rastreabilidade de campos magnéticos alternados · rastreabilidade de campos magnéticos...

7
Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN 1* ; Diego Joriro NAZARRE 2 ; Bruno Ferreira ANTUNES 3 1,2,3 Laboratório de Metrologia Elétrica Instituto de Pesquisas Tecnológicas, IPT-SP São Paulo, Brasil * [email protected] Resumo—A calibração de bobinas de referência é a forma mais direta de propagar a rastreabilidade de padrões primários de indução magnética para outros instrumentos de medida de campos magnéticos. Neste trabalho serão abordados alguns aspectos da utilização e calibração destas bobinas, com ênfase na geração de campos magnéticos alternados. Palavras-chave: rastreabilidade magnética; calibração; bobinas de referência; campos magnéticos ac I. INTRODUÇÃO Campos magnéticos alternados com frequências e intensidades bem determinadas são essenciais para a execução de ensaios de susceptibilidade e calibração de medidores empregados na área de compatibilidade eletromagnética. Estes campos são gerados por bobinas de referência. Bobinas de Helmholtz são usualmente utilizadas para este fim, pois permitem a obtenção de campos uniformes em volumes bem maiores do que aqueles gerados por bobinas de geometrias mais simples, como os solenóides. A calibração das bobinas de referência é a forma mais direta de dar continuidade à cadeia de rastreabilidade das grandezas magnéticas como intensidade de campo, indução e momento magnético. De forma geral, o emprego de bobinas de referência abrange aplicações em que os campos magnéticos variam na faixa de intensidades de 10 nT até 10 mT (o campo geomagnético é da ordem de dezenas de μT) e frequências desde dc até 1 MHz. O passo inicial para a obtenção das características dinâmicas, ou comportamento ac da bobina, é a sua caracterização estática ou dc. O padrão primário para esta caracterização é baseado no fenômeno da ressonância magnética nuclear RMN [1], que permite obter, em termos de frequência, a rastreabilidade para a intensidade de campo. A constante giromagnética do próton é a constante física que relaciona a intensidade do campo com a frequência RMN [2]. II. PARÂMETROS DE CARACTERIZAÇÃO A correta utilização de bobinas de referência requer uma caracterização prévia, através de alguns parâmetros listados a seguir: A. Constante da bobina É o parâmetro mais significativo, definido como a intensidade da densidade de fluxo magnético ou indução magnética B resultante da aplicação de uma corrente I: K BOB = B / I (1) A unidade de K BOB é T/A. A constante da bobina também pode ser definida em temos de intensidade de campo H, e neste caso K’ BOB será expresso na unidade m -1 : K’ BOB = H / I (2) K’ BOB = K BOB / μ 0 (3) B. Resposta em frequência A curva de resposta dinâmica relaciona a intensidade do campo gerado em função da frequência. Naturalmente o campo não é apenas determinado pela bobina, mas também pela fonte de excitação. Um diagrama de Bode com K BOB em função da frequência permite conhecer a intensidade do campo gerado a partir da medida da corrente em um shunt ac. C. Deriva térmica e Estabilidade dimensional A não ser que os enrolamentos da bobina sejam supercondutores, haverá geração de calor devido à resistência elétrica dos fios. Se este calor não for eficientemente dissipado por ventilação forçada ou refrigeração líquida, a bobina terá uma temperatura de equilíbrio para cada valor rms de corrente aplicada Dependendo dos materiais construtivos, o equilíbrio térmico pode levar horas para ser atingido, causando uma deriva temporal na intensidade do campo gerado. A elevação de temperatura terá dois efeitos, e ambos contribuem para a diminuição do campo: 1. Aumento da resistência ôhmica dos enrolamentos, que pode ser desconsiderada no caso da utilização de fontes de corrente com amplitude constante: R (T)= R 0 α(T-T 0 ) (4) α coeficiente térmico de resistividade 2. Dilatação térmica do suporte e dos enrolamentos, o que diminui o campo gerado, alterando a constante da bobina: K BOB (T)= K BOB0 β(T-T 0 ) (5) β coeficiente térmico de dilatação D. Campo máximo Além da capacidade da fonte de alimentação, a máxima intensidade de campo gerado pela bobina depende da máxima Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI. Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI.

Upload: lydan

Post on 12-Oct-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac)

Ramon Valls MARTIN 1*; Diego Joriro NAZARRE 2; Bruno Ferreira ANTUNES 3 1,2,3 Laboratório de Metrologia Elétrica

Instituto de Pesquisas Tecnológicas, IPT-SP São Paulo, Brasil

* [email protected]

Resumo—A calibração de bobinas de referência é a forma mais

direta de propagar a rastreabilidade de padrões primários de indução magnética para outros instrumentos de medida de campos magnéticos. Neste trabalho serão abordados alguns aspectos da utilização e calibração destas bobinas, com ênfase na geração de campos magnéticos alternados.

Palavras-chave: rastreabilidade magnética; calibração; bobinas de referência; campos magnéticos ac

I. INTRODUÇÃO

Campos magnéticos alternados com frequências e intensidades bem determinadas são essenciais para a execução de ensaios de susceptibilidade e calibração de medidores empregados na área de compatibilidade eletromagnética. Estes campos são gerados por bobinas de referência. Bobinas de Helmholtz são usualmente utilizadas para este fim, pois permitem a obtenção de campos uniformes em volumes bem maiores do que aqueles gerados por bobinas de geometrias mais simples, como os solenóides. A calibração das bobinas de referência é a forma mais direta de dar continuidade à cadeia de rastreabilidade das grandezas magnéticas como intensidade de campo, indução e momento magnético. De forma geral, o emprego de bobinas de referência abrange aplicações em que os campos magnéticos variam na faixa de intensidades de 10 nT até 10 mT (o campo geomagnético é da ordem de dezenas de µT) e frequências desde dc até 1 MHz. O passo inicial para a obtenção das características dinâmicas, ou comportamento ac da bobina, é a sua caracterização estática ou dc. O padrão primário para esta caracterização é baseado no fenômeno da ressonância magnética nuclear RMN [1], que permite obter, em termos de frequência, a rastreabilidade para a intensidade de campo. A constante giromagnética do próton é a constante física que relaciona a intensidade do campo com a frequência RMN [2].

II. PARÂMETROS DE CARACTERIZAÇÃO

A correta utilização de bobinas de referência requer uma caracterização prévia, através de alguns parâmetros listados a seguir:

A. Constante da bobina

É o parâmetro mais significativo, definido como a intensidade da densidade de fluxo magnético ou indução magnética B resultante da aplicação de uma corrente I:

KBOB = B / I (1)

A unidade de KBOB é T/A. A constante da bobina também pode ser definida em temos de intensidade de campo H, e neste caso K’BOB será expresso na unidade m-1:

K’BOB = H / I (2)

K’BOB = KBOB / µ0 (3)

B. Resposta em frequência

A curva de resposta dinâmica relaciona a intensidade do campo gerado em função da frequência. Naturalmente o campo não é apenas determinado pela bobina, mas também pela fonte de excitação. Um diagrama de Bode com KBOB em função da frequência permite conhecer a intensidade do campo gerado a partir da medida da corrente em um shunt ac.

C. Deriva térmica e Estabilidade dimensional

A não ser que os enrolamentos da bobina sejam supercondutores, haverá geração de calor devido à resistência elétrica dos fios. Se este calor não for eficientemente dissipado por ventilação forçada ou refrigeração líquida, a bobina terá uma temperatura de equilíbrio para cada valor rms de corrente aplicada Dependendo dos materiais construtivos, o equilíbrio térmico pode levar horas para ser atingido, causando uma deriva temporal na intensidade do campo gerado. A elevação de temperatura terá dois efeitos, e ambos contribuem para a diminuição do campo:

1. Aumento da resistência ôhmica dos enrolamentos, que pode ser desconsiderada no caso da utilização de fontes de corrente com amplitude constante:

R (T)= R0 α(T-T0) (4)

α – coeficiente térmico de resistividade

2. Dilatação térmica do suporte e dos enrolamentos, o que diminui o campo gerado, alterando a constante da bobina:

KBOB (T)= KBOB0 β(T-T0) (5)

β – coeficiente térmico de dilatação

D. Campo máximo

Além da capacidade da fonte de alimentação, a máxima intensidade de campo gerado pela bobina depende da máxima

Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI.

Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI.

Page 2: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

temperatura de trabalho admissível. Esta temperatura não deve atingir níveis que provoquem deformações irreversíveis, ou danos na isolação dos condutores. Em condições de operação críticas, a temperatura deverá ser monitorada.

E. Uniformidade de campo

Este parâmetro mede a homogeneidade do campo na região central da bobina (volume de trabalho). Haverá uma limitação no máximo gradiente de intensidade do campo gerado para observação de sinais de RMN, pois a relação sinal / ruído deteriora-se rapidamente com a não uniformidade do campo. Para medir o gradiente utilizam-se posicionadores lineares e sensores magnéticos de baixo ruído. Normalmente são usados magnetômetros tipo fluxgate, capazes de medir espacialmente pequenas variações de intensidade, da ordem de ppm / cm.

F. Perfil de intensidades e decaimento externo

O perfil de intensidades de campo, em função da posição axial da bobina, permite delimitar a sua região de trabalho. Além disto, também é interessante verificar o comportamento do campo no exterior da bobina. Quanto mais intenso for seu decaimento externo, mais imune será a bobina em relação à presença de materiais condutores e ferromagnéticos nas suas proximidades.

III. MÉTODOS DE CALIBRAÇÃO ESTÁTICA

A primeira etapa para a obtenção da rastreabilidade ac é a calibração estática, ou a determinação da constante KBOB da bobina de referência para correntes contínuas. Alguns métodos são listados a seguir:

A. Medida direta

É a forma mais simples para determinar KBOB . Basta medir o campo gerado no centro da bobina pela passagem de uma corrente constante. Podem ser usados magnetômetros fluxgate, gaussímetros, ou outro instrumento com calibração rastreada. A incerteza será dada pelo medidor de campo e pelo amperímetro.

B. Padrão primário

Se o instrumento de medição de campo for um magnetômetro absoluto RMN, a rastreabilidade da intensidade de campo é assegurada em freqüência [3], [4]. A incerteza em KBOB é limitada basicamente pela medição de corrente já que a magnetometria RMN é extremamente precisa com incertezas abaixo de 1 ppm.

C. Cálculo através de parâmetros dimensionais

Os campos gerados por bobinas com geometrias simples, como solenóides ou Helmholtz, podem ser calculados analiticamente através de suas dimensões. Simulações numéricas podem ser utilizadas para geometrias mais complexas. Trata-se de um método indireto, com grande incerteza envolvida.

D. Superposição

Quando a falta de homogeneidade da bobina a ser calibrada não permite a utilização de magnetometria RMN,

pode-se recorrer à outra bobina de referência de qualidade superior e previamente calibrada. As duas bobinas são montadas coaxialmente, levando à coincidência dos seus centros geométricos. As bobinas são alimentadas por fontes de corrente independentes. No centro do arranjo é posicionado um detector de zero, como um fluxgate. A determinação de KBOB é feita diretamente pela relação entre as intensidades das correntes aplicadas. O alinhamento das bobinas tem importante contribuição na determinação das incertezas deste método.

IV. CALIBRAÇÃO DINÂMICA

A constante da bobina KBOB praticamente não se altera para baixas frequências de operação, quando a parcela reativa da impedância da bobina é essencialmente indutiva. Com o aumento da frequência, os efeitos de capacitâncias e correntes parasitas, além do efeito skin, modificam o valor desta constante. Para obter a rastreabilidade dinâmica, a partir da estática, é necessário medir a variação de KBOB em função da frequência. Bobinas de referência com geometria simples têm curvas típicas, que apresentam um patamar plano desde o regime contínuo até frequências próximas à sua ressonância, quando ocorre um pico seguido de grande atenuação.

Para traçar o diagrama de Bode, a bobina é alimentada com uma corrente senoidal, e o campo resultante é medido com uma pequena bobina de sinal ou pick-up. Esta bobina deverá ser calibrada em termos do produto do número de espiras pela área ou NA. Naturalmente a resposta dinâmica desta bobina deverá ser muito melhor do que a da bobina de referência. Através da curva característica de impedância em função da frequência, obtida com uma ponte RLC Quadtech, modelo 1920, pode-se estimar rapidamente a resposta em frequência do pick-up. Um exemplo é mostrado na Fig. 1. Para minimizar o efeito de não linearidades é necessário limitar a frequência máxima de operação do pick-up. Conservadoramente, fixamos este limite em um décimo da frequência de ressonância. Neste caso, o limite é de aproximadamente 20 kHz.

Figura 1: Curva de impedância em função da frequência para uma bobina

pick-up: R=24,7 Ω; L=1,96 mH; N = 300; NA=0,0603 m2.

Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI.

Trabalho parcialmente financiado com recursos da Rede SIBRATEC/COMPMAG do MCTI.

f ressonância = 210 kHz

10

100

1000

10000

100000

10 100 1000 10000 100000 1000000Frequência, f (Hz)

Imp

ed

ân

cia

to

tal,

Z

t (

oh

ms

)

Page 3: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

O sinal senoidal induzido no pick-up VPIC é aplicado a um amplificador lock-in para medir a sua fase e amplitude VPIC 0. A intensidade da indução magnética B0 é determinada através de VPIC 0:

(6)

(7)

A corrente na bobina (IBOB ) pode ser medida diretamente com um shunt ac, e a constante da bobina é obtida por:

(8)

Caso não seja disponível um shunt ac com resposta em frequência adequada para medir IBOB , pode-se determinar KBOB utilizando a medida da tensão na bobina VBOB , e a impedância total da bobina ZT. A impedância pode ser medida diretamente com uma ponte RLC em toda faixa de frequências, ou estimada com os valores de resistência e indutância em baixa frequência, como em (10).

(9)

(10)

Após a determinação de KBOB , um dado valor de indução magnética pode obtido ajustando IBOB (modo corrente) ou VBOB (modo tensão) segundo (11).

(11)

V. BOBINAS DE REFERÊNCIA Há uma grande variedade de configurações possíveis para bobinas de referência com núcleo de ar. Neste trabalho serão analisadas as características de três tipos bem distintos, com um, dois e seis enrolamentos. A tabela 1 fornece alguns dados destas bobinas. Nos gráficos da Fig. 2 são mostradas as medições feitas com ponte RLC de resistência, indutância, e módulo e fase da impedância total. O seu aspecto é mostrado na Fig. 3. A bobina compensada tem seis enrolamento ligados em série e polaridades opostas, de forma a otimizar a homogeneidade do campo interno e simultaneamente minimizar o campo externo de espalhamento [5].

Tabela 1. Características das bobinas utilizadas.

Tipo Núm. Enrol.

RDC

(Ω) L @ 100Hz

(mH) KBOB DC (mT /A)

Bmáx (mT)

Pmáx (W)

Solenóide 1 24,45 24,59 37,6 35 15 Helmholtz 1par 14,50 39,69 2,01 2,5 22 Compensada 3 pares 289,7 2510 7,87 3,5 54

10

100

1000

10000

100000

1000000

10 100 1000 10000 100000 1000000

Frequência, f (Hz)

Re

sist

ên

cia

rie

, R

s (o

hm

s) Compensada

Helmholtz

Solenóide

-0.8

-0.6

-0.4

-0.2

0.0

0.2

0.4

0.6

0.8

10 100 1000 10000 100000 1000000

Frequência, f (Hz)

Ind

utâ

nci

an

cia

rie

, Ls

(H

)

Compensada: Ls / 10

Helmholtz

Solenóide

10

100

1000

10000

100000

1000000

10 100 1000 10000 100000 1000000

Frequência, f (Hz)

Imp

ed

ân

cia

to

tal,

Zt

( o

hm

s )

Compensada

Helmholtz

Solenóide

-90.00

-60.00

-30.00

0.00

30.00

60.00

90.00

10 100 1000 10000 100000 1000000

Frequência, f (Hz)

Fase

de

Zt

( g

rau

s )

Compensada

Helmholtz

Solenóide

Figura 2: Parâmetros elétricos das bobinas geradoras de campo ac. De cima para baixo: Resistência série, RBOB; indutância série, LBOB; impedância

total, ZT; fase da impedância total.

tNABdt

dBNA

dt

dNVPIC ωω

φcos0===

fNA

VB

PIC

π20

0 =

NAI

VK

BOB

PIC

BOBω

=

NAfV

ZVK

BOB

TPIC

BOBπ2

=

( ) ( )22 2 BOBSHUNTBOBT fLRRZ π++=

T

BOB

BOBBOBBOBZ

VKIKB ==

Page 4: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

Figura 3: Da esquerda para a direita: Bobina compensada, bobina solenóide, e

bobina de Helmholtz.

VI. IMPLEMENTAÇÃO DO SISTEMA DE

MEDIÇÃO AC

Na Fig. 4 é apresentado o arranjo experimental utilizado na calibração de bobinas ac. Um gerador senoidal fornece o sinal para um amplificador de banda larga marca Amplifier Research modelo 40AD1, que alimenta a bobina. A corrente é medida por um shunt ac marca Guildline modelo 7320. As tensões são monitoradas com multímetros marca HP modelo 34401A e osciloscópios. A bobina de pick-up, descrita na Fig. 1, é conectada a um amplificador lock-in marca Stanford modelo SR530. Aplicativos em Lab View controlam os instrumentos e a aquisição de dados. Uma questão prática refere-se ao tipo de fonte de alimentação. Amplificadores de transcondutância ou fontes ac operando em modo corrente seriam desejáveis, mas quando conectados à cargas predominantemente indutivas, apresentam comportamento instável em frequências elevadas. Outro problema da operação em modo corrente é a grande amplitude de tensão necessária para manter uma corrente de alta frequência na carga indutiva: V=2πfLI. Devido a estes inconvenientes é comum o emprego de amplificadores e fontes ac operando em modo tensão. Neste caso, a intensidade do campo gerado e o sinal induzido no pick-up terão o aspecto mostrado na Fig. 5. O número de espiras do pick-up deve ser ajustado para maximizar a relação sinal / ruído, porém o número máximo é limitado pela indutância resultante. O aumento da indutância diminui a frequência de ressonância, que deve ser mantida bem acima da máxima frequência de operação. É interessante construir um conjunto de bobinas pick–up otimizadas para cada faixa de frequências de medição.

VII. RESULTADOS EXPERIMENTAIS

Para determinar KBOB em regime ac, é necessário medir ZT, IBOB, VPIC, e VBOB . ZT já foi apresentado na Fig. 2. As demais medidas foram feitas simultaneamente e são mostradas nas Fig. 6 e 7. Nota-se uma atenuação na tensão sobre as bobinas VBOB , pois em baixas frequências a impedância indutiva da bobina diminui, e com uma corrente IBOB maior, também aumenta a queda de tensão sobre a impedância de

saída (série) do amplificador de potência. O campo magnético é obtido através de (7) com o sinal do pick-up VPIC . A Fig. 8 mostra este resultado. Finalmente KBOB é calculado com (8) para o caso da medição direta de corrente com um shunt, ou com (9) na medida indireta sem shunt. O resultado destes dois métodos, apresentado na Fig. 9, é praticamente o mesmo em baixas frequências, mas difere para as altas frequências.

Para a correta utilização das bobinas de referência é preciso determinar a máxima frequência operacional. Para facilitar a análise do desempenho dinâmico, KBOB deve ser normalizado em relação ao seu valor estático KBOB dc , ou um valor médio em baixas frequências:

KREL(f) = KBOB(f) / KBOB(f0 ) (12)

Figura 4: Arranjo experimental para calibração de bobinas ac.

Resistência total = 100 ohms

Tensão da fonte = 100 Vp

Kbob = 1 mT/A

0

0.2

0.4

0.6

0.8

1

1.2

10 100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

Induçã

o m

agnéti

ca, B

(m

T)

L=0,001 H

L=0,01 H

L=0,1 H

L = 0,01 H

0.0001

0.001

0.01

0.1

1

10 100 1000 10000 100000

Frequência, f (Hz)

Te

nsã

o i

nd

uzi

da

no

pic

k-u

p,

Vp

ic (

V)

NA=84,8 mm2

NA=848 mm2

NA=8480 mm2

Figura 5: Acima, campo gerado por bobinas alimentadas por fonte de

tensão ac com amplitude constante. Abaixo, sinal induzido no pick-up com diferentes valores de N x A e bobina geradora de 0,01 H.

Page 5: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

Figura 6: Acima, VPIC , sinal induzido na bobina pick-up. Abaixo, VBOB ,

tensão aplicada pelo amplificador de potência à bobina geradora de campo.

I = Vshunt / R shunt

0.00001

0.0001

0.001

0.01

0.1

1

10 100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

Co

rre

nte

na

bo

bin

a, I b

ob

( A

rm

s )

Helmholtz shunt

Solenóide shunt

Compensada shunt

I = Vbob / Zt

0.00001

0.0001

0.001

0.01

0.1

1

10 100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

Co

rre

nte

na

bo

bin

a, I b

ob

( A

rm

s )

Helmholtz

Solenóide

Compensada

Figura 7: Corrente na bobina IBOB medida direta através de shunt no gráfico acima, e por método indireto, usando a impedância, no gráfico abaixo.

Figura 8: Indução magnética medida com pick-up.

K bob com I = Vshunt / Rshunt

0.0001

0.0010

0.0100

0.1000

1.0000

10 100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

K b

ob

( T

/ A

)

Helmholtz

Solenóide

Compensada

K bob com I = V bob / Zt

0.0001

0.0010

0.0100

0.1000

1.0000

10 100 1000 10000 100000

Frequência, f (Hz)

K b

ob

( T

/ A

)

Helmholtz

Solenóide

Compensada

Figura 9: Comportamento dinâmico das constantes das bobinas. Acima, com medida direta de corrente com shunt. Abaixo, com medida de corrente pela

impedância ZT .

Optando pelo valor médio em torno de 100 Hz para a normalização, foram obtidas as curvas da Fig. 10. As frequências operacionais máximas são determinadas estabelecendo um desvio máximo no valor de KREL. Adotando um limite de 5%, estas frequências serão: 3100 Hz para a bobina compensada, 4500 Hz para o solenóide, e 13000 Hz para a bobina de Helmholtz.

Se a temperatura da bobina for monitorada, correções posteriores com (4) e (5) também podem ser aplicadas. Este procedimento reduz as incertezas originadas nas mudanças de temperatura ambiente e no autoaquecimento, principalmente quando a bobina é operada em campos intensos com grande dissipação de potência.

1.E-07

1.E-06

1.E-05

1.E-04

1.E-03

1.E-02

10 100 1000 10000 100000

Frequência, f (Hz)

Ind

ução

ou

cam

po

gera

do

, B

( T

)

Helmholtz

Solenóide

Compensada

0.001

0.010

0.100

1.000

10 100 1000 10000 100000

Frequência, f (Hz)

Sin

al n

o p

ick

-up

, V

PIC

( V

rm

s ) Helmholtz

Solenóide

Compensada

Page 6: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN

I = Vf / Zt

0.90

0.95

1.00

1.05

1.10

1.15

1.20

1.25

1.30

1.35

1.40

1.45

1.50

100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

K rel = K

bob / K b

ob e

m 1

00Hz

Helmholtz

Solenóide

Compensada

I = Vshunt /R shunt

0.90

0.95

1.00

1.05

1.10

1.15

1.20

1.25

1.30

1.35

1.40

1.45

1.50

100 1000 10000 100000Frequência, f (Hz)

K r

el = K

bob / K b

ob e

m 1

00H

z

Helmholtz

Solenóide

Compensada

Figura 10: Detalhe da constante da bobina normalizada KREL para a frequência de 100 Hz . Acima, a constante determinada com a corrente medida através da

própria impedância da bobina, e abaixo com o auxílio de um shunt. Nota-se que o shunt não funciona adequadamente nas frequências mais elevadas, nas quais a bobina de Helmholtz ainda opera. A medida de corrente é a principal fonte de incertezas para a determinação do desempenho dinâmico das bobinas. Desenvolvimentos futuros deste trabalho incluem métodos para avaliação dinâmica de bobinas sem a necessidade de medir diretamente a corrente ou o campo gerado: A parcela reativa da impedância muda substancialmente ao se aproximar da ressonância. Assim, comparando-se a impedância total dada na Fig. 10 com a impedância definida em (10), e usando os valores fixos para RBOB e LBOB dados na Tab. 1, chega-se ao gráfico da Fig. 11. Estes resultados têm o mesmo aspecto daqueles da Fig. 10, com a vantagem de utilizar apenas a ponte RLC. Programas interlaboratoriais utilizam gráficos semelhantes aos mostrados na Fig. 10 para a apresentação dos dados. O gráfico da Fig. 12 é o resultado de uma comparação em que um solenóide monocamada foi circulado por vários laboratórios europeus. O PTB, instituto nacional de metrologia alemão, forneceu a amostra, e foi o laboratório de referência.

0.90

0.95

1.00

1.05

1.10

1.15

1.20

1.25

1.30

1.35

1.40

1.45

1.50

100 1000 10000 100000

Frequência, f (Hz)

Zt

/

Zt

0

Compensada

Helmholtz

Solenóide

Figura 11. Comparação entre a impedância total ZT medida continuamente, e

a impedância ZT 0 definida em (10 ) utilizando valores fixos de resistência e indutância a 100 Hz.

Figura 12: Resultado de programa de comparação interlaboratorial

envolvendo diversos institutos metrológicos europeus.

IV. CONCLUSÕES E FUTUROS DESENVOLVIMENTOS

A rastreabilidade de campos magnéticos alternados,

gerados por bobinas de referência com núcleo de ar, parte da calibração estática destas bobinas. Nesta calibração é determinada a constante que relaciona o campo produzido e a corrente de alimentação. Esta relação se altera quando a frequência de operação se aproxima da ressonância característica da bobina. A etapa seguinte é a determinação do desempenho ac, onde é feita a verificação da faixa de frequências na qual a constante da bobina se mantém dentro de limites pré-estabelecidos de incerteza. Foram feitas algumas observações em relação à operação destas bobinas, e expostos alguns métodos para a realização da caracterização ac. A maior fonte de incertezas encontra-se na medida da corrente ac, principalmente em frequências elevadas. Naturalmente o campo pode ser medido diretamente por uma bobina pick-up, enquanto a corrente é ajustada, mas neste caso a incerteza estará limitada pela calibração do produto N x A do pick-up.

A continuidade deste trabalho seguirá com o aperfeiçoamento do arranjo experimental e dos procedimentos. Serão construídas novas bobinas pick-up com amplificadores integrados para minimizar o ruído captado. As incertezas envolvidas nos procedimentos de calibração serão avaliadas detalhadamente. Finalmente, deverão prosseguir os estudos de métodos alternativos para medir o desempenho ac de bobinas, utilizando apenas dados relativos às suas impedâncias.

.

REFERÊNCIAS

[1] K. Weyand, Maintenance and Dissemination of the Magnetic Field Unit at PTB, IEEE I-M, 50, 2, pp 470-473, April 2001.

[2] Mohr P J and Taylor B N 1999 CODATA “Recommended Fundamental

Physical Constants” 1998 J. Phys. Chem. Ref. Data 26 1213-1852

[3] R. V. Martin, Desenvolvimento de Padrão de Referência para Indução Magnética, Anais 7º CBMAG, Momag, B Horizonte, ago 2006.

[4] R. V. Martin, Implementação de Sistema para Obtenção de Rastreabilidade de Grandezas Magnéticas Estáticas, Anais 6º Congresso Brasileiro de Metrologia, Natal, set 2011.

[5] J. Lüdke, H. Ahlers, M. Albrecht, “Novel Compensated Moment Detection Coil”, IEEE Trans. Magn. 2007, 43, 3567

Page 7: Rastreabilidade de campos magnéticos alternados · Rastreabilidade de campos magnéticos alternados (Calibração e utilização de bobinas de referência ac) Ramon Valls MARTIN