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PROCEDIMENTOS ESPECIAIS: ENTRE O NOVO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL (NCPC) E O PROCESSO DO TRABALHO
MARCUS DE OLIVEIRA KAUFMANN
Doutor (2012) e Mestre (2004) em Direito das Relações Sociais (Direito do Trabalho) pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Bacharel (1998) em Direito pela
Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Professor em cursos de graduação
e de pós-graduação “lato sensu”, lecionou Legislação Social, Direito Material (Individual e
Coletivo) e Processual do Trabalho na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília
(UnB), no Instituto de Educação Superior de Brasília (Iesb), no Instituto Brasiliense de
Direito Público (IDP), na unidade de Brasília da Universidade Presbiteriana Mackenzie, na
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), no Centro Universitário Ritter dos
Reis (UniRitter), na Escola da Associação dos Magistrados do Trabalho da Décima Região
(Ematra X), na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas/PUC-
Camp) e na Escola de Direito de São Paulo (FGV Direito SP) da Fundação Getúlio Vargas.
Membro Efetivo do Instituto Brasileiro de Direito Social Cesarino Júnior (IBDSCJ) e da
Associação dos Advogados Trabalhistas do Distrito Federal (AAT/DF). Advogado.
SUMÁRIO : 1. Inspirações e novas topografias do Novo Código de Processo Civil (NCPC); - 2. A relativização dos procedimentos especiais; - 3. Procedimentos especiais típicos e atípicos no processo do trabalho: 3.1. Procedimentos especiais típicos: 3.1.1. Do inquérito judicial para a apuração de falta grave; 3.1.2. Do dissídio coletivo; 3.1.3. Da ação de cumprimento; 3.2. Procedimentos especiais atípicos: 3.2.1. Uma breve análise da oposição; - 4. Considerações finais
1. Inspirações e novas topografias do Novo Código de Processo Civil (NCPC)
O Novo Código de Processo Civil (NCPC)1, produto humano e histórico, é
um grande bálsamo das experiências vividas pela ciência processual nos últimos anos.
Tendo, em conformidade com a sua “Exposição de Motivos”, o grande intento de
1 Lei n° 13.105, de 16 de março de 2015 (publicada no Diário Oficial da União – DOU de 17 de março de 2015 e com vacatio legis de um ano estabelecida em seu artigo 1.045).
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proporcionar, à sociedade, o reconhecimento e a realização dos direitos ameaçados ou
violados, mediante um instrumental normativo organizado, orgânico, funcional, simples,
razoável, expedito, tudo para que a pretensão de direito material deduzida por quem de
direito deixasse de ser uma ficção apropriada pelo tempo para ser esgarçada e distorcida
segundo a legislação adjetiva cuja vigência já se expira, o NCPC, a um só tempo, manteve
e aperfeiçoou os institutos processuais novos advindos das reformas iniciadas na década de
90 para ensejar, na expressão da Comissão de Juristas que o projetou, um “Código novo,
que não significa, todavia, uma ruptura com o passado, mas um passo à frente. Assim, além
de conservados os institutos cujos resultados foram positivos, incluíram-se no sistema
outros tantos que visam a atribuir-lhe alto grau de eficiência”.
Nesse sentido, o NCPC se abeberou das várias inovações que, a partir de
1990, a legislação extravagante foi apresentando, como as atinentes, principalmente: (i) à
possibilidade de que a tutela específica das obrigações de fazer e de não fazer pudesse ser,
em ação coletiva, efetivada mesmo antes da sentença, nos moldes do artigo 84 da Lei n°
8.078/1990 (Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CPDC); (ii) à possibilidade de
que a tutela específica das obrigações de fazer e de não fazer também pudesse ser efetivada
antes da sentença em ações individuais, nos moldes do artigo 461 da Lei n° 5.869/1973
(Código de Processo Civil de 1973 - CPC), na alteração promovida pela Lei n° 8.952/1994,
bem como à possibilidade de que, também por provocação e obra da Lei n° 8.952/1994, a
própria tutela pudesse ser antecipada antes da sentença desde que houvesse prova
inequívoca e a demonstração da verossimilhança da alegação, nos moldes do artigo 273 do
CPC; (iii) à possibilidade de que, nos meandros da competência dos Juizados Especiais, a
sentença pudesse ser cumprida no mesmo processo na qual prolatada, em fase processual
logicamente conectada à fase decisória e dela decorrente, sem a necessidade de a parte
exequente instaurar nova relação jurídica-processual com uma nova ação em um outro
processo, o da execução, tudo com fundamento nos artigos 52 e 53 da Lei n° 9.099/1995;
(iv) à possibilidade de que a tutela atinente à entrega de coisa também pudesse se efetivar
antes de prolatada a sentença, nos moldes do artigo 461-A do CPC, na alteração promovida
pela Lei n° 10.444/2002; e (v) à possibilidade de que a execução de sentença se processasse
em uma mera fase procedimental após a fase de reconhecimento ou de acertamento do
direito, a partir de mera petição incidental para o início de uma denominada fase de
cumprimento de sentença, tudo em um só processo, nos moldes das alterações promovidas
pela Lei n° 11.232/2005 nos artigos 475-I e seguintes do CPC.
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Essas inspirações, reconhecidas e experimentadas pelo NCPC para a criação
de normas adjetivas que pudessem enfrentar as exigências da modernidade e concretizar os
intentos constitucionais, com destaque à instrumentalidade, de modo que o foco saísse do
desenvolvimento do processo, como se reconhece era a hipótese antes do NCPC, e recaísse
sobre o resultado do processo, com a entrega do bem da vida a quem de direito, orientaram
todo o processo civil a um sincretismo, de natureza horizontal e vertical, já detectado como
horizonte desde as reformas processuais da década de 90.
Um sincretismo processual horizontal, de um processo mais enxuto (com o
surgimento de tutelas executivas lato sensu independentes de processo de execução) e
menos preso a filigranas procedimentais para a concretização do comando sentencial, é
notável na estrutura da nova codificação.
De três processos, hoje se tem apenas dois e, ainda assim, sem que se possa
sustentar haver, entre eles, zonas estanques e incomunicáveis. Da tríade formada pelo
processo de conhecimento, pelo processo de execução e pelo processo cautelar2, o NCPC
encampa, agora, apenas o processo de conhecimento “e de cumprimento de sentença”
(apenas para um reforço à fase de cumprimento de sentença e da teleológica disposição
normativa à realização e à concretização de direitos materiais) e o processo de execução.
Dentro da estrutura do processo de conhecimento, o NCPC dispõe apenas de
dois procedimentos: o procedimento comum (tratado no Título I “DO PROCEDIMENTO
COMUM” do Livro I “DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO
DE SENTENÇA” da Parte Especial do NCPC – artigos 318 a 512 do NCPC) e os
procedimentos especiais (tratados no Título III “DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS”
do Livro I “DO PROCESSO DE CONHECIMENTO E DO CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA” da Parte Especial do NCPC – artigos 539 a 770 do CPC)3.
2 A clássica doutrina processual atribuía a classificação tripartite de tipos de processo (de conhecimento, de execução e cautelar) a uma conservadora postura que limitava o entendimento quanto a uma das classes de ações, e de suas respectivas sentenças: as condenatórias. Além das ações e sentenças condenatórias, outras classes de sentenças (e/ou de eficácias) eram concebidas, como as sentenças declaratórias e as sentenças constitutivas, mas a tripartição dos processos se conciliava a uma visão, hoje tida por míope, da sentença condenatória. Segundo o saudoso Ovídio Araújo Baptista da Silva, a concepção limitada da sentença condenatória explica, muito, a “teoria que divide o fenômeno jurisdicional em processo de conhecimento e processo de execução, quanto afasta do primeiro desses dois compartimentos qualquer ato específico de realização da sanção, definido como ato executório”, uma vez que enquanto “o juiz condena, apenas emite um enunciado lógico de cunho valorativo, sem descer, contudo, ao mundo dos fatos, ao mundo dos fenômenos, para transformar a realidade física; ao passo que, pela execução, o juiz realiza o que devera ter sido feito pelo demandado e não o foi” (Sentença e Coisa Julgada. 3ª ed. rev. e atual. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1995, p. 100). 3 Os procedimentos especiais, no CPC de 1973 são versados no Livro IV, ao lado do processo de conhecimento (no Livro I), do processo de execução (no Livro II) e do processo cautelar (no Livro III), em
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Com isso, o NCPC acabou com o procedimento sumário (tratado dos artigos
275 a 281 do CPC) e extinguiu a expressão “procedimento ordinário” do CPC, hoje
denominado, no NCPC, de “procedimento comum”, exatamente para traçar um paralelo
para com os “procedimentos especiais”, ambos inseridos no processo de conhecimento,
ainda que, pelo artigo 318 do NCPC, o procedimento comum seja de aplicação subsidiária
aos procedimentos especiais e, também, ao processo de execução.
O NCPC, em outra grande inovação, eliminou de sua estrutura o anterior
processo cautelar (do Livro III do CPC), substituindo-o ou inserindo-o pelas e nas novas
técnicas de tutelas provisórias de urgência (do Livro V da Parte Geral do NCPC), que
podem ser de natureza cautelar ou antecipada, concedidas em caráter antecedente ou
incidental (artigo 294, parágrafo único, do NCPC), a se efetivarem primordialmente no
procedimento comum do processo de conhecimento.
Essa nova estruturação formal e topográfica do NCPC ilustra o, agora,
sincretismo vertical, detectado a partir do incremento, no NCPC, de técnicas de
modificação e de efetivação de cognição sumárias, antes da cognição exauriente necessária
à prolação da sentença.
Os procedimentos especiais do processo de conhecimento, igualmente,
sofreram importantes modificações.
Do CPC, o NCPC excluiu, de seu rol de procedimentos especiais de
jurisdição contenciosa, a ação de depósito (artigo 901 do CPC), a ação de anulação e
substituição de títulos ao portador (artigo 907 do CPC), a ação de nunciação de obra nova
(artigo 934 do CPC), a ação de usucapião de terras particulares (artigo 941 do CPC) e as
vendas a crédito com reserva de domínio (artigo 1.070 do CPC).
O NCPC, de toda a sorte, inseriu, em seu rol de procedimentos especiais de
jurisdição contenciosa, a nova ação de exigir contas (artigos 550 a 553 do NCPC) em
substituição à ação de prestação de contas do artigo 914 do CPC; a ação de dissolução
uma composição mais fragmentada, rígida, e deficiente do ponto de vista dogmático, uma vez que ilustra falha científica porque, ao alojar os procedimentos especiais em livro específico, desconsidera o fato de que, também nos procedimentos especiais, constituem-se processos de conhecimento (CHAVES, Luciano Athayde. Os Procedimentos Especiais no Processo Comum e sua Aplicação no Processo do Trabalho: Um Olhar a Partir do Novo Código de Processo Civil. In: BRANDÃO, Cláudio; MALLET, Estevão (coord.). Processo do Trabalho. Salvador. JusPodivm, p. 383-448, 2015, p. 387), não havendo processo especial, nos procedimentos especiais, “cujos contornos, sob a perspectiva da tutela jurisdicional, sejam diferentes do processo de conhecimento, cautelar ou de execução” (CASTRO, Daniel Penteado de. Considerações sobre a Sobrevivência dos Procedimentos Especiais no NCPC. In: MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (org.). Procedimentos Especiais, Tutela Provisória e Direito Transitório . Salvador: JusPodivm, p. 257-287, 2015, p. 263).
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parcial da sociedade (artigo 599 do NCPC); a ação de oposição (artigo 682 do NCPC),
antes prevista como modalidade de intervenção de terceiros (artigos 56 a 61 do CPC)4; as
várias ações de família (processos contenciosos de divórcio, separação, reconhecimento e
extinção de união estável, guarda, visitação e filiação); e a ação de regulação de avaria
grossa (artigos 707 a 711 do NCPC), relacionada ao direito marítimo.
No que diz respeito aos procedimentos especiais de jurisdição voluntária,
além das hipóteses previstas nos incisos I a VIII do artigo 725, o NCPC inseriu, como
novos procedimentos, a notificação e a interpelação (artigo 726 do NCPC), antes tratadas
como medidas cautelares típicas ou nominadas; o divórcio; a separação consensual; a
extinção da união estável; e a alteração do regime de bens do matrimônio (artigos 731 a 734
do NCPC), ampliando a possibilidade do procedimento, antes restrito ao artigo 1.120 do
CPC para a separação consensual.
As ações de consignação em pagamento (artigo 539 do NCPC), possessórias
(artigo 554 do NCPC), de divisão e demarcação de terras particulares (artigo 569 do
NCPC), de inventário e partilha (artigo 610 do NCPC), de embargos de terceiro (artigo 674
do NCPC), monitória (artigo 700 do NCPC), de homologação de penhor legal (artigo 703
do NCPC) e de restauração de autos já estavam previstas no CPC e agora continuam
disciplinadas no NCPC como procedimentos especiais, mas apenas com algumas alterações
pontuais, sem muitas repercussões substanciais.
2. A relativização dos procedimentos especiais
A despeito das modificações sofridas pela ciência processual nos últimos
tempos, com o advento e a consolidação do sincretismo processual horizontal, tornando
regra a execução de tutelas provisórias e de sentenças em um mesmo processo sem
necessidade de um processo de execução apartado, e do sincretismo processual vertical,
com o advento e a consolidação de técnicas de efetivação de tutelas antes da prolação da
4 O NCPC excluiu, das modalidades de intervenção de terceiros, ainda, a nomeação à autoria, que continua a existir, mas sem classificação ou destaque maior, no artigo 338 do NCPC, e manteve, nas modalidades de intervenção de terceiros, as figuras da assistência simples e litisconsorcial (artigo 119 do NCPC), da denunciação à lide (artigo 125 do NCPC), do chamamento ao processo (artigo 130 do NCPC), adicionadas, de forma original, agora, pelo incidente de desconsideração da personalidade jurídica (artigo 133 do NCPC) e da figura do amicus curiae (artigo 138 do NCPC), “contrariando o entendimento consolidado do STF de que é mero auxiliar eventual do juízo” (CASSAR, Vólia Bomfim. O Novo Código de Processo Civil e o Processo do Trabalho: Uma Visão Panorâmica e Superficial de Alguns dos Artigos Aplicáveis e Inaplicáveis. In: MARTINS, Sérgio Pinto (coord.). O Novo CPC e o Processo do Trabalho: Estudos em Homenagem ao Ministro Walmir Oliveira da Costa. São Paulo: Atlas, p. 21-35, 2015, p. 26).
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sentença mediante a valorização de cognições sumárias concretizáveis em curto tempo, ao
invés de se valorizar cognições exaurientes que demandam longos períodos de maturação, o
NCPC revela a tradição em prol da manutenção dos procedimentos especiais, como uma
preservação histórica da necessidade de se destacar o direito material, substantivo, “para a
conformação do formalismo processual”5.
Lembram, nesse sentido, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e
Daniel Mitidiero, que, no CPC, a especialidade do procedimento estava ligada à “previsão
tópica de técnicas processuais diferenciadas para organização do processo para
determinadas espécies de litígios”6 e que escapavam, em certa medida, ao natural
processamento perante o procedimento comum, ou dito ordinário, de outrora. Os
procedimentos especiais, no CPC, no mais, eram versados e regrados apenas pelo legislador
quando do exercício da adequação daquelas “técnicas processuais diferenciadas” ao direito
em litígio.
Aqueles mesmos autores, constatando o fato de que “técnicas processuais
diferenciadas”, próprias do sincretismo processual horizontal e vertical, foram
incorporadas, como técnicas provisórias, de urgência ou de evidência, ou como fases de
processamento de uma pretensão executória (fase de cumprimento de sentença), ao agora
dito procedimento comum (em cláusulas gerais inscritas, por exemplo, nos artigos 300, 536
a 538 do NCPC), “a fim de que possam servir para a tutela de todos os direitos para os
quais se mostrem adequadas e efetivas”7, concluíram, perante o NCPC, que o exercício da
adequação de “técnicas processuais diferenciadas” ao direito em litígio é, de forma
compartilhada, feito entre o legislador, no texto da lei, e o julgador, no processamento da
demanda.
Tratam-se, os procedimentos especiais, mesmo diante desse cenário de
desenvolvimento do que antes era o procedimento ordinário e hoje é o procedimento
comum, de procedimentos que apresentam uma interseção de elementos oriundos de várias
técnicas de tutela jurisdicional (do processo de conhecimento, do processo de execução e
do processo cautelar), de questões de conveniência local ou histórica e de peculiaridades
próprias de certas relações jurídicas e de certos tipos de cognição específica.
5 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 587. 6 Ibidem, p. 587. 7 Ibidem, p. 587.
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Um procedimento pode ser tido por especial por conter apenas um acréscimo
de um ato inicial, mas depois se submetendo ao rito comum ou ao rito cautelar (enquanto
ainda vigente o CPC), bem como pode ser “irredutivelmente especial”8, a manter uma
especialidade do início ao fim do procedimento, bem diversa da do procedimento comum.
As peculiaridades marcantes dos procedimentos especiais, tais quais antes
versados no CPC, se aperfeiçoavam, na lição de Antonio Carlos Marcato, (i) na alteração
do prazo para resposta se comparado com o prazo do procedimento comum; (ii) na natureza
dúplice da ação, quando autor e réu ocupam simultâneas e concomitantes posições
subjetivas na relação processual, tendo um acesso ao bem da vida em litígio naturalmente a
partir do indeferimento da pretensão do outro; (iii) na limitação horizontal das fases do
processo ou das matérias objeto de cognição; (iv) na fusão de providências vindas dos
processos de conhecimento, de execução e cautelar; (v) na inclusão de atos processuais
novos; (vi) na diferença atinente à legitimação ativa e passiva; e (vi) nas regras de
competência9.
Atualmente, e a despeito dessa manutenção, dir-se-ia, residual dos
procedimentos especiais, o NCPC acabou com o regramento previsto no artigo 295, inciso
V, do CPC, segundo o qual, quando o tipo de procedimento escolhido pelo autor não
corresponder à natureza da causa ou ao valor da ação, e salvo na hipótese de adaptação ao
procedimento legal, a petição inicial será indeferida. Essa pequena, mas enorme, mudança é
sensível porque a teleologia do que se pretendeu é a de que não é porque o NCPC acabou,
como apontado, com determinados procedimentos especiais que a pretensão embasada de
semelhante pedido e causa de pedir, antes prevista para dados procedimentos especiais, não
possa ser deduzida no procedimento comum, ainda mais diante de seu leque de tutelas
provisórias e de tutelas executivas lato sensu, relativizando a obrigatoriedade de
determinado procedimento especial. Não sem razão, José Joaquim Calmon de Passos
pontuava que a “especialidade do procedimento deve ser, portanto, uma exceção, só
justificável em face da absoluta necessidade de se atender a algo tão específico que seria
disfuncional e até lesivo adotar-se em sua inteireza o procedimento ordinário”10.
8 CASTRO, Daniel Penteado de. Considerações sobre a Sobrevivência dos Procedimentos Especiais no NCPC. Ob. cit., p. 265. 9 Procedimentos Especiais. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 62 e seguintes. 10 Teoria Geral dos Procedimentos Especiais. In: FARIAS, Cristiano Chaves de; DIDIER JR., Fredie (coord.). Procedimentos Especiais Cíveis, Legislação Extravagante. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 1-10, 2002, p. 3.
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Com o NCPC, o que se deve preservar é a possibilidade de se atingir uma
certa tutela jurisdicional de forma simples, rápida e racional, independentemente do
procedimento, observados, obviamente, os princípios constitucionais do contraditório e da
ampla defesa, bem como os novos princípios processuais da adaptabilidade e da
flexibilização procedimental versados, por exemplo, no artigo 139, inciso V, do NCPC,
segundo o qual o juiz dirigirá o processo conforme as disposições do código, incumbindo-
lhe, ainda, dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova,
adequando-as às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do
direito material em testilha, com o que se relativiza o destaque a procedimentos especiais e
se acarreta, para os dogmáticos, o início do fim do que seria uma teoria geral dos
procedimentos especiais.
Segundo Daniel Penteado de Castro, o NCPC absorve os princípios da
adaptabilidade e da flexibilização procedimental para permitir que boa parte das tutelas
jurisdicionais antes requeridas mediante procedimentos especiais possa ser naturalmente
examinada e julgada no procedimento comum11, até porque os procedimentos especiais não
são formalidades legais tidas por essenciais para a prestação da tutela.
É por isso que se sustenta que o NCPC relativizou os procedimentos
especiais em prol do procedimento comum, jungido que está à celeridade e à efetividade,
ainda que se possa admitir, em tempos atuais, que o aumento da duração do procedimento
ordinário do CPC seja uma das causas da eclosão de procedimentos especiais aqui e acolá e
um dos motivos pelos quais, a despeito do avanço técnico e qualitativo do procedimento
ordinário ou comum, há uma contínua tendência de preservação dos procedimentos
especiais.
3. Procedimentos especiais típicos e atípicos no processo do trabalho
Como já se demonstrou, o CPC se organizava, ou ainda se organiza, em três
processos distintos (processos de conhecimento, de execução e cautelar), com uma série de
ritos que foram cedendo lugar, no NCPC e com os cortes efetuados no processo cautelar e
no rito sumário, à primazia da ordinariedade de rito, agora denominado “comum” e que se
coloca ao lado dos procedimentos especiais.
11 Considerações sobre a Sobrevivência dos Procedimentos Especiais no NCPC. Ob. cit., p. 282.
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Paralelamente ao sistema do NCPC, a Consolidação das Leis do Trabalho
(Decreto-lei n° 5.452/1943 – CLT), por sua vez, e por não ser um código propriamente dito
de normas adjetivas, quer porque contém normas de direito material e de direito processual,
quer porque sua organização, em termos de complexidade, ultrapassa a das leis esparsas,
mas não chega ao patamar de a de uma codificação12, não se organizou, de maneira efetiva,
para tratar de forma sistêmica de seus rituais, como já fez o CPC e faz o NCPC, tanto é que
deixa de regrar um procedimento em razão de já o ser por lei esparsa.
Nem seria o caso, portanto, nessas circunstâncias, de se estudar a CLT em
comparação com as mudanças ensejadas pelo NCPC, a fim de se identificar seus ritos e se
explorar análises comparativas. A partir do advento do NCPC, a reflexão importante que se
coloca é a de, com primordial atenção à CLT, se identificar os procedimentos mais comuns
no processo do trabalho, nessa comparação com o NCPC, e destacar, quando houver, as
eventuais especialidades.
O resultado desse empreendimento de identificação dos procedimentos
processuais, para o processo do trabalho como um todo, é: (i) regrado dos artigos 837 a 852
da CLT, tem-se o rito ainda tido e considerado como o “ordinário” para os dissídios
individuais de trabalho, o mais comum submetido à Justiça do Trabalho; (ii) regrado pelo
artigo 2° da Lei n° 5.584/1970, tem-se o rito dito “sumário” ou “de alçada”, cuja tutela
buscada é a que normalmente se busca pelo procedimento ordinário; (iii) regrado nos
artigos 852-A à 852-I da CLT, tem-se o rito sumaríssimo, cuja tutela buscada também é a
que normalmente se busca no procedimento ordinário13; (iv) regrado nos artigos 494 a 496
da CLT, e com passagem no artigo 821 da CLT, tem-se o rito especial dedicado ao
inquérito para a apuração de falta grave; (v) regrado nos artigos 856 a 871 da CLT, tem-se
o rito especial dedicado ao dissídio coletivo; e (vi) regrado no artigo 872 da CLT, tem-se o
rito especial dedicado à ação de cumprimento.
12 TUPINAMBÁ, Carolina. O Processo do Trabalho: Seu Perfil, Sua Autonomia, Seus Procedimentos e Um Pouco de seu Charme. In: TUPINAMBÁ, Carolina (coord.). Procedimentos Especiais na Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, p. 11-23, 2015 p. 15. 13 Em conformidade com o que é pontuado por Alexandre Agra Belmonte, os “procedimentos especiais não são, como o sumário e o sumaríssimo, abreviados em relação ao ordinário, que seguem todas as etapas processuais, com cognição exauriente. São apenas diferentes, a exemplo do Mandado de Segurança, em que não cabe realização de audiência. A decisão será sobre o alegado direito líquido e certo, comprovado mediante prova documental.” (Inquérito para Apuração de Falta Grave. In: TUPINAMBÁ, Carolina (coord.). Procedimentos Especiais na Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, p. 62-70, 2015, p. 64).
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Ao contrário do NCPC, em que um procedimento dito comum se coloca ao
lado dos procedimentos especiais, na CLT não é possível traçar um plano quanto a um
procedimento comum que se estabelece ao lado dos procedimentos especiais.
Em verdade, o processo do trabalho, orientado, precipuamente (porque não
se desconsidera o artigo 2° da Lei n° 5.584/1970), pela CLT, apresenta três procedimentos
específicos para o processo de conhecimento (o ordinário, o sumário e o sumaríssimo) e
três procedimentos especiais assim valorados em razão do especial destaque a tutelas
jurisdicionais específicas passíveis de obtenção e entrega pela Justiça do Trabalho,
relacionadas a causas pontuais oriundas de relações coletivas de trabalho, da ação sindical e
de normas coletivas de trabalho: a do inquérito judicial para a apuração de falta grave, a do
dissídio coletivo e a da ação de cumprimento.
Os procedimentos especiais relacionados ao inquérito judicial para a
apuração de falta grave, ao dissídio coletivo e à ação de cumprimento são, para os fins aqui
estabelecidos, denominados de “procedimentos especiais típicos” do processo do trabalho.
A contrario sensu, portanto, “procedimentos especiais atípicos” são aqueles
simplesmente não relacionados na CLT, sujeitos a regras próprias quanto ao rito e quanto à
diferenciação de tutelas diferenciadas tais quais constantes nas leis esparsas de origem ou
se submetendo, em maior ou menor largueza, ao rito ordinário do processo do trabalho
enquanto se perfazem perante a Justiça do Trabalho.
Nessa concepção, integram o rol de “procedimentos especiais atípicos” do
processo do trabalho as ações regradas nos procedimentos especiais do NCPC que possam,
de alguma maneira, ser objeto, eventualmente, da competência da Justiça do Trabalho, bem
como os procedimentos especiais previstos para ações específicas como as do mandado de
segurança.
Deixando de lado os procedimentos ordinário, sumário e sumaríssimo, que
se destacam dos demais procedimentos, esses, sim, especiais, pela brevidade com que
tratam de certos atos processuais e pela importância conferida a certas tutelas específicas
que possam ser buscadas e concedidas pela Justiça do Trabalho, um exame específico
quanto às suas principais particularidades e idiossincrasias se impõe, ainda que de forma
breve para apenas ilustrar a especialidade do procedimento.
3.1. Procedimentos especiais típicos
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3.1.1. Do inquérito judicial para a apuração de falta grave
Curiosamente, embora seja ilustrativo de um procedimento especial típico do
processo do trabalho, sua especialidade se concentra no fato de se iniciar por petição escrita
do empregador (artigo 853 da CLT) e de regrar a previsão de oitiva de até seis testemunhas
por litigante (artigo 821 da CLT)14. Tem-se, para o inquérito judicial para a apuração de
falta grave, logo no início, um destaque ao procedimento, e a sua inclusão no rol de
procedimentos especiais, por conta da diferença (se tomado o procedimento ordinário como
base de comparação) atinente à legitimidade ativa ad causam.
De toda a sorte, a especialidade do procedimento se alastra para algumas
providências iniciais reveladoras de pressuposto de constituição e de desenvolvimento
válido e regular do processo, caso o empregado detentor de estabilidade no emprego, réu no
inquérito, seja acusado de falta grave15. É que o artigo 494 da CLT dispõe que o empregado
acusado de falta grave poderá ser suspenso de suas funções, mas a sua despedida só se
tornará efetiva após a propositura do inquérito (embora a suspensão do contrato individual
de trabalho perdure até a decisão final do processo), que, nessa situação, deverá se dar no
prazo – que é decadencial segundo a Súmula n° 403 do Supremo Tribunal Federal – de 30
(trinta) dias da data do início da suspensão. Se não houver a suspensão prévia do contrato
do empregado estável, e nos termos do artigo 7°, inciso XXIX, da Constituição Federal, o
prazo para a propositura do inquérito, por integração normativa, deverá ser o de cinco anos.
A especialidade do procedimento, aqui, se dá, também, pela inclusão de
obrigatoriedade prévia de uma providência extrajudicial (a suspensão do contrato individual
do trabalho), no caso de o empregador resolver suspender o contrato individual de trabalho
antes da propositura do inquérito judicial.
Quanto ao mais, o inquérito judicial para a apuração de falta grave, alheio e
infenso ao NCPC, segue o rito ordinário trabalhista.
3.1.2. Do dissídio coletivo
14 BELMONTE, Alexandre Agra. Inquérito para Apuração de Falta Grave. Ob. cit., p. 64. 15 Somente os empregados estáveis que admitam, por lei, a resilição contratual por falta grave é que podem figurar como réus em inquéritos judiciais. São eles os dirigentes sindicais titulares ou suplentes (artigo 543, § 3º, da CLT e Súmula n° 197 do Supremo Tribunal Federal); os representantes de trabalhadores em atividade titulares ou suplentes, membros do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) (artigo 3º, § 7º, da Lei
12
A especialidade do dissídio coletivo se ilustra, em um primeiro momento,
por regras de competência distintas e pelas diferentes tutelas jurisdicionais pretendidas.
Por regras de competência, porque o dissídio coletivo, quer seja o de
natureza econômica (ou de interesse), quer seja o jurídico (ou de direito), deve ser proposto,
originariamente, e a depender da extensão do conflito coletivo do trabalho, ou perante
Tribunal Regional do Trabalho ou perante o Tribunal Superior do Trabalho.
A tutela jurisdicional possível para dissídios coletivos de natureza
econômica é constitutiva e dispositiva pela doutrina de mais vanguarda16, fugindo à clássica
tripartição de classes de eficácias de sentença em declaratórias, condenatórias e
constitutivas. Embora, pelo direito comum, as sentenças constitutivas dependam de
autorização de lei prévia para criar, modificar ou extinguir relações jurídicas, o produto
judicial em dissídio coletivo, a sentença normativa, inova na ordem jurídica, constituindo
novas relações coletivas de trabalho graças ao poder normativo da Justiça do Trabalho, que
detém competência constitucional para instituir normas e condições de trabalho por
critérios de equidade, dispondo originariamente acerca de normas que sujeitarão os
contratos individuais de trabalho a ela vinculados pelo conflito coletivo.
Para dissídios coletivos de natureza jurídica, a sentença normativa deterá
eficácia declaratória ou interpretativa. Para dissídios coletivos de greve, a sentença
normativa deterá eficácia mista por comportar a declaração sobre a abusividade, ou não, da
greve e por comportar a constituição de novas relações jurídicas quanto ao acatamento, ou
não, das reivindicações obreiras subjacentes à deflagração da greve.
Em um segundo momento, o dissídio coletivo se demonstra especial por
conta da inclusão de ato processual novo caracterizável como pressuposto processual (e,
pelo TST, de natureza diferida17) para o processamento da pretensão coletiva, que é a
exigência do comum acordo oriunda do artigo 114, § 2°, da Constituição Federal.
n° 8.213/1991); os empregados eleitos membros de comissão de conciliação prévia (artigo 625-B, § 1º, da CLT); e, se ainda existirem, os estáveis decenais (artigo 492 da CLT). 16 MELO, Raimundo Simão de. Processo Coletivo do Trabalho: Dissídio Coletivo, Ação de Cumprimento, Ação Anulatória. São Paulo: LTr, 2009, p. 67. Em sentido contrário, e na defesa, nos dissídios coletivos de natureza econômica, da eficácia apenas constitutiva da sentença normativa, em razão de o artigo 114, § 2°, da Constituição Federal ter abolido, após promulgação da Emenda Constitucional (EC) n ° 45/2014, a expressão anterior “estabelecer normas e condições”, RIPPER, Walter William. O Poder Normativo da Justiça do Trabalho após a EC 45/2014. São Paulo: LTr, 2007, p. 110. 17 Porque, na conciliação do princípio da inafastabilidade da jurisdição com o comum acordo, o Tribunal Superior do Trabalho concluiu que caberá, à parte suscitada, e quando de sua defesa, apresentar preliminar de extinção do processo sem resolução de mérito por ausência de pressuposto processual objetivo da ação coletiva, para que o dissídio coletivo seja extinto sem resolução de mérito. Caso contrário, o dissídio coletivo terá prosseguimento.
13
Em agosto de 2015, e sob a relatoria do Ministro Marco Aurélio, o Supremo
Tribunal Federal admitiu, no Tema 841 da lista de processos com repercussão geral – não
obstante processar ao menos 5 (cinco) ações diretas de inconstitucionalidade sobre o tema
sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes –, a apreciação, por aquela repercussão geral da
matéria constitucional, do Agravo em Recurso Extraordinário (ARE) n° 679.137-RJ em que
se discute a (in)constitucionalidade do comum acordo previsto no artigo 114, § 2°, da
Constituição Federal por afronta ao artigo 5°, incisos XXXV e XXXVI; e 60, § 4°, da
Constituição Federal. O Plenário Virtual aprovou, em 28 de agosto de 2015, a repercussão
geral da questão constitucional, seguindo a manifestação do Ministro Marco Aurélio.
Em um terceiro momento, a especialidade do dissídio coletivo também se
apresenta na legitimação ad causam multifacetada. Legitimados ativos e passivos são os
sindicatos patronal e profissional ou sindicato profissional e as empresas, sendo que, nas
greves em atividades essenciais, também o Ministério Público do Trabalho em legitimidade
concorrente com os demais legitimados interessados.
A especialidade do dissídio coletivo, em outra vereda, ultrapassa as questões
objetivas acima tratadas para enveredar em considerações estruturais acerca das eficácias
pretendidas e queridas pelo procedimento especial.
Como já se teve a oportunidade de se sustentar no passado18, controversa ou
não a assunção de uma tal postura, é possível, hoje, sustentar que, a despeito dos grandes
avanços empreendidos na jurisprudência, principalmente da oriunda da Seção Especializada
em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho (SDC/TST) nos últimos anos19, o
Tribunal Superior do Trabalho vivencia uma fase de adaptação ou de convivência, dir-se-ia
até teimosa, com o declínio natural do poder normativo da Justiça do Trabalho após a
promulgação da EC nº 45/2004.
O Tribunal Superior do Trabalho vivenciaria uma fase de maturação
referente aos caminhos a trilhar quando do julgamento de dissídios coletivos de trabalho,
naturalmente levado a sustentar alguma tutela coletiva excepcional, e mais específica e
18 KAUFMANN, Marcus de Oliveira. Despedida Coletiva: Preocupações a Partir do “Precedente Embraer”. In: LEITE, Carlos Henrique Bezerra; COLNAGO, Lorena de Mello Rezende; GUNTHER, Luiz Eduardo (coord.); COLNAGO, Lorena de Mello Rezende (org.). Execução Trabalhista: Uma Homenagem ao Professor Wagner Giglio. São Paulo: LTr, p. 212-228, 2015, p. 212-214. 19 Relatos objetivos acerca de decisões paradigmáticas da SDC/TST podem ser examinados em ARRUDA, Kátia Magalhães. Decisões Inovadoras em Dissídios Coletivos. In: ARRUDA, Kátia Magalhães; COSTA, Walmir Oliveira da (coord.). Direitos Coletivos do Trabalho na Visão do TST: Homenagem ao Ministro Rider Nogueira de Brito. São Paulo: LTr, p. 90-104, 2011.
14
eficaz do que a normalmente esperada, pela via do dissídio coletivo do trabalho, ainda que
não se trate de um dissídio coletivo de natureza econômica.
É curiosa essa observação, que não deixa de ser verdadeira, mormente ao
contextualizá-la para o ambiente da teoria geral do processo, do processo coletivo, em que
o sistema das tutelas coletivas se expande não para ritos e instrumentais clássicos, como é o
caso do procedimento especial de dissídio coletivo do trabalho, mas para o âmbito da tutela
coletiva comum e, por conseguinte, para os ritos e instrumentos comuns ou ordinários
regrados pela legislação adjetiva ordinária.
Na expressão de Leonardo Greco, constata-se, atualmente, o paradoxo que
se verifica “no esvaziamento do instituto do dissídio coletivo de natureza econômica, como
consequência da alteração do disposto no art. 114 da Constituição, enquanto se expande a
tutela coletiva no âmbito da jurisdição civil comum” 20, a ponto de, por densa pesquisa,
Paulo Américo Maia Filho já ter concluído que, não sendo, a jurisdição normativa,
decorrente de atividade essencialmente legislativa, tal jurisdição poderia ser exercida fora
do ambiente de um dissídio coletivo de trabalho, como seria o caso de uma ação civil
pública para substituir o dissídio coletivo de trabalho de interesse21, que permitiria o
julgamento conjunto de reivindicações sociais e econômicas dos trabalhadores, além da
tutela destinada a coibir abuso do exercício do direito de greve ou a prática de atos
antissindicais pela tutela inibitória coletiva, sem afastar a possibilidade, também, de a ação
civil pública ser utilizada para a atividade interpretativa de adaptação da norma legal ou
convencional ao caso concreto22.
Paulo Américo Maia Filho prossegue destacando as seguintes razões para a
prevalência crescente da ação civil pública para a tutela coletiva, inclusive para aquela que
sempre foi regrada pelo dissídio coletivo de trabalho:
“..................................................................................................................................... 9. A sentença de conteúdo normativo, proferida na ação civil pública, tanto quanto a proferida no dissídio coletivo, é fonte formal do direito, e pode ser derrogada por norma legal, convencional ou outra judicial-normativa, além de se submeter às regras de direito intertemporal, previstas na Lei de Introdução ao Código Civil. 10. Quanto à exequibilidade dos provimentos, destacam-se as vantagens da ação civil pública frente ao dissídio coletivo, pois, enquanto neste o provimento é,
20 Prefácio. MAIA FILHO, Paulo Américo. Ação Civil Pública como Via Alternativa ao Dissídio Coletivo. São Paulo: LTr: 13-14, 2011, p. 13. 21 Em uma lembrança, quando se estudam os procedimentos especiais, à tendência de relativização dos procedimentos especiais em prol de procedimentos comuns, em prol da ordinariedade. 22 Ação Civil Pública como Via Alternativa ao Dissídio Coletivo, p. 210.
15
apenas, em cognição exauriente, e só se encontrará apto à execução após o julgamento colegiado de um tribunal do trabalho, naquele, pelas possibilidades de cognição sumária, mediante provimentos antecipatórios, admite-se a execução imediata. 11. No plano da competência, é mais legítima e adequada a tutela jurisdicional coletiva dos conflitos trabalhistas pelos órgãos jurisdicionais de primeira instância, mediante o controle revisional dos tribunais, como ocorre na ação civil pública.”23
Já antes do advento da nova redação do artigo 114 da Constituição Federal, o
Tribunal Superior do Trabalho, em jurisprudência capitaneada pelo então Ministro Almir
Pazzianotto Pinto, editara a Instrução Normativa nº 04/1993 para restringir, ao máximo, o
recurso aos dissídios coletivos como meio de estimular a negociação coletiva (com
previsões detalhistas, formais e procedimentais para regrar o processamento do dissídio).
Quando da recomposição da SDC/TST, após o preenchimento dos 10 (dez) novos cargos de
ministro criados pela EC nº 45/2004, passaram a integrá-la, além dos integrantes da
administração da Corte, os Ministros mais novos, o que ilustraria algo perceptível como
uma paulatina, mas às vezes agressiva, modificação jurisprudencial em prol de algum
destaque a um novo protagonismo do dissídio coletivo de trabalho24.
A verdade é que parece que a SDC/TST tem examinado caso a caso a
deterioração e o declínio natural do poder normativo da Justiça do Trabalho, com
manutenção, em certas ocasiões de forma mais rígida, e em outras não, dos critérios
vigentes para a apreciação de dissídios coletivos de trabalho. Essa postura um tanto quanto
pusilânime se fez apresentar no que se convencionou denominar de o “Precedente
Embraer”, ou seja, na decisão paradigmática levada a efeito pela SDC/TST para o
julgamento do Processo (RODC) nº 0030900-12.2009.5.15.0000.
A SDC/TST, em setembro de 2009, ainda que reconhecendo se tratar de um
dissídio coletivo de natureza jurídica, ou de direito, estabeleceu, em conformidade com o
voto do Ministro relator, Mauricio Godinho Delgado, que a “hipótese dos autos, no
entanto, é excepcionalíssima, não se enquadrando inteiramente na figura clássica do
dissídio coletivo de natureza jurídica”, ainda que tenha asseverado que “a matéria central
aqui enfocada é eminentemente jurídica, envolvendo a interpretação quanto a aspecto
fundamental da ordem jurídica: se as dispensas massivas são, ou não, regidas do mesmo
modo normativo do que as dispensas meramente individuais e, não o sendo, quais as
23 Ibidem, pp. 210-211. 24 MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O Dissídio Coletivo à Luz da Emenda Constitucional n. 45/04. In: MELO FILHO, Hugo Cavalcanti; AZEVEDO NETO, Platon Teixeira de (coord.). Temas de Direito Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, p. 144-150, 2010, p. 145.
16
consequências jurídicas de sua regência normativa específica. Nesta medida, o presente
dissídio é fundamental e preponderantemente jurídico, embora se reconheça sua natureza
algo mista, quer dizer, é dissídio coletivo preponderantemente jurídico, mas também com
dimensões econômicas”.
Mais adiante no voto, o Ministro Mauricio Godinho Delgado asseverou que
o dissídio coletivo deveria ser tido como um “dissídio coletivo genericamente considerado,
já que este é o instrumento adequado para análise de questões envolvendo entes coletivos
normativamente especificados”.
Do ponto de vista processual, o grande impacto notado do julgamento do
“Precedente Embraer” é de natureza formal-processual: a natureza eventualmente
excepcional da matéria e do objeto de toda a discussão coletiva pode automaticamente
transformar um dissídio coletivo de trabalho, inapropriadamente proposto, em via adequada
para que o Tribunal do Trabalho adote a tutela jurisdicional que entenda por bem aplicar,
ainda que a parte suscitante dispusesse, e com muito mais eficiência, da ação civil pública
ou da ação civil coletiva.
A excepcionalidade da matéria em discussão pode transformar o Tribunal do
Trabalho no receptáculo maior de toda a ditadura judicial a partir do uso tergiversado do
dissídio coletivo para corrigir qualquer deslize processual em termos de conflitos coletivos
de trabalho, a ponto de, para um dissídio de natureza jurídica, o Tribunal vir a dar tutela
dispositivo-constitutiva e, para dissídio de natureza econômica, declaratória!
Do ponto de vista processual, a postura sugerida pelo TST é avançada, é
arriscada nos arredores dogmáticos da disciplina processual e causa certa insegurança
processual pela forma como apresentou, de súbito, a mudança de atitude causada pela
suposta excepcionalidade da matéria em discussão.
A postura adotada pelo TST nesse precedente rompe a tranquilidade
mediante a qual se convivia com o dissídio coletivo de trabalho25; rompe com a tendência,
25 Merece consternação a linha de raciocínio adotada pela SDC/TST quanto a tratar o dissídio coletivo de trabalho de maneira genérica para enfrentar qualquer tipo de conflito coletivo de trabalho, não obstante as especificidades das classificações de dissídios coletivos em dissídios de natureza econômica (subdivididos em originários, de revisão e de extensão), de natureza jurídica e de greve porque já se tem notícia de que certos sindicatos, visando driblar o pressuposto processual do comum acordo para a instauração da instância coletiva em dissídios coletivos de natureza econômica, acabam provocando ou deflagrando, artificialmente, greves ou outros entraves para as relações coletivas de trabalho a fim de que o dissídio coletivo de natureza econômica instaurado anteriormente se transforme, pela benevolência como são considerados os tipos de dissídios pela SDC/TST, automaticamente em dissídio coletivo de greve e assim possa, pela urgência e complexidade que suscita, diante de uma suposta relevância da matéria, ser normalmente apreciado pelo competente Tribunal do Trabalho, independentemente do pressuposto processual previsto no artigo 114, § 2º, da Constituição Federal.
17
saudável, de declínio do poder normativo (em prol da provocação, ainda que forçada, por
uma cultura de negociação coletiva necessária, constante e independentemente de tribunais,
ou de uma cultura, no máximo, de arbitragem coletiva, ainda que pela via “judicial”); e
inova, no mundo jurídico, a estabilização, por anos consolidada, de uma teoria do processo
coletivo do trabalho que começava a se sedimentar, exatamente quando se construíam
alternativas processuais melhores – e mais democráticas (pelo alargamento do rol de
pedidos possíveis e da concorrência de legitimados ativos para a propositura da ação
coletiva) – para a tutela coletiva (como o da ação civil pública ou, ainda, de uma
reclamação trabalhista plúrima), fora do âmbito do dissídio coletivo do trabalho, fora do
âmbito da retroalimentação da unicidade e de todos os institutos que, com ela, se alojaram
no sistema jurídico (como o do poder normativo e de seu instrumento, o dissídio coletivo
do trabalho). Isso porque, dada a dita excepcionalidade, o dissídio coletivo de trabalho
“genericamente considerado” é o instrumento, do poder normativo, apto para a “análise de
questões envolvendo entes coletivos normativamente especificados”.
Essa inovação processual ainda está a merecer uma exploração, elogios e/ou
críticas mais densas por parte da doutrina, que não se dedique a sustentar o que todos os
glosadores sempre sustentam ou a repetir o que a SDC/TST lá firmou no “Precedente
Embraer”, como um mantra, como uma verdade incontestável e impassível de avanço
diante da “coragem” judicante que a decisão encampou.
3.1.3. Da ação de cumprimento
Essa é uma hipótese de procedimento especial calcado no tipo de tutela
buscada, oriunda de uma norma autônoma ou de uma sentença normativa. A ação de
cumprimento, que tem por legitimados ativos o sindicato profissional ou os empregados, se
destina a compelir o devedor a cumprir26 uma sentença normativa ou acordo homologado
judicialmente em sede de dissídio coletivo de trabalho, bem como a fazê-lo cumprir normas
coletivas (convenções ou acordos coletivos de trabalho) tidas por descumpridas27 conforme
a jurisprudência vem admitindo pela Súmula n° 286 do Tribunal Superior do Trabalho,
26 “O conteúdo da sentença normativo não é executado, e sim cumprido, tal como acontece com a eficácia das normas jurídicas de caráter geral e abstrato” (LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Direito Processual Coletivo do Trabalho na Perspectiva dos Direitos Humanos. São Paulo: LTr, 2015, p. 357). 27 LOBATO, Márcia Regina. Dissídio Coletivo. São Paulo: LTr, 2014, p. 108.
18
ampliando a disposição permissiva da ação de cumprimento tal qual disposta,
originariamente, no artigo 872, caput, da CLT. E a especialidade do rito se esvai aqui.
Quanto ao mais, o rito adotado para a ação de cumprimento é o ordinário
trabalhista (ou, eventualmente, até mesmo o sumaríssimo se o objeto da condenação não
ultrapassar quarenta vezes o valor do salário mínimo), uma vez que a sentença buscada pelo
procedimento é de natureza condenatória comum, que pode ser buscada pelas etapas
comuns do rito ordinário ou do rito sumaríssimo trabalhista.
Uma particularidade da ação de cumprimento, que merece destaque e que
talvez realce, também, a especialidade de seu procedimento, é a de que, nos termos da
Súmula n° 246 do Tribunal Superior do Trabalho, a ação de cumprimento independe, para
o seu ajuizamento, do trânsito em julgado, formal, da sentença normativa, podendo,
inclusive, segundo o disposto no artigo 7°, §§ 6° e 7°, da Lei n ° 7.701/1988, ser ajuizada
tão somente com base no acórdão ou na certidão de julgamento do dissídio coletivo, salvo
na eventualidade de o Tribunal Superior do Trabalho conferir efeito suspensivo a recurso
ordinário em dissídio coletivo.
3.2. Procedimentos especiais atípicos
Muitos procedimentos especiais versados, originariamente, em leis esparsas,
por vezes continuam a ser denominados procedimentos especiais, embora atípicos, no
processo do trabalho por conta da origem alheia à CLT, ainda que adotem, na Justiça do
Trabalho, no processo do trabalho, o rito ordinário ou o rito sumaríssimo.
Essa situação está explicitada na Instrução Normativa n° 27/2005 do
Tribunal Superior do Trabalho, editada pela Resolução n° 126/2005 e publicada pouco
depois da promulgação da EC n° 45/2004, segundo a qual, por seu artigo 1°, as ações
ajuizadas na Justiça do Trabalho tramitarão pelo rito ordinário ou pelo rito sumaríssimo,
excepcionando-se, apenas, as que, por disciplina legal expressa, sejam sujeitas a rito
especial, tais como o mandado de segurança, o habeas corpus, a ação rescisória, a ação
cautelar e a ação de consignação em pagamento.
O que se tem identificado, nos foros trabalhistas, de qualquer maneira, é que
cada vez mais os procedimentos especiais previstos em leis esparsas, inclusive o do rol
exemplificativo da parte final do artigo 1° da Instrução Normativa n° 27/2005, quando
vindos para a Justiça do Trabalho a partir do momento em que houve o alargamento de sua
19
competência, são adaptados ao rito ordinário (ou mesmo ao rito sumaríssimo) trabalhista,
com pequenas modificações pontuais.
Se se retirar, dessa regra geral, as normas atinentes à legitimidade ativa e/ou
passiva, a certos traços da eficácia da sentença, a certos tipos de pedidos, ou a certos tipos
de direito material em testilha, que, pela origem adversa, qualificariam a existência de um
“procedimento especial”, o resto atinente à dinâmica do processo se ajusta à ordinariedade
processual trabalhista.
De toda a sorte, um especial destaque revela a ação civil pública, quando, em
seu artigo 12, § 2°, da Lei n° 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública – LACP), e a despeito
da inexistência de efeito suspensivo natural aos recursos trabalhistas, salvo concessão
extraordinária pela via da medida cautelar incidental28, se prevê que a multa cominatória
deferida liminarmente como medida acessória de uma antecipação dos efeitos da tutela
específica por exemplo, só será exigível após o trânsito em julgado da decisão favorável ao
autor, ainda que seja devida desde o dia em que tiver sido configurado o descumprimento.
Sustentam, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruda Alvim Wambier, que, em sede de
ação civil pública, dúvidas não podem persistir quanto ao disposto na norma especial
porque só possuem pertinência “no plano das ações individuais, em que a questão não está
definida por lei”, uma vez que, no plano da ação civil pública e do processo coletivo, a lei
“é clara ao disciplinar” a matéria29.
Afora essa regra especial que destoa, por completo, da ordinariedade
trabalhista, comuns são os casos, ainda na vigência do CPC, que suscitam alguma discussão
quanto à especialidade do procedimento da ação civil pública não observada na tendência
costumeira de submeter procedimentos especiais atípicos ao procedimento ordinário
trabalhista.
Trata-se da aplicação, ao rito especial da ação civil pública, da conjunção
dos artigos 19 da LACP com o 191 do CPC, a fim de que vários réus, com procuradores
distintos, tenham o prazo em dobro para a contestação. Mesmo diante da eventual
complexidade da causa e da eventual insuficiência do lapso temporal disposto na parte final
do artigo 841, caput, da CLT, juízes do trabalho tem afastado aquelas disposições ao
argumento de que a ação civil pública se inseriria na ordinariedade trabalhista ou de que o
28 Item I da Súmula n° 414 do Tribunal Superior do Trabalho. 29 Tratado Jurisprudencial e Doutrinário : Direito Processual Civil. Volume 1. Processo de conhecimento – Poderes do juiz – Terceiros – Fazenda Pública em juízo – Tutela específica – Tutela de urgência. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 777.
20
rito especial causaria delongas injustificáveis para o processo do trabalho, muitas vezes
com fundamento no Precedente Jurisprudencial n ° 310 da Orientação Jurisprudencial da
Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, não
obstante a garantia prevista quanto à observância do procedimento especial no artigo 1° da
Instrução Normativa nº 27/2005 do Tribunal Superior do Trabalho30.
Diante dos limites do estudo e da diversidade de procedimentos especiais
tutelados em leis esparsas (mandado de segurança, habeas corpus, ação civil pública, etc.),
o NCPC, de toda a sorte, apresentou, no seu novo rol de ações sujeitas ao procedimento
especial de jurisdição contenciosa, alguns procedimentos que, em exame perfunctório, são
compatíveis com o processo do trabalho, entre os quais a ação de consignação em
pagamento (artigos 539 a 549 do NCPC), a ação de exigir contas (artigos 550 a 553 do
NCPC), as ações possessórias (artigos 554 a 568 do NCPC), os embargos de terceiro
(artigos 674 a 681 do NCPC), a oposição (artigos 682 a 686 do NCPC), a habilitação
(artigos 687 a 692 do NCPC), a ação monitória (artigos 700 a 702 do NCPC) e a
restauração de autos (artigos 712 a 718 do NCPC)31.
De todos esses procedimentos especiais atípicos, a oposição parece ter sido a
“nova ação” cujos influxos do NCPC trazem reflexos importantes no processo do trabalho,
em relação à forma como a figura era tratada e discutida sob a égide do CPC e de como
fora aceita pela jurisprudência.
3.2.1. Uma breve análise da oposição
Como já se destacou alhures, o NCPC retirou a oposição de seu lugar de
figura de intervenção de terceiros tratada dos artigos 56 a 61 do CPC para o âmbito de ação
típica de procedimentos especiais de jurisdição contenciosa (artigos 682 a 686 do NCPC),
uma demanda autônoma movida pela parte opoente contra o autor e réu de processo já
instaurado, em hipótese de cumulação objetiva de lides. A nova natureza jurídica da
oposição é a de uma ação autônoma e, por ela, o opoente formula pretensão sobre coisa ou
30 A doutrina não deixou de detectar esse conflito entre procedimento especial e procedimento ordinário, como dá nota ZANETTI, Fátima; MONTEIRO, Carlos Augusto M. de O. O Procedimento Quanto ao Prazo para Defesa na Ação Civil Pública no Processo do Trabalho. Revista Legislação do Trabalho (Revista LTr 75-01). São Paulo: LTr, vol. 75, n° 1, janeiro: 55-65, 2011, pp. . 31 Para um estudo complete e detalhado de cada procedimento especial, incluindo os de jurisdição voluntária compatíveis com o processo do trabalho, ver CHAVES, Luciano Athayde. Os Procedimentos Especiais no Processo Comum e sua Aplicação no Processo do Trabalho: Um Olhar a Partir do Novo Código de Processo Civil. Ob. cit., pp. 394-446.
21
direito sobre o qual controvertem autor e réu, desde que o faça até a prolação da sentença
no processo originário.
Distribuída a ação por dependência ao processo no qual litigam autor e réu,
os opostos, agora, são citados/notificados, na pessoa de seus advogados, para contestarem a
oposição. Os autos dos processos são apensados e o Juízo competente prolatará uma mesma
sentença para resolver a oposição e o processo originário. A despeito de o artigo 685,
parágrafo único, do NCPC, prever a situação em que a oposição é ajuizada após o início da
audiência de instrução, hipótese em que o Juízo suspenderá o curso do processo a fim da
produção das provas, salvo se concluir que a unidade da instrução atenderá melhor ao
princípio da duração razoável do processo, aplica-se o rito ordinário trabalhista à oposição,
nada mais sendo especial aqui.
Sabe-se que a ocorrência de oposição no processo do trabalho era e é muito
rara em dissídios individuais, mesmo porque, contra a oposição individual, a incompetência
absoluta da Justiça do Trabalho se mostra palmar em casos em que o opoente empregado
ou trabalhador (ou mesmo empregador ou tomador de serviços) pretendesse a mesma coisa
ou direito litigada/o entre um outro empregado ou trabalhador, oposto, e o empregador ou
tomador de serviços, também oposto, formando-se uma relação jurídica processual,
cumulada com a originária, em que se colocam em conflito dois trabalhadores, empregados,
empregadores ou dois tomadores de serviço, o que, nem de longe, se subsume a qualquer
dos incisos do artigo 114 da Constituição Federal32.
Não obstante essa situação, a Justiça do Trabalho naturalmente encampou a
possibilidade da oposição para os conflitos de representação sindical33 deduzidos
incidentalmente a dissídios coletivos, a fim de que o conflito de representação sindical
versado na oposição fosse recepcionado como uma preliminar de representação34 e, assim,
solucionada incidenter tantum como pressuposto necessário para posterior e imediato
julgamento do dissídio coletivo35.
A despeito dessa autorização jurisprudencial à oposição em dissídio coletivo,
a discussão sempre foi calorosa quanto à sua conveniência, uma vez que muitos sustentam
32 GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Novo CPC: Oposição como Procedimento Especial no Processo do Trabalho. In: MIESSA, Elisson (org.). O Novo Código de Processo Civil e seus Reflexos no Processo do Trabalho. Salvador: JusPodivm, p. 273-282, 2015, p. 277. 33 BILHALVA, Vilson Antonio Rodrigues. Dois Estudos: I – Oposição em Dissídio Coletivo; II – Greve. Arquivos do Instituto Brasileiro de Direito Social Cesarino Júnior. Vol. 23. São Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Social Cesarino Júnior (IBDSCJ), p. 43-50, 1995, p. 43. 34 MELO, Raimundo Simão de. Ob cit., p. 117-118. 35 DALAZEN, João Oreste. Competência Material Trabalhista. São Paulo: LTr, 1994, p. 163.
22
que a oposição, mesmo incidentalmente a um dissídio coletivo, forçaria um Tribunal
Regional do Trabalho ou o Tribunal Superior do Trabalho a avaliar, mesmo que sem
formação de coisa julgada, matéria sobre a qual não teriam competência originária para
tratar.
Com a nova topografia da oposição no NCPC, as discussões a respeito de
competência, quando em debate o dissídio coletivo, se dissipam de vez. A partir da
vigência do NCPC, estará proibida a oposição em dissídio coletivo, e pela simples
incompatibilidade instrumental de se apensarem (artigo 685 do NCPC) autos de dissídio
coletivo com autos de ação autônoma de competência originária do primeiro grau de
jurisdição.
De toda a sorte, a doutrina tem sustentado a possibilidade da oposição em
autos em que litigam uma dada entidade sindical e uma empresa, na qual a entidade deduz
pedido de pagamento da contribuição sindical em desfavor da empresa36. Nessa situação,
uma outra entidade sindical poderia apresentar oposição para pretender a representação
categorial e, assim, o pagamento, pela empresa, da contribuição sindical.
4. Considerações finais
Em matéria de procedimentos especiais, e salvo a hipótese da oposição agora
transformada em ação autônoma capaz de inviabilizar a sobrevivência da oposição no
processo do trabalho quando apresentada incidentalmente a dissídio coletivo, o processo do
trabalho, com o advento do NCPC, se mantém infenso a grandes modificações. Salvo
modificações mínimas e ritualísticas de certos procedimentos especiais de jurisdição
contenciosa versados no NCPC que podem ser objeto da competência da Justiça do
Trabalho, os procedimentos especiais do processo do trabalho se mantém intactos e
independentes do NCPC.
Nessas circunstâncias, e a despeito das profundas modificações de conceito e
topográficas operadas pelo NCPC, o processo do trabalho, sob a égide principal da CLT,
mantém, como procedimentos típicos de seu processo de conhecimento, os ritos ordinário,
sumário e sumaríssimo, além de manter, inteiriços, seus procedimentos especiais típicos de
jurisdição contenciosa, relacionados ao inquérito judicial para a apuração de falta grave, ao
36 GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Novo CPC: Oposição como Procedimento Especial no Processo do Trabalho. Ob. cit., p. 280.
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dissídio coletivo e à ação de cumprimento. Quanto aos procedimentos especiais atípicos, já
era de rigor, no processo do trabalho, a recepção de ritos especiais previstos para certos
objetos e tutelas jurisdicionais distintas, sob o império da prevalência do procedimento
ordinário trabalhista, tendência que se confirma com o advento do NCPC. Isso porque o
NCPC encampa, como uns de seus novos princípios, os que enaltecem a adaptabilidade e a
flexibilização procedimental para permitir que boa parte das tutelas jurisdicionais antes
requeridas mediante procedimentos especiais de jurisdição contenciosa possa ser
naturalmente examinada e julgada no procedimento ordinário, o que se aplica, e com,
quiçá, mais verve, no processo do trabalho.