raciocÍnio jurÍdico do juiz constitucional moÇambicano
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8/3/2019 RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO
INTRODUO
1. Contextualizao e objecto do estudo
A Jurisdio Constitucional moambicana recente. Ela nasce, formalmente, com a
entrada em vigor da Constituio de 1990, tendo sido exercida pelo Tribunal Supremo at
Novembro de 2003, ano de entrada, de facto, em funcionamento substancial do Conselho
Constitucional1.
O Constitucionalismo Ptrio, sem sombra de dvidas, vive um momento sem
precedentes, de vertiginosa ascenso cientfica e poltica com consequncias notveis sobre
outros poderes do Estado, nomeadamente, a justia constitucional delimita (ou) e disciplina
(ou) a liberdade de aco dos diferentes ramos do Poder do Estado (). Alm disso, em
Direito Comparado, a jurisprudncia constitucional desenvolveu, a partir da interpretao de
regras constitucionais muito gerais, uma rede complexa de normas, enquadrando juridicamente
o funcionamento do Estado e, por um lado, as relaes entre os particulares e o Estado e, por
outro, as relaes entre particulares2.
A pesquisa que se vai desenvolver procura investigar, compreender e situar o MODO
DE RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMABICANO naaplicao do Direito, tendo em ateno que, num sistema jurdico positivado e codificado, a
liberdade do Juiz, como assevera ALVIN WAMBIER, () consiste em determinar, em cada
caso, o permetro ou o contorno das determinaes legais. O Juiz est vinculado lei, mas ele
1 Cfr. a Deliberao n. 03/CC/2010, de 29 de Outubro, que cria a Medalha Comemorativa do 7. Aniversrio do
Conselho Constitucional.2 CISTAC, Gilles. O Conselho Constitucional como Regulador do Sistema Jurdico-poltico, p. 2. Neste texto, o
autor questiona se, em pouco tempo, o Conselho Constitucional moambicano conseguiu influenciar, como os
seus congneres estrangeiros, os poderes pblicos ptrios e o contedo das regras constitucionais. Visando
responder a estas questes, o Autor props-se fazer um balano, a partir da debilidade do sistema de separao de
poderes, em Moambique, para da, avaliar a influncia, ainda nascente mas verdadeira e crescente do Conselho
Constitucional no mbito do sistema jurdico-poltico moambicano.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOa manipula de forma criativa. Se o juiz fosse la bouche de la loi no haveria oscilaes na
jurisprudncia. (). Qual o limite desta criatividade3.
Para ela, a tarefa do juiz no mais vista, exclusivamente, como s a de aplicar a lei
dedutivamente [entenda-se isto como pura e simples subsuno/deduo]. A recomendaoenfatizada aos juzes a de que procedam perquirio do valor de Justia subjacente s
normas () e, aplicando-as havero de realizar esse valor. Essa identificao do
substractum de Justia subjacente norma jurdica, em poca tensa e de disputa pelo espao
social, certamente, resta obscurecida, pois a lei que posta em cheque, porque seria carente
de fundamento ()4.
2. Delimitao do estudo
A actividade jurisdicional do Juiz Constitucional vasta e complexa. Com efeito,
impe-se a sua delimitao, atendendo o leque de objectivos que a lei confere ao Conselho
Constitucional que, consequentemente, vo se reflectir nos poderes funcionais conferidos ao
Juiz.
uma rea de interveno do Conselho Constitucional que o presente relatrio vai
focalizar, nomeadamente: o modo de pensamento jurdico do Juiz Constitucional quando
aprecia e delibera sobre a normatividade constitucional. Isto , no que tange a competncia de,nos termos da alnea a) do n. 1 do artigo 244 da Constituio da Repblica, o Conselho
Constitucional apreciar e declarar a inconstitucionalidade das leis e a ilegalidade dos actos
normativos dos rgos do Estado, em particular, quando se trata de fixao das regras de sua
competncia.
A anlise do pensamento jurdico do Juiz Constitucional nesta rea basilar de
interveno justifica-se pela necessidade de encontrar a base do seu raciocnio para atingir um
determinado fim, mormente, prolatar sentenas que resultam da aplicao das leis aos factos
que a ele so submetidos. Trata-se, na verdade, de um raciocnio prtico que, no prescindindo
de referenciais externos, axiolgicos ou normativos (pois visa alcanar um fim determinado),
3 Teresa Arruda.Recurso Especial,p. 101.4Idem,p. 12.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOse ocupa de argumentao justificativa plausvel do que de uma argumentao formalmente
correcta5.
Na estrutura tridimensional do Direito, o Juiz Constitucional deve compreender o
fenmeno jurdico a partir de trs pressupostos bsicos, nomeadamente, os factos que somaterialmente polticos, um valor que confere significado aos factos e indica a finalidade
encaracolada e a norma, que medeia a integrao do facto e valor6.
Com efeito, o facto, o valor e a norma impem ao Juiz, mais do que obedincia a meras
exigncias lgico-formais, apreciaes () valorativas (axiolgicas) dos fatos, e, no raro,
um processo de interpretao da lei, aplicvel ao caso, de maneira que qualquer tentativa de
formalizao redundaria no sacrifcio inaceitvel do contedo axiolgico da experincia
jurdica7.
3. Problema do estudo
Hodiernamente, a racionalidade jurdica dominada pelo modo sistemtico de
pensamento, baseado em premissas que, ao invs de decidir, previamente, sobre o problema,
procura traar, em primeiro lugar, os limites dentro dos quais a soluo h-de mover-se.
Portanto, este mtodo est assente na subsuno dos factos s normas correspondentes. Porm,
por via de hermenutica constitucional, a racionalidade moderna viu renascer o modo tpicode pensamento, que dominou o mundo antigo e esquecido nos Sculos XVIII e XIX devido
influncia do pensamento sistemtico8.
Dos dois modos de pensamento jurdico, qual tem influenciado o Juiz Constitucional
moambicano, na sua tarefa de dizer o Direito?
5 Cf. PERELMAN, Chaim.tica e Direito, ob. cit.,p. 278-283.6 Nestes termos,Idem.7 REALE, Miguel.Filosofia do Direito,p. 65.8 Cf. MALISKA, Marcos Augusto.A Influncia da Tpica na Interpretao Constitucional,p. 1.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO4. Objectivos do estudo
A indicao do tema o Modo de raciocnio jurdico do Juiz Constitucional
moambicano tem como objectivo geral, compreender o modo de raciocnio jurdico do juizconstitucional na aplicao das normas jurdico-constitucionais quando aprecia e delibera
sobre a normatividade, em particular, na delimitao da sua competncia.
Para se alcanar este objectivo central, em termos especficos, teremos que traar os
termos em que o Juiz Constitucional procede fundamentao ou argumentao das suas
deliberaes quando delimita as questes que caibam na sua competncia, bem como
encontrar o modelo basilar de pensamento do Juiz Constitucional.
5. Hiptese
Da leitura, ainda que preliminar, do trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pelo
Juiz Constitucional, pode vaticinar-se que o modo sistemtico de raciocnio tem influenciado a
sua actividade jurisdicional.
6. Localizao e justificao do tema
preciso situar e localizar o tema em debate no mbito das cincias jurdicas. Assim,
como indica o tema Modo de raciocnio jurdico do Juiz Constitucional, distinguem-se duas
partes essenciais que o compe: i) a descoberta do modo de raciocnio jurdico que, por
maioria de razo, estud-lo significa descer ao mbito das Metodologias Jurdicas e ii) o
prprio objecto do pensamento que o Direito Constitucional (o Juiz Constitucional), isto ,
compreender o Direito Poltico. Porm, o que se pretende neste trabalho aflorar o
pensamento jurdico e, portanto, a indicao lgica ser a de localizar o tema na Metodologia
Jurdica.
A relevncia do estudo do pensamento jurdico do Juiz Constitucional reside no que
sendo o Conselho Constitucional a instituio reguladora do sistema jurdico-poltico, h-de
determinar com as suas decises o modo de agir dos Governantes, das instituies pblicas,
privadas e dos partidos polticos.
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Por exemplo, quando o Conselho Constitucional recomenda, no mbito da sua funo
de proclamar e validar as eleies, () que o escrupuloso cumprimento dos prazos constitui
condio indispensvel para a celeridade que deve caracterizar todo o processo eleitoral. Nopresente processo eleitoral a celeridade foi seriamente prejudicada por falta de pronta resposta
s reclamaes, protestos, recursos e solicitaes de informaes necessrias para se deliberar
com justia e dentro da legalidade9, pretende chamar ateno Comisso Nacional de
Eleies, como rgo de superviso dos processos eleitorais, para que se aplique devidamente
no cumprimento dos prazos, evitando, desta forma, prejudicar os direitos e interesses legtimos
dos concorrentes s eleies, concretizando, assim, a funo educativa dos tribunais.
Pode, tambm, notar-se no Acrdo n 30/CC/2009, de 27 de Dezembro, lies
dirigidas ao Legislador, criticando-se as sucessivas alteraes da Legislao Eleitoral. O Juiz
Constitucional, neste aspecto, refere que () No esto em causa as alteraes legislativas
feitas para adequar as leis quer s modificaes constitucionais quer s realidades
supervenientes. Porm, a adequao no implica necessariamente a substituio completa das
leis em causa, pois a mesma pode conseguirse atravs do mecanismo de reviso pontual, o
qual apresenta largas vantagens prticas na medida em que permite ao aplicador da lei
identificar de forma fcil, clara e precisa as normas alteradas, bem como compreender as
inovaes introduzidas sem necessidade de confrontar na ntegra os sucessivos textos legais.Esta observao prendese com as frequentes mudanas da legislao eleitoral que se tm
verificado no pas de eleio para eleio, incluindo as que ocorreram na vigncia da actual
Constituio, sem introduzir, salvo raras excepes, solues substancialmente novas.
A aprovao da Lei n 8/2007 visou tornar a CNE num rgo despartidarizado, atravs
da integrao no seu seio de membros provenientes da sociedade civil, e reforar a sua
profissionalizao de harmonia com o princpio da imparcialidade nos termos do n 3 do artigo
135 da Constituio. Por sua vez, a Lei n 10/2007 teve como objectivo regular uma situao
nova, isto , a eleio de membros das assembleias provinciais, conforme o n 1 do artigo 142
da Constituio. J quanto s Leis ns 7/2007 e 9/2007, notamos que as inovaes substanciais
introduzidas no foram suficientes para justificar a opo pela substituio da legislao
9 Deliberao n 16/CC/04, de 14 de Janeiro que Validao e proclamao dos resultados das eleies autrquicas
de 19 de Novembro de 2003. Inwww.cconstitucional.org.mz.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOanterior, que poderia ter sido mantida com alteraes pontuais. Renovase, deste modo, o apelo
registado em anteriores processos de validao e proclamao dos resultados eleitorais,
nomeadamente, no Acrdo n 2/CC/2009, de 15 de Janeiro, relativo s Eleies dos rgo
das Autarquias Locais, sobre a ...necessidade de se estabilizar e consolidar a legislaoeleitoral, por forma a evitar se, para cada novo acto eleitoral, a aprovao de nova
legislao10.
a partir das deliberaes do Conselho Constitucional, como meio de expresso do
Direito, que buscaremos encontrar o modo de raciocnio do Juiz Constitucional e em que se
traduz a razo prtica das suas decises na incumbncia de avaliar as diferentes teses que lhe
so aduzidas pelas partes em litgio, escolher, num espectro de possibilidades legais, aquela
mais conforme sua viso da justia e motivar, em fim, o produto dessa deliberao, o juiz,decerto, o personagem actuante no cenrio jurdico que acumula mais qualidades e funes
idneas para evidenciar o que se entende pela razo prtica jurdica11.
O Juiz Constitucional, ao estabelecer o seu pensamento, h-de ter em conta os factos e
as normas aplicveis, aliado ao contedo do valor da funo jurisdicional que exerce, o que lhe
permitir com exactido estabelecer as consequncias que quer lograr com a aplicao da lei
constitucional. Quanto ao pensamento ou raciocnio do Juiz, a escola da Exegese tinha no
silogismo judicirio o ideal do seu modelo de concreo da lei.
Os sequazes desta escola pretenderam que o silogismo devesse consagrar uma premissa
maior, a qual seria constituda pela lei aplicvel quele caso concreto, a premissa menor dada
pelos factos claramente delimitados e a concluso, que consistiria na deciso tomada, em
consequncia da aplicao da lei. Se o papel do Juiz fosse, certamente, circunscrito a estes
silogismos no se levantariam questes de maior complexidade na funo de dizer o Direito,
mas como reconhece PERELMAN () colocar o problema nesses termos escamotear seu
ponto nevrlgico, j que, (), o limite que separa a lgica do Direito est na formao das
premissas, e no na inferncia que se faz a partir delas 12.
10 Processo n38/CC/2009, Acrdo do Conselho Constitucional relativo Validao e Proclamao dos
Resultados das Eleies Presidenciais, Legislativas e das Assembleias Provinciais, de 28 de Outubro de 2009.11 PERELMAN, Chaim.tica e Direito, ob. cit.,p. 278-283.12Idem.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO7. Referencial terico
A fundamentao terica da presente pesquisa est alicerada em duas teorias sobre o
raciocnio do Juiz que serviro para respaldar a pesquisa. Com efeito, existem dois modos depensar jurdico, nomeadamente, o sistemtico e o tpico.
Comecemos com o modo sistemtico de raciocnio.
Como escreve VIEHWENG o modo de pensar sistemtico parte do todo. A concepo
nele o principal e permanece sempre como o dominante. No quer buscar um ponto de vista.
O ponto de vista est adotado desde o princpio. E a partir dele se seleccionam os problemas.
Os contedos do problema que no se conciliam com o ponto de vista so rejeitados. So
considerados como uma questo falsamente colocada. Decide-se previamente no sobre a
soluo dos problemas, mas sim sobre os limites dentro dos quais a soluo pode mover-se13.
Expliquemos melhor isto!
O Direito tem como finalidade resolver problemas, em concreto, da sociedade.
Portanto, s vlido o Direito que consegue solucionar tais questes, dentro da sociedade
concreta. A partir da Modernidade, no Direito, passou a ganhar campo a dimenso sistemtica
do fenmeno jurdico, encarando-se o problema como uma questo meramente secundria,
pois o Direito gira em volta da norma e do sistema. Logo, se tudo gira em torno da norma ou
do sistema, o ponto de partida para resolver um problema concreto a norma, para deladeduzir-se a soluo para o caso concreto o raciocnio dedutivo.
Segundo VIEHWENG, quando se logra estabelecer um sistema dedutivo, a que toda a
cincia, do ponto de vista lgico, deve aspirar, a tpica tem de ser abandonada. (). Numa
situao ideal, a deduo torna totalmente desnecessria a inveno. O sistema assume a
direco14.
O modo sistemtico de pensamento implica sempre um esquema lgico-subsuntivo da
aplicao do Direito. Como reconhece CASTANHEIRA NEVES Deve ter-se, todavia, em
conta que a possibilidade do esquema subsuntivo como esquema metodolgico da aplicao do
direito pressupe, por sua vez, a possibilidade metodolgica da converso de um pensamento
intencionalmente axiolgico e teleolgico-normativo (como aquele que no direito, como tal,
13 VIEHWEG, Theodor. Ob. cit,p. 43.14Idem.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOse manifesta) num pensamento de estrutura apenas teortico-conceitual ou lgico-cognitiva: a
subsuno, sendo um operar com conceitos, pressupe a converso do normativo ao teortico,
do axiolgico ao lgico15.
O Juiz Constitucional ter enveredado por este modo sistemtico de pensar, quando,perante um pedido de declarao da inconstitucionalidade ou ilegalidade dos Despachos
Presidenciais ns 25 e 26/2007, de 21 de Agosto, ambos do Presidente da Repblica, nos quais
nomeia os Juzes Conselheiros do Tribunal Administrativo, se recusou de conhec-los,
alegando que Os Despachos Presidenciais em causa no contm nada mais seno os actos de
nomeao dos referidos Juzes Conselheiros, pelo que no tm contedo ou carcter
normativo. Alis, se assim fosse, em obedincia ao disposto na primeira parte do artigo 158 da
Constituio, teriam que assumir a forma de Decreto Presidencial, o que no manifestamente
o caso. Assim, porque ao Conselho Constitucional, nos termos do estabelecido na alnea a) do
n.1 do artigo 244 da Constituio, compete apenas apreciar e declarar a inconstitucionalidade
das leis e a ilegalidade dos actos normativos dos rgos do Estado, este rgo no tem
competncia para apreciar o pedido, razo porque no deve ser admitido16.
Este acrdo teria, futuramente, repercusses no pensamento do Juiz Constitucional.
Com certeza, franqueados alguns meses, o Conselho Constitucional recebia, novamente, dois
pedidos de declarao de inconstitucionalidade: i) do exerccio de funes de Procurador-
Geral da Repblica por parte do titular, na sequncia de correr contra aquela entidade umprocesso-crime, o que militava contra o preceituado17 na alnea d) do n. 1 do artigo 239 da
Constituio da Repblica, como tambm, atentava contra toda a estrutura da organizao da
Administrao da Justia; ii) da proposta do Conselho Superior da Magistratura do Ministrio
Pblico que indica novos Procuradores-Gerais Adjuntos, na sequncia de a sua nomeao ter
ocorrido antes da constituio do Conselho Superior da Magistratura do Ministrio Pblico,
15 CASTANHEIRA NEVES, Antnio. Ob. cit.p. 105.
16 CONSELHO CONSTITUCIONAL.Acrdo n. 7/CC/2007, de 18 de Dezembro Processo n. 11/CC/2007.Inwww.cconstitucional.org.mz17 O Procurador-Geral e o Vice-Procurador-Geral da Repblica so nomeados, por um perodo de cinco anos,
pelo Presidente da Repblica de entre licenciados em Direito, que hajam exercido, pelos menos durante dez anos,
actividade profissional na magistratura ou em qualquer outra actividade forense ou de docncia em Direito, no
podendo o seu mandato cessar seno nos seguintes casos: (); d)aposentao compulsiva em consequncia de
processo disciplinar ou criminal; ().
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOrgo com competncia para propor figuras ao Presidente da Repblica com vista sua
nomeao18.
Com efeito, nestes dois pedidos, o Conselho Constitucional, sem delongas, sancionou
que Em processo anterior, em que se solicitou a apreciao da inconstitucionalidade deDespachos Presidenciais de nomeao de Juzes Conselheiros do Tribunal Administrativo,
nomeadamente o Processo n. 11/CC/07, o Conselho Constitucional, reconhecendo-se
incompetente, luz do estabelecido na alnea a) do n 1 do artigo 244, decidiu pela no
admisso do pedido. No presente pedido est-se perante situao idntica, uma vez que o seu
objecto no nenhuma lei ou acto normativo mas a proposta de nomeao de Procuradores
Gerais Adjuntos. Por isso valem neste caso as mesmas razes de decidir pela incompetncia do
Conselho Constitucional19.
Nestes acrdos nota-se, em primeiro lugar, que o Juiz Constitucional encara o
problema que -lhe colocado de forma secundria, estribando o seu raciocnio na questo
primria que a norma jurdica. Ele procura no texto constitucional uma norma jurdica que o
habilite a pronunciar-se sobre os despachos do Presidente da Repblica que no tenham
contedo normativo, sem contudo, encontrar soluo, o que acabou por lev-lo a abster-se de
pronunciar-se sobre o problema.
Em segundo lugar, nos pedidos subsequentes que incidem sobre o pedido de declarao
de inconstitucionalidade de Despachos do Presidente da Repblica que no tenham contedonormativo, ele afirma-se consciente na adeso ao caso precedente, vinculando-se e amarrando-
se sua deciso anterior.
Nestas deliberaes do Conselho Constitucional, o que lhe levou a declarar-se
incompetente de conhecer os Despachos Presidenciais foi a falta nestes do contedo
normativo, apesar de serem actos de natureza jurdico-constitucional. Em suma, a falta de uma
18
Nos termos precisos do n. 2 do artigo 240 da CRM Os Procuradores-Gerais Adjuntos so nomeados peloPresidente da Repblica, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura do Ministrio Pblico, aps o
concurso pblico de avaliao curricular, aberto a cidados nacionais de reputado mrito, licenciados em Direito,
no pleno gozo dos seus direitos civis e polticos, que tenham, data do concurso, idade igual ou superior a trinta e
cinco anos e que tenham exercido, pelo menos, durante dez anos, a actividade forense ou de docncia em
Direito.19 CONSELHO CONSTITUCIONAL.Acrdos n. 3 e 4 /CC/2008, ambos, de 3 de Abril.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOnorma expressa e legitimadora da competncia levou a uma incapacidade de um rgo do
Estado poder resolver um problema concreto.
esta soluo, reagiu um Juiz Constitucional, atravs de voto de vencido, afirmando
que apesar da inexistncia de um contedo normativo naqueles Despachos e, portanto, nopoderem ser enquadrados na previso da alnea a) do n. 1 do artigo 244 da CRM20, () o
Conselho Constitucional devia apreciar a sua inconstitucionalidade, conforme lhe foi
solicitado, pois os mesmos encontram-se sujeitos ao princpio fundamental do n 3 do artigo 2
da Constituio21-22. Este Juiz vai ainda mais longe e refere que a deciso adoptada pelo
presente Acrdo seria de acolher se a fiscalizao dos citados Despachos Presidenciais
competisse a outra jurisdio. () Os Despachos Presidenciais nmeros 25 e 26/2007, de 21
de Agosto, no so actos polticos stricto sensu na medida em que, carecendo embora de
contedo normativo em sentido material, os Juzes Conselheiros do Tribunal Administrativo
nomeados, no exerccio das suas funes, so independentes, devem apenas obedincia lei,
gozam de garantias de imparcialidade e so inamovveis, nos termos do artigo 217 da
Constituio. De realar tambm que as referidas nomeaes no foram de livre vontade ou
critrio de quem os nomeou, mas antes foram, ou melhor, deviam ter sido sob proposta do
Conselho Superior da Magistratura Judicial Administrativa, nos termos do n 3 do artigo 229
da Constituio23.
A questo essencial entre a deciso do Conselho Constitucional e o argumentoutilizado no voto de vencido coloca-se no mbito da compreenso da problemtica do
significado metodolgico-jurdico do esquema lgico-subsuntivo da aplicao do direito24 e
das lacunas no direito, inerentes ao modo de pensar sistemtico, pois o Juiz Constitucional vai
preocupar-se, em primeiro lugar, do sistema, para dele deduzir a sua competncia de apreciar o
problema colocado. Portanto, a divergncia entre os Juzes Constitucionais vai residir no facto
de se pretender saber se o sistema em que se baseiam aberto ou fechado para oferecer
solues e adaptar-se s contingncias e mutaes da vida.
20 Artigo 244, n. 1 Compete ao Conselho Constitucional: a) apreciar e declarar a inconstitucionalidade das leis e
a ilegalidade dos actos normativos dos rgos do Estado.21 Acrdo n. 07/2007, j citado.22 O n. 3 do artigo 3 da CRM refere que O Estado subordina-se Constituio e funda-se na legalidade.23 Acrdo n. 07/2007, citado.24 Por todos, CASTANHEIRA NEVES, Antnio. Ob. cit.p. 105.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOO raciocnio tpico, ou melhor, a tpica jurdica procede em tudo ao contrrio do modo
sistemtico.
VIEWHENG, autor reinventor do pensamento tpico, ensina que o Direito sempre foi
destinado a solucionar questes prticas, problemas concretos. A proposta metodolgica desteAutor consiste em reavivar o raciocnio jurdico voltado para o problema e no para a norma.
O Autor da tpica assevera que o modo de pensar aportico no pe em dvida que o sistema
exista e que para sua prpria maneira de pensar talvez seja lentamente o determinante. A
tpica no pode ser entendida se no se admite a sugerida incluso em uma ordem que est
sempre por ser determinada e que no concebida como tal, qualquer que seja o modo como
se configure conceitualmente em particular. Da que este modo de pensar s pode contar com
panoramas fragmentrias25.
Na tpica, o ponto de partida do raciocnio o problema colocado, privilegiando-se a
induo em contraposio da deduo e, a nfase recai sobre as premissas e no sobre as
concluses. Portanto, a tpica vai ser uma tcnica de pensamento que se orienta para o
problema.
Nisto reconheceu LARENZ que misso dos tribunais decidir de modo justo os
conflitos trazidos perante si e, se a aplicao das leis, por via do procedimento de subsuno,
no oferecer garantias de uma tal deciso, natural que se busque um processo que permita a
soluo de problemas jurdicos a partir dos dados materiais desses mesmos problemas, mesmosem apoio numa norma legal. Esse processo apresentar-se- como um tratamento circular, que
aborde o problema a partir dos mais diversos ngulos e que traga colao todos os pontos de
vista tanto os obtidos a partir da lei como os de natureza extrajurdica que possam ter
algum relevo para a soluo ordenada da justia, com o objectivo de estabelecer um consenso
entre os intervenientes. Como modelo histrico de um tal procedimento, recomendou Viehweg
a tpica, no seu escrito sobre a jurisprudncia dado pela primeira vez estampa em 195326.
Parece ter sido seguido este modo de pensamento pelo Tribunal Supremo, na qualidade
de Conselho Constitucional, nos temos do artigo 202, literis, At entrada em
funcionamento do Conselho Constitucional, as sua competncias so exercidas pelo Tribunal
Supremo.
25 VIEHWEG, Theodor. Ob. cit,p. 35.26 LARENZ, Karl. Metodologia da Cincia do Direito, p. 170-171.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOO Tribunal Supremo27, em 1996, antes de entrada em actividade do Conselho
Constitucional, recebeu, do Presidente da Repblica e deu provimento um pedido de
fiscalizao preventiva da constitucionalidade da Lei que decretava feriados nacionais das
datas deIde-Ul-Fitre e Ide-Ul-Adha, festas religiosas islmicas, aprovada pela Assembleia daRepblica, em Maio do mesmo ano. O fundamento da Lei era o da necessidade de conferir
dignidade s datas comemorativas do fim do Ramado e do dia do sacrifcio e, ao mesmo
tempo, permitir que a comunidade islmica, como parte integrante e significativa do povo
moambicano, participe nas cerimnias religiosas a ela alusivas28.
Na altura, colocava-se o problema de saber se o Conselho Constitucional era ou no
competente para prover pedidos de apreciao preventiva da constitucionalidade das leis. Na
verdade, ao Conselho Constitucional competia, no essencial: a) apreciar e declarar a
inconstitucionalidade e a ilegalidade dos actos legislativos e normativos dos rgos do
Estado; b) dirimir conflitos de competncias entre os rgos de soberania; c) pronunciar-se
sobre a legalidade dos referendos29, entre outras competncias relativas ao domnio eleitoral.
O Tribunal Supremo, embora de forma duvidosa sobre a sua competncia no domnio
da fiscalizao preventiva da constitucionalidade, deliberou no sentido de admitir o pedido do
Presidente da Repblica de fiscalizao preventiva da constitucionalidade com o fundamento
no que Compete ao Presidente da Repblica promulgar e mandar publicar as leis no Boletim
da Repblica30
, podendo recusar ou efectuar a promulgao da Lei; ii) declarar ainconstitucionalidade material da Lei ora submetida para a promulgao baseado no facto de
constituir uma violao do princpio constitucional da igualdade dos cidados perante a lei, da
liberdade de praticar ou no praticar uma religio e da neutralidade que o Estado laico deve
manter em matria religiosa31.
Pronunciando-se sobre o acrdo do Conselho Constitucional, nos devidos termos, a
Assembleia da Repblica, atravs da Comisso dos Assuntos Jurdicos, Direitos Humanos e de
Legalidade, f-lo nos seguintes termos, quanto competncia de o Tribunal Supremo,
enquanto Conselho Constitucional, conhecer do pedido: () 1. Quanto questo da
27 Cfr. Acrdo de 27 de Dezembro de 1996, no editado.28 Nestes termos, o Prembulo da Lei que decreta os feriados nacionais nas datas deIde-Ul-Fitre e Ide-Ul-Adha.29 Cfr. Artigo 181 da Constituio da Repblica de 1990.30 Nmero 2 do artigo 124 da CRM9031 Acrdo do Tribunal Supremo, Ob. cit.,pg. 4.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOinconstitucionalidade da lei mantm as suas reservas porquanto h uma questo prvia que a
da constitucionalidade do prprio acrdo32.
Neste caso concreto, o Tribunal Supremo olhou, em primeiro lugar, ao problema que
lhe era colocado, se deve ou no admitir o ingresso na ordem jurdica moambicana de umanorma inconstitucional, uma questo de relevante interesse pblico. Isto , foi conhecer da
questo de fundo, antes porm, de proceder anlise da sua competncia orgnica.
O Tribunal Supremo, ao invs de se preocupar em procurar saber se ou no
competente para conhecer do pedido de apreciao preventiva da constitucionalidade, porque
luz da Constituio da Repblica de 1990 no resultava lquido que o Conselho Constitucional
tivesse tais poderes, entendeu que competindo ao Presidente da Repblica promulgar e mandar
publicar as leis e, encontrando-se este num dilema ou perante um problema concreto no
exerccio dos seus poderes, era legtimo que solicitasse ao rgo competente em matrias
jurdico-constitucionais para que se pronunciasse sobre o assunto e, por via de consequncia,
elucidando o Presidente da Repblica sobre o caminho a seguir.
Neste contexto, o Conselho Constitucional, no negando a existncia de um sistema,
determinou, naquele momento e perante aquele caso, o que era ou no justo, ligando os
conceitos, proposies, de um modo especfico, ao problema e dele partir-se para a sua
compreenso. Por isso, baseado na tcnica de pensamento problemtico, o Tribunal Supremo
resolveu um problema concreto, evitando, desta forma, que ingresse na ordem jurdica uma leiinconstitucional e permitiu ao Presidente da Repblica, no mbito do exerccio do direito ao
veto das leis, com lucidez negar a promulgao da referida lei.
Mas ningum negar que nessa altura, o Conselho Constitucional no detinha
competncia para apreciao preventiva da constitucionalidade, alis, em primeiro lugar, o
prprio Presidente da Repblica, no ano de 2003, antes de entrada em funcionamento efectivo
do Conselho Constitucional, perante o mesmo problema de dvidas quanto promulgao da
Lei do Combate Corrupo, ao invs de solicitar ao Tribunal Supremo a fiscalizao
preventiva, preferiu usar dos seus poderes, nomeadamente, vertidos no n. 3 do artigo 124 da
Constituio de 1990, literis, O Presidente da Repblica pode, por mensagem fundamentada,
devolver a lei para reexame pela Assembleia da Repblica.
32 Parecer n. 7/98, de 21 de Outubro, AR-IV/IX-24/22.10.98. Sublinhado nosso.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOCom efeito, o Presidente da Repblica devolveu a Lei do Combate Corrupo, para
reexame pela Assembleia da Repblica, com o argumento de que (...) por se tratar de uma lei,
que pela sua natureza, tem implicaes directas em relao aos direitos e liberdades
fundamentais dos cidados consagrados na Constituio da Repblica, requereu do Chefe doEstado especial ateno, enquanto garante da Constituio (...), envolvendo aturada anlise da
conformao de algumas das suas normas com a lei fundamental e, ainda, preocupaes de
harmonizao desta lei com o ordenamento jurdico geral33.
Em segundo lugar, o prprio Conselho Constitucional, j em funcionamento efectivo,
viria a duvidar se, face da Constituio de 1990, poderia falar-se de fiscalizao preventiva
da constitucionalidade, por via do poder judicial34.
O modo de pensamento utilizado pelo Tribunal Supremo, a tpica, por si s, no pode
dar uma explicao satisfatria sobre a argumentao jurdica utilizada para sustentar aquela
opo, pois, a tpica constitui uma teoria discursiva, visto que no permite mergulhar
profundamente na estrutura abissal e hierarquizada da metodologia jurdica, a ponto de dar
uma resposta definitiva questo da racionalidade das decises jurdicas35.
A tpica um modo de pensamento que pode trazer frutos quando se conceber, para o
caso do raciocnio do Juiz Constitucional, a Constituio como um sistema aberto. Pois neste
sistema que a tpica vai ter uma perfeita insero. A Constituio um sistema aberto de
regras e princpios, como escreve GOMES CANOTILHO um sistema aberto porque temuma estrutura dialgica, (CALLIESS) traduzida na disponibilidade e capacidade de
aprendizagem das normas constitucionais para captarem a mudana da realidade e estarem
abertas s concepes cambiantes da verdade e da justia.
Este ponto de vista conduz-nos a reflectir o texto constitucional como verdadeira e
constante busca. Isto , o texto constitucional no est pronto e acabado, e sim muito pelo
contrrio, ele est em via de ser construdo, de maneira que a inteirao do texto com a
realidade deve ser total, de modo a garantir a sua supremacia e sua fora normativa36.
33 Ofcio endereado pelo Presidente da Repblica ao Presidente da Assembleia da Repblica, de 24 de Dezembro
de 2003: Nef. 85/PR/GSGPRM/03.34 Cfr. Deliberao n. 12/CC/2003, publicada no Boletim da Repblica n. 2, I Srie, de 14 de Janeiro de 2003.35 Neste sentido, ATIENZA, Manuel.As Razes do Direito,p. 70 e SS.
36 MALISKA, Marcos Augusto. Ob. cit. p. 12.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO8. Metodologia e sistemtica
Do que foi dito anteriormente, decorre, agora, traar os procedimentos metodolgicos
sobre como vamos realizar a pesquisa.Primeiro, no que tange aos procedimentos tcnicos, abraa-se, desde logo, as pesquisas
bibliogrfica e documental, com base nos livros e artigos cientficos elaborados sobre o tema e
nas deliberaes do Conselho Constitucional, como documentos de primeira-mo,
respectivamente.
Como o tema indica o Modo de raciocnio jurdico do Juiz Constitucional a nossa
abordagem vai partir da anlise e compreenso das deliberaes do Juiz Constitucional
(induo) para concluir por uma proposio mais geral sobre o seu modo de raciocnio quando
d soluo aos problemas poltico-jurdicos que lhe so submetidos. Das proposies gerais
traadas, seguir-se- um mtodo crtico, tendo em ateno as teorias de base que fornecem as
explicaes sobre os modos de raciocnio do Juiz.
O esquema geral da investigao vai traar-se a partir de um plano de estudo. Assim, a
presente pesquisa comportar dois momentos, nomeadamente; o dos modos de raciocnio do
Juiz e o do raciocnio, in concreto, do Juiz Constitucional moambicano.
No primeiro o Raciocnio do Juiz , para alm de caracterizarmos os modos de
pensamento, o subsuntivo ou sistemtico e a tpica, vamos apresentar as deficincias que cadamodo de raciocnio apresenta, o seu relacionamento com a ideia de um sistema jurdico-
constitucional aberto e a problemtica das lacunas no Direito.
No segundo, preciso descrever o modo de pensamento do Juiz Constitucional atravs
da anlise das suas deliberaes (Acrdos e Deliberaes do Conselho Constitucional),
decorrentes da delimitao da pesquisa feita, tendo em conta as competncias do Conselho
Constitucional apreciar e declarar a inconstitucionalidade das leis e a ilegalidade dos actos
normativos dos rgos do Estado37. Tentaremos a seguir, traar a influncia que a tpica pode
ter no raciocnio do Juiz Constitucional e na sua actividade de interpretao das normas
jurdico-constitucionais, a par do mtodo sistemtico.
37 Alnea f),Idem.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO
PARTE I
OS MODOS DE RACIOCNIO DO JUIZ
1. O pensamento sistemtico ou subsuntivo
Todo o raciocnio jurdico diz respeito aplicao da lei aos casos concretos, que no
geral, se traduz em acrdos e sentenas dos tribunais, sem prescindir do auxlio necessrio da
doutrina e das alegaes das partes. Como reconhece PERELMAN, Para precisar a noo de
raciocnio jurdico, entende-se por essa expresso o raciocnio do juiz, tal como se manifesta
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOnuma sentena ou num acrdo que fundamenta uma deciso. As anlises doutrinrias de um
jurista, as alegaes dos advogados, o despacho de pronncia do ministrio pblico, fornecem
razes que podem exercer influncia na deciso do juiz: s a sentena fundamentada nos
fornece o conjunto dos elementos que nos permitem isolar as caractersticas do raciocniojurdico. (). O dispositivo da sentena, a parte que contm a deciso do juiz, precedido
pelo enunciado dos considerandos, quer dizer das razes que motivaram essa deciso. O
raciocnio judicial apresenta-se assim como o verdadeiro tipo do raciocnio prtico, que visa
justificar uma deciso, uma escolha, uma pretenso, que visa mostrar que elas no so
arbitrrias ou injustas. A sentena ser justificada se resultar dos seus considerados que ele
est conforme com o direito38.
O pensamento sistemtico, ou o raciocnio subsuntivo, seria por excelncia um
pensamento dedutivo, donde se decide os limites dentro dos quais a soluo a adoptar pelo Juiz
h-de mover-se. Na verdade, de forma simples, o modo subsuntivo quer dizer que a cincia
jurdica constri-se, assim, como um processo de subsuno, dominado por uma dualidade
lgica em que todo fenmeno jurdico reduzido a duas possibilidades: ou isto ou aquilo,
ou se encaixa ou no se encaixa, constituindo enormes redes paralelas de excees. A busca,
para cada ente jurdico, de sua natureza (...) pressupe uma atividade terica deste tipo, onde
os fenmenos so de direito pblico ou de direito privado, um direito qualquer real ou
pessoal, uma sociedade comercial ou civil etc., sendo as eventuais incongruncias tratadascomo excees ou contornadas por fices39.
O pensamento subsuntivo consequncia da ditadura metodolgica do positivismo
jurdico, em particular, a jurisprudncia dos conceitos, cujo ponto central o carcter lgico-
dedutivo do sistema jurdico, enquanto desdobramento de conceitos e normas abstractas, da
generalidade para a singularidade, em termos de uma totalidade fechada e acabada ().
Independentemente do carcter lgico-formal da construo e da subsuno e sem querer fazer
aqui uma generalizao indevida, podemos afirmar que, grosso modo, esses dois
procedimentos marcam significativamente a Cincia do Direito do sculo XIX40.
38 PERELMAN, Chaim. Ob. cit., p. 431-432.39 FERRAZ JR., Tercio Sampaio.A cincia do direito. Reflexes sobre o poder, a liberdade, a justia e o direito.
2 ed., So Paulo: Atlas, 1980, p. 36-37.40Idem, p. 33-34.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOOs sequazes da Escola da Exegese encontraram no silogismo judicirios o ideal do
modelo operativo do processo de subsuno da lei, reduzindo o papel do juiz a simples
inferncia de que se faz a partir das premissas. Um estudo de MANFRED MORITZ, sobre o
silogismo prtico, mostrou que () fundamentalmente impossvel deduzir de premissasmaiores imperativas imperativos concretos. Assim, por exemplo, do imperativo geral de que
todos os assassinos devem ser punidos com pena de priso perptua, no se poderia deduzir o
imperativo concreto de que o assassino Mdeve ser punido com pena perptua41.
Assim, neste silogismo, teramos que a premissa maior representaria a norma jurdica
geral e abstracta; a premissa menor os factos delimitados e a concluso a deciso a que o juiz
ter chegado. Para este raciocnio formal, PERELMAN apresenta a seguinte frmula para
todo ox, sefx, entogx. Ora A est nas condies que permitem substituir-se a x, logo fA; da
resulta gA: quer dizer que devendo a sentena conformar-se com a lei, A deve ser punido
()42com a de priso perptua.
Estas ideias so errneas, o mtodo dedutivo no se resume nos silogismos. A
premissa menor o nervo que veicula at ao caso concreto as ideias jurdicas gerais contidas
na lei, que o mesmo dizer, na premissa maior, e desse modo torna possvel a deciso do
mesmo caso em conformidade com a lei. (). A premissa maior jurdica, com a qual se
combina a menor, ela prpria, por seu turno, o resultado de uma penetrante actividade do pensamento jurdico. Assim , pelo menos, quando nos ocupamos em descobrir o Direito
atravs de dedues feitas a partir da lei e com fundamento nela. Poderemos mesmo dizer que
aquilo a que se chama metodologia jurdica tem por objecto em primeira linha a obteno da
premissa maior jurdica43.
No mtodo subsuntivo, o juiz tem como tarefa essencial a adaptao da norma uma
situao de facto e concreta da vida a ele submetida. Nesta tarefa o juiz vai considerar um
conjunto de normas potencialmente aplicveis do Ordenamento Jurdico, pois no basta
conhecer, ainda que profundamente, o direito para saber traduzir em realidade, e h tericos
distintos que no so capazes desta elasticidade mental que os torne mestres no manejo dos
41ApudENGISCH, Karl.Introduo ao Pensamento Jurdico.p. 66.42 PERELMAN, Chaim. Ob. cit.,p. 455.43 ENGISCH, Karl. Ob. cit.,p. 92.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOprincpios na arte de decidir. Existe ainda uma capacidade espiritual, um sentimento prprio, e
assim se explica como, ao lado da tcnica na aplicao, h tambm uma aplicao instintiva
do direito, por via da qual, sem mais, o prticosente a deciso justa e a segue44.
por isso que a prtica subsuntiva traz consigo um conjunto de pressupostosquestionveis, tais como: a completude do ordenamento; a racionalidade como caminho
suficiente para cotej-lo; e a possibilidade de distino entre fato (premissa menor) e o direito
(premissa maior)45. Neste contexto, a sentena do juiz () realiza o processo de
transformao da norma jurdica do mandato abstrato em mandato concreto; mediante a
sentena, o mandato toma forma, se individualiza e se define. () duplicidade das
premissas corresponde o duplo tema da atividade do juiz; posio da norma jurdica e posio
da situao de fato; ou como se diz na linguagem usual: questo de direito () e questo de
fato ()46.
O modo do pensamento subsuntivo, como reconhece ENGISH, serve muito mais para
emprestar uma lgica deciso judicial, a partir do exame da adequao entre os factos e a
norma jurdica aplicada, do que para explicar a actividade cognitiva do juiz levada a cabo, que
no se resume simples deduo lgica, a fim de estabelecer a norma jurdica individual47.
No modo sistemtico de pensamento, o Direito s na aparncia comportaria uma
estrutura sistemtica, que possibilitaria a deduo de todas as suas proposies e competentes
solues a partir de uns quatro axiomas de base. Na verdade, quatro planos decisivosimpossibilitariam tal contextura para a Cincia do Direito: a escolha dos princpios de base e
seus conceitos , logicamente, arbitrria; a aplicao do Direito requer, perante as proposies
pr-elaboradas, extenses, restries, assimilaes, concentraes e passos similares; a
necessidade de recurso linguagem, sempre multi-significativa, impossibilita derivaes; a
apreenso da matria de facto, condicionante de qualquer soluo, escapa ao sistema. Perante
tal situao, quedaria uma natureza tpica para o Direito ()48.
2. O pensamento tpico
44 ANDRADE, Manuel A. Domingues de.Ensaio sobre a Teoria da Interpretao das Leis., p. 186.45 COSTA, Henrique Arajo.Reexame de Prova em Recurso Especial: A Smula 7 do STJ.p.70-71.46 CARNELUTI, Francesco.A Prova Civil, apudCOSTA, Henrique Arajo. Ob. cit.p. 73.47 ENGISH, Karl. Ob. cit..p. 84-85.48 VIEHWEG, Theodor. Ob. Cit,p. 84-90.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO
A tpica como modo de pensamento ganha expresso com Aristteles, onde as
premissas so construdas tendo em conta a opinio pblica, pertencendo, portanto, ao campo
da dialctica. Para Aristteles, os conceitos e as proposies bsicas dos procedimentosdialcticos () constituam no axiomas nem postulados de demonstrao, mas topoi de
argumentao, isto , lugares (comuns), frmulas, variveis no tempo e no espao, de
reconhecida fora persuasiva no confronto das opinies49.
Este pensamento retomado por um autor Alemo, Theodor VIEHWEG, na sua obra
Topik und Jurisprudez, de 1953. Como sabemos, desde as ideias Popperianas, a pesquisa
nasce a partir de resoluo de problemas que frustram a teoria e no da observao, assim
como VIEHWEG prope a tpica como tcnica de pensamento que se orienta para problemas,
pois o Direito sempre foi destinado a solucionar questes prticas, problemas concretos.
Todavia, a contar da modernidade, passou a ganhar relevo a dimenso sistmica do fenmeno
jurdico, encarando o problema, a partir de ento, como uma questo meramente secundria50.
O pensamento tpico ope-se ao pensamento dedutivo, pois a sua dinmica no
termina nunca, as premissas alcanadas so sempre provisrias. Por um lado, a tpica , do
ponto de vista de seu objeto, uma tcnica do pensamento problemtico; por outro lado, do
ponto de vista do instrumento com que opera, o que se torna central a noo de topos ou
lugares-comuns; finalmente, do ponto de vista do tipo de atividade, a tpica uma busca eexame de premissas: o que caracteriza ser um modo de pensar no qual a nfase recai nas
premissas, e no nas concluses51.
O fundamento desta tese baseia-se no que 1) a estrutura total da jurisprudncia s
pode ser determinada a partir do problema; a aporia fundamental e o problema de determinar o
que justo aqui e agora. 2) As partes integrantes da jurisprudncia, seus conceitos e
proposies precisam ficar ligadas de um modo especfico ao problema e s podem ser
compreendidas a partir dele. 3) Os conceitos e as proposies da jurisprudncia s podem ser
utilizados numa implicao que conserve a sua vinculao com o problema. preciso evitar
qualquer outra52.49 FERRAZ JUNIOR, Trcio Sampaio.Introduo ao Estudo do Direito: Tcnica, Deciso, Dominao.p. 327.50 ATIENZA, Manuel. Ob. cit.p. 68.51Idem,p. 92.52 VIEHWEG. Theodor. Ob. cit. 129-130.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOO pensar tpico sintetizado na por FERRAZ JUNIOR, da seguinte maneira: "Quando
se fala, hoje, em tpica, pensa-se, como j dissemos, numa tcnica de pensamento que se
orienta para problemas. Trata-se de um estilo e no propriamente de um mtodo. Ou seja, no
um conjunto de princpios de avaliao da evidncia nem de cnones para julgar a adequaode explicaes propostas, nem ainda critrio para selecionar hipteses. Em suma, no se trata
de um procedimento verificvel rigorosamente. Ao contrrio, um modo de pensar,
problemtico, que nos permite abordar problemas, deles partir e neles culminar. Assim, pensar
topicamente significa manter princpios, conceitos, postulados com carter problemtico no
sentido de que jamais perdem a sua qualidade de tentativa. Veja, por analogia, o que acontece
com a elaborao de um dicionrio, em que muitos verbetes, pela diversidade de acepes,
exigem abordagens, que, partindo de distintos pontos de vista, no fecham nem concluem,
embora dem a possibilidade de compreender a palavra em sua amplitude (problemtica). Os
pontos de vista referidos, chamados loci, topoi, lugares-comuns, constituem pontos de partida
de sries argumentativas, em que a razoabilidade das opinies fortalecida. Como se trata de
sries argumentativas, o pensamento tpico no pressupe nem objetiva uma totalidade
sistematizada. Parte de conhecimentos fragmentrios ou de problemas, entendidos como
alternativas para as quais se buscam solues. O problema assumido como um dado, como
algo que dirige e orienta a argumentao, que culmina numa soluopossvel entre outras"53.
No pensar tpico, o juz parte de um caso concreto, buscando a soluo mais justa,atravs de um procedimento circular, por intermdio do qual so testados os diversos topoi
(pontos de vista), para verificar qual deles se adequa e produz melhor resposta para o problema
enfrentado. A deciso, na tpica, resulta do confronto dialtico entre os diversos topoi
pertinentes ao caso, devendo prevalecer aquele que contribuir para a construo da soluo
mais justa54.
Por assim dizer, a tpica, como reconhece Maria Helena DINIZ, ataca a concepo do
sistema jurdico como algo unitrio, definitivo e fechado e pressupe sempre a considerao
dinmica do direito, bem como a adoo da ideia de sistema aberto e elstico para poder
oferecer solues satisfatrias que se integrem sistemtica jurdica. () poder-se-ia dizer at
53 FERRAZ JUNIOR, Trcio Sampaio. Ob. Cit.p. 328-329.54 Cf. SARMENTO, Daniel. A Ponderao de Interesses na Constituio Federal. Rio de Janeiro : Editora
Lumen Juris, 2003, p. 128-129
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOque o raciocnio tpico dinamiza o direito entendido como um sistema aberto, tornando-o
malevel e adaptvel s contigncias e mutaes da vida. O pensamento jurdico, portanto,
mediante a tpica, torna-se necessariamente aberto incapaz de inserir numa axiomtica cerrada
()
55
.O reiventor56 da tpica aposta, na sua dissertao, no que, sendo a tpica tcnica do
pensamento problemtico, pode trazer resultados palpveis: i) () Ela se desdobra numa
contextura cultural que se distingue claramente nas menores particularidades de outra de tipo
sistemtico dedutivo; (ii) a tpica encontrada no ius civile, no mos italicus bem como na
civilstica actual e presumivelmente tambm em outros campos. As tentativas da era moderna
de deslig-la da jurisprudncia tiveram um xito muito restrito; (iii) o prosseguimento destas
tentativas exigiu uma sistematizao dedutiva rigorosa da nossa disciplina, com auxlio de
meios exactos. O seu alvo foi transformar a jurisprudncia em Cincia do Direito atravs de
sistematizao dedutiva. Com isto, ficava pressuposto que os seus problemas podiam, deste
modo, ser eliminados completamente.
Segundo o autor, a nfase no sistema opera uma seleco de problemas, enquanto
que o acento no problema busca um sistema que sirva de ajuda para encontrar a soluo, ou
em outras palavras, a nfase no problema opera uma seleco de sistemas, sem que se
demonstre a sua compatibilidade a partir de um sistema. Assim, VIEHWEG distingue uma
tpica de primeiro grau de outra de segundo grau. Configura-se a primeira quando, em facede um problema, procede-se de modo simples, tomando-se, atravs de tentativas, pontos de
vista mais ou menos causais, escolhidos arbitrariamente, como sucede na vida diria, segundo
mostra a observao. Posteriormente, a investigao conduz a determinados pontos de vista
directivos. Tendo em vista a insegurana derivada deste modo de proceder, busca-se apoio em
um repertrio de pontos de vista preparados de antemo, produzindo-se catlogos de topoi
configuradores da tpica de segundo grau57.
Este autor alemo assinala que a tpica deve estar vinculada ao problema, mantendo-se
a reduo e deduo em limites modestos, porque quando se logra estabelecer o modo
55As Lacunas no Direito. 2 ed. So Paulo: Saraiva, 1989, p. 123.56 VIEHWEG. Theodor. Ob. cit. 129-130.57Idem, apudMALISKA, Marcos Augusto. Ob. cit. ,p. 8.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOsistemtico de pensamento que, toda a cincia deve aspirar, a tpica deve ser abandonada, pois
a deduo torna impraticvel a inveno, assumindo o sistema a direco.
A tese de VIEHWEG foi bastante criticada, ressaltando as de CANARIS, que se
exprime no seguinte: () o Direito no , na essncia, tpico, antes surgindo sistemtico em sentido no axiomtico numa tradio que remota de Ius Romanum. No obstante,
sectorialmente, a tpica faz a sua erupo. Pense-se, por exemplo, na integrao de certas
lacunas ou no manuseio de conceitos indeterminados. No se aprofundam, pois, estes
aspectos58.
CANARIS no desarma nas suas crticas, avana, referindo que () Viehweg opera
uma equivocada apreenso do pensamento de Nicolai Hartmann, para o qual o pensamento
aportico no conduz assim, de modo algum, necessariamente tpica mas sim, apenas,
abertura do sistema. (...) Nicolai Hartmann no aceita uma posio frontal contra o
pensamento sistemtico - tambm o pensamento aportico parte da existncia do sistema! -
mas antes polemiza s contra um certo tipo de pensamento problemtico20 que recusa como
problemas aparentes as questes no ordenveis no sistema. Ele dirige-se apenas contra uma
concepo que v no sistema algo de definitivo e no apenas um projecto provisrio,
modificvel a todo o tempo, portanto contra um sistema fechado. Este, porm, no o da
Cincia do Direito nem o de qualquer outra Cincia, pelo menos enquanto um progresso nos
seus conhecimentos fundamentais ainda for possvel; e assim, atravs da identificao deViehweg da tpica com o pensamento aportico no resultou de modo algum uma definio
satisfatria da tpica. Pelo contrrio: ela , na mais alta medida, falaciosa, pois a forma de
pensar em Cincia, sem objeces consideradas no-tpicas, tambm aportica no sentido de
Hartmann, porque a recusa de problemas no susceptveis de ordenao no sistema (at ento
existente) deve ser considerada, em qualquer disciplina, como pecado contra o esprito da
Cincia; por certo nenhum fsico ou nenhum qumico iria ignorar um fenmeno contraditrio
perante os princpios at ento existentes, mas a ningum ocorreria ordenar, por isso, a Fsica e
a Qumica na tpica59.
ATIENZA, criticando a tpica, refere que talvez seja uma teoria ingnua e sem
consistncia, sem contudo, olvidar a importncia que ela para os seus seguidores, restando,
58 CANARIS, Claus-Wilhelm.Pensamento Sistemtico e Conceito de Sistema na Cincia do Direito,p. XLVII59Idem,p. 246-247.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOpara ele da tpica, apenas um raciocnio, sem fundamentao definitiva da concluso, para
alm de que a noo de problema tambm extremamente vaga e o de topos foi, ao longo da
histria, um conceito equvoco, sendo utilizado em vrios sentidos, bem como a fragilidade
dos conceitos de lgica e sistema na dissertao do reinventor da tpica
60
.Acrescenta, literis, que O mrito fundamental de Viehweg no ter construdo uma
teoria, e sim ter descoberto um campo para a investigao. Algo, ao fim e ao cabo, que parece
se encaixar perfeitamente no esprito da tpica61.
Ora, como que o Juiz Constitucional, no seu quotidiano, encara estes dois modos
(subsuntivo e tpico) de pensamento? o que se vai procurar saber na prxima parte.
PARTE II
O RACIOCNIO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO
1. Possveis influncias externas ao raciocnio do Juiz Constitucional?
Duas questes prvias relevam para compreender o pensamento jurdico do Juiz
Constitucional moambicano.
A primeira liga-se possibilidade ou no de influncias externas (polticas ou no) que
o Juiz Constitucional pode sofrer devido s escolhas constitucionais das formas de sua
designao.
Com efeito, da anlise da composio do Conselho Constitucional, em particular, dos
ns 2 e 3, ambos, do artigo 242 da Constituio da Repblica, Os Juzes Conselheiros do
Conselho Constitucional so designados para um mandato de cinco anos, renovvel e gozam
60 ATIENZA, Manuel. Ob. cit.p. 70.61Idem,p. 79.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOde garantia de independncia, inamovibilidade, imparcialidade e irresponsabilidade e Os
Juzes Conselheiros do Conselho Constitucional, data da sua designao, devem ter idade
igual ou superior a trinta e cinco anos, ter pelo menos dez anos de experincia profissional na
magistratura ou em qualquer actividade forense ou de docncia em Direito, respectivamente,pode extrair-se algumas ilaes sobre a forma como o Legislador Constitucional pretendeu
consolidar o rgo apesar de ter na sua composio cinco Juzes Conselheiros designados
pela Assembleia da Repblica segundo o critrio da representao proporcional62 e um Juiz
Conselheiro nomeado pelo Presidente da Repblica que o Presidente do Conselho
Constitucional63.
O Legislador Constituinte pretendeu que, apesar de a composio incluir elementos
provenientes da confiana poltica, nomeadamente seis dos sete membros, o Conselho
Constitucional fosse um rgo de grande prestgio e confiana nacionais, assegurada, por um
lado, atravs das caractersticas profissionais e pessoais dos seus membros e, por outro, por
meio de normas de organizao e funcionamento que o regem.
Por isso, traar o pensamento jurdico do juiz constitucional passa, necessariamente,
pela compreenso da sua composio e regras do seu funcionamento, no sentido de ver se estas
conferem ou no garantias suficientes de imparcialidade e independncia.
Primeiro, a questo a levantar tem a ver com a confiana poltica que os seis juzes do
Conselho Constitucional devem ter para com os seus proponentes, nomeadamente, oPresidente da Repblica e os Partidos Polticos representados na Assembleia da Repblica.
Nesta questo, a Constituio da Repblica quando afirma que os cinco membros so
designados pela Assembleia da Repblica segundo o princpio da representao proporcional
dissimulou a confiana poltica, sem querer dizer, necessariamente, que tais Juzes sejam
tambm membros dos respectivos Partidos Polticos proponentes, a verdade que haver
sempre confiana poltica entre o titular do cargo e o partido. Esta confiana pode muito bem
ser consolidada atravs da disciplina partidria de que o temor reverencial h-de ser sempre
um factor determinante para a sua observncia64.
62 Alnea b) do n. 1 do artigo 242 da Constituio da Repblica.63 Alnea a),Idem.64 COMOANA, Paulo Daniel. Uma Viso Jurdico-Administrativa da Comisso Nacional de Eleies,p. 4.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOPorm, a inamovibilidade e irresponsabilidade que so conferidas a estes membros
permite que, na sua actuao, o princpio da independncia supere o temor reverencial a
exercer pelos partidos polticos, conferindo, consequentemente, ao Juiz Constitucional um
estatuto de independnciasupra partidria.A inamovibilidade uma super garantia da independncia e imparcialidade do
magistrado. Ela protege ao Juiz dos abusos dos governantes, das ameaas, da arbitrariedade do
poder, quer se trate de favores imerecidos, quer de medidas como uma transferncia, uma
demisso ou uma preterio na promoo65.
O artigo 62 da Lei Orgnica do Conselho Constitucional, de forma clara, veda aos
juzes o exerccio de cargos polticos e de militncia activa em partidos polticos, bem como
suspende qualquer estatuto decorrente da sua filiao partidria66.
Desta forma, a inamovibilidade e irresponsabilidade do Juiz Constitucional pem,
formalmente, termo s possveis influncias da disciplina partidria, devendo este actuar
conforme a sua conscincia ao apreciar e aplicar a lei aos factos. Na essncia, tem sido a forma
de designao que leva a uma pretensa desconfiana na actuao do Juiz Constitucional.
Porm, a desconfiana sempre um captulo muito avanado na histria de uma confiana 67
e, portanto, em Moambique, sendo ainda nascente a Jurisdio Constitucional, a paisagem
constitucional , tambm, jovem e por lapidar.
A segunda liga-se descoberta do raciocnio jurdico do Juiz Constitucional, oumelhor, do modo de pensar do Juiz, quando aplica o Direito Constitucional ao problema, a que
se deve dar soluo. VIEHWEG define o problema como sendo toda questo que
aparentemente permite mais de uma resposta e que requer necessariamente um entendimento
preliminar, de acordo com o qual toma o aspecto de questo que h que levar a srio e para a
qual h que buscar uma resposta como soluo68.
Para alcanarmos a linha do Pensamento Jurdico do Juiz Constitucional moambicano,
ao dar soluo ao problema, passa, necessariamente, por compreender como que ele faz, nas
suas decises, a interpretao dos fenmenos polticos e jurdicos quando chamado a intervir,
65 Nestes termos, vide FRAGA, Carlos. Subsdios para a Independncia dos Juzes,p. 60.66 Cfr. Artigo 62 da Lei n. 6/2002, de 06 de Agosto.67 ORTEGA Y GASSEY, apud CASTANHEIRA NEVES. Questo de Facto Questo de Direito ou o
Problema Metodolgico da Juridicidade,p. 63.68 VIEHWEG, Theodor. Tpica e Jurisprudncia,pg. 31.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOtendo em conta que toda a interpretao deve ser situada dentro de uma vivncia histrica,
poca que, envolvendo factos reais, impe a subsuno destes nas normas jurdicas e,
consequentemente, buscar soluo que influencia os poderes pblicos e os particulares.
Como nos elucida PERELMAN assim como o legislador no interpreta aConstituio, mas decide votar certas leis, em virtude do poder legislativo que a Constituio
lhe atribui, assim tambm o juiz, ao aplicar a lei, no tem como misso dizer qual o seu
sentido correcto (richtig), mas decidir de facto, prolatando seu aresto, qual , dentre as
interpretaes possveis da lei, aquela que ele quer favorecer na ocorrncia69.
2. O pensamento lgico-dedutivo como pilar do raciocnio do Juiz
Constitucional
Conforme assinalmos, anteriormente, o pensamento subsuntivo consiste num esquema
de realizao do Direito que se decompe em vrias actividades do Juiz: a delimitao das
questes de facto com preciso, a determinao da fonte ou da norma aplicvel, a suainterpretao, eventual integrao de lacunas e o processo de qualificao jurdica dos factos e
sua subsuno norma, resultando da a concluso, pela aplicao da norma ao facto.
A construo jurdica de uma sentena, neste caso, de acrdos segue uma
regulamentao especfica, nos termos do artigo 659. do Cdigo do Processo Civil, 1. A
sentena comea pela identificao das partes (). 2. Seguem-se os fundamentos e a deciso.
O juiz toma em considerao os factos (); depois interpreta e aplica a lei aos factos,
concluindo-se pela deciso70. Por seu turno, o artigo 660. do mesmo diploma legal refere que
O juiz conhece, em primeiro lugar, e pela ordem estabelecida no artigo 288., das questes
que possam conduzir absolvio da instncia, nomeadamente, os casos de absolvio da
69 PERELMAN, Chaim.tica e Direito,p. 475.70 Itlico nosso.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOinstncia, o que implica, automaticamente, a absteno do juiz de conhecer do pedido e
consequente absolvio da instncia.
Este quadro delimitador da aco do juiz deriva da previsibilidade do direito, com
particular destaque, nos pases que adoptaram o sistema romano-germnico, pois, quando ojuiz recebe um litgio para dirimir, em primeiro lugar, como estatui o artigo 660. do Cdigo
do Processo Civil, comea por procurar a regra de direito que lhe habilite a conhecer do litgio
(a competncia do tribunal), seguindo-se, no momento posterior, a anlise de outros casos que
possam impedir o conhecimento do pedido.
Ultrapassadas as questes preliminares ou prvias, o juiz avana no sentido de,
delimitados os factos com preciso, procurar a regra de direito aplicvel ao caso e sua,
consequente, interpretao, dentro dos limites do pensamento lgico-subsuntivo.
A regra de direito escolhida pelo juiz para o caso concreto, devido sua generalidade,
implica, sempre, uma tarefa de interpretao das frmulas legislativas escolhidas pelo
Legislador, o que no ocorre nos pases da common law,pois a tcnica jurdica se caracteriza
pelo processo das distines.
Como explica Ren DAVID A boa regra de direito no concebida aqui e l do
mesmo modo: nos pases de common law deseja-se que as regras de direito sejam formuladas
dum modo to precioso quanto possvel; nos pases da famlia romano-germnico considera-
se, pelo contrrio, como desejvel que a regra de direito deixe uma certa margem de liberdadeao juiz, sendo a sua funo unicamente estabelecer quadros para o direito e fornecer ao juiz
directivas. O autor da regra de direito () no deve ir muito longe e esforar-se por regular
detalhadamente, porquanto ele incapaz de prever, na sua variedade, todos os casos concretos
que se apresentaro na prtica71.
O juiz, no sistema continental, deve ter, em primeiro lugar, uma norma habilitadora da
sua actuao, para dela deduzir a sua competncia orgnica. Nisto baseou-se o Conselho
Constitucional ao rejeitar de conhecer o pedido de oitenta e seis Deputados da Assembleia da
Repblica que, nos termos da alnea c) do n. 2 do artigo 245 da Constituio, requereram, a
27 de Novembro de 2007, a declarao da inconstitucionalidade ou ilegalidade dos Despachos
Presidenciais n. 25 e n. 26/2007, de 21 de Agosto, nos quais so nomeados como Juzes
71 DAVID, Ren. Os Grandes Sistemas do Direito Contemporneo,p. 105-106.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOConselheiros do Tribunal Administrativo, respectivamente, Jos Ibraimo Abudo e David
Zefanias Sibambo72.
Neste caso, o Conselho Constitucional, ao negar o pedido, argumenta que O artigo
241 da Constituio define o Conselho Constitucional como ...o rgo de soberania, ao qualcompete especialmente administrar a justia, em matrias de natureza jurdico-constitucional.
No havendo dvidas de que o objecto do pedido, isto , os Despachos Presidenciais de
nomeao de Juzes Conselheiros do Tribunal Administrativo, contm matria de natureza
jurdico-constitucional, pareceria, em princpio, caber a este Conselho o seu conhecimento.
Contudo, o artigo 241 limita-se a definir a natureza deste rgo de soberania, e, em
termos genricos, a sua rea de competncia em razo da matria, no sendo legtimo, ainda
que a sua letra pudesse, erradamente, induzir a tal, dele derivar directamente atribuies ou
competncias especficas.
Com efeito, no artigo 244 que se definem especificamente as competncias do
Conselho Constitucional, estabelecendo, a alnea a) do seu n.1, a de apreciar e declarar a
inconstitucionalidade das leis e a ilegalidade dos actos normativos dos rgos do Estado.73.
Para o Conselho Constitucional no basta a simples classificao da matria como
jurdico-constitucional, para da concluir-se na sua competncia, preciso que uma disposio,
clara e expressa, integre essa matria na sua competncia. Neste contexto, s matria denatureza normativa se enquadra na competncia orgnica do Conselho Constitucional. Porm,
reconhece o mesmo Conselho Constitucional que apesar de a nomeao feita pelo Presidente
da Repblica dever sujeitar-se ao princpio da legalidade e da subordinao do Estado
Constituio, tal no quer dizer que o Conselho Constitucional se deva pronunciar sobre actos
que no sejam normativos, neste caso actos tendencialmente polticos.
Neste particular, pronunciou-se no sentido contrrio da deliberao do Conselho
Constitucional, o Juiz Constitucional Manuel Franque, expendendo que Os Despachos
Presidenciais nmeros 25 e 26/2007, de 21 de Agosto, no so actos polticos stricto sensu na
medida em que, carecendo embora de contedo normativo em sentido material, os Juzes
Conselheiros do Tribunal Administrativo nomeados, no exerccio das suas funes, so
72 Acrdo n. 7/CC/2007, de 18 de Dezembro, j citado.73Idem,p. 3.
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOindependentes, devem apenas obedincia lei, gozam de garantias de imparcialidade e so
inamovveis, nos termos do artigo 217 da Constituio. De realar tambm que as referidas
nomeaes no foram de livre vontade ou critrio de quem os nomeou, mas antes foram, ou
melhor, deviam ter sido sob proposta do Conselho Superior da Magistratura JudicialAdministrativa, nos termos do n 3 do artigo 229 da Constituio. Na nomeao poltica, por
exemplo de um Ministro, tpico acto poltico stricto sensu, o nomeado, segundo os critrios e
vontade de quem nomeia, tem o dever de lealdade e obedincia para com a entidade que
pratica o acto, no inamovvel (pode ser livremente demitido em qualquer momento), no
goza de garantias de imparcialidade e recebe instrues de variada natureza, incluindo
polticas.
que um acto poltico est, sempre, na disponibilidade de quem o pratica. O que no
o caso do presente processo. Da no colher o argumento de insindicabilidade dos referidos
Despachos Presidenciais pois deviam ser fiscalizados recorrendo-se interpretao e
integrao da Constituio.
Esta justificao viria a ser adoptada nos acrdos 3 e 4/CC/2008, ambos de 3 de Abril
sobre o pedido de declarao de inconstitucionalidade do exerccio de funes de Procurador-
Geral da Repblica por parte do actual titular, Dr. Augusto Raul Paulino, nomeado pelo
Despacho Presidencial n. 28/2007, de 29 de Agosto e da proposta do Conselho Superior da
Magistratura do Ministrio Pblico que indica novos Procuradores Gerais Adjuntos, quando,novamente, o Conselho Constitucional negou de dar provimento ao pedido, alegando sua
incompetncia.
Note-se que a posio deste Juiz no foge do modo sistemtico ou do raciocnio
subsuntivo. Todavia, ele entende que possvel considerar-se competente o Conselho
Constitucional a partir do seu enquadramento no princpio estabelecido no n. 3 do artigo 2 da
Constituio da Repblica, bem como a partir do processo de interpretao baseado nos artigos
9. e 10., ambos do Cdigo Civil.
A questo que este juiz levanta coloca-se no mbito da problemtica das lacunas na lei
ou no direito74.74 Sem maior esforo, aquele Juiz Constitucional poderia melhor ter integrado a sua pretenso nos termos do n. 2
do artigo 228 da Constituio, remetendo o caso ao Tribunal Administrativo. Com efeito, cabe a este rgo de
soberania 2. O controlo da legalidade dos actos administrativos (). Podendo, neste caso, procurar-se a
soluo nestes termos.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOOra, neste caso particular, era preciso saber se estamos em presena de omisso no
sentido de lacuna de lei (incompletude do sistema)75 ou omisso no sentido de vazio da lei
quanto matria relativa fiscalizao dos actos que no se enquadram nos comandos gerais,
abstractos e hipotticos.Em Moambique, e nos pases que consagraram os sistema romano-germnico, a
misso de elaborar incumbe ao Legislador, portanto, () h limites para o poder do juiz,
porque este deve dizer o direito, mas no pode ir contra a vontade expressa ou presumida do
legislador. Se h vazios no direito positivo (), no papel do juiz remedi-las, mostrar-se-
indispensvel um apelo ao legislador76.
Em direito, o juiz pode colmatar as lacunas da lei utilizando todos os caminhos
indicados pelo juiz Conselheiro Manuel Franque, mas no pode fazer o mesmo em relao aos
vazios. Tratando-se de vazio nada pode o juiz fazer, sob pena de substituir o legislador na
sua funo legislativa, o que atentaria contra o princpio da separao de poderes, ou melhor,
situaria o juiz perante o vcio de usurpao de poder.
Assim, pode negar-se a existncia de lacuna na Constituio em relao fiscalizao
dos despachos de nomeao presidencial, quando a alnea a) do artigo 244 da Constituio da
Repblica no os contempla. Portanto, estamos em face de vazio, cuja sanao cabe s
escolhas do Legislador Constituinte.
Todavia, o fundamento do Conselho Constitucional, ao rejeitar de conhecer os pedidos,deve ser analisado, cuidadosamente, partindo do conceito das expresses leis e actos
normativos utilizadas pela alnea a) do artigo 244 da Constituio da Repblica, bem como o
fundamento do Juiz Constitucional que se pronunciou em sentido oposto quelas deliberaes,
o de que, embora os despachos presidenciais sejam actos polticos carecem de fiscalizao,
com base na integrao e interpretao da constituio, isto , o admitir-se que estamos em
face de lacunas na lei?
75 lacuna em direito corresponde, num sistema formal, a noo de incompletude. Dir-se- de um sistema
formal que ele incompleto quando, a partir dos axiomas e das regras de inferncia do sistema, impossvel
demonstrar uma proposio que se pode formular dentro do sistema, da qual no se pode provar nem a verdade
nem a falsidade in PERELMAN, Chaim. Ob. cit.p. 578.76 PERELMAN, Chaim. ob. cit., p. 580.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANO2.1. O conceito de leis e actos normativos no mbito da alnea a) do artigo
244 da Constituio da Repblica
O que se vai debater a seguir , resumindo, o contedo do ttulo em epgrafe, adefinio do conceito de norma para efeitos de controlo ou fiscalizao da
constitucionalidade perante o Conselho Constitucional. Sem definir o conceito de norma, o
Conselho Constitucional negou de conhecer os pedidos dos deputados, alegando que os
Despachos do Presidente da Repblica no integram, ou melhor, no tm matria de natureza
normativa que se possa enquadra na competncia orgnica do Conselho Constitucional.
A concluso do Conselho Constitucional resulta do modo sistemtico ou subsuntivo de
pensamento, pois, embora no definindo o conceito de norma, o rgo procede tentativa de
enquadramento dos Despachos no conceito de norma e chega concluso de que o contedo
dos despachos no normativo. Que conceito ser esse de norma utilizado pelo Conselho
Constitucional?
Pela doutrina, CARDOSO DA COSTA, para efeitos de fiscalizao da
constitucionalidade, adopta um () conceito funcional de norma, conceito que toma como
critrio ou ponto de vista determinante a natureza e sentido da funo que ao Tribunal se quis
atribuir, a saber, a de controlo da conformidade constitucional do ordenamento jurdico
objectivo estabelecido pelo Estado, lato sensu, enquanto quadro em que vai desenvolver-se aactuao jurdica das entidades pblicas e dos particulares77.
O afastar do conceito material reside no que este sentido exige requisitos da
generalidade e abstraco, porque no conceito funcional de norma inclui-se, mais do que estes
dois caracteres, qualquer acto do poder normativo do Estado, ainda que de contedo individual
e concreto, desde que no seja um acto poltico, ou de governo no sentido estrito que resultam
do exerccio da funo poltica, actos administrativos decorrentes do exerccio a funo
administrativa, desde que no incorporados em diplomas legais e em decises judiciais.
Para o Professor GOMES CANOTILHO, o conceito de norma para efeitos de
fiscalizao da constitucionalidade fundamentalmente um conceito de controlo ao qual est
77 CARDOSO DA COSTA, Jos Manuel M,A Jurisdio Constitucional em Portugal,p. 35.
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOsubjacente uma componente de proteco jurdica tpica do Estado de direito democrtico-
constitucional78.
O conceito de norma para efeitos de controlo da constitucionalidade deve ser aquele
que se encontra inserido num diploma de tipo normativo, bem caracterizado pelo artigo 143
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da Constituio da Repblica, ou que se enquadre naquela previso normativa.
Pela jurisprudncia afora, o Tribunal Constitucional Portugus estabeleceu, de forma
inequvoca, a definio do conceito de norma para efeitos de fiscalizao da
constitucionalidade, no seu Acrdo n.26/85, que () na averiguao e determinao do
que seja norma, para efeito, no pode partir-se de uma noo material, doutrinria e
aprioristicamente fixada, desse conceito80. E, consequentemente, no se pode partir () da
ideia clssica que liga ao mesmo conceito as notas da generalidade e da abstraco81.
A jurisprudncia portuguesa avana que () por um lado, cada vez maior a
fragilidade de um conceito de norma assente em ambas as notas (generalidade e abstraco) e,
por outro, se considerarmos a prtica constitucional do nosso tempo, assiste-se por toda a parte
() proliferao do fenmeno ou da figura das leis-medida ou leis-providncia () as
quais traduzem a necessidade, porventura insuprvel, da interveno directa do poder
legislativo na complexa gesto poltico-administrativa (nas reas econmica e social, etc.) hoje
exigida ao Estado, as quais se caracterizam, numa larga escala do seu contedo, por uma
natureza concreta e individual. Deste modo, no obstante o afastamento destas leis do conceitoclssico de norma, nenhum sentido faria que tais leis ou as normas que as integram
escapassem ao especfico controlo da constitucionalidade, sobretudo sendo certo que no seu
78 GOMES CANOTILHO, J. J.,Direito Constitucional e Teoria da Constituio,p. 822.79 O artigo 143 tem como epgrafe, Actos normativos: 1. So actos legislativos as leis e os decretos-lei. 2. Os
actos da Assembleia da repblica revestem a forma de lei, moes e resolues. 3. Os decretos-lei so actos
legislativos aprovados pelo conselho de Ministros mediante autorizao da Assembleia da Repblica. 4. Os actosregulamentares do Governo revestem a forma de decreto, quer quando determinados por lei regulamentar, quer no
caso de regulamentos autnomos. 5. Os actos do governador do banco de Moambique, no exerccio das suas
competncias, revestem a forma de aviso.80In Acrdos do Tribunal Constitucional,p. 7 e ss, cujo Relator do Acrdo foi Jos Manuel M. CARDOSO DA
COSTA.81Idem,p.18
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ALBANO MACIERELATRIO DE METODOLOGIA JURDICA
RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOmbito ainda maior o risco da desateno e do desrespeito pelas exigncias
constitucionais82.
Em suma, normas susceptveis de fiscalizao da constitucionalidade sero todos os
actos do poder pblico que contiverem uma regra de conduta para os particulares ou para aAdministrao, um critrio de deciso para o juiz, em geral, um padro de valorao de
comportamentos83.
Que dizer do posicionamento do Juiz Conselheiro Manuel Franque, que considera
sindicveis os Despachos do Presidente da Repblica de nomeao dos Juzes Conselheiros do
Tribunal Administrativo e dos Procuradores-Gerais Adjuntos?
Em primeiro lugar, dado assente que estes despachos constituem actos com
relevncia poltica e, como tal, consistem simplesmente em actos de aplicao, execuo ou
pura e simplesmente actos de utilizao ou materializao de normas, em particular,
constitucionais, e como tal, enquadram-se, perfeitamente, neste sentido, na previso normativa
do n. 2 do artigo 3 da Constituio da Repblica.
Em segundo lugar, ningum negar que a prpria Constituio, resultado de escolhas
do Legislador Constituinte, que colocou nas mos do Chefe do Executivo amplos poderes de
controlo do sistema, ficando merc da sua vontade a escolha das figuras a nomear. Isto , os
Despachos de nomeao, resta indubitvel, so absolutamente polticos.
Expliquemos melhor isto!Para o caso dos procuradores-gerais. Os Despachos do Presidente da Repblica de
nomeao constituem verdadeiros actos polticos84 de aplicao e utilizao das disposies
82Ibidem.83 Cfr. LOPES DO REGO, Carlos, Objecto Idneo dos Recurso de Fiscalizao Concreta da
Constitucionalidade: As interpretaes normativas sindicveis pelo Tribunal Constitucional, n Jurisprudncia
Constitucional, n. 3, 2004, p. 4.84 Sobre actos polticos, pode conferir-se Cristina M. M. QUEIROZ. Os Actos Polticos no Estado de Direito, O
Problema do Controle Jurdico do Poder. Quando fala da dupla reduo da insidicabilidade do acto poltico. Dajurisdio administrativa a jurisdio constitucional, a Autora enfatiza que o controlo jurdico de tais actos,
rigorosamente entendidos como actos polticos, no se apresenta tanto como um problema da competncia dos
tribunais de justia administrativa quanto como um problema da competncia dos tribunais de justia
constitucional. O acto de governo, longe de se exteriorizar como um acto da administrao dimanado no uso de
um poder discricionrio, percebe-se finalmente comoacto poltico, isto , como acto exercitado em virtude de
uma reserva de poder poltico, em relao ao qual no pode, portanto, pr-se em movimento o mecanismo de
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RACIOCNIO JURDICO DO JUIZ CONSTITUCIONAL MOAMBICANOconstates do artigo 240 da Constituio da Repblica, sem trazer consigo nenhum contedo
normativo no sentido de normas gerais e abstractas ou de condutas para os particulares ou para
a Administrao Pblica susceptveis de enquadramento na previso da alnea a) do n. 1 do
artigo 244 da Constituio da Repblica.Sendo um verdadeiro acto poltico, os procuradores-gerais adjuntos no possuem a
necessria autonomia e independncia para exercer as suas funes, uma vez que bastar
contrariar as orientaes do Presidente da Repblica (pois perante ele respondem) para que
sejam demitidos e exonerados85. Desta forma, os procuradores-gerais so nomeados e
exonerados livremente pelo Presidente da Repblica, o que lhes torna meros agentes polticos
do Governo.
compreensvel esta situao tendo em conta que o amadurecimento institucional ,
ainda, um caminho por percorrer com a devida certeza nos passos a dar. Neste sentido, Pontes
de MIRANDA criticava a nomeao dos Chefes do Ministrio Pblico no Brasil pelo
Presidente da Repblica, da seguinte maneira: () como se h-de esperar que denuncie altas
autoridades da administrao financeira e da polcia quem, com tal atitude, se exporia
demisso?86.
No futuro, no repugnar que o Procurador-Geral e seus adjuntos sejam eleitos pelos
seus pares (colgio de procuradores) ou atravs da Assembleia da Repblica, como ocorre com
o Provedor de Justia.Em relao aos juzes Conselheiros do Tribunal Administrativo. O Juiz Conselheiro
Manuel Franque, a dado passo da sua tese, argumenta () que Os Despachos Presidenciais
nmeros 25 e 26/2007, de 21 de Agosto, no so actos polticos stricto sensu na medida em
que, carecendo embora de contedo normativo em sentido material, os Juzes Conselheiros do
Tribunal Administrativo nomeados, no exerccio das suas funes, so independentes, devem
apenas obedincia lei, gozam de garantias de imparcialidade e so inamovveis, nos termos
do artigo 217 da Constituio87.
controlo previsto no n. 3 do artigo 268. da Constituio. ().85 Cfr. n.1 do artigo 239 da CRM.86In Comentrios Constituio de 1967, Forense, Rio de Janeiro, 3.a ed.,