relatório de estágio mestrado integrado em medicina .segundo estudos recentes australianos, para
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Relatrio de Estgio
Mestrado Integrado em Medicina
DOENA HEPTICA ALCOLICA
Alguns aspectos prticos
Marta Sofia Fernandes Duarte
Orientador
Professor Doutor Jorge Alberto Afonso Pereira Areias
Porto, 2010
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NDICE
Resumo 3
Introduo 4
Fundamentao terica 6
Metabolismo e toxicidade do lcool 6
Doena Heptica Alcolica 9
Manejo teraputico do doente alcolico com complicaes gastrenterolgicas 13
Fundamentao prtica 18
Discusso 20
Concluso 21
Bibliografia 22
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RESUMO
Sendo o lcool a principal causa de doena heptica em Portugal, decidi realizar o meu estgio
numa rea to estatisticamente significativa como a da Doena Heptica Alcolica em Portugal.
O objectivo principal era conhecer o perfil epidemiolgico dos doentes alcolicos com
complicaes gastrenterolgicas assim como conhecer o manejo teraputico desse doente
especfico e to complexo. No contexto do trmino do curso e na necessidade da elaborao de
um relatrio, passo a descrever as minhas actividades para este fim: participao e
acompanhamento de doentes com diagnstico clnico de doena heptica alcolica em consultas
externas de Gastrenterologia.
Ao longo deste estgio, fui me apercebendo da dificuldade que existe em acompanhar estes
doentes. Trata-se de um doente complexo que geralmente no aparece apenas com simples
alteraes analticas mas sim por danos sociais provenientes do consumo excessivo do lcool,
muitas das vezes j existe ruptura com o trabalho, com a famlia ou amigos.
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INTRODUO
As bebidas alcolicas tm sido usadas nas sociedades humanas pelo menos desde que h registo
da histria da humanidade. Desde ento, tem havido uma crescente valorizao dos problemas
sociais e de sade, causados pelo consumo excessivo do lcool. A comunidade cientfica acordou
para os problemas provocados pelo lcool nos ltimos 30 anos, quando os avanos substanciais
evidenciaram os problemas do consumo excessivo bem como a importncia do investimento na
preveno e tratamento.
O lcool uma das drogas mais acessveis e com mais consumo abusivo por parte dos
Portugueses, de todas as drogas de abuso, tambm tem a duvidosa distino de oferecer
benefcios de sade quando consumida em moderao.
Um dado interessante olharmos para um rtulo de uma garrafa de vinho e verificarmos que ao
contrrio do que acontece com outras bebidas, no contm a composio. Uma questo em voga
a quantidade de sulfitos no descriminada no rtulo, neste momento os produtores de vinhos
so apenas obrigados a declarar no rtulo se o vinho possui ou no sulfitos. Sulfitos so sais do
cido sulfuroso (ies com carga negativa que so libertados quando o cido sulfuroso se
dissocia). O cido sulfuroso forma-se quando o anidrido sulfuroso se liga com as molculas de
gua (H2SO3). O termo sulfitos inclui os sais formados a partir do sulfuroso livre, do cido
sulfuroso (anidrido sulfuroso hidratado) dos io bissulfito e sulfito e outras formas de sulfitos
mais complexos. O mtodo de anlise quantifica todas as formas de sulfuroso que esto activas
em termos de cheiro, efeito bactericida e fungicida, e que so potencialmente perigosas para
doentes com asma. O dixido de enxofre mais conhecido por anidrido sulfuroso (vulgo
sulfuroso), com a simples frmula de SO2, a forma mais comum de utilizao enolgica do
elemento enxofre. A sua principal funo de antioxidante mas tambm possui funes de
desinfectante porque bactericida e fungicida a que se junta a uma outra funo de solvente de
compostos fenlicos presentes na pelcula (aumenta a extraco), melhorador de aroma e
afinador de cor. Na verdade o SO2 reage lentamente com o oxignio. O que ele faz de essencial
ligar-se ao acetaldedo formado na cadeia de oxidao de determinados fenis (monomricos)
de modo a que no encontremos os aromas e os gostos da oxidao. A oxidao do mosto
sobretudo uma actividade enzimtica e o SO2 inibe tambm a enzimas oxidsicas ou oxidases,
sendo que vinhos feitos a partir de uvas podres necessitam de doses acrescidas de sulfuroso.
Segundo estudos recentes australianos, para proteger o vinho ou mosto contra a oxidao, a dose
mnima de SO2 livre situa-se entre os 10 e os 15mg/litro. Este nmero depende, obviamente, do
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tipo de vinho e respectivo pH. A Organizao Mundial de Sade (OMS) fixou um mximo de
consumo dirio de SO2 equivalente a 0.7mg/litro por quilo de peso. Sendo assim, uma pessoa de
70 quilos ter um limite dirio de 49mg de ingesto de sulfuroso. Meia garrafa de vinho com
150mg/litro pode fornecer 56mg de SO2.
O lcool a droga mais conhecida e aceite socialmente. muito procurada devido crena de
que os seus efeitos so estimulantes. De facto, as bebidas alcolicas podem ter efeitos a nvel
psicolgico e neurolgico induzindo de forma aguda a um estado inicial de desinibio,
loquacidade ou euforia, e tratando-se de um consumo crnico provoca irritabilidade, insnia,
delrios, psicose e demncia alcolica, com repercusso na sociedade, no trabalho e
principalmente na famlia.
Geralmente, a doena heptica ocorre apenas por uso excessivo e prolongado de lcool. O lcool
provoca acumulo de gordura no fgado, seguido de leso, inflamao, fibrose e cirrose alcolica
em quase metade das mortes por doena heptica crnica, e doena heptica alcolica. Acredita-
se que afecta cerca de 1% da populao adulta. No entanto, dos cerca de 7% dos norte-
americanos que abusam do lcool ou lcool-dependentes, apenas uma minoria desenvolve leso
heptica. Demonstrando que se para haver os primeiros sinais de doena heptica de estdios
iniciais necessrio haver o primeiro evento o lcool, para haver progresso para hepatite ou
cirrose necessrio um second-hit. As mulheres geralmente so mais susceptveis a leses no
fgado pelo lcool do que os homens. Abstinncia normalmente conduz a uma melhoria e at
mesmo a resoluo da doena heptica alcolica, mas deve ser instituda precocemente, antes de
se instalar a cirrose avanada.
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FUNDAMENTAO TERICA
1.Metabolismo e toxicidade do lcool
A ingesto de bebidas alcolicas um hbito enraizado na nossa cultura, sendo o lcool a droga
de abuso mais frequente em Portugal, em 2003, o consumo de lcool puro por cada portugus foi
9,8 l.
Para termos uma estimativa da nossa realidade, os ltimos dados indicam para que 60% dos
portugueses bebem regularmente, 10% apresentam problemas ligados ao lcool e que 10 a 15%
dos alcolicos desenvolvem cirrose heptica.
Produo, distribuio e consumo so aspectos que andam intimamente ligados, influenciando-se
reciprocamente. Portugal situa-se entre os pases de maior produo e consumo vincolas.
Em 2003, os lderes em volume de exportao por quota de mercado mundial eram: Frana
(22%), Itlia (20%), Espanha (17%), Austrlia (8%), Chile (6%), EUA (5%), Portugal (4%) e
Alemanha (4%).
Em 2007, as 13 maiores naes produtoras de uvas foram: Itlia, Frana, China, Estados Unidos
da Amrica, Espanha, Argentina, Chile, frica do Sul, Austrlia, Brasil, Alemanha, Portugal e
Grcia. (quadro I)
Quadro I. Produo de Vinho por pas em 2005 e 2007 (toneladas)
Classificao Pas Produo 2005 Produo 2007
1 Itlia 5 056 648 8 519 418
2 Frana 5 329 449 6 500 000
3 China 1 300 000 6 250 000
4 Estados Unidos 2 232 000 6 105 000
5 Espanha 3 934 140 6 013 000
6 Argentina 1 564 000 2 900 000
7 Chile 788 551 2 350 000
8 frica do Sul 1 157 895 1 600 000
9 Austrlia 1 274 000 1 530 439
10 Brasil 320 000 1 341 806
11 Alemanha 1 014 700 1 300 000
12 Portugal 576 500 1 050 000
13 Grcia 437 178 950 000
14 Romnia 575 000 821 306
15 Moldvia 230 000 598 000
16 Hungria 485 000 543 400
17 Ucrnia 240 000 415 000
18 ustria 258 000 329 825
19 Rssia 512 000 328 810
20 Crocia 180 000 180 000
O lcool ingerido tem de ser obrigatoriamente metabolizado, sendo o fgado o rgo incutido
para essa funo. Existem trs sistemas enzimticos: lcool-desidrogenase (ADH) citocromo
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P4502E1 (CYP2E1) e catalase, estando esta presente nas mitocndrias e nos lisossomas. As ADH
so enzimas citoplasmticas que actuam para baixas concentraes de etanol, mas quando a
concentrao superior a 10mM (50 mg/dl), a CYP2E1 entra em actividade, sendo esta tambm
induzida pelo consumo crnico de etanol. Qualquer uma destas enzimas converte o lcool em
acetaldedo que, por sua vez, convertido em acetato, atravs da aldedo-desidrogenase das
mitocndrias hepticas (ALDH2). No entanto, este metabolito altamente reactivo e
potencialmente txico, podendo ser metabolizado por vias alternativas para a sua rpida
metabolizao. Caso este se acumule ir causar leso das membranas e das clulas. O acetato
pode ser oxidado, originando dixido de carbono e gua, ou convertido atravs do ciclo do cido
ctrico, noutros compostos, incluindo cidos gordos. Esta reaco condiciona a reduo do
NAD+ em NADH (NAD reduzido). Este excesso redutor provoca esteatose por inibir a -
oxidao mitocondrial e estimula