1871/2003.

2007: Rejeitado em pareceres da

CSSF e CCJ, no bojo do PL

1871/2003.

2008: desapensação automática do

PL 1871/03.

2008: Arquivado na Mesa Diretora

da Câmara dos Deputados.

5233/05 Dep.

Sigmaringa

Seixas

(PT/DF)

Definindo a pessoa custodiada e

estabelecendo normas para

investigação, punição e prevenção

dos crimes de tortura, incluindo

no Código Penal (Decreto-Lei nº

2.848, de 1940) o tipo especial

"Alegação Falsa de Confissão sob

Tortura ou Ameaça de Tortura".

2005: Recebido pela CDHM.

2006: Apensado ao PL 5546/01.

2011: Apensado a este o PL

2442/11 e colocados em regime de

prioridade.

102/07 Dep. Jorge

Tadeu

Mudalen

(PFL/SP)

Estabelece a liberação

compulsória de internação aos 24

(vinte e quatro) anos de idade,

para os casos de ato infracional

grave e tráfico ilícito de drogas;

estendendo o período de

internação a no máximo 6 (seis)

anos,

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

109/07 Dep. Solange

Amaral

(PFL/RJ)

Possibilita a internação de

adolescente em estabelecimento

prisional e aumenta o prazo

máximo de internação para 9

(nove) anos, restringindo as

atividades externas e a concessão

de remissão pelo Ministério

Público nos casos de atos

infracionais tipificados como

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

homicídio qualificado ou crime

hediondo.

120/07 Dep. Neilton

Mulim

(PR/RJ)

Cria a Comissão da Infância e

Juventude para elaboração de

laudo que servirá como requisito

para o juiz estabelecer a medida

socioeducativa a ser aplicada ao

adolescente; extingue o prazo

máximo de internação que será

decidido pelo Juiz, conforme o

ato infracional praticado;

determina a separação do infrator

maior de idade do abrigo

destinado ao menor.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

167/07 Dep. Perpétua

Almeida

(PCdoB/AC)

e Abelardo

Camarinha

(PSB/SP)

Aumenta para até 10 (dez) anos o

tempo de internação e amplia o

limite de idade para liberação

compulsória do adolescente

infrator, aplicando medida sócio-

educativa especial em caso de ato

infracional descrito como crime

hediondo, praticada por

adolescente com mais de 16

(dezesseis) anos; determina o

cumprimento da medida de

internação em local diferenciado e

específico.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

177/07 Dep. Onyx

Lorenzoni

(PFL/RS)

Aumenta para no máximo seis

anos o prazo de internação do

menor infrator, com agravação

penal nos casos de homicídio ou

lesão corporal grave e por

participação em quadrilha ou

bando ou em crime organizado.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

395/07 Dep. Márcio

França

(PSB/SP)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente - para

ampliar o prazo de internação do

adolescente infrator, estabelecer a

possibilidade de aplicação de

medidas de segurança, e dá outras

providências.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

565/07 Dep. William

Woo

(PSDB/SP)

Possibilita a internação

provisória, autorizada pelo juiz,

no caso de suspeita da prática de

ato infracional por adolescente.

Aumenta o prazo de internação

para 6 (seis) meses em caso de

reincidência.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

820/07 Dep. Clodovil

Hernandes

(PTC/SP)

Estabelece a liberação

compulsória de internação aos 26

(vinte e seis) anos de idade;

estendendo o período de

internação a no máximo 8 (oito)

anos,

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

1170/07 Dep. Paulo

Paim (PT/RS)

Altera o art. 143 da Lei nº 8.069,

de 13 de julho de 1990 - Estatuto

da Criança e do Adolescente -

ECA, para ampliar as hipóteses de

vedação da divulgação de nomes

de crianças e adolescentes.

2007: Recebido pela CSSF.

2009: Aprovação do parecer

favorável pela CSSF.

2009: Recebido pela CCJC.

2011: Aprovação do parecer

favorável pela CCJC.

2011: Aguardo de deliberação de

recurso na Mesa.

2215/07 Dep. Laerte

Bessa

(PMDB/DF)

Estabelece a internação de menor

infrator com conduta descrita

como crime hediondo, tortura,

tráfico de drogas ou terrorismo.

2007: Apensado ao PL 2847/00.

2007: Recebido pela CSPCCO.

2009: Arquivado.

2754/08 Dep. Edson

Ezequiel

(PMDB/RJ)

Dispõe sobre o tratamento

individual adolescente que tenha

cometido ato infracional análago

a homicídio doloso e manifeste

grave desvio de personalidade.

2008: Apensado ao PL 2847/00.

2008: Recebido pela CSSF.

2009: Arquivado.

4808/09 Dep.

Fernando de

Fabinho

(DEM/BA)

Aumenta o prazo de internação do

menor infrator para até 6 (seis)

anos e estabelece a liberação

compulsória de internação aos 26

(vinte e seis) anos de idade.

2009: Apensado ao PL 2847/00.

2009: Recebido pela CSSF.

2009: Arquivado.

5673/09 Dep. Glauber

Braga

(PSB/RJ)

Dá nova redação ao art. 104 da

Lei nº 8.069, 13 de julho de 1990,

e inclui na referida lei os arts.

105-A e 122, considerando que o

regime de semiliberdade e a

medida de internação não serão

aplicados ao adolescente que

praticou o ato infracional em

razão de dependência ou sob o

efeito de droga; os benefícios da

anistia, graça e indulto alcançam

o menor infrator e a medida de

internação só poderá ser aplicada

após o trânsito em julgado da

sentença condenatória.

2009: Recebido pela CSPCCO.

2010: Aprovado parecer

desfavorável do Dep. Major Fábio

(DEM/PB).

2010: Recebido pela CSSF.

04/2012: Parecer desfavorável do

Dep. Rel. Osmar Terra

(PMDB/RS), pela CSSF.

2012: No aguardo da pauta.

7208/10 Dep. Willian

Woo (PPS/SP)

Altera os arts. 103, 108, 121, 122

e 123, da Lei n° 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente,

dispondo sobre medidas de

repressão aos atos infracionais

graves e aos correspondentes aos

crimes hediondos.

2010: Recebido pela CSPCCO.

2010: Designado Relator Dep.

Capitão Assumção (PSB/ES).

03/2012: Ao arquivo.

7934/10 Dep. Fátima

Pelaes

(PMDB/AP)

Torna obrigatória a realização de

cursos de reutilização e

reciclagem do papelão descartado

por supermercados e

distribuidoras varejistas, a

egressos do sistema prisional e

jovens em cumprimento de

medidas socioeducativas.

2010: Recebido pela CMADS.

11/2012: Parecer desfavorável -

Dep. Bernardo Santana de

Vasconcellos (PR-MG).

12.12.12: Recebido pela CSPCCO.

7398/10 Dep. Rita

Camata

(PMDB/ES)

Dá nova redação ao § 3º do art.

121 da Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990. [Aumenta o prazo

de internação em casos de atos

infracionais que se equiparem aos

crimes hediondos ou tráfico de

entorpecentes.]

2010: Apensado ao PL 7008/2010.

2010: Recebido pela CSPCCO.

2011: Arquivado na Mesa Diretora

da Câmara dos Deputados.

346/11 Dep. Hugo

Leal (PSC/RJ)

Estabelece que internação poderá

chegar a cinco anos e concede

formação técnico-profissional.

2011: Recebido pela CSPCCO.

04/2011: Designado Dep. Rel.

Alessandro Molon (PT/RJ).

347/11 Dep. Hugo

Leal (PSC/RJ)

Altera dispositivos da Lei nº

8.069, de 13 de julho de 1990,

que dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente e dá

outras providências, para tratar

dos casos de aplicação da medida

de internação.

2011: Recebido pela CSPCCO.

2011: Apensado a este o PL

1052/11.

06/2011: Parecer, pela rejeição, da

Dep. Rel. Benedita da Silva

(PT/RJ).

2012: Apensados a este os PLs

3503/12 e 3680/12.

348/11 Dep. Hugo

Leal (PSC/RJ)

Cria dispositivos na Lei nº 8.069,

de 13 de julho de 1990, que

dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente e dá

outras providências, para dispor

sobre antecedentes, tratamento

ambulatorial, internação em

estabelecimento de tratamento

psiquiátrico e responsabilidade do

Estado para adequar as entidades

de atendimento, públicas ou

privadas, às diretrizes e normas

deste Estatuto.

2011: Recebido pela CSPCCO.

2011: Apensa-se a este o PL

1035/11.

2011: Aprovação pela CSPCCO.

2011: Recebido pela CSSF.

04/2012: Designada Dep. Rel.

Carmen Zanotto (PPS/SC).

958/11 Dep.

Alessandro

Molon

(PT/RJ)

Obriga os órgãos de segurança

pública e os do sistema

penitenciário a informar sobre as

penas para a prática dos crimes de

tortura, bem como os telefones e

endereço eletrônico para a

denúncia desses crimes.

2011: Apensado ao PL 5546/01.

1052/11 Dep. Dr.

Ubiali

(PSB/SP)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente - para

ampliar o prazo de internação do

adolescente infrator, estabelecer a

possibilidade de aplicação de

medidas de segurança, e dá outras

providências.

2011: Apensado ao PL 347/11.

2011: Recebido pela CSPCCO.

1896/11 Dep.

Alexandre

Leite

(DEM/SP)

Aumenta o período de internação

no caso de atos infracionais

cometidos com violência ou grave

ameaça.

2011: Apensado ao PL 1052/11

(apensado ao PL 347/11).

2011: Recebido pela CSPCCO.

2442/11 Presidência da

República.

Institui o Sistema Nacional de

Prevenção e Combate à Tortura,

cria o Comitê Nacional de

Prevenção e Combate à Tortura e

o Mecanismo Nacional de

Prevenção e Combate à Tortura, e

dá outras providências.

11/2011: Apensado ao PL 5233/05.

3503/12 Dep. Ronaldo

Benedet

(PMDB/SC)

Antes da sentença, poderá ser

determinada a internação

preventiva, a critério da

autoridade judiciária, levando-se

em conta a periculosidade do

menor infrator.

04/2012: Apensado ao PL 347/11 e

recebido pela CSPCCO.

3680/12 Dep. Hugo

Leal (PSC/RJ)

Altera a redação do art. 122 da

Lei nº 8.069, de 13 de julho de

1990, que "dispõe sobre o

Estatuto da Criança e do

Adolescente, e dá outras

providências", a fim de

estabelecer critério para a

aplicação do conceito de

reiteração, com vistas à aplicação

da medida de internação.

05/2012: Apensado ao PL 347/11 e

recebido pela CSPCCO.

b) Senado Federal

A pesquisa no portal do Senado resultou em 15 Projetos de Lei e 01 Projeto de

Decreto Legislativo do Senado Federal (PDS)

Projetos de lei Autoria Ementa / Explicação da

ementa

Tramitação e

status

PLS 245/97 Sen. Paulo Paim

(PT/RS)

Dispõe sobre a reserva de 10%

(dez por cento) das vagas dos

cursos profissionalizantes

administrados pelo senac, senai,

senar e senat para adolescentes

egressos do sistema correcional

ou cumprindo medidas socio-

educativas de semiliberdade ou

liberdade assistida, e da outras

providencias.

1997: Recebido pela

CCJ.

1999: Arquivado.

PLS 107/03 Sen. Paulo Paim Modifica os artigos 121 e 122 da

Lei nº 8069, de 13 de julho de

11/2009: Parecer CCJ.

Rel. Valdir Raupp

(PT/RS) 1990, que 'dispõe sobre o Estatuto

da Criança e do Adolescente e dá

outras providências'.

(PMDB/RO).

11/2009: Encaminhado

para a CDH/LP.

04/2011: Parecer da

CDH/LP de aprovação

com emendas da CCJ.

21.11.2012: adiamento

da matéria por falta de

quorum.

PLS 478/03 Sen. Demóstenes

Torres (DEM/GO)

Altera os artigos 61, 118, 120,

121, 122 e 123 da Lei nº 8069, de

13 de julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente, para

fixar novos prazos de duração das

medidas de liberdade assistida, de

semi-liberdade e de internação,

estabelecer a oferta obrigatória de

atividades pedagógicas,

concomitantes à aplicação de

qualquer medida, e dá outras

providências.”

11/2003: remetido para

a CCJ.

2004: tramitação em

conjunto com a CAS.

11/2011: Designação

da Relatoria na CAS.

PLC 86/06 Sen. João Alfredo

(PT/CE)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990, que dispõe sobre o

Estatuto da Criança e do

Adolescente. (Substitui a

expressão "medida sócio-

educativa" pela "medida

psicossocioeducativa").

2006: Recebido pela

CCJ.

2009: Aprovação pela

CCJ.

2011: Arquivado.

PLS 118/07 Sen. Pedro Simon

(PMDB/RS)

Altera dispositivos do Livro II,

Título III, Capítulo IV da Lei nº

8.069, de 13 de julho de 1990

(Estatuto da Criança e do

Adolescente) para ampliar os

períodos de prestação de serviços

à comunidade e de internação, e

estabelecer outras sanções ao

adolescente infrator.

2007: remetido à

CDH/LP.

05/2011: Designação

de Relatoria na

CDH/LP.

PLC 168/08

(original PL

1871/03 – Câmara

dos Deputados)

Dep. Antonio

Carlos Biscaia

(PT/RJ)

Acresce parágrafos ao art. 120 da

Lei nº 8.069, de 13 de julho de

1990, que dispõe sobre o Estatuto

da Criança e do Adolescente.

(Dispõe sobre a supervisão da

autoridade judiciária nas

atividades de escolarização e

profissionalização desenvolvidas

pelas unidades socioeducativas

11/2008: remetido à

CDH/LP.

06/2010: Parecer

CDH/LP de aprovação

(Relatoria da Sen.

Fatima Cleide (PT-

RO)).

com adolescente em regime de

semi-liberdade).

06/2010: remetido à

CCJ.

06.03.2013: Relatoria

com Sen. Luiz

Henrique (PMDB/SC).

PLS 469/08 Sen. Demóstenes

Torres (DEM/GO)

Altera a Lei n° 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA),

para aumentar o prazo de

internação provisória de

adolescente infrator, fixar o prazo

máximo para a autoridade policial

concluir e encaminhar

procedimento investigatório ao

Ministério Público e alterar o

prazo máximo para conclusão do

procedimento judicial.

12.2008: Remetido à

CDH/LP.

11.2011: Parecer de

rejeição (Relatoria da

Sen. Ana Rita (PT-

ES)).

11.2011: remetido à

CCJ.

03.2012: remetido à

CCJSSP.

05.2012: Relatório

favorável Sen. Rel.

Aloysio Nunes

(PSDB/SP).

PLS 71/10 Sen. Marcelo

Crivella (PRB/RJ)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente, para

estabelecer pena de prisão aos

maiores de 18 (dezoito) anos

condenados pela prática de ato

infracional equivalente a crime

hediondo.

03.2010: remetido à

CDH/LP.

03.2011: Relatório

(Sen. Magno Malta -

PR-ES) favorável.

PLS 246/10 Sen. Demóstenes

Torres (DEM/GO)

Altera o Estatuto da Criança e do

Adolescente, para conferir, nos

feitos infracionais, efeito

suspensivo ao recurso de apelação

sempre que houver perigo de dano

irreparável ou de difícil reparação.

10.2010: remetido à

CCJ.

01.2011: aguardando

designação Relatoria.

PLS 389/11 Sen. Vital do Rêgo

(PMDB/PB)

Altera dispositivos da Lei nº

8.069, de julho de 1990, que

dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente.

[entre eles, normas sobre

internação socioeducativa, com

aumento de prazo para cinco

anos]

2011: Recebido pela

CDH/LP.

04/2012: Tramitação

conjunta com os PLS

357/11 e 568/11.

04/2012: Recebido pela

CAS.

13/03/2013:

Aprovação, na CAS, do

PLS 389/11, e rejeição

dos outros dois PLS.

13/03/2013: Recebido

pela CDH/LP.

PLS 408/11 Sen. Eduardo

Amorim (PSC/SE)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990, que dispõe sobre o

Estatuto da Criança e do

Adolescente e dá outras

providências, para garantir

tratamento especial ao

adolescente viciado em drogas.

07/2011: remetido à

CDH/LP.

03/2012: Parecer de

aprovação (Sen. Rel.

Paulo Davim –

PV/RN).

03.2012: remetido à

CAS.

11/2012: Parecer de

aprovação (Sen. Rel.

Ana Amélia - PP/RS).

11/2012: remetido à

Câmara dos Deputados.

PLS 445/11 Sen. Jayme Campos

(DEM/MT)

Altera o art. 122 da Lei nº 8.069,

de 13 de julho de 1990, que

dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente e dá

outras providências, para inserir,

dentre os pressupostos para

adoção da medida de internação, a

prática do tráfico de drogas ou de

crimes hediondos.

08/2011: remetido à

CDH/LP.

12/2011: Parecer de

aprovação (Sen. Rel.

Magno Malta (PR-

ES)).

12/2011: remetido à

CCJ.

06/03/2013: designada

relatoria do Sen.

Álvaro Dias

(PSDB/PR).

PLS 23/12 Sen. Aloysio Nunes

(PSDB/SP)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de

julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente e a Lei

nº 12.594, de 18 de janeiro de

2012, que institui o SINASE -

Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo, para prever nova

modalidade de medida

socioeducativa e dá outras

providências.

[Cria medida socioeducativa de

“atendimento médico-

psiquiátrico]

05/2012: Parecer de

aprovação, com

modificações, da CAS.

Rel. Sen. Cyro Miranda

(PSDB/GO).

05/2012: remetido à

CDH/LP. Sen. Rel.

Lídice da Mata

(PSB/BA).

PLS 26/12 Sen. Pedro Taques Acrescenta os arts. 114-A 258-A 03/2012: remetido à

(PDT/MT) à Lei nº 8.069, de 13 de julho de

1990 - Estatuto da Criança e do

Adolescente - para prever o prazo

prescricional das medidas

socioeducativas e das multas

aplicadas em razão de

cometimento de infrações

administrativas.

CCJ, aguardando

relatoria.

PLS 322/12 Sen. Gim Argello

(PTB/DF)

Altera a Lei nº 7.210, de 11 de

julho de 1984, e a Lei nº 12.594,

de 18 de janeiro de 2012, para

conceder incentivo tributário a

pessoas jurídicas que realizem

cursos de reutilização e

reciclagem de materiais ou outros

cursos de capacitação para

egressos do sistema prisional e

para jovens em cumprimento de

medidas socioeducativas.

08/2012: Recebido pela

CAE.

11/2012: Designado

Sem. Rel. Eduardo

Suplicy (PT/SP).

PDL 539/12 Sen. Ivo Cassol

(PP/RO)

Convoca plebiscito sobre a

alteração da maioridade penal.

10/2012: Recebido pela

CCJ.

Leitura política sobre as propostas normativas – padrões e tendências

As proposições encontradas refletem, certamente, o anseio de parcela da

população, notadamente em particulares momentos de vida e de relações interpessoais,

sobretudo as mediadas pelos veículos midiáticos de grande audiência. Justamente pela

capilaridade que possuem, as emissoras de rádio e televisão produzem e reproduzem um

sistema circular de fomento ao ódio e à descrença no processo democrático lentamente

em desenvolvimento no país.

Os picos de produção normativa de aumento de rigor na responsabilização dos

adolescentes ocorrem, coincidentemente ou não, no período em que os veículos de

comunicação de massa destinam significativa parte de seus noticiários à exposição de

casos isolados e singularizados de suspeita ou confirmação de cometimento de crimes

de impacto social. Casos elevados ao grau de exemplo e submetidos a um insistente

processo político-midiático de generalizações. Esse impacto social pode ser composto

pela complexa interface entre a natureza grave do (suposto) crime x classe social do

(suposto) autor x classe social da (suposta) vítima x porte da cidade ou da metrópole do

local do (suposto) crime x composição familiar do (suposto) autor e da (suposta) vítima,

origem étnica e condição de renda do (suposto) autor e da (suposta) vítima. Não à toa,

temos diversas proposições legislativas, ainda em andamento, apresentadas entre 2003 e

2004 (construção midiática do caso “Champinha”) e no ano de 2007 (construção

midiática do caso “João Hélio”)6. É o que se evidencia no artigo Mídia e Política: a

construção da agenda nas propostas de redução da maioridade penal na Câmara dos

Deputados, de Marcelo da Silveira Campos7.

Trata-se de proposições que compõem o acervo da “legislação de emergência”8,

isto é, o conjunto de reações legislativas de alta ressonância do comportamento -

especialmente midiático - de massa, supostamente veiculador dos anseios do povo. A

partir do levantamento realizado, verificamos alguns padrões – ou, no mínimo,

tendências - nessas produções de normas. Primeiro, de acordo com a tabela a seguir,

temos a quantidade e porcentagem de proposições de cunho regressivo perante as

conquistas sociais em regular andamento (vermelho) e em irregular andamento

(amarelo), bem como – em minoria – aquelas de natureza progressista em relação aos

direitos humanos de adolescentes e jovens (verde).

6 Vale observar que o primeiro caso é nomeado a partir do apelido do maquinado algoz; o segundo, ao

contrário, leva o nome da maquinada vítima.

7 Artigo escrito sob o Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Estadual de

Campinas, encontrado em http://www.scielo.br/pdf/op/v15n2/08.pdf.

8 Crime e Congresso Nacional no Brasil pós-1988: uma análise da política criminal aprovada de 1989 a

2006 / Marcelo da Silveira Campos. Campinas, SP: [s. n.], 2010, pg. 20. Dissertação de Mestrado

realizado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas.

Câmara dos Deputados Senado Federal

Vermelho 31 PEC (100%) 5 PEC (56%)

8 PL (18%) 10 PL (66%) e 1 PDS (100%)

Amarelo 0 PEC (0%) 4 PEC (44%)

23 PL (52%) 1 PL (6%)

Verde 0 PEC (0%) 0 PEC (0%)

13 PL (29%) 4 PL (26%)

Alguns destaques:

a) PECs da Câmara dos Deputados: todas as PECs identificadas (31) são de

andamento regular e finalidade de maior rigidez e controle sociopenal9 dos

adolescentes em conflito com a lei. Isso significa que as alterações pretendidas

de maior impacto jurídico e político na sociedade brasileira, partidas dos

deputados federais, são, todas, de tomada do retrocesso social.

b) Já no Senado Federal, apenas metade das PECs tem esse condão, o que pode nos

sinalizar vários significados, como:

i. o menor número de senadores e a ampliação de sua representatividade

política (representação nacional, e não apenas de seu estado eleitor) gera

uma leitura mais crítica, ponderada que, eventualmente, enseja maior

manutenção do ordenamento jurídico;

ii. o rigor seletivo do processo legislativo no Senado Federal pode ser maior

do que na Câmara dos Deputados, o que contribuiria para a mitigação de

tentativas imediatistas, oportunistas (de acordo com os apelos midiáticos)

e/ou incautas dos parlamentares.

iii. O grande quadro de deputados não significa, necessariamente, um maior

resguardo do princípio da segurança jurídica presente no ordenamento

constitucional. Em outras palavras, talvez não haja relação direta entre a

alta capilaridade evidenciada no significativo número de deputados

federais e a manutenção dos pilares democráticos da legislação

constitucional. A quantidade não revela, necessariamente, a qualidade

9 SILVA, Maria Liduína de Oliveira e. Entre proteção e punição: o controle sociopenal dos adolescentes.

São Paulo: Unifesp, 2011.

das ações, ou – para além -, a escolha popular talvez não esteja de acordo

com a postura dos escolhidos (e vice-versa).

c) Na Câmara, dentre as proposições de retrocesso social, temos praticamente o

triplo de projetos de leis em andamento irregular, em relação aos de andamento

regular. Isso pode se vincular diretamente ao significativo apensamento de

projetos de lei uns aos outros, como também com – ou em adição a – o circuito

de alta produção normativa sem efeito. Em outras palavras, há uma cifra

considerável de proposições que vão sendo arquivadas ao longo da tramitação

regular, seja por não receberem adesão nem mesmo para seu regular andamento,

seja porque não há iniciativa de desarquivamento no início da sessão legislativa

seguinte (início do ano). Podemos dizer que muitas das proposições, portanto,

são carentes de conteúdo, inovação e justeza frente aos princípios basilares do

Estado Democrático e Social de Direito?

d) Em segundo lugar, os projetos de lei da Câmara encontram-se no campo verde.

Ganham, portanto, dos PLs de retrocesso social e em andamento regular, o que

pode denotar maior sustância e consistência se comparado com os projetos de lei

em vermelho. Teríamos, aí, um foco de resistência aos apelos midiático-

legislativos? Um foco de desentorpecimento da razão10

? Um espaço de produção

normativa regulamentadora – e não destruidora - do marco regulatório dos

direitos humanos?

e) Como se vê e se deduz, a inexistência de PECs em verde, isto é, ausência de

criação normativo-constitucional, o que pode nos gerar a impressão de que a

Constituição Federal já não mais precisa de reparos de avanço político, e sim de

normas regulamentadoras de garantia estratégica de direitos humanos juvenis.

Muitas outras conclusões quantitativas podem ser extraídas da sistematização.

Outras, de cunho quanti-qualitativo, fazem-nos avançar para o conteúdo predominante

das proposições. Identificamos as seguintes tendências:

10 Alusão ao nome do Coletivo DAR – Desentorpecendo a Razão, composição que objetiva a discussão e

a promoção de ações de incidência política e de mobilização social a partir de posicionamentos

antiproibicionistas, especialmente os relacionados ao consumo, produção, porte e comércio de

substâncias psicoativas ilícitas.

40 PECs Câmara dos Deputados (CD) e Senado Federal (SF):

Redução da idade penal11

31 PECs CD

09 PECs SF

02 PECs condicionam à mera decisão judicial

(responsabilização penal ou socioeducativa de acordo com

decisão judicial)

05 PECs condicionam à elaboração de laudo psiquiátrico

ou psicológico

59 PLs Câmara dos Deputados (CD) e Senado Federal (SF)

1º - Aumento de tempo de internação

20 PLs CD 04 PLs SF

2º - Conversão da internação em prisão ou medida de segurança

(aos 18 anos de idade ou no momento da aplicação da medida socioeducativa)

3 PLs CD 1 PL SF

2º - Determinação legal de automática internação socioeducativa frente aos atos

infracionais equiparados a crimes hediondos

1 PL CD 1 PL SF

Vimos, na penúltima tabela, que todas as PECs versam sobre a redução da idade

penal, algumas das quais num ato judicial (consideração de aumento da capacidade do

adolescente de cumprir uma pena) ou, por ato judicial vinculado a laudos psiquiátricos

ou psicológicos, tema, aliás, que vem crescendo nas interlocuções parlamentares,

voltando a se associar (suposta) loucura ao (suposto) cometimento de crime. A este

fenômeno de transmissão de legado penal para o campo da saúde mental podemos

atribuir a expressão controle penal-sanitarista12

.

Já a última tabela nos mostra que mais de um terço de PLs em circulação no

Congresso Nacional propõem o aumento do tempo de internação.

11

Ainda lembramos que há o PDS n. 539/21, do Senado Federal, que visa a instituir o dia das eleições

presidenciais de 2014 como data de realização de plebiscito sobre a redução da idade penal.

12 Dissertação do curso de Mestrado Profissional Adolescente em Conflito com a Lei Risco

social e saúde mental como argumentos para o encarceramento de crianças e adolescentes /

Daniel Adolpho Daltin Assis – São Paulo: [s. n.], 2012. 179f., 30 cm, pg. 120 (Uniban).

IV. Estratégias utilizadas durante a Consultoria feita à RENADE

A Consultoria prestada à RENADE visava a mobilizar as entidades

componentes, especialmente por meio de debates em meio eletrônico; contribuir par a

realização de seminários e elaborar e aplicar ações de incidência política no parlamento

federal. Damos destaques aos dois últimos momentos, eis que os debates eletrônicos se

pulverizaram ao longo do ano.

a) Mobilização das entidades e adolescentes.

O ano de trabalho começou com a preparação do 3º Encontro da Rede Nacional

de Defensores do Adolescente em Conflito com a Lei, dando seqüência aos realizados

em fevereiro de 2008 e agosto de 2009.

A terceira edição ocorreu em Brasília, no mês de junho de 2012, com a presença

de representantes de Centros de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente

(CEDECAs), Defensores Públicos da Infância e Juventude, membros das Associações

de Mães do Adolescente em Risco (AMAR) e, pela primeira vez na RENADE, de

adolescentes internados ou egressos do sistema socioeducativo privativo de liberdade.

No mesmo mês, o consultor da RENADE estivera presente em seminário sobre o

SINASE promovido pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da

República e a Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente

(ANCED).

No mês de setembro, ocorreu o III Congresso Nacional dos Defensores Públicos

da Infância e Juventude (Belém, Pará), no qual o consultor esteve presente em

representação à secretaria executiva da RENADE, ampliando os canais de comunicação

com um dos expressivos segmentos da Rede Nacional.

Organiza-se, para tão logo, seminário a se realizar com e por adolescentes.

Em janeiro, para a realização de reunião final com equipe da secretaria

executiva, o consultor elaborou texto-base para provocar reflexões sobre a relação entre

justiça juvenil e saúde mental.

b) Articulação parlamentar e assessoria técnica

A estratégia da incidência política ensejou contato direto com parlamentares

federais e/ou sua assessoria de gabinete. É o que ocorreu, primeiro, com a Deputada

Érica Kokay (maio e junho) e, em seguida, com a assessoria da Senadora Lídice da

Mata (junho).

i. Deputada Érica Kokay (PT/DF)

Entre os dias 22 e 24 de maio, durante encontro promovido pela Agência de

Notícias sobre a Infância (ANDI), em que o “adolescente em conflito com a lei” fora a

temática, houve a primeira oportunidade de interlocução com o parlamento federal. Em

breve diálogo com a deputada federal Érica Kokay, foi possível apresentar a RENADE,

por meio de seu consultor, bem como anunciar algumas investidas realizadas por

instituições paulistas em face da norma contida no artigo 65 da recém-promulgada lei

federal n. 12.594/2012, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Sistema Socioeducativo

(SINASE) e dá outras providências. Com isso, despertada na deputada a importância do

assunto e a gravidade da disposição contida na norma, trocou-se contato para uma

próxima reunião.

Durante o período em que se realizava o Seminário sobre o SINASE, promovido

pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República e a

Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED), de

18 a 20 de junho, em Brasília, comparecemos a uma reunião com a deputada para a

formal apresentação da RENADE, a propósito do convite feito pelo Conselho Federal

de Psicologia (CFP), parceiro fundamental para o andamento dos trabalhos de

incidência política no Congresso Nacional. Nessa reunião, a deputada apresentou um

panorama das discussões que permeiam os temas socioeducativos bem como as

estratégias de qualificação dos debates. Dentre elas, anunciou a criação de uma agenda

de discussões interinstitucionais com vista a colocar em pauta as diversas questões que

sustentam a política de atenção integral à criança e ao adolescente. Tais reuniões seriam

realizadas quinzenalmente.

Ademais, surgia a iniciativa de se construir uma agenda de compromisso com

candidatos às prefeituras do país para o comprometimento com as causas da infância.

Nenhuma das pautas foi de possível acompanhamento, entretanto, a deputada esteve

presente no 3º Encontro da RENADE e afiançou a realização e o objetivo da Rede

Nacional.

ii. Senadora Lídice da Mata (PSB/BA)

No fim do mês de maio, fora realizado o primeiro contato com assessoria técnica

parlamentar. A interlocução foi feita com o gabinete da Senadora Lídice da Mata

(PSB/BA), assim que fora nomeada, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação

Participativa, relatora do processo pelo qual se encontra tramitando o projeto de lei do

Senado n. 23/2012, já pormenorizado acima.

A iniciativa fundamentou-se na oportunidade evidente de fornecer-lhe subsídios

técnicos para a criação de um posicionamento fecundo e decisivo no trajeto do

documento em pauta. A partir da percepção de que não seria positivo para o

desenvolvimento de adolescentes em conflito com a lei, o texto projetado deveria er

impugnado, entretanto, com as devidas cautelas estratégicas.

Por esse motivo, no dia 19 de junho, realizamos reunião com a assessoria do

gabinete da senadora para apresentar prévio posicionamento sobre o conteúdo do

projeto de lei e provocar a criação de uma agenda técnico-política fundada na

possibilidade de emitirmos, via RENADE, um parecer técnico para fortalecimento do

relatório da parlamentar. Destinou-se o mês de julho para a entrega do parecer à

assessoria, o que se concretizou no início de agosto. Até o final do ano, os diálogos com

o gabinete da Senadora foram moderados em razão da opção do grupo inteiro de manter

as notícias do PL, enquanto na Relatoria da Senadora, em baixa circulação, de modo a

aguardar o arquivamento provisório com o fim da sessão legislativa de 2012.

A articulação política e, especialmente, a elaboração do Parecer Técnico enviado

à assessoria do gabinete da Senadora Lídice da Mata foram feitas a partir da primeira

experiência da RENADE com outros coletivos. Trata-se da parceria com o Projeto

Justiça Criminal, consórcio das entidades Conectas Direitos Humanos, Instituto de

Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, Instituto

Terra, Trabalho e Cidadania, voltadas a promover ações de incidência política no

Congresso Nacional (para tanto, contavam com assessora legislativa alocada em

Brasília para funções diárias); e Frente Nacional Drogas e Direitos Humanos (FNDDH),

coletivo que conta com mais de 70 entidades, no país inteiro, destinadas a promover

ações de incidência política no parlamento e produzir conhecimento para articulações e

mobilizações de movimentos sociais.

iii. Projeto de Lei n. 1.185/2012 da Câmara Legislativa do Distrito Federal

Em meados do segundo semestre, em razão da propositura do Projeto de Lei n.

1185/2012 na Câmara Distrital, fomos acionados para a elaboração de parecer técnico

que levaria a adesão da Rede Nacional e outros parceiros. O texto proposto oficialmente

versava sobre a possibilidade de os agentes penitenciários e socioeducativos adquirirem

porte de armas de fogo de uso externo às unidades socioeducativas, em razão da

natureza de seu ofício. Feito imediatamente – cerca de uma semana depois da

apresentação do PL -, fora tão logo oferecido a parlamentares estratégicos e sensíveis ao

posicionamento evidenciado no parecer. Duas semanas após, tivemos a notícia de que o

artigo que atribui ao agente socioeducativo o direito ao porte de arma fora vetado.

iv. Nota técnica sobre a compatibilidade verificada entre o Decreto n. 3.597/2000,

pelo qual o Congresso Nacional ratifica a subscrição da Convenção 182/1999 da

Organização Internacional do Trabalho (OIT) realizada pelo Estado Brasileiro.

A Nota foi elaborada e entregue a convite de UNICEF Brasil, que, em apoio à

Frente Parlamentar Mista de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, solicitou

sugestões de temas a motivarem inovação ou revogação legal, com objetivo de

favorecer a construção de Plano de Ação para o Plano Decenal dos Direitos Humanos

de Crianças e Adolescentes. Apresentamos nota que apresenta distorções e contradições

na implementação da norma contida na Convenção 182/99 da OIT no Brasil.

v. Parecer Técnico ao PDS n. 539/2012, de autoria do Sen. Ivo Cassol.

Em sintonia com a questão social da adolescência em conflito com a lei,

elaboramos nova ação parceira junto aos coletivos já mencionados. Desta vez, ampliou-

se a composição com a aproximação da Justiça Global, entidade de Direitos Humanos

voltado à promoção de ações políticas e jurídicas nacionais e internacionais; Associação

pela Reforma Prisional; Rede de Justiça Criminal e Instituto dos Defensores de Direitos

Humanos.

O Projeto de Lei n. 539/2012, de autoria do Sen. Ivo Cassol (PP/RO), prevê a

realização de plebiscito no dia das eleições presidenciais de 2014. O parecer está pronto

e subscrito, e a utilização dele dar-se-á nas próximas semanas de março junto aos

parlamentes já mapeados no Senado Federal.

vi. Parecer Técnico à PEC n. 33/2012, de autoria do Sen. Aloysio Nunes.

A ampliação do grupo também resultou na elaboração de parecer contrário ao

texto da Proposta de Emenda Constitucional em maior avanço atualmente, também de

autoria do Senador Aloysio Nunes (PSDB/SP).

Ademais, importa informar que são espaços fundamentais para ampliação da

articulação político-parlamentar a Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos da

Criança e do Adolescente, sob coordenação, no ano de 2012, dos deputados Liliam Sá e

Dr. Adilson Soares, bem como a Frente Parlamentar Mista de Direitos Humanos da

Criança e do Adolescente, sob condução da deputada Érica Kokay.

V. Plano de Incidência – experiência 2012/2013 e propostas para a RENADE.

A consultoria assumiu o compromisso de apresentar uma série de ações de

incidência política no Congresso Nacional Brasileiro a partir de temáticas e estratégias

definidas e delimitadas conforme se apresentam o assunto e o debate “Adolescente em

Conflito com a Lei” no cenário nacional, considerada a peculiar observação que fazem

os atores que compõem a RENADE.

Para tanto, realizamos atividades que conferem à RENADE a qualidade de rede

que aprimorou suas ações de incidência e articulação política com a elaboração de

pareceres e notas técnicas. Dentre os meios, fez-se o levantamento das propostas em

tramitação no Congresso Nacional e sua análise crítica acerca do teor, propósito,

aspectos positivos e negativos. Neste momento, apresenta-se todo o material produzido.

Fixamos eixos pelos quais transitaríamos ao produzir conhecimento e articular

parceiros e interlocutores estratégicos. A ideia era acompanhar projetos de leis que

tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado Federal para conhecer, entender e

intervir politicamente em proposições escolhidas oportunamente e que retrocedem nas

conquistas constitucionais.

Embora não quiséssemos bastar nossa atuação nas estratégias de enfrentamento

a determinados projetos de lei e projetos de emenda constitucional, mas extravasar as

fronteiras da reatividade e criar campo fértil de debates sustentados em proposições da

RENADE perante o Congresso Nacional e o Poder Executivo, não logramos esse feito,

pela pequena estrutura que, pioneiramente, construiu-se no campo da adolescência e

conflitualidade. Com as próximas edições da RENADE e/ou outras redes e entidades,

certamente, o alerta servirá: devem promover ações afirmativas dos direitos humanos de

adolescentes em conflito com a lei, para o que importa também criar e apoiar as

proposições favoráveis e em andamento no Congresso Nacional. É o que pode ser feito

com base nos seguintes Projetos de Lei:

a) Na Câmara dos Deputados, com os destaques em negrito,

398/99 Dep. Enio Bacci

(PDT/RS)

Proibe a divulgação das iniciais do nome e prenome do

menor infrator.

1938/99 Dep. Enio Bacci

(PDT/RS)

Dispõe que a partir da idade de 18 (dezoito) anos, o

adolescente deverá ser liberado, colocado em

regime de semiliberdade ou de liberdade assistida;

ou ainda transferido para casas de transição.

5546/01 Dep. Nilmário Miranda

PT/MG) e Nelson

Pellegrino (PT/BA)

Estabelece medidas de prevenção e regras para a

persecução penal das práticas delituosas previstas na

Lei nº 9.455, de 07 de abril de 1997, e dá outras

providências.

1871/03 Dep. Antonio Carlos

Biscaia (PT/RJ)

Acrescenta parágrafos ao art. 120 da Lei nº 8.069,

de 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto

da Criança e do Adolescente, e dá outras

providências.

[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade

de profissionalização, entre adolescente, familiares

e despesa de custeio]

2799/03 Dep. Alexandre Santos

(PMDB/RJ)

Altera o Estatuto da Criança e do Adolescente.

[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade de

profissionalização, entre adolescente, familiares e

despesa de custeio.]

4487/04 Dep. Enio Bacci

(PDT/RS)

Proíbe qualquer imagem de crianças envolvidas em ato

infracional e dá outras providências.

3022/2004 Dep. Carlos Nader

(PL/RJ)

Acrescenta dispositivos ao art. 120 da Lei nº 8.069, de

13 de julho de 1990, que ‘dispõe sobre o Estatuto da

Criança e do Adolescente, e dá outras providências’.

[Propõe a divisão de lucros, resultantes da atividade de

profissionalização, entre adolescente, familiares e

despesa de custeio.]

5233/05 Dep. Sigmaringa Seixas

(PT/DF)

Definindo a pessoa custodiada e estabelecendo normas

para investigação, punição e prevenção dos crimes de

tortura, incluindo no Código Penal (Decreto-Lei nº

2.848, de 1940) o tipo especial "Alegação Falsa de

Confissão sob Tortura ou Ameaça de Tortura".

1170/07 Dep. Paulo Paim

(PT/RS)

Altera o art. 143 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de

1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA,

para ampliar as hipóteses de vedação da divulgação de

nomes de crianças e adolescentes.

5673/09 Dep. Glauber Braga

(PSB/RJ)

Dá nova redação ao art. 104 da Lei nº 8.069, 13 de

julho de 1990, e inclui na referida lei os arts. 105-A

e 122, considerando que o regime de semiliberdade

e a medida de internação não serão aplicados ao

adolescente que praticou o ato infracional em razão

de dependência ou sob o efeito de droga; os

benefícios da anistia, graça e indulto alcançam o

menor infrator e a medida de internação só poderá

ser aplicada após o trânsito em julgado da sentença

condenatória.

7934/10 Dep. Fátima Pelaes

(PMDB/AP)

Torna obrigatória a realização de cursos de reutilização

e reciclagem do papelão descartado por supermercados

e distribuidoras varejistas, a egressos do sistema

prisional e jovens em cumprimento de medidas

socioeducativas.

958/11 Dep. Alessandro Molon

(PT/RJ)

Obriga os órgãos de segurança pública e os do sistema

penitenciário a informar sobre as penas para a prática

dos crimes de tortura, bem como os telefones e

endereço eletrônico para a denúncia desses crimes.

2442/11 Presidência da

República.

Institui o Sistema Nacional de Prevenção e

Combate à Tortura, cria o Comitê Nacional de

Prevenção e Combate à Tortura e o Mecanismo

Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, e dá

outras providências.

Valem os destaques:

i. PL 1938/99: entra em campo a possibilidade de atrelar as questões de

adolescência às de juventude (marco dos 18 anos).

ii. PL 1871/03: a partir deste, é possível mobilizar atores do campo econômico,

industrial e comercial, de modo a sensibilizá-los por meio do direito ao trabalho e à

profissionalização qualificada. Mobiliza-se para o sentimento de co-responsabilidade

dos atores sociais.

iii. PL 5673/09: de significativa relevância, seu texto é de radicalização dos

princípios democráticos, levando a cabo a dúvida entre proporcionalidades entre ato

infracional e reação do Estado, e tornando objetiva a apreciação sobre os casos ligados

à dependência química, semiliberdade e internação socioeducativa.

iv. PL 2442/11: sugere-se seja o ponto forte das próximas ações de incidência

política. Do ponto de vista do conteúdo (finalístico), trata-se de um possível grande

avanço na democracia brasileira e no marco regulatório dos direitos humanos, uma vez

que estabelece um mecanismo de forte impacto na inibição dos atos estatais de

violência institucional. Do ponto de vista de forma (estratégico), é projeto de lei

proposto pelo Poder Executivo, o que leva a crer que obterá uma trajetória mais

previsível e, logo, possível de controlar.

b) No Senado Federal, com destaques em negrito:

PLS 245/97 Sen. Paulo Paim (PT/RS) Dispõe sobre a reserva de 10% (dez por

cento) das vagas dos cursos

profissionalizantes administrados pelo

senac, senai, senar e senat para

adolescentes egressos do sistema

correcional ou cumprindo medidas socio-

educativas de semiliberdade ou liberdade

assistida, e da outras providencias.

PLS 408/11 Sen. Eduardo Amorim

(PSC/SE)

Altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990,

que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do

Adolescente e dá outras providências, para

garantir tratamento especial ao adolescente

viciado em drogas.

PLS 26/12 Sen. Pedro Taques

(PDT/MT)

Acrescenta os arts. 114-A 258-A à Lei nº

8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da

Criança e do Adolescente - para prever o

prazo prescricional das medidas

socioeducativas e das multas aplicadas em

razão de cometimento de infrações

administrativas.

PLS 322/12 Sen. Gim Argello

(PTB/DF)

Altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de

1984, e a Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de

2012, para conceder incentivo tributário a

pessoas jurídicas que realizem cursos de

reutilização e reciclagem de materiais ou

outros cursos de capacitação para egressos

do sistema prisional e para jovens em

cumprimento de medidas socioeducativas.

Destacamos:

i. PLS 245/97: ainda que não seja esta, mas outra proposta contemporânea,

importa salientar a relevância deste tipo de projeto, pois aciona diversos segmentos do

ramo industrial e empresarial no mesmo sentimento de co-responsabilidade apontado

acima.

ii. PL 26/12: a prescrição socioeducativa vem sendo objeto de teses de defesa, mas

ainda não se consagrou plenamente na legislação brasileira. Por isso, ainda que haja

divergências sobre a equiparação do tempo prescricional socioeducativo com a

prescrição penal, está dado um avanço nas discussões políticas de regulamentação do

poder punitivo estatal.

iii. PL 322/12: mais um projeto que alia aos setores empresarial, comercial e

industrial. Obviamente, para além da sensibilização dos atores sociais desses

segmentos, reside aí uma clivagem importante de ser ultrapassada: os proprietários

majoritários dos meios de produção, especialmente no meio urbano (foco

predominante de ações socioeducativas em razão da demanda) situam-se no meio do

caminho para a autonomia jovem e o fortalecimento dos vínculos familiares e

comunitários.

c) Estratégias de sensibilização e articulação parlamentar

Retomemos as estratégias programadas no início do projeto RENADE. Muitas

delas estão condicionadas a eventos externos à Rede Nacional, não sendo controláveis.

São algumas, em geral: elaboração de cartilha sobre as questões-chave ligadas à

Adolescência e Conflitualidade, destinadas aos parlamentares; nomeação de Senador e

Deputado de Referência nas ações de sensibilização e articulação; instituição de selo

“Parlamentar em Defesa dos Direitos do Adolescente”; criação de subcomissão temática

na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, na Comissão de Legislação Participativa,

na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, e na Comissão Especial

destinada a promover estudos e proposições de políticas públicas e de Projetos de Lei

destinados a combater e prevenir os efeitos do Crack e de outras drogas ilícitas

(CEDROGA), todas da Câmara dos Deputados; Comissão de Direitos Humanos e

Participação Legislativa e Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal;

agenda técnica eventual entre a equipe da RENADE (ou outra rede) e a Subsecretaria

Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, para atualização de

dados e informações que configuram subsídio (político e técnico) para incidência no

parlamento federal; Elaborar os seguintes documentos: Plano Nacional de Atendimento

Socioeducativo; Avaliação da ratificação das Resoluções do CONANDA pelo

Executivo Federal; Avaliação de documentos internacionais ainda não ratificados

internamente; Avaliação dos programas de “egressos” do sistema socioeducativo;

Catalogação de todos os documentos oficiais de estudo e estatísticas sobre a política de

atendimento socioeducativo; Cartilha “passo a passo” para os estados e municípios

elaborarem seus planos de atendimento socioeducativo; Proposta de incidência na

elaboração do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (em

consonância com o PL 2442/11, de autoria do Poder Executivo e em trâmite na Câmara

dos Deputados.

Dentre os momentos estratégicos do ano, retomamos também os planejados no

início da terceira edição RENADE: maio - junho: votação da proposta executiva de Lei

de Diretrizes Orçamentárias (LDO) no Congresso Nacional; outubro – dezembro:

votação da proposta executiva de Lei Orçamentária Anual (LOA) no Congresso

Nacional; 15 de junho – prazo final para inscrição no Parlamento Jovem Brasileiro, da

Câmara dos Deputados; 26 de junho - Dia Internacional de Luta contra a Tortura; 13 de

julho – aniversário do Estatuto da Criança e do Adolescente; Encontros RENADE:

esses encontros podem ter a presença de parlamentares engajados na causa da

adolescência e conflitualidade.

Importa reforçar que há um universo de dezenas de proposições desfavoráveis à

defesa de direitos humanos submerso no cotidiano legislativo do qual podem brotar

muitos a cada mês, a depender dos ânimos e estímulos (midiáticos, sociais e de

instâncias propriamente administrativo-financeiras). É certo que temos muito a

contribuir, como RENADE, para a desconstrução qualificada de cada projeto de lei e

proposta de emenda constitucional que vise à supressão de garantias de direitos

humanos. Entretanto, para tal, “é preciso estar atento e forte”, bem como preparado aos

percursos e discursos. O ano que passou foi de intensa movimentação legislativa, mas se

tratou apenas de uma experiência piloto (primeira edição em que se utiliza,

permanentemente, da estratégia de incidência política), mostrando que temos

capilaridade tão grande ou maior, na sociedade brasileira, do que os falsos alcances

midiáticos apelativos a uma legislação de emergência. Esta, tão incerta e oportunista

quanto as ações inconsistentes de muitos parlamentares que se rogam o direito de atuar

com PLs flashes, entre os espasmos da mídia. Movimentos sociais somos os que

sustentam as bandeiras do avanço político dos mecanismos de direitos humanos no

Brasil. Afinal, ainda está para nascer o movimento que seja tão contrário quanto

expressivamente composto de membros do Brasil todo, em alta quantidade e qualidade

e de respeito às diversidades, como são os movimentos de esquerda e defensores de

direitos para todas e todos. É com essa trajetória histórica, acúmulo técnico e político e

o guia ético de atuação entre pares e entre diferentes que devemos caminhar,

articulando-se estrategicamente dentro da heterogeneidade e afiançando ainda mais as

relações de igualdade, fraternidade e solidariedade.

Palmas, março de 2013.

Anexos – Pareceres e Notas Técnicas

Parecer técnico ao Projeto de Lei do Senado nº. 23/2012

I. Constitucionalidade formal

De início, inexistem óbices constitucionais formais quanto à iniciativa, na medida em

que a Constituição da República, em seu art. 24, inciso XV, atribui à União, aos Estados

e ao Distrito Federal competência para legislar concorrentemente sobre proteção à

infância e à juventude.

II. Constitucionalidade material

O projeto de Lei do Senado Federal n° 23 de 2012 altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho

de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para incluir o inciso VIII e alterar o

parágrafo 3º, ambos do artigo 112, que passaria a vigorar com a seguinte redação:

“Art.112...............................................................................................................

...................................................................

VIII – inserção em programa de atenção integral à saúde mental, incluindo

assistência ambulatorial ou em regime de internação.

.............................................................................................................................

.......

§ 3º A medida prevista no inciso VIII do caput será aplicada ao adolescente

com transtorno ou deficiência mental constatada por meio de exame médico-

legal e incapacidade de entender o caráter pedagógico e educacional das

medidas socioeducativas previstas nos demais incisos, e não poderá ser

cumulada com essas medidas.” (NR)

Altera, outrossim, a Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, para conferir nova redação

ao art. 64 e para incluir o art. 66, nos seguintes termos:

“Art. 64

.....................................................................................................................

.............................................................................................................................

.....

§4º Quando a equipe técnica multidisciplinar e multisetorial concluir pela

incapacidade do adolescente de se submeter ou entender o caráter pedagógico

e educacional da medida socioeducativa que esta sendo executada, a medida

será extinta nos moldes do art. 46, IV, desta lei, submetendo-o à medida

prevista no inciso VIII do art. 112 da Lei n. 8.069/90 – Estatuto da Criança e

do Adolescente.

“Art. 66. O adolescente em cumprimento de medida socioeducativa com

comprovada dependência de álcool ou de outras substâncias psicoativas que

não o incapacite de cumprir plenamente as atividades previstas no seu PIA

deverá ser inserido em programa de tratamento, preferencialmente na rede

SUS extra-hospitalar, podendo a autoridade judiciária determinar que esse

seja realizado na rede privada se o SUS não dispuser do tratamento adequado,

a expensas do SUS.”

Ademais, revoga o art. 29 e os parágrafos 5º e 6º do art. 64 da mesma Lei 12.594/2 012.

Em parecer aprovado em 16.05.2011, a Comissão de Assuntos Sociais do Senado

Federal deliberou pela aprovação da matéria na forma de um substitutivo, nos termos

seguintes:

Art. 1º O art. 112 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, passa a vigorar

com a seguinte redação:

“Art. 112.

.................................................................................................................

VIII − inserção em programa de atenção integral à saúde mental, incluindo

assistência ambulatorial ou em regime de internação.

...................................................................................

§ 3º A medida prevista no inciso VIII do caput será aplicada ao adolescente

com transtorno ou deficiência mental constatada por meio de exame médico-

legal e incapacidade de entender o caráter pedagógico e educacional das

medidas socioeducativas previstas nos demais incisos, e, não poderá ser

cumulada com essas medidas.” (NR)

Art. 2º O art. 64 da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012, passa a vigorar

com a seguinte redação:

“Art. 64.

...................................................................................................................

§ 4º Quando a avaliação de que trata o caput concluir que o adolescente é

incapaz de entender o caráter pedagógico e educacional da medida

socioeducativa a que está sendo submetido, ele será encaminhado para a

realização de exame médico-legal, a fim de verificar a necessidade de

aplicação da medida prevista no inciso VIII do art. 112 da Lei nº 8.069, de 13

de julho de 1990, e a consequente extinção da medida em execução, nos

termos do inciso IV do art. 46 desta Lei.

...............................................................................

§ 9º Quando a avaliação de que trata o caput concluir que o adolescente é

dependente de álcool ou de outra substância psicoativa, mas que é capaz de

cumprir as atividades previstas no seu PIA, ele será inserido em programa de

atenção integral à saúde mental, no âmbito do SUS.

§ 10. Se o exame médico-legal de que trata o § 4º não comprovar a

incapacidade de o adolescente entender o caráter pedagógico e educacional da

medida socioeducativa a que está sendo submetido, aplicar-se-á o disposto no

§ 9º.

§ 11. O atendimento previsto no § 9º será realizado, sempre que o quadro

clínico permitir, em regime ambulatorial.

§ 12. O gestor local do SUS promoverá a inserção do adolescente no

programa de atenção integral à saúde mental de que trata o § 9º, sob pena de

responsabilidade, ainda que o atendimento tenha que ser realizado em serviço

privado de saúde sem vínculo com o SUS, mediante ressarcimento.” (NR)

Art. 3º Ficam revogados o art. 29 e os §§ 5º e 6º do art. 64 da Lei nº 12.594,

de 18 de janeiro de 2012.

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

A despeito da nobreza da preocupação em dar guarida a jovens acometidos de doença,

deficiência mental ou dependência de álcool e outras drogas, o presente projeto de lei

não deve prosperar, vez que dissonante dos postulados constitucionais de proteção da

criança e do adolescente, conforme passamos a articular.

II.1 – Sobre a natureza das medidas socioeducativas

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece que a medida socioeducativa

é a resposta estatal ao cometimento de ato infracional equivalente a crime ou

contravenção penal (art. 103).

Os conceitos relativos ao tema se fundam em princípios constitucionais, bem como os

procedimentos de apuração do delito, que, por derivação normativa, também se

assemelham, em parte, aos estabelecidos pela lei penal.

A medida socioeducativa, portanto, imbui-se de um caráter de responsabilização

proposto pelo Estado. Com isso, apresenta uma primeira e fundamental distinção em

relação aos Códigos de Menores de 1927 e 1979, para os quais a resposta estatal

responsabilizatória não atingia apenas crianças e adolescentes que cometiam crimes,

mas quaisquer jovens que estivessem na denominada “situação irregular” de vida.

O Código de Menores de 1927, por exemplo, marcou a consolidação do modelo de

assistência e proteção à infância que, a partir do saber jurídico, tornou possível a

construção e popularização da categoria “menor” no Brasil para crianças e adolescentes

pobres em situação considerada de abandono moral e material como “menor”.

Os juristas do início do séc. XX reivindicavam, para “o problema” da criminalidade

juvenil, a criação de leis e instituições assistenciais e protetoras voltadas a impedir o

desenvolvimento da criminalidade. Foi este discurso que permitiu a emergência do novo

Código em 1927 e a criação das instituições e práticas legais que permitiram a

internação do “menor” “abandonado” e “delinquente”.

Assim, com a institucionalização da infância e da adolescência no Brasil, o Estado

passou a visar diretamente os ‘menores’ em estado considerado “de perigo e abandono”

(vadiagem, mendicância, libertinos, loucos), gerando um processo de estigmatização

das crianças e adolescentes oriundos das classes pobres, condenados institucionalmente

à possibilidade de delinquência, caso não se enquadrassem nas normas de trabalho e da

educação (ALVAREZ, 1989; 199713

).

13 ALVAREZ, M.C. A emergência do Código de Menores de 1927 : uma análise do discurso jurídico e institucional de assistência e proteção aos menores. São Paulo, 1989. Dissertação (Mestrado em

Vale observar, ainda, que as instituições criadas para a internação do “menor”

“abandonado” ou “delinquente” eram mais entornadas ao recolhimento e à manutenção

dos abandonados fora das ruas, retirando assim do convívio social os considerados

“indesejáveis”.

No Código de Menores de 79, as hipóteses de jovens em “situação irregular” eram,

conforme art. 2º, as seguintes:

I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução

obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de:

a) falta, ação ou omissão dos pais ou responsável;

b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las;

Il - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou

responsável;

III - em perigo moral, devido a:

a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons

costumes;

b) exploração em atividade contrária aos bons costumes;

IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos

pais ou responsável;

V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou

comunitária;

VI - autor de infração penal.

Constata-se, portanto, que o Código de Menores de 1979 não distinguia as situações de

privação de direitos e de cometimento de ilegalidades para fins de resposta estatal. Para

efeito de aplicação de medidas, não diferenciava, assim, as condições de autor ou

vítima, assumida pelos jovens envolvidos em violação de direitos. A natureza da reação

estatal frente aos atos juvenis não era definida em lei.

Historicamente, crianças e adolescentes foram concebidos e tratados pela sociedade

brasileira de maneira autoritária, na medida em que foram juridicamente qualificados

Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989) e Menoridade e delinqüência: uma analise do discurso jurídico e institucional da assistência e proteção aos menores no Brasil. Cadernos da FFC. Marília, v.6, n.2, p. 93-114, 1997.

como sujeitos sem fala, destituídos de poder, enquanto, por outro lado, os adultos e a

família são concebidos como detentores de todo poder e que podem expressar as

vontades e deveres das crianças e adolescentes. Nesse contexto, crianças e adolescentes

brasileiros são vistos historicamente como objeto de intervenção de diversas instâncias

de correção e das chamadas instituições de ortopedia social (ADORNO, 200214

).

Apesar de romper com a Doutrina da “Situação Irregular”, o próprio ECA também não

define a natureza da medida socioeducativa, deixando a função a cargo dos segmentos

civis e oficiais incumbidos dos debates e da qualificação do sistema de justiça juvenil e

da política de atendimento socioeducativo. Nesse sentido, há duas vertentes bem

demarcadas.

Há estudiosos que reivindicam que a medida socioeducativa se trata de intervenção

meramente educativa, sem caráter punitivo, sancionatório ou responsabilizatório. É

comum a presença dessa interpretação em discursos que propõem o aumento do rigor,

por meio, principalmente, da redução da idade penal estabelecida constitucionalmente e

do aumento do tempo de internação em estabelecimento educacional.

Outros estudiosos, pelo contrário, avaliam constituir-se em ação que tem, em excesso,

um rigor sancionatório, o que é visto, inclusive, como ponto fraco da própria medida,

que tende, assim, a carecer de efetividade educativa. Eles defendem a diminuição das

determinações judiciais de internação em prol das medidas em meio aberto, dado que

seu caráter sancionatório, supostamente, afligiria menos a vida adolescente. Nos dois

pontos de vista, persiste a impressão de que as medidas socioeducativas apresentam-se

com insuficiente caráter educativo.

Dúvida não resta, todavia, se consideramos ampliada a natureza da medida

socioeducativa, dentro, pois, de uma ótica de proteção/sanção, vendo-a como educativa

porque proponente de construção de um projeto de vida, e, ao mesmo tempo,

responsabilizatória porque pungente no caráter compulsório do cumprimento.

Konzen diferencia finalidade e natureza das medidas socioeducativas. Segundo ele,

quanto à natureza, dois são os atributos da medida socioeducativa: a “unilateralidade”

e a “obrigatoriedade”. Pela unilateralidade entende-se que a medida socioeducativa

existe a partir de um único vetor, direcionado do/a magistrado/a para o/a adolescente,

sem que este/a tenha a opinião considerada. A obrigatoriedade, por sua vez, dá o devido

contorno à obediência do/a adolescente em não apenas não opinar sobre a medida

adequada, mas em aceitar e cumprir a designada pelo/a juiz/a.

Quanto à finalidade, Konzen define que serve à “reprovação pela conduta ilícita,

providência subsequente que carrega em si, seja a consequência restritiva ou privativa

de liberdade, ou até mesmo modalidade de simples admoestação, o peso da aflição,

14 ADORNO, S. Monopólio Estatal da Violência na Sociedade Brasileira Contemporânea. In: MICELI, S. (org). O que Ler na Ciência Social Brasileira – Volume IV. São Paulo, Editora Sumaré, 2002.

porque sinal de reprovação, sinônimo de sofrimento porque segrega do indivíduo um de

seus bens naturais mais valiosos, a plena disposição e exercício da liberdade”15

. Afirma,

por fim, que sua natureza, complexa, é de substância penal e finalidade

pedagógica16

.

Em coerência com a predominante doutrina acerca da temática, podemos afirmar

que qualquer das sete medidas socioeducativas já previstas no art. 112 do Estatuto

da Criança e do Adolescente configuram uma resposta estatal de compulsório

cumprimento e conteúdo sancionatório, ainda que sob uma perspectiva educadora.

Logo, a criação de qualquer outra medida deve ser alinhada a essa dupla perspectiva,

não sendo assim compreendida caso vise a outras finalidades, como é o caso da

proposição presente no PLS n. 23/2012.

Referido projeto de lei é justificado pela “necessidade de acesso aos serviços de saúde”,

a implicar iniciativa legislativa que serviria ao direito de atenção à saúde mental e não

ao dever de ser responsabilizado pelo cometimento de ato infracional.

De fato, as diretrizes e a dinâmica de execução de uma medida socioeducativa não

podem impedir ou restringir o exercício de direitos pelo/a adolescente, salvo o direito de

liberdade no caso de medidas de internação e semiliberdade. De modo que, ao/à

adolescente privado de liberdade, tanto quanto aos/às encontrados/as em meio aberto,

cabe a garantia do direito de atenção à saúde mental, entre outros direitos sociais.

Nesse sentido é que a instalação de uma nova medida socioeducativa – de

atendimento médico-psiquiátrico – que tenha como simples objetivo catalisar as

etapas de acesso ao serviço público de saúde mental apresenta-se na contramão da

finalidade da medida socioeducativa, que não é, prima facie, garantir direitos, já que,

para isso, há as medidas de proteção, mas responsabilizar os/as adolescentes, cuja ação

as sete medidas socioeducativas já contemplam.

A “nova” medida proposta insere-se no crescente processo de psiquiatrização dirigido a

jovens autores de ato infracional, definido pela professora Maria Vicentin da PUC/SP,

em estudo recém-publicado na Revista Brasileira de Crescimentos e Desenvolvimento

Humano17

, com os seguintes elementos centrais:

1) A emergência de propostas de alterações no ECA centradas no

argumento do transtorno mental e da periculosidade.

2) O crescente encaminhamento de adolescentes cumprindo medida

socioeducativa para perícias psiquiátricas visando aferição do “grau de

periculosidade” e diagnóstico de transtorno de personalidade anti-social.

15 KONZEN, Afonso Armando. Pertinência socioeducativa: reflexões sobre a natureza jurídica das medidas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 63. 16 Op. cit., p. 91. 17 A patologização do jovem autor de ato infracional e a emergência de “novos” manicômios judiciários. VICENTIM [ET.AL]. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, 2010; 20(1): 61-69.

3) A crescente internação psiquiátrica de adolescentes por mandado

judicial, já verificada nos dois maiores hospitais psiquiátricos para

adolescentes nos municípios do Rio de Janeiro e de São Paulo,

caracterizada pela: i) compulsoriedade; ii) pela estipulação de prazos para

a internação ou pela sua subordinação aos critérios jurídicos; iii) por

tempo médio de internação superior aos dos demais internos admitidos por

outros procedimentos; iv) pela acentuada presença de quadros relativos a

distúrbios de conduta (portanto, não psicóticos)

4) A proposição, pelo estado de São Paulo, da Unidade Experimental de

Saúde18

, inaugurada em dezembro de 2006, Tal atendimento não poderia,

segundo os propositores da Unidade, se dar em hospitais psiquiátricos, já

que esses últimos “obedecem às diretrizes da política de saúde mental do

SUS, caracterizada por serviços que não dispõem de espaços físicos de

contenção” (VICENTIN, 2010, p.62-63).

É preciso notar que a medida socioeducativa é um meio responsabilizatório para que se

alcancem objetivos de qualificação das condições de vida. Já a nova medida

intencionada pela via do projeto de lei em pauta apresenta-se, ela mesma, como um fim

de acesso a serviços públicos.

Neste rumo, portanto, em tela apenas a necessidade de garantia do direito à saúde

mental, reiteramos a possibilidade de o Poder Judiciário requisitar ao Executivo a

oferta imediata de serviços, inclusive no bojo de um processo socioeducativo. Essa

determinação judicial é suficiente para atingir qualquer meta esperada com a

propositura do PLS n. 23/2012, razão pela qual sucumbe a inovação pretendida em

seu texto. Para tanto, mais do que suficientes são as medidas protetivas, explanadas na

seqüência.

II.2 – Sobre a natureza das medidas protetivas

Sobre as medidas de proteção, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis

sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:

I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

18 A Unidade Experimental de Saúde foi criada em dezembro de 2006, num convênio entre as Secretarias da Saúde, Justiça e Administração Penitenciária do Estado de São Paulo, destinada a oferecer atendimento para autores de ato infracional portadores de diagnóstico de transtorno de personalidade e/ou de periculosidade, durante o cumprimento de medida sócio-educativa de internação em regime de contenção.

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;

III – em razão de sua conduta.

Cumpre lembrar que esses instrumentos protetivos “não poderão ser compreendidos

como castigo ou pena; nem, tampouco, ter o caráter de ‘aliviar’ a responsabilidade

jurídica daqueles que estão causando danos à criança e ao adolescente”19

.

A assertiva exprime bem a dificuldade que subjaz o projeto de lei sob análise: se se quer

proteger adolescentes que cometem atos infracionais a partir do ampliado e imediato

acesso aos serviços de saúde mental, não se deve fazer por meio exclusivo do sistema

socioeducativo. Fazer desse modo significaria revestir tal iniciativa protetiva do caráter

de pena ou castigo, tornando, na proporção em que se impõe judicialmente a nova

medida socioeducativa, obrigatória a adesão.

Conforme aduz o magistrado paulista Eduardo Resende de Melo, “as medidas de

proteção têm uma natureza cautelar. Elas diferem da procura espontânea e voluntária

das crianças, adolescentes e suas famílias aos programas de atendimento”20

.

Por isso, não há imposição de medidas protetivas, mas apenas a garantia de serviços a

serem oferecidos, em caráter de urgência e diante do insucesso da promoção regular do

direito. Logo, a medida protetiva não é compulsória, mas facultativa, conforme o desejo

do próprio demandante – criança, adolescente e/ou familiares. É o que depreendemos da

leitura da lei federal n. 8.069/90:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade

competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à

criança e ao adolescente;

V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime

hospitalar ou ambulatorial;

VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e

tratamento a alcoólatras e toxicômanos

Caracterizada como direito – e não um dever -, a medida protetiva é a categoria

normativa que mais se aproxima do atendimento médico-psiquiátrico almejado pelo

PLS n. 23/2012. Portanto, não há falar em nova medida socioeducativa, mas nas

necessárias melhorias e fortalecimento dos sistemas sociais, sobretudo o de saúde.

19 CURY, Munir (coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, 11ª edição. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 417. 20 CURY, op. cit., p. 419.

II.3 – Da incompatibilidade entre a instituição de nova medida

socioeducativa e sua finalidade

A proposta abrigada no projeto de lei fere os princípios da proporcionalidade e da

eficiência dos atos da administração pública, eis que, em primeiro plano, a nova

medida socioeducativa não visa produzir inéditas narrativas de responsabilização, já que

tem a única finalidade de garantir imediato acesso aos serviços de saúde mental.

Pior: impulsionará a criação de nova estrutura administrativa e judiciária, com

aumento de quadro de recursos humanos e, logo, custeio de pessoal, bem como a

ampliação dos sistemas de monitoramento da política de atendimento

socioeducativo; tudo que, em suma, reverter-se-á no agigantamento dos gastos públicos

sem nenhuma alteração de qualidade no campo socioeducativo, já que não é aí que

reside o principal problema disparador do projeto de lei, conforme anuncia o próprio

autor.

O nó a ser desatado, como pronuncia o Nobre Proponente e o Nobre Relator da

Comissão de Assuntos Sociais, é o acesso, a permanência e a qualidade dos serviços

públicos de atenção à saúde mental destinados a qualquer brasileiro/a, e não apenas a

qualidade e o modelo do sistema de responsabilização socioeducativa.

Se o objetivo é realmente aprimorar o acesso aos bens e serviços para a garantia do

desenvolvimento de adolescentes, devemos aprimorar as políticas correspondentes e não

tornar mais rigoroso o processo responsabilizatório.

Isso porque, além de tornar essa especificidade algo ineficiente e não proporcional

para a administração pública, não gerará, por outro lado, impactos objetivos na

própria política de saúde mental. Logo, a criação de nova medida socioeducativa não

logrará aperfeiçoar nem o sistema socioeducativo nem o sistema de saúde.

Assim, incorremos no risco de criar rotas excepcionais de garantia do direito à saúde

mental, vindo a ser potenciais usuários apenas aqueles jovens que cometerem atos

infracionais.

Corremos ainda outro risco: o regresso à doutrina da situação irregular, notadamente

no seu aspecto da (in)completude institucional, princípio anulado pela entrada em

vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente justamente porque se passou a

compreender que a garantia do exercício dos direitos fundamentais de crianças e

adolescentes não deve estar refém ou condicionada à tutela estatal ou à custódia

institucional, pressupondo-se, então, “o rompimento da cultura de institucionalização

como inerente à ação protetora”21

.

21 CURY, op. cit., p. 421.

Assim é o posicionamento estatutário, tanto porque, por esse meio, não se promove o

pleno exercício dos direitos – já que se mantêm os/as adolescentes responsabilizados/as,

estando, logo, com direitos restringidos – quanto porque as instituições socioeducativas

não são destinadas a cobrir todas as necessidades básicas do indivíduo - embora venham

a cobrir algumas por consequência da privação de liberdade -, mas, acima de tudo, a

responsabilizá-lo no tempo e espaço demarcados pela decisão judicial. Nesse sentido,

Konsen afirma que “a aplicação de medida socioeducativa, por si tão-somente, não

produz nenhum efeito tutelar ou protetivo do interesse do adolescente”22

II.4 – Possibilidades de acatamento da justificativa do PLS n. 23/2012: a

garantia do direito de atenção à saúde mental.

Identificado o nó que deu origem à propositura do mencionado projeto de lei, convém

desatá-lo a partir da correta identificação das suas causas.

Uma delas é o investimento público notória e historicamente sacrificado nos campos

socioeducativo e sanitário. A pífia destinação orçamentária encontrada na interface

entre ambas searas demonstra que muitos gestores públicos não atendem ao basilar

princípio da prioridade absoluta encampado na Convenção Internacional sobre os

Direitos da Criança, na Constituição Federal da República e no Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Segundo o princípio, os direitos de crianças e adolescentes devem ser garantidos por

meio de oferta de serviços e bens públicos destinados prioritariamente às crianças e

adolescentes, em relação aos demais grupos sociais. É o que preceitua o Estatuto da

Criança e do Adolescente:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder

público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos

referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

22 Op. cit., p. 75.

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a

proteção à infância e à juventude.

A prioridade absoluta se concretiza, portanto, na execução direta dos serviços

públicos, na amplitude da cobertura conforme a situação infanto-juvenil de

determinado local, no atendimento de proteção e socorro; da formulação das

políticas, bem como na destinação orçamentária de recursos públicos voltados à

garantia dos direitos.

No tocante aos recursos orçamentários, propomos duas dimensões de análise. Pela

primeira, ao se reconhecer que o investimento em saúde não oferece plena cobertura aos

demandantes – seja no acesso, na permanência ou qualidade em relação ao serviço

prestado -, a iniciativa do Estado-legislador não deve ser criar mais uma medida

responsabilizatória ao adolescente, senão ao próprio Estado-administrador, qual

seja, a imposição de maior destinação orçamentária ao setor bem como

qualificação dos sistemas de monitoramento dentre as esferas federativas

componentes da estrutura de co-gestão da política de saúde.

Com isso, promove-se uma “verdadeira inversão do ônus da prova, ao colocar sob a

obrigação do Estado comprovar que não pôde fazer mais do que fez em favor da

efetivação desses direitos sociais”23

. Isto porque, embora se suponha que quanto maior a

destinação de verba tanto maior será a cobertura, alguns aspectos não são plenamente

avaliados nessa perspectiva, sobre os quais se deve compreender o nível de qualidade

encontrado na execução da política, em paralelo à contínua ampliação de recursos.

Já numa segunda linha de análise, podemos dizer que, há tempos, superou-se a noção

restritiva de que saúde seja apenas a ausência de doença. Saúde é a promoção de bem-

estar vital, individual e coletivo. Não obstante, não é somente a denominada política

de saúde a responsável pela promoção do bem-estar, mas quaisquer outras,

especialmente as sociais básicas (educação, assistência social, previdência social,

habitação, saneamento básico, segurança alimentar e nutricional etc).

Logo, impera reforçar a responsabilidade gestora de produzir insumos de garantia

de vida e saúde mental não apenas no setor de saúde – e nas respectivas secretarias

e propostas orçamentárias -, mas em todos os setores sociais básicos. Um passo

adiante, cumpre a execução qualificada e prioritária da política quando o assunto é

criança e adolescente.

23 CURY, op. cit., p. 425.

Caso não se priorize a oferta de bens e serviços públicos com acesso, permanência e

qualidade, entende-se que, automaticamente, resta violado o direito por alguma das

ações descritas na lei federal n. 8.069/90:

Art. 5º. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de

negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,

punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus

direitos fundamentais.

Nessa direção, importa considerar que qualquer iniciativa legal que promova o

aumento do rigor responsabilizatório em nome da proteção de direitos já

estabelecidos em lei – como é o caso da atenção à saúde mental – confirma a prévia

negligência cometida pelo Estado na (não) consecução dos deveres estabelecidos

pela sociedade.

Conforme aduz Myriam Mesquita Pugliese de Castro, “qualquer tipo de ação que não

atenda às suas necessidades básicas de alimentação, moradia, educação, saúde, lazer

constitui descuido, incúria, desleixo e é, portanto, considerada negligência”24

.

A propósito, bom salientar a existência de duas portarias expedidas no âmbito do

Governo Federal que estabelecem diretrizes para a “implantação e implementação da

atenção à saúde dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e

internação provisória:

- PORTARIA INTERMINISTERIAL MS/SEDH/SEPM 1.426/200425

que

aprova as diretrizes para a implantação e implementação da atenção à saúde

dos adolescentes em conflito com a lei, em regime de internação e internação

provisória.

- PORTARIA Nº 647, DE 11 DE NOVEMBRO DE 2008 – levando em

conta a Portaria 1426/2004 e outras normativas, aprova as diretrizes para a

implantação e implementação da atenção à saúde dos adolescentes em

conflito com a lei com medida socioeducativa a ser cumprida, em regime de

internação e internação provisória, em unidades masculinas e femininas.

Referidas portarias delineiam política pública específica à equalização do problema

contido na justificativa do projeto de lei em comento e, nesse sentido, os esforços

devem ser envidados à efetivação de seus dispositivos e não à criação de mais uma

medida socioeducativa fadada a não apenas manter o problema como também a agravá-

lo.

24 CURY, op. cit., p. 50. 25http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/PORTARIA%20INTERMINISTERIAL%201426%20julho-2004.pdf

Ao se engendrar nova medida socioeducativa como ajustada resposta à precária

prestação positiva estatal de garantia do direito à saúde mental ao/à adolescente

que infringe a lei (por vezes, exatamente em razão de sua sofrida ou desorganizada

condição psíquica no momento do ato infracional), procede-se não necessariamente

à garantia do direito à vida – e à saúde mental -, mas, no máximo, a uma mera

estratégia de coerção do Estado para a prestação do dever de atendimento.

Atendimento que, ademais, pode fracassar haja vista a condição privativa de liberdade

do adolescente usuário do serviço.

No que diz respeito aos estudos citados no Parecer do Senador Cyro Miranda (p. 2, item

ii), em que se menciona pesquisa publicada no Jornal Brasileiro de Psiquiatria na qual

se revela a prevalência de transtornos psiquiátricos entre adolescentes (¾ dos

adolescentes em Salvador teriam pelo menos um transtorno psiquiátrico), cumpre

esclarecer alguns pontos que podem, se mal interpretados, levar a conclusões

desconectadas do estudo evocado.

Se analisado minuciosamente, verifica-se que o estudo em referência aponta para os

seguintes dados: em 290 indivíduos analisados, 40% possuem o chamado transtorno de

conduta e 27,9% transtorno por Uso Nocivo de Substância Psicoativa, ou seja,

aproximadamente 70%, o que representa os quase ¾ dos adolescentes citados como

possuidores de algum “transtorno”.

Segundo o próprio estudo citado, não se pode considerar o chamado “transtorno de

conduta” como uma patologia psiquiátrica (no sentido medicinal do termo), pois

seriam pessoas definidas pelo estudo como os que “...desafiam os limites socialmente

determinados”. Vejamos a citação acima na íntegra:

Em relação ao transtorno de conduta, freqüentemente os jovens com esse

diagnóstico não são considerados portadores de patologia psiquiátrica, mas

pessoas que não internalizaram normas e desafiam os limites socialmente

determinados. Os jovens com transtorno de conduta manifestam-se com

sentimento deficitário de empatia pelo próximo e ausência de culpa, que

atuam como facilitadores para a incursão no crime (2006, p.129)26

.

Quanto ao segundo índice – 27,9% dos adolescentes possuem transtorno por uso de

substância psicoativa – é importante ressaltarmos que o uso e dependência de drogas é

algo absolutamente distinto e que a discussão deve avançar no sentido de aumentar a

rede pública de proteção e atenção ao usuário de drogas, fortalecendo e capacitando o

Sistema Público de Saúde e a Rede de Assistência Social:

Em síntese, essa composição do ato infracional com o transtorno mental

vem construindo argumentos tanto para modificações no Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA) – seja no tempo de aplicação da medida ou

26 “Morbidade psiquiátrica entre adolescentes em conflito com a lei”. PINHO [et. al]. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 55(2) 2006, p.126-130.

na proposição do tipo de medida – quanto para a produção de práticas

dirigidas ao autor de ato infracional que são frontalmente contrárias aos

paradigmas do ECA e às da atual política nacional em Saúde Mental. p. 66-

6727

Com relação ao outro estudo citado – dissertação de mestrado defendida na UNB em

2011 por Natália Pereira Gonçalves junto ao Departamento de Serviço Social –

impende colacionar a conclusão da pesquisadora, que vai exatamente no sentido

contrário ao defendido na justificativa do Projeto de Lei 23/2012:

No atendimento a essas demandas, os adolescentes receberam o diagnóstico

que corresponde ao estigma de perigoso e ameaçador experimentado pelo

autor de ato infracional. A conduta dos adolescentes foi considerada

anormal por esse diagnóstico, devido ao pensamento moralizador que

aponta como doente aquele que foge do padrão de normalidade socialmente

colocado (GONÇALVES, 2011, p.80).

O adolescente, portanto, deve ser escutado para além de um processo “psíquico” ou

“psicossocial” que afeta os internos da Fundação Casa, mas em seu duplo “laço

político”: como lugar-cruzamento de técnicas de si e técnicas políticas e como dimensão

que afeta a todos28

.

É preciso buscar novas formas de reflexão sobre os adolescentes e atos infracionais, em

contraposição “...à constituição do discurso da periculosidade e da patologia dos

jovens, e à produção do medo, trata-se de encontrar outros ângulos analíticos que

abram novos espaços de reflexão e que permitam pensar algumas relações entre

processos políticos, sociais e subjetivos que atravessam vidas cotidianas de

adolescentes em espaços sociais de trauma, estigma e perigo.” (VICENTIN, 2011

p.108).

II.5 – Sobre a generalização da medida socioeducativa proposta, em afronta

ao melhor interesse do adolescente.

27 A patologização do jovem autor de ato infracional e a emergência de “novos” manicômios judiciários. VICENTIM [ET.AL]. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, 2010; 20(1): 61-69. 28 “Corpos em Rebelião e o sofrimento-resistência: adolescentes em conflito com a lei”. Maria Cristina Vicentin, Revista de Sociologia da USP, Tempo Social, v.23, n.1, p.97-113.

Sob outro ponto de vista, de se ponderar que, não bastasse a demonstrada inadequação

da criação da novel medida socioeducativa, também outra violação aos direitos dos

adolescentes emerge: não há, no texto legal proposto, qualquer restrição à imposição da

nova (e inadequada) medida socioeducativa proposta, de modo que, seja qual for o ato

infracional, presentes ou não violência ou grave ameaça, primária/o ou não a/o jovem

acusada/o, será possível a sua internação nos casos “transtorno ou deficiência mental

constatada por meio de exame médico-legal e incapacidade de entender o caráter

pedagógico e educacional das medidas socioeducativas previstas nos demais incisos”.

A novidade, portanto, demais de ser claramente inadequada aos fins que se propõe,

subverte o sistema sócio-educativo, que é calcado em disposições constantes de

diplomas internacionais, da Constituição da República e do ECA.

Tais normativas guindam ao patamar de prioridade absoluta o melhor interesse da

criança e do adolescente e, na repressão de atos infracionais, atribuem à privação de

liberdade o caráter de medida excepcional.

Nesse sentido, dispõe o artigo 37, item “b”, da Convenção das Nações Unidas de

Direito da Criança (1989):

“A detenção, a reclusão ou a prisão de uma criança será efetuada em

conformidade com a lei e apenas como último recurso, e durante o mais

breve período de tempo que for apropriado”

Em sentido homólogo, vale lembrar o que dispõem as Diretrizes das Nações Unidas

para a Prevenção da Delinqüência Juvenil (“Diretrizes de Riad”) em seus itens 4 e 5:

“4. É necessário que se reconheça a importância da aplicação de políticas e

medidas progressistas de prevenção da delinqüência que evitem

criminalizar e penalizar a criança por uma conduta que não cause

grandes prejuízos ao seu desenvolvimento e que nem prejudique os

demais. Essas políticas e medidas deverão conter o seguinte:

a) criação de meios que permitam satisfazer às diversas necessidades dos

jovens e que sirvam de marco de apoio para velar pelo desenvolvimento

pessoal de todos os jovens, particularmente daqueles que estejam

patentemente em perigo ou em situação de insegurança social e que

necessitem um cuidado e uma proteção especiais.

b) critérios e métodos especializados para a prevenção da delinqüência,

baseados nas leis, nos processos, nas instituições, nas instalações e uma rede

de prestação de serviços, cuja finalidade seja a de reduzir os motivos, a

necessidade e as oportunidades de cometer infrações ou as condições que

as propiciem.

c) uma intervenção oficial cuja principal finalidade seja a de velar pelo

interesse geral do jovem e que se inspire na justiça e na eqüidade.

d) proteção do bem-estar, do desenvolvimento, dos direitos e dos interesses

dos jovens.

e) reconhecimento do fato de que o comportamento dos jovens que não se

ajustam aos valores e normas gerais da sociedade são, com freqüência,

parte do processo de amadurecimento e que tendem a desaparecer,

espontaneamente, na maioria das pessoas, quando chegam à maturidade,

e

f) consciência de que, segundo a opinião dominante dos especialistas,

classificar um jovem de "extraviado", "delinqüente" ou "pré-

delinqüente" geralmente favorece o desenvolvimento de pautas

permanentes de comportamento indesejado.

5. Devem ser desenvolvidos serviços e programas com base na comunidade

para a prevenção da delinqüência juvenil. Só em último caso recorrer-se-á a

organismos mais formais de controle social.”

A Constituição da República assenta que o direito à proteção especial abrangerá,

entre outros aspectos, a “obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e

respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação

de qualquer medida privativa da liberdade” (artigo 227, § 3º).

Na mesma trilha, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reafirma a

excepcionalidade da medida de internação (artigo 121):

“A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios

de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em

desenvolvimento”

Justamente ao fim de estabelecer limites claros à excepcional medida de restrição de

liberdade (inclusa aqui a nova medida, que prevê “regime de internação”), o Legislador

cingiu a sua aplicação às hipóteses de ato infracional cometido com violência ou grave

ameaça à pessoa.

O fundamento de racionalidade dessa moldura legal é bastante simples e guiado pela

excepcionalidade de medida de internação, que, como se aferiu, é fartamente

normatizada: parte-se do pressuposto de que a medida de internação é a menos eficaz

e a mais traumática das medidas aplicáveis ao adolescente infrator, razão pela qual

apenas quando a conduta se concretiza com o emprego de violência ou grave ameaça

passa a ser admissível a privação da liberdade.

Observe-se que, mesmo nas hipóteses de ato infracional que envolve violência ou grave

ameaça, ao Juízo caberá ponderar se há outra medida adequada, sempre com o intuito de

evitar a perniciosa medida de internação:

“Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra

medida adequada” (artigo 122, § 2º).

Infere-se, pois, que a abertura para a aplicação de nova medida sócioeducativa de

internação a jovens com transtornos mentais, independentemente do ato infracional pelo

qual é acusado, é temerária e contrária ao melhor interesse do adolescente, na medida

em que generaliza medida que deveria ser excepcional (e, em última instância, dada a

inadequação já exposta no item anterior, sequer deveria existir).

III. Conclusão

Em sede de processo socioeducativo, cabe à atividade jurisdicional propagar garantia de

direitos não promovidos pelo Poder Executivo. Conforme vimos, o art. 112 do ECA

autoriza o juiz a aplicar, adjacente à determinação socioeducativa, a medida de

proteção, que pode se constituir, portanto, em assistência à saúde mental do/a

adolescente.

Logo, não há necessidade de se criar mais uma medida socioeducativa, pois, conforme

expõe Paulo Afonso Garrido de Paula, o interesse juridicamente protegido (nesse caso,

de acesso a serviços de saúde) nem sempre precisa resultar de norma específica,

devendo o magistrado recorrer a ferramentas interpretativas que possibilitam equacionar

relações conflituosas: “não concebo uma tutela de interesse divorciada de juridicidade;

eventuais dificuldades devem ser superadas pela atividade de interpretação”29

.

Em síntese de boa parte do que aqui se defende, Bianca Mora de Moraes e Helena

Vieira Ramos, ao tratarem da questão do adolescente portador de deficiência mental,

destacam:

“(...) na prática o que ocorre é a falta de instituições adequadas para o

tratamento individual e especializado legalmente previsto, ocasionando

diversidade de atuações para a solução dos casos concretos. Verifica-se que,

lamentavelmente, na maioria das vezes é aplicada a medida socioeducativa de

internação, deixando-se a cargo da entidade recebedora do jovem as

providências necessárias para o tratamento dos distúrbios psiquiátricos.

Considera-se, acompanhando João Batista Costa Saraiva, que aos

adolescentes em tal situação não há como se aplicar medida socioeducativa,

mas sim aquela que emerge do disposto no §3º do art. 112, c/c o art. 101, V,

ECA”30

.

Veicular a proteção de direitos por meio exclusivo da responsabilização

socioeducativa é aproximar a garantia de direitos da prática menorista e tutelar

que vigorou por séculos no Brasil e, em legislação específica, por 63 anos. Garantir

proteção pela via da repressão, restrição de direitos e privação de liberdade é

exatamente a ação que caracteriza, primordialmente, a doutrina da situação irregular. Os

meninos e meninas abandonados ou negligenciados eram internados em instituições

asilares, correcionais e disciplinares justamente para que obtivessem alguma garantia de

acesso a serviços públicos que lhes fortalecessem como seres humanos ordeiros,

corretos e obedientes. Essa era a visão que não pode ser mais ressuscitada, pois para ela

não há mais espaço em nossa história.

Ante todo o articulado, Conectas, CFP, Sou da Paz, Pastoral Carcerária, IDDD,

ITTC e RENADE se manifestam pela rejeição integral do PLS 23/2012, vez que

manifestamente eivado de inconstitucionalidade material.

29 PAULA, Paulo Afonso Garrido de. Direito da criança e do adolescente e tutela jurisdicional diferenciada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 55. 30 Curso de Direito da Criança e do Adolescente (Coordenação: Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel). Ed. Lumen Juris, 2008. 3ª edição.

NOTA TÉCNICA

A secretaria executiva da Rede Nacional de Defensores do Adolescente

em Conflito com a Lei – RENADE – vem apresentar posicionamento técnico acerca da

tramitação do Projeto de Lei n. 1.185/2012 da Câmara Legislativa do Distrito Federal,

conforme segue.

Preliminarmente, cai por terra o texto do Projeto de Lei simplesmente

porque imbuído de vício: desconsidera o rol taxativo de possíveis portadores de arma,

dentro do qual não se incluem agentes do sistema socioeducativo. É de se ver, conforme

a lei federal n. 10.826/2003:

.............................................................................................................................................

Art. 6º É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os

casos previstos em legislação própria e para: (destaque nosso)

.............................................................................................................................................

Conforme sinaliza o artigo, os incisos a seguir tratam dos

possíveis titulares do direito ao porte, também citados na Exposição de Motivos do

Projeto de Lei em pauta. Conforme afirmam os próprios parlamentares autores do texto

projetado, os profissionais do sistema socioeducativo não são contemplados no elenco.

Entretanto, por artifício de linguagem, os mesmos autores explicam não se tratar de rol

taxativo de portadores de arma, restringindo as condições de porte apenas à prévia

existência de legislação própria. E finalizam: se houver lei própria para essa categoria

de trabalhadores, não há impedimento legal para a garantia do direito. Vejamos.

O projeto de lei se justifica a partir do mesmo caput do art. 6º da

lei 10.826/2003, interrompendo o período, como se verifica: Art. 6º É proibido o porte

de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em

legislação própria... E conclui: Ocorre que a Legislação do Desarmamento, em seu art.

6º, não exclui outras categorias, desde que haja legislação própria, vejamos. Assim

citado, convence o desavisado que não tem a oportunidade de ler o artigo integralmente.

Ao afirmar que não se trata de rol taxativo, desconsidera o aditivo

“e”, pelo que, portanto, passa a inovar a legislação federal, o que não cabe ao ente

federativo distrital.

O artigo 6º da lei mencionado é expresso quanto aos possíveis

titulares do direito ao porte de armas. Mais que isso, reserva-lhes o direito, porém,

condiciona seu exercício à promulgação de legislação própria e para determinadas

categorias populacionais. Fundamental a observação desse aditivo, que cerca em

absoluto o grupo ao qual o direito é garantido.

No mérito, em consonância com a Nota de Recomendação do

Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente do Distrito Federal - CDCA/DF,

compartilhamos o posicionamento político segundo o qual os princípios armamentistas

estabelecidos no Projeto de Lei ora impugnado não se coadunam com os princípios de

direitos humanos que regem a legislação brasileira de proteção integral de crianças e

adolescentes. Quanto aos parâmetros político-metodológicos de atendimento de

qualquer criança e adolescente, distinção não há entre as ações de garantia de direitos

seja dentro ou fora do sistema socioeducativo, pois servem – todos – ao paradigma

contemporâneo de proteção dos direitos humanos.

Desse modo, o fato de estarem os adolescentes inseridos no

sistema socioeducativo não enseja constatar, automaticamente, perigo na atuação

educadora. Não há porque sustentar ações bélicas no lugar de intervenções

socioeducativas. Em outra medida, se defendido o uso apenas fora do sistema

socioeducativo, entende-se que cabe ao profissional prover cuidados e exigi-los do

Estado. Todavia, que sejam mecanismos de proteção de outra ordem, em nada associada

à natureza da atividade socioeducativa.

Nesses termos, rechaçamos o texto veiculado pelo PL n. 1.185,

em trâmite na Câmara Legislativa do Distrito Federal, compondo com os defensores de

direitos humanos de crianças e adolescentes.

Nota técnica sobre a compatibilidade verificada entre o Decreto n. 3.597/2000, pelo

qual o Congresso Nacional ratifica a subscrição da Convenção 182/1999 da

Organização Internacional do Trabalho realizada pelo Estado Brasileiro.

A Rede Nacional de Defensores do Adolescente em

Conflito com a Lei (RENADE), em sua terceira edição, vem apresentar a situação

normativa e sugestão para a resolução da equação composta, de um lado, pela norma

presente na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) –

ratificada pelo Brasil por meio do Decreto n. 3.597/2000 -, e de outro, pelo conjunto

normativo nacional encabeçado pela lei federal n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do

Adolescente).

Preliminarmente, responde brevemente às questões

apresentadas:

a) Você vê alguma lacuna entre a normativa internacional de proteção aos direitos

da criança e do adolescente e a legislação nacional? Em caso afirmativo,

(a.1) Em qual(is) normativa(s) internacional(is) e quais os aspectos não se encontram

contemplados na legislação nacional?

A lacuna se estabelece no conflito entre o art. 3º da

Convenção 182 da OIT, subscrita pelo Brasil e ratificada internamente por meio do

Decreto n. 3.597/2000, e o arcabouço legal nacional, em especial o Estatuto da Criança

e do Adolescente. Na Convenção da OIT, define-se que o reconhecimento da prática

adolescente de tráfico de drogas implica a assertiva de que o adolescente se situa na

condição de vítima de uma das piores formas de trabalho infantil. Já a legislação

nacional em vigor desde antes desta Convenção permanece tipificando a conduta

adolescente no âmbito penal e, em decorrência, responsabilizando-o apenas como autor

perante tal prática.

(a.2) Qual é o conteúdo da inclusão ou mudança a ser proposta?

O conteúdo se refere à compreensão de que seja necessário

compatibilizar os entendimentos antagônicos automaticamente vigentes no Brasil.

b) No caso da legislação nacional você avalia a necessidade alteração ou

complementação de aspectos ainda não regulamentados? Em caso positivo,

(b.1) Em qual (is) lei (s) e quais aspectos (artigos) necessitam alteração/complemento?

Importa desclassificar do campo infracional o ato de

tráfico de drogas, tornando-o uma ocorrência que interesse apenas em âmbito civil, de

modo que sejam as políticas sociais estatais o conteúdo essencial e exclusivo da

resposta estatal frente à conduta.

(b.2) Qual seria o conteúdo da alteração/complementação necessária em cada uma das

normas mencionadas?

A sugestão pode tomar dois caminhos alternativos:

1) Derrogar o art. 103 do ECA, acrescentando-lhe a informação (na forma de

parágrafo) que excetua o tráfico de drogas do quadro de ato infracional,

tornando-o uma conduta que não interesse ao âmbito da justiça especial da

infância e juventude, tampouco ao sistema socioeducativo,

ou

2) Derrogar os artigos pertinentes aos procedimentos judiciários de apuração do ato

infracional, de modo a, ainda que sejam comprovadas a conduta e sua autoria,

não caber ao/à adolescente nenhuma das medidas socioeducativas estabelecidas

pelo ECA, mas apenas as medidas protetivas.

TEXTO DE JUSTIFICATIVAS

I – O comércio de substâncias psicoativas Ilícitas e o Estatuto da Criança e do

Adolescente

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) impõe, em

seu artigo 103, que ato infracional é a “conduta descrita como crime ou contravenção

penal”. Portanto, de início concluímos que qualquer tipo penal inserido no Código Penal

e na legislação extravagante é, automaticamente, considerado ato infracional. Portanto,

o comércio de substâncias psicoativas ilícitas, nos termos do art. 33 da Lei federal n.

11.343/2006 combinado com o art. 103 do ECA, configura ato infracional.

Em um próximo plano, temos que o ato infracional enseja

investigação policial e, de modo geral, processo judicial, inaugurado a pedido do

promotor de justiça que, após ouvir o/a adolescente suspeito/a (art. 179, ECA), oferece

representação ao Juízo. Se recebida a representação, deve o/a juiz/a agendar a

audiência de apresentação (art. 184, ECA), por meio da qual colherá as primeiras

informações diretamente junto ao/à adolescente e família, bem como verificará a

necessidade de realização de próxima audiência, denominada em continuação, na qual

também se ouvirão as testemunhas. Essa audiência é obrigatória nos casos de possível

internacional em estabelecimento educacional (art. 186, § 2º, ECA). A todo tempo, vale

ressaltar, o juiz pode conceder a remissão (art. 188, ECA).

Vem, assim, o chamado tráfico de drogas a ser ato

infracional que enseja a passagem do/a adolescente por todas essas etapas.

Especialmente em função da natureza da prática – que justificou sua inserção na lei de

crimes hediondos (lei federal n. 8.072/90) -, ainda que não ocorra, via de regra, por

meio de grave ameaça ou violência, pois, de modo geral, exaure-se tão somente a partir

da compra e venda de um produto classificado como ilegal.

II – O comércio de substâncias psicoativas ilícitas e a Convenção 182 da OIT.

A Convenção 182 da OIT determina a “proibição das

piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação”. Informa, assim,

que o tráfico de substâncias psicoativas ilícitas é uma das piores formas de trabalho

infantil.

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Artigo 3º. Para os fins desta Convenção, a expressão as piores formas de trabalho

infantil compreende:

(c) utilização, demanda e oferta de criança para atividades ilícitas, particularmente

para a produção e tráfico de drogas conforme definidos nos tratados internacionais

pertinentes;

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Primeiro, devemos qualificar o público “infantil”.

Correlato ao público criança, essa expressão, conforme a Convenção Internacional

sobre os Direitos da Criança - e todos os demais documentos contemporâneos a ela

alinhados -, intitula todas as pessoas situadas entre 0 e 18 anos de idade incompletos.

Portanto, compreende a população de crianças e adolescentes em âmbito nacional.

Em segundo, constatamos que a prática de comércio de

substâncias psicoativas ilícitas cometida por esse público é tratada, em nível

internacional, como agressão e violação de seus direitos. Daí, a configuração de

exploração de trabalho infantil. Já em nível nacional, entretanto, é exclusivamente

tratada como autoria de ato infracional e ofensa por parte do/a adolescente frente à

sociedade31

, pois tipificado como crime:

31 Importa lembrar que há doutrinadores contemporâneos críticos que contestam a dogmática jurídica

segundo a qual o crime que afeta um bem jurídico e uma vítima abstrata (caso do tráfico de drogas, que

não apresenta bem e vítima diretamente ofendida) é válido e implica responsabilização na mesma

medida que os demais delitos.

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Lei federal n. 11.343/2006

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender,

expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar,

prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que

gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou

regulamentar:

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a

1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.

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Ao mesmo tempo, é da letra do Decreto n. 3.597/2000,

que “promulga Convenção 182 e a Recomendação 190 da Organização Internacional do

Trabalho (OIT) sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação

Imediata para sua Eliminação, concluídas em Genebra, em 17 de junho de 1999”, a

determinação de cumprimento, pelo Estado Brasileiro, dos dispositivos instalados na

Convenção:

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Art. 1º A Convenção 182 e a Recomendação 190 da Organização Internacional do

Trabalho (OIT) sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e a Ação

Imediata para sua Eliminação, concluídas em Genebra, em 17 de junho de 1999,

apensas por cópia a este Decreto, deverão ser executadas e cumpridas tão inteiramente

como nelas se contém.

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Ora, impossível não verificar a incompatibilidade entre a

consideração do ato de tráfico e a resposta estatal planejada em nível internacional e

em nível nacional, levando-se em conta que o Brasil é legislador nos dois âmbitos.

III – Incompatibilidade entre papeis de vítima e de autor assumidos pela mesma

pessoa

Vimos que, no Brasil, vigora um conjunto normativo

(mais antigo) que impõe a qualidade penal à prática de comércio de substâncias

psicoativas, bem como invoca o sistema penal e de justiça juvenil para as devidas

apuração e responsabilização. Constatada a autoria e materialidade da prática, esse

ordenamento jurídico responde apenas de modo responsabilizatório – à luz da

tipificação penal agravada, vale reiterar, pela lei de crimes hediondos. É o que se

verifica quando da leitura de qualquer relatório sobre o sistema de justiça juvenil e o

sistema socioeducativo, pelos quais se constata que o tráfico de drogas está sempre

disputando com o ato equivalente a roubo o primeiro lugar na tabela classificatória da

incidência de atos infracionais. Tanto assim que o Superior Tribunal de Justiça decidiu,

por meio da Súmula 492/2012, que

O ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente

à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente.

Ao surgir da mesma constatação de alta incidência de

tráfico de drogas nas Varas da Infância e Juventude e, em decorrência do rigor

responsabilizatório sobre a autoria e caráter ofensivo do ato, nas unidades de internação,

essa determinação dos magistrados superiores tem a finalidade de inibir os juízes frente

às corriqueiras sentenças judiciais mais severas. Entretanto – e também por isso -, é

necessário que se amplie o objetivo dessa súmula, incidindo nas estruturas do processo

responsabilizatório, de modo que não restem medidas socioeducativas a serem aplicadas

justamente porque a República Federativa do Brasil adotou, recentemente, a estratégia

de situar o/a adolescente no lugar de vítima de práticas de exploração do trabalho. Estar

nesse posto impõe ao Poder Judiciário o dever de isentar o/a adolescente da medida de

responsabilização, qualquer que seja. Em outras palavras, se do mundo dos brocardos

jurídicos podemos extrair a velha máxima de que ninguém pode ser considerado

autor e vítima do mesmo crime (ato infracional), aos/às adolescentes imputadas

práticas de comércio de substâncias psicoativas ilícitas devem seguir respostas estatais

de ordem distinta das tradicionais socioeducativas.

Parecer Técnico ao Projeto de Decreto Legislativo do Senado Federal n. 539/2012

O Projeto de Decreto Legislativo 539/2012 tem como objeto a convocação de

Plebiscito, de âmbito nacional, para consulta dos eleitores no primeiro turno das

eleições de 2014, sobre a alteração da maioridade penal. Eis aredação do decreto:

Art. 1º É convocado, nos termos do art. 49, XV, da Constituição

Federal e da Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998,

plebiscito, de âmbito nacional, para consultar os eleitores sobre

a alteração da maioridade penal de dezoito para dezesseis anos.

Art. 2º O plebiscito de que trata este Decreto Legislativo

realizarse-á juntamente com o primeiro turno das eleições de

2014, para deliberar sobre a seguinte questão: “Você é a favor

da alteração da maioridade penal de dezoito para dezesseis

anos?”. Parágrafo único. Fica sustada a tramitação das

proposições legislativas cuja matéria constitua objeto desta

consulta popular, até que o resultado das urnas seja

proclamado, na forma do art. 9º da Lei nº 9.709, de 1998.

Art. 3º O Presidente da Mesa do Congresso Nacional dará

ciência da aprovação deste ato convocatório ao Tribunal

Superior Eleitoral, para os efeitos previstos no art. 8º da Lei nº

9.709, de 1998.

Art. 4º Este Decreto Legislativo entra em vigor na data de sua

publicação.

I - Histórico das Propostas de Redução da Maioridade Penal

Desde o século XIX, a questão da criminalidade infanto juvenil no Brasil perpassou

uma série de discursos e práticas no saber jurídico, nas práticas institucionais (tanto em

termos assistenciais e pedagógicos, como numa perspectiva punitiva e reformadora)

voltadas aos adolescentes autores de atos infracionais na tentativa de solucionar a

questão da criminalidade das crianças e adolescentes ou de outro modo, a questão do

“menor”.

De um modo geral, as diferentes formas de organização do sistema da justiça criminal

(Roda dos Expostos, Código Criminal do Império, o Código Penal de 1890, o Código de

Menores de 1927, a FUNABEM e as FEBEM´s) basearam-se na construção de um

aparato médico-jurídico-assistencial, que se dividiu em prevenção (vigiar a criança),

recuperação (reabilitar a criança e o adolescente criminoso), educação (disciplinar a

criança ao trabalho) e na repressão (conter crianças e adolescentes delinqüentes)

(SPOSATO, 2001)32

. Vale observar a ementa das principais leis: o Código de Menores

de 1927 previa a proteção e assistência; o Código de Menores de 1979 previa, além da

proteção e assistência, a vigilância.

Esta preocupação com a criminalidade infanto-juvenil (que se manifesta de tempos em

tempos no discurso favorável a diminuição da maioridade penal) vem funcionando

durante este tempo, mais como um instrumento de marginalização da população pobre

do que uma ampliação e um reconhecimento dos direitos civis dos jovens (Alvarez,

1997).

É, portanto, na tentativa de romper com as antigas concepções higienistas,

assistencialistas e repressoras que predominaram no tratamento à infância e juventude

no Brasil, que o Estatuto da Criança e do Adolescente é promulgado em 1990 (lei

8.069). O ECA colocou a questão da infância e juventude no centro do ordenamento

jurídico brasileiro, em consonância com os movimentos internacionais de direitos e

proteção da criança e do adolescente colocando-os agora, como sujeitos de direitos.

Mesmo com esses avanços o ECA é constantemente criticado por diferentes setores da

sociedade (meios de comunicação, deputados, organizações civis) por não possuir

medidas “punitivas”, mas “somente” as chamadas sócio educativas. Estes setores

reclamam que o ECA mantém impunes os adolescentes autores de atos infracionais,

32 SPOSATO, K. B. Pedagogia do medo: adolescentes em conflito com a lei e as propostas de redução da idade penal. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v .6, p.31-49, 2001.

motivo pelo qual se faria necessária a redução da idade penal para conter supostas

“ondas” de criminalidade em cuja atual configuração de violência urbana seriam os

jovens seus principais atores e responsáveis. Assim, crianças e adolescentes brasileiros

são vistos historicamente como objeto de intervenção das instâncias de correção e das

chamadas instituições de ortopedia social (ADORNO, 2002).

Nesse sentido, emergem as diferentesPropostas de Emenda à Constituição Federal ou

Projetos de Decretos Legislativos que tramitamna Câmara dos Deputados e no Senado

Federal desde 199333

. Esses projetos propõem reduzir a imputabilidade penal dos atuais

dezoito para dezesseis anos de idade, ou, em alguns casos, até quatorze ou doze anos,

modificando assim a redação do artigo 228 da Constituição Federal.

Conforme expomos a seguir, o PDS n° 539 de 2012 é inconstitucional. Tal proposta não

pode ser objeto de deliberação, visto que: i) a afirmação da idade penal faz parte dos

direitose garantias constitucionais fundamentais de natureza individual, portanto,

irrevogáveis; ii) o Brasil ésignatário dos tratados internacionais - a exemplo da

Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU de 1989 – que confirmam os 18 anos

como marco de idade penal; iii) as taxas de incidência infracional estão caindo desde o

início do século XX, iv) a ‘irresponsabilidade penal da criança e do adolescente’ é um

mito.

I – A maioridade penal é Cláusula Pétrea.

A redução da idade penal é imbuída de uma questão constitucional fundamental: ela é

cláusula pétrea, sendo parte dos direitos e garantias fundamentais individuais de nossa

Constituição Federal de 1988. É o que consta do art. 60, §4º, da Carta Maior:

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a

abolir:

33 PEC 171/1993 Deputado Benedito Domingos.

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

Ora, se consta da Carta Magna que as garantias constitucionais individuais não podem

ser revogadas senão por meio de nova Constituinte Originária; e se os direitos e

garantias individuais estão espalhados ao longo da Constituição Federal, a exemplo do

constante de seu art. 228 (idade penal aos 18 anos de idade); concluí-se que esse marco

etário poderá ser alterado somente a partir da vigência de nova Constituição Federal,

não vindo um plebiscito ou uma emenda constitucional a ter força suficiente para sua

revogação.

Em outra medida, cabe dizer que a Constituição de 1988 inseriu a resposta do Estado

frente atos infracionais cometidos por adolescentes no sistema de

garantiasconstitucionais e penais. Isto, no plano jurídico, define que:

1) Como crianças e adolescentes gozam de todos os direitos

fundamentais atribuídos a quaisquer cidadãos (art. 5°, CF, e art. 3º,

ECA), além dos direitos especiais constantes do Estatuto da Criança e do

Adolescente, que ainda reserva ao Estado a única opção de promoção de

atos discriminatórios positivos, sendo-lhe vedado executar ações que

tenham a finalidade protetiva, que ampliem os direitos das crianças e

adolescentes (art. 5º, ECA)

2) reconhece que a resposta do Estado contra o adolescente comporta

privação de liberdade (art. 227, § 3°, V, CF): na democracias não há

prisão sem o devido processo legal e o sistema constitucional de

garantias (art. 5º, incisos XXXVII a LXVIII, CF). AConstituição

Federal, ainda, guarda norma expressa sobre a reserva da prisão como

conseqüência de prática de crime (art. 5°, LXVII), sendo autorizadas

apenas duas exceções constitucionais, que não se aplicam, por definição,

a crianças e adolescentes34

.

34 Prisão civil de curta duração para devedores de alimentos e depositários infiéis; situações jurídicas

nas quais crianças e adolescentes, porque são incapazes civilmente, nunca podem estar.

Desse modo, a Constituição Federal confere a crianças e adolescentes todas as garantias

de natureza penal e processual penal conferida aos adultos, mas em respeito à condição

peculiar de crianças e adolescentes em fase de desenvolvimento, assegurou-lhe mais

garantias (garantias especiais, exclusivas de crianças e adolescentes), também em

relação à resposta do Estado quando estes cometem atos infracionais. Trata-se de

conquistas sociais admitidas e assumidas pela sociedade, que, por sua vez, deve abrir

mão do retrocesso e lançar mão de criatividade e ações em busca da superação de novos

desafios, muitos deles decorrentes da própria assunção do contemporâneo marco

regulatório dos direitos humanos universais.

A essa dinâmica atribui-se a expressão vedação do retrocesso social (SILVA, 2010)35

,

segundo a qual a sociedade brasileira não pode abandonar as conquistas sociais, em

especial aquelas positivadas na Carta Federal e reconhecida a todo e qualquer cidadão

brasileiro. Em outra ordem, é como se o Parlamento Federal decidisse impor um

plebiscito para que a sociedade decida se deseja rever o caráter universal do sistema

único de saúde, colocando-o em cheque. Não há, portanto, lei ou mecanismo subjacente

à Constituição Federal que possa veicular decisões contrárias às conquistas históricas do

povo brasileiro.II – O valor constitucional dos documentos internacionais assinados

pelo Brasil.A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – ratificada

internamente pelo Decreto 99.710/90 – estabelece que criança (no Brasil, compreendida

como as fases de criança e adolescente) é o sujeito que se encontra até os 18 anos de

idade. Trata-se do primeiro marco etário para definições de direitos, deveres e políticas

públicas correspondentes. Esse documento internacional alinha-se a outros, como as

Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores

(Regras de Beijing, 1985), e as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da

Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad, 1990). Todos esses documentos confirmam

que a idade penal deve dividir a fase adulta da fase infanto-adolescente, e, portanto,

distinguir os tratamentos estatais perante a prática delituosa.A Constituição Federal, por

sua vez, estabelece em seu art. 5º, § 3º, que: Os tratados e convenções internacionais

35 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2010.

sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional,

em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes

às emendas constitucionais. Nesse sentido, se as premissas são:

a) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança é documento

subscrito e ratificado internamente pelo Brasil;

b) Conforme apregoa a Carta Magna Brasileira, todo documento

internacional assinado no exterior e ratificado em âmbito interno terá valor

constitucional;

Logo:

c) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e os demais

tratados, pactos e diretrizes dos quais o Brasil é signatário são documentos

com status constitucional.

Nessa medida, se trata de documentos de valor constitucional, podem ser revogados ou

contrariados apenas se não se tratarem de cláusula pétrea, seguindo as premissas e o

raciocínio do primeiro item dessa arrazoado. E, como tratam de garantias

constitucionais – que reforçam as já previstas pela Assembléia Constituinte -,

asseguram, indubitavelmente, a perenidade dessa norma e desse direito de qualquer

adolescente brasileiro, independentemente de ter cometido ato infracional. Nasce com o

direito de ser tratado de modo diferente, de receber, portanto, uma discriminação

positiva.

Segundo Machado36

(2006, p.107):“Neste passo, cumpre frisar que, se o direito de

liberdade da pessoa física criança ou adolescente possui as especificidades já referidas

no item II supra, é de ver que a imaturidade/vulnerabilidade do sujeito de direito, na

Democracia não pode ser invocada para discriminá-lo negativamente. A

desequiparação jurídica que a Constituição de 1988 criou para crianças e adolescentes

é a desequiparação jurídica protetiva, que é própria da atual fase de evolução da

36 “MACHADO, MARTHA .T. Sistema Especial de proteção da liberdade do adolescente na

Constituição brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. In: ILANUD, ABMP,

SEDH, UNFPA (Orgs) Justiça Adolescente e Ato Infracional: socioeducação e responsabilização.São Paulo,

2006, p.87-123”.

proteção aos direitos humanose que vem adotada na Convenção dos Direitos da

Criança e do Adolescente (ONU, 1989).”

Dentre estas garantias, estabeleceu-se a inimputabilidade penal para a pessoa até dezoito

anos de idade incompletos, que vem expressa nos artigos 228 e 227, § 3 º, V, última

parte, do texto constitucional. Este marco normativo diferencia-se da inimputabilidade

penal que vigorava no o paradigma menorista, pois,segundo Machado(ibid, p.108):

“[...]era uma inimputabilidade penal que impunha a crianças e adolescentes tratamento

penal severamente mais gravoso que aquele reservado aos adultos (impunha uma

medida de segurança perpétua, sem incidência da reserva legal, do contraditório e da

ampla defesa, entre outras salvaguardas.”

Portanto, a inimputabilidade penal atual impede a aplicação da sanção criminal (das

penas reservadas aos adultos). E isso configura não apenas preceito penal, mas

constitucional pétreo, de modo que se permite alteração apenas se promulgada nova

Carta Magna.

Ao assim determinar, a Assembleia Constituinte de 1988 ponderou sobre os valores

individuais e sociais na situação específica de crime cometido por adolescente, optando

pela enorme capacidade de autotransformação, que é própria do ser humano, impondo a

prevalência de medidas protetivas e educativas e instituindo as garantias de

excepcionalidade e brevidade da privação de liberdade (art.227, § 3º, V), que o ECA

tratou de concretizar. Destarte: “Importante destacar que a excepcionalidade não é só

das medidas privativas de liberdade (no ECA, internação e semi-liberdade), mas sim

uma excepcionalidade da própria imposição de qualquer medida sócio-educativa...E

veja-se que a excepcionalidade do sistema de responsabilização de crianças e

adolescentes vem e consonância com o princípio da intervenção mínima, contido nos

documentos da ONU: Diretrizes de Riad; Assembleia Geral Resolução 45/112-1990),

art 5º, caput, ‘e’ e ‘f ‘, e art 6º; Regras de Tóquio (AG 45/110 – 1990 – medidas não

privativas de liberdade) – art. 2.6” (ibid, p.109-110).

Sobre esse aspecto, também nos diz Dallari: “A previsão de tratamento jurídico

diferente daquele que se aplica aos adultos é um direito dos menores de 18 anos, que

são pessoas, indivíduos,sujeitos de direitos. De acordo com o artigo 60, § 4º, da

Constituição, não poderá ser objeto de deliberação proposta de emenda constitucional

tendente a abolir garantias individuais” (DALLARI, 2001, p. 25).

III – As taxas de incidência infracional estão caindo desde o iníciodo século XX.

Em poucas palavras, podemos informar que as taxas de incidência de ato infracional

têm caído significativamente ao longo do século XX. É o que extraímos da literatura.

Segundo Marcio Antonio Cabral dos Santos, “entre 1900 e 1916, o coeficiente de

prisões por dez mil habitantes era distribuído da seguinte forma”: 307,32 crimes

cometidos por adultos e 275,14 delitos cometidos por crianças e adolescentes, o que

sugere uma proporção de quase 50% para cada faixa etária (SANTOS: 214)37

.

Atualmente, temos a proporção de 10% dos crimes cometidos pela adolescência, o que

significa drástica redução da participação desses jovens nas ações delituosas, por

diversos motivos, entre elas, o próprio aumento da idade penal (à época da primeira

constatação, vigorava o Código Penal da Republica – 1890 -, pelo qual se instituía a

responsabilização penal especial entre os 09 e 17 anos de idade), bem como os novos

modelos de Estado que acentuaram seu papel de executor de políticas públicas sociais,

fundamentais para o desenvolvimento humano.

Vale frisar que atualmente, os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos

indicam um estabilização das taxas de atos infracionais privados de liberdade desde

2007: cerca de 16 mil adolescentes. Ainda, sobre este aspecto, a pesquisa do CNJ da

série “Pensando o Direito” (2010)38

constatou que:“...os dados coletados junto aos

Tribunais de Justiça e Superior Tribunal de Justiça em matéria de medida

socioeducativa de internação, e posteriormente, a observação de casos junto às Varas

da Infância e Juventude de São Paulo, Porto Alegre, Recife e Salvador, permitiram

concluir que, apesar das propostas garantidoras do Estatuto, a prática forense nem

sempre está com ela alinhada. Foi possível constatar que a medida de internação é

sistematicamente imposta com baixa fundamentação legal. Em muitos casos, sem a

devida consideração dos requisitos legais exigidos pelo ECA.”

37 SANTOS, Marcio Antonio Cabral dos. História das Crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.

38ECA: Apuração do Ato Infracional Atribuído a Adolescentes. Série Pensando o Direito, Nº

26/2010. Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Secretaria de Assuntos Legislativos do

Ministério da Justiça (SAL).

IV – O mito da irresponsabilidade penal do adolescente

Por último, vale citarmos mais uma característica importante acerca do debate sobre a

redução da inimputabilidade penal: o mito da irresponsabilidade penal do adolescente.

Segundo o Volpi39

, esta idéia se baseia na concepção de que o adolescente é incitado a

cometer um ato infracional porque a atual legislação é branda quanto a sua punição.

Confunde-se então, inimputabilidade com impunidade e se esquece que existem as

medidas sócio-educativas que até o momento ainda não foram implementadas

integralmente em nosso país, para responsabilização dos adolescentes.Assim sendo,

estas propostas reafirmam uma perspectiva criminalizadora dos jovens no Brasil, pois a

educação para a cidadania defendida pelo ECA continua em posição de subordinação à

perspectiva punitiva e criminalizadora dos antigos Códigos de Menores, uma vez que a

mentalidade jurídica no Brasil permanece predominantemente encarceradora40

.

Por outro lado, as taxas juvenis de vitimização quase duplicaram (ou mais) em relação

àpopulação total. Em 2010, enquanto a taxa de homicídio do total da população negra

foi de 36,0, a dos jovens negros foi de 72,0.Entre os jovens, a diferença entre brancos e

negros foi mais drástica: as taxas de homicídio de jovens brancos caíram no período

analisado de 40,6 para 28,3; enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,041

.

39 VOLPI, M. Sem liberdade, sem direitos: a privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo: Cortez, 2001. 40 Segundo (Kosminsky, 1993, p. 179-80) a identidade da criança internada é construída por duas

forças contraditórias: o processo de padronização e domesticação imposto pela instituição, e pela

afirmação da sua individualidade. Ou seja, essa tensão produzida pelo processo de domesticação e

padronização e, simultaneamente, pela busca da resistência expressa em gestos de rebeldia, é gerada

em uma instituição rigidamente burocratizada, que delimita o campo da sociabilidade infantil. O

problema refere-se ao duplo abandono em que se encontra a criança, pois, impedida de viver com a

família, a criança passa a viver em uma estrutura estatal burocratizada, em que funcionários

entendem suas ações apenas como modalidade de prestação de serviços, de amparo material,

operando nos precários limites da racionalidade institucional. Imersos nesta racionalidade, os

funcionários da instituição ‘especializados’, tratam as crianças no quadro das relações impessoais e

assim, a instituição nega a possibilidade de um agir coletivo entre os jovens e reproduz o estigma de

“futuro marginal”, alimentando o que discursivamente ela procura negar: o abandono e a

marginalidade.

41Mapa da Violência 2012: A Cor dos Homicídios no Brasil / JulioJacoboWaiselfisz – Rio de Janeiro: CEBELA, FLACSO; Brasília: SEPPIR/PR, 2012.

Assim, a vitimização de jovens negros, que, em 2002, era de 71,7%, no ano de 2010

pulou para 153,9%: morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros

que brancos.Um fato que merece especial atenção no último Mapa da Violência é a

idade das vítimas. Observa-se que não há diferenças significativas de taxas de

homicídio entre brancos e negros até os 12 anos de idade. Entretanto, nesse ponto

inicia-se um duplo processo: por um lado, um íngreme crescimento da violência

homicida, tanto branca quanto negra, que se avoluma significativamente até os

20/21 anos de idade das vítimas. Se esse crescimento se observa tanto entre os brancos

quanto entre os negros, nesse último caso, o incremento é marcadamente mais elevado:

entre os 12 e os 21 anos de idade, as taxas brancas passam de 1,3 para 37,3 em cada

100 mil; aumenta 29 vezes. Já as taxas negras passam, nesse intervalo, de 2,0 para

89,6, aumentando 46 vezes.

Vale frisar que a maior parte das Propostas apresentadas na Câmara dos Deputados e no

Senado Federal, favoráveis à Redução da Maioridade Penal são apresentadas em

momentos de forte mobilização de setores da grande mídia, mas somente quando a

vítima de um ato infracional é de classe média ou alta. Foram os casos das propostas

apresentadas no período 2003-2007, sempre referenciados nos crimes da jovem Liana

Friedenbach, em São Paulo, e do garoto João Hélio, no Rio de Janeiro. Vale frisar

também que estes dois casos aconteceram em São Paulo e Rio de Janeiro, cidades nas

quais estes dois meios de comunicação possuem suas sedes e repercutiram estes crimes

de modo exacerbado. A revista Veja São Paulo de 19/11/2003 colocou a foto de Liana

como capa de sua edição semanal com os dizeres “Até Quando?”; e a Veja Nacional

colocou a foto de João Hélio na capa de sua edição de 14/02/2007 com a frase “Não

Vamos Fazer Nada?”. (CAMPOS, 2009)

Ora, se as propostas de inimputabilidade penal forem relacionadas em consonância com

os dados acima, podemos concluir que, após 21 anos da promulgação do Estatuto, a

perspectiva punitiva da criminalização permanece presidindo as decisões e registramos

que a história de séculos de punições e mortes não se muda só com a lei, mas também

com a sua legitimidade social42

.

É preciso defender as conquistas democráticas do Estatuto da Criança e do Adolescente

aprofundando-as para assegurar o efetivo respeito à integridade das crianças e

42 PASSETI, E. Crianças Carentes e políticas públicas. In: PRIORE, M. (Org). História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto, 1999.

adolescentes, bem como os encarar, enfim, como sujeitos de direitos na contínua

conciliação entre democracia e segurança pública.

Acreditamos que a redução da idade penal no Brasil, como ponderou Adorno (2002)43

,

também se apresenta para nós como uma questão problemática. Os jovens no Brasil

foram introduzidos no mundo adulto muito cedo, vivenciaram experiências

precocemente, como trabalho, sexualidade, num contexto de desigualdade social, de

desigualdade de direitos, efeitos estes agravados num contexto de globalização.

Esses jovens, imersos num processo da 'criança sem infância’, talvez não tenham o dito

discernimento que tanto o direito penal moderno, como os redatores das propostas

favoráveis a redução da idade penal, a mídia e outros setores da sociedade afirmam

veemente que os adolescentes já possuem. Mas, ainda assim, afirmamos que possuem o

discernimento necessário à vida, cujo exercício é prejudicado – e então, algumas

possíveis causas para as práticas infracionais – por fatores indiretos costumeiramente

denominados exclusão social, vulnerabilidade e risco social, impossibilidade de

participação política etc.Não foram esgotadas, no Brasil, as formas de atenção que se

pode oferecer a estes jovens, seja pelas escolas, pelas instituições de assistência, pela

família, pela maior distribuição da riqueza, pela aplicação efetiva do ECA.

Portanto, uma eventual redução da maioridade penal aparece de forma cruel no Brasil,

pois, num país atingido por fortes desigualdades sociais e desigualdades de direitos,as

propostas favoráveis à redução da maioridade penal são cúmplices deste processo de

criminalização da pobreza, jogando para o aparelho carcerário-punitivo os grupos e

indivíduos mais vulneráveis psicologicamente, socialmente, economicamente,

culturalmente.(SOUZA e CAMPOS, 2007)44

.

Assim, com a aprovação do decreto legislativo, chegar-se-ia à conclusão de que os

jovens são “irrecuperáveis” atestando nossa incapacidade de lidar com o problema da

violência juvenil. Desse modo, a Doutrina deProteção Integral45

consagrada no ECA é

43 ADORNO, S. Adolescentes, crime e violência. In: ABRAMO, H.W; FREITAS. M.V. de; SPOSITO, M.P (Orgs). Juventude em Debate. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002. 44 SOUZA, L.F. de. ; CAMPOS, M. S. . Redução da Maioridade Penal: Uma Análise dos Projetos

que tramitam na Câmara dos Deputados. In: Leonardo Sica (coord). (Org.). Revista Ultima Ratio.

1ed.Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, v. 1, p. 231-259.

45“Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral à Criança”, conforme Emílio Garcia Mendez, engloba

a Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança, As Regras Mínimas das Nações Unidas

fundamental paraa construção de políticas de prevenção e enfrentamento à

criminalidade e, na forma mais gravosa, o homicídio dos jovens brasileiros.

V – Da Impossibilidade de Plebiscito para Reduzir a Maioridade Penal

O Projeto de Decreto Legislativo pretende submeter à plebiscito uma restrição a direito

fundamental consubstanciada na privação da liberdade de adolescentes, matéria está

insuscetível de disposição pela maioria, uma vez que isso irá inevitavelmente configurar

abuso de poder.

Ao promover consulta pública para a romper com direitos fundamentais reputados

pétreos pela Constituição da República, o Projeto atual irá abalar a própria estrutura

constitucional brasileira e, não obstante apresentar-se sob a roupagem de democrático,

irá na verdade ruir a própria democracia.

Os constitucionalistas apontam que o que caracteriza as democracias modernas é

justamente a autoimposição de limites, como garantia de sua própria sobrevivência. Se

não há limites para a democracia política ou formal, ou seja, se os princípios e garantias

constitucionais podem ser alterados a qualquer momento pela maioria, sem qualquer

limite, a própria democracia coloca-se em risco, pois ela mesma poderá ser abolida pelo

voto da maioria.

O Projeto, talcomo se coloca, não põe somente em risco a redução da maioridade penal

e por consequência a liberdade individual de adolescentes, a maioria deles

marginalizados e criminalizados, mas a própria segurança jurídica conferida pela

Constituição. O Projeto abre um precedente extremamente perigoso para a exclusão

indeterminada de direitos fundamentais sob o discurso da democracia direta.

para Administração da Justiça de Menores, As Regras Mínimas das Nações Unidas para a proteção

dos jovens privados de liberdade e as Diretrizes das Nações Unidas para a prevenção da

delinqüência juvenil. Este corpo de legislação internacional modifica total e definitivamente a velha

doutrina da situação irregular. A Doutrina da Proteção Integral foi adotada pela Constituição da

República, que a consagra em seu art. 227, tendo sido acolhida pelo plenário do Congresso

Constituinte pela extraordinária votação de 435 votos contra 8.

Desse modo, se houver alguma alteração constitucional resultante da presente proposta,

o caminho para a instalação de um estado autoritário estará pavimentado, onde a tirania

da maioria, por vezes manipulada para votar sem maiores reflexões sobre as

consequências de suas decisões, prevalece sobre a Constituição.

Nesse sentido, vale recordar a lição de Ferrajoli a respeito:

O garantismo, como técnica de limitação e disciplina dos poderes públicos,,

voltado da determinar o este não devem e o que devem decidir, pode bem se

concebido como a conotação (não formal, mas) estrutural e substancial da

democracia: as garantias, sejam liberais ou sociais, exprimem de fato os

direitos fundamentais dos cidadãos contra os poderes do Estado, os

interesses dos fracos respectivamente aos dos fortes, a tutela das minorias

marginalizadas ou dissociadas em relação às maiorias integradas, as

razões de baixo relativamente às razões do alto.46

Conclusão

Ante todo o articulado, ANCED, Associação pela Reforma Prisional, Conectas DH,

IDDD, Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, ITTC, Instituto dos Defensores de

Direitos Humanos, Justiça Global, Rede Justiça Criminal, RENADE e Frente Nacional

Drogas e Direitos Humanos manifestam-se pela rejeição integral do PDS n. 539/2012.

46 Cf. Ferrajoli, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: EditoraRevista dos

Tribuanis, 2002. P. 693.

Parecer Técnico à Proposta de Emenda à Constituição n° 33 de 2012 do Senado

Federal

A Proposta de Emenda à Constituição n° 33 de 2012 visa reduzir a inimputabilidade

penal para dezesseis anos, alterando a redação dos arts. 129 e 228 da Constituição

Federal, nos seguintes termos:

Art. 1º - O inciso I, do art. 129 da Constituição Federal passa a

vigorar com a seguinte redação:

Art. 129 – São funções institucionais do Ministério Público:

I - promover, privativamente, a ação penal pública e o

incidente de desconsideração de inimputabilidade penal de

menores de dezoito e maiores de dezesseis anos. (NR)

Art. 2º - Acrescente-se um Parágrafo Único ao art. 228 da

Constituição Federal com a seguinte redação:

“Art. 228 -

.........................................................................................

Parágrafo Único – Lei complementar estabelecerá os casos em

que o Ministério Público poderá propor, nos procedimentos

para a apuração de ato infracional praticado por menor de

dezoito e maior de dezesseis anos, incidente de

desconsideração da sua inimputabilidade, observando-se:

I - Propositura pelo Ministério Público especializado em

questões de infância e adolescência;

II - julgamento originário por órgão do judiciário especializado

em causas relativas à infância e adolescência, com

preferência sobre todos os demais processos, em todas as

instâncias;

III - cabimento apenas na prática dos crimes previstos no

inciso XLIII, do art. 5º desta Constituição, e múltipla

reincidência na prática de lesão corporal grave e roubo

qualificado;

IV - capacidade do agente de compreender o caráter

criminoso de sua conduta, levando em conta seu histórico

familiar, social, cultural e econômico, bem como de seus

antecedentes infracionais, atestado em laudo técnico,

assegurada a ampla defesa técnica por advogado e o

contraditório;

V - efeito suspensivo da prescrição até o trânsito em

julgado do incidente de desconsideração da inimputabilidade.

VI - cumprimento de pena em estabelecimento separado dos

maiores de dezoito anos.

Art. 2º - Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data

de sua publicação.

I – Sobre a equivalência entre Redução da Maioridade Penal e a “Desconsideração

da menoridade penal”

A despeito de constar de sua justificativa a intenção de manter intacta a maioridade

penal apenas aos 18 anos, a PEC 33/2012, na realidade, ao cunhar a possibilidade de

“desconsideração da menoridade penal” de acordo com as hipóteses a serem criadas

pelo legislador ordinário, reduz a maioridade penal.

Nos termos da proposição, a redução da maioridade penal, na prática, será mais ou

menos extensa de acordo com o talante do legislador ordinário e com a conjuntura

política que o animar.

A tentativa salomônica de construir “uma alternativa ao conflito de posições que já

está posto pelas diferentes correntes de opinião” não contempla, nem de perto, a

defesa elaborada por aquelas e aqueles engajados na luta pela promoção dos

direitos e garantias fundamentais esculpidos na Constituição Federal e em rechaço

a qualquer espécie de retrocesso.

A PEC em comento consiste, no limite, na abertura de uma fenda no sistema de

garantias para a redução da maioridade penal, que, se aprovada, estará sempre passível

de se estender a número cada vez mais amplo de casos.

Por consubstanciar tentativa inequívoca de redução da maioridade penal e pelos

motivos subsequentes, a PEC 33/2012 deve ser integralmente rejeitada.

II – Histórico das Propostas de Redução da Maioridade Penal

Desde o século XIX, a questão da criminalidade infanto juvenil no Brasil perpassou

uma série de discursos e práticas no saber jurídico, nas práticas institucionais (tanto em

termos assistenciais e pedagógicos, como numa perspectiva punitiva e reformadora)

voltadas aos adolescentes autores de atos infracionais, sempre na pretensa tentativa de

solucionar a questão da criminalidade das crianças e adolescentes ou, de outro modo, a

questão do “menor” (expressão anacrônica que sintomaticamente ainda é evocada).

De um modo geral, as diferentes formas de organização do sistema de justiça criminal

(Roda dos Expostos, Código Criminal do Império, o Código Penal de 1890, o Código de

Menores de 1927, a FUNABEM e as FEBEM´s) basearam-se na construção de um

aparato médico-jurídico-assistencial, que se dividiu em prevenção (vigiar a criança),

recuperação (reabilitar a criança e o adolescente criminoso), educação (disciplinar a

criança ao trabalho) e na repressão (conter crianças e adolescentes delinquentes)

(SPOSATO, 2001)47

. Vale observar a ementa das principais leis: o Código de Menores

de 1927 previa a proteção e assistência; o Código de Menores de 1979 previa, além da

proteção e assistência, a vigilância.

Esta preocupação com a criminalidade infanto-juvenil (que se manifesta de tempos em

tempos no discurso favorável à diminuição da maioridade penal), funciona, na

realidade, mais como um instrumento de marginalização da população pobre do que

uma ampliação e um reconhecimento dos direitos civis dos jovens (Alvarez, 1997).

É, portanto, na tentativa de romper com as antigas concepções higienistas,

assistencialistas e repressoras que predominaram no tratamento à infância e juventude

no Brasil, que o Estatuto da Criança e do Adolescente é promulgado em 1990 (Lei nº

8.069).

O advento do ECA alçou a questão da infância e juventude no centro do ordenamento

jurídico brasileiro, em consonância com os movimentos internacionais de direitos e

47 SPOSATO, K. B. Pedagogia do medo: adolescentes em conflito com a lei e as propostas de redução da idade penal. Cadernos Adenauer, Rio de Janeiro, v .6, p.31-49, 2001.

proteção da criança e do adolescente, colocando-os agora, como sujeitos de direitos,

tendo sido aplaudido em fóruns internacionais.

Apesar dos avanços normativos nele contidos, o ECA é alvo constante de críticas por

supostamente fomentar a impunidade na medida em que estabeleceria apenas “medidas

sócio educativas”.

É nesse cenário que se propugna pela redução da idade penal, com o fim de conter

supostas “ondas” de criminalidade em cuja atual configuração de violência urbana

seriam os jovens os principais atores e responsáveis. Assim, crianças e adolescentes

brasileiros são vistos historicamente como objeto de intervenção das instâncias de

correção (ADORNO, 2002).

Nesse sentido, emergem as diferentes Propostas de Emenda à Constituição Federal ou

Projetos de Decretos Legislativos que tramitam na Câmara dos Deputados e no Senado

Federal desde 199348

. Esses projetos propõem reduzir a imputabilidade penal dos atuais

dezoito para dezesseis anos de idade, ou, em alguns casos, até quatorze ou doze anos,

modificando assim a redação do artigo 228 da Constituição Federal.

Conforme expomos a seguir, o PEC 33/2012 é inconstitucional por quatro motivos

principais: i) a afirmação da idade penal faz parte dos direitos e garantias

constitucionais fundamentais de natureza individual, portanto, irrevogáveis; ii) o Brasil

é signatário dos tratados internacionais - a exemplo da Convenção sobre os Direitos da

Criança da ONU de 1989 – que confirmam os 18 anos como marco de idade penal; iii)

as taxas de incidência infracional estão caindo desde o início do século XX, iv) a

‘irresponsabilidade penal da criança e do adolescente’ é um mito.

III – A maioridade penal é Cláusula Pétrea.

A redução da idade penal é imbuída de uma questão constitucional fundamental: ela é

cláusula pétrea, sendo parte dos direitos e garantias fundamentais individuais de nossa

Constituição Federal de 1988. É o que consta do art. 60, §4º, da Carta Maior:

48 PEC 171/1993, de autoria do Deputado Benedito Domingos.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a

abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

Ora, se consta da Constituição da República que as garantias constitucionais individuais

não podem ser revogadas senão por meio de nova Constituinte Originária; e se os

direitos e garantias individuais estão espalhados ao longo da Constituição Federal, a

exemplo do constante de seu art. 228 (idade penal aos 18 anos de idade); concluí-se que

esse marco etário poderá ser alterado somente a partir da vigência de nova Constituição

Federal, não vindo um plebiscito ou uma emenda constitucional a ter força suficiente

para sua revogação.

Em outra medida, cabe dizer que a Constituição de 1988 inseriu a resposta do Estado

frente a atos infracionais cometidos por adolescentes no sistema de garantias

constitucionais e penais. Isto, no plano jurídico, define que:

1) Como crianças e adolescentes gozam de todos os direitos

fundamentais atribuídos a quaisquer cidadãos (art. 5°, CF, e art. 3º,

ECA), além dos direitos especiais constantes do Estatuto da Criança e do

Adolescente, que ainda reserva ao Estado a única opção de promoção de

atos discriminatórios positivos, sendo-lhe vedado executar ações que

tenham a finalidade protetiva, que ampliem os direitos das crianças e

adolescentes (art. 5º, ECA).

2) a resposta do Estado contra o adolescente comporta privação de

liberdade (art. 227, § 3°, V, CF): nas democracias não há prisão sem o

devido processo legal e o sistema constitucional de garantias (art. 5º,

incisos XXXVII a LXVIII, CF). A Constituição Federal, ainda, guarda

norma expressa sobre a reserva da prisão como consequência de prática

de crime (art. 5°, LXVII), sendo autorizadas apenas duas exceções

constitucionais, que não se aplicam, por definição, a crianças e

adolescentes49

.

Desse modo, a Constituição Federal confere a crianças e adolescentes todas as garantias

de natureza penal e processual penal conferida aos adultos, mas em respeito à condição

peculiar de crianças e adolescentes em fase de desenvolvimento, assegurou-lhe mais

garantias (garantias especiais, exclusivas de crianças e adolescentes), também em

relação à resposta do Estado quando estes cometem atos infracionais. Trata-se de

conquistas sociais admitidas e assumidas pela sociedade, que, por sua vez, deve abrir

mão do retrocesso e lançar mão de criatividade nas ações em busca da superação de

novos desafios, muitos deles decorrentes da própria assunção do contemporâneo marco

regulatório dos direitos humanos universais.

A essa dinâmica atribui-se a expressão vedação do retrocesso social (SILVA, 2010)50

,

segundo a qual a sociedade brasileira não pode abandonar as conquistas sociais, em

especial aquelas positivadas na Carta Federal e reconhecida a todo e qualquer cidadão

brasileiro. Em outra ordem, é como se o Parlamento Federal decidisse impor um

plebiscito para que a sociedade decida se deseja rever o caráter universal do sistema

único de saúde, colocando-o em cheque. Não há, portanto, lei ou mecanismo subjacente

à Constituição Federal que possa veicular decisões contrárias às conquistas históricas do

povo brasileiro.

IV – O valor constitucional dos documentos internacionais assinados pelo Brasil.

A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança – ratificada internamente pelo

Decreto 99.710/90 – estabelece que criança (no Brasil, compreendida como as fases de

criança e adolescente) é o sujeito que se encontra até os 18 anos de idade. Trata-se do

primeiro marco etário para definições de direitos, deveres e políticas públicas

correspondentes. Esse documento internacional alinha-se a outros, como as Regras

49 Prisão civil de curta duração para devedores de alimentos e depositários infiéis; situações jurídicas

nas quais crianças e adolescentes, porque são incapazes civilmente, nunca podem estar.

50 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2010.

Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça de Menores (Regras

de Beijing, 1985) e as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da

Delinquência Juvenil (Diretrizes de Riad, 1990). Todos esses documentos confirmam

que a idade penal deve dividir a fase adulta da fase infanto-adolescente, e, portanto,

distinguir os tratamentos estatais perante a prática delituosa. A Constituição Federal, por

sua vez, estabelece em seu art. 5º, § 3º, que: Os tratados e convenções internacionais

sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional,

em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes

às emendas constitucionais. Nesse sentido, se as premissas são:

a) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança é documento subscrito

e ratificado internamente pelo Brasil;

b) Conforme apregoa a Carta Magna Brasileira, todo documento

internacional assinado no exterior e ratificado em âmbito interno terá valor

supralegal;

Logo:

c) A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e os demais

tratados, pactos e diretrizes dos quais o Brasil é signatário são documentos

com status constitucional.

Assim, sendo documento imbuído de valor constitucional, poderá ser revogado ou

contrariado apenas se não se tratar de cláusula pétrea, seguindo as premissas e o

raciocínio do primeiro item desse arrazoado. E, como esses tratados e pactos

internacionais tratam de garantias constitucionais – que reforçam as já previstas pela

Assembleia Constituinte -, a perenidade dessas normas e desses direitos é assegurada

para todo adolescente brasileiro, independentemente de ter cometido ato infracional de

qualquer natureza. As crianças e adolescentes tem, pois, o incontestável direito de ser

tratado de modo diferente, de receber, portanto, uma discriminação positiva.

Segundo Machado51

(2006, p.107): “Neste passo, cumpre frisar que, se o direito de

liberdade da pessoa física criança ou adolescente possui as especificidades já referidas

51 “MACHADO, MARTHA .T. Sistema Especial de proteção da liberdade do adolescente na

Constituição brasileira de 1988 e no Estatuto da Criança e do Adolescente. In: ILANUD, ABMP,

no item II supra, é de ver que a imaturidade/vulnerabilidade do sujeito de direito, na

Democracia não pode ser invocada para discriminá-lo negativamente. A

desequiparação jurídica que a Constituição de 1988 criou para crianças e adolescentes

é a desequiparação jurídica protetiva, que é própria da atual fase de evolução da

proteção aos direitos humanos e que vem adotada na Convenção dos Direitos da

Criança e do Adolescente (ONU, 1989).”

Dentre estas garantias, estabeleceu-se a inimputabilidade penal para a pessoa até dezoito

anos de idade incompletos, que vem expressa nos artigos 228 e 227, § 3 º, V, última

parte, do texto constitucional. Este marco normativo diferencia-se da inimputabilidade

penal que vigorava no paradigma menorista, pois, segundo Machado (ibid, p.108):

“[...]era uma inimputabilidade penal que impunha a crianças e adolescentes tratamento

penal severamente mais gravoso que aquele reservado aos adultos (impunha uma

medida de segurança perpétua, sem incidência da reserva legal, do contraditório e da

ampla defesa, entre outras salvaguardas.”

Portanto, a inimputabilidade penal atual impede a aplicação da sanção criminal (das

penas reservadas aos adultos). E isso configura não apenas preceito penal, mas

constitucional pétreo, de modo que se permite alteração apenas se promulgada nova

Carta Magna.

Ao assim determinar, a Assembleia Constituinte de 1988 ponderou sobre os valores

individuais e sociais na situação específica de crime cometido por adolescente, optando

pela enorme capacidade de autotransformação, que é própria do ser humano, impondo a

prevalência de medidas protetivas e educativas e instituindo as garantias de

excepcionalidade e brevidade da privação de liberdade (art.227, § 3º, V), que o ECA

tratou de concretizar. Destarte: “Importante destacar que a excepcionalidade não é só

das medidas privativas de liberdade (no ECA, internação e semi-liberdade), mas sim

uma excepcionalidade da própria imposição de qualquer medida sócio-educativa...E

veja-se que a excepcionalidade do sistema de responsabilização de crianças e

adolescentes vem em consonância com o princípio da intervenção mínima, contido nos

SEDH, UNFPA (Orgs) Justiça Adolescente e Ato Infracional: socioeducação e responsabilização. São Paulo,

2006, p.87-123”.

documentos da ONU: Diretrizes de Riad; Assembleia Geral Resolução 45/112-1990),

art 5º, caput, ‘e’ e ‘f ‘, e art 6º; Regras de Tóquio (AG 45/110 – 1990 – medidas não

privativas de liberdade) – art. 2.6” (ibid, p.109-110).

Portanto, de acordo com Dallari: “A previsão de tratamento jurídico diferente daquele

que se aplica aos adultos é um direito dos menores de 18 anos, que são pessoas,

indivíduos, sujeitos de direitos. De acordo com o artigo 60, § 4º, da Constituição, não

poderá ser objeto de deliberação proposta de emenda constitucional tendente a abolir

garantias individuais” (DALLARI, 2001, p. 25).

V – As taxas de incidência infracional e vitimização de crianças e adolescentes

Em poucas palavras, podemos informar que as taxas de incidência de ato infracional

têm caído significativamente ao longo do século XX.

É o que extraímos de parte significativa da literatura que analisou a criminalidade

praticada por jovens no Brasil. Segundo Marcio Antonio Cabral dos Santos, “entre 1900

e 1916, o coeficiente de prisões por dez mil habitantes era distribuído da seguinte

forma: 307,32 crimes cometidos por adultos e 275,14 delitos cometidos por crianças e

adolescentes, o que sugere uma proporção de quase 50% para cada faixa etária”

(SANTOS: 214)52

.

Atualmente, este percentual caiu significativamente. Tem-se a proporção de 10% dos

crimes cometidos por adolescentes, o que significa drástica redução da participação

desses jovens nas ações delituosas, por diversos motivos, dentre os quais, o próprio

aumento da idade penal (à época da primeira constatação, vigorava o Código Penal da

Republica – 1890 -, pelo qual se instituía a responsabilização penal especial entre os 09

e 17 anos de idade), bem como os novos modelos de Estado que acentuaram seu papel

de executor de políticas públicas sociais, fundamentais para o desenvolvimento humano

das crianças e adolescentes.

52 SANTOS, Marcio Antonio Cabral dos. História das Crianças no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006.

Vale frisar que atualmente, os dados da Secretaria Especial de Direitos Humanos

indicam uma estabilização das taxas de menores infratoress privados de liberdade desde

2007: cerca de 16 mil adolescentes. Ainda, sobre este aspecto, a pesquisa do CNJ da

série “Pensando o Direito” (2010)53

constatou que: “...os dados coletados junto aos

Tribunais de Justiça e Superior Tribunal de Justiça em matéria de medida

socioeducativa de internação, e posteriormente, a observação de casos junto às Varas

da Infância e Juventude de São Paulo, Porto Alegre, Recife e Salvador, permitiram

concluir que, apesar das propostas garantidoras do Estatuto, a prática forense nem

sempre está com ela alinhada. Foi possível constatar que a medida de internação é

sistematicamente imposta com baixa fundamentação legal. Em muitos casos, sem a

devida consideração dos requisitos legais exigidos pelo ECA.”

Por outro lado, as taxas juvenis de vitimização quase duplicaram (ou mais) em relação à

população total.

Em 2010, enquanto a taxa de homicídio do total da população negra foi de 36,0, a dos

jovens negros foi de 72,0. Entre os jovens, a diferença entre brancos e negros foi mais

drástica: as taxas de homicídio de jovens brancos caíram no período analisado de 40,6

para 28,3; enquanto a dos jovens negros cresceu de 69,6 para 72,054

.

Assim, a vitimização de jovens negros, que, em 2002, era de 71,7%, no ano de 2010

pulou para 153,9%: morrem, proporcionalmente, duas vezes e meia mais jovens negros

que brancos. Um fato que merece especial atenção no último Mapa da Violência é a

idade das vítimas. Observa-se que não há diferenças significativas de taxas de

homicídio entre brancos e negros até os 12 anos de idade. Entretanto, nesse ponto

inicia-se um duplo processo: por um lado, um íngreme crescimento da violência

homicida, tanto branca quanto negra, que se avolumam significativamente até os

20/21 anos de idade das vítimas.

53 ECA: Apuração do Ato Infracional Atribuído a Adolescentes. Série Pensando o Direito, Nº

26/2010. Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Secretaria de Assuntos Legislativos do

Ministério da Justiça (SAL).

54 Mapa da Violência 2012: A Cor dos Homicídios no Brasil / Julio Jacobo Waiselfisz – Rio de Janeiro: CEBELA, FLACSO; Brasília: SEPPIR/PR, 2012.

Se esse crescimento se observa tanto entre os brancos quanto entre os negros, nesse

último caso, o incremento é marcadamente mais elevado: entre os 12 e os 21 anos de

idade, as taxas brancas passam de 1,3 para 37,3 em cada 100 mil; aumenta 29

vezes. Já as taxas de negros passam, nesse intervalo, de 2,0 para 89,6, aumentando

46 vezes.

Os dados elencados, portanto, apontam a estabilização da criminalidade praticada por

crianças e adolescentes. Além disso, os dados de vitimização confirmam que a questão a

ser encarada do ponto de vista da política pública é a mortalidade de jovens, sobretudo,

dos jovens negros.

VI – O mito da irresponsabilidade penal do adolescente

Por último, vale citarmos mais uma característica importante acerca do debate sobre a

redução da idade penal: o mito da irresponsabilidade penal do adolescente. Segundo

Volpi55

, esta ideia se baseia na concepção de que o adolescente é incitado a cometer um

ato infracional porque a atual legislação é branda quanto a sua punição. Confunde-se

então, inimputabilidade com impunidade e se esquece que existem as medidas sócio-

educativas que até o momento ainda não foram implementadas integralmente em nosso

país, para responsabilização dos adolescentes. Assim sendo, estas propostas reafirmam

uma perspectiva criminalizadora dos jovens no Brasil, pois a educação para a cidadania

defendida pelo ECA continua em posição de subordinação à perspectiva punitiva e

criminalizadora dos antigos Códigos de Menores, uma vez que a mentalidade jurídica

no Brasil permanece predominantemente encarceradora56

.

55 VOLPI, M. Sem liberdade, sem direitos: a privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo: Cortez, 2001. 56 Segundo (Kosminsky, 1993, p. 179-80) a identidade da criança internada é construída por duas

forças contraditórias: o processo de padronização e domesticação imposto pela instituição, e pela

afirmação da sua individualidade. Ou seja, essa tensão produzida pelo processo de domesticação e

padronização e, simultaneamente, pela busca da resistência expressa em gestos de rebeldia, é gerada

em uma instituição rigidamente burocratizada, que delimita o campo da sociabilidade infantil. O

problema refere-se ao duplo abandono em que se encontra a criança, pois, impedida de viver com a

família, a criança passa a viver em uma estrutura estatal burocratizada, em que funcionários

entendem suas ações apenas como modalidade de prestação de serviços, de amparo material,

operando nos precários limites da racionalidade institucional. Imersos nesta racionalidade, os

funcionários da instituição ‘especializados’, tratam as crianças no quadro das relações impessoais e

É inegável que as medidas de internação constituem-se em efetiva restrição de liberdade

em estabelecimento próprio destinado a isso, onde convivem somente adolescentes que

praticaram atos infracionais. Apesar das diferenças existentes entre as prisões e as

instituições destinadas à internação de adolescentes, as semelhanças são cada vez mais

brutais.

Ora, se as propostas de inimputabilidade penal forem relacionadas em consonância com

os dados acima apresentados, podemos concluir que, após 21 anos da promulgação do

Estatuto, a perspectiva punitiva da criminalização permanece presidindo as decisões e

registramos que a história de séculos de punições e mortes não se muda só com a lei,

mas também com a sua legitimidade social57

.

É preciso defender as conquistas democráticas do Estatuto da Criança e do Adolescente

aprofundando-as para assegurar o efetivo respeito à integridade das crianças e

adolescentes, bem como os encarar, enfim, como sujeitos de direitos na contínua

conciliação entre democracia e segurança pública.

Acreditamos que a redução da idade penal no Brasil, como ponderou Adorno (2002)58

,

também se apresenta para nós como uma questão problemática. Os jovens no Brasil

foram introduzidos no mundo adulto muito cedo, vivenciaram experiências

precocemente, como trabalho, sexualidade, num contexto de desigualdade social, de

desigualdade de direitos, efeitos estes agravados num contexto de globalização.

Esses jovens, imersos num processo da 'criança sem infância’, talvez não tenham o dito

discernimento que tanto o direito penal moderno, como os redatores das propostas

favoráveis a redução da idade penal, a mídia e outros setores da sociedade afirmam

veemente que os adolescentes já possuem. Mas, ainda assim, afirmamos que possuem o

discernimento necessário à vida, cujo exercício é prejudicado – e então, algumas

possíveis causas para as práticas infracionais – por fatores indiretos costumeiramente

assim, a instituição nega a possibilidade de um agir coletivo entre os jovens e reproduz o estigma de

“futuro marginal”, alimentando o que discursivamente ela procura negar: o abandono e a

marginalidade.

57 PASSETI, E. Crianças Carentes e políticas públicas. In: PRIORE, M. (Org). História da criança no Brasil. São Paulo: Contexto, 1999. 58 ADORNO, S. Adolescentes, crime e violência. In: ABRAMO, H.W; FREITAS. M.V. de; SPOSITO, M.P (Orgs). Juventude em Debate. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2002.

denominados exclusão social, vulnerabilidade e risco social, impossibilidade de

participação política etc.

Não foram esgotadas, no Brasil, as formas de atenção que se pode oferecer a estes

jovens, seja pelas escolas, pelas instituições de assistência, pela família, pela maior

distribuição de direitos, pela aplicação efetiva do ECA.

Ademais, o peculiar estágio de desenvolvimento vivenciado até os 18 anos deve ser

considerado de modo fundamental nessa discussão É um consenso entre os estudiosos

das temáticas que envolvem a adolescência que esta é uma fase complexa e marcante. É

um período de experimentações, novidades, descobertas, conflitos, sofrimento,

crescimento, amadurecimento, crises, construções. O adolescente passa por

desequilíbrios e instabilidades que requerem a sua proteção integral e o respeito a sua

condição especial de pessoa em desenvolvimento, pois, este é um período de vivências

de contradições e ambivalência caracterizado por tensões com o meio familiar e

social.59

Assim, com a aprovação da proposta de emenda à Constituição chegar-se-ia à conclusão

de que os jovens são “irrecuperáveis”, atestando nossa incapacidade de lidar com o

problema da violência juvenil. Desse modo, a Doutrina de Proteção Integral60

consagrada no ECA é fundamental para a construção de políticas de prevenção e

enfrentamento à criminalidade e, na forma mais gravosa, a vitimização dos jovens

pobres brasileiros.

Portanto, uma eventual redução da maioridade penal aparece de forma cruel no Brasil,

pois, num país atingido por fortes desigualdades sociais e desigualdades de direitos, as

59 CALDERONI, V. Adolescentes em Conflito com a Lei: considerações críticas sobre a medida de

internação. Revista Liberdades. nº5, set-dez 2010.p. 19-53.

60 “Doutrina das Nações Unidas de Proteção Integral à Criança”, conforme Emílio Garcia Mendez, engloba

a Convenção das Nações Unidas dos Direitos da Criança, As Regras Mínimas das Nações Unidas

para Administração da Justiça de Menores, As Regras Mínimas das Nações Unidas para a proteção

dos jovens privados de liberdade e as Diretrizes das Nações Unidas para a prevenção da

delinqüência juvenil. Este corpo de legislação internacional modifica total e definitivamente a velha

doutrina da situação irregular. A Doutrina da Proteção Integral foi adotada pela Constituição da

República, que a consagra em seu art. 227, tendo sido acolhida pelo plenário do Congresso

Constituinte pela extraordinária votação de 435 votos contra 8.

propostas favoráveis à redução da maioridade penal são cúmplices deste processo de

criminalização da pobreza, jogando para o aparelho carcerário-punitivo os grupos e

indivíduos mais vulneráveis psicologica, social, economica e culturalmente. (SOUZA e

CAMPOS, 2007)61

.

VII – Conclusão

Ante todo o articulado, ANCED, Associação pela Reforma Prisional, Conectas DH,

IDDD, Pastoral Carcerária, Instituto Sou da Paz, ITTC, Instituto dos Defensores de

Direitos Humanos, Justiça Global, Rede Justiça Criminal, RENADE e Frente Nacional

Drogas e Direitos Humanos manifestam-se pela rejeição integral da PEC 33/2012.

61 SOUZA, L.F. de. ; CAMPOS, M. S. Redução da Maioridade Penal: Uma Análise dos Projetos que

tramitam na Câmara dos Deputados. In: Leonardo Sica (coord). (Org.). Revista Ultima Ratio. 1ed.Rio

de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, v. 1, p. 231-259.