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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS RODRIGO MONTANARI CABRAL REGULAMENTAÇÃO DOS ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA NOVA LIMA – MG 2012

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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS RODRIGO MONTANARI CABRAL

REGULAMENTAÇÃO DOS ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

NOVA LIMA – MG 2012

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RODRIGO MONTANARI CABRAL

REGULAMENTAÇÃO DOS ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NA

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Projeto de pesquisa apresentado ao Curso de Graduação em Direito, da Faculdade de Direito Milton Campos, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharelado em Direito. Linha de Pesquisa: Regulamentação dos OGM Orientadora: Profa. Ms. Fernanda Aparecida Mendes e Silva Garcia Assumpção

NOVA LIMA – MG 2012

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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS

CURSO DE GRADUAÇÃO

A monografia intitulada REGULAMENTAÇÃO DOS ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA de autoria do graduando RODRIGO MONTANARI CABRAL, com banca constituída pelos seguintes professores:

____________________________________________________________ Profa. Ms. Fernanda Aparecida Mendes e Silva Garcia Assumpção

(Orientadora)

_______________________________________ Prof.

_______________________________________ Prof.

_______________________________________ Prof.

Nova Lima, novembro de 2012

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AGRADECIMENTOS

Em especial agradeço aos meus pais, pela paciência e pelo apoio ao

longo de todo este tempo, sempre me apoiando e incentivando, nunca me

deixando desistir.

À minha orientadora, Fernanda Aparecida, que me acolheu no meio

do meu trabalho, muito obrigado pelo apoio e pelos ensinamentos, não só ao

longo da produção deste trabalho, mas durante todo o Curso de Direito.

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RESUMO

O uso dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM) tem levantado diversas dúvidas na sociedade brasileira. Nesse contexto, o presente trabalho se propõe a analisar as normas jurídicas que regulamentam o seu uso. Para tanto, será feito um breve estudo em relação à legislação existente; à questão da rotulagem e serão discutidas as divergências e falhas na sua fiscalização. Tudo isso visando garantir a aplicação adequada da legislação brasileira e esclarecer corretamente o produtor e o consumidor quanto ao uso dos OGM. Palavras-chave: Agricultura Brasileira. Biossegurança. Legislação Brasileira. Transgênicos

.

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ABSTRACT The use of Genetically Modified Organisms (GMO) have raised several questions in Brazilian society. In this context, this study aims to examine the legal standards governing their use. Therefore, a brief study will be done in relation to the current legislation, considering the issue of labeling, and the differences and gaps will be discuss in its fiscalization . All this in order to ensure proper application of Brazilian law and clarifying the producer and the consumer in the right use of GMO. . Keywords: Biosafety. Brazilian Agriculture. Brazilian Legislation. Transgenics.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................ 1 2 ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGM) ......... 2 2.1 Origem ............................................................................................ 2 2.2 Evolução ........................................................................................ 2 2.3 Conceitos ....................................................................................... 3 2.3.1 Transgênico ou OGM ...................................................................... 3 2.3.2 Biotecnologia ................................................................................... 4 3 PRINCIPIO DA PRECAUÇÃO E OS ORGANISMOS

GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGM) ................................... 5

3.1 Características do princípio da precaução ................................. 5 4 LEGISLAÇÃO REGULAMENTADORA DOS ORGANISMOS

GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGM) ................................... 9

4.1 Lei 11.105/2005 ou Lei de Biossegurança e Decreto 5.591/2005 ......................................................................................

9

4.1.1 Conceituações ................................................................................. 9 4.1.2 Órgãos de fiscalização .................................................................... 12 4.1.2.1 Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) ............................... 12 4.1.2.2 Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio)............... 13 4.1.2.3 Comissão Interna de Biossegurança (CIBio) .................................. 17 4.1.2.4 Sistema de Informação em Biossegurança (SIB) ........................... 17 4.1.3 Responsabilidade civil e administrativa ........................................... 18 4.1.3.1 Princípio do Poluidor Pagador ......................................................... 18 5 A QUESTÃO DA ROTULAGEM ..................................................... 24 5.1 Decreto 4.680/2003 e o Código de Defesa do Consumidor ....... 24 5.2 Divergências na fiscalização da rotulagem ................................ 26 5.3 Falhas na fiscalização ................................................................... 27 6 CONCLUSÃO ................................................................................. 31 7 REFERÊNCIAS ............................................................................... 33

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FACULDADE DE DIREITO MILTON CAMPOS RODRIGO MONTANARI CABRAL

REGULAMENTAÇÃO DOS ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS NA

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

_________________________________

NOVA LIMA-MG 2012

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1 INTRODUÇAO

Constitui-se tema deste trabalho uma análise da discussão acerca dos riscos do uso

dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM), envolvendo não só as áreas da biologia,

da ética, da religião, da economia, da sociologia como, também, as questões jurídicas.

As empresas envolvidas com essa nova tecnologia não disponibilizam

esclarecimentos sobre as vantagens ou desvantagens de se produzir determinados alimentos

geneticamente modificados. Como as informações sobre esse assunto muitas vezes são

insuficientes, tem sido fervorosa, no Brasil, a discussão sobre os riscos da sua produção.

Discute-se a sua liberação, a forma de sua regulamentação e quais órgãos seriam competentes

para tal fim.

Os opositores dos OGM não se limitam apenas à preocupação com a saúde dos seres

humanos e ao equilíbrio do meio ambiente e sua biodiversidade. Eles opõem-se também ao

controle do mercado, nos países subdesenvolvidos, das grandes empresas multinacionais

detentoras do domínio da técnica, gerando assim uma dependência tecnológica e um aumento

das desigualdades no comércio internacional, sem falar nos efeitos relativos à liberdade de

escolha do consumidor.

Porém existem também os que defendem o fato de que os agricultores se beneficiam

das parcerias com as multinacionais, quando adquirem maquinário, implementos agrícolas e

até mesmo aviões, que serão usados no plantio e na pulverização de lavouras. Outros

partidários defendem que os OGM podem propiciar a criação de alimentos mais nutritivos e

duráveis, além do seu uso benéfico na medicina, criando novos remédios e colaborando no

avanço do transplante de órgãos.

O presente trabalho enfocará as normas jurídicas que regulamentam ou que, pelo

menos, tentam tratar da questão controversa que é o uso dos OGM. Também serão estudadas

as regras estabelecidas para o uso de técnicas de engenharia genética e para a liberação desses

organismos no meio ambiente.

Assim se faz necessário este estudo, já que esses organismos estão cada vez mais

ganhando espaço no nosso mundo, tornando-se imprescindível a sua regulamentação na nossa

legislação, garantindo o direito dos consumidores e a conservação do meio ambiente, sem que

haja um impedimento ao desenvolvimento ou retrocesso em nossas pesquisas científicas.

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2 ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGM)

Antes de adentrar no objetivo deste trabalho, que é o estudo da legislação pátria a

respeito dos OGM, é necessário fazer uma pequena abordagem sobre a origem e a evolução

desses organismos que hoje causam tanta polêmica.

2.1 Origem

Em 1856, o monge e botânico Gregor Mendel iniciava seus experimentos de

melhoramento genético cruzando, durante dez anos, ervilhas lisas e rugosas nos jardins e

hortas de seu mosteiro na Áustria. Mendel, hoje conhecido como o pai da genética, descobriu

que determinada característica de uma planta passava de uma geração a outra de uma maneira

matematicamente previsível.

O reconhecimento do trabalho de Mendel só se deu 16 anos após a sua morte, em

1884. Porém antes de 1900 já acontecia o melhoramento genético, o qual só passou a ser

considerado uma ciência com a evolução das técnicas aplicáveis graças às descobertas das

Leis de Mendel.

Depois dele vários cientistas deram seguimento ao estudo da hereditariedade em

plantas, alguns introduzindo novos conceitos e terminologias como mutação, gene e genética.

Começava assim a nascer uma nova ciência, surgindo os primeiros OGM da história da

humanidade.

2.2 Evolução

Desde 1900 até os dias atuais, os estudos e avanços tecnológicos em genética

cresceram e se desenvolveram. Foi descoberta a estrutura do DNA e, no ano de 1973, ocorreu

o fato mais importante para este estudo em questão, quando foi criada a técnica do DNA

recombinante. Dois cientistas norte americanos, Stanley Cohen e Hebert Boyer, transferiram o

gene de um sapo para uma bactéria, o que resultou na produção de proteínas do sapo por parte

da bactéria. Nascia assim a engenharia genética, começando a era da biotecnologia.

A partir de então outras descobertas aconteceram nesse campo, novas técnicas de

melhoramento genético foram criadas e em 1997 nasceu o primeiro mamífero clonado, a tão

conhecida e polêmica ovelha Dolly. Em 2000 é anunciado o fim da decodificação do genoma

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humano e os avanços continuam até hoje, já que a sede de saber do ser humano é

interminável.

Os OGM deixaram de ser ficção e se tornaram realidade. Foram desenvolvidas

plantas melhores, mais resistentes às pragas e às secas, tudo isso em prol de um

desenvolvimento com maior rentabilidade e redução de custos. Porém, tudo aquilo que

maravilha alguns também assusta outros, pois é normal do ser humano temer aquilo que ele

desconhece. Muitas são as pessoas que veem nos OGM ou transgênicos um perigo de

tamanho incalculável, questionando não só os efeitos desses organismos no meio ambiente

como também na saúde humana.

2.3 Conceitos

Mas o que são esses transgênicos que causam tanta polêmica? O que é essa tal

biotecnologia?

2.3.1 Transgênico ou OGM

A Lei de Biossegurança assim conceitua OGM em seu artigo 3°, inciso V: “OGM:

organismo cujo material genético – ADN/ARN tenha sido modificado por qualquer técnica de

engenharia genética.” 1

O mesmo artigo da citada lei, em seu parágrafo primeiro também define aquilo que

ele não considera como OGM:

§1° Não se inclui na categoria de OGM o resultante de técnicas que impliquem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, inclusive fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer outro processo natural.2

Já o dicionário assim define transgênico: “diz-se de ou organismo que contém um ou

mais genes transferidos artificialmente de outra espécie.” 3

1 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.716. 2 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.717. 3 HOUAISS, Antonio, VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. p.2751.

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Os dois conceitos trazem pontuações diferentes acerca do mesmo tema, já que a lei

traz ressalvas àquilo que ela define como OGM e o dicionário considera transgênico todo

organismo que contém genes transferidos artificialmente, independentemente do tipo de

tecnologia utilizada.

Luiz Pedro Bonetti faz o seguinte entendimento a respeito da conceituação de OGM:

A denominação Organismo Geneticamente Modificado ou OGM tem sido utilizada ultimamente como uma expressão de impacto negativo ao material genético resultante de procedimentos biotecnológicos, como a transferência gênica. Trata-se a meu ver de uma expressão que busca acentuar maior contraste entre uma variedade transgênica e uma variedade chamada convencional. Na realidade, ambas são resultantes de processos tecnológicos que alteram sua constituição genética. Assim sendo, uma variedade que tenha sido desenvolvida de cruzamentos através do melhoramento genético convencional também é um Organismo Geneticamente Modificado. Além disso, uma planta resultante desse processo convencional de hibridação é muito mais geneticamente modificada do que transgênica, uma vez que, ao cruzarmos duas variedades de uma espécie, estamos misturando milhares de genes desconhecidos na tentativa de obter a característica desejada. No genoma do milho, que já foi decifrado ou decodificado, são aproximadamente 100 mil genes. Por tudo isso, OGM poderia muito bem significar Organismo Geneticamente Melhorado. E identificaria os dois tipos de variedades. 4

Apesar de se concordar com a definição de Bonetti, como este é um estudo sobre a

legislação brasileira a respeito dos transgênicos, será mantida a conceituação dada pela lei

para o desenvolvimento do presente trabalho, ou seja, será considerado como OGM aquele

organismo geneticamente modificado através da técnica de DNA recombinante.

2.3.2 Biotecnologia

Este conceito já não traz tantos problemas e é assim definido pela Convenção sobre

Diversidade Biológica: “Biotecnologia significa qualquer aplicação tecnológica que utilize

sistemas biológicos, organismos vivos, ou seus derivados, para fabricar ou modificar

produtos ou processos para utilização específica.”5

Feitas as devidas explanações, na próxima seção procura-se analisar o princípio da

precaução que norteia a legislação referente ao presente objeto de estudo.

4 BONETTI, Luiz Pedro. A polêmica dos transgênicos. Cruz Alta: Centro Gráfico UNICRUZ, 2001. p.89. 5 BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas. Programa Nacional de Conservação da Biodiversidade. A Convenção sobre Diversidade Biológica – CDB: cópia do Decreto Legislativo no.2, de 5 de junho de 1992. Brasília: 2000. p.9.

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3 PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO E OS ORGANISMOS GENETICAMENTE

MODIFICADOS (OGM)

Dentre os princípios basilares do Direito Ambiental, o princípio da precaução é o que

rege a matéria dos OGM na nossa legislação, como assim declara João Carlos de Carvalho

Rocha:

É no campo da biotecnologia que o princípio da precaução apresenta uma das suas aplicações mais marcantes, seja em razão das incertezas contidas na difusão dessas novas realidades biotecnológicas, seja porque torna imperativo a definição de um processo coletivo de decisão entre alternativas com implicações evidentes em toda a estrutura social, processo permanente e com soluções necessariamente tópicas. 6

Porém, é necessário fazer a distinção entre o princípio da precaução e o princípio da

prevenção, para melhor entender o porquê da aplicação da precaução sobre a prevenção.

Edis Milaré assim distingue os dois princípios:

a) Princípio da prevenção Aplica-se esse princípio, como se disse, quando o perigo é certo e quando se tem elementos seguros para afirmar que uma determinada atividade é efetivamente perigosa. (...) b) Princípio da precaução A invocação do princípio da precaução é uma decisão a ser tomada quando a informação científica é insuficiente, inconclusiva ou incerta e haja indicações de que os possíveis efeitos sobre o ambiente, a saúde das pessoas ou dos animais ou a proteção vegetal possam ser potencialmente perigosos e incompatíveis com o nível de proteção escolhido. 7

Como se pode ver a partir da diferenciação feita pelo doutrinador, um princípio se

distingue do outro quando se faz a avaliação do risco que determinada atividade representa

para o meio ambiente. A prevenção trata do risco certo enquanto a precaução trata do risco

incerto.

3.1 Características do princípio da precaução

Desse modo o princípio da precaução é dotado de determinadas características que o

tornam único e bem distinto do princípio da prevenção. A primeira característica é a

existência de risco, a incerteza ou a probabilidade do dano ambiental, que devem ser levados

em conta para a sua aplicação. Havendo unanimidade a respeito do assunto que está sendo

analisado deve-se agir prevenindo para que esse não venha a ocorrer.

6 ROCHA, João Carlos de Carvalho. Direito ambiental e transgênicos: princípios fundamentais da biossegurança. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p.208. 7 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5.ed. ref. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.766-7.

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O mesmo pode-se perceber com a Agenda 21, que assim trata do princípio da

precaução:

PRINCÍPIO 15 Com o fim de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada como razão para se adiar a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação do meio ambiente. 8

A segunda característica leva em consideração o tipo do risco ou da ameaça, já que

em determinados casos o princípio poderá ser aplicado com a simples constatação de uma

ameaça sensível, que pode ser considerável ou, em outros casos, ele será aplicado quando a

atividade puder causar danos de grave ou difícil reparação.

A terceira característica é a obrigatoriedade da fiscalização por parte do Poder

Público, que não pode deixar de examinar as técnicas e métodos utilizados em atividades que

possam vir a causar danos à saúde humana e ao meio ambiente, como dispõe a Constituição

da República:

Art.225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...) §1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.9

Já João Carlos de Carvalho Rocha entende que esse dever não incumbe somente ao

Estado, mas também à coletividade como é de se ver:

Pelo princípio da precaução, quando aplicado a questões ambientais, a incerteza científica, vale dizer, a possibilidade de um resultado que não seja necessariamente adverso, mas simplesmente não possa ser previamente determinado quanto ao seu conteúdo e conseqüências, impõe ao Estado e à coletividade o dever de adotar todas as medidas necessárias para prevenir a degradação ambiental que possa eventualmente ocorrer. 10

A quarta característica é a imediata implementação das medidas de prevenção, já que

o perigo de dano pode ser iminente e o dano pode ser irreversível. A precaução deve agir no

8 AGENDA 21: Declaração do Rio de Janeiro sobre meio ambiente e desenvolvimento. Disponível em: <http: www.ecolnews.com.br/agenda21/ > Acesso em: 16 nov. 2010. 9 BRASIL. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05.10.1988. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.139. 10 ROCHA, João Carlos de Carvalho. Direito ambiental e transgênicos: princípios fundamentais da biossegurança. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p.204.

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presente para evitar lamentações no futuro. A sua não implementação no tempo correto

constitui crime ambiental assim tipificado na Lei nº. 9.605/98:

Art.54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora: Pena – reclusão, de 1(um) a 4(quatro) anos, e multa. (...) §3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível.11

Os OGM apresentam as características necessárias para que o princípio da

precaução seja aplicado. Existe o risco e até mesmo a probabilidade do dano ambiental e não

se sabe ao certo qual o impacto que esses organismos possam ter no meio ambiente em que

forem empregados. Pode ser que num primeiro momento não ocorra nada, mas sabe-se que a

natureza não sofre de imediato, em determinados casos ela leva tempo para apresentar seus

sintomas quando, então, já pode ser tarde demais e os danos sofridos podem ser irreversíveis.

Além do provável impacto sobre o meio ambiente, não se sabe se a possibilidade de

que o consumo desses organismos possa acarretar algum tipo de dano para a saúde humana.

Assim se faz necessário, como medida de precaução a ser adotada, a realização do prévio

estudo de impacto ambiental, como bem assevera Vladimir Garcia Magalhães:

À semelhança do que ocorre quanto à aplicação do princípio da prevenção, o instrumento jurídico mais idôneo para avaliar o risco, grau e gravidade dos impactos potencialmente gerados por atividade de risco, nos limites da incerteza científica, é o estudo prévio de impacto ambiental, desde que seja realizado com todos os seus requisitos, por equipe multidisciplinar que efetivamente examine a atividade de risco face ao ambiente em que se pretende realizá-la (e que não apenas compile experiências desenvolvidas em condições e circunstâncias diversas), e garanta a possibilidade de contribuição de todas as partes interessadas, para que se pondere os custos ambientais da atividade ou produto. 12

Essa medida foi adotada no caso da soja transgênica produzida no Brasil. No caso em

questão a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) havia aprovado o plantio,

em escala comercial, da soja geneticamente modificada, chamada de Round up Ready da

Monsanto. Esse tipo de soja é resistente ao glifosato, princípio ativo que é largamente

utilizado como herbicida nas lavouras de nosso país. Duas ações civis públicas foram

ajuizadas contra a liberação dada pela CTNbio, uma pela Associação Civil Greenpeace e a

outra pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor. O princípio da precaução foi

11 BRASIL. Presidência da República. Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.389. 12 MAGALHÃES, Vladimir Garcia apud ROCHA, João Carlos de Carvalho. Direito ambiental e transgênicos: princípios fundamentais da biossegurança. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p.206.

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bastante utilizado na argumentação das duas ações, que pediam a suspensão e/ou proibição do

plantio da soja transgênica, argumentações essas que foram acatadas, ficando proibida a

comercialização e suspenso o cultivo em escala comercial até que fosse realizado o estudo de

impacto ambiental. O plantio da soja transgênica ficou restrito à realização de testes para o

estudo de impacto.

Vê-se, no caso em questão, as outras duas características do princípio da precaução, a

fiscalização do Poder Público mesmo sob demanda e a imediata implementação das medidas

de precaução.

Porém a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, por maioria,

deu provimento aos apelos da União e da Monsanto considerando suficientes os estudos

prévios realizados pela empresa, liberando portando a sua comercialização, sem que fossem

realizados estudos mais abrangentes.

Feito o estudo do princípio da precaução aplicado aos OGM pode-se passar agora ao

estudo da regulamentação desses organismos na nossa legislação, objeto principal desse

trabalho.

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4 LEGISLAÇÃO REGULAMENTADORA DOS ORGANISMOS

GENETICAMENTE MODIFICADOS (OGM)

O principal instrumento normativo a tratar dos OGM é a Lei 11.105/2005, enquanto

o Decreto 5.591/2005 regulamenta dispositivos da citada lei.

4.1 Lei 11.105/2005 ou Lei de Biossegurança e Decreto 5.591/2005

O artigo primeiro da lei assim define seus objetivos:

Art. 1º Esta lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente. 13

A respeito do princípio da precaução, tratado anteriormente, resta agora analisar as

normas de segurança e os mecanismos de fiscalização, não sem antes passar pelos primeiros

artigos da lei que tratam de algumas conceituações.

4.1.1 Conceituações

Nos dois parágrafos do artigo 1º, a lei estabelece o que será considerado como

atividade de pesquisa e o que será considerado como atividade de comércio de OGM. Assim

define a lei:

§1º Para os fins desta Lei, considera-se atividade de pesquisa a realizada em laboratório, regime de contenção ou campo, como parte do processo de obtenção de OGM e seus derivados ou de avaliação da biossegurança de OGM e seus derivados, o que engloba, no âmbito experimental, a construção, o cultivo, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a liberação no meio ambiente e o descarte de OGM e seus derivados. §2º Para os fins desta Lei, considera-se atividade de uso comercial de OGM e seus derivados a que não se enquadra como atividade de pesquisa, e que trata do cultivo, da produção, da manipulação, do transporte, da transferência, da comercialização,

13 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.715.

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da importação, da exportação, do armazenamento, do consumo, da liberação e do descarte de OGM e seus derivados para fins comerciais.14

O Decreto 5.591/2005 também traz essa mesma conceituação. É de se perceber que a

legislação definiu a atividade comercial pelo método da exclusão, ou seja, aquilo que não for

considerado como atividade de pesquisa será considerado como atividade comercial.

Já se podem antever alguns problemas jurídicos que possam vir a surgir a respeito de

tal conceituação. Por exemplo, a situação de um produtor rural que adquire a semente de

milho transgênico, não para fins comerciais mas para uso interno na sua propriedade, ou seja,

a colheita daquele milho será utilizada na alimentação do gado do leite. Pode-se considerar

esse produtor rural como sendo uma atividade comercial de OGM? O leite produzido será

considerado como um derivado de OGM? Deverá ele ser rotulado como requer a legislação?

Voltar-se-á ao assunto ao se analisar o aspecto da rotulagem dos OGM.

No artigo 3º é encontrado o que a lei entende por OGM e também outras

conceituações que são necessárias para se entender o seu foco. Assim dispõe o artigo:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei considera-se: I - organismo: toda a entidade biológica capaz de reproduzir ou transferir material genético, inclusive vírus e outras classes que venham a ser conhecidas; II - ácido desoxirribonucléico – ADN, ácido ribonucléico – ARN: material genético que contém informações determinantes dos caracteres hereditários transmissíveis à descendência; III - moléculas de ADN/ARN recombinante: as moléculas manipuladas fora das células vivas mediante a modificação de segmentos de ADN/ARN natural ou sintético e que possam multiplicar-se em uma célula viva, ou ainda as moléculas de ADN/ARN resultantes dessa multiplicação; consideram-se também os segmentos de ADN/ARN sintéticos equivalentes aos de ADN/ARN natural; IV - engenharia genética: atividade de produção e manipulação de moléculas de ADN/ARN recombinante; V - organismo geneticamente modificado – OGM: organismo cujo material genético – ADN/ARN tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética; VI – derivado de OGM: produto obtido de OGM e que não possua capacidade autônoma de replicação ou que não contenha forma variável de OGM; (...) §1º Não se inclui na categoria de OGM o resultante de técnicas que impliquem a introdução direta, num organismo, de material hereditário, desde que não envolvam a utilização de moléculas de ADN/ARN recombinante ou OGM, inclusive fecundação in vitro, conjugação, transdução, transformação, indução poliplóide e qualquer outro processo natural. §2º Não se inclui na categoria de derivado de OGM a substância pura, quimicamente definida, obtida por meio de processos biológicos e que eu não contenha OGM, proteína heteróloga ou ADN recombinante.15

14 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.715-6. 15 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.716-7.

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11

Já os artigos 2º e 6º trazem algumas limitações para quem deseja explorar qualquer

tipo de atividade com OGM. Dispõe o artigo 2º que as atividades e projetos envolvendo OGM

e seus derivados ficam limitadas ao âmbito de entidades de direito público ou privado, sendo

responsáveis pela obediência da lei, bem como pelo seu descumprimento. Pessoas físicas em

atuação autônoma não poderão exercer atividades com OGM mesmo que mantenham

qualquer tipo de vínculo com pessoas jurídicas.

As entidades interessadas em realizar atividades relacionadas com OGM deverão

requerer autorização da CTNBio que se manifestará no prazo regulamentado. Já as

organizações públicas e privadas, nacionais ou estrangeiras, que tenham como objetivo

financiar ou patrocinar projetos ou atividades de pesquisas com transgênicos deverão requerer

daquelas entidades o Certificado de Qualidade em Biossegurança, sob pena de se tornarem

corresponsáveis pelas eventuais sanções advindas do desrespeito da lei.

O artigo 6º já traz algumas proibições com relação a certas práticas mas, assim como

o artigo 2º, não dispõe de qualquer sanção pelo seu descumprimento; apenas proíbe, entre

outras coisas, a implementação de projeto relativo à OGM sem manutenção de registro e sem

acompanhamento individual, o descarte ou destruição de OGM no meio ambiente em

desacordo com a legislação e sua regulamentação, bem como em descumprimento às normas

da CTNBio e demais órgãos de registro e fiscalização.

Fica proibida também a liberação de OGM no meio ambiente, para fins de pesquisa,

sem a devida decisão técnica favorável da CTNBio. Já no caso de liberação comercial ficará

proibida, sem o parecer técnico dessa Comissão ou sem o licenciamento do órgão ambiental

competente, quando ela considerar a atividade como potencialmente causadora de degradação

ambiental, ou ainda sem a aprovação do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS).

Quem quer que seja a pessoa jurídica ou entidade que pratique atividade relacionada

com OGM, fica obrigada, nos termos do artigo 7º, a adotar meios necessários para informar

plenamente, não só à CTNBio e às autoridades competentes, como também aos seus

empregados, os riscos a que possam estar submetidos e os procedimentos a serem tomados no

caso de acidentes com OGM. Em caso de acidente no curso de atividades de pesquisa, deverá

ser feita uma investigação com o envio de relatório à autoridade competente no prazo de cinco

dias a contar da data do evento. Já quanto a acidentes que possam provocar a disseminação de

OGM e seus derivados, deve ser feita uma notificação imediata à CTNBio ou às autoridades

competentes.

Passa-se agora à análise dos agentes responsáveis por essas autorizações e

proibições. Serão analisados os principais agentes preconizados pela lei, que são: o Conselho

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Nacional de Biossegurança (CNBS), a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

(CTNBio), os Órgãos e Entidades de Registro e Fiscalização e, por último, mas não menos

importante, as Comissões Internas de Biossegurança (CIBio).

4.1.2 Órgãos de fiscalização

4.1.2.1 Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS)

A Lei 11.105/2005, em seu artigo 8º, cria o CNBS e assim dispõe sobre sua

finalidade:

Art. 8º Fica criado o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, vinculado à Presidência da República, órgão de assessoramento superior do Presidente da República para a formulação e implementação da Política Nacional de Biossegurança – PNB. § 1º Compete ao CNBS: I – fixar princípios e diretrizes para a ação administrativa dos órgãos e entidades federais com competências sobre a matéria; II – analisar, a pedido da CTNBio, quanto aos aspectos da conveniência e oportunidade socioeconômicas e do interesse nacional, os pedidos de liberação para uso comercial de OGM e seus derivados; III – avocar e decidir, em última e definitiva instância, com base em manifestação da CTNBio e, quando julgar necessário, dos órgãos e entidades referidos no art. 16 desta Lei, no âmbito de suas competências, sobre os processos relativos a atividades que envolvam o uso comercial de OGM e seus derivados; IV – (Vetado.) § 2º (Vetado.) § 3º Sempre que o CNBS deliberar favoravelmente à realização da atividade analisada encaminhará sua manifestação aos órgãos e entidades de registro e fiscalização referidos no art. 16 desta Lei. § 4º Sempre que o CNBS deliberar contrariamente à atividade analisada, encaminhará sua manifestação à CTNBio para informação ao requerente. 16

Melhores explanações e disposições técnicas a respeito dos poderes da CNBS, em

relação à CTNBio, são encontradas no artigo 50 do Decreto 5.591/2005.17 Dispõe o decreto

que, no caso da CTNBio haver proferido decisão técnica a respeito da liberação do OGM,

essa decisão ficará suspensa até a decisão final do CNBS. Para que a análise do Conselho

ocorra, será necessário que a CTNBio protocolize junto à Secretaria Executiva do CNBS

cópia integral do processo e o motivo de seu encaminhamento para análise. Recebido o

protocolo por sua Secretaria, o Conselho tem um prazo de 60 dias para decidir sobre o pedido

16 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.718. 17 BRASIL. Presidência da República. Decreto 5.591, de 22 de novembro de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.742.

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de análise, porém esse prazo pode ser suspenso para cumprimento de diligências ou para

emissão de pareceres de consultores ad hoc. Os procedimentos aqui explanados são

exatamente os mesmos quando se trata da hipótese de avocação dos processos pelo CNBS,

porém deverá o Conselho avocar o processo para sua decisão em última e definitiva instância,

num prazo de 30 dias a contar da publicação da decisão técnica da CTNBio no Diário Oficial

da União (DOU).

O artigo 52 do Decreto 5.591/2005 trata dos recursos interpostos pelos órgãos e

entidades de registro e fiscalização quando, dentro de suas competências, demonstrarem

fundamentadamente a sua divergência com a decisão da CTNBio com relação aos aspectos de

biossegurança de OGM e seus derivados. Nos três casos em questão, onde cabe ao CNBS

fazer a análise da liberação de OGM, tem o Conselho um prazo de 60 dias para decidir,

podendo esse prazo ser suspenso e, nesse caso, não fala a lei e nem o decreto qual será o prazo

para cumprimento de diligências e emissão de pareceres por consultores ad hoc. É de se ver

que essa suspensão poderia ser evitada se o CNBS contasse “entre seus membros, com

cientistas e outros cidadãos de competência e mérito reconhecidos, para dar maior

significado e ressonância à instituição”, como bem explana Édis Milaré18 e com o que

concorda o autor deste trabalho.

4.1.2.2 Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio)

O próximo agente implementador da lei a ser estudado será a CTNBio que, diferente

do CNBS, não foi criada com a Lei 11.105/2005. A nova Lei de Biossegurança reestrutura a

CTNBio que já havia sido criada na legislação anterior pela Lei 8.974, de 05 de janeiro de

1995. O artigo 10 desta lei assim dispõe sobre a finalidade da CTNBio:

Art. 10. A CTNBio, integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia, é instância colegiada multidisciplinar de caráter consultivo e deliberativo, para prestar apoio técnico e de assessoramento ao Governo Federal na formulação, atualização e implementação da PNB de OGM e seus derivados, bem como no estabelecimento de normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados, com base na avaliação de seu risco zoofitossanitário, à saúde humana e ao meio ambiente. Parágrafo único. A CTNBio deverá acompanhar o desenvolvimento e o progresso técnico e científico nas áreas de biossegurança, biotecnologia, bioética e afins, com

18 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5.ed. ref. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.593.

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o objetivo de aumentar sua capacitação para a proteção da saúde humana, dos animais e das plantas e do meio ambiente.19

Diferente também do CNBS é a CTNBio quanto à sua composição, enquanto o

Conselho é composto por ministros, a Comissão é composta por especialistas de diversas

áreas, conforme se observa no artigo 11 da lei:

Art. 11 A CTNBio, composta de membros titulares e suplentes, designados pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, será constituída por vinte e sete cidadãos brasileiros de reconhecida competência técnica, de notória atuação e saber científico, com grau acadêmico de doutor e com destacada atividade profissional nas áreas de biossegurança, biotecnologia, biologia, saúde humana e animal ou meio ambiente, sendo: I – doze especialistas de notório saber científico e técnico, em efetivo exercício profissional, sendo: a) três da área de saúde humana; b) três da área animal; c) três da área vegetal; d) três da área de meio ambiente; (...) III – um especialista em defesa do consumidor, indicado pelo Ministro da Justiça; IV – um especialista na área de saúde, indicado pelo Ministro da Saúde; V – um especialista em meio ambiente, indicado pelo Ministro do Meio Ambiente; VI – um especialista em biotecnologia, indicado pelo Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; VII – um especialista em agricultura familiar, indicado pelo Ministro do Desenvolvimento Agrário; VIII – um especialista em saúde do trabalhador, indicado pelo Ministro do Trabalho e Emprego.20

A CTNBio ainda é composta por membros indicados pelos respectivos titulares, dos

seguintes órgãos: Ministério da Ciência e Tecnologia, Ministério do Meio Ambiente,

Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério do Desenvolvimento, Indústria e

Comércio Exterior; Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; Ministério da

Saúde, Ministério da Defesa e por fim da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca da

Presidência da República.

O artigo 14 elenca em seus variados incisos as competências da CTNBio que são,

dentre elas, as seguintes:

I- estabelecer normas para as pesquisas com OGM e derivados de OGM; II- estabelecer normas relativamente às atividades e aos projetos relacionados a OGM e seus derivados; (...) IX- autorizar a importação de OGM e seus derivados para atividade de pesquisa; (...)

19 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.719 20 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.719-20.

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15

XI- emitir Certificado de Qualidade em Biosegurança - CQB para o desenvolvimento de atividades com OGM e seus derivados em laboratório, instituição ou empresa e enviar cópia do processo aos órgãos de registro e fiscalização referidos no art.16 dessa Lei; (...) XIII- definir o nível de biossegurança a ser aplicado ao OGM e seus usos, e os respectivos procedimentos e medidas de segurança quanto ao seu uso, conforme as normas estabelecidas na regulamentação desta Lei, bem como quanto aos seus derivados; XIV- classificar os OGM segundo a classe de risco, observados os critérios estabelecidos no regulamento desta Lei; XV- acompanhar o desenvolvimento e o progresso técnico - científico na biossegurança de OGM e seus derivados; (...) XX- identificar atividades e produtos decorrentes do uso de OGM e seus derivados potencialmente causadores de degradação do meio ambiente ou que possam causar riscos à saúde humana; XXI- reavaliar suas decisões técnicas por solicitação de seus membros ou por recurso dos órgãos e entidades de registro e fiscalização, fundamentado em fatos ou conhecimentos científicos novos, que sejam relevantes quanto à biossegurança o OGM ou derivado, na forma desta Lei e seu regulamento; 21

Essas são algumas das várias competências da CTNBio, elencadas no seu artigo 14

conforme destacado anteriormente, para se fazer um reflexão quanto ao parágrafo 5 do

mesmo dispositivo que diz o seguinte: “§5º Não se submeterá a análise e emissão de parecer

técnico da CTNBio o derivado cujo OGM já tenha sido por ela aprovado. ”22

Pode-se perceber através de uma simples leitura deste parágrafo que ele está em

contradição com algumas das competências da CTNBio que foram destacadas. Ora, como não

submeter à análise da CTNBio um OGM já liberado por ela e no qual, por uma futura

descoberta científica, venha a ficar comprovado algum tipo de malefício? Não é da

competência da CTNBio acompanhar o desenvolvimento técnico - científico na biossegurança

de OGM e também não é de sua competência reavaliar sua decisões técnicas, por solicitação

de seus membros, fundamentado em fatos ou conhecimentos científicos novos, que sejam

relevantes quanto à biossegurança de OGM ou derivado ?

É de se esperar que um OGM já liberado seja reavaliado e até mesmo reclassificado

pela CTNBio se, por algum motivo, vier futuramente a apresentar algum risco para o ser

humano ou para a natureza. O que não se deve aceitar é que este não seja submetido à nova

análise, única e exclusivamente porque já tenha sido liberado anteriormente. O OGM, uma

vez liberado não pode ser esquecido, pois o que, a curto prazo, pode parecer inofensivo, no

21 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.720-1. 22 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.722.

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16

futuro pode trazer consequências alarmantes e, caso isso ocorra, novos estudos deverão ser

feitos a respeito do seu uso.

O Capítulo IV da Lei 11.105/2005 trata dos Órgãos e Entidades de Registro e

Fiscalização e assim dispõe o artigo 16:

Art.16. Caberá aos órgãos e entidades de registro e fiscalização do Ministério da Saúde, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e do Ministério do Meio Ambiente, e da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da Republica entre outras atribuições, no campo de suas competências, observadas a decisão técnica da CTNBio, as deliberações do CNBS e os mecanismos estabelecidos nesta lei e na sua regulamentação:

I- fiscalizar as atividades de pesquisa de OGM e seus derivados; II- registrar e fiscalizar a liberação comercial de OGM e seus

derivados; III- emitir autorização para a importação de OGM e seus derivados

para uso comercial; IV- manter atualizado no SIB o cadastro das instituições e responsáveis

técnicos que realizam atividades e projetos relacionados a OGM e seus derivados;

V- tornar públicos, inclusive no SIB, os registros e autorizações concedidas;

VI- aplicar as penalidades de que trata esta Lei; VII- subsidiar a CTNBio na definição de quesitos de avaliação de

biossegurança de OGM e seus derivados.23

Após definir as competências gerais dos órgãos de registro e fiscalização, o 1°

parágrafo do artigo 16 define o campo de atuação de cada órgão. Assim, cabe:

I - ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento emitir autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que utilizem OGM e seus derivados destinados a uso animal, na agricultura, pecuária, agroindústria e áreas afins (...) II - ao órgão competente do Ministério da Saúde emitir as autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades com OGM e seus derivados destinados ao uso humano, farmacológico, domissanitário e áreas afins (...) III - ao órgão competente do Ministério do Meio Ambiente emitir as autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que envolvam OGM e seu derivados a serem liberados nos ecossistemas naturais, de acordo com a legislação em vigor e segundo o regulamento desta Lei, bem como o licenciamento, nos casos em que a CTNbio deliberar, na forma desta lei, que o OGM é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente; IV - à Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República emitir as autorizações e registros de produtos e atividades com OGM e seus derivados destinados ao uso da pesca e aqüicultura, de acordo com a legislação em vigor e segundo esta lei e seu regulamento. 24

Definido o campo de atuação de cada órgão pode-se perceber que o de maior

abrangência é o do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). Porém

23 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.722. 24 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.722-3.

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percebe-se também que o campo de atuação dos demais ministérios pode entrar na

competência do MAPA, uma vez que a maioria dos produtos da pecuária e da agricultura é

para o consumo humano, bem como a maioria dos OGM liberados hoje para o uso animal,

pecuária e agricultura se dá no meio ambiente próximo aos ecossistemas naturais. Assim

sendo, os produtos de OGM provenientes da agricultura e destinados ao consumo humano

devem sofrer fiscalização do Ministério da Saúde ou essa fiscalização será de competência

exclusiva do MAPA? O mesmo ocorre com um produto de OGM destinado à agricultura. Se

ele for liberado, por exemplo, para o cultivo na Amazônia, deverá sofrer fiscalização do

Ministério do Meio Ambiente ou somente do MAPA? Haveria conflito de competências? Ou

a fiscalização, bem como as autorizações e registro de um órgão, valeriam para os demais

órgãos?

Ao entrar no site da CTNBio25 pode-se constatar que, dos órgãos ali existentes, o

único a exercer uma fiscalização efetiva e periódica é o MAPA, não constando, nos demais,

qualquer publicação de fiscalização. O que leva a pensar que os produtos liberados no

ecossistema e aqueles destinados ao consumo humano provenientes da pecuária e agricultura,

ou seja, os casos questionados anteriormente sofrem apenas fiscalização do MAPA, o que

seria suficiente para os demais órgãos.

4.1.2.3 Comissão Interna de Biossegurança (CIBio)

A Lei 11.105/2005 determina que toda instituição que utilize técnicas ou métodos de

engenharia genética, bem como aquelas que realizem pesquisas com OGM, devam ter uma

Comissão Interna de Biossegurança (CIBio), indicando um técnico responsável para cada

projeto específico. Compete à CIBio manter os demais empregados informados sobre os

riscos provenientes da atividade, criar programas de prevenção dentro dos padrões da

CTNBio para garantir o seu funcionamento, investigar a ocorrência de acidentes e

enfermidades que possam ser provenientes de OGM e notificar a CTNBio do ocorrido, bem

como suas providências. Além disso, cabe à Comissão o envio de documentos para efeito de

análise, registro e autorização do órgão competente, quando necessário, assim como manter

registro individual de cada atividade que envolva OGM.

4.1.2.4 Sistema de Informação em Biossegurança (SIB)

25 http://www.ctnbio.gov.br/

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A Lei 11.105/2005 também cria, no âmbito do Ministério da Ciência e Tecnologia, o

Sistema de Informação em Biossegurança (SIB), destinado à gestão das informações

decorrentes das atividades de análise, registro, autorização, monitoramento e

acompanhamento das atividades que envolvam OGM e seus derivados. O SIB será alimentado

com informações dos órgãos e entidades de registro e fiscalização referidos no artigo 16 da

Lei, além disso, qualquer alteração ou complementação que produza efeitos na legislação que

diz respeito aos OGM deverá ser divulgada no SIB tão logo entre em vigor. A intenção da lei

aqui é criar um banco de dados que contenha o máximo de informações possíveis a respeito

dos OGM.

4.1.3 Responsabilidade civil e administrativa

O Capítulo VII da Lei 11.105/2005 trata da responsabilidade civil e administrativa,

das infrações, sanções e dos responsáveis por danos causados ao meio ambiente no que diz

respeito aos OGM. O Artigo 20 desta Lei e o Artigo 68 do Decreto 5.591/2005 dizem o

seguinte:

Sem prejuízo da aplicação das penas previstas (...) os responsáveis pelos danos ao meio ambiente e a terceiros responderão, solidariamente, por sua indenização ou reparação integral, independentemente da existência de culpa.26 (grifo nosso).

A parte final foi destacada por representar um princípio muito importante do Direito

Ambiental, o Princípio do Poluidor Pagador.

4.1.3.1 Princípio do Poluidor Pagador

O Princípio do Poluidor Pagador, ao contrário do que inicialmente possa parecer, não

significa “pagar para poluir”, “poluir mediante pagamento” ou, até mesmo, “pagar para evitar

a contaminação”. Esse princípio não pode ser utilizado como desculpa pelo poluidor no

sentido de “poluo porém pago”. Ele não autoriza ao indivíduo poluir mediante pagamento,

muito pelo contrário, seus objetivos são: evitar a ocorrência de danos ambientais e, uma vez

ocorrido o dano, deverá haver uma reparação. O indivíduo ou até mesmo a pessoa jurídica,

26 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.724.

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que praticar uma atividade potencialmente poluidora, deverá arcar num primeiro momento

com os custos relativos à prevenção do dano que sua atividade possa vir a causar. Num

segundo momento, ocorrendo o dano ambiental, o responsável por ele deverá repará-lo. Esse

princípio está previsto no artigo 225, §3º da Constituição Federal, bem como no artigo 14, §1º

da Lei 6.938/81:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.27(grifo nosso) Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.28(grifo nosso)

Assim pode-se observar que, na aplicação do princípio do poluidor pagador, é

encontrada a incidência da responsabilidade civil, já que o pagamento do resultante da

poluição não possui um caráter de pena, tão pouco de sujeição à infração administrativa já que

não exclui a comutatividade desta, como está previsto na Constituição Federal. Mas o que

mais chama a atenção, em matéria de Direito Ambiental, é que aqui a responsabilidade civil é

objetiva, ou seja, independe de culpa, poluiu tem que reparar, tem que pagar.

A responsabilidade civil objetiva ocorre no Direito Ambiental e é aqui aplicada pela

importância dos bens tutelados. O meio ambiente não é exclusivo de uma comunidade ou

indivíduo, como já explanado, é um bem de uso comum do povo. Para a responsabilidade

objetiva não importa os atos do responsável, não se faz um juízo de valor daquela pessoa que

praticou ou era o responsável por aquela atividade. Ocorrido o dano, o responsável, mesmo

que sem culpa nos atos, deverá responder por ele. Aquele que pratica uma atividade

potencialmente poluidora deve assumir os seus riscos, pois a responsabilidade objetiva é

fundada na teoria do risco da atividade e, uma vez demonstrado o evento danoso e o nexo de

causalidade, poderá ser pleiteada uma indenização.

Explicado como se aplica o Princípio do Poluidor Pagador, analisa-se o que a Lei

11.105/2005 entende por infração administrativa e suas penas. O art. 21 considera como

infração administrativa “toda ação ou omissão que viole as normas previstas nesta Lei e

27 BRASIL. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05.10.1988. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.140. 28 BRASIL. Presidência da República. Lei 6.938, de 31de agosto de 1981. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.800-801.

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demais disposições legais pertinentes”29, porém não especifica qualquer tipo de ação ou

omissão. Já o Decreto 5.591/2005, em seu artigo 69, lista uma série de ações ou omissões que

serão consideradas infrações administrativas. Eis algumas delas:

I - realizar atividade ou projeto que envolva OGM e seus derivados, relacionado ao ensino com manipulação de organismos vivos, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico e à produção industrial como pessoa física em atuação autônoma. II - realizar atividades de pesquisa e uso comercial de OGM e seus derivados sem autorização da CTNBio ou em desacordo com as normas por ela expedidas; III - deixar de exigir a apresentação do CQB emitido pela CTNBio a pessoa jurídica que financie ou patrocine atividades e projetos que envolvam OGM e seus derivados; (...) VIII- deixar de manter registro do acompanhamento individual de cada atividade ou projeto em desenvolvimento que envolva OGM e seus derivados; (...) XIII- destruir ou descartar no meio ambiente OGM e seus derivados em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio, pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização e neste Decreto; XIV- liberar no meio ambiente OGM e seus derivados, no âmbito de atividades de pesquisa, sem a decisão técnica favorável da CTNBio, ou em desacordo com as normas desta; (...) XVIII- deixar a instituição de enviar relatório de investigação de acidente ocorrido no curso de pesquisas e projetos na área de engenharia genética no prazo máximo de 5 (cinco) dias a contar da data do evento; XIX- deixar a instituição de notificar imediatamente a CTNBio e as autoridades da saúde pública, da defesa agropecuária e do meio ambiente sobre acidente que possa provocar a disseminação de OGM e seus derivados; (...) XXVI- deixar a instituição de investigar a ocorrência de acidentes e as enfermidades possivelmente relacionados a OGM e seus derivado e notificar sua conclusões e providências à CTNBio; XXVII- produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar OGM e seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização.30

Vale lembrar que as infrações elencadas no art. 69 do Decreto 5.591/2005 não são

numerus clausus, não existem somente essas infrações, o caput de ambos os artigos explicita

que serão consideradas como infração administrativa toda ação e omissão que viole as normas

da Lei 11.105/2005 e do Decreto 5.591/2005 e demais disposições legais pertinentes.

O artigo 21 da Lei e o artigo 70 do Decreto dispõem também sobre as sanções

administrativas aplicadas, são elas: advertência, multa, apreensão de OGM e seus derivados,

29 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.724. 30 BRASIL. Presidência da República. Decreto 5.591, de 22 de novembro de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.746-7.

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suspensão da venda de OGM e seus derivados, embargo da atividade, interdição parcial ou

total do estabelecimento, atividade ou empreendimento; suspensão de registro, licença ou

autorização; cancelamento de registro, licença ou autorização; perda ou suspensão da

participação em linha de financiamento em estabelecimento oficial de crédito; intervenção no

estabelecimento e, por fim, proibição de contratar com a administração pública, por período

de até 5 (cinco) anos.

São competentes para a aplicação destas sanções os órgãos e entidades de registro e

fiscalização elencados no artigo 16 da Lei 11.105/2005, para a aplicação da pena esses órgãos

e entidades deverão levar em conta: a gravidade da infração, os antecedentes do infrator

quanto ao cumprimento das normas agrícolas, sanitárias, ambientais e de biossegurança; a

vantagem econômica auferida pelo infrator e a sua situação econômica. Para se definir a

gravidade da infração, as infrações serão classificadas como leve, grave e gravíssima, segundo

o parágrafo único do artigo 71 do Decreto, segundo os seguintes critérios: a classificação de

risco do OGM; os meios utilizados para a consecução da infração; as consequências, efetivas

ou potenciais, para a dignidade humana, a saúde humana, animal e das plantas e para o meio

ambiente; a culpabilidade do infrator.

O último critério pode parecer um pouco contraditório, uma vez que foi dito que,

para o Direito Ambiental, não será levada em conta a culpabilidade do infrator. O que

acontece na esfera administrativa assim como na esfera penal, em termos de responsabilidade,

é que elas atuam como um instrumento de repressão às condutas e às atividades consideradas

lesivas ao meio ambiente. Diferentemente da responsabilidade civil que tem além do alcance

repressivo o preventivo, podendo coibir condutas que apresentem mera potencialidade de

dano ou mesmo risco de agressão aos recursos naturais, a responsabilidade administrativa

manifesta-se no exercício do poder de polícia administrativo que, ao constatar a prática de

uma infração, tem que instaurar um processo de apuração da responsabilidade do agente.

Como bem explicitou Edis Milaré: “Na esfera administrativa, porém, a infração é

caracterizada não pela ocorrência de um dano, mas pela inobservância de regras jurídicas,

de que podem ou não resultar consequências prejudiciais ao ambiente”.31 O autor ainda traz

uma definição para a responsabilidade administrativa ambiental, a qual deveria ser utilizada

para não haver divergências:

Sendo assim, a responsabilidade administrativa ambiental caracteriza-se por constituir um sistema híbrido entre a responsabilidade civil objetiva e a

31 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5.ed. ref. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.832.

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responsabilidade penal subjetiva: de um lado, de acordo com a definição de infração inscrita no art. 70 da Lei 9605/1998, a responsabilidade administrativa prescinde de culpa; de outro, porém, ao contrário da esfera civil, não dispensa a ilicitude da conduta para que seja ela tida como infracional, além de caracterizar-se pela pessoalidade, decorrente de sua índole repressiva. Por isso, se a responsabilidade civil ambiental, sob a modalidade do risco integral, jamais admite a incidência das chamadas excludentes, a responsabilidade administrativa, em certos casos, pode ser elidida com base na alegação de força maior, caso fortuito ou fato de terceiro. Já na responsabilidade penal, a pessoa nunca pode ser punida uma vez caracterizada a presença de uma daquelas situações.

32

A Lei 11.105/2005 ainda trata, em seu Capítulo VIII, de crimes e penas, enquanto o

Decreto 5.591/2005 trata do processo administrativo. A lei estipula seis tipos de crimes, sendo

três deles específicos para os OGM:

Art.27. Liberar ou descartar OGM no meio ambiente, em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização. Pena – reclusão, de (1 ) um a (4) quatro anos, e multa (...) §2° Agrava-se a pena: I - de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se resultar dano à propriedade alheia; II - de 1/3 (um terço) até a metade, se resultar dano ao meio ambiente; III - da metade até 2/3 (dois terços), se resultar lesão corporal de natureza grave em outrem; Art.28. Utilizar, comercializar, registrar, patentear e licenciar tecnologias genéticas de restrição do uso: Pena- reclusão, de (2) dois a (5) cinco anos, e multa. Art.29. Produzir, armazenar, transportar, comercializar, importar ou exportar OGM ou seus derivados, sem autorização ou em desacordo com as normas estabelecidas pela CTNBio e pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização: Pena – reclusão, de (1) um a (2) dois anos, e multa. 33

Enquanto a Lei 11.105/2005 trata de crimes e penas relacionados aos OGM, o

Decreto 5.591/2005 estipula como se dá o processo administrativo. Qualquer pessoa que

constate a ocorrência de infração administrativa pode representar, junto ao órgão ou entidade

de fiscalização competente, para que seja exercido o poder de polícia. As infrações serão

apuradas em processo administrativo, próprio de cada órgão ou entidade, sendo garantido ao

infrator o direito de ampla defesa. As autoridades competentes para lavrar o auto de infração,

instaurar o processo administrativo e indicar as penalidades cabíveis, são os funcionários do

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Ministério da Saúde, Ministério do

Meio Ambiente e da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca da Presidência da República.

A autoridade fiscalizadora deverá encaminhar cópia do auto de infração à CTNBio, se esta

constituir crime ou contravenção, ou ainda lesão contra a Fazenda Pública ou ao consumidor.

32 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 5.ed. ref. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.835. 33 BRASIL. Presidência da República. Lei 11.105, de 24 de março de 2005. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.725

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Finalmente, a autoridade deverá representar, junto ao órgão competente, para apuração das

responsabilidades administrativas e penal. Também são aplicadas a este decreto, no que

couberem, as disposições da Lei 9.784/99.34

34 BRASIL. Presidência da República. Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Constituição Federal. Coletânea de Legislação Administrativa: atualizadas até 05.01.2005. 5.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p.964-73

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5 A QUESTÃO DA ROTULAGEM

Outra questão polêmica é a da rotulagem dos produtos que são diretamente

provenientes de um ONG ou daqueles que contenham uma porcentagem desses organismos.

Além da biossegurança, quando se fala em rotulagem de OGM, também é importante analisar

o direito do consumidor à informação adequada a respeito do produto que ele irá consumir,

motivo pelo qual serão analisados os Decreto 4.680/2003 e o Código de Defesa do

Consumidor (Lei 8.078 de 1990).

5.1 Decreto 4.680/2003 e o Código de Defesa do Consumidor

A rotulagem de produtos que contenham OGM visa não só conscientizar o

consumidor sobre o tipo de produto que ele vai consumir, como também quanto à sua

composição e possíveis consequências e ainda com relação aos seus processos de elaboração.

O artigo 1º bem como o caput do artigo 2º demonstram a preocupação com a questão da

informação ao consumidor. Os artigos dizem o seguinte:

“Art.1º Este Decreto regulamenta o direito à informação, assegurado pela Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, sem prejuízo do cumprimento das demais normas aplicáveis. Art.2º Na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, com presença acima de 1% (um por cento) do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto.” 35

Já o Código de Defesa do Consumidor trata do assunto em dois artigos:

“Art.6º São direitos básicos do consumidor: (...) III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (...) Art.31 A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos

35 BRASIL. Presidência da República. Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.710.

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de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.” 36

Assim todo produto produzido a partir de OGM, seja ele usado diretamente como

matéria prima ou não, deverá ser rotulado, de acordo com as especificações do artigo 2º do

Decreto 4.680/2003:

§1° Tanto nos produtos embalados como nos vendidos à granel ou in natura, o rotulo da embalagem ou do recipiente em que estão contidos deverá constar, em destaque, no painel principal e em conjunto com o símbolo a ser definido mediante ato do Ministério da Justiça, uma das seguintes expressões, dependendo do caso: “(nome do produto) transgênico”, “contém (nome do ingrediente ou ingredientes) transgênico(s)” ou “produto produzido a partir de (nome do produto) transgênico”37

O Ministério da Justiça definiu como se dará a rotulagem dos organismos

geneticamente modificados:

“PORTARIA N.º 2658, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2003. O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, no uso de suas atribuições e considerando o disposto no parágrafo 1º, do artigo 2.º, do Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003, resolve: Art. 1.º - Definir o símbolo de que trata o art. 2º, § 1º, do Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003, na forma do anexo à presente portaria. Art. 2.º - Esta portaria entra em vigor no prazo de 60 dias contados da data de sua publicação. MÁRCIO THOMAZ BASTOS ANEXO REGULAMENTO PARA O EMPREGO DO SÍMBOLO TRANSGÊNICO 1. ÂMBITO DE APLICAÇÃO E OBJETIVOS: O presente regulamento se aplica de maneira complementar ao disposto no Regulamento Técnico para Rotulagem de Alimentos Embalados aprovado pela resolução da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária de n.º 259, de 20 de setembro de 2002, ou norma que venha a substituir, e tem o objetivo de definir a forma e as dimensões mínimas do símbolo que comporá a rotulagem tanto dos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal embalados como nos vendidos a granel ou in natura, que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, na forma do Decreto n.º 4.680, de 24 de abril de 2003. 2. DEFINIÇÕES: 2.1 – Símbolo Transgênico: É a denominação abreviada do símbolo objeto do presente regulamento técnico. 2.2 – Rotulagem: É toda inscrição, legenda, imagem ou toda matéria descritiva ou gráfica que seja escrita, impressa, estampada, gravada, gravada em relevo ou litografada ou colada sobre a embalagem. 2.3 - Painel Principal:

36 BRASIL. Presidência da República. Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990. In: CAHALI, Yussef Said (Org.) Código Civil. Código de Processo Civil. Código Comercial. Legislação Civil, Processual Civil e Empresarial. Constituição Federal. 9.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p.1203-4, 1208. 37 BRASIL. Presidência da República. Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.710.

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Área visível em condições usuais de exposição, onde estão escritas em sua forma mais relevante a denominação de venda, a marca e/ou o logotipo se houver. 3. APRESENTAÇÃO DO SÍMBOLO: 3.1 – O símbolo terá a seguinte apresentação gráfica, nos rótulos a serem impressos em policromia:

3.2 – O símbolo terá a seguinte apresentação gráfica, nos rótulos a serem impressos em preto e branco:

3.3 – O símbolo deverá constar no painel principal, em destaque e em contraste de cores que assegure a correta visibilidade. 3.4 O triângulo será equilátero 3.5 – O padrão cromático do símbolo transgênico, na impressão em policromia, conforme apresentado no item 3.1, deve obedecer às seguintes proporções: 3.5.1 – Bordas do triângulo e letra T: 100% Preto. 3.5.2 – Fundo interno do triângulo: 100% Amarelo. 3.6 – A tipologia utilizada para grafia da letra T deverá ser baseada na família de tipos “Frutiger”, bold, em caixa alta, conforme apresentada no item 3.1. 4. DIMENSÕES MÍNIMAS: 4.1 – A área a ser ocupada pelo símbolo transgênico deve representar, no mínimo, 0,4% (zero vírgula quatro por cento) da área do painel principal, não podendo ser inferior a 10,82531mm2 (ou triângulo com laterais equivalentes a 5mm). 4.2 – O símbolo transgênico deverá ser empregado mantendo-se, em toda a sua volta, uma área livre equivalente a, no mínimo, a área da circunferência que circunscreve o triângulo, passando pelos três vértices e com centro no circuncentro. 5. As expressões de que trata o § 1º do art. 2º do Decreto 4.680/2003 deverão observar o quanto estabelecido pela resolução da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária de n.º 259, de 20 de setembro de 2002, ou norma que eventualmente a substitua”38

5.2 Divergências na fiscalização da rotulagem

Outra questão polêmica que envolve o assunto diz respeito ao símbolo que foi

adotado pelo Ministério da Justiça, o triângulo amarelo. Há quem defenda que o uso do 38 BRASIL. Ministério da Justiça. Portaria nº2658, de 22 de dezembro de 2003. Disponível em: <http:www.senado.gov.br/senado/programas/20anosCDC/pdf/2003_Portaria 2658_MJ.pdf> Acesso em: 03 abril 2012.

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símbolo é desnecessário e que ele até mesmo lesa o consumidor por não dar acesso à

informação clara e correta, já que esse triângulo amarelo também é usado para identificar

produtos de risco, conforme a norma ISO nº 3864/02. Assim, ao invés de garantir ao

consumidor o direito à plena informação, afasta-o de qualquer avaliação racional, uma vez

que provoca medo no consumidor e induz ao repúdio desses produtos.

Luis Carlos Heinze, então deputado federal pelo Rio Grande do Sul, afirmou que:

“uma legislação não pode provocar na sociedade receio de consumo de produtos cuja segurança alimentar e ambiental foi garantida e atestada pelo próprio governo, por meio da principal autoridade no assunto do País, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – que é formada por 54 membros cientistas e pesquisadores de áreas correlatas ao tema.”39

Na mesma linha de pensamento está a Senadora Kátia Abreu que é autora do Projeto

de Decreto Legislativo nº 90, de 2007, que tem como objetivo sustar a aplicação do art.3º do

Decreto nº 4.680/2003. Na justificação do projeto a Senadora argumenta que a estrutura

normativa é ineficiente e apresenta ponto de conflito com a nova Lei de Biossegurança.

Segundo a Senadora, o decreto cria um convite ao seu descumprimento uma vez que

estabelece que os alimentos produzidos a partir de animais alimentados com ração contendo

ingredientes transgênicos também deverão ser rotulados. Ela destaca que só por esse motivo o

animal não pode ser considerado geneticamente modificado ou ser derivado de OGM (art. 3º

Lei 11.105/05). Segundo a Senadora certamente será difícil encontrar hoje, no Brasil, um

proprietário de restaurante que tenha condições de informar a seus clientes se a carne utilizada

em determinado prato procede de um frango, vaca ou porco alimentados com ração que

continha algum ingrediente transgênico.40

5.3 Falhas na fiscalização

Outro ponto abordado por Kátia Abreu é a dificuldade que o setor produtivo

encontrará em criar e manter um sistema de rastreabilidade eficiente na garantia de que esse

tipo de informação chegue ao consumidor, através do rótulo dos produtos. Essa rotulagem

também poderá encarecer o produto importado, uma vez que caberá ao importador brasileiro

o ônus do fornecimento dessa informação, pois vários países não têm a mesma exigência de

39 HEINZE, Luis Carlos. A norma de rotulagem dos transgênicos deve beneficiar o consumidor. Disponível em: <http:www.portaldoagronegocio.com.br/conteudo.phd?id=32263> Acesso em: 03 abril 2012. 40 DESCONHECIMENTO marca debate sobre rotulagem de transgênicos. Notícias CNA. 2011.Disponível em: <http:www.canaldoprodutor.com.br/comunicação/noticias/desconhecimento-marca-debate-sobre-rotulagem-de-transgenicos> Acesso em: 20 set. 2011.

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rotulagem que o Brasil. O símbolo utilizado também é alvo do projeto já que, de acordo com

sua autora, ele pode fomentar a desconfiança prejudicando a sua introdução no mercado.

Mas como toda controvérsia tem dois lados, também existem aqueles que defendem

a permanência da lei sem modificações, alegando que ela não necessita de nenhuma alteração

e sim de maior implementação e fiscalização pelos órgãos responsáveis. Agnaldo Brito

demonstra a falta de fiscalização tanto no plantio no campo quanto na rotulagem do OGM.

Segundo ele o oeste do Paraná, uma das maiores regiões de produção de grãos do país, tem

áreas com plantio onde as regras impostas pela CTNBio, para o cultivo de milho transgênico,

são desrespeitadas. A maior preocupação não é nem com a quantidade de milho que está

sendo produzida e sim com os riscos sobre os milhões de toneladas que não são

geneticamente modificadas já que, segundo os próprios agricultores, a separação entre OGM e

não OGM será mínima. Segundo Brito “o IDEC (Instituto de Defesa do Consumidor)

acredita que o milho vai agravar um problema que já acontece com a soja”.41 No mesmo

artigo, Jairon do Nascimento, secretário executivo da CTNBio, entidade responsável pela

liberação de 11 tecnologias transgênicas no pais, afirmou que: “[A rotulagem] está sendo

cumprida, [mas] não na abrangência que a lei requer.”42

Voltando ao Decreto 4.680/2003, o artigo 2º ainda traz as seguintes disposições:

§1º Tanto nos produtos embalados como nos vendidos a granel ou in natura, o rótulo da embalagem ou do recipiente em que estão contidos deverá constar, em destaque, no painel principal e em conjunto com o símbolo a ser definido mediante ato do Ministério da Justiça, uma das seguintes expressões, dependendo do caso: ‘(nome do produto) transgênico’, ‘contem (nome do ingrediente ou ingredientes) transgênico(s)’ ou ‘produto produzido a partir de (nome do produto) transgênico’. (...) §3º A informação determinada no §1º deste artigo também deverá constar do documento fiscal, de modo que essa informação acompanhe o produto ou ingrediente em todas as etapas da cadeia produtiva.43

Já o artigo 3º, do mesmo Decreto, traz a seguinte disposição:

Art.3º Os alimentos e ingredientes produzidos a partir de animais alimentados com ração contendo ingredientes transgênicos deverão trazer no painel principal, em tamanho e destaque previstos no art.2º, a seguinte expressão: ‘(nome do animal) alimentado com ração contendo ingrediente transgênico’ ou ‘(nome do ingrediente)

41 BRITO, Agnaldo. Brasil perde controle do milho transgênico. Disponível em: <http:www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u56335.shtml> Acesso em: 10 maio 2009. 42 BRITO, Agnaldo. Brasil perde controle do milho transgênico. Disponível em: <http:www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u56335.shtml> Acesso em: 10 maio 2009. 43 BRASIL. Presidência da República. Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.710.

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produzido a partir de animal alimentado com ração contendo ingrediente transgênico’.44

O problema da desinformação não afeta somente o consumidor, mas também o

pequeno produtor rural que, ao adquirir a semente transgênica, procurando maior

rentabilidade e custos menores, a utiliza na sua fazenda e depois revende a sua produção ou a

utiliza como alimento para suas criações, sem ter ideia de que a sua produção também deveria

estar rotulada. Assim o problema vira uma bola de neve, uma vez que os futuros

consumidores de sua produção estarão adquirindo um produto transgênico sem saber.

Em outro artigo tem-se uma visão melhor dessa bola de neve. Rafael Cruz,

coordenador da Campanha de Transgênicos do Greenpeace, diz que a rotulagem não acontece

porque os produtores e a indústria têm medo da reação do consumidor. É uma ideia que deve

ser considerada, uma vez que o próprio produtor rural, sabendo da obrigação de rotular o seu

produto não o faz com medo de não conseguir vender e ficar com a sua produção encalhada

em sua propriedade. A falta de fiscalização ainda ajuda a agravar o problema, já que o

Ministério da Agricultura, órgão responsável por fiscalizar o produto desde o campo até o

consumo final não vem realizando esse trabalho pois, segundo a sua Assessoria de

Comunicação, cabe ao órgão somente a fiscalização no campo, ou seja no plantio, e que a

fiscalização nos supermercados caberia ao Ministério da Justiça através do Departamento de

Proteção ao Consumidor.45

A falta de fiscalização do OGM chegou a tal ponto que o Estado de São Paulo

publicou a Lei 14.274 de 16 de dezembro de 2010, regulamentando novamente a rotulagem

dos alimentos geneticamente modificados e determinando que esses alimentos ficassem em

lugar específico no supermercado. Assim dispõe o artigo 2º da citada lei:

“Artigo2º - Os estabelecimentos que comercializem produtos transgênicos ficam obrigados a possuir local específico para exposição destes produtos. Parágrafo único – Os produtos transgênicos não poderão ser expostos de forma a confundir os consumidores, em relação a produtos semelhantes não transgênicos.” 46

44 BRASIL. Presidência da República. Decreto 4.680, de 24 de abril de 2003. In: MEDAUAR, Odete (Org.) Coletânea de Legislação Ambiental. Constituição Federal. 7.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.710-1. 45 ASSUNÇÃO, Karol. Produtos continuam sem rotulagem adequada. Disponível em: <mercadoetico.terra.com.br/arquivo/produtos-continuam –sem-rotulagem-adequada/> Acesso em: 19 mar. 2012. 46 SÃO PAULO. Assembleia Legislativa. Lei nº 14.274, de 16 de dezembro de 2010. Disponível em: <www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/2010/lei%20n.14.274, %20de%2016.12.2010.htm/> Acesso em: 11 abr. 2010.

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Aqui é possível ver o problema que a falta de fiscalização e implementação da lei

ocasiona. Se a lei fosse aplicada como deveria, não seria necessária uma nova lei para

regulamentar algo que já tem regulamentação específica. A lei de rotulagem visa exatamente

a não confundir o consumidor a respeito do produto que ele está adquirindo, mas como ela

não é aplicada entendeu o Estado de São Paulo pela criação de outra lei para tentar sanar o

problema.

A ideia em princípio é boa, mas pode criar outros problemas de natureza jurídica. Da

mesma forma que a senadora argumentou pela descriminação do produto por causa da

rotulagem o mesmo pode ocorrer aqui já que a lei determina local diferenciado para os

produtos transgênicos. Aqueles que já fazem a rotulagem corretamente podem argumentar

que já estão de acordo com a lei federal não havendo motivo para separar o seu produto dos

demais semelhantes.

Mas o que a princípio pode prejudicar a inserção desses produtos também pode ajudar

a alertar os consumidores de que, cada vez mais, produtos transgênicos estão chegando ao

mercado, levando assim a uma maior preocupação desses consumidores em conhecer e cobrar

a aplicação da lei de rotulagem.

São poucos os que apresentam a devida rotulação, sendo que a maioria deles são os

provenientes de soja, alimento que primeiro desencadeou a discussão dos transgênicos tendo,

portanto, uma maior fiscalização. Mas e o milho e demais derivados de espécies transgênicas?

Pode-se ver que a lei exige a rotulagem de produtos e alimentos produzidos a partir

de transgênicos, nas diversas situações que os artigos abordaram, porém nem todos têm a

devida fiscalização. O problema é que a lei determina a rotulagem em todos os processos da

cadeia produtiva e pode-se constatar que ela não ocorre.

A verdade é que se a lei federal fosse aplicada corretamente não haveria necessidade

da criação de outras leis para tentar sanar as lacunas existentes, o que pode acabar piorando a

situação e fazendo com que, no final, nenhuma das leis seja aplicada.

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6 CONCLUSÃO

Desde o início os avanços tecnológicos da genética, aplicados à agricultura, foram

envolvidos em uma grande polêmica a respeito não só de suas definições, como também dos

perigos e/ou benefícios de seu uso.

Procurou-se abordar os instrumentos normativos que norteiam os organismos

geneticamente modificados. Os transgênicos, como costumam ser chamados, são hoje uma

realidade e estão presentes no nosso dia a dia. A tecnologia que possibilitou a concepção de

tais organismos está em constante evolução, a cada dia que passa novas espécies de

transgênicos são criados e colocados à disposição de produtores e consumidores, no Brasil e

no mundo. Seus efeitos e as consequências das liberações, tanto na natureza quanto na saúde

humana, ainda são desconhecidos. Saber se esses organismos vão causar ou não algum dano,

ainda pode levar algum tempo.

Foi demonstrado que não faltam, em nosso País, leis que regulamentem o assunto.

Elas existem e foram analisadas e, mesmo que algumas careçam de pequenas modificações

para se adaptarem à realidade do tema abordado, o maior problema ainda é a falta de

informação, que afeta tanto os legisladores como os consumidores e os produtores. Os

legisladores não conhecem a realidade da produção brasileira, não sabem como é feita a

produção no campo e o seu escoamento para o mercado consumidor. Os produtores de

transgênicos ficam perdidos entre as diferentes leis e seus diversos órgãos fiscalizadores. E,

finalmente, os consumidores que já são mal informados de uma maneira geral, desconhecem a

lei e somente se informam quando o assunto está sendo discutido na mídia, muitas vezes

envolvidos em discussões passionais e nem sempre com informações corretas.

O princípio da precaução, que é o norteador da lei, parece que foi esquecido, pois as

medidas que deveriam ter sido tomadas não foram aplicadas.

Outro problema é a falta de implementação da lei, a falta de fiscalização no campo e

na cidade. Como pode-se perceber, a Lei de Biossegurança determina de uma maneira geral,

sem dar as determinadas especificações, quais são os órgãos que devem fazer esse controle,

mas não especifica diretamente o que cabe a quem.

Interesses políticos prevalecem sobre a legislação e cada vez mais vê-se novas

variedades de transgênicos sendo liberadas, enquanto a população consome esses produtos

sem nem saber que se trata de um produto produzido a partir de transgênicos. É necessário

que a população tome conhecimento da legislação de rotulagem e passe a cobrar a sua

efetivação.

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O Brasil possui uma legislação de biossegurança exaltada como excelente por países

estrangeiros, apesar de ainda existirem lacunas que podem ser sanadas. Concluí-se, portanto,

que o que falta é a implantação de uma política de fiscalização e controle, tanto no campo

como nos supermercados, o esclarecimento sobre a competência de cada órgão fiscalizador e

a maior divulgação para a população a respeito da rotulagem dos produtos.

Enfim, o que falta é simplesmente a aplicação da lei.

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REFERÊNCIAS

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SITES CONSULTADOS:

http://www.ctnbio.gov.br/