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QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: SÉRIE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR Observatório de Educação Capes/Inep AVALIAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA UNIVERSIDADE Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Denise Leite Cleoni Barboza Fernandes Organizadoras

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QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR:

SÉRIE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIORObservatório de Educação Capes/Inep

AVALIAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA

UNIVERSIDADE

Instituto Nacional de Estudos ePesquisas Educacionais Anísio Teixeira

Denise LeiteCleoni Barboza Fernandes

Organizadoras

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QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR:

AVALIAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA

UNIVERSIDADE

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ChancelerDom Dadeus Grings

ReitorJoaquim Clotet

Vice-ReitorEvilázio Teixeira

Conselho EditorialAna Maria Lisboa de MelloArmando Luiz BortoliniAugusto BuchweitzBeatriz Regina DorfmanBettina Steren dos SantosCarlos Graeff TeixeiraClarice Beatriz de C. SohngenElaine Turk FariaÉrico João HammesGilberto Keller de Andrade Helenita Rosa FrancoJane Rita Caetano da SilveiraJorge Luis Nicolas Audy – Presidente Lauro Kopper FilhoLuciano KlöcknerNédio Antonio SeminottiNuncia Maria S. de Constantino

EDIPUCRSJerônimo Carlos Santos Braga – DiretorJorge Campos da Costa – Editor-Chefe

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Denise LeiteCleoni Barboza Fernandes

Organizadoras

Cecilia Luiza BroiloColaboradora

QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR:

AVALIAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA

UNIVERSIDADE

SÉRIE QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIORObservatório da Educação CAPES/INEP

v. 6

Porto Alegre, 2012

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© EDIPUCRS, 2012

Giovani Domingos

Patrícia Aragão e Caren Capaverde

Camila Provenzi e Jardson Corrêa

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização e/ou a recuperação total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos, do Código Penal), com pena de prisão e multa, conjuntamente com busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).

Q1 Qualidade da educação superior : avaliação e implicações para o futuro da universidade / org. Denise Leite, Cleoni Barboza Fernandes ; colab. Cecilia Luiza Broilo. – PortoAlegre : EDIPUCRS, 2012.

588 p. – (Série Qualidade da Educação Superior ; 6)

ISBN 978-85-397-0206-0Textos apresentados no X Seminário Internacional : A

Qualidade da Educação Superior: grupos investigativos internacionais em diálogo, realizado na PUCRS, 2011.

1. Educação Superior. 2. Universidade – Avaliação.I. Leite, Denise. II. Fernandes, Cleoni Barboza. III. Broilo, Cecilia Luiza. IV. Série.

CDD 378

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Denise LeiteCleoni Barboza Fernandes

Organizadoras

Cecilia Luiza BroiloColaboradora

Comitê CientíficoProf.ª Dra. Cleoni Barboza Fernandes – PUCRS

Prof.ª Dra. Cecília Luiza Broilo – PD/PUCRSProf.ª Dra. Denise Leite – UFRGS

Prof.ª Dra. Maria Estela Dal Pai Franco – UFRGSProf.ª Dra. Maria Isabel da Cunha – UNISINOS

Prof.ª Dra. Marilia Costa Morosini – PUCRS Prof.ª Dra. Silvia Maria de Aguiar Isaia – UFSM

Editoração TécnicaCecilia Luiza Broilo – PD/PUCRS

Apoio TécnicoSilvia Fernanda Rodrigues Viegas Kuckartz – PUCRS

Camila Peixeira – Bolsista AT/PUCRSPriscila Trarbach Costa – Bolsista Capes

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CONTEÚDO

APRESENTAÇÃO DA SÉRIE: QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR – OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO ................................21

APRESENTAÇÃO DO VOLUME 6 QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: AVALIAÇÃO E IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA UNIVERSIDADE ........................ 25

EIXO TEMÁTICO I AVALIAÇÃO DA UNIVERSIDADE

POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: INFLUÊNCIAS NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO ............................................. 29

Elizeth Gonzaga dos Santos LimaDenise Leite

MAPEIO DAS REDES DE COLABORAÇÃO: DETECTANDO INOVAÇÃO E MUDANÇAS NAS TEIAS DE CONHECIMENTO COM O PAJEK ..................................... 37

Bernardo Sfredo Miorando

INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO PARA CURSOS DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ................................45

Claudia Medianeira Cruz RodriguesBernardo Sfredo Miorando

PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (EAD) ..........................51

Lisiane Pellini FallerCláudia Medianeira Cruz RodriguesBernardo Sfredo Miorando

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Sumário - 8

WEBQUEST: INOVAÇÃO, AVALIAÇÃO, INDICADORES DE QUALIDADE ........................................................................................... 63

Denise Leite Graziela Fátima GiacomazzoGeraldo Ribas Machado

AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS DE UM CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA: A VISÃO DOS ALUNOS ......................................................... 67

Denise Grosso da Fonseca

A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: UMA ANÁLISE DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO NO BRASIL .............................. 75

Alam De Oliveira CasartelliAna Cristina Benso da SilvaBettina Steren dos SantosRafael Eduardo SchmittRosana Maria GessingerMarilia Costa Morosini

IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL COMO ESTRATÉGIA DE MUDANÇA INSTITUCIONAL NO CAMPO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL UNIVERSITÁRIA E A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL ............................................................. 87

Inês Amaro

AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO: POSSÍVEIS MEDIAÇÕES ENTRE TENSÃO E PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO ..................................................................................99

Mariângela da R. AfonsoEdilene da C. SinottRosane F. Veiga Fabiane de O. SchellinDiego E. do Nascimento

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 9

UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL......................... 109

Marinice Souza SimonMarilia Costa Morosini

EIXO TEMÁTICO II GESTÃO E POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES: ESPAÇOS DE QUALIDADE NA GESTÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ................. 119

Solange Maria Longhi Maria Estela Dal Pai Franco Cristina Zanettini-Ribeiro

A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO E DA GESTÃO: UMA VISÃO FUNDAMENTADA EM BOURDIEU ...................................................127

André Stein da SilveiraMarilia Costa Morosini

O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL .......................................................................135

Denise Grosso da Fonseca Marlis Morosini Polidori

A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA EM GESTÃO AMBIENTAL: QUALIDADE, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM FOCO ........................................................................ 143

Clarice Monteiro Escott Leandra Borba Leal

ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE: NOVOS DESAFIOS PARA A GESTÃO ............................................... 151

Inês Amaro Gustavo Balbinot

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Sumário - 10

PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS PARA UM COORDENADOR DE CURSO NA PERCEPÇÃO DOS GESTORES E FUNCIONÁRIOS DE UMA IES ........................................................ 161

Jênifer de Brum Palmeiras Rosani Sgari Szilagyi

O PAPEL DO GESTOR DE POLOS: DIFICULDADES E DESAFIOS .............................................................167

Patricia Thoma Eltz Rosalir Viebrantz

GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO PRETO/UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO: REFLEXÕES A PARTIR DE UMA EXPERIÊNCIA ........................................................175

Glaucia Maria da Silva Noeli Prestes Padilha Rivas Adriana Katia Corrêa Yassuko Iamamoto Maria Conceição De Mello E Souza Maria Suely Nogueira Filomena Elaine Paiva Assolini Alma Blásida Concepcion Elizaur Benites Catirse Marlene Fagundes

RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM: O COMPROMISSO DA GOVERNANÇA ACADÊMICA PARA O APRIMORAMENTO DO ENSINO-APRENDIZAGEM ................................................................................ 183

Carla Neto Rosália Figueiró Borges

O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA DE PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO PARA A GESTÃO ESCOLAR ...........................................................................193

Adriana Rivoire Menelli de Oliveira Carla Netto

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 11

O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR PÚBLICA: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DO CASO UFPEL ...............................................................205

Maria da Graça Gomes Ramos Tania Elisa Morales Garcia Mariângela da Rosa Afonso

UMA BREVE DISCUSSÃO SOBRE O PROJETO PEDAGÓGICO INSTITUCIONAL – PPI ........................................................................213

Francisco Nilton Gomes de Oliveira

REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS (REUNI):A PERTINÊNCIA DO CONCEITO DE CAMPO E OS DESAFIOS DA GOVERNANÇA ACADÊMICA ........................221

Raimundo Rajobac Viviane Guidotti Marilia Costa Morosini

QUALIDADE E GESTÃO PEDAGÓGICA DE PROFESSORES NO ENSINO SUPERIOR ...................................231

Elisiane Machado Lunardi

ANÁLISE DOS MARCOS REGULATÓRIOS NO CAMPO DAS POLÍTICAS DE ALFABETIZAÇÃO: ATUAÇÃO DOS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO ..................................................239

Claudia Martins Leirias

QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES: UNIVERSIDADE E SOCIEDADE ........................................................ 247

Mariangela da Rosa AfonsoMaria da Graça Gomes RamosTania Elisa Morales Garcia

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Sumário - 12

EIXO TEMÁTICO III INTERNACIONALIZAÇÃO

AS REDES DE AGÊNCIAS DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE E ACREDITAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NA AMÉRICA LATINA: RANA E RIACES ...................................................................261

Margareth Guerra dos Santos

DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIVERSIDADE BRASILEIRA: O REUNI E AS UNIVERSIDADES TRANSNACIONAIS .............................................................................269

Ralf Hermes Siebiger

DEMOCRATIZAÇÃO E EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL ........................................................................................... 277

Claisy Marinho Marlis Polidori Nathan Ono

UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR: UMA REALIDADE NO BRASIL E UMA NA ALEMANHA ......................................................285

Márcia Lenir Gerhardt

EIXO TEMÁTICO IV FORMAÇÃO DE PROFESSORES

QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E DO ENSINO MÉDIO ..................................................................................293

Cecília Luiza BroiloCleoni Barboza Fernandes

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 13

A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR ............................................................................307

Doris Pires Vargas BolzanAna Carla Hollweg PowaczukEliane Aparecida Galvão dos SantosAdriana Claudia Martins FigheraLuiza Salles JunchenSilvana Martins de Freitas MillaniFrancine de Bem RossiKarla Madrid Fonseca

FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SUL: DADOS PRELIMINARES ....................................................................................313

Simone Benvenuti Leite Flávia Maria Teixeira dos Santos

CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR DE ESTÁGIO PARA A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR FÍSICO: PERSPECTIVA DE PIERRE BOURDIEU .............................................319

Silvana ZancanViviane GuidottiMarilia Costa Morosini

A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM DA DOCÊNCIA: PROBLEMATIZANDO A QUALIDADE DA FORMAÇÃO INICIAL NO CURSO DE PEDAGOGIA .......................325

Doris Pires Vargas BolzanGislaine A. R. da Silva RossettoLeila Adriana Baptaglin Giovana Medianeira Fracari HautriveTásia Fernanda WischDaniela Dal Ongaro

FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO NÍVEL SUPERIOR: O OBSTÁCULO DAS CRENÇAS ...................................333

Althiere Frank Valadares CabralFábio Alexandre Araújo dos SantosJosé Jairan Valdevino 333Sandra Salustiano Dias da Silva 333

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Sumário - 14

A EDUCAÇÃO SUPERIOR E AS MODIFICAÇÕES CURRICULARES DAS LICENCIATURAS NO RIO GRANDE DO SUL ........................................................................339

Elizabeth D. KraheJuliana Arnor

CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR TUTOR NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: UMA ANÁLISE COM BASE NA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS (UNISINOS) ....................................................................345

Taís SchmitzMaria de Lourdes Borges

LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: A FORMAÇÃO INICIAL DO EDUCADOR E DA EDUCADORA DO CAMPO E A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO ............................................................353

Eliane Miranda CostaAlbêne Lis Monteiro

ENSINO DE HISTÓRIA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: REFLEXÕES SOBRE EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS EM ESPAÇO NÃO FORMAL DE ENSINO...............359

Bianca Silva CostaJuliana ZirgerMaria Elly Herz Genro

REFLEXÕES SOBRE O PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA (PIBID) ENQUANTO ESTRATÉGIA PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES .............. 367

Luciane Spanhol BordignonEgeslaine de Nez

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 15

O PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: POR UMA RESSIGNIFICAÇÃO DA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DOCENTE COM BASE NAPERSPECTIVA DO ENSINO CRIATIVO ...................................... 375

Fábio Alexandre Araújo dos SantosAndrezza Maria Batista do Nascimento TavaresJosé Jairan ValdevinoSandra Salustiano Dias da Silva

EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS E A FORMAÇÃO DO SUJEITO POLÍTICO NA UNIVERSIDADE ..................................385

Priscila Bier da SilveiraJuliana ZirgerMaria Elly Herz Genro

EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E QUALIDADE DA APRENDIZAGEM ...............................................389

Rosalir Viebrantz

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: APORTES CURRICULARES E DESAFIOS FORMATIVOS .................................................................. 397

Noeli Prestes Padilha RivasKarina de Melo ConteGlaucia Maria da Silva

AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES SOBRE AS CULTURAS, AS IDENTIDADES E OS CORPOS DA INFÂNCIA ... 405

Vanessa Ferreira Neves

INOVAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: OS CASOS UCS E UFRGS .........................................417

Andréia MorésDenise Leite

INDICADORES DE QUALIDADE E CONTRIBUIÇÕES À FORMAÇÃO DO PEDAGOGO .......................425

Marilene Gabriel Dalla Corte

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Sumário - 16

QUALIDADE E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES: CONTRIBUIÇÕES DE NARRATIVAS DE EGRESSOS DA LICENCIATURA EM MATEMÁTICA NA RECONFIGURAÇÃO CURRICULAR ......................................................................................437

Denise Nascimento SilveiraCleoni Maria Barboza Fernandes

EIXO TEMÁTICO V DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE

A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE PROFESSORES NA REGIÃO CENTRO-OESTE DO BRASIL ............................................447

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza Solange Martins de Oliveira Magalhães

DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: ALGUNS ACHADOS SOBRE A FORMAÇÃO CONTINUADA DESSE PROFISSIONAL ...................455

Vanessa Alves da S. de Vasconcellos Valeska Fortes de Oliveira

RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS DA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: UM ESTUDO EM CURSOS DE LICENCIATURA ......................................................467

Marja Leão Braccini

O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE O PERFIL DO EGRESSO DE PEDAGOGIA E AS DEMANDAS DO CAMPO PROFISSIONAL ....475

Raimunda Maria da Cunha Ribeiro Marilia Costa Morosini

O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE ........................483

Bárbara Burgardt Casaletti Cleoni Maria Barboza Fernandes

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 17

PERFIL INSTITUCIONAL/DOCENTE DOS PROFESSORES DAS UNIVERSIDADES PRIVADAS BRASILEIRAS: INDICADORES DE FUNÇÕES DOCENTES ................................................................. 491

Greice Scremin Silvia Maria de Aguiar Isaia

EIXO TEMÁTICO VI INDISSOCIABILIDADE E ENSINO DE GRADUAÇÃO

O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO EM QUESTÃO .............................................................................................499

Maria Isabel da Cunha Camila Guntzel Rita de Cássia Rodrigues

A RELAÇÃO ENSINO/PESQUISA: CONCEPÇÕES E TENSIONAMENTOS ...........................................................................507

Mari Margarete dos Santos Forster Maria Antonia Ramos de Azevedo Cristina Bohn Citolin Eliane Lourdes Felden Sandra Regina Soares Elisa Prestes Massena

A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO E PESQUISA NO ENSINO SUPERIOR: O QUE DIZEM OS ALUNOS? ..............................................................................................515

Alba Regina Battisti de Souza Denise Rosa Medeiros

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Sumário - 18

QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO, PESQUISA E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE:AS VOZES DA SOCIEDADE ..............523

Ana Carolina da Silva Bijoldo Maisa Beltrame Pedroso Maria Aparecida M. Rocha Monalisa da Silva Pinheiro Silvana Flores Gabriela Lammertz Maria Isabel da Cunha

DOCENTES NÃO PESQUISADORES E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO ............................531

Lígia Cardoso Carlos Maria Janine D. Reschke Marja L. Braccini Vânia A. Martins Chaigar

FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES E SUBJETIVIDADE NO CURSO DE PEDAGOGIA DA TERRA .......539

Denise Elza Nogueira Sobrinha Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza

QUALIDADE DE ENSINO DE GRADUAÇÃO: MITOS EM DISCURSOS INSTITUCIONAIS ..................................................543

Blasius Debald Inajara Vargas Ramos Luis Henrique Sommer Marcelo Salami Marialva Moog Pinto Tânia Maria Balbich-Faria

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 19

DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO E PESQUISA E QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO SOB O PRISMA DOS DOCENTES INICIANTES .....551

Neridiana Fabia Stivanin Gabriela Machado Ribeiro Nadiane Feldkercher Helena Beatriz Mascarenhas de Souza

QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO DO ENSINO E DA PESQUISA NO CONTEXTO DA EAD ......................559

NICOLODI, S. C. F. et al. Suzana Cine Freitas Nicolodi Maria Isabel da Cunha

SOBRE OS AUTORES .........................................................................569

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APRESENTAÇÃO DA SÉRIE: QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR –

OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO

A RIES, Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior, reconhecida como Núcleo de Excelência em Ciência, Tecnologia

e Inovação pelo CNPq/FAPERGS/PRONEX, tem como objetivo maior configurar a Educação Superior como campo de produção de pesquisa nas Instituições de Ensino Superior. Este objetivo se constitui pela clarificação da produção no campo de conhecimento e pela consolidação da rede de pesqui-sadores na área.

Em sua trajetória, a RIES é reconhecida também como Observatório da Educação Capes/INEP/MEC. Por sua vez, o programa de pesquisa Observatório da Educação visa ao desenvolvimento de estudos e investiga-ções na área de educação. Tem como objetivo estimular o crescimento da produção acadêmica e a formação de recursos humanos pós-graduados, nos níveis de mestrado, doutorado e pós-doutorado por meio de financiamento específico.

No caso da RIES – Observatório de Educação Capes/INEP, envolve quatro programas de pós-graduação em Educação pertencentes às seguintes universidades gaúchas – PUCRS, UFRGS, UFSM e Unisinos, e seu foco é a Qualidade da Educação Superior. Assim, desde 2006, formalmente, a RIES tem como projeto maior a Qualidade da Educação Superior. Este foco tem sido mote de estudos, práticas e políticas contemporâneas. Mas, mais do que certezas, temos algumas inquietudes sobre a qualidade da instituição univer-sitária e sobre o atrelamento da Inovação – alma da universidade, à gestão.

Na PUCRS, em conferência sobre Conducta responsable en investi-gación y docencia, o Prof. Miguel Zabalza, da Universidad de Santiago de Compostela destacava:

La universidad, nuestra universidad, ha sido brillante y transformadora solo en los momentos en que ha sido innovadora. A medida que han ido incremen-tándose las legislaciones y la normativa, a medida que la burocracia se ha ido adueñando de los procesos, a medida que se ha ido fijando un discurso de lo políticamente correcto y penalizando las desviaciones del mismo, a medida que el profesorado se ha limitado a cumplir sus obligaciones, la universidad ha dejado de ser un espacio de debate y creación. Salvo honrosas excepciones, el impulso hacia la transformación social, hacia la renovación intelectual y cre-ación artística y técnica no se encuentra hoy en día en la universidad sino en otros escenarios sociales.

Este questionamento e outros que identificam avaliações de grande es-cala, métricas universais e rotinas burocráticas institucionais presentes no pro-cesso de globalização conduziram a RIES a voltar-se ao estudo da Qualidade

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22 APRESENTAÇÃO DA SÉRIE

da Educação Superior. Nesse contexto o Observatório está publicando a Série Qualidade da Educação Superior – Observatório da Educação, composta por seis livros decorrentes de seminários realizados pela Rede RIES.

Qualidade da Educação Superior, Inovação e Universidade consti-tuiu-se no primeiro livro da Série Qualidade da Educação Superior e está pu-blicado (impresso e em e-book, inglês e português), em 2008, pela EDIPUCRS, resultante de Seminário Internacional de igual título e organizado por Jorge Audy (PUCRS) e Marlia Morosini (RIES/PUCRS):

Este livro considera que Inovação e qualidade na Universidade constitui um tema atual e premente na sociedade do conhecimento. Ele preocupa, ques-tiona e gera projetos e iniciativas na busca da excelência. Ambos os conceitos são multidimensionais, complexos e difíceis de definir, porém, objeto de es-clarecimento e de constante reflexão. Exigem um processo de planejamento, de ação e de avaliação. São ideias dinâmicas que devem adaptar-se a marcos e a situações mutáveis ao dependerem de fatores socioculturais e econômicos. Envolvem uma conotação axiológica, pois visam a excelência do planejamento, dos meios e, de modo especial, dos resultados. A educação para o desenvolvi-mento sustentável permite, por outra parte, permear todo o processo educativo ajudando na tomada de decisões que levem em conta a ecologia, a justiça e a economia de todos os povos e também das gerações futuras.1

Qualidade da Educação Superior: a Universidade como lugar de formação constituiu-se na segunda produção da Série Qualidade da Educação Superior resultante do Seminário de igual nome ocorrido na UFSM. A organi-zação do livro é de Silvia Maria de Aguiar Isaia, com a colaboração de Doris Pires Vargas Bolzan e Adriana Maciel, nossas companheiras do programa de pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Maria.

Como o próprio titulo afirma, A universidade como lugar de formação se detém no exame do campo científico e reflete sobre a governança acadê-mica, as realidades encontradas não só no Brasil, mas em outros territórios, decorrentes do processo de internacionalização. Reflete, em especial, sobre a formação de professores iniciantes, o seu desenvolvimento profissional, os discursos e as práticas de professores e alunos, bem como utopias e desafios no tocante a uma nova universidade.

Qualidade da Educação Superior: reflexões e práticas, neste mo-mento apresentado, constitui-se na terceira produção da Série Qualidade da Educação Superior resultado, basicamente, do Seminário internacional ocorrido em outubro de 2010, na PUCRS2. A organização deste livro é de Marilia Costa Morosini e aborda as tendências e incertezas quanto à quali-dade da Educação Superior em contextos de administração de risco para a reputação universitária, experiências nacionais e internacionais de qualidade

1 Disponível em: http://www3.pucrs.br/portal/page/portal/edipucrs/Capa/PubEletrSeries.2 Conference on Quality in Higher Education; Indicators and Challenges. Porto Alegre, October 15-16, 2010.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 23

da Educação Superior, como cases dos EUA, da União Europeia, especifi-camente do Processo de Bolonha e de países da América Latina. Detém-se em indicadores de qualidade para diferentes questões universitárias – ensino, pesquisa, inovação, formação e desenvolvimento profissional de professores, bem como na metodologia construída para a identificação desses indicadores. Finaliza o livro com reflexões sobre os desafios a serem enfrentados.

Qualidade da Educação Superior: dimensões e indicadores consti-tui-se na quarta produção da série Qualidade da Educação Superior resulta-do também do Seminário Internacional de outubro de 2010 e organizado por Maria Estela Dal Pai Franco e Marilia Costa Morosini. Está constituído pelos artigos, resultados de pesquisa de grupos de investigação integrantes da RIES e pertencentes ao programa de pesquisa Observatório de Educação Superior. São professores seniores e professores em processo de formação, bem como aprendizes desde os bolsistas de IC até mestrandos, doutorandos e pós-douto-randos em seu desenvolvimento profissional. Enfim são as inúmeras ramifica-ções da RIES, que foram originadas pela rede ou, a ela, deram origem.

Qualidade da Educação Superior: grupos investigativos interna-cionais em diálogo contitui-se na quinta produção da Série Qualidade da Educação Superior resultado do Seminário Internacional, na PUCRS, em dezembro de 2011. Sua organização é de Maria Isabel da Cunha. Parte da consideração de que “nossas universidades se encontram em processos de mudanças paradigmáticas, fomentadas tanto pelas exigências socioculturais de reconfiguração dos modos de produção do conhecimento científico e tec-nológico quanto pelas demandas externas do mundo globalizado. Visa-se pro-mover um diálogo entre os grupos de pesquisa do Brasil com grupos investi-gativos internacionais (EUA, México, UE, AL) preocupados com a qualidade de Educação Superior” (http://www.pucrs.br/evento).

Qualidade da Educação Superior: avaliação e implicações para o futuro da universidade contitui-se na sexta produção da Série Qualidade da Educação Superior resultado do Seminário Internacional, na PUCRS, em dezembro de 2011. Sua organização é de Denise Leite e Cleoni Barboza Fernandes, com a colaboração de Cecília Luiza Broilo.

No seminário citado, além dos grupos das quatro universidades, bus-cou-se ampliar a socialização da produção da rede RIES à comunidade cientí-fica de forma geral. Em outras palavras, pesquisadores e aprendizes de outras IES apresentaram suas pesquisas sobre Educação Superior. Este sexto livro é dedicado a dar visibilidade a essa rica produção.

Com a série Qualidade da Educação Superior consubstancia-se o pro-grama de pesquisa e sua caminhada ao longo de seis anos. Nos livros iniciais, apresentam-se as discussões de caráter mais teórico. Neles estão imbricadas posturas nacionais e internacionais, preparando o grupo de pesquisa para se lançar ao desafio de produção de indicadores para a Educação Superior bra-sileira. Após, a rede RIES apresenta indicadores de Educação Superior, na

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24 APRESENTAÇÃO DA SÉRIE

perspectiva nacional e, em alguns casos, regional. Os grupos de pesquisa que integram a Rede apresentam seus estudos de qualidade em inúmeros cases. Integram este livro também considerações e experiências de caráter interna-cional. No quinto livro, a Rede RIES apresenta resultados de seus indicadores para serem discutidos por observadores críticos internacionais. Finalmente neste ciclo de produção de conhecimento sobre qualidade na Educação Superior, a Rede RIES, nesta série, propicia a visibilidade de inúmeras outras produções sobre o tema influenciadas pelo próprio Observatório, mas também influenciadora do Observatório.

Resta-nos, ainda como desafio, o que brevemente ocorrerá, a testagem na realidade brasileira, dos indicadores aprimorados pelos observadores críti-cos internacionais.

Figura 1 – OBSERVATÓRIO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR Capes/INEP

O presente livro Qualidade da Educação Superior: avaliação e im-plicações para o futuro da universidade (v. 6) constitui uma das produções integrantes da Série Qualidade da Educação Superior e reflete sobre os indi-cadores de desempenho do sistema de Educação Superior brasileiro e interna-cionais relativos à qualidade da Educação Superior.

Porto Alegre, 11 anos da RIES

Marilia Costa MorosiniCoordenadora RIES

Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior 2012

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APRESENTAÇÃO DO VOLUME 6 QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: AVALIAÇÃO E

IMPLICAÇÕES PARA O FUTURO DA UNIVERSIDADE

A RIES, Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior, reconhecida como Núcleo de Excelência em Ciência, Tecnologia

e Inovação pelo CNPq/FAPERGS/PRONEX, tem o prazer de apresentar seu sexto livro, volume 6, estudos sobre Educação Superior e implicações para o futuro e a qualidade das universidades.

Ao avaliar nossas instituições de Educação Superior, ao estudá-las e produzir conhecimento sobre elas, pensamos com certa frequência que focali-zamos um retrato estático que vai se estabilizar no tempo. Ao longo de cinco anos de atividades de pesquisa, estivemos em permanente movimento de pro-dução e reflexão, de crítica e construção, no intuito de desfocar e refocar ima-gens e práticas. Nossa tarefa investigativa foi construir indicadores de quali-dade para a universidade brasileira. Realizamos esta tarefa tendo a Pedagogia Universitária como pano de fundo. Ou seja, estivemos preocupadas em ima-ginar o futuro a partir da perspectiva do presente e construir indicadores de avaliação que representassem positividades pedagógicas. Positividades que teriam a face do local em contraponto com as múltiplas faces internacionais da avaliação e dos indicadores de qualidade.

Nesse sentido, o leitor desta obra poderá pensar que nela irá encon-trar apenas indicadores de avaliação quantitativos. Na verdade para construir indicadores é preciso bem conhecer o terreno, o jardim e os jardineiros e a qualidade da terra.

Ao início do trabalho de investigação conjunta das quatro universida-des – PUCRS, UFRGS, UFSM E Unisinos, tivemos a preocupação de con-frontar indicadores internacionais e nacionais de avaliação. Lembramos que

“[...] os padrões de qualidade nacionais e internacionais podem resultar em bons programas e planejamentos em nossas IES, porém, são os padrões locais, aqueles que criamos participativamente, as evidências locais e a ação local que precisam ser consideradas em uma avaliação”. Com este ensinamento de Robert Stake, em verdade, plantamos sementes que germinaram, cresceram, se transformaram em frondosas árvores.

Neste volume consubstancia-se parte do programa de pesquisa segun-do o olhar dos pesquisadores, seus orientandos, de mestrado, doutorado, de Iniciação Científica e Pós-Doutorado, bem como de docentes e alunos de ins-tituições de Educação Superior que tiveram seus trabalhos aprovados e par-ticiparam do X Seminário Internacional intitulado ‘A qualidade da Educação Superior: grupos investigativos internacionais em diálogo’, realizado na PUCRS em 5 e 6 de novembro de 2011.

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26 APRESENTAÇÃO DO VOLUME 6

O presente livro é o sexto volume da Série Qualidade da Educação Superior que vem sendo publicada pela EDIPUCRS. Esta obra se estruturou em Seis Eixos Temáticos, os quais destacam as pesquisas e os estudos desen-volvidos apresentados no X Seminário Internacional, já referido. Este livro foi organizado a partir dos seguintes eixos: (I) Avaliação da Universidade, (II) Gestão da Educação e Redes Acadêmicas, (III) Internacionalização, (IV) Formação de Professores, (V) Desenvolvimento Profissional Docente e (VI) Indissociabilidade e Ensino de Graduação.

A proposta é trazer a posição reflexiva dos autores e sua produção de conhecimento sobre questões que importam para a qualidade atual e futura da Educação Superior. As reflexões integram-se ou tangenciam a produção dos grupos de pesquisa que constituem a RIES e o Observatório da Educação, coordenados pela Dra. Marilia Costa Morosini. Os textos foram agrupados em eixos temáticos que contemplam os temas-chave.

Os resultados das investigações, pequena parte deles, estão sintetiza-dos nesta obra. Esperamos que as novas sementes que a natureza e a ciência venham a produzir com a contribuição desses estudos possam se acumular e se concretizar em implicações de qualidade para o futuro de nossas instituições.

Denise LeiteCleoni Barboza Fernandes

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EIXO TEMÁTICO I

AVALIAÇÃO DA UNIVERSIDADE

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POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: INFLUÊNCIAS

NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

Elizeth Gonzaga dos Santos LimaDenise Leite

A produção do conhecimento constitui a função central da universi-dade desde a sua origem. A forma, o como e o para que produzir

conhecimento vai se ressignificando e tomando os contornos a partir das de-terminações históricas, econômicas e sociais e são definidoras da identidade da universidade. O modelo de universidade alemão ou humboldtiano idealiza-do no século XIX sustenta a produção do conhecimento na investigação livre do domínio da religião, do Estado e das pressões sociais e acadêmicas. No século XX a reconfiguração do papel do Estado, que passa de um estado pro-tetor e de bem-estar social para um Estado de controle deixando o comando no nível das demandas do mercado, traz outra perspectiva para a universidade e sustenta o conhecimento na vertente mercadológica. Nesse caso, o mercado define as demandas da produção do conhecimento, e o estado controla a qua-lidade do conhecimento que está sendo produzido. É nessa perspectiva que emergem os processos de avaliação da universidade como mecanismos de controle da qualidade da produção do conhecimento.

Este estudo tem como objetivo analisar as influências das Políticas de Avaliação para a produção do conhecimento, entendendo o processo de inovação na sociedade do conhecimento, tendo como foco o conhecimen-to produzido pelos pesquisadores nas redes de colaboração e suas implica-ções para as transformações econômicas, sociais, culturais e tecnológicas. Queremos entender a comercialização do conhecimento científico que pres-siona os pesquisadores a produzirem mais em menos tempo e com menor custo para satisfação dos consumidores, reduzindo a responsabilidade pela transformação social e consolidando a produção de um conhecimento co-mercializável.

Discutir a produção do conhecimento no contexto atual é uma questão emergente, complexa e de fundamental importância, se levarmos em conside-ração o cenário de construção da sociedade do conhecimento, as mudanças do mundo do trabalho, o processo de mundialização do capital e as alterações que vêm ocorrendo no papel do Estado desde a década de 80, com maior eferves-cência na década de 90. Com essas mudanças a centralidade do poder em dis-puta emana do conhecimento. Nesse sentido, o conhecimento está associado a uma mercadoria e, nos princípios do mercado, quanto mais mercadoria, mais condições para competir e mais poder. A produção do conhecimento passa a

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30 LIMA, E. G. S. et al. - POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

fazer parte dos acordos internacionais, das propostas dos organismos mun-diais e das políticas governamentais dos países. A busca pelo conhecimento tornou-se uma necessidade urgente e adentrou o cotidiano das organizações, das instituições e da vida das pessoas. Conhecer torna-se sinônimo de poder, prosperidade, sucesso e bem-estar econômico e social. Estamos falando da sociedade do conhecimento emergente no contexto da globalização.

Nesse contexto, é preciso tensionar a produção do conhecimento na universidade, antes que nos tornemos, enquanto pesquisadores e sujeitos do conhecimento, meramente executores de uma demanda de mercado. Como docente e pesquisadora, temos sentido a pressão do produtivismo, que tem se acirrado cada vez mais, a partir do controle do Estado por meio do uso de mecanismos e parâmetros de avaliação, ainda que pautados pelo discurso da promoção da qualidade na educação.

É neste contexto que emergem as questões para este estudo.

PROBLEMA/QUESTÕES• O que está sendo colocado como conhecimento nas Políticas

de Avaliação para a Pós-Graduação? • Quais as influências das Políticas de avaliação para a produ-

ção do conhecimento? • Como as Políticas de avaliação afetam professores/pesquisa-

dores e estudantes?

OBJETIVO GERAL Analisar as influências das Políticas de Avaliação para a produção do

conhecimento, entendendo o processo de inovação na sociedade do conheci-mento, tendo como foco o conhecimento produzido pelos pesquisadores nas redes de colaboração e suas implicações para as transformações econômicas, sociais, culturais e tecnológicas.

METODOLOGIA

Este estudo está vinculado ao Grupo de Pesquisa InovAval e é parte integrante do Projeto Avaliação e Redes de Colaboração: Inovação e mudan-ças nas teias de conhecimento, financiado pelo CNPq e coordenado pela Profa. Dra Denise Leite. Neste sentido, a metodologia segue o caminho abordado pelas pesquisas do Grupo InovAval e parceiros internacionais. Métodos e téc-nicas quali-quantitativas dão suporte ao estudo.

A primeira fase do estudo foi a construção de uma base teórica sustenta-da a partir de teóricos, tais como: Sabato, Leite, Magalhães & Stoer, Boaventura de Sousa Santos; Benjamin Barber; Paulo Freire; José Dias Sobrinho; Ernest House, dentre outros. Estamos construindo as categorias teóricas que são ba-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 31

silares para compreensão das questões levantadas: produção do conhecimento, inovação, avaliação e sociedade do conhecimento. A segunda fase consiste em analisar, como documentos, o Plano Nacional para a Pós-Graduação (2011-2020) e as diretrizes de Avaliação/Capes para a Pós-Graduação, procurando compreender o que está proposto como diretrizes para a produção do conhe-cimento. A terceira fase consiste na realização de um levantamento de dados sobre pesquisadores 1A e grupos de pesquisa na base de dados DGPB, CNPq. Analisamos os Currículos Lattes dos pesquisadores observando como se for-mam e o que produzem as redes e grupos de pesquisas. Os dados coletados serão aprofundados a partir das entrevistas com estes pesquisadores.

RESULTADOS PRELIMINARESAs conclusões que apresentamos são preliminares, pois o estudo está

em fase inicial e as considerações apresentadas estão sustentadas nas catego-rias teóricas, a partir das quais podemos afirmar que a (re)configuração do co-nhecimento produzido, levando em consideração os parâmetros da avaliação, está acontecendo em todos os níveis da educação, o que se evidencia na (re)configuração dos currículos das escolas e das universidades a partir das di-retrizes e instrumentos que orientam os processos de avaliação. Observamos uma inversão na lógica da avaliação.

Nas escolas professores e gestores estão preocupados em ensinar o que é exigido na Provinha Brasil, Prova Brasil, SAEB e ENEM a fim de aumentar o IDEB; na universidade os cursos de graduação também têm (re)configurado os currículos a partir das matrizes de referência do Enade; na Pós-Graduação não parece ser muito diferente, os grupos de pesquisa, as re-des, os projetos, as dissertações/teses estão voltados para uma perspectiva que contempla a Política de Inovação Tecnológica do Estado e das agências de financiamento, o Plano Nacional de Pós-Graduação e as diretrizes de ava-liação da Capes, mesmo que realizada pelos nossos pares. A nosso ver, estas avaliações carregam implicitamente uma concepção de educação, que serve ao desenvolvimento e consolidação dos princípios neoliberais: produção e liberdade de escolha nos princípios do mercado, produzir mais, em menos tempo e menor custo. Nesse sentido, a produção do conhecimento pode es-tar sendo afetada pelos indicadores de avaliação. Os pesquisadores elaboram seus projetos de pesquisa em função de uma demanda externa que define as prioridades para a investigação científica e atrelam o financiamento ao aten-dimento das prioridades.

É possível entender essas questões a partir da perspectiva da socieda-de do conhecimento, em que o conhecimento é “produto” que gera desenvol-vimento. Com essa primazia do conhecimento, e sendo a universidade o lugar por excelência da produção do conhecimento, existe uma expectativa em rela-ção a ela (universidade) como um instrumento útil para o desenvolvimento da sociedade. As influências das avaliações na reconfiguração do conhecimento

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32 LIMA, E. G. S. et al. - POLÍTICAS DE AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

e da identidade universitária no viés do modo de produção capitalista são a lógica inserida no contexto atual das instituições.

O conhecimento produzido de forma desinteressada deu lugar à ino-vação ou à produção de conhecimentos comercializáveis. Poderíamos aqui evocar vários autores, mas citamos Magalhães & Stoer (2003) ao afirmar que o conhecimento mudou não só de natureza, mas também de estatuto com as decorrentes transformações no modo de produzir, distribuir e consumir. O conhecimento é reconfigurado como rede comunicacional e informacional e como mercadoria, assumindo um lugar central na produção. Não queremos colocar essa vertente como “satânica” e não estamos nos opondo à necessida-de do conhecimento técnico e profissional, a grande questão é a supremacia do produtivismo e do viés mercantilista trazendo sérias consequências para a existência humana.

Os impactos do viés neoliberal com o aumento da produtividade sob o comando do mercado e controle do Estado tem se manifestado nas ações diárias da vida docente. Como docente da Educação Superior nos níveis da graduação e da pós-graduação tenho sentido cotidianamente a precarização do trabalho docente em nome da qualidade. Com um regime de trabalho exclu-sivo para a universidade e uma pressão produtivista, manifestada pelos parâ-metros de qualidades definidos pelas políticas de avaliação, nossas atividades acadêmicas estão se resumindo no quantitativismo.

Nas reuniões de docentes no interior do Programa de Pós-Graduação e nas discussões externas que emergem nos fóruns e encontros de educação, citamos aqui o FORPRED (Fórum Nacional de Coordenadores de Programas de Pós-Graduação em Educação), e o que temos observado é uma preocupa-ção em atingir as metas propostas pela Capes e alcançar a qualidade atenden-do os indicadores e os parâmetros da avaliação. Entre os docentes, observa-mos um mal-estar, que se por um lado estão sentindo a pressão e discordam de tais políticas, por outro, não veem alternativas a não ser entrar no “jogo” e se adequar às regras para se manterem.

O mundo contemporâneo vive a imposição dos imperativos capitalis-tas em todas as esferas da vida humana e traz consequências que considera-mos perversas para a existência humana. O discurso da produtividade tem de-senfreado a produção do conhecimento como forma de competir no mercado de trabalho, o que gera muita ansiedade e medo nas pessoas, que precisam a cada dia conhecer e produzir mais para se tornarem úteis para o crescimento e desenvolvimento social.

Documentos de organismos multilaterais, como o Banco Mundial, Unesco, Cepal, de mercados regionais, como o Mercosul e a União Europeia, ou os de governos nacionais, são unânimes em assegurar a centralidade do conhecimento a partir da educação – e, sobretudo a chamada Educação Básica

– nas atuais circunstâncias econômicas e políticas. Moraes (2001), estudando essa centralidade da educação nas políticas internacionais e nacional, apre-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 33

senta duas razões que podem justificar tal centralidade. Em primeiro lugar, porque a educação, ela própria, tornou-se mercadoria mediante a introdução de mecanismos de mercado no financiamento e gerenciamento das práticas educacionais. Um produto a mais entre os muitos a serem consumidos. Em segundo, porque a ela é atribuída a função de formar a força de trabalho com as “competências” necessárias para atender ao mercado.

Moraes (2001) continua discutindo a questão do conhecimento e afir-ma que os destinos da educação, desse modo, parecem estar diretamente ar-ticulados às demandas de um mercado insaciável e da sociedade dita do “co-nhecimento”. Como decorrência, os sistemas educacionais dos vários países sofrem pressões para construir ou consolidar escolas mais eficientes e aptas a preparar as novas gerações e, além da atualização do sistema escolar, a cria-rem mecanismos para uma Educação continuada, uma educação para toda a vida. Nessa sociedade do conhecimento a educação está sendo colocada como a salvação, em especial a universidade que tem a função de ser produtora e disseminadora do conhecimento.

Santos (p. 40, texto digitado) mostra a deterioração da universidade na política neoliberal nos últimos dez anos e discute os principais impactos como sendo: a perda da prioridade da universidade pública entre os bens públicos produzidos pelo Estado por via da crise financeira; a descapitalização da uni-versidade pública; a transnacionalização do mercado universitário; a gestão, a qualidade e a velocidade da informação são essenciais à competitividade econômica; a comercialização do conhecimento científico (pressão hiperpri-vatística da mercantilização do conhecimento, das empresas concebidas como consumidoras, utilizadoras e mesmo coprodutoras do conhecimento científi-co, uma pressão que visa reduzir a responsabilidade social da universidade à sua capacidade para produzir conhecimento economicamente útil, isto é, co-mercializável); a definição de prioridades de pesquisa e de formação, não só nas áreas das ciências sociais e de estudos humanísticos, como também nas áreas das ciências naturais, sobretudo nas mais vinculadas a projetos de de-senvolvimento tecnológico e, por último, o impacto das novas tecnologias de informação e comunicação que provocou a proliferação do ensino a distância e das universidades virtuais.

Leite (2010) contribui significativamente com esta análise, em seu texto: Brasil Urgente! Procuram-se Identidades. Esta autora apresenta uma análise histórica da Educação Superior nos últimos 200 anos e afirma que, atualmente, as reformas, chamadas neoliberais dos anos 90, que ocorreram em vários países, igualmente no Brasil não se limitaram à forma da lei, elas foram profundas e marcaram um modelo de instituição que saiu dos muros de marfim para voltar-se aos mercados e à internacionalização [...]. O per-fil produtivista da universidade empreendedora seria um dos frutos visíveis das reformas dos anos 90. Esta autora vai mostrando a inserção das políticas de avaliação na Educação Superior e analisa como as identidades estão sen-

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do construídas pelas distinções avaliativas. Praticamente todos os resultados das políticas estão sendo monitorados através dos programas de avaliação da qualidade Sinaes/MEC/INEP e Capes/MEC, através das diferentes provas e exames e avaliações externas das IES. O controle e a regulação do sistema permanecem centralizados no MEC mantendo-se o espaço de autonomia das IES no que respeita à sua autoavaliação. Este espaço da autoavaliação precisa ser utilizado como estratégia contra-hegemônica. Este estudo nos remete a pensar alternativas contra hegemônicas, ainda acreditamos na implantação da avaliação participativa como possibilidade de instaurar nos espaços da univer-sidade e nas atitudes dos sujeitos os princípios da emancipação, mesmo em tempos de globalização.

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MAPEIO DAS REDES DE COLABORAÇÃO: DETECTANDO INOVAÇÃO E MUDANÇAS NAS

TEIAS DE CONHECIMENTO COM O PAJEK

Bernardo Sfredo Miorando

EXPLORANDO REDES COM O PAJEK

E ste artigo tem como objetivo apresentar o uso do Pajek como recurso para a análise de redes sociais. Mais especificamente, trata da análi-

se da construção de redes de colaboração científica entre pesquisadores atuantes na docência universitária. O trabalho é parte inicial de uma pesquisa que vem sen-do desenvolvida pelo grupo de pesquisa Inovação e Avaliação na Universidade, sediado na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e orientado pela Professora Denise Leite, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Pajek é um software livre desenvolvido por Vladimir Batagelj e AndrejMrvar,comacontribuiçãodeMatjažZaveršnik,todosprofessoresdaUniversidade de Ljubljana, na Eslovênia. Do esloveno vem seu nome, que significa “aranha”. O programa é usado amplamente para analisar e visualizar redes. Sua versão mais atual do Pajek, a 2.05, está disponível em sua página virtual para download e uso não comercial. A gratuidade e livre disponibili-dade do software, bem como a facilidade para instalá-lo e sua rapidez, são os principais motivos que levaram à sua utilização. Além disso, o uso do Pajek também está difundido na comunidade científica, tendo a reputação de tra-balhar com volumes maiores de dados do que seus congêneres, como o mais conhecido, Ucinet.

Embora haja diversas maneiras de usar o Pajek, como para avaliar a coesão de uma rede ou a centralidade de seus componentes, apresentamos aqui o modo que consideramos mais adequado aos objetivos de nossa pes-quisa: a representação gráfica para proceder à inspeção visual. No Pajek, as redes se constituem e se expressam a partir de três tipos de elementos básicos: os vértices, as arestas e os arcos. Cada vértice (no inglês original, vertex) cor-responde a um indivíduo ou outra unidade de pesquisa. Os vértices podem se conectar de duas formas. A primeira, a aresta (edge), é uma linha simples, não direcionada, unindo dois pontos. A segunda, o arco (arc), é uma linha direcio-nada, com ponta de seta.

Na representação gráfica de uma rede de colaboração científica, os pesquisadores equivalem a um vértice, e as relações que tecem entre si confi-guram arestas ou arcos. O uso de uma ou outra forma de representação pode se dar de acordo com o desenho da pesquisa: arestas indicam uma cooperação

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bidirecional ou equilibrada, na qual dois autores contribuem do mesmo modo para a realização do trabalho e partilham suas habilidades na consecução de seus objetivos; arcos demonstram que a participação de um dos indivíduos foi preponderante, ou seja, que se deu uma transmissão de conhecimento mais intensa de um pesquisador a outro, ocorrendo assim uma qualificação do se-gundo autor pelo primeiro.

Em ambos os casos, ocorre uma construção na estrutura de saberes de cada investigador, já que a associação leva não apenas ao intercâmbio das informações diretamente abordadas no trabalho, mas também ao estabeleci-mento de um laço através do qual fluem dados passados, descobertas pre-sentes e oportunidades futuras. Na medida em que o investigador avança de uma colaboração a outra, forma novos laços e fortalece aqueles já existentes com novos trabalhos. Portanto, o registro destas conexões no Pajek evoca a imagem da teia de conhecimento que tece o profissional ao longo do tempo.

A inspeção dessa estrutura serve para apontar os rumos que toma o sa-ber em uma comunidade de cientistas, a capacidade que tem um investigador de difundir o conhecimento que adquire e acumula, bem como a medida e as formas pelas quais exerce essa capacidade. Permite, ademais, medir o pro-gresso que promove como o avanço de sua carreira: trata-se de enxergar além da perspectiva produtivista, na qual o que importa é a quantidade de obras que um indivíduo pode fornecer, para desvelar a ação desse mesmo indivíduo no sentido de interagir em sua investigação, sua intenção de compartilhar saberes desde o início do processo gerador de conhecimento.

No estudo-piloto que serve como base para este trabalho, foi averigua-do o currículo acadêmico de uma pesquisadora, segundo os dados inscritos na Plataforma Lattes do CNPq. A partir destes dados públicos disponíveis on-li-ne, foram apurados seus trabalhos publicados em forma de artigos científicos no período de 2001 a 2010. Cada obra deste tipo, bem como as associações com outros autores em sua produção, foi compilada no processador de plani-lhas Microsoft Excel e, a partir destes registros, seguiu-se o mapeio da rede da investigadora no Pajek.

CONSTRUINDO E EXPLORANDO MAPAS DE REDES NO PAJEKDemonstraremos agora a ilustração de uma rede com o Pajek a par-

tir do exemplo de contabilização de associações da investigadora pesquisada para a elaboração de artigos científicos. A criação de uma rede no Pajek pode ser feita diretamente pela inserção dos dados de cada vértice no programa. Este é, entretanto, um itinerário mais trabalhoso e demorado do que aquele que seguimos. Em nossa pesquisa, utilizamos o editor de texto simples Bloco de Notas, utilitário padrão do sistema operacional Windows. Para que um ar-quivo de texto seja lido pelo Pajek é necessário construí-lo com uma série de características, conforme a figura a seguir.

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Na primeira linha, são enumerados os vértices que fazem parte da rede. Em seguida, os vértices são descritos, cada qual em sua linha, dando-se suas características. Ao lado do número correspondente a cada vértice, pode-

-se agregar seu nome, entre aspas. Do contrário, o Pajek os rotulará automa-ticamente como “1, 2, 3,...” quando receber o comando de gerar a imagem da rede. Além do nome, podemos descrever como características do vértice forma, tamanho, cor e posição. Essas diferenciações são úteis caso queiramos ressaltar as especificidades dos indivíduos referidos pelos vértices.

Figura 1. Vértices descritos no Bloco de Notas.

Neste estudo, levamos em consideração a inserção de um pesquisador no mesmo grupo de pesquisa, na mesma universidade ou no mesmo país da autora estudada. Assim, estão representados por um quadrado (box) os inves-tigadores que fazem parte do mesmo grupo de pesquisa e têm a mesma nacio-nalidade que a autora estudada; por um losango (diamond) aqueles que parti-cipam do grupo, mas não trabalham no Brasil; por um triângulo (triangle), os brasileiros que participam do grupo; e por um círculo (ellipse) as pessoas que não realizam suas pesquisas a partir do Brasil nem fazem parte de seu grupo de pesquisa, mas mantêm uma relação de produção acadêmica comum.

Abaixo dos vértices, começa a lista de arestas ou arcos, conforme se deseje representar relações direcionadas ou não. Neste estudo, optamos por

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utilizar somente arestas, dado o alto grau de colaboração entre os autores. Descrevemos, assim, a quantidade de produções conjuntas entre os pares em um determinado período de tempo. Deste modo, nas duas primeiras colunas, listamos os vértices que serão conectados e, na terceira, o valor desta ligação: 1 caso haja uma coautoria no ano, 2 se colaboraram em dois trabalhos naquele ano, e assim por diante. Se o investigador analisado publicou sozinho, inseri-mos seu número tanto na primeira quanto na segunda colunas, indicando na terceira a quantidade de ligações consigo mesmo. Ao fim da linha, colocamos entre colchetes o período de tempo no qual se deram as colaborações.

Uma vez listados todos os vértices, arestas e arcos que se deseja repre-sentar, salvamos o arquivo no Bloco de Notas, através do comando “Arquivo > Salvar como”. Para que o Pajek possa lê-lo, mudamos a opção padrão de salvar o texto com a extensão.txt para “todos os arquivos” e acrescentamos a extensão.net, que corresponde aos arquivos de rede no Pajek.

Encerrado o processo de descrição da rede, abrimos o software Pajek. Em sua janela inicial, clicamos no ícone correspondente ao comando “Read Network” na seção “Networks”, em que se operam as ações relacionadas a abertura, salvamento e modificação de redes. Selecionamos o arquivo.net no caminho em que o tivermos salvo e o Pajek o carregará. Uma vez carregado o arquivo, podemos passar a trabalhar com a rede.

Figura 2. Janela inicial do Pajek.

Para obter uma imagem inicial da rede, basta utilizar o comando de desenho “Draw > Draw” do menu superior do Pajek. O programa abrirá uma nova janela, demarcando os vértices e arestas, dispostos de forma uniforme em um padrão circular. É possível alterar esta disposição utilizando as opções de comando “Layout”, nesta mesma janela.

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Figura 3. Imagem inicial da rede.

Para obter uma melhor ideia da intensidade dos vínculos entre investi-gadores e da participação de cada autor numa rede, é possível efetuar algumas alterações no Pajek. Na própria janela de desenho, selecionamos o comando

“Options > Lines > Different Widths” para que a espessura das arestas correspon-da ao volume de produções conjuntas entre os investigadores-vértices que unem. Voltando à janela inicial do Pajek, usamos o comando “Net > Vector > Summing up values of lines > All” para fazer com que o tamanho dos vértices representados seja proporcional ao número de artigos publicados de cada autor. Em seguida, para que este comando tenha efeito no grafo, clicamos em “Draw > Draw Vector”.

Figura 4. Imagem da rede em proporção.

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Outra distinção que se pode fazer na análise da rede de pesquisa-dores é levar em conta a origem acadêmica do investigador. Por meio da guia “Partitions”, é possível agrupar os vértices atribuindo a eles um valor específico para cada universidade. Antes de tudo, geramos uma partição através do comando “Partition > Create Constant Partition”, com a dimen-são igual ao número de vértices da rede. Em seguida, clicamos no ícone correspondente ao comando “Edit Partition” na seção “Partition”, em que se operam as ações relacionadas a abertura, salvamento e modificação de participações dentro de uma rede. Podemos então dividir os vértices em partições que, neste caso, corresponderão às universidades a que pertencem os investigadores. Essa partição pode ser salva a partir do próprio Pajek, para que não tenhamos que criá-la novamente caso queiramos repetir o tra-balho em outra seção. Para isso, clicamos no comando “Save Partition” na seção “Partition” e obtemos um arquivo com a extensão.clu, característica das participações do Pajek.

Executado o comando “Draw > Draw-Partition-Vector”, o programa gerará uma nova imagem da rede, atribuindo desta vez diferentes cores para diferentes universidades. Completamos, assim, o itinerário que nos permite visualizar com o Pajek toda a diversidade existente em uma rede constituída ao longo de dez anos. Por meio da inspeção visual, podemos verificar quais são, ao fim do período, as partes mais densas da rede e como os pesquisadores cooperam para tecer suas teias de conhecimento para além dos limites do seu grupo de pesquisa, sua universidade ou mesmo seu país.

Figura 5. Imagem da rede com partições.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 43

CONSIDERAÇÕES FINAIS: PARA ONDE VAI A PESQUISA?

Ao analisar as imagens da rede da pesquisadora, percebemos que a conexão entre autores é mais forte no seio de um grupo de pesquisa, a despeito de quais sejam suas origens nacionais ou institucionais. Entendemos assim que os vetores mais significativos da contribuição não são aqueles favoreci-dos pela localização, mas os laços criados pelos investigadores com base em suas afinidades teóricas. Portanto, para que haja colaboração, é mais impor-tante a complementaridade temática do que as conformações espaciais.

Esse fato se reforça com os avanços das telecomunicações, em tempo real ou assíncronas. Cremos que a configuração das teias de conhecimento é um exemplo paradigmático das transformações pelas quais também passam outras áreas do trabalho humano. Como os movimentos individuais rumo à inovação se dão com mais facilidade e agilidade do que as mudanças institu-cionais, os pesquisadores que contatam colegas de outras origens constituem pontes pelas quais poderão se aproximar suas universidades, pela assinatura de convênios, intercâmbio de alunos e estabelecimento de programas de pes-quisa conjunta.

Resta determinar como se iniciam e se reproduzem os movimentos individuais em direção à pesquisa inovadora. Por isso, a etapa seguinte ao mapeio das redes de colaboração dos pesquisadores é entrevistá-los para co-nhecer como articulam suas redes e quais são seus hábitos de trabalho em conjunto. As imagens das teias geradas no Pajek são um importante subsídio para orientar tais entrevistas e chamar a atenção do investigador para aspectos da rede que não se poderia perceber caso se partisse apenas das relações de obras para conduzi-las.

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INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO PARA CURSOS DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

Claudia Medianeira Cruz Rodrigues Bernardo Sfredo Miorando

A educação a distância (EAD) vem crescendo em ritmo acelerado a cada ano, em todas as áreas de conhecimento. Tal crescimento

deve-se, em grande parte, à política adotada pelo Governo Federal em termos de estimular a oferta e proporcionar condições para que todos tenham acesso ao ensino superior. Desta forma, medidas como reestruturação e revitalização do ensino foram adotadas e, com elas, estratégias para garantir que princípios como qualidade, respeito à identidade e à diversidade institucionais, globali-dade, legitimidade e permanência sejam respeitados.

Neste sentido, os ‘Referenciais de Qualidade para a Educação a Distância’ propostos pela Secretaria de Educação a Distância do Ministério da Educação fornecem orientações que subsidiam a discussão dos Projetos Pedagógicos dos Cursos, orientando e fixando bases para que a busca da quali-dade aconteça de forma contínua e permanente. Para tanto, os referenciais pro-põem a observância dos seguintes critérios: (i) Concepção de educação e cur-rículo no processo de ensino e aprendizagem; (ii) Sistemas de Comunicação; (iii) Material Didático; (iv) Avaliação; (v) Equipe Multidisciplinar; (vi) Infraestrutura de Apoio; (vii) Gestão Acadêmico-Administrativa e (viii) Sustentabilidade Financeira.

De modo específico, este trabalho propõe a reflexão acerca dos pro-cessos avaliativos que vêm sendo desenvolvidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) a partir do desenvolvimento do projeto PAIUFRGS/UFRGS, mas que preservam um foco maior em questões de ava-liação de aprendizagem relacionadas ao ensino presencial. Salienta-se que isso se deve, em grande parte, ao fato de que o próprio instrumento proposto pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) está mais voltado à realidade dos cursos presenciais.

Na UFRGS, atualmente, existe um instrumento para avaliação do pro-cesso ensino-aprendizagem que é disponibilizado para preenchimento pelo discente no Portal do Aluno ao final de cada semestre letivo, tanto para o ensino presencial quanto a distância. Esse instrumento foi criado por um gru-po de trabalho coordenado pela Secretaria de Avaliação Institucional (SAI) e aprovado pelas instâncias superiores da Universidade e engloba as seguintes seções: (i) avaliação do professor; (ii) avaliação da disciplina; (iii) avaliação da infraestrutura; (iv) autoavaliação do aluno. No entanto, verifica-se que tal instrumento não é adequado à realidade dos cursos a distância oferecidos pela UFRGS, já que a realidade é diferenciada e é preciso avaliar e levar em consi-

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46 RODRIGUES, C. M. C. et al. - INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO PARA CURSOS

deração se não a totalidade, pelo menos a grande maioria dos itens que cons-tam nos referenciais de qualidade. Há a necessidade de analisar fatores como tutores presenciais e a distância, tecnologias e plataformas adotadas no ensino.

Este trabalho tem como objetivo geral validar um instrumento de ava-liação para a educação a distância na UFRGS. Tal instrumento se constitui de 67 itens que avaliam: (i) corpo docente, corpo de tutores e coordenação; (ii) organização didático-pedagógica e (iii) instalações físicas. Ele se encon-tra disponível no endereço http://www.producao.ufrgs.br/interna.asp?cod_ctd=456&cod_tipo=1&codmenu=474.

Para tanto, apresenta-se na próxima seção o referencial que trata dos desafios da educação a distância para em seguida descrever o método de tra-balho, apresentando então os resultados e trazendo, por fim, as considerações finais deste estudo.

O DESAFIO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Os referenciais de qualidade para a educação a distância preconizam

que o modelo de ‘avaliação de aprendizagem’ deve se pautar em um proces-so contínuo, adotando uma lógica de avaliação formativa e, para tanto, deve

“ajudar o estudante a desenvolver graus mais complexos de competências cognitivas, habilidades e atitudes, possibilitando-lhe alcançar os objetivos propostos”. Desta forma, é de responsabilidade das Instituições de Educação Superior (IES) a proposição de mecanismos que promovam o permanente acompanhamento do estudante.

Neste sentido, “à medida que a ênfase é colocada na aprendizagem, o principal papel do professor deixa de ser o de ensinar e passa a ser o de ajudar o aluno a aprender” (GIL, 2007, p. 29). Ensino e aprendizagem são conceitos indissociavelmente ligados, sendo que ensino lembra orientação, instrução, transmissão de conhecimentos e comunicação, processos dos quais o profes-sor é o elemento principal. A aprendizagem, por sua vez, refere-se diretamente ao aluno, evidenciando a modificação de comportamento, apreensão, desco-berta e aquisição de conhecimentos (GIL, 2007, FALLER, 2009).

Para que ocorra a aprendizagem é preciso que os alunos sejam incentiva-dos a investigar, percebam suas aptidões, oportunidades, interesses e condições de aprender e assim sejam capazes de buscar meios para o seu desenvolvimento individual e social. Em relação à ‘avaliação institucional’, há a necessidade por parte das instituições de planejar sistemas de avaliação que contemplem a ava-liação das dimensões: (1) Organização didático-pedagógica; (2) Corpo docente, corpo de tutores, corpo técnico-administrativo e discentes e (3) Instalações. A avaliação destas dimensões deve ser coerente com o proposto pelo Sinaes – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, instituído pelo Governo FederalpelaLein˚10.861em14deabrilde2004comoobjetivodeassegurarum processo nacional de avaliação das instituições de Educação Superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus estudantes.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 47

No entanto, Leite (2005) reforça que o processo avaliativo não pode ser uma fôrma, um modelo que oferece um padrão único e técnico para anali-sar situações que são humanas e complexas. Assim, é importante conhecer as formas como as avaliações se apresentam, o que permite compreender e esco-lher os alcances confiáveis, técnicos e políticos, para desvendar as possíveis verdades sobre uma situação. Deve-se entender as racionalidades presentes nos diferentes formatos de avaliação, sejam educacionais ou institucionais, distinguindo seus efeitos e implicações.

Neste contexto, Faller (2009) desenvolve um referencial significativo ao que apresentar os elementos que compõem um ambiente da educação a dis-tância, a saber: (1) tecnologias, como chats, fóruns, e-mails, CDs, DVDs etc.; (2) estrutura, compreendendo tanto o espaço físico dos polos, com bibliotecas, laboratórios e salas de aula, como o Projeto Pedagógico do Curso (PPC); (3) pessoas que oportunizam que o PPC seja colocado em prática, ou seja, profes-sores, coordenadores de polos e do curso, tutores, orientadores e funcionários. A proposta de Faller (2009), acrescida do referencial teórico sobre a educação a distância e da legislação da Educação Superior pertinente, oportunizaram a construção de um instrumento de avaliação de cursos de ensino a distância para a UFRGS, tema da próxima seção.

METODOLOGIA O instrumento de avaliação para cursos de graduação via Educação a

Distância verifica a percepção dos discentes sobre a educação fornecida pela Universidade, avaliada através de questões agrupadas em constructos que se reúnem em três dimensões básicas. São elas:

1. Pessoas: professores, tutores presenciais e a distância, coor-denação do curso e do polo.

2. Organização Didático-Pedagógica: sistema de ensino, parti-cipação em atividades acadêmicas, organização do curso e expectativas referentes a conhecimento e empregabilidade.

3. Instalações Físicas: condições do polo, suporte técnico e aca-dêmico e ferramentas baseadas na tecnologia de informação e comunicação (TIC).

As respostas seguem a escala padrão mostradas a seguir, havendo ain-da a opção de resposta ‘não se aplica’ e um espaço aberto para sugestões.

Tal instrumento foi aplicado, a fim de validação, em dois cursos de gra-duação a distância na UFRGS, a saber: Licenciatura em Pedagogia e Tecnólogo em Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural (PLAGEDER). Em ambos os casos, originam-se das respostas dos alunos ao instrumento que foi encaminhado pela Coordenação do Curso.

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48 RODRIGUES, C. M. C. et al. - INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO PARA CURSOS

Os dados do curso de Pedagogia EAD foram coletados nos meses de outubro a dezembro de 2010, em todos os polos em que foi ofertado. As informações sobre o PLAGEDER foram obtidas entre junho e agosto de 2011. Neste caso, a população do estudo distribui-se entre nove dos doze polos em que foi oferecida a primeira edição do curso

RESULTADOS

Apresentam-se a seguir alguns resultados gerais obtidos a partir da aplicação do questionário desenvolvido e proposto junto a dois cursos de graduação a distância da UFRGS, o Curso de Licenciatura em Pedagogia e o Curso de Tecnologia em Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural (PLAGEDER).

PEDAGOGIA

O curso de Licenciatura em Pedagogia foi selecionado para estudo por ser o primeiro curso a distância da Universidade a entrar em processo de diplomação. Ainda, de acordo com os dados apresentados no Censo da Educação Superior de 2009, Pedagogia é o curso com o maior número de matrículas em EAD no país. Visando à formação de professores em exercício na rede pública de ensino do Rio Grande do Sul, o curso foi ofertado em cinco polos: (1) Alvorada, (2) Gravataí, (3) São Leopoldo, (4) Sapiranga e (5) Três Cachoeiras.

Da população de 347 alunos que se formaram, 47,5% responderam o questionário, totalizando uma amostra de 165 respondentes. Os resultados apontam médias superiores a 4 (na escala de 1 a 5) para todas as dimensões, o que indica a satisfação dos alunos com o curso como um todo. Não obstante, interessa prestar atenção às áreas avaliadas como menos satisfatórias, visando a melhorias. A média geral da dimensão Pessoas ressalta que o constructo referente aos ‘tutores presenciais’ recebeu a pior avaliação dos alunos. Dentro da dimensão Organização Didático-Pedagógica, o constructo ‘sistema de en-sino’ apresentou a menor média. Por fim, na dimensão referente às Instalações Físicas, ‘condições do polo’ foi o constructo que apresentou menor média. É possível concluir que, no entender dos alunos, a dimensão Instalações é a que mais carece de melhorias, especialmente no que diz respeito às condições dos polos. Ela merece atenção especial por parte da Coordenação do Curso, tendo em vista a realidade diferenciada de cada polo em que o curso é ministrado.

PLAGEDER

O curso de Tecnologia em Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural (PLAGEDER) foi selecionado por ser o primeiro curso de graduação tec-nológica da Universidade, combinando assim duas modalidades inovadoras de

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 49

ensino: EAD e formação de tecnólogos. A graduação visa a formar profissio-nais capazes de assessorar as coletividades locais e regionais, públicas e priva-das, atendendo às necessidades e particularidades das sociedades, articulando a questão ambiental ao desenvolvimento, a gestão e o planejamento rural. O curso foi ofertado em 12 polos: Arroio dos Ratos, Balneário Pinhal, Camargo, Constantina, Hulha Negra, Itaqui, Picada Café, Quaraí, Santo Antônio da Patrulha, São Francisco de Paula, São Lourenço do Sul e Três Passos.

Da população de 133 alunos que se formaram, 123 responderam ao instrumento, equivalendo a 92,5% do universo. Os resultados apontam para a necessidade de repensar a dimensão Organização Didático-Pedagógica, es-pecialmente em seu caráter profissionalizante. Unindo esta avaliação ao diag-nóstico das outras áreas, percebe-se que o curso fornece uma boa formação em termos analíticos, teóricos e genéricos, mas poderia dar mais atenção à atuação profissional, capacitando os alunos para a intervenção em favor do desenvolvimento através do engajamento em práticas agroindustriais locais. Esse exercício poderia ainda ser fortalecido com o aumento do material bi-bliográfico de referências específicas disponível no polo e um mais pronto retorno aos alunos e suas atividades pelos tutores.

CONSIDERAÇÕES FINAISO instrumento aplicado mostrou-se plenamente adequado em todas

as dimensões avaliadas. No curso de Pedagogia, o Alfa de Cronbach para a etapa de validação dos fatores, analisando o grau de consistência das variáveis e confiabilidade dos constructos, para os quais foi considerado o critério de Alfa superior a 0,7, obteve valores superiores a 0,758 em todos os constructos. No PLAGEDER, a medida encontrada foi superior a 0,719 em todos os cons-tructos. Tais dados confirmam a confiabilidade dos resultados. Na concepção de Hair et al. (2005), um valor de pelo menos 0,70 aponta uma fidedignidade dos dados aceitável, mesmo reconhecendo que esse valor não seja um padrão absoluto.

Os dados apontam para a validação do instrumento, da forma como se apresenta, sem a necessidade de excluir qualquer variável. No entanto, espera-

-se ainda aplicar esse instrumento a cursos de ensino superior que conferem o grau de bacharel, para confirmar assim sua utilidade nas três modalidades de formação: licenciaturas, bacharelados e tecnólogos. Sua aplicabilidade é ampla, podendo abranger instituições públicas ou privadas.

REFERÊNCIAS

FALLER, L. P. Estudo de parâmetros para a avaliação de cursos de ensino a distância (EAD). 2009. 165 f. (Mestrado em Administração). Universidade Federal de Santa Maria: Santa Maria, 2009.

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50 RODRIGUES, C. M. C. et al. - INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO PARA CURSOS

GIL, A. C. Metodologia do ensino superior. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. HAIR JUNIOR, J. et al. Análise multivariada de dados. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.LEITE, D. Reformas universitárias: avaliação institucional participativa. RJ/ Petrópolis: Vozes, 2005. MEC. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Referenciais de quali-dade para Educação Superior a Distância. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br>.UFRGS. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Relatório de Autoavaliação Institucional 2009. Porto Alegre: UFRGS/Comissão Própria de Avaliação, 2009.

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PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (EAD)

Lisiane Pellini FallerCláudia Medianeira Cruz Rodrigues

Bernardo Sfredo Miorando

A preocupação com a qualidade das instituições de Educação Superior (IES) surge num contexto que pode ser caracterizado

por um desajuste entre Estado, Universidade e Sociedade. Diversas mudanças sociais estão apresentando novas demandas às universidades, que, por sua vez, não podem responder a tais pronunciamentos sem transformar suas tradi-cionais estruturas e modos de funcionamento. Tais mudanças dizem respeito à globalização, expansão e diversificação do sistema de Ensino Superior, ao surgimento do Estado Avaliador, ao surgimento de novas tecnologias, entre outras. Neste contexto, surgem diferentes modelos de universidades, assim como pressões de diferentes tipos para que estas instituições se autoavaliem ou sejam avaliadas. Desta forma, a qualidade da educação e a sua avaliação assumem um papel fundamental (RODRIGUES, 2004).

Com o advento das novas tecnologias e as influências de um mercado turbulento, as universidades sentiram a necessidade de transpor as fronteiras tradicionais da educação, lançando-se ao desafio de promover a educação a distância (EAD), que cresce rapidamente no mundo. Encorajada pelas possi-bilidades advindas das tecnologias da informação e por sua introdução em to-dos os processos produtivos, essa opção de ensino é vista cada vez mais como um meio de democratizar o acesso ao conhecimento e de alargar oportunida-des de trabalho e aprendizagem ao longo da vida por cidadãos e instituições.

Na concepção de Aretio (1991a), educação a distância é um sistema tecnológico de comunicação massiva e bidirecional, que substitui a interação pessoal em aula entre professor e aluno como meio preferencial de ensino, através da ação sistemática e conjunta de diversos recursos didáticos e o apoio de uma organização tutorial, que propiciam a aprendizagem autônoma dos estudantes. Ela é, portanto, responsável por uma revolução nos paradigmas educacionais ao apresentar oportunidades para as IES, como integrar e enri-quecer materiais instrucionais e interação e comunicação entre instrutores e alunos (MAIA; MEIRELLES, 2003).

Considerando as questões que se colocam nesse contexto, este artigo busca apresentar um instrumento de avaliação da educação a distância para IES, sejam elas de natureza pública ou privada, visando a obter parâmetros de qualidade para o ensino em relação às dimensões pessoas, estrutura e tecnolo-gia de informação e comunicação (TIC). Este artigo está constituído de cinco seções. Nesta primeira seção, estão expostos a introdução e o tema do estudo.

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52 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

A segunda seção traz o referencial teórico, abordando a contextualização da educação a distância e a estrutura de suporte ao seu funcionamento. A terceira apresenta o método de estudo. A quarta demonstra o instrumento de coleta de dados elaborado para ambientes EAD. A quinta seção, por fim, comunica as considerações finais do estudo.

REFERENCIAL TEÓRICO

Educação a Distância: contextualizaçãoA educação a distância surgiu no século XX como uma alternativa,

uma opção às exigências sociais e pedagógicas tradicionais, contando com o apoio das TIC para se promover como uma modalidade de ensino não tra-dicional em que tempo e espaço são reconhecidos como variáveis ‘não prefi-xadas’ (MARCHETI et al., 2005; PRETI, 1996). A simultaneidade existente entre as variáveis no ensino presencial é alterada na concepção da educação a distância, que adapta o tripé professor-aluno-escola para educando-sociedade-

-tecnologia. Tal concepção é caracterizada por elementos, como: (i) separa-ção física entre professor e aluno no espaço-tempo; (ii) responsabilidade pelo aprendizado é mais do aluno do que do professor; (iii) comunicação entre professor-aluno ocorre por intermédio de documentos impressos ou algum tipo de tecnologia (KEEGAN, 1991).

Dewett e Jones (2001) afirmam que a tecnologia proporciona inova-ção, geração de ideias novas para a solução de problemas, beneficiando signi-ficativamente indivíduos, grupos, organizações ou sociedades. No entanto, a tecnologia não pode determinar as escolhas dos indivíduos. É o ser humano que atribui sentido à ferramenta, não existindo uma totalidade de tecnologia que seja por si só suficiente para assegurar competitividade (PYÖRIA, 2005; VASCONCELOS et al., 2001). Assim, o processo educativo se dá principal-mente através do capital humano, mesmo quando ele depende de tecnologias para ser efetivado, como acontece com o ensino a distância.

Comenta Leite et al. (2007, p. 451) que o auxílio das máquinas está mudando o papel de professor e aluno na aprendizagem. Espera-se que os alu-nos possam ser “protagonistas de sua própria educação” ou “pilotos de suas próprias aprendizagens”, com capacidade de linguagem digital para decifrar os códigos linguísticos das diferentes disciplinas.

Estrutura de Suporte ao Ambiente EAD O ambiente EAD integra elementos e/ou dimensões que interagem en-

tre si no processo de ensino-aprendizagem, utilizando-se: (1) das TIC (chats, fóruns, e-mails, CDs, DVDs etc.); (2) da estrutura do curso e dos polos (es-paço físico, bibliotecas, laboratórios etc.), e do Projeto Pedagógico do Curso

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 53

(PPC); (3) das pessoas que oportunizam colocar o PPC em prática (professo-res, coordenadores, tutores e funcionários). Em relação à avaliação, a mesma acontece em dois momentos distintos: (1) vinculada à estrutura de apoio for-necida pelo polo, sendo processual ou formativa e/ou final ou somativa; (2) envolvendo as três dimensões, tratando-se de uma avaliação de maior escopo, como a avaliação institucional, conforme ilustra a Figura 1.

Embora novas necessidades educacionais sejam instituídas a cada dia, é indispensável que, neste complexo e interativo ambiente que envolve a edu-cação a distância, não seja perdido o foco da qualidade da educação ofertada. A função de conhecer e avaliar como se encontra o ensino em determinada instituição é condição determinante para que as devidas mudanças possam ser implantadas, garantindo assim a instalação ou a permanência da imprescindí-vel qualidade do ensino (BALZAN; SOBRINHO, 1995).

Figura 1. Ambiente da Educação a Distância. Fonte: Faller (2009).

O conhecimento para a avaliação passa pela análise, de modo mais es-pecífico, das dimensões que compõem e que interferem na qualidade da EAD.

(1) Pessoas – Nessa dimensão encontram-se envolvidos os recursos humanos necessários ao funcionamento da estrutura que envolve a EAD: pro-fessores orientadores e conteudistas, tutores presenciais e a distância, coorde-nadores de curso e de polos e funcionários.

O professor conteudista, de acordo com Maia e Meirelles (2003), é aquele que participa da produção do material didático e pedagógico, com base

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54 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

no conteúdo de cada unidade (apostilas, cadernos, vídeos, páginas na Internet etc.), ficando com o papel de gestor do conhecimento e cabendo a ele e ao tutor a atualização do material utilizado. Conforme Moore e Kearsley (2008, p. 17), o professor conteudista deve preparar as tarefas que serão propostas aos alunos e cujos resultados estes enviarão aos tutores por meio eletrônico ou correio.

Quanto ao tutor, García Aretio (1999) menciona que a palavra ‘tutor’ pressupõe uma figura que exerce a proteção, a tutela ou a defesa de uma pes-soa menor ou necessitada. A característica essencial dessa pessoa em EAD é fomentar o estudo independente, figurando como orientador de aprendizagem do aluno solitário e carente da presença do professor. Para Riaño e Siebert (2004), a tutoria compreende uma ação mediadora de intervenção didática e comunicativa, de orientação e avaliação da autoaprendizagem do aluno.

(2) Estrutura – Conforme a Secretaria de Educação a Distância do MEC, além de mobilizar recursos humanos e educacionais, um curso a distân-cia exige a montagem de infraestrutura material proporcional ao número de alunos, aos recursos tecnológicos envolvidos e à extensão de território a ser alcançada, o que representa um significativo investimento para a instituição (SESU/MEC, 2007).

A infraestrutura material inclui aparelhos de televisão, som, DVD, im-pressoras, telefones, fax, equipamentos para produção audiovisual, computa-dores ligados em rede e instalações físicas para comportar essas TIC. Também é observada a “situação do acervo de livros e periódicos, imagens, áudio, ví-deos, sites na Internet, bem como laboratórios, bibliotecas e museus virtuais”. Além disso, a infraestrutura deve prever um local próprio para as “atividades práticas em laboratórios e estágios supervisionados, inclusive para alunos fora da sede, sempre que a natureza e o currículo do curso exigirem” (SESU/MEC, 2007, p. 15).

Esta dimensão também contempla a questão da avaliação adotada pelo curso, a qual se refere à avaliação de aprendizagem e à avaliação ins-titucional. Barros (2002, p. 11) menciona que é preciso pensar em práticas pedagógicas que não obstruam a experimentação de novas soluções e formas de conhecimento. Neste caso, devem ser apresentadas diferentes expectativas e histórias de vida, e os processos educacionais são tecidos como redes que possuem configurações imprevisíveis que se auto-organizam incessantemen-te, formando um padrão vivo e interativo. “O processo educacional é mais amplo, não se esgota na dimensão prática, exige a construção da formação em sua totalidade, tem que contribuir para a formação de homens plenos, plenos de humanidade” (PIRES, 1997, p. 91).

(3) Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC) – A tecnologia é responsável pelo desenvolvimento social à medida que afeta a vida das pessoas e organizações, abrangendo conhecimento, equipamentos, métodos, técnicas e melhorias nas atividades de gestão e produção. O surgimento de

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 55

novas tecnologias proporcionou à EAD a oportunidade de romper com a ideia de um projeto pedagógico baseado em ‘aulas’ e apostando na capacidade da

‘interação virtual’.No entender de Maia e Meirelles (2003), a educação na EAD provoca

transformações na relação tradicional de sala de aula: o domínio do professor transforma-se em compartilhamento do aprendizado; os instrutores passam a facilitadores; os cursos passam a ser mais personalizados e menos estru-turados. Por outro lado, afirma Belloni (2002, p. 137), interesses políticos e econômicos acabam gerando propostas educacionais mais centradas em pro-cessos de ensino do que de aprendizagem. Por isso, é importante cuidar para que os modelos de EAD não se transformem em “sistemas ensinantes”, ao invés de “sistemas aprendentes”, o que requer qualidade e consciência do do-cente. O professor deve superar a postura de transmissor de conhecimentos e assumir o papel de “agente organizador, dinamizador e orientador da constru-ção do conhecimento”, auxiliando o aluno a apropriar conhecimento (ALVES; NOVA, 2002, p. 7).

MÉTODO DE PESQUISA

A presente pesquisa é caracterizada por ser um estudo de caso que, segundo Yin (2007, p. 32), “é uma investigação empírica que investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente defi-nidos”. Este estudo foi realizado no ano de 2008 na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), tendo como foco investigativo o curso de graduação a distância em Educação Especial, um projeto-piloto oferecido em três polos: Bagé, Santana do Livramento e Uruguaiana. O público-alvo da pesquisa fo-ram os alunos, com o intuito de captar as multiplicidades e as possíveis pecu-liaridades ou falhas do processo educacional na modalidade EAD, garantindo, assim, a permanência ou a instauração da qualidade no ensino, e propondo mudanças através das vozes dos alunos.

O modelo de questionário da pesquisa foi elaborado a partir da revisão de literatura, do Projeto Político-Pedagógico do Curso, do modelo de ques-tionário aplicado para o curso de Administração a distância da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e dos Referenciais de Qualidade para Educação Superior a Distância (MEC/SEED). O questionário foi elabo-rado em 5 blocos: (1) dados gerais dos respondentes; (2) percepção quanto a Professores, Tutores e Coordenadores (cada um gerando um construto); (3) percepção quanto a TIC e Práticas Pedagógicas (cada um gerando um cons-truto); (4) percepção quanto à Estrutura do Polo e do Curso (um construto); (5) dados complementares (Avaliação – um construto). As escalas foram es-truturadas de 0 a 6 (Discordo Totalmente a Concordo Totalmente), exceto no último bloco, em que foi utilizada escala de 0 a 10.

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56 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

RESULTADOSA seguir, apresenta-se uma proposta de instrumento para avaliar os

elementos e/ou dimensões que envolvem a educação a distância, ou seja: (i) pessoas, (ii) estrutura e (iii) tecnologia de informação e comunicação (TIC). Tais elementos proporcionam parâmetros importantes de qualidade a serem observados nas IES.

PARTE I – DADOS GERAIS DO RESPONDENTEF Marque com um X a resposta indicada ou complete o espaço conforme solicitado:Idade: ____________ anosSexo: ( ) Feminino ( ) MasculinoEscolaridade: ( ) Superior incompleto ( ) Superior completo ( ) Pós-Graduação incompleta ( ) Pós-Graduação completa Estado Civil: ( ) Casado(a) ( ) Solteiro(a) ( ) Separado(a) ( ) Viúvo(a)( ) Outro Trabalha:( ) Sim. Onde__________________ ( ) Não ( ) Estágio Faixa mensal de renda familiar:( ) Até R$ 487,00 ( ) De R$ 488,00 a R$ 1.194,00 ( ) De R$ 1.195,00 a R$ 3.479,00 ( ) Acima de R$ 3.480,00

PARTE II – DIMENSÕES PESSOAS, ESTRUTURA E TICsPara dar sua opinião, utilize a escala de 1 a 6, conforme abaixo:

1 2 3 4 5 6

Discordo totalmente

Concordo totalmente

ProfessoresNº Item Escala

07 Os professores demonstram domínio do conteúdo. 1 2 3 4 5 6

08 Os professores esclarecem prontamente minhas dúvidas. 1 2 3 4 5 6

09 Os professores são acessíveis fora do horário do chat. 1 2 3 4 5 6

10 Os professores apresentam os planos de ensino, elucidando os objetivos das disciplinas. 1 2 3 4 5 6

11 Os professores são assíduos e pontuais. 1 2 3 4 5 6

12 Os professores demonstram interesse no aprendizado dos alunos. 1 2 3 4 5 6

13 Os professores tratam os alunos com respeito e consideração. 1 2 3 4 5 6

14 Os professores estimulam o relacionamento interpessoal. 1 2 3 4 5 6

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 57

Nº Item Escala

15 As explicações dadas pelos professores parecem claras e adequadas. 1 2 3 4 5 6

16 Os professores relacionam os conteúdos trabalhados com a realidade. 1 2 3 4 5 6

TutoresNº Item Escala

17 Os tutores demonstram domínio do conteúdo. 1 2 3 4 5 6

18 Os tutores esclarecem prontamente minhas dúvidas. 1 2 3 4 5 6

19 Os tutores são acessíveis fora do horário do chat. 1 2 3 4 5 6

20 Os tutores são assíduos e pontuais. 1 2 3 4 5 6

21 Os tutores demonstram interesse no aprendizado dos alunos. 1 2 3 4 5 6

22 Os tutores tratam os alunos com respeito e consideração. 1 2 3 4 5 6

23 Os tutores estimulam o relacionamento interpessoal. 1 2 3 4 5 6

24 Os tutores são capazes de argumentar com pontos de vista dife-rentes dos seus. 1 2 3 4 5 6

25 As explicações dadas pelos tutores parecem claras e adequadas. 1 2 3 4 5 6

26 Os tutores relacionam os conteúdos trabalhados com a realidade. 1 2 3 4 5 6

Coordenador de Curso e PoloNº Item Escala

27 O papel do Coordenador do Polo pode ser considerado satisfatório. 1 2 3 4 5 6

28 O papel do Coordenador do Curso pode ser considerado satis-fatório. 1 2 3 4 5 6

Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs)Nº Item Escala

29Os materiais didáticos (impressos e audiovisuais) são elaborados de forma clara e compreensível, promovendo a autonomia de estudos.

1 2 3 4 5 6

30 As homepages são atraentes e claras dando melhor suporte ao aluno. 1 2 3 4 5 6

31 Os materiais educacionais (apostilas, CDs, DVDs,...) são de alta qualidade 1 2 3 4 5 6

32 As ferramentas síncronas (chats, Internet, telefone etc.) disponí-veis estão cumprindo com seus propósitos. 1 2 3 4 5 6

33 As ferramentas assíncronas (e-mails, CDs, DVDs, fax, vídeos etc.) disponíveis estão cumprindo com seus propósitos. 1 2 3 4 5 6

34 Estou satisfeito com o desempenho dos chats (horários, interação, esclarecimento de dúvidas etc.). 1 2 3 4 5 6

35 Os recursos tecnológicos utilizados no curso são adequados e suficientes. 1 2 3 4 5 6

36 A plataforma E-proinfo atende às expectativas em termos de utilização e cumprimento dos objetivos esperados. 1 2 3 4 5 6

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58 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

Práticas PedagógicasNº Item Escala

37 O foco do curso se dá mais no conteúdo do que na aprendizagem. 1 2 3 4 5 6

38O foco do curso se dá mais no controle (acesso a chats, fóruns, datas de entregas de trabalhos etc.) do que no desenvolvimento de competências e habilidades.

1 2 3 4 5 6

39 Há mais incentivo por parte do curso em relação à cooperação do que a competição entre os colegas. 1 2 3 4 5 6

40 Existe um alto nível de interatividade entre professor/tutor e alunos. 1 2 3 4 5 6

41A avaliação (provas, acessos a chats, fóruns etc.) serve mais para controlar e classificar o aluno do que como um processo de corre-ção de rumos e construção do conhecimento.

1 2 3 4 5 6

42 Os métodos de avaliação utilizados estão cumprindo com seus objetivos. 1 2 3 4 5 6

43 Os materiais educacionais proporcionam uma abordagem contex-tualizada e interdisciplinar dos conteúdos. 1 2 3 4 5 6

44 Os materiais educacionais possuem procedimentos claros, lógicos e abrangentes para a autoavaliação do aluno. 1 2 3 4 5 6

45 Os materiais para Internet servem de suporte ao material didático, facultando interface significativa. 1 2 3 4 5 6

46 Existe complementaridade entre os materiais impressos, audiovi-suais e para uso na Internet. 1 2 3 4 5 6

47 Existe um sistema de avaliação continuada ao longo do curso. 1 2 3 4 5 6

48

O guia geral e de conteúdos distribuídos no início do semestre letivo (cronograma geral para os conteúdos) possuem informa-ções claras e completas sobre as formas de interação e o processo ensino-aprendizagem.

1 2 3 4 5 6

49 Os conteúdos curriculares são atualizados, relevantes e de acordo com a proposta pedagógica do curso. 1 2 3 4 5 6

50A metodologia estabelecida para o desenvolvimento das ativida-des inclui o desenvolvimento do espírito científico e a construção de indivíduos autônomos e cidadãos.

1 2 3 4 5 6

51 Existe acompanhamento, controle e feedback quanto às ativida-des executadas. 1 2 3 4 5 6

52 Percebe-se que as disciplinas estão planejadas de modo a propor-cionar integração entre os conteúdos trabalhados. 1 2 3 4 5 6

53 As disciplinas ofertadas estão sendo importantes para a formação do aluno. 1 2 3 4 5 6

Percepção geral quanto à estrutura do Polo e do CursoNº Item Escala

54 O Curso dá abertura para sugestões e opiniões sobre o trabalho que está sendo desenvolvido. 1 2 3 4 5 6

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 59

Nº Item Escala

55 Existe um clima de relacionamento amistoso entre professores, tutores e coordenadores. 1 2 3 4 5 6

56 Existe respeito a regras, normas e compromissos estabelecidos pelo Curso. 1 2 3 4 5 6

57 O Curso preocupa-se com a qualidade do aluno que está saindo para o mercado de trabalho. 1 2 3 4 5 6

58 O Curso estimula a participação do aluno. 1 2 3 4 5 6

59 O Curso é organizado em termos de cumprimento das atividades propostas, disciplinas ofertadas e sistema de avaliação. 1 2 3 4 5 6

60 As instalações disponibilizadas para as aulas são adequadas. 1 2 3 4 5 6

61 Os recursos utilizados de TICs estão em quantidade e qualidade satisfatórios. 1 2 3 4 5 6

62As condições de funcionamento e disponibilidade de laboratório para as aulas práticas atendem plenamente as necessidades do curso.

1 2 3 4 5 6

63 Livros e periódicos são disponibilizados em quantidade e qualida-de satisfatórios. 1 2 3 4 5 6

PARTE III – Dados Complementares

64. De zero a 10, qual sua avaliação em relação ao curso estar cumprindo suas expectativas de aprendizagem?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

65. De zero a 10, como você avalia o desempenho geral dos professores/tuto-res e coordenadores do Curso?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

De zero a 10, como você avalia a estrutura fornecida pelo polo?0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

67. De zero a 10, como você avalia a escolha das ferramentas/recursos utiliza-dos (TICs) pelas disciplinas do Curso?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

68. De zero a 10, como você avalia as Práticas Pedagógicas utilizadas pelo Curso?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

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60 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

69. Qual a sua autoavaliação até o momento em relação ao seu desempenho no curso?

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

70. Qual a sua satisfação de forma geral com o curso até o presente momento?0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No desenvolvimento deste estudo, procurou-se manter o foco no en-tendimento da complexa relação existente entre a Educação a Distância e as dimensões que envolvem essa modalidade de ensino. Para tanto, considera-se que a proposição de um instrumento que venha a envolver e a tratar da relação existente entre essas dimensões em toda a sua complexidade faz-se extrema-mente relevante, principalmente ao considerar os diversos sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem.

Deve-se ter cuidado, no entanto, em verificar de qual objeto da ava-liação e quais os parâmetros de qualidade se está tratando no momento, a fim de haver uma base fidedigna de informações que auxiliem os gestores nas reflexões e decisões resultantes. Para tanto, a escolha das fontes de coleta de dados, o cuidado com a aplicação dos instrumentos e o tratamento e destino dos dados obtidos devem ser fundamentais para a credibilidade do processo.

De um modo geral, pode-se dizer que o Curso obteve uma baixa eva-são dos alunos (cerca de 12%, do total de 120 alunos matriculados no início do Curso), sendo que a maioria dos evadidos saiu no início do Curso, todos por motivos conhecidos pela Coordenação e relacionados a problemas familiares ou de saúde. Os dados da literatura, no entanto, apontam que a evasão dos cursos a distância costuma ser considerável, sendo que os alunos abandonam os cursos em seu decorrer, com o surgimento das dificuldades, por falta de entusiasmo ou autonomia. Já o perfil dos entrevistados corresponde ao descri-to pela literatura, sendo que a maioria já possui algum trabalho, estado civil casado e com idade média geral de 36,4 anos.

A análise dos dados revelou que algumas dificuldades apresentadas pelos alunos dizem respeito à falta de contato com os professores e tutores das disciplinas, acessibilidade fora do horário ao chat, domínio de conteúdo e não esclarecimento de dúvidas por parte dos tutores, insatisfação com o desem-penho dos chats e materiais educacionais, métodos de avaliação continuada e autoavaliação, instalações para as aulas e laboratórios. Porém, é importante destacar que, embora as médias tenham se apresentado mais baixas para essas variáveis, suas médias ainda assim são consideradas altas, indicando que pelo menos 50% dos entrevistados mostram-se satisfeitos com os itens descritos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 61

Apesar da consciência da necessidade de aprimorar cada vez mais o processo avaliativo nas IES, cabe salientar que o presente estudo conseguiu formular ferramentas importantes e fundamentais para o diagnóstico e acom-panhamento do ensino a distância, elaborando proposições de parâmetros para essas avaliações através de análises consistentes sobre o objeto de estudo e os Referenciais de Qualidade para EAD propostos pelo MEC.

REFERÊNCIAS

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62 FALLER, L. P. et al. - PROPOSIÇÃO DE PARÂMETROS PARA AVALIAÇÃO

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WEBQUEST: INOVAÇÃO, AVALIAÇÃO, INDICADORES DE QUALIDADE

Denise LeiteGraziela Fátima Giacomazzo

Geraldo Ribas Machado

O s espaços da aprendizagem expandem-se na atualidade e criam--se novas formas de ensinar e de aprender, e este fenômeno

relaciona-se fortemente com o advento da Internet, usada para múltiplos e indefinidos interesses: social, político, pessoal, econômico, educacional e outros de acordo com as necessidades dos seus usuários. As possibilidades tecnológicas de informação e comunicação deste meio inserem-se num uni-verso sem fronteiras.

No Ensino Superior verifica-se que as metodologias de uso da Internet na prática docente ocorrem por meio de experiências pedagógicas que me-recem sempre contínuas e inovadoras aplicações. Entre estas, cita-se a me-todologia da Webquest, a qual será descrita como um relato de experiência vivenciada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

O modelo Webquest pensado por Bernie Dodge da San Diego State University (SDSU) encontra espaço significativo na educação em todos os níveis de ensino, respeitando-se as especificidades necessárias dos mesmos.

“Webquest é uma atividade investigativa, em que alguma ou toda informação com que os alunos interagem provém da Internet” (DODGE, 2007).

O sucesso desta metodologia certamente relaciona-se com sua origem que é o “chão de escola”, onde professores buscavam encontrar caminhos para o uso da Internet. No Ensino Superior nas modalidades presencial e a distância esta metodologia de trabalho apresenta-se promissora e significa-tiva, pois agrega pesquisa, informática e trabalho participativo. Além desses aspectos, a Webquest provoca a autoria das propostas de ensino pelos docen-tes, o que identifica e qualifica o trabalho educativo criando novos objetos de aprendizagem.

Para Abar e Lisbete (2008, p. 5), “o que se espera desse tipo de pro-posta não é nenhum virtuosismo computacional”, mas competência para ino-var o uso que se faz da Internet explorando suas possibilidades para que estu-dantes elaborem conhecimentos de forma participativa produzindo resultados significativos.

Ainda sobre as potencialidades do objeto de aprendizagem que está sendo apresentado, seu formato possibilitou a prática da avaliação partici-pativa. A avaliação, independentemente de a educação ser presencial e/ou a

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64 LEITE, D. et al. - WEBQUEST: INOVAÇÃO, AVALIAÇÃO, INDICADORES DE QUALIDADE

distância, segue procedimentos e critérios que acabam reproduzindo modelos, comportamentos, ideias de acordo com quem está avaliando. Desta forma, os novos formatos de avaliação on-line devem ser investigados, segundo Leite et al. (2007, 448):

Dependendo dos atores que detêm os saberes – sobre o próprio co-nhecimento objeto, sobre o uso da máquina, sobre o emprego da tecnologia

– deslocam-se os poderes. A avaliação capta esses poderes em sua horizontali-dade (participação) e em sua verticalidade (individualização).

Objetiva-se com este trabalho potencializar o uso da Internet no Ensino Superior com foco na pesquisa, no domínio das tecnologias de infor-mação e comunicação, na autoria docente e discente, na produção e avaliação do conhecimento participativo e na construção de objetos de aprendizagem.

METODOLOGIAOptou-se pela metodologia de investigação denominada Webquest

para ser trabalhada na disciplina semipresencial SEF3F: Inovação, Avaliação e Indicadores de Qualidade do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Este seminário teve caráter expe-riencial e foi desenvolvido com número definido de alunos. Incluiu atividades presenciais e on-line. As atividades propostas pelos docentes e seus colabo-radores de caráter participativo centravam-se na escolha de indicadores para medir a qualidade social de universidades inovadoras.

Conteúdos e práticas propostos: discutir inovação e universidade do fu-turo; caracterizar inovação científica e tecnológica e inovação pedagógica nas Universidades contemporâneas; compreender a relação inovação, avaliação e uso de indicadores; selecionar e/ou construir indicadores de avaliação segundo critérios e funções e/ou modelos de universidade projetada. Programa (conte-údos): Universidade e inovação, Universidade contemporânea; Universidade e avaliação; Indicadores de avaliação: conceitos, tipos, seleção, metodologias Método de trabalho (principais atividades). A Webquest foi construída em três momentos denominados: Parte I – Parte II – Parte III. Cada parte com a estrutura de: Introdução; Tarefa; Processo; Desafios; Recursos; Avaliação; Cronograma; Curiosidades. Os momentos a distância foram realizados por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem – Rooda/UFRGS.

O desenvolvimento envolveu a organização dos conteúdos, as estraté-gias pedagógicas, a criação de um site e o uso dos recursos do ambiente virtual para as interações a distância. Dentro do contexto da Webquest, usaram-se metodologias distintas para a sua execução. As tarefas em grupo eram reali-zadas e postadas em suporte digital como pbwikis e blogs. Encaminhamentos, discussões e dúvidas eram realizadas no ROODA. E os cronogramas nas três etapas previam a conclusão da tarefa antes da aula presencial, em que eram socializadas as produções e divulgada a próxima etapa.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 65

Os encontros presenciais ocorreram sob a forma de seminários e aulas expositivas com mídias selecionadas. Os alunos assumiram de forma indivi-dual e grupal a responsabilidade pelas atividades on-line com assistência dos professores e de seus colaboradores. Colaboraram com a disciplina orientan-dos de doutorado e pós-doutorado cujas teses e trabalhos de estágio situam-se na definição de indicadores de avaliação.

Os procedimentos e/ou critérios de avaliação aconteceram da seguinte forma: a avaliação se deu a partir de critérios de participação nas atividades on-line e presenciais; houve realização das atividades de seleção, descrição de metodologias e considerações sobre o emprego de indicadores de avaliação para universidades inovadoras. A avaliação participativa possibilitou a autoa-valiação e avaliação coletiva.

A Webquest foi construída em um editor de textos HTML do sistema operacional Linux e disponibilizado em um servidor com a URL: http://www.kiron.unesc.net/futuro.

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66 LEITE, D. et al. - WEBQUEST: INOVAÇÃO, AVALIAÇÃO, INDICADORES DE QUALIDADE

RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES

Os resultados indicam que o uso da Internet no Ensino Superior com foco na pesquisa pode ser potencializado ao optar-se por metodologias na perspectiva da Webquest. A construção de um objeto de aprendizagem a partir de uma experiência mostra-se positiva, pois teoria e prática são revistos para melhores resultados futuros. A opção pela metodologia da Webquest colabora para práticas que envolvem investigação e o uso intenso da Internet na edu-cação. Esta Webquest constitui-se em um objeto de aprendizagem e está dis-ponível na web. A mesma está hospedada no repositório CESTA da UFRGS, contudo pretende-se hospedá-la em outros repositórios digitais nacionais e internacionais, posto que o tema central abarca conteúdos de interesse em diversos campos do conhecimento.

O uso da Internet no Ensino Superior com foco na pesquisa pode ser potencializado ao optar-se por metodologias consistentes que promovam maior domínio das tecnologias de informação e comunicação, autoria docente e discente na produção de conhecimento de forma participativa, incluindo fortemente a avaliação on-line com e para a construção de objetos de apren-dizagem. Busca-se incentivar outros docentes, com ou sem domínio da in-formática, a serem autores de Webquest criando ambientes de aprendizagem atualizados e inovadores.

A realização deste trabalho foi possível primeiramente pela partici-pação dos discentes da disciplina que entenderam e assumiram esta metodo-logia, mesmo aprendendo em tempo real os recursos de informática na reali-zação das tarefas. Pela colaboração do Laboratório de Informática Aplicada

– KIRON da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC que cedeu gentilmente espaço no seu servidor para hospedar o site da Webquest.

REFERÊNCIAS

ABAR. Celina A.A.P; LISBETE, Madsen Barbosa. Webquest, um desafio para o professor! Uma solução inteligente para o uso da Internet. São Paulo: Avercamp, 2008.DODGE, Bernie. Webquest.org. Disponível em: http://webquest.org/index.php. Acessado em: 30 junho 2011.LEITE, Denise et al. Avaliação Participativa on-line e off-line. Revista Avaliação. Campinas; Sorocaba, SP, v.12, n.3, p.445-460, set.2007.

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AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS DE UM CURSO DE

EDUCAÇÃO FÍSICA: A VISÃO DOS ALUNOS

Denise Grosso da Fonseca

MOVIMENTO INICIAL

A participação do curso de Educação Física na primeira edição do Enade – Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes, em

2004, coincidiu com minha passagem pela coordenação de um curso, gestão desenvolvida de 2003 a 2006, e com a entrada no programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos para realização do curso de doutorado.

A proposta desse exame como parte do Sinaes – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – se configurou numa questão de pesquisa, dadas as possibilidades de investigar o movimento decorrente da nova política de avaliação institucional implantada e a dinâmica dos processos avaliativos do curso mencionado. Nesse sentido, o estudo buscou compreender as rela-ções entre a Avaliação da Instituição, o Enade e a Avaliação na Instituição, a avaliação do processo de ensino-aprendizagem. A hipótese defendida neste trabalho foi de que há implicação das políticas públicas educacionais na con-figuração das políticas e ações institucionais. Logo, o Enade implicaria mu-danças substanciais nas práticas avaliativas do curso de Educação Física do IPA. Em que direção estas mudanças se dariam (se dão), em que perspectiva e profundidade, foi o que pretendi compreender ao longo desta investigação.

A metodologia central utilizada na pesquisa foi de natureza qualitativa através da análise de documentos e entrevistas semiestruturadas, individuais e grupais, realizadas com professores e alunos do referido Curso.

Para Molina Neto (1999), a pesquisa qualitativa caracteriza-se por uma série de procedimentos hermenêuticos que se propõem a descrever e in-terpretar as representações e os significados que determinado grupo social dá à sua experiência cotidiana. Neste caso, vou tratar da experiência avaliativa de um curso, utilizando dados coletados somente através da entrevista focal com um grupo de alunos que realizaram a prova do Enade em 2004 como ingressantes e que concluíram o curso em 2007/01 e 2007/02.

A entrevista de grupo focal, ou grupo de discussão, segundo Guimarães (2006), é uma estratégia investigativa semelhante a uma entrevista coletiva que objetiva explorar um foco para coleta de dados, com ênfase não nas pes-soas individualmente, “mas no indivíduo enquanto componente de um grupo” (2006, p. 157). É um procedimento muito vinculado a abordagens qualitativas de pesquisa.

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FONSECA, D. G. - AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS 68

A opção pelos alunos formandos de 2007 se deveu ao fato de terem re-alizado a prova como iniciantes em 2004 e, portanto, terem vivenciado a expe-riência do Enade em sua totalidade: o antes, entendido aqui como o processo de preparação para a prova, o durante, a prova em si, e o depois, as atividades desenvolvidas no curso, a partir da participação no exame. Além do mais, a condição de formandos, é um indicador de que já vivenciaram quase toda sua formação, podendo ter uma maior visão do curso.

Ao serem questionados sobre lembranças da experiência de realização da prova, bem como sobre o trabalho dos professores e importância do Enade, os alunos trouxeram para análise um pouco do que pensaram, sentiram, enfim, experimentaram ao realizarem a prova e, posteriormente, enquanto discentes do curso de Educação Física do IPA.

É importante colocar que diante do período que ficou entre a realiza-ção da prova – novembro de 2004 e a realização da entrevista – maio de 2007, muito tempo passou. Tempo que entendi necessário para que os processos de caminhada do curso estivessem em andamento, com possibilidades de serem mais bem avaliados. Esse aspecto fez com que no início da entrevista os alu-nos se mostrassem um pouco distantes e até “esquecidos” daquele aconteci-mento. Ao serem indagados sobre o que se lembravam do Enade, as manifes-tações iniciais se mostraram um tanto vagas, como se estivessem recordando enquanto falavam. Era como se estivessem pensando alto.

Depoimento 3: Era mais ou menos... o que eu me lembro que era para ver o desempenho dos estudantes conforme o seu curso...

Mas aos poucos, à medida que falavam, também iam exercitando a memória, e as ideias se tornavam mais claras, permitindo perceber a pertinên-cia do grupo focal como estratégia de coleta de dados, naquele momento, na circunstância do estudo. A possibilidade de troca entre os alunos foi ajudando a compor um quadro de ideias que aos poucos foi tomando forma através dos pontos mais marcantes evidenciados nas respostas dadas. Os dados coletados levaram a uma análise didático-pedagógica. Essa análise será descrita, inter-pretada e discutida através dos dois grandes polos deste estudo: a avaliação da instituição e a avaliação na instituição.

AVALIAÇÃO DA INSTITUIÇÃOEste polo se refere à análise dos elementos relacionados ao Enade, um

dos pilares do Sinaes. Ao serem questionados sobre o que lembravam e qual a sua percepção sobre o evento, dentre os aspectos mencionados destacaram-se o ranqueamento e a importância da prova.

O ranqueamento foi um dos aspectos que chamou a atenção dos alu-nos. Houve crítica a respeito do destaque dado aos resultados por parte dos professores do curso, evidenciando que mesmo não sendo propósito do Sinaes desencadear um ranqueamento entre instituições, tal situação ocorreu, sendo percebida pelos alunos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 69

Depoimento 5: Eu não gostei muito. Eles expuseram muito os resultados. Falavam: a UFRGS ficou em tal lugar... O IPA ficou em tal lugar...

Limana e Brito (2005) comentam que nas décadas de 60 e 70 do sécu-lo passado, as pesquisas sobre progressos educacionais se apoiavam em cri-térios quantitativos usando valores absolutos e padronizados, para ordenação das escolas através de listas que evidenciavam a posição dos cursos em um

“rank” como foi o caso do ENC – Exame Nacional de Cursos – o Provão. Nos debates realizados a partir da edição do Enade 2004, houve muita polêmica a respeito dessa questão, uma vez que a atribuição e publicação de notas de 1 a 5, aos cursos, e também a forma como foi feita, sem explicitar o processo como um todo, favoreceram uma leitura classificatória dos resultados e uma possível utilização mercadológica desses dados.

A respeito do ranqueamento, Cunha (2005) faz uma consistente crí-tica ao modelo avaliativo que sustentava o ENC, Provão, instituído pela Lei 9.131/95 e implantado em 1996, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. A vertente balizadora da avaliação universitária ali implantada era de orientação técnica, de natureza somativa, e apoiada em valores como pro-dutividade, eficiência, certeza e predição com função de controle. “Nessa orientação paradigmática, estariam os estudos reputacionais, conhecidos como ranking, conduzidos por grupos externos à universidade e o uso de indi-cadores quantitativos” (CUNHA, 2005, p. 21). A autora destaca que a política da época reforçava os mecanismos de controle pela avaliação.

Ao contrário, a política de avaliação implantada através do Sinaes se sustenta num marco emancipatório e formativo. Mesmo assim alguns fatos e a forma como os resultados são divulgados dão margem a que se façam leituras reduzidas à dimensão quantitativa que possibilita a hierarquização. Documentos emitidos em anos posteriores evidenciam uma possível mudança de rumo nas orientações do processo de avaliação da Educação Superior, fato que tem gera-do críticas apontando controvérsias entre a concepção e a operacionalização do Sinaes. Como exemplo, a Lei 11.552/2007, que trata do FIES – Financiamento da Educação Superior e vincula o direito a esse financiamento ao resultado no Enade.

Com relação à importância atribuída à prova, há uma percepção de que o exame permite uma autoavaliação e possibilita a busca da qualificação do aluno e do curso. Esse entendimento parece haver sido construído ao longo da própria entrevista, evidenciando que a estratégia de grupo focal vai aju-dando os participantes a compreenderem e melhor se apropriarem de algumas questões colocadas no debate.

AVALIAÇÃO NA INSTITUIÇÃOCom relação à avaliação na instituição, compreendendo a visão dos alu-

nos sobre implicações do Enade na avaliação do processo de ensino-aprendiza-gem, ao serem questionados sobre a influência do Enade no curso, os alunos citam

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FONSECA, D. G. - AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS 70

a preocupação dos professores com a fundamentação teórica de suas disciplinas, com leituras e realização de trabalhos que exigissem mais análise, interpretação, síntese, produção textual, desenvolvimento de habilidades de expressão oral, sen-do que a elaboração de resenhas foi um dos instrumentos mais comentados pelos alunos. Ou seja, o Enade traz uma implicação na metodologia das aulas.

Depoimento 6: Só na questão de mais teoria. No meu ver não tinha tanta te-oria no curso, não havia tanta pressão, o aluno não precisaria ler muito. Depois deste teste passou a ter mais teoria no curso, em várias cadeiras, inclusive nas práticas. Muita teoria, muito artigo para ler, muito trabalho, muitas resenhas.

Os alunos perceberam a intensificação de atividades que envolvem leitura, maior preocupação com conteúdo teórico, mesmo dos professores de disciplinas de práticas corporais. Segundo Marques (2006, p. 59), “devemos conceber o papel da teoria no escrever não como o de algo a ser confirmado ou negado, mas como provocação de um horizonte mais vasto, como o descor-tinar da imaginação levando à aventura de novas hipóteses e novos caminhos”.

Depoimento 3: Logo depois do Enade, os professores tentaram mudar com a questão das resenhas. O aluno precisava escrever, precisava ler mais, precisava ter uma oralidade melhor.

Após a análise do relatório com os resultados do Enade, houve uma preocupação da coordenação do curso de mobilizar o grupo de professores para um trabalho que contemplasse o desenvolvimento de competências exi-gidas na prova e a melhor qualificação da formação, com destaque em estraté-gias de trabalho que contemplassem as habilidades necessárias para a qualifi-cação dos processos de leitura e escrita.

Para Hoffmann (2001, p. 166), “a fala, a escrita, e toda a forma de expressão é manifestação do pensamento (sic) [...] ao expressar-se o aluno reorganiza suas ideias. A expressão do pensamento é, portanto, fator essen-cialmente construtivo e reflexivo”. Os professores, como os alunos referem, parecem realmente buscar o desenvolvimento do processo subjacente ao ato de escrever, a reorganização do pensamento, o refino das habilidades e com-petências necessárias para que se produza um texto, com clareza e sentido. Algo que não seja cópia ou reprodução, mas “escrever como provocação ao pensar, como o suave deslizar da reflexão, como a busca do aprender, princí-pio da investigação” (MARQUES, 2006, p. 28). Percebe-se, na fala dos alu-nos, uma preocupação com a elaboração e aplicação de aulas, e com a relação teoria e prática até mesmo nas disciplinas práticas.

Segundo Shigunov (2002), a dicotomia teoria e prática historicamente tem sido discutida em todas as áreas do conhecimento, fato que o motiva a discuti-la no âmbito do ensino da Educação Física. Comenta a permanência desse conflito a partir de duas visões que tem reforçado: a visão clássica que defende a contemplação do conhecimento teórico como raciocínio correto e a ciência moderna que superestimou a ciência e a técnica sem, contudo, fazer

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 71

uma síntese dos polos que as compreendem. Nesse sentido, destaco que a evolução desse campo de estudo – a Educação Física – tem evidenciado, ao longo dos anos, movimentos no sentido de superar, dentre outros, os dua-lismos corpo-mente e teoria-prática, indicando uma tomada de posição que contemple um trabalho mais integrador, mais reflexivo.

Sobre a avaliação, os alunos fazem referência às alterações nos modos de avaliar, utilizados pelos professores, levando a pensar que de certa forma houve um uso exagerado de uma estratégia de trabalho, no caso a resenha.

Depoimento 4: É aquilo que a gente falou, muitos trabalhos teóricos, chega-mos a fazer três resenhas por cadeira.

De acordo com Marconi e Lakatos (2001, p. 90), ”a resenha em geral é elaborada por cientistas que, além do conhecimento sobre o assunto, têm capacidade de juízo crítico. Também pode ser feita por estudantes; neste caso, como um exercício de compreensão e crítica”. Esta estratégia, portanto, ao de-safiar o exercício de análise, síntese e crítica, cumpre um papel significativo na busca da concretização dos objetivos de ensino.

Outro aluno faz referência à possibilidade de trocas a partir de traba-lhos em grupo. Segundo Veiga (1991), o ensino socializado em sala de aula, ou trabalho em grupo, começa a ser utilizado no movimento da Escola Nova, mais especificamente por influência dos psicólogos sociais que estudavam dinâmicas de grupo.

Para a autora, três princípios sustentam teoricamente o ensino socializa-do. O primeiro se apoia no campo da psicologia, em que a noção de grupo está relacionada a questões afetivas e de interação. O segundo princípio diz respeito ao campo sociológico, cuja premissa é a de que professores e alunos são seres contextualizados, que mesmo considerados em suas individualidades não podem ser vistos isolados de suas condições históricas, sociais, econômicas e culturais. O terceiro princípio decorre dos dois primeiros e implica a interação entre pro-fessor e aluno na busca de uma compreensão mais crítica da realidade social.

Ainda com relação à estratégia de trabalhos em grupo, Anastasiou e Alves (2004) lembram que o que caracteriza o grupo não é a simples junção de pessoas, mas a relação inter e intrapessoal que possibilita o desenvolvimento da inteligência relacional.

A prática de seminários também é citada como metodologia diferen-ciada. Há indicativo de que os modos de avaliar encaminham o aluno para um processo mais instigante, mais ativo, de busca e produção de conhecimento.

Depoimento 6: No início, antes do Enade, o instrumento era a prova escrita. Depois do Enade chegou-se à conclusão de que o aluno deveria produzir sozi-nho, trabalhos, discussão em grupo, seminários.

A menção dos alunos ao uso de seminários nas aulas reforça a presen-ça de variados procedimentos avaliativos. Veiga (1991) desenvolve estudo sobre seminário, em que apresenta aspetos significativos para análise dessa

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FONSECA, D. G. - AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS 72

estratégia de ensino-aprendizagem-avaliação. Inicialmente aborda a etimo-logia da palavra seminário, que se origina do latim seminariu, significando viveiro de plantas onde se fazem as sementeiras, decorrendo daí a ideia de que essa estratégia visa semear ideias ou favorecer sua germinação. A análise didática dessa estratégia revela sua importância desde que bem conduzida, o que parece ser reconhecido pelo aluno já citado, ao comentar que as diferentes estratégias citadas, dentre as quais o seminário, “começam a instigar o aluno a produzir conhecimento” (VEIGA, 1991).

Também a prova é citada, como trabalho avaliativo, mas não como único instrumento utilizado.

Demo (2004, p. 128) analisa o processo avaliativo através de provas ou de outros instrumentos, indicando que “se queremos avaliar o saber pensar, te-mos que buscar outros indicadores de aprendizagem, em particular aqueles que correspondem à dinâmica complexa não linear da aprendizagem reconstrutiva e do conhecimento disruptivo”.1 Comenta que não se trata de apenas evitar a prova, mas buscar alternativas que desafiem a inteligência adotando estratégias que visem a elaboração individual e coletiva. Hoffmann (1991) também se posiciona a respeito da realização de provas colocando que quando se discute a respeito desse instrumento de avaliação e quando se pretende romper com uma avaliação tradicional, o que se deve levar em conta é que esse não seja o único instrumento a ser utilizado e também como ele é elaborado.

Além das categorias relacionadas aos instrumentos de avaliação, os alunos fazem referência a critérios, destacadamente à forma de expressão do aproveitamento dos alunos através da nota.

Com relação às notas, citadas como critério de avaliação dos traba-lhos tanto individuais como coletivos, Luckesi (1998) discute-as com rela-ção à forma como são tratadas, muitas vezes, como se não tivessem nada a ver com a aprendizagem. Quando se restringem à simples relação numérica, substituindo a relação professor-aluno, com vistas ao melhor aproveitamento, reduzindo o processo de ensino-aprendizagem, à questão de aprovação ou reprovação. Assinala ainda o risco de que a nota passe a ser a “divindade ado-rada” tanto pelo professor como pelos alunos.

Entretanto, para Demo (2004), o problema maior não está em atri-buir notas ou conceitos, mas no uso que se faz destes elementos. A nota não precisa, necessariamente, ‘quantificar’ o aluno ou reduzi-lo a uma referência numérica, podendo ser um indicador indireto de qualidade.

As posições dos diferentes autores contrapõem distintos entendimentos sobre o significado da nota, podendo a mesma evidenciar uma visão quantita-tiva, relacionada à concepção tradicional de avaliação ou uma visão mais for-

1 Segundo Demo (2004), entende-se por conhecimento ‘disruptivo’, aquele rompedor, rebelde, capaz de confrontar, questionar, desconstruir. Cita a ‘teoria crítica’ (FREITAG, 1986; TORRES, 2003), em que conhecer é questionar, não apenas constatar, verificar, afirmar.

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mativa e mediadora do processo avaliativo. Na fala do aluno, citada a seguir, é possível verificar que o mesmo identifica a presença de diferentes concepções por parte dos seus professores. Chama atenção a relação feita pelo aluno sobre métodos mais quantitativos ou qualitativos, levando a pensar que os primeiros estariam mais ligados ao produto da aprendizagem e os segundos, ao processo.

Depoimento 6: Uns são mais qualitativos e outros mais quantitativos. Por exemplo: os quali estão mais preocupados com o processo desenvolvido. O aluno vai construindo a nota ao longo do semestre...

A par destas questões comentadas que evidenciam indícios de uma possível ruptura com um modelo didático-pedagógico mais tradicional e tec-nicista, decorrente da participação no Enade, em que a prática docente passa a contemplar estratégias de ensino e avaliação mais reflexivas, integradas e diversificadas.

MOVIMENTO FINALA realização do estudo cujo objetivo era verificar as influências do

Enade nos processos avaliativos de um curso de Educação Física permitiu constatar, num primeiro plano, a crítica feita ao ranqueamento, elemento con-traditório no contexto do Sinaes. Além desse aspecto, as falas dos alunos refe-rem que houve mudanças significativas na metodologia das aulas e na diver-sificação das estratégias de avaliação. Evidenciam que houve um movimento de qualificação dos processos didático-pedagógicos, no sentido de aulas mais reflexivas, com maior aporte de conhecimentos teóricos e com maior aproxi-mação entre teoria e prática; de avanços na avaliação, com a diversificação de instrumentos avaliativos e implementação de critérios mais qualitativos. A necessidade de compreender os diversos elementos metodológicos citados durante a entrevista encaminhou uma importante análise didático-pedagógica, permitindo resgatar diferentes procedimentos que permeiam e sustentam a prática docente, constituindo-se no marco referencial deste recorte do estudo.

As constatações referidas permitem concluir que houve implicações das políticas públicas nas ações institucionais e docentes e que a par das crí-ticas pertinentes às mudanças que vem ocorrendo o Enade pode se constituir num importante elemento de qualificação dos cursos.

REFERÊNCIASANASTASIOU, L. G.C.; ALVES, L.P. Processos de ensinagem na univer-sidade: pressupostos e estratégias de trabalho em aula. 3ª ed. Joinville, SC, 2004.BRASIL. Diretoria de Estatísticas e Avaliação da Educação Superior – DAES. Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes. Brasília, MEC, documento elaborado em 18/06/2004.

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FONSECA, D. G. - AS IMPLICAÇÕES DO ENADE NOS PROCESSOS AVALIATIVOS 74

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A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: UMA ANÁLISE DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO NO BRASIL

Alam De Oliveira CasartelliAna Cristina Benso da Silva

Bettina Steren dos SantosRafael Eduardo Schmitt

Rosana Maria GessingerMarilia Costa Morosini

A evasão estudantil pode ser definida como um fenômeno educa-cional complexo, que ocorre em todos os tipos de instituição de

ensino e afeta o sistema educacional como um todo. Entendida como a perda de alunos nos diversos níveis de ensino, a evasão gera consequências sociais, acadêmicas e econômicas, afetando o desenvolvimento humano de todas as nações. Diante de sua importância, o tema tem sido objeto de investigações em todo o mundo, as quais buscam aprofundar os motivos, as causas e os impactos provenientes do abandono dos estudantes nos sistemas de ensino.

No Brasil, a maioria dos estudos ligados à evasão está voltada para a Educação Básica, sendo ainda escassos os trabalhos realizados sobre a temá-tica na Educação Superior. No entanto, uma busca sistemática nos principais indexadores da produção acadêmica demonstra um crescimento na produ-ção de investigações e artigos científicos relacionados à evasão na Educação Superior, sobretudo, na última década.

Nesse contexto, o presente artigo apresenta uma revisão sobre o tema da evasão na Educação Superior no Brasil, realizada pelo grupo de pesquisa-dores da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) que participa do Projeto Alfa Guia (Gestión Universitaria Integral del Abandono). O projeto é coordenado pela Universidad Politécnica de Madrid, em parceria com a PUCRS e outras instituições associadas, reunindo vinte universidades da América Latina e Europa, envolvendo Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Uruguai, Venezuela, Espanha, Portugal, França e Itália.

O Projeto Alfa Guia visa estabelecer e gerenciar uma rede de Instituições de Ensino Superior com o intuito de investigar o abandono estu-dantil de forma profunda e abrangente, buscando difundir medidas eficazes para incrementar a permanência na Educação Superior. A ação pretende pro-duzir um avanço qualitativo, gerando conhecimento, procedimentos e recur-sos, além de compartilhar boas práticas voltadas à melhoria da eficiência e qualidade do sistema educativo, sobretudo nos países Latino-Americanos.

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76 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

A pesquisa realizada analisou a produção recente nos principais perió-dicos da área de Educação no país, privilegiando as revistas de estrato A1, A2, B1 e B2, segundo as normas de classificação postuladas pelo sistema Qualis1 da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

As buscas foram realizadas a partir do Portal de Periódicos da Capes, bem como através do sistema Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Em ambos os sistemas, foram rastreados mais de 200 (duzentos) periódicos, definindo a busca a partir dos termos “evasão”, “Educação Superior” e seus correlatos, tais como “abandono”, “permanência”, “fracasso” e “ensino supe-rior”. Além do contexto geográfico e da delimitação dos periódicos pesquisa-dos, estabeleceu-se a última década como período temporal, de forma que fo-ram selecionadas somente produções publicadas no período entre 2000 e 2011.

O resultado inicial da pesquisa revelou a existência de aproximada-mente 70 (setenta) trabalhos, segundo os critérios estabelecidos. Entretanto, uma análise de conteúdo sobre o material encontrado identificou que somente sete trabalhos atendiam à especificidade do tema, no contexto da Educação Superior. Esses sete trabalhos constituíram o corpus do presente artigo.

O processo de análise do material selecionado foi realizado com base em três categorias, construídas a partir do conteúdo encontrado nas produções. As categorias, definidas a priori foram: 1) conceitos de evasão; 2) resultados das investigações analisadas; e 3) causas e consequências da evasão.

Sob essas categorias, buscou-se descrever os principais aspectos apre-sentados em cada um dos trabalhos, possibilitando uma análise abrangente do fenômeno da evasão acadêmica no Brasil. Além do material selecionado, procurou-se enriquecer o referencial com algumas Teses e Dissertações reali-zadas sobre o tema, considerando, igualmente, a última década.

Por fim, apresenta-se uma síntese das principais conclusões possibi-litadas a partir dos trabalhos encontrados sobre evasão na Educação Superior brasileira. Identificam-se tendências e fragilidades na referida produção, além de se apresentar reflexões para futuros estudos sobre o tema.

CONCEITOS DE EVASÃOInúmeros conceitos de evasão foram encontrados nas produções ana-

lisadas. Em contextos mais abrangentes destaca-se o definido por Gaioso (2005) como sendo a interrupção no ciclo de estudos, em qualquer nível de ensino. Especificamente na Educação Superior o termo evasão é frequente-mente utilizado para referir a “perda” ou “fuga” de alunos da universidade

1 Qualis é um conjunto de procedimentos utilizados no Brasil pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para estratificação da qualidade da produção intelectual dos programas de Pós-Graduação. A partir desse sistema os principais periódicos são classificados segundo estratos indi-cativos da qualidade. Os indicadores variam de A1 – o nível mais elevado, até C – o nível mais baixo da qualidade da produção. Fonte: http://www.capes.gov.br

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 77

(KIRA, 2002). Baggi e Lopes (2011) também definem a evasão como a saída do aluno da instituição antes da conclusão de seu curso.

Polydoro (2000) chama a atenção para a distinção entre dois concei-tos: a evasão do curso – que consiste no abandono do curso sem a sua con-clusão – e a evasão do sistema – que reflete o abandono do aluno do sistema universitário. Cardoso (2008) refere-se a estes conceitos a partir de diferentes nomenclaturas: a evasão aparente – enquanto a mobilidade do aluno de um curso para o outro – e a evasão real – que se refere à desistência do aluno em cursar o Ensino Superior.

Silva Filho e colaboradores (2007) definem dois aspectos sob os quais a evasão pode ser analisada. A evasão anual média e a evasão total. A evasão anual média corresponde à porcentagem de alunos que, não tendo se formado, não realizaram matrícula no ano seguinte. Esse índice demonstra as perdas médias anuais em determinado curso, instituição ou conjunto de instituições. A evasão total corresponde à quantidade de alunos que, tendo entrado em determinado curso, IES ou sistema de ensino, não obtiveram diploma, consi-derando um determinado período.

Ainda sobre os conceitos e as possibilidades de análise, Silva Filho e colaboradores (2007) também pontuam que há diferentes mecanismos de análise da evasão, as quais podem ser mensuradas por instituição, conjunto de todas as instituições de um país, em determinado curso, em determinada região geográfica, por categoria administrativa (público/privado), por forma de organização acadêmica (universidades, centros universitários, faculdades, institutos superiores) e por áreas de conhecimento, entre os principais estudos possíveis de serem realizados.

RESULTADOS DAS INVESTIGAÇÕES ANALISADASA partir da análise no material encontrado sobre evasão nos princi-

pais periódicos brasileiros, possibilitou-se identificar algumas características. Dentre os sete trabalhos analisados, verificou-se um predomínio de investiga-ções de natureza qualitativa, sendo esta a orientação metodológica em cinco dos trabalhos analisados, enquanto que somente dois trabalhos basearam-se nos métodos quantitativos de pesquisa.

Quanto aos métodos e técnicas empregadas nas investigações, verifi-cou-se que dentre os trabalhos qualitativos, dois estudos utilizaram entrevistas em profundidade a partir de roteiro semiestruturado, outros dois trabalhos realizaram análise documental e um realizou uma análise bibliográfica sobre o tema da evasão. Nas pesquisas quantitativas, o principal método utilizado consistiu na estatística descritiva e, também, na proposição de modelo causal explicativo, a partir de técnicas de regressão e correlações.

Ao verificar a abrangência das pesquisas analisadas, constatou-se que a maioria realizou investigações sobre contextos específicos e locais, investi-

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78 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

gando aspectos relacionados à evasão em um determinado curso de graduação. Destaca-se que nos cinco trabalhos que realizaram estudos em um único curso de graduação, todos foram realizados em instituições públicas federais.

Apenas dois, dentre os trabalhos analisados, voltaram-se para contex-tos abrangentes, sendo um deles realizado a partir de dados de uma instituição pública, enquanto que o outro apresentou um estudo macroscópico da evasão no contexto brasileiro, a partir de dados oficiais divulgados nos Censos da Educação Brasileira.

Considerando os diferentes recursos metodológicos utilizados, pro-curou-se nessa categoria de análise descrever os principais resultados encon-trados nas investigações analisadas. Dessa forma, passa-se a descrever breve-mente cada um dos estudos, destacando os principais elementos norteadores, bem como seus resultados.

No primeiro trabalho analisado, Silva Filho et al. (2007) realizaram um consistente estudo da evasão no Ensino Superior brasileiro, a partir de da-dos oficiais do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Com base no período 2000-2005 se constatou que para o conjunto de todas as Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil a evasão anual média se manteve próxima de 22%, no período analisado.

A pesquisa demonstrou que esses dados variam significativamente segundo a categoria administrativa. Enquanto que nas instituições públicas a evasão anual média se situou em aproximadamente 12%, nas privadas o índice oscilou de 22 a 28% no período analisado (2000-2005), registrando-se a média de 26%. A análise também foi realizada segundo a forma de organi-zação acadêmica. Os autores evidenciaram que as Universidades detêm os menores índices de evasão, os quais oscilaram entre 16 e 22%, estando a mé-dia estabelecida em 19%. A mesma média geral foi verificada para os Centros Universitários, mesmo que a variação no período tenha se diferenciado entre 9 e 25%. Os maiores índices de evasão segundo a organização acadêmica foram verificados para as Faculdades, nas quais se percebeu uma variação entre 28 e 33%, registrando-se a média de 29%.

Nesse mesmo estudo, os autores buscaram correlacionar os índices de evasão com a relação candidato por vaga em alguns cursos. Como conclusão verificou-se uma correlação negativa entre os índices de evasão e a demanda por curso, isto é, quanto maior a densidade candidato/vaga nos concursos ves-tibulares, menores são os índices de evasão verificados.

Em outro estudo, Baggi e Lopes (2011) conduziram uma recente re-visão bibliográfica sobre evasão e avaliação institucional no Ensino Superior brasileiro. A pesquisa foi realizada no Banco Digital de Teses e Dissertações (BDTD) a partir dos termos “evasão”, “ensino superior”, “avaliação institu-cional” e termos correlatos.

Dentre os 59 resultados encontrados para a evasão, apenas quatro den-tre os trabalhos encontrados estavam voltados para o Ensino Superior. Esse

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 79

fato, por si só, mostra que, embora se observe um crescimento na produção acadêmica sobre evasão no Ensino Superior, essa produção é, ainda, escassa.

Dentre as teses e dissertações analisadas pelas autoras tem-se a tese de Polydoro (2000) que investigou o trancamento de matrícula e as condições envolvidas na saída e no retorno do estudante à instituição. A pesquisa foi realizada em uma instituição privada na cidade de Campinas/SP. O estudo apontou que os acadêmicos, de maneira geral, relacionaram o trancamento de matrícula a uma possibilidade de manutenção do vínculo com a IES, de forma a oportunizar o reingresso, encarando a situação como algo transitório. Entretanto, os resultados da análise permitiram concluir que somente 9,65% dos alunos que se enquadraram em situação de trancamento ou cancelamento realizaram rematrícula, considerando um período de cinco anos.

Também se destaca a dissertação apresentada por Cardoso (2008) que analisou os efeitos das políticas de cotas na Universidade de Brasília (UnB), sob o ponto de vista do rendimento e evasão dos alunos cotistas. O plano de cotas, instituído nessa universidade em 2003, busca a integração social, étnica e racial por meio da garantia de vagas para negros e indígenas (cotistas) nas universidades públicas. Considerando o período 2004-2006, o estudo inves-tigou o impacto do programa de cotas sob o rendimento e evasão dos alunos cotistas.

Dentre os principais resultados, a dissertação apontou que os cotistas tendem a se candidatar em maior proporção para os cursos de menor prestí-gio social. O desempenho médio dos cotistas não diferiu substancialmente dos não cotistas entre os cursos de menor prestígio. Entretanto nos cursos de maior prestígio os alunos cotistas obtiveram rendimento significativamente inferior, quando comparados com os alunos não cotistas.

Outro importante aspecto consistiu na verificação de que os cotistas evadem em proporções menores que os não cotistas e, além disso, cotistas que trabalhavam e estavam indecisos sobre a escolha do curso, no momento da inscrição, evadiram em maior proporção que os cotistas que não trabalhavam ou estavam absolutamente decididos quanto à escolha do curso.

Em outro enfoque investigativo, Andriola e colaboradores (2006) apresentaram um importante estudo da evasão estudantil a partir da percepção de docentes e coordenadores de curso de graduação. Participaram do estudo 52 docentes e 21 coordenadores de cursos da Universidade Federal do Ceará. A pesquisa foi realizada através de entrevistas em profundidade, a partir de um questionário semiestruturado abordando diferentes aspectos, relacionados com a gestão e infraestrutura no contexto investigado. A análise dos dados deu-se por meio da análise de conteúdo, descrevendo-se a ocorrência dos fa-tos observados.

Os resultados demonstraram que os docentes investigados possuem opinião favorável ao resgate da função do professor orientador para auxilia-rem os alunos na superação de suas dificuldades durante os cursos de gradu-

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80 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

ação, situação que, segundo eles, influi de forma decisiva sobre o abandono/permanência do aluno no curso de graduação. Os participantes opinam sobre a necessidade das coordenações de curso oferecerem informações mais precisas e relevantes sobre os cursos, para todos os potenciais candidatos aos cursos de graduação. Os docentes e coordenadores enfatizam a necessidade de me-lhorias na infraestrutura física do contexto investigado, com atenção especial às condições das salas de aula e laboratórios, como aspectos essenciais para a retenção dos alunos.

Nessa mesma investigação, Andriola e colaboradores (2006) também apresentam dados de uma investigação anteriormente realizada com 86 estu-dantes evadidos. Nesse estudo os autores propuseram a elaboração de um mo-delo causal explicativo para a intenção dos alunos evadidos em cursar outro curso superior. A partir do método de regressão linear múltipla, a intenção de voltar a cursar outro curso após evadir relacionou-se com outras quatro variá-veis independentes, de alto valor explicativo: a) grau de informação acerca do curso universitário; b) opiniões acerca das limitações do curso abandonado; c) satisfação com o abandono; e d) contribuição econômica familiar.

Os resultados da análise sobre o modelo causal demonstraram que a va-riável “grau de informação acerca do curso universitário” foi a que melhor expli-cou a intenção do aluno em retornar para outro curso de graduação. Destaca-se que a variável “opiniões acerca das limitações do curso abandonado” também apresentou uma significativa contribuição para o modelo causal. Já as variáveis

“satisfação com o abandono” e “contribuição econômica familiar”, embora te-nham composto o modelo causal apresentado, demonstraram menor contribui-ção explicativa para a intenção do aluno em retornar para outro curso superior.

Villas Bôas (2003) apresentou um estudo realizado no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com o objetivo de investigar as relações entre as reformas curriculares realizadas no referido curso com as taxas de evasão percebidas no mesmo, ao longo de sua história. A investigação se baseou em análise documental e dados institucio-nais no período entre 1939 e 1988. O estudo demonstrou que o índice médio de evasão no curso se aproximou dos 50%.

Os resultados da investigação permitiram evidenciar que as reformas curriculares ocorridas no curso de ciências sociais da UFRJ não influem sobre as taxas de evasão dos estudantes. Considerando-se o período analisado, a im-plementação do Programa de Iniciação Científica do Laboratório de Pesquisa Social (LPS) foi o aspecto verificado que mais contribui para a retenção dos alunos na história do curso analisado. Segundo a autora, o LPS não só man-teve alto índice de alunos no curso até o término da graduação, como propor-cionou uma formação acadêmica que permitiu à maioria de seus egressos a possibilidade de se dedicar a atividades profissionais voltadas para as ciências sociais. Dessa forma, a autora destaca a iniciação científica como uma ferra-menta imprescindível de controle ao abandono do curso.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 81

Outras investigações foram conduzidas em contextos locais e especí-ficos, destacando-se dois trabalhos relacionados com o curso superior em quí-mica. Dentre eles, Cunha, Tunes e Silva (2001) buscaram analisar as razões que levaram os alunos que ingressaram no curso de química da Universidade Federal de Brasília (UFB) a saírem do curso antes da sua conclusão. A me-todologia da investigação orientou-se em duas partes: a primeira consistiu em identificar a trajetória acadêmica dos alunos evadidos, enquanto que a segunda buscou entrevistar 23 alunos selecionados aleatoriamente, dentre um universo de 320 alunos evadidos.

O período de abrangência da pesquisa compreendeu os anos entre 1990 e 1995. As entrevistas aconteceram a partir de um roteiro semiestrutura-do, que contemplou três temas: a) questões relacionadas à escolha do curso e ingresso; b) questões relacionadas às experiências durante o curso; e c) ques-tões relacionadas à saída do curso.

Em síntese, a pesquisa possibilitou identificar que as principais razões que levaram os estudantes a abandonar se mantiveram muito relacionadas com os aspectos da vida pessoal, antes mesmo do ingresso na universidade. Dessa forma, o não atendimento das expectativas que os alunos tinham quanto ao curso antes do ingresso se mostrou um fator muito presente.

Verificou-se entre os alunos evadidos uma elevada ocorrência de re-provação e repetência em algumas disciplinas do curso. Por fim, o estudo concluiu que o abandono na universidade é consequência dos problemas en-contrados durante o curso e que os sujeitos investigados manifestam-se muito mais em teor de protesto quanto à percepção de ineficiência do sistema uni-versitário, do que com relação ao fracasso pessoal na universidade.

Em outra investigação relacionada à área de química, Mazzetto e Carneiro (2002) investigaram o perfil socioeconômico, a evasão e o desempe-nho de alunos do curso de química da Universidade Federal do Ceará (UFC). Analisando uma amostra de 191 alunos, o estudo envolveu análise documental e coleta de dados da instituição no período entre 1995 e 2000. Os dados foram analisados quantitativamente a partir de estatísticas descritivas.

Além dos resultados específicos quanto ao perfil dos estudantes do curso de Licenciatura em Química da UFC, o estudo não possibilitou determi-nar qualquer relação entre o perfil socioeconômico dos alunos com a evasão. Quanto ao desempenho dos estudantes, verificou-se que os alunos com for-mação secundária na rede privada de ensino, especialmente as estudantes do sexo feminino, demonstraram desempenho superior à média geral observada. Foi possível verificar um alto índice de repetência entre os alunos evadidos, de forma que os autores sugerem uma correlação entre evasão e repetência nas disciplinas. Os resultados apontaram, ainda, que entre as causas da evasão no curso estudado, as que demonstraram maior frequência foram a insatisfação com o curso, os conflitos quanto à escolha adequada do curso e a decepção com a universidade.

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82 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

No último dentre os trabalhos analisados, Abbad, Carvalho e Zerbini (2006) buscaram identificar as variáveis explicativas da evasão em cursos a distância. Analisando uma amostra de 19.849 estudantes no ano de 2002, os autores realizaram uma análise de regressão logística, visando identificar, entre algumas variáveis da clientela do curso, quais explicavam os índices de evasão.

A partir do modelo explicativo testado, a pesquisa indicou que os alu-nos que concluem o curso via Internet possuem características demográficas e padrões de acesso aos ambientes virtuais do curso bastante diferenciados daqueles alunos que evadem. Verificando-se uma taxa de evasão de 44,7%, os resultados mostram que os alunos não concluintes são aqueles que tendem a não utilizar os recursos de interação (chat, mural de notícias, troca de mensa-gens, interação como o tutor e colegas).

Como sugestão, os autores enfatizam a necessidade de incluir variá-veis motivacionais como, por exemplo, o valor atribuído ao curso pelo par-ticipante, para melhor integrar os modelos que buscam predizer as causas da evasão. Além de variáveis motivacionais, variáveis cognitivas, tais como es-tratégias, estilos e hábitos de estudo se fazem necessárias para testar possíveis interações em modelos multivariados explicativos da evasão.

CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS DA EVASÃO

A partir dos estudos selecionados, também se procurou elencar as prin-cipais causas para a evasão na Educação Superior. A esse respeito, Silva Filho et al. (2007, p. 643) pontuam que as instituições públicas e privadas dão como principal causa da evasão a falta de recursos financeiros para o estudante pros-seguir nos estudos. É, também, o que o estudante declara quando perguntado sobre a principal razão por ter evadido. No entanto, verifica-se nos estudos existentes que essa resposta é uma simplificação, uma vez que as questões de ordem acadêmica, as expectativas do aluno em relação à sua formação e a própria integração do estudante com a instituição constituem, na maioria das vezes, os principais fatores que acabam por desestimular o estudante a priori-zar o investimento de tempo ou financeiro, para a conclusão do curso.

Baggi e Lopes (2011) mencionam as causas da evasão apontadas por Braga, Peixoto e Bogutchi (2003), os quais afirmam que a evasão é resultado da decisão do aluno ou de uma combinação de fatores sociais, econômicos e pessoais, quer seja a necessidade precoce de ingresso do aluno no mercado de trabalho, ou as dificuldades encontradas em razão das condições desfavorá-veis do currículo, dos docentes e da organização da instituição.

Os mesmos autores também salientam as causas apontadas por Polydoro (2000), o qual reporta os principais motivos apresentados pelos alunos no mo-mento do trancamento da matrícula, conforme segue: suporte financeiro (50%), condições relacionadas ao trabalho (17,69%), dificuldade de integração acadê-mica (16,54%) e baixo grau de compromisso com o curso (12,69%).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 83

Cardoso (2008) aponta, além dos fatores econômicos e baixo desem-penho acadêmico, a falta de identidade com o curso; escolha equivocada da profissão; desencanto com a universidade; baixa demanda pelo curso; baixo prestígio social do curso elegido.

Andriola et al. (2006, p. 366-7), com base na opinião de Tinto (1975 apud ANDRIOLA, 2006), refletem acerca da trajetória dos estudantes na uni-versidade:

O jovem chega à universidade com intenções, objetivos e compromissos predefinidos, que variam em função de diversas características. [...] Com o tempo, o aluno passa por uma série de interações com o ambiente acadêmico e social da instituição educacional, o que lhe permite, assim, redefinir suas intenções e seus compromissos, o que, em última instância, leva-o a persistir ou a evadir-se.

Os autores também supõem que:A decisão de evadir-se ou de persistir no curso é um processo psicossocial,

no qual as opiniões influenciam as atitudes e estas, por seu turno, influenciam as decisões. Sendo assim, a permanência ou a evasão do estudante é função das suas atitudes, da sua adaptação à universidade, e de fatores externos, como por exemplo: aprovação da família, encorajamento dos amigos, qualidade da instituição, situação financeira e oportunidade para transferir-se para outra ins-tituição (ANDRIOLA et al., 2006, p. 367).

A pesquisa realizada por esses autores com alunos evadidos da UFC, evidenciou os seguintes motivos para o abandono na universidade (ANDRIOLA et al., 2006): incompatibilidade entre horários de trabalho e de estudo (39,4%), aspectos familiares (como por exemplo, compromisso com filhos menores) e desmotivação com os estudos (20%), precariedade das con-dições físicas do curso ou inadequação curricular (10%).

Cunha, Tunes e Silva (2001) destacam os aspectos relacionados à vida pessoal do estudante antes mesmo do momento do ingresso. Segundo eles, a expectativa quanto ao curso antes do ingresso consiste em um fator muito importante para a evasão/permanência do aluno na universidade. Os autores ainda salientam que a reprovação e os altos índices de repetência se relacio-nam diretamente com a evasão. Apesar disso, a pesquisa realizada por eles frisou que os estudantes dificilmente atribuem as causas da evasão ao seu próprio desempenho, sendo mais frequente o relato da ineficiência do curso e da universidade, segundo a opinião dos estudantes evadidos.

Cabe ainda destacar a concordância de Mazzeto e Carneiro (2002) quanto à correlação entre altos níveis de repetência e reprovação nas discipli-nas com a ocorrência da evasão. Esses autores também apresentam posição consensual com os demais trabalhos ao mencionarem a insatisfação com o curso, os conflitos quanto à escolha adequada do curso e a decepção com a universidade, enquanto aspectos diretamente relacionados com a evasão.

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84 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

A partir do conteúdo encontrado nos sete trabalhos, foi possível propor uma síntese dos fatores associadas à evasão, segundo a ocorrência nas pro-duções analisadas. Dessa forma, as principais causas da evasão encontradas foram:

• Aspectos financeiros relacionados à vida pessoal ou familiar do estudante.

• Aspectos relacionados à escolha do curso, expectativas pre-gressas ao ingresso, nível de satisfação com o curso e com a universidade.

• Aspectos interpessoais – dificuldades de relacionamento com colegas e docentes.

• Aspectos relacionados com o desempenho nas disciplinas e tarefas acadêmicas – índices de aprovação, reprovação e re-petência.

• Aspectos sociais, como o baixo prestígio social do curso, da profissão e da universidade elegida.

• Incompatibilidade entre os horários de estudos com as demais atividades, como, por exemplo, o trabalho.

• Aspectos familiares como, por exemplo, responsabilidades com filhos e dependentes, apoio familiar quanto aos estudos etc.

• Baixo nível de motivação e compromisso com o curso.

Além de apontar as principais causas da evasão, segundo os trabalhos analisados nesse artigo, essa categoria de análise também buscou evidenciar o quanto essas produções discutem as consequências produzidas pela evasão na Educação Superior.

De um modo geral, percebeu-se que embora a maioria dos trabalhos mencione que a evasão ocasiona uma série de consequências e impactos, ne-nhum dentre os trabalhos analisados se deteve especificamente em aprofundar essas relações. Dentre os trabalhos analisados, o maior esclarecimento quanto às consequências do fenômeno da evasão foram apresentados por Silva Filho e colaboradores (2007, p. 642), conforme segue:

As perdas de estudantes que iniciam, mas não terminam seus cursos são desperdícios sociais, acadêmicos e econômicos. No setor público, são recursos públicos investidos sem o devido retorno. No setor privado, é uma importante perda de receitas. Em ambos os casos, a evasão é uma fonte de ociosidade de professores, funcionários, equipamentos e espaço físico.

Com isso, percebe-se o quanto os estudos sobre evasão se fazem ne-cessários no contexto brasileiro, não só no tocante à identificação de índices e causas, mas também na mensuração das consequências que o fenômeno acarreta para o sistema universitário brasileiro.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 85

CONSIDERAÇÕES FINAISO presente artigo teve por objetivo realizar uma revisão da produção

de conhecimento sobre evasão relacionada ao contexto universitário brasilei-ro, no período 2000-2011. A análise realizada verificou que a produção exis-tente sobre o tema é, ainda, bastante escassa, situação que foi duplamente verificada, tanto nos principais periódicos indexados no sistema Qualis da Capes quanto no banco de teses e dissertações.

Dentre os poucos estudos encontrados sobre o tema, predominam as investigações de natureza qualitativa, o que reflete a tendência da produção de conhecimento no campo da Educação no Brasil. Poucos são os estudos quan-titativos e, ainda, dentre esses, prevalecem análises estatísticas simplificadas, o que minimiza as potencialidades desse método de pesquisa, o qual oferece alto poder de detecção, ampliação e massificação de fenômenos complexos, como é o caso da evasão.

Outro aspecto a considerar reside na abrangência das pesquisas en-contradas no período analisado. Mesmo que se observe qualidade e relevância nessas pesquisas, verifica-se que a maioria dos estudos realiza investigações em contextos locais, investigando a evasão em um único curso de graduação. Dessa forma, exceto pelos poucos trabalhos verificados, carecem investiga-ções que se detenham em traçar um panorama abrangente acerca da evasão na Educação Superior brasileira.

A partir da análise realizada, possibilitou-se identificar uma diversida-de de conceitos relacionados à evasão. Observou-se que, mesmo que os auto-res utilizem diferentes nomenclaturas, existe um entendimento comum acerca do significado da evasão no contexto do Ensino Superior. Quanto às prováveis causas da evasão, também foi possível verificar convergências entre os auto-res, quanto aos diferentes fatores associados ao abandono e permanência na universidade.

Por parte dos estudos analisados, há um consenso de que os fatores econômicos não são os únicos responsáveis pelo abandono nos cursos de gra-duação. De forma geral, observou-se um grande destaque para os fatores pes-soais, relacionados com a escolha do curso, com as expectativas pregressas ao ingresso, com o grau de satisfação com o curso e com a instituição, além das questões associadas ao desempenho, como os principais fatores relacionados com a evasão. Assim, os estudos apontam o próprio aluno como o principal responsável pela decisão de evadir ou permanecer no Ensino Superior.

Por fim, considerando-se a realidade brasileira, na qual se detecta a ca-rência de produção e as dificuldades de obtenção de um conhecimento abran-gente acerca da evasão acadêmica, faz-se necessário explorar as relações existentes na literatura a partir de outras esferas do conhecimento construído sobre a Educação Superior. Dessa forma, o entendimento da evasão não pode estar dissociado dos condicionamentos sociais, políticos e socioeconômicos do contexto a ser analisado.

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86 CASARTELLI, A. O. et al. - A EVASÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

REFERÊNCIAS

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IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL COMO ESTRATÉGIA DE MUDANÇA INSTITUCIONAL NO

CAMPO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL UNIVERSITÁRIA E A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL

Inês Amaro

A profundidade e velocidade das mudanças na primeira década do novo século, impulsionadas pelo vertiginoso avanço científico e

tecnológico na sociedade do conhecimento e da informação, desafiam as or-ganizações à árdua tarefa de repensar sua legitimidade social e rever as bases que até então sustentaram seu desenvolvimento, seu progresso e sua razão de ser, no contexto das mudanças paradigmáticas e das tensões entre modernida-de e pós-modernidade (MORIN, 2005; SANTOS, 2007).

Pereira (2010) sintetiza a culminância de características muito par-ticulares na virada de século, entre elas o avanço do neoliberalismo e a pro-liferação de discursos que ecoam “em todos os cantos do planeta”, como a sustentabilidade, a cidadania e a responsabilidade social, sinalizando algumas contradições da nova forma de sociabilidade, por exemplo, a coexistência en-tre políticas de inclusão e práticas de exclusão, ou mesmo a ilusão de progres-so e de acesso, ao lado da violência contra os direitos humanos e sociais.

O rebatimento dessas questões no campo da Educação Superior, seja na dimensão do ensino, da pesquisa e da extensão e especialmente na gestão e na avaliação institucional, são ainda lugar de inquietação e carecem não so-mente de pesquisas como também do amadurecimento de políticas e práticas institucionais.

Um conjunto de iniciativas internacionais lideradas por organizações como a OCDE e a Unesco, as quais assumem um papel de orientadores na construção de paradigmas para Educação Superior, aponta para a construção do conceito de qualidade na perspectiva da educação para o desenvolvimen-to sustentável (MOROSINI, 2009) e coloca-se na agenda das Instituições de Ensino Superior (IES) o papel do conhecimento como fundamento do desen-volvimento sustentável da sociedade e as suas contribuições para a demo-cracia e a superação das grandes questões sociais e ambientais. Referência fundamental para o tema encontra-se também na Década das Nações Unidas da Educação para o Desenvolvimento Sustentável 2005-2014, da Unesco.

No Brasil, a Conferência Nacional de Educação de 2010 aponta para os desafios da construção de uma educação baseada nos direitos humanos e na democracia. No que se refere ao arcabouço legal, são relevantes as mu-danças a partir da Lei n° 10.861, de 14 de abril de 2004, que cria o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes. Entre seus objetivos

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AMARO, I. - IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL COMO ESTRATÉGIA88

e dimensões, o Sinaes inclui a responsabilidade social em relação à inclusão social, ao desenvolvimento econômico e social e à defesa do meio ambiente, da memória cultural, da produção artística e do patrimônio cultural das IES, respeitando a identidade institucional e a autonomia de cada organização.

Considerando a tarefa prioritária da Educação Superior na crise civili-zatória a necessidade de construção de novos paradigmas para uma sociedade planetária sustentável, compete às IES revisar suas missões para equilibrar o conhecimento economicamente pertinente como conhecimento humano e social (SEGRERA, 2010). No contexto das universidades comunitárias, per-cebe-se que o compromisso social das IES e a defesa de ideais humanísticos para a construção de uma sociedade justa e democrática, no âmbito da respon-sabilidade social, provocam a reflexão sobre as formas históricas de realiza-ção desse compromisso, exigindo atualização e inovação.

Conforme constatado entre instituições do Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (COMUNG), a falta de precisão conceitual sobre te-mas como compromisso social, responsabilidade social e assistência social ficou evidenciada na análise prévia de documentos e de projetos institucio-nais dessas instituições (OLIVEIRA et al., 2009). Constatamos uma apreen-são recente desses conceitos e a trajetória a percorrer para a apropriação dos mesmos a fim de responder a demandas e necessidades de diferentes ordens (SILVA, 2007). A responsabilidade social e a sustentabilidade, como catego-rias que expressam uma síntese de complexas variáveis e determinações do capitalismo mundial, convidam a universidade à reflexão crítica, à discussão interna, ao alinhamento de concepções e ao desenvolvimento de um modelo de gestão sustentável coerente com a identidade, a cultura e o posicionamento institucional de cada IES.

Na experiência como docente e gestora na Educação Superior, obser-va-se um conjunto de ações e iniciativas cotidianas nas universidades voltadas a aprofundar o debate, revisar, sistematizar, consolidar e/ou modificar políti-cas e práticas, bem como criar e inovar, de forma transversal, nos âmbitos do ensino, da pesquisa, da extensão e da administração, num profícuo processo de construção e implantação de modelos de gestão e educação sustentáveis. Entretanto, a imprecisão conceitual vigente, o tempo histórico recente e as mudanças institucionais que a responsabilidade social e a educação para o desenvolvimento sustentável na Educação Superior solicitam, provocam tam-bém resistências e o risco de uma apreensão reducionista, pragmática ou par-cial das demandas, implicando iniciativas dispersas e/ou isoladas dentro das universidades.

Considerando a necessária articulação entre práticas acadêmicas e práticas gerenciais e o papel relevante da avaliação institucional na gestão das universidades, cabe questionar em que medida os processos avaliativos no contexto da Educação Superior estão impulsionando e captando os aspectos centrais dessas mudanças ou apenas indicam se as instituições estão adaptadas

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 89

e instrumentalizadas para o sistema político-econômico vigente (MOROSINI, 2009). O caráter inovador desse momento histórico torna relevante analisar, compartilhar e disseminar experiências capazes de gerar novos conhecimen-tos e criar sinergias e círculos virtuosos de aprendizagem institucional, com potência para impulsionarem as desejadas e necessárias mudanças.

Esse é o propósito do presente artigo, que se constitui em um relato de experiência de implantação de uma política de desenvolvimento social em uma universidade gaúcha, confessional e comunitária, analisando alguns elementos que constituem o caminho percorrido na incorporação de princí-pios e práticas de responsabilidade social. Pretende-se destacar aqueles que possam ser indicativos de mudanças institucionais em curso nesse campo e suas relações com a avaliação institucional, assim como contribuir para o avanço do estudo da temática no ambiente universitário e lançar reflexões que impulsionem ao aprofundamento e atualização dos compromissos das Instituições de Ensino Superior (IES) com a promoção de princípios éticos que sustentem uma nova compreensão do desenvolvimento humano social, bem como oferecer possíveis insumos para qualificação dos processos de avaliação institucional.

PERCORRENDO CONCEITOS E PERSPECTIVAS DE ANÁLISEOs temas da Responsabilidade Social da Universidade (RSU) e da

Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) implicam repensar os sentidos de ciência e tecnologia e, portanto, de investigação e de formação profissional, com base em princípios de corresponsabilidade, justiça e equi-dade (GOERGEN, 2008). Assim, a educação, como um sistema aberto, é uma das principais forças de transformação para a mudança de mentalidades e for-mação de uma cultura evolutiva consciente, ecológica e socialmente sustenta-da (MORIN, 2003).

Entendemos a sustentabilidade, ou o adjetivo sustentável, a partir do conceito disseminado no documento Nosso Futuro Comum (RELATÓRIO BRUNDTLAND, 1987), como uma categoria que expressa premissas, atribu-tos, características ou mesmo condições de uma organização, de uma comu-nidade ou de uma sociedade, que se empenha, em seu processo de desenvol-vimento, em criar condições materiais concretas para existir no presente, com uma tal qualidade de interação dinâmica e com coerência entre dimensões culturais, ambientais, econômicas e sociais da vida, que viabilize a satisfação de necessidades e aspirações atuais, preservando recursos e potencialidades para manter a sua condição de existência futura.

Se originalmente o termo sustentabilidade foi e muitas vezes ainda é utilizado para expressar a sustentabilidade ambiental, diferentes autores já o vêm compreendendo em mais amplas dimensões. Na visão de Sachs (2008)

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AMARO, I. - IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL COMO ESTRATÉGIA90

a sustentabilidade social é prioritária, pois além de ser a própria finalidade do desenvolvimento, um colapso social pode ainda ocorrer antes mesmo da catástrofe ambiental.

Assim, ao mesmo tempo em que as organizações empresariais repre-sentam um modelo de desenvolvimento focalizado no crescimento econômico que se gestou em uma lógica dissociada das questões do desenvolvimento social e ambiental do ponto de vista da justiça social e da ecologia, por outro são também estas mesmas organizações que, no cenário contemporâneo, têm participado ativamente ou mesmo assumido liderança no trato destas contra-dições, ainda que comandadas pela lógica da competitividade global e neces-sidades de reinvenção/manutenção do sistema capitalista.

As universidades têm sido atravessadas por essas mudanças em todas as suas dimensões. No âmbito da Responsabilidade Social Universitária, as concepções apontam para a perspectiva dos impactos e dos princípios e pro-cessos, ambas sustentadas por um enfoque que inclui os quatro eixos: ensino, pesquisa, extensão e gestão. Vallaeys (2006) define a responsabilidade social das universidades como uma política de qualidade ética nas atividades da co-munidade universitária, através de uma gestão responsável dos serviços edu-cativos, cognitivos, laborais, sociais e ambientais, em um diálogo participati-vo com a sociedade, para promover o desenvolvimento humano sustentável.

Na visão da GUNI (Global University Network for Innovation), a responsabilidade social universitária é a capacidade que tem a universidade, como instituição, de difusão e colocação em prática de um conjunto de princí-pios e valores que devem sustentar os projetos pedagógicos e de desenvolvi-mento institucional, por meio de quatro processos principais: gestão, docência, investigação e extensão. Os princípios e valores abrangem os planos pessoal (dignidade da pessoa, liberdade e integridade), universitário (compromisso com a verdade, excelência, interdependência e transdisciplinaridade) e social, que contempla o bem comum e a equidade social, o desenvolvimento sus-tentável e meio ambiente, a sociabilidade e solidariedade para a convivência, a aceitação e apreço à diversidade e a cidadania, democracia e participação (MOROSINI, 2008).

A par das conceituações citadas, observa-se que na realidade das uni-versidades persistem equívocos e imprecisões na leitura e compreensão dos significados dessas novas demandas. Calderon (2006) aponta para a fragilida-de de entendimento do conceito da responsabilidade social universitária nas IES e os desafios de sua implantação como modelo de gestão de ética e trans-parência. A RSU não pode ser confundida com a mera execução de projetos socioambientais nas comunidades, nem com meras estratégias apelativas de marketing ou maquiagem social preparada para os avaliadores.

Caminhar em direção a um modelo de desenvolvimento sustentável requer o avanço da ciência, investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias inovadoras, bem como estratégias de planejamento e gestão

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pautadas em lógicas antes impensadas, já que a questão do uso dos recursos naturais parecia ilimitada e a pobreza e as desigualdades sociais, para muitos, seriam solucionadas pelo crescimento econômico. Requer, também, desenca-dear processos de formação, seja em espaços de educação formal, seja em es-paços informais, para o desenvolvimento dessa nova consciência e de valores e competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) que produzam novos sentidos, necessidades e aspirações de forma a tecer uma rede social e cultural em micro e macroescala, que constitua um processo de produção dessa sus-tentabilidade da vida e do desenvolvimento, constantemente retroalimentado. Tal afirmação remete ao fato de que “[...] o problema da consciência (ética da responsabilidade) supõe uma reforma das estruturas da própria consciência (autoética)” (MORIN, 1982, apud PENA-VEGA, 2005, p. 20).

A IMPLANTAÇÃO DE UMA POLÍTICA DE DESENVOLVIMENTO SOCIAL COMO ESTRATÉGIA DE MUDANÇA E A AVALIAÇÃO INSTITUCIONALImplantar políticas e práticas de responsabilidade socioambiental e

sustentabilidade nas universidades, de forma transversal, implica desencadear processos de mudança cultural e institucional, considerando as particularida-des da natureza, história e características de cada organização. Tal mudança exige uma ruptura conceitual, que parece que tem implicado essencialmente três movimentos, os quais também se expressam nas Universidades:

• Migrar de um entendimento de ações sociais, historicamen-te impregnadas de conteúdos assistencialistas, imediatistas e paternalistas para um novo paradigma de gestão social, mar-cado pelo direito social e cidadania e pelo desenvolvimento de ações articuladas, sistemáticas, contínuas e planejadas, fo-cadas em resultados sociais. Essa mudança convida as uni-versidades a revisarem suas práticas de extensão e de ação comunitária, potencializando a articulação das mesmas com o ensino e a pesquisa de forma a contribuir mais efetivamente com aquilo que lhe confere indiscutível e indispensável rele-vância – o conhecimento necessário para produzir mudanças sociais.

• Ampliar a visão sobre a responsabilidade social para além do compromisso com as comunidades, compreendendo como um compromisso de natureza ética com todas as partes afeta-das e interessadas no processo de produção ou prestação do serviço organizacional. Ou seja, no caso das Universidades, o compromisso também com alunos e familiares, funcionários, fornecedores, ambiente, governo e sociedade, baseado em va-lores coerentes e em um sistema de governança democrático.

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• Avançar da visão de responsabilidade social, ou socioambien-tal, para a visão de sustentabilidade e gestão sustentável, com a consequente introdução de modelos de gestão econômica, social e ambiental que integrem e confiram unidade e direcio-namento estratégico ao conjunto de iniciativas existentes de forma dispersa na organização, bem como implantem inova-ções e apropriem-se de reconhecidas diretrizes, normas, códi-gos e padrões de referência neste campo, com indicadores e metas gerenciais.

Na experiência objeto desse artigo, pode-se considerar uma das expressões da mudança institucional a criação de uma Coordenadoria de Desenvolvimento Social, no ano de 2007, com a missão primeira de elaborar uma Política de Desenvolvimento Social para a Universidade (PODES).

O processo de elaboração e aprovação da PODES ocorreu de outubro de 2007 a novembro de 2008 e permitiu que parte das tensões fosse eluci-dada e mais bem compreendida nas instâncias estratégicas da organização. Destacaram-se, nessa trajetória, três aspectos representativos das rupturas possíveis e das mudanças em curso:

• A opção por manter o processo focalizado no Desen- volvimento Social. Embora tendo presente a crescente de-manda pelas temáticas da Responsabilidade Social e da Sustentabilidade de forma transversal na Universidade, a de-cisão coerente com o momento institucional foi começar por trabalhar na perspectiva da Extensão Comunitária, provocan-do a mudança de visão de ação social para desenvolvimento social. Essa opção significou analisar o conjunto de ações so-ciais assim nomeadas na Universidade e desenvolvidas pelas Unidades Acadêmicas, classificar conforme novos conceitos e diretrizes, suprimir ações, bem como identificar novas práticas de desenvolvimento social e que não estavam sendo mapeadas. Foi criado um novo sistema de gestão das informações e pos-teriormente foram capacitadas todas as unidades universitárias no novo modelo, tendo como eixo norteador uma concepção de extensão comunitária que envolve o duplo benefício social: aprendizagem dos alunos com participação e protagonismo das comunidades participantes, gerando mudança social;

• O debate esclarecedor para o discernimento entre Política de Desenvolvimento Social e Filantropia dentro da Universidade. Quando os temas da responsabilidade social e do compro-misso social são debatidos no contexto de universidades co-munitárias e que juridicamente situam-se no marco legal de entidades beneficentes de assistência social, inevitavelmente existem aproximações e equívocos a serem elucidados entre

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 93

estas dimensões institucionais e organizacionais. Assim, foi dada maior visibilidade à diferenciação conceitual e de ordem jurídico-legal e administrativa, bem como às interfaces entre responsabilidade social, filantropia, assistência social e sus-tentabilidade na gestão da universidade, processo esse que se-gue sendo construído no amadurecimento de políticas institu-cionais e de modelos de gestão sustentados por novos valores e princípios, entre estes a prestação de contas e transparência.

• O pensar e projetar a contribuição da universidade para o desenvolvimento social de forma articulada entre os cam-pos do ensino, da pesquisa, da extensão e da gestão. O pro-cesso de discussão, elaboração e aprovação da Política de Desenvolvimento Social da Universidade ampliou um deba-te institucional inicialmente restrito ao campo da extensão e ação comunitária para o campo da formação e da produção de conhecimento, o que possibilitou a comunicação entre áreas e a descoberta de interesses e desafios comuns que geraram ações articuladas, bem como a mobilização de novas iniciati-vas e espaços de participação institucional.

Assim, a Política de Desenvolvimento Social, na experiência em ques-tão, formalizou e orientou o compromisso da universidade com o desenvol-vimento social, e sua implantação tem se constituído num esforço para atuar com proatividade e adequação frente aos desafios colocados pela sociedade, expressos inclusive em normatizações do Ministério da Educação, firmando o papel da IES na contribuição para a formação de uma sociedade inclusiva, jus-ta, sustentável e solidária, tendo como referência central a produção e trans-ferência do conhecimento e as potencialidades existentes na Universidade, colocadas a serviço do desenvolvimento da sociedade.

Depreende-se que uma política de desenvolvimento social, além de ser um instrumento para nortear um conjunto de iniciativas voltadas ao desen-volvimento social, pode alinhar conceitos, estratégias, prioridades e linhas de ação das diferentes instâncias acadêmicas na área de desenvolvimento social, contribuir para a construção de um modelo de gestão e criar sinergias entre as práticas de Responsabilidade Social e Desenvolvimento Social, no contexto do Desenvolvimento e da Gestão Sustentável, em uma universidade.

Um aspecto relevante nesse processo diz respeito a diretrizes, elemen-tos fundamentais na elaboração de uma Política. A concorrência de muitas so-licitações, demandas, oportunidades, interesses e mesmo desejos dos diferen-tes atores institucionais encontra nas diretrizes uma ancoragem que permite o direcionamento e alinhamento das ações, a tomada de decisões e o estabeleci-mento de prioridades nos caminhos que conduzirão as finalidades desenhadas. Nas diretrizes se estabelecem as rupturas e definem-se as linhas-mestras que garantirão o direcionamento do processo de mudança.

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Entretanto, elaborar uma política de desenvolvimento social integran-do os campos do ensino, da pesquisa, da extensão num modelo de gestão re-quer ainda um processo permanente e dinâmico de comunicação e articulação na construção de concepções e práticas comuns, que passem a dar consistên-cia à desejada construção de uma visão compartilhada, que será a sustentação de todo o processo.

Especificamente no âmbito do ensino, a PODES fomenta a formação dos alunos em termos de conhecimentos, valores, atitudes e comportamentos voltados à responsabilidade socioambiental e compromisso com o desenvol-vimento social e sustentável, o que tem sido objeto da revisão dos projetos pedagógicos dos cursos.

A dimensão social e comunitária da formação do aluno, alicerçada na filosofia institucional, tem sido gradativamente qualificada e ampliada, seja através de disciplinas teóricas ou disciplinas teóricas com atividades exten-sionistas, seja através de encontros e produções acadêmicas, ou ainda via ati-vidades complementares, para que novos programas e projetos foram criados, com a finalidade de oportunizar a experiência do aluno na realidade social. Concordamos com Wagenberg (2006) quando aposta na dimensão formado-ra da Educação Superior, ultrapassando meramente a formação acadêmica e informativa. A capacitação docente nas áreas de Responsabilidade Social, Desenvolvimento Social e Desenvolvimento Sustentável tem sido uma im-portante iniciativa da Universidade, junto com outras ações inclusivas e par-ticipativas com os alunos, voltadas à inclusão social e à garantia de acesso e permanência, bem como à concepção de um ensino relevante e pertinente para a sociedade.

No âmbito da pesquisa, destacam-se o estímulo a iniciativas e a cria-ção de edital interno para projetos de investigação que promovam educação, saúde, assistência social, desenvolvimento tecnológico e proteção ambiental, associadas ao desenvolvimento local, inclusão social e a cidadania.

Trata-se de desenvolver nos pesquisadores o comprometimento com a realidade social e ambiental que os cerca e com a formação de recursos humanos conscientes de seu papel transformador na comunidade onde estão inseridos, estimulando pesquisas capazes de produzir e socializar tecnologias sociais e que gerem impacto social e resultados relevantes para os públicos aos quais se destinam. Conforme Kliksberg (2006), a universidade no novo contrato social deve incorporar urgentemente na sua agenda a ética do desen-volvimento, tanto produzindo conhecimento da realidade através da pesquisa séria e rigorosa dos grandes temas da pobreza e da desigualdade social quanto formando eticamente os estudantes por meio da reflexão e da vivência de ex-periências com as comunidades.

Na extensão comunitária encontra-se o desafio da superação de um enfoque da extensão como um apêndice bem intencionado da função prin-cipal da universidade, a formação estudantil e a produção de conhecimento

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(VALLAEYS, 2006). Dentre as mudanças nas universidades no século XXI, Santos (2008) aponta a nova centralidade que deve ganhar a área de extensão decorrente da tendência do capitalismo global a funcionalizar a universida-de. A extensão, como prática acadêmica que interliga a universidade com as demandas da população, em especial aquelas que vivem situações de vulne-rabilidade e risco social, apresenta-se como um dos lócus de operação das re-feridas mudanças e desafia as universidades comunitárias a articular espaços que gerem efetivos resultados sociais e de aprendizagem para os alunos e as comunidades, pautados na participação e no protagonismo dos agentes, na indissociabilidade com a pesquisa e o ensino e na produção de conhecimentos transformadores, construídos no diálogo de saberes acadêmicos e populares.

As práticas de extensão comunitária são oportunidades de desenvol-ver a formação do aluno como cidadão comprometido com a realidade social e ambiental que o cerca, mobilizando competências acadêmicas, científicas, profissionais e sociais com enfoque interdisciplinar. Através da Extensão, a universidade pode ter uma participação ativa na construção da coesão social, no aprofundamento da democracia, na luta contra a exclusão social e a de-gradação ambiental e na defesa da diversidade cultural, o que supõe, confor-me apontado na Declaração do Congresso Internacional de Reitores Latino-Americanos e Caribenhos (2007), migrar do voluntariado e da filantropia para o compromisso ético com a justiça social e com o exercício de direitos, e migrar da ação conjuntural, dispersa e episódica, para linhas programáticas de amplo alcance.

Na universidade em questão, a PODES passou a ser um importante instrumento deste processo de mudança ao estimular o fomento, a execução, o apoio e a capacitação na área de desenvolvimento local, inclusão social e ci-dadania, através tanto da qualificação de serviços, programas, projetos e ações existentes, quanto da criação de novas frentes, definidas conforme a política institucional e progressivamente alinhados e integrados às políticas públicas. Exemplo disso é o próprio crescimento da área de Desenvolvimento Social e dos quatro eixos de atuação implantados: Extensão Comunitária, Assistência Social, Incubadora Social e Formação e Informação em Desenvolvimento Social, com expressiva ampliação da participação de alunos e Unidades Acadêmicas nos projetos.

A articulação entre ensino, pesquisa e extensão e a necessária coerên-cia entre práticas acadêmicas e práticas gerenciais remete à quarta e impres-cindível dimensão: a gestão institucional e a avaliação.

Cabe indagar até que ponto o atual sistema de avaliação, em relação à dimensão da responsabilidade social, tem permitido capturar esses movimen-tos qualitativos de mudança institucional e a efetiva contribuição social das IES nas perspectivas consideradas.

São ainda frágeis os indicadores de monitoramento e avaliação de processos e impactos nesse campo, que envolvam corpo docente, discente e

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AMARO, I. - IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICA SOCIAL COMO ESTRATÉGIA96

comunidades participantes. Ainda, ao abordar os principais enfoques sobre avaliação e qualidade na Educação Superior brasileira, Burlamarqui (2008) chama a atenção para as diferentes concepções de qualidade e para o fato de que a complexidade das realidades institucionais avaliadas implica um sistema de avaliação também complexo, constituído de tipos diferenciados de variáveis e que possam ser analisadas em sua relação com várias dimensões, as quais envolvem também informações de natureza qualitativa e relativas a processos que podem ser úteis para o conhecimento do sistema e para a tomada de deci-são, e que ainda não são consideradas. Por exemplo, as concepções de respon-sabilidade social, os valores e a cultura institucionais e a integração acadêmica.

Como aponta Morosini (2009), qualidade é um construto imbricado no contexto das sociedades e consequentemente nos paradigmas de interpre-tação da sociedade e do papel da Educação Superior na construção de um mundo melhor.

Considerando que a avaliação tem papel relevante hoje na gestão das universidades e sua potência para atuar construtivamente sobre o desenvol-vimento institucional, é importante que os processos avaliativos instiguem, mobilizem, captem e demonstrem os aspectos centrais das mudanças, para além da simples conformação ou adaptação institucional. Especificamente em relação à responsabilidade social universitária, trata-se de amadurecer as con-cepções, políticas e práticas vigentes na perspectiva mais efetiva da promoção do compromisso social das IES, para além das abordagens mais instrumentais ou superficiais do assunto.

Considerando que a responsabilidade social se desenvolve quando uma organização toma consciência de si mesma, de seu entorno e do papel que nele representa, pressupondo a superação de um enfoque egocêntrico, para uma consciência organizacional que passa a ser global e integral (VALLAEYS, 2006), alcançar essa consciência requer um conjunto de iniciativas voltadas aos diferentes públicos internos e externos que compõem e interagem com a comunidade universitária, bem como integrá-las em um sistema que permita monitoramento e realimentação sistemáticos do conjunto de planos, progra-mas, projetos e ações institucionais, desenvolvidos pelas diferentes unidades universitárias e gerenciados por diferentes estruturas organizacionais.

Para qualquer organização, a busca por coerência é fundamental. Na universidade, a coerência entre o discurso e a prática acadêmica e institucio-nal na implantação de um modelo de responsabilidade socioambiental ou de sustentabilidade é um caminho sem linha de chegada, trilhado na tensão en-tre o amadurecimento conceitual em nível gerencial e acadêmico, a mudança cultural, a vontade política e a gradativa adoção de medidas inovadoras num contexto de complexidade e diversidade. Entretanto, como coloca Morosini (2009, p. 96), “[...] para orientar a concepção do modelo de universidade hoje buscado permanecem e se fazem necessárias três questões centrais: que Educação Superior; para quem e para quê?”

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 97

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AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO: POSSÍVEIS MEDIAÇÕES ENTRE TENSÃO E

PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO

Mariângela da R. AfonsoEdilene da C. Sinott

Rosane F. VeigaFabiane de O. Schellin

Diego E. do Nascimento

N o momento atual vivido pelas universidades, as avaliações dos espaços científicos têm recaído sobre os grupos que pesquisam,

valorizando sobremaneira a produtividade docente – contabilizada através da qualidade – pelo número de publicações; participação em redes institucionais de pesquisa; parcerias entre grupos e outras atividades relacionadas à vida acadêmica. Neste contexto a produção do conhecimento precisa acontecer pela via das redes de pesquisadores, em que a construção de grupos institucio-nais possa facilitar a produção do conhecimento.

Medidas especialmente importantes para a institucionalização da pes-quisa nas universidades foram tomadas nesta última década, tanto por pres-sões externas às comunidades acadêmicas quanto pela necessidade de susten-tação dos grupos de pesquisadores.

Para Cunha (2000) o modelo de formação que vem presidindo o ma-gistério de nível superior tem na pesquisa a sua base principal. Tanto os planos de carreira das instituições quanto a própria exigência estatal para o creden-ciamento das universidades centram parâmetros de qualidade dos requisitos estabelecidos na Pós-Graduação stricto sensu.

Num cenário cada vez mais competitivo, governos, empresas, institui-ções passaram a ter, no conhecimento, o grande referencial para planejar o seu futuro. Assim, a universidade passa a ser a grande responsável pela produção do conhecimento no Brasil. Dessa forma, as parcerias institucionais aparecem como espaços de produção de pesquisa, um espaço descortinado a partir da década de 1990.

Na área da Educação Física, na década de 1990, os cursos stricto sensu credenciados apresentavam características de expansão, e a análise biomédica de pesquisa estava deixando de ser tão priorizada. Os profissio-nais, pesquisadores da área da saúde ou com ênfase nos aspectos biológicos, foram aceitando outros tipos de pesquisas. A qualificação dos docentes em Programas de Pós-Graduação em outras áreas do conhecimento foi sendo incentivada, houve ainda a melhor definição das linhas teóricas e abordagens (AFONSO, 2003).

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100 AFONSO, M. R. et al. - AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO

A riqueza do momento de estruturação e melhor definição dos pro-gramas tornaram-se importantes no sentido de aprofundar as discussões. Os ganhos desse processo foram o incremento da diversidade da produção inte-lectual, deixando que outras manifestações tivessem espaço; e um aumento da produção científica e, com isso, o crescimento da Pós-Graduação. Através da consolidação de alguns programas de mestrado e doutorado na área, acontece a melhora da produção do conhecimento contribuindo para a conquista de espaços profissionais e científicos na sociedade.

Hoje nos espaços de discussão da Pós-Graduação brasileira na área da Educação Física pode-se constatar que existe um esforço e uma vontade política coletiva para que se construa um lócus de produção do conhecimento na área, com capacidade de melhor inserção nos espaços científicos.

Este estudo teve como objetivo discutir os processos avaliativos que recaem sobre a Pós-Graduação e as mediações possíveis entre tensão e pro-dução de conhecimento, uma vez que hoje, as avaliações dos programas de Pós-Graduação estão centradas em quesitos referentes às áreas de concentra-ção; linhas de pesquisa; estrutura curricular; infraestrutura; corpo docente e discente; e a produção intelectual. Mas a produção do conhecimento, os cami-nhos e as estratégias de objetivação da produtividade docente têm sido fatores decisivos na avaliação dos programas de Pós-Graduação.

CAMINHOS METODOLÓGICOSTratou-se de um estudo descritivo do tipo análise documental, em que,

segundo Triviños (2007), são coletadas informações de forma que se possa trabalhar com documentos e dados sobre uma determinada instituição ou gru-po de sujeitos investigados.

Utilizou-se para análise o Currículo Lattes, uma vez que o acesso ao Currículo Lattes dos docentes, pesquisadores e estudantes fornece indicadores de produção científica e tecnológica e contribui para a implementação de po-líticas de gestão no Ensino Superior. Este documento, por sofrer modificações constantes, precisa ser analisado em um determinado período. Datou-se para fins de pesquisa a análise no mês de julho de 2011, considerando as últimas atualizações feitas até esse momento.

Tem-se clareza de que um dos meios de avaliação utilizados para ana-lisar a produção docente se dá pela apreciação do Currículo Lattes dentro da Plataforma Lattes (CNPQ, 2010), que é uma base de dados, caracterizada pela disponibilização pública das informações, viabilizando o conhecimento do processo de formação e da trajetória de desenvolvimento profissional docente.

Focou-se e priorizou-se a produção, qualificação e trajetória dos do-centes permanentes dos programas de Pós-Graduação stricto sensu na área da Educação Física no Rio Grande do Sul.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 101

Para esta análise foram elencados os indicadores de produção e inser-ção dos docentes; as linhas de pesquisa que emergem dentro de cada progra-ma; as tensões entre grupos; e as estratégias e escolhas dos professores diante da demanda pela manutenção de sua produtividade.

A amostra foi escolhida intencionalmente, através da elaboração de uma lista nominal dos professores permanentes por área do conhecimento, com a titulação e a linha de pesquisa na qual estavam inseridos nos Programas de Pós-Graduação stricto sensu da Escola Superior de Educação Física (ESEF) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e da Escola Superior de Educação Física (ESEF) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

CONTEXTUALIZANDO A TEMÁTICA

Franco (1996), buscando traçar uma trajetória da Pós-Graduação bra-sileira, diz que a década de 1960 foi a de promulgação de políticas que esta-beleceram as condições básicas para o crescimento da pesquisa; a década de 1970 foi de criação e expansão de cursos e dos planos globais articuladores; já a década de 1980 se apresentou como de consolidação e crítica; e a de 1990, como ainda de crítica, mas também de reestruturação.

Segundo Afonso (2003) a década de 1980 revela a ênfase da consoli-dação da pesquisa, marcada por três fontes políticas: o Ministério de Ciência e Tecnologia, criado em 1985, com respectivos órgãos e conselhos, como o Conselho Nacional de Pesquisa e Tecnologia (CNPq) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep); o Ministério de Educação, através, especialmente, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes); e o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT), criado em 1983, com o apoio do Banco Mundial e administrado pelo CNPq, Finep e Capes.

Já na década de 1990, de acordo com a mesma autora, o traço diretivo foi a busca de novas articulações em decorrência não só da limitação de recur-sos que incide sobre todas as áreas, mas, também, de tendências mais amplas marcadas pela internacionalização da economia.

Hoje a pesquisa tem contribuído para a produtividade docente e para a formação de um sujeito questionador, auxiliando na formação de um indi-víduo com consciência crítica, iniciativa própria, abrindo caminhos facilita-dores às mudanças e flexibilidades que o atual contexto sócio-histórico exige (DE CARLI; BAHLS, 2006).

Por outro lado as tensões geradas, no meio universitário, entre a cons-trução da identidade, trajetória e coerência profissional, têm marcado a docên-cia universitária. Neste estudo a coerência profissional é entendida como um processo de escolhas fundamentadas no teor científico e acadêmico das deci-sões, que significa optar por participação em grupos de pesquisas que tenham relação com as disciplinas ministradas, aproximação com pesquisadores de

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102 AFONSO, M. R. et al. - AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO

áreas afins, bem como coerência durante o desenvolvimento profissional. O somatório das escolhas profissionais em nosso entendimento sinaliza os pro-cessos de construção da carreira profissional.

Para discutir as tensões e mediações possíveis no espaço universitário, recorremos a Bourdieu (1983). Para o autor, este espaço é um campo social como qualquer outro e está impregnado de relações de força e monopólios, com disputas por espaços de prestígios diferenciados. Nesse sentido, a co-munidade científica não é um campo neutro, necessariamente só regido por idealismos. Ela reflete as mesmas disputas de qualquer campo social na orga-nização capitalista da sociedade.

Ao buscar o reconhecimento dos méritos da pesquisa, os docentes pro-curam também o que Bourdieu (1983) chama de legitimidade científica. Os investimentos dos pesquisadores dependem tanto da importância, quanto da sua natureza, e da importância de seu capital atual e potencial de reconhe-cimento, bem como de sua posição atual e potencial no campo. Assim são essas correlações que determinam as propensões de investimento do capital científico.

Ainda referindo-se à legitimidade científica, Bourdieu (1983) diz que na ótica da ciência oficial não é um sistema de normas e valores que a comu-nidade científica atribuiria a todos os seus membros. Ao contrário, é a noção de campo que permite/obriga a olhá-la enquanto espaço concorrencial e con-flitual de interesses diferentes e divergentes.

Daí é que decorrem os perfis diferentes dos diversos grupos de carrei-ras, já que os valores, em cada campo científico, podem variar. De acordo com Cunha (1998), “o que cada um deles é percebido como interessante é o que tem chance de ser reconhecido como importantes para os outros, tanto para os pares de mesma área ou campo como para a comunidade científica mais ampla” (p. 89).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Cenário 1: Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Educação Física da ESEF/UFPelO Programa de Pós-Graduação stricto sensu da ESEF/UFPel tem por

finalidade a capacitação de recursos humanos através da formação de mestres que atuem nas diversas áreas, buscando formar profissionais com qualificação para identificação de problemas relevantes que possam realizar projetos de in-vestigação científica contribuindo para o avanço do conhecimento científico na área da Educação Física. Outra finalidade do programa é a habilitação de profissionais para a docência em Ensino Superior (UFPEL, 2009).

O mestrado em Educação Física da Universidade Federal de Pelotas teve sua primeira turma de ingressantes em 2007. O curso obteve no ano de

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 103

2009 conceito 3 na avaliação trienal da Capes, mas cabe ressaltar que este pro-grama tem como estratégia o fortalecimento das linhas de pesquisa, através da melhora da qualificação docente.

Segundo Amadio (2007), os programas de pós-graduação stricto sensu em Educação Física no Brasil começaram a surgir no ano de 1977. Esse fato, para Kokubun (2006), originou-se na medida em que foi percebida a necessi-dade de capacitar profissionais para a atuação no Ensino Superior, objetivan-do ainda aplicar e conduzir o conhecimento adquirido no curso de graduação.

No quadro a seguir, temos as linhas de pesquisa do mestrado.

Área de Concentração Linhas de Pesquisa Docentes atuantes na linha

ATIVIDADE FÍSICA, SAÚDE E DESEMPENHO

Atividade Física e Saúde 11*

Atividade Física e Desempenho 5*

EDUCAÇÃO FÍSICA, CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS

Memória, Cultura e Sociedade 3**

Aprendizagem Motora e Desenvolvimento 4**

Escola, Formação e Trabalho 2**

Número total de professores - 18

Quadro 1. Distribuição dos Professores Permanentes da ESEF/UFPel.* Todos atuam também na linha de AF e Saúde, sendo as vagas divididas nas duas linhas.** Um dos professores oferta vagas para orientação em duas linhas diferentes, sendo uma vaga em cada linha.

O processo de qualificação destes profissionais da ESEF/UFPel coin-cide com a necessidade de capacitação e formação docente exigidas pelas mudanças no sistema avaliativo do Ensino Superior, gerado a partir dos meca-nismos de regulação e certificação da Pós-Graduação.

Houve uma capacitação em massa dos professores, buscando através de uma formação continuada – mestrado e doutorado – o conhecimento e reconhecimento social e profissional. A tensão entre conhecimento e poder fez com que a qualificação docente se estabelecesse como um dos pilares para a estruturação do Curso de Mestrado. Os professores recém-formados que ingressam no Ensino Superior – normalmente mais jovens – ajudam na ascensão do programa, pois saem do campo de formação diretamente para o espaço da pesquisa e da vida acadêmica.

Buscou-se dialogar com autores que discutem a questão da forma-ção profissional sobre as tensões existentes entre a construção da identidade, trajetória, coerência e desenvolvimento profissional, como possibilidade de construção teórica para tal temática. A docência universitária hoje se apoia numa dinâmica entre produção de conhecimento e formação de profissionais, e nesta perspectiva os docentes, muitas vezes, sentem-se pressionados pela necessidade de produção científica e qualidade de ensino.

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104 AFONSO, M. R. et al. - AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO

A partir das análises da base de dados dos currículos, verificou-se que os docentes que possuem uma maior produção bibliográfica encontram-se na área das Ciências da Saúde. Esta produção pode estar relacionada com a gran-de oferta de espaços para a publicação, pois a Educação Física, de acordo com o CNPq, está inserida na grande área das Ciências da Saúde.

Constatou-se ainda que na ESEF/UFPel existe uma heterogeneidade em relação à produção bibliográfica e participação em diferentes grupos insti-tucionais, confirmando que a organização e as parcerias criadas pelos docentes tendem a alimentar as redes de conhecimento e aumentar a produção científica.

Fica claro que a aproximação e formação de grupos ou redes de pesqui-sadores trazem também as tensões da própria área de conhecimento. Segundo Afonso (2003), baseado em Bourdieu (1983), em muitos momentos os profes-sores vêm atuando num espaço institucional de poder e lutas concorrenciais. Tomando as ideias de Bourdieu (1983), infere-se que o espaço universitário é um campo social como qualquer outro e está impregnado de relações de força e monopólios, com disputas por espaços de prestígios diferenciados. Em ou-tras palavras, significa dizer que, num determinado campo, os investimentos dos pesquisadores dependem tanto da importância quanto da sua natureza, e da importância de seu capital atual e potencial de reconhecimento, bem como de sua posição atual e potencial no campo. São essas correlações que determi-nam as propensões de investimento do capital científico.

No campo das discussões da área observa-se que, como as subáreas de investigação que adotam concepções e metodologias das ciências naturais, são identificadas na corrente epistemológica positivista, recebem, sistemati-camente, críticas daqueles que se identificam com correntes não positivistas, como a fenomenologia e a histórico-crítico.

O inverso também é verdadeiro, sendo as subáreas socioculturais, que adotam concepções e metodologias das ciências humanas e sociais, alvo de críticas de que suas pesquisas não passam de discursos e opiniões desprovi-dos de qualquer verificação ou, ainda, de que não têm sido capazes de ir além das discussões filosófico-genéricas para apresentar perspectivas concretas de pesquisa que enfoquem o fenômeno em si, através de linhas devidamente de-lineadas. Nesta disputa, é possível perceber certa ingenuidade em se pretender resolver na Educação Física diferenças que nem a ciência nem a filosofia foram ainda capazes de resolver.

Parece existir um consenso a respeito de que pesquisa vale mais que ensino e extensão. Nas universidades, a pesquisa aparece como mais importan-te, depois o ensino e, por último, a extensão. Razões históricas têm contribuído para tal. Isso não se deve ao acaso, pois houve e continuam existindo diferentes mecanismos institucionalizados de financiamento para pesquisa pelos órgãos oficiais, em detrimento de amparo às atividades de ensino e extensão.

Foi possível verificar, através da avaliação dos currículos dos docen-tes, que a extensão universitária não tem sido local de inserção e de consolida-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 105

ção da carreira docente, assim os professores que ingressaram na UFPel mais recentemente têm na pesquisa e na participação em projetos o mote de suas atividades (AFONSO, 2010).

Cenário 2: O Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Educação Física da ESEF/UFRGS O programa de pós-graduação em Ciências do Movimento Humano

da Universidade Federal do Rio Grande do Sul tem como objetivos: formar docentes e pesquisadores autônomos nas áreas de concentração, com domínio de uma temática específica, com capacidade para atuar no planejamento, exe-cução e avaliação do ensino, de extensão e de pesquisa; articular a formação dos pesquisadores com o ensino da graduação e a orientação de alunos de iniciação científica, oferecendo-lhes oportunidades para socializar e aprofun-dar o conhecimento produzido na atividade de pesquisa; consolidar a ESEF/UFRGS, como um centro de excelência científica e acadêmica, no cenário nacional e internacional; e produzir conhecimentos relevantes no âmbito de projetos de pesquisa básica e aplicada, que, mediante processos de transferên-cia e circulação, ofereçam às diversas comunidades docentes e de especialis-tas alternativas concretas para suas ações nas diferentes demandas em que as Ciências do Movimento Humano ganham relevância social.

Um dos fatores que contribuíram para a criação do mestrado foi uma tradição de êxitos em cursos de especialização no âmbito da fisiologia e medicina do exercício, como também no campo das técnicas desportivas (MOLINA, 1998).

No quadro a seguir, temos as linhas de pesquisa do mestrado.

Área de Concentração Linhas de Pesquisa Docentes atuantes na linha

MOVIMENTO HUMANO, CULTURA E EDUCAÇÃO

Representações Sociais do Movimento Humano 5

Formação de Professores e Prática Pedagógica 2*

MOVIMENTO HUMANO, SAÚDE E PERFORMANCE

Atividade Física e Saúde 6

Atividade Física e Performance 7**

Neuromecânica do Movimento Humano 4***

Desenvolvimento da Coordenação e do Controle Motor 1

Nº total de professores 18

Quadro 2. Professores Orientadores Permanentes na ESEF/UFRGS.*Todos atuam também na linha de Representações Sociais e Movimento Humano.**Três desses atuam também na linha de AF e Saúde.***Dois deles atuam em outras linhas, sendo um na AF e saúde e outro na AF e performance.

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106 AFONSO, M. R. et al. - AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO

Até o final do ano de 2009, no curso de mestrado, 280 dissertações tinham sido defendidas. Hoje o Programa atinge bons patamares de qualifi-cação, com conceito 5, no mestrado e doutorado, segundo a última avaliação feita pela Capes. Há, por parte da coordenação, certa mobilização para manter a qualidade das produções e pesquisas, que vem ao encontro das políticas avaliativas governamentais em que cada Programa deve buscar sua melhor

‘qualidade’ para estar nos níveis desejados. Essas propostas avaliativas parecem estar alicerçadas na ideia de ren-

dimento e produtividade. Para Chauí (2001), estamos vivendo o momento da chamada “universidade operacional”, uma organização voltada para si mesma, enquanto estrutura de gestão, administrando contratos, avaliada por índices de produtividade, calculada para ser flexível e estruturada por estratégias e programas de eficácia organizacional.

Cada vez mais se consolidam diferentes espaços de produção de co-nhecimento dentro do mundo acadêmico, fazendo com que as universidades, e por consequência os docentes, construam sua trajetória na busca da mediação entre a prática docente na sala de aula e as agências financiadoras de pesqui-sa. Porém não tem sido tão fácil administrar essas condições de trabalho e as consequências decorrentes desta nova formatação dentro da vida institucional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos dois Programas existe um esforço e uma vontade coletiva para que se construa um espaço/lócus de produção do conhecimento nas diferentes áreas para que seja possível competir com outros centros de excelência em ensino e de pesquisa já consolidados no centro do país.

Porém, diante dos indicativos de qualidade impostos pelas agências de fomentos de pesquisa e pelos índices a serem atingidos, as disputas por espaços de reconhecimento se dão tanto em nível docente quanto nas áreas de produção do conhecimento.

Através da plataforma curricular analisada, percebemos que é possí-vel ter maior visibilidade sobre a trajetória de cada um dos professores, bem como analisar as estratégias para obtenção de reconhecimento dos seus pares. Por outro lado verificamos que a produção do conhecimento tem sido priori-zada em detrimento do envolvimento com as atividades referentes à docência e extensão universitária. Esta estratégia adotada faz com que os docentes do Ensino Superior projetem suas expectativas num maior número de artigos científicos em revistas indexadas na busca de corresponder às exigências da avaliação externa.

As faces do poder e conhecimento estão tão imbricadas que é quase impossível traçar limites ou fronteiras, fazendo com que muitas vezes os do-centes sintam-se pressionados a ter como norte da vida acadêmica somente a pesquisa. Não se pretende aqui dicotomizar diferenças entre professores

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 107

e pesquisadores por se entender que existe a clareza de que ao adentrar no estudo-meio nas relações de poder, parece que não existe uma forma mágica de dizer isso é assim ou não é assim, na verdade são relações entre pessoas relativizadas por muitas dimensões.

Cabe pensar a avaliação na Pós-Graduação como uma estratégia para compreender as mediações entre tensão e produção de conhecimento, consi-derando-se os docentes como aqueles que podem fazer da universidade um lugar de ensino, pesquisa e extensão respeitando a vocação de cada um e ao mesmo tempo dando condições para o desenvolvimento de cada área de co-nhecimento sem as disputas tão presentes neste espaço acadêmico.

REFERÊNCIAS

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108 AFONSO, M. R. et al. - AVALIAÇÃO DA PÓS-GRADUAÇÃO

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UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

Marinice Souza SimonMarilia Costa Morosini

A o falarmos em avaliação institucional muitas vezes nos aparece a imagem de um processo tormentoso em que serão expostas nos-

sas fragilidades e posteriormente meios punitivos direcionados a sua correção. Poucas vezes a imagem evocada revela um processo construtivo a fornecer indicações para a correção do inadequado.

O ser humano é constantemente cobrado e exigido por diferentes ins-tâncias que regulam a sociedade. Assim habitua-se na maioria das vezes a proceder com vistas a cumprir as exigências, enquadrando-se no requisitado, sem questionamentos a respeito.

Solicitar a visão da avaliação a partir da imagem de uma porta que se abre para a transformação de práticas inadequadas resulta num procedimen-to revestido de oportunidades de melhora. Para isto é necessário, primeiro, desconstruir a cultura de cobrança policialesca que acompanha a avaliação e, segundo, que o processo seja esclarecedor e encorajador, no sentido de contri-buir, com os resultados apresentados, para a correção de fatores considerados fracos ou inadequados.

No Brasil a avaliação externa, mais especificamente na Educação Superior, evidencia diferentes concepções, passando por variados formatos que visam atender as linhas políticas com seus objetivos definidos.

O presente artigo busca analisar criticamente a trajetória da avaliação na Educação Superior Brasileira, cotejando as diversas propostas das princi-pais políticas avaliativas, destacando o período mais recente, em que os exa-mes de larga escala, com função de controle da eficiência e da produtividade das IES, habitam o cenário educacional do país.

AVALIAÇÃO DIRECIONADA AO ATENDIMENTO E EXIGÊNCIAS SOCIOPOLÍTICO-ECONÔMICASÉ interessante observar o quanto é determinante o contexto sociopolí-

tico-econômico na instalação e adoção de práticas avaliativas, educacionais e pedagógicas, em determinados tempo e lugar. Esta constatação não traz novi-dades, mas é sempre oportuno que analisemos o poder de influência emanado de esferas superiores, as quais, mesmo distantes do campo de ação, desenham e definem as políticas que melhor expressam a sua ideologia.

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110 SIMON, M. S. et al. - UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A AVALIAÇÃO

Confirmamos este posicionamento transcrevendo Gama (2010, p. 42):Instituída como sistema, a avaliação deve ir se impondo por meio do jogo

das regulações e das autorregulações de modo constringente em favor dos in-teresses subjacentes às políticas de governo e de Estado a serviço do processo sociometabólico do capital.

Ao percorrer a história recente da Avaliação do Ensino Superior, ob-servamos que no final década de 1980 saímos de um processo avaliativo (das universidades brasileiras) herdado do regime militar, com forte acento puni-tivo, para uma avaliação marcada por práticas mais dialógicas, em que a ne-gociação revelava condutas mais democráticas, entre o MEC e a comunidade do Ensino Superior, derrubando a resistência e abrindo maior espaço para as propostas avaliativas.

Encaminhando nossa análise para a década de 1990, mais precisamen-te para o ano de 1995, quando se anunciava a expansão do sistema de Ensino Superior, observamos que a avaliação, nesse período, assume um novo forma-to, para dar, como nos diz Dias Sobrinho (2010, p. 203),

[...] mais transparência à relação entre ofertadores e consumidores da edu-cação e regular o livre mercado da educação. Por outro lado, o Estado, além de se desobrigar de ampliar o orçamento público para o efeito de ampliação do sistema, assegura, através da avaliação, o controle sobre os resultados e sobre as finalidades e oferece à sociedade, especialmente ao mercado, as informações em forma de escalas de qualidade dos serviços educacionais que estão sendo oferecidos.

Nessa fase, a avaliação passou a constituir-se do Censo de Educação Superior da Avaliação das Condições de Ensino, juntamente com o instru-mento central, representado pelo Exame Nacional de Cursos, mais conhecido como Provão.

O Provão era um exame escrito que cobria o território nacional, sendo aplicado a alunos concluintes das áreas previamente selecionadas pelo MEC. A cobertura era ampliada a cada ano, atingindo 26 áreas até 2003, ano da úl-tima aplicação.Várias críticas foram feitas ao instrumento, como aponta Dias Sobrinho (2010, p. 204): “Modelo imposto pelo Ministério da Educação, sem consulta e sem discussão pública, recebeu pesadas críticas de boa parte da co-munidade de estudantes e professores, sobretudo de especialistas em avaliação”.

Na sequência da análise dirigimo-nos para a década de 2000 quan-do, em 2004, foi implantado o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), concretizado por movimentos democráticos, com o intuito de possibilitar o retorno da credibilidade da avaliação, conforme fica explícito em texto encontrado na Revista Sinaes – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Da concepção à regulamentação (p. 34): “Esse processo resgatou a legitimidade da Avaliação, uma vez que o amplo debate então es-tabelecido com a comunidade universitária estimulou a adesão voluntária das instituições ao processo avaliativo”.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 111

Embora originalmente o Sinaes apresentasse a proposta de aplicação de um instrumento mais amplo e integrador, contrapondo-se ao modelo do Provão, observamos que a extensão e a profundidade da proposição dificulta-ram seu entendimento, fazendo com que fosse vetada pelo MEC e por outras instâncias. Na época ficou evidente que a mídia também formulou opiniões equivocadas a respeito da referida intenção, disseminando-a para diferentes públicos, fatores que, acreditamos, tenham contribuído para o surgimento do Exame Nacional do Desempenho dos Estudantes – Enade como instrumento central de avaliação.

Para melhor explicar esse exame, transcrevemos Dias Sobrinho (2010, p. 212):

O Enade é um exame de amplitude nacional, mas com diferenças funda-mentais em relação ao provão. Como seu nome anuncia, opera com a noção de desempenho e não vincula mecanicamente resultados na prova à qualidade do curso. O Enade, tal como concebido, consiste num instrumento de avaliação a diagnosticar, geralmente a cada três anos, as habilidades acadêmicas e as com-petências profissionais que os estudantes são capazes de demonstrar, em cone-xão com suas percepções sobre sua instituição e com conhecimentos gerais não necessariamente relacionados aos conteúdos disciplinares.

Na comparação do Enade com o Provão encontramos algumas se-melhanças no que diz respeito à operacionalidade dos exames. No entanto, apontamos uma diferença fundamental ao percebermos que ambos estão loca-lizados em paradigmas diferentes, determinando objetivos, atos avaliativos e resultados distintos. Enquanto o Provão caracterizava-se como uma avaliação estática, essencialmente voltada ao produto, o Enade, hoje em vigor, supõe uma avaliação mais dinâmica, contemplando a noção de mudança e evolução do estudante em sua trajetória formativa.

Na Revista Sinaes – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Da concepção à regulamentação (p. 30), encontramos que:

A criação de um sistema, combinando regulação e avaliação educativa, em suas dimensões interna e externa, deve ser de responsabilidade compar-tilhada do Estado e das instituições, mas interessa também e, sobretudo, à população, que tem os direitos de contar com um sistema educativo que cumpra com os principais anseios e necessidades mais gerais da sociedade, e de saber como as instituições estão realizando seus mandatos sociais relati-vos ao avanço do conhecimento e à formação de cidadãos que também sejam bons profissionais.

Ainda revisitando o Ensino Superior Brasileiro em décadas mais pró-ximas, somos levados a visualizá-lo como parte de um cenário povoado por mudanças e transformações aceleradas que culminaram com sua expansão a partir de 1996, atendendo às demandas de uma sociedade alicerçada por va-lores neoliberais relacionados com o forte individualismo econômico e a alta competitividade.

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112 SIMON, M. S. et al. - UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A AVALIAÇÃO

Na sociedade competitiva e desigual uma das fontes de poder pas-sa a ser a titulação acadêmica, obtida de diferentes formas e em diferentes cursos, muitas vezes, de qualidade duvidosa e, em sua maioria, patrocinados pelo setor empresarial privado, sedento pela expansão capitalista, buscando viabilizar suas ideias sem a participação do governo, que, em outros tempos, defendia a igualdade de oportunidades para todos os cidadãos.

Nesse universo de avaliação transparece um modelo de qualidade isomórfica, em que os padrões são apresentados para que todos os sigam, independentemente de suas peculiaridades, bastando que se volte para o atendimento das demandas do mercado e das exigências de organismos inter-nacionais, buscando a excelência acadêmica a partir de parâmetros iguais para todos os avaliados.

AVALIAÇÃO ATENTA À ESPECIFICIDADE DOS DIFERENTES ALUNOS E LUGARES AVALIADOS

Numa tendência mais atual, inclusive apontada pela Unesco como prática válida e significativa ao contexto contemporâneo, verificamos a ava-liação voltada para a diversidade, que caracteriza diferentes universidades in-seridas em distintas realidades.

Na “Declaração Mundial sobre Educação Superior do Século XXI: vi-são e ação” (2006), encontramos referência à qualidade da Educação Superior como um conceito multidimensional que envolve várias funções e atividades desde o ensino, propriamente dito, ao ambiente acadêmico em geral.

Na continuidade da análise deste documento, destacamos:Uma autoavaliação interna e transparente e uma revisão externa com es-

pecialistas independentes, se possível, com reconhecimento internacional, são vitais para assegurar a qualidade. Devem ser criadas instâncias internacionais independentes e definidas normas comparativas de qualidade, reconhecidas no plano internacional. Visando levar em conta a diversidade e evitar a uniformi-dade, deve-se dar atenção aos contextos institucionais, nacionais e regionais específicos (DELORS et al., 2006, p. 47, Art. 11, Alínea a)

Quando falamos de Brasil, um país com dimensões continentais, pa-rece-nos lógico imaginar a diversidade presente em cada região, reunindo cul-turas muito específicas, as quais demandam um sistema educacional voltado para o atendimento de suas peculiaridades.

Trata-se de um espaço que deve ser balizado por valores universais, porém, com possibilidade de valorização das diferenças como meio enrique-cedor de vivências únicas, que poderão sempre contribuir para o fortalecimen-to de princípios que respeitem e acolham a participação de todos os implica-dos no processo.

Ampliando o olhar, visualizamos tal prática nos países que compõem a União Europeia, os quais demonstram o entendimento de qualidade fortemen-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 113

te ligado ao respeito às especificidades. Na sua realidade a ideia do processo de integração entre países ocorre predominantemente pelas diferenças, rele-gando a um segundo plano, as similaridades.

De Morosini (2001, p. 98), extraímos o seguinte exemplo de diversi-dade em países europeus:

A terceira estratégia do fomento da qualidade respeitando a diversidade se concretiza na European Network for Quality Assurance in Higher Education (ENQA), estabelecida em 1999 para promover a cooperação na Europa no cam-po da avaliação da qualidade entre atores envolvidos no processo de avaliação. Os membros da rede são agências de avaliação de qualidade, autoridades pú-blicas responsáveis pela Educação Superior e associações de instituições de Educação Superior dos Estados-membros da União Europeia.

BUSCANDO A EQUIDADE COMO ENTENDIMENTO DE QUALIDADE DE ENSINOA sociedade contemporânea põe como pauta de seus discursos e re-

ferência de seus anseios, a equidade. Como o sistema de ensino existe numa dada sociedade e num dado tempo, somos levados a concluir que hoje não cabe mais uma avaliação afastada desta temática.

Na realidade neoliberal sabemos que a avaliação do Ensino Superior volta-se exclusivamente para o eficientismo, tão defendido como ideologia e patrocinado por organismos internacionais, como o FMI e o Banco Mundial. Tais princípios e práticas afastam uma análise da qualidade com o critério da equidade.

Por ocasião da 2ª Conferência Mundial sobre Educação Superior, re-alizada em 2009, foram analisadas as mudanças desenvolvidas na Educação Superior desde a 1ª Conferência em 1998, observamos a preocupação com temas que contemplam a equidade, mediante as discussões sobre a crise civili-zatória, reclamando por urgência na construção de novos paradigmas, que sus-tentem movimentos concretos para a construção de uma sociedade sustentável.

Estas intenções ficam expressas no artigo de Segrera (2010, p. 105): “La Conferencia ratifico la importancia de la educación superior y la investiga-ción para hacer frente a los desafíos mundiales y construir economías basadas en el conocimiento que sean más integradoras, equitativas y sustentables”.

Na realidade brasileira, concluímos que os diferentes instrumentos de avaliação da Educação Superior, mais especificamente os exames de larga escala de avaliação da Educação Superior, como o Provão e o Enade, estão ligados a diferentes concepções de qualidade.

Na análise do Provão temos a compreensão que é um veículo que le-gitima um padrão de qualidade isomórfica, com pouco espaço para os valores solidários, para uma consciência planetária ou para as ideias de sustentabilida-de, revelando uma avaliação estática e somativa, colhendo respostas pontuais,

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114 SIMON, M. S. et al. - UM OLHAR CRÍTICO SOBRE A AVALIAÇÃO

somando (os acertos) e descontando (os erros), o que resultava em pontuações e classificações, que desconsideravam o contexto ou qualquer outra compe-tência, que fosse além do enfoque conteudista.

Quanto ao Enade, verificamos na sua origem uma maior abrangência do instrumento, denotando um enfoque de avaliação formativa. Aspectos de cidadania plena, posicionamento na vida social, críticas consistentes da rea-lidade, escolhas valorativas, entre outros, são comportamentos contemplados no instrumento, revelando a importância da equidade como entendimento da qualidade de ensino.

Para reafirmar o conceito de qualidade dentro da educação, citamos o argumento muito oportuno de Morosini (2009 p. 173):

A educação de qualidade é localmente importante e culturalmente adequada; está conformada pelo passado (por exemplo, conhecimentos autóctones e tradi-cionais), é significativa no presente e prepara as pessoas para o futuro; constrói conhecimentos, habilidades vitais, atitudes e valores; oferece instrumentos para tornar mais sustentáveis as sociedades atuais; e é possível mensurá-las.

CONSIDERAÇÕES FINAISA qualidade da educação passa muito mais pelo viés político e filosó-

fico do que pelos resultados numéricos relacionados única e exclusivamente ao aproveitamento dos estudantes. No Brasil e no mundo observam-se várias tendências para delimitar a qualidade da Educação Superior.

Os movimentos avaliativos são compostos pelas diferentes concep-ções, ou seja, pelo isomorfismo, pela diversidade e pela equidade, com maior ou menor intensidade, dependendo das políticas governamentais, do nível de consciência da comunidade universitária e também do momento histórico.

Entendemos que o isomorfismo se faz necessário quando carecemos de um nivelamento mínimo de qualidade, o qual poderá ser alavancado para melhor, a partir dos índices apresentados nos resultados avaliativos. Se a pa-dronização comparecer como uma oportunidade de desenvolvimento de pa-râmetros mínimos de qualidade, sem criar um ambiente de competitividade hostil, acreditamos que tenha sua valia.

O mesmo pode ocorrer com o paradigma da diversidade. Numa so-ciedade plural como a brasileira, urge que o olhar avaliativo vislumbre, com respeito e atenção, as diferentes manifestações da cultura poliédrica e multifa-cetada que habita o universo educacional do país.

Quando falamos de equidade, revelamos o paradigma ligado à justiça social, à igualdade de oportunidades, fatores que só existem numa sociedade consciente da necessidade da sustentabilidade.

Na educação, buscar construir um sistema educacional que assegure o acesso, a participação e a permanência a todos os cidadãos nos diferentes ní-veis de ensino parece-nos ser a melhor política e, principalmente, quando esti-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 115

ver ancorada numa pedagogia emancipatória, que propicie a instalação de uma nova cultura de solidariedade, tão necessária no mundo globalizado de hoje.

O meio acadêmico é um terreno fértil para a propagação de valores li-gados à sustentabilidade e à justiça nas relações, visto que este é um ambiente muito favorável ao surgimento de novas ideias e de propostas transformado-ras. Os docentes, com sua visão crítica e inovadora, e os alunos, com sua von-tade de transformar o mundo, certamente estão atentos a novas alternativas de vida que sejam pautadas por valores inegociáveis.

REFERÊNCIAS

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EIXO TEMÁTICO II GESTÃO E POLÍTICAS

DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

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REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES: ESPAÇOS DE QUALIDADE NA GESTÃO DA

EDUCAÇÃO SUPERIOR1

Solange Maria Longhi Maria Estela Dal Pai Franco

Cristina Zanettini-Ribeiro

N um contexto de mudanças aceleradas decorrentes do avanço do conhecimento científico e tecnológico, das alterações ambientais

e climáticas, dos movimentos sociais reivindicatórios, não surpreende que a gestão da Educação Superior (ES) assuma importância crucial. A contribuição dos pares torna-se fundamental para enfrentar os complexos problemas que se apresentam como desafios à educação e aos sistemas de ensino, exigindo que a ES assuma posição estratégica na dinâmica do mundo contemporâneo em função das complexas relações [...], da importância crescente do conhe-cimento técnico e científico, das novas e crescentes exigências sociopolíticas.

A cooperação e as modalidades associativas se firmaram na última década, reafirmando o vislumbrado em produção do INEP2 (FRANCO e MOROSINI, 2001): as redes e sua força política como impulsionadoras da produção do conhecimento.

Sob tais ponderações, o presente trabalho examina possibilidades das redes acadêmicas no que diz respeito a contribuições para qualidade na ges-tão da ES. Tem como referência estudos de dois projetos do Observatório de Educação Capes/INEP, desenvolvidos pela Rede GEU – Grupo de Estudo sobre Universidade e pela RIES – Rede Sulbrasileira de Investigadores de Educação Superior, sobre “desafios contemporâneos” e “indicadores de qua-lidade” na Educação Superior, respectivamente. Na perspectiva metodológica, foram adotados como procedimentos: escolha intencional de redes acadêmi-cas como instâncias organizativas, representativas de integração regional, de articulação de grupos de pesquisa e de articulação de redes; análise de docu-mentos e/ou de produções das redes para a sua caracterização e configuração de contribuições para a qualidade na gestão da Educação Superior; construção de categorias de convergências temáticas orientadas pelos princípios de simi-laridade e aproximações sucessivas.

1 O presente trabalho se sustenta no estudo desenvolvido por FRANCO, LONGHI e ZANETTIN-RIBEIRO sobre Esforços regionais e redes: no caminho da qualidade na gestão acadêmica apresentado na 1º Conferência do Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa, realizado nas Universidades de Lisboa e Coimbra nos dia 14 a 16 de novembro de 2011.2 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), autarquia federal vin-culada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro.

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LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES120 LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES

A rede de integração regional escolhida é a resultante da CRES 2008 – Conferência Regional de Educação Superior – Enlaces, sob os auspícios do IESALC – Instituto Internacional da Unesco para Educação Superior na América Latina e Caribe, devido ao avanço na integração e sua força política e credibilidade para articular junto aos diversos países e suas instituições.

A rede de articulação de grupos de pesquisa escolhida é a Rede GEU. A escolha recai por suas características e trajetória que passa pelo interdeparta-mental ao interinstitucional, ampliando participações em outras redes e grupos.

A rede que articula redes se aproxima da metarrede (FRANCO et al., 2011) e tem entre seus elementos constitutivos e interativos outras redes aca-dêmicas, nominadas ou não, mas certamente, operando como tal. É o caso da RIES e do Universitas.

As instâncias organizativas no âmbito deste trabalho ultrapassam a institucionalização de setores específicos; se organizam enquanto grupos/re-des institucionalizando-se pela legitimação do trabalho. Elas requerem apoio formal para subsistir, mas retribuem com a repercussão institucional dos re-sultados de sua atividade.

REDES ACADÊMICAS: FORMATOS ORGANIZATIVOS As redes acadêmicas são instâncias organizativo-associativas promo-

toras de ações cooperadas que têm em mira o desenvolvimento da ES e/ou de uma Instituição de Educação Superior (FRANCO, LONGHI e ZANETTINI-RIBEIRO, 2011). Tal definição é de sentido amplo e pode contemplar ins-tâncias representativas de blocos regionais e de pesquisadores institucionais, interinstitucionais, nacionais e/ou internacionais. A tônica são as ações asso-ciativas em face dos problemas e a geração de encaminhamentos; ela tende a se solidificar em patamares mais amplos do que os surgidos no cotidiano. A CRES 2008 considera a importância de interlocução estratégica de redes acadêmicas perante os governos.

REDE ACADÊMICA DE INTEGRAÇÃO REGIONAL A integração regional na América Latina é traçada a partir de ações

econômicas derivadas de parcerias políticas entre os países, tendo como re-sultado duas grandes organizações criadas para pensar a ES neste contexto: o “Mercosul Educacional”3, que envolve, além do Brasil, outros cinco paí-ses do continente, a saber, Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai e Venezuela, e o IESALC/Unesco4 – Instituto Internacional para a Educação Superior na América Latina e Caribe, que objetiva a integração regional e a ligação com outras regiões do mundo.

3 http://www.sic.inep.gov.br/index.php.4 http://www.iesalc.unesco.org.ve,

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 121

O IESALC/Unesco traz nos seus objetivos a melhoria da qualidade por meio da cooperação e mobilidade na América Latina e Caribe, visando maior equidade, desenvolvimento e empregabilidade regionais. Resultou desse mo-vimento e da Conferência Regional de Educação Superior da América Latina (CRES, 2008), a proposta do Enlaces, a qual estabelece “ a criação de uma plata-forma de diálogo para articular ações concretas de cooperação para a reforma dos sistemas e instituições de Educação Superior” (BOLETIM ESPECIAL n. 200).

O IESALC/Enlaces/Unesco objetiva a conservação das redes de ES existentes na região, incentivando novas criações. Mediante a constituição de redes, é expectativa que as IES (Instituições de Educação Superior) da região possam compartilhar o seu potencial científico e cultural para analisar e solu-cionar problemas estratégicos (CRES, 2008). Assim,

[...] grupos de universidades e instituições de Educação Superior e atores indi-viduais que se unem para atingir objetivos específicos relacionados com a ques-tão do Ensino Superior. Mesmo quando duas ou mais instituições atuam em diferentes níveis e várias esferas de ação ou quando trabalham em cooperação, elas podem maximizar seus esforços e, portanto, obter um melhor desempenho5 (http://www.iesalc.unesco.org.ve).

As instituições brasileiras de ES participam de redes cadastradas no portal Enlaces.

REDE ACADÊMICA DE PESQUISADORES – GEU6 O GEU, criado em 1988 como Grupo de Pesquisa sobre Universidade,

vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGEdu, atualmente, congrega grupos (GEU Ipesq/UFRGS, GEU Sociologia/UFRGS, GEU Ipesq/UFPel e GEU/UPF)7, envolvendo pesquisadores de mais de vinte IES. Isso de-monstra seu caráter agregador e sua tendência à busca de cooperação entre ins-tâncias organizativas atuantes nas instituições. Além disso, participa de redes nacionais e internacionais como o núcleo da AUGM. Acompanha a dinâmica da área, efetiva parcerias e integra associações como EAIR – European Higher Education Society e AIR – Association for Institutional Research e Lasa.

A análise de sua trajetória evidencia o movimento que somente um olhar retrospectivo a partir de seu interior permite elaborar: o movimento de um projeto que evolui para a constituição de um grupo de pesquisa; o movi-

5 Las Redes de Educación Superior pueden ser entendidas como organizaciones formales o grupos de universidades y/o de instituciones de Educación Superior y actores individuales que se agrupan para lo-grar objetivos específicos vinculados al tema de Educación Superior. Aún cuando dos o más instituciones actúen en distintos y variados niveles o ámbitos de acción, cuando trabajan en cooperación, pueden maxi-mizar sus esfuerzos y, por lo tanto, obtener mejores resultados.6 A experiência do Grupo e Rede GEU foi alvo de diversos estudos desde a década de 1990. Alguns deles foram socializados e se refletem no texto de FRANCO e KRAHE (2008). 7 UFPel – Universidade Federal de Pelotas/ UPF – Universidade de Passo Fundo.

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LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES122 LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES

mento do grupo se estende em rede de pesquisa – a Rede GEU, e o movimento de uma rede, alicerçada nas realidades locais, porém projetada para a constru-ção de interfaces com outras redes de pesquisa (FRANCO; KRAHE, 2008).

Desde 1988-1989, o GEU contou com pesquisadores com formação em centros internacionais de ES que participavam de projetos institucionais. Um destes, relacionado às condições de produção da pesquisa na própria UFRGS, em 1995, constituiu-se como projeto interinstitucional, envolvendo, posteriormente, conforme Franco (org., 1997), além da UFRGS, mais 15 IES

– Instituições de Educação Superior do estado (14 delas universidades). Ainda como grupo interinstitucional, traz inovação na metodologia

preconizada que motivou a releitura das histórias e trajetórias institucionais tendo como protagonistas, além do pesquisador institucional pró-reitores, coordenadores, assessores, e demais pesquisadores, num período em que es-tavam recém implantando ou ampliando seus Programas de Pós-Graduação stricto sensu. Além disso, a própria resposta aos dados requeridos repercu-tia politicamente na organização de setores, na institucionalização de normas, processos, editais propulsores da sistematização da pesquisa nas IES, cola-borando, de forma indireta, para o aperfeiçoamento da gestão da ES. Os efei-tos dessa pesquisa através dos seus indicadores serviram de referência, mais tarde aos indicativos de qualidade (FRANCO; AFONSO; LONGHI, 2010, LONGHI, 2010).

METARREDES RIES E UNIVERSITAS – NÓ QUE SUSTENTA

A RIES – Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior8 constitui-se como uma rede de pesquisa que busca a cooperação e o com-promisso social dos pesquisadores universitários na construção da Educação Superior e da Pedagogia Universitária como área de conhecimento e de práti-ca profissional. Em 2006 a RIES foi escolhida como Núcleo de Excelência em Ciência, Tecnologia e Inovação do CNPq/FAPERGS, o único núcleo em edu-cação composto pelas universidades PUCRS, UFRGS, UFSM e UNISINOS.

O grupo Universitas9 consolida uma rede acadêmica para a pesqui-sa e a interlocução entre pares que têm em comum a área de conhecimento Educação Superior. Ligado ao GT Política de Educação Superior da ANPED, congrega pesquisadores e estudantes de instituições de todos os estados brasi-leiros tendo entre seus objetivos selecionar, organizar, disponibilizar à comu-nidade, bem como avaliar a produção científica sobre Educação Superior no Brasil a partir de 1968.

A contribuição de projetos da rede Universitas contempla as catego-rias de cooperação, estruturação de instâncias organizativas de grupos e redes,

8 Informações retiradas do site do Grupo de Pesquisa: www.pucrs.br/face/pos/ries.9 Informações retiradas do site: www.pucrs.br/faced/pos/universitas.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 123

força política, protagonismo nas ações e no avanço da área, e inovação em suas metodologias expressas em reuniões sistemáticas e redirecionadoras de ações, por espaços de divulgação científica e abertura a grupos locais para socializarem trabalhos, o que se comprova em inúmeros encontros nacionais.

Segundo Morosini (2007): Inclusão de pesquisadores e de universidades que têm na rede a princi-

pal possibilidade de pesquisa. É o aprendizado, é a possibilidade de consul-ta e de produção de teses e dissertações etc. É importante registrar que com a parceria do INEP trabalhamos também em parceria com pesquisadores da Educação Superior dos 27 estados brasileiros, ampliando a socialização da rede. Consolidação da rede de pesquisadores Universitas. É notória a produção coletiva em parceria. No período 2004 – 2006 foram produzidas duas coletâ-neas (uma publicada pela Cortez e a outra pelo INEP), um número especial de revista de educação nacional A e 27 análises do censo da Educação Superior nos estados. Socialização da metodologia do projeto, através da discussão e da reflexão sobre o desenrolar do mesmo e da distribuição dos bancos de dados de periódicos, teses e dissertações e de livros. A metodologia da rede prevê, além da realização de reuniões que ocorrem durante o encontro anual da ANPED, no segundo semestre de todos os anos, reuniões em diversas regiões do país (MOROSINI, 2007, p. 247).

À semelhança das redes informáticas, os nós servem de suporte à aglutinações e sustentam a organização mais ampla da metarrede configu-rando-lhe resistência e permitindo o alcance/obtenção de sua metaidentidade. Entretanto, somente com forte e respeitosa articulação, solidária cooperação, esforço metodológico de inovação e força política exercida pelos protagonis-tas constituintes da instância organizativa dos grupos/redes é que se substan-cializa a inédita e propulsora metarrede.

ENCAMINHAMENTOS CONCLUSIVOS: DAS POSSIBILIDADES E CONTRIBUIÇÃO DAS REDES

A análise mostra que nos três tipos de rede, a de articulação de regiões, a de grupos e a de redes, tornam-se emergentes as categorias de cooperação entre instâncias organizativas: força política, protagonismo na pesquisa e na implementação de seus resultados e inovação metodológica, todas categorias-

-chave para alavancar a qualidade na gestão acadêmica e em suas políticas.Discutir os tipos de redes e antever possibilidades traz uma suposi-

ção e uma antecipação de movimentos cooperativos. Suposição é a de que a articulação exige concessões de dupla via. A antecipação faz vislumbrar os ganhos de espaço, de conhecimento e seus desdobramentos (FRANCO et al., 2011), sem omitir os riscos do “mercado da ES” (LITWIN, 2009) e “capitalis-mo acadêmico” (SLAUGHTER; RHOADES, 2004), amplamente discutidos e criticados. Ao analisar antecipadamente as possibilidades das redes, tendo consciência de que mudanças são inexoráveis e podem significar vislumbre de alternativas para com elas lidar, com qualidade na gestão.

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LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES124 LONGHI, S. M. et al. - REDES ACADÊMICAS E SUAS CONTRIBUIÇÕES

É inegável que as redes acadêmicas buscam a cooperação, inclusive a internacional. Uma contribuição é desenvolver nas suas instâncias de inte-gração regional, de grupos e de redes, culturas institucionais orientadas para a antecipação na formulação de leis e não meramente para sua absorção acrítica. O fortalecimento de espaços regionais ocorre pelo diálogo no estabelecimento de políticas e de programas conjuntos, pela cooperação, articulação e garantia de recursos. Subjaz a ideia de captar vazios para impregná-los de empreen-dimentos, na linha que Didriksson (2005), o que intensifica a solidariedade internacional e o reconhecimento mútuo.

O Enlaces/CRES se projeta como espaço para o estabelecimento de condições de cooperação para o avanço no campo da ES. Ele indica tendên-cias, pois, tem força política, mas mostra que os esforços regionais são pauta-dos pela cooperação e constituição de instâncias organizativas sobre qualida-de na gestão da ES.

A Rede GEU acompanha essa mesma dinâmica de cooperação com as meta- redes. Em diversos momentos, seus integrantes e suas ações assumiram a linha estratégica de contribuir para o delineamento de procedimentos políti-cos viáveis, constituindo motes articuladores de pesquisas institucionais.

As metarredes, aqui expressas pela experiência da RIES e do Universitas, podem conectar distintos grupos e entidades, especialmente faci-litadas pelo uso de meios informacionais. Subjaz a ideia de que uma das suas maiores contribuições vai além da significativa produção acadêmica: reside na consolidação de infraestrutura documental da produção (biblioteca virtual), no refinamento teórico metodológico de pesquisas, no estímulo à criação de novos grupos de pesquisa, no incremento a publicações como livros e perió-dicos temáticos e no fortalecimento da crítica às políticas públicas em busca por soluções alternativas

Fazer “as coisas” acontecerem exige pessoas qualificadas, projetos que visam à capacitação de quadros em vários campos disciplinares. São condições para viabilizar estratégias de qualidade na gestão. Ao identificar possibilidades das redes acadêmicas e sua contribuição para a qualidade na gestão da ES e suas políticas promotoras, nota-se que os exemplares de rede selecionados acompanham a dinâmica das políticas de produção acadêmica e tendências internacionais e locais que se vislumbram.

REFERÊNCIAS CRES. Declaração da Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e Caribe 2008. Recuperado em 16 de outubro, 2007 de www.iesalc.unesco.org.ve/.../declaracaocres_portugues.pdfSimilaresDIDRIKSSON, A. Reformulación de la Cooperación internacional en la educación superior de América Latina y el Caribe. México: ANUIES, 2005. Recuperado em 20 de setembro, 2011. Disponível em: www.anuies.mx/servicios/p_anuies/publicaciones/revsup/res 114/txt9.htm.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 125

FRANCO, M. E.; Afonso, M.; LONGHI, S. Indicativos de qualidade na Gestão da Universidade: dimensões e critérios em questão. In: XI Seminário Internacional “Qualidade na ES: Indicadores e Desafios”. Porto Alegre: RIES/Observatório Capes/PUCRS, 14 e 15 de out. de 2010, 28 p. FRANCO, M. E.; LONGHI, S. M.; ZANETTIN-RIBEIRO, C. Esforços re-gionais e redes: no caminho da qualidade na gestão acadêmica. a ser apresen-tado na 1ª Conferência do Fórum da Gestão do Ensino Superior nos Países e Regiões de Língua Portuguesa. Lisboa: Universidades de Lisboa e Coimbra, 14 a 16 de novembro de 2011.FRANCO, M. E.; MOROSINI, M. (orgs.). Redes acadêmicas e produção do conhecimento em educação superior. Brasília: INEP, 2001. FRANCO, M. E. et al. (org.). Universidade, pesquisa e inovação: o Rio Grande do Sul em perspectiva. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1997.FRANCO, M. E.; KRAHE, E. GEU/Ipesq: uma construção associativa para a produção do conhecimento. In: BROILO, C.; CUNHA, M. (orgs.) Pedagogia Universitária e produção de Conhecimento. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008, p. 368-377.FRANCO, M. E. Qualidade e Gestão da Educação Superior. Trabalho a ser apresentado no X Seminário Internacional do RIES – Grupos Investigativos internacionais em diálogo. Porto Alegre, PUCRS, 5 e 6 de dezembro de 2011. LITWIN, J. The efficacy of strategy in the competition for research funding in Higher Education. Tertiary education and management: linking research, policy and practice, 2009, 15 (01), 63-77. LONGHI, S. M. Qualidade na Gestão da Pesquisa. In: XI Seminário Internacional Qualidade na Educação Superior: Indicadores e Desafios. Porto Alegre: RIES/Observatório Capes/PUCRS, 14 e 15 de outubro/2010, 11p.MOROSINI, M. C. UNIVERSITAS/RIES. Educação. Porto Alegre, v. 30, p. 243-257, 2007. SLAUGHTER, S.; RHOADES, G. Academic capitalism and the new eco-nomy: markets, state, and higher education. Baltimore: The John Hopkins University Press, 2004.

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A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO E DA GESTÃO: UMA VISÃO

FUNDAMENTADA EM BOURDIEU

André Stein da SilveiraMarilia Costa Morosini

A complexidade dos negócios exige dos gestores, em qualquer seg-mento, habilidades que vão além de questões técnicas. Está em

pauta a difícil arte das relações interpessoais permeadas por interesses pessoais, hierarquia e poder.

Ser gestor exige uma incrível capacidade de sociabilidade com seus pa-res e um senso comunitário capaz de envolver e mobilizar muitos atores em prol de sua causa. Além disto, o gestor deve estar sempre atento à defesa dos interesses da instituição em que atua, seja ela da iniciativa pública ou privada, de pequeno, médio ou grande porte.

O bom gestor sabe lidar com o poder, legitimado por sua equipe, não pela imposição de suas ideias e métodos, e sim pela fidelidade, lealdade e res-peito para com sua equipe. Ao mesmo tempo em que exerce a liderança, deve ter ciência de que também é um liderado. Todo gestor está subordinado a alguém, seja por um profissional hierarquicamente superior, seja a um órgão superior, via de regra Conselhos de Administração.

O mundo da educação possui muitos elementos do mundo empresarial, em-bora esta afirmativa não seja unanimidade no segmento. A educação, e aqui os au-tores referem-se à Educação Superior, a exemplo do segmento empresarial, exige planos estratégicos e outras iniciativas do mundo corporativo. A educação também está inserida num ambiente onde é preciso examinar as tendências futuras, a legis-lação, os “concorrentes”, os clientes (identificados pelos autores como alunos) e os

“stakeholders”1. Isso tudo porque a Educação Superior, inserida num contexto socio-econômico de competitividade, requer estratégias de sobrevivência e sustentabilidade.

Para Machado (2008), a educação é um setor empresarial: “[...] alguns setores empresariais permanecem estáticos mesmo diante do caos reinante. São setores que não têm tradição nem histórico de uso de modernas práticas geren-ciais, nem mesmo gestores com conhecimento técnico em administração” (p. 12).

A GESTÃO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃOAs Instituições de Ensino Superior (IES) privadas vêm enfrentando ao

longo dos últimos anos uma verdadeira revolução neste mercado2. Segundo

1 Stakeholders: são as pessoas e grupos capazes de influenciar ou serem influenciados pelos resultados alcançados e que possuam reivindicações a respeito do desempenho da empresa (CHIAVENATO, 2006, p. 36).2 Mercado: Segundo Kotler (1996, p. 28), “O mercado consiste em todos os consumidores potenciais que compartilham de uma necessidade ou desejo específico, dispostos e habilitados para fazer uma troca

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SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO 128 SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO

dados do INEP3 (2009), expressos no Gráfico 1, o número de instituições privadas de Educação Superior chegou a 2.069 em 2009, o que representa um acréscimo de 1065 instituições desde o ano de 2000, significando 106% de crescimento no segmento. Em número de unidades (instituições), talvez seja um dos poucos segmentos com tamanha evolução. Somente nos últimos cinco anos foram criadas 280 novas instituições privadas no Brasil.

O contexto indica a necessidade de diferentes olhares. Existem insti-tuições privadas tradicionais, cujos mantenedores em sua grande maioria são oriundos de congregações religiosas. Para estes, durante anos a preocupação principal era com os processos de ensino e aprendizagem. Não havia a neces-sidade de preocuparem-se com estratégias, tampouco com o mercado. Agora diante do ingresso de grandes grupos com foco empresarial, cujo objetivo, além do processo educacional, é a lucratividade, se veem num novo contexto em que o papel do gestor torna-se fundamental.

Um fenômeno importante neste contexto é muito semelhante ao que ocor-re no mundo empresarial, em que empresas de grande porte dominam determinado mercado. Segundo o INEP (2009), as instituições consideradas de grande porte, apenas 117 (5,1%), em 2009 detinham 48,9% das matrículas, ou seja 2.506.670 matrículas na graduação presencial. O restante das matrículas, cerca de 51,1% do total, está distribuído entre as 2.197 instituições de pequeno e médio porte.

Gráfico 1. Evolução do Número de Instituições de Educação Superior – Brasil – 2000-2009. Fonte: Resumo Técnico da Educação Superior de 2009 – INEP – Ministério da Educação.

que satisfaça essa necessidade ou desejo”. Por outro lado, Kotler afirma que o conceito pode ser estendido para cobrir também grupos não consumidores, como mercado de eleitores, mercado de trabalho e mercado de doadores. O autor aqui faz referência observando que existem diferentes agentes formando estes merca-dos, de um lado alunos demandando educação, por outro as Instituições de Ensino Superior ofertando este

“bem” mediante uma remuneração/pagamento. 3 Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP – autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e equidade, bem como produzir in-formações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e público em geral. Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/conheca-o-inep>. Acesso em: 13 set. 2011.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 129

Estes dados apontam a concentração e ao domínio das instituições de grande porte. Quase metade das matrículas realizadas no Brasil está sob controle de 5,1% das IES – Instituições de Educação Superior de grande porte.

Diante deste cenário, os autores trazem à reflexão a importância do sistema de governança educacional e o papel dos gestores como agentes fun-damentais à manutenção e ao desenvolvimento de uma Educação Superior de qualidade.

Para Meyer Jr., Mangolim e Sermann (2004, apud MACHADO, 2008, p. 16):

Uma das funções mais negligenciadas nas instituições de Ensino Superior é a sua gestão. Alguns elementos contribuem para a situação em que se encontra a gestão das instituições de Ensino Superior. O primeiro deles é o fato de se atribuir à função gerencial na escola uma dimensão essencialmente operacio-nal e secundária. O segundo é a ausência de modelos próprios de gestão para a organização. [...] Finalmente, um terceiro elemento é o predomínio de uma prática amadora e professoral de gestão. As pessoas escolhidas para ocupar as posições de gestão não possuem preparação formal ou adequada experiência para assumir posições gerenciais.

A gestão em IES exige competências diferenciadas por atuar com vá-rios e diferentes atores no campo educacional. Trata-se da relação com alunos, corpo docente, coordenadores em geral, autoridades locais e governamentais, fornecedores, dentre outros.

A escolha do gestor torna-se um grande desafio para os mantenedores. Em alguns casos há de se reformular todo o processo de governança, reestru-turar departamentos, cargos e funções. Surge a ideia de que um bom professor será um bom gestor. Nem sempre isto é verdade, apesar de que muitas ativi-dades docentes estejam relacionadas à gestão.

Para Mosquera (1978, p. 112), “pode-se dizer que uma das caracterís-ticas do papel do professor é sua índole administrativa que consiste em fazer registros, utilizar materiais didáticos e aplicar procedimentos de avaliação”. Mosquera (1978) ainda destaca que “outros aspectos do papel do profissio-nal em educação consiste em pôr os alunos em contato com temas didáticos, motivá-los, planejar as atividades de aula, manter a disciplina, avaliar o rendi-mento e dirigir o diálogo em aula”, e completa “do desempenho do professor decorrem os progressos ou não dos alunos” (p.112).

A amplitude das atividades em IES exige mais do que um professor comprometido com os processos administrativos, de ensino e aprendizagem. As “[...] Instituições de Educação Superior têm uma série de responsabili-dades, tais como administrar recursos, programas, procedimentos, normas e incentivos que venham a intervir na aprendizagem e desenvolvimento do estudante [...]” (FELICETTI; MOROSINI. In: SANTOS; CARREÑO, 2010, p.12).

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SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO 130 SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO

Tanto nas instituições públicas como nas privadas, a boa gestão é fun-damental, e para Costin (2010) “a política educacional é uma política pública. Neste sentido, deve contemplar um enfoque que vai para além do que ocorre em sala de aula, na relação direta entre professor e aluno, terreno próprio da Pedagogia” (COSTIN. In: EBOLI et al., 2010, p.69). Costin (2010) com-plementa: “para que uma política pública seja efetiva, é fundamental haver mensuração e metas claras. [...] para o gestor da política educacional, há que, no entanto, saber com quais problemas específicos ele se defronta para poder melhorar a educação em seu estado ou município” (p. 70).

Os autores, ao trazerem o tema à discussão, pensam que alguns ele-mentos são fundamentais numa possível transição entre ser um educador e tornar-se um gestor no campo da educação. A forma como o sujeito, enquanto educador, vai criando e desenvolvendo suas competências científicas até se tornar uma autoridade naquilo que faz e por consequência receber o reconhe-cimento dos seus pares4 é um processo fundamental de conquista da liderança e da sua autoridade. Quando há este entendimento o educador torna-se uma autoridade naquilo que executa, discute e produz, e é ouvido e respeitado. Para Bourdieu (2004, p. 20), “a noção de campo está aí para designar esse es-paço relativamente autônomo, esse microcosmo dotado de suas leis próprias”.

Na medida em que ele domina o campo científico de atuação, mais autonomia conquista. Bourdieu (2004, p.21) destaca “[...] E uma das gran-des questões que surgirão a propósito dos campos (ou dos subcampos) cien-tíficos será precisamente acerca do grau de autonomia que eles usufruem”. No campo educacional o professor sofrerá pressões, de um lado, dos seus próprios alunos, que nos tempos atuais desejam aulas modernas, adaptadas às suas realidades, muita tecnologia, resistência a leitura etc. Por outro lado será cobrado pela qualidade de seu ensino, pelo cumprimento de horário, pela preparação dos materiais etc. Se gestor, também sofrerá pressões, desta vez pelo mantenedor, pela alta direção, pelos compromissos juntos aos órgãos reguladores. Segundo Bourdieu (2004, p. 21), “[...] o campo científico é um mundo social e, como tal, faz imposições, solicitações etc., que são, no entan-to, relativamente independentes das pressões do mundo social global que o envolve”. Para ele, “[...] as pressões externas, sejam de que natureza forem, só se exercem por intermédio do campo, são mediatizadas pela lógica do campo”.

Para Bourdieu, o campo tem a capacidade de refratar5 as pressões ou as demandas externas (p. 22). “Dizemos que quanto mais autônomo for um campo, maior será o seu poder de refração e mais as imposições externas serão transfiguradas, a ponto, frequentemente, de se tornarem perfeitamente irreconhecíveis” (p. 22).

4 Aqui interpretado pelos autores como todas as pessoas que convivem no mesmo ambiente de trabalho independentemente da posição hierárquica.5 Refratar: 1. Causar refração a. 2. Quebrar ou desviar a direção de (FERREIRA, 1988).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 131

No campo educacional, quanto mais o sujeito, enquanto professor ou enquanto gestor estiver integrado com sua equipe e com seus pares, maior será a sua capacidade de refratar. Para esse feito não basta apenas um bom re-lacionamento, é necessário investir-se de conhecimento e competência até for-mar o capital cultural necessário e reconhecido. Este capital não é necessaria-mente monetário, é o capital investido em cultura e conhecimento. Bourdieu (2010, p.73) afirma que “os economistas têm o mérito aparente de colocar explicitamente a questão da relação entre as taxas de lucro asseguradas pelo investimento educativo e pelo investimento econômico (e de sua evolução)”. Porém para ele existem outros tipos de capitais que também remuneram. Por exemplo, “[...] o rendimento escolar da ação escolar depende do capital cultu-ral previamente investido pela família e o rendimento econômico e social do certificado escolar depende do capital social – também herdado – que pode ser colocado a seu serviço” (2010, p. 74).

Sendo o campo um lugar de constituição de uma forma específica de capital (BORDIEU, 2004, p. 26), o campo educacional requer do gestor estra-tégias para estruturar a distribuição do seu capital entre os diferentes agentes engajados nesse campo. Para tanto o gestor deverá compartilhar o conheci-mento adquirido e acumulado ao longo dos anos, e com isto ele fortalece sua liderança e respeito perante a equipe e terá o reconhecimento de sua compe-tência. Porém há de se entender que os campos são os lugares de relações de forças, e o gestor deve estar preparado para lidar com a relação de poder entre os agentes.

Bourdieu (2005, p. 50) aborda as forças do campo quando trata do espaço social:

Essa estrutura não é imutável e a topologia que descreve um estado de posi-ções sociais permite fundar uma análise dinâmica da conservação e da transfor-mação da estrutura da distribuição das propriedades ativas e, assim, do espaço social. É isso que acredito expressar quando descrevo o espaço social global como um campo, isto é, ao mesmo tempo, como um campo de forças, cuja necessidade se impõe aos agentes que nele se encontram envolvidos, e como um campo de lutas, no interior do qual os agentes se enfrentam, com meios e fins diferenciados conforme sua posição na estrutura do campo de forças, con-tribuindo assim para a conservação ou a transformação de sua estrutura.

Bourdieu compara a luta científica com a luta armada entre adver-sários que possuem armas tão potentes e eficazes quanto o capital científico coletivamente acumulado no e pelo campo (2004, p.32). Existe por trás das

“armas” de luta a estratégia que nunca está explícita. Muitos professores alme-jam ser gestores e para tal intento investem numa estratégia de sucessão. O foco de seu investimento estará centrado nos investimentos necessários para se tornar um gestor, formação de redes de relacionamento (poder social), uso do marketing pessoal para fazer-se conhecido e angariar agentes para o seu campo e sempre que possível demonstrar aos seus pares sua competência téc-nica e científica.

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SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO 132 SILVEIRA, A. S. et al. - A ARTE DE TRANSITAR ENTRE OS CAMPOS DA EDUCAÇÃO

Aquele agente que não almeja ser ou ocupar cargos de gestão dedicar--se-á a sua carreira docente e encontrará também neste campo a necessidade de investimento para que no futuro possa ser “remunerado”6 e tornar-se uma autoridade no capital cultural acumulado.

CONSIDERAÇÕES FINAISEm ambas as situações discutidas, ser professor ou ser gestor, requer-

-se dos agentes uma dose de sabedoria, não só do conhecimento dos campos, mas de si próprio. O sucesso não estará escrito apenas nos indicadores de re-sultados, mas sim no bem-estar por exercer a atividade de sua escolha, aquela que torna uma pessoa realizada e feliz.

Ao exercer a atividade dentro do campo de sua escolha, o sujeito não somente reproduz seu conhecimento, mas torna-se um agente de mudança proporcionando e fazendo com que novos agentes produzam novos conheci-mentos. De toda sorte, é necessário para cada ator do processo entender que existem campos de atuação em que é preciso haver investimentos para formar um capital e tornar-se uma autoridade científica. É fundamental entender o poder social e as relações entre os atores que transitam neste campo.

Trata-se, portanto, de um investimento de longo prazo, e o diploma conquistado não garante as competências necessárias para o futuro. Para Bourdieu (2010, p.132), “o tempo do diploma não é o da competência: a ob-solescência das capacidades (equivalente ao desgaste das máquinas) é dissi-mulado-negado pela intemporalidade do diploma”. É o que Bourdieu chama de defasagem temporal, uma vez que as propriedades pessoais são adquiridas de uma só vez e acompanham o indivíduo durante toda a vida (p. 132). Para o autor, existe uma defasagem entre as competências garantidas pelo diploma e as características dos cargos, cuja mudança, dependente da economia, é mais rápida (p.132).

A arte de transitar entre os campos da educação e da gestão dependem muito mais do sujeito do que dos agentes externos. A partir de então, o do-mínio dos elementos do campo aqui discutidos tornarão o profissional mais seguro e preparado para um futuro de resultados pessoais e profissionais.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, P. Escritos da educação. In: NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. (orgs.). 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2010._______. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. Rio de Janeiro: UNESP, 2004.

6 Remunerado: utilizado aqui não como recompensas financeiras, e sim com retornos positivos dos re-sultados alcançados ao longo da vida nos processos de ensino e aprendizagem aplicados profissionalmente.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 133

_______. Razões práticas: sobre a teoria da ação.7.ed. Campinas: Papirus, 2005.CHIAVENATO, Idalberto. Recursos humanos: o capital humano das organi-zações. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2006COSTIN, Claudia. Educação básica no Brasil – a necessária transformação. In: EBOLI, Marisa ... [et al.] (orgs.). Educação corporativa: fundamentos, evolução e implantação de projetos. São Paulo: Atlas, 2010.EBOLI, Marisa ... [et al.] (orgs.). Educação corporativa: fundamentos, evolu-ção e implantação de projetos. São Paulo: Atlas, 2010.FELICETTI, V.L.; MOROSINI, M.C. Comprometimento e pedagogia univer-sitária. In: SANTOS, Bettina Steren dos; CARREÑO, Ángel Boza (orgs.). A motivação em diferentes cenários. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010, p.11-19.FERREIRA, Aurélio B. H. Minidicionário da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.INEP (2011). Resumo Técnico: censo da educação superior de 2009. Disponível em: <http://download.inep.gov.br/download/superior/censo/2009/resumo_tecnico2009.pdf>. Acesso em: 30 out. 2011.KOTLER, P. Administração de marketing: análise, planejamento, implemen-tação e controle. 4.ed. São Paulo: Atlas, 1996.MACHADO, Luis E. Gestão Estratégica: para instituições de Ensino Superior privadas. Rio de Janeiro: FGV, 2008.MOSQUERA, Juan José Mouriño. O professor como pessoa. 2.ed. Porto Alegre: Sulina, 1978.SANTOS, Bettina Steren dos; CARREÑO, Ángel Boza (orgs.). A motivação em diferentes cenários. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010.

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O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Denise Grosso da Fonseca Marlis Morosini Polidori

OS CAMINHOS DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

O sistema de Educação Superior é um importante elemento desen-cadeador de processos de crescimento de uma nação. Para Panizzi

(2006, p. 8), “a grandeza das nações, conforme nos demonstra a História, é o resultado do amadurecimento de suas instituições. E todo o processo de desen-volvimento – social, cultural, econômico e político – passa, necessariamente, pela busca da consolidação institucional”. Assim, para a autora, a relação entre universidade e sociedade constitui-se num desafio para a universidade em res-ponder, através do conhecimento, às necessidades da sociedade.

Como o Brasil, ao longo da história, tem buscado incluir a universi-dade no seu caminho rumo ao desenvolvimento social? Como a universidade se fez e se faz presente na consolidação do projeto de nação que o Brasil tem buscado construir?

Segundo Oliven (2002), diferentemente de outros países latino-ame-ricanos que foram colonizados pelos espanhóis e que, desde o século XVI, fundaram universidades em suas possessões, o Brasil Colônia somente três séculos mais tarde criou instituições de Ensino Superior em seu território. No percurso desse tempo, a elite colonial brasileira, que tinha como uma de suas missões unificar culturalmente o império português a partir de propósitos em que a fé católica e a superioridade da metrópole não fossem questionadas, re-alizava seus estudos na Universidade de Coimbra, em Portugal.

O início da Educação Superior no Brasil se dá só em 1808, com a vin-da da família real, quando são criadas algumas faculdades na Bahia e no Rio de Janeiro, com orientação bastante elitista e baseada no modelo das escolas francesas, mais voltadas ao ensino do que à pesquisa. A primeira universida-de foi criada em 1920, no Rio de Janeiro, e somente em 1931 o presidente Getúlio Vargas cria o Ministério de Educação e Saúde, quando é aprovado o Estatuto das Universidades Brasileiras que vigorou até 1961. Nele era propos-to que a universidade poderia ser oficial (pública) ou livre (particular).

A criação da Universidade do Brasil, nome que foi dado à anti-ga Universidade do Rio de Janeiro, fez parte do movimento gerador de um modelo único de Ensino Superior em todo o território nacional, coordenado pelo Ministro de Educação e Saúde do governo Vargas (1937-1945), Gustavo Capanema, que aproveitou o autoritarismo do Estado Novo para implantar seu projeto de ensino universitário, autoritário e centralizador. A seguir, durante a

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FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO136 FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO

Nova República (1945-1961), ocorreu o surgimento de inúmeras universida-des, públicas federais, distribuídas nas respectivas capitais de cada unidade da federação, e universidades religiosas, oportunizando a expansão das matrículas.

Em 1961, foi promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, Lei nº 4.024/61, que, mesmo tendo trazido a possibili-dade de certa flexibilidade no Ensino Superior, na prática reforçou o modelo tradicional vigente, mantendo as cátedras vitalícias e a supremacia do ensino sobre a pesquisa. De inovação assegurou representatividade estudantil nos co-legiados.

Com a transferência da capital do Brasil para Brasília, em 1961, foi criada a Universidade de Brasília (UNB), com uma estrutura moderna e fle-xível, seguindo o modelo norte-americano, organizada na forma de fundação e departamentos, substituindo as cátedras, tendo sido a primeira universidade que não surgiu da aglutinação de faculdades já existentes. Tinha como obje-tivo o desenvolvimento de uma cultura e tecnologia nacionais, dentro do pro-jeto desenvolvimentista da época. Entretanto, após o Golpe Militar de 1964, o governo federal passou a controlar diretamente as ações acadêmicas com o pretexto de coibir atividades de caráter subversivo, tendo afastado inúmeros professores e alunos cujas ideias representavam ameaça ao modelo instituído.

Em 1968, o Congresso Nacional aprovou a Lei da Reforma Universitária (Lei 5.540/68 – dirigida às instituições federais), que criou os departamentos, o sistema de créditos, o vestibular classificatório e também estabeleceu a indissociabilidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão, o regime de tempo integral e a dedicação exclusiva dos professores, valorizan-do a titulação e produção acadêmica, permitindo, assim, a profissionalização da classe.

Chauí (2001) analisa essa reforma universitária, feita sob a proteção do Ato Institucional nº 5 e do Decreto nº 477, em combinação com o Relatório Atacon (1966) e o Relatório Meira Mattos (1968). O primeiro preconizava a necessidade de encarar a educação como um fenômeno quantitativo a ser resolvido com máximo rendimento e mínima inversão através da implantação de um sistema universitário baseado no modelo administrativo. O segundo revelava a preocupação com a falta de disciplina e autoridade na universidade, refutava a ideia de autonomia universitária, sob a alegação de que essa repre-sentaria a possibilidade de ensinar conteúdos prejudiciais à ordem social e à democracia.

Nesse contexto, há uma grande pressão para o aumento do número de vagas cuja demanda passa a ser suprida, com a aquiescência do governo, pelo setor privado através da criação de inúmeras faculdades isoladas. Desta forma, em 1980, 86% dos alunos do terceiro grau estavam matriculados em faculdades privadas. Para o governo militar a expansão do setor privado atra-vés de faculdades isoladas representava a pulverização dos centros de estudos e desmobilização política dos estudantes.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 137

Além disso, a importância atribuída ao desenvolvimento econômico fez com que houvesse grande incentivo à formação de recursos humanos de alto nível, objetivo perseguido a partir da criação de cursos de pós-graduação stricto sensu, através das universidades públicas, as quais passaram a ser os principais centros de pesquisa no país. Ocorre que mesmo havendo um au-mento de instituições privadas, a pesquisa é assumida pelas universidades pú-blicas e se estabelece um novo problema: o avanço do movimento privatista.

Os debates que antecederam a Constituição Federal de 1988 confron-tavam educação pública x privada, colocando em questão por um lado o in-teresse daqueles que defendiam verbas públicas exclusivamente para institui-ções públicas e de outro lado os ligados ao setor privado que visavam acesso às verbas públicas, bem como a diminuição da interferência do estado nos negócios educacionais. A referida Constituição, no artigo nº 207, consolida a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; no artigo nº 209 declara a liberdade ao ensino na iniciativa privada, desde que sejam cumpridas as nor-mas gerais da educação nacional e as instituições passem pela autorização e avaliação de qualidade pelo poder público. No seu artigo nº 212 garantiu 18% da receita oriunda dos impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino e estabeleceu parâmetros para a elaboração de uma nova LDB. Assim, após a promulgação da Constituição Federal em 1988 começa o debate sobre a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9.394/1996 que revogou a primeira LDB, Lei 4.024/61, bem como a Lei 5.540/68, que teve como principal efeito, segundo Bittar, Oliveira e Morosini (2008), a ex-pansão do ensino privado de caráter empresarial.

A LDB 9.394/96 traz alterações na Educação Superior, como a “flexi-bilização/fragmentação por meio da diversificação institucional e a expansão pela via do setor privado, acentuando a privatização desse nível de ensino” (CHAVES, LIMA e MEDEIROS, 2008, p. 335). Nestes quase quinze anos de vigência da LDB, inúmeras alterações vêm ocorrendo, através de decretos, por-tarias e outros dispositivos legais por imposição de organismos internacionais, dentre os quais, o Fundo Monetário Internacional, FMI, compondo uma sequ-ência de instrumentos normativos que “foram fundamentais para a estrondosa expansão do empresariamento do Ensino Superior no Brasil” (idem, p.336).

O PÚBLICO E O PRIVADO NO PROCESSO DE EXPANSÃONa esteira da retomada da trajetória da Educação Superior à luz de

aspectos legais que sustentaram a criação e o desenvolvimento desse nível educacional, pretendemos discutir o crescimento desse sistema confrontando o público e o privado, a partir de dados dos sensos de 2007, 2008 e 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

Nas figuras a seguir, os gráficos apresentam os índices de crescimento de instituições e de matrículas por categoria administrativa, pública e privada, numa sequência cronológica que atravessa os anos de 1996 a 2009.

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FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO138 FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 139

Esses dados indicam que em 1996 havia 77,1% de instituições priva-das para um percentual de 22,9% de instituições públicas. Em 1997, decres-ce um pouco o número de privadas, mas esse percentual volta a subir em 1988, se mantendo em ascensão até 2009. Com relação ao índice de matrícu-las, há um decréscimo no percentual nas instituições públicas desde 1996 até 2005, apresentando um pequeno crescimento em 2006, o qual tem se manti-do até 2009.

Da mesma forma, o próximo gráfico apresenta os índices de cursos nas categorias pública e privada indicando a mesma tendência, ou seja, um aumento gradativo no percentual de cursos de instituições privadas e a dimi-nuição do percentual de cursos em instituições públicas. Entretanto, no caso dos cursos, o índice de cursos na categoria privada continua subindo até 2008, mas tem um pequeno decréscimo em 2009.

Para analisar os gráficos que indicam o significativo avanço do pro-cesso de privatização da Educação Superior brasileira, faz-se necessário re-visitar o processo histórico, cenário político e econômico da realidade aqui apresentada. O período em pauta compreende uma linha de tempo que atra-vessa os governos Fernando Henrique Cardoso, FHC (1995-2002), e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2008).Também é importante destacar que 1996 é o ano da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB nº 9.394/1996, que estabelece que deve ser criado o Plano Nacional de Educação

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FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO140 FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO

– PNE. Este plano, em sua proposta de diretrizes e metas para a Educação Superior, aprovada pela Lei nº 10.172/2001, apresenta como uma de suas principais questões o aumento no número de vagas no Ensino Superior.

Para Peixoto e Braga (2008), o aumento das vagas atenderia a uma demanda resultante de diversos fatores conjugados, tais como: índices de-mográficos, exigências do mercado de trabalho e aumento das matrículas e conclusões do Ensino Médio, nas redes estaduais, com provável crescimento de alunos oriundos das classes mais pobres da população. Outro aspecto des-tacado pelos autores e diagnosticado pelo PNE diz respeito ao baixo índice de acesso nesse nível de escolaridade, em relação à população de 18 a 24 anos, atingindo menos de 12%, configurando-se num dos níveis mais baixos de acesso ao Ensino Superior da América Latina. Desta forma o PNE (2001) es-tabelece como meta prover até o final da década a oferta de Educação Superior para, pelo menos, 30% da faixa etária dos 18 aos 24 anos.

Tais dados seriam motivos mais do que suficientes para que se esta-belecesse uma política pública educacional comprometida com a expansão e qualificação desse nível de ensino, de forma a garantir a democratização do acesso e permanência no Ensino Superior. Entretanto as pesquisas apontam para um período imediato à aprovação da LDB 9.394/96, em que a Educação Superior no Brasil passa por um processo de elevada privatização e desmante-lamento das instituições públicas, evidenciando uma grave crise institucional.

De acordo com Chaves, Lima e Medeiros (2008), a crise que afeta o sistema educacional superior brasileiro está relacionada às reformas de Estado de caráter neoliberal cujos ajustes no campo das políticas sociais promovem a supressão de vários direitos de cidadania. Na concepção neoliberal, a res-ponsabilidade pela crise econômica nos países capitalistas é do próprio Estado que produziu um setor público incompetente e privilegiado, em contraposição ao setor privado que executa suas funções com eficiência e qualidade. Nesse sentido, se justificam as medidas de redução do tamanho do Estado e, em es-pecial, os serviços de cunho social, como saúde, educação, transporte público, entre outros que favorecem a população.

Na América Latina, de um modo geral, as reformas de Estado imple-mentadas a partir dos anos 1990 sustentam-se na doutrina neoliberal. Nessa perspectiva, o governo FHC foi desenvolvendo políticas de ajuste estrutural que, entre outras medidas, centram-se na privatização do setor público, sob o argumento de que a solução da crise do Estado está na redução do déficit público originado nos excessivos gastos com pessoas e políticas sociais.

De acordo com Gomes (2008), durante o governo FHC, a expansão da Educação Superior deu-se mediante financiamento privado numa clara consolidação da Educação Superior como mercadoria, marca indiscutível da política liberal conservadora, tentando apagar da memória da população a ideia de educação como direito. Também com relação à universidade pública houve um movimento no sentido de elevar os níveis de eficiência e responsa-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 141

bilidade social, ao mesmo tempo em que as universidades foram submetidas às mais drásticas medidas de cortes e ajustes, não autorização de contratação de pessoal docente, buscando denegrir a imagem das universidades federais.

Voltando-se aos dados evidenciados nos gráficos, percebe-se que duran-te o governo Lula continuam aumentando os índices a favor da educação pri-vada. Entretanto, para Gomes (2008), embora exista essa linha de continuidade entre os governos FHC e Lula no sentido da privatização e mercantilização da Educação Superior, há um elemento de ruptura demarcado pela ação do Estado através de uma política de democratização e justiça social, no governo Lula.

Essa ação se estabelece através de medidas governamentais que intro-duzem a nova política de desenvolvimento do governo Lula, o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, que incorporou o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE. No ano de 2007, o Governo Federal lança o PDE, cons-tituído por um conjunto de decretos, projetos de lei, resoluções e portarias, visando prioritariamente à melhoria da Educação Básica. Entretanto, para qualificar a Educação Básica, é fundamental que a Educação Superior tam-bém seja impulsionada a crescer e se qualificar em direção aos propósitos democráticos e inclusivos. Assim a reforma universitária traz como principais aspectos: reserva de vagas a alunos da rede pública e a afrodescendentes em universidades federais, criação de um núcleo básico nos cursos de gradua-ção, obrigatoriedade no Enem, criação de uma loteria para financiar a amplia-ção das universidades federais e reserva de vagas para alunos de baixa renda na rede particular de ensino em troca de isenção fiscal – Prouni – Programa Universidade para Todos. O Decreto nº 6.094/2007 institui o Programa de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – Reuni que, no seu artigo 1º, estabelece como objetivo criar condições de acesso e permanência na Educação Superior, no nível de graduação, pelo me-lhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos. O Reuni prevê a ampliação da oferta, reestruturação acadêmico-curricular, renovação peda-gógica, compromisso social, suporte de pós-graduação ao desenvolvimento e aperfeiçoamento qualitativo. A adesão ao programa é voluntária1.

Nesta perspectiva, de acordo com Gomes (2008), o governo Lula apre-senta uma iniciativa diferenciada de lidar com o fenômeno da expansão, através da democratização do acesso e da justiça social, fundada no conceito de redistri-buição indireta de renda significando a incorporação de parcelas da população tradicionalmente excluídas da Educação Superior: a população estudantil de baixa renda oriunda das escolas públicas, incluindo a população negra e grupos étnicos raciais. A política de expansão nesse governo se dirige tanto ao setor privado, através do Prouni, como ao setor público como atestam as políticas de cotas, a interiorização da Educação Superior pública através da criação de novas universidades em cidades de médio porte no interior dos estados.

1 Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=content&task=view&id=593&Itemid= 910 &sistemas=1. Acesso em: 08 dez. 2007.

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FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO142 FONSECA, D. G. et al. - O PÚBLICO E O PRIVADO NO CRESCIMENTO DA EDUCAÇÃO

CONSIDERAÇÕES FINAISEsses elementos explicam os dados expostos nos gráficos, em que o

crescimento das instituições de Ensino Superior públicas e privadas, iniciado no governo FHC, continua avançando durante o governo Lula, sendo que o Prouni, mesmo cumprindo um importante papel na democratização do acesso das classes menos favorecidas no Ensino Superior, parece que tende a fortale-cer o processo de privatização. Entretanto existe uma diferença profunda entre a política de expansão ocorrida durante o governo FHC e a implementada ao longo do governo Lula: o elemento de democratização e justiça social pre-sente nas ações governamentais da gestão Lula e mantidas no governo Dilma Russef se contrapõe ao modelo marcado pela competitividade e mercantiliza-ção da gestão FHC.

REFERÊNCIAS

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A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA EM GESTÃO AMBIENTAL:

QUALIDADE, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO EM FOCO

Clarice Monteiro Escott Leandra Borba Leal

N este espaço, pretende-se apresentar os resultados parciais da pesquisa Tecnologia e Inovação nos Cursos Superiores de

Tecnologia1, desenvolvida pela Linha de Pesquisa e Inovação, Currículo e Avaliação do IFRS/Campus Porto Alegre. A pesquisa vem sendo realizada atra-vés de estudo de caso descritivo e comparativo, com abordagem qualitativa, em quatro IES – Instituições de Educação Superior do Rio Grande do Sul – uma Universidade, um Centro Universitário, uma Faculdade e um Instituto Federal, no período de 01/05/2011 a 31/01/2012, com Cursos Superiores de Tecnologia em Gestão Ambiental. Para tanto, vem realizando a análise de fatos primários

– análise da Legislação vigente para a Educação Tecnológica e da análise do-cumental dos Projetos Pedagógicos dos Cursos Superiores de Tecnologia em Gestão Ambiental. Além disso, realiza entrevistas com docentes e estudantes.

Como forma de produzir significados, a análise dos dados está sendo organizada tomando por base a técnica de referencialização utilizada por Figari (1996), para explicitar os referentes pertinentes às categorias de inovação e tecnologia no âmbito do currículo, da pedagogia e da avaliação e o contexto real de sua implementação. Sendo assim, para pesquisar Inovação e Tecnologia nos Cursos Superiores de Tecnologia de Universidades, Centros Universitários, Faculdades e Institutos Federais define-se como objetivo geral: analisar as categorias de inovação e tecnologia no currículo dos Cursos Superiores de Tecnologia em Gestão Ambiental nas IES das diversas organizações acadêmicas do RS. Esse objetivo geral desdobra-se em três objetivos específicos que orien-tam o desenvolvimento da investigação: identificar a influência da organização acadêmica das IES na constituição dos currículos, da pedagogia e da avaliação dos Cursos Superiores de Tecnologia; verificar a concepção de inovação e tec-nologia que permeiam os currículos dos Cursos Superiores de Tecnologia; cons-truir indicadores de inovação e tecnologia que contribuam para a consolidação da identidade das propostas curriculares dos Cursos Superiores de Tecnologia, bem como para a construção de instrumento de avaliação destes cursos.

As categorias que emergirem desta pesquisa orientarão a constru-ção de indicadores para consolidação e avaliação de Cursos Superiores de Tecnologia, de forma a contribuir para o avanço das categorias centrais – ino-vação e tecnologia, foco desta modalidade de Ensino Superior.

1 Pesquisa financiada pelo Programa de Bolsas de Iniciação Científica e Tecnológica – IFRS/Campus Porto Alegre.

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ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA144 ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA

A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA EM GESTÃO AMBIENTAL: CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMA DE PESQUISAOs Cursos Superiores de Tecnologia foram criados pela Resolução

CNE/CP nº 3/2002, a qual institui as Diretrizes Curriculares Nacionais gerais (DCN) para a organização e o funcionamento dos cursos superiores de tecno-logia. Diferentemente das demais Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação, as DCN para os Cursos Superiores de Tecnologia não são espe-cíficas por áreas, são gerais e os definem como cursos de educação profissio-nal de nível tecnológico que deverão: incentivar o desenvolvimento da capa-cidade empreendedora e da compreensão do processo tecnológico, em suas causas e efeitos; incentivar a produção e a inovação científico-tecnológica, e suas respectivas aplicações no mundo do trabalho; desenvolver competências profissionais tecnológicas, gerais e específicas, para a gestão de processos e a produção de bens e serviços; propiciar a compreensão e a avaliação dos impactos sociais, econômicos e ambientais resultantes da produção, gestão e incorporação de novas tecnologias; promover a capacidade de continuar aprendendo e de acompanhar as mudanças nas condições de trabalho, bem como propiciar o prosseguimento de estudos em cursos de pós-graduação; adotar a flexibilidade, a interdisciplinaridade, a contextualização e a atualiza-ção permanente dos cursos e seus currículos; garantir a identidade do perfil profissional de conclusão de curso e da respectiva organização curricular.

Sendo assim, a implantação dos Cursos Superiores de Tecnologia deve imprimir uma nova lógica de formação profissional, tendo como eixo central da organização curricular as categorias de tecnologia, inovação cien-tífico-tecnológica, dentre outras. A investigação da implantação destes cursos representa a possibilidade de compreender as novas lógicas curriculares, bem como as novas relações que se estabelecem entre a Educação Superior e o mundo do trabalho.

Neste projeto tomam-se as relações entre currículo, pedagogia e ava-liação (BERNSTEIN, 1988) em sua interação com a inovação e a tecnologia no âmbito dos cursos superiores de tecnologia, nova modalidade de Ensino Superior no Brasil. A tecnologia, elemento-chave na organização dos currícu-los dos Cursos Superiores de Tecnologia, exige novas habilidades cognitivas e reconfiguração de tarefas e métodos (DOWBOR, 2001). Neste contexto, por tecnologia pode-se definir o conjunto complexo de técnicas, artes e ofícios (techné) capazes de modificar/transformar o ambiente natural, social e huma-no (cognitivo), em novas realidades construídas artificialmente.

De acordo com este pressuposto, e como bem sabiam os gregos clássi-cos, a técnica (techné) não é boa, nem má, nem neutra – mas política.2 O con-ceito de inovação será considerado nesta investigação, conforme Leite (1999) e

2 In: http://www.gobiernoelectronico.org/node/4652, acesso em 04/04/2011.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 145

Santos (2003), uma ruptura clara com paradigmas vigentes nas Universidades; uma transição para um novo padrão; ou uma reconfiguração de saberes, pode-res ou conhecimentos. Estes conceitos serão analisados no âmbito dos currícu-los dos Cursos Superiores de Tecnologia, considerando as relações-chave entre o currículo, a pedagogia e a avaliação, tidos como as três formas de mensagens pelas quais o conhecimento formal é realizado, e as duas formas diferentes de transmissão definidas por oposição: estrutura ou currículo de coleção e estru-tura ou currículo de integração (BERNSTEIN, 1998).

Para essa interação, os currículos, as pedagogias e as avaliações dos Cursos Superiores de Tecnologia ainda não apresentam informações que pos-sam indicar seus resultados. Como nova modalidade de Ensino Superior que propõe a formação profissional específica e voltada aos processos de tecno-logia e inovação, não possuem modelos que constituam referências para a realidade nova que se coloca com as políticas públicas definidas para estes cursos. Os Cursos Superiores de Tecnologia são ofertados por IES de todas as categorias acadêmicas: Universidades, Centros Universitários, Faculdades e Institutos Federais.

De acordo com o Decreto 5.773/06, as universidades se caracterizam pela indissociabilidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão. São ins-tituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível su-perior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano, que se caracterizam por: produção intelectual institucionalizada mediante o estu-do sistemático dos temas e problemas mais relevantes, tanto do ponto de vista científico e cultural quanto regional e nacional; um terço do corpo docente, pelo menos, com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; um terço do corpo docente em regime de tempo integral. Já os Centros Universitários são instituições de Ensino Superior pluricurriculares, abrangendo uma ou mais áreas do conhecimento, que se caracterizam pela excelência do ensino ofere-cido, comprovada pela qualificação do seu corpo docente e pelas condições de trabalho acadêmico oferecidas à comunidade. As faculdades são instituições de Educação Superior, públicas ou privadas, com propostas curriculares em uma ou mais de uma área do conhecimento, sem autonomia acadêmica. Os Institutos Federais representam as mais novas autarquias de regime especial de base educacional humanístico-técnico-científica, encontrando na territo-rialidade e no modelo pedagógico elementos singulares para sua definição identitária. A nova organização escolar e acadêmica, singular aos Institutos Federais, aponta para a ruptura da reprodução de modelos externos e aponta para a inovação a partir da relação entre o ensino técnico e o científico, arti-culando trabalho, ciência e cultura na perspectiva da emancipação humana.

Assim, a concepção de educação profissional e tecnológica que deve orientar as ações de ensino, pesquisa e extensão nos Institutos Federais tem como elemento basilar a integração entre ciência, tecnologia e cultura como dimensões indissociáveis da vida humana e, ao mesmo tempo, no desenvol-

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ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA146 ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA

vimento da capacidade de investigação científica, essencial à construção da autonomia intelectual. O desenho curricular da educação profissional e tec-nológica nos Institutos Federais aproxima-se do que Bernstein (1998; 2003) chama de currículo de coleção, uma vez que deverá ofertar Educação Básica, principalmente em cursos de Ensino Médio integrado à educação profissio-nal técnica de nível médio; ensino técnico em geral; graduações tecnológi-cas, licenciatura e bacharelado em áreas em que a ciência e a tecnologia são componentes determinantes, bem como programas de pós-graduação lato e stricto sensu, sem deixar de assegurar a formação inicial e continuada de tra-balhadores.

Nesse contexto, dois conceitos apresentam-se como centrais: a trans-versalidade e a verticalização, constituindo-se dois aspectos que contribuem para a singularidade do desenho curricular nas ofertas educativas dessas ins-tituições. A verticalização, por sua vez, extrapola a simples oferta simultânea de cursos em diferentes níveis sem a preocupação de organizar os conteúdos curriculares de forma a permitir como princípio de organização curricular um diálogo rico e diverso entre os níveis de formação: educação profissional e tecnológica; qualificação profissional, técnico, graduação e pós-graduação tecnológica.

A transversalidade auxilia a verticalização curricular ao tomar as di-mensões do trabalho, da cultura, da ciência e da tecnologia como vetores na escolha e na organização dos conteúdos, dos métodos, enfim, da ação pedagógica. A pedagogia e a avaliação, no âmbito dos Institutos, implicam a superação da dicotomia ciência/tecnologia e teoria/prática, na pesquisa como princípio educativo e científico, nas ações de extensão e pesquisa como forma de diálogo permanente com a sociedade, o que revela sua deci-são de romper com um formato tradicionalmente imposto pela racionalida-de instrumental, trabalhando o conhecimento de forma fragmentada (MEC/SETEC). Assim, a transversalidade e a verticalização, cujo eixo de ação se dá através da inovação e tecnologia, sustentadas pelas dimensões de ensino, pesquisa e extensão, exigem novas habilidades cognitivas e reconfiguração de tarefas e métodos.

Tendo em vista as questões expostas e a necessidade de compreen-são do novo cenário da Educação Superior com a implantação dos Cursos Superiores de Tecnologia, orientam esta pesquisa as seguintes questões: a or-ganização acadêmica das IES incide sobre a proposta de constituição dos cur-rículos, da pedagogia e da avaliação?; qual a concepção de inovação e tecno-logia presente nos Cursos Superiores de Tecnologia das diferentes IES?; como se configuram as categorias de inovação e tecnologia nos currículos (disci-plinas, conteúdos e competências), na pedagogia (intervenção pedagógica na sala de aula) e na avaliação (instrumentos e critérios) dos Cursos Superiores de Tecnologia?; quais seriam os indicadores próprios ao desenvolvimento das categorias de tecnologia e inovação para avaliação dos cursos?

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 147

ANÁLISE DOS RESULTADOS PARCIAIS: INFLUÊNCIAS DE GESTÃO NA CONSOLIDAÇÃO DAS CATEGORIAS DE TECNOLOGIA E INOVAÇÃO NOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA EM GESTÃO AMBIENTALOs resultados parciais aqui apresentados estão contextualizados na

investigação das políticas públicas – DCN3 para os Cursos Superiores de Tecnologia, bem como a análise do Projeto Pedagógico de Curso e entrevis-tas com docentes e discentes do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Ambiental do IFRS.

A análise da Resolução nº 03/02 que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos Superiores de Tecnologia aponta que o foco dos currículos e da formação deve ser o da tecnologia, diretamente ligada à produção e gestão de bens e serviços. Além disso, no seu art. 6º, das DCN, fica expresso que os cursos superiores de tecnologia deverão contemplar, em sua organização curricular, o desenvolvimento de competências profissionais. No que se refere à categoria inovação, as DCN parecem apontar para uma concepção de currículo mais flexível, uma vez que indicam que “os cursos superiores de tecnologia poderão ser organizados por módulos que corres-pondam à qualificações profissionais identificáveis no mundo do trabalho” e ainda permitem que “o concluinte de módulos, citados anteriormente, fará jus ao respectivo Certificado de Qualificação Profissional de Nível Tecnológico”. Para a organização curricular, as DCN rompem com a organização dos cur-rículos míninos, quando definem: “a organização curricular compreenderá as competências profissionais tecnológicas, incluindo os fundamentos científi-cos e humanísticos”.

No Projeto Pedagógico do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Ambiental vinculado ao IFRS, pode-se perceber que o currículo e a peda-gogia estão voltados à categoria tecnologia quando definem como objetivos:

“propiciar a construção de conhecimentos específicos e tecnológicos na área de meio ambiente, relacionando aspectos teóricos e práticos; e fornecer os conhecimentos, métodos, novas tecnologias e ferramentas disponíveis para otimizar o uso dos recursos naturais e reduzir ou minimizar a degradação ambiental”. Além disso, no que se refere à avaliação, identifica-se no projeto do curso que “o aproveitamento de conhecimentos anteriores ao ingresso no curso, oriundos do mundo do trabalho, com fins de aproveitamento de estudos, ocorrerá mediante uma avaliação teórica ou teórico-prática, a ser elaborada e aplicada por uma comissão examinadora”. Tal encaminhamento aponta para a valorização dos conhecimentos prévios construídos no mundo do trabalho.

Quanto à categoria inovação, identifica-se, a partir da análise do pro-jeto do curso do IFRS, uma relação com as DCN, uma vez que a organização

3 DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos Superiores de Tecnologia (Resolução CNE/CP nº 3/02).

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ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA148 ESCOTT, C. M. et al. - A GESTÃO DOS CURSOS SUPERIORES DE TECNOLOGIA

do currículo é definida como flexível e visa ao acompanhamento das mudan-ças e avanços tecnológicos, promovendo a inter e a transdisciplinaridade. Isso se confirma quando o projeto define a inter-relação entre as disciplinas dos módulos e entre os módulos. Além disso, aponta para a constante atualiza-ção dos planos de ensino, englobando as ementas e bibliografia, em função das mudanças tecnológicas e novos conhecimentos gerados. Nesse sentido, as categorias inovação e tecnologia aparecem associadas no curso do IFRS. A avaliação aparece, principalmente, relacionada à categoria inovação.

O projeto do curso define que a avaliação da aprendizagem deve ocor-rer através do acompanhamento contínuo e cumulativo do desempenho do aluno, ao longo do semestre, nas diversas atividades teóricas e práticas de-senvolvidas, sendo que os critérios de avaliação são construídos, preferen-cialmente, em conjunto com os alunos. Além disso, a avaliação dos projetos integrados, compreendidos como projetos de investigação interdisciplinares, está prevista como avaliação parcial das disciplinas envolvidas.

Os resultados parciais das entrevistas realizadas no curso do IFRS apontam que, na percepção de professores e alunos, a tecnologia está aliada a equipamentos, visitas técnicas, relação teoria e prática, tecnologia computa-cional e pesquisa. A inovação está relacionada à adequação do currículo, inter-disciplinaridade, pesquisa, avaliação por instrumentos e critérios conceituais e atitudinais, bem como aulas participativas. Também destaca-se nas entrevis-tas com docentes e discentes a referência sobre o papel estratégico da gestão do curso que fomenta a discussão e a participação dos atores envolvidos para qualificação do mesmo. A gestão do curso vem possibilitando a agilidade na adequação curricular, na redefinição das estratégias pedagógicas, na diversifi-cação dos instrumentos e implantação da avaliação participativa.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 149

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ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE: NOVOS DESAFIOS

PARA A GESTÃO

Inês Amaro Gustavo Balbinot

N o presente trabalho lançamos um olhar sobre os movimentos que vêm ocorrendo na dinâmica interna do campo da educação e na

relação deste campo com o campo econômico, bem como sobre algumas ini-ciativas em curso na Província Marista do Rio Grande do Sul (PMRS), mais es-pecificamente em uma de suas entidades mantidas, a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com o intuito de identificar desafios vigentes no âmbito da governança institucional e da sustentabilidade e que geram novas demandas para a gestão na Educação Superior, em especial no que se refere às universidades comunitárias confessionais. Para tanto, realiza-mos uma leitura de produções acadêmicas e artigos teóricos sobre os temas da Educação Superior, da governança e da responsabilidade social/sustentabili-dade, destacamos alguns elementos presentes no âmbito político-legal e anali-samos documentos de planejamento institucional que expressam as mudanças em curso no campo da Educação Superior.

Bourdieu (2004), através da noção de campo, permite pensar a me-diação entre ciência pura, totalmente livre de qualquer necessidade social, e ciência escrava, sujeita a todas as demandas político-econômicas do entorno (2004, p. 19-21). A afirmação de que uma das manifestações mais visíveis da autonomia do campo é a sua capacidade de refratar, retraduzindo sob uma forma específica as pressões ou demandas externas, serve de base, no caso deste estudo, para refletir sobre as relações entre o campo da educa-ção e o campo econômico e, mais especificamente, identificar iniciativas que expressem como as universidades comunitárias confessionais estão se organizando para garantir sua sustentabilidade dentro do campo do Ensino Superior neste momento histórico e, ao mesmo tempo, preservar sua auto-nomia e identidade.

As instituições confessionais tiveram atuação histórica na educação brasileira desde a colonização até a criação da universidade brasileira. O Ensino Superior era formado por universidades públicas e confessionais até a década de 60, sendo que a partir da década de 80 inicia-se um processo de modernização das universidades brasileiras, o qual culmina na década de 90 com as reformas voltadas à expansão do sistema e a entrada de instituições universitárias com finalidade lucrativa e de caráter marcadamente empresa-rial, que passam a operar também no setor com a permissão do Estado.

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AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE152 AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE

Nesse novo contexto, as universidades confessionais e comunitárias defrontam-se com o desafio de fortalecer sua natureza e identidade e dife-renciam-se das Instituições de Ensino Superior Comunitárias (IES) particula-res, tanto por sua concepção filosófica, educacional e muitas vezes religiosa, quanto pela condição de serviço público não estatal, sem finalidade lucrativa.

Mortimer e Sathre (2010) estudam a influência das forças externas atualmente sobre os assuntos internos das IES, em especial a pressão do mer-cado sobre a rentabilidade e a competitividade, a globalização da ciência e tec-nologia e o crescimento da importância da tecnologia no ensino e na pesquisa, que transformam a propriedade intelectual em uma mercadoria lucrativa. As instituições competem por alunos e tentam responder a uma maior mobilidade e demanda para o ensino em qualquer hora e lugar, e as demandas internas para prestação de contas mudam o foco não no que é ensinado, mas no que é aprendido.

As profundas transformações que os sistemas de Ensino Superior no mundo vêm sofrendo impactam na garantia da qualidade e na sustentabilidade, atravessando todas as IES – Instituições de Educação Superior e provocando uma revisão das suas estruturas de governança. No Brasil, o forte crescimento da concorrência e um constante movimento de fusões e aquisições fazem com que a temática ganhe cada vez mais importância, muito embora, conforme conclui Regner (2010), em estudo sobre as práticas de governança corpora-tiva em mantenedoras de instituições de Ensino Superior privadas no Brasil, com e sem fins lucrativos, verifica-se que há ainda uma baixa adoção das re-comendações das Melhores Práticas de Governança Corporativa, entre essas instituições.

Segundo Tavares (2009), o termo governança corporativa passa a ser utilizado no meio empresarial a partir da década de 90 e consiste nas práticas e nos relacionamentos entre acionistas, Conselho de Administração e demais órgãos da organização, tendo em vista melhorar sua performance. Com a ex-pansão das entidades educacionais com fins lucrativos no campo universitário, a concepção passa a fazer parte do vocabulário dos mantenedores dos esta-belecimentos de ensino que “apresentavam boa performance de resultados financeiros, rápido crescimento de matrículas, cursos e campi, boas perspecti-vas para expansão e abertura de novas unidades universitárias”, e que “ passa-ram a se preocupar com os riscos do negócio e com a necessidade de assegurar sustentabilidade e retorno sobre o capital investido numa perspectiva de longo prazo (TAVARES, 2009, p. 232). Assim, segue o autor, tendo por base os prin-cípios da transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade cor-porativa, a governança, como estrutura de regras e práticas sobre as relações entre os agentes internos e externos, garantiria a continuidade institucional, assegurando sua imagem e sua reputação, mantendo-a atrativa a investidores e tornando-a capaz de atingir as expectativas da sociedade, ou seja, legítima.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 153

Nesse sentido, governança e gestão traduzem diferentes concepções e práticas no Ensino Superior. A governança refere-se ao exercício da autori-dade e legitimidade das decisões em relação às leis, políticas e regras que ar-ticulam os direitos, as responsabilidades e as interações entre diversos atores e os objetivos, metas e políticas de longo prazo da instituição, e a gestão diz respeito à implementação dos objetivos conforme as regras estabelecidas, ou seja, refere-se à ação, na perspectiva da eficiência, eficácia e qualidade dos processos e serviços institucionais (EURYDICE, 2008, p. 11).

No âmbito das IES particulares a adesão às boas práticas de gover-nança corporativa como forma de proporcionar maior transparência na gestão, conseguir investimentos e captação de recursos menos onerosos para as ins-tituições já tem sido uma prática. Rosseto (2009) estuda três instituições de Ensino Superior privadas que abriram seu capital na Bovespa e estão expan-dindo seus negócios para fazer frente aos riscos enfrentados pelas IES.

Nesse contexto, as IES comunitárias confessionais, que foram mate-rializando sua identidade em um compromisso social como forma de concreti-zação de seus ideais de justiça, inclusão e cidadania, mediante projetos sociais realizados pela extensão e por áreas de interseção entre a formação acadêmica e a prestação de serviços, como ambulatórios e hospitais, como é o caso da PUCRS, devem enfrentar as mudanças. Os novos paradigmas das instituições com fins lucrativos, emergentes no modelo de expansão do Ensino Superior proveniente das reformas da década de 1990, segundo Tavares (2009), afetam diretamente a governabilidade e sustentabilidade daquele projeto universitá-rio.

Segundo o mesmo autor, a questão é se a governança seria uma forma de garantir que os fins públicos dessas IES sejam atendidos ou se constituiria uma alternativa de levar as instituições a aderirem a uma concepção de go-vernança corporativa, oriunda do campo econômico e da lógica empresarial, voltada à geração de resultados e à eficaz competitividade no mercado, o que remete a questionar qual concepção de governança é compatível com os fins das universidades confessionais no contexto da pós-reforma da década de 90.

Analisando outras demandas e lógicas do mundo corporativo no cam-po econômico, que têm rebatimentos e começam a mudar as regras do campo da educação, identificamos a responsabilidade social e a sustentabilidade em-presarial, como a face da nova gestão proposta pelo capitalismo globalizado. A governança corporativa, como processo que proporciona aos shareholders e aos stakeholders da organização uma maior proteção, transparência, equidade de tratamento, prestação de contas e responsabilidade social, é uma estratégia voltada à longevidade das empresas, para que se mantenham competitivas no mercado, com sustentabilidade.

Especificamente no campo acadêmico, um conjunto de iniciativas in-ternacionais lideradas por organizações como a OCDE e a Unesco, as quais as-sumem um papel de orientadores na construção de paradigmas para Educação

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AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE154 AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE

Superior, aponta para a construção do conceito de qualidade na perspectiva da educação para o desenvolvimento sustentável (MOROSINI, 2009) e colocam na agenda das IES o papel do conhecimento como fundamento do desenvol-vimento sustentável da sociedade e as contribuições do Ensino Superior para a democracia e a superação das grandes questões sociais e ambientais.

No Brasil, são relevantes as mudanças a partir da criação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes, no ano de 2004, o qual inclui entre os seus objetivos e dimensões tanto a gestão quanto a responsa-bilidade social das IES, respeitando a identidade institucional e a autonomia.

Considerando a tarefa prioritária da Educação Superior na crise civili-zatória a necessidade de construção de novos paradigmas para uma sociedade planetária sustentável, compete às IES revisar suas missões para equilibrar o conhecimento economicamente pertinente como conhecimento humano e so-cial pertinente (SEGRERA, 2010). Por outro lado, o compromisso social das IES e a defesa de ideais humanísticos na construção de uma sociedade justa e democrática, em especial no caso das universidades comunitárias, encontram pontos de convergência com relação ao seu papel no âmbito da responsabi-lidade social, assim como provocam a reflexão sobre as formas históricas de realização desse compromisso, exigindo atualização e inovação.

Na visão da GUNI (Global University Network for Innovation), a res-ponsabilidade social universitária envolve a capacidade que tem a universida-de de difusão e colocação em prática de um conjunto de princípios e valores por meio de quatro processos principais: gestão, docência, investigação e ex-tensão. Se a responsabilidade social se desenvolve quando uma organização toma consciência de si mesma, de seu entorno e do papel que nele representa (VALLAEYS, 2006), alcançar essa consciência requer um conjunto de inicia-tivas e práticas que integram a gestão e a estratégia corporativa e atravessam todas as áreas da vida institucional, envolvendo os diferentes agentes internos e externos que interagem na comunidade universitária.

Para projetar e alavancar essa mudança, o planejamento estratégico, a capacitação e a participação dos gestores, do corpo docente, discente, e dos funcionários técnico-administrativos no processo de gestão e de melhorias, bem como a comunicação institucional, como estratégia de disseminação e sensibilização, são instrumentos fundamentais. Ainda, a gestão e os resulta-dos advindos dos serviços, programas, projetos e ações de ensino, pesquisa, extensão e gestão precisam ser compartilhados de forma transparente com a sociedade num processo democrático de prestação de contas, através de dife-rentes mecanismos, entre eles relatórios e balanços de sustentabilidade e/ou de responsabilidade socioambiental. A criação de comissões e grupos transversais para abordar questões como a inclusão social dos alunos, a gestão ambiental, o desenvolvimento de fornecedores, as relações com a comunidade, a gestão de pessoas, entre outros temas, tendo como fio condutor a necessidade de es-tabelecer um novo contrato social entre universidade e sociedade, são também importantes mecanismos que podem compor a governança institucional.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 155

GOVERNANÇA NA PROVÍNCIA MARISTA SUL E NA PUCRS A Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)

faz parte do Instituto dos Irmãos Maristas, congregação religiosa fundada por Marcelino Champagnat em 1817, em La Vallá, na França. É mantida pela União Brasileira de Educação e Assistência/UBEA, pessoa jurídica da Província Marista do Rio Grande do Sul. O título de Pontifícia, outorgado pelo Papa Pio XII já em 1º de novembro de 1950, significa a marca de união e de filial devotamento à Santa Sé. A natureza jurídica da universidade é de uma entidade privada sem fins lucrativos, filantrópica e, como instituição con-fessional católica e comunitária, tem como Chanceler o Arcebispo de Porto Alegre.

Em sua profícua história desde o surgimento, expansão e consolidação, a PUCRS chega ao ano de 2010, segundo o último Relatório Social (PUCRS, 2011), com um corpo docente de quase 1500 professores, sendo mais de 85% mestres e doutores e 29.640 alunos de graduação e pós-graduação, distribuí-dos em 57 cursos de graduação e 116 cursos de pós-graduação.

Um dos marcos dos avanços no processo de gestão institucional se expressa na implantação do processo de planejamento estratégico, instaura-do na universidade no ano de 2001 como uma ferramenta de apoio à ges-tão para responder à necessidade de atuar no ambiente competitivo de cons-tantes mudanças. O novo Planejamento Estratégico, do período 2011-2015, apresenta a PUCRS, “fundamentada nos direitos humanos, nos princípios do Cristianismo e na tradição educativa marista”, com a Missão de “produzir e difundir conhecimento e promover a formação humana e profissional, orien-tada pela qualidade e pela relevância, visando ao desenvolvimento de uma sociedade justa e fraterna”1. A visão demonstra mais claramente o movimento da universidade para acompanhar e assumir posição de liderança no contexto da Educação Superior frente aos desafios de seu tempo histórico, pois apon-ta para a PUCRS como referência nacional e internacional na qualidade do ensino e na relevância das pesquisas, “com a marca da inovação e da gestão sustentável, promovendo a formação integral dos alunos e contribuindo para o desenvolvimento científico, cultural, social e econômico”2.

O Presidente da Mantenedora apresenta o Plano Estratégico 2011-2015 como uma boa prática de gestão e que assegura, entre outros aspectos, sustentabilidade, visão de futuro, empreendedorismo e eficácia no cumpri-mento de sua missão institucional. Na visão do Presidente, o Plano evidencia a responsabilidade social da Instituição e fundamenta-se em recentes docu-mentos da Unesco e do MEC e contempla as orientações do 21° Capítulo

1 Plano Estratégico da PUCRS. Triênio 2011-2915. Disponível em http://www3.pucrs.br/portal/page/por-tal/pucrs/Capa/AdministracaoSuperior/asplam/AsplamPlanejamento/AsplamPlanejamentoDocumentos, acesso em 04/11/20112 Ibidem.

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AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE156 AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE

Geral dos Irmãos Maristas, em 2009, tanto na perspectiva da mudança de época quanto da formação cristã e cidadã no atual momento histórico.3

O documento apresenta elementos do cenário da Educação Superior que demonstram a clara sintonia da Universidade com a dinâmica dos campos da educação e sua interface com o campo econômico apresentadas no início deste trabalho, apontando um duplo desafio às IES: a atualização e inserção na realidade de transformações, dando um novo sentido ao seu papel social e à capacidade de entender e interpretar os problemas que tais transformações oferecem, apontando-lhes soluções.4 Por fim, as opções estratégicas revelam o empenho da PUCRS em diferenciar-se, manter-se alinhada com uma gestão capaz de consolidar seu posicionamento como universidade inovadora e em-preendedora e aprimorar sua sustentabilidade econômico-financeira. Ao mes-mo tempo, expressam a intensificação do compromisso da Universidade com a formação cristã, baseada na espiritualidade e na tradição educativa marista5.

Vinculada que está ao Instituto Marista, observamos como as ques-tões referentes à gestão e à governança buscam atender à característica de Universidade contextualizada na realidade de pertencer a uma instituição confessional católica, inspirada na filosofia de seu fundador. A relação com a Província Marista do Rio Grande do Sul se estabelece, seja pelas relações interpessoais entre os Irmãos e Leigos, seja pela partilha da mesma filosofia organizacional, ou ainda por dependência administrativa.

O modelo de governança vem sofrendo ajustes ao longo do tempo, como tentativa de responder adequadamente aos desafios de dupla natureza que se impõem às organizações confessionais. Podem ser desafios canônicos, da esfera da igreja católica, ou desafios gerenciais que respondem ao universo mais empresarial, de gestão dos negócios. Recentemente, em agosto de 2011, a Província Marista do Rio Grande do Sul (PMRS) promoveu uma ampla reestruturação organizacional e de governança. A reestruturação da forma de gestão da província e a definição de um Novo Modelo de Governança é um dos principais desafios do Triênio 2010-2112 e segue uma das prioridades definidas pelos Irmãos Maristas no Capítulo Provincial de 2009.

Segundo o editorial do documento Circular Provincial (PMRS, 2011), o novo modelo valoriza a unidade da Província ao criar uma dinâmica positiva entre o Conselho Provincial da entidade e suas estruturas executivas, impri-mindo um claro direcionamento aos empreendimentos e agilidade nas toma-das de decisões, com autonomia operacional (PMRS, 2011, p. 2). Uma nova instância de gestão foi criada, diretamente ligada aos objetivos da administra-ção provincial, para gerar orientações e apoio gerencial às unidades de gestão (Colégios e Unidades Sociais formam uma unidade, e PUCRS e Hospital São

3 Ibidem.4 Ibidem.5 Ibidem.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 157

Lucas, outra unidade). Com áreas como Pastoral, Vida Consagrada e Laicato, Gestão Financeira de Longo Prazo, Planejamento e Controle e Comunicação Corporativa, a administração provincial deve zelar pela atuação coerente das mantenedoras e de suas unidades. Toda a estrutura deve estar alinhada à Missão de evangelizar crianças, jovens e adultos, especialmente os menos fa-vorecidos (PMRS, 2011, p. 8), de forma que o cotidiano das áreas de atuação marista, entre elas a PUCRS, precisa estar profundamente comprometido com o propósito da Província.

As mudanças em curso na PMRS e seus impactos na gestão da Universidade traduzem as questões já levantadas referentes aos desafios às IES comunitárias confessionais. O novo modelo parece responder tanto à exi-gência de uma governança atenta à transparência na gestão e à comunicação entre as partes envolvidas quanto à necessidade de preservação da identi-dade institucional, garantida pelo alinhamento estratégico. Como percebeu Sampaio (SAMPAIO, 2000 apud TAVARES, 2009, p. 234), as universidades confessionais brasileiras constituem-se em um segmento com características específicas de identidade, finalidade, ação histórica, carisma e tradição, enfim, é um agente histórico cuja governança precisa ser construída em meio a esse contexto.

Qualificar a gestão para atender as necessidades contemporâneas é o grande objetivo da reestruturação administrativa e de governança da PMRS, que gera impacto no modelo de gestão das unidades. No caso da PUCRS, o envolvimento nas instâncias de decisão provinciais a torna produtora de polí-ticas de governança e produto das mesmas, de forma complementar. Ou seja, os gestores da Universidade têm espaço fixo nas instâncias de decisão que vão desde o Conselho Provincial (instância máxima de decisão), nos Conselhos Administrativos e nas estruturas administrativas da PMRS. Desta forma, as-segura-se que valores e estratégias corporativas tenham sintonia com as ne-cessidades das unidades, assim como que as grandes diretrizes de atuação da Província possam ter incidência efetiva nas mesmas.

O novo modelo institucional foi lançado, a implantação da estrutura de governança iniciou-se há menos de dois meses considerando a época de elaboração deste trabalho, e seu sucesso dependerá dos diferentes agentes que intervêm na elaboração de políticas e nas tomadas de decisão, bem como das variadas formas de interação entre os mesmos. Pelas considerações já realiza-das, parece-nos que um modelo para as IES comunitárias confessionais que esteja voltado à sustentabilidade e perenidade das mesmas, e mantenha sua identidade, depende da atualização e da segurança dos mecanismos e instru-mentos de governança e gestão na interação com as demandas e as pressões internas e externas do campo da educação e do campo econômico, com o desafio de manter um direcionamento estratégico sustentado em princípios e valores consistentes. A competência e autoridade técnica e de poder social de seus agentes (BOURDIEU, 2004) para realizar essa missão, mediando rela-

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AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE158 AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE

ções, interesses e articulações que se estabelecem nas dimensões do público e do privado e do reconhecimento da posição das IES comunitárias confessio-nais na Educação Superior são um ponto fundamental.

As concepções de governança compartilhada possuem relevante con-tribuição na construção desse modelo, pois exigem exatamente um delicado equilíbrio entre professores, alunos, funcionários e gestores na participação, no planejamento e na tomada de decisão, com a devida responsabilidade ad-ministrativa de cada um no processo. Considerando que “compartilhada” sig-nifica que todos têm um papel e as diversas partes interessadas em participar devem ter informação clara e compreensão deste papel bem definida no pro-cesso, a chave para a governança compartilhada genuína é a comunicação am-pla e sem fim. Eis um desafio na implantação do novo modelo nas Unidades Mantidas, entre essas a universidade. Conhecer as mudanças, a nova estrutura e suas implicações no processo de planejamento, gestão e decisão institucio-nal na PUCRS será um diferencial para o sucesso do novo plano estratégico e estrutura organizacional, pois a mudança impacta nas relações de poder entre os agentes e provoca mudanças de posição no campo.

Considerando o campo da educação como um “[...] um campo de forças e um campo de lutas para conservar ou transformar esse campo de forças” (BOURDIEU, 2004, p. 22), lutas essas condicionadas pela estrutura das relações objetivas entre os diferentes agentes e pela posição que ocupam nessa estrutura, destacamos, finalmente, nas abordagens de Mortimer e Sathre (2010), a questão da construção de relacionamentos e confiança como um dos grandes desafios à gestão, colocados pela governança. Nenhum processo de reestruturação ou reorganização poderá prescindir da liderança, da confiança e dos relacionamentos que permeiam as estruturas e processos na tomada de decisão efetiva. O sistema de governança necessita de liderança que confira orientação, motivação, significado, integridade, senso de propósito comum, formas de integrar múltiplas perspectivas, comunicação aberta, pessoas dis-postas a ouvir e legitimidade ao processo.

Como manter as pessoas engajadas e construir capital social e confian-ça entre as partes interessadas (conselhos, administradores e corpo docente)? Assim, se planos estratégicos com as prioridades definidas são essenciais, a legitimidade na governança coloca maior ênfase em quem pode ser confiável para tomar as decisões finais. Eis um grande desafio.

Caminhar em direção a um modelo de governança e sustentabilidade requer o avanço da ciência, investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologias inovadoras, bem como estratégias de planejamento e gestão pau-tadas em lógicas antes impensadas. Há necessidade de aprofundar estudos que indiquem com mais precisão como estão sendo percorridos estes caminhos e os processos de implantação dos novos modelos de gestão e governança nas IES comunitárias confessionais e sua potência para atualizar seu projeto iden-titário e garantir longevidade, no equilíbrio entre atender demandas imediatas do mercado e construir novos projetos de vida em sociedade.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 159

Cabe, nesse sentido, investigar iniciativas recentes, como o lançamen-to de programa de desenvolvimento de lideranças na Universidade, pois de-sencadear processos de formação e capacitação para o desenvolvimento de uma nova consciência e de valores e competências (conhecimentos, habilida-des e atitudes) que produzam novos sentidos remete-nos ao fato de que “[...] o problema da consciência (ética da responsabilidade) supõe uma reforma das estruturas da própria consciência (autoética)” (MORIN, 1982, apud PENA-VEGA, 2005, p. 20).

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AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE160 AMARO, I. et al. - ENSINO SUPERIOR, GOVERNANÇA E SUSTENTABILIDADE

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PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS PARA UM COORDENADOR DE CURSO NA PERCEPÇÃO DOS

GESTORES E FUNCIONÁRIOS DE UMA IES

Jênifer de Brum Palmeiras Rosani Sgari Szilagyi

A través deste trabalho, buscou-se analisar um fator muito impor-tante e ao qual muitas empresas estão dando grande importância:

o capital humano como diferencial competitivo. Para que estejam prepara-das para os desafios da inovação e da concorrência, as empresas necessitam de gestores ágeis e competentes para prestar serviços de qualidade. Partindo dessa premissa, foi define-se nesta pesquisa o perfil do coordenador de curso da Universidade de Passo Fundo na percepção de diretores, coordenadores, professores e funcionários. Foram identificadas manifestações sobre o grau de importância das competências para se exercer a função de coordenador de curso. No caso específico dos professores, também foi mensurado o grau de satisfação em relação aos atributos de gestão do coordenador.

METODOLOGIAA pesquisa teve uma etapa exploratória qualitativa e outra descritiva

e quantitativa. Os dados revelados indicam que o conjunto de competências é formado por vários tipos de conhecimentos, habilidades e atitudes. A amostra foi realizada numa população de 11 diretores, 31 coordenadores, 134 profes-sores e 24 funcionários das 12 unidades acadêmicas do Campus Central da UPF, onde foram observadas manifestações sobre o grau de importância das competências, para exercer a função de coordenador de curso.

Para a formação da lista de fatores importantes, foi realizada pesquisa exploratória com um grupo de 30 pessoas, representando diretores, coordena-dores, professores e funcionários; as informações coletadas através de entre-vistas semiestruturadas foram organizadas em sucessivas aproximações até se chegar a um conjunto de atributos para cada grupo. As expressões-chave identificadas foram:

• Para os conhecimentos: conhecimentos de tecnologia de in-formação e comunicação, dos instrumentos e regramentos institucionais vigentes.

• Para as habilidades: orientação para resultados, tomada de decisões, capacidade de negociação, liderança e organização.

• Para atitudes: ética, iniciativa, responsabilidade, criatividade e inovação, flexibilidade e adaptação a mudanças, trabalho em equipe, autocontrole, relacionamento interpessoal, capa-cidade de ouvir e perguntar.

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PALMEIRAS, J. B. - PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS162 PALMEIRAS, J. B. et al. - PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS

RESULTADOS E DISCUSSÕESHá quase um consenso de que a principal função do coordenador é de

natureza pedagógica; na prática, no entanto, o tempo disponível, numa carga horária insuficiente, acaba consumido quase integralmente em atividades ad-ministrativas. Neste sentido, podem ser apontadas algumas alternativas para discussão no âmbito institucional. Uma destas alternativas é transferir para os assistentes e encarregados administrativos a maior parte das tarefas burocrá-ticas.

Muitos processos administrativos, hoje, passam pelo coordenador apenas como trâmite de encaminhamento, pois ele não pode tomar decisões contrárias ao regramento, e o aluno acaba recorrendo e fazendo com que o mesmo processo passe duas ou até mais vezes pelo coordenador. Outra ques-tão institucional diz respeito à carga horária. Certamente, não há como com-parar a demanda de tempo de coordenadores que atendem até mais de 1.000 alunos com aqueles que têm menos de uma centena, principalmente quando se observa que são as tarefas administrativas as maiores consumidoras de tempo, fortemente relacionadas com a quantidade de alunos.

A primeira providência recomendada é aproveitar a renovação dos quadros de coordenadores que está acontecendo em razão do processo elei-toral em curso e, com o novo grupo que assumirá, iniciar um forte processo de treinamento sobre atribuições, responsabilidades e procedimentos. Aqui, a palavra treinamento foi intencional: é treinar mesmo, dar noções básicas, operacionais. Sugere-se que sejam desenvolvidos cursos de formação docen-te para cargos gerenciais, pois conforme apontado os professores não estão preparados ou não têm vocação para a gestão. São levados a ocupar funções gerenciais dentro do modelo de gestão extremamente político da instituição.

Outra providência viável e de implantação imediata, independente-mente de novos arranjos e disposições institucionais, é revitalizar o Fórum dos Coordenadores. Trata-se de uma iniciativa que ainda não produziu resul-tados consistentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E SUGESTÕESConforme apontado pela pesquisa, as percepções dos grupos estuda-

dos divergiram em alguns fatores, deixando clara a complexidade da orga-nização, em seus aspectos formais, administrativos e de recursos humanos. Mesmo assim, podem ser sugeridas algumas linhas de atuação com vistas a melhorar as competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) dos coor-denadores.

Porém, num plano inicial, parece ser necessário e conveniente uma discussão sobre o papel do coordenador. Há quase um consenso de que a prin-cipal função do coordenador é de natureza pedagógica; na prática, no entanto, o tempo disponível, numa carga horária insuficiente, acaba consumido quase

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 163

que integralmente em atividades administrativas. Neste sentido, podem ser apontadas algumas alternativas para discussão no âmbito institucional. Uma destas alternativas é transferir para os assistentes e encarregados administrati-vos a maior parte das tarefas burocráticas. Um exemplo são os muitos proces-sos administrativos, hoje, passam pelo coordenador apenas como trâmite de encaminhamento, pois ele não pode tomar decisões contrárias ao regramento e o aluno acaba recorrendo e fazendo com que o mesmo processo passe duas ou até mais vezes pelo coordenador. Uma alternativa é ter dois coordenadores em cada curso, um administrativo e um pedagógico. De certa forma, se res-suscitariam os departamentos administrativos.

Ainda no plano institucional, cabe uma discussão, esta sim mais ampla, sobre o próprio processo de nomeação ou seleção. Hoje, há um processo elei-toral para tanto. Muitas instituições usam o sistema de contratação de gestores, como nas empresas privadas. Um exemplo é a PUC. As universidades co-munitárias transitam entre as sistemáticas de gestão privada e gestão pública. Significa que não é necessário preencher todos os cargos através de processo eleitoral.

A melhoria dos processos administrativos também pode contribuir para diminuir a demanda de tempo dos coordenadores. Neste sentido, reco-mendam-se estudos sobre as rotinas internas, especialmente naquelas que en-volvem a relação entre coordenador e alunos.

Por fim, outra questão institucional diz respeito à carga horária. Certamente, não há como comparar a demanda de tempo de coordenadores que atendem até mais de 1.000 alunos com aqueles que têm menos de uma centena, principalmente quando se observa que são as tarefas administrativas as maiores consumidoras de tempo e estas estão fortemente relacionadas com a quantidade de alunos.

Um novo tema que começa a ser debatido nacionalmente é a questão da meritocracia, e este também pode ser um assunto estudado no âmbito da UPF. Aliás, esta já é uma recomendação antiga das consultorias e que envolve não só os coordenadores, mas todo o quadro docente. Uma das consequências diretas da meritocracia é a demissão por insuficiência de desempenho, o que por certo gerará um novo comportamento do quadro docente e dos coordena-dores.

Independentemente, porém, destas questões das instituições, manten-do-se coordenadores com as tarefas atuais ou não e ocupando o cargo por sele-ção normal ou processo eleitoral, os dados da pesquisa indicam possibilidades e necessidades de desenvolvimento de algumas ações que visam melhorar o desempenho dos coordenadores enquanto gestores dos cursos.

A primeira providência recomendada é aproveitar a renovação dos quadros de coordenadores em razão do processo eleitoral em curso e, com o novo grupo que assumirá, iniciar um forte processo de treinamento sobre atri-buições, responsabilidades e procedimentos. Aqui, a palavra treinamento foi

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PALMEIRAS, J. B. - PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS164 PALMEIRAS, J. B. et al. - PERFIL E COMPETÊNCIAS NECESSÁRIOS

intencional: é treinar mesmo, dar noções básicas, operacionais. Sugere-se que sejam desenvolvidos cursos de formação docente para cargos gerenciais, pois conforme apontado, os professores não estão preparados ou não têm vocação para a gestão, são levados a ocupar funções gerenciais dentro do modelo de gestão extremamente político da instituição.

Outra providência viável e de implantação imediata, independente-mente de novos arranjos e disposições institucionais, é revitalizar o Fórum dos Coordenadores. Trata-se de uma iniciativa que ainda não produziu re-sultados consistentes, mas que pode ser encarada como um aprendizado e com um novo grupo de coordenadores, viabilizar uma nova dinâmica. A troca constante de experiências, função central do Fórum, pode permitir pequenas correções de rumos e padronizações de procedimentos, dentro de uma filoso-fia de melhoria contínua.

Há, ainda, um outro grupo e/ou fator que pode fazer a diferença em todo o processo institucional e se tornar ponto de partida para mudanças ne-cessárias. Trata-se do aluno e/ou do mercado. O aluno ainda é muito passivo e aceita coordenações pouco comprometidas com as questões pedagógicas e pouco atentas aos aspectos administrativos. O mercado, porém, começa a oferecer novos modelos e isso, com o tempo, tende a fazer com que o aluno venha a ser mais crítico e mais exigente. Quando isso ocorrer, cursos mal co-ordenados não precisarão mais de coordenadores, pois não terão mais alunos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 165

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O PAPEL DO GESTOR DE POLOS: DIFICULDADES E DESAFIOS

Patricia Thoma Eltz Rosalir Viebrantz

A educação a distância precisa ser compreendida como um con-junto de ações e requisitos próprios ao seu desenvolvimento

que envolve atores diversos, materiais didáticos específicos, meios de co-municação e outros recursos. Na educação a distância, o ambiente educa-cional virtual não suprime o espaço educacional presencial. Ao contrário, ele o amplia. O aluno estuda sozinho, mas não deve se sentir solitário, por isso o acolhimento e a receptividade nos Polos de Apoio Presencial são importantíssimos. É fundamental salientar que o Polo de Apoio Presencial é uma organização de ensino, uma instituição da educação. O polo funcio-na como uma escola. O Polo de Apoio Presencial é o calor humano, pois os alunos precisam se sentir parte de um grupo, além de buscarem apoio técnico (CABEDA, 2010).

Se pensarmos no Polo como sendo aquele elemento de contato presen-cial, social, físico, o polo presencial de apoio à EAD pode ser muito importan-te pelo caráter efetivo de pertencer a um grupo. Entretanto, isto só se verifica na prática quando houve sucesso na constituição de fatores que provocam a formação de comunidades de aprendizagem (CABEDA, 2010, p. 5).

A educação é um trabalho de equipe, de que participam professores, gestor, demais funcionários, especialistas, alunos e comunidade da instituição. É um trabalho conjunto que se torna tanto mais produtivo quanto mais a equi-pe for capaz de trabalhar entrosada, afinal, todos podem e devem participar do esforço de coordenação, de gestão.

Gestão é caracterizada pelo reconhecimento da importância da parti-cipação consciente e esclarecida das pessoas nas decisões sobre orientação e planejamento de seu trabalho. Gestão significa ato de gerir, gerência, admi-nistração, é tomada de decisão, é direção. Relaciona-se com a atividade de impulsionar uma organização a atingir seus objetivos, a cumprir sua função.

A escola, a organização de ensino, ou seja, o Polo de Apoio Presencial, é organizada com a finalidade de atingir certos objetivos, os quais dão sentido à organização e orientam a tomada de decisões no que se refere ao tipo de edifício, à quantidade e qualidade do equipamento, ao número e à qualifica-ção do pessoal. Para Dias: “quem quer que se proponha a trabalhar em uma instituição educacional precisa procurar informar-se sobre seus objetivos e, na medida do possível, dar sua própria contribuição para o aperfeiçoamento dos mesmos” (1998, p. 253).

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ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS168 ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS

Em uma perspectiva democrática, a gestão escolar abrange o exercício do poder, incluindo os processos de planejamento, a tomada de decisões e a avaliação dos resultados alcançados. Trata-se de fortalecer os procedimentos de participação da comunidade escolar, descentralizando os processos de de-cisão e dividindo responsabilidades.

A gestão democrática implica participação intensa e constante dos di-ferentes segmentos sociais nos processos decisórios, no compartilhar das res-ponsabilidades, na articulação de interesses, na transparência das ações, em mobilização e compromisso social. Um processo de gestão democrática só existirá na medida em que forem desenvolvidas a autonomia e a participação de todos, em um clima e estrutura organizacional compatíveis.

Para atingir objetivos de uma gestão democrática e o cumprimento de metas decididas de forma colaborativa e compartilhada, é preciso uma míni-ma divisão de tarefas e a exigência de alto grau de profissionalismo de todos. Portanto, a instituição democrática implica não só a participação na gestão, mas a gestão da participação, em função dos objetivos da organização, no caso, do polo.

A liderança democrática é a mais adequada para a condução das ativi-dades de uma instituição. A participação do grupo na tomada de decisões é a garantia de maior identificação de todos com o trabalho a ser realizado. Para Dias: “fica mais fácil conseguir a adesão e o entusiasmo para um programa de inovação, quando todos sentem que se trata de um projeto em que cada um pode dar alguma coisa de si” (1998, p. 260).

Enfim, o bom diretor tem sempre a preocupação de colher sugestões, ideias, contribuições dos envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Não executando uma decisão sem antes certificar-se de que foi compreendida e aceita por todos.

Para buscar responder as questões que articularam a produção do estu-do, “Quais as atitudes/posturas que um gestor de polos deve ter?; Como o ges-tor de polos atua na mediação dos conflitos?; Quais as maiores dificuldades ou desafios enfrentados no polo de apoio presencial?”, realizou-se um ques-tionário com perguntas abertas e fechadas. Um foi destinado ao coordenador do polo de apoio presencial e outro, aos tutores presenciais. Participaram da pesquisa um coordenador de polo e seis tutores presenciais. Por razões de sigilo não revelamos o local do polo.

A primeira questão do questionário foi: “Qual é o papel do coordena-dor de polos?” Nas respostas apareceram com frequência os seguintes apon-tamentos: gerenciar questões administrativas, pedagógicas e socioafetivas; mediar, coordenar, motivar; ser articulador democrático; estabelecer clima de confiança e de satisfação; possibilitar e ampliar as condições de desenvol-vimento da modalidade de EAD; buscar melhorar as condições de estrutura junto aos órgãos competentes, entre outros. Nesse sentido, faz-se necessário destacar uma resposta obtida na pesquisa, relacionada à questão indagada:

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 169

Acredito que seja, em primeiro lugar, buscar a melhor maneira de estruturar o polo, pois este acaba sendo a referência física dos estudantes, visto que a universidade está distante (virtual). Em segundo lugar, creio que seja realizar a ligação entre o município e as universidades, pois os polos se formam de uma parceria. Outro papel fundamental do coordenador de polo está na dinâmica e visão diferenciada, ou seja, ser o fomentador de mudanças que venham melho-rar o polo e seu ambiente de aprendizagem. Ser um agente de conciliamento (sic) entre as diversas pessoas que habitam o polo. Por fim, saber ouvir e argu-mentar com clareza sobre os diferentes assuntos que compõem a vida educacio-nal, patrimonial e social dos polos (Tutora 2).

O intuito de apontar esta resposta em específico é salientar que foi a resposta mais completa em comparação com as outras respostas dadas. Expressões como: parceria, dinâmica, visão diferenciada, fomentador de mu-danças e saber ouvir estão de acordo com os estudos e com certeza relaciona-das ao papel do gestor de polos.

O clima organizacional tem efeito sobre a satisfação e rendimento dos membros de uma organização, e isso nos remete para a interação entre todos, enfim, das relações interpessoais. Para Machado, “a satisfação é influenciada pelo tipo das relações interpessoais, pela coesão do grupo e pelo apoio recebi-do no trabalho” (2000, p.89).

Toda e qualquer instituição é cheia de contradições, conflitos e possi-bilidades, pois muitas vezes deseja desenvolver autonomia, mas submete os envolvidos a ordens e rotinas discutíveis. Outras desejam a cooperação e o tra-balho em equipe, mas estimulam a competição individual, acabam com a ação coletiva ou neutralizam grupos. Outras vezes, ainda, desejam ensinar a apren-der e a descobrir, mas não aceitam o erro como elemento de construção do conhecimento. Por isso, é preciso intervir na realidade, recusando a ideia de que é impossível alterar as situações que nos são apresentadas. É necessário recuperar a ação da intervenção dentro da instituição. Nessas circunstâncias, o sucesso dos gestores não está assegurado, pois podem ocorrem fracassos e é preciso aceitá-los.

Na questão sobre tratamento e soluções de conflitos, cinco tutores e a coordenadora assinalaram a primeira alternativa. Os conflitos são enfrentados aberta e sinceramente, examinando-se suas causas e tratando-se de solucioná-

-los razoavelmente de maneira que não voltem a aparecer. Um tutor assina-lou outra opção: Quase não existem conflitos ou desacordos entre as pessoas, porque estas evitam entrar em polêmicas. As pessoas tomam cuidado em não deixar aflorar seus conflitos e irritações pessoais, procurando conservar a ami-zade e a harmonia, mesmo que isso exija ceder nos seus pontos de vistas.

Consequentemente, não se trata de negar as diferenças e os conflitos, mas sim de enfrentá-los de forma positiva. Enfrentar os desacordos não im-plica gerarmos dinâmicas de destruição nem, no outro extremo, acomodarmo-

-nos ou submetermo-nos às solicitações da outra parte.

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ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS170 ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS

Outra questão do questionário foi sobre a criatividade. Todos assina-laram que toda ideia sugerida é ouvida e acatada. As boas contribuições são analisadas e postas em prática. Aqui, cabe destacar que o polo busca realizar atividades diferenciadas para intensificar a integração de todos os envolvidos como: palestras, amigos secretos, confraternizações, participação em feiras e mostras.

O diálogo com os atores envolvidos na gestão de polos é fundamental e enriquecedor para todas as partes e em todos os sentidos. Só pode ser verda-deiro e frutífero a partir de um esforço de aproximação em que todos tentem perceber e conhecer o outro em seu próprio contexto. Precisa-se buscar o con-senso com todos os envolvidos e não apenas com aqueles que pensam como nós e, nesse intuito, o diálogo é a grande ferramenta.

O verdadeiro coordenador é um facilitador. É aquele que orienta, que ensina as pessoas a resolverem seus problemas de forma autônoma para que essas pessoas se sintam autoras do seu pensamento e consigam encontrar as soluções por conta própria. O coordenador precisa ser um líder facilitador que incentive a participação dos sujeitos nas discussões e permita que opiniões divergentes as suas sejam analisadas e aceitas, se contribuírem para o melhor desempenho da equipe.

Segundo Gadotti e Romão (2002), existem algumas limitações e obs-táculos à implantação de um processo democrático: a nossa pouca experiência democrática; a mentalidade que atribui apenas aos técnicos a capacidade de planejar; a própria estrutura do nosso sistema educacional que é vertical; o autoritarismo que impregnou nossa prática pedagógica; o tipo de liderança que domina nossa atividade educativa.

O senso comum é marcado pela visão da realidade de modo absolu-to e isolado, o que impossibilita a implantação de uma gestão democrática. Separa-se, por exemplo, “eles” de “nós” – em que “eles” são os agentes res-ponsáveis pelo que de ruim acontece e “nós” somos colocados como vítimas de suas ações ou como pessoas que agem de maneira sempre justa e correta. É fundamental a superação dessa visão, para que cada um faça parte da organi-zação e do sistema educacional como um todo e que a construção da realidade seja feita em conjunto de modo interativo entre os vários elementos.

Outro impasse é o exagero da burocracia e da hierarquia no dia a dia das instituições de ensino. A superação da visão burocrática para uma visão de coordenação passa pelo desenvolvimento e aperfeiçoamento da totalidade dos membros do estabelecimento. Para Luck (2004), o desenvolvimento e aperfeiçoamento dependem de ação coletiva e de espírito de equipe, sendo este o grande desafio da gestão educacional.

Entre os impasses da gestão democrática está a prática individuali-zada. Mais ainda a individualista e competitiva, devem ser superadas gra-dativamente em nome de uma ação coletiva pela qual, no final, todos saiam ganhando, aprimorando-se no exercício da democracia ativa e da socialização.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 171

No instrumento de pesquisa, especificadamente para o coordenador do polo, questionou-se sobre as maiores dificuldades ou desafios que ele en-frenta no polo de apoio presencial:

Gerenciar as pessoas disponibilizadas pelo mantenedor. Administrar as ati-vidades com recursos deficitários (espaço físico, recursos humanos não compa-tíveis para as necessidades) e a escassez de materiais tecnológicos para o apoio nas aulas presenciais (Coordenador).

Nesse sentido, se faz necessário explicar que na secretaria do polo existem pessoas que foram disponibilizadas pela SME (Secretaria Municipal de Educação) e muitas vezes essas pessoas não têm a formação adequada para a função, diferentemente dos tutores que passaram por um processo seletivo.

Ainda, especificadamente para o coordenador, questionou-se sobre como busca superar essas dificuldades:

Adaptando os setores (no laboratório, incluímos classes para atender as turmas novas que têm um número maior de discentes do que a estrutura do laboratório e computadores) pedindo que os alunos e tutores trouxessem seus notebooks. Colocar as dificuldades enfrentadas para o Conselho do Polo e co-ordenadores da UAB. Buscar agilização para que o mantenedor cumpra seu pa-pel enquanto responsável pela manutenção e expansão do polo (Coordenador).

É importante lembrar que o coordenador do Polo precisa ter uma visão empreendedora, pois estará o tempo todo debatendo, desenvolvendo proje-tos para vê-los implantados. Uma boa característica do coordenador de polos é “incomodar” os mantenedores municipais para formar parcerias. Enfim, o papel do gestor de polos é buscar parcerias com a mantenedora, programar es-tratégias de sustentabilidade, incentivar práticas inovadoras, elaborar planos diários e de longo prazo visando à melhoria da escola.

O Polo de Apoio Presencial precisa se adequar aos propósitos da Educação e às necessidades dos alunos que o frequentam. Por isso, o gestor de polos precisa gerenciar os recursos financeiros e humanos, assegurar a participação da comunidade na escola, bem como identificar as necessidades da instituição e buscar soluções.

CONSIDERAÇÕES FINAISAo longo do capítulo foram analisadas as atribuições do gestor, com

base nas respostas obtidas e a partir da prática como tutora presencial. Este estudo teve por objetivo analisar o papel do coordenador de polos e as difi-culdades enfrentadas no Polo de Apoio Presencial, destacando um novo para-digma de gestão.

Após a reflexão sobre as respostas dos questionários realizados com os tutores presenciais e coordenador de polo, alguns aspectos que foram con-siderados relevantes foram apresentados, no que dizem respeito às dificulda-des enfrentadas pelo coordenador no Polo de Apoio Presencial, bem como

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ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS172 ELTZ, P. T. et al. - O PAPEL DO GESTOR DE POLOS

a forma como o coordenador atua na mediação de conflitos e/ou situações problemas dentro do Polo de Apoio Presencial.

No polo pesquisado, verificou-se que o papel do coordenador está bem claro para todos os envolvidos, assim como as atitudes que o gestor de polos deve ter: saber ouvir, expressar ideias com clareza, harmonizar inte-resses divergentes, estabelecer relações saudáveis no polo, iniciar mudanças, enfrentar os conflitos com sinceridade e abertura para o diálogo, incentivar a participação de todos nas decisões, entre outros.

Também foi observado que as maiores dificuldades ou desafios en-frentados no polo de apoio presencial são as questões de gerenciamento com poucos recursos, falta de uma estrutura adequada e parceria com o mantene-dor. É preciso que o gestor tenha agilidade e fidelidade quanto às informações institucionais, com uma atitude transparente nas ações; que tenha coerência entre o discurso e a prática, a cultura do querer fazer, no lugar do dever fazer,

“suavidade” nos modos e firmeza na ação. Por fim, percebeu-se que o polo apresenta um clima saudável de par-

ticipação, e a maioria das respostas destacam que a ideia sugerida é analisada e colocada em prática na medida do possível.

Cada instituição, cada polo de apoio presencial, precisa construir sua gestão democrática. Deve haver vontade, capacidade, criatividade, perseve-rança e certeza de que esse é o caminho para se alcançar uma qualidade edu-cacional. Enfim, trata-se de entender o papel do gestor de polos como um líder, uma pessoa que consiga unir aspirações, desejos, expectativas da comunidade escolar e articular a adesão e a participação de todos os segmentos da escola na gestão de um projeto comum. Por isso, o gestor de polos tem uma visão de conjunto e uma atuação que apreende a instituição e seus aspectos pedagógi-cos, administrativos, financeiros e culturais. Portanto, o gestor necessita, fun-damentalmente, cultivar um clima organizacional positivo que leve as pessoas ao desafio da construção coletiva e à valorização, tanto profissional quanto afetiva, que gera o prazer de frequentar o ambiente de trabalho, no caso, o polo de apoio presencial.

Ao final deste estudo, procuramos não trazer todas as respostas, mas indícios significativos e valiosos para discussões futuras, pois ele não se en-cerra aqui, há a necessidade de maiores investigações sobre o papel do gestor de polos e a educação a distância. Pensamos que seria necessário mais tempo para estudo e pesquisa ou, ainda, observações diretamente no Polo de Apoio Presencial, objetivando mais reflexões individuais e/ou coletivas.

Nessa perspectiva, este estudo, mais do que resultados, sinaliza a ne-cessidade de aprofundar novas questões desencadeadas no processo investiga-tivo de construção. Significa a aceitação do caráter provisório do conhecimen-to, movido pelo paradigma da dúvida que nos impulsiona a qualificar nossa ação. Estejamos abertos e prontos para pensar, questionar e duvidar. Como nos afirma Freire, o necessário é duvidar e não ter certeza.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 173

REFERÊNCIAS

CABEDA, Marcelo; STAPF, Andréa; SILVA, Antônio; VICARI, Sabrina. Uma nova forma de polo de apoio presencial para EAD: o Polo dos Sonhos. Disponível em: http://www.abed.org.br/congresso2010/cd/2842010101650.pdf Acesso em: 3 fev. 2010.DIAS, José Augusto. Gestão da Escola. In: MENEZES, J. G. C. (org.) Estrutura e funcionamento da educação – Leituras. São Paulo: Pioneira, 1998.GADOTTI, Moacir; ROMÃO, José Eustáquio. Autonomia da Escola: princí-pios e propostas. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2002.LUCK, Heloisa. A evolução da gestão educacional, a partir de mudança pa-radigmática. Disponível em: http://eaprender.ig.com.br/gestao.asp Acesso em: 1 jul. 2004.MACHADO, Lourdes Marcelino. Administração e supervisão escolar: ques-tões para o novo milênio. São Paulo: Pioneira, 2000.

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GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO PRETO/UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO:

REFLEXÕES A PARTIR DE UMA EXPERIÊNCIA

Glaucia Maria da Silva Noeli Prestes Padilha Rivas

Adriana Katia Corrêa Yassuko Iamamoto

Maria Conceição De Mello E Souza Maria Suely Nogueira

Filomena Elaine Paiva Assolini Alma Blásida Concepcion Elizaur Benites Catirse

Marlene Fagundes

A docência universitária demanda a constituição de espaços forma-tivos promotores de reflexão sobre a prática pedagógica, em arti-

culação com os conhecimentos disponíveis do campo da pedagogia e didática. Esses espaços podem ser potencializadores de mudanças, o que também se re-laciona com a construção da identidade docente. Nesse contexto, desde 2002, foi constituído o Grupo de Apoio Pedagógico no Campus Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (GAPRP/USP). O objetivo deste estudo é relatar a experiência do GAPRP/USP como uma das estratégias inseridas na política de valorização do ensino de graduação da Universidade, apresentando sua trajetória de constituição, os seus objetivos, as atividades realizadas e os ele-mentos facilitadores de sua constituição, manutenção e consolidação, de 2002 a 2011.

PRESSUPOSTOS TEÓRICOS Considerada como área de pesquisa relativamente nova, a formação

de professores para Educação Superior tem preocupado muitos pesquisadores em âmbito mundial. Assumindo que um professor para o Ensino Superior ne-cessita de uma formação aprofundada nos conteúdos de sua área de atuação, que tenha uma formação em investigação científica e em didática, emerge como complexa a tarefa de sua preparação e constante atualização. Vários au-tores têm investigado esta temática, dentre os quais destacamos Nóvoa (1992), Giroux (1997), Contreras (2002), Pimenta e Anastasiou (2005), Zabalza (2004), Gatti (2004, 2009), Cunha (2007, 2010), Pimenta e Almeida (2011).

Do professor, nas atividades de ensino, se exigem conhecimentos, ha-bilidades, atitudes e disponibilidades que, em parte, diferem das exigidas de um pesquisador, no sentido estrito dessa palavra. Já é de conhecimento da aca-

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SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO176 SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO

demia que muitos bons pesquisadores não conseguem ter o mesmo nível de qualidade na docência. Nos cursos de formação de professores (mestrado ou doutorado), o exercício da docência, em nível superior, é praticamente deixa-da de lado, levando a expressão tão repetida da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão a tornar-se um refrão vazio, decantado sem o exercício da crítica (GATTI, 2004, p. 433). Todavia, o papel da pesquisa educacional é um dos componentes centrais da ação docente.

A expressão “professor pesquisador” comporta significações, não haven-do consenso sobre o conceito, bem como quanto aos desafios metodológicos para sua formação. O desenvolvimento profissional dos professores tem sido objeto de propostas que valorizam uma formação não mais baseada na raciona-lidade técnica, mas em perspectiva que reconheça a capacidade desses profissio-nais de decidir, de confrontar suas ações cotidianas com as produções teóricas (PIMENTA; ANASTASIOU, 2005, p. 264). Nóvoa (1992, p. 25) amplia essa compreensão, apontando como perspectiva de formação o professor crítico-re-flexivo, considerando como imprescindíveis três processos: produzir a vida do professor (desenvolvimento pessoal), produzir a profissão docente (desenvolvi-mento profissional), produzir a escola (desenvolvimento organizacional).

O GAPRP/USP: CONSTRUINDO UMA TRAJETÓRIAO GAPRP/USP foi idealizado pelos Presidentes de Comissão de

Graduação das Unidades do Campus, tendo iniciado suas atividades em se-tembro de 2002, contando com a participação de docentes de diferentes áre-as de todas as Unidades. A sua constituição foi motivada pelo envolvimen-to desses docentes com a melhoria do ensino de graduação nos diferentes cursos, compreendendo que a formação dos profissionais deve não apenas desenvolver competência científica e técnica para atuação em área específica, mas também competência pedagógica, política, ética e humana que favoreça a inserção crítica no contexto de trabalho e o exercício da cidadania na socie-dade brasileira.

Por meio da publicação da Portaria Interna Pró-G nº 4/2004, que dis-põe sobre as principais ações de apoio pedagógico ao docente na USP, ficou institucionalizado o GAPRP/USP. Atualmente, as discussões do Regimento de Graduação, no âmbito do Conselho de Graduação (CoG), referentes à constituição dos GAPs na Universidade e da Comissão de Apoio Pedagógico (CAP), no âmbito da Pró-Reitoria de Graduação, têm fortalecido o trabalho do GAPRP/USP. O grupo é composto por 22 docentes de distintas áreas de saber. A constituição de grupos de apoio pedagógico é uma das estratégias que vem sendo incentivada pela política de valorização do ensino de gradua-ção na Universidade de São Paulo, nas últimas gestões, pela Pró-Reitoria de Graduação. O trabalho desses grupos articula-se, sobremaneira, com o com-plexo campo da formação de professores que na Educação Superior apresenta peculiaridades.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 177

A formação do professor para atuar na Educação Superior está prevista nos cursos de Pós-Graduação. O preparo específico como pesquisador não necessariamente é acompanhado pela formação pedagógica. Outro ponto a ser considerado envolve a formação continuada, tendo em vista que a formação pedagógica não se esgota em único momento de formação, construindo-se a partir da análise crítica do fazer docente cotidiano e da busca permanente e compartilhada de conhecimentos.

O objetivo geral do GAPRP/USP é contribuir para o aperfeiçoamen-to pedagógico do corpo docente deste Campus, considerando as Diretrizes Nacionais da Graduação, além de promover as mudanças que se fizerem necessárias na prática pedagógica e apoiando as Comissões de Graduação, Comissões Coordenadoras de Curso e Docentes das Unidades. Os objetivos específicos do grupo são: incentivar práticas pedagógicas inovadoras nos cursos de graduação das diferentes unidades, a partir de cursos de pedago-gia universitária, estudos contínuos, seminários e workshops, sobre saberes pedagógicos, considerando as necessidades compartilhadas das Unidades; incentivar e desenvolver pesquisas sobre temas relativos à pedagogia uni-versitária, envolvendo as distintas unidades deste campus; favorecer a troca de experiências pedagógicas entre os docentes deste campus no que se refe-re a mudanças curriculares, construção/implementação de projetos político-

-pedagógicos, inovação em metodologia de ensino, práticas de avaliação, entre outros.

Em janeiro de 2005, foi aprovado o Projeto “Instalação e Funcionamento GAPRP/USP”, pela Pró-Reitoria de Graduação, sendo dis-ponibilizados recursos para adquirir equipamentos de informática, para or-ganização da secretaria do grupo, bem como para concessão de auxílio para estagiário (20 horas semanais). Em fevereiro de 2006, foi concedido ao gru-po, pela Prefeitura do Campus, um espaço físico próprio. Essa perspectiva de organizar um espaço próprio para o GAPRP/USP, não circunscrito a alguma unidade de ensino, é relevante, uma vez que dá visibilidade ao trabalho do grupo no Campus, considerando sua perspectiva interdisciplinar e a neces-sidade de ampliar sua atuação junto à comunidade docente e discente. Neste espaço, o grupo reúne-se semanalmente para operacionalizar as atividades propostas. Ao longo dos anos, o GAPRP/USP conta com apoio de estagiários, cabendo ressaltar que, para a sua seleção, sempre é realizado um proces-so seletivo aberto a estudantes dos diversos cursos do campus, em parceria com serviço social do campus e, sendo realizada, inicialmente, avaliação so-cioeconômica, seguida de avaliação técnica e entrevista grupal. Até então, o grupo já contou com a atuação de seis alunos (estagiários) de diversos cursos (Pedagogia, Ciências da Informação e Documentação, Matemática Financeira e Administração), o que, além de atender a uma demanda social, possibilita aprendizado aos universitários.

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SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO178 SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO

O GAPRP/USP: ATIVIDADES DESENVOLVIDAS Curso de Pedagogia UniversitáriaO GAPRP/USP promoveu vários encontros científicos de interesse

para o campo de saber e prática do docente universitário e, finalmente, em 2008, 2009 e 2011 foi possível promover, em nosso campus, o Curso de Pedagogia Universitária do Interior, contando com o apoio da Pró-Reitoria de Graduação e das unidades do campus de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, a saber: Escola de enfermagem de Ribeirão Preto (EERP), Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP), Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto (FEARP), Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP), Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (FORP) e Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP).

Este está sendo um importante marco para o GAPRP/USP, pois os docentes que o compõem partilham da concepção de que os espaços forma-tivos são mais promissores, no sentido de potencializar aprendizagem signi-ficativa e com potencial transformador, na medida em que são contínuos e com espaços de reflexão a partir da realidade cotidiana. Tais cursos foram precedidos dos Cursos de Pedagogia Universitária oferecidos em São Paulo, a partir de 2007, uma vez que foi no espaço de encontro dos docentes que compõem o GAP Central (formado pelos coordenadores dos distintos GAPs da universidade) que a ideia de cursos dessa natureza foi gerada, intensifica-da e operacionalizada. O Curso de Pedagogia Universitária visa estimular o desenvolvimento de intervenções no cotidiano, buscando efetivar o papel da pedagogia no Ensino Superior e compreender, renovar e valorizar o seu lugar nas práticas de coordenação pedagógica e de atuação docente nos contextos institucionais. Esses cursos são ministrados por especialistas externos, por docentes da própria Universidade e mediados pelos integrantes do GAPRP. Em Ribeirão Preto, mais de 200 docentes passaram pelo Curso de Pedagogia Universitária.

Eventos científicosOutra atividade realizada pelo GAPRP/USP é a promoção de eventos

científicos, abertos à comunidade, tendo sido realizados até então, de 2003 a 2011, quinze eventos, sendo que desses, quatro contaram com a participa-ção de convidados estrangeiros. A maioria desses eventos foi promovida com apoio da Pró-Reitoria de Graduação e alguns envolveram outras parceiras, com as Comissões de Graduação e de Pós-Graduação de distintas Unidades do Campus, incluindo o Programa de Aperfeiçoamento em Ensino – PAE. Isso revela que, ao longo do tempo, o grupo, pelo desenvolvimento da habi-lidade articuladora, vem conquistando confiança, sendo reconhecido pela co-munidade docente. Esses eventos têm sido bem avaliados pelos participantes

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 179

(docentes deste campus e de outras universidades e alunos de pós-graduação) considerando a relevância dos temas e a realização, em alguns momentos, de grupos de discussão, permitindo a participação mais efetiva de todos e a troca de conhecimentos e experiências.

Grupos de estudoOutra estratégia privilegiada, no início da atuação do GAPRP/USP,

foi a constituição, no segundo semestre de 2003, de grupos de estudo, tais como: “projeto pedagógico e avaliação”; “interdisciplinaridade”; “aspectos psicossociais dos graduandos” e “ensino à distância”, cujas temáticas foram selecionadas a partir de um levantamento realizado junto aos participantes do primeiro seminário. Esses grupos, coordenados por docentes do GAPRP/USP, funcionaram por cerca de dois anos, com encontros quinzenais ou mensais para leitura e discussão de textos e de experiências, com a participação de do-centes e pós-graduandos deste campus. Esta atividade emergiu da necessidade percebida pelo grupo em aproximar-se cada vez mais da comunidade docente, possibilitando espaços reflexivos e de estudo relativos aos saberes da docên-cia universitária e, de certo modo, foram propulsores dos “encontros abertos” e até mesmo dos cursos de Pedagogia Universitária.

Encontros abertos Apesar de, em momentos anteriores, terem sido propostos grupos de

estudos, com temáticas diversificadas, como estratégia para aproximar os do-centes das distintas unidades para o cotidiano do GAPRP/USP, construir uma aproximação mais estreita com a comunidade do Campus é um desafio per-manente para o grupo. Por outro lado, a organização dos docentes que com-põem o GAPRP/USP para efetivar os momentos de estudo, como atividade de apoio à realização de pesquisas, mostrou a potencialidade do grupo, no senti-do de tomar mais efetiva a criação de um espaço formativo ampliado (envol-vendo docentes e pós-graduandos deste campus), voltado ao estudo de temas pertinentes à pedagogia universitária. Desse modo, foram iniciados, em 2007, encontros abertos contando com a participação de docentes e pós-graduandos.

Projetos de pesquisaÀ medida que o GAPRP/USP foi se fortalecendo, os docentes perten-

centes ao grupo sentiram a necessidade de dedicar-se à prática da investigação, tendo como foco a pedagogia universitária. Cabe ressaltar que esse campo de saber vem, nos últimos anos, se solidificando, nos cenários nacional e inter-nacional. Assim, estão em andamento dois projetos de pesquisa. Um dos pro-jetos em desenvolvimento é “A Prática Pedagógica do Professor universitário no campus USP Ribeirão Preto: características, desafios e perspectivas” e ob-

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SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO180 SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO

jetiva conhecer a identidade docente e sua relação com a prática pedagógica, a partir de suas próprias concepções, em cursos das áreas exatas, humanas e biológicas do Campus de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP-RP). Este projeto tem a perspectiva de contribuir para a formulação/imple-mentação de diretrizes e estratégias políticas para qualificar a docência para o ensino de graduação, encontrando-se em fase de análise de dados. O outro projeto, “Curso Pedagogia Universitária: os professores e sua prática pedagó-gica”, objetiva analisar as reflexões elaboradas pelos professores participantes do Curso de Pedagogia Universitária oferecido em 2008, acerca de sua prática pedagógica, considerando os conhecimentos e experiências dos quais vêm se aproximando no decorrer desse processo formativo. A intenção primordial do grupo é que os resultados dessas pesquisas sejam direcionadores das propos-tas de atividades formativas para os docentes do campus USP-RP. Alguns pro-dutos parciais, frutos dessas pesquisas, estão sendo apresentados em eventos nacionais e internacionais voltados à pedagogia universitária.

CONSIDERAÇÕES FINAISO GAPRP/USP, grupo interdisciplinar, apoiado institucionalmente,

vem mostrando-se como espaço potencializador para transformações na prá-tica pedagógica dos docentes. O grupo tem recebido apoio financeiro para a realização de suas atividades, uma vez que se insere em uma das políticas da Pró-Reitoria de Graduação. Os professores deste grupo têm a oportunidade de vivenciar o processo formativo, aliando reflexão sobre a prática pedagó-gica cotidiana e conhecimentos teóricos consistentes. Nesse sentido, alguns aspectos merecem ser destacados como elementos facilitadores em relação à constituição e à trajetória do GAPRP/USP: o apoio institucional, a compo-sição interdisciplinar, a articulação formação-pesquisa e a compreensão da formação pedagógica da docência universitária como processo contínuo e crítico-reflexivo.

O trabalho cotidiano para ser viabilizado tem contado com espaço fí-sico adequado para as atividades de secretaria e realização das demais ativi-dades, além do apoio de estudante estagiário. Gerir um trabalho articulador e formativo realmente demanda um suporte adequado que possibilite agilidade nas decisões e comunicação efetiva. Tratando-se de grupo interdisciplinar, formado por docentes de cursos das áreas exatas, biológicas e humanas, tem sido possível a formação de uma “aliança” em torno do projeto comum de qualificar o ensino de graduação. Desse modo, a diversidade dos integrantes voltada para um projeto compartilhado vem sendo uma das molas propulsoras para a consolidação do trabalho e, ao mesmo tempo, um desafio. Cabe con-siderar que nenhum grupo efetivo se constitui como tal desde o início de sua formação e muito menos por cumprimento legal apenas. Os vínculos, os obje-tivos comuns e o compromisso coletivo com as atividades propostas, constru-ídos desde sua implantação, vêm sendo fundamentais para manter e aprimorar

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 181

o trabalho grupal, o que também envolve busca de conhecimentos, construção de articulações políticas e cuidado permanente com as relações interpesso-ais. A construção dos projetos de pesquisa vem fortalecendo e oportunizando perspectivas para o grupo, uma vez que a partir dessas o GAPRP/USP pode se aproximar da realidade dos professores deste campus, construindo conhe-cimentos que fundamentem as propostas de formação, com a preocupação de ir ao encontro das necessidades apontadas por esses docentes. Além disso, o grupo poderá contribuir com a consolidação da área de saber da pedagogia universitária.

Os docentes do GAPRP não têm restringido a formação pedagógica à realização de eventos/encontros pontuais, acreditando que esses são apenas um dos instrumentos formativos que, inclusive, dão visibilidade ao trabalho do grupo, algo importante para sua consolidação junto aos docentes, mas insu-ficiente do ponto de vista formativo. O GAPRP/USP já vivenciou a formação de grupos de estudos sobre temas pedagógicos de interesse dos docentes do Campus e, atualmente, mantém encontros abertos à comunidade para estu-do compartilhado de textos e vem viabilizando a realização dos Cursos de Pedagogia Universitária, com a proposta de formação contínua e crítico-refle-xiva. Em síntese, o trabalho no GAPRP/USP é desafiante, mostrando-se como espaço fértil para instigar mudanças no ensino de graduação.

REFERÊNCIAS

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SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO182 SILVA, G. M. et al. - GRUPO DE APOIO PEDAGÓGICO DO CAMPUS DE RIBEIRÃO

PIMENTA, S. G.; ANASTASIOU, L. (org.) Docência no Ensino Superior. São Paulo: Cortez, 2005.PIMENTA, S. G.; ALMEIDA M. I. (orgs.). Pedagogia Universitária: cami-nhos para a formação de professores. São Paulo: Cortez editora, 2011.UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Pró-Reitoria de Graduação. Grupo de apoio pedagógico. Relatório sobre a pesquisa: Atividades de docentes da USP, 2005.______. Pró-Reitoria de Graduação, Resolução CoG n. 5510. Institui a Comissão de Apoio Pedagógico (CAP), em substituição ao GAP Central, 2009.ZABALZA, M.A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto Alegre: Artmed, 2004.

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RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM: O COMPROMISSO

DA GOVERNANÇA ACADÊMICA PARA O APRIMORAMENTO DO ENSINO-APRENDIZAGEM

Carla Neto Rosália Figueiró Borges

O desenvolvimento científico e tecnológico na área da saúde, nos últimos séculos, tem vislumbrado várias conquistas que inspi-

ram a sociedade e os campos científicos para um projeto do “saber” mais mo-derno para a humanidade. Diante desse contexto, insere-se a representativida-de da Educação nos projetos para o desenvolvimento dos campos científicos em diversas áreas com intuito de respaldar, legalizar e permear ações éticas com o compromisso do bem-estar coletivo da sociedade. A pós-modernidade gerou uma nova forma de refletir sobre a realidade e com isso um despertar nas questões ético-políticas e profissionais. Assim, a ideia de globalização está presente no cotidiano profissional da Enfermagem, atingindo tanto o en-fermeiro assistencial quanto o enfermeiro docente, o que configura um novo paradigma diante da formação acadêmica.

Dessa forma, buscando superar limites e transformar contextos, o ensino de graduação em Enfermagem precisa (re)conhecer as tendências do mercado para então justapor as opções e exigências do mundo do trabalho às Políticas de Saúde e de Educação que embasam suas propostas pedagó-gicas na formação do profissional da Saúde. Destaca-se que a formação do acadêmico de Enfermagem é um processo dinâmico, no qual de um lado estão as propostas das escolas de Enfermagem e seus projetos políticos e pedagógicos estabelecidos de acordo com as diretrizes do MEC e, de outro, as exigências do mercado de trabalho. Assim, a delimitação da problemática do presente estudo passa pelas estratégias e recursos tecnológicos utilizados no ensino de graduação em Enfermagem, buscando uma aproximação entre a teoria e a prática.

Historicamente, a enfermagem brasileira recebeu uma parcela de in-fluência provinda dos EUA que culminou na criação das primeiras escolas de Enfermagem no Brasil. Entretanto, a diversidade de questões socioculturais e econômicas, que permeou mais de 88 anos, transformou a Educação em Enfermagem em uma profissão de destaque para a saúde pública e no âmbito hospitalar, com diferenças significativas no contexto de ensino-aprendizagem. A partir desses dados, procura-se, desvelar a realidade do ensino e aprendi-zado da Enfermagem entre o Brasil e os EUA, com intuito de averiguar que

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NETO, C.et. al - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM184 NETO, C. et al. - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM

recursos estão disponíveis no campo da informática que permitam que o aca-dêmico vivencie de forma plena diferentes situações e simulações que agre-guem competências esperadas diante de situações práticas do dia a dia no atendimento em saúde.

EDUCAÇÃO EM ENFERMAGEM NO BRASIL Visão históricaA realidade da enfermagem brasileira nasceu atrelada ao modelo hos-

pitalar de atenção individual e curativa (ITO; PERES; TAKAHASHI, 2006, p. 571). Este modelo de atenção médico-hospitalar esteve presente no ensino de Enfermagem no Brasil desde a criação da escola Anna Nery, que recebeu forte influência do modelo de saúde nightingaleano de enfermagem dos EUA em 1923. Considera-se que o Ensino de Enfermagem oficial no Brasil foi introdu-zido em 1923, pelo Decreto n° 16.300/23, no Rio de Janeiro.

A partir da década de 80, novas propostas foram apresentadas, modi-ficando o modelo de assistência, incorporando a realidade de mercado. Neste sentido, era necessário um profissional capaz de atuar em várias áreas da saúde, educação e gerenciamento, além de possuir uma visão generalista. Entretanto, os currículos da época apresentavam uma dissonância com as novas necessi-dades exigidas pelo SUS, prevendo, assim, a formação do enfermeiro com ên-fase em quatro áreas distintas: assistência, gerência, ensino e pesquisa (ITO; PERES; TAKAHASHI, 2006, p.571).

Com base na LDB, o Conselho Nacional de Educação não apenas instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Enfermagem como também instituiu componentes curriculares essenciais para graduação em enfermagem, tendo ainda o destaque sobre a diversida-de de cenários de aprendizagem, enfatizando o Sistema Único de Saúde e a particularidade de cada região, proporcionando a integralidade das ações de enfermagem.

O curso de graduação em Enfermagem no Brasil possui carga horária total de 3.200 horas distribuídas em 8 semestres, sendo que deste total 20% correspondem a Estágio Curricular (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2001). A base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional fundamenta que o processo de formação na Educação Superior deve focar-se nas competências e habilidades, bem como na flexibilização dos currículos e na implementação de novos projetos pedagógicos, com a intenção de proporcionar uma mudança na formação profissional.

A formação por competência indica a necessidade de experiências e oportunidades de ensino-aprendizagem que possibilitem o desenvolvimento para além do cognitivo, oportunizando ao aluno um “agir’ nas mais diversas situações. O conhecimento como representação da realidade é formado no decorrer das experiências vivenciadas e no processo de formação (XAVIER; CERIBELLI, 2005, p. 445)

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 185

O USO DO MANEQUIM NO BRASILEmbora o Brasil não tenha passado por uma fase interna de desenvol-

vimento tecnológico que propiciasse a criação nacional de manequins, nem por uma migração de conhecimentos de simulação de outras áreas profissio-nais para a área da Saúde, conforme aconteceu na trajetória dos EUA, o país também adotou o uso de manequins na prática do ensino da Enfermagem. Os primeiros simuladores, segundo os autores citados, começaram a ser utiliza-dos em 1923, em aulas práticas na Escola Anna Nery. Em 1959, a Escola de Enfermagem Alfredo Pinto adotou o uso de manequins em sala de aula. “Um registro de 1959, sob a forma de fotografia da ‘Sala de Técnica’ (denomi-nação do Laboratório de Enfermagem utilizada em 1959) demonstra vários estudantes trabalhando em dois manequins” (IBID., 2011, p. 113). Outro re-gistro do uso de manequins ocorreu em 1973, quando a Escola de Auxiliares de Natal transferiu sua infraestrutura para o Laboratório de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte contendo manequins simulado-res (VIEIRA; CAVERNI, 2011).

Apesar de o ensino da Enfermagem no Brasil registrar o uso de ma-nequins simuladores na formação de profissionais nessa área, são poucos os trabalhos científicos que aprofundam o uso desse recurso no ambiente de en-sino. Algumas pesquisas apontam a desproporção na quantidade desse recurso para cada aluno, em geral 2 manequins para uma turma de 60 alunos, e o uso de manequins de baixa fidelidade. Percebe-se, pois, que o Brasil adotou o modelo anglo-americano no uso de manequim na prática de ensino, mas não atualizou os recursos, reduzindo, assim, as experiências dos estudantes apenas aos manequins de baixa fidelidade.

Devido ao aumento do número de cursos na área da saúde, da quan-tidade de alunos em campos de estágio e, em consequência, ao impacto nos custos da aprendizagem, autores como Vieira e Caverni (2011) apontam que o uso de manequins no ensino da Enfermagem se faz necessário, principalmente quando associado à diminuição da proporção de ambientes clínicos, gerando menor disponibilidade relativa de pacientes para a experiência dos pacientes.

No Brasil, o número de cursos de graduação em Enfermagem saltou em 88%, no intervalo de 2004 a 2009, o que provavelmente resultou na dimi-nuição da quantidade de ambientes clínicos disponíveis para a prática clínica supervisionada. Além disso, a desproporção do numerador de relação quanti-tativa paciente/estudante pode interferir no tempo do aprendizado no campo do estágio (IBID., 2011, p. 108).

No cenário brasileiro, as pesquisas sobre simulação estão na fase ini-cial, mas os docentes e discentes têm demonstrado atitudes favoráveis ao uso dessa estratégia para o ensino de procedimentos e técnicas de Enfermagem (BARBOSA; MARIN, 2000). Ressalta-se que a maioria dos profissionais que atuam hoje na Educação não foi formada com o uso de recursos tecnológicos e possui pouca vivência na sua aplicação como elemento apoiador das ativi-dades envolvendo o ensino e a aprendizagem.

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NETO, C.et. al - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM186 NETO, C. et al. - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM

Segundo Aretio (2007) e Prensky (2010), o século XXI despertou uma nova fase em que a produção do conhecimento e difusão da informação foram colocados em questão, face ao desenvolvimento tecnológico e à glo-balização da economia, à mundialização da cultura e à integração em larga escala do processo de comunicação. Isso, evidentemente, afetou a forma como os jovens percebem e entendem o papel da instituição de ensino e atuação dos seus professores. Prensky (2010) salienta que as habilidades de atenção e concentração dos alunos de hoje mudaram e sua atenção é canali-zada para interesses pessoais e do seu grupo de referência (geralmente virtu-al). Eles se mantêm conectados e suas expectativas e pensamentos são muito diferentes dos seus professores. Os recursos tecnológicos estão cada vez mais disponíveis, fazendo parte da realidade do aluno; os professores vivem o paradoxo de ensinar de uma maneira que não foram ensinados. No entanto, um dos pontos que merecem destaque é que a inovação em Educação não está ligada aos recursos e sim à forma de trabalhar. Quem faz novas meto-dologias e constrói novas possibilidades para se ensinar e, por consequência, facilitar o aprendizado dos nossos alunos é o professor e não a tecnologia (GIRAFFA, 2009).

O USO DE MANEQUINS NO ENSINO DE ENFERMAGEM: A EXPERIÊNCIA DOS ESTADOS UNIDOSOs investimentos tecnológicos na área do ensino são de extrema im-

portância no processo de ensino e aprendizagem. Na área da saúde, esses investimentos se justificam pela “busca da autoconfiança do estudante em desenvolver habilidades psicomotoras, cujo resultado é o oferecimento de as-sistência baseada na segurança dos pacientes” (VIEIRA; CAVERNI, 2011, p. 108). O crescimento do uso do manequim de simulação humana se deu a partir de 1870, com o desenvolvimento das indústrias elétrica, de fundição, siderúr-gica, química e de refinaria de petróleo. Esses fatores levaram à produção de manequins em larga escala, tornando-os mais acessíveis e esteticamente mais parecidos com o ser humano. Na Enfermagem, o ensino de habilidades psi-comotoras pode ser realizado através do uso desses manequins, o que resulta na preservação da integridade física do paciente. Conforme aponta Vieira e Caverni (2011, p. 109):

A simulação com o uso de manequins tornou-se forma de poupar o paciente de exposição desnecessária a erros iatrogênicos e melhorar o aproveitamento do tempo de contato entre ele e o estudante, deixando para o campo clínico o aprendizado das habilidades impossíveis de serem trabalhadas com o mane-quim, tais como reações fisiológicas complexas, habilidade de comunicação e tratamento humanizado.

Os primeiros registros do uso de manequim como estratégia de ensino para a prática de habilidades motoras na Enfermagem foi em Hartford, nos EUA, em 1911. A instituição de ensino chamada Hartford Hospital Training

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 187

School foi a pioneira na utilização de simulação por manequim de baixa fi-delidade. Esses manequins foram os simuladores mais populares nos EUA na década de 50. Conforme apontam Teixeira e Felix (2011 apud ROTHGEB1, 2008), os simuladores podem ser caracterizados pelo grau de fidelidade – Baixa fidelidade: manequins estáticos; Média fidelidade: permite alguma proximidade com a realidade; e Alta fidelidade: representa melhor o corpo hu-mano, com semelhanças na aparência, sentimentos e respostas aos cuidados, inclusive ao oxigênio e às medicações, contribuindo para estimular o pensa-mento clínico. Esses simuladores podem ser programados para responder às falhas na administração de medicamentos e na performance de habilidades, demonstrando, aos estudantes, as possíveis consequências dos erros.

A partir da década de 70, os simuladores começaram a apresentar pro-dutos sintéticos associados ou revestindo parte dos manequins tornando-os esteticamente mais parecidos com o ser humano. Os estudos de Enfermagem em anestesia começaram a ser realizados prioritariamente em simuladores, na década seguinte, sendo a área que mais os utilizou. Por sua vez, a década de 90 é considerada aquela da explosão da quantidade, diversidade e complexi-dade dos simuladores, que apresentavam, por exemplo, a capacidade de trei-nar função respiratória, inserção de cateter vascular e parto vaginal (VIEIRA; CAVERNI, 2011, p. 112)

AUSTIN COMMUNITY COLLEGE ASSOCIATE DEGREE – PROGRAMA DE ENFERMAGEMA Austin Community College Associate Degree – Programa de

Enfermagem opera dentro do quadro filosófico da ACC – Austin Community College, em Austin, nos Estados Unidos, atendendo à necessidade da comuni-dade para a formação responsável de um profissional da Enfermagem. O pro-grama segue uma filosofia de que a Enfermagem é uma profissão que fornece um serviço essencial à sociedade em promoção, manutenção e/ou restauração da saúde para os indivíduos e suas famílias no contexto da comunidade.

O curso tem uma carga horária total de 2.145 horas2 – 53 horas presen-ciais por semestre: 9 horas destinadas para disciplinas que são pré-requisitos do curso e 44 horas por semestre de crédito do curso, que inclui experiências de aprendizagem em laboratórios. Os profissionais formados no estado do Texas e na Califórnia recebem o título de Enfermeiro Profissional Licenciado, e demais estados atribuem o título de Enfermeiro Prático Licenciado, além disso os profissionais realizam o mesmo exame para o exercício da profissão. O cronograma do curso é projetado para permitir que, geralmente, um dia da semana os alunos não estejam comprometidos com aulas em laboratórios.

1 ROTHGEB, M. K. Creating a nursing simulation laboratory: a literature review. J. Nurs. Educ., v. 47, n. 11, p. 489-94, 2008.2 http://www.austincc.edu/health/rnsg/documents/rnsg_traditional_track_degree_plan_app_process.pdf

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NETO, C.et. al - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM188 NETO, C. et al. - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM

Todas as aulas didáticas são oferecidos por videoaulas interativas. As aulas de laboratório e de habilidades clínicas são realizadas no respec-tivo campus em Austin. Os alunos que não têm acesso à Internet em casa podem usar os laboratórios de informática no campus. O ambiente virtu-al de aprendizagem é desenvolvido na plataforma ‘blackboard’, em que o aluno têm acesso a jogos, estudos de casos, tutoriais ou outro material ins-trucional. No ambiente físico, o aluno pode usar um software de instrução específico para o curso que está instalado nos computadores no laboratório de informática.

O curso de Enfermagem a distância tem três componentes: labo-ratório, clínico e teoria. As aulas em laboratórios são ministradas presen-cialmente nos laboratórios de aprendizagem. A parte clínica é ministrada no dia designado em hospitais clínicos. Apenas a parte teórica é minis-trada on-line. No ambiente virtual, o aluno realiza as leituras e realiza as atividades de cada módulo. Um questionário é dado no final de cada módulo para garantir a compreensão do conteúdo.Todos os professores do curso têm horário de expediente presencial por semana em que os alu-nos podem ir até o campus para fazer perguntas e esclarecer o conteúdo presencialmente. Além disso, os professores estão disponíveis por e-mail durante a semana.

O curso de Enfermagem possui 4 laboratórios contendo 44 quartos simulados de hospital e todo o equipamento necessário para simular o atendi-mento ao paciente. Esses laboratórios são equipados com 36 manequins com diferentes níveis de tecnologia. Alguns desses simuladores de paciente imitam a fisiologia humana (alta fidelidade) para fornecer uma ferramenta de apren-dizado interativo que melhor prepara os alunos para uma atividade de sucesso no ambiente clínico. Observam-se nas Figuras 1, 2, 3 e 4 os laboratórios de aprendizagem do ACC que utilizam manequins de alta fidelidade no ensino de técnicas e procedimentos clínicos, facilitando a aquisição de habilidades para os cuidados aos pacientes.

Figura 1. Quarto simulado de hospital.

Figura 2. Uso de manequins de alta fideli-dade nas aulas práticas.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 189

Figura 3. Uso de manequins de alta fideli-dade nas aulas práticas.

Figura 4. Um manequim para cada aluno nas aulas em laboratório.

Na figura 5 é possível verificar um aluno realizando prova prática com o uso de manequim de alta fidelidade. Através de um computador, o professor controla os movimentos realizados pelo manequim e observa a avaliação do paciente por parte do aluno, o seu desempenho psicomotor e o pensamento crítico para a solução de problemas. Além do laboratório que simula um hos-pital, os alunos contam com outro laboratório que simula uma ambulância e faz uso de manequins de alta fidelidade, conforme a Figura 6.

Figura 5. Aluno realizando prova prática. Figura 6. Laboratório de simulação de ambulância.

Observa-se que através das atividades práticas com o uso de manequins de alta fidelidade é que a simulação de tal prática contribui para a aquisição de habilidades psicomotoras para os cuidados aos pacientes e geram autoconfian-ça, já que, em muitos casos, os estudantes estão tendo o primeiro contato com o exercício da profissão. “Os cenários de simulação oferecem experiências cog-nitivas, psicomotoras e afetivas, contribuindo para a transferência de conheci-mento da sala de aula para os ambientes clínicos (TEIXEIRA; FELIX, 2011).

METODOLOGIATrata-se de um estudo de natureza qualitativa, descritiva e explora-

tória, com abordagem naturalístico-construtiva, levantamento bibliográfico e pesquisa de campo. A análise dos dados seguiu a metodologia proposta por

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NETO, C.et. al - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM190 NETO, C. et al. - RECURSOS PEDAGÓGICOS E TECNOLÓGICOS NA ENFERMAGEM

Moraes (2007) na Análise Textual Discursiva (ATD) e sistemas de busca pro-posto por Gil (2002, p. 68). Para a obtenção das informações da pesquisa bi-bliográfica proposta para este estudo, foram utilizadas as bases de periódicos da BVS (Biblioteca Virtual de Saúde), Lilacs (Sistema Latino-Americano e do Caribe de informações em Ciências da Saúde), Scielo (Scientific eletro-nics library on-line) que datam de 2004 a 2011. As fontes foram selecionadas a partir dos seguintes descritores: educação na enfermagem, simuladores e práticas pedagógicas.

CONSIDERAÇÕES FINAISAs Diretrizes Curriculares de enfermagem no Brasil preconizam for-

mar profissionais com visão crítica/reflexiva, capazes de atuar e promover mudanças no contexto social dentro de suas devidas particularidades inde-pendentemente de fatores locais, sociais ou financeiros. A formação por com-petências ultrapassa os muros da academia, oportunizando ao graduando a formação da capacidade de relacionar experiências vividas no seu caminho dentro da academia com a sua formação profissional.

Assim sendo, inseridos neste contexto sociocultural e econômico, as instituições de Ensino Superior dos cursos de graduação em enfermagem no Brasil, independentemente da influência histórica, estão reestruturando sua governança acadêmica de forma a contemplar novas estratégias de ensino, em especial com o uso das ferramentas da informática. Percebe-se que a maio-ria das instituições de Ensino Superior no Brasil tem investido pouco nes-tes recursos pedagógicos, o que pode reduzir as experiências dos estudantes utilizando apenas manequins de baixa fidelidade. O uso das ferramentas de informática como instrumento de ensino no ambiente dos laboratórios de en-fermagem propicia um desenvolvimento cognitivo de forma que o acadêmico exercite plenamente o seu modo de agir e pensar.

REFERÊNCIAS

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O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA DE PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO PARA

A GESTÃO ESCOLAR

Adriana Rivoire Menelli de Oliveira Carla Netto

N as últimas décadas, políticas públicas estão sendo instituídas pelo Ministério da Educação, para atender às necessidades da

Educação Básica com objetivos claros de melhorar a qualidade de ensino, a aprendizagem dos alunos e, consequentemente, o índice de desenvolvimento da Educação Básica das escolas públicas brasileiras.

Uma das políticas públicas lançadas pelo MEC, em 1998, foi o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, que surge no âmbito do Fundescola, em parceria com o Banco Mundial, para atender as necessidades das escolas com baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB.

Com a proposta do Ministério da Educação de melhorar as condições das escolas públicas, o PDE, hoje intitulado PDE Escola, conquista um espaço na vida escolar, antes nunca alcançado por um programa federal no cenário da educação do país.

Diante disso, o presente estudo analisa o programa do PDE Escola como ferramenta de planejamento estratégico, a sua implantação no sistema educacional e o impacto nos resultados do IDEB para a melhoria da qualidade de ensino e aprendizagem dos alunos.

A pesquisa vem contribuir para uma análise reflexiva sobre as políti-cas públicas instituídas nos últimos anos pelo Ministério da Educação, com vistas aos resultados e seu impacto na melhoria do IDEB das escolas, sua gestão e desenvolvimento.

Destarte, a pesquisa demonstra que, mesmo com a implementação do PDE Escola nas escolas com baixo IDEB, ainda há muito a ser realizado em termos de políticas públicas que visem o alcance da qualidade e da universa-lidade da Educação Básica no Brasil.

O PDE ESCOLA E A SUA TRAJETÓRIA HISTÓRICANas últimas décadas, com a preocupação dos baixos índices de ensino

e aprendizagem apresentados pelas escolas de Educação Básica no Brasil, o governo federal, por meio do Ministério da Educação, vem procurando desen-volver políticas públicas que venham atender as necessidades prementes para a melhoria da qualidade de ensino e sua universalização.

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OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA194 OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA

Para atender tais necessidades, o Plano de Desenvolvimento da Escola – PDE1 surge como proposta para a melhoria da educação, em 1997, pela Portaria Normativa nº 27, de 21 de junho de 2007, do Ministério da Educação, a partir do Fundescola2, em acordo entre o governo federal e o Banco Mundial, cujo objetivo “era melhorar a gestão escolar, a qualidade do ensino e a per-manência das crianças na escola” (PDE ESCOLA, 2011). O programa nasce, portanto, para dinamizar o processo de planejamento estratégico das escolas com relação às ações e à gestão escolar.

Até 2005, o programa era destinado exclusivamente às unidades escolares de Ensino Fundamental localizadas nas chamadas “Zonas de Atendimento Prioritário” (ZAPs) das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Estas zonas eram escolhidas entre aquelas com baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) e abrangiam um número restrito de escolas e municípios (em média, 3.800 escolas e 450 municípios, entre 2000 e 2007). Em 2006, após a divulgação dos resultados da primeira rodada do IDEB (relativo ao período 2005), o Ministério da Educação entendeu que seria necessário criar um mecanismo que envolves-se diretamente as escolas com os IDEBs mais críticos, optando-se então pela adoção do PDE Escola junto àquele público específico (PDE ESCOLA, 2011).

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) foi criado no ano de 2007, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC), com o objetivo de medir a qua-lidade da escola, como indicador para o cálculo do desempenho do aluno e taxas de aprovação. O IDEB passa, assim, a ser referência para as famílias e alunos, com relação à melhoria da qualidade de ensino das escolas.

O IDEB é medido a cada dois anos numa escala que vai de zero a dez, sendo seis o índice alcançado atualmente entre os países desenvolvidos, conforme a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). A meta brasileira é chegar a esse patamar até 2022 e igualar-se aos países que apresentam melhor desenvolvimento em nível mundial.

Em 2005, foi realizada a primeira medição em que a média nacional alcançou 3,8 nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Já em 2007, o índice au-mentou para 4,2, superando as expectativas de 3,9. Com o índice em crescimen-to, o país espera alcançar uma média superior a 6,0 em 2022, como está previsto.

A partir dos índices do IDEB, o Ministério da Educação vem acom-panhando os municípios que apresentam índices insuficientes de qualidade

1 PORTARIA NORMATIVA Nº 27, DE 21 DE JUNHO DE 2007. Institui o Plano de Desenvolvimento da Escola – PDE Escola. O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso de suas atribuições, faz um diagnóstico efetivo de seus problemas e respectivas causas, suas dificuldades, suas potencialidades, bem como a definição de um plano de gestão para melhoria dos resultados, com foco na aprendizagem dos alunos.2 Fundo de Fortalecimento da Escola (Fundescola) – Programa do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE/MEC), com a interface das secretarias estaduais e municipais de Educação das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e financiamento proveniente do Banco Mundial (Bird). Tem por objetivo promover um conjunto de ações para a melhoria da qualidade das escolas do Ensino Fundamental, amplian-do a permanência das crianças nas escolas públicas, assim como a escolaridade nessas regiões do país.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 195

de ensino, oferecendo apoio técnico e financeiro para o desenvolvimento da Educação Básica. Esse auxílio vem conjuntamente à adesão ao movimento Compromisso Todos pela Educação3 e, também, pela elaboração do Plano de Ações Articuladas – PAR4 do município.

De acordo com o MEC5, 100% dos municípios brasileiros aderiram ao Plano de Ações Articuladas – PAR, comprometendo-se a atingir as metas definidas para o alcance da melhoria da qualidade de ensino da Educação Básica, assim como a sua universalização.

A expansão do PDE Escola envolveu a mobilização de diversos atores, em especial, das secretarias de Educação estaduais e municipais. Entre setembro e novembro de 2007, foram realizados 14 encontros destinados a disseminar e pactuar a implementação do programa com os dirigentes dos estados e mu-nicípios cujas escolas integravam o conjunto de escolas priorizadas. [...] Os recursos são repassados por dois anos consecutivos e destinam-se a auxiliar a escola na implementação das ações indicadas nos planos validados pelo MEC (PDE ESCOLA, 2011).

Como programa prioritário do Ministério da Educação, o PDE Escola assume o papel de ferramenta de gestão (gerencial), que auxilia a escola a se organizar de maneira eficiente e eficaz para a melhoria dos seus indicadores edu-cacionais, de acordo com os seus documentos. O programa é desenvolvido em etapas, de forma participativa, envolvendo todos os atores da comunidade escolar, como familiares, alunos, gestores, equipes pedagógicas, parceiros, entre outros.

O PDE Escola auxilia a gestão no que tange a focalizar sua energia, assegurar que sua equipe trabalhe para atingir os mesmos objetivos e avaliar e adequar sua direção em resposta a um ambiente em constante mudança (PDE ESCOLA, 2011). Como ferramenta de planejamento estratégico para a gestão da escola, o programa segue um ciclo de gestão que conduz ao planejamento, monitoramento e execução das ações e avaliação. Esse ciclo acontece em todo o processo de implementação do PDE Escola, possibilitando que os gestores, sua equipe e comunidade escolar identifiquem seus principais problemas, de-finam seus objetivos e ações/metas prioritárias para o alcance da melhoria da qualidade de ensino e da aprendizagem dos seus alunos.

3 Compromisso com a Educação para Todos (EPT) firmado em Dacar no ano 2000 representa o principal eixo de atuação do programa de Educação da Unesco no mundo.4 O Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, um programa estratégico do PDE, instituído pelo Decreto 6.094, de 24 de abril de 2007, inaugurou um novo regime de colaboração, conciliando a atuação dos entes federados sem lhes ferir a autonomia, envolvendo primordialmente a decisão política, a ação técnica e o atendimento da demanda educacional, visando à melhoria dos indicadores educacionais. A partir da adesão ao Plano de Metas, os estados, os municípios e o Distrito Federal passaram à elaboração de seus respectivos Planos de Ações Articuladas (PAR). A partir de 2011, os entes federados poderão fazer um novo diagnóstico da situação educacional local e elaborar o planejamento para uma nova etapa (2011 a 2014), com base no Ideb dos últimos anos (2005, 2007 e 2009).5 O MEC dispõe de recursos adicionais aos do Fundo da Educação Básica (Fundeb) para investir nas ações de melhoria do Ideb. O Compromisso Todos pela Educação propõe diretrizes e estabelece metas para o Ideb das escolas e das redes municipais e estaduais de ensino (PDE ESCOLA, 2011).

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OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA196 OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA

O PDE Escola segue o Ciclo de Gestão que se desenvolve a partir do planejamento (preparação, análise situacional, definição do plano de suporte estratégico), do monitoramento e execução e da avaliação. De acordo com o programa, a ideia de “ciclo” é um recurso metodológico, mas as etapas não são estanques, há uma sinergia entre elas.

Reforçando o modelo de “ciclo”, Chianca (2001) propõe um detalha-mento maior nas etapas de planejamento, execução e análise/divulgação dos resultados da avaliação. No planejamento o autor propõe um estudo da viabi-lidade: determinação dos interessados, quem deve conduzir como selecionar os avaliadores, e o porquê e quando avaliar, assim como o esclarecimento de objetivos da avaliação e análise do contexto: determinação do que avaliar e mapeamento do contexto político envolvido (relações de poder, interesses).

Para a etapa da execução, Chianca (2001) propõe atentar para aspec-tos políticos e éticos durante a avaliação: não se deve permitir que valores in-dividuais e interesses influenciem a avaliação; coleta de dados: sempre testar os instrumentos de coleta, capacitar profissionais que coletam os dados, fazer cópia dos dados coletados, checar dados anotados. Quanto aos métodos, pro-curar combinar análise de documentos, observação, questionários, entrevistas individuais, entrevistas por telefone e entrevistas em grupo.

Com relação à análise de resultados, o autor coloca que a fase de aná-lise envolve o manuseio e a interpretação de dados quantitativos (frequências, médias, desvios-padrão, quantidades), dados qualitativos (agrupamento de respostas em categorias, análises de campo).

Por fim, sobre a etapa de divulgação e utilização dos resultados, Chianca (2001) afirma que os resultados devem ser divulgados através de relatórios para cada público de interesse envolvido no processo. Deve-se proceder a uma avaliação da avaliação: análise crítica do processo de avaliação, analisando pontos fortes, dificuldades e pontos a melhorar no processo como um todo.

As etapas para o processo de implantação, desenvolvimento e avalia-ção de programas, descritas por Chianca (2001), encontram-se em sinergia com a atual proposta do PDE Escola do MEC, que conduz ao Ciclo de Gestão e que pretende com o seu programa estruturar, organizar e facilitar a gestão das escolas públicas com baixo IDEB, para que assim consigam, a partir de uma gestão organizada e transparente, enfrentar desafios.

O primeiro Ciclo de gestão do PDE Escola vem ocorrendo no presente momento, na etapa do monitoramento e da execução, concomitante com a da avaliação dos planos de ação das escolas priorizadas. Para as novas escolas, o planejamento estará sendo inserido no sistema já no novo formato do progra-ma, agora chamado de PDE Interativo.

Para dar continuidade ao Ciclo de Gestão, estão sendo realizados encon-tros com os comitês das secretarias de Educação dos municípios e dos estados participantes do PDE Escola, por meio das Jornadas de Gestão6 promovidas pelo

6 Encontros de capacitação sobre o ciclo de gestão do PDE Escola para os comitês estratégicos das secretarias de Educação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 197

Ministério da Educação. O comitê é um grupo formado por técnicos da Secretaria de Educação que acompanham todas as escolas da rede (municipal ou estadual) na elaboração e execução dos seus Planos de Desenvolvimento da Escola.

O principal objetivo do Ciclo de Gestão é o de fortalecer a gestão da escola, de forma que todas as ações definidas no plano de cada escola sejam definidas de maneira participativa e compartilhada. O trabalho deve ser siste-matizado e acompanhado de forma cooperativa e periódica pelos gestores e grupo de sistematização, formado por membros que elaboram e executam o plano de ação de cada escola. Conforme o PDE Escola (2011), no planejamen-to são definidos os objetivos da escola para os próximos anos, bem como as es-tratégias para alcançar esses objetivos e as ações que formam essas estratégias.

O importante é que o planejamento bem estruturado seja executado de forma transparente, conforme a realidade de cada uma das escolas envolvidas no PDE Escola. Na medida em que o plano é validado pelo Comitê estraté-gico e pelo MEC, a escola tem direito a receber recursos destinados que irão melhorar as condições gerais da escola visando a melhoria da qualidade de ensino e de aprendizagem dos alunos.

A adesão ao PDE Escola iniciou em 2008, para as escolas públicas priorizadas na ocasião. Em 2009, com o lançamento da Plataforma Eletrônica do Simec7, as escolas chamadas a participarem do programa inseriram seus planos de forma eletrônica no sistema, facilitando o acompanhamento dos gestores, dos comitês e do próprio Ministério da Educação.

Em 2011, com as atualizações e inovações do programa, surge o PDE Interativo, que vem a atender toda a rede de escolas de Educação Básica, in-dependentemente do repasse de recursos federais. A nova ferramenta, muito mais ágil e completa, é de fácil acesso e centraliza todos os dados e programas relacionados à vida da escola.

O PDE Interativo é o novo módulo do PDE Escola no SIMEC. Ele foi de-senvolvido pelo Ministério da Educação em parceria com as secretarias esta-duais e municipais e a principal mudança em relação à versão anterior é o seu caráter autoinstrucional e interativo. [...] As mudanças tiveram como principal objetivo facilitar o acesso e a navegação da equipe escolar e de todas as pessoas interessadas em conhecer a ferramenta (PDE ESCOLA, 2011).

Primeiramente, o novo programa estará disponível para as escolas no-vas, que foram priorizadas pelo IDEB 2009, e que não participaram do pro-grama em 2008 e 2010. Para 2012, a proposta é que todas as escolas utilizem a ferramenta para dar continuidade ao seu planejamento estratégico, visando a melhoria da gestão escolar, mesmo que não venham a receber recursos fi-nanceiros do MEC.

O importante do programa do Ministério da Educação para as escolas de Educação Básica é o fortalecimento da gestão escolar, para que a mesma se

7 Sistema Integrado de Planejamento, Orçamento e Finanças do Ministério da Educação.

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OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA198 OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA

consolide de forma democrática e participativa, tornando-se melhor e qualifi-cada. Ressalte-se que toda essa proposta de mudança, veio pela participação ampla das escolas públicas estaduais e municipais, assim como de suas secre-tarias e do Ministério da Educação, por meio de reuniões, encontros e oficinas que aconteceram no decorrer destes últimos anos.

O resultado deste esforço pode ser comprovado a partir deste ano. As novas escolas priorizadas pelo programa já utilizarão o PDE Interativo e, a partir de 2012, todas as escolas e secretarias que desejem utilizar a metodologia poderão utilizar a ferramenta, mesmo sem a transferência de recursos por parte do MEC. Em 2011, das 19.096 escolas priorizadas pelo MEC para receberem recursos, 13.347 são novas e utilizarão o PDE Interativo. As outras 5.749 escolas rema-nescentes dos anos 2008, 2009 e 2010 devem continuar utilizando o módulo

“Escola” do SIMEC (PDE ESCOLA, 2011).

O PROGRAMA PDE ESCOLA E SEU IMPACTO NA EDUCAÇÃO BÁSICADiante das experiências das escolas públicas com o PDE Escola, os

planos de ação vêm sendo implementados de forma gradativa, até que todas as escolas públicas brasileiras venham a aderir ao programa como um todo.

No decorrer da implementação do programa, o MEC criou um sistema com formulário eletrônico, por meio da plataforma chamada Simec, para faci-litar o planejamento estratégico e, assim, as escolas gerenciarem seus planos de ação com maior dinamismo e transparência. O Simec conduz ao gestor a se or-ganizar, acompanhar o que está sendo executado pelas ações financiáveis e não financiáveis e, por fim, avaliar o ciclo de gestão da escola. Essa dinâmica vem a exigir maior dedicação, compromisso e profissionalismo daqueles que estão à frente das escolas atualmente, além de proporcionar maior transparência nas ações escolares e acompanhamento sistemático e periódico dos atores envolvi-dos no processo de gestão, como os conselhos escolares, os comitês estratégi-cos das secretarias de Educação dos municípios e dos estados, do FNDE8, que é quem libera os recursos, e do MEC que valida os planos de ação.

A proposta do MEC para profissionalizar a gestão das escolas fortale-ce o desejo de igualar-se aos países que apresentam melhor desenvolvimento em educação em nível mundial. Atualmente, pelos dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), por meio do relatório de Monitoramento de Educação para Todos de 2010, aponta que a qualidade da educação no Brasil ainda está baixa na Educação Básica.

O relatório da Unesco (2010) revela que ainda há muito a ser feito na área educacional, mesmo com os avanços já alcançados na última década, como a quase universalização do acesso no Ensino Fundamental, igual ou superior a 97%, mas que ainda a permanência e a conclusão dessa etapa na

8 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 199

idade adequada são uma meta longe de ser realizada. Mesmo com a melhora apresentada entre 1999 e 2007, o índice de repetência no Ensino Fundamental brasileiro (18,7%) é o mais elevado na América Latina e assume uma posição acima da média mundial (2,9%).

Outros problemas apontados no relatório Unesco (2010) referem-se ao indicador da qualidade (sobrevivência na última série da educação pri-mária), no qual o país ocupa a 103ª posição em nível mundial. A situação é saber se até 2015 o Brasil alcançará as metas definidas em Dacar no ano 2000, sendo signatário do compromisso com a Educação para Todos (EPT), que estabeleceu seis objetivos para assegurar o acesso a oportunidades educacio-nais abrangendo desde a oferta de educação e cuidados na primeira infância à garantia das necessidades de aprendizagem básicas de jovens e adultos.

Para Unesco, a baixa qualidade de ensino é um dos fatores que impe-de o Brasil de estar em condições melhores. Questões como estrutura física precária das escolas e o número baixo de horas em sala de aula são fatores determinantes para a avaliação da qualidade do ensino. Cerca de 13,8% dos brasileiros largam os estudos já no primeiro ano no ensino básico. O Brasil somente está à frente da Nicarágua (26,2%) na América Latina e, mais uma vez, bem acima da média mundial (2,2%).

Sendo assim, com o objetivo de melhorar os índices de qualidade da Educação Básica, o PDE Escola desafia as escolas com baixo IDEB a or-ganizarem seus planos em uma plataforma eletrônica, dando a visibilidade necessária para uma gestão transparente; que exige o monitoramento da exe-cução das ações e uma avaliação completa do plano como um todo, de forma a considerar o seu impacto na comunidade escolar.

Considerando os dados do IDEB das escolas brasileiras dos anos de 2005 a 2009 do Ensino Fundamental e Ensino Médio, pode-se observar um relativo crescimento nos índices de acordo com a Tabela 1 a seguir.

Tabela 1. IDEB 2005, 2007, 2009 e projeções para o Brasil.

Fonte: Saeb e Censo Escolar. Atualizado em 10/08/2011 / MEC – INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.

Anos Iniciais do Ensino Fundamental

Anos Finais do Ensino Fundamental Ensino Médio

IDEB Observado Metas IDEB

Observado Metas IDEB Observado Metas

200

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200

7

200

9

200

7

200

9

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200

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7

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9

2021

200

5

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7

200

9

200

7

200

9

2021

TOTAL 3,8 4,2 4,6 3,9 4,2 6,0 3,5 3,8 4,0 3,5 3,7 5,5 3,4 3,5 3,6 3,4 3,5 5,2

Dependência Administrativa

Pública 3,6 4,0 4,4 3,6 4,0 5,8 3,2 3,5 3,7 3,3 3,4 5,2 3,1 3,2 3,4 3,1 3,2 4,9

Estadual 3,9 4,3 4,9 4,0 4,3 6,1 3,3 3,6 3,8 3,3 3,5 5,3 3,0 3,2 3,4 3,1 3,2 4,9

Municipal 3,4 4,0 4,4 3,5 3,8 5,7 3,1 3,4 3,6 3,1 3,3 5,1 2,9 3,2 - 3,0 3,1 4,8

Privada 5,9 6,0 6,4 6,0 6,3 7,5 5,8 5,8 5,9 5,8 6,0 7,3 5,6 5,6 5,6 5,6 5,7 7,0

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OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA200 OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA

Os dados do IDEB revelam que os índices, tanto dos anos iniciais e anos finais do Ensino Fundamental, assim como do Ensino Médio tiveram uma melhora, nos anos iniciais de 3,8%, em 2005, para 4,6% em 2009. Para os anos finais, a elevação foi de 3,5%, em 2005, para 4,0%, em 2009. No en-tanto, o Ensino Médio obteve um crescimento menor no índice do IDEB, que foi de 3,4%, em 2005, para 3,6%, em 2009. A maior projeção, para 2021, é para os anos inicias que projeta 6,0% para o seu IDEB.

Como se observam, as metas estão sendo buscadas para que se atinja o índice de 6,0% em 2021, apesar da projeção do Ensino Médio, que será de 5,2%. No cenário das escolas públicas, a projeção para 2021 para os anos iniciais é de 5,8% e para os anos finais é de 5,2%; para o Ensino Médio é de 4,9%, abaixo das projeções finais para todas as escolas em nível nacional, que são de 6,0%, 5,5% e 5,2%, respectivamente.

Com o impacto dos resultados do PDE Escola para as escolas públicas, verifica-se um aumento no IDEB de 3,6% para 4,4%, para os anos iniciais; um IDEB de 3,2% para 3,7%, para os anos finais do Ensino Fundamental, e um IDEB de 3,1% para 3,4%, para o Ensino Médio.

Os dados do IDEB para as escolas públicas demonstram que as esco-las estão buscando resultados que estão impactando na qualidade de ensino e de aprendizagem, antes não revelada e registrada. O momento vivido pela Educação Básica das escolas públicas está definindo uma mudança cultural com relação à gestão das escolas, que necessitam ter maiores cuidados com os seus planejamentos, suas tomadas de decisão e definição de prioridades.

Sem dúvida, é uma mudança paradigmática na história da Educação Básica no Brasil, que tem o PDE Escola, agora PDE Interativo, como base para o planejamento estratégico das escolas. A diretriz é que o planejamen-to seja administrado de forma coletiva, pelos gestores, conselhos escolares, comitês estratégicos das secretarias de Educação dos municípios e estados, para então ser validado pelo Ministério da Educação, conforme os princípios da governança compartilhada. De acordo com os comitês, o monitoramento da gestão dos planos de ação das escolas tem procurado reforçar a prática da gestão compartilhada e participativa. Pelos depoimentos das secretarias de Educação, as escolas têm procurado reforçar suas ações dentro dos princípios e diretrizes do PDE Escola, o que tem melhorado consideravelmente os re-sultados referentes à melhoria da qualidade de ensino e de aprendizagem dos alunos, o que consequentemente se materializa nos melhores índices do IDEB.

De acordo com Oliveira (2010), a complexidade de uma organização como a escola9 define-se pelas suas relações e interfaces criadas em relação às demais micro-organizações que fazem parte do todo. Assim, nesse univer-so, deve haver uma sinergia qualificada entre os integrantes da organização para que as relações se estabeleçam, em diferentes níveis, de forma a dar uni-dade às ações e haver crescimento em toda a organização.

9 Grifo do autor.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 201

Kotler (1992, p. 63) entende que o planejamento estratégico é um pro-cesso gerencial que auxilia a “desenvolver e manter uma adequação razoável entre os objetivos e recursos da empresa e as mudanças e oportunidades de mercado”. Seu objetivo é orientar e reorientar os negócios e produtos da em-presa de modo que gere lucros e crescimento satisfatórios. O planejamento estratégico, portanto, orienta a gestão da organização para o futuro, para os desafios que estão por vir, auxiliando a ter clareza do melhor caminho a ser seguido a partir de uma construção de consenso.

Corroborando da mesma tese, Oliveira (1998) coloca que o planeja-mento estratégico é como uma metodologia gerencial que permite estabelecer a direção a ser seguida pela organização, visando o melhor grau de interação com o ambiente, considerando a capacitação da organização para esse proces-so de adequação.

O planejamento das escolas públicas, que atualmente utilizam o PDE Escola como ferramenta para estrutura e para organizar suas ações, tem se tornado bem mais viável e real, por um “processo continuado e adaptativo, por meio do qual, uma organização define sua missão, seus objetivos e metas; seleciona estratégias e meios para atingi-los, em um determinado período de tempo e por meio da constante interação com o ambiente externo” (MEYER JR., 1988, p. 55).

Ao adotar um planejamento estratégico, uma organização deve estar preparada para mudanças estruturais como um todo, pois as ações estarão pre-sentes em todos os seus níveis, desde a direção até os setores intermediários e de base. Somente, assim, proporcionando uma mudança geral, é que a organi-zação se oxigena e tem condições de mudar o seu rumo para o crescimento e para o seu desenvolvimento (OLIVEIRA, 2010).

A PESQUISA E SUA METODOLOGIA

A pesquisa sobre o impacto dos resultados da implementação do pro-grama do Ministério da Educação, instituído em 1998, e, posteriormente, em 2007, intitulado PDE Escola (atualmente PDE Interativo), denominou-se ex-ploratória tendo como base a busca documental das leis que sustentam o pro-grama governamental, suas Portarias e Resoluções, cujo objetivo não é obter conclusões definitivas, mas abrir espaços para reflexões para a busca de um melhor entendimento dos processos de construção coletiva e de cisão compar-tilhada. A pergunta do problema a ser pesquisado definiu-se para responder o seguinte questionamento: “Qual o impacto do PDE Escola como ferramenta de planejamento estratégico para a gestão escolar?”.

A pesquisa exploratória envolve o levantamento bibliográfico; entre-vistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesqui-sado e análise de exemplos que estimulem a compreensão do fato estudado. Por meio de uma pesquisa exploratória avalia-se a possibilidade de se desen-

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OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA202 OLIVEIRA, A. R. M. et al. - O IMPACTO DO PDE ESCOLA COMO FERRAMENTA

volver um estudo sobre uma determinada temática. Esse tipo de pesquisa tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito.

A pesquisa exploratória, por ser um tipo de pesquisa muito específica, quase sempre assume a forma de um estudo de caso (GIL, 2008).

A partir da definição do problema, os dados estatísticos referentes ao IDEB de cada escola de Educação Básica pública dos municípios e dos es-tados foram levantados no site do INEP. Os textos relacionados ao tema da gestão escolar e do PDE Escola foram buscados no site do programa e em bibliotecas virtuais disponíveis pelos órgãos do governo federal.

O levantamento dos dados considerou também os contatos com os comitês estratégicos de alguns estados, como do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, que contribuíram com depoimentos e dados sobre a implementação do programa, nos últimos anos em seus municípios e escolas. A análise conside-rou os dados, que foram distribuídos em categorias definidas, que facilitaram a análise de conteúdo para a obtenção dos resultados encontrados no estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAISOs baixos índices da qualidade de ensino e aprendizagem da Educação

Básica têm sido motivo de muita preocupação por parte da sociedade brasi-leira, nos últimos anos, tendo em vista a necessidade da melhoria das suas condições.

As políticas públicas com relação à Educação Básica surgem, nos úl-timos anos, visando o seu desenvolvimento, a partir de indicadores como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB nas escolas de todo o país.

Por certo, muito ainda há que ser feito para que consigamos alcançar os melhores índices internacionais, conquistados por países que investem boa parte do seu PIB em educação. Para tanto, o Brasil, além de necessitar investir mais em infraestrutura, capacitação, valorização do professor e condições de acesso para todos, deve almejar a qualidade de ensino que o coloque entre os países desenvolvidos e com melhor qualidade de vida.

Destarte, o PDE Escola, como ferramenta de planejamento estratégico para as escolas públicas, tem buscado auxiliar a gestão, para que esta se torne, cada vez mais, responsável, compromissada e profissional. Que os gestores que estiverem à frente dos processos administrativos e pedagógicos entendam o seu verdadeiro papel, que transcende a gestão, passa a ser um compromis-so com o desenvolvimento do país. Para isso, algumas mudanças imperiosas, como a cultura, a postura e a visão dos gestores são fundamentais para uma gestão qualificada das escolas, levando-as a alcançar índices melhores do IDEB e, consequentemente, a melhor qualidade de ensino e de vida para todos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 203

De fato, torna-se fundamental que as escolas assumam o PDE Escola como ferramenta de planejamento para os seus planos de ação, entendendo e assimilando o planejamento estratégico como ferramenta útil na gestão, como processo contínuo, permanente e dinâmico. Passa a ser, portanto, o processo-

-chave para a qualificação do ensino e da melhoria do IDEB para as escolas públicas brasileiras.

REFERÊNCIAS

CHIANCA, T.; MARINO, E.; SCHIESARI, L. Desenvolvendo a cultura de ava-liação em organizações da sociedade civil. Coleção Gestão e Sustentabilidade. São Paulo: I. Fonte/Editora Global, 2001.GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2008.KOTLER, Philip. Administração de marketing: análise, planejamento,implementação e controle. 2. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1992.MEC. Plano de Desenvolvimento da Escola – PDE Escola. Disponível em: http://pdeescola.mec.gov.br. Acesso em: 5 nov. 2011.

______. Sistema Integrado do Ministério da Educação. Disponível em: http://simec.mec.gov.br. Acesso em: 4 nov. 2011.MEYER JR., V. Considerações sobre o planejamento estratégico na univer-sidade. In: A. P. Finger. Organização, planejamento e gestão. Florianópolis: UFSC/CPGA/NUPEAU, 1988.OLIVEIRA, D. P. R. Planejamento estratégico, conceitos, metodologias e prática. São Paulo: Ed. Atlas, 1998.OLIVEIRA, A. R. M. Mudança na Educação Superior – Perspectivas e Possibilidades. Ensino Superior em Mudança: tensões e possibilidades UM. CIEd. Actas do Congresso Ibérico, 2010.ONU. Unesco. Monitoramento dos objetivos de educação para todos no Brasil. Brasil: Ed. Moderna, 2010.

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O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO SUPERIOR PÚBLICA: CONSIDERAÇÕES

A PARTIR DO CASO UFPEL

Maria da Graça Gomes Ramos Tania Elisa Morales Garcia Mariângela da Rosa Afonso

A Educação Superior exerce papel relevante no que diz respeito à mobilidade social, mostrando-se como a grande finalidade de

quem ingressa em instituições de Ensino Superior ao perceber nessa instância os grandes benefícios sociais e econômicos que ainda resultam da obtenção de um diploma superior. Isso, evidenciado nos grandes diferenciais de renda que existem no Brasil entre os detentores de diplomas de nível superior e o restante da população.

Esse entendimento do Ensino Superior como um caminho para se ob-ter o destaque econômico social pressiona a demanda por vagas nessa instân-cia do ensino brasileiro, levando o governo federal a implementar medidas que atendam essa demanda.

Nessa direção destacam-se como políticas do governo federal imple-mentadas nos últimos anos, visando a expansão do Ensino Superior: o Programa de Apoio ao Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

– Reuni, o Programa Universidade para Todos – ProUni e o Financiamento ao Estudante do Ensino Superior – FIES, além da Universidade Aberta do Brasil – UAB.

O Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) originado do Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007, tem como principal objetivo o aumento das vagas de ingresso e a redução das taxas de evasão nos cursos presenciais de graduação (BRASIL, 2007). O Reuni pre-tende que a expansão ocorra permitindo um acesso democrático ao Ensino Superior público, aumentando o contingente de estudantes menos favorecidos economicamente.

O Ministério da Educação, para alcançar seus objetivos, além das 14 novas universidades criadas e da ampliação das universidades existentes, pre-vê a expansão dos cursos noturnos, a ampliação da mobilidade estudantil, a re-visão da estrutura acadêmica e a diversificação das modalidades de graduação, propondo uma reestruturação não apenas de ordem quantitativa, mas também qualitativa (BRASIL, 2007; BRASIL, 2010).

O ProUni foi criado através da Lei nº 11.096, de 13 de janeiro de 2005, com o objetivo de estabelecer que as instituições beneficiadas por isenções fiscais concedam bolsas de estudos na proporção dos alunos pagantes por cur-

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RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO206 RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO

so e turno, sem exceção. As bolsas podem ser fornecidas nas modalidades integral, parcial de 50% ou parcial de 25%, a candidatos selecionados por meio do Enem, utilizando como critério a classificação do candidato no Enem aliado ao seu perfil socioeconômico: egressos de escola pública com renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio para bolsa integral e de até três salários mínimos para bolsa parcial de 50% (BRASIL, 2007).

O Programa de Financiamento Estudantil (FIES), criado em 1999 para substituir Programa de Crédito Educativo (PCE/Creduc) é destinado a financiar a graduação de estudantes que não têm condições de arcar com os custos de sua formação e estejam regularmente matriculados em instituições privadas, cadastradas no Programa e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo MEC.

A Universidade Aberta do Brasil, criada por meio do Decreto nº 5.800, de 8 de junho de 2006, estabelece um acordo de cooperação entre os estados e municípios e as universidades públicas. Por meio deles, os entes federados mantêm polos de apoio presencial para acolher professores sem curso superior ou garantir formação continuada aos já graduados. As universidades públicas, da sua parte, oferecem cursos de licenciatura e especialização, especialmente onde não exista oferta de cursos presenciais (BRASIL, 2007).

Partindo-se do cenário descrito e assumindo-se o Programa Reuni como referência, esse estudo propõe-se a investigar, junto a uma instituição pública, a Unversidade Federal de Pelotas, que aderiu preponderantemente a esse programa, como vem ocorrendo a expansão do ensino de graduação na instituição, verificando quais as áreas de formação que mais cresceram na UFPEL no período 2008-2011.

Destaca-se que os dados desse trabalho são resultados preliminares de um estudo que faz parte do projeto que tem como foco a Educação Superior e os desafios contemporâneos desenvolvidos por uma rede de pesquisadores no âmbito do GEU/UFRGS, vinculado ao PPG Sociologia/UFRGS e PPGEDU/UFRGS. O projeto do GEU/UFRGS é formado por diferentes subprojetos, que visam a investigar e a apreender alguns dos principais desafios para a compreensão da realidade educacional brasileira.

PANORAMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRANos anos recentes, tem sido interesse de diversos pesquisadores o ce-

nário da Educação Superior (ES) brasileira levando ao debate os formatos de seu sistema, colocando em xeque a contribuição e o papel das instituições de ES em transmitir, produzir e disseminar conhecimento com compromisso e responsabilidade social, e com atenção aos desafios globais e de construção de sociedades mais justas e igualitárias. Essa discussão tem revelado a neces-sidade de gerar mudanças no sentido de construir sistemas e instituições de ES que promovam a equidade e o crescimento dos mecanismos de inclusão social, ao mesmo tempo em que mantendo a qualidade da formação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 207

Nessa perspectiva, tem surgido como alternativa a ampliação das re-des acadêmicas, bem como a construção de novas modalidades de cursos su-periores.

Houve um fortalecimento da educação tecnológica com a reestrutura-ção dos 33 Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs), que muda-ram o foco do Ensino Médio para a Educação Superior, tornando-se Institutos Federais de Educação de Ciência e Tecnologia (IFETs).

Ainda que se tenha observado na Educação Superior brasileira um au-mento significativo de IES – Instituições de Educação Superior e de matrícu-las nos últimos anos, a taxa de escolarização líquida da população de 18 a 24 anos continua baixa (13,6%) e a taxa bruta, em torno de 25%.

Desse modo, apesar de ter havido um crescimento significativo do acesso à ES, o Brasil não atingiu as metas propostas pelo PNE (2001-2010) quanto ao crescimento de matrículas, ao pretender inserir ao menos 30% da faixa etária de 18 a 24 anos na ES até o final da década, nem mesmo nas re-giões economicamente mais desenvolvidas, que apresentam maior número de IES e de matrículas. A média do país subiu apenas de 8,8% para 13,6%. Além disso, a disparidade regional se manteve ao longo da década, com regiões apresentando no ano de 2008 menos de 10% de acesso à ES, como é o caso do Norte e Nordeste brasileiro que chegaram a apenas 9,9% e 8,2%, respecti-vamente – e outras com acesso próximo a 20%, como é o caso da região Sul com taxa de 18,6% (CNE, 2010).

No que diz respeito a essa questão, no projeto de lei do novo Plano Nacional de Educação (2011-2020), a meta é elevar a taxa bruta de matrícula na Educação Superior para 50% e a taxa líquida para 33% da população de 18 a 24 anos até 2020. Isso significa dobrar os índices verificados no final da última década (2010).

Na Tabela 1, apresenta-se um panorama do crescimento do Ensino Superior no Brasil no período de 1999-2009. Em 1999 existiam 8.878 cur-sos superiores, dos quais 5.384 (60,6%) pertenciam às IES privadas e 3.494 (39,4%) cursos às instituições públicas.

O último censo da Educação Superior brasileira, relativo ao ano de 2009 e divulgado pelo Ministério da Educação em fevereiro de 2011, aponta que em 2009 existiam 2.314 instituições de Ensino Superior, das quais apenas 245 (10,6%) são de natureza pública e 2.069 (89,4%) são privadas. Dados desse censo e integrantes da Tabela 1 mostram que do total de 28.671 cursos de graduação existentes no Brasil, 20.043 (70,13%) são oferecidos pelas IES privadas e 8.628 (29,87%) pelas públicas.

Os dados contidos na Tabela 1 mostram que, em uma década, mais do que o crescimento desproporcional do número de IES privadas, que passou de 905 IES em 1999 para 2.069 em 2009, evidenciando um crescimento de 128,6% no número dessas instituições, a taxa de matrículas no mesmo período, nas IES privadas aumentou 144,8%, passando de 1.537.923 para 3.764.728.

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RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO208 RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO

Na esfera pública no período em questão, o número de IES passou de 192 para 245, provocando um aumento de 27,6%, e o número de matrículas cresceu 62,4%, de 832.022 para 1.351.168 matrículas. Em 10 anos, enquanto as insti-tuições públicas cresceram 27,6%, as privadas aumentaram em 128,6. Chama a atenção, o processo de privatização das matrículas no Ensino Superior bra-sileiro, pois cerca de 3.764.728 de matrículas (73,6%) no ano de 2009 perten-cem às instituições privadas, estando apenas 1.351.68 matrículas (26,4%) no âmbito das IES públicas.

É preciso destacar que os dados da Tabela 1 não evidenciam nessa ex-pansão da Educação Superior a Educação Superior tecnológica, que vem ofer-tando diversos cursos e matriculando um número crescente de alunos, com muita força, a partir do ano 2000.

Tabela 1. Número de instituições de Educação Superior, cursos e matrículas por categoria administrativa – Brasil – 1998-2008.

Fonte: MEC/INEP (2004); MEC/INEP/DEED (2009, 2010).* No número total de cursos de graduação do ano 2009, estão incluídas as modalidades presenciais e a distância.

O cenário descrito a partir da Tabela 1, elaborada com informações disponibilizadas pelo INEP, leva a crer que a expansão do acesso ao Ensino Superior brasileiro, pelo viés privado, necessita ser controlada, pois, longe de resolver a distribuição desigual dos bens educacionais, tende a aprofundar as condições históricas de discriminação do direito à Educação Superior àqueles pertencentes aos setores populares.

Nesse sentido, Ristoff aponta que:Se a palavra de ordem da década passada foi expandir, a desta década pre-

cisa ser democratizar. E isto significa criar oportunidade para que os milhares de jovens de classe baixa, pobres, filhos da classe trabalhadora e estudantes

Instituições Cursos MatrículasAno Total Pública Privada Total Pública Privada Total Pública Privada

1999 1.097 192 905 8.878 3.494 5.384 2.369.945 832.022 1.537.923

2000 1.180 176 1.004 10.585 4.021 6.564 2.694.245 887.026 1.807.219

2001 1.391 183 1.208 12.155 4.401 7.754 3.030.754 939.225 2.091.529

2002 1.637 195 1.442 14.399 5.252 9.147 3.479.913 1.051.655 2.428.258

2003 1 859 207 1.652 16.453 5.662 10.791 3.887.771 1.137.119 2.750.652

2004 2.013 224 1.789 18.644 6.262 12.382 4.163.733 1.178.328 2.985.405

05 2.165 231 1.934 20.407 6.191 14.216 4.453.156 1.192.189 3.260.967

2006 2.270 248 2.022 22.101 6.549 15.552 4.676.646 1.209.304 3.467.342

2007 2.281 249 2.032 23.488 6.596 16.892 4.880.381 1.240.968 3.639.413

2008 2.252 236 2.016 24.719 6.772 17.947 5.080.056 1.273.965 3.806.091

2009 2314 245 2069 28671 8628 20043 5115.896 1351.168 3764.728

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 209

das escolas públicas tenham acesso à Educação Superior. Não basta mais ex-pandir o setor privado – as vagas continuarão ociosas; não basta aumentar as vagas no setor público – elas apenas facilitarão o acesso e a transferência dos mais aquinhoados. A democratização, para acontecer de fato, precisa de ações mais radicais – ações que afirmem os direitos dos historicamente excluídos, que assegurem o acesso e a permanência a todos os que seriamente procuram a Educação Superior, desprivatizando e democratizando o campus público (RISTOFF, 2008, p. 45).

O debate sobre a expansão e democratização do acesso à educação su-perior, levanta a preocupação com a garantia da qualidade e da flexibilização das condições de oferta desse nível de ensino.

METODOLOGIA O cenário investigado é a UFPel, que é uma instituição criada pelo

decreto-lei nº. 750, de 8 de agosto de 1969, dentro da política da Reforma Universitária, resultante do processo de interiorização do Ensino Superior, aglutinando estabelecimentos isolados em uma instituição universitária.

A UFPel, atualmente, situa-se em dois municípios vizinhos: Pelotas, onde funcionam suas unidades da zona urbana e a administração central da universidade, e Capão do Leão, onde se encontra o Campus Universitário.

Para dar conta do objetivo deste estudo, foram utilizados como fonte de dados documentos de abrangência institucional, tais como relatórios, infor-mativos e outros materiais associados ao foco do estudo e informações dispo-nibilizadas no site da instituição. As informações levantadas foram analisadas descritivamente.

RESULTADOS E DISCUSSÃOO número de alunos de graduação em regime presencial na UFPel,

até o primeiro semestre de 2011, aproxima-se de 15 mil, conforme dados da Coordenadoria de Comunicação da UFPel (2011).

Com a adesão da Universidade ao Reuni (Programa de Expansão e Reestruturação das Universidades Federais Brasileiras), a UFPel, na busca por expandir o número de alunos de graduação, criou a partir de 2008 41 novos cursos superiores: Tecnólogo em Gestão de Cooperativas, Tecnólogo em Viticultura e Enologia, Zootecnia, Biotecnologia, Engenharia Geológica, Licenciatura em Matemática noturno, Química Industrial, Antropologia – Habilitação em Antropologia Social, Antropologia – Habilitação em Arqueologia, Gestão Pública, Bacharelado em História, Cinema e Animação, Conservação e Restauro, Dança, Design Digital, Superior de Música – Habilitação em Composição, Teatro, Física, Química Industrial, Design Vestuário, Letras/Português/Alemão, Letras/Habilitação em Redação e Revisão de textos, Física Computacional, Musicologia, Tecnólogo em Agroindústria, Tecnólogo Meio Ambiente, Educação Física noturno, Jornalismo e Comunicação, Psicologia,

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RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO210 RAMOS, M. G. G. et al. - O REUNI E A AMPLIAÇÃO DO ACESSO À EDUCAÇÃO

Engenharia Civil, Engenharia Industrial Madeireira, Engenharia Sanitária Ambiental, Engenharia de Produção, Engenharia de Controle e Automação, Engenharia Eletrônica, Engenharia do Petróleo, Engenharia Hídrica, Engenharia de Computação e Engenharia de Materiais e Bioinformática.

Cabe destacar que até o ano de 2007 a UFPel não oferecia cursos superiores tecnológicos e na área das engenharias oferecia apenas os cursos de Engenharia Agrícola e de Engenharia Agronômica. De 2008 para 2011, foram criados os cursos de Engenharia Industrial Madeireira, Engenharia Sanitária Ambiental, Engenharia de Produção, Engenharia de Controle e Automação, Engenharia Eletrônica, Engenharia do Petróleo, Engenharia Geológica, Engenharia Hídrica, Engenharia de Computação, Engenharia Civil e Engenharia de Materiais, totalizando onze novos cursos na referida área, bem como diversos cursos tecnológicos. Esses dados evidenciam a pre-tensão da UFPel em apostar na área das engenharias, em que ocorreu a maior oferta no número de cursos novos na instituição.

CONSIDERAÇÕES FINAISO mapeamento da expansão dos cursos de graduação na UFPel, a par-

tir do Programa Reuni, revela uma diversificação na configuração do ensino de graduação, com a criação de cursos tecnológicos e o forte investimento na área das engenharias, até então, totalmente carente na instituição.

Acredita-se que tal fato possa ter ocorrido em função da demanda de mercados específicos na área que necessita de profissionais qualificados para o exercício da função, principalmente em função do alargamento das fron-teiras do conhecimento, mudanças na economia e descobrimento de novas fontes de energia. Também associado a essa questão pode estar o investimento que vem ocorrendo na região com a construção de plataformas da Petrobrás.

Entretanto, esse cenário de expansão do ensino de graduação na UFPel, sem dúvida, requer reflexão, pois o crescimento do acesso a esse nível de ensino impõe desafios qualitativos e de inclusão aos gestores e demais profissionais das instituições de Ensino Superior.

Desse modo, o compromisso da universidade em formar profissionais qualificados para atenderem as demandas da região com a criação e expansão do ensino de graduação, certamente, vai responder às necessidades do mer-cado regional que até então eram atendidas por profissionais formados por outras regiões.

REFERÊNCIASBRASIL. Plano Nacional de Educação 2011-2020. Projeto de Lei 8.035, 2010.CNE. Desafios e Perspectivas da Educação Superior Brasileira para a Próxima Década. Documento de Referência para Oficina de Trabalho CES/CNE, 2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 211

INEP – INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Resumo Técnico – Censo da Educação Superior de 2009. Brasília: INEP/MEC, 2010.INEP – INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS. Site: http://.inep.gov.br. Acesso em: 2 jun. 2005.RISTOFF, D. Educação Superior no Brasil – 10 anos pós-LDB: da expan-são à democratização. In: BITTAR, M., OLIVEIRA, J. F. de; MOROSINI, M. (orgs.) Educação Superior no Brasil – 10 anos pós-LDB. Brasília: INEP/MEC. 2008, p. 39-50 (Coleção INEP 70 anos v. 2).

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UMA BREVE DISCUSSÃO SOBRE O PROJETO PEDAGÓGICO INSTITUCIONAL – PPI

Francisco Nilton Gomes de Oliveira

D urante minha caminhada como avaliador de curso de gradu-ação e tecnológico pelo Ministério da Educação/MEC/INEP,

nas minhas vivências práticas em gestão universitária, observo que as IES – Instituições de Educação Superior têm encontrado dificuldades em elaborar documentos básicos que servem de suporte para as estratégias de planejamen-to nas Instituições de Ensino Superior (IES). Percebo que o documento muitas vezes é elaborado para atender uma exigência do Ministério da Educação, não apoiando as conduções de trabalho dos gestores nas Instituições. O Projeto Pedagógico Institucional – PPI é o enfoque principal deste paper que objetiva discutir questões reflexivas sobre o documento.

O texto enfoca uma discussão sobre a dimensão acadêmica, as difi-culdades e os desafios enfrentados dentro das Instituições de Ensino Superior, bem como se debruça numa leitura oriunda aos processos administrativos. Essa relação é fruto das variações epistêmicas e socioinstitucionais que vêm ocorrendo nos dias atuais; como apontam Goergen (2000), ao colocar em ques-tão os pilares sobre os quais se fundou a universidade moderna – o Estado e a Razão –, e as mudanças que vêm ocorrendo na vida social e produtiva colocam para as instituições universitárias o desafio de reorientar-se no novo contexto.

Compreendo que o Projeto Pedagógico Institucional – PPI é um ins-trumento político, filosófico e teórico-metodológico que define diretrizes para as práticas acadêmicas e administrativas das Instituições de Ensino Superior (IES). É um compromisso da Instituição com a sociedade local, regional e nacional, declarando sua identidade institucional; uma explicitação da linha filosófico-pedagógica que fundamenta todos os cursos, programas e projetos na direção de afirmar o princípio do funcionamento orgânico da Instituição.

REFERENCIAL TEÓRICOO Projeto Pedagógico Institucional – PPI norteia a realização da mis-

são institucional, na medida em que estabelece os parâmetros de condução das atividades acadêmicas e apresenta políticas institucionais compostas por um conjunto de estratégias necessárias à consecução dos objetivos maiores da Educação Superior e da Instituição. Tal documento serve de ferramenta para o planejamento estratégico das Instituições de Ensino Superior (IES).

O PPI conduz estratégias educacionais que o projeto educativo da Instituição de Ensino Superior visa, legitimando seu compromisso com a Educação Superior, tais como os aspectos éticos e sua contribuição social nos

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âmbitos regional e nacional, por meio do tripé ensino, pesquisa e extensão. Constitui-se numa identidade Institucional delineando o fazer científico e o projeto político-pedagógico.

Indico que o PPI seja descritivo, balizador e norteador nos aspectos logísticos das IES vislumbrando assim o seu compromisso com um projeto educativo no que tange ao exercício do princípio da liberdade de ensino, aos compromissos sociais, ao caráter plural da Instituição, articulando a pluralida-de de ideias e propostas que caracterizarão as IES.

Para Goergen (2000), o Projeto educativo é parte indissociável dos projetos sociais e culturais que compõem as IES. Entre suas características básicas, estão: identificar uma proposta pedagógica; entender o “ser humano” como foco de sua concepção; orientar-se por uma visão educativa e em um estilo de ensino-aprendizagem e a definição da missão que se concebe como princípio norteador da filosofia que compõe a proposta pedagógica.

Para elaboração do PPI se faz necessário referendar o Plano Nacional de Graduação, proposto pelo Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras – FORGRAD; as propostas de reformulação para a Educação Superior divulgadas pela Unesco por meio do documento

“Tendências da Educação Superior para o Século XXI”; a Lei nº 9.394, de 20/12/1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional; o Plano Nacional de Educação, aprovado pela Lei nº 10.172, de 09/01/2001; o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – Sinaes (Lei nº 10.861, de 14/04/2004); além das diversas normatizações do Ministério da Educação sobre a nova ótica do Ensino Superior. Tais documentos poderão dar suporte na elaboração do documento.

Alguns princípios epistemológico-filosóficos que orientam o desen-volvimento do projeto pedagógico das instituições de Ensino Superior basea-dos nas propostas de reformulação para a Educação Superior divulgadas pela Unesco, por meio do documento “Tendências da Educação Superior para o Século XXI”, são: igualdade de condições para o acesso e permanência na Instituição; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógi-cas; respeito à liberdade e apreço à tolerância; valorização do profissional da educação; gestão democrática do ensino, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, dos quais participarão os segmentos da comunidade acadêmica e representante da comunidade; garantia de padrão de qualidade; valorização da experiência extra-acadêmica; vinculação entre educação, mer-cado de trabalho e práticas sociais.

Esses documentos citados não são muitas vezes referendados, não servem de âncora para a elaboração dos documentos institucionais, então se acredita que esses instrumentos são meramente técnicos para se atender uma exigência ou uma normativa perpetuada pelo Ministério da Educação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 215

Algumas inquietudes pairam sobre essas discussões, entre essas al-guns requisitos primordiais que devem constar no projeto político, filosófico e teórico-metodológico que define as diretrizes das práticas acadêmicas das IES: inserção regional (enquanto foco institucional e como área do conheci-mento); os princípios filosóficos e teóricos metodológicos que norteiam as práticas acadêmicas da instituição; os desafios, o contexto; o conhecimento como colaborador para a redução das desigualdades; políticas de ensino, pes-quisa e extensão definindo suas concepções, metas e estratégias de trabalho a curto, médio e longo prazo, planos de sustentabilidade, definições de recursos financeiros; políticas de gestão (concepção; processo decisório, gestão de re-cursos físicos, financiamento estudantil e apoio aos estudantes, políticas de bolsa, metas de gestão); responsabilidade social (diretrizes e políticas, prin-cípios de atuação, proposta de avaliação; política de marketing); política de relações institucionais; políticas de Educação a Distância e políticas institu-cionais para cursos de graduação e pós-graduação lato sensu, na modalidade a distância e suas formas de operacionalização.

Não trago aqui uma verdade absoluta, mas uma reflexão para os leito-res pautada numa vivência de alguns anos na Educação Superior. Entendo que o PPI está intrinsecamente vinculado ao Plano de Desenvolvimento das IES, que soam como definições para a elaboração dos projetos pedagógicos dos cursos. Penso que as IES andam na contramão dessa proposta. Os documentos por vezes são divergentes no que se refere às diversas políticas institucionais, e não se trabalha numa perspectiva de uma mesma proposta pedagógica.

A Unesco, no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI, impinge que as IES busquem trabalhar em consonância com sua política metodológica e filosófica pautando a formação de atitudes e de valores, e o desenvolvimento e o domínio de conhecimentos e habilidades gerais e específicas que levem em conta a realidade local e regional, sem des-cuidar do caráter de universalidade do conhecimento, de sua relação com os avanços das áreas dos cursos ofertados no contexto nacional e internacional, bem como dos parâmetros e dinâmica do projeto pedagógico de cada institui-ção de Ensino Superior.

Conforme enfatizado no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI, “a educação deve transmitir, de fato, de for-ma maciça e eficaz, cada vez mais, saberes e saber-fazer evolutivos, adap-tados à civilização cognitiva, pois são as bases das competências do futuro. Simultaneamente, compete-lhe encontrar e assinalar as referências que im-peçam as pessoas de ficar submergidas nas ondas de informações, mais ou menos efêmeras, que invadem os espaços públicos e privados e as levem a orientar-se para projetos de desenvolvimento individuais e coletivos”.

Nesses parâmetros dinâmicos pedagógicos são observados alguns cri-térios gerais, entre os quais cabe destacar, segundo o Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI, que tal discussão neces-

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OLIVEIRA, F. N. G. - UMA BREVE DISCUSSÃO SOBRE O PROJETO PEDAGÓGICO216

sariamente deverá ser abordada no Projeto Pedagógico Institucional – PPI. Elenco 4 (quatro) considerações fundamentais a ser seguida pelas IES na construção do PPI, retirado do documento na íntegra:

• “Relevância social, com vistas a atender às necessidades e condições regionais, guardando-se sua inserção no contexto nacional e internacional, bem como considerando as expec-tativas dos diferentes segmentos sociais no que se refere à atuação dos profissionais da área”.

• “Atualidade, caracterizada pela incorporação de novos conhe-cimentos produzidos e pela releitura sistemática dos disponí-veis, com referência a padrões regionais, nacionais e interna-cionais do avanço científico-tecnológico e à universalidade do conhecimento”.

• “Potencialidade para o desenvolvimento intelectual dos alu-nos, permitindo-lhes lidar com mudanças e diversidades de ordens diversas, e a busca, avaliação e seleção crítica de no-vas informações em diversificadas fontes”.

• “Conteúdos estruturantes de diferentes campos de conheci-mento, com maiores possibilidades de integração horizontal entre as diferentes áreas de estudos e integração vertical, pas-síveis de organizar a aprendizagem do aluno em níveis cres-centes de complexidade”.

Dessa forma o Projeto Pedagógico Institucional – PPI deverá adotar como referencial pedagógico a prática da “educação ao longo de toda a vida”, conforme apresentado pela Unesco no Relatório da Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI.

Nessa perspectiva, a educação proporciona ao indivíduo um conheci-mento dinâmico do mundo, dos outros e de si mesmos, capacitando-o para o exercício profissional em tempos de mudanças.

A “educação ao longo de toda a vida” organiza-se em torno de quatro aprendizagens fundamentais, que constituem os pilares do conhecimento:

1. “Aprender a conhecer” significa, antes de tudo, o aprendizado dos métodos que nos ajudam a distinguir o que é real do que é ilusório e ter, assim, acesso aos saberes de nossa época. A ini-ciação precoce na ciência é salutar, pois ela dá acesso, desde o início da vida humana, à não aceitação de qualquer resposta sem fundamentação racional e/ou de qualquer certeza que es-teja em contradição com os fatos.

2. “Aprender a fazer” é um aprendizado da criatividade. “Fazer” também significa criar algo novo, trazer à luz as próprias po-tencialidades criativas, para que venha a exercer uma profis-são em conformidade com suas predisposições interiores.

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3. “Aprender a viver juntos” significa, em primeiro lugar, res-peitar as normas que regulamentam as relações entre os seres que compõem uma coletividade. Porém, essas normas devem ser verdadeiramente compreendidas, admitidas interiormen-te por cada ser, e não sofridas como imposições exteriores.

“Viver junto” não quer dizer simplesmente tolerar o outro com suas diferenças, embora permanecendo convencido da juste-za absoluta das próprias posições.

4. “Aprender a ser” implica aprender que a palavra “existir” sig-nifica descobrir os próprios condicionamentos, descobrir a harmonia ou a desarmonia entre a vida individual e social.

Os pilares do conhecimento significam a base de estruturação do Projeto Pedagógico Institucional – PPI, indicadores necessários para a con-dução de definições de estratégias pedagógicas, administrativas e concepções de ensino. A partir desses pilares é possível definir a metodologia, a visão e o compromisso social das IES.

A partir desse posicionamento, as IES conduzirão um itinerário de estratégias ou um plano de trabalho estratégico que implicará processos de planejamento, concepções e práticas. Um plano estratégico permite definir rumos de curto, médio e longos prazos para se planejar o futuro da Instituição.

O planejamento estratégico – conjunto de medidas com definições de metas e ações, prazos, recursos e avaliação dos procedimentos nas IES, é o princípio norteador pautado em inovação, qualidade de formação, relaciona-mento institucional, empreendedorismo, processos internos e, por fim, susten-tabilidade.

Pensar na inovação requer a criatividade dos atores que são os res-ponsáveis pela condução de gerenciamento das IES, buscando gerar receitas a partir de produtos e serviços inovadores nos três pilares da educação: ensino, pesquisa e extensão. Possibilita, assim, mecanismos de trabalho no tema ges-tão de projetos científicos e tecnológicos com o objetivo de contribuir para a adequada elaboração e gestão deste processo, através de cursos, capacitações e seminários; gerar superávit nas atividades-fim que garanta o reinvestimento na formação e qualificação institucional; buscar otimização na utilização dos recursos financeiros da Instituição. Firma-se, dessa forma, uma IES inovado-ra primordial para a comunidade regional e local. A inovação deverá ser um diferencial marcante e identitário.

Na qualidade de formação, faz-se necessário investir na autonomia intelectual que impactem de maneira empreendedora nos ambientes multicul-turais, no desenvolvimento da sociedade.

O papel das IES é definir e prover profissionais preparados para o es-tudo e para a atuação em todas as atividades em que se requeira a sua partici-pação, estimulando-os para o mercado de trabalho, para o compromisso social

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e para as novas demandas tecnológicas, científicas e laborais impingidas na atual concepção humana.

No relacionamento institucional, criar organograma horizontalizado a partir de práticas interdisciplinares e participativas com a intenção de garantir a excelência nos processos por meio do desenvolvimento de metodologias de gestão inovadoras e empreendedoras será uma ação balizadora para o proces-so de ensino-aprendizagem nas IES, o que garante engendrar processos de relacionamento institucional com a sociedade.

O empreendedorismo deve ser pautado na confluência dos processos de desenvolvimento do pensamento, sentimento e ação das IES; é um olhar diferenciado nas ações administrativas e acadêmicas, mudanças paradigmáti-cas de pensamento nas conduções das metas e objetivos delineados nas IES, levando-se em consideração a formação baseada na captação e interpretação da realidade, proposição de ações e intervenção na realidade; sensibilidade às questões emergentes do desenvolvimento de uma proposta diferenciada no ensino na área com um foco no desenvolvimento de competências para atuar com desenvoltura em ambientes globalizados de forma responsável e, sobretudo, ética e inovadora; valorização e domínio de um saber baseado no conhecimento já construído e que contemple o inédito; reconhecimento de que o aprendizado se constitui como um processo dinâmico, apto a acolher a motivação do sujeito e que contemple o desenvolvimento do próprio estilo profissional e articulação entre ensino, pesquisa e extensão.

Nos processos internos, definem-se os processos administrativos e acadêmicos possibilitando-se cenários metodológicos de trabalho interno, criando-se fluxos intersetoriais nas ações cotidianas das IES, sem grandes burocracias. O processo tem que ser dinâmico, flexível e ágil, permitindo co-municação interna satisfatória para todos os atores que constituem as IES.

A sustentabilidade dar-se-á a partir das estratégias de reengenharias nas IES, na formação capital intelectual (humano, organizacional e da infor-mação) de excelência; gerar receitas a partir de produtos e serviços inovado-res, promovendo assim a indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão, por meio de investigações científico-tecnológicas e de programas institucio-nais que deverão ser definidos no PPI, mecanismos de sustentabilidade em cada tripé, com objetivos, metas, ações, prazos e recursos.

Parafraseando Buarque (2003), o Projeto Pedagógico Institucional – PPI definirá em sua dimensão metodológica estratégias planejadas de forma a integrar ensino, pesquisa e extensão à gestão administrativa, assegurando dessa maneira condições necessárias à consecução da missão, dos princípios, das políticas, das metas institucionais e, consequentemente, o cumprimento do compromisso social, que é “produção, desenvolvimento e difusão do co-nhecimento”.

As IES não devem ser encaradas apenas como empresas que têm o ob-jetivo de gerar renda. Há, acima de tudo, uma função maior, a questão social,

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 219

em que existe a preocupação em proporcionar melhorias no desenvolvimento pessoal e profissional das comunidades. Ao capacitar pessoas para exercerem cargos e funções em uma organização, além de obter vantagem competitiva, as IES estão colaborando para o desenvolvimento econômico da região em que estão inseridas. Essa, seguramente, é a maior missão das IES no Brasil (SIMIONATTO, 1998).

METODOLOGIA

O paper construído abrange diversas leituras sistemáticas na área dis-corrida sobre a proposta temática que tem como o principal objetivo discutir novos conhecimentos e/ou corroborar ou refutar algum conhecimento pre-existente. A ideia é de contribuir para os mantenedores, gestores e todos os atores que estejam envolvidos na gestão universitária com reflexões sobre o projeto político-pedagógigo das IES.

Para a escrita do texto foram consultados relatórios, livros e teses. O texto foi elaborado de forma descritiva, a partir de análises e interpretações das fontes referendadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O PPI é resultado de um processo de construção coletiva, partici-pativa e sistemática (permanente) de planejamento estratégico visando à construção do futuro da instituição. Dessa maneira, indica-se a participação de todos os atores que a integram na sua construção pedagógica e adminis-trativa buscando de forma equilibrada um plano que procure atender novos desafios epistemológicos que carecem de novas apreciações, novas catego-rias de análise, uma vez que o nosso país, como centro de domínio, e a racio-nalidade instrumental, como essência do conhecimento, já não computam a realidade em seu movimento e a complexidade que são impingidas nos novos avanços científicos.

As IES encontram dificuldades no processo de elaboração e execu-ção do PPI, porque o documento muitas vezes só é utilizado para atender as necessidades impingidas pelo Ministério da Educação – MEC. Parte das IES seguem seus planejamentos acadêmicos e administrativos sem levar em consideração requisitos básicos que constam no PPI. Tal fato é decorrente de um documento mal elaborado, técnico e pouco orientativo para os gestores universitários.

O texto descrito serve de suporte para os mantenedores, gestores, pro-fessores, alunos, pesquisadores como instrumento norteador para elaboração e reflexão do Projeto Pedagógico Institucional – PPI.

Espero que a leitura corrobore para mudanças de cenários na Educação Superior, bem como apoie as ações pedagógicas e administrativas das IES.

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REFERÊNCIAS

BUARQUE, Cristovam. A universidade na encruzilhada. Educação Superior: reforma, mudança e internacionalização. Unesco, 2003, p. 69.GOERGEN, P. A Avaliação universitária na perspectiva da pós-modernida-de. In: SOBRINHO; RISTOFF. Universidade desconstruída. Florianópolis: Insular, 2000, p. 16-7.SIMIONATTO, Ivete. O social e o político no pensamento de Gramsci. In: AGGIO, Alberto. Gramsci, a vitalidade de um pensamento. São Paulo: UNESP, 1998, p. 38.UNESCO. A Educação Superior no Século XXI: visão e ação. Universidade e Sociedade. Brasília: ANDES, n. 17, nov. 1998, p. 83-93.

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REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS (REUNI):

A PERTINÊNCIA DO CONCEITO DE CAMPO E OS DESAFIOS DA GOVERNANÇA ACADÊMICA

Raimundo Rajobac Viviane Guidotti

Marilia Costa Morosini

SOBRE O REUNI

E nquanto projeto político, a expansão da Rede Federal de Educação Superior tem como marco inicial o ano de 2003 com previsão para

término em 2012. O que caracterizou este primeiro momento foi a interiori-zação dos campi das universidades federais, e logo em seguida possibilitou as condições para a criação de novas universidades. O resultado disso pode ser visto no surpreendente aumento em números: “[...] o número de municípios atendidos pelas universidades passou de 114 em 2003 para 237 até o final de 2011, com projeto agora pensado até 2014. Desde o início da expansão foram criadas 14 novas universidades e mais de 100 novos campi [...]” (BRASIL), possibilitando a criação de novos cursos de graduação e consequentemente a ampliação de vagas para ingresso de alunos em cursos superiores.

Nesse contexto, o Reuni “[...] tem como principal objetivo ampliar o acesso e a permanência na Educação Superior” (BRASIL, 2011). O Reuni exigiu que o governo federal adotasse medidas diversas para dar um novo impulso ao crescimento do Ensino Superior público. Dentre tais medidas en-contra-se o esforço em criar as condições para que as universidades federais possam se expandir fisicamente, mantendo a tradição acadêmica e pedagógica necessárias. Assim, “as ações do programa contemplam o aumento das vagas nos cursos de graduação, a ampliação da oferta de cursos noturnos, a promo-ção de inovações pedagógicas [...] o combate à evasão [...] e o propósito de diminuir as desigualdades sociais no país” (BRASIL, 2011).

O decreto que institui o Reuni é de 24 de abril de 2007 de número 6.096. O mesmo traça como meta “[...] a elevação gradual da taxa de con-clusão média dos cursos de graduação presenciais para noventa por cento e da ralação de alunos de graduação em cursos presenciais por professor para dezoito ao final de cinco anos [...]” (BRASIL, 2007).

Como diretrizes o Reuni apresentou as seguintes:

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RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES222 RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES

1. redução das taxas de evasão, ocupação de vagas ociosas e aumento de vagas de ingresso, especialmente no período no-turno;

2. ampliação da mobilidade estudantil, com a implantação de regimes curriculares e sistemas de títulos que possibilitem a construção de itinerários formativos, mediante o aproveita-mento de créditos e a circulação de estudantes entre institui-ções, cursos e programas de Educação Superior;

3. revisão da estrutura acadêmica, com reorganização dos cur-sos de graduação e atualização de metodologias de ensino-

-aprendizagem, buscando a constante elevação da qualidade;

4. diversificação das modalidades de graduação, preferencial-mente não voltadas à profissionalização precoce e especia-lizada;

5. ampliação de políticas de inclusão e assistência estudantil;

6. articulação da graduação com a pós-graduação e da Educação Superior com a Educação Básica (BRASIL, 2007).

A preocupação seguinte foi com os fundos monetários necessários para sustentar tais iniciativas. Ficou a critério do MEC destinar ao programa os recursos financeiros, os quais devem ser destinados de forma personali-zada. Ou seja, cada universidade federal deverá apresentar seus respectivos planos de reestruturação acompanhados de orçamentos e enviá-los ao MEC. Tal medida procura ser prudente tendo em vista as exigências decorrentes das iniciativas propostas. Principalmente no que diz respeito à “construção e readequação de infraestrutura e equipamentos [...]; compra de bens e ser-viços necessários ao funcionamento dos novos regimes acadêmicos; e des-pesas de custeio e pessoal associadas à expansão das atividades decorren-tes do plano de reestruturação” (BRASIL, 2007). Várias outras orientações burocráticas surgem como exigência, tais como a aprovação do projeto de cada universidade pelo órgão superior da instituição interessada e o esclare-cimento de que “as despesas decorrentes deste decreto correrão à conta das dotações orçamentárias anualmente consignadas ao Ministério da Educação” (BRASIL, 2007).

O Reuni trouxe-nos, portanto, a seguinte situação: universidades pre-existentes: 148; universidades criadas: 126; previstas de 2011 a 2012: 20; pre-vistas de 2013 a 2014: 27. Total geral até 2014: 321 universidades distribuídas nos diversos Estados brasileiros.

Observem-se as figuras a seguir:

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 223

Figura 1. Previsão do Reuni até 20141.

Figura 2 Campus preexistentes por Estado2.

1 Fonte: http://painel.mec.gov.br/academico/mapaSupProf/acao/S2 Fonte: http://painel.mec.gov.br/academico/mapaSupProf/acao/S

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RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES224 RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES

Figura 3. Distribuição por Estados até 2014.3

UM BREVE HISTÓRICO POLÍTICO DA CRIAÇÃO DE UNIVERSIDADES NO BRASILA história da criação de universidade no Brasil revela, inicialmente,

considerável resistência, seja de Portugal, como reflexo de sua política de co-lonização, seja da parte de brasileiros, que não viam justificativa para a criação de uma instituição desse gênero na Colônia (MOACYR, 1937). A concepção elitista de educação que perpassava o ideal formativo da elite brasileira prima-va pela ideia de negar à colônia o privilégio do estudo, concebendo as universi-dades da Europa como os ambientes suficientes e necessários para formação da elite do Brasil colônia. Iniciativas de criação de universidade ainda no século XVI foram negadas tanto à Coroa portuguesa quanto aos jesuítas4. “Em de-corrência, os alunos graduados nos colégios jesuítas iam para a Universidade de Coimbra ou para outras universidades europeias, a fim de completar seus estudos” (FÁVERO, 2006, p. 20). Por muito tempo várias iniciativas surgiriam com a intenção de criar universidades no Brasil, contudo, todas elas eram bar-radas pelo poder político de Portugal, “o que denota uma política de controle por parte da Metrópole [sobre] qualquer iniciativa que vislumbrasse sinais de independência cultural e política da colônia” (FAVERO, 200, p. 18-19).

3 Fonte: http://painel.mec.gov.br/academico/mapaSupProf/acao/S4 Conforme Fávero (2006), entre as tentativas de criação de universidade no Brasil, ao longo dos anos, registra-se, no nível das intenções, a que constava da agenda da Inconfidência Mineira. Tentativas, sem êxito, continuam por mais de um século. Uma delas coincide com a transferência da sede da Monarquia para o Brasil. Portanto, não seria exagero inferir que Portugal exerceu, até o final do Primeiro Reinado, grande influência na formação de nossas elites.

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A chegada da família real ao Brasil gera um impulso cultural significa-tivo e surgem aí as primeiras iniciativas de criação de universidades no Brasil. Assim, segundo Vilanova, o Decreto de 18 de fevereiro de 1808 cria o Curso Médico de Cirurgia na Bahia e, em 5 de novembro do mesmo ano, é instituída, no Hospital Militar do Rio de Janeiro, uma Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica. Outros atos são sancionados e contribuem para a instalação, no Rio de Janeiro e na Bahia, de dois centros médico-cirúrgicos, matrizes das atuais Faculdades de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Em 1810, por meio da Carta Régia de 4 de dezembro, é instituída a Academia Real Militar, inaugurada em abril do ano seguinte. Foi nessa Academia que se implantou o núcleo inicial da atual Escola de Engenharia da UFRJ (apud FÁVERO, 2006).

Todas essas iniciativas desenvolviam-se num processo político dedu-tivo cuja autoridade máxima era a coroa portuguesa e o que era criado tinha em vista criar condições para a coroa se estabelecer de forma conveniente. De acordo com Mendonça (2000) outros cursos foram ainda criados, na Bahia e no Rio de Janeiro, todos eles marcados pela mesma preocupação pragmática de criar uma infraestrutura que garantisse a sobrevivência da corte na colônia, tornada Reino Unido. Na Bahia, a cadeira de economia (1808), e os cursos de Agricultura (1812), de Química (1817) e de Desenho Técnico (1817). No Rio, o laboratório de química (1812) e o curso de Agricultura (1814). Alguns cursos avulsos foram ainda criados em Pernambuco, em 1809 (Matemática superior), em Vila Rica, em 1817 (Desenho e História), e em Paracatu, Minas Gerais, em 1821 (Retórica e Filosofia), visando suprir lacunas do ensino mi-nistrado nas aulas régias.

Esse processo se desenvolve politicamente vindo a sofrer na década de 30 significativa centralização. A marca central dos anos subsequentes à década de 30 será o conservadorismo político e os interesses regionais que resultam no atendimento a determinadas regiões do país. Para Fávero (2006), nessa linha, o Governo Federal elabora seu projeto universitário, articulando medidas que se estendem desde a promulgação do Estatuto das Universidades Brasileiras (Decreto-Lei nº 19.851/31) à organização da Universidade do Rio de Janeiro (Decreto-Lei nº 19.852/31) e à criação do Conselho Nacional de Educação (Decreto-Lei nº 19.850/31). Sendo que do início dos anos 40 aos anos 50, surgem os primeiros movimentos buscando a autonomia da universi-dade brasileira. Também nessa época evidencia o aceleramento no desenvol-vimento científico e tecnológico no país.

O resultado das preocupações desse período, dentre os quais se destaca o interesse em modernizar o Ensino Superior no Brasil, vai atingir seu ápi-ce, segundo Fávero (2006), com a criação da Universidade de Brasília (UnB). Instituída por meio da Lei nº 3.998, de 15 de dezembro de 1961. A UnB surge não apenas como a mais moderna universidade do país naquele período, mas como um divisor de águas na história das instituições universitárias, quer por

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suas finalidades, quer por sua organização institucional, como o foram a USP e a UDF nos anos 30. “Com o golpe de 645, entretanto, a Universidade de Brasília foi fortemente atingida, culminando com a invasão do seu campus em 65 e a intervenção governamental que viria a descaracterizar totalmente o seu projeto original” (MENDONÇA, 2000, p. 146). Em seguida “em 1968, [...] com o AI-5, foi instituído o Grupo de Trabalho (GT) encarregado de estudar a reforma da Universidade brasileira, constituído por representantes dos Ministérios da Educação e Planejamento, do Conselho Federal de Educação e do Congresso” (MENDONÇA, 2000, p. 146). Nesse contexto “[...] somente a partir de 1968 [...] é que ganha sentido falar-se de uma legislação básica da Reforma Universitária” (FÁVERO, 2006, p. 34), a qual tomava como objetivo principal “[...] aumentar a eficiência e a produtividade da universidade [...]” (FÁVERO, 2006, p, 34), pondo em relevo “[...] o sistema departamental, o vestibular unificado, o ciclo básico, o sistema de créditos e a matrícula por disciplina, bem como a carreira do magistério e a pós-graduação” (FÁVERO, 2006, p. 34)6.

Nas décadas posteriores notou-se uma crescente preocupação política por parte dos professores. O caminho percorrido pela universidade até aqui se mostrou substancialmente determinado por decisões políticas. A chegada ao governo de Fernando Henrique Cardoso coloca em foco a preocupação com o Ensino Superior. O diferencial em relação ao governo posterior é a não preocu-pação com um processo de expansão e democratização, mas segue uma linha dura de decisões. Segundo Mendonça (2000), no caso específico do Ensino Superior, essa reforma, que se consubstanciou na nova Lei de Diretrizes e Bases e em outros documentos legais complementares, combina-se com uma política de congelamento de salários dos docentes das universidades federais, de cortes de verbas para a pesquisa e a pós-graduação, de redirecionamento do financiamento público, com efeitos preocupantes, especialmente para as universidades públicas. Essas medidas tiveram um efeito fortemente desmo-bilizador sobre o movimento docente universitário. Tendo chegado a esse mo-mento do trabalho cabe-nos perguntar: até que ponto tendências políticas tem influenciado na maneira como tem sido distribuída a criação de universidades de acordo com o Reuni, e como o conceito de campo científico realmente transparece nas decisões?

5 Segundo Mendonça (2000) Um primeiro impacto do golpe militar de 1964 sobre os rumos da univer-sidade brasileira foi, sem dúvida, o de conter o debate que se travava no momento anterior e isso se fez através da intervenção violenta nos campi universitários, do expurgo no interior dos seus quadros docentes, da repressão e da desarticulação do movimento estudantil.6 Segundo Fávero (2006), Apesar de ter sido bastante enfatizado que o “sistema departamental constitui a base da organização universitária”, não seria exagero observar que, entendido o departamento como uni-dade de ensino e pesquisa, a implantação dessa estrutura, até certo ponto, teve apenas caráter nominal. Por sua vez, embora a cátedra tenha sido legalmente extinta, em muitos casos foi apenas reduzida sua autono-mia. A departamentalização encontra resistências desde o início da implantação da Reforma Universitária. Passadas mais de três décadas, observa-se ser o departamento, frequentemente, um espaço de alocação burocrático-administrativa de professores, tornando-se, em alguns casos, elemento limitador e até inibidor de um trabalho de produção de conhecimento coletivo. Com a Lei nº 9.394/ 96, o departamento não cons-titui mais exigência legal.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 227

DA POLÍTICA DE INVESTIMENTO MONETÁRIO À PERTINÊNCIA DO CONCEITO DE CAMPO PARA A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOROs investimentos na área da Educação Superior no Brasil cresceram

de forma significativa. Basta olharmos a efervescência do Reuni na atualidade. Considerando-se tal avanço, cabe-nos perguntar: quais os desafios em

manter a qualidade da Educação Superior no Brasil tendo em vista a atual política de expansão promovida pelo Governo Federal?

A atual política de investimento monetário pode ser visualizada nos gráficos a seguir:

Gráfico 1. Investimento Público por Estudante.7

Gráfico 2. Despesas com Educação Federal.8

7 Fonte: http://portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais.8 Fonte: http://portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais.

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Gráfico 3. Despesas em Educação no Brasil.9

A Governança Acadêmica interessa por todo esse fenômeno pelo fato de o mesmo envolver dimensões fundamentais, tais como financeira, estrutu-ral, social, política, pessoal, cultural, científica etc. Assim, nesse contexto, os governantes estão desafiados a dialogar com esferas diferentes e interdepen-dentes que compõem a sociedade. Um emaranhado de elementos indispensá-veis ao ato de administrar.

Estão englobados nesse processo “[...] o capital econômico, tomado em termos dos bens e serviços a que ele dá acesso, o capital social, definido como o conjunto de relacionamentos sociais influentes mantidos pela família, além do capital cultural institucionalizado [...]” (NOGUEIRA; et al., 2002, p. 21). O interesse do Brasil em expandir o Ensino Superior desperta, portanto, um questionamento singular, o qual nos parece essencial para a Governança Acadêmica: como é possível manter a qualidade do Ensino Superior num processo de expansão num país de dimensões continentais como o Brasil de forma a explorar os recursos oferecidos por regiões e culturas tão distintas? Aqui se justifica nosso interesse em apresentar a preocupação com o campo científico, tal como o pensou Bourdieu, para se garantir a preocupação com a qualidade do Ensino Superior na política atual do Reuni. Valeria lembrar que “a Sociologia da Educação de Bourdieu se notabiliza, justamente, pela diminuição que promove do peso do fator econômico, comparativamente ao cultural [...]” (NOGUEIRA et al., 2002, p. 21).

O que procuramos defender é que o processo de expansão do Ensino Superior no Brasil precisa ter presentes conceitos centrais apresentados por Bourdieu. Principalmente quando se pretende manter a qualidade do ensino

9 Fonte: http://portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 229

num país multicultural como o Brasil. Para Bourdieu, o universo “puro” da mais “pura” ciência é um campo social como outro qualquer, com suas rela-ções de força e monopólios, suas lutas e estratégias, seus interesses e lucros, mas onde todas essas invariantes revestem formas específicas (1983, p. 122). Dessa forma, parece-nos instigante que para além de diretrizes políticas for-malizadas, a preocupação com a qualidade da Educação Superior depende em sua essência do alerta de Bourdieu segundo o qual o campo científico, enquanto sistema de relações objetivas entre posições adquiridas (em lutas anteriores), é o lugar, o espaço de uma luta concorrencial. Dessa forma, o que se encontra em jogo na política expansiva do Reuni é especificamente o mo-nopólio da autoridade científica definida, de maneira inseparável, como capa-cidade técnica e poder social; ou, se quisermos, o monopólio da competência científica, compreendida enquanto capacidade de falar e agir legitimamente (isto é, de maneira autorizada e com autoridade), que é socialmente outorgada a um agente determinado (1983, p. 123).

A qualidade da Educação Superior enquanto desafio para a Governança gira em torno do mapeamento de capitais existentes, bem como conceitos básicos como os de competência e autoridade científica. Não basta apenas dispor de investimentos para uma política expansiva. Sua qualidade depende de núcleos fundamentais que exigem uma governança competente e aberta ao diálogo. A exigência de uma governança qualificada não se trata apenas do conhecimento aprofundado ou não do sistema formal-estrutural do Ensino Superior, ou seja, “[...] os ramos de ensino, cursos, estabelecimentos etc., mas, sobretudo, da compreensão que se tenha das hierarquias mais ou menos sutis que distinguem as ramificações do ensino do ponto de vista de sua qualidade acadêmica, prestígio social e retorno financeiro” (NOGUEIRA et al., 2002, p. 22). Enquanto política que visa o desenvolvimento do país, o Reuni tem muito a contribuir. Contudo, entendemos que sua contribuição poderá ser cada vez mais eficiente ao lançar mão de um ideal de Governança Acadêmica que se sirva da noção de campo científico na perspectiva de Bourdieu para que se possa primar pela qualidade e desenvolvimento social, cultural e financeiro para o país.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU. P. O campo científico. In: Sociologia. São Paulo: Ática, 1983.BRASIL. Decreto nº 6.096, de 24 de abril de 2007. Disponível em: http://reuni.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=25&Itemid=28. Acesso em: 24 set. 2011.

______. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Indicadores Financeiros Educacionais. Disponível em: http://portal.inep.gov.br/indicadores-financeiros-educacionais. Acesso em: 1 out. 2011.

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RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES230 RAJOBAC, R. et al. - REESTRUTURAÇÃO E EXPANSÃO DAS UNIVERSIDADES

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QUALIDADE E GESTÃO PEDAGÓGICA DE PROFESSORES NO ENSINO SUPERIOR

Elisiane Machado Lunardi

E ste trabalho discute a qualidade do Ensino Superior, com o ob-jetivo de apontar indicadores de qualidade da gestão pedagógica

de professores. Por meio de pesquisa bibliográfica, assim como de pesquisa do estado do conhecimento das produções científicas da ANPED, nos GTs 4, 8 e 11, verificaram-se concepções de qualidade que dizem as produções científicas sobre possíveis indicadores da gestão pedagógica de professores no Ensino Superior.

QUALIDADE NO ENSINO SUPERIORPercebe-se a preocupação com a melhoria de qualidade da educação,

considerando-se que nas últimas décadas, no mundo inteiro, está acontecendo um movimento de internacionalização na Educação Superior e, consequente-mente, está voltado para a qualidade da educação, entendendo-a como pilar para a formação e atuação profissional.

Órgãos internacionais, como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – Unesco, estão empenhados em questões e ações que priorizam a universidade socialmente responsável.

Morosini (2008), ao tratar sobre a internacionalização da Educação Superior, no que se refere a indicadores na perspectiva da qualidade do ensino e da pesquisa, sinaliza: “O impacto no ensino e na pesquisa tem como carac-terísticas: a visão que a qualidade está relacionada à responsabilidade e ao compromisso e contribui para o desenvolvimento de experiências de aprendi-zado de estudantes”.

Também, a autora se refere às “[...] evidências do impacto da avalia-ção de qualidade sobre as práticas de ensino” (p. 262), que apontam, propria-mente dito, prováveis indicadores de qualidade da Educação Superior:

Reformas no currículo, padrões mais altos e desenvolvimento de instrumen-to para avaliação de estudante, inovação em programas profissionais, progra-mas melhores para instrutores e desenvolvimento em padrões e sistemas de promoção; grande consolidação da qualidade e crescimento da atenção dada à função ensino nas IES e nas comunidades acadêmicas, através de discussões sobre ensino, monitoria e implicações do ensino por ele mesmo [...] da infor-mação para os professores sobre seus pontos fortes e fragilidades, situações diagnósticas de ajuda; discussão e mudança de valores desenvolvimento de sentido de pertença a uma IES e legitimidade daqueles que iniciaram a avalia-ção (MOROSINI, 2008, p. 262).

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Assim, a implementação de mecanismos avaliativos que priorizam a qualidade da Educação Superior está relacionada a mudanças no processo de ensino e aprendizagem, sobretudo, porque apontam para critérios e indicado-res que sinalizam o que está acontecendo e o que precisa ser redimensionado para alcançar os objetivos previstos para a IES, para o curso, para a produção docente e discente, entre outros aspectos.

Sendo assim, pode-se defender que a qualidade no Ensino Superior, entre outras instâncias, tem como premissa: produção científica docente e discente; padrões de satisfação às necessidades dos sujeitos aos quais a ins-tituição está disponibilizando seus serviços; padrões mínimos que possam garantir que as necessidades sejam bem atendidas; aprimoramento dos am-bientes, processos de gestão e organização, processo de ensino-aprendizagem e as relações.

Nesse sentido, a relação qualidade/Ensino Superior está intrinseca-mente agregada à cultura estabelecida pelos cursos de formação, bem como repercute nos contextos educacionais em que os professores atuam. Examinar as questões que envolvem a formação e atuação dos professores, em especial na cultura da Instituição de Ensino Superior (IES) e nas práticas que quali-ficam a formação pretendida com o enfoque no eixo da gestão pedagógica universitária, exige que se olhe pelo viés de um ensino eficaz. De acordo com Cabrera (2010) e Cabrera e LaNasa (2008), ensino eficaz é aquele capaz de produzir resultados demonstráveis em relação à aquisição de competências.

A qualidade na Educação Superior, conforme Rios (2001), pode ser entendida sob quatro enfoques: qualidade da educação como competência téc-nica; qualidade da educação enquanto proposição e realização de atividades; qualidade da educação organizacional; qualidade da educação pela capacida-de de articulação.

Em recente pesquisa acerca do Estado do Conhecimento, alusiva às produções científicas sobre a qualidade na Educação Superior, nos GT 4 – Didática, GT 8 – Formação de Professores e GT 11 – Política de Educação Superior, da Anped1, verificou-se que no período de 2000 a 2008 foram so-cializadas e registradas importantes pesquisas.

Os dados coletados e as análises realizadas sobre “gestão pedagógica” têm por base dois trabalhos apresentados na Capes, uma tese de doutorado da UFRGS e uma tese da UFRN, na Anped, no GT 8, três trabalhos, e no GT 11, dois trabalhos. Nos trabalhos analisados os estudos foram balizados no sentido de que a qualidade do ensino está diretamente vinculada ao trabalho docente e, logicamente, às condições oportunizadas pela instituição para o desenvolvimento do trabalho.

Os textos analisados referentes à “formação de professores formado-res” têm por base três teses apresentadas na Capes o três trabalhos apresenta-

1 Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. Disponível em: www.anped.org.br.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 233

dos na Anped. Os estudos apontam que o ensino não é reconhecido em toda a sua dimensão, complexidade e importância, tanto quanto aos pesquisadores como quanto aos profissionais autônomos que também são professores, não se verifica a devida preocupação com a dimensão pedagógica no exercício da docência.

No GT 4 da 24ª Reunião da Anped, Castanhos (2001) se refere à quali-dade do Ensino Superior numa sociedade em processo de mudança acelerada: docência e inovação. A autora pontua como importantes à qualidade do ensino a relação professor-aluno e a qualidade da relação teoria e prática.

Na 25ª Reunião da Anped, no GT 11, Morosini e Franco (2002) fazem alusão às políticas públicas de qualidade universitária e construção de espaços de participação. As autoras apresentam tensões entre regulação e emancipa-ção, assim como refletem as políticas públicas de avaliação no Brasil e, conse-quentemente, a qualidade na universidade. Propõem a qualidade universitária tendo como pressuposto essencial a construção dos espaços de participação.

Os dados coletados e as análises realizadas sobre “pedagogia univer-sitária” têm por base dois trabalhos apresentados na Anped no GT 11 e uma tese de doutorado na Capes. As discussões dos trabalhos analisados apontam que a pedagogia universitária precisa fortalecer-se como campo investigati-vo, capaz de compreender as lógicas que fundamentam as diferentes áreas em que os professores universitários atuam, para, a partir dessa compreensão, aproximar-se das necessidades didático-pedagógicas e, com eles, construir propostas de intervenção no ensino; acompanhar sistematicamente as propos-tas consideradas inovadoras e suas repercussões na aprendizagem dos alunos, além de outras pesquisas que possam constituir um corpus próprio, mesmo que provisório e em permanente construção.

Os dados coletados e as análises realizadas sobre “Qualidade na Educação Superior” têm por base um trabalho apresentado na Capes, uma tese de doutorado da UFRGS e dois trabalhos apresentados na Anped. Cossio (2008) em sua tese analisa em que medida a formação pedagógica dos profes-sores universitários; como uma política institucional; contribui na construção do profissionalismo docente e na configuração da institucionalidade univer-sitária identificada com os princípios da qualidade social, contrapondo-se à lógica mercadológica proposta pelo novo ordenamento global.

QUALIDADE E GESTÃO PEDAGÓGICA DE PROFESSORES

De acordo com Dourado (2003), a gestão da educação compreende a articulação entre aspectos administrativos, pedagógicos, políticos e financei-ros que possibilitam a dinamização das ações educativas. Pode-se dizer que a gestão vai além da visão técnica, burocrática, impessoal de administração da educação. Ela se amplia para a perspectiva de um espaço de tomada de deci-sões permeado por intencionalidades que revelam crenças, valores, propósitos

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LUNARDI, E. M. - QUALIDADE E GESTÃO PEDAGÓGICA DE PROFESSORES 234

de uma dada instituição em seu conjunto, quando o processo for participativo e democrático, ou de seus dirigentes, quando a tomada de decisões for resul-tante da vontade individual ou de um grupo restrito.

Quando se fala em gestão no setor da educação pensa-se em praticar democracia ou, melhor, em gestão democrática, justamente porque a assun-ção do termo “gestão” nos meios educacionais ocorre, de acordo com Luce e Medeiros (2006), no bojo dos movimentos reivindicatórios dos professores no contexto do processo de democratização do país, propiciando a discussão e a contestação das formas de administração escolar vivenciadas até então (década de 1980).

Entretanto, também se observa a utilização do termo por diferentes correntes e com diferentes enfoques, sendo que alguns deles pouco ou nada se assemelham aos processos democráticos.

Teichler (apud MOROSINI, 2003) destaca que os modelos de ges-tão da Educação Superior, independentemente do tipo de instituição (hum-boldtiana, francesa-napoleônica ou transformadora)2, são considerados como formas de governo marcadas pelas relações entre educação e sociedade e o modo de administração interno das instituições. As mudanças na organização da universidade são resultantes dos processos de reconfiguração do Estado no contexto da reestruturação capitalista contemporânea, que assinala para reformas estruturais de grande porte, incluindo a reforma da universidade, mas também da reconfiguração dos processos de produção e apropriação de conhecimentos e tecnologias.

Nesse sentido, as instituições universitárias tornam-se foco de atenção. São questionados os valores por elas disseminados, a qualidade do conheci-mento produzido em seu interior e, principalmente, como ocorrem os pro-cessos educativos pelos quais são responsáveis, considerando a formação de profissionais de diferentes áreas. Portanto, a qualidade da gestão pedagógica do professor não pode ser vista como um “dom”, que uns têm outros não, ou como resultado exclusivo da experiência, “que se aprende a fazer, fazendo”, nem mesmo possa ser considerada de responsabilidade exclusiva do professor.

Cunha (2004), ao estudar a configuração da docência universitária, afirma que “a concepção de docência como dom carrega um desprestígio da sua condição acadêmica, relegando os conhecimentos pedagógicos a um se-gundo plano e desvalorizando esse campo na formação do docente de todos os níveis, mas, principalmente o universitário” (p. 3).

A gestão pedagógica, também, está ancorada nos saberes da docência que podem ser traduzidos pelo conhecimento aprofundado de um dado campo

2 Os modelos mais difundidos de universidade são os identificados com a tradicional universidade alemã, chamada de humboldtiana, caracterizada pela ênfase na pesquisa e na produção do conhecimento científico; há os que adotam a perspectiva francesa-napoleônica, voltada para a formação profissional em bases técni-cas; e o modelo latino-americano, que valoriza a concepção de universidade como instituição de transforma-ção social (MOROSINI, 2003).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 235

de estudos; pela produção e manejo de materiais didáticos; pelo domínio de instrumentos metodológicos; pela clareza quanto à opção epistemológica e quanto ao nível cognitivo e intelectual esperado dos alunos durante as situa-ções de aprendizagem; pela criatividade e bom senso na elaboração de situa-ções que desafiem o pensamento e que produzam a novidade; pela capacidade de organizar o planejamento das aulas, as atividades de aprendizagem e a avaliação dos alunos; e pelo espírito investigativo que permite a elaboração própria, o pensamento autônomo e a autoavaliação.

O estudo do fenômeno educativo, enquanto gestão pedagógica em suas dimensões mais amplas, aparece circunscrito no campo da Pedagogia Universitária entendida por Leite (2003) “como um campo interdisciplinar que compreende o estudo do docente como intelectual público, do conheci-mento social como articulador do científico e do cotidiano, da inovação peda-gógica, da avaliação institucional e da classe nos contextos das novas tecno-logias” (p. 196). Como parte dos estudos próprios à Pedagogia Universitária situa-se a didática universitária, cujo objeto é o estudo e a intervenção nos processos de ensinar e aprender que ocorrem na aula.

Para a Educação Superior, alguns balizadores ao conceito de qualida-de são apontados, por Isaia e Bolzan (2008, p. 2):

[...] seu caráter interpretativo e valorativo, ambos ligados às dimensões sociais, políticas e históricas; sua dimensão docente, na medida em que são considera-das as estratégias voltadas para o desenvolvimento do processo de formação de alunos e professores, envolvendo empenho docente e discente nas tarefas acadêmicas, tendo em vista a relevância do que se aprende; seu caráter transfor-mativo, levando em conta as demandas da sociedade; sua vinculação a decisões políticas, na medida em que o Estado participa da gestão educacional; sua di-mensão micro englobando a trajetória institucional em todas suas instâncias e o processo especificamente pedagógico ou formativo dos professores.

Nesse sentido, a gestão pedagógica universitária constitui-se a partir do processo sistemático, organizado e autorreflexivo que envolve os professo-res, desde a formação inicial ao exercício continuado da docência nos diver-sos espaços institucionais em que se desenrolam as relações entre a teoria e a prática do professor da Educação Superior.

Para García (1999), a concepção de desenvolvimento profissional dos professores pressupõe uma perspectiva de formação que priorize o caráter contextual e organizacional, direcionado para a mudança, superando a visão individualista das ações de aperfeiçoamento docente, apontado, portanto, para o compartilhamento de saberes e fazeres.

Sobre esse aspecto, Fullan apud García (1999, p. 27) enfatiza que o[...] desenvolvimento profissional é um projecto ao longo da carreira desde a formação inicial, à iniciação, ao desenvolvimento profissional continuo através da própria carreira [...] O desenvolvimento profissional é uma aprendizagem contínua, interactiva, acumulativa, que combina uma variedade de formatos de aprendizagem.

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Assim, a representação de ser professor, considerando seus saberes e fazeres como pressupostos para a qualidade na gestão pedagógica universitá-ria se personifica nas práticas educativas no Ensino Superior e, consequente-mente, na formação dos futuros professores.

Enquanto processo multifacetário, a qualidade da gestão pedagógica abrange “questões de ordem teórica, profissional, atitudinal, valorativa, con-textual, sociocultural e política” (ISAIA; BOLZAN, 2008, p. 551). Aproximar o conceito de qualidade à área de educação, num sentido amplo, significa re-conhecer que ela pode consistir num significante, com múltiplos significados, por meio de conceituações fundamentais, como de sujeito, sociedade, vida e educação, inter-relacionadas com ideias afins, de caráter mais global, assim como de caráter profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O debate sobre a Educação Superior sinaliza a garantia de qualidade para a aprendizagem, a formação e a educação, abarcando estruturas, proces-sos e resultados educacionais (MOROSINI, 2008). A qualidade no Ensino Superior não se expressa simplesmente nem se esgota na relação entre insu-mos e quantidade dos produtos. Dimensões pedagógicas, científicas, técnicas, éticas, políticas, econômicas e tantas outras que constituem o humano são coessenciais no complexo fenômeno da qualidade educativa e muito pouco deles cabe indicadores que se centram no formal, no burocrático e no opera-cional.

Nesse sentido, as Instituições de Ensino Superior precisam articular a organização e a condução de todo o processo educativo, com critérios bem definidos para, sobretudo, saberem aonde querem chegar, por que, com quem e como irão fazer isso acontecer, para que, efetivamente, esse processo seja legitimado pela gestão pedagógica de seus professores.

A qualidade da gestão pedagógica docente aparece ancorada no campo da pedagogia universitária e está inter-relacionada à formação e atuação pro-fissional e, consequentemente, ao desenvolvimento profissional, tendo como aspectos fundantes e articuladores os saberes docentes (PIMENTA, 2002; TARDIF, 2002; GAUTHIER, 1998; NÓVOA, 2003); a gestão da classe e da matéria (GAUTHIER, 1998); as relações institucionais a nível macro e micro (ISAIA E BOLZAN, 2008; MOROSINI, 2008); a ação pedagógica que envol-ve o planejamento, a metodologia e avaliação (CUNHA, 1999; PIMENTA E ANASTASIOU, 2000).

Para Cossio (2008), os professores precisam se apropriar de conheci-mentos que envolvam a realidade educacional na qual estão situados, preci-sando, assim, de elementos de contexto (econômico, social, político, cultural) e da instituição educativa (estruturas de poder, formas de organização e de gestão, discursos e práticas veiculadas, vínculos com a comunidade – o ins-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 237

tituído e o instituinte); o seu campo de conhecimento específico, no caso de professores das diferentes áreas que compõem o currículo de um curso; o grupo de estudantes e de cada um deles em particular, detectando motivações, interesses, conhecimentos prévios, modalidades de aprendizagem, processos cognitivos; a didática, que compreende as questões específicas de ensinar e aprender, envolvendo planejamento de aulas; concepção e gestão do currículo da sua disciplina e do curso em sua totalidade; processos, técnicas e recur-sos que podem ser mais adequados para as diferentes situações; modalidades e formas de avaliação; postura em sala de aula; relação com os alunos; or-ganização do ambiente da aula; conhecimento sobre novas tecnologias que auxiliem no processo pedagógico e, por fim, o conhecimento da profissão que permita ao professor situar-se na carreira e no contexto da sua profissão, buscando formas de ampliar a sua profissionalidade.

Portanto, esses indicadores, se articulados, se configuram como meca-nismos desencadeadores e potencalizadores de processos pedagógicos orien-tados pelas políticas e finalidades da Educação Superior e da instituição, o que envolve o ensino, a aprendizagem, o currículo, os professores, os gestores e acadêmicos, consolidando a qualidade do trabalho pedagógico no Ensino Superior.

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ANÁLISE DOS MARCOS REGULATÓRIOS NO CAMPO DAS POLÍTICAS DE ALFABETIZAÇÃO: ATUAÇÃO

DOS CONSELHOS DE EDUCAÇÃO

Claudia Martins Leirias

O artigo apresenta um panorama acerca das políticas educacionais voltadas à alfabetização, tratando dos marcos regulatórios, dialo-

gando com conceitos de campo científico e governança. Parte do pressuposto de que o estudo acerca da temática alfabetização

implica considerarmos a complexidade que perpassa a política educacional, analisando-a como processo histórico, envolvido numa dinâmica social em que há lutas e contradições, com o necessário diálogo com os dados e sujeitos reais envolvidos.

Utilizaremos neste estudo o referencial teórico-analítico que trata da abordagem do “Ciclo de Políticas” formulado por Stephen Ball e colabora-dores e que, segundo Mainardes (2007), pressupõe a articulação dos proces-sos macro e micro, considerando a natureza da política educacional enquanto complexa e controversa, enfatizando os processos micropolíticos e a ação dos profissionais no nível local (MAINARDES, 2007).

Assim, cabe destacar que o Ciclo de Políticas é constituído de três con-textos: contexto da influência, em que as políticas são iniciadas e os discursos são construídos; contexto da produção de texto, constituído de textos legais oficiais e textos políticos, comentários formais e informais sobre os textos oficiais, entre outros, normalmente articulados com a linguagem do interesse público mais geral; e contexto da prática, em que as políticas são reinterpre-tadas e recriadas, produzindo efeitos e consequências que podem significar mudanças e transformações na política original. Neste estudo, focalizaremos nos dois primeiros contextos implicando a continuidade dos estudos e a pro-dução de conhecimento.

POLÍTICAS EDUCACIONAIS E CONTEXTO DA INFLUÊNCIA

O estudo tem como referencial que há uma “reconfiguração do papel do Estado” fundamentada no discurso de crise do Estado porque investiu de-mais nas políticas sociais (PERONI, 2006). Assim, as reformas decorrentes do Plano de Reforma do Estado no Brasil de 1995 incidiram no campo educa-cional, em relação ao financiamento, à gestão, à implementação de currículos, à formação de professores e avaliação, e são estimuladas e mediatizadas por organismos internacionais (BAZZO, 2006, p. 31).

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LEIRIAS, C. M. - ANÁLISE DOS MARCOS REGULATÓRIOS240

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico1 (OCDE) afirma que sua missão é promover políticas que irão melhorar o de-senvolvimento econômico e bem-estar social de pessoas em todo o mundo. Assim, no documento Análise das Políticas Educacionais, edição de 2003, afirma-se que as “reformas educacionais de grande porte estão sendo imple-mentadas no mundo inteiro, em resposta às necessidades de tornar a aprendi-zagem acessível a cada um ao longo da vida”.

Encontramos, ainda, na publicação Estudos Econômicos da OCDE Brasil2, de outubro de 2011, a avaliação dos progressos feitos nas áreas das reformas estruturais, baseadas nas recomendações de políticas feitas em outros estudos prévios. Assim, diante da recomendação de que o país concentrasse es-forços para melhorar a qualidade dos serviços educacionais no primeiro ciclo, há a sinalização positiva de que em alguns Estados e municípios brasileiros houve avanços, visto que instituíram um bônus salarial aos professores, basea-do no desempenho da escola, bem como ocorreu em âmbito nacional a criação de incentivos de bom desempenho em nível local, acrescido de mecanismos de avaliações comparativas uniformes através das instituições educacionais, o que permitiu avaliação de resultados de desempenho dos alunos e das escolas.

UNESCOAlém da OCDE, consideramos também que a Unesco apresenta signi-

ficativa influência na elaboração das políticas educacionais no país. A Unesco objetiva “auxiliar a formulação e operacionalização de po-

líticas públicas que estejam em sintonia com as estratégias acordadas entre os Estados-Membros da Unesco”. Destaca que o objetivo da Educação para Todos é aumentar em 50% os níveis de alfabetismo até o ano de 2015 e que tal objetivo serve também para a Década da Alfabetização (2003-2012).

Em relação aos objetivos da Educação para Todos, afirma que “o Brasil está entre os 53 países que ainda não atingiram nem estão perto de atin-gir” os objetivos até 2015. Dentre os compromissos dos países, assinalados nos documentos de Dakar e na Declaração do Educação para Todos, podemos encontrar a necessidade de consolidar a ampliação do número de anos de escolaridade obrigatória e o compromisso dos governos em “melhorar os sis-temas de mensuração de resultados, avaliação e prestação de contas ajustados e indicadores e padrões comparáveis, apoiados por mecanismos de avaliação externos ao próprio sistema” (DAKAR, 2001, p. 36).

Diante deste cenário, nos propomos, na continuidade, a analisar al-guns documentos que compõem a política educacional voltada à alfabetização no país, no sentido de avaliarmos as possíveis influências desses organismos na formulação e implementação das mesmas.

1 Disponível em http://www.oecd.org/pages/0,3417,en_36734052_36761800_1_1_1_1_1,00.html. Acesso em: 4 nov. 2011.2 Fonte: Estudos Econômicos da OCDE Brasil, outubro de 2011, p. 29.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 241

ALFABETIZAÇÃO: O CAMPO DA PRODUÇÃO DE TEXTOS O Brasil tem significativo desafio no campo da alfabetização, visto o

número preocupante de pessoas não alfabetizadas que no ano de 2010 era de aproximadamente 18,8 milhões (FERRARO, 2009). Diante desse dado e do contexto histórico do analfabetismo no país, destacamos algumas políticas voltadas à superação desse processo de exclusão, dentre elas a ampliação do Ensino Fundamental de nove anos.

A ampliação do Ensino Fundamental, com ingresso das crianças aos seis anos, segundo o MEC3, é um movimento mundial, sendo que a anteci-pação do acesso das crianças “é uma medida contextualizada nas políticas educacionais focalizadas no Ensino Fundamental” e tem como objetivo as-segurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio escolar, maio-res oportunidades de aprender e, com isso, uma aprendizagem mais ampla. A ampliação encontra fundamentação legal no Plano Nacional de Educação para a vigência 2001/2011. Em relação à ampliação, foram aprovadas as Leis nº 11.114/2005 e nº 11.274/2006, que alteram a LDB, tornando obrigatória a matrícula das crianças de seis anos no Ensino Fundamental e ampliando o Ensino Fundamental para nove anos de duração ao mesmo tempo em que estabelece o ano de 2010 como prazo máximo para implementação pelos sis-temas de ensino.

O Conselho Nacional de Educação (CNE), no ano de 2004, manifes-tou-se acerca dessa temática através do Parecer CNE/CEB nº 24, que tratava de estudos visando ao estabelecimento de normas nacionais para a ampliação do Ensino Fundamental. Na sequência, exarou o Parecer CNE/CEB nº 06, de 8 de junho de 2005, que sinalizava a necessidade do regime de colaboração entre os sistemas de ensino estaduais e municipais e garantia da implanta-ção do novo Ensino Fundamental como direito público subjetivo; destacava que caberia aos sistemas estabelecer se o primeiro ano se destinava ou não à alfabetização dos alunos, bem como a construção de um Projeto Político-Pedagógico próprio a esse novo Ensino Fundamental.

A partir desse cenário, houve a necessidade de reorganização da Educação Básica. Assim, o CNE publicou a Resolução CNE/CEB nº 03, em 03 de agosto de 2005, definindo que a Educação Infantil compreende a faixa etária até 5 anos de idade e o Ensino Fundamental compreende a faixa etária dos 6 aos 14 anos, organizado de forma que os cinco primeiros anos compõem os anos iniciais do Ensino Fundamental e os quatro últimos, os anos finais.

Na continuidade, outros Pareceres trataram da ampliação do Ensino Fundamental, dentre eles, o Parecer CNE/CEB nº 18/2005 que orientou os sistemas acerca da matrícula das crianças de 6 anos de idade no Ensino Fundamental obrigatório, o Parecer CNE/CEB nº 5/2007, reexaminado pelo Parecer CNE/CEB nº 7/2007 que respondeu consulta com base nas Leis nº

3 Ensino Fundamental de Nove Anos – Orientações Gerais (2004).

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LEIRIAS, C. M. - ANÁLISE DOS MARCOS REGULATÓRIOS242

11.114/2005 e n° 11.274/2006, que se referem ao Ensino Fundamental de nove anos e à matrícula obrigatória de crianças de seis anos no Ensino Fundamental.

Além desses marcos, no ano de 2008, novamente o CNE publicou Parecer (CNE/CEB nº 4/2008) reafirmando a importância da criação de um novo Ensino Fundamental, estipulando o ano de 2009 para que os sistemas que ainda não efetivaram a ampliação planejassem a implementação dessa política. Nesse Parecer reiterou, entre outros aspectos, as normas para o redi-mensionamento da Educação Infantil e orientou os sistemas a organizarem o chamado “ciclo da infância”, compreendido como os três primeiros anos do Ensino Fundamental, destinados ao processo de alfabetização e letramento.

Ressalta-se que as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de nove anos foram estabelecidas no Parecer CNE/CEB nº 11/2010 e na Resolução nº 1/2010. Tais Diretrizes tratam a amplia-ção do Ensino Fundamental como importante no processo de alfabetização e letramento das crianças, visto o alargamento dos tempos/espaços. Da mesma forma, reiteram a existência de um bloco destinado à alfabetização, conside-rando os três anos iniciais do Ensino Fundamental como um bloco pedagó-gico ou um ciclo sequencial não passível de interrupção. Assim, as referidas Diretrizes apontam que o Ensino Fundamental deve assegurar, dentre outros aspectos, a alfabetização e o letramento num processo de continuidade da tra-jetória escolar, “tendo em conta a complexidade do processo de alfabetização e os prejuízos que a repetência pode causar no Ensino Fundamental como um todo, e, particularmente, na passagem do primeiro para o segundo ano de escolaridade e deste para o terceiro”.

No campo das políticas educacionais a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, em cumprimento à legislação, foi realizada pela rede municipal em estudo no ano 2006. Nesse mesmo ano, o Conselho Municipal de Educação (CME) emitiu Parecer orientando o Sistema Municipal de Ensino sobre essa ampliação. No ano de 2010, o CME manifestou-se novamente acerca da conti-nuidade da trajetória escolar aos alunos do ciclo inicial de alfabetização.

GOVERNANÇA E ATUAÇÃO DO CONSELHO DE EDUCAÇÃO

Cabe destacar que o conceito de governança é considerado recente, datando de 1991 a utilização por R. Monks, nos Estados Unidos. No ano de 2002 iniciou-se ampla regulação da vida corporativa, fundamentada nos princípios da boa governança: transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade. Governança é entendida, então, como “sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo o rela-cionamento entre conselho, equipe executiva e demais órgãos de controle”4.

4 Slides apresentados no SAE: Formação, Políticas e Práticas em Educação VI: Qualidade da Educação Superior – campo científico e governança acadêmica. Fonte: ANDRADE, Adriana; ROSSETI, José Paschoal. Governança corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendências: 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 243

Segundo Amos (2010) o “termo governança está mais relacionado a aspec-tos técnicos: trata-se de instrumentos e modos, procedimentos e atores, além de suas constelações e formas de cooperação”. Assim, podemos depreender que o conceito de governança implica mais participação da sociedade civil no processo de implementação das políticas educacionais, envolvendo uma noção ampliada de bom governo e com vistas à legitimidade, num processo de integração entre Sociedade e Estado através de processos que envolvem a descentralização e a participação.

Dentre as atribuições do CME do sistema em estudo, destacamos a elaboração de atos normativos e normas complementares, proposição de medidas que visem à expansão, consolidação e aperfeiçoamento do Sistema Municipal de Ensino. Ou seja, o CME tem um campo de atuação específico, que segundo Bourdieu (2004) é o universo onde estão inseridos os agentes e as instituições que produzem, reproduzem ou difundem a arte, a literatura ou a ciência (p. 20); é o mundo social que obedece a leis sociais mais ou menos específicas. A autonomia de um campo é caracterizada como autonomia par-cial, sendo que quanto mais heterônomos, “mais a concorrência é imperfeita e é mais lícito para os agentes fazer intervir forças não científicas nas lutas científicas (BOURDIEU, 2004, p. 32)”. O autor afirma que “os campos são o lugar de duas formas de poder que correspondem a duas espécies de capital científico”: poder institucional ou institucionalizado, que está ligado a ocupa-ções de posições importantes nas instituições e prestígio pessoal, que implica o reconhecimento do conjunto de pares ou da parte mais consagrada dentre eles (p. 35).

Relacionamos essas questões com a atuação dos Conselhos de Educação, no sentido de refletirmos sobre tensões e desafios no campo da produção dos textos normativos, orientadores da implementação das políticas, para atender as demandas em nível macro e as especificidades locais, bem como participar da gestão dos sistemas de ensino num processo de controle social das políticas públicas e democratização da educação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS As reformas na educação precisam ser compreendidas como parte de

uma agenda global de reformas em tempo de reconfiguração do papel do Estado. Ao mesmo tempo, as reformas voltadas ao Ensino Fundamental são acompanhadas por um quadro normativo significativo acerca da ampliação da escolarização obrigatória no âmbito nacional e municipal que, entendemos, está em sintonia com recomendações de organismos internacionais.

Cabe pensar que na organização de um Sistema de Ensino, os Conselhos de Educação assumem função significativa na defesa da qualida-de do ensino e compartilhamento das decisões. Espera-se deles uma atuação fundamentada nos princípios da “boa governança”, com plena participação de

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LEIRIAS, C. M. - ANÁLISE DOS MARCOS REGULATÓRIOS244

todos, o que implica fazer parte, tomar parte e ser parte do processo no sen-tido de superação de situações de centralização do poder e controle de poucos.

Compreendemos que no reconhecimento pelos pares e construção de um capital científico específico é necessário um processo de empoderamento dos sujeitos, de forma que possam atuar para além da função normativa. Tal empoderamento implica a capacidade para incidir protagonicamente no pro-cesso político a partir da igualdade de condições de participação para todos, assumindo como princípio que o poder emana da “responsabilidade de cada um e não da posição hierárquica que ocupa na organização” (BAQUERO, 2007, p. 144). Entendemos, assim, que constitui também um desafio o empo-deramento organizacional (BAQUERO, 2007, p. 146) e a construção de uma cultura de participação, controle social, debates e encaminhamentos diante das especificidades locais e mobilização da sociedade na luta pela defesa do direito è educação.

Analisamos, enfim, que cabe a continuidade dos estudos no sentido de avaliarmos no contexto da prática como os marcos regulatórios que tratam da política de alfabetização se concretizam no interior da escola.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 245

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QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES: UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

Mariangela da Rosa AfonsoMaria da Graça Gomes Ramos

Tania Elisa Morales Garcia

A universidade como instituição voltada à formação das novas gera-ções deve estar comprometida com os valores fundamentais da contempora-neidade, como a ética, a transparência e a justiça social, cumprindo com os deveres para com a sociedade que a financia. Sua posição estratégica, no âm-bito da sociedade, conclama sua responsabilidade, e hoje, mais do que nunca, isso se torna imperioso.

Há décadas vêm sendo propostas novas visões para entender e transfor-mar de forma lúcida o papel da universidade nas sociedades contemporâneas.

Os desafios da globalização, a incorporação das novas tecnologias da comunicação e da informação e os avanços tecnológicos sem precedentes da sociedade atual formam um cenário em que o papel da universidade exige uma transformação à altura de tais desafios.

Fala-se de um novo “pacto social”, que precisa dar ênfase à responsa-bilidade social da instituição universitária em um mundo de crescente comple-xidade, o que constitui para essa instituição inúmeros desafios.

Desse modo, o presente trabalho propõe-se a refletir sobre a qualida-de da gestão das relações universidade e sociedade na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), tendo como norte os seguintes eixos: a) panorama das discussões sobre extensão universitária; b) qualidade como um indicador de gestão; c) o cenário da UFPel frente às demandas da extensão universitária pautada na responsabilidade social.

A presente investigação vem sendo desenvolvida pelo grupo de pes-quisa GEU-Ipesq/UFPel, ligado ao Grupo de Estudos sobre Universidade da UFRGS (GEU/Edu-Ipesq)1, e faz parte da trajetória de pesquisas desse grupo, que tem desenvolvido estudos sobre diferentes aspectos da estrutura, dinâ-mica, desempenho e funções do Ensino Superior, buscando situá-lo compa-rativamente face às tendências e características de outros sistemas de Ensino Superior da América Latina.

A partir da necessidade de reunir alguns subsídios para a discussão sobre a questão da qualidade da gestão e da relação universidade/sociedade,

1 A Rede GEU (Grupo de Estudos sobre Universidade) congrega o GEU-Ipesq (Universidade, Pesquisa e Inovação) da UFRGS (Porto Alegre-RS), e mais dois GEUs da mesma instituição: o GEU- Edu/Inovação e o GEU- Sociologia; além do GEU-UPF (Passo Fundo- RS) e do GEU- Ipesq/UFPel (Pelotas-RS). A rede GEU também se integra à RIES – Rede Sulbrasileira de Investigadores em Educação Superior.

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AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES248 AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES

o trabalho valeu-se de bibliografias pertinentes ao tema, documentos insti-tucionais, bem como da realização de uma pesquisa de cunho exploratório, com representantes da comunidade interna e externa da UFPel, os quais apresentaram opiniões e concepções a respeito da questão em pauta. Entre os representantes externos foram contemplados sujeitos que participam diretamente de ações de extensão desenvolvidas pela instituição. Foi uti-lizada uma amostra intencional constituída por esses indivíduos, a fim de qualificar as informações e balizar o estudo proposto. Os depoimentos ob-tidos sinalizam de que modo os entrevistados se posicionam diante do tema em discussão, a partir de análises originadas das transcrições de gravações e notas de campo, a que foram aplicadas técnicas específicas de análise de conteúdo (BARDIN, 1979).

Nesses procedimentos metodológicos, toma-se como alicerce a pers-pectiva de Minayo (2001), que afirma que a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.

O cenário investigado, conforme dito anteriormente, trata-se da UFPel, que é uma instituição criada pelo decreto-lei n. 750, de 8 de agosto de 1969, dentro da política da Reforma Universitária, resultante do processo de interio-rização do Ensino Superior, aglutinando estabelecimentos isolados em uma instituição universitária.

Hoje, essa universidade é uma fundação de direito público, é um órgão da administração federal indireta, com uma duração ilimitada, com autonomia administrativa, financeira, didático-científica e disciplinar. Rege-se pela legis-lação federal de ensino e pelos estatutos da Fundação e da Universidade.

A UFPel, atualmente, situa-se em dois municípios vizinhos: Pelotas, onde funcionam suas unidades da zona urbana e a administração central da universidade, e Capão do Leão, onde se encontra o campus universitário. A Missão institucional da UFPel consiste em “Promover a formação integral e permanente do cidadão, construindo o conhecimento e a cultura, comprome-tidos com os valores da vida e com a construção da sociedade”. Sendo essa missão cumprida através de ações de ensino, pesquisa e extensão.

Tendo como mote essa missão, e os objetivos deste estudo, apresen-tam-se os três eixos que nortearão este trabalho.

EIXO A: PANORAMA DAS DISCUSSÕES SOBRE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA É incontestável que a universidade é uma instituição que tem por mis-

são transmitir e produzir novos conhecimentos por meio de três atividades fundamentais: ensino, pesquisa e extensão, cuja indissociabilidade está asse-gurada na própria Carta Constitucional de 1988.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 249

Uma universidade de nível, que possui ensino, extensão e pesquisa de qualidade, inserida convenientemente no seu contexto social e econômico, certamente já cumpre a função para qual a sociedade a instituiu.

As ações de extensão, com base no Plano Nacional de Extensão de 2000-2001, aqui são entendidas como prática acadêmica que interliga a uni-versidade nas suas atividades de ensino e de pesquisa com as demandas da maioria da população. Um processo educativo, cultural e científico que encontra na sociedade a oportunidade de elaboração da práxis de um conhe-cimento acadêmico. É uma troca de saberes sistematizados, acadêmico e po-pular viabilizada por um trabalho interdisciplinar que favorece a visão inte-grada do social (PLANO NACIONAL DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA, 2000-2001).

Hoje, as atividades de extensão têm sido balizadas em temáticas de-finidas pelo Plano Nacional de Extensão Universitária 2000-2001, conforme descritas a seguir: comunicação; cultura; direitos humanos e justiça educa-ção; meio ambiente; saúde; tecnologia e produção; trabalho. Assim, as re-lações universidade/sociedade concretizadas pela extensão universitária vão possibilitar a interligação das atividades de ensino e de pesquisa às demandas da população.

Desse modo, ao refletir sobre a qualidade da gestão das relações da universidade com a sociedade, entende-se que a mesma efetiva-se através do equilíbrio entre a qualidade acadêmica e o compromisso social, ou seja, a uni-versidade precisa manter-se como uma instituição social comprometida com o desenvolvimento cultural, técnico e científico para a construção de uma so-ciedade mais justa. E nesse processo, a universidade precisa estar sensível aos problemas e apelos da sociedade, seja através dos grupos sociais com os quais interage, seja através das questões que surgem de suas atividades próprias de ensino, pesquisa e extensão.

Frente a essas premissas, o grande desafio da UFPel, neste momento, é consolidar suas ações de gestão para não só atender às demandas e políticas institucionais, como também crescer em áreas que emergem das necessidades de desenvolvimento regional.

EIXO B: QUALIDADE COMO UM INDICADOR DE GESTÃOA qualidade, quando diz respeito a instituições educativas e científicas,

que desenvolvem uma prática social que afeta e modifica pessoas, implica uma perspectiva histórica, plena de sentidos e valores.

Pode-se dizer que a qualidade no âmbito da Educação Superior cons-titui um conjunto de atributos que se manifesta no meio institucional que no cumprimento de sua missão atende com padrões recomendáveis de desempe-nho as expectativas de seus membros e da sociedade.

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AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES250 AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES

Em se tratando da qualidade no Ensino Superior, para alguns tem sig-nificado semelhante, variando em pequenos detalhes, para outros apresenta diferenças substanciais, além disso, o termo qualidade sempre pode variar no tempo e no espaço.

Para Morosini (2008), o conceito de qualidade na área educacional pode ser abordado de várias formas, abrangendo estruturas, processos e re-sultados educacionais. Por outro lado, a concepção de qualidade na Educação Superior nem sempre aponta para uma mesma direção, pois os parâmetros sobre os quais se baseia podem decorrer de projetos educativos e científicos diferenciados. Ou seja, o estabelecimento de padrões de qualidade deve estar vinculado aos objetivos que direcionam o processo educativo e ao projeto pedagógico e científico da IES.

Nessa perspectiva, é preciso que as instituições de ensino encontrem um conceito de qualidade adequado, que atenda às suas exigências e necessi-dades. Entretanto, não se pode desconhecer a existência de referentes univer-sais de qualidade, relacionados à natureza, condições e formatos das instituições que formam o sistema de Educação Superior, seja ele nacional ou estrangeiro. Nesse sentido, encontra-se: adequação e pertinência dos processos de formação, condição científica, social e cultural da produção acadêmica, rigor acadêmico e científico, construção da cidadania e o exercício da democracia (BRASIL, 2006).

No entanto, quando se trata de padrões específicos de qualidade, liga-dos à missão e natureza de uma instituição, os mesmos devem reafirmar as pe-culiaridades da IES e caracterizar seus propósitos autoinstituídos. Qualidade, enquanto conceito, é um valor conhecido por todos e, no entanto, definido de forma diferenciada por diferentes grupos ou camadas da sociedade, a percep-ção dos indivíduos é diferente em relação aos mesmos produtos ou serviços, em função de suas necessidades, experiências e expectativas. Para a OECD (Organization for Economic Co-operation and Development – 2008), a qua-lidade na Educação Superior tem papel relevante no desempenho econômico futuro e prestígio econômico dos países, nas economias e sociedades dirigidas pelo conhecimento.

No âmbito educacional, entende-se que, qualquer que seja a proce-dência avaliativa do elemento “qualidade”, na sua essência, deve estar a va-lorização da competência no fazer. Bertolin (2007), ao abordar a questão da qualidade da Educação Superior, destaca que o entendimento de qualidade é subjetivo, dependente fundamentalmente das concepções de mundo e de Educação Superior de quem o emite. Assim sendo, é difícil apresentar uma opinião consistente sobre qualidade em Educação Superior sem antes já estar delineada a concepção da própria Educação Superior.

Na tendência pluralista de visão da qualidade em Educação Superior está contemplada uma concepção de educação superior com diversidade de missões e propósitos, que valoriza as propriedades de diferenciação, pertinên-cia e relevância (UNESCO, 1998).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 251

A diferenciação destaca-se na perspectiva da ampliação de ofertas da Educação Superior, tornando-a mais acessível, com mais opções de escolha, de modo a responder melhor às pressões da sociedade e às necessidades do mercado de trabalho.

No que se refere à pertinência, a mesma deve ser observada princi-palmente em relação ao seu papel e seu lugar na sociedade, na sua missão em matéria de educação, de pesquisa e dos serviços que dela decorrem. Também deve ser olhada do ponto de vista de suas ligações com o mundo do trabalho em sentido amplo, de suas relações com o Estado e com as fontes de finan-ciamento públicas e de sua interação com os outros graus e formas de ensino (UNESCO, 1998).

Em se tratando da relevância, Fazendeiro (2002, p. 64) coloca que a mesma refere-se à “qualidade nos resultados, socialmente relevantes, face às necessidades e às expectativas dos indivíduos e da sociedade em todas as suas dimensões, econômica, social ou cultural”. Desse modo, entende-se que rele-vância significa a coerência entre a missão de uma instituição e as carências sociais da sua região de abrangência.

Já o termo equidade, abordado como uma das dimensões dos sistemas educativos por estudiosos da Educação Superior, significa possibilitar que todos os estudantes, quaisquer que sejam suas origens e condições (pessoal, familiar ou social), obtenham igualdade de oportunidades, processos e resul-tados (GARCIA, 2000).

Desse modo, a equidade na Educação Superior abarca diversos aspec-tos, como igualdade de oportunidades do acesso em relação aos grupos sociais, às etnias, às diferentes regiões de um país proporcionados pelas diferentes instituições educacionais. Traz como prioridades nos propósitos da Educação Superior a de busca por coesão social, desenvolvimento da democracia e da cidadania.

Outros conceitos trabalhados por pesquisadores que abordam a quali-dade da Educação Superior são a efetividade e a relevância.

A efetividade reflete a capacidade administrativa comprometida ver-dadeiramente com os objetivos sociais e com a satisfação das demandas con-cretas da comunidade externa. É um critério substantivo extrínseco, de nature-za política que reflete a capacidade de a educação responder às preocupações, exigências e necessidades da sociedade. A administração mostra-se efetiva através da sua capacidade estratégica para atender às necessidades sociais e às demandas políticas da comunidade em que o sistema educacional está inseri-do (SANDER, 1995).

A relevância, por sua vez, apresenta-se como o critério cultural que mede o desempenho administrativo em termos de importância, significação, pertinência e valor. Esse critério é de natureza substantiva e intrínseca e está

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AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES252 AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES

diretamente relacionado à atuação da educação para a melhoria do desenvol-vimento humano e qualidade de vida dos indivíduos e grupos que participam do sistema educacional e da comunidade como um todo (SANDER, 1995).

Observa-se que diferentes propostas de classificação para concepções de qualidade em Educação Superior publicadas ao longo do tempo são carac-terísticas da grande variabilidade de compreensões que continua existindo a respeito da mesma. É vasta na literatura das últimas décadas a afirmação de que qualidade em educação, especificamente em Educação Superior, não pos-sui um único significado. Entretanto, qualidade – além de um compromisso intrínseco com a nação – torna-se preponderante para a sobrevivência e suces-so das instituições de educação.

EIXO 3: O CENÁRIO DA UFPEL FRENTE ÀS DEMANDAS DA EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA PAUTADA NA RESPONSABILIDADE SOCIAL A responsabilidade social constitui temática emergente na agenda pú-

blica educacional. Surge, depois de o Governo Federal tê-la apontado como uma das dimensões a ser avaliada nas IES, pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES).

Antes de abordar a responsabilidade social universitária, cabe destacar o significado de responsabilidade social em uma organização moderna. Para isso, apresenta-se a perspectiva da União Europeia que a concebe na perspec-tiva das empresas em colaborarem, voluntariamente, com o aperfeiçoamento da sociedade e a preservação do meio ambiente, conscientizando-se do impac-to da sua atividade sobre todos e assumindo o compromisso de contribuir para o desenvolvimento econômico e, de igual modo, para a melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores e suas famílias, da comunidade local em que atuam e do conjunto da sociedade (ROGERS; KOSTIGEN, 2009)

No caso da responsabilidade social da universidade, a mesma desen-volve-se com a tomada de consciência da instituição sobre si mesma, do seu entorno e do papel que nele representa e efetiva-se através dos processos de gestão, docência, pesquisa e extensão universitária.

A responsabilidade social das IES diz respeito às políticas institucio-nais voltadas para inclusão social, desenvolvimento econômico e social, meio ambiente e preservação da memória e do patrimônio cultural. As políticas de inclusão devem abarcar alocação de recursos para sustentação, acesso e permanência de estudantes. O desenvolvimento econômico e social deve ser concretizado através de ações e programas que efetivem e integrem as dire-trizes curriculares dos cursos superiores com os setores sociais e produtivos, incluindo o mercado profissional. O meio ambiente e a preservação da memó-ria e do patrimônio cultural vão envolver ações e programas que efetivem e

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 253

integrem as diretrizes curriculares com as políticas relacionadas com a preser-vação do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural (BRASIL, 2006).

Também estão relacionados com a responsabilidade social, produção e transferência de conhecimentos, tecnologias resultantes de atividades científi-cas, técnicas e culturais, que atendam às demandas de desenvolvimento local, regional, nacional e internacional, e que sirvam para a preservação e melhoria do meio ambiente, da memória e do patrimônio cultural (BRASIL, 2006).

Ao se tratar da política de extensão da UFPel, a mesma tem-se pautado no compromisso social da universidade com a comunidade, com a valoriza-ção da participação discente como instância de formação da cidadania.

Ao se adentrar no universo investigado, partiu-se primeiramente para a análise dos documentos e estratégias de gestão da relação univer-sidade/sociedade presentes na UFPel. Assim, ao se analisar a política de extensão da UFPel, vemos que a mesma tem se pautado por estar voltada ao compromisso social da universidade com a comunidade, com a valorização da participação discente como instância de formação da cidadania. Como exemplo dessa atuação, destaca-se a participação da UFPel nas últimas edi-ções do Projeto Rondon.

Além disso, há diversos programas nas áreas temáticas e linhas de extensão, com grande número de projetos realizados em parceria com pre-feituras municipais, instituições federais de ensino, órgãos governamentais e não governamentais, sindicatos, cooperativas, entre outros, com objetivo de levar à sociedade os resultados de pesquisa obtidos nos diferentes projetos da UFPel, inserindo os estudantes na realidade socioeconômica brasileira.

Entre as inúmeras ações de extensão presentes na UFPel, destacou-se as ações que envolvem a produção de alimentos seguros, redução do impacto ambiental das atividades agropecuárias, a segurança e a saúde do trabalhador com as comunidades de abrangência da UFPel, as quais não se limitam ao ter-ritório nacional. Por exemplo, atividades com forte cunho social implementa-das com o Uruguai, através de projetos binacionais, que buscam a recuperação econômica da região fronteiriça do Brasil e Uruguai, bem como da bacia da Lagoa Mirim.

A UFPel tem atuado com o setor pecuário no fomento de práticas zootécnicas que incrementem a rentabilidade do sistema, como, por exemplo, o projeto de denominação de origem “Cordeiro Herval Premium”, que tem favorecido o desenvolvimento da cadeia produtiva da ovinocultura. Exerce, também, papel de liderança em ações com o setor agropecuário, sindicatos, associações nas questões de rastreabilidade e sanidade animal. Nesse con-texto, tem prestado serviços realizando diagnósticos de enfermidades de im-portância econômica para os sistemas produtivos. Desenvolve, ainda, ações de suporte aos Arranjos Produtivos Locais (cadeia de frutas e conservas e do turismo), atendendo às demandas de desenvolvimento regional e promovendo a inclusão social.

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AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES254 AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES

Nos documentos institucionais estão referidas ações desenvolvidas tendo como norte o compromisso com desenvolvimento regional, pois ficam evidenciadas sua inserção em um dos principais centros de produção e de transformação de alimentos na América Latina, destacando-se a área de grãos (arroz irrigado), frutas (pêssegos), pimenta e conservas. Para levar adiante o plano de integração regional e o desenvolvimento sustentado, a UFPel possui convênios locais com cooperativas, associação de produtores, indústrias de conservas e de alimentação, serviço de extensão rural (EMATER/RS), prefei-turas, hospitais-escola, empresas de pesquisa com ação na região, como é o caso da Embrapa Clima Temperado, entre outros. Essas parcerias são amplia-das por projetos financiados com recursos de entidades públicas (FAPERGS, Secretaria de Ciência e Tecnologia do RS, FINEP, CAPES, CNPq, MCT, MDA, MAPA, MS, Pastoral da Criança, entre outros), bem como por organis-mos internacionais de fomento (Organização Mundial de Saúde, Organização Panamericana de Saúde, IFS, Sociedade Americana de Química, Comunidade Europeia, Fundação Wellcome Trust etc).

ALGUMAS CONSIDERAÇÕESA bibliografia revisada com a finalidade de iluminar o olhar das pes-

quisadoras a respeito da temática da qualidade na gestão das relações univer-sidade/sociedade evidenciou que o assunto é candente no cenário nacional e sinaliza para inúmeros desafios que a instituição universidade necessita supe-rar para cumprir efetivamente o papel que a sociedade lhe reserva.

A qualidade em pauta efetiva-se na medida em que a universidade toma consciência sobre si mesma, do seu entorno e do papel que nele repre-senta, está sensível aos problemas e apelos da sociedade, e como instituição social, compromete-se com o desenvolvimento cultural, técnico e científico na construção de uma sociedade mais justa.

Na perspectiva de construção do cenário atual da UFPel, na dimensão da qualidade na gestão das relações universidade e sociedade, são trazidos resultados da análise dos documentos e da pesquisa de cunho exploratório.

Os documentos oficiais evidenciaram a necessidade da qualificação dos processos internos de gestão, bem como a necessidade de criação de es-tratégias da instituição para ampliar e redimensionar as perspectivas de aten-dimento à comunidade.

Os discursos dos entrevistados apresentam uma visão de qualidade associada aos papéis e funções da universidade, na direção de uma instituição comprometida com as questões sociais e o desenvolvimento local, regional e nacional, apontando para uma direção de qualidade da relação universidade e sociedade.

Os depoimentos evidenciaram que no contexto da universidade pú-blica inserida no Terceiro Mundo, um dos indicativos de qualidade estaria o

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 255

compromisso da universidade com questões sociais e a responsabilidade em buscar respostas a questões emergentes da sociedade.

Os sujeitos pesquisados argumentaram que uma das perspectivas para dar conta das demandas da comunidade seria o trabalho realizado pela exten-são universitária enquanto articuladora na relação entre ensino e pesquisa com a comunidade (troca de saberes).

Observa-se, assim, que um dos indicadores de qualidade na relação universidade e sociedade está na dimensão social da universidade focalizada no fortalecimento do estado democrático de direito indutor da construção da cidadania e fundamentalmente fator de construção da justiça social; compro-metimento orgânico com programas sociais relevantes; participante ativa na resolução de problemas sociais.

Esses aspectos destacados nos depoimentos parecem estar bastante associados ao termo efetividade que constitui um critério substantivo, que reflete a capacidade de a educação responder às necessidades sociais e às demandas políticas da comunidade. Contempla o conceito de qualidade subs-tantiva de Sander (1995) a qual implica a consecução dos fins e dos objetivos políticos e sociais.

Também é Sander (1995) quem traz o conceito de relevância como critério que mede o desempenho administrativo em termos dos significados e das consequências de sua atuação para a melhoria do desenvolvimento hu-mano e da qualidade de vida na instituição e na sociedade. Nessa perspectiva, entende-se a partir dos discursos dos entrevistados que a relevância na qua-lidade da gestão das relações universidade/sociedade vai acontecer se estiver apoiada em uma postura participativa dos responsáveis pela gestão. Quanto mais participativa e democrática a gestão, maiores as oportunidades de ser relevante para indivíduos e grupos que dela participam e de promover uma participação cidadã.

Ainda com relação à pesquisa exploratória, o olhar de um represen-tante legal da UFPel sobre o papel da responsabilidade social da instituição evidencia a percepção de que toda instituição deve ter uma política de res-ponsabilidade social expressa formalmente nos documentos institucionais. Aponta a preocupação com a transferência do conhecimento produzido pela universidade de forma que sejam atendidas as demandas da comunidade. O compromisso social da universidade estaria assim alicerçado na ideia de de-senvolvimento social.

Os discursos sinalizam que o conceito de universidade passa pela vi-são de que esta deve ser uma instituição comprometida com as questões so-ciais e o desenvolvimento local regional e nacional, buscando respostas aos problemas sociais, produzindo conhecimento vanguardista nas diversas áreas científicas, ou seja, a qualidade está relacionada aos papéis e funções da uni-versidade.

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AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES256 AFONSO, M. R. et al. - QUALIDADE E GESTÃO DAS RELAÇÕES

Desse modo, uma universidade de qualidade, no que se refere à gestão da relação universidade e sociedade, precisa possuir relevantes propósitos so-cioculturais e econômicos para o desenvolvimento e crescimento do Brasil e cumprir com suas funções consideradas básicas de ensino e formação integral dos indivíduos e da sociedade, de modo eficaz.

Para finalizar, entende-se que, em se tratando de instituição educa-tiva e científica, que por natureza desenvolve uma prática social que afeta e modifica as pessoas, a qualidade na Universidade Federal de Pelotas está plena de sentido e impregnada de valores, e que esta qualidade na gestão das relações universidade/sociedade deve constituir uma filosofia institu-cional, um espírito norteador, um ethos ético-cultural que perpassa em to-das suas ações.

REFERÊNCIAS

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 257

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EIXO TEMÁTICO III INTERNACIONALIZAÇÃO

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AS REDES DE AGÊNCIAS DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE E ACREDITAÇÃO DA EDUCAÇÃO

SUPERIOR NA AMÉRICA LATINA: RANA E RIACES

Margareth Guerra dos Santos

A boa universidade não é aquela que contribui para melhorar a performance do Sistema (sem perguntar o que isso significa), mas aquela que coloca suas competências a serviço da sociedade e de sua humanização (GOERGEN – Professor Uniso/Unicamp).

S istemas que asseguram a qualidade servem de base para a promo-ção e a venda do ensino como mercadoria e podem contribuir para

os rankings de competitividade entre as instituições que buscam maiores in-vestimentos. Nesse quadro de asseguramento, diversas redes de blocos regio-nais surgem com o intuito de integrar os países em seus continentes, a fim de fortalecerem a Educação Superior. Instala-se o credo de que o estabelecimen-to de critérios e padrões mínimos em matéria de Educação Superior garantiria o cumprimento de uma Educação Superior latina de qualidade, reconhecida internacionalmente. Muitas agências, na América Latina, começam a ser cria-das aos moldes dos países ricos, afastando seus princípios da realidade de seus países, a maioria emergente e com severas dificuldades.

A necessidade e importância das redes de cooperação e intercâmbio para o desenvolvimento de conhecimentos acadêmico-científicos na América Latina e, em matéria de Avaliação da qualidade e Acreditação da Educação Superior, a exemplo do que tem surgido em outros continentes, torna-se cláu-sula sine qua non na agenda das políticas públicas para a Educação Superior. Este estudo tem como objeto as redes de agências de Avaliação da qualidade e Acreditação da Educação Superior na América Latina, tratando-se de um estu-do de dois casos – a rede RANA (Rede de Agências Nacionais de Acreditação do Mercosul Educativo) e a rede RIACES (Rede Ibero-Americana para Acreditação da Qualidade da Educação Superior).

JUSTIFICATIVA, OBJETIVOS E METODOLOGIA

A temática de Redes de Acreditação e Avaliação da qualidade da Educação Superior na América Latina ainda é pouco explorada do ponto de vista da pesquisa, mas é tema de discussões diversas em muitos países. Nos úl-timos anos, o surgimento dessas redes intensifica a necessidade de discutir os seus reais propósitos. Recentemente, no Brasil, passa-se a utilizar os termos Acreditação e agências de Acreditação em discussões.

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SANTOS, M. G. - AS REDES DE AGÊNCIAS DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE262

O interesse por essa temática na presente pesquisa significa a con-tinuidade dos estudos e interesse pela Avaliação da Qualidade da Educação Superior, que se inicia no percurso paralelo à própria experiência profissional, tanto na qualidade de professora Assistente do quadro efetivo quanto na de Diretora da Coordenadoria de Graduação na Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) e integrante do Banco de Avaliadores do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira). Os motivos ligam-se à evolução da temática da avaliação no Brasil, mais precisamente no Estado do Amapá.

O universo do mestrado na UFRGS propicia sonhos de ousadia te-órico-metodológica, encontro de temáticas mais abrangentes que, ao invés de tecer contribuições somente para Unifap, podem contribuir para reflexões sobre a estrutura da Avaliação da Qualidade da Educação Superior no Brasil. A busca de experiências inovadoras, através das pesquisas do grupo Inovaval, proporciona o contato com a Avaliação da Educação Superior no mundo, prin-cipalmente as experiências na Europa, nos EUA e na América Latina, em es-pecial Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai, além de infinitas experiências no Brasil.

Atrelada a essas questões, a escolha do objeto de estudo se concretizou a partir de intensos estudos com a orientadora. As escolhas se pautaram em alguns caminhos. Ao percorrê-los, compreendeu-se sua relevância para a pes-quisa não apenas no Brasil, mas também na América Latina, os quais, talvez, possam resultar em paradigmas novos, tanto na compreensão da Avaliação da Qualidade da Educação Superior quanto da Sociedade necessária ao povo latino.

O foco de análise proposto é o papel da Acreditação e Avaliação da Qualidade da Educação Superior na América Latina.

Ao trilhar os caminhos para o objeto de estudo, as questões começa-ram a tomar corpo teórico com a leitura, em uma das pesquisas documentais da “Declaración de San Miguel de Tucumán” em que se destaca:

Repensar o sentido e a missão da avaliação e da acreditação em função da qualidade, da pertinência e da responsabilidade social das Universidades é um marco na planificação do futuro de nossas instituições, garantindo a mais ampla participação da comunidade, desprendendo-se de critérios que postulam essencialmente valores de mercado como indicadores de qualidade, fruto de políticas neoliberais (CENTRO, 2008 p. 2 [tradução livre]).

A partir da informação oficial de que a “Declaración de San Miguel de Tucumán” é um compromisso firmado de oposição ao modelo neoliberal de Universidade, através da Avaliação, sob o paradigma da regulação, bus-caram-se os elementos pragmáticos de análise a fim de pesquisar experiên-cias que contribuam para que seja repensado um caminho para as políticas da Educação Superior no Brasil.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 263

Esse processo desencadeou, então, a busca de elementos materiali-zadores dos credos adquiridos com a Declaração. Após, identificaram-se as Redes que tratam do tema da Avaliação e Acreditação da Qualidade da Educação Superior na América Latina, e selecionaram-se dois casos para es-tudo: a RIACES (Red Iberoamericana para la Acreditación de la Calidad de la Educación Superior, com sede na Argentina), e com sede no México, o caso RANA/Mercosul Educativo (Red Iberoamericana para la Acreditación de Calidad de la Educación Superior –Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai).

Este estudo pretende compreender o papel desempenhado pelas re-des RIACES e Mercosul Educativo, mediante processos de Acreditação da Educação Superior. Com o intuito de obter respostas a esses questionamentos, apresentam-se também os seguintes objetivos:

a) Conhecer a proposta dos Movimentos de redes de Acreditação e Avaliação da qualidade da Educação Superior na America Latina, estudando a RIACES e o Mercosul Educativo.

b) Identificar modelos dos processos de Acreditação e Avaliação discutida por essas Redes para Educação Superior latina.

c) Analisar os diversos tipos de organização e natureza dessas redes e examinar sua possível contribuição ao estudo de po-líticas de Avaliação da Qualidade da Educação Superior no Brasil.

Condicionada a esses aspectos está a relevância de apresentar estudos no campo da Avaliação Institucional com propósitos que revelem seu impac-to nos resultados obtidos, principalmente tendo por foco as concepções das tendências avaliativas que encaminham os trabalhos junto às IES, proporcio-nando, também, indicadores de avaliação sobre quais concepções avaliativas geram resultados positivos em relação às políticas de gestão institucionais. Quanto aos procedimentos metodológicos adotados para este estudo, pode-se afirmar que a investigação científica é a busca por conhecimentos com fina-lidades profissionais ou de mudanças no cenário das sociedades. Numa pers-pectiva de transformação, ao investigador cabe o papel de mudar conceitos a partir de sua leitura crítica do fenômeno estudado, pois, diz Melucci (2005), a construção de conhecimentos sobre conhecimentos se torna uma ação voltada para desencadear novos inputs do seu significado no contexto social.

Uma investigação é, por definição, algo que se procura. É um caminhar para um melhor conhecimento e deve ser aceita como tal, com todas as hesitações, des-vios e incertezas que isso implica [...] (QUIVY E CAMPENHOUDT, 2008 p. 31).

A perspectiva de pesquisa que se definiu neste estudo pauta-se em uma abordagem qualitativa e reflexiva. Melucci (2005, p. 40) afirma que:

[...] nas ciências sociais, o emergir de um ator reflexivo parece estar no centro da atenção como eixo em torno do qual gira a reflexão contemporânea e em torno do qual estão se modificando as práticas de pesquisa.

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SANTOS, M. G. - AS REDES DE AGÊNCIAS DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE264

Para a presente pesquisa utilizou-se o método qualitativo que, segun-do Minayo (2008), é um método que em seu fundamento permite revelar pro-cessos sociais, novas abordagens, conceitos e categorias durante a investiga-ção. Esse método se aplica à apreensão das percepções e opiniões dos grupos ou indivíduo(s) pesquisados, revelando seu cotidiano e sua compreensão do mundo em que vivem.

O método proposto para o estudo do objeto de pesquisa foi o ESTUDO DE CASO, lançando-se alguns conceitos para sustentar a escolha. Minayo (2008) descreve estudos de caso como estratégias de pesquisa qualitativa, em que é possível mapear, descrever e analisar o contexto do fenômeno em ques-tão, além de permitir análises minuciosas dos contextos organizacionais.

TÉCNICAS DE COLETA E ANÁLISE DE DADOSSabe-se que estudos de caso requerem técnicas qualitativas para se

compreender o universo do fenômeno estudado. A compreensão dos mundos da vida dos entrevistados é a condição sine qua non para a pesquisa quali-tativa, dizem Bauer e Gaskell (2007). Lança-se, então, como proposta para as técnicas de coleta de dados, a pesquisa e o levantamento de documentos institucionais, de material eletrônico (acessado no website das redes) e o uso da técnica de entrevista.

À época do início deste estudo, em 2008, fizeram-se os primeiros con-tatos com os representantes das redes para agendar futura visita e coleta de dados em lócus, para a qual se utilizaria o instrumento técnica da entrevista. Esse contato também foi uma forma de interagir com as redes que se pretendia investigar. Os dados foram obtidos a partir de estudo dos documentos oficiais ofertados pelos entrevistados e dos documentos on-line cujos endereços fo-ram sendo obtidos à medida que o trabalho de investigação progredia, uma vez que não tivemos acesso a estudos sobre o tema.

A entrevista foi aplicada aos especialistas da área da Acreditação en-volvidos com as redes, pessoal que as gerenciam. As entrevistas, segundo Quivy e Campenhoudt (2008), possuem uma função reveladora, expondo as-pectos do fenômeno que o pesquisador pode ainda não ter percebido e que está na leitura dos entrevistados.

Com a pretensão de explorar a discussão sobre o tema optou-se pela entrevista semi-estruturada que combina perguntas fechadas e abertas, pos-sibilitando ao entrevistado não se prender apenas a perguntas formuladas (MINAYO, 2008).

Entrevistamos no Uruguai um representante da Unesco, um docente, arquiteto e par-avaliador das avaliações do MEXA e ARCU-SUL, e outro do-cente da UDELAR, engenheiro e agrônomo, também par-avaliador do MEXA e do ARCU-SUL (Sistema de Acreditação de Cursos Universitários) e mem-bro da Comissão de Critérios de Acreditação para Avaliação e Acreditação de carreiras de Agronomia da RIACES.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 265

Na Argentina entrevistamos na sede da rede RIACES o presidente da rede, dois representantes do Comitê diretivo, também participantes dos pro-cessos de Acreditação do Mercosul Educativo (RANA), e o Secretario técnico da mesma. Informalmente discutimos a participação do Brasil na RANA e na RIACES com o diretor à época da Conaes (Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior).

Para o tratamento dos dados coletados, propõe-se a análise de docu-mentos e de materiais eletrônicos, como complemento às informações coleta-das através das entrevistas. Para André (1983), o método de análise de dados deve permitir a identificação do tema no contexto das situações verificadas, assumindo significados que subsidiem a interpretação e proporcionem indica-dores para sua sustentação.

As entrevistas foram desgravadas por uma professora de espanhol e traduzidas ao português. Foi feita a leitura das entrevistas, e o tratamento dado foi a organização de quadros que continham a questão central de cada per-gunta e as respostas dos diferentes entrevistados. A partir desse quadro foram identificadas as informações que permitiram entender a trajetória histórica, os objetivos e os modelos de avaliação e as questões políticas subjacentes ao desenvolvimento das redes.

Ressalta-se o fato de que os entrevistados puderam falar livremente sobre suas impressões a respeito das redes. As informações dos entrevistados permitiram checar os dados provenientes dos documentos acessados, e algu-mas informações obtidas nas entrevistas não foram integralmente aproveita-das neste estudo.

Quanto ao tratamento de dados dos documentos:1. Os documentos foram localizados no website ou obtidos dire-

tamente das fontes.2. Foram selecionados os documentos, tendo-se em vista que

não havia uma trajetória histórica definida.3. Optou-se por separar Atas dos demais documentos; a partir

das Atas foram buscados os demais documentos, tais como: Resoluções, Editais, Anexos, Informativos, Convocatórias, Planos de Trabalho, Agenda de Reuniões, Conclusões de Seminários, Planos Operativos.

4. A partir dos documentos foi traçada uma linha do tempo que reflete a Fundação, Trajetória, Estrutura Organizacional, Países-Membros, Fins e Objetivos, assim como as atividades com Planos de Trabalho de cada uma das redes.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕESDurante a pesquisa, questionou-se: “as redes estão padronizando di-

retrizes de Avaliação da Qualidade e Acreditação da Educação Superior ba-

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SANTOS, M. G. - AS REDES DE AGÊNCIAS DE AVALIAÇÃO DA QUALIDADE266

seadas em modelos externos a sua realidade?”. Outra preocupação surgida se refere à diversidade e heterogeneidade cultural dos países que compõem a rede! Isso está sendo perdido?

Observou-se muito a preocupação em atender padrões de qualidade reconhecidos por agências internacionais, apesar da insistência em afirmar que existe toda uma discussão e estudos para a implantação desses modelos. Nesse aspecto, a preocupação tomou conta no sentido de que se pode estar criando um modelo hegemônico de Avaliação da Qualidade e Acreditação da Educação Superior, em que agências internacionais definiriam quais as IES atendem seus padrões de qualidade, distanciando-se das discussões regionais ou até nacionais. Esta é uma hipótese que, ao final do estudo, se levanta e que precisa ser comprovada em um momento posterior. Mas ela induz a certa precaução em relação às redes.

Outra questão que se levanta é que esse discurso também pode masca-rar uma posição contrária às redes, pois a estruturação da Educação Superior em Rede possibilitaria o acesso dos países emergentes ao conhecimento, a discussões, e a participação de grupos que promovam o desenvolvimento da educação. Nessa perspectiva democrática, da autonomia e da liberdade de expressão, países emergentes podem alcançar níveis consideráveis de desen-volvimento mediante inserção de suas universidades em redes nacionais, re-gionais e até internacionais, o que pode gerar restrições à estruturação em rede por parte de governos que baseiam suas políticas para Avaliação da Qualidade e Acreditação da Educação Superior na centralização, mas a organização em rede poderia favorecer outra forma de política.

De modo geral, em que pesem os problemas de ranking, de finan-ciamento estabelecido por notas da avaliação (Banco Mundial), destaca-se que a organização de políticas para Avaliação da Qualidade e Acreditação da Educação Superior em redes regionais, nacionais, diante do contexto da globalização e de profundas mudanças, desempenha papel importante para a evolução das sociedades. A instituição universitária, tradicionalmente liga-da ao desenvolvimento de conhecimentos, é fundamental para o surgimento de sociedades do conhecimento. É importante garantir níveis de qualidade e comparabilidade adequados para a Educação Superior, como também desen-volver senso crítico no que se refere aos graus de conhecimento.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 267

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DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA E A UNIVERSIDADE BRASILEIRA: O REUNI E AS

UNIVERSIDADES TRANSNACIONAIS

Ralf Hermes Siebiger

C onsiderando-se a educação como política pública social de res-ponsabilidade do Estado, parte-se da premissa de que, num pri-

meiro momento, tais políticas – Processo de Bolonha, na Europa, e o Reuni e a criação de universidades com perfil transnacional, no Brasil – pareceriam ser iniciativas isoladas e independentes. No entanto, na hipótese deste trabalho, estas seriam rearranjos que concorrem para um processo de continuidade da subordinação das políticas educacionais às demandas do mercado de trabalho e de produção capitalista, bem como ao discurso neoliberal que sustenta essa lógica de funcionamento da sociedade.

Ressalta-se que as teses neoliberais – menos Estado e mais merca-do – defendem enfaticamente as liberdades individuais, criticam a interven-ção estatal e elogiam as virtudes reguladoras do mercado. O livre mercado é concebido como equalizador das relações tanto entre os indivíduos como das oportunidades na estrutura ocupacional da sociedade e, consequentemente, na definição de políticas educacionais. Nesse sentido, a educação permanece em seu caráter dualista (HÖFLING, 2001).

Se existe tal vetor na literatura especializada, a partir do objeto cons-truído, problematizaremos tais teses como possíveis vetores ou não, ou de que maneira foram ou não manifestos, a partir de Bolonha, recortando-se o Reuni (e, no bojo, a proposta do Ministério da Educação referente aos Bacharelados Interdisciplinares), e a recente criação de universidades com perfil transna-cional, iniciativas tomadas como indicadores de impacto para a realidade da universidade brasileira.

INSTAURAÇÃO DO PROCESSO DE BOLONHAEm declaração emitida no ano 2000 pelo Conselho Europeu, em 2010,

a União Europeia deveria transformar-se na sociedade do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo, sendo o Ensino Superior o instrumento principal para levar adiante esse objetivo (MELLO; DIAS, 2011). Para tan-to, a reforma proposta (Processo de Bolonha) está assentada em três pilares: a) competitividade, sinônimo de atratividade a estudantes estrangeiros para as Instituições de Ensino Superior europeias frente a um mercado educacio-nal internacional liderado por Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia; b) adaptação às demandas do mercado de trabalho, ‘enxugando-se’ os currículos tanto na graduação quanto na pós-graduação – sistema de ciclos conhecido

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SIEBIGER, R. H. - DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA270

como LMD 3-2-3, que significa licenciatura, mestrado e doutorado, em anos; e c) mobilidade estudantil, por meio de um sistema de transferência e apro-veitamento de créditos para estudos efetuados em outras IES e outros países (DIAS SOBRINHO, 2009; ERICHSEN, 2007; HORTALE; MORA, 2004).

Como outros dois recursos que compreendem o processo de Bolonha, há a adoção de um sistema de acumulação e transferência de créditos (ECTS

– European Credit Transfer System), que tornaria os currículos comparáveis e compatíveis para fins de reconhecimento de estudos e títulos entre universi-dades e países diferentes, além de um documento intitulado “Suplemento ao Diploma”, que seria um anexo ao histórico criado para ‘traduzir’ aos possíveis empregadores – ou seja, ao mercado de trabalho – as competências adquiridas a partir dos estudos efetuados na universidade. Assim, a ênfase reside antes em atender às demandas do mercado, e em compreender a universidade antes como lócus de formação profissional por excelência.

É, portanto, o aligeiramento da formação profissional em um primeiro ciclo de estudos universitários a principal estratégia para a atratividade e com-petitividade internacional das Instituições de Ensino Superior (IES) europeias. Isso significa tornar essas IES atraentes a estudantes oriundos de outros países, bem como estimular a competição dessas instituições em uma arena regulada pela lógica mercantil de prestação de serviços educacionais comercializáveis. Nas palavras de Dias (2003),

Na medida em que o comércio vira o critério dominante na definição de políticas educacionais [...] a ideia de serviço público é minada profundamente. [...] A definição de políticas educacionais será feita no exterior, será definida não soberanamente pelos governos democraticamente eleitos, mas sim pelo jogo do comércio, restringindo-se ainda mais a soberania dos países em desen-volvimento (p. 829).

Processo de Bolonha recebeu críticas desde seu início de várias entida-des, tanto no que diz respeito à proposta ter sido concebida pelos Ministros da Educação e sem participação da comunidade acadêmica (top-down) como no sentido de mercantilização do espaço acadêmico por meio do estímulo à pri-vatização por meio de ensino pago em instituições públicas (MELLO; DIAS, 2011). Para Mello e Dias, “o deslocamento da noção de ensino e de pesquisa como bem público para bem comercial estaria, assim, a demarcar a nova con-cepção de ‘universidade empresarial’” (2011, p. 420). É, portanto, pautada nos valores de aumento de produtividade e eficiência, oferecendo conteúdos que buscam fornecer competências para a inserção dos estudantes no mercado de trabalho e sendo por este, em última instância, avaliada (idem, 2011).

Vale ressaltar que esse modelo de eficiência universitária tem se tor-nado uma baliza na relação entre Estados-Nação e universidades. Conforme Bianchetti (2011), nos países signatários do Processo de Bolonha, os Estados-Nação têm financiado apenas um período de três anos durante a graduação (o que tem condicionado as universidades a oferecerem suas licenciaturas nesse prazo). Já o mestrado e o doutorado são financiados pelos estudantes.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 271

Para efeitos de atuação profissional, embora os três anos de bacharelado sejam gratuitos, são de pouca utilidade para os discentes, uma vez que, no caso das humanas e sociais, não os habilita suficientemente para o trabalho. Para trabalhar eles precisam concluir a licenciatura ou outra habilitação equivalente que somente pode ser obtida cursando os dois anos que anteriormente comple-tavam a universidade e que agora foram transformados em mestrado profissio-nalizante, custeado pelo aluno. Assim, tem-se uma redução do financiamento do Estado na Educação Superior europeia (BIANCHETTI; MATTOS, 2011).

Segundo a entrevista com o professor Josep Blanch, da Universidade Autônoma de Barcelona (BIANCHETTI, 2010), o Processo de Bolonha tem como um dos principais objetivos superar a heterogeneidade dos planos de estudo. Embora na Europa unificada seja legalmente possível os profissionais de um país trabalharem em outro, as organizações e conselhos profissionais ne-gavam essa possibilidade, uma vez que um currículo obtido em um país “não” era homologável para trabalhar em outro, devido a diferenças na carga horária e no currículo, que variavam de um país para outro dentre um mesmo curso.

Portanto, com o aligeiramento da formação profissional em nível uni-versitário em três anos, que seria referente ao primeiro ciclo da Educação Superior europeia, se estaria procedendo a uma lógica de ensino profissiona-lizante de nível superior. Quais as possibilidades de se pensar espaços para construção de conhecimento, de pesquisa e de formação emancipatória ao se condicionar a Educação Superior ao mercado?

Nas palavras de Dias Sobrinho (2009), esse desafio de se construir de convergências na Educação Superior europeia também tem a premissa de alcançar outros continentes; em especial, a América Latina. Para que isso se torne possível, a premissa é de se “consolidar um modelo convergente que permita a propagação de uma concepção de Educação Superior e a transna-cionalização de suas respectivas estruturas internacionais e seus programas pedagógicos a países de outros continentes menos desenvolvidos” (p. 136).

É a partir desses questionamentos que, ao se propor um modelo de Educação Superior transnacionalizado, e se buscar estabelecer convergências também com a Educação Superior brasileira, que é necessário analisar os dis-cursos subjacentes a essas políticas e às recentes reconfigurações que vêm acontecendo nas universidades brasileiras, principalmente por meio do Reuni, das orientações para criação de Bacharelados Interdisciplinares e da criação de universidades transnacionais, tratados a seguir.

PLANO DE EXPANSÃO E REESTRUTURAÇÃO DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS BRASILEIRAS (REUNI) E BACHARELADOS INTERDISCIPLINARES (BI)Em 2007, o governo federal instituiu, por meio do Decreto 6.096/2007,

o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – Reuni, que tem por objetivo ampliar o acesso e a permanência na Educação

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SIEBIGER, R. H. - DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA272

Superior por meio expansão física, acadêmica e pedagógica da rede federal de Educação Superior. Em seus planos, as universidades tiveram de apresentar também propostas de revisão de sua estrutura acadêmico-curricular por meio da reorganização dos cursos de graduação, implantação de regimes curricula-res e sistemas de títulos que possibilitem a construção de itinerários formati-vos, além da promoção de mobilidade estudantil.

Na proposta do Reuni, não há referência direta ao processo de Bolonha. Porém, no ano de 2010, o Ministério da Educação (MEC) publi-cou documento intitulado “Referenciais Orientadores para os Bacharelados Interdisciplinares e Similares”, propondo a implantação do regime de ciclos na Educação Superior brasileira sob a premissa de ampliar as opções de for-mação no interior das instituições universitárias (BRASIL, 2010). No referido documento, admite-se que as referências para a adoção do regime de ciclos e do BI nas universidades brasileiras inspiram-se “na organização da formação superior proposta por Anísio Teixeira para a concepção da Universidade de Brasília, no início da década de 1960, no Processo de Bolonha e nos colleges estadunidenses” (BRASIL, 2010). Dessa forma, estabelece-se, oficialmente, a influência do processo europeu na reconfiguração da universidade brasileira.

A proposta dos referenciais orientadores de Bacharelados Interdisciplinares se inspira principalmente no projeto denominado ‘Universidade Nova’, em que se defende uma proposta de reestruturação aca-dêmica que contemple uma organização curricular com duração de 6 (seis) se-mestres (2.400 horas-aula) em dois ciclos fundamentais: formação básica (em torno de 600 horas-aula) e formação específica (com carga horária variável). Os referenciais do MEC utilizam essa estrutura, definindo também dois ciclos de formação que atenda à organização das áreas de conhecimento definida pela Capes, CNPq e Finep1, e se inserem no âmbito do Reuni ante a neces-sidade de se apresentar, nos planos das universidades federais, respectivas propostas de construção de itinerários formativos, bem como de mobilidade estudantil.

Wielewicki e Oliveira (2010) apontam que, sob a tônica do estabe-lecimento de condições para o financiamento da Educação Superior, tem-se uma adesão maciça das instituições federais de Educação Superior (IFES) ao Reuni em meio a questionamentos sobre a celeridade, a insuficiência e até mesmo a ausência de debate sobre esse programa no âmbito da comunidade acadêmica. Questionamentos similares, portanto, aos feitos ao Processo de Bolonha. Do mesmo modo, na medida em que o Reuni provê as bases para a construção de um modelo de Educação Superior no setor público, isso poderia implicar mudanças de “arquitetura” do sistema, num alinhamento “casual-mente proposital” com Bolonha (WIELEWICKY; OLIVEIRA, 2010).

1 Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior; CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico; Finep – Financiadora de Estudos e Projetos

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 273

CRIAÇÃO, NO BRASIL, DE UNIVERSIDADES DE PERFIL TRANSNACIONALRecentemente, a Educação Superior brasileira tem presenciado a cria-

ção de universidades com perfil transnacional: a) a Universidade Federal da Integração Latino-Americana

(Unila), por meio da Lei 12.189/2010, tendo como premis-sa, conforme texto da lei, a “atuação nas regiões de fronteira, com vocação para o intercâmbio acadêmico e a cooperação solidária com países integrantes do Mercosul e com os demais países da América Latina” (UNILA, 2011). A Unila atende, em princípio, alunos oriundos do Brasil, Paraguai, Uruguai e Argentina. Atualmente, essa instituição conta com 12 cursos de graduação e 600 alunos.

b) a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), por meio da Lei 12.289/2010, com o objetivo de formar recursos humanos para contribuir com a integração entre o Brasil e os demais países-membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e, as-sim, concretizar a criação de um Espaço de Ensino Superior no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), mediante o princípio de fortalecimento dos víncu-los da lusofonia afro-brasileira. Vale lembrar que essa comu-nidade é integrada, além do Brasil, por Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.

c) a Universidade Federal da Integração Amazônica (Uniam), transformada em Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), por meio da Lei 12.085/2009, busca se constituir numa rede multi-institucional entre os países pertencentes ao Tratado da Cooperação Amazônica: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, sendo um agente de integração pan-amazônica. Sua concepção curricu-lar é modular e flexível. Nesse sentido, a universidade oferece as chamadas diplomações profissionais finais, de caráter in-tegral (entre 2.800 e 4.000 horas-aula) para diversas carreiras, sejam de bacharelado ou licenciatura, bem como as diploma-ções integradas (entre 2.800 e 3.200 horas-aula), que com-preendem estudos menos especializados que os anteriores, porém, com possibilidade de se abranger mais de uma área do conhecimento. Há, também, a opção pelas denominadas certificações alternativas (entre 800 e 2.000 horas-aula), além de várias outras opções de certificação (UNIAM, 2009, p. 27).

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SIEBIGER, R. H. - DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA274

A Unila e a Unilab assemelham-se no que tange à ênfase na equivalên-cia curricular, no reconhecimento mútuo de títulos e diplomas e na mobilidade acadêmica entre os respectivos países contemplados. No que diz respeito à Uniam/Ufopa, além de prever um sistema de três ciclos de formação (ciclo básico de estudos amazônicos, segundo ciclo de graduação profissional e ter-ceiro ciclo em nível de pós-graduação stricto sensu), oferece a possibilidade de várias certificações por etapas, tal como orienta o Reuni.

Essas universidades de perfil transnacional são estruturas recentes, criadas há menos de dois anos (2009-2010), e inclusive após a implementação do Reuni. Em sua organização curricular, a ideia de ciclos tem prevalecido na composição dos currículos bem como na de certificação dos cursos superiores. A exemplo do processo de Bolonha europeu, também preveem-se mecanis-mos semelhantes para questões como mobilidade estudantil, reconhecimento de títulos e diplomas entre os países que compreendem a abrangência da ins-tituição universitária.

Uma vez que essas instituições estão sediadas em território nacional, e que receberão estudantes de outros países, o Brasil torna-se referência e indu-tor de políticas de Educação Superior para outras nações, notadamente como a Europa historicamente tem-se tornado referência para o Brasil. E, ao adotar, em maior ou menor grau, as diretrizes emanadas do Processo de Bolonha na organização de sua Educação Superior, principalmente naquela oferecida nes-sas universidades nacionais, o Brasil torna-se também um veículo de propa-gação dos mecanismos da própria reforma europeia como parâmetro de uma Educação Superior que se propõe mundializada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ante as políticas pontuadas anteriormente, a discussão que se tem em pauta é em que medida as influências do Processo de Bolonha se disseminam nas atuais políticas de Educação Superior brasileira e, enquanto questão, por que as atuais reconfigurações nesse sentido aproximam-se, em determinados aspectos, à reforma europeia.

No que tange ao tema do Processo de Bolonha, é interessante observar que essa discussão passou a constar em periódicos qualificados da área de educação a partir de 2004, com o artigo de Hortale e Mora (2004). Após a publicação desse artigo, houve uma pausa de três anos até o lançamento, em 2007, da edição especial da revista Educação Temática Digital – volume 9, da Universidade Estadual de Campinas, em dezembro daquele ano.

Outra observação se refere ao tipo de tratamento do tema. Até 2007, os artigos publicados por autores brasileiros se ocupavam mais em caracterizar o Processo de Bolonha. Em 2008, surgem, em termos de publicação, a partir do artigo de Lima, Azevedo e Catani (2008), discussões sobre possíveis influên-cias desse processo na Educação Superior brasileira. Em especial, é por conta

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 275

da criação do Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – Reuni que irão se tecer correspondências, em certa medida, entre esses dois movimentos de reforma. E também de 2008 em diante a publicação sobre o Processo de Bolonha se adensa entre os autores brasileiros, constatando-se uma crescente produção de artigos sobre o tema em diferentes perspectivas.

Nesse sentido, o objetivo da presente discussão consistiu em traçar alguns apontamentos no que diz respeito a um processo gradativo e multifa-cetado de entrada dessas tendências europeias de harmonização no âmbito da Educação Superior brasileira, por meio dos enfoques propostos – Reuni/BI e universidades transnacionais – e das principais análises e discussões que vêm sendo publicadas sobre o tema.

Garantir um ambiente de discussão dessa conjuntura em agendas mais abrangentes e pertencentes não apenas à academia, mas também na esfera governamental e na sociedade civil organizada, tem a finalidade última de prevenir que o processo de entrada, no âmbito da Educação Superior brasi-leira, das respectivas tendências europeias, ocorra sem a devida análise e o devido tratamento crítico. Intenta-se, assim, identificar elementos objetivos e subjetivos em tais políticas e seus respectivos espaços de enunciação, para se proceder a uma discussão desveladora de discursos e intencionalidades.

REFERÊNCIAS

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SIEBIGER, R. H. - DOIS ENFOQUES SOBRE O PROCESSO DE BOLONHA276

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DEMOCRATIZAÇÃO E EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Claisy Marinho Marlis Polidori

Nathan Ono

EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

A história da Educação Superior no Brasil esteve marcada por três grandes períodos. A primeira foi a época colonial, de 1808 até a

República (1889), com sua organização primeiramente em cátedras e depois ten-do os cursos isolados (não universitários e com preocupação basicamente profis-sionalizante) foi uma “tendência marcante” que caracterizou o primeiro período.

Uma segunda fase, de 1930 a 1996, com a universidade constituindo--se como centro do Ensino Superior no Brasil, esta se tornou uma figura aca-dêmica administrativa central. Nesse período, a reforma universitária (1968) instituiu a ampliação das funções universitárias para a indissociabilidade en-tre ensino, pesquisa e extensão, criando um complexo sistema organizacional que se caracterizava, de um lado, pelo sistema administrativo (estrutura depar-tamental, matrícula por disciplinas, gestão de racionalidade) e, de outro, pelo sistema acadêmico (desenvolvimento da pós-graduação, cursos cedendo lugar a um todo orgânico – a universidade).

A terceira fase, que adentra o século XXI, é marcada pela influência da internacionalização no sistema de Educação Superior, respondendo a um contexto social que exige uma universidade de massa, com o Ensino Superior sendo visto como canal de ascensão social.

O Brasil deixou de contar com um modelo único de Ensino Superior – a universidade – para também refletir as tensões entre as concepções que en-tendiam a educação ou como um bem público ou como um serviço comercial (DIAS SOBRINHO, 2002). Neste sentido foi instituído, no país, um sistema de Educação Superior, complexo e expandido.

Esta fase de modernização estende-se até meados de 1990, caracteri-zada pela expansão do número e tamanho das instituições, a privatização do setor, a interiorização de novas instituições e a diversificação da comunidade acadêmica e de cursos, inclusive com a legitimação de cursos noturnos e em períodos especiais, como os cursos de férias para docente da Educação Básica.

O sistema de Educação Superior no Brasil tem seu marco legal na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (BRASIL, 1996), que de-fine objetivos, prioridades e condições para a política educacional brasileira, da Educação Básica à Educação Superior.

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278 POLIDORI, C. M. M. et al. - DEMOCRATIZAÇÃO E EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO

Em 2006, o Decreto nº 5.773 (BRASIL, 2006) classificou as Instituições de Educação Superior (IES) em Faculdades, Centros Universitários e Universidades, demarcando sua regulação, supervisão e avaliação. Esse mes-mo Decreto estabeleceu a legislação atual sobre o Sistema Federal de Ensino Superior, composto por instituições federais de Educação Superior (IFES), IES criadas e mantidas pela iniciativa privada e órgãos federais de Educação Superior.

De acordo com o Censo da Educação Superior que se refere aos núme-ros do ano de 2009 (MEC/INEP, 2010), o país tem hoje 2.314 IES. De 2007 para 2008 ocorreu um decréscimo no número de IES (de 2.281 para 2.252) possivelmente por uma tendência recorrente de integração de instituições, por fusão ou compra. No entanto, no ano de 2009 demonstrou novamente um au-mento devido à necessidade de expansão que o país apresenta.

Em relação aos cursos de graduação, houve um acréscimo de 13% em relação ao ano de 2008, representando um total de 3.108 novos cursos nas IES brasileiras. Embora as Faculdades sejam o tipo de IES com maior número no país, são as universidades que oferecem a maior quantidade de cursos: 49,8% do total dos cursos.

A diversidade dessa oferta se expressa em relação (a) à dependência administrativa: IES públicas e privadas que oferecem cursos de graduação presencial e a distância, com a maioria de instituições de caráter privado1 – 89% de instituições privadas (2.032) e 11% de instituições públicas (249), estas divididas entre federais (4,6%), estaduais (3,6%) e municipais (2,7%); (b) à localização geográfica: grande concentração nas regiões sudeste (1.095) e sul (375); (c) à organização acadêmica: universidades (8% das IES), facul-dades (com predomínio de cerca de 2.000 estabelecimentos, correspondente a 86,7% das IES e centros universitários (equivalendo a 5,3% das IES) (MEC/INEP, 2009).

A Educação Superior no Brasil apresenta um total de 5.954.021 de alunos matriculados em 2009 apresentando uma diferença de 873.965 em re-lação ao ano de 2008 e de 199.675 em relação a 2007. As IES agregam, ain-da, 317.041 funções docentes e 288.442 funcionários em exercício, tanto em cursos presenciais quanto a distância – ou seja, um expressivo contingente de atores educativos.

Sem dúvida, o sistema de Ensino Superior do Brasil vem expandindo--se, e o país precisa desse processo de expansão, tendo em vista o imperativo de incremento à formação de sua população2. No entanto, as vagas oferta-

1 As instituições privadas podem ser sem fins lucrativos, como é o caso das instituições comunitárias, confessionais e filantrópicas, e com fins lucrativos (particulares). 2 Nos países da OCDE, a porcentagem de jovens entre 18 e 24 anos que freqüentam o Ensino Superior é, em média, de 30%. No Japão (90%), na Bélgica (80%), na França (79%), em Portugal (66%), na República Checa (63%), na Hungria (62%), na Suécia (61%), na Coreia do Sul (60%), na Grécia (56%) e na Nova Zelândia (50%) (OCDE, 2007). No Brasil, o índice encontra-se ao redor de 14%.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 279

das para a Educação Superior não são totalmente preenchidas: sobram cer-ca de 40% dessas vagas, considerando todos os estados do país (MEC/INEP, 2007). Vários fatores parecem explicar a existência desse grande número de vagas ociosas, não obstante a baixa taxa de escolarização líquida (12,1%) na Educação Superior. Por um lado, tais vagas encontram-se, quase totalmen-te, em IES privadas e pagas, indicando possível dificuldade, por parte dos estudantes, em arcar com os custos das mensalidades. Com a crescente de-mocratização da Educação Básica, muitos jovens provenientes das baixas ca-madas socioeconômicas começam a chegar à Educação Superior; como as universidades públicas e gratuitas oferecem vagas em número insuficiente para atender a essa demanda, resta-lhes a alternativa do Ensino Superior pago. Com objetivo de atrair a população excedente das universidades públicas, e possivelmente para espantar a instalação de instituições concorrentes, o setor privado tende a oferecer vagas em grandes quantidades, muitas vezes acima da previsão de preenchimento.

Entretanto, o atual contexto da Educação Superior no país – expansão da oferta e aumento de matrículas contrapondo com uma cobertura de matrí-culas ainda muito aquém do necessário, vagas ociosas e aumento de inadim-plência – mostra que, atrelada à expansão e modernização do Ensino Superior, a oferta não vem garantindo o compromisso com uma qualidade acadêmica necessária à formação competente e comprometida socialmente.

A partir da década de 1990, houve um predomínio internacional da concepção de Educação Superior de caráter neoliberal, com sua gênese nas orientações advindas de documentos do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que apregoavam uma universidade voltada para o merca-do, eficiente e racional (BANCO MUNDIAL, 1995).

Nessa concepção, o modelo de universidade baseado na indissocia-bilidade entre ensino, pesquisa e extensão apresentar-se-ia muito oneroso para o estado, especialmente em países em desenvolvimento, inviabilizan-do sua manutenção a médio e longo prazo (CATANI & OLIVEIRA, 2000; SGUISSARDI & AMARAL, 2000; SILVA & SGUISSARDI, 2001). A orien-tação vigente era pela criação de instituições com o foco no ensino.

O Brasil aderiu fortemente a essa concepção, especialmente duran-te os oito anos do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, com Paulo Renato de Souza como ministro da Educação, quando foi notória a in-fluência de organismos internacionais neoliberais no Ensino Superior do país, em diversos aspectos: desde as orientações para o desenvolvimento de IES eficientes, empreendedoras e sustentáveis até a sugestão para constituição de uma instituição universitária de caráter transnacional.

Em contraponto, a história recente da Educação Superior nacional re-gistra uma forte resistência, organizada por movimentos da sociedade civil e por parte da comunidade acadêmica, aos modelos e propostas lançados à épo-ca por aquele governo. As principais críticas às políticas neoliberais gover-

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namentais recaíam para a ênfase na privatização da Educação Superior e na vinculação da autonomia ao desempenho; tais ações eram validadas por meio de processos avaliativos sustentados em uma concepção controladora de ava-liação, na qual critérios quantitativos balizariam a distribuição e a gestão de recursos, atrelados à divulgação de informações à sociedade sobre eficiência e produtividade das IES (CATANI & OLIVEIRA 2000; DIAS SOBRINHO, 2002; SGUISSARDI, 2008, 2006a, 2006b; SGUISSARDI, V.& SILVA Jr, J. R. 2005b; SGUISSARDI; GOERGEN; DIAS SOBRINHO; PINO; PIOZZI; OLIVEIRA & CAMARGO, 2004).

Nessa perspectiva, algumas legislações (Decreto 2026/963; Portaria 249/964; Decreto 3860/015, dentre outras) foram criadas para sustentar as po-líticas implantadas, propondo vários instrumentos avaliativos com o intuito de verificar a qualidade do Ensino Superior oferecido no país.

Estes instrumentos caracterizaram-se como o Exame Nacional de Cursos (ENC); o processo de Avaliação das Condições de Oferta (ACO), que depois passou a ser chamado de Avaliação das Condições de Ensino (ACE); o processo de avaliação das IES para credenciamento e recredenciamento, no caso de instituições privadas. No entanto, somente o Exame Nacional de Cursos, que ficou conhecido como Provão6, foi o instrumento utilizado para base de estruturação de políticas educativas. Os demais foram sendo desen-volvidos pontualmente, sobretudo para atender a legislação referente a autori-zação, reconhecimento, renovação de reconhecimento de cursos de graduação e credenciamento e recredenciamento de IES.

Inúmeras críticas, tanto de estudantes quanto de professores, inte-lectuais e representantes de diversos órgãos e associações, foram dirigidas ao Provão nos anos subsequentes, canalizando a resistência às políticas de Educação Superior que disseminavam processos avaliativos com caráter pu-nitivo, padronizado, classificatório e, por vezes, com ênfase na discrimina-ção e na exclusão (PACHECO & RISTOFF, 2004; POLIDORI, MARINHO-ARAUJO & BARREYRO, 2006; RISTOFF, 2003; SGUISSARDI, 2005).

Se, por um lado, o Provão constituiu-se em um dos modelos de maior visibilidade nacional sobre a avaliação das IES, por outro, deflagrou uma cul-tura de julgamentos da qualidade do ensino com base no ranqueamento, na concorrência, no ajuste aos mecanismos do mercado, no aumento da priva-tização, na expressão de uma política controladora exercida por um “Estado

3 Estabelece procedimentos para o processo de avaliação dos cursos e instituições de Ensino Superior.4 Regulamenta o Exame Nacional de Cursos (Provão).5 Dispõe sobre a organização do Ensino Superior, a avaliação de cursos e instituições, e dá outras provi-dências.6 A palavra Provão surgiu da União Nacional de Estudantes (UNE) que lançou essa expressão para se opor ao ENC na tentativa de desqualificá-lo; entretanto, o MEC utilizou-a positivamente, popularizando o Exame (POLIDORI, 2000).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 281

Avaliador”. A partir, portanto, da implantação do Provão, consolidou-se a am-pliação do poder regulador do Estado, por meio de procedimentos de controle das atividades relacionadas ao Ensino Superior, especialmente com a utiliza-ção de modelos avaliativos com ênfase em produtos e resultados.

Além do aliado mercadológico, a função reguladora da avaliação ob-teve, com a atuação da mídia, importante expansão, especialmente pela agi-lidade na divulgação dos resultados do Provão, favorecendo uma equivocada publicização de “notas” de cursos e universidades como deslocamentos das notas obtidas pelos alunos nos resultados do Provão (BARREYRO, 2004).

Em 2003, Luis Inácio Lula da Silva assumiu a presidência do país e destacou, como um dos pontos do programa de governo popular, a ênfase a uma política para a Educação Superior, com relevância para a questão da ava-liação, considerada um dos elementos propiciadores da qualidade e autonomia universitária.

Para efetivar a concretização de tais metas, o MEC institucionalizou o Sistema Nacional de Educaçao Superior , o Sinaes que organiza a avaliação da Educação Superior através da Lei nº 10.861/04, levando em conta a dimensão formativa e a dimensão de regulação.

A Lei nº 10.861/04 (MEC, 2004b) define como objetivo do Sinaes assegurar o processo nacional de avaliação das instituições de Educação Superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus es-tudantes, combinando, sob o princípio da globalidade, diversos instrumentos, tanto de informação quanto de avaliação. Esses instrumentos, considerados de forma integrada, constituem mecanismos que garantiriam a exequibilidade do desenvolvimento do sistema e a criação de um novo fluxo para a avaliação da Educação Superior no país. São eles: Avaliação dos Cursos de Graduação (ACG), Exame Nacional de Avaliação de Desempenho dos Estudantes (Enade) e Avaliação Institucional (Autoavaliação e Avaliação Externa).

Entretanto, o novo paradigma instalado pelo Sinaes implicou desafios já a partir de uma implementação fiel à proposta original (BERTOLIN, 2004; DIAS SOBRINHO, 2008b; DIAS SOBRINHO & BRITO, 2008; LEITE, 2008; POLIDORI, MARINHO-ARAUJO & BARREYRO, 2006).

Mais recentemente, a Portaria Normativa n° 12, de 05 de setembro de 2008, criou o Índice Geral de Cursos (ICG) “que consolida informações rela-tivas aos cursos superiores constantes dos cadastros, censo e avaliações ofi-ciais disponíveis no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP) e na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)” (MEC, 2008). Esse índice, além dos dados da Capes, está baseado na média ponderada dos Conceitos Preliminares de Cursos (CPC), estabeleci-dos pela Portaria Normativa n° 4, de 5 de agosto de 2008, que privilegiam os resultados do exame Enade em detrimento dos demais dados resultantes das outras dimensões avaliativas do Sinaes (BARREYRO, 2008).

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282 POLIDORI, C. M. M. et al. - DEMOCRATIZAÇÃO E EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO

Tais índices vêm sendo fortemente criticados por diversas associações, fóruns e entidades civis e acadêmicas, sob argumentos que contestam a vali-dade técnica e a coerência ideológica de tais medidas, bem como denunciam a ausência de processos de discussão no âmbito da comunidade educacional do país, e dos princípios básicos da avaliação da Educação Superior em vigor na Lei 10.861/04. As críticas atrelam o surgimento desses índices a uma ten-tativa de renovar práticas de listagem/ranking das instituições de Educação Superior, visando exclusivamente a interesses mercadológicos, em que se sobressai o acirramento da competição e da mercadorização da Educação Superior (BARREYRO, 2008; BERTOLIN, 2004; DIAS SOBRINHO, 2008b; DIAS SOBRINHO & BRITO, 2008; LEITE, 2008; POLIDORI, MARINHO-ARAUJO & BARREYRO, 2006).

Para além do tema da avaliação, outras importantes transformações na Educação Superior tiveram lugar recentemente no Brasil: em uma dimensão pedagógica, a promulgação das Diretrizes Curriculares Nacionais para os cur-sos de graduação no país; em uma dimensão política, a implementação de pro-gramas e projetos de financiamento enquanto estratégias à exequibilidade das metas de democratização do acesso e da permanência na Educação Superior

Com o intuito de garantir metas definidas no Plano Nacional de Educação (PNE), a Lei 10.172/2001 (MEC, 2001) decretou que até 2011 o país deveria atingir o percentual de 30% dos jovens, entre 18 e 24 anos, ma-triculados no Ensino Superior7.

Programas de financiamento têm sido implementados enquanto es-tratégias políticas à exequibilidade das metas do PNE: Políticas de Ações Afirmativas, Universidade para Todos (ProUni), Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) e Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) são alguns deles (MEC, 2007, 2005, 2001).

O ProUni, instituído pela Lei 11.096, de 13 de janeiro de 2005, des-tina-se à concessão de bolsas de estudo integrais e parciais (50% ou 25%), para estudantes de baixa renda de cursos de graduação ou sequenciais de for-mação específica, em instituições privadas de Ensino Superior, com ou sem fins lucrativos, que tenham aderido a esse Programa nos termos da legislação aplicável, constituindo-se, assim, em mais um caminho de democratização do acesso à Educação Superior.

O Reuni, instituído em 2007 pelo Decreto 6.096, tem o objetivo de criar condições para a ampliação do acesso e permanência na Educação Superior, no nível de graduação, por meio do melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades públicas federais. Dentre as metas desse programa estão: o aumento gradual da taxa de conclusão (re-lação entre o número de ingressantes e o número de concluintes) dos cursos

7 Atualmente, o percentual é ao redor de 14%.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 283

de graduação presenciais dos atuais 37% para 90%, além de reduzir a relação aluno/professor em cursos presenciais para 18 ao final de 5 anos, a contar do início de cada plano de reestruturação, os quais deverão ser elaborados pelas próprias universidades, tendo como limitadora a capacidade orçamentária e operacional do Ministério da Educação (MOROSINI, 2006).

Tais políticas merecerem uma análise crítica, especialmente quanto à sua real implementação, que, para muitos, já se mostra pouco factível: “a expansão criou uma ilusão quanto às possibilidades futuras desse ramo do sis-tema educacional brasileiro, o que motivou a construção de metas inexequí-veis” (GIOLO, 2006, p. 20). Para Catani, Rey & Giolili (2006), o ProUni tem funcionado como estímulo à expansão das universidades privadas, e as facili-dades de acesso não têm garantido a permanência do estudante na Educação Superior. Dias Sobrinho e Brito (2008) acreditam que para viabilizar uma democratização de fato da Educação Superior brasileira são necessárias, além de políticas efetivas de acesso que beneficiem os grupos tradicionalmente ex-cluídos, como o ProUni, também medidas que sustentem dignamente a per-manência dos estudantes na universidade.

O alerta para o acompanhamento crítico da implementação das recen-tes políticas públicas na Educação Superior no Brasil é um oportuno aspecto a ser agregado ao estudo do impacto de tais conjunturas sociopolíticas, e sua influência na aprendizagem e no desenvolvimento dos estudantes dessa mo-dalidade de ensino.

REFERÊNCIAS

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284 POLIDORI, C. M. M. et al. - DEMOCRATIZAÇÃO E EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO

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UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR: UMA REALIDADE NO

BRASIL E UMA NA ALEMANHA1

Márcia Lenir Gerhardt

A formação do professor envolve bem mais do que uma busca pelo professor ideal. Não há receitas para ser um bom professor ou

uma boa professora, há inúmeras possibilidades de ser docente. É uma cons-trução que não se faz sozinha. As relações intersubjetivas são fundamentais para a formação do professor, sendo essa, portanto, uma ação compartilhada com pares e grupos diversos. Cabe à instituição formadora, sim, um papel fun-damental, com clareza de pressupostos que precisam ser colocados em ação.

Analisar a forma como a arte é ensinada e aprendida é um dos fato-res para formar professores nessa área do conhecimento, capazes de atuar no contexto contemporâneo e globalizado. A formação dos professores é pautada pelas transformações exigidas por cada época.

Para Tardif (2002), a formação inicial visa habituar os alunos, futuros professores, à prática profissional dos professores de profissão e fazer deles práticos reflexivos. Para Pimenta (2002) as teorias tradicionais de formação de professores estão sendo colocadas em discussão, porque os cursos de for-mação de professores, ao desenvolverem um currículo formal, têm contribuí-do de forma insatisfatória na criação de uma nova identidade do profissional docente.

Compreende-se que poderá ser através das práticas que surgirá um novo paradigma educacional em que a estética e a sensibilidade façam parte dessa construção, pois a formação do professor se inicia antes da formação acadêmica e continua por toda a sua vida profissional.

Despertar no estudante, o futuro professor, desde o início de sua for-mação, o interesse de buscar e pesquisar a realidade escolar e, assim, cons-cientemente desenvolver a construção do conhecimento na sua área, é uma das possibilidades de diminuir o vão existente entre a teoria e a prática.

O texto apresenta a pesquisa de doutorado desenvolvida na Unisinos que teve como palco a UFSM no Brasil e a Uni-Siegen na Alemanha, a qual objetivou compreender como estão sendo produzidas as concepções de arte/educação e as práticas docentes na formação inicial do professor de Artes Visuais, na Universidade Federal de Santa Maria/UFSM e na Universidade

1 O texto foi escrito a partir da tese de doutorado intitulada A FORMAÇÃO DO EDUCADOR DE ARTES VISUAIS: UM ESTUDO COM FORMADORES E PROFESSORES EM FORMAÇÃO – UM DIÁLOGO ENTRE BRASIL E ALEMANHA, realizado na Universidade do Vale do Rio dos Sinos/Unisinos/RS/Brasil, orientado pela Professora Drª Mari Margarete dos Santos Forster.

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GERHARDT, M. L. - UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR286

de Siegen/Uni-Siegen/Alemanha; e possibilitou o entendimento de como a formação inicial de professores vem acontecendo na Uni-Siegen, nas pers-pectivas atuais e em paralelo às discussões presentes sobre o Processo de Bolonha2, e na UFSM.

Problematizou-se o tema buscando responder quais as bases sustenta-doras da formação inicial de professores dos cursos de Licenciatura em Artes Visuais da UFSM e da Uni-Siegen e como repercutem na prática docente.

As fontes de informações foram o diário de campo, a análise docu-mental, a observação participante o questionário discursivo, os sites das uni-versidades3, em que se encontram disponíveis os Processos Legais dos cursos, bem como os esclarecimentos de professores, alunos, secretárias das insti-tuições investigadas e dos profissionais do INEDD (International Education Doctorate Programme/Programa Internacional de Doutorado em Educação), este na Alemanha.

Os interlocutores convidados para fazer parte da construção da inves-tigação foram docentes e discentes do Curso de Artes Visuais – Licenciatura em Desenho e Plástica de Santa Maria/RS/Brasil, bem como de Siegen/Alemanha; os últimos, por sua vez, vivenciavam o Processo de Bolonha du-rante a sua formação.

No Brasil, foram ouvidos dois docentes e dois discentes do Curso de Artes Visuais – Licenciatura em Desenho e Plástica da UFSM. Esse cur-so possui uma estrutura curricular que prepara o futuro professor a atuar na Educação Básica4e é por esse motivo que elegeu-se somente dois docentes e dois discentes.

A Alemanha apresenta suas especificidades na estruturação da Educação Básica, sendo assim, o curso de Licenciatura em Artes Visuais apresenta um currículo para cada tipo de escola. Foram entrevistados qua-tro docentes e oito discentes na Uni-Siegen. Os alunos e professores eram da Licenciatura para o GHR (Grundschule – Escola primária; Hauptschule

2 Declaração conjunta dos ministros da Educação europeus, assinada em Bolonha em 19 de junho de 1999, define a criação do Espaço Europeu do Ensino Superior. Estabelece um conjunto de objetivos a serem concretizados até 2010. Maiores informações poderão ser encontradas nos sites: www.bologna.h-da.de/projekt; www.wbv.de; http://www.universia.com.br/materia/materia.jsp?materia=11888; http://www.mat.uc.pt/~jfqueiro/Bolonha-formacao-de-professores.html; http://www.allesgelingt.de/erfolgreich_studieren/was_ist_hauptstudium.html; http://alemania-hoy.com/dw/article/0,2144,3583126,00.html. PACHECO, José Augusto. Políticas educativas para o Ensino Superior na União Europeia: um olhar do lado português. Educ. Soc., Campinas, v. 24, n. 82, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302003000100002&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10.Abr.2007, BECHTOLD, Gregor & HELFERICH, Pia Sue. Generation Bologna: neue herausforderungen am übergang achule – ho-chschule. Wbv: Darmstadt, 2008.3 http://www.kunst.uni-siegen.de/; www.ufsm.br4 TÍTULO V: Dos Níveis e das Modalidades de Educação e Ensino. CAPÍTULO I: Da Composição dos Níveis Escolares. Art. 21º A educação escolar compõe-se de: I – educação básica, formada pela Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio (ftp://ftp.fnde.gov.br/web/siope_web/lei_n9394_20121996.pdf).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 287

– Educação Básica e Realschule – Escola Real); GYM (Gymnasien – Ensino Fundamental do 6º ao 9º ano (Ginásio) e Gesamtschulen – Escola Global ou de Integração). Os professores, tanto da UFSM quanto da Uni-Siegen, per-tenciam aos eixos: Formação em Arte, da Formação do Ensino da Arte e da Formação Pedagógica.

Pelo fato de a pesquisa ter acontecido em dois ambientes distintos, houve a preocupação com o significado, com as particularidades específicas das pessoas e dos ambientes envolvidos.

Na universidade de Siegen/Uni-Siegen, as observações foram reali-zadas em seu ambiente natural de trabalho e formação durante 90 dias, nos períodos da manhã, tarde e algumas no período noturno, entre o final do ano de 2008 e início de 2009. Na UFSM, a observação foi realizada durante o primeiro semestre de 2009, também em seu ambiente natural de formação.

Por ter sido uma pesquisa que buscou discutir, dialogar, identificar diferentes realidades na percepção dos seus sujeitos, a abordagem que melhor se identificou foi a do enfoque qualitativo do tipo etnográfico.

Breves conclusões do estudo realizadoOs currículos dos cursos investigados apresentam três eixos centrais:

formação em arte, formação no ensino da arte, formação pedagógica. Nesse prisma, visam a formação de um professor que saiba ser professor e saiba a respeito das diferentes linguagens artísticas (das Artes Visuais), bem como articulá-las no trabalho com seus diferentes públicos, isto é, o exercício do conhecimento educacional e da práxis artística.

A formação do professor de Artes Visuais e as concepções dos sujeitos envolvidos, da UFSM e da Uni-Siegen, estão vinculadas aos respectivos con-textos culturais, à formação pessoal e ao sistema educacional. Logo, discutir as diferentes experiências, de locais, países diferentes, significa compreendê-

-las em seu contexto. Definir por antecipação concepções de arte no cenário investigado,

bem como em qualquer outro, é correr o risco de equivocar-se, pois há várias formas de se ver a arte, percebê-la, vivenciá-la, contextualizá-la; portanto, di-ferentes concepções de arte são construídas pelos sujeitos, resultantes de sua trajetória pessoal e acadêmica.

Percebeu-se preocupação com a visão estética da arte, como possi-bilidade de sensibilidade do futuro professor para o exercício da docência. Os currículos ocupam espaço privilegiado nessa direção, talvez nem sempre compreendido pelos discentes como formador para a docência.

Destacou-se também o desenvolvimento de uma cultura de colabo-ração entre escola e universidade. Busca-se construir não somente o ensinar, mas o aprendizado constante em diferentes contextos. A tentativa de aproxi-mar escola e universidade, teoria-prática e as dificuldades enfrentadas para tal foram expostas pelos sujeitos envolvidos.

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GERHARDT, M. L. - UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR288

A discussão do conhecimento e concepções construídas no momen-to da prática de ensino com os alunos, na universidade e nas escolas, apon-tou que a construção do conhecimento se dá na direção do diálogo professor/aluno/professor, sendo que, neste, a percepção das dificuldades vividas pelos estudantes em sua prática de ensino os fez refletir, individualmente e com o grupo, na importância do saber pedagógico para ser professor, além dos co-nhecimentos específicos em Artes Visuais.

Compreendeu-se que as concepções nem sempre estão e são traduzi-das em novas práticas. Acredita-se que poderá ser com essa tradução que po-derá surgir um novo paradigma educacional em que a estética e a sensibilidade façam parte dessa construção, mais humana, pois a formação do professor se inicia antes da formação acadêmica e continua por toda a sua vida profissional.

O conhecimento para ser professor de Arte e o conhecimento de Arte são diferentes e se complementam, logo não são dicotômicos. Por várias ra-zões, algumas identificadas nos cursos observados, nem sempre isso fica claro para alunos e professores.

Os professores formadores têm maior clareza sobre suas concepções de arte, educação, formação, docência, o que seria esperado, do que os pró-prios alunos, uma vez que estão em processo de formação.

A concepção de prática é percebida e inserida na organização curri-cular e no cotidiano dos cursos de forma que essa é pensada criticamente e amparada teoricamente, buscando a contextualização do atual com o ontem, visando melhorar a do amanhã. Os estudantes têm a possibilidade de realizar os estágios extracurriculares e estabelecer suas relações entre a teoria e a re-alidade da escola.

O tempo de exercício prático para a docência é sentido como reduzido pelos discentes, o que tem dificultado suas ações em sala de aula. As práticas de ensino, realizadas pelos discentes nas escolas, constituíram um momento de socialização para conhecer e reconhecer a escola com outro olhar, não mais de aluno, e sim de professor. A análise feita pelos estudantes, durante a prática de ensino mostrou, como fator essencial para o futuro professor, o conhecimento dos aspectos referentes às condições da profissão docente além do conhecimento, da cultura profissional, da autonomia, das implicações, dos compromissos, das reivindicações da carreira docente.

Por fim, somos o resultado de um ontem que prepara um amanhã. Nesse processo, construímos nossas concepções amparadas em nossa própria história, como foi perceptível nos dois ambientes investigados. Somos inaca-bados por natureza e nos constituímos no cotidiano e, da mesma forma, nossas concepções, ideias, fatos, conhecimento.

Vivenciar a arte, estudá-la por meio do fazer e do apreciar foram for-mas apresentadas pelos envolvidos em uma educação sensível e estética. Esse tipo de educação proporciona ao professor e ao futuro professor um entendi-mento maior do seu espaço e de seu público. Isso não acontece sempre, nem

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 289

com todos, pois cada um tem seu tempo próprio para compreender e relacio-nar a sensibilidade, a aisthesis no seu fazer aula, no seu ser professor.

O ser humano é um ser capaz de aprender com alegria e esperança, confiando que a mudança é possível. Aprender é uma descoberta criadora, com abertura ao risco e à aventura do ser, pois ensinando se aprende e apren-dendo se ensina (FREIRE, 1998).

Humanizamo-nos na prática social da qual fazemos parte, e esse pro-cesso se denomina educação, formada por teoria e prática. É essa possibili-dade de relacionar teoria e prática que reside na educação e a torna um ato criador. Frente a isso, a discussão em torno da questão da formação de profes-sores está relacionada com o contexto social, cultural e político-econômico da sociedade contemporânea.

REFERÊNCIAS

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários para a prática educativa. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1998. PIMENTA, Selma Garrido (org.). Saberes pedagógicos e atividade docente. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002.TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

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EIXO TEMÁTICO IV FORMAÇÃO DE PROFESSORES

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QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL E DO ENSINO MÉDIO

Cecília Luiza BroiloCleoni Barboza Fernandes

E ste estudo tem como objeto de análise uma discussão da “qua-lidade do ensino em cursos de formação inicial para os anos fi-

nais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio”. Integra-se aos diferentes movimentos relacionados aos estudos dos projetos interinstitucionais ligados às licenciaturas dos Anos Finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio e à Resolução CNE/CP 2 de 19 de fevereiro de 2002, apresentando possibilidades e limites das reconfigurações de projetos pedagógicos (período 2003/2005) e do projeto atual “Movimentos de configuração curricular de cursos de licen-ciatura: dilemas e desafios nos processos formativos da formação inicial de professores”.

Observa-se que com o processo da implantação dessa resolução surge a necessidade de uma maior compreensão dos conceitos referentes à prática e à dimensão do trabalho como mediação, tanto no plano intelectual quanto no plano da profissionalização docente, assim como o significado da inserção dos estudantes no campo profissional desde o início do curso. Este estudo contempla, ainda, a possibilidade de integrar-se aos projetos desenvolvidos pelo Observatório de Educação no RS, com apoio do INEP/Capes (2006) vinculando-se à RIES (Rede Sulbrasileira de Investigadores de Educação Superior), Núcleo de excelência em Ciência, Tecnologia & Inovação em Educação – CNPq/FAPERGS.

É pertinente destacar que esta pesquisa caracteriza-se por um estudo desenvolvido em um território de formação docente, tendo como sujeitos coordenadores de curso e professores da formação específica e da forma-ção pedagógica dos cursos de licenciatura em Biologia, Física, História, Letras, Matemática e Química, visando perceber os impactos que podem estar refletindo na qualidade do trabalho acadêmico e a inserção de concei-tos/concepções que as políticas públicas propõem nos diferentes contextos no campo da Educação Superior, especialmente no campo da formação de professores.

Para tratar das questões de fundo teórico e epistemológico, este es-tudo centra-se no princípio emancipatório e de solidariedade, um desafio a ser enfrentado proposto por Sousa Santos (1987, 2000) e complementado por Santiago (1999). No aspecto referente à qualidade da pedagogia universitária, enfoca-se aqui o estudo de Morosini (2001, 2003) e Fernandes (2005). Já a

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294 BROILO, C. L. et al. - QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL

pesquisa de caráter qualitativo e quantitativo apoiada em André (1995) cola-borará para a efetiva busca dos indicadores de qualidade de formação.

Devido às sucessivas reformulações do currículo do curso de Pedagogia ocorridas nos últimos anos, se faz necessário pesquisar a formação de profes-sores, tanto no que diz respeito à formação inicial de professores, que envolve a infância, as séries iniciais e a Educação de Jovens e Adultos (EJA), quanto à atuação desse profissional nos espaços de gestão e de supervisão de processos educativos. Outro aspecto a destacar refere-se a nossa atuação na assessoria pedagógica da universidade, que nos possibilita a compreensão do campo da Pedagogia Universitária, entendendo as rupturas possíveis com o paradigma dominante proposto por Sousa Santos (1987) e o entendimento das territoria-lidades em movimento físico e epistemológico na visão de Fernandes (1999).

As discussões realizadas nos eventos organizados pela RIES, Núcleo de excelência em Ciência, Tecnologia & Inovação em Educação, criada em (1998), também têm possibilitado uma caminhada coletiva que nos desafia enquanto grupo de professoras-investigadoras envolvidas com a pedagogia universitária e a formação de professores. Através do Edital nº. 001/2006/INEP/Capes (agosto de 2006) foi criado o Observatório de Educação no RS, com o objetivo de investigar os Indicadores de Qualidade para a Educação Superior Brasileira. Envolvidos nesse processo, desenvolvemos esta pesquisa, que constitui-se como um estudo de abordagem qualitativa e quantitativa. Ela envolve o território de formação docente, visando perceber os impactos que podem estar refletindo na qualidade da formação acadêmica e na identidade profissional de curso de formação de professores.

Cabe destacar que as universidades brasileiras têm demonstrado, por meio do movimento de implantação do planejamento estratégico e/ou pelos resultados estabelecidos pelo Exame Nacional de Curso, implantado em 1996, uma preocupação com a qualidade do Ensino Superior, principalmente com a graduação, nível que revela a importância da preparação política, científica e pedagógica dos docentes. Sobre isso, Isaia (2003, 2006) apresenta uma série de desafios que os docentes universitários enfrentam para uma docência de qualidade, o que fica ainda mais evidenciado e com possíveis caminhos de solução em Isaia e Bolzan (2008, 2009a).

Para Leite et al. (1998), as universidades que iniciaram seus progra-mas de avaliação no início dos anos 1990 estão hoje enfrentando os desafios da melhoria na qualidade ou de solução para os problemas detectados, desta-cando problemas referentes à qualificação acadêmica e didática dos docentes universitários e demais níveis de ensino. Isso ocorre pela ampliação do número de entrada de novos professores (substituições e admissões) resultantes das apo-sentadorias e dos processos avaliativos que têm mostrado a falta de didática do docente, apontada pelos estudantes e pelos próprios professores. Seguem nessa mesma linha de discussão as informações obtidas no estudo sobre concepções de pedagogia realizado pela Universidade do Minho. De acordo com Vieira (2002),

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 295

os fatores que têm servido como pressão externa são: a avaliação e o financia-mento das universidades; o processo de acreditação dos cursos de formação de professores pelo Instituto Nacional de Acreditação da Formação de Professores (INAFOP); as orientações da Declaração de Bolonha; e a necessidade de encarar os problemas resultantes das práticas convencionais e inadequadas da formação.

Aceitando que a formação dos professores pode concorrer para uma melhor preparação dos estudantes em face desses desafios, este estudo centra-

-se numa questão fundamental: a qualidade do ensino do Curso de Formação de Professores. Essa qualidade define-se, principalmente, pelo potencial da ação pedagógica que ocorre na transformação dos sujeitos e dos contextos de sua atuação. Acredita-se que uma pedagogia transformadora pode ser concre-tizada por meio de atitudes emancipatórias que exigem conhecimentos acadê-micos e competências técnicas e sociais que configurem um saber fazer que extrapole os processos de reprodução. Sousa Santos (2000) afirma que sua característica é de “não ser indiferente à diferença” (p. 30). Isso significa que a competência do docente se mostra justamente no agir de forma diferenciada em cada situação, com base na leitura da cultura e das condições de produção do conhecimento que se estabelece entre o professor e seus estudantes.

Investir no processo da interdisciplinaridade, que de acordo com Machado (2001) não pode colocar-se como um discurso demagógico ou como uma receita mágica para superar a fragmentação do conhecimento ou estru-tura dos departamentos acadêmicos, é necessário para qualificar a prática do-cente. É importante ressaltar que uma concepção de interdisciplinaridade é mais do que um simples atravessamento dos limites departamentais da univer-sidade e das fronteiras que estabelecem os territórios de cada disciplina ou de programas de aprendizagens. Ao mesmo tempo em que transpõe tais limites, a interdisciplinaridade institui a solidariedade como um elo interdisciplinar e de interpráticas de trabalho desenvolvido por professores e por estudantes.

Algumas universidades têm realizado mudanças em suas estruturas, organizando-se administrativamente em cursos, extinguindo seus departa-mentos e transformando as unidades de ensino, pesquisa e extensão em dife-rentes centros ou, ainda, extinguindo esses centros. Isso tem provocado, entre o corpo de professores universitários, uma urgente necessidade de realizar um maior exercício epistemológico interdisciplinar. Colocam, ainda, o desafio de construir outra universidade, que passa pelo compromisso de sonhar outra sociedade (FERNANDES, 1999).

Nessa lógica, o professor caracteriza-se por ser participante ativo na aprendizagem do estudante, parceiro de seus colegas de curso e comprometido com os rumos da universidade. Sua função é também estabelecer uma relação dialógica com o estudante, estimulando-o a aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a ser e aprender a conviver. Nessa perspectiva, o estudante deve ser um construtor de conhecimento, um cidadão, protagonista de seu próprio processo de formação: faz, pergunta, pesquisa, descobre, cria e aprende (RIOS, 2001, 2004).

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296 BROILO, C. L. et al. - QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL

Alinhados aos princípios epistemológicos e à concepção curricular do Projeto Pedagógico, os princípios metodológicos necessitam: orientar-se, pela garantia do exercício do debate e do pluralismo como elemento próprio da na-tureza da vida acadêmica e profissional, sem a imposição de uma determinada matriz ideológica; dar ênfase na pesquisa como princípio educativo, a qual articula um conjunto de estratégias de ação e reflexão (seminários, práticas, leituras dirigidas, aulas expositivo-dialogadas, mesas-redondas, simulações etc); e de um ensino a distância adotado como alternativa para atender aos in-teresses e expectativas dos estudantes, uma vez que a possibilidade de apren-der e ensinar com a mediação de tecnologias em situação não presencial é um requisito do mundo contemporâneo. Sobre esse último aspecto, podemos citar Brandão (1982, p. 11): “conhecer a sua própria realidade, participar da produção deste conhecimento e tomar posse dele”.

O panorama atual da Educação Superior exige uma análise mais in-tensa da relação ensino e pesquisa, aprofundando o conceito de qualidade da Educação Superior e de como essas reflexões políticas e posições epistemoló-gicas incidem sobre os currículos e sobre as práticas de ensinar e aprender que se desenvolvem na universidade. É relevante considerar as mudanças sociais e estruturais que produzem fenômenos novos, como a massificação do acesso ao terceiro grau e a emergência desse nível de escolarização para a grande maioria de jovens e adultos.

Em 2003, em Portugal, estudava-se a implementação da proposta contida na Declaração de Bolonha estabelecida em 19 de junho de 1999 e assinada pelos ministros da Educação de dezenove países europeus. Essa Declaração especifica a importância da construção do espaço europeu nas suas dimensões científica e tecnológica, intelectual, cultural e social, visando promover um sistema de Educação Superior europeu de profundidade. Uma forte recomendação citada é a promoção da cooperação europeia na avaliação da qualidade com o objetivo de desenvolver critérios e metodologias compa-ráveis. Afirma-se, assim, a necessidade do conhecimento dos processos de avaliação das instituições.

Um conceito necessário para este estudo é o da qualidade no Ensino Superior. Santiago (1999) analisa a utilização desse conceito numa perspecti-va crítica, apontando que a visão da indústria traz a forma de reprodução, de adaptação e de reconstrução e tenta ligar a qualidade a determinadas práticas de gestão colaborativa no Ensino Superior. Leite (2000) discute que a ques-tão da qualidade não pode ser analisada de forma dissociada da pertinência da Educação Superior, uma vez que a “qualidade não é um atributo abstrato, traduzido em determinada propriedade ou conjunto de propriedades inerentes a um objeto, comparadas(s) a outros padrões de referência” (p. 24). A autora destaca que “a qualidade é um juízo valorativo que se constrói socialmente e, em consequência, implica escolha de um sistema valorativo em um determi-nado espaço social” (p. 24).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 297

Os desafios impostos pela sociedade contemporânea à universidade, juntamente com sua responsabilidade com a educação escolar composta pela Educação Básica, formada pela Educação Infantil, pelo Ensino Fundamental e Médio, exigem respostas complexas, criativas e eficientes. Com a ampliação do acesso à escola, especificada no Parecer CNE/CP n. 5 de 2005, as exigên-cias de qualificação docente cresceram, pois os professores devem estar aptos para orientar a aprendizagem de crianças e adolescentes de classes popula-res. Isso exige das universidades a necessidade de melhorar a formação de professores para atuar na escola básica, exercendo a docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, incluindo a modalidade de Educação de Jovens e Adultos (EJA). As Diretrizes Curriculares “firmaram a compreensão de que a Pedagogia trata do campo teórico-investigativo da educação, do ensino e do trabalho pedagógico que se realiza na práxis social” (CNE/CP nº 5/2005). Elas definem a docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental como área de atuação prioritária do egresso do curso de Pedagogia.

Leite (2005) destaca que a universidade é diferente de uma fábrica, pois a sua peculiaridade está ligada à preparação de produtos de longa ma-turação. Dessa forma, a universidade deve se antecipar nas reformas de seus currículos, visando projetar o seu futuro. Gaulthier (1998) defende que a cons-tituição de uma nova teoria pedagógica e uma construção conceitual poderiam integrar as dimensões especulativas e empíricas. Ao mesmo tempo, com os elementos básicos da tradição pedagógica e com os ditos saberes oriundos do encontro, poderiam realizar um confronto e um diálogo entre os práticos e os pesquisadores. Uma teoria preocupada com o ensino e aprendizagem, em que o conjunto de métodos e os procedimentos ajudariam no processo do ensinar e do aprender que acontece na complexidade do contexto da sala de aula.

Na compreensão de Ghiraldelli (1988), a Pedagogia só poderá inter-vir efetivamente na realidade educacional se utilizar outras ciências, sem se reduzir aos vícios do psicologismo, do socialismo e do economicismo. Com base nessa afirmação, também será considerado, neste projeto, o conceito de internacionalização da Educação Superior como campo de estudo. De acordo com Morosini (2006), essa é uma área de conhecimento que enfatiza a noção de nação e relações entre nações, políticas e programas de governo, sistemas e IES para lidar com a globalização. A autora destaca que a internacionalização da Educação Superior é baseada em relações entre nações e suas instituições.

Nesse sentido é preciso considerar o modo como os professores con-cebem o conhecimento nos diferentes campos científicos profissionais, pos-suindo sentimentos fortes relacionados às diferentes carreiras. É preciso pen-sar não só em formas diferenciadas do fazer pedagógico na universidade, mas também nas relações que se estabelecem. Sobre a questão que envolve os conhecimentos dos professores, Shulman (1986) realizou pesquisas que in-dicam certo privilégio de questões didático-pedagógicas de natureza geral e/

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298 BROILO, C. L. et al. - QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL

ou técnica em detrimento de conhecimentos sobre o conteúdo de ensino e a forma como esses poderiam ser trabalhados pedagogicamente em sala de aula. Defende, sob uma perspectiva renovada, a recuperação do “paradigma perdi-do”, o qual valoriza o saber do professor sobre aquilo que constitui o conteúdo do ensino e da aprendizagem. Por sua vez, Cowen (1996) indica que a uni-versidade está pensada como uma instituição voltada para produzir o conheci-mento, para buscar e divulgar a verdade. Hoje, em particular, a universidade vê-se orientada para a busca do “desempenho” exigido pelo mercado. Dessa forma, procura atender às políticas governamentais, muitas vezes balizadas pelas agências econômicas.

A universidade que se vai delineando no futuro próximo passa a ser configurada mais pelas pessoas e outros fatores que estão fora dela do que pela comunidade que integra o meio acadêmico. Isso gera um enfraquecimento da universidade, pois essa mudança traz uma nova concepção de conhecimento e faz com que sua produção enfraqueça pedagogicamente. Essa visão diferente de pesquisa, voltada mais para a ciência aplicada, que tem como objetivo atender às demandas da indústria, traz um enfraquecimento não só pedagógi-co como financeiro para as universidades, exigindo-lhes maiores ampliações do seu campo de ação e a realização de novas parcerias. Por isso existe a necessidade de acompanhamento e de avaliação desses processos, pois, de acordo com Leite (2006), a avaliação significa dar valor a algo, o tornando válido e digno. A autora reforça, ainda, que a avaliação “se refere a processos de construção de sentidos e conhecimentos sobre sujeitos, objetos ou coisas, atividades e instituições, colocados em relação educativa ou profissional du-rante determinado período de tempo” (p. 461).

Essa pesquisa busca, portanto, discutir sobre a importância da quali-dade do ensino em Cursos de Formação Inicial para os anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, mas não sem antes transitar pelo caminho da universidade, uma instituição social com compromissos historicamente de-finidos e legislados.

OBJETIVOS E QUESTÕES DA PESQUISA

A pesquisa maior busca compreender os movimentos de coordenado-res e de professores na operacionalização das propostas curriculares frente à inserção no campo profissional e suas tensões entre este e o campo da forma-ção, especialmente nas relações teoria-prática, formação específica, formação pedagógica e construção pedagógica do conhecimento. Os objetivos são: (i) analisar os mecanismos estruturantes dos projetos pedagógicos nas licencia-turas em estudo e a(s) forma(s) existentes de participação de coordenadores e professores no desenvolvimento do currículo frente às novas diretrizes curri-culares para a formação de professores; (ii) discutir a leitura do campo profis-sional a partir da necessidade de fazer a inserção na escola básica, da prática

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 299

como componente curricular na significação das relações forma-conteúdo, teoria-prática e do diálogo epistemológico e formação específica-formação pedagógica; (iii) compreender a construção histórica do conceito de episte-mologia da prática alicerçada na relação teoria-prática-contexto sociocultural e os pressupostos que sustentam essa construção; (iv) mapear e analisar os desafios, possibilidades e alternativas construídas no cotidiano das práticas curriculares vivenciadas nos cursos a serem investigados; (v) contribuir para a qualidade dos cursos de licenciatura, considerando as experiências adquiridas pelas IES participantes em suas múltiplas possibilidades.

Nesse sentido, propomos os seguintes objetivos para o desenvolvi-mento deste estudo:

1. Discutir sobre a importância da qualidade do ensino em cursos de formação inicial para os anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.

2. Contribuir para a qualidade dos cursos de formação de profes-sores, objetivando reforçar as experiências já realizadas pelas IES e inserir novos projetos.

3. Identificar o movimento de professores e de coordenadores quanto à implementação do Projeto Pedagógico do curso, vi-sando atender às demandas das Diretrizes Curriculares que fundamentam a formação inicial de professores.

4. Identificar indicadores de qualidade e práticas de aprendiza-gem necessárias nos cursos pesquisados com o intuito de pro-mover uma formação sólida, que leve o professor a atuar com competência e humanidade.

Algumas questões básicas são necessárias para que haja uma reflexão sobre o movimento de reestruturação, podendo ser definidas como dimensões que servem para aproximar o enfoque teórico do estudo empírico. Assim, sur-gem duas dimensões passíveis de aprofundamento, são elas:

1. Concepções de teoria e de práticas de aprendizagens constru-ídas (estágios curriculares, TCC.) pelos estudantes quanto à formação de professores, identificando os indicadores cons-tituídos em seu processo de formação e de sua inserção pro-fissional.

2. Definição do campo interdisciplinar e de investigação para o desenvolvimento de uma cultura que discuta a qualidade dessa formação como qualidade social (CORTELLA, 1996).

O projeto maior define as seguintes questões que podem servir de base para estudo e análises dos dados coletados: Como se configuram as trajetó-rias de formação acadêmica de coordenadores e professores? Como se inse-re a prática como componente curricular no desenvolvimento do currículo? Como é trabalhada a inserção dos estudantes e suas experiências do campo

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300 BROILO, C. L. et al. - QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL

profissional no movimento do curso nas ditas disciplinas teóricas? Como é compreendida e territorializada a finalidade do TCC no processo formativo da formação inicial? Como se territorializa o estágio curricular supervisionado no curso como uma totalidade em movimento? Como estão sendo produzidas as relações teoria-prática, conteúdo-forma e formação específica-formação pedagógica para a construção pedagógica do conhecimento?

Embora este estudo seja um recorte do projeto maior, é possível a utilização dessas questões no momento da análise dos dados coletados e à medida que as categorias sejam construídas.

ABORDAGEM METODOLÓGICA DO PROCESSO INVESTIGATIVOA pesquisa maior tem a perspectiva de realizar uma maior aproxima-

ção junto aos coordenadores e professores dos cursos de licenciatura exis-tentes na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Instituto Federal de Santa Catarina (IFC) e na Universidade de Caxias do Sul (UCS) nos cursos de Letras, Biologia, Física, História, Matemática e Química por meio dos interlocutores da pesquisa, que são: coordenadores e professores da formação específica e da formação pedagógica dos cursos de licenciatura em Biologia, Física, História, Letras, Matemática e Química.

Em razão de estar na fase de aplicação dos instrumentos definidos, como questionário semiestruturado, realização de entrevistas semiestruturadas individuais e coletivas (conforme andamento da pesquisa), a pesquisa maior já está realizando a análise documental de Projetos Políticos Pedagógicos e Planos de Ensino. Essa pesquisa propõe também um exercício cartográfico baseado nos questionários que servirão para a construção de referências. Esse exercício colaborará na triangulação entre problematização e questões da pes-quisa, destacando que as questões teóricas e as pré-categorias que surgirem da análise cartográfica estão fundamentadas nos princípios da análise de conteúdo.

A metodologia utilizada está apoiada nos princípios da pesquisa qua-litativa, envolvendo a possibilidade de um maior contato com a realidade in-vestigada, por meio de visitas in loco. Segundo André (1995), uma investi-gação qualitativa é um processo de ato de criação e de conhecimento sobre a realidade, portanto é uma forma de captar e compreender os significados das experiências em estudo.

A pesquisa qualitativa também procura interpretar fenômenos sociais inseridos em um contexto, por isso, ao considerar o ângulo da observação, da análise do conteúdo, do questionário a ser aplicado, da construção de catego-rias e das entrevistas a serem realizadas, seguir-se-á os parâmetros da pesquisa qualitativa propostos por André (1995), Bardin (1977), Lüdke e André (1986), Bogdan (1994) e Minayo (2002). Destaca-se que a aplicação de instrumentos

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 301

de coleta será em forma de questionários com escala e perguntas abertas e de entrevistas semiestruturadas, com possibilidade de participação em reuniões cuja pauta envolva a discussão da formação de professores.

Para a análise dos dados, buscamos construir uma descrição do estudo realizado, apresentando os quadros de categorias e indicadores identificados de qualidade do ensino em cursos de formação inicial para os anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio. É fundamental, nesse tipo de abordagem, a experiência como observadora da área de estudo, para garantir objetividade e rigor na análise e interpretação dos dados recolhidos. As entre-vistas serão utilizadas para garantir o rigor e a objetividade necessários para a interpretação, descrição e análise dos dados recolhidos, pois a interação direta com os entrevistados é uma forma de realizar um trabalho de campo mais apurado e de garantir, por meio do registro, a memória e a complementação dos pontos investigados. Serão considerados, para a análise dos resultados, as competências e os indicadores estabelecidos pelos professores no Seminário referente ao projeto maior, coordenado pela professora doutora Cleoni Maria Barboza Fernandes, e a sua relação com a discussão da qualidade do ensino em cursos de formação inicial para os anos finais do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.

ETAPAS E CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO

Primeira etapa (julho e agosto de 2011): início do Pós-Doc, em ju-lho de 2011. Realização do estudo teórico, planejamento do trabalho de campo, desenho da análise e da pesquisa bibliográfica. Estudo e análise do projeto de pesquisa maior. Acompanhamento das equipes em funcionamen-to nas instituições integrantes, com a professora doutora Cleoni Barboza Fernandes. Planejamento das atividades comuns: sessões de estudo e de trabalho. Levantamento bibliográfico para estudo e elaboração conjunta do cronograma para desenvolvimento da pesquisa.

Segunda etapa (setembro e outubro de 2011): análise dos Projetos Pedagógicos e dos documentos oficiais institucionais e das Diretrizes Curriculares dos cursos. Aplicação de questionários e realização das entrevis-tas. Participação do Seminário de integração do grupo de pesquisa: revisão do trabalho e discussão dos dados parciais coletados.

Terceira etapa (novembro de 2011 a janeiro de 2012): identificação e construção das categorias e mapeamento dos dados, usando diferentes va-riáveis. Análise dos dados coletados, baseado no referencial teórico e nas entrevistas, envolvendo os sujeitos participantes. Mapeamento de experiên-cias positivas. Organização, análise e interpretação dos dados à luz da teoria. Organização e realização do seminário de socialização da pesquisa, com a equipe participante da pesquisa, visando à consolidação dos dados analisados. Elaboração e publicação do relatório final.

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302 BROILO, C. L. et al. - QUALIDADE DO ENSINO EM CURSOS DE FORMAÇÃO INICIAL

Atividades complementares: (1) participação na organização do X Seminário Internacional 2011 – “A qualidade da Educação Superior: grupos investigativos internacionais em diálogo” – a ser realizado nos dias 5 e 6 de dezembro de 2011, promovidos pelo Observatório de Educação RS e pelo RIES; (2) participar no trabalho de organização de dois livros referentes aos eventos da Rede Sulbrasileira de Investigadores de Educação Superior (RIES), realizados em 2009 e 2010; (3) participação nas disciplinas desenvolvidas pela orientadora professora doutora Cleoni Barboza Fernandes, para graduan-dos, mestrandos e doutorandos da PUCRS.

AVALIAÇÃO E ANÁLISE DO ESTÁGIO PÓS-DOUTORALA perspectiva é de que este estudo possa contribuir nas discussões

sobre a temática das licenciaturas, numa forma de divulgar e destacar a im-portância das experiências realizadas pelas IES participantes da pesquisa, nas suas múltiplas possibilidades, uma vez que a pesquisa maior encontra-se em pleno desenvolvimento, assim como a realização de seminários, congressos e reuniões de estudo. Outra possibilidade é fazer um mapeamento das experiên-cias positivas, sem o caráter prescritivo, numa forma de levantar possibilida-des e alternativas para as situações detectadas. Objetiva também socializar os resultados do estudo empírico com o envolvimento dos professores formado-res e dos professores em formação, prevendo a interação teórica e tendo como referência o campo profissional.

Para a análise do estágio pós-doutoral, será considerado o todo em movimento. A avaliação de forma cooperativa será realizada pelas professo-ras Cecília Luiza Broilo e Cleoni Maria Barboza Fernandes. Também serão consideradas a publicação conjunta com a PUCRS, envolvida na pesquisa, a realização das atividades previstas e a socialização do estudo com os interlo-cutores e a orientadora.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 303

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 305

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A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR

Doris Pires Vargas BolzanAna Carla Hollweg Powaczuk

Eliane Aparecida Galvão dos SantosAdriana Claudia Martins Fighera

Luiza Salles JunchenSilvana Martins de Freitas Millani

Francine de Bem RossiKarla Madrid Fonseca

A democratização do acesso ao Ensino Superior resulta na criação de novas universidades e na crescente demanda de estudantes que

chegam aos bancos universitários. Essa situação traz uma série de implica-ções que diz respeito a como lidar com o contexto universitário atual, uma vez que essa nova universidade é caracterizada por uma grande diversida-de cultural resultante do ingresso de um público cada vez mais heterogêneo. As Instituições de Ensino Superior (IES) estão enfrentando dificuldades para atender a essa nova configuração da universidade, assim como a complexi-dade social, política e econômica que isso abrange. Entre essas dificuldades, podemos destacar: a diversidade que se apresenta na sala de aula, o desafio de equacionar o binômio qualidade/quantidade e a relação da docência com a formação para o ensino.

Nesse sentido, Zabalza (2004) ressalta que essa configuração se cons-titui como um empecilho à qualificação do trabalho docente realizado nas ins-tituições de ensino, pois, ao receberem um grande número de estudantes, tanto os professores quanto a própria instituição acabam por abdicar explicitamente o ensino de qualidade, buscando apenas a “sobrevivência”.

É nesse cenário que as IES, especialmente as universidades públicas, estão sendo desafiadas a atender as necessidades do seu tempo. Isso requer pensar na qualificação dos processos de formação dos professores. Para o professor dar conta das demandas cotidianas, inerentes ao seu fazer docente, principalmente no que se refere ao desenvolvimento de um trabalho docente em que os estudantes tenham a possibilidade de apropriar-se de conhecimen-tos que os qualifiquem a exercer a profissão escolhida, é necessário, entre outros fatores, que haja investimento nos processos formativos dos docentes desse nível de ensino.

Essa reflexão parte de estudos e pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Práticas Educativas: novas perspecti-

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308 BOLZAN, D. P. V. et al. - A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

vas para Educação Básica e Superior (GPFOPE)1 da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), com base na pesquisa “Aprendizagem docente e pro-cessos formativos: movimentos construtivos da professoralidade na Educação Básica e Superior”. Esse estudo comporta uma dinâmica de investigação qua-litativa-narrativa (FREITAS, 1998; BOLZAN, 2002) voltada a compreender os movimentos produzidos na formação docente, tanto na inicial como na continuada, remetendo-nos ao aprofundamento de temáticas que perfazem a constituição do ser professor. Como instrumentos da investigação, são utiliza-das entrevistas semiestruturadas que tomam como eixos norteadores: aspectos da trajetória pessoal e profissional, as concepções docentes sobre o ensinar e o aprender e a prática docente. Os sujeitos participantes dessa investigação são professores atuantes no curso de Pedagogia de uma universidade pública e de um centro universitário e professores de escolas públicas e privadas, contabi-lizando 32 sujeitos − 13 professores da Educação Básica (EB) e 19 professo-res das Instituições de Ensino Superior (IES). Conta ainda com a participação de 20 acadêmicos do curso de Pedagogia de uma universidade pública. As escolas e as IES localizam-se na cidade de Santa Maria (RS).

Logo, neste texto temos a intenção de colaborar para as discussões que permeiam a qualificação dos processos formativos nas IES. Assim, o foco deste estudo é a formação dos professores das IES, especialmente no que se refere aos processos que geram a aprendizagem docente no Ensino Superior.

OS PROCESSOS FORMATIVOS E A DOCÊNCIA NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIORA discussão acerca da docência nas IES nos instiga a interrogar a situa-

ção contraditória que envolve essa realidade e a pensar meios que contribuam para amenizar essa discrepância. Levamos em consideração o fato de que para o exercício da docência na Educação Básica há a legalidade da exigência de formação específica, mas para os docentes do Ensino Superior não há essa exigência. O investimento de políticas públicas é inexistente, consequente-mente presenciamos a ausência de espaços formativos que contemplem a for-mação continuada para a especificidade da docência nas IES (ISAIA, 2005; 2006; ISAIA; BOLZAN, 2004, 2005, 2007; ANASTÁSIOU, 2002).

Assim, pensar na qualidade da formação do professor das IES é uma situação complexa e implica o comprometimento, quase que individual, em aprender a ser professor nesse nível de ensino. É importante destacar que a

1 O Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Práticas Educativas: novas perspectivas para Educação Básica e superior (GPFOPE) é cadastrado desde 2002 no CNPq e realiza pesquisas nas áreas de formação de professores e práticas pedagógicas sob a coordenação da professora doutora Doris Pires Vargas Bolzan. O grupo conta com a participação de seis acadêmicas de doutorado em Educação, três acadêmicas de mestrado em Educação, acadêmicas da graduação em Pedagogia, além de professores da Educação Básica e Superior. Conta com bolsas de iniciação científica e bolsa de apoio técnico; a coordenadora ainda possui bolsa de produtividade em pesquisa pelo CNPq.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 309

docência não envolve somente a prática de ensino em sala de aula, abarca uma gama de exigências inerentes às condições contextuais que perpassam o exer-cício da docência. Essas exigências vão desde o domínio de conhecimento científico, acerca das questões relativas ao processo de ensino e de aprendiza-gem, até conhecimentos referentes à área de atuação dos docentes. Envolvem também outras atividades que fazem parte do cotidiano docente e que exigem conhecimentos peculiares, tais como: participação em colegiados, desenvol-vimento e divulgação de pesquisas, orientações de trabalhos aos estudantes, organização de eventos, participação em bancas de avaliação e participação nas políticas de pesquisa e financiamento. Essas são algumas das atividades que envolvem os professores desse nível de ensino e que podem configurar como elementos impulsionadores à qualificação dos processos formativos desses professores, uma vez que podemos considerá-las como mediações que favorecem a geração de uma postura reflexiva.

Nessa direção, se faz necessário definir o que compreendemos como qualidade, considerando que há diferentes interpretações para esse termo. Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, qualidade é o atribu-to, condição natural, propriedade pela qual algo ou alguém se individualiza, distinguindo-se dos demais; maneira de ser, essência, natureza; excelência, virtude, talento; grau de perfeição, de precisão, de conformidade a um certo padrão. Vimos, dessa forma, que o vocábulo “qualidade” assume múltiplos significados. Ao trazermos esse termo para o campo da Educação, observa-mos que ele pode estar relacionado à concepção que os sujeitos têm sobre edu-cação. Nesse sentido, é fundamental problematizar o que compreendemos por qualidade, pois podemos correr o risco, em um primeiro momento, de associar esse vocábulo à valoração de melhoria e de progresso, se o compararmos com algo, ou situação, que relaciona os objetivos com os resultados. Além disso, também podemos nos equivocar ao adotar critérios de qualidade que são va-lorados somente por um grupo específico de pessoas, os quais acabam, muitas vezes, por transformarem-se em padrão ou, na melhor das hipóteses, referên-cias para um contexto mais universal (BOLZAN. et al., 2010).

As reflexões aqui propostas estão assentadas na ideia de pensar a qua-lidade dos processos formativos não só com foco nos resultados alcançados, mas, especialmente, no processo e no desenvolvimento prospectivo do conhe-cimento. Aqui, os professores universitários são o centro da reflexão, uma vez que são os responsáveis por muitas das decisões e encaminhamentos ocorri-dos nas IES. Assim, a questão que move nossa reflexão neste ensaio é: que processos formativos podem estar implicados na qualificação da formação dos professores de Ensino Superior?

Nessa direção, Marcelo Garcia (1999) colabora ao trazer a concei-tuação acerca das ações de autoformação, interformação e heteroformação, todas inter-relacionadas. A autoformação é entendida como o processo pelo qual o indivíduo busca, com base em seus próprios interesses e necessidades,

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310 BOLZAN, D. P. V. et al. - A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

diferentes atividades e projetos formativos que contribuirão para o desenvol-vimento de seus conhecimentos e competências necessárias para exercer a atividade docente (MARCELO GARCIA, 1999; ISAIA, 2006).

O professor do Ensino Superior, em virtude das diversas e emergentes demandas do seu cotidiano, que ele precisa dar conta de forma imediata, acaba sendo pressionado a colocar em andamento um exercício reflexivo, exigindo uma postura balizada pela análise metódica, investigativa, crítica e autocrítica. Assim, sente a necessidade de teorizar a sua experiência, tendo como base referenciais que auxiliem a compreender a ação docente, podendo resultar na produção de novos construtos teórico-práticos (ZEICHNER, 1993). Nesse sentido, a consciência da incompletude junto ao desejo de fazer um trabalho melhor leva o professor a desenvolver a sua autoformação, envolvendo uma peculiaridade da aprendizagem que é a vontade de se formar (MARCELO GARCIA, 1999).

No que tange ao processo heteroformativo, esse “se organiza e se de-senvolve por agentes externos, especialistas, sem que seja levado em conta o comprometimento dos professores com as ações formativas postas em anda-mento” (ISAIA, 2006, p. 352). Nesse caso, quando o docente está envolvido, ou seja, participa da formação como sujeito aprendente e ensinante, ele se qualifica. Então, o assessoramento será um apoio para auxiliá-lo na problema-tização das questões relativas às suas necessidades formativas, sendo ponto de partida para a compreensão sobre as situações envolvidas na ação docente e elemento provocador à produção de novas elaborações, indicando, assim, pos-sibilidades de contribuir para a qualificação dos processos formativos nas IES.

Diante da articulação entre a auto e a heteroformação, o professor também pode se envolver em um processo que é interpessoal e, consequen-temente, interformativo − processo em que os professores se constituem com base nas atividades interpessoais que realizam ao longo da carreira. A possibi-lidade da interação grupal entre professores com interesses e necessidades co-muns instiga a busca do aperfeiçoamento e desenvolvimento de competências profissionais (ISAIA, 2006).

Ao considerarmos a discussão sobre a qualificação dos processos for-mativos dos professores e suas implicações baseadas na auto, hetero e interfor-mação, destacamos que o desenvolvimento desses processos inter-relaciona-dos são potencializadores de novas aprendizagens para a docência no Ensino Superior, uma vez que, com base em um conjunto variado de mediações e relações produzidas nessa dinâmica de formação, o professor poderá construir elementos capazes de colaborar para a conquista de maior autonomia no seu fazer docente.

Sabemos que a conquista da autonomia é paulatina e inacabada, im-plica em um processo permanente de construção, elaboração, reflexão, análise crítica do contexto, reelaboração de concepções e produção de conhecimentos. Para tanto, essa é uma conquista que não pode acontecer somente de forma

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 311

individual, se faz necessário o fortalecimento das relações interpessoais. Logo, podemos destacar que a ascensão da qualificação dos processos formativos docentes nas IES requer uma dinâmica de formação, baseada em uma pers-pectiva reflexiva individual e coletiva, com os seus pares e com especialistas da área e de outras áreas, por meio de um processo permanente de questiona-mento, de estudos e pesquisas, de buscas de soluções para as situações exigi-das na atividade docente.

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312 BOLZAN, D. P. V. et al. - A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

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FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SUL: DADOS PRELIMINARES

Simone Benvenuti LeiteFlávia Maria Teixeira dos Santos

O Brasil vem se transformando em uma potência emergente devi-do ao nível de desenvolvimento econômico que está alcançando,

porém o desempenho do seu sistema educacional ainda é muito precário, pois a qualidade da Educação Básica é muito baixa e apenas uma minoria da popu-lação tem acesso à Educação Superior.

Nos últimos anos temos acompanhado decisões e ações que institu-íram um conjunto articulado de políticas públicas educacionais, traduzidas em programas do MEC por meio da Diretoria de Educação Básica Presencial (DEB) da Capes e que visam à melhoria da Educação Básica e a ampliação do acesso ao Ensino Superior.

Com base no Compromisso Todos Pela Educação (Decreto N° 6.094, abril/2007), foi instituída a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação Básica (Decreto N° 6.755, janeiro/2009), com o obje-tivo de formar em primeira licenciatura cerca de 350 mil professores das redes públicas da Educação Básica sem graduação; em segunda licenciatura, 250 a 300 mil professores licenciados que ministram disciplina(s) fora de sua área de formação; além de assegurar a formação pedagógica a aproximadamente 100 mil professores graduados sem licenciatura que atuam hoje na Educação Básica.

O estabelecimento dessa Política Nacional envolveu, inicialmente, a criação dos Fóruns Estaduais Permanentes de Apoio à Formação Docente, ins-tituídos em cada Estado brasileiro. Assim, em cada unidade da federação, es-ses Fóruns se tornaram responsáveis pela elaboração dos planos estratégicos para a identificação das necessidades de formação e a organização das ações.

Apesar de instituído tardiamente, em 23 de julho de 2009, o Fórum Estadual Permanente de Apoio à Formação Docente do Rio Grande do Sul identificou problemas relacionados à necessidade de articular melhor as de-mandas do Estado e as ofertas das universidades federais, comunitárias e estaduais que compõem o Fórum Estadual. Essa articulação de demandas e ofertas envolve conhecer e compatibilizar as necessidades dos municípios e a disponibilidade das vagas oferecidas pelas universidades, assim como uma minuciosa análise das demandas e projetos de desenvolvimento regionais.

Este trabalho apresenta parte das informações coletadas no âmbito do projeto “Educação Superior no Brasil: desafios contemporâneos” financiado pelo programa Observatório da Educação − edital nº 38/2010/Capes/INEP −, que pretende desenvolver estudos e pesquisas que possam contribuir de forma inovadora e criativa para o enfrentamento de três grandes desafios: o da for-

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314 LEITE, S. B. et al. - FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SUL

mação docente para a Educação Básica; o da inclusão e diversidade no Ensino Superior; o desafio da qualidade da universidade por meio da expansão, per-manência, combate à evasão e da multi e interdisciplinaridade.

O subprojeto “Educação Superior e formação docente para Educação Básica – formação docente no Rio Grande do Sul”, do qual esta pesquisa é parte integrante, visa analisar o quadro demográfico e geopolítico do Estado do Rio Grande do Sul com enfoque nos aspectos relacionados à educação e à formação docente. Além disso, os estudos realizados nesse subprojeto objetivam apoiar as discussões do Fórum Estadual Permanente de Apoio à Formação Docente do Rio Grande do Sul, que tem como objetivo principal estabelecer as políticas públicas de Educação Superior e elaborar planos estra-tégicos para a identificação das necessidades de formação de professores e de ações para suprir as carências na formação desses profissionais. Dessa forma, o Fórum é responsável por combinar a demanda com a oferta de vagas nas Instituições de Ensino Superior (IES).

Por meio da análise dos dados disponíveis no site do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), Censo da Educação Superior e Censo da Educação Básica, pretende-se construir um quadro articulador entre a formação docente e a qualidade da aprendizagem dos estudantes da Educação Básica (EB), buscando aprimorar os estudos em relação à realidade da formação de professores no Rio Grande do Sul.

FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SULAnalisando alguns dados do INEP, podemos observar que o quadro de

professores no Rio Grande do Sul (RS) não sofreu melhoras significativas de 2007 a 2009. A tabela abaixo (Tabela 1) mostra o número de professores que atuava na EB nesses anos, de acordo com o grau de formação.Tabela 1. Número de professores na Educação Básica, em 2007 e 2009, por escolaridade no RS.

Grau de formação 2007 2009

Ensino Fundamental 1.067 804Ensino Médio Normal/Magistério 24.097 21.673Ensino Médio 4.844 6.154Ensino Superior com licenciatura 77.906 78.355Ensino Superior sem licenciatura 6.284 4.459

Total 114.198 111.790

Fonte: INEP.

De 2007 para 2009, o número de professores atuante na EB com curso superior sem licenciatura passou de 6.284 para 4.459. Mesmo assim ainda há um número significativo de professores sem licenciatura atuando nas escolas do RS. Observa-se que, em 2009, havia 28.631 (25,6%) professores sem formação de nível superior e 6.154 (5,5%) professores com formação somente de Ensino

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 315

Médio (EM). Esses dados fomentaram os seguintes questionamentos: onde es-ses professores lecionam? Em quais disciplinas estão atuando? Esse censo des-taca também que há professores com formação apenas no Ensino Fundamental que atuam nas salas de aula, embora seja percentualmente pequena a parcela (menos de 1%) − são 804 professores que não poderiam estar atuando.

Esses dados revelam que o artigo 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/1996 (LDB/1996) de 1996, o qual determina que a formação docente deva ser feita em nível superior, não está sendo cumprido plenamente. Aqui entra um dos papéis do Fórum Estadual: o de identificar a demanda por formação e providenciar, com as IES, vagas em cursos de forma-ção para esses docentes que ainda não possuem formação adequada.

Outra informação fornecida pelos dados refere-se às condições de tra-balho dos professores da EB. A seguir, são apresentados dois quadros (Quadro 1 e 2) referentes ao trabalho dos professores no ano de 2009. O primeiro mos-tra o número de estabelecimentos que esses docentes atuam, e o segundo, o número de turnos que lecionam.

Número de estabelecimentos Número de professores

1 83.4692 24.1173 3.5474 531

5 ou mais 126Total 111.790

Quadro 1. Número de professores na Educação Básica por quantidade de estabelecimentos em que lecio-nam no RS em 2009.Fonte: INEP.

Observa-se que há um número razoável de professores que atuam em mais de um estabelecimento e em mais de um turno. Esse é um elemento que desqualifica o trabalho do professor e, por isso, foi muito comentado na Conferência Nacional de Educação de 2010 (CONAE), eixo IV (Formação e valorização dos/das profissionais da Educação). A CONAE, que serviu de embasamento para a construção do Plano Nacional de Educação 2011-2020 (PNE), aponta que a dedicação a uma única instituição de ensino é ponto im-portante para a qualidade do trabalho docente.

Número de turnos Número de professores

1 60.092

2 41.822

3 9.876

Total 111.790

Quadro 2. Número de professores na Educação Básica por quantidade de turnos que lecionam no RS em 2009.Fonte: INEP.

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316 LEITE, S. B. et al. - FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SUL

Ao analisar os dados do quadro 2, identificamos um grande número de professores que lecionam em três turnos: 9.879 (8,9%) professores que tra-balham manhã, tarde e noite. Com base nesse dado, nos questionamos: esses profissionais têm condições de realizar planejamentos e estudos adequados e com qualidade para os diferentes perfis de turmas que certamente eles traba-lham se estão o dia inteiro dentro da sala de aula?

Esse é mais um assunto abordado pela CONAE e que está presente também no PNE – a carga horária disponível para o planejamento dos pro-fessores. Para um bom trabalho dentro da sala de aula é necessário, além de outros fatores, um planejamento benfeito. Esse planejamento só será possível se o profissional dispuser de tempo suficiente para realizá-lo, pois, em geral, exige muita pesquisa e estudo.

Essas informações preliminares apontam que o quadro de professores no RS não atende o que está definido na legislação. Isso acarreta em proble-mas à qualidade do ensino e da aprendizagem. Professores com condições de trabalho precárias e sem formação adequada certamente apresentarão di-ficuldades com a organização, o preparo e a realização de aulas adequadas e qualificadas, prejudicando a aprendizagem dos alunos.

FORMAÇÃO DOCENTE NO BRASILOs dados sobre o grau de formação dos professores no Brasil, apresen-

tados a seguir (tabela 2), são relativamente parecidos com os do RS.

Tabela 2. Número de professores na Educação Básica em 2007 e 2009 por escolaridade no Brasil.

Grau de formação 2007 2009

Ensino Fundamental 15.982 12.480

Ensino Médio Normal/Magistério 474.950 484.346

Ensino Médio 103.341 139.974

Ensino Superior com licenciatura 1.160.811 12.649.49

Ensino Superior sem licenciatura 127.877 62.379

Total 18.829.61 19.779.78

Fonte: INEP.

No Brasil, a diminuição do número de professores sem licenciatura foi um pouco mais significativa do que no RS. Se analisarmos os valores em percentual, em 2007 havia, no Brasil, aproximadamente 7% (127.877) de professores com curso superior, porém sem licenciatura. Em 2009, esse percentual cai para aproximadamente 3% (62.379). Já no RS, em 2007, há em torno de 5,5% de professores sem licenciatura, e, em 2009, diminui para 4%. É possível concluir, com base nessa análise, que as decisões políticas adotadas no RS não parecem ser as mais apropriadas, se comparadas com

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 317

a efetividade das decisões adotadas por outros Fóruns Estaduais do país na busca pela melhoria da formação dos professores.

Entretanto, é necessário reforçar que, mesmo aparecendo nos dados uma redução considerável de professores com ES sem licenciatura no Brasil, esses casos ainda existem. Além do mais, em 2009, há um número expressivo (152.454 - 8%) de professores que não possuem sequer um curso de magisté-rio em nível de Ensino Médio (EM), ou seja, professores que estão lecionando na Educação Básica e que possuem somente Ensino Fundamental (EF) ou EM. Com esse quadro não é possível que haja uma melhora significativa nos índices que medem a aprendizagem dos alunos, por meio de instrumentos de avaliação realizados pelo INEP, pois essa aprendizagem depende também da qualificação dos professores.

CONCLUSÕES PARCIAIS Pode-se concluir, com base na análise dos dados, que o quadro de pro-

fessores, tanto no Brasil como no RS, ainda está carente de professores com formação adequada para o magistério. Enquanto não houver investimento na formação desses profissionais, ficará inviável buscar melhoras no desenvolvi-mento e aprendizagem dos estudantes.

É importante retomar que todos os dados apresentados neste trabalho são do governo federal. O próximo passo da pesquisa será conseguir com a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul (SEC/RS) dados mais detalha-dos do quadro de professores do estado, pois há alguns indícios de que esses dados apresentados, obtidos no site do INEP, não corresponderiam à demanda real do Estado. Há uma suspeita, despertada por relatos de professores da EB, de que esse quadro estaria defasado. Essa situação é possível devido à forma de coleta desses dados. As fichas, instrumentos de coleta de dados do Censo da Educação Superior e da Educação Básica, são preenchidas por um funcionário das escolas e não pelos próprios docentes. Esse fato pode levar a questionamentos deste tipo: será que esses dados estão sendo corretamente preenchidos? Será que o responsável por essa tarefa está dando a devida im-portância para esses documentos? Além disso, espera-se que com os dados da SEC/RS consigamos mapear o quadro de professores por regiões do esta-do, ou pelas trinta Coordenadorias Regionais de Educação (CREs) do estado. Assim será possível verificar se a falta de formação adequada dos professores está mais concentrada em determinadas regiões ou não.

Há outro fator relevante que deve ser analisado, e que esses dados do INEP não apresentam, que é referente ao número de professores que possuem ES, mas que lecionam em outra área distinta de sua formação. Pretendemos obter essas informações com a SEC/RS, pois elas serão de fundamental impor-tância para as ações que o Fórum Estadual Permanente de Apoio à Formação Docente do Rio Grande do Sul deverá providenciar.

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318 LEITE, S. B. et al. - FORMAÇÃO DOCENTE NO RIO GRANDE DO SUL

REFERÊNCIAS

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CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR DE ESTÁGIO PARA A QUALIDADE NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR

FÍSICO: PERSPECTIVA DE PIERRE BOURDIEU

Silvana Zancan Viviane Guidotti

Marilia Costa Morosini

E ste trabalho tem por objetivo analisar o professor formador res-ponsável por orientar e supervisionar os licenciandos, em fase de

estágio curricular, do curso de Educação Física de uma instituição privada. Como a pesquisa está em andamento, procuramos refletir e analisar acerca do assunto, trazendo as noções de governança acadêmica e campo científi-co à luz de referenciais teóricos que entrelaçam o estágio curricular super-visionado, dando enfoque principal no professor orientador de estágio e no acadêmico em fase de realização do estágio frente as Diretrizes Curriculares norteadoras. Com base no capital cultural do professor formador surgem os seguintes questionamentos: o professor formador possui um habitus organiza-do à luz das competências que norteiam os estágios supervisionados? Quais os investimentos que as IES proporcionam para o desenvolvimento da constru-ção do processo ensino-aprendizagem dos professores em formação em rela-ção à disciplina de estágio curricular? E como essa disciplina é organizada, no curso-alvo da pesquisa, considerando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/96 e as Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de Professores? Em outro momento, já com os dados coletados, visamos apontar as boas práticas necessárias para a identificação de excelência do licenciando com sua futura profissão, tendo como suporte a disciplina de estágio supervi-sionado, e ampliar a compreensão da relação teoria e prática que acontece tão intensamente na Educação Física.

No presente estudo foram suscitados aportes teórico-metodológicos nos quais buscou-se encaminhar o percurso desta investigação. Para isso, uti-lizou-se a previsão de princípios de natureza qualitativa que permitiram, com a maior clareza possível, enfocar o problema levantado pela pesquisa, bem como os objetivos dele decorrentes, já que a proposta baseia-se no olhar do professor formador responsável por orientar e supervisionar os licenciandos no contexto de estágio curricular do curso de licenciatura de Educação Física.

Para Lüdke e André (1986), a pesquisa qualitativa ocupa o ambiente natural como fonte de dados, sendo o pesquisador o instrumento principal. Seus dados são predominantemente descritivos por serem fortemente vincula-dos a descrições e depoimentos pessoais do sujeito-alvo da pesquisa.

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320 ZANCAN, S. et al. - CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR DE ESTÁGIO

UM CAMINHO A PERCORRER NO ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO

O estágio curricular supervisionado proporciona inúmeras contri-buições significativas para as competências e habilidades na formação dos licenciados e para o exercício de sua profissão e profissionalidade docente. Sinaliza-se na Lei n. 11.788, de 25 de setembro de 2008, que o estágio é um ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente do trabalho e que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam fre-quentando o ensino regular em instituições de Educação Superior (BRASIL, 2008). De acordo com essa lei, o estágio faz parte do projeto político pedagó-gico do curso, além de integrar a formação completa do educando (BRASIL, 2008). A Constituição Federal, art. 214, inciso IV, estabelece a formação para o trabalho (BRASIL, 1988). Diante do exposto, o estágio curricular supervi-sionado é uma atividade integradora das graduações em licenciatura, a fim de aproximar o educando das vivências e aprendizagens práticas, fora da univer-sidade, isto é, de aproximar o licenciando em formação com o futuro campo de atuação. Esse período compreende 400 horas que devem ser cumpridas no âmbito escolar ou áreas afins.

A Lei de Diretrizes e Bases salienta algumas competências e habilida-des que compõem o habitus do graduado em Educação Física:

A identidade acadêmico-profissional em Educação Física deve, necessaria-mente, partir da compreensão de competências e de habilidades que abranjam as dimensões político-social, ético-moral, técnico-profissional e científica, con-siderando que a intervenção do profissional pressupõe a mediação com seres humanos historicamente situados (BRASIL, 2004).

Isso implica em um habitus em que o docente de Educação Física deve se adaptar e realizar sem cessar um ajustamento ao mundo (BOURDIEU, 1983b). Consubstanciado aos conhecimentos que embasam sua intervenção acadêmico-profissional, é necessário que saiba transformar esses aprendiza-dos em ações no contexto que vai atuar, pois o habitus constitui uma ma-triz cultural que dispõe os agentes a agirem coerentemente (NASCIMENTO, 2007). Além de dominar os conhecimentos que fundamentam e orientam sua intervenção acadêmico-profissional, a incorporação do perfil de educador, tra-balhando seguramente a indissociabilidade teoria-prática, é uma exigência da prática docente do licenciado em Educação Física.

A prática concebida como componente curricular determina vivên-cias em diferentes contextos acadêmico-profissionais, vivências que devem estar explicitadas no projeto político pedagógico do curso de Educação Física (BRASIL, 2004). As práticas são viabilizadas por meio de oficinas, projetos, laboratórios, cursos, oficinas, dentre outras atividades que colaboram para a aplicação dos conhecimentos teóricos articulados às praticas docentes.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 321

No Parecer CNE/CES 0058/2004 está previsto, como prática do com-ponente curricular, o estágio curricular supervisionado, que:

[...] representa o momento da formação em que o(a) graduando(a) deverá vivenciar e consolidar as competências e habilidades exigidas para o exercício acadêmico-profissional em diferentes campos de intervenção, a partir da segun-da metade do curso, sob a supervisão de profissional habilitado e qualificado.

O estágio supervisionado é o momento em que o graduando entra em contato com as reais situações em que viverá durante toda sua vida como docente. Nesse sentido, Pimenta e Lima (2004, p. 41) conceituam a “profis-são de educador como uma prática social”. Nessas ações e práticas, por meio do estágio curricular, esses futuros professores vão desenvolver nos contex-tos escolares um habitus mais enriquecedor e renovado, tanto diante de suas próprias concepções pedagógicas quanto dos conhecimentos vindos do meio social, de alunos e do contexto geral da escola.

O estágio supervisionado merece destaque nos projetos políticos pe-dagógicos dos cursos, pois, ao adquirir as habilidades e as competências aca-dêmico-profissionais, se objetiva alterar as instituições de trabalho, no senti-do de contribuir para o processo de ensino-aprendizagem dos educandos por meio de uma práxis reflexiva.

A prática pode ser o ponto de partida para a reflexão teórica, possibili-tando a investigação, reflexão e ação fundamentadas em bases pedagógicas e epistemológicas em que os conhecimentos são construídos por meio da ação e da interação da prática de ensino (DALLA CORTE, 2010).

Busca-se aqui ressaltar que o estágio proporciona aos licenciandos a percepção, mostrando que devem estar sempre dispostos a encarar as inova-ções pedagógicas para renovar e reestruturar o seu trabalho pedagógico. É im-portante integrar-se a diversas possibilidades que venham a surgir e acrescen-tar em sua jornada. Quando o professor realiza aproximações e significações dos seus conhecimentos, as relações teórico-práticas passam a ser fortemente estabelecidas, e o processo de saberes e fazeres transforma o olhar do profes-sor para um processo formativo com mais criticidade.

Os professores precisam “assumir-se enquanto produtores de sua formação”; busca-se argumentar que essa “formação passa por processos de investigação, diretamente articulados com as práticas educativas” (NÓVOA, 1992, p. 28). Nesse sentido, a construção da identidade profissional desse futuro educador físico se desenvolverá na confluência entre momentos de formação e momentos de prática profissional, situados na dinâmica de um projeto em que o professor, enquanto sujeito da própria formação, constrói seus saberes ancorados na superação da fragmentação do conhecimento, favo-recendo a visão e o trabalho compartilhado no contexto educacional.

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322 ZANCAN, S. et al. - CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR DE ESTÁGIO

O SUPERVISOR DE ESTÁGIOO campo científico deve considerar a pluralidade social, reconhecer

que o conhecimento deve quebrar paradigmas e que não existe uma única pergunta para uma única resposta. O sentido de aproximar o saber científico ao saber da escola é a quebra da relação unilateral e hierárquica afirmada por muitos que entendem a relação entre universidade e escola como uma relação entre conhecimento científico produzido na academia e seu espaço de divulgação − a escola (BOURDIEU, 2004). Infere-se, nesse sentido, que o professor supervisor de estágio, por meio de suas experiências e orientações, irá trilhar o processo de intervenção acadêmico-profissional que tornar-se-á concreto e autônomo quando da profissionalização do graduando (BRASIL, 2004). Nesse olhar, Pimenta e Lima (2004) reforçam que a formação envolve um duplo processo: o de autoformação dos professores, com base na reelabo-ração constante dos saberes que realizam em sua prática, confrontando suas experiências escolares, e o de formação nas instituições em que atuam.

O processo de envolvimento do professor supervisor de estágio, o aluno estagiário, a Instituição de Ensino Superior formadora, o campo pro-fissional, as diretrizes curriculares e Pareceres que norteiam a formação do educador físico compõem as dimensões para uma governança acadêmica, no sentido de contribuir para essa teia do processo de ensino e aprendizagem, do licenciando em formação. No contexto do Ensino Superior, governança refere-se ao exercício formal e informal da autoridade no âmbito das leis, po-líticas e regras que articulam os direitos e as responsabilidades de diversos atores, incluindo as regras pelas quais aqueles interagem (EURYDICE, 2008). Então, o modo de administrar, tanto a disciplina como o apoio a ela dado pela academia e pelo contexto profissional, se torna um dos fatores indispensáveis e que faz a diferença quando se objetiva a integralidade do sujeito em todas as suas dimensões.

A governança acadêmica possibilita realizar modificações para alicer-çar a formação do licenciado em Educação Física, com a colaboração das di-ferentes dimensões envolvidas, que em virtude das orientações e políticas em níveis internos e externos conseguem fazer a diferença no campo científico e no campo profissional.

Diante disso, no Parecer CNE/CES n. 142/2007 são manifestadas mudanças no sentido de que a formação do profissional de Educação Física deverá garantir o desenvolvimento de estágios curriculares sob a supervisão docente (BRASIL, 2007). Esse parecer esclarece que:

O Estágio Profissional Supervisionado constitui um processo de transição profissional, que procura ligar duas lógicas (educação e trabalho) e que propor-ciona ao estudante a oportunidade de demonstrar conhecimentos e habilidades adquiridas e também treinar as competências que já detém sob a supervisão de um profissional da área (BRASIL, 2007).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 323

O profissional é o detentor de um habitus habilitado e qualificado para contribuir com as atividades formativas, de caráter teórico ou prático, para o graduando em estágio curricular. Bourdieu (1998, p. 65) acrescenta “que o volume do capital social que um agente individual possui depende da exten-são das relações que ele pode efetivamente mobilizar e o volume do capital que é posse exclusiva de cada um daqueles em que está ligado”. Ressalta-se, dessa forma, as trocas de experiências entre o professor supervisor de estágio, o aluno estagiário e o contexto envolvido nesse processo.

Assim, o entrelaçamento das dimensões externas e internas da go-vernança acadêmica no Ensino Superior é o aporte necessário para o pros-seguimento das metas e objetivos na formação de qualidade do licenciado em Educação Física, de modo a instigar políticas de maneira coerente e co-ordenadas pelas autoridades científicas, que englobam o campo científico e profissional da Educação.

PRIMEIRAS CONSIDERAÇÕES

O estágio supervisionado implica pensar o curso como um processo de formação de profissionais da Educação, uma vez que o estágio poderá ser potencializador de novas práticas para os sujeitos envolvidos, conside-rando suas vivências e a possibilidade de [re]significar saberes. No decorrer do processo formativo, a disciplina de estágio visa dar maior reciprocidade entre a teoria e a prática, considerando que o ensino na universidade não pode ser descontextualizado do campo social, mas, sobretudo, enriquecido com as situações vividas no cotidiano de ensino da instituição formadora com o cam-po profissional. Essas mediações entre campo específico, campo profissional, políticas e orientações, em níveis internos e externos, potencializam a cons-trução de uma governança acadêmica e compartilhada, pensada na formação de qualidade do Educador Físico, preparando-o para a excelência no contexto de atuação.

Assim, o professor supervisor de estágio, por meio de suas experiên-cias docentes e detentoras de um habitus de saberes e fazeres pedagógicos, resgata a base reflexiva da atuação profissional, com o objetivo de esclarecer a forma em que realmente se abordam as situações problemáticas da prática, preparando, dessa forma, um profissional inovador e de qualidade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Presidência da República. Lei n. 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes. Diário Oficial da União. Brasília, 26 set. 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/ l11788.htm>. Acesso em: out. 2011.

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324 ZANCAN, S. et al. - CONTRIBUIÇÕES DO SUPERVISOR DE ESTÁGIO

BRASIL. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: out. 2011.

______. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES n. 58, de 18 de fevereiro de 2004. Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física. Diário Oficial da União. Brasília, 5 abr. 2004. Disponível em: <http://mec.gov.br>. Acesso em: out. 2011.

______. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CES n. 142/2007, aprovado em 14 de junho de 2007. Dispõe sobre a alteração do § 3º do art. 10 da Resolução CNE/CES n. 7/2004, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física, em nível su-perior de graduação plena. Diário Oficial da União. Brasília, 24 set. 2007. Disponível em: <http://mec.gov.br>. Acesso em: out. 2011.BOURDIEU, P. Os usos sociais da Ciência: por uma clínica do campo cientí-fico. São Paulo: Ed. UNESP: 2004.______. Gostos de classe e estilos de vida. In: ORTIZ, Renato (org.). Pierre Bourdieu: sociologia. São Paulo: Ática, 1983b.______. Escritos de Educação. Petrópolis: Vozes, 1998.DALLA CORTE, Marilene Gabriel. O estágio curricular e a formação de qualidade do pedagogo. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010. 315p. EURYDICE. A governança do Ensino Superior na Europa. Bruxelas: Eurydice, 2008. 141p.LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.NASCIMENTO, M. das G. Os formadores de professores e a constituição do habitus profissional. Congresso da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação: 30 anos de pesquisa e compromisso social. Minas Gerais: 2007. 16p.NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente. In: NÓVOA, António. Os professores e sua formação. Lisboa, Portugal: Dom Quixote, 1992.

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A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM DA DOCÊNCIA:

PROBLEMATIZANDO A QUALIDADE DA FORMAÇÃO INICIAL NO CURSO DE PEDAGOGIA

Doris Pires Vargas Bolzan Gislaine A. R. da Silva Rossetto

Leila Adriana Baptaglin Giovana Medianeira Fracari Hautrive

Tásia Fernanda WischDaniela Dal Ongaro

O curso de Pedagogia tem-se constituído historicamente por distin-tas configurações curriculares e por diferentes significados a ele

atribuídos. Entretanto, apesar das discussões, das tentativas e das concretiza-ções de mudanças, especialmente em seu formato curricular, compreendemos que ainda somos desafiados a rever seus objetivos, seus desenhos curriculares, suas abordagens teórico-práticas, sua forma e conteúdo, assim como as abor-dagens epistemológicas e socioculturais que permeiam os sujeitos aprendizes e os objetos de estudos que são focos desse campo profissional.

Nessa perspectiva, entendemos que todas essas questões somente pas-sam a ter sentido quando definimos, ao menos no interior do curso no qual so-mos professores, que tipo de profissional do campo da Pedagogia desejamos formar. Esse tipo de discussão e consenso se faz necessário para a qualificação do grupo de docentes e dos estudantes em formação inicial desse curso.

As discussões provenientes do campo acadêmico sobre a Pedagogia têm priorizado as reflexões acerca da formação docente, no entanto é importan-te salientar que já formamos técnicos, especialistas e bacharéis em Educação, segundo nos traz a história do curso (BRZEZINSKI, 1996). Proposições mais recentes, como as de Libâneo (2007) e Libâneo e Pimenta (2002), discutem outras possibilidades de atuação do pedagogo que não somente o espaço da educação formal e não formal.

O CURSO DE PEDAGOGIA A PARTIR DA LDB 9.394/96Oficialmente, o curso de Pedagogia nasceu como bacharelado que

tinha como meta formar “técnicos em Educação”, mas ao longo de sua tra-jetória passou por diferentes configurações. A LDB n. 9.394 de 1996 trouxe novas discussões em torno do curso, e uma nova instabilidade se instaura: os Institutos Superiores de Formação de Educação, que são trazidos para as universidades a fim de serem responsáveis pela formação de professores.

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326 BOLZAN, D. P. V. et al. - A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM

Desse ponto em diante, para poder atuar na Educação Básica é necessária a formação universitária. Institui-se, assim, o Curso Normal Superior cujo ob-jetivo é formar professores para a Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. Porém, em muitas regiões do país, foi extinto devido à polêmi-ca que causou entre a própria comunidade acadêmica (pesquisadores, profes-sores e estudantes) e entre a recepção desse profissional pelo próprio contexto de mercado. Nessa configuração, apresentam-se, ao profissional da Educação

− seja ele da administração, do planejamento, da supervisão ou da orientação −, duas possibilidades de formação: a graduação em Pedagogia ou em nível de pós-graduação, retirando-se, assim, a exclusividade de sua habilitação somen-te em nível de graduação.

Em 2006, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de licen-ciatura em Pedagogia em nível de graduação foram instituídas mediante a Resolução CNE/CP n. 1 e o Parecer CNE/CP n. 05/2005. Esses documentos definem que a formação nesse curso se destinará à docência, com participação na gestão e nos processos de avaliação institucionais, bem como da elabora-ção, execução e acompanhamento de atividade e programas educativos. Sua formação tem que abranger a aprendizagem e o desenvolvimento da produ-ção do conhecimento na área de Educação. Com isso, amplia-se o campo de formação desse novo perfil do pedagogo, que demarca a retomada de antigos debates e a criação de novas discussões na área da formação desse profis-sional da Educação, no sentido de encontrar respostas às necessidades desse campo de atuação. Percebemos, assim, que todas essas reformulações surgem no intuito de uma melhor qualificação1 do pedagogo. No entanto, distante de haver um consenso entre as discussões que emergiram, e ainda emergem de cada uma dessas novas diretrizes, e de haver consonância em relação à identi-dade do profissional em educação e, especialmente, a do curso de Pedagogia, percebemos que polêmicas ainda existem e possivelmente irão persistir por algum tempo.

Diante disso, somos desafiados cotidianamente a pensar que perfil de profissional se deseja formar. Nesse sentido, não podemos deixar de refletir em modos de conhecer e de agir no curso de graduação, no “aqui e agora”, não desconsiderando e nem deixando de acompanhar, de estudar e de participar das discussões epistemológicas e legais que acontecem e influenciam direta-mente em nosso dia a dia.

Provocados pela complexidade que permeia tanto o campo da Pedagogia quanto o curso, pela necessidade de compreender como ocorre o processo de aprender a ser professor e entender como os estudantes esperam que esse processo de aprendizagem aconteça na graduação que frequentam,

1 Entendemos por qualidade na educação “[...] a ideia de processo, considerando a dinâmica sobre as quais as práticas educativas são produzidas nesse nível de ensino colocando o professor no centro desta reflexão, uma vez que são responsáveis por muitas das tomadas de decisões e encaminhamentos que se dão nas IES” (BOLZAN, 2010, p. 3).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 327

desenvolveu-se uma investigação com o objetivo de compreender como a ati-vidade docente de estudo se estabelece no processo de aprendizagem de ser professor na formação inicial de estudantes do curso de Pedagogia.

DIMENSÕES INVESTIGATIVAS: UM POUCO DA PESQUISA QUE ORIGINA NOSSAS DISCUSSÕESEste trabalho é um recorte do projeto de pesquisa “Aprendizagem do-

cente e processos formativos: movimentos construtivos da professoralidade na Educação Básica e Superior” que vem sendo desenvolvido desde 2007. Esse projeto é coordenado pela professora doutora Doris Pires Vargas Bolzan e pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Formação de Professores e Práticas Educativas: Educação Básica e Superior (GPFOPE), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Esse projeto apresenta como foco os movimentos construtivos desencadeados no processo de aprender a ser professor.

Na primeira etapa do projeto foram realizadas entrevistas com pro-fessores da rede de ensino de Educação Básica e professores de Educação Superior. Em sua segunda e atual etapa, o foco voltou-se para a formação inicial das/os acadêmicas/os do curso de Pedagogia diurno da UFSM, que tem como meta formar professores para a Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental, a fim de conhecer as concepções sobre a aprendizagem docente dos futuros professores ainda em formação.

Nessa perspectiva, realizamos entrevistas narrativas com as acadê-micas do terceiro ao oitavo semestre. Essas entrevistas buscaram construir informações que, agregadas às entrevistas da primeira etapa, nos possibili-tam apontar para quais possíveis concepções sobre a aprendizagem docente balizam os movimentos construtivos da professoralidade, mesmo que ainda incipientes nessa fase de formação. Os estudos que tem pautado a investiga-ção são de: Garcia (1999), Bolzan (2002, 2007, 2008, 2009, 2010); Vygotski (1993, 1994); Leontiev (1984), Ferry (2004) entre outros. Em função da orga-nização da pesquisa, este estudo apresenta-se alicerçado por uma abordagem narrativa sociocultural.

As entrevistas realizadas na terceira etapa da pesquisa com as aca-dêmicas do curso de Pedagogia/UFSM encontram-se ainda em processo de análise e categorização. Com base nos dados construídos na primeira etapa, foi possível elencar algumas categorias prévias que foram mantidas na análise das entrevistas da segunda etapa, buscou-se, dessa forma, ampliar as possi-bilidades de articulação entre elas. As categorias elencadas na primeira etapa são listadas a seguir:

• Aprendizagem docente: revela-se na compreensão de inacaba-mento e na busca de uma continuidade formativa assentada nas experiências e reflexões estabelecidas mediante aconteci-mentos produzidos na relação pedagógica;

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328 BOLZAN, D. P. V. et al. - A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM

• Trabalho pedagógico: diz respeito aos processos pertencentes à prática docente em ação, envolvendo os modos de organiza-ção e reorganização das estratégias didáticas;

• Atividade docente de estudo: abrange os movimentos for-mativos que emergem como exigência da profissão docente, sendo inerente a mobilização dos sujeitos na busca da quali-ficação docente. Os movimentos destacados nesse processo são a alternância pedagógica e resiliência docente eixos que perpassam as três categorias elencadas.

□ A alternância pedagógica caracteriza-se como espa-ço/tempo transacional entre o fazer (prática docente) e a produção de conhecimento sobre esse fazer (ação formativa), exigindo do professor, ou do futuro pro-fessor, certo afastamento que lhe possibilite tomar sua ação como objeto de análise (FERRY, 2004).

□ A resiliência docente é a capacidade de reorganiza-ção interna do sujeito frente aos desafios e conflitos vivenciados na profissão. Configura-se no enfren-tamento do docente com as situações adversas que lhes são apresentadas e implica novas formas de sa-ber e fazer a docência (BOLZAN, 2010b).

Neste trabalho, focaremos nossas discussões na categoria “atividade docente de estudo”, por considerar que a problematização dos movimentos formativos sinalizam para o entendimento de como os estudantes se mobili-zam para aprenderem a ser professores e ao mesmo tempo os enfrentamentos impostos pela formação, situação essa, considerada por nós, necessária para a qualificação da profissão docente.

TECENDO AS TRAMAS DA ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO COM AS NARRATIVAS DOS ESTUDANTES

Como salientamos anteriormente, este estudo apresenta-se como um recorte de um projeto maior, no qual estão previstas a realização de entre-vistas com 29 acadêmicas do curso de Pedagogia (3º ao 8º semestre). Até o momento, foram realizadas 17 entrevistas e 11 foram analisadas. Tendo como foco de análise para este trabalho a categoria “atividade docente de estudo”, apresentamos algumas questões balizadoras, quais sejam: as/os estudantes re-conhecem a necessidade da aprendizagem da docência? Quais os motivos que as/os impulsionam a desenvolver a atividade da aprendizagem da docência? Quais as ações e operações que elas/eles planejam/concretizam para atingir este objetivo maior que é a aprendizagem da docência?

Ao buscarmos visualizar se as acadêmicas do curso de Pedagogia re-conhecem a necessidade de aprendizagem da docência, evidenciamos algu-mas falas que ilustram esta questão:

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 329

Eu acho que a prática vai me mostrar [...] é isso mesmo, de chegar aqui e tomar aquela teoria, eu sei que é necessário, eu sei que lá no final do curso eu vou sentir falta da disciplina de Psicologia que eu participei no primeiro e no segundo semestre. Acredito que vou precisar desses conhecimentos quando for fazer meu TCC, ou até antes [...] (AU, 7º Semestre).

Esses dias nós estávamos discutindo na disciplina de Práticas Educativas (PED) isso também. Porque nós não temos a prática. Nós temos somente teoria no início do curso. Pra que eu quero isso? Eu vejo que na teoria tudo é muito lindo [...], as professoras dizem que: “teoria e prática estão juntas, tu não vais conseguir uma sem a outra”. E eu acho que falta um pouco mais, no início do curso, os professores nos explicarem melhor esta relação entre teoria e prática, que nos façam entender porque nós precisamos disso, porque vamos chegar no sexto e sétimo semestre e vamos precisar daquelas disciplinas, pois muitos não dão valor, desistem, falam mal do curso, ou fazem de qualquer jeito só para ser aprovado (NA, 3º Semestre).

Nessas falas, as acadêmicas destacam que compreendem a necessi-dade de uma base teórica, atrelada a uma vivência prática desde o início do curso. Concebem que essa relação entre a teoria e a prática provocará um redimensionamento para a qualificação de sua aprendizagem docente, posto que o objetivo do curso é a formação do professor. De acordo com Leontiev (1984), a formação da necessidade/do fim consiste em dizer que os fins não se inventam, eles emergem de condições objetivas. E é isso que constatamos nessas narrativas, pois as condições objetivas são ilustradas pelos extratos grifados em negrito. Segundo Leontiev (1984), esse “fim” depende de um motivo. Esse, por sua vez, é essencial à mobilização do sujeito para o de-senvolvimento da atividade na perspectiva vygotskiana. Para “saber se dis-por para atividade”, o sujeito precisa compreender os motivos, mediante os quais necessita para realizar a atividade, ou seja, para aprender um conteúdo, independente de sua natureza, deve querer aprender, estar disposto ao desa-fio. Caso contrário, os processos pelos quais o sujeito realiza para aprender não passarão de reprodução, pois não atribuirá um significado para que essa aprendizagem se estabeleça.

Dessa forma, confirmamos que os estudantes precisam encontrar sen-tido nas disciplinas teóricas ministradas no início da formação, pois esse ele-mento está relacionado à falta de oportunidades de experiências práticas no início do curso. Evidenciamos que os estudantes passam a procurar outros motivos que os mantenham no curso de Pedagogia.

É necessária a prática desde o início do curso, mas eu percebo que isso não acontece atualmente, por isso é preciso participar de um grupo de pes-quisa para ter a oportunidade de desenvolver a prática, porque a discipli-na de prática de estágio é somente no sétimo e oitavo semestre. Talvez, se eu estivesse vivenciando esta disciplina, minha opinião seria outra, porque daí eu teria um professor me orientando, mas neste momento não (AL, 5º Semestre).

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330 BOLZAN, D. P. V. et al. - A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM

Eu até acho que o envolvimento em grupo de pesquisa é importante, porque nós vamos aprendendo muitas coisas, ajuda na liberdade para os professores, eles vão ter outras maneiras, outros conhecimentos (TA, 7º Semestre).

Eu acho que o grupo de estudo enriquece muito, eu não me imagino sem o grupo, talvez eu nem estivesse mais no curso. Eu acho que é necessário correr atrás de uma coisa a mais (AU, 7º Semestre).

Entendemos, por meio das vozes dos estudantes, que a possibilidade de participação em grupos de estudo, projetos de pesquisa e extensão vem sanar a falta de oportunidades de prática na fase inicial de formação. A par-ticipação nesses grupos é uma maneira de entrarem em contato e ampliar as possibilidades de qualificação da sua prática escolar. Esse envolvimento tor-na-se o motivo, o aspecto essencial para que a atividade docente de estudo aconteça, visto que é uma oportunidade de ingressarem no contexto escolar. Observamos que as/os estudantes assumem para si a busca de outros espaços de aprendizagem e isso representa o pensar autônomo. Esse, por sua vez, está diretamente ligado à motivação do sujeito para a realização da tarefa de estu-do; na concepção autônoma dessa tarefa, ou seja, a tomada de consciência do que temos que fazer nessa tarefa, e na projeção de uma organização da tarefa, de forma a dominar novos procedimentos de ação (DAVÍDOV; MÁRKOVA, 1987).

A busca pela inserção em grupos de estudo depende de reflexões do próprio estudante sobre suas necessidades formativas diante do desafio de aprender a ser professor. E refletir sobre como essa aprendizagem na docência vem ocorrendo, movimento que caracterizamos como uma alternância peda-gógica ainda em formação, como podem ser vistas especialmente nas duas primeiras narrativas que seguem:

A disciplina de práticas educativas (PED) está me remetendo a refletir. Está sendo bem boa, eu acho que eu me encontrei mais nas séries iniciais (MA, 5º Semestre).

Eu passei por uma crise de existência, “será que eu vou conseguir, será que eu vou dar conta”, mas o que eu percebi é que eu preciso exercitar um pouco mais desse ser professor, porque são poucos os momentos que vivenciamos com as crianças na escola, para então dizer que eu vou ser uma professora ótima, eu vou ser uma professora que não vou dar folhinha, desenhinho, eu não vou dar cartilha, eu não vou proibir eles de irem ao banheiro, vou ser uma professora que vai dominar tudo, eu vou ter resposta pra tudo, eu acho que preciso. Penso que vou ter um pouco de insegurança quando estiver na frente das crianças, vou precisar conquistá-las. Sei que estou bem insegura para a prática de estágio nos primeiros anos (AD, 7º Semestre).

Para eu amadurecer neste aprendizado de aprender a ler, foi realmente es-crevendo. Para aprender precisava reescrever os textos, colocando as ideias em palavras para dar significado para aquelas ideias do texto. Eu aprendo lendo umas trezentas vezes, basicamente escrevendo e lendo novamente. E meu aprendizado se guia nisso mesmo, e exaustivamente lendo, relendo e procuran-do o significado nas entrelinhas (FR, 7º Semestre).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 331

As narrativas indicam, também, algumas ações e operações, mesmo que ainda incipientes. Especialmente na última narrativa, podemos eviden-ciar os três importantes elementos estruturais da atividade de estudo: a com-preensão do estudante sobre a(s) tarefa(s) de estudo a serem realizadas; a operacionalização, pelos estudantes, das ações a serem efetivadas durante o processo de atividade de estudo; e, por fim, a autoavaliação que o próprio es-tudante faz sobre o desempenho e o controle das ações realizadas (DAVÍDOV; MÁRKOVA, 1987). Esses elementos coadunam no processo de percepção da necessidade de uma melhor qualificação, posto que organiza uma linha de ação que vai da compreensão e da operacionalização para a autoavaliação do processo pelo próprio estudante.

DIMENSÕES CONCLUSIVASAs discussões das narrativas nos possibilitam compreender como a ati-

vidade docente de estudo se estabelece no processo de aprendizagem docente na formação inicial de estudantes do curso de Pedagogia, a partir do momento em que conseguimos sinalizar algumas questões referentes à necessidade, ao motivo e às ações e operações realizadas por esses estudantes. Corroboramos que há a percepção da necessidade da busca de outros espaços, que não apenas as disciplinas curriculares, para a qualificação de sua formação inicial. Esses espaços surgem, então, como um motivo para a continuidade do curso e para a qualificação profissional, já que é com base nas experiências práticas viven-ciadas nos grupos de estudo, pesquisa e extensão que os estudantes buscam sanar a falta de prática no início do curso. No entanto, apesar dessa percepção da necessidade da busca por melhorar sua qualificação, é pouco evidenciado nas narrativas dos estudantes as ações que realizam para que a qualificação seja alcançada. Temos ainda a forte evidência de uma situação de paternalis-mo em que a/o estudante, em seu papel de aprendiz, não se mobiliza para a re-flexão de suas necessidades teóricas e práticas, embora participe e reconheça a importância da inserção nos outros espaços como potencializadores da sua qualificação profissional.

REFERÊNCIAS

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332 BOLZAN, D. P. V. et al. - A ATIVIDADE DOCENTE DE ESTUDO E A APRENDIZAGEM

______. Aprendizagem docente e processos formativos: movimentos constru-tivos da professoralidade na Educação Básica e Superior. Registro no GAP: 020117. Projeto de Pesquisa Interinstitucional e integrado CNPq/PPGE/CE/UFSM, 2010-2012. Relatório Parcial de Pesquisa Interinstitucional e inte-grado CNPq/PPGE/CE/UFSM, 2010.______.; POWACZUK, A. C. H.; SANTOS, E. A. G. S.; FIGHERA, A. C. M.; ROSSETTO, G. A. R. S. Aprendizagem Docente: Possibilidades de qualifica-ção dos processos educativos e as IES. (Apresentação de trabalho.) Seminário Internacional Qualidade na Educação: Indicadores e Desafios. 14 e 15 de outubro de 2010.BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto – Secretaria de Educação Fundamental. Lei n. 9.394/96. LDB − Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 1996.BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Parecer CNE/CP n. 5, de 13 de dezembro de 2005.BRASIL. Conselho Nacional de Educação, Conselho Pleno. Resolução CNE/CP n.1, de 15 de maio de 2006b.DAVÍDOV, V.; MÁRKOVA, A. El desarrollo del pensamiento em la edad es-colar. In: ______.; SHUARE, M. (Orgs.) La psiologia evolutiva y pedogógica em la URSS. Moscou: Progresso,1987. p. 173-193.FERRY, G. Pedagogia de la formación. Buenos Aires: UBA. FFyl. Ediciones Novedades Educativas, 2004.GARCIA, C. M. Formación del profesorado para el cambio educativo. Barcelona: Ediciones Universitarias de Barcelona, 1999. KUENZER, A. Z.; RODRIGUES, M. As diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia: uma expressão da epistemologia da prática. In: SILVA, A. M. et al. (orgs.). Novas subjetividades, currículo e questões pedagógicas na pers-pectiva da inclusão social. Recife: Bagaço, 2006. Disponível em: < http:// ced.ufsc.br > Acesso em: 7 set. 2007.LEONTIEV, A. N. Actividad, Conciencia, Personalidad. México: Editorial Cartago de México. 1984.LIBÂNEO, J. C. Diretrizes curriculares da Pedagogia: um adeus à Pedagogia e aos pedagogos? 2006. (Apresentação de Trabalho/Simpósio). Disponível em: <http:// ced.ufsc.br > Acesso em: 7 set. 2007.LIBANEO, J. C.; PIMENTA, S. G. Formação dos profissionais da Educação: visão crítica e perspectivas de mudança. In: PIMENTA, S. G. (org.) Pedagogia e pedagogos: caminhos e perspectivas. São Paulo: Cortez, 2002.VYGOTSKI, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.______. A formação social da mente. São Paulo: Martins fontes, 1994.

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FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO NÍVEL SUPERIOR: O OBSTÁCULO DAS CRENÇAS

Althiere Frank Valadares CabralFábio Alexandre Araújo dos Santos

José Jairan ValdevinoSandra Salustiano Dias da Silva

A formação do professor que trabalha no Ensino Superior, no con-texto da formação docente, é, em certo nível, negligenciada. Tal

negligência será posta em foco neste trabalho, uma vez que percebemos tal formação ocorrendo de maneira pontual, sem a devida sistematização. Procuraremos pontuar ainda como a crença das pessoas envolvidas no proces-so interfere no processo formativo do profissional.

A formação do professor do nível superior vem se configurando como um dos pilares na reconstrução tanto da profissão de professor quanto do ce-nário socioescolar vigente, isso se explica porque essas relações intrínsecas entre formação e educação são históricas ao longo do desenvolvimento da civilização.

Basicamente, em relação à formação do professor do Ensino Superior, algumas problemáticas são constantes e retratadas em várias pesquisas cien-tíficas, tanto nacionais como internacionais (ZEICHNER, 1996; GARCIA JIMENEZ, 1987; PIMENTA; ANASTASIOU, 2007).

AS CRENÇAS NA BASE DO PROBLEMAAs principais problemáticas referem-se justamente à falta de unidade

da própria formação em consonância com as demandas socioculturais. Não somente essa falta de unidade, mas também o aparente despreparo para o exercício acadêmico, o conteúdo excessivamente técnico e hiperespecializado sem abertura à transdisciplinaridade do conhecimento e as tipologias e/ou ca-tegorias distintas de professores atuando no Ensino Superior conforme a sua área de conhecimento.

Pensando ainda sobre as principais problemáticas da formação em nível superior, tem-se certo desconhecimento da missão e dos objetivos do Ensino Superior (MASETTO, 2003) por parte dos professores que inte-gram tal nível de ensino, e isso, claro, corrobora a construção das crenças. Quanto a tais crenças docentes que, geralmente, são esquecidas nos tópicos da formação do professor, muito ainda há por discutir, uma vez que elas não necessariamente estão relacionadas ao contexto escolar, mas interferem diretamente nele.

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334 CABRAL, A. F. V. et al. - FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO NÍVEL SUPERIOR

Assumimos que as problemáticas oriundas do contexto da formação docente não se esgotam nesse conjunto evidenciado acima. Contudo, essas problemáticas elencadas poderão auxiliar, possivelmente, na compreensão do papel dos impactos das crenças ao longo da atuação do professor em seus lócus de trabalho, assim como na possibilidade de mudança de sua postura enquanto professor.

Sendo assim, investigamos a formação do professor no Ensino Superior no intuito de desvelar como vem sendo tratado o perfil do professor em formação, e por sua vez o perfil do professor que forma esses professores, pois o aspecto mais relevante a ser refletido, nesse momento, é justamente a figura e o perfil do professor formador nesse nível de ensino.

A primeira problemática a destacar consiste na falta de unidade da formação do professor universitário. Isso em relação às demandas sociocultu-rais são questões que assolam a formação docente desde seus primórdios. Essa falta de unidade provoca grandes lacunas na formação profissional, como, por exemplo, no que refere-se ao sentimento presente nos alunos, geralmente na maioria deles, quanto à desarticulação entre os conteúdos que aprendem nos cursos de licenciaturas e bacharelados e as realidades exigidas pelo pró-prio trabalho (TARDIF, 2002). Essa desarticulação acaba, por várias vezes, desconectando o aluno do seu futuro trabalho, inclusive leva-o a pensar que tudo que aprendeu em sua formação não resultará em competências essenciais ao desenvolvimento de seu trabalho. É uma sensação de “desconforto” e “de-sencantamento” que faz o aluno pensar que sua formação está incompatível com as demandas do campo de trabalho que ele está se propondo a entrar. Essa crença tem vital importância para avaliar os rumos que estão sendo to-mados pelas formações profissionais nas instituições universitárias.

As avaliações institucionais, geralmente, se preocupam com os índices de rendimento dos alunos para conceituar bem ou mal cada curso, que ocorre com base na competência conteudinal oferecida por eles, mas não se preocu-pam tanto, ou melhor, não evidenciam tanto a avaliação que se dá no nível das competências necessárias ao trabalho desse aluno quando na condição de profissional. Avaliar o conteúdo das áreas de conhecimento e suas relações com o mundo do trabalho, com a ciência, com a tecnologia, com a diversidade cultural é tão importante quanto apenas avaliar se o aluno apreendeu o con-teúdo veiculado por cada curso por meio de suas disciplinas. É preocupante somente avaliar estatisticamente o rendimento por meio da compreensão dos conteúdos considerados vitais para a formação profissional sem conhecer com profundidade os “porquês” e os motivos reais que geram tais números negati-vos em relação aos conceitos de cada curso ou até os conceitos altos.

A referida falta de unidade na formação também decorre das dificul-dades de reavaliação do próprio curso e da própria área de conhecimento pro-venientes da profusão de conteúdos que emergem de forma muito veloz. Isso dificulta até mesmo a seleção de quais conteúdos são mais relevantes para serem veiculados nos processos de ensino-aprendizagem.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 335

Dessa forma, voltamos a refletir sobre certa liberdade referente ao ato de ensinar dos professores do Ensino Superior, principalmente pela crença de que as titulações de doutorado, as experiências de ensino em termos de tempo cronológico e, certamente, os vícios do ato de ensinar que regulam as ações docentes já “garantem” um processo de formação profissional promissor e adequado para a transposição para o campo do trabalho futuro. Tudo isso acaba por contribuir para uma “despreocupação” de quem discute tal universo em termos do professor estar bem ou malpreparado, sobretudo não se revela a necessidade de continuar se formando.

Essa crença de que ter titulação de mestrado ou doutorado, bem como ter muitos anos de experiência enquanto professor, aliada à ideia de que já sabe o suficiente e, portanto, não carece de mais formação, ou, ainda, a exis-tência de formações, frequentemente pontuais e superficiais, ora pelo profes-sor considerar, muitas vezes, desnecessárias, ora por considerar insuficientes para a melhoria de sua formação inicial e de suas experiências profissionais, ora por desejar, mas ser impedido pelo seu regime de trabalho e suas atri-buições, colabora intensamente para a desprofissionalização do professor no tocante à crença de que a formação tem pouco impacto no seu fazer e modificação pedagógicos. Essa mesma crença e questionamentos acerca dos reais impactos das formações continuadas, no caso dos professores formado-res do Ensino Superior, consistem em verdadeiros entraves na compreensão da importância da formação continuada e, consequentemente, dos impactos dela na formação do professor. Essa falta de interesse ocorre, principalmente, pela inexpressividade dos cursos de formação que, em geral, não satisfazem nem seduzem o professor de nível superior para uma incursão e renovação. É importante destacar que, enquanto profissional formador, o professor nunca cessa de aprender.

A falta de unidade na formação compromete também a essência dos conteúdos, as metodologias aplicáveis à difusão desses conteúdos e a percep-ção dos alunos sobre a importância de se aprender de forma interdisciplinar e concatenada com as demandas socioculturais e profissionais exigidas pelo profissional em sua prática de trabalho. Essa mesma problemática permite que o professor repita sempre os mesmos conteúdos. Porém não se pretende afirmar aqui que a escolha por conteúdos preexistentes sejam desnecessários, pois se reconhece a importância de conteúdos clássicos para a formação do profissional, o que não invalida o professor de ajustar ou relacionar esses com conteúdos emergentes e socialmente reconhecidos na sua realidade.

Essa seleção de conteúdos frequentemente não é revisada criticamente pelos professores, e sim transpostos para os cenários das salas de aulas, por-tanto da formação docente, geralmente sem contextualização, ou seja, somen-te de forma mecânica, como se o planejamento atual pudesse ser transcrito de um planejamento anterior. Isso acontece principalmente com os professores que atuam em cursos que não são licenciaturas, uma vez que não destinam

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336 CABRAL, A. F. V. et al. - FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO NÍVEL SUPERIOR

tanto o seu tempo e suas reflexões para a fundamentação pedagógica que lhes deveriam exigir replanejamentos permanentes. Cada sala de aula, cada aluno, cada contexto difere um do outro, mesmo que seja concomitante ou contem-porâneo, e, por isso, é injustificável um mesmo planejamento para prosseguir com suas aulas. Nesse sentido, o professor torna-se muito mais um “trans-missor de informações adquiridas em nível de maior requinte” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2007) do que propriamente um professor capaz de formar o alunado utilizando-se de conteúdos mais renovados, relacionados e articula-dos com sua formação vigente.

É pertinente salientar que essa visão restrita referente à transmissão da informação e não na produção de conhecimento, sobretudo na formação profissional de qualquer área do saber científico e sociocultural, advém da percepção de que a competência do conteúdo específico ou profissional abs-traído ou memorizado pelo aluno em formação é suficiente para sua profis-sionalização. Pimenta e Anastasiou (2007, p. 178) afirmam em relação a essa visão restrita, reducionista e simplista que

neste contexto, a ação de pesquisar e ensinar torna-se numa possibilidade e, ao mesmo tempo, num desafio, tanto na construção da identidade do docente como profissional professor quanto na revisão das ações em sala de aula.

De acordo com a citação acima, percebe-se que ser professor não se restringe apenas ao universo da sala de aula por meio das práticas pedagógi-cas cotidianas. Ao professor compete, além das práticas de ensino, as práticas de pesquisa e de extensão. Um professor sintonizado com as competências de investigar, de problematizar, de refletir criticamente sobre determinado objeto de estudo constitui-se em um profissional apto a conduzir ou mediar o aluno no processo de pensar sobre sua própria conduta, sobre o saber disseminado em sua formação, a relacionar teoria com as experiências pedagógicas vi-venciadas em seu trabalho, além de estar intensamente comprometido com a curiosidade, com a potencialidade criativa de não se conformar de forma passiva e definitiva diante do conhecimento que ora lhes é apresentado.

A realidade contida no interior das escolas, e porque não inserir nesse contexto as instituições de Ensino Superior, sobretudo as instituições deno-minadas de mercantis, ou seja, que não se preocupam muito com a qualidade pedagógica devido, justamente, a condições já citadas neste trabalho e pelo referencial mercadológico que a orienta, não está distante da realidade de um professor que se afirma formador profissional sem sequer problematizar o co-nhecimento, investigar e formar grupos de pesquisas, limitando-se a ser mero executor do programa curricular determinado institucionalmente (NÓVOA, 1992). A atitude investigativa e problematizadora deveria ser a competência básica de qualquer professor em qualquer nível de ensino, porém é sabido que a realidade não se configura dessa maneira. Nessa dimensão, a criatividade é um componente interessante para tal atitude, além do pensamento flexível, aberto, interdisciplinar e sedento de curiosidade.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 337

Diante do exposto em relação às tipologias utilizadas para classificar as instituições de Ensino Superior, somente as classificadas como regionais e de pesquisa favorecem em seu regime de trabalho as condições ambientais para o desenvolvimento dessas mesmas atitudes comentadas acima.

Infelizmente, o perfil do professor que vem de uma formação univer-sitária não atende a uma universalização. A configuração do perfil desse pro-fessor, isto é, se ele corresponde a um professor pesquisador − e entende-se como pesquisador não somente a produção de pesquisa científica por meio de grupos organizados e certificados por instituições de pesquisas reconhecidas social e academicamente −, ou se ele é mais um executor de “pacotes peda-gógicos”, dependerá, em grande parte, das relações socioprofissionais esta-belecidas entre ele e a instituição, os alunos e o mundo do trabalho de forma dialética e (re)construtiva. A própria ciência vem-se modificando ao longo do tempo, e isso exige, por parte do professor, uma revisão das disciplinas. É ne-cessário levar em consideração que as competências profissionais também se modificam, portanto os conteúdos se modificam, bem como as metodologias e outras variantes da educação em seus distintos níveis de ensino (MORIN, 2001). Nesse processo de desarticulação e fragmentação presentes nos proces-sos formativos, em geral, percebe-se que o professor constitui-se em um mero

“transmissor de informações”, ao invés de se constituir enquanto professor investigativo, crítico e criativo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A formação do professor que atua no nível superior traz em si a neces-sidade de reflexão constante no sentido de atender os anseios que a sociedade espera desse profissional. Neste trabalho, procuramos concatenar discussões teóricas que primaram por entender as crenças que perpassam a formação do professor, especialmente o professor do nível superior.

A formação desse profissional, sobretudo no âmbito dos bacharelados, não atende à pretensa formação transdisciplinar de que tratam os teóricos da Educação. Mais que isso: as competências relacionadas ao ensino continu-am se sobrepondo àquelas voltadas à pesquisa e à extensão. Muitos são os motivos para essa formação estar ainda deficitária, a despeito do aumento significativo de programas de pós-graduação em todo país. Fato que reforça o quadro em que as crenças estão na base dessa formação.

O fato de o professor lidar com seus conteúdos cotidianamente, de renovar seus conhecimentos de forma autodidática e, sobretudo, a falta de tempo e de condições ideais para a formação continuada são elementos que substanciam a construção de crenças contrárias a uma formação ideal. Diante desses desafios, que não são naturais, mas se configuram como comuns no meio de formação acadêmica, percebemos que as competências profissionais de um professor do nível superior estão fortemente marcadas pelas crenças

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338 CABRAL, A. F. V. et al. - FORMAÇÃO DO PROFESSOR DO NÍVEL SUPERIOR

pessoais, por elementos contingenciais e por fatores institucionais que, para serem repensados e reelaborados, precisam de um trabalho sistemático que abarque as crenças e os elementos constitutivos dessas crenças.

REFERÊNCIAS

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A EDUCAÇÃO SUPERIOR E AS MODIFICAÇÕES CURRICULARES DAS

LICENCIATURAS NO RIO GRANDE DO SUL

Elizabeth D. KraheJuliana Arnor

O tema “educação” está cada vez mais em pauta nas políticas go-vernamentais brasileiras. Assim, discutem-se novas teorias e

análises sobre diferentes formas de se chegar ao mesmo índice de qualidade educacional atingido pelos países desenvolvidos. Pela atualidade do tema e pela crescente demanda de ações voltadas à formação de professores para a Educação Básica, formou-se um grupo de pesquisa com o objetivo de anali-sar currículos de licenciaturas das universidades gaúchas. Objetivamos, dessa forma, evidenciar os processos de reformulação de currículos de cursos de formação inicial docente em nível superior, seja por meio da análise de grades curriculares ou testemunhos de professores em entrevistas. Buscamos fazer uma análise comparativa do processo de construção dos currículos das licen-ciaturas de acordo com as demandas legais de educação do nosso país. Este estudo aborda os novos e os antigos currículos de licenciaturas, focando nas possíveis diferenças e inovações entre o professor técnico-instrumental, de décadas atrás, e o professor autônomo e reflexivo das propostas oficiais atuais, nas quais percebemos uma mudança de racionalidade e embasamento teórico-

-prático na formação dos licenciados. O conjunto desse estudo nos remete a conclusões que indicam a origem do novo modo de ser professor.

OBJETIVOEste trabalho é a base das discussões acadêmicas realizadas com

orientandos e alunos no PPG em Educação da UFRGS e serve de apoio às pes-quisas realizadas por orientandos de mestrado e doutorado da professora pes-quisadora Elizabeth D. Krahe. Atualmente estão em andamento dois trabalhos de mestrado e seis de doutorado, todos na linha de pesquisa “Universidade teoria e prática”, a qual esta pesquisa se filia, complementares ao aqui expos-to. Este trabalho de pesquisa, inicialmente previsto para durar três anos, foi estendido até 2012 em razão da dimensão que tomaram as discussões da ques-tão das licenciaturas, presenciais e a distância, nas propostas governamentais brasileiras atuais.

O projeto “Modificações curriculares na formação de professores para a Educação Básica: consequências das determinações legais do MEC-BRASIL em licenciaturas no RS”, do qual aqui apresentamos alguns dados, tem como objetivo principal evidenciar mudanças curriculares nas licencia-

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340 KRAHE, E. D. et al. - A EDUCAÇÃO SUPERIOR E AS MODIFICAÇÕES CURRICULARES

turas da UFRGS e de mais duas universidades gaúchas com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96) e Resoluções com-plementares (Resoluções CNE/CP1 e CNE/CP2).

METODOLOGIA

Esta pesquisa se baseia em dados extraídos de documentos históri-cos e atuais das universidades, currículos e suas adequações e depoimentos de participantes ativos das reformas. A metodologia comparativa escolhida desenvolve-se em quatro etapas:

• contextualização;• compreensão dos dados obtidos;• justaposição dos elementos encontrados;• comparação.

Coletamos os dados por meio de informações disponibilizadas nas bi-bliotecas, nas ComGrads (Comissão de Graduação), nos sites das universidades estudadas e também mediante entrevistas com docentes e gestores partícipes de tais reformulações curriculares, acompanhadas por estudos de documentos históricos de cada instituição. Na primeira etapa, analisamos individualmen-te as grades curriculares antigas (pré-diretrizes das licenciaturas) e as atuais de alguns currículos de cada universidade e, posteriormente, comparamos as grades entre si e entre as universidades envolvidas. Após estabelecerem-se as comparações entre os antigos e os novos currículos, procuramos identificar se as normas quanto a modificações de racionalidade estavam sendo cumpridas ou se as adequações não passavam de mudanças superficiais por força da Lei.

DISCUSSÃO E RESULTADOS PARCIAISBuscamos analisar todos os currículos das licenciaturas, procurando

modificações e continuidades, como exemplificamos a seguir com a análise curricular comparativa do curso de licenciatura em Matemática em duas uni-versidades gaúchas privadas, com base nos currículos anteriores e posteriores à legislação.

Universidade Privada I: aproximação das áreas pedagógicas e espe-cíficas.

O curso de Matemática na Universidade Privada I surgiu em 1964. Em 1996, precisou fazer adequações profundas em razão da LDB e de suas determinações, como a redução do número total de suas disciplinas (32%) e o aumento de disciplinas pedagógicas (71%). Ou seja, o número de disciplinas específicas, que representava 78% do curso, passou a representar 63% do total da grade curricular. Desse modo, não só o número de disciplinas sofreu alte-rações como também o tempo total de curso foi alterado − de oito semestres passou a sete semestres.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 341

Universidade Privada II: continuidade das licenciaturas isoladas, com as disciplinas pedagógicas dentro de cada institutoAo analisarmos os currículos do curso de Matemática na Universidade

Privada II, destacamos que o programa de 1976 (que sofreu pequenos ajustes ao longo dos anos) passou por muitas modificações. Além do tempo de curso que aumentou (de três para quatro anos), a carga de disciplinas pedagógicas e o modo como o curso está sendo apresentado sofreram mudanças. O licen-ciando conta com disciplinas como laboratório de matemática, libras, recursos tecnológicos e disciplinas ligadas à informática em sala de aula.

Fundamentalmente, a carga horária do curso não sofreu alterações, mas está mais bem distribuída ao longo dos semestres. No gráfico 4 (anexo), aparece um resumo da evolução do curso, em que podemos notar que houve uma redução em 33% no número de disciplinas específicas com relação ao currículo antigo; já o número de disciplinas práticas aumentou, enquanto que o número de disciplinas pedagógicas se manteve. Com isso, o currículo atual está mais equilibrado. Proporcionalmente, as disciplinas pedagógicas, soma-das às práticas, representam 37% do total das disciplinas, o qual apresenta um aumento de dois semestres de curso.

Ao analisarmos tais grades curriculares e as realidades apresentadas por cada universidade, é evidente o confronto entre as duas racionalidades ainda presentes nas propostas de formação de professores (ver tabela 1 e grá-fico 2 no anexo:

a) Racionalidade técnico-instrumental, (3+1): o futuro profes-sor não possui nenhum contato com a sala de aula até o ter-ceiro ano de curso, estuda apenas as disciplinas específicas de cada área e no último ano tem sua bagagem pedagógica apresentada nos estágios e aulas de didáticas.

b) Racionalidade prática: ênfase na autonomia e refletividade do licenciando, que representa o novo modo de se ser/fazer professor, isto é, o aluno de graduação em licenciatura respira sala de aula durante toda a sua jornada acadêmica e sai da universidade ciente da sua escolha e profissão.

RESULTADOS OBTIDOS

Considerando o conjunto das políticas oficiais e seus desdobramen-tos nas instituições formadoras, os dados até agora coletados indicam que, nas universidades em questão, o modelo proposto é baseado na racionalidade prático/reflexiva, no qual a formação da identidade do professor tem sua di-mensão garantida já a partir do início dos estudos superiores, seja, por meio das disciplinas pedagógicas seja pelos laboratórios de ensino e estágios. As

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342 KRAHE, E. D. et al. - A EDUCAÇÃO SUPERIOR E AS MODIFICAÇÕES CURRICULARES

concepções e as necessidades do aluno são discutidas no primeiro semestre de cada curso, embora a carga de disciplinas específicas de cada curso seja extremamente maior que a carga pedagógica. Foi possível notar que as mu-danças ocorridas são muito significativas e mostram que o modo de se formar um professor está se encaminhando diretamente para o alcance das metas es-tipuladas pela LDB de 1995. Além disso, o resultado final foi o olhar mais crítico a respeito das mudanças ocorridas e da realidade de formação do novo professor; o questionamento e a análise que devem existir no que se refere às atitudes e posturas que eles devem assumir, assim como buscando um enfo-que no aluno e no tipo de pessoa que esperamos que se constitua. “[...] Essas diretrizes tornam-se fundamentais para que o futuro professor possa acompa-nhar a renovação da historiografia de modo crítico-reflexivo. Ele ainda será capaz de atuar no planejamento e implementação de atividades docentes em consonância com as exigências da autodeterminação para a aprendizagem contínua” (Apresentação do curso de história da Universidade II).

Nas três instituições pesquisadas, as mudanças apontam para propostas voltadas à racionalidade prática: “[...] A prioridade do curso é a formação de um professor de escola básica, um pesquisador crítico e capaz de articular em sua prática docente as dimensões da gestão dos processos educativos. Nesse proces-so, a problemática do mundo de trabalho e dos desafios de uma educação inclu-siva será uma preocupação constante” (Apresentação do curso de Pedagogia da Universidade II). Aqui, o novo professor é visto como sujeito reflexivo, autôno-mo, crítico e criativo, capaz de trabalhar na escola que se quer: inclusiva, crítica e formadora de cidadãos para a sociedade contemporânea e para além dela.

REFERÊNCIAS

BRASIL, LEI n. 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996. Fixa as diretrizes e ba-ses da educação nacional. Diário Oficial, Brasília: v. 134, n. 248, 23 dez. 1996.

______. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 1, de 18 de fe-vereiro de 2002. Diretrizes Curriculares Nacionais para formação de pro-fessores da Educação Básica, em nível superior, cursos de licenciatura, de graduação plena. Março de 2002.______. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CP 2, de 27 de agos-to de 2004. Adia o prazo previsto no art. 15 da Resolução CNE/CP 1/2002, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para formação de professores da Educação Básica, em nível superior, cursos de licenciatura, de graduação plena. Agosto de 2004.KRAHE, Elizabeth D. Reforma curricular de licenciaturas: UFRG (Brasil) – UMCE (Chile); década de 1990. Porto Alegre: UFRGS Editora, 2009.POPKEWITZ, Thomas S. Modelos de poder y regulación social en pedago-gía: crítica comparada en las reformas contemporáneas de la formación del profesorado. Barcelona: Pomares-Corredor, 1994.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 343

SANTOS, Boaventura de Souza. Para um novo senso comum: a ciência, o direito e a política na transição paradigmática. São Paulo: Cortez, 2000, v. 1. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. SCHÖN, Donald. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000STENHOUSE, Lawrence. La Investigación como base de la enseñanza. Madrid: Morata, 1987.TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2003, 3. ed.

ANEXOSTabela 1. Distribuição das disciplinas do curso de Licenciatura em Matemática na Universidades Privada 1.

UNIV. PRIVADA 1 Currículo antigo Currículo novo

Nº disciplinas específicas 38 26

Nº disciplinas pedagógicas 7 12

Nº disciplinas práticas 4 3

Nº semestres do curso 8 7

Total de disciplinas 49 41

Fonte: Autoras.

Diante de todos esses números apresentados, podemos destacar que não só o número de disciplinas sofreu alterações como também o tempo total de curso foi alterado − Antes eram oito semestres, ou seja, quatro anos; agora são sete semestres, isto é, 3,5 anos de curso.

A seguir, o Gráfico 1 mostra o comparativo entre os currículos estu-dados do curso de licenciatura em Matemática na Universidade Privada 1. Podemos notar a redução no número de disciplinas específicas e práticas e o aumento do número das disciplinas pedagógicas.

Gráfico 1. Comparativo entre os currículos.Fonte: Autoras.

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344 KRAHE, E. D. et al. - A EDUCAÇÃO SUPERIOR E AS MODIFICAÇÕES CURRICULARES

A Tabela 2, na sequência, mostra um resumo da evolução do curso. Podemos notar que houve uma redução em 33% no número de disciplinas com relação ao currículo antigo, porém o número de disciplinas práticas au-mentou, enquanto que o número de disciplinas pedagógicas se manteve. Tabela 2. Resumo da evolução do curso.

UNIV. PRIVADA 2 Currículo antigo Currículo novo

Nº disciplinas específicas 39 26Nº disciplinas pedagógicas 10 9Nº disciplinas práticas 4 5Nº semestres do curso 6 8

Total de disciplinas 53 41

Fonte: Autoras.

No Gráfico 2, apresentamos o número de disciplinas do currículo.

Gráfico 2. Número de disciplinas do currículo.Fonte: Autoras.

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CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR TUTOR NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: UMA ANÁLISE COM BASE NA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE DO

VALE DO RIO DOS SINOS (UNISINOS)

Taís SchmitzMaria de Lourdes Borges

O presente trabalho pretende situar a experiência de implementação da tutoria na Universidade do Vale dos Sinos em São Leopoldo

(UNISINOS) em diferentes disciplinas e cursos da graduação, objetivando a qualidade e analisando a Educação a Distância como um processo histórico, constituído e implementado dentro de uma política educacional vigente.

Para o entendimento dessa experiência, primeiramente abordaremos os pressupostos da constituição da Educação a Distância por meio da sua contex-tualização histórica, bem como das mudanças que esse novo cenário demanda, tal como a figura do professor tutor. Dentro desse processo, a UNISINOS op-tou pela institucionalização da função do professor tutor. Finalmente, as consi-derações finais apontam para a necessidade da Educação a Distância transfor-mar-se em uma ação efetiva na educação brasileira, assentando-se como uma possibilidade de acesso e possibilitando a democratização do ensino formal.

CONCEITOS INTRODUTÓRIOSA humanidade vem sendo marcada por uma nova revolução: a

Revolução Tecnológica. Essa, por sua vez, vem modificando e influenciando cada vez mais o modo de ser, agir, enfim, o modo de viver de toda sociedade global. Como não poderia deixar de ser, essa revolução tem influenciado de modo significativo o campo educacional. E nesse contexto de mudanças, educadores e educandos têm refletido a necessidade de compreender essas transformações e como incorporá-las, socializando experiências. Pensemos, então, de que maneira a inclusão do virtual vem contribuindo para a educa-ção. Segundo Tarouco (2010), a Internet pode propiciar o “estar junto”, por meio do mundo virtual, vivenciando com eles o processo de construção do conhecimento.

Para Casper e Iser (2009), a busca de interação vem impulsionando o desenvolvimento de mecanismos que permitem a ação compartilhada da infor-mação no sentido da comunicação. Um salto de qualidade, pois a interativida-de homem/máquina, por meio do uso de computadores como recurso didático, permite o acesso a conteúdos que estão na memória do computador, podendo assim se constituir na informação que se deseja, no ritmo e forma pessoais.

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346 SCHMITZ, T. et al. - CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR TUTOR

Tratar, então, da Educação a Distância significa trabalhar com um tema que represente romper com um ciclo predeterminado há muito tempo. Esse rompimento, no entanto, não pode ter em sua base a substituição de sistemas presenciais por sistemas à distância. Essa afirmação é colocada com um sentido de certa obviedade, já que, em nosso país, propostas de inovações metodológicas são tomadas quase sempre na perspectiva de solucionar pro-blemas de acesso e permanência de alunos nos sistemas de ensino.

A Educação a Distância tem em sua base a ideia de democratização e facilitação do acesso à escola, e não a ideia de suplência ao sistema regular estabelecido, nem tampouco a implantação de sistemas provisórios. Ela se estabelece em sistemas fundados na educação permanente, demanda que a sociedade nos impõe hoje como forma de superação de problemas relativos ao desenvolvimento econômico e tecnológico que vivenciamos. Portanto, tratar da Educação a Distância não é tratar de algo isolado da educação em geral.

O fazer tutoria no Brasil se expressa de muitas maneiras. Conforme Moran (2011), existem muitos modelos de cursos à distância no Brasil, dentre eles o tipo aula gravada, aula por teleconferência e educação on-line. Assim como os modelos de cursos à distância são numerosos, o papel do professor tutor acompanha tal diversidade, que vai desde o papel de tirar dúvidas, o de ser o elo presencial entre o aluno e o professor conteudista, até o de professor tutor local e virtual.

Entendemos que o professor tutor é um novo profissional no âmbito do ensino. Ele emerge como possibilidade de interface na lógica virtual, pois o processo de construção do conhecimento passa de individual para coletivo, uma vez que é construído de forma conjunta entre professores especialistas, professores tutores e alunos envolvidos (MUNHOZ, 2003).

DIALOGANDO COM OS TEÓRICOS

As alternativas para o Ensino Superior, nas atuais condições de um mundo globalizado e com a possibilidade da aplicação de novas tecnologias de produção e transmissão do conhecimento, levam-nos à lembrança do co-lapso da estrutura da universidade medieval, quando se impôs a instituição da palavra impressa. Nessa estrutura, segundo Casper (2009), a transmissão do conhecimento tinha como suporte principal a presença física do professor que, com sua voz, seus gestos e sua personalidade, representava o meio inequívoco da comunicação do saber. A forma dominante de aprendizagem era realiza-da por meio da memorização do conteúdo dos textos clássicos. Nessa acep-ção, a memorização consistia em armazenar informações necessárias para a constituição de um sólido saber, em que o extraordinário repertório fixado possibilitava a capacidade de criar novas estruturas com base nos códigos estabelecidos, utilizando-se da invenção de imagens e pensamentos baseados no anteriormente memorizado.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 347

A revolução da Tecnologia da Informação (TI) tem sido causa e pro-motora de mudanças. Ela influi diretamente nas formas de transmissão e cons-trução do conhecimento, obrigando a uma mudança estrutural da universidade. A revolução dos meios digitais, atualmente, assim como a da imprensa, na era medieval, força o repensar do como se dá o ato do aprender e do ensinar, que relações estabelecem entre si e quais as perspectivas de futuro possíveis. Apesar de ter sido insinuado como o causador do declínio e do desaparecimen-to do modelo clássico de universidade, uma vez que essa poderia ser substitu-ída por bibliotecas de livros impressos e digitais, que substituiriam os prédios e os professores, o movimento da revolução tecnológica induz à urgência de um novo conceito de ensino.

Respondendo ao desafio da TI, instituída pela imprensa escrita e pro-curando assimilá-la ao ato do ensinar, em 1810, Humboldt estabeleceu uma nova pedagogia. Casper (2009), falando do futuro da universidade e das bi-bliotecas, traz uma contribuição importante para a reavaliação da qualidade do ensino e da educação por toda a vida, com a inclusão das novas tecnologias. As alternativas do ensino a distância poderão influir diretamente na duração dos cursos e no convívio entre as pessoas, mas poderão abrir possibilidades de interação entre universidades para aperfeiçoar programas, ampliar a qua-lidade, diminuir custos, utilizando-se de diferentes modalidades de ensino e partilhamento de softwares e videoconferências. Outro aspecto ressaltado pelo autor em relação à ação da universidade é a capacidade de ela responder à mudança, questionando e pondo à prova seus pressupostos e práticas fun-damentais, sempre que se revelem ultrapassados. Assim, tendo a pesquisa e o ensino como a essência do trabalho acadêmico, precisa-se, continuamente, reafirmar o compromisso de buscar a qualificação da aprendizagem.

O trabalho docente constitui-se como um campo permanente de ques-tionamentos. Recentemente, o foco de discussão vem dando especial atenção ao papel que o professor exerce ao ensinar e ao aprender, à formação formal e ao próprio preparo para a função. Reformas e resoluções sugerem processos que preveem a formação continuada dos professores e estimulam as assesso-rias como importantes para a docência universitária. Estas questões norteiam as discussões: Como se constitui o professor universitário? Quem forma o profes-sor universitário? O que o habilita a dar aulas? Como ele dá conta do processo de ensinar e de aprender? Qual a sua trajetória de formação? Como o professor trabalha com a Educação a Distância? Qual é o papel do professor tutor?

No Brasil, a formação de professores para o ensino universitário, se-gundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional1, é tratada como pre-paração e transferida para o interior de cursos de pós-graduação, em nível de

1 “Art. 66 – A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.Parágrafo único – O notório saber, reconhecido por universidades com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico” (BRASIL, 1996).

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348 SCHMITZ, T. et al. - CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR TUTOR

especialização, de mestrado e de doutorado. O preparo pedagógico tem sido efetivado em disciplinas de Didática ou de Metodologia do Ensino Superior em cursos de especialização, de mestrado e de doutorado. Em algumas univer-sidades é realizado um acompanhamento didático-pedagógico, especialmente com os professores novos.2 Entretanto, esse acompanhamento ainda é uma atividade optativa.

A influência das novas configurações de trabalho e da sociedade, as demandas com a qualidade da educação, o ensino presencial e à distância, a inclusão das tecnologias de comunicação e informação, a redução da em-pregabilidade, entre outros motivos, já seriam suficientes para intensificar os estudos e compartilhar experiências.

OS PROFESSORES TUTORES DA UNISINOS: BUSCANDO CAMINHOSDesde 1970, assistimos as tentativas de organização de experiências

em Educação a Distância, sem que isso viesse a se consolidar na criação de um sistema de ensino baseado nessa modalidade. Essas experiências tiveram em seu início uma intervenção governamental acentuada, trazendo componentes ideológicos necessários para a manutenção do regime militar brasileiro que ocupava naquele momento o poder de estado. Grande parte das resistências a essa modalidade de ensino está associada ao regime ditatorial e à difusão dos chamados modelos tecnológicos tão em voga nessa mesma época. As ideias de desenvolvimento e de crescimento econômico foram os argumentos utili-zados pelos militares para a reforma educacional de 1972 e, principalmente, para justificar a ampliação das ofertas educacionais, que tinham por base uma formação mínima para o mundo do trabalho, entendido como o mundo da rá-pida industrialização. Explicar as bases do interminável começar da Educação a Distância no Brasil significa compreender os processos em que se forjaram os programas e as instituições que os criaram e os executaram. Para compre-endermos melhor, vamos fazer uma apresentação cronológica da implanta-ção de programas que se utilizaram da Educação a Distância, na tentativa de reconstruir as origens desse caminhar nessa modalidade. Os programas de Educação a Distância podem ser categorizados em três tipos: aqueles destina-dos à formação geral, à formação de professores e à formação profissional. A apresentação que se segue terá estes dois aspectos: a cronologia e a categori-zação conforme o fim da formação.

A trajetória da formação de estudantes integra os requisitos do nos-so tempo, atribuindo responsabilidade específica aos professores. Tempo de

2 No caso da UNISINOS, os professores novos, que não possuem dois anos de docência, recebem acom-panhamento pedagógico sistemático, de acordo com a Resolução do CONSUN n. 077/97, conforme referi-do no Capítulo I.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 349

definições humanas existenciais ligado à satisfação pessoal, como na busca por viver a vida com qualidade, o direito ao ócio, a afirmação da identidade, enfim, a busca pelas tonalidades e intensidades que nos autoafirmam diante da sociedade. Muito mais do que disponibilizar conteúdos específicos que a ciência construiu e constrói, compete aos professores o desenvolvimento da autonomia dos alunos e o desenvolvimento de seu senso crítico. Assim, queremos apresentar uma introdução teórico-prática para o papel do professor tutor, considerando que a relação tutor-aluno tem como essência a construção de uma formação da identidade de quem ensina e de quem aprende por vias da Educação a Distância.

A UNISINOS aderiu à ideia de que o professor tutor deve ser mais do que um auxiliar didático para o sucesso do seu modo de fazer ensino a distância. Para essa instituição de ensino, cabe ao papel do professor tutor responsabilizar-se pela interação de sua turma, não somente entre os colegas ou com o professor responsável, mas com o conteúdo e aprendizagem em si.

Na nossa experiência de professoras tutoras no primeiro semestre de 2007, fomos responsáveis por sete turmas nos cursos de Administração, Direito e Pedagogia em diferentes disciplinas da graduação. Percebemos que, primeiramente, a importância de um canal de comunicação aberto com os alu-nos e professores mostrou-se fundamental. São atribuições do professor tutor: coordenar os movimentos semanais que o grupo de alunos segue; responder as suas dúvidas; colocar-se à disposição para ajudar; e, principalmente, fazer a gestão de exceções. Na dinâmica dos trabalhos ocorrem situações distintas em que o professor tutor precisa atuar de forma individualizada, tomando de-cisões em prol da manutenção do processo ensino-aprendizagem.

A equipe do Escritório em Educação a Distância (chamado atualmen-te de UNISINOS Virtual) esteve sempre disposta a amparar nossas dúvidas, ansiedades e a nos dar uma direção, pois é importante lembrar que a apren-dizagem a distância somente ocorre se todos os envolvidos estiverem com ela comprometidos. Entenda-se, aqui, vários atores envolvidos no sucesso da aprendizagem a distância que vai desde o Ministério da Educação e Cultura até a instituição, os professores responsáveis pela turma, os professores tuto-res e, principalmente, os alunos.

Lembra-nos Munhoz (2003) que a Educação a Distância é voltada para a educação de adultos, e como tal pressupõe maturidade. Maturidade foi o que percebemos como um aspecto fundamentalmente necessário a to-dos os atores envolvidos na educação a distância. Maturidade para reconhecer humildade científica, para o limite a ser colocado com relação aos alunos, com o tempo dedicado, bem como responsabilidade no cumprimento das ta-refas. Maturidade dos professores responsáveis pela disciplina para lidar com o novo profissional denominado professor tutor. A falta de maturidade, de quaisquer dos atores envolvidos, interfere no trabalho do professor tutor, pois não basta ser adulto para ser uma pessoa madura.

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350 SCHMITZ, T. et al. - CONSTRUÇÃO IDENTITÁRIA DO PROFESSOR TUTOR

Diante das muitas e novas demandas que o ambiente do ensino a dis-tância exige, cada situação, cada turma e, muitas vezes, cada aluno devem ser entendidos no seu contexto e tratados de forma individualizada. Concordamos com Munhoz (2003) quando ele afirma que o professor tutor abarca um pa-pel de atendimento personalizado, além de um facilitador, um cuidador do processo colaborativo de construção do conhecimento do aluno. Ficou claro, com a nossa experiência, que somente TI bem estruturada, sem o cuidado do ser humano na interação, não faz aprendizagem, pois os alunos precisam de atenção, seja no modelo presencial ou virtual.

CONSIDERAÇÕES FINAISDiante dessa sociedade do conhecimento, que traz consigo, mui-

tas vezes, a intensificação do trabalho, um ritmo de mudança acelerado, a multiplicação de contextos, a diversidade e complexidade da aprendiza-gem, a exigência continuada de novas aprendizagens requer de todos uma nova forma de aprender e, portanto, de ensinar. Nessa sociedade, que se caracteriza por uma aprendizagem continuada, pela explosão da informa-ção e pelo questionamento do conhecimento como verdade relativizada, a concepção tradicional de uma aprendizagem baseada na apropriação e reprodução memorística não é mais plausível e suficiente. Do saber e po-der absolutos passa-se à incerteza e autoridade partilhadas. Isso amplia a necessidade de interpretação.

Com base nas experiências aqui apresentadas, é possível perceber a tentativa de tornar a Educação a Distância em uma ação efetiva na edu-cação brasileira. Os ambientes virtuais de aprendizagem podem fomentar espaços de ensino de alta qualidade e comprometimento docente e dis-cente. Concordamos plenamente com Kenski (2003) quando ele afirma que o impacto das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) na prática docente “exige uma reflexão profunda sobre as concepções do que é o saber e sobre as formas de ensinar e de aprender” (p. 45), uma vez que altera as estruturas e a lógica dos conhecimentos, requerendo novas concepções para o ensino, novas metodologias e novas perspectivas para a ação docente.

Portanto, o desenvolvimento da Educação a Distância no Brasil re-quer, em nosso entendimento, uma discussão mais profunda e geral da edu-cação como um todo, ou seja, em que medida estamos dispostos a enfrentar os problemas educacionais brasileiros verdadeiramente, sem transformar a Educação a Distância em uma panaceia ou em uma ação de segunda catego-ria, reforçando ainda mais a exclusão e a seletividade do ensino. A Educação a Distância terá que assentar-se como uma possibilidade de acesso maior à educação. Mas um acesso que traga a preocupação com a qualidade do ensi-no, já que o acesso, por si só, não tem o sentido pleno de democratização da educação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 351

Dessarte, o professor tutor é o profissional da educação que atua nas situações programadas de ensino e aprendizagem presencial, ou na orientação assistida à distância. Ele se relaciona diretamente com os alunos, auxiliando-

-os no manuseio e na aproximação dos conteúdos. Ao utilizar-se diferentes formatos para a apresentação dos conteúdos, como o material impresso (apos-tilas ou módulos), vídeos, telefone/fax, rádio e os recursos da informática, cabe ao tutor organizá-los com e para os alunos, fomentando o aprendizado por meio da participação e interação, visando a construção da autonomia crí-tica do cidadão.

Mais do que conhecer os materiais de ensino que são disponibilizados aos alunos, o professor tutor administra situações de conflito, situações de euforia, desânimos, rotinas. O modo como podemos responder às questões que surgem vai sendo constituído por passos que a educação presencial nos mostra em sua caminhada histórica. A exemplo dos professores da educação presencial, vamos perseguindo uma prática que se confunde e que se constrói: como professores tutores técnicos, reflexivos, pesquisadores, críticos sempre em busca da qualidade. Esses últimos chamados à consciência para atuarem com engajamento político emancipatório que possam vir a transformar o Ensino a Distância na Educação a Distância.

REFERÊNCIAS

CASPER, Gerhard; ISER, Wolfgang. Futuro da universidade. Rio de Janeiro: EduUERJ, 2009.CECHINEL, José Carlos. Manual do tutor. Florianópolis: UDESC, 2000.KENSKI. Vani Moreira. Tecnologias e ensino presencial e a distância. Campinas: Papirus, 2003.MORAN, José Manuel. Avaliação do Ensino Superior a distância no Brasil. Disponível em: http://www.eca.usp.br/prof/moran/avaliacao.htm Acesso em: 18 ago. 2011.MUNHOZ, Antonio S. A educação a distância em busca do tutor ideal. Colabora. Santos, 2003, v. 2, n. 5, p. 32-46.SILVA, Fátima. A evolução dos referenciais de qualidade para a EAD. In: SANCHEZ, Fábio (org.). Anuário Brasileiro Estatístico de Educação Aberta e a Distância. 4. ed. São Paulo: Instituto Monitor, 2008, p. 145-55.TAROUCO. Liane. Educação a Distância. Disponível em: http://www.sead.ufpa.br/v2/home/index.php?pag=entrevistaLiane Acesso em: 20 out. 2010.

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LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO: A FORMAÇÃO INICIAL DO EDUCADOR E DA EDUCADORA

DO CAMPO E A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO

Eliane Miranda CostaAlbêne Lis Monteiro

E ste trabalho integra a pesquisa de mestrado em andamento que tem como objeto de estudo o Programa de Apoio à Formação

Superior em Licenciatura em Educação do Campo – PROCAMPO. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa em que se elegeu a observação não participante, a entrevista semiestruturada e a análise documental como técnicas de coletas de dados. Esses se encontram em fase de sistematização e análises preliminares.

Aqui serão apresentados argumentos e reflexões apoiadas na análise documental acerca da formação inicial do docente do campo com base no entendimento do conceito de qualidade, ancoradas em interlocutores como Gentilli (2002), Morosini (2009), Frigotto (2003), Viebrantz e Morosini (2009), Enguita (2002), Arroyo (2004), entre outros.

Por se tratar de um programa voltado para a docência multidisciplinar e específica, nossa indagação volta-se para saber em que medida a forma-ção inicial do docente do campo, promovida pelo PROCAMPO, por meio do curso de Licenciatura em Educação do Campo (LEC), pode garantir uma educação de qualidade no/do campo. O objetivo principal é refletir sobre a importância da formação inicial do docente do campo na promoção de uma educação de qualidade, bem como identificar e analisar o conceito de qualida-de presente na política do PROCAMPO e na literatura pertinente.

Para tanto, faz-se necessário dizer que, de acordo com o enredo histó-rico, a formação do docente do campo apresenta-se relegada ao silêncio. Isso porque as políticas educacionais, ao considerar a cidade como parâmetro e o campo como adaptação ou o espaço a ser superado, reforça a concepção de que os povos do campo não precisam de educação que se volte à realidade vivida. Daí, que os docentes não precisam de qualificação, uma vez que para lidar com a terra não há necessidades de muitas letras (ARROYO, 2004).

O rompimento com a referida visão começa ocorrer nos anos de 1990 com o movimento “Por uma educação do campo”, que, por meio das reivin-dicações dos movimentos sociais, coloca em pauta a educação dos povos do campo, e, com isso, a formulação de políticas educacionais que reconheçam a população do campo como sujeitos de direitos a ter direitos. É nessa perspec-tiva que se insere a aprovação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (DOEC) e o PROCAMPO com o curso de LEC.

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354 COSTA, E. M. et al. - LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

As DOECs, embora mantenham o que é estabelecido na LDB n. 9.394/96, representam de certa forma uma ruptura com a sedimentação im-posta e avançam no sentido de valorizar e reconhecer a diversidade cultural e educacional do campo. Com base nesse documento, a formação específica defendida pelos intelectuais, pelas universidades e pelos movimentos sociais do campo passou a ser difundida, o que resultou, em 2005, no âmbito do MEC e por meio do Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo, na elaboração de propostas de formação inicial e continuada para docentes do campo brasileiro.

Assim, em 2006, um grupo de intelectuais ligados a universidades pú-blicas e aos movimentos sociais toma por base a experiência dos cursos de Pedagogia da Terra e apresenta ao MEC a proposta do curso de LEC destinado à formação inicial dos docentes do campo. Diante disso, ainda em 2006, o MEC/SECAD1 aprova o PROCAMPO, e, em 2007, as universidades públicas de Brasília, Minas Gerais, Sergipe e Bahia (UnB, UFMG, UFS, UFAB), por meio de um projeto-piloto, começam a implementar o curso de LEC.

No restante do país isso ocorre a partir de 2008, quando o MEC/SECAD convoca, via editais, as universidades públicas de todo o país para apresentarem propostas de cursos específicos para o campo. No Estado do Pará, lócus deste estudo, o PROCAMPO passa a ser implementado em 2009, quando o Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Pará (IFPA), ao par-ticipar da chamada pública do ano de 2009, aprova o primeiro projeto peda-gógico do curso de LEC.

A seguir, teceremos algumas considerações acerca da formação do do-cente do campo com base no curso de LEC e ancoradas no conceito de quali-dade. Para finalizar, algumas conclusões serão expostas no intuito de provocar possíveis contribuições significativas no construir de um processo educativo de e com qualidade no campesinato brasileiro.

FORMAÇÃO INICIAL DO DOCENTE DO CAMPO: UMA QUESTÃO DE QUALIDADE? O curso de LEC aprovado no âmbito do MEC/SECAD, em 2006, por

meio do PROCAMPO, é resultado das reivindicações engendradas pelos movimentos sociais do campo, com destaque para o MST, que em parceria com universidades públicas, intelectuais, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (PRONERA) e MEC, conseguiu colocar na pauta da agenda nacional a formação do docente do campo.

1 Em 2011, por meio do Decreto n. 7.480, de 16 de maio de 2011, a SECAD foi reestruturada, passando por compreender a inclusão. A partir de então passa a ser SECADI.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 355

Trata-se de um curso superior destinado à formação inicial de docen-tes do campo que tem por base a experiência dos cursos de Pedagogia da Terra cuja organização se dá por meio da pedagogia da alternância. O referido curso inaugura uma nova configuração no âmbito da formação docente no campo, visto que se trata de um curso específico, cuja organização e metodologia bus-cam teoricamente voltar-se para a valorização do contexto do campo, pois, até então, a formação desse docente se resumia em grande parte ao curso normal em nível médio, com habilitação em magistério, e, em nível superior, no cur-so de pedagogia, com habilitação para docência nos anos iniciais do Ensino Fundamental, ambos com características urbanocêntricas.2

Com a licenciatura em destaque, é preciso considerar, além da especificida-de, a expansão da Educação Básica. Essa prerrogativa acena para uma série de ca-tegorias que precisam ser consideradas, dentre os quais se encontra a qualidade da formação inicial docente. A categoria qualidade é bastante discutida na esfera políti-ca, bem como pelos intelectuais que sempre defendem uma educação de qualidade.

Para Enguita (2002), a qualidade tem se convertido em uma meta com-partilhada por todos, em que tanto o governo nas suas diferentes esferas (fede-ral, estadual e municipal) como as universidades e os intelectuais defendem o referido termo para coroar suas propostas, argumentos e ideias, independente de quais interesses defendem, isto é, seja em prol do capital ou da sociedade.

Na perspectiva de Viebrantz e Morosini (2009, p. 277), “a qualidade se tornou assunto de grande importância não apenas para governos e institui-ções, mas também para toda a sociedade de maneira geral”. Ainda de acordo com esses autores, na educação, essa preocupação manifesta-se por parte do governo em forma de políticas públicas. Resta saber que qualidade é essa ex-ternada pelos agentes públicos.

De acordo com os editais, a promoção do PROCAMPO justifica-se pelo cumprimento da atribuição do Ministério em responder pela formulação de políticas públicas que valorizem a diversidade e promovam a equidade na educação, a fim de contribuir na expansão da oferta da Educação Básica no campo, e assim superar as desvantagens educacionais históricas sofridas pelas populações do campo (BRASIL, 2009).

O discurso proferido permite inferir que qualidade atrela-se à necessi-dade de superar as desvantagens educacionais sofridas pelos povos que vivem e trabalham no campo, na medida em que um curso de formação inicial es-pecífico promoverá a valorização da diversidade e a promoção da igualdade. Com isso, deduz-se que o acesso das populações do campo à educação não se resumirá somente aos anos iniciais do Ensino Fundamental, pois terão acesso também aos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio, isto é, etapas, no contexto atual, quase inexistentes no campo paraense.

2 O termo urbanocêntrico aqui utilizado refere-se à visão de uma educação voltada para a reprodução do modelo didático-pedagógico utilizado nas escolas da cidade para as escolas do campo, isto é, um modelo que desconsidera as reais necessidades das populações que vivem no campo (campo enquanto espaço de vida e produção de conhecimentos) (HENRIQUES, 2007).

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356 COSTA, E. M. et al. - LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

É preciso considerar que a promoção da formação docente no campo em nível superior é fulcral para a valorização desses futuros profissionais da educação que irão atuar ou atuam com a população campesina, porém não basta apenas promover essa formação para se garantir a qualidade, pois, ao contrário, é preciso saber em que condições e com que intencionalidades ocor-rem essa promoção. Viebrantz e Morosini (2009) nos alertam que no campo educacional o conceito de qualidade abrange não só as estruturas, mas tam-bém os processos e os resultados educacionais.

Isso significa dizer que qualidade não pode se resumir a um elemento--chave para o aumento da produtividade e competitividade, como nos adverte Frigotto (2003), mas como elemento de construção e criação, não no senti-do de inventar, e sim de fazer acontecer com autonomia e responsabilidade. Em face disso, entende-se que a qualidade do curso de LEC, no contexto da formação inicial do docente do campo, precisa envolver, além do processo de articulação, a aprovação e implementação da licenciatura, bem como a organização político-pedagógica e o desenvolvimento, ou seja, o acontecer do curso em todo o país.

Essa é uma questão fundamental a ser considerada diante da estrutura societal existente, uma vez que, como se sabe, neste seu percurso histórico, o contexto campesino apresenta-se atrelado à lógica urbanocêntrica e consumis-ta. Na perspectiva de Cavalcante (2010, p. 555), o campo nessa lógica desen-volve o papel de “quintal que produz, que exporta, ou que alimenta o urbano e sua sede de possuir, ter e ser a referência de cultura e conhecimento social-mente reconhecido”. Gentilli (2002) esclarece o entendimento do conceito de qualidade na contraface do discurso da democratização, visto que qualidade assume o conceito do campo produtivo. Assim, os debates e as reformas po-líticas educacionais passam a ser permeadas por um sentido mercantil, o que caracteriza o conceito de qualidade dualizador e antidemocrático e faz esse conceito no campo educacional assumir uma fisionomia de retórica conser-vadora e funcional.

Nessa retórica, o mesmo autor (2002) anuncia que a qualidade no campo educativo assume duplo processo de transposição, em que um corres-ponde ao deslocamento da democratização para a qualidade e o outro se refere à transferência da qualidade do campo empresarial e mercadológico para as políticas educacionais. Isso certamente explica o descaso com os educadores, não só no sentido de formação inicial e continuada, mas de valorização de seu trabalho.

Nesse aspecto, Gadotti (2009, p. 1) acrescenta: “é preciso construir uma ‘nova qualidade’ que atenda a todos e todas”. Isso significa dizer que não basta aprovar um programa, é preciso dar condições para que o docente ou futuro docente do campo não só tenha acesso ao curso, mas permaneça com dignidade, visto que a “qualidade da educação é o resultado das condições que oferecemos a ela” (p. 1).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 357

Nesse sentido, pode-se dizer que não basta aprovar uma política emer-gencial ou permanente para que a qualidade seja garantida. Em outras pala-vras, não é a aprovação do PROCAMPO por si só que garantirá a qualidade da formação do docente do campo, mas, sobretudo, de como ele se desenvolverá, isto é, a sua processualidade e os seus resultados é que definirão que qualidade gerará, se a favor dos interesses a quem se destina a formação ou se contra ela quando essa qualidade se coloca a favor de outros interesses.

CONSIDERAÇÕES FINAISCom a aprovação do PROCAMPO, em particular do curso de LEC,

a formação inicial do docente do campo passa a ganhar uma característica específica, o que pode ser compreendida como uma forma de reconhecimento e valorização do contexto campesino. Para tanto, faz-se necessário que, além da aprovação de uma licenciatura, seja garantida condições estruturais que contribuam com a realização de uma educação de qualidade; uma educação atrelada a um projeto de sociedade em que os povos do/no campo tenham o direito de se construir como sujeitos históricos.

No entanto, os documentos (editais, diretrizes, pareceres) evidenciam que a formação inicial via licenciatura tende a se apresentar de duas formas: uma proposta defendida e construída pelo MST, em parceria com as univer-sidades públicas e PRONERA, e uma proposta do governo que se apoia na primeira, mas que possui concepções e princípios diferentes.

Em vista disso, pode-se dizer que educação de qualidade na forma-ção do professor é aquela que possibilita ao educando futuro docente ou em exercício não só o acesso à escola, ao curso, mas sua permanência nela com dignidade, e que seus saberes, suas experiências sejam reconhecidas e valori-zadas. Educação de qualidade possibilita o educando pronunciar a palavra e reconhecer-se como ser histórico (FREIRE, 2005).

No que tange ao campo da formação docente é preciso ainda consi-derar o caráter multidisciplinar e específico, com base na compreensão do conhecimento que será construído e pode romper com o conhecimento frag-mentado e descontextualizado. Isso porque, ao se tratar de um curso de for-mação de professores, nos resta evitar seguir a mesma forma de conhecimento pedagógico que há tempos se legitima oficialmente pelos editores, faculdades de Educação e instituições educacionais (KINCHELOE, 1997).

Diante da diversidade do contexto campesino, que realidade na forma-ção será relevante nessa construção e qual será irrelevante? De quem é o conhe-cimento legítimo e de quem são as vozes que podem ser ouvidas? Quem deve escutar? Que campo de conhecimento tomará forma nesse processo? Esses ques-tionamentos tornam-se relevantes na medida em que ao falar de uma educação de qualidade no campo, se questiona também o conhecimento que será produzi-do nos processos de formação inicial e formação continuada de professores.

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358 COSTA, E. M. et al. - LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO DO CAMPO

REFERÊNCIAS

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ENSINO DE HISTÓRIA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: REFLEXÕES SOBRE EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS EM ESPAÇO NÃO FORMAL DE ENSINO

Bianca Silva CostaJuliana Zirger

Maria Elly Herz Genro

O programa de extensão articulado às atividades de ensino e pes-quisa constitui uma das características da universidade entre os

diferentes modelos de instituições de Ensino Superior. Esse objetiva “contri-buir para a formação acadêmica, profissional e cidadã, fruto das experiências dos alunos realizadas junto à comunidade interna e externa à universidade”.1 Dessa forma, a extensão universitária busca intensificar a relação universida-de e sociedade na perspectiva de responsabilidade social e de tensionamento da lógica dos conhecimentos valorizados no campo científico, com a pesquisa e o ensino. Viabilizar o diálogo da academia com os saberes próprios dos va-riados grupos sociais que compõem a tessitura que sustenta a universidade é uma postura de valorização cultural, política e ética.

A interação da universidade com os diferentes segmentos sociais pro-movida pelas atividades de extensão é uma postura de valorização de múlti-plos saberes, ao contrário da imposição de um conhecimento sobre o outro e, da mesma forma, o oposto da lógica de descontextualização dos conheci-mentos desenvolvidos pela universidade, que podem ou não ser aplicados à sociedade (SANTOS, 2005). Percebida por nós como uma instituição social permeada pelas demandas e conflitos sociais (CHAUÍ, 2003), a universidade não deve ficar alijada do contexto ao qual pertence e, concomitantemente, não pode perder de vista sua autonomia crítica em relação às reivindicações sociais, uma vez que – como nos adverte Sobrinho (2009) – tais necessidades não são precisas, dificultando definir quais seriam as respostas adequadas da universidade às exigências que lhe são apresentadas.

Além da extensão como ação institucional que pode qualificar a re-lação universidade e sociedade, ponderamos também a sua importância para a formação dos estudantes universitários e para a comunidade envolvida. Buscamos, neste trabalho, refletir sobre as contribuições da atividade de ex-tensão com base em uma experiência prática, desenvolvida por estudantes e professores do curso de História, com base no projeto “Historiando: brincan-do com o tempo”, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em 2007.

1 Para maiores informações acessar o site de Extensão da UFRGS: http://www.prorext.ufrgs.br

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360 COSTA, B. S. et al. - ENSINO DE HISTÓRIA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

APRESENTANDO O CONTEXTO DE APLICAÇÃO DA OFICINA

Em 2005 foi criado2 o projeto “Historiando: brincando com o tempo”, ligado ao curso de História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da PUCRS. O projeto foi aplicado em um espaço de educação não formal3, em uma comunidade considerada em situação de vulnerabilidade social4, em Porto Alegre/RS, com o objetivo de elaborar e aplicar quinzenalmente ofici-nas lúdicas com temáticas históricas para crianças e adolescentes de 5 a 14 anos de idade. Pretendia-se refletir sobre as diversas possibilidades de ensinar História, inclusive brincando.

No final do ano de 2007, optou-se por voltar à comunidade com a finalidade de aplicar uma oficina. Essa durou duas horas e contou com a par-ticipação de 25 pessoas, sendo 16 meninos e 9 meninas, com idades entre 5 e 13 anos. O objetivo era refletir sobre a noção de tempo e processo histórico, “inserindo” as crianças na História, demonstrando que elas eram protagonistas da mesma. Essa oficina foi dividida em três momentos, sendo que apenas o último será analisado no presente artigo.

No primeiro momento, as crianças preencheram uma ficha autobio-gráfica, elaboraram um autorretrato e elencaram um fato que vivenciaram em cada ano de sua existência. No segundo, deveriam escrever/desenhar os pio-res e os melhores momentos de suas vidas. Por fim, a última parte da oficina objetivava explorar os sonhos de vida dos participantes, constituindo o foco deste trabalho.

ANÁLISE DA EXPERIÊNCIA EDUCATIVA

Larrosa (2002) propôs, em seus escritos, que a educação fosse pensa-da com base na relação entre a experiência e a construção de sentido. Para isso, o autor percorre os diversos significados atribuídos à palavra “experiência”

2 O projeto foi criado pelas professoras mestre Marcia Andrea Schimidt da Silva e doutora Maria José Barreras, contando com a participação de cinco alunos da graduação da Faculdade de História.3 “Por ser mais flexível, não segue necessariamente todas as normas e diretrizes estabelecidas pelo governo federal. É geralmente oferecida por instituições sociais governamentais e não governamentais e resulta em formação para valores, para trabalho e para a cidadania”. Disponível em: http://inep.gob.br/pesquisa/thesaurus/thesaurus.asp?tel=122175&te2=122350&te3=374994 A vulnerabilidade social é um conceito que tem sua origem na área dos Direitos Humanos. Refere-se a grupos ou indivíduos fragilizados, jurídica ou politicamente, na promoção, proteção ou garantia de seu direito à cidadania. Apesar de ser um conceito formulado recentemente, existe um consenso entre os autores que estudam essa temática de que a vulnerabilidade social apresenta um caráter multifacetado, abarcando inúmeras dimensões, a partir das quais podem-se identificar situações de vulnerabilidade dos indivíduos, famílias ou comunidades. Essas dimensões estão ligadas tanto às características próprias dos indivíduos ou grupos quanto àquelas relativas ao meio social no qual estão inseridas. Disponível em: http://www.unicruz.edu.br/15_seminario/seminario_2010/CCSA/A%20VULNERABILIDADE%20SOCIAL%20COMO%20UMA%20DIFICULDADE%20A%20PARTICIPA%C3%87%C3%83O%20POL%C3%8DTICA.pdf

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 361

e conclui que essa pode ser definida como aquilo que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca e, para tanto,

requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais de-vagar, olhar mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, sus-pender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paci-ência e dar-se tempo e espaço (p. 24).

Dessa forma, experiência requer principalmente tempo para senti-la, para que possamos vivenciar as transformações que ela pode nos provocar, para sentir os seus vestígios, enxergar suas marcas.

Além disso, Larrosa (2002) esclarece sobre o elemento de subjeti-vidade que está implícito na elaboração de sentido baseado na experiência vivida de forma particular e de acordo com cada ser humano. O sujeito da experiência, portanto, é entendido como o próprio espaço em que têm lugar os acontecimentos e de maneira subjetiva elabora os significados sobre tais acontecimentos (p. 24). Em suma, a experiência nos proporciona um saber diferente da opinião, da informação e até mesmo do saber científico e, prin-cipalmente, o saber da experiência se dá na relação entre o conhecimento e a vida humana (p. 26).

Com base nessa compreensão de experiência/sentido e na sua relação com o conhecimento, buscamos refletir sobre as oficinas realizadas no contex-to da educação não formal e sobre suas implicações nos saberes construídos e nas próprias vidas de todos aqueles envolvidos nessa experiência educativa.

Ao analisar uma das etapas das oficinas realizadas na qual os partici-pantes deveriam expor seus sonhos de vida por meio da escrita ou de desenhos, foram várias as respostas. Com base na análise dessas respostas, chegamos à elaboração de três categorias: família, moradia e profissão.

No item “família”, grande parte das crianças/adolescentes apontou que não queriam casar e/ou ter filhos. No caso de uma menina, ela escreveu que não queria beijar. Ficamos sabendo, por meio das educadoras do centro comunitário, que grande parte das crianças vivia em situação de miséria, mui-tas só se alimentavam naquele local e parte delas sofria ou já havia sofrido abuso sexual. Quando alguns escreviam sobre o desejo de casar ou de ter fi-lhos, na maior parte das vezes isso estava vinculado ao desejo de se relacionar com pessoas famosas, como jogadores de futebol ou, em outros casos, se casar com as filhas desses jogadores. Dada a complexidade social, encontramos di-versas respostas com temas relacionados à paternidade/maternidade. Um dos garotos, por exemplo, escreveu que gostaria de ter cem filhos para que esses lhe dessem muito carinho. Outro, por sua vez, respondeu: “quero ter dois filhos para ser meus empregados”. Essas respostas fizeram-nos pensar sobre como seria a realidade deles na casa em que moram.

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362 COSTA, B. S. et al. - ENSINO DE HISTÓRIA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Quanto à categoria “moradia”, as respostas foram semelhantes. As crianças e os adolescentes evidenciaram o desejo de morar em uma casa gran-de ou em um apartamento. Considerando a realidade em que vivem, de casas extremamente simples feitas de madeira e situadas à margem de um “valão”, é fácil entender o sonho das crianças por uma moradia com condições mais dignas de sobrevivência.

Dentre as “profissões” almejadas, alguns demonstraram interesse em seguir carreiras que exigem um diploma universitário, ligadas às áreas de Medicina Veterinária, Medicina, Licenciaturas e Engenharia; a maioria dos meninos demonstrou interesse em ser jogador de futebol. No entanto, o que mais nos chamou a atenção foram as respostas de meninos que evidenciaram a vontade de ser vendedor de relógio e mecânico de carroça, caracterizando profissões ligadas à realidade em que vivem. Duas respostas se destacaram por estar fora do padrão apresentado até então. Um menino escreveu que gos-taria de vender bebês por cem mil; enquanto outro escreveu que gostaria de ser galista. Foi solicitado ao menino que esclarecesse a sua resposta e ele explicou que iria fazer rinha de galo para ganhar dinheiro, pois era essa a ati-vidade do seu pai. Essa situação gerou algumas reflexões: considerando que o educador exerce um papel de “autoridade” em diferentes contextos de en-sino, como ele deve se posicionar diante da diversidade das práticas culturais, independente dessas serem legais ou não? O momento descrito demonstra as múltiplas faces da realidade social com a qual o educador se depara, resultan-do no tensionamento da sua formação.

Traçando rapidamente uma retrospectiva, é interessante observar que uma das primeiras oficinas que o grupo da PUCRS aplicou na comunidade, em 2005, também evocava os sonhos de vida das crianças. Na época, essas crianças demonstraram muita dificuldade para expor seus desejos. As respos-tas mais frequentes foram: ser catador de lixo, entrar para o tráfico e ser “dan-çarina”. Uma das meninas contou que queria ser veterinária e, imediatamen-te, as outras crianças zombaram dela, pois disseram que nunca conseguiria realizar esse desejo. As próprias crianças não se permitiam visualizar outros horizontes além dos limites de sua realidade, percebendo-se em uma condição inferior aos demais.

Observamos no retorno à comunidade, nesse segundo momento, uma modificação do padrão de resposta. Não pretendemos dizer que o grupo da universidade provocou essa mudança na mentalidade dessas crianças, mas ressaltamos que, a partir do momento em que foram realizadas atividades reflexivas, ainda que quinzenalmente e em um período de dois anos, algo parece ter mudado.

Acreditamos, enquanto educadores, que podemos refletir com as crianças e com os adolescentes sobre outras possibilidades de vida que não repitam, necessariamente, os seus padrões familiares ou os da comunidade em que vivem. Percebemos, com base nas respostas obtidas nas oficinas, que

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 363

há uma tentativa de imaginar a vida em uma realidade diferente, ainda que os sonhos possam estar limitados pelos elementos da realidade local. Na ten-tativa de alguns de vislumbrar uma “profissão com diploma”, isso se tornou um elemento cômico aos olhos dos colegas na primeira etapa do projeto. No entanto, no retorno do grupo universitário à comunidade, o desejo de ter uma profissão diferente da dos pais ou vizinhos deixa de ser engraçado, passando a se tornar algo viável, ainda que na dimensão da imaginação.

Os participantes dessas oficinas devem ter o direito e a chance de sonhar com uma vida diferente e melhor. Na perspectiva de Arendt (2008), criar novas possibilidades de ser e de existir neste mundo é uma ação política. Ação é a mais política das atividades humanas porque permite criar algo novo, ideias, valores que por sua vez referenciam as ações. Dessa forma, o sentido da política é a liberdade de agir na existência plural, permite trocas humanas e viabiliza a relação com a alteridade, construindo a singularidade humana e também as identidades plurais na existência comum entre os homens.

Nesse sentido, pensamos a educação e a extensão como um elemento capaz de intervir social e politicamente. Para tanto, é preciso estar ciente da importância do comprometimento de cada um para que essa transformação se concretize. A educação é pensada por Sobrinho (2009) como a abertura de novos horizontes e de múltiplas possibilidades. Argumenta que educação, for-mação e conhecimento são conceitos que devem estar inter-relacionados, uma vez que as ações sociais não se deslocam de valores e conhecimentos trazidos na bagagem de nossa experiência.

Para esse autor, o conhecimento é conteúdo imprescindível da cidada-nia, uma vez que cidadão é aquele que assume a responsabilidade comparti-lhada na construção da vida em sociedade, condição também para construção de si mesmo. Assim, nosso compromisso ético assume seu sentido político, pois se refere às práticas humanas de dimensão pública da existência comum.

Por fim, agradecemos a todas as pessoas envolvidas no processo de ensino-aprendizagem, pois proporcionaram uma instigante experiência para os educadores, possibilitando a reflexão acerca das próprias vivências e prá-ticas. Para resumir a vivência/convivência apresentada neste trabalho, relem-bramos as palavras do filósofo Ricardo Timm (2008): “a crise faz crescer!”. Sendo assim, que venham as próximas crises!

CONSIDERAÇÕES FINAISA realização da ação de extensão em questão provocou nos sujeitos en-

volvidos (estudantes) um tensionamento em relação ao retorno dos resultados para a sociedade/comunidade envolvida e a sua importância para a formação do futuro educador. A iniciativa justificou-se pela necessidade e pela impor-tância da intensificação da qualidade da relação entre universidade e socie-dade e do compromisso da primeira com uma formação mais ampla, ou seja, política, cultural e ética e não apenas a formação da técnica e profissional.

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364 COSTA, B. S. et al. - ENSINO DE HISTÓRIA E EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Santos (2006) considera fundamental a necessidade da universidade valorizar outros saberes ditos populares e enfatiza que isso não significa negar o saber científico, pelo contrário, ele considera diálogo dos múltiplos saberes leigos que circulam entre a sociedade e os acadêmicos. As instituições de Ensino Superior devem desenvolver um processo de fala e de escuta, para que se construa um espaço de diálogo na relação de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, o autor salienta que as universidades devem formar cidadãos comprometidos socialmente. Para isso se tornar possível, faz-se ne-cessário fortalecer os laços com a sociedade, observando cada vez mais os conhecimentos “ausentes” no espaço universitário.

A realização da oficina permitiu adquirir informações relativas ao contexto sociofamiliar das crianças, assim como criar laços com as mesmas. Podemos dizer que as crianças se envolveram nas atividades propostas, con-seguindo, em sua maioria, expor os acontecimentos de suas vidas (tanto pela escrita quanto por símbolos e desenhos).

Indagações, angústias e dúvidas surgiram ao longo deste trabalho, e, posteriormente, sobre o trabalho realizado em contexto não formal de ensino, como: Qual é a importância da extensão na formação dos estudantes/educa-dores e para a comunidade? Como é a preparação desses alunos para lidar com a multiplicidade cultural e com as desigualdades e exclusões? Quais os impactos da extensão tanto na comunidade quanto nos participantes do pro-jeto? O que fazer com os resultados obtidos na extensão? Há retorno para a comunidade? De que maneira?

Por fim, essas questões serviram para refletirmos sobre as contribui-ções da extensão para a comunidade envolvida e pensarmos sobre as possi-bilidades de tensionamento da formação dos estudantes/educadores universi-tários na vertente de responsabilidade social, de formação política e cidadã.

REFERÊNCIAS

ARENDT. Hannah. A promessa da política. Rio de Janeiro: DEFEL, 2008. CHAUÍ, Marilena. A universidade pública sob nova perspectiva. Conferência de abertura da 26. Reunião Anual da Anped Poços de Caldas: 5 de outubro de 2003. LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Disponível em: http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE19/RBDE19_ 04_JORGE_LARROSA_BONDIA.pdf Acesso em: 10 maio 2011.PADOIN, Isabel Graciele; VIRGOLIN, Isadora Wayhs Cadore. A vulnera-bilidade social como uma dificuldade a participação política. Disponível em: http://www.unicruz.edu.br/15_seminario/seminario_2010/CCSA/A%20 V U L N E R A B I L I D A D E % 2 0 S O C I A L % 2 0 C O M O % 2 0 U M A % 2 0DIFICULDADE%20A%20PARTICIPA%C3%87%C3%83O%20POL%C3%8DTICA.pdf Acesso em: 3 ago. 2011.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 365

SANTOS, Boaventura de Souza. A universidade no século XXI: para uma re-forma democrática e emancipatória da universidade. São Paulo: Cortez, 2005.______. A gramática do tempo para uma nova cultura política. São Paulo: Cortez, 2006.SOBRINHO, José Dias. Educação Superior, globalização e democratização: o debate ético-político. In: LEITE, Denise (org.). Avaliação participativa e qualidade: os atores locais em foco. Porto Alegre: Sulina, 2009. SOUZA. Ricardo Timm de. Sobre a construção do sentido. Porto Alegre: Perspectiva, 2008.

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REFLEXÕES SOBRE O PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA

(PIBID) ENQUANTO ESTRATÉGIA PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Luciane Spanhol BordignonEgeslaine de Nez

F ormação docente é uma temática recorrente na Educação. Essa é uma preocupação evidenciada nas investigações mais recentes e

na literatura da área, provocando debates e encaminhando propostas acerca da formação inicial e continuada de docentes. Aos desafios colocados para elevar a qualidade na formação de professores, novas respostas foram sendo constru-ídas pelas Instituições de Ensino Superior e pelas faculdades/departamentos/centros de educação, criando um fértil debate ao longo dos anos. Com esse intuito, o Ministério da Educação criou o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID).

Portanto, este estudo objetiva identificar as modificações na vida acadêmica e pessoal dos estudantes de licenciaturas, bem como as relações Universidade e Educação Básica na perspectiva do PIBID.

A metodologia utilizada partiu de uma pesquisa bibliográfica sobre a temática elencada. Em um segundo momento, contemplou uma pesquisa de campo com questionários destinados a acadêmicos dos cursos de Pedagogia e Matemática de uma universidade comunitária de Santa Catarina, que está inscrita no Programa.

Assim, considerando a formação de professores um processo que se consolida na prática, com a “reflexão na e sobre a ação” (SCHÖN, 1992), crê-se que é também responsabilidade da universidade alargar o objeto de re-flexão para transpor os limites, bem como para analisar as contradições exis-tentes no cotidiano escolar.

PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA (PIBID)A Portaria Normativa n. 16, de 23 de dezembro de 2009, dispõe sobre

o PIBID, que tem como objetivo conceder bolsas de iniciação à docência para alunos de cursos presenciais de licenciatura, que se dediquem ao estágio nas escolas públicas e que, quando formados, possam exercer o magistério na rede pública; e bolsas para coordenadores e supervisores responsáveis insti-tucionalmente pelo Programa e demais despesas a ele vinculadas (BRASIL, 2011). Isso proporciona a possibilidade de antecipar o vínculo entre os futuros

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368 BORDIGNON, L. S. et al. - REFLEXÕES SOBRE O PROGRAMA INSTITUCIONAL

professores e as salas de aula da rede pública. Com essa iniciativa, o PIBID faz uma articulação entre a Educação Superior (por meio das licenciaturas), a escola e os sistemas estaduais e municipais de Educação Básica.

Os desdobramentos dos objetivos do PIBID contemplam: a) incentivar a formação de professores para a Educação Básica,

especialmente para o Ensino Médio;b) valorizar o magistério, incentivando os estudantes que optam

pela carreira docente;c) promover a melhoria da qualidade da Educação Básica;d) promover a articulação integrada da Educação Superior do

sistema federal com a Educação Básica do sistema público, em proveito de uma sólida formação docente inicial;

e) elevar a qualidade das ações acadêmicas voltadas à formação inicial de professores nos cursos de licenciaturas das instituições federais de educação superior;

f) estimular a integração da educação superior com a Educação Básica no Ensino Fundamental e Médio, de modo a estabele-cer projetos de cooperação que elevem a qualidade do ensino nas escolas da rede pública;

g) fomentar experiências metodológicas e práticas docentes de caráter inovador, que utilizem recursos de tecnologia da in-formação e da comunicação, e que se orientem para a supe-ração de problemas identificados no processo ensino-apren-dizagem;

h) valorizar o espaço da escola pública como campo de expe-riência para a construção do conhecimento na formação de professores para a Educação Básica;

i) proporcionar aos futuros professores participação em ações, experiências metodológicas e práticas docentes ino-vadoras, articuladas com a realidade local da escola (Capes, 2011, p. 1).

As bolsas podem ser divididas em até cinco modalidades para estudo e pesquisa adequadas às condições seguintes: coordenação institucional (permi-tida a concessão de uma bolsa por projeto); coordenação de área (permitida a concessão de uma bolsa para cada subprojeto); coordenação de área de gestão de processos educacionais (concedida a uma bolsa por projeto institucional para o coordenador de área de gestão de processos educacionais); supervisão (permitida a concessão de uma bolsa para supervisor para até o mínimo de cinco e o máximo de dez alunos por supervisor); e iniciação à docência (para estudantes da licenciatura) (Capes, 2011).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 369

No organograma a seguir, é possível verificar de que forma se cons-titui a organização da coordenação do Programa na instituição, bem como a disposição de cada papel dos coordenadores das licenciaturas no processo como um todo.

Coordenador na Licenciatura 1

Até 30 estudantesBolsistas na L1

Supervisor daL1 na Escola 1

Supervisor da L1na Escola n

Supervisor da L2 na Escola 1

Supervisor da L2na Escola n

Supervisor daLn na Escola 1

Supervisor da Lnna Escola n

Até 30 estudantesBolsistas L2

Até 30 estudantesBolsistas Ln

Coordenador naLicenciatura 2

Coordenador naLicenciatura n

Coordenadordo Projeto Institucional

Figura 1. Organograma do PIBID.Fonte: Capes (2011).

O Programa tem como intenção unir as secretarias de educação e as universidades a favor da melhoria do ensino nas escolas públicas em que o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) esteja abaixo da média nacional, de 4,4. As propostas do PIBID sinalizam para o incentivo à carreira do magistério nas áreas da Educação Básica com maior carência de professores com formação específica, sendo elas: Ciência e Matemática de 5ª a 8ª séries do Ensino Fundamental, bem como Física, Química, Biologia e Matemática no Ensino Médio (Capes, 2011).

As propostas de projetos para o PIBID podem ser apresentadas pelas Instituições Federais e Estaduais de Educação Superior, além dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia que possuam cursos de licencia-tura que apresentem avaliação satisfatória no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) (BRASIL, 2011). As chamadas acontecem em fluxo contínuo, sendo que a última aconteceu em janeiro de 2011.

A UNIVERSIDADE E A FORMAÇÃO DOCENTE

A universidade é o lugar de produção de conhecimento. Isso se dá por meio da prática e do desenvolvimento da pesquisa. Nóvoa (2011, p. 2) afirma que “a função maior na universidade é proporcionar às pessoas os instrumen-tos da cultura e do pensamento”. Como instituição eminentemente social, a

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370 BORDIGNON, L. S. et al. - REFLEXÕES SOBRE O PROGRAMA INSTITUCIONAL

universidade deve ser comprometida com a difusão dos conhecimentos, seus avanços e com a ampliação da cidadania.

Segundo Franco (2009), “a universidade como instituição do conhe-cimento por excelência, cuja natureza é marcada pelo duplo papel de forma-ção das novas gerações e produção do conhecimento é habitat propício para desencadear a força estratégica da produção da pesquisa científica” (p. 92). Isso porque formar professores é abrir caminhos para as futuras gerações, que podem significar avanços, inovações, novas perspectivas, mas que também oferecem a possibilidade de se repetir o que aí está, ou pior, sendas que aca-bam em becos sem saída. Diante dessas possibilidades e das mudanças verti-ginosas pelas quais passa a contemporaneidade, as reflexões sobre a formação de professores merecem cada vez mais atenção e cuidado (KRAHE, 2007).

A formação de professores caracteriza-se pela construção da identida-de profissional. Nóvoa (2009, p. 21) reitera a importância dos movimentos pe-dagógicos ou das comunidades de prática1, “que reforçam um sentimento de pertença e de identidade profissional que é essencial para que os professores se apropriem dos processos de mudança e os transforme em práticas concretas de intervenção”.

Quanto às medidas necessárias para assegurar a aprendizagem docen-te e o desenvolvimento profissional dos professores, Nóvoa (2009) também destaca a articulação da formação inicial, indução e formação em serviço em uma perspectiva de aprendizagem ao longo da vida; atenção aos primeiros anos de exercício profissional e à inserção dos jovens professores nas escolas. Buscando, assim, a valorização do professor reflexivo e de uma formação de professores baseada na investigação; importância das culturas colaborativas, do trabalho em equipe, do acompanhamento, da supervisão e da avaliação dos professores.

Um dos grandes desafios para as universidades está na formação de educadores para o nível de Educação Básica. Nessa perspectiva, buscou-se, neste estudo, conhecer o PIBID e captar o “olhar” discente sobre o mesmo.

O OLHAR DISCENTE SOBRE O PIBID

Entre os objetivos deste estudo estava a percepção dos acadêmicos sobre o PIBID. Nesse sentido, realizou-se o tratamento dos dados apurados com relação às considerações apresentadas pelos respondentes.

Os questionários buscaram apreender o discurso dos discentes quanto a estas questões:

1 Hutchings e Huber (apud Nóvoa, 2009) indicam a importância de reforçar as comunidades de prática como sendo um espaço conceitual construído por grupos de educadores comprometidos com a pesquisa e a inovação. Nesse local se discutem ideias sobre o ensino e aprendizagem e se elaboram perspectivas comuns sobre os desafios da formação pessoal, profissional e cívica dos alunos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 371

a) quais as modificações significativas em sua vida acadêmica e pessoal com a inserção no PIBID?

b) qual a sua opinião sobre a relação da Universidade e Educação Básica por meio do Programa?

Esse questionário foi aplicado aos acadêmicos de Matemática e Pedagogia de uma Universidade Comunitária Catarinense2, sendo seis aca-dêmicos – quatro do sexo feminino e dois do sexo masculino. A idade dos participantes varia de 20 a 34 anos; a maior parte deles está no Programa PIBID há um ano.

Um dos objetivos desta pesquisa foi perceber as modificações signi-ficativas na vida acadêmica e pessoal com a inserção no PIBID. Para isso, o questionamento reflexionava sobre as considerações discentes. O Quadro 1, a seguir, revela esse olhar.

Quantidades13 Respostas

2 Experiência válida em sala de aula.2 Conhecimento da realidade diária de uma escola (dilemas e desafios).1 Conhecimento das atividades dos professores. 1 Mudanças de atitudes na busca do saber. 1 Aperfeiçoamento. 1 Incentivo aos estudos individuais, preparando para os estágios.1 Mais confiança no desempenho em sala de aula.

Quadro 1. Modificações na vida acadêmica e pessoal a partir do PIBID.Fonte: BORDIGNON; NEZ (2011).

Outro objetivo da pesquisa foi conhecer a opinião dos discentes so-bre as relações Universidade e Educação Básica por meio do Programa. O Quadro 2, a seguir, revela a posição de entrelaçamento entre esses elos.

Respostas dos Discentes14

• Poder levar à escola métodos aprendidos na universidade.• Facilita a didática e contribui para a aprendizado dos alunos.• Proporciona aos acadêmicos experiências em sala de aula e na escola.• Melhora a formação dos acadêmicos das licenciaturas, e os alunos das escolas se beneficiam das

atividades desenvolvidas.• Oportunidade dos acadêmicos de se inserir no meio educacional na prática.

Quadro 2: Relação Universidade e Educação Básica por meio do PIBID.Fonte: BORDIGNON; NEZ (2011).

2 Salienta-se que essa universidade, lócus da aplicação do questionário, implementou o PIBID a partir do segundo semestre de 2010. 3 Como o questionário possibilitava uma resposta aberta, os alunos descreveram suas opiniões. As res-postas foram condensadas e geraram uma quantidade maior do que o número de questionários aplicados.4 Cada linha de resposta do quadro indica a quantidade de um respondente para a indicação apresentada.

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372 BORDIGNON, L. S. et al. - REFLEXÕES SOBRE O PROGRAMA INSTITUCIONAL

Evidencia-se, assim, que a correlação entre a universidade e a Educação Básica necessita de um docente/coordenador do Programa com um perfil específico, isto é, aquele que situa sua disciplina no contexto histórico-

-social, vendo as possibilidades e os limites dos conceitos com que trabalha para a solução de problemas que desafia a própria ciência, que frequentemen-te direciona o olhar de seus alunos para o futuro, trabalhando nas fronteiras do conhecimento (BALZAN, 2000).

TECENDO CONCLUSÕESA reflexão sobre a formação docente abordada neste estudo exprime

contextos de inserção na Educação Básica por meio do PIBID. Assim, para que a universidade brasileira possa cumprir com sua função social, “[...] pre-cisa sair de seus muros e buscar a sua inserção na sociedade mais ampla, ana-lisando, discutindo e equacionando os diferentes problemas existentes, pro-movendo, assim, a contextualização da realidade” (ARAÚJO, 1998, p. 178). Portanto, o Programa elucidado nesta pesquisa cumpre essa finalidade.

A análise das fontes e os dados do questionário possibilitaram a iden-tificação de impactos positivos na vida acadêmica e pessoal dos participan-tes desse Programa, bem como a importância das relações Universidade e Educação Básica.

O conhecimento, a pesquisa e o respeito à diversidade de povos e cul-turas são imprescindíveis para a construção de políticas públicas educacionais voltadas à formação docente. Os programas e ações do Estado podem sinalizar a melhora da qualidade de ensino tão almejada no Brasil. Entende-se que a qualidade do ensino está atrelada à formação docente inicial e ao longo da vida. Formação comprometida com a pesquisa, estudo, desvelamento e diálo-go intercultural com vistas à capacitação técnica, mas principalmente humana.

Conhecer diferentes programas, entre eles o PIBID, permite recons-truir novas possibilidades à formação docente e construir novos caminhos que possibilitem uma formação docente humanizadora e emancipatória que per-passa pela universidade e pelo impacto das políticas educacionais.

Considera-se, então, que a conquista do saber não se dá exclusivamen-te por meio das fórmulas acadêmicas, mas também no âmago das relações so-ciais. Araújo (1998) acrescenta finalmente que: “o saber é visto como produ-ção coletiva dos homens que surge de sua atuação na vida real, por intermédio de suas relações com a natureza, com os outros e com ele próprio” (p. 179).

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, M. M.; et al. A prática da indissociabilidade do ensino-pesquisa--extensão na universidade. Revista Brasileira de Agrociência. V. 4, n. 3, set./dez.,1998.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 373

BALZAN, N. C. Indissociabilidade ensino-pesquisa como princípio metodo-lógico. In: VEIGA I. P. A.; CASTANHO, M. E. (orgs). Pedagogia universitá-ria: a aula em foco. Campinas: Papirus; 2000. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇAO. PIBID. Disponível em: http:// portal .mec.gov.br/index.php?Itemid=467&id=233&option=com_content&view=article. Acesso em: 31 out. 2011. CAPES. Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID. Disponível em: http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid. Acesso em: 30 out. 2011. FRANCO, M. E. D. P.; LONGHI, S. M.; RAMOS, M. G. Universidade e pes-quisa: espaços de produção do conhecimento. Pelotas: UFPel, 2009. KRAHE, E. D. Sete décadas de tradição: ou a difícil mudança de racionalida-de da pedagogia universitária nos currículos de formação de professores. In: FRANCO, M. E. D. P.; KRAHE E. D. (orgs.) Pedagogia universitária e áreas de conhecimento. Porto Alegre: Série RIES/PRONEX EdiPucrs, v.1, 2007. MOROSINI, M. C.; FRANCO, M. E. D. P. Universidade comunitária e sus-tentabilidade: desafios em tempos de globalização. Educar. Curitiba, n. 28, p. 69, UFPR, 2006.NÓVOA, A. O espaço público da educação: imagens, narrativas e dilemas. In: PROST, A. et al. Espaços de educação tempos de formação. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.

______. Professores: imagem do futuro presente. Lisboa: EDUCA, 2009.______. Uma herança cidadã. Jornal das Letras, Artes e Ideias. Portugal, jan. 2011.SCHÖN, D. A. Formar professores como profissionais reflexivo. In: NÓVOA, A. Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.

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O PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: POR UMA RESSIGNIFICAÇÃO DA FORMAÇÃO

E ATUAÇÃO DOCENTE COM BASE NA PERSPECTIVA DO ENSINO CRIATIVO

Fábio Alexandre Araújo dos SantosAndrezza Maria Batista do Nascimento Tavares

José Jairan ValdevinoSandra Salustiano Dias da Silva

E ste artigo no formato de ensaio teórico é em parte resultado da tese em elaboração, bem como está relacionado às atividades

de produção do Grupo de Pesquisa em Educação, Linguagens, Formação Profissional e Inclusão Social (GELFOPIS) pertencente ao IFRN, mais preci-samente ao campus Macau. O referido artigo tem o objetivo de refletir sobre algumas das principais problemáticas do Ensino Superior com o enfoque no professor universitário ou do Ensino Superior em relação à criatividade e ao ensino criativo.

É notório que as universidades, faculdades, centros universitários e institutos de formação de Ensino Superior no país, e porque não ampliar para nível mundial, necessitam repensar suas lógicas de formação profissional, principalmente no âmbito das licenciaturas, que visam instrumentalizar com aporte teórico e prático o professor em várias áreas do conhecimento científico.

A sociedade se transforma a cada momento, ao passo que cada indi-víduo se transforma também, num movimento dialético. O homem está em constante transformação e esse trânsito permanente permite olhar de várias formas para uma mesma situação, isto é, são inerentes a todos os seres huma-nos essas mudanças quantitativas e qualitativas.

Discute-se a criatividade como potencialidade humana que promove o autoconhecimento, o conhecimento mais qualitativo por meio da curiosidade, da necessidade imanente de investigar para intervir, sobretudo para propiciar o bem-estar individual/social e redirecionar os processos formativos que centra-lizam o saber no professor, assim como impossibilita o aluno de compreender com base em perspectivas críticas os fenômenos sociais e científicos. A criativi-dade deverá ser entendida como um bem cultural e social que por muitas vezes fora renegada e negligenciada por vários motivos pelo contexto educacional.

Assim, este trabalho está estruturado em duas seções reflexivas que tratarão sobre o professor universitário, as habilidades criativas necessárias a esse professor bem como a configuração de um ambiente pedagógico criativo. Posteriormente, tratar-se-ão das principais problemáticas e desafios para o Ensino Superior, isto é, para a educação na atualidade.

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376 SANTOS, F. A. A. et al. - O PROFESSOR UNIVERSITÁRIO

REFLEXÕES SOBRE O PROFESSOR UNIVERSITÁRIO, AS HABILIDADES CRIATIVAS E UM AMBIENTE PEDAGÓGICO CRIATIVOIniciar-se-ão as reflexões com a descrição das principais caracterís-

ticas ou atitudes do professor criativo apontadas por Alencar e Fleith (2004). Segundo esses autores, a capacidade de ouvir diferentes ideias e respeitá-las e, se possível, se apropriar para compreender as várias faces e possibilidades de se pensar sobre um determinado problema, fenômeno etc., constitui-se em uma das mais relevantes características do pensamento criativo.

Essa condição de ouvir e respeitar as diferentes ideias requer do pro-fessor o exercício permanente do pensamento divergente, cujo mesmo se ba-seia em conhecimentos sistematizados. Porém é possível enxergar além do que está posto como possível resposta e, diferentemente dessa resposta, pensa em outras a fim de resolver ou amenizar tal situação conflituosa ou proble-mática.

Outra habilidade criativa implica na condição de encorajar, motivar o aluno a realizar seus próprios projetos, isto é, investir energias diferenciadas e individualizadas no sentido de fazer o aluno refletir sobre seus potenciais, seja na pesquisa, na aquisição de habilidades em relação a determinados con-teúdos escolares, seja nas atitudes de pensar sobre os problemas e, sobretudo, buscar soluções para os mesmos.

Estimular o questionamento constitui-se em outra habilidade criativa importante a ser desenvolvida pelo professor, uma vez que o aluno precisa se apropriar do pensamento científico na escola ou na formação profissional inicial e continuada para visualizar outras facetas pertinentes ao contexto so-ciocultural em que está inserido.

Criar um ambiente rico em interações, sem tantas pressões formais no tocante a regras que não ajudam o aluno a compreender suas responsa-bilidades e necessidades, mas, sim, a fazer apenas porque lhes é obrigado, consiste em uma das condições de desenvolvimento do pensamento criativo no ambiente formativo.

Usar a crítica com cautela como subsídio importante para o desenvol-vimento de tal habilidade, pois a crítica permite o sujeito a pensar. Ao mesmo tempo permitindo que o aluno faça indagações sobre fundamentos teóricos e intervindo quando necessário para a efetivação da mudança. Tal condição exige do professor e do aluno relações mais estreitas, autoavaliativas e menos preconceituosas quanto aos valores de cada um deles no sistema educativo, ou seja, modifica, necessariamente o modo hierárquico escolar. Faz-se necessá-rio enfatizar que tal modificação no modelo hierárquico escolar não implica em afirmar que o professor deverá perder sua autonomia e sua autoridade, mas, sim, agir de forma autônoma e responsável com a aprendizagem do alu-no em conexão com as formas de suas estratégias de ensino.

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Descobrir o potencial de cada aluno em relação à criatividade confi-gura-se em uma característica importante do professor criativo.

Esse conjunto de características descrito por Wechsler (2003) e Cropley (2004) gera reflexões importantes quando transposto para a realidade da maioria dos professores que atua no Ensino Superior. O respeito à individu-alidade, a liberdade, a disciplina, a responsabilidade, a segurança psicológica e a tolerância, o reconhecimento e a valorização dos trabalhos e avanços de cada aluno, a afetividade originada de motivações intrínsecas, extrínsecas e sinergética e a mobilização para atividades educativas diversificadas configu-ram-se em algumas características peculiares ao ensino criativo.

Como visto anteriormente, o professor situado em um contexto pro-blemático, tanto em relação ao sistema de ensino, o contexto histórico-cultural do aluno e sua própria trajetória de formação e profissional quanto na aquisi-ção das habilidades criativas, trava em seu cotidiano inúmeros desafios no que compete ao ensino. Para Nakano (2006, p. 54), “[...] o professor estimulador da criatividade em sala de aula permite ao aluno pensar, desenvolver ideias e pontos de vista, fazer escolhas; valorizar o que for criativo; não rechaça o erro, mas vê como etapa do processo de aprendizagem [...].”

É importante estes questionamentos: o professor ao longo de sua for-mação escolar ou profissional (inicial e continuada) teve oportunidades de compreender e vivenciar práticas pedagógicas mais criativas? Se eles tiveram essas experiências criativas enquanto estudantes, os mesmos foram valoriza-dos no contexto de sua formação? Como aconteceram as relações entre eles e os professores nas divergências de pensamento em sala de aula? Foram re-chaçados ou considerados como sujeitos críticos e criativos nos processos de ensino-aprendizagem? Quais eram os seus perfis como alunos criativos no momento de sua formação escolar e acadêmico-profissional?

Sabe-se que, na maioria das vezes, os professores atuantes no Ensino Superior não experimentaram práticas escolares de cunho criativo, até porque no momento histórico que a maioria deles foi formada a concepção de educa-ção, de aluno, de professor, de ensino e de aprendizagem era distinta do que conhecemos hoje (FREIRE, 2003).

Além do professor, do aluno e do ambiente, três pilares emergem quando se objetiva valorizar e desenvolver o potencial criativo no cenário escolar: a heterogeneidade (diversidade cultural, de valores e de crenças), as percepções que os alunos e os professores têm de si mesmos e o clima de sala de aula (PAJARES, 2002).

Em se tratando de ambiente pedagógico facilitador, Martinez (1997) explicita o processo de ensino centrado no aluno, sendo o professor um faci-litador do processo de aprendizagem do aluno. Como se percebe, a figura de um professor meramente reprodutor de saberes e que mecaniciza suas práti-cas pedagógicas não figura como um professor criativo. Assim, um profes-sor criativo lida com o ambiente, com os materiais, com os alunos e com o

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sistema educativo de forma criativa, ousada, flexível, sensível aos proces-sos de ensino-aprendizagem e sua complexidade. Uma pesquisa realizada por Rodrigues Junior (2000) refletiu sobre o processo de autoidentificação dos professores universitários das áreas de saúde e ciências sociais aplicadas de sua criatividade, ou seja, se os professores se consideravam criativos. Os resultados mostraram a autoimagem positiva do professor relacionada à sua criatividade distintamente das concepções dos alunos sobre os mesmos, reve-lando uma incongruência entre o que os professores pensam e as percepções dos alunos sobre eles.

Dentre as condições que os professores na referida entrevista apre-sentaram como argumentos de sua autoimagen positiva sobre a qualidade de serem criativos, destacam-se as seguintes caracterizações: a modificação das atividades e metodologias das aulas, senso de humor, curiosidade, aceitação de desafios e autoconfiança. Percebe-se, então, que nos discursos dos sujei-tos, no tocante à pesquisa, a criatividade é compreendida como abertura e flexibilidade de pensamento, autonomia no aprender, liberdade de expressão e comunicação. Entretanto, se nos seus argumentos a criatividade é tão bem visualizada, por que na prática não acontece de forma efetiva e eficaz? Quais os entraves apontados pelos professores referentes à incongruência entre o dizer e o fazer pedagógico na perspectiva criativa? Quais os níveis de com-preensão dos professores a respeito das incongruências entre o dizer e o fazer na sua prática profissional na condição de formador dos futuros professores ou professores que estudam e já estão em exercício?

Diante de tais incongruências, revela-se uma questão: o que leva o aluno a perceber o seu professor no nível universitário pouco ou não criativo, quando o próprio professor se considera criativo? Quais as concepções dos professores e dos alunos a respeito da criatividade? Quais são os fundamentos teórico-metodológicos (concepções e práticas) que permitem aos professores universitários se verem como sujeitos criativos? Quais os impactos, segundo os professores, de sua perspectiva criativa na aprendizagem dos alunos?

Uma justificativa plausível decorre do contexto pedagógico, que ge-ralmente é pouco favorável à criatividade. Perrenoud (2001) aponta que o peso das tarefas fechadas, dos exercícios e das rotinas excessivamente buro-cráticas e de suas relações utilitaristas do trabalho como um dos fatores do contexto pedagógico implicam na pouca expressão do desenvolvimento da potencialidade criativa do professor e do aluno, além das lacunas referencia-das na formação docente anterior.

Leva-se a crer, então, que os professores discursam e praticam ativi-dades na dimensão criativa, intuitivamente, isto é, utilizam-se das crenças, ou, como afirma Ramalho, Nuñez e Ohara (2009), das suas Teorias Implícitas (TIs). Eles se fundamentam com base nelas para confirmar, validar e viven-ciar práticas pedagógicas na perspectiva da criatividade, sem necessariamente estarem de fato trabalhando nessa perspectiva.

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Sendo assim, torna-se latente a necessidade de os professores se auto-formarem na perspectiva do ensino criativo. Entretanto, não serão somente os cursos de formação na área, mas, sim, cursos e experiências que os motivem e fundamentem, sobretudo que os possibilitem a refletir sobre as crenças que os orientam em relação à importância e à fundamentação teórico-metodológica da criatividade no processo de ensino-aprendizagem.

Mediante as reflexões dos professores sobre suas próprias crenças a respeito da criatividade enquanto eixo norteador de práticas pedagógicas, bem como os impactos dela na formação dos alunos-professores, visualizar-

-se-ão possibilidades de repensar a diminuição do distanciamento entre o dizer e o fazer pedagógico criativo, de ir além da compreensão desse distan-ciamento, mas também em refletir sobre como se modificar tal estrutura de desconexão. Conforme Lubart (2007, p. 79), sobre as influências diretas dos professores sobre seus alunos, “os professores transmitem implicitamente aos alunos suas atitudes e suas preferências pela maneira como organizam suas classes”.

A próxima seção trata de alguns dos principais desafios e problemáti-cas inerentes ao contexto da formação no Ensino Superior com o fito de rela-cionar tais temáticas à primeira, isto é, a necessidade de habilidades criativas por parte dos professores naquele nível de ensino.

PROBLEMÁTICAS E DESAFIOS PARA O ENSINO SUPERIOR E O PROFESSOR

As excessivas demandas burocráticas são alvo das queixas dos profes-sores no tocante ao tempo pedagógico. Se existe muita burocracia (preenchi-mento de diários, elaboração de planos de ensino, elaboração de avaliações, correção de trabalhos e provas em uma grande escala) no nível do Ensino Superior, falta tempo pedagógico para o professor se preparar didático-peda-gogicamente.

Na atualidade, é exigido a indissociação ensino-pesquisa-extensão com base em uma visão integradora e interdisciplinar. Embora se façam essas exigências, existem instituições que burlam essa indissociação e, dependendo da cultura organizacional das mesmas, segundo Morosini (2000), é possível encontrar instituições que priorizam apenas o ensino; instituições que prio-rizam de forma mínima o ensino com a pesquisa; instituições que priorizam mais a pesquisa. De acordo com a autora supracitada (2000, p. 14):

Se ele atua num grupo de pesquisa em uma universidade, provavelmente sua visão de docência terá um forte condicionante de investigação. Já se ele atua numa instituição isolada, num centro universitário, ou mesmo numa federação, sua visão de docência terá um forte condicionante de ensino sem pesquisa, ou quando muito, do ensino com a pesquisa. A cultura da instituição e daí decor-rente a política que ela desenvolve terão seus reflexos na docência universitária.

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A situação dicotômica entre ensino-pesquisa-extensão acontece, prin-cipalmente, devido a esse funcionamento não harmônico entre a tríade enun-ciada acima. Além desse equívoco, existem docentes que são contratados no formato de dedicação exclusiva integral (Full-time) ou parcial (part-time), o que leva a crer que tal sistema eleva ainda mais o distanciamento entre ensino-

-pesquisa-extensão e as condições necessárias para que o professor se identi-fique com a instituição, seus alunos e se comprometa efetivamente com um ensino de qualidade.

Como pensar em qualidade de ensino se o professor, na maioria das vezes, para a instituição é considerado apenas pela sua força de trabalho, como no caso dos contratos com horários parciais? O professor adentra a instituição de ensino apenas para ensinar e não tem a mínima oportunidade de liderar grupos de pesquisas, discussões mais profundas sobre determinados objetos de estudos etc.

Isso acarreta danos irreparáveis para os alunos que, ao saírem das uni-versidades, em geral, não sabem pesquisar e ensinar de forma competente, pois lhe faltou em sua formação experiências que disponibilizassem saberes investigativos e saberes da prática oriunda de um ensino, por vezes desarti-culado da essência da educação: a socialização, os questionamentos, a inter-venção e a (re)socialização. Saberes imprescindíveis para aguçar o potencial criativo do aluno.

Ao investigar, o aluno deverá estar intrinsecamente motivado por curiosidades e vontades de saber o que é, como proceder, dominar as técnicas de pesquisa e com esse domínio encontrar resultados já esperados e resul-tados talvez nunca antes esperado, ou seja, o inusitado. Como afirma Torre (2008), o aluno que aprende por meio da pesquisa, por exemplo, aprende de forma criativa. Se ele ousar em seus pensamentos, não somente a experiência de pesquisa propiciará tal feito, mas também as condições de flexibilização, liberdade, autonomia e confiança mútua entre professor e aluno.

Outro fator agregador na problemática do contexto do professor uni-versitário constitui-se no seu fazer pedagógico na perspectiva integral, ou seja, nos níveis do planejamento, da interação pedagógica na sala de aula e na avaliação pós-experiências vividas na sala de aula. O que se pretende afirmar é que o professor universitário, geralmente, trabalha numa vertente “solitária”. Esse trabalho solitário do professor universitário decorre dos poucos espaços para a partilha das suas experiências pedagógicas, pois a ênfase é maior quan-do a partilha versa sobre os projetos de pesquisas, os grupos de pesquisas e seus resultados − mesmo assim quando se trata de uma instituição de ensino que privilegie o ensino com a pesquisa ou mais a pesquisa, conforme citado anteriormente.

Nesse caso, existem duas hipóteses básicas para a compreensão da latência desse trabalho caracterizado como “solitário”: o próprio sistema ins-titucional, que permite o professor trabalhar sozinho, sem orientações peda-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 381

gógicas e administrativas diretas, e a proteção de uma suposta autoridade científica, como enfatiza Cunha (2006). Para Pimenta e Anastasiou (2002, p. 143), “a universidade reforça o trabalho solitário, extremamente indivi-dual e individualizado; o professor é deixado a sua própria sorte e, se for bastante prudente, evitará situações extremas nas quais fiquem patentes as falhas de seu desempenho”. Discutir-se-á a partir deste momento, uma pro-blemática evidente que acaba por estender-se aos cursos de licenciaturas ou de formação de professores em nível superior, uma vez que tal formação também é vivenciada pelo professor que forma o aluno em nível superior. Tal problemática consiste nos pressupostos teórico-metodológicos que alicerçam as formações dos professores universitários, principalmente a tendência a hiperespecialização.

Em conjunto com a hiperespecialização, têm-se falhas no que concer-ne o enfoque conteudista. O conteúdo é privilegiado na formação do professor em detrimento de outros saberes tão importantes quanto os conteúdos. Para Cunha (2006, p. 258), a formação docente tem-se configurada:

Por força da tradição e ratificada pela legislação, como atinente quase que exclusivamente aos saberes do conteúdo de ensino. Espera-se que o professor seja, cada vez mais, um especialista em sua área, tendo-se apropriado com o concurso da pós-graduação stricto sensu, do conhecimento legitimado acade-micamente no seu campo científico. O domínio do conteúdo, por sua vez, deve ser alicerçado nas atividades de pesquisa que garantam a capacidade potencial de produção de conhecimento.

Enfim, a formação de professores atualmente apresenta-se em um eixo irradiador de discussões no meio acadêmico e científico com inúmeras teses, dissertações e artigos científicos. A configuração do professor univer-sitário contemporâneo implica em refletir sobre a sua formação, geralmente como carente de valorização de outros aspectos importantes, ou seja, as com-petências técnicas, as competências práticas, as competências científicas e as competências pedagógicas, segundo Perrenoud (2001).

Nesse olhar fragmentado da formação do professor universitário, percebe-se que tal fragmentação advém da mesma formação do professor que atua neste âmbito (RAMALHO, NUÑEZ; GAUTHIER, 2003). Em con-junto com a fragmentação e a hiperespecialização, destaca-se a carência nas próprias formações em não discutir de forma relevante como o professor visualiza sua própria formação, o processo de ensino-aprendizagem, como o aluno aprende e inclusive como o próprio professor aprendeu e aprende ao lidar com os processos de ensino-aprendizagem e o sistema educacional. Nesse caso, como foco deste estudo, como o professor percebe a importância da criatividade na prática em sala de aula ou como dar-se-á essa prática, bem como seus impactos no sentido pedagógico ao vivenciar tais práticas educa-tivas criativas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percebe-se, assim, que um dos maiores desafios a superar no Ensino Superior, nesse caso nas licenciaturas, refere-se à investigação mais fecunda acerca do desenvolvimento do pensamento criativo dos alunos. Um desafio para os professores responsáveis pelas formações dos futuros professores ou dos já professores em exercício concomitantemente a sua formação profissio-nal inicial.

Outro desafio consiste em sistematizar formações continuadas ade-quadas para os professores universitários de licenciaturas nas variadas áreas de conhecimentos sobre o processo de ensino-aprendizagem criativo, cujas reflexões os possibilite a compreender sobre o próprio processo educativo mediante suas concepções e revisões de práticas pedagógicas. Uma formação que revisite as raízes e as razões que guiam as concepções e as práticas, apro-ximando o pensar do fazer, o discurso da prática, enfim, que articule teoria/prática e que transite das Teorias Implícitas para as Teorias Explícitas no sen-tido de conceber e praticar atividades criativas.

Visualiza-se, com base nessa ótica, que o professor responsável pela formação dos licenciandos, salvaguarda as devidas proporções, apresenta la-cunas referentes às questões da criatividade. Porém ao longo de sua formação continuada, tem a oportunidade de repensar constantemente sobre as crenças que guiam, na maioria das vezes, suas concepções e, portanto, suas ações, seja no cotidiano ou no âmbito profissional. Assim, o profissional estará mais e melhor preparado para lidar com o desenvolvimento do pensamento criativo dos seus alunos-professores.

As críticas elaboradas aos cursos de formação docente realmente re-pousam sobre a escassa oportunidade de consciência crítica sobre o seu en-sinar, e mais especificamente o ensinar de forma criativa. Não será qualquer formação que conseguirá superar as crenças dos professores, isto é, a trans-formação das Teorias Implícitas para as Teorias Explícitas em relação à cria-tividade.

Por isso, as questões giram em torno de conhecer quais as possibili-dades das formações em propiciar aos professores participantes a condição de superar as limitações de suas práticas e TIs com base em suas reflexões de forma sistematizada e crítica.

A situação de ensino-aprendizagem vivenciada pelo professor uni-versitário difere das dos demais níveis, uma vez que além de preparar o professor em termos de conteúdos tem que prepará-los para ensinar e lidar com a complexidade da sala de aula de natureza pluridimensional, isto é, um espaço onde acontecem muitos eventos e com certa interdependência entre eles, e de forma inédita, não se repete, não dá para se preparar com uma

“receita pronta”.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 383

REFERÊNCIAS

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EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS E A FORMAÇÃO DO SUJEITO POLÍTICO NA UNIVERSIDADE

Priscila Bier da Silveira Juliana Zirger

Maria Elly Herz Genro

E ste estudo investiga as possíveis relações existentes entre a edu-cação e a intensificação da democracia por meio da formação

de sujeitos políticos na universidade. Os sujeitos envolvidos nesta pesqui-sa são três educadoras atuantes em espaço de educação não formal em uma instituição pública do município de Porto Alegre/RS, que atende crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Duas das educadoras es-tão fazendo o estágio curricular supervisionado e são estudantes portuguesas do curso de Animação Socioeducativa da Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC), Portugal. A terceira educadora popular tem formação aca-dêmica concluída em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Na perspectiva de intensificação da relação universidade e sociedade, compreendemos a universidade como uma possibilidade de formação do su-jeito político. Para pensar em uma formação política, evidenciamos dados de uma pesquisa em desenvolvimento na UFRGS sobre as relações entre a edu-cação e a democracia. Para tanto, foram realizadas entrevistas com duas edu-cadoras em situação de estágio curricular e com uma graduada. Os resultados das entrevistas realizadas foram elencados em categorias analíticas. Arendt, Chauí e Santos norteiam esta pesquisa.

METODOLOGIACom base na metodologia qualitativa, foram realizadas entrevistas se-

miestruturadas com as educadoras, sendo que a análise será complementada com a leitura do relatório das estudantes e do Projeto Pedagógico da insti-tuição onde o estágio foi realizado. As questões norteadoras das entrevistas foram desdobradas em categorias de análise, que denominamos de categorias a priori, quais sejam: experiências educativas vivenciadas durante a prática pedagógica, as dificuldades enfrentadas, os sentidos e as finalidades atribuí-dos ao educar.

CONCEITOS

• Política, com base em Hanna Arendt (2001).• Universidade, com base em Marilena Chauí (2003).

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• Educação, formação e conhecimento, com base em José Dias Sobrinho (2009).

• Política, universidade e democracia, com base em Boaventura de Sousa Santos (2006).

CONTEXTUALIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO LÓCUS DA INVESTIGAÇÃO: FUNDAÇÃO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E CIDADANIA (FASC)

A FASC tem como objetivo formular, gerenciar e executar a política de Assistência Social no município de Porto Alegre/RS em consonância com a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), a Lei Complementar Municipal 352 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Ela desenvolve progra-mas e serviços para a população em vulnerabilidade social.

A FASC criou os Centros de Comunidades e Esportivos que tinham o objetivo de oferecer esportes, recreação e cultura às comunidades que não dispunham desses equipamentos. As metas desses centros eram promover a educação integral, oportunizando desenvolvimento a todas as capacidades do ser humano e enfatizando o papel da recreação e das manifestações artísticas. Esses centros de comunidade passaram a ser chamados de Centros Regionais de Assistência Social. Para esta investigação, escolhemos um desses centros.

CONTEXTUALIZAÇÃO DE ALGUNS DOS SUJEITOS ENTREVISTADOS

Estudantes portuguesas provenientes do curso Animação Socioeducativa da Escola Superior de Educação de Coimbra (ESEC), Portugal, em período de estágio curricular. O intercâmbio em Porto Alegre foi realizado em parceria com a UFRGS.

RESULTADOS

Em relação às falas dos sujeitos envolvidos na pesquisa, emergiram as seguintes concepções, relacionadas aos objetivos da pesquisa: as experiên-cias educativas denotaram um tensionamento entre concepções de educação formal e não formal, bem como um processo educativo que se fundamenta no convívio humano, no respeito às diversidades e no diálogo; as dificuldades referenciaram um contexto marcado pelas desigualdades sociais, violência e opressão e, também, uma carência de infraestrutura que incide no desenvol-vimento do trabalho; os sentidos e as finalidades que constituem o educar compreendem a educação como possibilidade de intervenção social, como processo de construção de autonomia e como compreensão de si, do outro e do mundo.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 387

ALGUMAS FALAS DOS SUJEITOS ENTREVISTADOS

Experiências educativas

Sujeito A: “O que tem dado certo, quando eu sinto que tenho que ar-ranjar outra estratégia, é começar a conversar, pedir-lhes informações. Eles têm um monte de histórias para contar, histórias agressivas, de tiros e de mor-tes, já viram um monte de coisas.”

Sujeito C: Educação não formal: “[...] é expressar, de eles se expres-sarem. Acho que na escola eles não têm esse espaço, muito menos em casa, então ali é um espaço para isso.”

Sentidos do educar

Sujeito A: “[...] eu acho que a educação [não formal] tem essa coisa do sujeito político, um sujeito que questiona o momento que está, que trans-forma o momento que está e tem a capacidade de atuar sobre muitas coisas que se alterariam, porque a verdade é que a maior parte das pessoas não está satisfeita com essa vida, mas não sabe o porquê. E eu acho que a educação em vez de ser um instrumento de manipulação devia ser um instrumento de tomar consciência de nosso papel no mundo”.

Sujeito B: “[...] o educar, a educação é a base de tudo. É a base de tudo, é... bem simples, ou seja, sem educação não podemos crer em um país pro-gressista com uma evolução boa, econômica, cultural, todos os níveis, porque o ser humano é um ser que para ser cidadão, para ser pessoa e não ser animal irracional é através da educação que eles se desenvolvem dessa maneira, é através da educação que nós somos pessoas.”

Sujeito C: “[...] educação vai muito além, acho que quando cada um consegue se construir, consegue se enxergar, consegue enxergar o outro, não só o outro, mas um pouco, além disso a natureza, enfim, eu acho que até essa concepção de si mesmo, de autonomia, de mundo, eu acho que ter consciência, acho que educação tá muito além de sabedoria, eu acho que é uma questão de vida mesmo, de superação.”

Dificuldades Vivenciadas

Sujeito B: “Então detectei em relação às crianças e aos adolescentes [...] muita falta de concentração, dificuldade de criar pensamento crítico, pen-sar simplesmente. Eles não têm o hábito de pensar acerca das coisas, o porquê das coisas serem assim [...] eles são muito sedentários e sedentárias, muito passivos e passivas.”

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388 SILVEIRA, P. B. et al. - EXPERIÊNCIAS EDUCATIVAS E A FORMAÇÃO DO SUJEITO

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Dessa forma, pensamos a ação formativa na universidade como uma contribuição possível na formação política dos sujeitos e, consequentemen-te, na perspectiva de intensificação da democracia. No horizonte teórico de Hannah Arendt (2001), a ação entre os homens exercida no espaço público é a mais política das atividades, uma vez que possibilita a criação de ideias, valo-res e condutas inovadoras imprescindíveis à formação humana. Para tanto, a universidade deve ser concebida para além da formação técnica e profissional, mas também comprometida com a formação política, filosófica e ética. Assim, a universidade é compreendida, na perspectiva de Marilena Chauí (2003), en-quanto instituição social em contraposição à instituição organizacional. Cabe a nós repensar e atuar no desenvolvimento de projetos coletivos que refor-cem a ação política de sujeitos capazes de promover valores e condutas ci-dadãs que revigorem processos democráticos de alta intensidade, conforme conceito desenvolvido por Boaventura de Souza Santos (2006). Apostamos, portanto, na educação como uma possibilidade de fortalecimento do sujeito político, sem ignorar os limites e obstáculos desse caminho. A universidade, enquanto instituição permeada pelas demandas e conflitos da sociedade, deve constituir-se como um espaço de problematização da realidade e proposição de novos projetos na vertente da responsabilidade social.

REFERÊNCIAS

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EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E QUALIDADE DA APRENDIZAGEM

Rosalir Viebrantz

N os últimos tempos, verificou-se, no Brasil e no RS, um cres-cimento significativo na expansão da educação profissional, o

que ocasionou um aumento na oferta de cursos técnicos integrados ao Ensino Médio. Essa expansão, evidentemente, não pode prescindir de qualidade na aprendizagem. Diante disso, e partindo do princípio de que os alunos são res-ponsáveis pela sua própria aprendizagem, surge a necessidade de nos pergun-tarmos sobre como podemos definir indicadores de qualidade na aprendiza-gem em que os aprendizes não sejam apenas consumidores de conhecimento, mas coprodutores do seu próprio aprendizado em nível individual, organiza-cional e comunitário.

Dentro dessa temática, esta investigação, que tem como lócus a educa-ção profissional de nível técnico, no IFSul, no Campus Camaquã, visa inves-tigar a qualidade na aprendizagem da educação profissional em nível técnico, em tempos de expansão, na perspectiva individual, organizacional e comuni-tária. Nesse âmbito, são objetivos específicos deste estudo: analisar a quali-dade da aprendizagem e configurar indicadores de qualidade para os cursos técnicos integrados, na perspectiva individual, organizacional e comunitária.

No sentido de desenvolver um trabalho que possa contribuir de manei-ra relevante para a construção dos indicadores de qualidade para a aprendiza-gem na educação profissional, nível técnico, optou-se pela realização de uma pesquisa de natureza qualitativa, do tipo estudo de caso. Ao nos referirmos à qualidade da e na aprendizagem, partimos do princípio de que as fontes de aprendizagem abrangem todos os contextos em que essa ocorre, englobando não apenas a infraestrutura técnica e os materiais de aprendizagem, mas tam-bém os recursos humanos em suas funções de ensino e de apoio.

Esta pesquisa tem evidenciado que é necessário um novo quadro de qualidade da aprendizagem, ou seja, que se estabeleça um link entre a apren-dizagem individual, a comunitária, a organizacional e a territorial.

Vale destacar que o século XXI chegou marcado com algumas caracte-rísticas específicas, como o mundo globalizado, a economia do conhecimento e a sociedade da aprendizagem, por exemplo. Tal cenário trouxe inúmeras transformações em todos os setores da vida humana. O progresso tecnológico foi/é evidente e atua principalmente como facilitador no processo de comuni-cação e de aprendizagem. Nesse contexto de progresso tecnológico, constata-

-se, no Brasil e no RS, um aumento significativo na expansão da educação profissional e, de modo particular, na ampliação da oferta de cursos técnicos integrados ao Ensino Médio.

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VIEBRANTZ, R. - EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E QUALIDADE 390

A problemática que se constata, em algumas realidades educacionais, é o insucesso, a falta de empoderamento e a desmotivação na aprendizagem que afeta o indivíduo, a escola, a cidade, a comunidade, a região e a qualidade do curso, o nível da aprendizagem escolar e a própria qualidade em educação. Questões relativas à qualidade da aprendizagem não se restringem especifica-mente ao contexto em estudo; nessa pesquisa, entretanto, resta-nos saber como é a qualidade da aprendizagem na educação profissional, em cursos técnicos integrados ao Ensino Médio, em nível individual, organizacional e comunitário. Partimos do princípio de que os alunos são responsáveis pela sua própria apren-dizagem. O empoderamento é um elemento-chave na aprendizagem, e a moti-vação é um forte determinante nos resultados e no sucesso dessa aprendizagem.

Pressupomos que a qualidade de uma experiência de aprendizagem como um todo está relacionada com a qualidade dos processos individuais de aprendizagem que compõem a experiência particular na aprendizagem. Por sua vez, a qualidade de cada processo na aprendizagem está relacionada com o ambiente em que ocorre o processo e com as fontes utilizadas nesse proces-so (LAYTE; RAVET, 2006; PAWLOWSKI, J. M., 2007; VIEBRANTZ, R.; MOROSINI, M. C., 2009).

Sendo assim, nos perguntamos como podemos definir indicadores de qualidade na aprendizagem em que os aprendizes não sejam apenas consu-midores de conhecimento, mas coprodutores do seu próprio conhecimento/aprendizado em nível individual, organizacional e comunitário/cidade. Como objetivos específicos, pretendemos analisar a qualidade da aprendizagem no Campus Camaquã e configurar indicadores de qualidade na aprendizagem para cursos técnicos integrados.

METODOLOGIA (MATERIAL E MÉTODOS)

O recorte faz-se em relação à educação profissional em cursos técni-cos integrados ao Ensino Médio, no IFSul, no Campus Camaquã. No sentido de desenvolver um trabalho que possa contribuir de maneira relevante para a construção dos indicadores de qualidade para a aprendizagem na educação profissional, em cursos técnicos integrados ao Ensino Médio, optou-se pela realização de uma pesquisa de natureza qualitativa, do tipo estudo de caso. Em relação aos procedimentos metodológicos, a pesquisa teve: interligação e sucessividade de etapas – significa que o desenvolvimento de uma etapa subsequente é alimentado primordialmente pelos resultados da etapa que o precede. Tal princípio não foi impeditivo do avanço da etapa, sendo necessá-rio para seu pleno desenvolvimento.

Coleta de dados

Um conjunto de 210 questionários aplicados aos alunos foi analisado. Desse total de questionários, foram selecionados aleatoriamente 50% dos ques-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 391

tionários aplicados a todos os alunos dos cursos técnicos integrados – Controle Ambiental e Automação Industrial –, para serem codificados. O total geral dos questionários codificados para esta pesquisa foi de 105 questionários.

Análise dos dadosOs questionários, uma vez selecionados, foram analisados e codifica-

dos por meio da técnica de análise de conteúdos, com a finalidade de identifi-car a relação entre os fenômenos estudados. Moraes (1999) e Somers (2006) dividem o processo de análise de conteúdo em cinco etapas, as quais foram seguidas rigorosamente. Na etapa de preparação, verificou-se a representati-vidade e pertinência dos questionários em relação aos objetivos propostos e à codificação dos materiais. Na etapa de unitarização, foi feita a releitura cui-dadosa dos questionários e definidas as unidades de análise, no caso, palavras e termos repetidos ou de mesmo sentido que remetiam a uma mesma ideia; as unidades foram codificadas e posteriormente isoladas, tendo sido reelabo-radas para que tivessem um significado completo em si mesmas e agrupadas em unidades de conteúdo. A categorização/codificação foi feita em três fases, inicial, intermediária e final, mantendo-se um critério semântico analógico. Nos três níveis de categorização, foram observadas e cumpridas as caracte-rísticas fundamentais nos critérios de categorização, quais sejam: a validade

– pertinência em relação aos objetivos da análise; a exaustividade – classifica-ção de todos os dados significativos; a homogeneidade – manutenção de uma única dimensão de análise; a exclusividade – classificação de cada elemento em uma única categoria; e a objetividade ou consistência – classificação clara ao longo de toda a análise. Para o trabalho de descrição se produziu “textos-

-síntese”, em que se buscou expressar o “conjunto de significados presentes nas diversas unidades de análise” (MORAES, 1999). Finalmente, para a etapa de interpretação, foram retomadas as categorias finais, procedeu-se a um tra-balho de inferência e interpretação à luz das teorias existentes sobre o tema em estudo e buscou-se apoio de outros autores.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A pesquisa evidenciou nove grandes categorias de análise, que são: • Aprendizagem e motivação. • Dificuldades de aprendizagem: desmotivação. • O educando como componente do ensino: estilos de aprendi-

zagem, capacidade e contexto. • Aprendizagem e clima na sala de aula.• Aprendizagem colaborativa: prática eficaz de ensino.• Aprendizagem: requer avaliar resultados de alunos e profes-

sores.

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VIEBRANTZ, R. - EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E QUALIDADE 392

• Aprendizagem: empoderamento.• Aprendizagem: comprometimento.• Aprendizagem e qualidade.

Nesse momento, vamos trabalhar apenas com a categoria Aprendizagem e qualidade. Os alunos do Campus em estudo ao responderam o questiona-mento – “para você o que é uma aprendizagem com qualidade?” –, assim se referiram:

[...] percebo a qualidade na aprendizagem quando o aluno e o professor querem realmente evoluir e aprender. Acho que muitas pessoas pensam que quantidade é qualidade. E enquanto as pessoas não mudarem esse pensamento, a qualidade da aprendizagem não irá evoluir (Aluno 117).

Uma aprendizagem de qualidade é o aluno saber tudo o que aprendeu e não apenas decorar (Aluno 22).

Entender o porquê de estar aprendendo isso ou aquilo. Vendo se realmente aprendi algo e se isso é útil para hoje (Aluno 72).

A qualidade da aprendizagem está no prazer de aprender. Para mim é um sin-toma de que realmente estou sendo bem instruído e com qualidade (Aluno 79).

É quando um professor ensina bem e sabe tirar bem as dúvidas. Quando vejo uma aula em que o aluno e o professor interagem (Aluno 82).

É uma aprendizagem na qual todos conseguem entender e compreender (Aluno, 83).

Com diálogo e debates (Aluno 133). Bons professores, uma boa explicação da matéria. Isso pode ser percebido

com o rendimento da turma e como qualidade na aprendizagem (Aluno 137).É se esforçar para vencer as barreiras. Percebo vendo os exemplos que tenho

em minha frente: os professores (Aluno 140). Um bom rendimento em sala de aula (Aluno 154). Quando eu sei que estou aprendendo e não decorando. Quando eu estudo e

fico sabendo para sempre e não apenas para a prova (Aluno 62). Com alunos e professores com vontade de aprender e ensinar (Aluno 63).Um modo divertido de ensinar e aprender que me crie vontade de estudar

(Aluno 68). Quando um professor conhece seus alunos, ele sabe como é cada um e sabe

como auxiliá-lo em suas dificuldades, assim é no IFSul (Aluno 107).Aprendizagem com qualidade é aquela que não é esquecida, não é decorada

para a prova, fica por toda a vida (Aluno 112).Quando professor e aluno interagem e ambos aprendem (Aluno 113). Quando o professor se esforça para ser nosso amigo e passa os conteúdos de

forma mais clara, mesmo que o conteúdo seja difícil (Aluno 114).Aquela que não será esquecida, que é clara e objetiva (Aluno 18).Percebo qualidade na aprendizagem quando consigo aprender com clareza.

Percebo isso quando consigo explicar algo sem dificuldade (Aluno 32). Qualidade não é só o quanto se estuda, qualidade é a clareza com que se

aprende (Aluno 44).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 393

É saber que quem está ensinando já aprendeu/estudou e quer ensinar algo para mim, mas não apenas só conteúdo, quer ensinar para a vida, para o mundo do trabalho para eu ter uma profissão (Aluno 115).

É a pessoa que sabe do que está falando, que domina o assunto. Isso se percebe já na escola, quando se vê que o aluno fala por que sabe e não fica na dúvida ao responder para o professor (Aluno 119).

Aprendizagem com qualidade é aquela que nunca esquecemos, não sei como, acredito que através do conhecimento que nos é transmitido (Aluno 121).

Aprendizagem com qualidade é a que recebo agora, que reflete na relação escola/comunidade etc. (Aluno 167).

Aprender com qualidade na aprendizagem é aprender bem, com aulas prá-ticas, pois melhora o ensino dos professores. Eu percebo nos professores que têm mestrado e doutorado que possuem mais qualidade no ensinar. É assim que eu percebo (Aluno 180).

É o que temos no IF, pois aqui a gente pode dizer que está se preparando para o mundo do trabalho. Se soubermos aproveitar o que eles têm para nos ensinar, aprenderemos com qualidade e teremos qualidade (Aluno 157).

Qualidade da aprendizagem é aquela em que você aprende para a vida. E você sabe por que realmente dá pra ver [...] (Aluno 162).

Nas manifestações dos alunos do Campus estudado, evidenciou-se que para os alunos uma aprendizagem de qualidade é aquela em que a aprendiza-gem é coconstruída (SALMON, 2002); é experimental e exploratória-“prática” (KOLB, 1975); é proativa (LAYTE; RAVET, 2006); é social (VYGOTSKY, 1934, 1979, 1987, 1989); é reflexiva (DEWEY, 1933); requer regular feedback e diagnóstico (LAYTE; RAVET, 2006); é com prazer (LAYTE; RAVET,2006); é sobre a transformação das representações (PIAGET, 1974, 1975, 1978, 1987, 1988, 1990); em suma, a concepção de qualidade na aprendizagem é sobre ha-bilitar, capacitar e empoderar os alunos (LAYTE; RAVET, 2006).

A pesquisa tem evidenciado que é necessário um novo quadro de qua-lidade da aprendizagem, ou seja, que se estabeleça um link entre a aprendiza-gem individual, comunitária, organizacional e territorial, em que o educando esteja no centro do processo de aprendizagem. Os dados manifestaram que é necessária uma ligação orgânica na aprendizagem entre o indivíduo, a comu-nidade, a organização e o território. A pesquisa evidenciou, preliminarmente, algumas dimensões e indicadores: Veja.

Quem Que Como

Individual % tempo gasto na aprendizagem (formal, informal e não formal).

Como o que eu aprendi mudou a minha vida como cidadão, traba-lhador, cônjuge etc?

Quais são os meus estilos de aprendizado preferidos?

Programa/curso % de indivíduos que alcançaram sucesso no programa/curso.

Qual é o impacto do programa sobre o desempenho da organi-zação?

Quais são os métodos de ensino e aprendiza-gem utilizados?

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VIEBRANTZ, R. - EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E QUALIDADE 394

Quem Que Como

Comunidade (profissional)

% dos profissionais engajados em uma comunidade e no desen-volvimento profissional contínuo.

Quais são as práticas emergentes provocadas pela comunidade?

Como fazer comunida-des de apoio à prática reflexiva e prática in-formada?

Organização % do pessoal envol-vido em atividades de aprendizagem.

Desenvolvimento e adaptação da proporção de aprendizagem?

Como é o reconheci-mento da aprendiza-gem não formal?

Comunidade/cidade/região

% de cidadãos que participam ativamente em associações, clubes e redes.

% da população registrada na educação de adultos centros cul-turais e universidades populares.

Sistemas de orientação, centros comunitários, bibliotecas públicas e móveis.

Sociedade % dos cidadãos e de trabalhadores engaja-dos a qualquer momen-to em atividades de aprendizagem.

Proporção cultural/ profissional de apren-dizagem.

% de qualificações entregues, embora a acreditação prévia da aprendizagem

CONSIDERAÇÕES FINAISAssim, o surgimento de uma sociedade de aprendizagem e economia

do conhecimento exige a transformação do antigo quadro de referência de qualidade. Essa transformação não pode ser uma mera adaptação do antigo quadro, mas uma transformação radical com base no novo contexto político, econômico, sociológico e tecnológico. O empoderamento dos indivíduos por meio de tecnologias tem transformado a natureza das relações de aprendiza-gem entre os alunos, educadores e pessoal de apoio; entre o empregado e seu empregador, entre o cidadão e as comunidades de aprendizagem. A presença generalizada das tecnologias do conhecimento e o acesso irrestrito fornecem as bases para um ambiente de aprendizagem, ligando a comunidade, o indivi-duo e a aprendizagem organizacional e comunitária, reconhecendo uma me-dida mais ampla em que a aprendizagem ocorre no contexto e é ativa, social e reflexiva. Portanto, é de qualidade.

REFERÊNCIAS

DEWEY, J. How We Think. New York: D. C. Heath, 1933.LAYTE, M.; RAVET, R. Rethinkig quality for building a learning society. In: EHLERS, D.; PAWLOWSKI, J. M. (Ed.) Handbook on quality and standar-disation in e-learning. Berlin: Springer, 2006. PAWLOWSKI, J. M. The quality adaptation model: adaptation and adoption of the quality standard ISO/IEC 19796-1 for learning, education, and training.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 395

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DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: APORTES CURRICULARES E DESAFIOS FORMATIVOS

Noeli Prestes Padilha RivasKarina de Melo Conte

Glaucia Maria da Silva

M udanças profundas, tanto na estrutura de ensino na universidade como em sua posição e sentido social, são fortemente marcadas

pelas ideologias neoliberais e posições conservadoras, o que tem induzido à reorientação dos sistemas educacionais, na perspectiva de fazer valer o mer-cado como eixo das definições políticas nesse campo (CUNHA, 2007, 2009). Nesse cenário emerge a profissionalização do professor diante das mudanças. A valorização e construção da identidade do professor continuam com pouca ou nenhuma articulação com uma política que ofereça condições favoráveis de trabalho, associando sua profissionalização, aqui entendida como o reco-nhecimento do professor enquanto ser humano e profissional sensibilizado e estimulado para o seu autodesenvolvimento.

Os programas de pós-graduação, lócus privilegiado dessa formação, tendem a priorizar a condução de pesquisas, tornando-se responsável, mes-mo que não intencionalmente, por perpetuar a crença de que para ser pro-fessor basta dominar o conteúdo ou, no caso do Ensino Superior, ser um bom pesquisador. No início dos anos de 1990), a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior) passa a tornar obrigatório o estágio supervisionado na docência como parte das atividades dos bolsistas de mestrado e de doutorado sob sua tutela. A universidade introduziu, em 1991, o Programa de Aperfeiçoamento do Ensino-PAE, com o objetivo de aprimorar a formação dos alunos de pós-graduação nas atividades de docência universitá-ria. O Programa consta de duas etapas: a preliminar, denominada “preparação pedagógica”, e a posterior, intitulada “estágio em disciplina de graduação”, ambas com duração de um semestre letivo.

A etapa de preparação pedagógica, objeto da nossa investigação, as-sume diferentes características na unidade, de acordo com a estruturação da Comissão do PAE. Em linhas gerais, essa etapa é desenvolvida desta forma: a) uma disciplina de pós-graduação cujo conteúdo está voltado para as ques-tões da universidade e do Ensino Superior; b) um conjunto de conferências, com especialistas na área da Educação, condensadas num tempo menor, tendo como tema as questões do Ensino Superior; c) um núcleo de atividades que envolve preparo de material didático, discussões de currículo, de ementas de disciplinas e planejamento de cursos, coordenado por professores. A segunda etapa caracteriza-se por participação em seminários, experimentos de labo-

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398 RIVAS, N. P. P. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

ratório, estudos dirigidos e discussão de tópicos em pequenos grupos, bem como organização de plantões para elucidação de dúvidas, aplicação de pro-vas e exercícios.

Este trabalho é um recorte do projeto “Novos espaços formativos na universidade: desafios e perspectivas para a docência superior” desenvolvi-do no âmbito da universidade pública do interior de São Paulo. O objetivo é analisar os conteúdos formativos consubstanciados nas disciplinas curri-culares do Programa de Formação de Professores para a Educação Superior (Programa de Aperfeiçoamento do Ensino-PAE. Nesta pesquisa, optou-se por investigar a etapa de preparação pedagógica por meio dos currículos ofertados pelos cursos de pós-graduação (stricto sensu) das áreas exatas, humanas e bio-lógicas no período de 2000 a 2009, destacando suas relações de pertinência, atividades desenvolvidas pelos alunos, saberes pedagógicos contemplados no campo da didática e da formação de professores relacionados ao ensinar e ao aprender. Esta investigação, de abordagem qualitativa, utiliza a técnica de análise documental para a coleta de dados (BOGDAN; BICKLEN, 1994; CELLARD, 2008) e a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2002) para a análise dos dados. Os aportes teóricos de autores que investigam a forma-ção de professores e currículo consultados nesta pesquisa são: Cunha (2009, 2007), Pimenta e Almeida (2011), Pimenta & Anastasiou (2005), Lopes e Macedo (2011), Zabalza (2004), Contreras (2002), Giroux (1999), Sacristán Gimeno Sacristán (1998) e Nóvoa (1992).

A FORMAÇÃO DO DOCENTE UNIVERSITÁRIO: REALIDADE E PERSPECTIVASA formação de professores universitários, no sentido de qualificação

científica e pedagógica, é um dos fatores básicos da qualidade da universidade. A maioria dos professores possui lacunas em sua formação pedagógica e atu-ação docente, demonstrando dificuldades na adoção e utilização de novas me-todologias, estratégias e materiais de apoio. Os professores, quando chegam à docência na universidade, trazem consigo inúmeras e variadas experiências do que é ser professor (CUNHA, 2007; PIMENTA; ANASTASIOU, 2005; TARDIF; LESSARD, 2005). Essas experiências, que muitas vezes guiaram sua opção profissional, vão direcionar suas escolhas pedagógicas e, até mes-mo, seu relacionamento com os alunos. Por outro lado, considera-se a questão do ensino. É preciso reconhecer que se exige do professor conhecimentos, habilidades, atitudes mentais e disponibilidades que, em parte, diferem das exigidas a um pesquisador, no sentido estrito dessa palavra. Se antes a pro-fissão de professor calcava-se no conhecimento objetivo, no conhecimento das disciplinas, hoje apenas dominar esses saberes é insuficiente, uma vez que o contexto das aprendizagens não é mais o mesmo. Cunha (2007) destaca algumas iniciativas de inovações de professores universitários, como as trans-formações do paradigma de atuação docente, as quais exigem dos professores

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 399

reconfiguração de saberes, reconhecimento da necessidade de trabalhar no sentido de transformar a “inquietude” em energia “emancipatória”. Atitudes emancipatórias implicam conhecimentos acadêmicos e competências técni-cas e sociais que configurem um saber-fazer e que extrapole os processos de reprodução, em intervenções compromissadas com as rupturas que atuam no sentido da mudança. Não obstante, esses paradoxos e exigências estão sendo desenvolvidos no Brasil, por meio de iniciativas na área de formação de pro-fessores, as quais apontam para melhorias na profissionalização docente e na aprendizagem dos estudantes, pautadas na pesquisa da prática, na exploração dos saberes e na experiência. Nesse sentido, a formação do professor para a Educação Superior deve tomar o campo social da prática educativa e do ensi-nar como objeto de análise, de compreensão, de crítica, de proposição e que possibilite o desenvolvimento de atitude de pesquisa como forma de aprender (PIMENTA; ANASTASIOU, 2005).

A CONSTRUÇÃO DO CURRÍCULO PARA A FORMAÇÃO DOCENTE: ALGUMAS APROXIMAÇÕES

Há um consenso no campo da teorização crítica de currículo quanto ao fato de que o conhecimento escolar é fruto de uma seleção cultural condicio-nada por fatores que envolvem o campo sociocultural, o político e o econômi-co, bem como os critérios exclusivamente epistemológicos. Na última década do século XX, o pensamento curricular começou a incorporar enfoques pós-

-modernos e pós-estruturais, que convivem com as discussões modernas. As teorizações de cunho globalizante, sejam das vertentes funcionalistas, sejam da teorização crítica, vêm se contrapondo à multiplicidade característica da contemporaneidade. Tal multiplicidade não vem se configurando como dife-rentes tendências e orientações teórico-metodológicas, mas como tendências e orientações que se inter-relacionam, produzindo híbridos culturais (LOPES; MACEDO, 2002, 2011).

No “hibridismo” curricular, ressalta-se a perspectiva pós-estruturalis-ta, currículo em rede (pesquisas relacionadas ao sentido da escola e do coti-diano escolar), a história do currículo e o conhecimento escolar. Na história do currículo e da constituição do currículo escolar, destacam-se as pesquisas de autoria de Moreira (2009). Esse autor vem analisando os impasses e as con-tribuições da teoria curricular crítica nos grupos pós-modernos, defendendo a existência de uma reconfiguração do campo do currículo que coloca em crise a concepção de currículo como texto político.

Na história das disciplinas escolares, destacam-se os estudos de Chervel (1990) e Goodson (1995). Na concepção crítica de currículo, a cul-tura não é vista como uma unidade homogênea, mas como um campo de luta perpassado por conflitos e interesses sociais (relações de classe, gênero, raça). Por sua vez, o currículo escolar não transmite uma cultura neutra, mas impõe

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400 RIVAS, N. P. P. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

uma definição particular de cultura pertencente aos grupos dominantes. A esse respeito, Chervel (1990) assinala que as disciplinas escolares são vistas como criações espontâneas e originais do sistema escolar, mostrando como todo conhecimento sofre a ação pedagógica.

Gimeno Sacristán (1998) defende um modelo de interpretação que concebe o currículo como algo construído no cruzamento de influências e campos de atividades diferenciadas e inter-relacionadas. Para o autor:

[...] a política curricular é um aspecto específico da política educativa, que es-tabelece a forma de selecionar, ordenar e mudar o currículo dentro do sistema educativo, tornando claro o poder e a autonomia que diferentes agentes têm sobre ele, intervindo, dessa forma, na distribuição do conhecimento dentro do sistema escolar e incidindo na prática educativa, enquanto apresenta o currícu-lo e seus consumidores, ordena seus conteúdos e códigos de diferentes tipos (p. 109).

Além disso, esse autor sugere uma perspectiva teórico-prática no sig-nificado do currículo como “o projeto seletivo de cultura, cultural, social, po-lítica e administrativamente condicionado, que preenche a atividade escolar e que se torna realidade dentro das condições da escola tal como se acha configurada” (p. 35). Sem perder de vista as determinações sociais e políticas, ele chama a atenção para os condicionantes administrativos, institucionais e pedagógicos que afetam o desenvolvimento do currículo, que sempre pressu-põe uma ação, uma resposta ao problema educativo do que fazer em classe com os alunos.

Rule (apud GIMENO SACRISTÁN, 1998, p. 13-5), em um exame histórico da literatura especializada norte-americana, com base em uma cen-tena de definições, encontra os seguintes grupos de significados:

a) um grande grupo delas relacionado com a concepção do cur-rículo experiência, o currículo como guia da experiência que o aluno obtém na escola, como conjunto de responsabilida-des da escola para promover uma série de experiências, sejam essas as que proporcionam consciente e intencionalmente, ou experiências de aprendizagem planejadas, dirigidas ou sob supervisão da escola, ideadas e executadas ou oferecidas pela escola para obter determinadas mudanças nos alunos, ou ainda, experiências que a escola utiliza com a finalidade de alcançar determinados objetivos;

b) outras concepções: o currículo como definição de conteú-dos da educação, como planos ou propostas, especificação de objetivos, reflexo da herança cultural, como mudança de conduta, como programa da escola que contém conteúdos e atividades, soma de aprendizagens ou resultados, ou todas as experiências que o aluno possa obter.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 401

Considerando a polissemia do conceito de currículo, optamos, nes-te trabalho investigativo, conceituar currículo como plano e propostas, com base na perspectiva de Rule (apud GIMENO SACRISTÁN, 1998), explicita-do acima.

Moreira (2006) esclarece que o processo curricular nas instituições educacionais deve levar em conta tanto o cenário cultural local quanto o global, o que implica enfocar o currículo em uma perspectiva que analisa fenômenos culturais identificáveis nos dias de hoje como globalização, diferença, multi-culturalismo, pluralismo cultural e hibridização. Esse autor sustenta que essa abrangência no currículo nos auxilia a refletir sobre como selecionar e orga-nizar os conhecimentos curriculares de modo a promover uma aprendizagem contextualizada e significativa. As disciplinas escolares são frequentemente identificadas como as disciplinas científicas ou acadêmicas. Macedo e Lopes (2002) argumentam que as disciplinas escolares são vistas como extensão dos saberes de referência, possuindo objetivos e lógica derivados desses saberes. Assim, as críticas elaboradas aos processos de especialização das ciências são transportadas para o contexto escolar, como se as características definidoras de um contexto se reproduzissem sistematicamente no outro.

Nessa direção, Pinar et al. (1996) consideram três matrizes do pen-samento curricular clássico que influenciam o pensamento educacional: o currículo por competências, condicionando o currículo à avaliação e ao de-senvolvimento de habilidades cognitivas, afetivas e psicomotoras; o currículo centrado nas disciplinas de referência e o currículo centrado nas disciplinas ou matérias escolares.

Na análise das disciplinas que estão sendo desenvolvidas pelo Programa PAE, evidencia-se a concepção de currículo centrado nas discipli-nas de referência, cuja base teórica fundamenta-se nos estudos de Herbart e seus seguidores, bem como na primeira fase de Bruner (1977). Esses autores valorizam as disciplinas de referência e o conhecimento especializado como fontes para o currículo e para as finalidades de escolarização. Nas disciplinas analisadas, ressalta-se a lógica do conhecimento de referência, pois é do sa-ber especializado, acumulado pela humanidade, que devem ser extraídos os conceitos e os princípios a serem ensinados aos alunos. Verifica-se, em menor grau, o currículo centrado em disciplinas quando se trata de disciplinas de cunho pedagógico.

Os resultados da pesquisa apontam que há uma diversidade de dis-ciplinas relacionadas ao Programa PAE. Na área biológica, os currículos de pós-graduação contemplam o maior número de disciplinas nesse programa: Medicina (16), Enfermagem (4), Farmácia (2) e Odontologia (2). Na área de ciências humanas e exatas, os programas de pós-graduação oferecem: uma disciplina para os cursos de Administração, Economia e Contabilidade e uma para os cursos de Psicologia, Química, Biologia e Física. A diversidade e o nú-mero de disciplinas revelam o grau de importância que as unidades atribuem

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402 RIVAS, N. P. P. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

à preparação do professor para a educação superior, não necessariamente com a formação pedagógica nas disciplinas de referência.

Na área biológica, as temáticas estão consubstanciadas no eixo educa-ção e saúde, abordando as seguintes temáticas: conhecimento sobre metodolo-gia de ensino; processo de tutoramento; aprendizado centrado em problemas; principais metas do ensino de graduação; modelos de estrutura curricular; ten-dências atuais do ensino na área da saúde; questões didático-pedagógicas para futura atuação na educação superior; concepção e instrumentos de avaliação; relação aluno-professor; planejamento de ensino; elaboração de projeto pe-dagógico; conhecimento de diretrizes curriculares de cursos de graduação; e preparo de material didático.

Na área de ciências humanas e exatas são priorizadas: a discussão da universidade enquanto instituição de produção de conhecimento e de ensino; análise da trajetória da universidade; reflexão sobre a construção do professor universitário face aos diferentes modelos atuais de universidade; análise de programas de disciplinas da graduação; levantamento de questões éticas envol-vidas na formação e atuação do docente; e preparação do aluno para ministrar aulas em cursos superiores (aulas presenciais e ensino a distância). Em síntese, os dados revelam que há predominância dos aspectos relacionados à meto-dologia e estratégias de ensino em detrimento da explicitação das dimensões profissional e pessoal do docente. Pode-se inferir, ao analisar os documentos e relatórios, que a iniciativa de formação docente dos pós-graduandos de stric-to sensu da universidade investigada tem ressaltada a preparação didática e metodológica para a docência superior numa perspectiva instrumental, cujos aspectos institucionais, curriculares, enfim, os saberes pedagógicos que fazem parte da atividade docente, não são priorizados nos currículos analisados.

É importante ressaltar que o ensino e a aprendizagem constituem uni-dade dialética no processo, caracterizada pelo papel condutor do professor e pela autoatividade do aluno mediante tarefas contínuas dos sujeitos. Para o processo de ensinagem (ANASTASIOU, 2006) acontecer, é necessário iden-tificar alguns momentos: mobilização para o conhecimento, ou seja, articu-lar a realidade concreta com o grupo de alunos, que devem ter clareza dos objetivos pretendidos: o papel do professor será de desafiar a construção do conhecimento, pois todo conhecimento natural é também científico, social, local e total e de autoconhecimento; a formação docente deve acontecer em uma perspectiva crítico-reflexiva, em que a experiência e a pesquisa sejam balizadas para essa formação. Nesse sentido, concorda-se com Pimenta & Anastasiou (2005) quando apontam que “[...] os saberes da experiência são tomados como ponto de partida e intermediados pela teoria que se volta para a prática” (p. 58). Esse processo é fundamental para a construção da identi-dade do docente do Ensino Superior, porém há um longo caminho a percorrer no que se refere à formação pautada nos saberes específicos, pedagógicos e experienciais.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 403

REFLETINDO SOBRE OS PERCURSOS PARA A FORMAÇÃO

A universidade, instituição que produz saberes nas mais diversas áreas do conhecimento, está sendo conclamada a atender novas demandas, dentre as quais provocadas pelas políticas de acesso às camadas populares à universida-de, pelas diferenças entre as gerações de professores e alunos, dentre outros. Ela possui dificuldades em adequar-se às mudanças que ocorrem dentro da própria instituição, que modificam os olhares daqueles que nela atua. A res-significação dos saberes docentes, para que o professor universitário entenda a relevância da docência, e a responsabilidade da formação de uma sociedade tornam-se relevantes e necessárias. No contexto dessas mudanças, é preciso recontextualizar os currículos dos programas de pós-graduação, cujas disci-plinas necessitam superar a submissão única ao campo científico e especia-lizado, e contemplar aspectos que visem sua integração às áreas afins, pro-blematizando e contextualizando conceitos, estruturas, formas e domínios do conhecimento de referência, na busca de princípios de um currículo integrado (APPLE; BEANE, 2000; HÉRNANDEZ, 1998; BERNSTEIN, 1996).

A complexidade da educação faz com que o professor deva estar aten-to às mudanças que ocorrem na sociedade, seja pelas políticas curriculares, pelas teorias educacionais, pelos novos paradigmas socioculturais e econômi-cos, pelas diferenças entre gerações ou pela mutabilidade do conhecimento. Portanto, o PAE,como lócus de formação docente, constitui-se em um impor-tante espaço de formação de futuros professores universitários. No entanto, necessita rever a constituição de sua organização curricular, superando a atual instrumentalidade e reconceptualização que leve em conta a produção crítica do conhecimento, capaz de refletir os fundamentos para uma ação docente crítica e mobilizadora para a vida sociopolítica e cultural.

REFERÊNCIAS

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404 RIVAS, N. P. P. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

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AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES SOBRE AS CULTURAS, AS IDENTIDADES E OS

CORPOS DA INFÂNCIA

Vanessa Ferreira Neves

Em qualquer sociedade, há inúmeros mecanismos educativos presentes em diferentes instâncias socioculturais. Grande parte desses mecanismos tem como função primeira educar os sujeitos para viverem de acordo com as re-gras estabelecidas socialmente, e, porque, na sua maioria, estão inseridos na área cultural, esses mecanismos são revestidos de características “inocentes”, como prazer e diversão, que também educam e produzem conhecimento. Esses mecanismos contêm pedagogias culturais, formas de ensinar através das quais trabalham significados sociais (SABAT, 1999, p. 245).

Uma das instâncias socioculturais que investigo é a escola. Primeiramente, porque educam os sujeitos, e em segundo lugar, porque é um dos espaços pelos quais a cultura está inserida. Nesse segmento, busco problematizar algumas ques-tões que circulam sobre a formação dos professores que frequentam o Ensino Superior e lidam com abordagens sobre a infância e a cultura. Analiso como os professores lidam com a infância na escola. Com base nisso, pode-se pensar em estratégias que auxiliem a lidar com as infâncias de maneira a estimular o pensamento e a produção de sentidos, utilizando-se dos projetos relacionados ao Ensino Superior.

Inicio com as palavras de Giroux para pensar no quanto os docentes precisam relacionar os saberes das universidades e estar engajados para con-tribuir à infância, à cultura e ao modo como as pedagogias estão produzindo modos de ser.

A pedagogia ao mesmo tempo diz respeito ao conhecimento e às práticas em que os professores, os trabalhadores culturais e os alunos podem se envol-ver juntos, e às políticas culturais que essas práticas apoiam. É nesse sentido que propor uma pedagogia é ao mesmo tempo construir uma visão política (GIROUX, 1999, p. 278).

Há múltiplas conexões que podem ser realizadas quanto à análise cul-tural e à educação. As palavras de Sabat e Giroux auxiliam na elucidação de algumas questões que emergem após estudos sobre cultura, proposta desta pesquisa.

Para isso, é preciso pensar sobre a complexidade do currículo, que se torna cristalizado pelas práticas da modernidade. Dessa forma, esta pesquisa se relaciona com os Estudos Culturais para romper com práticas que são natu-ralizadas no campo da educação. Mostra a importância de se analisar além do que é percebido pelas crianças ou pelos docentes. Esses conjuntos de saberes formam significados, formam visões políticas e culturais das sociedades.

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NEVES, V. F. - AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES 406

Para situar este estudo e relacioná-lo com as questões da pesquisa, tra-go alguns recortes históricos sobre os Estudos Culturais. Tais estudos origina-ram a importância de outras análises caracterizadas pelos Estudos da Cultura Visual. Os Estudos Culturais originaram-se na Universidade de Birmingham, na Inglaterra, em meados da década de 1960. Trata-se centralmente da cultura como campo “adisciplinar” de contestação, que inicialmente questionava as visões elitistas da cultura em contraponto com a cultura popular.

Com a visão do pós-estruturalismo, é um campo que aborda a crítica livre de modo a pensar diferente, “ver com outros olhos”. Nelson, Treichler e Grossberg (2009) assinalam que “os Estudos Culturais apresentam uma pro-messa intelectual especial porque tentam atravessar, de forma explícita, in-teresses sociais e políticos diversos e se dirigir a muitas das lutas no interior da cena atual” (p. 7). Como pensamento crítico não afirma, mas suspeita e admite várias perguntas, colocam em dúvida as questões mais emergentes da cultura e da sociedade como elementos de análise.

As práticas discursivas e pedagógicas dos professores também se tor-nam elementos de análise quando se observa o quanto estão imbricadas por conceitos culturais “naturalizados” sobre as identidades, os gêneros e os mo-dos com que as pessoas devem aprender a enxergar o mundo. O entendimento da Pedagogia é abordado, neste estudo, como um sistema em que se articulam práticas discursivas e visuais que constroem conhecimentos, linguagens, von-tades, escolhas, valores sociais e, sobretudo, identidades.

O campo da Pedagogia ensina, por meio dos processos culturais em diferentes espaços sociais, a inscrição de gestos, atitudes, valores e prazeres nos corpos. Produz significados aparentemente naturalizados no entendimen-to das pessoas, devido à inserção gradativa e persuasiva das imagens e dos discursos produzidos culturalmente.

Segundo Giroux e MClaren (1995), “todas as pedagogias produzem certos efeitos de significado” (p. 144), seja dentro ou fora da escola. Exercem atividades constantes de posicionamento dos jovens quanto ao consumo, às práticas da mídia e às escolhas de pertencimento ao mundo. As práticas cul-turais são as pedagogias que ensinam modos de pensar e agir em relação a si, aos outros e ao mundo. Não se limitam à instituição escolar e acadêmica, mas atravessam-se às práticas midiáticas, sexuais, familiares, ensinando e consti-tuindo identidades.

De acordo com Ribeiro (2004, p. 117), “nesses processos de reco-nhecimento das identidades, inscrevem-se as diferenças, ou seja, marcam-se

‘outros’ sujeitos a partir da referência impingida ao masculino e ao feminino”.Apresento, neste estudo, um olhar sobre as pedagogias culturais, con-

forme as palavras de Ribeiro (2004): “discursos e estratégias que se inter-re-lacionam nas práticas de sala de aula, configurando maneiras de agir e pensar” (p. 110). A pesquisa propõe uma reflexão acerca dessas pedagogias que exer-cem modos de ser nas crianças e modos de entender o mundo, constituindo

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 407

as infâncias na contemporaneidade. “A infância, portanto, é uma criação da sociedade, que está sujeita à mudança sempre que ocorrem importantes trans-formações sociais” (STEIMBERG, 1997, p. 99). Dessa forma, cabe ressaltar o quanto a infância tem sido reinventada com modos de cuidado, proteção e uma busca constante de um “ideal de perfeição” (BUJES, 2001, p. 21). Não havendo espaço para perceber outras formas com que a criança expressa seus modos de conhecer o mundo e interagir com ele.

O corpo da criança está cada vez mais envolvido em uma proteção, ou melhor, regulação que prioriza a necessidade de conhecimento de tudo o que o mundo oferece, porém com a mente que pensa e não com o corpo que experimenta. A experimentação e as habilidades motoras são esquecidas a cada momento que a criança avança nos anos escolares. Desde os primeiros momentos de vida intrauterina, a criança passa a carregar consigo uma car-ga de expectativas que exercem nos pais modos de esperá-la e que vão se desdobrando ao longo de sua vida com marcadores culturais produzidos na sociedade. São marcadores que se tornam naturalizados conforme vão sendo incorporados pelos sujeitos sociais em diferentes contextos, independentes de classe social, gênero, etnia etc.

Há todo um arcabouço visual de formas, cores, tamanhos, texturas, aromas que nos sinalizam para percebermos a primeira infância como um lugar sem conflitos, suave, pacífico, calmo, confortável, enfim, há um conjunto de ele-mentos visuais que nos levam a formar determinadas visões sobre a infância (CUNHA, 2005, p. 28).

A invenção da primeira infância no nível da Educação Infantil, por exemplo, introduz na escola o corpo que vê, experimenta, brinca, modela, amassa, pula, corre, caminha, extravasa. Embora o sujeito escolar infantil seja constituído de forma governada, esse corpo é incentivado à expressividade de um modo “confortavelmente protegido” para que nada saia do controle de quem o ensina.

Estabelecem-se conhecimentos que distraem a mente enquanto o cor-po pode ser regulado gradativamente, como ao percorrer espaços determina-dos, sentar-se na cadeira, ao colocar-se diante das classes, ao portar-se den-tro do espaço que a criança ocupa na escola. E também em outras instâncias educativas, ou seja, fora da escola há, ainda, regulações em acontecimento. Seja num parque, shopping, em casa, no percurso de um lugar a outro, enfim, lugares que exercem pedagogias o tempo todo e que produzem os sujeitos incansavelmente.

O que acaba sendo mais esquecido pela escola é o fato de que a crian-ça possui “uma construção marcada por seu tempo, sua cultura” (SANTOS, 1999, p. 196).

Nesses termos é que se pode falar de um corpo escolar, um corpo tido como universal, assumido como igual para todos/as, que se fundamenta na

“velha” figuração anatômica, que não só atomiza o corpo, mas também o des-

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NEVES, V. F. - AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES 408

titui dos significados que o produzem enquanto corpo generificado, sexuali-zado, crente, racializado, temporal etc. (p. 196).

Assim percebe-se o corpo escolar: são sujeitos escolares as crianças, os jovens e os adultos que estudam ou estudaram as disciplinas e são ou fo-ram disciplinados colocando-se como mentes e corpos regulados, controlados,

“definidos” por uma igualdade de ação. Porém o corpo que extrapola, extra-vasa e sai do controle é encarado como diferente. Esse “diferente” faz pen-sar que emerge uma nova cultura, a cultura dos jovens, outra necessidade de compreender as identidades “corporificadas em novas formas de ser, tornar-se humano” (GREEN; BIGUM, 2009, p. 208).

Com base nesses binarismos entre os “moldados” e os “diferenciados”, penso nos adultos que se constituíram por meio das regulações escolares, das pedagogias que produziram inúmeros modos de ver o mundo de forma mais contida, menos extravagante. E daqueles que fugiram da norma, romperam barreiras, desmistificaram conceitos. Ambos atravessados pela escolarização da cultura, constituídos uns com os outros, sobre os outros e sobre si mesmos.

Os jovens estão sendo persuadidos/moldados pelas pedagogias esco-lares. Tradicionais ou emancipatórias, de algum modo, abafam a rebeldia, a inconformidade e a crítica produzida na fase da adolescência. A sociedade toma como “natural” e talvez mais “aceitável” as maneiras como os jovens se manifestam. Ou por uma questão hormonal – devido aos avanços das grandes pesquisas da biomedicina e por hora mais aceitáveis pela sociedade centrada nas questões da saúde – ou por uma cultura que quase não é percebida, mas é vista, também é ouvida, possui e provoca sentidos. Também com seus cheiros, cores, sons, produz efeitos que perpassam nas entrelinhas do cotidiano, for-mando identidades.

Já com as crianças acredita-se popularmente que se pode “moldar” o pensamento e o corpo com mais eficiência. Desde pequenas são submetidas a controlar-se, porém com ludicidade, ou seja, incorporam o “corpo escolar” organizando-se diariamente. Mesmo que utilizando-se do recurso da brinca-deira e das relações visuais, com o mundo imagético, as crianças se inter-

-relacionam com as mídias, com as imagens, com os discursos pedagógicos, mas pouco questionam seus propósitos.

Essas formas de compreender o mundo compõem o currículo e pro-duzem o corpo do sujeito escolar nas artes, nas ciências, com as tecnologias, as mídias. Analiso as palavras de Santos (1999), que apontam as diferentes abordagens dos currículos culturais.

São pedagogias, porque em seus modos de apresentação capturam sentidos que circulam na cultura, ressignificando-os, bem como impondo outros através de suas intricadas redes de poder. Contudo, mais do que impostos, pela forma como são apresentados, tais significados parecem necessários ao sujeito, pare-cem falar dele próprio, de suas necessidades mais íntimas; esses significados são ativos na construção dos sujeitos e de suas identidades sociais. E são cultu-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 409

rais, porque esses significados, a despeito de serem sociais, não são entendidos da mesma forma por todas as pessoas, mas variam em função dos mais dife-rentes marcadores sociais, tais como geração, sexo, gênero, classe social, raça/etnia, escolaridade etc., não só entre os grupos, mas dentro dos próprios grupos. Nesses termos, também, se pode falar que essas pedagogias exercem pedago-gias corporais (do corpo), um conjunto de práticas que “prescrevem” modos de ser que, antes que naturais, são produzidos ativamente pelos modos como (re)apresentam os sujeitos (p. 196-7).

Em seus escritos, Santos traz a ideia de “descorporamento” como redução de experiências corporais diretas: máquinas, tecnologias, padrões de beleza. Assim também segue com a colonização, acoplamentos híbridos: apontamentos sobre as relações humano/máquina e se refere a uma hibridiza-ção, como “devires-mundo”.

Duas formas de colonizar deste século: colonizar para conhecer/conhecer para colonizar. Diferentes aparatos produzem as variadas imagens que circulam em livros didáticos, livros científicos, em um sem-número de revistas popu-lares (o desenho em corte do aparelho reprodutor feminino já não causa mais espanto nas revistas femininas), filmes, vídeos, video games, Internet, parques de diversão, cultura científica, cultura popular – onde se situam as fronteiras? (SANTOS, 1999, p. 200).

Acredito que as fronteiras estão na resistência em problematizar, fazer pensar, questionar a produção das identidades com as crianças. Em buscar pis-tas, investigar os modos como as crianças estão sendo produzidas. Por onde estão as regulações? Como os corpos estão sendo organizados? Como os dis-cursos estão constituindo os corpos das crianças? Como as pedagogias estão sendo percebidas? Isto é, se estão sendo percebidas.

A pesquisa busca discutir sobre como as identidades e as diferenças de gênero, como também a sexualidade das crianças, têm sido tratadas em práticas nas séries iniciais. Nessa perspectiva, proponho perceber e refletir a respeito dos modos pelos quais se apresentam as infâncias como uma constru-ção histórica e cultural que envolve discursos pedagógicos expressos em com-portamentos, linguagens, representações, crenças, identidades e modos de ser. Busco pensar sobre a produção de “verdades” sobre a cultura, a infância e as pedagogias que se tornam socialmente naturalizadas.

Diante das marcas inscritas culturalmente nos corpos dos sujeitos es-colares, nesse caso das crianças, é que este estudo procura realizar uma cone-xão da linha de pesquisa no campo da educação a qual se baseia nos Estudos Culturais e se fundamenta pelos Estudos sobre Infâncias, aliado com as recen-tes investigações sobre a Cultura Visual.

A problematizaçao com as professoras e os professores sobre a cultura da imagem e as contribuições da escola quanto às pedagogias visuais tem o objetivo de levantar questionamentos sobre as pedagogias culturais que circu-lam o espaço da escola e outros espaços educativos.

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NEVES, V. F. - AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES 410

As diversas produções culturais estão constantemente a nos interpelar, não apenas como mães, pais ou professoras/es – ouvindo as conversas das crianças e o desejo que demonstram por brinquedos veiculados pela propaganda, ou o interesse que têm por músicas, artistas etc. – mas tais produções também nos capturam enquanto consumidores (FELIPE, 1999, p. 167).

As palavras de Jane Felipe nos mostram a importância de perceber como as imagens, modos de ser e pensar o mundo estão sendo mediados so-cialmente. São sites, blogs, materiais escolares, roupas, brinquedos e tantos outros artefatos e lugares que posicionam os sujeitos em determinados modos de ser.

Analiso essas pedagogias como culturalmente são construídas e sobre como a escola se posiciona diante das questões emergentes ao processo de aprendizagem das crianças. Por que não pensar também dos professores e das professoras que são interpelados fortemente por discursos sobre como devem ser e como devem pensar?

Em seu artigo, Jane Felipe (1999, p. 174) questiona se “a influên-cia da mídia e dessas novas professoras, que estão formando/informando as crianças, tem sido alvo de discussão nas escolas e nos cursos de formação de professores?”

Proponho, então, discutir tais questões com os professores e profes-soras para que possamos pensar em como estamos nos constituindo e consti-tuindo as crianças como sujeitos, professores e consumidores. Investigar com os profissionais da educação como a educação das imagens está acontecendo nas instituições. Será que as imagens são problematizadas com as crianças? Como as pedagogias culturais são percebidas pelos estudantes ou pelos pro-fissionais? Como aparecem questões relativas às pedagogias culturais e de que modo são percebidas? Aliás, se forem percebidas. Quais discursos sobre as infâncias são mais recorrentes? Que questões culturais estão imbricadas ou atravessadas nos discursos sobre as infâncias? Como as produções culturais legitimam efeitos de verdades sobre os sujeitos?

Acredito que essas questões são importantes para tratar de modo mais crítico a cultura e a veiculação das imagens no cotidiano. Como pensar então essas práticas com os professores? Encontrei nas palavras de Giroux (1997) algumas pistas:

Uma pedagogia da política cultural apresenta um conjunto duplo de tarefas para os educadores críticos. Primeiro, eles precisam analisar como a produ-ção cultural é organizada dentro de relações assimétricas de poder nas escolas. Segundo, eles precisam construir estratégias políticas de participação nas lutas sociais destinadas a lutarem pelas escolas como esferas públicas democráticas. Para tornar essa tarefa praticável, é necessário avaliarem-se os limites políticos e potencialidades pedagógicas dos exemplos diferentes, porém relacionados, de produção cultural que constituem os diversos processos de escolarização (p. 137).

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Para a análise, Giroux apresenta três campos de discurso que orientam a proposta de trabalhar com os professores: o discurso da produção, o discur-so da análise do texto e o discurso das culturas vividas. A seguir, apresento brevemente o que cada análise caracteriza como forma de entender no estudo como essa abordagem pode funcionar com os professores, particularmente, como base desta proposta.

O discurso da produção é entendido como as “práticas culturais são construídas, sustentadas e postas em circulação fora das escolas” (GIROUX, 1997, p. 137). Explica que funciona como um alerta para que os profissionais possam perceber os espaços em que são legitimadas estruturas ideológicas e artefatos que são produzidos como um conjunto de práticas e interesses. Seria uma forma de colocar os professores e professoras a analisar quais são os in-terstícios em que acontecem essas pedagogias e o estímulo necessário para o alcance de percepção sobre as pedagogias culturais. Quando percebessem tais processos de legitimação, passariam a “desconstruir os processos através dos quais eles são produzidos e postos em circulação” (GIROUX, 1997, p. 138). Seria um recurso que forneceria certa análise das condições trabalhadas pelos professores e professoras e da importância política quanto às possibilidades críticas de atuarem como intelectuais.

Até mesmo pode-se pensar nas condições de trabalho dos professores. Como uma prática para abordar e compreender tais condições de disposição e tempo para pensarem juntos e como forma de discutir e transformar o momen-to de estudo dos professores e professoras. A oportunidade estaria em reuniões que pudessem possibilitar as análises de maneira mais crítica às formas que a cultura aparece nas salas de aula, relacionando-as aos estudos advindos do Ensino Superior.

Giroux (1997), ao apresentar o segundo discurso, o discurso de análi-se de texto, como estratégia de suplementar o primeiro e questionar as produ-ções culturais, argumenta:

O que é importante a respeito desse tipo de discurso é que ele fornece a professores e estudantes os instrumentos críticos necessários para analisarem-

-se aquelas representações e interesses socialmente construídos que organizam e enfatizam leituras particulares dos materiais curriculares. Este é um modo de análise particularmente importante porque argumenta contra a ideia de que os meios de representação nos textos são simplesmente transmissores de ideias (p. 139).

Giroux mostra um dos diferentes caminhos que poderiam ser segui-dos para tal análise. No que diz respeito a esta proposta, interessa dirigir o foco para a percepção dos professores quanto às diferentes questões culturais que registram seus significados e suas tendências ideológicas. Seria assim um caminho de transformar os discursos pedagógicos entranhados por uma homogeneização cultural a contrapor-se para um discurso mais plural? Não pretendo aqui apresentar respostas ou receitas de “como fazer” aos professo-

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res ou a mim mesma, como pesquisadora acadêmica e orientadora de um gru-po de professores. Pretendo apontar questões, pensar nas pistas e, até mesmo, produzir conhecimentos diante dos desafios culturais da atualidade; discutir sobre a tarefa do profissional da educação com formação superior de hoje que não se limita em perceber o que ocorre dentro de suas salas de aula ou da ins-tituição de ensino. É para, além disso, passar a ser um compromisso com uma rede de significados que operam em nós e nas crianças e que precisam, com urgência, ser analisados mais criticamente.

Este discurso permite que professores e estudantes desconstruam os signi-ficados que estão silenciosamente embutidos nos princípios que estruturam os vários sistemas de significados que organizam a vida cotidiana nas escolas. [...] Este tipo de crítica textual pode ser usado, por exemplo, para analisar como as imagens ou convenções técnicas dentro de formas diversas, tais como a narra-tiva, formas de tratamento, e referência ideológica, tentam construir uma gama limitada de posições a partir das quais elas devem ser lidas (GIROUX, 1997, p. 139).

De acordo com os dois discursos apresentados, o discurso de produção e o discurso de análise de texto, como pensar criticamente sobre as imagens e os discursos que “naturalizam” as visões de mundo dos sujeitos? As narrativas de professores, os modos como os discursos são autorizados às crianças, as formas como os sujeitos professores e professoras foram constituídos ideolo-gicamente seriam os primeiros passos para pensar sobre essa questão.

Os processos que atuam sobre a passividade e a escolha, muitas vezes, sem algum critério diante de muitas imagens que “aparentemente” são parte da vida das crianças desde muito cedo “colocam os professores em uma po-sição de meros implementadores de conhecimento” (GIROUX, 1997, p. 140). Aliás, os discursos e as imagens de todo o tipo estão o tempo inteiro povoando os olhares e as sensações dos sujeitos, independentemente de suas escolhas.

Passaríamos então a pensar sobre as formas que as pedagogias funcio-nam nas escolas, começando pelos sujeitos que fazem parte da cultura. Giroux orienta que para desenvolver esses discursos devem ser valorizadas as expe-riências e o comportamento humano em suas redes de significados, porque a cada uma dessas caracterizações foram atribuídas formas determinadas ou variadas de ser e pertencer ao mundo.

A forma pela qual os indivíduos e grupos tanto medeiam quanto habitam as formas culturais apresentadas por tais forças estruturais é por si mesma uma forma de produção e precisa ser analisada através de um discurso e tipo de análise relacionado, porém diferente (p. 140).

Assim, esse autor introduz a análise do discurso das culturas vividas. Esse discurso valoriza o desenvolvimento da autoprodução. Destaca-se pela ideia das formas pelas quais os professores e os estudantes significam suas vi-das por meio das tramas “históricas, culturais e políticas que tanto incorporam como produzem” (GIROUX, 1997).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 413

O discurso das culturas vividas precisa questionar como as pessoas criam estórias, memórias e narrativas que postulam um senso de determinação e agencia. [...] oferecem visões de quem são e apresentam diferentes leituras do mundo. [...] Se tratarmos as histórias, experiências e linguagens de grupos culturais diferentes como formas particularizadas de produção, torna-se mais fácil compreender as diversas leituras, respostas e comportamentos, [...] uma política cultural precisa que seja desenvolvido um discurso que esteja atento às histórias, sonhos e experiências que tais estudantes trazem para as escolas (GIROUX, 1997, p. 141).

Giroux (1997) apresenta o discurso das culturas vividas como uma forma para olhar criticamente a cultura e desenvolver novas pedagogias que valorizem os estudantes, os professores como intelectuais e, ainda, produzir significados próprios legitimadores de suas vidas. Isso os torna questionado-res do poder, da dependência e da desigualdade social de forma a produzir outros modos de capacitar os estudantes às questões como as de classe, raça e gênero.

O discurso das culturas vividas torna-se valioso para os educadores porque pode servir não apenas para elucidar como o poder e o conhecimento inter-seccionam-se para deslegitimar o capital cultural dos estudantes de grupos su-bordinados, mas também para elucidar como este pode ser traduzido em uma linguagem de possibilidade (GIROUX, 1997, p. 141).

Penso ser um ganho para estudantes e, especialmente, para os pro-fessores, nesse caso, os sujeitos deste estudo. É valioso pensar que todas as formas culturais constituídas socialmente podem ser discutidas e transforma-das em novas possibilidades de olhar o outro. Atualmente, o mundo é voltado para o consumo, seja de imagens, seja por meios mais individualistas ou so-cialmente compartilhados. É preciso olhar para além do que está sendo visto, é preciso perceber a visualidade que interpela os sujeitos de todas as idades.

Dessa forma, os professores e as professoras têm em suas mãos muitos desafios quanto às pedagogias que passam a ser vistas mais criticamente. O olhar sobre o contexto, sobre as histórias de vida, sobre as políticas envolvidas nessas perspectivas, o compartilhamento das culturas como forma de constru-ção de outros olhares, outras linguagens. As questões que surgirão baseadas neste debate podem apontar para novas interações, para uma transformação com base na valorização dos profissionais da educação como intelectuais que atuam pelo desenvolvimento da escola democrática.

Giroux (1997) conclui que:O conhecimento do “outro” é incluído não apenas para exaltar sua presença,

mas também porque ele deve ser questionado criticamente com respeito às ide-ologias que contêm, os meios de representação que utiliza e as práticas sociais subjacentes que ele reitera. Aqui está em jogo a necessidade de desenvolver-se um laço entre conhecimento e poder, o qual sugira possibilidades praticáveis para os estudantes. Isto é, o conhecimento e o poder interseccionam-se em uma pedagogia de política cultural para dar aos estudantes a oportunidade não

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NEVES, V. F. - AS PEDAGOGIAS E SUAS PROBLEMATIZAÇÕES 414

apenas de compreender mais criticamente quem eles são como parte de uma formação social mais ampla, mas também para ajudá-los a apropriarem-se de maneira crítica daquelas formas de conhecimento que tradicionalmente lhes foram negadas (p. 141-2).

Acredito que a importância deste estudo se dá ao ponto de pensar que os professores tratados como intelectuais e tendo a oportunidade de articular os saberes do Ensino Superior potencializarão seus estudos para garantir uma valorização da cultura aos estudantes.

Devem partir da discussão sobre questões que interessam aos estu-dantes, tais como: a cultura, as identidades e os modos de ser que são me-diados por imagens. Isso possibilitará uma inserção mais crítica e atuante na escola. O contexto cultural constitui linguagens. É preciso que estudantes e professores estejam atentos a tais transformações, utilizem-se de suas próprias construções culturais e sociais para transformar a escola em um espaço de democracia e pluralidade que transforma as formas de pensar as pedagogias.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 415

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INOVAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: OS CASOS UCS E UFRGS

Andréia MorésDenise Leite

N a contemporaneidade, presencia-se um acelerado crescimento da educação superior, que traz desafios e exigências aos novos

tempos e espaços de formação. Conjuntamente, há um avanço nas concepções políticas da educação superior, principalmente com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), Lei n. 9.394/96, em que proporcionou maior flexibilização ao sistema educacional, ampliando e legislando a imple-mentação da Educação a Distância (EAD) no país.

Assim, a presente investigação contempla o estudo das inovações pre-sentes nos cursos de Pedagogia EAD da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e da Universidade Federal de Porto Alegre (UFRGS), e tem o objetivo de investigar as inovações pedagógicas, científicas e tecnológicas presentes nos respectivos cursos.

APROXIMAÇÕES AO CONCEITO DE INOVAÇÃO PEDAGÓGICA, CIENTÍFICA E TECNOLÓGICAA crescente evolução da ciência e da tecnologia provoca profundas

mudanças no âmbito da educação, exigindo a produção de novos conheci-mentos e saberes, em busca de proposições que atendam as necessidade e demandas dos novos tempos e cenários. Esse movimento é um desafio para que se repense o viés epistêmico da ciência enquanto princípio arraigado às concepções do paradigma da modernidade.

Ao longo dos anos, o termo “inovação” foi recebendo distinções em sua definição, principalmente quando se fala em inovação pedagógica. Leite (1999) destaca que nos anos 1960 e 1970 a inovação tinha a perspectiva do novo, do original, era a estratégia político-administrativa que determinava o que inovar. Nos anos 1980 e 1990, a inovação serve ao projeto hegemônico para justificar as iniciativas que envolvem avaliação institucional e a introdu-ção de tecnologias no Ensino Superior, dentre outras.

Na esfera da inovação em ciência e tecnologia, constata-se, mediante os estudos de Viotto e Macedo (2003), Cattani e Holzmann (2006), que a ino-vação, ao longo dos tempos, sempre esteve imbricada em oferta e produção de um novo produto, inerente ao mercado e à indústria. Essa visão tem perpas-sado os diversos espaços e contextos que, de certa forma, foram absorvidos pela visão do mercado, indústria e setores afins, a qual refletiu de modo geral sobre a sociedade.

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418 MORÉS, A. et al. - INOVAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

No entanto, a presente aproximação aos estudos da inovação foca-liza a compreensão de que a inovação não significa somente a produção de um produto novo, mas de um processo de mudança e de ressignificação em determinado contexto. Sob essa visão, adentra-se nos estudos da perspecti-va da inovação pedagógica, aproximando-se dos referenciais sobre inovação no campo das ciências sociais e humanas, destacando-se Leite (2005), Leite, Cunha e Lucarelli et al. (1999) que contemplam, no âmbito da educação uni-versitária, experiências e teorias que transgridem o paradigma da ciência mo-derna. Compreende-se, com Leite (2005), que quando a universidade não tem medo de avançar em busca de novos paradigmas, desloca seu olhar para o mundo, à procura de redes e conexões que sejam capazes de mantê-la ligada ao que de melhor existe no campo da inovação.

EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA E OS PROCESSOS DE ENSINO E APRENDIZAGEMGrande parte dos estudos situam a EAD no debate contemporâneo,

com realce para o potencial que essa modalidade pode oferecer à formação inicial e continuada, especialmente de professores, assim como pode contri-buir para a superação do inevitável desafio de repensar as práticas pedagógi-cas cristalizadas nas instituições educacionais, frente ao acelerado avanço da ciência e das tecnologias da informação e comunicação, que determinam uma nova dinâmica social.

Belloni (2002) corrobora esse pensamento ressaltando que a EAD apresenta transformações tanto nas finalidades sociais quanto nas estratégias e modalidades, notadamente com a introdução dos meios técnicos e com a tendência a maior flexibilidade de acesso, currículos e metodologias. Também aponta dois grandes desafios aos sistemas de educação superior, para os quais a EAD pode contribuir significativamente: “expansão significativa e diversi-ficação da oferta de formação inicial, para atender à demanda decorrente da expansão do ensino secundário; criação de novos modos de formação conti-nuada adequada às demandas do mercado de trabalho ‘pós-fordista’” (2002, p. 139). Isso tudo sem perder de vista as concepções humanistas de formação de um cidadão crítico e criativo, capaz de pensar e de inovar.

Nesse bojo, as avançadas tecnologias de informação proporcionam, progressivamente, maior flexibilidade e acessibilidade à educação, à cultura e ao desenvolvimento profissional e pessoal e contribuem para a criação dos sistemas educacionais do futuro.

Assim, é possível compreender que o ensino e a aprendizagem em EAD são processos complexos em uma sociedade em permanente mudan-ça. Suas estratégias vêm sendo modificadas de modo a responder às novas demandas, notadamente com a introdução de meios técnicos e de uma fle-xibilidade maior quanto às condições de acesso a currículos, metodologias e

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 419

materiais. Essas novas tecnologias globalizam, desse modo, as informações que estão sendo aplicadas ao ensino e à aprendizagem a distância.

Compreende-se, portanto, que a EAD deve proporcionar condições para a autoaprendizagem, ou seja, para uma aprendizagem autônoma, ativa e interativa, compreendendo esse processo não apenas como transmissão e aquisição de conhecimentos, mas como uma construção conjunta, em que alunos, tutores e professores se comprometam com a construção social do conhecimento.

ANALISANDO OS CASOS UCS E UFRGSPara esta investigação, faz-se a aproximação com a metodologia qua-

litativa embasada em autores como Bogdan e Biklen (1994), Lüdke e André (1986), André (2005), entre outros. Com base nessa abordagem qualitativa, damos ênfase ao estudo de caso. Tal como a expressão sugere, examina-se o “caso” (ou um pequeno número de “casos”) em profundidade, no seu con-texto natural, reconhecendo-se sua complexidade e recorrendo-se, para isso, aos métodos que se revelem apropriados. “O estudo de caso é uma investiga-ção empírica que investiga um fenômeno no seu ambiente natural, quando as fronteiras entre o fenômeno e o contexto não são bem definidas [...] em que múltiplas fontes de evidência são usadas” (YIN, 2005, p. 13).

Diante dessa compreensão, o método estudo de caso possibilita a in-vestigação do contexto na vida real em que ele acontece, podendo-se ilustrar certos tópicos, abarcando de modo descritivo e qualitativo o cotidiano. O es-tudo de caso é o estudo da particularidade e da complexidade de um caso singular, dentro de importantes circunstâncias.

A coleta de dados contemplou entrevistas semiestruturadas e ques-tionários aplicados a alunos, professores e tutores, e a análise dos Projetos Pedagógicos dos cursos. Com a coleta de dados foram realizados estudos do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e leituras de referências biblio-gráficas. A análise dos dados primou por uma sensibilidade de escuta, obser-vação e tessitura, que permeou esta escrita, entrelaçadas com as inovações pedagógica, científica e tecnológica presentes nos cursos de Pedagogia EAD da UCS e da UFRGS.

No discorrer das diversas páginas dos documentos institucionais e dos projetos pedagógicos dos cursos encontra-se, de forma clara, um grande real-ce aos princípios inovadores que dão sustentação ao planejamento e ao desen-volvimento dos cursos e da instituição como um todo. Assim, sob o olhar dos sujeitos participantes da investigação, ambos os cursos contemplam propostas e ações inovadoras.

Visualiza-se, assim, que as inovações pedagógicas estão presentes no processo de ensino e aprendizagem em EAD, contempladas no processo me-todológico de trabalho, de metodologias, os quais possibilitam, para além da

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420 MORÉS, A. et al. - INOVAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

transposição dos processos de ensino, a construção da autoaprendizagem, de uma aprendizagem autônoma, pois: “na aprendizagem autônoma, ao contrá-rio, o estudante não é objeto ou produto, mas o sujeito ativo que realiza sua própria aprendizagem” (BELLONI, 2009, p. 42).

Assim, essa concepção é entrelaçada no viés da inovação científica e tecnológica, respaldada em autores que dão referência a uma epistemologia fundada no social, no humano e na educação, para além da ciência clássica, positivista e dominante. Esse movimento construtivo abarcou a interligação com a inovação tecnológica, no qual se evidenciou que o uso contínuo das tecnologias contribuiu significativamente nas interações construídas, nas tro-cas de experiências e saberes, mediando ativamente o processo de ensino e aprendizagem em EAD.

A análise dos casos estudados mostra que:• Há elementos inovadores no que se refere às práticas peda-

gógicas, o uso das tecnologias e produção de materiais, guias didáticos e vídeos. Conforme citado pelos alunos, o curso em si é uma inovação, e destacam as tecnologias e as interações que elas proporcionaram, ou seja, que a inovação tecnológica favorece a inovação pedagógica.

• Há rupturas que correspondem ao apontado na literatura, fren-te às formas de conceber o ensino e aprendizagem em EAD.

• Tecnologicamente, as duas universidades requerem aper-feiçoamento e maiores investimentos tecnológicos, prin-cipalmente relacionados aos AVAs (Ambientes Virtuais de Aprendizagem), ao acesso à Internet, dentre outros recursos tecnológicos fundamentais à EAD.

Por fim, neste estudo constata-se, de acordo com o seu objetivo, que:• Existem inovações pedagógicas, das quais podem-se destacar:

□ a organização curricular, contempladas pelas inter-disciplinas;

□ o desenvolvimento de um processo de aprendiza-gem autônoma, que exigiu maior participação e comprometimento do acadêmico com sua aprendi-zagem;

□ a possibilidade de interligação teoria e prática, por meio de algumas interdisciplinas, seminários inte-gradores, oficinas e estágios;

□ o desenvolvimento de metodologias diversifica-das e articuladas às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), potencializadas pela proble-matização intrínseca às diversas produções, incluin-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 421

do o uso e elaboração de vídeos, debates em fóruns, chats, dentre outros;

□ as aproximações entre o ensino e a pesquisa, presen-tes em algumas ações docentes e discentes, de cunho investigativo e reflexivo;

□ a modalidade EAD, por possibilitar flexibilidade de horários, tempo e espaços para aprender;

□ as rupturas com algumas práticas e rotinas instituí-das, possibilitadas pela formação continuada.

• Existem inovações científicas e tecnológicas, destacando-se: □ uma perspectiva de avanço aos referenciais teóricos,

possibilitados por aportes contemporâneos; □ a organização dos guias didáticos e a construção de

vídeos como recursos importantes para a aprendi-zagem;

□ uso diversificado e contínuo de tecnologias, para além dos AVAs institucionais, entre as quais: blogs, wikis, pbworks, sites compartilhados de vídeos, e-

-mails, MSN; □ as leituras e os acessos a e-books, artigos digitais e

biblioteca virtual, como desafios a outras fontes e espaços de leitura;

□ a construção de um conhecimento, acessado e so-cializado em rede, por meio do uso de tecnologias;

□ o fortalecimento de vínculos e interações acadêmi-cas e familiares, adentrando no desenvolvimento de uma nova cultura, a cultura digital.

Nesse percurso de análise, estão presentes elementos inovadores que indagam aproximações e relações entre as inovações pedagógicas, científicas e tecnológicas interligadas aos processos de ensino e aprendizagem em EAD. Essa relação permite uma rede de construção de conhecimentos com apoio nos artefatos tecnológicos e pedagógicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É oportuno destacar que com base na análise documental e na pesqui-sa de campo desenvolvida com alunos, professores e tutores, em ambos os cursos de Pedagogia EAD, estão presentes inovações de cunho pedagógico, científico e tecnológico que corroboram de forma significativa os processos de ensino e aprendizagem em EAD.

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422 MORÉS, A. et al. - INOVAÇÃO E EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

Assim, observa-se que os referidos cursos de Pedagogia das universi-dades UCS e UFRGS contribuem para suprir as necessidades elencadas por Nevado, Fagundes, Menezes (2009), que apontam para a necessidade de cria-ção de novos modelos na formação de professores, ou seja, que passem a in-corporar a inovação − de forma a transformar a prática de modo significativo, em que o uso da tecnologia possibilite a preparação do próprio professor a fim de viver a experiência de mudança na educação que ele irá proporcionar aos seus alunos. Portanto, considera-se que esse processo de ensino e apren-dizagem mediado pelas TICs tem gerado grandes desafios e exigências às ins-tituições formadoras, aos acadêmicos e aos profissionais atuantes na rede de Educação Básica, de forma a desestabilizar as concepções já predeterminadas e pré-instituídas pelo paradigma dominante.

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INDICADORES DE QUALIDADE E CONTRIBUIÇÕES À FORMAÇÃO DO PEDAGOGO

Marilene Gabriel Dalla Corte

E ste trabalho, fruto da pesquisa de doutorado em Educação pela PUCRS, objetiva discutir a qualidade na educação superior, com

o foco em indicadores de qualidade e contribuições à formação do pedagogo, sob o viés do estágio curricular no curso de Pedagogia.

No contexto da formação de professores, o estágio curricular supervi-sionado tem recebido críticas sobre sua transitoriedade no currículo dos cur-sos, bem como sobre o pouco vínculo que estabelece com os referenciais teó-ricos e com o campo de atuação profissional. Assim, este estudo potencializa o conhecimento de fatores que estão relacionados e interferem na qualidade dos processos formativos do futuro pedagogo, bem como procura desvelar ca-minhos possíveis e viáveis para [re]significar e potencializar novos formatos e estratégias relacionadas ao Ensino Superior.

Desenvolveu-se uma pesquisa qualitativa, por meio de um estudo de caso do curso de Pedagogia de uma universidade pública, em que se buscou discutir como o estágio curricular pode contribuir para a formação de qualida-de do pedagogo, no sentido de [re]desenhar cenários em caminhos possíveis e viáveis para [re]significar a formação do pedagogo. Os sujeitos pesquisados constituíram-se pelo universo de representatividade de uma gestora, três pro-fessoras supervisoras de estágio e dezessete alunas estagiárias; as técnicas de pesquisa foram o questionário semiaberto e a entrevista semiestruturada.

À luz das avenidas pressupostas por Edgar Morin (1998), que tem o mérito de discutir a complexidade e a educação do século XXI, neste texto apresentam-se marcos conceituais, procedimentais e atitudinais para demar-car posicionamento, posturas e possibilidades qualitativas aos processos for-mativos no estágio curricular do curso de Pedagogia. Essas proposições se apoiam no paradigma do pensamento complexo, ou melhor, no paradigma da complexidade intitulada por Morin, que consiste em considerar o contexto e as suas múltiplas adversidades inerentes aos processos construídos e imple-mentados pelas condutas humanas.

Ao [re]desenhar cenários e [re]significar caminhos para a formação de qualidade do pedagogo, tendo o estágio como ponto de partida e de chegada, defende-se que ao entender a proposta da teoria da complexidade, proposta por Morin (1998), alicerça-se esses cenários e suas potencialidades nas “[...] diferentes avenidas que conduzem ao ‘desafio da complexidade’” (p. 177).

Os dados encontrados na pesquisa de campo são produtores de sentido da profissão docente e de significados socioculturais aos futuros pedagogos. Encaminham para confirmar que o estágio curricular do curso de Pedagogia

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repercute na formação de qualidade do pedagogo e está relacionado às po-líticas educacionais, à organização curricular e à cultura organizacional do curso, assim como às concepções e práticas dos professores formadores e dos futuros professores.

CENÁRIOS A REFLETIR E [RE]DESENHAR PARA A FORMAÇÃO DE QUALIDADE DO PEDAGOGO

Para Edgar Morin (1998; 2000), a Teoria da Complexidade, talvez, esteja relacionada ao ponto de vista das pessoas, ou seja, o que elas têm pen-sado ou conhecido de si mesmas e da realidade, assim como encaminha para possibilidades de como deveriam pensar e conhecer o mundo e a si mesmas. O autor destaca questões de superação acerca de distorções sobre a complexida-de, sinalizando que ela está relacionada, especialmente, com a incompletude do conhecimento.

Com base no que apontaram as pesquisadas, de maneira geral, encon-traram-se dimensões e indicadores de qualidade que se constituem múltiplas possibilidades para [re]significar a formação do pedagogo:

• Estratégias formativas relacionadas à indissociabilidade teo-ria e prática:

□ ensino, pesquisa e extensão articulando o Projeto Pedagógico do curso;

□ interdisciplinaridade na dinâmica curricular do cur-so;

□ estágio articulado à dinâmica curricular do curso e aos contextos de atuação docente;

□ constante planejamento participativo e coletivo.• Melhorias na articulação do tempo do e no estágio, de manei-

ra que se constituam articuladores da dinâmica curricular do curso de Pedagogia:

□ estágios realizados ao longo do curso; □ estágios articulados à cultura organizacional do cur-

so; □ boas condições de trabalho aos professores super-

visores; □ distribuição do tempo e das atividades de estágio

condizentes com a realidade de atuação docente • Estágio como efetiva via de mão dupla entre IES e institui-

ções parceiras: □ conhecimento do contexto de atuação docente; □ fortalecimento de parcerias institucionais;

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□ boa comunicação entre universidade e instituições parceiras;

□ espaços compartilhados de planejamento e [re]construção do conhecimento;

□ interdependência e corresponsabilidade institucio-nal articulada à dinâmica curricular do curso.

• Processos investigativos reflexivos, [re]construtivos e instru-mentalizadores da produção científica:

□ ação-reflexão-ação no ensino, na pesquisa e na ex-tensão;

□ atividades de pesquisa e produção científica no es-tágio;

□ ética nas relações interpessoais e institucionais; □ metacognição docente e discente.

Tendo por base essas dimensões e indicadores de qualidade encontra-dos, infere-se que do prisma que se olha e do enfoque e abordagem que se tem ou se quer ou adotar nos processos formativos na educação superior, o estágio repercutirá ou não na qualidade da formação dos futuros pedagogos.

Se visto como o lugar da prática, o estágio se limita em si mesmo e, certamente, sensibilizará o futuro pedagogo para questões do contexto prático da profissão. Porém, se visto como o lugar de incertezas, de inacabamento e de incompletude do conhecimento, o estágio cresce em grau de complexidade e, dessa forma, acaba por aproximar as questões do cotidiano da profissão docente com as questões da ciência. Cabe destacar que não só a aproximação potencializa aprendizagens, mas a qualidade das relações e das teorizações acerca do que é vivido que se constitui ciência com consciência.

Na relação teoria e prática, potencializada pelas aproximações e in-terlocuções com e no estágio, é importante destacar que é preciso que sejam exploradas, analisadas e refletidas as muitas dimensões de um mesmo fenô-meno, de um mesmo fato, de um mesmo comportamento ou fator mobilizador da realidade da profissão docente.

Então, quando se problematiza como o estágio curricular pode con-tribuir com a formação de qualidade do pedagogo, percebe-se que a grande complexidade que envolve a formação de pedagogos não se constitui uma teo-ria que possui explicações a todas as coisas. Pressupõe situações desafiadoras e a busca constante para transpor a incompletude do individual e do coletivo.

Para Morin (1998), essa opção de busca encaminha a percorrermos “diferentes avenidas que conduzem ao desafio da complexidade” (p. 177). Conforme o autor: “A primeira avenida, o primeiro caminho é o da irredutibi-lidade do acaso e da desordem [...]. Como definir o acaso que é um ingredien-te inevitável de tudo o que nos surge como desordem?” (p. 177). É justamente com essa ideia de busca e de devir que se chega à certeza de que as dimensões

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e indicadores encontrados apontam para muitas possibilidades que nos con-duzem a opções e caminhos, ao desenvolvimento e melhoramento de ações formativas que qualifiquem o estágio curricular e, sendo assim, à formação dos futuros pedagogos.

Sempre há algo no contexto que escapa, mas que de certa forma, em algum momento, poderá desocultar-se. Essa questão, no estágio curricular, é importante porque se relaciona ao olhar atento, o olhar de quem percebe, de quem reflete e estabelece relações com o repertório de saberes docentes; a apropriação de dados e elementos que são mobilizadores de futuras opções e estratégias de ação em campo de atuação docente.

Morin (1998) aponta a segunda avenida como possibilidade de avan-çarmos para outros níveis de complexidade e de compreensão e envolvimento com a realidade. Afirma que a segunda avenida está relacionada à transgres-são e que é entendida como possibilidade de transcender a fatores limitadores. Isso, de certa forma, nos processos formativos do pedagogo se conquista com a consolidação dos saberes e fazeres. Então, o estágio curricular pode contri-buir com a formação de qualidade do pedagogo na medida em que se consti-tuir mobilizador e retroalimentador no processo de [re]construção e consoli-dação do repertório de seus saberes docentes.

Porém o autor propõe que se evite a generalização do conhecimento e, em outras palavras, que a transposição didática seja constância nos processos formativos. Isso, efetivamente, se concretiza pela qualidade das aproximações e significações teórico-práticas, da solidez dos fundamentos da educação, as-sim como do significado que a realidade de atuação docente tem para o futuro professor.

O conhecimento de si, do outro, dos seus saberes e fazeres para o e no exercício da docência não pode, conforme afirma o autor, ser reducionista e fragmentado, já que

o pensamento reducionista continua a procurar de modo míope a causa e o efeito, a determinar o bem e o mal, a nomear o culpado e o salvador [...]. Precisamos de um pensamento que considere as partes em relação com o todo e o todo em suas relações com as partes (MORIN, 2000, p. 112).

É importante que se evite generalizações, já que sinalizam “superfi-cialidade”, como apontam com preocupação as pesquisadas. O estágio não pode constituir-se um campo de generalização teórico-prática, afirma uma das professoras orientadoras. A generalização está intimamente interligada ao sintoma de que não existe um sólido repertório de saberes e, portanto, se sabe um pouco de tudo ou quase tudo, porém não se aprofunda e se domina com propriedade o universo teórico-prático que alicerça a profissão docente.

Na terceira avenida, a da complicação, verifica-se que está relaciona-da a problemas que surgem com as múltiplas interações, sejam elas humanas, institucionais, do conhecimento, entre outras. Compreende-se que o professor formador, o futuro professor e também os professores em serviço nos dife-

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rentes campos de estágio se constituem seres desenvolventes, aprendentes e, sobretudo, seres que precisam ser desvelados constantemente pelas suas po-tencialidades, pela fusão dos aspectos já conhecidos com os aspectos a serem conhecidos.

Constatou-se que estágio, sob o prisma do [re]dimensionamento e da consolidação de parcerias institucionais, tem por finalidade o envolvimento e a apropriação de espaços de construção da práxis pedagógica. Como sinali-zam a gestora, as professoras orientadoras e boa parte das alunas estagiárias, o estágio é pensado para estar intimamente articulado às escolas, mas ainda está longe de se constituir via de mão dupla entre IES e campo de atuação do pedagogo; está envolto pela avenida da complicação.

Entretanto, como a terceira avenida efetivamente se concretiza po-tencializadora de [re]significação da formação do pedagogo? A complicação, justamente, serve para desacomodar e encaminhar para melhorias qualitativas nos processos formativos do curso de Pedagogia: investimento em processo comunicacional e de parceria entre IES e instituição de atuação do pedagogo; realização de reuniões e encontros de planejamento participativo e coletivo pelos professores e futuros professores; [re]estruturação dos tempos e do lugar que ocupam os estágios na dinâmica curricular do curso; melhores condições de trabalho aos professores orientadores, entre outros aspectos. Essas ques-tões, sob o viés da terceira avenida, são convidativas à reflexão, à mobilização coletiva na busca de soluções e melhorias aos processos formativos alusivos ao estágio.

A quarta avenida proposta por Morin (1998) se refere a noções opostas que estão relacionadas e produzem conhecimento, avanço e organização. No caso do curso de Pedagogia, ao olhar e refletir o estágio curricular, tendo por base a trajetória do curso de Pedagogia no Brasil e considerando a legislação referente às políticas públicas para a formação de professores e a gestão da qualidade, verificou-se que o curso tem em sua gênese períodos de formação identitária. De certa forma, o curso de Pedagogia precisou passar por um pro-cesso de desordem para, então, se ancorar em nova ordem; verdadeiros ciclos de constituição identitária.

As transformações da Pedagogia ao longo de sua trajetória-história dizem respeito especialmente à identidade do pedagogo no âmbito histórico, epistemológico e filosófico. A gênese histórica desse curso traduzida, confor-me Silva (2003), por diferentes períodos de identidade (período de identidade questionada – 1939 a 1972; período da identidade projetada – 1973 a 1978; período da identidade em discussão – 1979 a 1998; período de identidade outorgada – final da década de 1990), está recheada de facetas de ordem e desordem que desencadeiam novas organizações e construção identitária do pedagogo.

Esses períodos, relacionados a marcos regulatórios oficiais, ocorridos desde 1939, são oriundos de movimentos de luta e participação de institui-

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ções, órgãos e entidades nacionais, entre outros movimentos sociais envol-vidos com a Educação Básica e Superior. Certamente, foram desencadeados por processos de debate, reflexões, proposições e defesas, bem como homolo-gação e implantação de normativas para a formação e atuação de professores, especialmente ao curso de Pedagogia.

De acordo com os Pareceres do CNE/CP 009/2001 e 028/2001, com as Resoluções do CNE/CP 02/2002 e 01/2006, surgiram questões pontuais quanto às diretrizes para formação de professores. Elas [re]dimensionaram aspectos importantes com relação aos estágios curriculares e à prática de ensi-no, objetivando romper com a concepção linear da organização curricular dos cursos de licenciatura. Será que no curso de Pedagogia houve avanço?

O estágio curricular, no ideário de sua trajetória, esteve e está envolvi-do com discussões sobre suas concepções e implicações à formação docente. Foi entendido como sendo o local de observação e aplicação de técnicas e ati-vidades instrumentais relacionadas à futura profissão; passou a ser resultante da ideia de prática como treinamento e instrumentalização técnica, ancorada no modelo de racionalidade técnica da didática; constituiu-se como a parte prática dos cursos de formação de professores, submetendo o aluno a desen-volver habilidades que priorizam o “como fazer” sem refletir sobre o “saber fazer” ancorado no “saber” (PIMENTA; LIMA, 2004).

Ao final dos anos 1990, o estágio, influenciado pela “sociedade do conhecimento”, começou a ser repensado, surgindo assim normativas legais com o pressuposto básico de que o professor não é um profissional trans-missor do conhecimento, passando a compreendê-lo como um profissional formador sob o enfoque da perspectiva crítica e reflexiva da educação.

Então, tendo por base a quarta avenida de Morin, que relaciona-se à ideia de ordem x desordem x organização, verifica-se que ao longo de sua trajetória histórica o curso de Pedagogia se fortaleceu com estatuto próprio, considerando especialmente que possui Diretrizes Curriculares específicas. Porém, divergências continuam acerca de questões antigas referentes ao ali-cerce da formação profissional, à concepção de docência, à estrutura do curso, à carga horária do estágio, ao mercado de trabalho e às atividades profissio-nais do pedagogo. Isso é demonstrado nas discussões das pesquisadas quan-do sinalizam diferentes entendimentos acerca do que é docência e quando atribuem juízo de valor ao campo de atuação do pedagogo, seja em âmbito escolar ou não.

Com base nas discussões de Silva (2003), talvez possamos repensar o curso de Pedagogia, que está adentrando em um novo momento, intitulado como “período de [re]significação” ou “período de [re]estruturação” da iden-tidade do pedagogo; momento para repensar a ordem vigente e os fatores que contribuem para a desordem da mesma. O estágio curricular, nesse movimen-to, requer potencializar aprendizagens que se constituam em saberes da ação pedagógica, pela intermediação direta da teoria e da prática na dinâmica cur-

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ricular do curso e, também, da relação fortalecida entre instituições de Ensino Superior e contextos de atuação do pedagogo.

A quinta avenida da complexidade diz respeito especificamente a essa provável organização. Nessa perspectiva, passa-se a compreender que a orga-nização está relacionada a tudo aquilo que contribui para a constituição de um sistema, ou seja, na proposição de Morin (1998, p. 180), “[...] um sistema é mais e menos do que aquilo que poderíamos chamar de soma de suas partes”.

No caso da educação superior no Brasil, constatou-se que está sob a égide de um forte movimento de avaliação, o qual vem definindo critérios de qualidade para a formação de profissionais ao mercado de trabalho. A regula-ção por parte do Estado vem cada vez mais se ancorando em normatizações, traduzidas por resoluções, pareceres, entre outros documentos, os quais regu-lamentam e implementam reformas educacionais que necessitam de dispositi-vos avaliativos de verificação da qualidade.

As ações do Estado veiculam-se por lógicas regulatórias e, como di-zem Morosini e Franco1: “É bom lembrar que o paradigma da modernidade com predomínio do Estado regulador se apoia num conhecimento também re-gulador, utilizando como estratégia concepções de qualidade universitária que lhe são compatíveis”. Assim, o paradigma da modernidade, que se ancorou no enfoque do Estado regulador e de suas interveniências, utiliza-se de saberes e conhecimentos reguladores resultantes de avaliação externa e interna, que encaminha e orienta para novas definições e decisões alusivas às políticas educacionais.

Tendo por base as três concepções de qualidade, estudadas em Morosini (2001), isomorfismo – diversidade – equidade, verificou-se que são produzidas pelas expectativas e políticas de administração. Os condicionantes paradigmáticos que interferem nas concepções e práticas de avaliação, con-sequentemente, produzem indicadores que apontam à qualidade dos serviços, aprendizagem, espaços físicos, gestão, conhecimento [re]construído, recursos, entre outros. Não existe, portanto, somente uma tendência de qualidade numa instituição de Ensino Superior, num curso e/ou numa disciplina, pois depen-dendo do momento e da situação adota-se uma sistemática ou outra, assim como se pode estar mesclando as diferentes facetas que envolvem a qualidade na educação superior.

Isso ficou visível na cultura organizacional do curso investigado, já que pelo olhar de cada pesquisada se percebeu diferentes posicionamentos acerca do que é qualidade e do que esperam da instituição de Ensino Superior e do seu curso quanto ao bom andamento das atividades cotidianas, bem como o que vem a ser uma formação de qualidade.

A cultura organizacional da instituição e do curso, em especial, se tra-duz pelo universo de significados e pelo compartilhamento de ideias e ações

1 Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt11/t1113.pdf>

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que estruturam, normatizam, organizam e dão visibilidade ao andamento das atividades pelos gestores, professores e alunos. Constitui o modo instituciona-lizado de pensar e agir que existe em uma organização.

Então, a soma das partes, no caso do curso de Pedagogia, se refere a todos os quesitos e elementos indispensáveis à consecução das atividades for-mativas na dinâmica curricular. Nessa ótica, os tempos, os espaços, os recur-sos, as parcerias, os projetos institucionais internos e externos, as normativas, entre outros aspectos, são fatores intervenientes e se constituem pontos fortes e, também, fragilidades do curso.

É importante destacar que a soma das partes, sob o enfoque da com-plexidade, não pode somente ser pensado com o olhar simplista de “somató-rio”, ou na ideia de mais um a agregar parcerias. Esse sistema requer que da soma das partes possam emergir possibilidades, prioridades, metas e estraté-gias de ação compartilhada entre docentes e discentes para qualificar a cultura organizacional do curso.

Morin (1998) aponta uma sexta avenida, intitulada como princípio hologramático. Coloca que essa perspectiva é surpreendente porque o

[...] holograma é a imagem física cujas qualidades de relevo, de cor e de pre-sença são devidas ao fato de cada um de seus pontos incluírem quase toda a informação do conjunto que ele representa [...] não só a parte está no todo, mas também que o todo está na parte (p. 181).

Por exemplo, a apreensão da realidade indicada pelas estagiárias pes-quisadas tem conotação de detalhes, de totalidade, de incoerências, das neces-sidades e das possibilidades, contudo esse processo não pode ser solitário, tem que contemplar momentos distintos de ir e vir envolvendo o campo de estágio e a instituição de Ensino Superior formadora. Esse processo precisa ser feito para estabelecer reflexão dialética de trocas entre os professores formadores e os futuros professores, tendo por base parâmetros de observação, captação de informações, reflexão, planejamento e implementação de práticas conscientes e significativas, o que potencializa a práxis na formação do futuro pedagogo.

Não se pode apenas estabelecer relação teoria e prática sem que haja comprometimento da equipe de professores formadores, assim como dos fu-turos professores. Então, o protagonismo é caráter indispensável à concretude da perspectiva hologramática na educação. O protagonismo docente e discen-te parte do princípio de que é necessária a percepção e a compreensão do que é e no que efetivamente se constituem e repercutem as etapas e situações de estágio, assumindo-se como corresponsável pelos e nos processos formativos do e no curso.

Defende-se que o compartilhamento entre as disciplinas que compõem o currículo do curso potencializa o princípio hologramático, no entendimento de que os três núcleos que integram a estrutura curricular do curso de pedago-gia, alvo dessa pesquisa, são singulares, porém complementares, e necessitam

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estar articulados pelos saberes e fazeres das disciplinas. Considera-se que as práticas de ensino e os estágios se constituem efetivamente pilares de articula-ção curricular e vias de imersão, conscientização e, sobretudo, protagonismo no contexto de atuação.

Outro aspecto a retratar se refere às práticas docentes reiterativas, an-coradas na valorização do conteúdo pelo docente. Esse modelo contribui para que haja a fragmentação do conhecimento e, consequentemente, dificuldade pelos futuros professores em agregar saberes e fazeres quando se inserem nos processos formativos de estágio. Para alcançar a qualidade, na perspectiva da dinâmica curricular do curso, o protagonismo docente ancorado na criticida-de, na reflexividade e na transformação é elemento indispensável para que se constituam práticas emergentes e balizadoras de qualidade nos processos formativos do curso de Pedagogia.

Quanto à sétima avenida, segundo Morin (1998), se refere à crise de conceitos fechados e claros. É fator que qualifica os processos formativos, sejam eles isolados ou não. No caso do estágio, ele não pode ser pensado, explicado, nem articulado em separado da dinâmica curricular do curso de Pedagogia. Conforme colocam algumas pesquisadas ao entender o estágio como o momento de exercitar tudo o que se aprendeu durante o curso, sendo ele dicotômico ao que se defende e se entende por processual e qualitativo.

A articulação dos tempos e a [re]significação das estratégias formati-vas do e no estágio pressupõem a inter-relação do estágio ao longo do curso de Pedagogia com as demais disciplinas que compõem a sua dinâmica curri-cular. Não se explica uma disciplina curricular isolada das outras, ou, também, como a superpoderosa que tem que dar conta de aplicar o que as outras pres-crevem ao final de uma trajetória. Como destacam as professoras orientado-ras pesquisadas, o estágio requer ser desenvolvido ao longo do curso, estar articulado aos saberes em construção, já que sua principal função, além de aproximação do contexto de atuação profissional, é significar ao futuro pro-fessor saberes que são necessários ao exercício da docência. Para tanto, não se configura possível [re]construir saberes ao longo dos processos formativos se o estágio somente acontece lá no final do curso e, no caso do curso investi-gado, com carga horária conjunta num mesmo semestre, de maneira intensiva, sem que os futuros professores tenham tempo para processar as informações, tabulá-las, teorizá-las e analisá-las individual e coletivamente. São relações indispensáveis e necessárias à qualidade da formação do pedagogo.

Quanto ao Projeto Pedagógico do Curso (PPC), considerando-o o eixo norteador das ações formativas dos futuros profissionais, percebeu-se que precisa estabelecer relações mais próximas entre as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e as práticas pedagógicas propostas, articuladas e desen-volvidas no currículo do curso.

Conforme o INEP/MEC, com relação ao currículo, são indicadores imprescindíveis de qualidade dos processos formativos de um curso de gradu-

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ação: coerência do currículo com os objetivos do curso; coerência do currícu-lo com o perfil desejado do egresso; coerência do currículo face às diretrizes curriculares nacionais; adequação da metodologia de ensino à concepção do curso; inter-relação das disciplinas na concepção e execução do currículo; di-mensionamento da carga horária das disciplinas; adequação e atualização das ementas e programas das disciplinas; adequação, atualização e relevância da bibliografia; coerência da proposta curricular com os recursos humanos (do-centes e técnicos); e coerência da proposta curricular com os recursos mate-riais específicos do curso (laboratórios e instalações específicas, equipamen-tos e materiais).

Na oitava avenida, Morin (1998) faz alusão ao papel do observador, em que o seu olhar é construído no contexto sociocultural, ou seja, nas traje-tórias, nas relações, na cultura, nas relações intra e interpessoais, entre outros aspectos. Assim, a realização de processos investigativos reflexivos potencia-liza o questionamento [re]construtivo e a produção científica no e do estágio em contextos de atuação e formação docente.

Esse olhar de desvelar, de refletir e pontuar caminhos e novos cená-rios, como diz Morin, é o que torna possível a produção das novas teorias. Nesse sentido, agregam-se outras interpretações, muitas possibilidades e po-tencialidades em um contexto, recheado de outros pontos de vista e contextos inter-relacionados em suas realidades, problemáticas e expectativas.

CONSIDERAÇÕES FINAISÉ importante que se tenha a compreensão de que existem situações,

questões, fatores, possibilidades que podem, efetivamente, ser definidos com clareza. Porém também é preciso ter clareza de que existem questões que

“ainda” não podem ser [re]significadas. Daí, então, a proposição de serem [re]desenhados constantemente cenários no curso de Pedagogia, os quais tenham valor em potencial para contribuir com a qualificação dos processos formati-vos do pedagogo, entendendo com clareza que o conhecimento, o tempo, os espaços, as pessoas, as instituições, os recursos materiais, entre outros, são elementos envolvidos nessa aventura de definir, articular, implementar, exe-cutar, avaliar e consolidar práticas educativas na educação superior.

Cabe defender que o estágio, como componente curricular, num pe-ríodo que se diz de possível retomada e [re]significação da identidade do pe-dagogo, necessita de elementos constituintes aos saberes da ação pedagógica, no sentido de fortalecer, entre outros aspectos, as aproximações e articulações da teoria e prática, da relação entre universidade e contextos de atuação do pedagogo, bem como [re]significar os tempos e as estratégias formativas ao longo do curso. Certamente o estágio curricular está diretamente relacionado à qualidade dos processos formativos do pedagogo, considerando que os va-riados fatores já sinalizados e desvelados interferem para que esta qualidade se constitua em dimensões e indicadores de qualidade.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 435

Nessa perspectiva, o estágio curricular poderá avançar da proposição de momento de prática na dinâmica curricular do curso; transcender à ideia de

“supervisão” relacionada somente com a constatação do que o aluno estagiário está concretizando no contexto de atuação ou se está colocando em prática tudo o que aprendeu no curso. É importante, sobretudo, evoluir para além da concepção de momento final ou de culminância de um curso de graduação.

REFERÊNCIAS

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QUALIDADE E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES: CONTRIBUIÇÕES DE NARRATIVAS

DE EGRESSOS DA LICENCIATURA EM MATEMÁTICA NA RECONFIGURAÇÃO CURRICULAR

Denise Nascimento SilveiraCleoni Maria Barboza Fernandes

O caminho que o professor escolheu para aprender foi ensinar. No ato do ensino ele se defronta com as verdadeiras dificuldades, obstáculos reais, con-cretos, que precisa superar. Nessa situação ele aprende (PINTO, Álvaro Vieira, 2010).

Este texto apresenta um recorte da pesquisa interinstitucional deno-minada “Movimentos de configuração curricular de cursos de licenciatura: dilemas e desafios nos processos formativos da formação inicial de profes-sores”, do grupo de pesquisa CNPq “Formação de professores, licenciatu-ras e práticas pedagógicas”, vindo a reforçar sua criação e sua consolida-ção. As IES (Instituições de Ensino Superior) envolvidas são: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), que coordena o pro-jeto; a Universidade Federal de Pelotas (UFPEL); a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); o Instituto Federal Catarinense e a Universidade de Caxias do Sul (UCS).

No desenvolvimento dessa pesquisa, viemos nos deparando com a discussão da qualidade, tanto em nível nacional quanto em nível local – no caso – na reconfiguração curricular. Reafirmando a trajetória que os pesqui-sadores desse grupo têm percorrido, este estudo está sendo realizado em uma abordagem qualitativa, incluindo os procedimentos próprios dessa modalida-de e utilizando princípios da etnografia: imersão na realidade, descrição densa para sustentar a ênfase na interpretação dos fenômenos apreendidos com base nos significados produzidos no contexto sociocultural dos interlocutores.

As leituras que temos feito no grupo de pesquisa vêm apontando a am-biguidade e a porosidade do conceito de qualidade. Trata-se de um conceito dinâmico contextualizado nas relações que se produzem no mundo globaliza-do, marcado por transformações socioculturais e econômicas, e por condicio-nantes de ingerência externa às questões educativas institucionais. Nessa pers-pectiva, a história das relações de poder dentro e fora do contexto da educação superior interfere no desenvolvimento de políticas públicas e suas instâncias de operacionalização A discussão sobre a qualidade da educação não está iso-lada dos paradigmas educacional e social. Tal como afirma Morosini (2009, p.184), “qualidade é um construto imbricado no contexto das sociedades e consequentemente nos paradigmas de interpretação da sociedade”.

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438 SILVEIRA, D. N. et al. - QUALIDADE E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

PROBLEMATIZAÇÃO, OBJETIVOS E QUESTÕES DA PESQUISA

De posse dessas considerações iniciais, apresentamos a problematiza-ção desse recorte da pesquisa para compreender os movimentos dos egressos dessa licenciatura diante da inserção no campo profissional e suas tensões entre este e o campo da formação, especialmente nas relações de teoria-prá-tica, formação específica-formação pedagógica e construção pedagógica do conhecimento.

Os instrumentos adotados até o presente momento foram basicamente entrevistas semiestruturadas individuais e coletivas. Essa estratégia nos per-mitiu ouvir narrativas reveladoras. Realizamos também uma análise docu-mental dos Projetos Políticos Pedagógicos, analisando todas as versões que estão arquivadas, inclusive a versão vigente.

O que pretendemos nesse convívio com os egressos é compreender a leitura do campo profissional com base na sua inserção ou na continuidade da formação acadêmica por meio de cursos de pós-graduação stricto sensu. As narrativas coletadas poderão contribuir para a melhoria de aspectos que venham a qualificar o curso de formação inicial. Nessa perspectiva, conside-ramos relevante perceber se a inserção no campo profissional, na metade do curso, contribuiu ou não para a permanência do egresso na docência ou se os motivou a buscar a continuidade de sua formação.

Os que permanecem nas instituições escolares encontram alguma difi-culdade? Se houve, como poderiam contribuir para que os atuais professores em formação, no momento da inserção no campo profissional, não enfrentem as mesmas agruras? Ou, ainda, ao seguirem a formação em programas de pós-graduação, pretendem voltar a atuar como professores ou haverá uma dedicação maior para o ramo da pesquisa? Nos cursos de mestrado ou douto-rado encontraram dificuldades? Se aconteceram essas dificuldades, como as superaram? Em qualquer uma das condições em que se encontram, quais re-comendações fariam aos atuais professores em formação? De que forma esses ex-alunos pensam em contribuir com a formação que receberam? Será que algum desses egressos se afastou da área que se licenciou? O que poderiam dizer a respeito desse afastamento da área de formação inicial? Que mensa-gem gostariam de deixar para os colegas em formação? Interrogantes que nos trazem inquietudes e uma necessidade de retomar a questão central da profis-sionalização: finalidade ético-existencial da constituição de ser professor.

O RECORTE COM OS INTERLOCUTORES

Os estudos sobre egressos apresentam como uma das características básicas a localização e atuação desses egressos cadastrados por seus regis-tros acadêmicos no colegiado do curso, os quais passaram a ser contatados

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 439

e convidados a participar deste momento da pesquisa. Para este texto, trou-xemos narrativas de alguns ex-alunos que ingressaram em 2004, convivendo com o currículo em fase de transição para a adequação às novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e também ex-alunos que ingressaram a partir de 2005, inseridos no currículo definido por essas diretrizes.

Consideramos relevante a informação de que a licenciatura de Matemática, disponibilizada no período diurno, tem 2.948 horas com dura-ção prevista para oito semestres. Não abordamos o curso de licenciatura de Matemática do período noturno, pois o mesmo iniciou em 2008, com a mesma carga horária, porém distribuída em dez semestres e, assim, ainda não têm alunos formados.

MARCO CONCEITUAL

A palavra “formação”, como apresenta Silveira (2008, p. 16), tornou--se uma palavra porosa, deixando permeabilizar-se no campo educativo tanto pelo discurso quanto pelo percurso, correndo o risco de banalizar-se como conceito. Defini-la não é tarefa fácil nem consensual, pois talvez seja o con-ceito mais polissêmico na terminologia pedagógica da atualidade. Mostra-se guarnecido de tantos matizes de significados e entrou em tantas diferenças históricas que já não é possível utilizá-lo de modo inequívoco. Aliás, o sen-tido pedagógico do termo, que remonta à longa data, articula em si mesmo, de acordo com Fabre (1992), uma lógica que se define em função do que é dominante em formação.

Concordamos com essa ideia porque, como nos diz Nóvoa (2002), em formação os verbos conjugam-se nas suas formas transitivas e pronominais: formar é sempre formar-se.

Nessa perspectiva, a formação pode adotar diferentes aspectos confor-me se considera o ponto de vista do objeto. A formação que se oferece, orga-nizada exteriormente ao sujeito, ou do ponto de vista do sujeito, a formação que se ativa como iniciativa pessoal (MARCELO GARCIA, 1999). Mas nas duas perspectivas é possível perceber a importância dos processos de forma-ção que o autor considera como uma das pedras angulares nos movimentos da educação.

Diante dessas marcas da formação docente, optamos pela narrativa como instrumento de coleta. Essa opção fundada em Walter Benjamin (1996) aproxima-nos do pensamento de Correia (In: DUBAR, 2006, p. 11), quanto esse autor anuncia que:

[...] Esta compreensão exige que se escute o que os indivíduos dizem, que se observe o que eles fazem e, sobretudo, que se compreenda seus contextos de vida. No atual contexto, observar, escutar e compreender os percursos biográfi-cos é metodologicamente mais relevante do que a análise das pertenças sociais.

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440 SILVEIRA, D. N. et al. - QUALIDADE E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

Com a perspectiva de Walter Benjamin (1994, 1996) partimos para a pesquisa com a ideia de poder escrevê-la a “contrapelo”, ou seja, da pers-pectiva dos que ainda não haviam sido ouvidos – os egressos da licenciatura. Nossa intenção foi a de ter condições de compreender, com esses professores, algumas das razões que os levaram a se envolver nessa complexa tarefa da docência, mesmo que muitas vezes não tivessem a leitura dos documentos legais e do importante momento histórico que nessas condições se gesta, das produções de sentido do fazer docente.

O cronista que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e os pequenos, leva em conta a verdade de que nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história (BENJAMIM, Walter, 1994, 1996).

AS NARRATIVAS

Os egressos, durante as narrativas, foram convidados a escolherem o nome de um matemático e/ou cientista que apreciassem e, assim, nos relató-rios escritos, os sujeitos serão identificados por esse nome. E, dessa forma, o egresso tem sua identidade protegida, ficando inclusive à vontade para fazer os recortes que acredita ser importante para a melhoria do curso de licenciatu-ra. Trazemos um recorte de três narrativas.

Nossa entrevista começou com o ex-aluno que se denominou Galileu1 e atualmente cursa o mestrado em uma grande universidade de nosso Estado. Ele já recebeu convite para realizar seu doutorado no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA).

Começo minha fala e um pouco de minha história. Me formei aqui (UFPEL – IFM) em 2009, assim peguei um currículo muito parecido com o anterior, ou seja, pouco tempo na escola como estagiário, mas gostei do que fiz e da convivência. E, quando me formei, em seguida saiu o concurso da Secretaria Municipal de Educação, eu fiz e fui aprovado nos primeiros lugares. Muito feliz e com todo apoio da minha família assumi numa escola bem conceituada que se localiza em um bairro grande de Pelotas. Ao chegar à escola fui muito bem recebido por todos. Eles comentavam sobre minha pouca idade, diziam que me confundiam com os alunos mais velhos. Senti-me muito bem na chegada e co-mecei a trabalhar e ai... ai ficou complicado. Nas vinte horas que assumi, tinha 18 em sala de aula e mais duas de reuniões, sem tempo de preparar e estudar. Como gosto de estudar sempre, ler muito, assistir filmes e refazer exercícios de livros da universidade, passei a não ter tempo para mais nada disso e, para complicar, meus alunos não queriam ‘nada com nada’, uma desmotivação to-tal. Ficava profundamente irritado com a condição de impotência diante dos alunos. Passei a não gostar mais do jeito que fazia o meu trabalho, nem estava mais gostando de ser professor, passei a me considerar um professor medíocre, sem total controle da sala de aula, totalmente despreparado.

1 Galileu Galilei nasceu em Pisa na Itália, em 15 de fevereiro de 1564, e faleceu em Florença, em 8 de janeiro de 1642. Um dos domínios em que se fez conhecido foi o da astronomia.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 441

Então me reporto para minha formação, realmente não aprendemos nada de docência, ser professor não era discutido em nossa época de aluno, não sei se hoje, com essa carga horária maior de estágio, as coisas melhoraram para quem entra direto, depois de formado, numa sala de aula. Eu, mesmo com pouca idade, já carrego essa frustração, que eu quero curar um dia, pois gosto do ambiente estudantil, e a pesquisa tem que ser com alunos, vivo isso no mestrado; não se faz pesquisa sozinho sem alunos, e a sala de aula é um espaço privilegiado para discussões e trocas de informações. Ainda quero ser professor, além de pesquisador, e espero que esse novo formato de licenciatura ajude os futuros professores a estarem mais preparados para a sala de aula.

A segunda narrativa veio de uma ex-aluna que escolhe o nome da Hipátia2, como referência feminina na Matemática. Essa professora atual-mente leciona como substituta em uma escola pública da cidade, cursa uma especialização em Educação Matemática e acabou de ser aprovada na seleção do mestrado profissional para o Ensino de Matemática. Declarou que vive um momento especial, tanto profissionalmente como pessoalmente, e começou sua narrativa assim:

Quando conclui minha licenciatura, a reforma já havia acontecido no pa-pel, mas não havia acontecido de fato. Já fiz outra graduação e descobri que não era bem isso que queria ser, fui então cursar Matemática para ser pro-fessora. Sempre me esforcei para dar uma aula como imagino que seja uma

“boa aula”. Como não tenho muita clareza do que é essa “boa aula”, procurei uma especialização e agora estou seguindo para o mestrado. Penso de modo geral que as licenciaturas ainda não nos preparam para sermos professores, e olha que eu sou formada dentro do novo currículo, e penso que ainda falta muito. Há bons professores que se esforçam muito. Há projetos como o do PIBID que participei e muito me ajudou, mas considero ainda pouco [...]. Hoje, atuando em sala de aula, percebo o que me falta de leitura sobre docên-cia, leituras sobre os processos de aprendizagens, sobre como lidar com os alunos que estão em constante evolução e cada vez mais exigentes, buscando coisas novas, e, ao olhar para trás, muito próximo mesmo, pois estou forma-da a menos de dois anos, enxergo a licenciatura muito distante da realidade. Vejo que muitos dos professores que trabalham no curso não têm o curso de licenciatura, ou seja, não são professores – são bacharéis, ou engenheiros, ou agrônomos –, outros são ótimos pesquisadores, mas não pesquisas sobre a Educação Matemática e sobre os processos de formação. Dessa forma per-cebo melhorias na formação e penso que vai melhorar, com professores da área do ensino, com projetos do tipo PIBID e outros movimentos que ocorrem, mas também acho que falta muito para se percorrer. ‘Entender os processos de ensino e de aprendizagem não é tarefa fácil, mas são aspectos fundamen-tais para uma melhor docência’.

2 Personagem importante da História da Matemática. Hipátia é um dos maiores ícones da inteligência feminina de todos os tempos. Hipátia de Alexandria foi uma erudita grega de marcadas tendências gnósti-cas, notável no estudo da matemática, da filosofia e da astronomia. Filósofa neoplatônica, estava alinhada a Plotino. Hipátia pertencia a Academia de Atenas e seguia os ensinamentos dessa Escola. Foi ela que se ocupou com o trabalho de Diofanto ou Diofante, que até aquela época foi o único matemático grego a se dedicar à Álgebra.

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442 SILVEIRA, D. N. et al. - QUALIDADE E FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES

O recorte da próxima narrativa que apresentamos veio de uma profes-sora que está concluindo a segunda graduação e, concomitantemente, se habi-litou a um curso de pós-graduação em nível de mestrado. Essa aluna egressa da licenciatura de Matemática escolheu o nome de Maria Agnesi.3

Ao terminar o estágio da licenciatura em Matemática, percebi minhas “fra-gilidades pedagógicas”; embora o novo currículo já estivesse em vigor, perce-bia que os professores não sabiam lidar com essa outra situação; então me de-cidi: vou fazer licenciatura em Pedagogia com a esperança de entender ‘tudo’. Assim, paralelamente, fiz o último ano da licenciatura em Matemática e o pri-meiro da Pedagogia. Enfrentei muitos conflitos, [...] quando a “poeira baixou” e me dediquei somente ao curso da Pedagogia, percebi muitas coisas e tentei compreender essas situações. Algumas consegui, outras não, então pensei: “te-nho que seguir”. [...] Chego até aqui com a intenção de continuar buscando através da pesquisa nesse mestrado profissional em Ensino de Matemática. [...] Gostaria de continuar essa conversa – se conseguir participar desse programa

–, pretendo desenvolver um projeto que associe a pedagogia e a matemática; ainda tenho muito para compreender, mas tenho vontade de conviver com essa relação pedagógica. Ainda não dei aula “oficialmente”, mas hoje me sinto mais à vontade para iniciar uma carreira docente.

A história é objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas o tempo saturado de ágoras (BENJAMIN, Walter).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos constatar que, mobilizadas pela escuta dos egressos – alguns já professores dentro dessa nova configuração curricular, de um estágio cur-ricular supervisionado a partir da metade do curso –, que em outros trabalhos de pesquisa de Fernandes (2004, 2005b) já sinalizavam para outra relação com prática, a partir de depoimentos de pró-reitores de graduação, de coorde-nadores de curso e de professores das instituições formadoras, nesse caso, as universidades.

Dessa forma, com a perspectiva de trazer as narrativas dos professo-res iniciantes – que são os egressos de nossa universidade –, algumas situa-ções foram desveladas, nas quais a memória é trazida pela força do vivido, com emoção, insegurança e saudade, sem que tenhamos a preocupação de explicá-las. Temos apenas a pré-condição de compreendê-las como os ágo-ras, saturados de tempos, que retornam como espaço produtor de pensamento.

3 Logo depois da morte de Hipátia, a matemática entrou num período de estagnação. Somente depois da Renascença foi que outra mulher escreveu seu nome nos anais da matemática: Maria Agnesi. Ela nasceu em Milão, em 1718, e, como Hipátia, era filha de um matemático. Ela foi reconhecida como uma das me-lhores nessa área da Europa e ficou particularmente famosa por seus tratados sobre as tangentes às curvas. Em italiano, as curvas são chamadas versiera, palavra derivada do latim vertere, “virar, mas esta palavra também é uma abreviação de aversiera, ou “esposa do diabo”. Uma curva estudada por Agnesi (Versiera Agnesi) foi traduzida erradamente para o inglês como “a bruxa Agnesi” e, em pouco tempo, a matemática era chamada pelo mesmo título.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 443

Conforme diz Benjamin (1994, p. 229), “A história é objeto de uma constru-ção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas um tempo saturado de

‘ágoras’” [grifo dos autores]. Para além dos saberes da prática, dos quais demonstram carência, há

muitos outros saberes presentes na cotidianidade escolar que são fundamen-tais para o processo de formação desse professor e que pela natureza de que são constituídos, somente podem ser percebidos na vivência na escola.

Nesse contexto, acreditamos que é possível investir em uma episte-mologia da prática, especialmente quando ouvimos de egressos que é preciso trabalhar mais com a prática na prática. Assim percebemos indícios de uma possibilidade de reinvenção na formação inicial de professores.

Afirmamos que é preciso compreender, pela história e pela cultura na qual nos produzimos e somos produtores do que nos produz (VIEIRA PINTO, 1969), que o conceito de qualidade se assenta nas condições concretas da mate-rialidade do mundo da vida e do trabalho, sendo produzidas, principalmente, nos espaços de contradição. De modo geral, não se exercita uma antropologia refle-xiva que questione as finalidades da ciência e da existência para uma compreen-são filosófica da profissionalidade que constitui o ser professor. Outras concep-ções de conhecimento e de seus modos de produção se entranham nas práticas cotidianas, porque incidem nos saberes/conhecimentos considerados válidos, que são oriundos do campo legal, do campo científico e do campo profissional.

REFERÊNCIAS

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EIXO TEMÁTICO V DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE

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A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE PROFESSORES NA REGIÃO CENTRO-OESTE DO BRASIL

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza Solange Martins de Oliveira Magalhães

A base empírica deste artigo é a pesquisa denominada “A produção acadêmica sobre os professores/as – um estudo interinstitucional

da Região Centro-Oeste”. Além dessa base, fundamenta-se em parte significa-tiva da literatura contemporânea sobre o professor e tem como objetivo básico discutir a produção acadêmica sobre o professor na Região Centro-Oeste, des-tacando os seguintes aspectos: formação, profissionalização e prática docente.

Mesmo que a base empírica do trabalho seja a região Centro-Oeste, avaliamos que as conclusões a que temos chegado podem ser ampliadas para boa parte da pesquisa acadêmica sobre o tema, que se desenvolve no Brasil.

Este texto delineia traços gerais da pesquisa interinstitucional, eviden-ciando seu universo e seus objetivos, em seguida faz uma apresentação e uma análise gerais dos dados com base nos tópicos da “ficha de análise”.

A formação e a atuação docente tornaram-se temas recorrentes nos programas de pós-graduação, especificamente, nas linhas de pesquisa volta-das para o estudo do professor. O professor tem sido foco também dos discur-sos e normas oficiais. Estas, por sua vez, têm se manifestado ora sob a forma de diretrizes nacionais, ora de reformulações e providências locais que, das mais despretensiosas às mais significativas, buscam intervir na formação (ini-cial e/ou continuada) e na atuação desse profissional.

O destaque ao professor tem ocorrido, como nunca antes visto, tam-bém nos meios de comunicação, principalmente em revistas de grande cir-culação. O enfoque mais comum é a cobrança de novos papéis à escola, de novas aprendizagens que os professores precisam garantir aos alunos e múl-tiplas competências que têm de desenvolver para lidar com o imprevisível que, às vezes, envolve condutas muito inusitadas para um processo educativo. Contudo, tais condutas vão se familiarizando também na sala de aula, por já terem se tornado familiares na sociedade.

Tratando-se especificamente da produção acadêmica, mesmo que seja consensual o seu aumento em relação ao professor (DIAS-DA-SILVA, 2005), parece que ainda sabemos pouco a respeito do modo como, efetivamente, esse profissional aparece nesses estudos. A discussão entabulada neste artigo se inse-re nesse amplo contexto de destaque ao professor, de ampliação, mas também de dúvidas a respeito de se e como o professor efetivamente aparece nessa produção.

A “Pesquisa interinstitucional sobre o professor”, da qual participa-mos, procura dar respostas à questão sugerida há quase duas décadas por Warde (1990): se e como a atual produção acadêmica sobre esse tema está

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contribuindo para o avanço do conhecimento científico e para a melhoria dos processos e das práticas educacionais. Daí seus objetivos: a identificação, or-ganização e catalogação da produção sobre o professor no período de 1999-2005; o conhecimento da produção e de seu efetivo significado para melhoria da formação do professor e da educação escolar brasileira; a constituição de espaços interativos para promoção do intercâmbio de dados e informações entre os pesquisadores da área na Região; a contribuição para os trabalhos de orientação de estudos, pesquisas e publicações nos referidos programas.

Como se refere a um trabalho de uma ampla equipe1 que investiga um também amplo universo de produção sobre o professor, a recriação da metodologia de trabalho tem sido uma constante no decorrer desse processo investigativo. O que tem possibilitado criar uma relação dialógica entre os participantes, favorecendo o debate e o crescimento mútuos entre universida-des de uma região que, cada vez mais, por diversos fatores socioeconômicos, tem se destacado no cenário nacional.

Nossa opção é por estudar o professor. Essa não é uma opção casual e gratuita. Segundo Schön (2000), delimitar uma problemática implica escolher e nomear aspectos que serão levados em conta, baseando-se nos antecedentes disciplinares, papéis, histórias passadas, interesses e perspectivas econômicas e políticas. Assim, a definição do tema “professores(as)” como problema é uma maneira de apresentar uma visão do mundo. Atualmente, esse tema está presente tanto entre os que defendem sua reformulação no sentido de modi-ficar a atuação dos(as) professores(as), para adaptá-la às novas exigências do capital, quanto entre aqueles que são contra essas adaptações, uma vez que se preocupam não só com a quantidade, mas também, e sobretudo, com a quali-dade dessa atuação.

Diferentemente da maioria dos estudos caracterizados como “estado da arte”, optamos por ler não só os resumos, mas o texto completo das disser-tações, pois verificamos que, na sua maioria, as informações veiculadas pelos resumos não traduzem o trabalho desenvolvido pelos discentes e não fornecem elementos consistentes para a investigação. Com base nessa leitura integral, as obras são analisadas, catalogadas e discutidas em cada grupo que compõe a pesquisa. As categorias de análise utilizadas na avaliação desses trabalhos estão consolidadas em uma “ficha de análise” comum a todas as equipes. As equipes utilizam uma “ficha de análise” como instrumento comum para orien-tar e registrar as leituras das dissertações.2 A formação, a profissionalização e a prática docente são, digamos, as chaves de entrada ou de escolha das dis-sertações a ser lidas. Contudo, essa ficha possibilita a coleta e a construção de outros dados, como os procedimentos e tipos específicos de pesquisa referen-ciais teóricos, ideário pedagógico e método utilizado,objetivos e resultados.

1 Atualmente, participam da pesquisa: 21 professores pesquisadores, 23 pesquisadores colaboradores (alunos e ex-alunos de pós-graduação) e 15 bolsistas de iniciação científica.2 Até o ano de 2005 não havia teses de doutorado defendidas nos programas da Região.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 449

Os resultados que passamos a apresentar referem-se a todos os tra-balhos selecionados: 72 na UFG, 90 na UFMT, 40 na UFU, 34 na UFMS, 33 na UNIUBE e 83 na UnB. Levando-se em consideração os limites de espaço deste artigo, faremos uma breve apresentação e análise dos dados da primeira fase da pesquisa.

Com referência aos tipos de pesquisa, nota-se grande predominância de pesquisas empíricas na produção sobre o professor da Região Centro-Oeste, seguindo tendência constatada também por André et al. (1999), Brzezinski e Garrido (2001) e Toschi et al. (2003). Quanto aos tipos específicos de pesqui-sa, os dados mais recorrentes foram: estudo de caso, pesquisa etnográfica e pesquisa histórica. O tipo de pesquisa é um dos “temas de aprofundamento”3 que estamos realizando na segunda fase da pesquisa. O objetivo é tentar apri-morar a análise e, assim, elucidar tais aspectos.

Em relação aos procedimentos de pesquisa, a coleta de dados tem se concentrado no uso conjunto de diversas técnicas e procedimentos, especial-mente na combinação de entrevista, aplicação de questionários, observação e análise de documentos. Essa combinação está intrinsecamente relacionada à predominância de pesquisas do tipo qualitativa em toda a produção anali-sada na Região. Outros procedimentos utilizados em menor escala foram: a aplicação de testes (3,33% – UFMT), o uso de pesquisa bibliográfica (8%

– UFG; 2,5% – UFU; 22,89%), o grupo focal (2,67% – UFG; 2,5% – UFU). Há também alguma inovação quanto à utilização de instrumentos. Aparecem, mesmo que sem grande frequência, a utilização de jogos, brincadeiras, dese-nhos, fotografias, histórias, ilustrações, dinâmicas, filmagens, gravações de programas televisivos, dentre outros.

Acerca dos referenciais teóricos mais utilizados, consideramos o en-tendimento de Lenoir (2006, p. 306), no qual o processo de pesquisa exige ri-gor na investigação, devendo “ser crítico, reflexivo e responder às exigências das estratégias de verificação em uso. A teorização que resulta da pesquisa e que a sustenta deve estar relacionada a teorias reconhecidas”. Nesse sentido, tem sido feito um levantamento dos autores mais utilizados nas dissertações que subsidia a análise da pertinência do suporte teórico em relação ao tema, ao método e ao ideário pedagógico trabalhado.

Em análise da produção destacam-se como principais teóricos utiliza-dos: Antonio Gramsci, Karl Marx, Paulo Freire, Lev S. Vygotsky, Gimeno J. Sacristã, M. Thillent, M. Manacorda, Robert Bodgan, Gaudêncio Frigotto e José Carlos Libâneo. Contudo, a análise dos referenciais teóricos ganha sen-tido quando referendada por outras informações, como o tema para o qual se

3 A partir do desenvolvimento da pesquisa, foram estabelecidos alguns temas a serem aprofundados pe-las várias equipes de pesquisadores. Assim, o tema “referencial teórico, associado a palavras-chave” foi as-sumido pela UFMS, como tema de aprofundamento; o item “temas estudados” ficou a cargo da UNIUBE; a equipe da UFG se incumbiu da questão “método”; os itens “concepção de educação” e “concepção de professor” ficaram sob responsabilidade das equipes da UFU e da UnB, respectivamente.

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recorreu a cada autor, as obras que foram utilizadas de cada um, o ano das publicações, a apropriação que os pós-graduandos têm feito das ideias desses autores.

Quanto ao ideário pedagógico, percebemos que os autores das disser-tações e teses sobre professores têm se preocupado em esclarecer a concepção que têm sobre a educação e sobre o ser professor. Os trabalhos apresentam com clareza a concepção crítica de educação e de professor. Mesmo que em alguns trabalhos tais concepções tenham ficado pouco explícitas, exigindo que o próprio leitor se esmere para identificá-las, apenas um trabalho não foi possível identificar a concepção de educação. Apesar de se tratar de ape-nas um trabalho, a equipe avalia que deficiências como essa devem merecer atenção dos programas e orientadores, uma vez que se trata de uma produção (dissertação) sobre a educação e, especificamente, sobre o professor. As con-cepções de professor e de educação também estão sendo aprofundadas pela equipe.

A equipe da UFG ficou incumbida de aprofundar o tema “método”. Para tanto, elaborou-se – com a participação de todas as equipes – uma “fi-cha de aprofundamento”, visando subsidiar e ampliar esse processo de estu-do do método. Essa ficha contempla as concepções de método vinculado ao Materialismo-Histórico-Dialético, à Fenomenologia e ao Positivismo.

Tanto a pesquisa de André et al. (1999 e 2001) como a de Toschi et al. (2003) apontam a existência de problemas em relação ao método, sobretudo quanto à dificuldade do posicionamento conceitual, bem como quanto à clare-za no trilhar metodológico da pesquisa em educação. Em nosso caso, as análi-ses indicaram que os trabalhos da Região Centro-Oeste apresentam caracterís-ticas diferentes em relação ao método. Apesar das dificuldades na adequação de algumas pesquisas ao rigor metodológico, a produção do Centro-Oeste tem utilizado preferencialmente o método fenomenológico, sendo 55% na UFMT, 71% na UnB, 50% na UFMS, 27% na UFG, 27% na UFU e 0% na UNIUBE; seguido do materialismo histórico dialético, sendo 90% na UFG, 40% na UFMT, 28% na UnB, 12% na UFMS, 27% na UFU e 33% na UNIUBE. Esses dados estão em coerência com o ideário pedagógico identificado. Setenta e nove por cento dos trabalhos analisados destacaram a concepção crítica de educação e de professor. Consideramos importante ressaltar ainda que os tra-balhos, em sua maioria, tiveram como orientadores pesquisadores ligados a linhas críticas de investigação, perspectiva que propõe um olhar sobre a so-ciedade em que o embate por hegemonia se faz estruturante dessa realidade, por refletir o resultado da contraposição de forças sociais em sua evolução histórica, aspectos que denotam coerência com a escolha dos métodos.

De uma maneira geral, os trabalhos desenvolvidos nas perspectivas críticas em educação partem da visão de que a sociedade atual se estrutura sobre relações de dominação de uma classe social sobre outra e de determi-nados grupos sociais sobre outros, preconizando a necessidade de superação

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 451

dessa sociedade. Com esse objetivo, as perspectivas críticas procuram enten-der como e com que intensidade a educação contribui para a reprodução das relações de dominação. O principal ponto em comum dessas perspectivas é a necessidade de superação da organização societária atual, isto é, a superação da sociedade regida pelo capital.

De acordo com Gatti (2001), esse ponto em comum de forma nenhu-ma significa que não sejam grandes e fundamentais os pontos de divergência e domínio dessas teorias, sobretudo em relação ao método. Algumas fragili-dades encontradas na utilização dos métodos levam-nos a questionar, como Gatti, se há um domínio consistente de métodos e técnicas de investigação, qualquer que seja a abordagem em que o pesquisador se situa.

Há razões suficientes para afirmar que a pesquisa tem corroborado o entendimento da tarefa conjunta, baseada na compreensão, decisões demo-cráticas e comunicação aberta para a avaliação do processo. As ações devem ser sempre baseadas na práxis, que concentra-se na ação comprometida da teoria e da prática no trabalho investigativo, ou seja, dentro da própria prática o grupo tem reconstruído uma interpretação da ação e consequências, con-textualizando-se como uma espiral autorreflexiva de ciclos de planejamento, ação, observação, avaliação e reflexão. Por outro lado, a pesquisa coletiva tem promovido o desenvolvimento profissional, via compromisso dos mem-bros do grupo, o que tem gerado condições para estruturar o projeto (tempo, espaço e apoio), com metas claras, e compartilhamento de um marco teórico, o que permite sucessivas melhorias para a prática investigativa no campo de formação de professores.

Como já foi dito, as dissertações são selecionadas com base em três descritores bem gerais, que denominamos de categorias temáticas: forma-ção, profissionalização e prática docente. A categoria temática mais estudada tem sido a prática docente, com notável expressividade. Em seguida, temos a formação docente. Já o tema da profissionalização aparece como o menos investigado nessa produção.

Nas dissertações que estudam a formação, investiga-se em qual mo-dalidade formativa se concentrou o estudo. Esses resultados revelam que o foco das pesquisas acadêmicas produzidas na FE/UFG é formação inicial. Detalhando um pouco mais, constatamos que a maior parte das dissertações na UFG, na UFMT e na UFMS que versam sobre formação tem como tema de maior interesse a modalidade inicial de formação; enquanto na UNIUBE e na UnB o enfoque está na formação continuada. Comparando esses resulta-dos com pesquisas anteriores realizadas no Brasil, percebemos que os dados de nossa pesquisa confirmam, parcialmente, a tendência mostrada por André et al. (2001), Brzezinski e Garrido (2006), Toschi et al. (2003) e Souza et al. (2008a; 2008b). Nas pesquisas desses autores predominam a formação ini-cial e a formação continuada, como modalidades mais comuns de pesquisas, quando o tema é o professor(a).

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As pesquisas que têm como foco a prática docente são 65% na UFG; na UFMT, 60%; na UFMS, 72%; na Uniube, 63%; na UnB, 67%. Para analisar a prática docente, enquanto categoria deste estudo, tomamos como referência os estudos de Sacristán (2002, p. 82). Concordamos com o autor quando afir-ma que a prática docente está entrelaçada à profissionalidade e à formação do professor, permeando, enquanto práxis, toda a vida do sujeito. A prática, então, vai além do saber-fazer, relacionando-se a demais esferas da docência. Nesse entendimento, a prática não se reduz às ações de sala de aula, nem tampouco às atividades cotidianas dos professores, até porque essas ações inserem-se em uma cultura de práticas consolidadas, em uma espécie de “capital cultural”.

Na categoria profissionalização estão incluídas três subcategorias: sindicalização, ação coletiva e identidade profissional. Na UFG, identifica-mos que 35% dos trabalhos têm como tema a profissionalização. Dentre esses predominam estudos sobre identidade profissional (68%), seguidos pelos de ação coletiva (19%) e sindicalização (12%). Na UFMS, 24% da produção se refere à profissionalização, porém todo o conjunto versa sobre identidade profissional, não havendo trabalhos sobre sindicalismo ou ação coletiva. Na UFU não há trabalhos sobre sindicalização, apenas sobre identidade profis-sional e ação coletiva (8%). Na UFMT, 8,9% dos trabalhos versam sobre a profissionalização. Nesse conjunto, a sindicalização como a ação coletiva são pesquisadas em 12,5% dos estudos, enquanto que a identidade profissional abrange 75%. Na UnB, 9% dos trabalhos referem-se à profissionalização e todos tratam da identidade profissional. Na UFG, a profissionalização é tema de 26% das dissertações analisadas, sendo 9% sobre o subtema sindicalização e 12% sobre ação coletiva. Pode-se afirmar que o tema profissionalização é o menos explorado em toda a Região Centro-Oeste, e dentro desse o subtema sindicalização é o que menos foi trabalhado.

A partir do ano 2011, o grupo constituiu-se como Redecentro-Rede de pesquisadores sobre professores do Centro-Oeste, que se propõe a dar pros-seguimento à pesquisa relatada e consolidar a Rede, criando um “Centro de referência sobre professores para pesquisadores nacionais e internacionais”. Esse Centro será interligado às universidades que compõem a Rede, como espaços que recebam professores-pesquisadores, mestrandos, doutorandos, pós-doutorandos, professores das redes, bolsistas de iniciação científica, para atividades de formação continuada, desenvolvimento de pesquisas e estudos, congressos e seminários. São nossos objetivos: fortalecer a produção dos Programas de Pós-Graduação em Educação da Região Centro-Oeste; consoli-dar e ampliar o caráter cooperativo da Rede de pesquisadores, ampliando seus estudos e diálogos com outras redes nacionais e internacionais; promover a criação de disciplinas que aprofundem esses estudos nos programas de pós-

-graduação nas diferentes instituições que compõem a REDE; publicizar os processos e resultados obtidos a partir de publicações em eventos nacionais e internacionais, em livros e na rede digital. A pesquisa tem caráter formativo e cooperativo.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 453

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DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA: ALGUNS ACHADOS SOBRE A FORMAÇÃO CONTINUADA DESSE

PROFISSIONAL

Vanessa Alves da S. de Vasconcellos Valeska Fortes de Oliveira

C om o intuito de contribuir no campo da pedagogia universitária e para as discussões em relação à formação continuada do pro-

fessor de Ensino Superior, apresentamos este trabalho que origina-se de uma pesquisa de mestrado na qual seu principal objetivo é se aproximar e conhecer as significações dos professores universitários da Universidade Federal de Santa Maria, em relação ao seu processo formativo. Para isso, foi acompanha-do no segundo semestre do ano de 2009 o I CICLUS (Programa Institucional de Formação e Desenvolvimento Profissional de Docentes e Gestores) dessa universidade.

Pensando a formação de professores como um processo singular, res-saltamos Oliveira (2005) ao afirmar que a formação acontece ao longo da vida, em tempos e espaços diferenciados, e até mesmo nos processos de escolariza-ção, na condição de aluno, com experiências positivas e negativas que fazem a diferença na construção de uma representação do professor. E quando nos reportamos à formação, pensamos esta na mesma perspectiva de Ferry (2004, p. 54) quando diz que “ninguém forma o outro”. Não podemos dizer que re-cebemos uma determinada formação, pois esta não se recebe, o indivíduo se forma sozinho e é ele que encontra a sua forma.

Nóvoa (1995), no prefácio do livro de Josso (2004), defende que nin-guém forma ninguém e que pertence a cada um transformar, ou não, em for-mação, os conhecimentos que adquire ou nas relações que estabelece em seu cotidiano. Dessa forma, compreendendo a formação como um trabalho de re-flexão sobre os percursos de vida, destacamos os processos formativos e como os colaboradores foram se construindo professores durante sua trajetória.

Ainda nesse ideal de formação, o momento da entrevista proporcio-nado aos docentes que colaboraram na investigação oportunizou um espaço/tempo para que esses sujeitos pudessem, por meio de suas narrativas, fazer uma retrospectiva de sua participação no programa CICLUS, tomando cons-ciência das aprendizagens construídas ao longo dos encontros.

Acompanhar e perceber como os encontros do CICLUS estavam im-plicando os professores que dele participaram, compreender as expectativas diante do programa e saber quais as aprendizagens construídas foram algumas questões que tiveram um enfoque nas entrevistas e possibilitaram ao profes-sor fazer uma reflexão sobre o percurso formativo construído ao longo dos encontros.

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456 VASCONCELLOS, V. A. S. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

O destaque dado ao programa CICLUS nesta pesquisa quer evidenciar que se torna imprescindível dar atenção às questões de formação pedagógica do professor de Ensino Superior, com a intenção de qualificar a formação con-tinuada desses docentes, bem como o ensino que é oferecido nas instituições de Ensino Superior.

Oliveira (2006), com seus estudos e pesquisas, contribui na defini-ção do termo “processo formativo” e afirma que os processos formativos são contínuos. De acordo com suas pesquisas, que trazem narrativas e utilizam o trabalho com a memória, nos primeiros anos como professor as referências que este se ancora são as imagens, as posturas e as atitudes de professores que ficaram em sua lembrança.

Considerando esta pesquisa, e os professores que dela fizeram parte, observamos que os relatos que resultaram desta investigação revelam saberes carregados com ricas experiências, comportamentos, valores e posturas, pro-porcionando ao professor a reconstrução das imagens da/na docência. Assim, quando esses docentes depararam-se diante da docência universitária relatam que foram constituindo-se nessa profissão, tendo como base suas experiências como alunos, referenciais de professores que lhes produziram marcas em sua vida escolar, na graduação e, também, na pós-graduação. As falas a seguir evidenciam esta questão:

Então talvez essa formação (pedagógica), a gente tenha ela intrínseca, não sei é uma coisa interessante, de ver teus professores, são dez anos junto com professores, então tu aprende ser professor talvez por observação, de talvez criticar e olhar, eu não faria isso ou faria assim, esse tipo de aula eu faria diferente e isso vai incorporando no teu, vamos dizer assim, no teu cabedal, dentro das coisas que tu vai se tornando, tu torna-se professor por observação (Professor A).

Porque eu não tive formação nenhuma para o ensino, o que eu aprendi foi com a minha mãe, foi com os professores antigos que eu tive, que a gente con-versa e observa. Assim o que eu gostava num, eu repito e o que não gostava eu procuro não fazer (Professor B).

Essa reconstrução, provocada pela memória e pelo processo narrativo, permite aos docentes afirmarem suas referências, em uma reflexão e reorgani-zação da sua identidade profissional. Dessa forma, percebe-se esta como um dado mutável, como um processo de construção que vai se constituindo com base no significado que cada professor, enquanto ator e autor, atribui à sua atividade docente.

Pensando nessa identidade e onde acontece a formação do professor universitário, trazemos alguns questionamentos. Onde o professor constrói sua identidade profissional? E ainda mais, onde acontece a formação do pro-fessor universitário?

Partindo desses questionamentos e observando a maneira com que o professor tende a construir a sua identidade profissional, focando, muitas ve-zes, em sua produção científica, pois é por meio dela que esse docente adquire

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 457

méritos acadêmicos, tentamos observar como essa identidade se constrói e se sua formação tende a capacitar esse profissional e trazer as competências que esse contexto, que é a universidade, exige.

As questões legais, no artigo 66 da LDBEN/96 (BRASIL, 1996), esta-belece que para ser professor universitário a formação deve-se dar, prioritaria-mente, em nível de mestrado ou doutorado. Entretanto, os cursos de mestrado e doutorado não são voltados para a docência e, sim, para a formação do pes-quisador. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) recomenda que nos cursos de mestrado e doutorado sejam ofertadas disciplinas de docência, em que o pós-graduando com o seu orientador possa experienciá-la no Ensino Superior.

Diante dessas experiências e dos programas de pós-graduação que tra-zem nos cursos de mestrado e doutorado a disciplina “Docência Orientada”, perguntamos se essa experiência é suficiente para que sejam construídos os saberes necessários para ser um professor universitário e para trabalhar nesse contexto, que apresenta uma conjuntura diferente da escola, um funcionamen-to e alunos também distintos, que apresentam angústias, desejos e culturas diversas.

Ao ingressar na docência universitária, o professor se depara com inúmeros dilemas. Zabalza (2007) constrói uma discussão em torno dessa questão. O primeiro dilema, destacado pelo autor e que é uma das principais características da universidade, é o individualismo/coordenação. A maneira individual de o professor desenvolver o seu trabalho e de construir a sua iden-tidade é uma forte tendência, analisada dentro da universidade. É possível observar essa forte tendência como uma cultura institucional na qual obser-vamos sucessivas subdivisões, instâncias internas que ocasionam um grande isolamento por parte dos professores. É necessária a mudança dessa lógica do individual sobre o coletivo, nos programas, na própria organização de tempo e espaço para buscar uma maior funcionalidade e também no reforço das es-truturas de coordenação que devem se preocupar com o trabalho em grupo.

O segundo dilema discutido por Zabalza (2007) traz a questão da pes-quisa/docência. A cultura universitária sempre direcionou um maior status acadêmico à pesquisa, até transformá-la no componente básico da identidade e do reconhecimento do docente universitário. Pode-se observar no contexto acadêmico que a pesquisa tem um grande incentivo por parte dos professores e que, geralmente, o destino dos investimentos para a formação do pessoal acadêmico é orientado principalmente com esse enfoque.

Não defendemos aqui que o professor universitário não deva realizar pesquisas, mas acreditamos que precisa se preocupar também com sua for-mação para o ensino, com a aprendizagem de seus alunos, com um ambien-te produtor de aprendizagem significativa e não estar preocupado somente com o domínio de seu conhecimento específico a ponto de esquecer o ensinar (ZABALZA, 2007).

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458 VASCONCELLOS, V. A. S. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

Evidenciando a concepção da docência como uma atividade profis-sional que requer conhecimentos específicos e consistentes acerca dessa pro-fissão, em contrapartida é possível constatar no contexto do Ensino Superior uma visão ainda bastante recorrente de que “ensinar se aprende ensinando”. Dessa forma, verifica-se uma visão não profissional da docência, ou seja, não é necessário preparar-se para ser docente, pois essa é uma atividade prática para a qual não são necessários conhecimentos específicos, mas, sim, experi-ência e vocação.

Destacamos a urgência do debate sobre uma epistemologia da experi-ência (DINIZ, 2010) já iniciado na última reunião anual da nossa associação no grupo de trabalho sobre formação de professores e, ainda, no seu artigo, publicado no último número da revista Formação Docente. A proposição de Diniz (2010) é olharmos com atenção para a categoria da experiência, afastan-do nosso debate da contraposição entre teoria e prática na formação docente, e focarmos nosso olhar para a potência da experiência, recuperada a partir de Dewey (2010).

Com base nas narrativas dos professores colaboradores desta pesquisa, observa-se essa realidade ainda bastante latente. O Professor C, ao falar sobre sua atuação docente e como constituiu-se professor, refere que nunca foi pre-ciso ou solicitado uma formação específica para esse trabalho, e que foi com base em suas experiências que foi moldando sua maneira de ser e agir como professor.

Nunca peguei pra ler um livro de didática, nada, nada e nunca foi colocado [...] foi tudo no improviso e eu tentava com os meus valores, com minhas cren-ças, com as minhas experiências e sozinho e deu certo viu, deu certo, não tive problemas (Professor C).

No contexto desses docentes que desempenham seu trabalho no espa-ço da universidade, a não profissionalização da docência é um dado instituído, e as experiências obtidas com professores na visão de aluno, na conversa com seus colegas, na própria prática dentro da sala de aula e o aprofundamento na área específica na qual trabalha são suficientes na atuação como profes-sores. Acreditamos que essas experiências devem fazer parte do repertório de saberes dos docentes e são fundamentais na constituição do ser professor, bem como no reconhecimento de sua professoralidade, mas não são os únicos saberes que devem ser privilegiados.

METODOLOGIA: CAMINHOS QUE FORAM TRILHADOSA abordagem teórico-metodológica Histórias de Vida suscitou e con-

tinua a provocar muitos debates epistemológicos e metodológicos, devido à extrema riqueza do material biográfico que ela produz e de toda sua potencia-lidade nas pesquisas no campo das ciências humanas e sociais.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 459

Essa abordagem biográfica utilizada reforça o princípio afirmado por Nóvoa (2010), segundo o qual é sempre a própria pessoa que se forma, sendo ela o principal ator de seu processo de formação. Sendo assim, o indivíduo deve encontrar estratégias para “tornar-se ator do seu processo de formação, por meio da apropriação retrospectiva do seu percurso de vida” (NÓVOA, 2010, p. 168).

Partindo dessa questão em relação à formação e observando o contex-to da universidade que se afetou pelas mudanças e crises geradas pela moder-nidade, observamos como o papel do professor veio se modificando e o quan-to a busca pela formação foi-se colocando como um processo infindável. Uma das questões que influenciaram esse contexto e, consequentemente, o papel do docente foi a revolução tecnológica, que repercutiu em novas formas de distribuir informação e abalou diretamente a tradicional posição da educação.

Perante esses desafios, é necessário que o professor repense suas práti-cas e busque uma formação continuada. Segundo Cunha (2009, p. 356), diante das “exigências que progressivamente se apresentam para o exercício da pro-fissão impõem o desenvolvimento de habilidades e saberes antes não configu-rados, estimulando novas compreensões sobre o fazer profissional docente”.

Tivemos a oportunidade de acompanhar o programa CICLUS, no qual pretendemos perceber e enfocar a trajetória profissional e os processos formativos dos docentes que participaram dos encontros desse programa e que o buscaram devido aos desafios que encontraram na docência do ensino universitário.

É nessa perspectiva metodológica que este trabalho procurou caminhar. Uma metodologia em que o professor, por meio da construção das narrativas, tivesse um espaço para relatar sua trajetória e seu processo formativo: como está sendo o programa, o que está lhe mobilizando, se está ressignificando posturas, saberes, práticas como docente do Ensino Superior, conduzindo-o a uma reflexão de si, de suas práticas e de sua vida.

Baseando-se na entrevista semiestruturada, por meio de um roteiro de perguntas, que se possibilitou entrar em contato com as narrativas dos professo-res. Esse rico instrumento de pesquisa pode ser um movimento reflexivo, pois a narração de um recorte da experiência vivida pelo entrevistado oferece-o um momento de organização de ideias e de construção de um discurso que é único, pois é dirigido no momento da entrevista e para um determinado interlocutor.

Corroborando as ideias de Szymanski (2008), a entrevista é compre-endida como:

Um encontro interpessoal no qual é incluída a subjetividade dos protagonis-tas, podendo se constituir um momento de construção de um novo conhecimen-to, nos limites da representatividade da fala e na busca de uma horizontalidade nas relações de poder, que se delineou esta proposta de entrevista, a qual cha-mamos de reflexiva, tanto porque leva em conta a recorrências de significados durante qualquer ato comunicativo quanto a busca de horizontalidade (p. 14-5).

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E foi na (re)interpretação das narrativas desses professores colabora-dores com os entrelaçamentos do referêncial teórico estudado que este traba-lho foi sendo produzido e as categorias foram se configurando.

O PROGRAMA CICLUS – PASSOS QUE CONSTROEM O CAMINHO DA PESQUISAO I CICLUS (Programa Institucional de Formação e Desenvolvimento

Profissional de Docentes e Gestores da Universidade Federal de Santa Maria) buscou o incentivo à educação permanente dos docentes e gestores dessa uni-versidade. Esse programa é um movimento de formação que respeita as di-ferentes trajetórias trazidas pelos docentes, de diferentes formações e áreas do conhecimento, enriquecendo as discussões em torno dos desafios que a docência no Ensino Superior apresenta.

O delineamento do programa se deu com a total participação dos pro-fessores que nele estiveram envolvidos, partindo das expectativas desses do-centes, dos desafios que eles encontram na docência universitária para então ser construído um cronograma de atividades e temas a serem abordados, tota-lizando em dez encontros.

Obtendo a oportunidade de observar esse programa, como também os envolvimentos dos professores que neles participam, nos deparamos com docentes que realmente encontram dilemas, que levantam questionamentos diante da docência no Ensino Superior e que buscam no espaço proporciona-do pelo programa CICLUS um lugar para discutir, debater, refletir sobre as práticas que eles desenvolvem enquanto docentes.

Ter a oportunidade de estarmos presente nos encontros que foram pro-postos pelo CICLUS e percebermos como os dispositivos de formação desse programa implicaram os professores, nos possibilitou trabalhar com a metodo-logia de pesquisa-formação desenvolvida por Josso (2004). Essa metodologia propõe que os professores que serão colaboradores desta pesquisa sejam também sujeitos da formação, pois a situação de construção da narrativa de formação se configura como uma experiência formadora, “porque o aprendente questiona as suas identidades a partir de vários níveis de atividade e de registro” (2004, p. 40).

A possibilidade de narrar os momentos nos quais os professores estão vivenciando no programa CICLUS é, de certa forma, contar a si mesmo a própria história. As vivências que estão sendo relatadas, reconstruídas pelo trabalho da memória, mostram recordações lembradas com intensidades par-ticulares e outras que são silenciadas e talvez esquecidas, para que possam dar passagem a outras formas de vida.

Vivemos uma infinidade de momentos que nos marcam, que nos fazem chorar, nos fazem rir, nos tornam fortes ou frágeis, mas certas vivências atin-gem o status de experiências quando fazemos um trabalho reflexivo sobre o que se passou e sobre o que foi observado, percebido e sentido. Concordamos com Josso (2004), quando afirma que:

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 461

Esse modo de reconsiderar o que foi a experiência, oferece a oportunidade de uma tomada de consciência do caráter necessariamente subjetivo e intencional de todo e qualquer ato de conhecimento, e do caráter eminentemente cultural dos con-teúdos dessa subjetividade, bem como da própria ideia de subjetividade (p. 44).

Nem todas as experiências podem ser consideradas significativas, for-madoras e provocadoras de mudanças em atitudes, posturas e ideias. Quando se fala em experiência formadora se fala em provocação de aprendizagem (JOSSO, 2004). É nessa perspectiva metodológica que este trabalho procura caminhar, em que o professor, pela construção das narrativas, tem um espaço para relatar como está sendo o curso, o que está lhe mobilizando, conduzindo-

-o a uma reflexão de si, de suas práticas e de sua vida, bem como (re)signifi-cando posturas, saberes, práticas como docente do Ensino Superior.

A formação, dentro dessa perspectiva metodológica, é vista como autoformação, assim como os processos formativos de cada professor são singulares, pois nesses processos são constituídas experiências, identidades, consciência, subjetividade e saber-fazer. Josso (2004, p. 48) destaca que: “a formação é experiencial, ou então não é formação, mas a sua incidência nas transformações da nossa subjetividade e das nossas identidades pode ser mais ou menos significativas”. Sendo assim é possível observar nesta pesquisa como os dispositivos de formação desse programa estão atingindo os profes-sores e que os mesmos estão sendo significativos em suas vidas.

Souto (1999) acredita que o dispositivo sempre promove criação, mudan-ças, transformação, incrementando a teoria da qual provém. Segundo a autora:

El dispositivo no es consecuencia de la teoría aunque haya sido pensado des-de uma lógica de aplicación. Genera nueva producción a nível de las prácticas sociales en juego (enseñanza, cura, trabajo etc.) avanza em la realización y da lugar a nuevas teorizaciones y a investigaciones (p. 72).

Pensando no programa de formação que estamos acompanhando, o qual apresenta diferentes dispositivos pedagógicos para que os professores universitários estejam refletindo sobre suas práticas docentes e seus proces-sos formativos, observamos que esses dispositivos, partindo da perspectiva do conceito proposto por Souto (1999), se ancoram em teorias acerca da pe-dagogia universitária, mas também podemos observar que reforçam teorias, transformando-as e (re)significando-as.

Diante dos dispositivos apresentados pelo programa, o ambiente moo-dle, que disponibilizou o CICLUS por meio da modalidade a distância, se destaca como uma ferramenta que pretendeu inovar. A plataforma moodle se mostrou como uma potencial ferramenta, que garantiu a participação e o en-volvimento dos participantes.

O interessante do CICLUS foi ter esse apoio do moodle, por que às vezes eu não consigo estar naquele encontro, mas aí tava lá o encontro registrado no moodle, então eu sei, de certa forma, o que vinha acontecendo [...]. Tinha o registro, tinha o rastro, as pegadas dessa caminhada. Eu achei muito interes-sante ter esse acompanhamento dentro do moodle (Professor A).

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462 VASCONCELLOS, V. A. S. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

O programa CICLUS buscou assumir na prática o que já vem se te-orizando por meio da produção científica acerca da Pedagogia Universitária, e os docentes que buscaram o programa, mesmo com uma bagagem de co-nhecimento bastante diversificada e com a formação em distintas áreas, pos-suíam expectativas muito semelhantes, pois a maioria desses professores sentiam a necessidade de formação para trabalharem na docência do Ensino Superior.

Os professores participantes do CICLUS o visualizaram como um espaço de dialogicidade, de ação reflexiva e de aprendizagem colaborativa. Entre suas narrativas, destaca-se:

Acredito que o CICLUS é um espaço para conhecer novas técnicas e talvez seja importante resgatar, principalmente para o professor que entra novo na universidade, quais as normas da universidade, o que tu tem que fazer e como tu preenches um caderno (Professor A).

Na perspectiva do colaborador C, o CICLUS, a princípio, foi visto como algo necessário a cumprir devido ao seu estágio probatório, por isso entrou no programa, com a maioria dos professores novos que também in-gressaram no mesmo ano que ele. Quando ele descobriu ser um programa de formação docente ficou bastante entusiasmado, pois sempre sentiu necessida-de de participar de cursos que enfocassem os aspectos pedagógicos, já que em sua formação nunca foi dado um espaço no sentido dessas questões. No relato a seguir, podemos visualizar essas questões:

Achei interessante quando descobri que era um Programa de formação do-cente, eu já sabia que eu precisava disso, pois eu não tinha essa formação. Sentia necessidade, mas nunca sobra tempo. Então era um negócio que a prin-cípio era obrigado, mas eu fui de bom grado pra ver o programa. Então minha expectativa lá no CICLUS foi de fato com que eu pudesse ter um conhecimento, me aprofundar na questão da didática, que é uma qualificação que eu nunca tive (Professor C).

Diante dos relatos dos professores, quanto ao desabafo de sua necessi-dade de formação na direção dos aspectos pedagógicos, constatamos o quanto a Pedagogia Universitária se torna um campo emergente, que deve inserir-se nos espaços acadêmicos, identificando sua fragilidade e assumindo sua neces-sidade de alcançar uma nova reconfiguração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: AMPLIANDO OS HORIZONTES SOBRE A PEDAGOGIA UNIVERSITÁRIANeste momento, trazemos algumas considerações finais, partindo dos

desafios que os professores universitários trazem e que o programa CICLUS oportuniza em um espaço de trocas e de discussões. Diante dessas questões, e por entre as trajetórias e os processos formativos dos colaboradores, a grande marca percebida é que todos detectam a contradição que existe entre a for-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 463

mação exigida para se atuar na docência universitária, resultando em gran-des desafios enfrentados em seu cotidiano. Esses professores relatam que se constituíram nessa profissão tendo como base suas experiências como alunos, tendo como referências os docentes que lhes produziram marcas em sua vida escolar, na graduação e também na pós-graduação.

Percebemos nas narrativas a consciência por parte dos docentes de que “ensinar se aprende ensinando”, e as experiências obtidas com professo-res na visão de aluno, na conversa com seus colegas, na própria prática dentro da sala de aula e no aprofundamento da área específica na qual trabalha são suficientes para atuação na docência. Observamos a necessidade de que se (re)signifique esses saberes construídos na experiência, à luz de teorias, refle-xões e no entrelaçamento com outros saberes, que permitam a construção de uma maneira de ser e agir na profissão própria da pessoa que a exerce.

Ao contemplar o processo de construção de ser docente, queremos aqui defender uma identificação com a profissão, que considera a docência como uma atividade que possui uma gama de conhecimentos e condições específicas para seu exercício. E para além dessa identidade, busca-se com-preender que essa constituição do ser professor acontece na trajetória pessoal e profissional ao longo da história de vida, dentro de um processo que, expe-rimentando e refletindo sobre a prática, produz um modo de ser singular na profissão.

Percebemos o quanto a iniciativa do Programa CICLUS é necessária dentro das universidades, visto que os desafios são grandes e tão complexos que, muitas vezes, os professores ingressantes no ensino universitário não se encontram preparados, tendo que enfrentar as dificuldades sem a formação necessária para isso. Acreditamos que a universidade é, em princípio, um es-paço de formação dos professores da educação superior, garantindo a possibi-lidade de ações formativas.

Na tentativa de definir esses termos tão utilizados na pesquisa educa-cional – espaço/lugar/território –, Cunha (2008) acredita que para se transfor-mar em lugar, os espaços têm que ser preenchidos a partir dos significados de quem os ocupa, ou seja, o sujeito que ocupa esse espaço tem que atribuir um sentido a ele. Nessa perspectiva é que analisamos o CICLUS, percebendo as discussões e interesses dos participantes que estão nesse espaço por vontade própria, sem imposição de leis e de regras, mas por grande interesse e vontade de discutirem as questões da docência universitária e do Ensino Superior.

Podemos observar que esse programa está oportunizando um espaço de convivência entre os professores, de partilha de saberes que eles constro-em durante sua profissão, bem como de angústias geradas pelos desafios da docência universitária. Verificamos o quanto esse programa busca a iniciativa de mudança da cultura do professor universitário, que é pautada em uma ló-gica individual, devido a sucessivas subdivisões que afastam um professor do outro.

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464 VASCONCELLOS, V. A. S. et al. - DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA

Sinalizando para a importância do trabalho formativo em serviço, considerando a constituição de rede de interações e mediações para a efetiva construção de conhecimentos pedagógicos, Isaia e Bolzan afirmam que:

A constituição dessa rede se faz à medida que se instaura o processo de trocas entre os pares como elemento preponderante nesta construção coletiva [...]. Assim, a partir de sua constituição, podemos observar que a construção de conhecimento pedagógico é favorecida, considerando que sua reorganização acontece por meio de um trabalho coletivo e sistemático, ou seja, de forma compartilhada (2009, p. 170).

Dentro da lógica que consideramos o Programa CICLUS como um espaço provocador de experiências formadoras, está tendo sentido, implican-do os professores que neles participam. Em consonância com esse movimento formativo, evidenciamos espaços como este que permite a desconstrução da ideia de que o professor universitário é um profissional de um único saber específico e provoca a construção da consciência de que esses docentes são profissionais do ensino e precisam constantemente refletir sobre sua prática, rever suas ações, evidenciando a necessidade de formação a todos aqueles que se aventuram na profissão docente.

REFERÊNCIAS

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 465

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RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS DA INICIAÇÃO CIENTÍFICA: UM ESTUDO

EM CURSOS DE LICENCIATURA

Marja Leão Braccini

A s tendências contemporâneas para formação docente indicam uma diversidade de abordagens sobre professor pesquisador

e parece que é recorrente a aceitação da pesquisa como parte da formação para uma boa prática docente. Compreender se (e em que sentido) a Iniciação Científica faz parte desses espaços que qualificam a formação de professores parece ser interessante.

Este estudo busca investigar a contribuição (ou não!) da Iniciação à pesquisa, como componente da formação inicial, e seus impactos na docên-cia. Para tanto, nos propomos a escutar egressos dos programas de Bolsas de Iniciação Científica (BIC)1 – para perceber como eles ressignificam essa expe-riência no exercício da docência e os saberes a partir daí produzidos. Também planejamos ouvir os professores orientadores dos bolsistas sobre essa questão. Esta pesquisa está sendo realizada como requisito parcial ao título de Mestre em Educação em uma universidade privada no sul no Brasil.

Partindo da própria experiência da autora, é possível perceber o quan-to os saberes produzidos enquanto iniciante à pesquisa foram significativos para o exercício da docência. A participação enquanto BIC possibilitou uma maior reflexão sobre a educação contemporânea, o papel do professor e a importância da formação continuada e a reflexão constante sobre a prática.

Porém os projetos/programas de Bolsas de Iniciação Científica têm como objetivo principal a inserção (desde a graduação) em pesquisas cientí-ficas para encaminhar o graduando aos cursos de mestrado e doutorado, for-mando pesquisadores (CNPq, 2010). A docência não é um foco prioritário dos programas de IC.

De certa forma, poder-se-ia se pensar que o licenciando deveria estar fazendo estágios na sua área e não usar seu tempo para Bolsa de Iniciação à Pesquisa, pois essa poderia retirar dele a possibilidade de adentrar mais no seu curso e de ter experiências docentes antes da conclusão da formação inicial.

Em uma observação baseada no senso comum, pode-se crer que o bolsista é aquele que somente carrega os livros dos pesquisadores, lava tubos de ensaio, faz transcrições etc. Poderiam essas atividades ou esses espaços ser significativos para construção de saberes docentes? A iniciação em pesquisa científica estaria auxiliando aos licenciandos a construírem saberes docentes?

1 Bolsista de Iniciação Científica

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BRACCINI, M. L. - RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS 468

Rodrigues (2010, p. 88), em pesquisa realizada com professores em início de carreira, destacou, com base na contribuição dos seus interlocutores, a Iniciação Científica como uma etapa importante na formação e um espaço de construção de saberes docentes. Os entrevistados “comentam que ter sido Bolsista de Iniciação Científica foi um diferencial na formação e consequen-temente um importante aspecto para construção dos seus saberes docentes”. Essa afirmativa encontrou eco em outras experiências, mas não com indicado-res mais sistematizados que pudessem produzir uma visão mais abrangente do tema. Essa condição estimulou um aprofundamento da questão, percebendo a valorização que alguns autores já vinham fazendo a respeito.

A importância da pesquisa por meio dos Programas de Iniciação Científica foi destacada por Calazans como um espaço de formação docente, porque a

inserção de alunos de graduação nos grupos mais estruturados de pesquisa, vin-culados a programas de pós-graduação, e que tratem o ensino, a pesquisa e a ex-tensão de modo indissociável, tem se constituído em uma das possibilidades de formação de docentes para escola básica imbuídos de um espírito investigativo, imprescindível às necessidades que se impõem a uma educação de qualidade (CALAZANS, 2002, p. 138).

Para essa autora, a participação enquanto BIC possibilita ao futuro professor o exercício do espírito investigativo que na escola pode refletir-se em ações voltadas para melhoria da qualidade da educação.

Freire (1996, p. 29) diz que “não há pesquisa sem ensino e ensino sem pesquisa”. Para ele, a atitude investigativa faz parte do trabalho docente, que envolve um movimento constante de investigar em um processo formativo:

Enquanto ensino, continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, conta-tando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade (FREIRE, 1996, p. 29).

Freire alerta que a pesquisa não pode ser separada das “atribuições” do professor na contemporaneidade. Por meio dela, o professor melhor com-preende e qualifica o ensino. Também Enriconi (2008, p. 81) contribui nessa direção, afirmando que a pesquisa pode ser realizada pelo professor para “me-lhor compreender, viver e avaliar seu ensino”. A autora destaca que o profes-sor não precisa somente aguardar resultados de pesquisas de outros, pode ele mesmo estudar e analisar seu cotidiano.

A pesquisa pode ser identificada como fonte de atualização do profes-sor, seja do docente em exercício ou durante a sua formação. Freire (1996) alerta para que o professor não seja apenas um consumidor de pesquisas, mas que ele mesmo tenha uma leitura crítica sobre os temas em questão.

Durante os cursos de licenciatura, a pesquisa tem sido inserida como componente da formação docente. Mesmo que com iniciativas ainda tímidas, essas atividades fazem parte do cotidiano desses cursos.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 469

Crê-se que a inserção à pesquisa pode auxiliar na atualização do pro-fessor, pode desenvolver uma atitude investigativa fazendo com que o docen-te busque continuar pesquisando e também pode favorecer outra forma de ensinar: ensinar pesquisando com os alunos. Essas questões nos levaram a desenhar o principal problema desta pesquisa: a experiência como Bolsista de Iniciação Científica nos cursos de licenciatura interfere na condição docente dos professores que atuam na Educação Básica?

Estamos buscando compreender se os saberes construídos na pesquisa científica durante o curso de formação inicial impactam no trabalho docente. Para tal, tomamos o problema a partir do ponto de vista de quem já passou pelo processo de Iniciação à Pesquisa e exerceu/está exercendo a docência. Para tanto, levantamos algumas questões auxiliares:

• Como os egressos dos cursos de licenciatura ressignificam a experiência de bolsistas de IC que tiveram na sua formação?

• Que motivações estimularam essa trajetória?• Que aprendizagens e saberes indicam como principais na sua

experiência de bolsista?• Como os egressos de IC – hoje docentes da Educação Básica –

analisam sua experiência de formação em relação ao trabalho que realizam?

• Qual sua concepção de ensino? E de pesquisa?• Em que circunstâncias os saberes de pesquisa influenciam os

saberes da docência?• A experiência como bolsista de IC os auxilia a enfrentar os

desafios iniciais da carreira?• Essa experiência foi capaz de desenvolver compreensões so-

bre a relação ensino e pesquisa?• Contribuiu com as perspectivas teóricas referentes ao profes-

sor que pesquisa a própria prática?• Como os professores orientadores dos programas de IC per-

cebem a iniciação à pesquisa durante o curso de formação inicial para docência?

Este estudo utiliza entrevistas com professores da Educação Básica que foram BIC em seus cursos de graduação. Utiliza-se um roteiro semies-truturado para as entrevistas, baseando-se na compreensão qualitativa de pes-quisa.

Sobre a pesquisa qualitativa, Minayo diz que elatrabalha com o universo de significados, dos motivos, das aspirações, das cren-ças, dos valores e das atitudes. [...] O universo da produção humana que pode ser resumido no mundo das relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa dificilmente pode ser traduzido em números e indicadores quantitativos (MINAYO, 2007, p. 21).

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BRACCINI, M. L. - RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS 470

Para adentrar no universo de significados dos sujeitos está sendo inte-ressante ouvi-los, descrevendo e compreendendo seus depoimentos. Os dados servem para compreender o problema e perceber o que os respondentes pen-sam, como veem e qual valor que atribuem às experiências formativas foco desta pesquisa. A pesquisa qualitativa tem como uma das suas características a descrição. O compreendido na coleta de dados é descrito e não pode ser representado em números (BOGDAN; BIKLEN, 1994).

O contexto também é levado em conta, tanto na coleta quanto na aná-lise de dados,

a abordagem da investigação qualitativa exige que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do nos-so objeto de estudo (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 49).

A investigação está sendo realizada com sujeitos egressos de cursos de licenciatura e de BIC em uma universidade privada localizada na Região Sul do país. As diretrizes que guiam a estrutura desses cursos, as normas dos Programas de IC e o contexto em que esses alunos desenvolveram as pesquisas científicas durante o período de IC estão servindo de pano de fundo para o estudo.

Realizamos, na primeira etapa da parte empírica da pesquisa, um ma-peamento de possíveis sujeitos com base nos seguintes critérios:

• egressos dos programas de iniciação científica em uma uni-versidade privada do sul do Brasil;

• formados em algum dos cursos de licenciaturas da universi-dade;

• que tenham participado ao menos por um ano de programa de iniciação científica;

• que após a participação como BIC tenham atuado enquanto docente da Educação Básica por pelo menos um ano, com o máximo de cinco anos de atuação.

Temos também como interlocutores(as) os professores pesquisadores orientadores desses bolsistas para compreender se percebem a inserção da pesquisa como um referente para a docência dos seus alunos de licenciatura. A seleção desses professores orientadores estará articulada com a dos egressos, em especial de áreas de conhecimento distintas.

O compreendido até aqui indica que os dados podem ser analisados inicialmente com base em duas dimensões: Aprendizagens de habilidades e metodologias de ensinar e aprender com pesquisa.

APRENDIZAGENS DE HABILIDADESNossos interlocutores identificam a habilidade de trabalhar em equipe

como uma importante aprendizagem dentro dos grupos de pesquisa enquanto Bolsista de Iniciação Científica e que é muito valorizada na atuação docente.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 471

Um dos professores orientadores entrevistados diz que a dinâmica de trabalho do grupo de bolsistas de IC é sempre coletiva, eles escrevem artigos juntos, vão para eventos juntos e que se ajudam mutuamente. O interlocutor destaca ainda que essa é certamente uma aprendizagem que é levada para atuação docente e que é muito rica nas escolas, onde é importante o trabalho em equipe.

Eu sempre digo: o nosso grupo além de ser um grupo de pesquisa é também um grupo de amigos, pois para trabalhar em equipe eles ficam entre si amigos, isto é, eles se ajudam mutuamente inclusive fora do grupo de pesquisa, se eles estão juntos na mesma disciplina, lá eles se ajudam e eu acho que isso é uma coisa muito importante [...] então isso é o trabalho de equipe e acho que isso é hoje uma das habilidades principais da docência (professor 1).

Os bolsistas egressos entrevistados confirmaram a compreensão emi-tida pelo orientador e também destacaram o trabalho em equipe como um aprendizado importante durante o período enquanto BIC. Um dos interlocuto-res, quando questionado sobre as principais aprendizagens durante o período de bolsa, afirmou que “a aprendizagem do trabalho em grupo, de tu aprende-res a trabalhar em grupo, é importante” (bolsista egresso 1).

Galiazzi afirma que a inserção à pesquisa favorece o desenvolvimento de habilidades necessárias ao trabalho docente. A autora diz que os professo-res que pesquisam estarão

mais acostumados a dialogar com seus pares, a buscar interlocutores teóricos capazes de responder aos questionamentos que faz sobre sua atuação em sala de aula, a argumentar, participar na construção da proposta pedagógica da escola (GALIAZZI, 2003, p. 56).

Para a autora, a inserção à pesquisa durante a formação inicial favo-rece o desenvolvimento de outras habilidades que não aquelas diretamente relacionadas à metodologia de pesquisa utilizada e ao desenvolvimento da pesquisa em si. Destaca o diálogo com os pares e a atuação em equipe na construção da proposta pedagógica da escola como importantes.

O PPP tem o potencial para a união da proposta político-pedagógica e sistematização dos propósitos da comunidade escolar. Esse documento serve de base para reuniões pedagógicas, administrativas e planejamentos da insti-tuição, unindo os sonhos e utopias com o comprometimento dos profissionais envolvidos. Sobre isso, Veiga diz:

Quando se busca uma nova organização do trabalho pedagógico, está se considerando que as relações de trabalho, no interior da escola, deverão es-tar calcadas nas atitudes de solidariedade, de reciprocidade e de participação coletiva, em contraposição à organização regida pelos princípios da divisão do trabalho, da fragmentação e do controle hierárquico (VEIGA, 1995, p. 31).

Nossos interlocutores reconhecem a importância de participar de es-paços coletivos no interior da escola, porém destacam que esses espaços são

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BRACCINI, M. L. - RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS 472

raros na dinâmica do trabalho dessas instituições. Um entrevistado que pos-sui um ano de atuação docente em uma escola particular de ensino técnico profissionalizante destaca que nunca teve reunião de professores. Entretanto, almejaria essa participação e entende que sua valorização do trabalho coletivo decorre muito do que viveu como bolsista.

METODOLOGIAS DE ENSINAR E APRENDER COM PESQUISANossos interlocutores destacam, também, que ter sido Bolsista de

Iniciação Científica os auxiliou a “gostar de fazer pesquisa” e a querer traba-lhar com pesquisas em sala de aula com os alunos. Acreditam que a pesqui-sa favorece o desenvolvimento da autonomia e construção de conhecimento. Tomam a pesquisa como um princípio epistemológico e sob essas bases orga-nizam muitas das atividades aplicadas aos seus alunos.

Como eu trabalho muito com experimento, às vezes eles falam: “vamos abrir um bicho professor?” [...] daí a gente abre e tento criar com eles esta metodologia científica para o conhecimento, a partir da experimentação, para eles conseguirem “bolar” o que eles sabem, ver o que eles já conhecem, trazer coisas novas, e aí eu fui percebendo que a Iniciação Científica poderia ser im-portante (bolsista egresso 2).

Para Freire, a pesquisa tem mesmo a finalidade de construir pensa-mentos novos e os dar a conhecer. Diz que “pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar alguma novidade” (1996, p. 29).

Nesse movimento é importante valorizar o conhecimento dos alunos, o que eles já sabem sobre o assunto e também as curiosidades que podem surgir no decorrer da pesquisa.

Balzan (2000, p. 136) nos auxilia a refletir sobre a pesquisa como princípio metodológico. Defende que são positivos os professores que reali-zam pesquisas com seus alunos, que a inserem na sua proposta de aula cons-truindo com os discentes o conhecimento sobre os temas em questão. Ou seja,

“professores e alunos trabalhando juntos, procurando solucionar problemas extraídos da realidade homem-natureza-sociedade”. Para o autor, a pesquisa enquanto metodologia de ensino é uma forma de tornar a aula interessante e um dos principais caminhos para um ensino de qualidade.

A revisão de literatura e os achados baseados na análise dos depoimen-tos dos nossos interlocutores nos ajudam a compreender que a pesquisa, como componente da formação docente, não pode ser vista de forma isolada. Estará na dependência das condições objetivas do trabalho docente. Entretanto, ao considerarmos a Iniciação Científica como uma experiência significativa na formação de licenciandos, percebemos que essa condição pode ter impacto nos saberes da docência, contribuindo para qualificação do ensino e do traba-lho docente.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 473

A consolidação do estudo certamente trará maiores contribuições so-bre o tema. Entretanto, os dados parciais já apontam para a sua importância e revelam que a experiência de Iniciação Científica nos cursos de licenciatura pode contemplar tanto a dimensão investigativa, com vistas à pós-graduação stricto sensu, como a qualificação para docência na Educação Básica, for-mando um futuro professor mais capaz de atuar coletivamente, pesquisar sua própria prática e aplicar metodologias onde a pesquisa se estabelece como pressuposto.

REFERÊNCIAS

BALZAN, Newton. Indissociabilidade ensino-pesquisa como princípio meto-dológico. In: VEIGA, Ilma Passos (org.). Pedagogia universitária: a aula em foco. Campinas: Papirus, 2000, p. 115-36.BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.CALAZANS, Julieta (org.). Iniciação Científica: construindo o pensamento crítico. São Paulo: Cortez, 2002.CHARLOT, Bernard. O professor na sociedade contemporânea: um trabalha-dor na contradição. Educação e Contemporaneidade. Salvador, v. 17, n. 30, p. 17-31, jul./dez. 2008.CNPq. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Bolsas por quotas no país. Disponível em: www.cnpq.br Acesso em: 4 abril de 2010. CUNHA, Maria Isabel da. O bom professor e sua prática. 17. ed. São Paulo: Papirus Editora, 2005.ENRICONI, Delcia. Qualidade epistemológica nas práticas docentes infor-madas pela ação da pesquisa. In: EGGERT, Edla. et al. (org.) Trajetórias e processos de ensinar e aprender: didática e formação de professores. Porto Alegre: EdiPUCRS, 2008, p. 77-88.FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 29. ed., São Paulo: Paz e Terra, 1996.GALIAZZI, Maria do Carmo. Educar pela pesquisa: ambiente de formação de professores de ciências. Ijuí: Editora Unijuí, 2003.LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em Educação: aborda-gens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.MINAYO, Maria C. S. (org.) Pesquisa Social – teoria, método e criatividade. 26. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.NÓVOA, António. O professor pesquisador e reflexivo. Disponível em: <http://www.tvebrasil.com.br/ SALTO/entrevistas/antonio_novoa.htm>. Entrevista cedida em 13 set. 2001: Acesso em: 22 jan. 2009.

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BRACCINI, M. L. - RESSIGNIFICANDO AS APRENDIZAGENS 474

RODRIGUES, Heloiza. O peão vermelho no jogo da vida: o professor ini-ciante de história e a construção dos saberes docentes. Dissertação (mestra-do). Programa de Pós-Graduação em Educação, Área de Ciências Humanas, Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, 2010.TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.VEIGA, Ilma Passos de Alencastro. Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível. 11. ed. Campinas: Papirus, 1995.

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O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA: UM ESTUDO DE CASO SOBRE O

PERFIL DO EGRESSO DE PEDAGOGIA E AS DEMANDAS DO CAMPO PROFISSIONAL

Raimunda Maria da Cunha Ribeiro Marilia Costa Morosini

O s principais desafios do Ensino Superior, em uma perspectiva exigente de modernização da universidade, capaz de dar con-

ta das demandas do tecido social do qual faz parte, devem ser: atingir um nível de qualidade que responda ao padrão estabelecido pela comunidade científica internacional; melhorar a governança, tendo clareza em relação às decisões a serem tomadas, bem como o conhecimento de quem são as autoridades científicas outorgadas para decidir em nome dos pares insti-tucionais; aumentar e diversificar as fontes de financiamento, como uma forma de agir legitimamente em nome das regras estabelecidas em um dado contexto institucional.

As questões que serviram de norte para esta pesquisa, no sentido de atingir o objetivo proposto, foram: o que é governança acadêmica e qual sua relação com o campo profissional na perspectiva da teoria de Bourdieu? De que forma se aplica o conceito de governança na Universidade Estadual do Piauí, especificamente no curso de Pedagogia? O perfil do egresso, uma ex-pectativa do campo científico, está correspondendo às demandas do campo profissional?

O objetivo principal foi contextualizar a governança no tecido do campo científico teorizado por Bourdieu, transitando no campo acadêmico do Ensino Superior e identificando o perfil do egresso com as competências necessárias para atuar no campo profissional.

Esta é uma pesquisa qualitativa e quantitativa, de caráter teórico e empírico, descritiva e exploratória. O estudo fundamentou-se na teoria de Bourdieu, especificamente acerca do campo científico. A parte empírica ca-racterizou-se por um estudo de caso, tendo como objeto o curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Piauí/Campus Jesualdo Cavalcanti, na cidade de Corrente-PI, enfocando, prioritariamente, o perfil do egresso.

Para conhecer sobre a governança acadêmica da Universidade Estadual do Piauí e o perfil do egresso de Pedagogia, foram consultados, res-pectivamente, o Estatuto da Universidade, as Diretrizes Nacionais do Curso de Pedagogia e Projeto Político Pedagógico do curso de Pedagogia do campus objeto deste estudo.

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476 RIBEIRO, R. M. C. et al. - O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA

Além do estudo realizado no campus universitário, foi feito um le-vantamento de dados quantitativos na Secretaria Municipal de Educação, da cidade de Corrente-PI, com o objetivo de identificar quantos pedagogos concursados fazem parte do quadro de professores e quantos são egressos da Universidade Estadual do Piauí/Corrente-PI.

O CAMPO CIENTÍFICO E O PROFISSIONAL: ENTRE A GOVERNANÇA ACADÊMICA E A CORPORATIVA

Em toda sua teoria, Bourdieu (1997) advoga que campo científico é um espaço de disputas por capitais e de rupturas sociais com paradigmas vi-gentes – subversão. Nesse jogo de interesses pelo poder e pelo reconhecimen-to, entre dominantes e novatos, a ciência luta para se manter em uma posição de autoridade, de prestígio e de celebridade.

Sendo o campo científico um espaço de jogo e lutas, algumas regras fazem parte do cenário, como, por exemplo, o poder social, a competência científica, a acumulação de capital, o investimento no capital e a ordem cien-tífica estabelecida. No mundo científico, há sempre a marca das lutas, em um jogo pelo reconhecimento e pelo prestígio, em uma perspectiva de relações de dominação, em que os agentes caracterizados pelo volume de seu capital acabam por determinar a estrutura do campo.

Governança e gestão são substantivos, cujos sentidos são semelhantes, mas não iguais. Segundo Eurydice1 (2008), governança diz respeito às regras e mecanismos por meio dos quais os atores podem influenciar nas tomadas de decisões e de que forma é feita a prestação de contas e a quem esta pode ser direcionada; gestão, por sua vez, está relacionada à implantação de um conjunto de objetivos definidos por uma instituição, de acordo com as regras estabelecidas. Complementando a ideia do que significa cada um desses con-ceitos, pode-se dizer que a diferença está no seguinte: enquanto governança é a visão dos objetivos, das metas e da política interna, a gestão, então, pode ser entendida como a qualidade, a eficiência e a eficácia na prestação dos serviços, a fim de que os objetivos e as metas sejam alcançados. E ainda: a governança pode ser compreendida como a regra, enquanto a gestão, a forma como está sendo aplicada a regra, envolvendo, nos dois casos, o exercício da autoridade do campo.

Nessa mesma perspectiva, a governança acadêmica significa o con-junto de políticas institucionais. Costa de Sousa (2011) trata dessa questão, mas com a configuração de gestão acadêmica, sendo entendida como um for-mato de atuação organizado de acordo com a missão, com as crenças e com os valores estabelecidos pelos líderes responsáveis, ou seja, autoridades científi-cas, sociologicamente, assim denominadas por Bourdieu.

1 Rede de Informação sobre Educação na Europa.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 477

A governança acadêmica, enquanto viabilidade de resultados satisfató-rios no lócus de formação profissional, deve estar baseada em boas políticas e boas práticas, sendo possível contar com seus pares, porque nada é tão difícil para uma instituição do que não poder contar com as pessoa.

A GOVERNANÇA UNIVERSITÁRIA E OS DESAFIOS PARA O SÉCULO XXI Com o objetivo de prover soluções para os desafios da universidade

no século XXI e colocar em movimento um processo de profunda reforma na Educação Superior mundial, a Unesco tem estado à frente de Conferências, tanto regionais, como é o caso da Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e no Caribe, realizada em junho de 2008, na Colômbia, quanto em uma perspectiva mundial, como é o caso da Conferência Mundial sobre Educação Superior no século XXI: visão e ação, realizada em Paris em outubro de 1998, além de estabelecer uma Política de Mudança e Desenvolvimento no Ensino Superior – texto publicado originalmente em 1995 e traduzido no Brasil em 1999.

Em linhas gerais, esses documentos traduzidos em Declarações apon-tam uma série de desafios a serem enfrentados pela Educação Superior no mundo, ao mesmo tempo que apontam metas a serem atingidas em prazo mais ou menos preestabelecido. Nessa perspectiva, cada universidade deve planejar seu ensino, de modo a adaptar-se às mediatas exigências mundiais e às imediatas exigências nacionais, estabelecidas via Ministério da Educação e reorientadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e outros dispositivos legais.

Esse conjunto de políticas para a educação superior no mundo confi-gura-se em uma governança mais abrangente, no sentido de organizar e viabi-lizar, por meio de uma gestão compartilhada, a modernização da universidade para o século XXI, com, pelo menos, três características definidas: produtora de saber; lócus de formação de profissionais; parceira de seu entorno com o compromisso de promover o desenvolvimento econômico e reduzir a pobreza.

No Brasil, recentemente, algumas políticas de Estado, para articular uma reforma universitária mais profunda, foram implantadas, principalmente a partir do governo do presidente Lula, tais como: Sinaes, ProUni, Lei de Inovação Tecnológica, Lei da Parceria Público-Privada, Reuni.

O momento atual exige que as universidades se proponham a superar os desafios a elas impostos, como, por exemplo, em linhas gerais, os apontados por Zabalza (2004): das universidades não se contentarem em apenas transmitirem a ciência, mas em criarem a ciência por meio da indissociabilidade ensino e pesquisa; que deem um sentido prático e profissionalizante para a formação dos estudantes; que façam isso abertas ao contexto social, econômico e profissional e nunca fechadas em si mesmas; e que possam difundir a cultura universitária.

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478 RIBEIRO, R. M. C. et al. - O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA

Nesse processo de modernização, alguns princípios norteadores das políticas educacionais para o Ensino Superior são indispensáveis na estrutu-ração, organização e planejamento estratégico da universidade. Sousa Santos (2010) elenca alguns desses princípios: enfrentar o novo com o novo; lutar pela definição da universidade; reconquistar a legitimidade (acesso, extensão, pesquisa, ecologia de saberes, reforço à responsabilidade social) e criar uma nova institucionalidade, na perspectiva de uma instituição mais democrática.

As “regras do jogo”, geralmente, são claras e fazem parte do campo, um ambiente competitivo e de lutas, conforme defende Bourdieu em sua te-oria sociológica. Nessa mesma perspectiva, Rámirez (2011) trata do sistema de Ensino Superior como um ambiente em que as exigências estão cada vez mais intensas e que esse será medido menos pelo investimento e mais pelos resultados educacionais alcançados pelos alunos e o impacto na competitivi-dade econômica.

As políticas públicas para o Ensino Superior deverão se estruturar conforme as expectativas atuais de cidadãos e empregadores (OCDE, 2010), assim entendidas como as características que constituem a governança acadê-mica, a saber: sejam sensíveis e capazes de adaptar-se às exigências impostas pela força da globalização; ofereçam programas para que as habilidades certas sejam adquiridas no momento certo; sejam flexíveis e usem a tecnologia de forma inteligente; reduzem as barreiras ao ingresso e à rigidez institucional que dificultem a inclusão; proporcionem a aprendizagem continuada; desen-volvam abordagens eficientes e sustentáveis para financiamento que conci-liem acesso, equidade e acessibilidade.

A PEDAGOGIA DO PONTO DE VISTA DO CAMPO CIENTÍFICO E AS PERSPECTIVAS NO CAMPO PROFISSIONALO objeto de estudo deste artigo foi a Universidade Estadual do Piauí,

especificamente o campus Jesualdo Cavalcanti, como o campo científico da formação dos profissionais de Pedagogia. Na intenção de compreender as configurações desse campo específico, é importante identificar os princípios e as finalidades dessa IES, estabelecidas no Estatuto da Universidade, como um comprometimento na superação das demandas sociais do campo profissional. O foco aqui é o egresso do curso de Pedagogia, entendendo que o campo científico prepara o futuro profissional com as competências necessárias para atuar no campo profissional.

Os princípios institucionais estabelecidos no estatuto parecem claros, no que diz respeito à governança, tanto em nível de governo estadual quanto em nível acadêmico/institucional. O princípio da autonomia, bem como a in-dissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão, já previsto na Constituição Federal/88 (Art. 207), clarifica o grau de responsabilidade social da universi-dade; a gestão democrática e colegiada e o pluralismo remetem à ideia de uma

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 479

governança baseada nos fundamentos da participação; e o compromisso com o desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da cultura demonstra a preo-cupação da instituição em se firmar como campo científico, ou seja, lócus de produção de saber, em nome do desenvolvimento econômico e social.

O conjunto de políticas internas (governança), elegidas no estatuto, como propostas de modernização, também outorga à universidade, lócus de produção do saber, o status de campo científico. Bourdieu (1997), em sua análise clínica de campo, chama a atenção para a lógica desse mundo científi-co e, ao mesmo tempo, social, político, econômico e, por isso, intencional. O jogo tem como finalidade o reconhecimento dos pares em seu próprio campo e as disputas constituem-se na pulsão, para buscar sempre mais em nome da compensação. Por isso, leva-se em consideração a escolha que compensa e a noção de custo-benefício. Sendo assim, o agente precisa conhecer as regras do jogo, quem são as autoridades outorgadas, quem são seus avaliadores e quais são os critérios de avaliação.

RESULTADOSO perfil do egresso do curso de Pedagogia (PPC) e a relação com

as finalidades e princípios da Educação Superior previstas no Estatuto da UESPI e nas Diretrizes Nacionais do Curso de Pedagogia Resolução CNE/CP/2006.

A Universidade Estadual do Piauí, uma instituição pública educacio-nal, não se furtando do compromisso com o desenvolvimento do Estado do Piauí, prevê em seu Estatuto o viés de sua responsabilidade social.

O Projeto Político do curso de Pedagogia (2009) estabelece algumas diretrizes na formação do pedagogo, como: formação teórica e sólida acer-ca do fenômeno educacional, produzida no escopo dos saberes pedagógicos; garantia de unidade entre teoria e prática; compromisso com a formação do educador pesquisador; garantia de saberes relativos à docência da Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental, assim como saberes pertinen-tes à gestão; vivência de atividades complementares conforme o interesse dos graduandos, mas sob acompanhamento da instituição. O que está descrito no PPC2 vem, de certa forma, atender a uma governança em nível nacional, esta-belecida na Resolução CNE/CP (2006), conforme determina em seu artigo 2º: planejamento, execução e avaliação de atividades educativas.

Compete ao egresso da Pedagogia da UESPI: comprometimento com os valores inspirados da sociedade democrática; compreensão do papel social da escola; domínio dos conteúdos a serem socializados, de seus significa-dos em diferentes contextos e de sua articulação interdisciplinar; domínio do conhecimento pedagógico; conhecimento de processos de investigação que

2 Projeto Político do Curso.

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480 RIBEIRO, R. M. C. et al. - O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA

possibilitem o aperfeiçoamento da prática pedagógica e; gerenciamento do próprio desenvolvimento profissional. Tais competências não se furtam às ca-racterísticas do egresso, conforme estão descritas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia (Resolução CNE/CP, art. 5º). Isso demonstra o atendimento às demandas e o cumprimento de dispositi-vo legal estabelecido nacionalmente.

Planejamento de ensino, práticas pedagógicas utilizadas pelos pro-fessores do curso de Pedagogia da UESPI/Corrente-PI, na formação de no-vos profissionais e avaliação da aprendizagem e Enade – como funciona o colegiado do curso de Pedagogia.

Em análise realizada no PCC do curso de Pedagogia da UESPI/Campus Jesualdo Cavalcanti em Corrente-PI, é possível pontuar algumas considerações:

O planejamento de ensino é uma exigência da coordenação do curso, que repassa a ementa da disciplina para que o professor possa elaborar o seu plano conforme modelo instituído. O professor é livre para ampliar ou adaptar a ementa, conforme as necessidades da disciplina; utiliza livros da instituição, de sua própria biblioteca ou emprestados dos colegas.

A recomendação da universidade é para que ao longo dos semestres letivos, o professor estimule e exercite a pluralidade de métodos de ensino e aprendizagem; em especial, as contribuições metodológicas provenientes das pesquisas em educação, priorizando o diálogo entre culturas e saberes e privilegiando a integração teoria-prática, de maneira que possibilite o bom desempenho profissional ao egresso.

A avaliação da aprendizagem deve ser compreendida por alunos e professores tanto na dimensão social quanto pedagógica: na dimensão social deve ficar claro o que a sociedade espera dos alunos; na dimensão pedagógi-ca leva-se em consideração o desenvolvimento da aprendizagem dos alunos, no que diz respeito aos conhecimentos adquiridos, raciocínios desenvolvidos, crenças, valores e estratégias para o exercício profissional.

A avaliação do curso é um mecanismo necessário para a verificação de pontos fortes e pontos fracos e os prováveis descompassos entre o PPC e as ações desenvolvidas. Além de uma avaliação interna, elaborada e aplicada pela UESPI, o curso de Pedagogia passa pela avaliação externa – o Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) –, tendo em vista o dispos-to na Lei n. 10.861/2004 (Sinaes).

O curso de Pedagogia da UESPI/Campus Jesualdo Cavalcanti já tem seu colegiado de curso estruturado, com estatuto próprio; as reuniões aconte-cem de dois em dois meses para discutir assuntos pertinentes ao curso, tanto em relação aos professores quanto em relação aos alunos. O que não é de competência do colegiado, é automaticamente encaminhado ao conselho do campus para as devidas providências.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 481

O CAMPO PROFISSIONAL E EMPREGABILIDADE: LEVANTAMENTO NA SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO EM CORRENTE-PI. A Secretaria Municipal de Educação conta, atualmente, em seu quadro

docente com 325 professores efetivos/concursados, sendo que destes, 82 têm habilitação para o magistério em nível de licenciatura em Pedagogia: dos 82 pedagogos, 75 são egressos da Universidade Estadual do Piauí.

Embora essa secretaria conte com 82 pedagogos, esse número é con-siderado insuficiente para atender a grande quantidade de alunos existentes na rede municipal de ensino, sobretudo no que diz respeito ao atendimento aos alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental. Não é raro observar profes-sores com formação em outra área ou até mesmo sem formação adequada le-cionando nas séries iniciais (SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO/CORRENTE-PI, 2011).

CONSIDERAÇÕES FINAISQuem determina as regras do jogo, a estrutura do campo, o que pode e

o que não pode ser feito no campo, geralmente, é alguém que tem autoridade outorgada e reconhecida pelos seus pares. Essa autoridade é conhecida como

“autoridade científica”. No âmbito do Ensino Superior – campo científico –, as autoridades são os pares, por assim dizer, são os atores, que fazem parte da universidade, os que tomam as decisões e influenciam os rumos, ou seja, em quais caminhos a instituição “deve andar”.

A educação hoje, seja em qualquer nível e em qualquer parte do mun-do, está profundamente marcada e influenciada pelas tendências de uma so-ciedade planetária. Em relação ao Ensino Superior não poderiam ser diferente, visto que as políticas nacionais e internacionais têm exigido da universidade um envolvimento cada vez maior em relação às demandas acadêmicas, so-ciais e econômicas.

O Estado do Piauí ainda enfrenta uma carência de profissionais da educação com formação em nível superior, principalmente em dois casos: mu-nicípios da zona rural e municípios mais distantes da capital – como é o caso do município pesquisado, com aproximadamente 1.000 km de distância.

Uma política pública de governo tenta reduzir essa carência, contra-tando, por período determinado de um ano e prorrogado por mais um ano, pessoal em processo de formação, advindos dos cursos de licenciatura ou pro-fissionais recém-formados, tanto das licenciaturas quanto das engenharias e bacharelados, para ministrar aulas nas áreas das ciências exatas e da natureza. Por isso, a Universidade Estadual do Piauí reconhece o curso de Pedagogia como um elemento de contribuição com o desenvolvimento social e econômi-co do Piauí, ao formar profissionais competentes na área educacional aptos a intervirem nos diversos espaços sociais.

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482 RIBEIRO, R. M. C. et al. - O CAMPO CIENTÍFICO E A GOVERNANÇA ACADÊMICA

REFERÊNCIAS

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O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE

Bárbara Burgardt Casaletti Cleoni Maria Barboza Fernandes

A experiência aqui relatada teve início em uma disciplina do Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS, intitulada

“Construindo o Estado do Conhecimento de sua Dissertação ou Tese”.1 Nessa disciplina foi construído um artigo chamado “Uma análise das publicações na Anped e na Capes acerca da formação de docentes on-line em um contexto de educação corporativa”.

O artigo acima citado teve como inspiração a Resolução n. 71/2010, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), que institui a Política Nacional de Educação a Distância e Autoinstrução para os Servidores da Justiça do Trabalho, bem como a Resolução n. 126/2011, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que trata do Plano Nacional de Capacitação Judicial de Magistrados e Servidores do Poder Judiciário.

Nesse estudo da disciplina foram examinadas, inicialmente, as pu-blicações referentes aos anos de 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010, constantes dos Grupos de Trabalho 8 e 16 da Anped (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação), que tratam, respectivamente, sobre formação de professores e sobre educação e comunicação. Nessas encon-tramos um material significativo para fundamentar os estudos acerca de uma categoria que denominamos “Formação de Professores”. Para uma melhor análise dos trabalhos dessa categoria, decidimos subdividi-la da seguinte forma: Formação de Professores Leigos (aqui considerados pro-fissionais das mais diversas áreas, sem formação docente) e Formação de Professores On-line. Dos quinze trabalhos encontrados, quatro foram cata-logados somente na categoria “Formação de Professores”, dois na subcate-goria “Formação de Professores Leigos” e nove na subcategoria “Formação de Professores On-line”.

No que diz respeito à Educação Corporativa, que foi outra cate-goria utilizada, a pesquisa se deu no banco de teses/dissertações da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), no ano de 2009, onde constam os trabalhos mais recentes, por não ter sido essa temática contemplada na pesquisa feita na Anped. Ali descobrimos 47 teses/disserta-

1 Disciplina ministrada pela professora doutora Marilia Costa Morosini, que tem como objeto uma cons-trução de um estado de conhecimento sobre a produção científica de áreas pertinentes à temática em estudo, destacando dimensões de análise que contribuem para a compreensão do que está sendo produzido e de onde pode avançar no próprio estudo.

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484 CASALETTI, B. B. et al. - O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE

ções, assim distribuídas: oito teses de doutorado, 31 dissertações de mestrado acadêmico e oito de mestrado profissionalizante.

Ao final, ficou evidente o valor do material catalogado, mostrando o quanto a Anped e a Capes realmente foram uma fonte de consulta primordial para dar início à pesquisa que ali se iniciou.

Destacamos, ainda, naquele artigo, que os dados encontrados na Capes apontaram que trinta e dois por cento das teses/dissertações do ano de 2009 envolvendo as palavras-chave “educação corporativa” estão aos cuidados das faculdades de Administração; quarenta e seis por cento aos cuidados de outras faculdades; e apenas vinte e dois por cento aos cuidados das faculdades de Educação. Talvez por isso não foram encontrados trabalhos com tal temática nos Grupos de Trabalho 8 e 16 da Anped.

A partir da construção do mencionado artigo que se dá a inserção no Mundo Digital Virtual em 3D (MDV3D) Second Life (SL), que descrevere-mos no presente trabalho.

PROBLEMASEste artigo está referenciado no trabalho “Uma análise das publica-

ções na Anped e na Capes acerca da formação de docentes on-line em um contexto de educação corporativa”, que foi construído durante uma disciplina integrante do Programa de Pós-graduação em Educação da PUCRS, sendo, posteriormente, aprovado para apresentação no VII Congresso Internacional de Educação da UNISINOS, cuja temática era “Profissão docente: há futuro para esse ofício?”

Entretanto, as apresentações a distância dos trabalhos inscritos no eixo 11 – Educação e Cultura Digital, no qual se inseriu o trabalho antes referido, seriam realizadas exclusivamente via Second Life (SL), um mundo virtual no qual não se tinha nenhuma experiência prévia. É a partir desse contexto que surgiram alguns desafios que precisaram ser enfrentados.

O primeiro deles foi baixar o programa no computador. Registramos, aqui, que qualquer pessoa pode fazer isso gratuitamente por meio do site do Second Life Brasil.2

Após escolher um login e uma senha, o passo seguinte foi selecionar um avatar. Cada avatar representa uma pessoa no Second Life e pode ser com-pletamente modificado pelo seu criador. Porém, dada a inexperiência com essa modalidade de trabalho, o avatar ficou da mesma forma que foi apresen-tado pelo SL.

Para melhor entender o significado de um avatar, recorremos a Schlemmer e Backes (2008, p. 523), que assim explicam:

2 http://secondlife.com/?lang=pt-BR

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 485

No contexto tecnológico, na área de realidade virtual, o termo refere-se me-ramente a uma representação gráfica de um sujeito em um mundo virtual.

O avatar pode representar a simulação do seu “eu físico” ou ser resultado da imaginação. Por meio dele é possível: deslocar-se no espaço 3D – caminhar, cor-rer, voar, pular. Assim como interagir, se comunicar, por meio do chat escrito, do diálogo oral, dos gestos e realizar ações – dançar, sorrir, chorar, acenar, abraçar, dentre outras.

Coincidentemente, após a aprovação do trabalho para apresentação, a Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) promoveu a Jornada Virtual ABED de Educação a Distância (JOVAED) onde surgiu a oportunida-de de participação em atividades no Second Life com o objetivo de proporcio-nar um primeiro contato com o mundo virtual.

Durante a JOVAED, outros problemas apareceram, como, por exem-plo, o desconhecimento de como andar com o avatar (que é muito fácil: basta usar as setas), bem como o fato de não conseguirmos ouvir os palestrantes, que tiveram que usar o chat para escrever, resumidamente, o que eles estavam falando.

Nessa oportunidade foi possível perceber que as apresentações eram feitas em um telão, que mais tarde descobrimos ser chamado de display no mundo virtual. Porém, até esse momento, não tínhamos a menor ideia de como disponibilizar uma apresentação feita em Power point naquele telão.

Nessa etapa de inserção no SL, o sentimento que surgiu foi o medo, e o consolo foi encontrado nas palavras de Fernandes (2008, p. 156): “traba-lhar o medo e com o medo é um grande desafio, medo que nós, professores e alunos, temos de sair do caminho previsto, do caminho da prescrição”. Na discussão que fizemos na orientação do projeto de dissertação3, o medo foi um tema que nos permitiu grande desafio. Também mantivemos um diálogo com a afirmação de Grillo (2008, p. 67):

O impacto dos novos eventos da sociedade do conhecimento desestabiliza professores experientes e iniciantes e lhes exige aprender a ensinar de forma diferente do que pretendiam, diferente da forma como foram ensinados, muitas vezes observando seus professores ou baseando-se, apenas, em sua atividade profissional [grifos nossos].

Assim, saindo do caminho previsto que foi desestabilizado com as novas possibilidades de um novo conhecimento, nesse caso, o Second Life, o medo foi vencido, os problemas que apareceram no caminho foram resolvidos e a apresentação do trabalho foi realizada com sucesso.

3 Dentre as discussões comuns ao desenvolvimento do projeto, a questão do medo foi tematizada e pro-blematizada. Desencadeada por este trabalho, tornou-se uma importante contribuição para o mesmo, como um movimento mais amplo para a própria arte de viver.

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486 CASALETTI, B. B. et al. - O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE

Figura 1. Apresentação de trabalho via Second Life (VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos).

Por fim, destacamos que os slides feitos no power point para apresen-tação do trabalho foram encaminhados por meio de mensagem eletrônica à equipe organizadora do VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos, que foi a responsável por disponibilizá-lo no display (Figura 1). Esclarecemos, também, que, para avançar ou retroceder os slides, basta usar o mouse e “cli-car” nas setas que aparecem à direita e à esquerda da tela.

OBJETIVOS

Este trabalho teve como objetivo contribuir com as discussões acerca da qualidade na Educação Superior baseado no relato de uma experiência aca-dêmica com Mundos Digitais Virtuais em 3D (MDV3D), bem como descrever as etapas que envolveram essa experiência. Pretende, ainda, analisar a relação dos inscritos no VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos para verificar o quanto os participantes utilizaram o mundo virtual SL para apre-sentar os seus trabalhos.

De acordo com Morosini (2003, p. 219-20), a RIES (Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior)

encontra justificativa no fato de que o desenvolvimento científico-tecnológico, especialmente o desenvolvido pela universidade, ancora a sociedade atual e exige reflexões éticas como nunca antes na história.

Assim, os objetivos do presente trabalho, por estarem diretamente re-lacionados com o desenvolvimento científico-tecnológico da atualidade, bus-cam contribuir, ainda, para reflexões sobre as finalidades acerca do uso da tecnologia na universidade no século XXI.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 487

METODOLOGIA

A metodologia deste trabalho envolveu duas etapas.A primeira delas relacionada à apresentação do artigo “Uma análise

das publicações na Anped e na Capes acerca da formação de docentes on-line em um contexto de educação corporativa” via Second Life no VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos.

Para essa apresentação, além da participação prévia na Jornada Virtual ABED de Educação a Distância (JOVAED), foi feito um teste, na ilha da Unisinos no SL, com o auxílio da equipe de Educação a Distância da PUCRS. Salientamos que a possibilidade de apresentar o trabalho de dentro da própria universidade foi um fator relevante para o sucesso dessa experiência no SL.

Em uma etapa posterior, tendo em vista que observamos, durante a apresentação do trabalho, que poucos participantes estavam no SL, ainda que não tenhamos uma noção de quantos estavam presencialmente na Unisinos assistindo, visto que as imagens do Second Life foram simultaneamente transmitidas no Auditório Pe. Werner, foi feita uma análise numérica das apresentações feitas no VII Congresso Internacional de Educação daquela universidade.

RESULTADOSA partir da experiência de apresentar um trabalho via Second Life no

VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos, percebemos, em um primeiro momento, que muitos alunos e professores não tinham a menor ideia de como utilizar o SL, não podendo, dessa forma, auxiliar na inserção nos mundos virtuais digitais naquele momento.

Com isso, ao se refletir sobre as tecnologias disponíveis para serem utilizadas no campo educacional neste início do século XXI, resgatamos a afirmativa de Mosquera (2003, p. 45) ao dizer que:

Estamos rodeados de brinquedos animados, realidades virtuais, criaturas ar-tificiais e um mundo digitalizado, no qual as crianças do século XXI aprendem a relacionar-se rapidamente com objetos pensantes. Já os adultos mergulhados em transformações operadas desde os locais de trabalho têm fortes dúvidas para se atualizar e se colocar em dia no universo tecnológico e científico. Isto nos leva a entender que a cisão geracional se estabelece de maneira muito pro-funda e aparece como desafio fundamental o conhecimento, na base de diferen-tes espaços psicológicos temporais, nos diferentes momentos da vida.

Essa afirmativa tão atual e verdadeira, nessa experiência serviu como ponto de partida para além de uma reflexão sobre o que estamos vivenciando. Assim, também trazemos uma análise quantitativa acerca das apresentações de trabalho no VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos, que resultaram, inicialmente, na seguinte tabela:

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488 CASALETTI, B. B. et al. - O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE

Tabela 1. Comparativo das apresentações presenciais e virtuais.

VII Congresso Internacional de Educação da UNISINOS

Tipo de apresentação Quantidade de apresentadores

Porcentagem de apresentadores

Presencial 615 98,4%A distância(via Second Life)

10 1,6%

Total de apresentadores 625 100%

Com base na tabela acima, para uma melhor visualização dos dados, foi elaborado o seguinte gráfico:

Gráfico 1. Comparativo das apresentações presenciais e virtuais.Fonte: Apresentações presenciais e via Second Life no VII Congresso Internacional de Educação da Unisinos.

Diante desse gráfico está sendo possível encaminhar hipóteses do des-conhecimento/negação/desinteresse pelo que já está ocorrendo, como mos-tram os estudos de Schlemmer e Backes, e, também, pressupor a existência do medo diante do novo. Entretanto, vencido o medo, percebemos que a apre-sentação desse trabalho fez parte de uma minoria que se dispôs a apresentar trabalho via Second Life.

Um detalhe que nos chamou a atenção foi que apenas 1,6% dos ins-critos utilizaram o SL para apresentar os seus trabalhos, no contexto do Eixo Temático 11, que tratava de Educação e Cultura Digital. Percebemos, então, que mesmo nesse eixo a grande maioria dos apresentadores recusou o mundo virtual e optou pela apresentação presencial de seu trabalho, conforme tabela que segue:

Tabela 2. Comparativo das apresentações presenciais e virtuais do Eixo Temático 11.

Eixo Temático 11 – Educação e Cultura Digital

Tipo de apresentação Quantidade de apresentadores

Porcentagem de apresentadores

Presencial 29 74,4 %

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 489

Eixo Temático 11 – Educação e Cultura Digital

Tipo de apresentação Quantidade de apresentadores

Porcentagem de apresentadores

A distância(via Second Life)

10 25,6 %

Total de apresentadores 39 100 %

Para melhor compreensão, elaboramos o seguinte gráfico, para uma melhor visualização dos dados:

Apresentações presenciais e via Second Life Eixo Temático 11 - Educação e Cultura Digital

Gráfico 2. Comparativo das apresentações presenciais e virtuais do Eixo Temático 11.

Para finalizar este texto, acreditamos que longo é o caminho para a mudança, como nos mostram os dados do Eixo Temático 11. Convidamos todos os professores ou alunos da Educação Superior que tiverem a oportuni-dade de conhecer/utilizar o Second Life, que o façam, mesmo que seja para se posicionarem favoravelmente ou não, porque essa é uma realidade que se faz presente. Precisamos colocá-la a serviço de valores que nos permitam usar a tecnologia a serviço da nossa humanidade. Essa experiência configurou-se em uma tarefa possível, desafiante no uso de recursos científicos e tecnológicos disponíveis nesse início do século XXI.

Além disso, trazemos de Marcelo García (1999, p. 137) algumas refle-xões sobre o desenvolvimento profissional de professores:

[...] O conceito de “desenvolvimento” tem uma conotação de evolução e continuidade que nos parece superar a tradicional justaposição entre forma-ção inicial e aperfeiçoamento de professores. Por outro lado, o conceito de

“desenvolvimento profissional dos professores” pressupõe, como mais tarde justificaremos, uma abordagem na formação de professores que valorize o seu carácter contextual, organizacional e orientado para a mudança. Esta aborda-gem apresenta uma forma de implicação e de resolução de problemas escolares a partir de uma perspectiva que supera a carácter tradicionalmente individualis-ta das actividades de aperfeiçoamento dos professores.

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490 CASALETTI, B. B. et al. - O SECOND LIFE COMO POSSIBILIDADE

REFERÊNCIAS

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PERFIL INSTITUCIONAL/DOCENTE DOS PROFESSORES DAS UNIVERSIDADES

PRIVADAS BRASILEIRAS: INDICADORES DE FUNÇÕES DOCENTES

Greice Scremin Silvia Maria de Aguiar Isaia

E ste trabalho tem o objetivo de apresentar os resultados encontra-dos e discutidos em uma dissertação de mestrado desenvolvida

no Programa de Pós-Graduação da UFSM entre os anos de 2007 e 2009. Essa pesquisa teve como objetivo fazer um levantamento do perfil institucional/do-cente dos professores das universidades privadas brasileiras dentro do contex-to dos indicadores de qualidade apontados pela avaliação externa do Sinaes.

O estudo realizado contribuiu com os objetivos levantados pelo pro-jeto da RIES (Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior) – Núcleo de Excelência em Ciência, Tecnologia e Inovação CNPq/FAPERGS e o OBSERVATÓRIO DA EDUCAÇÃO, com o projeto: “Indicadores de Qualidade para a Educação Superior Brasileira449”. Edital n. 001/2006/INEP/Capes – 2006.

Neste estudo, dois objetos de pesquisa se aproximam a avaliação e a qua-lidade da educação superior. Os dois objetos serão buscados em bases de da-dos disponibilizadas pelo INEP/MEC através de indicadores que definam seus principais atributos. Com isso estarão inseridos nos contextos da realidade da Educação Superior brasileira. Contudo, estes objetos em justaposição não poderiam nos oferecer um quadro real de um sistema de ensino, como o de nosso país, se não forem olhados com as lentes da comparação com aqueles indicadores que, de longa data, vêm sendo estudados e aplicados aos contextos educativos de outros países, indicadores internacionais elaborados por agências especializadas tais como a UNESCO, OCDE, BANCO MUNDIAL e outros (Projeto: RIES Indicadores de Qualidade para a Educação Superior Brasileira

– Edital n. 001/2006/INEP/Capes – 2006).

Dessa pesquisa fez parte o Projeto Observatório da Educação, que é um programa de fomento que visa ao desenvolvimento de estudos e pesquisas na área de educação. Esse projeto tem como objetivo estimular o crescimento da produção acadêmica e a formação de recursos humanos pós-graduados, nos níveis de mestrado e doutorado por meio de financiamento específico. Trata-se de uma parceria entre a Capes e o INEP. O Observatório da Educação pre-vê que regularmente seja feita a abertura de editais chamando a comunidade acadêmica a apresentar projetos de estudos e pesquisas na área de educação, envolvendo os programas de pós-graduação de mestrado e de doutorado das Instituições de Educação Superior (IES). As normas do programa exigem a uti-lização dos dados estatísticos educacionais produzidos pelo INEP como sub-sídio ao aprofundamento de estudos sobre a realidade educacional brasileira.

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492 SCREMIN, G. et al. - PERFIL INSTITUCIONAL/DOCENTE DOS PROFESSORES

DESENVOLVIMENTO Funções docentes como Indicadores de Qualidade

Vimos, com base no desenvolvimento teórico dessa pesquisa, que a questão qualidade não pode ser analisada de forma dissociada da pertinência da educação superior, tendo em vista que a qualidade não é um atributo abs-trato, e sim que deve ser comparada a outros padrões de referência (LEITE; TUTIKIAN; HOLZ, 2000). Baseando-se nos conceitos e visões de qualidade apresentados nesse trabalho, podemos observar que a proposição de indica-dores que possam medir qualidade da educação é um tanto complexa, pois há a necessidade de haver coerência entre o conceito de qualidade adotado pela instituição responsável pela mensuração da qualidade e os indicadores por ela propostos.

Como podemos ver durante o estudo, o INEP considera qualidade como um conceito dinâmico, e os indicadores de qualidade teriam a função de colaborar na avaliação e melhoria da qualidade da educação. Dessa forma, retomamos os dois princípios que caracterizam a definição de qualidade na educação para a Unesco/INEP: o primeiro trata do desenvolvimento cog-nitivo dos alunos e o segundo trata da promoção de atitudes e valores de cidadania. A questão que nos colocamos no final deste trabalho é: como está estabelecida a relação dos indicadores de função docente (grau de formação, regime de trabalho e sexo) com essa concepção de qualidade considerada pela instituição que faz a avaliação da qualidade da Educação Superior em nosso país?

Outro aspecto importante de salientar é o que o INEP entende por Funções Docentes no plano conceitual e como esse conceito se aplica em termos práticos na formulação dos indicadores de funções docentes. O INEP considera funções docentes como uma função educativa, diretamente ligada ao processo de ensino-aprendizagem, que exige formação pedagógica e prá-tica de ensino.1

Desse modo, podemos compreender o indicador de função docente denominado Grau de Formação, pois esse, como vimos anteriormente, exige certa formação para a docência superior, no entanto não estabelece a formação pedagógica como requisito no processo formativo docente. Remetemos-nos, assim, aos nossos referenciais teóricos que tratam justamente da formação para a docência superior balizada por uma formação na área específica de ensino atrelada a uma formação pedagógica em sentido mais amplo.

Desse modo, voltamos nossos olhares para a discussão da qualidade do processo formativo do professor universitário que se caracteriza, segundo Isaia e Bolzan (2008), por um “processo sistemático, organizado e autorrefle-xivo” (p. 513). Ainda de acordo com essas autoras, a qualidade do processo

1 Fonte: http//:www.inep.gov.br/thesaurus

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 493

formativo precisa considerar a especificidade própria da Educação Superior, compreendendo seu estatuto epistemológico e metodológico que é qualitati-vamente diferente da Educação Básica.

Ainda considerando o conceito de funções docentes proposto pelo INEP, resgatamos o indicador de regime de trabalho, que possibilita um pano-rama sobre as condições de trabalho dos docentes nas IES públicas e privadas do país, no entanto não está abarcado no conceito proposto anteriormente. O regime de trabalho dos docentes universitários, sem dúvida, demonstra as condições de trabalho com as quais se deparam os professores, principalmen-te das IES privadas. Muitas vezes com uma carga de trabalho muito grande, o que impossibilita um processo de ensino-aprendizagem aliado a um processo de reflexão contínua por parte do docente.

Quanto ao indicador sexo, que se constitui como nossa maior incóg-nita nessa pesquisa, resgatamos os conceitos de indicadores de qualidade e de funções docentes para que possibilitassem maior entendimento sobre os dados que encontramos. No entanto, consideramos o indicador sexo como um levan-tamento diagnóstico sobre a situação do quadro docente do Ensino Superior, entretanto, entendemos que ele não define atributos de qualidade.

Resgatando o objetivo central desta pesquisa, de traçar um perfil ins-titucional/docente de professores do Ensino Superior em universidades priva-das brasileiras, quanto às funções docentes, encontramos o seguinte:

No decorrer dos três anos, percebemos que a maioria dos professores, tanto nas particulares como nas comunitárias, confessionais e filantrópicas, tem a formação de mestre; aumentou o nível de formação dos docentes para a atuação na profissão de um ano para o outro. Esse fato pode ser entendido tanto a partir de contratações de docentes mais qualificados como pela busca da pós-graduação por parte dos professores já empregados. Como explici-tamos anteriormente, a dinâmica de contratações possível nas IES privadas possibilita um aumento muito rápido do nível de formação do seu quadro de professores, dessa forma, chamamos a atenção para a situação do docente que trabalha sem estabilidade, isto é, com a possibilidade da demissão constante-mente em sua vida.

Os professores das universidades privadas brasileiras são, em sua maioria, contratados sob um regime de trabalho horista, o que permite a esses docentes a dedicação para a docência em diversas instituições, pois segundo o Cadastro Nacional de Docentes de 2005.1, embora em média 86,3% minis-trem aulas em apenas uma IES, é significativo registrar que: a) 31.514 docen-tes atuam em mais de uma instituição; b) 4.840 atuam em três ou mais de três IES; e c) 730 docentes atuam em quatro ou mais instituições. Esse regime de trabalho nos indica também uma realidade desse profissional que tem uma relação com a qualidade do trabalho que ele desempenha, pois o professor se transforma em um mero “tarefeiro” que não tem tempo de refletir nem sobre a sua prática docente, nem sobre as suas condições de trabalho.

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494 SCREMIN, G. et al. - PERFIL INSTITUCIONAL/DOCENTE DOS PROFESSORES

Esses professores são, em sua maioria, do sexo masculino. Ainda que a predominância sobre o sexo feminino não seja expressiva, o ambiente da universidade acaba retransmitindo experiências e obstáculos que homens e mulheres enfrentam na sociedade em geral.

Sendo assim, nos permitimos concluir que os indicadores de qualida-de da educação são estabelecidos mais fortemente a partir de matizes políticas que levam em conta a necessidade de regulação, mais do que a avaliação como instrumento para a melhoria da qualidade do ensino oferecido, com indicadores estabelecidos com base em correntes teóricas coerentes. Dessa forma, segundo Morosini (2004), frente a um Estado regulador, surge essa tendência isomórfica nos processos de avaliação, o que leva as instituições a se expressarem pela produção científica. Assim, o mecanismo de avaliação é suplementado por uma série de outras informações que podem ser obtidas por meio de agências de fomento, revistas renomadas, programas de ensino e pesquisa financiados, assim como pela avaliação dos pesquisadores das IES.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entendemos que todos os processos de avaliação pelos quais a educa-ção está sujeita a passar ainda não consideram a dimensão pessoal dos sujeitos envolvidos nos processos educativos. Pois, basicamente, estamos tratando de professores e alunos, e as preocupações da avaliação, seja ela voltada para a regulação ou para a melhoria efetiva da qualidade, precisam ser pautadas em princípios humanos.

Com base nos achados teóricos e nas concepções sobre funções do-centes, entendemos que os três indicadores que representam as “Funções Docentes” são demasiadamente rudimentares quando comparados à com-plexidade exposta no conceito que o INEP adota para esse indicador. Desse modo, os indicadores de qualidade da Educação Superior brasileira podem avaliar a dimensão profissional docente, mas não as pessoas efetivamente envolvidas, tendo em vista a sua subjetividade. Sendo assim, os indicado-res de função docente (Regime de trabalho, grau de formação e sexo) têm uma contribuição que é parcial sobre a avaliação da qualidade do trabalho do professor. Entendemos ainda que esses indicadores, quando interpretados, deixam lacunas no entendimento sobre o que é válido em termos de avaliação da Educação Superior e o que não é.

Como podemos ver anteriormente, em nossa pesquisa, a avaliação em nosso país está pautada em um modelo de universidade pública e federal, e esse modelo muitas vezes não condiz com a grande maioria das instituições de Ensino Superior que temos. Como vimos, as IES privadas são em maior número em nosso país, justamente para atender a uma demanda de alunos que são excluídos do ensino público. Dessa forma, reforçamos o argumento de que o sistema de avaliação precisa ter uma base comum que seriam os indica-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 495

dores quantitativos e uma parte qualitativa que vai estabelecer se determinada instituição tem qualidade, levando em conta seu contexto e a realidade da comunidade em que está inserida.

A proposição de novos indicadores de qualidade para a Educação Superior obviamente é um desafio, pois acreditamos que a educação, que é um processo qualitativo, não pode ser avaliada por critérios unicamente quan-titativos. Desse modo, acreditamos que a avaliação da qualidade da Educação Superior poderia ser, de fato, melhorada, a partir do acréscimo de informações qualitativas ao sistema de coleta de informações. Poderiam ser criados indica-dores subdivididos em quantitativos (objetivando um diagnóstico) e qualitati-vos (objetivando as especificidades individuais e institucionais).

Não desconsideramos, de forma alguma, a importância dos dados quantitativos para essa avaliação, tendo em vista que eles se constituem como instrumentos eficientes no levantamento diagnóstico sobre a situação da nos-sa Educação Superior. No entanto, acrescentaríamos indicadores qualitativos justamente com o objetivo de desvendar, de forma mais específica, quem são as instituições as quais estamos avaliando, em que contexto estão inseridas, assim como quem são os professores e alunos que nelas estão.

Sendo assim, por considerarmos que os sistemas de indicadores têm sido um dos instrumentos mais importantes e utilizados em âmbito mundial para estudar e analisar o desenvolvimento, o desempenho e a qualidade dos sistemas nacionais de educação, é que desenvolvemos este estudo com o in-tuito de preservar as ações com resultados positivos e propor mudanças, quan-do necessárias, no âmbito da avaliação da qualidade dos sistemas de educação.

REFERÊNCIAS

ISAIA, S. M. de A; BOLZAN, D. P. V. Formação docente: em busca de indica-dores de qualidade. In: AUDY, J. L. N.; MOROSINI, M. C. (orgs.) Inovação e qualidade na universidade. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008.LEITE, D.; TUTIKIAN, J.; HOLZ, N. (org.) “Avaliação e compromisso – construção e prática da avaliação institucional em uma universidade pública”. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.MOROSINI, M. C. Educação superior e transnacionalização: avaliação/qua-lidade/acreditação. In: MANCEBO, D.; FÁVERO, M. de L. de A. (orgs.) Universidade: políticas, avaliação e trabalho docente. São Paulo: Cortez, 2004.RIES (Rede SulBrasileira de Investigadores da Educação Superior). Indicadores de Qualidade para a Educação Superior Brasileira. Edital n. 001/2006/INEP/Capes – 2006. Disponível em: http://www.inep.gov.br/sinaes Acesso em: 18 ago. 2008. Disponível em: http://www.inep.gov.br/thesaurus. Acesso em: 2 set. 2008.

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EIXO TEMÁTICO VI INDISSOCIABILIDADE E ENSINO DE GRADUAÇÃO

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O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO,

PESQUISA E EXTENSÃO EM QUESTÃO

Maria Isabel da Cunha Camila Guntzel

Rita de Cássia Rodrigues

O processo de redemocratização, vivido no Brasil nos anos 80, retomando a perspectiva republicana, colocou a Educação

Superior em uma condição essencial para as bases do Estado democrático. A demanda populacional por oportunidades educacionais provocou movimen-tos e mudanças em todos os níveis educativos. Foi um período de particular efervescência acadêmica, afetado diretamente pela possibilidade de redemo-cratização das estruturas internas da universidade, entendida como condição para o acompanhamento do novo momento institucional. A principal bandeira de luta constituía-se em fazer constar na Lei maior a conceituação da univer-sidade que incorporava o eixo da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão. Havia um consenso das bases chamadas progressistas de que essa definição seria capaz de garantir uma perspectiva mais universal de qualidade da Educação Superior, que teria assim um formato identitário estruturante, fa-zendo avançar a universidade para patamares de crítica e compromisso social, notadamente articulando os processos de produção do conhecimento.

Visitando os anais das reuniões do Fórum dos Pró-Reitores de Graduação das universidades brasileiras é possível perceber que esse espaço, à época, se constituía, talvez, na arena mais promissora de mobilização das desejadas mudanças, mas ainda com pouca sustentação teórica, advinda das ciências da educação e incipiente respaldo das políticas institucionais. A temá-tica da autoavaliação institucional vinha tomando força e, com ela, se tornava urgente e necessária a implementação de ações que dessem consequências a seus resultados.

Os desafios nacionais de transformação da Educação Superior no Brasil foram progressivamente afetados pelo contexto internacional, e o fe-nômeno da globalização trouxe impactos significativos para as políticas pú-blicas, em especial as da área social. Gradativamente, os projetos nacionais foram dando lugar às metanarrativas produzidas pelos órgãos mundiais de financiamento que anunciavam novos cenários nas disputas internacionais.

Nessa perspectiva que se aproxima da lógica concorrencial, as ava-liações internacionais foram dando cada vez mais importância e visibilidade aos produtos da pesquisa sobre os demais. O tripé, que se queria equilibrado, da pesquisa, do ensino e da extensão, sofre um abalo e anuncia referentes de

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500 CUNHA, M. I. et al. - O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

valor colocados em tensão. A literatura mostra que a extensão sempre foi o pilar de menor status e investimento acadêmico, por uma conjuntura histórica. Mas o ensino – que foi a base da função social da universidade por longo perí-odo − também se sente atingido em seu prestígio no contexto contemporâneo. No caso do Brasil, o desejado fortalecimento da pós-graduação stricto sensu favoreceu a criação de um sistema compartimentado, inclusive na administra-ção da avaliação e do financiamento, ocasionando uma perda de importância da graduação, que vai se massificando e vendo diminuída a sua legitimidade social.

Na mesma direção, a ampliação dos Programas de Pós-Graduação produziu um impacto significativo na formação docente e nas formas de re-crutamento dos professores universitários. Os saberes da base profissional foram perdendo terreno para os saberes da pesquisa, objeto da formação pós--graduada.

Entretanto, a experiência empírica nos mostra que os percursos de for-mação dos alunos de graduação, tanto o nível dos currículos como das práticas pedagógicas, raramente sofreram alteração conceitual com o perfil pós-gradu-ado dos professores. Se, por um lado, esses se tornaram mais competentes no domínio da pesquisa e do aprofundamento temático de sua área, bem como no desenvolvimento de significativas habilidades intelectuais, não raras vezes essa condição os afasta da necessária visão generalista e da capacidade arti-culadora de seu campo de conhecimento. Aprofundam a visão formativa pelo olhar da sua especialidade e diminuem a perspectiva de conjunto e a capaci-dade de apreender o fenômeno na sua totalidade.

Como, então, trabalhar com a tensão que envolve ensino e pesquisa no âmbito dos currículos universitários e nas práticas de ensinar e aprender que deveriam implementar? Poderia se afirmar que a formação em pesquisa é dispensável na Educação Superior? Por outro lado, seria ela suficiente?

Em tese, a pesquisa faz melhores os professores porque os ajuda a pensar, a duvidar, a compreender, sendo essas qualidades importantes na docência. Pode-se questionar se o bom ensino decorre da pesquisa, mas é pouco sustentável afirmar que o adjetivo “superior”, com o que se qualifica a educação de terceiro grau, não esteja intrinsecamente ligada à condição intelectual de produção do conhecimento, portanto às atividades investigati-vas. Entretanto, como afirma Hughes (2008, p. 41), “a crença de que existe uma relação entre ensino e pesquisa é mais forte do que as provas reais da mesma”. O autor ressalta, também, que a relação entre ensino e docência nunca se poderá demonstrar de todo e, por essa razão, se tem tomado a apren-dizagem como foco, elemento central de ambas as dimensões. Exemplifica que essa perspectiva se constituiu em um movimento presente nos anos 90 no Reino Unido, que aprofundava as relações entre investigação e aprendi-zagem, alcançando um patamar mais prático em relação aos currículos e às práticas pedagógicas.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 501

O equívoco, entretanto, é assumir que os saberes da pesquisa cons-tituem a única base da profissão de professor. Para Elton (2008), somente o saber pedagógico pode estabelecer a ponte entre investigação e docência. São esses os saberes que tornam possível a mediação entre os processos desen-cadeados em cada uma das dimensões constituintes da Educação Superior. Para o autor, trata-se de ensinar um “modo de investigação”, “considerando os estudantes peças-chave nos planos de estudo” (p. 146). Para fundamen-tar essa afirmativa, recorre a escritos de Humbolt, em 1810, acerca da futura Universidade de Berlim, defendendo que “as universidades devem propor a docência como se colocasse problemas ainda não resolvidos e, portanto, como um modo de investigação” (p. 148). Entretanto, Elton analisa a realidade da Educação Superior de forma crítica, dizendo que essa perspectiva passou ao largo das práticas acadêmicas. A tradição das aulas magistrais, centradas na erudição dos professores, preponderou no cenário da universidade.

Romper com essa perspectiva se constitui em um processo exigen-te que envolve reflexões epistemológicas e apropriação teórica dos cam-pos da docência, da aprendizagem e da avaliação (CUNHA, 1998, 2006; FERNANDES, 1999; MAYOR RUIZ, 2007). Essas, por sua vez, é que podem interferir na compreensão de currículos e práticas pedagógicas inovadoras, que aproximem as dimensões do ensino e da pesquisa. Entretanto, no contexto preponderante da carreira universitária, há poucos espaços para construção desses saberes e um reconhecimento frágil da sua legitimidade. Continua-se, então, com a preponderância dos currículos tradicionais e tomando somente como retórica a propalada indissociabilidade entre ensino e pesquisa.

Uma agenda propositiva está exigindo uma análise mais intensa da re-lação ensino e pesquisa, aprofundando o conceito de qualidade da Educação Superior e de como essas reflexões políticas e posições epistemológicas inci-dem sobre os currículos e sobre as práticas de ensinar e aprender que se desen-volvem na universidade. Vale tomar como pano de fundo as mudanças sociais e estruturais que produzem fenômenos novos, como a massificação do acesso ao terceiro grau e a emergência desse nível de escolarização para a grande maioria de jovens e adultos. Quantos dilemas nunca foram adequadamente resolvidos? Como as novas configurações estão a exigir revisões dos conceitos consoli-dados? Que lugares abrigam a discussão desses temas no cenário acadêmico?

Há, também, nesse caso, um pressuposto inquestionável de que a pes-quisa qualifica o ensino, e sobre ele há uma tácita concordância que todos rati-ficamos. Mas será que essa relação se faz de forma tão linear? Sempre que há pesquisa haverá ensino de qualidade? Serão necessárias outras mediações para que essa relação aconteça? Quando e em que condições essa assertiva seria con-firmada? Que intervenção pedagógica seria importante para esse fim? Os saberes que sustentam a pesquisa serão suficientes para a realização de práticas pedagó-gicas significativas? Como essas questões impactam o ensino de graduação na Educação Superior brasileira? Quando se tornam indicadores de qualidade?

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502 CUNHA, M. I. et al. - O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

Essas são questões que estimularam a pesquisa aqui apresentada, cuja motivação estimulou aprofundar as questões relacionadas à formação/desen-volvimento profissional dos docentes e os lugares e características da forma-ção, bem como a qualidade do ensino de graduação que desemboca na relação ensino e pesquisa.

Se a formação do professor universitário centra-se na condição de pes-quisa proporcionada pela pós-graduação stricto sensu, é porque há o pressu-posto de que a pesquisa qualifica o ensino, e este dela decorre. Ao colocar em questão essa assertiva, é possível perguntar em que medida centrar a formação e valorização do docente universitário nas habilidades de pesquisa impacta a qualidade da Educação Superior?

Para cercar o objeto de investigação de forma a apreender sua com-plexidade, foram propostas as seguintes questões de pesquisa: Há relação ine-quívoca de qualidade entre pesquisa e ensino? Que revela essa realidade em relação ao conceito de indissociabilidade do ensino com a pesquisa? A relação entre ensino e pesquisa é que caracteriza como “superior” a educação univer-sitária? Se há a legitimação de que os saberes da pesquisa é que qualificam a Educação Superior, que compreensão de qualidade sustenta essa premissa? Que conceito de qualidade é presente nas representações de professores e alunos da Educação Superior? Por que o lugar da formação para a pesquisa se transfor-mou em território e lugar da formação para o docente universitário? Por que os saberes próprios da docência não alcançam essa condição? Poder-se-ia chamar esse profissional, então, de professor? Os indicadores tomados para “medir” a condição investigativa dos professores (produtos e publicações; ou processos) têm impacto na qualidade do ensino? Como os docentes produzem (ou não) as relações de mediação entre pesquisa e ensino nas suas práticas pedagógicas? De que natureza são essas mediações? Como os docentes as constroem? Que traje-tórias na carreira auxiliam os professores a construírem mediações entre pesqui-sa e ensino? O que seria importante aportar aos professores iniciantes? Como os estudantes de graduação percebem a relação pesquisa e ensino? Consideram-na como eixo da qualidade da Educação Superior? Quando percebem que o exercí-cio da pesquisa faz diferença na prática pedagógica que vivenciam?

Como já explicitado, o objeto principal deste estudo tomou a relação da pesquisa e do ensino e seu impacto da concepção de docência e qualidade da Educação Superior. Considerando a abrangência do grupo de pesquisa, fo-ram mapeados os eixos de análise que a problemática sugere.

Eixo I – A literatura e a legislação referente à qualidade da Educação Superior. Nesse contexto, procurou-se resgatar, desde a perspectiva histórica, a matriz da concepção que toma a pesquisa como função da universidade e seus desdobramentos na cultura acadêmica contemporânea, em especial no caso do Brasil. Foram realizadas entrevistas com intelectuais brasileiros que escrevem sobre o tema e têm, com sua produção, especial impacto na área da Educação Superior.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 503

Eixo II – As políticas institucionais. Exploram-se os Anais do Forgrad, analisando as políticas indutoras das culturas acadêmicas, entendendo os es-paços institucionais como componentes fundantes dos processos que produ-zem indicadores de qualidade da Educação Superior. Foram realizadas entre-vistas com pró-reitores de graduação no sentido de perceber como a questão da qualidade e a relação ensino-pesquisa e extensão perpassam os projetos pedagógicos institucionais e as práticas daí recorrentes.

Eixo III – Os docentes pesquisadores com expressiva trajetória e se-nioridade investigativa para analisar suas representações e práticas da relação da pesquisa com o ensino. A intenção foi relacionar a sua formação, a traje-tória de investigação que marca sua carreira com os desafios de ensinar na graduação. Também foram as entrevistas a principal estratégia de coleta de dados.

Eixo IV – Os docentes, que não são pesquisadores, no conceito stricto sensu, reconhecidos positivamente pelos estudantes. No contexto desse bloco, por meio das entrevistas, procurou-se compreender, com base na experiência e trajetória dos professores prestigiados pelos estudantes, como percebem a relação ensino e pesquisa considerando que são eles os atores propositivos das práticas positivas na aula universitária.

Eixo V – Os docentes iniciantes. Deu-se especial atenção aos docentes iniciantes para compreender como processam a passagem entre uma formação que privilegia a pesquisa e uma prática significativamente exigente de docên-cia. Foram eles também entrevistados com base nos objetivos do estudo.

Eixo VI – Os estudantes. Partindo do pressuposto da qualidade alicer-çada na relação pesquisa e ensino, se quis perceber/compreender como os es-tudantes reagem a essa concepção, aproximando-os das representações e per-cepções que os mesmos fazem desse fenômeno, com base em suas vivências acadêmicas. Para a coleta de dados desse Eixo, foram aplicados questionários em diferentes IES e a estudantes de distintas carreiras.

Eixo VII – As experiências de ensino em EAD (Educação a Distância). Dada a ampliação dessa modalidade de ensino no contexto nacional, tomou--se como um Eixo especial a análise da relação ensino e pesquisa na EAD. Para tanto, foram entrevistados docentes gestores de programas em diferentes IES e analisados os materiais institucionais que são utilizados nas plataformas disponíveis.

Eixo VIII – As vozes da sociedade. Com o intuito de cercar o objeto de pesquisa da forma mais abrangente, tomamos a perspectiva da sociedade como mais um segmento que pode auxiliar a compreensão do fenômeno da qualidade do ensino de graduação, no marco conceitual da relação ensino e pesquisa. Foram entrevistadas pessoas que, desde seu lugar profissional, rece-bem os estudantes egressos dos cursos de graduação, no sentido de analisar a percepção deles de qualidade da formação.

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504 CUNHA, M. I. et al. - O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

A investigação teve caráter interinstitucional, como parte da trajetória do grupo de pesquisa. Dele participam docentes da Unisinos e de outras IES, alunos mestrandos e doutorandos, bem como bolsistas de iniciação científica. A parceria se estabeleceu com a UFPel, UNESC, FURG, Unipampa, UFPR, UEFES, UNEB e UDESC, por intermédio dos pesquisadores, doutorandos e pós-doutorandos.

Os resultados são múltiplos e complexos em função da multiplicidade de Eixos. Cada um deles assumiu condições de uma pesquisa em si, ao mesmo tempo que aportam informações para a investigação geral. A reflexão teórica foi realizada em conjunto e os conceitos fundantes foram definidos para todos os Eixos, guardada a possibilidade de ampliação teórica para dar sustentação à especificidade de cada caso.

Nas conclusões preliminares foi possível inferir que:• Os múltiplos estudos anunciam a nebulosidade conceitual que

cerca a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, desde o discurso dos intelectuais, passando pelos gestores acadêmicos, até os atores principais, docentes e estudantes. Essa condição é compatível com a literatura que nos serviu de base no estudo, capitaneada pelos teóricos anglo-saxões (BARNETT et al., 2008).

• Essa condição afeta ainda mais a complexidade que se estabe-lece em torno do conceito de qualidade da Educação Superior, dada a óbvia dificuldade de estabelecer parâmetros e indica-dores.

• Há pouca reflexão sobre o papel da pesquisa no ensino de graduação, incluindo visões seletivas centradas nos poucos estudantes que têm oportunidade de vivenciar a experiência da iniciação científica.

• A formação pós-graduada dos docentes não contempla os sa-beres do ensino, atingindo, não raras vezes, a qualidade do ensino que ministram e colocando em questão a sua profis-sionalidade.

• As compreensões da relação ensino e pesquisa são atingidas pelas culturas dos campos científicos que compõem a univer-sidade.

• Os docentes iniciantes são os mais impactados com o dese-quilíbrio entre a formação que tiveram e os desafios das prá-ticas pedagógicas que precisam enfrentar.

• As IES, quando o fazem, desenvolvem atividades pontuais di-rigidas aos docentes ingressantes, com raro acompanhamento de suas práticas e construção profissional.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 505

• Há docentes que, mesmo sem o exercício regular de pesquisa, por conta de fatores pessoais e institucionais, têm significati-vo êxito como professores. Em geral, tomam a pesquisa como princípio pedagógico, no exercício de uma didática que assu-me a epistemologia investigativa.

• Os gestores dos programas de formação em EAD nem sempre têm clareza da relação ensino e pesquisa. O material institu-cional é que pode explicitar esse valor e sugerir a pesquisa como eixo metodológico.

• Os representantes da sociedade explicitam qualidades que va-lorizam nos egressos, mas não têm clareza da importância da relação ensino e pesquisa na universidade.

De uma forma sucinta, para fins desse informe, essas são as principais conclusões que a pesquisa aponta. São elas exploradas exaustivamente nos relatórios de cada Eixo e que desdobram essa síntese contemplando especifi-cidades e ampliando reflexões.

O que parece ser o mais importante refere-se a um contexto nacional e internacional em que os discursos sobre a qualidade e a excelência se des-dobram e se ampliam, ao mesmo tempo que se evidencia a falta de reflexão sobre os constructos – universais e/ou locais – que deveriam orientar as comu-nidades epistêmicas e universitárias. Sem essa condição, os discursos se insti-tuem sem uma base conceitual clara, e as práticas acadêmicas são afetadas por visões pontuais e pouco reflexivas. Certamente não se advoga aqui parâmetros únicos e inflexíveis, mas se reivindica uma responsabilidade sobre a interpre-tação conceitual e prática sobre os discursos de qualidade que são produzidos.

REFERÊNCIAS

BARNETT, Ronald (Ed.). Para una transformación de la universidad. Nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, 2008.CUNHA, Maria Isabel da. O professor universitário na transição de paradig-mas. Araraquara: JM Editora, 1988.ELTON, Lewis. El saber y el vínculo entre la investigación y la docencia. In: BARNETT, Ronald (Ed.). Para una transformación de la universidad. Nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, 2008.FERNADES, Cleoni Maria Barbosa. Sala de aula universitária – ruptu-ra, memória educativa, territorialidade – o desafio da construção pedagó-gica do conhecimento. Tese (doutorado). Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 1999.

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506 CUNHA, M. I. et al. - O REFERENTE DA QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

HUGHES, Mark. Los mitos en torno de lãs relaciones entre investigación y docencia en lãs universidades. In: BARNETT, Ronald (Ed.). Para una trans-formación de la universidad. Nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, 2008.PAOLI, Niuvenius. O discurso da indissociabilidade do ensino e da pesquisa: elementos para uma discussão. Caderno CEDES - Educação Superior: auto-nomia, pesquisa, extensão, ensino e qualidade. São Paulo: Cortez Editora, n. 22, p. 27-52, 1988.PIMENTA, Selma; ANASTASIOU, Lea. Docência no Ensino Superior. São Paulo: Cortez Editora, 2000.RUIZ MAYOR, Cristina (org.). El asesoramiento pedagógico para La for-mación docente del profesorado universitario. Ed. Universidade de Sevilha, Universidade de Sevilha, 2007.

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A RELAÇÃO ENSINO/PESQUISA: CONCEPÇÕES E TENSIONAMENTOS

Mari Margarete dos Santos Forster Maria Antonia Ramos de Azevedo

Cristina Bohn Citolin Eliane Lourdes Felden Sandra Regina Soares Elisa Prestes Massena

O presente trabalho explora um recorte da pesquisa “Qualidade do ensino de graduação: a relação entre ensino, pesquisa e desenvol-

vimento profissional docente”, em andamento, inserida no contexto do grupo Formação de Professores, Ensino e Avaliação.1 Para nos aproximarmos da temática, as análises vêm sendo realizadas em múltiplos eixos; para fins deste texto, dedicamo-nos a ouvir professores pesquisadores consolidados, de di-ferentes áreas do conhecimento, atuantes em instituições de Ensino Superior, públicas e privadas, nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Bahia.

A coleta de dados foi realizada com base em critérios que nortearam a escolha dos parceiros da pesquisa. Nesse caso, mostrou-se relevante a experi-ência de docência universitária e pesquisa, de professores reconhecidos por sua produção científica, consolidada por bolsas de produtividade oferecidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Partindo desse horizonte, contatamos dezoito atores, cujas considerações fo-ram registradas por entrevistas semiestruturadas e questionários. As questões a eles propostas abarcam provocações à explanação acerca de pressupostos, aprendizagens e saberes implicados na docência e na pesquisa, da relação en-tre essas duas instâncias e possíveis tensionamentos no exercício do magisté-rio, sendo a categoria da qualidade do Ensino Superior fundante em todas as indagações. As políticas educativas internas e externas também entrecortaram as considerações; o período de coleta deu-se entre julho de 2009 e julho de 2010. Visando à ampliação da análise interpretativa, contemplamos represen-tantes da área da Medicina, Odontologia, Biologia, Educação, Administração, Geologia, Agronomia, Ecologia, História, Urbanismo, Química e Letras.

CONCEPÇÕES DE ENSINO E PESQUISAO tripé sobre o qual a universidade se constituiu – ensino, pesquisa

e extensão – para além de geradora de conhecimentos e inovação, é também

1 Coordenado pela Professora doutora Maria Isabel da Cunha. Projeto financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que possui como objetivo principal compreender a rela-ção entre ensino e pesquisa na graduação e seu impacto na formação e no desempenho do docente universitário.

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508 FORSTER, M. M. S. et al. - A RELAÇÃO ENSINO/PESQUISA

vetor de tensionamentos e disparidades na atualidade. O quadro se agudiza ao tomarmos em conta as inúmeras demandas e frentes pelas quais a univer-sidade brasileira é atingida, entre o atendimento de anseios da sociedade e as induções do mercado.

No epicentro desses movimentos, interpelados por ações de avaliação e regulação, estão os professores, que se veem mediante o desafio de articular o ensino na graduação e as requisições do exercício da pesquisa. Este tex-to lançará olhares para as vivências desses sujeitos, buscando compreender como eles respondem ao desafio de associar a docência universitária à pesqui-sa e como concebem essa relação.

Para Balzan (2002), a indissociabilidade entre ensino e pesquisa per-passa o entendimento de que a relação entre esses dois polos deve ser en-tendida, projetada e trabalhada como princípio metodológico: a pesquisa é trabalhada como ação teórico-metodológica que alimenta o ato de ensinar. Nas palavras do autor, entranham-se reflexões sobre o papel que o ensino e a pesquisa poderiam exercer no cenário universitário e na sociedade:

Como formar um aluno com a consciência clara de que sua formação jamais será completa, devendo se tornar um aprendiz durante a vida toda? De que adiantaria essa consciência se ele não dispusesse de autonomia de voo, isto é, da capacidade de aprender por conta própria, que somente um forte e sistemático exercício em pesquisa pode lhe assegurar? (2002, p. 116).

A fim de nos associarmos a esses questionamentos, neste recorte do estudo, ouvindo os professores pesquisadores consolidados, apresentamos al-gumas de suas ponderações. De imediato, cabe referir que todos os entrevis-tados se revelam como protagonistas de um processo que coloca dilemas e realizações àqueles que se propõem a integrar o ensino de graduação e a pes-quisa nas universidades brasileiras. Assim, a interlocução com esses sujeitos evidenciou várias dimensões quanto a essa relação na universidade, refletindo a multiplicidade desse território. Nesse caso, por se tratar de uma pesquisa interinstitucional, com representantes de distintas áreas do conhecimento, é necessário considerar, também, que contextos diferenciados possam impactar de distintas formas as concepções desses docentes.

Ao serem instados a discorrer sobre o ensino na graduação e a pesqui-sa, os posicionamentos dos entrevistados convergiram, especialmente quanto: a uma pretensa qualidade de que se reveste a docência por meio da pesquisa; à ampliação, atualização e revisão constante de conhecimentos, por meio da pesquisa, que chegam às salas da graduação; ao apuramento da ação de orien-tação de trabalhos de conclusão de curso e outros; e à aproximação dos dados discutidos em aula, oriundos da pesquisa do professor, com a realidade dos es-tudantes, muitas vezes não discutida em bibliografias internacionais utilizadas na graduação. Outras ideias, tais como: “Não consigo me ver como professor se não estiver envolvido com as questões que estudo, com a pesquisa que faço”; “Eu acredito [...] que o processo educativo tem de ter essa dimensão

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 509

de pesquisa”; e “A condição de docente também qualifica muito a pesquisa prática” ilustram a premissa da qualidade ligada à indissociabilidade entre ensino de graduação e pesquisa.

Por essa via, ao observarmos os dizeres dos interlocutores, percebem--se variadas formas de conceber a pesquisa e sua relação com o ensino da graduação. Alguns dizeres revelam a pesquisa como fonte de resultados a serem apresentados em sala de aula, como meio de atualização das informa-ções repassadas aos estudantes. Saberes relacionados ao constructo teórico oriundo da pesquisa são bastante valorizados por esse grupo de entrevistados. Para isso, segundo eles, é relevante ser um bom comunicador, dominar o tema, atualizar-se permanentemente e desejar transmitir o que construiu. Essa visão de indissociabilidade ensino/pesquisa, segundo Cunha (2010), é a mais usual e tradicional, centrando-se na distribuição do conhecimento. Os produtos da pesquisa seriam acessados de forma pública e universal pelos alunos, que se beneficiariam com isso. Segundo a autora, essa posição, ainda que defensável nos seus argumentos e na sua lógica, suscita questionamentos, pois pode não favorecer uma visão mais avançada do aprender. Outros interlocutores, em uma direção complementar a essa, parecem apontar a pesquisa como apli-cação, destacando que as disciplinas profissionalizantes, ligadas à linha de pesquisa compatível ao seu campo de estudo, favorecem a análise, discussão e revisão dos conhecimentos; indicam que a pesquisa traz um conhecimento daquilo que é mais importante para o ensino, orientando a seleção de informa-ções mais relevantes a serem desenvolvidas; apontam, também, nessa direção, que o docente desenvolve, com a pesquisa, uma maior autonomia em relação à análise de materiais didáticos a serem usados, pois pode aplicar os dados de suas próprias pesquisas; outro argumento que consolida essa concepção o é de que o domínio de métodos e técnicas de pesquisa impõe qualidade à docência, especialmente ao favorecer a análise de dados a ser apresentada aos alunos.

Há também, entre os nossos interlocutores, ideias que remetem à pes-quisa como ato formativo, intrinsecamente relacionado aos processos educati-vos no ensino de graduação, ao encontro do que defende Demo (2009, p. 78): “para o aluno aprender, tem de pesquisar, principalmente, para se formar de maneira adequada. Pesquisa não se reduz a conhecimento de ponta, mas é, an-tes de tudo, ambiente de aprendizagem”. Segundo os entrevistados: “O ensino precisa da reflexão, e da criatividade que o exercício da pesquisa pode dar, por mais simples que seja. Pesquisar faz parte da vida”; “A pesquisa tem se mostrado ferramenta essencial no desenvolvimento de conhecimento crítico por parte dos estudantes”; e “Uma coisa que a pesquisa faz é ajudar a gente a abrir os olhos, abrir os ouvidos para as coisas que estão acontecendo. Acho que uma grande coisa da pesquisa é isso. [...] um papel do ensino é ajudar que essa capacidade também se desenvolva”.

É possível observar, nessas diferentes concepções, duas distinções centrais: a visão do ensino com pesquisa e a do ensino para pesquisa. O pri-

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meiro, como entende Paoli (1988), visa ao desenvolvimento de habilidades intelectuais fundamentais, como “[…] decompor e recompor argumentos, estabelecer relações e elaborar abstrações a partir de regularidades e discre-pâncias de dados e fatos, produzindo um certo nível de interpretação” (p. 38), envolvendo uma organização nova de ideias e não uma reprodução dos auto-res estudados, na perspectiva de “[...] formar pessoas com discernimento, com a percepção aguçada para lidar com o conhecimento, com a experiência de ter vivenciado alguns processos básicos contidos no seu modo de produção” (p. 39). Consiste ainda em um “[…] passo anterior ao ensino para a pesquisa ou para a formação do pesquisador profissional ou acadêmico” (p. 39).

A adoção da estratégia metodológica do ensino com pesquisa na gra-duação, como afirma Balzan (2002), é condição necessária para que se al-cance um ensino de qualidade, sobretudo no contexto atual, marcado pela produção e profusão de conhecimentos de forma nunca antes vista. Essa rea-lidade desafia a universidade e seus professores a centrarem seu trabalho na formação de sujeitos capazes de lidar com a pluralidade de conhecimento e de saber buscar, selecionar, relacionar, interpretar, resolver problemas inéditos de forma construtiva e autônoma ao longo da sua trajetória profissional. Tais ha-bilidades se aprendem com o exercício da problematização e da investigação no contexto formativo.

Discute-se, ainda, como o ensino com pesquisa favorece uma relação dialética e dialógica entre teoria e prática, desafiando os estudantes a descons-truírem a expectativa da teoria que se encaixa como receita no exercício da prática, reforçada pela formação baseada na racionalidade técnica. Contreras (2002) nos ajuda nessa reflexão ao dizer que: “[...] a prática é em si um modo de pesquisar, de experimentar com a situação para elaborar novas compreen-sões adequadas ao caso, ao mesmo tempo em que se dá a transformação da situação” (p. 111).

Já ensino para pesquisa, mais voltado para a formação do pesquisador, implica, segundo Paoli (1988, p. 39):

[…] a produção de um conhecimento ou interpretação original, que significasse algo novo, que acrescentasse elementos para um avanço numa dada área de co-nhecimento […] o uso de rigor na produção de dados e interpretações, seguindo os novos critérios que lentamente vinham sendo adotados pelas diferentes co-munidades científicas […].

Pressupõem-se habilidades como originalidade, rigor e domínio acer-ca do objeto em estudo e, portanto, um maior grau de aprofundamento do que é esperado na proposta do ensino com pesquisa.

Os entrevistados relataram benefícios que refletem na qualidade do seu ensino da graduação, oriundos do exercício da pesquisa, apontando que a pesquisa amplia a interação e a criticidade frente ao meio de atuação profis-sional, à área de estudo ou à sala de aula; promove sua constante atualização, amparando as construções teóricas por eles produzidas; mobiliza, também,

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 511

seu espírito investigativo, desenvolvendo a sistematização, a troca entre pares e a reflexão. Os alunos, ainda segundo nossos interlocutores, são beneficiados pela variedade e profundidade de dados apresentados pelos professores pes-quisadores; pelo estímulo ao exercício da pesquisa, seja por meio de exem-plos bem-sucedidos de investigações de seus docentes, seja pelo envolvimen-to nessas pesquisas; pela imersão no âmbito local, por meio das pesquisas; pelo exercício da pergunta e pelo desenvolvimento de conhecimento crítico, de uma racionalidade crítica, que amplia as possibilidades de intervenção no mundo. Tanto professores quanto alunos aumentariam seu campo de visão, construindo, revendo e discutindo novos conhecimentos, desenvolvendo pro-cessos pedagógicos coletivos de troca, de debate e de aprendizagem signifi-cativas.

Os professores pesquisadores destacaram que as habilidades constitu-ídas por meio do exercício de pesquisa, como a indagação, a crítica, a criativi-dade e a flexibilidade, influenciam aquelas ligadas à docência. Nas suas pon-derações, independentemente da área de conhecimento, a pesquisa influencia a qualidade do ensino de graduação: “A pesquisa exige o desenvolvimento de um raciocínio fundamentado em metodologia científica, a qual facilita a exposição do professor de um determinado tema durante uma aula”; “A ri-queza de detalhes que consigo trabalhar com meus alunos [...] só é possível em função da participação e da pesquisa que faço. Isso está intimamente re-lacionado ao desenvolvimento da criatividade que esse exercício permite”; “O professor pesquisador é sempre mais atualizado e mais crítico. Isso influi diretamente na qualidade de sua atuação na graduação”; “A pesquisa en-riquece muito a minha aula, porque permite esse olhar amplo, não apenas algo muito focado apenas no meu dia a dia, na rotina”; “A condição de pes-quisador acrescenta, ao espírito investigativo, em geral, ‘sistematização’ [no sentido assumido por Bernard Charlot], quer dentro de nós, quer na partilha com outros, quer nos procedimentos metodológicos [empíricos], quer nos re-flexivos e de pensamento”.

A premissa da qualidade de ensino da graduação ligada à pesquisa também circula entre tensionamentos, e vários são os condicionantes impos-tos a essa relação. Os entrevistados trazem alguns elementos que devem ser considerados, com ênfase à valorização excessiva para a produção científica em detrimento do ensino. Tal fator impacta a exigência de produtividade alia-da à pesquisa, que toma tempo da docência ao gerar demandas de publicações, de gestão de grupos de pesquisa e de foco na pós-graduação; e leva à falta de disposição para investir na formação pedagógica em função da supervalori-zação da pesquisa. Quanto à graduação, sua lógica de ensino é contraditória frente à da pós-graduação; a pesquisa mostra-se, em muitas situações, restrita a programas de Iniciação Científica; o recrutamento de docentes, com ênfase ao ranqueamento de produções científicas, decorre em uma seleção de nova geração de doutores que sabe pesquisar, mas não detém experiência na do-

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512 FORSTER, M. M. S. et al. - A RELAÇÃO ENSINO/PESQUISA

cência; emergem tensões entre a concepção de docência aprendida e as novas demandas pedagógicas. Questões estruturais, como o excessivo número de alunos nas salas de aula da graduação, também dificultam a inter-relação entre ensino e pesquisa.

CONSIDERAÇÕES FINAISO Brasil tem, por razões diversas, a tradição acadêmica muito tardia-

mente ligada à pesquisa. Os frágeis e recentes movimentos de liberdade de-mocrática podem ter contribuído com isso. É grande a dúvida acerca do papel que a docência e a investigação de fato ocupam na dinâmica universitária, acabando por embaçar ainda mais o potencial existente no campo da docência articulada ou não à pesquisa no contexto atual. Scott (apud Barnett, 2008) aponta que esses dilemas acabam por estar vinculados às próprias lideranças institucionais que, por falta de estratégias e prioridades, passam a atrapalhar as atividades da docência e da pesquisa, ora por apontar uma perspectiva po-lítica, ora por buscar uma perspectiva intelectual.

A articulação e/ou a desarticulação da docência com a pesquisa pro-duz um tipo de entendimento acerca do papel da universidade na atualidade e, consequentemente, a ação do professor universitário acaba por se pautar na valoração ou não dessas atividades no desenvolvimento da sua intervenção profissional.

Para Scott (apud Barnett, 2008), é necessária uma organização insti-tucional que possa articular as relações entre investigação e docência, mas, para isso, é fundamental enxergar mudanças nas práticas da investigação e da própria docência, dando uma nova conceituação à docência e reinventando a investigação.

Podemos apontar, em uma tentativa de síntese inicial, alguns pontos que serão ainda amadurecidos em outras análises em andamento:

a) a docência exerce um papel importante na profissionalidade dos sujeitos, mas é difícil de ser desenvolvida porque é cercada de tensionamen-tos e complexidades; b) há restrições para maior envolvimento com a docên-cia na graduação, se comparada ao ato de fazer pesquisa, haja vista o status que esta ocupa no contexto da universidade e das regulações governamentais; c) a diferente natureza das áreas de conhecimento ouvidas projeta divergên-cias desafiadoras, mas a central reside na concepção de aprendizagem como construção de conhecimento; d) as políticas internas institucionais precisam ser consolidadas na definição do que efetivamente interessa à universidade, revertendo a seu favor ações coletivas solidárias e cooperativas como forma de resistência às pressões externas; e) a pesquisa e o ensino devem caminhar com esse projeto, na busca de um trabalho de qualidade, que repercuta no entorno social.

Por fim, acreditamos que a própria maneira de conceber a formação profissional poderia passar por uma transformação, sob uma ótica da totali-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 513

dade, pois as Instituições de Ensino Superior, como espaços educativos, são também responsáveis pela formação de seus membros como cidadãos e pro-fissionais competentes.

REFERÊNCIAS

BALZAN, Newton C. Indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão como prin-cípio metodológico. In: VEIGA, Ilma P.; CASTANHO, M. L. (orgs.) Pedagogia Universitária: a aula em foco. 3. ed. Campinas: Papirus, 2002.CONTRERAS, José. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002.CUNHA M. I. da (org). Trajetórias e lugares de formação da docência uni-versitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara: Junqueira & Marin; Brasília: CAPES: CNPq, 2010.DEMO, Pedro. Pesquisa: princípio científico e educativo. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2009.PAOLI, Niuvenius J. O princípio da indissociabilidade do ensino e da pesqui-sa. Cadernos CEDES 22. Educação Superior: autonomia, pesquisa, extensão, ensino e qualidade. São Paulo: Cortez, 1988.SCOTT, Peter. Divergencia ou convergencia? Las relaciones entre docencia e investigación de la universidad superior de masas. In: BARNETT, Ronald (Ed.). Para una transformación de la universidad: nuevas relaciones entre in-vestigación, saber y docencia. Barcelona: ediciones Octaedro, 2008, p. 75-90.

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A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO E PESQUISA NO ENSINO SUPERIOR:

O QUE DIZEM OS ALUNOS?

Alba Regina Battisti de Souza Denise Rosa Medeiros

O s estudos sobre a docência no Ensino Superior podem ser con-siderados recentes. Ao examinarmos as produções sobre o tema,

identifica-se que apenas nos últimos vinte anos passaram a ser divulgadas de forma mais sistemática.

Dentre muitas questões abordadas pelos pesquisadores, Pimenta e Anastasiou (2002) indagam a forma de identificação dos professores do Ensino Superior, por exemplo: um físico, um advogado, um médico, um geó-grafo e um engenheiro se reconhecem profissionalmente como profissionais dessas áreas ou como docentes? Com as devidas ressalvas, podemos supor que se identificam, em primeira instância, com a formação básica, ou seja, como advogado, médico, engenheiro etc. Observam-se que as exceções se re-ferem, de forma geral, aos profissionais que possuem uma carreira acadêmica e experiência profissional com base na educação. Para as autoras, isso reflete, de certa forma, a supremacia do conhecimento profissional específico sobre o pedagógico e certo desconhecimento científico do que seja o processo de ensino e de aprendizagem, pelo qual profissionais oriundos de diversas áreas passam a ser responsáveis.

Este trabalho apresenta e analisa as percepções dos estudantes de gra-duação sobre a relação entre ensino e pesquisa na universidade. Faz parte de uma ampla pesquisa que envolve pesquisadores de várias instituições, além de mestrandos, doutorandos e bolsistas de Iniciação Científica, e está organizada em diferentes eixos de investigação, sendo nomeado “os estudantes” como objeto do presente artigo.

Com base em uma abordagem qualitativa, são analisados os depoimen-tos de 116 estudantes de graduação de sete universidades privadas e públicas do Brasil, tendo como questões orientadoras: A dimensão baseada na relação ensino e pesquisa é significativa para os estudantes? Os estudantes percebem a condição do professor pesquisador como uma dimensão que qualifica o en-sino que ministra? Em que dimensão? Como essa condição é percebida nas práticas cotidianas da sala de aula? Que indicadores são percebidos para tal?

Os estudantes participantes da pesquisa frequentam os seguintes cursos: Engenharia Florestal; Engenharia de Materiais; Engenharia Civil; Física; Agronomia; Engenharias e Agrárias; Pedagogia; Artes Visuais; Letras; Educação Física; Matemática; Ciências Biológicas; Administração; Direito; Moda; Ciências Sociais Aplicadas; Nutrição; Psicologia e Medicina Veterinária.

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516 SOUZA, A. R. B. et al. - A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO

Ao dar “voz” aos acadêmicos, entende-se que quem integra esse co-letivo tem muito a dizer sobre o Ensino Superior. Estudos sobre os estudantes universitários e sua relação com o conhecimento são escassos, de alguma forma parece que ao referirmo-nos a eles, assumimos uma perspectiva universal, como se somente a condição acadêmica fosse expressão inquestionável desse grupo. Ficam submersas muitas outras características, como origem social, gênero, fai-xa etária, capital cultural prévio, valores e expectativas motivacionais. Em geral, os estudantes universitários são vistos como adultos, havendo pouca curiosida-de investigativa sobre seus percursos, subjetividades e estilos cognitivos.

Além disso, como afirma Cunha (1988), a sala de aula é um lugar privilegiado, e estudar o que nela acontece e porque acontece é tarefa pri-meira daqueles que se encontram envolvidos com a educação de professo-res comprometidos com uma prática pedagógica competente. Considerar as percepções e opiniões daqueles que fazem parte − com o professor − do ato pedagógico, pode permitir a melhor compreensão do ensino e sua relação com a pesquisa.

Connel (2010), ao desenvolver um estudo sobre o significado do que é ser um bom professor, reconhece que esse conceito varia de acordo com o contexto histórico e cultural. Isso significa deduzir que não precisamos de um retrato do “bom professor” no singular, mas “bons professores” no “plural”, no sentido coletivo, pois essa concepção é variável. Dessa forma, elaborar as políticas educacionais é levar em conta essa condição e estar atento às ma-nifestações culturais que expressam a compreensão majoritária. Certamente também é preciso ouvir os profissionais e incluir as opiniões dos estudantes.

Neste texto, organizamos a análise em quatro agrupamentos: percep-ções sobre a relação entre ensino e pesquisa na sala de aula; ênfase no en-sino – dissociação entre ensino e pesquisa na docência; ênfase na pesquisa − importância da pesquisa para uma boa docência; integração entre ensino e pesquisa na sala de aula – questionamentos e ponderações. As respostas dos alunos serão apresentadas desta forma: E (Estudante) seguido de um numeral (número do questionário) e do curso que frequenta.

PERCEPÇÕES SOBRE A RELAÇÃO ENTRE ENSINO E PESQUISA NA SALA DE AULAAo serem indagados se é possível perceber a relação entre ensino e

pesquisa na sala de aula, os estudantes, em sua maioria, afirmam que sim. Para alguns, essas afirmações decorrem das posturas dos docentes, como destaca um acadêmico de Agronomia: “Sim, pois dentro da Agronomia, como muitos professores trabalham com pesquisas, eles se utilizam de suas experiências para muitas vezes exemplificar a matéria que está sendo ministrada” (E29). Nessa direção, um estudante de Pedagogia reitera a opinião anterior: “Alguns (os mais envolvidos com pesquisa) trazem alguns dados e experiências sobre suas próprias pesquisas e de seus bolsistas” (E2).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 517

Para alguns acadêmicos, as pesquisas realizadas pelos professores podem representar uma possibilidade de complementação da aprendizagem, movimentando os alunos em busca de mais conhecimentos:

Sim. Vários professores estão engajados em projetos de pesquisa e utilizam os dados desses projetos para complementar o ensino passado em sala de aula. Além disso, vários alunos procuram grupos de pesquisa para complementar o aprendizado em sala de aula (E26 − Medicina Veterinária).

Sim, principalmente em disciplinas dadas por professores envolvidos em projetos de pesquisa. Inclusive, poder participar destes projetos enriquece nos-sa formação (E7 − Nutrição).

Isso também pode ser percebido na fala de um aluno do curso de Agronomia de uma universidade pública federal, além do reconhecimento da pesquisa como uma possibilidade de aplicação dos conhecimentos:

Pesquisando, os professores podem informar avanços tecnológicos aos alu-nos. Com a pesquisa, o aluno pratica e pode levar o que aprendeu para outras pessoas, como, por exemplo, os produtores rurais (E27 − Agronomia).

As possibilidades de os alunos perceberem ou não se um professor é pesquisador variam de acordo com diversas situações com as quais convivem. Por exemplo, um acadêmico afirma que: “às vezes, os professores pegam e mostram alguns trabalhos que eles fazem, às vezes trabalham com alguns textos, aí eles mostram as produções” (E92 − Física). E completa: “Mas, nas físicas básicas, a gente não vê essa relação entre o ensino e a pesquisa, por-que há professores que às vezes trabalham, fazem trabalhos de pesquisa em uma área que ela não tem muita relação com aquele conteúdo que ele tá tra-balhando, aquele assunto daquela disciplina”.

Os estudantes revelam identificar quando as atividades de pesquisa do docente estão ou não presentes na sala de aula. Os que possuem essa vivência destacam os possíveis benefícios ou não dessa relação no processo de forma-ção. Por outro lado, em alguns cursos nos quais não está tão presente, percebe--se certa “resignação” com a situação, inclusive justificando que a pesquisa não é algo que possa vir a contribuir.

Sempre é pertinente frisar que esses dados e depoimentos devem ser reconhecidos segundo o contexto de origem e vivência acadêmica dos gradu-andos.

ÊNFASE NO ENSINO – DISSOCIAÇÃO ENTRE ENSINO E PESQUISA NA DOCÊNCIADentre os respondentes, uma boa parte entende que a pesquisa não é

condição para uma boa docência. As razões dessa posição são diversas, mas há em comum o destaque aos saberes didáticos como necessários, nem sem-pre articulados com os saberes da pesquisa. Um dos nossos colaboradores afirmou:

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518 SOUZA, A. R. B. et al. - A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO

Creio que ser bom pesquisador, ou simplesmente ser pesquisador, não ga-rante uma boa docência. Está mais relacionada à forma de ensinar, ao método pedagógico e, principalmente, com a intencionalidade da prática educativa, que pode ser crítica, questionadora, emancipatória ou dominante, limitante e doutrinante (E21 − Engenharia Florestal).

O depoimento a seguir revela uma percepção negativa da pesquisa, como uma dimensão qualificadora do ensino universitário:

Não. O bom professor é aquele que está bem atualizado com o que está acontecendo no mundo. Não necessariamente ele precisa desenvolver a pes-quisa e descobrir algo. Bom profissional é aquele que sabe transmitir uma ideia, dá uma aula com vontade e se interessa em saber se os alunos estão entendendo. Conheço pesquisadores que estão tão envolvidos com a pesquisa que estão fazendo, estando estressados e sem tempo, que ir para uma sala de aula não passa de obrigação e acabam “cuspindo” a matéria para seus alunos (E25 − Medicina Veterinária).

Para alguns estudantes, a integração harmoniosa entre pesquisa e do-cência é questionável, “[...] existem vários professores que são ótimos pesqui-sadores. Que possuem conhecimento, mas são péssimos professores em sala de aula” (E83 − Moda).

Acreditam que:[...] não haja qualquer relação entre ser bom professor e bom pesquisador. Tenho excelentes professores que não estão no núcleo de pesquisa da universi-dade, como existem bons pesquisadores na área, mas que em sala de aula não conseguem passar a matéria (E30 − Direito).

Essas menções restritivas à pesquisa na docência, provavelmente, se assentam em vivências nas quais os acadêmicos percebem que há um foco superlativo por parte do professor sobre suas pesquisas ou, mesmo sendo pes-quisador e demonstrando bom conhecimento na área, não tem um desempe-nho pedagógico na mesma proporção.

O reconhecimento da formação docente como componente necessário para uma boa prática também está presente entre os alunos:

Para ser um bom professor, além de pesquisador, é necessário que ele real-mente tenha formação docente. O que geralmente ocorre é ter professores que são bacharéis e/ou pesquisadores, mas que não passaram por uma formação docente. Estes, com pouquíssimas exceções, não exercem uma boa docência. Dessa forma, o fato de o professor ser pesquisador pode não dizer nada sobre sua docência (E56 − Matemática).

Os estudantes manifestaram, também, uma valorização pela prática profissional do professor. Para eles, “a experiência no dia a dia” também conta muito. “Citar exemplos em sala de aula, exemplos práticos nos ajudam a entender melhor a situação”, assim afirmou um aluno da Engenharia Civil.

O grupo que enfatizou a dimensão didática como a mais importante para uma boa docência revela, em suas expressões, um conjunto de expecta-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 519

tivas com relação à docência no Ensino Superior. Para esse grupo, um bom professor deve ser capaz de ensinar, de se fazer compreender e de estar atuali-zado, com novos conhecimentos.

Há, nas manifestações dos respondentes, uma representação algumas vezes negativa da pesquisa, que ocorre quando o professor se afasta do con-teúdo das disciplinas curriculares e se concentra preponderantemente no seu foco de pesquisa.

ÊNFASE NA PESQUISA − IMPORTÂNCIA DA PESQUISA PARA UMA BOA DOCÊNCIA Um bom número dos estudantes − 38 do total dos 88 respondentes

− demonstra compreender a pesquisa como fundamental para uma docência no Ensino Superior, como podemos perceber no depoimento do discente que expõe, “Com certeza, sim. Com as mutações constantes do contexto social é preciso que o professor pesquise, se atualize constantemente para ampliar sua autonomia e situar-se mais próximo de sua realidade” (E67 − Artes).

Outras manifestações também vieram no mesmo sentido, especial-mente ligando a pesquisa à capacidade de atualização do professor universitá-rio. É dessa forma que buscam novos conhecimentos, que por sua vez poderão contribuir para uma boa aula, como afirma outro estudante: “Sim, acredito que é importante manter projetos de pesquisa para estimular o aprendizado, a busca pelo novo conhecimento nunca é demais” (E90 − Moda).

A pesquisa como possibilidade de “prover” conhecimentos para uma boa docência está explícita em várias respostas, inclusive como uma condi-ção. Dizem eles: “para mim, o bom professor é, sim, também pesquisador, isso lhe dará a condição de ser um bom professor” (E70 − Artes); ou, “na minha opinião, aqueles professores que considero como muito bons tão também pes-quisadores” (E80 − Moda). Referem-se que “se ele está pesquisando, o que está ensinando há uma maior credibilidade” (E14 − Nutrição).

A justificativa para valorizar a condição investigativa do professor está na possibilidade de ampliar os conhecimentos: “buscar novas publicações e estar sempre atualizado [...] pois os professores envolvidos com pesquisa têm maior capacidade de ensinar” (E18 − Nutrição).

Também ressaltam que a condição investigativa do professor favorece a busca de “novas maneiras de desenvolver as habilidades exigidas do pro-fissional em formação [...] a pesquisa é a tarefa fundamental nesse processo” (E34 − Direito).

Eles demonstraram admiração pelos professores pesquisadores porque trazem resultados de seus estudos para a sala de aula. Felizmente alguns con-seguem perceber que os professores pesquisadores são capazes de incentivar a participação em pesquisa, utilizando a dúvida como ponto de partida do ensino que ministram. Dizem eles: “Sem dúvida, para a boa formação do acadêmico,

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520 SOUZA, A. R. B. et al. - A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO

é necessário ter bons professores, pois é neles que nos inspiramos. O professor pesquisador aguça o aluno a também pesquisar” (E62 − Engenharia Civil).

O professor pesquisador incentiva seu aluno a ir além do que lhe é transmi-tido nas aulas, indicando bibliografias complementares, comentando sobre os fóruns em sala de aula. Só o fato de mudar suas aulas de um semestre pra outro a partir do interesse de sua turma já é uma grande novidade (E11 − Pedagogia).

Esse grupo de respondentes expressa que a pesquisa faz parte da ca-racterização do que seria um bom professor, especialmente como atualização e busca de novos conhecimentos, que são condições para uma boa docência.

Suas colocações advêm de vivências significativas com docentes pes-quisadores que abordam os temas das disciplinas com propriedade, se referem a questões atuais e pertinentes e os instigam também a pesquisar.

INTEGRAÇÃO ENTRE ENSINO E PESQUISA NA SALA DE AULA – QUESTIONAMENTOS E PONDERAÇÕESPara diversos estudantes, a relação entre uma boa docência e pesquisa

é passível de ponderações, como exemplifica o depoimento que se segue:Acredito que a pesquisa é importante, sim. Porém, não se pode generalizar.

Alguns professores são brilhantes em sua produção científica e, no entanto, são medíocres quanto a sua práxis pedagógica, sabendo muito, mas não con-seguindo partilhar suas descobertas. O ideal é professor e aluno serem postos juntos no processo de pesquisa, crescendo juntos, e não fazer com que a dis-sociação entre um e outro crie ainda mais distância entre o conhecimento de ambos (E53 − Matemática).

São expressões que revelam a posição dos respondentes quanto ao significado do que é ser um bom professor e sua relação com a pesquisa:

Acredito, sim, que o bom professor é pesquisador. Isso em todos os níveis de ensino, desde a Educação Básica até o Ensino Superior. A postura investi-gativa acrescenta credibilidade e qualidade ao trabalho docente. Porém, nem todo pesquisador é, necessariamente, um bom professor. Alguns pesquisadores podem ficar divagando muito sobre conhecimentos teóricos e não conseguir trazê-los para a realidade ou restringir-se em debater questões relativas à sua linha de pesquisa (E07 − Pedagogia).

É interessante perceber que os alunos conseguem expor suas percep-ções de forma coerente, analisando o fato de que a pesquisa pode ser ou não uma aliada do ensino, dependendo da forma como se estabelece essa relação. Fica subentendido nas suas manifestações que há mediações necessárias entre a pesquisa e o ensino que se estabelecem pelos saberes pedagógicos.

Acredito que a pesquisa ajuda o professor a se aprimorar. Mas o que irá fazer um diferencial para o professor é sua intenção diante da sua prática pe-dagógica. Pois o professor pode pesquisar e não fazer uso da pesquisa de modo significativo aos seus aluno (E12 − Pedagogia).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 521

Penso que há uma complementação entre o pesquisador e o docente, sendo que o conhecimento apenas poderá ser repassado se o docente não tiver prazer no que realiza, quer seja na pesquisa, quer seja na docência (E51 − Psicologia).

Alguns estudantes relativizam a relação da pesquisa com o ensino, em função da área de conhecimento. “Nem todas as áreas necessitam da pes-quisa constante. Existem professores mais ‘práticos’ que são muitos bons” (E82 − Moda). Certamente, há nessa resposta uma concepção de pesquisa que se afasta da prática. Divide os professores entre aqueles que “fazem” e que valorizam os que “pesquisam”, evidenciando um paradigma de conhecimento dicotomizador muito presente na academia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As reflexões realizadas até então nos permite mergulhar em uma am-pla temática que é a formação do professor universitário, assim como produzir sínteses provisórias sobre a relação entre ensino e pesquisa segundo os estu-dantes.

Os estudantes valorizam o professor pesquisador que sabe aliar os co-nhecimentos do campo da pesquisa com os conhecimentos das disciplinas curriculares da graduação. Destacam a credibilidade, o aprimoramento e a capacidade de ensinar desses professores. Alguns ressaltam o valor do co-nhecimento advindo da prática, contrapondo ao que tem origem na pesquisa. Mas, em sua maioria, reconhecem a importância da relação entre o ensino e a pesquisa.

Assim como a ciência moderna não mais consegue responder às ques-tões propostas pela sociedade, o professor no exercício da docência também se vê compelido a adotar uma nova postura diante do conhecimento, admitin-do que “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 1996, p. 23).

A relação dos docentes com os saberes não pode ser restrita à transmis-são de conhecimentos já constituídos, mas exige uma relação com diferentes saberes aninhados na prática do docente com seus alunos. Tardif (2002, p. 36) define o saber docente “[...] como um saber plural, formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais”. Nesse contexto, os saberes profissionais carregam as impressões dos seres humanos.

De acordo com as respostas, os acadêmicos reconhecem a pesquisa como um instrumento de atualização da docência, importante e imprescindí-vel na opinião da grande maioria. Algumas vezes, demonstraram uma com-preensão mais restrita de pesquisa, quer quando essa está a serviço da docên-cia, quer na elaboração e sistematização de novos conhecimentos. Por outro lado, expressam certa maturidade sobre o conceito de boa docência, implícita em diversas expressões, quando revelam a compreensão da dinamicidade e

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522 SOUZA, A. R. B. et al. - A QUALIDADE DA PRÁTICA DOCENTE E A RELAÇÃO ENSINO

constante expansão dos conhecimentos que a integram. Percebem que a boa docência implica na necessidade de atualização do professor para que também possa propiciar aos alunos os novos conhecimentos, inclusive tendo reper-cussões metodológicas em sala de aula. Relatam que alguns professores que pesquisam os instigam à reflexão, possuem mais elementos e recursos para exemplificarem e referenciarem suas exposições.

Vários estudantes em suas respostas ponderaram que, nem sempre, os melhores professores são os melhores pesquisadores e vice-versa. Deram a entender que, em vários casos, o professor pesquisador provoca uma espécie de distanciamento, exerce alguma soberba diante dos alunos e se concentra excessivamente no seu foco de investigação em detrimento de outras abor-dagens e/ou conteúdos. Também explicitam que apreciam a relação da teoria com a prática, e, nessa perspectiva, nem sempre os melhores professores são os pesquisadores.

As respostas analisadas expressam enunciados que devem ser com-preendidos e inseridos em um determinado contexto e conjunto de experi-ências que cada acadêmico viveu e vive no espaço universitário, incluindo também suas concepções de ensino. Revelam muitos aspectos sobre a relação entre pesquisa e docência que merecem ser considerados com seriedade pela pertinência e capacidade de análise explicitada por nossos participantes da pesquisa.

REFERÊNCIAS

CUNHA, Maria Isabel da. O professor universitário na transição de paradig-mas. Araraquara. JM Editora, 1988.CONNELL, Raewyn. Bons professores em um terreno perigoso: rumo a uma nova visão da qualidade e do profissionalismo. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 36, n. Especial, 2010, p. 165-185.FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática edu-cativa. 13. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. PIMENTA, Selma; ANASTASIOU, Lea. Docência no Ensino Superior. v. 1. São Paulo: Cortez Editora, 2002.TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: 2002.

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QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO, PESQUISA E

DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOCENTE: AS VOZES DA SOCIEDADE

Ana Carolina da Silva Bijoldo Maisa Beltrame Pedroso

Maria Aparecida M. Rocha Monalisa da Silva Pinheiro

Silvana Flores Gabriela Lammertz

Maria Isabel da Cunha

O artigo ora apresentado é um recorte da pesquisa “Qualidade do ensino de graduação: a relação entre ensino, pesquisa e desen-

volvimento profissional docente”. Esta busca compreender a efetividade das práticas do conceito de indissociabilidade entre ensino e pesquisa no ensino de graduação, como indicador de qualidade. O grupo de pesquisa para fins me-todológicos foi subdividido a partir do tema central em oito eixos de análise com a principal finalidade de aprofundar as análises do tema em questão. As autoras fazem parte do subgrupo que estudou e tratou dos dados referentes ao chamado Eixo VIII – Vozes da Sociedade.

Esse Eixo investiga a percepção da sociedade por meio de diversas co-munidades sobre os profissionais egressos das universidades, que trabalham em diferentes organizações e áreas, tendo em vista a presença da relação en-sino e pesquisa.

A pesquisa envolveu dez entrevistas (oito presenciais e duas on-line) com gestores de diferentes organizações públicas e privadas sobre suas per-cepções do egresso, enquanto aquele profissional que desenvolve sua tarefa no cotidiano dessas organizações. Ao todo, foram entrevistados dez interlocu-tores, sendo uma da área de Assistência; três da área da Saúde; duas da área de Educação; uma da área de Recursos Humanos; uma da área Sindical; uma da Cultura e uma de Direitos Humanos, na perspectiva de pensar a comunidade como mais um segmento que pode auxiliar a compreensão do fenômeno da qualidade do ensino de graduação, no marco conceitual da relação ensino e pesquisa. Como é um estudo qualitativo, apresenta algumas questões nortea-doras que poderão nos auxiliar na análise do problema de pesquisa. A saber: Que concepção(ões) de qualidade da Educação Superior está(ão) presente(s) nas contradições entre essas representações? Como perceber (ou não) se a dimensão da pesquisa faz diferença na formação acadêmica? Que caracterís-

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524 BIJOLDO, A. C. S. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

ticas são valorizadas na formação acadêmica do profissional que selecionam? Entendem que a origem institucional define a qualidade da formação de seus profissionais? Como estratégias de coleta de dados foram utilizados documen-tos, textos e entrevistas semiestruturadas, com gestores e coordenadores de diferentes segmentos da sociedade, realizadas de forma presencial e on-line.

Torna-se importante destacar que o foco deste estudo é identificar nos discursos dos interlocutores a qualidade do ensino de graduação. Como cená-rio dessas relações, iniciamos apontando a distinção entre dois conceitos que vão permear o estudo ora apresentado, a saber: comunidade e sociedade.

Comunidade, segundo Ferreira, autor do Dicionário de bem-estar so-cial, é “um grupo humano vivendo em área geográfica contígua, caracterizado por uma trama de relações e contatos íntimos, possuindo a mesma tradição e os mesmos interesses, mais a consciência da participação em ideias e valores comuns”. Pode ser definida também como “a existência de uma população ativa e unida em torno de alguns valores, interesses, atitudes e ligações de proximidades física, econômica e social, suficientes para assegurar um certo grau de coerência e de fisionomia coletiva” (1982, p. 86).

Já o conceito de sociedade, segundo o mesmo dicionário, é definida como:

Em sentido mais amplo, significa agrupamento organizado que reúne ho-mens tendo entre si laços reconhecidos;, em sua vida política ou cultural. Consoante certa ótica sociológica: agrupamento social fundado sobre a vontade mais ou menos consciente de alcançar vantagens pessoais diretas ou indiretas. Neste sentido, o aspecto voluntário ou artificial da sociedade opõem-se a comu-nidade, que designa um grupo espontâneo e natural (1982, p. 308).

Para o autor, o saber é plural, heterogêneo, é temporal, pois se constrói durante a vida e o decurso da carreira, portanto é personalizado, situado. O sa-ber é oriundo da formação profissional (o conjunto de saberes transmitido pe-las instituições de formação de professores); de saberes disciplinares (saberes que correspondem ao diverso campo do conhecimento e emergem da tradição cultural); curriculares (programas escolares) e experienciais (do trabalho co-tidiano). O que exige do professor capacidade de dominar, integrar e mobili-zar tais saberes enquanto condição para sua prática. Diante da concepção dos saberes, é necessário refletir sobre os elementos que garantam a premissa da educação popular, constituída em um espaço de confronto de saberes, em que as necessidades populares transformam-se em demandas sociais.

Percebemos que se faz importante estabelecer outras relações com o conhecimento, contemplando conteúdos e formas metodológicas como alter-nativas, pelas inúmeras diferenças culturais e diferentes camadas das classes trabalhadoras e intelectuais, formando as sociedades brasileiras. Tentamos per-ceber como a dimensão pedagógica presente nos discursos intelectuais é apre-endida pelo mundo do trabalho, em especial aquele envolvido com a dimensão pública, e como a qualidade dos cursos universitários é percebida, de forma a

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 525

aprimorar as competências e garantindo melhorar as ações coletivas. Fazendo uma relação dessas relações interpessoais e considerando a importância do tra-balho coletivo, na busca de consolidar espaços mais democráticos e construir sujeitos mais críticos e autônomos, podemos trazer como contribuição Paulo Freire, que acredita que pelo diálogo há o encontro dos homens, mediatizado pelo mundo, para pronunciá-lo (1987, p. 78). Podemos observar em alguns discursos a percepção dos gestores sobre a qualidade da Educação Superior:

Eu acho que toda e qualquer formação acadêmica, para sair excelentes profissionais, bem capacitados, tem que desenvolver esse lado da ética, da humanização. Eu acho que tem que ser, a capacitação acadêmica, para nos humanizar e para tornar esse mundo mais plenamente humano. Não é cair num antropocentrismo, mas o lado do humano, da humanização, da ética, que ainda não é bem recebida em qualquer área [...].

Então, são coisas que dão outra dinâmica que impactam na qualidade a for-mação, mas essa formação mais global, mais um todo, porque o cara vem tecni-camente preparado, mas a formação da vida, da concepção de vida, da concep-ção de compromisso como cidadão para transformação, isso não. É cotidiano.

Entendemos que a formação e o trabalho profissional por meio desses discursos nos são apresentados como entrelaçados. Franzoi (2006), inspirada em Dubar, nos auxilia a compreender o conceito de profissão de um indivíduo:

[...] é resultado da articulação entre um conhecimento adquirido e o reconhe-cimento social da utilidade da atividade que esse indivíduo é capaz de desem-penhar, decorrente do conhecimento adquirido. Esse reconhecimento social da utilidade dessa atividade se dá através da inserção do indivíduo no mercado de trabalho, correspondente ao conhecimento adquirido. Estreitamente ligado a esse reconhecimento pelo sujeito que é deles o portador (p. 20).

É possível observar, nos discursos dos gestores, que há uma certa uni-dade conceitual no que consideram importante na formação acadêmica, explí-cito na aquisição de valores humanos e éticos, tão presentes na valorização do outro e nas atividades em que os egressos passam a se envolver pelo processo de trabalho. Há uma percepção por parte desses gestores de que a formação acadêmica pode ser muito qualificada, mas ela deve privilegiar não apenas as competências relacionadas aos conhecimentos gerais, específicos e técnicos da profissão, mas também desenvolver as atitudes positivas no trato com os outros. Isso significa que para ser um bom profissional não basta apenas ter uma formação qualificada em uma boa universidade, é preciso mais, é neces-sário ter uma formação voltada à cidadania, com um olhar criativo, inovador e propositivo para a sociedade.

A excelência profissional passa por se discutir as dimensões do sa-ber, do aprender, do trabalho com o outro e com o inventar-se. Para Josso (2004), essas dimensões são essenciais para um profissional que constrói a sua formação pessoal e profissional no exercício da ação refletida na sociedade. Podemos ilustrar tais percepções por meio das seguintes citações:

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526 BIJOLDO, A. C. S. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

Trabalhar a demanda de formação permitirá fazer sobressair, se o clima de confiança se prestar a isso, necessidade individuais ou mais coletivas e, sobre-tudo, a dimensão do desejo tanto no que diz respeito aos saberes e competências procurados como na certificação pretendida [...] (p. 239).

Sousa Santos, no que se refere ao papel e desafios da universidade na sociedade contemporânea, contribui com esta discussão quando trabalha o con-ceito da ecologia de saberes, em que um conjunto de práticas promove uma nova convivência de saberes com o pressuposto de sempre enriquecerem o diálogo.

Segundo o autor, (2008):Implica uma vasta gama de ações de valorização, tanto do conhecimento

científico, como de outros conhecimentos práticos, considerados úteis, cuja partilha por pesquisadores, estudantes e grupos cidadãos serve de base à criação de comunidades epistêmicas mais amplas que o seu lugar e convertem a univer-sidade num espaço público de interconhecimento onde os cidadãos e os grupos sociais podem intervir sem ser exclusivamente na posição de aprendizes (p. 77).

A educação emancipatória pressupõe educar para a cidadania e como tal é impossível não relacioná-la com o projeto ético-político de educação qualificada. Gracindo (1999) comenta que a política de educação para este milênio exige transformações profundas, envolvendo novas lógicas, novos paradigmas, novas práticas e saberes, novas posturas epistemológicas, ou seja, uma nova política de educação global que seja flexível para abarcar todos os estágios e estruturas diferentes neste período de mudanças velozes que estão ocorrendo no universo cultural e educacional.

A universidade é situada e datada. Assim sendo, é condicionada à re-alidade na qual está inserida, com base em injunções de todos os tipos, seja de ordem econômica, social, cultural, política ou religiosa. As transformações políticas e econômicas ocorridas no mundo forçosamente obrigam a institui-ção a repensar o seu lugar e a sua função na sociedade.

A ênfase dada pelos autores quanto à dimensão em que são permeadas as relações da universidade com a sociedade e o Estado mostra a complexida-de dessa instituição.

Tal compreensão do espaço da universidade se faz necessária uma vez que ela conjuga o movimento do saber científico com o diálogo. Esses de-safios e o papel da universidade são compreendidos conforme o discurso do interlocutor, quando o mesmo comenta que:

Percebendo que existe uma universidade por trás, sabes que o que está sen-do feito, aí vai ser levado adiante, é uma forma de mostrar que é possível e que trará bons resultados. Hoje as pessoas estão mais críticas, hoje estão menos tolerantes. Toda a situação que a gente sabe que está acontecendo na sala de aula repercute aqui também.

O autor (2010) também nos auxilia quando nos faz pensar sobre al-guns movimentos inversos, como, por exemplo, a importância do aprendizado que ocorre no cotidiano dos processos de trabalho como a interlocução, a troca

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 527

de ideias entre os diversos sujeitos, o respeito pelos diferentes conhecimentos e saberes. A ecologia dos saberes como um conjunto de práticas que promove uma nova convivência.

A universidade como uma instituição que perpassa o tempo, debruça--se sobre as questões que assolam a sociedade, contribuindo com questio-namentos e indagações. O resultado de uma formação acadêmica de maior sucesso provavelmente envolve a necessidade de a universidade passar a as-sumir, na sua organização, as condições indispensáveis para chegar-se a esse objetivo. Em outras palavras, o papel da universidade já está prescrito em torno do tripé ensino, pesquisa e extensão, não havendo outros espaços para envolver-se com as expressões da questão social a não ser sob a forma de pes-quisa e em alguns programas de extensão.

Universidade passa a ser, então, o lugar de produção do conhecimento, consolidando-se na pós-graduação, lugar onde se desenvolve a pesquisa. É certo que alguns movimentos no sentido inverso foram se constituindo, mas com muita dificuldade, dadas as condições estruturais dos currículos e das concepções de formação.

A pesquisa é importante, pois estimula o estudante a ler uma determi-nada realidade, a buscar referenciais teóricos, a organizar seu pensamento para comunicar seus trabalhos, estimulando-o ao protagonismo. Contudo, existe a grande dificuldade de tornar a pesquisa como universal na universidade.

Para Cunha (2010):[...] em tese, a pesquisa faz melhores professores porque os ajuda a pensar, a duvidar, a compreender, e essas são qualidades importantes na docência. Pode-se questionar se o bom ensino decorre da pesquisa, mas é pouco sustentável afirmar que o adjetivo “superior”, com o que se qualifica a educação de terceiro grau, não esteja intrinsecamente ligada à condição intelectual de produção do conhecimento, portanto às atividades investigativas (p. 5).

A pesquisa se torna fundamental na formação de qualquer profissio-nal, ajudando-o a refletir, a realizar de forma mais articulada os desafios no seu campo de trabalho. Percebe-se, porém, que a pesquisa não é a única base para a construção da formação, ela faz parte da trajetória profissional.

É importante a compreensão de que o conhecimento nunca será uni-versal e único, ele está sempre sendo reconstruído com novas teorias e desco-bertas, e a pesquisa sempre será o ponto de partida, pois onde existem dúvidas, existe a formação e a busca constante do conhecimento.

Os discursos a seguir demonstram como quatro gestores valorizam a pesquisa como um elemento que traz qualidade no processo de trabalho na organização:

Os desafios colocados aos profissionais localizados nessa faixa implicam em expectativas constantes a serem atingidas. Exercitar a curiosidade, nesses casos, é uma obrigação [fase propositiva; fase implementativa; fase de avalia-ção; fase de revisão].

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528 BIJOLDO, A. C. S. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO

[...] a pesquisa é fundamental. A pesquisa não é só para um grupo fechado, ela é estratégica, ela é fundamental, ela faz parte do tripé.

O último pronunciamento revela um gestor mais afinado com as inú-meras contribuições que provêm do ato de pesquisar. Compreende que a pes-quisa torna-se estratégica no espaço profissional e valoriza o tripé ensino, pes-quisa e extensão, a qual é possível a todos que se interessam.

Os gestores, ao serem questionados sobre a qualidade do ensino de graduação, mostravam-se surpresos e comentavam que dificilmente pa-ravam para pensar sobre esse assunto. A rotina do mundo do trabalho nas organizações acaba sendo um empecilho quanto ao fato do exercício da reflexão mais aprofundada sobre o processo profissional. Isso, geralmente, faz com que o empregado seja visto apenas como alguém que deva desem-penhar qualificadamente as funções solicitadas para o seu cargo ou função. Por outro lado, as opiniões dividem-se quanto à importância da pesquisa como elemento qualificador da prática profissional. Há um grupo de ges-tores que percebe que aqueles egressos que se envolvem com a pesquisa demonstram uma maior qualidade, não apenas na ação profissional, como também no seu processo de trabalho, como na equipe. Outro grupo entende que a pesquisa não necessita ser desenvolvida em seu espaço de trabalho, isso denota que a pesquisa não é valorizada , assim como a produção de conhecimentos advinda da mesma.

Alguns dos resultados dessas investigações indicam que a sociedade afirma identificar as diferenças nos percursos acadêmicos dos egressos que perfazem o caminho da formação que envolva a relação entre ensino e pes-quisa, frente aos desafios da prática, valorizando o desenvolvimento profis-sional contínuo. Mostram também que eles se tornam mais qualificados no seu desempenho diário profissional, assim as atividades profissionais e res-ponsabilidades sociais na formação dos egressos são valorizadas. Entretanto, reconhecem que nem sempre a compreensão desses critérios são valorizados nas políticas de recrutamento e empregabilidade, pois essa origem pode vis-lumbrar maiores pretensões salariais dos candidatos, em um contexto em que o peso econômico tem papel importante.

REFERÊNCIAS

BARNETT, Ronald (Ed.). Para una transformación de la universidad. Nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona, Editorial Octaedro, 2008.CHAUÍ, Marilena. A universidade pública sob nova perspectiva. Revista Brasileira de Educação, n. 24, p. 4-15, set./dez. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n24/n24a02.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2007.CUNHA, Maria Isabel da; ZANCHET, Beatriz Maria Atrib. Entre a docência e a investigação: impacto no ingresso na carreira docente da universidade, em

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 529

tempos de democratização. In: II Congreso Internacional sobre profesorado principiante e inserción profesional a la docencia. Buenos Aires, Argentina: Ministério da Educação, 2010.FERREIRA, Francisco de Paula. Dicionário de bem-estar social. São Paulo, Cortez, 1982.FRANZOI, Naira Lisboa. Entre a formação e o trabalho: trajetórias e identi-dades profissionais. Porto Alegre: UFRGS. 2006.FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.GRACINDO, Regina Vinhaes. Educação para o ano 2000: dilemas e pers-pectivas. In: SILVA, Rinalva Cassiano (org.). Educação para o século XXI: dilemas e perspectivas. Piracicaba: UNIMEP, 1999, p. 17-27.JOSSO, Marie-Christine. Experiências de vida e formação. São Paulo: Cortez, 2004. MAIA, Almir de Souza. Educação superior: perspectivas para o próximo mi-lênio. In: SILVA, Rinalva Cassiano. Educação para o século XXI: dilemas e perspectivas. Piracicaba: UNIMEP, 1999. p.29-38.NÓVOA, Antonio (org.). Vida de professores. Porto: Porto Ed., 1992.PORTO, E. M. Tânia. Redes em construção: meios de comunicação e prática educativas. São Paulo: JM, 2000.RIOS, Teresinha. O gesto do professor ensina. Disponível em: http://www.acer-vodigital.unesp.br/bitstream/ 123456789/ 25/3/D04_O_Gesto_do_Professor _Ensina.pdf. SANTOS, Boaventura de Sousa. A universidade do século XXI: para uma re-forma democrática e emancipatória da universidade. São Paulo: Cortez, 2008.

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DOCENTES NÃO PESQUISADORES E SUAS CONTRIBUIÇÕES NA QUALIDADE DO

ENSINO DE GRADUAÇÃO

Lígia Cardoso Carlos Maria Janine D. Reschke

Marja L. Braccini Vânia A. Martins Chaigar

A intenção deste texto é problematizar aspectos da condição dos docentes universitários que, atualmente, não estão envolvidos

com pesquisa acadêmica de forma sistemática. Esse tema se inclui em um amplo projeto de pesquisa interinstitucional − que tem como foco a pedagogia universitária e a relação entre a pesquisa e a qualidade do ensino de gradu-ação − no qual ele se configura como um dos diversos eixos investigativos. Inicialmente, contextualizaremos a investigação como um todo e, posterior-mente, discutiremos a dimensão de responsabilidade de nosso subgrupo.

A PESQUISA DE ORIGEMO projeto de pesquisa interinstitucional “Qualidade do ensino de

graduação: a relação entre ensino, pesquisa e desenvolvimento profissio-nal docente”1, o qual vem sendo desenvolvido entre distintas instituições de Ensino Superior2, pauta-se por importantes questionamentos que orientam o recorte aqui apresentado. São eles: Que lugares abrigam a discussão sobre a qualidade do ensino da graduação no cenário acadêmico? Há um pressuposto inquestionável de que a pesquisa qualifica o ensino e sobre ele há uma tácita concordância que todos ratificamos. Será que essa relação se faz de forma tão linear? Sempre que há desenvolvimento da pesquisa ocorre ensino de quali-dade? Serão necessárias outras mediações para que essa relação aconteça? A formação do professor universitário contempla essa relação e esses saberes?

São perguntas mobilizadoras as quais instigam a examinar como, na prática, diferentes atores percebem a relação ensino e pesquisa e se a mesma é elemento que dá qualidade ao ensino de graduação. Também levam a analisar a trajetória de formação de docentes universitários e as condições que definem

1 Desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Formação de Professores, Ensino e Avaliação – CNPq/Unisinos e coordenado pela Professora.doutora Maria Isabel da Cunha.2 Constitui-se em uma parceria interinstitucional com a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a Universidade Federal do Rio Grande (FURG), a Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), a Universidade Federal do Paraná (UFPR/Litoral), a Universidade Católica de Santos (UNISANTOS), a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFES), a Universidade Estadual Paulista (UNESP/Rio Claro).

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532 CARLOS, L. C. et al. - DOCENTES NÃO PESQUISADORES E SUAS CONTRIBUIÇÕES

a relação ensino e pesquisa, além de buscar a construção de referenciais teóri-cos sobre práticas de ensinar e aprender na Educação Superior, em tempos de democratização do acesso a esse nível de ensino.

Considerando essa problemática, seus desdobramentos e complexida-des, o projeto interinstitucional organiza-se em oito subgrupos de trabalho que investigam, respectivamente: a literatura acadêmica, os pró-reitores de graduação, os professores consolidados, os professores não pesquisadores, os professores iniciantes, os estudantes, a educação a distância e as vozes da comunidade.

PROFESSORES NÃO PESQUISADORES COMO EIXO DE INVESTIGAÇÃOTendo como foco de trabalho os professores não pesquisadores, pro-

curamos compreender, com base em suas experiências e trajetórias, o pressu-posto da qualidade alicerçada na relação pesquisa e ensino. Buscamos mapear alguns desses profissionais, considerando como critérios terem reconhecida competência docente, não estarem integrados em programas de pós-gradua-ção, representarem instituições públicas e privadas e serem vinculados a dife-rentes áreas do conhecimento. Ouvimos coordenadores de curso, estudantes e colegas professores. Suas indicações resultaram em nossos sujeitos.

Quanto às orientações metodológicas que organizaram a busca de compreensões, foram utilizados os princípios da pesquisa qualitativa, já usual na trajetória do grupo de pesquisa, assentada, sobretudo, nos princípios da pesquisa etnográfica.

Cabe também destacar o caráter coletivo que dá sustentação ao grupo de pesquisa, no qual trajetos individuais de cada subgrupo são compartilhados, sistematicamente, com os demais membros da equipe investigativa, e dessas interlocuções vai sendo construído o aparato teórico-metodológico. Trata-se, portanto, de movimentos que ocorrem ora do particular para o coletivo, ora do coletivo para o particular e incorporam, como não poderia deixar de ser, cul-turas institucionais distintas que se intercruzam e se alimentam mutuamente.

Na procura de elementos para a investigação, ensaiamos as seguintes questões: Os professores não pesquisadores consideram-se “bons professo-res”? Por quê? Esses professores reconhecem e/ou distinguem especificidades entre os saberes da pesquisa e os da docência? Os professores não pesquisa-dores reconhecem e/ou consideram a condição de não pesquisadores como um déficit na sua formação e/ou desempenho? De que maneira os professores não pesquisadores constroem suas docências? De onde atribuem os saberes que as constituem? Como esses docentes compreendem a qualidade da Educação Superior?

Fomos ao encontro de instituições localizadas em espaços e regiões distintas, constituindo uma amostra que envolveu, dentre instituições públi-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 533

cas e privadas, a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), a Universidade Federal do Rio Grande (FURG), a Universidade Católica de Pelotas (UCPel), a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), a Federação de Estabelecimentos de Ensino Superior em Novo Hamburgo (FEEVALE), a Universidade Federal do Tocantins (UFT) e a Faculdade Cenecista de Osório (FACOS). Foram entrevistados dois professores do curso de Geografia, dois professores do curso de Direito, duas professoras do curso de Pedagogia, uma professora do curso de Psicologia, dois professores do curso de Arquitetura e Urbanismo e dois professores do curso de Biologia. Somam-se cinco professo-res representantes de universidades públicas e seis de universidades privadas.

Onze professores de diferentes formações e atuando em distintas áreas foram investigados com base em entrevistas semiestruturadas que ocorreram de forma presencial e a distância.

OS SUJEITOS E SEUS CONTEXTOSA preocupação em abarcar sujeitos de diferentes áreas do conhecimen-

to está amparada na compreensão de que há culturas distintas nos diferentes campos científicos, ou seja, há peculiaridades nas definições do que seja con-siderado um valor para cada área do conhecimento (CUNHA & LEITE, 1996).

Considerando o contexto contemporâneo, podemos perceber em nos-so país, nos últimos vinte anos, um período em que a lógica da Educação Superior está fortemente marcada pelo modelo da formação pela pesquisa. Sendo assim, se a formação do professor universitário centra-se na condição da pesquisa proporcionada pela pós-graduação stricto sensu é porque há o pressuposto de que a pesquisa qualifica o ensino e esse dela decorre.

Ao colocar em questão essa assertiva, é possível perguntar: em que medida centrar a formação e valorização do docente universitário nas habili-dades de pesquisa impacta a qualidade da Educação Superior?

Anteriormente, podíamos pensar em um período marcado por uma ló-gica validada no modelo da formação profissional, na qual quem sabia tinha erudição, também estava munido de saberes para ensinar. Entretanto, isso não é mais suficiente, face à complexidade da docência contemporânea que incor-pora questões epistemológicas, éticas, relacionais, culturais etc., constante-mente postas à prova no espaço da sala de aula.

Scott (2007) apresenta que, na atualidade, tanto a docência quanto a investigação têm superado seus limites como categorias, sendo facilmente confundidas uma com a outra. Para ele, muitos legisladores apostam e con-sideram inevitável a apartação entre a docência e a investigação no Ensino Superior, visando atender demandas de produzir um sistema de investigação universitário descentrado, ao que Scott acrescenta a pergunta: “E debilitado?” A debilidade a que se refere o autor deve-se ao fato de, do ponto de vista inte-lectual, muitos pesquisadores afirmarem que a docência e a pesquisa, além de serem indissociáveis, também se alimentam reciprocamente.

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534 CARLOS, L. C. et al. - DOCENTES NÃO PESQUISADORES E SUAS CONTRIBUIÇÕES

Outro argumento, utilizado para justificar a separação entre docência e pesquisa, é o da massificação do ensino universitário e as novas demandas que a ele acessam. O sistema de Educação Superior de massas constituiria um tipo de continuação do Ensino Médio, daí a denominação terceiro grau, e, nesse sentido, a maioria dos estudantes não precisariam ser pesquisadores ativos, ao que poderíamos acrescentar problematizando: Nem os professores? Já se conhece a expressão pejorativa “escolão” atribuída à universidade por muitos ao se referirem a essa nova fase da instituição no Brasil, a qual, sobretudo nos anos 2000, tem acolhido milhares de jovens estudantes oriundos de camadas sociais que antes não acessavam esse nível de ensino. A esses jovens a pesqui-sa seria um luxo? Aos seus professores também?

Considerando que os últimos anos têm sido, no Brasil, um marco da inclusão de novas demandas na universidade, que estas suscitam novas cate-gorias explicativas ao exercício da docência e que os novos professores tam-bém fazem parte de um tipo de geração profissional que chega à universidade já no topo da carreira, parece oportuno investigar a relação entre a qualifica-ção profissional e a qualidade da docência exercida nos cursos de graduação.

A BUSCA DE DADOS E ALGUMAS DE SUAS SIGNIFICAÇÕESNessa perspectiva, a partir do segundo semestre do ano de 2009, de-

mos início ao processo de coleta de nossos dados. Com o recorte de pesquisa nos acercamos de sujeitos que pouco se identificam com o paradigma atual da formação para a pesquisa e, por meio deles, nos aproximamos das práticas mais usuais que caracterizam suas lógicas de docência.

A partir do acesso a aspectos da trajetória e das experiências dos pro-fessores e professoras entrevistados e do diálogo com a literatura sobre o tema, organizamos os achados de pesquisa em dois eixos de análise, mediados pela qualidade: pesquisa e docência.

No que se refere à pesquisa, podemos dizer que esses docentes criti-cam a excessiva valorização da pesquisa acadêmica em detrimento do ensino, a qual está em pauta na universidade atualmente, porém reconhecem sua im-portância na produção do conhecimento. Pensam que ela deva ser constan-temente socializada e contextualizada com os temas do ensino para, nessa condição, trazer contribuições e qualificar o ensino.

Todos tiveram experiências de pesquisa, seja nos seus cursos de pós--graduação, seja participando − em alguns momentos de suas trajetórias na universidade − de grupos de pesquisa. Acreditam que essas ações de investi-gação foram significativas para a docência e que as aprendizagens e produ-ções delas resultantes acabaram sendo convertidas em aportes para o ensino.

Os docentes entrevistados compreendem que as ações de ensinar e pesquisar são distintas e que, necessariamente, um bom pesquisador não se

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 535

converte em um “bom professor”. O envolvimento com pesquisa − tanto na condição de consumidores quanto de produtores − é um aspecto importante da formação docente e potencializador de boas práticas. Nesse sentido, podemos dizer que esses sujeitos utilizam a pesquisa como um princípio metodológico (BALZAN, 2000) de forma mais ou menos evidente, pois, discutindo os da-dos da investigação, foi possível perceber caminhos metodológicos na ação docente que identificamos como ensino-pesquisa (id.).

Esses professores com reconhecida competência revelam-se constan-temente envolvidos com exercícios de reflexão acerca do currículo, da práti-ca profissional e da problemática social na qual suas ações estão implicadas. Parecem fazer de suas práticas profissionais ambientes de exercício de atitu-des investigativas, bem como promover a formação dessas atitudes em seus alunos. Essas reflexões acerca do currículo, da prática profissional e seus con-textos ocorrem em simultaneidade ao trabalho pedagógico.

Estimuladas pelas considerações de Diniz Pereira e Lacerda (2009) sobre os significados da pesquisa na prática docente, parece-nos que são ações que possibilitam aos professores autogerenciarem sua formação pondo em di-álogo o conhecimento teórico e as urgências e desafios do cotidiano, orga-nizando assim uma maneira própria de ser e agir na profissão, condicionada pelas condições do campo.

O contexto que promove elevado status da pesquisa acadêmica no Ensino Superior e a consequente invisibilidade das dinâmicas do ensino na graduação contribuem para o restrito investimento na docência, bem como para o relativo reconhecimento da sala de aula como espaço produtor de co-nhecimento no e para o ensino. Nessa perspectiva, a ênfase na pesquisa acadê-mica, sistematizada nos cursos de pós-graduação stricto sensu, tem potencia-lizado o baixo status que historicamente estão aderidos à docência e eclipsado aspectos relativos às ações de compreensão, raciocínio, transformação e re-flexão nela presentes. Essas ações − também presentes e legitimadas na pes-quisa acadêmica − nos permitem dizer que há exercícios de investigação nas práticas de ensino dos sujeitos entrevistados e que estas, vivenciadas como princípio metodológico no ensino, representam uma forma de desenvolvimen-to profissional e uma expressão de produção do conhecimento.

No eixo docência, discutimos a representação do “bom professor”, categoria identificada por Cunha (2008b), e a transição dessa representação, considerando características apontadas por Balzan (2000), Scott (2007) e Esteves (2010) ao analisarem necessidades contemporâneas do ensino e da sala de aula universitária.

Nossos interlocutores, quando questionados se eram bons professores e quais as características dos mesmos, em geral, afirmaram que sim e destacaram a importância da relação de afetividade e compromisso com os alunos. Pela afetividade são estabelecidos os vínculos de companheirismo condutores do trabalho, de acordo com a realidade de vida e saberes dos alunos. Característica

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536 CARLOS, L. C. et al. - DOCENTES NÃO PESQUISADORES E SUAS CONTRIBUIÇÕES

que não aparece romantizada ou ingênua, mas reconhecida como uma forma de comprometimento entre docente e discente. Os entrevistados revelam um olhar interessado nos alunos, destacam a importância de estabelecer relações de proximidade, comunicação e valorização de seus conhecimentos.

Essa forma de compreender a sala de aula e as relações que vão sendo estabelecidas nos processos de ensino e de aprendizagem nos desenham a fi-gura de um professor que escuta seus alunos, procura tornar significativos os conhecimentos presentes nas suas aulas, nega o silêncio da subalternidade e estabelece diálogos entre os conteúdos das disciplinas e as realidades de vida e de trabalho, valorizando os conhecimentos produzidos pelos discentes.

As entrevistas mostram que o “bom professor” identifica-se com a profissão que exerce, estuda e busca a qualidade de ensino. Além disso, valo-riza as atuações colegiadas e as aprendizagens aí produzidas, características que na pesquisa realizada por Cunha (2008b), ao final da década de 80, tam-bém foram reveladas.

Entretanto, se na década de 80 a construção da representação do “bom professor” estava focada no docente, na sua forma de ensinar e nos conhecimen-tos que possuía para “transferir” aos estudantes, parece que ao final da primeira década dos anos 2000 há algumas transformações nesse padrão. Enquanto, à época, ainda não fora percebido o estímulo aos estudantes para desenvolverem habilidades investigativas na sala de aula, “a fazerem suas próprias pesquisas” (CUNHA, 2008b, p. 168), boa parte de nossa amostra revela ter na associação ensino-pesquisa um dos principais indicadores do bom professor.

Suas falas, contudo, evidenciam posições diferenciadas em relação aos fins dessa investigação e à indissociabilidade do vínculo ensino-pesquisa. Enquanto algumas narrativas parecem associadas aos novos paradigmas que separam as instituições de Ensino Superior segundo sua excelência ou voca-ção para a pesquisa, outras se posicionam na “contramão”, questionando esse modelo e os significados do bom professor segundo a lógica liberal, assim como o próprio sentido da pesquisa acadêmica.

O papel do diálogo e da pergunta parece permanecer como traço co-mum entre esses bons professores contemporâneos, reforçando o entendimen-to sobre a sala de aula como espaço de autonomia e protagonismo dos sujeitos que a compõem. Os professores apostam na postura investigativa como con-dição da produção de saberes socialmente necessários e de profissionais com capacidade reflexiva em tempos de incertezas e flutuações.

CONSIDERAÇÕES FINAISCompreendendo a indissociabilidade entre docência e pesquisa como

um fenômeno epistemológico e histórico, a produção de conhecimento sobre o tema, no âmbito da pedagogia universitária, pode gerar movimentos em di-reção a paradigmas instigantes e inovadores sobre a formação de professores

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 537

e a qualidade da graduação nas nossas instituições. Inovação que, para Cunha (2008a, p. 468), é ruptura paradigmática e se materializa “pelo reconhecimen-to de formas alternativas de saberes e experiências, nas quais se imbricam objetividade e subjetividade, senso comum e ciência, teoria e prática, cultura e natureza, anulando dicotomias e procurando gerar novos conhecimentos”.

Os investimentos profissionais que esses professores realizam estão associados a um leque de compromissos docentes vinculados, quer seja à aprendizagem, à sociedade ou ao papel da universidade na trama da produção de conhecimento socialmente relevante. A pesquisa como princípio metodoló-gico torna-os melhores professores porque os ajuda a pensar, a duvidar, a com-preender e essas são qualidades importantes na docência. Pode-se questionar se o bom ensino decorre da pesquisa acadêmica, mas é pouco sustentável afir-mar que não esteja intrinsecamente ligado à condição intelectual de produção do conhecimento, portanto às atividades investigativas. Nossos sujeitos não organizam suas ações docentes baseados na valorização das certezas e do co-nhecimento como produto, mas na condição presidida pela pesquisa, em que a dúvida e a provisoriedade são partes integrantes de suas posturas acadêmicas. Registram-se energias institucionais que valorizam essas práticas de ensinar e aprender? É o desafio que está posto.

REFERÊNCIASBALZAN, Newton. Indissociabilidade ensino-pesquisa como princípio meto-dológico. In: VEIGA, Ilma Passos (org.). Pedagogia universitária: a aula em foco. Campinas: Papirus, 2000, p. 115-36.CUNHA, Maria Isabel da; LEITE, Denise B. Cavalheiro. Decisões pedagógi-cas e estruturas de poder na universidade. Campinas: Papirus, 1996.______. Formação docente e inovação: epistemologias e pedagogias em ques-tão. In: EGGERT, Edla et al. (orgs.). Trajetórias e processos de ensinar e de aprender: didática e formação de professores. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2008a, p. 465-76. (Livro 1)______. O bom professor e sua prática. 20. ed. Campinas, SP: Papirus, 2008b. DINIZ-PEREIRA, Julio E.; LACERDA, Mitsi P. Possíveis significados da pesquisa na prática docente: ideias para fomentar o debate. Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n.109, p. 1.229-42, set./dez. 2009. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br. Acesso em: 20 jun. 2011.ESTEVES, Manuela. Sentidos da inovação pedagógica no Ensino Superior. In: Leite, Carlinda (org.). Sentidos da pedagogia no Ensino Superior. Porto: CIIE, Livpsic, 2010.SCOTT, Peter. Divergencia o convergencia? Las relaciones entre docencia e investigación em la educación superior de masas. In: BARNETT, Ronald (Ed.). Para uma transformación de la universidad: nuevas relaciones entre in-vestigación, saber y docencia. Barcelona: Ediciones Octaedro, 2007, p. 75-90.

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FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES E SUBJETIVIDADE NO CURSO DE

PEDAGOGIA DA TERRA

Denise Elza Nogueira Sobrinha Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza

A proposta desta pesquisa, ora em desenvolvimento no curso de mes-trado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade

Federal de Goiás (UFG), tem como objeto de estudo sentidos subjetivos atribu-ídos pelos sujeitos aprendentes no processo de formação inicial de professo-res no curso de Pedagogia da Terra da FE/UFG. O curso foi firmado por meio de um convênio entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), o Programa Nacional de Educação nas Áreas de Reforma Agrária (PRONERA), a Faculdade de Educação da UFG e a Via Campesina, da qual par-ticipam vários movimentos sociais, entre eles: o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o Movimento dos Atingidos por barragens (MAB), a Pastoral de Juventude Rural (PJR) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Este trabalho está vinculado à linha “Formação, profissionalização docente e práticas educativas” e à pesquisa “A produção acadêmica sobre o professor: estudo interinstitucional da região Centro-Oeste” e pretende com-preender a relação entre formação e subjetividade na formação inicial de professores. Essa compreensão faz-se necessária, pois a formação como um processo dialético envolve diversos condicionantes, entre eles os condicio-nantes materiais que podem evidenciar ou ocultar as estruturas objetivas da sociedade, no nosso caso, a infraestrutura e a superestrutura que configuram e modelam a existência da vida atual atrelada ao modo de reprodução do siste-ma capitalista e os condicionantes subjetivos, que por meio da superestrutura figura um esforço do próprio sistema em criar condições de internalização dos contravalores, como o individualismo, a competição e o consumismo, que favoreçam o modo de reprodução do sistema capitalista.

É nesse contexto histórico, marcado por contradições e tentativas de rupturas com o atual modo de produção e construção da vida, que se insere essa pesquisa, que procura apreender os sentidos subjetivos atribuídos por su-jeitos em processo de formação inicial em curso de formação de professores. Nesse curso de Pedagogia, evidenciam-se a busca por alternativas formativas que promovam um processo de contrainternalização, ou de formação de uma nova consciência, assim como o resgate e a valorização das experiências e dos sujeitos humanos no tempo presente. Para tanto, algumas questões têm orientado a construção deste trabalho, entre elas podem-se destacar: Como se relaciona formação e subjetividade na formação de professores? Quais sen-

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540 SOBRINHA, D. E. N. et al. - FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES E SUBJETIVIDADE

tidos subjetivos os sujeitos aprendentes atribuem ao seu processo inicial de formação como professores? Nesse caso, quais sentimentos, valores e emo-ções perpassam a formação inicial de professores? E de que forma os sentidos subjetivos produzidos pelos sujeitos aprendentes podem afetar ou configurar a formação de professores?

ObjetivosObjetivo geral Compreender a relação entre formação acadêmica e subjetividade na

formação de professores e sua complexidade no processo formativo.Objetivos específicos

• Investigar sentidos subjetivos materializados por meio dos sentimentos, dos valores e das emoções (re)veladas no proces-so de formação inicial de professores, neste caso, dos sujeitos aprendentes que participaram da primeira turma do curso de Pedagogia da Terra da FE/UFG, no período de 2007 a 2011.

• Apreender e analisar concepções pedagógicas e experiências de ensino ocorridas no referido curso e as repercussões que essas podem produzir na formação dos professores.

Método Segundo Minayo (1994, p. 35), “o método científico permite que a re-

alidade social seja reconstruída enquanto um objeto do conhecimento, através de um processo de categorização [...] que une dialeticamente o teórico e o em-pírico”. Nesse sentido, esta pesquisa tem sido embasada em uma abordagem qualitativa, e o método que tem possibilitado a reconstrução e a compreensão da realidade social com suas contradições e seu processo de historicidade é o Materialismo Histórico Dialético. O tipo de pesquisa escolhido para desen-volver este trabalho é o estudo de caso, e os instrumentos utilizados para a coleta de dados foram: questionários, entrevistas semiestruturadas e grupos focais. Ao todo participaram da pesquisa doze sujeitos da primeira turma do curso de Pedagogia da Terra da FE/UFG. A pesquisa foi registrada e aprovada no Comitê de ética da UFG, todos os sujeitos participantes foram informados sobre os protocolos da pesquisa, procedimentos éticos e possibilidade de pu-blicação dos achados no processo, dando, dessa forma livre consentimento.

CONSIDERAÇÕES FINAISNo curso de Pedagogia da Terra da FE/UFG, ao todo foram 59 sujeitos que

concluíram o curso. Mediante critérios específicos inerentes a este trabalho, foi orga-nizado e selecionado um grupo de doze sujeitos para participarem mais efetivamente da pesquisa, o que representa uma amostra de vinte por cento do total da turma.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 541

É importante salientar que o curso ocorreu em nove semestres entre o período de 2007 e 2011 e organizou-se em dois tempos distintos, mas com-plementares entre si, embasados na pedagogia da alternância, que foram: o tempo escola, momento em que os sujeitos estavam na FE/UFG nos meses de janeiro, fevereiro e julho, e o tempo comunidade, momento em que eles retornavam para as comunidades de origem nos outros meses do ano, porém com atividades formativas relacionados ao curso.

Na primeira fase da coleta de dados, que envolveu todos os sujeitos do curso e que foi realizada em janeiro de 2010, foi aplicado um questionário com questões abertas e fechadas que possibilitam a percepção de diversos ele-mentos do caso estudado. Entre eles, pode-se destacar que a maioria da turma foi composta por mulheres, ao todo 47, o que representa oitenta por cento da turma, sendo que o número de homens correspondeu a 12 sujeitos, ou seja, vinte por cento da turma.

Um dos aspectos que chama a atenção nessa turma é a condição socio-econômica dos sujeitos. Dos 59 sujeitos, 29 por cento sobrevivem sem renda, 25 por cento sobrevivem com uma renda inferior a um salário-mínimo, dez por cento com um salário-mínimo, dezenove por cento com uma renda entre um e dois salários-mínimos, dois por cento com dois salários-mínimos, dois por cento com uma renda superior a dois salários-mínimos e treze por cento não divulgaram. Uma análise inicial indica a situação de desigualdade social em que se encontram esses sujeitos e as dificuldades de viver no campo com uma renda tão baixa ou pela ausência de renda. Essa condição de luta pela sobrevivência e a sua relação com a formação docente será um dos elementos que serão mais aprofundados na pesquisa.

Após a aplicação dos questionários foram realizadas as entrevistas semiestruturadas com os doze sujeitos, no período de janeiro e fevereiro de 2010. As entrevistas tiveram como objetivo aprofundar as condições materiais em que se desenvolveu a formação acadêmica, assim como os sentidos subje-tivos atribuídos a esse processo. Posteriormente, foram realizados quatro gru-pos focais, no período de julho de 2010 e fevereiro de 2011. Esses encontros objetivaram aprofundar conceitos, relatos de experiência e outros elementos que surgiram no decorrer deste trabalho.

A pesquisa está em fase de elaboração escrita e análise preliminar dos dados coletados. Neste momento está sendo realizada a categorização dos dados obtidos nas diferentes etapas e que visa um processo de triangulação dos elemen-tos, configurando assim a construção teórica e empírica do objeto pesquisado.

REFERÊNCIASANASTASIOU, Léa das Graças C. Ensinar, aprender, apreender e proces-sos de ensinagem. In: ANASTASIOU, Léa das Graças C.; ALVES, Leonir Pessate. Processos de ensinagem na universidade. Joinville: Editora Univille, 2003.

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542 SOBRINHA, D. E. N. et al. - FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES E SUBJETIVIDADE

CHAUI, Marilena. A universidade pública sob nova perspectiva. Rev. Bras. Educ. 2003, n. 24.DIAS SOBRINHO, José. Dilemas da Educação Superior no mundo globali-zado: sociedade do conhecimento ou economia do conhecimento? São Paulo: Casa do Psicólogo, 2005. MARIOTTI, Humberto. As paixões do Ego: complexidade, política e solida-riedade. São Paulo: Palas Athena, 2000.MELLO Alex Fiúza de; FILHO, Naomar de Almeida; RIBEIRO, Renato Janine. Por uma universidade socialmente relevante. Fórum Nacional de Educação Superior. Brasília, 2009. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=13548&Itemid=953. Acesso em: 10 ago. 2011. MÉSZÁROS, István. O desafio e o fardo do tempo histórico: o socialismo no século XXI. Tradução de Ana Cotrim e Vera Cotrim. São Paulo: Boi Tempo, 2007.MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1994.REY, Fernando. Questões teóricas e metodológicas nas pesquisas sobre a aprendizagem. A aprendizagem no nível superior. In: MARTINEZ, Albertina, Mitjáns; TACCA, Maria Carmem Villela Rosa. A complexidade da aprendiza-gem: destaque ao Ensino Superior. Campinas/SP: Editora Alínea, 2009.SANTOS, Souza Boaventura de. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. Revista crítica de ciências sociais, n. 63, 2002.______. Souza Boaventura de. A universidade no século XXI: para uma refor-ma democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo: Cortez, 2005. SCOZ, Beatriz Judith Lima. Aprendizagem e ensino de professores: senti-dos subjetivos. In: MARTINEZ, Albertina, Mitjáns; TACCA, Maria Carmem Villela Rosa. A complexidade da aprendizagem: destaque ao Ensino Superior. Campinas/SP: Editora Alínea, 2009.SOUZA. Ruth Catarina Cerqueira R de. Universidade: inovações pedagógicas e complexidade. In: GUIMARÃES, Valter Soares. Formação e profissão do-cente. Goiânia: Editora da PUC Goiás, 2009.

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QUALIDADE DE ENSINO DE GRADUAÇÃO: MITOS EM DISCURSOS INSTITUCIONAIS

Blasius Debald Inajara Vargas Ramos

Luis Henrique Sommer Marcelo Salami

Marialva Moog Pinto Tânia Maria Balbich-Faria

E ste trabalho resulta de investigação empírica denominada “Qualidade do ensino de graduação: a relação entre ensino, pes-

quisa e desenvolvimento profissional docente”. Neste estudo, dirigimos nossa atenção para os conceitos de qualidade de ensino de graduação expressos nos discursos institucionais, seus indicadores e ações deles decorrentes, especifi-camente com foco na relação ensino, pesquisa e desenvolvimento profissio-nal docente. Interessava-nos, especialmente, auscultar tanto concepções como práticas delas decorrentes.

Para promover uma aproximação com os bastidores das políticas de gestão institucional do ensino de graduação, elegemos como sujeitos da pes-quisa pró-reitores de graduação das instituições de Ensino Superior compo-nentes do Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras (ForGRAD).

Os dados aqui analisados foram obtidos por meio de entrevistas se-miestruturadas concedidas por doze pró-reitores, sendo que algumas foram feitas presencialmente e outras por e-mail. De posse das narrativas, foram tabulados os dados, usando os princípios da análise de conteúdo. Os núcleos de significação discursiva foram agrupados na expectativa de constituir cate-gorias de análise e apontaram a possibilidade de construir indicadores que aju-daram nas inferências de conhecimentos relativos às condições de produção das mensagens (BARDIN, 1979).

CONCEITOS, INDICADORES E AÇÕESAnalisando os dados empíricos, mais notadamente no que se refere ao

conceito de qualidade de ensino de graduação, seus indicadores e exemplos de ações daí decorrentes, constatamos a falta de clareza do que seja qualidade de ensino de graduação, desde a perspectiva da instituição, a subordinação da instituição à lógica do mercado e das agências reguladoras de âmbito nacio-nal, a ausência de ações que efetivamente corroborem aquilo que está expres-so no discurso e um olhar individualizado e pontual, centrado no docente, e não o sistemático, orgânico, institucional.

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544 DEBALD, B. et al. - QUALIDADE DE ENSINO DE GRADUAÇÃO

Sinteticamente, podemos afirmar que o conceito de qualidade do en-sino de graduação predominante entre os gestores refere-se à cidadania com competência técnico-profissional e genuína inserção no mercado. Aqui, cha-mou-nos atenção o que consideramos uma justaposição acrítica de concepções ideológicas divergentes, sem consistência epistemológica. Vale sublinhar que o fenômeno ocorreu com onze sujeitos, independentemente da mantenedora de suas instituições, do tempo de exercício de pró-reitoria, de suas formações em nível de mestrado e doutorado, bem como das regiões geográficas de suas universidades.

No que se refere aos indicadores de qualidade, é preciso dizer que há um forte nível de coerência em relação ao conceito de qualidade, o que para nós é sintoma de que as afirmações acerca das justaposições teórico-epistemo-lógicas se mantêm. Entretanto, também é preciso referir que alguns dos sujei-tos da pesquisa sugerem indicadores cuja natureza se direciona à sociedade, à indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão, a programas de formação continuada de docentes e a processos de avaliação interna e colegiada, além de infraestrutura adequada para a aprendizagem. Compreendemos, como Cunha (2010), que esses exemplos corroboram o fato de que a universidade não se assume unicamente como executora de determinações de política exógenas.

Especificamente no que se refere às ações, é importante destacar que na coleta dos dados foi solicitado aos sujeitos da pesquisa que apontassem bons exemplos de práticas e ações institucionais que materializassem a qua-lidade de ensino de graduação expressa em seus projetos institucionais pe-dagógicos. Quando esperávamos a manutenção da harmonia existente entre conceitos e indicadores, deparamo-nos com o que definimos como um vazio de acontecimentos, expressão que designa a grande dificuldade que os sujeitos da pesquisa tiveram em apontar ações que exemplificassem o imenso rol de indicadores de qualidade de ensino de graduação que anteriormente referiram. Assim, muitos deles não responderam essa questão, outros repetiram indica-dores e os poucos que responderam citaram uma ou no máximo duas ações de caráter esporádico, assistemático e/ou individual.

Nos conceitos de qualidade expressos pelos sujeitos, o preceito constitucional da indissociabilidade entre ensino e pesquisa na formação de graduação apareceu repetido como um mantra, repetição esta que mais esconde do que mostra, na medida em que os indicadores e as ações exem-plificadoras expressas pelos entrevistados não corroboraram o conceito de qualidade assumido.

Essas análises dos materiais empíricos demandaram um retorno à literatura, com vistas a realizar cotejamentos que qualificassem as interpre-tações. Nesse processo, percebemos que a literatura anglo-saxã é que nos alimentava com reflexões pertinentes que sugeriam que o problema da rela-ção ensino e pesquisa, como referente da qualidade acadêmica, tem caracte-rísticas universais.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 545

VISITANDO ESTUDOS INSPIRADORES

Ramsden e Moses (1992, p. 273), com certo ceticismo, afirmam que “há poucas crenças no mundo acadêmico que suscitem defesas tão apaixona-das como a opinião de que a docência e a pesquisa são atividades complemen-tares e mutuamente benéficas”. Autores como Scott (2008, p. 75) afirmam que “a relação entre docência e pesquisa é um dos pontos mais complicados, com-plexos e polêmicos intelectual, administrativa e politicamente nos sistemas de Educação Superior”. Hughes (2008), buscando saber mais sobre essa relação e após analisar os artigos publicados nas quatro revistas mais prestigiadas de Educação Superior do Reino Unido, no período compreendido entre 1990 e 2002, concluiu que pouquíssimos são os trabalhos resultantes de materiais empíricos e que é possível detectar uma persistente mitificação da relação entre pesquisa e ensino. Sua pesquisa categoriza o que chama de “mitificação do debate” (HUGHES, 2008, p. 31) em cinco diferentes mitos, a saber: 1) o mito de uma relação generalizável e estática; 2) o mito da relação de benefício mútuo entre pesquisa e docência; 3) o mito da superioridade do professor--pesquisador; 4) o mito do professor como centralidade do processo; 5) o mito da relação ensino e pesquisa apesar do paralelismo ou do princípio educativo no discurso. Em suas conclusões, afirma que normalmente, em grande parte do debate, a relação positiva entre pesquisa e ensino é tida como óbvia.

O objeto em estudo nos levou a escolher como suporte de análise as categorias desenvolvidas por Hughes (2008).

O mito de uma relação generalizável e estática Para Hughes (2008), esse mito nasce da ideia de que é possível esta-

belecer e identificar uma relação estática e generalizável entre a docência e a pesquisa. A crítica que o autor faz vai ao encontro de Brew (1999), que afir-ma a importância da compreensão de que toda relação entre pesquisa e do-cência pode variar com o tempo e nutrir-se de diferentes contextos. Afirma, também, que os vínculos podem ser fortes ou débeis, diretos ou indiretos, positivos ou negativos, ou ainda podem ter uma relação totalmente neutra e que podem se dar em diferentes disciplinas, ou instituições, ou somente em um departamento etc.

Esse mito assenta-se em compreensões de fundo, em um certo “dever ser” como um projeto orientador dos discursos sobre a qualidade acadêmica. Pode ser exemplificado pelo depoimento de um dos entrevistados:

Pesquisa e Ensino promovem ambientes de aprendizagens construtivas, questionadoras, criativas. Desacomoda professores e estudantes, instiga, pro-voca novas perguntas e contribui para a qualificação profissional e, principal-mente, da formação.

Essa proposição revela uma representação presente na teoria pedagó-gica e nos discursos sobre a qualidade acadêmica. Mas não chega a indicar alternativas e impasses que envolvem a operacionalização do conceito.

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546 DEBALD, B. et al. - QUALIDADE DE ENSINO DE GRADUAÇÃO

O mito da relação de benefício mútuo entre pesquisa e ensino Hughes (2008) afirma que a essência desse mito se baseia no fato de

que existe uma relação, demonstrada empiricamente, que produz mútuos be-nefícios entre a pesquisa e o ensino. A crítica ao mito, explicitada pelo autor, empresta de Brew e Bound (1995) a afirmação de que a crença de que existe uma relação é mais forte que as provas reais da mesma, de que essa relação nunca poderá ser totalmente demonstrada, e de Barnett (1992) a ideia de que essas duas atividades não são necessariamente comparáveis.

Os pró-reitores, sujeitos da pesquisa, manifestam esse mito pelas se-guintes afirmações:

A minha função de professor, ela vinha desafiar minha pesquisa e ao mesmo tempo minha pesquisa queria informar e orientar e apoiar minha função de professor.

O vínculo ensino-pesquisa quando fortalecido faz toda a diferença no pro-cesso educativo – qualifica verdadeiramente o processo de aprendizagem, do aprendiz e do mestre.

Esses depoimentos reforçam a compreensão dos respondentes em re-lação à repercussão que uma das ações pode ter sobre a outra. Certamente, essa já é uma condição positiva. Mas há uma compreensão de que os proces-sos relacionais se dão espontaneamente, sem uma intencionalidade de inter-venção mais explícita.

O mito do discurso de benefício mútuo, no qual o beneficiário de fato é o ensino, dado que a pesquisa é tida como superior: mito do pseudobenefí-cio mútuo

O material empírico mostrou um tipo de mito que afirma a relação mútua de benefício, mas que exemplifica a afirmação − seja no expressamente dito ou nas entrelinhas do discurso −, deixando transparecer a superioridade da pesquisa como instância principal. Esse mito não foi explicitado pelo estu-do de Hughes (2008), mas nos pareceu importante explicitá-lo mediante falas dos entrevistados:

Quanto mais pesquisa, melhor o ensino. Percebo essa condição, na prática, na minha IES, através das atividades e resultados dos projetos de iniciação científica e dos cursos de pós-graduação. Não resta dúvida de que os alunos que obtêm melhores desempenhos são os que se envolvem com pesquisa e tam-bém extensão.

Entendo que a busca pelo conhecimento, a abertura ao novo, a atualização constante, a condução com ética, a observação e a análise necessárias ao de-senvolvimento da pesquisa geram meios para um ensino especial e de melhor qualidade.

Os depoimentos, que são muitos, expõem a posição corrente dos pró--reitores e desvelam uma similaridade de discursos que expressam a relação ensino e pesquisa na dimensão do domínio valorativo da investigação. Essa parece não se alimentar do ensino, ao contrário da relação que se faz da pes-

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 547

quisa para o ensino. Certamente, não se pode contestar os benefícios que os processos e os produtos da pesquisa trazem ao ensino, quando afasta as formas de ensinar e aprender da reprodução de conteúdos sem questionamentos. Mas parece ainda estar distante a concepção de que também se aprende com os estudantes e suas culturas, que poderiam ser fonte de novas pesquisas.

O mito da superioridade do professor-pesquisadorHughes (2008) afirma que nesse mito os professores-pesquisadores

são considerados superiores aos professores que não participam sistematica-mente de atividades de pesquisa. Essa percepção parece povoar com intensi-dade o ambiente acadêmico brasileiro, conforme atestam os depoimentos de nossos parceiros da investigação:

Professores pesquisadores são professores reflexivos, que levam, conduzem, elevam seus estudantes a estudantes iniciados cientificamente.

Enquanto o pesquisador produz novas incertezas com a busca do conheci-mento, o professor orienta sua prática pedagógica para preparar os estudantes a lidar e conviver com estas incertezas.

Mesmo não fazendo uma referência clara sobre os docentes que não são reconhecidamente pesquisadores, os pró-reitores ressaltam as qualidades do docente pesquisador. Certamente, reconhecem que a docência é desvalori-zada nas universidades, mas, de alguma forma, reforçam que o bom ensino é decorrente da condição investigativa do professor. Infere-se que há uma sensi-bilidade valorativa saudável em relação ao binômio ensino e pesquisa, mesmo que ainda estejam invisíveis os saberes da docência.

O mito do professor como centralidade do processoMesmo reconhecendo, de forma unânime, que os professores univer-

sitários não foram formados para a docência e que essa condição é problemáti-ca, identifica-se uma supremacia da pesquisa sobre o ensino, pelo menos para dois terços dos respondentes. Parece que eles creem na cultura universitária que aposta que essa formação se faz na prática, com base nos modelos cultu-rais e no domínio do conteúdo curricular. Por isso, convivem com iniciativas pontuais de formação pedagógica continuada sem uma aposta em políticas es-pecíficas de larga duração. Responsabilizam o professor pela construção dessa competência, mas também convivem com a ausência dessa possibilidade, que não se revela com consequências na carreira e no prestígio do docente. Sobre a forma como os saberes da pesquisa e os saberes da docência se manifestam na qualidade educativa, eles salientam:

De forma geral, a figura do pesquisador está desvinculada da do professor. [ou] A relação entre os saberes da pesquisa e os saberes da docência se mani-festa quando se ensina e pratica-se o método científico, quando levamos a sala de aula ou para as atividades de ensino as práticas vivenciadas na pesquisa.

Quando os docentes conseguem fazer uma articulação consistente entre a atuação docente e conteúdos da docência na graduação, com projetos de pes-quisa inovadores e ou consistentes, de relevância.

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548 DEBALD, B. et al. - QUALIDADE DE ENSINO DE GRADUAÇÃO

(Quando/se) proporciona vivência de situações de ensino para os futuros professores, realizando uma eventual crítica de seu desempenho nestas expe-riências à luz das descobertas e fundamentos das ciências da educação, subs-tituindo, portanto, a tagarelice pseudofilosófica, infelizmente, ainda predomi-nantes nos cursos de formação de professores.

Essas manifestações reveladoras são capazes de nos colocar em xeque com relação aos mitos previstos por Hughes (2008). Mas não prescindem de uma reflexão mais intensa sobre como essas posições dos gestores, no caso pró-reitores de graduação, se materializam (ou não) em políticas institucionais para a melhoria da qualidade do ensino.

O mito da relação ensino e pesquisa apesar do paralelismo ou do princípio educativo no discurso

Metade dos sujeitos entrevistados admite o paralelismo entre ensino e pesquisa, valorizando as duas atividades como cerne da qualidade da univer-sidade. Entretanto, dois deles mencionaram a pesquisa como princípio edu-cativo, mesmo que seus exemplos se identificassem pouco com essa posição teórica. Outros quatro, porém, assumem a pesquisa como princípio educativo, sendo que os exemplos variam entre ações de natureza individual ou institu-cional como monografias e estágios, até um programa institucional da pró--reitoria de graduação na direção de estimular o ensino com pesquisa.

A presença desse conceito nos discursos dos respondentes é alenta-dora, mas não foram identificados projetos/programas de formação e acom-panhamento nesse sentido, o que indica que se espera que essa mudança pa-radigmática seja “natural” e fique à mercê de iniciativas pontuais de alguns docentes, atingidos pela insatisfação com as práticas tradicionais de ensinar e aprender.

CONSIDERAÇÕES FINAISNossas análises demonstraram que os gestores, em sua maioria, não

apresentam discussões acumuladas sobre o tema que nos mobiliza: a relação ensino e pesquisa e seu impacto na qualidade da graduação. Fica também evidente a existência de um vácuo entre “intenção e gesto”, bem como cons-tatamos a presença fortemente predominante de um olhar individualizado e pontual sobre qualidade, muito centrado na figura do professor e não na ins-tituição. Isto é, há uma evidente carência de políticas e programas de caráter sistemático e intencional.

O presente estudo corrobora a forte e persistente mitificação da relação entre pesquisa e ensino apontada pela literatura contemporânea. Observamos a existência do fenômeno que afirma e reafirma que a pesquisa influencia positivamente o ensino, aprimorando sua qualidade, mas assumindo essa con-dição como um fenômeno de natureza tanto mítica quanto axiomática. No caso da maioria quase que absoluta das universidades aqui estudadas, esse

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 549

fenômeno “mostra sua cara” mediante os mitos do benefício do ensino em relação à pesquisa, aqui também denominado de pseudobenefício mútuo; da superioridade do professor pesquisador e da centralidade do professor no pro-cesso de pesquisa e do ensino.

Vale apontar que o estudo identificou um exemplo atípico, único e ilhado, que sugere a possibilidade alentadora de um rompimento possível dos mitos que sugerem dialeticamente novos horizontes para a questão da relação ensino e pesquisa e a qualidade de ensino na graduação.

REFERÊNCIAS

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1979.BARNETT, R. (Ed.) Para una transformación de la universidad: nuevas re-laciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, 2008.BREW, A. The value of Scholarship, Society for Research into Higher Education Conference, 1999.BREW, A.; BOUND, D. Teaching and research: establishing the vital link with learning. In: Higher Education, n. 29, p. 261-73, 1995.CUNHA, Maria I. Diálogo com as experiências: que conclusões incitam os estudos? In: CUNHA, M. I. da. (org.) Trajetórias e lugares de formação da docência universitária: da perspectiva individual ao espaço institucional. Araraquara: Junqueira & Marin; Brasília: CAPES: CNPq, 2010, p. 291-9. HUGHES, M. Los mitos en torno a las relaciones entre investigación y do-cencia en las universidades. In BARNETT, R. (Ed.) Para una transformación de la universidad: nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, p. 29-44, 2008.RAMSDEN, P.; MOSES, I. Associations between research and teaching. Australian higher education in Higher Education, n. 23, p. 273-95, 1992. SCOTT, P. Divergencia o convergencia? Las relaciones entre docencia y in-vestigación en la educación superior de masas. In: BARNETT, R. (Ed.) Para una transformación de la universidad: nuevas relaciones entre investigación, saber y docencia. Barcelona: Editorial Octaedro, p. 75-91, 2008.

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DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: A RELAÇÃO ENTRE ENSINO E PESQUISA E QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO SOB O PRISMA DOS

DOCENTES INICIANTES

Neridiana Fabia Stivanin Gabriela Machado Ribeiro

Nadiane Feldkercher Helena Beatriz Mascarenhas de Souza

O processo de expansão do acesso à Educação Superior vem-se consolidando nas últimas décadas, por meio da ampliação do nú-

mero de vagas, da criação de novos cursos e de novas universidades. Cunha (2010) pondera que a universidade está em tempos de expansão e chama aten-ção para o fato de que as políticas de estímulo à interiorização da universidade e ao acesso das classes populares à Educação Superior, principalmente na rede acadêmica federal, propiciam também uma expressiva ampliação dos quadros docentes.

Esse processo de expansão acelerada da Educação Superior ocorre, muitas vezes, sem a devida atenção a aspectos pedagógicos, a aspectos refe-rentes à percepção de ensino, de pesquisa, de qualidade da educação, e/ou a aspectos da formação desse novo professor universitário. A desatenção a esses aspectos incide fortemente sobre o processo de seleção dos novos professores o qual, conforme apontado por Cunha (2010), geralmente parte do pressupos-to inquestionável de que “a pesquisa qualifica o ensino” (p. 2).

A preocupação com essas e outras questões referentes à pedagogia uni-versitária levou ao desenvolvimento da pesquisa interinstitucional “Qualidade do ensino de graduação: relação entre ensino, pesquisa e desenvolvimento profissional”. Com essa pesquisa objetiva-se analisar a relação ensino e pes-quisa, aprofundando o conceito de qualidade da Educação Superior, sob vários vieses. Nesse âmbito, nosso Grupo de Pesquisa, Pedagogia Universitária e Formação de Professores, vinculado à Universidade Federal de Pelotas, busca compreender a relação ensino e pesquisa e a qualidade da Educação Superior a partir da voz de professores universitários iniciantes (aqueles que possuem até cinco anos de experiência docente, conforme definido por Bozu (2009)).

No trabalho aqui apresentado, objetivamos discutir como professores universitários iniciantes estabelecem relações entre ensino e pesquisa e anali-sar o que entendem por qualidade da Educação Superior.

Os colaboradores dessa pesquisa foram vinte e sete professores universitários iniciantes pertencentes a quatro Instituições de Educação Superior: Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Universidade do Vale

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552 STIVANIN, N. F. et al. - DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

do Rio dos Sinos (Unisinos), Universidade Federal do Paraná − campus Litoral (UFPR) e Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Foram se-lecionados docentes mestres e/ou doutores com até cinco anos na carreira universitária, oriundos de formação inicial (graduação) bastante distinta, em duas Instituições consolidadas e duas Instituições novas da região Sul do país. No texto, esses colaboradores são identificados com nomes fictícios, preservando o gênero.

O instrumento adotado para a coleta das informações foi a entrevista individual semiestruturada, com roteiro composto por questões abertas. As questões que priorizamos para a discussão neste trabalho voltam-se para as temáticas relação ensino e pesquisa e qualidade da Educação Superior.

O estudo caracterizou-se pela abordagem qualitativa. As informações coletadas foram trabalhadas por meio da análise de conteúdo, pela qual bus-camos compreender o significado dos dados obtidos, com vistas a responder nossas indagações e a ampliar o nosso conhecimento sobre a relação ensino e pesquisa e qualidade da Educação Superior, principalmente pelo viés dos professores iniciantes.

Para efeitos didáticos e para alcançarmos os objetivos a que nos pro-pomos, as discussões teóricas e as análises apresentadas neste trabalho foram organizadas em dois blocos que serão apresentados na sequência, um tratan-do das percepções de professores iniciantes sobre as relações entre ensino e pesquisa e outro que aborda a compreensão de professores iniciantes sobre a qualidade na Educação Superior.

RELAÇÃO ENSINO E PESQUISA: O QUE DIZEM OS DOCENTES INICIANTESCom base nas contribuições de nossos sujeitos, alguns aspectos fi-

cam evidentes em relação à percepção desses professores iniciantes sobre as relações entre ensino e pesquisa. Um primeiro aspecto que observamos ao analisar os dados foi a significativa valorização da pesquisa em detrimento do ensino, conforme exemplifica a fala abaixo:

Hoje em dia, todo mundo quer ser pesquisador, é difícil tu encontrar um professor que entre na universidade que queira ser extensionista, por exemplo, são raros, porque a gente tem na verdade proposições macro que sinalizam para isso (para a pesquisa). Hoje em dia a pesquisa, na verdade, é uma grande fonte de manutenção e implemento, de crescimento das instituições (Professor Lucas).

Essa percepção é estimulada pelo contexto de formação dos profes-sores durante seus cursos de mestrado e doutorado − local de sua preparação para o ingresso na carreira universitária −, em que tiveram uma formação voltada para os princípios da pesquisa e foram encorajados e cobrados a pes-quisar e socializar os resultados de suas pesquisas.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 553

É evidente que a universidade, de modo geral, atribui um maior status acadêmico à pesquisa e faz com que o ensino se transforme em uma atividade secundária dos docentes. Muitas vezes, na universidade, tem-se presente a ideia de que quem trabalha com pesquisa possui um nível de desenvolvi-mento intelectual superior, uma capacidade para ver as coisas de forma mais rigorosa e sistemática e/ou um maior domínio de conhecimentos científicos específicos.

Ao mesmo tempo, a formação pedagógica necessária aos professores da Educação Superior continua sem a devida atenção e implementação. As decisões pedagógicas ficam a cargo de cada professor, que tem livre-arbítrio sobre sua prática educativa. Normalmente, quando professores iniciantes co-meçam a ensinar, percebem que são necessários saberes que vão além dos saberes específicos desenvolvidos ao longo de seu percurso investigativo. Pimenta e Anastasiou (2008, p. 198) apontam que os professores desenvol-vem, nos cursos de pós-graduação, “habilidades referentes ao método de pes-quisa que conta com especificidades bem diferentes do método de ensino”. Os professores iniciantes colaboradores desta pesquisa também percebem isso, como expresso no seguinte fragmento de fala:

[...] a pós-graduação talvez teoricamente tenha o papel de formação do pro-fessor universitário, mas ela não está dando conta disso [...] O meu mestrado não me fez um professor universitário [...] Então não forma [...] Eu acho que falta, acho não, eu tenho certeza que falta isso, um local de formação para o professor universitário [...] O que eu fiz ali me fez pesquisador. Eu me tornei professor [...] foi no dia a dia. (Professor Adriano)

Nesse cenário, torna-se importante retomar o dilema entre a forma-ção para a docência e a formação para a pesquisa. Segundo Zabalza (2004), nas universidades existe a orientação de desenvolver atividades tanto de ensino como de pesquisa; entretanto, a cultura universitária tem atribuído um maior status acadêmico à pesquisa e lhe dado prioridade. O autor acres-centa ainda:

O que normalmente é avaliado nos concursos de ingresso e promoção são os méritos das pesquisas; o que os professores e seus departamentos tendem a prio-rizar por causa dos efeitos econômicos e do status são as atividades de pesquisa; o destino prioritário dos investimentos para formação do pessoal acadêmico, em geral, é orientado principalmente para a formação em pesquisa (muitas vezes, é administrado pelas pró-reitorias de pesquisa) e assim sucessivamente (ZABALZA, 2004, p. 154).

A formação realizada nos cursos de mestrado e doutorado incide signi-ficativamente sobre a percepção que os professores elaboram sobre a relação entre ensino e pesquisa e, consequentemente, sobre a qualidade do ensino que desenvolvem. Algumas das percepções dos professores iniciantes colaborado-res da nossa pesquisa sobre a relação ensino e pesquisa podem ser identifica-das a seguir:

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554 STIVANIN, N. F. et al. - DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Os espaços nas universidades são muito fragmentados e é pouco prová-vel que se consiga articular de modo integrado ensino, pesquisa, extensão. Considero desafio a ser atingido, que deve ser vislumbrado em cada prática. Infelizmente não é alcançado porque no cotidiano o docente encontra o cami-nho todo dividido, inclusive com carga enorme de burocracia em cada espaço (Professor Darlei).

Para mim, o professor é, ele não deixa de ser, ele é pesquisador, ele é docen-te [...] sem pesquisa o professor se torna um papagaio, ele vai “repetindo” as coisas, vai transmitindo... e segue vinte anos dando a mesma aula sem ter um aprimoramento, sem haver mudanças (Professor Diovani).

A fala do primeiro professor revela uma crítica ao sistema da universi-dade que muitas vezes dificulta a preconizada indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Já a percepção do segundo professor é a de que todo professor é pesquisador, portanto não vê dissociados ensino e pesquisa. Nessa fala é interessante perceber o reconhecimento de que a pesquisa pode fazer o pesquisador desenvolver a atividade de professor e de que a pesquisa ajuda a aprender a pensar e observar as coisas sob outros ângulos que acabam gerando outros conhecimentos.

QUALIDADE DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: COMO A COMPREENDEM OS DOCENTES INICIANTESNo que tange à qualidade, os docentes iniciantes revelam diferentes

entendimentos. Alguns deles associam fortemente a qualidade da Educação Superior às características do egresso. Tendo por foco o aluno, essas caracte-rísticas perpassam desde uma visão bem pontual de inserção no mercado de trabalho, de desempenho em testes avaliativos, de autonomia na busca de qua-lificação, até uma concepção mais abrangente de formação cidadã do egresso.

Por exemplo, há entrevistados que salientam a independência do alu-no, sua iniciativa em buscar novas informações e o domínio de determinados conteúdos como aspectos a serem desenvolvidos por uma Educação Superior de qualidade. A ênfase nessa premissa pode ser percebida na fala de um dos entrevistados quando afirma que a qualidade do ensino

[...] seria a qualidade do produto final, como o estudante sai no final [...] a forma que a gente tem de demonstrar isso é como eles vão nos tais de Enade, na vida ou como eles são aprovados em concursos e coisas assim (Professor Marcos).

Sinalizando outra perspectiva de egresso, um dos respondentes desta-ca que a Educação Superior de qualidade deve

[...] desenvolver o senso crítico dos estudantes, compromisso social, ensino voltado para a transformação da realidade. Ensino Superior para além das de-mandas de mercado. O aluno deve sair apto a produzir conhecimento na área que bem entender, deve-se lhe dar as ferramentas, os meios, e não o conheci-mento pronto, estático. Deve estar preparado para as mudanças e ter a plena

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 555

consciência que a sociedade e a vida podem ter qualquer forma possível e que nada é normal ou natural, entender-se como sujeitos de um processo histórico (Professor Ricardo).

Apesar de essas falas apresentarem diferenças significativas entre si, elas focalizam a mensuração da qualidade da Educação Superior no indiví-duo, no profissional egresso. Essa associação, em especial no primeiro caso, está atrelada em grande medida ao princípio da empregabilidade, o qual con-siste em ter a “condição de ser empregável, de conseguir emprego para os seus conhecimentos, habilidades e atitudes intencionalmente desenvolvidos pela educação e treinamento sintonizados com as necessidades do mercado” (MOROSINI, 2001, p. 92).

É pertinente considerar que há professores que vislumbram a forma-ção cidadã do profissional como um elemento essencial ao salientar como aspectos importantes a criticidade, o compromisso social e a compreensão do sujeito como ser histórico.

Por sua vez, um número significativo de entrevistados identifica o re-ferencial de qualidade no corpo docente das IES e no comprometimento que os professores demonstram ter com as atividades de ensino. Nessa direção, um dos entrevistados explica que

a qualidade da Educação Superior passa pela qualificação e formação dos docentes, a construção de boas relações no ambiente de ensino, comprometi-mento e dedicação dos docentes para com alunos e Instituição, vocação, flexi-bilidade (Professora Greici).

Esse entendimento, embora expresse um deslocamento da centralida-de do aluno para o docente, revela uma compreensão de qualidade ainda atri-buída ao indivíduo, nesse caso ao professor. Apesar de reconhecermos o im-prescindível papel que os docentes exercem na efetivação de uma Educação Superior de qualidade, cabe questionarmos se é prudente atribuirmos a eles toda essa responsabilidade. Compreendemos que o comprometimento e a de-dicação são substanciais à atividade docente; entretanto, há que se ponderar as implicações e a intensidade desse movimento.

A responsabilização desmedida do corpo docente pela qualidade re-monta à ideia de professor como centro do processo educativo, como alguém vocacionado, capaz de resolver sozinho todos os problemas concernentes à educação. Nessa direção, Garcia e Anadon (2009) explicam que a exploração, pelos discursos e pelas propostas educacionais oficiais, das autoimagens e dos sentimentos de profissionalismo dos docentes, a incitação a sentimentos de autorresponsabilização pelo fracasso/sucesso do ensino, a adoção de uma postura salvacionista, configuram um processo de autointensificação do tra-balho docente.

Além do comprometimento e dedicação que os docentes devem dedi-car ao seu trabalho, é sinalizada a necessidade de que estes se assumam como

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556 STIVANIN, N. F. et al. - DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

professores, mesmo não tendo uma formação inicial em licenciatura, ou mes-mo que tenham escolhido a docência universitária motivados pelo gosto pela pesquisa. Conforme destaca um dos entrevistados:

Em um Ensino Superior de qualidade eu tenho que ter bons professores, e o que rege ter bons professores? Professores que mesmo eles estando nas en-genharias ou nas licenciaturas, eles são professores, é essa a grande questão, no momento em que eu chegar e me olhar no espelho e dizer “eu não sou mais engenheiro, eu não sou mais historiador, eu não sou mais homem da linguística ou mulher da linguística”, eu sou professor, eu encarnar esse personagem de professor educador. O ensino melhora, se nós conseguimos fazer essas duas coisas, eu acho (Professora Sabrina).

Aspectos relacionados à infraestrutura também foram mencionados como atributos de qualidade da Educação Superior. Conforme enuncia um dos respondentes:

Qualidade é tu oferecer realmente para o aluno, em primeiro plano, a ques-tão de estrutura física, oferecer condições para que esse aluno possa desenvol-ver todo o potencial e buscar tudo aquilo que na realidade ele tem direito no momento que está matriculado numa universidade, seja pública ou privada, esse deve ser o alicerce do ensino de boa qualidade (Professor Robson).

Embora compreendamos que boas instalações e condições estruturais sejam importantes ao bom desenvolvimento de qualquer atividade profissio-nal, cabe questionarmos se atribuir a qualidade da Educação Superior essen-cialmente a essa condição não remeteria, conforme explica Sguissardi (2009), à ideia de universidade como centro de excelência, em que são oferecidas todas as condições de alcance da eficiência e produtividade. Tal compreensão encontra-se intimamente vinculada à lógica empresarial que adentra e se dis-semina no âmbito acadêmico. Morosini (2001) aponta, ainda, que essa manei-ra de vislumbrar a qualidade da Educação Superior referenda a concepção de isomorfismo e padronização, em que é atribuída à estrutura a chamada quali-dade excepcional, por seus padrões excepcionalmente elevados de realizações acadêmicas, por serviços e facilidades ligados a recursos e à garantia de boas instalações.

CONSIDERAÇÕES FINAISO intuito deste texto foi refletir sobre a relação entre ensino e pesquisa

e a qualidade da Educação Superior com base no entendimento de docentes iniciantes na carreira universitária.

O depoimento dos professores entrevistados, no que se refere à rela-ção entre ensino e pesquisa, revela que percebem uma acentuada valorização da pesquisa em detrimento do ensino. Tal percepção coaduna-se tanto com o processo de formação que vivenciaram em sua pós-graduação, pautada es-sencialmente na pesquisa, quanto com a atual configuração das atividades no

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 557

âmbito universitário, que tem conferido maior status acadêmico à pesquisa, denotando ao ensino um caráter secundário nas atribuições docentes.

No que tange à compreensão de qualidade da Educação Superior, além de mencionarem o aparato estrutural da instituição como aspecto importante, os interlocutores assinalam, preponderantemente, o desempenho dos sujeitos sociais envolvidos no processo educativo. Assim, sinalizam as características dos egressos e dos docentes como indicadores de qualidade.

Tais constatações nos remetem a problematizar a sobreposição da pesquisa em relação ao ensino no âmbito universitário. Cabe ponderar que a valorização da pesquisa acadêmica é importante – entretanto, ela deve ser entendida para além do domínio do conhecimento específico, configurando-se como uma prática investigativa capaz de romper com os preceitos da raciona-lidade técnica e constituindo-se como um princípio educativo.

Para que seja superada a condição de supervalorização da pesquisa em detrimento do ensino e para que se transcenda a compreensão de qualidade da Educação Superior calcada na mensuração do desempenho de discentes e docen-tes, sugerimos que se garanta aos professores que estão se inserindo nesse contex-to momentos para reflexão e problematização dessas questões: espaços/tempos que lhes possibilitem compreender a configuração do atual contexto universitário, conhecer aspectos relacionados à dimensão pedagógica do fazer docente e vis-lumbrar a complexidade que envolve a docência na Educação Superior.

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558 STIVANIN, N. F. et al. - DOCÊNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

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QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO: A RELAÇÃO DO ENSINO E DA PESQUISA NO

CONTEXTO DA EAD

NICOLODI, S. C. F. et al. Suzana Cine Freitas Nicolodi Maria Isabel da Cunha

A ampliação das reflexões sobre currículo e práticas de formação na universidade exige um investimento, aprofundando questões

que necessitam análises mais sistemáticas e corajosas. Esse campo ainda re-presenta uma potencialidade a ser descortinada, tanto na sua dimensão epis-temológica e pedagógica como na arena política que envolve tensões entre culturas e interesses. Na perspectiva epistemológica, é preciso investir na te-mática conceitual que alia ensino e pesquisa, ampliando a reflexão sobre a na-turalização com que esse discurso vem sustentando a qualidade da Educação Superior. Do campo dos conhecimentos pedagógicos é exigida uma base de pesquisa e reflexão, focando o currículo, os processos de ensinar e aprender e sua dimensão de qualidade. Essa perspectiva incide fortemente da concepção de docência e nos saberes necessários ao seu exercício. Considerando a EAD como tendência crescente na educação contemporânea, faz-se necessário in-vestigar de que maneira a indissociabilidade do ensino e pesquisa tem-se apre-sentado, também, nessa modalidade de ensino.

Para tanto, toma-se como objetivos principais, neste recorte da pesqui-sa, desvelar a concepção epistemológica dos docentes atuantes na modalidade EAD; examinar como, na prática, percebem a relação ensino e pesquisa como elemento que dá qualidade ao ensino de graduação e, ainda, verificar como os mesmos têm sido preparados em sua formação para atuar nessa modalidade.

ANCORAMENTO TEÓRICOCom as crescentes iniciativas em todo o Brasil em favor da EAD, que

se visibilizam também pelas políticas do Ministério da Educação (MEC), cria--se a necessidade de as mesmas virem acompanhadas de um viés específico para formação de professores que atuarão nessa modalidade de ensino.

Nesse sentido, é importante ampliar o olhar e estudos sobre a modali-dade a distância para qualificar as práticas pedagógicas que são aplicadas nos cursos de formação de professores, especialmente as licenciaturas, entenden-do que, mesmo utilizando todas as possibilidades tecnológicas disponíveis, a qualidade da educação não estará garantida.

Compreendendo que não bastará apenas estar conectado à rede, em uma velocidade alta, Silva (2010) destaca que a formação de professores deve se preocupar com a troca de uma pedagogia da transmissão para uma forma-

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NICOLODI, S. C. F. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO560

ção capaz de redimensionar a prática docente, na qual o professor “será um formulador de problemas, provocador de situações, arquiteto de percursos, mobilizador da experiência do conhecimento” (p. 216). O que realmente fará a diferença será a compreensão de que se trata de outra modalidade de ensino, de outra natureza, muito distinta da natureza do ensino presencial.

A percepção da necessidade da mudança no processo ensino/apren-dizagem é essencial para as modificações e transformações das práticas do professor em formação. De acordo com Fagundes (2006), é mais importante conhecer sobre o sujeito que se deseja educar, ter em mente o que já dispomos de informação sobre ele e o que ainda não sabemos, do que dominar com ma-estria o conteúdo, métodos e técnicas de ensino.

A autora compreende que a incorporação das tecnologias digitais na EAD represente uma mudança paradigmática, na qual o modelo de ensino como transmissão de conhecimento dá lugar ao modelo de aprendizagem como construção de sistemas conceituais. Em outras palavras, de um paradigma de ensino, o qual possui um sistema fechado, estamos migrando para um paradig-ma de aprendizagem que é compreendido como um sistema aberto e possibilita processos transformadores dos sujeitos envolvidos na ação educativa.

Como a EAD possui algumas especificidades, é relevante que uma aten-ção especial seja dada quanto à formação dos profissionais que estarão envolvi-dos no processo de mediação para que seja possível a esses profissionais com-preender tais especificidades. Conforme Schlüzen, Junior e Terçariol (2006),

[...] é primordial que as IES preocupem-se também com o processo de forma-ção de seus professores que atuarão em um curso a distância, uma vez que es-ses não serão mais responsáveis apenas pela formação presencial, mas estarão contribuindo para a formação de professores de uma nova modalidade (p. 103).

É fundamental que a EAD represente mais que uma novidade no cam-po da educação, ela precisa se constituir enquanto uma inovação, até em fun-ção da necessidade de repensar práticas e processos de mediação pedagógica a partir do uso de diferentes TDs, o que acrescenta novos elementos e possi-bilidades à ação e à interação dos sujeitos que dela participam. No entanto, para que isso seja possível, se faz mister o rompimento do velho paradigma, de forma que essa nova modalidade educacional não sirva apenas como um aparato que pode facilmente continuar servindo a ele, perpetuando a ideologia dominante e atendendo a um currículo preestabelecido, as práticas fundamen-tadas na reprodução, na repetição de um modelo que não dá mais conta dos desafios que os docentes enfrentam ao entrar em uma “sala de aula”, em que “nativos digitais”, a “Geração Homo Zappiens”, os esperam.

Usar uma nova tecnologia não garante inovação, a inovação está na forma criativa de utilizá-la, na forma como aproveitamos todas as possibilidades para os processos de ensino e de aprendizagem, de outra forma, podemos estar sim-plesmente falando de uma novidade e não de uma inovação (SCHLEMMER, 2008 p. 11).

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 561

Somos frutos, enquanto docentes, de uma proposta escolar disciplinar, inspirada na ciência moderna e, concordamos com Sousa Santos que salienta, que “será desastroso se as inércias, atadas à ideia de que a universidade sabe estar orgulhosamente parada na roda do tempo, não permitirem enfrentar os riscos e maximizar as potencialidades”.

Alterar paradigmas requer um compromisso com a mudança e, tam-bém, a construção de novas formas de compreender o conhecimento e a apren-dizagem. Esses desafios se apresentam para o campo da formação.

Boaventura de Sousa Santos (2005) auxilia-nos a compreender o mo-vimento cambiante do pensamento humano e da ciência, inclusive o da peda-gogia, ao afirmar que “os paradigmas socioculturais nascem, desenvolvem-se e morrem. Ao contrário do que se passa com a morte dos indivíduos, a morte de um paradigma traz dentro de si o paradigma que lhe há de suceder” (p. 15).

Segundo Sousa Santos (2004), a humanidade se encontra em um mo-mento de transição paradigmática. Embora ainda fortemente marcados pelo pa-radigma epistemológico da modernidade, ansiamos pelo modelo emergente que privilegia o subjetivo, as diferenças, a diversidade, que considera o entorno do sujeito e do objeto e que requer novos olhares e reflexões acerca dos contextos, de como nos inserimos neles e das funções que somos requisitados a desempenhar.

Moraes (2003), com base no modelo epistemológico emergente, con-sidera que as novas estratégias e metodologias do campo educacional devam estar voltadas para atender às necessidades do mundo atual, com vistas em um pensamento inter e transdisciplinar, que compreende o que antes era contradi-tório, agora, como complementar.

Ainda, segundo Moraes (2003), ao adotarmos um novo paradigma, fre-quentemente esbarramos na questão da formação docente, e há de considerar-se que a prática do professor é sempre perpassada por mais de um paradigma, o que dificulta, para os que se encontram nesse momento de transição, a transfor-mação das suas práticas, pois ainda estamos seriamente implicados no passado, uma vez que “fomos educados para não inovar, para não discordar dos mais ve-lhos, para repetir o conhecido, para não incomodar e não transformar” (p. 193).

Para a autora, o que está na base do processo da mudança é acreditar que é possível ser diferente, é ter esperança. Então, parafraseando Maturana (2003), que a emoção mova a razão e desenvolva o processo.

ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOSForam utilizados os princípios da pesquisa qualitativa, como é usual

na trajetória do grupo de pesquisa, em especial os princípios da pesquisa et-nográfica. Nessa abordagem, os fenômenos são aprendidos em uma dimensão de contextualização e percebidos como socialmente produzidos. Envolve uma possibilidade de imersão na realidade pesquisada, procurando captar os signi-ficados das experiências em uma perspectiva cultural e política.

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NICOLODI, S. C. F. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO562

A análise dos dados procurou contemplar a visão interpretativa das bases epistemológicas dos conceitos de qualidade do ensino de graduação e o impacto da relação pesquisa e ensino nessa representação. Procurou compre-ender as mediações que se constroem nessa relação e a formação dos protago-nistas que as efetivam

As entrevistas semiestruturadas e questionários respondidos por meio eletrônico foram também fundamentais para coletar outra natureza de infor-mações. As narrativas dos sujeitos sobre os processos vividos, suas concep-ções e motivações constituíram-se em importante instrumental para fornecer o material de análise.

Os interlocutores foram selecionados levando em conta a necessida-de de ouvir, não apenas docentes atuantes, como, também, os coordenadores de cada curso investigado. Nesse sentido, nossa abordagem deu-se em um recorte de quatro instituições de grande porte de Ensino Superior brasileiro, optando-se por diferentes áreas do conhecimento e buscando ouvir, pelo me-nos, dois docentes de cada instituição e seus respectivos coordenadores. O critério de escolha dos docentes, além da disponibilidade em colaborar com a pesquisa, foi o maior tempo de atuação nessa modalidade de ensino, na in-tenção de garantir certa apropriação das práticas e conceitos exercidos nesse campo específico de ensino.

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS ACHADOSComo o presente trabalho trata-se de um recorte da pesquisa que está

em desenvolvimento, a discussão dos resultados que será apresentada a seguir é de caráter parcial e focada apenas nos objetivos explicitados anteriormente.

Ao serem indagados se acreditam que a relação ensino e pesquisa defi-ne a qualidade do Ensino Superior, os respondentes são unânimes em afirmar que sim, que existe a necessidade da articulação entre a pesquisa e o ensino, entretanto, reconhecem a distância e a dificuldade da efetivação dessa articu-lação, o que fragiliza a qualidade da educação.

Creem que a pesquisa deva estar voltada à realidade escolar, à evolu-ção do conhecimento e às práticas que vêm sendo implementadas, o que abre a possibilidade para refletir essa mesma realidade.

Um dos coordenadores aponta, ainda, que percebea Pesquisa muito internalizada, no sentido das escolhas conceituais assim como dos desenvolvimentos e das divulgações muito voltadas à própria comu-nidade dos PPGs. E o Ensino, um espaço que tomou um caminho muito “ope-racional” e pouco “formador”. Quando ambos conversarem posicionando-se como interdependentes, mesmo, penso que, em uma linguagem menos acadê-mica, tanto o “serviço” Ensino, quanto o “produto”, a formação em todos os níveis, estarão em harmonia quase que sistêmica, porque esta qualidade estará garantida tanto em termos de experimentação interna quanto em termos daqui-lo que estamos oferecendo ao mercado.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 563

Outro docente argumenta, ainda, que a falta de tempo específico desti-nado à pesquisa dificulta, quando não impossibilita, a sistematização e publi-cização de suas experiências e achados.

Tais considerações nos fazem refletir sobre a pressão externa que a educação vem sofrendo, a cobrança pela quantidade de produção científica por parte dos órgãos responsáveis pelo setor, aliada à falta de tempo para a pesquisa, especialmente para a modalidade EAD, resultam tanto em uma fra-gilização da qualidade do ensino ofertado, como por gerar no docente insatis-fação, angústia e a sensação de não atender satisfatoriamente nem a pesquisa, nem ao ensino.

Outra questão abordada nesta investigação buscou desvelar como são preparados os professores que atuam na EAD, se a relação ensino/pesquisa faz parte dessa preparação e se tem sido critério para seleção docente. Nesse ponto, as instituições apresentaram variações em suas respostas, embora a maioria tenha afirmado que existe uma capacitação para atuar nessa modali-dade, buscando atender às orientações do Ministério da Educação e Cultura (MEC). Outros consideram que essa capacitação não é suficiente e buscam outras alternativas para qualificar o processo ensino/aprendizagem, como é possível verificar na colocação de um docente:

Lembro que os tutores faziam um treinamento sobre o uso do moodle, eu fiz, mas não me ajudou, passei muito trabalho. [...] Pedi permissão para o coor-denador na época e me desloquei para o polo presencial uma vez por semana, que ficava em outra cidade, e conversava com os alunos, eles me disseram tudo que eu precisava saber.

Outros docentes ainda, incluindo um dos coordenadores de curso, dis-seram que suas preparações se deram na prática, seja em função de sua forma-ção acadêmica ou pela urgência da situação que se apresentava no momento de sua inserção na modalidade.

Um dos coordenadores lembra que, durante um período passado, sua instituição ofertou uma preparação docente articulada, pois na época

a concepção era a de uma “formação” realmente, inclusive no âmbito concei-tual e não apenas uma “capacitação tecnológica” como é comumente enten-dida. [...] outro aspecto que se buscava era a produção intelectual da equipe que atuava no curso.

Embora, como mencionado, existam orientações do MEC a respeito da preparação do docente para atuar na EAD, com o exposto, fica claro que isso ainda não é uma realidade absoluta entre as IES. Será que se pode con-siderar que um dos motivos dessa falta de sintonia entre orientações e apli-cações seria a explosão de procura e oferta por cursos a distância, originando um déficit de pessoal com formação específica para atuar nessa modalidade e obrigando as instituições a oferecerem uma capacitação rápida e, talvez,

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NICOLODI, S. C. F. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO564

inconsistente, refletindo, consequentemente, na qualidade do ensino ofertado e das pesquisas realizadas?

Como percebem se um curso de EAD exercita a relação ensino/pesquisa, também foi tema abordado com os sujeitos desta pesquisa. Sobre esse assunto, grande parte dos investigados diz perceber o exercício dessa relação por meio da produção científica docente, conforme aponta um dos professores:

Se os professores pesquisam e publicam, esse conhecimento adquirido se infiltra nas aulas, o conhecimento da pesquisa e das publicações não fica iso-lado, ele se mescla nas relações e nas aulas.

Alguns respondentes declaram que percebem que a relação se reflete no desenvolvimento do curso, das disciplinas e das propostas de trabalho. Entretanto, um dos coordenadores destaca que a articulação entre ensino e pesquisa não é determinada pela modalidade de ensino, seja ela presencial ou a distância, e sim pela promoção de

um “casamento” entre ambos, de forma que a modalidade possa expressar da melhor maneira possível o que a área deseja [...] Dessa forma, não esta na mo-dalidade EAD o segredo para a relação entre o ensino e a pesquisa.

Segundo Kenski (2009), é possível identificaruma defasagem entre as iniciativas e as práticas de pesquisa e as práticas de ensino e socialização dos conhecimentos para que todos possam conviver com as transformações postas pelos avanços e inovações tecnológicas na sociedade contemporânea. As universidades cada vez se destacam pelo avanço no conhe-cimento e a produção de inovações tecnológicas diferenciadas, em todas as áreas do conhecimento. No entanto, os mesmos espaços que privilegiam as ino-vações nas pesquisas, são tímidos e reagentes em relação ao desenvolvimento e aplicação de práticas inovadoras no ensino (p. 255).

Nessa perspectiva, cabe ponderar que o exercício da relação ensino/pesquisa não é determinado pela modalidade do ensino, como coloca o co-ordenador, ele depende muito mais de intenções e programação de um plano político pedagógico e um currículo que o privilegie.

Procuramos, ainda, identificar os principais desafios que os docentes encontram para alcançar a condição da articulação entre o ensino e a pesquisa. Obtivemos respostas variadas, como a questão da avaliação. Um dos docentes investigados considera que, embora a modalidade seja a distância, a avaliação permanece, em grande medida, sendo realizada presencialmente.

A necessidade de um maior aparato tecnológico foi um ponto levan-tado por um dos coordenadores, o mesmo acredita que uma vez que isso se viabilize teriam condições de colocar em funcionamento ideias, criações e processos pedagógicos.

Porém, a maciça maioria dos respondentes apontou a precária comu-nicação entre professores e tutores que atuam no presencial, e acredita que

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 565

isso reflete direta e negativamente nos resultados obtidos. Essa maioria pen-sa que seria fundamental a organização conjunta das propostas de atividades práticas a serem implementadas e, como indica um dos coordenadores, existe a necessidade de “boas equipes articuladas entre o Ensino e a Pesquisa, e que dominem também a modalidade tanto no âmbito teórico quanto no da experimentação”.

Essa colocação vem ao encontro do que comenta Kenski (2009) sobre a importância de

um professor para as novas educações, que saiba trabalhar em equipes e convi-ver com pessoas com diferentes tipos de formação e objetivos (alunos, técnicos, outros professores) unidos com uma preocupação de oferecer o melhor de si para que todos possam aprender. Um novo professor-cidadão preocupado com sua função e com sua atualização (p. 261).

Como se vê, os desafios pontuados pelos docentes e coordenadores respondentes desta investigação colocam luz sobre a necessidade essencial de um olhar mais atento no que se refere à formação específica para atuar na modalidade a distância que tem sido ofertada pelas instituições. Quer parecer que a mesma tem sido insuficiente, superficial e não tem oportunizado um espaço significativo para que as práticas sejam refletidas, nem individual e menos ainda coletivamente. Talvez fosse interessante considerar a urgência de uma formação contínua e aprofundada – e não apenas uma rápida capacitação, como nos foi colocado, tanto no campo tecnológico como no campo pedagó-gico e conceitual, para que a qualidade do ensino ofertado não corra o risco de ser comprometido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

E seguimos adiante, querendo aprender mais e, principalmente, a não ter medo de mudar [...] (KENSKI, 2009).

Pontuaremos a seguir, brevemente, na intenção de melhor visualizar os achados que os objetivos propostos nos trouxeram, mesmo certos de que muito ainda existe por ser desvelado sobre o tema:

• Os entrevistados trazem a convicção da necessidade da arti-culação do ensino e da pesquisa como fator qualificador do processo ensino/aprendizagem, mesmo considerando a difi-culdade de tal articulação, seja por fatores externos como in-suficiência de tempo para realizar pesquisa, como por fatores como dificuldade de mobilização dos sujeitos que promovem as propostas de ação.

• Os sujeitos desta investigação identificam os cursos que exer-citam a articulação entre ensino e pesquisa por meio do volu-

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NICOLODI, S. C. F. et al. - QUALIDADE DO ENSINO DE GRADUAÇÃO566

me de publicação de seus docentes, assim como no desenvol-vimento das práticas e propostas de ação.

• Com relação à formação específica para a atuação na EAD, pu-demos perceber que, embora exista orientação do MEC sobre as ações, isso não é uma constante e nem uma unanimidade, uma vez que ao invés de formação para essa especificidade, os do-centes têm recebido uma breve capacitação tecnológica, deixan-do muito a desejar nas outras esferas do processo ensino/apren-dizagem, como a parte pedagógica e conceitual, por exemplo.

• Apontam, ainda, que um dos maiores desafios a ser superado é a comunicação clara entre os sujeitos que participam do pro-cesso, nesse caso, professores e tutores, atribuindo a isso cer-to retrancamento do fluxo que o processo deveria acontecer, acarretando em uma possível perda de qualidade do serviço ofertado.

Acreditamos que questionar as narrativas universais sobre qualidade da Educação Superior, seja no âmbito da modalidade EAD ou na modalidade presencial, pode auxiliar a compreender que os processos educativos estão su-jeitos a mediações humanas e que são elas que podem trazer ao plano do real os discursos que balizam conceitos consagrados.

Healey (2008), referindo-se a uma citação de Barnett, lembra que no século XX vimos como a universidade passou de um lugar onde a investiga-ção e o ensino mantinham um relacionamento bastante confortável para uma onde essas duas facetas são antagônicas. Esse autor sugere que uma forma de reconstruir pontes seria incentivarmos o envolvimento dos estudantes na pes-quisa, adaptando-o para dar conta da variação e compexidade da estruturação do conhecimento nas diferentes disciplinas.

Sem dúvida, o desejo maior é que as relações proporcionem a dis-cussão sobre o que realmente é relevante para o desenvolvimento de novos conhecimentos e busquem a garantia das aprendizagens de todos como indi-víduos melhores.

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SOBRE OS AUTORES

ORGANIZADORAS

Denise Balarine Cavalheiro LeiteDoutora em Ciências Humanas pela UFRGS. Docente permanente do PPGEDU UFRGS. Professora titular DEC FACED UFRGS aposentada. Pesquisadora 1B CNPq. Pesquisadora da RIES-PRONEX-Observatório da Educação Superior.E-mail: [email protected]

Cleoni Maria Barboza FernandesDoutora em Educação pela UFRGS. Professora pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS. Integrante do Centro de Estudos da Educação Superior (CEES/FACED/PUCRS). Membro do PRONEX – CNPq/FAPERGS e coordenadora do Observatório da Educação CAPES/DEB/PUCRS. Pesquisador 2 CNPq. E-mail: [email protected]

COLABORADORA

Cecília Luiza BroiloDoutora e Mestre em Educação pela UFRGS. Estágio de doutorado sandu-íche na Universidade de Aveiro/Portugal. Pós-doutorado (UFSM/PUCRS). Integrante da equipe do Projeto de Cooperação Internacional CAPES/GRICE/Brasil-Portugal e Rede Sulbrasileira de Investigadores da Educação Superior/RIES/Observatório da Educação INEP/CAPES. E-mail: [email protected]

INTEGRANTES DA EQUIPE COORDENADORA DA RIES

Marilia Costa MorosiniCoordenadora do CEES/PUCRS. Centro de Estudos em Educação Superior. Coordenadora da REDE UNIVERSITAS/RIES-PRONEX-Observatório da Educação Superior. Pesquisadora 1 do CNPq. Coordenadora do Programa Conjunto de Pesquisa CAPES/Universidade do Texas/PUCRS. E-mail: [email protected]

Maria Isabel da CunhaDoutora em Educação. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Coordenadora do Grupo de Pesquisa Ensino, Avaliação e Formação de Professores (CNPQ). Pesquisadora da RIES-PRONEX-Observatório da Educação Superior. Pesquisadora 1 A do CNPq. E-mail: [email protected]

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- SOBRE OS AUTORES570

Maria Estela Dal Pai FrancoDoutora em Ciências Humanas/UFRGS. Mestre em Administração da Educação- Temple University/EUA. Coordenadora PPGEdu/PUCRS (1972-1977). Vice-diretora FACED/UFRGS (1981-1984). Professora titular da UFRGS. Coordenadora do Grupo de Estudos sobre Universidade Inovação e Pesquisa (GEUIpesq). Pesquisadora da REDE UNIVERSITAS/RIES/PRONEX-Observatório da Educação Superior/GEU/UFRGS. E-mail: [email protected]

Silvia Maria de Aguiar IsaiaProfessora do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UFSM) e do mestrado profissionalizante em Ensino de Física e Matemática da UNIFRA. Líder do Grupo de Pesquisa trajetórias de Formação (GTFORMA). Pesquisadora Produtividade em Pesquisa do CNPq e Coordenadora do Observatório da Educação na UFSM. E-mail: [email protected]

DEMAIS AUTORES

Adriana Claudia Martins FigheraAcadêmica do doutorado em Educação da UFSM/PPGE. Integrante do grupo GPFOPE. Bolsista Capes/Reuni.

Adriana da Rocha MacielProfessora do Departamento de Fundamentos da Educação e do PPGE/UFSM. Coordenadora substituta do Programa de Pós-Graduação em Educação do CE/UFSM. Líder do Grupo de Pesquisa sobre Ambientes Virtuais de Ensino-aprendizagem e Redes de Formação-KÓSMOS. Integrante da RIES. E-mail: [email protected]

Alba Regina Battisti de SouzaUnisinos e UDES. E-mail: [email protected]

Albêne Lis MonteiroUniversidade do Estado do Pará – UEPA.

Althiere Frank Valadares CabralIFRN, Campus Macau.

Ana Carla Hollweg Powaczuk

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 571SOBRE OS AUTORES

Acadêmica do doutorado em Educação (UFSM/PPGE). Integrante do grupo GPFOPE. Bolsista Capes.

Ana Karin NunesDocente FEEVALE. Doutoranda em Educação/UFRGS.

André Stein da SilveiraEstágio Pós-Doutoral no Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS. Doutor em Educação pela PUCRS. Mestre em Economia pela UFRGS. Economista pela PUCRS. E-mail: [email protected]

Andréia MorésDoutora em Educação pelo PPGEDU/UFRGS. Professora titular no Centro de Filosofia e Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS).

Andrezza Maria Batista Do Nascimento TavaresIFRN. Campus Macau, RN

Bárbara Burgardt CasalettMestranda em Educação pela PUCRS. E-mail: [email protected]

Bernardo Sfredo MiorandoBacharel em Relações Internacionais pela UFRGS. Bolsista de Iniciação Científica (UFRGS). E-mail: [email protected]

Bettina Steren dos SantosPós-doutorado no College of Education, The Univesity of Texas at Austin, EUA. Doutorado em Psicologia Evolutiva e da Educação pela Universidad de Barcelona. Pedagoga pela UFRGS. Professora e coordenadora do Grupo de Pesquisa Processos Motivacionais em Contextos Educativos&quot da FACED/PUCRS. Coordenadora do curso de especialização em Psicopedagogia da PUCRS. Bolsista de Produtividade em Pesquisa – PQ/CNPq. E-mail:

Bianca Silva CostaDoutoranda em Educação/PPGEdu/UFRGS. E-mail: [email protected]

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- SOBRE OS AUTORES572

Camila GüntzelBolsista de Iniciação Científica pela Unisinos. E-mail: [email protected]

Carla NetoDoutoranda do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da PUCRS. Mestre em Educação em Ciências e Matemática pela PUCRS. Especialista em Educação a Distância e Pedagoga em Multimeios e Informática Educativa pela PUCRS. E-mail: [email protected]

Claisy MarinhoUniversidade de Brasília, Brasília, Brasil.

Clarice Monteiro EscottInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS). E-mail: [email protected]

Claudia Martins LeiriasMestranda em Educação pela PUCRS.

Claudia Medianeira Cruz RodriguesDoutora em Engenharia de Produção pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção – PPGEP/UFRGS. Professora do Departamento de Engenharia de Produção/Transportes/DEPROT/UFRGS. E-mail: [email protected]

Daniela Dal OngaroDoutoranda em Educação – PPGE/UFSM.

Denise Elza Nogueira SobrinhaProfessora UEG, PPGE/FE/UFG. Mestranda. E-mail: [email protected]

Denise Grosso da FonsecaProfessora da Escola de Educação Física da UFRGS. E-mail: [email protected]

Denise Nascimento SilveiraUFPEL. E mail: [email protected]

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 573SOBRE OS AUTORES

Denise Rosa MedeirosUnisinos e UDESC. E-mail: [email protected]

Diego E. do NascimentoMestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação Física.

Doris Pires Vargas BolzanProfessora do Departamento de Metodologia do Ensino e do Programa de Pós-Graduação em Educação do CE/UFSM. Líder do Grupo de Pesquisa Formação de Professores e Práticas Educativas: Educação Básica e Superior/GPFOPE/CNPq. Membro da RIES. Pesquisadora Produtividade em Pesquisa do CNPq.E-mail: [email protected]

Edilene da C. SinottMestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Física.

Egeslaine de NezUniversidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT). Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS. Professora da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT).

Eliane Aparecida Galvão dos SantosDoutoranda em Educação pela UFSM/PPGE. Integrante do grupo GPFOPE. Bolsista Capes.

Eliane Miranda CostaUniversidade do Estado do Pará – UEPA.

Elisiane Machado LunardiDoutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS. E-mail: [email protected]

Elizabeth D. KraheDoutora em Educação pela UFRGS. Professora orientadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS. Professora Associada II. Departamento de Estudos Especializados – Faced, UFRGS.

Elizeth Gonzaga dos Santos Lima

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- SOBRE OS AUTORES574

Universidade do Estado de Mato Grosso. Pós-doutorado pela UFRGS. Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da UNEMAT.

Fabiane de O. SchellinMestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação Física.

Fábio Alexandre Araújo dos SantosIFRN, Campus Macau, RN.

Flávia Maria Teixeira dos SantosUFRGS – Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. E-mail: [email protected]

Francine de Bem RossiAcadêmica do curso de Letras – UNIFRA. Integrante do grupo GPFOPE. Bolsista de Apoio Técnico – CNPq.

Geraldo Ribas MachadoDoutor em Educação pela UFRGS, com ênfase em avaliação institucional. Mestre em Engenharia da Produção pela UFRGS, com ênfase em Qualidade e Desenvolvimento de Processos. Professor da UFRGS. Integrante do grupo de pesquisa InovAval – Inovação e Avaliação na Universidade (UFRGS). E-mail: [email protected]

Giovana Medianeira Fracari HautriveDoutoranda em Educação – PPGE/UFSM.

Gislaine A. R. da Silva RossettoDoutoranda em Educação – PPGE/UFSM.

Glaucia Maria da SilvaDepartamento de Química/FFCLRP. USP- Ribeirão Preto-SP.

Graziela Fátima GiacomazzoDocente Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC). Doutoranda pela UFRGS. Grupo de Pesquisa InovAval – UFRGS. Docente da Unidade Acadêmica de Humanidades, Ciência e Educação (UNAHCE) e do Setor de Educação a Distância (SEAD). E-mail: [email protected]

Greice ScreminDoutoranda e mestre em Educação pelo PPGE/UFSM. Pedagoga. Professora e representante docente. Professora do Centro Universitário Franciscano. Bolsista do Observatório da Educação.

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 575SOBRE OS AUTORES

E-mail: [email protected]

Gustavo BalbinotVice-coordenador da Comissão de Assistência Social (COAS) da Província Marista do Rio Grande do Sul. Mestrando do Programa de Pós Graduação em Educação da PUCRS.

Inês AmaroProfessora e coordenadora de Desenvolvimento Social da PUCRS. Doutoranda do PPGED-FACED-PUCRS.

Jênifer De Brum PalmeirasE-mail: [email protected]

José Jairan ValdevinoEscola Estadual Nestor Lima. Natal-RN.

Juliana ArnorUFRGS – Programa de Pós-Graduação em Educação.

Juliana ZirgerMestranda em Educação/PPGEdu/UFRGS. E-mail: [email protected]

Karina de Melo ConteFaculdade de Educação – GEPEFE/USP-SP. Centro Universitário Claretiano de Batatais-SP.

Karla Madrid FonsecaAcadêmica do curso de Pedagogia – UFSM. Integrante do grupo GPFOPE.

Leandra Borba LealInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS). E-mail: [email protected]

Leila Adriana BaptaglinDoutoranda em Educação – PPGE/UFSM.

Lisiane Pellini FallerMestre em Administração pelo Programa de Pós-Graduação em Administração – PPGA/UFSM. Professora substituta do Departamento de Ciências Administrativas da UFSM. Professora da Faculdade Metodista de Santa Maria (FAMES). E-mail: [email protected]

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- SOBRE OS AUTORES576

Luciane Spanhol BordignonDoutoranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRGS. Professora da UPF.

Luiza Salles JunchenDoutoranda em Educação – UFSM/PPGE. Integrante do grupo GPFOPE.

Maisa Beltrame PedrosoMestre e Doutora em Educação. Nutricionista. Especialista em Saúde. Integrante do Grupo de Pesquisa Ensino, Avaliação e Formação de Professores (CNPQ). E-mail: [email protected]

Marcia Lenir GerhardtDoutora em Educação pela Unisinos. Professora do Colégio Politécnico da UFSM. E-mail: [email protected]

Margareth Guerra dos SantosUniversidade Federal do Amapá. Mestre em Educação pela UFRGS. Professor Assistente II na Universidade Federal do Amapá. E-mail: maragrethguerra#hotmail.com

Mari ForsterDoutora em Educação pela PUCRS. Professora no Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos. Pesquisadora nas áreas de Formação de Professores e Avaliação. E-mail: [email protected]

Maria da Graça Gomes RamosProf. Dr. em Educação, Universidade Federal de Pelotas/UFPel-RS/Brasil. E-mail: [email protected].

Maria de Lourdes BorgesDoutoranda em Administração pela Unisinos. Mestre em Administração pela Unisinos. Psicóloga pela Unisinos. Professora da UNILASALLE. E-mail: [email protected]

Maria Elly Herz GenroDoutora em Educação pelo PPGEdu/UFRGS. Professora adjunta da Faculdade de Educação e do PPGEdu/UFRGS. E-mail: [email protected]

Mariângela da R. Afonso

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Qualidade da Educação Superior: Avaliação e Implicações para o Futuro da Universidade 577SOBRE OS AUTORES

Escola Superior de Educação Física/Programa de Mestrado em Educação Física, UFPel. Prof. Dr. em Educação, Universidade Federal de Pelotas/UFPel- RS/Brasil. E-mail: [email protected].

Mariângela da R. AfonsoEscola Superior de Educação Física/Programa de Mestrado em Educação Física, UFPel.

Marinice Souza SimonPUCRS. E-mail: [email protected]

Marja Leão BracciniMestre em Educação pela Unisinos. Pedagoga pela Unisinos. Bolsista CNPq, Unisinos. E-mail: [email protected]

Marlis Morosini PolidoriCentro Universitário Metodista, do IPA. Grupo de Pesquisa em Educação e Inclusão. E-mail: [email protected]

Marialva Moog PintoMestrado e Doutorado em Educação pela Unisinos. Doutorado Sanduiche/Universidade de Sevilha-Espanha. Bolsista/RIES e do Observatório de Educação CAPES/INEP, sobre os Indicadores de Qualidade da Educação Superior. Coordenadora do Curso de Pedagogia (CESUCA). E-mail: [email protected]

Nathan Ono de CarvalhoBolsista de Iniciação Científica do Grupo de Pesquisa Educação e Inclusão do Centro Universitário Metodista IPA.

Noeli Prestes Padilha RivasDepartamento de Psicologia e Educação/FFCLRP/GEPEFE. USP-Ribeirão Preto-SP.

Raimunda Maria Da Cunha RibeiroDoutoranda do PPG/Edu/PUCRS. Professora da Universidade Estadual do Piauí/Campus de Corrente-PI. E-mail: [email protected]

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- SOBRE OS AUTORES578

Raimundo RajobacDoutorando em Educação pelo PPGEDU-PUCRS.

Rosalir ViebrantzDoutorado em Educação pela PUCRS. Professora no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense – Campus/Camaquã. E-mail: [email protected]

Rosália Figueiró Borges Doutora e Mestre em Educação pela PUCRS. Pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da PUCRS e pela University of Texas at Austin. Licenciada em Letras pela PUCRS.

Rosane F. VeigaMestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação Física.

Rosani Sgari SzilagyiUPF. E-mail: [email protected]

Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de SouzaProfessora FE/UFG, PPGE/FE/UFG – orientadora. E-mail: [email protected]

Sandra Salustiano Dias da SilvaEscola Estadual Passo da Pátria. Natal-RN.

Silvana Martins De Freitas MillaniMestranda em Educação – UFSM/PPGE. Integrante do grupo GPFOPE.

Silvana ZancanMestranda em Educação pelo PPGEDU-PUCRS.

Simone Benvenuti LeiteFaculdade de Educação – Programa de Pós-Graduação em Educação – UFRGS. E-mail: [email protected]

Solange Maria LonghiUPF.E-mail: [email protected]

Solange Martins de Oliveira MagalhãesFE/UFG.E mail: [email protected]

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Taís SchmitzDoutoranda em Educação pela PUCRS. Mestre em Educação pela Unisinos. Especialista em Gestão Escolar UCB. Licenciada em Pedagogia UNILASALLE. E-mail: [email protected]

Tania Elisa Morales GarciaProf. Dr. em Educação, Universidade Federal de Pelotas/UFPel- RS/Brasil. E-mail: [email protected].

Tásia Fernanda WischDoutoranda em Educação – PPGE/UFSM.

Valeska Fortes de OliveiraProfessora titular do Departamento de Fundamentos da Educação da UFSM. Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação e Imaginário Social (GEPEIS). Professora integrante da Linha de Formação, Saberes e Desenvolvimento Profissional do PPGE/UFSM. Membro do Comitê Científico/GT/Formação de Professores/ANPED. Pesquisadora CNPq. E-mail: [email protected]>

Vanessa Ferreira NeveUFRGS.

Viviane GuidottiMestranda em Educação pelo PPGEDU-PUCRS.

Viviane GuidottiMestranda em Educação pelo PPGEDU-PUCRS.

Editoração EletrônicaFormato

TipografiaNúmero de Páginas

Impressão e Acabamento

Camila Provenzi e Jardson Corrêa16 x 23 cmTimes New Roman e Mentone588Gráfica EPECÊ