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PROJETO GESTÃO INTEGRADA E SUSTENTÁVEL DOS RECURSOS HÍDRICOS TRANSFRONTEIRIÇOS NA BACIA DO RIO AMAZONAS, CONSIDERANDO A VARIABILIDADE E MUDANÇA CLIMÁTICA OTCA/GEF/PNUMA Subprojeto II.1 Investigação dirigida sobre a compreensão da base de recursos naturais da bacia do Rio Amazonas Atividade II.1.1 Melhorar o conhecimento dos ecossistemas aquáticos amazônicos Atividade III.1.1 Manejo de ecossistemas aquáticos em hotspots Foto: Roberto E. Reis Relatório Parcial – Produto 1 As cabeceiras do rio Xingu Brasília, Brasil Fundo Para o Meio Ambiente Mundial Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente 1

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PROJETO GESTÃO INTEGRADA E SUSTENTÁVEL DOS

RECURSOS HÍDRICOS TRANSFRONTEIRIÇOS NA BACIA DO RIO AMAZONAS, CONSIDERANDO A VARIABILIDADE E

MUDANÇA CLIMÁTICA

OTCA/GEF/PNUMA

Subprojeto II.1 Investigação dirigida sobre a compreensão da base de recursos naturais da bacia do Rio Amazonas

Atividade II.1.1 Melhorar o conhecimento dos ecossistemas aquáticos amazônicos

Atividade III.1.1 Manejo de ecossistemas aquáticos em hotspots

Foto: Roberto E. Reis

Relatório Parcial – Produto 1

As cabeceiras do rio Xingu

Brasília, Brasil

Fundo Para o Meio Ambiente Mundial

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

1

PROJETO GESTÃO INTEGRADA E SUSTENTÁVEL DOS RECURSOS HÍDRICOS TRANSFRONTEIRIÇOS NA BACIA DO RIO AMAZONAS, CONSIDERANDO A VARIABILIDADE E A

MUDANÇA CLIMÁTICA

OTCA/GEF/PNUMA

Subprojeto II.1 Investigação dirigida sobre a compreensão da base de recursos naturais da bacia do Rio Amazonas

Atividade II.1.1 Melhorar o conhecimento dos ecossistemas aquáticos amazônicos

Atividade III.1.1 Manejo de ecossistemas aquáticos em hotspots

Relatório Parcial – Produto 1 As cabeceiras do rio Xingu

Coordenador dos Componentes

Cleber J. R. Alho Coordenação da Atividade

Norbert Fenzl

Consultor Roberto E. Reis

Maio/2013

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AS CABECEIRAS DO RIO XINGU

RESUMO EXECUTIVO

A bacia Amazônica está situada sobre um terreno de origem mista – uma grande área recente de terras baixas no centro, duas grandes áreas periféricas de rochas ígneas cristalinas e metamórficas Pré-Cambrianas, o Escudo Brasileiro e o Escudo das Guianas, e os Andes a oeste. Uma das características mais marcantes do continente Sul Americano é a sua baixa altitude média na crosta terrestre. Cerca de 50% da área total do continente situam-se abaixo de 250 m de altitude. Uma consequência dessa baixa elevação é que porções significativas do continente estiveram repetidamente expostas a transgressões e regressões marinhas ao longo do curso dos últimos 120 milhões de anos, afetando drasticamente a extensão e distribuição dos hábitats disponíveis para os peixes de água doce. A distribuição biogeográfica dos peixes amazônicos está limitada por características ecológicas e de paisagem, como geomorfologia das bacias, clima, tipos de hábitat, e química da água. A sazonalidade na Amazônia se refere à precipitação pluviométrica e não a temperatura. A precipitação na Amazônia é, de maneira geral, muito intensa, apesar de não ser homogeneamente distribuída no espaço e no tempo. A estação chuvosa se estende por cerca de seis meses, com a maior parte da chuva em janeiro. Julho é geralmente o meio da estação seca, na maior parte da Amazônia. A precipitação média anual situa-se entre 1,5 e 2,5m na bacia como um todo, com valores locais ultrapassando os 4m no noroeste da bacia, na Colômbia, e ao norte da foz do rio Amazonas, no Amapá. Toda essa pluviosidade é a causa do mais importante aspecto da sazonalidade dos rios Amazônicos, o regime de enchentes e secas. As águas altas seguem a estação chuvosa, com as épocas locais de enchente dependendo de fatores geográficos locais e posição na bacia.

A enorme diversidade de peixes Sul Americanos vive em uma série de diferentes hábitats aquáticos, incluindo grandes rios, pequenos riachos, extensos banhados e áreas alagadas, lagos e rios de altitude, lagoas costeiras, etc. Esses principais tipos de hábitats aquáticos são baseados em altitude, gradiente, pluviosidade, temperatura, cobertura vegetal e tipo de solo. A química da água impõe limites adicionais à distribuição e abundância dos peixes neotropicais, especialmente na Amazônia. A principal característica regional e de paisagem que influencia a química da água é a localização das cabeceiras (escudos, Andes, florestas baixas), a cobertura vegetal dominante (floresta ou savana) e o tipo de solo (rochas ígneas antigas ou terreno sedimentar Andino). A fauna de peixes da bacia Amazônica é a mais rica do mundo e estimativas conservativas sugerem que existam cerca de 2.200 espécies conhecidas na bacia Amazônica. Esse número, entretanto, é uma clara subestimativa, pois uma parcela significativa da biodiversidade está ainda por ser descoberta e descrita. Essa enorme e diversa fauna de peixes de água doce é muito antiga e tem origens históricas distintas.

O rio Xingu é um dos principais tributários da bacia Amazônica e drena o Escudo Brasileiro, juntamente com o Tocantins, Araguaia, Tapajós e parte da bacia do rio Madeira. Na maior parte de seu percurso o rio Xingu corre sobre terrenos cristalinos de granito e também calcário, o que lhe confere uma quantidade de sedimentos carreados muito baixa e alta transparência. O clima nesta ecorregião é tropical, com precipitação média anual entre 1,5 e 2,5 m e com estação de cheia entre novembro e abril e com temperatura do ar média entre 21,6 e 26,5ºC. O rio Xingu é a quarta maior bacia hidrográfica da Amazônia (cerca de 7% em área) e

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um dos maiores rio de águas claras que drena os platôs cristalinos e planícies sedimentares do Escudo Brasileiro, sendo responsável por cerca de 5% da vazão do rio Amazonas. A transparência de suas águas esverdeadas varia de 0,6 a 4 metros, com pH entre 4,5 e 7,8. Estima-se uma riqueza aproximada de 500 espécies de peixes para a bacia do rio Xingu, sendo que 25 espécies são de alta importância para a pesca esportiva no rio Xingu.

Durante a inspeção da área, fazendas e pousadas de pesca foram visitadas e seus proprietários e funcionários foram entrevistados sobre as suas práticas profissionais, sobre o desmatamento da região e sobre a sua percepção do declínio da quantidade de peixes nos rios e suas possíveis causas. Todos os fazendeiros e outros trabalhadores agrícolas entrevistados tendem a atribuir à pesca esportiva indiscriminada a responsabilidade pela diminuição da quantidade de peixes. De modo geral, apesar de reconhecerem que defensivos agrícolas e fertilizantes podem ser prejudiciais aos peixes, não reconhecem o desmatamento como um importante impacto aos ambientes aquáticos. Ao contrário dos fazendeiros, as pessoas envolvidas com a pesca esportiva atribuem o declínio na quantidade de peixes às praticas agrícolas, mas também não veem o desmatamento como um impacto sério para os ambientes aquáticos.

Diversas ameaças diretas e indiretas aos ambientes aquáticos e peixes do rio Xingu foram identificadas nesta viagem. As principais ameaças detectadas são:

1) Pesca esportiva – na região do alto Xingu o número de pousadas especializadas em receber pescadores esportivos e disponibilizar condições para pesca é muito grande. Em uma área visitada de cerca de 50 km no baixo rio Coluene, por exemplo, existem pelo menos cinco pousadas com capacidade para receber dezenas de pescadores e de levá-los para pescar diariamente.

2) Coleta de peixes ornamentais – essa atividade está restrita ao baixo Xingu e se concentra na região da Volta Grande, entre Altamira e Belo Monte. Essa atividade é de baixo impacto para o ambiente aquático, mas tem efeito diretamente nas populações de peixe pela retirada de indivíduos.

3) Retirada de mata ripária – a mata ripária é fundamental para o ambiente aquático e para os organismos que vivem nos rios, pois mantém a integridade das margens impedindo o assoreamento dos rios e fornecendo alimento e abrigo para os peixes.

4) Uso de fertilizantes e pesticidas agrícolas – os solos da região do alto Xingu necessitam de correção de pH e de acréscimo de fertilizantes. Além disso, diversos tipos de herbicidas e pesticidas são empregados nos cultivos de soja e outros grãos, predominantes na região do alto Xingu.

5) Desmatamento extensivo – o desmatamento extensivo provavelmente representa o mais importante fator de impacto sobre os ambientes terrestres, com consequências igualmente importantes para os ambientes aquáticos envolvidos.

6) Mineração de areia no leito dos rios – a mineração de areia no leito do rio causa a completa destruição do leito e as margens localmente, causando um impacto severo porem pontual.

7) Construção e operação de usinas hidrelétricas – represas hidrelétricas impactam as populações de peixes de diferentes maneiras, causando a transformando de um ambiente lótico em um lago, regulam o fluxo do rio a jusante, e perturbam as rotas migratórias de muitos peixes.

8) Mudanças climáticas – Secas severas tendem a se tornar mais frequentes e podem reduzir a vazão do rio Xingu tornando inacessíveis áreas de alimentação e refugio e reduzindo as migrações reprodutivas dos peixes.

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LISTA DE FIGURAS Figura 1. Lago do rio Coluene formado por mudanças do curso do leito principal do rio dentro da faixa de mata alagável. Foto: Roberto Reis.

Figura 2. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando a área visitada com os principais pontos referidos no texto. Note a Reserva Indígena do Alto Xingu no canto superior esquerdo. A área marcada com o track de GPS na confluência dos rios foi visitada de barco.

Figura 3. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando a área visitada com os principais pontos referidos no texto. Note a bacia do rio Araguaia no canto inferior direito e a Reserva Indígena do Alto Xingu no canto superior esquerdo. A área marcada com o track de GPS na confluência dos rios foi visitada de barco. O Rio Sete de Setembro próximo à Canarana e o seu riacho afluente próximo à Água Boa foram visitados de carro.

Figura 4. Margem do rio Sete de Setembro mostrando o desmatamento até a beira do rio. As árvores mais altas são testemunhos da dimensão que a mata primária possuía antes do desmatamento. Foto: Roberto Reis.

Figura 5. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando o rio Coluene imediatamente acima da área visitada. Note lagos (oxbow lakes) formados pelas mudanças do curso do leito principal do rio dentro da faixa de mata alagável. A linha vermelha corresponde a 4 km.

Figura 6. Montes de areia produto da mineração em riacho tributário do rio Sete de setembro acumulados na margem. Foto: Roberto Reis.

Figura 7. Plantação de soja em fase de colheita junto à área de mineração de areia em riacho tributário do rio Sete de setembro. Foto: Roberto Reis.

Figura 8. Espécies de peixe que representam os principais alvos da pesca esportiva na região do alto Xingu. Imagens obtidas na Internet, exceto onde assinalado abaixo. A) Curimba, foto: Tiago Carvalho; B) Jaraqui; C) Piau; D) Pacu-peva; E) Tambaqui; F) Matrinxã; G) Cachorra; H) Cachorra-facão; I) Traíra; J) Trairão; K) Bicuda.

Figura 9. Espécies de peixe que representam os principais alvos da pesca esportiva na região do alto Xingu. Imagens obtidas na Internet, exceto onde assinalado abaixo. L) Piraíba; M) Jurupoca; N) Pirarara; O) Mandi, foto: Mark Sabaj; P) Barbado, foto: Tiago Carvalho; Q) Cachara; R) Caparari; S) Jurupensem; T) Jaú; U) Mandubé; V) Corvina; X) Tucunaré (Cichla marianae); Y) Tucunaré (C. melaniae).

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O presente relatório refere-se ao Produto 1, sobre a primeira viagem ao campo (primeiro hotspot), confrontando os dados existentes na literatura sobre ameaças aos ecossistemas aquáticos, à biologia pesqueira, à questões relacionadas à pesca e degradação ambiental. Os hotspots, como utilizados neste projeto, são as cabeceiras do rio Xingu, o baixo rio Tocantins, nas proximidades de Tucuruí e o médio rio Negro, nas proximidades de Barcelos. Esses hotspot foram definidos pelo projeto do Banco Mundial-Global Environment Fund “Manejo Integrado dos Recursos Aquáticos da Amazônia – Aquabio”.

I. A BACIA AMAZÔNICA, UMA INTRODUÇÃO

Descrição física da bacia

A maior estrutura geológica do continente é a Plataforma Sul Americana, um antigo acúmulo de fragmentos de crosta terrestre que fica por baixo da Amazônia atual e áreas adjacentes, ocupando cerca de 60% da área do continente. Dentro desta plataforma estão duas grandes áreas de rochas ígneas cristalinas e metamórficas Pré-Cambrianas, o Escudo Brasileiro e o Escudo das Guianas. Estes escudos são porções antigas e tectonicamente estáveis da crosta continental e sobreviveram as divisões e colisões dos continentes e supercontinentes por pelo menos 500 milhões de anos. Entre as terras altas dos escudos e a cordilheira dos Andes, de formação bem mais recente, estendem-se as terras baixas da bacia Amazônica, uma grande superfície relativamente plana com áreas erosionais nos Andes e nos escudos e, em sua maior parte, deposicionais em toda a Amazônia central. Os escudos cristalinos tem origem Pré-Cambriana e, há muito, já perderam a maior parte dos sedimentos facilmente erodíveis, atingindo apenas altitudes modestas (até cerca de 1.000 m). Dessa forma, são terrenos drenados por rios com baixa quantidade de sedimentos e águas claras, como o Xingu, Tocantins, Araguaia, Tapajós, Trombetas, etc (Albert & Reis, 2011a).

Uma das características mais marcantes do continente Sul Americano é a sua baixa altitude média na crosta terrestre. Cerca de 50% da área total do continente situam-se abaixo de 250 m de altitude, 72% abaixo de 500 m e 87% abaixo de 1.000 m. Como uma comparação, no continente Africano apenas 15% da superfície está abaixo de 250m de altitude. Uma consequência dessa baixa elevação é que porções significativas do continente estiveram repetidamente expostas a transgressões e regressões marinhas ao longo do curso dos últimos 120 milhões de anos, drasticamente afetando a extensão e distribuição dos hábitats disponíveis para os peixes de água doce. Além da imediata extirpação de peixes de água doce de áreas inundadas pelo mar, a redução do hábitat e das populações reduz a variabilidade genética das espécies e causam isolamentos genéticos. De maneira oposta, as regressões marinhas causam exposição de grandes porções de terra e expansão das bacias e áreas de inundação dos rios, permitindo que populações de peixes se expandam e diversifiquem. Outra consequência da baixa altitude do continente é uma ativa história de trocas hidrológicas entre bacias, resultado de capturas de cabeceiras e anastomoses de rios em áreas de leques aluviais, áreas de inundação e planícies costeiras. Como uma consequência geral desses processos a fauna de peixes da América do Sul tornou-se a mais diversa do planeta (Albert & Reis, 2011a).

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A distribuição biogeográfica dos peixes amazônicos está limitada por características ecológicas e de paisagem, como geomorfologia das bacias, clima, tipos de hábitat, e química da água. Ainda, como em todo o planeta, cerca de 80% da superfície da Amazônia é drenada por cursos d’água de primeira e segunda ordem. Riachos de primeira ordem são os menores tributários de cabeceiras, e riachos de segunda ordem são formados pela confluência de riachos de primeira ordem. Apenas uma pequena fração da superfície terrestre é ocupada por grandes rios (8-12 ordem) e suas áreas de inundação associadas, que ocupam aproximadamente 8% da área da bacia Amazônica. Ainda assim, essa superfície de áreas periodicamente inundadas do rio Amazonas é da ordem de 250.000 km2. Nesta bacia, todas as dimensões são gigantescas. Quando o comprimento total ou mesmo a área da bacia de drenagem são considerados, apenas dois rios da América do Sul estão entre os dez maiores do mundo, o Amazonas e o Paraná. Entretanto, se a descarga média dos rios é considerada, cinco rios Sul Americanos estão entre os dez maiores do planeta – Amazonas, Orinoco, Madeira, Negro e Paraná, que juntos descarregam 393.000 m3 por segundo no oceano Atlântico. O rio Amazonas sozinho é de longe o mais volumoso do mundo, com uma descarga de 219.000 m3 por segundo, à frente do Orinoco com 98.000 e do Congo, na África, com 41.800 m3 por segundo (Reis, 2013).

Outra importante característica ecológica da bacia Amazônica é a sua posição sobre o equador, estendendo-se cerca de 10º norte e 15º sul, com cerca de dois terços do total da bacia no hemisfério sul. A sazonalidade na Amazônia se refere à precipitação pluviométrica e não a temperatura. A precipitação na Amazônia é, de maneira geral, muito intensa, apesar de não ser homogeneamente distribuída no espaço e no tempo. A estação chuvosa se estende por cerca de seis meses, com a maior parte da chuva em janeiro. Julho é geralmente o meio da estação seca, na maior parte da Amazônia. A precipitação média anual situa-se entre 1,5 e 2,5 m na bacia como um todo, com valores locais ultrapassando os 4 m no noroeste da bacia, na Colômbia, e ao norte da foz do rio Amazonas, no Amapá. Toda essa pluviosidade é a causa do mais importante aspecto da sazonalidade dos rios Amazônicos, o regime de enchentes e secas. As águas altas seguem a estação chuvosa, com as épocas locais de enchente dependendo de fatores geográficos locais e posição na bacia (Goulding et al., 2003). Muitos rios das terras baixas amazônicas estão em período de enchente por cerca de seis a sete meses por ano, com os tributários da margem sul geralmente enchendo primeiro. Os tributários do Amazonas que drenam o Arco de Fitzcarraldo, no Peru, e o Escudo Brasileiro (Madeira, Tapajós, Xingu, Araguaia e Tocantins) tem sua cheia com a estação chuvosa, com o pico entre março e abril. O Negro e o Branco tem seu período de águas mais altas em junho e julho. No oeste da bacia as águas mais altas são em março e abril, e se propagam para baixo, de tal maneira que o pico das águas altas chegam a Manaus e Santarém em junho e julho. O período de águas mais baixas geralmente ocorre quatro a seis meses mais tarde. O nível da água ao longo da bacia Amazônica varia enormemente, com o nível anual em Tefé, na Amazônia central, variando cerca de 10m entre a cheia e a seca, chegando a mais de 13m no médio Madeira e médio Purus. O período de águas baixas dura de agosto a dezembro na maior parte da bacia Amazônica, apesar de que as enchentes podem durar até setembro em alguns tributários da margem norte (Goulding et al., 2003).

A enorme diversidade de peixes Sul Americanos vive em uma série de diferentes hábitats aquáticos que incluem grandes rios, pequenos riachos, extensos banhados e áreas alagadas, lagos e rios de altitude, lagoas costeiras, etc (Reis, 2013), com algo entre 25 e 28% de toda a água superficial livre do planeta localizada na América do Sul (Vari & Malabarba, 1998). Esses principais tipos de hábitats aquáticos são baseados em altitude, gradiente, pluviosidade,

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temperatura, cobertura vegetal e tipo de solo (Olson et al., 1998). Na Amazônia, esses hábitats incluem rios e riachos de altitude (acima de 500m de elevação), rios e riachos de terra firme alta (acima de 250m), rios e riachos de terra firme baixa (abaixo de 250m), e rios e lagos de área de várzea, que alternam entre fases de cheia e seca, incluindo os canais profundos dos grandes rios. Cada um desses principais tipos de hábitats aquáticos exibe uma composição taxonômica distinta de espécies de peixes. As extensas terras baixas das bacias do Amazonas e do Orinoco (5.3 milhões de km2 abaixo de 250m de elevação) representam o centro de diversidade para a maioria dos grupos de peixes Neotropicais.

A química da água impõe limites adicionais à distribuição e abundância dos peixes neotropicais, especialmente na Amazônia. A principal caraterística regional e de paisagem que influencia a química da água é a localização das cabeceiras (escudos, Andes, florestas baixas), a cobertura vegetal dominante (floresta ou savana) e o tipo de solo (rochas ígneas antigas ou terreno sedimentar Andino). A composição taxonômica e a produtividade dos ecossistemas variam de maneira bastante previsível com a carga de sedimentos, oxigênio dissolvido, temperatura, pH, e área de inundação anual (Albert & Reis, 2011a). Os rios de água branca, ricos em sedimentos, que drenam e erodem os Andes (Amazonas, Madeira, Marañon, Meta, Napo, Ucayali), tem um perfil taxonômico distinto e alta produtividade quando comparados aos rios de águas pretas, com baixas cargas de sedimento, ricos em taninos, baixo pH, e que se originam nas áreas baixas e densamente florestadas (Negro, Tefé, Trombetas). Finalmente, os rios que drenam a rochas cristalinas antigas dos escudos Brasileiro e das Guianas tem água clara, baixa carga de sedimentos e alta transparência. Algumas bacias drenam uma mistura de fontes geográficas e não são prontamente classificáveis em branco ou negro, como o Içá e o Japurá, com cabeceiras tanto nos Andes com em áreas de florestas de inundação. Apesar desses tipos principais de águas da bacia Amazônica (branca, preta e clara) exibirem uma composição taxonômica de peixes distinta, muitas espécies estão presentes em mais de um tipo de água. A carga de sedimentos afeta fortemente a produtividade primária e a biomassa de peixes, especialmente por interferir na visibilidade e na condutividade elétrica da água e, portanto, na habilidade das espécies que usam sinais visuais (Characiformes, cichlídeos) ou elétricos (gymnotiformes, bagres) para navegar, forragear, escapar de predadores e se reproduzir. Os peixes da bacia Amazônica A fauna de peixes da bacia Amazônica é a mais rica do mundo e rivaliza em diversidade com peixes marinhos de recifes coralinos. Estimativas conservativas sugerem que existam cerca de 2.200 espécies descritas de peixes na bacia Amazônica (Albert & Reis, 2011b). Esse número, entretanto, é uma clara subestimativa, pois uma parcela significativa da biodiversidade está ainda por ser descoberta e descrita. De acordo com Reis (2013), a fauna de peixes de água doce da América do Sul está estimada em mais de 4.000 espécies. Quando toda a região Neotropical é considerada – incluindo também a América Central ao sul do istmo de Tahuantepec, no México – o número de espécies de peixes sobe para mais de 5.000, representando quase 10% de todos os vertebrados conhecidos (Lundberg et al. 2000). A seguir, apresento uma interessante ilustração do atual ritmo de descoberta e descrição de novas espécies de peixes. O Check List of the Freshwater Fishes of South and Central America – CLOFFSCA (Reis et al., 2003) listou 4475 espécies válidas de peixes e estimou a existência de 1550 espécies adicionais, ainda não descritas, com base na expertise dos autores e conjecturas e conhecimento sobre pesquisas em andamento, elevando o número estimado de espécies existentes na região Neotropical para

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6.025. Nos nove anos decorridos desde a publicação do CLOFFSCA, cerca de 900 novas espécies de peixes de água doce foram descritas para a região, perfazendo uma média de uma nova espécie descrita a cada 3,5 dias, e assim elevando o número de espécies conhecidas para cerca de 5.400 em 2012. Mantido este ritmo de descrição de novas espécies, a estimativa de 6.025 espécies do CLOFFSCA será atingida em seis anos. Como a curva de acumulação de descrição de novas espécies está claramente ascendente e não se aproxima de uma assintótica, pode-se esperar que o número final de peixes de água doce da região Neotropical possa exceder a estimativa de Schaefer (1998) de 8.000 espécies! Aplicando-se a mesma estimativa de aumento para a fauna de peixes de água doce apenas da bacia Amazônica, conclui-se que é possível que ela possa exceder 3.200 espécies! Surpreendentemente, essa estimativa de que cerca de 30% da fauna de peixes de água doce da América do Sul ainda estão por ser descritas, não é novidade. Há 35 anos, um clássico artigo de Boehlke et al. (1978) estimou o número de peixes de água doce da América do Sul e chegou a mesma avaliação de que 30% das espécies ainda estavam por ser descritas. O período decorrido desde a avaliação de Boehlke et al. testemunhou um número sem precedentes de espécies de peixes sendo descritas da América do Sul. Ainda assim, 35 anos depois continuamos com a mesma estimativa da percentagem de espécies que ainda não foram descritas. Os fatores que explicam o aumento na taxa de descobertas de novas espécies de peixes na América do Sul foram listados por Ferraris & Reis (2005) referindo-se aos bagres (Siluriformes), mas aplicam-se igualmente a todos os grupos de peixes: o aumento no número de taxonomistas de peixes, a exploração mais intensa dos ambientes aquáticos do continente e mudanças no conceito de espécie, que tendem cada vez mais a discriminar mais finamente as populações.

Essa enorme e diversa fauna de peixes de água doce é muito antiga e tem origens históricas distintas (Albert et al., 2011). Os ancestrais marinhos da maioria dos pequenos grupos de peixes invadiram as águas doces do continente Sul Americano e diversificaram durante o Paleogeno, principalmente Oligoceno e Mioceno. Os grandes grupos, entretanto, como os Cichlidae e Ostariophysii, estiveram isolados no continente desde o final da separação do Gondwana, no Cretáceo, aproximadamente a 100 milhões de anos.

Neste parágrafo, de Reis (2013), sobre a fauna de peixes Neotropicais, apresento entre colchetes os números correspondentes apenas aos peixes da bacia Amazônica. “Aproximadamente 340 [140] espécies de água doce pertencentes a 28 famílias primariamente marinhas contrastam com os 1.080 [450] cichlídeos, peixes anuais e barrigudinhos, e os quase 3.800 [1.610] Ostariophysii (characiformes, bagres e peixes elétricos). Os peixes dessas 28 famílias são usualmente referidos como a Divisão Periférica, os quais invadiram e se especializaram para a vida em água doce. Esses grupos variam de uma a cerca de 100 espécies – a maioria apresenta 2-6 espécies – e incluem as raias de água doce, enguias, sardinhas, anchovas, tainhas, peixes-agulha, peixes-rei, peixes-cachimbo, corvinas, gobiões, linguados e baiacus, entre outros. A Divisão Secundária é composta por famílias de água doce que são proximamente relacionadas a grupos marinhos, mas são inteiramente confinadas a hábitats continentais, e inclui os cichlídeos com 480 [270] espécies, os rivulídeos ou peixes anuais, em grande parte ameaçados de extinção, com 270 [160] espécies, os anablepídeos com 17 [2] espécies, os cyprinodontídeos com 59 [nenhuma] espécies, e os poecilídeos, ou barrigudinhos, com 250 [20] espécies. Em contraste, a Divisão Primária é composta pelos Ostariophysii e quatro outras pequenas famílias que se originaram e diversificaram em hábitats de água doce antes da separação do Gondwana. Estes são o peixe pulmonado Sul Americano ou piramboia, os

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pirarucus – o maior peixe de água doce da América do Sul, as duas espécies de aruanãs, e meia dúzia de espécies de peixes-folha (Polycentridae). Os Ostariophysii, no entanto, perfazem cerca de 75% da fauna de peixes de água doce em todo o mundo. Neste grupo estão os lambaris, piranhas, pacus e seus parentes, os Characiformes, com cerca de 1.700 [810] espécies, os sarapós e tuviras ou Gymnotiformes, com 180 [100] espécies, e os bagres e cascudos ou Siluriformes, com 1.900 [700] espécies”.

II. A BACIA DO RIO XINGU

A bacia hidrográfica

O rio Xingu é um dos principais tributários da bacia Amazônica e drena o Escudo Brasileiro, juntamente com o Tocantins, Araguaia, Tapajós e parte do rio Madeira. A bacia do rio Xingu compõe a Ecorregião Aquática 322 do mapa das ecorregiões de água doce do mundo de Abell et al. (2008), que é limitada ao norte pela área de Belo Monte, na zona de contato entre a bacia sedimentar Amazônica e o Escudo Brasileiro, a leste e ao sul pelo divisor de águas com a bacia do rio Araguaia, ao longo da Serra do Roncador, Serra dos Gradaús e Serra dos Carajas, e a oeste pelo divisor de águas com a bacia do rio Tapajós, ao longo da Serra Formosa e Serra do Cachimbo. A elevação ao longo da bacia é muito lenta na maior parte da bacia, com um aumento da cota em relação ao nível do mar de cerca de 150 metros ao longo da Volta Grande, entre Belo Monte e Altamira e mais 150 metros entre Altamira e a confluência dos rios Sete de Setembro e Coluene, já em sua parte alta, área visitada neste estudo. As suas cabeceiras mais altas nascem no Planalto de Mato Grosso, a mais de 800 metros de altitude. Na maior parte de seu percurso o rio Xingu corre sobre terrenos cristalinos de granito e também calcário, o que lhe confere uma quantidade de sedimentos carreados muito baixa e alta transparência. O clima nesta ecorregião é tropical, com precipitação média anual entre 1.485 e 2.547 mm e com estação de cheia entre novembro e abril e com temperatura do ar média entre 21,6 e 26,5ºC.

O rio Xingu é a quarta maior bacia hidrográfica da Amazônia (cerca de 7% em área) e um dos maiores rio de águas claras que drena os planaltos cristalinos e planícies sedimentares do Escudo Brasileiro, sendo responsável por cerca de 5% da vazão do rio Amazonas. A transparência de suas águas esverdeadas (por causa de florações de fitoplancton) varia de 0,6 a 4 metros, com pH entre 4,5 e 7,8. O nível da água começa a subir em setembro ou início de outubro, atingindo o pico da cheia entre março e abril. A média anual de flutuação do nível do rio é entre dois e cinco metros. Por causa da baixa carga de sedimentos, o rio é bastante largo na ria, assemelhando-se a um lago. Marés oceânicas ocorrem até cerca de 100 km acima da sua foz, a qual se encontra a cerca de 420 km do oceano Atlântico. A parte superior da bacia do rio Xingu, ao sul do paralelo de 10ºS, que coincide aproximadamente com a divisa Pará-Mato Grosso, situa-se em uma depressão caracterizada por extensas áreas úmidas que são periodicamente alagadas. Essa área contém lagos (Fig. 1), banhados, florestas sazonalmente alagadas e savanas. Comparando-se com a parte baixa da bacia, onde o nível de nutrientes é baixo, a parte superior da bacia é mais rica em nutrientes, suportando maior diversidade de vegetação aquática, moluscos e outros invertebrados. Cataratas e corredeiras ocorrem principalmente na parte baixa e nos tributários do rio Xingu, notadamente as cataratas da Serra do Cachimbo e as corredeiras da Volta Grande, que agem como barreiras para a fauna aquática entre a Amazônia central e o Xingu superior (Hales & Petry, 2013).

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Figura 1. Lago do rio Coluene formado por mudanças do curso do leito principal do rio dentro da faixa de mata alagável. Foto: Roberto Reis.

A fauna de peixes

A bacia do rio Xingu está dentro da região ictiogeográfica Guyano-Amazônica, e mais especificamente na província ictiogeográfica Amazônica (Gery, 1969; Ringuelet, 1975). Esta bacia contém um grupo de espécies diverso e único da porção leste do escudo Brasileiro (Hales & Petry, 2013). Em um estudo recente sobre a ictiofauna dos rios Xingu e Tapajós, Buckup et al. (2011) coletaram 288 espécies de peixes de pequeno porte no rio Xingu, 128 das quais foram exclusivas dessa bacia. Essas espécies se distribuíram entre uma espécie de Condrichthyes (Rajiformes) e 11 ordens da Actinopterygii, das quais os Characiformes representaram cerca de 50% das espécies, seguidos pelos Siluriformes com cerca de 32%, dos Perciformes com cerca de 10% das espécies, entre outras. Ainda, pelo menos dois gêneros de peixes de água doce são endêmicos da bacia do rio Xingu (Ossubtus e Phallobrycon). Um achado muito positivo nesse estudo é que nenhuma espécie exótica foi capturada na bacia do Xingu. Considerando as espécies de médio e grande porte não levantadas e as demais espécies pequenas não amostradas naquele estudo, estima-se uma riqueza aproximada de 500 espécies para a bacia do rio Xingu. Ao final deste relatório estão listadas e ilustradas as 25 espécies mais importantes da pesca esportiva no rio Xingu.

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III. O HOTSPOT DO ALTO RIO XINGU

Durante a viagem a campo para o alto rio Xingu priorizou-se a estratégia de inspeção ambiental direta, através de deslocamento por barco e automóvel. A equipe ficou hospedada na Pousada Nascente do Xingu, na beira do rio Xingu no município de Canarana, Mato Grosso. A partir dessa pousada diversas excursões em barco rápido (voadeira) foram empreendidas a áreas de lavouras, sedes de fazendas, pousadas de pesca, áreas florestadas e diferentes ambientes aquáticos. Essas áreas encontram-se localizadas nos rios Coluene e Sete de Setembro, próximas a nascente do rio Xingu, formado pela confluência dos dois rios acima, e no rio Coronel Vanick, um afluente do rio Sete de Setembro (Fig. 2). A área das nascentes do rio Sete de Setembro, escolhida para representar da região de nascentes do rio Xingu, foi inspecionada por terra, em veículo apropriado, e comparada com as demais nascentes do rio Xingu através de imagens de satélite (Fig. 3). Todo o trabalho foi registrado fotograficamente e as áreas visitadas nos rios foram georeferenciadas através de GPS.

Figura 2. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando a área visitada com os principais pontos referidos no texto. Note a Reserva Indígena do Alto Xingu no canto superior esquerdo. Os trechos de rio marcados com o track de GPS foram visitados de barco. A floresta do alto Xingu. A região do alto Xingu representa uma zona de transição entre a Floresta Amazônica típica e o Cerrado do Planalto Central, com uma composição florística própria. À medida que a floresta amazônica vai avançando para o sul, sua fisionomia também vai se modificando, por causa do clima estacional sob o qual essa formação encontra-se hoje. Por isso, apesar de tratar-se de Floresta Estacional, é distinta florística e fisionomicamente da

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Floresta Estacional Semidecidual ou Decidual, com a qual ainda mantém algum contato por meio das florestas de galeria. Por este motivo, Ivanauskas et al. (2008) sugeriu a denominação de Floresta Estacional Perenifólia para o tipo vegetacional do alto Xingu. Assim, sob o ponto de vista fitogeográfico, a floresta do alto Xingu é considerada Amazônica, mas do ponto de vista morfoclimático é uma área de transição para o domínio do Cerrado. A área visitada situa-se exatamente sobre a fronteira do desmatamento no município de Canarana. A inspeção de imagens de satélite mostra que uma grande parte das florestas do alto Xingu já foi retirada para abrir espaço para a pecuária e, mais recentemente, para a agricultura extensiva (Fig. 3).

Figura 3. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando a área visitada com os principais pontos referidos no texto. Note a bacia do rio Araguaia no canto inferior direito e a Reserva Indígena do Alto Xingu no canto superior esquerdo. Os trechos de rio marcados com o track de GPS foram visitados de barco. O Rio Sete de Setembro próximo à Canarana e o seu riacho afluente próximo à Água Boa foram visitados de carro. Fazendas na área visitada. Durante a inspeção da área, algumas fazendas de criação de gado e de plantação de soja foram visitadas. Nessas visitas os proprietários e/ou funcionários das fazendas foram entrevistados sobre as suas práticas de agricultura e pecuária, sobre desmatamento da região e sobre a sua percepção do declínio da quantidade de peixes nos rios e suas possíveis causas. Todos os fazendeiros e outros trabalhadores entrevistados tendem a atribuir à pesca esportiva indiscriminada a responsabilidade pela diminuição da quantidade de peixes. De modo geral, apesar de reconhecerem que defensivos agrícolas e fertilizantes podem ser prejudiciais aos peixes, não reconhecem o desmatamento como um importante impacto aos ambientes aquáticos. Essa falta de entendimento da importância da floresta para os ambientes

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aquáticos está claramente expressa na mínima faixa de floresta ripária mantida na beira dos rios em várias áreas inspecionadas (Fig. 4).

Figura 4. Margem do rio Sete de Setembro mostrando o desmatamento até a beira do rio. As árvores mais altas são testemunhos da dimensão que a mata primária possuía antes do desmatamento. Foto: Roberto Reis. Pousadas de pesca. Durante as excursões de barco no rio Sete de Setembro e, principalmente, rio Culuene, cinco Pousadas de Pesca foram visitadas e seus proprietários e/ou funcionários foram entrevistados. Algumas dessas pousadas são bastante bem aparelhadas, possuindo grande número de barcos (mais de 20), e pista de pouso. Da mesma forma que nas fazendas, estes foram questionados sobre suas práticas profissionais como guias e promotores de pesca esportiva, pescadores, desmatamento da região e sobre a sua percepção do declínio da quantidade de peixes nos rios e suas possíveis causas. Aqueles que vivem na região há muito tempo reconhecem um drástico declínio na quantidade de peixes nos últimos 10-15 anos. Essa percepção não é tão clara para os entrevistados que vivem a menos de 15 anos na região. Apesar do inicio do desmatamento na região ser mais antigo, este era feito prioritariamente para criação de gado, que não impacta tão severamente os ambientes aquáticos. No entanto, a partir de cerca da 15 anos atrás muitas das fazendas de criação de gado iniciaram a trocar sua atividade principal para o plantio de soja ou outros grãos como milho, sorgo, etc., o que introduziu no ambiente, de forma sistemática e periódica, enormes cargas de defensivos agrícolas e fertilizantes de solo, além de provocar o incremento do desmatamento e diminuição adicional da faixa de floresta ciliar ao longo dos rios. Ao contrário dos fazendeiros, as pessoas envolvidas com a pesca esportiva

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atribuem o declínio na quantidade de peixes às praticas agrícolas, mas também não veem o desmatamento como um impacto sério para os ambientes aquáticos. Ambientes aquáticos visitados. A expedição às cabeceiras do rio Xingu foi conduzida durante a estação de cheia, quando o rio está vários metros acima do nível normal. Os ambientes visitados de barco foram rio de grande porte (Xingu), rios de médio porte (Sete de Setembro e Culuene), e também rios pequenos, como o Coronel Vanick. Apesar dos rios estarem sobre o planalto, estes são bastante convolutos e com muitos meandros, e possuem uma faixa de floresta inundável que varia de um a cinco quilômetros de largura na parte baixa dos rios Culuene e Sete de Setembro, e de quatro a oito quilômetros de largura no rio Xingu – semelhantes as áreas de terras baixas da Amazônia central. Essa floresta é anualmente inundada pela cheia do rio e peixes e outros organismos aquáticos deixam o leito do rio para se abrigar e alimentar na mata inundada. Nessa mesma época ocorre a frutificação de um grande número de árvores de mata inundável, fornecendo assim frutos e sementes como um valioso recurso energético para os peixes que deles se alimentam. Além disso, uma grande quantidade e diversidade de invertebrados, especialmente insetos, ocupam as florestas inundadas e são consumidos por numerosas espécies de peixe.

Além dos rios, vários lagos dos rios Coluene e Sete de Setembro foram visitados. Estes lagos (oxbow lakes) são formados pela dinâmica de mudanças do curso do leito principal do rio dentro da faixa de mata alagável (Fig. 5). Estes lagos são permanentes, sobrevivendo a estação das águas baixas, e se constituem em áreas de refugio e criação de algumas espécies e área de alimentação para outras.

Figura 5. Imagem de satélite (Google Earth) mostrando o rio Coluene imediatamente acima da área visitada. Note lagos (oxbow lakes) formados pelas mudanças do curso do leito principal do rio dentro da faixa de mata alagável. A linha vermelha corresponde a 4 km.

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Também foram visitadas as nascentes do rio Sete de Setembro, em áreas dos municípios de Canarana e Água Boa. Cerca de 20 km a oeste da cidade de Canarana o rio Sete de Setembro apresenta um leito variando entre 30 e 60 metros de largura, com meandros dentro de uma área de floresta inundável de 600-1.200 metros de largura. Mais acima, a oeste da cidade de Água Boa, um riacho afluente do rio Sete de Setembro foi inspecionado. Esse riacho tem cerca de 20-30 metros de largura, já não possui área de mata inundável e pouca mata ciliar foi mantida após o desmatamento. Nesse riacho havia mineração de areia no leito e grandes montes de areia estavam acumulados esperando compradores (Fig. 6). Também, grandes lavouras de soja se localizavam em todo o entorno desse e de outros mananciais na região (Fig. 7). Finalmente, foi inspecionado um pequeno córrego de primeira ordem, da cabeceira do rio Sete de Setembro. Este córrego estava parcialmente represado e, como todos na região, era cercado de lavouras de soja. Abaixo do represamento, no entanto, sua água é corrente e aparentemente limpa, mas possivelmente poluída com defensivos e fertilizantes agrícolas.

Figura 6. Montes de areia produto da mineração em riacho tributário do rio Sete de setembro acumulados na margem. Foto: Roberto Reis.

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Figura 7. Plantação de soja em fase de colheita junto à área de mineração de areia em riacho tributário do rio Sete de setembro. Foto: Roberto Reis. As ameaças aos peixes e ambientes aquáticos. Diversas ameaças aos ambientes aquáticos e peixes do rio Xingu foram identificadas nesta viagem. As ameaças podem ser classificadas em diretas, como a pesca, coleta de peixes ornamentais, retirada de mata ripária e uso de defensivos e fertilizantes agrícolas, com ação rápida diretamente sobre os peixes; e indiretas, como desmatamento extensivo, mineração no leito do rio, construção e operação de usinas hidrelétricas e mudanças climáticas. Pesca esportiva. A pesca esportiva é, de maneira geral, uma atividade de baixo impacto

nas comunidades de peixes, especialmente quando a prática de pescar-e-soltar é utilizada. Na região do alto Xingu, entretanto, o número de pousadas especializadas em receber pescadores esportivos e disponibilizar condições para pesca é muito grande. Em uma área visitada de cerca de 50 km no baixo rio Coluene, por exemplo, existem pelo menos cinco pousadas com capacidade para receber dezenas de pescadores e de levá-los para pescar diariamente. Essas pousadas contam com acesso por estrada e por aviões pequenos e tem até cerca de 20 barcos para piloto e dois pescadores. Relatos de pilotos de barcos de pesca nessa área reportam varias dezenas de barcos pescando concomitantemente neste trecho do rio na estação de seca. As quotas individuais de pesca, tanto para pescadores comerciais como esportivos, tem sido sistematicamente diminuídas nos últimos anos.

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Ainda assim, a retirada contínua de peixes pela pesca esportiva é um impacto considerável para as populações locais. Ainda, uma consequência conhecida da pesca é a diminuição do tamanho dos peixes. A pesca, especialmente a pesca esportiva, seletivamente retira da população os exemplares grandes, fazendo com que os peixes menores, mas já maduros, produzam a nova geração. Com o passar do tempo o tamanho médio dos peixes da população sob efeito de pesca pode ser sensivelmente diminuído.

Coleta de peixes ornamentais. A coleta de peixes ornamentais no rio Xingu é bastante

importante economicamente, sustentando uma comunidade de pescadores que se originaram do garimpo de ouro no leito do rio. Essa atividade, no entanto, está restrita ao baixo Xingu e se concentra na região da Volta Grande, entre Altamira e Belo Monte. Essa atividade é de baixo impacto para o ambiente aquático, mas tem efeito diretamente nas populações de peixe pela retirada de indivíduos e representa uma ameaça por produzir os mesmos efeitos que a pesca comum.

Retirada de mata ripária. Mata ciliar ou ripária é a vegetação que ocorre nas margens dos

rios. Essa mata é fundamental para o ambiente aquático e para os organismos que vivem nos rios por três motivos principais. A integridade das margens é, em grande parte, sustentada pela vegetação ripária. A sua retirada facilita o carreamento de terra e outros sedimentos para o leito do rio pela chuva, causando o assoreamento do leito, com a consequente diminuição da profundidade e da estruturação. Além disso, a mudança na turbidez da água provoca alteração na penetração de luz e consequentemente na produtividade primária do manancial. Ainda, altera as habilidades de percepção do meio pelos peixes que se orientam visualmente para atividades reprodutivas, alimentares, etc., impactando a sua sobrevivência. Finalmente, diversas árvores da mata ciliar produzem frutos e sementes que são utilizadas por diversos peixes para alimentação, especialmente na época de cheia.

Fertilizantes de solo agrícolas. Diferentes tipos de solos precisam ser corrigidos para

adaptar-se a distintos cultivos agrícolas. Os típicos latossolos do Escudo Brasileiro na região do alto Xingu são empobrecidos de nutrientes e necessitam de correção de pH e de acréscimo de fertilizantes para o plantio da soja e outros grãos. A engenharia agrícola obviamente procura minimizar o uso destes componentes a fim de diminuir o custo da produção. No entanto, parte destes corretivos e fertilizantes é carreada para os riachos e daí para os rios, eutrofizando os mananciais e modificando a dinâmica da cadeia alimentar dos organismos aquáticos.

Herbicidas, inseticidas e outros defensivos agrícolas. Da mesma forma que os

fertilizantes, diversos tipos de herbicidas e pesticidas são empregados nos cultivos de soja, predominantes na região do alto Xingu. Estes produtos são usualmente aplicados com aviões que jogam grandes quantidades sobre as lavouras. Uma vez aplicados, parte acaba sendo carreada pela chuva para os rios causando diferentes tipos de envenenamentos nos organismos aquáticos.

Desmatamento extensivo. O desmatamento extensivo provavelmente representa o mais

importante fator de impacto sobre os ambientes terrestres, com consequências igualmente importantes para os ambientes aquáticos envolvidos. A retirada da floresta aumenta

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drasticamente a evaporação da água do solo, causando a diminuição de fluxo ou mesmo desaparecimento de nascentes, culminando com a diminuição da vazão dos rios. O desmatamento também desagrega o solo que será parcialmente carreado pelas chuvas, especialmente quando a faixa de mata ciliar remanescente for pequena.

Mineração de areia no leito dos rios. A demanda por areia para a construção civil tem

crescido dramaticamente na região do alto Xingu, uma vez que cidades estão crescendo e se desenvolvendo com o dinheiro da soja que chegou recentemente à região. A mineração de areia no leito do rio causa a completa destruição do leito e das margens localmente, causando um impacto severo, porém pontual. As ameaças ao ambiente aquático e à fauna aquática são severas, mas são, como mencionado, pontuais.

Construção e operação de usinas hidrelétricas. Represas hidrelétricas impactam as

populações de peixes de três maneiras. A transformação de um ambiente lótico em um lago erradica ou reduz significativamente as populações das espécies reofílicas e ao mesmo tempo fornece as condições para que as espécies lênticas proliferem, dessa forma alterando a composição da comunidade local. Em uma escala mais ampla, as barragens regulam o fluxo do rio a jusante, perturbando os ciclos anuais de alimentação e reprodução, e perturbando as rotas migratórias de muitos peixes grandes que não conseguem atravessar a barreira criada pela represa. Nas cabeceiras do rio Xingu, especificamente no rio Coluene, existe a Usina Hidrelétrica do rio Coluene. Há relatos de pescadores e de cientistas (Flávio Lima, comunicação pessoal), de que grandes cardumes de matrinxã chegam até a represa do rio Coluene e se acumulam a jusante desta por não poder seguir rio acima. Essa parada na rota migratória de espécies de piracema, como o Matrinxã, prejudica a reprodução da espécie. Além disso, há relatos de que comunidades de pescadores locais se reúnem nessas ocasiões para uma pesca farta e fácil, mesmo durante o período de defeso da piracema. No baixo Xingu, por outro lado, a UHE Belo Monte está em fase de construção e depois de concluída irá afetar a comunidade de peixes reofílicos, especialmente acaris da família Loricariidae, que vivem na Volta Grande do Xingu, a jusante de Altamira.

Mudanças climáticas. Dados preliminares de um estudo em desenvolvimento pela WWF sugerem que as mudanças climáticas futuras não estão sendo consideradas de maneira adequada no planejamento energético de longo prazo ou na avaliação da viabilidade de projetos hidrelétricos da Amazônia. Secas severas como as que assolaram a Amazônia em 2005 e 2010 tendem a se tornar mais frequentes, e essas alterações climáticas, associadas ao desmatamento generalizado da região, podem reduzir a vazão do rio Xingu e de outros rios Amazônicos que drenam o Escudo Brasileiro. Uma eventual redução na vazão do rio Xingu poderá afetar a produtividade em usinas hidrelétricas como a UHE Belo Monte, como sugerido pelo estudo da WWF. As consequências de uma redução de vazão do rio Xingu por causa de mudanças climáticas, entretanto, poderão ser muito mais prejudiciais à fauna aquática, uma vez que áreas de alimentação e refugio podem tornar-se menos acessíveis anualmente e migrações reprodutivas rio acima podem não ser desencadeadas por uma vazão reduzida em um ano de seca.

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A fauna de peixes importante para a pesca esportiva. Tanto a pesca comercial como a coleta de espécies ornamentais são importantes no baixo rio Xingu. A região visitada no curso superior da bacia do rio Xingu, no entanto, possui grande importância na pesca esportiva, com muitas pousadas e operadoras de turismo especializadas nesse esporte.

As espécies listadas abaixo foram levantadas como sendo as principais espécies alvo da pesca esportiva na região do alto Xingu, a sua ocorrência e utilização foi confirmada através de entrevistas com pescadores e operadores de turismo durante o trabalho de campo. As 25 espécies de maior importância na pesca esportiva no alto Xingu são apresentadas abaixo, listadas em uma classificação seguindo Reis et al. (2003). Os dados apresentados sobre as famílias dessas espécies é amplamente adaptado de Reis et al. (2003) e de referências nesse livro, e os autores dos capítulos individuais são citados ao final do texto de cada família. As espécies são ilustradas com imagens obtidas na Internet, exceto onde assinalado na legenda, nas Figs. 8 e 9. CHARACIFORMES Prochilodontidae Prochilodus nigricans – Curimba Semaprochilodus brama – Jaraqui Os membros da família Prochilodontidae são de tamanho moderado a grande (até 74 cm de comprimento total) e podem ser distinguidos de outros peixes pelos seus lábio carnosos equipados com duas séries de numerosos dentes pequenos, falciformes ou espatulados, frouxamente inseridos nos lábios. Os lábios, quando protraídos, formam um disco oral arredondado e circundado por dentes, que os peixes utilizam para explorar detritos e perifíton em superfícies subaquáticas. A prevalência desses recursos em águas doces permanentes e na floresta periodicamente inundada (Goulding et al, 1988) é provavelmente responsável pela abundância de Prochilodontidae na região Neotropical. Como consequência do hábito de se alimentar de detritos e de suas grandes populações, os Prochilodontidae possuem um importante papel no fluxo de energia nos sistemas aquáticos que habitam (Winemiller, 1996) sendo funcionalmente dominantes e alguns ecossistemas aquáticos. Espécies de Prochilodontidae fazem migrações massivas associadas com alimentação e reprodução, com alguns indivíduos viajando pelo menos 1.500 km entre locais de marcação e recaptura. Prochilodontidae são famosos pela sua habilidade de ultrapassar obstáculos encontrados durante a migração com natação vigorosa e saltos dramáticos de vários metros (Castro & Vari, 2003).

Membros de Prochilodontidae são muito importantes na pesca comercial e de subsistência em toda a área de ocorrência da família. No baixo rio Negro, mais de 90% da pesca comercial consiste de duas espécies de Semaprochilodus (Goulding, 1988) e os Prochilodontidae estão se tornando progressivamente mais importantes na pesca comercial na porção central da bacia Amazônica (Ribeiro & Petrere, 1990). Anostomidae Leporinus spp. – Piaus Os Anostomidae se distinguem de todos os demais Characiformes pela presença de uma única série de três ou quatro dentes em cada premaxila ou dentário, dispostos em escada. A maxila é pequena e excluída da borda da boca. Espécies desta família são amplamente distribuídos do sul

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da América Central até as regiões sub-tropicais da América do Sul. Os Anostomidae são todos fusiformes e incluem espécies que variam de 10 a 80 cm de comprimento. Muitas espécies são conhecidas pelo seu hábito de se alimentar em posição inclinada e constituem uma porção significativa da biomassa de peixes em diversos hábitas aquáticos. Graças a posição variável da sua boca e longos intestinos, os Anostomidae são eficientes em utilizar esponjas, detritos, insetos e itens vegetais como sementes, folhas e algas filamentosas. Algumas espécies de grande tamanho dos gêneros Leporinus e Schizodon são conhecidos por fazer migrações reprodutivas na bacia Amazônica. Por causa dessas migrações anuais, essas espécies são exploradas pela pesca comercial e de subsistência como um importante item na América do Sul (Garavello & Britski 2003). Characidae Myleus spp. – Pacu-peva Colossoma macropomum – Tambaqui (translocação: escape de cultivo no rio Xingu) Por causa do tamanho extremamente grande da família Characidae e a sua natureza extremamente heterogênea, as suas espécies são agrupadas em subfamílias. A subfamília Serrasalminae tem corpo alto, comprimido lateralmente e com uma série de espinhos abdominais na linha média e, exceto os gêneros Colossoma, Piaractu e Mylossoma, um espinho dirigido anteriormente na frente da nadadeira dorsal. Algumas espécies possuem uma única fileira de dentes em cada maxila – as piranhas. Esses dentes muito afiados e pontiagudos, tricúspides em Pygocentrus, Pristobrycon e Serrasalmus, e pentacúspides em Pygopristys. Em Acnodon, Colossoma, Piaractus, Metynnis, Myleus, Mylossoma e Utiaritichthys – os pacus e tambaquis, os dentes são molariformes e fortemente implantados nas maxilas, e principalmente usados para quebrar frutos e sementes. Em Mylesinus, Ossubtus and Tometes – pacus de cachoeiras, os dentes são incisiviformes e tricúspides, fracamente implantados e principalmente utilizados para cortar folhas. As maiores espécies desse grupo chegam a 70 ou 80 cm de comprimento, e pertencem aos gêneros Colossoma e Piaractus, e juntamente com Mylossoma, são considerados como peixes de alta qualidade da América do Sul. Estas espécies são as mais importantes da subfamília na pesca comercial e na piscicultura (Jégu, 2003). Brycon falcatus – Matrinxã As espécies da subfamília Bryconinae são peixes de tamanho médio a grande, com espécies entre 15 e 70 cm de comprimento. Os Bryconinae não podem ser diagnosticados por um conjunto único de caracteres, mas a combinação de três fileiras de dentes na premaxila, a presença de dentes maiores na fileira interna, e a presença de um dente sinfiseal atrás da fileira principal de dentes são incomuns entre os demais Characidae. As espécies de Brycon são importantes na pesca por toda a América do Sul e Central. Algumas espécies são importantes em pescarias comerciais em muitas bacias hidrográficas e são também cultivados em vários países da América do Sul. As espécies de Brycon são omnívoras, utilizando principalmente itens alóctones como frutas, sementes e insetos. Estas espécies são conhecidas por fazer migrações reprodutivas, algumas delas em grandes distâncias (Lima, 2003).

Brycon falcatus habita exclusivamente rios de água clara ou preta, e migra anualmente no rio Xingu e Coluene, entre setembro e novembro, antes da cheia dos rios. A usina hidrelétrica do rio Coluene, na porção superior deste rio, constitui-se em uma barreira importante à piracema

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destes peixes, que não conseguem subir para reproduzir nas cabeceiras deste rio. Como outras espécies de Brycon, B. falcatus é um peixe altamente móvel e utiliza uma grande variedade de hábitats incluindo o canal de grandes rios, floresta inundada, planícies de inundação e pequenos tributários (Flávio Lima, Comunicação Pessoal). Cynodontidae Hydrolycus armatus – Cachorra Rhaphiodon vulpinus – Cachorra-facão Os peixes desta subfamília compõem um grupo muito distinto de Characiformes Neotropicais não migradores, facilmente reconhecíveis pela sua boca oblíqua com dentes caninos bem desenvolvidos no dentário e nadadeiras peitorais relativamente expandidas. Os maiores membros da subfamília são do gênero Hydrolycus, e chegam a 65 cm de comprimento. Eles vivem junto à superfície e meia-água de rios, lagos e floresta inundada de todos os tipos de água, são predadores, principalmente piscívoros, usando seus grande dentes caninos para perfurar as presas. Apesar de não serem muito valorizados como alimento, algumas espécies tem importância na pesca de subsitência. Por outro lado, as espécies de Hydrolycus são importantes na pesca esportiva, como é o caso da região do alto Xingu (Toledo-Piza, 2003). Erythrinidae Hoplias malabaricus – Traíra Hoplias aimará – Trairão Os peixes da família Erythrinidae são caracterizados por possuir o corpo cilíndrico, nadadeira caudal arredondada, nadadeira dorsal com 8 a 15 raios, nadadeira anal curta, com 10 ou 11 raios, nadadeira adiposa ausente, e numerosos dentes no palato. As espécies de Hoplias são de tamanho médio a grande, variando de 30 a 100 cm de comprimento. Eles são encontrados em uma grande variedade de hábitats como lagos, lagoas, e pequenos e grandes rios, e são relativamente importantes como alimento em muitas regiões da América do Sul (Oyakawa, 2003). São espécies residentes (não migradoras) que depositam seus ovos em ninhos de vegetação e os cuidam até a eclosão. A traíra atinge até cerca de 70 cm e o trairão tem registros de até 100 cm de comprimento. Ctenoluciidae Boulengerella cuvieri – Bicuda Os peixes da família Ctenoluciidae tem o corpo alongado, as maxilas também alongadas e com números dentes pequenos arranjados em uma única fileira, além da nadadeiras dorsal e anal posicionadas posteriormente no corpo. As espécies de Boulengerella são predadoras, aparentemente alimentando-se exclusivamente de peixes adultos. Estes peixes são importantes predadores de topo e costumam ser explorados pela pesca de subsistência, comercial, esportiva e pelo comercio de peixes ornamentais (Vari, 2003). Boulengerella cuvieri é o maior representante dos Ctenolucidae, atingindo até cerca de 82 cm de comprimento. SILURIFORMES Pseudopimelodidae

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Pseudopimelodus bufonius – Jaú pedra Os membros da família Pseudopimelodidae podem ser distinguidos de outros peixes por sua boca grande, olhos pequenos, ausência de margem orbital livre e barbilhões curtos. Alguns gêneros possuem um belo padrão de coloração com grandes manchas marrons escuras no tronco. O tamanho é variável, atingindo de 5 cm em Microglannis até aproximadamente 40 cm em Pseudopimelodus (Shibatta 2003). Pimelodidae Brachyplatystoma filamentosum – Piraíba, filhote Hemisorubim platyrhynchos – Jurupoca Phractocephalus hemiolioterus – Pirarara Pimelodus spp. – Mandis Pinirampus pirinampu – Barbado Pseudoplatystoma reticulatum – Caparari Pseudoplatystoma tigrinum – Cachara Sorubim lima – Jurupensem Zungaro zungaro – Jaú Ainda que os Pimelodidae não possuam uma única característica visível externamente, seus membros podem ser identificados dentre outros Siluriformes Sul Americanos por uma combinação de características: pele nua (poucas espécies possuem ossículos da linha lateral levemente aumentados), canais laterosensoriais cutâneos ramificados, teto do crânio nunca coberto por musculatura epaxial e sua pela usualmente fina, e ossos do teto do crânio ornamentados com quilhas estriadas, pequenos tubérculos, ranhuras e nuca lisos. Os adultos de muitos Pimelodidae situam-se na faixa de tamanho entre 20 e 80 cm de comprimento, mas existem tamanhos extremos na família como por exemplo a piraíba, ou filhote (Brachyplatystoma filamentosum), que atinge mais de 2 m de comprimento. A maioria dos Pimelodidae são carnívoros ou omnívoros que consomem grandes números de pequenos peixes ou invertebrados. Algumas espécies, como as do gênero Brachyplatystoma (piraíba, dourada), são predadores de natação ativa, enquanto que outros como os Pseudoplatystoma parecem ser mais sedentários, usando uma estratégia de ficar parados e esperar pelas presas. Algumas espécies de Brachyplatystoma fazem longas migrações reprodutivas rio acima na bacia Amazônica, as vezes de milhares de quilômetros. As larvas e juvenis dessas espécies flutuam rio abaixo na estação de cheia até as áreas de planícies de inundação onde crescerão. Os Pimelodidae habitam uma grande variedade de hábitats desde pequenos rios até grandes rios de água branca, preta ou clara, como também lagos, onde eles estão entre os peixes mais abundantes. Muitas espécies grandes de Pimelodidae, como Brachyplatystoma spp. and Pseudoplatystoma spp., são recursos alimentarem muito importantes na maior parte da América do Sul tropical, estando já sobreexplotadas em alguns lugares. Varias espécies de Sorubim e Pimelodus são populares na indústria de peixes ornamentais enquanto outros como Phractocephalus hemiolioterus e Brachyplatystoma tigrinus alcançam altos preços no mercado de espécies ornamentais (Lundberg & Littmann 2003). Auchenipteridae Ageneiosus inermis – Mandubé, palmito, fidalgo, boca larga

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Membros desta família podem ser facilmente reconhecidos por possuir a região predorsal do corpo coberta por placas ósseas suturadas entre si e visíveis através de uma fina pele, barbilhão nasal ausente, nadadeira adiposa pequena mas raramente ausente, olho coberto por tecido adiposo e sem uma margem orbital distinta. Os Auchenipteridae são únicos entre os bagres em ao menos um aspectos da sua biologia reprodutiva – todas as espécies apresentam fertilização interna e as fêmeas não necessariamente expelem os seus ovos imediatamente após a fertilização. Em vez disso, carregam óvulos maduros, porém não fecundados, e pacotes de esperma dentro do seu trato reprodutivo, por certo período de tempo, antes de iniciar a fecundação e liberação dos ovos. Este comportamento presumivelmente permite que a fêmea tenha tempo de procurar um local adequado para desovar após a fertilização.

Os Auchenipteridae são tipicamente noturnos, apesar de que espécies de Auchenipterus, Ageneiosus e alguns Centromochlus parecem alimentar-se ativamente durante o dia. As maioria das espécies que tiveram seus hábitos alimentares estudados se alimenta de insetos, especialmente aqueles que caem na superfície da água. Algumas espécies da família, como por exemplo as do gênero Auchenipterus são planctívoros, enquanto que espécies de Ageneiosus são primariamente piscívoros. Os maiores Auchenipteridae são do gênero Ageneiosus, cujas maiores espécies chegam a cerca de meio metro de comprimento. Umas poucas espécies desta família são exportadas como peixes ornamentais (Ferraris, 2003). PERCIFORMES Sciaenidae Plagioscion squamosissimus – Corvina A família Sciaenidae inclui cerca de 78 gêneros e 300 espécies que habitam primariamente o ambiente marinho. Seis gêneros, entretanto, são restrito a ambientes de água doce, podendo temabém ocorrer em estuários. Entre estes, o gênero Plagioscion é endêmico dos rios da América do Sul e suas espécies são conhecidas localmente como corvinas. As espécies de Plagioscion são piscívoras e são encontradas principalmente em grandes rios, onde suportam importantes pescarias comerciais e esportivas (Casatti, 2003). Cichlidae Cichla mirianae – Tucunaré Cichla melaniae – Tucunaré Os Cichlidae representam a maior família de peixes de água doce não-Ostariophysii em ambientes de água doce de todo o mundo e uma das maiores famílias de vertebrados com pelo menos 1.300 espécies e estimativas se aproximando de 2.000 espécies. Na América do Sul existem cerca de 480 espécies. Os Cichlidae são reconhecidos por vários caracteres evolutivamente derivados, especialmente da sua anatomia óssea, mas podem ser facilmente reconhecidos por possuir a linha lateral dividida em dois segmentos. A maioria das espécies dessa família varia entre 5 e 20 cm de comprimento, mas alguns tucunarés, como por exemplo a espécie Cichla temensis pode alcançar até 1 m de comprimento. A maioria dos Cichlidae neotropicais ocupa hábitats lênticos em rios e riachos, e se alimenta de uma variedade de invertebrados e matérias vegetais. Espécies de alguns gêneros como Cichla, Crenicichla, Petenia e Astronotus, entre outros, se alimentam de peixes e grandes invertebrados. A maioria dos

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Cichlidae neotropicais são moderadamente a fortemente dimórficos sexualmente, e se reproduzem em pares. Ovos são tipicamente depositados no substrato e ambos os pais guardam os juvenis por várias semanas. Por causa da diversidade de comportamente e coloração usualmente atrativa, os Cichlidae são comumente exportados como peixes ornamentais. A pesca esportiva é concentrada nos tucunarés, para os quais existe um forte mercado incluindo safáris e concursos de pesca, predominantemente no norte do Brasil. Todas as espécies de grande porte são utilizadas como alimento, com uma tradicional pesca artesanal e de subsistência. Praticamente todos os mercados na Amazônia brasileira corriqueiramente oferecem espécies de Cichla, Astronotus e outras espécies maiores de 10-15 cm que sejam disponíveis. Espécies de Astronotus e, ainda de forma incipiente, Cichla, são utilizadas para aquacultura no Brasil (Kullander, 2003).

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Figura 8. Espécies de peixe que representam os principais alvos da pesca esportiva na região do alto Xingu. Imagens obtidas na Internet, exceto onde assinalado abaixo. A) Curimba, foto: Tiago Carvalho; B) Jaraqui; C) Piau; D) Pacu-peva; E) Tambaqui; F) Matrinxã; G) Cachorra; H) Cachorra-facão; I) Traíra; J) Trairão; K) Bicuda.

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Figura 9. Espécies de peixe que representam os principais alvos da pesca esportiva na região do alto Xingu. Imagens obtidas na Internet, exceto onde assinalado abaixo. L) Piraíba; M) Jurupoca; N) Pirarara; O) Mandi, foto: Mark Sabaj; P) Barbado, foto: Tiago Carvalho; Q) Cachara; R) Caparari; S) Jurupensem; T) Jaú; U) Mandubé; V) Corvina; X) Tucunaré (Cichla marianae); Y) Tucunaré (C. melaniae).

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IV. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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