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Trabalho de Conclusão de Curso - Dezembro de 2005 Desenho Industrial - Projeto do Produto FAAC - Faculdade de Artes, Arquitetura e Comunicação UNESP - Universidade Estadual Paulista – Campus de Bauru Aluno: Flávio Cavaleiro – Professor: José Carlos Plácido da Silva As restrições ao uso de madeiras retiradas de florestas nativas e a preocupação mundial com questões do meio ambiente têm provocado mudanças na indústria moveleira, como o aumento da importância, no mercado internacional, de madeiras de reflorestamento, como o pínus e o eucalipto, usados tanto na produção de painéis de MDF e aglomerados, como de móveis de madeira maciça. O futuro da indústria moveleira está no uso dessas árvores. 1- Panorama no Brasil As principais fontes de madeira são os reflorestamentos de pínus e eucalipto, mas a indústria madeireira tem preferência por aplicações exclusivas, principalmente fibras, que dão origem aos painéis de MDF¹, aglomerado² e outros produtos baseados em celulose. No caso do eucalipto, as empresas de papel e celulose, proprietárias de grandes extensões de áreas plantadas, estão investindo em pesquisas no desenvolvimento da madeira (espécie apropriada, secagem e processamento) destinada à indústria de mobiliário, já havendo, no mercado, laminados, lambris, pisos, madeira serrada e painéis. Atualmente, já são encontrados alguns móveis confeccionados em eucalipto no mercado interno, como, por exemplo, na estrutura interna de estofados, cômodas e armários, nas laterais de gavetas e na fabricação de jogos de mesas, podendo receber diversos tipos de acabamento, como tingimento e verniz. Os móveis de eucalipto têm grande aceitação no mercado internacional, que tem rejeitado produtos baseados em madeiras nativas. No caso do pínus, que substituiu a araucária, o aumento do consumo de madeira e a baixa velocidade da reposição florestal gerou, em 2003, um déficit de 11,3 milhões de metros cúbicos de toras. As projeções, baseadas nos fatores ritmo do aumento de consumo, área plantada, estoque e ciclo das árvores, indicam para um déficit de 27 milhões de metros cúbicos para o ano de 2020. Esses dados podem ser confirmados quando se analisa o crescimento das importações: em 1995, o Brasil importou, de países vizinhos como Argentina e Uruguai, 6 mil metros cúbicos; em 2002, o volume chegou a 30 mil metros cúbicos. 1. O painel de MDF é produzido a partir de fibras de madeira, aglutinadas com resinas sintéticas através de temperatura e pressão, possuindo consistência similar à da madeira maciça; 2. O painel de aglomerado é formado a partir da redução da madeira em partículas que são depois impregnadas com resina sintética para formar um colchão que, pela ação controlada de calor, pressão e umidade, transforma-se no painel.

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Trabalho de Conclusão de Curso - Dezembro de 2005

Desenho Industrial - Projeto do Produto

FAAC - Faculdade de Artes, Arquitetura e Comunicação

UNESP - Universidade Estadual Paulista – Campus de Bauru

Aluno: Flávio Cavaleiro – Professor: José Carlos Plácido da Silva

As restrições ao uso de madeiras retiradas de florestas nativas e a preocupação mundial com questões do meio ambiente têm provocado mudanças na indústria moveleira, como o aumento da importância, no mercado internacional, de madeiras de reflorestamento, como o pínus e o eucalipto, usados tanto na produção de painéis de MDF e aglomerados, como de móveis de madeira maciça. O futuro da indústria moveleira está no uso dessas árvores.

1- Panorama no Brasil

As principais fontes de madeira são os reflorestamentos de pínus e eucalipto, mas a indústria madeireira tem preferência por aplicações exclusivas, principalmente fibras, que dão origem aos painéis de MDF¹, aglomerado² e outros produtos baseados em celulose.

No caso do eucalipto, as empresas de papel e celulose, proprietárias de grandes extensões de áreas plantadas, estão investindo em pesquisas no desenvolvimento da madeira (espécie apropriada, secagem e processamento) destinada à indústria de mobiliário, já havendo, no mercado, laminados, lambris, pisos, madeira serrada e painéis. Atualmente, já são encontrados alguns móveis confeccionados em eucalipto no mercado interno, como, por exemplo, na estrutura interna de estofados, cômodas e armários, nas laterais de gavetas e na fabricação de jogos de mesas, podendo receber diversos tipos de acabamento, como tingimento e verniz. Os móveis de eucalipto têm grande aceitação no mercado internacional, que tem rejeitado produtos baseados em madeiras nativas.

No caso do pínus, que substituiu a araucária, o aumento do consumo de madeira e a baixa velocidade da reposição florestal gerou, em 2003, um déficit de 11,3 milhões de metros cúbicos de toras. As projeções, baseadas nos fatores ritmo do aumento de consumo, área plantada, estoque e ciclo das árvores, indicam para um déficit de 27 milhões de metros cúbicos para o ano de 2020. Esses dados podem ser confirmados quando se analisa o crescimento das importações: em 1995, o Brasil importou, de países vizinhos como Argentina e Uruguai, 6 mil metros cúbicos; em 2002, o volume chegou a 30 mil metros cúbicos.

1. O painel de MDF é produzido a partir de fibras de madeira, aglutinadas com resinas sintéticas através de temperatura e pressão, possuindo consistência similar à da madeira maciça;

2. O painel de aglomerado é formado a partir da redução da madeira em partículas que são depois impregnadas com resina sintética para formar um colchão que, pela ação controlada de calor, pressão e umidade, transforma-se no painel.

Apesar do avanço sobre o estoque florestal, o Brasil tem domínio tecnológico, além de condições de clima e solo extremamente favoráveis para a implantação de florestas: aqui, o ciclo da silvicultura esta entre 6 e 7 anos, muito diferente de outros tradicionais produtores de madeira plantada, como Suécia, Canadá e Austrália, cujos ciclos nunca são inferiores a 60 e 80 anos.

Já há muitas pesquisas, no Brasil, envolvendo a produção de madeira a partir da seringueira, como no sudeste asiático. A madeira é extraída quando o período produtivo das árvores se encerra (25 - 30 anos). Segundo o IAC (Instituto Agronômico de Campinas), a madeira da seringueira pode ser utilizada na indústria de móveis e na fabricação de portas, janelas e outros artigos domésticos. Encontrei, também, pesquisas envolvendo o bambu: cultura predominantemente tropical, renovável, perene, de produção anual, de rápido crescimento, com centenas de espécies espalhadas por todo o planeta. É muito utilizado nos países asiáticos – principalmente na China - para fins que vão da alimentação à construção civil. Possui características físicas e mecânicas que o tornam apto a ser utilizado no desenvolvimento de produtos normalmente produzidos com madeira nativa ou de reflorestamento, como: componentes da construção civil, móveis, cabos para ferramentas agrícolas, painéis, etc.

2 - A Indústria Moveleira Brasileira

Abrangendo uma diversidade de produtos e matérias-primas, a indústria moveleira pode ser classificada em função dos materiais utilizados (madeira maciça, painéis, metais etc.), e em função da destinação (móveis para residência e para escritório). Devido a aspectos mercadológicos, as empresas são especializadas em um ou dois tipos de ambientes (cozinhas e banheiros, salas, quartos etc.).

Segundo o IBGE, os móveis de madeira são divididos em dois tipos: os retilíneos e os torneados. Os retilíneos são lisos, sem detalhes sofisticados de acabamento, com desenho simples e linhas retas, enquanto os torneados apresentam muitos detalhes de acabamento, misturando formas retas e curvilíneas.

Os móveis torneados são subdivididos em dois grupos: 1 – de madeira de lei, mais defasado tecnologicamente, é restrito ao mercado interno, uma vez que, no mercado internacional, produtos provenientes de florestas nativas não despertam mais o interesse, devido a questões ambientais; e 2 – de madeiras de reflorestamento, principalmente o pinus, explorado por grandes empresas verticalizadas, que destinam a maior parte de sua produção à exportação.

Tabela 1

Principais Características do Segmento de Móveis de Madeira para Residência

Os móveis de pínus, apesar de apreciados no mundo todo, não têm boa aceitação no mercado doméstico: lançados no início dos anos 70, ficaram estigmatizados como móveis baratos e de baixa qualidade, devidos a vários fatores:

• Baixo investimento em design;

• Uso de tecnologia inadequada, com o uso de equipamentos de acabamento e usinagem obsoletos ou adaptados;

Corte das árvores e secagem inapropriados, produzindo madeira com muitas falhas e nódulos;

• Manejo inadequado da floresta, com ausência de desbastes e podas – necessários quando a produção é destinada à fabricação de móveis - e corte precoce de árvores, além da mistura de espécies.

Apesar dos tropeços do início, as indústrias do setor investiram em equipamentos modernos, como leitoras óticas para corte (eliminam os nós), presas de alta freqüência (para montagem de painéis), centros de usinagem com controle numérico e cabines pressurizadas para acabamento. A produção é destinada à exportação, onde é bastante competitiva, num mercado onde a concorrência se dá via preços.

No segmento sob encomenda, atuam uma multiplicidade de micro e pequenas empresas, principalmente marcenarias, com instalações e equipamentos quase sempre deficientes e ultrapassados. A produção é artesanal, destinado ao mercado interno.

O segmento seriada, é constituído por grandes empresas, mais modernas, que produzem para as grandes redes de magazines. Os móveis são retilíneos, sem detalhes sofisticados, com desenho simples e linhas retas.

Há empresas no segmento retilíneo seriada modernas e bem equipadas, mas não conseguem ser competitivas no mercado externo – exceto pequenas exportações para o Mercosul – porque os painéis de aglomerado e MDF nacionais são mais caros, quando comparados aos fabricados na Europa, por dois motivos: 1 - incidência de alta carga tributária; e 2 – enquanto na Europa, são fabricados a partir de resíduos de madeira, aqui são produzidos a partir de madeira cortada exclusivamente para sua fabricação.

O processo de fabricação dos móveis torneados seriados envolve inúmeras etapas: secagem da madeiras, processamento, usinagem, acabamento prévio, montagem, acabamento final e embalagem, contrastando com o processo produtivo do segmento retilíneo seriada, que exige maior grau de especialização, mas é mais simplificado, envolvendo a produção em grande escala e poucas etapas: corte, usinagem, colagem de bordas e embalagem. A etapa de acabamento foi eliminada, pois os painéis de madeira já são adquiridos com acabamento. A montagem é feita pelo varejista.

Alguns dos fatores que emperram o desenvolvimento da indústria moveleira nacional são:

• A maioria das fábricas é desatualizada tecnologicamente, de baixa produtividade. São poucas as empresas modernas, exportadoras, que investiram na importação de equipamentos – principalmente vindos da Itália e da Alemanha;

• A verticalização da produção, que aumenta os custos industriais, é causada pela existência de poucos fornecedores de partes, componentes e produtos semi-acabados, além da carência de fornecedores especializados no plantio e nas etapas iniciais do processamento de árvores (que exige grandes investimentos em plantio, corte e secagem de madeira). Algumas empresas possuem o próprio plantio.

• Baixos investimentos em design, que dificultam e atrasam o desenvolvimento e utilização de novos materiais, como plástico, bambu, vime, junco, metais, vidro, pedra, couro, entre outros. Sem a diferenciação proporcionada pelo design, a produção de torna commoditie - móveis padronizados em que a comercialização se define pelo preço. Poucas empresas investem em design: no mercado externo, ele é determinado pelo comprador; no mercado interno, os produtos são cópias modificadas dos modelos exportados ou projetados a partir de protótipos submetidos aos revendedores.

• Os níveis de acabamento e os processos de usinagem, fundamentais na determinação da qualidade dos produtos, são tecnologicamente inferiores, quando comparados aos de

fábricas européias.

• A informalidade que, além de dificultar a introdução de normas técnicas e, consequentemente, a padronização da produção, partes e componentes, estimula a destruição de florestas nativas.

4 - A Indústria Internacional

Três países detêm mais de 40% da produção mundial de móveis: Itália é o maior exportador, seguido da Alemanha e dos Estados Unidos. A indústria italiana procura distinguir seus produtos através de um design característico, que atualmente define padrões que orientam o mercado mundial, além de proporcionar uma maior rentabilidade, graças à exclusividade.

As principais características da indústria moveleira mundial são:

• O uso de equipamentos de alta tecnologia, integrados a softwares de operação, permite a agilidade dos processos fabris, resultando em muitos tipos de produtos em uma mesma linha de produção, em grande escala;

• Aumento da eficiência produtiva e a conseqüente redução dos custos, graças à horizontalização da produção: muitos pequenos e médios produtores especializados em fornecer partes componentes para a indústria de móveis (ex: um trilho para gavetas é um componente; uma gaveta é uma parte);

• Pesquisa e introdução de novas e variadas matérias primas, como os diversos materiais para revestimento, que barateia o custo final enquanto mantém o mesmo nível de acabamento.

O desenvolvimento de tecnologias tem superado grandes empecilhos no uso de madeiras menos nobres, como o eucalipto (um processo de secagem, desenvolvido na Itália, mantém a densidade da madeira e evita o empenamento e a rachadura), o pínus (os nós, que o depreciam, são facilmente removidos com a otimizadora ótica de corte), e, até, a seringueira, que vem sendo utilizada com sucesso na Malásia, Indonésia, Filipinas e Ceilão.

Para atender mercados como Estados Unidos e Europa, que exigem cada vez mais móveis funcionais e confortáveis, novos conceitos estão sendo introduzidos aos projetos. Um volume crescente de móveis passou a ser projetado para que possa ser montado pelo próprio consumidor. Este tipo de móvel é mais barato, tem um custo menor de transporte e estocagem e, com isso, tem grande vantagem no comércio internacional.

5 - A proposta

Projetar e construir uma cadeira de madeira com material alternativo aos comercializados, de preferência, usando apenas técnicas e equipamentos disponíveis ou facilmente encontráveis.

5.1 – Os materiais disponíveis no mercado

Há, no mercado, os mais variados tipos de madeira e seus derivados. Numa pesquisa num grande fornecedor do setor, encontrei tábuas de cedrinho, pínus e pinho; pranchas de cerejeira, caxeta, freijó, eucalipto, pínus, imbuia e marfim; painéis compensados, MDF, aglomerado, de diversos tipos e acabamentos, além de painéis de eucalipto e de teça. Alguns materiais, como os painéis de teca e eucalipto, tem o selo FSC, concedido a produtos madeireiros provenientes de florestas com manejo sustentado.

5.2 – Resíduos de madeira

Pesquisando, encontrei uma única alternativa aos produtos comercializados: a remadeira: técnica desenvolvida pelo arquiteto Paulo Roberto Alves dos Santos e pelo designer José Artur Grossi, de Brasília, consiste numa mistura de cola a base de PVA (a cola branca, para madeira) e pó de serra ou serragem. O projeto tem apoio do IBAMA, e inclui ensinar a técnica a um grupo de crianças carentes, que usam a remadeira para confeccionar quadros decorativos e revestimento de móveis. A pesquisa aborda o comportamento da remadeira diante do desgaste provocado pelo tempo e pelo meio ambiente, como calor, umidade e ataque de fungos. O material está tendo grande aceitação comercial no mercado moveleiro do Distrito Federal.

5.3 – A definição do material

O projeto da cadeira deverá ser em função do material escolhido. Defini que, se é material disponível no mercado, não é alternativo e, portanto, não serviria para o projeto. Pensei na serragem. Não há, no Brasil, nenhum tipo de painel fabricado a partir de resíduos de madeira. Exceto pelo projeto remadeira, o pó de serra, a serragem e os cavacos de madeira são utilizados somente como combustível ou como composto orgânico para solo. Talvez fosse possível usar o pó de serra como material para construir uma cadeira, mas exigiria o conhecimento de técnicas e uso de equipamentos não disponíveis. Decidi por procurar uma árvore que não fosse explorada como madeira, mas que se pudesse, dela, construir painéis

como os de teca e eucalipto.

Passeando pelo meu próprio quintal, encontrei uma grande mamoneira.

6 – A mamona

“O governo decidiu antecipar para este ano a obrigatoriedade de produtores e importadores de diesel de petróleo adicionarem 2% de biodiesel para a venda às distribuidoras de combustíveis.

... A obrigatoriedade de adicionar 2% de diesel vegetal ao mineral estava prevista apenas para janeiro de 2008. Em 2013, o percentual de biodiesel subirá a 5%. ...A decisão favorece principalmente a Brasil Ecodiesel, que almeja conquistar até 40% do mercado de biodiesel brasileiro. A companhia tem hoje 20 mil toneladas de grãos de mamona armazenados (prontos para serem esmagados). A produção da mamona foi realizada em regime de agricultura familiar.

...O Ministério de Minas e Energia alega que a mamona é o melhor produto para o objetivo "social" do programa, de integrar um plano de agricultura familiar a solos pouco ricos e subutilizados.

Fernando Canzian, Folha de S. Paulo, 21 de agosto de 2005”

Existem muitas variedades de mamonas. A maioria é arbustiva, ramificada, mas algumas se parecem com árvores altas, com poucos ramos. O ciclo de vida é de aproximadamente 2 a três anos. Quando morre seu caule se degrada rapidamente. A produção de sementes inicia-se aos seis meses e só termina com a morte da planta. È uma cultura indicada como recuperadora de solo desgastando: durante o ciclo vegetativo, produz grande quantidade de matéria orgânica, e suas raízes, quando apodrecem, deixam o solo descompactado e aerado, promovendo sua revitalização. O óleo de mamona tem mais de 700 aplicações – pode ser usado como insumo ou base na fabricação de tintas, isolantes, lubrificantes, cosméticos e perfumarias, fármacos, corantes, anilinas, desinfetantes, germicidas, colas e aderentes, polímeros, fungicidas e inseticidas.

Depois de extraído o óleo, a sobra (chamada de torta ou farelo) ainda pode ser usada como composto orgânico de excelente qualidade, na recuperação de solos degradados, e como ração animal. A mamona produz de 15 a 20 toneladas de madeira por hectare, que segundo pesquisa da EMBRAPA, pode ser processada e transformada em composto orgânico.

Observando caules de mamoneiras mortas, vi que são atacados por fungos e insetos que aceleram sua degradação.

7 – Painel de mamona

Decidi cortar e processar algumas mamoneiras que encontrei. Elas foram cortadas no dia 05 de fevereiro de 2005. Os troncos e galhos foram segmentados de maneira a retirar as curvaturas. Após o corte, a casca foi retirada – solta-se facilmente, como casca de mandioca. As peças de diâmetro maior, como o tronco, perto da raiz, não apresentavam o cerne oco – uma característica da planta. A madeira, de cor branca, foi posta a secar na sombra.

Em pouco mais de um mês – no dia 12 de março, a madeira já estava bem seca e pronta para ser processada. Os troncos e galhos foram serrados ao meio e empilhados, em ambiente protegido, onde ficaram em observação até 23 de novembro de 2005. Notei que, nesse período, as peças que foram expostas à umidade sofreram ataques de fungos, que provocaram manchas azuis (o mesmo tipo de fungo que ataca o pínus, quando não recebe tratamento preventivo). Não houve ataque de insetos. No início do mês de agosto, cedi ao Professor Milton Nakata, da FAAC, um pedaço da madeira, para que fosse avaliada como matéria prima para artesanato. A madeira proporcionou a criação de uma escultura com muitos detalhes finos. Segundo ele, “para esculpir, ela tem uma série de vantagens, tais como "nervuras" que favorecem o ato de esculpir de forma detalhada, em todos os ângulos e entraves. Ela é muito leve, porém bem resistente. Para trabalhos manuais e com detalhes pequenos, considero esta madeira ideal.”

No dia 23 de novembro de 2005, a madeira foi processada, transformada em sarrafos com larguras entre 3 e 5 cm, com espessura de 11 mm. Optei por construir um painel do tipo compensado: em 3 camadas, sendo a do meio no sentido transversal em relação às outras duas. Esse tipo de construção não exige equipamentos sofisticados: basta uma prensa comum e cola a base de PVA. O resultado foi em painel medindo 60 cm de largura, 110 cm de comprimento e 3,3 cm de espessura. Com base nesse painel desenhei a cadeira.

8 – A cadeira

Depois de vários rascunhos, optei por desenhar uma cadeira curvilínea, cujos traços valorizassem a madeira. Quis dar ao projeto uma aparência exótica e natural. Decidi, também, que desenharia a cadeira de modo que não exigisse equipamentos sofisticados para a sua fabricação: serra circular, desengrossadeira e prensa manual (para beneficiamento da madeira e montagem do painel); serra tico-tico e furadeira (para o corte das peças e montagem final). Optei por fazer as junções com cavilhas, ao invés de espigas e furas, além de evitar a usinagem.

Após definido, desenhei as peças em escala natural e transferi as formas para o painel. Fiz os cortes com uma serra tico-tico e dei acabamento com lixas.

Fig. 14 – painel de mamona recortado (Flávio Cavaleiro)

Depois de fazer as junções com cavilhas e cola a base de PVA, lixei e passei um corante para madeira na cor jatobá (o tingimento foi necessário para encobrir as manchas causadas pelo ataque de fungos). Em seguida, impermeabilizei a madeira com um fundo de base poliuretana (desta forma, a madeira estará imune aos fungos e insetos). Dei o acabamento final com verniz transparente acetinado, de base poliuretana.

Fig. 15 – cadeira pronta (Flávio Cavaleiro)

9 – Conclusão

O reconhecimento do design brasileiro no exterior é influenciado pela imagem que o nosso país carrega: tropical, colorido, rico em recursos naturais. É restrito ao ecodesign, utensílios artesanais a partir de diversos materiais (pedras e, principalmente, aproveitamento de sobras de madeiras amazônicas), jóias, moda e têxteis. Conheço, há muitos anos, como empresário, o setor moveleiro nacional – sei que o design é preocupação recente. Sem investimentos em design, não há desenvolvimento da indústria de partes e componentes; sem a indústria de partes e componentes, não há desenvolvimento da indústria moveleira. Quando quero produzir uma peça com acabamento e design diferenciados, sou obrigado a recorrer aos componentes e insumos importados (puxadores da Espanha, gavetas da Alemanha, por ex.). A madeira de mamona é macia e leve, permitindo usos diversos, do artesanato ao mobiliário. É abundante e pode se tornar fonte de renda extra para as famílias que exploram o plantio com a finalidade de produção de sementes, podendo ser vendida como madeira (matéria-prima) ou como produto acabado (peças de mobiliário e artesanato). Quando decidi projetar e construir uma cadeira a partir da madeira da mamona, quis que somente a madeira e sua forma tivessem importância. Nela não há nenhum componente, nenhum parafuso - é só mamona. Mamona e design!

Bibliografia

• Ergonomia, Projeto e Produção, Itiro Iida, Ed. Edgard Blücher Ltda, S. Paulo, 1990.

• Revista da Abimóvel 2004, Editora Alternativa.

• Revista da Madeira, ano 15, número 92

• Revista Formoblie, vários numeros

• Revista Home Furniture, outubro de 1996

• Revista Nuevo Estilo, vários números

• Folha de São Paulo, edição de 21 de agosto de 2005

Sites:

• BNDES – Os Novos Desafios para Indústria Moveleira no Brasil, disponível em: http://www.bndes.gov.br/conhecimento/bnset/set1504.pdf

• BNDES – Panorama do Setor Moveleiro no Brasil, Com Ênfase na Competitividade Externa a Partir do Desenvolvimento da Cadeia Industrial de Produtos Sólidos de Madeira, disponivel em: http://www.bndes.gov.br/conhecimento/bnset/set801.pdf

• Biotecnologia – Ciência e Desenvolvimento - Importância do Biodiesel Para a Economia Brasileira, discurso do Senador Alberto Silva, realizado em 19 de novembro de 2004, disponível em: http://www.biotecnologia.com.br/biocongresso/discursos_data.asp?id=401

• Radiobrás - Técnicos Aproveitam Pó de Madeira Para Revestimento e Obras de Arte, disponível em: http://www.radiobras.gov.br/ct/1999/materia_241299_4.htm

• Correio Brasiliense - A Revolução da Mamona, disponível em: http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO_20030714/pri_bra_140703_22.htm

• Ambiente Brasil – Biodiesel, disponível em: http://www.ambientebrasil.com.br/composer.php3base=./energia/index.html&conteudo=./energia/artigos/biodiesel.html

• UNESP – Bauru – Projeto Bambu, disponível em: http://wwwp.feb.unesp.br/pereira/pesquisa.htm

• USP – São Carlos – Óleo de Mamona Aplicado a Compensados, disponível em: http://www.sc.usp.br/pop_integral.php?id=600&origem=materias

• PNDU – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – Produção do Biodiesel Requer Mais Pesquisa, disponível em: http://www.pnud.org.br/energia/entrevistas/index.php?id01=1206&lay=ene

• IAC – Instituto Agronômico de Campinas – Programa Seringueira, disponivel em: http://www.iac.sp.gov.br/Centros/Centro_cafe/seringueira/Programa%20Seringuiera.htm

• ARCOWEB - Público Italiano Vê a Originalidade do Design Brasileiro, disponível em: http://www.arcoweb.com.br/design/design35.asp

• UNICAMP – Adesivo Natural Reduz Riscos à Saúde, disponível em: http://www.unicamp.br/unicamp/canal_aberto/clipping/abril2004/clipping040417.correiopop.html

• Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental - Ricinus communis, disponível em: http://www.institutohorus.org.br/download/fichas/Ricinus_communis.htm

• ISI - The Global Invasive Species Initiative - Ricinus communis L. (syn. Ricinus digitatus Nor.), disponível em: http://tncweeds.ucdavis.edu/moredocs/riccom01.html

• www.leomadeiras.com.br

• www.porada.it