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ATUALIZAÇÕES / CURRENT COMMENTS QUIMIOTERAPIA DA TUBERCULOSE* Roberto Brólio ** RSPU-B/249 BRÓLIO, R. — Quimeoterapia da tuberculose. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 9: 71-85, 1975. RESUMO: Uma revisão dos conhecimentos atuais sobre o tratamento da tuberculose revela como evoluiram os conceitos básicos de associação medica- mentosa, continuidade e tempo prolongado. Evidencia a tendência para a ado- ção de novos esquemas terapêuticos e as vantagens do tratamento intermitente, da redução do período de tempo e a nova conotação de conceitos, em que "continuidade" nem sempre significa "diariamente" mas "regularidade", quando os medicamentos são administrados com intervalos, na intermitência. São ana- lisados os princípios básicos da quimioterapia, os medicamentos em uso, sua eficácia, toxicidade, doses e vias de administração. São revistos os critérios para a escolha do melhor esquema terapêutico, continuidade do tratamento e as principais causas de insucesso terapêutico. UNITERMOS: Tuberculose. Quimioterapia. Medicamentos. Esquemas tera- pêuticos. * Aula ministrada na Disciplina de Tratamento das Doenças Infecciosas e Parasitárias, no Curso de Pós-Graduacão da Clínica de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da USP — Av. Dr. Arnaldo, 455 — São Paulo, SP — Brasil ** Da Disciplina de Tisiologia do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pú- blica da USP — Av. Dr. Arnaldo, 715 — São Paulo, SP — Brasil 1. INTRODUÇÃO A quimioterapia da tuberculose tem re- velado, nos diferentes países, que a cura da enfermidade é possível tanto na clínica como em programas de saúde pública. Quando bem conduzida, proporciona as seguintes vantagens: 1. Promove a cura de praticamente 100% dos doentes tratados. 2. Diminui o período de contagiosida- de, pela rápida negativação do exa- me de escarro. 3. Evita a formação de crônicos. 4. Impede o aparecimento de resistên- cia bacteriana. 5. Torna viável o tratamento ambula- torial. 6. Diminui o tempo de hospitalização. 7. Diminui a letalidade. 8. Diminui a necessidade do repouso, possibilitando o retorno do paciente

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ATUALIZAÇÕES / CURRENT COMMENTS

QUIMIOTERAPIA DA TUBERCULOSE*

Roberto Brólio **

RSPU-B/249

BRÓLIO, R. — Quimeoterapia da tuberculose. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 9:71-85, 1975.

RESUMO: Uma revisão dos conhecimentos atuais sobre o tratamento datuberculose revela como evoluiram os conceitos básicos de associação medica-mentosa, continuidade e tempo prolongado. Evidencia a tendência para a ado-ção de novos esquemas terapêuticos e as vantagens do tratamento intermitente,da redução do período de tempo e a nova conotação de conceitos, em que"continuidade" nem sempre significa "diariamente" mas "regularidade", quandoos medicamentos são administrados com intervalos, na intermitência. São ana-lisados os princípios básicos da quimioterapia, os medicamentos em uso, suaeficácia, toxicidade, doses e vias de administração. São revistos os critériospara a escolha do melhor esquema terapêutico, continuidade do tratamento eas principais causas de insucesso terapêutico.

UNITERMOS: Tuberculose. Quimioterapia. Medicamentos. Esquemas tera-pêuticos.

* Aula ministrada na Disciplina de Tratamento das Doenças Infecciosas e Parasitárias, noCurso de Pós-Graduacão da Clínica de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Faculdadede Medicina da USP — Av. Dr. Arnaldo, 455 — São Paulo, SP — Brasil

** Da Disciplina de Tisiologia do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pú-blica da USP — Av. Dr. Arnaldo, 715 — São Paulo, SP — Brasil

1. I N T R O D U Ç Ã O

A quimioterapia da tuberculose tem re-velado, nos diferentes países, que a curada enfermidade é possível tanto na clínicacomo em programas de saúde pública.

Quando bem conduzida, proporciona asseguintes vantagens:

1. Promove a cura de praticamente100% dos doentes tratados.

2. Diminui o período de contagiosida-de, pela rápida negativação do exa-me de escarro.

3. Evita a formação de crônicos.

4. Impede o aparecimento de resistên-cia bacteriana.

5. Torna viável o tratamento ambula-torial.

6. Diminui o tempo de hospitalização.

7. Diminui a letalidade.

8. Diminui a necessidade do repouso,possibilitando o retorno do paciente

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às suas atividades após reduzido in-terregno.

9. Mantém o estado de cura do pacien-te, reduzindo o risco das recidivas.

10. Possibilita o controle efetivo da en-fermidade, em termos de saúde pú-blica, permitindo pensar em sua erra-dicação em futuro que não deveestar longe.

São muitos os medicamentos que evi-denciam eficácia no tratamento da tuber-culose, e foram classificados inicialmenteem dois grupos: de primeira linha ou me-dicamentos maiores e de segunda linha oumedicamentos menores.

Ao primeiro grupo pertencem as dro-gas que foram utilizadas largamente emprimeira opção tanto na clínica como emprogramas de saúde pública: a hidrazidado ácido isonicotínico ou isoniazida ( INH),a estreptomicina (SM) e o ácido para-aminossalicílico (PAS).

Ao segundo grupo pertencem as drogasmantidas como reserva, para serem em-pregadas na eventualidade de não se obterbons resultados com os medicamentos deprimeira linha.

As pesquisas atuais indicam que outrosmedicamentos, pela sua eficácia, baixa to-xicidade e boa tolerância podem ser em-pregados, com vantagem, em primeiraopção, no tratamento da tuberculose, comoa rifampicina (RMP), etambutol (EMB),etionamida (ETH), tiossemicarbazona(TSC), morfazinamida (MZA).

Alguns medicamentos como a RMP e oEMB, são relativamente caros. O fatorpreço deve ser ponderado principalmentequando os medicamentos se destinam àadministração em massa. Porém, não de-vemos esquecer que o ser humano mereceo melhor e tudo o que se fizer para a suasaúde não representa desperdício, mas in-vestimento econômico que reverte em seupróprio benefício e da coletividade. Todoesforço deve ser feito para que sejam em-pregados os medicamentos mais ativos, me-

lhor tolerados, menos tóxicos e que curemno menor prazo de tempo possível.

Ao conceito antigo de drogas de primei-ra linha temos, assim, o de drogas de pri-meira escolha, classificação que dá maiorversatilidade ao médico, sempre que pos-sível, para instituir o tratamento que lheparece mais adequado.

2. PRINCÍPIOS BÁSICOS DAQUIMIOTERAPIA DA TUBERCULOSE

A condição essencial para que se possaobter o máximo rendimento da quimiote-rapia é a observação de princípios que fo-ram considerados fundamentais:

— Associação medicamentosa, na qual aisoniazida deve entrar como um doscomponentes.

— Uso contínuo de drogas administradasem concentração útil.

— Tratamento por tempo prolongado.

Esses princípios se baseiam no resultadode ensaios controlados feitos em diferentespaíses e na observação de grande númerode autores, com o emprego em primeiraopção das drogas de primeira linha oumedicamentos maiores 2, 10, 11, 18, 20, 21, 22,24, 25, 26, 27, 28, 29, 30.

Modernamente, com o advento de novosmedicamentos, esses princípios estão sendoligeiramente modificados, relativamente aoritmo de administração das drogas e aotempo de tratamento 6, 12, 14, 15, 16, 22, 25, 28.

2.1. Associação medicamentosa, na quala isoniazida seja um dos compo-nentes

A experiência evidenciou a vantagem doemprego de três drogas administradas dia-riamente durante a fase inicial, quando égrande a população bacilar, com o fim deobter uma rápida desbacilização das lesõestuberculosas e evitar a possibilidade deseleção de mutantes resistentes.

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Entre os doentes, mesmo virgens de tra-tamento, existem bacilos naturalmente re-sistentes a uma ou outra droga. O empre-go da monoterapia dá margem à multipli-cação dos mesmos e, depois de um períodode melhoria aparente do doente, há o agra-vamento do quadro infeccioso, reduzindoa possibilidade do rendimento que se espe-ra do tratamento.

No decurso da quimioterapia associada,havendo resistência para uma das drogas,o bacilo continua sob a ação das demais,potencializando a eficácia dos medicamen-tos.

A isoniazida, pela sua eficácia compro-vada, facilidade de administração, grandedifusibilidade nos tecidos, baixa toxicida-de, boa tolerância e baixo custo, é consi-derada o principal medicamento nos esque-mas de quimioterapia, devendo ser admi-nistrada durante todo o período de trata-mento.

A sua substituição só deverá ser feitanos casos raros de intolerância, ou quan-do ficar comprovada a existência de resis-tência à mesma.

2 .2 . Uso contínuo das drogas adminis-tradas em concentração útil

Por continuidade se entende a adminis-tração dos medicamentos feita diariamen-te, sem interrupção, a fim de manter aconcentração sanguínea das drogas e ga-rantir o seu efeito bactericida e bacterios-tático sobre o bacilo.

Além da continuidade, os medicamen-tos devem ser administrados em concen-tração útil.

As drogas, em geral, apresentam açãobactericida quando administradas em do-se certa e passam a bacteriostáticas emconcentrações insuficientes.

Atualmente "continuidade" não signifi-ca ''diariamente" mas regularidade na ad-ministração das drogas, quando se faz usoda intermitência.

O aspecto mais significativo dos novosconceitos sobre continuidade decorrem dos

trabalhos experimentais de Dickinson eMitchison 12 e de ensaios feitos em váriospaíses sobre quimioterapia intermitente.

Dickinson e Mitchison 12 trabalharamcom culturas de bacilos virulentos, expon-do-as à ação de diferentes drogas e de-pois de um período de tempo variável,retirando-as, verificaram o comportamen-to dos bacilos. Constataram que certasdrogas apresentam ação bactericida inicialseguida de ação bacteriostática que se pro-longa durante 3 a 4 dias, dependendo dadroga. Estes novos conhecimentos vieramdar uma abertura para o estudo do em-prego das drogas em regimes intermiten-tes, pois não há necessidade de manter acontinuidade de concentração da droga noslocais da infecção para que se obtenha amáxima eficácia terapêutica que dela seespera. Realizando experiências em ani-mais de laboratório previamente infecta-dos, aplicando vários esquemas terapêu-ticos, constataram a validade dos regimesintermitentes preconizados.

A par desses estudos, inúmeros ensaiosem seres humanos, feitos em várias par-tes do mundo, por diferentes autores, vie-ram comprovar a eficácia dos mesmos 13,14, 15, 16, 22.

O intervalo ótimo de administração dosmedicamentos é de duas vezes por semana.

Embora exista grande entusiasmo pelaadministração das drogas nestes esquemas,a maioria dos autores ainda preconiza umafase inicial com quimioterapia diária e,em continuação os esquemas bi-semanaiscom menor número de drogas.

Esta conduta tem por finalidade assegu-rar uma rápida desbacilização das lesõestuberculosas na fase inicial e evitar a pos-sibilidade de seleção de mutantes resis-tentes.

Os medicamentos administrados em umasó dose, tanto nos regimes diários comonos intermitentes, produzem resultados su-periores aos administrados em várias do-ses no mesmo dia 16.

Na quimioterapia intermitente as dosesdevem ser mais elevadas, não havendo,

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contudo, necessidade de que a dose sema-nal seja equivalente à da terapia diária.

Nos resultados apresentados por Dickin-son e Mitchison 12, as drogas mais eficazespara a intermitência são: estreptomicina,isoniazida, rifampicina, etambutol e etio-namida.

A pirazinamida e a cicloserina apresen-tam ação duvidosa e a tiacetazona e tio-carbanilida são impróprias para a inter-mitência. O PAS nos ensaios no homemmostrou-se igualmente pouco eficaz paraos regimes intermitentes.

2.3. Tempo de tratamento

O tratamento deve ser mantido duranteum tempo prolongado, para se obter a curadas lesões e evitar a possibilidade de rea-tivação de focos nos quais podem encon-trar-se germes persistentes.

Os medicamentos agem durante a fasede multiplicação bacteriana, sendo pratica-mente inativos durante a fase de repousometabólico do bacilo.

Para que se obtenha a máxima eficácia,a terapêutica deve ser prolongada, a fimde surpreender os germes durante a fasede multiplicação.

O tempo médio de tratamento preconi-zado é de 12 meses, podendo ser am-pliado para 18 ou 24 meses, dependendoda gravidade e evolução de cada caso.

Com o emprego de drogas altamenteeficazes é possível encurtar o tempo daquimioterapia para 6 ou 8 meses, prin-cipalmente nas formas mínimas, pauciba-cilares, nas quais a fase inicial de trata-mento tríplice diário pode durar de duasa quatro semanas e, em seguida, a con-tinuação do tratamento é mantida com aadministração de duas drogas em ritmointermitente.

Como regra, deve-se manter o tratamen-to, sem interrupção, por mais seis mesesapós a negativação do exame para pesquisade bacilos álcool-ácido resistentes, e consi-derar negativo quando confirmado pelomenos com três exames repetidos com ma-terial colhido em dias diferentes.

3. MEDICAMENTOS: EFICÁCIA,TOXICIDADE, DOSES, VIAS DE

ADMINISTRAÇÃO

3.1. Isoniazida — INH. Hidrazidado ácido isonicotínico. É administrada porvia oral e mais raramente por via intra-muscular. Por via oral, a dose média éde 5 a 10 mg por quilo de peso corporal,por dia, para pessoas acima de 10 anos,nos esquemas diários. Nos esquemas in-termitentes a dose pode ser elevada para15 ou 20 mg por quilo de peso corporal,duas vezes por semana. Para as crianças,a dose é de 10 a 20 mg por quilo depeso corporal, nos esquemas diários.

Efeitos colaterais podem ocorrer em re-duzido número de casos, principalmenteem pessoas desnutridas e em mau estadogeral. São reações do sistema nervosocentral, como euforia e excitabilidade psi-co-motora. Podem ocorrer, ainda, erupçõescutâneas, formigamentos nos lábios e nasextremidades, náuseas e vômitos.

São sintomas reversíveis, que desapare-cem com a suspensão da droga e podemser corrigidos ou evitados com a adminis-tração simultânea de piridoxina (vitaminaB6) .

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A droga é metabolizada no fígado peloenzimaN-acetyl-transferase. Em determi-nadas pessoas o medicamento é metaboli-zado rapidamente (inativadores rápidos)e em outras, mais lentamente (inativado-res lentos).

Pela sua alta eficácia, baixa toxicidade,facilidade de administração e baixo custo,a INH é o medicamento mais usado nosdiferentes esquemas de quimioterapia anti-tuberculose.

Tem ação bactericida e bacteriostática,dependendo de sua concentração ao níveldas lesões específicas.

É apresentada em xarope contendo 50mg por colher das de chá (5 ml), emampolas de 100, 150 e 300 mg, e com-primidos de 50, 100, 200 e 500 mg.

3.2. Rifampicina — RMP. É umantibiótico, altamente ativo por via oral,do grupo das Rifamicinas. Quimicamenteé a 3-(4-metil-1-piperazinil-iminometil)rifamicina SV.

Nos esquemas diários é administrada nadose de 600 a 900 mg por dia, para adul-tos, em dose única ou em duas tomadas,em jejum ou longe das refeições. Paraas crianças com menos de um ano deidade a dose média é de 10 mg por quilode peso corporal por dia e, para as crian-ças maiores, de 15 a 20 mg por quilo depeso corporal por dia, em uma ou duasadministrações.

Nos esquemas intermitentes a dose podeser aumentada, não ultrapassando 1.200mg por dia, para adultos.

É um medicamento de alta eficácia te-rapêutica e, dependendo da concentraçãotem ação bactericida ou bacteriostática.Seus efeitos colaterais são relativamenteraros, de natureza imuno-alérgica, e fo-ram classificados em seis grupos 11:

a. reações cutâneas, como prurido, ru-bor, exantemas;

b. reações do aparelho digestivo, comonáuseas, vômitos e diarréias;

c. reações do aparelho respiratório su-perior lembrando o resfriado comum("flu") com indisposição coriza, ce-faléia;

d. reações cardio-respiratórias, com hi-potensão dispnéia;

e. púrpura trombocitopênica;

f. reações hepáticas, com icterícia, náu-seas e vômitos.

É apresentada em suspensão contendo100 mg de substância ativa por colher dasde chá (5 ml) e em comprimidos e cáp-sulas de 150 e 300 mg.

3.3. Etambutol — EMB. É o d-eti-leno-diamina-di-1-butanol.

É administrado por via oral em umaúnica tomada. Nos esquemas diários a do-se para adultos é de 15 a 25 mg por quilode peso corporal por dia, não havendonecessidade de ultrapassar a dose de 1.200mg por dia e, para crianças, em média15 mg por quilo de peso, por dia.

O principal efeito tóxico da droga semanifesta por uma neurite retrobulbar,com dor no globo ocular e diminuição daacuidade visual. Outros sintomas podemestar presentes, como náuseas, vômitos ecefaléias.

São sintomas reversíveis que desapare-cem com a suspensão da droga.

Tem ação bactericida e pode passar abacteriostático em pequenas doses.

É apresentado em comprimidos de 400mg e em xarope contendo 125 mg por co-lher das de chá (5 ml) .

3.4. Estreptomicina — SM. Antibió-tico extraído inicialmente do Streptomycesgriseus, sendo depois produzido sintetica-mente.

É administrado por via intramuscular nadose de um grama para adultos, diaria-mente, e de 0,02 a 0,04 g por quilo depeso corporal, para crianças.

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Durante a administração da droga po-dem surgir reações tóxicas que se mani-festam com parestesias, dores de cabeça,tremores musculares, vômitos, vertigens esurdez.

O principal efeito tóxico da droga semanifesta com a lesão do 8.° par craniano.A dihidroestreptomicina lesa o nervo co-clear, causando surdez. Atualmente usa-semais o sulfato de estreptomicina, de menortoxicidade, embora possa comprometer onervo vestibular, causando distúrbios doequilíbrio, vômitos e vertigens.

A lesão do 8.° par craniano é freqüen-temente irreversível, sendo necessário aten-ção especial durante a administração dadroga, a fim de surpreender os primeirossinais ou sintomas de suas manifestaçõestóxicas.

O medicamento deve ser administradocom cautela para as crianças, pois não sa-bem informar a existência dos sintomas detoxicidade, bem como para as gestantes epessoas com mais de 50 anos de idade.

A incidência e gravidade dos efeitos co-laterais têm relação com a quantidade to-tal da droga administrada e a duração dotratamento.

Embora seja uma droga muito eficaz,de ação bactericida e bacteriostática, estásendo preterida nos esquemas de quimio-terapia para a administração em progra-mas de saúde pública, pelas dificuldadesde aplicação e pela necessidade de contro-le permanente dos doentes a fim de preve-nir os possíveis efeitos colaterais.

É apresentada em frasco contendo 1 g.

3.5. Etionamida — ETH. É o 2-etil--isotionicotinamida, 1314 ou trecator.

É um medicamento usado mais freqüen-temente por via oral, na dose de 0,75 a1 g por dia, em uma ou duas tomadas,para adultos. Para crianças a dose médiaé de 10 mg por quilo de peso corporal,por dia. Pode ser empregado também porvia venosa e retal. A via venosa já tevegrande indicação na cobertura dos casoscirúrgicos.

Apresenta ação bactericida e bacterios-tática e sua atividade foi evidenciada mes-mo para os germes resistentes a outros qui-mioterápicos, com excessão aos resistentesà tiossemicarbazona, por apresentar fenô-meno de resistência cruzada com esse me-dicamento.

Os efeitos colaterais se manifestam comdistúrbios do aparelho digestivo e sistemanervoso: inapetência, náuseas, vômitos, es-pasmos gástricos e intestinais, diarréia, in-sônia, cansaço e psiconeurose. A droga écontraindicada na insuficiência hepática,no alcoolismo e psicolabilidade.

É apresentada em comprimidos de0,25 g.

3.6. Tiossemicarbazona — TSC. Tia-cetazona ou TB1.

É a p-acetilamino-benzaldeido-tiossemi-carbazona.

Empregada por via oral na dose de 150mg por dia em uma única tomada, paraadultos. Tem sido utilizada largamenteem substituição ao PAS, em associação coma isoniazida em um único comprimido.

Quando foi lançada na década de 40, eadministrada na dose de 200 mg por dia,apresentou alta porcentagem de efeitos co-laterais. Nos últimos anos foi re-introdu-zida nos programas de massa, na dose de150 mg por dia, sendo muito bem tole-rada, revelando baixa toxicidade.

Os principais efeitos colaterais se mani-festam com náuseas, vômitos, icterícia,erupções cutâneas, tendo sido descritos al-guns casos de agranulocitose e púrpura.

Foram constatadas algumas diferençasnos efeitos colaterais entre populações daÁsia e outras regiões geográficas. Essasdiferenças são atribuidas a fatores ambien-tais, como alimentação, exposição ao sol,atividades e, provavelmente ao fator racial.

É apresentada em comprimidos de 150mg.

3.7. Tiossemicarbazona heterocíclica— TSCH. É a nicotil-aldeiado-tiossemi-carbazona.

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É administrada por via oral na dose de1 mg por quilo de peso corporal por dia,em uma ou duas tomadas. Apresenta me-nor toxicidade e maior tolerância do queos compostos isocíclicos.

É apresentada em comprimidos de 10 e20 mg.

3.8. Ácido para-aminossalícilico —PAS.

É administrado por via oral na dose de10 a 12 g por dia, para adultos, em umaou duas tomadas. Para as crianças a doseé de 0,15 a 0,30 g por quilo de peso cor-poral, por dia.

Apresenta ação bacteriostática.

Os sintomas de intolerância mais fre-qüentes são os relacionados com o apare-lho digestivo, como anorexia, náusea, sen-sação de queimação e dor no epigastro.

Esses sintomas são muito freqüentes, fa-zendo com que os pacientes prefiram to-mar injeções a terem que ingerir 10 a12 comprimidos de PAS, em uma ou duastomadas diárias 21.

Por ser uma droga anti-tuberculose pou-co ativa e pelos fenômenos de intolerânciaque apresenta, está sendo gradativamentepreterida nos esquemas de quimioterapiatanto na clínica como em saúde pública.

É apresentada em comprimidos de 1 g.

3.9. Kanamicina — KM. É umasubstância extraída do Streptomyces kana-miceticus. Apresenta ação bacteriostáticae é administrada por via intramuscular nadose de 0,75 a 1 g por dia, para adultos.

Causa efeitos tóxicos sobre os rins eanormalidades eletrolíticas no soro. Po-dem surgir manifestações alérgicas, albu-minuria, hematúria e cilindrúria, eosinofi-lia, edemas, retenção de água, vertigens eperda parcial da audição.

É apresentada em ampolas de 1 g.

3.10. Cicloserina — CS. É uma subs-tância extraída inicialmente do Streptomy-ces orquidaceus e também produzida por

meio de síntese. Quimicamente é a D-4-amino-3-isoxalidona. Tem ação bacterios-tática.

É administrada por via oral na dose de0,75 a 1 g por dia, em duas tomadas,para adultos.

É um medicamento aplicado com sériasrestrições para crianças e pessoas que apre-sentam alguma labilidade do sistema ner-voso central, pois podem ocorrer sintomasde euforia, excitabilidade, amnesia, dis-túrbios do caráter, insônia cefaléias.

É apresentada em comprimidos de0,25 g.

3.11. Viomicina — VM. É uma subs-tância extraída do Streptomyces floridae.

É administrada por via intramuscularna dose média de 1 g por dia, para adul-tos, tendo ação bacteriostática.

Os efeitos colaterais se equiparam aosda Kanamicina. Toxicidade para os rinse aparelho auditivo.

É apresentada em ampolas de 1 g.

3.12. Morfazinamida — MZA ou Pia-zolina. Quimicamente é o cloridrato den-morfalinometil-pirazinamida.

Apresenta atividade bacteriostática com-provada. Pode ser administrada durantetempo prolongado por ser praticamenteatóxica.

É empregada por via oral, podendoigualmente ser utilizada por via endove-nosa.

Tem ação tanto nas formas iniciais datuberculose em que predomina o compo-nente exsudativo, bem como nas formascrônicas, resistentes a outros medicamen-tos.

A posologia é de 2 a 3 g diárias paraadultos, por via oral, em uma ou duastomadas. Por via endovenosa pode serempregada na dose de 1 a 2 g por dia.

É apresentada em comprimidos de 0,5 ge ampolas de 1 g de substância ativa.

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3.13. Capreomicina — CM. É umasubstância extraída do Streptomyces ca-preolus.

Apresenta ação bacteriostática. É admi-nistrada por via intramuscular na dose de1 g por dia, para adultos.

Os efeitos colaterais se assemelham aosda estreptomicina (ototoxicidade), e aosda Kanamicina e viomicina (oto e nefro-toxicidade).

É apresentada em ampolas de 1 g.

3.14. Terizidona — TZ. É drogaaf im da cicloserina , de fórmula N, N--teraftal-bis-D-4-amino-3-isoxazolidona.

Tem ação bacteriostática e é adminis-trada por via oral, na dose de 1 g pordia, para adultos, em duas tomadas.

Toxicidade para o sistema nervoso cen-tral: cefaléia, depressão psíquica, excita-bilidade e ansiedade.

É apresentada em cápsulas de 0,25 g.

3.15. Protionamida — PT. É o me-dicamento afim da etionamida: propil-2--isonicotil-tionamida.

Apresenta ação bacteriostática, sendoadministrada por via oral na dose de 0,75a 1 g, por dia, para adultos, em uma ouduas tomadas.

Efeitos colaterais idênticos aos da etio-namida, porém menos intensos.

É apresentada em comprimidos de0,25 g.

3.16. Tiocarbanilida — DATC. É o4'4-di-isoamil-oxitiocarbanilida.

Apresenta ação bacteriostática, sendoadministrada por via oral na dose de 6 g,em média, para adultos, em duas tomadasao dia.

É medicamento de pouca toxicidadeembora possa causar distúrbios de intole-rância gastro-hepática.

3.17. Pirazinamida — PZA. É a pi-razina-2-carboxi-amida.

Apresenta ação bacteriostática, adminis-trada por via oral, na dose de 2 a 3 g, pordia, para adultos em duas ou três tomadas.

É uma droga que apresenta elevada to-xicidade gastro-hepática, podendo ocorrernáuseas, vômitos, desconforto abdominal,icterícia e alterações das provas de funçãohepática.

É apresentada em comprimidos de 0,5 g.

3.18. Corticosteroides. O acetato e ofosfato dissódico de betametasona, a de-xametasona 21-fosfato, o acetato de metilprednisolona, e outros similares, são mui-to usados em vários campos da medicina.

Agem em todas as fases do processoinflamatório: congestiva, exsudativa, proli-ferativa e resolutiva.

Além da ação anti-inflamatória, apre-sentam atividade anti-alérgica e anti-tóxi-ca, podendo ser empregados no tratamen-to de certas formas de tuberculose, sem-pre em associação com quimioterápicoseficazes, aumentando o efeito anti-bacilare melhorando a tolerância aos mesmos.

Encontram aplicação na tuberculose dasserosas (pleura, pericárdio, peritônio), natuberculose miliar, na tuberculose exsuda-tiva aguda, na uveite e meningite especí-ficas.

Os pacientes sob a ação dos corticoste-roides apresentam melhoria do apetite edo estado geral.

Nas formas exsudativa e miliar há umarápida reabsorção dos processos inflama-tórios e alérgicos, aumentando a ação dosquimioterápicos.

Na meningite, a associação do corticoi-de proporciona grande vantagem, melho-rando a difusibilidade dos medicamentos,evitando o bloqueio do liquor.

Nas formas crônicas, de pacientes emmau estado geral, os corticoides diminuemo estado tóxico do paciente e melhorama tolerância aos medicamentos específicos.

Para a administração de corticosteroidesem pacientes portadores de processos tu-

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berculosos ativos ou cicatriciais, devemosobservar as seguintes precauções:

1 — Havendo indicação, na tuberculo-se, administrar o corticosteroide semprecom quimioterápicos eficazes em associa-ção tríplice, para garantir ampla ação anti-bacteriana específica.

2 — Os corticosteroides quando admi-nistrados por tempo prolongado inibem osprocessos imunitários e podem provocaruma diminuição da defesa orgânica. Apro-veitar a máxima eficácia anti-inflamató-ria dos mesmos durante tempo limitado,no máximo durante 3 meses.

3 — Não administrar corticosteroides apacientes portadores de tuberculose causa-da por germes reconhecidamente resisten-tes aos quimioterápicos em uso.

4 — Quando há indicação de corticos-teroideterapia prolongada em pacientesportadores de lesões cicatriciais, fazer acobertura com medicação específica, a iso-niazida, como medida profilática, a fim deevitar a possível reativação das mesmas.

5 — As formas de apresentação, vias deadministração, doses e contra-indicaçõesdos corticosteroides são universais, deven-do ser respeitadas nos doentes portadoresde lesões tuberculosas.

nas dois medicamentos quando foremutilizadas drogas de alta eficácia tera-pêutica como a isoniazida e rifam-picina.

— Atender para a comodidade do pacien-te, dando preferência para os esque-mas orais, eficazes, que sejam bemtolerados, de pouca toxicidade e quepossam ser tomados em uma só vez,em hora certa.

— Garantir uma larga margem de segu-rança, empregando medicamentos emdoses apropriadas cuja eficácia tenhasido comprovada em ensaios controla-dos e que não acarretem risco para opaciente.

— Atender aos postulados básicos de Saú-de Pública, pois a tuberculose ainda éuma doença de massa. Fornecer osmedicamentos gratuitamente e usar es-quemas terapêuticos que possam ser to-mados sem grandes dificuldades pelosdoentes, sob controle e supervisão dosServiços Assistenciais.

— Inúmeros esquemas podem ser elabo-rados, utilizando combinações de medi-camentos, de acordo com as disponibi-lidades de cada Serviço devendo-se con-tudo, utilizar esquemas de eficácia com-provada, como por exemplo:

4. ESQUEMAS TERAPÊUTICOS

Inúmeros esquemas e associações dedrogas têm sido empregados nos diferen-tes países, nas diferentes formas de evo-lução da tuberculose, e por mais parado-xal que pareça, quando seguidos com re-gularidade levam à cura de alta porcenta-gem dos doentes.

Há, contudo, certos preceitos que devemestar sempre presentes:

— Usar sempre associações tríplices noinício do tratamento, mesmo que sejapor um curto período de tempo. Excep-cionalmente podem ser empregados ape-

5. SEQÜÊNCIA DA QUIMIOTERAPIA

A administração dos medicamentos obe-dece a uma seqüência lógica em três pe-ríodos seguidos. No primeiro, quando égrande a população bacilar e se procuraobter o máximo efeito das drogas, o tra-tamento deve ser feito com o emprego de

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três drogas associadas. No segundo, a con-tinuidade terapêutica é mantida com duasdrogas e, posteriormente, apenas a admi-nistração de um medicamento é suficientepara garantir a consolidação da cura eevitar as recidivas.

O critério para a escolha das drogasiniciais e para a retirada gradativa dasmesmas depende da extensão das lesões,de sua evolução durante o tratamento, dadisponibilidade de medicamentos de cadaServiço, bem como da toxicidade, tolerân-cia e viabilidade de administração dosmesmos.

No esquema tríplice clássico inicia-secom INH, SM e PAS. O segundo períodoé mantido com INH e PAS e, finalmente,apenas com a INH.

Quando são empregados quimioterápicosaltamente eficazes, o período inicial podedurar de um a três meses, sendo que nasformas discretas da doença, apenas duasou três semanas são suficientes. O segun-do período pode prolongar-se até comple-tar 6 meses e, finalmente, o terceiro, atéperfazer o total de um ano de tratamento,em média.

A substituição de uma droga por outra,durante qualquer fase da quimioterapia,deve ser feita nos casos em que o pacien-te apresenta intolerância, reações de toxi-cidade, ou quando os testes de sensibilida-de revelam a existência de resistência bac-teriana à mesma.

As clássicas observações feitas em Ma-dras, na Índia30, confirmam a validadedo tratamento, tanto no regime hospita-lar como domiciliar, desde que possa serbem conduzido.

É de aceitação geral, atualmente, a va-lidade do tratamento difásico, no qual otratamento inicial é feito no hospital e, emcontinuação, no ambulatório, em ServiçosGerais ou Especializados de Saúde 20. Du-rante a primeira fase, de hospitalização,procura-se aproveitar o impacto causadopela doença para dar orientação ao doen-te, transmitindo-lhe os princípios básicos

de educação para a saúde, conscientizan-do-o para a necessidade do tratamento,que embora demorado, deve ser feito comregularidade para que se possa obter omáximo efeito que dele se espera.

O risco de contágio é reduzido quandoo doente está sob a ação da quimioterapia,mesmo na eventualidade de ser bacilíferoao deixar o hospital7. O maior risco ocor-re no período que antecede ao diagnósticoe início do tratamento.

6. CRITÉRIOS PARA A ESCOLHA DOMELHOR ESQUEMA TERAPÊUTICO

O critério para a escolha do melhoresquema terapêutico a ser prescrito develevar em conta os seguintes fatores:

— Sensibilidade do bacilo às drogas.

— Extensão e tipo das lesões a serem tra-tadas.

— Possibilidade do doente ter ou não to-mado medicamentos específicos ante-riormente.

— Idade, condições fisiológicas e de saú-de do paciente.

6.1. Sensibilidade do bacilo às drogas

A pesquisa da sensibilidade bacterianaaos quimioterápicos deve ser feita sempreque possível, embora seja relativamentedemorada, dependendo do resultado dacultura. Contudo, o tratamento deve seriniciado imediatamente após o diagnósticoe mantido enquanto se aguarda o resul-tado da mesma.

Sua praticidade é de certo modo rela-tiva em programas de Saúde Pública. Emmuitas regiões afastadas de países em de-senvolvimento não se dispõe de meios pa-ra a realização desse exame especializado,devendo-se contar, não raras vezes, apenascom a bacterioscopia e contagem do nú-mero de bacilos, tanto para o diagnósticocomo para o controle da evolução do tra-tamento.

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6.2. Extensão e tipo das lesões a seremtratadas

A extensão e o tipo das lesões represen-tam fatores ponderáveis.

A classificação da National Tuberculo-sis Association (NTA) fornece subsídiosvaliosos, possibilitando distribuir as for-mas de tuberculose de re-infecção em 3grupos: mínima, moderadamente avança-da e muito avançada.

Embora a quimioterapia bem conduzidapossa ser eficaz no tratamento da tuber-culose em qualquer fase da sua evolução,é natural que nas formas mínima e mo-deradamente avançada o tempo de trata-mento seja mais reduzido e maiores aspossibilidades de cura.

As formas mais graves requerem maistempo de tratamento, não apenas no pe-ríodo inicial, mas também nos subsequen-tes.

As formas mínimas e recentes, predomi-nantemente exsudativas são de prognósti-co mais favorável e de restituição integral;enquanto as formas antigas, predominan-temente produtivas, estão sujeitas a deixarseqüelas.

As drogas mais eficazes disponíveis de-vem ser empregadas nas associações maisúteis, desde o início do tratamento, mes-mo que sejam mais onerosas, em qualquerforma ou tipo de tuberculose.

As formas mínimas de re-infecção eoutras formas, como a pleurisia específi-ca e a tuberculose de primo-infecção, em-bora sejam de evolução favorável em me-nos tempo de tratamento, devem merecero mesmo cuidado para que se possa ga-rantir a máxima eficácia da quimiote-rapia.

6.3. Possibilidade do doente ter ou nãotomado medicamentos específicosanteriormente

Antes de prescrever a medicação espe-cífica deve ser feita uma anamnese tera-pêutica minuciosa para conhecer a possi-

bilidade do doente ter sido ou não medi-cado anteriormente.

Seguindo esta orientação os doentes po-dem ser classificados em três grupos:

1. Virgens de Tratamento (VT)

2. Provavelmente sensíveis (PS)

3. Provavelmente crônicos (PC)

Pertencem ao grupo de VT os doentesque através da anamnese terapêutica re-velam ausência de tratamento anterior ouque fizeram o tratamento correto duranteum período inferior a 30 dias.

Pertencem ao grupo de PS os pacientesque já foram medicados com drogas deprimeira escolha de maneira correta, du-rante um período maior de 30 dias, sendoprovavelmente sensíveis às mesmas.

São provavelmente crônicos os pacientesque já foram submetidos ao tratamentode primeira escolha de maneira incorreta,e os doentes crônicos, em tratamento, pro-vavelmente resistentes às drogas. Perten-cem ainda a este grupo os infectados pordoentes crônicos, embora não tenham sidomedicados anteriormente.

6.4. Idade, condições fisiológicas e desaúde do paciente

Em linhas gerais a quimioterapia datuberculose na criança, pessoas idosas, ges-tantes e portadores de outros estados mór-bidos, não deve afastar-se dos conceitosfundamentais já estabelecidos, baseadosna pesquisa e numa larga experiência desaúde pública.

A principal preocupação deve estar vol-tada para o princípio da adaptação, se-gundo o qual os medicamentos devem serajustados a cada tipo de paciente em par-ticular.

As formas de tuberculose na criança sãofreqüentemente de primo-infecção e, em-bora possam evoluir favoravelmente, nãoexcluem a necessidade do tratamento, mes-mo das formas discretas, pois é durantea fase da infecção primária que se dão

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as propagações linfo-hematogênicas, res-ponsáveis pelas formas de tuberculose ex-tra-pulmonar e da tuberculose de re-infec-ção 1, 3, 4, 25.

Seu organismo, em fase de crescimentoe desenvolvimento, requer, muitas vezes,medicação complementar e cuidados dieté-ticos especiais.

Observar que embora possa tolerar cer-tos medicamentos em doses relativamentemais elevadas em relação aos adultos, acriança não sabe reclamar os efeitos inde-sejáveis que podem ocorrer para o 8.°par craniano com a administração da es-treptomicina em dose elevada, por tempoprolongado.

Usar medicamentos ativos, por via oral,e entre os quais não seja incluido o PAS,pela dificuldade de administração e pornão ser bem tolerado pelo organismo in-fantil.

Quanto ao tempo de tratamento, podeser encurtado para 4 ou 6 meses quandosão utilizadas drogas altamente eficazes co-mo a isoniazida, rifampicina e etambutolno início do tratamento.

Na maioria dos casos podem ser utili-zados apenas dois medicamentos no perío-do inicial 5, 23.

Por outro lado, as pessoas de mais ida-de também merecem cuidados especiais.A relativa freqüência de portadores detuberculose pulmonar que não fazem otratamento corretamente e o aumento devida média das pessoas, nos últimos anos,veio elevar o número de portadores deformas crônicas depois dos 50 anos deidade.

Nessa fase da vida são freqüentes cer-tas perturbações funcionais do aparelho di-gestivo e manifestações de arteriosclerosee enfisema pulmonar em diferentes grausde evolução.

Evitar o emprego de drogas de elevadaintolerância gastro-hepática e toxicidadepara o sistema nervoso central e nervoscranianos. O ácido para-aminissalicílico ea cicloserina devem ser usados muito ra-ramente, e caso haja indicação para oemprego da estreptomicina, dar preferên-

cia para os esquemas intermitentes, duasou três vezes por semana, ou utilizar do-ses diárias menores do que as que sãousadas normalmente.

Durante a gestação as mesmas restriçõesdevem ser feitas, tendo sempre a preocupa-ção de empregar medicamentos que sejambem tolerados e pouco tóxicos para a ges-tante e para o produto concetual.

Do mesmo modo, as pessoas desnutridasnão estão isentas de cuidados especiais.Elas estão sujeitas a formas de tuberculosemais grave, por diminuição da resistênciaorgânica, e estão mais propensas aos fenô-menos de intolerância medicamentosa.

A desnutrição não diz respeito apenasà falta primária de uma ou mais substân-cias na alimentação diária, causando a fo-me crônica, frequentemente observada nasregiões em desenvolvimento, mas tambémàquela que aparece na decorrência deoutras doenças e da própria tuberculosecrônica.

Na desnutrição e na decorrência deoutras doenças e estados mórbidos comodiabetes, alcoolismo e disfunções hepato-renais, além dos cuidados para o empregoda terapêutica antituberculosa adequada, énecessário uma vigilância mais amiude,e elaboração de uma terapêutica comple-mentar e dietética, a fim de equilibrar oestado reacional e garantir a cura da tu-berculose.

São cuidados que devem ser tomadosnão apenas no tratamento da tuberculosepulmonar, mas também nas formas de tu-berculose extra-pulmonar e na meningite.

7. CAUSAS DE INSUCESSO DAQUIMIOTERAPIA

A experiência de mais de 20 anos dequimioterapia anti-tuberculose evidenciouque a mesma pode falhar em grande por-centagem de casos, pelas seguintes razoes:

1. Utilização de esquemas incorretos.A instituição de esquemas terapêuticos ina-dequados, sem observar os princípios bá-sicos de associação, tempo e ritmo do tra-

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tamento, leva freqüentemente ao insucesso,pela formação de crônicos, dando margemao desenvolvimento de resistência bacte-riana.

2. Falta de cooperação do doente paraseguir a orientação indicada. Na verdade,não basta prescrever bem; é necessárioque os doentes tomem os medicamentosprescritos com regularidade.

Entre os fatores que contribuem paraque os doentes não tomem os medicamen-tos corretamente, sobressai a falta de cons-cientização para a valorização da saúde.Outras vezes, são problemas inerentes àsdrogas, como intolerância, toxicidade, di-ficuldade para a aquisição ou para a apli-cação de medicamentos injetáveis.

3. Descoberta tardia do casos e doen-tes cronificados.

Nas formas crônicas as lesões histopato-lógicas são predominantemente produtivase menos vascularizadas em confronto comas lesões exsudativas9, levando a concluirque a concentração das drogas nesses lo-cais também seja variável, embora possamser administradas em doses adequadas.

4. Existência de resistência bacteria-na.

A resistência bacteriana às drogas cons-titui um sério obstáculo ao êxito do trata-mento, embora a observação tenha de-monstrado que o tratamento bem condu-zido durante tempo prolongado, possa sereficaz em grande número de casos, mes-mo em portadores de amostras bacilaresresistentes.

As formas de resistência podem existirnaturalmente. Mesmo numa população ba-cilar ''selvagem", que nunca tenha estadoem contato com os medicamentos especí-ficos, existe uma pequena porcentagem debacilos naturalmente resistentes, variávelpara as diferentes drogas. São contudo,nutantes pouco numerosas. Calcula-se quepara a estreptomicina seja da ordem deum para um milhão e para a isoniazida deum para cem mil geneticamente resis-tentes.

Recebe o nome de primária quandoocorre em pacientes que não tomaram me-dicamentos anteriormente (VT), devidaao contágio de doentes bacilíferos porta-dores de bactérias resistentes às drogas.

Uma pesquisa realizada por Canetti ecol. 8 no período de 1962 a 1970, em11.643 amostras de M. Tuberculosis pro-venientes de 70 Serviços Hospitalares daFrança, de doentes adultos, antes do tra-tamento, evidenciou a existência de resis-tência bacteriana primária nas seguintesproporções:

A resistência para uma só droga foiconstalada em 6,8% dos casos, para duasdrogas em 2,2% dos casos, e para astrês drogas em 0,8% dos casos.

A resistência secundária é condicionadapor uma quimioterapia incorreta, qual se-ja, a administração de uma só droga, ainterrupção do tratamento, o emprego dedoses insuficientes ou de medicamentospouco ativos.

A resistência bacteriana não surge emdecorrência de uma transformação dosbacilos sensíveis em bacilos resistentes, soba ação dos medicamentos. Segundo o con-ceito geneticista, a resistência decorre demutações expontâneas não influenciadaspela presença ou contato com a droga 8, 19.O mecanismo básico desse processo é des-conhecido, mas não há evidência de queesse fato se deva a exposição de um de-terminado medicamento, pois ocorre tam-bém em populações bacilares que nuncaestiveram em contato com o mesmo.

O aparecimento da resistência duranteo tratamento representa apenas a multi-plicação seletiva de mutantes resistentesque já existiam desde o início da infecção.

As drogas anti-bacterianas isoladamen-te não são eficazes contra todos os ger-mes dos locais da infecção. Estudos "invitro" demonstraram que quando o germe

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é exposto à ação de duas ou mais drogasao mesmo tempo, o aparecimento da resis-tência é praticamente nulo.

Quando a quimioterapia é feita sempromover ampla cobertura anti-bacilar,

durante um tempo prolongado, há maiorrisco de multiplicação de estirpes resisten-tes, reduzindo as possibilidades terapêu-ticas.

RSPU-B/249

BRÓLIO, R. — [Chemotherapy of tuberculosis.] Rev. Saúde públ., S. Paulo, 9:71-85, 1975.

SUMMARY: A review of present knowledge on the treatment of Tuberculosisreveals as to how basic concepts on combination of drugs, prolonged treatmentand continuity have evolved. It discloses the tendency towards adoption ofnew therapeutical schemes and the advantages of intermittent treatment, timereducing and the new concept denomination by which the word "continuity"doesn't necessarily mean "daily" but "with regularity" when medicines are givenat regular intervals throughout the intermittent period. The basic principlesof chemotherapy, the drugs at present being used as well as their efficacy,toxicity, doses and manner of administration are analysed. The criteria forchoice of the best therapeutical scheme, continuity of treatment and mainreasons for therapeutical failure are also reviewed.

UNITERMS: Tuberculosis. Chemotherapy. Drugs. Therapeutical schemes.

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Recebido para publicação em 26-12-74

Aprovado para publicação em 13-01-75