almanaque do cinema

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ÉRICO MARCELO MARCELO BORGO FORLANI HESSEL HISTÓRIAS, CURIOSIDADES E GRANDES NOMES DA SÉTIMA ARTE

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Page 1: Almanaque do Cinema

ÉRICO MARCELO MARCELO

BORGO FORLANI HESSEL

O OMELETE começou de certa forma no final da década

de 1980, com a amizade de ÉRICO BORGO e MARCELO

FORLANI, que se conheceram na oitava série. Nerds da

classe, passavam as tardes na banca perto do colégio ou

no cinema do bairro, sem a menor ideia de que todas

aquelas sessões de Caça-Fantasmas e De Volta Para o

Futuro um dia renderiam o maior site de entretenimento

do Brasil. A faculdade, porém, fez com que seguissem

caminhos diferentes – Érico foi fazer design gráfico e

Marcelo seguiu a carreira de publicitário. Eventualmente,

acabaram no mesmo ramo, a criação de sites para a

nascente internet, e se reencontraram. Com o desejo

de trabalhar juntos, começou oficialmente em 2000 o

site OMELETE.COM.BR. Pouco mais de um ano depois,

MARCELO HESSEL, jornalista e crítico, começou a cola-

borar para o site, graças a um convite feito em um curso

de crítica, e foi “bromance” à primeira vista. Com os três

na edição do Omelete, o que era um projeto independente

e feito nas horas vagas começou a render frutos. Hoje o

maior website do gênero do país e um dos poucos

mundialmente reconhecidos pela indústria do cinema,

o Omelete tem 1 milhão de leitores por mês, ganhou um

programa em vídeo semanal e agora gera um livro, este

Almanaque do Cinema que você tem em mãos.

WWW.ALMANAQUEDOCINEMA.COM.BR

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H I S T Ó R I A S , C U R I O S I D A D E S E G R A N D E S N O M E S D A S É T I M A A R T E

ÉRICO

BORGOMARCELO

FORLANIMARCELO

HESSEL

A INTERNET MUDOU NOSSO JEITO DE VER CINEMA.Se antes as informações chegavam pelas poucasrevistas especializadas e pelos jornais, hoje é possívelacompanhar passo a passo a criação de um filme.Nesse cenário, há poucos sites que oferecem o que oOmelete dá a seus leitores: uma cobertura que nadadeve aos principais sites de entretenimento do mundo.

Desde o início, no entanto, quando Érico Borgo eMarcelo Forlani tocavam o Omelete de suas casas,ficou claro o que tornava o site tão distinto: o gostopela coisa. Mais que meramente um trabalho feito por fãs e para fãs, os editores do site, agora ao lado do crítico de cinema Marcelo Hessel e de uma onda de colaboradores que foram chegando, elevaram o trabalho a outro patamar.

A soma disso tudo é o livro que você tem em mãos. O resultado é um impressionante e detalhadopasseio pela história do cinema, em que descobrimosfatos inusitados, mistérios não resolvidos, grandes personagens e, além disso, um vislumbre privilegiadodos mecanismos internos da indústria cinematográfica,década por década, dos irmãos Lumière ao mais recenteblockbuster hollywoodiano. Os autores nos conduzempor uma trama tão bem amarrada que renderia – e porque não? – um belo documentário em longa-metragem.

Há duas maneiras de encarar este volume. Uma é seguindo página a página, cronologicamente, o fio proposto pelos autores. A outra maneira, de acordocom a tradição dos melhores almanaques, é aleatória:abrindo o livro num trecho qualquer, o leitor encontrará curiosidades, números, dados e, quem sabe, um novofilme favorito. De ambos os jeitos, o resultado seráo mesmo: ótima diversão.

Alan Smithee, cineasta

Page 2: Almanaque do Cinema

A NOITE DOS MORTOS-VIVOS (Night of the Living Dead, 1968)

direção GEORGE A. ROMERO. roteiro GEORGE A. ROMERO E JOHN A. RUSSO. com JUDITH O’ DEA, RUSS STREINER, DUANE JONES, KARL HARDMAN, KEITH WAYNE, JUDITH RIDLEY E MARILYN EASTMAN.

O primeiro longa-metragem do pai dos zumbis modernos, feito com apenas 100 mil dólares,

era agressivamente realista se comparado com a inspiração gótica e barroca da maioria dos fil-

mes B de monstros de então. A ideia de George Romero era mostrar como um fenômeno inex-

plicável, sobrenatural, pode afetar qualquer pessoa normal a qualquer momento. Os irmãos

Barbara (Judith O’Dea) e Johnny (Russ Streiner), por exemplo, estavam simplesmente visitando

o túmulo do pai em um cemitério quando mortos-vivos saem do chão e matam Johnny a den-

tadas. Barbara se refugia em uma casa e lá percebe que outros também estão sendo vítimas

do misterioso evento. As ousadas insinuações sociais propostas por Romero estão na sua forma

de filmar – o realismo nos aproxima do terror, tanto que depois do relançamento do filme, em

1969, ele começou a ser visto como um libelo contra a Guerra do Vietnã – e também no roteiro,

como a escolha de fazer do ator Duane Jones o primeiro herói negro de que se tem notícia no

cinema americano. A crítica social se inflamaria na quase-continuação Amanhecer dos Mortos

(Dawn of the Dead, 1978), que rivaliza em importância com o clássico de 1968.

O BANDIDO DA LUZ VERMELHA (1968) direção e roteiro ROGÉRIO SGANZERLA. com PAULO VILLAÇA, HELENA IGNEZ E JOSÉ MARINHO.

O Brasil vivia o auge do Cinema Novo quando, aos 22 anos, Rogério Sganzerla realizou o seu pri-

meiro longa-metragem – que imediatamente verbalizou o descontentamento de outros cineas-

tas que, no ano do AI-5 e da intensificação do regime militar, não acreditavam mais na ideia de

nação (e de um cinema nacional unido e instituído) que os cinemanovistas pregavam. Com O

Bandido da Luz Vermelha surgiu, então, o Cinema Marginal, originado na boêmia e violenta re-

gião do centro de São Paulo, conhecida como Boca do Lixo, e não havia figura mais emblemática

desse abandono à própria sorte do que o matador de mulheres (vivido no filme por Paulo Vil-

laça) inspirado no verdadeiro João Acácio Pereira da Costa, o bandido que abordava suas vítimas

com uma lanterna vermelha. A exemplo de outro clássico, O Demônio das Onze Horas (Pierrot

le Fou, 1965), de Jean-Luc Godard, Sganzerla usou seu filme para colecionar referências – da mú-

sica erudita, da cultura popular, do gênero policial – e ordená-las de forma desestruturada. Era,

nas palavras do diretor, um faroeste do Terceiro Mundo. O filme encontrou impensável reper-

cussão entre o público, apesar do discurso de Sganzerla (e depois de todo o Cinema Marginal)

deixar claro já no texto do filme que sua arte não fazia concessões: “Quem não pode nada tem

mais é que avacalhar”.

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Page 3: Almanaque do Cinema

O PODEROSO CHEFÃO (The Godfather, 1972)

direção e roteiro FRANCIS FORD COPPOLA. com AL PACINO, MARLON BRANDO, JAMES CAAN, JOHN CAZALE, ROBERT DUVALL, TALIA SHIRE, ABE VIGODA E DIANE KEATON.

Que o maior filme americano dos últimos quarenta anos

tenha um dia saído do papel foi um feito. A Paramount

já estava sem opções quando entregou a direção ao no-

vato Francis Ford Coppola. Pelo menos meia dúzia de

atores foi cogitada para o papel de Michael Corleone,

até que outro novato, Al Pacino, pegasse a vaga. Marlon

Brando não facilitava – o próprio reconhece que atuou

o filme inteiro lendo cartões com suas falas, às vezes co-

lados no peito de seus coadjuvantes – e o diretor, por

vezes, tinha um substituto pronto ao seu lado caso ele,

Coppola, fosse sumariamente demitido. O que se vê na

tela, porém, não é esse equilíbrio limítrofe, mas uma

afinação insuspeita. A história do caçula da família

mafiosa (Pacino) que, depois de uma ameaça à vida do

Don (Brando), precisa manter a casa de pé contra o as-

sédio das famílias nova-iorquinas rivais é genial sob

todas as leituras: tradição versus modernidade, drama

íntimo versus vocação épica. Ah, e tem o maior número de

cenas e falas lembradas e imitadas da história do cinema.

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Page 4: Almanaque do Cinema

TUBARÃO (Jaws, 1975)

direção STEVEN SPIELBERG. roteiro CARL GOTTLIEB E PETER BENCHLEY (LIVRO). com ROY SCHEIDER, ROBERT SHAW, RICHARD DREYFUSS, LORRAINE GARY E MURRAY HAMILTON.

Tubarão foi o primeiro filme a superar os 100milhões de dó-

lares em bilheterias nos Estados Unidos, marca batida dois

anos depois por Star Wars, e pensando hoje é incrível cons-

tatar que a obra-prima de Steven Spielberg era, acima de

tudo, insinuação. O espetáculo, de fato, está na construção

do suspense, desde a trilha mínima de John Williams até a

decisão de esconder o peixe, o máximo possível, simples-

mente porque o monstro mecânico de 3 toneladas mal fun-

cionava. O contexto familiar que se tornou uma das marcas

do diretor já estava presente: o chefe de polícia Martin Brody

(Roy Scheider) acaba de se mudar com a mulher e dois filhos

de Nova York para a litorânea Amity Island, onde acha que

pode fazer a diferença como homem da lei. Pena que seja

hidrófobo, porque uma ameaça com uma mandíbula for-

rada de caninos está avançando nos veranistas (entre eles,

claro, um dos filhos do chefe Brody). O herói e pai supera

seus medos com a ajuda de dois parceiros de pescaria – não

por acaso, dois opostos, o oceanógrafo racional com seus

sonares e o lobo do mar passional com suas cicatrizes de

guerra. Aos 80 minutos de filme, enfim, o tubarão bota os

olhos para fora da água pela primeira vez, e sabemos que

Brody vai precisar de toda ajuda, além de um barco maior.

NOIVO NEURÓTICO, NOIVA NERVOSA (Annie Hall, 1977)

direçãoWOODY ALLEN. roteiroWOODY ALLEN E MARSHALL BRICKMAN. comWOODY ALLEN, DIANE KEATON, TONY ROBERTS, CAROL KANE, PAUL SIMON E COLLEEN DEWHURST.

Já virou clichê dizer que o melhor da carreira de Woody

Allen está nos anos 1970, e não é difícil entender o porquê

vendo uma das cenas de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa,

quando Alvy Singer (Allen) começa a discutir com um su-

jeito, na fila do cinema, que se diz especialista na obra se-

miótica de Marshall McLuhan e, para prová-lo errado, Alvy

puxa McLuhan em pessoa para a discussão! Que comédia,

hoje em dia, se aventuraria em algo assim? De certa forma,

Allen estava ciente da atual banalização da arte e da dis-

cussão intelectual, tanto que boa parte das suas piadas no

filme está voltada contra a indústria da TV, do cinema e dos

gurus existenciais da Califórnia. Essa imagem do judeu

neurótico e estudado que, sufocado por seu conhecimento,

não consegue relaxar e gozar (não consegue sequer pôr

uma lagosta dentro da panela...) é definidora de uma par-

cela da sociedade de Nova York e o grande legado de Woody

Allen à comédia hollywoodiana. Aliás, antes de ganhar a

presença luminosa e espontânea de Diane Keaton, cuja

personagem se impõe a ponto de dar nome ao filme, Annie

Hall se chamava Anhedonia (de anedonia, a incapacidade

de ter prazer ou se divertir).

“Gort! Klaatu barada nikto!” HELEN BENSON (PATRICIA NEAL)

O Dia em que a Terra Parou (The Day the Earth Stood Still, 1951)

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Page 6: Almanaque do Cinema

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Page 7: Almanaque do Cinema

GUERRA NAS ESTRELAS (Star Wars, 1977)

direção e roteiro GEORGE LUCAS. com MARK HAMILL, HARRISON FORD, ANTHONY DANIELS, CARRIE FISHER, PETER CUSHING, ALEC GUINNESS, KENNY BAKER, PETER MAYHEW E DAVID PROWSE.

Poucos filmes são tão importantes para o cinema de massa como o conhecemos hoje (uma disputa de cifras

entre produtos colecionáveis voltados para adolescentes) quanto o longa depois renomeado Star Wars: Epi-

sódio IV – Uma Nova Esperança. Dos faroestes, George Lucas cunhou o pistoleiro solitário Han Solo. Das tra-

gédias gregas, tirou um jovem aspirante a herói com contas freudianas a acertar com o pai. Dos samurais

de Akira Kurosawa (influência confessa de George Lucas), pegou o design do capacete de Darth Vader e sua

habilidade como espadachim. Adicione aí a construção de uma mitologia toda particular e um esforço qui-

xotesco para criar efeitos especiais à frente de seu tempo e temos uma salada sem igual. Que essa salada

tenha resistido ao tempo (ao contrário das aventuras espaciais da literatura pulp dos anos 1930) e definido

o chamado filme arrasa-quarteirão – aqueles que geram expectativa antes da estreia e muito dinheiro com

licenciamentos depois dela – é uma dessas combinações de fatores que só mesmo as estrelas explicam.

“Eu sou grande! São os filmes que ficaram pequenos” NORMA DESMOND (GLORIA SWANSON)

Crepúsculo dos Deuses (Sunset Blvd, 1950)

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Page 8: Almanaque do Cinema

ALIEN, O OITAVO PASSAGEIRO (Alien, 1979)

direção RIDLEY SCOTT. roteiro DAN O’BANNON E RONALD SHUSETT. com SIGOURNEY WEAVER, TOM SKERRITT, VERONICA CARTWRIGHT, YAPHET KOTTO, HARRY DEAN STANTON, JOHN HURT E IAN HOLM.

O pôster deste misto de ficção científica e filme de terror já traz, naquela que é uma

das mais famosas frases de marketing da história do cinema, o aviso fundamental:

“No espaço, ninguém pode ouvi-lo gritar”. Se a corrida espacial estimula em muita

gente o medo do desconhecido, então o diretor inglês Ridley Scott lhes dá mais um

motivo para o pânico: de volta para a Terra, depois de uma missão espacial, os tripu-

lantes da nave Nostromo são despertos de sua hibernação para atender a um sinal de

um planeta próximo. Sem saber, o capitão Dallas (Tom Skerritt) traz uma bizarra cria-

tura que agarra o rosto de Kane (John Hurt). A tenente Ellen Ripley (Sigourney Weaver)

já avisava: não é seguro trazer Kane de volta à nave. Ninguém a escuta e, momentos

depois, irrompe da barriga do hospedeiro um monstro alienígena, naquela que é uma

das cenas mais famosas (e medonhas) do gênero, e o horror está instalado na Nos-

tromo. Scott trabalha a criação de expectativa de forma exemplar com luz baixa – como

se Steven Spielberg um dia ousasse fazer um Contatos Imediatos de Terceiro Grau (Close

Encounters of the Third Kind, 1977) com o suspense de um Tubarão (Jaws, 1975) – e ainda

dá espaço a uma interpretação interessante: nesta ficção, é um homem que pariu o

“bebê”, e é uma mulher, a heroica Ripley, que cuida de “educá-lo”.

TOURO INDOMÁVEL (Raging Bull, 1980)

direção MARTIN SCORSESE. roteiro MARTIN SCORSESE, MARDIK MARTIN, PAUL SCHRADER, JOSEPH CARTER(LIVRO), PETER SAVAGE (LIVRO) E JAKE LAMOTTA (LIVRO). com ROBERT DE NIRO, CATHY MORIARTY, JOE PESCI, FRANKVINCENT, NICHOLAS COLASANTO, THERESA SALDANA E JOHNNY BARNES.

Em documentários e livros, Martin Scorsese sempre reitera seu lado cinéfilo. Touro In-

domável, à parte a evidência de ser um dos melhores filmes de esporte da história,

pode ser visto como uma compilação dessas referências que ajudaram a moldar o es-

tilo de Scorsese – desde a fotografia em preto e branco e os barracos em família típicos

do neorrealismo até citações literais, como o monólogo final de Jake La Motta, tirado do

personagem de Marlon Brando em Sindicato de Ladrões (On the Waterfront, 1954).

Diante de um espelho, bem depois do fim da sua carreira, o La Motta de Robert De Niro,

com muita maquiagem e 22quilos mais gordo (é lendária a história de que a produção

foi suspensa por meses para que o ator engordasse, uma das transformações físicas

mais famosas e radicais de Hollywood), repete para si mesmo que “poderia ter sido al-

guém”. Scorsese pega a história real desse boxeador que não soube administrar o pró-

prio temperamento e a transforma em um de seus dramas violentos sobre um

ítalo-americano marginalizado em Nova York em busca de redenção – outra referência

fundamental na obra do diretor. No caso, uma autorreferência.

“O senhor é um fanfarrão!”CAPITÃO NASCIMENTO (WAGNER MOURA)

Tropa de Elite (2007)

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OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA (Raiders of the Lost Ark, 1981)

direção STEVEN SPIELBERG. roteiroWILLARD HUYCK, LAWRENCE KASDAN, GEORGE LUCAS E PHILIP KAUFMAN. com HARRISON FORD, KAREN ALLEN, DENHOLM ELLIOTT, PAUL FREEMAN, WOLF KAHLER, JOHN RHYS-DAVIES, RONALD LACEY, ANTHONY HIGGINS E ALFRED MOLINA.

Ao conceber o arqueólogo que, quando não estava dando aulas, preferia colocar

a própria vida em risco em expedições no meio do nada, o produtor George Lucas

e o diretor Steven Spielberg tinham em mente homenagear os filmes seriados

da Republic Pictures dos anos 1930 e 1940. Como tais, a ideia era criar aventura

barata, entretenimento sem compromisso. Por que não começar o filme, pensaram,

já com uma cena de ação? O que era ousadia em 1981, já que a regra exigia que

se apresentassem os personagens apropriadamente, hoje se tornou lei – sob

pena de perder o interesse do espectador antes da marca de dez minutos de me-

tragem. Aliás, a expressão em inglês “cut to the chase” (algo como “vamos ao que

interessa”) foi tirada do cinema e literalmente quer dizer “corta para a persegui-

ção”. Como narrador, Spielberg tem a paternidade inconteste do pique dos filmes

de Indiana Jones, mas a série não existiria sem Lucas. Foi ele que, quando Spiel-

berg estava cogitando dirigir um filme de James Bond, no fim dos anos 1970, con-

venceu o amigo dizendo que tinha criado “um herói melhor, um James Bond sem

toda aquela tralha tecnológica”.

CURTINDO A VIDA ADOIDADO (Ferris Bueller’s Day Off, 1986)

direção e roteiro JOHN HUGHES. com MATTHEW BRODERICK, ALAN RUCK, MIA SARA, JEFFREY JONES, JENNIFER GREY, CINDY PICKETT, LYMAN WARD, EDIE MCCLURG E CHARLIE SHEEN.

Como Ferris Bueller (Matthew Broderick) diz diretamente para a câmera logo ao

perceber que o sol matinal está bonito demais para ser desperdiçado na escola,

ele não acredita em “ismos”, ele crê em si mesmo. Naquela manhã teria uma

prova sobre socialismo europeu, “mas eu não sou europeu, nem pretendo me tor-

nar”, defende-se. Não é por acaso que o roteirista e diretor John Hughes é tido

como o grande historiógrafo da geração 1980. O fim das ideologias, o processo

pós-1968, que culminaria na queda do Muro de Berlim, em 1989, está todo con-

tido no moicano punk que Ferris Bueller faz com o xampu de zoeira no banho.

Esse subtexto não é discreto – entre a hora em que pega a Ferrari do amigo e a

que rouba a cena cantando Twist and Shout, o gazeteiro sempre fala diretamente

à câmera para tecer seus comentários “sérios”. O fato é que Hughes está, no

fundo, mais interessado em acompanhar como esse pensador infalível influencia

seu amigo fraco e pessimista, Cameron (Alan Ruck), um tipo muito mais interes-

sante, dramaticamente, do que Bueller. É Cameron a grande síntese dos enfermos

anos 1980, e a luta de Hughes é justamente por animá-lo a aproveitar a vida, não

importando o dia ou o momento.

“Carpe diem. Aproveitem o dia, rapazes. Façam de suas vidas algo extraordinário” JOHN KEATING (ROBIN WILLIAMS)

Sociedade dos Poetas Mortos (Dead Poets Society, 1989)

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Page 10: Almanaque do Cinema

ÉRICO MARCELO MARCELO

BORGO FORLANI HESSEL

O OMELETE começou de certa forma no final da década

de 1980, com a amizade de ÉRICO BORGO e MARCELO

FORLANI, que se conheceram na oitava série. Nerds da

classe, passavam as tardes na banca perto do colégio ou

no cinema do bairro, sem a menor ideia de que todas

aquelas sessões de Caça-Fantasmas e De Volta Para o

Futuro um dia renderiam o maior site de entretenimento

do Brasil. A faculdade, porém, fez com que seguissem

caminhos diferentes – Érico foi fazer design gráfico e

Marcelo seguiu a carreira de publicitário. Eventualmente,

acabaram no mesmo ramo, a criação de sites para a

nascente internet, e se reencontraram. Com o desejo

de trabalhar juntos, começou oficialmente em 2000 o

site OMELETE.COM.BR. Pouco mais de um ano depois,

MARCELO HESSEL, jornalista e crítico, começou a cola-

borar para o site, graças a um convite feito em um curso

de crítica, e foi “bromance” à primeira vista. Com os três

na edição do Omelete, o que era um projeto independente

e feito nas horas vagas começou a render frutos. Hoje o

maior website do gênero do país e um dos poucos

mundialmente reconhecidos pela indústria do cinema,

o Omelete tem 1 milhão de leitores por mês, ganhou um

programa em vídeo semanal e agora gera um livro, este

Almanaque do Cinema que você tem em mãos.

WWW.ALMANAQUEDOCINEMA.COM.BR

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ÉRICO

BORGOMARCELO

FORLANIMARCELO

HESSEL

A INTERNET MUDOU NOSSO JEITO DE VER CINEMA.Se antes as informações chegavam pelas poucasrevistas especializadas e pelos jornais, hoje é possívelacompanhar passo a passo a criação de um filme.Nesse cenário, há poucos sites que oferecem o que oOmelete dá a seus leitores: uma cobertura que nadadeve aos principais sites de entretenimento do mundo.

Desde o início, no entanto, quando Érico Borgo eMarcelo Forlani tocavam o Omelete de suas casas,ficou claro o que tornava o site tão distinto: o gostopela coisa. Mais que meramente um trabalho feito por fãs e para fãs, os editores do site, agora ao lado do crítico de cinema Marcelo Hessel e de uma onda de colaboradores que foram chegando, elevaram o trabalho a outro patamar.

A soma disso tudo é o livro que você tem em mãos. O resultado é um impressionante e detalhadopasseio pela história do cinema, em que descobrimosfatos inusitados, mistérios não resolvidos, grandes personagens e, além disso, um vislumbre privilegiadodos mecanismos internos da indústria cinematográfica,década por década, dos irmãos Lumière ao mais recenteblockbuster hollywoodiano. Os autores nos conduzempor uma trama tão bem amarrada que renderia – e porque não? – um belo documentário em longa-metragem.

Há duas maneiras de encarar este volume. Uma é seguindo página a página, cronologicamente, o fio proposto pelos autores. A outra maneira, de acordocom a tradição dos melhores almanaques, é aleatória:abrindo o livro num trecho qualquer, o leitor encontrará curiosidades, números, dados e, quem sabe, um novofilme favorito. De ambos os jeitos, o resultado seráo mesmo: ótima diversão.

Alan Smithee, cineasta