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SERMAIS “EU QUERO, AGORA!” Todos nós conhecemos crianças que não hesitam em transformar em lei seus desejos e caprichos. De forma imperava, decretam: “Eu quero, agora!”, demonstrando, assim, dificuldade em se colocar no lugar do outro, autorregulação, controle das emoções e baixa tolerância à frustração. Escolhem o que comer, ou o que não comer, se querem ou não realizar tarefas, tomar banho, o que vesr, quando dormir... Se e quando contraria- das, reagem de maneira agressiva, seja com empurrões, mordidas, chutes, pontapés ou puxões de cabelo. A agressividade é um comportamento que, segundo Winnico (2005), está associada a uma perda que gera uma frustração. Diz o autor que os comportamentos agressivos são inatos, coexistentes com o amor. A agressi- vidade é um sintoma de medo que faz com que as pessoas tomem atudes para que as outras a notem ou que diminuam a frustração que sentem. Ainda, segundo Winnico (2005), as crianças buscam relação de confiança com o ambiente e com aqueles que estão em sua volta, principalmente a família. Porém, quando o ambiente fracassa e não dá força ao ego, desen- cadeia-se um comportamento agressivo, apelo emido pela criança para que suas necessidades sejam atendi- das, como a de ser amada e contar com as outras pessoas que estão ao seu redor. No passado, as crianças nham passagem breve e insignificante pela família e pela sociedade e eram conside- radas como adultos em miniatura. De forma lenta e gradual, a sociedade percebeu que a infância merecia maior atenção, o que levou a uma descoberta gradava de sua estrutura sica, de sua linguagem e de suas peculiaridades. A parr do século XX, ocorre uma grande virada no pensamento cienfico e filosófico, marcada principalmente pelos estudos de Freud, que enfazou a importância da infância, afirmando que muitas das neuroses nham origem em traumas ocorridos nessa fase. A criança realmente se torna o centro das atenções, o principal movo pelo qual os pais enfrentam jornadas de trabalho intensas e sacrificantes, que, muitas vezes, os obrigam a passar pouco tempo com sua prole. Com o objevo de “dar o melhor” para os filhos, hoje, os casais optam por terem poucos filhos e mantém a agenda da criança cheia, preenchida com as mais diferentes avidades. Se, no passado, não nham visibilidade, hoje, as crianças conquistaram leis de proteção, adquiriram vez e voz, parcipando, avamente, das avidades e, através do diálogo, consensualmente, das decisões familiares.

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Page 1: Projeto Ser Mais - PDF - campusvilla.com.br · WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005. “EU QUERO, AGORA!” Todos nós conhecemos crianças

SERMAIS

“EU QUERO, AGORA!”

Todos nós conhecemos crianças que não hesitam em transformar em lei seus desejos e caprichos. De forma

imperativa, decretam: “Eu quero, agora!”, demonstrando, assim, dificuldade em se colocar no lugar do outro,

autorregulação, controle das emoções e baixa tolerância à frustração. Escolhem o que comer, ou o que não

comer, se querem ou não realizar tarefas, tomar banho, o que vestir, quando dormir... Se e quando contraria-

das, reagem de maneira agressiva, seja com empurrões, mordidas, chutes, pontapés ou puxões de cabelo.

A agressividade é um comportamento que, segundo Winnicott (2005), está associada a uma perda que gera

uma frustração. Diz o autor que os comportamentos agressivos são inatos, coexistentes com o amor. A agressi-

vidade é um sintoma de medo que faz com que as pessoas tomem atitudes para que as outras a notem ou que

diminuam a frustração que sentem.

Ainda, segundo Winnicott (2005), as crianças buscam relação de confiança com o ambiente e com aqueles que

estão em sua volta, principalmente a família. Porém, quando o ambiente fracassa e não dá força ao ego, desen-

cadeia-se um comportamento agressivo, apelo emitido pela criança para que suas necessidades sejam atendi-

das, como a de ser amada e contar com as outras pessoas que estão ao seu redor.

No passado, as crianças tinham passagem breve e insignificante pela família e pela sociedade e eram conside-

radas como adultos em miniatura. De forma lenta e gradual, a sociedade percebeu que a infância merecia

maior atenção, o que levou a uma descoberta gradativa de sua estrutura física, de sua linguagem e de suas

peculiaridades.

A partir do século XX, ocorre uma grande virada no pensamento científico e filosófico, marcada principalmente

pelos estudos de Freud, que enfatizou a importância da infância, afirmando que muitas das neuroses tinham

origem em traumas ocorridos nessa fase.

A criança realmente se torna o centro das atenções, o principal motivo pelo qual os pais enfrentam jornadas

de trabalho intensas e sacrificantes, que, muitas vezes, os obrigam a passar pouco tempo com sua prole. Com

o objetivo de “dar o melhor” para os filhos, hoje, os casais optam por terem poucos filhos e mantém a agenda

da criança cheia, preenchida com as mais diferentes atividades.

Se, no passado, não tinham visibilidade, hoje, as crianças conquistaram leis de proteção, adquiriram vez e voz,

participando, ativamente, das atividades e, através do diálogo, consensualmente, das decisões familiares.

O grande problema é que passamos de um extremo ao outro: da infância que sofreu com o anonimato e a

rigidez do passado àquela que agora ocupa o papel de centro da vida dos casais, que, mais sensíveis às necessi-

dades das crianças e com intenso sentimento de culpa, procuram compensar a sua ausência com mimos

desnecessários, tendo dificuldade extrema de exercer autoridade, tão necessária, estruturante e legítima para

o bem-estar e desenvolvimento saudável da criança.

Imersos em um verdadeiro dilema sociocultural, pais e educadores ficam, muitas vezes, inertes à crescente

onda de adultização precoce e ao apelo excessivo para o consumo. O mercado consumidor agora enxerga a

criança como potente consumidora, ficando ela exposta a variados e nefastos estímulos e influências midiáti-

cas. Ao mesmo tempo e paradoxalmente, reage, com ações que prolongam de forma exagerada esse período,

superprotegendo meninos e meninas e satisfazendo todas as vontades.

A escola, na maioria das vezes, é quem recebe diferentes crianças com as mais variadas características, sujeitas

às regras diferentes das validadas em suas famílias, regras próprias para o funcionamento da instituição. Esse é

o primeiro local onde são exteriorizados os comportamentos agressivos, acompanhados de acessos de raiva,

comportamento opositor e desafiador.

Dentro ou fora de suas salas de aula, professores e professoras, solitariamente, muitas vezes, incompreendidos

e repreendidos, labutam com a tarefa de educar e promover para as crianças a oportunidade de vivenciar

pequenas frustrações, aprendendo a suportá-las e superá-las.

Como as crianças ingressam cada vez mais cedo na escola, é preciso admitir que família e escola exercem papel

preponderante na construção dos limites. La Taille (1995) observa que a escola completa a socialização que

começa no ambiente familiar, onde a criança tem o primeiro contato com o mundo das regras e dos valores.

Para o autor, a escola, por se constituir em importante espaço para trocas sociais, deve preparar os alunos para

o convívio, para a adaptação ao espaço público e para o exercício da cidadania. Porém, família e escola têm

papéis diferenciados e complementares no desenvolvimento moral das crianças.

Educar e ser consistente na educação não são tarefas fáceis, pois requerem atenção redobrada, dedicação

constante e esforço, muito esforço. É um constante ir e vir, de ouvir, calar e falar sem medo de magoar ou

decepcionar o outro. Crianças precisam de regras e limites que, na maioria das vezes, são inegociáveis, para

entender que, muitas vezes, não terão o que desejam, convivendo, dessa maneira, com a frustração do não

poder.

A única coisa que, realmente, faz uma criança sofrer é a falta de amor, o desamor, não se sentir querida, prote-

gida e pertencente. Como escreveu Hannah Arendt, o que ela precisa mesmo é “de um abrigo seguro para cres-

cer”.

Portanto, lembre-se disto: Se não somos felizes com o que temos, também não seremos com o que nos falta,

pois o verdadeiro valor e a melhor recompensa estão naquilo que pertence à nossa essência e que se guarda no

armário do nosso coração.

Autor desconhecido

REFERÊNCIAS

LA TAILLE, Y. (1995). Educação moral: família e escola. Dois pontos, 3(11), 99-94.

LA TAILLE, Y. (1996). A indisciplina e o sentimento de vergonha. Em J. C. Aquino (Org.), Indisciplina na escola: alternati-

vas teóricas e práticas (p. 09-24). São Paulo: Summus.

LA TAILLE, Y. (1999). Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ática.

LA TAILLE, Y. (2001). Desenvolvimento moral: a polidez segundo as crianças. Cadernos de Pesquisa, 114, 89-119.

WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005.

Page 2: Projeto Ser Mais - PDF - campusvilla.com.br · WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005. “EU QUERO, AGORA!” Todos nós conhecemos crianças

“EU QUERO, AGORA!”

Todos nós conhecemos crianças que não hesitam em transformar em lei seus desejos e caprichos. De forma

imperativa, decretam: “Eu quero, agora!”, demonstrando, assim, dificuldade em se colocar no lugar do outro,

autorregulação, controle das emoções e baixa tolerância à frustração. Escolhem o que comer, ou o que não

comer, se querem ou não realizar tarefas, tomar banho, o que vestir, quando dormir... Se e quando contraria-

das, reagem de maneira agressiva, seja com empurrões, mordidas, chutes, pontapés ou puxões de cabelo.

A agressividade é um comportamento que, segundo Winnicott (2005), está associada a uma perda que gera

uma frustração. Diz o autor que os comportamentos agressivos são inatos, coexistentes com o amor. A agressi-

vidade é um sintoma de medo que faz com que as pessoas tomem atitudes para que as outras a notem ou que

diminuam a frustração que sentem.

Ainda, segundo Winnicott (2005), as crianças buscam relação de confiança com o ambiente e com aqueles que

estão em sua volta, principalmente a família. Porém, quando o ambiente fracassa e não dá força ao ego, desen-

cadeia-se um comportamento agressivo, apelo emitido pela criança para que suas necessidades sejam atendi-

das, como a de ser amada e contar com as outras pessoas que estão ao seu redor.

No passado, as crianças tinham passagem breve e insignificante pela família e pela sociedade e eram conside-

radas como adultos em miniatura. De forma lenta e gradual, a sociedade percebeu que a infância merecia

maior atenção, o que levou a uma descoberta gradativa de sua estrutura física, de sua linguagem e de suas

peculiaridades.

A partir do século XX, ocorre uma grande virada no pensamento científico e filosófico, marcada principalmente

pelos estudos de Freud, que enfatizou a importância da infância, afirmando que muitas das neuroses tinham

origem em traumas ocorridos nessa fase.

A criança realmente se torna o centro das atenções, o principal motivo pelo qual os pais enfrentam jornadas

de trabalho intensas e sacrificantes, que, muitas vezes, os obrigam a passar pouco tempo com sua prole. Com

o objetivo de “dar o melhor” para os filhos, hoje, os casais optam por terem poucos filhos e mantém a agenda

da criança cheia, preenchida com as mais diferentes atividades.

Se, no passado, não tinham visibilidade, hoje, as crianças conquistaram leis de proteção, adquiriram vez e voz,

participando, ativamente, das atividades e, através do diálogo, consensualmente, das decisões familiares.

O grande problema é que passamos de um extremo ao outro: da infância que sofreu com o anonimato e a

rigidez do passado àquela que agora ocupa o papel de centro da vida dos casais, que, mais sensíveis às necessi-

dades das crianças e com intenso sentimento de culpa, procuram compensar a sua ausência com mimos

desnecessários, tendo dificuldade extrema de exercer autoridade, tão necessária, estruturante e legítima para

o bem-estar e desenvolvimento saudável da criança.

Imersos em um verdadeiro dilema sociocultural, pais e educadores ficam, muitas vezes, inertes à crescente

onda de adultização precoce e ao apelo excessivo para o consumo. O mercado consumidor agora enxerga a

criança como potente consumidora, ficando ela exposta a variados e nefastos estímulos e influências midiáti-

cas. Ao mesmo tempo e paradoxalmente, reage, com ações que prolongam de forma exagerada esse período,

superprotegendo meninos e meninas e satisfazendo todas as vontades.

A escola, na maioria das vezes, é quem recebe diferentes crianças com as mais variadas características, sujeitas

às regras diferentes das validadas em suas famílias, regras próprias para o funcionamento da instituição. Esse é

o primeiro local onde são exteriorizados os comportamentos agressivos, acompanhados de acessos de raiva,

comportamento opositor e desafiador.

Dentro ou fora de suas salas de aula, professores e professoras, solitariamente, muitas vezes, incompreendidos

e repreendidos, labutam com a tarefa de educar e promover para as crianças a oportunidade de vivenciar

pequenas frustrações, aprendendo a suportá-las e superá-las.

Como as crianças ingressam cada vez mais cedo na escola, é preciso admitir que família e escola exercem papel

preponderante na construção dos limites. La Taille (1995) observa que a escola completa a socialização que

começa no ambiente familiar, onde a criança tem o primeiro contato com o mundo das regras e dos valores.

Para o autor, a escola, por se constituir em importante espaço para trocas sociais, deve preparar os alunos para

o convívio, para a adaptação ao espaço público e para o exercício da cidadania. Porém, família e escola têm

papéis diferenciados e complementares no desenvolvimento moral das crianças.

Educar e ser consistente na educação não são tarefas fáceis, pois requerem atenção redobrada, dedicação

constante e esforço, muito esforço. É um constante ir e vir, de ouvir, calar e falar sem medo de magoar ou

decepcionar o outro. Crianças precisam de regras e limites que, na maioria das vezes, são inegociáveis, para

entender que, muitas vezes, não terão o que desejam, convivendo, dessa maneira, com a frustração do não

poder.

A única coisa que, realmente, faz uma criança sofrer é a falta de amor, o desamor, não se sentir querida, prote-

gida e pertencente. Como escreveu Hannah Arendt, o que ela precisa mesmo é “de um abrigo seguro para cres-

cer”.

Portanto, lembre-se disto: Se não somos felizes com o que temos, também não seremos com o que nos falta,

pois o verdadeiro valor e a melhor recompensa estão naquilo que pertence à nossa essência e que se guarda no

armário do nosso coração.

Autor desconhecido

REFERÊNCIAS

LA TAILLE, Y. (1995). Educação moral: família e escola. Dois pontos, 3(11), 99-94.

LA TAILLE, Y. (1996). A indisciplina e o sentimento de vergonha. Em J. C. Aquino (Org.), Indisciplina na escola: alternati-

vas teóricas e práticas (p. 09-24). São Paulo: Summus.

LA TAILLE, Y. (1999). Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ática.

LA TAILLE, Y. (2001). Desenvolvimento moral: a polidez segundo as crianças. Cadernos de Pesquisa, 114, 89-119.

WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005.

Page 3: Projeto Ser Mais - PDF - campusvilla.com.br · WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005. “EU QUERO, AGORA!” Todos nós conhecemos crianças

“EU QUERO, AGORA!”

Todos nós conhecemos crianças que não hesitam em transformar em lei seus desejos e caprichos. De forma

imperativa, decretam: “Eu quero, agora!”, demonstrando, assim, dificuldade em se colocar no lugar do outro,

autorregulação, controle das emoções e baixa tolerância à frustração. Escolhem o que comer, ou o que não

comer, se querem ou não realizar tarefas, tomar banho, o que vestir, quando dormir... Se e quando contraria-

das, reagem de maneira agressiva, seja com empurrões, mordidas, chutes, pontapés ou puxões de cabelo.

A agressividade é um comportamento que, segundo Winnicott (2005), está associada a uma perda que gera

uma frustração. Diz o autor que os comportamentos agressivos são inatos, coexistentes com o amor. A agressi-

vidade é um sintoma de medo que faz com que as pessoas tomem atitudes para que as outras a notem ou que

diminuam a frustração que sentem.

Ainda, segundo Winnicott (2005), as crianças buscam relação de confiança com o ambiente e com aqueles que

estão em sua volta, principalmente a família. Porém, quando o ambiente fracassa e não dá força ao ego, desen-

cadeia-se um comportamento agressivo, apelo emitido pela criança para que suas necessidades sejam atendi-

das, como a de ser amada e contar com as outras pessoas que estão ao seu redor.

No passado, as crianças tinham passagem breve e insignificante pela família e pela sociedade e eram conside-

radas como adultos em miniatura. De forma lenta e gradual, a sociedade percebeu que a infância merecia

maior atenção, o que levou a uma descoberta gradativa de sua estrutura física, de sua linguagem e de suas

peculiaridades.

A partir do século XX, ocorre uma grande virada no pensamento científico e filosófico, marcada principalmente

pelos estudos de Freud, que enfatizou a importância da infância, afirmando que muitas das neuroses tinham

origem em traumas ocorridos nessa fase.

A criança realmente se torna o centro das atenções, o principal motivo pelo qual os pais enfrentam jornadas

de trabalho intensas e sacrificantes, que, muitas vezes, os obrigam a passar pouco tempo com sua prole. Com

o objetivo de “dar o melhor” para os filhos, hoje, os casais optam por terem poucos filhos e mantém a agenda

da criança cheia, preenchida com as mais diferentes atividades.

Se, no passado, não tinham visibilidade, hoje, as crianças conquistaram leis de proteção, adquiriram vez e voz,

participando, ativamente, das atividades e, através do diálogo, consensualmente, das decisões familiares.

O grande problema é que passamos de um extremo ao outro: da infância que sofreu com o anonimato e a

rigidez do passado àquela que agora ocupa o papel de centro da vida dos casais, que, mais sensíveis às necessi-

dades das crianças e com intenso sentimento de culpa, procuram compensar a sua ausência com mimos

desnecessários, tendo dificuldade extrema de exercer autoridade, tão necessária, estruturante e legítima para

o bem-estar e desenvolvimento saudável da criança.

Imersos em um verdadeiro dilema sociocultural, pais e educadores ficam, muitas vezes, inertes à crescente

onda de adultização precoce e ao apelo excessivo para o consumo. O mercado consumidor agora enxerga a

criança como potente consumidora, ficando ela exposta a variados e nefastos estímulos e influências midiáti-

cas. Ao mesmo tempo e paradoxalmente, reage, com ações que prolongam de forma exagerada esse período,

superprotegendo meninos e meninas e satisfazendo todas as vontades.

A escola, na maioria das vezes, é quem recebe diferentes crianças com as mais variadas características, sujeitas

às regras diferentes das validadas em suas famílias, regras próprias para o funcionamento da instituição. Esse é

o primeiro local onde são exteriorizados os comportamentos agressivos, acompanhados de acessos de raiva,

comportamento opositor e desafiador.

Dentro ou fora de suas salas de aula, professores e professoras, solitariamente, muitas vezes, incompreendidos

e repreendidos, labutam com a tarefa de educar e promover para as crianças a oportunidade de vivenciar

pequenas frustrações, aprendendo a suportá-las e superá-las.

Como as crianças ingressam cada vez mais cedo na escola, é preciso admitir que família e escola exercem papel

preponderante na construção dos limites. La Taille (1995) observa que a escola completa a socialização que

começa no ambiente familiar, onde a criança tem o primeiro contato com o mundo das regras e dos valores.

Para o autor, a escola, por se constituir em importante espaço para trocas sociais, deve preparar os alunos para

o convívio, para a adaptação ao espaço público e para o exercício da cidadania. Porém, família e escola têm

papéis diferenciados e complementares no desenvolvimento moral das crianças.

Educar e ser consistente na educação não são tarefas fáceis, pois requerem atenção redobrada, dedicação

constante e esforço, muito esforço. É um constante ir e vir, de ouvir, calar e falar sem medo de magoar ou

decepcionar o outro. Crianças precisam de regras e limites que, na maioria das vezes, são inegociáveis, para

entender que, muitas vezes, não terão o que desejam, convivendo, dessa maneira, com a frustração do não

poder.

A única coisa que, realmente, faz uma criança sofrer é a falta de amor, o desamor, não se sentir querida, prote-

gida e pertencente. Como escreveu Hannah Arendt, o que ela precisa mesmo é “de um abrigo seguro para cres-

cer”.

Portanto, lembre-se disto: Se não somos felizes com o que temos, também não seremos com o que nos falta,

pois o verdadeiro valor e a melhor recompensa estão naquilo que pertence à nossa essência e que se guarda no

armário do nosso coração.

Autor desconhecido

REFERÊNCIAS

LA TAILLE, Y. (1995). Educação moral: família e escola. Dois pontos, 3(11), 99-94.

LA TAILLE, Y. (1996). A indisciplina e o sentimento de vergonha. Em J. C. Aquino (Org.), Indisciplina na escola: alternati-

vas teóricas e práticas (p. 09-24). São Paulo: Summus.

LA TAILLE, Y. (1999). Limites: três dimensões educacionais. São Paulo: Ática.

LA TAILLE, Y. (2001). Desenvolvimento moral: a polidez segundo as crianças. Cadernos de Pesquisa, 114, 89-119.

WINNICOTT, D. W. Privação e Delinquência. 4 ed., São Paulo, Martins Fontes, 2005.

Miriam Manucci é coordenadora do Programa de Educação Bilíngue da Educação Infantil do Villa Campus de Educação; pedagoga e especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela UFBA e pelo Instituto Sedes Sapientiae, São Paulo. É uma profissional motivada pela paixão que tem pela infância e pela preservação da cultura infantil, das brincadeiras, da exploração da natureza e da experimenta-ção.