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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA ÁREA DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL: ENTRE EXPERIÊNCIAS & VIVÊNCIAS MUSICAIS ADRIANE LEANDRA BÜNDCHEN PIRES Joaçaba 2005

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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA

ÁREA DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:

ENTRE EXPERIÊNCIAS & VIVÊNCIAS MUSICAIS

ADRIANE LEANDRA BÜNDCHEN PIRES

Joaçaba

2005

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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA

ÁREA DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:

ENTRE EXPERIÊNCIAS & VIVÊNCIAS MUSICAIS

ADRIANE LEANDRA BÜNDCHEN PIRES Dissertação apresentada ao Programa de

Mestrado em Educação da Universidade do

Oeste de Santa Catarina – Unoesc Campus

de Joaçaba, para obtenção do grau de Mestre

em Educação, sob orientação da profª. Drª.

Graciela Ormezzano.

Joaçaba

2005

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ADRIANE LEANDRA BÜNDCHEN PIRES

PROFESSORAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL:

ENTRE EXPERIÊNCIAS & VIVÊNCIAS MUSICAIS

Dissertação apresentada ao Programa de

Mestrado em Educação da Universidade do

Oeste de Santa Catarina – Unoesc Campus

de Joaçaba, para obtenção do grau de

Mestre em Educação, sob orientação da

profª. Drª. Graciela Ormezzano.

Aprovada em:

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________ DRA. GRACIELA ORMEZZANO – Orientadora

Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC

_______________________________________________ DRA. ANEMARI ROESLER VIEIRA LOPES– Examinadora

Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC

___________________________________________ DRA. MARIA CECÍLIA TORRES – Examinadora

Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

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Dedico esta pesquisa a Deus por estar presente em todos os momentos de minha

vida, nos felizes, nos tristes, nos fáceis e nos difíceis.

Ao meu marido Ezequiel, por estar sempre disposto a incentivar e me auxiliar na

difícil tarefa de conciliar mestrado com lar e trabalho.

A meus filhos Ezequiel Júnior e Carolina Fernanda, por entenderem minha

sobrecarga de tarefas e, mesmo assim, pedirem minha atenção toda hora. São

presentes que recebemos de Deus e fonte de alegria constantes.

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AGRADECIMENTOS

Não tenho palavras pra agradecer Tua bondade, dia após dia me cercas com fidelidade. Nunca me deixes esquecer que tudo o que tenho, tudo o que sou, e o que vier a ser vem de Ti Senhor.

(Ana Paula Valadão Bessa).

A Deus, razão da minha existência.

A meus pais, Fermino e Célia, por me mostrarem um caminho musical a ser trilhado.

A meu marido Ezequiel e meus filhos Ezequiel Júnior e Carolina Fernanda, por

entenderem minha ausência durante todo o processo de composição deste trabalho.

À Professora Doutora Graciela Ormezzano, por seu incentivo e prontidão para

auxiliar sempre que requisitada.

À Professora Doutora Maria Cecília Torres, que mesmo sem me conhecer, enviou-

me materiais para que pudesse ter mais subsídios para a pesquisa.

A todos os professores da primeira turma do curso de mestrado em Educação, pela

dedicação e empenho e por acreditarem na educação como agente de

transformação do homem.

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Senhor, Tu me sondas e me conheces Sabes quando me assento e quando me levanto;

De longe penetras os meus pensamentos. Esquadrinhas o meu andar e o meu deitar

E conheces os meus caminhos. Ainda a palavra não me chegou à língua,

E Tu Senhor já a conheces toda. Tu me cercas por trás e por diante

E sobre mim pões a mão Tal conhecimento é maravilhoso demais para mim:

É sobremodo elevado, não o posso atingir. Como me ausentarei do Teu Espírito?

Para onde fugirei da tua face? Se subo aos céus, lá estás;

Se faço a minha cama no mais profundo abismo, Lá estás também;

Se tomo as asas da alvorada E me detenho nos confins dos mares, ainda lá me haverá de guiar a Tua mão,

E aTua destra me susterá. Se eu digo: as trevas com efeito, me encobrirão,

e a luz ao redor de mim se fará noite, até as próprias trevas não te serão escuras:

as trevas e a luz são a mesma cousa. Pois Tu formaste o meu interior

Tu me teceste no seio de minha mãe. Graças te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso me formaste;as tuas obras são

admiráveis, E a minha alma o sabe muito bem...

Sonda-me o Deus, E conhece o meu coração, prova-me

E conhece os meus pensamentos; Vê se há em mim algum caminho mau

E guia-me pelo caminho eterno.

Salmo 139. Bíblia

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RESUMO A educação infantil tem na música uma grande aliada, pois esta faz parte do seu cotidiano. Pela ânsia de procurar compreender as experiências e vivências musicais que as professoras da educação infantil, no município de Joaçaba tiveram, a intenção deste trabalho foi realizar uma composição, numa apologia à música, pois este é o tema das experiências vivenciadas pelas pesquisadas, com o objetivo de contribuir para a compreensão da vivência musical das professoras da educação infantil no decorrer de seu ciclo vital, envolvendo as áreas pessoal e profissional. A metodologia escolhida foi a fenomenologia, dividida em quatro movimentos, como numa sinfonia, denominados: allegro, que trata do embasamento teórico; adágio, posto em prática com uma oficina de música, tendo como participantes, professoras da rede municipal, privada e da estadual de ensino, em que compareceram trinta e oito professores; scherzo, que foi a realização de entrevistas abertas com nove professoras das três redes de ensino, que, quando da oficina, propuseram-se a colaborar; e, por fim, o quarto movimento, Presto Finale ou obra-prima, relato das essências encontradas nas entrevistas: música na infância; mídia, cotidiano escolar e musicalização; e importância da música na vida. O relato das essências demonstrou que todas as entrevistadas possuem vivências musicais, algumas tinham consciência deste fato, outras não, e estas vieram a ter durante o processo. Mas, o que pôde ser observado foi o desejo de uma capacitação adequada, para que as profissionais possam trabalhar a música com seus alunos. Por isso, foi apresentada a proposta de inclusão da música na cadeira de Teoria e Metodologia do Ensino de Artes, além da uma possibilidade de cursos de capacitação para professores já formados. Palavras-chave: Música, Educação Infantil, Professor.

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ABSTRACT Music is a great allied in infant education, since it is part of children’s daily life. Motivated by a desire to comprehend the experiences of infant education teachers from Joaçaba, I intended to make a composition with their experiences and music, since this is the researched subject. This paper aims to contribute to comprehending the infant education teachers’ musical experience during their vital cycle, involving both the personal and professional areas. The chosen methodology was the phenomenology, divided into four movements, like a symphony; so called: allegro, which dealt with the theory, adagio, which was the first practical part, consisting of a music workshop involving thirty-eight teachers from both private and public schools; scherzo, that consisted on an open interview with nine of the teachers from three schools that took part of the music workshop and were dealing to contribute; and finally Presto Finale or masterpiece, which was the descriptions of the essences that was mentioned in the interviews: music during childhood, media, daily school life related to music and the importance of music in life. The report of these essences, showed that every interviewed teacher has musical experiences and that some are aware of this fact, whereas others are not; and the latter became conscious of this during the process. However, what we could actually observe was the desire of a proper qualification, so that the professionals can include the music in their classes. Based on that, we proposed to include music in Theory and Methodology of Art school subject, besides offering qualification courses to graduated teachers. Key-words: Music, Infant Education, Teacher.

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LISTA DE FOTOGRAFIAS Fotografia 1 – Apresentação do grupo 1 ...................................................................51 Fotografia 2 – Apresentação do grupo 2 ...........................................................................52 Fotografia 3 – Apresentação do grupo 3 ...........................................................................54 Fotografia 4 – Apresentação do grupo 4 ...........................................................................55 Fotografia 5 – Apresentação do grupo 5 ...........................................................................56 Fotografia 6 – Apresentação do grupo 6 ...........................................................................57

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Relato de comportamento do menino Bória.............................................46

Quadro 2 – Sons definidos pelo grupo 1 .......................................................................51

Quadro 3 – Sons definidos pelo grupo 2 .......................................................................52

Quadro 4 – Sons definidos pelo grupo 3 .......................................................................53

Quadro 5 – Sons definidos pelo grupo 4 .......................................................................54

Quadro 6 – Sons definidos pelo grupo 5 .......................................................................55

Quadro 7 – Sons definidos pelo grupo 6 .......................................................................57

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SUMÁRIO

PRELÚDIO ................................................................................................................13

CAPÍTULO I ..............................................................................................................21

1 ALLEGRO: SUBSÍDIOS TEÓRICOS ....................................................................21

1.1 EDUCAÇÃO INFANTIL .......................................................................................21

1.1.1 Educação no Brasil ........................................................................................27

1.2 AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS ......................................................................29

1.3 INTELIGÊNCIA MUSICAL...................................................................................30

CAPÍTULO II .............................................................................................................36

2 OS MOVIMENTOS DA SINFONIA ........................................................................36

2.1 ALLEGRO ...........................................................................................................41

2.2 ADÁGIO: RELATO DA OFICINA.........................................................................42

2.3 SCHERZO...........................................................................................................61

2.4 PRESTO FINALE: A OBRA-PRIMA ....................................................................62

CAPÍTULO III ............................................................................................................64

3 A OBRA-PRIMA – ESSÊNCIAS FENOMENOLÓGICAS DA PESQUIS A ............64

3.1 MÚSICA NA INFÂNCIA.......................................................................................67

3.1.1 Relatos de sons da Infância ..........................................................................67

3.1.2 Referência aos gostos da família ..................................................................70

3.1.3 Lembrança das músicas infantis da escola .................................................73

3.2 MÍDIA, COTIDIANO ESCOLAR E MUSICALIZAÇÃO.........................................79

3.2.1 Referência à mídia ..........................................................................................80

3.2.2 Temas trabalhados na escola e aspectos profissionai s .............................86

3.2.3 Conhecimento musical das participantes ....................................................95

3.3 IMPORTÂNCIA DA MÚSICA NA VIDA ...............................................................99

3.3.1 Desejo de tocar um Instrumento .................................................................100

3.3.2 Música para relaxar ......................................................................................102

3.3.3 Significações pessoais ................................................................................104

POSLÚDIO..............................................................................................................108

REFERÊNCIAS .......................................................................................................112

APÊNDICES ...........................................................................................................117

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PRELÚDIO

A música faz parte da vida das pessoas. O próprio pulsar do coração

pode ser comparado com um instrumento rítmico que bate compassadamente. A

música, embora não em todos os estilos, está à disposição das pessoas,

principalmente através da mídia, não considerando aqui a questão da qualidade das

músicas expostas.

A infância e a música sempre estiveram ligadas, como relata Nogueira,

[...] as crianças,historicamente sempre se aproximaram da música. Da canção de ninar e do chocalho ao primeiro CD pedido de presente, a vida da criança, em diferentes contextos sociais, é marcada pela convivência com esta linguagem artística, talvez a mais presente delas. (2000, p.2).

Durante minha vida, desde a infância, sempre tive oportunidades e

contato com a música e com instrumentos musicais. Cantava e experimentava

instrumentos, que mais tarde, passaria a tocar. Desde que nasci, tive o privilégio de

ouvir músicas cantadas por meus pais, tocadas em discos e fitas-cassete.

Como meu pai é pastor, desde pequena, eu sempre participava dos cultos

e o ouvia cantar. Aquela voz forte e firme que levava toda igreja a cantar junto, algumas

vezes até mesmo sem nenhum instrumento musical, me encantava e me deixava

fascinada. Ele e minha mãe também cantavam sempre para eu e meu irmão dormirmos;

muitas vezes pedíamos a mesma música por vários dias, e eles nos atendiam.

Quando eu estava na educação infantil, por volta dos quatro anos de

idade, fui matriculada no período matutino, minha mãe me acordava cantando uma

música da qual eu lembro um trecho: “Acorda Maria bonita, levanta vai fazer o café,

que o dia já está raiando e a polícia já está de pé.” Essa música marcou essa fase

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de minha vida, talvez pela letra, mas, provavelmente, pelo significado emocional de

ser acordada por minha mãe, com sua voz carinhosa.

Aos cinco anos, comecei a ter aulas particulares de flauta doce dadas

numa escola que ficava um pouco mais distante de minha casa e no período

extraclasse. Para mim era uma experiência nova andar por aqueles corredores

enormes, tão estranhos para mim. A professora era muito amorosa e me lembro com

carinho das suas aulas e de como insistia para que eu estudasse e me dedicasse a

praticar em casa as lições aprendidas. Ainda guardo os livros com suas anotações.

Estudei com a mesma professora durante três anos, sempre incentivada por meus

pais; algumas vezes me sentia desestimulada para ir às aulas, e queria ficar

brincando, porém meus pais foram firmes e não me deixaram desistir, tanto que hoje

eu agradeço por isso, pois a minha caminhada musical nunca parou.

Depois desses três anos de estudo, mudamos para a cidade de Joaçaba,

onde procuramos professores de flauta doce. Cheguei a fazer algumas aulas em

grupo com um professor pago pela prefeitura, mas as aulas não foram muito

produtivas, pois os conhecimentos não avançaram, visto que eu apenas tocava as

músicas que eu já tinha aprendido anteriormente. Então fiquei desestimulada e parei

de ir às aulas, mas não de tocar, pois na igreja sempre havia programações e eu era

requisitada para participar tocando flauta.

Meu irmão, então, começou a ter aulas de piano, o que eu também

queria, porém a condição econômica de meus pais não o permitiu no momento. Por

isso quando meu irmão voltava das aulas, eu pegava o livro de piano dele, e como

eu sabia ler notas, praticava piano num harmônio portátil que meu pai tinha para os

cultos em outras congregações que ele atendia. Esse harmônio tinha uma

peculiaridade: para sair o som, era preciso ficar pedalando.

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Meus pais, vendo meu esforço e minha ânsia em aprender, matricularam-

me também para ter aulas de piano com a mesma professora. Então passei a ir em

todos os dias úteis da semana para a casa da professora, dois dias para ter aulas e

os outros para praticar, enquanto não tinha piano em casa. A aquisição do piano foi

uma vitória, tanto que me lembro até hoje do momento em que ele chegou e da

minha alegria, e de toda a família, afinal era uma conquista. Meu pai todos os meses

depositava uma pequena quantia em dinheiro na caderneta de poupança dos quatro

filhos, e, para comprar o piano, foi necessário tirar a economia de vários anos de

todas as cadernetas. Foi uma alegria muito grande para todos nós em especial para

mim. É a realização de um sonho. Meus pais fizeram um esforço imenso para que o

piano fosse comprado.

Após ter estudado alguns anos, minha professora me encaminhou para

realizar provas no Conservatório em Curitiba, para onde eu ia todos os meses

realizar aulas e provas, não só práticas, mas também teóricas, de história da música,

harmonia e folclore. Foi um esforço grande, mas aprendi muito nos cinco anos que

realizei esse percurso. No intermeio deste tempo, fazia cursos de férias em São

Paulo, que incluíram órgão litúrgico, flauta doce e regência. Depois de formada em

piano e nas outras matérias que citei, senti vontade de aprender a tocar flauta

transversal, instrumento cujo som sempre me encantara, principalmente tocado na

orquestras em músicas eruditas de compositores famosos.

O estilo de música clássico sempre me atraiu. Minhas oportunidades

musicais, no entanto, foram fora do âmbito escolar. Embora nas séries finais do

ensino fundamental eu tive aulas de canto, essas não tinham objetivos claros,

apenas se cantava e se aprendiam algumas músicas.

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Comecei a trabalhar com crianças muito cedo, ainda na adolescência,

primeiro ministrando aulas de flauta doce, depois de piano. Durante alguns anos

lecionava também em duas cidades vizinhas por não haver lá professor desses

instrumentos.

Quando tive meu primeiro filho, parei de trabalhar por um tempo para

dedicar-me a ele integralmente; depois veio minha filha e foi uma época ótima de

minha vida, pois pude curtir todos os momentos do início da vida deles. Quando meu

filho começou a freqüentar a educação infantil, senti vontade de estar novamente em

contato musical com as crianças. Então, incentivada pelo meu marido elaborei um

projeto de musicalização e entreguei-o a uma escola, que me chamou para

trabalhar. Foi um ótimo recomeço. Depois veio outra escola, e também voltei a

lecionar piano e flauta. É apaixonante ver as crianças interessando-se pelos

instrumentos rítmicos e musicais, pelas músicas eruditas e pelas cantigas folclóricas,

além de criarem músicas e descobrirem os sons.

A musicalização, com certeza fará parte da vida dessas crianças, afinal,

elas estão vivenciando a música na escola. Esta pesquisa buscou investigar as

experiências e vivências musicais que as professoras tiveram no decorrer de suas

vidas, se houve esse tipo de experiência na escola ou fora dela. É possível afirmar

que todas as pessoas têm experiências e vivências musicais, seja com músicas

clássicas, populares, cantigas de roda, canções de ninar ou com instrumentos. No

caso, pesquisamos as professoras da educação infantil que trabalham com esse

nível de ensino, no município de Joaçaba, buscando verificar se suas experiências e

vivências musicais pessoais têm relação com sua vida profissional.

Por que experiências e vivências? Porque entendemos que experiência e

vivência não têm o mesmo significado. A vivência é o viver a experiência, é vivenciar

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o que se passa, é imergir naquilo que se experimenta. Por sua vez, experiências

podem ser fatos isolados que ocorrem em nossa vida. Vivências são fatos vividos, o

próprio fato de existir. Segundo Maturana, (1991), a vivência compreende todo

campo de experiências do indivíduo; é como se uma palavra completasse a outra.

Há muitos aspectos da música que podem ser trabalhados mesmo por

quem não toca instrumentos musicais. As músicas trazem uma história da época em

que foram compostas, da situação social em que vivia o compositor, seja ele erudito

ou popular. As próprias cantigas folclóricas trazem elementos históricos da vida das

pessoas. A música é um ótimo instrumento para ser usado como material didático

em sala de aula, mas não é só isso. Stravinsky salienta que “a música se expressa

em si mesma”. (GARDNER, 1994b, p. 83).

Segundo Jeanne Bamberger, musicista e psicóloga desenvolvimental,

que auxiliou Gardner em seus estudos sobre a inteligência musical, o pensamento

musical envolve suas próprias regras e não pode ser simplesmente incorporado no

pensamento lógico-matemático ou lingüístico. (ibid, 1994b). Assim, consideramos a

música como elemento importante para o desenvolvimento da criança, mas a música

pela música e não somente como instrumento didático. Nosso desejo foi investigar

que significado a música tem para as professoras da educação infantil em sua

trajetória de vida pessoal e se essa história faz ponte com sua história profissional;

se elas consideram a música como parte importante de seu trabalho, como

trabalham a música e para que finalidades a música é utilizada.

Esta investigação buscou esclarecer esses pontos para que, a partir

deles, seja possível elaborar uma proposta de aperfeiçoamento para as professoras

com relação à música, a fim de que elas estejam preparadas para auxiliar a criança

em seu desenvolvimento integral e também musical.

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Tentaremos, pois, fazer uma relação entre a educação infantil e a música,

primeiramente, conhecendo um pouco da história da educação infantil e, após, sua

relação com a música, baseada na teoria das múltiplas inteligências de Gardner.

Este autor destacou a inteligência musical como uma das primeiras a surgir na

criança: “De todos os talentos com que os indivíduos podem ser dotados, nenhum

surge mais cedo do que o talento musical”. (GARDNER, 1994b, p. 78).

Assim, procuramos responder à seguinte questão: Qual a significação

da música para professoras da educação infantil em sua trajetória de vida

pessoal e de que maneira suas vivências musicais são aproveitadas em sua

profissão? Ou seja, buscamos saber que ponte elas fazem da sua experiência

musical pessoal para sua vida profissional. Entendemos por experiência musical

tudo o que se refere à música, desde o primeiro contato que o indivíduo teve com

ela na infância: das cantigas de roda às músicas gravadas eruditas ou populares.

Também é nosso intento investigar como as professoras da educação infantil

trabalham a música em sala de aula e como a sensibilidade musical delas pode se

refletir no aluno.

Numa sinfonia, os movimentos são uma variação do tema, e este trabalho

foi uma composição com vários movimentos, mas todos em volta do tema: a música

na vida das professoras da educação infantil, nos âmbitos pessoal e profissional. A

pesquisa não foi feita de questões fechadas, mas, para delinear o trabalho, algumas

questões consideradas importantes para o estudo serão abordadas, enfatizando

fatos do cotidiano, que ocorrem no dia-a-dia, não somente no ensino formal, mas na

vida de cada um. “A vida cotidiana não é algo ‘especial’, nenhum momento do qual

poucos participam ; ao contrário, é algo que envolve a todos e no qual todos estão

presentes seja ativos ou passivos” . (SOUZA, 2000, p. 36).

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Essa é uma concepção do paradigma humanista, onde o “eu“ é o centro, que

interage com o meio ambiente. Portanto, há dois princípios: o indivíduo em si com suas

experiências e as suas relações interpessoais. Há uma correlação do mundo interno do

indivíduo com o mundo externo. Um dos pontos fundamentais do paradigma humanista é

que “o homem só aprende se estiver interessado e se seus conhecimentos forem

fundamentalmente multi-sensoriais e subjectivos”. (BERTRAND, VALOIS, 1994, p. 136).

A valorização de cada um tem importância fundamental nesse paradigma,

e é essa também nossa perspectiva nesta pesquisa: valorizar a experiência de cada

professora, pois consideramos, assim como no paradigma humanista, que é única e

intransferível, uma vez que cada indivíduo constrói sua própria história na

complexidade da vida cotidiana de acordo com suas experiências. Não existem

histórias idênticas, cada uma é única. Para tanto, delineamos como objetivo geral:

contribuir para a compreensão da vivência musical das professoras da educação

infantil, no decorrer de seu ciclo vital, envolvendo as áreas pessoal e profissional.

Os objetivos específicos ficaram assim definidos: investigar que

experiências musicais as professoras tiveram durante suas vidas; diante das

experiências vivenciadas por elas, verificar que importância, as professoras

conferem à música em sua vida e na sala de aula; identificar em que circunstâncias

a música é inserida em sala de aula pelas professoras; apresentar proposta de

formação continuada para professoras da Educação infantil na área musical.

Portanto, esta pesquisa não pretendeu ser prescritiva, e, sim, baseada nos

resultados obtidos, apresentar uma proposta de continuidade para que a educação seja

também beneficiada no âmbito musical, haja vista que a relação ensino-aprendizagem,

que é a linha desta pesquisa, abrange não somente a educação formal, mas também

as experiências de cada um em seu cotidiano, em sua vida como um todo.

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No segundo capítulo, tratamos dos aspectos teóricos, fazendo um passeio

teórico sobre os temas: educação infantil e sua história de existência, arte musical e

inteligências múltiplas, com ênfase na inteligência musical.

O capítulo dois, intitulado movimentos da sinfonia, traz a descrição da

metodologia, o campo pesquisado e o relato da oficina realizada. Como numa

sinfonia, cada movimento terá sua hora, sua característica, mas todos giram em

torno do mesmo tema: a experiência musical do professor da educação infantil, na

sua vida pessoal e profissional.

A caminhada trouxe movimentos adagio e presto, na intensidade piano e

fortíssimo. Foi uma composição de idéias surgidas da busca fenomenológica dos

resultados; notas antes não usadas, compassos incorporados, acordes dissonantes

e consonantes; notas que deram base aos acordes no arranjo que resultou na

harmonia do todo, como numa sinfonia, respeitando cada movimento, que tem mais

beleza na audição do conjunto.

Esse é o processo de acontecimento da composição. Muitas coisas ocorreram

na sinfonia do trabalho, assim como na sinfonia da vida. Os movimentos chegaram

ao grand finale, mas deixo claro que a caminhada continua, pois a estagnação não é algo

que faz parte da música, nem deve fazer parte da educação. Portanto, a continuidade de

leitura de partituras (autores), sua execução e, quem sabe uma nova composição não

estão fora de cogitação. Aos poucos, a composição foi se constituindo como música

sonora e agradável; os compassos outrora inacabados, foram se harmonizando e os

acordes, deixando de ser dissonantes, porque, no decorrer da realização da arte,

tomaram forma e caminharam para a harmonia da obra.

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CAPÍTULO I

1 ALLEGRO: SUBSÍDIOS TEÓRICOS

1.1 EDUCAÇÃO INFANTIL

A educação infantil tem sido, nos últimos anos, motivo de discussão por

especialistas, por ser considerada como direito da criança de zero a seis anos no

que se refere à educação, não somente como assistencialismo, isso após o advento

da Lei de Diretrizes e Bases, nº 9394, de 1996.

Esse assunto, a educação ou cuidado de crianças em idade pré-escolar,

como o próprio nome diz “pré” já informa, tem sido discutido há muito tempo. Relata

a respeito, Oliveira:

A idéia de educar crianças menores de seis anos de diferentes condições sociais já era tratada por Comenius (1592 – 1670) no seu livro The School of Infancy, publicado em 1628, onde aquele autor propunha um nível inicial de ensino que era o "colo da mãe” (mother’s lap). Advogava ele, que o processo de aprendizagem se iniciava pelos sentidos. Impressões sensoriais advindas da experiência com manuseio de objetos seriam internalizadas e futuramente interpretadas pela razão. Daí sua defesa de que a educação de crianças pequenas deveria utilizar materiais e atividades diferentes – passeios, quadros, modelos e coisas reais – segundo suas idades de modo a auxilia-las no futuro a fazer aprendizagens abstratas. (2000, p.13).

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Esse pensamento era uma teoria que, talvez sonhava Comenius, se

realizaria na criação de escolas. Mas, para chegar à educação infantil que temos

hoje, o caminho foi longo. A realidade da educação infantil não é desvinculada da

realidade social e cultural. Talvez se as mães não necessitassem ser alicerces no

sustento da casa poderiam dispensar mais tempo à educação inicial dos filhos e a

educação infantil teria outra história. Portanto, o fator social está intimamente ligado

com a história da educação, mesmo na sua criação, no século XVII, na Europa,

quando a criança não era considerada como tendo um bom ímpeto; por isso deveria

ser moldada para tornar-se um bom cidadão.

A “escola de principiantes” ou “escola de tricotar”, criada por Oberlin em 1769, na paróquia rural francesa de Ban-de-la-Roche, tem sido reconhecida como a primeira delas. De acordo com os seus objetivos, ali a criança deveria: perder os maus hábitos; adquirir hábitos de obediência, sinceridade, bondade, ordem etc. (KUHLMANN JR., 2001, p. 5).

Posteriormente, alguns pensadores criaram teorias sobre a educação de

crianças; Rosseau (1712 – 1778) enfatizou que a educação deveria seguir a

liberdade e o ritmo da natureza; Pestalozzi (1746 – 1827) considerava que a

educação das crianças deveria ser baseada na afetividade, na bondade e no amor.

(OLIVEIRA, 2002).

Se, na Idade Média, a criança era considerada como um miniadulto que

deveria crescer logo para assumir suas responsabilidades, quando do surgimento da

sociedade burguesa, ela passou a ser entendida como um ser que precisava ser

cuidado, escolarizado e preparado para uma atuação futura. Tal tarefa foi

atribuída às escolas, com o que a educação se tornou mais pedagógica e menos

empírica.

O criador do jardim de infância, considerado mais pedagógico do que

assistencialista e humanitário, foi Froebel (1782 – 1852), que fazia das atividades

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práticas o cerne, pois considerava a criança um ser essencialmente criativo. No

entanto, Froebel não foi exclusivamente pedagógico, visto que a criação dos

jardins de infância estava relacionada com os fatores econômicos, sociais e

culturais da época. É claro que não se podem separar as realidades e é ilusão

pensar que uma criação como essa ocorra apenas por um sonho pois vivemos

numa sociedade, e não separados ou isolados da realidade que nos cerca. É

inconcebível, portanto, pensar que a criação do jardim de infância não estivesse

relacionada com as necessidades sociais da época, assim como, num comparativo,

é inconcebível pensar que a Reforma da Igreja no século XVI não sofreu influências

políticas.

Assim, foi com a Revolução Industrial implantada na Europa que

nasceram as instituições pré-escolares, buscando suprir a necessidade dos pais

que trabalhavam fora e não tinham com quem deixar as crianças, que muitas vezes

ficavam abandonadas em casa. Apesar de alguns reformadores protestantes

defenderem a educação como universal, a elite ficou receosa que os pobres fossem

educados, o que entendia que não seria “bom” para a economia. (OLIVEIRA, 2000).

Foi então que a escola para crianças pequenas assumiu o papel assistencialista

para as classes menos favorecidas, concretizando a separação de classes sociais:

os ricos tinham um tipo de educação e os pobres, outro, mais voltado para o

assistencialismo.

Ainda hoje, na Inglaterra, as escolas de educação infantil que apenas

proporcionam um espaço para as crianças brincar são chamadas nursery. Tive

oportunidade de comprovar esse fato, quando meu filho de quatro anos, em 1999,

freqüentou uma nursery, pois morei com minha família por quatro meses nas

redondezas de Londres. As aulas não eram todos os dias, as crianças podiam ir de

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duas a quatro vezes por semana, conforme as vagas, ou seja, os pais podiam optar

em colocar o filho na escola freqüentando dois dias por semana. Por exemplo, se em

uma nursery houvesse vagas para a criança apenas dois dias por semana e os pais

gostariam que a criança participasse mais dias, podem colocá-la em outro grupo,

outra nursery. Nas aulas, as crianças dispunham de papel e lápis para desenhar e

pintar livremente, de livros de literatura infantil e muitos brinquedos, e algumas

brincadeiras eram dirigidas.

Infelizmente, não tive oportunidade de estudar e pesquisar mais sobre

isso enquanto estava lá e a experiência foi única. Observei que outras escolas de

educação infantil tinham uma preocupação maior com a educação pedagógica. As

crianças que freqüentavam apenas as nursery podiam entrar na escola mesmo sem

uma preparação anterior. A idade para a entrada na escola regular é de cinco anos.

Depois desse pequeno interlúdio, alguns pontos sobre a Educação infantil

são importantes para conhecer os teóricos que auxiliaram nessa evolução. Faremos,

pois, uma menção a alguns deles, por considerarmos que suas teorias tiveram

influência sobre a educação.

No século XX, outros nomes surgiriam como Decroly, que defendia o

ensino voltado para o intelecto, valorizando a criança como um ser especial, não um

adulto em miniatura; um ser que tem o direito de desenvolver-se na fase em que

está, a infância, sem que a educação seja uma preparação para a vida adulta.

Decroly destacou três etapas para a educação: a observação, a associação e a

expressão. Por observação entendia não ser algo separado das demais etapas, mas

que estivesse presente em todos os momentos; a associação consistia na forma de

relacionar os conhecimentos, pois não são separados e estanques, mas têm relação

com tudo; por fim, a expressão é a culminância do trabalho, por meio da qual a

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criança pode expor aquilo que tem dentro de si de forma concreta, através de

desenhos ou trabalhos manuais, ou de forma abstrata, através da linguagem

simbólica (escrita).

Maria Montessouri também teve seu papel significativo na educação

infantil, tendo como marca a elaboração de materiais específicos para favorecer o

desenvolvimento da criança, como materiais de exercícios para a vida cotidian;,

material sensorial, de linguagem, de matemática, de ciências. Esses materiais são

constituídos de peças sólidas de diversos tamanhos e formas: caixas para abrir,

fechar e encaixar; botões para abotoar; série de cores, de tamanhos, de formas e

espessuras diferentes; coleções de superfícies de diferentes texturas e campainhas

com diferentes sons, além de outros. Portanto o material, na concepção

montessouriana era muito importante. (ZACHARIAS, 2003).

Por sua vez, Vigostsky com a zona de desenvolvimento proximal,

defendeu que a criança pequena se auxiliada por uma mais experiente desenvolve-

se. A ênfase está na mediação, ou seja, o indivíduo tem acesso mediado aos

objetos, aos recortes do real; o homem não tem acesso direto aos objetos, mas

acesso mediado, ou seja, operado pelos sistemas simbólicos de que dispõe.

Enfatiza-se a construção do conhecimento como uma interação mediada por várias

relações, ou seja, o conhecimento não é visto como uma ação do sujeito sobre a

realidade, como o construtivismo vê e, mas resulta da mediação feita por outros

sujeitos. Outro ponto importante é a internalização: o sujeito tem a mediação, que é

interpessoal ,e, depois, tem de internalizar o aprendido, tornando a aprendizagem

também intrapessoal. (LA TAILLE et al., 1992).

Wallon enfatizou a afetividade, considerando que não é possível separar

os aspectos afetivo, motor e cognitivo do ser humano. A criança deve ser

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considerada como um todo, em todos os seus aspectos e em sua relação com o

meio, significando que se deve contextualizá-la deve-se considerar onde a criança

está contextualizada. (LA TAILLE, 1992).

Piaget revolucionou a educação com o cognitivismo, no qual considera o

processo de desenvolvimento do indivíduo como influenciado por quatro fatores:

pela maturação interna (hereditariedade), pela experiência física, pela

transmissão social (fator educativo) e pela equilibração, que é progressiva, não

estática, e as novas descobertas devem se equilibrar com as já existentes. Com

base nesses pressupostos, a educação deve possibilitar à criança um

desenvolvimento amplo e dinâmico desde o período sensório- motor até o

operatório-abstrato. (PIAGET, 1983).

O movimento pedagógico fundado por Freinet caracterizou-se por sua

dimensão social, na defesa de uma escola centrada na criança, que não é um

indivíduo isolado, mas faz parte de uma comunidade. Defendeu uma escola

centrada na criança, onde as atividades manuais tinham tanta importância como as

intelectuais; nela, a disciplina e a autoridade são resultado de um trabalho bem

organizado, em que a livre expressão predomina. Os jogos são muito importantes na

educação, segundo Freinet, questionou as atividades repetitivas e enfadonhas da

escola, enfatizando que a escola é agente ativo de mudanças sociais na sociedade.

(FREINET, 1979).

Com esse pequeno resgate histórico de alguns teóricos que pensaram a

educação como o desenvolvimento da criança em si, reportemo-nos ao nosso país e

do surgimento da educação infantil.

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1.1.1 Educação no Brasil

No Brasil, a educação infantil surgiu com o jardim de infância importado

da teoria de Froebel, mas para atender as crianças das classes mais abastadas, em

1875. Então, no Rio de Janeiro, o Colégio Menezes Vieira, recebia em seu jardim de

crianças, alunos da idade de três a seis anos, mas apenas do sexo masculino.

(BASTOS, 2001).

No entanto esse tipo de educação infantil era considerado prejudicial às

crianças por tirá-las muito cedo do convívio familiar, sendo, pois, admitido apenas

para crianças cujas mães trabalhassem fora. Sobre esse fato, Manoel Olimpo da

Costa, em Congresso de Instrução Pública, afirmou que o Brasil não conseguia nem

mesmo dar educação para as crianças de sete a quinze anos, e que o jardim de

infância seria uma forma de as famílias relegarem suas funções para o Estado

(BASTOS, 2001). Inicia-se, pois, a historicidade da educação infantil como

assistencialista, destinada para as classes menos favorecidas.

Até a Constituição de 1988, a educação para crianças menores de seis

anos não era dever do Estado e as creches estavam vinculadas à assistência social

e não à educação. No relato de Campos et al.:

[...] a Lei nº 5.692/71 praticamente ignorou a educação da criança pré-escolar. É o Artigo 19 que, de forma extremamente vaga, estabelece que os sistemas de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a 7 anos recebam conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições equivalentes (1993, p.44).

Essa forma ampla de referir que a educação de crianças menores de sete

anos deve ser “velada” pelo Estado é difícil de entender, motivo pelo qual, talvez , as

crianças ficassem relegadas apenas a cuidados, e não recebendo educação. O que

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caracterizaria a educação infantil como educação sistematizada foi a Lei de

Diretrizes e Bases de nº 9394, de 1996, a partir da qual as creches e pré-escolas

começaram a ter responsabilidades educacionais, não só assistencialistas. Para

essa fundamentação, os parâmetros curriculares nacionais direcionam o que deve

ser trabalhado em sala de aula, então aparece a preocupação educacional para esta

faixa etária.

O Referencial Curricular Nacional destinado à educação infantil, é

composto por três volumes. O terceiro volume, intitulado “Conhecimento do

mundo”, compõe-se de seis documentos, relacionados aos enfoques de

trabalho: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza

e Sociedade e Matemática. É interessante destacar que a música aparece

separada das artes, pois, geralmente das vezes, música e artes são integradas

indistintamente. Neste trabalho, ficaremos restritos à área musical da educação

infantil.

A Lei do Sistema Estadual de Ensino de Santa Catarina atesta em

parágrafo único; “Na educação infantil, o ensino da arte e a educação física são

componentes curriculares obrigatórios, ajustando-se às faixas etárias e às condições

das crianças” (SANTA CATARINA, 1998, p. 70). Prevê ainda que o sistema estadual

de ensino compreende as instituições públicas e privadas (p. 59).

O material apresentado pelos Parâmetros Curriculares é de ótima

qualidade, conforme atesta Monique Andries Nogueira em trabalho apresentado na

23ª Reunião Anual da Anped, em 2000, sob o título: “Brincadeiras tradicionais

musicais: análise do repertório recomendado pelo Referencial Curricular Nacional

para a Educação infantil / MEC.” É interessante, contudo, saber se os professores da

educação infantil, que não vivem em grandes centros têm acesso a esse material e

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têm conhecimento da relevância da música para as crianças, de como despertar a

musicalidade e como ela contribui e faz parte do desenvolvimento da criança.

Para deixar mais claro esse aspecto da música na vida das crianças,

revisemos a teoria das múltiplas inteligências de Howard Gardner (1994a, 1994b,

1995, 2000).

1.2 AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS

Howard Gardner é professor universitário de Psicologia e Neurologia nas

universidades de Harvard e Boston. Desenvolveu a “teoria das inteligências

múltiplas” por discordar dos testes de inteligência aplicados às crianças, pois só

ressaltavam a lingüística e a matemática. Segundo essa teoria, o ser humano é

dotado de várias formas de inteligência e suas potencialidades podem ser

desenvolvidas se estimuladas. Diz Gardner em Inteligências múltiplas – A teoria na

prática: “considero a inteligência um potencial biopsicológico. Isto é, todos os membros

da espécie têm o potencial de exercitar um conjunto de faculdades intelectuais, do

qual a espécie é capaz”. (1995, p. 38).

Dessa teoria, Gardner destacou sete inteligências: a musical, a corporal-

cinestésica, a lógico-matemática, a lingüística, a espacial, a interpessoal e a

intrapessoal: “todos os seres humanos possuem certas capacidades essenciais em

cada uma das inteligências” (1995, p.31).

A cultura popular diz que alguns indivíduos não têm capacidade ou

habilidade para alguma área, como a matemática, o português, a música e assim por

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diante. Essa teoria vem justamente discordar dessa crença popular, salientando que

todos os indivíduos possuem capacidade para todas as áreas, podendo desenvolver

mais algumas do que outras. No caso da música, é muito comum ouvir que

determinada pessoa não tem capacidade musical e, pensando assim, também não

se interessa por desenvolver essa habilidade. A escola e a família têm grande

responsabilidade sobre esse sentimento, pois, na idade adulta, a infância é a mais

lembrada em se tratando de música: “As oportunidades são fundamentais para que

a criança coloque a música como parte integrante de sua vida”. (ORMEZZANO;

TORRES, 2002, p. 140).

Gardner, em sua obra Estruturas da mente (1994b, p.78), afirma que “de

todos os talentos com que os indivíduos podem ser dotados, nenhum surge mais

cedo do que o talento musical”.

1.3 INTELIGÊNCIA MUSICAL

A música, do ponto de vista positivista, é vista como algo estático, separado

por tom, ritmo, timbre. Somente a forma objetiva da música é evidenciada, não se

considerando o sentimento que e sua história, o momento em que foi composta, a

situação que o compositor vivia na época, como era a sociedade, a política. A

música não é uma junção de compassos ritmados, de métricas perfeitas, de tempos

contados matematicamente, embora “ao longo dos séculos tentativas de relacionar

música com matemática parecem um esforço conjunto para ressaltar a racionalidade

(quando não negar os poderes emocionais) da música”. (GARDNER, 1994b, p.83).

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Esse é um pensamento positivista, que separa enfaticamente a razão da

emoção. Contudo, na música a emoção não pode ser excluída, haja vista a própria

história evidenciar ligação da composição com o estado de espírito do compositor,

com a situação histórica e emocional que vivia na época da composição de suas

obras. Para Gardner (1994b), a música é muito mais do que isso, ela faz parte da

criança desde sua mais tenra infância. Bebês de dois meses podem imitar a altura

da voz da mãe e o contorno melódico de músicas cantadas por elas; aos quatro

meses, podem se adequar ao ritmo das canções. A partir de um ano de idade,

começam a produzir contornos melódicos parecidos com músicas que lhe são

familiares, mas, depois dos três ou quatro anos, as músicas da cultura vencem a

produção e a criança deixa de produzir passando a cantar o que já está posto.

Os primeiros anos de vida parecem ser fundamentais para o desenvolvimento musical. Parece haver um período crítico de sensibilidade ao som e à freqüência entre os quatro e seis anos de idade. Durante este período, um ambiente musical rico pode proporcionar a base para a capacidade musical posterior. (CAMPBELL et al., 2000, p. 132).

Como afirma a Campbell, nos anos iniciais a sensibilidade é maior e pode

ser desenvolvida com facilidade; à medida que a criança vai crescendo, necessita de

mais estímulo para se desenvolver. Portanto, a idade em que a criança freqüenta a

educação infantil é a melhor fase para que a sensibilidade musical seja explorada e

desenvolvida. Todavia, para tanto, é necessário que os professores estejam

preparados para desempenhar tal papel. Neste aspecto, conhecendo a grade

curricular acadêmica da região em que estamos inseridos, constatamos que o

preparo é insuficiente para sua atuação com a música, a não ser que o professor

tenha formação ou preparação extra-acadêmica.

A música certamente está presente nas escolas de educação infantil,

porém o modo como acontece na sala de aula foi uma das questões pesquisadas

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neste trabalho, pois a educação é o objetivo da escola nos dias de hoje, não

somente o cuidar, e a música também faz parte deste universo educacional.

A música parece ser própria do ser humano, pois há evidências de

instrumentos musicais datados da Idade da Pedra, contudo, não é um privilégio do

ser humano, porque o canto dos pássaros não pode ser ignorado. Estudos feitos

com pássaros mostraram que a sua sensibilidade, a sua performance musical, está

localizada na parte esquerda do seu sistema nervoso. Esses estudos levaram a

investigações também no ser humano, comprovando-se que a sensibilidade musical

está localizada no hemisfério direito da maioria dos indivíduos normais destros. Isso

significa que a música pode ser dissociada da competência lingüística, por exemplo,

que se situa no hemisfério esquerdo, atestando, desse modo, a independência da

competência musical.

[...] a música é uma competência intelectual separada, que também não depende de objetos físicos no mundo...a destreza musical pode ser elaborada até um grau considerável simplesmente através da exploração e do aproveitamento do canal oral-auditivo. (GARDNER, 1994b, p.95).

Embora Gardner afirme isso, também argumenta que não se quer dizer

que outras inteligências, como a interpessoal, a corporal-cinestésica, a espacial, não

tenham vínculo ou não estejam ligadas com a inteligência musical, pois, na

execução de uma música num instrumento, a inteligência corporal-cinestésica está

presente na interpretação, bem como na relação do maestro com sua orquestra, ou

seja, a inteligência interpessoal.

A emoção também faz parte da vida de cada um, bem como das crianças

em idade pré-escolar, como Goleman (1996, p.276) afirma: “O aprendizado não

pode ocorrer de forma isolada dos sentimentos das crianças. Ser emocionalmente

alfabetizado é tão importante na aprendizagem quanto a matemática e a leitura”.

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A ligação com a música é íntima da criança, bem como no decorrer do

seu crescimento. Walter Howard (1984, p. 66-67) afirma que a sensibilidade musical

deve ser despertada. E acrescenta:

Até hoje a educação da atenção tem sido completamente negligenciada. Há unicamente a preocupação de evidenciar fatos isolados suscetíveis de “excitar” a atenção e, de resto, contenta-se com o débil pretexto de que a faculdade de apercepção sintética de um conjunto mais complexo de relações é uma questão de “dom”, não podendo ser despertada, nem desenvolvida ou influenciada.

Ouvimos, constantemente, que algumas pessoas têm o “dom” para

música; outras, não. Então para que insistir? É fato que a música é trabalhada na

educação infantil, mas qual seria a maneira mais apropriada para trabalhá-la nessa

faixa etária? Apenas fazendo reproduções de músicas existentes? Ouvindo,

imitando gestos feitos pela professora, ouvindo música como fundo musical e não

aprendendo a respeitar o silêncio? Nesse sentido, Murray Schafer, professor e

compositor canadense, ressalta a importância da limpeza de ouvidos, ou seja,

aprender a ouvir os sons do ambiente, da rua (sons de fora) e os sons do próprio

corpo (sons de dentro). Os olhos, se quisermos, podemos fechá-los, mas os ouvidos

não (SCHAFER, 1991, p.67). Enfatiza, assim, a importância do silêncio, pois na

música ele é presente e importante, mas precisa ser entendido como tal.

Esse silêncio existe na música em suas pausas, no ouvir, na sucessão

dos instrumentos de uma orquestra, por exemplo. O silêncio total, no entanto, não

existe para quem tem memória auditiva, pois, por mais que tudo esteja quieto, algum

som sempre poderá ser ouvido, ainda que seja o da respiração. O silêncio total se

dá para quem não tem memória auditiva, com o que o silêncio é um poço sem cores,

um buraco profundo, como acontece com os deficientes auditivos (FUX,1988).

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Assim, o aprender a ouvir é importante; não ouvir só o habitual, mas

aprender a ouvir os sons de fundo, aqueles que geralmente não se percebem se a

atenção não for específica para eles, como por exemplo, os ruídos de cadeiras

sendo arrastadas ou de pigarros na apresentação de uma orquestra. (SCHAFFER,

1991). Em sala de aula, o silêncio muitas vezes é ensinado como sinônimo de ficar

sem falar para ouvir o professor, ou seja, não é silêncio pelo silêncio, não é prestar

atenção em sons não habituais, mas sim com o propósito de ouvir uma voz, a do

professor. Como, então, seria possível trabalhar o silêncio com os alunos da

educação infantil? Muitos seriam os caminhos, não há receita, mas aguçar a

curiosidade é uma das alternativas que pode gerar mais resultados satisfatórios, pois

o ser humano, principalmente a criança, é curioso por natureza.

A própria música tem sido usada nas escolas de educação infantil, muitas

vezes como simples cantar, o que também é importante, mas não tem sido

explorada para desenvolver as potencialidades musicais das crianças, para auxiliar

no desenvolvimento da sua inteligência musical. Provavelmente isso aconteça por

falta de preparo dos professores, que, em nossa região, não possuem grade

curricular na academia que lhes proporcione um preparo para trabalhar a música

com as crianças. E talvez, também, por se sentirem desvalorizados no que se refere

ao seu próprio desenvolvimento musical. Muitos não se dão conta de que todos

possuem experiências musicais, que, buscadas na infância, podem conter cantigas

de roda, músicas cantadas pelos pais, avós, tios e assim por diante. Outras também

podem ser buscadas na adolescência, como as músicas que lembram algum fato

específico, algum momento memorável da vida, entre tantas outras experiências que

as pessoas têm e que podem utilizar em sua vida profissional.

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Essa falta de consciência de que as experiências musicais não são

apenas aquelas em que se toca um instrumento ou se ouve música erudita, mas,

sim, tudo aquilo que envolve a música em si, qualquer música marcante que o

indivíduo ouve ou ouviu, e de como fazer dessa experiência pessoal uma

experiência profissional, talvez leve a que as pessoas se travem no que se refere à

música, pensem não ter experiências musicais, não ter “talento” para isso e

simplesmente deixem-na de lado.

Na caminhada da vida adulta, chega um determinado momento em que paramos para refletir, repensar nossa postura, nossos valores e, muitas vezes, corajosamente, abrimos nosso baú de sonhos e desejos não realizados. Sempre é tempo de realizá-los. (ORMEZZANO; TORRES, 2002, p. 153).

O aprendizado é um constante buscar que nunca finda, e as experiências

de cada indivíduo são únicas, cada um possui a sua. Isso se pode aplicar também à

música: cada um possui suas experiências, cuja valorização pode ser fundamental

para que haja crescimento e busca de novas experiências, que se tornem

agradáveis. Como disse Victor Hugo: “O que não podemos dizer ou não podemos

calar, a música exprime.” (SNYDERS, 1992, p. 98).

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CAPÍTULO II

2 OS MOVIMENTOS DA SINFONIA

Esta pesquisa procurou valorizar a experiência de cada ser humano

pesquisado, de cada professor, em suas vivências pessoais e profissionais.

Considerando que cada ser é único, não existindo experiências, nem vivências

iguais. Conforme salienta Sherman, citado por Bertrand e Valois (1994, p.133),

a vida é uma permuta com o ambiente; ela é dinâmica; é crescimento, transcendência e criação; vive-se no presente, é global e comporta múltiplos níveis de percepção; é multi-sensorial, naturalmente alegre, e deve respeitar o seu ritmo natural.

A vida é uma experiência única de cada indivíduo, pois ninguém pode

viver a vida de outrem, senão a sua própria. Muitas vezes não nos damos conta

desse fato e também de que nossas experiências pessoais são ricas de informações

que podemos buscar até mesmo na infância. Isso não quer dizer que tenhamos uma

vida isolada dos outros indivíduos e de tudo a que temos acesso; pelo contrário,

embora sejamos diferentes, somos também ligados.

A realidade pessoal está fortemente influenciada pela infância; está simultaneamente diferenciada e ligada à dos outros; baseia-se na sensibilidade interpessoal e no processo de comunicação; exige autenticidade como condição para as relações com os outros. (BERTRAND; VALOIS, 1994, p. 134).

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Portanto, o indivíduo, apesar de ser único, está ligado com os outros e

com o mundo através das relações interpessoais. O estudo dos fatos como eles são,

das experiências de cada um, do fenômeno, da busca da essência, chama-se

“fenomenologia.”

A fenomenologia é o estudo das essências, e de todos os problemas, segundo ela, tornam a definir essências: a essência da percepção, a essência da consciência, por exemplo. Mas também a fenomenologia é uma filosofia que substitui as essências na existência e não pensa que se possa compreender o homem e o mundo de outra forma senão a partir de sua “facticidade.” (TRIVIÑOS, 1992, p. 43).

Os fatos devem ser estudados como se apresentam na sua essência, não

superficialmente; é preciso buscar o seu âmago, a sua descrição e compreensão, e

não a explicação, ou análise do fato, pois este não é o objetivo; não analisar, mas,

sim, descrever e compreender. As experiências de cada professor, o modo como elas

se apresentam, cada vivência, cada momento, terão sua descrição e compreensão,

sem pretensão alguma de analisar e encontrar explicações para cada uma delas.

A fenomenologia surgiu com Edmund Husserl (1859-1938), como

resultado de sua crítica ao cientificismo, pois, para ele, “o ser humano tem sua

identidade assegurada por ser racional, ao invés de a racionalidade ser vista como

um modo de ser do humano.” (MASINI, 1989, p.61). Também se opõe ao

psicologismo, preponderante na época, em que a filosofia ficava em segundo plano,

reduzida a uma psicologia científica vinculada ao positivismo.

Husserl, como Hegel, Brentano e outros, trabalhou a idéia da

fenomenologia ligada à intencionalidade. A vivência é intencional, e o conhecimento

precisa ser atraído pela intencionalidade. Quando o homem pensa numa palavra

como “banco”, em sua consciência há um banco, não importando se no mundo

externo esse objeto existe ou não. “A consciência é sempre ‘consciência de alguma

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coisa’, que ela só é consciência estando dirigida a um objeto (sentido de intentio).”

(DARTIGUES, 1992, p. 18). Para Platão, existia um mundo “inteligível”, um “mundo

das idéias”, inacessível ao homem, ao passo que, para Husserl, o mundo está na

mente do homem, como fenômeno mental.

Os positivistas reificaram o conhecimento, transformaram-no num mundo objetivo, de “coisas”. A fenomenologia, com sua ênfase no ator, na experiência pura do sujeito, realizou a desreificação do conhecimento, mas a nível da consciência, em forma subjetiva. (TRIVIÑOS, 1992, p. 47).

Essa subjetividade refere-se às experiências, à não-objetividade do

cientificismo; refere-se à experiência como ela é, sem querer justificá-la,

encontrando causas e efeitos, mas valorizando a posição do sujeito como

“construtor” da realidade.

Ter a experiência de uma estrutura não é recebê-la em si passivamente: é vivê-la, retomá-la, assumi-la, reencontrar seu sentido imanente. Portanto, uma experiência nunca pode ser correlacionada a certas condições de fato como a sua causa e, se produz a consciência de distância para tal valor da convergência e para tal grandeza da imagem retiniana, ela só pode depender desses fatores o tanto quanto eles figuram nela.(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 348).

Se levarmos essa idéia para o âmbito educacional, o sujeito é construtor

do seu conhecimento, porém aí entramos também na área psicológica, e Husserl

quis deixar claro que a fenomenologia, no seu âmbito de consciência, não abrange

questões psicológicas desse assunto, mas enfoca o método fenomenológico como

descrição dos fatos, na busca da essência.

Através de um fato é sempre visado um sentido. Husserl gosta de evocar a esse respeito o exemplo da “IX Sinfonia”. Esta pode se traduzir pelas impressões que experimento ao escutar este ou aquele concerto, pela escritura desta ou daquela partitura, pela atividade do regente de orquestra ou dos músicos, etc. Em cada caso poderei dizer que se trata da ”‘IX Sinfonia” e, contudo, esta não se reduza a nenhum desses casos, se bem que ela possa a cada vez se dar neles inteiramente. A essência da “IX Sinfonia” persistiria mesmo se as partituras, orquestras e ouvintes viessem a desaparecer para sempre. Ela persistiria não como uma realidade, como um fato, mas como uma pura possibilidade. (DARTIGUES, 1992, p.15).

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Outro exemplo seria a de alguém que vê as folhas de uma árvore serem

agitadas pelo vento, experiência que é toda ela um fenômeno interior, que se passa

essencialmente dentro da consciência. Os objetos exteriores são apenas condições

para que se crie a percepção e a vivência desse fenômeno interior. A fenomenologia

se prende, por meio da atitude reflexiva, a esses fenômenos ou estados da consciência

e prescinde da realidade exterior das coisas, ou, como diz Husserl, coloca-se entre

parênteses. Porém não o faz como a psicologia, ou o psicologismo, pois neste

[...] o investigador esforça-se para suspender, ou colocar entre parêntesis, preconceitos e pré-suposições pessoais antes de fazê-los explícitos. Enquanto este processo de colocar entre parênteses (chamado de redução fenomenológica) continua, o investigador torna-se cada vez mais ciente de suposições mais adicionais imóveis e pode-se assim mover-se completamente de uma atitude natural para transcendental. Obviamente, o processo de parênteses nunca termina e assim uma redução completa é impossível. Enquanto a redução fenomenológica não pretende negar absolutamente a existência do mundo natural, esta (fenomenologia psicológica) esforça-se por suspender temporariamente a opinião científica natural que o mundo é independente de cada indivíduo. (STONES, 1986, p. 117).1

Com Husserl, a filosofia retorna ao ser, à ontologia: ser no mundo é estar

no mundo, e não simplesmente estar ligado a ele; é estar voltado para a

consciência, não para o objeto. Portanto, a fenomenologia procura reduzir o

fenômeno à essência, mas não esquece que o pesquisador faz e é a consciência

daquilo que pesquisa.

A característica de reduzir o fenômeno a sua essência chama-se “redução

fenomenológica”, ou epoche, como chamou Husserl, isto é, o ato de liberar a atenção do

exterior para que se detenha na análise da vivência ou experiência pura, o método pelo

qual tudo que é dado é mudado num fenômeno que se dá e é conhecido na e pela

consciência, ou seja, o fenômeno é reduzido para que a consciência fique livre dos

seus próprios conceitos e o fenômeno possa emergir como essência.

1 Tradução da pesquisadora.

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O mundo não é em primeiro lugar e em si mesmo o que explicam as filosofias especulativas ou as ciências da natureza, já que essas explicações são posteriores à abertura do campo primordial, mas sim que ele é em primeiro lugar o que aparece à consciência e a ela se dá na evidência irrecusável de sua vivência. O mundo não é assim nada mais que o que ele é para a consciência: O mundo, na atitude fenomenológica, não é uma existência, mas um simples fenômeno. (DARTIGUES, 1992, p. 21).

O fazer ciência, para a fenomenologia, não é ser neutro, como para o

positivismo, mas procurar reduzir o fenômeno para que ele apareça e seja descrito e

compreendido na sua essência, sem influências, como ele é; não na tentativa de

explicar fatos, suas causas e efeitos, mas de descrever e compreender sem deixar

que essa descrição seja passiva, mas compreendida.

O ideal da fenomenologia não é só a explicação ingênua do fato, mas a

explicação do sentido, que é o verdadeiro modo filosófico do conhecimento. A

pesquisa do sentido dos objetos já não é mais uma pesquisa sobre os próprios

objetos, mas dos atos de pensamento no momento em que o indivíduo os pensa. A

percepção é uma percepção de algo que é percebido, não existe por si própria,

assim como todo o desejo é desejo de algo que é desejado; isso implica que a

significação se constitua como a chave dessa noção. Expressar não é apenas

simbolizar. Isso não quer dizer que o pensado e o pensamento somente tenham uma

relação, mas são aquilo que são. Essa maneira pela qual o pensamento contém em

si, idealmente, outra coisa além de si próprio constitui a intencionalidade. Se essa

intencionalidade tem base no surgir, ou emergir da evidência, a evidência é algo que

aparece como dado ao espírito e, ao mesmo tempo, é origem daquilo que recebe.

O fenômeno surge, aparece, e o pesquisador tem a tarefa de proporcionar

que isso aconteça e deixar acontecer, descrevendo-o e compreendendo-o, tendo

claro que não se trata de explicar ou analisar, mas de descrever compreensivamente,

para que a ação também não seja passivamente descritiva. Para tanto, como uma

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forma de nortear o trabalho, tendo em vista que as entrevistas foram abertas, sem

questões dirigidas, formulamos algumas questões que nortearam este trabalho:

Quais experiências musicais as professoras tiveram durante suas

vidas?

A música exerce alguma influência sobre a vida das professoras?

Qual?

Qual é a importância da música na sala de aula, par a que e como ela

é utilizada?

Como as professoras desenvolvem a música com seus a lunos?

A música é utilizada apenas como instrumento auxili ar para outra

atividade ou tem relevância por si só no cotidiano da sala de aula?

Como numa sinfonia musical, cada movimento tem sua importância. Na

composição, cada movimento tem seu momento para ser composto, mas é no

conjunto que a música terá sentido e beleza. Cada movimento não desvirtua o tema,

que é sempre o mesmo, mas com formas diferentes, seja no allegro, no adágio, no

scherzo, ou no presto.

Assim, este trabalho foi como a composição de uma sinfonia, com seus

movimentos sempre em volta do tema.

2.1 ALLEGRO

O allegro, primeiro movimento, foi a revisão bibliográfica, que

fundamentou o tema e deu consistência aos demais movimentos. No entanto, a

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fenomenologia requer que nos livremos dos pré-conceitos e pré-concepções para

que o fenômeno possa aflorar. Essa é uma tarefa constante, a redução

fenomenológica, mas necessária para que o fenômeno surja.

Na tentativa de deixar o fenômeno aflorar, a fenomenologia argumenta

que a teoria da pesquisa deve andar simultaneamente com a pesquisa de campo, o

que foi feito no decorrer do processo desta composição, pois “fazer pesquisa

fenomenológica consiste em delinear o caminho durante a caminhada, em saber

conviver com a insegurança de uma pesquisa aberta para modificações no próprio

curso de sua realização”. (MORAES, 1993, p. 21).

2.2 ADÁGIO: RELATO DA OFICINA

O adagio, segundo movimento, foi um encontro com os professores da

educação infantil do município de Joaçaba das três redes de ensino municipal,

estadual e particular em forma de oficina, com a duração de quatro horas. Foram

convidadas todas as escolas que oferecem as séries de pré-escolar (quatro a seis

anos) das redes estadual e particular para que os professores participassem do

encontro. As escolas da rede municipal de ensino foram convocadas pela própria

prefeitura do município de Joaçaba. Nesse encontro, trabalhamos com a

sensibilidade musical do professor, com as recordações musicais de sua infância e

com as experiências em torno do ouvir, contextualizar e fazer.

Nosso objetivo era preparar atividades que, primeiro, integrassem o

grupo, e após fornecessem uma pequena base teórica sobre a importância da

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música na vida das crianças, incluindo a escola. Também busquei enfatizar a

experiência musical de cada um, pelo relato de fatos musicais que tinham vivenciado

na infância, e, por fim, o fazer musical, com a criação de histórias a partir de

desenhos sonorizados graficamente e, após, com os instrumentos da bandinha

rítmica, teclado, violão e flauta. Na preparação das fichas usadas pelos professores,

como está descrito no decorrer deste relato, selecionei figuras, de livros e revistas,

que proporcionassem uma sonorização, a qual foi expressa em forma gráfica nas

próprias fichas durante a atividade; só depois é que as histórias foram criadas e os

sons foram produzidos com os instrumentos.

Além disso, privilegiei a integração da música erudita no ouvir, o

internalizar e identificar a música, bem como interpretá-la e, em alguns momentos,

expressar-se com o corpo, segundo o sentimento que ela trazia, fosse pela harmonia

das notas, pela intensidade dos fortes e pianos, fosse pelo seu andamento. Esses

foram os objetivos que tive ao preparar esta oficina, realizada no dia 29 de maio de

2003, das 8h às 11h e 15min, contando com 38 professores presentes.

No primeiro momento da oficina, fiz minha apresentação pessoal,

relatando minha formação e algumas experiências musicais vividas na infância,

como está descrito nas primeiras páginas deste trabalho. Em seguida fizemos uma

dinâmica de apresentação, em que cada um escreveu seu nome e a escola em que

trabalha num papel, colocando-o dentro de um balão, enchido em seguida. Todos

colocaram-se em posição confortável, com espaço dos lados, e passaram a se

movimentarem ao som da “Sonata em dó menor” (Patética), de Beethoven; em

seguida, os movimentos foram ritmados pelo primeiro movimento da “5ª Sinfonia”,

também de Beethoven. Ao terminar a música, solicitei que alguns expusessem como

haviam se sentido com relação às duas músicas. As respostas giraram em torno de

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que, na primeira, o sentimento fora de paz, de harmonia e de tranqüilidade e, na

segunda, houvera um sentimento de agitação. Nesse primeiro momento, em que os

movimentos foram feitos de olhos fechados, notou-se uma certa timidez por parte de

alguns, talvez por medo de crítica, de se sentirem ridicularizados.

Os balões foram jogados ao chão e em seguida, cada um pegou um

balão qualquer, estourando-o e apanhando o papel nele contido. Lido o nome do

papel, a pessoa referida se apresentava e dizia a série em que trabalhava. Essa

atividade foi prazerosa, pois houve uma integração do grupo e a maioria sentiu-se à

vontade para continuar a oficina.

A fundamentação teórica tem uma importância fundamental em qualquer

área, pois é a base de tudo e não se pode fazer qualquer coisa sem ter uma base

teórica, ou do contrário o trabalho ficará jogado ao vento, sem alicerces. Por esse

motivo, apresentei aos professores com os quais estava trabalhando alguns

aspectos teóricos das concepções de Gardner (1994a, 1994b, 1995), Mársico

(1982), e Schafer (1991), embora não pretendesse ser aprofundada em razão do

limite do tempo, pois este não nos permitia delongas. Tópicos foram refletidos na

parede através do retro projetor, e à medida em que iam aparecendo, eu ia

discorrendo sobre o assunto como segue o relato abaixo.

Sobre Gardner, enfocamos sua teoria das inteligências múltiplas, em que

a música é referenciada como a primeira inteligência a aflorar: “De todos os talentos

com que os indivíduos podem ser dotados, nenhum surge mais cedo do que o

talento musical.” (GARDNER, 1994b, p.78). Argumentei, baseada nesse autor, que a

música não é só tom, ritmo, timbre, não se trata apenas de compassos ritmados e

melodias, é muito mais do que isso. Não se pode ocultar a história que cada música

traz, seja erudita ou popular. A emoção também não pode ser excluída, devendo-se

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levar em conta o estado de espírito do compositor e a situação histórica e emocional

que vivia na época da composição de suas obras.

Para Gardner (1994b) a música faz parte da vida da criança desde sua

mais tenra infância. Assim é que bebês de dois meses podem imitar a altura da voz

da mãe e o contorno melódico de músicas cantadas por elas; aos quatro meses,

podem se adequar ao ritmo das canções e, a partir de um ano de idade, começam a

produzir contornos melódicos parecidos com músicas que lhe são familiares.

Contudo, depois dos três ou quatro anos, as músicas da cultura vencem a produção,

com o que a criança deixa de produzir para cantar o que já está posto.

Para exemplificar essas afirmações, as professoras ouviram um relato lido

por mim, que descreve o comportamento do menino Boria, feita por Teplov (1966,

apud MARSICO, 1982, p. 31-32):

2 meses e 18 dias Durante os últimos 14 dias, observa-se que Boria reage violentamente aos sons musicais. Ouve esses sons com muita atenção. Parece sentir prazer ao ouvir sons tirados do piano mas chora quando se toca uma peça inteira. Ouve-me cantar e permanece imóvel enquanto eu canto.

4 meses e 18 dias A música e o canto excitam sua atenção. Ouve com interesse a canção que canto, mas continua a chorar quando toco uma peça ao piano. Chora também quando ouve sons agudos e penetrantes.

6 meses e 2 dias

Quando a babá canta, Boria põe-se muitas vezes a choramingar, como se quisesse ajudá-la a cantar.

1 ano Manifesta aptidões vocais e acompanha os outros, algumas vezes, com voz delicada e com a letra “a”. Canta também sozinho.

1 ano, 5 meses e 5 dias Até aqui batia no teclado do piano com os cinco dedos ao mesmo tempo; agora toca com um dedo somente.

1 ano e 9 meses Depois de alguns dias, canta uma canção que toca ao piano com a mãe. Canta destacando corretamente cada som.

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1 ano, nove meses e 5 dias Boria reconhece a mesma canção que toco ao piano e se põe a cantá-la, mas não no tom dado ao piano.

2 anos, 2 meses e 13 dias Boria tem provavelmente um ouvido musical apurado e é muito sensível aos sons musicais. Quando toco um acorde dissonante ao piano, olha-me com perplexidade. Se as dissonâncias são muito fortes, chora.

2 anos, 6 meses e 21 dias Canta as canções de ninar que são empregadas para fazê-lo dormir.

Quadro 1 – Relato de comportamento do menino Bória Fonte: A autora (2002)

Esse relato foi feito para que pudéssemos observar como as crianças

podem ser estimuladas e dar respostas positivas ao estímulo musical. Comentamos

também como perdemos oportunidades preciosas de auxiliar no desenvolvimento

musical das crianças, simplesmente por ignorar o fato de que a sensibilidade pode e

deve ser desenvolvida.

A música, no entanto, não se trata somente de sons; o silêncio também

faz parte da música, não só através das pausas apresentadas na notação musical,

mas do “saber ouvir”, que faz diferença na vida do ser humano. Como pode alguém

se entender se não sabe ouvir a si próprio? Podemos ouvir tudo ou nossos ouvidos

estão tão habituados aos sons cotidianos que nem prestamos atenção aos sons que

passam por eles? Murray Schafer (1991) fala sobre a importância do silêncio e que

devemos exercitar nossos ouvidos para os refocalizar e então perceber sons

diferentes daqueles a que estamos acostumados.

Na primeira infância, as crianças recebem os sons e conseguem devolvê-

los com o mesmo timbre e sonoridade. É a fase de recepção e devolução de sons

sem “sotaque”, ou seja, conseguem expressar a repetição de sons da mesma forma

que os ouviram, sem outras interferências, sem transformá-los. Portanto, elas

possuem uma sonoridade própria delas, e aos educadores cabe instigar o

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desenvolvimento dessa capacidade. “Musicalizar nada mais é do que despertar-lhe a

expressão espontânea e as potencialidades latentes”. (MÁRSICO, 1982, p. 39).

Na idade pré-escolar propriamente dita, a música faz parte do dia-a-dia

das crianças, mas o seu despertar para o desenvolvimento apurado da música

requer um pouco de esforço por parte da escola. Alguns aspectos podem ser

destacados nessa caminhada da musicalização infantil na idade dos três aos seis

anos, segundo Mársico (1982):

• as atividades devem ser diárias, com duração de 20 minutos;

• as canções são importantes no processo de musicalização porque

reúnem ritmo, melodia, forma, harmonia, tempo, dinâmica e,

principalmente, ação, pois as crianças, ao ouvirem as canções, logo se

põem a balançar e inventar gestos;

• a música deve ser diferenciada de instrumento musical. Não é só o tocar

instrumento que é música: o cantar, o cantarolar, o assobiar, o estalar

de dedos, entre outros, devem ser considerados também como música;

• o desenvolvimento do senso rítmico musical e a audição compreendem

os níveis sensorial e rítmico-melódico;

• a valorização do silêncio como forma até de criar o hábito de ouvir;

• a identificação dos sons: de onde vêm, quais suas direções. A

percepção musical está muito ligada ao desenvolvimento da percepção

também no que se refere à identificação de qual som se está ouvindo,

se é voz, instrumento, ruído etc.;

• movimentos sonoros (ascendente / descendente);

• atributos do som: altura, intensidade, duração, timbre.

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A história de cada um é construída a partir das experiências que se

iniciam no ventre materno e passam pela infância, pela adolescência, pela juventude

e pela fase adulta. Por isso solicitei ao grupo de trabalho, considerando que todos

têm experiências e vivências musicais, que cada um, ao som da mesma sonata em

dó menor ouvida anteriormente, lembrasse e escrevesse, num papel, algum fato de

sua infância ou adolescência relacionado com a música. Ao terminar essa parte da

atividade, perguntei aos participantes se conheciam a música ouvida, ou se já a

tinham ouvido. Uma professora disse que a conhecia, duas ou três disseram que

“achavam” já tê-la ouvido, mas não sabiam onde. Relatei, então, que a música fora a

mesma da dinâmica anterior, com o objetivo de identificar se houvera a percepção

musical durante a audição nas duas vezes. Então, grande foi o espanto deles ao

perceberem que não tinham reconhecido a música ouvida há poucos minutos.

Como afirma Schafer (1991), o ouvido deve ser pensante, não somente ouvinte; não

é o ouvir pelo ouvir, mas ouvir com percepção.

O ideal seria que todos pudessem ouvir um fato musical de cada

participante para que a troca de experiências fosse mais profunda e abrangente no

intuito de haver a percepção de que todos têm experiências musicais as quais são

bem diversificadas, conforme a vivência de cada um. Contudo, como o número de

pessoas era grande, foram divididos em seis grupos, da seguinte forma: cada um

recebeu um número, até seis, cada número correspondia a um animal (cachorro,

pinto, vaca, peru, gato e pato). Deslocamo-nos, então para outra sala, onde o

espaço era maior, e, ao meu sinal, todos fizeram os sons dos animais

correspondentes ao seu número. A tarefa era, então, encontrar os animais com o

mesmo som, identificando a sonoridade dos sons dos animais, o que também faz

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parte da música. Assim, formaram-se grupos, nos quais cada um pôde compartilhar

com os outros integrantes seu fato musical.

Em seguida solicitei que aqueles que não se importassem entregassem

os papéis que continham a experiência; alguns o fizeram e esses fatos aleatórios,

sem identificação dos autores, estão descritos a seguir:

“Lembrei-me de quando tinha 11 anos e colocava meu irmão (bebê) para

dormir. Eu cantava cantigas de ninar para ele”.

“Quando eu era criança (10 – 11 anos), adorava vir aqui na escola ouvir

música com a profª Terezinha Campagnholo, que tocava maravilhosamente o piano

que pertencia ao Grupo Escolar Roberto Trompowsky na época. Ela era professora

e nos intervalos tocava para as crianças que ficavam encantadas. Eu adorava e

sempre pedia para me ensinar“.

“Quando eu era pequeno eu gostava de subir nas árvores e cantava as

músicas que ouvia no rádio, ou cantos que aprendi com minha mãe“.

“Perto do dia de Natal, na igreja da vila onde eu morava, eles cantavam

“Noite feliz”, e eu também murmurava tentando cantar; depois parei e fiquei só

ouvindo e consegui ver através de minha imaginação: uma noite de lua cheia o céu

todo estrelado, em todos os lugares piscavam luzes, anjinhos flutuando e cantando e

as renas puxando o Papai Noel, passavam entre as nuvens e os anjinhos. Era tudo

tão lindo e real”.

“A vó me ensinou a dançar, eu escutava o pai tocar gaita de boca”.

“Minha mãe cantava muito enquanto trabalhava e eu brincava. Ela

contava histórias que tinham canções de repetição. No jardim de infância,

cantávamos bastante e em casa gostava de cantá-las também, andando de balanço.

Lembrei-me: do ritmo da máquina de lavar roupa, das fitas do carro do pai, concerto

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para juventude aos domingos de manhã, violão e piano (da minha prima), na casa

dela, durante as férias, hinos na igreja acompanhados do harmônio e da flauta

transversal, da escola dominical e os hinos de Natal.”

Embora muitas pessoas pensem que por não saberem tocar um

instrumento musical, não tiveram e não têm experiências musicais, pudemos

constatar que a música faz parte da vida de todos: para alguns, de modo mais

marcante; para outros, talvez, faltando apenas uma motivação para que as

lembranças musicais venham à tona.

A atividade seguinte teve como objetivo a sonorização das figuras através

de formas gráficas, a visualização dos sons através da grafia, a imitação dos sons

com o uso de instrumentos rítmicos, violão, flauta e teclado, relacionando um com o

outro e, a criatividade na invenção das histórias. Além da exploração dos

instrumentos musicais e rítmicos e, a demonstração de exemplos de atividades que

podem ser feitos com as crianças.

Então, nos mesmos grupos, oito fichas com figuras (telefone, crianças,

carros, bicicletas, motos etc.) foram distribuídas para cada grupo. Dessas fichas,

cada grupo deveria escolher quatro ou cinco, discutir qual som a figura poderia

simbolizar e representar graficamente tal som, ou sons, na própria ficha. Depois dos

sons estarem representados, os grupos montaram uma história utilizando as fichas

escolhidas com os sons. Montada a história, os participantes tiveram a oportunidade

de explorar alguns sons da bandinha rítmica, da flauta doce soprano, da flauta doce

contralto, do violão e dos vários sons que o teclado pode fazer. Dos sons explorados

puderam escolher os mais semelhantes aos sons de sua história e usá-los na

apresentação ao grande grupo.

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Quando vemos crianças se deparando com novidades, percebemos quão

curiosas elas são e que não tem medo da exploração do novo. Ao me deparar com

adultos, a impressão que tive foi de medo perante a novidade, perante o teclado,

como se fosse algo tão frágil que não poderia ser tocado. Todavia com algumas

palavras de motivação, de encorajamento, aos poucos o “gelo” foi sendo quebrado e

a apresentação foi muito agradável.

As histórias ficaram assim:

FIGURAS: SONS:

Burro Io, io ,io, plof, plof, plof

Molho de chaves Blim, blim, clac clac...

Cachorro Au, au ploc,plo, rhrr...

Vaca Muuuuu, schilapt, chilapt, tchi, tchi...

2 Meninos jogando bola Eh! Eh! Eh! Bum, bum, poc,poc... Quadro 2 – Sons definidos pelo grupo 1 Fonte: A autora (2002)

Um dia de Sol

Os meninos foram jogar bola (som com o teclado), fecharam a casa com

as chaves. O cachorro ouviu o barulho e latiu.

A vaca curiosa veio ver o que era, e viu o burro chegando com o pão.

Fotografia 1 – Apresentação do grupo 1 Fonte: A autora (2002)

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FIGURAS: SONS:

Relógio Triiimm, tic-tac.

Flauta Tu –tu, flu, flu, fu,fu

Moto Rruummm, hrummmm...

Coração Tum, tum

Peixes Glub..glub...

Menina com olhar de admiração e anel no

dedo

Ohh!Ohh! Ohh!

Quadro 3 – Sons definidos pelo grupo 2 Fonte: A autora (2002)

Música

(Este grupo resolveu fazer uma música usando os sons ao invés de uma

história.)

Melodia: Eu tive um sonho (George Israel/ Paula Toller)

Eu tive um sonho vou te contar um motoqueiro parou em meu andar. Era

preciso ter o coração forte para suportar.

O que ele veio fazer, me trazer um anel (Ohh! Ohh!)

E ele a flauta tocou, e os peixes assustou.

Não, não, não, não deixei o relógio tocar se não vou acordar e meu

sonho vai atrapalhar.

Fotografia 2 – Apresentação do grupo 2 Fonte: A autora (2002)

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FIGURAS: SONS:

Cachorro Au, au, au!

Urso Grrr...grrrrr...

Leões Grrrr, grrrr

Machado Poc, poc, poc...

Foguete Pum, pum, fich, pom, pim, pim, pum...

Lobo Auuu, auuu, auuuu....

Gelo Trac, trac

Telefone Trim, trim, trim-trim

Patins Gim, giiim

Ambulância Ió, ió, ió, ió...

Chuva Ploc, ploc, ploc...

Pianista Plim, plom, dim, dom Quadro 4 – Sons definidos pelo grupo 3 Fonte: A autora (2002)

Passeio ao Zoológico

Eu estava tocando piano , e ouvindo a chuva cair lá fora. E meu cachorro

começou a latir por causa de uma ambulância que passou pela rua.

Neste momento tocou o telefone, era meu amigo convidando para ir ver a

inauguração do zoológico. Como havia parado de chover, peguei meu roller, e fui

deslizando pela calçada.

Quase caí ao escorregar na calçada, pois estava lisa como gelo.

Quando cheguei, ainda havia alguns homens montando as barracas, só

ouvia o barulho do machado nas tábuas.

Alguns instantes depois, começou a estourar foguetes. Entramos e

começamos a visitar as jaulas. Primeiro a do leão e sua companheira a leoa , eles

faziam muito barulho.

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Depois fomos ver o urso, mas quando começou a grunhir o meu amigo

ficou com medo. Então fomos para casa assistir ao filme dos três porquinhos e o

Lobo Mau .

Fotografia 3 – Apresentação do grupo 3 Fonte: A autora (2002)

FIGURAS: SONS:

Telefone Trim-trim-trim...

Meninos assistindo partida de futebol Gooooool, goooool, e-e-viva....

Jipe Brum-brum-vrum-vrum...

Navio Piuiii-piuiii-piuiiii, chuá- chuá- chuá... Quadro 5 – Sons definidos pelo grupo 4 Fonte: A autora (2002)

Tarde Divertida

Toca o telefone, trim-trim-trim, mamãe atende, são os meninos avisando

que estão no jogo de futebol e que seu time fez um gol, gooool, gooool, que

alegria o time dos meninos venceu.

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Para comemorar eles participaram da carreata com o jipe do pai de

Pedro, vrum- vrum- brum- brum.

Mais tarde, chegando em casa, combinaram de brincar no rio, ao lado da

casa de Pedro, com o navio que ele tinha ganho no Natal, piuii- piuii- piuii- piuiii-

chuá- chuá.

Fotografia 4 – Apresentação do grupo 4 Fonte: A autora (2002)

FIGURAS: SONS:

Pintinhos Piu! Piu! Ploc!Ploc!

Índios Uh! Ugh! Uh! Uuuuuuuuu!!!

Leão Grrrrrr!

Cachorro Mmmmmm!

Cidade Brum – brum! Bang- Bang, piiiii...ai,ai,ai!

Miau! Au-au! Tac-tac, blá-blá-blá, lá-lá-

lá, chuuuuuuu... Uí-u

Moto Brrrrrr! Immm...immm

Bicicleta Tac, tac, tac, tac!

Menino tropeçando em uma pedra Ploccc, ui!ii Tum!

Violão Dom- dom! Blim – blim! Bram Quadro 6 – Sons definidos pelo grupo 5 Fonte: A autora (2002)

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Uma aventura na cidade

Certa vez, um grupo de índios foi a uma visita à cidade . Na despedida,

realizaram um ritual de boa sorte: Ug! Uh!

Os animais ficaram tristes. O Leão grrrr e o cachorro chorou mmmm.

Chegando lá, ficaram apavorados com a imensa barulheira , com a qual não

estavam acostumados, pois eram sons estranhos.

Por falta de sorte, ou atenção, sem conhecer sinais de trânsito, se

assustaram com o barulho da moto e um deles foi atropelado por uma bicicleta: ui,

ui – tum. No pronto-socorro, um voluntário estava tocando violão para alegrar os

doentes, o que lhes chamou a atenção, ficando assim, mais calmos.

Depois de dias na cidade, voltaram para a aldeia e reencontraram seus

animais. Os passarinhos vieram encontrá-los muito alegres. Falaram à tribo, que tão

cedo não voltariam para a cidade , pois o som da aldeia era mais agradável.

Fotografia 5 – Apresentação do grupo 5 Fonte: A autora (2002)

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FIGURAS: SONS:

Sapatos Tekk... packk...

Piano Dó, ré, mi, fá, sol, lá, si.

Bailarina Tic, tac.. tic, tac, passa as horas

Jogador de futebol cansado Ufa..., uufaá..., haaá..., haaá..., uuufa

Cidade Biiiiiiii..., biiiii....., bibi..., fom fom..., brumm...

bi bi...

Carro Ramm...bibi..., urruuu..., bibiii..., bibi....,

rammm...,urruuu... Quadro 7 – Sons definidos pelo grupo 6 Fonte: A autora (2002)

O Sufoco

Em sua casa a pequena Larissa ensaiava para uma apresentação de

balé em homenagem ao Dia dos Pais, ao som do seu relógio.

Seu pai saiu nervoso e cansado por estar atrasado, pois o jogo de

futebol demorara mais do que o esperado.

Às pressas chamou um táxi, que chegou rapidamente. Mas o que não

esperava era encontrar um enorme engarrafamento .

Com muito esforço conseguiu chegar a tempo para a apresentação de

sua filha. Ao subir as escadas da escola, ouviu o som do piano e ficou tão feliz, que

nem percebeu que estava sem os seus sapatos novos.

Fotografia 6 – Apresentação do grupo 6 Fonte: A autora (2002)

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Os olhares de satisfação pelo trabalho realizado e pelos sons

conseguidos dentro da história puderam ser vistos nas expressões de cada um.

Então, como última atividade, ouvimos o primeiro movimento da sonata “Claire de

Lune”, ou “Sonata ao Luar”, de Ludwig van Beethoven, tentando buscar na música a

mensagem nos transmitir.

Ouvida a música, falei que quem quisesse se manifestar poderia dar a

sua interpretação para a música, o que sentira, o que achava que o compositor

estava querendo transmitir com a música. Sintetizando respostas, as interpretações

foram as seguintes: “tristeza, melancolia, paixão, morte, amor.” Realmente

Beethoven, ao compor essa sonata, estava apaixonado pela condessa Giulietta

Guicciardi. Envolvera-se com a moça em 1801, mas o pai dela fora extremamente

contra o namoro. Beethoven quis se casar com ela, mas não teve o consentimento,

por causa da sua condição social inferior. Em carta a seu amigo Wegeler, de 16 de

novembro de 1801, ele escreveu:

Essa mudança foi provocada por uma jovem encantadora e muito querida, que me ama e a quem amo. Depois de dois anos, volto a desfrutar de alguns momentos felizes; e pela primeira vez sinto que – o casamento poderia me trazer a felicidade. Infelizmente, ela não é da minha classe – e no momento – eu certamente não poderia me casar – ainda preciso dar muito duro. (ORGA, 1992, p. 121).

Mais tarde, Giulietta se casaria com outro homem, agora de sua classe

social. Um dia quando ela e o marido estiveram em Viena, cidade em que Beethoven

morava, ele disse a seu amigo Schindler: “Ela me amou muito mais do que ao marido.

No entanto, ele foi seu amante muito mais do que eu.” (ORGA, 1992, p. 122).

Para haver uma contextualização da música, é necessário conhecer um

pouco da história do compositor, do que se passou na sua vida durante os períodos

de composição, não só a título de conhecimento, mas para entender o seu estilo

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musical. Para tanto, contei-lhes uma história resumida de Beethoven utilizando um

álbum confeccionado por mim, com pinturas feitas sobre ele, de lugares que

marcaram sua vida e de pessoas que foram coadjuvantes de sua trajetória pessoal e

musical, coladas em folhas de cartolina e encadernadas, tudo com base no livro

bibliográfico de Beethoven de Attes Orga (1992). A história foi sendo contada por

mim enquanto as figuras eram mostradas:

Uma parte dos ancestrais de Beethoven era camponesa, outra parte era comerciante. O bisavô de Beethoven, Michael van Beethoven, trabalhou como padeiro chefe e comerciante de rendas, mas foi à falência e fugiu para Bonn (Alemanha), em 1741. Um de seus filhos, chamado Ludwig, tornou-se músico da Corte Imperial, bem como seu filho Johann, mais tarde. Johann casou-se com Maria Magdalena. Ludwig van Beethoven foi o primeiro filho do casal a sobreviver. O casal teve sete filhos dos quais somente três sobreviveram: Ludwig, Caspar Anton Carl e Nikolaus Johann. A mortalidade infantil, na época, era muito grande por causa da falta de higiene das cidades. Beethoven desde muito cedo se interessou por música. Tinha aulas diárias de teclado (piano) e violino. Queria tocar de ouvido sem notas, mas seu pai o obrigava a ler notas. Em 26 de março de 1778, fez sua primeira apresentação pública, aos sete anos e três meses, mas seu pai dizia que ele tinha seis anos. Sua primeira obra a ser impressa foi “Variações para Fortepiano” sobre uma Marcha de Dressler, aos doze anos de idade. Aos 15 anos de idade, começou a dar aulas de música. Em 2 de novembro de 1792, Beethoven foi para Viena e nunca mais retornou a Bonn. Foi uma fuga apressada por causa da guerra contra a França. Foi estudar com Haydn, um compositor que também se tornou famoso pelas suas composições e sua atuação musical. No salão do Augarten, Beethoven fez muitas apresentações, como também Mozart. Beethoven também se apresentava no Teatro de Viena, teatro da Corte Imperial. Beethoven viveu uma vida de muita solidão, em seu quarto, com seu piano, compôs muitas músicas, sonatas, sinfonias, variações, entre outras. Ele se apaixonou algumas vezes, mas não foi correspondido. Dizem que sua aparência não era das melhores, sendo seu rosto cheio de berrugas.

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Beethoven compunha músicas e era o regente da orquestra da cidade de Viena, coisa que ele gostava de fazer. Quando seu irmão Caspar Carl morreu, Beethoven ficou incumbido de ajudar na educação do sobrinho Karl. Mas Beethoven e a mãe de Karl não se entendiam, o que os fez brigar na justiça pela guarda do menino. Karl foi morar com o tio, mas seu caráter não era dos melhores o que o fez fugir e voltar para sua mãe; Beethoven, então, desistiu de lutar por ele. No final de sua vida, estava muito doente e acabou ficando completamente surdo, tanto que um dia estava regendo a orquestra e os músicos pararam de tocar porque eles tocavam uma coisa e Beethoven regia outra. Beethoven morreu no dia 26 de março de 1827, aos 57 anos, de edema pulmonar.

A história de cada um, mesmo que não venha a ser conhecida por grande

número de pessoas é importante, pois é singular; cada indivíduo é único, assim

como Beethoven também foi único e tornou-se parte da vida da humanidade. Como

esta pesquisa versa sobre as experiências e vivências musicais, individuais de cada

professora, considerei proveitoso contextualizar a vida desse maravilhoso compositor.

Ao final dos trabalhos, encerramos a oficina com uma avaliação oral. As

manifestações por parte dos participantes foram de satisfação e anseio de

continuidade, fato a ser levado em consideração tanto pela importância da música

na educação infantil, como pelo aprimoramento dos professores, que, na maioria das

vezes, se sentem despreparados e “bloqueados” com relação à música, o que pudemos

perceber durante o desenvolvimento das atividades. Portanto, a oficina foi encerrada não

com a sensação de fim, mas de um começo para uma continuidade próxima.

Nesse encontro, foram selecionados os participantes da pesquisa da

seguinte forma: durante a realização da oficina, foi passada uma lista de presença,

na qual havia um espaço para as pessoas marcarem quem estava disposto a auxiliar

no trabalho proposto por mim. Apresentaram-se então nove professoras integrantes

das três redes de ensino: particular, municipal e estadual.

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Para Husserl, a intencionalidade é algo “puramente descritivo, uma peculiaridade íntima de algumas vivências”. Desta maneira, a intencionalidade característica da vivência determinava que a vivência era consciência de algo[...] A importância do conceito de intencionalidade, para a fenomenologia, é fundamental, se pensa que a vivência e a consciência são idéias básicas desta filosofia. (TRIVIÑOS, 1992, p. 45).

A valorização da vivência das professoras não teve a intenção de explicar,

mas de descrever os dados, na busca da essência do fenômeno. No entanto, “o

método fenomenológico não se limita a uma descrição passiva. É simultaneamente

tarefa de interpretação (tarefa da Hermenêutica) que consiste em pôr a descoberto

os sentidos menos aparentes, o que o fenômeno tem de mais fundamental”.

(MASINI, 1989, p. 63).

2.3 SCHERZO

Seguindo essa linha, o scherzo, terceiro movimento, foi a realização de

entrevista fenomenológica, pois a sensibilidade e a música estão em íntimo contato

e devem aflorar na entrevista, não com a intenção de explicar fatos, mas de

compreender e descrever a realidade, como se apresenta. Para essa entrevista aberta, a

pergunta inicial foi a seguinte: “fazendo um retrospecto da sua vida com relação à

música, que significação você atribui a ela na sua vivência pessoal e profissional?”

Segundo Carvalho, a entrevista fenomenológica,

[...] não submete a situação observada e o cliente a uma análise conceitual, classificadora, orientada por um esquema de idéias e direcionada para determinados fins [...] é um “ver” que não é “pensamento de ver”, como observa Merleau-Ponty, mas efetivação de uma consciência de si, a do cliente. (1987, p.30).

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Na fenomenologia, o pesquisador não pode ser completamente separado

do fenômeno, porque ele faz parte do que está pesquisando, é envolvido pelo

fenômeno; o objetivo não é analisar o entrevistado, nem tentar encontrar causas e

efeitos ou explicar o fenômeno, mas compreendê-lo e descrevê-lo:

[...] compreender o pensamento do cliente é penetrar o seu mundo, sua presença e sua vida. E, para tanto, há que haver uma comunhão com quem fala, um ouvir olhando para o cliente, envolvendo-se com ele, sendo tomado pelo seu gesto lingüístico [...] não é ouvir por complacência ou misericórdia, não é ouvir mesmo por acaso ou coincidência mas é tornar-se sensibilidade e intuição. Igualmente, não se trata de permanecer passivo diante de um cliente que efetua uma “catarse”, deixando-o falar até que se “esvazie inteiramente”. (ibid, 1987, p. 40-41).

2.4 PRESTO FINALE: A OBRA-PRIMA

O movimento finale, um presto com expressão, é a tentativa de

compreensão das entrevistas no comparativo com o material teórico revisado. A

partitura tem agora sua estrutura na harmonização da obra-prima com os fatos

teóricos, a obra- prima realizada.

Para que isso fosse possível, de uma forma que o fenômeno aflorasse, foi

necessário seguir alguns passos do método fenomenológico. Segundo Ormezzano e

Torres (2002) quatro são os passos apontados:

• o primeiro foi a leitura do todo, a compreensão do todo, ou seja, a

leitura minuciosa das entrevistas transcritas várias vezes até que a

linguagem das entrevistadas se tornasse familiar, na busca da

compreensão do todo;

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• no segundo, aconteceu a redução fenomenológica, quando o

fenômeno pesquisado foi focado. Isso aconteceu com a releitura do

texto da entrevista, num exercício de percepção como numa música

com sinais de repetição, mas, por fim, o coda aparece e a música

pode seguir em frente;

• no terceiro a sensibilidade do pesquisador aflora, numa compreensão

da essência das entrevistadas, das suas experiências e vivências.

Para isso, foi necessário mergulhar em seu mundo, a fim de entender

a mensagem e transformar o fenômeno em linguagem psicoeducativa;

• no quarto aconteceu uma síntese da entrevista, quando a intuição da

pesquisadora fez com que a essência do fenômeno aparecesse; ao

mesmo tempo, nessa síntese a percepção fundiu-se com a das

entrevistadas, surgindo uma síntese nova, numa visão totalizadora,

como numa música para piano, em que a melodia da mão direita se

funde com a da mão esquerda, numa mistura de claves, mas para

quem ouve e aprecia a melodia musical aparece da mesma forma,

harmonicamente.

Surge então a obra-prima, o resultado da composição feita com dedicação

e parte da sinfonia.

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CAPÍTULO III

3 A OBRA-PRIMA – ESSÊNCIAS FENOMENOLÓGICAS DA PESQUI SA

Para identificar as participantes da entrevista, utilizei nomes de

instrumentos da orquestra escolhidos aleatoriamente.

Violino é uma professora de trinta e cinco anos, que trabalha na rede

privada e municipal de ensino. Gosta de ouvir música, mas não declarou um gosto

definido pelo estilo, apesar de dizer que gosta de músicas tranqüilas. Violino disse

que gostaria de ter aprendido a tocar um instrumento musical, como o acordeão ou o

violão, porém a situação financeira da família não o permitiu.

Flauta, de trinta e cinco anos, trabalha na rede privada de ensino e tem

uma caminhada significativa com a música, pois toca flauta e violão e canta músicas

eruditas. Gosta de ouvir música e detém-se mais nas clássicas, mas também gosta

de bossa nova. Atribui um significado muito grande à música em sua vida.

Piano, de quarenta e quatro anos, trabalha na rede privada de ensino,

gosta de ouvir música, tem muitas lembranças referentes à família com relação à

música; gostaria de tocar piano, e tentou colocar os filhos em aulas de piano e

flauta, mas eles não quiseram aprender a tocar.

Xilofone, de trinta e três anos, gosta de músicas populares que tenham alguma

letra significativa, com alguma mensagem; não teve muito contato com a música, mas se

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lembra de um colega de trabalho que era professor de música e a encantava com a

maneira como trabalhava. É professora da rede municipal de ensino, e utiliza a música

como parte do seu trabalho, mas de forma a complementar outra atividade.

Clarinete, com trinta e sete anos, é professora da rede estadual. A música

faz parte do seu dia-a-dia porque todos os dias a ouve para relaxar; se está triste

ouve uma música mais calma, e, se está feliz algo com ritmo mais rápido.

Viola, de trinta e cinco anos, gostaria muito de ter aprendido a tocar um instrumento

musical, mas não teve condições financeiras para isso. Então, tentou proporcionar esta

oportunidade aos filhos, mas eles, até o momento, não demonstraram interesse para tal.

Harpa, de vinte e quatro anos, é professora da rede municipal e ouve

música todos os dias quando volta da faculdade; gosta de músicas românticas, de

ritmo mais lento.

Romantismo é uma palavra tão abrangente que sempre é preciso explicar em que sentido está sendo empregada. Em todas as épocas pode-se identificar um impulso “romântico” do ser humano: é quando os sentimentos tomam o primeiro lugar, quando as emoções são fortes. (HORTA, 2000, p. 71).

A respeito, sabemos que o estilo musical pode dizer muito da pessoa;

assim pessoas românticas provavelmente gostarão de música de estilo romântico,

de andamento mais lento. O temperamento do indivíduo também influencia no estilo

de música que ele gosta. Minha professora de piano sempre me oferecia o mesmo

estilo de partituras musicais para eu escolher. Ela conhecia o estilo romântico e lento

de músicas que eu gostava e gosto até hoje. Meus alunos de piano e flauta, por sua

vez têm gostos específicos. Alguns não gostam de maneira alguma de tocar músicas

de ritmo lento, preferindo músicas mais alegres, mais ritmadas, com ritmo mais

marcado. Observando esse comportamento e refletindo sobre ele, pude perceber

que isso ocorre com todos, conforme o estilo e o temperamento de cada um.

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Fagote, de trinta e sete anos, tem muito orgulho por seus filhos estarem

aprendendo a tocar um instrumento musical; a menina toca violino e o menino,

teclado. Sua realização é ver os filhos tocando, pois ela gostaria muito de ter

aprendido, mas seus pais não tinham condições financeiras para isso. Ela é

professora da rede estadual de ensino.

Saxofone, com trinta e nove anos, é uma professora da rede privada de

ensino, estudou piano durante cinco anos na sua adolescência; disse que gostaria

muito de voltar a ter aulas para praticar novamente. A música faz parte da sua vida,

ela gosta de ouvir música sempre. Na sua infância o rádio ficava ligado durante todo

o dia e ela não se esquece disso, hábito que permanece até a atualidade.

A experiência musical é um fato inegável na vida do ser humano, tanto

que mesmo aqueles indivíduos desprovidos da audição podem sentir as vibrações

dos sons. A questão é que, dependendo da cultura de um povo, da educação, das

prioridades educacionais de um país, os sons, os ritmos, a música são mais ou

menos valorizados. Portanto, as experiências musicais têm mais significado para

alguns e menos para outros, dependendo do destaque que a ela se dá.

Podem-se focalizar as experiências musicais de forma que elas se tornem

significativas para as pessoas, se a figura é o foco de interesse, mas que também

possa-se ver o fundo e o campo, como explica Schafer:

foram os psicólogos fenomenológicos que apontaram para o fato de que aquilo que é percebido como figura de fundo é determinado principalmente pelo campo e pelas relações que o sujeito mantém com esse campo... A figura corresponde ao sinal, ou marca sonora. O fundo corresponde aos sons do ambiente à sua volta – que podem , com freqüência, ser sons fundamentais – e o campo, ao lugar onde todos os sons ocorrem, a paisagem sonora. (2001, p. 214).

Nesta paisagem sonora afloram as experiências musicais das

entrevistadas. Algumas demonstraram na entrevista enxergar não só a figura, mas

também o fundo, tornando mais ampla a experiência. No entanto para obter

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respostas mais concretas questiono sobre qual a significação da música para

professoras da educação infantil em sua trajetória de vida pessoal e de que maneira

suas vivências musicais são aproveitadas em sua profissão.

Para responder a isso, é necessário fazer uso da fenomenologia e

encontrar as essências das dimensões que envolvem família, escola, mídia, desejos

pessoais, as quais foram três: Música na infância; Mídia, cotidiano escolar e

musicalização; Importância da música na vida.

3.1 MÚSICA NA INFÂNCIA

A primeira essência aborda as lembranças e primeiras referências

musicais das entrevistadas e está subdividida em três dimensões assim designadas:

Relatos de sons da infância; Referência aos gostos musicais da família; Lembranças

das músicas infantis na escola.

Cada dimensão procura encontrar o cerne de cada entrevista realizada,

buscando no íntimo da entrevistada suas experiências e vivências musicais.

3.1.1 Relatos de sons da Infância

Flauta gostava de ouvir os sons dos aparelhos eletrodomésticos que tinha

na sua casa. “Tinha máquina de lavar, uma bem antiga que ficava funcionando boa

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parte da manhã enquanto eu ficava brincando lá perto da mãe. Gostava de ficar

fazendo barulho, dançando e imitando o aspirador de pó, a enceradeira. Eu gostava

de ouvir os ruídos dos equipamentos”. Conforme Schafer (1991, p. 73), “o som corta

o silêncio (morte) com sua vida vibrante. Não importa o quão suave ou forte ele está

dizendo: ‘Estou vivo’. O som, introduzindo-se na escuridão e esquecimento do

silêncio, ilumina-o.”

Saxofone imitava os sons da madeireira de seu pai que ficava em frente a

sua casa. Ela lembra que muitas das suas brincadeiras eram embaladas pelo som

provindo deste lugar, pois o barulho era constante. Então ela aproveitava para

brincar com os sons. Neste sentido o som não se refere somente à música, mas

envolve também aqueles sons que o ambiente nos proporciona, os sons que estão

ao redor, no fundo, que provavelmente, só perceberemos se quisermos ouvir.

A maioria das entrevistadas lembra das cantigas de roda como os sons

que marcaram a sua infância. Piano lembra especificamente da ”Gata Cega e

Ciranda Cirandinha” e “quando criança, agente aprendeu muita música de

brincadeiras que a mãe ensinava e a gente brincava com as amigas”.

O canto faz parte da cultura de um povo. No Brasil temos as cantigas de

roda, que estão muito presentes na infância, e as canções de ninar que as mães

cantam para as crianças ao fazê-las dormir. É uma expressão musical que vai

acrescentando à vida das crianças um experiência de ouvir música. Cantar é “uma

atividade profundamente humana, cultural e social”. (TAFURI, 2000, p. 27).

Xilofone diz que as cantigas de roda marcaram sua infância, tanto

cantadas pela mãe antes de dormir, como nas brincadeiras com os colegas: “Minha

música preferida era Ciranda cirandinha”.

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Já Viola teve sua infância marcada pela empregada, que cantava e

brincava de roda com ela e seus dois irmãos.

Clarinete gostava muito de ouvir música. Ela morava com sua avó que

ouvia músicas sertanejas no rádio e a ensinava a dançar. Ela lembrou com

entusiasmo outro fato: “Eu lembrei que na casa do meu tio ele tinha aqueles toca-

disco antigo. Então ele tinha uns discos e eu lembro que nós escutávamos e eu

achava aquilo perfeito”.

O bebê identifica-se com os sons que lhe são familiares: a voz da mãe, do

pai, um ruído da sua casa. Harpa tem uma experiência nesse sentido. A mãe dela

conta que, quando ela era bebê e estava chorando, assim que a mãe começasse a

cantar a música “Atirei o pau no gato”, ela parava de chorar.

Eu mesma tive o privilégio de ter pais que cantavam muito, todos os dias,

quando era pequena, para eu dormir. Depois eu mesma escolhia as músicas para

que eles cantassem. Quando estávamos viajando de carro, sempre eles eram

requisitados por mim para que cantassem algo; mal balbuciava as primeiras palavras

e já tinha meus gostos musicais, músicas de que eu mais gostava, provavelmente

porque estavam associadas a momentos agradáveis que eu passara.

A música marca nossa memória, organiza nossa sensação de tempo e intensifica nossas experiências no presente. Uma prova de que a música organiza nossa noção de tempo em que uma canção pode nos trazer as mais vivas lembranças do passado (MAFFIOLETTI, 2002, p. 44).

A mãe de Fagote cantava canções de ninar para ela; cantava e brincava

com as cantigas de roda envolvendo os seus sete irmãos. A exemplo da mãe, logo

Fagote começou também a cantar para os irmãos mais velhos, atividade que lhe

dava prazer.

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“As experiências musicais são valiosas para maturação emocional e o

desenvolvimento de qualquer criança”. (LELIS, 2000, p. 28). Flauta lembra com

saudade o modo como a mãe cantava para ela:

“Eu passei assim a minha infância, desde bebezinho, ouvindo ela cantar. Eu acho que este meu gosto pelo canto eu tenha herdado dela, embora ela não cante mais agora. E também quando ela ia me fazer dormir ela contava historinhas e essas historinhas tinham alguns refrões de música de repetição”.

O lar é um lugar de segurança para a criança e onde ela tem seus

primeiros contatos. A música seja vinda do canto da mãe, seja da avó, da

empregada, do tio, influencia a criança na sua caminhada. São essas as suas

primeiras experiências musicais.

3.1.2 Referência aos gostos da família

Os gostos musicais podem variar conforme os elementos sócioculturais

como etnia, classe social, casa, escola, grupo de amizades, comunidade em que

está inserido etc.

As entrevistadas demonstraram de diversas formas os gostos musicais da

família, algumas relatando o gosto da família quando ainda eram crianças, outras do

marido, dos filhos e o seu próprio na idade infantil, adolescente ou adulta.

Para Fagote as lembranças afloraram à medida que foi falando de sua

família quando ainda era uma menina. A família morava no interior, o seu pai era

agricultor e a mãe, professora. A presença da mãe foi musicalmente marcante, pois

era uma professora diferente para a época; ela cantava e brincava com os alunos e

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também com os filhos. “Minha mãe era rígida no sentido de não deixar os filhos

brincarem na casa dos outros, então, pra compensar isso, ela cantava e brincava

conosco. Foi uma época inesquecível para mim. Eu e meus irmãos brincávamos e

cantávamos muito com nossa mãe.”

Já Violino e Viola não têm lembranças da mãe cantando. Violino afirma

com tristeza: “...minha mãe não tinha tempo disponível e achava que cantar era

perder tempo“. Viola não menciona por que a mãe não cantava. Simplesmente não

lembra de ouvi-la cantando, somente tem lembranças da empregada que cantava e

brincava com ela e seus irmãos quando eram pequenos. Por outro lado depois que

ela teve seus filhos, procurou incentivá-los musicalmente:

“sempre cantei canções de ninar para meus filhos quando eram bebês e mais tarde cantigas de roda. Tentei colocá-los na aula de música para aprenderem a tocar algum instrumento, mas a menina que é mais velha não quis e o menino já ganhou até um violão pequeno mas por enquanto não demonstrou interesse.”

Flauta ainda não tem filhos, mas desde bebê foi incentivada pela mãe a

gostar de música, a qual cantava para ela; mais tarde, também foi, juntamente com a

irmã mais velha, sua platéia para apresentações de violão que ela começava a

aprender. O gosto musical de Flauta também teve a influência da mãe e atualmente

é bem variado: músicas eruditas, óperas, árias (solistas), MPB, bossa nova, música

regionalista, gaúcha e rock (não pesado). Contudo a predileção é por música erudita.

A mãe e o contexto cultural vivido por Flauta foram marcantes em sua

vida, pois, como afirma Sekeff:

O homem é um animal social, simbólico, construtor de cultura, e o grupo é o aspecto mais importante de seu ambiente... Assim, se o comportamento humano resulta de sua constituição individual, é também alimentado do repertório cultural (pelo qual o indivíduo é construído e construtor) e da aprendizagem, o que quer dizer que ele é flexível. (2002, p 58).

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Portanto, o ambiente cultural vivido pelas pessoas é muito importante na

sua formação musical, bem como em outros aspectos. Por isso podemos dizer que

“a emoção musical é alimentada por nossa sensibilidade e favorecida pela

aprendizagem e pela cultura.” (p. 59).

A casa, o lar, as pessoas que convivem conosco são muito importantes

no processo de formação musical, não só o aprendizado da música como

instrumento ou cantada, mas a musicalidade de que todos nós temos necessidade.

Para Piano marcou sua infância o fato de em sua casa muitas vezes sua mãe estar

fazendo almoço, com alguma música tocando, geralmente sertaneja ou clássica, e o

pai pegar a mãe para dançar. Ela, então, largava tudo e os dois dançavam. Isso a

marcou tanto que hoje Piano, já casada e com filhos, cultiva o mesmo hábito com o

marido.

A mãe de Clarinete não costumava cantar para ela, pois teve uma

educação diferente e era mais fechada, reflete ela. Já a mãe de Saxofone

proporcionou uma forma abrangente de experiências musicais. Ela gostava muito de

cantar; cantava no coral da igreja e, nos finais de semana, tocava violão e o tio

tocava acordeão. O estilo variava de músicas sertanejas, como de Tonico e Tinoco,

a Amado Batista e Roberto Carlos, além de não faltarem músicas religiosas. A

música era tão presente em sua família que, quando a mãe dela morreu, durante o

enterro, o coral da igreja cantou; e, conta Saxofone, era como se eles estivessem

vendo a mãe cantar, tal era o amor que ela tinha pela arte musical.

Portanto, em todas as experiências citadas, a música mostrou-se

presente na vida das entrevistadas de uma forma ou de outra.

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3.1.3 Lembrança das músicas infantis da escola

A escola é um lugar de grandes experiências e marcante na vida da

maioria das pessoas. Assim como a música está inserida no contexto familiar, está

também algumas vezes mais, outras menos, na escola.

Lembrar de fatos ocorridos há anos nem sempre é fácil, pois nossa

memória guarda apenas os fatos mais significativos de nossa existência, aqueles

que nos marcaram e que fizeram alguma diferença em nossa vida. Relata Lieury:

Muito longe do conceito de que desfruta no imaginário popular, a memória não é uma entidade única, mas fragmentada em múltiplos módulos que armazenam milhares de informações e se comunicam por interfaces e “cabos” em milésimos de segundo. Por causa dessa complexidade, a memória não é a mesma aos 7 anos ou aos 77 anos. Com o envelhecimento, os módulos estão cheios de lembranças (palavras, imagens, fisionomias), mas a morte dos neurônios acarreta esquecimentos esporádicos, o desgaste dos processos bioquímicos diminui a qualidade da memorização, os dois hemisférios do cérebro têm dificuldade de comunicar-se e as transmissões, através de cabos desgastados, de uma região para outra do cérebro tornam-se lentas (1997, p.101).

Para Violino, algo inesquecível é a música:

“Há três noites que eu não durmo, oh, lá, lá,

Pois perdi o meu galinho, oh, lá, lá,

Pobrezinho, oh, lá, lá

Coitadinho, oh, lá, lá.

Ele está lá no jardim.”

Violino a cantou toda durante a entrevista, lembrando com saudades da

professora da terceira série, a qual ensinou esta música para a turma. Ela lembra também

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que não pôde freqüentar a educação infantil, pois somente as escolas particulares

ofereciam educação para essa faixa etária, na época. Para Ormezzano e Torres:

O reforço positivo por parte do adulto, parente ou professor, o propiciar a atividade musical de forma agradável e prazerosa, são caminhos para que a criança carregue a semente da música pela vida afora... cada adulto traz suas músicas e canções; sejam elas tocadas ou cantadas, do folclore ou das cantigas de ninar ( 2002, p.147).

Foi assim para Flauta. A professora do pré-escolar, além de tocar violão e

cantar com a turma, o que é lembrado com muito carinho por Flauta, era amiga de

sua irmã mais velha e freqüentava sua casa, onde também tocava violão e cantava.

Essa experiência positiva, levou a que Flauta desenvolvesse um amor muito grande

pela música.

Duas músicas marcaram a infância de Piano: “A gata cega” e “Ciranda

cirandinha”. Essas músicas foram citadas como muito cantadas por ela e pelas

amigas na escola, mas a lembrança não está relacionada com alguma professora

especificamente, nem com conteúdo ministrado em sala de aula, e, sim, associada

às amigas que cantavam na hora do recreio e brincavam simultaneamente.

Fagote, que iniciou a caminhada escolar já nas séries iniciais, lembra que

a escola foi uma adaptação difícil para ela, pois ela estava costumada com uma mãe

que brincava com ela e com os irmãos; não cursando a educação infantil, a

preparação para as séries iniciais não aconteceu. Além disso, a ruptura foi maior

porque o professor era homem e lecionava para as quatro séries ao mesmo tempo

(escola multisseriada). Conta Fagote que ele era enérgico, não brincava e nem

cantava; por isso, ela ficava muito angustiada na hora de ir para a escola. Todavia,

no recreio, assim como Piano, brincava de roda com os colegas. As músicas de que

ela lembra são: “Ciranda cirandinha”, “Roda cutia” e “Passa Passará”.

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Brincadeira é uma atividade que a criança realiza por iniciativa própria, sem um objetivo educativo ou de aprendizagem, para seu prazer e sua recreação, e que permite a ela entrar em contato com os outros e com o espaço, com o meio ambiente, com a cultura. (SANTOS, 2000, p. 125).

Muitas vezes os professores pensam que a educação acontece apenas

em sala de aula, mas, conforme as experiências vividas por algumas das entrevistadas,

podemos constatar que a hora do intervalo, musicalmente, foi o que as marcou mais.

Quando o recreio é compartilhado por alunos e professora, fica ainda mais significativo.

Harpa teve esse privilégio, segundo ela, de ter a professora participando

do recreio e cantando, fazendo brincadeiras de roda cantadas. Ela tem lembrança

de quatro músicas em especial: “Ciranda cirandinha”, “Atirei o pau no gato”,

“Negrinhos da África” e “Senhora Dona Cândida”. No entanto, o único estilo de

música que ela lembra de ser cantada na escola eram as cantigas de roda.

Conforme suas lembranças, não havia outros tipos de música, cantadas ou tocadas,

na educação infantil. Nas séries seguintes a música foi diminuindo e quase não era

trabalhada. As lembranças que ela tem sobre esse período incluindo a música são

praticamente nulas, pois não soube citar nenhuma.

Como atividade lúdica, ela (a música) se recorta como um jogo, cuja dinâmica é caracterizada por uma escuta que se enriquece da aprendizagem, motivando, criando necessidades e despertando interesses. É aí atentamos para os estudos de R. Hubert (Not, 1987) em torno da evolução do educando em sua fase de desenvolvimento cognitivo (SEKEFF, 2002, p.121).

A importância da música envolvendo a brincadeira fica explícita porque o

envolvimento do indivíduo na fase da infância com a música, geralmente, encontra-se

relacionado com a brincadeira, que nessa fase tem uma importância muito grande.

Para Xilofone as cantigas de roda marcaram a infância. Nas brincadeiras

com os colegas de aula, as amigas e ensinadas pela professora da educação

infantil. A música preferida dela era: “Ciranda cirandinha,” além da brincadeira do

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“ovo choco” que ela brincava na escola. Ela contou que ficava esperando a hora de

ir para a escola para poder brincar com as amigas, o que lhe trazia muita alegria.

O brinquedo ou cantiga de roda é , sem dúvida, uma atividade de grande valor educativo. É modalidade de jogo muito simples e, por incluir tradição, música e movimento, se constitui num poderoso agente socializador... A roda é o princípio do grupo, dá a sensação de união, de um todo ao qual se pertence. Daí a satisfação que a criança sente em estar de mãos dadas com seus coleguinhas, de cantar e movimentar-se ao som da melodia, de participar de um grupo em que todos fazem os mesmos gestos. (NOVAES, 1986, p.7).

Tanto Violino, como Fagote, que não tiveram a oportunidade de freqüentar a

educação infantil, sentem que perderam uma parte importante da sua educação,

tanto na área psicomotor como na área musical. Clarinete também teve essa experiência

de não ter participado do convívio social, educacional e musical da educação infantil.

Das séries em que iniciou sua jornada escolar, Clarinete tem apenas uma

lembrança musical que também é uma cantiga de roda: “O cravo brigou com a rosa”.

Essa cantiga era cantada pela diretora da escola em que ela estudava durante o

recreio. Clarinete lembra que a diretora ia a um lugar mais alto do pátio e cantava

com os alunos, fato que foi muito marcante em sua vida. Portanto, as lembranças de

Clarinete se restringem à diretora da escola, pois nenhuma professora é mencionada

como tendo marcado sua vida educacional na área musical.

Outras lembranças musicais de Clarinete referem-se ao curso de

Magistério, que ela cursou dez anos após ter terminado o ensino fundamental. Neste

ela cantava com as colegas e professoras músicas infantis para serem utilizadas nas

aulas que iriam ministrar. Com tristeza ela refere não ter tido nenhum contato com a

música no período em que cursou da quinta à oitava série.

Saxofone tem mais lembranças da escola, especificamente das séries

iniciais. Da primeira série lembra-se da música que a professora cantava para

desenvolver a coordenação motora, com a melodia da cantiga “Ciranda cirandinha”:

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”O meu lápis sobe e desce, sobe e desce sem parar, vejam só meus amiguinhos, quem

acaba de chegar.“ Era um exercício que tinham que fazer indo da esquerda para a direita

com vários tipos de linhas, curvas, triangulares, etc. Sempre ao final da linha

traçada, havia um desenho de algum animal, o que ela mais lembra era o coelho.

Na segunda série as lembranças são da voz da professora, ela não

lembra das músicas, mas ao remeter-se ao passado era como se a professora

estivesse cantando para ela. O professor da terceira série era um homem que

segundo Saxofone, era muito carinhoso com as e gostava de cantar com os alunos.

Viola tem lembranças que marcaram sua vida, ela não lembra em que ano

especificamente, mas quando cursava entre a quinta e oitava série, relata que um

irmão (padre) cantava e tocava violão para os alunos, e conta sobre uma

homenagem que ela e seus colegas fizeram para um outro irmão (padre), de setenta

anos, cantando uma música de Roberto Carlos “-esses seus cabelos brancos,

bonitos”, música que ela não esqueceu mais. Das séries iniciais, Viola lembra a

professora de educação física, que cantava e trabalhava com cantigas de roda,

como “Ciranda cirandinha” e “Negrinhos da África”.

A música tem sido usada na escola muitas vezes como complemento

para outra atividade, não por ela mesma, provavelmente porque os professores não

têm preparo para tal, pois, para que a música seja usada por si própria, é necessário

que o professor tenha objetivos claros sobre o que pretende realizar com a utilização

da música. Nas escolas atuais o problema continua, embora em algumas já existam

professores especializados em música, que trabalham a música como matéria

específica. Eu tive essa experiência quando trabalhei numa escola de ensino

privado, onde trabalhava a música por ela mesma. O resultado foi impressionante, e

o gosto que os alunos demonstraram pela música é algo que jamais poderei

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esquecer. Nessa escola, as músicas eruditas puderam ser trabalhadas e cada

compositor teve seu momento com sua história revivida, e suas músicas

executadas. Era fantástico ouvir as crianças, mesmo que em tão tenra idade, na

educação infantil, pedindo para ouvir Beethoven, Mozart, Villa-Lobos, entre outros. A

criação musical também era enfatizada, tanto a criação de letras, fazendo paródias,

quanto a criação de melodias, com a própria voz, com instrumentos como flauta e

teclado ou a criação de ritmos com instrumentos da bandinha rítmica.

Infelizmente, entretanto, sabemos que, por mais que, na LDB esteja

inserida obrigatoriamente no currículo escolar, como citado neste trabalho, e

também na lei estadual que rege o ensino na educação infantil no estado, a música

ainda é trabalhada superficialmente.

Em meados da década de 1930, Villa-lobos, famoso compositor brasileiro

e amante da música, da educação musical e do Brasil, foi convidado para debater o

ensino da música e canto orfeônico nas escolas do Distrito Federal. Não demorou

muito para que Villa-Lobos organizasse cursos para capacitar professores que

ministrariam as aulas de música nas escolas, o que ocorreria no Rio de Janeiro. Em

23 de fevereiro de 1932, numa entrevista ao Diário de Notícias (jornal do estado do

Rio de Janeiro), Villa-Lobos proferiu uma frase que viria a ficar conhecida

nacionalmente: “O povo brasileiro deve cantar.” (SILVA, 2003).

Foi criada a Superintendência da Educação Musical e Artística (Sema)

das Escolas Públicas do Rio de Janeiro, fundada pelo educador Anísio Teixeira. A

qual criou o curso de Orientação e Aperfeiçoamento do Ensino de Música e Canto

Orfeônico, para preparação dos educadores. Contudo, para manter um bom nível

dos profissionais as exigências eram de uma boa preparação e, num país como o

Brasil, em que as distâncias são enormes, as dificuldades apareceram.

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A despeito de qualquer controvérsia, não há como negar a importância do canto orfeônico no Brasil. Villa-Lobos acreditava que as escolas deveriam oferecer muito mais que os elementos básicos necessários para a vida prática. Dessa forma, o seu trabalho educacional tinha como intenção ensinar a apreciar, compreender e criticar de forma discriminada os produtos da mente, da voz e do corpo que dão dignidade ao homem e lhe exaltam o espírito. O insucesso de sua empreitada na área da educação musical deve-se muito mais a problemas de ordem operacional do que a problemas de ordem conceitual (GOLDEMBERG, 2002).

Na época, foi enviada a todos os estados brasileiros uma carta pedindo

aos governadores que incentivassem a implantação das aulas de canto orfeônico

nas escolas. Alguns atenderam, mas, devido às dificuldades já citadas, esse projeto,

que era um sonho de Villa-Lobos, não pôde se concretizar. Por isso o Brasil

continuou a ficar sem as aulas de música nas escolas.

3.2 MÍDIA, COTIDIANO ESCOLAR E MUSICALIZAÇÃO

A segunda essência trata da influência da mídia e do cotidiano escolar na

musicalização das pessoas, que passaram pela infância e, agora, já na fase adulta,

ainda têm lembranças musicais daquilo que as influenciou musicalmente, mesmo

que algumas não tivessem consciência disso antes da entrevista. Como a

fenomenologia faz as essências aflorarem, assim aconteceu nas entrevistas, sendo

que aflorando as falas e até emoções durante a mesma, algumas entrevistadas

tomaram consciência de que a mídia também pode contribuir para a formação

musical, ainda que informal e sutilmente.

Esta essência tem três dimensões, que são: Referência à mídia; Temas

trabalhados na escola e aspectos profissionais; Conhecimento musical das

participantes.

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3.2.1 Referência à mídia

A mídia é algo cada vez mais presente na realidade dos dias atuais, seja

provinda da televisão, do rádio, da internet e até dos celulares. A cada dia, a

tecnologia avança um pouco mais e aparecem coisas não imaginadas há alguns

anos. Ao contrário, no período em que nossas entrevistadas estavam na infância, o

computador não era algo muito comum, muito menos a internet, pois o avanço

tecnológico nos últimos anos cresceu em nível extraordinário. Mesmo assim, a mídia

através da televisão e do rádio fez parte da sua vida musical.

Ainda que na época em que vivenciaram a infância e a fase escolar não

tivessem consciência disso, a mídia não passou desapercebida em suas vidas, pois

a música não se restringe a tocar, ler partituras, cantar, mas está inserida em um

contexto social, agindo na vida das pessoas diariamente, mesmo que de forma sutil,

seja através da família, da escola, da mídia ou de qualquer outra forma de

expressão musical.

[...] precisamos ter em mente que, quando vivenciamos música, não nos relacionamos somente com a matéria musical em si (altura, duração, intensidade, timbre, estrutura e expressão) e suas relações. Logo que ouvimos os primeiros sons de qualquer música, começamos assimilá-los a partir de uma rede de significados construídos no mundo social (Green, 1988, p.27). É no mundo social que definimos e convencionamos o que consideramos como sendo música e quais as funções e usos de determinada peça musical, seja ela de pular, de gente jovem ou para uma cena triste de novela. (SOUZA, 2000, p. 102)

Para Clarinete, a televisão teve uma participação significativa pelos os

temas de novelas a que ela assistia, tanto de músicas nacionais como de

estrangeiras. Uma música que a marcou muito provinda da televisão foi o tema de

uma campanha contra a fome de crianças, cujo nome era: “We are the world”.

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Segundo Clarinete, todas as vezes que ela via uma criança maltrapilha na rua,

lembrava-se da música veiculada na comunicação televisiva há alguns anos quando

ela estava na adolescência.

Outras formas de expressão musical na televisão também foram

mencionadas, através de programas mais específicos de música. No relato de

Saxofone, ela citou o programa “Globo de Ouro” da Rede Globo, a que ela assistia

todas as semanas e lembra com carinho, pois servia-lhe de inspiração para as suas

brincadeiras com as primas. Então todas se vestiam com as roupas das mães,

sapatos de salto e brincavam de cantar e se apresentar no programa citado.

Também nos sábados à tarde ela assistia ao programa do Chacrinha, onde eram

cantadas muitas músicas, e também ao programa de calouros do SBT. Diz Saxofone

que gostava de assistir a esses programas porque as pessoas estavam tentando

cantar, o que ela achava muito legal.

Além desses programas, um infantil a marcou Vila Sésamo, no qual havia

muitas músicas e algumas partes ela lembra até hoje.

Os programas de televisão estão repletos de músicas, até os comerciais

apresentam música, cada uma com seu objetivo.

Nas novelas, filmes e desenhos animados, por exemplo, há música, boa parte do tempo, como trilha sonora, reforçando as intenções e emoções das cenas. Na propaganda a música vem enfatizar os conceitos subentendidos no texto e nas imagens. A música de abertura reforça o caráter dos programas, sejam jornalísticos ou humorísticos. Em programas de auditório a música não só preenche espaço entre os quadros como também reforça os diferentes temas abordados, de modo semelhante à trilha sonora nas novelas, filmes e desenhos. (DEL BEN, 2000, p. 102).

Dessa forma a música caracteriza-se também pelo ver, não só pelo ouvir.

A televisão trouxe essa forma de relacionar a música a uma imagem, cena ou

situação. Até mesmo os jingles cantados nos comerciais podem ser interessantes e

chamar a atenção dos ouvintes, pois essa é a intenção da propaganda. Flauta conta

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que os jingles na televisão a alegravam muito na infância, tanto que tinha um

caderno para anotá-los.

A música faz a diferença em qualquer situação e pode, inclusive, mudar a

interpretação de uma situação. Lembro de uma aula em que eu e meus colegas

fomos desafiados a analisar a pintura de um quadro, não me lembro de qual o pintor,

quando a professora colocou uma música de fundo, erudita, lenta e bem

melancólica, provavelmente de Chopin. Então, ao final, quase todos os alunos

expressaram opiniões parecidas sobre a história do quadro, influenciados pela

melancolia da música.

Esse fato pode sugerir que a música pode influenciar a finalidade e a

história de qualquer coisa que esteja sendo apresentada. Como exemplo, num filme

de suspense a música é essencial para dar ênfase ao suspense em si; num filme de

romance, ao aspecto sentimental.

Os filmes de Elvis Presley marcaram a vida de Viola, pois assistia aos

seus filmes e chorou muito quando ele morreu. Gostava das músicas dele, e que na

fase da adolescência se tornou seu ídolo.

Para Piano, a música romântica é a sua preferida desde a adolescência,

em especial a trilha sonora e o próprio filme Romeu e Julieta, marcaram sua vida e a

fizeram sonhar em ir para a Itália para ouvir lá as músicas do filme. Felizmente, esse

sonho se realizou na idade adulta e, enquanto Piano me contava esse fato, lágrimas

corriam pelo seu rosto, mostrando uma forte emoção ao relatar o acontecimento.

A mídia influenciou também Violino, que na adolescência ouvia músicas

que estavam em evidência na televisão. Ela lembra que a irmã mais velha viajou

para Cascavel e trouxe uma mochila com a foto do Michael Jackson, cujas músicas

ela gostava de ouvir e também dos Menudos.

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A televisão gera muitas críticas dos estudiosos, sejam pedagogos ou

psicólogos, mas a questão talvez seria como utilizá-la de maneira proveitosa, de

maneira a não ultrapassar os limites de idade das crianças e jovens e para trazer

informações úteis e momentos agradáveis para apreciar e recordar. Segundo Flauta,

a televisão contribuiu para diversificar seu gosto musical também para MPB e

música clássica. Ela assistia a Concertos para a Juventude, e Vila Sésamo onde

ouvia Marcos Valle cantando, considerado um cantor da segunda geração da bossa

nova. Flauta apreciava muito ouvir. Uma música que a marcou foi “Construção”, de

Chico Buarque, cujo timbre de voz ela considera interessante; esta música lhe

causava curiosidade e tristeza, uma sensação estranha, segundo ela.

Outras influências televisivas em sua vida foram Tom Jobim, Elis Regina e

uma novela chamada Bravo, que abordava a história de um maestro apaixonado por

uma moça. E na abertura da novela, ele aparecia regendo uma orquestra. A irmã de

Flauta comprou o disco da trilha sonora dessa novela que continha trechos de obras

famosas interpretados por Osvaldo de Los Rios, fazendo uma interpretação mais

popular para cativar as pessoas. Então Flauta ouvia diariamente essas músicas.

Segundo ela, essa foi uma forte influência para despertar seu gosto pela música

erudita.

O rádio é um outro meio de comunicação da mídia, onde a música

está muito presente, mas já foi muito mais utilizado antes do advento da

televisão. Só para exemplificar: “Em 1969, os americanos estavam ouvindo 268

milhões de aparelhos de rádio, quer dizer, cerca de um para cada cidadão. A vida

moderna foi ventriloquizada”. (SHAFER, 2001, p. 135).

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Na casa de Saxofone durante sua infância, o rádio ficava ligado durante

todo o dia, para ouvir programas religiosos e músicas. Ela também cantava e

dançava durante as músicas, o que a marcou muito.

Na família de Violino as músicas ouvidas também eram do rádio,

sertanejas, românticas, músicas da época. Ela relata que poderia ter ouvido músicas

de melhor qualidade.

Harpa ouvia as músicas no rádio junto com seu pai, o qual gostava de

músicas sertanejas e influenciou no seu gosto. Também se lembra das músicas de

Roberto Carlos, fazendo parte de sua adolescência, inclui também na lista de

lembranças Zezé de Camargo e Luciano.

Viola lembra-se do rádio como parte do seu namoro, incluindo também os

discos gravados por cantores como Tim Maia e Roberto Carlos.

Da mesma forma, Fagote apreciava as músicas sertanejas e gauchescas

ou regionalistas, juntamente com sua família. Ela conta que, como não tinham

televisão em casa, a família se reunia em volta do rádio a pilha para ouvir o

programa do Teixeirinha, que tocava músicas nativistas; logo após, havia outro

programa da Rádio de São Paulo que tocava músicas sertanejas, o qual era o

programa familiar preferido de todos os filhos.

Tanto a televisão quanto o rádio e, atualmente, também a internet, i-Pods,

CDs e outras formas de mídia, seja ouvida ou visual, influenciam a musicalidade das

pessoas, pois, se a criança tem contato com todos os tipos de música, fica mais

democrática a sua escolha pelo estilo musical preferido. Contudo, se ela tem contato

apenas pela televisão, onde nos canais abertos, não se apresenta grande variedade

de estilos musicais. O que vemos na mídia hoje é um crescente aumento da

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divulgação por conveniência, ou seja, para que seja vendido pelas gravadoras aquilo

que é de seu interesse, não importando se é de qualidade ou não.

Mesmo assim, não se pode condenar a mídia; o fato é que ela existe e

influencia as pessoas até musicalmente, como pudemos ver em alguns casos

citados. Algumas vezes, essa influência pode parecer não muito significativa, mas

em outras parece ter tido mais importância na vida musical dos indivíduos. Dessa

forma, podemos destacar que, a mídia tem uma influência grande sobre a

musicalidade das pessoas e, especificamente nos dias atuais, é necessário que “[...]

a cultura midiática seja seriamente tomada como local de aprendizagem e

contestação, especialmente para as crianças”. (SOUZA, 2000, p.53). A variedade da

mídia pode ser aproveitada na escola, tanto como conhecimento musical, como para

desenvolver a criticidade dos alunos e a musicalidade em si.

Portanto, a escola tem um papel importante no desenvolvimento musical

da criança, seja trabalhando as músicas, seja mostrando-lhe a diversidade musical

existente, seja na televisão, no rádio, computador, video games, CDs e outros.

Também deve trabalhar no desenvolvimento crítico do aluno de modo que com o

conhecimento adquirido possa avaliar a qualidade ou não das músicas ouvidas e

veiculadas nos meios de comunicação. Esse, é um ideal que ainda nos parece longe

de ser alcançado, entretanto acreditar nas mudanças é a principal tarefa de um

educador, para que possa também ser um agente transformador. Como as entrevistas

revelaram ainda estamos longe desse ideal, no que se refere à musicalidade escolar.

A segunda dimensão dessa essência são os temas trabalhados na escola

e os aspectos profissionais, que relatam e trazem à tona o que é trabalhado pelas

professoras entrevistadas na sua sala de aula e os aspectos profissionais da sua

musicalidade.

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3.2.2 Temas trabalhados na escola e aspectos profissionai s

O que os professores trabalham em sala de aula com seus alunos mostra

o modo como usam suas habilidades de ensinar e demonstram seus conhecimentos

sobre o que estão trabalhando. Não se pode esquecer que o professor estará, de

uma forma ou outra influenciando seus alunos. Afinal, a educação não é algo

impessoal, mas envolve sentimentos, emoções, além das múltiplas inteligências e

habilidades e da influência social de cada um.

Assim como a mente de cinco anos perdura no aluno em idade escolar, também os valores e a prática da comunidade mais ampla não desaparecem apenas por que o estudante está sentado em uma classe e escutando o professor falar. Uma vez que o estudante saia no fim do dia, ou no fim de sua carreira escolar, as mensagens e as práticas apresentadas na televisão, os objetos apreciados pela sociedade de consumo, as partidas jogadas...adquirem enorme saliência. Apenas como equilibrar e integrar a missão da escola com as práticas da comunidade mais ampla é um problema que poucas instituições educacionais resolveram. (GARDNER, 1994a, p. 123).

Para trabalhar com a música em sala de aula, seria necessário muito mais

que o simples ato de ouvir música com objetivos diferenciados, geralmente para

acompanhar outra atividade.

A valorização do cotidiano social dos alunos no que se refere à música e

o aproveitamento das experiências pessoais das crianças para o trabalho em sala de

aula tem uma importância significativa, pois o ser humano não é um ser isolado, não

é uma ilha na escola, mas consigo traz toda a bagagem de suas vivências.

As professoras entrevistadas, adotam diferentes formas de trabalhar a

música com seus alunos, as quais variam conforme a segurança que cada uma tem

para trabalhar com seus alunos. Essa segurança se dá através do conhecimento

que cada uma detém ao trabalhar e ao se expressar com relação à música. Essa

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demonstração de conhecimento pode ser observada na fala de Flauta, que revela

uma preocupação com o repertório empobrecido das crianças. Por isso, ela procura

trazer uma variedade de músicas, principalmente aquelas a que as crianças

dificilmente têm acesso em casa.

Flauta também leva para a sala músicas clássicas, para bebês, para

crianças, CDs do grupo Palavra Cantada, do Castelo Ratimbum, que tem sons de 42

instrumentos musicais, para trabalhar os timbres, e também CDs de cantigas de

roda. Sobre a visão de Flauta, Celso Antunes afirma que “o ciclo da educação infantil

não será completo enquanto não forem exploradas a sensibilidade tátil, a acuidade

auditiva, a motricidade e a dinâmica de sua inteligência cinestésico-motora, além da

audição e do paladar.” (2001, p.30).

Viola procura trabalhar a música em sala porque acredita que a música

pode ajudar a desenvolver todas as habilidades das crianças. Assim, ela canta com

elas e apresenta-lhes músicas novas e agradáveis para movimentação e gestos;

explora as letras das músicas para trabalhar as palavras e também a dramatização;

usa muita música nas brincadeiras da “Hora lúdica”, que é um momento diário

específico de brincadeiras, mas com objetivos de aprendizagem.

Em minha experiência profissional como professora de música na

educação infantil, o uso da música apenas pela música, sem outro objetivo de

aprendizagem, como ler, escrever, contar, entre outras habilidades que são tarefas

da educação infantil, parecia ser novidade para os alunos. O apenas ouvir música e

apreciá-la começou a ser uma constante em minha sala de aula, onde tínhamos o

momento de apreciação musical, com comentários sobre o que cada um tinha

percebido ao ouvir a música. Algumas vezes os alunos davam interpretações

parecidas, outras vezes, bem diferentes, segundo o ponto de vista de cada um.

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As habilidades de conhecer, observar, compreender, comparar, reunir,

conferir (ANTUNES, 2001) podem ser desenvolvidas com a audição de música,

principalmente de música erudita ou de música sem palavras, somente tocadas, pois

o conhecer se dá ao ouvi-las várias vezes e em dias diferentes. Isso demonstrará o

nível de percepção das crianças, ou seja, se elas identificam o que estão ouvindo.

Quanto ao observar, por mais que se possa pensar que é preciso usar a

visão para observar, o ouvido pode também ser utilizado como instrumento

observador, ou seja, os deficientes visuais, por exemplo, usam os outros sentidos

para observar, e o fazem muito bem. É necessário que os professores tenham a

consciência de que todos os sentidos devem ser desenvolvidos.

Além de dar sua interpretação da música, é interessante conhecer a

história do compositor e em que situação ele compôs a música ouvida, quais eram

seus sentimentos na época, por que se expressou desta forma. Assim, a habilidade

de compreender estará também sendo usada.

Ao ouvir várias músicas do mesmo compositor ou de compositores

diferentes, a criança poderá comparar, seja um com o outro, ou seja uma música

com outra da mesma autoria, aumentando, assim, suas habilidades comparatórias.

Da mesma forma, poderá separar ou reunir músicas que têm o mesmo andamento

ou andamentos diferentes e consultar músicas para identificar sua intensidade, seu

andamento, sua forma melódica. A identificação de diferentes instrumentos que

estão sendo tocados pela orquestra também faz parte dessa habilidade.

Conta Piano que, durante a audição das músicas eruditas, algumas

crianças conseguem diferenciar qual instrumento está tocando, principalmente o

piano e a flauta. Certamente, essa linguagem de intensidade, altura, forma melódica

não é usada explicitamente com as crianças dessa faixa etária, mas “mais devagar”,

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“mais rápido”, “mais forte”, “mais fraco”, são linguagens de fácil entendimento para

as crianças nessa faixa etária e que a auxiliam no desenvolvimento de outras

habilidades operatórias. A intensidade, a altura e a melodia das músicas podem

variar, mas sempre terão suas próprias características.

Incentivar as próprias crianças a inventarem melodias também é algo

muito significativo pra elas. “Parafraseando Paul Klee, uma melodia é como levar um

som a um passeio”. (SCHAFER, 1991, p. 81).

Para começar a exploração dos sons, nada melhor do que as crianças

descubram os sons que o próprio corpo faz. É assim que Flauta começa as

atividades musicais com seus alunos, com noções de som sons corporais; depois vai

avançando para outras atividades, como onomatopéia, ritmo, freio inibitório,

intensidade, volume, timbres, às vezes ouvindo os diferentes tipos de instrumentos,

das vozes deles, que são gravadas para eles ouvirem e analisarem se gritaram, se

ficou bom, o que poderia melhorar.

Violino trabalha as cantigas de roda, o resgate do folclore. As músicas

folclóricas são cantadas e brincadas, diz ela, como, por exemplo, “Escravos de Jô”,

brincando com pedrinhas, passando e marcando o ritmo da música. Esta professora

também tenta adequar a música folclórica e as cantigas de roda aos conteúdos.

As aulas de Piano são iniciadas com música, bem como todas as

atividades que as crianças fazem, de modo que elas já sabem o que vão fazer em

seguida, ou seja, reconhecem qual será a atividade que farão pela música que

está sendo cantada. Essa estratégia utilizada por Piano não é recente, pois,

quando da instalação dos jardins de infância no Brasil, algumas regras eram

seguidas rigorosamente, principalmente no que se tratava à seqüência das

atividades.

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De acordo com a programação da Revista do Jardim de Infância, cantava-se tanto antes como após a refeição, para visitantes, na entrada e na saída, marchando. As canções e as práticas corporais eram alguns dentre outros marcadores do tempo escolar, presentes em seqüências fixas e atividades repetidas diariamente, instituindo regularidade para crianças e adultos. (SANTOS, 2000, p. 115)

Harpa também faz uso dessa prática utilizando músicas específicas para

a hora do lanche e para ficar em silêncio; quando ela canta determinada música, as

crianças já sabem que têm de ficar em silêncio.

Além desse objetivo, nas entrevistas aflorou a idéia da música usada para

desenvolvimento da expressão corporal das crianças, o que Piano faz com música

clássica. As crianças ouvem a música e fazem movimentos corporais seguindo seu

ritmo. Se é uma música lenta, suave, elas caminham ou rolam mais devagar; se é de

intensidade mais forte e de andamento mais rápido, elas fazem movimentos que

combinem com este ritmo.

Piano nos contou que, como na escola em que trabalha há uma

professora que trabalha especificamente a expressão corporal das crianças, ela não

se preocupa com isso, deixando essa responsabilidade àquela.

Harpa também cita a expressão geral e corporal da criança através das

músicas que ela trabalha em sala.

As músicas populares também são usadas com os alunos, como Piano

declarou citando pagode e samba. Já Clarinete pensa de forma diferente, não

usando música popular, pois afirma que é preciso ter um cuidado muito grande com o

repertório que aparece na mídia. Assim, ela prefere deter-se nas músicas folclóricas

infantis, “[...] além de usar a música popular por seus próprios valores, os professores

devem estar cientes da força das letras das músicas e do comércio no qual a música

popular está imersa, pois as letras carregam mensagens culturais.” (NARITA, 1998, p.56).

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Tendo essa visão da música popular, Clarinete canta e coloca CDs de

cantigas de roda e músicas folclóricas para as crianças ouvirem e cantarem;

segundo ela, com o CD as crianças aprendem muito mais rápido do que apenas com

a professora cantando. Outra estratégia que ela adota para trabalhar com a música

é explorar sua letra, seja para analisar, seja até mesmo para alfabetizar as crianças.

Clarinete diz que sempre gostou de trabalhar com música em sua sala de aul,

porém, se ressente por não ter tido maior preparo em sua formação profissional.

Xilofone também utiliza as músicas folclóricas e cantigas de roda com

gestos e sons de animais, que as crianças ouvem e imitam, desenvolvendo a

expressão corporal e a socialização. Já no início da aula de Xilofone, as cantigas de

roda estão presentes, até mesmo havendo a oportunidade de as crianças criarem,

improvisarem músicas, o que eles fazem na hora e cantam para os colegas.

A improvisação é algo que as crianças têm muito presente, e que pode

ser muito explorado pelos professores. A gravação das músicas inventadas pelas

crianças e a análise dessas músicas num momento posterior, para ver se combinam

ou não, se rimam, se algo poderia ser diferente, ajuda no desenvolvimento das

habilidades já citadas anteriormente.

[...] a aula deve possibilitar ao aluno sair da posição de simples consumidor passivo e se tornar um produtor e um transmissor. Só assim pode sair de um consumo alienante, podendo ter uma opinião própria sobre a música... A intenção é tomar a questão do seu objetivo educacional em seu sentido mais fundamental, ou seja, entendida como educação que não quer a modelagem de pessoas, porque não temos o direito de fazê-lo, e também a mera transmissão de conhecimentos, mas a produção de uma consciência verdadeira que exigiria a participação de pessoas emancipadas. (SOUZA, 2000, p. 178, 179).

A emancipação das pessoas deveria ser o objetivo principal da educação

como um todo, em todas as fases de desenvolvimento da criança. Todavia, a

realidade observada, nos mostra algo um pouco diferente, pois a música é

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trabalhada como suporte ou complemento de outra atividade, não como fator ativo

no desenvolvimento pensante da criança.

Quando os alunos de Harpa levam de casa músicas de vários estilos,

como rock ou de rodeio, eles as ouvem e dançam na sala, mesmo que não esteja no

planejamento da aula, o que valoriza a criança. Quando eles acabam as atividades

também é colocada música para ouvirem e conforme o conteúdo que está sendo

trabalhado, a música é aproveitada como aquelas que falam de números, de

palavras, desmembramentos de palavras. Isso é incluído no planejamento, feito

pelas quatro professoras da mesma série, pois existem quatro turmas de cada série,

na escola em que trabalha. Segundo Harpa, quando o conteúdo é trabalhado com

música, as crianças não o esquecem mais.

Também dependendo do conteúdo que está sendo trabalhado, Fagote

propõe músicas na aula, mas também promove rodinhas onde todos cantam, batem

palmas e dançam durante as cantorias das músicas.

Flauta, por sua vez, aproveita músicas que se encaixam nos conteúdos

desenvolvidos, como, por exemplo, no projeto realizado pela educação infantil sobre

família, ela aproveitou para explorar a família dos instrumentos musicais família das

flautas doce: flauta soprano, flauta contralto, flauta tenor, e flauta baixo; a família de

teclas: piano, teclado, cravo; a família de cordas: violão, violino, viola, violoncelo, e assim

por diante. Flauta também procura valorizar os gostos das crianças. Assim se

alguma criança leva CD de música infantil, mesmo que não seja de qualidade, este é

ouvido, pois ela sabe que tais músicas também fazem parte da vida da criança.

O professor, além de respeitar a opção da criança, não deve se restringir apenas a um tipo de música. Cabe-lhe adaptar as atividades ao nível do desenvolvimento da criança, apresentando diversos temas musicais, mas dosando a quantidade de temas e os assuntos que podem ser trabalhados (JEANDOT, 1993, p. 117).

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Quando Harpa trabalhou numa creche com crianças de zero a dois anos,

costumava colocar músicas que os pais das crianças ouviam em casa. Ela nos

relatou que o resultado era impressionante, ou seja, as crianças se acalmavam pois

a música lhes lembrava o seu ambiente e os influenciava.

A experiência de infância contada por Harpa, retrata como as marcas

deixadas pelas vivências das pessoas continuam fazendo parte da vida adulta.

Assim é que, seguidamente, quando ela está cantando com seus alunos, remete-se

à sua própria infância, por serem músicas que lá ela ouvia.

A mesma experiência foi contada com emoção por Fagote, que disse

muitas vezes se reportar à sua própria infância quando está cantando com seus

alunos, seja pela lembrança das músicas cantadas em casa pela mãe e com os

irmãos, ou seja pela lembrança de que não teve oportunidade de participar da

educação infantil e cantar com a professora.

Ao caírem no domínio infantil, as letras e quadras em referência conservaram as características de origem e, passando de geração a geração, constituem hoje uma tradição popular. É interessante notar-se que, ainda hoje, nas cidades do interior, nas fazendas, podem ser observadas as rodas que se organizam à tardinha ou à noite, integradas não só por crianças, como também por adultos de ambos os sexos. (NOVAES, 1986, p. 10)

Em minha vivência juvenil, participei várias vezes de grupos que

brincavam de roda com as quadrinhas e cantiga, o que era muito divertido, pois

eram jovens e adultos que participavam e a alegria resplandecia no rosto de cada

um. Foi uma experiência muito agradável que tive. Esse grupo se reunia

semanalmente na igreja e, após estudo da Bíblia havia brincadeiras de roda.

Dessa forma, percebe-se que a escola não é o único lugar em que as cantigas de

roda estão introduzidas, pois elas são realmente populares, no sentido literal da

palavra, pertencem ao povo de qualquer faixa etária. Como Fagote mencionou

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que sua mãe fazia parte das brincadeiras, assim também há outros jovens e

adultos que participam, não apenas como instrutores, mas como participantes

ativos do grupo.

As músicas também são usadas em apresentações na escola, como

recurso agradável aos sentidos da audição e visão na apresentação do todo. Fagote

vale-se desse recurso para as apresentações folclóricas ou de outra espécie feitas

na escola. Ela conta que tem o aparelho de som sempre na sala para colocar

músicas de fundo enquanto as crianças estão fazendo alguma atividade, como

músicas infantis, cantigas de roda, ou de cantoras como Xuxa e Angélica. Fagote

afirma que essas músicas fazem parte do convívio das crianças e as conduzem a se

sentirem mais familiarizadas com o ambiente escolar.

Para Saxofone, a música também serve como recurso didático. Ela

relata que trabalha muito com música na sala de aula, meio pelo qual, as crianças

memorizam até palavras em inglês muito mais facilmente. Para ensinar a contar,

trabalhar os animais também utiliza a música, que está presente todos os dias em

sua sala da aula.

A música pode ser utilizada como recurso didático e por sinal tem se

mostrado, como vimos nas falas, um ótimo recurso. Contudo, deve ser o uso da

música por si só, independente de outro objetivo; a música usada apenas como

música, defendendo sua independência, o aprender a apreciar diversos ritmos,

diversas melodias, intensidades, alturas. A participação efetiva da música na escola.

Portanto, pontuar música na educação é defender a necessidade de sua prática em nossas escolas, é auxiliar o educando a concretizar sentimentos em formas expressivas; é auxiliá-lo a interpretar sua posição no mundo; é possibilitar-lhe a compreensão de suas vivências, é conferir sentido e significado à sua condição de indivíduo e cidadão. (SEKEFF, 2002, p.120).

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É claro que tudo isso implica ter um conhecimento, ter um preparo

para trabalhar com os alunos dessa forma, desenvolvendo suas habilidades,

expressões e capacidade de pensar a música, não somente de ouvi-la. É disso

que trata a próxima dimensão desta essência.

3.2.3 Conhecimento musical das participantes

No Brasil, a música faz parte do currículo da Lei de Diretrizes e Bases em

que está inserida a educação infantil. Mas, se é assim, qual é a formação oferecida

pelas universidades na formação dos professores da educação infantil?

Em sua fala Xilofone deixou claro: “Nunca trabalhei a música em si, com

objetivos específicos, porque não tive formação para isto.” Da mesma forma,

Violino afirmou que não trabalha profundamente a música por falta de

conhecimento. Disse que ainda não consegue trabalhar como foi feito na oficina,

porque não tem preparo para isso. Contudo, depois da oficina a sua visão quanto ao

trabalho com a música mudou, segundo sua afirmação, pois, não canta mais só por

cantar. Todavia, declarou que ainda lhe falta conhecimento para trabalhar melhor

com a música em sala de aula. Violino disse que na escola existe a bandinha

rítmica, com a qual ela não trabalha por não ter segurança de como fazê-lo.

Como Flauta teve uma formação musical extracurricular, ou seja, fora da

escola formal, ela toca flauta e violão e também teve aulas de canto e aulas teóricas.

Então aproveita seu conhecimento e leva para a sala instrumentos musicais como

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flauta doce, que as crianças têm a oportunidade de experimentar, e o violão (o

mesmo verde que ela brincava quando criança).

Saxofone, apesar de ter feito quatro anos de aulas de piano na infância e

também aulas de violão, não lembra mais como tocar, apenas lembra das notas

musicais e das melodias e ritmos que tocava. Ela tentou tocar na igreja enquanto

fazia aulas de piano, mas o instrumento que havia ali na época era um harmônio, um

instrumento de teclas parecido com o piano, mas que, para funcionar precisa ser

pedalado. Como ela ficava preocupada com os pedais, não conseguia se concentrar

nas notas, por isso desistiu. Apesar disso, ela aproveita seus conhecimentos

musicais de ritmo, melodia, canto, história da música como auxílio no trabalho em

sala de aula.

Para Clarinete a realidade mostra-se diferente. Ela declarou que, na

formação acadêmica, o professor deveria ser preparado para trabalhar com a

música, que é utilizada todos os dias em sala de aula. A formação da entrevistada

não abrangeu a música, pois a disciplina de artes foi especificamente expressão

corporal, o que poderia ter sido direcionado para a música, que seria mais

proveitoso, segundo a entrevistada.

Harpa também diz que com música clássica ela nunca trabalhou, por não

ter muito conhecimento. Assim como Clarinete, relatou não ter tido base musical na

faculdade, pois na disciplina de artes trabalhou-se apenas expressão corporal e

teatro; além disso, a professora da disciplina dedicou-se mais à pós-graduação do

que à graduação na época, já que a matéria era intensiva. Ela também disse que

gostaria de fazer cursos de formação continuada sobre música para poder trabalhar

melhor com seus alunos.

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Como exigir dos professores algo para o qual eles não foram preparados?

Como querer que eles desempenhem um papel musical significativo em sala de aula

se eles próprios têm suas limitações de conhecimento? Explica Oliveira (2001):

[...] a educação geral e a educação musical devem objetivar a realização de transações musicais significativas, que combinem as experiências nos domínios cognitivos, afetivo e psicomotor com as relações socioculturais entre os vários contextos disponíveis [...] (p. 37).

Para que isso aconteça, é necessário uma mudança significativa nas

aulas de artes da graduação, dos cursos que formam para o magistério. Isso por que

os relatos sobre a formação acadêmica que obtivemos nesta pesquisa, não são tão

agradáveis quanto deveriam ser.

Ainda com relação à formação acadêmica, Fagote diz que não houve uma

disciplina que contemplasse a música, do que ela sente falta, pois o trabalho na

educação infantil exige música todos os dias e não houve formação para isso. Por

isso, cada um acaba fazendo o que acha melhor, cantando e encaixando as músicas

conforme os conteúdos. O contato musical que ela teve ocorreu no curso do ensino

médio, o magistério, marcado pelas cantigas de roda, por músicas folclóricas que

poderiam se encaixar nos conteúdos que as aspirantes ao professorado iriam

ministrar em sala de aula.

O relato das professoras demonstra claramente que poucas se sentem

preparadas musicalmente para atuar em sala de aula e que mesmo as que tiveram a

oportunidade de desenvolver a musicalidade, o fizeram fora do contexto escolar formal.

Infelizmente, o preparo dos professores para trabalhar a música, não por culpa deles, mas

por toda uma questão social, cultural, desde a infância, e também de formação profissional,

não é satisfatório. Foi o que todas as professoras afirmaram na entrevista. Então, como

fazer um trabalho satisfatório com os alunos se o preparo para isso é insuficiente?

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É essa uma questão a ser pensada e refletida por todos os agentes da

educação, tanto da educação infantil quanto das séries seguintes e da formação

profissional dos professores. É na educação infantil que se torna mais atraente e

mais fácil iniciar o processo de musicalização, cuja continuação é de suma

importância para o desenvolvimento geral da criança e também para o

desenvolvimento musical em si.

Há cursos de pedagogia que oferecem a disciplina de Metodologia do

Ensino da Música, como é o caso da Universidade Federal de Santa Maria, no Rio

Grande do Sul. Cláudia Ribeiro Bellochio, professora desta cadeira na universidade

citada, explica:

[...] a disciplina de Metodologia do ensino da Música no curso de Pedagogia da UFSM tem propiciado um espaço de desafios e conquistas aos futuros professores, fato que entendo referendar a necessidade de maiores discussões e de implementação de formação musical, teórica e prática, na formação desses professores. (2001, p. 43)

Entretanto, essa não é a realidade nas universidades da nossa região,

razão por que muitos professores já se formaram e não têm preparo algum para

trabalhar com música. Não seria o momento de intervirmos nessa realidade e incluir

a música no currículo, mesmo que seja na matéria “artes” já existente? Há de se

pensar nisso, nesse ciclo de professores que têm dificuldades e insegurança para

trabalhar com a música, cujos alunos terão experiências semelhantes às dos

professores, já que o preparo destes é insuficiente.

Afinal, a música não poder ser considerada como algo apenas passivo,

pois é uma forma de pensar de interagir, um meio de ajudar as pessoas a pensarem

através da música. Não existe solução latente, mas há várias formas de se pensar

em transformar essa realidade, já que os educadores são agentes transformadores

do mundo, não agentes passivos.

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Mesmo que as professoras não se sintam preparadas para trabalhar com

a música em sala de aula, isso não significa que elas não tenham experiências

musicais, pois, como relatado anteriormente na primeira essência, a música fez

parte da vida de cada uma, apenas não foi aprofundada no que tange à área do

conhecimento. Segundo Ormezzano e Torres: “existe um elo muito forte entre

homem / música que sempre aparece na história humana. As vivências pessoais

estão misturadas, imbricadas com esse universo musical.” (2002, p.121).

Mas o que é música? Será um elo de ligação com nossas vivências e sentimentos? Acreditamos que sim, pois as experiências auditivas e de percepção musical misturam-se com as vivências do homem...Não encontrando uma definição para a música, consideramos como um grupo harmônico de idéias, optando por senti-la e acompanhá-la, assim como ela acompanha ao longo de nossas vidas. (Ibid, p.122).

A música, sem dúvida, acompanha a vida das pessoas, mas seria muito

mais proveitoso se elas tivessem consciência desse fato; se principalmente os

professores que trabalham não com a educação musical em si, mas com a música

tivessem consciência de que a música faz parte da vida e pode produzir bons frutos

se desenvolvida de uma forma mais direcionada e com subsídios.

3.3 IMPORTÂNCIA DA MÚSICA NA VIDA

A terceira essência, que trata da música na vida das professoras, possui

três dimensões que são: “O desejo de tocar um instrumento,” “Música para relaxar,”

e “Significações pessoais da música.”

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3.3.1 Desejo de tocar um Instrumento

A música, como parte das vivências musicais das pessoas, acaba por ter

uma importância diferente e única para cada uma, pois cada indivíduo é um ser

totalmente diferente de outro. Portanto, cada experiência é própria de cada um, cada

vivência é única e especial para cada um.

Algumas das entrevistadas mostraram um grande interesse em tocar um

instrumento musical. Violino tinha vontade de aprender a tocar acordeão na

infância, pois sua amiga tinha aulas deste instrumento e ela achava bonito. Porém

sua família não tinha condições financeiras de adquirir um violão para que pudesse

aprender.

O desejo de aprender a tocar um instrumento musical pode ser o primeiro

passo para uma caminhada musical. Se o indivíduo já apresenta o desejo, é mais

fácil de aproveitá-lo, pois este se mostra claro. Mas o desejo latente não é a única

forma de descobrir a vontade ou a identificação com um instrumento específico; há

também a possibilidade de descobrir o desejo de tocar um instrumento através da

musicalização e da exploração de vários instrumentos musicais, procurando

descobrir com qual há maior identificação.

No meu caso, o estímulo dos meus pais ajudou muito, pois iniciei com a

flauta doce fora do ensino formal, como já relatei no princípio deste trabalho;

posteriormente, o desejo de tocar piano e, mais tarde a flauta transversal

também aflorou por haver uma identificação pessoal com esses instrumentos e

a apreciação da sua beleza de minha parte. “O reforço positivo por parte do

adulto, parente ou professor, o propiciar a atividade musical de forma agradável

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e prazerosa, são caminhos para que a criança carregue a semente da música

pela vida afora.” (ORMEZZANO, TORRES, 2002, p. 147).

O mesmo aconteceu com Flauta em se tratando de influência

familiar.Como sua irmã ganhou um instrumento musical, mas logo de desinteressou

pelas aulas de música, o violão – verde – tornou-se seu brinquedo de infância. Ela

brincou com ele até os dez anos quando começou a fazer aulas de violão. A mãe e a

irmã eram sua platéia e a incentivavam, ouvindo seu repertório, que aumentava a

cada semana. Embora Flauta não tenha avançado nos estudos de violão, hoje ela

toca, porém gostaria de ter aprendido a tocar violão clássico, não popular. Flauta

também toca flauta doce, instrumento pelo qual tem verdadeiro amor.

Piano não teve influência dos pais nesse sentido, mas incentivou os filhos

a aprenderem a tocar um instrumento; infelizmente, segundo ela, apesar do

incentivo dos pais, eles não aprenderam a tocar nenhum instrumento musical. O

marido de Piano toca violão e sempre incentivou os filhos; chegou, mesmo, a

comprar flautas para as crianças e até fez flautas de bambu, porém eles não

quiseram aprender a tocar.

Portanto, nem sempre o incentivo dos pais tem resultado. Seria pois,

importante que a escola tivesse programas para despertar o interesse dos alunos

em tocar um instrumento musical.

Ainda podemos ressaltar a criatividade musical na invenção de canções,

visto que as crianças inventam canções com uma grande facilidade.

Viola contou um fato muito interessante e que retrata algumas

brincadeiras musicais que se tornam posteriormente em desejos reais. Quando Viola

tinha oito anos de idade, ela, sua irmã e a filha da patroa da mãe, colocavam-se

sobre a Kombi do pai de Viola e com pedaços de isopor tocavam e cantavam uma

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música que elas mesmas haviam composto em uma língua inventada por elas. Elas

decoraram aquela letra e a cantavam, ensaiando todos os dias, com a idéia de que

poderiam gravar esta música um dia. Sonhos tornam-se ou não realidade, conforme

o quanto se investe neles. O sonho de Viola não se realizou, mas os professores

podem incentivar seus alunos a criarem muitas coisas, inclusive música.

Apesar dos professores terem algumas resistências, porque vêem a improvisação e composição como algo difícil, que requer genialidade e grandes competências técnicas, a realidade nos diz que as crianças começam desde pequenas a expressar-se com o canto: primeiro, com pequenas seqüências melódicas que depois se transformam em historinhas cantadas (para acompanhar o jogo e a vida cotidiana) enfim, verdadeiras cançõeszinhas. Isto é possível, com certeza, se ao redor da criança há pessoas cantando: pais, irmãos, professores, etc. (TAFURI, 2000, p.60).

Para Fagote, o desejo encontrava-se latente pelo violão, mas não teve

oportunidade de aprender a tocá-lo. Todavia, mesmo sem ter aprendido, ela

incentiva os filhos, tanto que o menino toca teclado e a menina faz aulas de violino,

o qual ganhou alguns meses atrás, quando completou quinze anos. Relata Fagote

que o professor de violino ficou impressionado ao ver o rápido progresso da menina

com o instrumento. Seu marido não toca nenhum instrumento musical, mas assim

como Fagote, tem vontade de aprender e cultiva nos filhos juntamente com a

entrevistada o gosto pela música seja gauchesca que faz parte da tradição familiar,

ou seja clássica, que traz tranqüilidade, segundo ela.

3.3.2 Música para relaxar

A música também foi citada como fonte de relaxamento, tanto para as

entrevistadas em sua vida pessoal como para seus alunos em suas atividades

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cotidianas. “A música influencia sobre o metabolismo, a respiração, a pressão

arterial, diminui a fadiga, aumenta os reflexos; diminui as tensões, a ansiedade e

eleva o estado moral.” (ORMEZZANO & TORRES, 2002, p. 90).

Harpa gosta de ouvir músicas românticas quando volta da faculdade para

relaxar do dia cansativo. Ouve música por uma hora aproximadamente e diz que

consegue dormir bem por causa do efeito exercido sobre ela.

Violino gosta de músicas descritas como calmas, das quais não se lembra

do nome, mas deduz serem músicas clássicas. Segundo seu marido ouvir uma

música suave é bom para acalmar quando se levanta e enquanto se toma café.

Então, ela, o marido e o filho, ouvem CDs de músicas instrumentais.

Piano também afirma que a música clássica lhe traz tranqüilidade e paz,

sendo, atualmente, sua preferida.

Flauta contou que sua mãe lhe disse: “Você precisa da música para viver

e relaxar, você fica insuportável sem a música.”

Para Saxofone a música depende do humor; ela diz amar música

instrumental para relaxar, mas nem sempre ter tempo para ouvi-la. Seu filho mais

velho, de 13 anos, ouve música erudita enquanto está fazendo as tarefas escolares,

o que para ele, é uma verdadeira terapia; “A música constitui também um recurso

contra o medo e a ansiedade, além de uma defesa contra situações paranóides e

melancólicas.” (SEKEFF, 2002, p. 112).

No âmbito profissional, a música também é utilizada como forma de

relaxamento, como a usa Violino com seus alunos, para relaxar, acalmar e

descontrair em sala de aula, conforme o momento, conforme o conteúdo que ela

está trabalhando.

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Para Xilofone, a música também é adotada como relaxante para acalmar

as crianças depois de uma atividade mais agitada.

A música é usada por Clarinete para relaxamento, principalmente quando

as crianças voltam da educação física ou do recreio, bem como por Fagote.

Como recurso para outra atividade, o relaxamento é um exemplo. A

música dispõe de um poder grande, que é o de poder acalmar. O ritmo influencia

muito na condição que o objetivo pede: se for um objetivo de relaxamento, a música

precisa ter andamento lento e intensidade piano.

Cada uma das entrevistadas, traz consigo marcas musicais, mesmo sem

saber, mesmo se ressentindo de não ter tido oportunidade de maior preparo profissional.

A fenomenologia fez aflorar a música e sua história dentro de cada experiência relatada,

pois cada uma mostrou a importância que a música tem para sua vida.

3.3.3 Significações pessoais

Os sons são encontrados não somente na música, mas na própria

natureza, no corpo humano, na terra, no mar, nos pássaros, nos insetos, nas

cigarras, nos animais, no campo, na cidade, no homem, na vida. “Mesmo onde não

há vida, pode haver som.” (SCHAFER, 1977, p. 49).

Para cada indivíduo, os sons são presentes, pois, mesmo nos indivíduos

desprovidos da audição, as vibrações sonóricas podem ser sentidas. Som e música

se entrelaçam e criam um universo musical que transcende as concepções de

música composta. As significações pessoais de cada um têm base em suas

experiências e vivências diárias, desde a infância até a velhice.

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Para cada indivíduo a significação musical aparece de forma diferente,

atuando em sua vida com mais ou menos intensidade, quer ela seja consciente ou

mesmo inconsciente na mente das pessoas. Muitas vezes, apesar de a música estar

presente na vida diária, ter feito parte da história de cada um, a sua importância

pode passar como imperceptível, caso não haja uma reflexão sobre isso.

Essa caminhada começa com o bebê e o seu balbuciar musical, passando pela criança pequena e suas músicas expressivas e repetidas; as primeiras vivências escolares e a música, os adolescentes e a grande necessidade do som como companheiro até chegar a música dos adultos para relaxar, acabar com o stress do dia, amar, chorar perdas, comemorar as vitórias, relembrar sua infância e juventude, evocar os primeiros amores, realizar sonhos deixados para trás, construir novos caminhos... (ORMEZZANO, TORRES, 2002, p. 122).

Para Flauta a música foi e é parte atuante da sua vida. Segundo suas

próprias palavras, “a música tem para mim, a mesma importância do ar que respiro.

É a música minha companheira nas horas difíceis e nas horas alegres.” A

consciência de que aconteceram vivências musicais significativas é que leva Flauta

a afirmar seu significado musical dessa forma.

Afirma Saxofone:

A música sempre fez parte de minha vida, desde a infância quando lembro de minha mãe cantando, das músicas cantadas na igreja, na Escola Dominical, onde aprendíamos a cantar músicas de Jesus que eu lembro até hoje. Para mim a música ajuda a relaxar, dá ânimo, conforme o meu humor. Sempre estou ouvindo música, se entro no carro, ligo o CD, é automático, se estou fazendo almoço estou ouvindo música. E algumas lembranças gostosas que tenho são de quando cantava para fazer meus filhos dormir.

Para Saxofone a presença da mãe cantando influenciou-a para que

tomasse a mesma atitude com os filhos.

A mãe de Fagote cantava e brincava de roda com seus filhos, o que a

marcou muito; atualmente, ela, os filhos e o marido, têm uma apreciação grande

pela música. Mesmo sem saber tocar um instrumento, ela diz: “A música faz parte da

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minha vida, gosto tanto que meus filhos sentiram isso, consegui passar isso pra eles

e eles estão aprendendo a tocar teclado e violino. É tão emocionante ouvi-los

tocando, tem uma importância muito grande pra mim”.

Como Harpa ainda não tem filhos, esse compartilhar a música ainda não

aconteceu em sua casa, mas ela diz: “A música me acalma, preciso ouvir antes de

dormir para dormir tranqüila. É algo maravilhoso.”

Mas e aquelas pessoas que não tiveram experiências como essas?

Poderão agir de forma mais musical com a sua descendência ou com seus alunos?

Clarinete mostra que isso é possível, pois, como pôde ser observado no

relato das experiências que ela teve na infância, na primeira essência deste

trabalho, ela não teve incentivo musical por parte de sua mãe ou de outro membro

da família; mesmo assim, a música tem um grande significado em sua vida: ”Não

consigo viver sem música. Se estou triste, ouço uma música mais calma; se estou

alegre, aumento o volume do som e canto uma música mais agitada, e, quando

estou muito cansada, ligo uma música e ouço para relaxar. A música está tão

presente em minha vida, que não saberia viver sem ela.”

Na vida de Violino, a música foi descoberta em sua vida pessoal. Apesar

de ela declarar que não tivera formação musical, na própria entrevista, à medida que

iam surgindo as questões, a expressão de alegria em seu rosto era visível e foi

expressado também através de palavras quando disse: “Então eu tenho

experiências musicais? Achava que não tinha.” Por isso explorar questões que

estão implícitas é uma tarefa da fenomenologia, quando afloraram as vivências

musicais de Violino, ela se sentiu motivada a ter mais experiências nesse sentido.

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Para outras entrevistadas, a significação da música tem um sentido mais

profissional, como para Viola: “Eu gosto muito de usar a música com meus alunos,

ela é muito importante no meu trabalho, eu não saberia dar aula sem música.”

Piano, além de mostrar como a música faz parte de sua vida pessoal,

principalmente músicas que a marcaram, como citado nas referências aos gostos da

família, também dá uma importância especial à atuação musical na vida profissional:

“A música é algo muito importante para o desenvolvimento da criança. Eu sempre

uso com meus alunos, pois sei que ela ajuda no desenvolvimento cognitivo e

emocional da criança. Eu sempre cantei para meus filhos, mesmo quando ainda

estavam em meu ventre.”

Falando do significado profissional, Xilofone diz: “A música deveria ser

uma matéria específica desde a educação infantil até o ensino médio, porque se

trata de algo muito importante para as crianças.” Para ela deve existir uma ponte

entre o aspecto pessoal e profissional: “Para o aluno gostar de música, ele deve

sentir que o professor também gosta; é a mesma coisa com a leitura, o aluno tem

que sentir que o professor gosta. Eu gosto muito de ouvir música, quando estou

sozinha em casa, o som está sempre ligado.”

Portanto, cada uma de sua forma, pois as vivências e experiências são

individuais, mostrou como a música tem importância para elas, para umas mais,

para outras menos, o importante é que a música faz parte de suas vidas.

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POSLÚDIO

A emoção está quase sempre ligada às vivências musicais das pessoas.

Embora, por falta de conhecimento mais aprofundado, alguns pensem não ter

experiências e vivências musicais, todos as têm, alguns em maior número, outros

em menor, alguns de forma mais sistematizada, outros não. Mas as vivências

ocorrem mesmo assim. Como explica Sekeff,

[...] a palavra é incapaz de traduzi-la (a música) pelo fato de suas naturezas serem diferentes (o código lingüístico opera com signos simbólicos cuja sintaxe é a contigüidade, e a música manipula signos não simbólicos, operando por similaridade), ainda assim é possível uma “transcrição relativamente gratificante” em termos da emoção que a vivência musical suscita (2002, p. 120).

A emoção está intimamente ligada com as vivências pessoais. Mas nem

sempre estas experiências vivenciadas são explícitas, fazendo com que o indivíduo

tenha consciência disso, principalmente no que se trata da música. Pó esse motivo.

este trabalho, buscou fazer aflorar as experiências e vivências musicais das

professoras da educação infantil no município de Joaçaba.

Muitas foram as experiências relatadas, muitas vieram à tona no decorrer

das entrevistas e, algumas das entrevistadas tiveram a oportunidade de tomar

consciência de suas experiências musicais, iniciando na participação da oficina e

após, na realização das próprias entrevistas.

A dependência da música de Flauta fica explícita quando afirma: “Não

posso viver sem música.” O amor de Saxofone pelas músicas que sua mãe cantava

e sua vontade de voltar a tocar piano novamente mostram que a fenomenologia com

seu método de fazer vir à tona, atingiu seu objetivo. Da mesma forma como Violino

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se expressou ao descobrir que tinha experiências musicais, pois pensava que por

não ter sistematizado o conhecimento, a vivência musical não existia.

O conhecimento musical, no Brasil, infelizmente está restrito a aulas

extra-classe, geralmente fora da escola. Por esse motivo há tanta carência de

conhecimento musical, de apreciação de música de qualidade, com composições

que sejam harmônicas, que soem bem aos ouvidos. Segundo Shafer:

A música é, sobretudo, nada mais que uma coleção dos mais excitantes sons concebidos e produzidos pelas sucessivas operações de pessoas que têm bons ouvidos. O constrangedor mundo de sons à nossa volta, tem sido investigado e incorporado à música produzida pelos compositores de hoje. (1991, p.187-188).

Portanto, as experiências musicais são mais do que simples melodias, do

que tocar um instrumento; é cantar, ouvir todos os tipos de sons, inclusive aqueles

que nem parecem música, mas têm ritmo, como os sons da máquina de lavar roupa

da mãe de Flauta, que a embalavam e a faziam dançar. No mesmo sentido se

explica a ansiedade de Piano, Harpa e Xilofone para brincar com as amigas

cantando as cantigas de roda, que, como afirma Novaes, “além de apresentar...tão alto

valor educativo, imprime na alma e no coração da pessoa, através de sua melodia

ingênua e doce, uma de suas mais belas e duradouras recordações” (1986, p.12).

Ainda emergiu o desejo realizado e emocionado de Fagote, ao contar da

sua realização ao ver os filhos tocando instrumentos musicais e, as lembranças de

Clarinete sobre a hora do recreio, quando a diretora da escola cantava, e o prazer

que tem hoje de ouvir música, conforme seu estado de espírito. As lembranças de

improvisação de Viola, e seus sonhos de gravar um CD, são todas vivências que

mostram que há experiências musicais, pode haver muito mais; é mister prestar

atenção aos pequenos detalhes que fazem a diferença, mas às vezes não são

notados.

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Assim, a compreensão da vivência musical das professoras da educação

infantil em Joaçaba pôde acontecer, concretizando os objetivos desta pesquisa. Dentre

as muitas experiências e vivências que relatei, a que mais exigiu atenção foi o pedido

de ajuda delas entendido nas entrelinhas, de busca de um maior conhecimento musical

para regozijo próprio e para seu uso profissional em sala de aula.

Ficou demonstrado que não houve preparo musical em sua formação

profissional. Assim, com a realização da oficina e a descoberta do uso da música

como música em si própria, tudo ficou um pouco mais claro, porém seria

interessante que houvesse uma continuidade desse processo. Para tanto, há

necessidade de que em nossa universidade se aproveite a cadeira de teoria e

metodologia do ensino da arte, para a preparação dos professores na área musical,

haja vista a música ser presença constante nessa fase da educação. Não estou

propondo a criação de outra grade curricular, mas, sim, a adequação de uma grade

já existente às necessidades da comunidade docente. Afinal, não é esse um dos

principais objetivos da pesquisa? Que se compreenda a realidade para depois

propor formas de como agir e melhorar o que já existe?

Buscam-se mudanças, movimentos, afinal, música é movimento; não é

estática e não existe música sem movimento (SCHAFER, 1991); música é a

variação dos sons, de intensidade, de altura, de ritmos. Propomos, portanto, que

haja uma adaptação na grade curricular dos cursos que capacitam professores para

contemplar a música, a fim de cultivar a cultura e o desenvolvimento pessoal que

essa área pode trazer.

A vida musical de uma pessoa pode ser cheia de emoções à flor da pele,

ou cheia de emoções prontas a emergir, simplesmente esperando a oportunidade

para aflorar; pode ter muitos movimentos e a formação educacional desde a

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educação infantil até a acadêmica pode contribuir para que isto aconteça. Nessa

visão é que a sinfonia foi composta, respeitando os movimentos, suas intensidades,

seu ritmo e harmonia.

Ao longo da composição, deparei-me com sinais de repetição,

apogiaturas, colcheias, fusas, semifusas, semibreves, mordentes, pausas, porém,

como a composição é obra do compositor, tudo passou a ter sentido e harmonia no

momento da execução. Afinal, são essas diferenças de tempo, intensidade e altura

que deram beleza ao trabalho, num movimento constante, afinal, é música.

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APÊNDICES

SÍNTESE DO TODO

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APÊNDICE A – Entrevistada: Violino

A entrevistada afirmou não ter tido muito contato com a música.

Na casa dela, não havia o hábito de ouvir música. As músicas ouvidas eram do

rádio, não era música de qualidade, segundo ela.

A situação econômica da família não era boa, então não havia acesso a materiais

como instrumentos musicais.

A entrevistada tinha vontade de aprender a tocar acordeão, pois sua amiga tinha

aulas deste instrumento e ela achava bonito. Sua família não tinha condições

financeiras de ter um violão para que pudesse aprender, sempre teve vontade, mas

eram em três irmãos.

Ela não lembra da mãe cantando, pois esta não tinha tempo disponível e achava

que isto era perder tempo.

Da escola a lembrança que a entrevistada tem é da música: “Há três noites que eu

não durmo, o, lá, lá, pois perdi o meu galinho o lá, lá, pobrezinho lá, lá coitadinho, lá,

lá, ela está lá no jardim”.Foi a professora da terceira série das séries iniciais que

cantava esta música para a turma e a entrevistada nunca esqueceu. Ela não fez

educação infantil, pois só existia particular.

Na adolescência ela ouvia músicas da moda, que estavam na mídia. Ela lembra que

a irmã mais velha viajou para Cascavel e trouxe uma mochila com a foto do Michael

Jackson. Ela gostava de ouvir as músicas dele e também dos Menudos. Segundo

ela pensa hoje, as músicas não tinham qualidade nenhuma.

Nos dias atuais ela mudou seu estilo de música, gosta de músicas calmas, não

lembra o nome, mas sabe que é clássica. Seu marido foi fazer um curso e recebeu

orientação lá que, de manhã, ouvir uma música suave é bom para acalmar quando

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levanta e enquanto toma café. Então eles ouvem, ela, o marido e o filho. Ouvem CDs de

músicas instrumentais e não gostam de músicas vulgares, fortes, segundo ela.

A entrevistada disse que não ouve só música clássica, mas que está aprendendo a

gostar e gosta também de músicas populares mais calmas, inclusive o filho

adolescente gosta de MPB e não gosta de rock e pagode.

No âmbito profissional ela usa a música para relaxar, acalmar e descontrair em sala

de aula, conforme o momento, conforme o conteúdo que ela está trabalhando. Disse

que ainda não consegue trabalhar como foi feito na oficina (parte do projeto), porque

não tem preparo para isso.

Ela trabalha também as cantigas de roda, o resgate do folclore. As músicas

folclóricas são cantadas e brincadas, como por exemplo, “Escravos de Jô,” que se

brinca com pedrinhas.

Ela costuma colocar a música também com vários tipos de ritmo para as crianças

desenharem ou para se acalmarem quando estão muito agitadas. Afirmou que não

trabalha profundamente a música por falta de conhecimento. Tenta adequar a

música aos conteúdos, mas se trata mais de música folclórica, as cantigas de roda.

Depois da oficina, a visão dela para trabalhar a música mudou, segundo sua

afirmação, não canta mais só por cantar, mas disse que ainda falta conhecimento

para trabalhar melhor com a música em sala de aula.

A entrevistada relatou que na escola existe a bandinha rítmica, mas ela não trabalha

porque não tem segurança de como fazê-lo.

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APÊNDICE B – Entrevistada: Flauta

Entrevistada: Flauta

A entrevistada foi influenciada pela mãe desde bebezinho.

Uma vizinha e professora do pré a influenciou com suas músicas tocadas no violão e

cantadas.

A irmã da entrevistada ganhou um instrumento musical, mas logo de desinteressou

pelas aulas de música. Este instrumento foi o seu brinquedo de infância, um violão

verde. Ela brincou com ele até os 10 anos quando começou a fazer aulas de violão.

A mãe e a irmã eram sua platéia e a incentivavam, ouvindo seu repertório que

aumentava.

A entrevistada não avançou nos estudos de violão e hoje ela toca, mas gostaria de

ter aprendido a tocar violão clássico e não popular.

A igreja a influenciou, pois gostava de acompanhar os hinos nos cultos, ouvindo o

som do harmônio, tocado sempre, e da flauta transversal, tocada de vez em quando

pelo marido da organista. Gostava também da época do Natal onde havia

apresentações que a entrevistada participava e as crianças, inclusive ela podiam

tocar instrumentos de percussão, como: coco e triângulo. Ela também participava de

corais infantis.

A televisão contribuiu em variar o seu gosto musical também para MPB e música

clássica. Ela assistia a “Concertos para a Juventude”, “Vila Sésamo” , onde o Marcos

Vale cantava e ela gostava. Uma música que a marcou foi “Construção”, de Chico

Buarque, cuja voz ela não percebe como maravilhosa, mas acha o timbre

interessante e a música lhe causava curiosidade e tristeza, uma sensação estranha

segundo ela.

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Outras influências televisivas foram Tom Jobim, Elis Regina e uma novela chamada

“Bravo”, que era a história de um maestro que era apaixonado, e na abertura

aparecia ele regendo uma orquestra. A irmã da entrevistada comprou o disco da

trilha sonora desta novela que continha trechos de obras famosas interpretado por

Osvaldo de Los Rios, fazendo uma interpretação mais popular para cativar as

pessoas, e a entrevistada ouvia o dia todo essas músicas. Segundo ela, essa foi

uma forte influência pelo seu gosto pela música erudita.

Alguns sons que a marcaram na infância foram o dos eletrodomésticos: aspirador de

pó, enceradeira e máquina de lavar que enquanto funcionava durante a manhã, a

entrevistada ficava imitando o barulho e dançando, acompanhando o ritmo.

Também os jingles da TV, ela gostava tanto que tinha um caderno para anotá-

los.Segundo ela isso a alegrou muito na infância.

A música é parte atuante da vida da entrevistada, a qual afirma que a música para

ela tem a mesma importância do ar que ela respira. É a música sua companheira

nas horas difíceis e nas horas alegres.

Seu gosto é variado: músicas eruditas, óperas, árias (solistas), MPB, Bossa Nova,

música regionalista, gaúcha, rock não pesado, mas a predileção é por música

erudita.

Na vida profissional, ela tem preocupação com o repertório empobrecido das

crianças, por isso procura trazer uma variedade boa de músicas, principalmente as

que as crianças dificilmente têm acesso em casa. Leva para a sala música clássica,

música para bebês, para crianças, CDs do grupo Palavra Cantada, do Castelo

Ratimbum que tem sons de 42 instrumentos musicais, para trabalhar os timbres e

também CDs de cantigas de roda.

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Leva também para a sala instrumentos musicais como flauta doce que as crianças

têm a oportunidade de experimentar e o violão (o mesmo verde que ela brincava

quando criança).

As atividades com música são noções de som sons corporais, onomatopéia, ritmo,

freio inibitório, intensidade, volume, timbres, às vezes ouvindo os diferentes tipos de

instrumentos, das vozes deles, que é gravada para eles ouvirem e analisarem como

foi se gritaram, se ficou bom, o que poderia melhorar.

Também ela encaixa a música com o conteúdo que está trabalhando, como por

exemplo, no projeto Família, ela encaixou a família dos instrumentos musicais.

Se alguma criança leva CDs de música infantil, mesmo que não seja de qualidade, o

CD é ouvido para valorizar a criança e sabendo que essas músicas também fazem

parte da vida dela.

Segundo a entrevistada, as crianças pedem pras mães para aprender a tocar um

instrumento, pelo contato que têm em sala de aula e vêm falar com a professora,

que incentiva o aprendizado em atividades musicais extraclasse.

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APÊNDICE C – Entrevistada: Piano

A entrevistada lembra das cantigas de roda na sua infância, seja pela mãe cantando

e ensinando as brincadeiras seja pelas brincadeiras com as amigas. Duas músicas

específicas são:”A gata cega” e “Ciranda cirandinha.”

Um fato marcante era que na infância em sua casa muitas vezes sua mãe estava

fazendo almoço, alguma música tocando, geralmente sertaneja ou clássica e o pai

vinha pegava a mãe para dançar, ela largava tudo e os dois dançavam. Isto marcou

tanto que hoje, a entrevistada, casada, cultiva o mesmo hábito com o marido.

A música romântica é a sua preferência desde que era adolescente, a trilha sonora

e o próprio filme: “Romeu e Julieta”, marcaram sua vida. E um sonho que ela tinha e

conseguiu realizar na idade adulta era ir até a Itália e ouvir lá as músicas do filme.

Houve uma emoção grande da entrevistada ao relatar este fato, que as lágrimas

correram pelo seu rosto.

Na fase atual de sua vida pessoal ela gosta de ouvir músicas eruditas, porque

trazem tranqüilidade e paz.

Na vida profissional ela relatou que inicia a aula com música, e todas as atividades

que as crianças fazem são iniciadas através da música. Então as crianças já sabem

o que vão fazer em seguida.

Ela também leva gravações de música clássica para a sala e as crianças fazem

movimentos corporais através da música. Se é lenta, suave, elas caminham ou

rolam, e assim por diante. A música também serve para acalmar as crianças quando

estas estão muito agitadas. Também tem uma professora que trabalha

especificamente a expressão corporal com eles, então esta parte, afirmou a

entrevistada, fica mais sob a responsabilidade desta professora. Durante a audição,

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algumas crianças conseguem diferenciar qual instrumento está tocando,

principalmente o piano e a flauta.

As músicas populares também fazem parte do repertório das crianças, pagode,

samba, são levados para a sala pela própria professora.

A música é algo muito importante para o desenvolvimento da criança, disse a

entrevistada, que sempre cantou para seus filhos, mesmo quando ainda estavam em

seu ventre. Segundo ela, a música desenvolve a oralidade da criança, e faz a

criança gostar de música, o que ela pôde constatar com seus filhos, que gostam de

música, mas, apesar do incentivo dos pais, não aprenderam a tocar nenhum

instrumento musical.

O marido toca violão e sempre chegou a comprar flautas para as crianças, até fez

flautas de bambu pra eles, mas eles não quiseram aprender a tocar. Os

instrumentos que ela gosta mais são: piano e violão que segundo ela, bem tocados

fazem bem para o ouvido.

Ela ouve música o dia todo e sempre toma banho cantando, pois a música faz parte

da sua vida.

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APÊNDICE D – Entrevistada: Viola

A entrevistada afirmou não ter tido muitas experiências musicais. Mas lembra que

quando estudava nas séries iniciais, a professora de educação física, trabalhava

com brincadeiras de roda. Ela lembra de duas: “Ciranda cirandinha” e “Negrinhos da

África.”

Um fato marcante aconteceu quando ela tinha oito anos. A irmã, a filha da patroa da

mãe e ela subiam em cima da Kombi do pai da entrevistada e com pedaços de

isopor tocavam e cantavam uma música que elas mesmas criaram em uma língua

inventada por elas. Elas decoraram aquela letra e cantavam, ensaiavam todos os

dias. Sua idéia era que poderiam gravar esta música um dia.

Da infância ainda, ela lembra de ouvir rádio em casa, da empregada que cantava e

brincava de roda, com ela e seus dois irmãos. Da mãe, ela não tem lembrança de

vê-la cantando para os filhos.

As músicas do Elvis Presley, ela lembra, pois assistia seus filmes e chorou muito

quando ele morreu.

Já quando estava cursando as séries de 5ª a 8ª ela lembra de um irmão (padre) que

cantava e tocava violão para os alunos. E de uma homenagem que ela e seus

colegas fizeram para um irmão (padre), de 70 anos cantando uma música de

Roberto Carlos (...esses seus cabelos brancos, bonitos...), música que ela não

esqueceu mais.

Na adolescência, ela lembra de músicas que marcaram seu namoro, músicas do Tim

Maia e do Roberto Carlos.

Atualmente Lea não ouve muita música por falta de tempo, mas gosta de Enia, Era

de ouvir FM. O marido ouve Bruno e Marrone e José Geraldo.

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Ela diz que sempre cantou para os filhos, quando eram bebês, canções de ninar,

depois cantigas de roda. Tentaram colocar eles na aula de música para aprender

algum instrumento musical, a menina que é mais velha não quis e o menino até já

compraram um violão para ele, mas por enquanto não demonstrou interesse.

Na vida profissional ela disse que trabalha a música em sala porque a música pode

ajudar a desenvolver todas as habilidades. Ela canta com as crianças, leva músicas

novas e agradáveis para movimentação e gestos. Trabalha as letras das músicas

para trabalhar as palavras, também a dramatização. Usa muita a música nas

brincadeiras da “Hora lúdica”, que é um momento diário específico de brincadeiras,

mas com objetivos de aprendizagem. Usa a música também como forma de acalmar

as crianças.

Ressaltou que sempre que as crianças levam CDs para a sala ela os coloca para

tocar, valorizando a criança e sua iniciativa.

Também a escola oferece aulas de música com uma professora específica, o que

tem ajudado as crianças no desenvolvimento, segundo a entrevistada.

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APÊNDICE E – Entrevistada: Xilofone

As cantigas de roda marcaram a infância da entrevistada, seja cantadas pela mãe

antes de dormir ou nas brincadeiras com os colegas de aula, as amigas e ensinadas

pela professora da educação infantil.

A música preferida dela era: “Ciranda cirandinha” e, também a brincadeira do ovo

choco que ela brincava na escola. Em casa ela lembra que a mãe cantava: “Boi da

cara preta”, “Fui morar numa casinha” e a “Baratinha.”

Ela contou que ficava esperando a hora de ir para a escola para poder brincar com

as amigas e que isto era uma alegria.

Em casa ela assistia televisão e ouvia rádio, mas não tem muitas lembranças sobre

as músicas que ouvia nesses meios de comunicação, seus pais trabalhavam fora e

ela passava o dia brincando com os vizinhos.

Atualmente ela gosta de ouvir músicas que tenham conteúdo, como por exemplo:

“Epitáfio” dos Titãs. Segundo ela este tipo de música faz a pessoa refletir e melhorar

o comportamento, pois ela pode parar para analisar a música e pensar na

mensagem que ela traz.

Na área profissional a entrevistada canta as cantigas de roda com os alunos,

músicas com gestos, que tem sons de animais, para eles ouvirem e imitarem.

Desenvolvendo a expressão corporal e a socialização, segundo ela.

A música também é usada como relaxante para acalmar as crianças depois de uma

atividade mais agitada.

Já no início da aula, as cantigas de roda estão presentes, até mesmo há a

oportunidade de as crianças criarem, improvisarem músicas, que eles inventam na

hora e cantam para os colegas.

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A entrevistada afirmou que nunca trabalhou a música em si, com objetivos

específicos, porque não teve formação para isto. Em uma outra escola que ela

trabalhou havia um professor específico de música que cantava com as crianças e

tocava violão, o que era fascinante para as crianças, segundo ela. Mas as

professoras que participavam também da aula, ficavam encabuladas de movimentar-

se com as crianças e participar mais ativamente da aula.

Os repertórios usados em sala são as cantigas de roda e música popular infantil que

a mídia apresenta Eliana, Xuxa, Gugu, ás quais a entrevistada referiu-se como

ótimas para serem usadas em sala, pois trazem também uma fita de vídeo com os

gestos para as crianças imitarem.

Ela pensa que a música deveria ser uma matéria específica desde a Educação

infantil até o ensino médio, porque se trata de algo muito importante para as

crianças.

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APÊNDICE F – Entrevistada: Clarinete

Da infância alguns fatos marcantes que a entrevistada lembra são da avó que ouvia

músicas sertanejas no rádio e a ensinava a dançar, e de um Tio que comprou um

aparelho de som, um toca disco, e ela ouvia e achava aquilo perfeito.

A mãe não costumava cantar para ela, pois teve uma educação diferente e era mais

fechada, reflete ela.

Na escola, ela não teve a Educação infantil, então a área musical ficou restrita a

Diretora da escola cantar na hora do recreio, uma música lembrada por ela é a do

“Cravo brigou com a rosa”. Relata a entrevistada, que a diretora subia em um lugar

mais alto do pátio e cantava com os alunos, e isto a marcou muito.

Na adolescência, ela ouviu muita música de estilo popular, no rádio e na Televisão,

temas de novela, música estrangeira e nacional. Uma música marcante para ela, foi

o tema de uma campanha contra a fome das crianças, cujo início era: “We are the

world”. Cada vez que ela via crianças maltrapilhas na rua ela lembrava desta

música.

Ela afirma que não consegue viver sem música. Se está triste, ouve uma música

mais calma, se está alegre, aumenta o volume do som e canta uma música mais

agitada, e quando está muito cansada, liga uma música e ouve para relaxar.

Quando está sozinha em casa, o som está sempre ligado.

Na área profissional ela diz que sempre gostou de trabalhar com música. Ela canta e

coloca CDs de cantigas de roda e músicas folclóricas para as crianças ouvirem e

cantarem, segundo ela com o CD as crianças aprendem muito mais rápido do que

só com a professora cantando.

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Outra forma de trabalhar coma música é explorar a letra da mesma, até mesmo para

alfabetizar as crianças usando letras de músicas. Ela não usa música popular, pois

afirma que é preciso ter um cuidado muito grande com o repertório que aparece na

mídia, então ela prefere deter-se às músicas folclóricas infantis.

A música também é usada para relaxamento, principalmente quando eles voltam da

educação física ou do recreio. Às vezes quando há músicas relacionadas com

histórias, ela coloca a música primeiro e depois conta a história.

No entanto a música clássica nunca foi usada pela entrevistada, mas ela pensa que

seria para relaxamento.

Um problema que ela vê, é que não há um aparelho de som disponível para cada

sala de aula, então algumas vezes a professora quer usar o aparelho de som e não

há nenhum disponível, pois já estão ocupados por outras salas.

Segundo ela, para o aluno gostar de música o professor tem que gostar, assim como

para o aluno gostar de leitura o professor tem que gostar e incentivar.

Ela sente que, na formação acadêmica, o professor deveria ser preparado para

trabalhar com a música, pois é algo que é usado todos os dias, em sala de aula. A

formação da entrevistada não abrangeu a música, pois a disciplina de artes, foi

especificamente expressão corporal, o que poderia ter sido direcionado para a

música, que seria mais proveitoso, reflete ela.

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APÊNDICE G – Entrevistada: Harpa

A entrevistada relatou que a mãe cantava pra ela, principalmente a música: Atirei um

pau no gato. A mãe disse que quando ela estava chorando era só cantar esta

música que ela parava de chorar.

O pai da entrevistada gostava de ouvir no rádio músicas sertanejas e ela acabava

ouvindo junto e gostando. Já da televisão ela não lembra de ouvir músicas na

infância, porque isto não a marcou.

Na escola a professora cantava com as crianças e fazia brincadeiras de roda. As

preferidas que ela têm mais lembrança são: “Atirei o pau no gato”, “Ciranda

cirandinha”, “Negrinhos da África”, “Senhora Dona Cândida”. No entanto não havia

outros tipos de música, eram só as cantigas de roda mesmo.

Nas séries iniciais a música foi diminuindo, quase não era trabalhada.

Na adolescência ela ouvia músicas populares como de Roberto Carlos, Zezé de

Camargo e Luciano.

Atualmente ela ouve músicas calmas, prefere as românticas. Quando volta da

faculdade, fica ouvindo música até tarde para relaxar. Ela também gosta de ouvir

música quando está sozinha em casa.

Ela acha que a música é muito importante na sala de aula, por desenvolver a

expressão em geral e corporal da criança. Quando as crianças trazem músicas de

casa que são de vários estilos como rock ou de rodeio, eles ouvem e dançam,

mesmo que não esteja no planejamento da aula, mas para valorizar a criança.

Quando eles acabam a atividade também se coloca a música para ouvirem. E

conforme o conteúdo que se está trabalhando a música é aproveitada pra ser usada,

como músicas que falam de números, para trabalhar algumas palavras,

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desmembramentos de palavras, isto está incluído no planejamento que é feito junto

com as quatro professoras da mesma faixa etária da escola. Segundo ela, quando o

conteúdo é trabalhado com música as crianças não esquecem mais.

Também são usadas músicas específicas para a hora do lanche e para ficar em

silêncio, quando canta uma determinada música as crianças já sabem que têm que

ficar em silêncio.

Quando ela trabalhou na creche, com crianças de zero a dois anos, costumava

colocar músicas que os pais das crianças ouviam em casa e relata ela, que o

resultado era impressionante, ou seja, as crianças se acalmavam pois a música

lembrava o ambiente deles, e já os influenciava.

Seguidamente quando ela está cantando com seus alunos é arremetida para sua

própria infância, devido que as mesmas músicas que a marcaram são cantadas

ainda hoje com seus alunos.

Com música clássica ela nunca trabalhou, por não ter muito conhecimento, justifica

ela, que disse não ter tido base musical na faculdade, pois a disciplina de artes foi

apenas expressão corporal, teatro, e a professora dedicou-se mais à pós-graduação

do que à graduação na época, já que a matéria era intensiva.

Ela afirma que gostaria de fazer cursos de formação continuada sobre música.

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APÊNDICE H – Entrevistada: Fagote

As recordações da infância da entrevistada foram marcadas pela mãe cantando

músicas de ninar e depois cantigas de roda. A mãe cantava e brincava com os filhos

que eram em número de oito, a entrevistada é a segunda filha do casal, então conta

ela que a exemplo da mãe cantava para os irmãos.

A família morava no interior seu pai era agricultor e a mãe professora. A presença da

mãe foi marcante, pois era uma professora diferente para a época, enquanto as

escolas eram mais formais e não havia brincadeira, ela cantava e brincava com os

alunos e também com os filhos, que tinham que brincar em casa, já que a mãe

nesse sentido era rígida e não os deixava brincar na casa de outros. No entanto, a

mãe não chegou a ser sua professora.

A família era humilde, não tinham televisão, mas tinham um rádio a pilha, em que o

pai e a mãe ouviam a noite o programa do Teixeirinha, muito apreciado por eles,

com músicas gauchescas e em seguida um programa da Rádio de São Paulo com

músicas sertanejas. Os filhos ouviam também e apreciavam as músicas, era o

programa familiar da noite. O nome da entrevistada é atribuído por muitas pessoas à

uma música do Teixeirinha, mas conta ela que na verdade seu nome tem outra

história.

Iniciou a caminhada escolar já nas séries iniciais, ela lembra que foi uma ruptura

muito grande, pois era um professor homem que lecionava para as quatro séries ao

mesmo tempo (escola multiseriada), ele era enérgico, não brincava e não cantava,

ela ficava apreensiva na hora de ir para a escola. Mas na hora do recreio, brincava

de roda com os colegas, as músicas lembradas são: “Ciranda cirandinha”, “Roda

cutia”, “Passa passará.”

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De quinta à oitava série não houve mais música na escola, ela só foi ter contato em

se tratando de escola, com a música novamente quando fez o Magistério, dez anos

após ter terminado o ensino fundamental.

Sua adolescência foi uma extensão da infância, ela brincava e cantava as mesmas

músicas da infância. Começou a trabalhar com quinze anos, na antiga LBA com

educação infantil. AS lembranças musicais que ela tem são do rádio e de que ela

cantava.

No curso de magistério, o contato musical se deu pelas cantigas de roda, músicas

folclóricas que poderiam se encaixar nos conteúdos que elas iriam dar em sala de

aula.

Na formação acadêmica não houve uma disciplina que contemplasse a música, ela

sente falta, pois o trabalho na educação infantil exige música todos os dias e não

houve formação para isso, então se acaba fazendo o que cada um acha melhor,

cantando e, encaixando as músicas conforme os conteúdos.

A entrevistada contou que sempre quis aprender a tocar um instrumento musical,

gosta muito de violão, mas não teve oportunidade então ela incentiva os filhos,

sendo que o menino toca teclado e a menina faz aulas de violino que ganhou há uns

meses atrás quando completou quinze anos. O professor de violino ficou

impressionado ao ver o rápido progresso da menina com o instrumento. A mãe se

emociona ao ouvir a filha tocar.

O marido da entrevistada não toca instrumento musical, mas tem vontade de

aprender e cultiva nos filhos junto com a entrevistada o gosto pela música seja ela

gauchesca que faz parte da tradição familiar, já que participavam de CTG na cidade

que moravam anteriormente, seja ela clássica, pois, traz tranqüilidade. Ela enfatiza

que a música sempre esteve muito presente em sua família.

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Ela lembrou que na oficina de música ficou impressionada da forma como eu falei de

Beethoven e com as músicas ouvidas lá. Ela disse que há uma música que não

lembra o nome, mas é de Beethoven e que marcou a sua vida.

No âmbito profissional, ela canta muito com as crianças as cantigas de roda e as

cantigas folclóricas que envolvem datas também folclóricas, inclusive estas músicas

são usadas para apresentações na escola.

A entrevistada conta que tem o aparelho de som sempre na sala para colocar

músicas de fundo enquanto as crianças estão fazendo alguma atividade, as músicas

são infantis, seja cantigas de roda, ou de cantoras como Xuxa e Angélica, pois ela

afirma que estas músicas fazem parte do convívio das crianças e faz com que elas

se sintam mais familiarizadas com o ambiente escolar. As músicas são usadas

também para acalmar.

Dependendo do conteúdo que está sendo trabalhado, as músicas são encaixadas

na aula, mas também são feitas rodinhas onde se canta, bate palma e se dança

durante as cantorias das músicas. A entrevistada diz que muitas vezes se remete à

infância quando está cantando com seus alunos, seja porque as músicas são as

mesmas, seja pela lembrança de que não teve oportunidade de participar da

Educação infantil e cantar com a professora.

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APÊNDICE I – Entrevistada: Saxofone

A entrevistada tem muitas lembranças da infância. Lembra que morava na frente da

madeireira do pai e imitava os sons que vinham de lá. Lembra que a mãe cantava

muitas músicas para ela e sua irmã. Principalmente músicas da igreja que ela

também cantou para seus filhos. Citou alguns nomes: “Meu barco é pequeno; Pedro,

Tiago e João; Deus tem amado; Oh vinde meninos.” Ela cantava para os filhos

dormirem.

Na sua casa, durante a infância, o rádio ficava ligado o dia todo, ouviam programas

religiosos, notícias e música, que ela ouvia, cantava junto e dançava.

Da televisão ela lembra do programa Globo de Ouro, que ela assistia toda a

semana, era um programa que mostrava os cantores cantando as músicas mais

tocadas na semana, era muito bom de assistir, diz ela. Também era fascinada pelo

programa: “Show de calouros do Chacrinha”, aonde as pessoas iam lá para tentar

cantar e ela gostava tanto que era uma das brincadeiras dela e das primas, brincar

de show de calouros,vestiam as roupas de suas mães, sapatos de salto, camisolas e

se apresentavam cantando. Outro programa que ela gostava era “Vila Sésamo”, que

tinha muita música envolvida.

A mãe da entrevistada tocava violão e seu tio tocava gaita. Nos finais de semana

eles se reuniam e tocavam juntos, músicas sertanejas como do Teixeirinha, Tonico

e Tinoco, e também Amado Batista, Roberto Carlos e músicas religiosas. Diz a

entrevistada que se ela sabia a letra cantava junto. Lembra com muito carinho dessa

fase da vida.

Também lembra da mãe cantando no coral da igreja. Ela lembra que gostava muito

de ouvir a mãe cantando e quando ela faleceu o coral cantou no seu enterro, e foi

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muito emocionante, pois ela imaginava a mãe cantando junto. Foi algo que a marcou

muito.

A entrevistada estudou piano por quatro anos, na infância e também teve aulas de

violão. Mas ela parou de fazer as aulas e não lembra mais como tocar, mas ainda

lembra das notas. Ela conta que tentou tocar na igreja, mas não era piano era um

instrumento chamado harmônio, que para funcionar tinha que friccionar os pedais,

então ela não conseguia se concentrar nas notas, nas teclas e nos pedais ao

mesmo tempo e desistiu. Ela diz que sente vontade de voltar a tocar tanto o piano

como o violão novamente.

Ela gosta muito de ouvir música, dependendo do seu humor, ela ouve músicas mais

agitadas ou mais calmas principalmente para relaxar, ela gosta de músicas

instrumentais, mas reclama que nem sempre tem tempo. O filho mais velho dela,

gosta de ouvir música enquanto faz os temas da escola.

Ainda na sua infância, na escola a professora da primeira série cantava uma música

que ela lembra até hoje. Como não fez educação infantil, a coordenação motora era

desenvolvida na primeira série, então a professora cantava (com a melodia da

música “Ciranda cirandinha”): “O meu lápis sobe e desce, sobe e desce sem parar,

vejam só meus amiguinhos quem acaba de chegar.” Ela lembra que quando

chegava ao fim da linha sempre tinha um animal, era o prêmio. Ela lembra do

coelho. Lembra da voz da professora da segunda série que cantava bastante, mas

não lembra das músicas, também o professor da terceira série cantava e como era

homem, a voz era mais forte e foi marcante.

A música sempre fez parte da vida da entrevistada, diz ela. Conta que a igreja teve

um papel importante em sua vida musical. Ela diz que sempre que entra no carro,

liga o som e ouve música e canta junto sempre que está fazendo almoço, gosta do

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grupo Ira e também de música gospel. Ela diz que a música dá ânimo pra pessoa e

a ajuda a relaxar. Sempre cantou para os filhos dormirem.

Também trabalha com a música em sua sala de aula. Diz ela que a música se faz

presente todos os dias em suas aulas. Ela diz que as crianças memorizam melhor

com a música, até palavras em inglês se tornam mais fáceis se a música for usada.

Mas ela usa a música apenas como um recurso a mais.