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UFSC PROJETO ANEEL/UFSC Regras do Mercado Atacadista de Energia Elétrica Junho de 2000

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UFSC

PROJETO ANEEL/UFSCRegras do Mercado Atacadista de

Energia Elétrica

Junho de 2000

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APRESENTAÇÃO

Este relatório se insere no escopo de um convênio estabelecido entre a Universidade Fede-ral de Santa Catarina (UFSC) e a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) que visao desenvolvimento de estudos e pesquisas relacionados com a regulação do mercado deenergia elétrica.

Neste relatório apresentamos um parecer técnico sobre as “Regras do Mercado Atacadistade Energia Elétrica”, com ênfase no processo de formação do preço, onde discutimos osprocedimentos ex-ante e ex-post, e na administração do excedente financeiro gerado pelatransferência de energia entre submercados.

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EQUIPE DE TRABALHO

Prof. Edson Luiz da Silva, Dr. Eng.Prof. Marciano Morozowski Filho, D. Sc.

Eng. Adriano de Souza, M. Eng.Eng. Erlon Cristian Finardi, M. Eng

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................... 42 ESTRUTURA DAS REGRAS DO MAE................................................................................................... 6

2.1 Apresentação e Consistência das Regras ............................................................................................ 62.2 Adequação das Regras ao Mercado Brasileiro.................................................................................... 7

3 CÁLCULO DO PREÇO MAE : EX-ANTE X EX-POST............................................................................ 93.1 Formação do Preço MAE.................................................................................................................... 93.2 Preço MAE Ex-ante x Ex-post .......................................................................................................... 10

4 ALOCAÇÃO DO EXCEDENTE FINANCEIRO .................................................................................... 154.1 Introdução ......................................................................................................................................... 154.2 Descrição do Problema ..................................................................................................................... 154.3 MRE.................................................................................................................................................. 174.4 Alocação do Excedente Financeiro entre Submercados.................................................................... 18

5 REFERÊNCIAS........................................................................................................................................ 20

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1 INTRODUÇÃOA reforma do setor de energia elétrica se apoia na introdução da competição nos segmentosde geração e comercialização (G&C), por um lado, e na premissa de que os preços reflitamos custos reais, coerentemente com o uso, nos segmentos de transmissão e distribuição, poroutro. Assim, nos segmentos de G&C, o enfoque de obrigatoriedade de servir é substituídopor um enfoque de mercado de energia elétrica, onde o preço serve como instrumento deorientação aos agentes. Em resumo, a energia elétrica é tratada como uma commodity.

Constituem aspectos chave do processo de reestruturação: o mecanismo de formação depreços, o livre acesso à transmissão e distribuição e a regulação do mercado. Nos mercadoscompetitivos, é legítimo que os agentes maximizem os seus benefícios; portanto, é legítimoque o agente regulador atue de forma a estimular uma competição saudável, ao mesmotempo em que protege os direitos dos consumidores cativos. Nestes mercados, a ação doagente regulador se dá de duas formas principais: através do oferecimento de sinais econô-micos que orientem os agentes do mercado a caminharem em uma direção considerada de-sejável para o país e através de limites à participação de mercado.

Na formação de preços, que é inerente à toda atividade industrial, é socialmente desejávelque os preços reflitam os custos de produção. Ao mesmo tempo, para que haja um amplia-ção consistente da oferta de energia, é necessário que os agentes de geração possam recupe-rar os seus custos e obtenham lucros.

No caso brasileiro, que apresenta um sistema gerador predominantemente hidroelétrico, oprocesso de formação de preço se distingue das práticas observadas em outros países. Porexemplo, diferentemente de outros mercados, onde os geradores declaram o preço, no MAEos geradores informam suas disponibilidades técnicas.

Não obstante a essas particularidades, os requisitos de transparência, reprodutibilidade deresultados e neutralidade dos agentes de mercado, devem ser mantidos. Para isso, é essenci-al o estabelecimento das “Regras do Mercado Atacadista de Energia Elétrica”, cuja análiseconstitui o objeto deste documento, com base nos seguintes aspectos :

♦ impactos para o consumidor;

♦ eficiência econômica;

♦ impactos para a competição;

♦ prática de manipulação do mercado pelos agentes (gaming);

♦ alternativas às regras, quando necessário.As regras, por sua vez, podem ser agrupadas como segue:

♦ formação do preço MAE;

♦ encargos de serviços do sistema;

♦ mecanismo de realocação de energia (MRE);

♦ alocação do excedente financeiro;

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♦ cálculo dos encargos de capacidade;

♦ processo de contabilização e liquidação;

♦ penalidades.

Este documento enfatiza o processo de formação de preços, particularmente nos aspectosrelacionados a uma fixação ex-ante ou ex-post, e na alocação dos excedentes financeirosresultantes da transferência de energia entre submercados.

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2 ESTRUTURA DAS REGRAS DO MAEEm nosso entendimento, existem dois aspectos de ordem geral a serem analisados:

♦ apresentação e consistência das regras;

♦ conteúdo das regras;

2.1 Apresentação e Consistência das RegrasEm qualquer mercado de energia elétrica, os atributos de transparência, unicidade e repro-dutibilidade de resultados são fundamentais. Para atender a esses atributos e evitar proble-mas de interpretação, as regras devem ser expressas em forma algébrica. Portanto, as regrasdo MAE seguem o padrão adotado internacionalmente. Não obstante, apresentam-se algu-mas sugestões que visam aperfeiçoar o processo de formulação e facilitar o entendimentodas regras do MAE por parte dos agentes de mercado.

♦ Sempre que possível, a nomenclatura (nomes de variáveis e acrônimos) usadana formulação verbal e algébrica das regras deveria ser consistente com a ter-minologia tradicionalmente usada no planejamento e na operação do sistemaelétrico brasileiro.

♦ Um processo de análise sistemática das regras do MAE deveria ser estabelecidovisando assegurar a consistência interna do conjunto de regras, identificar vazi-os ou redundâncias regulatórias e delimitar o alcance das alterações que foramou que vierem a ser introduzidas nestas regras.

A fim de ilustrar a nossa preocupação, podemos tomar como exemplo, o processo de liqüi-dação dos encargos de serviços do sistema, no tocante aos geradores restritos. Nesse casoem particular temos dúvida se os geradores participantes do MRE estão ou não recebendodupla remuneração.

Tanto num caso como no outro, seria indispensável uma participação efetiva de todos osagentes, o que justifica também o esforço a ser despendido na melhoria da apresentação dasregras.

Conceitualmente, considera-se que as regras do MAE cobrem todos os aspectos relaciona-dos ao funcionamento eficiente do mercado, num horizonte de curto e médio prazos. Noentanto, a inexistência de estudos abrangentes sobre os impactos de critérios e parâmetrosregulatórios sobre o comportamento dos diversos tipos de agentes dificulta uma avaliaçãoobjetiva da eficiência econômica do MAE, num horizonte de longo prazo.

Para ilustrar essa dificuldade, servem como exemplo as regras relacionadas ao encargo decapacidade, para as quais podem ser formuladas algumas questões:

♦ Qual o risco de o encargo de capacidade distorcer o Preço MAE ?

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♦ Em condições hidrológicas favoráveis, os benefícios de energia secundária nãoseriam suficientes para remunerar a capacidade instalada em centrais hidroelé-tricas ?

♦ Qual o impacto de uma eventual participação de consumidores livres no geren-ciamento da demanda de ponta via contratos de longo prazo ?

2.2 Adequação das Regras ao Mercado BrasileiroO atual modelo de despacho e formação de preço foi concebido com base na experiência deoutros mercados de energia elétrica, cujos sistemas elétricos apresentam em geral caracte-rísticas técnicas e operacionais diferentes do existente no Brasil. O reconhecimento destasdiferenças resultou, entre outras medidas, na adoção de um modelo de despacho tight-poole na criação do Mecanismo de Realocação de Energia (MRE).

No modelo em implantação no Brasil, observa-se a coexistência de componentes de merca-dos regulados e de mercados competitivos, o que dificulta uma comparação direta destemodelo com os modelos implantados em outros países.

Por exemplo, no modelo de mercado proposto para o Brasil, um dos pontos de maior preo-cupação reside no valor atribuído ao custo do déficit, que irá influir, diretamente ou indire-tamente, no custo marginal de curto prazo e, consequentemente, no Preço MAE. Num sis-tema de mercado “puro”, o custo do déficit seria estabelecido, implicitamente, pela disposi-ção a pagar dos consumidores livres, evidenciada pelas ofertas econômicas para redução dademanda. Este processo admite que o racionamento seria feito apenas via preço, sem qual-quer interferência de autoridades governamentais.

Desse modo, uma análise mais aprofundada de adequação das regras ao mercado brasileirorequer uma avaliação das potenciais incongruências entre o modelo de mercado postulado,conforme refletido nas regras atuais, e um modelo de mercado mais realista, conforme re-fletido pela ação (ou inação) dos agentes de mercado.

Esta análise poderá ser feita algum tempo após o início de atuação do MAE, na medida emque se estabeleça um conjunto de indicadores de mercado1 e que se estabeleça um meca-nismo de acompanhamento e de aferição (benchmarking) destes indicadores. Outra possi-bilidade de aprofundar esta análise seria através da construção de modelos matemáticos(normativos ou descritivos) com base em dados experimentais e no conjunto de regras vi-gente num certo momento. Um aspecto interessante da modelagem seria servir como su-porte para a identificação dos indicadores relevantes e para a especificação do mecanismode acompanhamento.

1 Com a condição de que indicadores de mercado comparáveis estejam disponíveis em outros mercados e/oupaíses.

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3 CÁLCULO DO PREÇO MAE : EX-ANTE X EX-POST

Neste capítulo, tem-se por objetivo confrontar os processos de formação de preço ex-ante eex-post à operação do sistema. Para tanto, inicialmente descrevemos o processo de forma-ção do Preço MAE, para posteriormente analisarmos as duas possibilidades de formação depreço.

3.1 Formação do Preço MAEO mercado brasileiro de eletricidade se apoia no denominado modelo Tight-Pool. O agenteoperador do sistema, objetivando a minimização de custo, despacha os geradores disponí-veis por ordem de mérito, até que a carga seja plenamente atendida. Seguindo os princípiosda teoria microeconômica que, sob condições de concorrência perfeita, os preços tendemaos custos marginais de curto prazo, o preço de equilíbrio do mercado é determinado pelocusto incremental do último gerador despachado (o de maior custo incremental).

Diferentemente de outros mercados de eletricidade, onde geradores e demanda apresentampreços para produção e consumo, respectivamente, a forte predominância hidráulica denosso sistema requer que o despacho do sistema seja realizado considerando as conseqüên-cias futuras de cada decisão; ou seja, deve-se quantificar e internalizar ao modelo de despa-cho o impacto de cada decisão sobre os custos futuros de combustíveis e eventuais déficits.

A característica apresentada anteriormente, acrescida da existência de vínculos hidráulicosentre usinas e pertencentes a distintos proprietários, constitui um obstáculo para a imple-mentação de um modelo de despacho baseado em ofertas de preços dos geradores. Assim, asolução encontrada apoia-se no uso de uma cadeia de modelos de otimização hidrotérmica.

Nessa cadeia de modelos, o despacho é determinado com base nos preços ofertados porgeradores termelétricos (estes preços são constantes para um período longo) e no custo dodéficit. Os geradores hidráulicos não fazem oferta de preços para o operador do sistemarealizar o despacho. O modelo de despacho adotado incorpora apropriadamente, o valorimplícito da água armazenada, possibilitando uma otimização dos recursos do sistema; istoé, despacha-se o sistema ao mínimo custo esperado. O preço MAE é então determinadopelo recurso de maior custo incremental que foi utilizado.

Rigorosamente falando, o preço de equilíbrio do mercado, aqui denominado de PreçoMAE, deveria refletir a escassez dos recursos de geração e a disposição a pagar dos consu-midores, continuamente. Na prática, entretanto, a solução encontrada para o cálculo dopreço se apoia na definição de intervalos de apuração de 30 minutos ou 1 hora, calculando-se um preço médio para o intervalo. No mercado brasileiro, o Preço MAE será calculado acada 30 minutos. Este modelo imita as caraterísticas de um despacho centralizado, tradicio-nalmente usado na estrutura de mercado monopolista (caraterizado pela sua estrutura verti-cal e a falta de competição).

Visando refletir a real escassez de recursos de geração para distintas zonas do sistema, cal-culam-se preços para cada uma dessas zonas, que são denominadas de submercados. Comisso, tem-se uma sinalização econômica para a localização eficiente de novas usinas.

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3.2 Preço MAE Ex-ante x Ex-post

O Preço MAE pode ser calculado ex-ante ou ex-post à operação do sistema. No procedi-mento ex-ante, o preço é calculado anteriormente à operação em tempo real, com base nosrequisitos de demanda, nas disponibilidades declaradas dos geradores hidrelétricos, na pre-visão de afluências e nas disponibilidades e preços dos geradores termelétricos . No proce-dimento ex-post, o preço é calculado posteriormente à operação em tempo real, com basenas disponibilidades efetivas das unidades geradoras, nas afluências medidas e na demandamedida.

Na realização de uma transação comercial, é sempre desejável que o fluxo financeiro re-sultante corresponda a uma medida direta da quantidade da commodity que está sendo ne-gociada. Com base nessa premissa, pode-se afirmar que o preço ex-post é a melhor opção,na medida em que o preço reflete o real valor dos recursos na operação em tempo real. Poroutro lado, a transação será realizada sem conhecimento do preço exato, o que constituiuma desvantagem deste procedimento.

O preço ex-ante supera este inconveniente e tem como vantagem adicional facilitar o ge-renciamento pelo lado da demanda (demand side bidding). De fato, embora a demanda sejapraticamente inelástica2 a curto-prazo (um dia à frente, p.ex.), é possível exercer um certonível de gerenciamento da demanda, o que constitui uma característica atraente desta op-ção, na medida em que permite ao mercado modular o consumo de acordo com o preçopreviamente estabelecido (ex-ante).

Na proposta apresentada pela ASMAE, prevê-se o cálculo ex-post do preço MAE, precedi-do de um cálculo ex-ante com finalidade indicativa. Com isto, espera-se que o cálculo ex-post do preço, combinado com o preço ex-ante indicativo, mantenha as características posi-tivas de ambos os métodos.

Considerando que os geradores despachados por mérito são remunerados ao Preço MAE, afixação de preço ex-ante pode estimular a manipulação de informações (gaming), com opropósito de elevar o Preço MAE. Para exemplificar, geradores com custo de produçãomais baixo poderão declarar-se indisponíveis para forçar uma elevação dos preços; poisgeradores infra-marginais3 são remunerados ao Preço MAE, independentemente de seuscustos de produção. Esse tipo de estratégia poderá ser utilizada com vantagem por empresasque possuam um parque gerador com custos dispersos, ou então por coalizão entre empre-sas geradoras. Empresas com uma única central não tem incentivos a falsas declarações,pois a planta não despachada não poderá ser substituída por outra da mesma empresa e todaa renda será perdida.

Na verdade, o preço ex-post não eliminaria completamente a possibilidade de gaming, poisum gerador com baixo custo de produção pode se declarar indisponível para forçar a eleva-ção do Preço MAE a ser calculado no dia seguinte. Contudo, redeclarações genuínas deaumento de disponibilidade seriam também estimuladas, pois geradores com essa condiçãodesejariam influir na formação do preço. Já o preço ex-ante não estimula geradores com

2 No curto prazo, o consumidor tem dificuldade de gerenciar o seu nível de consumo em resposta ao preço daenergia. A facilidade de responder ao preço restringe-se praticamente aos consumidores com autoprodução.3 Geradores com custos de produção inferiores ao custo de produção do gerador marginal.

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capacidade adicional disponível a apresentar redeclaração de disponibilidade, pois seriampenalizados pelo preço pré-fixado. Além disso, redeclarações falsas dificilmente seriampunidas, dada a impossibilidade prática de distinguir entre uma redeclaração falsa de dispo-nibilidade e outra verdadeira.

Em ambos os casos, declarações de disponibilidades acima das reais não são em geral dointeresse dos geradores. No procedimento ex-ante, o preço tenderia a cair e o gerador seriapenalizado por desvio de geração. No procedimento ex-post, embora o preço não caia, ogerador é penalizado por desvio de geração em relação ao programado.

A análise anterior focalizou apenas o lado dos geradores. É importante não perder de vista ocomportamento dos consumidores, diretamente ou através de suas distribuidoras. Assim,caso se implemente um processo de preço ex-ante, as distribuidoras se sentiriam estimula-das a declarar suas demandas para menor. Nesses casos, torna-se necessário a implementa-ção de arranjos (na forma de serviços ancilares, p.ex.) destinados à cobertura dos desbalan-ços de geração e demanda.

No mercado brasileiro, em sua fase inicial, o problema descrito no parágrafo anterior não semanifesta, pois compete ao Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) desempenhar afunção de previsão de demanda. Este fato justifica a razão pela qual esse tipo de análise temse concentrado sobre o comportamento dos geradores.

Mesmo considerando a neutralidade do ONS na previsão da demanda, erros de previsão sãoinevitáveis. Assim, na fixação de preço ex-ante, esses erros podem distorcer o preço verifi-cado no despacho em tempo real. No procedimento ex-post, o Preço MAE independe daqualidade da previsão da demanda.

Na justificativa apresentada pelo COEX, em defesa do preço ex-post, é afirmado que o “oencargo de serviço de sistema será menor”. Isto realmente é verdadeiro, pois os desvios degeração serão medidos em relação à programação ex-post, que é definida a partir de dispo-nibilidades e demandas reais, sem considerar as restrições de transmissão internas em cadasubmercado. Em outras palavras, as gerações reais são medidas em relação a referênciasbaseadas em cargas e disponibilidades reais. Não obstante, cabe observar que se separarmoso consumo efetivo em duas partes, uma liquidada ao preço MAE e outra liquidada via en-cargo dos serviços do sistema, se a última diminui a outra aumenta. Como a primeira par-cela é remunerada ao Preço MAE, é possível que a redução do encargo de serviço de siste-ma possa ser neutralizada pelo aumento da outra parcela.

No caso de uma fixação de preço ex-ante, dado que a previsão de demanda poderá ser rea-lizada tanto para maior quanto para menor, um aumento ou diminuição do encargo de ser-viço de sistema poderá ser neutralizado pelo montante pago ao Preço MAE.

Cabe observar que, para os geradores, a abordagem ex-post é mais interessante, pois sempreque houver uma falha de geração antes, ou mesmo durante a operação em tempo real, emtese, o Preço MAE sobe, garantindo que todos os geradores despachados pelo mérito eco-nômico tenham um aumento de renda para os montantes não contratados, pois todos serãoremunerados com base no custo do último recurso despachado (Preço MAE). Na aborda-gem ex-ante, a quebra de geradores a partir do momento do cálculo do preço faria com queos geradores despachados para cobrir a lacuna de geração recebessem o seu custo variável enão o Preço MAE. Com isso, todos os geradores despachados por ordem de mérito, seriam

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remunerados, para os montantes não contratados, com base em um Preço MAE não afetadopela quebra de geração.

No parágrafo anterior, quando falamos que na fixação de preço ex-post, em tese o PreçoMAE deverá subir, estamos nos resguardando pelo fato de que, em geral, o Preço MAE,será determinado pelo valor da água, que poderá ser menos sensível às alterações de dispo-nibilidades de curto prazo.

Conclusivamente, salientamos os seguintes pontos da discussão anterior :

Preço ex-ante

♦ não reflete a real escassez do recurso de geração na operação do sistema, po-dendo ocasionar redução de receita para os geradores infra-marginais;

♦ a conclusão anterior poderá estimular a manipulação de informações relativasàs declarações de disponibilidades, o que requer um sistema eficaz de monito-ração e aplicação de penalidades;

♦ não estimula a apresentação de redeclarações verdadeiras de disponibilidadespor parte dos geradores;

♦ caso os consumidores livres ou empresas distribuidoras venham a realizar assuas previsões de demanda, haverá um estimulo para a prática de “gaming”(declarando carga para menor), o que requer a definição de arranjos regulatóri-os (aplicação de penalidades) que desestimulem essa prática;

♦ possibilita o gerenciamento pelo lado da demanda (demand side bidding);

♦ na ausência de erros significativos de previsão de demanda, esse procedimentotem a tendência de não alterar o Preço MAE em eventos de quebra de geração,fazendo com que as demandas não contratadas paguem uma maior parcela deencargo de serviço de sistema, mas que pode ser interessante, dado que a par-cela paga no MAE tende a ser menor. A prática é benéfica para as demandasnão contratadas.

Preço ex-post

♦ reflete o real valor dos recursos de geração na operação do sistema, garantindoaos geradores infra-marginais, para a parcela de energia não contratada, umareceita igual ou superior àquela obtida por um procedimento ex-ante;

♦ a exemplo do procedimento ex-ante, ainda poderá haver interesse na apresenta-ção de falsas declarações de indisponibilidade, visando a elevar o Preço MAE aser calculado no dia seguinte;

♦ estimula a apresentação de redeclarações verdadeiras de disponibilidades porparte dos geradores;

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♦ inibe a prática de “gaming” por parte de consumidores livres ou de distribuido-ras, caso eles, no futuro, venham a realizar às suas projeções de demanda;

♦ combinado com um preço indicativo calculado ex-ante possibilita o gerencia-mento da demanda;

♦ tem a tendência de alterar o Preço MAE em eventos de quebra de geração, fa-zendo com que as demandas paguem um preço maior para os montantes nãocontratados, embora os encargos de serviço de sistema diminuam.

Confrontando-se os pontos salientados anteriormente, acreditamos que a formação de preçoex-post confere uma maior confiança ao mercado, embora possa causar maiores custos àsdemandas não contratadas em eventos de falha de geradores na medida em que o PreçoMAE tende a subir. Na prática essa tendência de aumento de preço poderá não se realizar,dado que alterações de disponibilidade dificilmente causarão mudanças significativas dovalor da água.

Por essas razões e considerando que o procedimento ex-post poderá ser realizado conjugadoa um preço indicativo ex-ante, somos de parecer favorável a adoção desse procedimento.

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4 ALOCAÇÃO DO EXCEDENTE FINANCEIRO

4.1 IntroduçãoEste capítulo tem por objetivo avaliar e emitir um parecer sobre o procedimento propostopara alocação do excedente financeiro gerado entre submercados. Para tanto, descreve-seinicialmente o problema em foco e analisa-se o Mecanismo de Realocação de Energia(MRE). A análise do MRE se faz necessária pois parte do excedente financeiro será utiliza-da para aliviar as exposições de geradores que tenham obtido crédito de energia de outrosubmercado, com menor preço, via MRE.

4.2 Descrição do ProblemaQuando não há restrições de transmissão entre submercados, os preços se igualam e omontante pago pelos consumidores corresponde exatamente ao montante recebido pelosgeradores; consequentemente não existem excedentes financeiros. Em caso contrário, gera-se um excedente financeiro, associado à transferência de energia entre submercados compreços MAE diferentes. O submercado importador está exposto a um preço mais alto, demodo que a energia que está sendo importada, e que foi “vendida” no submercado de ori-gem a um preço mais baixo, recebe o preço do submercado importador, tendo-se então umexcedente de renda causado pela diferença de preços.

O excedente financeiro, a princípio, deveria ser alocado à transmissão, dado que ela estáviabilizando a transferência de energia de um submercado com menor preço para um outrocom preço maior. Contudo, dado que a transmissão opera em um regime de monopólio re-gulado, onde a receita pela prestação do serviço é regulada, o excedente financeiro deveriaser utilizado apenas para reduzir os encargos de transmissão e não para propiciar ganhos derenda ao detentor da transmissão.

A presença de restrições de transmissão entre submercados, além de gerar o excedente fi-nanceiro traz outras conseqüências, como segue:

♦ os geradores da área exportadora podem ficar expostos a custos de oportuni-dade na medida em que poderão exportar menos do que gostariam;

♦ os geradores da área importadora são beneficiados, pois serão remunerados aum preço mais alto;

♦ os consumidores da área importadora ficam expostos a preços mais altos.A existência de excedentes financeiros, associada ao fato de que restrições de transmissãoafetam os diversos agentes do mercado de formas distintas, dá origem ao problema de alo-cação desses excedentes.

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As atuais regras do MAE determinam o seguinte esquema de alocação dos recursos oriun-dos do excedente financeiro entre submercados:

♦ utilizar o excedente para redução dos riscos dos geradores decorrentes de con-tratos envolvendo diferentes submercados;

♦ utilizar o excedente para redução dos riscos devido as exposições causadas poralocar energia, através do MRE, aos geradores em um submercado, que não sejao seu próprio;

♦ utilizar o excedente financeiro para redução dos custos dos encargos de uso dosistema de transmissão, alocando-se um nono (1/9) do fundo referente ao exce-dente financeiro para essa finalidade, após o décimo mês de operação do MAE.

A energia assegurada ajustada do MRE será alocada aos geradores, de acordo com o preçovigente no submercado onde a energia tenha sido produzida, a fim de que a contabilizaçãodo submercado do MAE fique equilibrada. No entanto, esta alocação expõe os geradoresaos riscos do preço: o preço que receberão pela energia alocada pelo MRE não será o preçovigente em seu próprio submercado, mas sim o preço do submercado onde esta energia foigerada. Este preço tende a ser inferior ao preço do MAE em seu próprio submercado, pois aalocação será feita, geralmente, a partir de áreas com excesso de geração àquelas áreas comgeração insuficiente.

Em tais circunstâncias os geradores enfrentarão riscos de preço pois:

♦ em seu próprio submercado, os geradores terão um volume de energia credita-do inferior ao volume de energia assegurada;

♦ esta diferença de energia será a eles alocada a partir de um outro submercado,com um preço provavelmente inferior;

♦ o resultado líquido será que o gerador sofrerá uma exposição ao volume deenergia realocada de outro submercado, multiplicado pela diferença entre opreço do MAE naquele submercado e o preço em seu próprio submercado. Estadiferença poderá ser positiva ou negativa, dependendo das condições predo-minantes no sistema.

Antes de analisarmos o esquema proposto, descreveremos a seguir os conceitos relaciona-dos com o MRE, face ao estreito relacionamento deste mecanismo com a alocação do ex-cedente financeiro.

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4.3 MRESistemas hidrotérmicos, de uma forma geral, e particularmente o sistema brasileiro, têmuma acentuada volatilidade dos custos marginais. Tal característica poderia expor todos osgeradores a riscos intoleráveis.

Como forma de contornar o problema, foi criado o MRE. Esse mecanismo possibilita atransferência de energia das usinas superavitárias para as deficitárias, quando o volumetotal de energia produzido pelas usinas hidrelétricas do MAE for suficiente para atender suaenergia garantida global. Ressalte-se que embora o MRE proteja os geradores hidrelétricosindividuais do risco hidrológico, esse mecanismo não evita que o sistema passe por situa-ções com dramáticas elevações do Preço MAE, caso a expansão do sistema não aconteça deforma sustentada.

Através do MRE, as usinas participantes do mecanismo são consideradas como unidades denegócio de uma grande corporação, onde é permitido transferências de recursos entre essasunidades, visando estabilizar o nível de renda de cada uma delas.

Com esse mecanismo, se o nível de produção total for inferior à energia assegurada do sis-tema, todos os geradores têm as suas energias asseguradas ajustadas para um nível inferior,proporcionalmente às suas alocações de energias asseguradas. Por outro lado, caso existaum excedente de produção em relação à energia assegurada total, tal excedente, denomina-do de energia secundária, é alocado aos participantes.

O MRE prevê uma escala de prioridades na alocação de energia entre os seus participantes;isto é, primeiramente, o excedente de produção de um submercado é alocado nele próprioaté que os níveis de energia assegurada das usinas deficitárias sejam restabelecidos; poste-riormente, caso ainda se tenha excedente, o mesmo é alocado às usinas dos submercadosque produziram abaixo de suas energias asseguradas. Finalmente, uma vez restabelecido asenergias asseguradas de todo o sistema, o excedente remanescente, quando houver, consti-tui a energia secundária do sistema, sendo rateado da seguinte forma :

♦ metade da energia secundária total deverá ser alocada às usinas na proporçãode seus níveis de energia assegurada;

♦ a outra metade da energia secundária total deverá ser alocada às usinas queproduziram acima de seus níveis de energia assegurada.

Partindo do princípio que a água é um recurso do sistema e não de cada gerador individu-almente, entendemos que qualquer procedimento que prioritariamente restabeleça os níveisde energia assegurada de todas as usinas é o mais eficiente, além de estabilizar o fluxo decaixa dos geradores. Se isto não fosse feito seguramente, num cenário otimista, os gerado-res buscariam algum outro mecanismo de proteção e, consequentemente, repassariam oscustos financeiros associados no preço de seus contratos. Num cenário pessimista, e prova-velmente o mais realista, os investidores se afastariam do processo de expansão.

De todas as regras estabelecidas para o MRE, o ponto que merece uma discussão maisaprofundada corresponde à alocação da energia secundária. A pergunta evidente que surgeé : por que alocar a energia secundária na proporção descrita anteriormente ?

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Uma alocação baseada apenas nas energias asseguradas tem como principal argumentaçãoo fato dos despachos não serem controlados pelos geradores e, consequentemente, a produ-ção de energia secundária fugir ao controle do detentor da usina.

Como desvantagens dessa abordagem, no curto prazo, tem-se a possibilidade de os gerado-res não se sentirem estimulados para declararem as suas reais disponibilidades com a fina-lidade de produzirem energia secundária. Os geradores poderão até, definir planos de ma-nutenção que não busquem a otimização dos recursos hídricos. A longo prazo, usinas hi-dráulicas existentes e novas usinas não terão estímulos para proporcionar incrementos demotorização pois os benefícios obtidos da produção da energia secundária independem dadecisão de investimento. A falta de estímulos para incrementos de motorização, além depossibilitar o uso eficiente dos recursos hídricos poderá também comprometer o nível dacapacidade de atendimento à ponta do sistema.

Alternativamente, à abordagem anterior, tem-se um esquema de alocação baseado apenasna produção da energia firme. Nessa abordagem, as desvantagens da abordagem anteriortornam-se vantagens e vice-versa.

A argumentação do COEX para um regra que abriga parcialmente as duas abordagens énitidamente uma ação conciliadora que, em nossa visão, embora seja aceitável pelos gera-dores, poderá trazer prejuízos aos consumidores na medida em que a busca de eficiência,tanto a curto prazo, como a longo prazo é comprometida. Para o consumidor, uma alocaçãode energia secundária onde apenas as usinas que produziram acima de suas energias asse-guradas seriam beneficiadas, garantiria, no curto prazo, programas de manutenção eficien-tes e estímulos a declarações verdadeiras de disponibilidades. No longo prazo, haveria es-tímulo aos incrementos de motorização que possibilitariam um melhor aproveitamento dosrecursos hídricos, como também, poderiam reduzir ou até mesmo eliminar o encargo decapacidade do sistema.

4.4 Alocação do Excedente Financeiro entre SubmercadosA proposta de alocação do excedente financeiro, numa visão de curto prazo, é apropriadapois reduz os riscos para os geradores, embora a carga do submercado importador seja oagente financiador.

O arranjo proposto prevê ainda que parte do excedente financeiro será utilizado para redu-zir os encargos de transmissão. Tal procedimento é uma forma de reduzir os custos finaispara o consumidor. Para um observador externo é difícil avaliar se o montante destinado àredução dos encargos de transmissão é adequado ou não. Qualquer valor que tenha sidodestinado, sem a apresentação de um estudo, será sempre questionável.

Outro ponto a destacar é o fato de que ambos, geradores e distribuidores, serão beneficiadospela redução dos encargos de transmissão. Vale lembrar que geradores e carga comparti-lham os custos totais na proporção de 50 % cada um. Um procedimento mais adequado

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seria restringir a aplicação do excedente financeiro à redução dos encargos de transmissãopago pelas distribuidoras.

O grande problema no gerenciamento do congestionamento entre submercados surge quan-do se estende o horizonte de análise para o longo prazo. Isso se explica porque a proposiçãoatual diz apenas o seguinte: o excedente financeiro será aplicado para reduzir a exposiçãodos atuais agentes. O procedimento não ataca a raiz do problema, ou seja, como eliminar asrestrições de transmissão entre submercados, sempre que isso possa ser justificado econo-micamente.

Como um gerador em um mercado exportador é comprador líquido no mercado importador,ele estará exposto a um preço mais alto, podendo incorrer em prejuízo. Sob este ponto devista, haverá um incentivo para que a expansão da oferta se concentre nas áreas importado-ras o que está adequado. Contudo, caso a capacidade de transmissão entre os submercadosfosse ampliada, mesmo considerando os custos dessa ampliação, não pode ser eliminada ahipótese de que a ampliação da oferta no submercado exportador fosse a melhor alternativa.

A melhor resposta para tal problema seria utilizar a maior parte do excedente financeiropara financiar projetos destinados a eliminar restrições de transmissão entre submercados.Os arranjos necessários para esse tipo de solução, embora complexos, merecem um examemais aprofundado. Uma medida complementar, embora o tema extrapole as fronteira doMAE, seria possibilitar que os agentes de geração e distribuição pudessem financiar cir-cuitos, com o objetivo de ampliar a capacidade das interligações, possibilitando-lhes nego-ciar direitos de transmissão.

A discussão anterior remete às seguintes conclusões:

♦ a curto prazo, o procedimento para alocação do excedente financeiro reduz osriscos para os geradores e possibilita uma redução de custo para o consumidorfinal, pois parte do excedente financeiro é utilizada para reduzir os encargos detransmissão;

♦ a inexistência de estudos que a respaldem torna a decisão de alocar 1/9 do ex-cedente financeiro para a redução dos encargos de transmissão discricionária,independentemente do valor desta alocação. Se realmente esta for a parceladestinada à redução dos encargos de transmissão é recomendável que se exa-mine a possibilidade de incrementá-la gradualmente com a conseqüente redu-ção da parcela destinada à cobertura das exposições a preço dos geradores;

♦ a longo prazo, o mecanismo proposto não incentiva a redução das restriçõesentre submercados, que tende a reduzir o excedente financeiro até os níveiseconomicamente justificáveis em termos de uso eficiente dos recursos do siste-ma.

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5 REFERÊNCIAS

1. ASMAE, “Regras do Mercado Atacadista de Energia Elétrica”, Março de 2000.

2. E.L. Silva, E. C. Finardi, “Processo de Estabelecimento do Preço MAE”, apostila decurso oferecido por Cepel e UFSC, e patrocinado pela ASMAE e ONS, Novembro de1999.

3. A.S. Kligerman; “Avaliação da Instabilidade do Preço do Mercado de Energia ElétricaObtido a Partir do Custo Marginal de Curto Prazo”, UFRJ, Monografia submetida Cur-so MBA- Eletrobrás, Outubro de 1999.