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TEXTO: A INTEGRAÇÃO ENTRE O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E O PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 1 BRASÍLIA, MARÇO DE 2006 1 Texto elaborado por Márcia Guedes Vieira, para Vanda Mendes Ribeiro Consultoria. Márcia Guedes Vieira, assistente social, foi assistente técnica do Fórum Nacional DCA e da Marcha Global Contra o Trabalho Infantil; Coordenadora Executiva do CFESS; Assessora da Cáritas Brasileira e Técnica do Departamento de Proteção Social Especial do MDS. 1

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TEXTO:

A INTEGRAÇÃO ENTRE O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA E O PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL1

BRASÍLIA, MARÇO DE 2006

1 Texto elaborado por Márcia Guedes Vieira, para Vanda Mendes Ribeiro Consultoria.Márcia Guedes Vieira, assistente social, foi assistente técnica do Fórum Nacional DCA e da Marcha Global Contra o Trabalho Infantil; Coordenadora Executiva do CFESS; Assessora da Cáritas Brasileira e Técnica do Departamento de Proteção Social Especial do MDS.

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ÍNDICE

I – INTRODUÇÃO ....................................................................................................................03

II - O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA .....................................................................................04

− Gestão do Programa

− Seleção das Famílias

− Forma de Pagamento do Benefício

− Condicionalidades

− Controle Social

III - PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL – PETI ......................08

− Gestão do Programa

− Seleção das Famílias

− Forma de Pagamento do Benefício

− Condicionalidades

− Controle Social

IV - A INTEGRAÇÃO DOS PROGRAMAS .............................................................................11

− Gestão da Integração

− Seleção das Famílias

− Forma de Pagamento do Benefício

− Condicionalidades

− Controle Social

V – CONSIDERAÇÕES GERAIS .............................................................................................19

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................31

LEGISLAÇÃO CONSULTADA ................................................................................................31

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I – INTRODUÇÃO

No dia 30 de dezembro de 2005 foi publicada no Diário Oficial da União a Portaria n.º 666 de 28 de dezembro de 2005, que disciplina a integração entre o Programa Bolsa Família (PBF) e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI).

Essa integração está mobilizando os setores da sociedade que atuam diretamente no combate ao trabalho infantil em favor de uma qualificação do atendimento às crianças e adolescentes vítimas da exploração do trabalho precoce, com total respeito aos seus direitos.

Sendo o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil um dos atores principais na luta pela erradicação do trabalho infantil, e por congregar também diferentes atores, como governo, Ongs, trabalhadores e empregadores, seu objetivo é interferir nesse processo e contribuir com o debate entre a sociedade e o governo.

Por conseguinte, o tema da integração oferece uma oportunidade para discutir o lugar de uma política de erradicação do trabalho infantil no âmbito da política governamental. Compreende-se que o PETI é um programa que deveria ser parte de uma política de erradicação do trabalho infantil, entretanto, observa-se que desde que foi criado tornou-se o carro-chefe do que deveria ser uma política. Deste modo, a pergunta que se coloca é se a proposta de integração dos programas traz uma qualificação para o PETI, e se caminha para efetivar uma política de erradicação do trabalho infantil.

Obviamente este documento não pretende esgotar o debate, mas se propõe a organizar as questões que têm sido objeto de discussão nas reuniões do Fórum Nacional e nas reuniões entre o Governo Federal e os gestores municipais e estaduais. Além dessas contribuições, foram ouvidas pessoas envolvidas no movimento de defesa dos direitos da criança e do adolescente e técnicos governamentais que estão operando essa integração.

A seguir, apresentaremos os conteúdos do PBF e do PETI, destacando seus objetivos, gestão, condicionalidades, seleção das famílias e o controle social, a fim de que possamos entender melhor a integração dos dois programas. Em seguida, apresentaremos o conteúdo da Portaria 666/2005, que define essa integração, e por fim as questões que ela traz para o tema da erradicação do trabalho infantil no âmbito da política governamental.

II - O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA

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O Programa Bolsa Família foi criado pela Lei 10.836, de 09 de janeiro de 2004, com a finalidade de unificar os procedimentos de gestão e execução das ações de transferência de renda do Governo Federal, especialmente as do Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à Educação - Bolsa Escola, do Programa Nacional de Acesso à Alimentação – PNAA, do Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à Saúde - Bolsa Alimentação, do Programa Auxílio-Gás, e do Cadastramento Único do Governo Federal. O Programa Bolsa Família foi regulamentado pelo Decreto n.º 5.209, de 17 de setembro de 2004, e integra a estratégia do Fome Zero no eixo Ampliação de Acesso à Alimentação, e é coordenado pela Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC) do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).

Os objetivos básicos do Programa Bolsa Família (PBF) são:

“I - promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social;

“II - combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional;

“ III - estimular a emancipação sustentada das famílias que vivem em situação de pobreza e extrema pobreza;

“IV - combater a pobreza; e

“V - promover a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das ações sociais do Poder Público”.

O programa se organiza em dois tipos de benefícios:

• o benefício básico, que é destinado a famílias que se encontrem em situação de extrema pobreza, no valor de R$50,00 (cinqüenta reais); e

• o benefício variável, no valor de R$15,00 (quinze reais) por pessoa beneficiada, podendo chegar ao máximo de R$45,00 (quarenta e cinco reais) destinado a famílias que se encontrem em situação de pobreza e extrema pobreza e que tenham em sua composição gestantes, nutrizes, crianças entre 0 (zero) e 12 (doze) anos ou adolescentes até 15 (quinze) anos.

No caso das gestantes e nutrizes ainda não se efetivou a regulamentação do pagamento do benefício.

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De acordo com a lei do Programa Bolsa Família, é considerada situação de extrema pobreza aquela em que a família tem renda mensal per capita de até R$50,00. E situação de pobreza aquela em que a família recebe uma renda mensal per capital acima de R$50,00 até o limite de R$100,00.

As famílias em situação de extrema pobreza têm direito a receber mensalmente o valor de R$ 50,00, do benefício básico, e cumulativamente o benefício variável, observando o limite de R$45,00. Neste caso a família poderá receber até R$95,00. Por exemplo, uma família em situação de extrema pobreza recebe R$50,00, e mais R$15,00 porque possui uma criança com idade inferior a 16 anos, então essa família passará a receber R$65,00 mensais do Programa Bolsa Família.

As famílias consideradas em situação de pobreza só poderão receber os recursos do benefício variável, ou seja, R$15,00 por criança até 15 anos, obedecendo ao teto máximo de R$45,00.

A lei prevê também o benefício variável de caráter extraordinário para aqueles casos em que na ocasião do ingresso no Programa Bolsa Família, as famílias que já eram contempladas com os Programas Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, PNAA e Auxílio-Gás, e que por isso seus benefícios excediam o limite máximo fixado, sendo essa parcela do valor a mais mantida até a cessação das condições de elegibilidade de cada uma das pessoas contempladas por cada um dos benefícios.

Gestão do Programa

O programa possui um Conselho Gestor, formado pelos Ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Educação, Saúde, Planejamento, Fazenda, Casa Civil e Caixa Econômica Federal, que tem por finalidade “formular e integrar políticas públicas, definir diretrizes, normas e procedimentos sobre o desenvolvimento e implementação do Programa Bolsa Família” (Decreto 5.209, art. 5.º).

A gestão do programa é descentralizada em cooperação com os entes federados, observada a intersetorialidade, a participação da comunidade e o controle social.

O Termo de Cooperação entre o Governo Federal e os estados, Distrito Federal e os municípios deve contemplar a realização de programas e políticas sociais destinadas ao público atendido pelo Bolsa Família visando sua emancipação e prevendo a possibilidade de aporte de recursos financeiros para ampliação da cobertura e o aumento do valor do benefício.

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Cabe aos estados e aos municípios constituir uma coordenação do Programa que envolva as áreas da saúde, da educação, da assistência social e da segurança alimentar (onde houver).

Seleção das Famílias

O Governo Federal identifica as famílias que receberão o benefício por meio do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico. Esse instrumento é utilizado para identificação das famílias em situação de pobreza de todos os municípios brasileiros. O CadÚnico é um banco de dados que deve ser alimentado pelos municípios e o seu objetivo é proporcionar aos governos municipais, estaduais e federal, o diagnóstico socioeconômico das famílias cadastradas, possibilitando a análise das suas principais necessidades.

Para isso, são coletadas principalmente as seguintes informações2:

• “características do domicílio (número de cômodos, tipo de construção, tratamento da água, esgoto e lixo);

• “composição familiar (número de membros, existência de gestantes, idosos, mães amamentando, deficientes físicos);

• “qualificação escolar dos membros da família;

• “qualificação profissional e situação no mercado de trabalho;

• “rendimentos;

• “despesas familiares (aluguel, transporte, alimentação e outros)”.

Forma de Pagamento do Benefício

De acordo com o Decreto 5.209, art. 16, a Caixa Econômica Federal é o agente operador do Programa Bolsa Família, responsável pela “organização e operação da logística de pagamento dos benefícios”; pelo “desenvolvimento dos sistemas de processamento de dados”; pelo “fornecimento da infra-estrutura necessária à organização e à manutenção do Cadastramento Único do Governo Federal”; e pela “elaboração de relatórios e fornecimento de bases de dados necessários ao acompanhamento, ao controle, à avaliação e à fiscalização da execução do Programa Bolsa Família por parte dos órgãos do Governo Federal designados para tal fim”.

2 Informação retirada da página da Web - www.mds.gov.br

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A Caixa emite um cartão magnético, por meio do qual a pessoa responsável da família recebe o benefício. O Decreto, no art. 23 prevê que essa pessoa deverá ser preferencialmente a mulher da família, ou na sua ausência ou impedimento, outra pessoa responsável pela unidade familiar.

Condicionalidades

De acordo com o Decreto 5.209, são consideradas como “condicionalidades do Programa Bolsa Família a participação efetiva das famílias no processo educacional e nos programas de saúde que promovam a melhoria das condições de vida na perspectiva da inclusão social”. E remete aos diversos níveis de governo a responsabilidade de garantir o direito de acesso pleno aos serviços educacionais e de saúde, para viabilizar o cumprimento das condicionalidades por parte das famílias beneficiárias do Programa.

Nesse sentido, é responsabilidade do Ministério da Saúde o acompanhamento e a fiscalização no que diz respeito ao crescimento e desenvolvimento infantil, à assistência ao pré-natal e ao puerpério, à vacinação, bem como à vigilância alimentar e nutricional de crianças menores de sete anos. E fica a cargo do Ministério da Educação o acompanhamento e a fiscalização com relação à freqüência mínima de 85% da carga horária escolar mensal, em estabelecimentos de ensino regular, de crianças e adolescentes de seis a quinze anos.

Ao MDS compete o apoio, a articulação intersetorial e a supervisão das ações governamentais para o cumprimento das condicionalidades do Programa Bolsa Família, e também a disponibilização da base atualizada do CadÚnico aos Ministérios da Educação e da Saúde.

De acordo com a Lei 10.836, em seu art. 3.º, “a concessão dos benefícios dependerá do cumprimento, no que couber, de condicionalidades relativas ao exame pré-natal, ao acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde, à freqüência escolar de 85% (oitenta e cinco por cento) em estabelecimento de ensino regular, sem prejuízo de outras previstas em regulamento.”

O Decreto 5.209, que regulamenta o Programa, no artigo 25 definiu como motivos para suspensão do benefício o seguinte:

“Comprovação de trabalho infantil na família, nos termos da legislação aplicável;

“Descumprimento de condicionalidades que acarrete suspensão ou cancelamento dos benefícios concedidos (...);

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“Comprovação de fraude ou prestação deliberada de informações incorretas quando do cadastramento;

“Desligamento por ato voluntário do beneficiário ou por determinação judicial;

“Alteração cadastral na família, cuja modificação implique a inelegibilidade ao Programa; ou

“Aplicação de regras existentes na legislação relativa aos Programas Remanescentes, respeitados os procedimentos necessários à gestão unificada (...)”.

No caso da família não cumprir as condicionalidades por não haver oferta dos serviços ou por “força maior ou caso fortuito”, não haverá suspensão ou cancelamento do benefício.

Controle Social

O controle e a participação social do Programa Bolsa Família se dá em âmbito local e estadual, por um conselho formalmente constituído pelo estado ou município ou pelo Distrito Federal, garantindo a paridade entre governo e sociedade, e deve ser composto por integrantes das áreas da assistência social, da saúde, da educação, da segurança alimentar e da criança e do adolescente, quando existentes, podendo ser acrescidas outras áreas que o município ou o Distrito Federal julgarem conveniente.

III - PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTIL – PETI

O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil é desenvolvido pelo Ministério do Desenvolvimento Social, por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), e compõe o conjunto de programas do Departamento de Proteção Social Especial da referida Secretaria. Está presente em 3.309 municípios, e atende a 1.010.017 crianças e adolescentes. O PETI é regulamentado pela Portaria MPAS/SAS 458/2001. Contudo, é importante lembrar que há uma previsão de reformulação da Portaria 458/01, ainda em 2006, que contemple as mudanças trazidas pela Portaria 666/05, que disciplina a integração entre o Programa Bolsa Família e o PETI e o novo formato da Política Pública de Assistência Social, pois o contexto de hoje, com relação à organização dos serviços sociais por meio do Sistema Único da Assistência Social (SUAS) é diferente do contexto da criação do PETI em 1996. O que será descrito a seguir tem como referência a portaria do PETI ainda em vigor, mas serão feitas a observações sobre quais mudanças já estão ocorrendo na prática.

A Portaria 458/01 define como objetivos do PETI:

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- “erradicar, em parceria com os diversos setores governamentais e da sociedade civil, o trabalho infantil nas atividades perigosas, insalubres, penosas ou degradantes nas zonas urbana e rural (...)”, entretanto a Portaria 666/05 estabelece que a partir de agora serão atendidas todas as formas de trabalho infantil;

- “possibilitar o acesso, a permanência e o bom desempenho de crianças e adolescentes na escola;

- “implantar atividades complementares à escola3 (...); - “conceder uma complementação mensal de renda - Bolsa Criança Cidadã, às

famílias;- “proporcionar apoio e orientação às famílias beneficiadas; - “promover programas e projetos de qualificação profissional e de geração de trabalho

e renda junto às famílias4”.

A família incluída no PETI tem o direito a receber uma bolsa mensal por cada filho que for retirado do trabalho precoce. O valor da bolsa para as famílias que residem em área rural ou em municípios com menos de 250 mil habitantes é de R$25,00 e para famílias que residem em áreas urbanas com mais de 250 mil habitantes o valor da bolsa é de R$40,00. Não há limite de bolsas por família. Além da família, o município da área rural ou que possui menos de 250 mil habitantes recebe R$20,00 por criança ou adolescente para executar as atividades sócio-educativas e de convivência no horário extra-escolar. Os municípios urbanos com mais de 250 mil habitantes, as capitais e regiões metropolitanas recebiam o per capita de R$10,00 para essas atividades, mas com a publicação da Portaria n.º666/05, que ocasiona algumas mudanças na gestão do programa, esse valor vai subir para R$20,00.

Com relação à renda familiar, até dezembro de 2005, o PETI era destinado, prioritariamente, às famílias com renda per capita de até ½ salário mínimo. No entanto, o valor da renda foi modificado com a Portaria n.º666/05. A partir de então, serão incluídas no PETI as famílias com situação de trabalho infantil que têm renda mensal per capita superior a R$100,00 (cem reais). As famílias que tiverem renda mensal per capita igual ou inferior a R$100,00 serão incluídas no Bolsa Família e estarão sujeitas às regras e valores deste programa. No entanto, as crianças deverão freqüentar as atividades sócio-educativas e de convivência, coordenadas e geridas pelo PETI. O programa atende ainda crianças e

3As atividades complementares à escola são denominadas de “atividades sócio-educativas e de convivência”, conforme Portaria 666/05.4 As ações voltadas para a geração de renda e qualificação profissional, desde 2004, foram incorporadas às ações do Departamento de Proteção Social Básica da SNAS, ficando o PETI responsável exclusivamente pelo repasse da bolsa e das atividades sócio-educativas e de convivência.

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adolescentes vítimas da exploração sexual comercial e a faixa etária, que era de 07 a 15, passou a ser de 0 a 15 anos.

Gestão do Programa

No âmbito federal, o PETI é coordenado pela SNAS, por meio do Departamento de Proteção Social Especial. Nos estados e municípios o programa é coordenado pela Secretaria Estadual de Assistência Social ou órgão equivalente.

Seleção das Famílias

De acordo com a Portaria de regulamentação do Programa, a implantação do PETI no município requer primeiramente a realização de um diagnóstico prévio referente aos aspectos sócio-econômicos das regiões priorizadas para atendimento.

O órgão gestor do Programa deve fazer o cadastramento das famílias que têm situação de trabalho infantil, o que deve ser acompanhado pela Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil, a qual pode sugerir critérios complementares para a seleção das famílias.

Forma de Pagamento do Benefício

Até o momento há duas formas de efetuar o pagamento das bolsas às famílias. Uma delas é feita por meio da Caixa Econômica Federal (CEF), com cartão magnético, para as famílias que já foram incluídas e selecionadas no CadÚnico. Neste caso, o MDS repassa o recurso à CEF, que faz o pagamento diretamente às famílias. A outra forma é realizada por meio da Prefeitura, a qual recebe o recurso do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) diretamente no Fundo Municipal de Assistência Social (FMAS) e providencia o pagamento. Esta maneira de efetuar a transferência da renda está sendo abolida pelo Ministério, tendo os municípios o prazo de 31 de março de 2006 para incluir todas as famílias no Cadastro Único e seleciona-las no sistema para receber por meio da CEF.

Condicionalidades

A família pode receber as bolsas somente quando: Retirar todos os filhos menores de 16 anos de atividades laborais; As crianças e os adolescentes inseridos no Programa tiverem freqüência mensal

mínima de 85%5 na escola e nas atividades sócio-educativas e de convivência.

5 Conforme a Portaria 666/2005

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Controle Social

O controle social se dá por meio dos Conselhos de Assistência Social, dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, dos Conselhos Tutelares e das Comissões de Erradicação do Trabalho Infantil, da qual devem fazer parte os conselhos citados e outros órgãos governamentais das áreas de saúde, educação, esporte etc, e organizações da sociedade civil. A participação da Secretaria Nacional de Assistência Social nas Comissões ocorre por meio das Delegacias Regionais do Trabalho-DRTs, sendo esta participação compulsória no caso dos estados. A existência desta Comissão é uma exigência para a implantação do Programa nos municípios e nos estados. Ela tem caráter consultivo e propositivo e tem como objetivo contribuir para a implantação e implementação do PETI.

A criação dessa Comissão deve ser formalizada “por meio de decreto do governador do estado ou do prefeito ou por portaria do gestor estadual/municipal de Assistência Social, após aprovação do Conselho Estadual/Municipal de Assistência Social”. (UNICEF,2004). E deve se reunir regularmente e ter um plano de trabalho.

IV - A INTEGRAÇÃO DOS PROGRAMAS

Dentre as considerações da Portaria n.º 666/05 para justificar a integração dos programas está que ambos são prioridades do Governo Federal, e têm objetivos comuns como o de combater a pobreza e de erradicar o trabalho de crianças e de adolescentes. Nesse sentido, os objetivos que norteiam essa iniciativa são os seguintes:

- “racionalização e aprimoramento do processo de gestão do PBF e do PETI”;

Neste caso, o aprimoramento se dá principalmente pela obrigatoriedade do pagamento da bolsa diretamente às famílias, por meio do cartão magnético da CEF, sem a intermediação da Prefeitura, o que garantirá também regularidade e pontualidade do pagamento. Como o PBF atende por meio da seleção de famílias inscritas no Cadastro Único, o mesmo deverá acontecer com as famílias em situação de trabalho infantil, as quais serão selecionadas pelo sistema para o PBF ou para o PETI, dependendo do seu perfil e dos critérios de elegibilidade de cada um dos respectivos programas. Então, compreende-se que um dos elementos de aprimoramento da gestão, segundo o Governo, é a forma de seleção/inclusão das famílias por meio do Cadastro e a transparência da informação sobre a família que

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está sendo selecionada, o que era de difícil acesso quando a ficha da família ficava sob controle da prefeitura.

- “ampliação da cobertura do atendimento de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil do PETI”;

Nesse objetivo, ressalte-se que a cobertura contempla uma ampliação do PETI para o atendimento a crianças com até 06 anos.

- “universalização do PBF para as famílias que atendem aos seus critérios de elegibilidade”.

Nesse caso, refere-se a famílias que têm o perfil do programa, mas estavam em situação de trabalho infantil e eram ou iriam ser atendidas pelo PETI.

A Portaria 666/05 define uma série de atribuições exclusivamente relativas à integração dos programas quanto à gestão, à seleção das famílias, à forma de pagamento, às condicionalidades e ao controle social. Veremos a seguir cada uma delas.

Gestão da Integração

Cada ente federado e o MDS têm um papel a desempenhar com relação à integração. Cabe ao gestor municipal do PBF, cujo município tenha aderido formalmente ao programa, as seguintes responsabilidades:“I - analisar as demandas de bloqueio e de cancelamento de benefícios financeiros do PBF remetidas pelas instâncias de gestão, participação ou controle social, promovendo as ações de gestão de benefícios cabíveis;“II - promover a atualização do cadastro das famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil; e“III - manter interlocução com o gestor do PETI no município, se for o caso”.

Ao gestor municipal do PETI cabe as seguintes atribuições:“I - analisar as demandas de bloqueio ou de cancelamento de benefícios financeiros do PETI oriundas das instâncias de gestão, participação ou controle social, promovendo, quando cabível, as ações de gestão de benefícios competentes”;“II - promover a inclusão no CadÚnico das famílias usuárias do PETI com benefícios financeiros operacionalizados mediante convênio firmado pelo FNAS”;

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“III - prover a oferta de atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, segundo a legislação vigente”;“IV - encaminhar à SNAS o resultado do acompanhamento das atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, segundo normas vigentes; e”“V - manter interlocução com o gestor do PBF no Município, se for o caso”.

No âmbito estadual caberá ao gestor estadual do PBF, cujo estado tenha aderido formalmente ao processo de atualização cadastral, as seguintes atribuições:“I - apoiar a atualização do cadastro das famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil; e”“II - manter interlocução com o gestor do PETI no estado, se for o caso”.

Ao gestor estadual do PETI, competirá:“I - apoiar a inclusão no CadÚnico das famílias usuárias do PETI com benefícios financeiros operacionalizados mediante convênio firmado pelo FNAS;“II - prover a oferta de atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, segundo a legislação vigente;“III - encaminhar à SNAS o resultado do acompanhamento das atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, segundo normas vigentes; e“IV - manter interlocução com o gestor do PBF no estado”.

No âmbito do Governo Federal, as Secretarias do MDS terão as seguintes atribuições no processo de integração entre o PBF e o PETI:A Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (SENARC) deverá:I – transferir recursos ao agente operador (Caixa Econômica Federal) para pagamento do benefício do PBF;“II –orientar os estados e municípios sobre assuntos relacionados à integração entre o PBF e o PETI, no que lhe couber;“III - disciplinar questões operacionais pertinentes à integração entre o PBF e o PETI, em conjunto com a SNAS;“IV - garantir aos agentes autorizados em normas específicas acesso ao Sistema Informatizado de Gestão de Benefícios do PBF;

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“V - realizar a repercussão do descumprimento das atividades sócio-educativas e de convivência nos benefícios financeiros das famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF, segundo normas vigentes e informações encaminhadas pela SNAS;“VI - promover o intercâmbio de experiências entre os estados e municípios, divulgando-as em âmbito nacional; e“VII - acompanhar o desenvolvimento das atividades realizadas pelos gestores do PBF nos estados e municípios”.

À Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) caberá:I – transferir recursos ao agente operador (CEF) para pagamento dos benefícios financeiros do PETI;“II - orientar os Estados e municípios sobre assuntos relacionados à integração entre o PBF e o PETI, no que lhe couber;“III - regulamentar assuntos pertinentes à integração de que trata esta Portaria, em conjunto com a SENARC;“IV - promover a oferta de atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, por meio dos municípios que formam a rede de implementação do PETI;“V - realizar o acompanhamento das atividades sócio-educativas e de convivência para as famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PBF ou usuárias do PETI, segundo normas vigentes, encaminhando à SENARC as informações relativas ao PBF;“VI - garantir aos agentes autorizados em normas específicas o acesso ao Sistema Informatizado de Gestão de Benefícios do PETI;“V - realizar a repercussão do descumprimento das atividades sócio-educativas e de convivência nos benefícios financeiros das famílias em situação de trabalho infantil beneficiárias do PETI, segundo normas vigentes”;“VI - promover a articulação regional dos responsáveis pela erradicação do trabalho infantil”;“VII - promover o intercâmbio de experiências entre os estados e municípios, com vistas à identificação de exemplos de boas práticas de erradicação do trabalho infantil, divulgando-as em âmbito nacional; e”“VIII - acompanhar o desenvolvimento das atividades realizadas pelos responsáveis pela erradicação do trabalho infantil nos estados e municípios”.

Seleção das Famílias

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A seleção das famílias, a partir de agora, será feita por meio do CadÚnico. Para isso, as prefeituras deverão cadastrar todas as famílias com situação de trabalho infantil e/ou em situação de vulnerabilidade social, para que ela possa ser selecionada pelo PBF ou pelo PETI, respeitando os critérios descritos anteriormente.

Forma de Pagamento do Benefício

A forma de pagamento será direta ao cidadão ou à cidadã, por meio de cartão magnético emitido pela Caixa, proveniente de recursos da SENARC (PBF) e da SNAS (PETI).

Condicionalidades

As crianças e os adolescentes do PBF, que estavam em situação de trabalho infantil, deverão freqüentar as atividades sócio-educativas e de convivência realizadas pelo PETI, mantendo-se ainda as condicionalidades de saúde e de educação exigidas pelo PBF. A freqüência mínima exigida para o ensino regular e as atividades sócio-educativas é de 85%. E não pode haver mais situação de trabalho infantil nas famílias contempladas pelos programas.

Controle Social

Com relação ao controle social, foram mantidas as instâncias já estabelecidas nos dois programas, ou seja, as Comissões Municipais e Estaduais de Erradicação do Trabalho Infantil e os conselhos locais e estaduais do PBF; estes devem ser formados paritariamente entre governo e sociedade civil. As atribuições previstas na Portaria 666/05 são direcionadas à integração dos programas e sem prejuízos às atribuições já estabelecidas pela Lei que cria o PBF e pela Portaria 458, que regulamenta o PETI.

Deste modo as responsabilidades da instância municipal de controle social do PBF são as seguintes:“I - comunicar aos Gestores Municipais do PBF e do PETI os casos de famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil em sua localidade;“II - manter interlocução com a Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil; e“III - comunicar aos Gestores Municipais do PBF e do PETI a respeito de famílias que recebam recursos desses programas que não estejam respeitando a freqüência às ações sócio-educativas e de convivência, sobre a inexistência ou precariedade da oferta destas ações no âmbito local”.

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A Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil do PETI ficou com as seguintes atribuições:“I - comunicar aos Gestores Municipais do PBF e do PETI os casos de famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil em sua localidade;“II - manter interlocução com a instância municipal de controle social do PBF; e“III – comunicar aos Gestores Municipais do PBF e do PETI a respeito de famílias que recebam recursos desses programas que não estejam cumprindo a freqüência às ações sócio-educativas e de convivência, ou sobre a inexistência de oferta destas ações no âmbito local”.

Com relação ao controle social do PBF no âmbito do Estado, as atribuições quanto à integração são as seguintes:“I - comunicar aos Gestores Estaduais ou Municipais do PBF e do PETI os casos de famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil em seu território de abrangência; e“II - manter interlocução com a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil”.

A Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil do PETI terá como atribuições:“I - comunicar aos Gestores Estaduais ou Municipais do PBF e do PETI os casos de famílias beneficiárias do PBF em situação de trabalho infantil em sua localidade; e”“II - manter interlocução com a instância estadual de controle social do PBF”.

Em resumo, a integração entre os dois programas traz as seguintes modificações para o PETI:

1) Caberá ao PETI o atendimento das crianças e dos adolescentes retiradas do trabalho por meio das ações sócio-educativas e de convivência, sejam elas do PETI ou do PBF. O Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) manterá o repasse dos recursos das atividades sócio-educativas para o Fundo Municipal de Assistência Social (FMAS), equiparando os valores entre a área rural e a urbana em R$20,00 per capita;

2) O PETI ficará responsável somente pelo pagamento da bolsa às famílias em situação de trabalho infantil com renda mensal per capita superior a R$ 100,00, mantendo-se os valores de R$25,00 para área rural e municípios com menos de 250 mil habitantes; e R$40,00 para Capitais e regiões metropolitanas;

3) A bolsa só será concedida às famílias que estejam inscritas no Cadastro Único. O município tem o prazo até 31 de março de 2006 para inclusão das famílias no

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Cadastro. Isso significa que não haverá mais repasse do FNAS para os FMAS para pagamento de bolsa às famílias;

4) Nesse processo de transição e transferência das famílias do PETI para o PBF, as famílias que possuam renda mensal per capita acima de R$100,00 permanecerão recebendo pelo PETI, e permanecerão também aquelas famílias cuja transferência implicar a redução do valor do benefício;

5) O PETI passará a atender as diversas situações de trabalho de crianças e adolescentes com idade inferior a 16 (dezesseis) anos. A Portaria 458/01, que regulamenta o PETI, determinava o atendimento para as situações de trabalho infantil nas atividades perigosas, insalubres, penosas ou degradantes para a faixa etária de 07 a 15 anos.

6) A freqüência mínima exigida da criança e do adolescente no ensino regular e nas atividades sócio-educativas passou a ser de 85% (oitenta e cinco) da carga horária mensal. Anteriormente era exigido 75% de freqüência, conforme consta no Manual do PETI.

7) A Jornada Ampliada passa a ser denominada “Ações sócio-educativas e de convivência”. Aliás, essa denominação já vinha sendo utilizada pelo MDS no Plano Plurianual e na Lei de Diretrizes Orçamentária-LDO.

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A partir das informações anteriormente apresentadas obtém-se o seguinte quadro:Quadro Sintético dos Programas e da Integração

Bolsa Família PETI Integração PBF/PETILegislação Lei 10.836, de 09 de janeiro

de 2004.Portaria SEAS/MPAS 458, de 04 de outubro de 2001.

Portaria 666, de 30 de dezembro de 2005

Objetivos - Acesso a serviços públicos de saúde, educação e assistência social;

- Combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional”;

- Estimular a emancipação sustentada das famílias;

- Combater a pobreza;

- Intersetorialidade, complementaridade das ações sociais do Poder Público.

- Erradicar o trabalho infantil nas atividades perigosas, insalubres, penosas ou degradantes nas zonas urbana e rural

- possibilitar o acesso, permanência e sucesso na escola”;

- implantar atividades complementares à escola;

- conceder bolsa mensal;- apoiar e orientar as

famílias;- qualificação profissional e

de geração de trabalho e renda às famílias.

- Racionalização e aprimoramento da gestão

- Ampliação da cobertura do atendimento

- Universalização do PBF

Gestão Conselho Gestor; Gestão descentralizada/entes federados;coordenações paritárias municipais e estaduais

Em âmbito federal é coordenado pela SNAS/DPSE. Nos estados e municípios, é coordenado pela Secretaria Estadual de Assistência Social ou órgão equivalente.

- Cada ente federado e o MDS têm um papel a desempenhar com relação à integração

Público Famílias em situação de pobreza e extrema pobreza

- Crianças e adolescentes entre 07 e 15 anos em situação de trabalho infantil.

- PBF - Famílias em situação de pobreza e extrema pobreza com incidência de trabalho infantil cujos filhos tenham entre 0 e 15 anos.

- PETI - Crianças e adolescentes até os 15 anos em situação de trabalho infantil, cujas famílias tenham renda per capita superior a R$100,00

Seleção das Famílias

Feita por meio do Cadastro Único

- Realização de um diagnóstico local;

- Cadastramento das famílias com acompanhamento da Comissão Municipal.

- Feita por meio do CadÚnico

Forma de pagamento

Diretamente às famílias por cartão magnético/Caixa.

- Prefeitura via FMAS (maioria)

- Cartão magnético/Caixa

- Diretamente às famílias por cartão magnético/Caixa.

Condicionali-dades - Exame pré-natal

- Acompanhamento nutricional

- Retirar filhos menores de 16 anos de atividades laborais;

- Freqüência mensal mínima de 75% na escola e na jornada ampliada.

- Par o PBF: Acompanhamento de saúde; - Freqüência mensal mínima de 85% na escola e nas atividades sócio-educativas e de convivência. Para o PETI: Freqüência mensal mínima de 85% na escola e nas atividades sócio-educativas

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- Acompanhamento de saúde

- Freqüência escolar de 85%

e de convivência.; - Retirar filhos menores de 16 anos de atividades laborais;

Controle Social Conselho em âmbito municipal e estadual paritários entre governo e sociedade.

- Por meio dos Conselhos de Assistência Social, de Direitos, dos Conselhos Tutelares e das Comissões de Erradicação do Trabalho Infantil.

- PETI - Comissões municipais e estaduais de erradicação do trabalho infantil- PBF - Conselhos paritários em âmbito estadual e municipal.

V – CONSIDERAÇÕES GERAIS

Os Programas Bolsa Família e PETI, por conterem um componente de transferência de renda, remetem à necessidade da discussão das políticas de renda mínima e seu impacto na redução da pobreza. O Senador Eduardo Suplicy (2002) reconhecidamente grande defensor de um programa de renda mínima, argumenta que receber o benefício em dinheiro, em que a família decide no que gastar, gera mais oportunidades de estimulação de comércio local, e principalmente, denota a compreensão de que para erradicar a fome é necessário mais do que comida. São necessários recursos para comprar um agasalho, ou consertar uma porta da casa, comprar remédios etc. “O pagamento em dinheiro propicia muito maior eficiência, grau de liberdade, menor possibilidade de desvios e economia de tempo para as pessoas. Daí não haver dúvida de que confere às pessoas muito maior grau de cidadania” (SUPLICY2002:143).

Alguns dos defensores da renda mínima argumentam que o conceito de trabalho está mudando e que é um direito das pessoas terem uma renda. Eduardo Suplicy (2002) cita em seu livro um comentário, sobre programa de renda mínima, da economista Maria da Conceição Tavares, a qual enfatiza que “é importante que seja compatibilizado com recursos existentes, e tratado como um instrumento que complementará os demais, para a erradicação da pobreza. Certamente constitui um dos elementos importantes de política econômica, ao lado da universalização do direito à educação e da assistência à saúde pública, da realização da reforma agrária, da capilarização do crédito, do estímulo às formas cooperativas de produção, da maior interação entre empresários e trabalhadores em todas as unidades produtivas” (SUPLICY,2002:157).

Nesse sentido, os referidos programas geram a expectativa de constituírem-se também como estratégia de combate à pobreza.

Por outro lado, existem questionamentos sobre esse tipo de programa, muitas vezes classificando-o apenas como uma política compensatória, que não tem impacto na mudança do perfil sócio-econômico das famílias. O PBF atende a cerca de oito milhões de famílias,

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mas na análise de alguns especialistas, dentre eles Ricardo Paes de Barros (2006), para que ele reduza efetivamente a pobreza é necessário que haja uma rede de programas sociais que possam melhorar a vida das pessoas. A grande vantagem desse programa é que ele chega diretamente às pessoas, e o governo poderia aproveitar essa relação direta para oferecer oportunidades de acordo com as necessidades das famílias, fazendo uma linha direta com a política social. Como isoladamente ele não muda estruturalmente a vida das pessoas mais pobres, ele deve estar articulado a um aumento de ofertas de educação, saúde, emprego, etc

(SCHEINKMAN, 2005).

O PBF é apresentado pelo governo federal como seu principal programa na área social, em que realiza uma transferência de renda entre R$15,00 e R$95,00, e exige das famílias como contrapartida a freqüência escolar, a participação em programas de saúde, a não ocorrência de trabalho infantil, e agora a freqüência das crianças e dos adolescentes nas atividades sócio-educativas e de convivência.

Na avaliação do Tribunal de Contas de União – TCU, realizada em 2004, a unificação dos programas de transferência de renda no PBF contribuiu para uma estratégia de transferência de renda com foco na família, e não mais nos seus indivíduos separadamente. Considera que transferência de renda com condicionalidades gera um aumento nas matrículas escolares; melhor consumo na família e cuidados com a saúde. Contudo, indicou ao Governo Federal, dentre outras coisas, a regulamentação do controle das condicionalidades e do controle social.6

O PETI também é um programa de transferência de renda, tendo em vista que repassa à família uma bolsa/renda mensal para que a criança e/ou o adolescente, retirados do trabalho, freqüentem a escola e as atividades sócio-educativas e de convivência. Neste caso, há uma intencionalidade bastante específica que é a retirada do trabalho e a substituição da remuneração recebida pela criança. Tendo-se por base as críticas ao PBF, de que apenas a renda e as condicionalidades não são suficientes para a modificação da situação de pobreza da família, o mesmo pode ser atribuído ao PETI, que embora prevendo as atividades no contra turno da escola, a obrigatoriedade de freqüência escolar e as atividades sócio-educativas e de geração de renda às famílias, apresentava uma série de problemas que comprometiam um melhor desempenho do programa. Estes problemas foram apontados pela Análise Situacional do PETI7, publicada em 2004 pelo Unicef. O estudo identificou principalmente que há pouca articulação entre as atividades sócio-

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7 Responderam aos questionários 23 governos estaduais e Distrito Federal e 1.603 municípios (62%).

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educativas e de convivência e a rede educacional, e que apesar de ser consenso que essa ação é estratégica no combate ao trabalho infantil, ela apresenta ainda muitas dificuldades de funcionamento, dentre elas a inexistência de uma proposta pedagógica que contemple as diferenças regionais e a capacitação dos monitores, e a inadequação dos espaços em que são realizadas. Chama muito a atenção a dificuldade identificada no atendimento a crianças e adolescentes inseridos em determinados tipos de atividades consideradas como piores formas, como as atividades ilícitas ligadas ao tráfico de drogas e narcoplantio e à exploração sexual comercial. E apesar de haver maior número de crianças e adolescentes da área urbana e do sexo masculino no programa, é na zona rural que existem mais espaços para as atividades sócio-educativas.

No campo do controle social, a Análise Situacional (UNICEF,2004) identificou que as Comissões de Erradicação do Trabalho Infantil não têm um trabalho continuado, e que os Conselhos de Direitos, de Assistência Social e Tutelares não têm tido uma participação mais qualificada nessas comissões, assim como os representantes de trabalhadores e empregadores. Com relação ao apoio familiar apontou a inexistência de uma metodologia de trabalho com as famílias, mesmo sendo proposta do programa a centralidade na família.

Em resumo, o estudo identificou problemas que requerem solução por meio de uma política que promova a articulação e a coordenação de ações de diferentes áreas, e que garanta recursos financeiros, materiais e humanos.

Uma política de erradicação do trabalho infantil implica na estruturação de um conjunto complexo de ações que vão desde estratégias de comunicação social para mudar a cultura de tolerância para com o trabalho infantil, até o apoio familiar para a garantia de uma renda mínima. Ela deve ser pensada na perspectiva da proteção integral, da qual deriva a obrigação do Estado em assegurar de forma articulada:

uma política de educação de qualidade, que promova a inclusão, a permanência e o sucesso escolar, respeitando a diversidade geográfica, cultural, de gênero, de raça e de etnia.

uma política de saúde, que garanta prioridade no atendimento, acompanhamento e reabilitação das crianças vítimas das doenças provocadas pelo trabalho precoce;

uma política de cultura, esporte e lazer, que se preocupe com o resgate do ser criança, com a estimulação e o desenvolvimento das habilidades físicas de crianças e adolescentes;

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uma política de trabalho, geração de emprego e renda, que promova a inclusão dos pais no mundo do trabalho, de forma digna, com a formação adequada, com os direitos trabalhistas garantidos e com uma estratégia de fiscalização direcionada à identificação da ocorrência de trabalho infantil.

uma política de comunicação, que busque romper com as questões culturais que ajudam a sustentar a tolerância para com o trabalho infantil; que informe a sociedade sobre os males do trabalho infantil, e ajude a criar uma cultura de direitos.

e uma política de assistência social, que promova a inclusão das crianças e suas famílias nos serviços e programas sociais, e nas demais políticas públicas.

O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil está inserido nas ações da Assistência Social, do MDS, assim convém identificar a posição dessa ação, que é destinada a atender crianças e adolescentes inseridos no trabalho precoce, no âmbito da implementação da Política Nacional de Assistência Social (BRASIL,2004), por meio do Sistema Único da Assistência Social (SUAS).

Com a Constituição Federal de 1988, a Assistência Social passou a ter uma nova concepção e um novo status ao integrar o campo da Seguridade Social, juntamente com a Saúde e a Previdência Social. Ao ser regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – n.º8.742/93) como uma política social pública, passou definitivamente para “o campo dos direitos, da universalização dos acessos e da responsabilidade estatal” (BRASIL, 2004:25), e passa a ter também o caráter de Proteção Social, voltada para a garantia de direitos e de melhores condições de vida. Seus objetivos são: “prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitarem; contribuir com a inclusão e a eqüidade dos usuários e grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços sócio-assistenciais básicos e especiais, em áreas urbana e rural”; assegurar que as ações no âmbito da assistência social tenham centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e comunitária” (BRASIL, 2004:27). Portanto, ela é realizada de maneira integrada às políticas setoriais, a fim de universalizar direitos e garantir os mínimos sociais.

Dentre as diretrizes da Política Nacional de Assistência Social (BRASIL,2004) destaca-se a centralidade na família, para conceber e implementar serviços, programas e benefícios. Deste modo, o PBF e o PETI estão bem sintonizados com essa Política, uma vez que ambos também se referem à família como núcleo central de suas ações.

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A Política de Assistência Social está organizada em serviços de Proteção Social Básica e Proteção Social Especial (esta se divide em proteção social especial de média complexidade e de alta complexidade) e é executada por meio do Sistema Único da Assistência Social (SUAS), responsável por organizar e regular as ações sócio-assistenciais em todo o Brasil.

A proteção social básica objetiva viabilizar a inclusão de pessoas em situação de risco social nas demais políticas públicas, na comunidade e no mundo do trabalho. Atua preventivamente visando a inclusão social, e é voltada a segmentos da população que vivem em condição de vulnerabilidade social, decorrentes da pobreza e/ou da fragilização dos vínculos afetivos e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências).

A proteção social especial é voltada às famílias e “indivíduos que se encontrem em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e/ou psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas sócio-educativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras. São serviços que requerem acompanhamento individual e maior flexibilidade nas soluções protetivas” (BRASIL, 2004: 31). Deste modo, o tema do trabalho infantil está colocado na Política Nacional de Assistência Social no âmbito da Proteção Social Especial.

Para coordenar e articular a proteção social especial de média complexidade, a Política Nacional de Assistência Social prevê a implantação do Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS, como integrante do Sistema Único de Assistência Social, que se constitui como pólo de referência, “sendo responsável pela oferta de orientação e apoio especializados e continuados de assistência social a indivíduos e famílias com seus direitos violados, mas sem rompimento de vínculos (...)”(BRASIL,2006: 4). É responsável ainda, pela integração dos serviços e potencialização das ações para os seus usuários, oferecendo um conjunto de profissionais e processos de trabalhos a fim de ofertar apoio e acompanhamento individualizado especializado.

A orientação é de que neste momento de implantação do SUAS, inicialmente o CREAS atenda às crianças e adolescentes em situação de risco e violação de direitos e os adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa de Liberdade Assistida ou Prestação de Serviço à Comunidade, com enfoque à potencialização da capacidade de

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proteção da família. Contudo, o CREAS de abrangência local, implantado em municípios habilitados em gestão inicial e básica deverá oferecer serviços para o enfrentamento ao abuso e exploração sexual, e se tiver capacidade poderá ampliar os serviços para atender as demais situações de risco e violação de direitos de crianças e adolescentes. O CREAS implantado em municípios de gestão plena8 também atenderá demandas de enfrentamento ao abuso e à violência sexual, mas deverá ampliar para ações de enfrentamento das situações de violação de direitos, conforme os serviços listados no Guia, e que serão co-financiados pelo Governo Federal, sendo eles: “Serviço de Enfrentamento à violência, abuso e exploração sexual contra crianças, adolescentes; Serviço de Orientação e Apoio Especializado a Indivíduos e Famílias com seus Direitos Violados; e Serviço de Orientação e Acompanhamento a Adolescentes em Cumprimento de Medida Sócio-Educativa de Liberdade Assistida e de Prestação de Serviços à Comunidade” (2006:10). Dentre as ações previstas o tema do trabalho infantil está citado no “Monitoramento da presença do trabalho infantil e das diversas formas de negligência, abuso e exploração, mediante abordagem de agentes institucionais em vias públicas e locais identificados pela existência de situações de risco” (BRASIL, 2006: 7).

Quanto ao público referenciado no Guia, destaca-se dentre as situações para atendimento as famílias inseridas no PETI e que apresentam dificuldades no cumprimento das condicionalidades. Contudo, não faz referência às famílias que tinham situação de trabalho infantil e estão sendo atendidas pelo PBF e que apresentam dificuldade de cumprir a condicionalidade. Neste caso, a responsabilidade por atender famílias do PBF que não estão cumprindo as condicionalidades de saúde e educação é do Centro de Referência da Assistência Social (CRAS)9, mas não se refere à condicionalidade de participação nas atividades sócio-educativas e de convivência apontada pela Portaria 666/05.

O tema trabalho infantil está incluído também no serviço voltado ao enfrentamento da violência, abuso e exploração sexual contra crianças e adolescentes, nas Ações de prevenção e busca ativa, que é realizada por meio de educadores sociais em vias públicas e locais identificados com situações de violação de direitos e também será contemplado pelas ações dos CREAS por meio do Serviço de Orientação e Apoio Especializado a Crianças, Adolescentes e Famílias.

8 Município em Gestão Plena é o que tem capacidade de gestão total das ações de assistência social.9 Conforme o Guia de Orientação Técnica – Suas Nº 1 - Proteção Social Básica De Assistência Social.

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Tendo em vista os problemas identificados pela Análise Situacional do PETI (UNICEF, 2004), citado anteriormente, e as mudanças ocorridas na Política de Assistência Social e na sua execução, o trabalho junto às famílias com situação de trabalho infantil, segundo o Departamento de Proteção Social Especial (DPSE) da SNAS, se dará, por meio do SUAS, nas unidades territorializadas dos CRAS e dos CREAS, que estão localizados nos municípios com o fim de promover a inclusão dessas famílias nos serviços da assistência social, e terão prioridade nas ações de inclusão produtiva, oferecidas pelos CRAS, juntamente com outras famílias com situação de exploração sexual; população de rua; catadores de materiais recicláveis e outros. No caso dos municípios que ainda não têm Centro de Referência da Assistência Social, o PETI continuará operando no modelo antigo, até que o re-ordenamento da assistência social seja implantado.

Alguns dos problemas identificados pela Análise Situacional (UNICEF,2004) já foram objeto de mudança no programa ou estão em andamento, como o aumento do limite da faixa etária para 0 a 15 anos; a não exigência da Certidão Negativa de Débito com o INSS da Prefeitura para o repasse de recursos; a pontualidade no pagamento da bolsa, o que se dará por meio do cartão magnético da CEF; e a elaboração de uma proposta pedagógica para as atividades sócio-educativas e de convivência, que, segundo o DPSE, está em processo de elaboração. O grupo de trabalho constituído para tal tarefa é composto por técnicos da Proteção Social Básica e da Proteção Social Especial e pretende agregar outros parceiros como o Ministério da Educação, a OIT e o próprio Fórum Nacional e também ouvir os estados e municípios. Será feita uma pesquisa quantitativa e qualitativa sobre as atividades sócio-educativas e de convivência e o estudo culminará com a análise de custo dessas atividades. Apesar do empenho do grupo de trabalho ainda não se vislumbra uma maior participação do Ministério da Educação na elaboração e execução das atividades sócio-educativas e de convivência, em parceria com o MDS. É claro que não é da alçada apenas do MDS e da Portaria 666/05 equacionar esse problema, por isso é preciso realizar uma pressão maior sobre o governo para que haja uma articulação para a resolução dessa ausência do MEC. Aliás, não somente com relação às atividades sócio-educativas, mas com relação à participação no delineamento de uma política de erradicação do trabalho infantil.

Por outro lado, a Secretaria argumenta que, ao ficar responsável pelo atendimento sócio-educativo e de convivência, a SNAS poderá investir mais na sua qualidade. Tal afirmação ainda precisa ser melhor averiguada, pois a equalização em R$20,00 per capita para todos os municípios não traz grande impacto no aspecto geral do atendimento, já que apenas 448 municípios que antes recebiam R$10,00 per capita passarão a receber o dobro.

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Há ainda outro dado que se refere à ampliação da faixa etária do atendimento, incluindo as crianças abaixo de 07 anos, e que precisará de um modelo de atividade sócio-educativa diferenciado, não se esquecendo a grande reivindicação do movimento de defesa da criança que é a inclusão desse segmento na educação infantil.

A posição do governo é de que a integração vai garantir às crianças e suas famílias que serão migradas para o PBF o acompanhamento à saúde e a continuidade no programa caso o adolescente complete 16 anos e tenha irmãos mais novos, assim como o acompanhamento familiar e de suas demandas pelo Sistema Único da Assistência Social, por meio dos CRAS e dos CREAS. O atendimento pelo SUAS permitirá acesso amplo à assistência social de todas as famílias ou indivíduos que necessitem de seus serviços. Assim, democratiza-se o atendimento e desconstróem-se estigmas criados sobre as famílias e as crianças atendidas por determinados programas.

Deste modo, compreende-se que o tema do trabalho infantil está contemplado no SUAS, por meio do atendimento no CREAS, e também no CRAS, pois sendo este uma unidade ligada à proteção social básica, que atua junto a famílias, objetivando o convívio familiar e comunitário, de maneira que possa superar as condições de vulnerabilidade e atuar na prevenção de situações que indicam risco potencial, estaria também atuando na prevenção da ocorrência de trabalho infantil. A tese dos técnicos do governo é de que quando a criança é retirada do trabalho; recebe a bolsa; é incluída na escola e nas atividades sócio-educativas e de convivência ela passa a ser usuária do trabalho desenvolvido pelo CRAS, da proteção social básica, pois se considera que a criança e sua família saíram do grau de risco em que se encontravam. É responsabilidade também da proteção básica a execução das atividades sócio-educativas e de convivência, onde as crianças e os adolescentes serão atendidos no contra turno da escola em atividades oferecidas pelo município juntamente com outras crianças, e não somente em núcleos exclusivos do PETI. O CREAS atenderá as situações em que a família apresentar dificuldades no cumprimento das condicionalidades.

O que tem que ficar mais claro no Sistema Único de Assistência Social é uma descrição mais detalhada das ações de prevenção, de atendimento e de enfrentamento de situações de trabalho infantil. Não vamos defender a focalização que historicamente permeou a política pública brasileira, mas sim o olhar diferenciado necessário às diversas situações de violação de direitos.

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Observa-se, na proposta de integração do Programa Bolsa Família e PETI , o objetivo de articular ações, garantir maior agilidade e qualidade no atendimento, melhorar a gestão e ainda, a inclusão dos programas no âmbito de um sistema que visa implementar uma Política Pública de Assistência Social, que é o SUAS.

Deste modo, entende-se que o tema do trabalho infantil em tese está bem posicionado na proposta da Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2004), e mesmo sabendo-se que essa política pública é a porta de entrada de uma criança ou adolescente e sua família no sistema de proteção social do Estado, ainda achamos necessário um detalhamento maior dos serviços e da forma do atendimento a ser prestado às famílias e às crianças em situação de trabalho infantil, e as estratégias de inclusão nas outras políticas, como educação, cultura e saúde.

Como foi frisado inicialmente, a questão que preocupa o Fórum Nacional, em vista à integração dos programas de Erradicação do Trabalho Infantil e Bolsa Família é a contribuição desse ato para a efetivação de uma política de erradicação do trabalho infantil e a qualificação do PETI. Pelo que foi apresentado anteriormente, observa-se que ocorreram avanços e concretamente alguns problemas estão sendo encaminhados, entretanto, é preciso reafirmar que uma política de erradicação do trabalho infantil, fundada no paradigma da proteção integral, precisa muito mais do que essa iniciativa de integração para dar concretude a uma política. Precisa de um conjunto de ações das diferentes políticas (educação, da saúde, da cultura, do trabalho e outras que se fizerem necessárias), do qual a assistência social constitui parte integrante.

A proposta de integração em si, na forma como está colocada na Portaria, não apresenta soluções para a maioria dos problemas existentes no PETI. Nesse sentido, é urgente a revisão da Portaria que regulamenta este programa, para que o governo se debruce especificamente sobre o atendimento das crianças em situação de trabalho infantil e suas famílias adequando o programa à lógica da Política Pública de Assistência Social e do SUAS. O PETI deve se constituir como parte integrante de uma política, seja de erradicação do trabalho infantil, seja de assistência social, e deve romper com a concepção de programa isolado, responsável por prover todas as necessidades do grupo atendido.

Além disso, as ações de integração do PETI e do Bolsa Família operacionalizadas pelo Sistema Único da Assistência Social, precisam estar articuladas a uma ampla ação do

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governo e da sociedade para a eliminação do trabalho infantil, por meio de uma política multisetorial, que enfrente os diferentes aspectos dessa problemática.

Com relação aos aspectos operacionais da proposta de integração, um dos nós que têm sido apontado nas discussões com o governo é o critério de seleção das famílias colocado para aquelas em situação de trabalho infantil. Anteriormente, o PETI atendia, preferencialmente, famílias com renda per capita de até ½ salário mínimo, mas o lócus da sua ação era o trabalho infantil, sem limite de número de bolsas. De certa forma, hoje, o critério da renda, no universo de famílias em situação de trabalho infantil, estará definindo quem será atendido pelo PBF e pelo PETI, prevalecendo então, esse critério. Isso é questionável, pois esse tipo de critério pode variar, além do mais o conceito de pobreza vai além da renda, e deve relacionar diferentes indicadores, como a qualidade da habitação, o acesso ao saneamento básico, o nível de escolaridade e outros. Alguns desses aspectos estão sendo registrados no Cadastro Único, mas ainda não estão servindo como critério para a seleção de famílias.

Uma outra preocupação também já aventada pelo Fórum Nacional é com relação às famílias que têm renda mensal per capita entre R$50,00 e R$100,00 e possui uma criança trabalhando, para a qual a bolsa será de R$ 15,00, sendo que no PETI esse valor seria de R$25,00 ou R$40,00. Esse quadro muda um pouco se a família tiver uma renda mensal per capita de R$50,00 ou menos, em que o benefício passaria para R$65,00 (R$50,00 de benefício básico e R$15,00 pela criança). Como no processo de integração prevaleceu o critério da renda, a fim de não afetar os critérios já estabelecidos pelo PBF, as famílias com renda superior a R$100,00, e em situação de trabalho infantil, serão atendidas pelo PETI. Não se conseguiu saber como esse problema será enfrentado, mesmo porque, de acordo com informações do DPSE da SNAS, ainda não se sabe quantas famílias estarão nessa situação, pois estão dependendo do cadastramento feito pelo município. Fica então, a dúvida se a concorrência entre os programas foi realmente abolida. Talvez o governo devesse processar um aumento do valor do benefício variável do PBF e do PETI urbano e rural, e equalizar os critérios de seleção, passando então todo o recebimento de bolsa das famílias em situação de trabalho infantil para o Bolsa Família, mantendo a inclusão na escola e nas atividades sócio-educativas e de convivência, a condicionalidade da saúde e a inserção social (articulando outras políticas) por meio do SUAS.

Logicamente que essa proposta vai esbarrar num dado fundamental, que é o orçamento público. Conforme a Portaria 666/05, a concessão dos benefícios do PBF e do PETI respeitará a disponibilidade orçamentário-financeira existente, portanto não há

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garantia, a cada ano, da ampliação dos programas, nem da sua continuidade. Nesse sentindo, a sociedade civil organizada e o Fórum Nacional deverão acompanhar anualmente, junto ao Congresso Nacional, a proposta da Lei Orçamentária Anual (LOA) e a revisão anual do Plano Plurianual (PPA), bem como a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que apresenta dentre outras coisas os programas e ações que são prioritários ao governo. Aliás, é importante atentar-se para a elaboração do PPA, que cada governo deve elaborar no seu primeiro ano. Ou seja, no ano que vem (2007), o novo governo deverá preparar uma proposta para encaminhar ao Congresso Nacional, e para que uma ação ou programa seja executado ele precisa estar previsto no PPA. Com a integração dos programas fica difícil acompanhar pelo número de bolsas previstas, mas isso pode ser feito pelo acompanhamento da previsão de per capitas/metas para o custeio das atividades sócio-educativas e de convivência, cujo recurso deve ser previsto no Fundo Nacional de Assistência Social. Mesmo assim, é necessário disponibilizar à sociedade os dados referentes aos atendimentos do PBF a famílias que estavam com situação de trabalho infantil.

O controle social sobre os recursos que são repassados aos estados e municípios deve ser feito pelas instâncias criadas pelos Programas, mas é fundamental que a sociedade, os movimentos sociais, as organizações de defesa de direitos também realizem esse monitoramento. Os recursos federais dos programas e serviços continuados da assistência social, geridos pelo Fundo Nacional da Assistência Social podem ser monitorados, no seu repasse aos municípios, por meio do InfoSuas, disponível na página da Web do MDS. Com essa informação, é possível saber os montantes de recursos recebidos pelos municípios e as suas metas de atendimentos. É possível também, ter acesso, na página do MDS ao número de famílias atendidas pelo PBF, inclusive saber os nomes das pessoas contempladas. A utilização desses instrumentos é muito importante para o processo de monitoramento e controle dos gastos públicos. O acesso à internet ainda é muito restrito; conseqüentemente, é preciso construir uma estratégia de divulgação e democratização desse tipo de informação a toda a população.

Outra questão importante é a participação mais efetiva dos estados e dos municípios na gestão e no co-financiamento das ações de combate e erradicação do trabalho infantil, com destaque para os Estados, e isso precisa ser reivindicado e monitorado pelas organizações nos estados e nos municípios.

À medida que se debate a Portaria da integração dos dois programas muitas dúvidas e sugestões vão surgindo, e o interessante disso tudo é que as discussões caminham em direção a algo maior, que é a consolidação de uma política de direitos, e não a simples

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defesa de uma ação específica, mas sim a defesa de uma ação maior e mais qualificada. Com certeza ainda há mais a dizer e a debater, e essa é a idéia.

O movimento de defesa dos direitos da criança e do adolescente sempre almejou

políticas e programas articulados para o combate e a erradicação do trabalho infantil; e ações isoladas, sobrepostas e/ou paralelas sempre se mostraram ineficazes para o enfrentamento das iniqüidades sociais do país.

Além disso, é preciso considerar a necessidade de incluir os programas de transferência de renda numa estratégia maior de redução da pobreza, que implica ações contundentes da área da política econômica, que promovam distribuição de renda e redução das desigualdades.

Apresentamos a seguir um quadro resumo sobre as vantagens que a integração dos programas apresenta e os desafios que ainda precisam ser resolvidos na sua implementação. Quadro Resumo

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Vantagens da Integração Desafios da Integração• Equiparação entre os municípios do valor

da per capita das atividades sócio-educativas para R$20,00.

• Inscrição das famílias no CadÚnico, permitindo conhecimento sobre quem está sendo atendido.

• Pagamento diretamente às famílias/Cartão (aprimoramento da gestão)

• Atendimento a todas as formas de trabalho infantil.

• Ampliação da faixa etária para 0 a 15 anos.

• Aumento da freqüência escolar para 85%• Atendimento das crianças e adolescentes

do PBF retiradas do trabalho nas atividades sócio-educativas.

• Acompanhamento de saúde (inclusive nutricional) para as crianças atendidas pelo PBF.

• Aumento do atendimento do PBF, que absorve famílias com trabalho infantil; e o PETI atende as famílias fora dos critérios do PBF

• Articulação entre a SNAS e SENARC –na implementação de ações.

• Perspectiva de apoio social à família que não consegue cumprir as condicionalidades.

• Garantia orçamentária• Inclusão de novas famílias, com renda

per capita inferior a R$100,00 no PBF, com valor de bolsa reduzido.

• Atendimento adequado às crianças até 06 anos, com o compromisso da educação na elaboração e execução de uma proposta pedagógica para as atividades sócio-educativas e de convivência.

• Controle do orçamento e da execução das metas atendidas pelo PBF de crianças e adolescentes retirados do trabalho.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS – Guia de Orientação n.º 1 (1.ª versão). Brasília/DF, 2006.

2. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Guia De Orientação Técnica – Suas Nº 1 - Proteção Social Básica De Assistência Social, Brasília, outubro de 2005.

3. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Política Nacional de Assistência Social, Brasília, novembro de 2004.

4. BRASIL. Tribunal de Contas da União. Avaliação do TCU sobre o Programa Bolsa-Família / Tribunal de Contas da União. – Brasília : TCU, Secretaria de Fiscalização e Avaliação de Programas de Governo, 2005.

5. FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFÂNCIA – UNICEF. Análise Situacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil. Brasília, maio de 2004.

6. PAES E BARROS, Ricardo. (Coordenador de Avaliação de Políticas Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA). Entrevista. Jornal Valor Online. Entrevista de,– em 13/01/2006. (www.valor.com.br)

7. SCHEINKMAN, José Alexandre. Bolsa-Família e Pobreza. Folha de São Paulo, São Paulo, 18/12/2005. Opinião Econômica

8. SUPLICY, Eduardo Matarazzo. Renda de Cidadania: a saída é pela porta. São Paulo: Cortez: Fundação Perseu Abramo, 2002.

LEGISLAÇÃO CONSULTADA:

1. Decreto n.º 5.209, de 17 de setembro de 2004 – Regulamenta o Programa Bolsa Família.

2. Decreto no 3.877, de 24 de julho de 2001 - Cadastramento Único do Governo Federal.3. Decreto no 4.102, de 24 de janeiro de 2002 - Programa Auxílio-Gás. 4. Lei n.º 10.836, de 09 de janeiro de 2004 – Programa Bolsa Família.5. Lei no 10.219, de 11 de abril de 2001 - Programa Nacional de Renda Mínima

vinculada à educação – "Bolsa Escola".6. Lei no 10.689, de 13 de junho de 2003 - Programa Nacional de Acesso à Alimentação

– PNAA "Cartão Alimentação"7. Portaria MPAS/SAS n.º 458 de 04 de outubro de 2001 – Regulamenta o PETI8. Portaria n.º 666, de 28 de dezembro de 2005 – Disciplina a integração entre o

Programa Bolsa Família e o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil.

Sites Consultados

www.mds.gov.br/secretarias/secretaria04_06.aspwww.planalto.gov.brwww.camara.gov.br

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