prática de ensino supervisionada em educação pré-escolar ... · adulto, releva-se a ideia de...

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Prática de Ensino Supervisionada em Educação Pré-Escolar Iveta Pinto Parra Relatório Final de Estágio apresentado à Escola Superior de Educação de Bragança para obtenção do Grau de Mestre em Educação Pré-Escolar Orientado por Professora Doutora Maria Angelina Sanches Bragança 2013

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  • Prtica de Ensino Supervisionada em Educao Pr-Escolar

    Iveta Pinto Parra

    Relatrio Final de Estgio apresentado Escola Superior de Educao de

    Bragana para obteno do Grau de Mestre em Educao Pr-Escolar

    Orientado por

    Professora Doutora Maria Angelina Sanches

    Bragana

    2013

  • I

    Dedicatria

    Ao meu pai [in memorium]

  • II

    Agradecimentos

    Este relatrio um trabalho individual, mas que reflete as contribuies de todos

    os que me apoiaram na sua elaborao e na formao desenvolvida. Assim, ao termin-

    lo quero agradecer a todos os que, de algum modo, contriburam para a sua

    concretizao:

    minha orientadora, Professora Doutora Maria Angelina Sanches, pela sua

    disponibilidade, incentivo e partilha do seu saber cientfico.

    Aos profissionais da instituio onde realizei o estgio, com um agradecimento

    particular minha educadora cooperante pela partilha de saberes e apoio que me

    proporcionou para que pudesse percorrer a caminhada efetuada.

    s crianas que participaram no desenvolvimento das atividades e sem as quais

    no era possvel a realizao deste trabalho.

    Aos professores e funcionrios da Escola Superior de Educao do Instituto

    Politcnico de Bragana, pela colaborao e ateno prestada.

    s minhas colegas do curso pelo incentivo que me deram ao longo do trabalho.

    Aos amigos e familiares que direta ou indiretamente me ajudaram e apoiaram.

    Um muito obrigada a todos

  • III

    Resumo

    O presente relatrio corresponde ao relato de um trabalho desenvolvido no

    mbito da unidade curricular de Prtica de Ensino Supervisionada do Mestrado em

    Educao Pr-Escolar, tendo como finalidade aprofundar a reflexo sobre a ao

    educativa que desenvolvemos num jardim-de-infncia situado em contexto urbano.

    Apresenta a caraterizao da instituio e do grupo de crianas, as opes

    pedaggicas em que procurmos apoiar a ao educativa, bem como algumas

    experincias de aprendizagem desenvolvidas no decurso da ao educativa. Estas

    experincias integram uma abordagem integrada e integradora das diferentes reas de

    contedo previstas nas Orientaes Curriculares para a Educao Pr-escolar. A prtica

    educativa foi orientada segundo uma perspetiva de aprendizagem pela ao, valorizando

    o papel ativo da criana e do educador, enquanto mediador e facilitador do

    desenvolvimento desse processo.

    Inclui ainda uma reflexo acerca da prtica educativa, na sua globalidade, tendo

    em conta o ambiente educativo e processo de aprendizagem promovido com as crianas,

    bem como os seus contributos para a nossa formao e desenvolvimento pessoal e

    profissional.

    Palavras-Chave: Educao pr-escolar, prtica de ensino supervisionada, experincias

    de aprendizagens integradas, pedagogia participativa.

  • IV

    Abstract

    This report corresponds to the report of a work within the course of Supervised

    Teaching Practice of the Masters in Preschool Education, and aims to deepen the

    reflection on the educational work we develop a garden for children located in an urban

    context.

    Presents the characterization of the institution and the group of children,

    educational options that sought to support educational activities, as well as some

    learning experiences developed during the educational activity. These experiments are

    part of an integrated approach and integrating the different content areas specified in the

    Curriculum Guidelines for Pre-school Education. Educational practice was oriented

    according to an action learning perspective, emphasizing the active role of the child and

    the educator as a mediator and facilitator in the development of this process.

    It also includes a reflection on the educational practice as a whole, taking into

    account the educational environment and learning process promoted with children as

    well as their contributions to our training and personal and professional development.

    Key Words: Pre-school, supervised teaching practice, learning experiences integrated,

    participative pedagogy.

  • V

    ndice Geral

    Resumo ...III

    Abstract IV

    ndice de Figuras ............................................................................................................ VI

    Introduo ......................................................................................................................... 7

    1.Contextualizao da Prtica e Ensino Supervisionada .................................................. 9

    1.1. Caracterizao da Instituio ..................................................................................... 9

    1.2. Caracterizao do grupo de crianas ....................................................................... 11

    1.3. Aspetos pedaggicos de funcionamento em grupo/sala .......................................... 13

    1.3.1. Organizao de espaos e materiais ..................................................................... 13

    1.3.2. Organizao do tempo pedaggico....................................................................... 18

    1.3.3. O desenvolvimento de interaes ......................................................................... 20

    2.Fundamentao das opes educativas........................................................................ 22

    2.1. A educao pr-escolar: princpios e orientaes educativas .................................. 22

    2.2.As Orientaes Curriculares: Relanando o olhar sobre as reas de contedo ........ 26

    2.3. Perspetivas pedaggicas .......................................................................................... 31

    2.4. Modelos Curriculares em Educao de Infncia ..................................................... 32

    3. Descrio, anlise e interpretao das experincias de aprendizagem ....................... 42

    3.1. Experincia de aprendizagem: Descobrindo as caractersticas de algumas

    substncias ...................................................................................................................... 43

    3.2.Experincia de Aprendizagem: Imaginando e descobrindo em conjunto, partindo

    duma histria .................................................................................................................. 55

    3.3 Experincia de Aprendizagem: A msica e a expresso corporal da criana .......... 72

    4. Reflexo crtica ........................................................................................................... 85

    Consideraes Finais ...................................................................................................... 89

    Bibliografia ..................................................................................................................... 91

  • VI

    ndice de Figuras

    Figura1 - Planta da sala de atividades.........16

    Figura 2 Rotina diria/Responsvel do dia...17

    Figura 3 Regras da sala.........17

    Figura 4 Quadro de presenas..18

    Figura 5 Verificao das substncias que se dissolvem na gua..46

    Figura 6 Carta de planificao e registos das crianas.47

    Figura7Verificao da dissoluo de diferentes quantidades de sal e acar na gua..51

    Figura 8 Carta de planificao..52

    Figura 9 Dissoluo da mesma quantidade de sal em gua fria e quente54

    Figura 10 Verificao da dissoluo do sal em gua quente e fria...54

    Figura 11 Cuquedo imaginado pelas crianas..57

    Figura 12 Imitao dos animais da histria..58

    Figura 13 Os animais ordenados..59

    Figura 14 Formao e registo grfico de conjuntos.60

    Figura 15 Modelagem e elaborao dos animais..60

    Figura 16 Reproduzindo nomes com letras soltas62

    Figura 17 Registo grfico das palavras que rimam com Cuquedo ..63

    Figura 18 Texto elaborado pelas crianas64

    Figura 19 Elaborao do grfico dos animais preferidos.64

    Figura 20 Formao de padres66

    Figura 21 Pesquisa de caractersticas dos animais...68

    Figura 22 Elaborao das mscaras..70

    Figura 23 Dramatizao da histria..70

    Figura 24 Registo grfico dos instrumentos musicais..74

    Figura 25 Construo dos instrumentos musicais....75

    Figura 26 Instrumentos musicais construdos..75

    Figura 27 - Agrupamento de instrumentos por categorias..78

    Figura 28 Copiar palavras por iniciativa das crianas.81

    Figura 29 Formao de palavras..81

    Figura 30 - Explorao de sombras83

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    7

    Introduo

    A educao de infncia uma etapa crucial no processo de aprendizagem ao

    longo da vida das crianas, da qual se espera que lhes proporcione oportunidades de

    desenvolvimento de saberes essenciais para o seu sucesso e integrao na vida em

    sociedade. Esse processo implica uma ao refletida, integradora e flexvel, na qual

    sejam contempladas, articulada e coerentemente, as diferentes reas de contedo.

    , nesta linha de pensamento que se situa a ao que descrevemos e refletimos

    no presente relatrio, tendo por base a ideia de que a criana constri o conhecimento na

    interao com os objetos, pessoas, ideias e acontecimentos. No que se refere ao papel do

    adulto, releva-se a ideia de observar e interagir com as crianas para descobrir o que

    estas pensam acerca do mundo que as rodeia, percebendo, desta forma, as suas

    verdadeiras necessidades e os seus verdadeiros interesses. Procura-se, assim, valorizar a

    aprendizagem pela ao. Este tipo de aprendizagem s se torna possvel a partir se

    forem tidos me conta os interesses pessoais das crianas e o seu desejo de conhecer e de

    procurar resposta para as perguntas com que se confrontam.

    Neste trabalho, procuramos atribuir relevncia ao processo de aprendizagem das

    crianas, no que se refere mais especificamente sua capacidade de observar, ao desejo

    de experimentar, curiosidade de saber, atitude para criticar e satisfao por

    descobrir e partilhar com os outros as suas descobertas, e no tanto ao produto final.

    Valoriza-se sobretudo o processo experienciado por todos, crianas e adultos,

    bem como os seus potenciais contributos para sua progresso, no quadro de um

    processo formativo globalizante.

    No que se refere estrutura do relatrio, este encontra-se organizado em quatro

    pontos interligados.

    O primeiro ponto inclui a caracterizao do contexto onde decorreu a nossa

    prtica educativa, incidindo sobre a caraterizao do ambiente educativo, mais

    especificamente no que diz respeito organizao do espao, caracterizao do grupo, a

    organizao da rotina diria e o desenvolvimento das interaes ao nvel do grupo.

    O segundo ponto centra-se em torno das opes educativas, relevando os

    pressupostos tericos em que procurmos situar a prtica pedaggica, atribuindo

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

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    particular ateno s Orientaes Curriculares para a Educao Pr-escolar1. Fazemos

    ainda referncia a alguns modelos curriculares para a educao de infncia, visando

    recolher ideias que possam ajudar-nos a melhor compreender, fundamentar e interpretar

    a prtica pedaggica.

    O terceiro ponto integra a descrio, anlise e reflexo de algumas experincias

    de aprendizagem que desenvolvemos e que, pela sua abrangncia e diversidade de

    contedos nelas contemplados, permitem perceber o processo formativo que

    procurmos promover e a continuidade que tentmos que integrasse. Para tal,

    valorizmos o recurso a alguns instrumentos de recolha de informao, entre os quais

    so de destacar a planificao da ao educativa, as notas de campo, as produes das

    crianas e os registos fotogrficos, permitindo, no seu conjunto, evidenciar os processos

    de aprendizagem promovidos.

    Por ltimo, o quarto ponto constitui uma reflexo crtica final que incide sobre a

    globalidade da ao educativa desenvolvida e aspetos que a influenciaram, relanando

    sobre ela um olhar crtico construtivo, no sentido de melhor poder compreend-la e

    encontrar formas alternativas de interveno, no quadro de um desenvolvimento pessoal

    e profissional em continuidade.

    1

    Referimo-nos ao documento subordinado a esse mesmo ttulo, publicado pelo Ministrio da Educao/Departamento de Educao Bsica (ME/DEB, 1997), bem como ao definido no Despacho n

    5220/97 de 4 de agosto.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

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    1. Contextualizao da Prtica de Ensino Supervisionada

    Um contexto educativo bem organizado constitui a base para um bom

    desenvolvimento e formao global da criana. Um ambiente educativo que responda s

    necessidades formativas da criana e equipado com materiais diversificados e de

    qualidade um elemento essencial para criar oportunidades de aprendizagem s

    crianas. Conhecer o contexto, permite ao educador conhecer os recursos disponveis

    para desenvolver a sua ao pedaggica e melhor poder mobiliz-lo.

    Deste modo, neste ponto comeamos por descrever e refletir sobre o contexto

    em que desenvolvemos a ao educativa, considerando a instituio na sua globalidade

    e, mais especificamente, a sala de atividades e o grupo de crianas, bem como as aes

    pedaggicas em que apoimos o nosso estgio.

    1.1. Caracterizao da Instituio

    O jardim-de-infncia em que desenvolvemos a ao educativa, um

    estabelecimento da rede pblica da educao pr-escolar e integra-se num Agrupamento

    de Escolas do distrito de Bragana. Situa-se em contexto urbano ladeado por duas ruas

    com um fluxo de trfego considervel, relativamente perto do centro da cidade.

    O jardim-de-infncia, est dimensionado para 125 crianas, mas ao longo do ano

    letivo em que decorreu o nosso estgio, era frequentado por 90 dos 3 aos 6 anos,

    organizadas em cinco grupos/salas.

    A estrutura fsica do jardim-de-infncia encontra-se ao nvel do rs-do-cho,

    delimitado por muros e grades de forma a possibilitar uma maior segurana das

    crianas. O acesso ao edifcio feito atravs de duas entradas, possuindo uma delas uma

    rampa de acesso, o que possibilita a sua utilizao por pessoas com limitaes motoras.

    O pavimento que circunda o edifcio de cimento, relva e areia. Encontra-se organizado

    de modo a potenciar atividades de natureza diversa. Neste espao existe um parque

    infantil, onde esto fixas algumas estruturas/equipamentos de recreio (molas/cavalinhos,

    balizas de futebol e de basquetebol). Existe ainda um espao que possui pavimento em

    placas de borracha onde esto fixos um escorrega, baloios e cordas para trepar, bem

    como outro em cimento onde esto desenhados jogos como o da macaca e do galo.

    O espao exterior potencia autnticos momentos de recreio e aprendizagem,

    usufruindo as crianas de oportunidades para o explorar e usar em funo de gostos

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    10

    pessoais e estabelecer interaes alargadas com crianas de outros grupos, de diferentes

    idades. Hohmann e Weikart (2009) lembram que fundamental para o desenvolvimento

    das crianas que usufruam do contacto com espaos ao ar livre, sendo neles que se

    assumem como construtores imaginativos.

    Relativamente ao espao interior composto por cinco salas de atividade, um

    hall de entrada, um salo polivalente, dois sanitrios para crianas e dois para adultos,

    uma pequena cozinha que se destina, essencialmente, a atividades culinrias e de

    expresso plstica, uma arrecadao com materiais de apoio (cartolinas, roupas de

    disfarce, carto, papel de desenho, esferovite, ) indispensveis realizao de

    atividades, uma pequena biblioteca e gabinetes de coordenao e de apoio s atividades

    pedaggicas. Destes espaos, fazemos referncia particular ao salo polivalente e

    biblioteca, pela complementaridade que proporciona ao trabalho curricular. O

    salo/polivalente um espao amplo, no qual se desenvolvem atividades de expresso

    motora, festividades e de recreio interior, bem como as atividades integradas na

    componente de apoio famlia. Este espao usufrui de uma boa iluminao natural,

    contendo vrias janelas que possibilitam criana ter contacto visual com o exterior.

    Est equipado com materiais diversos de recreao e lazer, como televiso, cassetes de

    vdeo, leitor de CD, DVDs, colunas, colches, bolas, cordas, escorrega, baloios, entre

    outros.

    A biblioteca um espao de apoio aos diferentes grupos do jardim-de-infncia,

    que embora de dimenso reduzida, rene um alargado conjunto de livros, podendo estes

    serem consultados por toda a comunidade educativa e, ainda, serem levados para as

    salas de atividade.

    Estes espaos so interligados por um corredor, equipado com cabides

    individuais, identificados com o nome e a fotografia de cada criana, para que, cada

    uma, possa proceder com autonomia na arrumao e acesso aos seus pertences.

    Encontram-se ainda no corredor placards para expor trabalhos, registos de atividades e

    projetos desenvolvidos, com o objetivo de partilha com os pais/comunidade. No hall da

    entrada existe ainda um outro placar que se destina a expor informaes aos

    encarregados de educao.

    No que se refere ao equipamento de segurana, constata-se a existncia de

    quatro extintores, prontos a serem utilizadas em situaes de emergncia, refletindo

    existir preocupao pela segurana das crianas e do pessoal docente e no docente.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    11

    Todo o espao interior que temos vindo a referenciar provido de equipamento

    adequado, com uma boa iluminao natural, facilitando uma tima ventilao, assim

    como de um sistema de aquecimento central que permite suportar as baixas condies

    meteorolgicas que se fazem sentir em meses mais frios.

    O horrio de funcionamento do jardim-de-infncia rege-se de acordo com o

    calendrio escolar da rede pblica e complementa-se com um horrio adequado s

    necessidades das famlias das crianas, funcionando a partir das 8h00m s 19h15m.

    Inclui a componente letiva, que funciona das 9h00m s 12h00m e das 14h00m s

    16h00m, num total de cinco horas dirias, como a legislao prev (Lei n5/97, de 10 de

    fevereiro) e a componente de apoio famlia funciona nos tempos de permanncia das

    crianas no jardim-de-infncia que vo para alm da componente letiva.

    A equipa educativa da instituio, no ano em que decorreu o estgio era

    constituda por cinco educadoras de infncia titulares de grupo, sendo que uma das

    cinco educadoras exercia funes como coordenadora de departamento de docentes,

    uma educadora do QZP (Quadro de Zona Pedaggica), colocada por concurso de

    afetao, uma educadora de educao especial e uma terapeuta da fala que apoiavam as

    crianas com necessidades educativas especiais, bem como sete assistentes operacionais

    e outros educadores que apoiavam o desenvolvimento da componente educativa e a

    componente de apoio famlia.

    1.2. Caracterizao do grupo de crianas

    A informao relativa s caractersticas do grupo de crianas apresentada neste

    relatrio, foi recolhida atravs de observaes, dilogos informais com as crianas e

    outros elementos da comunidade educativa, da entrevista no estruturada educadora e,

    ainda atravs da consulta de dados das fichas de caracterizao e inscrio das crianas

    preenchidas pelos pais, no perodo inicial do ano letivo.

    Importa, assim, caraterizar o grupo de crianas com o qual desenvolvemos a

    nossa interveno pedaggica, nas diferentes dimenses.

    O grupo era constitudo por vinte crianas com cinco anos de idade, sendo dez

    crianas do sexo masculino e dez do sexo feminino. As crianas eram provenientes de

    diferentes zonas/bairros citadinos. Tambm se caracterizam pela diversidade cultural e

    tnica: integravam o grupo trs crianas de etnia cigana, uma do sexo masculino e duas

    do sexo feminino. Das vinte crianas do grupo, dezoito j frequentavam o Jardim-de-

    Infncia pela terceira vez e duas pela primeira vez.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    12

    A maioria das crianas apesar de viverem na cidade, tinham contacto frequente

    com o meio rural, possibilitando-lhes desta forma conhecer diferentes espaos

    socioculturais e geogrficos.

    O grupo revelava-se, de um modo geral, ativo e curioso, principalmente por

    situaes novas, predisposto a levar a efeito, quer as tarefas propostas pela educadora

    quer as que surgiam por iniciativa prpria. Mostravam-se recetivas leitura de histrias

    e dramatizaes, manifestando especial interesse por atividades relacionadas com a

    expresso musical e expresso plstica, o que lhes permitia a fluidez de muitas

    oportunidades de explorao de tcnicas e materiais. Algumas crianas eram bastante

    recetivas a atividades que envolvessem a linguagem oral e abordagem escrita, bem

    como o domnio da matemtica.

    No que se refere escolha das reas, o interesse demonstrado pelas crianas na

    rea da expresso plstica era evidente. A rea da casa era maioritariamente procurada

    pelas meninas e a rea das construes pelos rapazes. Por sua vez, a rea menos

    frequentada era a da biblioteca. Neste sentido, ao longo do ano letivo, introduzimos

    material nesta rea de modo a que despertasse nas crianas o gosto pela leitura.

    Ao identificarmos determinados interesses das crianas, procurmos dar-lhes

    relevncia, pelo que nos propusemos, no decorrer da ao educativa, intervir no sentido

    de desenvolver uma relao afetiva com as crianas, envolvendo-as na vivncia da

    rotina diria, desafiando-as com experiencias de aprendizagem que fossem ao encontro

    das suas necessidades formativas e interesses. Considerando o agregado familiar das

    crianas, de acordo com os dados que constavam no projeto curricular do grupo, a

    maioria (n=15) delas vivia com os dois progenitores e cinco com um deles (a me).

    A formao acadmica dos pais/encarregados de educao das crianas situava-

    se maioritariamente ao nvel do ensino bsico e do secundrio, apenas seis

    apresentavam nvel superior (4 mes e 2 pais). Ao nvel da atividade profissional

    indicada na ficha de inscrio da criana, observam-se vrias atividades profissionais, as

    profisses apresentadas dizem respeito, na sua maioria, a duas categorias, sendo elas:

    servios e comrcio e pessoal operrio. Constatam-se algumas situaes de pais

    desempregados (5 pais e 1 me) e 8 mes integram a condio de domstica.

    No que concerne faixa etria dos pais, situa-se em idades compreendidas entre

    os vinte e cinco e os cinquenta anos de idade e a idade das mes varia entre os vinte e

    trs e quarenta oito anos de idade.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    13

    1.3. Aspetos pedaggicos de funcionamento em grupo/sala

    Para que o ambiente educativo seja facilitador de aprendizagens, necessrio

    que o educador reflita acerca dos materiais existentes e pondere a insero de novos

    elementos, tendo em perspetiva o desenvolvimento de competncias associadas s

    vrias reas de contedo.

    O ambiente educativo deve organizar-se como um contexto que facilite o

    desenvolvimento das crianas, bem como dos prprios adultos que intervm nesse

    mesmo ambiente. O espao deve ser facilitador de mltiplas aprendizagens, por isso,

    deve ser criado com e em funo das crianas que o iro utilizar. O educador deve estar

    sempre atento a tudo o que se passa na sala, refletindo para que o seu ambiente se torne

    desafiante e enriquecedor para as crianas.

    1.3.1. Organizao de espaos e materiais

    Na ao educativa, promovida no Jardim-de-infncia, valoriza-se o espao

    enquanto meio potenciador da construo de aprendizagens. Entende-se que a sua

    organizao deve ser planeada de modo a atender s caractersticas e necessidades das

    crianas, aos projetos emergentes e gesto dos tempos pedaggicos. Tem por base a

    criao de oportunidades de manipulao, experimentao, recriao e descoberta das

    crianas, individualmente, em pares, em pequeno grupo ou em grande grupo. Como

    referem as Orientaes Curriculares para a Educao Pr-escolar (ME/DEB, 1997):

    os espaos de educao pr-escolar podem ser diversos, mas o tipo de

    equipamento, os materiais existentes e a forma como esto dispostos

    condicionam, em grande medida, o que as crianas podem fazer e aprender. A

    organizao e a utilizao do espao so expresso das intenes educativas e da

    dinmica de grupo, sendo indispensvel que o educador se interrogue sobre a

    funo e finalidades educativas dos materiais de modo a planear e fundamentar

    as razes dessa organizao (p.37).

    Nesta linha de pensamento, interrogmo-nos sobre o tipo de estruturas,

    equipamentos, materiais, organizao e reflexo permanente sobre a funcionalidade e

    adequao do espao e as potencialidades educativas dos materiais no qual as crianas

    tivessem a oportunidade de assumirem um papel ativo no processo de co construo do

    seu conhecimento e aprendizagem, alargar o seu desenvolvimento pessoal, social,

    cognitivo, fsico, intelectual, ou seja aprendendo brincando num clima de aprendizagens

    ativas. De acordo com Hohmann e Weikart (2009) ambientes que promovem a

    aprendizagem activa incluem objectos e materiais que estimulam as capacidades de

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    14

    explorao e criatividade das crianas. Deve existir bastante espao para estas

    brincarem, quer sozinhas, quer umas com as outras (p. 160), em que explorem,

    inventem, imaginem e construam. importante que o espao seja atraente e esteja

    dividido em reas de interesse bem definidas e que o material esteja organizado e

    etiquetado de modo a permitir a sua visualizao.

    Tendo em conta que, quando inicimos a ao educativa, o espao/sala estava

    organizado, mas que dispnhamos de liberdade para promover a sua reorganizao,

    questionmo-nos sobre o modo como se apresentava, tomando por referncia os

    princpios assinalados por Hohmann e Weikart (2009), que indicam que deve: ser

    atraente para as crianas; estar dividido em reas de interesse bem definidas, de forma a

    encorajar diferentes tipos de atividade; organizar as reas de forma a assegurar a

    visibilidade dos objetos e materiais, bem como a locomoo entre elas; incluir materiais

    e objetos de modo a permitirem uma grande variedade de brincadeiras e serem

    arrumados no sentido de facilitarem a execuo do ciclo encontra-brinca-arruma

    (pp.163-164).

    A sala das crianas de cinco anos, onde desenvolvemos a ao educativa era

    agradvel e convidativa, pela cor suave e pela vantagem de ter amplas janelas, o que lhe

    dava muita luz natural, uma maneira de suavizar o ambiente e trazer para o interior

    elementos naturais. A organizao parecia ir ao encontro dos princpios acima referidos.

    Optmos por manter a disposio das reas da sala e, ao longo da nossa ao

    educativa, ir introduzindo material diversificado e as alteraes necessrias na

    organizao das reas, indo ao encontro dos interesses do grupo de crianas, mediante

    os projetos que se estavam a desenvolver e aos critrios de qualidade, de maneira a criar

    novas e amplas aprendizagens.

    O espao estava organizado por diversas reas com o objetivo de possibilitar

    diferentes aprendizagens curriculares tendo em ateno as necessidades e interesses do

    grupo. Tal como refere Oliveira-Formosinho, (2007b) a organizao do espao em

    reas e a colocao dos materiais nas reas onde so utilizados so a primeira forma de

    interveno da educadora (p. 69).

    A sala integrava as seguintes reas de atividades: rea da expresso plstica que

    inclua desenho, recorte, colagem, modelagem e pintura; rea da escrita; rea da

    biblioteca; rea da casa; rea dos jogos; rea das construes; e, a rea do computador

    com equipamento kidsmart, devidamente identificadas com o nome, registo grfico

    (elaborado pelas crianas) e o nmero de crianas que podiam frequent-las.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    15

    As reas da sala apresentavam limites bem definidos e reconhecveis de modo a

    permitirem, s crianas, uma boa visualizao de todas elas, no sentido de poderem ver

    os materiais que contm e as atividades que os colegas estavam a desenvolver em cada

    uma. A organizao da sala por reas indispensvel para a dinmica do grupo para que

    lhes possa permitir uma maior autonomia e responsabilidade. Concordando com

    Hohmann e Weikart (2009) definir as reas de interesse uma maneira concreta de

    aumentar as capacidades de iniciativa, autonomia e estabelecimento de relaes sociais

    das crianas (p. 165).

    Intencionalmente, as reas estavam dispostas e organizadas consoante a

    funcionalidade de cada uma. Na rea de expresso plstica existia um enorme placar,

    permitindo que as crianas expusessem trabalhos que realizavam. De acordo com as

    OCEPE (ME/DEB, 1997) os contactos com a pintura, a escultura, etc. constituem

    momentos privilegiados de acesso arte e cultura que se traduzem por um

    enriquecimento da criana, ampliando o seu conhecimento do mundo e desenvolvendo o

    sentido esttico (p. 63). A rea da escrita e a rea da biblioteca foram integradas na

    zona mais calma e iluminada da sala, pois potenciava, nas crianas uma melhor

    concentrao.

    Nesta sala existia, ainda, um espao central, onde diariamente o grande grupo se

    reunia, sendo neste espao que se desenvolveram vrias conversas, troca de opinies,

    resoluo de problemas, momentos de planeamento, de partilha e de reflexo.

    A observao das interaes do grupo com o espao e os materiais levaram-nos,

    por vezes, a fazer alteraes, para que aquele se tornasse mais funcional e estimulador

    de aprendizagens, pois da responsabilidade do educador, como nos dizem Brickman e

    Taylor (1991) criar e manter um ambiente fsico que encoraje as brincadeiras ativas

    (p. 151). Foi sobretudo na parte dos materiais existentes em algumas reas, em pequena

    quantidade e j explorados pelas crianas que optmos por introduzir materiais variados

    em cada rea, dispostos de forma a permitir criana uma viso daquilo que cada rea

    lhe podia oferecer, reforando a rea da casa, da expresso plstica e dos jogos. Os

    materiais encontravam-se etiquetados, visveis e acessveis, o que permitiu criana

    uma maior facilidade de arrumao.

    As crianas cooperavam no processo de organizao dos materiais, de forma a

    favorecer a autonomia na escolha e utilizao dos mesmos, sendo de ter em conta que a

    organizao dos materiais etiquetados em prateleiras e gavetas de arrumao que os

    tornem visveis possibilita, como refere Oliveira Formosinho (2007b), a independncia

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    16

    em relao ao adulto [e] sobretudo para as crianas (), um caminho de autonomia

    (p.67).

    de salientar que tivemos em ateno a qualidade pedaggica dos materiais,

    pois atravs destes que a criana promove aprendizagens significativas. Tal como

    refere, Oliveira Formosinho (2007b) o ambiente rico em materiais (usados em grupo

    de pares, em contextos de projectos significativos) tem todas as condies para provocar

    essas aprendizagens (p.68)

    Esta organizao do espao e materiais facilita a proposta de atividades por parte

    do educador, e sobretudo, promove a escolha da criana.

    Mediante o esquema apresentado na figura 1, podemos observar a planta da sala.

    Figura 1 Planta da sala de atividades

    1 a 4 - rea da expresso plstica 8 rea dos jogos

    5 - rea da escrita 9 rea das construes

    6 rea da biblioteca 10- rea do computador

    7 rea da casa

    Placares

    Janelas

    Armrio

    Das reas faziam parte equipamentos de apoio especficos, como mesas,

    cadeiras, um armrio com vrias estantes onde se encontravam materiais que o adulto

    podia usufruir para o seu trabalho dirio. Outro dos armrios possua uma grande

    variedade de material de apoio s atividades das crianas. As paredes da sala que se

    encontravam livres eram revestidas com as produes das crianas, divulgando o

    trabalho que se desenvolvia na sala.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    17

    Para alm das produes das crianas havia, tambm, alguns quadros que

    ajudavam a regular a ao educativa e que passamos a descrever.

    Quadro da rotina diria, construdo depois de termos refletido com as crianas

    sobre cada momento do dia do jardim-de-infncia. Esses momentos foram registados

    por fotografia servindo, posteriormente,

    como referencial para que as crianas

    pudessem fazer os seus prprios registos

    e ainda a descrio verbal de cada

    momento. Este quadro facilitava porque

    permitia que as crianas assimilassem a

    sequncia dos tempos e as

    oportunidades de trabalho que havia ao

    longo do dia. Na figura 2 procuramos

    especificar mais em detalhe a sua

    organizao. Este quadro tambm tinha a

    funo de quadro de responsabilidades. Nele estavam todas as fotografias das crianas

    com os respetivos nomes, no qual todos os dias, seguindo a ordem da lista do grupo,

    uma criana indicada assumia uma tarefa. Tinha algumas tarefas a cumprir, como

    verificar se reas estavam arrumadas, ajudar a distribuir o leite aos colegas, ser o

    primeiro na fila quando iam para o recreio, entre outros.

    Quadro das regras, nele encontravam-se registadas as regras de funcionamento

    da sala. Do lado esquerdo colocaram-se

    as fotografias com as atitudes que as

    crianas deveriam assumir, no meio

    fizeram o respetivo registo e na coluna

    do lado direito escreveu-se a regra

    enunciada em grupo. As regras foram

    estabelecidas e negociadas em grupo,

    sendo introduzidas pouco a pouco

    conforme as necessidades. Figura 3 Regras da sala.

    Como apontam Oliveira-Formosinho e Andrade (2011) escrever um

    compromisso e faz-lo visvel cria uma oportunidade de ajuda no cumprimento do

    compromisso (p.26).

    Figura 2- Rotina diria/Responsvel do dia

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    18

    Quadro das presenas, constitudo por um mapa de dupla entrada que servia

    para a criana marcar com um sinal,

    escolha, a presena na quadrcula

    correspondente. Era uma forma de a

    criana se consciencializar sobre a

    sequncia dos dias da semana e de

    perceber que h dias de ausncias

    intercalados com dias de presenas.

    1.3.2. Organizao do tempo pedaggico

    A distribuio do tempo est estreitamente relacionado com a organizao do

    espao e as diversas atividades que nele se desenvolvem, reforando a coexistncia

    duma articulao entre estas dimenses, com vista integrao e resposta s

    caractersticas e necessidades formativas das crianas. Para tal, requer-se que o tempo

    pedaggico, como referem Oliveira-Formosinho e Formosinho (2011), inclua uma

    polifonia de ritmos: o da criana individual, o dos pequenos grupos, o do grupo todo

    (p.30). Pressupe-se, ainda, como acrescentam os autores (idem) que inclua

    intencionalidades e experincias diversificadas, no sentido de favorecer o

    desenvolvimento das crianas, nas mltiplas dimenses que integra.

    Importa considerar que, como sublinham Hohmann e Weikart (2009), a

    existncia de uma rotina diria oferece um enquadramento comum de apoio s crianas

    medida que elas perseguem os seus interesses e se envolvem em diversas atividades de

    resoluo de problemas (p.224).

    Assim, e no que se refere rotina diria que se implementou na sala dos cinco

    anos, privilegiavam-se trs momentos educativos diferentes, sendo eles: tempo de

    grande grupo, tempo de pequeno grupo e tempo de planear/fazer/rever. No sentido de

    melhor poder perceber-se a rotina praticada, passamos a descrev-la:

    i) Tempo de acolhimento: Momento de receo das crianas, onde se

    partilhavam ideias, vivncias e notcias que traziam de casa. Neste momento

    privilegiava-se a escuta de cada criana, no respeito que todas merecem e do

    direito de cada uma participao.

    Figura 4 Quadro de presenas

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    19

    ii) Tempo de trabalho em grande grupo: Momento em que todos os elementos

    do grupo, crianas e educadoras, se envolviam na concretizao de atividades.

    Normalmente tinha a durao de 30 minutos contavam-se histrias, liam-se

    poesias, realizavam-se jogos de linguagem, de matemtica, msica e movimento,

    entre outras iniciativas.

    iii) Higiene/lanche: Momento em que as crianas faziam a sua higiene pessoal

    com o auxlio de um assistente operacional e lanchavam na sala.

    iv) Tempo de recreio: As crianas e adultos, neste tempo, iam para o espao de

    recreio exterior, podendo desfrutar dos equipamentos que nele existiam ou iam

    para o salo polivalente, onde se envolviam em diversos jogos e brincadeiras.

    v) Tempo de trabalho em pequeno grupo: Momento em que as crianas

    trabalhavam organizadas em pequenos grupos, sendo este destinado ao

    alargamento das experincias de aprendizagem e sua sistematizao, em

    atividades propostas pela educadora com intencionalidades especficas.

    vi) Higiene pessoal: Momento destinado higiene e preparao das crianas

    que almoavam na cantina, enquanto as que iam almoar a casa continuavam a

    realizar as atividades em desenvolvimento.

    vii) Almoo: Sada das crianas para almoar.

    viii) Tempo de relaxamento: Momento destinado a atividades calmas, em que

    as crianas, sentadas nas cadeiras ou no cho, ouviam msica, poemas, faziam

    mmicas ou, simplesmente em silncio, escutavam os sons do exterior.

    ix) Tempo de planear/fazer/rever: Neste bloco tripartido de tempo, as crianas

    planeavam o trabalho que queriam desenvolver, escolhiam a rea, bem como os

    colegas que poderiam ajud-las no trabalho. No final, as crianas arrumavam os

    materiais e partilhavam com o restante grupo o trabalho desenvolvido. Os

    colegas questionavam os processos de realizao, dando opinies e sugestes

    para melhorar o trabalho.

    x) Higiene/lanche: As crianas faziam a sua higiene pessoal, com o apoio de um

    assistente operacional e tomavam o leite escolar.

    xi) Tempo de recreio: Momento em que as crianas usufruam, mais uma vez

    de oportunidades de recreao e interao com as crianas das outras salas no

    espao de recreio.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    20

    xii) Componente socioeducativa: Tempo de atividades integradas na

    componente de apoio famlia que decorria no salo polivalente.

    A existncia de uma estrutura do tempo, ou seja, uma rotina educativa

    organizada da forma como foi apresentada, facilita, em nosso entender e como a

    literatura sobre este tpico nos permite perceber (Hohmann & Weikart, 2009; Oliveira-

    Formosinho & Andradade, 2011), a segurana necessria para o investimento cognitivo

    e emocional das crianas. Estabelece-se um fluir para o tempo dirio que, tendo

    flexibilidade, no deixa de ser estvel, o que permite s crianas apropriarem-se do

    mesmo, o qual contribui para que possam tornar-se progressivamente mais autnomas e

    independentes dos adultos. Permite-lhes conhecer a sequncia dos acontecimentos e

    prever as atividades que integram o quotidiano da instituio pr-escolar. Isto porque a

    rotina diria constante, estvel e, portanto, previsvel para a criana. Assim, a criana

    sabe o que a espera, conhece o tempo de rotina em que est no momento, conhece as

    finalidades desse tempo de rotina e, por isso, no precisa ficar ansiosa nem se preocupar

    com o que poder suceder a seguir, pois sabe que existem momentos para diferentes

    atividades. Estes permitem ainda construir noes de sequncia temporal, como as de

    antes, agora e depois. A previsibilidade da sequncia dos tempos de atividade contribui

    para a segurana e independncia das crianas, o que, em conjugao com as diferentes

    possibilidades educacionais de cada tempo, permite-lhes fazer escolhas, tomar decises,

    agir e estabelecer diferentes tipos de interao.

    A rotina diria e o espao educativo so um organizador duplo de ao do

    educador, principalmente porque criam condies estruturais para as crianas se

    tornarem independentes, ativas, autnomas, facilitando-lhe, assim, uma utilizao

    cooperativa do poder.

    1.3.3. O desenvolvimento de interaes

    As interaes entre criana e adulto baseiam-se na ideia de que, como afirmam

    Hohmann e Weikart (2009), crianas e adultos tomam iniciativa e respondem s

    iniciativas uns dos outros, alicerando as suas interaces nas ideias, sugestes e aces

    de todos e de cada um (p.51). No que se refere a esta dimenso, procurmos

    proporcionar situaes que fossem desafiantes para o pensamento da criana, capazes de

    gerar o desequilbrio das suas estruturas cognitivas, entendido como conflito cognitivo

    (Piaget, 1976) na medida em que desencadeia a procura de um novo equilbrio e

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    21

    impulsiona reorganizao dessas estruturas e, por conseguinte, favorecem a sua

    progresso.

    Consideramos que ao longo de todo este processo o nosso objetivo baseou-se em

    proporcionar, s crianas, um conjunto de atividades que favorecesse a sua implicao

    na procura de solues para as questes e problemas emergentes. Deste modo,

    procurmos ter presente a pertinncia de fornecer s crianas um clima que se pautasse

    pelo equilbrio, proteo e interajuda. Nesta linha de pensamento, entendemos as

    crianas como sujeitos ativos e, como sugere Vasconcelos (2009), sujeitos de direitos e

    deveres, numa dinmica interactiva com os outros (p. 56). Assim, procurmos criar

    oportunidades de estabelecerem diferentes tipos de interaes, quer em momentos do

    trabalho em grande grupo, quer em pequeno grupo, favorecendo um clima de

    cooperao e entreajuda entre as crianas e entre os adultos e as crianas. A interao

    estabelecida pelo grupo na concretizao das atividades permitiu-lhe confrontar

    diferentes pontos de vista, question-los, emitindo a sua opinio e escutando a opinio

    dos outros. Assumimos o papel de mediadores desses processos, utilizando uma

    linguagem que permitisse s crianas compreenderem, negociarem e aceitarem

    diferentes formas de pensar e ser, no quadro de respeito por todos e cada um, do direito

    diferena e de uma cidadania ativa e responsvel.

    O desenvolvimento de interaes educativas num clima de segurana afetiva

    requer, como sublinha Mesquita-Pires (2007), a promoo do bem-estar na criana, da

    sua autonomia; a adequao da linguagem s necessidades do grupo; o respeito e a

    valorizao pelas aces das crianas, demonstrando tambm capacidade de se envolver

    afetivamente com elas (p.179).

    Os instrumentos construdos e utilizados para proceder organizao

    pedaggica do quotidiano de vida pr-escolar, como o quadro da rotina diria, o quadro

    mensal das presenas e o quadro das regras ajudaram a regular as interaes,

    favorecendo o sentido de pertena, responsabilizao e gesto da vida em grupo. neste

    sentido que se constri um grupo capaz de regular as suas prprias aes com base nos

    direitos, deveres e regras elaboradas colaborativamente e que todos devem assumir.

    Sublinha-se o papel de apoio que cabe ao adulto proporcionar a cada criana

    para que todas possam progredir. Nesta linha de pensamento, procurmos promover o

    envolvimento de todos os intervenientes no processo educativo (crianas, educadoras,

    pais e parceiros da comunidade), favorecendo o dilogo e a colaborao, o que

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    22

    possibilitou vivenciarmos experincias de aprendizagem estimulantes, bem como

    conhecermos outros espaos educativos da comunidade local.

    Procurmos ainda tomar em considerao que, como se expressa nas

    Orientaes Curriculares para a Educao Pr-escolar (DEB/ME,1997), a colaborao

    dos pais, e tambm de outros membros da comunidade, o contributo dos seus saberes e

    competncias para o trabalho educativo a desenvolver com as crianas, um meio de

    alargar e enriquecer as situaes das crianas e adultos (p. 65).

    Relativamente interao estabelecida entre os adultos, sublinhamos a dinmica

    de formao criada, onde foi valorizado o trabalho em equipa e a reflexo, pr e ps-

    ativa, em conjunto, debatendo princpios e dinmicas de ao a ter em conta para criar

    oportunidades potencialmente facilitadoras da aprendizagem e desenvolvimento de

    todos, crianas e adultos.

    Parece-nos que este trabalho se tornou frutfero, pois ajudou a compreender

    melhor os papis, expetativas e desempenhos de cada um, bem como a identificar e a

    mobilizar estruturas de apoio para uma continuada melhoria das respostas educativas

    em que nos encontrvamos envolvidas e para a nosso prprio desenvolvimento

    profissional e pessoal.

    2. Fundamentao das opes educativas

    Neste ponto procedemos ao aprofundamento de conhecimentos que possam

    contribuir para nos ajudar a melhor orientar, analisar e interpretar a ao educativa pr-

    escolar e, por conseguinte, sustentar a prtica pedaggica que desenvolvemos. Neste

    sentido, procuramos debruar-nos sobre os princpios e orientaes em que se apoia a

    educao pr-escolar, as aprendizagens que se pretendem promover e as perspetivas e

    modelos curriculares a ter em conta para que possamos responder aos desafios e

    exigncias que a interveno nesta etapa educativa apresenta.

    2.1. A educao pr-escolar: princpios e orientaes educativas

    A educao pr-escolar tem vindo a merecer um crescente reconhecimento,

    enquanto etapa fundamental no processo de aprendizagem ao longo da vida, alertando o

    Conselho da Unio Europeia (2011) para os benefcios que a sua frequncia representa

    no desenvolvimento de aprendizagens/competncias essenciais para o sucesso da

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    23

    criana ao longo do seu percurso escolar e de vida, bem como para a sua integrao

    social (idem).

    No que se refere ao nosso pas, os princpios de organizao e orientao da

    educao pr-escolar, parecem-nos apontar nesse sentido, estabelecendo a Lei-Quadro

    da Educao Pr-escolar2, na sequncia do previsto na Lei de Bases do Sistema

    Educativo3 que:

    A educao pr-escolar primeira etapa da educao bsica no processo de

    educao ao longo da vida, sendo complementar da ao educativa da famlia,

    com a qual deve estabelecer estreita relao, favorecendo a formao e o

    desenvolvimento equilibrado da criana, tendo em vista a sua plena insero na

    sociedade como ser autnomo, livre e solidrio (Lei n 5/97, artigo 2).

    nas ideias contidas neste princpio que assentam as Orientaes Curriculares

    para a Educao Pr-escolar (OCEPE)4, nas quais deve apoiar-se o processo educativo a

    desenvolver com as crianas.

    Dos princpios acima referidos, como sublinha Rodrigues (2007), salienta-se o

    papel social bsico da educao pr-escolar e a relao de complementaridade que

    assume com a famlia, mas tambm a dimenso educativa que lhe cabe desempenhar,

    acentuando o princpio da continuidade da articulao com os restantes nveis

    educativos da educao bsica, no quadro de uma igualdade de oportunidades e de

    sucesso para todos.

    Relativamente ao desenvolvimento do processo educativo relevada a

    importncia de favorecer a progresso e diferenciao das aprendizagens, no sentido de

    se criarem as condies necessrias para que todas as crianas tenham ocasio de

    progredir e para continuarem a aprender (ME/DEB, 1997, p. 17), perspetivando-a no

    quadro de uma igualdade de oportunidades e de aprendizagem ao longo da vida.

    De acordo com o expresso nas OCEPE (idem): a educao pr-escolar cria

    condies para o sucesso da aprendizagem de todas as crianas, na medida em que

    promove a autoestima e autoconfiana e desenvolve competncias que permitem que

    cada criana reconhea as suas possibilidades e progressos (p. 18).

    Estas dimenses so desenvolvidas medida que as crianas se desenvolvem na

    sua individualidade, tendo em conta as suas caratersticas, mas tambm se promove no

    2 Lei n 5/97, de 10 de fevereiro

    3 Lei n46/86, de 14 de outubro Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE); Lei n 115/97, de 19 de

    setembro Alterao LBSE: Lei n49/2005, de 30 de agosto Segunda Alterao LBSE. 4 Despacho n5220/97, de 4 de agosto; Ministrio da Educao/Departamento de Educao Pr-escolar

    ME/DEB (1997).

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    24

    coletivo, na tomada de conscincia enquanto membro do grupo. Ela vai aprender a

    trabalhar com os outros, a ser progressivamente mais autnoma na concretizao das

    tarefas e a saber recorrer, quando necessrio, ao adulto enquanto mediador do processo

    educativo.

    Trata-se de dimenses que carecem, por isso, de ateno e reflexo,

    reconhecendo a complexa tarefa que reveste atender e responder s solicitaes e

    necessidades formativas de um grupo de crianas da faixa etria pr-escolar.

    Nesse processo merece no descurar o papel ativo que cada criana pode

    assumir na construo do seu desenvolvimento e aprendizagem, o que, como o

    documento que vimos citando sustenta partir do que as crianas j sabem, da sua

    cultura e saberes prprios (idem, p. 19) e valorizar os contributos do grupo para o

    processo formativo do mesmo.

    Vasconcelos (2007a), considerando os resultados de um estudo da Faculdade de

    Psicologia e Cincias da Educao da Universidade do Porto (2006), alerta para a

    necessidade de investir na qualidade das propostas educativas que so colocadas s

    crianas, de modo a contribuir para o desenvolvimento de processos cognitivos mais

    elaborados, sem cair no risco da escolarizao das crianas. Neste sentido, a autora

    (idem) releva que o carcter, mesmo fsico, dos jardins-de-infncia deve ultrapassar as

    propostas tradicionais (), para introduzir desafios que trabalhem na zona do

    desenvolvimento prximo das crianas, que provoquem problemas, que induzam a

    pesquisa cientfica e o trabalho exploratrio (idem, p. 55).

    Nesta linha de pensamento, Vasconcelos (idem) lembra, ainda, que o estudo da

    OCDE (2006) alerta para o perigo de uma escolarizao precoce das crianas,

    aconselhando a [manter] as caractersticas de uma educao de infncia que tome como

    ponto de partida o jogo e a expresso livre da criana (pp. 56-57), de forma a manter as

    caratersticas prprias deste etapa educativa. Por isso, considera-se importante:

    Colocar o bem-estar, o desenvolvimento e aprendizagem no centro do trabalho

    em educao e infncia, ao mesmo tempo que se respeita a inteligncia da

    criana e as suas estratgias naturais de aprendizagem, introduzindo as crianas

    aos valores democrticos da sociedade (idem, p. 55).

    Por outro lado, considerando um trabalho realizado por Peter Moss (2006), a

    autora (idem) lembra que este introduz a ideia de que o jardim-de-infncia, deve ser

    um lugar de encontro e dilogo entre cidados (p. 57), tendo em vista uma prtica

    democrtica, a qual necessita da partilha de um conjunto de valores, como: Respeito

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    25

    pela diversidade; reconhecimento da existncia de mltiplas perspetivas; favorecer a

    curiosidade, a incerteza e a subjetividade; pensamento crtico e um trabalho sistemtico

    de documentao pedaggica.

    Estas dimenses no podem deixar de constituir um importante desafio para ns,

    conscientes que estamos da rdua tarefa que representa concretizar um processo pautado

    por estes princpios, mas tambm do valor formativo que assume a sua promoo. Tanto

    mais que, como alerta tambm Vasconcelos (2007b), num outro documento:

    O jardim-de-infncia, formando as crianas a nvel pessoal e social, educando o

    seu sentido tico e esttico, prepara-as para uma efetiva prtica de cidadania:

    aprendem a importncia do respeito, como difcil negociar diferentes pontos de

    vista mantendo a amizade, aprendem acerca da diversidade e da igualdade de

    oportunidades, da paridade entre sexos, da diversidade de culturas, da

    importncia de cuidar do ambiente e da sade, interiorizando um sentido de

    responsabilidade social (p.113).

    Releva-se, neste sentido, a importncia de proporcionar s crianas

    oportunidades e recursos para poderem realizar experincias que envolvam esse tipo de

    vivncias. Esse processo pressupe que a construo de saberes ocorre da implicao

    pessoal e do relacionamento com os outros, tanto adultos como crianas, no quadro de

    uma corresponsabilizao pela sua prpria aprendizagem e a dos outros.

    Destaca-se a importncia de sustentar a ao educativa na indagao e na

    participao ativa e efetiva de todos os intervenientes, orientando-a para o dilogo com

    o meio que nos rodeia.

    Assim, deve valorizar-se o relacionamento reflexivo com a famlia das crianas,

    no sentido da partilha de informaes e cooperao no projeto formativo que, ao nvel

    do grupo e instituio, se pretende promover.

    Importa considerar que, como relevam as OCEPE (ME/DEB, 1997) e o Perfil

    especfico de desempenho profissional do educador de infncia5, importante promover

    o desenvolvimento de um currculo integrado, no qual sejam tomadas em considerao

    as diferentes reas e domnios de contedo curricular, aspeto que nos merecer maior

    desenvolvimento no ponto que se segue. Merece atender, tambm, as verdadeiras

    aprendizagens so as que ficam para a vida, que ajudam cada um a mudar como pessoa

    e a progredir, relacionando-se, portanto, com o seu desenvolvimento intelectual, tico e

    emocional.

    5 Decreto lei n 241, de 30 de agosto, de 2001.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    26

    2.2. As Orientaes Curriculares: Relanando o olhar sobre as reas de contedo

    As reas de contedo previstas nas Orientaes Curriculares e as Metas de

    Aprendizagem para a Educao pr-escolar so entendidas como formas de pensar e

    organizar o trabalho do educador e as experincias de aprendizagem a desenvolver com

    as crianas. Como se refere nas OCEPE (ME/DEB, 1997) a sua organizao tem por

    base as reas do desenvolvimento socio-afetivo, motor e cognitivo, no quadro de uma

    formao global da criana e de atividades que tm a ver com as possibilidades

    oferecidas pelo espao educativo, relevando formas diversas de articulao.

    Considerando o importante suporte que as reas de contedo representam para a

    orientao e reflexo da nossa interveno educativa importa que, de uma forma

    resumida, faamos uma breve abordagem s dimenses curriculares de cada uma,

    nomeadamente s reas de formao pessoal e social, expresso e comunicao e de

    conhecimento do mundo.

    A rea de Formao Pessoal e Social entendida como uma dimenso,

    transversal e integradora, para a qual devero contribuir as outras diferentes

    componentes curriculares e refere-se a um processo que deve favorecer a aquisio do

    esprito crtico e a interiorizao de valores espirituais, estticos, morais e cvicos (p.

    51), de modo a permitir s crianas tornarem-se em cidados conscientes, solidrios e

    autnomos, capacitando-os para a resoluo de problemas de vida. Nesta perspetiva

    surge acentuada a importncia de promover aprendizagens que se relacionam com a

    identidade, autoestima, autonomia, cooperao, convivncia democrtica e exerccio da

    cidadania.

    Sendo na famlia e no meio sociocultural prximo que as crianas iniciam as

    experincias de desenvolvimento pessoal e social, importa ter em conta que a educao

    de infncia facilita a sua integrao num contexto educativo mais alargado, no qual

    pode interagir com outros adultos e crianas que tm, possivelmente, valores e

    perspetivas diferentes das suas, constituindo-se como um contexto favorvel tomada

    de conscincia de si prprios e dos outros. Importa ter em conta que, como se refere nas

    OCEPE (ME/DEB, 1997), as relaes e interaes que o educador estabelece com cada

    criana e com o grupo, a forma como apoia as relaes e interaes entre as crianas no

    grupo, so o suporte dessa educao (p. 52).

    A rea de Expresso e Comunicao, como se referem nas Orientaes

    Curriculares (ME/DEB,1997) engloba as aprendizagens relacionadas com o

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    27

    desenvolvimento psicomotor e simblico que determinam a compreenso e o

    progressivo domnio de diferentes formas de comunicao (p. 56). Esta rea divide-se

    em trs domnios: domnio das expresses motora, dramtica, plstica e musical;

    domnio da linguagem oral e abordagem escrita e o domnio da matemtica.

    Todos estes domnios esto relacionados entre si e apontam para a aprendizagem

    de cdigos que so meios de relao, de recolha de informao e sensibilizao esttica

    e que permitem criana representar o seu mundo interior e o mundo que a rodeia. Por

    se tratar de formas de comunicao, estes domnios apelam para a perceo do mundo, a

    sensibilizao esttica, a utilizao de materiais e tcnicas como meio de criar

    oportunidades para pensarem e para construrem cadeias de conceitos que lhes

    permitam organizar os saberes (Leito et al., 1997).

    Ao nvel da linguagem oral e abordagem escrita, de acordo com Hohmann e

    Weikart (2009) as crianas de idade pr-escolar esto muito motivadas para comunicar

    com os outros atravs da conversao [e] apreciam participar em altos voos literrios

    como escrever e ler atravs de formas muito prprias (p. 522). Da o importante

    desafio que se coloca ao educador para propiciar-lhes ambientes instigadores

    expresso e interao verbal. Requer-se que as crianas usufruam de oportunidades para

    alargarem o seu vocabulrio, construrem frases corretas e mais complexas, permitindo

    um progressivo domnio da linguagem.

    As OCEPE (ME/DEB,1997) salientam a importncia de proporcionar s

    crianas o contacto com diversos tipos de texto escrito, levando-as a compreender a

    necessidade e as funes da escrita, bem como a desenvolver a sensibilidade esttica e a

    partilhar sentimentos e emoes.

    As novas tecnologias da informao e comunicao so um meio de

    comunicao com que as crianas contactam diariamente. Cada vez mais, fazem parte

    do nosso dia-a-dia e, por essa razo, devemos valoriz-las no processo de aprendizagem

    pr-escolar.

    No que se refere ao domnio da matemtica, de acentuar que na idade pr-

    escolar a construo de noes matemticas fundamenta-se na vivncia do espao e do

    tempo, tendo como ponto de partida as atividades espontneas e ldicas da criana. a

    partir da conscincia da sua posio e deslocao no espao, bem como da relao e

    manipulao de objetos que a criana pode desenvolver muitas noes matemticas,

    como: longe/perto, dentro/fora/entre, aberto/fechado, reconhecer, representar,

    diferenciar e nomear diferentes formas, classificar, seriar, ordenar, formar padres e

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    28

    construir o conceito de nmero. O desenvolvimento da capacidade de pensamento

    atravs destas experincias , segundo Zabalza (1998), crucial para a aprendizagem

    futura.

    Quanto ao domnio das expresses, podem diferenciar-se quatro vertentes:

    expresso motora, expresso dramtica, expresso plstica e expresso musical, cada

    uma com a sua especificidade prpria, mas que se completam mutuamente. Como se

    refere nas OCEPE (ME/DEB, 1997):

    O domnio das diferentes formas de expresso, implica diversificar as situaes e

    experincias de aprendizagem, de modo a que a criana v dominando e

    utilizando o seu corpo e contactando com diferentes materiais que poder

    explorar, manipular e transformar de forma a tomar conscincia de si prprio na

    relao com os objectos (p.57).

    No que diz respeito Expresso motora, importa considerar que medida que a

    criana cresce vai desenvolvendo a motricidade, comea a gatinhar, a andar e a correr,

    pelo que devemos proporcionar s crianas ocasies para exercitarem as suas

    competncias motoras, quer em termos de motricidade global quer de motricidade fina,

    recorrendo a jogos e materiais diversificados. Como sublinham Hohmann e Weikart

    (2009) numa abordagem educacional baseada no conceito aprendizagem activa e na

    importncia da construo do conhecimento efectuada pela criana, o movimento

    constitui um elemento essencial da experincia de aprendizagem (p. 625). Trata-se de

    ideias que procuramos ter em conta na nossa ao e, por conseguinte, que nos levam a

    valorizar os jogos de movimento na nossa ao, na sua relao com outras linguagens

    expressivas, como a dramtica, a musical, a plstica e a oral.

    No que se refere expresso dramtica, importa considerar que as crianas

    gostam e criam situaes de faz de conta com muita facilidade, utilizando e atribuindo

    aos objetos diferentes significados. Como afirmam Hohmann e Weikart (2009) atravs

    da imitao e do faz de conta as crianas organizam aquilo que compreendem e ganham

    sentido de mestria e controlo sobre os acontecimentos que testemunharam ou nos quais

    tomaram parte (p. 494). , ainda, de considerar que cada criana cria formas nicas

    de fazer de conta e de construir smbolos, de uma forma que para si fazem sentido.

    Importa que os adultos apoiem e encorajem as crianas a implicarem-se em jogos

    dramticos e a criarem os seus prprios smbolos e textos narrativos, para o que se

    requer valorizar os tempos de trabalho nas reas da sala e refletir sobre a qualidade e

    diversidade dos materiais que existem para poderem facilitar as suas representaes.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    29

    A expresso plstica implica que as crianas controlem a motricidade fina, que

    promovam a imaginao e as possibilidades de expresso (ME/DEB, 1997). Devem

    proporcionar-se s crianas experincias de aprendizagem com uma grande variedade

    de materiais e instrumentos, de modo a permitir-lhes alargar a imaginao e as

    possibilidades da expresso. Como sublinham Godinho e Brito (2010), na educao pr-

    escolar a expresso plstica deve combinar experincias em torno da explorao e

    descoberta (criao), da utilizao de tcnicas (execuo) e do contacto com diferentes

    formas de manifestaes artsticas (apreciao) (p. 11).

    No que diz respeito expresso musical, importa considerar que assenta num

    trabalho de explorao de sons e ritmos que as crianas vo aprendendo a identificar e a

    produzir, tendo por base, como se refere nas OCEPE (ME/DEB, 1997), diversos

    aspetos que caraterizam os sons: intensidade (fortes e fracos), altura (graves e agudos),

    timbre (modo de produo), durao (sons longos e curtos), chegando depois audio

    interior, ou seja, a capacidade de reproduzir mentalmente fragmentos sonoros (p. 64).

    No que se refere educao musical, esta desenvolve-se em torno de cinco mbitos, que

    se prendem com o escutar, cantar, danar, tocar e criar.

    Relevando a importncia a atribuir expresso musical, Hohmann e Weikart

    (2009), lembram que ouvir msica, mover-se ao seu som e fazer msica so

    experincias vitais que permitem s crianas expressar-se e participar nos rituais das

    suas comunidades (p. 656). Atravs de sons e ritmos a criana produz e explora

    espontaneamente o que vai aprendendo.

    Sintetizando as ideias apontadas em relao rea de expresso e comunicao,

    importa relevar a importncia de as crianas se envolverem num ambiente que

    possibilite promover as diferentes linguagens, quer seja na sua forma oral, escrita e

    criativa, dimenses a que ao longo da nossa prtica pedaggica, procurmos atender,

    como ainda teremos, no ponto 3 deste trabalho, ocasio de explicitar melhor.

    Em relao rea de Conhecimento do Mundo, importa considerar que esta

    abarca o incio das aprendizagens das diferentes cincias naturais e humanas, no sentido

    do desenvolvimento de competncias essenciais para a estruturao de um pensamento

    cientfico cada vez mais elaborado, que permita s crianas compreender, interpretar,

    orientar-se e integrar-se no mundo que as rodeia. Conforme as OCEPE

    (ME/DEB,1997), esta rea enraza-se na curiosidade natural da criana e no seu desejo

    de saber e compreender porqu (p. 79). Essa curiosidade fomentada e alargada na

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    30

    educao pr-escolar atravs de oportunidades de contactar com novas situaes

    simultaneamente ocasies de descoberta e explorao do mundo (p.79).

    A rea do Conhecimento do Mundo encarada como uma sensibilizao s

    cincias e que aponta para a introduo a aspetos relativos a diferentes domnios do

    conhecimento humano: a histria, a sociologia, a geografia, a fsica, a biologiaque,

    mesmo elementares e adequados a crianas destas idades, devero corresponder sempre

    a um grande rigor cientfico (ME/DEB,1997, pp.80-81).

    Alguns destes domnios esto, tambm, diretamente relacionados com a rea de

    Formao Pessoal e Social e a de Expresso e Comunicao, possibilitando s crianas

    edificarem conhecimentos de forma integrada acerca do mundo, dos outros e de si

    mesmas.

    Importa no esquecer que, desde muito cedo, a criana comea a contactar com

    situaes e objetos repletos de cincia, como por exemplo, encher um balo, ao brincar

    na banheira com brinquedos que flutuam, ao empurrar, puxar, atirar e levantar objetos,

    entre outros (Martins et al., 2009). atravs destas aes com os objetos, que a criana

    constri as primeiras aprendizagens. Quando as crianas chegam ao pr-escolar j tm

    algumas explicaes para diversos acontecimentos que nem sempre esto de acordo

    com o conhecimento cientfico da atualidade, mas que, para elas, fazem sentido e, por

    isso, difcil mud-las (idem). Como tal, relevante as crianas comearem, desde cedo

    a envolver-se em experincias de aprendizagem relacionadas com as cincias,

    incentivando-as e ajudando-as a descobrir mtodos ou estratgias que facilitem a

    observao e descoberta.

    Martins et al. (2009) sublinham que a educao em cincias, nos primeiros anos,

    estimula e desenvolve as ideias e interesses das crianas, contribuindo para uma

    imagem positiva e reflexiva face s cincias. Os autores (idem) relevam ainda que este

    tipo de aprendizagens facilita uma melhor perceo de conceitos em outros nveis de

    ensino, impulsiona a antecipao de pensar crtica e cientificamente, favorece o respeito

    pelo que se observa e a preocupao com o meio ambiente.

    Tendo como suporte estes propsitos, desenvolvemos experincias de

    aprendizagem diversas, algumas das quais descrevemos neste relatrio, no prximo

    ponto.

    Considerando as diferentes reas e domnios de contedo referidos, sublinha-se a

    importncia de, tal como as Orientaes Curriculares (ME/DEB, 1997) e Metas de

    aprendizagem (ME, 2010) sublinham, que devemos privilegiar uma abordagem que

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    31

    favorea a construo articulada do saber e, por conseguinte, enveredar por uma

    abordagem integrada e globalizante.

    2.3. Perspetivas pedaggicas

    A opo por uma perspetiva pedaggica pressupe o questionamento sobre

    teorias e prticas que podero ajudar-nos a construir um ambiente educativo

    comprometido com o desenvolvimento de respostas que favoream o bem-estar e

    progresso das crianas e dos contextos em que se integram e de ns prprios.

    Nesta linha de pensamento releva-se, como defende Oliveira-Formosinho

    (2007a), a importncia de mobilizar ideias que apontem para uma pedagogia

    transformativa que permita valorizar a ao e os saberes de todos, crianas e adultos no

    processo formativo.

    Segundo a autora (idem) podem caraterizar-se duas perspetiva pedaggicas em

    que os modos de interveno contrastam, assumindo uma matriz pedaggica

    transmissiva e outra uma matriz participativa.

    A perspetiva pedaggica transmissiva, tal como a designao deixa perceber,

    apoia-se na transmisso cultural e valoriza a estimulao ambiental exterior criana.

    Os objetivos educacionais so alcanados socialmente, de acordo com o previamente

    definido. O educador de infncia que desenvolve a sua ao educativa dentro desta

    perspetiva planifica, com antecipao, um currculo, diferenciando reas de contedo

    por componentes, numa ordenao de realizao, que vai do mais simples para o mais

    complexo. Os alunos so considerados passivos, necessitando motivao extrnseca e

    sensvel ao reforo (Skinner, citado por Fosnot, 1996). A preocupao central a

    organizao do currculo sequencial, bem estruturado, e a determinao do modo como

    iro avaliar, reforar e motivar a criana. O progresso das crianas avaliado atravs da

    medio de resultados observveis.

    A perspetiva pedagogia participativa, assume uma forma educacional alternativa

    anterior, que assenta nos processos de desenvolvimento das crianas, nas suas etapas

    de crescimento. Esta perspetiva v as crianas como construtoras ativas e que, como

    refere Fosnot (1996) d significados, interpretando a experincia por meio de

    estruturas cognitivas que so resultantes de maturao (p. 25).

    Nesta conceo, ao educador de infncia que cabe o papel de organizar o

    ambiente educativo enriquecido e ajustado do ponto de vista do desenvolvimento das

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    32

    crianas. A avaliao efetuada em funo dos limites de desenvolvimento e o

    currculo decomposto em termos das suas necessidades cognitivas, sendo, moldado ao

    estdio de desenvolvimento destes (Krogh & Slentz, 2001). Citando Kolberg e Mayer,

    Oliveira-Formosinho (1998) aponta que esta perspectiva no tem fundamentao

    terica clara que permita a prossecuo de objectivos educacionais especficos (p.123).

    2.4. Modelos Curriculares em Educao de Infncia

    Segundo Spodeck e Brown (2002) um modelo curricular uma representao

    ideal de premissas tericas, polticas e administrativas e componentes pedaggicas de

    um contexto que visa obter um determinado resultado educativo (p. 194). Baseando-

    nos em diferentes teorias, podemos entender que o modelo curricular estipula um

    conjunto de recursos e de estratgias que facultam a adequao, bem como a

    mobilizao dos saberes fundamentais necessrios na aprendizagem das crianas.

    Para Oliveira-Formosinho (2007b) a adopo de um modelo pedaggico pelas

    educadoras um factor de sustentao da sua prxis. A autora acrescenta dizendo que

    o facto de o Estado definir linhas curriculares no contraditria com esta adopo,

    pois a definio do estado diz respeito s aprendizagens mnimas obrigatrias, no s

    dimenses curriculares nem aos dispositivos pedaggicos, pois no compete aos estados

    arbitrar questes cientficas nem dirimir entre propostas pedaggicas. (p.40)

    Entre os modelos curriculares que se inscrevem na pedagogia participativa

    evidenciam-se o modelo High/Scope (Hohmann e Weikart, 2009), o modelo Escola

    Moderna (Niza, 2007) e o modelo Reggio Emilia (Malaguzzi, 2008). Importa que

    faamos, ainda que de uma forma resumida, uma abordagem a cada um destes modelos.

    No que se refere ao modelo curricular High/Scope a partir de meados da

    dcada de 80 que comea a surgir, no nosso pas, interesse por este modelo.

    O currculo situa-se no quadro de uma perspetiva desenvolvimentista, tendo

    vindo a evoluir para uma perspetiva socio-construtivista. Comeou por fundamentar-se

    na teoria de Piaget e Erikson, mas veio a integrar outras perspetivas, como a de Dewey,

    Bruner e Vygostky.

    Privilegia a metodologia de aprendizagem por descoberta, da resoluo de

    problemas e de gesto partilhada. O processo de aprendizagem visto como interativo,

    centrado na aprendizagem pela ao, uma vez que considera que o desenvolvimento e o

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    33

    conhecimento se vo construindo pelo sujeito a partir das suas interaes com o mundo

    que o rodeia, ou seja, atravs da ao e da experimentao.

    A preocupao central do modelo a construo intelectual da autonomia da

    criana (Hohmann & Weikart, 2009; Oliveira-Formosinho, 2007b). Os elementos

    estruturantes desse modelo so o espao, a rotina diria e as interaes (adulto-criana,

    criana-criana e adulto-adulto), numa lgica que coloque a criana no centro da

    construo da sua autonomia. Estes elementos funcionam como fatores facilitadores e

    promotores da mesma.

    Proporcionar criana o envolvimento ativo com pessoas e ideias e proporcionar

    atividades que lhes permitam explorar de forma natural os diferentes espaos e materiais

    a melhor forma de tornar as vivncias dirias das crianas em aprendizagens

    significativas. portanto, um modelo centrado na criana, nas suas exploraes e no

    desenvolvimento de experincias-chave (Hohman & Weikart, 2009).

    O conhecimento no emerge dos objetos ou das crianas, mas das interaes que

    se estabelecem entre a criana e esses objetos (Piaget, 1976). A aprendizagem ativa que

    este modelo defende depende, sobretudo, da interao positiva entre os adultos e as

    crianas. Pressupe-se que os adultos apoiem as conversas e brincadeiras das crianas,

    que as escutem com ateno, que faam os comentrios e observaes que considerem

    pertinentes, devendo encoraj-las a envolverem-se em experincias educativas,

    ajudando-as a aprender, a fazer escolhas e a resolver problemas. Desta forma, a criana

    sentir-se- mais confiante e com liberdade para manifestar os seus pensamentos e

    sentimentos.

    No que se refere ao espao de aprendizagem (sala de atividades), este deve ser

    organizado em reas bem definidas e diferenciadas, de modo a integrar uma grande

    variedade de materiais e a proporcionarem oportunidades de aprendizagem e de

    relacionamento entre todas as crianas. Como salientam Hohmann e Weikart (2009)

    num contexto de aprendizagem ativa as crianas necessitam de espaos que sejam

    planeados e equipados de forma a que essa aprendizagem seja efectuada (p. 161)

    Para que as experincias das crianas possam ser variadas, os materiais e

    objetos sua volta tambm o devero ser. As diferentes reas contm materiais

    facilmente acessveis que as crianas possam escolher para depois usarem conforme o

    que tinham planeado, para levar a cabo as suas brincadeiras e jogos. A criana dever-se-

    sentir desafiada a tocar, a experimentar, a ouvir, a cheirar e a saborear, em

    segurana fsica e emocional.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    34

    Quando a criana termina a tarefa que realizou, arruma devidamente os

    materiais que utilizou no lugar. Para que isto acontea, necessrio que todos os

    materiais se encontrem devidamente etiquetados, visveis e acessveis, o que permitir

    criana uma maior facilidade de arrumao. Esta organizao do espao e materiais

    facilita a proposta de atividades por parte do educador e, sobretudo, promove a escolha

    da criana. O tempo de planeamento, permite a iniciativa da criana, em qualquer

    momento, seja o da realizao de um plano, seja o da resoluo de um problema, seja o

    da colaborao com outros num pequeno projeto.

    O espao fsico entendido como um meio fundamental de aprendizagem que

    deve exigir do educador investigao e grande investimento, no seu arranjo e

    equipamento. A organizao do espao permite usufruir de um ambiente mais arrumado

    e organizado e, ao mesmo tempo, constitui uma forma de passar mensagens implcitas

    s crianas. dada preferncia aos materiais simples que possam ter vrias funes,

    como por exemplo os do dia-a-dia. As cores da instituio so tambm discretas. Os

    armrios, as mesas e as paredes so neutros, de preferncia da cor da madeira para

    transmitirem criana um ambiente familiar calmo, com pouca estimulao visual.

    Um espao educacional estruturado nestes moldes torna-se condio necessria

    para que a aprendizagem ativa que nele emerge, seja um suporte central das

    aprendizagens curriculares.

    Segundo Oliveira Formosinho (2007b) a organizao de um espao fsico que

    responda criana e a criao de estilos de interao que revelem respeito pela criana

    tm de fazer-se no quadro de coisas reais. Essas coisas reais so os interesses e as

    necessidades das crianas. De facto, no parece que possam restar dvidas sobre a

    centralidade destas preocupaes no mbito do programa High-Scope (p. 77)

    No que se refere rotina diria, embora a gesto do tempo seja pensada pelo

    adulto, tem que ser progressivamente construda pela criana. O adulto no pode alterar

    a rotina diria todos os dias, mas utilizar o tempo de cada dia para prestar servios

    educativos criana.

    Assim, estabelece-se um fluir do tempo dirio, que permite criana apropriar-

    se do mesmo, permitindo-lhe tornar-se autnoma e independente do adulto. A rotina

    diria estvel e, portanto, previsvel para a criana. A criana sabe o que a espera,

    conhece o tempo de rotina em que est no momento, conhece as finalidades desse

    tempo e, por isso, no precisa de ficar ansiosa, nem de se preocupar, pois sabe que

    existem momentos para diferentes atividades.

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    35

    Este conhecimento , simultaneamente, muitas coisas, entre elas, o

    conhecimento do antes, do agora e do depois. A previsibilidade da sequncia dos

    tempos de rotina contribui para a segurana e independncia da criana, estas, em

    conjugao com as possibilidades educacionais diferenciadas de cada tempo, permitem

    escolhas, decises, aes, tal como permitem diferentes tipos de interao e sustentam a

    comunicao.

    A rotina diria e o ambiente educacional assim estruturados, so um organizador

    duplo de ao do educador, principalmente, porque se criam condies estruturais para a

    criana ser independente, ativa, autnoma, facilitando, assim, ao educador uma

    utilizao cooperada do poder.

    Todos os dias, os adultos fazem um plano de uma rotina que apoiar a

    aprendizagem ativa da cada criana. Os adultos ficam a saber o que as crianas

    pretendem fazer (processo planear-fazer-rever) questionando-as. Depois, as crianas

    pem em prtica aquilo que planearam, e cabe ao adulto incentiv-las a rever as suas

    experincias. Isto no significa que elas tenham que contar de forma oral todos os

    passos que deram dentro da rea. A criana pode fazer uma reviso da sua experincia e

    do que acha que aprendeu, atravs de um simples desenho. Por outro lado, alm dos

    planos individuais, podem criar-se pequenos grupos numa sala, devendo o educador

    encorajar as crianas a explorar e a experimentar novos materiais. Quando se trabalha

    em grande grupo pode optar-se por atividades de msica e de movimento e de jogo

    cooperativo (incentivando assim a coeso de grupo).

    A avaliao realizada atravs de vrios instrumentos de avaliao, prprios do

    modelo. So instrumentos rigorosos e complementares, permitem que a avaliao seja

    feita mediante um registo dirio das observaes feitas. Essas observaes so

    registadas em papel, fotografia ou em gravao de voz e de imagem e, posteriormente,

    analisadas, tanto pelos educadores como pelo psiclogo.

    O modelo curricular Reggio Emilia baseia-se nas relaes, interaes e

    cooperao, onde o educador procura criar um ambiente agradvel e familiar, no qual,

    as crianas, as famlias e os educadores se sintam como em casa. Segundo Lino (2007)

    um dos pilares do modelo Reggio Emilia o sentimento e a vivncia de

    comunidade educativa, onde os professores e as famlias constituem uma equipa

    de trabalho, cooperando e colaborando para conseguir um atendimento de

    melhor qualidade para as crianas. A aprendizagem processa-se de forma

    bilateral e recproca entre as crianas professores e famlias, em que todos

    aprendem com todos (p. 95).

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

    36

    Trata-se de um modelo que prima pela valorizao do outro e que d primazia

    escuta atenta da criana. Valoriza-se uma pedagogia de escuta (Lino, 2007), pois,

    escutando que se valoriza e respeita o outro, estando atento s suas diferenas e de ser

    capaz de as aceitar, conhecer e legitimar. Por isso, a escuta requer uma profunda

    abertura mudana e no significa perder o poder, significa multiplicar o poder,

    enriquecendo aquele que escuta e o que escutado (p. 110).

    O papel do professor o de criar um contexto educacional de conforto,

    confiana e motivao, no qual as teorias e a investigao das crianas so escutadas e

    legitimadas. Neste contexto, privilegia-se o ouvir (no s com os ouvidos, mas com

    todos os sentidos) e o falar, d-se prioridade ao que a criana diz em detrimento do que

    o professor fala e expe. A criana vista como ativa, possuidora de conhecimentos e

    competncias, criativa e produtora de cultura.

    No modelo Reggio Emilia procura-se, como sublinha Lino (2007) retomando a

    ideia de Rinaldi (1998):

    promover as relaes, as interaes, a comunicao entre os trs protagonistas

    do processo educativo as crianas, os professores, os pais e a comunidade em

    geral. Acredita-se que todo o conhecimento emerge de uma construo pessoal e

    social, onde a criana tem um papel activo na sua socializao co construda

    com o grupo de pares e com os adultos (p. 102).

    As crianas so estimuladas a explorar o ambiente, expressando-se, usando

    diversas formas de linguagem ou modelos de expresso, o que significa usar diferentes

    tipos de palavras, desenhos, movimentos, pintura, moldagem, msica e jogos

    dramticos. Atravs destas mltiplas formas de expresso a criana pode representar a

    realidade que a rodeia e o seu conhecimento fsico e social.

    A documentao assume um papel importante, no modelo Reggio Emilia, pois

    atravs desta as crianas podem com facilidade partilhar as suas experincias,

    favorecendo as relaes entre educadores crianas e famlias.

    A organizao do espao resulta, tambm, de um trabalho de cooperao e

    colaborao, em que todos os intervenientes, no processo educativo, devem

    complementar e partilhar esforos e tarefas. Deste modo, o espao cuidadosamente

    planeado por educadores, pedagogos, artistas plsticos, pais e arquitetos.

    No que se refere organizao do espao fsico, nas escolas que seguem o

    modelo Reggio Emlia existe um espao comum que a piazza e sua volta encontram-

    se dispostas as trs salas de atividades. Junto de cada sala existe um miniatelier de apoio

    aos projetos que vo surgindo. Comum a toda a escola existe tambm uma biblioteca

  • Mestrado em Educao Pr-Escolar - Relatrio de Estgio

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    com computadores, um arquivo, um atelier, uma sala para guardar materiais, uma

    cozinha, um refeitrio e vrias casas de banho.

    Os espaos comuns (piazza, biblioteca, atelier, arquivo, refeitrio) permitem s

    crianas e adultos estabelecer interaes, partilhando assim experincias, ideias,

    conhecimento, espaos e materiais.

    As salas esto divididas por reas. Para essa diviso so utilizadas divisrias

    baixas de forma a permitir criana e ao educador uma visibilidade global da sala e das

    diferentes possibilidades que o espao lhe oferece.

    O espao exterior entendido como uma continuidade do espao interior. Este

    deve ter caractersticas naturais, zonas com sombras, solo irregular e terreno uniforme,

    zonas com areia, gua e materiais que permitam realizar experincias lgico-

    matemticas. Devem existir tambm estruturas para brincar e realizar atividades

    especficas, trepar, saltar, escorregar, baloiar, ultrapassar obstculos, etc. No espao

    exterior (na entrada) devem existir cadeiras para que os pais possam sentar-se e

    conversar uns com os outros, com as crianas e com os professores. O aspeto deste

    espao deve ser agradvel estando cuidadosamente decorado, existindo harmonia entre

    os materiais e equipamentos e as cores, procurando favorecer o desenvolvimento social

    e cognitivo das crianas.

    Nas escolas Reggio Emilia a esttica fundamental, as paredes e mobilirios tm

    cores neutras, as janelas so grandes, as portas ou paredes de vidro, para facilitar a

    comunicao entre os diferentes espaos, os materiais de diferentes cores e diferentes

    texturas. Nas paredes existem placares onde so expostos os trabalhos das crianas,

    esses podem estar acompanhados de fotografias e textos que documentam as etapas do

    processo das atividades educativas das crianas. Como frisa Gandini (1999) um

    modo de transmitir aos pais, aos colegas e aos visitantes o potencial das crianas, suas

    capacidades em desenvolvimento e o que ocorre na escola (pp.155-156)

    O espao sem dvida muito importante sendo mesmo considerado como o 3.

    educador, j que na sala devem existir dois (idem). O espao deve ser flexvel, estar

    aberto s mudanas, de modo a dar resposta s necessidades dos que o ocupam.

    No que se refere organizao do tempo nestas escolas, no se pode considerar

    que existe uma rotina diria, o que existe um tempo determinado para cada uma das

    atividades, ou seja o tempo organizado de forma a proporcionar s crianas

    oportunidades de estabele