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Provérbios EDITORA AVE-MARIA Extraído da Bíblia Ave-Maria

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Provérbios

editoraAve-mAriA

Extraído da Bíblia Ave-Maria

Introdução

Para Alonso Schökel, o Livro dos Pro-vérbios é o mais representativo dos livros sapienciais bíblicos. Nele há os mais antigos testemunhos, e é escrito no mais refinado estilo sapiencial.

A obra

Do título do livroNo início do livro estão as palavras pro-

vérbios de Salomão (filho de Davi, rei de Israel). Claro que se trata de uma designação pseudônima. Atribuir um livro a um renomado personagem era comum na literatura antiga. É nesse intuito que ditos e sentenças de diferentes datas são agrupados como sendo obra de um só autor: o protótipo dos sábios, Salomão.

Essa paternidade salomônica certamente ajudou o livro dos provérbios a ser considera-do um livro canônico para os judeus. Somente assim argumentos de índole tão diferente, em muitos casos, do pensamento judaico, puderam ser acolhidos no cânon. Hoje, na Bíblia hebraica, a obra faz parte dos Escritos.

6Introdução

Estrutura e temáticaO livro é feito de um conjunto de provérbios

que podem ser de épocas diversas. Portanto, um redator final trabalhou um material bastante heterogêneo, procurando organizá-lo segundo uma estrutura não totalmente evidente.

A estrutura mais simples do livro é obtida dos títulos elaborados pelo redator ao longo do livro:

1) (1,1-7) título do livro, com a apresentação de sua finalidade;

2) (1,8-9) parece um grande prólogo ao qual segue as coleções dos provérbios. Trata-se de um grande bloco onde se faz o convite à Sabedoria, além de apresentar diversos conselhos. Seu estilo é exortativo, com a personificação da sabedoria e da loucura. Tudo isso para falar da importância de ser sábio. J. N. Aletti propõe a análise de Pr 1–9 por intermédio de um fio condutor: a palavra humana e sua força. Nesses nove primeiros capí-tulos a sabedoria fala como uma mulher à qual se opõe no texto a adúltera. A palavra sedutora é aquela que procura destruir a comunidade e, em consequência, perverter a linguagem. A sa-bedoria, ao contrário, é uma palavra que edifica a comunidade.

Assim, o objetivo dessa seção, provavelmen-te pós-exílica, é claramente didático: procura inculcar uma filosofia de vida em uma geração que crescera num período de instabilidade e que corria o risco de perder valores religiosos e de

7Introdução

se alienar num meio sociocultural imposto pelo domínio político estrangeiro. O povo judaico é convidado a guardar sua própria tradição cultural e religiosa, isto é, a sabedoria de Israel. Sendo obra do último redator de Provérbios (c. séc. V–IV a.C.), os capítulos 1 a 9 apresentam a sabedoria personificada, como uma “criatura” de Deus que estabelece a conexão entre Ele e todo o Universo.

3) (10,1–22,16) “Provérbios de Salomão”. São provérbios breves (375), geralmente em forma arcaica. Uma coleção de ditos e máximas variadas. Cada provérbio é uma unidade inde-pendente, uma sentença artística, conforme Von Rad, está desligado dos demais e não tem con-texto, o que torna a interpretação mais exigente.

A forma simples desses provérbios é base-ada, sobretudo, no parallelismus membrorum (paralelismo dos membros), em que o poeta deve exprimir em dois versos dois aspectos da mesma realidade. Esse tipo de construção poé-tica é muito exigente, requer maior elaboração intelectual do que um poema que se desenvolve livremente. Observe os seguintes provérbios: Balança e peso justos são do Senhor, e são obra sua todos os pesos da bolsa (Pr 16,11); O falso testemunho não fica sem castigo; o que profere mentira não escapará (Pr 19,5). São dois exemplos de paralelismo sinonímico, onde as duas partes do verso apresentam em duplicata a mesma mensagem.

8Introdução

Muito frequente é o chamado paralelismo antitético (quase 80% dos provérbios dos capí-tulos 10–15), onde os contrastes são claros, mas não correspondem exatamente em suas antíte-ses. Desse modo, os provérbios não se tornam enfadonhos. Há sempre um espaço aberto ao pensamento. Outra forma poética é o chama-do paralelismo sintético: Os cabelos brancos são uma coroa de glória a quem se encontra no caminho da justiça (Pr 16,31); Um escravo prudente vale mais que um filho desonroso, e partilhará da herança entre os irmãos (Pr 17,2). O segundo versículo prossegue a ideia introdu-zida, geralmente superando-a, em uma espécie de prolongamento. Por vezes, trata-se de uma generalização, outras, de uma especificação, que completa o que foi dito. Frequentes são ainda as comparações, sobretudo na coleção de Pr 25–27, e que podem ter formulações do tipo: “é melhor... do que...”, ou “como... assim...”, entre outras.

Tais sentenças artísticas possuem um cará-ter mais descritivo do que exortativo (como em Pr 1–9) e mais secular do que religioso, o que levou muitos estudiosos a sustentarem que essa seria a coleção mais antiga do livro. A seção 16,1–22,16 parece estar voltada à formação dos funcionários do rei, o que seria indício da época monárquica. Os temas tratados são variados, as-sim como os fatos e situações da vida cotidiana. Está sempre presente o desejo de reconhecer

9Introdução

no mundo uma ordem e de elaborar normas de comportamento para o sábio que quer viver em sintonia com o cosmos e com a humanidade. A fonte soberana da sabedoria seria a reflexão sobre a experiência.

4) (22,17–24,22) esta coleção de provér-bios não possui um título redacional (v.17: as palavras dos sábios), mas pode ser vista como a coleção das Máximas dos Sábios: conselhos proverbiais dados aos jovens que precisam aprender. Quanto à forma, são mais complexos que os da coleção precedente, apresentados num discurso direto em que predominam a descrição e a argumentação sapiencial. O estilo reproduz bem a relação mestre-aluno.

Particularmente refinada é a descrição da embriaguez (Pr 23,29-35), feita com emoção e ironia. A arte poética se eleva nessa seção, com notório uso de metáforas. Nessa seção também se apresenta a conexão entre ação e resultado, porém, observa-se que somente Deus possui a última palavra. Ele intervém livremente na his-tória, colocando-se entre os projetos humanos e seus resultados. A atuação livre de Deus na retribuição é indicada em Pr 22,22-23; 23,10-11; 24,12.18.

5) (24,23-34) segunda coleção dos ditos dos sábios, conforme v.23a: O que segue é ainda dos sábios. Destaca-se a reflexão sobre o preguiçoso e as consequências do ócio.

10Introdução

6) (25,1–29,27) segunda coleção dos pro-vérbios de Salomão, com a seguinte precisão: recolhidos pelos homens de Ezequias, rei de Judá (Pr 25,1b).

Existe clara relação com a primeira coleção (3), reaparecendo as sentenças artísticas com pre-domínio, quanto à forma, dos dísticos antitéticos e comparativos. A atribuição a Salomão honra sua pessoa e faz com que a obra seja prestigiada.

7) (30,1-14) coleção conhecida como pala-vras de Agur. Bastante heterogênea.

8) (30,15-33) são os provérbios numéricos, os quais segundo alguns autores fazem parte das palavras de Agur e, segundo outros, formam uma coleção independente.

9) (31,1-9) Palavras de Lemuel. Trata-se de conselhos recebidos de sua mãe. Como nas Palavras de Agur, nota-se o desejo de eliminar a pobreza.

10) (31,10-31) composição poética alfabéti-ca, ou seja, cada primeira palavra de um verso se inicia com uma letra do alfabeto hebraico. Fala da “mulher de valor”, fundamentalmente, da mulher sóbria. O livro termina como o mesmo tema dos capítulos iniciais. Haveria intenção de estabelecer uma inclusão?

Mensagem teológicaOs sábios do Livro dos Provérbios, segun-

do Maurice Gilbert, não se ocupam de ciência

11Introdução

natural. No centro das suas reflexões está a abordagem do homem, em si mesmo e em todas as suas relações, inclusive naquela com Deus. Do cosmo e dos animais, eles falam somente pela sua semelhança e proximidade com os seres humanos.

Esses sábios prendem-se sempre aos as-pectos da vida terrestre, uma vez que na sua concepção não havia ainda o conceito de vida eterna. Assim como no Livro de Jó e Coélet (Eclesiastes), o Sheol é o destino comum de todos os homens, não há o conceito de céu ou inferno ainda. Precisaremos esperar o Livro de Sabedoria para alcançar a temática da ressur-reição no âmbito sapiencial.

A teologia da retribuição é constante nesse livro. A relação com Deus se move em uma con-jectura de causa e efeito. Cumpro certas regras e recebo o bem; não as cumpro, e recebo o mal. Tais teses serão criticadas posteriormente nos Livro de Jó e Coélet.

DataçãoO material mais antigo, cananeu (sobretu-

do, as sentenças agrícolas), estaria espalhado pelo livro e pode remontar ao segundo milênio antes de Cristo.

As partes mais antigas são as duas coleções de 10–22 e 25–29. A nota textual do capítulo 25,1 relaciona parte do conteúdo com o período

12

pré-exílico. Quanto à formação das coleções e expansão do material, é provável que tenha ocorrido durante o período monárquico tardio. Já o título geral (1,1-7) e o primeiro bloco de instruções e advertências (1,8–9,18) seriam do período pós-exílico.

Bem provável é que Provérbios tenha esta-do pronto antes da época de Ben Sirac (c. 190 a.C.). A ortodoxia da doutrina da retribuição e a possível influência de ideias gregas (es-pecialmente em 1–9) fazem pensar nos sécs. IV – III a.C.

Introdução

13PROVÉRBIOS 1

Provérbios

Finalidade dos provérbios

1 1 Provérbios de Salomão, filho de Davi, rei de Israel,

2 para conhecer a sabedoria e a instrução, para compreender as palavras sensatas, 3 para adquirir as lições do bom senso, da justiça, da equidade e da retidão; 4 para dar aos simples o discernimento, ao adolescente a ciência e a reflexão. 5 Que o sábio escute, e aumentará seu saber, e o homem inteligente adquirirá prudência 6 para compreender os provérbios, as alegorias, as máximas dos sábios e seus enigmas. 7 O temor do Senhor é o princípio da sabedoria. Os insensatos desprezam a sabedoria e a instrução.*

Fugir da companhia dos maus

8 Ouve, meu filho, a instrução de teu pai: Não desprezes o ensinamento de tua mãe. 9 Isto será, pois, um diadema de graça para

tua cabeça e um colar para teu pescoço.

1,7. Princípio: isto é, começo, fonte, cume, elemento primordial. Temor: no sentido de reverência a Deus, piedade, religião.

14PROVÉRBIOS 1

10 Meu filho, se pecadores te quiserem seduzir, não consintas; 11 se te disserem: “Vem conosco, faremos emboscadas para derramar sangue, armaremos ciladas ao inocente, sem motivo, 12 como a região dos mortos devoremo-lo vivo, inteiro, como aquele que desce à cova.* 13 Nós acharemos toda a sorte de coisas preciosas, nós encheremos nossas casas de despojos. 14 Tu desfrutarás tua parte conosco, uma só será a bolsa comum de todos nós!”. 15 Oh, não andes com eles, afasta teus passos de suas sendas, 16 porque seus passos se dirigem para o mal, e se apressam a derramar sangue. 17 Debalde se lança a rede diante daquele que tem asas.* 18 Eles mesmos armam emboscadas contra seu próprio sangue e se enganam a si mesmos. 19 Tal é a sorte de todo homem ávido de riqueza: arrebata a vida àquele que a detém.

sabedoria personificada

20 A Sabedoria clama nas ruas, eleva sua voz na praça, 21 clama nas esquinas da encruzilhada, à entrada das portas da cidade ela faz

1,12. Região dos mortos: onde os hebreus acreditavam que as almas habitavam para sempre numa espécie de triste letargia.

1,17. Debalde: os pecadores não alcançarão seu fim como o caçador de pássaros que põe as armadilhas diante dos pássaros.

15PROVÉRBIOS 1

ouvir sua voz: e até quando os que zombam se comprazerão na zombaria? 22 “Até quando, insensatos, amareis a tolice, e os tolos odiarão a ciência? 23 Convertei-vos às minhas admoestações, espalharei sobre vós o meu espírito, eu vos ensinarei minhas palavras. 24 Uma vez que recusastes o meu chamado e ninguém prestou atenção quando estendi a mão, 25 uma vez que negligenciastes todos os meus conselhos e não destes ouvidos às minhas admoestações, 26 também eu rirei do vosso infortúnio e zombarei, quando vos sobrevier um terror, 27 quando vier sobre vós um pânico, como furacão; quando se abater sobre vós a calamidade, como a tempestade; e quando caírem sobre vós tribulação e angústia. 28 Então me chamarão, mas não responderei; eles me procurarão, mas não atenderei. 29 Porque detestam a ciência sem lhe antepor o temor do Senhor, 30 porque repelem meus conselhos com des prezo às minhas exortações; 31 comerão do fruto dos seus erros e se sacia-

rão com seus planos,*

1,31. Comerão: sofrerão as consequências dos seus atos.

16

32 porque a apostasia dos tolos os mata e o desleixo dos insensatos os perde. 33 Aquele que me escuta, porém, habitará com segurança, viverá tranquilo, sem recear dano algum.”

Discurso do mestre

21 Meu filho, se acolheres minhas palavrase guardares com carinho meus preceitos,

2 ouvindo com atenção a sabedoria e inclinando teu coração para o entendimento; 3 se tu apelares à penetração, se invocares a inteligência, 4 buscando-a como se procura a prata; se a pesquisares como um tesouro, 5 então compreenderás o temor do Senhor, e descobrirás o conhecimento de Deus, 6 porque o Senhor é quem dá a sabedoria, e de sua boca é que procedem a ciência e a prudência. 7 Ele reserva para os retos a salvação e é um escudo para os que caminham com integridade; 8 protege as sendas da retidão e guarda o caminho de seus fiéis.*

2,6-8. Estes três versículos devem ser considerados como uma espécie de parêntese. O v. 9 está unido, pelo sentido, ao v. 5.

PROVÉRBIOS 2

17

9 Então, compreenderás a justiça e a equidade, a retidão e todos os caminhos que conduzem ao bem. 10 Quando a sabedoria penetrar em teu coração e o saber deleitar a tua alma, 11 a reflexão velará sobre ti, ela te amparará a razão, 12 para preservar-te do mau caminho, do homem de conversas tortuosas, 13 que abandona o caminho reto para percorrer caminhos tenebrosos; 14 que se compraz em praticar o mal e se alegra com a maldade; 15 do homem cujos caminhos são tortuosos e os trilhos sinuosos. 16 Ela te preservará da mulher alheia, da estranha que emprega palavras lisonjeiras, 17 que abandona o esposo de sua juventude e se esquece da aliança de seu Deus. 18 Sua casa declina para a morte, seu caminho leva aos lugares sombrios;* 19 não retornam os que a buscam, nem encontram as veredas da vida. 20 Assim tu caminharás pela estrada dos bons e seguirás as pegadas dos justos, 21 porque os homens retos habitarão a terra, e os homens íntegros nela permanecerão, 22 enquanto os maus serão arrancados da terra e os pérfidos dela serão exterminados.

2,18. Sombrios: os habitantes da morada dos mortos. Cf. 9,18.

PROVÉRBIOS 2

18

31 Meu filho, não te esqueças de meu ensinamento e guarda meus preceitos

em teu coração 2 porque, com longos dias e anos de vida, eles te assegurarão a felicidade. 3 Oxalá a bondade e a fidelidade não se afastem de ti! Ata-as ao teu pescoço, grava-as em teu coração! 4 Assim obterás graça e reputação aos olhos de Deus e dos homens. 5 Que teu coração deposite toda a sua confiança no Senhor! Não te firmes em tua própria sabedoria! 6 Sejam quais forem os teus caminhos, pensa nele, e ele aplainará tuas sendas. 7 Não sejas sábio aos teus próprios olhos, teme ao Senhor e afasta-te do mal.* 8 Isto será saúde para teu corpo e refrigério para teus ossos. 9 Honra ao Senhor com teus haveres, e com as primícias de todas as tuas colheitas. 10 Então, teus celeiros se abarrotarão de trigo e teus lagares transbordarão de vinho. 11 Meu filho, não desprezes a correção do Senhor, nem te espantes de que ele te repreenda, 12 porque o Senhor castiga aquele a quem ama, e pune o filho a quem muito estima.*

3,7. Sábio aos teus olhos: pensamento citado implicitamente em Rm 12,16. 3,12. Pune: segundo o texto grego. Outra versão: como um pai castiga. Texto

citado em Hb 12,5s.

PROVÉRBIOS 3

19

benefícios da sabedoria

13 Feliz do homem que encontrou a sabedoria, daquele que adquiriu a inteligência, 14 porque mais vale este lucro que o da prata, e o fruto que se obtém é melhor que o fino ouro. 15 Ela é mais preciosa que as pérolas, joia alguma a pode igualar. 16 Na mão direita ela sustenta uma longa vida; na esquerda, riqueza e glória. 17 Seus caminhos estão semeados de delícias. Suas veredas são pacíficas. 18 É uma árvore de vida para aqueles que lançarem mãos dela. Quem a ela se apega é um homem feliz.* 19 Foi pela sabedoria que o Senhor criou a terra, foi com inteligência que ele formou os céus. 20 Foi pela ciência que se fenderam os abismos, por ela as nuvens destilam o orvalho.* 21 Meu filho, guarda a sabedoria e a reflexão, não as percas de vista.* 22 Elas serão a vida de tua alma e um adorno para teu pescoço. 23 Então caminharás com segurança, sem que o teu pé tropece. 24 Se te deitares, não terás medo. Uma vez deitado, teu sono será doce.

3,18. Árvore de vida: ver Gn 2,9; 3,22. 3,20. Fenderam-se os abismos: para deixar jorrar as fontes. 3,21. Os dois versos foram intervertidos para clareza.

PROVÉRBIOS 3

20

25 Não terás a recear nem terrores repentinos, nem a tempestade que cai sobre os ímpios, 26 porque o Senhor é tua segurança e preservará teu pé de toda cilada.

Atenção ao próximo

27 Não negues um benefício a quem o solicita, quando está em teu poder conceder-lho. 28 Não digas ao teu próximo: “Vai, volta depois! Eu te darei amanhã”, quando dispões de meios. 29 Não maquines o mal contra teu vizinho, quando ele habita com toda a confiança perto de ti. 30 Não litigues com alguém sem ter motivo, se esse alguém não te fez mal algum. 31 Não invejes o homem violento, nem adotes o seu procedimento, 32 porque o Senhor detesta o que procede mal, mas reserva sua intimidade para os homens retos. 33 Sobre a casa do ímpio pesa a maldição divina, a bênção do Senhor repousa sobre a habitação do justo. 34 Se ele escarnece dos zombadores, concede a graça aos humildes.*

3,34. Humildes: trata-se de gente humilde, pobre, sem pretensões, que não é rica por si mesma. É nesse sentido que o Evangelho (Mt 5,3.5) emprega o termo. Texto citado em Tg 4,6; 1Pd 5,5.

PROVÉRBIOS 3

21

35 A glória será o prêmio do sábio, a ignomínia será a herança dos insensatos.

Formação familiar

41 Ouvi, filhos meus, a instrução de um pai;sede atentos, para adquirir a inteligência,

2 porque é sã a doutrina que eu vos dou; não abandoneis o meu ensino. 3 Fui um verdadeiro filho para meu pai, terno e amado junto de minha mãe. 4 Deu-me ele este conselho: “Que teu coração retenha minhas palavras; guarda meus preceitos e viverás. 5 Adquire sabedoria, adquire perspicácia, não te esqueças de nada, não te desvies de meus conselhos. 6 Não abandones a sabedoria, ela te guardará; ama-a, ela te protegerá. 7 Eis o princípio da sabedoria: adquire a sabedoria. Adquire a inteligência em troca de tudo o que possuis. 8 Tem-na em grande estima, ela te exaltará, ela te glorificará quando a abraçares, 9 colocará sobre tua fronte uma graciosa coroa, ela te outorgará um magnífico diadema”.

Dois caminhos

10 Ouve, meu filho, recebe minhas palavras e se multiplicarão os anos de tua vida.

PROVÉRBIOS 4

22

11 É o caminho da sabedoria que te mostro, é pela senda da retidão que eu te guiarei.* 12 Se nela caminhares, teus passos não serão dificultosos; se correres, não tropeçarás. 13 Aferra-te à instrução, não a soltes, guarda-a, porque ela é tua vida. 14 Na estrada dos ímpios não te embrenhes, não sigas pelo caminho dos maus. 15 Evita-o, não passes por ele, desvia-te e toma outro, 16 porque eles não dormiriam sem antes haverem praticado o mal, não conciliariam o sono se não tivessem feito cair alguém, 17 tanto mais que a maldade é o pão que comem, e a violência, o vinho que bebem.* 18 Mas a vereda dos justos é como a aurora, cujo brilho cresce até o dia pleno. 19 A estrada dos iníquos é tenebrosa, não percebem aquilo em que hão de tropeçar.

Primeira exortação do sábio: fugir da companhia dos maus

20 Meu filho, ouve as minhas palavras, inclina teu ouvido aos meus discursos.

4,11. Caminho: o que conduz à sabedoria, ou melhor, onde a sabedoria ensina a caminhar.

4,17. Maldade: literalmente – eles comem o pão da maldade e bebem o vinho da violência.

PROVÉRBIOS 4

23

21 Que eles não se afastem dos teus olhos, conserva-os no íntimo do teu coração, 22 pois são vida para aqueles que os encontram, saúde para todo corpo. 23 Guarda teu coração acima de todas as outras coisas, porque dele brotam todas as fontes da vida.* 24 Preserva tua boca da malignidade, longe de teus lábios a falsidade! 25 Que teus olhos vejam de frente e que tua vista perceba o que há diante de ti! 26 Examina os caminhos onde colocas os pés

e que sejam sempre retos! 27 Não te desvies nem para a direita nem para

a esquerda, e retira teu pé do mal.

51 Meu filho, atende à minha sabedoria,presta atenção à minha razão,

2 a fim de conservares o sentido das coisas e guardares a ciência em teus lábios.

Perigo da mulher leviana

3 Porque os lábios da mulher alheia destilam o mel; seu paladar é mais oleoso que o azeite. 4 No fim, porém, é amarga como o absinto, aguda como a espada de dois gumes.

4,23. Teu coração: o coração é, na Bíblia, considerado como sede da inteli-gência, dos desejos, dos pensamen tos, da vontade, da consciência.

PROVÉRBIOS 5

24

5 Seus pés se encaminham para a morte, seus passos atingem a região dos mortos. 6 Longe de andarem pela vereda da vida, seus passos se extraviam, sem saber para onde. 7 Escutai-me, pois, meus filhos, não vos aparteis das palavras de minha boca. 8 Afasta dela teu caminho, não te aproximes

da porta de sua casa, 9 para que não seja entregue a outros tua fortuna e tua vida a um homem cruel; 10 para que estranhos não se fartem de teus haveres e o fruto de teu trabalho não passe para a casa alheia; 11 para que não gemas no fim, quando forem consumidas tuas carnes e teu corpo 12 e tiveres que dizer: “Por que odiei a disciplina, e meu coração desdenhou a correção? 13 Por que não ouvi a voz de meus mestres, nem dei ouvido aos meus educadores? 14 Por pouco eu chegaria ao cúmulo da desgraça no meio da assembleia do povo”.

Fidelidade à mulher

15 Bebe a água do teu poço e das correntes de tua cisterna.*

5,15. Teu poço: metáfora que designa a mulher legítima.

PROVÉRBIOS 5

25

16 Tuas fontes se derramarão por fora e teus arroios nas ruas? 17 Sejam eles só para ti, sem que os estranhos neles tomem parte. 18 Seja bendita a tua fonte! Regozija-te com a mulher de tua juventude, 19 corça de amor, serva encantadora. Que sejas sempre embriagado com seus encantos e que seus amores te embriaguem sem cessar! 20 Por que hás de te enamorar de uma alheia e abraçar o seio de uma estranha? 21 Pois o Senhor olha os caminhos dos homens e observa todas as suas veredas. 22 O homem será preso por suas próprias faltas e ligado com as cadeias de seu pecado. 23 Perecerá por falta de correção e se desviará pelo excesso de sua loucura.

Fiador

6 1 Meu filho, se ficaste por fiador do teu próximo, se estendeste a mão a um estranho,*

2 se te ligaste com as palavras de teus lábios, se ficaste cativo com a tua própria linguagem, 3 faze, pois, meu filho, o que te digo: livra-te, pois caíste nas mãos do teu próximo; vai, apressa-te, solicita-o com instância,

6,1. O fragmento 6,1-19 não se acha em seu lugar. A sexta exortação recomeçará a partir do v. 20.

PROVÉRBIOS 6

26

4 não concedas sono aos teus olhos, nem repouso às tuas pálpebras. 5 Salva-te como a gazela do caçador, e como o pássaro das mãos do que arma laços.

Preguiça

6 Vai, ó preguiçoso, ter com a formiga, observa seu proceder e torna-te sábio: 7 ela não tem chefe, nem inspetor, nem mestre; 8 prepara no verão sua provisão, apanha no tempo da ceifa sua comida. 9 Até quando, ó preguiçoso, dormirás? Quando te levantarás de teu sono? 10 Um pouco para dormir, outro pouco para dormitar, outro pouco para cruzar as mãos no seu leito, 11 e a indigência virá sobre ti como um ladrão; a pobreza, como um homem armado.

o perverso

12 É um homem perverso, um iníquo aquele que caminha com falsidade na boca; 13 pisca os olhos, bate com o pé, faz sinais com os dedos; 14 só há perversidade em seu coração: não cessa de maquinar o mal, e de semear questões. 15 Por isso, repentinamente, virá sua ruína, de improviso ficará irremediavelmente quebrantado.

PROVÉRBIOS 6

27

sete coisas

16 Seis coisas há que o Senhor odeia e uma sétima que lhe é uma abominação:* 17 olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, 18 um coração que maquina projetos perversos, pés pressurosos em correr ao mal, 19 um falso testemunho que profere mentiras e aquele que semeia discórdias entre irmãos. 20 Guarda, filho meu, os preceitos de teu pai, não desprezes o ensinamento de tua mãe. 21 Traze-os constantemente ligados ao teu coração e presos ao teu pescoço. 22 Eles te servirão de guia ao caminhares, de guarda ao dormires e falarão contigo ao despertares, 23 porque o preceito é uma tocha, o ensinamento é uma luz, a correção e a disciplina são o caminho da vida, 24 para te preservar da mulher corrupta e da língua lisonjeira da estranha. 25 Não cobices sua formosura em teu coração, não te deixes prender por seus olhares; 26 por uma meretriz o homem se reduz a um pedaço de pão,

6,16. Sentença numérica destinada a provocar curiosidade, por sua aparência de enigma. Ver outros exemplos bem parecidos em 30,15-33; Eclo 25,1-4. Essa maneira de falar já se encontra na literatura ugarítica (Fenícia).

PROVÉRBIOS 6

28

e a mulher adúltera arrebata a vida preciosa do homem. 27 Porventura pode alguém esconder fogo em seu seio sem que suas vestes se inflamem? 28 Pode caminhar sobre brasas sem que seus pés se queimem? 29 Assim o que vai para junto da mulher do seu próximo não ficará impune depois de a tocar. 30 Não se despreza o ladrão que furta para satisfazer seu apetite, quando tem fome;* 31 se for preso, restituirá sete vezes mais e entregará todos os bens de sua casa. 32 Quem comete adultério carece de senso, é por sua própria culpa que um homem assim procede. 33 Só encontrará infâmia e ignomínia e seu opróbrio não se apagará, 34 porque o marido, furioso e ciumento, não perdoará no dia da vingança, 35 não se aplacará por resgate algum, nem aceitará nada, se multiplicares os presentes.

o adultério como símbolo da insensatez

7 1 Meu filho, guarda minhas palavras,conserva contigo meus preceitos.

Observa meus mandamentos e viverás.

6,30. O indivíduo que furta por motivo de fome é escusável; contudo, se é pego, está definitivamente arruinado. Quanto, então, não é culpado quem não tem nenhuma escusa!

PROVÉRBIOS 7

29

2 Guarda meus ensinamentos como a pupila de teus olhos. 3 Traze-os ligados aos teus dedos, grava-os em teu coração. 4 Dize à sabedoria: “Tu és minha irmã”, e chama à inteligência “minha amiga”, 5 para que elas te guardem da mulher alheia, da estranha que tem palavras lúbricas. 6 Estava eu atrás da janela de minha casa, olhava por entre as grades. 7 Vi entre os imprudentes, entre os jovens, um adolescente incauto: 8 passava ele na rua perto da morada de uma dessas mulheres e entrava na casa dela. 9 Era ao anoitecer, na hora em que surge a obscuridade da noite. 10 Eis que uma mulher sai-lhe ao encontro, ornada como uma prostituta e o coração dissimulado.* 11 Inquieta e impaciente, seus pés não podem parar em casa; 12 umas vezes na rua, outras na praça, em todos os cantos ela está de emboscada. 13 Abraça o jovem e o beija, e com um semblante descarado diz-lhe: 14 “Tinha que oferecer sacrifícios pacíficos; hoje cumpri meu voto.*

7,10. O coração dissimulado: texto duvidoso. Sugeriu-se a correção: coberta por um véu.

7,14. Sacrifícios pacíficos: eram as vítimas oferecidas em ação de graças em vir-tude de um voto. Fazia-se por costume, no dia mesmo, um grande banquete com as carnes oferecidas. Ver Tb 2,1.

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15 Por isso, saí ao teu encontro para te procurar! E achei-te! 16 Ornei minha cama com tapetes, com estofos recamados de rendas do Egito. 17 Perfumei meu leito com mirra, com aloés e cinamomo. 18 Vem! Embriaguemo-nos de amor até o amanhecer, desfrutemos as delícias da voluptuosidade, 19 pois o marido não está em casa: partiu para uma longa viagem, 20 levou consigo uma bolsa cheia de dinheiro e só voltará lá pela lua cheia”. 21 Seduziu-o à força de palavras e arrastou-o com as lisonjas de seus lábios. 22 Põe-se ele logo a segui-la, como um boi que é levado ao matadouro, como um cervo que se lança nas redes, 23 até que uma flecha lhe traspassa o fígado, como o pássaro que se precipita para o laço sem saber que se trata de um perigo para sua vida. 24 E agora, meus filhos, ouvi-me, prestai atenção às minhas palavras. 25 Que vosso coração não se deixe arrastar para seguir essa mulher, nem vos extravieis em suas veredas, 26 porque numerosos são os feridos por ela e considerável é a multidão de suas vítimas. 27 Sua casa é o caminho da região dos mortos, que conduz às entranhas da morte.

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Discurso da sabedoria

8 1 Porventura não clama a Sabedoriae a inteligência não eleva a sua voz?

2 No cume das montanhas posta-se ela, e nas encruzilhadas dos caminhos. 3 Alça sua voz na entrada das torres, junto às portas, nas proximidades da cidade. 4 “É a vós, ó homens, que eu apelo; minha voz se dirige aos filhos dos homens. 5 Ó simples, aprendei a prudência, adquiri a inteligência, ó insensatos. 6 Prestai atenção, pois! Coisas magníficas vos anuncio, de meus lábios só sairá retidão, 7 porque minha boca proclama a verdade e meus lábios detestam a iniquidade. 8 Todas as palavras de minha boca são justas, nelas nada há de falso nem de tortuoso. 9 São claras para os que as entendem e retas para o que chegou à ciência.* 10 Recebei a instrução e não o dinheiro. Preferi a ciência ao fino ouro, 11 pois a Sabedoria vale mais que as pérolas e joia alguma a pode igualar.

sabedoria personificada

12 Eu, a Sabedoria, sou amiga da prudência, possuo uma ciência profunda.

8,9. Claras: a Sabedoria se justifica por si mesma.

PROVÉRBIOS 8

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13 O temor do Senhor é o ódio ao mal. Orgulho, arrogância, caminho perverso, boca mentirosa: eis o que eu detesto. 14 Meu é o conselho e o bom êxito, minha a inteligência, minha a força.* 15 Por mim reinam os reis e os legisladores decretam a justiça;* 16 por mim governam os magistrados e os magnatas regem a terra. 17 Amo os que me amam. Quem me procura, encontra-me. 18 Comigo estão a riqueza e a glória, os bens duráveis e a justiça. 19 Mais precioso que o mais fino ouro é o meu fruto, meu produto tem mais valor que a mais fina prata. 20 Sigo o caminho da justiça, no meio da senda da equidade. 21 Deixo os meus haveres para os que me amam e acumulo seus tesouros. 22 O Senhor me criou, como primícia de suas obras, desde o princípio, antes do começo da terra.* 23 Desde a eternidade fui formada, antes de suas obras dos tempos antigos. 24 Ainda não havia abismo quando fui concebida, e ainda as fontes das águas não tinham brotado.

8,14. O conselho: o segredo das sábias resoluções. 8,15. Por mim: a sabedoria é a inspiradora dos atos dos príncipes. 8,22. Me criou: pode-se traduzir também – me conquistou, me possuiu.

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