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Projeto de terminal portuário para granéis sólidos (píer para barcaças) André Vidas Cardoso, Caio Mascarenhas Raul, Carolina Yuka Ishihata, Thiago Vieira Fernandes, Pedro Henrique Cerento de Lyra, Kalil José Skaf 1 Engenheiro Civil / Modus Engenharia de Estruturas / [email protected] 2 Engenheiro Civil / Dynatest Engenharia LTDA. / [email protected] 3 Engenheira Civil / EGT Engenharia / [email protected] 4 Engenheiro Civil / Milímetro Empreendimentos / Engenharia / [email protected] 5 Engenheiro Civil / Professor do IMT e sócio da EGT Engenharia / [email protected] 6 Engenheiro Civil / Professor da EPUSP e sócio da EGT Engenharia / [email protected] Resumo O sistema estrutural de um píer para atracação de barcaças, por operar com embarcações de menor deslocamento, apresenta características diferenciadas com relação a sistemas para embarcações de grande porte. Para atracação e amarração tem-se, de modo geral, as mesmas variáveis a serem controladas, dentre as quais se destacam o deslocamento da embarcação, velocidade e ângulo de aproximação, ações ambientais (vento e corrente), sistema de apoio a operação (rebocador, “bow thruster”, “hauling”), concepção do sistema estrutural e outros. Neste artigo são apresentadas e calculadas, para o terminal estudado, as principais ações incidentes sobre a estrutura concebida a partir dos condicionantes citados. Posteriormente, os valores calculados são utilizados em uma análise estrutural dividida em duas frentes: uma que versa sobre o desenvolvimento de um modelo matemático que simula a fase operacional do píer, e outra que versa sobre o estudo do faseamento construtivo e suas consequências no dimensionamento e detalhamento dos elementos que constituem a estrutura de atracação. Palavras Chaves Terminal portuário; análise estrutural; concreto armado; detalhamento; granéis sólidos. Introdução Importância do agronegócio para a economia brasileira Entende-se como agronegócio todas as atividades ligadas à produção e à subprodução de produtos derivados da agricultura e da pecuária. O entendimento do agronegócio como um processo se faz necessário, pois a produção agrícola intensiva faz uso de uma série de tecnologias e biotecnologias, a fim de atingir os maiores níveis de produtividade possíveis. Em países desenvolvidos, a agropecuária responde, em média por 3% do PIB; contudo, ao contabilizarmos todas as atividades ligadas ao agronegócio, esse percentual se eleva a cerca de um terço do PIB. Por esse motivo, algumas nações subsidiam sua produção agrícola além de tomarem medidas protecionistas, preservando assim as atividades de seus produtores. No Brasil a tendência não se mostra diferente; em 2013, a participação do agronegócio no PIB chegou a 23%, ultrapassando a marca de R$ 1,0 trilhão; em 2014, apesar do crescimento do PIB ter sido de apenas 0,1%, a agropecuária manteve-se acima desse valor, crescendo 0,4%, motivada principalmente pelas culturas de soja e mandioca. Neste cenário, o fato de o PIB do agronegócio apresentar sucessivos incrementos e, assim, se destacar dentro da economia brasileira, torna ainda mais importantes os estímulos e investimentos dados a esse setor. Analisando-se a produção da soja no Brasil, deve-se destacar a região centro-oeste como sendo a principal produtora deste grão, especialmente o estado de Mato Grosso. Quanto aos principais portos utilizados para escoar a safra, destacam-se os portos de Santos, Paranaguá, Rio Grande, São Francisco do Sul e Itaqui, que respondem pelo escoamento de 72% da safra.

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Page 1: Projeto de terminal portuário para granéis sólidos (píer ... · transversal, segundo recomendação da NBR 9782. Atracação De posse das dimensões da embarcação de projeto

Projeto de terminal portuário para granéis sólidos (píer para barcaças) André Vidas Cardoso, Caio Mascarenhas Raul, Carolina Yuka Ishihata, Thiago Vieira

Fernandes, Pedro Henrique Cerento de Lyra, Kalil José Skaf 1 Engenheiro Civil / Modus Engenharia de Estruturas / [email protected]

2 Engenheiro Civil / Dynatest Engenharia LTDA. / [email protected] 3Engenheira Civil / EGT Engenharia / [email protected]

4 Engenheiro Civil / Milímetro Empreendimentos / Engenharia / [email protected] 5Engenheiro Civil / Professor do IMT e sócio da EGT Engenharia / [email protected]

6Engenheiro Civil / Professor da EPUSP e sócio da EGT Engenharia / [email protected]

Resumo

O sistema estrutural de um píer para atracação de barcaças, por operar com embarcações de

menor deslocamento, apresenta características diferenciadas com relação a sistemas para

embarcações de grande porte. Para atracação e amarração tem-se, de modo geral, as mesmas

variáveis a serem controladas, dentre as quais se destacam o deslocamento da embarcação,

velocidade e ângulo de aproximação, ações ambientais (vento e corrente), sistema de apoio a

operação (rebocador, “bow thruster”, “hauling”), concepção do sistema estrutural e outros.

Neste artigo são apresentadas e calculadas, para o terminal estudado, as principais ações

incidentes sobre a estrutura concebida a partir dos condicionantes citados. Posteriormente, os

valores calculados são utilizados em uma análise estrutural dividida em duas frentes: uma que

versa sobre o desenvolvimento de um modelo matemático que simula a fase operacional do

píer, e outra que versa sobre o estudo do faseamento construtivo e suas consequências no

dimensionamento e detalhamento dos elementos que constituem a estrutura de atracação.

Palavras Chaves

Terminal portuário; análise estrutural; concreto armado; detalhamento; granéis sólidos.

Introdução

Importância do agronegócio para a economia brasileira

Entende-se como agronegócio todas as atividades ligadas à produção e à subprodução de

produtos derivados da agricultura e da pecuária. O entendimento do agronegócio como um

processo se faz necessário, pois a produção agrícola intensiva faz uso de uma série de

tecnologias e biotecnologias, a fim de atingir os maiores níveis de produtividade possíveis.

Em países desenvolvidos, a agropecuária responde, em média por 3% do PIB; contudo, ao

contabilizarmos todas as atividades ligadas ao agronegócio, esse percentual se eleva a cerca

de um terço do PIB. Por esse motivo, algumas nações subsidiam sua produção agrícola além

de tomarem medidas protecionistas, preservando assim as atividades de seus produtores. No

Brasil a tendência não se mostra diferente; em 2013, a participação do agronegócio no PIB

chegou a 23%, ultrapassando a marca de R$ 1,0 trilhão; em 2014, apesar do crescimento do

PIB ter sido de apenas 0,1%, a agropecuária manteve-se acima desse valor, crescendo 0,4%,

motivada principalmente pelas culturas de soja e mandioca. Neste cenário, o fato de o PIB do

agronegócio apresentar sucessivos incrementos e, assim, se destacar dentro da economia

brasileira, torna ainda mais importantes os estímulos e investimentos dados a esse setor.

Analisando-se a produção da soja no Brasil, deve-se destacar a região centro-oeste como

sendo a principal produtora deste grão, especialmente o estado de Mato Grosso. Quanto aos

principais portos utilizados para escoar a safra, destacam-se os portos de Santos, Paranaguá,

Rio Grande, São Francisco do Sul e Itaqui, que respondem pelo escoamento de 72% da safra.

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Figura 1 - Regiões produtoras x principais portos

Diante da figura acima e considerando que os principais destinos da soja brasileira são a

Europa e a Ásia, é notória a necessidade de melhorar a logística de escoamento da soja.

Apresentação do empreendimento

As informações apresentadas sobre a importância da exportação de soja para a economia do

país confirmam a necessidade de maiores investimentos e estudos referentes à implantação de

obras portuárias. É nesse contexto que este artigo objetiva se desenvolver.

O empreendimento escolhido para estudo, o TERFRON, é um terminal de uso privado que

compõe o complexo portuário Miritituba - Barcarena, no Estado do Pará, região estratégica

pela proximidade dos principais mercados consumidores de soja e por receber rede

hidroviária (rios Tapajós e Amazonas). A soja é transportada por caminhões até a estação de

transbordo em Miritituba, de onde segue em barcaças até o TERFRON. Chegando ao Porto de

Vila do Conde, os grãos são armazenados nos silos da retroárea e, posteriormente,

embarcados em navios de grande curso que rumam principalmente à Ásia e à Europa.

Princípios da concepção de obras portuárias

As alternativas de modulação do arranjo estrutural de obras portuárias em geral são

concebidas levando-se em consideração um certo conjunto de fatores dentre os quais se

destacam a sua vocação, a solução de fundação escolhida pela geotecnia, os tipos de

embarcações que serão operados no terminal, e as cargas atuantes na estrutura.

Quanto à vocação, é a partir dela que se determinam as combinações críticas de

carregamentos que solicitarão a estrutura. Esses carregamentos são definidos em função das

Figura 2 - Nova rota de escoamento e vista panorâmica da retroárea do TERFRON

Page 3: Projeto de terminal portuário para granéis sólidos (píer ... · transversal, segundo recomendação da NBR 9782. Atracação De posse das dimensões da embarcação de projeto

embarcações previstas, das cargas variáveis ou permanentes atuantes, das condições

ambientais e do método construtivo empregado.

Quanto à geotecnia, é essencial que sejam conhecidas as condições geotécnicas da região

através de ensaios de campo (sondagens, CPTU’s, "Vane Test"), para se escolher a solução

mais adequada dentre as que atendam os critérios de calado, método construtivo e geotecnia.

Escolhida a fundação, determina-se a sua capacidade de carga, que é o primeiro parâmetro

responsável por definir a modulação da estrutura. A batimetria/topografia também é um fator

importante por fornecer as curvas de nível da região e permitir, dessa forma, maior

conhecimento para o estudo de implantação da obra (píer e retroárea). A partir desses

resultados, é possível determinar o calado disponível, optar ou não pelo afastamento do píer

da linha costeira e prever-se a necessidade de obras de dragagem.

Todos esses fatores são analisados para, em seguida, definir-se uma alternativa de modulação

e disposição geométrica inicial das estacas (verticais e inclinadas), através de modelos planos

porticados. Com base nesse primeiro arranjo, refinam-se os cálculos com auxílio de

modelagem computacional e, adequando-os de forma iterativa, chega-se a uma configuração

ideal de projeto.

Concepção do píer de atracação de barcaças do TERFRON

Para o píer estudado, escolheu-se a alternativa de arranjo estrutural composta por estacas

verticais intercaladas por estacas inclinadas em duas direções ao longo do píer, solução

usualmente adotada em projetos de obra em mar. Essa alternativa é usualmente escolhida,

pois diminui a deslocabilidade do píer na ocasião da atracação, amarração das barcaças e

ações ambientais não favoráveis, por causa de sua maior rigidez na horizontal proveniente do

sistema resistente formado pelos cavaletes de estacas inclinadas.

As estacas escolhidas são protendidas de concreto; a protensão tem duas principais

finalidades: a resistência aos esforços de flexão tanto durante seu transporte e posicionamento

para cravação como também para garantia de sua resistência na ruptura - exceto na ligação

entre a infraestrutura e a superestrutura - e melhoria da durabilidade.

Além do parâmetro geotécnico, outro ponto importante para a definição do arranjo estrutural é

a adequação da estrutura aos principais carregamentos atuantes. No caso deste píer, o

equipamento descarregador foi uma carga preponderante para a escolha de uma estrutura

estaqueada interligada por viga longitudinal. Já que a viga longitudinal onde este se apoiará é

a principal responsável por transferir as cargas que dele proveem para às fundações.

Definido o arranjo estrutural da obra, estuda-se a sua disposição geométrica. A primeira

medida delimitada foi a largura da plataforma, pois a distância entre os trilhos depende da

bitola do equipamento descarregador. Quanto à distância dos vãos longitudinais, conhecendo-

se as demais cargas atuantes na estrutura definiu-se a quantidade e o espaçamento máximo

das estacas verticais e dos conjuntos de estacas inclinadas que dão base para a definição dos

outros elementos do píer. As estacas verticais transmitem ao solo as cargas verticais, já o

conjunto de estacas inclinadas é considerado como um sistema resistente principalmente às

forças horizontais, mas que também participa do equilíbrio das ações verticais.

Após a definição da disposição geométrica das estacas, determinou-se a disposição dos outros

componentes. Visando maior facilidade e rapidez na execução, optou-se por uma estrutura

composta de peças pré-moldadas solidarizadas com concreto moldado “in loco”, uma

alternativa bastante utilizada em obras em mar, por diminuir a quantidade de concreto fresco a

transportar, por possibilitar maior controle na produção das peças estruturais e reduzir prazos.

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Figura 3 - Píer de atracação de barcaças TERFRON

Método construtivo adotado

Como a estrutura concebida é constituída de peças pré-moldadas que serão montadas e

solidarizadas por fases, é importante que cada uma das etapas seja bem definida e que se

realize uma análise detalhada, tanto em termos qualitativos (viabilidade executiva) quanto em

termos quantitativos (capacidade portante da estrutura) em cada uma das fases. O método

construtivo estudado e adotado pela projetista consiste em:

1) cravação das estacas;

2) demolição das estacas até a cota de arrasamento;

3) montagem das placas de cabeça nas estacas;

4) 1ª fase de concretagem: concretagem dos furos das placas de cabeça;

5) montagem das vigas pré-moldadas;

6) 2ª fase de concretagem: concretagem entre as vigas pré-moldadas;

7) montagem das lajes pré-moldadas;

8) 3ª fase de concretagem: concretagem parcial entre as vigas longitudinais;

9) 4ª fase de concretagem: concretagem da laje in-loco;

10) montagem do paramento da praça das defensas;

11) 5ª fase de concretagem: concretagem parcial dos balanços; e

12) 6ª fase de concretagem: concretagem final dos balanços.

Figura 4 – Método construtivo do píer de barcaças

Ações incidentes nas estruturas de acostagem

Para o dimensionamento e concepção de estruturas de acostagem, ações particulares devem

ser levadas em consideração; tais ações serão brevemente descritas a seguir.

Cargas permanentes: peso próprio (γconc = 25 kN/m³)

Cargas operacionais: descarregador Siwertell VST-790 M

Quanto aos elementos operacionais do terminal, a carga mais relevante é a proveniente do

descarregador Siwertell VST-790 M. De acordo com as especificações do fabricante, adotou-

se uma carga de 300 kN em cada roda, considerando-se no modelo computacional uma

abertura de cargas de 45° para que a carga chegue ao eixo da viga longitudinal.

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Figura 5 - Elevação lateral do descarregador Siwertell VST-790 M

Cargas operacionais: sobrecarga

Ainda quanto às cargas operacionais, deve-se prever uma sobrecarga de 30,0 kN/m² sobre o

tabuleiro da plataforma operacional, reduzindo-a a metade na região do descarregador, ou

seja, para 15,0 kN/m². Esse coeficiente considera que a área em questão não é usualmente

utilizada durante a operação portuária.

Frenação e vento

Considerou-se simplificadamente que as forças provenientes da frenação e do vento possuem

juntas 10% do valor total da carga vertical do descarregador, tanto na longitudinal quanto na

transversal, segundo recomendação da NBR 9782.

Atracação

De posse das dimensões da embarcação de projeto e das características ambientais do local de

implantação do píer, é possível determinar-se a energia cinética desenvolvida pela

embarcação durante a manobra de atracação. Passo seguinte, determinam-se coeficientes que

levam em conta características como a excentricidade e a configuração da manobra, a

curvatura do ponto de contato entre a defensa e o casco da embarcação e a rigidez da

estrutura; definindo-se tais coeficientes, obtém-se a energia cinética absorvida pelo sistema de

atracação. Contudo, deve-se ainda incorporar um fator de segurança que considere os riscos e

os custos envolvidos no projeto, bem como o bom senso da equipe de projetistas; definindo-se

este fator de segurança, chega-se ao valor de projeto da energia cinética a ser absorvida pelas

defensas. De posse deste valor, após análises de viabilidade técnica e financeira, define-se um

tipo de defensa a ser adotado, analisando as diferentes opções oferecidas pelos mais diversos

fabricantes de defensas. Este procedimento encontra-se detalhado em CARDOSO et al., 2015,

e pode ser representado esquematicamente como consta na Figura 6.

Neste trabalho, foram adotadas defensas Sumitomo UPi 800H x 100L CP2, e calculou-se a

força de atracação como sendo uma força de 408 kN de magnitude agindo transversalmente à

plataforma operacional. Esta força, por sua vez, gera uma componente de atrito na direção

longitudinal cuja magnitude é de 30% da força que a originou (122 kN), conforme critérios

estabelecidos pela norma espanhola ROM 2.0-11, utilizando modelos analíticos.

Amarração

A embarcação deve ser amarrada para que as operações necessárias sejam viáveis e seguras,

sem movimentos excessivos que impossibilitem ou reduzam a eficiência operacional. Para

que esses movimentos sejam limitados, as embarcações são presas por cabos que são

amarrados em volta dos cabeços de amarração, elementos geralmente metálicos, fixos a

estrutura do píer e responsáveis por transmitir a ele os esforços de amarração.

O dimensionamento do número de cabos e cabeços de amarração e o estudo de sua disposição

levou em conta os esforços de amarração, determinados a partir das diretrizes da norma ROM

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Figura 6 - Fluxograma atracação Figura 7 - Fluxograma amarração

2.0-11, que estabelece cinco fatores que solicitam as amarras: vento, corrente, ondas, forças

hidrodinâmicas de repulsão e forças hidrodinâmicas induzidas pela passagem de outras

barcaças. Calculados esses esforços, estudou-se o arranjo do sistema de amarração e

determinou-se as forças atuantes sobre cada um dos cabos, utilizando o método da OCIMF

(Oil Companies International Marine Forum). Combinando-se as forças incidentes sobre a

embarcação amarrada com os arranjos propostos, é possível determinar a força crítica

aplicada por cada cabo sobre o píer e definir o cabeço de amarração. Este processo está

detalhado em CARDOSO et al., 2015, e foi representado esquematicamente na Figura 7.

Variação uniforme de temperatura

Para variação da temperatura: T = ±15°C; para retração: T = −15°C

Variação não uniforme de temperatura

De acordo com a NBR 6118, admitiu-se uma variação linear de 10°C entre as faces superior e

inferior dos elementos estruturais.

Análise estrutural

Desenvolvimento do modelo computacional

Para o desenvolvimento do projeto estrutural deste píer foi necessária a utilização do STRAP

2010, um programa de cálculo estrutural. No programa, desenvolveu-se um modelo espacial

formado por barras (vigas, estacas, lajes pi, estacas) e elementos de placa (capa da laje mais

mesa colaborante do pré-moldado, laje em balanço e o paramento das defensas), levando em

consideração o caminhamento dos carregamentos, o qual deve representar a realidade. Neste

modelo, foram inseridos como carregamentos todas as ações previamente descritas.

Figura 8 - Modelo espacial do píer de barcaças e detalhe do carregamento de atracação

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Estudo do faseamento construtivo e suas consequências

Como visto anteriormente, a obra é executada em diferentes fases construtivas. Dessa forma,

além das ações incidentes previamente citadas, para o dimensionamento estrutural deve-se

considerar a sequência executiva de construção e montagem. Deve-se ter em mente que

geralmente em obras de grande porte, nem sempre a situação mais crítica para uma peça

estrutural ocorre durante sua fase de operação. As fases de transporte e as etapas construtivas

da estrutura (fases de descontinuidade e continuidade, carregamentos de construção) devem

ser analisadas, pois podem apresentar esforços solicitantes mais críticos.

De forma a exemplificar as consequências do faseamento construtivo no dimensionamento

dos elementos estruturais da obra, será apresentado nesse artigo o dimensionamento da viga

longitudinal que compõe a estrutura do píer, por tratar-se do elemento estrutural que propicia

uma análise mais detalhada e elaborada em comparação aos demais.

Para esse estudo, foram especificadas quatro etapas de análise estrutural:

- 1ª etapa: viga pré-moldada no instante em que é sacada das fôrmas de pré-moldagem pelas

alças de içamento, situação em que se tem uma viga biapoiada com dois balanços;

- 2ª etapa: instante posterior à segunda fase de concretagem, no qual se tem uma série de vigas

biapoiadas (peças pré-moldadas dispostas sobre as bolachas das estacas), uma vez que o

concreto proveniente da segunda fase de concretagem ainda encontra-se fresco;

- 3ª etapa: momento em que as canaletas já estão consolidadas, garantindo ao sistema o

comportamento de viga contínua, e o sistema deve suportar seu próprio peso próprio, bem

como o proveniente das lajes pi já dispostas e da massa de concreto fresco proveniente da

terceira fase de concretagem, além de uma sobrecarga de trabalho;

- 4ª etapa: etapa em que mantém-se o sistema de viga contínua, alterando-se a seção

transversal em função do concreto da terceira fase de concretagem já ter adquirido resistência

e alterando-se os carregamentos, uma vez que acrescenta-se a massa de concreto fresco da

quarta fase de concretagem.

A partir do momento em que o concreto da quarta fase de concretagem, disposto sobre as

lajes pi, adquire resistência, assume-se que o sistema passa a se comportar como um pórtico,

de tal forma que passem a valer as considerações referentes à fase operacional do

empreendimento, estudada com auxílio do modelo computacional, para fins de análise

estrutural. Os resultados do modelo computacional encontram-se em CARDOSO et al., 2015,

bem como, as análises e o estudo detalhado das etapas construtivas.

Figura 9: Seções transversais típicas das etapas estudadas no faseamento construtivo

Dimensionamento das armaduras

Escolheu-se a viga destacada na figura abaixo, situada no segundo vão entre estacas verticais.

Na Tabela 1, resumem-se as armaduras necessárias, que guiaram o detalhamento da estrutura.

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Figura 10 - Indicação da posição da viga longitudinal a ser detalhada

Tabela 1 - Resumo das armaduras necessárias para cada fase

Armaduras longitudinais e transversais: peça pré-moldada

Foram alocadas 11 barras de 25mm (N2, N4) na peça pré-moldada, para o atendimento à fase

crítica; as barras N2 garantem monoliticidade e transferência de esforços, enquanto que as

barras N4 são limitadas às extremidades da viga, em função da decalagem do diagrama de

momento fletor. Distribuem-se as barras simetricamente para evitar a indução de esforços.

Figura 11 - Armaduras longitudinais e transversais principais da peça pré-moldada

Já as 4 barras N1 resistem aos momentos negativos. Essas barras também extrapolam o limite

das peças, garantindo a transferência de esforços entre elementos. As armaduras transversais

principais da estrutural (N12, N13, N14) são montadas e posicionadas na peça pré-moldada.

Armaduras auxiliares: peça pré-moldada

Para o transporte do pré-moldado devem ser calculadas e detalhadas alças de içamento.

Figura 12 – Detalhamento e posicionamento das alças

Transversal

Inferior (cm2) Superior (cm

2) (cm

2/m)

1a Construtiva 4,0 4,0 5,02a Construtiva 5,0 4,0 5,03a Construtiva 12,9 23,9 16,84a Construtiva 25,8 25,8 16,8Operacional 46,7 26,7 16,8

FaseLongitudinal

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Estas alças devem ser elaboradas com cordoalhas, devido a sua maior capacidade de

deformação e acomodação de esforços provenientes de içamentos assimétricos ou não

conformes com o que foi projetado.

Armaduras longitudinais e transversais: segunda e terceira fase de concretagem in loco

Na segunda fase, adicionam-se armaduras que atendam aos momentos positivos e negativos

calculados na terceira etapa de análise do faseamento construtivo.

Antes da terceira fase alocam-se novas armaduras longitudinais e transversais. Destacam-se as

armaduras longitudinais superiores, que respondem aos momentos fletores negativos da

quarta e última etapa da análise do faseamento construtivo e as armaduras transversais que

resistem aos esforços provenientes da praça das defensas.

Figura 13 - Armaduras adicionadas na segunda e terceira fase de concretagem

Armaduras longitudinais e transversais: quarta, quinta e sexta fases de concretagem in loco

Na quarta fase posicionam-se as armaduras longitudinais que responderão aos momentos

negativos junto aos apoios durante a fase operacional. Nas últimas fases, as armaduras

adicionadas são aquelas necessárias para a adequada resistência e transmissão dos esforços

provenientes das defensas e do descarregador.

Figura 14 – Armaduras adicionadas na quarta, quinta e sexta fases de concretagem

Detalhamento das armaduras: pontos críticos

De acordo com o primeiro princípio básico da concepção, deve-se visualizar o caminhamento

das cargas; desde o ponto de aplicação até a fundação. Isso porque, ao analisarmos esses

caminhamentos, podemos observar pontos críticos que exigem detalhamentos específicos.

Neste artigo, trataremos sobre as mudanças de direção do eixo de uma estrutura, principais

pontos críticos encontrados em obras portuárias e que provocam mudanças significativas na

direção dos esforços internos, e assim, demandam análise cuidadosa de seu detalhamento.

Praça das defensas

A praça das defensas é um caso típico de nó de pórtico ortogonal com esforço solicitante de

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momento negativo. Nesse caso, a mudança dos esforços internos provoca tensões de tração

externa, na direção diagonal e assim, a armadura do banzo situada no lado externo deve ser

detalhada com raio de dobramento suficientemente grande para evitar que a pressão devido à

mudança de direção das barras da armadura cause fendilhamento do concreto.

Evita-se emendar as barras do banzo em nós de pórticos, próximos ao canto. Contudo, como

se trata da conexão do pré-moldado do paramento com a estrutura in loco, a emenda das

barras se faz necessária. É possível, nesse caso (moderada porcentagem de armadura),

executar emenda por traspasse de laços em gancho. Quando detalhada a emenda, deve-se

ainda adicionar barras transversais para resistir aos esforços de fendilhamento.

Conexão da estaca vertical com a viga longitudinal e da viga cavalete com as estacas

inclinadas

Assim como os paramentos das defensas, a transferência de carga da viga para a estaca

também é um caso típico de nó de pórtico.

Já para a viga cavalete, além do mecanismo de transferência de carga de nó de pórtico

promovida pela conexão desta com as estacas inclinadas, esta região também recebe

introdução de flexão (gerado pelo momento binário desenvolvido pelos esforços de tração de

uma estaca e de compressão concomitante de outra), e assim, necessita de reforço local.

Figura 15 - Pontos críticos (praça das defensas, conexão estaca vertical com viga

longitudinal e viga cavalete com estacas inclinadas)

Conclusões

Tendo em vista os principais desafios da concepção de obras portuárias apresentados nesse

artigo, concluímos que é possível, através de técnicas de engenharia e experiência de obra,

desenvolver projetos nessa área, visando economia e segurança.

Bibliografia CARDOSO, A.; RAUL, C.; ISHIHATA, C.; FERNANDES, T. Projeto de terminal portuário para

granéis sólidos: terminal portuário fronteira norte, Barcarena/PA. 2015. 352 p. Trabalho de

Conclusão de Curso – Escola Politécnica, Bacharelado em Engenharia Civil, Universidade de São

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ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118: Projeto de estruturas de

concreto: Procedimento. Rio de Janeiro: ABNT, 2014. 238 p.

GAYTHWAITE, J. W. Design of Marine Facilities for the Berthing, Mooring, and Repair of Vessels.

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