primeiras aproximaÇÕes de pesquisa em histÓria da …

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1 PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES DE PESQUISA EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO: ESCOLA FRANCISCANA “INSTITUTO EDUCACIONAL DE DOURADOS” - MATO GROSSO (UNO) - 1955-1971 ELIANE MARIA AMARO. 1 FANNY SILVA VALDEZ. 2 MARIA DO CARMO BRAZIL. 3 Resumo: Refletimos neste artigo sobre a temática História das Instituições Educativas (HIE), focada na escola confessional católica franciscana Instituto Educacional de Dourados, surgida em 1955, no município de Dourados - região da Grande Dourados (sul do Mato Grosso - uno) em funcionamento até os dias atuais. Têm-se como base os caminhos abertos pela Nova História Cultural a qual vem propiciando a ampliação de problemas, objetos e temas de pesquisa histórica. Pretende-se expor um texto que abarque questões que dê possibilidades de fomentar o processo de trabalho do historiador em relação ao objeto de pesquisa, sem ter a pretensão de esgotar as possibilidades de busca e interpretação. As análises comportam questionamento sobre a identidade histórica, as razões para a criação, instalação e funcionamento dessa instituição no período de 1955 a 1971. A ideia inicial é discutir alguns dos motivos da instalação da referida instituição, aspectos ligados ao espaço físico do prédio, o perfil dos agentes ali envolvidos e o cotidiano escolar. Estas primeiras considerações contam com documentos oriundos principalmente acervo da escola (crônicas, documentos, iconografia, livros de ocorrências, utensílios, objetos escolares, entre outros) e da imprensa local (Jornal o Progresso) Os dados obtidos serão interpretados a partir das categorias de análise explicitadas, com a consideração, em especial, das relações reflexivas entre o particular a Escola, a cidade de Dourados e o geral, o contexto histórico-escolar e social do país, desde a segunda metade do século XX. Já nos primeiros contatos com as fontes históricas arroladas já é possível observar que esta escola historicamente teve, por um lado, suas singularidades regionais, mas por outro, foi propagadora de ideais franciscanos e da fé católica e engajamento com os propósitos educacionais próprios dessa fase republicana, os quais foram nacionalmente divulgados. Palavras-chave: Instituições Educativas Educação Franciscana - Cultura Escolar Introdução 1 Mestranda em Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail: <[email protected]> 2 Mestranda em Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail: <[email protected]>, 3 Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Docente no Programa de Pós-Graduação da FAED da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail: <[email protected]>.

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PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES DE PESQUISA EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO:

ESCOLA FRANCISCANA “INSTITUTO EDUCACIONAL DE DOURADOS” -

MATO GROSSO (UNO) - 1955-1971

ELIANE MARIA AMARO.1

FANNY SILVA VALDEZ.2

MARIA DO CARMO BRAZIL.3

Resumo: Refletimos neste artigo sobre a temática História das Instituições Educativas (HIE),

focada na escola confessional católica franciscana Instituto Educacional de Dourados, surgida

em 1955, no município de Dourados - região da Grande Dourados (sul do Mato Grosso - uno)

em funcionamento até os dias atuais. Têm-se como base os caminhos abertos pela Nova

História Cultural a qual vem propiciando a ampliação de problemas, objetos e temas de

pesquisa histórica. Pretende-se expor um texto que abarque questões que dê possibilidades de

fomentar o processo de trabalho do historiador em relação ao objeto de pesquisa, sem ter a

pretensão de esgotar as possibilidades de busca e interpretação. As análises comportam

questionamento sobre a identidade histórica, as razões para a criação, instalação e

funcionamento dessa instituição no período de 1955 a 1971. A ideia inicial é discutir alguns

dos motivos da instalação da referida instituição, aspectos ligados ao espaço físico do prédio,

o perfil dos agentes ali envolvidos e o cotidiano escolar. Estas primeiras considerações

contam com documentos oriundos principalmente acervo da escola (crônicas, documentos,

iconografia, livros de ocorrências, utensílios, objetos escolares, entre outros) e da imprensa

local (Jornal o Progresso) Os dados obtidos serão interpretados a partir das categorias de

análise explicitadas, com a consideração, em especial, das relações reflexivas entre o

particular – a Escola, a cidade de Dourados – e o geral, o contexto histórico-escolar e social

do país, desde a segunda metade do século XX. Já nos primeiros contatos com as fontes

históricas arroladas já é possível observar que esta escola historicamente teve, por um lado,

suas singularidades regionais, mas por outro, foi propagadora de ideais franciscanos e da fé

católica e engajamento com os propósitos educacionais próprios dessa fase republicana, os

quais foram nacionalmente divulgados.

Palavras-chave: Instituições Educativas – Educação Franciscana - Cultura Escolar

Introdução

1Mestranda em Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail:

<[email protected]>

2Mestranda em Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail:

<[email protected]>, 3 Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Docente no Programa de Pós-Graduação da

FAED da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). E-Mail: <[email protected]>.

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O presente ensaio visa discutir as primeiras aproximações concernentes à temática

“História das Instituições Educativas”, focada na escola confessional católica Escola

Franciscana Imaculada Conceição, surgida em 1955, na região da Grande Dourados (sul do

Mato Grosso uno) em funcionamento até os dias atuais.

As análises pretendidas desta pesquisa comportam questionamentos sobre identidade

histórica dessa instituição no período de 1955 a 1971. A ideia inicial é discutir alguns dos

motivos da instalação da referida instituição, aspectos ligados ao espaço físico do prédio, o

perfil discente e docente e o cotidiano escolar. Estas primeiras considerações contam com

documentos oriundos principalmente do acervo da escola (crônicas, documentos, iconografia,

livros de ocorrências, utensílios, objetos pedagógicos, entre outros) e da imprensa local

(Jornal “O Progresso”). Os dados obtidos, até então, foram interpretados a partir das

categorias de análise explicitadas, com a consideração, em especial, das relações reflexivas

entre o particular – a Escola, a cidade de Dourados – e o geral, o contexto histórico-escolar e

social do país, desde a segunda metade do século vinte. A partir das fontes arroladas e dos

referenciais teórico-metodológicos, pretende-se expor um texto que dê possibilidades de

ampliar o processo de trabalho do historiador em relação ao objeto de pesquisa, no caso

Instituições Educativas, sem ter a pretensão de esgotar as possibilidades de busca e

interpretação. Nosso intuito em desenvolver esta pesquisa fortalece-se no fato de poder

ampliar as informações sobre a História da Educação, no campo das Instituições Educativas

no Mato Grosso (uno).

Inicialmente, neste texto, abordar-se-á sobre a História da Educação e o estudo de

Instituições Educativas. Na sequência o tema é a pesquisa em História das Instituições

Educativas e a Cultura Material Escolar. E em seguida, tecem-se nexos para o estudo de

Instituições Educativas. E, encerrando, entram em cena as primeiras aproximações

investigativas e o breve histórico da escola franciscana “Instituto Educacional de Dourados”.

1 História da Educação e o estudo das Instituições Escolares

O nascimento da História da Educação se dá no século XIX, desenvolveu-se,

sobretudo nas escolas normais e nos cursos de professores, nos institutos de pesquisa e ensino

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de História. No Brasil a trajetória da História da Educação está muito associada às trajetórias

das escolas normais, cursos de Pedagogia de Filosofia, ou seja, no campo da Educação. O fato

de trajetória da História da Educação estar relacionada à Pedagogia e ao ensino dificultou sua

constituição como uma área de pesquisa propriamente dita. Ela não se desenvolveu como

uma área da História, em alguns momentos foi até um objeto ignorado, contudo com a

progressiva influência da Nova história Cultural este cenário está mudando (LOPES E

GALVÃO. 2001). Mas afinal em que nos auxilia a história da educação? Para Lopes e

Galvão. 2001, p. 17:

A história nos permite ver que, em outros lugares, culturas e em outras épocas, ou

aqui perto de nós, a educação de modo geral, e a escola, em particular, têm mudado,

mas parece manter alguns elementos intocados que, surpreendentemente, são os

mesmos em 2001, e lá, em 2015. A História, desta forma, ajuda-nos a olhar nossa

realidade com paciência: afinal, as coisas demoram muito a mudar... Às vezes é

preciso esperar duas ou três gerações para que uma inovação educacional aconteça.

As práticas escolares repetem-se ao longo do tempo e dos espaços, com diferenças

que sugerem as “variações-sobre-um-tema” como fizeram alguns compositores.

(LOPES E GALVÃO. 2001, p. 17)

Com a História da Educação amplia-se o olhar historiográfico. Surgem os

historiadores da educação, cuja disposição para fazer história caracteriza-se por estar “imersos

em um presente que faz indagações, impõe questões, sugere temáticas [...] formulam

problemáticas para a história: o que se fazia, por que [...] como se fazia alguma coisa em

determinada época” (LOPES; GALVÃO, 2001, p. 16). A formação deste novo campo

investigativo, a História da Educação, passou por uma fase de dificuldade, sendo até

prejudicada. Porém, com a progressiva influência da Nova História Cultural, resultante da

evolução dos Annales4 este cenário está mudando, apresentando maiores possibilidades de

abordagens investigativas.

Fernand Braudel (1902-1985) considerado o pai fundador da Nova História Cultural,

propõe: “numerosas abordagens do tempo: a longa duração, uma história imóvel das relações

entre o homem e espaço; uma história das estruturas sociais, econômicas, demográficas – e,

4 A Escola dos Annales foi um movimento historiográfico surgido na França, durante a primeira metade do

século XX. O movimento historiográfico foi muito impactante e renovador, colocando em questionamento a

historiografia tradicional e apresentando novos e ricos elementos para o conhecimento das sociedades.

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enfim acontecimento de um tempo curto” (JABINET, 2003, p. 131). Emergiram também, com

a Nova História Cultural, variados objetos de pesquisa como Instituições Escolares,

disciplinas, questões de gênero, cultura escolar, imprensa, legislação, dentre outros. Surgiram

novos métodos resultando numa diversidade na informação e produção historiográfica. Abriu-

se a um grande campo de investigação, constituído pelo inventário de novos temas, pela

construção de novos objetos epistêmicos e pela recuperação de uma vastidão de fontes.

Multíplice e denso, o domínio científico da História da Educação tem sido objeto de soluções

científicas diversas. (LOPES; GALVÃO, 2001). Suscitando, desta forma, novos temas, novas

metodologias e novas abordagens historiográficas.

As Instituições Educativas, de acordo com a Nova Histórica Cultural, surge como um

novo objeto de conhecimento. Magalhães (2004, p. 134) em seus estudos conceitua que:

A construção desse novo objeto de conhecimento como totalidade em organização e

desenvolvimento, na sua internalidade e na sua relação ao exterior carece de um

marco teórico interdisciplinar e de uma hermenêutica cruzada entre memórias,

arquivos e museus, no âmbito de uma projeção e de uma regressão investigativa –

um percurso metodológico indutivo/dedutivo. [...] um objeto de conhecimento

amplo complexo, interdisciplinar, aprofundando um quadro de reflexão e de ação,

focalizando na projeção e na reversibilidade das teorias e práticas. (MAGALHÃES,

2004, p. 134)

Magalhães (2004) enfatiza o redimensionamento que as abordagens sobre as

Instituições Educativas devem evocar, necessitam estruturar-se numa abordagem cruzada dos

planos macro, meso ou micro histórico, por uma dialética de convergência/divergência e de

uma reconceitualização espaço temporal: nacional/universal, o regional o local, de forma que

permitem representar a instituição educativa na sua totalidade, em permanente relação e

desenvolvimento.

Esta análise das Instituições Educativas permite o entendimento de que as

Instituições Educativas “são organismos vivos” onde “se transmite uma cultura (a cultura

escolar), não deixam de produzir culturas, cuja especificidade lhes confere uma identidade

histórica” (MAGALHÃES, 2004, p. 124-125) não são entidades isoladas da realidade social,

constituem parte da história dos homens, são recortes autônomos de uma realidade social,

política, cultural, econômica e educacional.

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2 A pesquisa em História das Instituições Educativas e a Cultura Material Escolar

Em História da Educação o motivo central em investigar do presente ao passado, do

passado ao presente, é sempre a busca de um dado, uma explicação, uma nova abordagem,

guiada pelos sentidos gerais da história, que se faz para a criação de respostas e dados novos,

que dificilmente se esgotam e muitas vezes apenas se aproxima da problemática pesquisada.

“A pesquisa, em sua dinamicidade de instâncias que se interpenetram dialeticamente,

configura-se como estrutura e como processo.” (FÉLIX, 1998, p. 73). O processo

investigativo estabelece-se por meio da qualidade do diálogo que o pesquisador consiga

estabelecer entre teoria e empiria, com a formulação de sucessivas hipóteses e interpretação

histórica, regrada de metodologia que valide seu trabalho.

Compreender e explicar a realidade histórica de uma Instituição Educativa é rever

suas memórias, garimpar documentos/cultura material escolar e integrá-la de forma interativa

no quadro mais amplo do sistema educativo, nos contextos e nas circunstâncias históricas,

implicando-a na evolução de uma comunidade região, seu território público e zonas de

influência, sendo esta sua principal base de informação e de orientação.

Nesta trajetória interpretativa da realidade histórica a cultura material escolar

presente nos objetos e artefatos incita o processo investigativo. São “vestígios da circulação

de ideias pedagógicas [...] o que se preservou desta materialidade pode ser compreendido

como [...] ‘ancoradouros para os indicadores’ da memória” (SILVA, 2012, p. 19). Os quais

contribuíram para que a instituição pudesse instruir, educar, moralizar e civilizar. Com a

investigação da cultura material pode-se descortinar-se relações sociais, fatos e práticas

internas com reflexos das práticas externas.

Os lugares de memória alargam o campo investigativo em História da Educação e

deles emergem indagações: o que os lugares revelam sobre espaços e objetos? Que elementos

da prática educativa podem ser evidenciados a partir do artefato material escolar? Qual a

dinâmica intencional da arquitetura escolar? Os estudos de Silva (2006, p. 11) apontam que:

Na perspectiva da microfísica, o espaço escolar apresenta chaves de análises

inseridas na tecnopolítica disciplinadora, a qual conta com dispositivos para fazer

dóceis os corpos e as consciências. Quando se trata de sua função simbólica e

estética, é possível apreender os espaços escolares dotados de dimensões semânticas,

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constituindo-se em referente de um modo de vida e civilização e de semiologias

capazes de desconstruir e codificar elementos que expressam um sistema de

intenções, valores e discursos que são próprios de determinada tradição cultural, por

exemplo: os muros escolares, o pátio escolar, a separação arquitetônica das salas de

aulas, etc. (SILVA, 2006, p. 11)

O espaço e os artefatos, a cultura material escolar propriamente dita, ao ser

interpretada enquanto significados sociais e culturais precisa distanciar-se da ideia de

neutralidade e transcender os enfoques para além do físico, topográficos ou ecológicos do

espaço escolar. Ao analisar o interior de uma escola, não perder de vista as conexões

existentes entre o específico e o geral, entre o privado e o público. Os objetos, os espaços e o

tempo, como componentes institucionais escolares, socializam informações conectadas e

carregam vestígios significativos que auxiliarão o processo historiográfico.

3 Nexos para o estudo de Instituições Educativas

Como estruturar a abordagem e tecer nexos para o estudo de Instituições educativas?

A pergunta nos conduz ao cerne de um debate fecundo que é à base do trabalho investigativo

em Instituições Educativas:

Uma epistemologia da instituição educativa compreende: a construção do objeto; a

construção do conhecimento; a elaboração/apresentação da ideia fundamental. São

estes os três passos fundamentais de um processo investigativo, que se expressa

numa síntese da combinatória entre: materialidade, representação e apropriação;

quadros biográficos e memorialistas; modelização. A interpretação das informações

discursivas e das práticas, constituindo um desafio à aplicação conceitual e à

compreensão da realidade-objeto, medeia entre a teorização e a interpretação e entre

praxeologias e reconceituações. (MAGALHÃES, 2004, p. 134-135)

Enquanto objeto historiográfico constituído, a Instituição Educativa é composta por

uma totalidade em organização e desenvolvimento o local, o nacional e o universal. Estruturar

a abordagem e realizar os encadeamentos necessários para o estudo de Instituições Educativas

passa por uma síntese combinatória entre a materialidade, a representação e a apropriação e

Magalhães (2004, p. 134) aponta que:

A construção desse novo objeto do conhecimento (a instituição educativa como

totalidade em organização e desenvolvimento, na sua internalidade e na relação ao

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exterior) carece de um marco teórico interdisciplinar e de uma hermenêutica cruzada

entre memórias, arquivos e museus, no âmbito de uma projeção e de uma regressão

investigativa – um percurso metodológico indutivo/dedutivo. [...] um objeto do

conhecimento, amplo, complexo, interdisciplinar, aprofundado um quadro de

reflexão e de ação, focalizando na projeção e na reversibilidade entre teorias e

práticas. (MAGALHÃES, 2004, p. 134)

A tecitura de historiar uma Instituição Educativa encontra base no trabalho

investigativo entrelaçando os percursos concretos da indagação cognitiva, fixando os pontos

estratégicos de uma investigação arquivista, museológica e etnográfica, sem perder de vista,

como já citado anteriormente, a “abordagem dos planos macro, meso ou micro histórico, por

uma dialética de convergência/divergência/convergência e de uma reconceitualização espaço

temporal: o nacional/universal, o regional o local.” (MAGALHÃES, 2004, p. 134). A

pesquisa acontece de forma processual, paciente, assídua e ética, num constructo de conexões

que levam a novas descobertas ou novos encadeamentos.

4 Breve histórico da escola franciscana “Instituto Educacional de Dourados” e primeiras

aproximações investigativas

A escola confessional católica franciscana “Instituto Educacional de Dourados”,

surgida em 1955, no município de Dourados - região da Grande Dourados (sul do Mato

Grosso - uno) em funcionamento até os dias atuais, foi criada, conforme ata número 01-

1º/03/1955. Inicialmente foi aberta a escola primária, no centro da cidade, na antiga casa

paroquial, com o nome de Patronato de Menores Santo Antônio. Depois foi construído prédio

próprio ao lado da igreja matriz Imaculada Conceição passando a chamar-se Educandário

Santo Antônio.

Em 1957, as irmãs ampliaram sua casa de madeira com a ajuda financeira da família

Targas, de Itahum, para poderem internar seus filhos. Em 16 de outubro de 1958 iniciou-se a

construção de uma moradia própria para as irmãs na Vila Progresso e em 30 de janeiro de

1959, as mesmas passaram a morar ali, onde quase tudo era mato. Em 07 de outubro de 1959,

foi iniciada a construção do “Instituto Educacional de Dourados”, onde hoje é a Escola

Franciscana Imaculada Conceição. O prédio foi concluído em 1969.

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Com a mudança para a Vila Progresso, as irmãs ficaram mais distantes do centro da

cidade e utilizavam bicicletas como veículo de locomoção, enfrentavam a poeira ou barro em

suas idas e vindas. No novo e atual endereço foram abertos outros cursos: 1959 – Normal

Regional; em1959 – Normal Colegial; em 1961 – Ginásio Secundário; em 1971 – Pré-

primário e Primário. Em 1970 o instituto passa a chamar-se Colégio Imaculada Conceição.

Conforme os estudos de Brazil e Mancini, 2012, "Investigar as dimensões históricas

da Escola Normal “Instituto Educacional de Dourados” hoje, Escola Franciscana Imaculada

Conceição, assentada no município de Dourados, no ano de 1955, liga-se, portanto ao

interesse em fazer avançar o conhecimento histórico acadêmico sobre as instituições

educacionais regionais e locais. Dada à pequena produção historiográfica sobre história e

memória da educação na região importa realizar um estudo específico que envolve as

dimensões históricas das instituições [...] sobretudo nas formas de representação municipal e

sua localização em área de fronteira (Brasil-Paraguai)”.

A vinda das irmãs franciscanas para o estado do Mato Grosso foi relatada por Moreira

(1990, p. 81, apud BRAZIL E MANCINI, 2012) da seguinte forma: "Seduzida por essa

mística do desenvolvimento, cuja construção fez parte de manobras políticas, a sociedade

douradense acolheu de forma efetiva, em 1955, a ‘Ação Social Franciscana’ oriunda do estado

do Rio Grande do Sul. Em 1955, foi criada a escola particular Patronato de Menores da Ação

Social Franciscana. Além de manter o Patronato de Menores, as irmãs franciscanas investiram

na edificação da escola que demandou dez anos pra concluir. Seu funcionamento ocorria em

dois períodos e havia ainda o regime de internato, semi-internato e externato" E, registrado

nas crônicas da Escola Imaculada Conceição de 1955 encontramos:

[...] Em 1955 – Dia 9 de fevereiro às 14 horas, conforme o relógio do Rio Grande do

Sul e as 13 segundo o horário de Dourados que tem uma hora de diferença,

aportamos. A surpresa foi geral. Ninguém calculava que já estivessem no destino.

Nem tão pouco os douradenses, que correram como estavam, sem se preocupar com

as vestimentas. Frei Teodardo nos deu as boas-vindas. Em seguida convidaram-nos

para tomar uma merenda na casa da diretoria do grupo escolar, Sr. Celso e Dona

Neuza Amaral. [...] Dia 15 de fevereiro – início da matricula que até o fim do mês já

passou de 300. A matrícula total atingiu o número de 480 disto, inclusive as do

Corte e Costura [...]. (CRÔNICAS ESCOLA IMACULADA CONCEIÇÃO, 1955)

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A pretensão desta pesquisa norteia-se em conceitos e noções de História da

Educação, Memória e Sociedade, em especial no que tange as instituições escolares tendo

como referencial teórico metodológico a Nova História Cultural. Nesse sentido, em relação

aos limites temporais da pesquisa pretendemos investigar a história e a memória das práticas,

a metodologia, os materiais didáticos e funcionamento da sala de aula, bem como memórias

de irmãs e professoras da época, no período de 1955 até 1971. A proposta é dar historicidade

à gênese e perfil de funcionamento delineado neste período. O ano de 1955 marca o ano de

fundação da instituição através da Ata número 01-1º/03/1955. Além disso, a criação do

“Instituto Educacional de Dourados” no referido ano significa a materialização e consolidação

dos Institutos de Educação desde o ano de 1932, graças ao Manifesto dos Educadores no

mesmo ano. A criação dos institutos veio ampliar as finalidades da Escola Normal que, além

da formação de professores primários, envolveu o próprio curso primário e pré-primário,

destinado à prática dos alunos-mestres, o secundário e os cursos de extensão e

aperfeiçoamento para professores já formados. O ano de 1971 se justifica em função de o

processo educacional brasileiro passar por dois momentos significativos neste período, as Leis

de Diretrizes e Bases (LDB) de 1961 e 1971.

Nas primeiras aproximações investigativas sobre os modelos e práticas pedagógicas

da escola franciscana em estudo, chamou-nos a atenção o fato da referida instituição

apresentar como registro, no ano de 1975, apesar desta data ultrapassar nosso recorte

temporal, a implantação do método Montessoriano. Metodologia desenvolvida por Maria

Montessori (1870) que buscava atender aos princípios da Escola Nova, que tinha por ideal

educar para a liberdade, no sentido de possibilitar a autogestão do educando e a construção de

uma sociedade democrática. Encontramos atas sobre a implantação do referido método e

formação das professoras, álbuns fotográficos e muitos objetos pedagógicos montessorianos.

Os registros sobre o Método Montessori na escola Imaculada desaparecem a partir do ano de

1985. Deixando a ideia de que o método Montessoriano vigorou por um período de dez anos.

Abre-se aqui mais uma possibilidade investigativa.

Aos poucos, nesta trajetória investigativa inicial, vamos interagindo com pessoas e

suas memórias escolares, com os documentos, com o acervo fotográfico e a descoberta vasta

de artefatos antigos, as ditas “coisas velhas” que podem gerar um “percurso de investigação

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sobre cultura material escolar”, conforme Camargo (2000) são encantadoras e afloram

possibilidades da constituição de um memorial institucional.

No intuito de reunir elementos para a elaboração desta pesquisa, recorremos à

internet por meio dos portais de busca como Google acadêmico e banco de tese e dissertações.

Consultamos também teses digitalizadas de bibliotecas das Universidades e Centros

Universitários de Dourados e Campo Grande. Encontramos afinidade em trabalhos publicados

sobre Instituições Escolares, como o de Fernanda Ros Ortiz (2014). Bem como alguns artigos

que fazem menção a Escola Franciscana Imaculada Conceição, como os de Maria do Carmo

Brazil e Ana Paula Gomes Mancin (2012 e 2013) e Magda Sarat Oliveira e Ana Paula G.

Mancini (2007), o que reforça nossa intenção de pesquisa como possibilidade de contribuir

com mais trabalhos, documentação e estudos a respeito das instituições escolares.

A análise historiográfica pretenderá centrar-se nas abordagens inovadoras e mais

recentes acerca da História da Educação e das Instituições Escolares, com destaque para as

análises de Magalhães (2007); Boudieu (1998); Certeau (1998); Le Goff (2003), entre outros.

E assim, abrem-se os caminhos para uma trajetória investigativa em Instituições

Escolares tendo como concepção que, o estudo de Instituições Educativas não é uma realidade

isolada, constituem parte da história dos homens, tornam-se um recorte da realidade social e

cultural. Um trabalho primoroso onde o conhecimento, a paciência, a ética e a estética

tornam-se companheiros de viagem.

1. Considerações finais

O objetivo deste texto foi apresentar as primeiras aproximações de pesquisa em

História da Educação concernente à temática de Instituições Escolares e fomentar questões

que deem possibilidades ao historiador de buscar melhorias em seu processo de trabalho

investigativo, sem ter a pretensão de esgotar a busca e interpretação do conhecimento.

As ideias aqui reunidas sobre História da Educação e o estudo de Instituições

Educativas; a pesquisa em História das Instituições Educativas e a Cultura Material Escolar;

tecer nexos para o estudo de Instituições Educativas; primeiras aproximações investigativas

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pretenderam colocar em evidência e em debate as várias formas pelas quais os conceitos

podem ser pensados e articulados na pesquisa historiográfica.

Finalizamos este ensaio, com a perspectiva de termos contribuído para o processo de

busca incansável pelo conhecimento, muito mais intensa na vida daqueles que se aventuram

pela seara investigativa. Por acreditar ser esta, a via do conhecimento, inesgotável. Quando

pensamos que aproximamos da dita verdade, surgem novos vestígios que levam a novos

nexos e encadeamentos. E assim o caminho recomeça num ciclo de idas e vindas, avanços e

retrocessos. Afinal a vida e a história se fazem pelo processo e este creio ser infinito.

2. Fontes

ESCOLA FRANCISCANA IMACULADA CONCEIÇÃO. Crônicas da Escola Imaculada

Conceição – 1955 a 1987

3. Referências

BRAZIL, M. C.; MANCINI, A. P. G. História das instituições formadoras de professores

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Revista Educação, teoria e prática, Rio Claro, v. 15, n.1, p. 1-26, jan./abr. 2012.

__________________Notas historiográficas sobre instituições escolares no sul de mato

grosso: (1940-1970) Revista Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.3, n.9, p.73-93,

mai./ago. 2013

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LE GOFF, Jacques, 1924. História e memória. Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1990.

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