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1 QUÍMICA INORGÂNICA MEDCINAL A Química Bioinorgânica estuda as funções do metabolismo e aplicações de íons inorgânicos e seus complexos em sistemas biológicos, correlacionando a atividade biológica apresentada por um sistema inorgânico com suas características estruturais e eletrônicas. A área possui duas linhas principais de trabalho: a) Os elementos inorgânicos que ocorrem naturalmente em biologia e a introdução de metais como sondas em sistemas biológicos; b) Aspectos periféricos, mas essenciais incluem a investigação de elementos inorgânicos noutras áreas tais como saúde e ambiente. 1. FACTORES DE DESENVOLVIMENTO • Melhores Métodos Analíticos • Técnicas Preparativas mais Rápidas • Melhores Técnicas Espectroscópicas e de Difração • Síntese de Complexos Inorgânicos Simples como Modelos de Sistemas Biológicos Complexos • Impacto Social dos Problemas Ambientais • Agentes Terapêuticos RESTRIÇÕES AOS BIOSSISTEMAS 2. ALGUNS ASPECTOS DA QUÍMICA INORGÂNICA BIOLÓGICA Uma característica dos metais que os torna tão importantes como componentes (funcionais e estruturais) dos seres vivos é sua propensão em perder elétrons facilmente formando íons com cargas positivas, que tendem a ser solúveis em fluidos biológicos. É na forma catiônica que os metais desempenham suas principais funções biológicas 1-3 . Enquanto íons metálicos apresentam-se deficientes de elétrons, biomoléculas tais como proteínas e DNA são ricas em elétrons. A atração entre estas oposições de cargas conduz a uma tendência geral de "íons metálicos interagirem com moléculas biológicas". Os compostos de coordenação formados a partir destas interações são extremamente estáveis e podem ser definidos a partir das Equações 1-3 4-5 . A reação de complexação envolve a desolvatação do íon metálico e das biomoléculas, o processo de complexação e finalmente a solvatação do complexo formado. Efeitos eletrônicos (e.g. tipo de ligação entre a biomolécula e o íon metálico etc.), efeitos estéreos, termos entrópicos e efeitos de solvatação constituem a base da estabilidade do complexo formado 6 . A coordenação entre biomoléculas com íons metálicos inclui a deformação do centro metálico pela biomolécula e vice-versa. Associada a esta deformação está à perda de energia

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QUÍMICA INORGÂNICA MEDCINAL A Química Bioinorgânica estuda as funções do metabolismo e aplicações de íons

inorgânicos e seus complexos em sistemas biológicos, correlacionando a atividade biológica apresentada por um sistema inorgânico com suas características estruturais e eletrônicas. A área possui duas linhas principais de trabalho:

a) Os elementos inorgânicos que ocorrem naturalmente em biologia e a introdução de metais como sondas em sistemas biológicos;

b) Aspectos periféricos, mas essenciais incluem a investigação de elementos inorgânicos noutras áreas tais como saúde e ambiente.

1. FACTORES DE DESENVOLVIMENTO

• Melhores Métodos Analíticos • Técnicas Preparativas mais Rápidas • Melhores Técnicas Espectroscópicas e de Difração • Síntese de Complexos Inorgânicos Simples como Modelos de Sistemas Biológicos Complexos • Impacto Social dos Problemas Ambientais • Agentes Terapêuticos

RESTRIÇÕES AOS BIOSSISTEMAS

2. ALGUNS ASPECTOS DA QUÍMICA INORGÂNICA BIOLÓGICA

Uma característica dos metais que os torna tão importantes como componentes

(funcionais e estruturais) dos seres vivos é sua propensão em perder elétrons facilmente formando íons com cargas positivas, que tendem a ser solúveis em fluidos biológicos. É na forma catiônica que os metais desempenham suas principais funções biológicas1-3.

Enquanto íons metálicos apresentam-se deficientes de elétrons, biomoléculas tais como proteínas e DNA são ricas em elétrons. A atração entre estas oposições de cargas conduz a uma tendência geral de "íons metálicos interagirem com moléculas biológicas". Os compostos de coordenação formados a partir destas interações são extremamente estáveis e podem ser definidos a partir das Equações 1-3 4-5.

A reação de complexação envolve a desolvatação do íon metálico e das biomoléculas, o processo de complexação e finalmente a solvatação do complexo formado. Efeitos eletrônicos (e.g. tipo de ligação entre a biomolécula e o íon metálico etc.), efeitos estéreos, termos entrópicos e efeitos de solvatação constituem a base da estabilidade do complexo formado6.

A coordenação entre biomoléculas com íons metálicos inclui a deformação do centro metálico pela biomolécula e vice-versa. Associada a esta deformação está à perda de energia

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estérea que é compensada pela energia da ligação, que resulta da formação da ligação átomo doador de par de elétrons da biomolécula com o íon metálico (Equação 4).

Na organização das estruturas biomolécula livre, metal e, finalmente, o complexo

influenciam a especificidade do par íon metálico/biomolécula ligante que envolve tamanho e forma, assim como flexibilidade e liberdade torsional da biomolécula7,8.

A estabilidade termodinâmica ainda dependerá de fatores como: (i) Estado de oxidação do metal e geometria de coordenação; (ii) Estrutura tridimensional do complexo formado; (iii) Estequiometria; (iv) Disponibilidade biológica da macromolécula alvo para coordenação; (v) Hidrofilicidade e hidrofibicidade local (vi) Impedimento espacial momentâneo; (vii) Presença de grupos que fazem ligações de hidrogênio com átomos ligados e não ligados

ao metal. Alguns fatores que devem ser considerados na formação de complexo metal ligante em um sistema biológico são: (i) Caráter duro e macio do metal e dos ligantes (cátions duros formam compostos mais

estáveis com ligantes duros enquanto que cátions macios formam compostos mais estáveis com ligantes macios);

Existem numerosos conceitos e teorias que são utilizados na interpretação e previsão da estabilidade dos complexos metal-biomoléculas e propriedades relacionadas (e.g. previsão dos potenciais redox9-11, a correlação entre potenciais redox e características eletrônicas das biomoléculas12-14 e/ou sinais de RMN15). Algumas destas teorias são puramente qualitativas, outras permitem previsões semiquantitativas, mas todas são limitadas em sua aplicabilidade. Entretanto, frequentemente as interações metais-biomoléculas são interpretadas, com sucesso, com base no princípio HSBA de Pearson (dureza e maciez de ácidos e bases)16. A teoria dos ácidos e bases de Lewis serviu de base para uma descrição qualitativa da dureza e maciez dos ácidos e bases feita por Pearson17. De acordo com Pearson, uma espécie "macia" em geral tem grande raio atômico, baixa carga efetiva nuclear e alta polarizabilidade, enquanto que uma espécie "dura" possui características opostas. Enquanto os íons metálicos são considerados ácidos de Lewis, seus contra-íons são átomos ligantes com características de dureza e maciez. No contexto fisiopatológico, estes ligantes estão representados pelas cadeias protéicas, pelas bases dos ácidos nucléicos, pequenos constituintes do citoplasma celular, cofatores orgânicos e, claro, pela água. Embora possam existir algumas exceções, a regra geral enuncia que ácidos duros se ligam a bases duras enquanto ácidos macios preferem bases macias. Uma melhor visualização da distinção entre as espécies macias e duras pode ser observada na Figura 1, que representa a correlação entre potencial de ionização e a razão carga/raio de algumas espécies M2+. Este gráfico é uma maneira simplificada de representar a distinção entre íons metálicos duros e macios. Ele fornece qualitativamente a série de Irving-Williams18,19.

A estabilidade termodinâmica do centro metálico em ambientes biológicos é determinada não somente por um estado de oxidação particular, pela biomolécula e

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geometria de coordenação, mas também pela estrutura tridimensional do complexo formado, pela estequiometria e disponibilidade das biomoléculas para coordenação. Outros fatores tais como hidrofilicidade ou hidrofobicidade local, impedimento espacial dos sítios de coordenação, e grupos ligantes de hidrogênio que podem interagir com átomos ligados e não ligados da esfera de coordenação metálica podem aumentar ou diminuir a estabilidade dos complexos de metalo-biomoléculas. A carga positiva dos íons metálicos estabiliza os ligantes próticos (ânions ácidos) da esfera de coordenação20.

(ii) Concentração do íon metálico e do ligante em torno do sítio de complexação

(determinadas através de gradientes de concentração, permeabilidade da membrana e outros fatores);

𝑀 + 𝐿 → 𝑀𝐿 = 𝐾1 =[𝑀𝐿]

[𝑀][𝐿]

𝑀𝐿 + 𝐿 → 𝑀𝐿2 = 𝐾2 =[𝑀𝐿2]

[𝑀𝐿][𝐿]

.

.

.

.

.

.

.

.

.

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𝑀𝐿𝑛 + 𝐿 → 𝑀𝐿𝑛+1 = 𝐾𝑛 = [𝑀𝐿𝑛+1]

[𝑀𝐿𝑛][𝐿]

Onde n = K1 x K2 x K3 ··· x Kn Pelo fator estatístico K1 > K2 > K3

Previsão da estabilidade: A velocidade de reação depende da altura da barreira de energia de ativação para a conversão. Segundo TAUBE em condições ordinária (temperatura ambiente e concentração de 0,1 mol L-1) complexos que reagem completamente dentro de um (1) minuto são ditos lábeis. Os que levam mais do que um minuto são ditos inertes. Duas generalizações podem ser observadas:

(a) Complexos que não apresentam estabilização adicional pela (Energia de Estabilização do Campo Cristalino) são mais lábeis

(b) Íons pequenos são menos lábeis porque a força da ligação M-L é maior e porque é difícil para um pré-ligante se aproximar do metal.

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(iii) Competição entre os vários equilíbrios existentes (Ex.: solubilidade dos produtos, complexação e ácido-base). Além destes o tamanho, a carga e a geometria de coordenação preferencialmente assumida pelo íon metálico e o efeito quelato exibido pelo ligante devem ser considerados.

Uma característica dos sistemas vivos é a dependência de uma “estabilidade cinética” para a sua

existência, ou seja, todos são termodinamicamente instáveis e se transformariam em CO2 e H2O caso o

equilíbrio termodinâmico fosse atingido. Desta forma o processo de manutenção da vida depende da habilidade dos organismos em restringir essa tendência utilizando-se de equilíbrios delicados de forma a produzir ou consumir apenas a energia para um determinado processo. No caso específico dos sistemas que envolvem metais, considerações relevantes incluem o equilíbrio que existe entre os

centros metálicos e seus ligantes e a cinética que envolve a ligação metal-ligante.

Além destes, no estudo de metais em sistemas biológicos há mais quatro pontos

importantes a serem considerados antes de discutirmos os sistemas mais conhecidos: (i) Nem sempre o metal presente em um sistema biológico tem uma função catalítica. Por

exemplo, há um grande número de casos descritos em que o Zn2+ tem uma função estrutural, pois este forma ligações fortes com o S de aminoácidos da proteína como a cisteína. Já o íon Ca2+ desempenha um papel fundamental na regulação da ação dos nervos (em seqüência) porque os seus complexos não são nem muito lábeis, nem muito inertes.

(ii) Os íons em um sistema biológico frequentemente estão em um ambiente pouco usual. Isto não é devido aos arranjos geométricos dos átomos coordenantes, mas está relacionado à fatores como a manutenção de sítios livres para a coordenação (seja de átomos da vizinhança, do solvente ou até mesmo de um substrato) e com o volume dos ligantes, que controlam não só o acesso ao sítio de ligação do substrato, como também regulam a mobilidade do substrato e auxiliam a manter a vizinhança hidrofílica ou hidrofóbica.

(iii) Alguns íons não são tão facilmente estudados. Íons como Zn2+ e Ca2+ não apresentam transições eletrônicas que caiam numa faixa em que possam ser observados, não tem abundância isotópica suficiente para serem estudados por RMN, não são paramagnéticos para serem analisados por RPE, não são analisáveis por Mössbauer e assim por diante. Para permitir um estudo estes íons devem ser substituídos por outros similares que possuam as propriedades espectroscópicas desejadas. No caso do zinco os íons mais utilizados são Co2+, Cu2+, Mn2+ e Cd2+. Já os íons cálcio normalmente são trocados por lantanídeos como Nd3+ e Eu3+.

(iv) Espécies contendo dois ou mais íons metálicos em ponte são extremamente comuns.

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3. METAIS NA MEDICINA

A Química Inorgânica Medicinal, por sua vez, tem como características seu caráter multidisciplinar, visto que os elementos químicos desempenham papel crucial em processos biológicos e que muitos fármacos, não possuem mecanismo de ação puramente orgânico, alguns são ativados ou biotransformados por íons metálicos incluindo metaloproteínas (como o citocromo P450) e que outros sofrem efeitos diretos ou indiretos de íons metálicos no metabolismo. As inúmeras atividades biológicas exercidas por íons metálicos têm recentemente estimulado o desenvolvimento de fármacos à base de metais (metal-based drugs). Os principais objetos de estudo tem sido:

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4. Figura 1. Guo, Z. Sadler, P.J. Angew. Chem. Int. Ed. 1999, 38, 1512 Orvig, C. Abrams,

M.J. Chemical Reviews, 1999, 99, 2201

Thompson, K.H, Orvig, C.; Science, 2003, 300, 936

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4. PERMEAÇÃO ATRAVÉS DA MEMBRANA CELULAR

Um processo celular dinâmico reside na extração de íons metálicos minerais e inserção nas biomoléculas. Para muitos íons, tais como Na+, Mg2+, ou Zn2+, solubilidade não representa um problema e apenas concentrações milimolares são necessárias. Alguns elementos tais como ferro, entretanto, são tão insolúveis em pH fisiológico que estão indisponíveis. Solubilização à parte, íons metálicos devem ser absorvidos pelas células, um mecanismo que

ainda permanece não muito claro e caracterizado. Dois são os possíveis caminhos21,22.

Íons positivos, tais como sódio, têm acesso ao meio intracelular, através de canais e bombas especiais na membrana celular21. Para outros íons, existem biomoléculas que facilitam seu transporte através da membrana celular, onde estes encontram proteínas transportadoras específicas (Tabela 1). Existem ainda vários outros mecanismos pelos quais a célula pode captar e concentrar

um íon metálico específico em seu ambiente.

As espécies carregadas negativamente entram na célula por um sistema específico denominado transporte de ânions, tais como íon sulfato, por meio da membrana externa. Uma

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vez dentro da célula, o ânion é reduzido, liga-se a um componente intracelular e, então, é difundido para o meio. Um exemplo interessante é o cromo, que, na forma do ânion cromato, CrO4

2-, é carcinogênico. Seu mecanismo de entrada na célula pode ser ilustrado pela Figura 2.

O cromo é celularmente internalizado pelo sistema de transporte de ânions. No citoplasma, ele reage com a glutationa (GSH), um peptídeo intracelular. Nesta reação com GSH o ânion cromato é reduzido a Cr(V) e Cr(IV), e forma-se uma ligação Cr – S com o grupo sulfidrila do resíduo de cisteína da GSH. O íon metálico é então difundido para dentro do plasma, onde se liga ao DNA e sofre uma redução para Cr(III)23.

Para complexos metálicos ou metais neutros, a captação celular pode ocorrer por difusão passiva através da membrana celular. Este é o mecanismo que aparentemente opera a administração da cisplatina, com atividade antitumoral. A cisplatina é administrada por injeção intravenosa em solução salina aquosa. Aproximadamente metade da platina se liga às proteínas do soro e é excretada. O restante é distribuído para os vários tecidos24. Íons metálicos são captados e absorvidos por células animais e vegetais, onde vão desempenhar dois papéis principais: atuam como cofatores enzimáticos, mas, também podem catalisar reações citotóxicas25.

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Exemplo: Tratamento da Leishimaniose As leishmanioses são doenças parasitárias que atingem cerca de 12 milhões de pessoas no mundo. São zoonoses típicas de áreas rurais de regiões tropicais e subtropicais. No entanto, uma crescente urbanização da doença tem sido observada. Provocada por parasitas Protozoários do gênero Leishmania, a enfermidade é transmitida ao homem (ou outros hospedeiros vertebrados) pela picada de um mosquito hematófago infectado, denominado flebótomo. Esses parasitas são fagocitados pelos macrófagos2, onde se multiplicam livremente e escapam aos sistemas de defesa do hospedeiro. No Brasil ocorrem cerca de 30 mil novos casos anuais da doença, sendo a população de baixa renda a mais atingida.

Os grandes laboratórios farmacêuticos investem pouco no desenvolvimento de alternativas terapêuticas para essas doenças, p r i n c i p a l m e n t e porque são classificadas como doenças negligenciadas, que dão pouco lucro.

No início do século passado, Gaspar Vianna foi o primeiro a relatar

a eficácia do tártaro emético, antimonial

trivalente (Esquema 1), no tratamento da leishmaniose cutâneo-mucosa

(Vianna, 1912). A partir dos trabalhos desse importante médico

brasileiro, os doentes de calazar (forma visceral e fatal da doença) passaram

a ter esperança de sobrevivência.

Entretanto, em razão de seus graves efeitos colaterais, os complexos de antimônio

trivalente (Sb III) foram rapidamente substituídos por complexos de antimônio pentavalente (SbV). Foi proposto que o SbV se comportaria como uma pró-droga, sendo reduzido por tióis a Sb III

no organismo hospedeiro. Segundo essa hipótese, Sb III

seria a forma ativa e tóxica do antimônio.

A biomolécula glutationa (GSH, esquema 2), que contém o grupo sulfidrila e é o tiol predominante no

meio intracelular, seria um forte candidato a redutor de SbV a SbIII

(Frézard et al, 2001; Ferreira et al., 2003). A equação (1) mostra a redução de SbV a SbIII

com formação de um complexo onde três moléculas de GSH se ligam ao Sb III.

Tem sido sugerido que nos meios biológicos Sb III interagiria com os grupos sulfidrilas de certas proteínas, resultando na perda de sua função. Por outro lado, foi também demonstrado

que SbV forma complexos com ribonucleosídeos, e que essa interação poderia ter implicações no mecanismo de ação dos antimoniais (Esquema 3) (Demicheli et al., 2002). Na Figura, mostramos um esquema dos dois modelos propostos para o mecanismo de ação dos

antimoniais pentavalentes.

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Os medicamentos utilizados como primeira escolha para o tratamento de todas as formas de leishmaniose no homem continuam sendo compostos à base de SbV

.

Essencialmente, dois derivados de antimônio pentavalente encontram- se em uso clínico desde 1945: o antimoniato de meglumina (Glucantime®) e o Rhodia, Foto 1) e o estibogluconato de sódio (Pentostam®, Welcome). No Brasil o medicamento utilizado é antimoniato de meglumina. O composto é obtido sinteticamente a partir de SbV e N-metil-D-glucamina, mas não possui fórmula estrutural definida. Porém, tem sido sugerido que o antimônio se liga ao N-metil-D-glucamina através do oxigênio do carbono- 3 (Esquema 4).Esses compostos injetáveis são administrados por um período de 20-40 dias, o que dificulta a adesão dos pacientes. Diante dessas limitações, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a pesquisa de novos fármacos e formulações, bem como de vias de administração mais simples e seguras, como as vias oral e tópica (Ridley, 2003).

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5. BIODISPONIBILIDADE E SUPLEMENTAÇÃO DE ELEMENTOS TRAÇO Segundo a International Union of Pure and Applied Chemistry (IUPA, Elemento traço é

qualquer elemento que possua uma concentração média inferior a 100 mg /Kg. O termo traço é utilizado porque no século XIX esses elementos não eram tetectáveis pelas técnicas então disponíveis. Com a evolução da tecnologia analítica, descobriu-se que esses elementos estavam presentes em baixas concentrações (Brown, Milton, 2005).

Podemos dizer que a Química Inorgânica Medicinal, baseando-se nos conhecimentos e informações fornecidos pela Química Bioinorgânica durante as últimas décadas, tem conseguido interessantes e valiosos avanços no campo da suplementação de elementos-traços essenciais, bem como novos critérios e ideias para um desenvolvimento racional, baseado em conceitos científicos sólidos, desse importante ramo da Farmacologia moderna.

Nos seres vivos predominam o carbono, o hidrogênio, o nitrogênio e o oxigênio. Como esses são os elementos fundamentais da Química Orgânica, acreditou-se durante muito tempo que somente os compostos orgânicos e as reações que os envolviam eram indispensáveis para a Vida, e que os elementos e compostos comumente chamados “inorgânicos” tinham escasso ou nenhum significado para os sistemas vivos. Havia, no entanto, algumas exceções bem conhecidas e estabelecidas, tais como o reconhecimento da presença de ferro no sangue, ou de cálcio nos ossos e dentes, e a participação do fósforo em numerosos processos metabólicos. Só recentemente tomou-se consciência clara de que muitos outros elementos inorgânicos, sobretudo metais de transição, presentes geralmente em baixas concentrações (traços), são essenciais para todos os seres vivos. Hoje sabemos que certas alterações no metabolismo desses elementos-traços são causa de várias doenças e desordens fisiológicas. Em razão das concentrações muito baixas desses elementos, a importância biológica de muitos deles só foi determinada há pouco tempo, pois foi necessário dispor, primeiramente, de métodos analíticos muito sensíveis e específicos para detectá-los e, depois, de ferramentas bioquímicas capazes de confirmar seu caráter essencial.

Diz-se que um elemento é essencial para um determinado organismo quando a deficiência de sua ingestão produz desordens em certas funções, e quando sua recuperação aos níveis fisiológicos é

capaz de reverter essas desordens. Sem sua participação, o organismo não pode desenvolver-se normalmente e nem completar seu ciclo vital, pois sua função não pode ser realizada de forma completa por outro sistema ou elemento.

Atualmente, cerca de trinta elementos são reconhecidos como essenciais para os seres vivos. A Tabela 1 apresenta a composição elementar média de um ser humano adulto normal (Baran, 1995). De acordo com a sua abundância relativa no organismo, esses elementos se classificam como majoritários, traços e ultramicro-traços. Hidrogênio, carbono, nitrogênio e oxigênio, componentes básicos da matéria orgânica, são constituintes majoritários, assim como o enxofre, o fósforo, o cloro e os quatro metais representativos biologicamente relevantes - sódio, potássio, magnésio e cálcio.

Ferro, zinco e cobre correspondem ao grupo de elementos traços, e são também os três

metais de transição mais abundantes em todos os seres vivos. Os metais restantes e alguns

outros elementos não metálicos (por exemplo, selênio e iodo) encontram-se em

concentrações extremamente baixas, mas possuem uma extraordinária importância para a

vida.

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Os metais essenciais em processos metabólicos são relativamente mais abundantes

que os outros. Surge então uma pergunta: Porque a natureza selecionou alguns elementos em detrimento de outros?

Mudanças na atmosfera e consequentes mudanças no mar e na superfície da terrestre, ao longo de milhares de milênios, tiveram um efeito considerável na distribuição dos elementos e na sua incorporação pelos seres vivos.

Seleção natural. A utilização de elementos químicos por sistemas biológicos depende da abundância e da biodisponibilidade do elemento, na versatilidade dos compostos formados, de suas propriedades químicas (especificidade) e do desenvolvimento de vias de captura e

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transporte. Isto explica, por exemplo, a pequena participação do alumínio que é o metal mais abundante na crosta terrestre em processos biológicos notáveis. Apesar da abundância, este só se encontra na crosta terrestre em estados de oxidação altos na forma de hidróxidos e óxidos insolúveis em agua. Este estado de oxidação é o mais estável no pH fisiológico. Para entender porque alguns elementos foram escolhidos como essenciais enquanto outros são potencialmente tóxicos, é preciso estudar as formas químicas e a especiação em que estes metais occoreem nos ambientes naturais. É preciso entender que as limitações não são impostas apenas pela solubilidade em água em certa faixa de pH, mas que requerimentos redóx tam também são atendidos.

Em pH 7 o potencial redox da água é bastante restrito variando de -0,4 a a +0,8 V (referente ao potencia padrão do hidrogênio) e corresponde aos sistemas H+/H2 e O2/OH-. Isto é, valores em que a água é reduzida a H2 ou oxidada a O2. Desta forma a atividade redox dos metais é bastante restringida em meio biológico [Ex.: Fe (+2, +3), cobre (+1, +2)] , enquanto que os não metais terão uma faixa bem ampla [Ex.: S (-2 a +6) e C (-4 a +4)]. A diferença se deve principalmente ao fato de que nos metais de transição os elétrons são retirados de orbitais 3d, que rapidamente aumentam a energia para a retirada de mais um elétron devido o aumento da carga, e esta não pode ser facilmente compensada pela ligação de hidrogênio com a água. Já para os não metais o processo ocorre nos orbitais s/p e é facilmente compensado dentro do organismo. O único elemento de interesse biológico que foge a esta generalização é

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o molibdênio, o qual é um elemento da segunda série de transição, mas que comporta-se como um não metal apresentando vários estados de oxidação possíveis nesta faixa de potencial. Note que a ionização neste caso ocorrerá em um orbital 4d. Outro elemento que apresenta esta variação é o vanádio (embora seu papel biológico ainda não esteja completamente entendido).

Outro ponto importante de ser considerado é que há diversos metais e não metais com apenas um estado de oxidação estável (Ex.: metais alcalinos, zinco, cádmio, boro (boratos), silício (sílica) e fósforo (fosfatos)). Note também que alguns estados de oxidação do metal são inatingíveis biologicamente. No caso de não metais: O estado de oxidação mais comum do cloro é cloreto, mas este é pouco encontrado nos organismos vivos. No entanto, normalmente estão presentes em muitos antibióticos. O uso do cloreto deve ser cuidadoso porque este também é encontrado em muitos pesticidas, inseticidas e outros produtos industriais, que estão sendo lentamente banidos pelos órgãos oficiais). Um exemplo de comportamento oposto nos não metais é o nitrogênio que é instável em seus potenciais extremos (E.: NO3

– tende a ser reduzido a NH). Isto mostra que a um número muito limitado de não metais podem ser explorados pelos sistemas biológicos em seus potenciais redox, sendo esta posição dominada pelo hidrogênio (-1 a +1) e pelo carbono (-4 a +4)com potencias de conversão próximos zero.

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Pode se dizer que os elementos estão disponíveis na atmosfera na forma gasosa, (C) CO2, O (O2) e N (N2) e H (vapor de água), ou a partir de soluções aquosa em que as espécies estão presentes como íons simples ou complexos.

Pela discrepância é possível entender porque é tão difícil manter os níveis de certos

elementos nos organismos. Podemos identificar cinco funções que requerem sua participação (Baran, 1990, 1995): 1. Transporte e ativação do oxigênio: Essa é uma das funções mais importantes para todos os organismos superiores. O transporte do oxigênio se realiza normalmente utilizando proteínas que contêm ferro (por exemplo, hemoglobina) ou, eventualmente, cobre (hemocianina). Nesses casos, forma-se uma ligação entre o centro metálico e a molécula de oxigênio e, em consequência, a molécula de O2 sofre um processo, chamado de ativação, que a torna extremamente reativa. 2. Transporte de elétrons: Certos metais, que podem apresentar-se em dois ou mais estados de oxidação (manganês, ferro, cobre e molibdênio), são utilizados para o transporte de elétrons. Isto é, os sistemas que os contêm podem receber elétrons de um agente redutor (capaz de doar elétrons) e transferi-los depois a outro oxidante (capaz de receber elétrons). 3. Centro catalítico em processos de oxirredução: Nesses sistemas, o metal constitui o sítio ativo onde ocorre uma reação de oxirredução (por exemplo, a decomposição de H2O2 em H2O e O2, catalisada pela catalase, uma enzima que contém ferro, ou a oxidação de sulfito a sulfato, catalisada pela sulfito-oxidase, uma enzima que contém molibdênio). Vários metais de transição participam de reações redox. 4. Centro catalítico em processos ácido-base: Nesses casos, um metal é o sítio ativo onde ocorre uma reação de tipo ácido-base (por exemplo, a conversão de CO2 em HCO3

– ou a hidrólise de um éster fosfórico, catalisadas pelas enzimas anidrase carbônica e fosfatase, respectivamente, ambas contendo zinco Zn2+). 5. Função estrutural: Uma função óbvia desse tipo é, por exemplo, a participação de fosfatos de cálcio na formação das estruturas ósseas de todos os organismos superiores. Desse modo, muitas vezes a união de um cátion metálico a um determinado sítio de uma biomolécula (por exemplo, uma proteína) é essencial para obter-se uma estrutura espacial adequada que lhe permita realizar alguma função predeterminada.

Atualmente sabe-se que os íons Na+ e K+ são utilizados para gerar gradientes iônicos através de membranas e na manutenção do balanço osmótico. Em contraste, Mg2+ e Ca2+ desempenham um papel estrutural importante e especialmente o Ca2+ atua como transportador de carga e como gatilho no sinal de transdução. Além de desempenhar um

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papel estrutural importante, o íon Zn2+ exerce importantes funções como ácido de Lewis. Já íons metálicos com propriedade redox, como ferro e cobre, participam em várias reações redox e em processos que envolvem o oxigênio. A utilização de elementos químicos por sistemas biológicos depende da abundância e da disponibilidade do elemento, da versatilidade e estabilidade dos compostos formados, de suas propriedades químicas (especificidade) e do desenvolvimento de vias de captura e transporte. Neste texto, focaremos em processos que envolvem metais de transição.

Juntamente com o melhor conhecimento dos mecanismos de atividade e da função dos metais em sistemas biológicos, tem-se tornado evidente que a concentração de qualquer metal presente em um organismo vivo deve estar sujeita a um continuado e estrito controle. Isto permite um funcionamento adequado dos processos metabólicos e fisiológicos e uma inter-relação equilibrada entre todos os sistemas e espécies inorgânicas presentes nesse organismo. Concretamente, no caso dos seres humanos, um amplo número de desordens e doenças é atualmente associável aos excessos ou deficiências de certos elementos metálicos. O desequilíbrio leva ao desenvolvimento da patologia e em muitos casos a recuperação do

elemento à níveis fisiológicos é capaz de reverter a desordem.

Para o caso de uma sobrecarga de algum metal essencial gerada por desordens fisiológicas, ou em casos de envenenamento por excesso de um elemento tóxico, tem-se desenvolvido diferentes agentes quelantes ou drogas que são capazes de eliminar esses excessos e permitem restabelecer os equilíbrios biológicos e bioquímicos normais. Esses sistemas constituem a base do que, na Química Inorgânica Medicinal, se denomina quelatoterapia (Baran, 1995;

Taylor & Williams,1995). São também conhecidas doenças e desordens geradas por deficiência de um elemento essencial e, nesse caso, a Química Inorgânica Medicinal propõe diferentes caminhos e metodologias para sua suplementação em forma adequada e eficiente. A discussão da suplementação, relacionada a um grupo selecionado de elementos-traços e ultramicro-

traços, constitui o aspecto central deste artigo.

Ferro

O ferro é o quarto elemento mais abundante na crosta terrestre e está envolvido em processos vitais para a maioria dos organismos. O elemento pode ocorrer em diferentes estados de oxidação (variando de -2 a +6). No meio biológico os principais estados de oxidação são o Fe2+(d6) e o Fe3+(d5), mas estados de oxidação mais altos (+4 e +5) podem ocorrer em intermediários de ciclos catalíticos de algumas monooxigenases. O potencial redox do par Fe2+/Fe3+ é bastante variável e pode ser facilmente modulado pelo ambiente em que ele se encontra inserido. O Fe3+ é um ácido duro preferindo ligantes oxigenados como carboxilatos e fenolatos, seus compostos são praticamente insolúveis em água. Já o Fe2+ tem um caráter ácido intermediário, prefereligar-se a ligantes como imidazóis e pirróis ou ligantes contendo enxofre e forma compostos extremamente solúveis em água. Ambos os estados de oxidação

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podem assumir números de coordenação de 3 a 6. A transição entre estados de spin de alto para baixo é acompanhada de uma contração no raio do centro de ferro.

As proteínas contendo ferro podem ser classificadas pela sua química de coordenação (i) hemoproteínas; (ii) proteínas ferro-enxofre e (iii) proteínas contendo ferro que não tem centros Fe/S nem grupo heme. Aqui serão abordados apenas alguns exemplos selecionados.

(i) HEMOPROTEINAS: As globinas são proteínas responsáveis pelo transporte e/ou armazenamento de oxigênio em organismo multicelulares e são constituídas de uma parte protéica, a cadeia polipeptídica, e uma parte não protéica (o grupo heme). O grupo heme consiste de um anel porfirínico quelando um centro de ferro. O tamanho da cavidade (~ 2 Å) é ideal para acomodar metais da primeira série de transição. O O2 é capturado pela hemoglobina nos pulmões ou guelrras e transportado até os tecidos em que é estocado pela mioglobina. Além destas funções as globinas aumentam muito a solubilidade do O2 em água. A molécula de O2 pode ser considerada como um ligante macio com certa

possibilidade de efetuar ligação . O cátion Fe2+ geralmente não é considerado macio, mas certamente o anel porfirínico e o ambiente protéico o auxiliam na ligação com o O2. A ligação do complexo "heme" com o oxigênio é fraca e instável, dependendo de uma série de fatores, como pH, temperatura e da pressão parcial dos gases dissolvidos no sangue.

A mioglobina (mio = músculo) é uma proteína globular pequena (17.000 Da) contendo

uma única cadeia polipeptídica que contêm várias -hélices (que lhe conferem mobilidade) e protegem um grupo heme que coordena O2 reversivelmente e controla a concentração de oxigênio nos tecidos. O grupo protético heme contém um centro de ferro quelado por um anel porfirínico e uma histidina deixando um sítio vago para a coordenação do O2 sem transferência de elétrons. O centro de Ferro(II) spin alto possui um raio de aproximadamente 92 pm e não cabe na cavidade do canal porfirínico. O átomo de ferro se encontra 42 pm acima do plano dos nitrogênios do anel porfirínico. Quando a molécula de O2 se liga ao centro de ferro, este muda para spin baixo causando uma contração no raio para 75 pm e o ferro se ajusta ao plano do anel. A ligação Fe-O nas globinas é frequêntemente expressa em termos da coordenação de um oxigênio no estado singleto

ao centro de ferro(II) no qual o orbital 2g* duplamente ocupado

atua como doador para o ferro e o orbital vazio 2g do O2 recebe densidade eletrônica do ferro. As reações que ocorrem são:

Pulmões ou guelrras: Hb + 4O2 Hb(O2)4

Tecidos: Hb(O2)4 + 4Mb 4 Mb(O2) + Hb

Em uma primeira aproximação a hemoglobina poderia ser considerada um tetrâmero da mioglobina. Ela tem um peso molecular de 64.500 Da e contem 4 grupos heme ligados a 4

cadeias protéicas. 2 cadeias e duas cadeias . Uma única hemoglobina pode aceitar a ligação de até 4 moléculas de O2 no entanto observa-se o efeito da cooperatividade. Quando a

hemoglobina é oxigenada uma metade gira 15 em relação à outra metade alterando a estrutura quaternária. Esta estrutura modificada apresenta maior afinidade pela molécula de O2.

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Da mesma forma que na mioglobina, a chave do processo é a coordenação da molécula de O2 ao centro de Fe2+ spin alto (ligeiramente acima da cavidade porfirínica) mudando o seu estão de spin para baixo e permitindo que este se encaixe na cavidade e desencadeie as mudanças conformacionais que levam ao efeito cooperativo. Compostos modelo: A questão central a respeito das globinas é como a molécula de O2 se liga reveressivelmente ao centro de ferro. Outro ponto está relacionado ao modo de ligação da molécula de O2 que pode ser monodentada ou bidentada. Estes estudos são realizados com porfirinas de ferro em que o anel porfirínico é modificado. Muitas vezes estes anéis são suportados em uma matriz para evitar a formação de dímeros. Alguns macrocíclicos de cobalto e irídio também são utilizados nestes estudos devido ao seu potencia para o transporte de oxigênio.

Outra classe de hemoproteínas, os citocromos, possui centros de ferro spin baixo hexacoordenados. A grande importância dos citocromos reside na habilidade de atuar como intermediário redox em reações de transferência de elétrons. Nestes sistemas as porfirinas desempenham um papel importante nos diferentes sistemas, pois a acessibilidade biológica é modulada variando-se o metal, ou o estado de oxidação deste, ou modificando a natureza dos grupos ligantes. O grupo heme do citocromo c está envolvido por uma cadeia polipeptídica e reage apenas por mecanismos de transferência de elétrons. Ele pode reduzir a molécula de O2, transferir este poder oxidante para a queima de alimentos e liberar energia na respiração. Esta energia liberada pode ser estocada na forma de ADP, ATP e fosfatos. Há uma grande variedade de citocromos, cuja maioria não esta bem descrita como o citocromo c. Dependendo dos ligantes presentes, o potencial redox de um determinado citocromo pode ser modulado para um necessidade específica no esquema de transferência de elétrons, seja na fotossíntese ou

na respiração. Os potenciais são tais que os elétrons fluem do citocromo b c a O2 na mitocôndria das células. Onde pelo menos o tipo a é capaz de ligar O2.

Uma família de citocromos importantes é a do citocromo P-450 que catalisa a adição de oxigênio a um substrato hidrocarboneto (monooxigenases). O nome provém de uma banda de absorção característica no espectro eletrônico. Esta banda é conhecida como banda Soret e é deslocada para o vermelho (450 nm) quando há carbonilas coordenadas. O representante mais importante dessa classe é:

R-H + 1/2O2 R-O-H (ii) PROTEÍNAS FERRO-ENXOFRE: Existem diversas proteínas contendo ferro e enxofre que não são baseadas em grupos heme. Nos primeiros bilhões de anos a atmosfera do nosso planeta era anaeróbica. Neste início ferro e enxofre eram abundantes, o que sugere que estas proteínas estejam entre os primeiros catalisadores utilizados pelos organismos. A mais simples delas é a da bactéria rubredoxina que contém apenas um centro de ferro e está envolvida em diversas reações biológicas do tipo redox, principalmente de bactérias anaeróbicas. A importância bioquímica das que contém cluster Fe/S reside na possibilidade de envolvimento em reações de transferência de elétrons e na tendência de ligar substratos orgânicos contendo oxigênio e nitrogênio como átomos doadores. Dentre estes são clusters do tipo [2Fe2S], [4Fe4S] e [3Fe4S]. Eles normalmente operam em potenciais mais negativos do que os citocromos e são compostos por centros de Fe2+ e Fe3+ spin alto em ambiente tetraédrico com ligantes sulfetos (S2-) e ligados à proteína por (RS-) de resíduos de cisteínas.

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Rubredoxina

Ferredoxina fotossíntese de plantas superiores

Cubano Aconitases isomerização do citrato ao isocitrato

Estrutura de centros FeS comuns

Após a transferência de elétrons, os clusters mostram pequenas modificações estruturais, o que está de acordo com a função desempenhada. Estudos de difratometria de raios X, Mössbauer e magnetoquímica em compostos modelo do tipo [4Fe4S] com estruturas similares aos dos cubanos e duplo cubanos sugerem que estes sistemas são de valência mista e que apesar de ter mais de um centro de ferro, os clusters são envolvidos em uma única transferência de elétrons por vez. Ainda são conhecidos exemplos em que um ou mais centros de ferro são ligados a outros ligantes como alcóxidos, carboxilatos, hidróxidos, etc. Por exemplo, nas aconitases, que tem uma função diferenciada, catalisando a desidratação de um substrato, um dos centros de ferro é coordenado a uma molécula de água. Cluster maiores do tipo duplo cubanos ou heterometálicos também ocorrem. Exemplos clássicos são o cluster P [8Fe-7S] e os cofatores das nitrogenases de FeMoco [Mo-7Fe8S-X] e o seu análogo de vanádio. (iii) OUTRAS PROTEÍNAS CONTENDO Fe. Há muitas proteínas contendo ferro que não tem centros Fe/S nem grupo heme. Entre elas estão proteínas presentes em organismos superiores como as de estoque (ferritinas) e transferência de elétrons (transferinas). As transferinas são glicoproteínas que contém dois sítios de ferro(III), em ambiente octaédrico distorcido, separados e essencialmente equivalentes, cada um em um lóbulo da proteína. A coordenação nos dois domínios diferentes da proteína leva há mudanças conformacionais que permitem o reconhecimento da trasnferina pelo seu receptor. As ferritinas representam a principal forma de estoque de ferro (não heme) nos animais. Elas tem dois componentes, um núcleo mineral (com mais de 4500 átomos de ferro) e uma “casca” protéica. O núcleo mineral é composto por óxidos de ferro(III) hidratados com uma quantidade variável de fosfatos. O mecanismo de liberação do ferro envolve uma redução a ferro(II) que possui uma mobilidade maior.

Além destas há outras duas classes: (a) mononucleares de ferro (inclui um grande número de enzimas envolvidas na ativação e inserção do oxigênio em um substrato) e (b) binucleares de ferro (contém carboxilatos ligados em ponte a dois centros de ferro no sítio ativo). Estas últimas desempenham uma grande variedade de funções, mas como ponto em comum, ocorre uma reação como o dioxigênio como parte de seu processo funcional.

transferina ferritina Binucleares de ferro

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O ferro é o metal de transição mais abundante no organismo humano e participa de

uma importante e variada série de processos e funções, entre as quais o metabolismo do oxigênio (hemoglobina, mioglobina, oxigenases), o transporte de elétrons (citocromos, ferredoxinas), e em centros catalíticos de enzimas de diversos tipos (peroxidases, catalases, fosfatases ácidas púrpuras). Isso o torna um daqueles elementos cuja deficiência gera maiores desordens e disfunções. As desordens associadas ao metabolismo do ferro são basicamente de dois tipos: por um lado anemias e processos similares associados a deficiências do metal e, por outro, problemas de toxidez relacionados à presença de ferro em excesso nos tecidos e fluidos biológicos.

A Anemia pode ser definida como um estado em que a concentração de hemoglobina no sangue está anormalmente baixa, em conseqüência da carência de um ou mais nutrientes essenciais, qualquer que seja a origem dessa carência. Contudo, apesar da ausência de vários nutrientes contribuir para a ocorrência de anemias carenciais como folatos, proteínas, vitamina B12 e cobre, indiscutivelmente o ferro é, dentre todos, o mais importante.

A deficiência de ferro aparece como o problema nutricional mais freqüente no mundo,

afetando em torno de 24% da população. Sua incidência nos paises desenvolvidos oscila entre 4 e 10%, enquanto nos países em desenvolvimento esses números crescem dramaticamente até cerca de 40%. Estudos recentes da Organização Mundial da Saúde (World Health Organization, WHO) mostram que, em países em desenvolvimento, 47% das mulheres em idade reprodutiva são pelo menos ligeiramente anêmicas. Em muitos países de nossa região tenta-se reduzir o impacto desse problema suplementando, com ferro, o leite que se administra aos recém-nascidos e às crianças pequenas.

Os compostos clássicos utilizados na suplementação de ferro por via oral incluem diversos sais simples de Fe(II) e Fe(III), de ácidos orgânicos ou inorgânicos tais como:

o sulfato ferroso ou férrico FeSO4 ou Fe2(SO4)3 pode causar uma reação alérgica em algumas pessoas, resultando em uma erupção cutânea ou prurido. Também pode ser associado inchaço na face, no interior da boca e dos lábios. * Outro lado efeito da pílula de ferro com sulfato ferroso é a mudança na cor das unhas, lábios e nas palmas. Eles costumam ter uma aparência azulada.

Complexos de como o citrato de amônio férrico C6H5+4yFexNyO7, o fumarato ferroso e o gluconato ferroso, entre outros.

Os sais ferrosos são absorvidos mais rapidamente que os férricos. A administração simultânea de ácido ascórbico (vitamina C) também parece favorecer a melhor absorção do ferro. Por outro lado, o uso de ferro elementar tem voltado a despertar interesse nos últimos anos. Pode-se obter um pó de ferro muito finamente dividido por decomposição térmica do pentacarbonil ferro

([Fe(CO)5] → Fe + 5CO)

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e esse pó parece ser a forma ideal para enriquecer diversos cereais, assim como a farinha (e subseqüentemente o pão amassado com ela). Dessa forma, o ferro é facilmente absorvido e não gera efeitos colaterais indesejáveis. Experiências recentes têm demonstrado que muitos desses efeitos colaterais também podem ser minimizados, se forem utilizados complexos de ferro que liberam muito lentamente o elemento.

A suplementação parenteral é raramente utilizada porque a maioria dos pacientes responde bem à suplementação oral. O sistema mais amplamente utilizado para ser aplicado em forma intramuscular ou intravenosa é um complexo de hidróxido férrico com dextrano. Outros sistemas similares são constituídos por Fe(OH)3 coloidal associado a dextrina parcialmente hidrolisada, ou a misturas de ácido cítrico/sorbitol. Zinco Entre os elementos-traços o zinco é, depois do ferro, o metal mais abundante em sistemas biológicos. Até o momento foram identificadas mais de 200 metaloenzimas contendo esse elemento. Por suas características químicas, eletrônicas e estruturais, o zinco é o exemplo típico de metal associado a processos catalíticos de tipo ácido-base. No entanto, participa igualmente de sistemas reguladores e estruturais.

É encontrado em mais de 300 enzimas podendo desempenhar um papel catalítico ou estrutural. Além destes há um grande número de proteínas de zinco que se ligam a ácidos nucléicos, o que sugere que este possa estar envolvidos na regulação da transcrição de genes e síntese de proteínas. A química bioinorgãnica do zinco é dominada por uma série de fatores: (i) o íon Zn2+ é inativo frente a processos redox; (ii) a configuração d10 significa que não ocorrem transições d-d (não há espectro de absorção) e os complexos não estão sujeitos a efeitos de estabilização de campo ligante. A coordenação e a geometria são determinados principalmente pelo tamanho e a carga dos ligantes. O Zn2+ forma complexos estáveis com ligantes macios como resíduos de histidina e cisteina, geralmente em ambiente tetraédrico. Os sítios catalíticos típicos apresentam 3 ligantes protéicos e uma molécula de água enquanto que

os que desempenham papel estrutural encontram-se coordenados a 4 ligantes protéicos.

Algumas metaloenzimas podem atuar como catalisadores ácidos devido a acidez de um íon metálico ou acidez de Bronsted de um ligante. Dentre os ácidos de Lewis disponíveis o íon Zn2+ é preferido devido a sua alta disponibilidade, a baixa atividade redox e a possibilidade

de trocar de ligantes rapidamente.

A anidrase carbônica exemplifica bem este papel do zinco a reação reversível da

hidratação do dióxido de carbono.

CO2(aq) + H2O(l) H2CO3(aq)

Na ausência do catalisador esta reação levaria alguns segundos o que seria incompatível com os processos vitais (1 mol 33 s e a catalisada 1 mol em 10-6 s-1). O Zn2+ está coordenado a três resíduos de histidina. Análises de difratometria de raios X indicam que as reações de hidratação/desidratação ocorrem em sítios hidrofóbicos.

A carboxipeptidase promove a remoção de aminoácidos. O Zn2+ é ligado a dois

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imidazóis da histidina e um grupo glutâmico. O zinco pode ser trocado por cobato(II) nesta e em várias outras enzimas sem perda de atividade. Isto permite que vários estudos espectroscópicos sejam realizados. Há dois mecanismos de ação propostos (i) a hidrólise da ligação petídica ocorre por um hidróxido ligado ao zinco; (ii) a molécula de água é coordenada ao zinco pelo átomo de oxigênio do grupo carbonila do peptídio.

As proteínas com motivos do tipo dedos de zinco são uma classe de proteínas regulatórias. Os motivos dedos de zinco podem ser considerados “blocos” para a construção de grandes proteínas ligantes de DNA (Klug, 1999). Cada dedo consiste de aproximadamente

trinta aminoácidos e possui duas fitas anti-paralelas (formando uma folha e uma hélice (Elrod-Erickson, et al., 1998). Esta estrutura secundária é coordenada por um íon zinco ligado a resíduos de cisteínas e histidinas que são bastante conservados nestes motivos.

anidrase carbônica carboxipeptidase Dedos de zinco

Muitas proteínas que se ligam ao DNA contém domínios cujos aminoácidos estão dobrados em uma única unidade estrutural em torno de um átomo de zinco (papel estrutral). No dedo de zinco clássico (zinc fingers), um átomo de zinco está ligado a duas cisteínas e duas histidinas. Entre as cisteínas e histidinas estão 12 resíduos que formam uma ponta de dedo que se liga ao DNA. Através de variações na composição das seqüências na ponta do dedo e no número e espaçamento das repetições, os dedos de zinco podem formar um grande número de diferentes sítios de ligação para seqüências específicos. As deficiências de zinco são bastante comuns, porém difíceis de reconhecer. Essas deficiências têm um forte impacto no crescimento, na cicatrização de feridas, na resposta imunológica e na reprodução, e afetam os órgãos gustativos, a visão e o tato. Recentemente, têm sido associadas também aos quadros de anorexia nervosa. Na presença de baixos níveis de zinco no organismo e em deficiências severas, tem-se detectado também desordens emocionais, irritabilidade mental e diarréias crônicas. Os compostos habitualmente empregados para suplementar zinco são sais inorgânicos de sulfato ou cloreto, ou orgânicos, de acetato, gluconato ou estearato. Algumas vezes utiliza-se também o óxido de zinco para a fortificação de alimentos. De qualquer modo, o composto mais amplamente utilizado continua sendo o sulfato de zinco. A principal desvantagem desse composto, sobretudo no caso de tratamentos prolongados, é o efeito de sua acidez, que freqüentemente causa desordens gastrointestinais, náusea ou vômitos. Com o objetivo de reduzir esses efeitos colaterais, recentemente foi sugerido o uso de sais básicos de zinco, tais como Zn5(OH)8Cl2.H2O ou Na2Zn3(CO3)4.3H2O. Finalmente, é importante ter em mente que em tratamentos prolongados de suplementação, ou quando são usadas doses altas de Zn(II), observam-se deficiências de cobre, geradas provavelmente por mecanismos competitivos de absorção de ambos os cátions no trato gastrointestinal. Por essa razão, durante tratamentos prolongados de suplementação de zinco, é importante agregar às dietas pequenas doses de algum sal de cobre para compensar a deficiência.

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Cobre O cobre está presente em um grande número de enzimas que ocorrem em plantas e animais. Elas estão envolvidas na transferência de elétrons (azurinas, plastocianinas, lacase), em reações de oxigenação (tirosinase e ascorbato oxidase) e no transporte de oxigênio (hemocianina) em alguns moluscos e artrópodos. Os estados de oxidação normalmente encontrados são Cu1+ (d10) e Cu2+ (d9) e normalmente encontra-se ligados a ligantes doadores de N e/ou S de forma a modular a força eletromotriz do centro metálico tornando mais ou menos susceptível a reação redox. Os íons Cu2+ relativamente duros preferem ligantes nitrogenados (observados pela estrutura hiperfina no espectro de RPE de Cu2+) enquanto que os íons Cu1+ são macios e preferem ligantes contendo enxofre como átomo doador. O Cu1+ forma complexos com NC = 2, 3 e 4 (tetraédrico) enquanto que o Cu2+ prefere NC mais altos 4 (quadrado planar), 5 e 6. Ambas as formas tem uma velocidade de troca de ligantes elevada. Uma questão intrigante é como a transferência de elétrons pode ser tão rápida entre geometrias preferidas tão distintas para os diferentes estados de oxidação. Os centros de cobre geralmente estão distorcidos com uma geometria imposta pelos ligantes (ambiente protéico). Esta é uma das razões porque é difícil encontrar bons modelos para estas proteínas. As proteínas de cobre são divididas em três categorias que podem ser identificadas por técnicas analíticas e instrumentais (espectroscopias de RPE e eletrônica).

Tipo I são as chamadas proteínas azuis de cobre por causa da sua intensa banda de

transferência de carga no espectro eletrônico (S Cu2+). As plastocianinas estão envolvidas no processo da fotossíntese e o centro de Cu1+/2+ apresenta geometria pseudo-tetraédrica e encontra-se coordenado a 2 átomos de nitrogênio de dois resíduos de imidazóis e a 2 enxofres de resíduos de cisteina e tionina. (preferência por ligantes N e S). Esta geometria facilita a transferência de elétrons em relação às geometrias tetraédricas e quadrado planar. A transferência de elétrons é realizada com pequenas mudanças na posição dos ligantes, o que faz com que a barreira de ativação seja pequena.

Tipo II Possuem potenciais de redução mais positivos, EPR característico de complexos quadrado planares e preferem ligantes nitrogenados ou oxigenados. (Ex. Monoxigenases).

Tipo III Apresentam bandas intensas de absorção no espectro eletrônico, mas o sítio ativo é composto por um binuclear de Cu2+ (d9) com ligantes oxigênio ou hidróxido em ponte que permitem um forte acoplamento antiferromagnético, tornando-o silencioso no RPE. Ex. (na hemocianina (participa do transporte de O2 em artrópodos e moluscos) o dioxigênio liga-se aos

2 centros de cobre por uma ponte -2,2 e é reduzido a peróxido.

incolor azul plastocianina

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Além destas uma importante família compreende a enzimas com múltiplos centros demetálicos que podem combinar dois ou mais dos três tipos de centros de cobre como a Lacase, a ascorbato oxidase (combina tipo I e II), ou heterometálicos como a superoxidismutase (Cu1+/2+/Zn) e catalisa a reação de desproporcionamento do radical superóxido (O2

-) a H2O2. O substrato e outras moléculas pequenas ligam-se ao sítio de cobre(II), já o zinco tem papel ambíguo, parece que ele auxilia na estabilização da estrutura terciária da enzima e confere estabilidade térmica.

Tal como o ferro, o cobre participa de uma ampla gama de funções e sistemas biológicos, estando envolvido em uma grande variedade de processos enzimáticos (por exemplo, nos associados a citocromo oxidases, tirosinases, ceruloplasmina, lisina oxidase, ascorbato oxidase, superóxido dismutase, amino oxidase e muitos outros). Sendo assim, sua deficiência também gera um sem número de problemas e desordens, e uma variedade de enfermidades que podem estar correlacionadas claramente às deficiências desse elemento são conhecidas. Por exemplo, pacientes que padecem de artrite reumatóide, úlceras gástricas, tumores cancerígenos ou episódios epilépticos, usualmente apresentam concentrações elevadas de cobre no soro ou plasma. Outro problema bem conhecido, desta vez relacionado à deficiência de cobre, é a doença de Menkes, uma desordem de origem genética que conduz a uma rápida degeneração cerebral, usualmente acompanhada por convulsões, hipotermia e retardos do crescimento.

A doença de Menkes, também conhecida como síndrome dos cabelos encarapinhados, trata-se de uma desordem genética, de caráter autossômico recessivo, multissistêmica, neurodegenerativa, ligada ao cromossomo X, que afeta os níveis de cobre no organismo, levando à carência deste mineral. Estima-se que afete entre 1:40.000 a 1:350.000 crianças do sexo masculino nascidas vivas. A deficiência de cobre livre resultante altera o funcionamento das enzimas dependentes de cobre, provocando os sintomas da doença. Estes incluem: atraso do crescimento intra-uterino e deterioração neurológica progressiva, com aparecimento de hipotonia axial, espasticidade, convulsões e hipotermia durante os primeiros meses de vida. A gliose leva ao desenvolvimento de microcefalia. O cabelo apresenta um fenótipo característico: ralo, hipopigmentado, seco, torcido e quebradiço. O tratamento consiste na administração parentérica de cobre. Quando iniciado precocemente, o tratamento previne os sinais neurológicos e aumenta a sobrevida. A incidência da doença é de 1/300.000 nascidos-vivos.

Apesar de se saber que a doença de Menkes não pode ser tratada mediante suplementação com cobre, o tratamento de pacientes afetados por este mal com o complexo que o Cu(II) forma com L-histidina, de fórmula [Cu(L-histidinato)2], aparece como a terapia mais eficiente se aplicada no estágio inicial da doença, pois a eficácia do tratamento parece depender de uma boa disponibilidade de cobre em um período crítico de formação e desenvolvimento do sistema nervoso. Os complexos que o cobre forma com uma grande variedade de aminoácidos, peptídeos de baixo peso molecular e ligantes similares, têm demonstrado uma importante atividade antiinflamatória, antiulcerosa, anticonvulsivante e até anticarcinogênica. Evidentemente, esses compostos servem como forma de transporte de cobre e permitem a ativação ou reativação de enzimas dependentes desse metal, razão pela qual são adequados como via de suplementação. Selênio

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A maioria das desordens originadas de deficiências de selênio está relacionada com os mecanismos de defesa celular frente ao ataque por radicais livres (Baran, 1995, 1997). Assim, o selênio parece ter alguma relação com os sistemas imunológicos. Nos seres humanos, a deficiência tem-se associado freqüentemente a doenças cardíacas e a problemas nas articulações e na estrutura óssea. Nesse contexto, deve-se mencionar a existência de duas enfermidades endêmicas que foram descritas em diferentes regiões da China, e que são claramente associáveis a deficiências desse elemento: a doença de Keshan, que afeta fundamentalmente crianças e produz importantes transtornos no ritmo cardíaco, levando freqüentemente à morte, e o mal de Kashin e Beck, que ocasiona desordens graves no desenvolvimento ósseo, produz deformações nas articulações e gera fraqueza muscular. Recentemente, foram sugeridas também relações entre os níveis de selênio e a AIDS.

Estrutura esquemática da selenometionina.

Por essas razões, a suplementação de selênio tem despertado grande interesse e, em muitos países, já são incorporados diferentes compostos de selênio aos alimentos para sua fortificação. Vários compostos simples, tais como SeO2, Na2SeO3 ou Na2SeO4, se mostraram fisiologicamente ativos. Recentemente foi avaliada uma grande variedade de compostos orgânicos do elemento, e demonstrou-se que o L-selenometionina (Figura 4) é particularmente útil. Desse modo, alguns fermentos, crescidos em meios ricos em selênio, mostraram também excelentes efeitos. Do ponto de vista farmacológico, os compostos orgânicos de selênio aparecem como mais apropriados do que os inorgânicos, já que os selenitos e oxiânions relacionados são mais tóxicos do que os compostos orgânicos e, por outro lado, os compostos inorgânicos tendem a reduzir-se, inativando-se com certa facilidade.

La Deficiencia de Selenio Aumenta la Severidad de la Gripe en Ratones

Por Judy McBride 27 de abril 2001

Cuando se les da una dieta deficiente en selenio a los ratones, y consecutivamente ellos son expuestos al virus humano de influenza, les da un caso más severo de la gripe que a los animales alimentados con una cantidad adecuada de selenio. Este es el resultado de un estudio cooperativo por los investigadores de la Universidad de North Carolina (UNC) en Chapel Hill; el Centro de Investigación de Nestle en Lausanne, Switzerland; y el Servicio de Investigación Agrícola (ARS) en Beltsville, Maryland. Este estudio también sigue el modelo encontrado en estudios anteriores con un virus menos conocido. Esto indica que la deficiencia de selenio puede aumentar la virulencia de una variedad de virus. Los investigadores reportaron hoy en el Internet (http://www.fasebj.org/) que los ratones recibiendo la dieta deficiente en selenio desarrollaron significativamente más patología de los pulmones que los animales recibiendo suficiente selenio. Los ratones deficientes en selenio tenían significativamente más inflamación en sus pulmones, y la inflamación duró más tiempo. El selenio es una parte critica de una enzima antioxidante que los humanos y animales producen para proteger los componentes delicados de las células contra el daño causado por sustancias en la sangre llamadas "radicales libres de oxigeno." Los norte americanos reciben suficiente selenio en sus dietas, según el especialista de nutrición de ARS Orville A. Levander. Buenas fuentes del selenio incluyen las nueces de Brasil, carne y productos de granos enteros. Pero las deficiencias pueden ocurrir en partes de China, New Zealand y otras naciones donde los suelos agrícolas carecen de este elemento. Levander colaboró con el líder del estudio Melinda A. Beck, una especialista en inmunología en los departamentos de pediatría y nutrición en UNC, en este estudio y el estudio anterior. Los investigadores sospechan que el virus de influenza se mutó a una forma más violenta en los animales deficientes de selenio porque a estos animales le faltan la protección contra antioxidantes que viene de la enzima "glutathione peroxidase," que contiene el selenio.

Cobalto

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As cobalaminas são bastante versáteis quimicamente podendo o cobalto assumir os estados de oxidação III, II e I, todos de spin baixo. A estrutura eletrônica do cobalto é extremamente importante para o seu desempenho biológico. Co3+ (d6) é hexacoordenado, Co2+ é penta-coordenado e tem um elétron desemparelhado no orbital dz

2 e Co1+ tem uma estrutura quadrado planar devido à dissociação da base nitrogenada. O Co1+ é altamente nucleofílico podendo ser rapidamente metilado o complexo metilado de (Me-Co3+) atua como agente metilante de substratos C-H e C-C. Na coenzima-B12 a ligação Co3+-C da 5-deoxiadenosina é bastante fraca podendo sofrer clivagem homolítica (Co2+, dz

1) para produzir um radical baseado no carbono que é utilizado em reações que envolvam rearranjos radicalares como a isomerização.

A anemia Perniciosa é um tipo de anemia que se caracteriza pela deficiência de vitamina B12, secundária a uma doença gástrica auto-imune, que pode causar graves lesões neurológicas, podendo levar a demência. A chamada anemia perniciosa é uma desordem que se apresenta geralmente em adultos que carecem de vitamina B12. Inicialmente essa doença se manifesta com quadros de fadiga e debilidade extrema, dores de língua e dificuldades motrizes. Simultaneamente, aparecem diversas desordens hematológicas, entre as quais uma importante diminuição no número de eritrócitos (células vermelhas do sangue). A vitamina B12 é uma das biomoléculas mais complexas que se conhece (Figura 5), sendo o único sistema bioinorgânico presente no organismo humano que contém cobalto, o qual participa como coenzima em uma importante série de reações e transformações biológicas. As deficiências de vitamina B12 usualmente podem ser controladas por injeções intramusculares de cianocobalamina (a cianocobalamina é um complexo no qual o resíduo 5’-desoxiadenosil unido ao Co(III) é substituído por um ânion cianeto). O tratamento para anemia perniciosa é feita através da suplementação de vitamina B12 e ácido fólico, e pode ser necessário durante toda a vida.

Figura 5: Estrutura esquemática da vitamina B12. O Co(III) está unido equatorialmente a

um anel macrocíclico chamado corrina, uma das posições axiais está ocupada pelo grupo 5’-desoxiadenosil, que gera uma união Co-C, e a outra posição axial envolve uma base orgânica (ligação Co-N).