artigo: história do orçamento público no brasil

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Wagner Maia HISTÓRIA DO ORÇAMENTO PÚBLICO NO BRASIL São Paulo Outubro de 2010

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Wagner Maia

HISTÓRIA DO ORÇAMENTO PÚBLICO NO BRASIL

São Paulo

Outubro de 2010

Resumo

Este trabalho aborda a evolução histórica do orçamento público no Brasil, analisando as

diversas épocas do país desde o século XVII, com a vinda do D. João VI para o Brasil, até

os dias atuais. Exploramos também a evolução do conceito de Orçamento Público, que

remonta a 1822, quando a Inglaterra introduz o orçamento como instrumento formalmente

acabado, marcando a data de surgimento do primeiro orçamento no Brasil.

Também são estudadas as opções existentes em adotar-se o orçamento autorizativo ou o

orçamento impositivo, bem como os reflexos dessa escolha na independência entre os

poderes Executivo e Legislativo.

Por fim, a pesquisa demonstra avanços positivos na administração pública brasileira,

notadamente, a preocupação e o consenso dos gestores públicos em relação à necessidade

de melhoria da qualidade do gasto público. Além disso, a população que antes era

praticamente renegada, hoje pode acompanhar mais ativamente quase todo o processo de

orçamentário brasileiro.

Palavras chaves: Atribuições Econômicas, Evolução, Orçamento Impositivo, Orçamento

Autorizativo, Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias e Lei Orçamentária Anual.

Apêndice

Introdução ..............................................................................................................................1

1. A história do orçamento público pelo mundo ...................................................................2

2. O orçamento nas constituições brasileiras .........................................................................4

3. Evolução conceitual do Orçamento Público .................................................................. 10

3.1 – Orçamento Tradicional .............................................................................................. 11

3.2 - Orçamento de desempenho ou por realizações .......................................................... 11

3.3 - Orçamento-Programa ................................................................................................. 11

3.4 - Orçamento de base zero ou por estratégia ................................................................. 12

3.5 - Orçamento Participativo ............................................................................................ 12

4. Orçamento Impositivo versus Orçamento Autorizativo ................................................. 13

5. O Processo Orçamentário Atual – Constituição e 1988 ................................................. 14

Considerações Finais........................................................................................................... 22

Bibliografia ......................................................................................................................... 24

iii

SIGLAS E ABREVIATURAS

ADCT Atos das Disposições Constitucionais Transitórias

Art. Artigo

CF Constituição Federal

EC Emenda à Constituição

LDO Lei de Diretrizes Orçamentárias

LOA Lei Orçamentária Anual

OP Orçamento Participativo

PE Poder Executivo

PL Poder Legislativo

PPA Plano Plurianual

Introdução.

O orçamento público, hoje em dia, é discutido e aperfeiçoado dentro e fora do

Brasil devido sua grande relevância para a economia do país e mundial. O Estado é

responsável por grandes dispêndios seja quando da aquisição de grandes quantidades de

produtos ou serviços, seja na contratação de empresas para execução de obras públicas

(pontes, estradas, hospitais) ou quando paga salários aos seus servidores que irão consumir

grandes quantidades de produtos ou serviços, colocados à disposição pelo setor privado.

É verdade que, como contrapartida, o Estado tende a recuperar parte desses gastos,

através da arrecadação de impostos ou contribuições que são pagos por todos os que

possuem renda, sejam proprietários de bens imóveis ou bens móveis e consomem produtos

e serviços, sejam pessoas físicas ou pessoas jurídicas.

A arrecadação de tributos tem como contrapartida a necessidade de o Estado gerir

melhor os recursos de forma a satisfazer aos anseios e às necessidades da população.

Diante desse cenário, surgem as três atribuições ou funções econômicas do Estado.

A primeira função estatal é denominada alocativa, ou seja, diante da ineficiência

por parte de mecanismos privados (sistema de mercado) o Estado assume a função de

“alocar” recursos em produtos ou serviços que não sejam rentáveis à iniciativa privada.

Como exemplo podemos citar os investimentos em infra-estrutura efetuados pelo

Governo nas áreas de transporte, energia, comunicações, que compreendem investimentos

altos e possuem longo período de carência entre as aplicações e o retorno, ocasionando o

desinteresse do envolvimento privado nesses setores. Esses setores, apesar do acima

exposto, são indutores do desenvolvimento regional e nacional, sendo compreensível que

se transformem em áreas de competência estatal.

A segunda função estatal é denominada distributiva, isto é, busca-se promover

ajustamentos na distribuição de renda entre os seus pares. Uma forma de melhorar a

distribuição da renda é a instituição de tributos progressivos sobre a classe de renda mais

elevada com transferências para aquelas classes de renda mais baixa. Outro exemplo, seria

a concessão de subsídios aos bens de consumo popular financiados por impostos sobre

bens consumidos pelas classes de mais alta renda.

A terceira atribuição estatal é chamada de estabilizadora. Essa função está associada a

quatro objetivos macroeconômicos: (a) manutenção de elevado nível de emprego, (b)

estabilidade nos níveis de preços, (c) equilíbrio no balanço de pagamentos, e (d) razoável

taxa de crescimento econômico. Esses quatro objetivos, especialmente os dois primeiros,

configuram o campo de ação da função estabilizadora.

Para exemplificar, citamos que em uma economia, os níveis de emprego e de preços

resultam dos níveis de demanda agregada, ou seja, da disposição de gastar dos

consumidores, sejam as famílias, o governo, o capitalista, enfim, qualquer tipo de

comprador. Se a demanda for superior à capacidade da produção, os preços tenderão a

subir; se inferior, haverá desemprego. O mecanismo básico da política de estabilização é,

portanto, a ação estatal sobre a demanda agregada, aumentando-a ou reduzindo-a conforme

as necessidades.

Nesse cenário, percebe-se a grande importância que tem o orçamento público

atualmente, pois dele deriva a alocação de recursos necessários ao desenvolvimento do

país, a inserção de pessoas na vida econômica ativa e a estabilidade econômica de mercado

perseguida por todos países.

É com base nesses preceitos que começamos a dissertar sobre a história do orçamento

público, passando por toda a sua história e evolução, desde seu surgimento, no século XIII,

na Inglaterra, até os dias atuais.

1. A história do orçamento público pelo mundo

Parece haver consenso entre os estudiosos do assunto em afirmar que o orçamento

público teve origem por volta do século XIII. Na Inglaterra, durante o reinado do Rei João

Sem Terra, foi assinada a Carta Magna, datada de 15 junho de 1215.

A nobreza e a plebe, cansadas de tanto combater e perder as batalhas contra a França,

aumentavam sua insatisfação contra o rei. Os barões ingleses então se rebelaram,

capturaram Londres em maio de 1215 e, no mês seguinte, obrigaram John Lackland (João

Sem Terra) a assinar a Carta Magna. Este documento evidenciava três aspectos principais:

liberava a Igreja para gerir independentemente suas ações;

reportava-se a limitação do rei em lançar impostos (somente poderia ser cobrado

novos impostos com autorização de um feudal); e,

ninguém poderia ser punido fora da common law¹. (FORD, 1999).

¹Common Law – Conselho dos comuns

O reinado de João Sem Terra foi tumultuado, pois no período em que governou (1199

a 1215) sofreu algumas intervenções e interdições papais. Chegou até a ser excomungado

pelo Papa Inocêncio III por atacar as propriedades da Igreja. Dessa forma, abriu várias

frentes de descontentamentos e alguns barões forçaram-no a instituir a primeira Carta

Magna, cujo artigo 12 explicitava que: “Nenhuma cobrança de impostos pode ser lançada

em nosso reino sem consentimento do Conselho dos Comuns, exceto para custear o

resgate da pessoa do rei, para fazer seu filho mais velho um cavaleiro e para casar (uma

vez) sua filha mais velha. Os subsídios para essa finalidade deverão ser razoáveis em seus

montantes”.

Reis que sucederam o João Sem Terra não aceitavam pacificamente a idéia de

submissão ao Conselho dos Comuns nos assuntos relacionados à arrecadação. As famílias

reais convergiam em pensamento no tocante à idéia de que a soberania do rei advinha de

Deus e assim possuíam o direito de governar os homens. Os reis reagiam à idéia de pedir

autorização ao Parlamento para lançar impostos quando em guerra ou quando a coroa

assim o desejasse. O povo e o Parlamento não concordavam com o pensamento real. O

auge do conflito aconteceu no reinado de Carlos I, pois ele exercia pressão policial e

judicial sobre o povo que se recusava a contribuir sem o consentimento do Parlamento.

Houve luta armada e o rei foi derrotado, processado e morto (VIANA, 1950).

Somente no Bill of Rights², 1689, no governo de Guilherme de Orange e da Rainha

Ana apareceu a palavra tax (impostos). Esse documento consolidou a instituição

parlamentarista e a regra de que a arrecadação da receita real deveria ser previamente

autorizada pelo Parlamento (Câmara dos Lordes e Câmara dos Comuns).

A Constituição Francesa, pós-revolução de 1789, consagrou que a votação de receitas

e despesas pertencia exclusivamente aos representantes do povo. A Assembléia Nacional

estabeleceu que cabia aos representantes do povo a votação dos impostos a serem pagos

pela sociedade. (VEIGA, 1975).

Alguns autores consideram que a revolução pela independência americana decorreu

da contrariedade dos colonos em face dos tributos cobrados pelo governo inglês.

Em 1765, os habitantes da Virgínia se insurgiram fortemente contra o Parlamento

britânico motivados pela discordância em aceitar os impostos da ilha real na colônia. O

povo resolveu votar a sua liberdade em termos de impostos lançados pela coroa.

²Bill of Rights – Carta de Direitos (similar à Constituição Federal).

A Assembléia Nacional votou o texto que normalizava: somente a assembléia geral

da Colônia tem o direito e o poder de exigir impostos dos seus habitantes (VEIGA, 1975).

Todos esses acontecimentos históricos tiveram reflexos diretos ou indiretos no

desenvolvimento e aprimoramento do orçamento brasileiro, pois todo o estudo sobre sua

finalidade, evolução e o porquê de sua existência são analisados por estudiosos e técnicos

pátrios e esses ensinamentos são aplicados ao nosso sistema orçamentário, de forma a

aprimorar, ano a ano, sua elaboração, execução e controle.

Após essa rápida digressão sobre a história de orçamento por países considerados

como “os incipientes do orçamento público” passaremos a analisar de forma

pormenorizada a evolução do orçamento brasileiro, passando pelas oito Cartas Magnas

existentes, até o momento, em nosso país. As constituições podem ser promulgadas

(elaboradas através do processo democrático, com participação popular) ou outorgadas

(impostas, autoritárias, sem participação do povo).

A evolução do orçamento brasileiro é caracterizada e marcada pelo processo político

pelo qual o país está passando, sendo que no caso brasileiro as constituições outorgadas

são as dos anos de 1824, 1934, 1937 e 1969. Já as Constituições consideradas promulgadas

foram as dos anos de 1891, 1946, 1967 e 1988 (atual). Esse processo político (constituição

outorgada ou promulgada) vai delinear de forma expressa quem tem a iniciativa de

elaborar, aprovar, executar e controlar a lei orçamentária.

Vale ressaltar que a classificação das oito constituições em promulgadas ou

outorgadas não ser pacífica entre os estudiosos da área. Esse trabalho preferiu adotar a

classificação que parece ser a mais aceita entre o meio acadêmico da área de ciências

jurídicas, e constar de diversos livros de Direito Constitucional, por se tratar de assunto

afeto a sua seara. Há, também, autores que não classificam a carta de 1969 como

Constituição propriamente dita, e, sim, como uma revisão constitucional à carta de 1967.

2. O orçamento nas constituições brasileiras

A tributação da metrópole portuguesa na colônia brasileira ocasionou graves

descontentamentos. A Inconfidência Mineira (1785 - 1789) foi um desses movimentos. O

estopim do movimento foi a emanação de tributos portugueses na colônia. Portugal queria

receber todos os impostos atrasados (fato conhecido como Derrama) e causou profunda

inquietação social que culminou com o citado movimento e a morte de Joaquim José da

Silva Xavier – Tiradentes (1746-1792).

Por outro lado, o rei de Portugal, D. João VI, pressionado por acontecimentos na

Europa, mais precisamente no tocante ao Imperador Francês, Napoleão, que forçava

Portugal a fechar seus portos para a Inglaterra abandonou sua terra natal, fortemente

escoltado por navios ingleses, e se estabeleceu no Brasil. Sua chegada à colônia promoveu

a organização das finanças e o disciplinamento dos tributos aduaneiros. O regime de

contabilidade pública, o Erário Público (Tesouro), o Conselho Real da Fazenda e três

contadorias reais foram criados em 1808. (VEIGA, 1975).

Nessa passagem de nossa história assevera James Giacomoni em sua obra Orçamento

Público: “Com a vinda do rei D. João VI, o Brasil iniciou um processo de organização de

suas finanças. A abertura dos portos trouxe a necessidade de maior disciplinamento na

cobrança dos tributos aduaneiros. Em 1808, foram criados o Erário Público (tesouro) e o

regime de contabilidade”.

Mais à frente assevera: “é na constituição de 1824 que surgem as primeiras

exigências no sentido de elaboração de orçamentos formais por parte das instituições

imperiais. Em seu artigo 172, assim estabelecia aquela Lei Magna”:

“O ministro de Estado da Fazenda, havendo recebido

dos outros ministros os orçamentos relativos às

despesas das suas repartições, apresentará na Câmara

dos Deputados anualmente, logo que esta estiver

reunida, um balanço geral da receita e despesa do

Tesouro Nacional do ano antecedente, e igualmente o

orçamento geral de todas as despesas púbicas do ano

futuro e da importância de todas as contribuições e

rendas públicas”.

Apesar de expresso na Constituição Federal de nosso país, tal dispositivo não foi

implementado à época por ter sido considerado muito avançado. Alguns autores

consideram, então, que a Lei de 14-12-1827 foi a primeira lei de orçamento do Brasil, no

entanto as dificuldades da época em ter mecanismos arrecadadores eficientes nas

províncias, dificuldades de comunicação e conflitos de ordem legal, oriundas do período

colonial, foram consideradas como fatores que frustraram sua implantação.

Os estudiosos apontam, então, que o primeiro orçamento brasileiro teria sido, então,

aquele aprovado pelo Decreto Legislativo de 15-12-1830 que fixava a despesa e orçava a

receita das antigas províncias para o exercício de 1ª-7-1831 a 30-6-1832. (VEIGA FILHO;

MOOJEN, 1959, p.22-3).

A Lei Magna brasileira de 1824 afirmava em seu texto que ao Executivo competia à

elaboração da proposta orçamentária e à Assembléia Geral (Câmara dos Deputados e

Senado) a aprovação da Lei Orçamentária. À Câmara dos Deputados competia ainda à

iniciativa das leis sobre impostos.

Em relação à fiscalização da execução orçamentária, esta é definida de forma vaga no

artigo 37: “Também principiarão na Câmara dos Deputados: 1º. O exame da administração

passada, e reformas dos abusos nela introduzidos”. (GIACOMONI, 2007).

Com a Constituição de 1891, que seguiu à Proclamação da República, houve

importante alteração na distribuição das competências em relação ao orçamento. A

elaboração desse passou a ser função do Congresso Nacional, assim como a tomada de

contas do Poder Executivo. Com essa nova sistemática, coube à Câmara dos Deputados a

iniciativa de elaboração do orçamento público brasileiro, mas como observa Arizio Viana,

ela (a iniciativa) “sempre partiu do gabinete do ministro da Fazenda que, mediante

entendimentos reservados e extra-oficiais, orientava a comissão parlamentar de finanças na

confecção da lei orçamentária”.

Visando auxiliar o Congresso Nacional em sua missão institucional de controle

externo da contas públicas, a Constituição Federal instituiu o Tribunal de Contas da União.

Aqui cabe uma rápida passagem histórica do iminente Rui Barbosa, grande

incentivador o motivador da criação da Corte de Contas, Ministro da Fazenda à época.

Assim assinalou em sua exposição de motivos, no decreto n. 988-A/1890, que preconizou a

criação da citada Corte:

“Convém levantar, entre o poder que autoriza

periodicamente a despesa e o poder que cotidianamente

a executa, um mediador independente, auxiliar de um e

de outro, que, comunicando com a legislatura, e

intervindo na administração, seja, não só o vigia, como

a mão forte da primeira sobre a segunda, obstando a

perpetração das infrações orçamentárias por um veto

oportuno aos atos do Executivo, que direta e indireta,

próxima ou remotamente discrepem da linha rigorosa

da leis de finanças‟.

Nessa mesma época, na República, as antigas províncias transformam-se em Estados

regidos por constituições próprias, o que lhes assegurou grande autonomia. Igualmente, a

primeira constituição republicana que tratou de estender essa autonomia aos Municípios.

(GIACOMONI, 2007).

O Brasil entrou no século XX e ultrapassou suas duas primeiras décadas sem maiores

novidades na questão da organização das finanças públicas. A economia brasileira era

caracterizadamente agroexportadora e a industrialização e a urbanização eram fenômenos

tímidos, a ponto de não exigirem grande atuação do setor público. (GIACOMONI, 2007).

Com a aprovação do Código de Contabilidade da União pelo Congresso Nacional,

em 1922, ordenaram-se os procedimentos orçamentários, financeiros, patrimoniais,

contábeis, etc. Quanto à iniciativa da lei orçamentária, o código legalizou o que já estava

acontecendo, informalmente, na gestão federal. O Executivo fornecia ao Legislativo todos

os elementos para esse exercitasse sua atribuição de iniciar a feitura da lei orçamentária.

Em 16 de julho de 1934, é outorgada uma nova Constituição Brasileira, e a

autonomia dos Estados e o federalismo desenhados pela Carta de 1891 cederam lugar à

centralização da maior parte das funções públicas na área federal. A iniciativa da

elaboração da proposta orçamentária volta a ser do presidente da República, cabendo ao

Congresso Nacional a votação da proposta e o julgamento das contas do presidente,

contanto para tal com o auxílio do Tribunal de Contas da União.

Crises políticas jogaram o País num regime fortemente autoritário, o Estado Novo

gerador de nova Constituição decretada em 10 de novembro de 1937. A elaboração

orçamentária foi tratada com destaque, merecendo um capítulo especial com seis artigos.

Segundo essas disposições, a proposta orçamentária seria elaborada por um departamento

administrativo a ser criado junto à Presidência da República e votada pela Câmara dos

Deputados e pelo Conselho Federal (uma espécie de Senado que contaria também com dez

membros nomeados pelo presidente da República). A verdade é que essas duas câmaras

legislativas nunca foram instaladas e o orçamento federal foi sempre elaborado e decretado

pelo chefe do poder Executivo. (VIANA, 1950).

Já em 1939, o regime estado-novista liquidou com o que restava de autonomia dos

Estados e Municípios ao transferir ao presidente da República a prerrogativa de nomear os

governadores estaduais (Interventores) e a esses a nomeação dos prefeitos. – Decreto-lei

1.202, de 8-4-1939. (GIACOMONI, 2007).

Com o restabelecimento da democracia no país, foi promulgada uma nova

Constituição, em 18 de setembro de 1946. Ela consagrava certos princípios, como o da

unidade, o da universalidade, o da exclusividade e o da especialização, princípios esses até

hoje orientadores do nosso orçamento. O orçamento passou a funcionar nos moldes da

Constituição de 1934, sendo que o Poder Executivo elaborava o projeto de lei orçamentária

e a discussão e votação acontecia no Poder Legislativo. Através de emendas, os

legisladores também participavam da elaboração do orçamento e o papel do Tribunal de

Contas foi evidenciado de forma mais precisa.

A Lei 4320, de 17-3-1964, ainda vigente, produto resultante de inúmeras

colaborações, que estatuiu normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle

dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal,

padronizou o modelo orçamentário para os três níveis de governo, facilitando os

procedimentos contábeis, financeiros e orçamentários nos diversos níveis de gestão

governamental. Essa Lei que foi aprovada com força de lei ordinária em sua época passou

a ter força de Lei Complementar, em diversos de seus artigos, por determinação expressa

da Constituição Federal de 1988. Portanto, hodiernamente, essa lei é considerada

“híbrida”, ou seja, alguns de seus artigos possuem força de lei ordinária; e outros, força de

lei complementar.

Cabe aqui mais um parêntese para melhor compreensão do que diferencia uma lei em

ser ordinária ou ser complementar. Passamos o ensinamento dos Professores Vicente Paulo

e Marcelo Alexandrino: “São duas, portanto, as diferenças entre lei complementar e lei

ordinária: (a) a lei complementar disciplina matérias especificamente a ela reservadas

pelo texto constitucional e (b) o quorum de aprovação”.

Expliquemos melhor o assunto, que é matéria reservada ao ramo do Direito

Constitucional. A primeira distinção é de caráter material, significa dizer que os assuntos a

serem tratados por meio de lei complementar estão expressamente previstos na

constituição. Não cabe ao Presidente da República ou ao Presidente do Poder Legislativo

decidir quais matérias serão tratadas por meio desta lei, visto que a própria Constituição

assim definiu. A segunda distinção, de natureza formal, diz respeito ao processo legislativo

de elaboração de normas: a lei ordinária poderá ser aprovada por maioria simples de votos

(CF, artigo 47), enquanto a lei complementar exige maioria absoluta para sua aprovação

(CF, artigo 69).

Dessa forma os constituintes à época da elaboração do texto constitucional vigente,

previram a necessidade de uma segurança maior para aprovação e/ ou alteração de algumas

matérias por eles elencadas, por isso o caráter mais dificultoso para umas matérias, e

processos menos rigorosos para outros assuntos.

Vencida essa etapa para explicarmos as diferenças entre leis ordinárias e leis

complementares, voltaremos ao assunto almejado nessa pesquisa.

Em 24 de janeiro de 1967 foi publicada a sexta constituição brasileira. A grande

novidade residiu na retirada de prerrogativas do Legislativo quanto à iniciativa de leis ou

emendas que criem ou aumentem despesas, inclusive emendas ao projeto de lei do

orçamento. O texto dessa constituição mostra grande preocupação com a “segurança

nacional”, ostentando tendência de centralização político-administrativo na União e de

ampliação dos poderes do Presidente da República.

O Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967, vigente também até os dias atuais,

disciplina a organização e a reforma administrativa da União. O Planejamento foi definido,

pela primeira vez em nosso ordenamento jurídico, como princípio fundamental e norteador

das atividades da administração federal, tendo como instrumento básico o orçamento-

programa anual e os Programas Gerais, Setoriais, Regionais (todos de duração Plurianual),

o Plano Geral de Governo e a Programação Financeira de Desembolso.

A constituição de 1967 teve curtíssima duração, porque, em 1969, foi editada a EC

nº 01, de 17.10.1969, com entrada em vigor em 30.10.1969.

A EC nº 1/1969, embora formalmente seja uma emenda à Constituição de 1967, é

considerada por muitos constitucionalistas verdadeiramente uma nova Constituição. Nas

palavras do Professor José Afonso da Silva, “a emenda só serviu como mecanismo de

outorga”, ou seja, imposição de novas disposições constitucionais sem consentimento do

parlamento. Uma peculiaridade histórica dessa constituição é que ela se denominava

“Constituição da República Federativa do Brasil”, a de 1967 era, simplesmente,

“Constituição do Brasil”.

A constituição de 1969 alterou diversos artigos da carta de 1967, mas manteve os

dispositivos sobre orçamento, inclusive o que limita a capacidade de iniciativa do

Legislativo em leis que gerem despesas e em emendas ao orçamento quando de sua

discussão. Em alguns aspectos ela aperfeiçoou o processo de elaboração da lei

orçamentária, a fiscalização financeira e orçamentária dos municípios, modificou o sistema

tributário, entre outros assuntos.

Nos anos oitenta iniciaram as pressões no campo político com vistas ao fim do

regime autoritário e à abertura institucional. No biênio 1982/1983, com o agravamento da

crise econômica, ficou evidente a fragilidade da base política do governo, que assistiu às

campanhas de forte conteúdo popular, como a das “diretas já” para Presidente da

República, e a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte.

Em 5 de outubro de 1988, o país recebeu, então, sua oitava constituição. O tema

orçamento foi fortemente discutido entre os constituintes, pois era visto como símbolo dos

privilégios perdidos durante o período autoritário. Novos conceitos e regras foram

introduzidos, bem com a confirmação de princípios e normas já consagrados.

Entre as inovações, podemos citar a exigência de, anualmente, o Executivo

encaminhar ao Legislativo, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias com o objetivo de

orientar a elaboração da lei orçamentária. Assunto esse que será melhor explicado no item

cinco deste trabalho.

Tabela 01 – Constituições Brasileiras e o Processo de Elaboração e Aprovação

Constituições Quem Elabora Quem Aprova

1824 Poder Executivo Poder Legislativo

1892 Poder Legislativo Poder Legislativo

1934 Poder Executivo Poder Legislativo

1937 Poder Executivo Poder Executivo

1946 Poder Executivo Poder Legislativo

1967 Poder Executivo Poder Legislativo

1969 Poder Executivo Poder Executivo

1988 Poder Executivo Poder Legislativo

3. Evolução conceitual do Orçamento Público.

A evolução conceitual do orçamento público acompanha o desenvolvimento e o

progresso realizados no mundo, com fito de aperfeiçoar a qualidade da distribuição de

renda entre as pessoas, o inter-relacionamento entre as funções de planejar e executar o

orçamento, e o melhor controle sobre os gastos realizados pelos governantes. Podemos

dividir a evolução do orçamento em:

3.1 - Orçamento Tradicional.

Processo orçamentário em que apenas uma dimensão do orçamento é explicitada,

qual seja, o objeto de gasto. Também é conhecido como Orçamento Clássico.

No orçamento tradicional ou clássico constavam apenas a fixação da despesa e a

previsão da receita, sem nenhuma espécie de planejamento das ações do governo. Era peça

meramente contábil–financeira, um documento de previsão de receita e de autorização de

despesas.

Neste tipo de orçamento não havia preocupação com a realização dos programas de

trabalho do governo, preocupando-se apenas com as necessidades dos órgãos públicos para

realização das suas tarefas, sem preocupação em questionar sobre objetivos e metas a

serem atingidos.

3.2 - Orçamento de desempenho ou por realizações.

Sucessor natural do orçamento clássico foi o orçamento de desempenho ou por

realizações. Neste tipo de orçamento, o gestor começa a se preocupar com o resultado dos

gastos e não apenas com o gasto em si, ou seja, preocupa-se agora em saber “as coisas que

o governo faz e não as coisas que o governo compra”. Apesar de ser um passo importante,

o orçamento de desempenho ainda se encontra desvinculado de um planejamento central

das ações do governo.

3.3 - Orçamento-Programa.

O orçamento - programa foi introduzido no Brasil através da Lei 4320/64 e do

decreto–lei 200/67. O orçamento–programa pode ser entendido como um plano de

trabalho, um instrumento de planejamento da ação do governo, através da identificação dos

seus programas de trabalho, projetos e atividades, além dos estabelecimentos de objetivos e

metas a serem implementados, bem como a previsão dos custos relacionados.

A CF/88 implantou definitivamente o orçamento-programa no Brasil, ao

estabelecer a normatização da matéria orçamentária através do Plano Plurianual - PPA, da

Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e da Lei Orçamentária Anual - LOA, ficando

evidente o extremo zelo do constituinte para com o planejamento das ações do governo.

3.4 - Orçamento de base zero ou por estratégia.

Técnica utilizada para a confecção do orçamento–programa, que consiste

basicamente em uma análise crítica de todos os recursos solicitados pelos órgãos

governamentais. Neste tipo de abordagem, na fase de elaboração da proposta orçamentária,

haverá um questionamento acerca das reais necessidades de cada área, não havendo

compromisso com qualquer montante inicial de dotação.

Os órgãos governamentais deverão justificar anualmente, na fase de elaboração da

sua proposta orçamentária, a totalidade de seus gastos, sem utilizar o ano anterior como

valor inicial mínimo.

3.5 - Orçamento Participativo.

Caracteriza-se por uma participação direta e efetiva das comunidades na elaboração

da proposta orçamentária do governo.

Orçamento Participativo (OP) é um mecanismo governamental de democracia

participativa que permite aos cidadãos influenciar ou decidir sobre os orçamentos públicos,

geralmente o orçamento de investimentos de prefeituras municipais, através de processos

de participação cidadã. Esses processos costumam contar com assembléias abertas e

periódicas e etapas de negociação direta com o governo. No Orçamento Participativo

retira-se poder de uma elite burocrática repassando-o diretamente para a sociedade. Com

isso a sociedade civil passa a ocupar espaços que antes lhe eram "furtados".

Com diferentes metodologias em cada município em que o OP é executado, suas

assembléias costumam ser realizadas em sub-regiões municipais, bairros ou distritos, em

discussões temáticas e/ou territoriais, elegendo também delegados que representarão um

tema ou território nas negociações com o governo.

Esses delegados formam um Conselho anual que além de dialogar diretamente com

os representantes da prefeitura sobre a viabilidade de executar as obras aprovadas nas

assembléias, também irão propor reformas nas regras de funcionamento do programa e

definirão as prioridades para os investimentos, de acordo com critérios técnicos de carência

de serviço público em cada área do município.

4. Orçamento Impositivo versus Orçamento Autorizativo.

Assunto de grande controvérsia atualmente sobre o orçamento público é ser o seu

caráter meramente autorizativo ou efetivamente impositivo. A corrente governamental

dominante difundiu a concepção de que o orçamento é necessariamente autorizativo, o que,

na prática, tem reduzido o Congresso Nacional a um papel decorativo na aprovação do

orçamento, pois o Executivo, além do poder de veto, pode simplesmente não executar

despesas, sem razão aparente ou justificativa fundamentada. Contingenciando dotações e

retendo liberações financeiras, o Executivo direciona o orçamento segundo seus próprios

interesses e conveniências, sem ter de prestar contas de sua gestão.

De outra sorte, no caráter efetivamente impositivo, o Poder Legislativo tornar-se-ia

mais forte, pois caberia a ele definir as prioridades de gastos do governo, sendo obrigatória

a sua execução, pelo Poder Executivo, dos programas alocados no orçamento. Defensores

dessa tese descrevem que o sistema de repartição de poderes, instituído na CF/88, não seria

ferido, pois ao Poder Executivo caberia realizar projetos e programas já acordados,

discutidos, aprovados e formalizados por leis específicas, de comum acordo com as

aspirações do povo.

A questão não é pacifica entre os Poderes Executivo e Legislativo, pois dela deriva

o poder de decisão em implementar, complementar ou executar ou não determinada

política pública. Há interpretações doutrinárias positivas e negativas para os dois lados,

mas, mesmo assim, diante de toda essa controvérsia, é pacifico dizer que a opção brasileira

é pelo caráter meramente autorizativo.

Nossos legisladores pátrios, através da Assembléia Constituinte instaurada para

promulgar a Carta Magna de 1988, optaram em fornecer ao chefe Poder Executivo uma

margem de manobra para lidar com a execução da peça orçamentária, não a engessando.

Assim, cabe ao chefe do Executivo delimitar as ações e programas, que conforme sua

conveniência, devem ou não fazer parte de seu plano de governo para o exercício corrente,

não necessitando executar toda gama de projetos colocados a sua disposição.

5. O Processo Orçamentário Atual – Constituição e 1988.

O atual estágio do processo de elaboração, aprovação, execução, avaliação e controle

do planejamento orçamentário pátrio compreende a edição de três leis ordinárias, todas a

cargo do Poder Executivo, com posterior aprovação do Poder Legislativo:

Plano Plurianual – PPA;

Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO;

Lei Orçamentária Anual – LOA.

Esse processo orçamentário, denominado doutrinariamente de ciclo orçamentário,

desempenha a possibilidade de o Estado interligar o planejamento à execução

orçamentária, que tem as seguintes fases: planejamento (elaboração e aprovação),

execução, avaliação e controle. Ao todo, o ciclo orçamentário atual não se destina somente

a um exercício financeiro, que corresponde à previsão e execução da receita e fixação e

execução da despesa do ano corrente. O processo orçamentário começa muito antes,

quando da abertura das agendas políticas, a cargo das eleições para o comando do Poder

Executivo e dos assentos nas cadeiras do Poder Legislativo e termina no ano seguinte a

execução de cada Lei Orçamentária Anual, quando da auditoria externa, no setor público

denominado Controle Externo, exercido pelo Tribunal de Contas da União, órgão que

auxilia o Congresso Nacional, na missão de fiscalizar os dinheiros e patrimônios públicos.

A própria Constitucional Federal - CF expressamente descreve em seu artigo 71,

caput: “O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido como o auxílio

do Tribunal de Contas da União” (...).

Todo esse arcabouço foi elaborado de forma a possibilitar a melhor administração,

gerencia, guarda e utilização dos recursos que entram na conta do governo, com o intuito

de financiar as políticas públicas, que irão satisfazer aos anseios da sociedade brasileira.

Para melhor compreensão, faz-se necessário delinearmos detalhadamente os

pormenores das leis que fazem parte do nosso ciclo orçamentário, conforme abaixo:

O plano plurianual – PPA é instrumento de planejamento de médio prazo, que

estabelece as diretrizes, os objetivos e as metas do governo para os projetos e programas de

longa duração, para um período de quatro anos. Nenhuma obra de grande vulto ou cuja

execução ultrapasse um exercício financeiro (01 de janeiro a 31 de dezembro) pode ser

iniciada sem prévia inclusão no plano plurianual.

A Constituição Federal - CF em seu artigo 165, parágrafo 1º assim estabelece: “A lei

que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes,

objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras

delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada”.

Mais à frente, a CF, no artigo 167, parágrafo 1º, descreve: “Nenhum investimento

cuja execução ultrapasse um exercício financeiro poderá ser iniciado sem prévia inclusão

no plano plurianual, ou sem lei que autorize a inclusão, sob pena de crime de

responsabilidade”.

Inserto nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, artigo 35,

parágrafo 2º, inciso I, da CF as normas a serem seguidas pela União, sobre exercício

financeiro, vigência, prazos, elaboração e organização: “O projeto do plano plurianual,

para vigência até o final do primeiro exercício financeiro do mandato presidencial

subseqüente, será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do primeiro

exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da sessão legislativa”.

Infere-se desse dispositivo constitucional que o Projeto de Plano Plurianual deve ser

enviado pelo Poder Executivo ao Poder Legislativo até 31 de agosto e o Poder Legislativo

tem até o dia 22 de dezembro para apreciar, emendar, votar, aprovar e devolver o plano

plurianual ao Poder Executivo para fins de sanção e publicação. Essas datas são

determinadas pela própria CF, quando menciona em seu artigo 57, caput: “O Congresso

nacional reunir-se-á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de

1ª de agosto a 22 de dezembro”.

O autor Francisco Glauber Lima Mota descreve em sua obra Contabilidade Aplicada

ao Setor Público:

Desse trecho do ADCT também se depreende que o

plano plurianual representa uma lei de vigência

quadrienal, ou seja, quatro anos. Ele é elaborado no

primeiro ano de mandato do chefe do Poder Executivo,

para vigorar desde o segundo ano do mandato atual até

o primeiro ano do mandato subseqüente, representando

uma forma de entrelaçar os mandatos. Então, seu

período de execução não coincide exatamente com o do

mandato do chefe do Poder Executivo. Segundo as

regras atuais, que são transitórias, pois determinadas

pelo ADCT, enquanto um mandatário no primeiro ano

de seu governo encerra o PPA de seu antecessor,

elabora seu próprio PPA para execução nos três anos

restantes, ficando um ano para ser executado pelo seu

sucessor. Essa regra deve vigorar até a entrada em

vigor de uma lei complementar que estabeleça regras

permanentes, conforme determinado pelo artigo 165 da

CF. Essa lei complementar é conhecida como „nova lei

4320‟, porque deve tratar de Direito Financeiro.

Para finalizarmos, colocamos abaixo o nome das quatro edições de PPA que o país já

teve.

Tabela 02 – Planos Plurianuais editados na esfera federal.

Vigência Chefe do Poder Executivo Nome do PPA

1996-1999 Fernando Henrique Cardoso Brasil em Ação

2000-2003 Fernando Henrique Cardoso Avança Brasil

2004-2007 Luiz Inácio Lula da Silva Brasil de Todos

2008-2011 Luiz Inácio Lula da Silva Desenvolvimento com Inclusão Social e

Educação de Qualidade

A lei de diretrizes orçamentárias - LDO define as metas e prioridades do governo

para o ano seguinte, orienta a elaboração da lei orçamentária anual, dispõe sobre alterações

na legislação tributária e estabelece a política das agências de desenvolvimento (Banco do

Nordeste, Banco do Brasil, BNDES, Banco da Amazônia, etc.). Também fixa limites para

os orçamentos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público e dispõe sobre

os gastos com pessoal. A Lei de Responsabilidade Fiscal remeteu à LDO diversos outros

temas, como política fiscal, contingenciamento dos gastos, transferências de recursos para

entidades públicas e privadas e política monetária.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias é o elo de ligação entre o planejamento (Plano

Plurianual) e a ação governamental (Lei Orçamentária Anual). Ela é responsável pela

interligação entre o que o governo planejou para os seus quatro anos de mandato e o que

efetivamente vai realizar em cada ano civil. Para exemplificar, podemos citar que entre os

planos de governo existe a meta de construir 1.000.000 (um milhão) de casas durante seus

quatro anos mandato. A Lei de Diretrizes Orçamentárias vai definir quantas casas serão

construídas por ano, isto é, pode-se dividir o total de casas a serem construídas pelos

quatro anos de mandato, sendo construídas, dessa forma, 250.000 (duzentas mil) casas por

ano, ou simplesmente definir que no primeiro ano serão construídas 400.000 (quatrocentas

mil) casas, no segundo, 300.000 (trezentas mil) residências, no terceiro ano, nenhuma casa,

e no quarto ano mais 300.000 (trezentas mil) moradias.

Ou seja, o chefe do Poder Executivo tem o condão de decidir, conforme sua

conveniência e seu interesse, se realizará o programa e de que forma irá conduzi-lo,

podendo até não implementar a política pública, se assim decidir. No exemplo dado,

poderia não ser construída nenhuma casa durante os quatro anos de seu governo caso fosse

sua opção. Daí surge a grande controvérsia, comentada no item 04 deste trabalho, entre os

Poderes Executivo e Legislativo, sobre ser o orçamento meramente autorizativo ou

efetivamente impositivo. Discussões acaloradas não faltam sobre o tema, conforme já

descrito no item 04.

Ainda sobre a LDO, a CF, artigo 165, parágrafo 2º, assim descreve sobre a Lei de

Diretrizes Orçamentárias: “lei de diretrizes orçamentárias compreenderá as metas e

prioridades da administração pública federal, incluindo as despesas de capital para o

exercício financeiro subseqüente, orientará a elaboração da lei orçamentária anual,

disporá sobre as alterações na legislação tributária e estabelecerá a política de aplicação

das agências financeiras oficiais de fomento”.

O ADCT, artigo 35, parágrafo 2º, inciso II, da CF orienta sobre o exercício

financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização: “O projeto de lei de

diretrizes orçamentárias será encaminhado até oito meses e meio antes do encerramento

do exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento do primeiro período

da sessão legislativa”.

Portanto, o projeto da lei de diretrizes orçamentárias deverá ser enviado pelo poder

Executivo ao Congresso Nacional até o dia 15 de abril, e este tem até o dia 17 de julho para

apreciar, emendar, votar, aprovar e devolver ao Poder Executivo para fins de sanção e

publicação.

Sobre o tema, ainda, assevera a CF, no artigo 57, parágrafo 2: “A sessão legislativa

não será interrompida sem a aprovação do projeto de lei de diretrizes orçamentárias”.

Significa dizer que o Congresso Nacional não poderá entrar em recesso parlamentar no

período de julho enquanto não aprovar a LDO.

Mas grande novidade introduzida pela LRF para elaboração da LDO, foi determinar a

inclusão do Anexo de Metas Fiscais e do Anexo de Riscos Fiscais, instrumentos esses de

controle de gastos e o endividamento governamental como abaixo mencionado:

“Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias

Anexo de Metas Fiscais, em que são estabelecidas

metas anuais, em valores correntes e constantes,

relativas a receitas, despesas, resultado nominal e

primário e montante da dívida pública, para o

exercício a que se referirem e para os dois seguintes.

(LRF, artigo 4º, parágrafo 1º).

(...)

A lei de diretrizes orçamentárias conterá Anexo de

Riscos Fiscais, onde serão avaliados os passivos

contingentes e outros riscos capazes de afetar as

contas públicas, informando as providências e serem

tomadas, caso se concretizem. (LRF, artigo, 4º,

parágrafo 3)”.

A lei de diretrizes orçamentárias - LDO é novidade introduzida pela Constituição

Federal de 1988, e tem como principal objetivo fazer o elo de ligação entre o planejamento

(PPA) e a execução orçamentária (LOA), de forma a representar uma só unidade entre

planejamento e execução de um governo. A nova visão gerencial da administração pública

pátria vem exigindo esforços cada vez maiores de nossos representantes eleitos,

principalmente, do Poder Executivo, no sentido de convergir os interesses partidários ou

pessoais aos interesses da sociedade. Isso só se alcança se os instrumentos de planejamento

e execução estiverem interligados através de normas e regulamentos que dêem efetivação a

sua unidade.

Na lei orçamentária anual (LOA) estão estimadas as receitas que serão arrecadadas

durante o exercício financeiro e fixadas as despesas que o governo espera realizar. A LOA

contém três orçamentos, conforme previstos na Constituição Federal: o orçamento fiscal, o

orçamento da seguridade social (previdência social, assistência social e saúde) e o

orçamento de investimentos das empresas estatais. O projeto de lei orçamentária é

elaborado pela Secretaria de Orçamento Federal (SOF) e encaminhado ao Congresso

Nacional pelo Presidente da República.

A CF, no artigo 165, parágrafo 5º e seus incisos descreve sobre a lei orçamentária

anual (LOA):

“A lei orçamentária anual compreenderá:

I – o orçamento fiscal referente aos Poderes da

União, seus fundos, órgãos e entidades da

administração direta e indireta, inclusive fundações

instituídas e mantidas pelo Poder Público;

II – o orçamento de investimento das empresas em

que a União, direta e indiretamente, detenha a

maioria do capital social com direito a votos;

III – o orçamento da seguridade social, abrangendo

todas as entidades e órgãos e ela vinculados, da

administração direta ou indireta, bem como os fundos

e fundações instituídos e mantidos pelo Poder

Público”. (grifo nosso).

A lei 4.320/64 em seu artigo 2º tratou a lei do orçamento estabelecendo que: “A lei

do Orçamento conterá a discriminação da receita e despesa, de forma a evidenciar a

política econômico-financeira e o programa de trabalho do Governo, obedecidos os

princípios da unidade, universalidade e anualidade”.

O autor Francisco Glauber Lima Mota nos ensina com primazia essa passagem:

“Pode afirmar que, desses dois comandos legais, as

receitas e despesas contempladas nas esferas fiscal e

seguridade social são registradas de acordo com as

regras da Lei 4.320/64, empregando as técnicas da

Contabilidade Aplicada ao Setor Público. Enquanto as

receitas e despesas constantes da esfera de

investimentos das estatais são contabilizadas em

atenção aos preceitos da Lei nº 6.404/76 (Contabilidade

Aplicada à Atividade Empresarial)”.

Tabela 03 – Regras Contábeis a serem aplicadas às esferas da Lei Orçamentária Anual

Esfera da Lei Orçamentária ﴾

Fiscal

﴿ Lei 4.320/64 Seguridade

Social

Investimentos das Estatais ﴿

Lei 6.404/76

O ADCT, artigo 35, parágrafo 2º, inciso III, da CF descreve sobre o exercício

financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização: “O projeto de lei da

orçamentária da União será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do

exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da primeira sessão

legislativa”.

Desprende-se do citado dispositivo que o projeto da lei orçamentária anual deverá ser

enviado pelo poder Executivo ao Poder Legislativo até o dia 31 de agosto, e este tem até o

dia 22 de dezembro para apreciar, emendar, votar, aprovar e devolver ao Poder Executivo

para fins de sanção e publicação.

Outras determinações são emanadas da Carta Maior, como vedação ao início de

programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual (artigo 167, inciso I). As

emendas aos projetos de lei do orçamento anual ou aos projetos de créditos adicionais

somente podem ser aprovadas caso sejam compatíveis com o plano plurianual e com a lei

de diretrizes orçamentárias, de conformidade com o artigo 166, parágrafo 3º, inciso I.

Para melhor visualização de como é a estrutura do orçamento anual, elaboramos um

orçamento de forma simplifica, apenas para efeitos didáticos, conforme abaixo.

Tabela 04 – Quadro ilustrativo da Lei Orçamentária Anual

Abaixo construímos, também, uma tabela com o nome dos projetos de leis, que

fazem parte de nosso ciclo orçamentário, com os prazos de envio e de retorno entre os

Poderes Executivo e Legislativo.

RECEITAS DESPESAS

Fiscal 600 Fiscal 450

Seguridade Social 300 Seguridade Social 350

Investimentos das Estatais 500 Investimentos das Estatais 600

TOTAL 1400 TOTAL 1400

Tabela 05 – Datas limites para entrega e devolução dos projetos de lei que versam sobre

planejamento e orçamento.

Projetos de

Leis

Datas de Envio para o

Poder Legislativo

Datas de Devolução para

o Poder Executivo

PPA 31 de agosto 22 de dezembro

LDO 15 de abril 17 de julho

LOA 31 de agosto 22 de dezembro

Considerações Finais

O trabalho abrangeu de forma clara e objetiva a evolução do orçamento público

brasileiro destacando as principais passagens da história mundial e brasileira sobre o tema.

Destaca-se que muito se avançou desde os tempos primórdios até os dias atuais, sendo os

Estados Unidos da América, a Inglaterra e a França os precursores do orçamento público

no mundo, sempre preocupados com aprimoramento de sua elaboração, execução e

avaliação, com a finalidade de reduzir ou até mesmo eliminar o desperdício de dinheiros

públicos, que é o ponto mais sensível da relação entre os governantes e os cidadãos.

Discorreu-se, também, sobre a evolução conceitual do orçamento desde o orçamento

tradicional, passando pelo orçamento de desempenho, orçamento-programa, orçamento

base-zero, até chegarmos ao orçamento participativo, em que nos quatro primeiros o

cidadão era posto de lado, não tendo poder nenhum de decisão sobre o gasto do governo; e

hoje, no orçamento participativo, ajuda ativamente na elaboração da peça orçamental,

tendo, sua voz, o poder de decidir em que programa de governo o governante aloca os

recursos que detém para realizar as políticas públicas. Essa participação efetiva do cidadão

na elaboração e acompanhamento dos gastos do governo é o ponto máximo de um Estado

Direito.

Passada essa fase, discorremos sobre o modelo brasileiro, o orçamento impositivo ou

orçamento autorizativo, detalhamos os conceitos de cada um dos dois institutos e

concluímos que mesmo com o antagonismo existente entre as duas correntes, nosso país

adota o sistema de orçamento autorizativo, em que o governante tem a opção de executar

ou não uma política pública já aprovada pelo Poder Legislativo.

Descreveu-se como o orçamento é elaborado em nosso país atualmente, quais são as

competências e interações entre os Poderes Executivo e Legislativo (poder de elaborar,

emendar e aprovar a lei orçamentária). Demonstrou-se que o sistema orçamentário é

composto por três leis, todas com iniciativa do chefe do Poder Executivo. São elas: o Plano

Plurianual (PPA) que estabelece as diretrizes, os objetivos e as metas do governo para um

período de quatro anos; a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que funciona como o elo

de ligação entre o planejamento (PPA) e a execução do orçamento (LOA), ou seja, essa lei

busca no Plano Plurianual, dentre os vários programas de governo, os que serão realizados

no ano seguinte, funcionando como um direcionador, delimitando as metas e prioridades

do governo; e a Lei Orçamentária Anual (LOA), que é responsável pela execução do que

foi planejado e direcionado nas leis anteriores, isto é, esta lei é quem vai determinar quais

os programas que realmente serão executados.

Por fim, este artigo tentou abranger toda a história do orçamento público de forma

sintética, pontuando os principais fatos históricos, mas não teve a pretensão de esgotar todo

o assunto, visto que o tema requer estudos mais aprofundados, inclusive sob o ponto de

vista jurídico, que demandaria, com certeza, um outro tipo de análise.

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