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PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO 1 PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO MEDICINA DO ESPORTE E EXERCÍCIO

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PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO

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PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO

MEDICINA DO ESPORTE E EXERCÍCIO

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PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO

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PREVENÇÃO DE LESÕES NO ESPORTE: FATORES E ANÁLISE DE RISCO

CONTEÚDO: PEDRO LUIZ GUIMARÃES CURADORIA: PEDRO LUIZ GUIMARÃES

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SUMÁRIO

PREVENÇÃO DE LESÕES ............................................................................. 4

FATORES DE RISCO ...................................................................................... 5

FATORES DE RISCO EXTRÍNSECOS .......................................................... 9

FATORES DE RISCO INTRÍNSECOS ......................................................... 11

ANÁLISE DE RISCO ..................................................................................... 14

REFERÊNCIAS ............................................................................................... 16

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PREVENÇÃO DE LESÕES

Já está mais do que comprovado que a atividade física é essencial para ga-rantir a saúde e longevidade de um indiví-duo. Os motivos para praticar atividade fí-sica regularmente podem variar, podendo ser pela busca do prazer e bem-estar, inte-ração social, competitividade ou até mesmo como prescrição médica. Apesar dos pontos benéficos da atividade física, não é incomum que seus praticantes, prin-cipalmente os que praticam algum esporte, sofram lesões relacionadas à essa prática. Essas lesões podem ser das mais diversas etiologias e gravidades, de maneira que, por exemplo, uma lesão grave no joelho pode resultar em uma ausência a longo prazo do trabalho e do esporte e em um risco aumentado de osteoartrose precoce. Por Esse motivo, torna-se essencial a busca por prevenções de lesões relacionadas a atividade física.

Sempre que um indivíduo é submetido à um programa de treinamento, o objetivo principal deve ser buscar um equilíbrio entre a carga mínima de treinamento necessária para provocar uma melhora na aptidão, e a carga máxima de treinamento tolerável antes de provocar aumentos consideráveis de incidência de lesão. Por ser uma área de grande interesse, principalmente para grandes clubes, estudos com atletas de esportes

coletivos mostraram uma relação positiva entre cargas de treinamento e incidência de lesões, sugerindo que quanto mais esses atletas treinarem, mais lesões eles sofrerão. Com esses achados, torna-se quase intuitivo considerar que programas de prevenção de lesão sejam orientados pela seguinte hipótese: se as cargas de treino excederam um "limiar" planejado, os atletas foram "afastados" de potenciais lesões.

Além dos estudos sobre a relação entre carga de treinamento e lesões, há também evidências emergentes que sugerem que o treinamento insuficiente pode levar ao aumento do risco de lesões. Essas evidências demonstram que existe um bom equilíbrio entre treinamento, destreinamento e excesso de treinamento. Garantir que os indivíduos atinjam padrões mínimos de aptidão física, juntamente com o monitoramento científico das cargas de treinamento para evitar o excesso de treinamento e fadiga excessiva, oferece aos treinadores uma abordagem de "melhores práticas" para minimizar as lesões nos esportes de equipe

Quando estudamos lesões na medicina do exercício e esportiva, foco tende a ser sobre lesões agudas, principalmente as mais graves. Apesar disso, as lesões por overuse não devem ser negligenciadas. Embora o conhecimento e

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a sobreposição de lesões por overuse fiquem para trás em comparação com lesões agudas, as lesões por overuse podem representar uma comorbidade significativa para o praticante, não só em termos de tempo e performance esportiva perdida, mas também através da perda de qualidade de vida. Consequentemente, as lesões esportivas constituem um problema significativo para o esporte, a sociedade e para os indivíduos afetados. É importante lembrarmos que os benefícios da atividade física na saúde do indivíduo tendem a ex-ceder em muito os problemas causados por lesões.

Estudos da Finlândia mostram que ex-atletas da equipe nacional em endurance e esportes coletivos vivem até uma idade mais avançada, principalmente porque eles têm uma menor incidência de câncer, doença pulmonar e doenças cardíacas e vasculares. Ex-atletas de elite também têm um menor risco de hospitalização, embora estejam em maior risco de problemas musculoesqueléticos (principalmente osteoartrose nos joelhos e quadris) do que outros, na maioria dos casos relacionados a lesões sofridas durante carreira atlética.

Embora os ganhos líquidos de saúde da atividade física regular incluam um aumento da expectativa de vida e um menor risco de doença cardiovascular e

diabetes, a prevenção de lesões em conexão com o esporte e a atividade física deve ser enfatizada. Nessa apostila vamos mostrar a base dos programas de prevenção de lesão aplicados pelo mundo. Embora as medidas de prevenção de lesões diferem entre as modalidades esportivas, vamos focar nos princípios dos programas de prevenção de lesão e vamos descreve-los usando exemplos para os tipos mais comuns de lesões

FATORES DE RISCO

Ao buscarmos prevenir - ou pelo me-nos reduzir - as lesões dos praticantes de atividade física, é crucial entendermos tanto da modalidade esportiva, quanto dos indivíduos que serão submetidos ao pro-grama de prevenção. Também é essencial que o médico tenha compreensão da(s) causa(s) da lesão. Mesmo nos casos em que a causa de uma lesão parece ser muito óbvia, - como um chute direto na canela causando uma fratura tibial transversal- a causa real pode ser muito mais complexa. Vamos usar o exemplo que acabei de dar: os fatores contribuintes podem ser as caneleiras que eram muito curtas, uma fratura de estresse subclínica anterior na área, um esqueleto osteoporótico (por exemplo, devido à um déficit de energia), ou simplesmente que o atleta estava muito cansado e não prestou atenção no final de um jogo difícil.

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Como as causas das lesões esportivas são muitas vezes complexas, modelos mais completos foram desenvolvidos para descrever essas relações multicausais, levando em consideração a cadeia de eventos que resultam em uma lesão. Ou seja, os fatores de risco devem ser consi-derados como variáveis que interagem en-tre si causando uma lesão. É necessário ter uma atenção especial aos esportes coleti-vos, quando a previsibilidade de situações de jogo é baixa.

O primeiro diagrama sobre os fatores de risco que originam a lesão foi proposto em 1994 por Meeuwisse e continua sendo o mais utilizado. Ele está representado na Figura 1 e, nele podemos notar que a com-binação de fatores de risco aumenta a chance de um indivíduo sofrer uma lesão, como uma cadeia de eventos que desen-cadeiam uma lesão.

Como podemos ver na Figura 1, os fa-tores de risco são divididos em extrínsecos e intrínsecos. Obviamente, temos mais in-fluência sobre os fatores que dependem do jogador, e não sobre os fatores que estão além do seu controle ou que ocorrem ao redor do jogador. Portanto, os fatores ex-trínsecos devem ser levados em conside-ração, mas os programas de prevenção de lesão devem ser criados com base nos fa-tores de risco intrínsecos, que são aqueles que nós temos maior poder de influenciar.

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Como fatores intrínsecos são os inerentes aos praticantes, é de se imaginar que neles estejam incluídos: idade, redução da amplitude de movimento, lesões anteriores que reduzem a função neuromuscular ou causam instabilidade mecânica e osteoporose. A existência de um ou mais fatores intrínsecos pode contribuir para a predisposição de um atleta para uma lesão. Já os fatores extrínsecos, são aqueles que afetam o praticante através do seu ambiente externo. Exemplos incluem: jogar handebol

em pisos onde o atrito é muito alto ou muito baixo, jogar futebol em uma superfície onde o gramado irregular, sprint de treinamento em clima frio, e correr no asfalto duro ou com sapatos ruins. Fatores intrínsecos e extrínsecos são, geralmente, separados no tempo a partir do momento em que a lesão ocorre, e raramente são suficientes para causar lesões sozinhos. Entretanto, a combinação e a inter-relação desses fatores contribuem para tornar o praticante mais vulnerável a lesões.

Figura 1 – Causas de lesões relacionadas ao esporte. Dinâmica de Meeuwisse. Modelo causal multifatorial que divide as causas em fatores de risco intrínsecos e extrínsecos, e descreve o mecanismo de lesão no evento incitante.

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Conforme falamos no início dessa apostila, para ser capaz de prevenir lesões e realizar tratamentos eficazes, o médico deve entender as causas. Isto é particularmente verdade quando se trata de lesões por overuse, que muitas vezes retornam se o atleta é incapaz de mudar seu padrão de treinamento. É justamente nas lesões por overuse que é essencial a compreensão de que está acontecendo um desequilíbrio entre a capacidade do indiví-duo de suportar certa carga de treino e a carga de treino imposta a ele. Isso nos diz que, além de alterar a carga de treina-mento, nosso programa de prevenção deve buscar aumentar as capacidades do indivíduo de resistir aos tipos de contato mais frequentes dentro da sua modalidade esportiva, visando reduzir a incidência e a gravidade desse tipo de lesão.

Como você pode imaginar, os fatores de risco são determinados, por um lado, pela força ou estímulo aplicado ao jogador e, por outro lado, pela sua habilidade de responder a eles. Além disso, o treina-mento causa adaptações tanto positivas quanto negativas no médio-longo prazo através de reações biológicas individuais (“carga” interna) à um estímulo externo pro-posto pelo treinador ou pela própria situação de jogo (“carga” externa). É por isso que a pre-venção de lesão deve ser considerada um

processo de treinamento que visa adaptar as respostas do indivíduo às ações do jogo que ele será exposto enquanto pratica sua modali-dade esportiva e que possuem um risco de le-são.

O evento que podemos chamar de “evento incitante”, é o último elo na cadeia que resulta em uma lesão. Muitas vezes, o atleta geralmente pode descrevê-lo com bastante precisão (por exemplo, trauma no lado lateral do joelho que resulta em uma lesão ligamentar medial). Como uma lesão muitas vezes pode ser descrita em simples termos cinemáticos, existe sempre o perigo de que a descrição do mecanismo de lesões possa desviar a atenção de importantes fatores de risco intrínsecos ou extrínsecos. Por isso é importante destacar que, mesmo que muitas vezes seja mais difícil, todos os fatores de risco também devem ser documentados com precisão para facilitar o tratamento bem-sucedido e prevenção de lesões esportivas.

Além disso, é importante notar que, mesmo que as forças agindo em um membro ou uma articulação podem ser descritos em detalhes, isso nem sempre é suficiente para planejar medidas preventivas. Como o objetivo é prevenir lesões, é necessário expandir a abordagem biomecânica tradicional para descrever o evento incitante. Uma descrição completa do mecanismo para um tipo de lesão

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particular em um determinado esporte precisa explicar: a) os eventos que levaram à situação de lesão (situação de jogo, jogador e comportamento do adversário); b) incluir uma descrição da biomecânica de todo o corpo e articulação no momento da lesão.

Assim, quando um programa de prevenção for elaborado, as informações sobre o mecanismo de lesões devem ser consideradas em um modelo que também considera como os fatores de risco intrínsecos e extrínsecos podem modificar o risco de lesões. Por exemplo, nas moda-lidades coletivas é muito comum monitorar a carga de treino. Os dois principais objeti-vos dessa monitorização são: a) otimizar a performance; b) prevenção de lesão pre-vendo a sua probabilidade de ocorrerem registrando a carga aguda e crônica que a equipe e o indivíduo são expostos.

FATORES DE RISCO EXTRÍNSE-COS

Fatores de risco extrínsecos podem incluir uma variedade de fatores, como: treinamento inadequado, novos equipamentos, temperatura fria e uma superfície escorregadia ou dura. Um histórico de treinamento minucioso pode revelar problemas na carga de

treinamento, normalmente expresso pelo paciente como: "demais", "muitas vezes", "muito cedo" ou com "muito pouco descanso". Fazer um histórico de treinamento tem como objetivo registrar detalhes precisos do treinamento e, em particular, identificar quaisquer mudanças recentes na rotina de treinamento (como: um aumento na intensidade, frequência ou duração que acrescentam à carga geral de treinamento). Nas lesões por uso excessivo, um indivíduo pode ter aumentado o volume ou intensidade do treinamento muito rapidamente. Esses princípios se aplicam tanto aos atletas de elite quanto a qualquer indivíduo fisicamente ativo.

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O início do treinamento físico é o momento que as pessoas estão particularmente vulneráveis, e se não haver um treinamento preparatório antes ou durante o início da sua prática esportiva, há o perigo de geralmente começar em um nível muito alto e com um progresso muito rápido.

Muitos atletas experientes treinam muito e estão continuamente à beira do uso excessivo. Para tais atletas é crucial manter o equilíbrio correto, treinando o suficiente para otimizar o desempenho, mas com variação suficiente para permitir a recuperação. Ocasionalmente, isso dá errado, levando à condição de uso excessivo. Os tempos em que atletas de

elite também são vulneráveis incluem: quando os atletas intensificam seu treinamento após as férias, doença, uma lesão ou uma pausa no treinamento. Por isso, ajustes constantes são necessários.

As lesões nem sempre são causadas por aumentos no volume de treino, mas podem resultar de uma mudança no padrão de carga, por exemplo, quando novos treinos são introduzidos ou quando o atleta muda sua técnica. Pode haver uma mudança no ambiente ou tipo de treinamento, por exemplo, quando um tenista muda de um tipo de superfície de quadra para outro.

Figura 2 – Exemplos dos principais Fatores Extrínsecos relacionados a lesões do esporte.

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Outros fatores além do treinamento em si podem aumentar a carga de treinamento. O equipamento não ajustado adequadamente e sem o treinamento específico pode alterar o padrão de carga que, sozinho ou em combinação com outros fatores, pode desencadear uma lesão por uso excessivo. Mudanças em equipamentos como calçados, raquetes, tacos de golfe, esquis, bicicletas e remos também podem contribuir para o desenvolvimento de lesões. Por exemplo, a carga no cotovelo de um tenista é altamente dependente da espessura da alça, do tamanho da raquete e de quão apertadas são as cordas. Da mesma forma, alterar o tamanho da aderência do taco de golfe ou da alça do remo muda a carga.

O clima e a superfície são outros fatores que podem desencadear lesões. Os corredores, por exemplo, sejam velocistas ou corredores de longa distância, experimentam mais problemas musculares e tendinosos em climas frios do que em climas quentes. Jogadores de vôlei e basquete sofrem lesões de uso excessivo nos joelhos mais facilmente jogando e pulando em pisos duros do que em pisos mais macios. Os corredores que introduzem subidas também podem precisar mudar seu estilo de corrida e reduzir o volume de treinamento para evitar lesões.

FATORES DE RISCO INTRÍNSE-COS

Fatores de risco intrínsecos contribuem para a etiologia das lesões por uso excessivo, embora seu papel e contribuição exatas ainda não tenham sido bem documentados. Apesar disso, acredita-se que fatores de risco intrínsecos como desalinhamento anatômico, habilidades ruins ou outros fatores específicos do indivíduo devem ser identificados, mesmo que possam ser difíceis ou até mesmo impossíveis de corrigir. Dentre os fatores intrínsecos, o único que não é capaz de ser modificado é a idade do indivíduo. Fatores intrínsecos por si só raramente causam um padrão de lesão por uso excessivo, mas podem aumentar o risco desse tipo de lesão em tecidos específicos, como, por exemplo, um desalinhamento anatômico em combinação com um aumento na carga de treinamento. Apesar do pouco volume de publicações sobre o tema, um estudo com corredores demonstro que dos 40% que estavam lesionados, apenas 10% dos casos tiveram os fatores intrínsecos identificados como o gatilho da lesão.

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O desalinhamento articular é considerado um importante fator de risco intrínseco. Embora o desalinhamento articular ocorra com mais frequência em corredores que sofrem lesões de uso excessivo, há pouca evidência direta de que o desalinhamento em si desencadeia lesões específicas. No entanto, ele pode impedir a distribuição ideal da carga e, assim, sobrecarregar estruturas específicas ou gerar processos que levam a lesões. Ao considerarmos que um corredor de longa distância dá cerca de 5.000 passos por hora, torna fácil entender como até mesmo um pequeno desalinhamento articular pode causar carga anormal cumulativa em estruturas individuais. Por exemplo, uma posição de varo no joelho deve, em teoria, levar ao

aumento das forças de compressão nas estruturas mediais do joelho (como o menisco medial) e forças de distensão aumentadas no lado lateral dos tornozelos e joelhos, enquanto uma posição de valgo deve resultar no padrão de carga oposto.

Para avaliar um eventual desalinhamento articular, o indivíduo deve ser examinado tanto em repouso quanto durante o uso de carga sobre a estrutura e durante o gesto motor. A gravação em câmera lenta pode ser uma ferramenta útil. Outro ponto importante em ser levado em consideração é a relação entre o desalinhamento e a carga aplicada. O mesmo grau de desalinhamento articular pode ser de menor importância para uma

Figura 2 – Exemplos dos principais Fatores Extrínsecos relacionados a lesões do esporte.

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pessoa que corre alguns quilômetros para fins de aptidão, mas aplica uma carga cumulativa significativa em um tecido de um corredor de maratona que corre de 150 a 200 km por semana.

A fraqueza muscular ou o desequilíbrio muscular relativo ao redor de uma articulação podem contribuir para o desenvolvimento da lesão. Alguns indivíduos, por exemplo, têm os músculos do jarrete fracos ("H", medidos durante a contração excêntrica) em relação à força do quadríceps ("Q", medido durante a contração concêntrica), referido como uma baixa relação H/Q. Isso pode causar carga assimétrica do joelho ou dos músculos próximos ao joelho, que é um padrão que predispõe à lesão. Isso pode ocorrer tanto em um indivíduo sem lesão prévia ou que foi previamente lesionado onde, sem a reabilitação ideal, o desequilíbrio muscular persiste — o paciente pode ter um padrão de movimento desviante e potencialmente desenvolver uma lesão de uso excessivo. A reabilitação inadequada de lesões anteriores é provavelmente um dos fatores de risco mais importantes para o desenvolvimento de novas lesões. Um histórico de lesões prévias como parte do exame físico de rotina ou exame periódico de saúde pode orientar intervenções para prevenir novas lesões.

Atletas com força ou amplitude de movimento particularmente boas, ou que aumentaram rapidamente sua força ou amplitude de movimento, também podem ter um risco de lesão por uso excessivo. Durante o treinamento físico, quando há um programa específico de treinamento de força, os músculos se adaptarão rapidamente. Em compensação, a cartilagem, os tendões e os ligamentos se adaptam mais lentamente do que os músculos, e correm mais risco de lesão. Esse conceito tem que ser bem compreendido pelo treinador e pela equipe responsável pelo atleta, para programar um treinamento físico que inclua um período para adaptação desses tecidos ao nível do desenvolvimento do tecido muscular. Nesses casos, o treinamento deve ser ajustado às habilidades, pontos fortes e fraquezas de cada indivíduo.

Um excesso de mobilidade articular e frouxidão ligamentar potencialmente aumentam o risco de lesões. A baixa mobilidade (hipomobilidade) pode resultar em lesões de uso excessivo. Por exemplo, os músculos flexores curtos e rígidos do quadril podem fazer com que a pelve se incline para a frente quando um atleta estende o quadril durante a corrida em alta velocidade. Isso aumenta a carga na parte inferior da região lombar, levando a dor nas costas durante ou após a atividade. Alongamento dos flexores do quadril

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podem melhorar a amplitude dos movimentos e reduzir a dor nas costas. Por outro lado, a mobilidade excessiva (hipermobilidade) também pode levar a lesões. Alguns indivíduos têm frouxidão articular generalizada, outros são hiper-móveis em uma única articulação. Independente do caso, o indivíduo deve fortalecer os músculos ao redor da articulação para reduzir o estresse direto na articulação.

Assim, conseguimos compreender que muitos dos fatores intrínsecos podem causar lesões de uso excessivo. Alguns desses fatores, como a idade, são impossíveis de mudar. Enquanto outros, como a fraqueza muscular, a baixa mobilidade e o excesso de peso, podem ser alterados. No tratamento de uma lesão de uso excessivo, é importante corrigir fatores internos.

ANÁLISE DE RISCO

Uma ferramenta que pode ser muito útil no processo de prevenção de lesão é fazer uma análise de risco para documentar os momentos da temporada em que os indivíduos estão em maior risco de sofrer lesões, seja por causa do treinamento ou de competições (Figura 2). Podemos usar como exemplos de situações em que o risco tende a aumentar a mudança de uma superfície de

treinamento para outra (por exemplo: da grama para o cimento), ou novos tipos de treinamento (por exemplo: no início de um período de treinamento de força). Este tipo de análise é uma base importante para o planejamento de medidas preventivas, particularmente com a finalidade de evitar lesões por overuse. Essa análise usa como base a ideia de que o risco de lesões é maior durante os períodos de transição e que cada etapa tem certas características que podem aumentar o risco. Temos sempre que ter em mente que o perfil de risco geralmente varia de esporte para esporte. Esse tipo de análise é de responsabilidade da equipe médica em colaboração com os treinadores e atletas, que devem criar um plano para medidaseventivas relevantes, com base na análise de risco.

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Utilizando o perfil de risco ilustrado na Fi-gura 2, vamos entender o que deve ser considerado relevante em cada um dos momentos dentro da programação pro-posta para o time de futebol em questão:

1. Mudança de superfície, clima e ritmo du-rante o training camp em Portugal.

2. Transição para maiores cargas de trei-namento e treinamento de alta intensi-dade, combinados com vários treinos prá-ticos em ambientes fechados e em grama artificial.

3. Final do training camp para aperfeiçoar a forma antes de começar a temporada competitiva, incluindo jogos de treinos em campos no Chipre. A competição por uma vaga na equipe aumenta a intensidade du-rante a competição e o treinamento.

4. Início da temporada competitiva. Um ritmo alto e cronograma competitivo lo-tado, com o qual o atleta não está acostu-mado. Mudança de superfície para grama macia.

5. Alto risco de lesões agudas durante a temporada competitiva, apresentando um cronograma competitivo repleto de inten-sidade total.

6. Período de treinamento básico duro, in-cluindo treinamento de resistência ao qual o atleta não está acostumado e mais tempo de corrida que o normal.

7. O fim da temporada competitiva. Joga-dores desgastados e cansados.

8. Transição para o período de treinamento básico, com corrida em areia mais grossa.

Figura 4 – Perfil de risco. Exemplos de períodos de uma temporada quando existe um risco aumentado de lesões em um time de futebol. Training camp: período organizado em que atletas participam de um cronograma rigoroso e focado de treinamento para aprender ou aprimorar habilidades

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@jalekoacademicos Jaleko Acadêmicos @grupoJaleko

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