processo civil alexandre freitas câmara - lições de direito processual civil - vol. 01...

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  • LIOES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

    V O L U M E 1

    Por refletir uma viso global do processo, esta obra, eminentemente didtica, objetiva servir de instru

    mento para facilitar o acesso do estudante de Direito ao Direito Processual Civil, especificamente dos

    cursos de graduao, que trava seu primeiro contato com este ramo do conhecimento jurdico de fun

    damental importncia terica e prtica.

    Mesmo sendo destinada ao estudante dos cursos de graduao, a obra passa a ser instrumento po

    deroso e fonte de consulta obrigatria para todos os profissionais do Direito (advogado, magistrado,

    promotor de justia ou qualquer outro profissional do Direito), tendo em vista a aplicao prtica de

    cada uma das questes suscitadas. Constitui-se tambm em relevante interesse para os candidatos aos

    concursos pblicos para ingresso nas carreiras jurdicas, como a Magistratura, o Ministrio Pblico e a

    Defensoria Pblica.

    Por esse motivo, o autor fez questo de apresentar, ao longo dos textos, no s sua opinio sobre os

    temas versados, mas tambm a posio dos mais importantes juristas que trataram de cada um dos

    assuntos, analisando as mais relevantes polmicas doutrinrias. O autor optou, ainda, por inserir as

    informaes de Direito Comparado e de evoluo histrica dos institutos ao longo dos captulos a eles

    destinados, sem que se apresentassem tais informaes em captulos separados.

    A obra dividida em trs tomos. No volume 1, so analisados a Teoria Geral do Direito Processual (esta

    luz do Direito Processual Civil) e o processo de conhecimento. O volume 2 examina os processos nos

    tribunais e o processo de execuo. J o volume 3 dedicado anlise do processo cautelar e dos pro

    cedimentos especiais.

    Alexandre Freitas Cmara desembargador no TJRJ, oriundo do Quinto Constitucional da Advocacia, professor de Direito Processual Civil da EMERJ (Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro) e

    de diversos cursos de ps-graduao. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual, da Academia

    Brasileira de Direito Processual Civil, do Instituto Ibero-Americano de Direito Processual e da International

    Association of Procedural Law. Autor de diversos livros de Direito Processual, entre os quais Ao resci

    sria, publicado pela Atlas.

    a t l a s . c o m . b r

  • 2012 by Editora Atlas S.A.

    As edies anteriores so da Lumen Juris; 23. ed. 2012; 24. ed. 2013

    Capa: Leonardo Hermano Composio: Lino-Jato Editorao Grfica

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Cm ara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Cmara, Alexandre Freitas

    Lies de direito processual civil: volume 1 / Alexandre Freitas Cmara. -- 24. ed. -- So Paulo : Atlas, 2013.

    Bibliografia. ISBN 978-85-224-7639-8

    eISBN 978-85-224-7992-4

    1. Processo civil 2. Processo civil - Brasil I. Ttulo.

    12-06081CDU-347.9

    ndice para catlogo sistem tico:

    1. Direito processual civil 347.9

    TODOS OS DIREITOS RESERVADOS - proibida a reproduo total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio. A violao dos

    direitos de autor (Lei nfi 9.610/98) crime estabelecido pelo artigo 184do Cdigo Penal.

    v-lEditora Atlas S.A.Rua Conselheiro Nbias, 1384 Campos Elsios 01203 904 So Paulo SP 011 3357 9144 atlas.com.br

    avtV'

  • Este livro devido, em parte, ao esforo de algum as pessoas, a quem o dedico: m eu m ais querido e antigo am igo, Lus Fer

    nando M arin, a quem desejo sucesso na carreira jurdica, que agora abraa; m eus alunos, que, com pacincia, serviram de

    teste para as lies que aqui apresento; m inha esposa Janana,sim plesm ente por existir em m inha vida.

  • SUMRIO

  • Apresentao, xii

    N ota introdutria, xvi

    N ota introdutria 23 3 edio, xx

    N ota introdutria 17 3 edio, xxii

    N ota introdutria 163 edio, xxvi

    N ota introdutria 113 edio, xxx

    N ota introdutria 8 3 edio, xxxii

    PARTE 1 - TEORIA GERAL DO DIREITO PROCESSUAL, 3

    I Direito Processual: Conceito, Denominao, Posio Enciclopdica e Evoluo Cientfica, 4

    l C onceito de D ireito Processual, 5

    2 D enom inao, 8

    3 Posio Enciclopdica, 9

    4 Evoluo Cientfica do D ireito Processual, 10

  • v i i i Lies de Direito Processual Civil Cmara

    II A Existncia de uma Teoria Geral do Direito Processual, 14

    III Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil, 18 1 Fontes do D ireito Processual Civil, 19 2 Interpretao da Lei Processual, 27

    2.1 M todo Literal ou Gram atical, 272.2 M todo Lgico-Sistem tico, 282.3 M todo H istrico, 292.4 M todo Com parativo, 302.5 M todo Teleolgico, 31

    3 Integrao da Lei Processual, 33 4 Eficcia da Lei Processual no Espao, 34 5 Eficcia da Lei Processual no Tempo, 36

    IV Princpios Constitucionais do Direito Processual, 40 1 Princpio do Devido Processo Legal, 41 2 Princpio da Isonom ia, 49 3 Princpio do Ju iz N atural, 52 4 Princpio da Inafastabilidade do C ontrole Jurisdicional, 55 5 Princpio do C ontraditrio , 58 6 Princpio da M otivao das Decises Judiciais, 64 7 Princpio da Tem pestividade da Tutela Jurisdicional, 67

    V A Trilogia Estrutural do Direito Processual, 70

    VI Jurisdio, 74 1 As Funes do Estado e a Funo Jurisdicional, 75 2Q Conceito, 78 3 C aractersticas Essenciais, 82 4 Espcies de Jurisdio, 85 5 Jurisdio Voluntria, 88 6 Escopos da Jurisdio, 91 7 Tutela Jurisdicional: C onceito e Classificaes, 94 8 Tutela Jurisdicional Antecipada, 97 9 Tutela Jurisdicional Especfica Relativa s Obrigaes de Fazer, N o Fazer e

    E ntregar Coisa, 100 10 C om petncia, 106

    10.1 Conceito, 10610.2 C ritrios de Fixao, 10610.3 Incom petncia A bsoluta e Relativa, 11210.4 Causas de M odificao da Com petncia, 113

  • Sumrio X

    10.5 Declarao de Incom petncia, 11710.6 Conflito de Com petncia, 119

    VI-A Limites Internacionais da Jurisdio Brasileira, 122

    VII Ao, 138 1 Teorias sobre a Ao, 139 2a Conceito de Ao, 144 3a "Condies da Ao ou Requisitos do Provim ento Final, 147 4a Classificao da Ao, 156

    VIII Processo, 158 I a Teorias sobre o Processo, 159 2a C onceito e N atureza Jurdica, 166 3a Processo e Procedim ento, 169 4a Sujeitos do Processo, 170

    4.1 O Estado-Juiz e o Juiz, 1714.2 Auxiliares da Justia, 1754.3 As Partes, 1784.4 O Advogado, 1854.5 Litisconsrcio, 1884.6 Interveno de Terceiros, 205

    4.6.1 A ssistncia, 2074.6.2 Oposio, 2114.6.3 N om eao Autoria, 2154.6.4 D enunciaao da Lide, 2204.6.5 C ham am ento ao Processo, 2324.6.6 Recurso de Terceiro, 2364.6 .7 A lim entos e Interveno de Terceiro, 238

    4.7 M inistrio Pblico, 2444.8 Am icus Curice, 246

    5a Escopos do Processo: Instrum entalidade e Efetividade do Processo, 251 6a Classificao do Processo, 254 7a O bjeto do Processo, 257 8a P ressupostos Processuais, 261

    IX Atos Processuais, 270 I a Fato, Ato e Negcio Jurdicos, 271 2a Fato Processual, 272 3a A tos do Processo e Atos Processuais, 273 4a Negcios Processuais, 274 5a Classificao dos Atos Processuais, 274

  • X Lies de Direito Processual Civil Cmara

    6 Form a dos Atos Processuais, 277 6a-A Inform atizao dos A tos Processuais, 284 7a Existncia, Validade e Eficcia dos Atos Processuais, 287 8a Com unicao dos A tos Processuais, 295

    PARTE 2 - MDULO PROCESSUAL DE CONHECIMENTO, 305

    X Cognio: Conceito, Objeto e Espcies, 306

    XI Formao, Suspenso e Extino do Mdulo Processual de Conhecimento, 318 I a Formao do M dulo Processual de Conhecim ento, 319 2a Suspenso do Processo, 322 3a Extino do M dulo Processual de C onhecim ento, 331

    XII Procedimento Ordinrio, 350 I a C onceito e C abim ento, 351 2a Petio Inicial, 353 3a R esposta do Ru, 366

    3.1 Contestao, 3673.2 Reconveno, 3733.3 Exceo, 3793.4 Im pugnao ao Valor da Causa, 382

    4a Providncias Prelim inares, 3834.1 Rplica, 3834.2 Especificao de Provas, 3854.3 Declarao Incidente, 386

    5a Ju lgam ento conform e o Estado do Processo, 3915.1 "Extino do Processo, 3925.2 Ju lgam ento A ntecipado do M rito, 3935.3 Audincia Prelim inar e Saneam ento do Processo, 396

    6a Instruo Probatria e Audincia de Instruo e Julgam ento, 405

    XIII Procedimento Sumrio, 412 I a Conceito e C abim ento, 413 2a Petio Inicial, 417 3a Citao e A udincia de Conciliao, 418 4a R esposta do Ru: C ontestao e Exceo, 420 5a Converso do Procedim ento, 422 6a Instruo Probatria e Audincia de Instruo e Julgam ento, 423 7a Inadm issibilidade de Declarao Incidental, 424 8a Interveno de Terceiros no Procedim ento Sum rio, 425

  • XIV Direito Probatrio - Teoria Geral das Provas, 428 1 C onceito de Prova, 429 2 O bjeto da Prova, 432 3 nus da Prova, 434 4 D estinatrios da Prova e S istem as de Valorao, 439 5 M eios de Prova: G eneralidades; Procedim ento Probatrio; Espcies, 442 6 Das Provas em Espcie, 446

    6.1 Conceito, 4466.2 D epoim ento Pessoal, 4486.3 Confisso, 4506.4 Exibio de D ocum ento ou Coisa, 4526.5 Prova D ocum ental, 4536.6 Prova Testem unhai, 4566.7 Prova Pericial, 4616.8 Inspeo Judicial, 464

    XV Sentena, 466 1 Conceito, 467 2 Classificao, 471 3 Elem entos Essenciais, 472 4 Publicao e Irretratabilidade, 476 5 Classificao da Sentena Definitiva, 478 6 Sentenas Executivas e M andam entais, 488 6-A Captulos de Sentena, 492 7 Tutela Antecipada, 497 8 Tutela A ntecipada contra a Fazenda Pblica, 513

    XVI Coisa Julgada, 518 1 C onceito e N atureza Jurdica, 519 2 Coisa Julgada Formal e Coisa Julgada M aterial, 524 2-A Relativizao ou D esconsiderao da Coisa Julgada M aterial, 527 3 Lim ites Objetivos da Coisa Julgada, 531 4 Lim ites Subjetivos da Coisa Julgada, 535 5 A Coisa Julgada nas Sentenas D eterm inativas, 539 6 A Coisa Julgada nas D em andas Coletivas, 543 7 A Coisa Julgada no M andado de Segurana, 547 8 Precluso, 550

    Referncias bibliogrficas, 558

    ndice remissivo, 584

  • APRESENTAO

  • AS LETRAS JURDICAS DO PAS SE ENRIQUECEM HOJE COM O LANAMENTO, TO ESPERADO, DO PRIMEIRO VOLUME DE LIES DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DESTE JOVEM E TALENTOSO MESTRE DO PROCESSO, QUE ALEXANDRE FREITAS CMARA.

    Pode parecer estranho que esteja a recom endar o autor e sua obra um professor, ainda que m odesto, de Direito Civil. Os que, entretanto, acompanham a saudvel evoluo da cincia do processo, em busca de sua m aior efetividade, transform ando-o em verdadeiro instrum ento da realizao da justia, entendero o sim bolism o da escolha, que traduz a aproximao necessria com o direito material.

    E Alexandre Freitas Cm ara representa, mais do que nenhum outro, essa tendncia, realizando o milagre da coexistncia do professor, querido e respeitado pelos alunos; do jurista, em sua profundidade dogmtica, que tanto admiramos; e do advogado m ilitante, m ergulhado no psicodram a da soluo dos conflitos de interesse.

    Da por que sua obra reflete um a viso global do processo, sendo leitura indispensvel no apenas para os alunos que se iniciam no estudo do Direito Processual Civil, como m odestam ente observa o autor, mas para todos os que se propem a desvendar suas m ensagens e m istrios.

    A leitura do prim eiro volum e revela que o autor j venceu o enorm e desafio que m inistrar um curso com pleto de Direito Processual Civil, partindo

  • x iv Lies de Direito Processual Civil Cmara

    da sua teoria geral e depois enfrentando o processo de conhecim ento, em sua linguagem a todos acessvel, e despertando o interesse para a continuao dos estudos, nos prxim os volumes.

    A obra ora lanada passa a ser instrum ento poderoso e fonte de consulta obrigatria para todos os profissionais do Direito, consolidando a posio de seu autor entre aqueles que esto construindo, com sua cultura, dedicao e ideal, um novo tem po e um a sociedade mais justa.

    Ficamos todos, leitores cativos e perm anentes alunos de Alexandre Freitas Cmara, a lhe dever mais essa inestim vel contribuio ao estudo jurdico, cobrando-lhe o com prom isso da continuidade da obra.

    No percamos mais tempo.Vamos todos, encantados, m ergulhar em sua leitura.

    Sylvio Capanema de Souza

  • NOTA INTRODUTRIA

  • Esta um a obra cujo objetivo servir de instrum ento para facilitar o acesso dos estudantes de D ireito ao Direito Processual Civil. Em inentem ente didtica, seu pblico-alvo , sem dvida nenhum a, o estudante dos cursos de graduao, que trava seu prim eiro contato com esse ram o do conhecim ento jurdico de fundam ental im portncia terica e prtica. Por essa razo, mais do que por qualquer outra, procuram os elaborar este livro em linguagem simples e acessvel, sem, no entanto, descurar da term inologia adequada do ponto de vista da cincia processual. Optam os, ainda, com a finalidade de no cansar o leitor, por inserir as informaes de Direito Com parado e de evoluo histrica dos institu tos ao longo dos captulos a eles destinados, sem que se apresentassem tais informaes em captulos separados.

    Apesar dessa opo por escrever um livro destinado ao estudante dos cursos de graduao, no nos esquecemos dos candidatos aos concursos pblicos para ingresso nas carreiras jurdicas, como a M agistratura, o M inistrio Pblico e a Defensoria Pblica. Por esse motivo, fizemos questo de apresentar, ao longo da obra, no s nossa opinio sobre os tem as versados, mas tam bm a posio dos mais im portantes juristas que trataram de cada um dos assuntos, analisando as mais relevantes polmicas doutrinrias.

    Esperamos, por fim, que esta possa ser ainda um a obra til ao operador do Direito, seja ele advogado, magistrado, prom otor de justia ou qualquer outro profissional do Direito, razo pela qual buscamos sem pre apresentar a aplicao prtica de cada um a das questes suscitadas. Tal m todo de trabalho decorre ainda de um a convico pessoal, a de que a cincia isolada da prtica

  • x v i i i Lies de Direito Processual Civil Cmara

    um a cincia estril, enquanto a prtica do Direito distante da cincia pode se tornar puro charlatanism o.

    A obra que ora apresentam os ao pblico e considerao dos doutos dividida em trs tom os. No primeiro, so analisados a Teoria Geral do Direito Processual (esta luz do Direito Processual Civil) e o processo de conhecim ento. No segundo volume, so examinados os processos nos tribunais e o processo executivo, sendo o terceiro volum e dedicado anlise do processo cautelar e dos procedim entos especiais. com a esperana de servirm os divulgao e com preenso do Direito Processual Civil que apresentam os este livro, m anifestando desde j que esperam os a colaborao, com crticas e sugestes, de todos aqueles que o lerem, para que esta obra, que pode ser considerada um a "obra aberta, possa sem pre evoluir.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA A23- EDIO

  • Esta 23a edio a prim eira a ser lanada pela prestigiosa Editora Atlas. A m udana de selo editorial no representa, porm, um a modificao do contedo ou do estilo da obra, que se preservam , fazendo-se, apenas, as sem pre devidas correes e atualizaes. Acrescentou-se, a este prim eiro volume das Lies, um captulo novo, dedicado ao exame dos lim ites internacionais do exerccio da jurisdio brasileira, tem a tradicionalm ente designado pela equivocada expresso "com petncia internacional, que de grande relevncia e que antes era apenas superficialm ente mencionado.

    Espero que este livro continue a ser m erecedor da acolhida que sem pre teve em suas edies anteriores. Sempre me surpreendeu a quantidade de citaes que dele encontrei em obras de doutrina, no Brasil e no exterior, na jurisprudncia de todos os tribunais, em peties e pareceres de advogados e m em bros do M inistrio Pblico de todos os lugares. Alm disso, a adoo da obra por professores e sua acolhida por estudantes de todos os cantos deste im enso pas sem pre me fascinaram, e acabaram por me levar a viajar, m inistrando aulas e palestras, por todas as regies. Ao elaborar esta 23a edio, s no tive ainda oportunidade de visitar dois Estados brasileiros: Tocantins e Amap, falha que, espero, serei brevem ente capaz de corrigir.

    Encerro esta breve introduo agradecendo aos m eus novos editores pela acolhida e dedicando esta nova edio, como todas as anteriores, aos grandes am ores de m inha vida: Janana, Rodrigo e G uilherm e, que sem pre esto ao m eu lado.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA 17- EDIO

  • No prim eiro sem estre de 1998, depois de ter lanado trs livros (Linea- mentos do novo processo civil Dos procedimentos sumrio e sumarissimo e Arbitragem), ousei lanar o primeiro volume desta obra que chamei de Lies de direito processual civil. Agora, dez anos depois, preparo sua 17a edio e me sinto na obrigao de elaborar esta apresentao.

    Devo dizer, e no vai aqui qualquer falsa m anifestao de m odstia, que a aceitao que o livro teve ao longo destes seus prim eiros dez anos me surpreendeu. Afinal, j havia, quela altura, um a srie de cursos e m anuais de direito processual civil que atendiam bastante bem s necessidades do meio jurdico. Alm disso, um autor que ainda no era m uito conhecido arriscava- -se a lanar um a obra de exposio sistem tica do direito processual civil brasileiro, e no m e parecia m uito provvel que o pblico acorresse a esta nova obra.

    Todavia, ao longo de dez anos, m inhas Lies de direito processual civil contaram com o beneplcito dos estudantes e profissionais do Direito, o que levou necessidade da elaborao de 16 edies, das quais a prim eira pela Editora Freitas Bastos e todas as dem ais pela Editora Lum en Juris.

    Para m eu envaidecimento, m inhas Lies de direito processual civil foram citadas por alguns dos processualistas que mais adm iro. Juristas como Jos Carlos Barbosa Moreira, Ada Pellegrini Grinover, H um berto Theodoro Jnior, Araken de Assis, A thos Gusmo Carneiro, en tre m uitos outros, me honraram com referncias a posies que sustento neste livro. Tambm em decises de

  • x x iv Lies de Direito Processual Civil Cmara

    diversos tribunais brasileiros (inclusive do STJ e do STF) encontrei, por diversas vezes, referncias s opinies que sustentei.

    Toda essa aceitao que teve a obra me encorajou a publicar outros livros (as duas sries dos m eus Escritos de direito processual, onde reno m eus artigos e pareceres, alm dos livros Juizados Especiais Cveis Estaduais e Federais - uma abordagem critica, A nova execuo de sentena e Ao rescisria), e me levou a viajar por quase todo o pas m inistrando aulas e conferncias sobre tem as de direito processual civil. A rigor, no m om ento em que preparo esta dcima stim a edio, posso dizer que s no estive ainda em quatro Estados da Federao: Piau, Amap, Tocantins e M ato Grosso do Sul, quatro lacunas que ainda espero poder preencher.

    Tudo isso me fez pensar que era chegado o m om ento de elaborar um a edio com emorativa desta prim eira dcada de vida do prim eiro volum e das Lies de direito processual civil. Mas havia um outro aspecto a considerar. Ao longo destes dez anos, tan to a teoria geral do direito processual civil como o mdulo processual de conhecim ento, tem as tratados neste prim eiro volume, passaram por um a srie de modificaes, algumas delas m uito profundas. Todas essas modificaes foram levadas em considerao quando atualizei o livro para as 15 edies posteriores original. De toda sorte, chegado o m om ento de fazer um a reviso com pleta do volume, a fim de se buscar um a coerncia m aior entre todos os segm entos do livro. Alm disso, eu no sou mais o processualista que era h dez anos. O Alexandre Freitas Cmara de 2008 o Alexandre Freitas Cmara de 1998 acrescido de dez anos de estudos e reflexes. Isso faz com que, evidentem ente, haja outros pontos a enfrentar, e novas abordagens de antigos tem as, o que tinha de ser levado em conta em um a obra que se prope a apresentar m inha opinio sobre o direito processual civil brasileiro.

    Por isso, promovi um a releitura de toda a obra, no apenas para buscar os pontos alterados por reformas legislativas, mas para revisitar todo o volume.

    Assim, esta dcima stim a edio praticam ente a apresentao de um novo prim eiro volume das Lies de direito processual civil. Evidentem ente, a m aior parte do que j estava escrito foi preservada. Afinal, por mais profundos que tenham sido m eus estudos e por m ais que tenha refletido, no poderia ter m udado de opinio quanto a todos os tem as aqui abordados (ainda que um a ou outra m udana de entendim ento tenha acontecido). Alis, algumas m udanas de opinio j haviam sido apresentadas ao longo do tempo, nas edies anteriores (e nunca m udei de opinio sem alertar, em nota de rodap, para a m udana ocorrida). De toda maneira, esta a verso inteiram ente atualizada da m inha viso do direito processual civil brasileiro.

    Espero, sinceram ente, que esta nova edio, com em orativa da prim eira dcada de vida do prim eiro volum e desta coleo, seja recebida com o m esm o carinho com que o pblico recebeu as edies anteriores.

  • Nota Introdutria 17a Edio XXV

    Termino esta breve apresentao desta edio com emorativa dedicando- -a ao m eu querido amigo Sylvio Capanema de Souza, em inente civilista e m agistrado, que me honrou com a elaborao da apresentao da prim eira edio deste prim eiro volume, que fiz questo de m anter em todas as edies posteriores. Seu texto, certam ente, m uito ajudou a tom ar este trabalho confivel aos olhos do pblico leitor. Dedico, tam bm , esta edio a todos os alunos que tive, por todo o Brasil, ao longo destes anos, eles todos verdadeiras cobaias das m inhas Lies.

    Como no poderia deixar de ser, esta edio dedicada m inha esposa Janana, litisconsorte de todos os m om entos que vivi desde 1989, quando comeamos a namorar. Sem ela, eu certam ente no teria sido capaz de produzir m inha obra, nem teria alcanado os resultados profissionais que atingi. A ela, dedico no s esta edio, mas toda a m inha obra, o m eu amor, a m inha vida. , tambm , esta edio dedicada a Rodrigo e Guilherme, m eus filhos, ambos nascidos quando este livro j existia. Se eles no viram o pai escrever o livro, por outro lado cresceram vendo o pai trabalhar em suas atualizaes. por eles, para tentar construir para eles um m undo melhor, que envido todos os meus esforos. Rodrigo e Guilherme so os mais belos frutos que a vida me deu.

    Por fim, m as no por ltim o, h algo mais a dizer. No m esm o ano em que lancei a prim eira edio deste prim eiro volume, vivi o mais trgico m om ento da m inha vida. Foi em 1998 que nasceu e logo aps faleceu m eu prim eiro filho, Alexandre. Sua fugaz passagem pela vida foi suficiente para m udar todo o sentido da m inha existncia. sua memria, dedico no s esta edio, mas - ainda mais do que isso - a m inha saudade.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA A16 - EDIO

  • No final do ano de 2006, um a srie de leis m uito im portantes trouxe inm eras modificaes ao Direito Processual Civil brasileiro. Temas como a execuo de ttu los extrajudiciais, a repercusso geral da questo constitucional, a sm ula vinculante e o processo eletrnico im puseram a necessidade de um a reviso com pleta destas m odestas Lies de direito processucd civil. Assim que, agora, apresentam os com unidade jurdica brasileira mais um a edio desta obra, com a sincera esperana de que a m esm a continue a ser digna da aceitao que as edies anteriores tiveram.

    O fato de ter havido tan tas modificaes no sistem a processual brasileiro, porm , leva-nos a advertir o leitor: sem pre possvel que, em um a obra extensa como so estas Lies, algum ponto tenha passado despercebido durante o trabalho de reviso e atualizao da obra.

    Esta breve introduo nova edio das nossas Lies, porm, tem um propsito: apresentar consideraes (breves) acerca dessas reformas por que vem passando o Direito Processual Civil brasileiro. Estam os absolutam ente convencidos de que o legislador tem se valido de suas armas para atacar o alvo errado. Os m aiores problem as da prestao jurisdicional civil no Brasil, a m orosidade do processo e a qualidade das decises judiciais, devem ser resolvidos atravs de reformas estruturais (como, por exemplo, a contratao de pessoal ou a informatizao de procedim entos adm inistrativos dos tribunais que ainda no o fizeram), bem assim com a realizao de cursos de atualizao para m agistrados e outros profissionais, que precisam estudar mais do que tm feito (e preciso dizer que m uitos no estudam no porque no queiram , mas

  • x x v i i i Lies de Direito Processual Civil Cmara

    sim plesm ente porque no tm tem po para estudar, em razo da sobrecarga de trabalho a que so subm etidos).

    Isso, evidentem ente, no quer dizer que reformas das leis processuais no tenham de ser feitas. Tais reformas, porm , deveriam ser feitas para atacar pontos da lei que, atuados na prtica, no tenham sido capazes de resolver adequadam ente os problem as que se destinam a solucionar. Como disse, com m uita propriedade, um dos mais autorizados processualistas brasileiros, "de que adianta reform ar as leis, se pela inobservncia delas que o retardam ento dos feitos se d? (Hum berto Theodoro Jnior, "A O nda Reformista do Direito Positivo e suas Implicaes com o Princpio da Segurana Jurdica, Revista Ma- gister de Direito Civil e Processual Civil, vol. 11, p. 31). Alm disso, m uitas alteraes tm sido capazes de gerar dvidas doutrinrias que as norm as anteriores no geravam. Assim, acaba-se por se pr em dvida a efetividade de m uitas das reformas, que acabam - em razo dessas divergncias - gerando um a perda de tem po ainda maior.

    Isso no quer, evidentem ente, dizer que nenhum a reform a seja positiva. O processo eletrnico, por exemplo, um passo adiante no modo de se desenvolver o processo civil no Brasil. Tomados os cuidados necessrios com a aplicao de um sistem a como esse em um pas de excludos digitais (e basta dizer que no Brasil apenas oito por cento da populao tem acesso In ternet a partir de com putadores instalados em residncias, e o itenta e nove por cento da populao brasileira formada por excludos digitais, segundo dados do Com it para Democratizao da Informtica, um a organizao no governamental criada no Brasil), o processo eletrnico pode m elhorar m uito a qualidade da prestao jurisdicional.

    A nosso juzo, preciso ter cuidado para no se pensar que toda reforma s vem para m elhorar o sistem a. Juristas no so Pollyanas, e no pode ser saudvel a existncia de juristas naif. preciso elogiar o que apresenta bons resultados e criticar o que no o consegue, de modo a perm itir que - atravs do trabalho dos juristas com prom etidos com a boa qualidade da prestao ju risdicional - se consiga aperfeioar sem pre o direito objetivo.

    Esperamos, sinceram ente, que nossa obra seja capaz de contribuir no s para a com preenso do Direito Processual Civil brasileiro vigente, m as tam bm para a m elhoria desse sistema.

    No poderamos encerrar esta nota introdutria sem dizer que esta nova edio de nossas Lies de direito processual civil dedicada, como no poderia deixar de ser, a Janana, para quem transcrevo as palavras de George Harrison, o genial Beatle que foi capaz de escrever um a das mais belas canes de am or de todos os tem pos, e sem usar um a vez sequer a palavra que d nom e ao sentim ento que cantou:

  • Nota Introdutria 16a Edio XXX

    Something in the way she moves attracts me like no o ther lover.Something in the way she woos me.I d o n 't w ant to leave her now, you know I believe and how.Somewhere in her smile she knows tha t I do n 't need no o ther lover.Something in her style tha t shows me.I d o n 't w ant to leave her now, you know I believe and how.You're asking me will my love grow.I d o n 't know, I d o n 't know.You stick around now, it may show,I d o n 't know, I d o n 't know.Something in the way she know, and ali I have to do is think o f her.Something in the th ing she shows me.I d o n 't w ant to leave her now, you know I believe and how.

    Esta edio , tam bm , dedicada a Rodrigo e Guilherme, filhos adorados. A eles, as palavras de Helen Gunn: Os jardins so como os filhos: voc pode adm irar o dos outros de forma objetiva, mas nada se pode com parar com a satisfao e o prazer que do os prprios. a que reside a verdadeira felicidade. Rodrigo e Guilherm e so as flores do m eu jardim . S descobri a verdadeira felicidade depois que eles entraram em m inha vida.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA 11* EDIO

  • A elaborao desta 11a edio contou com a colaborao de diversos leitores e alunos que, lendo a edio anterior, apontaram aspectos em que a obra precisava ser revista, tendo em conta as implicaes do Cdigo Civil de 2002 sobre o sistem a processual civil brasileiro. Por mais que se tenha buscado, j nas edies anteriores, essa atualizao, errar hum ano e sem pre possvel que pontos em que tal atualizao deveria ter sido feita ainda no tivessem sido encontrados. Por conta disso, no se pode deixar de agradecer, sem nom inar para no correr o risco de esquecim entos, a todos aqueles que me ajudaram nessa difcil em preitada. Continua-se, ainda, com a esperana de que eventuais falhas que persistam sejam perdoadas e apontadas pelos leitores que, ao longo da vida desta obra, tm sido to gentis em acolh-la.

    Aproveita-se, ainda, essa oportunidade, para agradecer aos profissionais do D ireito que com tan ta generosidade tm feito aluso ao que aqui se escreveu e se sustenta. A referncia a estas m odestas Lies em obras doutrinrias, peties, pareceres e decises, inclusive das Cortes de Superposio, envaidece o autor e o faz acreditar que vale a pena trabalhar para melhorar, sempre, o contedo do livro.

    Por fim, no posso deixar de lem brar que esta 11a edio foi elaborada nos dias im ediatam ente seguintes ao nascim ento de m eu filho Guilherme. A ele, ao meu prim ognito Rodrigo, e a Janana, vai esta edio dedicada, como no poderia deixar de ser.

    O Autor

  • NOTA INTRODUTRIA8- EDIO

  • O ano de 2002 marca, decisivamente, a h istria do D ireito brasileiro. Em prim eiro lugar, a aprovao de um novo Cdigo Civil, logo em janeiro. Pouco tem po depois, em maio do m esm o ano, a aprovao da Lei n2 10.444, que modificou radicalm ente o Cdigo de Processo Civil, nele provocando um a guinada radical. Esses dois im portantes diplom as foram aprovados quando j estava pronta a stim a edio deste prim eiro volume, razo pela qual a oitava edio vem inteiram ente revista e remodelada. Este prim eiro volume, preciso que isso fique claro, foi escrito originariam ente sob a gide do Cdigo Civil de 1916 e antes dessa m udana radical provocada pela assim chamada "segunda etapa da reform a do CPC. O que se espera que o livro continue a ter a m esma aceitao que vinha tendo anteriorm ente, tan to por parte de estudantes como de profissionais. Aproveita-se o ensejo para agradecer a todos os juristas que levaram em conta e citaram em seus trabalhos as opinies manifestadas nestas m odestas Lies, bem assim a todos os advogados, m em bros do Ministrio Pblico e m agistrados que, em suas peties, promoes, pareceres e decises citaram o que aqui se sustenta. Espera-se, sinceram ente, que este livro possa ser cada vez mais til construo de um Direito Processual justo e eficiente, capaz de contribuir para o surgim ento de um Brasil melhor.

    Encerra-se esta apresentao dedicando-se esta oitava edio do prim eiro volum e das Lies de Direito Processual Civil a Luiz Fux, de quem tive a honra de ter sido aluno no curso de graduao em Direito, na UERJ, e que honra este pas com sua cultura hum anista, e que com seu talento enriquece o Superior Tribunal de Justia. Dedico, ainda, esta edio, m em ria de James Thben-

  • x x x iv Lies de Direito Processual Civil Cmara

    chlak, amigo querido que to cedo se foi, e de quem sem pre sentirei saudade. Por fim, dedico esta edio ao m eu filho Rodrigo e m inha esposa Janana, com m eu eterno amor.

    O Autor

  • PARTE 1

  • TEORIA GERAL D O D IR E IT O PROCESSUAL

  • IDIREITO PROCESSUAL: CONCEITO, DENOMINAO, POSIO ENCICLOPDICA E

    EVOLUO CIENTFICA

  • l fi CONCEITO DE DIREITO PROCESSUAL

    Ao iniciar o estudo do Direito Processual Civil, fundam ental fixar o conceito de Direito Processual, visto que este (ou ao m enos um a de suas m anifestaes - o D ireito Processual Civil) ser o tem a central desta obra. Parece- -nos que todo o restante da obra ficaria sem sentido se no se apresentasse, desde logo, o que me parece a m elhor forma de conceituar esse ram o do Direito a cujo estudo tenho me dedicado.

    A doutrina, tan to a nacional como a estrangeira, diverge ao conceituar o Direito Processual. Assim que o notvel processualista colombiano Hernando Devis Echanda, considerado por m uitos um dos m aiores processualistas latino- -americanos de todos os tem pos, define o D ireito Processual como "o ram o do Direito que estuda o conjunto de norm as e princpios que regulam a funo jurisdicional do Estado em todos os seus aspectos e que, portanto, fixam o procedim ento que se h de seguir para obter a atuao do direito positivo nos casos concretos, e que determ inam as pessoas que devem subm eter-se jurisdio do Estado e os funcionrios encarregados de exerc-la.1 J o ju rista m exicano Jose Becerra Bautista, em sua obra didtica, definiu o Direito Processual com base nas lies do processualista italiano Paolo D 'Onofrio, afirm ando ser

    1 Hernando Devis Echanda, Teoria general dei proceso, tomo I, p. 6.

  • 6 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    esse o conjunto de norm as que tm por objeto e fim a realizao do direito objetivo atravs da tu te la do direito subjetivo, m ediante o exerccio da funo jurisdicional".2

    Tambm na doutrina italiana podem -se encontrar subsdios para se chegar ao conceito mais adequado de D ireito Processual, no sendo dem ais lembrar que a doutrina italiana , no Direito Processual, como em outros ram os da cincia jurdica, a que mais influncia exerce sobre o Direito brasileiro. Assim que o notvel processualista Crisanto Mandrioli define o D ireito Processual Civil como o ram o da cincia jurdica que estuda a disciplina do processo civil".3 Ainda na doutrina italiana encontra-se a lio de Enrico Tullio Liebman,4 para quem o Direito Processual deve ser entendido como um "ramo do Direito destinado precisam ente tarefa de garantir a eficcia prtica e efetiva do ordenam ento jurdico, instituindo rgos pblicos com a incum bncia de atuar essa garantia e disciplinando as m odalidades e formas da sua atividade.5

    A doutrina italiana mais recente tam bm tem dedicado ateno ao tema. Assim, por exemplo, afirma-se - em im portante obra - que o Direito Processual Civil o conjunto de norm as que [...] constituem a lei reguladora do processo (civil)".6

    Tambm a doutrina brasileira apresenta conceitos de Direito Processual Civil, como se v, por exemplo, em Moacyr Amaral Santos, para quem o Direito Processual o sistem a de princpios e leis que disciplinam o processo".7 J a mais m oderna doutrina sobre a teoria geral do D ireito Processual v neste "o complexo de norm as e princpios que regem o exerccio conjunto da jurisdio

    2 Jose Becerra Bautista, Introduccin al estdio dei derecho procesal civil, p. 15.

    3 Crisanto Mandrioli, Corso di diritto processuale civile, vol. I, 1995, p. 8. No mesmo sentido manifesta-se Ferrucio Tomaseo, um dos mais notveis processualistas italianos da atualidade, na obra Appunti di diritto processuale civile - nozioni introduttive, p. 9.4 A influncia de Liebman sobre o desenvolvimento do Direito Processual Civil brasileiro notvel. Discpulo de Chiovenda (considerado o maior processualista de todos os tempos), Liebman morou no Brasil na poca da Segunda Guerra Mundial. Atravs de sua atuao como professor na Faculdade de Direito do Largo de So Francisco, Liebman foi o responsvel por uma escola de pensamento, a qual Ficaria conhecida como "Escola Processual de So Paulo", e que hoje constitui-se numa verdadeira escola brasileira de processo. As principais teorias defendidas por Liebman foram consagradas no Cdigo de Processo Civil brasileiro, o qual resultou de um anteprojeto elaborado pelo mais notvel de seus discpulos, o saudoso professor Alfredo Buzaid. Alm disso, Liebman chegou a elaborar obras em portugus, s quais farei referncia ao longo deste livro.5 Liebman, Manual de direito processual civil, vol. I, trad. bras. de Cndido Rangel Dinamarco, p. 3.

    6 Giovanni Arieta, Francesco de Santis e Luigi Montesano, Corso base di diritto processuale civile,p. 1.7 Moacyr Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, vol. I, p. 14.

  • Direito Processual: Conceito, Denominao, Posio Enciclopdica e Evoluo Cientfica 7

    pelo Estado-juiz, da ao pelo dem andante e da defesa pelo dem andado.8 Em obra modernssim a, im portante processualista brasileiro afirmou que o Direito Processual Civil "disciplina que se dedica a estudar, a analisar, a sistematizar a atuao do prprio Estado, do Estado que, por razes perdidas no tem po, mais ainda vlidas at hoje por fora das opes polticas feitas pela Constituio Federal de 5 de outubro de 1988, tem o dever de prestar tu te la estatal de direitos naqueles casos em que os destinatrios das norm as, desde o plano material, no as acatam devidamente, no as cum prem e, consequentem ente, frustram legtimas expectativas das outras pessoas.9

    Dessas lies transcritas acima, proferidas por alguns dos mais im portantes processualistas brasileiros e estrangeiros, pode-se ver que no fcil chegar a um conceito preciso de Direito Processual, sendo certo que m uitas das definies apresentadas "chovem no m olhado, definindo o Direito Processual como o conjunto de norm as que regem o processo. Parece, todavia, que essas definies no so adequadas, data venia, para que se com preenda exatam ente no que consiste esse ram o do Direito. A m eu juzo, o Direito Processual pode ser definido com o o ramo da cincia jurdica que estuda e regulamenta o exerccio, pelo Estado, da funo jurisdicional

    Em prim eiro lugar, h que se explicar que, ao falar em ram o da cincia jurdica que estuda e regulamenta, tenho por objetivo dem onstrar que o D ireito Processual, como qualquer ou tro ram o da cincia jurdica, deve ser examinado em dois sentidos: como cincia e como direito positivo. A m eu sentir, a anlise de qualquer ram o do D ireito apenas com o direito positivo, ou seja, com o um conjunto de norm as, insuficiente, assim como o a anlise de tais ram os do D ireito apenas com o cincia, e desligados da legislao. Todos os ram os do direito devem ser exam inados em sua in teireza para que possam ser bem com preendidos. A Cincia do D ireito no tem vida prpria se distanciada das norm as jurdicas, da m esm a form a que a anlise das norm as jurdicas im possvel sem que se conhea a cincia. O D ireito Processual , pois, cincia e norm a, e assim deve ser estudado.

    Deve-se esclarecer, ainda, quanto ao conceito de Direito Processual por m im exposto, que o objeto central dos estudos realizados nesta obra a ju risdio (o que levou boa doutrina a sugerir a m udana da denom inao da disciplina para D ireito Jurisdicional),10 a qual, com o se sabe - e ser visto mais adiante em detalhes - , um a das funes exercidas pelo Estado como manifestao do seu Poder Soberano. A jurisdio, porm, para ser exercida depende de um a srie de outros institu tos a ela ligados, como a ao, o processo, a sen

    8 Antonio Carlos de Arajo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cndido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, p. 40.

    9 Cssio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de direito processual civil, vol. 1, p. 9.10 Juan Montero Aroca, Evolucin y futuro dei derecho procesal, p. 71.

  • 8 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    tena, os recursos, a coisa julgada (s para citar alguns). Assim que se compreendem no universo do Direito Processual no s a jurisdio, mas tambm todos os demais institu tos jurdicos que a ela se ligam com o fim de viabilizar seu exerccio adequado pelo Estado.

    por essas razes que conceituo o Direito Processual, como visto, como o ram o da cincia jurdica que estuda e regulam enta o exerccio, pelo Estado, da funo jurisdicional.

    2 Q DENOM INAO

    A denom inao em pregada nesta obra a mais frequentem ente utilizada pelos doutrinadores deste ram o do Direito. Tal nom enclatura, porm, no foi sem pre usada, nem aceita pela unanim idade dos especialistas. De incio, costum ava em pregar a doutrina a denom inao "processo civil" (ou, na doutrina italiana, procedura civile), como se v, por exemplo, nas obras de grandes juristas do sculo XIX, como Francisco de Paula Baptista11 e Lodovico Mortara.12

    O utros autores antigos preferiam falar em "Direito Judicirio", como o grande ju rista brasileiro Joo Mendes de Almeida Jnior.13 Essa nom enclatura, porm, inadequada, por ter um sentido capaz de abranger tem as que no pertencem a esse ram o do Direito, como, por exemplo, a organizao judiciria.

    A denom inao Direito Processual, como dissem os, hoje a mais utilizada, tendo sido empregada, por exemplo, por Giuseppe Chiovenda,14 Liebman,15 Mandrioli16 e, en tre os brasileiros, por Moacyr Amaral Santos,17 Humberto Theodoro Jnior18 e Vicente Greco Filho.19 certo, porm, que essa denom inao possui um

    11 Francisco de Paula Baptista, Teoria e prtica do processo civil e comerciai Paula Baptista, lente de Processo Civil na Faculdade de Direito de Pernambuco, lecionou naquela casa entre 1835 e 1881 e pode ser considerado o ancestral de todos os processualistas brasileiros, tendo defendido posies doutrinrias que s seriam aceitas como verdadeiras na Europa anos (s vezes dcadas) depois.12 Lodovico Mortara, Istituzioni di procedura civile.

    13 Joo Mendes de Almeida Jnior, Direito judicirio brasileiro.

    14 Giuseppe Chiovenda, maior processualista de todos os tempos, foi professor da Universidade de Roma, sendo autor, entre outras obras fundamentais, das Instituies de direito processual civil, trad. bras. de J. Guimares Menegale.

    15 Manual de direito processual civil.

    16 Corso di diritto processuale civile.17 Primeiras linhas de direito processual civil.

    18 Humberto Theodoro Jnior, Curso de direito processual civil.19 Vicente Greco Filho, Direito processual civil brasileiro.

  • Direito Processual: Conceito, Denominao, Posio Enciclopdica e Evoluo Cientfica 9

    grave defeito: o nom e Direito Processual passa a falsa ideia de que o processo (e no a jurisdio) o conceito central e mais im portante desta cincia, quando na verdade o processo m eram ente um meio de que se vale o Estado para exercer a funo jurisdicional. Por essa razo, como j mencionado, o ju rista espanhol Juan Montero Aroca defende a adoo de nova denominao: Direito Jurisdicional.20 Se por um lado as razes do notvel professor espanhol parecem convincentes, a sugerir a aceitao de sua sugesto no sentido de se defender um a nova denominao, no se deve deixar de ponderar no sentido de que a nom enclatura atual, em bora no seja perfeita (como no seria nenhuma outra), tem um a grande vantagem. Em razo de sua im ensa aceitao, a denom inao Direito Processual perm ite que, ao m ero enunciar das palavras que a formam, todos os que a ouvem pensem em um m esm o ram o do Direito, com lim ites m uito precisos, inexistindo qualquer dvida possvel quanto ao alcance da expresso. Por esse motivo, e aplicando a m xim a segundo a qual "em tim e que est ganhando no se mexe, que opto aqui por utilizar esta que, apesar das crticas procedentes que lhe so dirigidas, ainda a mais aceita denom inao da disciplina jurdica de que se ocupa este livro.

    Assim que, em bora utilize como fonte de denom inao o processo, m ero instrum ento posto pelo sistem a a servio da jurisdio, e no esta ltima, verdadeiro conceito central e essencial desse ramo da cincia jurdica, continuarei em pregando, ao longo deste livro, o nom e consagrado: Direito Processual. preciso ter claro, porm, que aqui se trata, apenas, do Direito Processual Jurisdicional, e no de outros (como o D ireito Processual Administrativo, por exemplo), ainda que ali tam bm se esteja diante de verdadeiros processos.

    3* POSIO ENCICLOPDICA

    sabido por todos os que se iniciam no estudo do Direito que os ramos dessa rea do conhecim ento hum ano podem ser divididos em duas grandes famlias: direito pblico e direito privado. Tal diviso, em bora seja alvo de m uitas crticas, ainda um m todo seguro de se estabelecer critrios interpretativos baseados em princpios com uns aos ramos que com pem cada um a dessas grandes "famlias jurdicas. Ao se dizer que um determ inado ram o do Direito pblico ou privado, estam os estabelecendo um a srie de premissas que devero ser levadas em conta quando da interpretao das norm as que o compem, como, por exemplo, a posio de coordenao entre os sujeitos da relao ju rdica (no direito privado), ou a posio de suprem acia de um dos sujeitos (o Estado) em relao aos dem ais (no direito pblico).

    20 Montero Aroca, ob. e loc. cit.

  • 1 0 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    No h nenhum a dvida na doutrina especializada quanto incluso do Direito Processual dentro da "famlia" do direito pblico. certo, porm, que durante m uito tem po as norm as processuais (em especial as processuais civis) foram consideradas de direito privado. Isso se deu, porm, antes da afirmao da autonom ia cientfica do Direito Processual, o que ocorreu, como se ver adiante, em meados do sculo XIX. At essa poca, as norm as processuais eram consideradas um m ero apndice do Direito Civil, o qual, indubitavelmente, integra o direito privado. A afirmao da autonom ia cientfica do Direito Processual, porm, com a certeza de que nas relaes jurdicas por ele estudadas um dos sujeitos o Estado, que ali se pe em posio de supremacia, exercendo seu poder soberano, tom a inquestionvel a natureza pblica desse ram o da cincia jurdica.

    Assim sendo, o D ireito Processual deve ser sem pre interpretado como um ram o do D ireito em que h um predom nio do Estado, o qual tem um a das m anifestaes de seu poder por ele estudadas, o que aproxim a o D ireito Processual, em m uitos aspectos, do D ireito Constitucional (onde encontra, obviamente, os seus princpios norteadores, como o devido processo legal e o contraditrio) e do Direito Adm inistrativo (com o qual m antm , alis, um a rea de interseo, o processo adm inistrativo, que contm elem entos desses dois ram os do D ireito). Tal proxim idade tem como conseqncia a conscincia - que hoje tem o processualista - de que as sem elhanas entre as diversas funes do Estado so m uito mais im portantes do que suas diferenas, mxime porque, en tre tais semelhanas, um a essencial: qualquer que seja a funo do Estado que esteja sendo exercida, o que se tem um a m anifestao do poder estatal soberano, o qual, como notrio, uno e indivisvel.

    4 e EVOLUO CIENTFICA DO DIREITO PROCESSUAL

    O Direito Processual tem sua evoluo cientfica dividida em trs fases m uito ntidas: a fase im anentista, a fase cientfica e a fase instrum entalista. Diga-se desde logo que, nesse quadro, no se leva em considerao a evoluo do processo civil romano, por exemplo, pois sigo aqui a orientao de Montero Aroca, para quem o estudo da evoluo do D ireito Processual no precisa re tro ceder a "Ado e Eva, ou ao macaco pelado, segundo se prefira.21

    A prim eira fase, chamada im anentista, a anterior afirmao da au tonom ia cientfica do D ireito Processual. D urante essa fase do desenvolvim ento do D ireito Processual (na verdade, nessa fase no se pode falar propriam ente em D ireito Processual, o que se faz por m era com odidade), o processo era m ero

    21 Montero Aroca, p. 5.

  • Direito Processual: Conceito, Denominao, Posio Enciclopdica e Evoluo Cientfica 11

    apndice do direito m aterial. Dizia-se, ento, que o direito m aterial (como o direito civil, por exemplo), sendo essencial, era verdadeiro direito substantivo, enquanto o processo, m ero conjunto de formalidades para a atuao prtica daquele, era um direito adjetivo. Essas denominaes, hoje inteiram ente ultrapassadas, e equivocadas do ponto de vista cientfico, devendo ser repudiadas diante do grau de desenvolvim ento alcanado pelos estudos processuais, continuam - infelizmente - a ser empregadas por alguns autores e, principalm ente, por m uitos operadores do Direito, como advogados e magistrados. Tal linguagem, porm, deve ser banida, por ser absolutam ente divorciada da preciso cientfica j alcanada.

    A fase im anentista, que com o se viu caracterizada pela negao autonom ia cientfica do D ireito Processual, tem como lum inares os praxistas, ou procedimentalistas, juristas que concentraram seus esforos na anlise das formas processuais, e que viam no processo, portanto , m era seqncia de atos e formalidades. M uitos dos praxistas, alis, eram juristas que sem pre estudaram o D ireito Civil, mas que analisavam tam bm as norm as processuais, por serem essas, como dito, consideradas um apndice daquele im portante ram o do Direito.

    Em 1868, ano da publicao da obra do ju rista alemo Oskar von Blow, denom inada Die Lehre von den Processeireden und die Processvoraussetzungen (A Teoria das Excees Processuais e os Pressupostos Processuais), com a qual se inicia o desenvolvimento da teoria do processo como relao jurdica, o Direito Processual passa a ser considerado ram o autnom o do Direito, passando a integrar, como j afirmado, o direito pblico. Inicia-se, com a publicao do referido livro do ju rista alemo, a fase cientfica do Direito Processual, assim denom inada por ter sido um a fase em que predom inaram os estudos voltados para a fixao dos conceitos essenciais que compem a cincia processual, tais como os de ao, processo e coisa julgada. nessa fase que surgem os maiores nom es do Direito Processual de todos os tempos. Nomes como os de Giuseppe Chiovenda, Francesco Camelutti, Piero Calamandrei e Enrico Tullio Liebman, na Itlia; de Adolf Wach, Leo Rosenberg e James Goldschmidt, na Alemanha; Jaime Guasp, na Espanha; Alfredo Buzaid, Lopes da Costa e Moacyr Amaral Santos, no Brasil, enriqueceram a cincia processual desenvolvendo teorias essenciais para a afirmao da autonom ia cientfica desse ramo do Direito.

    A partir do m om ento em que no se pde mais pr em dvida a au tonom ia cientfica do D ireito Processual, e estando assentados os mais im portantes conceitos da m atria (apesar de se m anter im enso o nm ero de polmicas doutrinrias - todas extrem am ente saudveis para o desenvolvimento cientfico), passou-se fase que vive hoje o Direito Processual: a fase instrum entalista. Trata-se de um m om ento em que o processualista dedica seus esforos no sentido de descobrir m eios de m elhorar o exerccio da prestao jurisdicional, tornando tal prestao mais segura e, na m edida do possvel, mais clere, ten tan

  • 1 2 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    do aproxim ar a tu tela jurisdicional, o mais possvel, do que possa ser chamado de justia. O processo deixa de ser visto como m ero instrum ento de atuao do direito m aterial e passa a ser encarado como um instrum ento de que se serve o Estado a fim de alcanar seus escopos sociais, jurdicos e polticos. Alm disso, passa-se a privilegiar o consum idor do servio prestado pelo Estado quando do exerccio da funo jurisdicional, buscando-se meios de adm inistrao da justia que sejam capazes de assegurar ao titu lar de um a posio jurdica de vantagem um a tutela jurisdicional adequada e efetiva. Os grandes nom es dessa fase do desenvolvim ento do Direito Processual nada deixam a dever aos lum inares da fase anterior, podendo ser citados aqui, por todos, os nom es de Mauro Cappelletti, professor italiano, o m aior nom e da cincia processual do fim do sculo XX, alm dos notveis juristas brasileiros Jos Carlos Barbosa Moreira e Cndido Rangel Dinamarco.

    Deve-se afirmar que a evoluo legislativa do Direito Processual tem acom panhado a evoluo cientfica. Assim que os Cdigos de Processo Civil brasileiros foram elaborados luz dos critrios e conceitos predom inantes na fase cientfica (tanto o CPC de 1939, elaborado luz das teorias de Chiovenda, como o de 1973, verdadeiro "m onum ento em hom enagem a Liebman,f, enquadram -se nessa fase da evoluo do D ireito Processual). O Cdigo de Processo Civil vigente (o de 1973) foi, todavia, reform ado por um a srie de leis que alteraram diversos preceitos e princpios ali contidos e que geraram um a verdadeira revoluo em nosso sistem a processual, tendo sido tal reforma realizada j sob a influncia dos princpios norteadores da fase instrum entalista do processo.22

    Ao afirmar que as recentes reformas da legislao processual brasileira foram realizadas luz dos mais m odernos princpios defendidos pela doutrina processual, e ao asseverar que entre os grandes nom es da m oderna cincia processual encontram -se autores brasileiros (e no apenas os dois anteriorm ente citados, mas m uitos outros mais), tenho a inteno de dem onstrar que o Brasil ocupa hoje um a posio de liderana no cenrio da cincia processual em nvel m undial, sendo certo que diversos processualistas estrangeiros buscam na doutrina e na legislao brasileiras subsdios para fundam entar as opinies que m anifestam .23

    22 Sobre a primeira etapa da reforma do Cdigo de Processo Civil, consulte-se Alexandre Freitas Cmara, Lineamentos do novo processo civil.

    23 Dentre os mais importantes processualistas estrangeiros que embasam algumas de suas afirmaes nas lies dos autores brasileiros podem ser citados o argentino Augusto Mario Morello e o italiano Elio Fazzalari.

  • II

    A EXISTNCIA DE UMA TEORIA GERAL DO DIREITO

    PROCESSUAL

  • Costum a-se dividir o D ireito Processual em pelo m enos dois grandes ramos, o D ireito Processual Civil e o Direito Processual Penal. Alm desses, outros ram os podem ser identificados, como o D ireito Processual do Trabalho, o Direito Processual Eleitoral e o Direito Processual Adm inistrativo. Tal diviso, porm, se faz com o fim de atender a critrios exclusivamente didticos e de facilitao da atividade legislativa. Na verdade, o D ireito Processual nico, no com portando verdadeiras divises. Essa afirmao resulta na adm isso da existncia de um a teoria geral do D ireito Processual, ou seja, um a parte geral da cincia, aplicvel a todos os "ram os que a integrem.

    No pacfica em sede doutrinria a existncia de um a teoria geral do Direito Processual. A resistncia inicial existncia de tal teoria, porm , foi sendo gradualm ente vencida, at que tal teoria chegasse m esm o a ser apresentada como cadeira autnom a nos cursos de graduao em Direito de inm eras faculdades de nosso pas.

    No parece possvel o oferecimento de qualquer contestao existncia da teoria geral do D ireito Processual. inegvel o im enso nm ero de institu tos afins a todos os ram os do Direito Processual, podendo servir como exemplo do que acaba de ser afirmado o fato de que todos os citados "ram os tm um a base comum, formada pela "trilogia estrutural do Direito Processual, a qual formada pela jurisdio, pela ao e pelo processo.

    Alm desses trs conceitos, porm, outros h, com uns a todos os ramos do Direito Processual, como os conceitos de precluso, ato processual, nus

  • 1 6 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    processual, coisa julgada, recursos. A existncia de todos esses (e m uitos outros) institu tos com uns perm ite afirmar, com Waldemar Mariz de Oliveira Jnior, que a diferena entre os diversos ram os do D ireito Processual to som ente de grau, no de qualidade ou de natureza.1 Em verdade, no h qualquer diferena ontolgica entre o D ireito Processual Civil e o D ireito Processual Penal (ou entre esses e quaisquer outros ram os do Direito Processual). Isso porque todos esses ram os tm um a finalidade comum, qual seja, estudar e regulam entar o exerccio da funo jurisdicional. Ora, em sendo essa funo estatal una e indivisvel,2 como se ver com mais calma adiante, no pode ser aceita um a verdadeira diviso entre ram os do D ireito que tm a m esm a finalidade e o m esm o objeto.

    Por essa razo, crendo firm em ente na existncia de um a teoria geral do D ireito Processual (e, como visto, na sua unidade ontolgica), que dedico a prim eira parte deste volume ao estudo daquela teoria. Sendo, porm, um livro sobre o Direito Processual Civil (um daqueles "ram os do D ireito Processual a que se fez referncia e cuja finalidade estudar e regulam entar o exerccio da jurisdio civil, um a das espcies de jurisdio que costum am ser apresentadas pela doutrina com aquela finalidade didtica e de facilitao da atividade legislativa a que se fez referncia anteriorm ente, e que sero a seguir explicitadas), os institu tos centrais do D ireito Processual, com ponentes da teoria geral do D ireito Processual, sero encarados sob um a tica processual civil, sendo certo que raram ente se far referncia, aqui, aplicao desses conceitos e institu tos nos dem ais ram os do Direito Processual.

    Foi dito anteriorm ente que a diviso em ram os do Direito Processual tem duas finalidades essenciais: um a didtica, a ou tra de facilitar a atividade legislativa. Deve-se explicar essa assertiva. A diviso do D ireito Processual em ramos, sem nenhum a dvida, facilita a com preenso das peculiaridades de cada hiptese. Basta imaginar quo mais complexo seria para aquele que se lana, pela prim eira vez, ao estudo do D ireito entender como tem as aparentem ente to distintos como a ao de consignao em pagam ento e a execuo penal pudessem pertencer ao m esm o ram o da cincia jurdica. Por outro lado, fica bem mais fcil para os legisladores elaborar leis que digam respeito exclusivam ente ao D ireito Processual Civil ou ao D ireito Processual Penal, como sejam os Cdigos referentes a cada um desses ram os do Direito Processual. H que se recordar que a funo legislativa exercida, m uitas vezes, por pessoas sem formao jurdica, deputados e senadores que no esto acostum ados aos m istrios e s belezas da cincia jurdica e que, apesar de assessorados por especialistas, podem no ter a exata dim enso da unidade conceptual existente entre os diversos ram os da cincia processual. Por essa razo, m uito mais

    1 Waldemar Mariz de Oliveira Jnior, Teoria geral do processo civil, p. 13.2 Arajo Cintra et al. Teoria geral do processo, p. 141.

  • A Existncia de uma Teoria Geral do Direito Processual 1 7

    simples, sem som bra de dvida, a elaborao de leis que regem cada um desses ramos do D ireito Processual separadam ente. certo que alguns poucos pases tentaram um a experincia diversa, elaborando Cdigos que reunissem os preceitos de Direito Processual Civil e Penal, como se fez, por exemplo, na Sucia. Essa experincia, porm, no foi levada adiante na maioria dos pases, sendo bastante mais freqente a existncia de Cdigos separados, como no Brasil, em que h um Cdigo de Processo Civil e um Cdigo de Processo Penal.

    A conscincia, por parte do estudioso do Direito Processual, de que existe um a teoria geral desse ram o do conhecim ento jurdico essencial para a adequada com preenso dos m eandros e detalhes que o compem. Aquele que conhece bem a teoria geral do Direito Processual pode, sem nenhum a dvida, "navegar pelo Direito Processual (civil ou penal) sem grandes dificuldades, sendo certo, de outro lado, que aquele que ignora os conceitos genricos da disciplina ter im ensa dificuldade em bem apreender o Direito Processual Civil (ou qualquer outro ram o do D ireito Processual).

  • III

    FONTES, INTERPRETAO E APLICAO NO ESPAO

    E NO TEMPO DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

  • l fi FONTES DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

    por certo m uito difcil conceituar as fontes do Direito. Sendo fonte o lugar de onde provm algum a coisa, a expresso fonte do direito no pode ser entendida seno como o lugar de onde so oriundos os preceitos jurdicos.1 O estudo das fontes do direito extrem am ente im portante para a exata delimitao do que e do que no pode ser considerado Direito. Assim que o Direito Processual s o enquanto provm de um a das fontes do Direito Processual.

    H que se explicitar o que vem de ser dito, o que se faz com um exemplo. As leis municipais no so, no ordenam ento brasileiro, fontes do Direito Processual. Assim sendo, eventual lei municipal que versasse sobre m atria processual no seria ap ta a integrar o sistem a que se denom ina D ireito Processual, sendo certo que aquela norm a seria inconstitucional (um a vez que o Municpio estaria legislando sobre m atria para a qual a Constituio da Repblica no lhe dera com petncia legislativa - inconstitucionalidade formal), no podendo ser aplicada por nenhum rgo jurisdicional.

    As fontes do D ireito Processual Civil, portanto, so os lugares de onde provm esse ram o do Direito, e se classificam tais fontes em formais e m ate

    1 Rubens Limongi Frana, Hermenutica jurdica, p. 84.

  • 2 0 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    riais. Fontes formais so aquelas que possuem fora vinculante, sendo, portanto, obrigatrias para todos. So as responsveis pela criao do direito positivo. J as fontes m ateriais no tm fora vinculante, servindo apenas para esclarecer o verdadeiro sentido das fontes formais.

    Fonte formal do D ireito Processual Civil a lei. Fala-se aqui, porm, em lei lato sensu, a significar norm a jurdica. Diversas so as formas de expresso da norm a jurdica que podem originar preceitos de Direito Processual: a Constituio Federal, a lei federal ordinria, a lei estadual, os tratados internacionais e os regim entos in ternos dos Tribunais.

    Assim que, antes de qualquer outra, a Constituio da Repblica fonte formal do Direito Processual Civil, ali sendo encontradas regras das mais relevantes entre as que com pem esse ram o do Direito. As norm as contidas na Constituio e que dizem respeito ao Direito Processual podem ser divididas em dois grupos: o Direito Constitucional Processual e o Direito Processual Constitucional.

    Antes de mais nada, h que se afirmar que estes no so dois novos ramos do Direito Processual, m as to som ente conjuntos de norm as jurdicas sem autonom ia cientfica (e aqui lem bro o que j foi afirmado anteriorm ente: qualquer ram o do Direito s tem autonom ia se puder ser visto ao m esm o tem po como conjunto de norm as positivas e com o cincia).

    O Direito Constitucional Processual o conjunto de norm as de ndole constitucional cuja finalidade garantir o processo, assegurando que este seja, tan to quanto possvel, um processo justo. Com pem o Direito Constitucional Processual os cham ados "princpios gerais do Direito Processual, que sero alvo de ateno mais adiante, entre os quais se incluem o princpio do devido processo legal, o do contraditrio e o da isonomia.

    J o Direito Processual Constitucional o conjunto de norm as de ndole processual que se encontram na Constituio com o fim de garantir a aplicao e a suprem acia hierrquica da Carta Magna. Aqui so encontradas as norm as que regulam, entre outros, o m andado de segurana, o recurso extraordinrio e o m andado de injuno.

    Alm (e abaixo, de acordo com a "pirm ide da hierarquia das norm as jurdicas) da Constituio da Repblica, outras formas de expresso das norm as jurdicas tam bm so fontes formais do Direito Processual Civil. Entre elas destaca-se, sem dvida, a lei ordinria federal. Basta dizer que o Cdigo de Processo Civil, a m ais im portante das leis processuais brasileiras, um a lei ordinria federal, a Lei nQ 5.869/1973.

    H que se frisar, porm, que apenas a lei ordinria, e no a lei complementar, fonte formal do Direito Processual. Como se sabe, a lei com plem entar s adequada s hipteses em que for expressam ente exigida pela Constituio da Repblica. No mais, a lei ordinria que se faz adequada regulamentao de preceitos jurdicos.

  • Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil 2 1

    Considerando que em nenhum m om ento a Carta Magna exige a elaborao de lei com plem entar para a regulam entao de qualquer institu to de ndole processual, esta no pode ser tida como fonte do Direito Processual Civil.

    Quid. iuris, se o Congresso Nacional aprovasse um a lei com plem entar que, por exemplo, alterasse o Cdigo de Processo Civil? E se essa lei com plem entar viesse a ser depois contrariada por lei ordinria? A soluo dessas questes depende, em prim eiro lugar, da afirmao de que entre lei com plem entar e lei ordinria inexiste qualquer suprem acia hierrquica, m as to som ente campos diversos de incidncia.2

    Assim sendo, deve-se passar a considerar as duas questes que foram postas anteriorm ente. Em prim eiro lugar, quais as conseqncias de um a lei com plem entar regular m atria processual? Poder-se-ia sim plesm ente afirmar que tal lei com plem entar seria inconstitucional, por estar invadindo campo de atuao que no o seu. Ocorre que, como se viu, a lei com plem entar encontra-se no m esm o nvel hierrquico da lei ordinria e, alm disso, por exigir um quorum mais elevado para a sua aprovao (seguindo, no mais, o m esm o processo legislativo) do que a lei ordinria, parece que a lei com plem entar nesse caso deveria ser tida como constitucional, em bora devendo ser vista como um a lei com plem entar "com fora de ordinria, isto , como um a lei form alm ente complementar, m as substancialm ente ordinria. Assim sendo, a lei que ora se imagina seria perfeitam ente compatvel com o ordenam ento constitucional.

    Aceita essa prim eira afirmao, chega-se facilmente soluo da seguinte questo: quais as conseqncias de um a lei ordinria que, posteriorm ente lei com plem entar m encionada acima, tratasse inteiram ente da m esm a m atria? Ora, considerando-se que no exemplo dado a lei com plem entar substancialm ente ordinria, e aplicando-se a regra segundo a qual lei posterior revoga lei anterior quando trata inteiram ente da m esm a m atria, fica fcil concluir que a lei ordinria posterior revogaria, nessa hiptese, a lei com plem entar com fora de ordinria anterior.

    Alm da Constituio e da lei ordinria federal, tam bm fonte formal do Direito Processual Civil a lei estadual. Essa afirmao depende, para sua exata com preenso, de um a rpida excurso pela evoluo histrica e constitucional do Direito brasileiro na fase republicana.

    Com o sabido, com o advento da Repblica, o Brasil tornou-se um Estado federal, o que perm anece at os dias de hoje. Ocorre que, por fora da Constituio de 1891, era dos Estados a com petncia privativa para legislar sobre Direito Processual, o que fez com que cada Estado-m em bro da Unio elaborasse seu prprio Cdigo de Processo Civil. Essa situao perm aneceu at a Constituio de 1934, quando ento passou tal com petncia para a Unio. Conseqncia dessa m udana foi a edio, em 1939, do prim eiro Cdigo de Processo Civil nacional.

    2 Nesse sentido, Celso Ribeiro Bastos, Curso de direito constitucional, p. 308.

  • 2 2 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    Esse sistem a foi m antido at os dias de hoje, dispondo a Constituio vigente, a de 1988, que da com petncia privativa da Unio legislar sobre D ireito Processual (art. 2 2 ,1, CR). Ocorre que a Constituio de 1988 inovou ao dispor que a Unio, os Estados e o D istrito Federal possuem com petncia concorrente para legislar sobre "procedim entos em m atria processual (art. 24, XI, CR). Tal regra de difcil interpretao, no s em razo da tradicionalm ente difcil questo acerca da diferena entre processo e procedim ento (que ser examinada adiante), mas tam bm por fora do disposto nos pargrafos do referido art. 24 da Constituio, segundo os quais a com petncia da Unio, nesse caso, apenas para editar norm as gerais, devendo tais norm as ser suplem entadas pelos Estados. Fica ento ou tra questo de difcil soluo: precisar o que norm a geral e o que no em tem a de procedim entos em m atria processual. Aduza-se, ainda, que os Estados e o D istrito Federal tm com petncia concorrente com a Unio para legislar sobre processo nos juizados de pequenas causas (art. 24, X, CR).

    Parece que a nica forma de solucionar a aparente contradio entre o art. 2 2 ,1, e o art. 24, XI, am bos da Constituio (contradio que existiria na m edida em que a regulam entao dos procedim entos pertence ao D ireito Processual), afirmar, com apoio em Vicente Greco Filho, que por "procedim entos em m atria processual devem-se entender os procedim entos adm inistrativos de apoio ao processo, e no o procedim ento judicial, j que este indissocivel do processo.3

    Assim sendo, com pete exclusivamente Unio legislar sobre D ireito Processual, podendo o Estado expedir to som ente (com base no art. 24, XI, da CR) norm as jurdicas suplem entares das gerais - as quais so de com petncia da Unio - sobre procedim entos adm inistrativos de apoio ao processo, como, por exemplo, o procedim ento adm inistrativo para arquivam ento e desarqui- vam ento dos autos de um processo, ou o procedim ento adm inistrativo para rem essa Im prensa Oficial das notcias dos atos processuais que devero ser publicadas por aquele rgo.

    No se pode esquecer, porm, que, no que se refere aos juizados de pequenas causas (art. 24, X, da CR),4 tm os Estados e o D istrito Federal com petncia (concorrente com a Unio) para legislar sobre processo e, nessa hiptese, no h como se negar lei estadual o carter de fonte do D ireito Processual

    3 Greco Filho, Direito processual civil brasileiro, vol. I, p. 71.

    4 A Constituio prev, no art. 24, X, um rgo jurisdicional denominado juizado de pequenas causas, e no art. 98 ,1, outro rgo, chamado juizado especial cvel. Embora sejam rgos ontologicamente distintos, o primeiro com competncia para causas de pequeno valor econmico e o segundo competente para causas cveis pouco complexas (ainda que de grande valor), o legislador ordinrio os reuniu em um s rgo, batizado de juizado especial cvel, regido pela Lei n 9.099/95, e que competente tanto para causas de pequeno valor como para causas pouco complexas.

  • Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil 2 3

    propriam ente dito. Podem os Estados legislar sobre processo nos juizados de pequenas causas, instituindo, por exemplo, regras quanto assistncia judiciria pela Defensoria Pblica, ou a formas de se realizar a execuo perante aqueles rgos, desde que no sejam tais norm as contrrias s gerais, editadas pela Unio e que, como notrio, encontram -se reunidas na Lei n 9 .099 /1995.5

    Ao lado da lei federal ordinria e da lei estadual, tam bm podem ser includos entre as fontes formais do Direito Processual os tratados in ternacionais. Aqui, porm, h que se analisar um problem a de grande importncia, qual seja, o conflito que possa existir entre um tratado internacional e um a lei in terna que tratem do m esm o tema. Exemplifiquemos com a hiptese do art. 90 do CPC, segundo o qual a existncia de dem anda pendente diante de juzo estrangeiro no im pede a propositura de dem anda idntica no Brasil, o que se pe em confronto com o disposto no art. 394 do Cdigo de Bustamante, tratado internacional de que o Brasil um dos Estados contratantes. certo que a boa doutrina considera que, na hiptese do exemplo apresentado, deve incidir o tratado se a dem anda estiver pendente perante juzo estrangeiro de pas que tam bm seja contratante do Cdigo de Bustamante, incidindo o CPC apenas em relao aos pases que no sejam partes daquele tratado.6 Parece, porm, prefervel entender que o tratado internacional e a lei interna encontram -se em paridade hierrquica, e assim sendo a lei in terna posterior capaz de revogar o tratado anterior, prevalecendo assim a mais recente expresso de vontade do legislador.7 Assim sendo, deve-se entender que o disposto no art. 90 do CPC prevalece sobre o art. 394 do Cdigo de Bustamante, j que a lei federal , no caso, posterior ao tratado internacional.

    Evidentemente, esse raciocnio no se aplica aos tratados internacionais que, por fora do disposto no art. 5Q, 3Q, da Constituio da Repblica, ali includo pela Em enda Constitucional n 45/2004, tm status de em enda constitucional, o que os pe em posio hierrquica superior da lei. Nem todo tratado internacional, porm, tem aquele status.

    Por fim, so fontes formais do Direito Processual os regim entos internos dos tribunais. Estes so conjuntos de norm as que regem o funcionam ento interno do tribunal, dispondo, por exemplo, sobre sua composio. Tais regim entos, porm, podem conter (e efetivam ente contm) norm as processuais, como, por exemplo, as regras contidas nos regim entos internos do Supremo

    5 Sobre o microssistema processual dos Juizados Especiais, seja permitido remeter o leitor a Alexandre Freitas Cmara, Juizados especiais cveis estaduais e federais - uma abordagem crtica.6 Assim pensam, entre outros, Greco Filho, Direito processual civil brasileiro, vol. I, p. 191, e Celso Agrcola Barbi, Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, vol. I, p. 245.

    7 Jos Francisco Rezek, Direito internacional pblico (curso elementar), p. 106. Noticia ainda o referido autor, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, que o Pretrio Excelso adotou esse entendimento no julgamento do Recurso Extraordinrio n 80.004.

  • 2 4 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justia acerca do procedim ento a ser observado no recurso de embargos de divergncia (a propsito, consulte-se o disposto no art. 546 do CPC).

    Conhecidas as fontes formais do Direito Processual Civil, passa-se anlise das fontes materiais, as quais - como dito - no tm fora vinculante, no sendo assim obrigatrias, e tm por finalidade revelar o verdadeiro sentido do Direito Processual. Podem ser considerados fontes m ateriais do Direito Processual Civil os princpios gerais do Direito, o costume, a doutrina e a ju risprudncia.

    Entende-se por princpios gerais do Direito aquelas regras que, em bora no se encontrem escritas, encontram -se presentes em todo o sistema, inform ando-o. o caso da velha parm ia segundo a qual "o D ireito no socorre os que dorm em . Embora tal regra no esteja escrita em nenhum lugar, inegvel que institu tos como a prescrio e a decadncia no direito material e a preclu- so tem poral no Direito Processual comprovam que aquele se trata de verdadeiro princpio geral, inform ador do direito objetivo brasileiro.

    Vrios princpios gerais do Direito poderiam ser aqui enum erados, mas, com m edo de cansar o leitor, perm ito-m e referir apenas mais dois, que com certeza so conhecidos de tantos quantos estudam a cincia jurdica: nemo alle- ganspropriam turpitudinem auditur (ningum que alegue sua prpria torpeza pode ser ouvido) e allegatio et non probatio quasi non allegatio (alegado e no provado como no alegado).

    O utra fonte material do D ireito Processual Civil o costum e. C ostum e que se pode definir como a conduta socialm ente aceita e que realizada para criar um a "sensao de obrigatoriedade. Nisso, essencialm ente, difere o costum e do hbito. O costum e um a conduta que gera um a sensao de obrigatoriedade para a sua realizao, ou seja, realiza-se o costum e por haver a sensao de que, em se agindo de ou tra forma, poder incidir alguma sano ou ocorrer algum prejuzo.

    Da m esm a form a que em outros ram os do Direito, tam bm no Direito Processual Civil o costum e contra legem, isto , contrrio lei, no pode ser adm itido como fonte do Direito. De outro lado, os costum es secundum legem (em conformidade com a lei) e praeter legem (prvios lei, ou seja, que operam diante de um a lacuna da lei) podem ser tidos como fontes de expresso do Direito Processual Civil.

    No difcil apresentar um exemplo de costum e que funciona com o fonte do Direito Processual Civil. certo que, por fora do disposto nos arts. 282, VI, e 300, am bos do Cdigo de Processo Civil, autor e ru devem anunciar, de forma especfica, na petio inicial e na contestao, as provas que pretendem produzir no processo. H, porm , um hbito de m uitos advogados de descum- prir esse comando (o qual, a rigor, de observncia praticam ente impossvel),

  • Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil 2 5

    anunciando apenas que pretendem produzir "todos os m eios de prova adm issveis em direito". Por fora disso, surgiu um costum e dos juizes de, aps o encerram ento da fase postulatria, determ inar que as partes especifiquem as provas que pretendem produzir.8

    A doutrina, isto , o conjunto de lies dos jurisconsultos acerca do Direito Processual Civil, tam bm se constitui em fonte do D ireito Processual Civil. certo que a prpria doutrina diverge quanto a te r ou no essa qualidade, havendo autores que negam sua incluso entre as fontes do Direito.9 Parece-me, porm , que as lies doutrinrias so essenciais para que se possa conhecer, com preciso, o que o Direito. Todos os que estudam Direito conhecem a fora de argum entos de autoridade e a im portncia que se d fundam entao doutrinria das opinies manifestadas por todos aqueles que de alguma form a operam o Direito. Advogados, magistrados, m em bros do Ministrio Pblico, professores, todos fazem questo de m ostrar que a opinio que defendem encontra respaldo doutrinrio e, m uitas vezes, buscam m uito mais na doutrina do que na prpria lei a fundam entao para suas afirmaes. Isso m ostra a necessidade de se incluir a doutrina entre as fontes do Direito (no s do Processual Civil).

    Por fim, tam bm fonte m aterial do Direito Processual Civil a jurisprudncia. Valem aqui, em princpio, as m esm as afirmaes feitas para justificar a incluso da doutrina entre as fontes do Direito Processual Civil. inegvel a fora das sm ulas da jurisprudncia dom inante dos tribunais, principalm ente dos tribunais superiores.

    certo que, em nosso sistem a, a jurisprudncia no tem eficcia vincu- lante, como tem , por exemplo, no sistem a da commom law, im perante nos Estados Unidos da Amrica. A atribuio de eficcia vinculante jurisprudncia teria como conseqncia inclu-la entre as fontes formais do Direito, o que no freqente nos ordenam entos jurdicos que seguem o sistem a do ius scriptum ou da civil law, de origem romano-germnica, e ao qual se filia o Direito brasileiro. H entre ns a inteno, m anifestada de pblico por juristas, m agistrados e polticos, de atribuir eficcia vinculante - em algumas situaes, e preenchidos certos requisitos - jurisprudncia, atravs de um a m udana no sistem a do incidente de uniformizao de jurisprudncia (CPC, arts. 476/479). Sobre tal projeto, j m e m anifestei anteriorm ente em outra obra,10 e a ele voltarei quan

    8 Esse costume noticiado tambm por Cndido Rangel Dinamarco, A reforma do Cdigo de Processo Civil, p. 107.9 Nega doutrina a qualidade de fonte do Direito, entre outros, Miguel Reale, Lies preliminares de direito, p. 176. Em sentido contrrio - e, portanto, de acordo com o texto -, consulte-se, por todos, Limongi Frana, Hermenutica jurdica, p. 109; Jos de Albuquerque Rocha, Teoria geral do processo, p. 34.10 Freitas Cmara, Lineamentos do novo processo civil, p. 225.

  • 2 6 Lies de Direito Processual Civil Cmara

    do da anlise do mencionado incidente, que se inclui no Ttulo do Cdigo de Processo Civil que regula os processos nos tribunais.

    Merece referncia o fato de que a Em enda Constitucional n* 45/2004 criou, no Direito brasileiro, a figura da "sm ula vinculante. E o que decorre do disposto no art. 103-A da Constituio da Repblica, inserido em seu texto pela referida Emenda, e que assim dispe: "O Suprem o Tribunal Federal poder, de ofcio ou por provocao, m ediante deciso de dois teros dos seus m em bros, aps reiteradas decises sobre m atria constitucional, aprovar sm ula que, a partir de sua publicao na im prensa oficial, ter efeito vinculante em relao aos dem ais rgos do Poder Judicirio e Administrao pblica direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder sua reviso ou cancelamento, na form a estabelecida em lei. Observe-se, porm, que a "sm ula vinculante (;rectius, enunciado vinculante da Smula) s pode versar sobre m atria constitucional, no se configurando, pois, como fonte do Direito Processual (a no ser, evidentem ente, quando se tratar de m atria constitucional que verse sobre processo - a includos o Direito Constitucional Processual e o D ireito Processual Constitucional). A "sm ula vinculante, registre-se, no deve ser vista como fonte material do direito (como a ju risprudncia em geral), mas como fonte formal, estando no m esm o plano das norm as jurdicas abstratas.

    A sm ula vinculante foi regulam entada pela Lei n^ 11.417/2006. Tal diplom a legislativo afirma, em seu texto, que o STF aprovar enunciado de smula, o qual te r eficcia vinculante. preciso tom ar cuidado com esse texto. O que tem eficcia vinculante a smula (isto , o resum o da jurisprudncia dom inante do STF), e no apenas os enunciados que a compem. A rigor, a sm ula com posta pelos enunciados e pelos precedentes que lhes deram origem. Assim, deve-se considerar que rgos jurisdicionais e adm inistrativos esto vinculados ao que consta dos enunciados, interpretados estes luz dos precedentes. Isso se torna im portante para que se possa verificar se o caso concreto, subm etido apreciao da autoridade estatal, tem algum a peculiaridade que o diferencie dos casos que deram origem ao enunciado sumular. Trata-se do que na tradio jurdica anglo-saxnica se cham a distinguish. Afinal, no se pode considerar que o m agistrado (ou a autoridade adm inistrativa) tenha de aplicar o enunciado da sm ula a um caso que no seja igual queles que deram origem a tal enunciado.

    Deve-se dizer, guisa de concluso acerca da incluso da doutrina e da jurisprudncia entre as fontes do D ireito Processual Civil, que entre elas h um a diferena essencial. Enquanto na doutrina o dissdio saudvel, e as polmicas existentes em razo das diversas correntes que surgem quando da interpretao de determ inada norm a ou institu to contribuem de forma inequvoca para o desenvolvim ento da cincia, o dissdio jurisprudencial deve ser com batido. Isso porque a divergncia entre os tribunais quando da aplicao

  • Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil 2 7

    de determ inada norm a aos casos concretos tem como conseqncia a diversidade de tratam ento dada aos jurisdicionados, j que para cada um deles a lei in terpretada e aplicada de m odo diverso, o que contraria o princpio constitucional da isonomia. m uito difcil para o leigo en tender por que ele no consegue ob ter determ inada vantagem em juzo se um amigo dele, ou um parente, que props dem anda para obter providncia idntica perante outro juzo ou tribunal conseguiu. Basta lem brar o triste clebre episdio do bloqueio dos cruzados retidos no "Plano Collor, em que alguns juzos determ inavam o desbloqueio do dinheiro retido, enquanto outros rgos judicirios determ inavam exatam ente o inverso, que o dinheiro perm anecesse bloqueado. para com bater esses dissdios que o sistem a cria um a srie de rem dios destinados uniform izao da jurisprudncia, dos quais trs se destacam: o j m encionado incidente de uniform izao de jurisprudncia e, ao lado deste, o recurso especial fundado em dissdio jurisprudencial (art. 105, III, c, da CR) e o recurso de em bargos de divergncia (art. 546 do CPC).

    2 Q INTERPRETAO DA LEI PROCESSUAL

    In terpretar a lei fixar seu significado e delim itar seu alcance. Em outras palavras, a atividade de interpretao da lei tem por finalidade no s descobrir o que a lei quer dizer, mas ainda precisar em que casos a lei se aplica, e em quais no. Trata-se de atividade essencial para o jurista, sendo certo que todas as norm as jurdicas (e, para dizer a verdade, todos os atos jurdicos) devem ser interpretadas, at m esm o as mais claras. A ideia, por m uito tem po consagrada, de que a clareza da lei dispensa a interpretao errada, m esm o porque s se sabe que a lei clara depois de se interpret-la.

    A interpretao da lei processual, como no poderia deixar de ser, segue os m esm os critrios e pode alcanar os m esm os resultados que a interpretao das leis em geral. preciso, assim, apresentar os m todos de interpretao da lei processual e, em seguida, enum erar os possveis resultados da atividade interpretativa.

    So cinco os mtodos de interpretao da lei processual: literal ou gram atical, lgico-sistemtico, histrico, comparativo e teleolgico. Antes de apreci- -los separadam ente, preciso se afirmar que nenhum deles suficiente para determ inar a verdadeira vontade da lei, sendo essencial a utilizao de todos.

    2.1 M todo Literal ou Gramatical

    Com o o prprio nom e indica, esse m todo perm ite a interpretao da norm a atravs da verificao do sentido literal das palavras e frases. No se

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    pode negar um a realidade: impossvel qualquer interpretao da lei sem que a m esm a seja lida e suas palavras entendidas. No , porm , suficiente, e isso se prova com um simples exemplo: o art. 890, l , do CPC afirma que, "tratando-se de obrigao em dinheiro, poder o devedor ou terceiro optar pelo depsito da quantia devida, em estabelecim ento bancrio oficial, onde houver, situado no lugar do pagam ento, em conta com correo m onetria, cientificando-se o credor por carta com aviso de recepo, assinado o prazo de dez dias para a manifestao de recusa. Trata-se de dispositivo que regula o cabim ento e procedim ento da consignao em pagam ento extrajudicial. A ser interpretado literalm ente, pareceria que o depsito da quantia deveria ser realizado em estabelecim ento bancrio oficial, onde houvesse um. No havendo estabelecim ento bancrio oficial, tornar-se-ia impossvel a consignao extrajudicial. Essa a concluso a que se chega pela leitura da norma, que fala em depsito a ser realizado "em estabelecim ento bancrio oficial, onde houver. Ocorre que houve a um a m colocao da vrgula, que deveria estar antes da palavra "oficial, o que altera inteiram ente seu significado. Devendo o depsito ser feito "em estabelecim ento bancrio, oficial, onde houver, verifica-se que, no havendo estabelecim ento bancrio oficial, a consignao extrajudicial pode ser realizada em qualquer outro estabelecim ento bancrio.11

    Tem-se, assim , dem onstrada a insuficincia do m todo literal de in terpretao da lei (insuficincia esta que, com o dito, com um a todos os m todos de interpretao). Em bora seja insuficiente, porm , o m todo literal essencial para a adequada interpretao da norm a, pois que, com o j ressaltado (e decorre da prpria natureza das coisas), impossvel ao in trprete realizar sua atividade sem ler a lei, ou lendo-a sem ter conhecim ento do significado literal das palavras e gramatical das frases que com pem a norma.

    2 .2 M todo L gico-Sistem tico

    O segundo m todo interpretativo o chamado lgico-sistemtico, pelo qual se in terpreta a norm a inserindo-a em um sistem a lgico, o qual no adm ite contradies ou paradoxos, o ordenam ento jurdico. O intrprete jamais pode se esquecer de que a norm a objeto da atividade interpretativa no algo isolado do restante do ordenam ento, devendo ser interpretada em consonncia com o restante das norm as jurdicas que com pem o sistema.

    Um bom exemplo de aplicao desse m todo o seguinte: nos term os do disposto no pargrafo nico do art. 155 do CPC, o direito de consultar os autos do processo restrito s partes e a seus advogados, e terceiros s podem obter certides do dispositivo da sentena se dem onstrarem ao juzo que so

    11 No sentido do texto, entendendo-se que o verdadeiro sentido da lei o que se encontra com a alterao da posio da vrgula, J. E. Carreira Alvim, Cdigo de Processo Civil reformado, p. 274.

  • Fontes, Interpretao e Aplicao no Espao e no Tempo do Direito Processual Civil 2 9

    titulares de interesse jurdico que os legitime a obter tais certides. A leitura isolada desse dispositivo poderia induzir o intrprete a achar que essa regra aplicvel a todo e qualquer processo, o que no correto. Isso porque o art. 155 afirma que os processos so pblicos, salvo aqueles que devem tram itar em segredo de justia e, alm disso, dispe o art. 141, V, do CPC, que incumbe ao escrivo fornecer, independentem ente de despacho judicial, certido dos atos do processo (observado o disposto no art. 155). Da interpretao sistem tica dessas regras s se pode concluir que a restrio im posta pelo pargrafo nico do art. 155 aplicvel, to som ente, aos processos que tram itam em segredo de justia.12

    Verifica-se, assim, a im portncia de se inserir a norm a a ser interpretada no sistem a a que pertence, lem brando-se sem pre que tal sistem a no pode conter paradoxos ou contradies, sendo impossvel a coexistncia de duas norm as num m esm o ordenam ento jurdico que regulem o m esm o institu to diferentem ente. E por essa razo, e nenhum a outra, que a Lei de Introduo s Norm as do D ireito Brasileiro, em seu art. 2C, I a, dispe no sentido de que a lei posterior revoga a anterior quando com ela