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Psicologia USP - Coronary Heart Disease Prevention: A Psychological Perspective in a Multidisciplinary Program Psicologia USP Print ISSN 0103-6564 Psicol. USP vol.13 no.1 São Paulo 2002 Curriculum ScienTI How to cite this article PREVENÇÃO DA DOENÇA CORONÁRIA: PERSPECTIVA PSICOLÓGICA EM UM PROGRAMA MULTIPROFISSIONAL Anency Giannotti 1 Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia / Secretaria de Estado da Saúde Um programa multiprofessional de prevenção da doença coronariana foi implantado no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia e idealizado em ciclos de palestras com cada profissional de saúde tendo um papel especial de acordo com a sua especialidade. Este artigo apresenta os fatores de risco psicológicos e psicossociais e resume as apresentações da área da Psicologia. Neste relato destaca-se o papel das emoções, stress e dos fatores de risco de modo geral e das dificuldades que as pessoas podem ter e como encontrar maneiras de promover mudanças pessoais para cuidado com a saúde. Descritores: Distúrbios do coração. Prevenção. Programas. Intervenção psicológica. Grupo multiprofissional. O Programa Educativo Multiprofissional de Prevenção Secundária da Doença Coronariana foi implantado no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia da Secretaria de Estado da Saúde, constituindo parte de um programa mais amplo chamado "Heart Care Network". Seus http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100009 (1 de 22)14/10/2005 06:19:14 a.m.

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  • Psicologia USP - Coronary Heart Disease Prevention: A Psychological Perspective in a Multidisciplinary Program

    Psicologia USPPrint ISSN 0103-6564

    Psicol. USP vol.13 no.1 So Paulo 2002

    Curriculum ScienTI

    How to cite this article

    PREVENO DA DOENA CORONRIA: PERSPECTIVA PSICOLGICA EM UM PROGRAMA MULTIPROFISSIONAL

    Anency Giannotti1

    Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia / Secretaria de Estado da Sade

    Um programa multiprofessional de preveno da doena coronariana foi implantado no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia e idealizado em ciclos de palestras com cada profissional de sade tendo um papel especial de acordo com a sua especialidade. Este artigo apresenta os fatores de risco psicolgicos e psicossociais e resume as apresentaes da rea da Psicologia. Neste relato destaca-se o papel das emoes, stress e dos fatores de risco de modo geral e das dificuldades que as pessoas podem ter e como encontrar maneiras de promover mudanas pessoais para cuidado com a sade.

    Descritores: Distrbios do corao. Preveno. Programas. Interveno psicolgica. Grupo multiprofissional.

    O Programa Educativo Multiprofissional de Preveno Secundria da Doena Coronariana foi implantado no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia da Secretaria de Estado da Sade, constituindo parte de um programa mais amplo chamado "Heart Care Network". Seus

    http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100009 (1 de 22)14/10/2005 06:19:14 a.m.

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    objetivos gerais eram os de propiciar ao paciente com doena arterial coronria um acesso maior ao conhecimento tcnico e cientfico da cardiopatia, promover melhor integrao institucional, melhorar a adeso ao tratamento e motiv-los para a preveno.

    A doena coronariana geralmente se instala a partir da sexta dcada de vida e consiste na progressiva obstruo das artrias que irrigam o corao, por depsitos de gordura (aterosclerose), causando insuficincia coronariana, em diferentes graus de isquemia, at a necrose do tecido do msculo cardaco, podendo causar angina, infarto agudo e morte sbita. A sintomatologia tpica, a dor retro esternal denominada "angina pectoris", pode surgir abruptamente ou de forma insidiosa e aliviada com medicao especfica. A teraputica mdica habitual consiste no tratamento clnico e em mtodos invasivos, tais como a cirurgia de revascularizao do miocrdio e os procedimentos hemodinmicos, como a angioplastia e "stent".

    A etiologia multifatorial dessa enfermidade amplamente reconhecida. Os fatores que alteram sua histria natural, isto , as circunstncias que aumentam as chances de um indivduo vir a adquirir a doena ou agrav-la, os chamados fatores de risco, classificam-se, na literatura, em dois nveis. Aqueles em que, potencialmente, o indivduo pode intervir para modific-los so a presso arterial elevada, o aumento do colesterol, dos triglicrides, o hbito de fumar, a vida sedentria e falta de exerccio fsico, a obesidade, o diabetes e os fatores denominados psicossociais, incluindo o estresse emocional. Os fatores de risco potencialmente no modificveis so a hereditariedade, isto , o fato de o indivduo possuir ancestrais com a enfermidade, o sexo, considerando a predisposio maior em indivduos do sexo masculino, dependendo da faixa etria, e a prpria idade, isto , a tendncia ao seu aparecimento na faixa etria mais avanada.

    O presente relato ir focalizar a parte do Programa que aborda os fatores de risco de ordem psicolgica e psicossocial.

    O Programa foi idealizado com base em um ciclo de palestras, ministradas por profissionais de sade de diferentes especialidades, integrantes da equipe multiprofissional, tais como o mdico cardiologista, psiclogo, enfermeiro, assistente social, professor de educao fsica e nutricionista.

    Alm das palestras, o Programa inclui outros procedimentos tais como as dramatizaes, onde so simuladas situaes de pacientes em tratamento na instituio, e as tcnicas de dinmica de grupo para a discusso de temas especficos, visando facilitar a aprendizagem e levantamento de dificuldades. Incluem-se tambm tcnicas de relaxamento e procedimentos recreativos, que pretendem facilitar o entrosamento entre os pacientes presentes e a troca de experincias. So utilizados, ainda, recursos udio-visuais, como slides, transparncias e exposio de vdeos.

    Os membros da equipe multiprofissional ministram suas palestras tendo como tema a doena coronria e fatores de risco, sob o prisma das reas de conhecimento que representam. Nesse sentido, o mdico cardiologista aborda a anatomia e fisiopatologia da doena coronria,

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    explicitando os fatores de risco e as modalidades de tratamento clnico ou cirrgico.

    Nesta ocasio, os pacientes tm tambm a oportunidade de, ao levantar algumas questes especficas sobre sua patologia, refletir com o grupo sobre as dvidas mais comuns.

    O enfermeiro tambm aborda conceitos sobre a anatomia e fisiopatologia da doena arterial coronria, sobre os fatores de risco e tratamento, com destaque para as medidas farmacolgicas e no farmacolgicas do tratamento da presso arterial e controle do diabetes. Sua participao engloba tambm a preparao dos pacientes para o auto-cuidado e para a adeso ao tratamento com superviso sistematizada.

    O professor de educao fsica explica a importncia da atividade fsica na preveno, pelos benefcios diretos circulao e sade, e d orientao especfica para a prtica de atividade fsica. Alm das aulas tericas, ensina a relaxar, a verificar a freqncia cardaca em repouso e em exerccio, a realizar exerccios de resistncia muscular localizada e alongamento. Procura incentivar os pacientes para a prtica rotineira e programada de exerccios fsicos.

    O nutricionista aborda hbitos alimentares saudveis e prejudiciais, instrumentalizando os pacientes para a reduo do colesterol e triglicrides, para o controle do diabetes e da presso arterial elevada. As inmeras receitas culinrias alternativas s tradicionais auxiliam os pacientes, apesar da dieta, a tornar saudvel e atraente o hbito alimentar.

    O assistente social procura ampliar a conscincia de direito e de cidado, do direito assistncia sade e informao sobre a doena. Seu papel consiste em incentivar a participao ativa do paciente no processo de seu tratamento, atravs do acesso s informaes e aos recursos pblicos de sade e comunitrios existentes, recursos estes mdicos, psicolgicos, farmacuticos e laboratoriais.

    A participao do psiclogo engloba duas palestras e abrange trs aspectos. Sua proposta inicial consiste no convite reflexo sobre o comportamento e estilo de vida habituais. Procura demonstrar a interrelao entre os aspectos emocionais e as funes corporais. Introduz o conceito de fatores de risco psicolgicos e sociais da doena coronria, procurando tornar acessveis esses conhecimentos, como tratados na literatura, incluindo relatos de pesquisas clnicas com seres humanos e com animais em situao experimental. O stress emocional abordado dentro de uma perspectiva que engloba a elevao, a curto prazo, dos parmetros fisiolgicos, tais como a presso arterial, o colesterol e os triglicrides e, a longo prazo, o desenvolvimento progressivo da aterosclerose. Na terceira parte da exposio, propem-se medidas de preveno, controle do stress e melhoria da qualidade de vida. So tambm tratados assuntos relativos s dificuldades habituais de mudar hbitos, atitudes, comportamento e estilo de vida. A ampla experincia clnica com o paciente coronariano possibilita apresentar os mecanismos psicolgicos de defesa e fatores de resistncia a mudanas de comportamento comumente observados, o que equivale a abordar aspectos tais como, a dificuldade de abandonar o hbito de fumar, fazer dieta e iniciar a prtica do exerccio fsico.

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    O Programa foi idealizado com base no reconhecimento da necessidade de haver ampla integrao entre os profissionais de sade para a definio de propostas e dos temas a serem desenvolvidos. Isto principalmente porque, embora cada um desenvolva sua temtica especfica, observa-se grande permeabilidade entre as fronteiras das atribuies profissionais. Nesse sentido, alm das reunies semanais conjuntas para o planejamento de estratgias, pretende-se que todos os representantes das diversas reas estejam presentes em todas as reunies com cada grupo, podendo, eventualmente, participar ativamente das palestras que esto sendo ministradas pelo outro profissional.

    Procura-se simplificar ao mximo a linguagem empregada junto aos pacientes, evitando-se a utilizao de terminologia tcnica e cientfica, a no ser nos aspectos cuja meno facilite a aprendizagem e o posterior dilogo do paciente com o cardiologista nas consultas, e com os outros profissionais de sade.

    Procura-se, ainda, passar aos pacientes a idia de que a preveno no equivale a um modo de vida restrito imposto aos portadores de enfermidade, mas uma opo a um modo de vida saudvel, necessrio a todas as pessoas. Aps as reunies, com cerca de quatro horas de durao no total, incluindo intervalo, e a participao de dois profissionais diferentes, servido um lanche com base nutricional e diettica recomendadas.

    Em algumas ocasies, os pacientes so questionados, pelos profissionais, sobre os fatores de risco que apresentam e sua dificuldade em control-los. No entanto, procura-se evitar focalizar, colocar em evidncia ou deixar de qualquer modo os pacientes expostos perante os demais, em relao a certas dificuldades que possam apresentar, tais como a dificuldade de largar o hbito de fumar e a obesidade, com o fim de obter o controle de seu comportamento. Quando h a participao do cnjuge, as manifestaes deste tipo, quando ocorrem, so neutralizadas pela equipe.

    Os pacientes em tratamento mdico clnico ou cirrgico na Instituio so convidados a integrar o Programa, mediante convocao por carta. Embora o programa no seja especificamente destinado aos familiares e cnjuges, a participao dos mesmos deixada vontade. Em cada convocao, pretende-se incluir cerca de 80 a 100 participantes e so ministradas cerca de 14 palestras, com dois profissionais por encontro. O Programa inicia-se com uma apresentao inaugural e h, tambm, um encontro de encerramento e avaliao. Nesta primeira ocasio, os pacientes so informados sobre o Programa e suas finalidades, incentivando a participao, sem o carter de obrigatoriedade. Os profissionais de sade apresentam-se e explicitam os temas especficos que iro abordar. Nesse dia, tambm, procura-se estabelecer uma linha de base sobre os conhecimentos dos pacientes a respeito da enfermidade, dando a oportunidade de os mesmos levantarem questes e expressarem suas dvidas. Foram elaborados dois questionrios a serem respondidos pelos pacientes, antes e depois da realizao do Programa, que, ainda em fase experimental, tm a finalidade de avaliar seu alcance e eficcia, em termos de ampliao de conhecimentos e possveis mudanas de atitudes, de comportamento e estilo de vida.

    A grosso modo, pode-se dizer que a maioria dos pacientes pertence classe scio-econmica

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    de baixo ou mdio poder aquisitivo. Apenas alguns pertencem classe de maior poder aquisitivo.

    A originalidade desta abordagem est na ampliao dos horizontes do modelo de atendimento tradicional. O desenvolvimento progressivo de novos medicamentos e procedimentos teraputicos sofisticados, apesar do seu importante papel no controle da morbidade de mortalidade da doena arterial coronria, no atinge os fatores causais da enfermidade, de etiologia multifatorial. possvel, assim, divulgar conhecimentos, alm da medicina, de outras especialidades na rea da sade, que se desenvolvem nos hospitais, cujo produto e sua utilidade s raramente so acessveis populao. Alm disso, o contato direto com os profissionais, incluindo o mdico em particular, faz com que os mesmos sejam menos idealizados e percebidos como mais acessveis, possibilitando que os pacientes se sintam mais vontade para esclarecer dvidas e tenham uma participao mais ativa no seu tratamento. O aspecto mais importante, no entanto, a meu ver, est na originalidade metodolgica: a proposta de um modelo psicossomtico de atuao multiprofissional, voltado sade e tratamento de doenas orgnicas.

    No que tange ao exerccio da Psicologia nas instituies mdicas ou da Psicologia Hospitalar, o Programa representa tambm uma alternativa vivel, ainda que se considere as limitaes de um programa de mtodo predominantemente educativo, j que no possvel utilizar, nestes contextos, os modelos de atendimento psicolgico individual disponveis para a prtica clnica. A metodologia tradicional de consultrio e a psicoterapia analtica longo prazo possibilitariam o atendimento de um nmero reduzido de pacientes e por muito tempo. Essa e outras questes, cujo assunto de grande relevncia para os psiclogos que vm progressivamente ingressando nas instituies mdicas, foram abordadas por mim em vrias ocasies e por outros autores.

    O objetivo deste relato apresentar o contedo especfico do Programa de preveno psicolgica da doena coronariana, idealizado para o Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. Optou-se, para maior clareza, por transcrev-lo na forma como o assunto desenvolvido nos encontros com os pacientes, que ser, a seguir, ilustrado.

    Transcrio das apresentaes da rea de Psicologia que integra o Programa de Preveno Secundria da Doena Coronariana

    "O objetivo do nosso encontro refletir, pensarmos juntos, trocarmos experincias sobre o que chamamos de fatores emocionais que causam a enfermidade, que os senhores e senhoras possuem: a doena coronariana". Em outras palavras, vamos refletir sobre as atitudes, hbitos do nosso dia a dia, nosso comportamento, nosso estilo de vida, que podem provocar ou contribuir para o agravamento da doena card aca.

    Nesse aspecto, vou apresentar as pesquisas em Psicologia, o que os cientistas vm descobrindo sobre os estados emocionais, sobre a maneira como nos comportamos, que

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    podem provocar a doena. Vamos falar sobre o que o stress e outros fatores de risco psicolgico e como preven-lo.

    Vamos falar tambm sobre mudanas. As modificaes que podemos fazer em nossa vida para prevenir a enfermidade. A maneira como as pessoas levam a vida, como se comportam diante de situaes, certos hbitos do nosso dia a dia, que no sabemos que so prejudiciais ou que no percebemos que fazemos, que vo, aos poucos, causando danos ao nosso corao. A maioria dos senhores j ouviu falar que o stress ou que o nervoso pode prejudicar o corao. Outros nunca ouviram falar. Os senhores e senhoras podem no saber exatamente o que o stress. E o que muito importante: no qualquer nervoso que causa problemas ao corao. muito comum as pessoas considerarem que o paciente cardaco no pode passar nervoso. O mdico pode falar para evitar situaes de . Ser que a gente pode evitar? Como evitar? Os senhores e senhoras j ouviram falar que cigarro faz mal para o corao e causa uma srie de outras doenas, mas sabem que no fcil conseguir parar de fumar. Por que ser? Muitas pessoas no conseguem fazer dieta, praticar exerccios fsicos, mesmo sabendo que necessrio. Ns vamos, desse modo, falar tambm sobre mudanas, porque dificil fazer mudanas, mudanas de hbito, de estilo de vida e o que necessrio para adotar um comportamento mais saudvel e compatvel com as necessidades de seus coraes.

    Como eu disse, no qualquer nervoso que pode causar ou agravar o problema cardaco e ns vamos ver, desse modo, o que os pesquisadores falam sobre isso.

    Sabemos que h uma relao entre nossa mente e nosso corpo. Nosso estado emocional provoca mudanas em nosso corpo e, em algumas ocasies, pode produzir doenas. Quando choramos, vivenciamos um estado emocional de tristeza, que produz alteraes no nosso corpo, tais como as lgrimas, a acelerao dos batimentos cardacos e a elevao da presso arterial. Assim, as lgrimas, a acelerao do corao e o aumento da presso so o efeito do nosso estado emocional sobre o corpo.

    Nosso estado emocional, assim como outros fatores tais como a atividade fsica, podem provocar graus extremos de alteraes dos batimentos cardacos, sem provocar doenas no corao normal.

    Sentimentos de raiva, ansiedade, medo ou um susto que levamos podem acelerar o corao. Sentimentos de abandono, tristeza, desesperana diminuem nosso ritmo cardaco. Essas reaes so normais. Todos ns passamos por isso sem perceber.

    As emoes fazem parte da nossa vida, sejam elas boas, prazerosas ou difceis de serem vivenciadas. No h, pois, como evit-las.

    Algumas emoes, no entanto, a maneira como levamos a vida, a maneira como nos comportamos, como reagimos s situaes podem provocar doenas em nosso corpo.

    H dois tipos de pesquisas sobre os fatores psicolgicos que podem causar ou agravar a doena coronariana. H aquelas que mostram que determinados estados emocionais extremos

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    podem provocar infarto e morte. H tambm estudos que mostram que os fatores psicolgicos e o stress atuam atravs dos outros fatores de risco. Isto , de imediato, curto prazo, podem elevar o colesterol, os triglicrides, a presso arterial, e mais tarde, longo prazo, produzem a aterosclerose, que os senhores e senhoras j sabem o que so, as tais das placas de gordura que entopem as artrias que levam sangue ao corao.

    O que so fatores de risco da doena coronria? Como j foi explicado anteriormente pelos outros profissionais, so as circunstncias que aumentam as chances, a propenso para a doena coronria, contribuindo para seu agravamento. Em outras palavras, aumentam as chances de ter o problema cardaco ou do agravamento da doena. A doena coronria multifatorial, como a gente chama, isto , vrios so os fatores de risco.

    Quais so os fatores de risco da doena coronria? Entre aqueles que teoricamente podem ser controlveis est a hipertenso ou presso alta, o colesterol, os triglicrides, o hbito de fumar, o diabetes, a falta de exerccio fsico, a obesidade, a alimentao inadequada e o stress. Entre aqueles no controlveis est a hereditariedade, o sexo e a idade. Isto , quem tem parentes com essa enfermidade tem maior propenso a adquiri-la. Quanto ao sexo, os homens so mais propensos que as mulheres, at a menopausa da mulher. Depois disso, as chances so iguais para ambos. E, por fim, a idade. O avanar da idade aumenta o risco da doena. Assim, os primeiros so os mais controlveis, o que significa que podemos fazer mudanas. J, quanto aos ltimos, nada se pode fazer.

    Assim, como dizia, o stress um dos fatores de risco da doena coronria. Alguns estudos demonstram sua influncia direta sobre as coronrias, j outros sua influncia sobre os fatores de risco. Em outras palavras, h pesquisas que mostram que situaes de grande impacto podem provocar a doena cardaca. Por outro lado, h tambm pesquisas que mostram que o stress e outros fatores psicolgicos podem, curto prazo, elevar o colesterol, a presso, os triglicrides, etc, e, progressivamente, isto , aos poucos, ir produzindo a aterosclerose.

    A fim de entender melhor o que estou dizendo, fcil compreender que no possvel provocar grande stress nas pessoas s para fazer pesquisas, por essa razo, os cientistas usam animais. Estudos feitos com animais em laboratrio mostram o elo entre o crebro, isto , a mente e o corao. Os cientistas utilizaram pombos, por exemplo, e para produzir stress, paralisaram a musculatura desses animais, de tal forma que eles no podiam se mexer e isso impedia que eles evitassem choques eltricos constantes que foram aplicados, para verificar seu efeito. Os cientistas observaram que o intenso stress provocava a morte ou um grande dano ao corao destes animais, depois de 48 horas.

    H outras observaes realizadas pelos cientistas. As guerras so situaes de grande e contnuo stress, no verdade? Na guerra da Coria, nas autpsias, isto , no exame dos corpos dos soldados americanos muito jovens, com idade mdia de 22 anos, foram encontradas leses coronarianas em 77% dos casos. Isto , uma situao de grande stress pode provocar aterosclerose, independentemente dos outros fatores de risco. claro que no estamos em guerra e esta uma situao extrema. Outros estudos mostram que a elevao da presso, da taxa de colesterol e de triglicrides so as respostas do nosso corpo s emoes e

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    pode ser uma reao normal. Essas taxas, por exemplo, aumentam em estudantes s vsperas de um exame importante, comparadas s de depois do exame. O mesmo pode ocorrer em pacientes hospitalizados, assim que comunicada a necessidade de realizao de uma cirurgia grave, comparadas s taxas anteriores ao recebimento da notcia. O mesmo pode ocorrer, ainda, em indivduos que so submetidos a entrevistas estressantes ou com lembranas que mobilizam neles forte carga emocional, ou em pessoas que exercem profisses que exigem atividade contnua e decises importantes.

    Assim, estou dizendo que os fatores de risco, isto , a hipertenso, o hbito de fumar, a obesidade, o diabetes, o colesterol e os triglicrides elevados so a resposta do nosso corpo, do nosso organismo, ao que acontece na nossa mente. As nossas questes pessoais no resolvidas manifestam-se no nosso corpo, com a elevao dos fatores de risco.

    H alguns raros casos de pacientes que dizem que no tm fator de risco e no sabem porque ficaram doentes do corao. De certa forma, se h doena coronria, h ou houve stress. Alm disso, segundo essas pesquisas, podemos dizer que se h fator de risco h stress. Determinadas condies, no entanto, de stress constante, podem tornar as taxas permanentemente elevadas.

    H dois tipos de stress, o chamado crnico e o agudo. O stress crnico, permanente, eleva os parmetros fisiolgicos, isto , os fatores de risco, produzindo a aterosclerose. O stress agudo refere-se s situaes de grande impacto, que, como j vimos, tambm podem obstruir as artrias.

    Dessa forma, com cuidados, com tratamento, controlando a presso, o stress, fazendo exerccio e dieta adequada, parando de fumar e mudando o estilo de vida, possvel controlar a progresso da aterosclerose e o infarto. Como prevenir o stress veremos mais adiante. importante salientar que, mesmo depois do primeiro infarto ou da cirurgia que remove a obstruo, o problema no desaparece por completo, porque os fatores de risco continuam atuando.

    O que o stress e como evit-lo?

    O stress o mais popularmente conhecido fator de risco psicolgico da doena coronariana, mas, como j disse, ele um dos fatores. H outros fatores psicolgicos responsveis pelo aparecimento da aterosclerose. Sobre os outros fatores, falaremos depois.

    O stress , de fato, comum a todas as pessoas e passar por stress normal. No h quem no tenha na vida vivenciado um certo grau de stress. Ele pode ser definido como um estado de tenso, de presso, de desgaste, provocado por situaes da vida diria. Passar por stress requer adaptao, isto , nosso organismo fica em estado de alerta, e nos obriga a estarmos preparados para reagir. Diz o ditado que ns no passamos duas vezes pelas guas do mesmo rio. Podemos pensar que o rio o mesmo, mas suas guas nunca so as mesmas. Assim nossa vida, est sujeita a constantes mudanas, que mobilizam nossos mecanismos de defesa, nosso estado de alerta. a pressa, o trnsito da cidade, a falta de tempo, o excesso de

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    trabalho, a falta de trabalho, a perda de pessoas, por morte ou separao, e at as emoes prazerosas, que causam jbilo. Sempre nos defrontamos com situaes novas, desconhecidas e inesperadas, sejam elas percebidas como boas ou ms, as nossas alegrias, as nossas frustraes e decepes, que nos obrigam a termos novos padres de respostas, novas maneiras de reagir.

    H situaes que ampliam nosso espao significativo, como um casamento, o nascimento de um filho, de um neto, um novo emprego ou a promoo no mesmo e situaes que produzem uma reduo do nosso universo, diminuem nosso espao, tais como a perda de uma pessoa, da sade, a separao, a morte, nossas decepes e frustraes cotidianas.

    Os cientistas fizeram observaes em animais e seres humanos, em situaes de laboratrio, ou observando como as pessoas se comportavam, no seu dia a dia. Em animais, em situaes que teoricamente deveriam causar medo ou raiva, tais como um choque eltrico constante, os pesquisadores descobriram que havia a mobilizao de mecanismos de adaptao, de defesa, com modificaes corporais, que os preparavam para agir, para o ataque ou fuga. Havia a liberao, no sangue, de substncias tais como a adrenalina, havia a acelerao dos batimentos cardacos, elevao da presso arterial, entre outras reaes. Estas situaes geravam um estado de alerta que foi definido como a Sndrome Geral de Adaptao.

    Segundo o autor de stress, a falha nesse mecanismo de adaptao pode provocar doenas. Para ele, o segredo da sade e felicidade reside no ajustamento bem sucedido s condies deste mundo, em constantes mudanas, em perptuo processo de modificao.

    O stress ento o desgaste provocado pela vida. a pressa, a falta de tempo, o trnsito, o excesso de trabalho, a alegria, o amor e a paixo.

    Uma mesma experincia, no entanto, pode ser revigorante, revitalizadora para uma pessoa e provocar doena em outra. A vivncia de situaes novas pode representar a oportunidade para a pessoa modificar-se, progredir, pode ser uma chance para o seu crescimento emocional, ou pode produzir doenas. O stress produz doenas quando h falha nesse sistema de adaptao, nas nossas defesas. Por essa razo ficamos doentes. Os senhores e senhoras j repararam que muitas vezes ficamos gripados, quando estamos tristes?

    As conseqncias do stress repetido so os sintomas do stress, tais como o cansao, a irritabilidade, a depresso, a insnia, a reduo da resistncia fsica e as doenas.

    A resultante desse mau ajuste ao stress da vida a elevao da presso, do colesterol, dos triglicrides, fumar, beber em excesso, comer demais, para compensar frustraes e decepes. curto prazo, h um aumento progressivo da aterosclerose e, a longo prazo, o surgimento da doena coronria.

    Por essa razo os senhores e senhoras esto aqui, para saber como preven-lo.

    Aprofundando a questo, se o stress comum a todas as pessoas, ele faz parte do nosso

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    cotidiano, porque algumas pessoas adquirem a doena coronariana e outras no? H uma predisposio individual. A diferena est na maneira como as pessoas reagem ao stress, como elas se comportam diante de situaes, como levam a vida.

    H tambm fatores ligados ao ambiente, sociedade em que a pessoa vive. Os ndios por exemplo, no costumam ter doena coronria. A doena coronariana, nos Estados Unidos, a doena de executivos, pessoas que trabalham demais e tm que tomar muitas decises. Certos comportamentos ligados ao estilo de vida, tais como o consumo excessivo de alimentos gordurosos, a falta de exerccio, o hbito de fumar, so socialmente incentivados ou esto associados aos hbitos comunitrios. Assim entram em jogo os fatores emocionais da pessoa e os do ambiente em que vive, combinados.

    Vamos agora falar sobre o que mais as pesquisas revelam.

    A maioria das pessoas que tem doena coronria tem uma concepo sobre algum tipo de fator emocional que levou aquisio da enfermidade. Em geral, os pacientes tm alguma hiptese, uma intuio ou uma fantasia sobre a causa da enfermidade. Nos questionrios que os senhores e senhoras responderam, antes de iniciarem o Programa, cerca de 70% dos senhores consideraram que determinadas vivncias, de forte carga emocional, foram as responsveis pelo aparecimento da doena. Pois h autores que consideram que essa concepo sobre a causa da enfermidade est relacionada ao que realmente ocorreu. Outros pesquisadores, analisando 170 casos, descobriram que o infarto com morte havia ocorrido durante ou logo aps essas pessoas terem vivenciado experincias emocionais intensas. Eram situaes de pesar e aflies intensos, de ameaa ou de perda de pessoas importantes, por situaes de injria, de difamao ou de humilhao pblica.

    O corao, do ponto de vista orgnico, nada mais que um msculo que faz bombear o sangue e faz-lo funcionar sob presso, e to importante quanto a maioria dos outros rgos do corpo. Do ponto de vista psicolgico, no entanto, atribumos uma srie de significados simblicos ao mesmo. Nossa linguagem plena de expresses que revelam esse significado, tais como "prepare seu corao para enfrentar..." "O que aconteceu partiu meu corao". O mesmo ocorre com outros rgos do nosso corpo, na expresso " necessrio ter estmago para agentar isso", etc. O corao, em particular, associado ao amor e considerado a sede dos nossos estados emocionais, de tal forma que uma leso no msculo cardaco " um machucado no corao".

    Estamos dizendo isso para que compreendam melhor o que acontece no ntimo de cada um dos senhores e senhoras, para que possamos juntos, posteriormente, analisar as possveis situaes de risco e como fazer preveno.

    Outra linha de estudos abrange o chamado padro A de comportamento. Os cientistas dos Estados Unidos observaram as caractersticas de personalidade das pessoas que tinha doena coronria e com base nessa observao formularam uma hiptese de como o paciente cardaco seria. Depois, escolheram na populao as pessoas que tinham essas caractersticas e as que no tinham. As que tinham essas caractersticas classificaram como pertencentes ao

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    padro A de comportamento e, as que no tinham, classificaram como pertencentes ao padro B de comportamento. Esperaram cerca de 20 anos, e verificaram quais tinham adquirido a enfermidade e quais no tinham e compararam com a classificao. Assim, comprovaram que essas caractersticas eram tpicas do doente coronariano. Eles observaram que estas eram pessoas muito ambiciosas. Eram pessoas que, em sua vida, propunham-se a metas constantes e inalcanveis, gerando uma permanente insatisfao. A vida, para elas, era uma corrida de obstculos, que no terminava nunca. Eram pessoas com ambio de poder, de prestgio, que se "cobravam" muito, que exigiam muito de si. Era tambm o trao de pessoas com sobrecarga de trabalho ou atribuies de grandes responsabilidades.

    Outra caracterstica do Padro A de comportamento era a competitividade acentuada. Eram pessoas que procuravam se sobressair, cuja meta de vencer na vida era um trao marcante de sua personalidade. Outro aspecto era o senso de urgncia de tempo acentuado. Eram pessoas que se sentiam pressionadas a realizar tarefas o mais rapidamente possvel. Viviam com pressa e a obsesso pelo tempo era uma constante. Eram tambm pessoas com trao marcante de agressividade, quer de forma expressa ou contida, que agentavam muito at explodir ou que permaneciam irritadas e impacientes, muitas vezes, sem nem se darem conta dessas reaes.

    H estudos, tambm, que mostram que a presso alta, o colesterol e os triglicrides elevados so encontrados em pessoas com dificuldades de expressar a agressividade ou de entrar em contato com seus aspectos agressivos, negando sua percepo. Em outras palavras, nem percebem que so agressivos, que esto irritados e impacientes.

    As pessoas pertencentes ao padro B de comportamento, inversamente, so mais moderadas, calmas e tranqilas. Assim, os senhores e senhoras agora podem vislumbrar outros aspectos para prevenir o agravamento da enfermidade cardaca e que tipo de comportamento e de estilo de vida podem fazer mal para o corao.

    Outros estudos ainda descrevem como prejudiciais ao aparelho cardiovascular, a maneira como certas pessoas reagem s situaes de decepo que possam vivenciar. Todos ns, em algum momento de nossa vida, podemos ter vivenciado o desejo de morrer, por qualquer razo, diante de intensas frustraes e perdas. No processo de elaborao do luto de pessoas que perdemos, por exemplo, faz parte a vivncia do desejo de ir embora com aquela que nos deixou. Os senhores conhecem a histria do velhinho que perde a esposa e, no vendo mais sentido na vida, vem a morrer logo depois. No entanto, esse desejo de morte pode e deve ser passageiro e, sob certas circunstncias, pode ser uma reao normal. Todos ns passamos por perdas e separaes, mas a persistncia nessas reaes, a depresso resultante, pode contribuir para que possamos dar cabo de nossa vida, atravs da doena coronria. A pessoa que est nessa situao no v sada para a vida e no se d conta que esta vivncia sem perspectiva pode ser momentnea. Est implcito aqui um comportamento autodestrutivo, que muitas vezes pode no ser consciente. Por outro lado, h tambm situaes cujo desejo de morte ou comportamento autodestrutivo aparece mascarado ou encoberto. o caso do hbito de fumar. No ato de fumar a pessoa inspira o gs carbnico que um veneno, ao invs de inspirar o oxignio necessrio para nutrir nosso pulmo e nosso organismo. Mas h outros comportamentos que, em certas ocasies, podem ser autodestrutivos tais como, a ingesto de

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    alimentos gordurosos, que fazem mal para o corao, a recusa do tratamento mdico e at mesmo o relacionamento com pessoas sabidamente nocivas, das quais no conseguimos nos desvencilhar. Todas as opes que nos debilitam fsica ou emocionalmente so autodestrutivas.

    O prprio infarto, se pensarmos bem, uma espcie de suicdio inconsciente, pois corresponde necrose, ou morte do tecido de parte do msculo cardaco. Por essa razo, muitas pessoas que sofreram infarto dizem que mudaram de vida, aps se conscientizarem do que estavam fazendo sua sade.

    Com tudo isso, quer dizer que a doena cardaca no um acontecimento na vida dos senhores, que aparece sem que percebam, um transtorno que cai sobre a cabea e perante o qual nada se pode fazer.

    Uma pessoa que quer fazer mais do que pode, est brigando consigo, no est respeitando seus limites. As enfermidades no acontecem por acaso e, quer conscientemente ou inconscientemente, isto , sem percebermos, podemos ter contribudo, de alguma forma, para as doenas que adquirimos. Pessoas que sofreram infarto mudaram de vida e a doena representou uma advertncia de que elas no estavam se cuidando. Considerando que os fatores de risco atingem todas as pessoas da populao em geral, num certo sentido, os senhores esto em melhores condies que elas, pois os senhores sabem o que possuem e podem fazer preveno.

    Ns vamos passar agora a tratar da preveno. De que maneira pode prevenir o stress e outros fatores de risco psicolgico da doena coronria. Como podemos minimizar a progresso da enfermidade.

    Em primeiro lugar, necessrio refletir e observar como os senhores e senhoras tm levado a vida. Ns raramente paramos para pensar. Os senhores e senhoras podem comear a ficar atentos maneira como se comportam e porqu. Em que ocasies tm mais vontade de fumar ou assaltar a geladeira. Se vivem apressados e o que causa stress. O que acontece que no conseguem controlar o colesterol ou a presso. Porque no conseguem fazer exerccios rotineiramente? Os senhores devem parar para refletir sobre isso. Depois, necessrio definir metas; o que preciso mudar? O que acham que precisariam mudar para prevenir o agravamento da enfermidade. necessrio dedicarem-se mudana como algo importante. As mudanas exigem disciplina e seriedade.

    Em segundo lugar, devem se propor a melhorar a qualidade de vida. O que isto? : no trabalhar demais, diminuir a pressa, o excesso de compromissos e dedicar-se ao lazer, fazer uma coisa de cada vez e evitar preocupaes desnecessrias. Pensar no que significam os acontecimentos no futuro, pois provavelmente no tero o mesmo peso e significado atual. Procurem identificar o que os deixa tensos e irritados. Procurem afastar-se de situaes perturbadoras, porque se a situao os perturbou muito, provavelmente no podero resolv-la no momento e, com mais calma, podero avali-la melhor. As caminhadas, alm do benefcio ao aparelho circulatrio, so excelentes meios de reduo do stress. Quando se

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    sentirem perturbados, saiam para caminhar e s retornem quando notarem que esto mais tranqilos. Muitas de nossas tenses se manifestam em nosso corpo pela contrao da musculatura. Assim, faam o caminho inverso e procurem relaxar. Nem sempre querer poder e muitas vezes desperdiamos tempo e energia em sonhos impossveis. Verifiquem se suas metas so realizveis. Procurem viver em harmonia com o ambiente e com a realidade. Tenham respeito por si e pelo seu corpo e procurem levar uma vida prazerosa, gostosa e saudvel.

    Outro aspecto saber que levar uma vida tranqila no o mesmo que evitar problemas. Se, como j dissemos, no vivemos sem stress, se o stress faz parte da nossa vida, se todos vivemos situaes de tenso, de preocupao, exigncias do dia a dia, no trabalho, em casa, nos relacionamentos com as pessoas, se no podemos eliminar o stress de nossa vida, devemos administr-lo. Os senhores conhecem aquele bicho avestruz que, em situaes de perigo, enfia a cabea embaixo da terra, para no ver o que acontece? Pois as pessoas podem fazer isso. No querem ver o que acontece. O senso popular entende que o paciente cardaco no pode passar nervoso ou emoes fortes. Emocionar-se ou cuidar de si no ficar alheio ao que acontece. impossvel no reagirmos s situaes do nosso cotidiano. Sempre reagimos, mesmo fazendo de conta que no. Ademais, ficar alheia deixa a pessoa despreparada para as dificuldades cotidianas, o que faz com que levem um grande impacto quando se deparam com a realidade. Emocionar-se eqivale a estar vivo e as experincias podem ser emocionalmente fortalecedoras.

    Outro aspecto o de que no devemos responsabilizar os outros ou a vida pelas nossas adversidades. No devemos achar que ficamos doentes por causa dos outros. Alguns pacientes cardacos ficam revoltados, por considerar que a enfermidade surgiu em decorrncia de problemas causados, quer pelas outras pessoas, quer por determinada circunstncia de sua vida pessoal, perante os quais no puderam fazer nada para evitar, sentindo-se vitimados. So os problemas financeiros, as irritaes constantes da esposa ou do cnjuge, as provocaes do vizinho, do inquilino, do proprietrio ou a morte ou separao de algum. necessrio lembrar que os reveses so comuns a todos e nem todas as pessoas que passam por essas situaes adquirem a doena cardaca. Cada pessoa responsvel pelos seus atos e se algum pode causar doenas em si, esse algum ele mesmo. Achamos que os outros ou as circunstncias foram as responsveis, no nos damos conta do que podemos fazer por ns mesmos. Culpar algum escapar da nossa responsabilidade nesse processo. fundamental que se analise a maneira como lidamos com essas situaes adversas, e responsabilizar os outros ou a vida no leva a lugar nenhum.

    Outro aspecto, ainda, o de que devemos ficar atentos a situaes crticas ou crnicas, associadas ao desejo de morte. Se porventura passarem por um perodo difcil e se sentirem desorganizados, desmotivados e melanclicos e se essas reaes persistirem, os senhores devem procurar ajuda do psiclogo. Se mantiverem um comportamento autodestrutivo, no conseguindo modific-lo, devem procurar ajuda.

    O trabalho com o psiclogo consiste em promover o autoconhecimento e esse autoconhecimento tem um valor teraputico.

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    As pessoas tm muito preconceito em relao psicoterapia, pois acham que coisa para loucos ou fracos, o que no verdade. Ns no gostamos de sentir que no temos o controle sobre nosso ntimo e nossas emoes. Poucas so as pessoas que procuram este procedimento. Mas os senhores j pensaram quantas vezes procuramos o mdico? Logo ao nascimento consultamos o pediatra, apenas para ver se estava tudo bem, e ningum acha anormal. Quantas vezes, porm, procuramos o psiclogo para saber como vai a nossa mente? A gente capaz at de encarar com certo desprezo as pessoas que fazem psicoterapia e isto impede que os senhores possam se beneficiar da mesma. A psicoterapia um procedimento que promove um autoconhecimento de atitudes e comportamentos que podem ser prejudiciais e nem percebemos.

    Ns, aqui no Instituto Dante Pazzanese, dispomos de um servio de atendimento psicolgico e todos os pacientes podem procur-lo espontaneamente, no sendo necessrio o encaminhamento de qualquer profissional.

    Outro aspecto empenhar-se em modificar os fatores de risco mais controlveis, que os senhores e senhoras podem ter uma influncia mais direta, j que a hereditariedade, o sexo e idade no se pode mudar. Quais so eles? O hbito de fumar, a vida sedentria, a alimentao adequada, o controle do stress, da presso, da obesidade.

    Outro aspecto ainda cumprir o tratamento mdico. O no cumprimento do tratamento mdico tambm uma espcie de fator de risco da doena coronariana.

    necessrio lembrar que o tratamento no termina quando acaba a caixa de remdios. Pode ocorrer que o mdico no acerte de imediato a medicao para o seu caso e necessrio mud-la. No existem milagres. Se acha que no se deu bem com a medicao, no deve abandonar o tratamento, mas conversar com o mdico. Muitos pacientes no compreendem o que seja o acompanhamento clnico. O paciente vem s consultas e o mdico no mudou a medicao, faz sempre os mesmos exames e diz que est tudo bem e o paciente, no entendendo bem o significado desse acompanhamento da evoluo da enfermidade, abandona o tratamento ou a medicao. Outro caso do paciente que no toma direito o remdio e no conta para o mdico. O mdico passa a questionar o efeito da medicao. Os fatores mais comuns que levam no adeso ao tratamento so o desconhecimento da doena e sua necessidade, a ausncia de sintomas, a rejeio do diagnstico, a desconfiana da qualificao do profissional ou da teraputica indicada e durao prolongada do tratamento na doena crnica.

    A omisso da informao sobre a no adeso ao tratamento representa um prejuzo na qualidade da comunicao da relao mdico-paciente.

    necessrio saber que a enfermidade crnica e o no-tratamento implica no agravamento da mesma, com progressiva incapacidade fsica at a morte e concomitante piora da qualidade de vida. Muitas vezes, quando o paciente resolve voltar ao tratamento, a molstia j se agravou consideravelmente. O paciente que no se trata vive a iluso de que a enfermidade no progredir. O mesmo poderia ser dito em relao dieta, o controle do stress, a atividade

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    fsica, o hbito de fumar, o tratamento do diabetes, da hipertenso, do colesterol, da presso alta. A no adeso ao tratamento gera culpa, stress, preocupao, pois o paciente sempre sabe que pode estar se arriscando.

    Saber o que os senhores e senhoras tm representa, no entanto, uma vantagem sobre a populao em geral. Aqueles que no tm a enfermidade e desconhecem seus fatores de risco podem vir a adquir-la, enquanto os senhores tm mais chances de control-la, porque sabem o que pode agrav-la.

    Agora vamos falar sobre outro aspecto. Por que difcil promover mudanas? Porque difcil fazer dieta, parar de fumar, comear a atividade fsica, para quem nunca o fez?

    Um dos motivos est no que os psiclogos chamam de negao e descrdito. O cigarro faz mal sade e todo mundo sabe, mas o fumante no registra essa informao. Ele no acredita que possa acontecer algo com ele, o risco sempre dos outros. Ele pode alegar, por exemplo, que conhece pessoas que fumaram at os noventa anos de idade, sem que nada tivesse acontecido. Assim ele se baseia em uma nica pessoa para justificar suas atitudes, no enxerga os malefcios imediatos do cigarro, de modo que, no seu ntimo, ele no acredita que possa realmente fazer mal. O mesmo pode ocorrer em relao obesidade, vida sedentria, e todas as formas de no adeso ao tratamento e controle dos fatores de risco. O hbito de comer demais, salvo raros casos, o fator que faz engordar. No adianta argumentar que metablico. uma questo de lgica, se engordou porque comeu mais.

    Uma variante disso a negao da prpria doena. O paciente pensa que no est realmente doente ou to grave quanto o mdico falou. Se o mdico fosse mais "bonzinho", menos exigente ou no tivesse excesso de preocupao, ele deixaria comer aquele "torresminho", aquela feijoada ... Se ele no est realmente doente no precisa se tratar.

    Outro aspecto que inviabiliza mudanas est relacionado maneira como o paciente se relaciona consigo. Ele sente-se prejudicado porque cardaco. S ele deve fazer sacrifcio, s ele vtima e "coitadinho". Todos podem fumar, beber, comer o que quiser. Da, como ele vtima, faz uma espcie de barganha consigo. Outro dia encontrei uma amiga no supermercado e ela me dizia que no conseguia controlar o colesterol. J havia tentado tudo. Ao olhar para o carrinho que carregava notei, sem falar, que ele estava repleto de alimentos proibidos. Ela passou a comentar que adorava doces e que, somente uma vez por ms os ingeria, dizendo: - afinal eu tambm sou filha de Deus! E assim por diante, com relao ao caf, bebida alcolica, ao omelete e feijoada, a cada cinco dias, a cada semana, a cada quinze dias, etc, de modo que o deslize constante. O importante aqui salientar que todos tm que cuidar da sade, no s o paciente coronariano.

    Uma forma de saber se os senhores e senhoras esto se cuidando verificar o resultado dos exames clnicos e a balana. Se as taxas reduziram porque esto fazendo o que preciso, se no, no esto. Faam experincias, com caminhadas, dietas, ou levando uma vida mais tranqila, se os parmetros diminuem. Os senhores mesmos podem observar.

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    Outro aspecto que dificulta as mudanas acreditar que pode haver mudanas sem esforo. O paciente espera que as mudanas de estilo de vida, o abandono do hbito de fumar venham como um milagre, que caiam do cu. Vive a iluso de que no precisar se esforar para isso. Todas as mudanas em nossa vida podem ser difceis, dolorosas, exigem grande empenho de nossa parte para nos adaptarmos. Falo das mudanas em geral, tais como casar, separar, arrumar um novo emprego, ter um filho, um neto ou a aposentadoria e cuidar da doena coronria. As mudanas representam grandes desafios e envolvem momentos de incerteza, de desnorteamento, de dvidas quanto a estarmos no caminho certo. Mas esses desafios representam vantagens, pois estaremos indo ao encontro de algo melhor.

    Outro aspecto, ainda, que dificulta mudanas a dificuldade de tolerar frustraes. Quando somos crianas, nossos desejos so imperiosos. A criana quer o doce antes do almoo e, se a me no deixa, ela no aceita. Mais tarde ela j compreende melhor que no pode ter tudo que quer. Ela vai aprendendo a tolerar frustraes, sem que tudo fique negro sua volta e ela se desorganize. Todos ns podemos conservar certos traos infantis, mas com o nosso desenvolvimento, vamos aprendendo a adiar gratificaes, a renunciar hoje para obter algo melhor amanh. O mesmo pode ocorrer com quem vai se propor a fazer mudanas. O fumante tem que fumar naquela hora. O cigarro, de fato, causa dependncia fsica e psquica e aumenta essa necessidade imperiosa. O mesmo pode acontecer com a gula, com a vontade de comer certos alimentos gordurosos, com a dificuldade de fazer exerccios. No s o cigarro que vicia, a pessoa pode ser viciada em comida, bebida e utilizar essas circunstncias para compensar decepes, frustraes, obtendo um falso benefcio do prazer imediato que proporcionam. A pessoa no consegue enxergar o amanh e os benefcios do controle de seus impulsos e quer o seu prazer imediato.

    Um outro aspecto que dificulta mudanas permanentes a dificuldade de persistir quando ocorrem recadas. s vezes a pessoa no resiste ao chocolate, feijoada, e da "libera geral". Acha que no tem jeito mesmo, sente-se culpado e infeliz porque no tem controle e da precisa comer mais, beber, fumar mais para compensar a frustrao. Assim, o melhor persistir quando h recadas. Liberou-se um dia, o mundo no vai acabar. Volta no dia seguinte, mas volta mesmo. O ideal ser flexvel, conseguir o controle, sem ser carrasco de si mesmo. Ns sabemos de um paciente que depois de fazer o programa ficou anorxico, uma doena psicolgica que faz com que sinta medo de comer qualquer coisa. No isso que queremos passar para os senhores e senhoras.

    necessrio tambm fazer mudanas planejadas para que sejam mais permanentes. A mudana que estamos falando envolve uma alterao mais profunda em suas vidas: a mudana de estilo de vida. O cigarro faz mal para todos, a gordura faz mal para todos, no s para o coronariano. O tabagista pode decidir ficar uma semana, um ms sem fumar, da considera que j se curou do vcio e decide fumar s um ou dois cigarros por dia. Quando se d conta, voltou a fumar. A pessoa pode decidir levar uma vida mais tranqila hoje e esquecer o que planejou amanh. Assim, necessrio aprender a lidar com as recadas, sem perder de vista as metas. A satisfao real que se obtm advm, no do prazer imediato de fazer tudo que se quer, mas do sentimento de que somos donos de ns mesmos, sabemos controlar nossos impulsos, sem ser radical e sem culpa.

    http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100009 (16 de 22)14/10/2005 06:19:14 a.m.

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    Continuando, devemos lembrar que s possvel fazer mudanas quando as desejamos verdadeiramente. Quando queremos algo de verdade, enfrentamos qualquer obstculo. Muita gente diz que no consegue parar de comer, de fumar, no sabe porque no consegue fazer exerccios, no controla a pressa e o stress e isso passa a ser uma justificativa para no mudar.

    necessrio, alm disso, j que as mudanas em nossa vida no so to fceis, eleger um perodo mais tranqilo e se preparar emocionalmente para enfrent-las. Isto no quer dizer adiar indefinidamente essa data, mas estar preparado para a instabilidade emocional que essa nova adaptao pode desencadear. O desafio pode ser gratificante. Quem se libera de um vcio, pode ser a pressa, a ambio, o cigarro, descobre coisas novas de si que estavam ocultas, sentimentos que no se dava conta e s assim poder lidar melhor com eles.

    Em certos casos, aconselhvel usar facilitadores, tais como os comprimidos de reposio de nicotina, para o fumante; utilizar dietas mais atrativas, que os senhores tero vrias sugestes com a nutricionista, ou fazer atividade fsica em ambientes mais agradveis, como no parque, e fazer disso um lazer e no uma obrigao.

    Finalmente, o grande obstculo a mudanas de estilo de vida est no desejo de abandonar a luta pela vida. Muitas vezes, no queremos promover mudanas porque perdemos a vontade de viver. Assim, como j comentamos, o cigarro, o stress, a pressa, a urgncia de tempo, a gordura em excesso podem ser uma espcie de veneno. Devemos pensar se, com isso, no estamos cometendo, inconscientemente, uma espcie de suicdio."

    Concluses

    Faz-se necessrio, nos tempos atuais, que as polticas pblicas de sade implementem programas mais consistentes com os novos conhecimentos. Uma modalidade a abertura de novos canais de comunicao com os pacientes, de modo a torn-lo mais participativo, integrando-o no processo de tratamento da enfermidade orgnica.

    A ampliao da informao, alm de todos os possveis efeitos indiretos, ligada ao contato com os profissionais de sade, parece representar uma pondervel contribuio ao controle da progresso da enfermidade coronria. Futuras pesquisas podero, no entanto, dimension-la melhor.

    Os depoimentos de alguns pacientes, registrados em reunies de encerramento e avaliao do aprendizado, podem servir de ilustrao sobre o efeito imediato do Programa. Pede-se aos pacientes que sejam sinceros tanto na avaliao das aquisies quanto dos aspectos que no conseguiram modificar: "Descobri que a doena fatal se no me cuidar". "Tenho que mudar tudo que fazia antes". "Agora eu conheo melhor e sei que com a doena tem que ter controle". "Descobri que possvel comer bem, fazendo regime". "Recebi uma explicao detalhada de como me cuidar. Eu pensava que quando a presso estava boa no precisava de remdio". "Aprendi sobre alimentao, fatores de risco. Que a gente no deve voltar ao

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    cigarro quando tem alta do hospital". "Aprendi a identificar a dor de angina. Quando angina e quando no ". "Descobri que a doena no tem cura". "S no consegui controlar meu nervosismo". "Descobri que tenho que controlar o nervoso, ser mais calmo". "Eu s no consegui emagrecer". "Eu emagreci 5 quilos depois que iniciei o Programa". "Eu me trato h 12 anos no Instituto Dante Pazzanese e s agora fiz tratamento em grupo". "Descobri que tem outras pessoas com o mesmo problema que o meu". "Descobri que sozinho a gente no faz nada. Eu ia comer alguma coisa que no devia e lembrei do grupo e no comi". "Antes eu tinha medo de andar, agora aprendi a fazer ginstica". "Aprendi quase tudo aqui, aprendi a andar no plano". "Tenho muita preguia de andar sozinha, no consegui ainda". "A minha rua muito ruim, tem muita ladeira e eu me canso, por isso no vou caminhar. Vocs (profissionais de sade) conseguem fazer exerccios?". "Aprendi que tenho que tomar remdio sempre". "Eu procuro fazer dieta, mas a patroa no faz comida de dieta e eu vou na cozinha e preparo minha comida". "Aqui falaram que desde jovem se deve fazer dieta para no ter colesterol, mas em casa os filhos adolescentes no querem nem saber".

    Nas reunies de encerramento, os pacientes em geral, lamentando a separao, manifestam o desejo de que o "grupo" (como chamado) tenha continuidade. Isto levou a equipe a promover reunies peridicas com vrios grupos de veteranos, para reteno das aquisies.

    Do ponto de vista da abordagem psicolgica, ainda no dispomos de dados consistentes sobre o grau de aproveitamento, no que concerne s efetivas mudanas de hbitos e atitudes propiciadas pela experincia. Um dos fatores que, a princpio, poderia representar uma limitao a uma abordagem de tipo informativo-educativo estaria nas restries do prprio mtodo. Pode-se incluir aqui o desafio que representa o nmero elevado de participantes em cada mdulo do Programa, cerca de 80 a 100 pacientes. Pode-se considerar, tambm, diante apenas da informao, a dificuldade peculiar de reconhecer, por parte das pessoas e, portanto, do paciente coronariano, seus sentimentos e motivaes, que possibilitariam mudanas de atitudes. De todo modo, embora se reconhea que o alcance do trabalho psicoterpico e as chances desse reconhecimento sejam indubitavelmente ampliados, este procedimento, de enfoque individual e que atende mais ao perfil do psiclogo enquanto profissional liberal configura-se como invivel, quando se pensa em polticas de sade e propostas que atendam a populao.

    A preveno da doena coronria, pelo que foi exposto, envolve indubitavelmente questes sociais bem mais amplas, tais como o desemprego, a pobreza, as injustias sociais, a violncia e inclusive o preo dos medicamentos, que no se pretende discutir aqui. O efeito geral do programa sobre os pacientes, no entanto, talvez no esteja apenas no incremento de informaes, na proposta educativa, e na possibilidade de que os mesmos tenham a seu servio um controle maior dos fatores de risco da enfermidade. possvel que o que os profissionais de sade passam, nesses encontros, esteja alm da comunicao verbal. A manifestao genuna de interesse pela pessoa do paciente, a troca de experincias entre eles e a fora de coeso do grupo, podem conter em si um potencial regenerador considervel, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dos que se dispuseram a investir emocionalmente no Programa.

    http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642002000100009 (18 de 22)14/10/2005 06:19:14 a.m.

  • Psicologia USP - Coronary Heart Disease Prevention: A Psychological Perspective in a Multidisciplinary Program

    Giannotti, A. (2002). Coronary Heart Disease Prevention: A Psychological Perspective in a Multidisciplinary Program. Psicologia USP, 13 (1), 167-195.

    Abstract: The Hospital Dante Pazzanese offers a multidisciplinary psychoeducational program which consists of classes organized by health experts from different areas. This article discusses the strategies to enhance the sense of control of the psychological and psychosocial factors and emphasizes the importance of psychological interventions. The study explores the role of emotions, stress and general risk factors and the difficulties found by people and how to discover ways to promote personal changes for health care.

    Index terms: Heart disorders. Prevention. Programs. Psychological intervention. Multidisciplinary group.

    Giannotti, A. (2002). Prvention de la Maladie Coronarienne: Perspectives Psychologiques Dans un Programme Multidisciplinaire. Psicologia USP, 13 (1), 167-195.

    Resume: Un programme multidisciplinaire de prvention de la maladie coronarienne a t implant l'institut Dante Pazzanese et perfectionn au moyen de cycles de confrences prsentes par les diffrents spcialistes. Cet article prsente les facteurs de risques psychologiques et psychosociaux et rsume les prsentations dans le domaine de la psychologie. Dans ce rapport on met en relief le rle des motions, du stress et les facteurs de risque de faon gnrale, les difficults que les personnes peuvent rencontrer et comment trouver les manires de promouvoir les changements personnels pour prendre soin de sa sant.

    Mots-cls: Maladies cardiaques. Prvention. Programmes. Intervention psychologique. Groupe multiprofessionnel.

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