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Módulo 2 unidade 5

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  • COLEO PROINFANTIL

  • PRESIDNCIA DA REPBLICAMINISTRIO DA EDUCAO

    SECRETARIA DE EDUCAO A DISTNCIA

  • COLEO PROINFANTILMDULO IIunidade 5livro de estudo - vol. 2Karina Rizek Lopes (Org.) Roseana Pereira Mendes (Org.)Vitria Lbia Barreto de Faria (Org.)

    Braslia 2005

    Ministrio da EducaoSecretaria de Educao a Distncia

    Programa de Formao Inicial para Professores em Exerccio na Educao Infantil

  • Livro de estudo: Mdulo II / Karina Rizek Lopes, Roseana Pereira Mendes, Vitria Lbia Barreto de Faria, organizadoras. Braslia: MEC. Secretaria de Educao Bsica. Secretaria de Educao a Distncia, 2005.

    66p. (Coleo PROINFANTIL; Unidade 5)

    1. E7ducao de crianas. 2. Programa de Formao de Professores de Educao Infantil. I. Lopes, Karina Rizek. II. Mendes, Roseana Pereira. III. Faria, Vitria Lbia Barreto de.

    CDD: 372.2

    CDU: 372.4

    Ficha Catalogrfica Maria Aparecida Duarte CRB 6/1047

    L788

  • MDULO IIunidade 5livro de estudo - vol. 2

  • SUMRIO

    B - ESTUDO DE TEMAS ESPECFICOS 8

    FUNDAMENTOS DA EDUCAO A CONSTRUO DE CONHECIMENTOS E DA SUBJETIVIDADE

    PELA CRIANA E O DESENVOLVIMENTO DA

    FUNO SIMBLICA ........................................................................... 9Seo 1 Interaes sociais e a construo do conhecimento

    e da subjetividade ............................................................ 1 1

    Seo 2 A brincadeira, a imitao e o desenvolvimento da

    imaginao e da criatividade ........................................... 18

    Seo 3 A construo da autonomia pela criana ....................... 25

    ORGANIZAO DO TRABALHO PEDAGGICO A COMUNICAO COM BEBS E COM CRIANAS PEQUENAS ........ 33Seo 1 Imitar conhecer: interaes e desenvolvimento

    infantil ............................................................................... 35

    Seo 2 O que e o que no brincar? Pode-se dizer que o

    beb brinca? .................................................................... 46

    Seo 3 O desenvolvimento pela criana de sua capacidade de fazer de conta, de agir a partir de sua prpria

    capacidade de imaginar .................................................. 55

    c ATIVIDADES INTEGRADoraS 62

  • 8b - ESTUDO DE TEMAS ESPECFICOS

    8

  • 9FUNDAMENTOS DA EDUCAo

    a construo de conhecimentos e da subjetividade pela criana e o desenvolvimento da funo simblica

    O pirataO menino brinca de pirata:sua espada de ouroe sua roupa de prata.Atravessa os sete maresem busca do grande tesouro.Seu navio tem setecentas velas de panoe o terror do oceano.Mas o tempo passa e ele se cansade ser pirata.E vira outra vez menino.

    Roseana Muray1

    1 Roseana Muray, escritora, tem vrias obras dedicadas s crianas. Esta poesia faz parte do livro No mundo da lua, publicado pela Editora Miguilim.

  • 10

    ABRINDO NOSSO DILOGO

    Amigo(a) professor(a), estamos juntos em mais esta oportunidade de estudar as aes das crianas e compreender o seu desenvolvimento, tarefa fundamental para que possamos promov-lo no cotidiano das creches, pr-escolas e escolas que atendem a Educao Infantil.

    Nossa proposta conversarmos sobre o que observamos diariamente no trabalho com as crianas ou em situaes comuns em nossa cultura. Nossas observaes nos permitem acompanhar a maneira de a criana ser, modificar-se e alcanar novas formas de relao com o seu meio. A questo que guia nossa reflexo : como cada criana conhece, constri uma forma pessoal de agir, sentir e pensar, e cria novos elementos em sua cultura, dando asas sua imaginao?

    DEFININDO NOSSO PONTO DE CHEGADA

    Esta unidade pretende dar a voc elementos para compreender o processo de construo de conhecimentos como algo que ocorre ao longo de toda a vida. Este processo orientado pelas capacidades j desenvolvidas pelo sujeito, mas constitudo nas interaes sociais que, desde cedo, cada sujeito e seus diferentes parceiros estabelecem em situaes cotidianas.

    Chamamos sua ateno para a funo mediadora do(a) professor(a), seu papel de recurso no desenvolvimento da criana, e destacamos a importncia das interaes com companheiros de idade. Discutimos a brincadeira infantil como um recurso privilegiado para promoo do desenvolvimento da criana pequena. Todas as leituras, finalmente, tm o objetivo de nos levar a refletir sobre como ajudar a criana a promover sua autonomia para agir nas diversas situaes criadas em nossa cultura.

    CONSTRUINDO NOSSA APRENDIZAGEM

    O tema desta unidade ser analisado em trs sees: na primeira, estudaremos como as interaes que a criana estabelece com parceiros adultos e com outras crianas no seu dia-a-dia contribuem para a formao, ou construo, de sua forma de conhecer e de sentir o mundo e a si mesma; na segunda seo, estudaremos alguns pontos que tratam da brincadeira infantil e sua funo no desenvolvimento da criana e como as instituies de Educao Infantil podem promov-la; e na terceira seo, trataremos da construo da autonomia pela criana pequena. No decorrer desta unidade, sugerimos que voc desenvolva algumas atividades em seu trabalho e, depois, as registre em seu caderno. Vamos l?

  • 11

    Seo 1 Interaes sociais e a construo do conhecimento e da sub-jetividade

    Esta seo tem os seguintes objetivos especficos:- Discutir com voc e seus(suas) colegas do Proinfantil alguns processos envolvidos nas interaes que as crianas estabelecem com diferentes parceiros.- Analisar o valor destas interaes na construo do conhecimento e da subjetividade.- Discutir a formao de laos de amizade, de relaes de cooperao e a ocorrncia de conflitos envolvendo as crianas de at 6 anos.

    Teremos oportunidade de discutir observaes de situaes cotidianas de interaes entre crianas e a evoluo destas interaes para relacionamentos sociais mais estveis com o decorrer do tempo. Esperamos que isso possa ajudar no seu trabalho como docente da Educao Infantil!

    importante, para o(a) professor(a), saber como a criana conhece o mundo e constri um modo prprio de agir em diferentes situaes. Quando observamos atentamente os bebs, vemos que, desde o nascimento, eles realizam uma verdadeira atividade de pesquisa do mundo, buscando compreend-lo, testando de alguma forma as significaes que constroem sobre ele. Isto ocorre cada vez que os bebs experimentam uma sensao de desconforto, de incerteza diante de uma situao nova, que cria neles necessidades e desejos e exige deles novas respostas.

    Por exemplo, uma criana de 7 meses pode agir de modo tranqilo em relao a pegar um carrinho de madeira, colocado no cho perto dela. Contudo, ela reage de um modo novo quando colocamos um pano sobre o objeto. Como ela no

  • 12

    mais o enxerga, ela pra de procurar o brinquedo. Esta situao exemplifica um momento em que h um desequilbrio nas formas de ao at ento usadas pela criana na relao com o objeto. Este desequilbrio perdura at que a criana, algum tempo depois, verifica que o carrinho no deixa de existir quando o escondemos dela, podendo ser retirado de debaixo do pano. A descoberta agrada muito a criana e se torna um fator fortalecedor das suas possibilidades de ao, reequilibrando seus esquemas: pegar um objeto, escond-lo sob algo e busc-lo, reiniciando um ciclo de aes que vai sendo aperfeioado.

    Os textos das Unidades 1 e 2 deste mdulo apresentam a teoria de Jean Piaget sobre o modo como a criana constri seu conhecimento num processo de assimilao e acomodao. Seria interessante reler esses textos para melhor compreenso dos temas abordados nesta unidade.

    O beb um ser ativo em seu processo de desenvolvimento. Ao nascer, ele j apresenta condies iniciais para perceber e reagir s situaes, sobretudo aos parceiros diversos que formam seu meio humano: seus familiares, vizinhos, pessoal da creche. O beb procura ajustar seus meios de expresso (gritos, gesticulaes) para obter ajuda para a satisfao de suas necessidades (de incio fisiolgicas, e depois tambm afetivas e cognitivas) e construir significados conforme os adultos que o rodeiam respondem.

    Por outro lado, o beb apresenta uma grande imaturidade motora. difcil para ele realizar atos motores mais complexos, como se locomover, sentar, levantar, subir, descer, comer, se vestir etc., o que lhe impe um perodo longo de dependncia de outros seres humanos, crianas ou adultos.

  • 13

    No decorrer de sua experincia, conforme realiza uma tarefa com outras pessoas uma atividade de cuidado pessoal, ou de explorao do meio, por exemplo, e especialmente nos momentos de conversa, ou de brincadeiras a criana se apropria de meios para memorizar, expressar-se, solucionar problemas, criados na interao com as pessoas com quem convive.

    Nas muitas interaes que as crianas estabelecem com o(a) professor(a) e com companheiros na creche, na pr-escola ou na escola, a partir de seus movimentos, gestos, sons, palavras, imagens, mltiplas ligaes vo se formando entre os assuntos que as crianas exploram, desencadeando, tambm, confrontos de significaes. Alm disso, seus parceiros criam situaes que possibilitam s crianas aprenderem normas de agir e de se relacionar com outras pessoas.

    A imagem a seguir mostra um quadro de Pierre Auguste Renoir, pintor francs que nasceu em 1841, onde ele retrata seu filho brincando com Gabrielle, uma jovem que foi morar com a famlia do artista aos 16 anos. As cores fortes sugerem uma cena de calor humano, onde h interao entre as pessoas que dela participam.

  • 14

    Auguste Renoir, Criana com brinquedos Gabrielle e o filho do artista, Jean 1894

    Vamos agora refletir sobre os fatores que intervm nas interaes sociais das quais as crianas participam.

    1. Sendo uma ao compartilhada, a interao influenciada pelas caracters-ticas de ambos os parceiros: as da criana e as da me ou outra pessoa.

    2. A contribuio da criana evidentemente depende de seu nvel de desenvol-vimento: se um beb que comea a engatinhar, se uma criana de 4 anos com bom domnio da fala etc. Este nvel de desenvolvimento influencia a resposta do adulto (me, pai, professor(a), av) que cuida dela ou de outra criana que interage com ela.

    3. A maneira como seu meio social v a criana, as representaes sociais que as pessoas tm do que ser criana e as idias comuns que circulam sobre ela so fatores importantes no desenrolar das interaes. Mesmo antes de nascer, seus familiares pensam na criana como um ser cheio de significa-dos, e diferentes expectativas sobre ela so criadas. Os adultos organizam o cotidiano da criana, desde cedo, conforme entendem as possibilidades de desenvolvimento de que ela dispe (se acreditam que j capaz de realizar uma certa ao) e as expectativas que eles tm de seu desenvolvimento (por exemplo, se crem que ela ser um lder no seu grupo ou se ser uma pessoa mais dependente da orientao de algum).

    4. No apenas cada criana se modifica neste processo, mas tambm os adul-tos e as demais crianas que com ela interagem tm oportunidade para se desenvolverem.

  • 15

    A partir das experincias com seus parceiros, a criana constri maneiras mais elaboradas de perceber, tomar decises, lembrar-se de algo, emocionar-se com alguma coisa, maneiras que so historicamente construdas em sua cultura. Conclui-se, assim, que ser acolhido e atendido em suas necessidades, ter amigos, conversar, explorar o mundo e brincar com algum so alguns dos principais elementos que contribuem para o desenvolvimento infantil.

    Atividade 1Os temas estudados nesta unidade at o momento mostram que no confronto com os parceiros em situaes cotidianas que ns vamos construindo nossa forma de agir, sentir e pensar. Que relao voc percebe entre esta afirmao e seu trabalho como professor(a) de Educao Infantil? Sugerimos que voc escreva sobre isso em seu caderno.

    Resumindo o que vimos at aqui, as diversas situaes cotidianas que ocorrem nas creches, pr-escolas e escolas possibilitam criana a construo de novos significados e a modificao de outros anteriormente formulados, conforme seu(sua) professor(a), ao organizar a atividade e selecionar os materiais para serem explorados, lhe apresenta modelos de ao, orientaes, ou exemplos. Portanto, no contexto da Educao Infantil, as formas como o(a) professor(a) atuar dependero muito das caractersticas e necessidades da criana e dos significados que ele(a) e a criana emprestam situao vivida. Mas preciso lembrar que estes significados podem ser diferentes entre si.

    Atividade 2Aps a leitura do texto, e tomando como base sua experincia com crianas, procure escrever pelo menos trs objetivos educacionais que, na sua opinio, um(a) professor(a) que atua na Educao Infantil deve perseguir em seu trabalho. Voc pode escrever esses objetivos em seu caderno e no encontro quinzenal com seus(suas) colegas do PROINFANTIL discutir os objetivos anotados pelos componentes de seu grupo.

    Abordaremos agora outro ponto ligado ao que j estudamos: o bom desempenho do(a) educador(a) junto s crianas requer o exame das relaes que elas estabelecem entre si em diferentes situaes. Sabemos que, desde pequenas, as crianas, ao interagirem com seus colegas, estabelecem atos cooperativos, se imitam, criam dilogos, disputam objetos e brigam ou se

  • 16

    consolam. Estas situaes, to freqentes nas creches, pr-escolas e escolas, so grandes momentos de desenvolvimento, e to importantes que os(as) professores(as) devem criar condies para as crianas lidarem com elas positivamente.

    A situao descrita abaixo ilustra como os conflitos podem ser positivos para o desenvolvimento das crianas, dependendo do modo como o(a) professor(a) atua como mediador(a) na situao.

    Andra professora de uma turma de crianas de 3 anos. hora do lanche. A professora est sentada com as crianas em torno de uma mesa coletiva, onde todos lancham. Sara, uma das crianas, quer um biscoito de Bruno, seu colega de sala, mas ele no quer dar o biscoito menina. Sara insiste, Bruno resiste. Chorosa, a menina vai at a professora: ele no quer me dar o biscoito! A professora responde: por que voc no oferece um biscoito seu para ele e v se ele quer trocar? Sara aceita a sugesto da professora e Bruno, por sua vez, aceita a troca. Sara olha para Andra e sorri, j com o biscoito desejado na boca.

  • 17

    Atividade 3 Como voc analisa a atitude da professora? De que modo tal atitude contribuiu para a soluo do conflito entre as crianas?

    As interaes que as crianas estabelecem entre si favorecem a manifestao de saberes j adquiridos e a construo de conhecimentos compartilhados, de smbolos coletivos e de solues comuns. Na relao com os parceiros, as crianas aprendem que ser membro de um grupo envolve competncias para concordar com os demais membros ou contrapor-se a eles, ser dependente ou independente, lder ou seguidor. As relaes interpessoais so, portanto, situaes de crescimento pessoal. Contudo, as relaes que as crianas estabelecem entre si no so sempre harmoniosas, mas tambm de rivalidade, criando situaes difceis para o(a) professor(a). Assim, disputas e oposies so situaes bastante freqentes no cotidiano das instituies de Educao Infantil.

    Atividade 4Com sua experincia como professor(a) de Educao Infantil, voc pode fazer uma lista de situaes que voc observa na instituio onde trabalha em que h interaes criana-criana, assinalando qual o tipo de interao vivida em cada situao (brincadeira, conflito, cooperao, cuidado etc.) e o ambiente onde ela se d. Depois, ao reler a lista, voc pode escrever como voc e/ou outros(as) professores(as) poderiam auxiliar as crianas nessas interaes.

    Atividade 5 O quadro que voc preparou, observando as interaes entre as crianas, levou voc a descobrir algo novo sobre a maneira como seus alunos interagem? O qu? A comparao com os quadros elaborados por seus(suas) colegas do PROINFANTIL pode ser uma atividade interessante para ser desenvolvida no prximo encontro quinzenal.

    Favorecer as interaes entre crianas da mesma idade e de idades diferentes em creches, pr-escolas e escolas pode ajud-las a lidar com seus impulsos ao participar no grupo, a internalizar regras, adaptando seu comportamento a um sistema de controle e sanes, a ser sensvel ao ponto de vista do outro,

  • 18

    a saber cooperar e a desenvolver uma variedade de formas de comunicao para expressar sentimentos e conflitos. Isto inclui a construo de relaes diversificadas em uma atmosfera afetiva, na qual cada pessoa seja objeto de considerao pelos demais.

    Atividade 6Como voc tem trabalhado com os grupos de crianas? Que situaes voc observa que promovem mais cooperao? Em que situaes freqente a ocorrncia de conflitos? Como o(a) professor(a) pode agir nos dois tipos de situao?

    Maior cooperao ocorre quando...

    O professorpode...

    Mais conflitos ocorrem quando...

    O professor pode...

    Aps a realizao da atividade, talvez voc possa discutir com seus(suas) colegas do PROINFANTIL, no prximo encontro quinzenal, o quanto a ocorrncia de cooperao ou conflito est associada a condies do ambiente em que as crianas esto: o tamanho do grupo, o espao fsico existente, o horrio da atividade, os objetos disponveis, o tipo de atividade etc. Voc pode anotar as concluses a que vocs chegaram em seu caderno.

    Seo 2 A brincadeira, a imitao e o desenvolvimento da imaginao e da criatividade

    O objetivo desta seo :- Analisar a brincadeira como forma privilegiada da atividade infantil, destacando sua importncia no estabelecimento de laos de cooperao entre as crianas e seu papel no desenvolvimento da imaginao e da criatividade.

    Vamos, nesta seo, nos dedicar um pouco mais a uma ao com a qual as crianas freqentemente se envolvem: a brincadeira. Iremos reexamin-la, de modo a pensar como integr-la proposta pedaggica da creche ou pr-escola. Esta importante atividade abordada tambm em outras unidades deste Mdulo II, especialmente na Unidade 7.

  • 19

    H diferentes concepes e teorias sobre o jogo, cada uma delas relacionada com certa concepo de criana presente em uma determinada cultura. O termo jogo no tem um sentido nico. Brincar de ciranda pode ser entendido como uma brincadeira, enquanto que o faz-de-conta de casinha, ou o jogo de xadrez so denominados jogos. Todavia, muitos autores no fazem distines entre os termos jogo e brincadeira, usando-os como sinnimos.

    O jogo no existe apenas para a espcie humana. Vrios mamferos se ocupam de simular perseguies e fazer exploraes do meio, desligadas de objetivos de sobrevivncia. Estas atividades so chamadas brincadeiras e esto voltadas para o aprendizado de determinados comportamentos. Gatinhos, por exemplo, passam muito tempo brincando de perseguir novelos de l, como vemos com freqncia. O jogo humano difere, contudo, de modo significativo do jogo animal, por requerer a capacidade de comunicar-se simbolicamente atravs de diferentes linguagens, para tomar certas decises, criando o novo. A grande diferena que os animais realizam essas aes por instinto, enquanto que, para os seres humanos, o papel da sociedade e da cultura fundamental.

    Minha forma de diverso predileta. Renata, 6 anos.

    a necessidade psicolgica que motiva o ldico. Em outras palavras, no se pode brincar se no se deseja. Entretanto, este desejo pode ser estimulado por outras pessoas, assim como pelo prprio ambiente, embora a ao do sujeito no jogo ou brincadeira deva ser espontnea. O jogo e a brincadeira so tambm atividades submetidas s prprias regras e no s regras sociais rgidas das situaes concretas. So instrumentos de expresso que possibilitam alguma variabilidade.

  • 20

    As crianas encontram rapidamente as aes adequadas para participarem de um jogo ou brincadeira. Isto ocorre, por exemplo, quando a me introduz o beb em certas aes no voltadas ao atendimento de uma necessidade imediata, como brincar com ele de cuca! ou esconde-esconde, e tambm pode ser observado quando as crianas iniciam repentinamente uma brincadeira de esconde-esconde sem combinarem isso previamente.

    Ao brincarem de casinha, hospital ou escola, as crianas retomam com bastante fidelidade as caractersticas bsicas de situaes anteriormente vividas. Entretanto, a comunicao interpessoal que a brincadeira envolve no pode ser considerada ao p da letra: ela requer uma constante negociao de regras e a transformao dos papis assumidos pelos participantes, fazendo com que seu desenrolar seja sempre imprevisvel. Com isso, a brincadeira cria espao para a novidade. Ela evolui com o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criana, porque envolve sua personalidade e sua forma de entender o mundo sua volta.

    Atividade 7Faa uma lista de brincadeiras que voc conhece. Depois assinale as que voc costumava brincar em sua infncia.

    Pieter Bruegel, Jogos infantis 1560

  • 21

    A imagem anterior mostra um quadro do pintor Pieter Bruegel, que viveu na Holanda entre 1525 e 1569. No quadro so retratadas 250 crianas envolvidas em brincadeiras da poca. interessante observar que algumas dessas brincadeiras fizeram parte tambm de nossa infncia.

    Uma brincadeira especialmente valiosa para o desenvolvimento infantil no perodo de 1 a 6 anos o jogo simblico ou brincadeira de faz-de-conta. Particularmente, ele ferramenta para a criao da fantasia, para construir vises criativas da realidade. O faz-de-conta possibilita a construo de novas possibilidades de ao e novas formas de organizar os elementos do ambiente. Nossa meta agora refletir sobre como isto se d. Mesmo os adultos, quando do asas sua imaginao, de alguma forma fazem de conta, embora possam no utilizar a brincadeira para isto.

    Lili vive no mundo do faz-de-conta.Faz de conta que isto um avio, zum...Depois aterrizou em pique e virou tremTuc, tuc, tuc, tuc...Entrou pelo tnel chispando.Mas debaixo da mesa havia bandidos.Pum! pum! pum! pum!O trem descarrilhou. E o mocinho? Meu Deus!No auge da confuso, levaram Lili para a cama fora.E o trem ficou tristemente derribado no cho,Fazendo de conta que era mesmo uma lata de sardinha.

    Lili inventa o mundo, Mrio Quintana.

    A poesia acima Lili inventa o mundo, escrita por Mrio Quintana, revela o papel que a imaginao desempenha na vida da criana e as mltiplas possibilidades que se abrem a partir da brincadeira de faz-de-conta. Abaixo, voc pode conhecer um pouco mais sobre este autor, segundo ele mesmo se define.

    Mrio Quintana por Mrio Quintana

    Nasci em Alegrete, em 30 de julho de 1906. Creio que foi a princi-pal coisa que me aconteceu. (...) Minha vida est nos meus poemas, meus poemas so eu mesmo. Nunca escrevi uma vrgula que no fosse uma confisso.

    http://marioquintana.blogspot.com/

  • 22

    Brincar de fazer de conta cria condies para uma transformao marcante da forma de a criana ter conscincia do mundo e de si mesma, por lhe exigir formas mais complexas de ao. Vejamos como isto se d.

    Os objetos manipulados no faz-de-conta so usados de modo simblico, como substitutos para outros, atravs de gestos imitativos que reproduzem as posturas, expresses e verbalizaes conhecidas pela criana. Por exemplo, uma vassoura deixa de ser percebida em suas caractersticas objeto utilizado para varrer o cho e passa a ser usada pela criana como se fosse um cavalo, conforme ela, em p, coloca a vassoura entre suas pernas, segura seu cabo perto da ponta superior e saltita pelo ambiente como se trotasse.

    Na situao de faz-de-conta, a criana age cada vez mais guiada por imagens criadas a partir de sua experincia com outras vivncias reais as suas experincias na escola, por exemplo adotando comportamentos diferentes dos que assume em outras situaes de sua vida diria. Mais tarde, ela pode apenas fazer um gesto sem usar qualquer objeto para imitar o comportamento de pentear-se ou, ainda, pode dizer j me penteei!, sem executar um ato observvel, e esta declarao ser usada como parte do enredo que est sendo criado na brincadeira. Com o desenvolvimento da criana, o jogo simblico deixa de depender dos objetos e passa a apoiar-se mais nas idias, imagens e regras construdas por ela para sua realizao.

    Ao mesmo tempo, ao representar o papel do outro no jogo, a criana comea a perceber as diferentes perspectivas envolvidas na situao. Por exemplo, ela pode ser o(a) professor(a), reproduzindo seus comportamentos, experimentando como acha que ele v os alunos etc. Conforme tm maior experincia de criao de situaes imaginrias, as crianas passam a ter maior controle sobre a histria que est sendo criada, podendo planej-la e distribuir os papis que a compem, com maior facilidade.

    O jogo de faz-de-conta desenvolve-se a partir das atitudes e desejos dos jogadores e por uma disposio particular de certos objetos que do apoio para a definio de uma situao, como casa de bonecas, supermercado, hospital etc., onde h determi nadas regras.

    Atividade 8Observe, por alguns minutos, brincadeiras e jogos de crianas em pequenos grupos, procurando acompanhar como so construdos os enredos do faz-de-conta. A partir disto, faa um relato detalhado do que foi observado,

  • 23

    descrevendo os participantes, objetos, falas e gestos criados pelas crianas. Voc pode usar seu caderno para registrar este relato.

    Vamos agora analisar dois elementos associados ao jogo infantil: a imaginao e a criatividade.

    A imaginao um atributo de todo ser humano e se desenvolve durante toda a vida. Ela livre, embora ainda pobre na criana, enquanto que o adulto, por ter uma experincia mais diversificada, pode experimentar uma funo imaginativa extremamente rica e madura.

    Por outro lado, inventar algo no tarefa de uma s pessoa. Mesmo as grandes descobertas resultam do acmulo de experincia de uma ou vrias geraes de pessoas. No se fala, assim, de um criador isolado, mas de um ambiente onde a criatividade estimulada. A ao criativa necessita da imaginao, que, na criana, se desenvolve especialmente atravs do jogo simblico, que a envolve como um todo, mas tambm por meio do desenho, da narrativa de histrias, entre outras atividades.

    Atividade 9 Prepare um curto texto para explicar aos(s) colegas do PROINFANTIL o valor da brincadeira e do jogo na aprendizagem. A leitura deste texto pode ser uma das atividades a serem desenvolvidas no prximo encontro quinzenal do seu grupo.

    Atividade 10Procure observar como o jogo de faz-de-conta das crianas vivido na creche, pr-escola ou turma de Educao Infantil da escola em que voc trabalha. Para isto, faa um relato de situaes de faz-de-conta observadas em alguns dias e registre-as, seguindo o roteiro abaixo, em seu caderno:

    Data Local Crianas Objetos Tema

    22.05 Ptio Ana, Rui (5a) Carrinhos Frmula 1

    22.05 Ptio Jos, Maria (3a) Cestos, caixas Ida s compras

  • 24

    Considerando o jogo como um elemento pedaggico, verificamos o quanto o papel do(a) professor(a) importante. Mas igualmente importante o papel das demais crianas e dos outros elementos que compem a situao, como os objetos, adereos etc. Alm de conhecer os jogos e brincadeiras infantis (seus temas, materiais, personagens etc.), para poder contribuir com o pensamento e a ao das crianas, o(a) professor(a) necessita ser criativo(a) e sensvel para apoiar o desenvolvimento da criatividade das crianas no brincar. Precisamos, como professores(as), ter em mente que, para a criana envolver-se em brincadeiras, ela necessita sentir-se emocionalmente bem em relao aos adultos e s outras crianas presentes e precisa querer brincar. Da que podemos organizar oportunidades para a realizao de brincadeiras, deixando que as crianas circulem pelos ambientes e que se envolvam em diferentes tipos de jogos. Nesta situao, a atitude do(a) professor(a) que atua na Educao Infantil a de ser um(a) observador(a) atento(a), voltado(a) para acompanhar a riqueza das interaes infantis que a ocorrem.

    Observando os jogos simblicos ou brincadeiras de faz-de-conta que as crianas estabelecem com os companheiros de idade, o apoio do(a) professor(a) pode auxiliar o grupo de crianas a entrar nos personagens e a agir a partir da. A interveno do(a) professor(a) deve basear-se em uma anlise das situaes criadas pelas crianas, tanto em relao a seu contedo (temas, personagens, clima emocional etc.) como a sua forma de acontecer (regras, materiais utilizados, organizao do espao, formas de cada criana desempenhar certos papis).

    A participao do(a) professor(a) no jogo simblico ou brincadeira de faz-de-conta pode ocorrer de forma indireta, quando ele(ela) organiza os espaos e objetos que estruturam enredos e papis adotados, cuidando para que as regras propostas pelo grupo sejam mantidas. Pode, excepcionalmente, ser uma participao direta, quando ele(ela) assume o papel de juiz em um jogo de regra ou em um jogo esportivo, ou mesmo fazendo o papel do(a) aluno(a) em uma brincadeira de escolinha.

    Em outras ocasies, as crianas mostram que querem brincar sozinhas. Neste caso, o(a) professor(a) ter uma excelente oportunidade para perceber a maneira como elas se organizam, suas competncias na brincadeira, ou mesmo para observar uma criana que esteja lhe chamando a ateno.

    As brincadeiras, dentre outras atividades, tambm contribuem na construo da autonomia pela criana. Vamos ver como?

  • 25

    Seo 3 A construo da autonomia pela criana

    O objetivo desta seo:Refletir sobre como a criana constri sua autonomia a partir das interaes com seus parceiros, adultos ou crianas.

    As reflexes sobre as interaes e as brincadeiras infantis nos levam a pensar na criana como algum que constri sua independncia e capacidade de deciso. Isso porque, ao brincar, a criana no apenas desenvolve sua imaginao e criatividade, como tambm se desenvolve, medida que se comporta de modo diferente quele prprio sua idade. Quando observamos crianas brincando de casinha, por exemplo, as atitudes que a me ou o pai adotam com o beb de cuidado, proteo reproduzem comportamentos diferentes daqueles adotados pelas crianas pequenas, e se aproximam do comportamento dos adultos.

    Eug

    nio

    Sv

    io

    No brinquedo, a criana sempre se comporta alm do comportamento habitual de sua idade, alm de seu comportamento dirio; no brinquedo, como se ela fosse maior do que na realidade.

    Lev Vygotsky

  • 26

    Esta afirmao de Lev Vygotsky, autor que voc j teve a oportunidade de conhecer em outros textos deste mdulo, aponta para a estreita relao entre a atividade de brincar e o desenvolvimento de novas formas de comportamento pela criana que permitem a ela maior autonomia.

    Nesta ltima seo, discutiremos aspectos ligados ao desenvolvimento de atitudes de autocuidado, de habilidades para expressar seus sentimentos e idias e para tomar decises, bem como as questes relacionadas autonomia moral.

    A meta colocada pela Educao Infantil de promoo da autonomia da criana tem sido cada vez mais defendida. Para trabalhar por seu alcance, precisamos refletir sobre o que autonomia e no que ela difere da independncia, por exemplo.

    Independncia a capacidade de executar uma tarefa sem ajuda de outra pessoa. J a autonomia a capacidade de o sujeito seguir suas prprias orientaes na execuo de uma tarefa, a possibilidade de ele decidir e saber por que realiza aquela ao. Os dois aspectos nem sempre andam juntos. Por exemplo, todos ns adultos demonstramos independncia para executar um enorme grupo de tarefas, mas, em muitas delas, no agimos de forma autnoma, consciente do porqu fazemos aquilo. No mostramos ter autonomia para execut-las. Antes, seguimos regras gerais, alheias. Temos que aprender no s a sermos independentes, como tambm a agirmos com autonomia, e isto j comea na Educao Infantil.

    Temos discutido ao longo desta unidade como a criana, ao nascer, tem uma relao de estreita dependncia com o meio humano (seus familiares e outros parceiros mais experientes), que lhe ajuda a satisfazer suas necessidades bsicas. Vimos tambm que exatamente esta ligao inicial que ajuda a criana a criar suas formas de agir, sentir, comunicar-se e pensar.

    Como voc j viu em outras unidades, a dependncia inicial de todo ser humano em relao s pessoas de seu meio vai sendo trabalhada na experincia diria da criana, que, cada vez mais, adquire capacidade para executar sozinha uma srie de tarefas aprendidas na convivncia com parceiros

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    mais experientes, que lhe ensinam modos de atender suas necessidades. Comer, banhar-se, usar o pinico ou a privada, pr e tirar a roupa, buscar um objeto desejado, acender a luz, decidir o que fazer em cada situao, apreciar uma narrativa de histria e fazer um desenho so exemplos de tarefas que as crianas aprendem a dominar, se forem ajudadas pelos contextos em que se desenvolvem.

    Atividade 11Pense em sua experincia na Educao Infantil. Que tipo de situao voc acha que colabora na construo da autonomia pela criana e por qu? Que tipo de situao cotidiana voc considera mais difcil para orientar as crianas a executarem-na com autonomia e por qu?

    Ser autnomo, como sabemos, no significa no seguir regras! Entretanto, as regras podem ser definidas com a participao das crianas e dos(as) professores(as), num trabalho conjunto.

    Uma professora da Educao Infantil que trabalha com crianas de 5 anos se queixava coordenadora da dificuldade de fazer com que as crianas guardassem os brinquedos aps cada atividade. A coordenadora sugeriu, ento, que a professora colocasse todos os brinquedos em grandes caixas de papelo e solicitasse a elas que, em colaborao com a professora, decidissem onde cada brinquedo deveria ser guardado. Aps algumas semanas, a professora observou que as crianas se sentiam mais responsveis por manter a organizao que elas mesmas haviam dado aos brinquedos, mostrando-se mais dispostas a guard-los ao trmino de cada atividade.

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    As crianas, ao dependerem das experincias cotidianas que vivem em seu meio social, vo construindo uma forma prpria de perceber as situaes e de reagir a elas, considerando possveis regras de ao que j foram estabelecidas. Sabendo disto, o(a) professor(a) que atua na Educao Infantil pode preparar situaes e formas de estimular o desenvolvimento da autonomia pelas crianas, ou seja, sua capacidade de decidir, como ilustra a situao descrita no quadro anterior. sempre bom lembrar que isso se torna possvel medida que o ambiente favorece tanto as interaes entre as crianas como o acesso delas aos materiais. Armrios, estantes e demais peas do mobilirio, assim como as instalaes sanitrias, devem ser acessveis s crianas.

    As dificuldades que as crianas possam encontrar, inicialmente, para tomar decises ou realizar algumas atividades de forma autnoma no so justificativas para que as impeamos de decidir, mas nos coloca na condio de ajud-las a conquistar sua autonomia, processo que ir se prolongar por toda a sua vida. Basta lembrar como ns, adultos, temos dificuldade de sermos autnomos, por exemplo, quando enfrentamos um problema de sade, econmico ou mesmo emocional. Nesta hora, dependemos de um olhar amigo que nos ajude a pensar a situao.

    A forma como o(a) professor(a) desempenha seu papel enquanto autoridade constituda, j que a criana ainda no desenvolveu plenamente sua autonomia, particularmente importante, dado que a criana com freqncia o imita na interao com companheiros.

    Em funo do que estamos estudando, espera-se que a organizao curricular da creche e da pr-escola deixe de buscar um ambiente de silncio e obedincia, marcas de nosso passado cultural, mas no mais defendido no presente, e viabilize situaes nas quais as crianas mostrem-se envolvidas, atentas ao que fazem, interativas, cooperativas, alegres e encorajadas a refletir sobre seus contextos sociais e as formas possveis de neles interagirem.

    PARA RELEMBRAR

    Vimos que a interao social o ponto bsico no desenvolvimento das crianas e a importncia de o(a) professor(a) ajud-las a usarem certas habilidades motoras, emocionais e cognitivas, a agirem de modo criati-vo, a sensibilizarem-se com seus parceiros e a pensarem criticamente. Os companheiros de idade so, para cada criana, uma fonte de interesse, um modelo a ser imitado e uma oportunidade para a percepo das diferenas.

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    Estudamos como a brincadeira e o jogo infantil so instrumentos de ampliao das capacidades das crianas, dado que suas interaes em brincadeiras as levam a construir novos modos pessoais de pensar, sentir, memorizar, mover-se, gesticular etc. O jogo e a brincadeira possibilitam que a criana crie sua identidade em um ambiente em contnua mudana, onde ocorre constante recriao de significados.

    Conclumos que uma ao pedaggica que visa a autonomia no pode se apoiar em medidas baseadas em um controle externo da criana, mas deve se pautar em aes que a levem, progressivamente, autodisci-plina. Para ajudar a criana a se perceber no coletivo, para que ela viva sua condio de cidad no presente, gozando de seus direitos espe-cialmente o direito de brincar o(a) professor(a) pode criar condies no ambiente para ampliar a ocorrncia de cooperao e ajudar a lidar de forma positiva com o conflito: cuidar do tamanho do grupo, dispor objetos adequados, planejar com cuidado cada atividade etc.

    ABRINDO NOSSOS HORIZONTES

    O que mais podemos pensar a partir do que foi estudado?

    Para que voc possa acompanhar o desenvolvimento de seus alunos, procure sempre registrar os comportamentos das crianas em um dirio. Busque debater pessoalmente, ou atravs de outros meios de comunicao, com outros educadores suas dvidas, descobertas e experincias. Essa seria uma boa forma de aperfeioar sua prpria maneira de trabalhar com as crianas. Afinal, todo ser humano busca aprender a lidar com o que no sabe, no mesmo?

    Reflita como voc interage com as crianas e a quais delas voc acha difcil responder e realizar com elas uma atividade. Pense nas razes para que isso acontea. Veja o que voc pode fazer para melhorar sua forma de se relacionar com elas. Observe-as e use com mais freqncia o que mais as interessa, observando em que momentos elas se mostram satisfeitas e envolvidas. Procure conhecer mais os pais das crianas com as quais voc trabalha e troque com eles informaes sobre elas. Observe como eles as tratam na creche ou pr-escola, nos momentos de entrada e sada, em festas ou outras situaes.

    Bom trabalho!

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    ORIENTAO PARA A PRTICA PEDAGGICA

    Nosso objetivo, neste tpico, dar a voc sugestes de formas de ao didtica, perceber suas vantagens e dificuldades, e buscar construir sua prpria forma de criar boas condies de desenvolvimento e aprendizagem para as crianas com as quais voc trabalha.

    Uma forma de incentivar o faz-de-conta das crianas arrumar uma ou mais caixas grandes de papelo. Em cada uma delas podem-se colocar roupas, adereos, enfeites, objetos que reforcem um determinado tema da vida cotidiana das crianas: cabeleireiro, barbeiro, time de futebol, venda, lanchonete ou restaurante, castelo mgico, ilha encantada, fbrica de automvel, barco de pesca etc. Como voc pode ver, a variao grande e voc pode, melhor que ningum, reconhecer quais temas so interessantes para as crianas. Procure acompanhar como elas utilizam os objetos da caixa e modifique alguns itens, se necessrio, aumentando ou trocando alguns deles. Faa um registro de cada um dos primeiros dias de uso do ba da fantasia. Que tal?

    GLOSSRIO

    Competncias: capacidades.

    Habilidades: destrezas.

    Subjetividade: relativo ao sujeito; caractersticas pessoais de algum.

    SUGESTES para LEITURA

    OLIVEIRA, Zilma de M, MELLO, Ana Maria, VITRIA, Telma, FERREIRA, Maria Clotilde R. Creches: Crianas, Faz de conta & cia. So Paulo: Vozes, 1992.

    OLIVEIRA, Zilma R. de. Educao Infantil: fundamentos e mtodos. So Paulo: Cortez, 2002.

    OLIVEIRA, Z. M. R., ROSSETTI-FERREIRA, M. C. O valor da interao criana-criana em creches no desenvolvimento infantil. Cadernos de Pesquisa, n. 87, p. 62-70, nov./1993.

    BROUGRE, G. Brinquedo e cultura. So Paulo. 2004.

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    QUINTANA, M. Lili inventa o mundo. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985.

    VYGOTSKY, L. A formao social da mente. So Paulo: Martins Fontes, 1991.

    QUESTES DE PROVA MDULO II UNIDADE 5

    1. Qual o papel que as pessoas com as quais a criana convive desempenham no seu desenvolvimento?

    So as pessoas com as quais a criana convive que atribuem significados, ges-tos e aes da criana. Esses significados so internalizados pela criana.

    2. Qual a diferena existente entre as formas de jogo para a espcie humana e o jogo entre os animais?

    Entre os animais, o jogo uma atividade instintiva, enquanto que, para os seres humanos, o jogo uma atividade intencional, que atende a necessi-dades psicolgicas e depende da cultura em que a pessoa est inserida.

    3. Qual a relao entre a brincadeira e o desenvolvimento da imaginao e da criatividade?

    Ao desempenhar diferentes papis na brincadeira, a criana desenvolve a capacidade de negociar regras e transformar os papis desempenhados pelos participantes.

    4. Qual o papel do(a) professor(a) de Educao Infantil diante do jogo como elemento pedaggico?

    Organizar o ambiente, ser um(a) observador(a) atento(a) e sensvel s ne-cessidades e interesses da criana para compreender como interagem no jogo.

    5. Qual a diferena entre autonomia e independncia?

    A independncia diz respeito nossa capacidade de realizar alguma tarefa sem ajuda, enquanto a autonomia se refere capacidade de tomar decises seguindo nossas prprias orientaes.

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    organizao do trabalho pedaggicoa comunicao com bebs e com crianas pequenas

    Nutrir a criana?Sim.Mas no s com o leite. preciso peg-la no colo. preciso acarici-la, embal-la.E massage-la.

    necessrio conversar com sua pele,falar com suas costas,que tm sede e fome,como sua barriga.

    Frdrick Leboyer1

    1 Frdrick Leboyer pediatra. O trecho que abre esta rea temtica foi escrito por ele para apre-sentar um livro chamado Shantala: uma arte tradicional, massagem para bebs, publicado pela Editora Ground. Neste livro, o autor apresenta uma tcnica para massagear bebs aprendida por ele na ndia, com uma mulher chamada Shantala.

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    ABRINDO NOSSO DILOGO

    Vimos em unidades anteriores do Mdulo II como as crianas se desenvolvem e o importante papel das relaes scio-afetivas para esse desenvolvimento, bem como a forma como podemos nos comunicar com elas e mediar sua relao com o mundo.

    Nessa unidade, refletiremos sobre a comunicao com bebs e com crianas pequenas no interior das creches, pr-escolas e salas de Educao Infantil que funcionam em escolas de Ensino Fundamental, focalizando em especial o papel da interao entre as crianas no desenvolvimento infantil, bem como o papel da brincadeira e do faz-de-conta, tema sobre o qual estudaremos na Unidade 7 de Fundamentos da Educao deste Mdulo II.

    Como os bebs brincam? De que maneira se relacionam com os adultos e com outras crianas no ambiente das instituies de Educao Infantil? Que papel a imitao desempenha no desenvolvimento do beb? Como o(a) professor(a) pode ser um mediador(a) da relao dos bebs com o mundo que os cerca, favorecendo seu desenvolvimento? Essas e outras questes sero abordadas no decorrer dessa rea temtica.

    Para efetivamente nos comunicarmos com as crianas de 0 a 6 anos, importante conhecer os significados das aes e interaes infantis. S assim possvel apoiar a criana quando necessrio, incentivando-a em suas conquistas e aquisies. Vamos l?

    DEFININDO NOSSO PONTO DE CHEGADA

    Esperamos que, ao final dessa rea temtica, voc possa ter alcanado os seguintes objetivos:

    1. Discutir o papel da imitao como forma de construo de conhecimento e o papel das interaes nesse contexto.

    2. Refletir sobre o que o brincar e como isso se expressa no beb.

    3. Compreender o processo do faz-de-conta infantil e a imaginao presente nele.

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    CONSTRUINDO NOSSA APRENDIZAGEM

    Esta rea temtica est dividida em trs sees: a primeira discute o papel da imitao no processo de construo de conhecimento pela criana, a segunda trata do brincar e sua forma de expresso na criana de 0 a 6 anos; e a terceira aborda a questo do faz-de-conta e da imaginao infantil a presentes.

    Seo 1 Imitar conhecer: interaes e desenvolvimento infantil

    O objetivo desta seo:Analisar episdios de interao de crianas entre 1 e 4 anos para investigar o papel da imitao no seu desenvolvimento.

    Cena 1

    No ptio de um espao de Educao Infantil, algumas crianas com idade em torno de 2 anos esto juntas. Uma delas resolve correr de uma ponta a outra do ptio. Em seguida, todas as outras correm, em meio a gostosas gargalhadas.

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    Desde muito pequenas, as crianas j possuem modos de aproximarem-se umas das outras, que variam de criana para criana, de grupo para grupo. Podemos ver nas crianas bem pequenas, que mesmo sem utilizar ainda a fala como possibilidade comunicativa, elas encontram formas de estabelecer parcerias pelo movimento, pelos gestos, pela imitao etc. A cena descrita no quadro acima um exemplo.

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    Quem j viu uma cena como essa? O exemplo da corrida em grupo mostra que, a partir do movimento executado inicialmente por uma nica criana e, em seguida, coletivamente, o grupo criou um modo prprio de relao, uma brincadeira cujo disparador foi o corpo em movimento.

    A relao com o outro se d de diversas formas. Uma criana, ao entrar na creche, pode passar alguns dias ou semanas mais observadora. Aparentemente, poderamos dizer que ela no est se relacionando com o outro, pois no faz nenhum movimento em direo s outras crianas. No entanto, se observarmos o interesse com que ela acompanha o movimento do grupo e os movimentos e brincadeiras que passa a fazer a partir dessa observao, poderemos perceber claramente o quanto a presena do outro influencia suas aes. Mesmo bem pequenas, as crianas se influenciam mutuamente e criam formas prprias de brincarem juntas.

    A situao descrita a seguir mostra como a imitao tem um papel importante no aprendizado da criana e na sua insero no grupo.

    Cena 2

    Todos os dias, uma professora de crianas com idades entre um ano e meio e dois anos canta com seu grupo msicas de domnio popular como Atirei o pau no gato, A linda rosa juvenil, O cravo e a rosa etc. Ela acompanha essas msicas com gestos e movimentao do corpo. Aps algum tempo, as crianas, mesmo sem que a professora sugira, repetem os movimentos realizados quando cantam a msica inclusive quando esto em casa, o que desperta a curiosidade dos pais, que querem saber qual o significado daqueles movimentos.

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    Vemos, nessa situao, a apropriao que os bebs fazem de uma experincia vivida coletivamente. A atividade com msica apenas um exemplo. Vrias outras atividades que trazem a riqueza do patrimnio cultural da comunidade na qual voc, professor(a), trabalha, podem ser exploradas com as crianas, seja individual ou coletivamente, ampliando o repertrio do grupo.

    Atividade 1A situao descrita no quadro abaixo foi observada numa pesquisa realizada pelas professoras Erclia Maria Angeli Teixeira de Paula e Zilma de Moraes Ramos de Oliveira.

    Cena 3

    Quando uma msica que vem de fora da sala (onde crianas da creche almoavam) ouvida, Katarina (16 meses) sorri e bate as palmas das mos ritmicamente na mesa, olhando para Fernanda (19 meses). Em seguida, Fernanda repete os gestos. Ela bate as palmas de suas mos na mesa, observada por Katarina. Depois as duas meninas batem as palmas das mos na mesa, rindo. Fernanda apia o cotovelo na mesa e olha para a educadora que se aproxima, enquanto Rosa (17 meses) balana a cabea de Katarina. Esta balana sua cabea no ritmo da msica, batendo as palmas das mos na mesa. Fernanda bate de leve e rapidamente a mo direita nos prprios lbios, enquanto grita: O, o, o, o!. Katarina imita Fernanda por um instante e novamente bate as palmas das mos na mesa. Uma educadora aproxima-se e d s crianas seus pratos de comida.

    PAULA, E. M. A. T. de, OLIVEIRA, Z de M. R., 1997.

    Como voc interpreta esta cena? O que as crianas esto compartilhando na situao descrita? Voc j observou alguma situao parecida com a descrita? Se j observou, seria interessante escrever como foi e discuti-la com seus(suas) colegas do PROINFANTIL no prximo encontro quinzenal.

    A situao descrita na Cena 3 mostra que as experincias compartilhadas entre as crianas vo constituindo a histria, a cultura, as formas de expresso do grupo. Essas experincias permitem que as crianas estabeleam relaes de confiana, de intimidade, de pertena. O grupo se constitui a partir das muitas atividades partilhadas. Essas atividades podem ter incio a partir da iniciativa de uma ou de vrias crianas nas mais diversas situaes, como a

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    hora do almoo no exemplo relatado. Nesse sentido, importante que os adultos criem espaos para que essas interaes aconteam, considerando que a imitao tem papel importante de integrar, criar identificaes e significados compartilhados coletivamente.

    Como voc j viu em unidades anteriores, a imitao faz parte do desenvolvimento cognitivo e cultural da criana. Para imitar algum, a criana precisa atribuir um significado ao do outro. pela imitao que ela vai experimentar comportamentos e aes que talvez ainda no fizesse por conta prpria. Nesse sentido, ela se coloca em situao de aprendizagem, de ampliao de seus recursos de ao. Impulsionada pelos modelos que a cercam, ela vai criando e incorporando novas formas de ao. A situao descrita no quadro a seguir, observada num trabalho de pesquisa desenvolvido pelas professoras Maria Teresa Falco Coelho e Maria Isabel Pedrosa, mostra como, ao imitar, a criana vai internalizando novas formas de ao. As crianas observadas nesta pesquisa tinham entre 2 e 3 anos.

    Cena 4

    Joo e Viviane esto sentados no cho, um ao lado do outro, mexendo em peas de encaixe. Joo coloca uma pecinha no ouvido e segura com a mo, olhando Viviane que est sentada ao lado dele. Ela faz o mesmo e coloca a mo no ouvido dizendo: Al.... Joo olha rapidamente para ela, que est mexendo nas pecinhas. Ela diz: Ah, t quebrado. Ele a olha, fala algo e ela o olha e pega peas junto dele. Ele pega rapidamente a que restou, coloca no ouvido e sai.

    COELHO, M. T. F., PEDROSA. M. I., 1997.

    Nesta situao, Viviane aprende com Joo um significado que ele atribui pea de encaixe ao coloc-la no ouvido como se fosse um telefone. Portanto, as crianas esto compartilhando significados na ao de brincar, ao mesmo tempo em que atribuem novos significados aos objetos, nesse caso, as peas de encaixe.

    Vamos recordar que, como vimos nas Unidades 1 e 2 de FE, para Vygotsky, a criana apreende a ao do outro enquanto imita, e, ao atribuir significado a esta ao, aprende. No se trata de uma mera cpia, uma vez que, para imitar algum, a criana precisa compreender o comportamento do outro e se envolver intelectualmente na atividade, o que implica represent-la e avaliar a adequao de sua imitao.

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    De acordo com Vygotsky, a imitao tem um papel crucial no desenvolvimento. A criana s consegue imitar aquilo que est na sua zona de desenvolvimento proximal. Isto quer dizer que o que ela imita hoje, amanh, ir tornar-se algo prprio dela.

    Por exemplo, quando imita a me numa brincadeira de faz-de-conta, a criana fala como se fosse a me, apresenta gestos e posturas mais desenvolvidos do que ela, criana, na realidade. Quando volta ao seu lugar cotidiano de criana, ela volta diferente, pois incorpora algo do que imitou. Assim, tambm quando busca o modelo de um amigo mais velho para fazer um desenho, reproduz o trao do outro e, em seguida, coloca algo diferencial que marca sua produo prpria.

    Tambm no custa repetir que o principal conceito da teoria de Vygotsky o de zona de desenvolvimento proximal. A zona do desenvolvimento proximal se refere diferena entre o desenvolvimento atual da criana e aquilo que ela consegue fazer com o auxlio de outras pessoas. A presena e ajuda do outro permite que a criana faa mais do que ela conseguiria fazer sozinha, atingindo novos nveis de desenvolvimento. Aquilo que a criana faz hoje com ajuda poder fazer amanh sozinha.

    FE, MOD. II, UNID. 1

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    Nesse sentido, podemos colocar em destaque a importncia das interaes das crianas entre si e com os adultos no cotidiano da Educao Infantil, uma vez que essas trocas sero oportunidades de crescimento e construo de conhecimentos.

    Partimos do princpio de que o desenvolvimento humano se d atravs das interaes estabelecidas com outros seres humanos em ambientes fsicos e sociais, culturalmente es-truturados.

    Especialmente nos primeiros anos de vida, perodo em que muitas crianas freqentam as creches e pr-escolas, a dependncia dos pequenos em relao ao outro constitui uma peculiaridade especial do desenvolvimento. Essa dependncia vai se transformando gradualmente, medida que a criana vai conquistando novas formas de ao.

    Desde bebs, possumos uma certa organizao do comportamento e algumas condies para perceber e reagir s situaes exteriores, principalmente aos parceiros diversos que formam nosso meio humano. na relao com os outros que vamos compreendendo o mundo, dando significado para as aes, dominando formas de agir, pensar e sentir presentes em nosso meio cultural, desenvolvendo a capacidade de expresso e de linguagem.

    Tomemos como exemplo o compor-tamento do beb em seus primeiros meses de vida. Inicialmente, ele chora em reao a diferentes incmodos e ajustes orgnicos: clicas, sono, fome, necessidades de higiene etc. Os adultos responsveis pelos cuidados com o beb normalmente a me ou o pai reagem ao seu choro e tomam atitudes para ampar-lo, oferecendo-lhe alimento, colo, trocando suas fraldas etc. Sendo assim, de certa forma, o beb vai ensinando aos adultos como estes devem se comportar para atender s necessi dades que ele manifesta.

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    Pouco a pouco, o beb percebe que sempre que chora obtm a ateno de seus objetos de afeio e, ento, comea a chorar no mais como ao reflexa. Agora seu choro se torna intencional, isto , ele chora para obter a ateno desejada e a resoluo de seus desconfortos. Depois de algum tempo, podemos at diferenciar quando o choro indica fome, ou sono, ou apenas necessidade de proximidade fsica. No apenas o beb vai controlando seu choro (mais intenso, mais alto), como tambm os adultos que se relacionam com ele vo aprendendo, na interao, a diferenciar suas formas de expresso.

    Vale destacar que a forma como o adulto vai compreender esse choro ser fundamental para que a criana v tambm dando um sentido s suas sensaes. Para o beb, embora reconhea o desconforto fsico, a discriminao entre o que exatamente est lhe incomodando no clara. Se, por acaso, o adulto reage ao choro do beb, achando que sempre que ele chora porque est com fome e o alimenta, provvel que o beb comece a associar suas sensaes de desprazer quela forma de conforto apresentada pelo adulto (nesse caso, ao alimento).

    importante investigarmos as expresses infantis, tentando compreender os diferentes significados que se expressam em seus comportamentos. Ser por meio de nossa ajuda que desde muito cedo o beb ir compreender e dar sentido ao que sente e vive.

    Atividade 2Professor(a), propomos que voc, a partir da observao das crianas com as quais trabalha, faa uma pequena lista relacionando uma forma de expresso da criana aos significados que voc pode atribuir a esta expresso. O quadro abaixo uma sugesto de como voc pode organizar esta lista em seu caderno.

    Gesto expressivo Significados

    Choro

    Abrir os braos

    Jogar um objeto no cho

    Outros gestos

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    Os exemplos das cenas que apresentamos at aqui, e que tambm esto presentes em nossas experincias e observaes cotidianas, nos indicam que a comunicao entre a criana e seus parceiros sejam eles adultos ou crianas se d muito precocemente. O papel do adulto, em especial, compreender a criana para ajud-la a compreender a si mesma e ao mundo. Vemos tambm que nesse contexto a imitao tem lugar privilegiado como forma de a criana aprender sobre o outro, sobre si e sobre tudo o que est ao seu redor. Com isso, ela tambm amplia suas possibilidades de expresso. observando os adultos de referncia suas expresses, seus gestos, suas falas que o beb vai conhecendo o mundo, o outro e a si mesmo. Como podemos lidar com essas questes na prtica cotidiana? Os conflitos entre as crianas so bons exemplos de como o adulto pode ser um mediador dos relacionamentos entre as crianas, pois, para que possamos intervir adequadamente, precisamos observar o que motivou o conflito, quais as crianas envolvidas nele e de que forma aquelas crianas tm conseguido expressar seus desagrados e resolver seus impasses. Veja como isso acontece na situao descrita a seguir.

    Cena 5

    Um grupo de crianas de 3 anos brinca no ptio de areia, sob a superviso da professora. Pedro e Lucas iniciam uma disputa por um baldinho de areia. Antes que a professora pudesse intervir, Pedro bate com uma pazinha de plstico na testa de Lucas, arranhando-a. Lucas comea a chorar. A professora abaixa-se e conversa com os dois meninos. Dirige-se a Pedro e mostra a ele que Lucas est chorando, sugerindo que faam algo para cuidar do colega machucado. Leva os dois pela mo at o banheiro e pede que Pedro ajude a limpar o arranho na testa do colega. Vai, ento, orientando-o a lavar as prprias mos e pass-las, ainda molhadas, na testa do colega. O gesto repetido, posteriormente, agora com um algodo embebido em soro. Aos poucos, Lucas e Pedro vo se acalmando, o gesto inicial de agresso vai se tornando um gesto de carinho, de cuidado com ou outro.

    Aviozinho, Cenas infantis. Sandra Guinle

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    Muitas vezes, com a mediao do adulto que a criana vai experimentando novas condutas que, sozinha, ainda no seria capaz de vislumbrar. Vale destacar que, especialmente nos primeiros anos de vida, atitudes como a descrita na Cena 5 no podem ser consideradas simplesmente agresses. A criana pequena, de um modo geral, no tem ainda plenamente desenvolvida sua capacidade de expresso pela fala e est construindo um entendimento sobre os efeitos que suas aes causam nos outros. Portanto, bater, puxar um brinquedo da mo de outra criana ou mesmo morder podem significar uma inabilidade da criana para lidar com a situao. Para as crianas, ainda um desafio perceber que no apenas seu prprio desejo que deve ser considerado, bem como compreender que suas aes provocam reaes. O papel do(a) professor(a) ir ajudando a criana a construir este entendimento de si mesma e do outro, bem como desenvolver formas de resoluo de conflitos baseadas no cuidado com o amigo, no respeito e no afeto.

    O afeto ir facilitar o estabelecimento de vnculos entre a criana, o(a) professor(a) e seus(suas) colegas e os objetos do conhecimento, pois ele quem suscita motivos para a ao. Promover a capacidade da criana para relacionar-se desde cedo com parceiros diversos, particularmente com outras crianas, uma ao fundamental por parte do(a) professor(a) de Educao Infantil.

    Atualmente vivemos uma crise dos laos de solidariedade entre os adultos, especialmente no mundo do trabalho, que tem se expandido para outras esferas da sociedade. Cada um por si o lema no qual o que vale o prprio interesse. Para que possamos nos contrapor a essa cultura do individualismo, preciso promover momentos de troca e de partilha entre as crianas, tendo em vista que nascemos disponveis para o contato com o outro e dependemos dele para nosso desenvolvimento.

    Como isso pode ser feito na prtica? Atitudes simples podem ser tomadas. Promover brincadeiras em que as crianas se relacionem e percebam umas s outras um bom caminho.

    No caso das crianas bem pequenas podemos, por exemplo:

    1. Promover um jogo de bola em crculo em que o(a) professor(a) vai nomeando cada criana para quem passa a bola e incentivando-a a jogar a bola para outra criana.

    2. Quando houver disputas por brinquedos, o(a) professor(a) pode intervir propondo uma brincadeira coletiva com o objeto da disputa, de modo que esse objeto possa ser compartilhado.

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    3. O(a) professor(a) pode fazer um mural com fotos e/ou desenhos das crianas em diferentes situaes de brincadeira, relembrando os momentos vividos e fortalecendo o reconhecimento do sentido de grupo.

    4. Promover situaes de brincadeiras que envolvam o toque, a aproximao, o carinho, as manifestaes de afeto.

    Atividade 3Marque com um X a frase CORRETA, de acordo com o que voc estudou at aqui sobre o papel da imitao no desenvolvimento infantil.

    a) ( ) A criana, ao imitar, apenas copia o que v os adultos fazerem.

    b) ( ) S h aprendizagem quando a criana realiza suas prprias aes, sem imitar ningum.

    c) ( ) Na imitao, a zona de desenvolvimento proximal ativada, pois a criana realiza aes que no seria capaz de realizar sozinha.

    d) ( ) Os adultos no devem intervir nos conflitos entre as crianas.

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    Atividade 4Certamente voc j vivenciou diferentes situaes de conflito entre as crianas com as quais voc trabalha. Descreva uma dessas situaes e comente qual foi a sua atitude para favorecer a resoluo do conflito. Voc considera que sua atitude tenha sido adequada? Por qu? Voc pode utilizar seu caderno para anotar suas concluses.

    Nessa seo, vimos que o aprendizado da convivncia pode ser potencializado nos espaos de Educao Infantil. So nesses locais que, privilegiadamente, as crianas podero aprender a negociar com o outro, reconhecer diferentes pontos de vista, lidar com conflitos de interesse, promover situaes cooperativas, internalizar regras, trocar afeto etc. No ambiente das creches, pr-escolas e salas de Educao Infantil, as crianas podero ter mltiplas oportunidades de se relacionarem, desenvolvendo formas de comunicao variadas e vivenciando diferentes desafios que a convivncia pe em cena.

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    Vimos, ainda, que a imitao uma forma de conhecer o outro, de compreender formas de se relacionar e expressar a partir da vivncia com os parceiros crianas e adultos. Ser, ento, a partir da interao que as crianas descobriro formas socialmente construdas de estarem juntas, se comunicarem, construrem regras coletivas. o encontro com o outro que favorece nosso desenvolvimento.

    Na prxima seo, falaremos um pouco sobre o papel da brincadeira nesse processo de desenvolvimento.

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    Seo 2 O que e o que no brincar? Pode-se dizer que o beb brinca?

    O objetivo dessa seo:- Repensar como se d o faz-de-conta das crianas na instituio de Educao Infantil e como aprimor-lo.

    Cena 6

    Logo que chega sala de aula, Marina (4 anos) se dirige ao cantinho das fantasias e veste uma saia amarela, de tule, bem rodada. Uma das professoras a v e diz: Como voc est bonita! Parece uma princesa!

    Marina responde: Eu no sou princesa! Sou bailarina.

    A brincadeira um espao de aprendizagem, de imaginao e reinveno da realidade. Desde muito cedo, as crianas envolvem-se em diferentes brincadeiras.

    Como voc teve a oportunidade de ver na Unidade 5 e ter oportunidade de aprofundar na Unidade 7 de Fundamentos da Educao deste mdulo, o brincar uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento das crianas pequenas. Atravs das brincadeiras, a criana pode desenvolver algumas capacidades importantes, tais como: a ateno, a imitao, a memria

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    e a imaginao. Ao brincar, as crianas exploram e refletem sobre a realidade e a cultura na qual vivem, incorporando e, ao mesmo tempo, questionando regras e papis sociais. Nos jogos de faz-de-conta, por exemplo, a criana recria situaes que fazem parte de seu cotidiano, trazendo personagens e aes que fazem parte de suas observaes. Assim, ela pode vestir uma saia rodada e se tornar bailarina, colocar uma bolsa a tiracolo e dizer que vai trabalhar. Podemos dizer que, nas brincadeiras, as crianas podem ultrapassar a realidade, modificando-a atravs da imaginao.

    Nas instituies de Educao Infantil, a organizao do tempo e do espao pode favorecer ou no a criao de brincadeiras diversas pela criana. Em Fundamentos da Educao desta unidade, voc encontrou algumas sugestes de como proceder para favorecer a brincadeira na rotina das instituies de Educao Infantil que apresentamos no quadro a seguir.

    Uma forma de incentivar o faz-de-conta das crianas arrumar uma ou mais caixas grandes de papelo. Em cada uma delas podem-se colocar roupas, adereos, enfeites, objetos que reforcem um determinado tema da vida cotidiana das crianas: cabeleireiro, barbeiro, time de futebol, venda, lanchonete ou restaurante, castelo mgico, ilha encantada, fbrica de automvel, barco de pesca etc. Como voc pode ver, a variao grande e voc pode, melhor que ningum, reconhecer quais temas so interessantes para as crianas. Procure acompanhar como elas utilizam os objetos da caixa e modifique alguns itens, se necessrio, aumentando ou trocando alguns deles. Faa um registro de cada um dos primeiros dias de uso do ba da fantasia.

    FE, MD. II, UNIDADE 5.

    O modo como as crianas vo se apropriar dos objetos que so colocados sua disposio para brincar e os enredos que vo criar a partir deles depende da cultura na qual a criana est inserida. A criana aprende a brincar com os outros membros de sua cultura. Primeiramente com os mais prximos e, medida que cresce e se desenvolve, vai ampliando seu rol de relaes. Suas brincadeiras so repletas de hbitos, valores e conhecimentos do grupo social ao qual pertence. Por isso dizemos que a brincadeira histrica e socialmente construda. Ou seja, a criana utilizar as experincias que vive em sua comunidade os valores que circulam, as tradies, os personagens do folclore tpico da localidade.

    assim que, se pensamos numa criana que mora no Maranho, onde a festa popular do bumba-meu-boi muito forte, se pensamos numa criana de Recife,

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    que tem o frevo e o maracatu como manifestaes culturais de seu povo, ou, ainda, numa criana que vive prxima a uma comunidade de pescadores e que conhece todos os ritos das pescarias, as lendas e a sabedoria popular ligada a essa prtica, teremos a uma riqueza de elementos, conhecimentos e experincias culturais que iro influenciar no que as crianas conhecem, nas brincadeiras que faro parte de suas vidas, nas msicas de seu repertrio etc. A histria de um povo suas crenas, festas, tradies, hbitos alimentares e culturais importante na formao da identidade cultural da criana e estar presente em suas brincadeiras, por isso importante que sejam valorizadas na instituio de Educao Infantil.

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    - A imagem acima mostra o teatro de marionetes O Brasil de Pedro a Pedro.

    - O teatro de marionetes existe desde o antigo Egito. L, as marionetes eram imagens sagradas que faziam parte de rituais religiosos.(...)

    - No Brasil, o teatro de marionetes chegou com os padres jesutas, que usavam esse recurso para catequizar os ndios.

    - Em Minas Gerais, no sculo XVIII, os artistas apresentavam, de vilarejo em vilarejo, seu teatro de bonecos em carroas-palcos. Eram chamados de Circos do Briguela.

    - No Nordeste do Brasil, os artistas mambembes criaram o mamulengo como uma forma de manifestao popular. Os artistas criam um personagem e a apresentao improvisada, inventada na hora pelo manipulador, sempre com muito humor.

    POUGY, E. Criana e Arte: descobrindo as artes visuais. So Paulo: Editora tica, 2001. vol. 4.

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    O teatro de marionetes, como voc pode ver no quadro ao lado, tem uma histria, faz parte de nossa cultura. Muitas atividades na instituio de Educao Infantil podem ser desenvolvidas, por exemplo, a partir do teatro de fantoches ou de marionetes.

    Os fantoches podem ser de vrios tipos: de dedo (dedoche), em que voc pode simplesmente pintar carinhas nos dedos das crianas ou fazer dedais que sejam bonecos de papel ou tecido; de meia, sendo usadas meias velhas para pintar personagens diversos; de vara, com bonecos, que podem ser feitos pelas prprias crianas ou pelo(a) professor(a), em papel, sendo recortados e colados em varinhas de madeira. Essas so apenas algumas sugestes. Voc, professor(a), pode criar muitas outras com suas crianas.

    Os personagens e enredos que vo aparecer no teatro tambm podem ser vrios, baseados na cultura da comunidade onde as crianas vivem. assim que, por exemplo, na zona oeste do Rio de Janeiro, um grupo de crianas de uma escola municipal vivia fazendo com as mos gestos de quem estava soltando uma pipa. A professora percebeu ento a presena da pipa no cotidiano dessas crianas e desenvolveu um projeto a partir da observao desta brincadeira: entraram em cena msicas de pipa, confeco com a ajuda dos pais de pipas de diferentes cores e tamanhos e, claro, no poderia deixar de ser, soltaram as pipas no final do projeto.

    Com relao aos bebs, vemos que este brincar vai surgir nos primeiros momentos de vida. Os pais, familiares e educadores responsveis pelos cuidados com os bebs ensinam-lhes a brincar desce cedo. Atravs da interao e dos vnculos afetivos, vo criando diferentes situaes. No difcil lembrarmos do tradicional jogo de esconde-esconde que os pais fazem com seus bebs: Cad o nen?. Nesses momentos, a criana vai construindo na relao com suas primeiras figuras de referncia, os pais um jogo, isto , aprende a brincar a partir da repetio, da percepo da expresso dos pais, do entendimento que vai construindo do significado daquela brincadeira.

    No caso da brincadeira de esconde-esconde, por exemplo, quando pais e/ou educadores utilizam lenis ou panos para sumir ou fazer as crianas sumirem, podemos identificar mltiplos aprendizados que esto em jogo: a possibilidade de representar o objeto sumido apesar de sua ausncia, o entendimento da linguagem, a alternncia de participao dos envolvidos como estrutura da brincadeira etc. Alm disto, a brincadeira um especial momento de prazer, troca afetiva e alegria. Elementos fundamentais na vida de qualquer pessoa para a sua constituio.

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    A brincadeira uma aprendizagem social, fruto das relaes entre os sujeitos de um grupo social. Nesse sentido, a Educao Infantil apoiada nesta perspectiva histrica-cultural do desenvolvimento tem um papel muito importante na organizao e no planejamento de condies propcias para o desenvolvimento e a aprendizagem do processo de brincar.

    A brincadeira no uma atividade que a criana j nasce sabendo. Brincar implica troca com o outro, trata-se, como j vimos, de uma aprendizagem social. Nesse sentido, a presena do(a) professor(a) fundamental, pois ser ele quem vai mediar as relaes, favorecer as trocas e parcerias, promover a integrao, planejar e organizar ambientes instigantes para que o brincar possa se desenvolver.

    Voc pode, por exemplo, na sala de atividades de crianas entre 1 e 2 anos, amarrar uma corda de uma ponta a outra da sala e pendurar nela diferentes tripas de papel ou tipos diferentes de barbantes, tecidos e/ou fitas. Voc ver como este toque no ambiente promover exploraes divertidas. As crianas dessa faixa etria adoram provocar efeitos de movimento nos objetos e se encantam em balan-los e pux-los, dentre outras aes. Assim vo conhecendo mais sobre os efeitos de sua ao sobre o mundo material e sobre as prprias caractersticas dos objetos em questo.

    O(a) professor(a), ao organizar o espao e disponibilizar alguns materiais para explorao pelas crianas, j cria um ambiente propcio para surgirem brincadeiras. Depois s entrar com elas na farra! Fantasias, tecidos, caixas e bolas, objetos de baixo custo, so excelentes para brincar. Entrar e sair de caixas, fazer com elas casas e carros, vestir fantasias e brincar de faz-de-conta, manipular bolas de tamanhos e texturas diferentes, enfim, so muitas as possibilidades de explorao.

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    Atividade 5Voc j brincou de faz-de-conta com as crianas com as quais voc trabalha? Que personagem voc assumiu? Como a brincadeira comeou? Que histria criaram, e como ela terminou? O que mais lhe chamou a ateno nesta atividade? Voc se sentiu vontade na situao? Por qu? Voc pode utilizar seu caderno para anotar suas observaes.

    A brincadeira simblica ou de faz-de-conta leva construo pela criana de um mundo ilusrio, de situaes imaginrias em que objetos so usados como substitutos de outros, conforme a criana os emprega com gestos e falas adequadas.

    Assim, uma fralda de pano pode se transformar na capa de um super-heri; uma cadeira, no assento de uma espaonave ou trem; uma rampa, em uma corda bamba de equilibrista etc.

    Nessas situaes, a criana reexamina as regras embutidas nos atos sociais, ou seja, ela reproduz na ao aquilo que v usualmente em suas experincias sociais e culturais: os heris voam e ela voar, no entanto no voar realmente, pois percebe a distino entre jogo simblico e realidade. Isso ocorre conforme a criana experimenta vrios papis no brincar e pode verificar as conseqncias por agir de um ou de outro modo. Com isso, internaliza regras de conduta, desenvolvendo sistemas de valores que iro orientar seu comportamento.

    A criana, ao brincar, mais do que repetir um modelo de ao que observou, estaria examinando o papel do adulto, por ela vivenciado na relao adulto-criana, em que, na realidade, ela prpria recebe cuidados. Ela pode, ento, tomar o papel do outro para melhor compreend-lo. Imita a me, reproduzindo o comportamento que a mesma adota em relao a si, ou que ela v a me adotar em relao a outros elementos do meio.

    A brincadeira de faz-de-conta tem outro papel importante para a criana. Ela permite reviver situaes que lhe causaram enorme excitao e alegria ou alguma ansiedade, medo ou raiva, podendo, na situao mgica e descontrada da brincadeira, expressar e trabalhar essas emoes muito fortes ou difceis de suportar. Na brincadeira, esto envolvidos aspectos cognitivos, emocionais e fsicos, e o que est em jogo para os adultos que convivem com a criana conhecer melhor os sentimentos e emoes que ela vive, bem como o modo como ela os elabora por meio do brincar.

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    Atividade 6

    Jos tem 2 anos e est na creche h um ano. Conhece bem os adultos e as crianas e demonstra muito prazer em freqentar a instituio de Educao Infantil. Recentemente, sua me foi convidada para assumir um novo trabalho distante de sua casa, o que exigiu que ela passasse de segunda a sexta-feira fora da cidade onde moravam, s vindo para a casa nos fins de semana. Jos ficava com o pai. Para Jos, o afastamento da me de segunda sexta era um grande desafio.

    Na sexta-feira, ele e o pai iam buscar a me na rodoviria. Sua famlia deu a ele um nibus de madeira e ele passou a andar agarrado a esse brinquedo. Sempre que algum adulto chegava perto, ele explicava toda a histria:

    Esse o nibus que a mame pegou, ela vai voltar sexta-feira. O nibus vai l na estrada...

    Como voc entende o apego de Jos ao nibus de brinquedo, considerando o que vimos nessa primeira seo sobre o papel do brincar no desenvolvimento da funo simblica? Aproveite para retomar o estudo sobre este tema em Fundamentos da Educao desta unidade

    Quando o(a) professor(a) est atento(a) ao que acontece com as crianas, pode favorecer o desenvolvimento de relaes de troca, afeto e confiana, condio fundamental para ajudar a criana a lidar com seus conflitos e para propiciar o brincar junto.

    Cano da Amrica

    Amigo coisa para se guardar debaixo de sete chaves, dentro do corao. Assim falava a cano que na Amrica ouvi (...) Amigo coisa para se guardar no lado esquerdo do peito, mesmo que o tempo e a distncia digam no...

    Milton Nascimento

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    Brincar coisa de amigos! Quanto mais estreitos os laos de afeto, mais espaos e situaes de brincar se expandem. Todos ns podemos lembrar de alguns amigos especiais, daqueles que guardamos no lado esquerdo do peito, como nos diz o Milton em sua Cano da Amrica (alis, como os poetas traduzem o que passa pelo nosso corao, no ?).

    Currupio, Cenas infantis. Sandra Guinle

    Nossos amigos so aqueles que partilharam conosco diferentes momentos de nossa vida, com os quais passamos por muitas situaes, compartilhamos experincias, convivemos e trocamos afetos, histrias, enfim, possumos algo em comum. Estabelecemos vnculos, ligaes com nossos amigos queridos, que fazem com que tenhamos cumplicidade, histrias prprias que so parte dessas relaes, segredos e causos. Muitas vezes, basta um olhar ou uma palavra para que lembremos de algum episdio passado em conjunto, que s mesmo os amigos entendem. O entendimento exige poucas palavras, a intimidade e a familiaridade j carregam uma poro de sentidos partilhados, fruto das experincias em comum.

    So muitas as situaes dirias que envolvem interaes criana-criana e criana-adulto: as rodas de conversa, onde est em jogo o aprendizado da escuta do outro e da prpria expresso; as refeies, quando todos compartilham o alimento, conversam sobre suas experincias; nas brincadeiras, quando precisam encontrar formas de incluir as diferentes idias, vontades, movimentos uns dos outros; as histrias, quando se acomodam de forma que todos possam ver o livro que o(a) professor(a) mostra etc. Enfim, todos os momentos partilhados no cotidiano da Educao Infantil podem convidar as crianas a estabelecerem relaes umas com as outras em trocas intensas e constantes.

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    Conflitos so inevitveis nesse contexto, seja em funo do desejo por um mesmo brinquedo ou dificuldades em estabelecimento de combinados coletivos. O(a) professor(a) ser o(a) principal mediador(a) nesses momentos, no resolvendo os impasses pelas crianas, mas ajudando-as a olharem para as situaes de conflito conjuntamente, buscando com elas formas de resoluo, esclarecendo as diversas formas de compreenso que se colocam em cena.

    Em alguns momentos, aflitos(as) com os desentendimentos infantis, acabamos tomando atitudes mais drsticas, separando algumas crianas para manter a disciplina. Nesse ponto, vale retomar uma discusso que j tivemos na parte dedicada aos Fundamentos da Educao deste mesmo mdulo.

    Trata-se da importncia de estimularmos o desenvolvimento da autonomia na criana, entendendo por autonomia a possibilidade de ela fazer escolhas por si prpria sem que seja necessrio um rgido controle externo. O(a) professor(a) ser sim o(a) mediador(a) nos momentos de conflito, mas sem impedir que a criana possa buscar formas de se comunicar com seus parceiros, de fazer com eles combinados. Ser no confronto e na vivncia tranqila destes momentos de embate com o apoio do(a) professor(a) que a criana vai construir com autonomia uma disciplina que nortear seu comportamento social.

    Muitas vezes, a criana chega creche ou pr-escola com comportamentos e formas de agir prprias que desenvolveu em casa. A atividade que propomos a seguir apresenta uma situao que ilustra este fato.

    Atividade 7

    Paula tem quase 2 anos e est vivendo sua primeira experincia em um espao de Educao Infantil. Em sua casa, costuma alimentar-se sempre com ajuda, sendo muito cuidada por seus familiares e tendo poucas oportunidades de tomar iniciativas com relao aos cuidados consigo mesma: sempre ajudada em atividades como trocar a roupa, organizar seu material, lanchar etc. Na hora do lanche na creche, enquanto a professora distribua biscoitos nos pratos das crianas, Paula abriu a boca, esperando ser alimentada. A professora, conver sando com ela, pegou em sua mo, colocando ali o biscoito e a estimulando a comer sozinha.

    Como voc analisa a situao descrita no quadro anterior e a atitude da professora? Voc j viveu ou vive situao semelhante com as crianas com as quais trabalha? Voc pode usar seu caderno para anotar suas concluses.

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    Atividade 8Se voc fosse o(a) professor(a) de Paula e tivesse que justificar aos pais da menina sua atitude, o que diria? Tente escrever um bilhete explicando aos pais sua atitude. No se esquea de utilizar argumentos baseados nos conhecimentos que voc vem construindo sobre a importncia de incentivar a autonomia da criana.

    O exemplo de Paula mostra como as experincias que a criana vive vo influenciar os modos de ela agir, pensar e sentir. Num grupo de crianas, o que far com que elas se sintam prximas e possam estabelecer laos fortes de amizade sero as experincias vividas em conjunto. Brincadeiras de faz-de-conta, histrias contadas que se tornam queridas por todos, jogos inventados que se repetem, cantigas etc. Nesse sentido, esta seo nos aponta a importncia de criarmos ambientes propcios ao brincar e ao estreitamento das relaes entre as crianas; as experincias compartilhadas so condies importantes para que isto ocorra efetivamente.

    Seo 3 O desenvolvimento pela criana de sua capacidade de fazer de conta, de agir a partir de sua prpria capacidade de imaginar

    O objetivo desta seo:- Pensar alternativas para promover a brincadeira na instituio de Educao Infantil.

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    (...) O mundo era um pedao complicado para um menino que viera da roa. No vi nenhuma coisa mais bonita na cidade do que um passarinho. Vi que tudo o que o homem fabrica vira sucata: bicicleta, avio, automvel. S o que no vira sucata ave, rvore, r, pedra. At nave espacial vira sucata. Agora penso uma gara branca de brejo ser mais linda que uma nave espacial. Peo desculpas por cometer essa verdade.

    Manoel de Barros

    O autor do poema que voc leu no quadro acima conta que em sua infncia, vivida numa cidade do interior, as crianas brincavam com tudo o que era possvel e tudo virava brinquedo: boizinhos de osso, bolas de meia, carrinhos de lata. Brincavam de escutar conchas, de fazer de conta que sapo era cavalo de cela e sair num passeio imaginado, montado num sapo-cavalo. Vivendo na cidade grande, o autor relembra a magia do brincar de sua infncia passada na roa, a beleza da natureza que estava to prxima dele quando criana e as infinitas possibilidades que esse convvio com a natureza trazia para um menino.

    Manoel de Barros fala de uma das principais caractersticas do brincar: ele no depende de materiais sofisticados, brinquedos caros, ou qualquer coisa nesse sentido. O brincar uma ao que nasce da necessidade da criana de criar, imaginar, compreender o mundo sua volta, como j discutimos em vrias unidades do PROINFANTIL e discutiremos mais na Unidade 7 deste mdulo.

    O brincar uma atividade ldica, isto quer dizer que ela gratuita, no-instrumental, surge liberada, livre. Ou seja, exercida pelo simples prazer que as crianas encontram em faz-lo. Isto no quer dizer que ela no atenda s necessidades de desen volvimento, ela tem enorme importncia neste aspecto. O brincar tende sempre a aperfeioar-se, tornando-se cada vez mais complexo.

    O recm-nascido, por exemplo, exercita suas possibilidades sensoriais nascentes. Brinca de olhar, de fazer sons, de movimentar os seus membros. Aos poucos, medida que cresce, o beb descobre novas brincadeiras. A princpio, provoca alguns aconte cimentos por acaso, como por exemplo quando est deitado em seu bero e acidentalmente esbarra no mbile que fica pendurado prximo a ele. O prazer que o movimento do mbile traz ao beb faz como que ele v aos poucos e pela repetio do gesto associando o efeito de sua ao (o balano do mbile) ao que causou este efeito (sua mo esbarrando no mbile).

    Essa associao favorece o fato de o beb comear a buscar repetir este efeito intencionalmente, ou seja, ele agora no esbarra mais por acaso no mbile, mas

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    pratica essa ao intencionalmente em busca da repetio da situao que lhe causou prazer. Nessa situao ele est desenvolvendo intensamente suas habilidades motoras e suas emoes diante das tentativas bem ou mal-sucedidas.

    Esse mesmo padro ldico, ou seja, a mudana de uma ao gratuita para outra intencional se repete mais tarde em outros patamares do desenvolvimento infantil. O grafismo um bom exemplo. Uma criana de trs anos aproximadamente poder dar um significado diferente a seu desenho sempre que perguntarmos o que ela desenhou. Este significado s ir se estabilizar mais tarde, a partir de seu desenvolvimento e das experincias no campo da produo plstica que for vivenciando. Por isso importante que, nas instituies de Educao Infantil, a criana tenha oportunidade de experimentar livremente diversos materiais para desenhar, sem que seja cobrado dela um produto final de sua atividade.

    As crianas de 1 a 3 anos atravessam um perodo marcadamente sensorial/motor e simblico. Isto quer dizer que ela tem desejo por experincias ligadas ao movimento e s sensaes. Est construindo o conhecimento sobre seu prprio corpo e sobre o mundo sua volta. Portanto, brincadeiras que envolvam subir, descer, pular, cair, levantar, pr, tirar, fazer, desfazer, criar e destruir fazem sucesso.

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    Para favorecer essas brincadeiras o(a) professor(a) pode preparar o espao de modo a favorecer essas exploraes, convidando ao movimento. Caixas de vrios tamanhos, almofadas, tecidos, pequenos obstculos nos quais a criana possa subir e descer com segurana, objetos que ela possa colocar e tirar de dentro das caixas, tais como bolas de encher cheias, colees diversas etc. As crianas gostam tambm de entrar com o corpo inteiro em diferentes lugares e objetos. Podemos fazer tneis de tecido para elas passarem, caixas que virem casas e carros etc.

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    Para alimentar o jogo simblico, podemos brincar com as palavras fazendo rimas, lendo poemas, cantando canes. A utilizao de gestos e movimentos pode fazer parte desses momentos. Espelhos para brincar de fazer caretas, para se observar depois de colocar fantasias e fazendo movimentos inusitados com o corpo so tambm excelentes recursos para ampliar o brincar.

    Enfim, amigo(a) professor(a), ns temos o papel de alimentar com materiais e sugestes as aes de brincar das crianas com as quais trabalhamos. Msica, pintura, escultura, dana, poesia, narrativa e teatro so formas de brincar e fazer fruir as manifestaes infantis. Alm disso, a mediao deve favorecer que o brincar seja partilhado e que o grupo se integre, reconhecendo-se como parceiros queridos com os quais possvel trocar, brincar, amar e cuidar.

    Neste sentido, importante que tambm ns, adultos, entremos na roda, nos dispondo a brincar com as crianas, vivenciando com elas as aventuras e invenes maravilhosas que so capazes de criar. Vamos brincar?

    PARA RELEMBRAR Nesta unidade, retomamos alguns temas j tratados em unidades anteriores para pensar em situaes da nossa prtica cotidiana nas instituies de Educao Infantil. Retomando alguns conceitos estudados neste volume, em Fundamentos da Educao, vimos que a imitao infantil uma forma de conhecer o outro, de compreender e construir formas de se relacionar e se expressar a partir da vivncia com os parceiros crianas e adultos. A partir da, pensamos as diferentes formas de interpretar a situaes em que as crianas realizam gestos imitativos e como o(a) professor(a) pode favorecer a imitao como forma de interao entre as crianas para que elas descubram formas socialmente construdas de estarem juntas, se comuni carem e construrem regras coletivas.

    Discutimos o brincar como uma forma muito intensa de interao entre as crianas, reconhecendo que esta uma das atividades fundamentais para o desenvolvimento das crianas pequenas. Ao brincar, as crianas exploram e refletem sobre a realidade e a cultura na qual vivem, incorporando e, ao mesmo tempo, questionando regras e papis sociais. Inveno, criatividade, conhecimento de mundo esto implicados no ato de brincar. Nesse sentido, enfatizamos o importante papel da instituio de Educao Infantil de incentivar brincadeiras prprias cultura das crianas com as quais trabalha, organizando tempos e espaos para que isso acontea.

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    Outro aspecto fundamental a destacar nessa unidade diz respeito ao papel da creche e pr-escola no incremento de relaes afetivas, de troca entre as crianas. Esse tema ser retomado no Mdulo III, mas, por ora, cumpre destacar que o espao da Educao Infantil muito propcio ao desen volvimento dos laos de afetividade e de amizade. O(a) professor(a) precisa estar atento(a) s relaes entre as crianas, organizando o tempo e o espao de modo a possibilitar que elas tenham inmeras oportunidades de brincarem juntas, de participarem de atividades em conjunto etc. O adulto vai apoiar o grupo na resoluo de conflitos, garantindo regras de convivncia pautadas na troca, na partilha, no respeito mtuo e no dilogo, para que o enten dimento se construa na solidariedade, na incluso e na aceitao da diferena, tema este que ser tambm desenvolvido na Unidade 7 de OTP deste mdulo.

    Por fim, refletimos sobre o desenvolvimento pela criana de sua capaci-dade de fazer de conta, retomando