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Prática de Leitura e Escrita

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Prática de Leitura e Escrita

Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Material Teórico

Responsável pelo Conteúdo: Profa. Ms. Helba Carvalho

Revisão Textual:Profa. Ms. Silvia Augusto Albert

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• Estrutura do parágrafo

• A coesão e a coerência no parágrafo

· Nesta unidade – “Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais”– você encontrará, no texto teórico, as características do parágrafo: a estrutura do parágrafo padrão, além de tipos de tópicos frasais e tipos de desenvolvimento do parágrafo. Além disso, estudaremos nessa unidade quais os mecanismos de coesão e de coerência devemos utilizar para que um parágrafo tenha unidade de sentido e, portanto, maior clareza em sua expressão.

Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Atenção

Para um bom aproveitamento do curso, leia o material teórico atentamente antes de realizar as ativi-dades. É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Contextualização

Você, como futuro licenciado em Letras, portanto, tendo recebido a formação para ser professor, deve ter o texto como instrumento de trabalho no cotidiano escolar, pois a leitura e a escrita são fatores fundamentais para a inclusão social e inserção do aluno no mundo letrado.

Saiba que o conteúdo estudado nesta unidade mostra que em qualquer situação de comunicação escrita em prosa você utilizará a estrutura básica do parágrafo, e como professor, deverá dominá-la.

Em uma atividade de produção de texto em prosa, em sala de aula, você, como professor, poderá orientar a seguinte atividade: propor um determinado tema, por exemplo, “o uso abusivo do celular” e dividir a sala em três grandes grupos para que produzam, cada um, um tipo de parágrafo sobre esse tema: narrativo, descritivo e dissertativo.

Ao final da produção, você pode escolher dois parágrafos de cada tipo e apresentar aos alunos a estrutura de cada parágrafo, analisando com eles se os mecanismos de coesão estão sendo utilizados corretamente, se há coerência e, principalmente, como podemos produzir tipos de parágrafos diferentes a partir de um mesmo tema, ressaltando as diferenças entre o narrativo, o descritivo e o dissertativo.

Mostre aos seus alunos que uma boa redação começa com um bom parágrafo escrito!

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Estrutura do parágrafo

No processo da escrita, alguns elementos e mecanismos são essenciais para dar unidade ao texto, configurando sua completude e clareza na expressão. Nessa unidade, veremos que tanto a organização do texto em parágrafos quanto a coerência e a coesão textuais permitem estabelecer uma lógica interna do texto. As duas últimas criam elos pontuais entre as partes do texto, conforme veremos a seguir.

Você já deve ter se perguntado: qual a importância de se usar o parágrafo? A paragrafação é “um recurso que permite organizar as ideias apresentadas em um texto, agrupando-as em parágrafos ou blocos textuais que reúnam as frases que vão compô-lo” (GOLDSTEIN; LOUZADA; IVAMOTO, 2009, p. 31).

Como recurso visual e gráfico, sabemos que toda vez que se escreve um parágrafo é feito um recuo junto à margem esquerda do texto e que a tendência é que não se escrevam parágrafos muito longos. Essas informações elementares parecem ser de domínio de quem escreve, porém, para que você possa entender melhor a importância de um parágrafo bem estruturado, é preciso perceber que cada parágrafo carrrega um tema ou ideia central.

Além disso, o parágrafo deve apresentar as seguintes características:

Unidade: cada parágrafo deve ter apenas uma ideia central à qual as demais ideias devem estar relacionadas, sem desvios que possam quebrar a unidade;

Coerência: a ideia principal do parágrafo deve ficar evidente, bem como a relação de sentido entre ela e as demais informações presentes no mesmo parágrafo;

Clareza: o parágrafo deve apresentar com clareza as informações necessárias para a compreensão do assunto tratado.

(GOLDSTEIN; LOUZADA; IVAMOTO, 2009, p. 32).

Pensando nessas características apontadas pelas escritoras, em destaque no quadro, você pode notar, no exemplo a seguir, que os elementos de coesão (que serão vistos mais adiante) podem ligar uma frase à outra, mas é preciso pensar na coerência, ou seja, na unidade de sentido do parágrafo. Isso significa que o texto pode ser coeso sem ser coerente, como no exemplo de Koch & Travaglia (1997):

João vai à padaria. A padaria é feita de tijolos. Os tijolos são caríssimos. Também os mísseis são caríssimos. Os misseis são lançados no espaço. Segundo a teoria da Relatividade o espaço é curvo. A geometria Rimaniana dá conta desse fenômeno.

Não é possível dizer que há total falta de coesão a esse parágrafo. Mas de que ele trata mesmo? De João? Da padaria? Dos mísseis? Fica difícil dizer. Embora ele procure estabelecer alguma coesão entre as frases, encadeando o que se diz anteriormente, não constrói uma coerência, uma unidade de sentido.

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Você deve ter observado que, apenas, retomar a cada frase uma palavra da frase anterior não significa que o parágrafo ficará coerente. A coesão e a coerência são processos que caminham juntos, são interdependentes. Mas retornaremos a esses dois princípios de textualidade, mais adiante.

Vamos começar a falar da constituição, da construção de um parágrafo?

O parágrafo, além de apresentar unidade, coerência e clareza, conforme Goldstein, Louzada e Ivamoto, a partir de um determinado padrão, é constituído de:

1) Tópico frasal: formado, geralmente, por um ou dois períodos breves, os quais trazem a ideia núcleo do parágrafo. Do ponto de vista gráfico, o final do tópico frasal vem sinalizado por algum sinal de pontuação: ponto, vírgula, ponto-e-vírgula, travessão;

2) Desenvolvimento: é a parte do parágrafo na qual o conteúdo do tópico frasal será especificado, expandido. É certo que nem todo parágrafo apresenta essas características: às vezes, o tópico frasal, ou seja, a ideia núcleo vem diluída nele, sendo apenas evocada por palavras de referências. Mas, na maioria deles, o tópico frasal aparece logo no início, seguido do desenvolvimento;

3) Conclusão: consiste na parte do parágrafo que apresenta, de modo conciso, consequências, implicações ou até mesmo inferências. Nem todos os parágrafos apresentam a conclusão, somente quando o parágrafo sozinho constitui o texto é que a conclusão aparece obrigatoriamente.

Agora vamos ver um exemplo de parágrafo bem estruturado, com coerência, coesão, unidade e clareza?

“Viver é mesmo uma ginástica. O coração se contorce para bombear o sangue que, por sua vez, corre o corpo inteiro. A respiração estica e encolhe os pulmões. O aparelho digestivo se dobra e desdobra com o alimento. Tudo na vida animal é movimento - músculos que se contraem, músculos que se estendem. Graças a cerca de 650 músculos o homem pode, além de viver, ficar em pé, andar, dançar, falar, piscar os olhos, cair na gargalhada, prorromper em lágrimas, expressar no rosto suas emoções, escrever e ler este texto. Portanto, o desempenho da musculatura é muito mais forte que mera força bruta.” (Revista Superinteressante, n.2, 1988).

No exemplo anterior, note que o parágrafo apresenta um tópico frasal (“Viver é mesmo uma ginástica”), ou seja, é a ideia núcleo do parágrafo formado por um período curto e que apresenta o assunto do texto. Na sequência, você pode observar o desenvolvimento do tópico frasal, expandindo e especificando, de forma clara e coerente, como viver exige certa ginástica de todos os órgãos do corpo humano. Por fim, o último período (“Portanto, o desempenho da musculatura é muito mais forte que mera força bruta.”), de modo conciso e conclusivo, finaliza o texto ressaltando a importância do desempenho da musculatura e argumentando que os músculos não servem apenas para “a força bruta”, ou seja, para lutar ou carregar pacotes. Creio que há uma intenção na conclusão de levar o leitor a refletir sobre o que se fala no “senso comum” sobre a função dos músculos no corpo humano. Há a intenção de fazer o leitor ampliar seus conhecimentos e sair do “senso comum”. Concorda? Releia o parágrafo para refletir sobre o que dissemos acima.

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Você deve notar também que os parágrafos são, normalmente, descritivos, narrativos ou dissertativos. O parágrafo que acabamos de ver é um bom exemplo de parágrafo dissertativo, na medida em que se observa uma posição defendida pelo autor do texto (“viver é mesmo uma ginástica”) que se apoia em exemplos de órgãos do corpo humano que realizam “uma ginástica” para manter o corpo vivo. Além disso, as formas verbais no presente do indicativo acentuam a posição defendida pelo autor, bem como a permanência da verdade afirmada e a intenção final de ampliar conhecimentos e a reflexão do leitor sobre o tema.

E o parágrafo descritivo? Como se caracteriza? Vamos ver dois exemplos num mesmo trecho?

“Era um burrinho pedrês, miúdo e resignado, vindo do Passa-Tempo, Conceição do Serro, ou não sei onde no sertão. Chamava-se Sete-de-Ouros, e já fora tão bom, como outro não existia e nem pode haver igual.

Agora, porém, estava idoso, muito idoso. Tanto que nem seria preciso abaixar-lhe a maxila teimosa, para espiar os caldeirões dos dentes. Era decrépito mesmo à distância: no algodão bruto do pêlo - sementinhas escuras em rama rala e encardida; nos olhos remelentos, cor de bismuto, com pálpebras rosadas, quase sempre oclusas, em constante semi-sono; e na linha fatigada e respeitável - uma horizontal perfeita, do começo da testa à raiz da cauda em pêndulo amplo, para cá, tangendo as moscas.” (ROSA, 1984, p.17)

Perceba que, no texto de João Guimarães Rosa, o burrinho pedrês é singularizado, caracterizado por diferentes adjetivos, como “miúdo”, “resignado”, “idoso” etc. Também, nos dois parágrafos descritivos, você pode notar a presença das formas verbais no pretérito imperfeito, como “era”, “chamava”, “existia”, “estava” etc, sugerindo uma continuidade no passado.

É importante você observar que na descrição não há uma ordem determinada, isso significa que o autor poderia alterar a ordem das frases sem alterar o sentido do parágrafo. Ele poderia ter começado o parágrafo com a frase “Chamava-se Sete-de-Ouros, e já fora tão bom,...” e, na sequência, “Era um burrinho pedrês...” Essas alterações, no primeiro parágrafo, revelam que as características descritas não indicam relações de anterioridade ou causalidade, mas sim propriedades e aspectos presentes numa situação.

No parágrafo narrativo, no lugar de uma sequência de estados, como aquela que acabamos de ver na descrição do “burrinho pedrês”, temos uma sequência de ações expressas por formas verbais no pretérito perfeito do indicativo ou pretérito mais-que-perfeito do indicativo, além de relatar um acontecimento ou uma sucessão de fatos em sequência, como você pode observar no parágrafo seguinte, do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis:

Naquele dia, a árvore dos Cubas brotou uma graciosa flor. Nasci; recebeu-me nos braços a Pascoela, insigne parteira minhota, que se gabava de ter aberto a porta do mundo a uma geração inteira de fidalgos. Não é impossível que meu pai lhe ouvisse tal declaração; creio, todavia, que o sentimento paterno é que o induziu a gratificá-la com duas meias dobras. Lavado e enfaixado, fui desde logo o herói da nossa casa. Cada qual prognosticava a meu respeito o que mais lhe quadrava ao sabor. Meu tio João, o antigo oficial de infantaria, achava-me um certo olhar de Bonaparte, coisa que meu pai não pôde ouvir sem náuseas; meu tio Ildefonso, então simples padre, farejava-me cônego. (...) (ASSIS, disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000167.pdf,acesso em maio de 2013)

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Note que no parágrafo anterior, o narrador, Brás Cubas, apresenta uma sequência de ações, transformações em torno do acontecimento: o nascimento do narrador protagonista, a ação da parteira, os prognósticos dos tios. Observe, também, a presença, principalmente, das formas verbais no pretérito perfeito do indicativo, como “brotou”, “nasci”, “recebeu”, “fui” e atente para a sequência de ações que revelam uma sucessão no tempo e uma relação de anterioridade e posterioridade. Isso significa, por exemplo, que as opiniões dos tios sobre o futuro de Brás Cubas são apresentadas depois do nascimento do protagonista.

É importante lembrar que mesmo em um parágrafo predominantemente narrativo podemos encontrar sequências descritivas ou expressões que caracterizem algo, no caso, o próprio Brás Cubas, “herói de nossa casa”, como ele mesmo disse, e os tios que o viam futuramente como “cônego” e com “um certo olhar de Bonaparte”.

Vimos os tipos de parágrafos, vamos ver agora como você pode iniciar um parágrafo?

A forma mais comum de iniciar um parágrafo é a declaração inicial. Trata-se de uma afirmação inicial que é rodeado por ideias secundárias que a justificam e costuma vir na introdução do texto. Veja o exemplo a seguir:

“A prática da redação é muito importante para a formação profissional. Não é apenas por causa da necessidade de redigir cartas, relatórios, ofícios e, eventualmente, artigos que um agrônomo, por exemplo, precisa saber escrever. A prática da redação é fundamentalmente um excelente treinamento para a organização do raciocínio e para o desenvolvimento da capacidade de se expressar”. (MORENO; GUEDES, 1989, p.72).

Como afirma Goldstein, Louzada e Ivamoto (2010, p.40), “a declaração inicial aproveita-se de um dado conhecido por todos no princípio”, ou seja, de que a prática de redação é fundamental para a formação profissional. Note como, na sequência, os autores justificam como é importante a redação na forma de “organização do raciocínio” e “o desenvolvimento da capacidade de se expressar”.

Outra forma de você iniciar um parágrafo é com a interrogação, apresentando uma ou mais perguntas, uma reflexão sobre o que se está discutindo. Normalmente, responde-se à questão na sequência, como no seguinte exemplo:

“Por que me lembraria agora daquela velhinha de Florença? Há sentimentos antigos, dentro de nós, que não perdem a força, que não se deixam aniquilar pelo tempo e pelos acontecimentos; estão apenas reclinados como em cadeiras invisíveis, numa obscura sala de espera.” (MEIRELES, 1973, p.24).

No primeiro parágrafo da crônica “Uma velhinha em Florença”, de Cecília Meireles, é possível observar que a pergunta inicial se não é respondida logo depois, é refletida na sequência, na medida em que se fala sobre lembranças, sentimentos antigos que não podem ser esquecidos como a lembrança daquela velhinha de Florença.

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A definição é uma outra maneira de iniciar o parágrafo. Partimos do conceito de algo, de uma ideia, normalmente o foco do tema, o que se assemelha muito ao que faz o dicionário. Veja o exemplo:

“A conversação é uma atividade lingüística básica, que pertence às práticas diárias de qualquer cidadão, independente de seu nível sócio cultural. Ela representa o intercurso verbal em que duas ou mais pessoas se alternam, discorrendo livremente sobre questões propiciadas pela vida diária”. (CASTILHO, 1986, p. 21)

No exemplo, observe como o autor Ataliba de Castilho define, inicialmente, o que é a conversação para, depois, expandir o conceito acrescentando outras ideias relacionadas ao assunto, como a do “intercurso verbal”, alternada por duas ou mais pessoas no momento da conversação.

Outra possibilidade de iniciar um parágrafo é por meio da oposição e comparação, o que subdivide o parágrafo em dois grupos de ideias de posições diferentes sobre um mesmo tema. No famoso texto de Rui Barbosa “Política e Politicalha”, citado no livro de Othon Moacir Garcia (2001), você pode encontrar um bom exemplo de oposição e comparação, como se observa:

Política e politicalha não se confundem, não se parecem, não se relacionam uma com a outra. Antes se negam, se excluem, se repulsam mutuamente. A política é a arte de gerir o Estado, segundo princípios definidos, regras morais, leis escritas, ou tradições respeitáveis. A politicalha é a indústria de explorar o benefício de interesses pessoais. (BARBOSA apud GARCIA, 2001, p. 232)

Marcado por contraste, o parágrafo se inicia com frases que comparam e opõem a política à politicalha. Note como o autor, Rui Barbosa, marca antiteticamente o sentido de cada palavra, realçando o sentido contrário de cada uma.

Podemos iniciar o parágrafo também por uma citação. Nesse caso, logo no início utilizamos a fala de alguém, o discurso de uma autoridade no assunto, por exemplo, recortada por aspas no caso de citação direta, informando o autor do dito, depois (ou antes). Esse tipo de início de parágrafo é Importante na sustentação do que se defende. Vamos ver o seguinte exemplo:

Ser ou não

Disse Alexandre Dumas que Shakespeare, depois de Deus, foi o poeta que mais criou. Aos 37 anos, já escrevera 21 peças e inventara uma forma de soneto. Era um rico proprietário de terras e sócio do Globe Theatre, de Londres. Suas peças eram representadas regularmente para a rainha Elizabeth I. Na Tragégia de Hamlet, Príncipe da Dinamarca, publicada em 1603, Shakespeare superou a si mesmo, tomando uma antiga história escandinava de fraticídio e vingança e transformou-a numa tragédia sombria sobre a condição humana, traduzida quase 1000 vezes e encenada sem cessar. Sarah Bernhardt, John Gielgud, Laurence Olivier, John Barrymore e Kenneth Branagh, todos buscaram entender o melancólico dinamarquês.

(Veja - especial do Milênio, disponível em http://pt.scribd.com/doc/118807916/Guia-de-Producao-Textual, acesso em 12 de maio de 2013)

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Você observou como é possível introduzir um parágrafo citando o pensamento ou apoiando-se em palavras de especialistas no assunto? No caso, o autor desse parágrafo utilizou a citação indireta do romancista francês Alexandre Dumas para ressaltar a importância de Shakespeare para a literatura inglesa e universal.

Por último, temos a alusão. Esse é um recurso muito utilizado tanto em textos que remetem a fatos corriqueiros ou já acontecidos, podendo-se voltar ao passado para comparar o que acontece hoje quanto em textos informativos, para fazer referências a localizações geográficas e a dados estatísticos. No exemplo novamente de um texto de Rui Barbosa, você pode observar como o autor se refere a um fato já acontecido:

“Conta uma tradição cara ao povo americano que o Sino da Liberdade, cujos sons anunciaram, em Filadélfia, o nascimento dos Estados Unidos, inopinadamente se fendeu, estalando, pelo passamento de Marshall. Era uma dessas casualidades eloqüentes, em que a alma ignota das coisas parece lembrar misteriosamente aos homens as grandes verdades esquecidas.” (BARBOSA apud GARCIA, 2001, p. 210).

Observe que a partir de uma alusão a um episódio da tradição histórica do povo americano, Rui Barbosa faz uma reflexão a partir do Sino da Liberdade (1752) que tanto marcou, com seus badalos, o movimento abolicionista e a independência norte-americana (1776), quanto à morte de John Marshall em 1835, conhecido como um dos participantes da Revolução Americana.

Já vimos algumas formas de iniciar um parágrafo. Agora, vamos ver as diferentes maneiras de se desenvolver um parágrafo?

Você pode desenvolver o parágrafo de diversas maneiras, uma delas é a oposição ou contraste e comparação que já vimos no texto de Rui Barbosa sobre a oposição entre política e politicalha. Retome o parágrafo e note que o autor, ao comparar os dois termos, deixa clara a definição de cada um, revelando como a politicalha corrompe os ideais básicos da política.

Outra forma de você desenvolver um parágrafo está na enumeração ou descrição de detalhes, como notamos no parágrafo inicial de O Mulato, de Aluísio Azevedo, citado como um exemplo desse tipo de desenvolvimento por Othon Moacir Garcia:

Era um dia abafadiço e aborrecido. A pobre cidade de São Luís do Maranhão parecia entorpecida pelo calor. Quase que se não podia sair à rua: as pedras escaldavam; as vidraças e os lampiões faiscavam ao sol como enormes diamantes, as paredes tinham reverberações de prata polida; as folhas das árvores nem se mexiam; as carroças d’água passavam ruidosamente a todo o instante, abalando os prédios; e os aguadeiros, em mangas de camisa e pernas arregaçadas, invadiam sem-cerimônia as casas para encher as banheiras e os potes. Em certos pontos não se encontrava viva alma na rua; tudo estava concentrado, adormecido; só os pretos faziam as compras para o jantar ou andavam no ganho. (AZEVEDO, disponível em http://narradoresdoreconcavo.com.br/listas/arquivos/484/lit_o_mulato.pdf, acesso em 17 de maio de 2013)

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“O dia abafadiço e aborrecido” é descrito nos detalhes de tudo o que se pode encontrar neste espaço: “pedras” que “escaldavam”, “as vidraças e os lampiões” que “faiscavam ao sol”, o reflexo da prata polida nas paredes, as árvores que não se mexiam e a ausência de pessoas nas ruas, enfim, os detalhes são enumerados pelo narrador exemplificando “o dia abafadiço”.

A relação de causa e efeito é também outra possibilidade desenvolver o parágrafo. Em Goldstein, Ivamoto e Louzada (2010, p.44), temos um exemplo desse desenvolvimento:

A indústria do plástico alegará em uma campanha publicitária que suas sacolinhas não são danosas ao ambiente. A justificativa é que quase 100% delas são reutilizadas em geral para embalar lixo. O problema é que muitas se rasgam com facilidade. Por isso, a indústria fará uma campanha junto ao comércio para que compre apenas sacolinhas com certificado de resistência.

Veja. São Paulo: 28 maio 2008, p.40 apud GOLDSTEIN; LOUZADA; IVAMOTO (2010, p.44)

No parágrafo, o que aparece em negrito, segundo as autoras, são causas para que a indústria do plástico divulgue uma campanha publicitária. Sobre suas sacolinhas (não danosas) está o fato de que elas são reutilizadas para embalar lixo. Ao fato de se rasgarem com facilidade (causa), coloca-se em seguida o efeito, isto é, promover uma campanha publicitária que enfatize a compra de sacolinha com certificado de resistência.

Até o momento, vimos como se estrutura um parágrafo, a partir de alguns exemplos de tipos de tópicos frasais e tipos de desenvolvimentos que produziram textos coesos e coerentes, com unidades de sentido e clareza. Mas quais são os elementos de coesão/coerência que promovem uma organização lógica, revelando um encadeamento de ideias, garantindo, assim, a construção de sentidos na ligação de uma frase com outra? Este é o assunto do nosso próximo item.

A coesão e a coerência no parágrafo

Vimos, no início dessa unidade, que a coesão e a coerência devem caminhar juntas em um texto. A coerência é a lógica interna do texto, que se revela na medida em que há uma progressão das ideias partindo de um tema ou assunto inicial. As ideias se articulam ao longo do parágrafo, construindo uma unidade de sentido. Segundo Goldstein, Louzada e Ivamoto, para garantir a coerência de um texto deve-se considerar:

1. acontinuidade de sentido, caracterizada pela manutenção do assunto central e pelo desenvolvimento desse assunto de modo progressivo e claro;

2. a sequência lógica das ideias: das mais gerais às mais específicas ou o inverso;3. a manutenção da mesma pessoa verbal ao longo do texto;4. a adequação da variante linguística utilizada ao contexto da comunicação e ao gênero

textual escolhido;

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

5. a descrição espacial ordenada: dos dados mais próximos aos mais distantes ou o contrário;6. as indicações temporais, situando o assunto em relação a fatos anteriores ou posteriores;7. a adequação do título ao contexto. (GOLDSTEIN; LOUZADA; IVAMOTO, 2010, p.24)

Para construir e manter a coerência no texto é fundamental estar atento aos processos de coesão textual, que vão permitir estabelecer ligações entre as partes do texto pela retomada de palavras, pela repetição, pela substituição de um termo por outros, sejam por outros nomes, expressões ou pronomes, ou pelo uso de palavras que liguem frases e palavras do texto (essas palavras são os conectivos: conjunções, preposições, pronomes relativos etc.).

Sendo assim, podemos dizer que coesão será do tipo referencial, quando retomar termos por meio da substituição, de repetição da própria palavra ou elipse; e será do tipo sequencial, na medida em que estabelecer elos entre as palavras, frases e orações que compõem o texto. (GOLDSTEIN; LOUZADA; IVAMOTO, 2010, p.27).

Vamos ver agora como esses mecanismos de coesão aparecem no parágrafo do texto a seguir, de Rubem Braga, intitulado “O Pavão”:

Eu considerei a glória de um pavão ostentando o esplendor de suas cores; é um luxo imperial. Mas andei lendo livros, e descobri que aquelas cores todas não existem na pena do pavão. Não há pigmentos [...]. O que há [...]são minúsculas bolhas d’água em que a luz se fragmenta, como em um prisma. O pavão é um arco-íris de plumas. (...)(BRAGA, 1960, p. 149)

Note que o parágrafo apresenta diversos mecanismos de coesão. Quanto ao tipo referencial, ele pode ser observado tanto na a repetição da palavra “pavão”, que aparece sublinhada, e na sua substituição em “arco-íris de plumas” quanto nas elipses destacadas nas chaves que retomam a expressão “na pena”.

Já as palavras assinaladas em retângulos representam a coesão do tipo sequencial, ou seja, são conectivos (termos que ligam duas palavras, expressões ou orações) como o e, que tem o valor adicional (“andei lendo livros” e (somado a isso, acrescido a isso) descobri”; ao passo que o em que ( preposição “em” + pronome relativo “que”) funciona como ligação entre as expressões “bolhas d’água” e “luz” (uma anterior e outra posterior) indicando relação de lugar (a luz se fragmenta nas minúsculas bolhas d’água).

Vale assinalar que este último caso, pode ser exemplo tanto de coesão sequencial, por estabelecer uma relação sintática, quanto de coesão referencial, por retomar um termo anterior (“minúsculas bolhas d’água”).

Por fim, é importante observar que a coerência no parágrafo ocorre não apenas pelos elementos de coesão citados, mas também pela forma como o tema central, o pavão, apresenta uma progressão, permitindo uma unidade ao texto, desde o título.

Nessa unidade, apresentamos alguns conceitos e pudemos refletir juntos sobre importantes mecanismos e recursos que auxiliam tanto no processo de produção escrita como no de leitura, na medida em que possibilitam a construção de sentidos no texto: por um lado, eles auxiliam a produzir uma expressão mais clara e organizada daquilo que ser quer dizer (escrita) e, por outro, auxiliam a obter uma compreensão mais adequada e apurada daquilo que foi dito (leitura).

Procure fazer um quadro síntese com as ideias aqui apresentadas, não só para seus estudos, mas também para sua consulta durante a leitura e a escrita de seus textos.

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Material Complementar

Para saber mais sobre a construção do parágrafo e a importância de conhecer bem esses mecanismos para sua formação na graduação, leia o Capítulo 1 do livro Metodologia da Pesquisa e da Produção Científica.

Disponível no link: http://lms.ead1.com.br/webfolio/Mod3936/mod_metodologia_v1.pdf#page=11

Nesse texto, você encontrará também importantes informações sobre as características da linguagem acadêmica.

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Unidade: Estrutura do parágrafo, coesão e coerência textuais

Referências

ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Disponível em http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000167.pdf, acesso em 12 de maio de 2013.

AZEVEDO, Aluísio. O Mulato. Disponível em http://narradoresdoreconcavo.com.br/listas/arquivos/484/lit_o_mulato.pdf, acesso em 17 de maio de 2013.

BRAGA, Rubem. Ai de ti, Copacabana. Rio de Janeiro, Editora do Autor, 1960.

CASTILHO, A. T. de. Uma proposta para o ensino de gramática no 1.o e 2.° Graus. Campinas, UNICAMP, 1986.

GARCIA, Othon Moacir. Comunicação em prosa moderna. 20. ed. Rio de Janeiro, 2001.

GOLDSTEIN, Norma. O texto sem mistério: leitura e escrita na universidade. São Paulo, Ática, 2010.

KOCH, Ingedore Villaca; TRAVAGLIA, Luiz Carlos. A coerência textual. 8. ed. São Paulo, Contexto, 1997.

MEIRELLES, Cecília. Seleta em prosa e verso. Rio de Janeiro, José Olympio, 1973.

MORENO, Cláudio; GUEDES, Paulo Coimbra. Curso básico de redação. São Paulo, Ática, 1989.

ROSA, João Guimarães. Sagarana. Rio de Janeiro, Record, 1984.

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Anotações

www.cruzeirodosulvirtual.com.brCampus LiberdadeRua Galvão Bueno, 868CEP 01506-000São Paulo SP Brasil Tel: (55 11) 3385-3000