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RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL NO PROCESSO DO TRABALHO

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Reclamação constitucional no PRocesso do tRabalho

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clÁudio bRandãoMinistro do Tribunal Superior do Trabalho. Mestre em Direito (UFBA). Membro da

Associación Iberoamericana de Derecho del Trabajo e do Instituto Baiano de Direito do Trabalho. Membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho — ABDT e da Academia

de Letras Jurídicas da Bahia — ALJBA. Professor convidado da Faculdade Baiana de Direito, da Escola Judicial do TRT da 5ª Região e da Escola Nacional de Formação e

Aperfeiçoamento de Magistrados — ENAMAT.

Reclamação constitucional no PRocesso do tRabalho

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R

EDITORA LTDA.

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-003São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.brMaio, 2017

Produção Gráfica e Editoração Eletrônica: RLUXProjeto de capa: FABIO GIGLIO Impressão: GRÁFICA SANTUÁRIO

Versão impressa — LTr 5806.1 — ISBN 978-85-361-9263-5Versão digital — LTr 9155.6 — ISBN 978-85-361-9261-1

© Todos os direitos reservados

Índice para catálogo sistemático:

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Brandão, CláudioReclamação constitucional no processo do trabalho / Cláudio

Brandão. — São Paulo : LTr Editora, 2017.

Bibliografia

1. Direito constitucional 2. Direito constitucional — Brasil 3. Reclamação constitucional I. Título.

17-04223 CDU-347.9:331

1. Reclamação constitucional : Direito processualdo trabalho 347.9:331

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 A Esther, Felipe e André ponto de partida e de chegada de tudo o que sou,

de tudo que faço e de tudo que tenho.

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sumÁRio

1. Prefácio ..................................................................................................................... 13

2. Introdução................................................................................................................ 15

3. A reclamação constitucional no “Sistema Brasileiro de Precedentes Judi-ciais Obrigatórios” ................................................................................................. 19

3.1. A reclamação constitucional no mundo ....................................................... 19

3.2. A força do precedente judicial no sistema da common law ......................... 21

3.3. A função desempenhada pela reclamação no “Sistema Brasileiro de Pre-cedentes Judiciais Obrigatórios” ................................................................... 26

4. Histórico ................................................................................................................... 35

4.1. A “pré-história” no processo do trabalho ..................................................... 35

4.2. Primeira fase (de 1.10.1993 a 26.11.2002) ...................................................... 39

4.3. Segunda fase (de 27.11.2002 a 16.9.2011) ...................................................... 41

4.4. Terceira fase (de 17.9.2011 a 17.3.2016) — a “Fase da Escuridão” ............ 47

4.5. Quarta fase (de 18.3.2016 a 12.7.2016) ........................................................... 47

4.6. Quinta fase (a partir de 13.7.2016 — a “Fase Constitucional” — Fase atual) .................................................................................................................. 48

5. Natureza Jurídica ................................................................................................... 54

5.1. Procedimento de jurisdição voluntária ou mero procedimento ............... 55

5.2. Recurso e sucedâneo recursal ......................................................................... 56

5.3. Incidente processual ........................................................................................ 59

5.4. Exercício do direito constitucional de petição ............................................. 60

5.5. Ação .................................................................................................................... 62

6. Elementos da Ação ................................................................................................. 70

6.1. Partes .................................................................................................................. 72

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6.2. Causa de pedir .................................................................................................. 73

6.3. Pedido ................................................................................................................ 74

7. Pressupostos Processuais ...................................................................................... 75

7.1. Pressupostos de existência .............................................................................. 76

7.1.1. Jurisdição ou investidura do juiz ......................................................... 76

7.1.2. Demanda regularmente formulada..................................................... 76

7.2. Pressupostos de validade ................................................................................ 77

7.2.1. Competência ........................................................................................... 77

7.2.1.1. Processo principal ........................................................................ 78

7.2.1.2. “Sempre que possível” ............................................................. 78

7.2.2. Imparcialidade do juiz ............................................................................. 79

7.2.3. Capacidade das partes ............................................................................. 81

7.2.4. Inexistência de fatos extintivos da relação processual ..................... 83

7.2.4.1. Pressupostos negativos genéricos ........................................... 83

7.2.4.2. Pressupostos negativos específicos......................................... 83

7.2.4.2.1. Trânsito em julgado da decisão reclamada ........... 84

7.2.4.2.2. Não esgotamento das instâncias ordinárias .......... 84

7.2.5. Respeito às formalidades do processo ................................................ 94

7.2.6. Legitimação para agir ............................................................................ 94

7.2.6.1. Legitimação ativa ......................................................................... 95

7.2.6.2. Legitimação ativa em processo coletivo ................................. 100

7.2.6.3. Legitimação passiva .................................................................. 100

7.2.6.4. A participação de terceiros ....................................................... 101

7.2.6.4.1. Reclamação proposta pelo assistente simples....... 102

7.2.6.4.2. Impugnação por “qualquer interessado” .............. 104

7.2.6.4.3. Amicus curiae .............................................................. 107

7.3. Interesse de agir................................................................................................ 109

8. Litisconsórcio .......................................................................................................... 111

9. Hipóteses de cabimento ........................................................................................ 112

9.1. Usurpação da competência ............................................................................. 113

9.2. Garantia da autoridade das decisões ............................................................ 118

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9.3. Garantia da observância de enunciado de súmula vinculante e de deci-são do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitu-cionalidade ........................................................................................................ 122

9.4. Garantia da observância de acórdão proferido em julgamento de inci-dente de resolução de demandas repetitivas ou assunção de competên-cia (e, acrescento, de incidente de Recursos de Revista Repetitivos) ....... 130

9.5. Decisão que deixa de observar a força obrigatória do precedente judi-cial, sem apontar as razões da distinção ou da superação ......................... 132

9.1. Reclamação como instrumento para interpretação da decisão do tribu-nal — O caso da Rcl. n. 9.428 .......................................................................... 137

9.2. Reclamação como instrumento de revisão de coisa julgada — O Caso da Rcl. n. 4.374/PE ................................................................................................. 138

10. Petição inicial ........................................................................................................ 140

10.1. Requisitos ........................................................................................................ 14210.1.1. Autoridade judiciária a quem é dirigida .......................................... 14210.1.2. Identificação dos sujeitos que integram a relação processual ou a

qualificação das partes ........................................................................ 14310.1.3. O pedido com as suas especificações ................................................ 14510.1.4. O valor da causa ................................................................................... 14910.1.5. As provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos

fatos alegados ....................................................................................... 14910.1.6. A opção do autor pela realização ou não de audiência de conci-

liação ou de mediação ......................................................................... 14910.1.7. Outros requisitos .................................................................................. 150

11. Postulação .............................................................................................................. 151

11.1. Prova documental .......................................................................................... 15111.2. Distribuição ..................................................................................................... 15211.3. Indeferimento da petição inicial .................................................................. 154

12. Providências preliminares .................................................................................. 156

12.1. Requisição de informações ........................................................................... 15612.2. Defesa do beneficiário da decisão ................................................................ 156

12.2.1. A revelia na reclamação ...................................................................... 15712.3. Concessão de tutela provisória (cautelar de urgência, antecedente ou

incidental) ....................................................................................................... 15712.4. Concessão de tutela provisória antecipada de urgência, antecedente ou

incidental, e da evidência ............................................................................. 160

12.5. Regras comuns às tutelas provisórias antecipada ou cautelar e da evi-dência .............................................................................................................. 161

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12.6. Julgamento liminar de improcedência (art. 332 do CPC) ........................ 163

12.7. Possibilidade de impugnação por “qualquer interessado” ..................... 165

13. Parecer do Ministério Público do Trabalho...................................................... 166

14. Julgamento ..................................................................................................................... 168

14.1. Espécies de provimento jurisdicional ......................................................... 17014.2. Perda superveniente de objeto ..................................................................... 17214.3. Decisão unipessoal do relator ...................................................................... 17214.4. Julgamento por órgão colegiado .................................................................. 17814.5. Provimento jurisdicional em caso de usurpação de competência .......... 17914.6. Provimento jurisdicional em caso de desacato à autoridade de decisão .. 17914.7. Provimento jurisdicional em caso de não aplicação de tese firmada em

precedente judicial de cumprimento obrigatório ..................................... 18014.8. Efeitos do julgamento .................................................................................... 18114.9. Coisa julgada sujeita a condição resolutiva ................................................ 182

15. Recursos ................................................................................................................. 186

15.1. Reclamação proposta no TRT ....................................................................... 18715.1.1. Decisão proferida pelo Tribunal Pleno ou Órgão Especial ............ 18715.1.2. Decisão proferida por Seção Especializada ou por órgão encarre-

gado de julgar ações de competência originária dos TRTs ............ 18815.1.3. Decisão proferida por Turma ............................................................. 190

15.2. Reclamação proposta no TST ....................................................................... 19115.2.1. Decisão proferida pelo Tribunal Pleno ou Órgão Especial ............ 19115.2.2. Decisão proferida pelas Seções Especializadas (SBDI-1, SBDI-2 e

SDC) ....................................................................................................... 19115.2.3. Decisão proferida por Turma ............................................................. 192

15.3. Relação entre recurso e reclamação ............................................................. 192

16. Prazo para a propositura da reclamação .......................................................... 195

17. Reclamação como instrumento de controle do precedente judicial de cumprimento obrigatório ......................................................................................... 196

17.1. Controle de Aplicação do Precedente no Processo do Trabalho ............. 196

17.1.1. Procedimento ordinário (sem precedente obrigatório) .................. 198

17.1.2. Procedimento especial (precedente obrigatório existente) ............ 202

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18. Reclamação de reclamação ................................................................................. 206

19. Reclamações repetitivas ...................................................................................... 209

20. Reclamação preventiva ........................................................................................ 211

21. Reclamação contra membro ou órgão do mesmo tribunal ........................... 213

21.1. Proposta de nova hermenêutica ................................................................... 218

21.2. Precedente do TRT e processos nele sobrestados ...................................... 218

21.3. Precedente do Tribunal Pleno ou da SbDI-I do TST e recursos de revista sobrestados ..................................................................................................... 219

21.4. Precedente do Tribunal Pleno ou da SbDI-I do TST e recursos de em-bargos sobrestados ........................................................................................ 221

21.5. Precedente do Tribunal Pleno ou da SbDI-I do TST e decisão da Turma em agravo de instrumento em recurso de revista .................................... 221

21.6. Proposta de cabimento da reclamação ........................................................ 224

22. Ação rescisória de reclamação ............................................................................ 226

23. Apêndice — Procedimento no PJe-JT ............................................................... 228

23.1. A petição inicial .............................................................................................. 228

23.1.1. Cadastramento e distribuição ............................................................ 229

23.1.1.1. Dados iniciais ........................................................................... 229

23.1.1.1.1. Jurisdição e classe processual ................................ 230

23.1.1.1.2. Assuntos Associados .............................................. 230

23.1.1.2. Partes ......................................................................................... 230

23.1.1.3. Características .......................................................................... 232

23.1.1.3.1. Segredo de justiça.................................................... 232

23.1.1.3.2. Justiça gratuita ......................................................... 234

23.1.1.4. Pedido de concessão de tutela antecipada, cautelar ou de mérito ........................................................................................ 235

23.1.1.5. Valor da causa .......................................................................... 235

23.1.1.6. Prioridade do processo ........................................................... 235

23.1.2. Anexar petição e documentos ............................................................ 236

23.2. Anexar documentos à petição inicial .......................................................... 237

23.2.1. Descrição e tipo de documento .......................................................... 237

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23.2.1.1. Atribuição de sigilo aos documentos .................................... 238

23.2.1.2. Adicionar e incluir o documento .......................................... 239

23.2.1.3. Documento em meio físico .................................................... 239

23.2.1.4. Assinar digitalmente ............................................................... 240

23.2.2. Informações da Justiça do Trabalho .................................................. 241

23.3. Distribuição ..................................................................................................... 241

23.3.1. Regras da distribuição ......................................................................... 242

23.3.2. Prevenção .............................................................................................. 245

23.3.3. Redistribuição ....................................................................................... 246

23.4. Protocolo em lote ............................................................................................ 246

23.5. O processo na palma da mão ................................................................ 247

24. Referências bibliográficas ................................................................................... 251

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1. PRefÁcio

No início da minha trajetória de professor de processo civil, tive acesso à então recém-publicada tese de doutoramento de Marcelo Navarro Ribeiro Dantas, professor da UFRN e hoje ministro do STJ. A tese cuidava da “recla-mação constitucional”. Tratava-se de um calhamaço de quase mil páginas. O tema me interessava por duas razões: a) eu jamais havia estudado o assunto, que de resto nem constava dos programas da disciplina que cursei como alu-no e que ministrava como professor; b) ainda aluno da graduação, ouvia um dos meus professores, Celso Castro, conhecido advogado baiano, explicando a tese que havia formulado a respeito do uso de uma tal “reclamação”, para preservar direitos dos municípios — ouvia atentamente a explicação de Cel-so, mas não tinha como apreendê-la em sua inteireza, exatamente porque não sabia do que se tratava essa tal da “reclamação”.

O livro de Marcelo foi importantíssimo para a doutrina brasileira e, não é ocioso dizer, para a prática da reclamação no Brasil. A partir da sua leitura, eu passei a incluir o assunto em minhas aulas, a despeito de o tema não estar no conteúdo programático da disciplina — alguns colegas consideravam ex-cêntrica essa minha opção.

Os anos 2000 tornaram a reclamação uma verdadeira “estrela forense”. A reclamação passou a ser utilizada rotineiramente, a ponto de o número de reclamações, nos tribunais superiores, ter-se multiplicado em progressão geométrica. A jurisprudência sobre a reclamação, errática e pouco sólida até então, passou a transformar-se rapidamente: permissão de reclamação pe-rante Tribunal de Justiça, ampliação da reclamação como instrumento para fazer valer as decisões em controle de constitucionalidade, relação entre ela e o sistema de precedentes obrigatórios que começava a desenvolver-se no Brasil etc. É dessa época, ainda, a EC n. 45/2014, que inseriu na Constituição a expressa previsão da reclamação por desrespeito à ao comando normati-vo enunciado em súmula vinculante. Inúmeros livros e artigos sobre o tema passaram a ser publicados. Os cursos e manuais de processo civil passavam a tratar da reclamação em capítulo autônomo, a demonstrar a expansão do tema na prática docente no Brasil.

Era inevitável, então, que o CPC-2015, que começou a ser gestado em 2009, incorporasse o regramento da reclamação, aperfeiçoando-o substancial-mente, e revogasse a tímida regulação prevista na Lei n. 8.038/1990.

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Uma das principais mudanças na disciplina normativa da reclamação foi a previsão de cabimento dessa ação perante “qualquer tribunal” (art. 988, caput, CPC). A previsão era fundamental para, por exemplo, garantir o cabi-mento da reclamação no âmbito dos tribunais trabalhista. É que, há uns anos, o STF entendeu que, à míngua de previsão legal expressa, não era possível que os tribunais trabalhistas, especialmente o TST, previssem o cabimento da reclamação em seus regimentos internos — nessa decisão, o STF enten-deu inconstitucional a previsão da reclamação no Regimento Interno do TST. Curioso o pensamento do STF, nesse caso: a reclamação surgiu no próprio STF, sem previsão expressa, a partir da construção teórica dos poderes im-plícitos. A partir disso, o processo do trabalho passou a ficar desprovido do instrumento da reclamação, até a superveniência do CPC-2015 e, depois, da EC n. 92/2016, que expressamente previu o cabimento da reclamação perante o TST, agora em nível constitucional.

Cláudio Brandão, amigo e confrade baiano, hoje Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, agora apresenta aquela que possivelmente é a primeira monografia sobre a reclamação no processo do trabalho, totalmente escrita dentro desse contexto histórico de ampla regulamentação legal do assunto, vastíssima produção intelectual e intensa atividade jurisprudencial.

O livro já nasce fundamental.

Trata-se de trabalho completo: apresenta todos os problemas práticos até agora imaginados e os soluciona com muita habilidade dogmática. Cláudio examinou tudo que de relevante se produziu sobre o tema no Brasil, apresen-tando uma contribuição importantíssima para o desenvolvimento do tema no processo do trabalho. Destaco a análise que Cláudio fez das relações entre a reclamação e o sistema de precedentes obrigatórios, sobretudo o exame do § 5º do art. 988 do CPC.

Uma das grandes qualidades de um intelectual, ao meu sentir, é a capa-cidade de estar antenado com as preocupações do seu tempo. Cláudio é um intelectual com essa característica e larga na frente com este seu belíssimo livro.

Parabéns, querido amigo.

Salvador, março de 2017.

Fredie Didier Jr.

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2. intRodução

Como dito a algumas pessoas próximas, este livro foi o meu “projeto férias” de 2016/2017.

Desde a vigência do Código de Processo Civil de 2015,(1) a reclamação foi um dos institutos que, de forma imediata, mais despertaram a minha aten-ção, pelas suas diversas singularidades.

Procedimento expedito; razões objetivas do seu cabimento; grande semelhança com o mandado de segurança; possibilidade de exigência de cumprimento imediato do comando contido na decisão nela proferida; ado-ção de medidas auxiliares para a satisfação da obrigação instituída em decisão unipessoal do relator ou no acórdão do órgão julgador colegiado; ampliação das hipóteses de sua utilização e dos tribunais nos quais pode ser ajuizada; possibilidade de ser adotada como adjutório à força de cumprimento obriga-tório do precedente judicial; importante instrumento auxiliar no sistema de precedentes aperfeiçoado e ampliado no CPC; tudo isso me impressionou bastante e me levou a garimpar, no segundo semestre de 2016, as poucas obras específicas (seis ou sete) que tratam do tema, no âmbito do processo civil (algumas com edições esgotadas, só adquiridas em sebos virtuais).

Destaco a importância de algumas obras que, pioneiramente, enfrenta-ram o tema e, por isso mesmo, tornaram-se referências, como: O Mandado de Segurança e Outras Ações Constitucionais Típicas, de José da Silva Pacheco; Reclamação Constitucional no Direito Brasileiro, de Marcelo Navarro Ribei-ro Dantas; mais recentemente, “Reclamação e sua Aplicação para o Respeito da Súmula Vinculante”, de Leonardo Lins Morato; e Reclamação Constitucional, de Ricardo de Barros Leonel. Em todas elas, a reclamação é analisada com profundidade. No universo bibliográfico, porém, constata-se que poucas são posteriores à edição do Código e, por isso, não abordam os novos contornos que assumiu, relacionados às hipóteses de cabimento e aos tribunais em que pode ser proposta, com exceção de análises feitas, em algumas delas, ao pro-jeto até então em curso.

No processo do trabalho são raros. À exceção de capítulo escrito pelo Professor Estêvão Mallet, em obra coletiva (MALLET, Estêvão. A reclamação

(1) De logo, esclareço que, por ser a norma em vigor, não uso qualquer adjetivo que o qualifique, como “Novo CPC” ou “CPC/2015”. É simplesmente CPC e, quando ocorrer referência ao anterior, será identificado como “CPC/73”, tal como fazíamos, na sua vigência, com o “CPC de 1939”.

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perante o Tribunal Superior do Trabalho. In: NOGUEIRA, Pedro Henrique Pedrosa; COSTA, Eduardo José da Fonseca (org.). Reclamação constitucional. Salvador: Juspodivm, 2013), muito pouco foi encontrado — na verdade, ne-nhum que analisasse os diversos aspectos do tema —, apesar do esforço de pesquisa, inclusive com auxílio da competente e prestimosa equipe da Biblio-teca do Tribunal Superior do Trabalho.

O interesse cresceu e se tornou ainda maior quando, nas primeiras lei-turas, tomei conhecimento de se tratar de instituto genuinamente brasileiro, sem precedentes em outros sistemas jurídicos. Também marcou, de logo, a contradição, apontada pela doutrina, em relação aos fundamentos adotados pelo Supremo Tribunal Federal para reconhecer a inconstitucionalidade da reclamação prevista, por breve período, no Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho — ausência de lei que o autorizasse —, muito embora ele próprio — STF — e de modo original a tivesse instituído a partir de estu-dos do Ministro Rocha Lagoa que, em julgamento proferido no ano de 1952, invocou como fundamentoa Teoria dos Poderes Implícitos (Implied Powers Theory), do direito americano. Naquela época, sequer havia norma regimen-tal e, mesmo assim, pela importância de ser garantida a autoridade plena da decisão judicial, a Excelsa Corte não hesitou em a admitir, de início pela prática judiciária e mais tarde por alteração no Regimento Interno.

Outro aspecto marcante nos primeiros contatos se relacionou com o fato de ser instituto genuinamente brasileiro e serem inúmeras as discussões em torno da sua natureza jurídica, tema extremamente controvertido ao longo de sua evolução. Em que pese doutrina amplamente majoritária afirmar ser ação constitucional de natureza especial e fundamentação vinculada, essa compreensão diverge frontalmente — ou, pelo menos, divergia — do quanto decidido pelo STF, que reconheceu ser decorrente do exercício do direito constitucional de petição, posicionamento recentemente revisto em decisão monocrática do Ministro Luís Roberto Barroso, já sob as luzes do novo sistema processual (Rcl. n. 24.417, 1ª T., julgamento em 7.3.2017).

Tudo isso me incentivou ao desafio e a programá-lo para as férias, quando, em Salvador e afastado das atividades cotidianas no TST, poderia dedicar-lhe o tempo necessário a vencê-lo, sem prejuízo do imprescindível descanso, entremeado com corridas na praia de Piatã. A finalização, porém, retardou um pouco.

Assim nasceu o livro.

Procurei abordar os diversos aspectos da reclamação, na perspectiva do processo do trabalho, mas com ampla incursão no processo civil, não apenas por conta da origem, mas, sobretudo, pela incidência das normas que a regem.

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A ideia foi tentar abranger tudo aquilo que pudesse despertar interesse em torno dessa nova ação, sem deixar de manifestar a minha posição pessoal em cada uma das muitas questões jurídicas e de tentar apresentar soluções — ou propostas — para algumas delas que, sem dúvida nenhuma, serão alvo de acalorados debates na doutrina, reverberados em decisões judiciais. Veja-se, por exemplo, o intrincado sistema recursal, a partir de precedentes fixados pelos TRTs.

Procurei contar a história da reclamação no processo do trabalho e tomei por base a divisão por fases, concebida por José da Silva Pacheco e de-talhada amiúde por Marcelo Ribeiro Navarro Dantas. Levei em consideração fatos marcantes dos seus avanços e retrocessos, desde 1993, quando se pro-moveu a alteração regimental autorizadora de sua propositura no processo do trabalho.

Registrei decisões importantes, como a proferida pelo Ministro Lelio Bentes, em 2006, que afastou a alegada inconstitucionalidade (ED-R-1050976-67.2003.5.00.0000), e, já no período posterior ao CPC, pelo Ministro Walmir Oliveira da Costa (AgR-Rcl — 6852-59.2016.5.00.0000), que reconheceu o seu cabimento no processo do trabalho e começou a fincar os marcos divisórios entre jurisprudência, precedente e súmula.

Ponto final foi a Emenda Constitucional n. 92/2016, responsável por ele-vá-la ao patamar mais alto das ações constitucionais, ombreando o TST aos demais tribunais superiores, aliás, como não poderia deixar de ser.

Importante a pesquisa empreendida na jurisprudência do Supremo Tri-bunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, sobretudo para nela tentar identificar questões jurídicas que, em tese, estarão superadas pelo novo re-gramento legal, e outras que permanecerão atuais. Por isso a cautela na “caça aos precedentes” pretéritos para fundamentar novas pretensões, sobretudo porque, em muitos casos, a jurisprudência sedimentada ruiu — ou não sobre-viverá —, no novo cenário normativo, inaugurado em 2016.

Não preciso dizer que, embora “caçula” na seara processual laboral, a reclamação renasceu com fôlego de atleta. Desde os seus primeiros “momen-tos de vida” do CPC, figura no acervo de processos submetidos à apreciação dos Ministros do TST, muito embora a esmagadora maioria seja liminar-mente indeferida, em virtude da não observância dos pressupostos e das hipóteses referentes ao seu cabimento.

Em juízo premonitório, posso supor que a possibilidade de ajuizamento nos Tribunais Regionais do Trabalho fará com que também neles se multi-plique o que permite recomendar o cuidado necessário a fim que não seja banalizado o seu uso e contribuir para o seu “desgaste” e o seu consequente “enfraquecimento”.

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Por tudo e muito mais, posso dizer: o tema é instigante e, ao concluir a obra, confesso que por ele fiquei fascinado, diante da potencialidade do alcance da reclamação, para muito além do texto que exprime as regras con-tidas no CPC.

No capítulo final — a que denominei de apêndice, por não estar di-retamente ligado ao tema —, a prática do uso do PJe-JT na postulação do advogado e o novo aplicativo que permite diversas consultas ao processo por meio do telefone celular; o futuro, para quem duvidava, chegou ao processo do trabalho que, agora, está na palma da mão, literalmente.

Por fim, agradecimentos se fazem necessários.

Em primeiro lugar, à minha família — Esther, Felipe e André —, de cuja companhia fiquei privado nos horários em que me dediquei ao estudo e à escrita. O prejuízo foi meu, tenho — e tenham — certeza.

Em segundo lugar, ao conterrâneo, amigo e renomado Professor Fredie Didier Jr., pela gentileza de prefaciar a obra, o que me honra sobremanei-ra, principalmente pela autoridade de quem, como poucos, inscreveu o seu nome na história do Direito Processual Civil brasileiro, pela dedicação e em-penho em prol da aprovação do CPC, qualidade intelectual da doutrina que diuturnamente professa nas inúmeras palestras proferidas nos rincões do Brasil e na escrita, simples, mas com profundidade científica, revelada em variadas obras.

Em terceiro lugar, à Drª Fernanda Smizmaul Paulino, Chefe de Gabine-te, pela gentileza de sacrificar o tempo destinado ao descanso e ao convívio familiar para fazer a revisão do texto, após a estafante tarefa de liderar — e o faz com maestria — a equipe de trabalho. Exerce esses misteres sempre com muita competência e dedicação.

O objetivo foi contribuir com a doutrina e ampliar o espaço de discussão sobre esse importante tema. Espero haver alcançado.

As contribuições são sempre bem-vindas. Elas aperfeiçoam a obra, qua-lificam o debate e servem de incentivo.

Cláudio BrandãoSalvador e Brasília, janeiro a março de 2017

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3. a Reclamação constitucional no “sistema bRasileiRo de PRecedentes

Judiciais obRigatóRios”

3.1. A reclAmAção constitucionAl no mundo

Instituto genuinamente brasileiro. Essa a primeira afirmação importante em torno da reclamação constitucional. Em estudo pioneiro, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas(2) analisou, segundo suas próprias palavras, os mais interes-santes sistemas jurídicos, “sob o ponto de vista da jurisdição constitucional, [...] e que mais influências e ligações tiveram ou têm com o Direito Brasileiro”, e não encontrou nada “parificável à reclamação constitucional”.(3)

No Direito Americano, o writ of certiorati possui algumas de suas caracte-rísticas, quando relacionado à usurpação de competência; pode ser utilizado em casos de conflitos de decisão entre tribunais de apelação em questões im-portantes, inclusive com funções avocatórias, além da certified question, para o mesmo fim, ou o contemp of court (desacato ao tribunal), adotada esta últi-ma para variada gama de situações, desde a preservação do poder de polícia jurisdicional, até litigância de má-fé, imposição de multas, etc.; o writ of pro-hibition destina-se a impedir que um juiz ou tribunal inferior exceda a sua jurisdição ou extrapole a sua competência e o writ of mandamus consiste em mandamento para que o agente pratique determinado ato que constitui seu dever de ofício, nos casos em que o servidor não tem poder discricionário;(4) nada, contudo, que concentre em uma só ação os atributos conferidos à re-clamação, embora, além de vigorar a doutrina do stare decisis, as decisões de tribunais de última instância vinculem “naturalmente” os tribunais inferio-res, em virtude do primado do stare decisis, do precedente judicial.(5)

No Direito Alemão, semelhanças são encontradas nas decisões que re-solvem os conflitos de competência (die Kompetenzkonflikten), os quais atendem parte das finalidades que podem ser atingidas pela reclamação, mas passando ao largo da preservação da autoridade das decisões de tribunais, salvo figura similar ao contemp of court americano — a Zwanngsstraf —; o remédio cons-

(2) DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação constitucional no direito brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 2000. p. 385-429.(3) DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação constitucional no direito brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 2000. p. 386.(4) TAKOI, Sérgio Massaru. Reclamação constitucional. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 34.(5) TAKOI, Sérgio Massaru. Reclamação constitucional. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 31.