"quem tem direito à cidade?"

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UM QUÊ DE MARX COMPARTILHA NA REDE PROIBIDO A COMERCIALIZAÇÃO. CASO UTILIZE, CITE A FONTE. 1 www.umquedemarx.com.br “Nós somos a cidade 1 [...] a concepção de direito à cidade toma novos viés. Foi nas ruas que os tchecos se libertaram em 1989, de opressivas formas de governança; foi na Praça da Paz Celestial que o movimento estudantil chinês buscou estabelecer uma difusão alternativa de direitos; foi através de massivos comícios que a Guerra do Vietnã foi forçada a terminar; foi nas ruas que milhões protestaram contra o prospecto de uma intervenção imperialista norte-americana no Iraque em 15 de fevereiro de 2003; foi nas ruas de Seattle, Gênova, Melbourne, Quebec e Bangkok que os direitos inalienáveis da 1 Autora do artigo Fernanda E. Mattos (Nanda Luxemburg), conteúdo criado para os periódicos do blog Um quê de Marx. propriedade privada e da taxa de lucro foram desafiados [...] (HARVEY, p.33, 2013). Os movimentos populares em suma, reivindicam aquilo que David Harvey(2013) 2 afirma como “direito à cidade”. Mas em que constitui este direito? Até que ponto o mesmo abrange? O direito à cidade vai além do simples e básico direito de ir e vir, mais que isso, o direito efetivo à cidade é o poder para transforma-la e como se sabe existem inúmeras forças que lutam contra a conquista desses direitos e que segundo o mesmo autor essas forças numerosas lutam contra “o exercício de tais direitos, e querem inclusive impedir que tenhamos consciência para agir contra essas forças opostas”. Será que os cidadãos já pararam para pensar o que acontece quando todos, ou boa parcela, resolve exercer o seu direito à cidade? Os resultados são as lutas de classe e conflitos, não há cidade pacífica, não há harmonia plena. O “turbilhão da cena urbana” se dá de modo complexo, por meio de processos construtivos, quantos também destrutivos. E se fizer o seguinte questionamento: O direito à cidade 2 HARVEY, David. A liberdade da cidade. In: ______ Cidades rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo: Carta Maior, 2013. p. 28. Periódico: 1ª edição Volume: 1 Nov 2013

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Artigo aborda questões urbanas. Periódico edição 1 volume 1 Leia mais em: www.umquedemarx.com.br

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Page 1: "Quem tem direito à cidade?"

UM QUÊ DE MARX COMPARTILHA NA REDE

PROIBIDO A COMERCIALIZAÇÃO.

CASO UTILIZE, CITE A FONTE.

1

www.umquedemarx.com.br

“Nós somos a cidade1”

[...] a concepção de direito à cidade toma novos

viés. Foi nas ruas que os tchecos se libertaram em

1989, de opressivas formas de governança; foi na

Praça da Paz Celestial que o movimento estudantil

chinês buscou estabelecer uma difusão alternativa de

direitos; foi através de massivos comícios que a

Guerra do Vietnã foi forçada a terminar; foi nas ruas

que milhões protestaram contra o prospecto de

uma intervenção imperialista norte-americana no

Iraque em 15 de fevereiro de 2003; foi nas ruas de

Seattle, Gênova, Melbourne, Quebec e Bangkok que

os direitos inalienáveis da

1 Autora do artigo Fernanda E. Mattos (Nanda Luxemburg),

conteúdo criado para os periódicos do blog Um quê de Marx.

propriedade privada e da taxa de lucro foram

desafiados [...] (HARVEY, p.33, 2013).

Os movimentos populares em suma, reivindicam

aquilo que David Harvey(2013)2 afirma como

“direito à cidade”. Mas em que constitui este

direito? Até que ponto o mesmo abrange? O

direito à cidade vai além do simples e básico

direito de ir e vir, mais que isso, o direito

efetivo à cidade é o poder para transforma-la e

como se sabe existem inúmeras forças que

lutam contra a conquista desses direitos e que

segundo o mesmo autor essas forças numerosas

lutam contra “o exercício de tais direitos, e

querem inclusive impedir que tenhamos

consciência para agir contra essas forças

opostas”.

Será que os cidadãos já pararam para pensar o

que acontece quando todos, ou boa parcela,

resolve exercer o seu direito à cidade? Os

resultados são as lutas de classe e conflitos, não

há cidade pacífica, não há harmonia plena. O

“turbilhão da cena urbana” se dá de modo

complexo, por meio de processos construtivos,

quantos também destrutivos. E se fizer o

seguinte questionamento: O direito à cidade

2 HARVEY, David. A liberdade da cidade. In: ______

Cidades rebeldes: Passe livre e as manifestações que

tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo: Carta

Maior, 2013. p. 28.

Periódico: 1ª edição

Volume: 1 Nov 2013

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pertence a quem? “Marx escreveu, entre

direitos iguais, quem decide é a força” (MARX,

2013 apud HARVEY 2013, p.31) o direito à

cidade se torna efetivo via lutas sociais, as vozes

das ruas, elas são indispensáveis para o exercício

do direito à cidade, direito a tudo o que a

mesma pode proporcionar. É importante ter

consciência de que o direito à cidade, de forma

alguma se dá sob a perspectiva individual, esse

direito é se torna efetivo quando parte da

demanda coletiva.

Refletindo sobre as palavras de Marx, citado

anteriormente por Harvey, se os direitos iguais

eles serão determinados pela força, ou seja, pelo

lado que exerce maior poder, sob esta

perspectiva é importante salientar que se a

massa não vai à luta e não exerce o seu direito à

cidade, ela acaba se tornando o lado mais fraco.

E com bem se sabe, a cidade sempre foi local de

desigualdades e na cidade sempre houve as

forças hegemônicas e em consequência desta

força, o urbano foi e continua sendo o lugar

onde o desejo, a cultura, os direitos, as visões

de mundo e as religiões se chocam, muito se diz

que a tendência dessas diversidades cada vez

mais se é de se acentuarem.

Com a explosão da globalização e tendências

neoliberais acentua-se o quadro da hegemonia,

essa força condutora de ideologias, políticas e

cidadania (direito à cidade), as cidades parecem

ser feitas para a vida privada, para uma vida

baseada apenas no consumo. Cada vez mais a

cidade parece não ter sido criada para o

sociabilização, para solidariedade, coletividade e

comunhão entre povos, a cidade acaba sendo

lócus da alienação, até porque muitos nem

sabem que todos possuem o direito à cidade,

(todos). Mas caso não tenha consciência de que

esse desejo é um bem onde todos possam fazer

uso, esse direito “perdido” acaba sendo

transferido para as mãos de quem tem

consciência, ou ainda pior, acaba sendo entregue

de bandeja para o lado hegemônico. Segundo

Harvey (2013) “o direito à cidade não é um

presente, e sim conquista, o mesmo deve se

garante pelo movimento político”.

Em outras palavras, os direitos sociais à cidade

acabam sendo esmagados pelos direitos

privados (a força hegemônica da cidade liberal) e

se a força for maior no lado dos direitos de

liberais (de alguns) o mais fracos (que são a

maioria) tem seus direitos negligenciados ou

quando não são negados.

Por esses (e entre outros) fatores citados

anteriormente é preciso compreender, pois

para que a luta se efetive, é indispensável

promover o enfraquecimento das impiedosas

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políticas liberais que permeiam o urbano (e não

somente).

Carlos Vainer 3 aponta que uma cidade sob a

ótica neoliberal ela tende a ser regida pelas

necessidades gerais da acumulação e circulação

do capital, portanto, nessas circunstâncias, o

espaço para cidadania, solidariedade e direitos

humanos não são prioridades, pelo contrário, é

um incômodo para um sistema que apenas se

preocupa com os lucros. As cidades passam a

ser concebidas como se fossem “empresas” e

não um espaço comum, fruto do coletivo e dos

direitos (coletivos) econômicos, sociais e

humanos.

Os movimentos e manifestos em prol o

exercício da cidadania e dos direitos sociais

coletivos é a esperança que nos enche de utopia

para continuar crendo que outra realidade social

seria possível, que a lógica da acumulação seja

quem sabe enfraquecida. E não custa nada

sonhar, e utopia nos serve para não deixemos

de caminhar4.

3 VAINER, Carlos. A cidade neoliberal: empresa e

mercadoria. In: ______ Cidades rebeldes: Passe livre e as

manifestações que tomaram as ruas do Brasil. São Paulo:

Boitempo: Carta Maior, 2013. p.35-40. 4 Ver mais em Eduardo Galeano, A utopia.

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REFERÊNCIAS

HARVEY, David. A liberdade da cidade. In:

______ Cidades rebeldes: Passe livre e as

manifestações que tomaram as ruas do Brasil.

São Paulo: Boitempo: Carta Maior, 2013. p.27-

34.

MARICATO, Ermínia. [et al] Cidades

rebeldes: passe livre e as manifestações que

tomaram as ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo:

Carta Maior, 2013.

VAINER, Carlos. A cidade neoliberal: empresa e

mercadoria. In: ______ Cidades rebeldes:

Passe livre e as manifestações que tomaram as

ruas do Brasil. São Paulo: Boitempo: Carta

Maior, 2013. p.35-40.

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