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Projeto de Combate a Pobreza Rural: Alternativas para o desenvolvimento socioeconômico das comunidades rurais no Vale do Mucuri – MG. A relevância do processo de descentralização das políticas públicas no Brasil vem sendo debatido pelos meios acadêmicos com uma considerável propriedade principalmente a partir da Carta Constitucional de 1988. Cabe ressaltar que o processo de formulação e implementação das políticas públicas no Brasil remonta-se ao inicio do século XX, período em que o país dava os primeiros passos no sentido de substituir o modelo econômico pautado na agroexportação, pelo modelo pautado na industrialização e urbanização. Dentre as iniciativas implementadas visando garantir a expansão do modelo de produção capitalista no Brasil, destaca-se a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs), conhecida como a Lei Eloi Chaves de 24 de janeiro de 1923, através do decreto nº. 4682, que instituiu a criação das CAPs nas empresas de estrada de ferro. O foco desta lei era diminuir a tensão entre capital/trabalho e criar uma coesão social propícia para o desenvolvimento do Capital. A respeito desse processo COHN acrescenta que: “Lei até certo ponto de defesa nacional, importantíssima para aqueles dias de inquietação constantes, porque decisiva em sua influência pacificadora dos meios trabalhistas e mesmo na contenção das greves que em sua progressão vinham cada vez mais prejudicando o ritmo da produção do país...” (COHN, 2008, p.14-15). Percebe-se que as políticas públicas foram sendo configuradas para dar sustentabilidade ao processo de industrialização iniciado no Brasil na primeira metade do século XX. Doravante, verifica-se uma grande centralização das políticas públicas no meio urbano, ficando as populações rurais totalmente desprotegidas e alijadas de qualquer processo de inclusão social e extremamente vitimizadas pela adoção de uma política de tecnificação e mecanização da produção agrícola. PALMEIRA nos sugere que: “... o setor agrícola, a partir de finais dos anos 60, absorveu quantidades crescentes de crédito agrícola, incorporou os chamados "insumos modernos" ao seu processo produtivo, tecnificando e mecanizando a produção, e integrou-se aos modernos circuitos de comercialização”(PALMEIRA, 1987, p.87). Observa-se que o modelo de desenvolvimento adotado no Brasil buscou a implementação do parque industrial brasileiro e a adoção de medidas de modernização da produção agrícola no país, segundo PALMEIRA:

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Projeto de Combate a Pobreza Rural: Alternativas para o desenvolvimento socioeconômico

das comunidades rurais no Vale do Mucuri – MG.

A relevância do processo de descentralização das políticas públicas no Brasil

vem sendo debatido pelos meios acadêmicos com uma considerável propriedade

principalmente a partir da Carta Constitucional de 1988.

Cabe ressaltar que o processo de formulação e implementação das políticas

públicas no Brasil remonta-se ao inicio do século XX, período em que o país dava os

primeiros passos no sentido de substituir o modelo econômico pautado na

agroexportação, pelo modelo pautado na industrialização e urbanização.

Dentre as iniciativas implementadas visando garantir a expansão do modelo de

produção capitalista no Brasil, destaca-se a criação das Caixas de Aposentadorias e

Pensões (CAPs), conhecida como a Lei Eloi Chaves de 24 de janeiro de 1923, através

do decreto nº. 4682, que instituiu a criação das CAPs nas empresas de estrada de ferro.

O foco desta lei era diminuir a tensão entre capital/trabalho e criar uma coesão social

propícia para o desenvolvimento do Capital. A respeito desse processo COHN

acrescenta que:

“Lei até certo ponto de defesa nacional, importantíssima para aqueles dias de inquietação constantes, porque decisiva em sua influência pacificadora dos meios trabalhistas e mesmo na contenção das greves que em sua progressão vinham cada vez mais prejudicando o ritmo da produção do país...” (COHN, 2008, p.14-15).

Percebe-se que as políticas públicas foram sendo configuradas para dar

sustentabilidade ao processo de industrialização iniciado no Brasil na primeira metade

do século XX. Doravante, verifica-se uma grande centralização das políticas públicas no

meio urbano, ficando as populações rurais totalmente desprotegidas e alijadas de

qualquer processo de inclusão social e extremamente vitimizadas pela adoção de uma

política de tecnificação e mecanização da produção agrícola. PALMEIRA nos sugere

que: “... o setor agrícola, a partir de finais dos anos 60, absorveu quantidades crescentes

de crédito agrícola, incorporou os chamados "insumos modernos" ao seu processo

produtivo, tecnificando e mecanizando a produção, e integrou-se aos modernos circuitos

de comercialização”(PALMEIRA, 1987, p.87).

Observa-se que o modelo de desenvolvimento adotado no Brasil buscou a

implementação do parque industrial brasileiro e a adoção de medidas de modernização

da produção agrícola no país, segundo PALMEIRA:

“Essa modernização, que se fez sem que a estrutura da propriedade rural fosse alterada, teve, no dizer dos economistas, "efeitos perversos": a propriedade tornou-se mais concentrada, as disparidades de renda aumentaram, o êxodo rural acentuou-se, aumentou a taxa de exploração da força de trabalho nas atividades agrícolas, cresceu a taxa de auto-exploração nas propriedades menores, piorou a qualidade de vida da população trabalhadora do campo. Por isso, os autores gostam de usar a expressão "modernização conservadora"(PALMEIRA, 1987, p 87).

O crescimento econômico balizado pela industrialização e urbanização foi

considerado sinônimo de desenvolvimento no século XX no Brasil. Diante desse

cenário observa-se a presença de políticas sociais fragmentadas de atendimento as

necessidades da população rural. Segundo Pessoa:

“As políticas de desenvolvimento implementadas no campo foram direcionadas para a expansão produtiva, favorecendo uma minoria de grandes proprietários de terra enquanto a maioria dos trabalhadores do campo sofreu o processo de deteriorização dos seus meios de vida a ponto de utilizar-se da migração como alternativa de sobrevivência (2012pg 70)”.

As migrações internas foram as grandes responsáveis pelo crescimento urbano e

o IBGE estima que, em 1970, de 30 milhões de migrantes, total acumulado de

residentes em municípios distintos daqueles em que nasceram, 21 milhões "se dirigiram

para as áreas urbanas" (FIBGE, 1979, p.23). George Martine, levando em consideração

também a migração rural-urbana intramunicipal estima que 7.299.000 migrantes se

deslocaram do campo para a cidade na década de 60 e 11.003.000 nos anos 70

(MARTINE, 1984, p.203).

Vale destacar que as regiões Norte e Nordeste de Minas Gerias também

vivenciaram um intenso processo de êxodo rural no século XX, essas regiões tem como

características municípios com menos de 15 mil habitantes cujo uma parte considerável

da população vivia e vive na zona rural e qualificam-se como pequenos agricultores.

Dados do Governo do Estado de Minas Gerais, apresentados no Manual de

Operações do Programa de Combate a Pobreza Rural (PCPR), relativos ao ano de 2010,

mostram que no Vale do Mucuri encontra-se uma população total de 511.145 mil

pessoas, dessas 315.860 vivem na urbana e 195.285 vivem na zona rural.

Os dados apresentados acima sugerem uma considerável concentração de

habitantes na zona rural de Minas Gerais e particularmente no Vale do Mucuri. Diante

disso fica claro a necessidade de elaboração e implementação de políticas sociais que

visem atender essa camada da população e que esse atendimento deve ser

operacionalizado não resgatando a cultura tecnocrática que norteou e de certa forma

norteia até os dias atuais a formulação e implementação das políticas sociais, mas sim

implementando novas formas de gestão que possibilitem à população beneficiária a

participação ativa durante os processos de elaboração, implementação e fiscalização das

políticas sociais.

Esse procedimento é importante, pois em meados dos anos 80, impulsionado

pela reorganização dos movimentos sociais, percebe-se o crescimento de novas

concepções no processo de formulação e implementação das políticas sociais, tal

modelo passa a valorizar aspectos democráticos na elaboração, implementação e

fiscalização das políticas sociais. Ainda segundo PESSOA:

Hoje se defende o modelo gestor bottonup, em que se pretende que a política seja configurada a partir dos problemas que visa, e que seu processo de implementação incorpore os diferentes atores públicos e privados envolvidos, dando ênfase a participação do seu público alvo (2012 p. 72).

O crescimento da participação popular sugere um novo modelo de gestão das

políticas sociais; com a valorização das variáveis locais e regionais, a elaboração das

políticas sociais tende a aproximar seus objetivos dos anseios da população.

Diante do desafio de implementar políticas inovadoras que combatam a pobreza

rural e possibilitem um maior envolvimento das populações beneficiárias no processo

de concepção, implementação e avaliação de políticas sociais, o governo do estado de

Minas Gerais criou em 2003 a Secretaria Extraordinária de Desenvolvimento dos Vales

do Mucuri, Jequitinhonha e Norte de Minas – SEDVAN. De acordo com informações

fornecidas pela mesma:

A criação da secretaria fez com que Minas Gerais se tornasse uma referência nacional e internacional na geração, adequação e utilização de um modelo de Governança Social, com tecnologias sociais e metodologias emancipatórias eficazes na construção de desenvolvimento sustentável em comunidades de baixa renda e baixa escolaridade (Folheto Governo de Minas- Construindo um novo tempo, [s.d]).

A SEDVAN postula ainda que sua criação é um feito inédito, pois busca

alternativas para uma região que convive “simultaneamente com a pobreza e muitas

potencialidades naturais, culturais, sociais e econômicas” (IDENE, 2011).

Reconhecendo o modo mal sucedido como se operou o desenvolvimento no Brasil, a

instituição se julga consciente da necessidade de buscar novas estratégias que absorvam

os conhecimentos locais e implementem “com eficiência, criatividade e permanente

participação popular, projetos e programas que resultem em efetivos avanços para o

bem estar da sociedade” (IDENE, 2011).

A partir dessa nova concepção de formulação, implementação e participação no

campo das políticas sociais o governo do estado de Minas Gerais criou em 2006 o

Programa de Combate a Pobreza Rural – PCPR. Este objetiva apoiar e incentivar a

organização social e econômica de trabalhadores rurais desde que estejam organizados

em grupos de interesse comum, habitando um mesmo espaço social.

Com a assinatura do Acordo de Empréstimo com o Banco Mundial, em 31 de Janeiro de 2006, o governo de Minas Gerais, depois de doze anos sem receber financiamento desse banco, contratou um empréstimo de US$ 70 Milhões( em duas etapas de US$ 35 milhões) exclusivo para aplicação no Projeto de Combate a Pobreza Rural – PCPR. (BRANDÃO, 2009, p 335).

O PCPR busca incentivar a organização das associações de trabalhadores rurais

desde que estejam legalmente constituídos enquanto associação. Os recursos - não

reembolsáveis - destinam-se ao financiamento de subprojetos de natureza produtiva, tais

como, casas de farinha, mecanização agrícola, unidades de beneficiamento de grãos,

piscicultura, agricultura, bovino cultura, caprino cultura, hortas comunitárias, como

também podem ser financiados subprojetos de natureza social, nesses casos para a

construção ou reforma de escolas, postos de saúde, melhorias habitacionais, construção

de centro social) e de infraestrutura básica( barragens, poços tubulares, cisternas. É

importante salientar que existe uma gama enorme de subprojetos de natureza produtiva,

social e de infraestrutural que podem ser financiados pelo PCPR, entretanto, nenhum

projeto pode ser superior ao valor de R$100 mil reais.

Sem a pretensão de esgotar o assunto, esse artigo visa resgatar a trajetória

histórica do PCPR enquanto programa social de combate a pobreza no meio rural e

elencar suas principais características.