quintiliano-institutio

Upload: fabio-oliveira

Post on 06-Jul-2015

374 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

InstitutioOratoria A RetoricaParte do Livro II QuintilianoIndiceLivroII . . . . . . . . . . . . . . . . 1XI. Necessidade da instrucaoretorica. . . . . . . . . . . . . . . 1XII. Por que razao parecemser melhores os oradores semformacaoacademica . . . . . . . . 2XIII - Dimensaodaretoricaci-entca . . . . . . . . . . . . . . . 3XIV-Osconceitosdaretorica . . 5XV-Denicoesderetorica . . . . 6XVI- Vantagens e desvantagensdaretorica . . . . . . . . . . . . . 11XVII-Earetoricaumaarte?. . . 11XVIII-Aretoricaeasartesans . 11XIX-Donsnaturaisearte . . . . 11XX-Earetoricaumavirtude? . . 11XXI-Materiadaretorica . . . . . 11ARetoricadeQuintiliano(nasceuem35esabe-se que morreuantes doano100) e com-postade12livros.OLivroII ecompostode21captulos.Aedicaoutilizadaparaestatraducaoe a edicao bilingue, editada e traduzida por Hel-mut Rahn, publicada na Wissenschaftliche Buch-gesellschaft, Darmstadt, 19882(1975). Oobjec-tivodestatraducao,feitadirectamentedolatimecotejadacomatraducaoalema, efundamen-talmente pedagogico pois visa servir de texto deapoioaosalunosdaDisciplinadaRetoricadoscursosdeCienciasdaComunicacaoedeFiloso-a da Universidade da Beira Interior. O docenteAntonio Fidalgo ([email protected]).LivroIIXI.Necessidadedainstrucaoretorica1- Agora temos de nos debrucar sobreaquelapartecomquecostumamcomecarosqueomitemaquiloqueapresentei ateagora:emboratenhadeenfrentarlogoaoincio as objeccoes dos que pensamqueaeloquencianaoprecisaderegras dessetipo, mas que, considerando que lhes bastaaproprianatureza,arotinahabitualeosexercciosescolares, seriemdonossoafa,e recorrendo ao grande exemplo de profes-sores de renome, dos quais um, se bem melembro, interrogado sobre o que era c,vue ocu,1respondeuque naosabia, masquequandosetratavadeosaplicar,esta-vamcontidosnasuadeclamacao. 2- Umoutro, `a pergunta se estava do lado de Te-odoreuoudeApolodoreu, respondeuqueestavadoladodosgladiadores.Claroquenao poderia declarar commais classe asuaignorancia. Naverdade, aqueles quegracasaotalentosaotidoscomoexcelen-tes e que tambemdisserammuitas coi-sas dignas de memoria, sao acompanhadospor muitos que os assemelham no desprezodasregras, maspormuitopoucosquese1Esquemae pensamento.2 Quintilianolhes equiparem no talento. 3- Vangloriam-se assim de seguir o seu impulso e de con-arnaspr opriasforcas; poisquenaoim-porta nem a justicacao nem a disposicaodostemaspropostos, massimaquiloqueleva a encher um auditorio, a saber, fraseseloquentes, de que as melhores sao as nas-cidasemmomentoscrticos. 4-Emesmoquandopreparamas ideias, ousepoem,semqualquer plano, a olhar para o ar,eesperamdurantediasquelhesadvenhaum momento de inspiracao, ou entao, mo-vidossejaporummurm urioincertosejaporumsinalinstintivoentregam-seaummovimento rapidssimo do corpo nao parapronunciar quaisquer palavras, masparaas procurar. 5- Alguns, mesmoantes deencontraremosentido,adoptamdetermi-nadosprincpiosaquesujeitamqualquerdiscursoeloquente; edepois deos teremdurante muitotempoe claramente pen-sado, mas faltando-lhes aperspectivadeumapossvel ligacao, divergemparaou-tros assuntos e mais outros ainda, nao me-nos familiares e conhecidos. 6- Os que pa-recemsermaisinteligentesnaoseatemacasos em geral, mas apenas a pontos parti-culares, semsepreocuparemossistema-tizar, mas atiram-nos empedacos `ame-didaquelheschegam`asmaos. 7-Donderesulta que um discurso feito de partes dis-persas ediversas naopodeser coerente,e assemelhar-se-a aos cadernos dos me-ninos daescolaemqueestes apontamoque e louvado no discurso de outros. Con-tudo, conseguemproduzir grandes frasese ate coisas boas (e costumamtambemvangloriar-secomisso);masissotambemo fazem os escravos e os barbaros, e se issofosseobastante, entaonaohaveriarazaodeserparaaretorica.XII.Porquerazaoparecemsermelhoresosoradoressemformacaoacademica1- Nao pretendo de algummodo negar,alias opiniao corrente, de que parecemmais fortes os oradores semformacao.Essaopiniaoassentadesdelogonojuzoerradodequemjulgaqueaforcaemaiorquandofaltaaarte, tal comoquandosepensaque rebentar e mais forte doqueabrir, romper do que resolver ou empurrardoquelevar. 2- Poisquetantoogladia-dorque, ignorantenomanejodasarmas,selanca`apeleja, comoolutadorqueseempenhacomtodooseucorponainves-tida, sao chamados de mais fortes, quandopor vezeseatefrequentementesaoleva-dos aochaopelas proprias forcas ecomumleve movimento evitariamas inves-tidas veementes dos adversarios. 3- Masenestasituacaoqueos inexperientes fa-lhamnaturalmente;comefeito,emboraadivisaosejadecisivanos pleitos, elapa-recediminuirasforcas, tal comosejulgaqueogrosseiroemaisfortequeopolido,e o que esta disperso e mais numeroso queoque estaordenado. 4- Por outrolado,tambemacontecequeasvirtudeseosde-feitossetocam, detal modoquesecon-fundemaledicenciacomfranqueza, teme-ridade com coragem e sumptuosidade comriqueza. Quem nao tem formacao cai maisapique e mais vezes namaledicencia, efrequentemente mesmosobriscode issose voltar contra si proprio. 5- Esta opini aotambemereforcadapelofactodequeoque os homens mais gostamde ouvir eaquiloqueelespropriospreferiamnaodi-zer. Tambemincorremnumoutroperigoque reside na propria apresentacao do dis-www.bocc.ubi.ptInstitutioOratoriaARetorica 3curso e que consiste emnada recear eatrever-seatudo, donderesultaqueen-contra por vezes coisas grandes quem andasempre `a procura dos extremos. Contudo,issoe raroe naocompensaaquedaemoutroserros.6-E por causa destas coisas que por ve-zes os oradores sem formacao parecem terummaior leque de recursos, porque di-zemtudo, aopassoqueosoradorescomformacaoprocedemaumaseleccaoetemtino no que dizem. Acresce a isso queos primeiros descuramemprovar aquiloquequeremdemonstrar.Dessemodoevi-tamasquestoeseosargumentosquepa-recemdesinteressantesapessoasdejuzojadesbotado, e nadamais procuramdoque o que agrada, por vol upia rasteira,aos ouvidos dos assistentes. 7- De igualmodo, mesmo as frases soltas, que e a unicacoisaquelhesinteressa,soamtantomelhorquantomaissordidoeabjectofortudo `a sua volta. Pois que, tal como Ccerodiz, naoeentreassombrasqueasluzesmaisbrilham,masnomeiodetrevaspro-fundas.Sesequiser,chamem-segeniaisaessesoradores,poremdesdequeesselou-vor seja tido como ofensa a um orador ver-dadeiro. 8- No entanto, nao se pode negarque a formacao suprime algo, como a lima`asarestas, asaadoras`asobtusidades, ea idade ao vinho; mas o que retira sao de-feitos, tal como so e menor porque melhoraquiloqueaformacaoliterariaeliminaaoburilarumtexto.9- Na verdade, tambem na apresentacaoessesoradoresprocuramafamamedianteumdiscursomaisexagerado;gritamtudoe em todo o lugar e, como eles proprios di-zem,dem aolevantada,corremcomolou-cos, esbaforidos, gesticulando, abanandoviolentamente coma cabeca. 10- Comefeito, bater palmas, bater comope nochao, oubaternaperna, nopeitoounafronte, temlogoumefeitoespantosonopovosimples.Aocontrario,ooradorcomformacao tal como num discurso sabe dife-renciar, variar, dispor, as muitas materias,assimtambemnaapresentacaosabeade-quarcadaumdosseusactos`atonalidaderespectiva do que diz, e se algo e digno deatencaopermanente, entaoprefere ser eparecer modesto. 11- E esses tais oradoreschamam de discurso forte `aquilo que e an-tes um discurso violento. Mas o que e piorequeseencontramnaosooradoresdes-ses, mas tambemprofessores deoratoriaque, apos um breve exerccio, omitem todaateoria, conformelhesapetece, eacadapassocriticamosquehonrammaisateo-riaechamam-nosdeincapazes,pacovios,fracotes e doentios, e outros nomes des-prezveis que lhes vem `a cabeca. 12- Resta-noslouvaressesquesemesforco, semre-ectir ou sem a aprendizagem da retorica,sao todavia eloquentes. Quanto a mim,porem, quejahamuitomeafastei tantodoensinocomodoforodostribunais,porconsiderarquepararporminhainiciativaeramelhorenquantoosoutrosaindade-sejavamquecontinuasse, preronomeuocioganhar algumconsolo, investigandoeescrevendomaterias quenofuturopo-deraoser uteisajovensinteligentes, con-forme julgo, e ainda, desse modo, obteralgumprazernisso.XIII-Dimensaodaretoricacientca1-Ninguem, porem, meexijaaqueletipodepreceitosquemuitosautoresdelivroswww.bocc.ubi.pt4 Quintilianode retorica costumam apresentar, como setivesse de impor regras obrigatorias, ne-cessariamenteimutaveis, paraos quees-tudam a retorica, nomeadamente, uma in-troducao,comtaletalformato,depoisanarracaoe aseguir, conforme as regras,a descricao do assunto, ouentao, comoalguns gostam, uma digressao, depois aordenacaorigorosadasquestoes, etc., talcomoofazemosbemmandados,comosefosseumainfraccaofaze-lodeoutrama-neira. 2- De facto, a retorica seria bemfacil eligeira, casopudesseser resumidanumbreve receituario. Ao inves, quasetudomudaconsoanteas causas, os tem-pos,aocasiaoeanecessidade.Eporissoqueacoisamaisimportantenaretorica eareexaoporqueseadapta`asdiferentescircunstancias.3-Queseriaseseprescre-vesse ao general, sempre que travasse umabatalha,dealinharavanguarda,defazeravancar os ancos e de lancar acavala-ria pelos lados? Sera eventualmente o me-lhormetodo, quandoforpossvel deexe-cutar,massesealteraratipologiadolo-cal,sehouverummonte,seumriocons-tituiumobstaculo,seoimpedemascoli-nas, as orestas ouoacidentadodoter-reno. 4- Ese muda o tipo de inimigo,entao tambemmuda a condicao da ba-talhanomomento: oranumataquefron-tal, oranumataqueemcunha, oracomastropasauxiliares, oracomalegiaoro-mana, e `as vezes ate convira voltar ascostas e simular umaretirada. 5- Assimtambemcadacasodiraseaintroducaoenecessaria ou superua, breve ou longa, see de se dirigir directamente ao juiz ou ape-nasindirectamenteatravesdeumaguradeestilo,seanarracaodeveserdensaoumais difusa, se contnua oudividida, selinear ounaolinear. 6- Eomesmovaledizer para o ordenamento das questoes,jaquenomesmopleitoefrequentepro-curar adiantar-se `aoutraparte litigantemedianteumapergunta. Naverdade, es-tespreceitosnaosaovalidadosporlei ouplebiscito popular, mas por aquilo, sejaoque for, que autilidade ditar. 7- Naonego, porem, queesses preceitos habitu-aissao uteisamaiorpartedasvezes; decontrario, nemvaleriaapenaestar aquiaescreveristo.Noentanto,seautilidadenosaconselharafazeroutracoisa, entaoha que lhe dar preferencia relativamente `aautoridadedosmestres.8-Queromesmo,muito em especial, dar aqui um conselhoerepeti-loincessantemente: doispontosdevistadeveoorador ter emcontaemcadaumdosseusactos:oqueseimpoeeo que e conveniente. Ora e conveniente fre-quentemente alterar a ordem antes estabe-lecida e habitual, e por vezes isso tambemseimpoe, comovemosnaspinturasenasesculturas, em que se muda a atitude, a ex-pressaofacial eaposicao. 9-Comefeito,ocorpodepeeoquetemmenos graci-osidade; umacaravoltadaparaafrente,osbracoscadosadireito, ospesunidos,issoseraoquesechamaumaobrargidadecimaabaixo. Flexvel, por assimdi-zer, sera aquela obra em que o movimentoempresta accao e comocao.E por isso queas maos nao sao moldadas apenas de umamaneira e ha milhares de formas no rosto.Ha estatuas que aparentamestar a an-dar, ou que simulam movimentam, outrasestao sentadas ou deitadas, umas est aonuas, outrasvestidas, outrasaindasemi-nuas. Havera porventura algo mais distor-cidoeelaboradoqueolancadordediscode Miron? Se, contudo, alguemcriticarwww.bocc.ubi.ptInstitutioOratoriaARetorica 5estaobrapelofactodenaoestardireita,nao denotara apenas falha de percepcao deumaarte, emqueanovidadeeadicul-dadeconstituemelementosdeadmiracaoelouvor?11-Demodosemelhanteofere-cem graca e prazer as guras retoricas pre-sentestantonossentidoscomonaspala-vras. Pois que alteram algo ao decurso nor-mal e tem ainda a vantagem de se liberta-remdocomumevulgar.12-Numquadrocostumaapresentar-se todaacara, con-tudoApellessomostraumladodacarade Antgono, de modo a esconder a defor-midadedafaltadeumolho.Naoteremosentaodenodiscursoesconderaquiloquenao deve ser expresso ouque nao podese-lodevido`adignidade dapessoa? 13-TalcomoTimantes,comocreio,deCitnofeznaquelequadroemquevenceuColotede Teio. Na verdade, quando, no sacrifciodeIgenia, depoisdeterpintadoCalcasentristecido, eUlisses aindamais, deuaMenelau uma tal expressao de dor quantolhopermitiaasuaarte.Gastostodoole-quedeemocoesenaosabendocomopo-deriaexprimir demododignoafacedopai, cobriu-lheacabecaedeixouacadaumatarefadeimaginaradordeste. 14-Naosepassaporventuraomesmocomoque Sal ustiodiz: sobre Cartagenaachoque emelhornaodizernadadoquedizerpouco?E por estas razoes que tomei porhabito ligar-me o menos possvel a pre-ceitos, queusualmentechamamosde-0o.,2istoe, comodiremosnamedidadopossvelemtermoslatinos,universaliaouperpetualia. Naverdade, poucoexistedeste generode preceitos que naopossadeummodoououtroserpostoemcausa2universais.ou mesmo destrocado. 15- Mas trataremoseste ponto commais detalhe a seu de-vidotempo; entretantoapenas pretendoevitar queosjovensseachemsuciente-menteinstrudoscomaleituradessesli-vritos deretoricaquecirculampor a, amaior parte das vezes em resumos, e se jul-guemcaucionadospelosconselhosdoses-pecialistas. Ora a arte da retorica consistede muitotrabalho, de estudoconstante,de muitoexerccio, de in umeras tentati-vas, demuitssimaprudenciaedemuitosanguefrionomomentoexacto.16-Con-tudo,podeserreforcadacomesseslivros,desdequeapontemumcaminhoadireitoaquem, julgandotratar-sedeumtrilhoapertadodoqualeprejudicial afastar-se,temdeaceitarquetemdeserpercorridopasso apos passo `a semelhanca dos que ca-minhamsobre arames. Por esse motivo,temosdesairfrequentementedocaminhoreal amde encurtar caminho, e se aspontesdocaminhoadireitoforamderru-badas pelaforcadas rios, temos de nosdesviar, eseasportasestiveremaarder,entaotemosdeforcarasadapelaspare-des. 17- Enorme e atarefa, complexaequase todos os dias uma nova, e nuncacompletamenteexpressaempalavras. Noentanto,procurareiensinartudooquedebomnos foi ateagoratransmitido, e, semeparecer ser melhor, mudar, acrescen-tar,oucortar.XIV-Osconceitosdaretorica1-Ostradutoresusaramoraoratoriaoraoratrixparaverteremparalatimotermogregorethorice.Naopretendoroubar-lheso merito que lhes e devido, por desse modowww.bocc.ubi.pt6 Quintilianoprocuraremaumentarariquezadolexicoromano. Todavia, nem tudo o que nos vemdosgregos edeseguir,talcomonaoode-vemfazerelesquandoquiseremdesignarcoisas nossas compalavras deles. 2- Taltraducao n ao e menos dura que essentiaeentiadePlauto3; e, alemdisso, nemcor-rectas.Eque oratoria ecoaracomoelo-cutoria, oratrix comoelocutrix, enquantoarethorice, dequefalamos,etal equalcomoaeloquentia.3-Nemhaqueduvi-darqueemgregootermoretorica temtambemumduplo signicado; por umlado, e umadjectivocomopor exem-plo, ars rethorica e navis pirata , poroutrolado, eumsubstantivo, onomedeuma coisa, tal como philosophia ou ami-citia.Oracomelepretendemossignicara substancia, tal como grammatice e lite-raturaen aoliteratrix ouoratrix, nemlitteratoria ou oratoria; nao se usa o sig-nicadodeadjectivonanossarethorice.4- Nao se faca disto um cavalo de batalha,sobretudoquandotemos deutilizar tan-tos termos gregos; por mim, continuarei adizer philosophi, musici egeometrae,semos violentar comumatraducaofeiaemlatim. E, por m, jaque M. T ulio4nosprimeiroslivrosqueescreveusobreotemausouotermogrego, naohaquedetodo nos envergonharmos, por parecer agirtemerariamente, aocreditarmosaomaiordosoradoresonomedasuaarte.5- A rethorice portanto pois que uti-lizaremossemmedodapolemicaestade-signacao deixa, segundo creio, dividir-seda melhor forma ao tratarmos da arte, do3Nao se trata do conhecido escritor decomedias latino, mas de um losofo estoico. N.T.4Prenomes de Ccero(MarcoT ulioCcero).N.T.artcee da obra. Artedeve ser entendidacomo disciplina: e a ciencia do falar bem.5Artceeoquerecebeestaarte:eoora-dor a quem cabe falar bem. A obra e o quee realizado pelo artce: e o bom discurso.Tudoistoporsuavezsedivideemsub-especies. Mas este assunto sera tratado nostiodevido. Agoraquerocomecarcomoquedevesertratadonaprimeiraparte.XV-Denicoesderetorica1- Antes de tudo o mais: o que e aretorica? Dene-se de diferentes maneiras,mas no fundo ha aqui uma dupla questao:adiferencadeopinioesestaounaquali-dadedapropriacoisaounacompreens aodaspalavras.Aprimeiraeaprincipaldi-ferencadeopinioesequeunsachamquetambem homens maus podem ser designa-doscomooradores, enquantooutros, nosquais me conto, apenas querematribuiresse nome e arespectivaarte ahomensbons. 2- De entre os que separam o dom dapalavraeumavidaaquesedeveprestarmaisemaiorlouvor, haunsqueaconsi-deram apenas uma faculdade (vis), outrosumaciencia(scientia),masnaoumavir-tude, unsqueatomamcomoumhabito(usus),outroscomoarte,masdistintadacienciaedavirtude, eaindaoutros quea temcomo uma arte depravada a quechamaramo.c,..63- Estes sao deopiniao que a tarefa do orador e persuadiroufalardeummodoaptoapersuadir, oque pode ser feito tambem por quem nao eumaboapessoa. Assim, adenicaomaisfrequentee ade retoricacomoaforcadepersuadir. Aoquechamofaculdade5bene dicendi scientia.6fraude, vigarice.www.bocc.ubi.ptInstitutioOratoriaARetorica 7(vis), muitos chamam capacidade (potes-tas), ealgunsdom (facultas). Paraquenaohajaconfusao,digoquefaculdadeeo.u.c.74- Esta opiniao tem a sua origememIsocrates, seforverdadequeedeleolivro que circula com o seu nome. Mas em-bora se distancie do desejo dos que queremvilipendiar aretorica, foi algoligeiroaodeniroobjectivodestaarte, namedidaemquedissequearetoricaeraoartcedapersuasao, istoe:c.0o.covu.o.c.Comefeito, naomepermitirei empregaramesmaf ormulapelaqualEniochamameduladapersuasao8aM. Cetego. 5-Naobrade PlataotambemGorgias, nolivro como mesmo nome, diz quase omesmo,masPlataoquisqueessaopiniaofossevistacomoadeleenaocomoasua.Ccero escreveu em muito lado que o ofciodoorador eradizer oadequadoaper-suadir.96- Nas suas obras de retorica,que sem d uvida ele proprio nao pode apro-var, dene como objectivo persuadir; masaverdadeequetambemodinheiroper-suade, tal como a graca e a autoridadedooradorouasuadignidade. Porm, apropriavisaomesmosemvoz, pelaqualsurgearecordacaodosmeritosdealguemouaface de alguemasuscitar penaoua beleza de uma forma, determina umaopiniao. 7- Naverdade, quandoAntonionadefesadeManusAquliolherasgaasroupas e mostra as cicatrizes que rece-bera no peito ao servico da patria, naodepos a sua conanca no discurso, masforcou o olhar do povo de Roma, que,7dinamica.8Suadae medulla. Esta expressao tornou-se idiomatica e signica hoje orador fre-quentssimo. N.T.9dicere adposite ad persuadendum.comosecre, emocionadssimoporaquelavisao, absolveu o reu. 8- Eque ServioGalba so encontrou compaixao por no mdodiscursoapresentaraotribunal, trazi-dospelamao, naosoosseuslhosaindapequenos, mas tambemo proprio lhodeSulpcioGalo, tendosidoentaoliber-tado, isso foi comrmado por testemunhosvarios e por um discurso de Catao. 9- E aFrine10naofoi odiscursodeHiperides11,aindaqueadmiravel, masavisaodoseucorpo belssimo, que ela mostrou tirando at unica, que, conforme se julga, a livrou doperigosoprocesso. Orase tudoistoper-suade, entao a denicao referida nao eidonea. 10- Por isso consideram-se maiscuidadosos os que, embora tendo a mesmaideiaderetorica,adeniramcomosendoafaculdadedepersuadirpelodiscurso.EaliasessaadenicaoqueGorgias,coa-gidoporSocrates, danolivrojareferidoacima, denicaoessaquetambemparti-lhaTeodectonolivrosobreretoricaquelevaoseunome, sejadele ou, comoal-gunsjulgam,deAristoteles.Asedizqueo mda retorica e induzir os homens`aquilo que o autor pretende. 11- Con-tudo, tambemestadenicaonaoesuci-ente, pois que e tambem pelo discurso quepersuademoulevamosoutrosaoquede-sejam, sejam as meretrizes, os aduladores,ossedutores. Emcontrapartida, ooradornemsempreconseguepersuadir,demodoquetal objectivonaolheseriaespecco,antesometerianomesmosacocompes-soasqueestaomuitolongedeserorado-res. 12- Mesmoassim, Apolodoronaose10Cortesa grega extremamente bela que serviude modelo `a Afrodite de Praxteles. N.T.11Um dos dez oradores consagrados da Grecia.N.T.www.bocc.ubi.pt8 Quintilianoafastamuitodestadenicao,poisdizqueo primeiro e o mais importante to dodiscursojudicial epersuadir os juzes eleva-los a pronunciar a sentenca que sepretende. Na verdade, acaba por sub-meteroorador`asorte, detal modoquesenaopersuadir, naopodemanteroseuttulode orador. 13- Alguns evitaramoescolhodasorte,comoAristotelesdiz:aretorica e a faculdade de encontrar no dis-curso tudo o que e adequado a persuadir.Esta denicao alem de ter o defeito de quefalamosatras, temaindaodeserestrin-gir`ainvencao, poissemelocucaonaohadiscurso. 14- AHermagoras quedizqueoobjectivodaretoricaedizerpersuasi-vamente, eaoutros quesaodamesmaopiniao, mas que a exprimemapenas compalavras diferentes eaconsideramcomodenicao, ja lhes foi dada resposta su-ciente, ao termos mostrado que a per-suasaonaoserestringeaodiscurso.Nesteponto foramfeitas mais algumas consi-deracoesdediversotipo. 15- Algunsjul-garamquearetoricaversasobretodasascoisas, e outros que apenas versa sobre coi-sas do foro p ublico. Sobre qual destas duasposicoes e a mais verdadeira di-lo-ei no lu-gar mais apropriadoaestaquestao. 16-Aristotelespareceterdefendidoaposicaode que o orador pode falar sobre tudo,quandodiz que: e acapacidade de veroqueemcadacoisapodeserpersuasivae Iatrocles, que nao acrescentando emcadacoisa,dizomesmosemfazerqual-querexcepcao. Designa-acomoaforcade encontrar o que seja persuasivo no dis-curso:taisdenicoescingem-seapenas`ainvencao. A m de evitar este erro, Eudoroencara-acomoaforcadeencontrareapresentar eloquentemente de forma or-namentadaaquiloque ecredvelemqual-quer discurso. 17- Mas pois que o credvele opersuasivoodescobre qualquer pes-soa,mesmonaosendoorador,juntandoaexpressaoemqualquerdiscurso, acabapor atribuir, mais que os autores ante-riores, o nome da actividade mais belatambemaos que aaconselhamparacri-mes. Segundo Platao, Gorgias diz ser oartcedapersuasaotantonos tribunaiscomo nas outras reunioes e tratar do justoedoinjusto. Socratesreconhece-lheafa-culdade de persuadir, mas naoade en-sinar. 19- Os autores, porem, queconsi-deraramque a oratoria nao versa sobretodas as coisas, diferenciaram-na cuida-dosae profusamente, tal comose impu-nha, edentreelesestaAriston, discpulodo peripatetico Critolaus, que dene destemodo a oratoria: a ciencia teorica epratica de abordar as questoes p ublicase de por meio do discurso persuadir opovo. 20- Porque e peripatetico, encara-acomo ciencia e nao, `a maneira dos estoicos,comoumavirtude. Mas, aoreferiraper-suasaoaopovo, tomaumaposicaoaindamais adversa `a oratoria, pois que achaquenaoserviraparapersuadiraspessoascomformacao. Quanto `aqueles que jul-gamque a oratoria apenas incide sobrequestoesp ublicas,diga-sequeexcluimui-tastarefasdoorador, pelomenostodaaoratoria laudatoria, que constitui a ter-ceirapartedaretorica.1221- TeodorodeGadara e mais cuidadoso para falar-mosdosqueachamquearetoricaeumaarteenaoumavirtude, poisquediz, e12SegundoAristotelesaretoricadivide-seemtres generos: deliberativo, forense e laudatorio ouepidctico. N.T.www.bocc.ubi.ptInstitutioOratoriaARetorica 9usoas suas proprias palavras assimtra-duzidas dogrego: aarteassentenain-vencao, nojuzoenaenunciacaodecen-temente ornamentadafeita`amedidadoque pode ser entendido como util parapersuadir,nomeadamenteemassuntosdenatureza p ublica. 22- De igual modo,tambem Cornelio Celso diz que o objectivoda retorica e falar persuasivamente sobreassuntosduvidososdeinteressep ublico.Estas denicoes nao diferentes daquelasqueoutrosdefendem, asaber: acapaci-dade de alguemperceber e de falar elo-quentemente sobre temas p ublicos que lhesejampropostos, e de o fazer comper-suasao, comadevidaposturacorporal ecom a enunciacao daquilo que quer dizer.Hamilharesdeoutrasdenicoes, masousaoidenticas`asjaapresentadasoucom-postas a partir destas. Responder-lhes-ei quandotratar doobjectodaretorica.Outros autores ha que nema conside-ramuma capacidade, nemuma ciencia,nemumaarte, mas que, comoCritolau,a encaramcomo ummodo de falar13(pois que e isso que .c.signica), oucomo Ateneucomo arte de enganar1424- Amaior parte, porem, contentam-secomalgunsexcertos,queoutrosantesde-les insipientementeretiraramdoGorgiasde Platao, semque tenhamlidopor in-teiro este ou outros l chama-lhe a adulacaoda medicina, e `a arte dos negociantesdeescravosadulacaodaexercitacao, poisque encobrema cor verdadeira dos es-cravos commaquilhagemesimulam-lhesa forca genuna comabundancia de ali-mento, contrapondo assim a sofstica `a le-13usum dicendi.14fallendi artem.galidadeearetorica`ajustica. Tudoissoestadefactoescritonesselivroefoi ditopor Socrates, emcujo nome Platao pa-rece dizer o que sente. Contudo, algunsdosseusdiscursosforamescritosparare-futarosopositores,oschamados cc-..o.c , outros para ensinar os cha-mados oou..o. 27- Socrates, oume-lhor dizendoPlatao, subestimade factoaretoricatal comoseexerciaentao(naverdade, di-locomestaspalavras.o..o.` o :c o.o. ` o .uc.c :o..c.cc0c.15Mastambemconheceumaretoricaverdadeirae honesta, ja que na controversia comGorgias conclui desta maneira: o.o.v.` o cv.oc.` o o.o c... .` oo`c o.o o.cc0. o. :c..c..1628-Perante esta armacao Gorgias cala-se,masPolotomaapalavracomaimpetuo-sidadepropriadosjovensevira-secontraos que a consideram simulacro e adulacao.Caliclesaindaemaisveemente, poisqueacaba por concluir que: .` o uco.oc0 cccv.oc.` occcc0. o.ococ.c.. ` c:.c.uo. co.c,17peloque se torna claro que Platao nao encara aretoricacomoummal,antesentendequeapenasumhomemjustoebompodeche-gar`aretoricaverdadeira.29-Istoainda emais manifesto no dialogo Fedro, pois quenao se pode exercer cabalmente a retoricasemo conhecimento da justica, opini aoesta que tambem eu partilho. Ou sera que,sendo doutro modo, poderia ele ter escrito15No modo como vos comportais como ci-dadaos.16 E assim que o orador com formacao deve serjusto, mas o justo dever querer fazer o que e justo.17Quemquiserserumhomemcomformacaoretorica tem de ser um homem justo e conhecer oque e justo.www.bocc.ubi.pt10 QuintilianoaapologiadeSocrateseolouvoraosquemorrerampelapatria, quesaoindubita-velmente obras de retorica? 30- Mas e ver-dade que invectivou aquele tipo de homensqueutilizavamparaomalafacilidadedediscorrer.EqueoproprioSocratesachouque nao estava `a sua altura o discurso queLsias lhe fez aquando do seuprocesso,tantomaisqueeracostumeescreverparaos litigantes de um processo, que estes pro-nunciavam como se da sua autoria fossem,infringindo-se desse modo a lei que proibiaquealguemaparecessecomoadvogadodeoutro. 31- APlataotambemosdocentesdaretoricalhe pareciampoucoidoneos,porsepararemaretoricadajusticaepre-feriremo credvel ao verdadeiro; e issoquediznoFedro. 32- Comesses docen-tespareceestardeacordoCornelioCelsode quem sao estas palavras: o orador pro-cura apenas o que e semelhante `a verdadeeque`afrentedizainda:opremionaoeuma boa consciencia, mas a vitoria no pro-cesso. Fosse isto verdade e entao os pioreshomens poderiam fornecer perniciosos ins-trumentosparaoscostumesmaisnocivoseajudar amaldadecomdoutrinas. Mascabe-lhesaelesveremcomojusticamasuaopiniao.33- Maspoisquejacomecamosafor-mar o orador perfeito, que antes de tudo omaisdeveserumhomembom,queremosvoltar `aqueles que melhor trataramestetema.Alguns,naverdade,acharamquearetoricaeumsentidop ublico18, Ccerodesigna-a como uma parte da cienciade estado19(ciencia de estado que e omesmo, porem, que a sabedoria), e ou-18civilitatem19scientiae civilis.tros,dentreelesIsocrates,chamam-lhe-losoa. Da que `a natureza de retoricaseja a denicao mais adequada a seguinte:aretoricae acienciade bemdizer,20pois que compreende numa palavra to-das as virtudes dodiscursoe aomesmotempoasqualidadesdoorador, poisquenaosepodefalar bemsenaosefor umhomembom. TambemboaeadenicaodadaporCrsipo,tiradadadeCleante,equediz: acienciadefalarcomproprie-dade.2135-Hamuitasoutrasdenicoes,masreportam-semaisaoutrasquestoes.O mesmo signica a denicao que reza as-sim: persuadir do que convem, a nao serqueligueaarteaosucesso. 36- Tambemesta bem Areu quando a dene como: dis-cursar consoante a virtude da oracao.De igual modo aqueles que entendema retorica como a ciencia dos deverescvicosexcluemdela os maus, pois queaoconsideraremqueacienciaevirtuosa,apenas a connamao ambito mais res-tritodas questoes p ublicas. Alb ucio, umconhecido professor e autor, tambemaconsideraacienciadebemdizer, maspeca ao restringi-la acrescentando: emquestoesp ublicasecomcredibilidade, aque,tantoaumacomo`aoutra,jademosaqui resposta. 37- Deigual mododede-cisao louvavel sao tambem os que conside-raram a retorica como sentir e dizer compropriedade.22Estassaoasdenicoesmaisfamosasetambemasquesuscitarammaisdisputa.Aborda-las todas nemcabeaqui, nemopossofazer, poisqueentreosautoresda20rhetoricem esse bene dicendi scientiam.21scientia recte dicendi .22recte sentire et dicere.www.bocc.ubi.ptInstitutioOratoriaARetorica 11especialidade existe, emminha opiniao,um erro que e o de nao denir nada com asmesmas palavras, ja utilizadas por outros,ambicao que me e estranha. 38- O que voudizernaoepoisaquiloquedescobri, maso que considero certo: retorica eacienciade bem dizer.E que uma vez achado o quee melhor, quemprocurar algode outro,quer algo pior. Estando de acordo com es-tas denicoes entaotambemsetornasi-multaneamenteclaroqual om ultimoemaior da retorica, a que se chama teloc, eparaoqualtendetodaaarte:poisquesearetoricaeacienciadebemdizer, oseummaior eentaobemdizer.XVI-Vantagensedesvantagensdaretorica1-Segue-seaquestaosearetoricae util.Na verdade, alguns costumam ataca-la vi-olentamente e, o que me parece muitopoucodigno, usamnaacusacaoque lhefazemasforcasdaretorica.2-XVII-Earetoricaumaarte?XVIII-AretoricaeasartesansXIX-DonsnaturaisearteXX-Earetoricaumavirtude?XXI-Materiadaretoricawww.bocc.ubi.pt