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CURSOS ON-LINE – DIR. PROCESSUAL CIVIL P/ TCU E CGU PROFESSORA MIRIÃ NUNES www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA 01 – ATOS JUDICIAIS: DESPACHOS, DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS E SENTENÇAS. Olá, pessoal! É com prazer que inicio a primeira aula do nosso curso de direito processual civil, pois se você chegou até aqui, é sinal de que se identificou com a linguagem e compreendeu os pontos iniciais do programa. Prosseguiremos hoje para abordar as noções basilares da teoria geral do processo (jurisdição, ação e processo), relembraremos a estrutura da relação processual e conheceremos os pressupostos processuais. A aula de hoje é fundamental para a compreensão de toda a disciplina processual. Temos a tarefa de compreender conceitos dotados de alto grau de abstração, mas que, justamente por isso, são muito interessantes. Tenha especial atenção aos conceitos da trilogia estrutural do processo (jurisdição, ação e processo). Ao compreendê-los, você estará à frente dos concorrentes que buscam tão somente decorar os dispositivos do Código de Processo Civil. E aí, prontos? Então, ao trabalho! 2.1 Noções Sobre a Teoria Geral do Processo Na aula anterior, aprendemos que há uma distinção fundamental entre as normas de direito material e as de direito processual, sendo que as últimas tratam, basicamente, de disciplinar uma função, um Poder do Estado, que é a Jurisdição. Como veremos adiante a Jurisdição é, por definição, una e indivisível. Sabemos também que existe uma divisão fundamental do direito processual em Direito Processual Civil e Direito Processual Penal, sem falar na existência de outros ramos especializados, como o Direito Processual do Trabalho, por exemplo. Já posso imaginar a sua cara de dúvida: “ora, se a Jurisdição é uma só, como justificar tantas subdivisões? Por que há um código de processo civil e um outro código para o processo penal? Juízos criminais e juízos cíveis?” São perguntas bastante pertinentes.

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AULA 01 – ATOS JUDICIAIS: DESPACHOS, DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS E SENTENÇAS.

Olá, pessoal!

É com prazer que inicio a primeira aula do nosso curso de direito processual civil, pois se você chegou até aqui, é sinal de que se identificou com a linguagem e compreendeu os pontos iniciais do programa. Prosseguiremos hoje para abordar as noções basilares da teoria geral do processo (jurisdição, ação e processo), relembraremos a estrutura da relação processual e conheceremos os pressupostos processuais. A aula de hoje é fundamental para a compreensão de toda a disciplina processual. Temos a tarefa de compreender conceitos dotados de alto grau de abstração, mas que, justamente por isso, são muito interessantes. Tenha especial atenção aos conceitos da trilogia estrutural do processo (jurisdição, ação e processo). Ao compreendê-los, você estará à frente dos concorrentes que buscam tão somente decorar os dispositivos do Código de Processo Civil. E aí, prontos? Então, ao trabalho! 2.1 Noções Sobre a Teoria Geral do Processo Na aula anterior, aprendemos que há uma distinção fundamental entre as normas de direito material e as de direito processual, sendo que as últimas tratam, basicamente, de disciplinar uma função, um Poder do Estado, que é a Jurisdição. Como veremos adiante a Jurisdição é, por definição, una e indivisível. Sabemos também que existe uma divisão fundamental do direito processual em Direito Processual Civil e Direito Processual Penal, sem falar na existência de outros ramos especializados, como o Direito Processual do Trabalho, por exemplo. Já posso imaginar a sua cara de dúvida: “ora, se a Jurisdição é uma só, como justificar tantas subdivisões? Por que há um código de processo civil e um outro código para o processo penal? Juízos criminais e juízos cíveis?” São perguntas bastante pertinentes.

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De fato, sendo o direito processual, basicamente, aquele que disciplina a função jurisdicional, podemos identificar elementos comuns em todos os seus “filhotes”. Daí, falar-se em uma Teoria Geral do Processo, isto é, uma parte geral da matéria que se aplica indistintamente a todos os seus “ramos”. Tanto é assim que alguns países como Suécia, Honduras e Panamá optaram por uma regulamentação única para o direito processual (civil e penal). Mas a tendência majoritária e a de separar tanto o estudo quanto a legislação (tal como nós brasileiros fizemos), o que se dá por razões didáticas e de ordem prática. Mas, tal separação não impede que os elementos essenciais, comuns tanto ao processo civil quanto ao penal, sejam agrupados e estudados sob a denominação de “Teoria Geral do Processo”, que é a disciplina que estuda os conceitos essenciais ao exercício da função jurisdicional, dentre eles aqueles que compõem a denominada “trilogia estrutural do processo”. O Direito Processual, tal como o estudamos hoje, é uma construção abstrata, bastante recente se comparada a outros ramos do direito (o direito civil, por exemplo, que possui alguns institutos praticamente inalterados desde a Roma Antiga). Claro que, desde os primórdios, o homem criou normas, fórmulas para exercer seus direitos em juízo, mas houve um longo percurso até que os juristas passassem a se preocupar em “fundamentar” o processo. Fala-se em “trilogia” porque são três os conceitos: A Jurisdição, a Ação e o Processo. É “estrutural” porque estes três conceitos são os “pilares” que sustentam, fundamentam, justificam toda a disciplina processual. Eles constituem um ponto de passagem obrigatório para a compreensão dos demais institutos do direito processual, seja civil, ou penal. Dentro dos objetivos delimitados para o nosso curso, abordaremos esses institutos sempre com uma ótica voltada para o processo civil, deixando de lado o processo penal. Bem, agora que já entendemos que há uma teoria geral do processo, isto é, um campo de estudo que reúne os institutos aplicáveis indistintamente a todos os ramos do processo (separados por razões didáticas e práticas) e que, dentre seus institutos há três conceitos principais, que são a jurisdição, a ação e o processo, vamos tratar de conhecê-los mais de perto.

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Abordaremos em primeiro lugar a Jurisdição. Mas antes, para auxiliar a compreensão do tema, passaremos por uma breve introdução. Com ela, entenderemos melhor qual é a função do direito e o longo trajeto percorrido desde a solução privada dos conflitos até a submissão dos particulares à Jurisdição estatal.

a) A Trilogia Estrutural: Jurisdição, Ação e Processo. Introdução: A Função Pacificadora do Direito, Os Conflitos de Interesses e Seus Meios de Resolução. Conforme já mencionamos, o objetivo maior da ordem jurídica é assegurar a paz social, harmonizar as relações sociais com o menor desgaste possível. O “direito” nasce como um critério do que é “certo”, “justo”, em uma dada sociedade, em um determinado contexto de tempo e espaço. Então, existe um direito “regulador” (material) que orienta, norteia a vida em sociedade. Mas, nem sempre esse ordenamento é suficiente para garantir a paz social, pois, a cada momento, surgem conflitos de interesses entre os particulares. Ih! Já vi de novo a cara de dúvida: “que negócio é esse de conflito de interesses?” Explico com um exemplo: imagine que João tem uma pretensão sobre um bem que está em poder de Pedro. Segundo Carnelutti “pretensão é a intenção de submissão do interesse alheio ao interesse próprio”. Então, Pedro resiste à pretensão de João e quer permanecer com o bem em seu poder por qualquer razão. Trocando em miúdos, João pretende obter um bem que Pedro detém e Pedro resiste à pretensão de João. Surge um conflito de interesses. Não é difícil imaginar que daí não vai sair boa coisa, não é mesmo? Pois é, a lide (litígio) é este conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. Tal situação traz insatisfação aos envolvidos, desestabiliza a sociedade. Há necessidade de “compor” o litígio, resolver a situação em nome da paz social. Podemos enunciar três formas de solução de conflitos: a autocomposição, a autotutela, e a heterocomposição.

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Na autocomposição, os próprios envolvidos chegam a um acordo, seja porque uma das partes desiste do seu interesse reconhecendo o do outro, seja porque ambas as partes fazem concessões recíprocas com vistas à solução do conflito. Seria maravilhoso se vivêssemos num mundo abundante em autocomposição, não é mesmo? Dá até vontade de desejar aos amigos “Olha, um ano novo repleto de autocomposição para você!” Desculpem a ironia, mas é que, na verdade a maioria dos conflitos não se resolve assim tão fácil, embora, mais recentemente, a conciliação tenha facilitado a autocomposição, especialmente a endoprocessual. “Quê? Autocomposição endoprocessual?” Calma, vamos ver o que é isso. A autocomposição pode ser extraprocessual (fora do processo) ou endoprocessual (dentro do processo). A extraprocessual ocorre numa fase prévia, antes que as partes levem o seu conflito de interesses à apreciação do Judiciário. Já a endoprocessual ocorre após a ação ter sido proposta. Imagine uma causa da competência do Juizado Especial Cível, na qual as partes chegam a um acordo na audiência de conciliação. No caso, houve autocomposição endoprocessual, pois não foi um terceiro (o juiz, ou o conciliador) quem decidiu a causa, mas as próprias partes que chegaram a um acordo. Muitas vezes o conciliador funciona como um mediador, um facilitador do diálogo entre as partes e, no caso, como o processo já foi iniciado, o juiz apenas verificará se os termos do acordo estão de acordo com os ditames legais e o homologará na sentença. Cabe lembrar que a autocomposição, por importar em transação (concessões recíprocas de ambas as partes), ou renúncia ao direito por uma das partes valerá apenas para direitos disponíveis (sobre esse tema, veja a aula anterior). Após analisarmos a autocomposição, vamos à autotutela. Ocorre quando um dos envolvidos, mediante seus próprios meios (principalmente o uso da força), subjuga o outro, submete-o a sua pretensão. Autotutela e autocomposição têm em comum o fato de serem soluções promovidas pelos próprios envolvidos (soluções parciais, das partes). A autotutela já foi amplamente aceita em tempos remotos. Mas, na medida em que o estado foi se organizando e adquirindo poder, o exercício da autotutela foi praticamente extinto, pois não corresponde

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à distribuição da Justiça, à concretização do Direito, mas à mera prevalência do mais apto. Hoje, seu exercício é vedado, mas ainda é possível rastrear alguns de seus vestígios no ordenamento jurídico (são as exceções previstas pela lei, como a possibilidade de rechaçar o invasor pela força no esbulho possessório – o desforço imediato do art. 1210, do Código Civil). Bem, impossibilitada a autotutela, se as partes não obtêm sucesso em promover a solução do conflito pela autocomposição, a alternativa será a heterocomposição. Como o próprio nome indica, na heterocomposição um “outro”, um terceiro não envolvido e, portanto, imparcial, é quem decidirá o conflito. Esse “outro” pode ser um terceiro não investido no poder jurisdicional, um profissional do direito habilitado (um árbitro). Ou então, pode ser um Juiz com todas as garantias inerentes, investido de jurisdição, o Estado-juiz representado por um indivíduo com atribuição para julgar a causa. Na primeira hipótese, estaríamos diante da arbitragem. Na segunda, estaríamos no âmbito do Poder Judiciário, da Jurisdição. A Lei 9.376/96 trouxe a arbitragem como alternativa à Justiça convencional, lenta e assoberbada. Sua aplicação, no entanto, é bastante restrita. Atenção, pois ela é admitida apenas em algumas situações. Para começo de conversa, é admitida tão somente nas causas sobre direitos disponíveis. Ressalte-se que e viável apenas mediante compromisso previamente estabelecido no próprio contrato que regula a relação jurídica entre as partes (a chamada convenção de arbitragem). Isto é, as partes precisam ter “combinado” antes, ter inserido uma cláusula prevendo que os litígios eventualmente decorrentes da relação estabelecida naquele contrato seriam submetidos a um juízo arbitral (que lembrem, não é um juiz de carreira, investido de jurisdição, não representa o Estado). É ainda inadmissível nos contratos de adesão (os chamados “contratos de massa”. Exemplo: contratos padrão entre fornecedores ou prestadores de serviço e consumidores). Cumpre observar que as decisões dos juízos arbitrais podem ser posteriormente submetidas à apreciação do Poder Judiciário, caso uma das partes deseje, nos termos do art. 33, da Lei 9307/96. Aliás,

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não poderia ser de outro modo, pois o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal consagra o Princípio da Inafastabilidade da jurisdição: “XXXV – A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” Por tudo que acabamos de aprender, verificamos que a heterocomposição através da arbitragem dá conta de pequena parcela das lides, sendo imprescindível o desejo das partes de submeter-se a ela. O Estado-Juiz é o principal viabilizador da solução imparcial dos conflitos pela substituição das partes. Através do Poder Judiciário, o Estado exerce uma função a ele conferida pelos particulares (a Função Jurisdicional) e o faz em busca do bem comum, com o objetivo de alcançar a paz social através da justa composição da lide. Aqui já entramos na seara do monopólio estatal da jurisdição, que é o nosso próximo ponto e, agora que já conhecemos a função pacificadora do direito, o conflito de interesses e os seus meios de composição, teremos grande facilidade em compreendê-la. A Jurisdição Vimos então que, vedada (em regra) a autotutela, se as partes não chegam a uma solução pela autocomposição (ou se ela não é admitida por tratar-se de direito indisponível), as partes envolvidas devem recorrer ao Estado para dirimir o conflito. É o monopólio estatal da Jurisdição. A Jurisdição é uma das Funções do Estado, ao lado da Executiva e da Legislativa. Constitui função, poder e atividade do Estado ao mesmo tempo. Quer aprender mais um pouco de latim? Vamos lá: o termo “Jurisdição” deriva da expressão romana iuris dictio, que significa “dizer o direito”. Através dela o Estado substitui as partes na resolução dos conflitos de interesses, aplica a lei ao caso concreto, age imparcialmente, com o objetivo de manter a ordem, a paz social. A Jurisdição é dotada de várias características essenciais que a distinguem das demais Funções do Estado. Em seguida analisaremos as mais citadas pelos principais autores de Direito Processual Civil, embora não haja um consenso rigoroso entre os manuais ao apontá-las.

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Preste atenção a elas, pois é comum encontrar questões de prova sobre o tema. As Características Essenciais da Jurisdição: Substitutividade, Secundariedade, Lide, Inércia, Unidade, e Definitividade. A primeira característica da Jurisdição é a substitutividade. Na atividade jurisdicional ocorre a substituição da partes pelo Estado-juiz para a solução do conflito. Creio que, após tudo o que foi aprendido nos itens anteriores, você já é capaz de visualizá-la perfeitamente. As partes, incapazes de chegar à composição por si, procuram a jurisdição que as substitui na resolução do conflito. Outra característica fundamental mencionada por vários autores é a Secundariedade. A Jurisdição tem o “escopo” (isto é, o objetivo, a finalidade) de atuação do direito. Existem os preceitos jurídicos, a lei abstrata e genericamente dirigida a todos como um comando. Mas algumas vezes isso não basta para garantir a ordem em caráter primário. Os preceitos são descumpridos e surgem os conflitos de interesses. Aí é preciso promover a atuação concreta da vontade da lei, isto é, adequá-la ao caso concreto, àquele conflito de interesses surgido entre os particulares, numa atividade secundária. Humberto Theodoro esclarece: “Diz-se que é atividade ‘secundária’ porque, através dela, o Estado realiza coativamente uma atividade que deveria ter sido primariamente exercida, de maneira pacífica e espontânea, pelos próprios sujeitos da relação jurídica submetida à decisão”. Mais uma característica apontada para a Jurisdição é a presença da Lide. Já Sabemos que a lide é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida. Trocando em miúdos, a lide configura a presença do conflito, do litígio. Contudo, nem todos os autores apontam à lide como uma característica inerente à jurisdição, pois ela estará presente na maioria dos casos, mas não sempre. Aqui cabe fazer a distinção entre jurisdição contenciosa e jurisdição voluntária. A jurisdição é denominada contenciosa quando há lide. A Jurisdição voluntária ocorre em razão de determinação legal, é a chamada administração estatal de interesses privados.

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Na Jurisdição voluntária, mesmo que as partes estejam “satisfeitíssimas” com a situação, não poderão prescindir da atuação do Poder Judiciário. Podemos citar como exemplo o inventário e o arrolamento de bens, que são procedimentos para transmissão dos direitos e herança. Neles, mesmo que todos os envolvidos concordem com os termos da sucessão, haverá, necessariamente, a participação do Estado-juiz, independentemente da vontade das partes. Na jurisdição voluntária, não há lide. Outra característica da Jurisdição, de grande relevância, é a Inércia. “Ih, que esquisito! Ficar inerte não é permanecer parado, sem fazer nada? E isso é uma característica da Jurisdição”? Bem, é mais ou menos isso... A Jurisdição é inerte no sentido de que não toma a iniciativa, não tem uma atuação espontânea. O órgão jurisdicional deve agir (salvo as exceções previstas em lei) mediante a provocação da parte interessada. O motivo de tal restrição é simples. O objetivo final da jurisdição é a paz social, então, ela só deverá agir se há alguém “incomodado” com a situação. Se a parte não move a jurisdição, a intromissão forçada do Estado iria desestabilizar a relação ou, mesmo, impedir uma possível solução pacífica ente as partes (autocomposição). Além disso, se ao juiz fosse facultada a iniciativa para a causa, já haveria um prejulgamento, uma tendência de envolvimento que atingiria a própria imparcialidade do juiz. Princípio da inércia (ou da demanda como também é chamado) está consagrado no art. 2º, do Código de Processo Civil. Há uma frase em latim identificada com a Inércia que vale a pena você memorizar, pois os examinadores gostam correlacionar algumas das expressões mais conhecidas com os respectivos conceitos jurídicos. Prontos? Aí vai: “ne procedat iudex ex officio”. Significa: o juiz não procede de ofício. Proceder de ofício é tomar a iniciativa jurisdicional, independentemente de provocação das partes, o que é admitido apenas excepcionalmente e, em geral, com relação apenas à matérias de ordem pública. Temos também a característica da Unidade da Jurisdição. O poder Estatal é uno e indivisível e, como manifestação do Poder do Estado a Jurisdição também o é. Conforme já mencionei, a atribuição de

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competências a diferentes órgãos do judiciário é feita apenas para uma melhor distribuição do trabalho, da atividade. Podemos falar ainda da Definitividade ou Imutabilidade da Jurisdição. Diz-se que a jurisdição é revestida de definitividade porque, após a decisão proferida pelo Poder Judiciário transitar em julgado, não mais poderá ser alterada. O trânsito em julgado ocorre quando não é mais cabível qualquer recurso para determinada decisão judicial, seja porque se esgotaram as vias recursais, seja porque a parte desistiu do seu direito de recorrer no prazo legal. Nesse caso terá se formada a coisa julgada, protegida pela própria Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXVI: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Aqui abro “parênteses” para lembrá-los de que a coisa julgada pode ser material ou formal. Diz-se que há coisa julgada formal quando a decisão proferida pelo juízo não analisou o mérito da causa. No caso, poderá ser proposta uma outra demanda semelhante. Haverá coisa julgada material quando a decisão insuscetível de recurso houver alcançado o mérito da questão. Neste caso, jamais poderá ser proposta demanda idêntica. Mas não se preocupem muito com isso agora. Precisamos avançar um pouco mais para alcançar este tema. Voltando ao nosso tema, a definitividade como característica da Jurisdição, só os atos do Estado no exercício da função jurisdicionais a possuem. Os atos do Poder Executivo e Legislativo são mutáveis, podem ser rediscutidos, revistos. Bem, essas são as características mais citadas. Há ainda quem cite a imparcialidade do juízo, que é a ausência de interesse do juízo na decisão da causa. Ser imparcial é, basicamente, não tomar partido, não pender para qualquer dos lados, não estar inclinado a uma decisão favorável ou desfavorável, acompanhar com isenção todo o processo para, ao final, poder decidir. Conforme adverti antes, não há um consenso rigoroso entre os autores. É bem possível que, numa prova, você encontre uma questão ou um item que omita uma das características citadas, o que não significa que esteja, necessariamente, incorreto.

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Se isso ocorrer, analise com cuidado. Tenha em mente que a substitutividade e a inércia são, citadas por todos os autores, sem exceção e que a secundariedade é citada pela maioria deles. Saibam que teóricos fundamentais como Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco incluem a lide entre as características essenciais da jurisdição. O importante é que você já conhece as mais citadas e poderá discernir se houver algum elemento destoante no contexto. Agora, vamos ao nosso próximo ponto, os princípios da jurisdição. Princípios da Jurisdição: Investidura, Improrrogabilidade, Indelegabilidade, Juiz Natural, Inevitabilidade e Inafastabilidade. Além das características que analisamos acima, existem ainda os Princípios específicos da Jurisdição. Você aprendeu que a Jurisdição é exercida em nome do Estado por um indivíduo. O Princípio da Investidura estabelece que para fazê-lo, tal indivíduo (o juiz) deve estar investido na atividade jurisdicional de acordo com as regras legais. A jurisdição só pode ser exercida por uma pessoa investida no papel de juiz, com todas as formalidades e exigências legais cumpridas. Cada juiz tem a autoridade de exercer a função jurisdicional no âmbito de um determinado território. Explico: A Jurisdição é una e a brasileira alcança todo o nosso território. Mas é claro que, para efetivá-la é necessário estabelecer critérios para atribuição das funções aos órgãos jurisdicionais. Por exemplo, para o juiz de direito (o juízo singular de primeiro grau) essa “limitação territorial” é a comarca, que corresponde à delimitação geográfica do município. O Princípio da improrrogabilidade (ou da aderência ao território) é aquele segundo o qual cada órgão jurisdicional tem uma delimitação territorial à qual corresponde a sua atuação. Assim, se o juiz da comarca do Rio de Janeiro quer intimar alguém que mora na vizinha Belford Roxo deve fazê-lo através de um pedido ao seu colega juiz (a carta precatória), para não extrapolar os limites da sua competência, nem invadir a do outro magistrado.

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Esses critérios de distribuição são rígidos, por isso nenhum órgão ou poder jurisdicional pode delegar a outro a sua atribuição é o denominado Princípio da Indelegabilidade. Para cada causa há sempre um único juízo determinado segundo critérios legais previamente estabelecidos, lembre-se disso. Aqui cabe mencionar o Princípio do Juiz Natural, que é um importante e inafastável princípio da jurisdição. Não me alongarei no seu exame porque já foi abordado, na aula anterior, uma vez que é também um princípio constitucional do direito processual e um corolário do devido processo legal, lembra-se? O Princípio da Inevitabilidade prevê a submissão de todos nós ao Estado-juiz. Ninguém pode recusá-lo, evitar a sua autoridade. Tomemos o exemplo do réu, uma vez citado, não pode dizer “não quero participar desse processo”. Será convocado a comparecer em juízo e, se não apresentar a sua defesa, sofrerá os ônus decorrentes de sua atitude. Do mesmo modo nenhum de nós pode simplesmente declarar que não concorda com determinada decisão e que, portanto, não irá cumpri-la. Se não concordar, deve recorrer para modificar a decisão, mas nunca tão somente descumpri-la. Por fim, falta apenas abordar o Princípio da Inafastabilidade, importantíssimo, fundamental na disciplina processual. Embora muito haja a ser explorado com relação a ele, faremos aqui apenas uma breve apresentação, pois precisamos avançar na matéria. Está consagrado no Art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. “a lei não excluirá da apreciação do Poder judiciário lesão ou ameaça a direito” O Poder Judiciário deve apreciar qualquer lesão ou ameaça ao direito de qualquer pessoa e nada, nem mesmo a lei, pode impedir a apreciação. Pelo mesmo princípio (embora o dispositivo mencione apenas “a lei não excluirá”), o juiz não pode furtar-se a decidir qualquer causa, mesmo que haja lacuna na lei ou que a lei seja obscura (de difícil compreensão). “Lacuna”? É lacuna, um lugar vazio a ser preenchido.

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Diz-se que a lei é lacunosa quando não se vislumbra nela a disciplina para uma determinada situação, a solução legal para certo caso. O legislador, por mais abrangente que busque ser, por vezes, não consegue prever todos os desdobramentos possíveis. Não seria razoável que o juiz dissesse: “olha, rapaz, seu caso não foi disciplinado, não posso fazer nada contra essa injustiça. Espere surgir uma lei para o caso”. Ainda que a lei seja lacunosa o juiz está autorizado pelo art. 126 do Código de Processo Civil a decidir o caso. Hoje há uma compreensão de que o Princípio da inafastabilidade traz uma dimensão referente ao próprio acesso à justiça, que pode ser traduzido, em síntese, como o acesso a uma ordem jurídica justa. O conceito do acesso à Justiça é riquíssimo e carrega em seu bojo a idéia de que não é suficiente que o Judiciário aceite apreciar o caso, mas que, efetivamente, viabilize uma tutela adequada dos direitos a todos os envolvidos no processo, a qualquer cidadão que dela necessite. Apenas para citar alguns desdobramentos do acesso à Justiça, podemos lembrar que justifica a assistência judiciária gratuita aos desprovidos de recursos financeiros e determina a efetividade das decisões (devem ser rápidas se apresentarem caráter de urgência, risco de lesão ao direito). O acesso à justiça importa, enfim, num processo justo, célere, adequado, disponível a todos, sem exceção. Bem, você acabou de ser apresentado à definição, às características e aos princípios da jurisdição. Isso não esgota o assunto, mas já permite o avanço na compreensão da dinâmica do processo, agora precisa entender o conceito de Ação. Vamos a ele! A Ação Você já sabe que o Estado negou a autotutela e exerce com exclusividade a atividade jurisdicional, mas apenas mediante provocação, pois a jurisdição é caracterizada pela inércia. Então, na presença do conflito de interesses, o particular deve procurar o Estado-juiz para solucioná-lo.

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Mas é aí? Como é que ele faz isso? É através do Direito de Ação. O direito de ação é um direito do particular em face do Estado. Não é dirigido contra o seu oponente na relação de direito material (o réu que responderá a ação), mas é direcionado ao próprio Estado. Através dele o que o particular busca é a apreciação do Estado-juiz sobre aquilo que acredita ser uma lesão ou ameaça ao seu direito. É um direito público que tem de um lado o cidadão que busca a apreciação do seu “caso” e de outro o Estado que tem o dever de apreciá-lo. Veja que o direito de ver o seu caso apreciado pelo judiciário independe do fato do indivíduo ter ou não “razão” no caso concreto, de estar certo ou errado, de ter ou não ter o “direito” que alega em relação ao seu oponente, ao réu. Isto seria verificado apenas numa fase posterior. Após o desenrolar do processo é que o juiz pode decidir, acolher ou rejeitar o pedido feito pelo autor, conforme seja ou não demonstrada a existência do direito alegado. Observe que mesmo que o juiz ao final decida que o autor não tem o direito material em face do réu, já terá apreciado, analisado o seu pedido, ainda que para negá-lo. É possível concluir, então, que o direito de ação é autônomo, vale dizer, independente do direito material. É o direito de mover a jurisdição. Diz-se do direito de ação que é autônomo e abstrato e também que é instrumental. Essa instrumentalidade decorre do fato que ele existe para viabilizar um pretenso direito material, isto é, é um instrumento para assegurar o exercício de um outro direito. Vamos adiante: Então o direito de ação é o instrumento que assiste ao particular para provocar a jurisdição. Porém, o seu exercício é condicionado. O legislador estabeleceu uma série de condições que devem ser seguidas pelo autor para que o mérito da causa, o seu pedido seja apreciado. Não basta ao autor exercer o direito de ação para ver seu pedido apreciado pelo o juiz, é preciso exercê-lo do modo correto, legítimo, regular segundo as condições impostas pelo legislador.

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As Condições da Ação As condições da ação são três: possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimação ad causam. Diz-se que são as condições para o legítimo exercício da ação. Veja que mesmo que elas não sejam observadas por aquele que propõe o feito, o direito de ação terá sido exercido, pois o juízo terá sido provocado e dará uma resposta ao particular. No entanto, tal resposta será apenas para afirmar que, dada à ausência das condições impostas pelo legislador, o feito não prosseguirá. Passaremos agora a analisar cada uma das condições da ação. A primeira delas é a Possibilidade Jurídica do Pedido. Mas antes de analisá-la, vamos entender o que é o pedido. Cada ação tem sempre três elementos que a identificam. São eles as partes, a causa de pedir e o pedido. As partes são os envolvidos no pólo ativo e passivo da ação, conforme você já aprendeu na aula passada, quando discutimos a relação processual. O pedido consigna o objeto da ação, aquilo que se pretende obter em juízo. A causa de pedir é constituída apelas razões de fato e de direito que fundamentam esse pedido. A possibilidade jurídica do pedido concerne ao fato do ordenamento jurídico admitir ou não o pedido feito em juízo. É impossível pedir ao judiciário que satisfaça um pedido vedado pelo direito. Exemplo clássico é o da dívida de jogo. Suponha que João, jogando num cassino clandestino ganhou certa quantia em dinheiro. Se o compromisso não for saldado espontaneamente, João não pode propor uma ação visando o recebimento dos valores. Como admitir um feito contrário ao direito? O Interesse de Agir diz respeito à necessidade de mover a jurisdição para satisfazer a pretensão do autor. O aparato estatal é dispendioso, devem ser evitadas lides desnecessárias. O interesse de agir deve ser compreendido em duplo aspecto: o binômio necessidade/utilidade (ou adequação). Antes de propor uma ação é preciso verificar se o provimento jurisdicional é realmente necessário, isto é, se o mesmo fim desejado com ele não poderia ser obtido por outro meio. Esse é o aspecto da necessidade.

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Já o aspecto da utilidade – adequação concerne ao meio utilizado para veicular o pedido. Existem tipos diversos de ação e cada um deles tem uma determinada finalidade. De nada adianta impetrar um mandado de segurança, por exemplo, que é uma ação mandamental cuja sentença constituirá numa ordem, num mandamento, para receber valores em dinheiro. Para este fim existe a ação de cobrança. Portanto, se o juízo verificar que o provimento solicitado é desnecessário, resultará inócuo, inútil, inadequado para fim a que se destina, não deve permitir o prosseguimento da ação. A terceira condição da ação á a Legitimidade ad Causam. O art. 6º, do Código de Processo Civil, estabelece: “ninguém poderá pleitear em nome próprio, direito alheio,salvo quando autorizado por lei”. Em geral, tem a legitimidade para exercer o direito de ação aquele que detém a titularidade do direito. Abaixo, vou me utilizar dos esquemas gráficos relativos às relações jurídicas de direito material e à relação processual, já apresentado na aula anterior, para uma melhor visualização. Imagine que Maria é filha de João. Entre parentes, existe a obrigação alimentar, sempre dentro do binômio possibilidade/necessidade (o credor deve necessitar dos alimentos e o devedor tem que poder pagar). Maria, menor de idade e dependente financeiramente de João é credora da obrigação alimentar e João é o devedor.

RELAÇÃO JURÍDICA DE DIREITO MATERIAL

MARIA ----------- JOÃO sujeito ativo sujeito passivo

Suponha agora que João vem descumprindo a obrigação alimentar a vários meses e mesmo após tentativas amigáveis, recusa-se a cumpri-la. A maneira adequada de sanar tal situação é através da propositura de uma ação de alimentos junto à vara competente. Após a propositura, preenchidas as condições da ação e os pressupostos processuais (que veremos mais adiante), o réu será citado e integrará a relação processual.

RELAÇÃO JURÍDICA DE DIREITO PROCESSUAL

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JUIZ / \

/ \ MARIA JOÃO (pólo ativo - autora) (pólo passivo - réu) Normalmente, há uma coincidência entre a titularidade do direito material e a legitimidade para a propositura da ação (legitimidade ad causam). Apenas quando a lei autoriza expressamente, alguém irá a juízo em nome próprio pleitear direito alheio (são os casos excepcionais de legitimação extraordinária). O juiz deve verificar tanto a legitimidade ativa (do autor - pólo ativo da ação) quanto à passiva (do apontado réu - pólo passivo da ação). Do mesmo modo que o autor, o réu também tem que ser integrante da relação jurídica de direito material. A ação deve ser regularmente proposta pelo legitimado ativo e prosseguirá apenas em face do legitimado passivo adeqüadamente indicado. Voltemos ao nosso exemplo. A correta legitimada à propositura da ação é Maria, a filha, não a sua mãe. Se for menor, deverá ser representada legalmente pela mãe, mas ainda assim será ela, Maria, e não a mãe, a autora do feito. Do mesmo modo deve integrar o pólo passivo de uma Ação de Alimentos aquele que tem relação de parentesco com o alimentando. No caso, a prova da legitimidade passiva na Ação de Alimentos é feita pela certidão de nascimento. Se João registrou Maria como filha, responderá à ação. Então, quando da propositura da ação, o juiz deverá verificar tanto a legitimidade ativa quanto a passiva. Todas as três condições da ação (possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade ad causam) devem estar sempre presentes em qualquer ação que seja proposta. A ausência de uma só delas já bastará para ensejar, acarretar a carência da ação. Na carência de ação o juiz não irá analisará o mérito da causa, isto é, não chegará ao ponto central que o autor quer ver analisado, não se pronunciará quanto ao direito pleiteado, quanto ao pedido.

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Se a carência de ação for flagrante, detectada já à primeira vista é causa de indeferimento da petição inicial, caso contrário, é causa de extinção sem o julgamento do mérito. O indeferimento da petição inicial está previsto no art. 295, incisos II e III e parágrafo único, inciso III, do Código de Processo Civil. É a rejeição liminar da ação, a recusa imediata pelo reconhecimento da carência de ação. Aqui, não há sequer citação do réu. É como se o juiz dissesse logo de cara: “Sai pra lá! Você pediu uma coisa proibida (impossibilidade jurídica do pedido), ou pediu algo que não precisa ou é inútil pra você (ausência de interesse de agir), ou pediu algo que não está legitimado a fazer ou em face de quem não tem nada a ver com isso”. A carência de ação também pode acarretar a extinção sem julgamento do mérito com base no art. 267, inciso VI e no art. 329 do código de processo Civil. Normalmente isso vai ocorrer quando, por qualquer razão, a ausência de uma das condições só foi verificada num momento posterior do processo, pois a análise das condições da ação não é objeto de preclusão, isto é, pode ser analisada a qualquer tempo no processo. A preclusão é o instituto processual que impede a prática de um ato no processo, seja porque o prazo para fazê-lo já foi perdido (preclusão temporal), seja porque tal ato já foi praticado anteriormente (preclusão consumativa), seja porque a parte praticou um ato anterior incompatível com o outro que deseja praticar (preclusão lógica). As matérias de ordem pública em geral não são alcançadas pela preclusão. As condições da ação possuem tal natureza e podem ser reconhecidas em qualquer estágio do processo. Na extinção sem o julgamento do mérito, como o próprio nome diz o processo será extinto, findará, sem que o juiz chegue a analisar o mérito, a questão de direito, o pedido do autor. Tanto no indeferimento da petição inicial quanto na extinção sem o julgamento do mérito uma nova ação idêntica à anterior (mesmas partes, causa de pedir e pedido) pode vir a ser proposta. Isto porque não houve a formação da coisa julgada material, que impede a propositura de lide idêntica, mas apenas da coisa julgada formal. Lembre-se que quando analisamos a definitividade como característica da jurisdição no começo da aula de hoje você aprendeu a respeito da coisa julgada.

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As ações são classificadas de acordo com a tutela que se espera do juízo. Podem ser de conhecimento (visam reconhecer uma relação de direito material), de execução (visam à satisfação de um direito pré-reconhecido), cautelares (visam proteger um direito do seu perecimento) ou mandamentais (contém um comando, uma ordem). Feita essa síntese sobre o direito de ação, as condições para o seu legítimo exercício, as conseqüências da carência da ação e a classificação das ações, podemos passar ao terceiro elemento da trilogia estrutural, o Processo. O Processo O Estado-juiz é inerte e a ação é o instrumento que assegura ao particular a provocação do exercício da função jurisdicional Mas, como é que essa função será exercida, por qual meio? Segundo Pellegrini, Dinamarco e Cintra, o processo é “o instrumento através do qual a jurisdição opera”. O Processo pode ser entendido como um meio do qual o Estado se utiliza para o desempenho da função jurisdicional, desencadeado mediante o exercício do direito de ação pelo particular. Percebeu agora porque toda a disciplina processual está assentada sobre essa trilogia estrutural, esses três pilares conceituais que são a jurisdição, a ação e o processo? A Jurisdição regulamenta a função do Estado de prestação da atividade jurisdicional e é caracterizada pela inércia, pela necessidade de provocação pelo particular. A ação é o instrumento do particular para provocar essa atividade visando à garantia dos direitos materiais que o ordenamento jurídico lhe assegurou. O Processo é o meio que o Estado utiliza para exercer a atividade jurisdicional, deflagrada pelo exercício da ação e que consiste numa sucessão de atos tendentes a viabilizar a prestação da tutela jurisdicional pleiteada pelo particular. Daí, que um não existe sem o outro. São três conceitos bastante diferentes entre si, mas profundamente interligados.

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A palavra processo tem em seu sentido corrente pelo menos duas acepções que causam certa confusão: por vezes é identificada com a sucessão ordenada de atos praticados em juízo (que na realidade, constitui o procedimento) e por outras é confundida com a sua própria expressão externa, material, concreta (isto é, aquele punhado de folhas escritas com uma capa que fica lá no Fórum). Há que se fazer a distinção. Deve-se utilizar a palavra procedimento para designar a ordem preordenada segundo a qual os atos devem ser praticados no processo, de acordo com um rito legal preestabelecido. Por sua vez, Autos do processo é a denominação adequada para o volume externo, material que configura a concretização do processo. Deve-se dizer: “Vou ao Fórum examinar dos autos do processo” e não apenas, “vou examinar o processo”, pois o que você pega, folheia, lê é apenas a manifestação exterior, palpável, que são os autos. Você deve lembrar-se da nossa primeira aula e nela antecipamos muita coisa sobre a relação jurídica processual. Ela envolve os sujeitos do processo, que são o Estado, o demandante e o demandado, ou em outras palavras, o juiz, o autor e o réu.

ESTADO (JUIZ)

/ \ / \ DEMANDANTE DEMANDADO (AUTOR) (RÉU) Veja que o esquema é angular e não linear o que ocorre porque o Estado (personificado pelo juiz) não está agindo como parte, defendendo qualquer interesse seu, mas exerce uma função para a promoção do bem comum e, portanto, está acima das partes. Observe que as partes se encontram eqüidistantes do juiz, o que demonstra a sua imparcialidade, já que ele não se aproxima mais de um lado que do outro. Se os sujeitos da relação processual são o Estado, o demandante e o demandado, o objeto dessa relação não é o bem da vida que se procura obter através do processo, não coincide com o pedido efetuado na ação, mas consiste na própria prestação jurisdicional. Analisados estes pontos, apresentarei aos pressupostos processuais.

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Traçando um paralelo como direito civil, o ato jurídico, para ter validade deve ser praticado por agentes capazes, ter objeto lícito e ter a sua forma prevista ou não defesa (isto é, não proibida) em lei. O mesmo se dá com o processo que, para se desenvolver validamente, precisa obedecer a certos requisitos. Tais requisitos são os pressupostos processuais, previstos no art. 267, inciso IV, do Código de Processo Civil. Sem estes pressupostos a relação processual nascerá, mas permanecerá inválida. Os pressupostos processuais podem ser objetivos ou subjetivos. Os subjetivos relacionam-se aos sujeitos da relação processual. São eles: Competência do Juízo, Capacidade das Partes, Representação por Advogado. Já os pressupostos processuais objetivos são a Forma Processual Adequada, a Citação Válida, Inexistência de Litispendência Coisa Julgada, Perempção e Nulidades e Petição Apta não-inepta. Ufa! Já trabalhamos um bocado hoje, não é mesmo? A essa altura você deve estar com a cabeça cheia com tantas informações novas! Precisamos ainda analisar cada um dos pressupostos processuais, formar uma noção de procedimento, de ato processual, entender a participação do juiz como sujeito do processo para, finalmente, alcançar a disciplina dos atos judiciais e analisar os despachos, as decisões interlocutórias e as sentenças. Como são muitos tópicos, o melhor em termos didáticos é parar por aqui, pois chegamos a um ponto da matéria que permite a interrupção sem prejuízo da seqüência lógica. Todos os pontos enumerados no parágrafo anterior serão abordados em nossa próxima aula, juntamente com exercícios comentados que incluirão a matéria da aula de hoje. Até lá!