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7202 PROGRAMA DE VISITAS AO CAMPUS DA UNESP-OURINHOS: CONHECENDO A GEOGRAFIA E SUA DIVERSIDADE i Lucas Labigalini FUINI; Ângela Peres CRESPO; Patrícia INAGUE IFSP-campus de S. João da Boa Vista (ex-docente da UNESP-Ourinhos); UNESP-campus de Ourinhos; UNESP-campus de Ourinhos Eixo temático 02: Formação continuada e desenvolvimento profissional de Professores da Educação Básica PROEX-Unesp [email protected] [email protected] [email protected] . 1. Introdução Diante do histórico afastamento da escola em relação às universidades (vice- versa) e dado o desconhecimento de alunos de ensino fundamental e médio sobre o que é universidade pública e os trabalhos que nela se realizam, iniciou-se no ano de 2014, ainda como projeto piloto, atividades de recepção de alunos no campus de Ourinhos da UNESP. Tal projeto, desenvolvido em 2015 com cadastro na Proex/Unesp e apoio da coordenadoria executiva do campus de Ourinhos, teve por objetivo aperfeiçoar o trabalho de divulgação do curso de Geografia (licenciatura e bacharelado) junto à comunidade externa e educandos e buscar aproximar os conteúdos científicos dos escolares por meio de palestras, oficinas e atividades práticas ambientadas nos laboratórios e salas de aula da universidade, explorando tanto conhecimentos da Geografia humana quanto da Geografia física, considerando a característica de interdisciplinaridade da ciência geográfica (SANTOS, 1978, 1985, 1994, 1996). Além da divulgação regular do vestibular da Unesp, por meio de parceria com a Vunesp, esse projeto logrou auxiliar na divulgação do curso de Geografia da Unesp- Ourinhos fundado em 2003, mas que tem sentido fortemente o declínio do interesse por licenciaturas em todo o país e, por isso, há uma queda na relação de alunos candidatos por vaga no vestibular, chegando, no vestibular Unesp/2016, a 1,3 no período diurno e 1,7 no período noturno. O curso de Geografia oferece, desde 2008, 45 vagas para o período noturno (iniciou oferecendo vagas apenas nesse período) e 45 vagas no período diurno, com formação e titulação em bacharelado e licenciatura. Portanto, o presente artigo segue o método descritivo-analítico, buscando evidenciar por meio da análise de um projeto de extensão educativo voltado às escolas públicas, um duplo despertar de consciência: quanto à importância da formação em nível superior e do contato com a universidade pública, desmitificando o desapreço historicamente construído junto às licenciaturas; e quanto à construção do raciocínio

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PROGRAMA DE VISITAS AO CAMPUS DA UNESP-OURINHOS:

CONHECENDO A GEOGRAFIA E SUA DIVERSIDADE i

Lucas Labigalini FUINI; Ângela Peres CRESPO; Patrícia INAGUEIFSP-campus de S. João da Boa Vista (ex-docente da UNESP-Ourinhos); UNESP-campus de

Ourinhos; UNESP-campus de OurinhosEixo temático 02: Formação continuada e desenvolvimento profissional de Professores da

Educação BásicaPROEX-Unesp

[email protected]@ourinhos.unesp.br

[email protected].

1. Introdução

Diante do histórico afastamento da escola em relação às universidades (vice-

versa) e dado o desconhecimento de alunos de ensino fundamental e médio sobre o que

é universidade pública e os trabalhos que nela se realizam, iniciou-se no ano de 2014,

ainda como projeto piloto, atividades de recepção de alunos no campus de Ourinhos da

UNESP.

Tal projeto, desenvolvido em 2015 com cadastro na Proex/Unesp e apoio da

coordenadoria executiva do campus de Ourinhos, teve por objetivo aperfeiçoar o trabalho

de divulgação do curso de Geografia (licenciatura e bacharelado) junto à comunidade

externa e educandos e buscar aproximar os conteúdos científicos dos escolares por meio

de palestras, oficinas e atividades práticas ambientadas nos laboratórios e salas de aula

da universidade, explorando tanto conhecimentos da Geografia humana quanto da

Geografia física, considerando a característica de interdisciplinaridade da ciência

geográfica (SANTOS, 1978, 1985, 1994, 1996).

Além da divulgação regular do vestibular da Unesp, por meio de parceria com a

Vunesp, esse projeto logrou auxiliar na divulgação do curso de Geografia da Unesp-

Ourinhos fundado em 2003, mas que tem sentido fortemente o declínio do interesse por

licenciaturas em todo o país e, por isso, há uma queda na relação de alunos candidatos

por vaga no vestibular, chegando, no vestibular Unesp/2016, a 1,3 no período diurno e

1,7 no período noturno. O curso de Geografia oferece, desde 2008, 45 vagas para o

período noturno (iniciou oferecendo vagas apenas nesse período) e 45 vagas no período

diurno, com formação e titulação em bacharelado e licenciatura.

Portanto, o presente artigo segue o método descritivo-analítico, buscando

evidenciar por meio da análise de um projeto de extensão educativo voltado às escolas

públicas, um duplo despertar de consciência: quanto à importância da formação em nível

superior e do contato com a universidade pública, desmitificando o desapreço

historicamente construído junto às licenciaturas; e quanto à construção do raciocínio

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geográfico e da consciência espacial para entendimento de diversos processos e eventos

a ocorrer nos âmbitos local, regional, nacional e global.

2. O programa de visitas ao campus

As universidades públicas e privadas têm crescentemente organizado programas

de visita aos seus campi e estruturas de cursos com interesses diversos. As particulares,

em geral, oferecem meios de transporte, lanche e materiais promocionais, além de

palestras e outras atividades, como forma de buscar convencer os estudantes à participar

de seus processos seletivos sequenciais e, ao ser aprovado, realizar matrícula em um de

seus cursos. Trazem também uma função educativa de orientação e auxílio à escolha

profissional dos jovens. Geralmente esses programas ficam concentrados no segundo

semestre. As públicas, apesar de também interessadas na divulgação de seus

vestibulares e na comunicação de seus aspectos positivos, executam também uma

atividade de extensão educativa ao se mostrarem ao público externo e ampliarem o

conhecimento sobre cursos e áreas dos conhecimentos com contato direto com

laboratórios, salas de aulas e materiais diversos dos cursos existentes.

A Unicamp realiza há mais de dez anos o UPA, “Unicamp de Portas Abertas”, no

mês de setembro. A UFSCar também realiza sua “Feira de profissões” no mês de

outubro. Há também feiras de profissões que são organizadas por editoras e reúnem

informações e materiais de uma série de universidades. A Unesp não possui um sistema

de visitas centralizado, este acaba ficando à cargo de seus cursos e unidades

universitárias. É possível também que cada parte interessada (escolas, professores,

coordenadores pedagógicos) solicite visitas específicas à laboratórios, centros e grupos

de pesquisa, mas, nesses casos, o contato ocorre de modo mais individualizado e

fragmentado, não apresentando uma visão da totalidade da área do conhecimento e da

abrangência da profissão.

A visita in loco organizada para toda a unidade universitária e o curso (estruturado

em departamentos, coordenadorias ou institutos) serve como uma espécie de choque de

realidade para alunos de ensino médio (e mesmo de fundamental) que apresentam um

horizonte de perspectivas restrito sobre a continuidade de estudos no nível superior

(sobretudo em instituições públicas, tidas como difíceis de alcançar e se manter),

contribuindo com uma visão mais sistemática da universidade e entendimento de sua

dinâmica ao buscar a formação de um raciocínio mais complexo sobre os ramos da cada

ciência e a relação entre estes.

No campus de Ourinhos as visitas ocorriam de formas esporádicas, atreladas à

projetos de extensão vinculados à laboratórios específicos, com o projeto de extensão

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“Semana de Geografia nas escolas” organizada pela prof.a Márcia de Oliveira Mello com

alunos dos estágios supervisionados. No passado tentou-se promover eventos de

visitação, como no ano de 2013 com a “Feira de profissões”, mas restritos à uma data

específica e com poucas escolas participantes por conta da capacidade de recepção. Em

experiência anterior realizou-se também uma exposição do curso na Praça Mello Peixoto,

no centro de Ourinhos, mas não foi dada continuidade a essa ação.

Em 2014, através de uma demanda captada junto às escolas e instituições onde o

coordenador do projeto realizava ações de extensão, foram organizadas visitas (ainda

que, de certo modo, improvisadas) para contato com os trabalhos dos grupos e projetos

de pesquisa e extensão os quais coordenava (GEMUG: Grupo de Estudos de Música em

Geografia e, GEDET: Grupo de Estudos sobre Dinâmicas Econômicas e Territoriais),

articulados em um grupo de pesquisa maior cadastrado no CNPq denominado DITER

(Processos e Dinâmicas Territoriais) e ao Laboratório de Geografia Humana (LAGHU).

Nessas atividades, no entanto, houve preocupação em se transmitir uma visão mais

ampla da universidade e do curso de Geografia aos alunos, com palestras de abertura

orientando sobre a Unesp, seus cursos e o vestibular, visitas panorâmicas ao campus,

contato com outros projetos e grupos, como o Cursinho e, realização de dinâmicas e

atividades didáticas com diferentes áreas da Geografia.

Outro vínculo criado foi através da participação do coordenador do projeto como

docente na divulgação do Vestibular Unesp (2014, 2015 e 2016), tendo abertura para

divulgar também o curso de Geografia e o campus de Ourinhos em escolas da região,

identificando o interesse de diversas delas em conhecer o campus.

Nesse primeiro momento, em 2014, recebemos a visita de três instituições

educativas de Ourinhos. A primeira, no mês de agosto, com o CRAS (Centro de

Referência em Assistência Social) e suas unidades I e III (da Vila S. Luiz e Vila Mano).

Trata-se de instituição parte do Sinaes (Sistema Nacional de Assistência Social) e que

atua em áreas e bairros tidos como de vulnerabilidade social e baixa renda. Esses jovens

(geralmente adolescentes, na faixa de 14 a 17 anos, um grupo de cerca de 30 atendidos),

participam de projetos educativos no período contrário ao da escola e a visita se inseriu

em uma dessas atividades de complementação da formação.

A segunda visita ocorreu no mês de novembro com a Escola Estadual Orlando

Quagliato, localizada junto à Usina de Açucar e Alcool São Luis, na zona rural de

Ourinhos. Tratou-se de um grupo de cerca de 25 alunos de ensino médio noturno, a

maioria empregados da própria usina. A terceira ocorreu no início do mês de dezembro

em parceria com a unidade de Ourinhos do Centro Paula Souza (ETEC “Jacinto Ferreira

e Sá”), um grupo de alunos dos 2º.s anos do ensino médio integrado ao ensino técnico

(ETIM, período vespertino). A visita ocorreu com um grupo de 35 alunos.

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Essas experiências iniciais foram fundamentais para o teste da rotina de

atividades de visitação, recepção do público-alvo à proposta e estreitamento de parcerias

com laboratórios, grupos de pesquisa-extensão, docentes, servidores e alunos,

fundamentando o projeto de visitação que fora desenvolvido em 2015, cadastrado junto à

Proex. Foram realizadas algumas reuniões com o núcleo coordenador, formado pelo

docente coordenador Lucas Fuini e as servidoras (assistentes de suporte acadêmico)

Ângela e Patrícia. Foram enviados convites para reuniões abertas com os demais

parceiros, mas não houve manifestações de outras partes para compor esse núcleo.

Nessas reuniões foram definidas datas semanais de visitas (às terças-feiras), quantidade

(2 visitas ao mês), forma de divulgação (por contato telefônico e site institucional),

cadastro (via formulário online conforme disponibilidade) e formato/roteiro da visita. Após

cada visita era realizada uma reunião de avaliação e aperfeiçoamento do projeto.

A disponibilidade do ônibus da Unesp sempre foi de interesse manifesto das

escolas para a visita, mas só foi possível contar com o veículo na primeira visita

realizada, em 2015, já que posteriormente uma resolução do conselho de curso e do

conselho diretor da unidade, conforme normatização da Unesp, recomendou que os

veículos oficiais fossem utilizados apenas por servidores e alunos matriculados. Nesse

sentido, a partir da segunda visita, as próprias escolas providenciaram o transporte dos

alunos junto às prefeituras ou através de fretamento, inviabilizando para outras a

realização de visitas que já haviam sido agendadas.

3. Um desafio: a baixa procura pelo curso de Geografia

A Unesp é uma instituição de ensino superior estadual, pública e gratuita com 40

anos de existência (oficialmente formada em 1976) e que traz em sua essência uma

territorialidade peculiar: ser desconcentrada espacialmente em 24 cidades, 28 campus e

34 unidades universitárias. A universidade foi formada pela unificação de diversos

institutos de ensino superior espalhados pelo Estado. Sua expansão mais recente

ocorreu a partir de 2002, com a abertura de sete unidades diferenciadas (posteriormente

transformadas em campus experimentais) em cidades de menor porte, como Ourinhos,

Tupã, Dracena e Itapeva). Essa geografia peculiar tornou a Unesp uma instituição mais

diretamente vinculada aos problemas do desenvolvimento regional e local em relação à

outras instituições do Estado e do país mais centralizadas.

Segundo dados do anuário estatístico da Unesp/2015, a universidade oferece

cerca de 134 opções de cursos de graduação (articulados em cerca de 60 profissões nas

áreas de humanidades, exatas e biológicas), 141 programas de pós-graduação

(mestrados acadêmicos e profissionais e doutorados). Possui um total de mais de 50.590

alunos, sendo cerca de 37.400 estudantes de graduação e 13.200 de pós-graduação,

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contando também com mais de 3.880 professores e 7.000 técnicos. Tem uma ampla

infraestrutura com mais de 942 mil m2 de área construída, com mais de 30 bibliotecas e

1.900 laboratórios (UNESP, 2015).

Ocupa posição entre as cinco melhores universidades do país e entre as cem

melhores do mundo (rankings internacionais) e seus cursos tem grande procura devido à

qualidade do corpo docente e às altas notas em avaliações externas (Enade e Guia do

estudante da Abril). Para ingresso nas vagas dos cursos de graduação o aluno participa

do programa Vestibular, organizado por uma fundação universitária, a Vunesp. No

vestibular Unesp/2016 foram inscritos mais de 100 mil estudantes, sendo os cursos mais

procurados os de Medicina (Botucatu) e Direito (Franca), e os de menor procura os de

Arquivologia (Marília) e Geografia (Ourinhos) (http://www.vunesp.com.br ).

Desde 2014 vigora um programa de ingresso dos alunos do ensino público

(SRVEBP) que no último vestibular destinou 35% das vagas de qualquer curso para

disputa entre estudantes que cursaram o ensino médio em escolas da rede pública ou do

Centro Paula Souza (ETECs), sendo que, desse total, 35% são destinadas às cotas

étnico-raciais (PPIs: Pretos, Pardos e Indígenas), conforme comprovação posterior à

adesão.

A esses alunos é também concedido desconto de 75% na inscrição no vestibular

mediante senha individual por aluno enviada às escolas. Trata-se de uma tentativa de

corrigir uma distorção histórica gravíssima que destina as vagas dos cursos do ensino

público superior, os mais qualificados, para alunos de classes média e alta que

conseguem custear o ensino privado de nível médio e obtém vantagens no vestibular,

tornando-o um filtro injusto e excludente a tratar como iguais um conjunto formado por

desiguais.

No entanto, mesmo com essas mudanças, ainda se coloca um cenário desafiador,

sobretudo na relação entre Unesp e alunos de escolas públicas e que somente a

divulgação do Vestibular não tem obtido êxito momentâneo: a atração e permanência de

alunos de renda inferior oriundos do ensino público em seus cursos e a baixa demanda

por alguns cursos, sobretudo as licenciaturas. No primeiro caso, há o desafio de informar

e convencer alunos para uma realidade (a universidade pública) que muitos viam como

distante e impossível, além de muitos estarem impossibilitados de se desligarem do

emprego (mesmo que pelo período de graduação). Hoje também outro desafio que se

acrescenta por conta da concorrência com outras universidades públicas federais, pelo

sistema do Enem/Sisu e pelas bolsas concedidas pelo Prouni em IES privadas.

Há a questão da permanência estudantil para alunos migrantes oriundos de

outros municípios, regiões e estados do país que parcialmente é resolvido pelo programa

de bolsas de extensão e de ensino e iniciação científica. No entanto, a evasão ainda

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ocorre por razões econômicas e extraeconômicas (inadequação com o curso, evasão por

baixo rendimento, problemas familiares) e, com o aumento do alunado formado por

estudantes do ensino público, o desafio torna-se maior pelas defasagens de

aprendizagem que muitos carregam desde o ensino fundamental.

O curso de Geografia de Ourinhos, antes mesmo da implantação do sistema de

reserva de vagas, já apresentava uma realidade de mais de 60% de seus alunos

oriundos do sistema público. No vestibular 2015, 67,8% dos alunos matriculados

ingressantes eram oriundos da educação pública. No entanto, nem todas as vagas

destinadas a esse público são mantidas preenchidas com o passar do primeiro ano. Na

cidades-posto de Ourinhos e Piraju (regiões de abrangência da divulgação do vestibular

pelo campus de Ourinhos), dos 479 alunos de escolas públicas inscritos no vestibular,

apenas 16 realizaram matricula, ou seja, 3,3%. O restante, a ampla maioria, ou não

obteve nota suficiente nas provas para aprovação ou, mesmo sendo aprovado, não fez

matrícula.

No segundo caso, no qual também o curso de Geografia de Ourinhos se coloca,

há o problema da histórica desvalorização social do professor que afeta as licenciaturas,

problema que pode ser acentuado pela localização do curso em região já servida por

outros cursos de geografia (raio máximo de 300 km de distância), como é o caso de

Ourinhos que concorre com as “geografias” de Presidente Prudente (Unesp), Bauru

(USC), UENP (Cornélio Procópio), UEPG (Ponta Grossa), UEL (Londrina), e na própria

Ourinhos com o curso de licenciatura em Geografia oferecido por uma faculdade

particular local (FIO).

Nesse cenário problemático, um grupo do campus de Ourinhos, vinculado aos

Laboratório de Geografia Humana e de Ensino, mediante experiências realizadas no ano

de 2014 vinculadas à projetos de extensão, resolveu organizar um Programa institucional

de visitas ao campus, com divulgação entre escolas públicas da região, mediante contato

com a Diretoria Regional de Ensino de Ourinhos (DERO) e diretamente com as escolas

do município. Buscou-se auxiliar, através de um trabalho de médio e longo prazo, para

um maior conhecimento e compreensão mais qualificada sobre as possibilidades (e

vantagens) de se estudar em uma universidade pública de qualidade e as

potencialidades (e oportunidades) que a formação do geógrafo oferece.

A ideia foi de contribuir para o aumento da quantidade de candidatos/vaga do

curso, atraindo alunos de escolas públicas para a Unesp e fortalecendo o contato da

instituição com a comunidade local e regional, em um processo de crescente valorização

de seu papel na sociedade como ferramenta de desenvolvimento econômico e social.

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4. As ações do projeto e parcerias

Em 2015, já como projeto de extensão e contando com o apoio institucional, o

“Programa de visitas da Unesp, campus de Ourinhos” articulou-se, inicialmente, por meio

de uma equipe de trabalho formada pelo docente coordenador (Prof. Lucas Fuini), duas

assistentes de suporte acadêmico (Ângela e Patrícia) e um bolsista de extensão

(Gabriel), realizando reuniões de planejamento, preparação e avaliação no Laboratório de

Geografia Humana (Laghu). Foi construído um site

(http://www.ourinhos.unesp.br/#!/visite-o-campus/) pela servidora Ângela para orientação

dos coordenadores de escolas interessadas, podendo-se realizar o agendamento online,

além de sido enviado um convite direto para as escolas e diretoria de ensino através de

contato telefônico e por email.

As visitas foram iniciadas com uma palestra, realizadas no auditório ou ao ar livre,

com o professor coordenador, com explicações sobre a universidade pública, a Unesp, o

Vestibular e o curso de Geografia de Ourinhos. Essas palestras foram proferidas pelo

Prof. Lucas Fuini com auxílio de vídeosiiiii e materiais de divulgação sobre a Unesp, sua

história, cursos e campus existentes e sobre o campus de Ourinhos e seu curso de

Geografia. Nesse momento inicial de palestras e orientações gerais foram também

destinados espaços ao Cursinho alternativo da Unesp-Ourinhos (Cacuo), de caráter pré-

vestibular, para apresentarem o projeto aos jovens e explicar suas concepções de

universidade pública e educação crítica e libertária.

Em seguida os alunos fizeram visitas aos Laboratórios onde ocorreu contato com

conceitos e conteúdos referentes às áreas específicas e de fronteira da Geografia

(Climatologia, Geologia, Pedologia, Cartografia, Ensino de Geografia, Problemas

ambientais e Ecologia etc) em intervenções didáticas preparadas por docentes, técnicos

de laboratório e grupos de pesquisa/extensão. Essas atividades propiciaram uma

aproximação com instrumentos de trabalho do geógrafo nas áreas de climatologia,

meteorologia, geologia, pedologia e geomorfologia e cartografia, ensino de geografia e

educação inclusiva, além de serem introduzidos a conhecimentos na área de educação

ambiental.

No Laboratório de Climatologia, sob orientação do prof. Jonas Nery e auxílio de

estagiários, os alunos compreenderam melhor a dinâmica do clima e do tempo

atmosférico e se familiarizaram com uma estação meteorológica e seus instrumentos de

medição de chuvas (pluviômetro), temperatura (termômetro de bulbo seco e úmido e de

mercúrio), do vento (anemógrafo) e da pressão do ar (barômetro). Nesse laboratório e

estação ocorreram duas visitas.

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No Laboratório de Pedologia e Geologia, sob orientação do servidor técnico

Jakson Ferreira, foram realizadas duas visitas e palestras sobre o ciclo das rochas e

introduzidos conceitos sobre tipos de rochas e mineralogia, utilidade econômica dos

minerais e rochas, além de atividades com produção de pigmentos de terra com o grupo

Colóide e seus bolsistas, sob coordenação da Prof.a Maria Cristina Perusi.

No Laboratório de Ensino foi realizada, em uma das visitas, uma apresentação

didática sobre maquetes produzidas para portadores de necessidades especiais (com

baixa visão), na área de cartografia tátil (com a delimitação da altimetria do relevo),

ministrada por alunos bolsistas sob coordenação da prof.a Carla Gimenes de Sena.

Houve também a participação, em três ocasiões, dos alunos estagiários do

Cenpea (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação Ambiental), coordenado pela

prof.a Luciene Risso, realizando palestra sobre a importância de se preservar os recursos

naturais, a formação de uma consciência sobre a sustentabilidade ambiental e o

consumo e noções de reciclagem e reuso de produtos. Ao final da atividade, os alunos

participaram de uma trilha ecológica educativa pelo campus que orienta sobre o uso

racional da água e correta destinação de resíduos sólidos.

Em último momento os alunos tiveram contato com a Biblioteca universitária e seu

acervo, atividade realizada com todas as escolas, com visitas guiadas orientadas pelos

servidores responsáveis (Marcos, o bibliotecário, Laryssa e Rafael), com explicações

sobre a importância de uma biblioteca e da leitura na formação do aluno e, ao final,

distribuição de materiais de divulgação do vestibular e dos cursos da Unesp.

O quadro abaixo, com fotos, explicita o passo a passo das visitas realizadas:

Figuras 1 e 2: palestras de recepção e boas vindas com docente coordenador e alunos doCacuo

Fonte: Ângela Peres Crespo e Patrícia Inague. Acervo do projeto.

Fotos 3 e 4: visitas monitoradas ao Laboratório e estação de Climatologia/Meteorologia eLaboratório de Geologia e Pedologia

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Fonte: Ângela Peres Crespo e Patrícia Inague. Acervo do projeto.

Figuras 5 e 6: palestras com grupos de extensão/pesquisa Cenpea e Cartografia Tátil

Fonte: Ângela Peres Crespo e Patrícia Inague. Acervo do projeto.

Figuras 7 e 8: visitação à Biblioteca universitária e deslocamento dos alunos no roteiro devisita guiada pelo campus

Fonte: Ângela Peres Crespo e Patrícia Inague. Acervo do projeto.

5. Alguns resultados

Em 2015 recebemos a visita de cinco escolas públicas estaduais e municipais nos

meses de maio, julho, agosto, setembro e outubro, em um total de 171 alunos visitantes

oriundos de 9º. Ensino Fundamental e do 1º., 2º. e 3º. do Ensino médio. Apenas uma das

escolas visitantes não foi de Ourinhos, mas da cidade vizinha de Ribeirão do Sul.

Vejamos no quadro (Quadro 1), exibindo informações coletadas durante a visita e via

questionárioiii respondido pelos docentes e coordenadores que acompanharam os alunos:

Quadro 1: Informações sobre as escolas visitantes no Programa de Visitas da Unesp-Ourinhos no ano de 2015 Data Escola Alunos Ano Idade Parcerias A visita ao campus da

Unesp e o contato com o curso de Geografia atendeu às expectativas da escola, dos coordenadores/professores e alunos

Quais atividades realizadas mais chamaram a atenção dos alunos

Em sua escola é comum realizarem atividades como esta?

07/05/15 E.E. Virgínia Ramalho

37 9 EF 14 Laboratórios de Geologia/Clima

Totalmente Visita aos laboratórios

Raramente

30/07/15 E.M.E.F. Prof. José Alves Martins

39 9 EF 14 Laboratórios de Geologia/Clima

Totalmente Visita aos laboratórios

Regularmente

18/08/15 E.M.E.F. Prof. José Alves Martins

41 9 EF 14 Cartografia Tátil Totalmente Visita aos laboratórios

Regularmente

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22/09/15 E.E. Nicola Martins Romeira

28 1 EM 15 Cenpea Totalmente Todas Regularmente

27/10/15 E.E. Profa. Josepha Cubas da Silva

29 2 e 3 EM

16/17 Cenpea Totalmente Palestra e Visita aos laboratórios

Regularmente

Fonte: da coordenação do projeto. Org.: Ângela Peres Crespo.

Deste modo, a experiência acumulada (cinco visitas em 2015 e três no ano

anterior) pode ser considerada exitosa em avaliações com os professores responsáveis e

alunos no sentido de demonstrarem interesse e passaram a ter compreensão mais sólida

sobre a universidade pública e seu papel na sociedade. Todos os responsáveis pelas

escolas visitantes responderam que as expectativas quanto ao contato com um campus

da Unesp e obtenção de conhecimento sobre o curso de Geografia foram totalmente

atendidas com a visita, a maioria captando um maior interesse dos alunos com a

visitação aos laboratórios universitários.

A maioria dos coordenadores e docentes respondeu realizar visitas e saídas

regulares para atividades de campo, mas alguns docentes, em conversas informais,

admitiram a dificuldade de se planejar tais ações em um calendário curricular anual

extenso. Soma-se a isso o fato de que no ano de 2015 ocorreram alguns eventos

imprevistos: durante os meses de abril, maio e junho muitos docentes das escolas

estaduais aderiram à greve da categoria, uma das mais longas já vistas. Outro episódio,

ocorrido no final do ano (segunda metade de novembro e início de dezembro), foi a

ocupação de algumas escolas estaduais por alunos contrários à reorganização escolar.

Além disso, há o período de recesso, feriados e semanas de provas e avaliações

externas (Saresp: Sistema de avaliação do rendimento escolar do estado de São Paulo)

que inviabilizam atividades extra-classe.

Além disso, surgiram dificuldades quanto ao tempo exíguo das visitas que muitas

escolas dispunham (geralmente foi de 2 horas por conta do horário do ônibus) e

dificuldades de se organizar saídas e dispor de meios de transporte aos alunos. Uma das

escolas visitadas sugeriu também que fosse feito um intervalo durante a visita para

lanche dos alunos, já que estes acabam perdendo o horário da merenda escolar. Em

alguns casos a euforia dos alunos também tardou em dissipar, com a necessidade do

palestrante interromper a explicação para angariar a concentração dos alunos. A maioria

deles estava visitando um campus de universidade pública pela primeira vez.

As escolas visitantes, exceto a de Ribeirão do Sul, ocupam áreas de periferia no

município de Ourinhos ou atendem a alunos dessas áreas, conforme evidencia o mapa

abaixo (Figura 9). São geralmente alunos mais carentes de acesso à bens culturais e

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científicos e, portanto, a visita pode funcionar como “porta de entrada” em um universo

desconhecido, o do ensino superior público e o da pesquisa científica em alto nível.

Figura 9: Mapa de localização das escolas visitante do “Programa de visitas da Unesp-Ourinhos” em 2014 e 2015.

Fonte: QGIS, Googlemaps e pesquisa da coordenação. Org.: Ângela Peres Crespo.

Há também o desafio interno referente ao conhecimento geográfico quando

buscamos explorar suas diferentes áreas em perspectiva sintética, em se tratando de um

saber muito antigo e epistemologicamente complexo (MORAES, 2002). Recorreu-se ao

trabalho já desenvolvido por grupos de pesquisa e extensão do próprio campus e

materiais disponíveis, a fim de dar aos alunos uma visão da Geografia como a ciência a

estudar o espaço, uma totalidade resultante da ação do homem em sociedade

transformando a natureza, o espaço como morada do homem (LACOSTE, 1988;

CORRÊA, 1995).

6. Considerações finais

O objetivo do “Programa de visitas à Unesp-Ourinhos”, realizado durante o ano de

2015, foi o de demonstrar o caráter de ciência interdisciplinar da Geografia e suas

dimensões educativas, da licenciatura, e técnicas, associadas ao bacharelado, além de

trabalhar com a ideia de educação para transformação e emancipação por meio do

acesso e permanência no ensino público superior e gratuito.

Através das ações desse projeto de extensão educativo foi possível constatar que

ainda existem barreiras que separam e afastam o universo acadêmico, e o conhecimento

que dele emana, do universo escolar e os diversos formatos de apropriação de saber que

ele permite. Sendo a Geografia uma ciência ao mesmo tempo acadêmica e escolar,

buscamos desenvolver roteiros de visitação que permitissem considerar a diversidade e

função social da Unesp e a totalidade interdisciplinar do conhecimento geográfico, com

estratégias de mediação pedagógica por meio do contato in loco com instrumentos,

materiais e conceitos de uso comum do profissional geógrafo.

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Ao final, foi possível constatar que há um longo caminho a percorrer para

aproximar universidade e comunidade local/regional, sobretudo aquela mais sensível e

interessada nos cursos e na formação oferecidos em nível superior, que é a população de

alunos das escolas de educação básica. Esse projeto constituiu em um primeiro passo

para reverter uma situação de declínio da procura por cursos de licenciatura, em especial

o de geografia, e buscar oferecer maiores esclarecimentos à alunos do ensino público

sobre as oportunidades cada vez maiores de acesso ao ensino superior público gratuito.

Pois, como destaca Moreira (1994), a geografia deve buscar explicar a dinâmica da

sociedade no espaço para além das aparências, falando de homens concretos travando

relações concretas.

7. Referências CORRÊA, Roberto L. Espaço, um conceito-chave da Geografia. In: CASTRO, Iná. E., et al.,Geografia: conceitos e temas. RJ: Bertrand, 1995, p. 309-352.LACOSTE, Yves. A geografia: isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. Campinas: Papirus, 1988. MELLO, Guiomar. N. Transposição didática, interdisciplinaridade e contextualização. Consultado

em <http.://namodemello.com.br>, 2013. Acesso em: 19 nov. 2013.MORAES, Antonio C. R. Geografia: pequena história crítica. SP: AnnaBlume, 2003. MOREIRA, Ruy. O que é geografia. 14ª. Ed. SP: Brasiliense, 1994.SANTOS, Milton. Por uma Geografia nova: Da crítica da Geografia a uma Geografia crítica. SP:

Edusp, 1978. SANTOS, Milton. Espaço e método. SP: Nobel, 1985.

____________. Técnica, espaço e tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. SP:Hucitec, 1994.

______________. A natureza do espaço: Técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec,1996.

UNESP. Guia de Profissões: formação em todas as áreas do conhecimento. SP: Edunesp, 2013. UNESP. Anuário Estatístico 2015. SP: Fundação Editora da Unesp, 2015. 344 p. Disponível em: <https://ape.unesp.br/anuario/pdf/Anuario_2015.pdf>. Acesso em: 14 jan. 2016. UNESP. Você sabia? (Did you know?). SP: Edunesp, 2013.VUNESP. Vestibular 2016: divulgação. CD-ROM. SP: Vunesp, 2015.

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i Este artigo corresponde a um projeto de extensão cadastrado junto à Pró-reitoria de extensão da Unesp (Proex) edesenvolvido durante o ano de 2015.

ii Esses materiais estão disponíveis no site geral da Unesp (http://www.unesp.br/) e no site da Vunesp(http://www.vunesp.com.br). Todas vídeos foram também disponibilizados para consulta no site do programa de visitas(http://www.ourinhos.unesp.br/#!/visite-o-campus/).

iii Tentou-se implantar um questionário online mais detalhado a ser respondido por alunos e docentes no site do projeto(http://www.ourinhos.unesp.br/#!/visite-o-campus/), mas, mesmo mediante contatos e solicitações via email, nenhum dosvisitantes logrou responder ao projeto. Portanto, todas as informações obtidas foram coletadas in loco e sistematizadasposteriormente.

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