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FINANÇAS PÚBLICAS: O “PONTO CEGO” DA AÇÃO DO ESTADO
Vanice Regina Lírio do Valle
A falta de compreensão sobre o orçamento público – como ele se constrói,
mas cima de tudo, como se executa – está na raiz do conhecido problema de
desatendimento pelo Estado de compromissos que a Constituição lhe traça.
Notícia recente no CONJUR mostra outra manifestação disso.
A notícia é de uma decisão da 6ª Vara Federal de Campinas, onde se
proíbe a União de empreender ao contingenciamento de recursos do Fundo de
Defesa dos Direitos Difusos. Vamos traduzir o que isso quer dizer.
No orçamento público, é possível a criação por lei, de “fundos especiais”.
Isso nada mais é do que associar uma determinada receita (na hipótese da
notícia, são recursos que venham de condenações judiciais por violação a
direitos coletivos) a uma finalidade específica. A expressão comum é “carimbar
o dinheiro” – tudo que venha daquela fonte só pode ser aplicado naquela
destinação.
Criar fundos especiais é um mecanismo relativamente comum de garantir
que determinadas atividades (que nem sempre são prioridade dos governantes)
venham ter conte de recursos, de financiamento. O FDD, mencionado na notícia,
se relaciona a violação a direitos coletivos – pense por exemplo, no desastre de
Mariana, onde além da população ribeirinha, há uma lesão ao direito coletivo de
proteção ao meio ambiente.
A notícia dá conta de que esse “dinheiro carimbado” não vem sendo objeto
de aplicação – não se tem realizado o empenho, que é a primeira providencia
técnica para aplicar os recursos. E porque isso? Aparentemente para favorecer
o saldo final das contas do governo – para não agravar o déficit público, a
circunstância de que se está gastando mais do que se arrecada.
O resultado final, todavia, é que o fundo especial não tem utilidade
nenhuma, porque embora os recursos fiquem “carimbados”, eles não são
Visiting Fellow junto ao Human Rights Program da Harvard Law School. Pós-doutorado em Administração pela EBAPE – Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV/Rio); Doutorado em Direito pela UGF. Professora Permanente do PPGD/UNESA, Membro do Instituto de Direito Administrativo do Estado do Rio de Janeiro e Procuradora do Município do Rio de Janeiro.
aplicados. Você que é da área jurídica, e do direito público, deve ter ouvido
notícia parecida com relação ao fundo penitenciário – o STF na ADPF 347
ordenou, na mesma linha de conclusão dessa decisão aqui, que não houvesse
o contingenciamento (em linguagem vulgar, o “bloqueio”) destes recursos.
Importante avançar no estudo do real regime jurídico destes fundos
especiais – que estão sendo frustrados na sua intenção, com essa manobra
prática de simplesmente, não se aplicar o saldo que ali está acumulado. O Direito
Financeiro preciso entrar na nossa esfera de estudo e consideração.