relações internacionais

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apostila relações internacionais

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Page 1: Relações Internacionais

DISCIPLINA ON-LINE

RELAÇÕES INTERNACIONAIS

AULAS DE 1 A 10

CURSOADMINISTRAÇÃO

DIRETORIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

Page 2: Relações Internacionais

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FORMATAÇÃO teste1

Edição, Produção Editorial e Projeto Gráfico

Diretoria de Educação a Distância

É proibida a duplicação ou reprodução deste material, ou parte do mesmo, sob qualquer meio, sem autorização

expressa da Universidade Estácio de Sá.

Índice Dicas para seu Estudo On-line 04

Introdução 05

Estrutura e Funcionamento das Disciplinas On-line 07

Unidade 1 – Os Sistemas, os Atores e o Meio Internacional 08

Aula 1: O sistema internacional contemporâneo 08

Aula 2: Atores do sistema internacional 14

Aula 3: Ação e interação dos atores no sistema internacional 19

Unidade 2 – Paradigmas de relações internacionais 25

Aula 4: Liberalismo, realismo e idealismo 25

Aula 5: Interdependência e globalização 31

Unidade 3 – Estimativas de Custo 35

Aula 6: O comércio internacional e a OMC 35

Aula 7: A formação de blocos regionais 40

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Unidade 4 – Temas da agenda política contemporânea 47

Aula 8: Desenvolvimento sustentável e acesso a tecnologias sensíveis 48

Aula 9: Segurança internacional e suas conseqüências econômicas 55

Aula 10: Direitos humanos e o problema das migrações 64

Considerações Finais 70

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ATENÇÃO

Esta apostila é uma reprodução do material constante no ambiente virtual de aprendizagem de sua disciplina on-line. Por isso, ela serve para fornecer o mesmo conteúdo do ambiente virtual de forma a permitir que você possa estudar as aulas ainda que não possua acesso on-line ao ambiente. Entretanto, isso não quer dizer que você não precisará acessar a sua disciplina on-line no ambiente, mesmo que estude pela apostila, pois diversas outras informações importantes estão lá, como: a) exercícios de autocorreção; b) trabalhos a serem feitos; c) biblioteca virtual – onde estão os textos para leitura e uma programação (estudo dirigido) com data sobre os inícios de cada aula, eventos e participações etc. No ambiente virtual, ainda, você conta com o professor on-line. Através do fórum, e também pela central de mensagem, você pode se comunicar com o professor de sua turma.

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DICAS PARA O SEU ESTUDO ON-LINE: Presença A sua presença é contabilizada pela realização das atividades de autocorreção e não pelo número de horas acessadas. Assim, sua participação é verificada de forma qualitativa e não quantitativa. Fórum Participe do fórum! Nele você vai debater e trocar informações e conhecimento com seus colegas e professor sobre assuntos das aulas. Além disso, é lá que o professor fará revisões para as AVs e dará dicas de estudo! Agendamento de Prova O agendamento da avaliação é feito no Campus Virtual. Assim que a ferramenta estiver disponível, todos os alunos serão avisados. Portanto, não deixe para a última hora! Você pode agendar sua prova até três dias antes do início das avaliações das disciplinas on-line. Professor On-line Tem alguma dúvida? Não entendeu aquele conceito complicado? Envie um e-mail pela Central de Mensagens para o seu professor. Ele estará presente para lhe responder e esclarecer sua questão. Agenda Sua disciplina on-line possui uma agenda com a programação de todas as atividades mês a mês. Você pode não saber o que fazer hoje, mas sua agenda sabe! Consulte-a Biblioteca Não confunda Biblioteca Virtual com a Biblioteca da Disciplina On-line! Enquanto a primeira fica no Campus Virtual e é utilizada por algumas disciplinas presenciais, a segunda é exclusiva de sua disciplina on-line. Na Biblioteca da Disciplina On-line você irá encontrar vários textos complementares, arquivos em mp3 e também a apostila da disciplina. Trabalhos Consulte sempre a ferramenta Trabalhos a Concluir. Nela você deverá enviar anexados seus exercícios e deixar seus comentários no campo Observações. Os trabalhos são muito importantes para a fixação do seu aprendizado e são complementares à sua avaliação. Atendimento Para mais informações e esclarecimento, entre em contato com nossa Central de Atendimento pelo tel.: (21) 3231-0000 ou pelo nosso Fale Conosco, disponível em http://www.estacio.br/fale.asp.

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Curso: Administração Disciplina: Relações Internacionais INTRODUÇÃO Olá! Bem-vindo(a) à disciplina Relações Internacionais! As relações internacionais têm despertado interesse cada vez maior no público em

geral. Domínio exclusivo de diplomatas e acadêmicos até há bem pouco tempo, a disciplina tornou-se indispensável para qualquer curso de graduação. Atualmente, o fenômeno da globalização e as grandes transformações decorrentes do mesmo no

sistema internacional demandam mais atenção e informação. A disciplina de relações internacionais fornece ao aluno ferramentas conceituais que o capacitam a analisar e

melhor compreender fatos decorrentes da interação de atores do sistema internacional.

O espaço reservado a questões internacionais cresceu não apenas nos meios de comunicação, mas também no meio empresarial. Conflitos armados, conferências sobre

meio ambiente, encontros de chefes de estado e de governo, desintegração de estados, integração regional, são todos eventos que interferem, direta ou indiretamente, na vida dos agentes sociais, políticos e econômicos. Positivos ou negativos, tais eventos têm

reflexos sobre a política, a economia, a cultura, os valores e as estratégias. Mais do que nunca as empresas são afetadas por interações entre fatores domésticos e

internacionais. O fenômeno da globalização tornou imprescindível uma estratégia empresarial consciente dos problemas mundiais.

Qualquer área de conhecimento hoje requer uma visão internacionalista. Um curso de administração, em particular, não tem como evitar a interdisciplinaridade com a

área de relações internacionais. Seja pela crescente pressão por internacionalização das empresas, seja pela necessidade de atualização e de inserção de seus alunos num

mercado onde este conhecimento tornou-se um diferencial desejável. Ter fluência sobre assuntos internacionais é fundamental para compreender e atuar nas relações que

ultrapassam as fronteiras do país. Cada vez mais, a eficiência de um administrador está relacionada à percepção dos efeitos que fatos mundiais exercem sobre sua atividade.

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Fique atento aos livros que servirão de base para o conteúdo das aulas, bem como para sua consulta:

Bibliografia da disciplina

CARR, E. H. Vinte anos de Crise, 1919-1939. (Coleção CLÁSSICOS IPRI) Brasília: Editora Universidade de Brasília, Instituto de Pesquisa em Relações Internacionais, 2001.

HERZ, Mônica e HOFFMAN, Andréa Ribeiro. Organizações Internacionais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria dos Advogados, 1997.

Bibliografia Complementar

RODRIGUES, Simone. Segurança Internacional e Direitos Humanos: a prática da intervenção humanitária no pós-Guerra Fria. 1ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2000.

TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direito das Organizações Internacionais. 3 ed. rev. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

Sítios institucionais oficiais.

A disciplina está estruturada em quatro unidades e dez aulas: Unidade 1: O SISTEMA, OS ATORES E O MEIO INTERNACIONAL

Aula 1: O sistema internacional contemporâneo

Aula 2: Atores do sistema internacional – o Estado e as organizações governamentais internacionais.

Aula 3: Atores transnacionais: organizações não-governamentais internacionais; Corporações multinacionais; Grupos diversos da sociedade civil organizada e a opinião pública internacional.

Unidade 2: PARADIGMAS DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

Aula 4: Liberalismo, realismo e idealismo

Aula 5: Interdependência e globalização

Unidade 3: INTERNACIONALIZAÇÃO E REGIONALIZAÇÃO

Aula 6: O comércio internacional e a OMC

Aula 7: A formação de blocos regionais

Unidade 4: TEMAS DA AGENDA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA

Aula 8: Desenvolvimento sustentável e acesso a tecnologias sensíveis

Aula 9: Segurança internacional e suas conseqüências econômicas

Aula 10: Direitos humanos e o problema das migrações

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ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO

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Unidade 1

OS SISTEMAS, OS ATORES E O MEIO INTERNACIONAL Você já se perguntou como Estados, Organizações Internacionais e Empresas Multinacionais se relacionam no que chamamos de sistema internacional? Afinal, do que tratam as Relações Internacionais? Relações apenas entre Estados? Essa primeira unidade vai apresentar a você o sistema internacional e explicar como ele se compõe e caracteriza. A partir daí, será possível entender as relações que nele se desenvolvem e compreender o papel que cada ator desempenha.

Aula 1 O Sistema Internacional Contemporâneo

DEFINIÇÕES

O sistema internacional é o local, o espaço geográfico onde ocorrem as relações

internacionais produzidas pela ação dos atores internacionais.

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Chamamos de “papel” a função que cada ator internacional exerce no cenário

internacional. É bem verdade que a importância atribuída à função de cada ator depende da opção teórica do analista, como será visto na aula 4. Os atores e suas funções serão objetos, respectivamente, das aulas 2 e 3. Por hora, nos concentraremos no sistema

internacional e suas características.

O sistema internacional é também o conjunto de relações entre os atores que compartem um espaço comum e se submetem a algum grau de regulação, gerando

fenômenos internacionais nos campos da política, economia, cultura, meio ambiente etc.

Este talvez seja um dos poucos pontos pacíficos das relações internacionais – a anarquia na origem do SI. Apesar das divergências existentes entre os diferentes paradigmas das relações internacionais (aula 4), a ausência de um governo ou de leis

que regulem o SI na sua origem – anarquia - é aceita por todos como uma característica do SI. É bem verdade que esses mesmos paradigmas vão discordar quanto à forma de

ordem possível no SI, como será visto na aula 4. Por enquanto, basta que se registre que a ordem no SI é definida de acordo com a natureza da interação que se estabelece entre os atores.

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O sistema internacional possui estrutura, dinâmica e características muito

particulares. No que se refere a sua estrutura, o SI pode ser definido como global, isto é, as relações internacionais ocorrem em todo o planeta e não apenas na Europa ou nas Américas. As incursões, que ao longo da história mundial permitiram o contato entre os

diferentes povos e a exploração de áreas inóspitas do globo, permitiram a compreensão do mundo como um todo. Sem essa compreensão do todo não se poderia falar em

sistema internacional. Por quê?

A formação do SI, portanto, está intimamente ligada às expansões marítimas européias entre os séculos XV e XVII e ao processo de centralização do poder e

surgimento do Estado-Nação. Portugal, Espanha e, por que não, os Países Baixos estabeleceram fluxos comerciais e de exploração com as Américas e áreas da África e da Ásia.

As grandes navegações contribuíram para tornar

globais os intercâmbios e fluxos entre diferentes regiões do mundo. Este processo histórico ocorre simultaneamente ao

surgimento de um dos principais atores do SI – o Estado. Somente os reinos que lograram centralizar o poder e se organizar como um Estado puderam se lançar na aventura

do caminho para as Índias. É justamente da interação desses estados e o reconhecimento externo de suas

fronteiras e do direito de se auto-regularem (soberania) que surgem as bases do Sistema Internacional Contemporâneo.

Outra característica do SI é a sua heterogeneidade, seja pela diversidade de

atores (estados, organizações internacionais, organizações não-governamentais, corporações multinacionais), seja pelas diferenças entre atores do mesmo grupo. Por exemplo, é notório que estados têm territórios, populações, recursos naturais e

tecnológicos, economias, além de interesses completamente diferentes. O mesmo se pode perceber quando se comparam diferentes organizações e corporações

multinacionais.

Quanto à organização, se no sistema internacional a ordem não é estabelecida por meio de leis ou de um governo como já foi dito, ela surge da interação entre as forças existentes no sistema. Assim, podemos identificar três tipos de ordem definidos de

acordo com a hierarquia de tais forças: a unipolar, a bipolar e a multipolar.

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Uma ordem unipolar é caracterizada pela emergência de um poder que exerce

influência (hegemonia) ou comanda os demais (império). A hegemonia britânica, durante parte do século XIX, é um exemplo de ordem unipolar.

A ordem bipolar, por sua vez, caracteriza-se pela existência de dois pólos distintos, como foi o caso da União Soviética – URSS e dos Estados Unidos durante a Guerra Fria (1947 a 1989). Era a clara divisão do mundo entre duas esferas de influência: a dos países capitalistas e a dos países socialistas.

Já a ordem multipolar apresenta a pulverização de poderes entre diferentes membros do sistema, assim como no Concerto Europeu, como ficaram conhecidas as alianças entre a França, a Grã-Bretanha e a Rússia de um lado e a Prússia, os impérios austro-húngaro e turco-otomano de outro. O SI contemporâneo é o resultado de um processo histórico em que a criação do

Estado tem grande relevância. Como lembra Gonçalves (2002, p.16) ao citar Poggi: “A criação dos estados confunde-se com a criação do sistema de estados.”

Esse SI foi estruturado a partir dos tratados de Westphalia (1648) e desenvolvido ao longo dos três últimos séculos, sendo decisivo para a consolidação dos estados nacionais e do poder destes sobre a sociedade. Até hoje esse sistema vem sendo tomado como modelo tradicional de ordem internacional e estamos acostumados a enxergá-lo como o único possível. Ele estabelece uma rígida distinção entre assuntos domésticos - questão exclusiva de soberania nacional - e assuntos internacionais - regulados por um direito que só reconhece os estados como sujeitos. Dentro desse sistema interestatal anárquico, baseado no equilíbrio de força entre estados autônomos, a soberania é o princípio que asseguraria a todos os estados o mesmo status no plano internacional, ainda que apenas formalmente. Todavia, o processo de globalização crescente, acelerado com o fim da Guerra Fria1, demanda uma proteção que o Estado-Nação sozinho não pode mais fornecer.

1 Durante a Guerra Fria, ainda que não tenha havido guerra frontal e direta (por isso era chamada de fria), a

ordem internacional era marcada por conflitos bélicos entre os satélites das duas superpotências ou entre estas e os satélites do lado oposto (Guerra do Vietnã, 1965; Invasão do Afeganistão; Guerra Angola-África do Sul). Esse período, portanto, tem como principal tema o conflito ideológico entre o bloco capitalista e o socialista.

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Informação, comunicação eletrônica, terrorismo, poluição, doenças, crimes, drogas, aquecimento global e o perigo de armas nucleares, entre outros, não respeitam territórios nem fronteiras. Na economia, é cada vez maior a presença de corporações e instituições financeiras internacionais nos assuntos domésticos, em nome da sobrevivência financeira dos estados, sem que a defesa da soberania constitua qualquer obstáculo. O fluxo de turistas circulando pelo mundo passou de 70 milhões para 500 milhões em pouco mais de trinta anos. A diversidade de culturas, etnias e valores dentro de um mesmo Estado afeta o critério da territorialidade como fator primordial de integração social. O buraco na camada de ozônio ameaça a todos, ricos e pobres. Trilhões de dólares circulam diariamente pelo mundo, entrando e saindo de países, e provocando, na retirada, arrasadoras crises cambiais e políticas, como a que ocorreu recentemente no Brasil. Neste sentido, a universalidade dos desafios que enfrentamos, neste fim de século, aponta para a necessidade de uma regulação global de problemas que são

verdadeiramente mundiais, recorrendo-se a um direito da humanidade que está consubstanciado, em grande medida, na doutrina internacional dos direitos humanos.

Com efeito, a densidade e intensidade das interconexões globais estimulam redes mais complexas de relações entre estados, instituições internacionais e organizações da

sociedade civil.

O Estado-nação se enfraquece com o processo de globalização, seu peso relativo diminui e seu papel se transforma, ao mesmo tempo que assistimos a um fortalecimento da sociedade civil global e da chamada cidadania planetária, dentro de uma ordem de

fato mundial e não somente interestatal.

Atualmente, há controvérsias quanto à melhor caracterização do SI contemporâneo. Desde o desmembramento da URSS, em 1991, tinha-se a impressão de

que, sem concorrência, os Estados Unidos exerceriam facilmente sua hegemonia, construindo uma ordem unipolar. No entanto, apesar da supremacia bélica norte-americana, é possível observar uma crescente oposição política e econômica no SI. De

um lado, a hegemonia norte-americana é contestada, de outro, não é ainda possível identificar um pólo que ofereça concorrência. O SI estaria então mais próximo de uma

ordem multipolar? Especulações à parte, pode-se afirmar com segurança que o SI está em uma fase de transição de uma ordem hegemônica.

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No novo sistema internacional, outros fenômenos passam a merecer atenção, tais

como a batalha comercial entre os países, a questão do terrorismo e das migrações internacionais, o problema do meio ambiente etc., e também outros atores passam a ter relevância. Na próxima aula, analisaremos os atores do SI, suas características e

funções.

Para aprofundar seus conhecimentos, leia o Capítulo 2, tópico 2.1 do livro de Cristina Pecequilo, indicado na bibliografia da disciplina.

Pesquisa na internet sobre as razões históricas que levaram Paz de Westphalia! Nesta aula, você tratou da natureza do sistema internacional.

Na próxima aula (Aula 2), veremos uma abordagem dos atores das relações

internacionais, ou seja, os sujeitos das relações desenvolvidas no âmbito internacional. Quem tem legitimidade no cenário internacional? Como estes agentes influenciam o

sistema e uns aos outros?

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Aula 2 Atores do sistema internacional – o Estado e as organizações governamentais internacionais.

INTRODUÇÃO Nesta aula, vamos diferenciar os atores que atuam no cenário internacional. A

alusão a atores internacionais é em geral associada à figura do Estado, quer na visão clássica do realismo, quer para o senso comum. As relações internacionais parecem exprimir apenas as relações entre estados. Para pluralistas, porém, essa visão de ator

internacional é bastante restrita. A idéia de relações internacionais protagonizadas exclusivamente por estados está de acordo com a realidade do século XIX, mas não com

a realidade da segunda metade do século XX e menos ainda com a realidade do século XXI.

O processo de globalização, como vimos na aula anterior, tornou evidente a

atuação de atores não-estatais que hoje desempenham papel importante no cenário internacional. Assim, pode-se inicialmente identificar dois tipos de atores: os atores estatais e os não–estatais. Os atores estatais resumem-se nos estados, enquanto os

não-estatais ainda se subdividem em dois grupos distintos: as Organizações Internacionais Governamentais (ou Intergovernamentais) e as Forças Transnacionais.

OS ATORES: ESTADOS, ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS GOVERNAMENTAIS E

FORÇAS TRANSNACIONAIS

Os estados estiveram praticamente sozinhos nas relações

internacionais como atores internacionais até o século XX e ainda constituem a peça em torno da qual se organiza a

política internacional, mas vem gradualmente enfrentando a concorrência de outros atores não-estatais.

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As Organizações Internacionais Governamentais (OIGs)

aparecem ainda na primeira metade do século XX, multiplicando-se no pós-II Guerra Mundial. Pertencem a esta categoria organizações como a Organização das Nações

Unidas (ONU), a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Fundo

Monetário Internacional (FMI), a Organização dos Estados Americanos (OEA), a Organização do Tratado do Atlântico

Norte (OTAN) etc. Todas com o objetivo de organizar e regulamentar alguma área do SI.

As Forças Transnacionais (FTs), por sua vez, representam fluxos de natureza variada que ultrapassam as fronteiras dos

estados e que envolvem movimentos de origem privada. São forças relativas à sociedade civil e não-ligadas ao setor

público, podendo afetar os estados tanto de maneira positiva quanto negativa. São FTs as Organizações Não-Governamentais Internacionais (ONGIs), as Corporações

Multinacionais ou Transnacionais, os grupos diversos da sociedade civil e a opinião pública internacional.

O ESTADO

Apesar da atividade de outros atores no cenário internacional, a política

internacional continua sendo definida a partir dos atores centrais – os estados.

Essa entidade política surge entre os séculos XV e XVI, segundo a dinâmica de movimentos de fragmentação do poder universalista e centralizado do Papa, e de

descentralização do poder dos príncipes contra o poder político e militar de chefes políticos rivais. Desse processo, lembra Gonçalves (2002, p.15), resultaram as características fundamentais do Estado moderno: exército e burocracia permanentes,

padronização tributária, direito codificado e mercado unificado.

Para as relações internacionais, o marco do processo de ascensão e afirmação do Estado é a Paz de Westphalia, em 1648, no encerramento da Guerra dos Trinta Anos.

Neste tratado, vários estados europeus asseguraram a manutenção da nova ordem européia, com a soberania e a igualdade orientando suas relações.

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O sistema de estados westphalianos é um modelo e não uma verdade histórica, pois a igualdade dos estados corresponde, na verdade, a uma abstração jurídica. Não há

no mundo um Estado igual a outro - as diferenças estão na extensão territorial, na densidade demográfica, na disponibilidade de recursos naturais, no nível de

desenvolvimento econômico e social, nas realizações culturais, no nível de desenvolvimento tecnológico e nos recursos militares. Obviamente, a maior ou menor

capacidade de projeção internacional e de influência sobre os demais atores é uma função dessas diferenças. É inegável que no SI a soberania dos estados mais fracos é sistematicamente desrespeitada pelos mais fortes, que aspiram obter alguma vantagem

por esse meio.

Ainda assim, acredita-se que a igualdade jurídica seja a melhor garantia de respeito à diversidade das realidades nacionais e concretas.

Mas qual é, afinal, a natureza jurídica do Estado? A definição de estado de direito internacional foi formulada na Convenção de Montevidéu (1933), quando se convencionou que todo Estado deve possuir: população permanente, território definido,

governo e capacidade de honrar os compromissos contraídos com outros estados. Essas características do Estado podem ser sintetizadas no conceito de soberania.

O território é o espaço geográfico de cada Estado, delimitado por fronteiras reconhecidas por outros estados e dentro do qual esta unidade política possui soberania

e autonomia política.

A população envolve mais do que apenas o número de habitantes de um Estado, corresponde a uma identidade comum, de onde surge a unidade política, cultural, nacional e lingüística. Estados multiétnicos, cuja população não desenvolve um processo

de integração, acabam tendo conflitos internos separatistas ou de minorias sequiosas de mais autonomia. O caso da ex-Iugoslávia é clássico.

O governo representa a centralização da autoridade e a organização do comando

político por meio de uma administração pública. Ele detém o monopólio da força legítima, controlando os fluxos internos de sua sociedade. Cada Estado possui um regime, forma e sistema de governo que escolheu. Em geral, identificam-se duas formas de governo: a

República e a Monarquia. Quanto à estrutura interna, identificam-se três poderes

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separados e independentes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário (responsáveis pelo

comando do governo, a legislação e a justiça, respectivamente).

ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS GOVERNAMENTAIS (OIGS)

Organizações Internacionais Governamentais ou Intergovernamentais são

grupamentos políticos que têm os estados como seus membros fundadores. Elas ganham destaque e escala na segunda metade do século XX como organizações representativas dos interesses conjuntos dos estados. A questão da segurança coletiva é, em grande

parte, responsável pelo surgimento dessas organizações. Principalmente, depois da Primeira Guerra Mundial (1914/1918) e da Segunda Guerra Mundial (1939/1945),

percebe-se a necessidade de se estabelecer formas alternativas de relacionamento entre os estados que minimizassem a instabilidade global e as disputas diretas.

As OIGs surgem para encontrar soluções para questões internacionais não-resolvidas pela diplomacia tradicional. Tratam-se de fóruns permanentes de debate destas questões e mediação das negociações. A criação das OIGs é uma decisão dos estados, que delimitam sua área de

atuação inicial. As grandes potências têm um papel crucial nesse processo.

Assim, as OIGs são atores importantes por onde as idéias circulam e se legitimam, além de desenvolverem mecanismos de cooperação entre estados e outros

atores. Além de contribuir para a gestação de normas e regras, as OIGs fornecem mecanismos para garantir a aquiescência a essas normas e regras. Em outras palavras, as OIGs podem legitimar normas e regras ao fazer a maior parte dos atores do SI

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acreditarem que elas devem ser respeitadas, gerando um sentimento de obrigação

moral.

As OIGs podem ser classificadas segundo critérios diferentes. Algumas organizações são regionais como a OEA (Organização dos Estados Americanos) ou a SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral), enquanto outras são

globais como a OMC (Organização Mundial de Comércio) ou a OMS (Organização Mundial de Saúde).

Pode-se usar também um critério funcional para classificar as OIGs: organizações

que desempenham muitas funções e não são definidas a partir das mesmas; ou organizações especializadas como a UNICEF (fundo da ONU para as crianças) ou a OIT

(Organização Internacional do Trabalho).

Leia o capítulo 2, tópico 2.2 do livro Introdução às relações internacionais: temas, atores e visões, indicado na bibliografia da disciplina.

Pesquise detalhadamente na internet sobre pelo menos uma das Organizações Intergovernamentais do Sistema Internacional! Nesta aula, você definiu quem são os sujeitos das relações desenvolvidas no

âmbito internacional e como estes agentes influenciam o sistema e uns aos outros.

Agora que já sabemos o papel dos Estados e das Organizações Intergovernamentais, vamos estudar as Organizações Não-Governamentais – ONGs, as

Corporações Multinacionais e os diversos grupos da sociedade civil organizada. Esses atores vêm crescendo em importância no sistema internacional, principalmente no Pós-Guerra Fria.

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Aula 3 Atores transnacionais: organizações não-governamentais internacionais; Corporações multinacionais; Grupos diversos da sociedade civil organizada e a opinião pública internacional.

INTRODUÇÃO

Se você se interessou pela dinâmica do relacionamento entre os estados no Sistema Internacional e dentro das Organizações Intergovernamentais, é hora de investigarmos os atores transnacionais. Para isso, vamos analisar e conceituar as

Organizações Não- Governamentais, assim como as corporações multinacionais e os grupos da sociedade civil organizada. Preste atenção na distinção estabelecida na

caracterização dos mesmos e principalmente na função que desempenham no sistema.

Dando continuidade ao estudo dos atores das relações internacionais, esta aula concentra-se nas Forças Transnacionais (FTs), isto é, forças relativas à sociedade civil e não-ligadas ao setor público, podendo afetar os Estados tanto de maneira positiva quanto

negativa. São FTs as Organizações Não-Governamentais Internacionais (ONGIs), as Corporações Multinacionais ou Transnacionais, os grupos diversos da sociedade civil e a

opinião pública internacional.

ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS INTERNACIONAIS (ONGIS)

Há divergências quanto a origem das ONGIs no cenário internacional.

No século XIX, existia a Anti-Slavery Society, fundada na Grã-Bretanha, em 1823, e atuante no combate a todas as formas de exploração de tipo escravista - talvez a ONGI

mais antiga do mundo. Porém, foi certamente a internacionalização de temas contemporâneos, na década de 90, a responsável pela explosão da criação das ONGIs. Hoje, o Banco Mundial estima que existam em torno de 13 mil ONGs internacionais.

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A partir de meados do século XX, o reconhecimento da importância da atuação

das ONGIs pela ONU, especificamente no artigo 71 da Carta de São Francisco2, no capítulo referente à competência do Conselho Econômico e Social, confere legitimidade a essas organizações e as fortalece no cenário internacional.

As relações entre as ONGIs e as OIGs são cada vez mais densas. As grandes

conferências internacionais3, organizadas desde os anos 70, principalmente a partir dos anos 90, são espaços de interação entre esses dois tipos de organizações. Estas

conferências são exemplos de momentos de forte presença das ONGIs no cenário internacional, lado a lado com representantes legais de Estados.

As ONGIs são instituições privadas (por isso não-governamentais) e voluntárias,

com membros individuais ou coletivos de vários países. Sua atuação se estende além do poder de alcance da influência governamental e do direito internacional. Atuam dentro e fora dos Estados e lidam com questões cujas demandas não têm sido adequadamente

atendidas pelo Estado, ou para chamar a atenção para uma causa. Algumas se voltam para casos como direitos humanos, paz, a proteção ambiental, saúde, educação,

violência urbana, questões fundiárias, direitos da mulher, da criança, dos presos políticos, de minorias étnicas, das prostitutas, dos homossexuais ou de refugiados políticos. As ONGIs são formadas também para prover serviços específicos, como a ajuda

humanitária e a assistência ao desenvolvimento. Em alguns casos, são redes ou federações de organizações com base nacional como, por exemplo, a Federação das

Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho ou os Médicos Sem Fronteiras.

Outros exemplos de ONGIs conhecidas internacionalmente são o Greenpeace, dedicado às questões ambientais e com afiliados no mundo inteiro, e a Anistia

Internacional e o Human Rights Watch, no campo dos Direitos Humanos.

2 Artigo 71 - O Conselho Econômico e Social poderá entrar em entendimentos convenientes para a consulta com organizações não- governamentais, que se ocupem de assuntos no âmbito da sua própria competência. Tais entendimentos poderão ser feitos com organizações internacionais e, quando for o caso, com organizações nacionais, depois de efetuadas consultas com o membro das Nações Unidas interessado no caso.

3 Algumas conferências importantes - Conferência sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio de Janeiro, 1992); Conferência de Viena sobre Direitos Humanos (Viena, 1993); Conferência sobre os Direitos da Mulher (Pequim, 1995); Conferência sobre Desenvolvimento Social (Copenhague,1995); Conferência Mundial sobre Alimentação (Roma, 1997); e III Conferência Mundial da ONU contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata (Durban,2001).

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É imprescindível que a ONGI seja privada para não comprometer a sua

mensagem. O que seria da Cruz Vermelha se esta não fosse sabidamente neutra, imparcial? Qual seria a credibilidade das denúncias de abuso aos direitos humanos da Human Rights Watch se esta estivesse ligada a algum governo?

Além disso, estas organizações não podem visar lucro, do contrário se

transformariam em empresas multinacionais.

Por último, é necessário que a ONGI tenha uma causa duradoura pela qual atuará e não apenas um evento.

CLASSIFICAÇÃO

O Conselho Econômico e Social da ONU discrimina as ONGs em três grandes

grupos: um pequeno grupo de organizações de alto-nível, mais direcionadas para o trabalho do próprio Conselho; um grupo de ONGs especializadas, envolvidas em atividades nos mais variados campos e gozando de uma elevada reputação; e um grupo

de ONGs capacitadas para, a qualquer momento, prestar sua contribuição aos trabalhos do Conselho.

Os entusiastas que defendem a idéia de que as ONGIs são importantes atores das

relações internacionais consideram que o seu surgimento compensa a debilidade dos Estados, em relação a determinados problemas que não dizem respeito diretamente ao poder público, nem tampouco podem ser considerados no âmbito da economia e dos

interesses do lucro. A ação das ONGIs, sob este prisma, expressaria a uma ainda mal definida e não-organizada “sociedade civil internacional".

Os mais céticos sustentam que as ONGIs não têm condições de competir com os

Estados e as OIGs.

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CORPORAÇÕES MULTINACIONAIS E TRANSNACIONAIS

As empresas multinacionais e transnacionais têm origem4 em um determinado

Estado do SI, mas sua atuação ultrapassa as fronteiras do mesmo, estabelecendo-se em vários Estados e sendo guiadas pela lógica da maximização de lucros.

A natureza jurídica de multinacional surge quando as colônias se tornam independentes. A mudança de estatuto jurídico-político de colônia para Estado,

independente das áreas que tinham seus interesses implantados, foi o primeiro e mais importante passo para a transformação dessas empresas nacionais em multinacionais.

A partir daí são as leis do sistema econômico-liberal que definem a

internacionalização das empresas: a unificação crescente do mercado cujos elementos são todos independentes e a tendência à concentração das empresas.

Pode-se dizer, com alguma segurança, que as multinacionais aparecem nos anos

1960 e, a partir dos 1970, passam a ter grande influência no cenário internacional. As multinacionais, principalmente dos países centrais, passam a contar com capacidade econômico-financeira que supera várias economias nacionais. Sua força política é

exercida tanto dentro dos países onde estão suas sedes, como naqueles onde estabelecem suas unidades de produção.

4 A origem dessas empresas é européia e data do período pós-Segunda Guerra Mundial. As empresas pioneiras

foram organizadas em pequenos estados como a Holanda (Philips, Unilever) e a Suíça (Nestlé). O surgimento

das multinacionais está diretamente relacionado aos impérios coloniais, já que é o monopólio sobre as áreas

coloniais que permitiu às empresas européias se internacionalizarem. O poder soberano das metrópoles, além

de protegê-las da concorrência estrangeira na exploração de fatores de produção de baixo preço, permitia

ainda consolidar sua estrutura empresarial como também fortalecer elos com seus respectivos aparelhos

estatais.

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A atuação das empresas multinacionais pode ser interpretada como positiva ou negativa, dependendo quem avalia. Os que defendem as multinacionais consideram que estas atuam como qualquer outra empresa nacional, buscando sempre a maximização de seus lucros. Para tanto,

seus dirigentes procuram influir positivamente no processo legislativo, tentando remover obstáculos nas áreas tributária e trabalhista, pressionando para obter subsídios

governamentais e exigindo repressão dos movimentos grevistas dos trabalhadores, para assegurar condições políticas ótimas e, assim, mais facilmente alcançar seus objetivos

econômicos.

Os que têm posição contrária sustentam que o poder econômico das multinacionais é de tal ordem que, em muitos casos, prevalecem os seus interesses sobre os países em que se encontram instaladas. A evasão de divisas que essas

empresas provocam, sob a forma de remessa de lucros para a sede, é, muitas vezes, superior aos benefícios econômicos que geram para o país- hospedeiro. Além disso, sua

força política é de tal ordem que, naqueles países mais débeis, onde há dependência maior dos frutos econômicos das multinacionais (impostos e empregos), estas acabam por moldar a legislação aos seus objetivos privados. Mais ainda: quando encontram

algum tipo de resistência à sua consecução, atuam de maneira subversiva, geralmente com total apoio e recursos do país de origem, para alterar o quadro político e, enfim,

fazer prevalecer seus interesses. Assim agiram, por exemplo, empresas norte-americanas, como a International Telephone and Telegraph (ITT) no Chile, para a

derrubada do governo de inspiração marxista de Salvador Allende, em 1973.

Os investimentos diretos feitos por essas empresas representam, em geral, importante fonte de recursos para países em desenvolvimento. Principalmente porque são investimentos na produção que geram externalidades positivas para a economia do

país- hospedeiro, isto é, cria empregos, ativa a economia regional e nacional, receita fiscal, aporte de tecnologia, formação de divisas etc. Trata-se de investimentos que têm

longa maturação e por isso não oferecem os perigos de desestabilização que o capital especulativo representa.

Em geral a empresa multinacional tomará a decisão de se fixar num Estado de acordo com as condições de ação que este ofereça: existência de mão-de-obra barata,

mas relativamente qualificada; recursos naturais; infra-estrutura para sua instalação; incentivos financeiros e fiscais e a existência de um mercado interno significativo.

De acordo com sua estratégia, podemos distinguir as empresas entre

multinacionais e transnacionais.

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A relação dessas empresas com os Estados, portanto, é de dependência e

autonomia. Ao longo dos anos, entretanto, elas têm aumentado seu poder de influência nos processos decisórios por meio de lobbies, visando maior independência.

GRUPOS DIVERSOS E OPINIÃO PÚBLICA INTERNACIONAL

Os grupos diversos englobam desde atividades de grupos religiosos, como a Igreja Católica (talvez um dos primeiros atores transnacionais do SI), até a de sindicatos e partidos políticos (em negociações e grupos de trabalhos sobre corporações multinacionais, integração regional etc.), chegando à ação de grupos terroristas, máfias e o crime organizado. Assim como os outros atores mencionados, ainda que menores do que a de Estados e OIGs, estes grupos têm capacidade de influenciar, podendo levar a crises ou a soluções.

Já a opinião pública internacional é ainda uma força incerta e dispersa no SI. Sua influência certamente cresceu nos últimos anos, devido ao avanço da tecnologia da informação que, somado à maior velocidade das trocas e dos transportes, também levou a uma intensificação da comunicação entre as sociedades de vários Estados. A opinião pública, no entanto, só tem força quando as eleições nacionais se aproximam e ela pode expressar objetivamente sua aprovação ou desaprovação.

O Vaticano é a sede da Igreja Católica e é o menor Estado independente do mundo.

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Você já entende a dinâmica do sistema e já tem conhecimento do comportamento

dos atores das relações internacionais. Vamos agora buscar instrumentos que nos permitam analisar essas relações, ou seja, teorias que nos ajudem a compreender o porquê das ações e decisões dos atores. Deixemos o “achismo” comum das mesas de bar

e passemos à análise madura e fundamentada nas teorias das relações internacionais.

Unidade 2

PARADIGMAS DAS RELAÇÕES INTERNACIONAL Hoje, se a Bolsa de kuala Lumpur (Malásia) despencar, há uma grande probabilidade do mercado financeiro brasileiro, assim como o da maioria dos países emergentes e de alguns centrais serem afetados, como aconteceu na Crise Asiática de 1997. A palavra globalização deixou de ser uma teoria há muito. Esta é a nossa realidade e por isso precisamos compreendê-la. Para tanto vamos estudar a interdependência no sistema internacional (aula 5) e teorias das Relações Internacionais que nos ajudarão a melhor compreender esses fenômenos, tais como o Liberalismo e o Realismo (aula 4).

Aula 4 Liberalismo e Realismo

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INTRODUÇÃO

Nesta aula, você será apresentado às teorias de Relações Internacionais (RI).

Apesar das divergências entre o que se deve estudar (objeto) e como deve ser estudado (metodologia), as RI, de forma geral, orientam-se em dois eixos básicos: a cooperação e o conflito. Em termos teóricos, estes eixos se dividem em correntes básicas5: o Realismo

e o Liberalismo, que desde 1930 vêm desenvolvendo os “grandes debates”. Essa condição de corrente teórica das RI diz respeito a uma dimensão analítica, mas também

normativa, que pretende mostrar como é a realidade, mas também pretende mostrar como ela deve ser. Por isso, costuma-se chamar de paradigma essa visão, interpretação

ou perspectiva dos fenômenos internacionais, amparada em algum método e com o objetivo de explicar e dar sentido para os fatos que estão se desenrolando no cenário internacional.

Cada uma dessas correntes teóricas adotou pressupostos próprios para explicar as

Relações Internacionais, refletindo diferentes variáveis políticas, diplomáticas, sociais, culturais e econômicas de seus atores, fenômenos e acontecimentos. Estudiosos

costumam sistematizar e separá-las de acordo com as correntes de pensamento ou concepção teórica às quais pertencem. Cabe, aqui, fazer um resumo de pelo menos os paradigmas básicos da disciplina.

LIBERALISMO

Nas Relações Internacionais, o Liberalismo tem origem no pensamento iluminista do século XVIII. Suas principais fontes de inspiração são obras de Adam Smith, John Locke e Immanuel Kant.

A perspectiva liberal das RI, contudo, passou a exercer grande influência sobre o

pensamento e a ação político-diplomática nos anos 1920 (Gonçalves, 2002). Os quatorze pontos apresentados pelo presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, como

proposta para encerrar a Primeira Guerra Mundial, sintetiza muitas das idéias centrais deste paradigma. Para o presidente americano, o sistema de equilíbrio de poder (ver Aula 1), fundado em Westphalia, foi incapaz de garantir uma paz durável. Wilson

acreditava ser possível um novo modo de pensar as relações internacionais, mediante a

5 Não seria totalmente coreto chamar essas correntes de teorias já que mesmo dentro das mesmas há grande

divergência.

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adoção dos cinco princípios e nove medidas objetivas contidas em seu documento. Este

propunha democracia, livre-comércio, desarmamento, respeito ao princípio da autodeterminação dos povos e ao direito internacional. Os liberais acreditavam que, respeitados esses princípios, a paz no mundo seria duradoura.

Observe esta tabela de Cristina Pecequilo, indicado na bibliografia da disciplina,

onde estão resumidos os pressupostos básicos do Liberalismo.

Note que está implícita uma comparação entre a análise desenvolvida pelos pensadores citados para o comportamento do homem, em sociedade, e o

comportamento do Estado no SI. A grande diferença é que o indivíduo submete-se ao poder central, enquanto Estados soberanos não reconhecem nenhum poder superior -

por isso a anarquia na origem, como visto na aula 1. Na ausência de um poder central, os liberais acreditam que a ordem no SI seria resultado da articulação de regimes internacionais, isto é, por meio de técnicas, instituições, regras, normas e acordos

jurídicos entre os Estados e segundo as necessidades específicas de cada uma das questões internacionais.

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REALISMO

Muitos consideram o Realismo como a corrente teórica dominante nas RI, em

função do número de conflitos em andamento. A elaboração teórica do paradigma realista tem origem em clássicos como o trabalho de Tulcídides, na Grécia Antiga, história da Guerra do Peloponeso. Ao proceder à analise histórica dessa guerra entre

Atenas e Esparta, no século V a.C. (431- 404 a.C.), Tulcídides (260 - 400 a.C.) argumenta que a causa da guerra foi a insegurança dos espartanos, diante do aumento

do poder militar dos atenienses. Essa identificação do desequilíbrio de poder, como causa fundamental e objetiva da guerra, inaugura uma tradição intelectual que se manteve nas

obras de Nicolau Maquiavel, Thomas Hobbes, Carl von Clausewitz e Max Weber.

A base da argumentação dos realistas contemporâneos é formada com essas idéias, principalmente as de Hobbes. Na

concepção de Hobbes, os Estados vivem em estado de natureza. Apesar de se

relacionarem todo o tempo, eles não formam uma sociedade de Estados. Vivem em estado de anarquia, uma vez

que, na ausência de um poder soberano, que faça com que todos respeitem as leis

por ele instituídas, cada Estado busca maximizar seu próprio poder para

intimidar os mais fracos e, simultaneamente, não ser intimidado pelos mais fortes. Essa situação é

conhecida como o jogo do dilema do prisioneiro.6

6 Imagine que o diretor de uma prisão precisa de uma confissão voluntária de um dentre dois prisioneiros, que cometeram um crime juntos. Ele oferece ao prisioneiro 1 sua liberdade, se ele confessar o crime antes do prisioneiro 2. Assim, ele poderia condenar o prisioneiro 2. Mas o diretor também estabelece que se o prisioneiro 2 confessar antes, o mesmo seria libertado e o prisioneiro 1 seria condenado. Caso os dois confessem no mesmo dia, os dois seriam condenados a uma pena menor. Caso nenhum dos dois confessasse, ambos seriam libertados. As mesmas condições foram apresentadas ao prisioneiro 2. Se os prisioneiros colaborarem, eles podem obter uma solução mais favorável. Seria o caso dos dois optarem por não confessar. Mas atores racionais, em um ambiente competitivo, sem informação perfeita (no caso sobre qual a estratégia escolhida pelo outro prisioneiro), tendem a fazer a opção que acaba gerando uma solução menos favorável para os dois em conjunto. Isso ocorrerá se ambos optarem pela confissão. A repetição do jogo “n” vezes geraria uma maior propensão para cooperação. A repetição e a disponibilidade de informação são justamente a forma como as instituições, segundo os neoliberais institucionalistas, estimulam a opção por uma estratégia de colaboração por parte de atores racionais e egoístas.

“Ponham a felicidade na liberdade e a liberdade na bravura”, Tulcídides

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O homem em sociedade, para se livrar do medo da morte violenta a que está sujeito no estado de natureza, firma o pacto social e se submete ao poder do Estado, do Leviatã. Todavia, pelo fato de não ser factível um pacto que erga um poder soberano,

que submeta os Estados às suas leis, o homem vive permanentemente sob a ameaça de guerra entre os Estados.

Como corrente teórica das RI, o realismo surge coincidentemente em momentos

de instabilidade. As contribuições teóricas de Edward H. Carr, em Twenty Years Crisis – 1919-1939 –, e de Hans J. Morgenthau, em Politics Among Nations, foram fundamentais

para a organização dos pressupostos do Realismo.

A cada novo conflito internacional o Realismo se fortalece, afinal essa corrente teórica fornece uma explicação bastante convincente para a razão da guerra.

Morguenthau também lança alguns princípios do Realismo:

• Em qualquer tempo e lugar, o comportamento político é sempre orientado pela busca da realização dos interesses.

• O interesse é definido em termos de poder. • Interesses, sim, podem variar segundo o tempo e o lugar. Exprimem o contexto

político e cultural em que são formulados. • A política internacional possui suas próprias leis morais. A ética política do

governante é avaliada a partir das responsabilidades que o governante tem para com o povo que representa e não a partir de leis abstratas universais.

• O Realismo recusa a idéia de que uma determinada nação possa revestir suas

próprias aspirações e ações, com fins morais universais. • A esfera política é independente das demais esferas que compõem a vida do

homem em sociedade.

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Enquanto o Liberalismo lida com as perspectivas de paz, prosperidade e

progresso, com possibilidades para a criação de oportunidades de cooperação, o Realismo pensa a guerra e o poder, os interesses e a racionalidade dos Estados.

Fascinante, não? Se você se interessou e quer saber mais sobre as teorias de RI, não se preocupe. Há material suficiente na bibliografia e uma série de outras teorias

derivadas destas que você pode estudar.

Acesse:

www.culturabrasil.org/maquiavel.htm

www.culturabrasil.pro.br/nicolaumaquiavel.htm

sites.uol.com.br/gballone/hlp/hobbes.html

Leia, também, o capítulo 3, tópico 2.1 do livro Introdução às relações internacionais: temas, atores e visões, indicado na bibliografia da disciplina.

Dois fenômenos das Relações Internacionais marcaram o sistema internacional contemporâneo: a globalização e a interdependência. São esses dois movimentos, que

vamos estudar, muitas vezes estão entrelaçados.

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Aula 5 Interdependência e Globalização

INTRODUÇÃO

Nesta aula, você entrará em contato com dois processos que afetam sua vida

direta ou indiretamente: a revolução tecnológica e a globalização.

As relações internacionais contemporâneas têm como característica a crescente

interdependência entre mercados e entre nações. Pode-se conceituar a globalização

como um fenômeno observado na atualidade, que consiste na maior integração entre os

mercados produtores e consumidores de diversos países do mundo. O termo também

pode se referir à maior integração social e cultural entre as nações. Através deste

processo, as pessoas, os governos e as empresas trocam idéias, realizam transações

financeiras e comerciais e espalham aspectos culturais pelo mundo.

Não há, contudo, um consenso em relação à globalização. Muitos são os que têm

uma visão crítica deste processo. O próprio termo globalização é discutido. O jornal francês Le Monde, por exemplo, só se refere a este fenômeno como mundialização, resistindo à terminologia anglo-saxã.

ORIGENS DA GLOBALIZAÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS

Há precedentes para a atual economia internacionalizada.

A Revolução Industrial, no século XVIII, e a generalização da tecnologia industrial moderna, a partir dos anos 1860, também são apontadas como fatores que viabilizaram a internacionalização. Em certos aspectos a economia internacional já estava bastante internacionalizada, durante o imperialismo europeu (1870-1914), quando as inversões

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em infra-estrutura e os fluxos comerciais estabelecidos entre as metrópoles e suas colônias aumentaram significativamente as transações financeiras no mundo. A globalização propriamente dita tem origem, segundo alguns autores, nos fatos que sucederam a Segunda Guerra Mundial, como as rodadas de negociação multilaterais

no âmbito do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), que levaram à redução das barreiras ao comércio internacional. Data desta época o acordo de Bretton Woods, que

criou o FMI e tornou o dólar americano referência para a paridade das moedas dos demais signatários.

Porém, a globalização efetivou-se mesmo no final do século XX, logo após a queda

do socialismo no leste europeu e na União Soviética. O neoliberalismo, que ganhou força na década de 1970, impulsionou o processo de globalização econômica. Com os mercados internos saturados, muitas empresas multinacionais buscaram conquistar

novos mercados consumidores, principalmente dos países recém-saídos do socialismo. A concorrência faz com que as empresas utilizem cada vez mais recursos tecnológicos para

baratear os preços e também para estabelecerem contatos comerciais e financeiros de forma rápida e eficiente. Não se pode esquecer de mencionar a utilização da Internet, das redes de computadores, dos meios de comunicação via satélite etc.

Uma outra característica importante da globalização é a busca

pelo barateamento do processo produtivo pelas indústrias. Muitas delas produzem suas mercadorias em vários países,

com o objetivo de reduzir os custos. Optam por países onde a mão-de-obra, a matéria-prima e a energia são mais baratas.

Na década de 80, percebe-se um crescente processo de eliminação de controles sobre fluxos internacionais de capitais e de serviços financeiros, nas principais economias

industrializadas (Alemanha, Japão, Estados Unidos e Inglaterra), e depois gradativamente removido em outros países, ampliando a interdependência financeira

internacional.

Toda essa transformação nas relações internacionais foi respaldada no pensamento neoliberal, que defende a remoção das diferentes formas de intervenção pública na economia e apregoa que o mercado deve ter ampla liberdade de ação, porque

somente a concorrência é capaz de conduzir a uma alocação mais eficiente dos recursos

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mundiais. A análise neoliberal identifica no Estado o problema dos países em

desenvolvimento e endividados: indisciplina fiscal, déficit fiscal e intervenção estatal excessiva.

Para sanar esse problema, muitos concordaram em acatar um receituário de reformas econômicas apelidado de Consenso de Washington, que tinha por meta a

redução do papel do Estado na economia por meio de privatizações, liberalização dos mercados de bens e capitais e ampla desregulamentação. O FMI teve um papel decisivo

neste processo, pois condicionava a concessão de empréstimos à adoção de tais políticas e reformas econômicas.

BLOCOS ECONÔMICOS E GLOBALIZAÇÃO

Curiosamente, ao mesmo tempo em que se assiste à intensificação do processo

de globalização, um outro movimento, aparentemente oposto, parece também crescer: o regionalismo econômico. Muitos países juntaram-se e formaram blocos econômicos, cujo principal objetivo é aumentar as relações comerciais entre os membros. Neste contexto,

surgiram a União Européia, o Mercosul, o Comecom, o NAFTA, o Pacto Andino, a Asean, Apec e a Sadc (estes blocos serão estudados na Aula 7). Muitos afirmam que a formação

de blocos econômicos é uma estratégia de inserção no processo de globalização. Assim, cada membro consegue se posicionar melhor nas relações comerciais internacionais.

INTERNET E ALDEIA GLOBAL

Com certeza, há outras questões a serem consideradas, afinal, não foram apenas as distâncias que diminuíram, o mundo se integrou na sua dimensão temporal, passou a

ser simultâneo. A famosa imagem da “aldeia global” representa muito bem a nova relação subjetiva entre o espaço e o tempo.

A globalização extrapola as relações comerciais e financeiras. As pessoas estão cada vez mais descobrindo, na Internet, uma maneira rápida e eficiente de entrar em

contato com pessoas de outros países ou, até mesmo, de conhecer aspectos culturais e sociais de várias partes do planeta. Junto com a televisão, a rede mundial de

computadores quebra barreiras e vai, cada vez mais, ligando as pessoas e espalhando as idéias, formando, assim, uma grande aldeia global.

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Apesar da falta de consenso quanto à terminologia pertinente ou o momento de

origem, ou mesmo quanto à intensidade, pode-se afirmar, com certa segurança, que no

mundo de hoje a distribuição de capital, empregos, produção, renda, bens e serviços

está vinculada à globalização. Isso não elimina a necessidade de uma visão crítica desse

processo (Barroso, 1999).

UM OLHAR CRÍTICO

Não há como negar que uns poucos Estados-nação modernos – o Grupo dos 7 (com a tardia incorporação da Rússia, Grupo dos 8) – formam um centro decisório no

mundo. Suas decisões são “impostas” sobre o conjunto dos demais países dos quais não são representantes. São, virtualmente, uma autoridade pública mundial, ainda que não

possam constituir um efetivo Estado mundial (lembre-se da Aula 1, o sistema internacional é anárquico!).

Na verdade, esse grupo dominante não é constituído somente por Estados-nação.

Trata-se de uma trama institucional mais complexa, que envolve as entidades intergovernamentais de controle e exercício da violência como a OTAN, as autoridades de controle de fluxo financeiro mundial em especial (FMI, BIRD, Clube de Paris) e as

grandes corporações multinacionais. Por isso, a necessidade de uma visão crítica do processo de globalização.

Estamos iniciando uma nova unidade. Daqui para frente, nos preocuparemos com os principais temas em debate no cenário internacional. Inicialmente, nos deteremos nas questões referentes ao sistema de comércio internacional atual, sua formação a partir da

Conferência de Bretton Woods, a importância do GATT e, a partir de 1994, da OMC. Na Aula 7, abordaremos o processo de integração econômica regional. Na Aula 8, nossa

atenção se voltará para o meio ambiente e suas questões. Finalmente, na Aula 9 falaremos sobre a questão da segurança e do terrorismo internacional. E na Aula 10, nos

dedicaremos à questão dos direitos humanos.

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Unidade 3

INTERNACIONALIZAÇÃO E REGIONALIZAÇÃO Você sabia que, hoje, para entrar na Argentina, nós brasileiros precisamos apenas de carteira de identidade? Pois é, maravilhas da integração regional. Nesta unidade trataremos da questão do regionalismo econômico (aula 7) assim como da formação do sistema internacional de comércio com a criação da Organização Mundial de Comércio - OMC, em 1994, (aula 6). Não fosse pela OMC, o Brasil não poderia ter apadrinhado a causa da EMBRAER contra a Empresa canadense Bombadieu.

Aula 6 O Comércio Internacional e a OMC Nesta aula, você será apresentado ao sistema internacional de comércio e a uma das principais OIGs da atualidade, a Organização Mundial de Comércio (OMC). Para isso,

primeiro é preciso voltar ao pós-Segunda Guerra Mundial.

A criação de uma organização para administrar o comércio internacional já fazia parte dos projetos da ONU, em 1945, ano de sua criação. Ela seria criada junto com outras organizações do chamado sistema de Bretton Woods, acordo pelo qual se

pretendia reorganizar a ordem mundial pós-Segunda Guerra Mundial. Instituições como o FMI e o Banco Mundial foram criadas para, respectivamente, regular o sistema financeiro

e prover liquidez à economia internacional, e ajudar os países a captarem recursos (a princípio os países destruídos pela guerra, depois os países desenvolvidos).

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No caso do comércio internacional, os norte-americanos, principalmente,

desejavam reduzir as tarifas alfandegárias que se elevaram excessivamente ao longo dos anos 1930.

Por isso era necessário criar mecanismos de redução das tarifas e liberalizar o

comércio. Uma organização do comércio, como se estava propondo, não foi aceita pelas elites americanas e por isso encontrou-se uma solução provisória: um acordo. O GATT

(General Agreement on Tariffs and Trade) ou Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio teve a duração de 47 anos e foi responsável por oito rodadas de negociação entre as partes contratantes, com o objetivo de reduzir as tarifas e estimular o crescimento dos fluxos

comerciais internacionais.

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A ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE COMÉRCIO

Os princípios da OMC continuam os já existentes no GATT7. Uma particularidade

que é introduzida nas rodadas de negociação da OMC é o princípio de que todos os itens da negociação devem ser incluídos no final de cada rodada, ou seja, nada fica pendente (single undertaking). Este princípio é ao mesmo tempo visto como um facilitador de

negociações amplas e complexas, pois favorece a política de barganhas, mas também como um fator condicionador para países menos poderosos.

Por outro lado, acreditava-se que o sistema de Solução de Controvérsias poderia beneficiar os países menos desenvolvidos, pois as economias mais fracas poderiam solicitar proteção contra as pressões exercidas pelos mais fortes. Na prática, as potências continuam usando seus recursos maiores para impor suas vontades (principalmente mediante o artifício de invocar a proteção ao meio ambiente e aos direitos humanos), como forma de retaliar as economias mais fracas, que aumentam sua competitividade em determinados setores da produção de bens e serviços e passam a concorrer com vantagem com os mesmos setores das nações mais desenvolvidas. Por esse mecanismo, sob o pretexto de proteger o trabalho infantil, por exemplo, as economias mais desenvolvidas dão-se ao direito de sobretaxar certos bens importados, alegando proteção contra a prática do dumping social.

Mesmo assim, a OMC é reconhecida, hoje, como uma organização de grande

importância para a condução do processo de globalização. Devido à intensificação dos fluxos comerciais e da concorrência entre os agentes econômicos, cresce o interesse sobre as controvérsias e as decisões tomadas pela organização, já que tais decisões

podem favorecer ou prejudicar os interessados.

7 Os mais importantes são o da não-discriminação entre parceiros, por meio do respeito à cláusula da nação

mais favorecida e em relação aos agentes nacionais, através da cláusula de tratamento nacional. É bem

verdade que o princípio da não-discriminação pode ser temporariamente suspenso para fins de

desenvolvimento, a título de tratamento especial e diferenciado.

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O principal órgão da OMC é a Conferência Ministerial, composta por representantes de todos os membros, que se reúnem pelo menos a cada dois anos e tomam decisões por consenso. Cada membro tem direito a um voto, ao contrário de outras organizações de Bretton Woods, como o FMI e o Banco Mundial, e o poder de voto dos membros é ponderado, de acordo com sua contribuição financeira. Outros órgãos importantes são o Secretariado, o Conselho Geral e os Conselhos Setoriais: Comércio de bens, Comércio de serviços, Aspectos da Propriedade Intelectual relacionados ao comércio, entre outros.

Uma prática comum nas negociações da OMC é a formação de coalizões políticas, na forma de grupos, entre membros que tenham interesses em comum. A maior parte

desses grupos corresponde a blocos econômicos regionais, como a União Européia, o Mercosul, o NAFTA e a ASEAN. Outros grupos são formados por afinidades, tais como o

Grupo Africano, o dos Países Menos Desenvolvidos, os Estados da África, Caribe e Pacífico (ACP), o Grupo de Cairns e, mais recentemente, o G-21.

A OMC tem regulado e moldado o comércio internacional por meio de rodadas de negociação em conferências ministeriais:

O comércio internacional apresenta distorções como conseqüência da desigualdade econômica entre os diferentes países. A OMC, apesar das limitações inerentes a uma organização intergovernamental, tem se constituído num foro importante, na tentativa de minimizar os efeitos danosos dessas distorções. Ainda que suas decisões logrem resultados apenas quando os países envolvidos na controvérsia têm economias equiparáveis, a OMC provê transparência às negociações de normas comerciais.

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Para aprofundar seus conhecimentos, leia o capítulo 4 (tópico 4.3) do livro Introdução às Relações Internacionais: temas, atores e visões, indicado na bibliografia da disciplina.

Nesta aula, você acompanhou o surgimento da Organização Mundial do Comércio (OMC) e definiu seus principais órgãos. Viu ainda a importância da OMC no crescente processo

de globalização.

Você já deve ter ouvido falar da União Européia (EU), um bloco econômico que alcançou

elevados níveis de integração econômica e regional. Esse desenvolvimento todo, porém, não aconteceu de uma hora para outra – foi fruto de mais de 50 anos de um longo

processo de integração econômica. Na Aula 7, então, vamos aprender a diferenciar os blocos de acordo com sua política comercial e níveis de integração econômica.

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Aula 7 A formação de Blocos Regionais

INTRODUÇÃO

Você deve se lembrar que, na Aula 5, tratamos da globalização e da

interdependência, quando chegamos a mencionar que a integração econômica poderia ser entendida como uma forma de inserção no novo sistema internacional. Pois bem,

vamos nesta aula analisar o processo de integração regional, caracterizando os diferentes níveis de integração e apresentando os principais exemplos.

Nesta aula, você estudará mais um fenômeno das Relações Internacionais Contemporâneas: a integração econômica.

Desde a segunda metade do século XX, é possível perceber o ressurgimento do regionalismo na política mundial. Seja como resultado do aumento da interdependência

ou da cooperação entre os Estados, ou simplesmente como uma estratégia comercial mercantilista, a integração regional é uma realidade, em diferentes níveis e regiões do

planeta.

O QUE É INTEGRAÇÃO ECONÔMICA REGIONAL?

Há organizações regionais funcionais, de segurança e de integração e de integração econômica, que podem ocorrer concomitantemente. Interessa, aqui, analisar

os casos de integração econômica regional, isto é, atividades no âmbito de uma região geográfica específica e não no âmbito universal, que visam criar áreas de livre comércio,

uniões aduaneiras, mercados comuns ou uniões econômicas e monetárias, para desenvolver o comércio entre seus membros.

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Historicamente, o fenômeno do regionalismo econômico está associado a dois

períodos, conhecidos com primeira e segunda ondas de regionalismo. A primeira onda iniciou-se no pós-guerra, e embora seu vigor tenha sido maior até a década de 1970,

engloba também os acordos criados até o início da década de 1980. A segunda, a “nova onda de regionalismo”, só começa na segunda metade da década de 1980, com o fim da Guerra Fria, com a recuperação econômica global e a aceleração do processo de

globalização. Em tese, o comércio entre os países-membros de um bloco traz crescimento

econômico para todos eles. Geralmente estes blocos são formados por países vizinhos ou que possuam afinidades culturais ou comerciais. Esta é uma tendência mundial, pois cada vez mais o comércio entre blocos econômicos cresce - economistas afirmam que

ficar de fora de um bloco econômico é viver isolado do mundo comercial.

Antes de conhecer os principais blocos da atualidade, cabe classificar e caracterizar os diferentes níveis de integração econômica.

NÍVEIS DE INTEGRAÇÃO ECONÔMICA

No quadro a seguir pode-se observar, na tabela, diversos tipos (ou etapas) de integração

econômica, que estão classificados segundo um grau crescente de interdependência, de baixo para cima.

A Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL) surgiu na década de 1950, com objetivo

de desenvolvimento econômico da região. Esperava-se, de acordo com os economistas da

cepalinos, liderados pelo argentino Raúl Prebisch, ampliar as dimensões dos mercados nacionais

com a eliminação gradual das barreiras ao comércio intra-regional; melhorar o aproveitamento

dos fatores de produção; e contribuir para o incremento do comércio dos países latino-

americanos entre si e com o resto do mundo, por meio do fortalecimento de suas economias.

Assim também surgiu, na década de 1950, na Europa, um forte movimento de integração

econômica, motivado pela necessidade de reconstrução das economias européias devastadas

pela II Guerra Mundial. Os funcionalistas ou federalistas desenvolvem, nessa época, planos de

integração que culminarão na formação da Comunidade Européia do Carvão e do Aço (CECA),

embrião da União Européia, como veremos mais à frente.

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Zona de livre comércio: quando dois ou mais

países concordam em eliminar as barreiras sobre comércio recíproco, mantendo políticas comerciais independentes em relação aos demais.

União Aduaneira: além da eliminação recíproca das barreiras sobre o comércio, os sócios passam

a adotar uma política comercial uniforme, em relação aos demais, isto é, cria-se uma tarifa

externa comum.

Mercado Comum: a partir da União Aduaneira, dois ou mais países decidem liberar também o

livre fluxo de capitais e de mão-de-obra.

União Econômica e/ou Monetária: acordos não se limitam aos movimentos de bens, serviços e fatores de produção, mas buscam harmonizar

políticas econômicas para que os agentes possam operar sob condições semelhantes, nos

países constituintes do bloco econômico, e seja possível a introdução de uma moeda única.

Integração econômica total: essa fase implica livre deslocamento dos bens, serviços e

fatores de produção, além de completa igualdade de condições para os agentes

econômicos, pois o acordo prevê idênticas políticas econômicas e sociais, administradas por autoridades supranacionais, além de

política externa e de defesa comuns.

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Há quem ainda caracterize uma fase anterior à área de livre comércio, a área de

tarifas preferenciais, quando dois ou mais países decidem promover redução tarifária.

Nesse sentido, a escolha de um grau de integração ou a sua evolução se dá de acordo com as conveniências dos países envolvidos, podendo ser iniciada em qualquer uma das etapas do quadro anterior. Essa é uma escolha que depende, em grande parte,

da vontade política de se comprometer economicamente e das possibilidades econômicas dos países envolvidos. Muitas vezes, as economias envolvidas não são complementares,

isto é, uma não produz o que as outras precisam e vice-versa. Algumas são até concorrentes, disputam mercados para seus produtos.

Nesse sentido, a classificação de determinado bloco é feita em função das suas principais características. O Mercosul, por exemplo, tem como objetivo tornar-se um mercado comum, porém, ainda não conseguiu terminar a sua “união aduaneira”, persistindo listas de exceções à Tarifa Externa Comum (TEC). Nas próximas telas, você conhecerá os principais blocos econômicos da atualidade e suas características.

OS PRINCIPAIS BLOCOS ECONÔMICOS DA ATUALIDADE

Não se pretende, aqui, esgotar o número de blocos econômicos existentes hoje, mas apresentar alguns deles com mais informações, pelo menos um de cada continente.

A. UNIÃO EUROPÉIA

A União Européia (UE) é resultado do processo de integração econômica que se iniciou, em 1951, com o Tratado de Paris. Neste tratado, seis países (Alemanha

Ocidental, Bélgica, França, Holanda, Itália e Luxemburgo) criaram a Comunidade Européia do Carvão e do Aço, com o objetivo de organizar a produção, distribuição e

precificação do carvão e do aço desses países. Clique aqui e saiba quais foram os tratados que definiram a UE e quais são seus países-membros atuais.

Este bloco possui uma moeda única que é o EURO, um sistema financeiro e

bancário comum, além de políticas trabalhistas, de defesa, de combate ao crime e de imigração também comuns. Os cidadãos dos países-membros são também cidadãos da União Européia e podem circular ou estabelecer residência livremente pelos países da

União Européia. A UE possui vários órgãos, a Comissão Européia, o Parlamento Europeu, o Conselho de Ministros e o Tribunal de Justiça são os principais.

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B. NAFTA

O Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA) não chega a ser uma área

de livre comércio tradicional, embora já tenha reduzido tarifas de aproximadamente 20 mil produtos entre os seguintes países: Estados Unidos, México e Canadá. O tratado teve

início em 1994 e oferece aos países-membros vantagens no acesso aos mercados dos países. Além disso, estabeleceu o fim das barreiras alfandegárias, criou regras

comerciais, padrões e leis financeiras em comum e oferece proteção comercial.

C. PACTO ANDINO

Outro bloco econômico da América do Sul é formado por: Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. Foi criado no ano de 1969 com o Acordo de Cartagena, tendo a cidade-sede da secretaria em Lima, no Peru. O objetivo principal era integrar

economicamente os países- membros. As relações comerciais entre os países-membros chegam a valores importantes, embora os Estados Unidos sejam o principal parceiro

econômico do bloco.

O bloco foi chamado Pacto Andino até 1996, quando passa ao status de Comunidade Andina. Atualmente, possui 120 milhões de habitantes,

em uma área de 4.700.000 quilômetros quadrados, com um produto interno bruto

nominal de 280 bilhões de dólares.

D. MERCOSUL

A criação do Mercado Comum do Sul (Mercosul) deve-se a alguns acordos bilaterais realizados entre Brasil e Argentina. Somente mais tarde outros países da

América do Sul passaram a fazer parte deste bloco.

Atualmente, o Mercosul é formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, mas Chile, Equador, Colômbia, Peru e Bolívia poderão entrar neste bloco econômico, pois assinaram tratados comerciais e já estão organizando suas economias para tanto.

Participam até o momento como países associados ao Mercosul. No ano de 1995, foi instalada a zona de livre comércio entre os países-membros. A partir

deste ano, cerca de 90% das mercadorias produzidas nos países-membros podem ser comercializadas sem tarifas (alguns produtos não entraram neste acordo e possuem

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tarifação especial, por serem considerados estratégicos ou por aguardarem legislação

comercial específica).

Em julho de 1999, um importante passo foi dado no sentido de integração econômica entre os países-membros. Estabeleceu-se um plano de uniformização de taxas de juros, índice de déficit e taxas de inflação. Futuramente, há planos para a

adoção de uma moeda única, a exemplo do que fez o Mercado Comum Europeu.

Atualmente, os países do Mercosul juntos concentram uma população estimada em 311 milhões de habitantes e um PIB (Produto Interno Bruto) de aproximadamente 2

trilhões de dólares.

E. APEC

A APEC (Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico) foi criada, em 1993, na

Conferência de Seattle (Estados Unidos). Integram este bloco econômico os seguintes países: EUA, Japão, China, Formosa

(Taiwan), Coréia do Sul, Hong Kong, Cingapura, Malásia, Tailândia, Indonésia,

Brunei, Filipinas, Austrália, Nova Zelândia, Papua-Nova Guiné, Canadá, México e Chile. Somada a produção industrial de todos os países, chega-se à metade de toda produção mundial. Ela pretende estabelecer a livre troca de mercadorias entre todos os países do

grupo até 2020 e, quando estiver em pleno funcionamento, será o maior bloco econômico do mundo.

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F. ASEAN

A Associação de Nações do

Sudeste Asiático (ASEAN) foi constituída em 8 de agosto de 1967, originalmente pela Tailândia,

Indonésia, Malásia, Cingapura e Filipinas.

Os principais objetivos da ASEAN são acelerar o crescimento econômico e

fomentar a paz e a estabilidade regionais. Assim, estabeleceu um fórum conjunto com o Japão, e um acordo de cooperação com a União Européia. A sede e o secretariado

permanente encontram-se em Jacarta. Em 1992, os países participantes decidiram transformá-la em zona de livre comércio, a ser implantada gradativamente até 2008.

Desde a fundação, cresceram bastante as trocas comerciais entre os estados-membros e, em 1992, a zona de livre-comércio desenvolveu a competitividade da região.

No nível das relações externas, a prioridade da ASEAN é fomentar o contacto com os países da região Ásia-Pacífico, mas foram também estabelecidos acordos de cooperação

com o Japão, China e Coréia do Sul.

G. SADC

O bloco econômico SADC (Southern African Development Community), ou Comunidade para o Desenvolvimento da África

Austral, existe desde 1980 e hoje engloba 13 países do sul da África. O bloco não tem ainda o status de mercado comum, mas

é de grande importância para a economia regional. Atualmente há uma redução de 85% das tarifas alfandegárias internas, com planos de se extinguir até 2008, ano em que o

bloco se tornaria uma zona de livre comércio. A moeda de três países, Namíbia, Lesotho e Suazilândia, está atada à moeda da

África do Sul, em uma pequena zona monetária comum.

Os países-membros somam uma população de aproximadamente 210 milhões de pessoas e têm um PIB de aproximadamente 226 bilhões de dólares, valor este que, embora não seja muito alto (semelhante ao da Suécia), já é significativo, especialmente

levando-se em conta as economias dos países vizinhos.

A região enfrenta uma série de problemas, desde dificuldades naturais, como secas prolongadas, até mais significativamente a enorme disseminação da AIDS e a

grande pobreza do povo local. A erradicação da doença e a promoção do desenvolvimento são duas das principais metas do grupo.

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Leia o capítulo 4, tópico 4.3 do livro: PECEQUILO, Cristina Soreanu. Introdução às Relações Internacionais: temas, atores e visões. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.

Pesquise na internet: escolha um dos sites propostos de um dos blocos

econômicos apresentados e faça um sumário de n linhas, evidenciando sua estrutura, membros e objetivos.

Meio ambiente talvez seja o tema sobre o qual você tenha mais informação.

Provavelmente, porque este é o tema que nos afeta diretamente no nosso dia-a-dia. A alteração do clima, a poluição, os problemas ambientais etc. nos fazem pensar sobre esta questão. Vamos tratar das negociações internacionais a respeito do meio ambiente.

Unidade 4

TEMAS DA AGENDA POLÍTICA CONTEMPORÂNEA Problemas com o meio ambiente, violações dos direitos humanos e atentados terroristas povoam os noticiários da TV e dos jornais. Seja um homem bomba em Tel Aviv (Israel), o degelo das calotas polares, ou mesmo o massacre dos Curdos na fronteira da Turquia com o Iraque, nossa atenção é constantemente direcionada para esses temas internacionais. Na Unidade 4 travaremos contato esses temas para compreendermos melhor suas razões.

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Aula 8 Aula 8: Desenvolvimento sustentável e acesso a tecnologias sensíveis

INTRODUÇÃO

Nesta aula, você travará contato com o debate internacional, envolvendo as

possíveis resoluções para o problema global do meio ambiente e a posição brasileira (considerada a maior reserva de biodiversidade no mundo) sobre o assunto. Faremos

inicialmente um breve histórico para identificarmos o momento em que o tema se torna um dos tópicos da agenda internacional. Depois trataremos dos principais pontos dessa discussão hoje, ressaltando a necessidade de alteração da matriz energética mundial.

QUESTÃO AMBIENTAL

A questão ambiental passou a ser uma

preocupação global na segunda metade do século XX. Seja pelo medo dos efeitos da bomba atômica, que

introduziu a possibilidade de aniquilação total da Terra, seja pela consciência de que progressos científicos podem causar danos em escala planetária, cresce na sociedade,

ao longo dos anos, um movimento ambientalista. Paralelamente, problemas ecológicos decorrentes do

desenvolvimento de técnicas científicas apareciam em diversas áreas: na indústria, na agricultura, nas cidades.

Além disso, o desenvolvimento de modernos computadores permitiu o cruzamento

de dados referentes à industrialização, ao crescimento econômico dos países, ao incremento populacional e aos recursos disponíveis. Os resultados revelaram que se a

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exploração dos recursos e a industrialização continuarem em ritmo acelerado, em pouco

tempo as fontes de riquezas naturais mundiais estariam esgotadas.

Entre os países desenvolvidos cresce a idéia de preservação, isto é, reduzir a industrialização e o crescimento econômico. Esta, no entanto, é uma proposta perversa para os países em desenvolvimento que tinham, na industrialização, o caminho de acesso

ao mundo desenvolvido e, eventualmente, o acesso a tecnologias sensíveis. Não foi preciso muito esforço para perceber que o grande sacrifício preconizado, quanto à

contenção no uso de recursos para a industrialização e ao controle populacional, caberia aos países pobres. Entre estes, uma tríade apresentava índices de crescimento

preocupantes para o Norte desenvolvido: Brasil, China e Índia.

A CONFERÊNCIA DE ESTOCOLMO

O reconhecimento da existência dos problemas ecológicos num plano global levou, em 1968, à realização da Conferência da Biosfera, em Paris,

reunindo vários estados. Apesar de essencialmente científica, essa conferência serviu para divulgar

descobertas alarmantes sobre o meio ambiente e para que a idéia de reunir estados, para discutir politicamente o meio ambiente, fosse fortalecida.

No entanto, a efetiva transformação dessa questão, em objeto das Relações Internacionais, aconteceu em 1972, em Estocolmo, com a

realização da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano (Gonçalves, 2002). Essa primeira conferência temática da ONU reuniu 113 países, 19 órgãos

intergovernamentais e 400 outras organizações intergovernamentais e não-governamentais.

A conferência foi, em grande parte, fruto da convergência de um número considerável de movimentos políticos organizados, que provocaram o debate dentro da

ONU. Ficou marcada não só pela participação das ONGs, mas também pelo confronto de posições entre as potências capitalistas avançadas e os países do Terceiro Mundo. Do

lado dos países desenvolvidos, predominava a preocupação com temas como a chuva ácida e a poluição dos mares, recomendando-se uma política preservacionista. Do lado dos países em desenvolvimento, a preocupação era com o desenvolvimento econômico-

social, prevalecendo a tese de que a pobreza e a miséria eram a pior forma de poluição (“poluição da pobreza”, expressão atribuída a Indira Gandhi). Eram tempos de

articulação dos países em desenvolvimento na ONU, da formação de blocos como o dos não-alinhados e das lutas por melhores preços para os produtos primários. Por isso, a

convocação de uma conferência, por parte dos países ricos, para tratar da poluição dos recursos naturais e da superpopulação, era recebida pelos países em desenvolvimento

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como uma tentativa de congelamento do poder mundial. Muitos países do Terceiro

Mundo apregoavam ser necessário primeiro desenvolvimento e depois o acerto de contas dos danos ambientais, como fizeram os países ricos. Apesar das divergências, criou-se o Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (Unep – United Nations Environmental

Programme), um verdadeiro avanço, no sentido de uma abordagem mais racional da questão ambiental.

A Declaração de Estocolmo, documento aprovado ao final da conferência, reflete

bem as divisões entre os participantes e os compromissos atingidos, assim como a oportunidade para que os países menos desenvolvidos firmassem suas posições. Por

exemplo: entre os primeiros princípios enunciados encontra-se a condenação de políticas que promovam o apartheid, a discriminação, a colonização e outras formas de opressão e dominação estrangeira. Há referências à estabilização do preço das commodities como

fator importante para a viabilização da gestão ambiental e a reafirmação de que os estados têm o direito soberano de explorar seus recursos, segundo suas políticas

ambientais, além da responsabilidade de assegurar que as atividades em seus territórios não causem danos a outros países. Ao menos no discurso, os países em desenvolvimento lograram marcar a sua posição como Terceiro Mundo.

A POSIÇÃO BRASILEIRA

O Brasil teve uma participação combativa e de liderança entre os países em desenvolvimento. Talvez por isso mesmo tenha sofrido ataques e recebido referências de vilão ambiental. O país mostrava-se resistente a qualquer imposição externa relativa ao meio ambiente, reiterando a noção de proteção ao meio ambiente sem prejuízo ao desenvolvimento. Tinha-se, então, uma soberania absoluta que não teve uma repercussão muito boa, já que se queria resolver um problema global.

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A CONFERÊNCIA DO RIO DE JANEIRO

Passaram-se 20 anos, desde a conferência de Estocolmo,

para que uma outra fosse convocada. Nesse ínterim, cenas de grandes desastres ambientais8, associados a uma intensa e

dramática cobertura dos meios de comunicação, com direito a astros do cinema e da música internacionais, criaram as condições

para uma nova conferência.

Pode-se dizer que na segunda metade dos anos 1980 ocorre uma segunda onda verde internacional, que recolocou a questão na agenda internacional. Muito contribuiu para isso o relatório

apresentado pelo grupo de estudos chefiado pela primeira-ministra da Noruega, Gro Brundtland, intitulado Nosso Futuro Comum, por

propiciar o diálogo entre países desenvolvidos e os do Terceiro Mundo, mediante à elaboração do conceito de desenvolvimento sustentável.

No Brasil, uma década perdida, de crise da dívida externa e inflação galopante,

8 Os dois choques do petróleo (1973 e 1978), o desemprego maciço, a reestruturação das corporações, ou seja, a recessão global, tiveram como resultado a economia; carros mais econômicos, ciclovias, programas de reciclagem e busca de formas alternativas de energia. A mudança de comportamento e estilo de vida obedecia ao amadurecimento da consciência ambiental e às dores no bolso. Muitas questões tornam-se urgentes ao longo da década de 1980. A camada de ozônio havia se tornado mais fina, e mesmo rompido em algumas partes, formando áreas desprotegidas da radiação solar, atingindo principalmente países do norte, mais vulneráveis a doenças de pele e oftalmológicas provocadas pela incidência dos raios do sol. Some-se a isso a divulgação das pesquisas sobre o “efeito estufa”, isto é, a elevação das temperaturas em virtude do aprisionamento de certos gases, sobretudo CO2, nas camadas inferiores da atmosfera, podendo gerar uma variedade de desastres: secas, inundações, furacões, derretimento das geleiras e modificação das áreas aráveis. Em 1986, o vazamento da indústria química de Bhopal, na Índia, e o acidente de Chernobyl, na URSS, evidenciaram a falta de transparência dos governos para lidar com acidentes ambientais. Na Europa também aumenta a pressão para o combate aos efeitos da chuva ácida que afetam florestas e a população. Além disso, com o fim do bloco socialista, foram reveladas as péssimas condições do meio ambiente em países do Leste Europeu e a falta de segurança de instalações nucleares.

Não menos impactantes foram as imagens de queimadas na Amazônia, que percorriam o mundo prejudicando a

imagem do país que ficou mais difamado pelo assassinato do líder seringueiro Chico Mendes.

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vulnerabilizou a posição do país no cenário internacional. Os contenciosos com os

Estados Unidos nas áreas comerciais e de tecnologias sensíveis (o país chegou a ser

chamado de Estado-pária como a Líbia e o Irã, por sua determinação em não-aderir ao

Tratado de Não-proliferação Nuclear), além da inclusão de novos temas – como serviços

e cláusulas relativas a questões trabalhistas e ambientais – nas negociações para a

liberalização do comércio promovidas pela Rodada Uruguai do GATT (ver Aula 6),

levaram o país a procurar uma outra saída.

Em vez de continuar com a retórica de um complô internacional para conter o crescimento do Brasil e legitimar possíveis intervenções no país, em nome de uma ordem ecológica que se construía à revelia dos países em desenvolvimento, o país se oferece

para sediar o novo encontro sobre meio ambiente.

O que teria levado o Brasil a se voluntariar? A resposta é mudar a imagem de vilão. Tratava-se da primeira conferência internacional de grande porte após o fim da

Guerra Fria, portanto, um momento decisivo na retomada do multilateralismo.

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

aconteceu em junho de 1992, no Rio de Janeiro, e reuniu 110 chefes de Estado e de governo, cerca de cinco mil delegados de 178 países, duas mil organizações não-

governamentais, e nove mil jornalistas do mundo inteiro. Os principais temas propostos foram: a proteção aos solos, por meio do combate ao desmatamento, desertificação e

seca; a proteção da atmosfera por meio do combate às mudanças climáticas, ao rompimento da camada de ozônio e à poluição transfronteiriça; a proteção das áreas oceânicas e marítimas; a conservação da diversidade biológica; controle da

biotecnologia; controle de dejetos químicos e tóxicos; erradicação de agentes patogênicos e proteção das condições de saúde.

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Concomitantemente às deliberações oficiais da conferência, realizava-se, no

Aterro do Flamengo, o Fórum Global, que reuniu dez mil pessoas para discutir assuntos relativos à área ambiental, desde representantes de ONGs e da sociedade civil organizada até chefes de tribos indígenas.

UM NOVO CONCEITO – DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O resultado da conferência foi um pacto entre os países ricos e pobres, cujo objetivo é a luta em favor do desenvolvimento sustentável. Esse pacto desdobrou-se em quatro documentos:

A Agenda 21 é o principal desses documentos, pois apresenta um plano de ação

dividido em quatro seções de 40 capítulos, com vistas a viabilizar a adoção do

desenvolvimento sustentável e ambientalmente racional em todos os países.

Para o Brasil, a conferência do Rio permanece como um marco das relações multilaterais e um êxito diplomático, apesar de grande parte do acordado não ter sido

posto em prática. Pode-se dizer que a euforia que se seguiu à ECO-92 não correspondeu ao empenho na implementação de suas metas. Na primeira avaliação dos resultados da

conferência, em 1997, e da implementação da Agenda 21, descobriu-se que poucas metas haviam sido atingidas.

Um dos grandes problemas da década, que causou muita polêmica, foi o

aquecimento global. A solução proposta pela Convenção sobre Mudanças Climáticas e aprovada na Rio-92 é a redução dos gases causadores do efeito estufa, nas proporções e designações estabelecidas em 1997 pelo Protocolo de Quioto. Segundo o protocolo, entre

2008 e 2012, os países industrializados deveriam reduzir suas emissões em pelo menos 5%, em relação aos níveis de 1990. Para saber mais sobre o protocolo, acesse a

biblioteca da disciplina e leia o texto “Protocolo de Quioto”

A CONFERÊNCIA DE JOANESBURGO (2002)

A Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, convocada para

Joanesburgo, na África do Sul, entre agosto e setembro de 2002, para avaliar os

progressos alcançados desde a ECO-92, aconteceu em um momento descendente da

curva de cooperação internacional. Ainda que tenha sido garantida a manutenção dos

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princípios firmados na ECO-92, como o da responsabilidade comum mas diferenciada

para os países em desenvolvimento e desenvolvidos, a conferência logrou poucos

resultados positivos9.

Um dos pontos positivos da conferência foi a promessa de recuperação, até 2015, de áreas

comerciais pesqueiras que se encontram bastante degradadas. A questão agrícola, contudo, permaneceu

como uma das arenas de confrontação em que países ricos e pobres se enfrentam em vários foros: na OMC, nas negociações sobre a Área de Livre Comércio das

Américas (ALCA) e em Joanesburgo. Os países ricos se recusam a abrir mão ou reduzir os subsídios para

agricultura. Essa questão vem atualmente ganhando mais atenção por conta do uso em certos países (como o

Brasil) de biocombustíveis. Muitos temem que o aumento da produção do biocombustível possa ter um impacto ambiental e a redução das áreas de plantio para

alimentação.

O Brasil possui, em virtude de sua riqueza e da diversidade de seu território, lugar assegurado nas discussões internacionais sobre meio ambiente e sobre energias alternativas.

Os atentados de 11 de setembro, em 2001, nos Estados Unidos, marcaram a história mundial, seja pelo número de vítimas, seja pela audácia dos terroristas. A

principal conseqüência deste evento é a ascensão da questão da segurança como o principal tema das relações internacionais da atualidade. É exatamente sobre segurança internacional e terrorismo que vamos conversar na próxima aula.

9 Um tema que mereceu especial atenção foi o da biodiversidade. Firmou-se um acordo sobre megadiversidade para garantir que as comunidades locais usufruam dos benefícios decorrentes da exploração de recursos naturais encontrados em suas terras. A redução significativa das taxas de extinção de animais e plantas raros até 2010 também foi acordada, sem que tenha havido a fixação de metas específicas.

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Leia o capítulo 4, tópico 4.2, do livro Introdução às relações internacionais:

temas, atores e visões e também Globalização e identidade nacional, ambos indicados na bibliografia da disciplina.

Pesquise na internet sobre o Protocolo de Quioto e reflita: o Mercado de Carbono é um projeto eficaz, na tentativa de implementar o Protocolo de Quioto ou apenas mais

uma oportunidade de especulação financeira?

Aula 9 Segurança internacional e suas conseqüências econômicas

INTRODUÇÃO

A segurança internacional é um tema que vem despertando a atenção do mundo todo e tornou-se um dos principais temas da agenda internacional, depois dos atentados de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Nesta aula, faremos um panorama da segurança

mundial e analisaremos como esta questão está alterando as relações internacionais no mundo. Começaremos com a definição de terrorismo, passaremos pelos principais grupos

terroristas em ação na atualidade e, por fim, especularemos sobre os efeitos do terrorismo sobre a economia mundial.

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O dia 11 de setembro de 2001 poderia ter sido igual a outro qualquer. Mas não

foi. No amanhecer desse dia, 19 pessoas embarcaram em aeroportos da Costa Leste dos Estados Unidos, em quatro aviões diferentes, para uma viagem sem volta. Esses passageiros de origem árabe (segundo informações da CIA e do FBI) tinham uma

missão: lançar os aviões cheios de combustível sobre símbolos norte-americanos – as torres gêmeas do World Trade Center (Nova Iorque), o Pentágono e a Casa Branca. Sem

que ninguém esperasse, um avião atingiu a primeira torre como um míssil. Vinte minutos depois, um segundo avião atingiu a outra torre. Todos olhavam essas imagens atônitos:

as emissoras transmitiam a cena ao vivo. Os andares mais altos desprendiam fogo, rolos de fumaça negra, vidros estilhaçados. Pânico. Lágrimas. Mortes. Caos. De repente, uma das torres dasaba; logo em seguida, a outra. Edifícios com mais de 500 metros de altura

desabaram, deixando milhares de mortos sob seus escombros e provocando uma nuvem de cimento e fuligem que cobriu a cidade de Nova Iorque.

A pergunta permanece até hoje: o que levou

essas pessoas a realizarem um ato de tal envergadura, com uma logística tão apurada? Para responder a essa pergunta, é preciso entender o que é terrorismo e quais

as suas conseqüências para a economia mundial. Afinal, é inegável que o mundo mudou depois de 11 de

setembro de 2001.

Não se trata de questões práticas como o aumento da segurança nas revistas aos passageiros em

aeroportos, mas da elevação da questão da segurança internacional ao nível da política internacional.

ORIGEM DO TERMO TERRORISMO

O período entre setembro de 1793 e julho de 1794, caracterizado por grande violência e por centenas de execuções, deu início à fase do terror da Revolução Francesa.

O terrorismo, hoje, é considerado um instrumento de violência com fins

estratégicos e políticos, patrocinado por ideologias inclusive religiosas. É difícil conseguir uma definição suficientemente ampla e consensual para terrorismo, já que ela envolve

conceitos políticos, ideológicos, militares, religiosos. No início do século XX, por exemplo, o termo terrorismo era definido, em dicionários, com uma conotação bem diferente da que temos hoje em dia: “pessoa que espalha boatos assustadores; que prediz catástrofes

ou acontecimentos funestos; pessimistas”.

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DEFINIÇÕES DE TERRORISMO

Veja algumas definições do que é terrorismo:

Como se pode perceber, a partir da leitura destas definições, ainda que elas variem com relação aos objetivos, todas parecem concordar com os meios utilizados para alcançá-los.

Essas definições, no entanto, não discriminam os autores, isto é, não dizem nada

sobre os que praticam o terrorismo. Ao longo do século XX e início do XXI, o sentido de

terrorismo não ficou preso ao seu sentido original, ligado às ações de execução e de

extermínio do Estado, sendo hoje muito mais identificado com ações violentas e de

objetivos políticos de grupos ou de pessoas que se opõem a governos. Assim, é possível

diferenciar o terrorismo de acordo com seus agentes.

1.“Terrorismo é o uso de

violência como forma de

pressionar um governo e/ou

sociedade para que se aceite

uma mudança política ou

social radical.” ROBERTSON,

D. A Dicitionary of Modern

Politics. New York: Oxford,

1993

2.“Terrorismo pode ser definido como

uma intimidação coercitiva ou, mais

amplamente, como o uso sistemático

de assassinatos, ferimentos e

destruição, ou ameaças, para criar um

clima de terror, para divulgar uma

causa, e coagir pessoas a se

submeterem aos seus objetivos.”

BOGDANOR, V. (ed) The Blackwell

Encyclopedia of Political Institutions.

New York: Oxford, 1987.

3. “O Terrorismo assenta, pois, no recurso sistemático à violência como forma de intimidação da

comunidade no seu todo. No entanto, a prática do “terror” pode visar finalidades políticas muito

distintas: a subversão do sistema político (como sucedeu com as Brigadas Vermelhas na Itália ou

com o Baader Meinhof na Alemanha), a destruição de movimentos cívicos ou democráticos (como

sucedeu com a Aliança Anticomunista da Argentina e, em certa medida, com os Esquadrões da

Morte brasileiros), o separatismo (como sucede com o ETA) ou a afirmação de convicções

religiosas (como sucede com alguns movimentos fundamentalistas).” BOBBIO, N. Dicionário de

Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1986.

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FORMAS DE TERRORISMO

Terrorismo de Estado: É aquele no qual o governo promove

genocídio, extermínio, prisões, torturas e deportações, alegando para tanto razões de Estado, ou segurança nacional, agindo contra minorias étnicas, religiosas ou políticas.

Pecequilo (2004, p.206) refere-se ao terrorismo vindo de cima, caracterizando a ação do Estado.

Por exemplo: A Revolução Russa de 1917 pôs fim ao regime

imperial russo, implantando o socialismo. Iossef Stálin, Secretário-Geral do Partido Comunista, era o responsável pela administração e pela

filiação e exclusão de seus membros. Como a URSS era dirigida pelo partido, na prática, Stálin governava com mãos de ferro, incentivando o culto a sua personalidade, perseguindo, prendendo, deportando e eliminando qualquer um que fosse considerado

suspeito ou “inimigo do regime”. No total, no período do terror stalinista (1936 a 1938), 13,5 milhões de pessoas foram executadas. Mesmo depois da Segunda Guerra Mundial,

essa prática continuou contra os povos inimigos (as minorias étnicas), promovendo deportações em massa. Somente após a morte de Stálin, em 1953, é que essa era teve fim.

Outro bom exemplo de terrorismo de Estado é o holocausto nazista. No pós-

Primeira Guerra Mundial, Adolf Hitler emergiu com um discurso nacionalista, ressaltando o quanto a Alemanha tinha sido oprimida pelos vencedores, exaltando a superioridade

(racial) dos arianos e condenando os judeus e comunistas pelo infortúnio alemão. Hitler conseguiu levar a Alemanha novamente ao conflito e nessa empreitada perseguiu

minorias como os judeus, ciganos, negros, homossexuais, além de comunistas.

A Revolução Comunista e a Revolução Cultural na China também tiveram conseqüências trágicas. A marcha de Mão Tsé-Tung pelo interior da China até Pequim possibilitou a introdução de um regime socialista em 1949. Logo depois da tomada do

poder, estabeleceu-se uma política de “reeducação” de massas, segundo a qual a população deveria libertar-se das tradições e do pensamento feudal e capitalista.

Iniciou-se aí um processo de eliminação de todos os considerados opositores do

regime. Estima-se que cinco milhões de chineses tenham sido mortos em menos de dois anos, após serem torturados.

Não é preciso voltar tanto no tempo. A atuação dos norte-americanos no Iraque durante a guerra (2004) e mesmo depois pode ser classificada como terrorismo de

Estado. A condução do processo de “redemocratização”, assim como o uso de empresas de segurança privada, tem se demonstrado uma forma nova e sutil de terrorismo de

Estado, em pleno século XXI.

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Terrorismo de pessoas ou de grupo: praticado por pessoas que se reúnem

com o mesmo objetivo para praticar atos que levem temor a governos ou a populações. Pecequilo (2004: p. 205) sustenta que terrorismo engloba ameaças e atos de violência implícitos e explícitos realizados por grupos específicos, visando realização de seus

objetivos em um dado contexto, sejam eles políticos, territoriais, religiosos ou ideológicos. Por exemplo: O Exército Republicano Irlandês (IRA) é um grupo terrorista

que entrou em atividade na década de 1970 para lutar, por meio de atentados e guerrilha urbana, por igualdade de direitos civis entre católicos e protestantes na Irlanda

do Norte. As ações terroristas do IRA levaram o governo inglês a reformular sua política para a Irlanda do Norte e, após muitas mortes, um acordo de paz foi firmado em 1998.

O Euskadi ta Askatsona (ETA) também é um exemplo de grupo terrorista, neste caso, lutando por uma causa territorial. O ETA representa a luta dos bascos por

independência. O País Basco situa-se a nordeste da Espanha e sudoeste da França, apresentando uma identidade cultural muito forte e diferente da espanhola. Basta

observar a língua basca, o euskara ou vasconço, ou suas tradições culturais. Esta região teve sua participação política proibida e suas tradições reprimidas durante a ditadura Franquista. Surge, então (1968/69), um movimento terrorista que inicia uma série de

atentados contra autoridades ligadas ao regime de Franco. Com o fim da ditadura e a redemocratização, o grupo perde a simpatia popular, principalmente a partir de 1990,

porque os radicais do movimento não aceitavam a negociação política. Assim, como esses outros grupos, também destacaram-se no final dos anos 1960 e nos 1970, na Itália

– As Brigadas Vermelhas (Brigate Rosse) – e na Alemanha – o grupo Baader-Meinhof. Ou mesmo a luta armada no Brasil, com o MR-8 (Movimento Revolucionário de 8 de Outubro).

Terrorismo de indivíduo: Praticado por apenas um indivíduo que usa da prática

do terror para conseguir seus objetivos. Por exemplo: Nascido na Venezuela, o Chacal, influenciado na infância por seu pai comunista, recebeu treinamento militar em Cuba e

estudou na URSS. Em 1973, aos 24 anos, ingressou na Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) e se tornou o homem mais procurado pelas polícias secretas do ocidente, pelo número de atentados e assassinatos que praticou. Assim também atuou

Thimothy McVeigh, norte-americano ligado a milícias brancas racistas e grupos de extrema-direita do interior dos Estados Unidos, que em 1995 provocou a explosão de um

carro-bomba com mais de duas toneladas e meia de nitrato de amônia, destruindo um prédio federal em Oklahoma City, vitimando 168 pessoas e ferindo mais 600, inclusive 19

crianças que estavam na creche da repartição.

Há quem fale do terrorismo como manipulação do discurso político, maximizando e mistificando a figura do inimigo, em especial as chamadas novas redes internacionais como a Al-Qaeda, provocando um clima de pânico, ansiedade e instabilidade que permite

a aplicação de medidas coercitivas, em um controle social e policial rígido das sociedades.

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Nesse sentido, parece uma tendência atual

batizar de ‘novo terrorismo’ as atividades de redes transnacionais de ameaças que se valem das tecnologias do século XXI para ganhar uma

dimensão mundial. O novo terrorismo se sustentaria em dois pilares: tecnologia e

fundamentalismo religioso (Pecequilo, 2004: p.207).

Trata-se de grupos terroristas altamente capacitados tecnologicamente, que

contestam a ordem mundial representada pela hegemonia norte-americana. A Al-Qaeda se encaixa perfeitamente nessa descrição.

Com certeza, o terrorismo atual tem mais recursos para causar danos maiores e maior visibilidade nos meios de comunicação para torná-los mais espetaculares. Ainda

assim, a aparente modernidade do terrorismo novo está paradoxalmente ligada ao uso da religião na contestação do sistema. É a religião que permite cooptação de seguidores

frustrados com a sensação de exclusão e perda de lugar no mundo.

PRINCIPAIS GRUPOS TERRORISTAS

Observe, no quadro a seguir, os principais grupos terroristas.

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CRIME ORGANIZADO E TRÁFICO DE DROGAS

A segurança internacional, entretanto, não está ameaçada apenas pelo

terrorismo, outras ameaças têm se expandido com a transnacionalização, tais como o tráfico de drogas e o crime organizado. Em ambos os casos, crescem os riscos para países envolvidos na rota do tráfico, seja sob a ação de cartéis de drogas ou de máfias

internacionais, tendendo a crescer mais ainda diante dos vácuos de poder e da crise socioeconômica que atingem certas nações. Subsidiariamente, aumenta a violência, os

crimes, a corrupção do poder público e a desagregação social. O caso colombiano, no qual o Estado oficial controla apenas 1/3 de seu território soberano, mostra a

incapacidade do poder público de lidar com o narcotráfico e com a guerrilha.

O crime internacional está diretamente relacionado à lavagem de dinheiro, transferências ilegais de dinheiro no âmbito da internet por meio da ação de hackers, assim como da invasão de privacidade, da exploração sexual etc.

O grande perigo, todavia, está no mercado negro de

armas, principalmente o comércio de Armas de Destruição em Massa (ADM). Com o fim da URSS e da

importância do arsenal nuclear em 1991, um shopping center de armas abriu-se para o mundo: o arsenal das antigas repúblicas soviéticas. Os principais conflitos

armados mundiais, principalmente na África e na Ásia, recebem armas desse grande mercado de sucatas

atômicas, quando não de produtores clandestinos.

Nesse contexto, a natureza da guerra parece alterar-se novamente. Hoje há uma regressão na autocontenção do uso do

elemento decisivo, mesmo por parte de potências “responsáveis” como os EUA. As AMDs funcionam como um elemento de poder,

podendo ser usadas na prática ou apenas como instrumento de dissuasão. O conflito entre Índia e Paquistão, pela região da Cashemira, é um bom exemplo - ambos têm bombas atômicas.

O grande perigo está na “democratização” das ADMs, como

lembra Pecequilo (2004: p. 213), afinal está-se tornando comum até

Com relação ao tráfico de drogas, pode-se enumerar uma

série de atividades ilícitas, tais como o comércio de substâncias entorpecentes como a cocaína, a heroína, o ópio, a maconha e também das chamadas drogas sintéticas, como ecstasy, de fácil manipulação e venda.

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entre grupos terroristas. Não se trata apenas de dispositivos nucleares, mas também de

químicos e biológicos. Até na guerra, o número de agentes parece aumentar. A exclusividade do Estado parece estar ameaçada.

Vale lembrar que o caráter transnacional dos grupos terroristas suscita dúvida até quanto à forma de combate: atividade policial ou das forças armadas? Combate local,

regional ou mundial? Como e quando cooperar?

Muitos Estados, porém, preferem utilizar as forças armadas para dar mais

visibilidade a sua ação. Os norte-americanos, por exemplo, promoveram a invasão e

bombardeio do Afeganistão na “caçada” aos responsáveis pelos atentados de 11 de

setembro. Por que bombardear o território de um Estado soberano, se a ação foi

executada por um grupo terrorista? Na verdade, os Estados Unidos precisaram

‘territorializar’ o terrorismo para promover sua nova estratégia geopolítica. Afinal, com o

fim da Guerra Fria, terminara em tese a necessidade de forças armadas invencíveis.

Talvez por isso os norte-americanos tenham transformado o terrorismo numa

“cruzada”. O Eixo do Mal, como batizado por Bush, representa o grupo de países

considerados pelos Estados Unidos como países terroristas. Faziam parte do Eixo do Mal,

segundo o governo norte-americano, o Afeganistão, o Iraque, o Irã, a Coréia do Norte

etc. Essa classificação tem permitido aos Estados Unidos intervir em países soberanos,

de acordo com seus interesses geopolíticos, e violando o direito internacional.

Assim ocorreu no Iraque. Não é segredo que não havia armas de destruição em

massa (ADM) escondidas no Iraque, nem Saddam Hussein era aliado ou colaborador do

Bin Laden ou da Al-Qaeda. Portanto, a intervenção norte-americana, no Iraque, não

passa de uma grande estratégia de controle de fontes produtoras de petróleo e um

ensaio da nova estratégia de “dominação” mundial.

IMPACTO ECONÔMICO

O terrorismo, o crime organizado e o tráfico de drogas têm um impacto

significativo na economia internacional. No pós-atentado de 11 de setembro, empresas aéreas, agências de turismo, hotéis, comércio e até o sistema financeiro foram atingidos. A economia mundial, como um todo, percebeu sua dependência em relação à

segurança internacional. Bastou um atentado para que viagens fossem canceladas,

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compras deixassem de ser feitas, investimentos fossem reavaliados e novos destinos

escolhidos.

Levou algum tempo para que o déficit da segurança fosse equilibrado. Para isso, medidas de segurança foram implementadas e governos precisaram garantir que a vigilância havia sido reforçada. Curiosamente, alguns países se beneficiaram de um perfil

pacífico. Ainda que vítima da sua violência civil, o Brasil passou a ser destino certo de muitos transatlânticos, que viram na costa da América do Sul uma rota segura. Muitos

turistas deixaram de visitar países centrais e buscaram opções entre países em desenvolvimento.

As decisões de investimentos, seja

na produção seja em portfólio, passaram a levar em consideração não só riscos financeiros e políticos, mas também a

questão da possibilidade de ataques terroristas.

A economia internacional mudou

desde os atentados de 11 de setembro e a segurança internacional passou a figurar como um novo custo na produção, porque

encareceu os transportes, e comprometeu as vendas.

Outro assunto que ocupa a mídia internacional, com mais freqüência do que nós gostaríamos, é a questão da violação dos direitos humanos. Você não acha curioso esse

termo – direitos “humanos”? Será que chegamos a tal ponto de termos que nos diferenciar do que não é humano? Por isso é importante discutirmos como esse tema vem sendo tratado nas relações internacionais e quais são as principais conseqüências

dessas violações, tais como as migrações.

Para aprofundar seus conhecimentos, leia o capítulo 4, tópico 4.3.2, do livro Introdução às relações internacionais: temas, atores e visões, indicado na bibliografia da disciplina.

Pesquise na internet sobre as conseqüências econômicas do atentado de 11 de setembro

para a economia mundial.

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Aula 10 Aula10: Desenvolvimento sustentável e acesso a tecnologias sensíveis Afinal, a última aula. Deixamos um tema bastante polêmico para esta aula – Direitos Humanos. O que são os tais direitos humanos? Quando surgiu este conceito? Até que ponto a defesa dos direitos humanos interfere com questões culturais e de valores? Quais as conseqüências das violações aos direitos humanos para o sistema internacional. Todas estas questões permeiam nossa aula sobre direitos humanos. Vamos lá?

HISTÓRICO

Na cultura ocidental, o tema de direitos humanos nos remete a discussões

filosóficas que datam da Idade Média. Podemos resumir esse debate nas teorias de jusnaturalistas, que defendem a existência de direitos inerentes à condição humana (direitos naturais), tais como o direito à vida, à liberdade, à igualdade etc., os quais

poderiam ser defendidos e invocados a qualquer tempo; e os positivistas, que sustentam que direitos são válidos e eficazes quando transformados em normas positivas

(expressas na Constituição, nas leis e etc.). Mas de onde provêm os direitos tidos, hoje em dia, como humanos?

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Pode-se afirmar que o Cristianismo, e a Igreja Católica em particular,

contribuíram para a expansão dos Direitos Humanos como “valores universais”, com base em sua natureza divina. Por isso o direito natural teve sua origem no direito canônico (o direito da Igreja Católica) e só posteriormente tornou-se laico (desligado da religião).

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM

No âmbito internacional, apenas recentemente a questão dos direitos humanos

torna-se uma preocupação – data de após a Segunda Guerra Mundial -, ainda que o Congresso de Viena (1815) tenha iniciado o processo de abolição do tráfico de escravos

já no século XIX, como lembra Gonçalves (2002). A questão dos direitos dos indivíduos era considerada como competência exclusiva do Estado, abrindo-se exceção apenas para os estrangeiros e para as minorias étnicas e religiosas. Juridicamente, nenhum órgão ou

instituição externa tinha competência para interferir em assuntos internos de um Estado. A divulgação na mídia das atrocidades praticadas nos campos de concentração e do

genocídio nazista, durante a Segunda Guerra Mundial, no entanto, foi suficiente para que esse entendimento fosse revisto. Iniciativas regionais e mundiais, de proteção aos

direitos humanos, tornam necessária a criação de mecanismos que comprometessem os Estados. Por isso a questão da defesa dos direitos humanos é incluída em todo o processo de criação da ONU, como matéria de grande relevância. É emblemática desse

processo a Declaração Universal dos Direitos do Homem, apresentada em 1948 na ONU. Nela fundem-se duas concepções sobre direitos humanos, isto é, os direitos civis

enunciados na Constituição Francesa (1789) e os direitos econômicos e sociais (direito ao trabalho, à educação e ao lazer) reconhecidos pelos governantes europeus, no final do século XIX.

No continente americano, é de se citar a Declaração

Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948), e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida

como Pacto de San José da Costa Rica (1969). Esses instrumentos constituem a base jurídica mediante a qual a

OEA e a Corte Interamericana de Direitos Humanos vêm tratando os problemas de Direitos Humanos no hemisfério.

Na Europa, o Convênio Europeu dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais (1950) também é um

instrumento basilar, a partir do qual o Tribunal de Justiça da União Européia protege os Direitos Humanos como parte

integrante dos princípios gerais do ordenamento comunitário.

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DIREITOS HUMANOS E A DIVISÃO POLÍTICO-IDEOLÓGICA DA GUERRA FRIA

De todas as discussões internacionais sobre os direitos humanos, o apartheid

(sistema de discriminação e segregação racial), na África do Sul, foi o que mais movimentou as instâncias deliberativas da ONU até hoje. Desde 1948, o governo branco passou a adotar severas restrições aos direitos e garantias fundamentais da população

negra da África do Sul. Diante dessas agressões aos direitos humanos, a comunidade internacional passa a condenar abertamente o regime do apartheid. A Assembléia-Geral

da ONU qualificou-o de crime de lesa-humanidade e o Conselho de Segurança declarou-o crime contra a consciência e a dignidade da humanidade.

Essa luta ensejou uma decisão inédita na história das

relações internacionais: o Conselho de Segurança tornou obrigatório, em 1977, nos termos do Capítulo VII da Carta da ONU (Ameaças à Paz e à Segurança Internacionais), o

embargo de armas (suspensão da venda e do envio de qualquer tipo de arma ou munição) contra a África do Sul.

No campo do direito internacional isso significou que, pela primeira vez na história, a ONU ditava uma norma de caráter obrigatório aos Estados-membros.

Não obstante à luta contra o apartheid, a segregação

racial na África do Sul só termina com o fim da Guerra Fria. Na verdade, o regime do apartheid foi instrumental para os

Estados Unidos, na medida em que a África do Sul se opunha a Angola, ex-colônia portuguesa que, ao proclamar a

independência, se tornou socialista e alinhada à URSS. Na época da Guerra Fria, havia divergências entre o mundo soviético e o ocidental. Os soviéticos acusavam o mundo

capitalista de violar os direitos humanos por não respeitar o direito econômico-social; e o bloco capitalista acusava o

soviético de não respeitar os direitos políticos de seus cidadãos.

DIREITOS HUMANOS E O MULTICULTURALISMO

Quando a Guerra Fria terminou, acreditava-se que esse problema estaria superado. No entanto, outro problema surgia: o multiculturalismo. Para determinados

Estados do oriente, é inadmissível a pretensão do ocidente de universalizar sua concepção individualista de direitos humanos. Segundo esses Estados, a concepção

desses direitos está submetida a códigos culturais inconfundíveis, de modo que qualquer tentativa de universalização do conceito só pode corresponder a evidentes interesses de hegemonia cultural.

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O mais curioso dessa questão é que todos os Estados em tese os defendem, bem

como nenhum Estado admite sua violação. Assim, apesar da dificuldade de conciliar diferentes visões de direitos humanos, a luta contra o desrespeito avançou em muitas áreas:

A CONFERÊNCIA MUNDIAL DOS DIREITOS HUMANOS DE VIENA (1993)

No âmbito da ONU, em 1993 foi realizada, em Viena, a Conferência Mundial dos Direitos Humanos com a participação de 1.200 ONGs de defesa dos direitos humanos 10e confirmando, assim, o incremento da participação dos atores não-governamentais nos

assuntos internacionais.

A conferência tinha como objetivo elaborar um documento consensual que representasse um verdadeiro avanço no tratamento do tema pela comunidade

internacional (Pecequilo, 2004: p. 195).

10 Algumas delas, já abordadas na Aula 3, como a Anistia Internacional, a Organização Mundial Contra a Tortura e o American Watch, produzem relatórios periódicos sobre a situação dos direitos humanos no mundo, conseguindo muitas vezes até influenciar a opinião pública e governos.

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A situação internacional complicou-se substancialmente desde então, mas nem tudo está perdido. Ninguém pretende negar a gravidade das violações de direitos humanos que ocorrem em países em desenvolvimento, inclusive, no Brasil. Tampouco

seria lógico abandonar a luta para fazer ver, ao Primeiro Mundo, a parcela de responsabilidade que lhe incumbe pela situação de miséria com que se defrontam

parcelas da população mundial, favorecendo a ocorrência de violações em toda parte. Além disso, é preciso ter clareza que a imposição de um modelo, ou de “valores

universais”, gera uma natural resistência. É preciso tratar os fatores que ameaçam os direitos humanos11 de forma objetiva e multicultural para podermos resolver a questão dos direitos humanos.

MIGRAÇÕES E DIREITOS HUMANOS

A persistência desses problemas gera distorções no sistema

internacional, dentre elas as migrações internacionais. Motivadas pela crescente interdependência econômica e as oportunidades de

trabalho que oferecem os países desenvolvidos, bem como por receio de conflitos armados de natureza interna e internacional, contingentes populacionais têm se deslocado no globo.

A questão migratória entre México e Estados Unidos, por

exemplo, é um clássico. A fronteira entre os dois países tem sido a porta de entrada de milhares de mexicanos que imigram de seu país,

em direção ao “sonho americano”. Grande parte desse fluxo migratório dá-se de forma ilegal, ou seja, sem que as autoridades

destes Estados registrarem a passagem das pessoas (Pecequilo, 2004: p.209).

11 Incapacidade de governos para controlar seus agentes, o crescimento generalizado da criminalidade comum, a persistência de preconceitos arraigados nas respectivas culturas, o fundamentalismo religioso intolerante, a falta de equidade na aplicação das leis, as condições de pobreza absoluta e marginalidade de vastos segmentos populacionais, as deficiências dos sistemas educacionais, a escassez de recursos para a área da saúde, emprego, previdência social, assim como a falta de conhecimento dos direitos garantidos a cada pessoa pelo Direito Interno.

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No caso dos conflitos armados e dos conflitos étnicos, os deslocamentos populacionais dão-se de maneira forçada: são populações civis tentando escapar do risco de morrer, seja pelas armas, seja pela própria inanição gerada pelo isolamento de

cidades que estão sob fogo cruzado, sem alimentos, nem água, nem energia. Para se ter uma idéia do impacto de tais migrações em certos países, verificou-se, em 1992, que o

Irã abrigava 4.151.700 refugiados do Afeganistão e do Iraque; a Alemanha abrigava 827.100 refugiados da ex-Iugoslávia, da Romênia e da Turquia, e o Sudão abrigava

725.500 da Somália e da Etiópia.

Para cuidar desse assunto, a ONU dispõe de uma agência especializada - o Alto Comissariado das Nações para Refugiados (ACNUR) - que tem escritórios espalhados por vários pontos do globo.

MIGRAÇÕES INTERNACIONAIS E RELAÇÕES DE TRABALHO

É interessante notar que a demografia sempre foi um fator

dos mais considerados nas estratégias geopolíticas dos Estados. Quanto maior o poder de deslocamento das

populações e o tamanho de seus exércitos, maior o poder relativo do Estado. Com o advento da era nuclear e a ameaça de destruição em massa, o fator populacional havia

perdido sua importância no contexto da Guerra Fria. Porém, em tempos de crescente interdependência, o fator populacional voltou a ganhar

relevância. Principalmente porque esses deslocamentos podem não ser desejados, nem da parte do país que está sendo evadido, nem pela parte do país receptor. As

conseqüências para o mercado de trabalho, de um país que está recebendo contingentes populacionais de outro, podem ser desastrosas.

Imigrantes, em geral, estão dispostos a qualquer trabalho e por isso promovem uma baixa no patamar salarial, principalmente dos empregos de nível salarial mais baixo, que

não requerem mão-de-obra especializada.

Cresce também o subemprego e o emprego clandestino, tornando mais difícil avaliar os indicadores econômicos e trabalhistas do país.

Para aprofundar seus conhecimentos, leia o Capítulo 4 do livro Introdução às relações internacionais: temas, atores e visões, indicado na bibliografia da disciplina.

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Pesquise na internet o problema da mutilação genital das mulheres, em culturas

fundamentalistas, e faça um sumário de n linhas, que deve ser postado na central de mensagens do seu professor até dd/mm.

Nesta aula, você:

• Conheceu o histórico dos Direitos Humanos e os principais conceitos a ele

relacionados. • Analisou a importância da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do

Homem, de1948. • Analisou como as migrações afetam o mercado de trabalho nos países.

Considerações finais Parabéns! Você terminou a sua disciplina on-line.

Aprender no mundo virtual é gratificante!

Em primeiro lugar, seria muito importante você lembrar da caminhada realizada! E, quem sabe, você não se entretenha com aquele conteúdo mais apreciado ou descubra

questões novas que fugiram a sua percepção?

Para finalizar, responda ao questionário de avaliação da disciplina e a sua auto-avaliação.

Lembre-se de que suas respostas são muito importantes para todos nós – professores que realizam a tutoria, professores que estruturaram a disciplina, profissionais

responsáveis pelo layout e acessibilidade da mesma.

Somente com sua opinião sincera, poderemos melhorar cada vez mais nosso atendimento àqueles que são nossa meta mais importante no ato de educar – os alunos! Perceba que, ao avaliar esta disciplina, você está colaborando com um processo que é

cada vez mais necessário e inevitável em nossa sociedade – a inclusão digital.

Desde já, agradecemos sua participação.

IMPORTANTÍSSIMO: Muito obrigado pela sua companhia! Com certeza, todos nós crescemos um pouco mais ao longo do estudo desta disciplina: crescemos como

estudantes, crescemos como professores; mas, principalmente, crescemos como pessoas! E isso é muito bom, não é?