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Curso de Direito Artigo de Revisão Proteção à liberdade do jovem infrator no Brasil: Uma análise Protecting the freedom of the young offender in Brazil: Analysis Roberta Cristina Mattos¹, Kadidja Barros Leadebal² 1 Aluna do curso de Direito 2 Professora Mestra do curso de Direito Resumo O Estatuto da Criança e do Adolescente é tido como uma das legislações mais modernas do mundo, pois trata os jovens por ela tutelados como prioridade absoluta, protegendo a infância e a juventude em diversos aspectos como educação, saúde, lazer, liberdade. Contudo, questiona-se se o tratamento no tocante à liberdade é exacerbado, o que encoraja o jovem infrator a continuar a delinqüir. Assim, o objetivo da pesquisa aqui realizada é analisar minuciosamente se a medida socioeducativa restritiva de liberdade é adequada. Para tanto foi utilizado como material de pesquisa processos judiciais de casos concretos, dados estatísticos e análise doutrinária. O método de análise adotado foi o dedutivo, que parte da premissa maior que é a lei e a garantia estatal, para somente após ser realizada a verificação da proposição particular. Com base nesse método se buscou chegar à precisão do tema proposto. Se depreendeu, como resultado, que a sensação de impunidade impulsiona o jovem infrator a reincidir e continuar a cometer atos em conflito com a lei, ainda que cumpridas as medidas socioeducativas. A par dessa constatação concluiu-se que a privação de liberdade aplicada ao menor é ínfima e por assim ser, ainda que o Estado proporcione alguns mecanismos aptos a ressocializar o menor, o estimula a continuar a delinqüir, o que afasta a intenção e o objetivo legislativo. Palavras chave: Jovem infrator; proteção; liberdade, análise. Abstract The Statute of Children and Adolescents is considered one of the most modern legislation in the world, as it deals with her young wards as an absolute priority, protecting children and youth in various aspects such as education, health, leisure, freedom. However, it is questionable whether treatment with regard to freedom is exacerbated, which encourages young offenders to continue to commit crimes. The objective of the research conducted here is carefully analyzing the socio- educational measures restrictive of freedom is adequate. For that was used as a research lawsuits concrete cases and doctrinal analysis material. The analysis method used was deductive, that part of the major premise is that the law and the state guarante, only for checking the particular proposition after being held. Based on this method we attempted to reach the accuracy of the proposed topic. If surmised, as a result, the sense of impunity drives the young offender to reoffend and continue to commit acts in conflict with the law, yet it fulfills the educational measures. Alongside this observation it was concluded that the deprivation of liberty applied to smaller minuscule and so being, even though the State provides some able to re-socialize the smaller engines , it stimulates continue to commit crimes , which rules out the intent and purpose legislature. Keywords: young offender; protection; freedom; analysis. Contato: [email protected] Introdução Constantemente, surgem grandes debates na sociedade sobre o tema da menoridade no Direito Penal. Além disso, discute-se sobre as penas aplicadas aos infratores de menor idade como forma de educação e igualmente no sentido de punibilidade das condutas reprováveis. Nesse sentido a previsão legal de que o menor somente poderá ficar internado pelo prazo máximo de três anos, consoante artigo 121, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, gera muitas polêmicas, haja vista tamanha desproporcionalidade com a pena aplicada aos adultos, pois podem alcançar até o limite máximo de trinta anos de cumprimento das penas privativas de liberdade conforme prevê o artigo 75 do Código Penal.

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Curso de Direito Artigo de Revisão

Proteção à liberdade do jovem infrator no Brasil: Uma análise

Protecting the freedom of the young offender in Brazil: Analysis

Roberta Cristina Mattos¹, Kadidja Barros Leadebal²

1 Aluna do curso de Direito

2 Professora Mestra do curso de Direito

Resumo O Estatuto da Criança e do Adolescente é tido como uma das legislações mais modernas do mundo, pois trata os jovens por ela tutelados como prioridade absoluta, protegendo a infância e a juventude em diversos aspectos como educação, saúde, lazer, liberdade. Contudo, questiona-se se o tratamento no tocante à liberdade é exacerbado, o que encoraja o jovem infrator a continuar a delinqüir. Assim, o objetivo da pesquisa aqui realizada é analisar minuciosamente se a medida socioeducativa restritiva de liberdade é adequada. Para tanto foi utilizado como material de pesquisa processos judiciais de casos concretos, dados estatísticos e análise doutrinária. O método de análise adotado foi o dedutivo, que parte da premissa maior que é a lei e a garantia estatal, para somente após ser realizada a verificação da proposição particular. Com base nesse método se buscou chegar à precisão do tema proposto. Se depreendeu, como resultado, que a sensação de impunidade impulsiona o jovem infrator a reincidir e continuar a cometer atos em conflito com a lei, ainda que cumpridas as medidas socioeducativas. A par dessa constatação concluiu-se que a privação de liberdade aplicada ao menor é ínfima e por assim ser, ainda que o Estado proporcione alguns mecanismos aptos a ressocializar o menor, o estimula a continuar a delinqüir, o que afasta a intenção e o objetivo legislativo.

Palavras chave: Jovem infrator; proteção; liberdade, análise. Abstract The Statute of Children and Adolescents is considered one of the most modern legislation in the world, as it deals with her young wards as an absolute priority, protecting children and youth in various aspects such as education, health, leisure, freedom. However, it is questionable whether treatment with regard to freedom is exacerbated, which encourages young offenders to continue to commit crimes. The objective of the research conducted here is carefully analyzing the socio-educational measures restrictive of freedom is adequate. For that was used as a research lawsuits concrete cases and doctrinal analysis material. The analysis method used was deductive, that part of the major premise is that the law and the state guarante, only for checking the particular proposition after being held. Based on this method we attempted to reach the accuracy of the proposed topic. If surmised, as a result, the sense of impunity drives the young offender to reoffend and continue to commit acts in conflict with the law, yet it fulfills the educational measures. Alongside this observation it was concluded that the deprivation of liberty applied to smaller minuscule and so being, even though the State provides some able to re-socialize the smaller engines , it stimulates continue to commit crimes , which rules out the intent and purpose legislature. Keywords: young offender; protection; freedom; analysis.

Contato: [email protected]

Introdução Constantemente, surgem grandes

debates na sociedade sobre o tema da menoridade no Direito Penal. Além disso, discute-se sobre as penas aplicadas aos infratores de menor idade como forma de educação e igualmente no sentido de punibilidade das condutas reprováveis.

Nesse sentido a previsão legal de que o menor somente poderá ficar internado pelo prazo máximo de três anos,

consoante artigo 121, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, gera muitas polêmicas, haja vista tamanha desproporcionalidade com a pena aplicada aos adultos, pois podem alcançar até o limite máximo de trinta anos de cumprimento das penas privativas de liberdade conforme prevê o artigo 75 do Código Penal.

Após a publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 13 de julho de1990, surge uma nova vertente de tratamento com relação ao adolescente infrator, uma vez que o menor deixa de ser somente uma preocupação dos pais e da família e passa a ser do Estado e da sociedade, como um todo.

As crianças e adolescentes são prioridade absoluta, sendo certo que são pessoas em fase especial de desenvolvimento. Contudo, a super

proteção à liberdade pode encorajá-lo a delinqüir novamente, ou ainda assumir um crime que não tenha cometido.

Portanto, o cerne do presente Trabalho de Conclusão de Curso é a discussão sobre a proteção à liberdade do jovem infrator no Brasil, que ciente de suas prerrogativas desafia os bons costumes e infringe a lei, como se passa a demonstrar a partir do desenvolvimento.

Desenvolvimento Evolução legal sobre o tema menor infrator

Nas Ordenações Filipinas, ano 1580-1640, a faixa etária para condenação penal era delimitada entre os dezessete e vinte e um anos de idade quando os agentes eram considerados como jovens e adultos.

Contudo, por não ser a temática da menoridade penal alvo de debates a nível mundial, pois não é uma discussão trivial, não há relatos comparativos históricos concretos que possam ensejar uma comparação remota da humanidade.

A primeira vez que se entrou em um consenso a nível global sobre regras mínimas para o tratamento de jovens infratores foi quando promulgada as “Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil”, em 1985. Assim, nessa resolução elencou-se que a idade da imputação de responsabilidade penal seja baseada na maturidade emocional, mental e intelectual do menor, não deixando pré definida nenhuma idade numérica, ficando, portanto, a critério de cada país.

No Brasil, pode-se historicamente relatar que desde o descobrimento do Brasil, nossa pátria se submetia, às leis penais, às normas advindas da Metrópole (com as ordenações afonsinas, manuelinas e filipinas).

Ademais, sob influência da França com o Código Criminal de 1830 o Brasil começa a adotar o entendimento de que menores de quatorze anos não poderiam ser julgados como criminosos. Todavia, se restasse comprovado que atuaram com discernimento poderiam ser recolhidos e privados da liberdade até completarem dezesseis anos.

Após a promulgação da República houve reforma da esfera criminal no Brasil sendo utilizado no território pátrio o Código Penal dos Estados Unidos da América com adaptações no que tange a responsabilização ou não dos maiores de

nove anos e menores de quinze anos. Assim, era feita uma análise individual para apurar se o menor possuía ou não condições psíquicas para ser responsabilizado pelo ato delitivo.

Por conseguinte adveio o Código de Menores, em 12 de outubro de 1927, que impossibilitou por completo a prisão de menores de dezoito anos.

Em 1940 o Código Penal foi criado sendo utilizada a presunção absoluta e legal de que o jovem menor de dezoito anos é incapaz e inconsciente acerca do caráter ilícito da conduta de que possa vir a praticar, o que vigora até hoje em nosso país.

Contemporaneamente, há o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei 8.069/90, que tutela a criança desde o seu nascimento até o alcance da maioridade penal, que é com dezoito anos completos.

Documentos internacionais que reverberam no âmbito nacional

Os Direitos das crianças e dos

adolescentes são alvo de discussão mundial e possuem inúmeros tratados e acordos, sendo ratificados pelo Brasil, que abrangem de forma genérica e específica a tutela dos direitos fundamentais inerentes a pessoa ainda em desenvolvimento.

Dentre eles, de forma genérica, pode ser citado a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica – que versa, nos artigos 4 e 19, sobre a prevenção do direito à vida, desde o momento da concepção não sendo permitida qualquer privação quanto ao direito à vida.

Da mesma forma a Declaração Universal dos Direitos Humanos genericamente preleciona dignidade da pessoa humana, o direito à vida, à liberdade, à justiça social e a paz mundial. Desta forma, os artigos XXV e XXVI, possuem a previsão de que a maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais.

Especificamente o Brasil ratificou a Declaração dos Direitos da Criança em novembro de 1959 que possui princípios que abrangem direito à educação, amor, compreensão, proteção, primeiros socorros, nome, nacionalidade, compreensão e etc.

Por fim é de todo oportuno citar a Declaração Mundial sobre a Sobrevivência, a Proteção e o Desenvolvimento das Crianças nos anos 90 que, sobretudo, deu ênfase ao bem estar das crianças de forma a mover toda a sociedade para trabalhar em prol de benefícios à criança, de forma a estender a responsabilidade estatal e dos pais.

Destarte, verifica-se que existe uma carga mundial e evolutiva de toda a sociedade global no sentido de promover a garantia do direito à dignidade da pessoa humana que reverbera em vários outros direitos e garantias fundamentais das crianças e adolescentes dos quais o Brasil ratificou e se prontificou a aplica-las no âmbito nacional. Definição de criança e adolescente

É na fase da infância que a criança tem o primeiro contato com o meio social, com a educação, que realiza suas primeiras fantasias existenciais através de brincadeiras e no momento da adolescência é que, abandonado a primeira fase existencial, realizam-se descobertas tendo o primeiro contato com os direitos de cidadão.

Nesse sentido e tendo em vista que há uma lei que tutela as fases da vida humana descritas acima é necessário, de início, conceituar criança e adolescente. Pois bem, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente traz a definição no artigo 2º, vejamos:

“Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.”

Desta forma, verifica-se que tanto as crianças como os adolescentes possuem seus direitos tutelados pelo Estado, o que lhes garante amparo legal para o exercício dos direitos fundamentais à saúde, educação, lazer e etc.

A criança e adolescente como cidadãos

É importante esclarecer, igualmente, que não é por serem as crianças e os adolescentes pessoas ainda em

desenvolvimento que serão inferiorizadas ante a sociedade.

Ao revés, pode-se dizer que são tanto cidadãos, indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos, como os adultos, com mais de dezoito anos e que por este motivo suas necessidades e anseios devem ser considerados e atendidos.

Sobre esse tema vejamos trechos do que preleciona o ínclito doutrinador Veronese1:

“todo aquele que tem seus direitos fundamentais protegidos e aplicados, ou seja, aquele que tem condições de atender a todas as suas necessidades básicas, sem as quais seria impossível viver, desenvolver-se e atualizar suas potencialidades enquanto ser humano, isto posto, pode-se dizer que cidadão é quem tem plenas condições de manter a sua própria dignidade.” Dessa forma, temos o rompimento

com a interpretação menorista que inferioriza a criança e o adolescente diante do adulto, maior de dezoito anos, visto que crianças e adolescentes não são objetos e sim uma vida dotada de direitos e garantias fundamentais protegidos pela Carta Magna.

Ato infracional

Comumente alvo de confusão e

distorção pela sociedade o ato infracional se difere de crime previsto no Código Penal com penalidade de restrição de direitos, haja vista que o juízo de reprovação que recai sobre o menor é diferenciado do juízo de reprovação lançado ao maior infrator, uma vez que crianças e adolescentes possuem imaturidade mental, que é um fator determinante de diferenciação.

Contudo, há uma semelhança entre crime com penalidade de restrição de direitos e ato infracional, qual seja só há infração por parte do menor se sua conduta corresponder a uma hipótese prevista legalmente como proibida.

O artigo 103 do Estatuto prevê que:

“Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.”

Portanto, verifica-se que não há dúvidas que os menores de dezoito anos podem praticar crime ou contravenção

1 VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da

criança e do adolescente. São Paulo: LTR, 2009.

penal. Assim, verifica-se que a única diferenciação entre o menor de idade e o adulto nessa esfera é a aplicação da penalidade, tendo em vista que para os maiores de dezoito anos serão apenas e para os menores serão medidas sócio educativas. Princípios que norteiam a proteção à criança e ao adolescente

É sabido que o conhecimento dos princípios em qualquer ramo do Direito é de fundamental importância, haja vista que ainda que se tratem de definições abstratas e genéricas servem de fundamento e de sentido norteador de determinado tema.

Desta forma o estudo da estrutura principiológica da proteção à criança e ao adolescente é absolutamente relevante para a compreensão da essência do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Antes de tratar-se dos princípios em espécie é de todo oportuno ressaltar que esses encontram gênese no princípio da dignidade da pessoa humana que perpassa todo o ordenamento jurídico pátrio.

Posto isso vejamos os princípios em espécie:

i) princípio da proteção integral

Princípio advindo da Carta Magna de

1988 que renegou a antiga visão brasileira de que a criança e o adolescente só precisariam de tutela estatal se estivessem em situação irregular e quando atentavam contra o ordenamento jurídico cometendo atos ilícitos.

Assim, esse princípio da proteção integral visa tratar a criança e o adolescente com respeito, pois são pessoas em desenvolvimento e sujeito de direitos detentores de garantias fundamentais constitucionais.

O ingresso desse princípio em nosso ordenamento jurídico acarretou uma série de mudanças, quais sejam:

i) Caráter de política pública; ii) Fundamento de direito subjetivo; iii) Centralidade de atendimento judiciário municipal; iv) Competência executória local; v) Decisório participativo; vi) Gestão democrática. Contudo, apesar das inovações

supracitadas a sociedade contemporânea ainda não aceita essa postura estatal, haja vista que esse tema ainda é encarado pela sociedade como uma verdadeira utopia, uma vez que é extremamente inovador.

ii) princípio da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento

Expressão que retira a visão do passado das crianças e adolescentes serem como sujeitos pertencentes aos seus pais. Visão essa advinda do Direito Romano que foi recepcionada no Brasil pelo Código Civil de 1916. Essa perspectiva antiga de que os pais eram proprietários dos seus filhos mais tarde se transmudou no instituto do pátrio poder que mais adiante se transformou no conceito de poder familiar.

Todavia, esta expressão da condição peculiar da pessoa em desenvolvimento demonstra que tanto a criança como o adolescente são detentores de direitos, desde que possíveis à idade e compatíveis com o grau de desenvolvimento, e não somente os adultos que atuam como seus responsáveis e em nome dos menores.

Portanto, esse princípio, previsto expressamente no Estatuto da Criança e do Adolescente, no artigo 4º, e igualmente previsto na Constituição Federal de 1988, no artigo 227, dá ênfase à necessidade do merecimento de atenção especial das pessoas de faixa etária inferiores a dezoito anos, visto que são vulneráveis em sua essência e merecem serem salvaguardadas pelo ordenamento jurídico por meio de regime especial que permita o livre desenvolvimento das potencialidades humanas de forma plena.

iii) princípio da intervenção mínima

Princípio reafirmador do caráter fragmentário e subsidiário da esfera penal no Direito, tendo em vista que esse ramo do Direito trata de um bem dos mais importantes inerentes à pessoa humana que é a liberdade. Destarte, por base nesse princípio tem-se que o Estado só deve recorrer ao Direito Penal quando nenhum outro ramo jurídico for suficiente para a solução do conflito.

Esse princípio esta expresso na letra da lei, no artigo 122 caput e §2º do Estatuto, vejamos:

“Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II - por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III - por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

(...) § 2º. Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada.” Dessa forma, assim como o Direito

Penal genérico o Direito Penal juvenil se norteia no sentido da necessidade de serem adotadas medidas judiciais somente quando não houver outro tipo de remédio adequado para a correção dos atos infracionais dos menores.

iv) princípio da proporcionalidade

Este princípio está intrinsecamente

interligado com a aplicação de qualquer medida socioeducativa, haja vista que deve haver equilíbrio entre a aplicação da medida punitiva com o ato de infração cometido pelo menor.

Além do mais, deve ser levado em consideração, igualmente, a capacidade da criança e do adolescente de cumprir a penalidade imposta. Nesse mesmo diapasão coaduna o doutrinador Luiz Antônio Ferreira2 que preleciona:

“A relação de proporcionalidade é aferida por critérios objetivos e subjetivos. A gravidade do delito e as circunstâncias em que foi praticado podem ser avaliadas por meio dos elementos constantes no procedimento investigatório e se apresentam como critérios objetivos às partes e à Autoridade Judiciária. O critério subjetivo dessa relação de proporcionalidade revela-se pela análise da capacidade que o adolescente infrator apresenta para cumprir a medida socioeducativa, sendo que os estudos técnicos ganham extraordinária relevância, a partir do momento em que avaliam a personalidade do infrator, a rede familiar e comunitária na qual está inserido, o seu envolvimento com o ato infracional e os recursos de que dispõe para a sua superação.”

2 FERREIRA, Luiz Antônio. A discricionariedade do juiz na aplicação e execução da medida socioeducativa de internação em estabelecimento educacional, 2008.

Assim, verifica-se que o princípio da proporcionalidade se relaciona com a aplicação de medidas sócio-educativas de forma adequada e compatível com a infração cometida pelo menor, devendo ser a medida harmoniosa com relação ao bem jurídico tutelado pelo Estado.

Critério biológico da inimputabilidade do menor infrator

São três critérios que buscam definir a inimputabilidade:

a) Critério biológico; b) Critério psicológico; c) Critério biopsicológico ou misto Dentre esses três o critério biológico

será o abordado no presente tópico, pois a inimputabilidade das crianças e dos adolescentes não se dá somente pela incapacidade de discernimento que essas pessoas em desenvolvimento apresentam, mas sim e na mesma proporção pela impropriedade de submeter o menor infrator à contaminação carcerária adulta que é comprovadamente falida no tocante a ressocialização.

A esse propósito necessário se faz mencionar o entendimento do eminente Luis Flávio Gomes que preconiza:

“Os dois maiores grupos de criminosos que atualmente aterrorizam as maiores cidades do Brasil nasceram dentro de nossos presídios: O Comando Vermelho, no Rio de Janeiro, RJ, e o Primeiro Comando da Capital, em São Paulo, SP. Isso reforça a ideia da ineficiência dos nossos presídios para a recuperação ou ressocialização dos criminosos.” Portanto, o critério biológico que

impossibilita que menores de dezoito anos respondam por pena de reclusão e de detenção e que da mesma forma evita que a criança e o adolescente sejam inseridos no sistema carcerário adulto não é fundado somente na capacidade cognitiva do menor e sim na possibilidade de se tentar recuperá-los à sociedade de forma saudável, o que seria mais difícil inserindo esses menores em um presídio.

A prática de atos infracionais

Previsto no artigo 103 da Lei 8.069/90 o ato infracionário se conceitua como a conduta prevista como crime ou contravenção penal pelo ordenamento

jurídico quando praticada por menor de dezoito anos.

Os atos infracionais podem ser subdivididos em espécies tais como leves, graves ou gravíssimos, vejamos:

i) Atos infracionais leves: São comparados a infrações penais de menor potencial ofensivo e a crimes de médio potencial ofensivo, como por exemplo: Calúnia, ameaça, difamação, porte de drogas, furto estelionato, receptação, constrangimento ilegal; ii) Atos infracionais graves: São comparados a crimes de maior potencial ofensivo e que envolvem violência, como por exemplo: Tráfico de drogas, furto qualificado; iii) Atos infracionais gravíssimos: São comparados a crimes de maior potencial ofensivo e que envolvem maior grau de violência cuja pena mínima prevista no Código Penal seja superior a um ano, como por exemplo: Roubo, sequestro, estupro, homicídio.

O menor infrator irá ser

responsabilizado conforme a espécie de ato infracional praticado, sendo certo que em hipótese alguma poderá ser a medida socioeducativa mais árdua que a penalização aplicada a um adulto.

Apuração de ato infracional

Consoante ao prelecionado no Estatuto da Criança e do Adolescente a apuração de ato infracional possui uma série de regras e princípios próprios que devem observar o contraditório, ampla defesa e o devido processo legal a favor do menor. Essas regras e princípios encontram-se esculpidos positivamente no Estatuto da Criança e do Adolescente nos artigos 110 e 111 igualmente na Constituição Federal no artigo 5º inciso LIV e LV.

A forma peculiar de apuração de ato infracional dos menores infratores encontra embasamento jurídico igualmente nos princípios da prioridade absoluta e da proteção integral à criança e ao adolescente, visto que o propósito desse procedimento não é a simples aplicação de uma sanção estatal e sim a proteção integral da criança e do adolescente.

Por força dos princípios acima a apuração de ato infracional é um procedimento célere, pois tanto as

investigações policiais quanto a atuação do parquet são rápidas.

A competência jurisdicional é do juiz da Vara da Infância e Juventude do local da ação ou omissão em observação ao previsto nos artigos 227 da Constituição Federal e artigo 4º parágrafo único do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Por fim, para haver imposição de medida sócio educativa, igualmente ao que ocorre na Justiça Penal comum, é necessária a apuração da autoria e da materialidade da infração com a análise perfunctória do conteúdo fático probatório dos autos, que deve dispor de provas idôneas e suficientes aptas a condenar o menor.

Medidas sócio educativas

Elencadas no Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 112 as medidas sócio educativas são uma forma de penalização diferente das previstas no Código Penal, uma vez que possui a finalidade de reeducar os menores infratores e não de puni-los.

Antes de ser aplicado em desfavor do adolescente as medidas sócio educativas deve o jovem infrator ser submetido anteriormente ao devido processo legal, garantia constitucional elencada no artigo 5º da Carta Magna.

O rol das medidas é exaustivo e esta sob a égide do princípio da legalidade. Assim, é impossível a aplicação de qualquer outra medida a não ser as de advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semi-liberdade e internação em estabelecimento educacional.

Vejamos a seguir no que consiste cada uma delas: i) Advertência

É a medida socioeducativa mais branda, vem positivada no artigo 115 do ECA, e possui a finalidade de informar o cometimento de um ato infracional e seu alcance.

A advertência é comumente utilizada para os jovens praticantes de furtos de pequeno valor ou lesões corporais leves.

Essa medida é intimidatória e é realizada por meio da simples leitura do ato infracional e da decisão com os pais e ou responsáveis presentes. ii) Obrigação de reparar o dano

Medida que busca levar o jovem um ensinamento mais severo que o da advertência, visto que faz com que o adolescente perceba o senso de verificação do dano causado, vejamos o que preleciona o artigo 116 do ECA que elenca a modalidade ora comentada:

“Art. 116 − Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser substituída por outra adequada.” Dessa forma, verifica-se que é uma

medida sócio educativa peculiar e que somente é aplicada se houver possibilidade do cumprimento pelo menor infrator, pois deverá ser feita pelo próprio infrator, sob pena de perder a finalidade de sua aplicação. iii) Prestação de serviços à comunidade

Trata-se de uma medida que determina que o menor realiza serviços gratuitos de interesse de toda a comunidade por um lapso temporal que não ultrapasse seis meses.

Prevista no artigo 117 do Estatuto da Criança e do Adolescente a medida poder ser aplicada nas modalidades de serviços a hospitais, escolas, asilos, etc.

As atividades não podem expor o jovem que esta cumprindo-as a situação humilhante ou vexatória e devem ser executadas preferencialmente nos dias de sábado, domingo e feriados para que não atrapalhe os estudos e o trabalho, aos jovens que já exercem atividades laborais.

iv) Liberdade assistida

É a medida a ser cumprida sem restrição de liberdade mais grave, uma vez que possui prazo mínimo para o seu cumprimento, qual seja seis meses.

A medida é prevista no artigo 118 do Estatuto da Criança e do Adolescente, vejamos:

“Art. 118 - A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente. § 1o A autoridade designará pessoa capacitada para acompanhar o

caso, a qual poderá ser recomendada por entidade ou programa de atendimento. § 2o A liberdade assistida será fixada pelo prazo mínimo de seis meses, podendo a qualquer tempo ser prorrogada, revogada ou substituída por outra medida, ouvido o orientador, o Ministério Público e o defensor.” Conforme se verifica no texto legal

o magistrado designará uma pessoa responsável pelo acompanhamento do menor infrator para acompanhá-lo durante o cumprimento da medida, que será chamado de orientador.

Todavia, a medida é bastante criticada, sendo certo que o Estado não possui meios e instalações para a sua adequada realização.

v) Regime de semiliberdade Penalidade que pode durar até três

anos e que pode ser instituída tanto de início quanto posteriormente, como meio de progressão de transição de regime mais grave para um mais tênue.

Elencada no artigo 120 do ECA essa consiste na realização de atividades externas a favor da comunidade, sendo impreterível a escolarização e a profissionalização do jovem. vi) Internação

É a mais grave das medidas socioeducativas, pois consiste em internação juvenil, prevista nos artigos 121, 122 e 123 do Estatuto da Criança e do adolescente.

Essa medida é cumprida no menor lapso temporal possível, tendo em vista que retira do menor infrator o direito constitucional a liberdade, vejamos o inteiro teor do prevista na lei 8.069/1990:

“Art. 121 - A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. § 1o Será permitida a realização de atividades externas, a critério da equipe técnica da entidade, salvo expressa determinação judicial em contrário. § 2o A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses. § 3o

Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. § 4o Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5o A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade. § 6o Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de autorização judicial, ouvido o Ministério Público. Art. 122 − A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I – Tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III – Por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. § 1º O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser superior a três meses. § 2º Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida adequada. Art. 123 - A internação deverá ser cumprida em entidade exclusiva para adolescentes, em local distinto daquele destinado ao abrigo, obedecida rigorosa separação por critérios de idade, compleição física e gravidade da infração. Parágrafo único. Durante o período de internação, inclusive provisória, serão obrigatórias atividades pedagógicas”. Por ser a medida socioeducativa

mais gravosa o legislador determinou como requisito para seu cumprimento a garantia da dignidade do infrator, que o cumprimento ocorresse em entidades exclusivas e o prazo de três meses para a aplicação em detrimento do jovem infrator. vii) Remissão

É utilizada como forma de exclusão do processo que deve ser aplicada atendidos os requisitos da análise de personalidade do adolescente infrator, a participação no ato infracional do menor e analisadas as conseqüências do ato praticado.

Elencado no artigo 126 e 127 do Estatuto da criança e do adolescente servem como forma de perdão judicial,

devendo ser levado em consideração para a sua concessão os requisitos de natureza objetiva e subjetiva contida nos artigos.

Análise de casos concretos

Analisando casos concretos de menores infratores submetidos à Análise do Poder Judiciário ao juiz de primeira instância do Estado de Alagoas verifica-se que os menores infratores cometem infrações análogas a crimes cometidos por adultos, dentre eles porte ilegal de arma, tráfico de drogas e furto.

Contudo, verificando os autos – a saber: processos de conhecimento de nº 970-04.2014.8.02.0058, 4974-84.2014.8.02.0058 e 365-07.2014.8.02.0058 – em todos o Ministério Público, ao fazer a análise jurídica dos autos, concedeu remissão, como forma de exclusão do processo.

Ao julgar os feitos o juiz posteriormente homologou a remissão com fundamento no artigo 181§1º da Lei 8.069/1990 aplicando a medida sócio educativa de liberdade assistida pelo prazo de seis meses.

Extraiu-se dos autos como forma de acompanhamento social após o julgamento e o trânsito em julgado dos processos somente um relatório que foi elaborado pelo Ministério Público após seis meses de cumprimento das referidas medidas aplicadas aos infratores menores de idade.

A reincidência da delinqüência juvenil posteriormente a aplicação das medidas socioeducativas

Conforme dados estatísticos colhidos do Conselho Nacional de Justiça3, no ano de 2013, dez a cada cinco adolescentes menores infratores voltam a delinqüir após a aplicação de medida sócio educativa.

Vejamos outras pesquisas realizadas pelo Poder Judiciário

- Apuração do Poder Judiciário de Mato Grosso, no ano de 2013 em Cuiabá, mostra que 71% dos jovens em conflito com a lei voltam a praticar atos infracionais mesmo depois de ter cumprido medidas socioeducativas.

3 Conselho Nacional de Justiça – Estatística sobre a reincidência dos menores infratores – Link: http://www.cnj.jus.br/noticias/judiciario/25684:mesmo-apos-medidas-socioeducativas-menores-voltam-ao-crime

- Polícia Judiciária Civil, no primeiro semestre do ano de 2013, concluiu que altos índices de reincidência, demonstrando a pesquisa que a cada 10 menores apreendidos, seis são reincidentes, o que mostra que 60% voltam a delinqüir.

Evidencia-se com os dados arrolados pelas pesquisas que os menores infratores não estão sendo ressocializados, como é o objetivo do Estatuto da Criança e do Adolescente, haja vista que mais da metade dos jovens queda novamente na prática de atos infracionais.

Todavia, é importante registrar que esses dados estatísticos são resultados de uma cadeia de acontecimentos desfavoráveis à recuperação juvenil, quais sejam precariedade da estrutura socioeducativa, abandono do ambiente escolar, condição social, etc.

Por fim, sabe-se que alguns casos já foram apreciados pelos Tribunais Superiores que ao julgar o caso concreto de reincidência aplicou medida sócio educativa mais severa à anteriormente cumprida, vejamos:

“ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO. INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO. EXCESSO DE PRAZO. ART. 108, DO ECA. PEDIDO PARA AGUARDAR EM LIBERDADE O JULGAMENTO DO RECURSO. ‘REINCIDENTE’. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. O ato infracional equiparado ao delito de roubo, em tese, comporta a aplicação da internação, pois amolda-se ao enunciado do inciso I do artigo 122 do ECA (ato cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa). O art. 108 do ECA, ao estabelecer o prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) de internação provisória, reporta-se, quanto ao marco temporal, à prolatação da sentença, e não ao trânsito em julgado desta. Inexiste constrangimento ilegal no ato judicial que determina, ao adolescente reincidente com passagem anterior por ato infracional equiparado ao crime de roubo, a internação provisória como garantia da ordem pública.

ORDEM DENEGADA.”4 (Grifo nosso) No caso supracitado verificou-se a

alegação por parte do menor infrator de que submetê-lo à internação provisória seria constrangimento ilegal. Porém, a tese recursal não foi acolhida pela Corte Superior sendo aplicada a pena mais grave com a finalidade de assegurar a ordem pública.

Redução da maioridade penal

Tema debatido há anos como forma de resolução da criminalidade que somente aumenta e como forma de tranqüilizar a população. Matéria bastante discutida no mundo jurídico, igualmente, uma vez que uma parte da doutrina entende que a inimputabilidade penal é uma espécie de garantia individual e que por este motivo estaria protegida pelo véu da imutabilidade constitucional, como preleciona o artigo 60,§ 4º, IV da Constituição Federal.

A propósito: “A menoridade de dezoito anos acarreta a inimputabilidade por imaturidade natural, o que é reafirmado pela presunção penal, na qual, por motivos de questões de política criminal, entendeu o legislador brasileiro que não gozam de plena capacidade de entendimento que lhe permita imputar a prática de um fato típico e ilícito.”5 Todavia, muito se debate, pelos

juristas que entendem a contrário senso, que durante toda a história do Brasil há registros de que houve constantes variações quanto a forma de tratamento dada aos jovens infratores, com o fulcro nas transformações da sociedade e na constante evolução do ser humano.

Nesse sentido, veja-se o que prediz Mariana Moura Rocha6 em recente entrevista dada a revista jurídica Consulex:

4 HC 41.014/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 20/06/2005, p. 382

5 LEITE, Gisele. Juris Plenum, Maioridade Penal –

Considerações Jurídicas. V. 10, n. 55, jan. 2014, p. 119.

6 ROCHA, Mariana Moura. Consulex: Revista Jurídica, A redução da maioridade sob a ótica da

“Embora a criminalidade juvenil seja um sério problema a ser observado (e que vem sendo tratado com descaso há décadas pelo Poder Público, haja vista as condições das entidades de atendimento ao jovem infrator), não podemos deixar de observar que o clamor pela redução da maioridade penal ignora questões gravíssimas, dentre elas a deficiência das políticas públicas.” A temática aqui levantada à

discussão é de extrema importância, haja vista que o problema de violência atinge a todos, sem distinção. Vê-se constantemente que cada vez mais cedo os menores ingressam na criminalidade, pois não raras as vezes sabem ser inimputáveis, o que os encorajam a cometerem delitos ou ainda assumirem crimes de alto escalão.

Privar o menor infrator da liberdade resolveria?

Muito se discute, como visto acima, sobre a redução da maioridade penal no Brasil. Contudo, indaga-se se essa seria a solução. A restrição da liberdade reeduca?

Sobre o tema nos obtempera o doutrinador Cavallieri7:

“Ninguém, em boa fé, afirmaria que os presos estão sendo recuperados e até já se tornou um chavão dizer que as cadeias são escolas que aperfeiçoam o criminoso. (...) Se a cadeia não está cumprindo sua missão, por que levar mais alguém para dentro dela? Consideremos que, de cada cem menores presos, cerca de 70 têm idade entre 16 e 18 anos. Como 80% de seus crimes são contra o patrimônio, calcule-se quantidade de jovens que aumentaria a superlotação das penitenciárias.” Assim, verifica-se que somente

prender o jovem infrator juntamente com os adultos, submetendo os adolescentes ao mesmo tratamento não seria a solução

crise no sistema penal. V. 18, n. 408, p. 62, jan. 2014.

7 CAVALLIERI, Alyrio. Idade da Responsabilidade penal. Belo Horizonte : Del Rey, 2003, p. 7/8.

para resolver o problema da delinqüência juvenil. Dados estatísticos

8 sobre a situação das

medidas socioeducativas i) Perfil dos adolescentes

Quanto a esse tópico os dados estatísticos foram baseados em entrevista com 1.898 (mil oitocentos e noventa e oito) adolescentes.

O escopo foi analisar a idade média dos menores infratores, a faixa etária das crianças ou adolescentes quando do primeiro ato infracional por região, o motivo da atual internação por região, a quantidade percentual de reincidência dos adolescentes por região, o ato infracional cometido na primeira internação dos adolescentes reincidentes por região, a gravidade dos atos infracionais cometidos por adolescentes reincidentes por região – comparando a primeira internação com a atual, a alfabetização dos adolescentes entrevistados por região, a média de idade em que o adolescente interrompeu os estudos por região.

ii) Dados externos que ajudaram o adolescente a delinqüir

Dos 1.898 (mil oitocentos e

noventa e oito) adolescentes entrevistados foi verificado igualmente os dados externos que contribuíram para sua delinquência e para a reincidência.

Os quesitos externos avaliados pela pesquisa foram:

a) Quanto a família: Responsáveis pela criação dos adolescentes em conflito com a lei em âmbito nacional; b) Relação com entorpecentes: Uso de drogas por adolescente em cumprimento de medidas socioeducativas por região, tipo de droga utilizada por adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas por região.

8 PANORAMA NACIONAL – A EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO. 2012. Brasília. Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2012. Em: http://www.cnj.jus.br/images/programas/justica-ao-jovem/panorama_nacional_justica_ao_jovem.pdf

iii) Perfil processual

9

Foram analisados 14.613 processos

em fase de execução de medida socioeducativa. Dentre os processos analisados podem haver a apreciação de mais de um ato infracional cometido pelo mesmo adolescente.

Dentre os quesitos analisados nos autos foram observadas a faixa etária, a distribuição por faixa etária dos adolescentes nos processos analisados, historio de evasão por adolescente registrado nos processos por região, tipo de internação dos adolescentes registrado nos processos por região, tipos de atos infracionais cometidos pelos adolescentes registrados nos processos por região e o registro de reincidência nos autos.

Gráficos

9 PANORAMA NACIONAL – A EXECUÇÃO DAS

MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO. 2012. Brasília. Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2012. Em: http://www.cnj.jus.br/images/programas/justica-ao-jovem/panorama_nacional_justica_ao_jovem.pdf

Possibilidade de ressocialização do menor infrator

O principal objetivo da medida

socioeducativa de privação de liberdade é a ressocialização do menor infrator, uma vez que o período de internação deverá preparar e garantir que o jovem em conflito com a lei seja reinserido no convívio social.

Para tanto o Brasil, sob os ditames da ONU 10 auxilia a volta à sociedade, ao contato com a família, à educação e à vida profissional.

Pedagogicamente o jovem deveria ser auxiliado pelo Estado, consoante prevê o artigo 123 do Estatuto da Criança e do adolescente, devendo ser oferecido ao menor atividades pedagógicas no período de internação.

Contudo, consoante dados fornecidos pelo instituto de pesquisa do Conselho Nacional de Justiça, ainda que as referidas atividades pedagógicas sejam consideradas fundamentais pelo legislador para a ressocilização cerca de 12% dos estabelecimentos do país não oferece nenhum auxílio ao aprendizado.

Porém, é importante registrar com fundamento na mesma pesquisa que cerca de 61% da totalidade dos estabelecimentos que trabalham com a ressocialização dos menores garantem o direito de ingresso em atividades pedagógicas durante o cumprimento da medida socioeducativa.

Assim, depreende-se que o Estado se preocupa com a reintegração do jovem em conflito com a lei na sociedade de modo que mais da metade dos estabelecimentos oferecem cursos voltados para essa finalidade, o que, todavia, ainda carece de melhoras, pois o ideal seria que todos os locais de tratamento pudessem oferecer essa espécie de tratamento.

Discussão

Discute-se no presente Trabalho de Conclusão de Curso se o tratamento no tocante à liberdade é exacerbado, o que encoraja o jovem infrator a continuar a delinqüir.

Com a análise do pesquisado verificou-se que o prazo máximo para a privação de liberdade do jovem infrator é somente de três anos, o que cabalmente o influencia a continuar a delinqüir,

10

Organização das Nações Unidas para a Proteção de

Jovens Privados de Liberdade - 1990

reincidindo muitas vezes, como verificado nas estatísticas colacionadas.

Contrastando a literatura com os dados dos casos concretos e os resultados colhidos dos gráficos estatísticos demonstrou-se que a intenção legislativa não é eficaz, pois os jovens se sentem cada vez mais encorajados a pratica de atos infracionais equiparados a crimes, como se adultos fossem. O método utilizado no presente trabalho, o dedutivo, permitiu a comparação da lei e a garantia estatal, para somente após ser realizada a verificação da proposição particular.

Contudo, o trabalho é limitado somente aos dados publicados, doutrinas e a apreciação do previsto em lei. Os dados colhidos diretamente da fonte, mais próximos da realidade atual, pois se tratam de processos que transitaram em julgado em julho de 2014, foram os dos autos analisados.

Assim, vê-se que a pesquisa pode contribuir para um aprofundamento no tema da proteção à liberdade do jovem infrator no Brasil, tendo em vista que inferiu-se que esta é exacerbada o que impulsiona o jovem a continuar a cometer atos em conflito com a lei. Conclusão Concluiu-se com a perfunctória análise da problemática como um todo, leia-se: Verificação da lei, doutrina e casos concretos, que o caso merece mais atenção para se evitar a piora do quadro aqui apresentado, pois os jovens continuam a delinqüir após a aplicação das medidas socioeducativas. Como resultado da análise dos gráficos verificou-se que os adolescentes de 15 a 17 anos são os que mais delinqüem, crimes contra o patrimônio são os mais praticados, em segundo lugar o roubo seguido de morte e em terceiro tráfico de drogas. Depreendeu-se igualmente da análise do trabalho que a região nordeste é a que mais tem registro de reincidência, que em media 80% dos jovens infratores de todo o pais são alfabetizados, em média, em todo o país os jovens infratores largam os estudos a partir dos 13 anos, que a maioria dos jovens em conflito com a lei são criados somente pela mãe, que o centro oeste é a região do pais que alcança mais níveis de uso de drogas pelos menores infratores e que a maioria dos jovens em todo o país recebem a medida de internação definitiva ao invés das demais formas previstas em lei. Além do mais verificou-se que há defasagem da garantia do direito de

ingresso em atividades pedagógicas durante o cumprimento da medida socioeducativas o que dificulta ainda mais o reingresso do menor delinqüente na sociedade. Portanto, conclui-se quanto a liberdade dos jovens em conflito com a lei que a redução da maioridade penal não seria a solução. Contudo, o aumento da medida socioeducativa que restringe a liberdade seria uma solução plausível, visto que o prazo máximo de somente três anos impulsiona o jovem a reincidir na prática de atos infracionais.

Agradecimentos

Primeiramente, agradeço a Deus pela conclusão do trabalho e do curso de Direito, agradeço também ao meu marido Nelson, que amo muito, aos meus filhos, que me acalmavam nas horas tensas,aos meus sogros que me apoiaram e a minha mãe que é tudo para mim.

Referências bibliográficas

1- BRASIL. Código de Processo Penal – Decreto Lei no 3.689, de 03 de outubro de 1941 – Edição federal. Rio de Janeiro, 1941.

2- BRASIL. Código Penal Brasileiro. Decreto – lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Rio de Janeiro/RJ,1940.

3- BRASIL. Constituição ( 1988 ). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.

4 - CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 16. Ed. Ver. E ampl. São Paulo: Saraiva 2014.

5- CAVALLIERI, Alyrio. Idade da Responsabilidade penal. Belo Horizonte : Del Rey, 2003, p. 7/8.

6- Conselho Nacional de Justiça – Estatística sobre a reincidência dos menores infratores – Link: http://www.cnj.jus.br/noticias/judiciario/25684:mesmo-apos-medidas-socioeducativas-menores-voltam-ao-crime

7- FERREIRA, Luiz Antônio. A discricionariedade do juiz na aplicação e execução da medida socioeducativa de internação em estabelecimento educacional, 2008.

8- GOMES, Luiz Flávio. Redução da maioridade penal. Jus navigandi, Teresina, ano 11, n. 1338, 1 mar. 2007. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/9552

9- HC 41.014/SP, Rel. Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 20/06/2005, p. 382.

10- LEITE, Gisele. Juris Plenum, Maioridade Penal – Considerações Jurídicas. V. 10, n. 55, jan. 2014, p. 119.

11- Organização das Nações Unidas para a Proteção de Jovens Privados de Liberdade - 1990

12- PANORAMA NACIONAL – A EXECUÇÃO DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE INTERNAÇÃO. 2012. Brasília. Conselho Nacional de Justiça. Brasília: CNJ, 2012. Em: www.cnj.jus.br/images/programas/justica-ao jovem/panorama_nacional_justica_ao_jovem.pdf

13- ROCHA, Mariana Moura. Consulex: Revista Jurídica, A redução da maioridade sob a ótica da crise no sistema penal. V. 18, n. 408, p. 62, jan. 2014.

14- VERONESE, Josiane Rose Petry. Os direitos da criança e do adolescente. São Paulo: LTR, 2009.