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"As famílias estão cada vez mais sozinhas, isoladas" Entrevista rosário farmhouse COMISSÃO DOS DIREITOS DOS JOVENS P.BE

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"As famílias estãocada vez maissozinhas, isoladas"

Entrevista rosário farmhouse

COMISSÃO DOS DIREITOS DOS JOVENS P.BE

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As famíliasestão cadavez maissozinhas,isoladas"Rosário Farmhouse Preside há quatro meses à Comissão

Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Criançase Jovens e a sua aposta é fomentar a parentalidade positivaTexto de Leonor Paiva Watson | Foto Reinaldo Rodrigues /Global Imagens

? Rosário Farmhouse chegou à Co-missão Nacional de Promoção dos Di-reitos e Proteção das Crianças e Jovenshá quatro meses. Ao IN, afirmou queum dos seus objetivos é a coesão comas CPCI e passar uma boa imagem do"trabalho fantástico" que fazem. A ou-tra grande aposta é capacitar as famí-lias para uma parentalidade positiva.Não quis falar do processo Supernan-ny, mas reconheceu que vivemos tem-pos complexos e que é difícil educarum jovem, até porque as famílias estãosozinhas. Acredita que a prioridade é

ajudar os agregados para que as crian-ças possam sempre permanecer emmeio natural de vida. Quando tal não é

possível, acredita que as famílias deacolhimento são uma boa solução.

Um dos objetivos da Comissão Na-cional é fazer formação na área daparentalidade positiva. Na práticao que é que isto significa?Estamos a preparar uma candidaturaao Fundo Social Europeu que terádois eixos. Por um lado, teremos umprojeto que envolve as comissõesalargadas, que fazem um diagnósticoe que desenham um plano de pre-venção e promoção dos direitos das

crianças da comunidade. Por outrolado, temos o eixo destinado às insti-

tuições de primeira linha, como es-colas ou centros de saúde, e tambémàs próprias famílias, com alguns pro-jetos piloto, que terão lugar no NorteCentro e Alentejo.

Relativamente às famílias, a ideia éensiná-las a educar os filhos paranão terem de recorrer a programascomo o Supernanny?Eu admito que os tempos que esta-mos a atravessar são muito comple-xos em termos de educação dos fi-lhos. As famílias precisam de ajudapara perceberem como se lida comestes novos tempos, que trouxeramredes sociais e muitas solicitaçõesque passam através das paredes dos

quartos, sem que nos apercebamos.Há toda uma preocupação da Comis-são Nacional e queremos fortaleceras famílias. Mas a abordagem a fazerserá construída em conjunto com as

próprias famílias.

Como é que está a correr o julga-mento do processo Supernnany?Ora aí está um processo do qual não

quero falar. Ainda só passaram doisdias da audição de testemunhas. Vaicontinuar, portanto, aguardemos.

O que pode dizer de tudo isto que

A família alarga-da, as relações devizinhança, tudoaquilo que nosajudava a educar acriança, a comu-nidade, desapare-ceu. Cada famíliaestá muito fecha-da no seu aparta-mento"

aconteceu à volta da Supernanny ?

Não se tinha visto até hoje esta expo-sição e ampliação das imagens nega-tivas das crianças através de um pro-grama de televisão, ou seja, uma ex-ploração enorme de imagens dascrianças em situações íntimas. Mas

penso que, face a esta exploração, fo-mos exemplares, porque nunca, emnenhum outro país, se viu sobre istouma sociedade tão ativa. Não só asestruturas oficiais, como também ou-tras organizações, juntaram-se emprol desta causa contra o programa.Há quem diga que todas estas orga-nizações se juntaram contra o pro-grama porque, no fundo, custa vero resultado da educação excessiva-mente permissiva que temos dadoàs crianças. Concorda?Penso que os tempos não são sim-ples. Temos uma democracia que nãoé assim tão crescida, é possível quetenhamos caído no outro extremo.Talvez tenhamos passado de umaeducação extremamente rígida, con-troladora, para um extremo onde po-derá valer tudo. Mas não quero gene-ralizar. No caso da Supernanny, as

queixas que tivemos aqui foi de pes-soas que disseram que não reconhe-ciam os seus familiares naquelescomportamentos. Significa que, dealgum modo, as crianças poderiamestar mais stressadas por causa dascâmaras.Mas há ou não um problema de in-disciplina, por exemplo, nas nossasescolas?Há casos. A diversidade é muita. Masreconheço que os tempos são com-plexos, muito complexos. Provavel-mente, só agora reconhecemos as

consequências da educação permis-siva, que não é generalizada. Pode serdifícil encontrar um meio termo, masnão quero generalizar. Reconheço,todavia, que é um problema com di-mensão e que temos muito trabalhopela frente.Fenómenos como o baleia azul di-zem-nos o quê?É uma faceta destes tempos comple-xos. Estamos numa sociedade de so-lidão, as famílias estão cada vez maissozinhas, isoladas. A família alarga-da, as relações de vizinhança, tudoaquilo que nos ajudava a educar acriança, a comunidade, desapareceu.

Cada família está muita fechada noseu apartamento, no seu quarto. Mui-tas vezes, os pais pensam que o filhopor estar em casa está seguro e, noentanto, através das novas tecnologias pode estar em perigo. O ritmo detrabalho dos pais, juntamente com afalta de diálogo, com a solidão, leva a

que estas coisas sejam descobertasmuito tarde.Esta complexidade dos tempos vaiser abordada nas tais formações deparentalidade positiva?A ideia é mesmo essa.A ideia é capacitar a família?A prioridade é sempre trabalhar coma família, porque a prioridade é sem-pre manter os jovens em meio natu-ral de vida. Um dos dramas que en-frentamos hoje é quantidade de fa-mílias onde encontramos problemasde ordem mental, das dependênciase depressões.Relativamente ao objetivo de fazertodos os esforços para manter ascrianças em meio natural de vida,os técnicos têm a ideia clara de queisso é prioritário?Penso que sim.

Pergunto porque já houve históriasno sentido contrário, como o casoda Liliana Melo, a quem foram reti-rados os filhos, por exemplo.As nossas formações servirão paraisso também. Para sublinhar essaideia.Quando começam essas formaçõesde parentalidade positiva?No segundo semestre do ano.O grupo de trabalho que estava noterreno para averiguar se são pre-cisas, ou não, mais famílias de aco-lhimento já apresentou conclu-sões?Não tenho conhecimento ainda dasconclusões. Mas a Comissão Nacio-nal entende que é muito melhor umacriança crescer numa família de aco-lhimento do que numa instituição.Mesmo que a criança vá depois serretirada àquela família e passe poroutra desvinculação?Tudo isso tem de ser trabalhado commuito cuidado, certamente.Há meios e recursos para contornareste problema de saúde mental quese encontra em tantas famílias?Reconheço que quando o bolo não é

muito grande, é difícil a distribuição.Mas tem havido um reforço apostanesta área.Além da parentalidade positiva,que outros objetivos estão na agen-da da nova presidente da ComissãoNacional?São muitos objetivos, mas acima detudo trazer uma maior coesão entre acomissão nacional e as comissões lo-cais, as CPCI. E também passar umamensagem mais positiva do seu tra-balho fantástico, trabalho que geral-mente é muito falado quando as coi-sas não correm bem, mas não é tãofalado quando as coisas resultam.Pode ajudar a construir essa ima-gem positiva alocar às CPCI maistécnicos, uma vez que ainda temoscomissões em que cada técnico temem mãos dezenas de processos?A forma como o nosso sistema depromoção e de proteção está dese-nhado é muito inovadora, até porquecompromete toda a comunidade emtorno das nossas crianças. Infeliz-mente, ainda não temos todos os in-tervenientes conscientes da impor-tância de alocarem recursos às co-missões.O que me está a dizer é que quemconstitui as comissões alargadas[autarquias, segurança social, IPSS,etc] nem sempre disponibiliza osseus elementos a tempo inteiro, es-tando as CPCI com pessoas a tempoparcial...Muitas vezes, porque também nãotêm recursos, acabam por disponibi-lizar pessoas que não têm muito tem-po, ou que o perfil não é o mais ade-quado. Embora, neste momento,creio que se trate mais de uma ques-tão de tempo, o que faz com que mui-tos estejam muito absorvidos pormuitos processos.Bastaria que algumas das pessoasque estão nas CPCI a tempo parcialpassassem a estar a tempo inteiroou, de facto, são necessários técni-cos novos?Se cada um conseguisse cumprircom os tempos de afetação que estãoprevistos, penso que conseguiríamosdar resposta. Naturalmente, há co-missões com volumes processuaiselevados.Portanto, a Comissão Nacional nãopretende alocar mais gente?

Temos noção de que são precisos al-guns reforços e estamos neste mo-mento a fazer uma avaliação no ter-reno, perceber quais são as CPCImais necessitadas. Temos de estaratentos às que têm maior volumeprocessual.Há quem defenda a profissionaliza-ção das comissões para evitar-seesta eterna questão do técnico quedá um pouco de tempo à CPCI, se a

entidade para aqual trabalhapermitir...

Se em vez determos estes par-ceiros todos [au-tarquias, segu-rança social, IPSS,etc] nas comis-

sões alargadas, que depois disponi-bilizam os seus elementos para as co-missões, profissionalizássemos asCPCI, estaríamos a desvirtuar a ideiadeste sistema que compromete todaa comunidade. Mas tem de havermeios, respostas, e reconheço que háfragilidades. Acredito, porém, que omodelo é o indicado.lá fez um périplo pelas CPCI emtodo o território?Fiz apenas encontros com as nossas

equipas regionais, que agora são cin-co: Norte, Centro, LSS - Lisboa, San-tarém e Setúbal, Alentejo e Algarve.Até aqui, estas últimas três eram sóuma.O que é o projeto "selo protetor"?É um projeto recente, lançado em fe-vereiro, que pretende reconhecer,através de um selo de qualidade, asentidades que se assumam comoprotetoras das crianças. As candida-turas decorrem até 31 de março. Se as

instituições cumprirem uma série derequisitos, receberão um selo. •

A presidenteda Comissão Na-cional está

empenhada emmostrar o "traba-lho fantástico"das comissões