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REGINA LÚCIA CAMPANA O INQUÉRITO POLICIAL E O JÚRI NO UNIVERSO DA IDADE DAS TREVAS: UM ESTUDO FILOSÓFICO, JURÍDICO, HISTÓRICO, LITERÁRIO E MIDIÁTICO, DA OBRA O NOME DA ROSA, DE UMBERTO ECO. Assis-SP 2013

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REGINA LÚCIA CAMPANA

O INQUÉRITO POLICIAL E O JÚRI NO UNIVERSO DA IDADE DAS

TREVAS: UM ESTUDO FILOSÓFICO, JURÍDICO, HISTÓRICO,

LITERÁRIO E MIDIÁTICO, DA OBRA O NOME DA ROSA, DE

UMBERTO ECO.

Assis-SP

2013

REGINA LÚCIA CAMPANA

O INQUÉRITO POLICIAL E O JÚRI NO UNIVERSO DA IDADE DAS

TREVAS: UM ESTUDO FILOSÓFICO, JURÍDICO, HISTÓRICO,

LITERÁRIO E MIDIÁTICO, DA OBRA O NOME DA ROSA, DE

UMBERTO ECO.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto

Municipal de Ensino Superior de Assis – IMESA e Fundação

Educacional do Município de Assis, como requisito do Curso

de Graduação.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Eliane Aparecida Galvão Ribeiro Ferreira

Área de Concentração: Direito Penal e Processo Penal

Assis-SP

2013

FICHA CATALOGRÁFICA

CAMPANA, Regina Lúcia.

O inquérito Policial e o Júri no Universo da Idade das Trevas: Um estudo filosófico, jurídico, histórico, literário e midiático, da obra O Nome da Rosa, de Umberto Eco/ Regina Lúcia Campana. Fundação Educacional do Município de Assis – FEMA – Assis, 2013.

106 p.

Orientadora: Eliane Aparecida Galvão Ribeiro Ferreira Trabalho de Conclusão de Curso – Instituto Municipal de Ensino Superior de Assis –

IMESA.

1. Inquérito 2.Inquisição 3. Júri 4. Direito

CDD: 340 Biblioteca da FEMA.

BANCA DE DEFESA

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Eliane Aparecida Galvão Ribeiro Ferreira

Analisadoras: Prof.ª Aline Silvério Paiva

Prof.ª Dr.ª Elizete Mello da Silva

Assis-SP

2013

DEDICATÓRIA I

A minha Tia Landa e a minha prima Cidinha, que foram minha

força e meu porto seguro nas horas mais difíceis desta

caminhada por este curso. E também pelo carinho e pela

compreensão em todos os momentos de realização desse meu

sonho de ser advogada. Em especial, a Cidinha que foi a

publicitária de plantão para que os trabalhos de mídia

alcançassem o sucesso desejado.

DEDICATÓRIA II

Aristóteles disse: “A lei é a razão livre da paixão”. Minha

orientadora, mesmo sem saber que iria ser a escolhida, propôs

a mim que trabalhasse com Umberto Eco. Disse-me que o

estudo e saber são infinitos. Assim, ao apresentar-me o livro O

Nome da Rosa como um simples Trabalho de Leitura, trouxe

de volta a mim o amor pela história e pela pesquisa. E neste

momento foi concebida a ideia deste trabalho. Eu costumo

dizer que existem professores que passam pela nossa vida na

graduação, outros não passam apenas, eles permanecem em

nossas vidas como exemplo. A professora Eliane Galvão

marcou minha vida acadêmica na Fema e vai estar sempre

presente em todos meus trabalhos. Eu agradeço a ela de

coração por ser minha orientadora e lhe dedico este estudo.

DEDICATÓRIA III

Como não poderia faltar jamais neste trabalho é a dedicatória

ao Professor Mestre Edgard Pereira Lima que, de maneira

terrível, nos deixou. Ele plantou dentro de mim a importância

do Direito e como essa profissão mais um sacerdócio pode nos

mudar e nos melhorar como ser humano. Este Trabalho é

dedicado a este mestre do processo penal que foi como um pai

e baluarte do curso de Direito da Fema.

Obrigada mestre!

DEDICATÓRIA IV

Este trabalho eu dedico in memorian aos meus avós paternos

José Campana e Elvira Burali Campana, que foram e sempre

serão os grandes amores da minha vida e não poderiam faltar

neste momento. Meus amores onde vocês estiverem recebam

esta singela dedicatória e de todo meu coração e todo meu

amor, para vocês que dedicaram toda sua vida e seu amor e

seus cuidados a mim. Eu os amarei para sempre.

Também quero dedicar este trabalho ao meu pai Francisco,

que mesmo de longe sempre me amou com meus erros e

defeitos e dizer que o admiro muito por ser um guerreiro e por

ter lutado pela sua vida para pode me curtir mais, te amo pai.

DEDICATÓRIA V

Dedico com todo amor e carinho este trabalho in memoriam ao

meu avô materno Francisco Rebes e a minha avó materna

Albertina Thomé, pelo exemplo de avós que sempre foram.

Em especial eu dedico este Trabalho a minha mãe Vera que foi

a grande responsável pela minha formação e dedicação ao

estudo. Obrigado de coração mãe. Afinal você sempre me

incentivou estudar. E com todo carinho sempre escolheu os

melhores professores e as melhores escolas. Te amo mãe.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que, de uma forma ou de outra, colaboraram para a realização

deste trabalho, em especial, à minha família e à tia Landa, e à Cidinha, que foram a

segurança e a base para a conclusão deste sonho. E a todos meus professores que

sempre, de alguma forma, colaboraram com minha formação como aluna.

Contudo, quero agradecer, em especial, à Professora Doutora Elizete Mello da Silva

que, gentilmente, aceitou ser minha banca embora não tenha sido minha professora,

mas é uma amiga querida e considerada.

Agradeço ao Professor Mestre Luiz Antônio Ramalho Zanoti, que sempre me

motivou e me ensinou que, para ser um bom profissional, é necessário ter ética e

realizar muitos estudos.

Jamais poderia deixar de mencionar o meu querido Professor Mestre Gerson José

Beneli que me fez descobrir que sou uma civilista nata.

O Professor Mestre Eduardo Augusto Vella Gonçalves, que foi meu exemplo de

amor pelo direito e pela Fema.

A professora Mestre Lenise Antunes Dias de Almeida, que me ensina com

dedicação o processo civil e me confirma todos os dias que quem dominar esta

matéria dominará o direito.

A professora Mestre Maria Angélica Lacerda Marin Dassi, que veio nos socorrer em

um momento muito triste e foi perfeita ao recuperar meu amor pelo processo penal.

A professora Aline Silvério Paiva, que me deu muita força para concluir o segundo

capitulo deste trabalho que foi o mais árduo de todos. E por deixar claro que do

campo do direito o que há de mais belo e perfeito é o processo penal.

A professora Gisele Spera Máximo, que mostrou qual caminho seguir no exame da

OAB, ou seja, que me darei bem se fizer minha prova em prática civil.

E, finalmente, agradecer a minha orientadora, a Professora Doutora Eliane

Aparecida Galvão Ferreira, que teve toda a paciência do mundo para que este

trabalho tomasse corpo e se concretizasse.

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar a obra O Nome da Rosa, de Umberto

Eco, e contextualizar o Santo Inquérito e o Tribunal Eclesiástico com O Inquérito

Policial e o Plenário do Júri.

Para tanto, utilizamos uma abordagem histórica, filosófica, jurídica e midiática,

visando a alcançar o objetivo do estudo proposto.

O romance O Nome da Rosa tem sua história desenvolvida em um mosteiro

beneditino na Itália e se passa na Idade Média. Os assassinatos dos monges

causam espanto e levam o abade, bem como os demais religiosos a acreditarem

que Lúcifer atua no local. Entretanto, Willian de Baskerville não acredita nesta

hipótese e afirma que estão ocorrendo assassinatos no mosteiro e não ações

místicas.

A partir das investigações e do julgamento da obra, parte a evolução deste trabalho

até chegar aos dias de hoje.

Palavras-chave: Inquérito, Inquisição, Júri e Direito.

ABSTRACT

This study aims to analyze the work The Name of the Rose, by Umberto Eco, and

contextualize the Holy Inquiry and Ecclesiastical Court with the police investigation

and the Plenary of Judges.

We used a historical, philosophical, legal and media in order to achieve the objective

of the proposed study.

The novel The Name of the Rose has its history developed in a Benedictine

monastery in Italy and is set in the Middle Ages. The murders of the monks cause

shock and lead the abbot, as well as other religious to believe that Lucifer works on

site. However, William of Baskerville not believe this assumption and argues that

murders are taking place in the monastery and not mystical actions.

From the investigation and prosecution of the work, the evolution of this work until the

present day.

Keywords: Survey, Inquisition, Jury and Law.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura I - Roda do Despedaçamento ................................................... 31

Figura II - Açõite de Ferro ..................................................................... 32

Figura III - Cadeira das Bruxas ............................................................. 32

Figura IV - Cadeira da Inquisiç ............................................................. 33

Figura V - Cavalete ............................................................................... 33

Figura VI - A Forquilha do Herege e o Ferro Incandescente ................. 34

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................... 16

1. O CONTEXTO DA OBRA EM QUESTÃO ....................................... 20

1.1 OBRA, TEMPO E DOUTRINA CRISTÃ .................................................... 20

1.2 DISPUTAS FILOSÓFICAS AO PENSAMENTO ARISTOTÉLICO ............ 21

1.3 A ÉPOCA, O TÍTULO, A BIBLIOTECA DO MOSTEIRO E O

PENSAMENTO FILOSÓFICO ......................................................................... 22

1.4 A INQUISIÇÃO: SUAS ORIGENS, SEUS PROCEDIMENTOS E SEUS

PARALELOS ................................................................................................... 25

1.5 O SANTO INQUÉRITO: SEU PROCEDIMENTO DE TORTURA E SEUS

PARALELOS ................................................................................................... 29

1.6 O INQUÉRITO POLICIAL, SEU PROCEDIMENTO E SEUS PARALELOS

......................................................................................................................... 36

2. O TRIBUNAL EM QUESTÃO ........................................................... 46

2.1. O TRIBUNAL DO SANTO OFÍCIO: SEU SIGNIFICADO, SUA ORIGEM,

SUA HISTÓRIA ............................................................................................... 46

2.2. O PROCESSO NA SANTA INQUISIÇÃO? SEU PORCEDIMENTO E

SEUS PARALELOS ......................................................................................... 50

2.3 O TRIBUNAL DO JÚRI: SEU SIGNIFICADO, SUA ORIGEM, SUA

HISTÓRIA ........................................................................................................ 55

2.4. A HISTÓRIA DO TRIBUNAL DO JÚRI NO BRASIL ................................ 56

2.5. O NOVO JÚRI BRASILEIRO SEU PROCEDIMENTO E PARALELOS .. 68

3. DIREITO E LITERATURA: UM DIÁLOGO PROFÍCUO ................... 95

3.1. O DIREITO E A LITERATURA .......................................................... 95

3.2 O QUE É METAFICÇÃO HISTORIOGRÁFICA .................................... 96

3.3 O NOME DA ROSA E A METAFICÇÃO HISTORIOGRÁFICA ............... 99

3. 4 O NOME DA ROSA E A MÍDIA CINEMATORGRÁFICA .................... 101

CONCLUSÃO .................................................................................... 103

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................. 105

16

INTRODUÇÃO

Obsta dizer que o presente estudo tem por função demonstrar que o direito canônico

tem presença decisiva no inquérito, assim como O Tribunal do Santo Oficio seria o

embrião do júri moderno.

O Nome da Rosa, de Umberto Eco, é uma obra literária que se aproxima da

realidade histórica medieval e das penalidades impostas pelo júri inquisitivo do

Santo Ofício. Em seu enredo demonstra-se uma investigação atualíssima que alude

ao inquérito policial moderno, o qual prima pelos fatos e pelo direito, e não pela

tortura do inquérito medieval.

Este trabalho tem a modesta pretensão de fazer uma abordagem histórica, filosófica,

literária, midiática e, principalmente, jurídica, no que tange ao inquérito policial e ao

tribunal do júri, dentro da obra fenomenal de Eco.

Isto posto, vamos discorrer sobre o que o passado influenciou e ainda influencia no

nosso direito e qual é a sua importância para os dias de hoje.

Esse paralelo se encontra claramente na obra de Eco, mostrando que o saber e a

astúcia de nosso personagem central, configurado como Willian, um monge

franciscano, contrapõe-se à ignorância do Santo Ofício, o qual desejava que a

população temesse a Igreja Católica, bem como suas leis absurdas.

Dentro do exposto acima, o estudo proposto e embasado na obra literária de

Umberto Eco, O Nome da Rosa, a partir do confronto entre passado, presente e

futuro, confere destaque ao saber filosófico e histórico do personagem principal.

Que, de forma impressionante, consegue trazer sua investigação sobre os

homicídios para o campo da modernidade, embasada em provas reais e não em

devaneios de torturas.

Obviamente, isso decorre da formação filosófica e histórica de Eco, o qual

demonstra que, na história e na moral histórica, tudo se repete e se adapta ao

presente e ao futuro, portanto, os fatos de hoje seriam reflexo do passado. Essa

visão foulcautiana do autor traz uma posição filosófica esplêndida à obra, porque

17

Foucault era um mestre em trabalhar filosofia e história ao mesmo tempo, tornando-

o um brilhante pensador de sua época.

O saber empírico e lógico de William, um monge franciscano, dotado de uma

inteligência fenomenal e de estudo absurdamente assombroso para época,

contrapõe-se aos princípios da ordem franciscana, voltados para a emoção e não

para a razão. O emprego frio da razão era privilégio dos monges beneditinos que, na

obra, são vítimas dos crimes. Entretanto, é fato que William havia sido um padre

inquisidor e advém disto o seu saber racional e sua astúcia.

O estudo demonstra que O Tribunal do Santo Ofício tinha meios de evitar as

atrocidades praticadas em sua fase de inquérito, mas não o fazia, pois deveria agir

para causar temor à população. Desse modo, mantinha o controle da Igreja, por

meio do temor, segundo Maquiavel, para quem o governante deve ser temido e não

amado (O PRÍNCIPE DE MAQUIAVÉL, 2008). Este era o princípio básico do poder

católico e do outros tribunais inquisitivos. Interposta esta tese, fica claro que a

ignorância investigativa e desumana do Santo Ofício não era por estar no caminho

de combater ao demônio ou afirmando que os crimes ocorriam em seu nome, de

fato consistia em pura demonstração de poder.

Nesse contraponto, temos a luta entre o bem e o mal, vimos um convento dono de

um saber inenarrável, representado pela sua biblioteca, e que dominava um feudo, o

que demonstra seu poder financeiro. Nesse contexto, não seria cabível a atuação de

Lúcifer, como afirmavam os próprios monges beneditinos, representados pelo Abade

e pelo monge franciscano mais velho que ali se encontravam.

As acusações dos assassinatos recaem sobre a leitura de uma obra pagã proibida, a

qual trata da poética de Aristóteles. Nela defende-se o riso, considerado pelos

beneditinos como ato instintivo do ser humano em pecado. Aristóteles era o mestre

da lógica filosófica, pela leitura, nota-se que William, o protagonista, era seu

seguidor fervoroso.

O riso era temido pela Igreja porque libertava as pessoas da prisão do medo nefasto

que poderia provocar a ira de Deus ou porque poderia diluir a teoria doutrinária da

Igreja Católica Medieval, podendo levar à ruína seu poder Estatal. Seguindo esta

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visão, a alusão ao riso nada mais seria que o fim dos mitos monstruosos sobre a

figura de Lúcifer ou seria, na realidade, a alusão ao saber e à verdade.

O venerável Jorge, assassino de fato no enredo, não temia o riso acima de tudo,

antes tinha pavor da sabedoria extraída dos escritos de Aristóteles porque essa sim

libertava e destruía as correntes da ignorância que a Igreja impunha para os seus

fiéis e para os próprios clérigos.

Esse fato é lógico, pois o saber liberta o ser humano das trevas da ignorância e mina

o poder dos poderosos donos do capital e da política, se o povo e a maioria dos

clérigos tivessem acesso ao saber real a Igreja perderia seu domínio por completo.

Eco deslustra isso na capacidade investigativa de William, que mostra uma

investigação em cima de fatos lógicos reais, com alguma riqueza de perícia fática,

onde fica visível que Lúcifer não seja o algoz dos monges, muito menos na obra do

fantástico filósofo. Na obra, fica demonstrado pela investigação que o algoz de tudo

é um ser humano, metaforicamente representando a humanidade.

Esse misto de tecnologia e de saber do Monge Franciscano contrapõe-se aos

procedimentos do Santo Ofício, bem como sustenta toda discussão jurídica desse

trabalho que mostra o passado e presente no questionamento do processo

inquisitivo das investigações e do júri.

Hoje, vivemos uma fase mista do processo penal, em que o inquérito policial deve

ser inquisitivo e fechado, e o júri aberto a todos, principalmente, para manter os

princípios do contraditório e da ampla defesa do devido processo legal. Essa forma

inquisitiva é fruto do direito canônico. Sendo assim, o objetivo desse estudo é o de

propor que o saber deve nortear o processo penal e o direito penal, o qual visa à

humanização das penas e preserva o princípio da reserva legal.

O que estará em segundo plano em nossa análise é a questão da morte, se esta

representa o melhor caminho de punição ao assassino, como era feito no tribunal

inquisitivo do Santo Ofício.

Dentro do saber, a legalidade jurídica e a sua segurança decorrem de uma

investigação fática e científica, que venha possuir o mínimo de dúvida para a

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punição do réu. Nesse contexto, torna-se absurdo um tribunal baseado em

alucinações religiosas e fantasiosas.

Nosso objeto de estudo recai sobre a cena do julgamento do Santo Ofício. Por ser

um estudo com várias abordagens, utilizamos apenas livros como objeto de

pesquisa. Isto posto, devido à natureza do presente estudo e de como ocorrera sua

exposição, também terá a parte de mídia cinematográfica para a ilustração da cena.

Essa utilização das imagens da obra mostra todo trabalho mercadológico feito em

cima desse livro que, por sua vez, seria o primeiro best-seller ficcional de Eco.

20

1. O CONTEXTO DA OBRA EM QUESTÃO

1.1 OBRA, TEMPO E DOUTRINA CRISTÃ

A Baixa Idade Média (século XI ao XV) é marcada pela desintegração do feudalismo

e formação do capitalismo na Europa Ocidental. Neste período, o mundo conhecido

até então irá sofrer transformações na esfera econômica (crescimento do comércio

monetário), social (projeção da burguesia e sua aliança com o rei), política

(formação das monarquias nacionais representadas pelos reis absolutistas) e até

religiosas, que culminarão com o cisma do ocidente, através do protestantismo

iniciado por Martinho Lutero na Alemanha em 1517 (SÁNCHEZ, 2000).

Culturalmente, destaca-se o início do movimento renascentista que surgiu em

Florença no século XIV e se propagou pela Itália, e toda Europa Ocidental, entre os

séculos XV e XVI. O renascimento, enquanto movimento cultural resgatou da

antiguidade greco-romana os valores antropocêntricos e racionais que, adaptados

ao período, entraram em choque com o teocentrismo e dogmatismo medievais

sustentados pela Igreja (SÁNCHEZ, 2009).

Na obra literária em questão, o monge franciscano representa o intelectual

renascentista que, com uma postura humanista e racional, consegue desvendar a

verdade por trás dos crimes cometidos no mosteiro. Na sua contextualização,

discutem-se os elementos formadores da cultura moderna, o surgimento do

pensamento moderno, no período da transição da Idade Média para a Modernidade.

O Nome da Rosa pode ser interpretado como tendo um caráter filosófico, quase

metafísico, ao suscitar a busca da verdade, da explicação, da solução do mistério,

através de um novo método investigativo. Por conseguinte, o frade franciscano fora

chamado para ser o detetive que tem por missão investigar certo mistério, isto posto,

o supracitado monge tem formação filosófica aristotélica, porquanto fundamentado

na mais pura teoria da lógica. Sendo assim, vai investigar examinar, interrogar,

periciar, duvidar, questionar e por fim, com seu método empírico e lógico analítico,

desvendar o mistério, ainda que para isso pague um alto preço.

21

A narrativa contextualiza-se no ano de 1327, ou seja, na Alta Idade Média. Lá se

retoma o pensamento de Santo Agostinho (354-430), um dos últimos filósofos

antigos e o primeiro dos medievais, que fará a mediação da filosofia grega e do

pensamento do início do cristianismo com a cultura ocidental que dará origem à

filosofia medieval, a partir da interpretação de Platão e o neoplatonismo do

cristianismo. As teses de Agostinho nos ajudarão a entender o que se passa na

biblioteca secreta do mosteiro (ECO, 2010).

Em seu tratado, Santo Agostinho estabelece precisamente que os cristãos podem e

devem tomar da filosofia grega pagã tudo aquilo que for importante e útil para o

desenvolvimento da doutrina cristã, desde que seja compatível com a fé. Isto vai

constituir o critério para a relação entre o cristianismo (teologia e doutrina cristã) e a

filosofia, e a ciência dos antigos. Por isso é que a biblioteca tem que ser secreta,

porque ela inclui obras que não estão devidamente interpretadas no contexto do

cristianismo medieval (LENZENWEGER, 2006).

O acesso à biblioteca é restrito, porque há ali um saber que é ainda estritamente

pagão (especialmente os textos de Aristóteles), e que pode ameaçar a doutrina

cristã. Como afirma ao final Jorge de Burgos, o velho bibliotecário, acerca do texto

da “poética” de Aristóteles – a comédia poderia fazer com que as pessoas

perdessem o temor a Deus e, portanto, todo esse mundo desmoronasse (ECO,

2010).

1.2 DISPUTAS FILOSÓFICAS AO PENSAMENTO ARISTOTÉLICO

Entre os séculos XII e XIII temos o surgimento da escolástica, que constitui o

contexto filosófico teológico das disputas que se dão na Abadia em que se situa o

espaço da obra. A escolástica significa literalmente "o saber da escola", ou seja, um

saber que se estrutura em torno de teses básicas e de um método básico que é

compartilhado pelos principais pensadores da época (SÁNCHEZ, 2000).

A influência do saber corresponde ao pensamento de Aristóteles, trazido pelos

árabes (mulçumanos), que traduziram muitas de suas obras para o latim. Essas

22

obras continham o saber filosófico e científico da Antiguidade que despertariam

imediatamente interesses pelas inovações científicas decorrentes (SÁNCHEZ,

2000).

Na obra supracitada, ocorre o pensamento, conforme as performances do

personagem central, da lógica aristotélica, misturada com a doutrina de Foucault, a

qual mostra, em sua essência, que as investigações de Wiliam se situam nos dias

de hoje. Isto fica evidente na tese de que na história tudo se transforma e se repete,

e que o fato histórico volta das cinzas com uma roupagem nova.

Esse entrelace filosófico torna perspicaz o pensamento de Eco, que é um historiador

nato e um filósofo moderno que segue uma corrente que tende a aproveitar o melhor

de cada escola filosófica, para que se possa ter uma filosofia contemporânea atual

com uma memória moral embasada na história das correntes já apresentadas.

1.3 A ÉPOCA, O TÍTULO, A BIBLIOTECA DO MOSTEIRO E O

PENSAMENTO FILOSÓFICO

A consolidação política e econômica do mundo europeu fazia com que houvesse

uma maior necessidade de desenvolvimento científico e tecnológico: na arquitetura e

construção civil, com o crescimento das cidades e fortificações; nas técnicas

empregadas nas manufaturas e atividades artesanais, que começam a se

desenvolver; e na medicina e ciências correlatas.

O saber técnico-científico do mundo europeu era nesta época extremamente restrito

e a contribuição dos árabes será fundamental para este desenvolvimento pelos

conhecimentos de que dispunham de matemática, de ciências (física, química,

astronomia, medicina) e de filosofia. O pensamento Aristotélico será marcado pelo

empirismo e materialismo (ECO, 2010).

O enredo desenvolve-se na última semana de 1327, num monastério da Itália

Medieval. A morte de sete monges ocorre em sete dias e noites, cada uma de

maneira insólita. A primeira vítima aparece dentro de um barril que contém sangue

de porco. Este cadáver é o motor responsável pelo desenvolvimento da ação.

23

O narrador das peripécias é homodiegético, sua enunciação se instaura dentro do

relato. Ele se aproxima assim de outro narrador, Watson, comparsa de Sherlock

Holmes, nas obras de Sir Arthur Conan Doyle. O narrador de Eco, Adson, possui

nome dialógico, pois se aproxima da personagem de Doyle, pela sonoridade e

função de relator testemunhal. Trata-se de um jovem monge de apenas 17 anos que

presencia os acontecimentos, mas só os narra já na velhice, quando inclusive sua

memória o trai.

A obra é uma crônica da vida religiosa no século XIV e seu relato surpreendente

trata de movimentos heréticos. Para muitos críticos, este romance é uma parábola

sobre a Itália contemporânea. Para outros, é um exercício monumental sobre a

mistificação.

A expressão "O Nome da Rosa" foi usada na Idade Média significando o infinito

poder das palavras. A rosa subsiste em seu nome, apenas; mesmo que não esteja

presente e nem sequer exista. “A rosa de então”, centro real desse romance, é a

antiga biblioteca de um convento beneditino, na qual estavam guardados, em grande

número, códigos preciosos: parte importante da sabedoria grega e latina que os

monges conservaram através dos séculos. Entretanto, é sabido que Eco escreveu

toda a obra sem título e definiu seu nome, posteriormente, em homenagem ao

poema de Shakespeare: “O Cravo e a Rosa”. O que demonstra, conforme People

(1982), que as interpretações dadas ao nome do livro são mera ficção factual da

obra. Todavia, não devemos esquecer quem é Umberto Eco e qual é a sua

formação intelectual, fica assim o título do romance histórico como mais uma enigma

para divertir e instigar seu leitor.

Durante a Idade Média, uma das práticas comuns nas bibliotecas dos mosteiros era

a de apagar obras antigas, escritas em pergaminhos, e sobre elas escrever ou

copiar novos textos. Eram os chamados palimpsestos, livretes em que textos

científicos e filosóficos da Antiguidade Clássica eram raspados das páginas e

substituídos por orações, rituais litúrgicos. (ECO, 2010).

O Nome da Rosa contextualiza em seu enredo a linguagem da época, por isso

aparece repleto de citações teológicas, muitas delas em latim. É também uma crítica

ao poder e ao esvaziamento dos valores pela demagogia, pela violência sexual.

24

Enfim, denuncia os conflitos dos movimentos heréticos e a luta contra a mistificação

e o poder. Trata-se de uma parábola sangrenta patética da história da humanidade.

O pensamento filosófico dominante era o da Escolástica de Santo Agostinho e que

deveria permanecer para que o poder Estatal do Clero se mantivesse. Assim,

impedia-se que o conhecimento fosse acessível a qualquer um, ficando restrito aos

escolhidos pelos chefes locais do Clero, que eram chamados de Abade. Em O

Nome da Rosa, a biblioteca configura-se como um labirinto e quem conseguia

chegar ao final deste era morto. Só alguns tinham acesso. É uma alegoria do

Umberto Eco, que tem a ver com o pensamento dominante da Idade Média. A

informação restrita a alguns poucos representa a dominação e o poder da Igreja. Na

Idade das Trevas, deixa-se o homem comum na ignorância, sem luzes.

Percebe-se isto claramente no filme, pelas cenas escuras. Assim, a ficção retrata a

época Medieval perfeitamente: o saber era negado, para que a Igreja permanecesse

centro do poder Medieval e não perdesse o controle estatal e social da época. O que

demonstra claramente que a Igreja medieval não se importava com seus seguidores,

para ela prevalecia e era importante de fato o poder que tinha em mãos. Mesmo

dentro do clero o saber era limitado. Assim, a Santa Inquisição, as Cruzadas ou as

Guerras Santas visavam solidificar cada vez mais esse poder e aumentar o Império

Católico.

Justifica-se, então, o temor acerca dos conhecimentos de Aristóteles, mentor de

Alexandre, o Grande, que governava um império, era monarca absolutista e

dominava a estratégia da guerra. Se esse “saber” chegasse até um rei, que

vislumbrasse ter poder centralizado atrapalharia muito os planos da alta cúpula da

Igreja Católica Medieval. Essa preocupação se revelava no fato de que o segundo

filho de vários nobres tinha como tutores padres ou monges, devido à lei do

primogênito. Essa lei permitia que apenas o primeiro filho homem herdasse o título e

os bens do seu pai. O segundo era mandado para a Igreja para se tornar um

príncipe do clero.

Pode-se concluir que o pensamento geral era manter todos na ignorância, para que

se mantivesse o império religioso.

25

1.4 A INQUISIÇÃO: SUAS ORIGENS, SEUS PROCEDIMENTOS E SEUS

PARALELOS

A Inquisição não foi criada de uma só vez, nem procedeu do mesmo modo no

decorrer dos séculos. A lnquisição Medieval, voltada contra as heresias cátara e

valdense, surgiu nos séculos XII-XIII. Atuou contra falsos misticismos até os séculos

XIV-XV, seguindo para a Europa e suas colônias até o século XIX, com exceção das

trezes colônias, que durou até início do século XX. (NOVINSKY, 2007).

A lnquisição Espanhola, instituída em 1478, por iniciativa dos reis Fernando e Isabel,

visou, principalmente, aos judeus e muçulmanos. Tornou-se um poderoso

instrumento do absolutismo dos monarcas espanhóis até o século XIX, a ponto de

quase não poder ser considerada instituição eclesiástica (não raro a inquisição

Espanhola procedeu independentemente de Roma, resistindo à intervenção da

Santa Sé, porque o rei de Espanha a esta se opunha).

A inquisição Romana (também dita Santo Ofício), instituída em 1542, pelo Papa

Paulo III, surgiu em vista do surto do protestantismo (EYMERICO, 2009).

Apesar das modalidades próprias, a Inquisição Medieval e a Romana foram movidas

por princípios e mentalidade características. Passamos a examinar essa

mentalidade e os procedimentos de tal instituição, principalmente como nos são

transmitidos por documentos medievais.

Como antecedentes da Inquisição contra os hereges, podemos ver a Igreja antiga, a

qual aplicava penas espirituais, principalmente a excomunhão e não pensava em

usar a força bruta. Quando, porém, o Imperador Romano se tornou cristão, a

situação dos hereges mudou. Sendo o Cristianismo religião de Estado, os Césares

quiseram continuar a exercer os direitos de imperadores romanos (Pontífices

Maximi) em relação à religião pagã. Assim, quando arianos, perseguiam os

católicos; quando católicos, perseguiam os hereges (NOVINSKY, 2007).

A heresia era tida como um crime civil e todo atentado contra a religião oficial era

visto como atentado contra a sociedade. Não se deveria ser mais clemente para

com um crime cometido contra a Majestade Divina do que para com os crimes de

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lesa-majestade humana. As penas aplicadas, do século IV em diante eram,

geralmente, a proibição de fazer testamento, a confiscação dos bens, o exílio. A

pena de morte foi infligida, pelo poder civil, aos maniqueus e aos donatistas.

Agostinho, de início, rejeitava qualquer pena temporal para os hereges. Porém, com

os danos causados pelos donatistas, os representantes da Igreja propugnavam os

açoites e o exílio, mas não a tortura nem a pena de morte. As sentenças dos Padres

sobre a pena de morte dos hereges variavam. São João Crisóstomo, Bispo de

Constantinopla, baseando-se na parábola do joio e do trigo, considerava a execução

de um herege como culpa gravíssima, não excluía, porém, medidas repressivas

(CIDADE, 2009).

Das penas infligidas pelo Estado aos hereges não constava a prisão, esta parece

ter tido origem nos mosteiros, de onde foi transferida para a vida civil. Os reis

merovíngios e carolíngios castigavam crimes eclesiásticos com penas civis, assim

como aplicavam penas eclesiásticas a crimes civis. Chegamos, assim, ao fim do

primeiro milênio. A Inquisição teria origem pouco depois (CIDADE, 2009).

No antigo Direito Romano, o juiz não empreendia a procura dos criminosos, só

procedia ao julgamento depois que lhe fosse apresentada a denúncia. Até a Alta

Idade Média, o mesmo se deu na Igreja, a autoridade eclesiástica não procedia

contra os delitos se estes não lhes fossem previamente apresentados. No decorrer

dos tempos, porém, esta praxe mostrou-se insuficiente. Além disto, no século XI

apareceu, na Europa, nova forma de delito religioso, isto é, uma heresia fanática e

revolucionária, como não houvera até então (NOVINSKY, 2007). Considerando a

matéria por si, os cátaros rejeitavam não somente a face visível da lgreja, mas

também instituições básicas da vida civil — o matrimônio, a autoridade

governamental, o serviço militar — e enalteciam o suicídio. Destarte, constituíam

graves ameaças não somente para a fé cristã, mas também para a vida pública

(NOVINSKY, 2007).

Em bandos fanáticos, às vezes apoiados por nobres senhores, os cátaros

provocavam tumultos, ataques às igrejas etc., por todo o decorrer do séc. XI até

1150 aproximadamente, na França, na Alemanha e nos Países-Baixos. O povo, com

a sua espontaneidade e a autoridade civil, encarregava-se de reprimi-los com

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violência. Não raro, o poder régio da França, por iniciativa própria e a contragosto

dos bispos, condenou à morte os que solapavam os fundamentos da ordem

constituída. Em síntese, pode-se dizer que a Igreja, nos seus onze primeiros

séculos, não aplicava penas temporais aos hereges, mas recorria às espirituais

(excomunhão interdita, suspensão etc.). Somente no século XII, passou a submeter

os hereges a punições corporais. E por quê?

As heresias que surgiram século XI (as dos cátaros e valdenses) deixavam de ser

problema de escola ou academia, para representarem movimentos sociais

anarquistas que contrariavam a ordem vigente e convulsionavam as massas com

incursões e saques. Assim, tornavam-se um perigo público.

O Cristianismo era patrimônio da sociedade, à semelhança da prática e da família

hoje. Aparecia como o vínculo necessário entre os cidadãos ou o grande bem dos

povos, por conseguinte, as heresias, especialmente as turbulentas, eram tidas como

crimes sociais de excepcional gravidade.

Não é, pois, de estranhar que as duas autoridades – a civil e a eclesiástica –

tenham finalmente entrado em acordo para aplicar aos hereges as penas reservadas

pela legislação da época aos grandes delitos.

De resto, a Inquisição foi praticada pela autoridade civil mesmo antes de estar

regulamentada por disposições eclesiásticas. Muitas vezes, o poder civil se

sobrepôs ao eclesiástico na procura de seus adversários políticos. Segundo as

categorias da época, a Inquisição era um progresso para melhor em relação ao

antigo estado de coisas, em que as populações faziam justiça pelas próprias mãos.

É de notar que nenhum dos Santos medievais (nem mesmo São Francisco de Assis,

tido como símbolo da mansidão) levantou a voz contra a Inquisição, embora

soubessem protestar contra o que lhes parecia destoante do ideal na igreja

(NOVINSKY, 2007).

As táticas utilizadas pelos Inquisidores são hoje conhecidas, pois ainda se

conservam manuais de instruções práticas entregues ao uso dos referidos oficiais.

Quem lê tais textos verifica que as autoridades visavam a fazer dos juízes

inquisitoriais autênticos representantes da justiça e da causa do bem.

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Além disto, leva-se em conta que o papel do juiz, sempre difícil, era particularmente

árduo nos casos da Inquisição. O povo e as autoridades civis estavam

profundamente interessados no desfecho dos processos, pelo que, não raro,

exerciam pressão para obter a sentença mais favorável a caprichos ou a interesses

temporais. Às vezes, a população obcecada aguardava ansiosamente o dia em que

o veredicto do juiz entregaria ao braço secular os hereges comprovados. Em tais

circunstâncias, não era fácil aos juízes manter a serenidade desejável. Entre as

táticas adotadas pelos Inquisidores, merece particular atenção a tortura e a entrega

ao poder secular (pena de morte) (NOVINSKY, 2007).

Quanto à pena de morte, reconhecida pelo antigo Direito Romano, estava em vigor

na jurisdição civil da Idade Média. Sabe-se, porém, que as autoridades eclesiásticas

eram contrárias à sua aplicação em casos de lesar a religião. Contudo, após o surto

do catarismo (séc. XII) alguns canonistas começaram a julgá-la oportuna, apelando

para o exemplo do Imperador Justiniano, que no século VI a infligira aos maniqueus

(NOVINSKY, 2007).

Os Inquisidores trabalhavam a distâncias mais ou menos consideráveis de Roma,

em uma época em que, dada à precariedade de correios e comunicações, não

podiam ser assiduamente controlados pela suprema autoridade da lgreja. Esta,

porém, não deixava de censurá-los devidamente, quando recebia notícia de algum

desmando verificado em tal região.

Procuremos agora formular um juízo sobre a Inquisição Medieval. Não é necessário

justificar tudo que, em nome desta, foi feito. É preciso, porém, que se entendam as

intenções e a mentalidade que moveram a autoridade eclesiástica a instituir a

Inquisição. Estas intenções, dentro do quadro de pensamento da Idade Média, eram

legítimas e, diríamos até, deviam parecer aos medievais inspiradas por santo zelo.

Podem-se reduzir a quatro os fatores que influíram decisivamente no surto e no

andamento da Inquisição:

1. Os medievais tinham profunda consciência do valor da alma e dos bens espirituais. Tão grande era o amor à fé (esteio da vida espiritual) que

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se considerava a deturpação da fé pela heresia como um dos maiores crimes que o homem pudesse cometer (notem-se os textos de São Tomás e do Imperador Frederico II atrás citados). 2. A fé dos medievais era viva e espontânea. Assim, dificilmente, admitir-se-ia que viesse alguém a negar com boas intenções um só dos artigos do Credo. 3. As categorias de justiça na Idade Média eram um tanto diferentes das nossas. Havia mais espontaneidade (que, às vezes, equivalia à rudez) na defesa dos direitos. Pode-se dizer que os medievais, no caso, seguiam com mais rigor a lógica do que a ternura dos sentimentos. O raciocínio abstrato e rígido neles prevalecia por vezes sobre o senso psicológico. 4. A intervenção do poder secular exerceu profunda influência no desenvolvimento da inquisição. As autoridades civis anteciparam-se na aplicação da forma física e da pena de morte aos hereges. Instigaram a autoridade eclesiástica para que agisse energicamente. Provocaram certos abusos motivados pela cobiça de vantagens políticas ou materiais. De resto, o poder espiritual e o temporal na Idade Média estavam, ao menos em tese, tão unidos entre si que lhes parecia normal, recorressem um ao outro em tudo que dissesse respeito ao bem comum. A partir do início do século XIV, a inquisição foi sendo mais explorada pelos monarcas, que dela se serviam para promover seus interesses particulares, subtraindo-a as diretivas do poder eclesiástico, até mesmo encaminhando-a contra este, onde só deixou de existir em 1789 com o advento da revolução francesa (NOVINSKY, 2007).

1.5 O SANTO INQUÉRITO: SEU PROCEDIMENTO DE TORTURA E SEUS

PARALELOS

O inquérito na Santa Inquisição, além de ser totalmente fechado, sem qualquer

chance de esclarecimento do réu, não era exposto e nem aberto o que foi colhido

durante a investigação, no plenário do tribunal. Não havia uma investigação lógica,

havia uma suspeita de bruxaria ou da pessoa se insurgir contra os dogmas da igreja,

dessa forma, instalava-se o tribunal inquisitivo para punir os culpado e livrar o

mundo de Lúcifer. Portanto, o inquérito era presidido pelo padre ou monge

inquisidor, assim como o tribunal.

A principal peça investigativa para o santo inquérito se baseava na confissão, obtida

por intermédio de tortura. O inquérito era lacrado com cera quente e o símbolo do

tribunal se escrevia na capa com a letra de culpado ou inocente.

Observa-se que o princípio da reserva legal não era preservado no santo ofício, ou

seja, na maioria das vezes, sempre a pessoa seria condenada, mesmo sendo

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inocente. O que se absolvia eram quase sempre animais que eram julgados pelo

tribunal.

Segundo Nicolau Eymerico (MANUAL DA INQUSICÃO, 2009), o santo inquérito era

uma peça de investigação divina, onde Deus inspirava os inquisidores em busca da

justiça e da luta contra o anticristo.

Para Bernardo de Gui, um dos principais e mais severos inquisidores do século XIV,

na baixa Idade Média, que pertencia à ordem Dominicana, também bispo de Lodève

e conhecido como inquisidor de Toulouse, as seguintes normas deveriam ser

seguidas pelos seus colegas:

O inquisidor deve ser diligente e fervoroso no seu zelo pela verdade religiosa, pela salvação das almas e pela extinção das heresias. Em meio às dificuldades permanecera calmo, nunca cedera à cólera nem a indagação do demônio. Nos casos duvidosos, seja circunspecto, não de fácil crédito ao que parece provável e muitas vezes não é verdade. Também não deveria rejeitar obstinadamente a opinião contraria, pois o que poderia parecer improvável frequentemente poderia acabar comprovando a verdade (CIDADE, 2009).

Diante do que revela a História, cabe no presente trabalho demonstrar a realidade

de anos de tribunais inquisitivos embasados em violentas formas de torturas para

que se obtivesse a confissão, também deve se deixar claro e informar que o santo

inquérito utilizava métodos de torturas jamais vistos e sem precedentes na

atualidade. Vale destacar que não houve somente tribunais inquisitivos católicos,

esta foi uma prática utilizada também por protestantes e pelo Estado, que findou

apenas com a Revolução Francesa.

Por ser um trabalho que se baseia em fatos históricos, vamos obrigatoriamente falar

dos métodos de tortura praticados pelo santo inquérito. As origens dos instrumentos

de tortura, demonstrados com fotos, perderam-se nas trevas da História. A maioria

teve em uso por séculos, mesmo antes do advento dos Tribunais dos Feiticeiros. De

acordo com informações precisas de fatos históricos, não havia fabricação em

massa desses instrumentos. Os mesmos eram impressionantemente duráveis,

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sendo conservados por décadas, mesmo no auge do Santo Oficio, os ferreiros locais

dos Burgos conseguiam dar conta de demanda.

Após invariáveis pesquisas, chegou-se à conclusão de que os inventores possuíam

mentes sádicas, porém nunca foi conhecida a identidade deles e, por conseguinte,

foram mantidos no anonimato da história para evitar a dúbia imortalidade que viria

ter seu nome eternamente vinculado a implementos tão infernais, que

permaneceram nos anais da História Canônica e Mundial (CRESCENTI, 2005).

Após a Antiguidade, o mundo retrocedeu, entrou na Idade das Trevas, na qual

prevaleceu o medo a Deus e à Igreja. Os materiais de torturas e seu funcionamento

fazem parte do procedimento investigativo do Santo Inquérito:

1. Roda do Despedaçamento: como os instrumentos eram horríveis, a liturgia da morte era terrível. O réu era amarrado com as costas na parte extrema da roda. Sob a roda colocava-se brasas incandescentes. O carrasco, girando lentamente a roda, fazia com que o réu confessasse o crime ou ao invés de ir para tribunal na fogueira, morria queimado na roda. Em outros casos, a roda tinha agulhões de madeira que o corpo girando de vagar e continuamente, era arranhado terrivelmente. Essa roda foi mais utilizada na Inglaterra, Holanda e Alemanha, entre os anos de 1100 a 1700 (EYMERICO, 2009).

Figura I – Roda do Despedaçamento (In: www.misteriosantigos.com, 2013).

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2. Açoite de Ferro: mais que um material de tortura, era uma arma de guerra. Na Idade Média, os templários utilizavam na guerra parra matar os cavalos dos inimigos, quebrar a espada e matar os mesmos no final da batalha. No Santo Inquérito, o açoite era utilizado para quebrar ossos (EYMERICO, 2009).

Figura II – Açoite de ferro (In:

www.mistériosantigos.com, 2013).

3. Cadeira das Bruxas: o condenado era preso pela cabeça para baixo em uma grande cadeira. Tal posição criava atrozes dores nas costas, obviamente desorientava e aterrorizava o réu em questão. Permitia, por sua vez, a fácil imposição de interminável sofrimento e tortura e vários tormentos. A esta tortura eram submetidas mulheres acusadas de bruxaria. Foi utilizada de 1500 a 1800 em quase todos os países da Europa e também nas trezes colônias da caça às bruxas (EYMERICO, 2009).

Figura III – Cadeira das Bruxas (In: www.misteriosantigos.com, 2013).

4. Cadeira da Inquisição: Era o instrumento essencial utilizado pelo Inquisidor, a cadeira era usada na Europa Central, especialmente em

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Nuremberg, onde fora usada até 1846 durante regulares interrogatórios dos processos do Santo Oficio. O réu era posto sentado nu e com mínimo de movimento, as agulhas que penetravam no corpo provocando dores terríveis. Em outras versões, a cadeira tinha seu assento de ferro, que podia ser aquecido até ficar em brasas, seu aquecimento era feito com uma fogueira em baixo da cadeira. A agonia que o metal entrando na pele nua do réu era tanta que o mesmo não aguentava mais de quinze minutos antes de confessar. A cadeira normal possuía 1606 pontas de madeira e 23 de ferro em lugares estratégicos (EYMERICO, 2009).

Figura IV – Cadeira da Inquisição (In: www.misteriosantigos.com, 2013).

5. Cavalete: o suposto culpado era colocado deitado de costas, com as mãos afixadas com cravos e os pés presos por anéis de ferro. E ainda se fechava a narina para introduzir enormes quantidades de água pela boca. Eram utilizados para os suspeitos de bruxaria e heresias, e a tortura, dependo do estado físico de réu, poderia durar de trinta a quarenta horas, porque era um sistema de tortura lento que visava à confissão do réu, dos coautores e partícipes (SAMPEL, 2001).

Figura V – Cavalete (In: www.misteriosantigos.com, 2013).

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6. A Forquilha do Herege e o Ferro incandescente: A inquisição Italiana, Espanhola e Portuguesa utilizava muito a forquilha. Esta era colocada no pescoço do herege e sua parte pontiaguda furava o tronco do mesmo, também se chamava de ferro incandescente, porque se esquentava em brasa para causar mais dor e evitar o sangramento, para que o torturado aguentasse mais tempo até que entregasse todos os envolvidos nos crimes de heresia. Em O Nome da Rosa foi utilizado como mecanismo de tortura praticado a mando de Bernardo Gui (EYMERICO, 2009).

Figura VI – A Forquilha do Herege e o Ferro incandescente (In:

www.misteriosantigos.com, 2013).

Após os procedimentos de tortura ilustrados acima, O Santo Interrogatório se dava

da seguinte forma, de acordo com uma cena na obra de Umberto Eco:

Quando um herege é apresentado pela primeira vez para ser examinado, ele assume um ar de segurança, para garantir sua inocência. Pergunto-lhe porque traiu. Ele responde sorridente e cortês: “senhor, me agradaria saber a sua causa”.

Gui: o senhor é acusado de herege, e de crer ensinar coisas diferentes às que a Santa Igreja crê.

Acusado: (levanta os olhos ao céu, com ar de sua grande fé) Senhor, sabes que sou inocente disto, e que nunca tive fé diferente a do cristianismo verdadeiro.

Gui: o senhor diz que sua fé é cristã, aposto que considera a nossa como falsa e herege. Mas lhe pergunto, crê em uma fé diferente a que a Igreja Romana declara como verdadeira?

Acusado: creio na fé verdadeira que a Igreja Romana crê, a qual o senhor nos prega abertamente.

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Gui: possivelmente existem alguns membros de sua seita em Roma a quem a quem chama de igreja romana. Quando eu prego digo muitas coisas, algumas delas são comuns entre nós, por exemplo, que Deus vive, e o senhor creem em alguma coisa que prego. Não obstante pode ser um herege devido a não crer em outra coisa que deveria crer.

Acusado: creio em todas as coisas que um cristão deve crer.

Gui: conheço suas artimanhas. O que os membros da sua seita creem é o que diz que um cristão deve crer. Mas não gastaremos tempo nesta mutreta. Diga claramente, crê em Deus Pai, Filho e Espírito Santo?

Acusado: creio.

Gui: crê em Cristo nascido de virgem, aquele que sofreu, ressuscitou e subiu ao céu?

Acusado: (vigorosamente) creio.

Gui: crê que o pão e o vinho na missa realizada pelos sacerdotes se transformam no corpo e no sangue de Cristo por virtude divina?

Acusado: eu não devo crer nisto?

Gui: não perguntei se deve e sim se crê.

Acusado: creio em tudo que os senhores e outros doutores bons me ordenam crer.

Gui: esses doutores bons são os mestres de sua seita, se digo algo de acordo com eles deve crer em mim, caso contrário, não.

Acusado: creio voluntariamente no senhor, pois ensina o que é bom para mim.

Gui: se considera bom o que os outros mestres ensinam. Diga então, se crê que o corpo de nosso Senhor Jesus Cristo está no altar?

Acusado: (imediatamente) creio que um corpo está ali e que todos os corpos são de nosso senhor.

Gui: perguntei se o corpo no altar é do Senhor Jesus que nasceu da virgem, foi crucificado, levantou entre os mortos, ressuscitou e etc...

Acusado: senhor, não é o que crê?

Gui: creio eternamente.

Acusado: creio da mesma maneira.

Gui: não perguntei se crê no que creio, mas se o senhor crê no cristianismo.

Acusado: se o senhor deseja interpretar minhas palavras de outro modo diferente, então não sei mais o que dizer. Sou apenas um simples ignorante. Peço-lhe que não me faça tropeçar em minhas próprias palavras.

Gui: se o senhor é simples, responda simplesmente sem rodeios.

Acusado: com muito prazer.

Gui: jura então que nunca aprendeu nada contrario à nossa verdadeira fé?

Acusado: (palidamente) se devo jurar, jurarei dispostamente.

Gui: não perguntei se deve, mas se realmente jura.

Acusado: se o senhor me ordena jurar, jurarei.

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Gui: não lhe forço a jurar, mas é o senhor mesmo que acredita que todos os juramentos são ilícitos, e se eu o forçasse a jurar transferiria o pecado para mim; mas se realmente jura lhe escutarei.

Acusado: porque devo jurar se o senhor não me ordena?

Gui: para poder acabar com a suspeita de que é um herege.

Acusado: senhor, não sei como fazer, a não ser que me ensine.

Gui: se eu tivesse que jurar, levantaria a mão, afastaria os dedos e diria: “que Deus me ajude, nunca aprendi heresia, nem creio em nada a não ser a fé verdadeira.

Então, tremendo e como se não pudesse repetir as palavras ele continuou seu delírio como se falasse consigo mesmo, afirmando que não existe uma forma absoluta de juramento que retire a aparência de ter sido jurado. Se as palavras ditas são distorcidas de modo tal que apesar de não jurar aparenta haver jurado. Ou ele converte o juramento em um tipo de oração, “Deus, ajuda-me não sou herege nem nada parecido”. E quando lhe perguntarem se jura, ele dirá: “não me recordo que jurei?” e quando lhe pressionam de forma adicional, ele apela dizendo: “Senhor, se fiz algo errado estou disposto a suportar a penitência, apenas ajude-me a evitar a infâmia pela qual sou acusado embora sem malícia nem culpa da minha parte”. Mas um inquisidor ardoroso não deve permitir ser manipulado desta maneira e sim proceder firmemente até conseguir que esta gente confesse seu erro, ou pelo menos que renunciem publicamente a heresia, de modo que subsequentemente se descubra que jurou falsamente, se é possível para eles abandonar o braço secular sem que precisem audiência adicional. (GUI, 1323. In: Livro das sentenças. Cap. II, técnica da inquisição, p. 210).

O ritual inquisitivo supracitado era o modelo seguido por Bernardo Gui, o inquisidor

de Toulouse, que obviamente foi escolhido para ilustrar o procedimento do Santo

Inquérito na obra de Umberto Eco. Porém, tanto o interrogatório e as formas de

torturas eram verdadeiros, assim como o próprio inquisidor. Após esse método

investigativo, a sentença era lacrada com o timbre da Santa Madre Igreja e com o

anel do Inquisidor, contendo a letra correspondente de culpado ou inocente, na

capa. Uma vez lacrado, jamais seria aberto, nem no santo julgamento. Desse modo,

o inquisidor já condenava de imediato e sua decisão jamais era questionada.

1.6 O INQUÉRITO POLICIAL, SEU PROCEDIMENTO E SEUS PARALELOS

O sistema processual penal brasileiro quando trata da modalidade Inquérito Policial,

ainda, tem por base teórico-ideológica, mesmo que seja em graus diversos

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logicamente, a inquisição da Igreja Católica. A Santa Inquisição torturou e

assassinou seres humanos (hereges) cruelmente (CIDADE, 2009).

O inquérito policial é o meio em que a polícia judiciária informa atos supostamente

ilícitos praticados por alguém. Esta peça administrativa, o inquérito policial, contribui

com o Ministério Público que, por sua vez, poderá oferecer denúncia (processo

contra o autor dos fatos) (BARBOSA, 2011).

O Ministério Público, através de seu representante legal, o Promotor de Justiça, é

dono exclusivo da Ação Penal.

No inquérito policial não há contraditório, ou seja, o suposto indiciado (réu) não pode

contestar as informações colhidas pelos policiais. Os policiais podem colher o que

bem entenderem, pois não há Direito ao contraditório quando se encontra nessa

fase investigativa, que é proferida pela polícia judiciária, a qual deve produzir as

investigações probatórias das provas. Se este inquérito policial mais tarde servir de

base para uma denúncia (processo contra o suposto réu) poderá formar opinião do

juiz de direito com relação ao caso, quando este ler o inquérito policial, mesmo que o

réu, na ação penal propriamente dita, tenha o direito ao contraditório.

Trata-se de um sistema falho e sobrecarregado de serviços, o qual comete erros e,

por consequência, restringe um dos nossos maiores “bens”: a liberdade. A busca da

“verdade real” no processo penal não ocorre. Há, então, entre teoria e prática pontos

antagônicos (BARBOSA, 2011).

No Brasil, é correto dizer que o processo penal é acusatório puro (a própria ação

penal – Ministério Público acusa o réu), mas o sistema é misto (acusatório e

inquisitório), pois há uma fase inquisitiva no Inquérito Policial (BARBOSA, 2011).

Sendo assim, o inquérito policial nada mais é do que o conjunto de diligências que

serão realizadas pela polícia judiciária, como determina o Código de Processo penal

brasileiro, que tem por função elucidar as infrações penais e sua autoria.

De acordo com os artigos 4º e 12º do Código de Processo Penal, o inquérito tem a

finalidade de apuração da infração penal e da respectiva autoria.

A competência do inquérito policial é da polícia judiciária e este deve ser presidido

pelo delegado de polícia. Entretanto, em caso de crime federal, transfere-se a

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competência para polícia judiciária federal, como determina o artigo 109 da

Constituição Federal.

O inquérito policial é necessário, porém não absolutamente. Sua natureza é

administrativa. No Santo Inquérito, o indiciado ficava incomunicável, aqui depois da

Constituição de 1988, em seu artigo 136, §3º e inciso IV: “[...] é vedada a

incomunicabilidade do preso”, exceto em caso que prevaleça o interesse da

sociedade e se for conveniente para as investigações, mesmo assim com um prazo

determinado de 3 (três) dias, respeitando sempre a integridade do preso e o artigo

89, inciso III do Estatuto da Ordem dos advogados (lei 4.215, de 27 de abril de

1963).

Perante a Notitia Criminis, a autoridade policial dá início à investigação, no Santo

Inquérito, era com suspeita de heresia. O inquérito será iniciado quando:

a notícia chegar à autoridade de polícia judiciária;

mediante requisição da autoridade judiciária;

mediante requisição do ministério público ou, enfim, mediante requerimento

do ofendido.

A polícia judiciária tem o dever de instalar o inquérito policial quando o delito for de

natureza de ação pública, como determina o artigo 5º do Código de Processo Penal.

No inquérito existirão, ainda: diligências investigativas, com busca e apreensão dos

objetos e do instrumento do crime; o depoimento do ofendido, se não for homicídio;

o depoimento do indiciado, das testemunhas, se houver; o reconhecimento do

indiciado, caso a vítima o reconheça; as acareações; os exames periciais; a

reprodução simulada; a identificação do indiciado; e folhas de antecedentes. O

inquérito deverá ser concluído em trinta dias, se o indiciado não estiver preso. Caso

esteja preso, o prazo será de dez dias.

Esse prazo jamais poderia ocorrer no Santo Inquérito, a vitima morreria em

decorrência das torturas e não na Santa Fogueira.

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A autoridade policial fará um minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará

ao juiz competente. Caso o juiz não ache materialidade do delido, pode se pedir o

arquivamento do inquérito policial. Com a conclusão da peça administrativa, o

inquérito será encaminhado ao juízo para que se proceda à denúncia e possibilidade

da resposta à acusação, como determina o artigo 396-A do Código de Processo

Penal. Será, então, marcada a audiência de instrução e julgamento. No caso de júri,

temos a audiência de pronúncia ou impronúncia. Caso o réu seja pronunciado,

teremos o Tribunal do Júri.

Podemos aproximar o inquérito policial do Santo Inquérito no que concerne à

estrutura documental, pois ambos são peças administrativas, conduzidas pela

autoridade competente. Contudo, distam-se, pois o primeiro é feito de forma lógica,

científica e social; e o outro se baseia na confissão por meio de tortura. O inquérito

policial termina no tribunal e o outro acaba no Tribunal do Santo Ofício.

O Nome da Rosa traz esse paralelo investigativo, por meio da representação da

personagem central, o justo e honesto frei franciscano e antigo Inquisidor, William de

Baskervile, contra um inquisidor cruel e de origem histórica, trazido por Eco para a

ficção, o poderoso Bernardo Gui.

William, discípulo fiel da lógica aristotélica, investiga buscando provas científicas e

utilizando perícia, assim como observa cada monge envolvido e toma como início do

inquérito o depoimento do abade do monastério. Diante da sua investigação, o

monge franciscano chega ao verdadeiro culpado: o livro da poética de Aristóteles

que fora envenenado pelo Venerável Jorge. Assim, o assassino seria o antigo abade

que temia o riso. Em uma época em que o riso afrontava os dogmas católicos, na

realidade, um texto aristotélico levava os monges e os padres a pensarem no que

era proibido. Vale destacar que, apenas, os monges beneditinos e os inquisidores

tinham acesso irrestrito ao saber.

A investigação inquisitiva de Bernardo Gui opõe-se a de Baskervile. Isto decorre do

fato de que Gui se utiliza do ferro incandescente e do cavalete de tortura para tirar a

confissão dos inocentes acusados de heresia: dois monges beneditinos e uma

camponesa. Esta é acusada de ser a filha de Lúcifer e de trazer o anticristo para

dentro do monastério.

40

Claro que prevalece o inquérito de Bernardo Gui, o qual não tem sua autoridade

questionada por ser um juiz do Santo Ofício.

A investigação de William será rechaçada pelo abade do monastério e mais tarde

pelo tribunal do Santo Ofício.

William, no decorrer da história, utiliza uma técnica muito atual de investigação,

estando seu trabalho fundamentado em tese num trabalho pericial minucioso, como

o estudo do pequeno pedaço de papel que tinha aroma de limão e o traço preto na

boca e no dedo indicador do monge. Eco preocupou-se em mostrar que uma pessoa

dotada de saber seria capaz de desvendar os assassinatos sem os horrores do

Santo Inquérito.

O que a obra nos mostra a todo tempo é que, mesmo na Idade das Trevas, havia

uma luta muito grande em prol do saber e da liberdade de pensamento para o clero,

na tentativa de libertar a mente em prol da sociedade.

A luta fictícia contra o anticristo representava a barbárie do pensamento sádico para

impor à força o medo em toda uma sociedade.

O Santo Inquérito era de uma crueldade atroz, em que o inocente morria e o

verdadeiro culpado não era punido. Mas a maior heresia de todas e mais combatida

era o saber e a liberdade de pensamento. Desta forma, os grandes pensadores

viviam à margem da sociedade com medo do Santo Ofício e de sua inquisição

doutrinadora da sociedade.

Prova real disso foi o que Galileu passou, sendo torturado pelo Santo Inquérito até

que viesse a se retratar e ignorasse sua teoria de que a terra era redonda.

Em O Nome da Rosa, o próprio William foi torturado por Bernardo Gui até se retratar

e mandar para fogueira um homem que traduziu um livro para o grego.

O que deixa bem clara a nossa tese de que a Inquisição não lutava contra uma

sociedade que não era dotada de saber, mas sim contra o próprio saber que insurgia

dentro da Igreja Católica.

41

Hoje, também se comete muita injustiça investigativa no inquérito policial, porém o

indiciado tem a chance de ter uma ampla defesa dentro do julgamento e também de

produzir provas que o inocentem, sem falar que tem sua integridade física mantida.

No Santo Ofício, o indiciado não tinha direito à defesa e já ia para o julgamento

condenado. Ou seja, era decretado culpado de ofício.

Hoje, uma pessoa só é culpada de um crime depois de ter uma defesa justa e só

com o resultado do trânsito em julgado.

É sabido que o direito penal canônico foi a célula embrionária de nosso direito penal

e processual penal, portanto, vamos demonstrar os textos legais que sustentam o

inquérito policial e a defesa do réu em juízo em nosso país.

O artigo 136, da Constituição Federal de 1988 (VADE MECUM, 2013), discorre a

respeito da proibição de deixar o inquerido sem comunicação:

Artigo 136: O presidente da República, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, decretar o estado de defesa para preservar e ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem publica ou paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidade de grandes proporções na natureza.

§ 3º Na vigência do estado de defesa:

IV- é vedada a incomunicabilidade do preso.

No Brasil, prevalece o princípio do in dubio pro réu. Assim, tudo que for benéfico

para o preso e suposto réu sobrepõe-se e se transforma em benéfico para o suposto

culpado. O que difere do Santo Inquérito que o preso ficava incomunicável ate o

julgamento final.

Os artigos do Código de Processo Penal (VADE MECUN, 2013), que dão

sustentação legal ao inquérito policial e a defesa do réu, são:

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Artigo 4º: A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e de sua autoria. Parágrafo Único: A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Artigo 5º: Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I- De ofício; II- Mediante a requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. § 1º o requerimento a que se refere o n.II conterá sempre que possível. a) A narração do fato, com todas as circunstancias; b) A individualização do indiciado ou seus sinais característicos e as razoes de convicção ou de presunção de ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade de o fazer; c) A nomeação das testemunhas, com indicação de sua profissão ou residência. § 2º Do despacho que indeferir o requerimento de abertura de inquérito caberá recurso para o chefe de policia. § 3º Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência da infração penal em que caiba ação publica poderá, verbalmente ou por escrito, comunica-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandara instaurar inquérito. § 4º O inquérito, nos crimes em que a ação publica depender de representação, não poderá sem ela ser iniciado. § 5º Nos crimes de ação privada de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder ao inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la. Artigo 6º: logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial devera: I- Dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II- Aprender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III- Colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV- Ouvir o ofendido; V- Ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto do Capitulo III do Titulo VII, deste livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura; VI- Proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII- Determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII- Ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - Averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. Artigo 7º: Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.

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Artigo 8º: havendo prisão em flagrante, será observado o disposto no Capítulo II do Titulo IX deste livro. Artigo 9º: Todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e neste caso, rubricadas pela autoridade. Artigo 10: O inquérito deverá terminar no prazo de 10 (dez) dias, se o indiciado tiver sido preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se executar a ordem de prisão, ou no prazo de 30 (trinta) dias , quando estiver solto, mediante fiança ou sem ela. § 1º: A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará os autos ao juiz competente. § 2º: No relatório poderá a autoridade indicar testemunhas que não tiverem sido inquiridas, mencionando o lugar onde possam ser encontradas. § 3º: Quando o fato for de difícil elucidação, e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz. Artigo 11: Os instrumentos do crime, bem como os objetos que interessarem à prova , acompanharão os autos do inquérito. Artigo 12: O inquérito policial acompanhará a denuncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra. Artigo 13: Incumbirá ainda à autoridade policial: I- Fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias á instrução e julgamento dos processos. II- Realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público. III- Cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias. IV- Representar acerca da prisão preventiva. Artigo 14: O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requere qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade. Artigo 15: Se o indiciado for menor, ser-lhe-á nomeado curador pela autoridade policial. Artigo 16: O Ministério Público não poderá requerer a devolução do inquérito á autoridade policial, senão para provas e diligências, imprescindíveis ao oferecimento da denúncia. Artigo 17: A autoridade policial não poderá mandar arquivar autos de inquérito. Artigo 18: Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. Artigo 19: Nos crimes em que não couber ação pública, os autos do inquérito serão remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a

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iniciativa do ofendido ou de seu representante legal, ou serão entregues ao requerente, se o pedir, mediante traslado. Artigo 20: A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário á elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade. Parágrafo Único: Nos atestados de antecedentes que lhe forem solicitados, a autoridade policial não poderá mencionar quaisquer anotações referentes à instauração de inquérito contra os recorrentes. Artigo 21: A incomunicabilidade do indiciado dependerá sempre de despachos nos autos e somente será permitida quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação exigir. Parágrafo Único: A incomunicabilidade que não excederá de 3 (três) dias, será decretada por despacho fundamentado do juiz, a requerimento da autoridade policial, ou do órgão do Ministério Público, respeitado em qualquer hipótese, o disposto no artigo 89,III,do Estatuto da ordem dos Advogados do Brasil ( lei 4.215, de 27 de abril de 1963). Artigo 22: No Distrito Federal e nas comarcas em que houver mais de uma circunscrição policial, a autoridade com exercício em uma delas poderá, nos inquéritos a que esteja procedendo, ordenar diligências em circunscrição de outra, independentemente de precatórias ou requisições, e bem assim providenciará, até que compareça a autoridade competente, sobre qualquer fato que ocorra em sua presença, noutra circunscrição. Artigo 23: Ao fazer a remessa dos autos do inquérito ao juiz competente, a autoridade policial oficiará ao Instituto de Identificação e Estatística, ou repartição congênere, mencionando o juízo a que tiverem sido distribuídos, e os dados relativos à infração penal e à pessoa do indiciado. Artigo 396 A: Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando, qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. § 1º: A exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a112 deste Código. § 2º: Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferece-a, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias.

Diante da exposição legal da maneira em que o Inquérito é conduzido no Brasil,

podemos observar que o Santo Inquérito não respeitava os direitos dos inqueridos e

nem procedia de forma legal na investigação. Também ficou evidenciada que a

mesma autoridade inquisidora presidia o Santo Inquérito e o Tribunal do Santo

Ofício. Assim, o réu não tinha direito a nada a não ser se arrepender e morrer na

fogueira, pois já era condenado antes do julgamento.

O Tribunal Santo era montado apenas para dar ciência da condenação. Dessa

forma, notamos muita diferença do procedimento legal de hoje. Para que não haja

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dúvida sobre a fundamentação legal, a resposta aparece no artigo 396-A, peça

imprescindível para a continuidade do processo, por se tratar da defesa do réu. No

capítulo II, deste trabalho, estudamos com mais profundidade o Tribunal e

discorremos sobre o Tribunal dos Feiticeiros e sobre o Júri.

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2. O TRIBUNAL EM QUESTÃO

2.1. O TRIBUNAL DO SANTO OFÍCIO: SEU SIGNIFICADO, SUA ORIGEM,

SUA HISTÓRIA

O Tribunal do Santo Ofício tem o formato bem parecido com júri atual, porém com

diferenças básicas que vamos demonstrar neste capítulo. O que se permite afirmar

que estamos diante do embrião do tribunal do júri, o qual surgiu na Inglaterra, pois

foi o primeiro a utilizá-lo como procedimento formal para seus julgamentos (CIDADE,

2009).

A etimologia da palavra inquisição provém do latim Inqisitio que tinha o significado

de busca e indagação.

Santa Inquisição era a designação de um tribunal eclesiástico, cuja vigência

aconteceu na Idade Média e na Idade Moderna em alguns países e suas colônias,

terminando totalmente seu uso com a Revolução Francesa início da Idade

contemporânea.

O Tribunal do Santo Ofício, criado pela Igreja Católica, julgava os hereges e as

pessoas suspeitas de heterodoxia em relação ao catolicismo. Com quanto o Tribunal

Inquisitivo também foi praticado pelo Estado Absolutista Moderno e houve também o

Tribunal Inquisitivo Protestante que perseguia as bruxas nas treze colônias.

Obsta dizer que as execuções públicas, realizadas na Inquisição Eclesiástica, eram

conhecidas pelo nome de autos de fé.

Embora a Santa Inquisição tivesse sua plena pujança no século XIII, suas origens

datam do século IV, assim sendo, a partir de então, existem relatos da perseguição

àqueles que se recusavam a aceitar o credo católico. Por sua vez, esses tinham

seus bens confiscados pela Santa Inquisição e obviamente eram condenados à

morte na fogueira santa.

Os primeiros relatos do século IV afirmam que a Santa Inquisição não tinha apenas

o cunho punitivo, ela visava modificar as ideias em questão. Embora os inqueridos

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fossem torturados e tivessem seus bens confiscados, raramente eram condenados à

morte, neste período, alguns grupos de maniqueus e donatistas foram parar na

fogueira (NOVINSKY, 2007).

Esse pensamento perdurou por séculos no tribunal, fato que o próprio Eco relata

quando William conta para seu pupilo que havia sido inquisidor em uma época que o

tribunal não visava à morte, mas sim doutrinar.

Outro relato interessante do século IV, foi quando o Imperador Romano, “Caio Júlio

César Máximo”, mandou e condenou o herege espanhol Prisciliano, demonstrando

que o estado Romano mesmo decadente utilizou-se do Tribunal para mostrar seu

poder de império. Nesta condenação, a maioria do clero reprovou a atitude dos

bispos espanhóis, entretanto o tribunal ainda era só uma pequena célula do que viria

a ser Santa Inquisição.

Do século VI ao IX, as perseguições diminuíram e o Tribunal ficou esquecido, sendo

pouco utilizado. Entretanto voltaram com toda força na metade do século X e ainda

assim a Santa Inquisição tinha o formato visto em O Nome da Rosa, era sem dúvida

o próprio inferno na terra, com atrocidades vistas somente no nazismo e stalinismo.

Na historiografia da Idade Média é fato que o Tribunal tomou o formato estudado no

presente trabalho com o Papa Inocêncio III, em 1198, após as cruzadas contra os

albigenses, nas quais foram praticadas várias execuções inquisitivas em massa para

provar o poder do Império Católico. E depois desta demonstração de força e dessa

atrocidade por parte da Igreja, finalmente, em 1229, após o Concílio de Toulouse,

foram criados oficialmente a Inquisição e O Tribunal do Santo Ofício (CIDADE,

2009). Obviamente com essa criação também surgiu a legislação Canônica e a

Jurisprudência para fundamentar o Júri Inquisitivo.

A lei que dava legitimidade ao Tribunal de Deus era a Bula Excommunicamus,

editada em 1231, que instituiu a legislação do Tribunal e da excomunhão, essa

encíclica foi feita pelo Papa Gregório IX.

Obviamente essa encíclica se baseava na Lei de Taliao, onde a pessoa pagava com

vida quando matava alguém, no caso em questão pagava com a vida a heresia

cometida contra os dogmas eclesiásticos.

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É importante dizer que o Tribunal de Deus não era a Inquisição, mas o meio pelo

qual se aplicava a punibilidade para os hereges. A encíclica reafirmava a tortura e o

procedimento do júri inquisitivo, em que a figura central do inquisidor tinha todos os

poder para deliberar sobre a vida do herege sem qualquer interferência, pois o

Tribunal de Deus era absoluto.

As excomunhões que vieram na Encíclica ou Bula Excommunicamus ainda vigoram.

Apenas, o Tribunal de Deus que acabava na fogueira Santa foi extinto.

A seguir os tipos de excomunhão e de heresia que levava ao auto de fé da Santa

Inquisição:

(VATICANO)

(In: Vatican: the Holy see.com, 2013)

Excomunhão ferendae sententiae - A que é decretada pela autoridade eclesiástica, aplicando à pessoa ou a pessoas determinadas sanções que a religião tem estabelecidas, como condenação da falta cometida.

Excomunhão latae sententiae - Aquela em que o fiel incorre no momento que comete a falta previamente condenada pela religião.

Excomunhão de participantes - Aquela em que incorrem os que se associam com o excomungado declarado ou público.

Excomunhão menor - É limitada apenas à privação dos sacramentos.

Excomunhão maior - É aplicada contra os cristãos que têm incorrido em heresia ou em determinados pecados de escândalo, privando o excomungado de receber e administrar os sacramentos, de assistir aos ofícios religiosos, da sepultura eclesiástica, dos sufrágios da religião, de toda dignidade eclesiástica, do relacionamento com os demais fiéis, etc. Quando a Excomunhão Maior se pronuncia solenemente ou num concílio e vai contra a heresia, chama-se também anátema, ou seja, os excomungados são considerados amaldiçoados. (GREGÓRIO IX, 1231).

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As heresias cometidas, que antes levavam à morte, hoje geram a excomunhão. Há

outros tipos de delito:

O Delito de Heresia Material e Formal: "[...] é o assentimento errôneo de um homem batizado e que professa uma fé contra a verdade da fé só por motivo de ignorância ou erro, sem pertinácia da vontade de persistir nele. É a sentença comum. Não deve ser enumerada entre as verdadeiras heresias" (capítulo "Dixit Apostolus" e "Damnamus". In: Bula de

Excommunicamus, GREGORIO, IX, 1231).

“Heresia formal é o erro voluntário de um homem batizado, que professa a fé cristã e afirma aquela de modo pertinaz contra uma verdade de fé” (capítulo "Dixit Apostolus" e "Damnamus". In: Bula Excommunicamus, GREGÓRIO, IX, 1231). É a sentença comum. Para ela se requer erro no intelecto e pertinácia na vontade. A pertinácia não consiste em reter e defender um erro por muito tempo e de modo acre e mordaz, mas, sim, em reter o erro depois de que o contrário lhe foi proposto de forma suficiente ou quando se sabe que o contrário é mantido pela verdadeira Igreja de Cristo, a cujo juízo se antepõe o seu. Assim, é comum entre os doutores. A heresia formal pode ser interna ou mental: é a que existe somente no coração e na mente e não se manifesta exteriormente por palavras ou atos.

O Delito de Heresia Externa: existindo interiormente, manifesta-se de modo suficiente, exteriormente, por palavras ou atos. A heresia externa pode ser pública ou manifesta abertamente diante de muitos. Pode ser manifesta por palavras, atos, sinais exteriores, diante de ninguém ou diante de um somente, ou de outro presente e ouvinte. Esta heresia, porquanto é verdadeira e externa, ainda que oculta, é suficiente para incorrer em penas. Nem “outras condições são requeridas para que seja pública.” (capítulo "Dixit Apostolus" e "Damnamus". In: Bula Excommunicamus, GREGÓRIO, IX, 1231).

A noção de heresia pública é judicialmente definida pelo Cânon 2197 do Código de

1917. Público é o delito "já divulgado" (no passado) e também aquele que no futuro

"poderá e deverá ser facilmente divulgado conforme um juízo prudente"

(CRESCENTI, 2005). É a forma pública potencial. Não depende do número de

pessoas atuais às quais é manifesto o delito, mas sim da evidência do ato em si que

pode ser conhecido por muitos.

O dever de denunciar: sob pena de excomunhão os hereges devem ser

denunciados. Os que foram conhecidos como tais e os suspeitosos devem ser

denunciados ainda que não se possa provar, pois em 6-9-1665 Alexandre VII

condenou a proposição: "Ainda que conste de modo evidente para ti que Pedro é

herético, se não podes provar, não estás obrigado a denunciá-lo" (CIDADE, 2009).

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Sendo a heresia o maior mal e de fácil contágio social, o exercício desse dever

pertence a todos os cristãos em relação a todos. Pedro aqui pode ser até o Romano

Pontífice sobre quem Paulo IV ensina que é lícito resistir e apartar-se da obediência

(Bula "Cum ex Apostolatus") ou qualquer outro, clérigo ou leigo. A Fé é comum a

todos, universal. A "evidência" do ato. Ou seja, a notoriedade do delito, justifica a

denúncia: cabe às autoridades ortodoxas remanentes julgá-la. E cabe ao

denunciado provar sua inocência, remover a suspeita através da confissão

inequívoca da Fé. Se persistir no erro, segue o que diz o Cânon 2315: deve ser tido

por herético, depois de certo prazo.

Todos os hereges estão excomungados:

Todos os hereges formais externos incorrem "ipso facto" em excomunhão reservada ao Papa. É a sentença comum certa (De Haereticis, capítulo. Sicut, Ad Abolendam", "Excommunicamus"). E não somente os hereges, mas também os que neles creem, os que os recebem e os que os favorecem. É a sentença comum e certa (GREGORIO IX, 1231).

2.2. O PROCESSO NA SANTA INQUISIÇÃO? SEU PORCEDIMENTO E

SEUS PARALELOS

O procedimento do júri inquisitivo era sumário, o acusado nem precisava saber o

nome de seu delator. O processo sumário inquisitivo se baseava na denúncia do

delator e, depois, se confirmava a suspeita por intermédio de confissão

fundamentada em métodos de tortura e aí se convocava o Tribunal de Deus e

passava para o auto de fé.

Autoridade inquisidora que presidia o Santo Inquérito também era a autoridade

máxima do Tribunal. Tanto como delator ou testemunhas não importava se eram

mulheres, crianças, escravos ou nobres, porém, serviam apenas como testemunha

de acusação. Assim que o herege era delatado, começava o Santo Inquérito, que

levaria ao Tribunal de Deus.

A defesa do herege iria ser feita por um padre ou monge que seria um dos três

juízes inquisitivos. Uma defesa que mais está para acusação, porque ninguém

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ousava divergir do inquisidor presidente. Entretanto, se o processado confessasse e

ainda delatasse seus cúmplices que poderiam ser amigos ou parentes, neste caso, o

processa teria chance de ter algumas regalias e até de escapar da Santa Fogueira.

Segundo Bernardo Gui, um dos maiores inquisidores medievais, para se

conseguisse a boa confissão e os bons relatos do prisioneiro, portanto, era

necessário levá-lo à exaustão física e perda de suas forças, porque a tortura

purificava o herege a caminho do purgatório divino (EYMERICO, 2009).

Insta salientar que, por ser um Tribunal de Deus, a Igreja não podia, pelas mãos dos

inquisidores, proceder com o ritual da Santa Fogueira. Portanto, os hereges

condenados à morte eram entregues a um Tribunal Civil que era presidido pela

autoridade do Feudo, o Senhor, o qual mandava preparar a fogueira e cumpria a

determinação inquisitiva de queimar o herege. Esse Tribunal Civil Inquisitivo não

julgava apenas cumpria a determinação do Tribunal Santo.

Esse processo se denominava auto da fé ou festa da morte que ocorria da seguinte

forma, terminada a sessão de tortura, os réus eram levados ao Tribunal da Santa

Inquisição, que tinha três juízes, normalmente, padres ou monges, era um

julgamento publico.

Os servos do feudo assistiam a todo Tribunal. Um dos três juízes acusava, era o

inquisidor santo esse também era o presidente do júri, um defendia e o outro votava

a favor ou contra a condenação. Entretanto, se o herege fosse do clero o Tribunal de

Deus era fechado dentro dos mosteiros ou das igrejas. E aí se condenado era

encaminhado para o tribunal civil que era encarregado de cumprir a sentença do

Tribunal Santo.

A última etapa do processo era o auto da fé. Na frente do cortejo vinham os

coordenados à morte. Estes eram seguidos pelos condenados à pena leve, depois,

apareciam os que eram conduzidos ao cárcere e os que se flagelavam com uma

vela na mão rezando e se penitenciando. Por último, os guardas feudais executavam

a pena de morte.

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Desta forma, quem matava aos olhos de Deus era a Justiça Civil, o Tribunal de Deus

apenas investigava, acusava e condenava. Quem executava a pena era a Justiça

dos Homens.

Entretanto, havia casos de pessoas que se arrependiam e preferiam morrer na paz

de Deus. Esses eram estrangulados e, depois de mortos, jogados na Santa

Fogueira. Os que eram delatados pelos acusados, mas conseguiam fugir, tinham um

boneco queimado simbolicamente até serem encontrados. Os que morriam no

cárcere em decorrência da tortura também não escapavam da Santa Fogueira,

tinham seus restos lançados nela.

O auto da fé ou festa da morte era público para que todos conhecessem os

acusados e suas famílias que seriam excluídas da sociedade para sempre através

da excomunhão ou pelo tempo de penitência, e também tinham seus bens

confiscados pelo alto clero. Os que se arrependiam, tinham a misericórdia de não

ser queimado vivo.

Há relatos da época que existiam dois tipos de auto da fé: os públicos e os privados.

Os autos privados eram cerimônias fechadas dentro do átrio dos castelos feudais,

onde se realizam as condenações mais leves de nobres que incorreram em heresias

menores. Portanto, não era aberta ao público e também não podia ser utilizada para

queimar esses hereges.

Ocorre que o auto da fé público além de mostrar a punição ao homem comum,

também era nele que se transcorria a Santa Fogueira. Era um ato muito

dispendioso, cheio de pompa que trazia autoridades eclesiásticas, reis, príncipes

que, por sua vez, durava o dia todo dependendo do numero de réus.

No auge do Tribunal de Deus, essa festa ocorria uma vez por ano nos feudos, onde

eram construídas estradas de acesso para a imensa festa e mobílias especiais para

as autoridades, além dos comes e bebes. A festa da morte era um ritual de

execução punitiva de mais alta pompa medieval. Com o passar do tempo, o auto da

fé se tornou anual e cada vez mais requintado, assim como a sua duração poderia

ser de até 72 horas. A Santa Fogueira tinha caráter festivo para punir e humilhar os

hereges e suas famílias.

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A cerimônia sempre começava com procissão da fé, onde os condenados

caminhavam com velas nas mãos e eram locados em lugar determinado para que

pudessem ouvir a sentença bem aos olhos de todos do feudo. Após a entrada do

condenado, ocorria uma missa explicando a gravidade da heresia e a necessidade

da Santa Inquisição. E depois das execuções, Deus voltaria a olhar para o feudo.

O luxo era tão presente que muitos nobres e reis se casavam durante a cerimônia

do auto da fé, após toda rotina cerimonial cumprida, os réus eram encaminhados

aos cremadores que se situavam no centro do átrio público do feudo. O momento

mais esperado pelo povo era o momento da Fogueira Santa que libertava o povo

das mãos de Lúcifer e seus demônios.

Em nome Deus não se perseguia somente os hereges que ofendiam os dogmas

católicos da época, mas também aqueles que se opunham ao Império da Igreja.

Desta forma, muita gente morria apenas por se opor a um governo ou à economia e

fortuna eclesiástica.

A Igreja Católica Medieval nem de longe é a Igreja de hoje que prega paz, amor e

fraternidade. Na Idade Média, coube a essa mesma conduzir um mundo que havia

perdido sua identidade Estatal e voltava à barbárie, Talvez, um fardo muito grande

para ser carregado por uma Instituição Religiosa.

O júri inquisitivo tem seu formato espacial bem parecido com o Tribunal do Júri

Brasileiro. Entretanto, ambos diferem em seu procedimento, por exemplo, o júri atual

tem o rito especial bifásico, já o júri inquisitivo tinha o rito sumário. Hoje, não se

confisca o bem do réu, naquela época sim. Na realidade, é importante ressaltar que

o Júri Inquisitivo foi célula embrionária do Tribunal do Júri Mundial.

O Júri Inquisitivo se aproxima um pouco do Tribunal apresentado por Eco na obra

em questão. Ambos são semelhantes, pois como meio investigativo utilizam o

método de tortura e um auto de fé. Contudo, no livro, este aparece sem a pompa do

evento, apenas com a fogueira Santa do lado de fora do Mosteiro. Além disso, o

tribunal foi montado dentro da Abadia, o que não ocorreria na realidade.

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No Brasil Colônia teve a Santa Inquisição e só foi abolida em 1822 quando o país se

tornou independente, no caso da Inquisição Brasileira, tinha por função garantir os

direitos da coroa portuguesa e manter os dogmas da Igreja Católica.

Com a expansão colonial portuguesa, o Tribunal do Santo Ofício também se

expandiu e imigrou para as colônias. Em cada colônia, o Tribunal seguia o auto da fé

do seu país de origem. Portanto, no Brasil Colônia, o tribunal era na praça central

das províncias e era presidido pelo inquisidor geral da Santa Fé no nosso país. O

rito do Tribunal Eclesiástico é o mesmo já relato neste trabalho (NOVINSKY, 2007).

É Importante ressaltar que nas 13 colônias Inglesas, o Júri Inquisitivo era na sua

maioria Anglicano e Protestante e perdurou até os primórdios do século XX. Sendo

necessário grifar que o primeiro Inquisidor Geral da Espanha residia em Cuba, por

sinal era bispo da província (NOVINSKY, 2007).

A primeira Inquisição no novo Mundo foi a Espanhola, que também foi a primeira a

tomar corpo na Europa.

No Brasil Colônia, houve 75 mortos na Foguearia Santa, depois o Tribunal foi banido

por D. Pedro I, no intuito de cortar todos os vínculos com Portugal (NOVINSKY,

2007).

Como foi supracitada a Inquisição Anglicana, Protestante e dos Estados formados, é

bom salientar que todas usavam o rito idêntico em seu processo do Santo Ofício.

A primeira vez que a Santa Inquisição atuou no Brasil foi na província da Bahia e lá

permaneceu julgando e promovendo o auto da fé por três anos. Depois foi na

província de Pernambuco esses dois Tribunais tiveram um cunho político já que

perseguiam os judeus holandeses, na tentativa da Metrópole Portuguesa de impedir

a invasão holandesa. Esses Tribunais expulsavam os invasores e os mesmos iam

para outras colônias, porém é fato histórico que a Inquisição Portuguesa causou

muitos prejuízos financeiro a Holanda.

É interessante perceber que esse tribunal utilizado no Brasil tinha cunho político e

não religioso, embora se escondesse atrás do auto da fé religiosa.

O que demonstra ainda poder da Igreja, mesmo com as monarquias absolutistas. O

poder dos Reis era embasado no poder imperial da Igreja Medieval.

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Após todos os dados citados no presente trabalho, vamos desmistificar o júri.

2.3 O TRIBUNAL DO JÚRI: SEU SIGNIFICADO, SUA ORIGEM, SUA

HISTÓRIA

A origem do Júri é muito controversa, talvez por falta de acervo. Existem duas

correntes sobre a origem do tribunal. A vertente mais conservadora se posiciona

diante do fato do tribunal ter sido utilizado em todas as aglomerações humanas na

história e sua origem se estrutura na raiz da formação da sociedade. Justamente por

isto, os mais conservadores afirmam que o tribunal sempre esteve presente nas

mais remotas sociedades históricas (RANGEL, 2009). Entretanto, há uma corrente

liberal que indica a origem do Júri em uma época mosaica, que preceda Grécia e

Roma, que, por sua vez, foi utilizada pelos dois impérios. Ou seja, no mundo Egípcio

e depois entre os judeus na época de Moisés.

No entanto, de acordo com o pensamento filosófico histórico de Foucault, que

embasa o pensamento contemporâneo, tudo que surge na modernidade histórica já

deve ter tido precedente nos anais da história, e o Júri Moderno Penal teve também

sua formação no auge da democracia da Grécia antiga em Helieia. Contudo, é

importante salientar que o Santo Tribunal é o mais próximo embrião do júri penal

para crimes capitais, como era considerada a heresia.

O Tribunal do Júri, independentemente da sua origem, sempre foi marcado pela

oralidade de seus participantes, apesar de ser cercado por um misticismo religioso.

Mas para fins deste estudo é importante dizer que embora o Júri não tenha surgido

na Inglaterra, o Júri Brasileiro o utilizou como modelo.

Na realidade, o Tribunal de Deus, criado por Gregório IX, foi a origem do tribunal do

júri, o qual possuía um julgamento teocrático e tinha um conselho de jurados

denominado de Ordálias ou jurados de Deus, e mais três padres. Destes, o

presidente era o Padre Inquisidor.

56

Após o fim da Inquisição e a ascensão da Revolução Francesa, o Tribunal de Deus

foi reformulado nos anais da História para atender as mais diversas sociedades e

países do mundo.

É importante ressaltar que, na França e nos demais países europeus, o Tribunal do

Júri foi instituído pela declaração dos direitos dos homens de 1789, para apurar os

delitos contra a vida. Em alguns países surgiu para apurar o delito civil que não vem

ao caso no presente trabalho por se tratar de um trabalho penal. Esse júri criminal

Francês foi consagrado como instituição judiciária política.

Faz-se necessário ressaltar que na Inglaterra o Tribunal se faz presente desde sua

formação e o modelo de Júri Inglês foi exportado par o mundo. E devido à ratificação

do Júri pela carta magna Inglesa, esse procedimento passou a ser o modelo tribunal

europeu.

A própria França se utilizou deste modelo de tribunal para julgar os réus do ato que

ficou denominado como a queda da bastilha.

O tribunal do Júri Europeu foi utilizado como forma jurisdicional na formação dos

novos Estados Absolutistas, entretanto não foi inserido no ordenamento jurídico da

Dinamarca e Holanda ( RANGEL, 2009).

No mundo latino a Argentina, embora tenha o júri inserido em seu ordenamento

jurídico, não se faz uso desse procedimento no país em questão.

Então, pode-se afirmar que o Tribunal do Júri como procedimento jurisdicional seria

quase uma unanimidade no mundo ocidental.

2.4. A HISTÓRIA DO TIRBUNAL DO JÚRI NO BRASIL

No Brasil, o Tribunal do Júri teve um histórico mais favorável, apesar de, em

determinados períodos, passar certas crises institucionais. Foi disciplinado em nosso

ordenamento jurídico pela primeira vez, pela Lei de 18 de junho de 1822, a qual

limitou sua competência ao julgamento dos crimes de imprensa, sendo que o

mesmo era formado por Juízes de Fato, num total de vinte e quatro cidadãos bons,

57

honrados, patriotas e inteligentes, os quais deveriam ser nomeados pelo Corregedor

e Ouvidores do crime, e a requerimento do Procurador da Coroa e Fazenda, que

atuava como o Promotor e o Fiscal dos delitos. “Os réus podiam recusar dezesseis

dos vinte e quatro nomeados, e só podiam apelar para a clemência real, pois só ao

Príncipe cabia a alteração da sentença proferida pelo Júri” (RANGEL, 2009).

Tem que se salientar que ao Tribunal do Júri, criado pela Lei 18 de 1822, cabia

julgar inicialmente crimes de imprensa. Sua previsão constitucional surgiu com a

Constituição Imperial de 1824 e incluía uma parte denominada Poder Judicial. Este

estabeleceu em seus artigos que o poder dos juízes e jurados era independente do

poder executivo. Entretanto somente o Imperador ou um dos príncipes teriam o

poder de mudar a sentença do conselho de jurados.

Os artigos da Constituição de 1824, que dão suporte constitucional ao tribunal, eram

os seguintes:

Artigo 151 - O poder judicial é independente, composto de juízes e jurados, os quais terão lugar, assim no cível como no crime, nos casos e pelo modo que os códigos determinarem.

Artigo 152 - Os jurados se pronunciam sobre o fato, e os juízes aplicam a lei.

Em 1832, foi disciplinado pelo Código de Processo Criminal, o qual conferiu ampla

competência, só restringida em 1842, com a entrada em vigor da lei nº 261.

(WALFREDO, 2008).

Nos anos que compreenderam de 1842 a 1869, teve no país uma regressão muito

forte no poder judiciário. O Tribunal do Júri sofreu várias sanções e ficou à margem

do poder, perdendo sua autonomia com a lei nº 261. Seu tribunal de acusação foi

extinto. Ou seja, o Júri perdeu sua importância e seu significado na legislação

vigente. Esse Júri era responsável pela acusação ou não do réu. Trabalho que hoje

é feito pelo Ministério Público. E com a retirada da acusação, o próprio tribunal titular

perdeu muito de sua competência.

58

Na realidade, o Tribunal do Júri no Brasil tinha em seu início mais um caráter político

do que judicial e sua utilidade, bem como competência, eram medidas pela situação

da política que doutrinava as províncias.

Sua competência foi cerceada até 1871 com a publicação da Lei 2.033, que

acompanhou o decreto 4.824 do mesmo ano e que devolveu ao Tribunal do Júri sua

competência para julgar crimes de estelionato, moeda falsa, roubo e homicídio,

inclusive nas fronteiras do Império.

Deve-se lembrar de que o Tribunal da época era uma magistratura leiga composta

de desembargadores da lei e jurados, que eram escolhidos dentro sociedade, da

mesma forma que se procedia na Inglaterra, o que dava poder ao Tribunal,

contrastando com o poder absolutista de D. Pedro II. Ou seja, a província era

autossuficiente para montar o tribunal e não havia juiz de fato, mas sim leigos que

decidiam a vida da sociedade.

A instituição, por ter uma formação leiga e de cunho político, foi muito criticada no

século XIX. Também, o foi pelo seu caráter mais absolvitório do que punitivo ou

condenatório. Embora visasse a impor o poder de império do Estado Brasileiro,

passou a ter uma irrelevância jurídica no âmbito do poder judiciário, por se tratar de

um tribunal leigo.

Após várias discussões, quando da promulgação da Constituição da República dos

Estados Unidos do Brasil, de 24 de fevereiro de 1891, foi aprovada a emenda que

dava ao artigo 72, § 31, o texto: “[...] é mantida a instituição do Júri”. O Júri foi,

portanto, mantido, e com sua soberania (RANGEL, 2009).

Porém, a Constituição da Primeira República não conferiu ao Tribunal o tratamento

que fora dado no Império. Entretanto lhe foi dada a autonomia judiciária necessária

para julgar os crimes contra a vida, que o legislador garantiu para o cidadão o direito

de um plenário do Júri de cunho legal e não leigo, que deixava bem claro o desejo

de que o Tribunal se perpetuasse em nosso ordenamento jurídico.

Dessa forma, o Tribunal perdeu o caráter provincial e passou a ser utilizado como

uma intuição, cuja sua competência era a de julgar os crimes mais graves cometidos

pela sociedade da época.

59

Em 1894, foi criado um Júri de competência federal que serviria para julgar crimes

federais, por exemplo, como moeda falsa, porque sua competência era restrita, não

se julgavam crimes dolosos contra a vida no novo plenário federal do júri, esse tipo

de crime era de competência do conselho de sentença estadual.

Obsta dizer que, na primeira república, o legislador não deu ao júri o caráter de

tribunal que hoje ele tem, porém teve a preocupação de lhe dar um formato judicial e

manter sua importância no ordenamento, para que o mesmo fosse aperfeiçoado

com o tempo.

Com essa nova instituição, o Brasil passou a ter dois Tribunais do Júri: um estadual

e outro federal. Esse novo decreto do governo republicano ratificou de vez a

importância do Tribunal nos anais da história processual deste país. Ou seja, mesmo

havendo um retrocesso no tribunal como garantia individual que o Júri tinha no Brasil

Império, o legislador não o afastou do poder judiciário, por mantê-lo e instituir o juiz

togado. E passou a permitir que lei ordinária mudasse a instituição do tribunal do júri.

Essa importante inovação adveio da Constituição da República dos Estados Unidos

do Brasil, de 16 de julho de 1934, com a retirada do antigo texto referente ao Júri

das declarações de direitos e garantias individuais, passando para a parte destinada

ao Poder Judiciário, conforme artigo 72: “É mantida a instituição do Júri, com a

organização e as atribuições que lhe der a lei” (RANGEL, 2009).

O que importa ressaltar no Estado Novo em relação ao Tribunal do Júri é que

mesmo sendo um governo autoritário, o ditador achou melhor manter o Júri, por dar

uma segurança jurídica muito grande à sociedade, por cuidar de crimes dolosos

contra a vida.

Nos anais da história, o Júri tem como característica principal compor um tribunal,

um conselho de sentença, leigo, escolhido por sorteio na própria sociedade. Ou seja,

nem o ditador de uma época interferiu na forma de se conduzir o Júri e de seu

conselho de sentença. E manteve um tribunal democrático para punir crimes

hediondos e dolosos contra a vida.

Obviamente, o ditador da época, anos 1930 e 1940, Getúlio Vargas, também se

utilizou do tribunal do júri para manter seu poder, ao levar crimes contra o Estado em

vigor para tribunal, sua atitude visava a proteger seu governo do ataque dos

60

comunistas, como Júlio Prestes. No Estado Novo, entretanto, o júri foi mantido para

punir os crimes contra a vida. Mesmo não estando explícito na constituição

Varguista de 1934, o júri não foi extinto do nosso ordenamento jurídico. Porém, se

manteve de forma implícita na referida constituição e na Constituição 1937.

Pouco mais adiante,

[...] com a Constituição de 1937, que não se referia ao Júri, houve opiniões controvertidas no sentido de extingui-la face ao silêncio da Carta. Contudo, logo foi promulgada a primeira lei nacional de processo penal do Brasil republicano, o Decreto-lei nº 167, em cinco de janeiro de 1938, instituindo e regulando a instituição (WALFREDO, 2008, p.562).

Ocorre que, para a história oficial brasileira, foi um ditador que instituiu de vez o

conselho de sentença democrático para crimes contra a vida.

A Constituição democrática de 1946 restabeleceu a soberania do Júri, provendo-o

dos direitos e das garantias constitucionais. A Constituição do Brasil de 1967, em

seu artigo 150, § 18, manteve o Júri no capítulo dos direitos e garantias individuais,

dispondo:

São mantidas a instituição e a soberania do Júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida”. Da mesma forma, a Emenda Constitucional de 1969, manteve o Júri, todavia, omitiu referência a sua soberania. O artigo 153, § 18, previa: “é mantida a instituição do Júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida (WALFREDO, 2008, p.562).

Com o retorno da democracia, a Constituição de 1946, por ter sido promulgada e

oriunda de uma vontade popular, reestabeleceu a autonomia dos poderes e deu ao

conselho de sentença um lugar de destaque no ordenamento jurídico, como forma

de garantia da segurança jurídica. Entretanto, o júri em sua forma processual, sofreu

uma mudança significativa para manter sua idoneidade e sua isenção, e

61

imparcialidade, para que o poder econômico não interferisse nas decisões do

conselho de sentença. Dessa forma, o plenário do júri passou a ser composto com

sete pessoas, tinha que ser um número ímpar para garantir a soberania do tribunal

do júri penal.

Insta dizer que, antes, o júri tinha um número par que, no tribunal civil, era de 12

pessoas. O tribunal penal, por sua vez, de 24 pessoas.

Mesmo com a ditadura militar, o tribunal do júri penal foi mantido como garantia

fundamental na constituição de 1967. Todavia, sua função era tão somente a de

julgar crimes dolosos contra a vida. Diante desta exposição o tribunal penal do júri

foi ratificado de vez nos costumes e no ordenamento jurídico do Brasil.

Sendo assim, podemos observar que ficou mantido e preservado o conselho de

sentença penal e não o conselho de sentença civil, este sim foi extinto e mudou por

completo a prática do direito civil, porque antes as questões do direito privado eram

resolvidas por um conselho de sentença. Hoje, as problemáticas privadas têm o

direito a uma audiência reservada tão somente com as partes. O juiz, em caso que

um menor está envolvido ou quando o caso é de interesse público, solicita a

presença de um representante do Ministério Público.

Embora a ditadura militar tenha mantido o plenário do júri e sua soberania, em 1969,

a emenda constitucional instaurou um governo militar mais autoritário, assim, o júri

sofreu uma nova crise porque, nesse regime mais arraigado, suas decisões

poderiam sofrer interferência do poder executivo ditatorial. Diante desta situação, a

intuição mais democrática do judiciário se via novamente ameaçada e o judiciário

passou a viver a incerteza da preservação do júri. Porém, o tribunal sobreviveu à

ditadura e recuperou sua importância e função na nova democracia brasileira.

Na Carta Magna promulgada em 1988, é reconhecida a instituição do Júri estando

disciplinada no artigo 5º, XXXVIII. O Tribunal do Júri, no Brasil, após todo o percurso

histórico, passou a ter, com essa Carta, quatro princípios constitucionais basilares: a

plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a

competência para os crimes dolosos contra a vida (artigo 5°, inciso XXXVIII)

(WALFREDO, 2008).

62

A plenitude de defesa, atribuída à instituição do Júri, traz aparente redundância do

direito constitucional à ampla defesa (artigo 5°, LV, da Constituição Federal de

1988). O sigilo nas votações visa resguardar a liberdade de convicção e opinião dos

jurados, para uma justa e livre decisão, sem constrangimentos decorrentes da

publicidade da votação. Trata-se de uma mínima exceção à regra geral da

publicidade, disposta no artigo 93, IX, da Constituição Federal, para prestigiar a

imparcialidade e idoneidade do julgamento. A forma sigilosa ou secreta da votação

decorre da necessidade de resguardar-se a independência dos Jurados no ato

crucial do julgamento (WALFREDO, 2008).

A soberania dos veredictos está, hoje, entre as cláusulas pétreas da Constituição de

1988. “Entende-se que a decisão dos jurados, feita pela votação dos quesitos

pertinentes, é suprema, não podendo ser modificada pelos magistrados togados”

(RANGEL, 2009). A estes cabe a anulação por vício processual ou, por uma vez,

determinar novo julgamento, no caso de decisão manifestamente contrária à prova

dos autos. Trata-se do princípio relativo, pois no caso de apelação das decisões do

Júri pelo mérito (artigo 593, III, do Código de Processo Penal), o Tribunal pode

anular o julgamento e determinar a realização de um novo, se entender que a

decisão dos jurados afrontou manifestamente a prova dos autos (TOURINHO

FILHO, 2011).

Finalizando os princípios constitucionais do Júri, encontramos a sua competência

para os crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados. Tais crimes estão

previstos no início da Parte Especial do Código Penal: homicídio simples,

privilegiado ou qualificado (artigo 121 §§ 1° e 2°); induzimento, instigação ou auxílio

ao suicídio (artigo 122); infanticídio (artigo 123); e aborto (artigos. 124, 125, 126,

127e 128) (RANGEL, 2009).

Cabe esclarecer, de antemão, que crimes dolosos contra a vida não são todos

aqueles em que ocorra o óbito (MIRABETE, 2011). Também, são considerados

aqueles que se referem à tentativa de homicídio.

O nosso país é um Estado Democrático de Direito, com base nisso garante o

respeito aos direitos dos cidadãos. Entre outras garantias fundamentais, está a de

uma decisão judicial que preze em atendê-los, conforme a Constituição Federal. A

63

garantia que toma o aludido artigo é a do devido processo legal, onde estas

deveriam seguir o mesmo procedimento, sendo igual para todos e com as devidas

fundamentações para garantia da sua licitude, cabendo essa, portanto ao Tribunal

do Júri. Este que, dentro do nosso ordenamento, representa o pilar da democracia

do país, já que qualquer pessoa pode julgar não se abstendo apenas nas mãos de

poucos para não viciar e desrespeitar garantias fundamentais.

Todavia, apesar do Tribunal ter sido criado desde a Antiguidade e vir no tempo se

alterando, acompanhando a evolução social, ainda se apresenta com falhas, como

ainda podem ser vistas na falta de preparação dos jurados, na burocracia e no gasto

para a formação do Júri. Há, ainda, falta de severidade sobre os jurados, pois os

juízes devem decidir fundamentadamente, para provar que sua decisão não teve

nenhum tipo de vício, e este deverá ter certo preparo, para tais decisões, requisitos

não propostos ao júri.

O Julgamento Popular, por ter como competência crimes dolosos contra a vida,

deveria ter uma preparação melhor na escolha dos jurados, todavia com isso

poderia descaracterizar o júri como a qualquer cidadão sem auferir diferenças, como

este é a representação da democracia no ordenamento. Contudo, as mudanças

propostas pela lei ainda são recentes, o sistema ainda vai ter sua adequação na

realidade da sociedade brasileira.

Faz-se necessário expor os artigos de lei supracitados neste item, para se entender

o embasamento legal do tribunal em nossa pátria.

A Constituição Cidadã de 1988 fundamentou o Tribunal do Júri em seu:

Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados;

64

LV - aos litigantes em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;

Artigo 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal; disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

Os artigos, do Código Penal, de competência do Tribunal do Júri, referentes a delitos

são:

Artigo 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Caso de diminuição de pena

§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Homicídio qualificado

§ 2º Se o homicídio é cometido:

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;

II - por motivo fútil;

III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;

V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

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Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

Homicídio culposo

§ 3º - Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965);

Pena - detenção, de um a três anos.

Aumento de pena

§ 4º - No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003).

§ 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. (Incluído pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977).

§ 6º - A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio. (Incluído pela Lei nº 12.720, de 2012).

Artigo 122. - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Parágrafo único - A pena é duplicada:

Aumento de pena

I - se o crime é praticado por motivo egoístico;

II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.

Artigo 123. Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:

Pena - detenção, de dois a seis anos.

Artigo 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque.

Pena - detenção, de um a três anos.

Artigo 125. Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:

Pena - reclusão, de três a dez anos.

Artigo 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante.

Pena - reclusão, de um a quatro anos.

Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência forma qualificada.

Artigo 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de 1/3 (um terço), se, em consequência do aborto ou dos

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meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

Artigo 128. Não se pune o aborto praticado por médico: I- Se não há outro meio de salvar a vida da gestante; II- Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

No que tange ao recurso do réu esta previsto no Código de processo Penal

Brasileiro, disposto no artigo infracitados.

Artigo 593. Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias;

I - das sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas por juiz singular;

II - das decisões definitivas, ou com força de definitivas, proferidas por juiz singular nos casos não previstos no Capítulo anterior;

III - das decisões do Tribunal do Júri, quando;

a) ocorrer nulidade posterior à pronúncia;

b) for a sentença do juiz-presidente contrária à lei expressa ou à decisão dos jurados;

c) houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança;

d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos.

§ 1º Se a sentença do juiz-presidente for contrária à lei expressa ou divergir das respostas dos jurados aos quesitos, o tribunal ad quem fará a devida retificação.

§ 2º Interposta a apelação com fundamento no inciso III, c, deste artigo, o tribunal ad quem, se Ihe der provimento, retificará a aplicação da pena ou da medida de segurança.

§ 3º Se a apelação se fundar no inciso III, d, deste artigo, e o tribunal ad quem se convencer de que a decisão dos jurados é manifestamente contrária à prova dos autos, dar-lhe-á provimento para sujeitar o réu a novo julgamento; não se admite, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação.

§ 4º Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra.

Ao se traçar um paralelo histórico entre o tribunal do júri brasileiro e a Inquisição, fica

apenas a montagem do cenário do júri, porém mesmo com todas as diferenças, os

dois sobreviveram a várias intempéries.

67

O Tribunal de Deus também não foi extinto, apenas não se queimam mais os

hereges, mas ainda são julgados e excomungados, embora ainda esteja previsto na

Constituição Canônica. Só não mais utilizam a parte do auto de fé porque os

Estados contemporâneos não queimariam mais os hereges, haja vista que o

Tribunal de Deus não podia queimá-los, apenas condenava à Santa fogueira. Ocorre

que sempre foi responsabilidade da autoridade civil do feudo aplicar a pena.

Portanto, quando a Igreja instaura o Tribunal do Santo Ofício, ela pode somente

aplicar a pena de excomunhão.

Prova disto foi a recente Excomunhão Maior do Padre Roberto Francisco Daniel por

ter cometido o delito de Heresia Externa, da Cidade de Bauru. Em sua defesa, o

padre alegou, na justiça comum, que não poderia ser excomungado porque o Papa

Francisco rejeitou os homossexuais. No entanto, Padre Beto não foi excomungado

pelo seu ponto de vista de combater o preconceito, mas sim por causa de sua

conduta. Ou seja, um padre não pode frequentar bares e publicar suas fotos na

libertinagem em sites como facebook e twiter. Essa conduta fere os dogmas

canônicos da Igreja Católica Apostólica Romana e, de certa maneira, agride o

público católico.

De acordo com a cúria vaticana, a decisão de excomunhão aplicada pelo Bispo da

cidade de Bauru, do estado de São Paulo, refere-se ao fato de que um padre não

pode se entregar aos “prazeres mundanos da carne” e sim se dedicar ao seu

trabalho espiritual, para melhor cumprir suas obrigações como sacerdote.

Para o direito canônico, um sacerdote tem que viver em consonância com a vida de

Jesus na terra, ou seja, abrir mão de sua vida carnal para viver a vida espiritual.

Esses dogmas canônicos são imutáveis, nem o Concílio Vaticano II, que foi

convocado pelo papa João XXIII, em 25 de dezembro de 1961, e promulgado em

1962, através da “Bula Humanae Salutis”, mexeu na conduta do sacerdote, ou seja,

esta ficou preservada, de acordo com a reforma do Papa Gregório VII. É pertinente

afirmar que a conduta do Padre Roberto Francisco Daniel, vulgo Beto, não condiz

com a doutrina católica imposta ao sacerdote e a pena para esse tipo de conduta é a

excomunhão, depois enfrentamento do Tribunal Eclesiástico no Vaticano.

68

No que tange à ação proposta na justiça brasileira para que o ex-padre Roberto

Francisco Daniel possa votar a exercer o seu sacerdócio, esta foi indeferida pela

justiça civil de Bauru, pois não procede porque um padre serve a Igreja e está sujeito

a suas leis, no que se refere à sua prática sacerdotal, ou seja, foge da competência

da justiça brasileira.

Obviamente, em seu julgamento, não haverá tortura nem fogueira, mas serão três

cardeais juízes que farão a arguição e será promulgada a sentença final. Somente o

monarca da atual da Igreja Católica, o Papa Francisco, pode reverter a decisão do

tribunal, entretanto, seria difícil que o Santo Padre o fizesse. Insta salientar que o ex-

padre Beto não voltara a ser padre, dificilmente, o Tribunal Eclesiástico reverterá a

decisão do Bispo de Bauru.

No livro O Nome da Rosa, a montagem do tribunal, com a tentativa de debate,

instaurada pelo Frei Willian de Baskerville, ficou bem próxima. Baskerville tentou

defender os hereges, sua tentativa só foi possível por ser uma obra de ficção,

porque num Tribunal de Deus real, jamais a defesa afrontaria o inquisidor, ou seja,

não havia defesa.

2.5 O NOVO JÚRI BRASILEIRO SEU PROCEDIMENTO E PARALELOS

Após ter se tornado cláusula pétrea em nosso ordenamento pátrio, o Júri Brasileiro

teve uma reforma em seu procedimento processual em 2008. Dessa forma, o

presente trabalho tem a necessidade de demonstrar as normas e mudanças

processuais, bem como seu procedimento, porque é a lei processual penal que dá

fundamento ao estudo em questão. Salienta-se dizer que, por iniciativa do “Poder

Executivo”, uma proposta de discussão do novo júri começou em 2001, quando a

Professora Ada Pelegrini Grinover, presidiu essa comissão, que gerou a PEC 35, a

qual se tornou a lei infracitada.

A referida Lei 11.689/2008 entrou em vigor em nosso ordenamento jurídico em nove

de junho do referido ano, trazendo mudanças significativas na procebilidade do

tribunal. As alterações se deram em consonância com os princípios constitucionais

69

da efetividade e razoabilidade do processo, e pode se afirmar que foram mudanças

profundas no procedimento dos crimes de competência do conselho de sentença

que, por sua vez, se encontram previstas no artigo 406 e seguintes do Código de

Processo Penal.

Cabe salientar que a nova lei tem caráter processual, atingindo de forma irrefutável o

processo. Sem esquecer que seu caráter é de direito público. Essa lei atinge o

processo em todas suas fases, guardadas as proporções legais, sua força normativa

veio trazer mudanças para tornar os processos do Plenário do Júri mais céleres,

atendo a uma necessidade social porque, quando se fala de crimes dolosos contra a

vida, há uma cobrança maior por parte da sociedade por uma justiça rápida.

Sem falar que, quanto mais cedo se aplica a punição, mais eficiente se torna a

medida punitiva. Dessa forma, não era mais interessante ter um tribunal que

demorava mais de dez anos para punir. Como já foi dito, o júri representa um local

democrático, onde a população participa da condenação, o que traz uma saciedade

maior na questão de justiça, ou seja, a sociedade tem certeza de que no conselho

de sentença a justiça vai ser feita e celebrar isso foi necessário para a exigência da

nova ordem social do século XXI.

Antes da reforma procedimental do Júri, o julgamento no plenário possuía três

etapas preliminares:

I- primeira fase: tinha início com o oferecimento da denúncia e se encerrava

com a sentença de pronúncia, impronúncia, absolvição sumária ou descalcificação.

Alguns doutrinadores, juristas e operadores de direito ainda denominam esta fase de

sumário da culpa ou culpabilidade;

II- segunda fase: se denomina período do libelo ou oferecimento do libelo, essa

fase perdurava do pronunciamento até a inclusão de pauta para o julgamento pelo

tribunal do júri competente;

III- terceira fase: se iniciava com a sessão que deveria possuir no mínimo 15

jurados, e se encerrava com a sentença pelo conselho que é prolatada pelo juiz

presidente. Ou seja, seria o julgamento propriamente dito com o tribunal instaurado.

70

Com a reforma no júri, não há mais a segunda fase e deixou de existir o libelo.

Portanto, de acordo com crivo da lei em comento, o tribunal do Júri segue os ritos

presentes nos seguintes artigos reformados do Código do Processo Penal.

O novo júri passou a ter duas fases, seu rito é chamado de escalonado ou bifásico,

porém decorre de lei que o procedimento como um todo será ordinário para O

Tribunal (WALFREDO, 2008).

As duas fases serão exposta a seguir:

I- primeira fase: se denomina iundicum acusadons, que seria o juízo de

acusação.

Anteriormente, utilizava-se o rito de ordinário sem a fase que está prevista no artigo

499 do Código de Processo Penal. A nova lei trouxe um rito sumário para formação

do juízo de culpa. Com o oferecimento da denúncia, ó réu será citado para

responder à acusação, conforme previsto no artigo 396-A do referido código e já

supracitado neste trabalho, arrolando no máximo oito testemunhas.

Posteriormente, será designada uma audiência de instrução e julgamento, em que o

Juiz tomará as declarações do ofendido, se for possível, em caso em que o

homicídio não tenha se consumado, e das testemunhas arroladas pelas partes. Ele

interrogará o réu e, após os debates, proferirá sentença. In thesi deve ser observar

sempre que o novo júri se encontra em conformidade com a nova redação do artigo

396 do Código de Processo Penal.

Se o Juiz estiver convencido da materialidade do crime e dos indícios de autoria,

coautoria e partícipe, após o recebimento da denúncia, ele deverá, em decisão

fundamentada, pronunciar a acusação. Entretanto, não se convencendo dos

requisitos citados, o juiz impronunciará o réu, lembrado que a impronúncia é um

juízo de incerteza. Se depois de algum tempo, aparecerem novas provas, o acusado

poderá ser reconduzido ao tribunal do Júri, obviamente, a prescrição se dará pelo

tempo genérico do delito em caso de impronúncia, porque embora tenha o poder de

punir, esse poder não ser conferido ad eterno ao Estado.

71

Poderá, ainda, o juiz, se não achar indícios dos requisitos supracitados, absolver o

réu sumariamente. Obsta dizer que tanto a pronúncia quanto a absolvição sumária

não formam juízo de dúvida.

Insta salientar que, com relação à absolvição sumária, o juiz poderá aplicá-la

somente em quatro hipóteses distintas de: inexistência do fato; falta de provas; o

fato não se constitui como infração penal; exclusão do crime.

Fica evidenciada a vantagem desse novo procedimento para a fase de acusação em

relação ao anterior, porque se permite o saneamento das irregularidades da

denúncia, não prejudicando o direito do ministério público de oferecer nova

denúncia.

Ainda na primeira fase ocorreram profundas: o desaforamento será permitido se

preenchidos os pressupostos estabelecidos, para outra comarca dentro do Estado,

dando-se preferência às mais próximas, porque a regra anterior não satisfazia o

corpo de jurados isentos de influências. O pedido, contudo, deverá ser submetido ao

Tribunal com preferência do julgamento. Caberá também ao acusado requer o

desaforamento na hipótese de demora do julgamento superior ao prazo supracitado

quando não houver excesso de serviço ou a inexistência de processo aguardando

julgamento, numa quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo

tribunal do Júri.

A nova lei ainda resguardou o interesse constitucional da ampla defesa e do

contraditório ao preservar que as partes pudessem acompanhar o sorteio de jurados

com intimação prévia das mesmas. E a convocação dos jurados far-se-á através dos

correios. E com expediente da convocação, os jurados ainda receberão as cópias da

pronúncia e do relatório do processo.

II- segunda fase: judicium causae, ou seja, juízo de causa.

Nesta fase, ocorre a preparação do processo para julgamento em Plenário, portanto,

tem que ser uma fase simples e rápida, porque é uma passagem desprovida de

maiores formalidades. Com já foi dito, caiu a fase do libelo-crime de acusação,

72

depois da sentença de pronúncia, passa-se para a formação do plenário, o que

tornou mais célere o julgamento pelo tribunal. Portanto, ao receber os atos, o juiz

deverá determinar a intimação das partes para que, no prazo de cinco dias,

apresente-se o rol de testemunhas que irá depor no Plenário. O número permitido de

testemunhas será sempre o máximo de oito, podendo ainda juntar documentos e

requerer diligências.

Neste momento, vai se revelar uma etapa extremamente importante, porque prevê a

deliberação do Juiz Presidente sobre a realização de diligências para sanar as

nulidades ou esclarecer o fato, que interesse ao julgamento da lide. E ainda será

feito o relatório do processo e não em Plenário do Júri. Sendo este relatório uma das

peças obrigatórias remetidas aos jurados, juntado ao expediente de convocação.

Permite-se o conhecimento antecipado da causa que irá ser apreciada.

No que tange aos jurados, ficou previsto o alistamento anual, por parte do

Presidente do Júri, de pessoas que poderão prestar serviços obviamente nos limites

do artigo 425, do Código de Processo Penal, e também tem que ser escalonado em

conformidade com os números de habitantes.

Portanto, este quantum não significa em hipótese alguma um limite máximo,

podendo ser aumentado ser houver necessidade em prol do interesse da sociedade.

Também deve ser organizada a lista de suplentes, que deverá atender à demanda e

ao crescimento vegetativo de processos da competência do júri nas grandes

cidades.

A lei 11 689/2008, também, prevê a exclusão da lista geral, pelo prazo de dois anos,

daquele que tiver integrado o Conselho de Sentença no ano anterior, o que evitará a

profissionalização dos jurados. O sorteio de jurados será realizado entre o décimo

quinto e o décimo dia útil antecedente à instalação da reunião, e o jurado sorteado

poderá ter seu nome reincluído para reuniões futuras.

Ampliou-se o número de jurados sorteados, antes eram vinte um, hoje, são vinte e

cinco. No Plenário do Júri, entre os vinte e cinco convocados, serão sorteados, na

hora, sete jurados para compor o Conselho de Sentença.

73

As perguntas dos jurados serão feitas para as testemunhas. Para o réu, serão feitas

pelo Juiz Presidente. No que tange à acusação e à defesa, serão feitas pela própria

parte. Entretanto, com a mudança permitiu-se mais liberdade e oportunidade de

participação do jurado, pois faculta-se a ele que indique a folha dos autos por ele

lida ou citada, assim como solicite esclarecimentos sobre a questão de fato. No

plenário anterior, isso já ocorria na prática.

Os quesitos ou questionário serão simplificados, perdendo em complexidade e, por

sua vez, ganhando em simplicidade e objetividade. O conselho de Sentença será

sempre questionado sobre a matéria de fato. Os quesitos deverão sempre ser

redigidos em preposições afirmativas, simples, direitas e distas, não será permitida a

formulação com indagação negativa.

Dessa forma, a simplicidade alcançou o limite máximo. As perguntas serão sobre:

A - materialidade do fato;

B - autoria ou participação;

C - se o acusado deve ser absolvido ou condenado;

D - se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa;

E - se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena

reconhecida na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível

acusação.

Isto posto, o terceiro quesito terá redação própria disposta da lei. Far-se-á

necessariamente a constante indagação desse quesito número três para evitar a

indução do jurado em uma resposta afirmativa ou negativa, que poderia ocorrer se a

formulação se procedesse da seguinte forma: “os jurados condenam, ou se os

jurados absolvem o acusado”.

O próximo passo será dado pelo Juiz Presidente, se houver condenação, ele fixará a

pena base e deverá considerar as circunstâncias de agravantes e atenuantes

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alegadas nos debates. Também irá impor os aumentos ou a diminuição de pena em

atenção ao disposto no artigo 387 do Código de Processo Penal, naquilo que for

cabível.

Mantêm-se a incomunicabilidade dos jurados e a sala secreta. Também, foi mantido

o interrogatório do réu, das testemunhas de acusação e defesa. Assim, como os

debates em plenário de uma hora e meia para acusação e assistência, com o

mesmo tempo para a defesa e, depois, mais uma hora de réplica e tréplica. No caso

de mais de um réu, os tempos serão dobrados por quantidade de acusados. É

importante lembrar que o assistente de acusação divide o tempo com o

representante do Ministério Público. O mesmo equivale se o réu tiver mais de um

defensor.

Ocorre que, no júri anterior, os debates eram de duas horas.

Depois dos debates, os jurados são levados à sala secreta com o representante do

Ministério Público, defesa e Juiz presidente para se proceder à votação. Após a

votação, esta será apurada somente com quatro votos, ou seja, com maioria

simples, para condenar e absolver. Anteriormente, apuravam-se os sete votos.

Com a revelação do resultado, o Juiz Presidente proferirá a sentença. E far-se-á

leitura da sentença respeitando os requisitos já supracitados no Plenário do Júri.

Com o término do júri, o réu absolvido será posto em liberdade. Mas, se estiver

preso e se for condenado, será encaminhado ao presídio para cumprir a pena.

Entretanto, se respondeu o processo em liberdade, terá o direito também de

responder ao recurso em liberdade. É importante salientar que tanto a defesa quanto

a acusação comunicarão no plenário o interesse de interpor recurso de apelação no

prazo de cinco dias.

Conforme disposto no artigo 418, do Código de Processo penal, o juiz presidente do

plenário do júri poderá utilizar-se do instituto da emendatio libele somente na

primeira fase, em que poderá corrigir a denúncia sem prejuízo ao réu e ao princípio

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da ampla defesa, e do contraditório. Porque o acusado se defende dos fatos

descritos na peca acusatória.

No que tange ao instituto da mutatio libele, o Juiz Presidente deve aplicar também

na primeira fase, exigindo o aditamento da denúncia para o crime cometido, para

evitar nulidade da sentença no duplo grau de jurisdição.

Dessa forma, verificou-se que a lei buscou cumprir todos os anseios de

modernidade, simplicidade e eficácia do Plenário do Júri e seu procedimento se

tornou mais garantista, eficaz e ágil.

Ocorrem mudanças na desclassificação do crime, permitindo que o Juiz Presidente

na audiência do Plenário do Júri possa proferir a sentença em crimes que não são

de competência do Conselho de Sentença e até em crime de menor potencial

ofensivo, ligado à Lei 9.009/95, do juizado especial, sem interferir na competência.

Essas mudanças estão em consonância com os artigos modificados e previstos no

Código de Processo Penal. Diante da explicação das mudanças do rito do júri,

dever-se-ão os artigos a seguir apresentados explicar de forma legal e expressa

como se procede ao júri dentro do processo penal:

Artigo 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato;

II - não haver prova da existência do fato;

III - não constituir o fato infração penal;

IV - estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

V - não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal;

VI - existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (artigo 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

VII - não existir prova suficiente para a condenação. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).

Parágrafo único. Na sentença absolutória, o juiz:

I - mandará, se for o caso, pôr o réu em liberdade;

II - ordenará a cessação das penas acessórias provisoriamente aplicadas;

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II - ordenará a cessação das medidas cautelares e provisoriamente aplicadas; (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).

III - aplicará medida de segurança, se cabível.

Artigo. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória: (Vide Lei nº 11.719, de 2008).

I - mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código Penal, e cuja existência reconhecer;

II - mencionará as outras circunstâncias apuradas e tudo o mais que deva ser levado em conta na aplicação da pena, de acordo com o disposto nos arts. 59 e 60 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

III - aplicará as penas de acordo com essas conclusões; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido; (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

V - atenderá, quanto à aplicação provisória de interdições de direitos e medidas de segurança, ao disposto no Título Xl deste Livro;

VI - determinará se a sentença deverá ser publicada na íntegra ou em resumo e designará o jornal em que será feita a publicação (art. 73, § 1º, do Código Penal).

§ 1º O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).

§ 2º O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade. (Incluído pela Lei nº 12.736, de 2012).

Artigo. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

I - for manifestamente inepta; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Parágrafo único. (Revogado). (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Artigo. 396. Nos procedimentos ordinário e sumário, oferecida a denúncia ou queixa, o juiz, se não a rejeitar liminarmente, recebê-la-á e ordenará a citação do acusado para responder à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Parágrafo único. No caso de citação por edital, o prazo para a defesa começará a fluir a partir do comparecimento pessoal do acusado ou do defensor constituído. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

Artigo. 396-A. Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo o que interesse à sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, qualificando-as e

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requerendo sua intimação, quando necessário. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

§ 1º A exceção será processada em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

§ 2º Não apresentada a resposta no prazo legal, ou se o acusado, citado, não constituir defensor, o juiz nomeará defensor para oferecê-la, concedendo-lhe vista dos autos por 10 (dez) dias. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Artigo. 406. O juiz, ao receber a denúncia ou a queixa, ordenará a citação do acusado para responder a acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O prazo previsto no caput deste artigo será contado a partir do efetivo cumprimento do mandado ou do comparecimento, em juízo, do acusado ou de defensor constituído, no caso de citação inválida ou por edital. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º A acusação deverá arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), na denúncia ou na queixa.

§ 3º Na resposta, o acusado poderá arguir preliminares e alegar tudo que interesse a sua defesa, oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas, até o máximo de 8 (oito), qualificando-as e requerendo sua intimação, quando necessário. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 407. As exceções serão processadas em apartado, nos termos dos arts. 95 a 112 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 408. Não apresentada a resposta no prazo legal, o juiz nomeará defensor para oferecê-la em até 10 (dez) dias, concedendo-lhe vista dos autos. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 409. Apresentada a defesa, o juiz ouvirá o Ministério Público ou o querelante sobre preliminares e documentos, em 5 (cinco) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 410. O juiz determinará a inquirição das testemunhas e a realização das diligências requeridas pelas partes, no prazo máximo de 10 (dez) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 411. Na audiência de instrução, proceder-se-á à tomada de declarações do ofendido, se possível, à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, nesta ordem, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado e procedendo-se o debate. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Os esclarecimentos dos peritos dependerão de prévio requerimento e de deferimento pelo juiz. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º As provas serão produzidas em uma só audiência, podendo o juiz indeferir as consideradas irrelevantes, impertinentes ou protelatórias. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º Encerrada a instrução probatória, observar-se-á, se for o caso, o disposto no art. 384 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 4º As alegações serão orais, concedendo-se a palavra, respectivamente, à acusação e à defesa, pelo prazo de 20 (vinte) minutos, prorrogáveis por mais 10 (dez). (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

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§ 5º Havendo mais de 1 (um) acusado, o tempo previsto para a acusação e a defesa de cada um deles será individual. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 6º Ao assistente do Ministério Público, após a manifestação deste, serão concedidos 10 (dez) minutos, prorrogando-se por igual período o tempo de manifestação da defesa. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 7º Nenhum ato será adiado, salvo quando imprescindível à prova faltante, determinando o juiz a condução coercitiva de quem deva comparecer. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 8º A testemunha que comparecer será inquirida, independentemente da suspensão da audiência, observada em qualquer caso a ordem estabelecida no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 9º Encerrados os debates, o juiz proferirá a sua decisão, ou o fará em 10 (dez) dias, ordenando que os autos para isso lhe sejam conclusos. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 412. O procedimento será concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Se o crime for afiançável, o juiz arbitrará o valor da fiança para a concessão ou manutenção da liberdade provisória. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º O juiz decidirá, motivadamente, no caso de manutenção, revogação ou substituição da prisão ou medida restritiva de liberdade anteriormente decretada e, tratando-se de acusado solto, sobre a necessidade da decretação da prisão ou imposição de quaisquer das medidas previstas no Título IX do Livro I deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 414. Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Enquanto não ocorrer a extinção da punibilidade, poderá ser formulada nova denúncia ou queixa se houver prova nova. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 415. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - provada a inexistência do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - provado não ser ele autor ou partícipe do fato; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - o fato não constituir infração penal; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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IV - demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade prevista no caput do art. 26 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 416. Contra a sentença de impronúncia ou de absolvição sumária caberá apelação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 417. Se houver indícios de autoria ou de participação de outras pessoas não incluídas na acusação, o juiz, ao pronunciar ou impronunciar o acusado, determinará o retorno dos autos ao Ministério Público, por 15 (quinze) dias, aplicável, no que couber, o art. 80 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 418. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 419. Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no § 1o do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Remetidos os autos do processo a outro juiz, à disposição deste ficará o acusado preso. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 420. A intimação da decisão de pronúncia será feita: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - pessoalmente ao acusado, ao defensor nomeado e ao Ministério Público; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - ao defensor constituído, ao querelante e ao assistente do Ministério Público, na forma do disposto no § 1o do art. 370 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Será intimado por edital o acusado solto que não for encontrado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 421. Preclusa a decisão de pronúncia, os autos serão encaminhados ao juiz presidente do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Ainda que preclusa a decisão de pronúncia, havendo circunstância superveniente que altere a classificação do crime, o juiz ordenará a remessa dos autos ao Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Em seguida, os autos serão conclusos ao juiz para decisão. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 422. Ao receber os autos, o presidente do Tribunal do Júri determinará a intimação do órgão do Ministério Público ou do querelante, no caso de queixa, e do defensor, para, no prazo de 5 (cinco) dias, apresentarem rol de testemunhas que irão depor em plenário, até o máximo de 5 (cinco), oportunidade em que poderão juntar documentos e requerer diligência. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 423. Deliberando sobre os requerimentos de provas a serem produzidas ou exibidas no plenário do júri, e adotadas as providências devidas, o juiz presidente: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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I - ordenará as diligências necessárias para sanar qualquer nulidade ou esclarecer fato que interesse ao julgamento da causa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - fará relatório sucinto do processo, determinando sua inclusão em pauta da reunião do Tribunal do Júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 424. Quando a lei local de organização judiciária não atribuir ao presidente do Tribunal do Júri o preparo para julgamento, o juiz competente remeter-lhe-á os autos do processo preparado até 5 (cinco) dias antes do sorteio a que se refere o art. 433 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Deverão ser remetidos, também, os processos preparados até o encerramento da reunião, para a realização de julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 425. Anualmente, serão alistados pelo presidente do Tribunal do Júri de 800 (oitocentos) a 1.500 (um mil e quinhentos) jurados nas comarcas de mais de 1.000.000 (um milhão) de habitantes, de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) nas comarcas de mais de 100.000 (cem mil) habitantes e de 80 (oitenta) a 400 (quatrocentos) nas comarcas de menor população. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Nas comarcas onde for necessário, poderá ser aumentado o número de jurados e, ainda, organizada lista de suplentes, depositadas as cédulas em urna especial, com as cautelas mencionadas na parte final do § 3o do art. 426 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º O juiz presidente requisitará às autoridades locais, associações de classe e de bairro, entidades associativas e culturais, instituições de ensino em geral, universidades, sindicatos, repartições públicas e outros núcleos comunitários a indicação de pessoas que reúnam as condições para exercer a função de jurado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 426. A lista geral dos jurados, com indicação das respectivas profissões, será publicada pela imprensa até o dia 10 de outubro de cada ano e divulgada em editais afixados à porta do Tribunal do Júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º A lista poderá ser alterada, de ofício ou mediante reclamação de qualquer do povo ao juiz presidente até o dia 10 de novembro, data de sua publicação definitiva. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Juntamente com a lista, serão transcritos os arts. 436 a 446 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º Os nomes e endereços dos alistados, em cartões iguais, após serem verificados na presença do Ministério Público, de advogado indicado pela Seção local da Ordem dos Advogados do Brasil e de defensor indicado pelas Defensorias Públicas competentes, permanecerão guardados em urna fechada a chave, sob a responsabilidade do juiz presidente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 4º O jurado que tiver integrado o Conselho de Sentença nos 12 (doze) meses que antecederem à publicação da lista geral fica dela excluído. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 5º Anualmente, a lista geral de jurados será, obrigatoriamente, completada. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 427. Se o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, o Tribunal, a requerimento do Ministério Público, do assistente, do querelante

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ou do acusado ou mediante representação do juiz competente, poderá determinar o desaforamento do julgamento para outra comarca da mesma região, onde não existam aqueles motivos, preferindo-se as mais próximas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1ºO pedido de desaforamento será distribuído imediatamente e terá preferência de julgamento na Câmara ou Turma competente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Sendo relevantes os motivos alegados, o relator poderá determinar, fundamentadamente, a suspensão do julgamento pelo júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º Será ouvido o juiz presidente, quando a medida não tiver sido por ele solicitada. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 4º Na pendência de recurso contra a decisão de pronúncia ou quando efetivado o julgamento, não se admitirá o pedido de desaforamento, salvo, nesta última hipótese, quanto a fato ocorrido durante ou após a realização de julgamento anulado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 428. O desaforamento também poderá ser determinado, em razão do comprovado excesso de serviço, ouvidos o juiz presidente e a parte contrária, se o julgamento não puder ser realizado no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da decisão de pronúncia. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Para a contagem do prazo referido neste artigo, não se computará o tempo de adiamentos, diligências ou incidentes de interesse da defesa. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Não havendo excesso de serviço ou existência de processos aguardando julgamento em quantidade que ultrapasse a possibilidade de apreciação pelo Tribunal do Júri, nas reuniões periódicas previstas para o exercício, o acusado poderá requerer ao Tribunal que determine a imediata realização do julgamento. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 429. Salvo motivo relevante que autorize alteração na ordem dos julgamentos, terão preferência: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - os acusados presos; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - dentre os acusados presos, aqueles que estiverem há mais tempo na prisão; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - em igualdade de condições, os precedentemente pronunciados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Antes do dia designado para o primeiro julgamento da reunião periódica, será afixada na porta do edifício do Tribunal do Júri a lista dos processos a serem julgados, obedecida a ordem prevista no caput deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º O juiz presidente reservará datas na mesma reunião periódica para a inclusão de processo que tiver o julgamento adiado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 430. O assistente somente será admitido se tiver requerido sua habilitação até 5 (cinco) dias antes da data da sessão na qual pretenda atuar. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 431. Estando o processo em ordem, o juiz presidente mandará intimar as partes, o ofendido, se for possível, as testemunhas e os peritos, quando houver requerimento, para a sessão de instrução e julgamento,

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observando, no que couber, o disposto no art. 420 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 432. Em seguida à organização da pauta, o juiz presidente determinará a intimação do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil e da Defensoria Pública para acompanharem, em dia e hora designados, o sorteio dos jurados que atuarão na reunião periódica. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 433. O sorteio, presidido pelo juiz, far-se-á a portas abertas, cabendo-lhe retirar as cédulas até completar o número de 25 (vinte e cinco) jurados, para a reunião periódica ou extraordinária. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O sorteio será realizado entre o 15o (décimo quinto) e o 10o (décimo) dia útil antecedente à instalação da reunião. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º A audiência de sorteio não será adiada pelo não comparecimento das partes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º O jurado não sorteado poderá ter o seu nome novamente incluído para as reuniões futuras. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 434. Os jurados sorteados serão convocados pelo correio ou por qualquer outro meio hábil para comparecer no dia e hora designados para a reunião, sob as penas da lei. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. No mesmo expediente de convocação serão transcritos os arts. 436 a 446 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 435. Serão afixados na porta do edifício do Tribunal do Júri a relação dos jurados convocados, os nomes do acusado e dos procuradores das partes, além do dia, hora e local das sessões de instrução e julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 436. O serviço do júri é obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18 (dezoito) anos de notória idoneidade. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de instrução. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º A recusa injustificada ao serviço do júri acarretará multa no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 437. Estão isentos do serviço do júri: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - o Presidente da República e os Ministros de Estado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - os Governadores e seus respectivos Secretários; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Distrital e Municipais; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

IV - os Prefeitos Municipais; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

V - os Magistrados e membros do Ministério Público e da Defensoria Pública; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

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VI - os servidores do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

VII - as autoridades e os servidores da polícia e da segurança pública; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

VIII - os militares em serviço ativo; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

IX - os cidadãos maiores de 70 (setenta) anos que requeiram sua dispensa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

X - aqueles que o requererem, demonstrando justo impedimento. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 438. A recusa ao serviço do júri fundada em convicção religiosa, filosófica ou política importará no dever de prestar serviço alternativo, sob pena de suspensão dos direitos políticos, enquanto não prestar o serviço imposto. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Entende-se por serviço alternativo o exercício de atividades de caráter administrativo, assistencial, filantrópico ou mesmo produtivo, no Poder Judiciário, na Defensoria Pública, no Ministério Público ou em entidade conveniada para esses fins. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º O juiz fixará o serviço alternativo atendendo aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 439. O exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

Artigo. 440. Constitui também direito do jurado, na condição do art. 439 deste Código, preferência, em igualdade de condições, nas licitações públicas e no provimento, mediante concurso, de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional ou remoção voluntária. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 441. Nenhum desconto será feito nos vencimentos ou salário do jurado sorteado que comparecer à sessão do júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 442. Ao jurado que, sem causa legítima, deixar de comparecer no dia marcado para a sessão ou retirar-se antes de ser dispensado pelo presidente será aplicada multa de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a sua condição econômica. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 443. Somente será aceita escusa fundada em motivo relevante devidamente comprovado e apresentada, ressalvadas as hipóteses de força maior, até o momento da chamada dos jurados. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 444. O jurado somente será dispensado por decisão motivada do juiz presidente, consignada na ata dos trabalhos. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 445. O jurado, no exercício da função ou a pretexto de exercê-la, será responsável criminalmente nos mesmos termos em que o são os juízes togados. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 446. Aos suplentes, quando convocados, serão aplicáveis os dispositivos referentes às dispensas, faltas e escusas e à equiparação de responsabilidade penal prevista no art. 445 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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Artigo. 447. O Tribunal do Júri é composto por 1 (um) juiz togado, seu presidente e por 25 (vinte e cinco) jurados que serão sorteados dentre os alistados, 7 (sete) dos quais constituirão o Conselho de Sentença em cada sessão de julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 448. São impedidos de servir no mesmo Conselho: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - marido e mulher; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - ascendente e descendente; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - sogro e genro ou nora; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

IV - irmãos e cunhados, durante o cunhadio; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

V - tio e sobrinho; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

VI - padrasto, madrasta ou enteado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O mesmo impedimento ocorrerá em relação às pessoas que mantenham união estável reconhecida como entidade familiar. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Aplicar-se-á aos jurados o disposto sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades dos juízes togados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 449. Não poderá servir o jurado que: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - tiver funcionado em julgamento anterior do mesmo processo, independentemente da causa determinante do julgamento posterior; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - no caso do concurso de pessoas, houver integrado o Conselho de Sentença que julgou o outro acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - tiver manifestado prévia disposição para condenar ou absolver o acusado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 450. Dos impedidos entre si por parentesco ou relação de convivência, servirá o que houver sido sorteado em primeiro lugar. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 451. Os jurados excluídos por impedimento, suspeição ou incompatibilidade serão considerados para a constituição do número legal exigível para a realização da sessão. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 452. O mesmo Conselho de Sentença poderá conhecer de mais de um processo, no mesmo dia, se as partes o aceitarem, hipótese em que seus integrantes deverão prestar novo compromisso. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 453. O Tribunal do Júri reunir-se-á para as sessões de instrução e julgamento nos períodos e na forma estabelecida pela lei local de organização judiciária. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 454. Até o momento de abertura dos trabalhos da sessão, o juiz presidente decidirá os casos de isenção e dispensa de jurados e o pedido de adiamento de julgamento, mandando consignar em ata as deliberações. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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Artigo. 455. Se o Ministério Público não comparecer, o juiz presidente adiará o julgamento para o primeiro dia desimpedido da mesma reunião, cientificadas as partes e as testemunhas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Se a ausência não for justificada, o fato será imediatamente comunicado ao Procurador-Geral de Justiça com a data designada para a nova sessão. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 456. Se a falta, sem escusa legítima, for do advogado do acusado, e se outro não for por este constituído, o fato será imediatamente comunicado ao presidente da seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, com a data designada para a nova sessão. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Não havendo escusa legítima, o julgamento será adiado somente uma vez, devendo o acusado ser julgado quando chamado novamente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Na hipótese do § 1o deste artigo, o juiz intimará a Defensoria Pública para o novo julgamento, que será adiado para o primeiro dia desimpedido, observado o prazo mínimo de 10 (dez) dias. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 457. O julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sido regularmente intimado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Os pedidos de adiamento e as justificações de não comparecimento deverão ser, salvo comprovado motivo de força maior, previamente submetidos à apreciação do juiz presidente do Tribunal do Júri. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Se o acusado preso não for conduzido, o julgamento será adiado para o primeiro dia desimpedido da mesma reunião, salvo se houver pedido de dispensa de comparecimento subscrito por ele e seu defensor. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 458. Se a testemunha, sem justa causa, deixar de comparecer, o juiz presidente, sem prejuízo da ação penal pela desobediência, aplicar-lhe-á a multa prevista no § 2o do art. 436 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 459. Aplicar-se-á às testemunhas a serviço do Tribunal do Júri o disposto no art. 441 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 460. Antes de constituído o Conselho de Sentença, as testemunhas serão recolhidas a lugar onde umas não possam ouvir os depoimentos das outras. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 461. O julgamento não será adiado se a testemunha deixar de comparecer, salvo se uma das partes tiver requerido a sua intimação por mandado, na oportunidade de que trata o art. 422 deste Código, declarando não prescindir do depoimento e indicando a sua localização. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Se, intimada, a testemunha não comparecer, o juiz presidente suspenderá os trabalhos e mandará conduzi-la ou adiará o julgamento para o primeiro dia desimpedido, ordenando a sua condução. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

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§ 2º O julgamento será realizado mesmo na hipótese de a testemunha não ser encontrada no local indicado, se assim for certificado por oficial de justiça. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 462. Realizadas as diligências referidas nos arts. 454 a 461 deste Código, o juiz presidente verificará se a urna contém as cédulas dos 25 (vinte e cinco) jurados sorteados, mandando que o escrivão proceda à chamada deles. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 463. Comparecendo, pelo menos, 15 (quinze) jurados, o juiz presidente declarará instalados os trabalhos, anunciando o processo que será submetido a julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O oficial de justiça fará o pregão, certificando a diligência nos autos. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Os jurados excluídos por impedimento ou suspeição serão computados para a constituição do número legal. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 464. Não havendo o número referido no art. 463 deste Código, proceder-se-á ao sorteio de tantos suplentes quantos necessários, e designar-se-á nova data para a sessão do júri. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 465. Os nomes dos suplentes serão consignados em ata, remetendo-se o expediente de convocação, com observância do disposto nos arts. 434 e 435 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 466. Antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença, o juiz presidente esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O juiz presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do art. 436 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º A incomunicabilidade será certificada nos autos pelo oficial de justiça. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 467. Verificando que se encontram na urna as cédulas relativas aos jurados presentes, o juiz presidente sorteará 7 (sete) dentre eles para a formação do Conselho de Sentença. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 468. À medida que as cédulas forem sendo retiradas da urna, o juiz presidente as lerá, e a defesa e, depois dela, o Ministério Público poderão recusar os jurados sorteados, até 3 (três) cada parte, sem motivar a recusa. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. O jurado recusado imotivadamente por qualquer das partes será excluído daquela sessão de instrução e julgamento, prosseguindo-se o sorteio para a composição do Conselho de Sentença com os jurados remanescentes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 469. Se forem 2 (dois) ou mais os acusados, as recusas poderão ser feitas por um só defensor. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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§ 1º A separação dos julgamentos somente ocorrerá se, em razão das recusas, não for obtido o número mínimo de 7 (sete) jurados para compor o Conselho de Sentença. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Determinada a separação dos julgamentos, será julgado em primeiro lugar o acusado a quem foi atribuída a autoria do fato ou, em caso de coautoria, aplicar-se-á o critério de preferência disposto no art. 429 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 470. Desacolhida a arguição de impedimento, de suspeição ou de incompatibilidade contra o juiz presidente do Tribunal do Júri, órgão do Ministério Público, jurado ou qualquer funcionário, o julgamento não será suspenso, devendo, entretanto, constar da ata o seu fundamento e a decisão. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 471. Se, em consequência do impedimento, suspeição, incompatibilidade, dispensa ou recusa, não houver número para a formação do Conselho, o julgamento será adiado para o primeiro dia desimpedido, após sorteados os suplentes, com observância do disposto no art. 464 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 472. Formado o Conselho de Sentença, o presidente, levantando-se, e, com ele, todos os presentes, fará aos jurados a seguinte exortação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Em nome da lei, concito-vos a examinar esta causa com imparcialidade e a proferir a vossa decisão de acordo com a vossa consciência e os ditames da justiça.

Os jurados, nominalmente chamados pelo presidente, responderão:

Assim o prometo.

Parágrafo único. O jurado, em seguida, receberá cópias da pronúncia ou, se for o caso, das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação e do relatório do processo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 473. Prestado o compromisso pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando o juiz presidente, o Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão, sucessiva e diretamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as testemunhas arroladas pela acusação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Para a inquirição das testemunhas arroladas pela defesa, o defensor do acusado formulará as perguntas antes do Ministério Público e do assistente, mantidos no mais a ordem e os critérios estabelecidos neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Os jurados poderão formular perguntas ao ofendido e às testemunhas, por intermédio do juiz presidente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º As partes e os jurados poderão requerer acareações, reconhecimento de pessoas e coisas e esclarecimento dos peritos, bem como a leitura de peças que se refiram, exclusivamente, às provas colhidas por carta precatória e às provas cautelares, antecipadas ou não repetíveis. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 474. A seguir será o acusado interrogado, se estiver presente, na forma estabelecida no Capítulo III do Título VII do Livro I deste Código, com as alterações introduzidas nesta Seção. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

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§ 1º O Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor, nessa ordem, poderão formular, diretamente, perguntas ao acusado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Os jurados formularão perguntas por intermédio do juiz presidente. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 475. O registro dos depoimentos e do interrogatório será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, eletrônica, estenotipia ou técnica similar, destinada a obter maior fidelidade e celeridade na colheita da prova. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. A transcrição do registro, após feita a degravação, constará dos autos. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 476. Encerrada a instrução, será concedida a palavra ao Ministério Público, que fará a acusação, nos limites da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, sustentando, se for o caso, a existência de circunstância agravante. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º O assistente falará depois do Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Tratando-se de ação penal de iniciativa privada, falará em primeiro lugar o querelante e, em seguida, o Ministério Público, salvo se este houver retomado a titularidade da ação, na forma do art. 29 deste Código. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008). § 3º Finda a acusação, terá a palavra a defesa. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 4º A acusação poderá replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 477. O tempo destinado à acusação e à defesa será de uma hora e meia para cada, e de uma hora para a réplica e outro tanto para a tréplica. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Havendo mais de um acusador ou mais de um defensor, combinarão entre si a distribuição do tempo, que, na falta de acordo, será dividido pelo juiz presidente, de forma a não exceder o determinado neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Havendo mais de 1 (um) acusado, o tempo para a acusação e a defesa será acrescido de 1 (uma) hora e elevado ao dobro o da réplica e da tréplica, observado o disposto no § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 478. Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade, fazer referências: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - a decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - ao silêncio do acusado ou à ausência de interrogatório por falta de requerimento, em seu prejuízo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

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Artigo. 479. Durante o julgamento não será permitida a leitura de documento ou a exibição de objeto que não tiver sido juntado aos autos com a antecedência mínima de 3 (três) dias úteis, dando-se ciência à outra parte. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Compreende-se na proibição deste artigo a leitura de jornais ou qualquer outro escrito, bem como a exibição de vídeos, gravações, fotografias, laudos, quadros, croqui ou qualquer outro meio assemelhado, cujo conteúdo versar sobre a matéria de fato submetida à apreciação e julgamento dos jurados. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 480. A acusação, a defesa e os jurados poderão, a qualquer momento e por intermédio do juiz presidente, pedir ao orador que indique a folha dos autos onde se encontra a peça por ele lida ou citada, facultando-se, ainda, aos jurados solicitar-lhe, pelo mesmo meio, o esclarecimento de fato por ele alegado. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Concluídos os debates, o presidente indagará dos jurados se estão habilitados a julgar ou se necessitam de outros esclarecimentos. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Se houver dúvida sobre questão de fato, o presidente prestará esclarecimentos à vista dos autos. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 3º Os jurados, nesta fase do procedimento, terão acesso aos autos e aos instrumentos do crime se solicitarem ao juiz presidente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 481. Se a verificação de qualquer fato, reconhecida como essencial para o julgamento da causa, não puder ser realizada imediatamente, o juiz presidente dissolverá o Conselho, ordenando a realização das diligências entendidas necessárias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Se a diligência consistir na produção de prova pericial, o juiz presidente, desde logo, nomeará perito e formulará quesitos, facultando às partes também formulá-los e indicar assistentes técnicos, no prazo de 5 (cinco) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 482. O Conselho de Sentença será questionado sobre matéria de fato e se o acusado deve ser absolvido. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Os quesitos serão redigidos em proposições afirmativas, simples e distintas, de modo que cada um deles possa ser respondido com suficiente clareza e necessária precisão. Na sua elaboração, o presidente levará em conta os termos da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, do interrogatório e das alegações das partes. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 483. Os quesitos serão formulados na seguinte ordem, indagando sobre: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - a materialidade do fato; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - a autoria ou participação; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - se o acusado deve ser absolvido; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

IV - se existe causa de diminuição de pena alegada pela defesa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

90

V - se existe circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º A resposta negativa, de mais de 3 (três) jurados, a qualquer dos quesitos referidos nos incisos I e II do caput deste artigo encerra a votação e implica a absolvição do acusado. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Respondidos afirmativamente por mais de 3 (três) jurados os quesitos relativos aos incisos I e II do caput deste artigo será formulado quesito com a seguinte redação: (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

O jurado absolve o acusado?

§ 3º Decidindo os jurados pela condenação, o julgamento prossegue, devendo ser formulados quesitos sobre: (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - causa de diminuição de pena alegada pela defesa; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - circunstância qualificadora ou causa de aumento de pena, reconhecidas na pronúncia ou em decisões posteriores que julgaram admissível a acusação. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 4º Sustentada a desclassificação da infração para outra de competência do juiz singular, será formulado quesito a respeito, para ser respondido após o 2o (segundo) ou 3o (terceiro) quesito, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 5º Sustentada a tese de ocorrência do crime na sua forma tentada ou havendo divergência sobre a tipificação do delito, sendo este da competência do Tribunal do Júri, o juiz formulará quesito acerca destas questões, para ser respondido após o segundo quesito. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 6ª Havendo mais de um crime ou mais de um acusado, os quesitos serão formulados em séries distintas. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 484. A seguir, o presidente lerá os quesitos e indagará das partes se têm requerimento ou reclamação a fazer, devendo qualquer deles, bem como a decisão, constar da ata. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Ainda em plenário, o juiz presidente explicará aos jurados o significado de cada quesito. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 485. Não havendo dúvida a ser esclarecida, o juiz presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Na falta de sala especial, o juiz presidente determinará que o público se retire, permanecendo somente as pessoas mencionadas no caput deste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º O juiz presidente advertirá as partes de que não será permitida qualquer intervenção que possa perturbar a livre manifestação do Conselho e fará retirar da sala quem se portar inconvenientemente. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 486. Antes de proceder-se à votação de cada quesito, o juiz presidente mandará distribuir aos jurados pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo 7 (sete) delas a palavra sim, 7 (sete) a palavra não. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

91

Artigo. 487. Para assegurar o sigilo do voto, o oficial de justiça recolherá em urnas separadas as cédulas correspondentes aos votos e as não utilizadas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 488. Após a resposta, verificados os votos e as cédulas não utilizadas, o presidente determinará que o escrivão registre no termo a votação de cada quesito, bem como o resultado do julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Do termo também constará a conferência das cédulas não utilizadas. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 489. As decisões do Tribunal do Júri serão tomadas por maioria de votos. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 490. Se a resposta a qualquer dos quesitos estiver em contradição com outra ou outras já dadas, o presidente, explicando aos jurados em que consiste a contradição, submeterá novamente à votação os quesitos a que se referirem tais respostas. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Parágrafo único. Se, pela resposta dada a um dos quesitos, o presidente verificar que ficam prejudicados os seguintes, assim o declarará, dando por finda a votação. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 491. Encerrada a votação, será o termo a que se refere o art. 488 deste Código assinado pelo presidente, pelos jurados e pelas partes. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 492. Em seguida, o presidente proferirá sentença que: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - no caso de condenação: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

a) fixará a pena-base; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

b) considerará as circunstâncias agravantes ou atenuantes alegadas nos debates; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

c) imporá os aumentos ou diminuições da pena, em atenção às causas admitidas pelo júri; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

d) observará as demais disposições do art. 387 deste Código; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

e) mandará o acusado recolher-se ou recomendá-lo-á à prisão em que se encontra, se presentes os requisitos da prisão preventiva; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

f) estabelecerá os efeitos genéricos e específicos da condenação; (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - no caso de absolvição: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

a) mandará colocar em liberdade o acusado se por outro motivo não estiver preso; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

b) revogará as medidas restritivas provisoriamente decretadas; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

c) imporá, se for o caso, a medida de segurança cabível. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 1º Se houver desclassificação da infração para outra, de competência do juiz singular, ao presidente do Tribunal do Júri caberá proferir sentença em seguida, aplicando-se, quando o delito resultante da nova tipificação for considerado pela lei como infração penal de menor potencial ofensivo, o

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disposto nos arts. 69 e seguintes da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

§ 2º Em caso de desclassificação, o crime conexo que não seja doloso contra a vida será julgado pelo juiz presidente do Tribunal do Júri, aplicando-se, no que couber, o disposto no § 1o deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 493. A sentença será lida em plenário pelo presidente antes de encerrada a sessão de instrução e julgamento. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 494. De cada sessão de julgamento o escrivão lavrará ata, assinada pelo presidente e pelas partes. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 495. A ata descreverá fielmente todas as ocorrências, mencionando obrigatoriamente: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - a data e a hora da instalação dos trabalhos; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - o magistrado que presidiu a sessão e os jurados presentes; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - os jurados que deixaram de comparecer, com escusa ou sem ela, e as sanções aplicadas; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

IV - o ofício ou requerimento de isenção ou dispensa; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

V - o sorteio dos jurados suplentes; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VI - o adiamento da sessão, se houver ocorrido, com a indicação do motivo; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VII - a abertura da sessão e a presença do Ministério Público, do querelante e do assistente, se houver, e a do defensor do acusado; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VIII - o pregão e a sanção imposta, no caso de não comparecimento; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

IX - as testemunhas dispensadas de depor; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

X - o recolhimento das testemunhas a lugar de onde umas não pudessem ouvir o depoimento das outras; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XI - a verificação das cédulas pelo juiz presidente; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XII - a formação do Conselho de Sentença, com o registro dos nomes dos jurados sorteados e recusas; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XIII - o compromisso e o interrogatório, com simples referência ao termo; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XIV - os debates e as alegações das partes com os respectivos fundamentos; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XV - os incidentes; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XVI - o julgamento da causa; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

93

XVII - a publicidade dos atos da instrução plenária, das diligências e da sentença. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 496. A falta da ata sujeitará o responsável a sanções administrativa e penal. (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

Artigo. 497. São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código: (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

I - regular a polícia das sessões e prender os desobedientes; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

II - requisitar o auxílio da força pública, que ficará sob sua exclusiva autoridade; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

III - dirigir os debates, intervindo em caso de abuso, excesso de linguagem ou mediante requerimento de uma das partes; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

IV - resolver as questões incidentes que não dependam de pronunciamento do júri; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

V - nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VI - mandar retirar da sala o acusado que dificultar a realização do julgamento, o qual prosseguirá sem a sua presença; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VII - suspender a sessão pelo tempo indispensável à realização das diligências requeridas ou entendidas necessárias, mantida a incomunicabilidade dos jurados; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

VIII - interromper a sessão por tempo razoável, para proferir sentença e para repouso ou refeição dos jurados; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

IX - decidir, de ofício, ouvidos o Ministério Público e a defesa, ou a requerimento de qualquer destes, a arguição de extinção de punibilidade; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

X - resolver as questões de direito suscitadas no curso do julgamento; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XI - determinar, de ofício ou a requerimento das partes ou de qualquer jurado, as diligências destinadas a sanar nulidade ou a suprir falta que prejudique o esclarecimento da verdade; (Redação dada pela Lei nº 11.689, de 2008).

XII - regulamentar, durante os debates, a intervenção de uma das partes, quando a outra estiver com a palavra, podendo conceder até 3 (três) minutos para cada aparte requerido, que serão acrescidos ao tempo desta última. (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).

Faz-se necessário, ainda, explicitar a lei para entender as mudanças supracitadas

no Novo Plenário do Júri. No texto legal, percebe-se claramente as mudanças.

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Desta forma, a Lei 11689/2008, do Código do Processo Penal, modernizou o júri e o

tornou mais célere.

Vimos nos paralelos processuais com o Tribunal de Deus, que ambos decorem de

um inquérito, embora o Tribunal do Júri tenha um procedimento especial bifásico em

sua primeira fase, vai se aproximar do rito sumário da Santa Inquisição. Pode-se,

ainda, afirmar que O Tribunal do Santo Oficio e o Júri também se assemelham na

disposição cenográfica do plenário. Porém distam no que tange aos princípios: da

dignidade humana, da ampla defesa e do contraditório, da reserva legal e do in

dubio pro réu. Porque mesmo sendo um ato legal da Idade Média, o tribunal de

Deus não respeitava esses princípios, nem podia ser contestado, e o acusado

acabava morrendo.

No Júri, todos os princípios supracitados estão preservados e sua decisão pode ser

discutida em duplo grau de jurisdição, onde o réu permanece vivo e íntegro. A

semelhança principal entre os dois tribunais reside na sua função de trazer

saciedade social. Na Idade Média, a morte do herege trazia Deus de volta ao local

que estava com a presença de Lúcifer. Nos dias de hoje, a condenação do réu

assassino traz certeza de que a justiça foi feita e a pessoa repulsiva que agrediu a

moral e os bons costumes vai pagar com a reclusão pelo o crime contra a vida que

cometeu.

Para finalizar esta etapa, faz-se necessária uma abordagem sociológica weberiana,

pois esta mostra que todos os tribunais históricos sugiram da necessidade de

demonstrar e satisfazer a sociedade de sua sede de justiça. Ou seja, os tribunais

davam segurança jurídica para se manter a ordem nas sociedades.

Na realidade, os tribunais surgiram da necessidade do Estado de impor sua força de

império de uma forma que a sociedade participasse e tirando a visão de imposição.

Antes, demonstrado a união entre Estado e sociedade no combate aos crimes cruéis

que ferem o cerne da sociedade, que são as famílias.

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3. DIREITO E LITERATURA: UM DIÁLOGO PROFÍCUO

3.1. O DIREITO E A LITERATURA

O diálogo que se estabelece entre Direito e Literatura existe desde o direito romano,

quando se utilizava a literatura nas questões judiciais.

No decorrer de outras idades históricas, o Direito tomou posse da poesia lúdica da

literatura para se fazer presente na sociedade. Alguns juristas de renome no mundo

acadêmico fazem uso da literatura para melhorar suas arquições, por exemplo,

Kelsen, em seu livro Teoria Pura do Direito, e Jhering, que se fez anônimo para

versar no mundo literário.

Nos dias de hoje, alguns juízes mais sensíveis se utilizam de textos literários para

fundamentar suas sentenças, com o objetivo de que as pessoas possam entendê-

las melhor.

No que tange ao direito constitucional contemporâneo, ocorre que a hermenêutica

constitucional se aproxima da hermenêutica literária, assim como é muito visível a

aproximação das constituições atuais com a Literatura. Um exemplo em que a

hermenêutica constitucional esta tão próxima da literatura se encontra em Obra

aberta, de Umberto Eco. Este livro foi utilizado em várias interpretações das

constituições europeias.

Atualmente, a literatura se mistura com a poética jurídica, dando origem a pecas

processuais em versos. No Brasil, autores de renome trouxeram para usas obras o

universo jurídico, entre eles estão Machado de Assis, Jorge Amado e outros.

No presente trabalho em questão, foi Umberto Eco que emprestou sua hermenêutica

para o direito penal canônico e que foi trazido ainda para a realidade do direito

processual penal brasileiro.

O ludismo da obra O Nome da Rosa permitiu avançar em questões sociológicas

jurídicas importantes porque retratou as atrocidades do Tribunal de Deus e, ao

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mesmo tempo, forneceu subsídio para se entender o Inquérito contemporâneo

brasileiro e o Novo Júri.

Com a riqueza de detalhes investigativos e jurídicos apresentada na obra, também

foi possível traçar paralelos necessários para a construção jurídica estudada neste

trabalho.

O Nome da Rosa por ser uma obra muito rica no que concerne ao direito medieval

passou a ser utilizada nos cursos de direito das universidades europeias.

Isto posto fica evidenciado que as obras literárias, ao se utilizarem de abordagens

jurídicas, acabam popularizando a justiça, colocando em questão seu sentido e sua

necessidade para a sociedade.

3.2 O QUE É METAFICÇÃO HISTORIOGRÁFICA

A metaficção historiográfica surge da junção da obra de ficção com a história, ou

seja, por mais que a obra literária seja uma peça de ficção, a mesma dá sinais

visíveis de que se apropria de fatos da realidade histórica. Contudo, seu objetivo é

relatar outra história, a possível, a omitida ou somente a imaginada.

De fato, para ser classificada como metaficção historiográfica, a obra deve ter as

seguintes características: o caráter de autorreflexividade intensa e, paradoxalmente,

referências explícitas a personagens e eventos históricos; a imbricação de reflexões

literárias, históricas e teóricas; o trabalho que realiza a partir das convenções com o

objetivo de subvertê-las; e a defesa de que, apesar de não negar a existência da

história, o passado só nos é acessível por meio da textualidade (HUTCHEON,

1988).

Como um fenômeno pós-moderno, obras literárias caracterizadas como metaficção

historiográfica problematizam e ampliam o saber histórico, e o modo como

acessamos a humanidade passada, o que permite a construção de verdades

históricas e não mais uma “verdade” absoluta e inquestionável. Nas narrativas

metaficcionais pós-modernas, portanto, a análise histórica, assim híbrida, utiliza

97

falsificações ou abordagens radicalmente críticas e irônicas em relação à história

tradicional, colocando as grandes narrativas sob suspeita. Na verdade, esse tipo de

texto é a produção literária ficcional mais comum na contemporaneidade e nos

campos do pós-moderno e do pós-colonial (HUTCHEON, 1988).

Esta abordagem contemporânea de estudo da ficção esteve o tempo todo presente

no trabalho em questão, porque a obra de Eco se encaixa no modelo supracitado.

A verdade histórica do ponto de vista metaficcional, por ser ficção, não seria

absoluta e nem seria inquestionável. Ocorre que a realidade histórica não pode ser

muda, portanto, mesmo que negue a história oficial, a obra de ficção precisa dela

como fonte e referência. Ocorre, assim, um movimento dialético profícuo que

favorece a criação literária.

Pode-se afirmar que a obra de ficção traz a sociedade para mais perto da história,

mas nem um autor literário tem o poder de mexer na realidade histórica e, se o

mesmo se afastar muito da história, a obra saíra do cerne da metaficção.

Isto posto fica evidenciado que a discussão da metaficção historiográfica teria a

função de aproximar o leitor da realidade histórica, mas há que se ter cuidado,

mesmo um literato quando viaja pela história tem que ter o conhecimento do fato

histórico. Desta forma, mesmo uma obra literária não pode fugir totalmente da

realidade absoluta e imutável da história enquanto ciência.

O saber pertence ao universo democrático, em que tanto os ficcionistas, quanto os

historiadores podem abordar a história no intuito de colocar em xeque a verdade em

si. Obviamente, a abordagem metodológica de estudo diferencia um do outro.

Questionar a história oficial é mais fácil para a ficção. Já para um historiador, a

verdade histórica precisa de subsídios, de embasamento, de provas documentais.

Um historiador busca sempre busca sempre em seu objetivo organizar e arranjar os

eventos históricos e tenta provar a realidade dos fatos, entretanto, por mais fiel que

o historiador seja ao fato, sempre terá sua subjetividade. Ou seja, enquanto o

historiador é apenas um intérprete do fato histórico, o ficcionista inventa suas

próprias histórias, quebrando a realidade absoluta dos fatos.

98

Portanto, essa é a diferença principal entre a metaficção historiográfica e a história.

A liberdade de criar não é permitida ao historiador, enquanto este se preocupa com

fatos. Contudo, mesmo o historiador pode se entregar à ficção, criando textos

literários.

Mas a história enquanto ciência tem no historiador sua mediação, ele a respeita,

pois a reconhece como válida e, justamente por isto, não anseia mudá-la, antes

transmiti-la a outros.

O literato, por sua vez, mesmo se apossando da história para escrever, pode mudar

e criar uma nova realidade ficcional e, com isso, quebrar o absolutismo da verdade

fática histórica. Desta forma, a história se torna parceira nas aventuras de um

ficcionista, por outro lado, essa liberdade aproxima o leitor da realidade histórica,

assim como faz com o direito.

Vale destacar que a história e metaficção separam-se como ciência, mas

aproximam-se como fonte de inspiração ao literato para criar uma obra literária que

viaja nos anais da história.

A história se aproxima da ficção ao refazer o referencial, ao proceder a omissões,

portanto a modificações, estabelecendo assim com os acontecimentos relações que

são novas na medida em que incompletas. É interessante verificar que certas

escolas históricas recentes sentiram como que uma espécie de inquietação sobre a

legitimidade da História tal qual vinha sendo feita, introduzindo nela, como forma de

esconjuro, se me é permitida a palavra, não apenas alguns processos expressivos

da ficção, mas da própria poesia. Lendo esses historiadores, temos a impressão de

estar perante um romancista da História, não no incorreto sentido da História

romanceada, mas como o resultado duma insatisfação tão profunda que, para

resolver-se, tivesse de abrir-se à imaginação (SARAMAGO, 1990).

A visão de Saramago se assemelha à visão Hutcheon, no tange à representação

metaficcional histográfica nos romances. Neste contexto, a metaficção historiográfica

possibilita uma leitura alternativa do passado o que denota uma crítica não oficial

dos fatos históricos. E devido ao seu caráter contraditório, nega a verdade do objeto

em questão e o recupera ao mesmo tempo.

99

Segundo Linda Hutcheon (1988), a metaficção historiográfica sugere que verdade e

a falsidade são pontos de partida para discutir a ficção. Sendo assim, a Metaficcao

trabalha com verdades no plural, devido à sua busca por várias verdades, diferente

da história que busca provar a veracidade do fato histórico. Apesar disto, a

metaficção historiográfica necessita da história para se recriar e existir no contexto

ficcional. Prevalece em seu enredo a antítese entre autenticidade e inautenticidade

dos objetos a serem analisados. Partindo de uma nova construção linguística, a

metaficção reescreve o passado em uma obra de ficção, utilizando-se dos mesmos

métodos e processos de escrita da história que traz fatos ao presente.

Para Hutcheon (1988), ao trazer o fato para o presente permite-se questionar a

verdade absoluta, essa verdade histórica só se permite ser questionada nessa

contemporaneidade.

Contudo, essa afirmação serve tão somente para a literatura, porque a história

enquanto ciência, para questionar um fato histórico, solicita provas. Mas como o fato

é passado, torna-se inquestionável. Isto não impede que existam questionamentos,

como os de Foucault para a história, ou seja, a transformação do fato histórico e sua

repetição na sociedade moderna.

3.3 O NOME DA ROSA E A METAFICÇÃO HISTORIOGRÁFICA

Diante das definições de Hutcheon (1998), podemos compreender que a obra de

Umberto Eco enquadra-se na categoria de metaficção historiográfica. Eco aborda no

romance vários fatos históricos e os problematiza, muitas vezes, trazendo

personagens reais para a obra. Neste sentido, o enredo versa sobre a temática do

Santo Inquérito e do Tribunal Eclesiástico. Pela leitura, somos convocados a refletir

sobre a atualidade e seus julgamentos, em especial, no Tribunal do Júri.

No que tange ao inquérito policial, a obra em questão mostra como um inquisidor

conduzia o horror da tortura em busca da verdade e, providencialmente, Eco

escolheu como inquisidor Bernardo Gui, que versava em seus ensinamentos reais

que, ao torturar o herege, o inquisidor não pode se exaltar e perder a calma.

100

Os procedimentos de investigação dos assassinatos realizados por Baskerville

aproximam-se dos de Sherlock Holmes. Não por acaso, Eco utiliza-se do sobrenome

Baskerville, para, por meio da dialogia, reforçar a proximidade de seu detetive

daquele que aparece nos romances de Conan Doyle, sobretudo, no intitulado O cão

dos Baskerville.

Eco elege, contudo, para seu romance investigativo, a Idade Média, onde a Igreja

Católica lutava para manter uma ordem social e o reinado absolutista do Papa, o

que tornava imprescindível a manutenção da ordem e da segurança jurídica da

época. Assim, mesmo com todo seu horror, a Inquisição se fez necessária neste

momento histórico, como detentora da verdade única. Embora a Igreja possa ser

muito questionada, O Tribunal Eclesiástico era uma forma de mostrar o poder de

império do regime clerical estatal da época sem promover guerras e cruzadas, ou

seja, o tribunal além satisfazer os anseios sociais, impedia chacinas com as

cruzadas.

Diante exposto, fica evidente a presença da abordagem de Foucault, de que na

história tudo se transforma, sendo através dessa renovação que se permite discutir

as verdades, inclusive por que não, as propostas pela metaficção historiográfica.

Eco propôs verdades e inverdades para abrir várias discussões sobre sua obra. A

hermenêutica jurídica do direito natural e as abordagens filosóficas explicam as

investigações de Willian e levam o leitor a uma reflexão sobre o que de fato é a

justiça e como ela se realiza em diferentes épocas. Portanto, a metaficção leva o

leigo a questionar a história, a sociologia, a filosofia e o direito no caso da obra de

Eco.

A intenção do autor na obra em questão foi desconstruir o passado para questionar

o futuro. E foi essa desconstrução que permitiu a este trabalho discutir seis séculos

de história e mostrar como foi possível construir a modernidade jurídica proposta

neste estudo.

Neste caso, fizemos o caminho inverso da metaficção historiográfica, porque

partimos da obra de ficção para a realidade histórica, filosófica e jurídica, visando à

construção deste trabalho. Utilizamos um método contemporâneo, invertendo seu

101

processo para demonstrar como o Inquérito Policial é oriundo do Santo Inquérito e o

Novo júri tem como um de seus embriões o Tribunal Eclesiástico.

Ao partir da obra literária em questão, este estudo pôde percorrer a história, a

filosofia o direito, e a mídia para fundamentar sua tese em direito processual penal.

Deduz-se, neste caso, que a ficção trabalhou em prol da realidade e da ciência.

3. 4 O NOME DA ROSA E A MÍDIA CINEMATOGRÁFICA

O trabalho em questão se utilizou da filmagem cinematográfica de O Nome da Rosa,

do diretor Jean Jacques Annaud, de 1986, para melhor demonstrar as propostas

discutidas.

A divulgação midiática da obra de Eco possibilitou a grande maioria da sociedade o

acesso às discussões proposta pelo autor.

Nesse intuito, a abordagem de desconstrução da história para seu questionamento

teve uma projeção inominável no estudo da metaficção historiográfica.

Ao tratar de cinema e história, a montagem cinematográfica envolvendo a obra

literária O Nome da Rosa foi muito fidedigna, o que trouxe várias críticas de

historiadores, afirmando que obra retratava fielmente a história da época.

Segundo Jacques Le Goff, considerado o maior historiador especialista em Idade

Média da atualidade, a adaptação da obra homônima de Umberto Eco é desprovida

de autenticidade e rigor histórico (apud PEOPLE, 1986).

Pode-se notar, então, que a adaptação da obra para o cinema provocou discussões

divergentes entre os historiadores.

A obra cinematográfica, de fato, enfatizou mais a ficção, visando atingir as massas,

do que a proposta histórica da obra literária.

102

Vale destacar que esta opção deve-se ao objetivo publicitário, pois o público do

cinema não é o mesmo da obra literária. Por isso, houve necessidade de um

excesso de emoção para atingir o público-alvo, em virtude dessa abordagem fez-se

necessária a fuga da realidade histórica e a imersão na fantasia.

Apesar disto, a obra cinematográfica serviu para demonstrar como era o Santo

Inquérito e a Inquisição em contraposto com o Inquérito Policial e o Plenário do Júri.

103

CONCLUSÃO

Este trabalho, pelo viés humanista, vem demonstrar as semelhanças do Inquérito

atual com o Santo Inquérito, assim como suas falhas. Também buscou apontar a

semelhança de objetivo tanto dentro do Tribunal Eclesiástico, quanto do Novo Júri

brasileiro, por meio da análise da obra de Umberto Eco, O Nome da Rosa. Para

tanto, utilizou-se de uma abordagem histórica, filosófica, jurídica literária e midiática.

Entretanto, a principal hermenêutica visou discutir o ocultismo do saber da Idade

Média frente a uma realidade contemporânea proposta na obra de Eco.

Em consonância com a proposta de trabalho e da obra, foi possível demonstrar, pelo

viés filosófico e histórico do pensamento de Foucault, que percorrer os meandros da

história, da filosofia, da literatura e das leis, significa demonstrar como foi se

formando os paradigmas jurídicos do processo penal para crimes contra a vida. Para

tanto, partimos do direito canônico medieval até chegar aos dias de hoje, e ao

formato que o processo penal brasileiro tem como regra para esses crimes.

Deve-se dizer que este estudo, voltado para a análise de uma obra literária, bem

como para sua comparação com o mundo jurídico, histórico e filosófico, realizou-se

através de uma nova ciência, denominada metaficção historiográfica, a qual

desmistificou a literatura histórica tradicional que se preocupava em relatar a história

fielmente e possibilitou, do ponto de vista da ficção, desmistificar verdades

históricas.

Pelo exposto, pudemos verificar que o trabalho atingiu seu objetivo, ao trazer a

ficção para ilustrar as realidades históricas, que, enquanto ciência, devem ser

comprovadas, pois um fato histórico pode ser reescrito ou até se repetir com uma

nova roupagem, mas nunca mudado.

Ocorre que a metaficção se aproxima muito do pensamento de Foucault na

observação do fato histórico, pois pelo imaginário o recria, produzindo, contudo, uma

história outra, alterada, e do provável.

Partindo da proposta foulcautiana de a história se repete, foi possível extrair de uma

literária, embasada no pensamento lógico aristotélico, o caminho para verdade

104

histórica filosófica e jurídica, que se transformou na realidade das leis processuais

penais brasileiras, no que tange ao inquérito policial e ao novo júri.

Este trabalho também se utilizou da adaptação cinematográfica para ilustrar as

ideias propostas na hermenêutica pela luta de um saber capaz de combater o

ocultismo que favorecia à ignorância medieval. Portanto, é possível afirmar que o

trabalho aqui defendido atingiu suas propostas e foi além, ao provar que, para o

estudo e o saber, torna-se possível transportar a ficção para a realidade histórica, a

fim de demonstrar que o imaginário, mesmo quando fantástico, tem a realidade

como referencial.

Outro objetivo que alcançado foi o de mostrarmos, no discorrer no universo histórico

e jurídico do direito canônico, que Igreja Católica não era a grande vilã medieval,

mas sim a alma e o exemplo de Estado para uma sociedade destroçada por guerras.

Isto quer dizer que essa Igreja unia o mundo medieval, o qual buscava preservar

valores da sociedade para a posteridade. Como todo poder estatal, ela se utilizava

do seu poder de império para impor seu modelo de sociedade e garantir o mínimo

de segurança jurídica para a polução medieval.

Em síntese, pelas reflexões arroladas neste trabalho, notamos que o saber sempre

vence a ignorância arraigada, ainda, que esta esteja representada por questões

sociais. Partindo desse ponto de vista, A Poética de Aristóteles foi grande vencedora

da obra de Eco, porque, de suposta assassina, passou a ser o ícone do saber contra

a ignorância imposta pela Igreja Católica Medieval. Neste contexto, ficou evidente

que a lei e a tecnologia estão aptas a punir os verdadeiros culpados.

Assim sendo, a justiça legal, mesmo na ficção, venceu a ignorância do medo e do

novo. Neste caso, o riso seria o caminho para quebrar as amarras do passado,

preparando, desta forma, todo o contexto social de uma época para um futuro

esplendoroso no campo científico, jurídico, filosófico, literário e histórico.

Justamente, este saber levaria a sociedade para um mundo melhor e muito mais

favorável à hermenêutica do saber. Em síntese, mostramos que a história foi se

repetindo, mas se configurando através de fatos novos, enquanto movimento

dialético aos velhos, justamente por isto, pôde favorecer a construção de uma

sociedade preocupada com questões sociais e culturais.

105

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