pré-resfriamento e conservação de hortaliças folhosas · frutos e hortaliças em geral são...
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FINGER FL; FRANÇA CFM. 2011. Pré-resfriamento e conservação de hortaliças folhosas. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE OLERICULTURA, 51. Horticultura Brasileira 29.
Viçosa: ABH.S5793-S5812
Hortic. bras., v.29, n. 2 (Suplemento - CD ROM), julho 2011 S5793
Pré-resfriamento e conservação de hortaliças folhosas
Fernando Luiz Finger1; Christiane de Fátima Martins França
2
1 Professor Associado– Universidade Federal de Viçosa- Departamento de Fitotecnia. 36570-000 Viçosa-
MG, 2Mestranda em Produção Vegetal - Universidade Federal de Viçosa - Departamento de Fitotecnia.
36570-000 Viçosa- MG, [email protected], [email protected]
PERDAS PÓS-COLHEITA
As perdas pós-colheita das hortaliças podem ser de três tipos: a fisiológica, por
dano mecânico ou pela incidência de parasitas. Estima-se que as perdas acumuladas pós-
colheita em hortaliças oscilem entre 20 e 50% na maioria dos países em
desenvolvimento. Estas perdas podem ser de natureza quantitativa ou qualitativa, porém
independente da natureza da perda, há sempre redução da oferta final de produto
comercializável.
As hortaliças são organismos vivos, e, portanto, sofrem a ação de agentes de
natureza fisiológica ou endógenos e do ambiente (abióticos ou bióticos) durante o
transporte e armazenamento. As perdas durante a cadeia de comercialização são
cumulativas, e decorrem da incidência de um ou mais fatores de deterioração como
segue:
a. Perda física do produto por danos mecânicos ou pela presença de doenças ou insetos.
b. Perda de água pelo processo transpiratório.
c. Perdas por extremos de temperatura – congelamento ou estresse por altas
temperaturas.
d. Redução da energia armazenada (carboidratos ou lipídeos) pelo processo respiratório.
e. Perda da qualidade pela degradação de vitaminas.
f. Desenvolvimento de distúrbios fisiológicos –exposição de alface ao etileno
A colheita das hortaliças no estádio adequado de desenvolvimento e a
manipulação adequada da temperatura, umidade do ar, concentração dos gases
respiratórios O2 e CO2, dos níveis de etileno, redução da incidência de danos mecânicos,
e aplicação de tratamentos fitossanitários, permitem minimizar a ação dos fatores de
deterioração com conseqüente extensão da vida pós-colheita.
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Um dos fatores determinantes da elevada perecibilidade das hortaliças folhosas é
a respiração e a falta da retirada do calor de campo no momento do transporte
refrigerado e armazenamento na prateleira das lojas. Nessa revisão serão abordados
diferentes aspectos da influência da remoção do calor de campo sobre a conservação das
hortaliças folhosas.
IMPORTÂNCIA DA RESPIRAÇÃO
A respiração, para a maioria dos produtos hortícolas é o fator mais importante da
deterioração dos órgãos destacados e a intensidade da atividade respiratória reflete a
velocidade de deterioração dos produtos.
A respiração afeta diretamente diversos aspectos do metabolismo dos produtos
hortícolas:
a. Responsável pela redução, e em alguns casos extremos como em flores, a depleção
das reservas de carbono (amido, açúcares solúveis e ácidos orgânicos). Em frutos e
hortaliças, o consumo das reservas orgânicas reduz o sabor do produto.
b. O calor produzido pela respiração ou também chamado de calor vital, é importante
para estabelecer a capacidade de refrigeração das câmaras frigoríficas durante o
armazenamento.
c. A dissipação do calor produzido pela respiração dá-se via transpiração, reduzindo
assim a vida útil de prateleira dos hortícolas.
Todos os produtos hortícolas continuam respirando apo a colheita, havendo
constante troca de elementos entre o tecido vivo e o ambiente, conforme pode ser
definida pela equação geral da respiração:
C6H12O6 + 6O2 6CO2 + 6H2O + 686 kcal
Portanto, a oxidação completa de uma molécula de glicose consome 6O2 e libera
para o ambiente 6CO2 e 6H2O, possibilitando a geração de 686 kcal, parte liberada na
forma de calor a parte armazenada como ATP. A respiração é um processo pouco
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eficiente de conservação de energia, onde apenas 42 % do potencial da energia
produzida pela oxidação completa da glicose é armazenada na forma de ATP (Kader,
1987). O restante da energia será dissipado na forma de calor para ambiente circundante,
determinando, em parte, o método de resfriamento a ser utilizado, o tipo e dimensão da
embalagem e a altura das pilhas no armazenamento dos produtos hortícolas.
A oxidação completa da glicose pela respiração aeróbica pode ser dividida em
três etapas:
a. Glicólise – oxidação da glicose para piruvato, realizada por um conjunto de enzimas
localizadas no citoplasma.
b. Ciclo do ácido tri-carboxílico – formado por um conjunto de enzimas que catalisam a
oxidação do piruvato para CO2 na mitocôndria.
c. Cadeia de transporte de elétrons – rota onde ocorre a oxidação dos dinucleotídeos
NADH, NADPH e FADH2 para a geração de ATP via duas rotas a citrocromo oxidase e
pela rota alternativa resistente ao cianeto. Os sistemas protéicos oxidativos são
formados na membrana interna da mitocôndria e a reação final de oxidação se dá com
oxigênio molecular formando H2O como produto.
A glicose pode não sofrer completa oxidação pelo processo respiratório, por
deficiência ou ausência de O2, com subsequente acúmulo de piruvato, sendo então
convertido em lactato e/ou etanol e CO2 pela fermentação alcoólica.
PERDA PÓS-COLHEITA DE ÁGUA EM PRODUTOS HORTÍCOLAS
As hortaliças iniciam acelerado processo de deterioração no momento da
colheita, porém a sua velocidade é determinada pela combinação de fatores internos e
externos aos órgãos vegetais.
A temperatura e a umidade do ar são os fatores do meio mais importantes na
determinação da extensão da vida de prateleira dos produtos hortícolas. A respiração e a
produção de etileno dos produtos hortícolas são influenciadas pela temperatura e,
quando ocorrem em taxas elevadas, há redução do período de conservação de frutos e
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hortaliças, porém, em frutos climatéricos como banana e maçã, estas favorecem o
desenvolvimento da qualidade organoléptica ideal para o consumo.
A colheita interrompe o suprimento de água para o órgão vegetal e, assim, a
perda de água subseqüente por transpiração determina, em grande parte, as perdas
quantitativa e qualitativa dos produtos. O murchamento e, ou, enrugamento de frutos e
hortaliças são os sintomas iniciais da excessiva perda de água. Além disso, pode ocorrer
o aceleramento da deterioração pelo aumento da taxa de algumas reações de origem
predominantemente catabólica, como a degradação de clorofila.
NATUREZA E COMPOSIÇÃO DOS PRODUTOS HORTÍCOLAS
Os produtos hortícolas são oriundos de diferentes partes da planta e constituem
estruturas morfológicas distintas, que podem ser classificadas em subterrâneas e aéreas.
A função primária das folhas, enquanto na planta, é a produção de carboidratos
pela fotossíntese. Porém, o seu potencial fotossintético é reduzido após a remoção da
planta; assim, a manutenção das suas funções vitais depende dos carboidratos
armazenados nos tecidos. As espécies de interesse comercial mais comuns deste grupo
são o espinafre (Spinacea oleracea L.), a couve-de-folha (Brassica oleracea L. var.
acephala), o repolho (Brassica oleracea L. var. capitata), a couve-chinesa (Brassica
rapa L. var. pekinensis), a alface (Lactuca sativa L.), o alho-porro (Allium
ampeloprasum L.) e a cebola-de-cheiro (Allium schoenoprasum L.).
As hortaliças folhosas são órgãos que não armazenam quantidade expressiva de
carboidratos e a falta de reserva energética reduz o potencial de armazenamento. Elas
apresentam altas taxas transpiratórias e, portanto, são suscetíveis à rápida desidratação
após a colheita. O conseqüente fechamento dos estômatos das folhas não elimina as
elevadas taxas transpiratórias observadas em produtos como alface, espinafre, couve-de-
folha e cebola-de-cheiro.
COMPOSIÇÃO QUÍMICA
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Os frutos e as hortaliças são importantes fontes de nutrientes na alimentação
humana, apresentando teores de água que variam de cerca de 75 a 94% (Quadro 1).
Embora a água seja o principal componente da matéria fresca de frutos e
hortaliças, estes não toleram perdas elevadas de peso, sem que apareçam sintomas de
murchamento e enrugamento da superfície. Em tubérculos, rizomas e bulbos, há
necessidade de determinada perda de água imediatamente após a colheita, para assegurar
menores perdas de peso ao longo do armazenamento.
Frutos e hortaliças em geral são fontes de carboidratos na forma de açúcares
solúveis ou amido, mas geralmente fornecem baixa quantidade de proteínas ou lipídeos
(Quadro 1). Porém, em algumas variedades de abacate, o teor de lipídeos chega a atingir
20% da matéria fresca do fruto.
Quadro 1 - Composição química de alguns produtos hortícolas.
Produto
Água Carboidratos Proteína Lipídeos _
(%)
Frutos:
Banana
Uva
Maçã
Laranja
Morango
Tomate
Hortaliças:
Batata
75,7 22,2 1,1 0,2
81,6 15,7 1,3 1,0
84,4 14,5 0,2 0,6
86,0 12,2 1,0 0,2
89,9 8,4 0,7 0,5
93,4 2,8 0,9 Traços
75,8 20,8 2,1 0,1
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Repolho
Cebola
Alface
91,9 4,6 1,8 0,1
92,8 5,2 0,9 Traços
93,4 2,5 2,1 0,3
Dados obtidos de Salunkhe e Desai (1984ab).
EFEITOS DA PERDA DE ÁGUA
A redução do peso total e o enrugamento do produto são considerados como
sintomas iniciais da excessiva perda de água. Em temperatura constante, a perda de peso
apresenta correlação linear inversa com a umidade relativa (quando acima de 75%) para
a maioria dos frutos e das hortaliças.
Além do efeito de redução do peso da matéria fresca do produto, a perda de água
pós-colheita exerce profundos efeitos sobre a fisiologia dos produtos hortícolas. De
maneira geral, perda de água excessiva afeta a respiração, produção de etileno,
degradação de clorofila e induz alterações no padrão de síntese de proteínas.
A perda de água acentuada em frutos de banana induz aumento da respiração e
da produção de etileno na fase pré-climatérica (Littmann, 1972; George et al., 1982).
Perdas de peso de 5% induziram aumentos de 70 e 50% na respiração e produção de
etileno, respectivamente, em bananas pré-climatéricas, quando comparadas com frutos
que tiveram 0,5% de perda de peso (Finger et al., 1995).
PERDAS PÓS-COLHEITA
A perda de peso total pós-colheita dos produtos hortícolas é resultado do
somatório da perda de água pela transpiração e perda de matéria seca devida à atividade
respiratória. Baseando-se nas taxas respiratórias desses produtos, vê-se que a perda de
peso pela respiração situa-se entre 3 e 5% da perda total de peso observada na pós-
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colheita (Ben-Yehoshua, 1987). Portanto, a intensidade da transpiração pós-colheita
determina, em grande parte, a taxa de perda de peso total dos produtos hortícolas.
O nível máximo de perda de peso aceitável para produtos hortícolas varia em
função da espécie e do nível de exigência do mercado consumidor. Para a maioria dos
produtos hortícolas frescos, a perda de peso máxima observada sem o aparecimento de
murcha ou enrugamento da superfície oscila entre 5 e 10%.
O Quadro 2 apresenta dados médios de perda de peso máximas em diversos
produtos hortícolas, colhidos no estádio de maturidade ideal para consumo. Esses dados
demonstram que há grande variação na quantidade de perda de peso máxima
estabelecida para os diferentes produtos. Brócolis e couve-flor são produtos altamente
sensíveis à desidratação e não toleram perdas de peso superiores a 4%. Por outro lado,
produtos como cenoura, pimentão e tomate são mais tolerantes à desidratação,
admitindo perdas de peso de 7 a 8%, sem que apresentem sintomas de murcha ou
enrugamento externo.
Quadro 2 - Perda de peso máxima da matéria fresca, em percentagem, admitida para
produtos hortícolas.
Produto
Perda de peso (%)
Hortaliças:
Brócolis
Couve-flor
Alface
Cenoura
4
4
5
8
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Frutos:
Laranja
Maçã
Morango
Pimentão
Tomate
5
5
6
7
7
Dados obtidos de Robinson et al. (1975) e Kays (1991).
UMIDADE DO AR E TEMPERATURA
A umidade da atmosfera e a temperatura são variáveis controláveis no
armazenamento de frutos e hortaliças; contudo, na maioria dos casos, o controle da
umidade do ar é negligenciado ou manejado inadequadamente.
A umidade do ar pode ser expressa de diferentes maneiras, porém as expressões
mais utilizadas referem-se a umidade absoluta, umidade relativa, pressão de vapor e
ponto de orvalho.
Umidade absoluta - define-se como a massa de vapor de água presente em
determinada quantidade de ar seco, em dada temperatura. Usualmente a umidade
absoluta é expressa em g kg-1
ar seco.
Umidade relativa - refere-se a razão entre a pressão de vapor de água do ar e a
pressão de vapor de saturação na mesma temperatura. Normalmente é expressa em
percentagem, variando de 0%, no ar seco, a 100%, em ar completamente saturado com
vapor de água.
Ponto de orvalho - pode ser definido como a temperatura do ar, em pressão
constante, em que se inicia a condensação do vapor de água (100% de umidade
relativa). A condensação de umidade sobre a superfície dos produtos hortícolas, após a
sua retirada das câmaras de refrigeração, evidencia que o ponto de orvalho foi atingido
no ar circundante.
As relações entre temperatura e umidade são visualizadas no gráfico
psicrométrico ( Figura 2).
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Figura 2 - Representação do gráfico psicrométrico.
A umidade do ar é determinada pela temperatura do termômetro de bulbos seco e
úmido (linha de 100% de umidade relativa), definindo assim o ponto de estado do ar
atmosférico. Exemplo de definição do ponto de estado do ar atmosférico com o auxílio
do gráfico psicrométrico: temperatura do bulbo seco, 25oC; temperatura do bulbo
úmido, 22oC. Nessas condições de temperatura dos bulbos seco e úmido, a umidade
relativa é de 78%; a pressão de vapor de água é de 22,5 mBar; o ponto de orvalho de
21oC; e a umidade absoluta é de 15,2 g kg
-1 ar seco.
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A combinação de ar seco com vapor de água exerce certa pressão parcial e, em
determinada pressão barométrica, há correlação entre umidade absoluta e pressão de
vapor, independente da temperatura. A pressão de vapor é usada como expressão do
nível de umidade, e das diferenças de pressão de vapor entre dois pontos. A quantidade
de vapor de água presente no ar de armazenamento exerce grande efeito sobre a taxa de
movimento de água do interior do tecido para a atmosfera circundante. O gradiente de
pressão de vapor entre o produto e o ar circundante determina, em grande parte, a taxa
de transferência de água do produto para o ambiente (Grierson e Wardowski, 1975).
Desse modo, o controle das condições de umidade do ar de armazenamento é
determinante para evitar a desidratação de frutos e hortaliças em geral. Para o
estabelecimento do gradiente de pressão de vapor entre o produto e o ambiente,
considera-se que a umidade relativa nos espaços intercelulares e a superfície dos
produtos hortícolas seja igual a 100%. Assim, um produto com temperatura de 20oC terá
uma pressão de vapor de água de 22 mBar. Nessa temperatura, a pressão de vapor de
água do ambiente será dependente da umidade do ar de armazenamento, estabelecendo,
assim, o gradiente de pressão de vapor e, conseqüentemente, a intensidade de perda de
água do produto para o ar circundante.
PERDA DE ÁGUA
A taxa de perda de água pelos produtos hortícolas é função da interação entre
fatores do meio e internos dos órgãos vegetais. A temperatura, umidade e velocidade do
ar são fatores de meio determinantes do controle e da redução das perdas de água pós-
colheita em frutos e hortaliças. Porém, fatores inerentes aos produtos, como relação
superfície/volume, natureza da superfície protetora e integridade física, determinam, em
parte, a taxa de difusão do vapor de água do produto para o ambiente.
RELAÇÃO SUPERFÍCIE/VOLUME
As trocas gasosas entre determinado produto hortícola e o ambiente são
influenciados pela razão entre a área e o volume do produto, ou seja, a superfície
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específica. Admitindo que a forma do produto seja constante, a superfície específica
aumenta com a redução do tamanho. Logo, a perda de vapor de água por transpiração
será mais elevada para produtos com maior relação superfície/volume.
A relação superfície/volume varia em função do tamanho e da forma do produto
hortícola (Quadro 3).
Quadro 3 - Relação superfície/volume de alguns produtos de origem vegetal.
Relação superfície/volume
(cm2 cm
-3)
Produto
50 – 100
10 – 15
5 – 10
2 – 5
0,5 - 1,5
0,2 - 0,5
Folhas individuais, sementes pequenas
Grãos de cereais
Frutos pequenos (framboesa), sementes de leguminosas
Frutos médios (morango), acelga, nozes
Tubérculos, raízes, cebolas, bananas, frutos cítricos,
maçãs, pêras, pêssegos, pepinos, abóboras italianas
Repolho, inhame, abóboras maduras
Dados obtidos de Kays (1991).
NATUREZA DA SUPERFÍCIE PROTETORA
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A natureza e os tipos de estruturas superficiais de proteção em frutos e hortaliças
afetam a taxa de perda de água. Cutículas, películas e periderme são estruturas de
proteção que restringem em parte a passagem de vapor de água para o exterior dos
órgãos.
Cutícula - consiste na camada cerosa que recobre a superfície das células
epidérmicas geralmente presentes em folhas e frutos. As ceras são formadas por
diferentes lipídios esterificados, dificultando a penetração de patógenos e a passagem de
vapor de água. A estrutura química das ceras parece ser mais importante que a espessura
no controle da difusão do vapor de água através da cutícula. Lownds et al. (1994)
observaram que houve variação de até 60% na perda de peso entre nove cultivares de
pimentão quando os frutos foram armazenados em temperatura e umidade semelhantes.
Essa variação sugere a existência de diferentes graus de permeabilidade das cutículas ao
vapor de água entre as cultivares estudadas.
Películas - estão presentes em bulbos de cebola e alho. As películas externas
desses órgãos são formadas por uma a três bainhas de folhas. O secamento parcial das
películas é denominado “cura”, pelo qual se forma uma estrutura de proteção que auxilia
na manutenção da dormência, restringe o fluxo de vapor de água e dificulta a penetração
de fungos e bactérias (Brewster, 1994). A cura em bulbos de cebola promove reduções
na perda de peso superiores a 50%, durante o período de armazenamento, em relação à
observada em bulbos não curados. Na maioria das cultivares de cebola, a cura se
completa após um período de 14 a 17 dias, entre 16 e 27oC e umidade relativa de 70-
80% (Salunkhe e Desai, 1984b).
CAMADA DE AR LIMÍTROFE
A camada de ar limítrofe pode ser definida como uma fina camada de ar
adjacente à superfície dos produtos hortícolas. A pressão de vapor de água da camada de
ar limítrofe apresenta-se próxima ao equilíbrio com a pressão de vapor de água nos
espaços intercelulares do produto e representa uma barreira ao movimento de gases,
como vapor de água, gás carbônico, oxigênio e etileno.
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A influência do vento sobre a taxa de perda de água de produtos colhidos deve-
se ao efeito que o movimento do ar exerce sobre a espessura da camada de ar limítrofe.
A elevação da turbulência na superfície do produto reduz a espessura da camada de ar
limítrofe, elevando a diferença de pressão de vapor de água entre o produto e o
ambiente, com conseqüente aumento da perda de água. Porém, um movimento mínimo
de ar deve ocorrer nas câmaras de armazenamento de modo a remover o calor produzido
pelo produto. Correntes de ar superiores a 50 m min-1
tendem a romper o equilíbrio da
camada de ar limítrofe, causando redução da umidade relativa e elevação da
transpiração de frutos e hortaliças (Ben-Yehoshua, 1987).
MEDIDAS DE CONTROLE DA PERDA DE ÁGUA
Diversas medidas de controle da perda de água podem ser tomadas de modo a
retardar ou prevenir o murchamento durante o armazenamento e a comercialização.
Todas as medidas de controle da perda de água objetivam reduzir a capacidade do ar
circundante de absorver vapor de água da superfície do produto. Tal efeito pode ser
obtido pela redução da temperatura, elevação da umidade do ar e adição de barreiras
protetoras que reduzem o movimento de vapor de água para o exterior do produto.
PRÉ-RESFRIAMENTO
O termo pré-resfriamento é usado para qualquer tratamento de resfriamento
rápido aplicado ao produto antes do transporte, armazenamento ou processamento
(Wills et al, 1998). Uma definição mais específica refere-se aos métodos através dos
quais o produto é resfriado em período menor que 24 horas após a colheita, com
objetivo principal de remover o calor de campo. A temperatura das hortaliças quando da
colheita é próxima a temperatura ambiente e dependendo da hora do dia pode atingir
40ºC na horas mais quentes. Caso esse calor não seja removido, há intensa perda de
massa fresca devido as elevadas taxas de perda de água que estão associadas a produtos
com elevada relação superfície/volume como as folhasas e inflorescências.
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A taxa de resfriamento de um produto hortícola depende de:
Diferença de temperatura entre o produto e o meio de resfriamento
Acesso do meio de resfriamento ao produto
Natureza do meio de resfriamento
Velocidade de resfriamento do meio utilizado
Taxa de transferência de calor do produto para o meio de resfriamento
Métodos de pré-resfriamento:
A. Gelo
Primeiro método de pré-resfriamento utilizado
Chamado de resfriamento por contato
Mistura para resfriamento 40% água fria + 60% gelo + 0,1% sal
B. Sala de resfriamento
Colocação do produto em câmara fria de pré-resfriamento para facilitar a
comercialização
Sala deve apresentar ventiladores para forçar o ar frio pelo produto
Velocidade do ar entre 40 a 60 m min-1
Baixo custo
C. Ar forçado frio
Calor do produto é removido por jato de ar frio
Promove rápida remoção do calor
Velocidade do ar entre 200 a 400 m min-1
Umidade do ar deve ser próxima a 100% para evitar desidratação do produto
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D. Hidroresfriamento
Água como meio de resfriamento
Resfriamento rápido
Ausência de desidratação do produto
Temperatura da água deve estar próxima a OoC
Ajuda a limpar o produto
Pode haver contaminação por microrganismos
Sistema de imersão ou jatos de água
E. Resfriamento a vácuo
Baseia-se no calor latente de vaporização da água
Em pressão de 760 mm Hg a ebulição da água ocorre a 100oC; a 4,6 mm Hg ocorre a
0oC
Redução de 5 a 6oC equivale a 1% de perda de massa fresca
Produtos devem ter alta relação superfície/volume para adequado resfriamento
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REFERÊNCIAS
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